Você está na página 1de 3

Apendicite

DEFINIÇÃO
- Resquício embrionário fixado na confluência das tênias do ceco.
- Ocorre devido a inflamação do apêndice vermiforme (diferenciar do epiplóico).

EPIDEMIOLOGIA
- Primariamente entre os 10 e 30 anos de idade, afetando 6 a 7% da população, mais frequente no sexo masculino.

ANATOMIA E EMBRIOLOGIA
- Órgão do intestino médio, formando a partir de uma dilatação do ceco.
- Mucosa semelhante à do intestino grosso, com epitélio colunar, células neuroendócrinas e células de goblet (produtoras de mucina).
- Tecido linfoide na submucosa, indicando papel no sistema imune.
- O apêndice possui funções imunológicas (secreta IgA, maturação de linfócitos), microbiológica (armazenando bactérias benéficas para que possam
recolonizar o cólon, e há estudos que associam apendicectomia com infecção por Clostrioides mais grave e prolongada) e possivelmente endócrinas (já
foram isolados hormônios aminas em seu muco).
- Localiza-se no ceco, na área de confluência das tênias, sua posição NÃO varia, ou seja, sempre está localizado no ceco, o que varia é a direção da ponta
(retrocecal, subcecal, pélvica, pré ou pós íleal) do apêndice e/ou a posição do ceco.
- Pélvica: sintomas urinários (disúria, urgência) e retais (diarreia, tenesmo).
- Retrocecal: dor lombar.
- Vascularização se dá pela artéria apendicular > artéria ileocólica > artéria mesentérica superior.
- Possui flora polimicrobiana, com presença de anaeróbios (bacterioides fragilis) e aeróbios (e. coli, estreptococcus viridans, pseudomonas aeruginosa).

FISIOPATOLOGIA
- Obstrução da luz do apêndice: fecálito, apendicolito, hiperplasia linfoide (principalmente em crianças).
- Alguma coisa (fecálito, hiperplasia linfoide, neoplasia) leva a obstrução do lúmen proximal do apêndice, então acumula-se muco na cavidade formada e
proliferam-se bactérias, que podem produzir gases, aumentando a pressão intraluminal, reduzindo a drenagem venosa e linfática, aumentando o
extravasamento dos capilares e edemaciando a parede do órgão, culminando em isquemia, se intensa, pode causar necrose de porção da parede, levando
a perfuração, liberando as bactérias presentes na cavidade abdominal.

CLÍNICA E EXAME FÍSICO


- Dor periumbilical (distensão do apêndice estimula as fibras nervosas aferentes viscerais, causando dor abdominal vaga), conforme a inflamação progride,
alcança o peritônio parietal, há estímulo a nervos somáticos, que lavam a dor localizada em FID.
- Anorexia, náuseas, vômitos, febre, disúria.
- Sinais clássicos:
- Blumberg: descompressão súbita dolorosa em McBurney (vibração do peritônio parietal).
- Rovsing: pressão FIE e dor FID (deslocamento da coluna de ar, levando a distensão do FID, que comprime o apêndice).
- Dunphy: dor FID que piora com tosse (vibra o peritônio).
- Lenander: T retal > T axilar em pelo menos 1ºC (mostra quadro inflamatório pélvico inferior) – isquemia mesentérica aguda com lenander reverso
(andar superior do abdome).
- Sinal do obturador: dor abdominal à rotação interna do quadril (pélvico, sobre o músculo obturador interno).
- Sinal do Psoas: dor na FID à extensão do quadril (retrocecal, sobre o músculo psoas).
- Paciente imóvel devido a presença de peritonite localizada que torna qualquer movimento doloroso.
- Taquicardia e desidratação.
- Febre, podendo ser baixa < 38,5 ou até alta.
- Abdome silencioso com dor e defesa à palpação do FID.
- Se peritonite, rigidez da parede abdominal, podendo haver massa palpável se abcesso.

DIAGNÓSTICO CLÍNICO
- Alta probabilidade (história clássica, homem): clínico (não há outras condições que causam clínica semelhante – e.g. cisto roto).
- Probabilidade média (criança, idoso, mulher): imagem.
- Complicação (massa palpável ou tardio > 48 horas): imagem.

EXAMES LABORATORIAIS
- Hemograma: leucocitose, indicando inflamação, se desvio à esquerda aumenta a probabilidade (neutrófilo – bastões – aumentadas entre 5 a 10%).
- PCR: aumenta a sensibilidade quando combinada ao hemograma.
- Mulheres: teste de gravidez, determinando hipóteses (gravidez ectópica) e a conduta (solicitar tomografia ou ultrassom).
- Criança ou gestante: USG, indicando apêndice maior ou igual a 7mm, espessamento, aumento da vascularização (doppler).
- USG com apêndice normal: sem apendicite.
- USG sem visualização de apêndice: inconclusivo, em gestante, realizar RM (teoria, na prática não é feito).
- Homem ou não gestante: tomografia, indicando apêndice maior ou igual a 7mm, espessamento, borramento da gordura periapendicular, abcesso,
apendicolito.
- Tomografia é o mais acurado, deve ser feito com contraste endovenoso (sem contraste também é acurada), permitindo a avaliação de diagnósticos
diferenciais, delinear presença de abcesso e flegmão, guiando a conduta cirúrgica.
- Achados TC: aumento da espessura, realce das paredes, borramento de gordura, apendicolito (apêndice inteiro com espessura de >6mm, e cada parede
> 2mm.
- Achados RX: apendicolito (presente em 5% dos casos) e pneumoperitônio (indicando perfuração de víscera, como úlcera ou diverticulite), achados
indiretos, pois não permitem ver o apêndice inflamado.
- Achados USG: incompressibilidade do apêndice, dor à compressão do apêndice, espessamento, apendicolito, aumento de ecogenicidade na gordura.
- Achados RM sem contraste (gestante): aumento do apêndice >7mm, espessamento >2mm e presença de inflamação.

TRATAMENTO
APENDICITE AGUDA NÃO COMPLICADA
- Simples (sem complicações - perfurações) e precoce (menos de 48h): ATB profilático + apendicectomia em 12 a 24 horas (não há tanto risco de
perfuração ou complicações) OU manejo não operatório (contraindicado se apendicolito OU idade > 45 anos).
- Apendicectomia imediata: reanimação hídrica, antibióticos de amplo espectro para anaeróbios e gram-negativos.
APENDICITE AGUDA PERFURADA
- Reanimação mais agressiva, terapia antibiótica imediata.
- Aberta ou laparoscópica são indicadas.
- Culturas não são mandatórias, mas se realizada para orientar troca de ATB, se necessário.
- Pós-operatório com ATB por 4 a 7 dias.
- Aspiração nasogástrica se íleo pós-operatório.
- Retornar alimentação oral o mais breve, alta quando tolerar dieta, sem febre, leucócitos normais.
- Se febre, leucocitose, dor e atraso no retorno da função do TGI, investigar abcesso.
APENDICITE TARDIA
- Tratamento não operatório: reanimação com fluídos e terapia ATB de amplo espectro.
- TC para diagnóstico de abcesso ou flegmão.
- Abcesso: drenagem percutânea guiada por TC, ATB 4 a 7 dias (pode ser feita drenagem operatória ou laparoscópica).
- Flegmão, sem possibilidade de drenagem: ATB 4 a 7 dias.
- Apendicectomia de intervalo (após esfriar abcesso/flegmão) SE recorrência.
APENDICECTOMIA NEGATIVA
- Avaliar o abdome em busca de líquido livre (perfuração), íleo (divertículo de Meckel), serosa do delgado (inflamação, indicando doença de Crohn),
mesentério ileal (adenite mesentérica), anexos ovarianos (salpingite, torção ovariana, abcesso, endometriose, cisto roto), cólon sigmoide (diverticulite
aguda).
- Se ambos negativos, pensar em abdome superior, com vesícula biliar e duodeno.
- Posteriormente, realiza-se remoção do apêndice, removendo apendicite de diagnóstico diferencial.
APENDICITE CRÔNICA
- Dor abdominal recorrente em FID, com alívio posterior a apendicectomia.
APENDICECTOMIA ACIDENTAL
- Durante outra cirurgia (e.g. histerectomia) realiza-se a remoção do apêndice, sendo indicado APENAS se anomalias visualizadas durante operação.

CLASSIFICAÇÃO

OBSERVAÇÕES
- Complicada (perfurada, abcesso, flegmão) ou tardia: imagem para indicar conduta.
- Não complicada: trata como simples.
- Complicada:
- Perfurada: cirurgia de emergência se sepse, instabilidade hemodinâmica, peritonite generalizada (todo abdome, DM difusa, abdome em
tábua ou rígido), pneumoperitônio, com 2 a 4 dias de ATB intravenoso.
- Abcesso: drenagem do abcesso + ATB + colonoscopia para descartar outras causas, como neoplasia (4 a 6 semanas), apendicectomia
tardia se necessário.
- Flegmão: inflamação piogênica com infiltração e propagação para os tecidos (massa inflamatória), antibióticos e observação, se melhora
clínica, alta, reavaliação em 6 a 8 semanas se melhora do processo inflamatório e agendamento de cirurgia.
- Peritonite difusa: cirurgia de urgência + antibioticoterapia terapêutica, utilizar videolaparoscopia (pus em todos os 4 quadrantes, permitindo
melhor visualização – exceto se instabilidade hemodinâmica).
- Pode ser feita aberta ou por vídeo (mais indicada em provas), com incisão de McBurney (oblíqua), rockey-davis (transversa) ou mediana (abaixo do
umbigo).
- Se durante cirurgia o apêndice não está inflamado é realizado apendicectomia acidental.
- Manejo não operatório: paciente internado, recebendo ATB endovenoso, analgesia e sob observação, normalmente por 3 dias. Na ausência de dor com
melhora da anorexia, alta com ATB até completar 7 a 10 dias de tratamento.
- Conforme estudo CODA, há evidência que o antibiótico não muda desfecho, apoiado pelo fato de que a apendicite não-perfurada é fundamentalmente
inflamatória e não infecciosa.
- Vantagens: evita cirurgia e o pós-operatório.
- Desvantagens: recorrência da apendicite e não detectar neoplasia.
POPULAÇÕES ESPECIAIS
GESTANTES
- Apresentação típica em 50 a 60% dos casos, entre 2 e 3º trimestre, com sintomas da gestação semelhantes ao da apendicite.
- Exame físico mais difícil e alterado pelo útero gravídico, que desloca o apêndice em localização mais cefálica.
- Dor do ligamento redondo, parto pré-termo, DPP ou ruptura uterina podem ser diagnósticos diferenciais.
- Possui leucocitose e PCR elevados fisiologicamente.
IDOSO
- Dor abdominal aguda, sem presença de febre, dificuldade diagnóstica por demência ou estado mental alterado.

ESCORE DE ALVARADO

COMPLICAÇÕES
- Perfuração, podendo evoluir com abcesso e peritonite difusa.
- Ressecção ileocecal em apendicite perfurada: quadro prolongado, PCR elevado (>10), não visualização do apêndice, presença de flegmão.
- Abcesso no pós-operatório: febre, leucocitose, persistência da dor abdominal e anorexia.

DIAGNÓSTICO DIFERENCIAL
- Apendagite epiplóica: infarto isquêmico de um apêndice epiplóico (pequena bolsa de gordura associada ao cólon), devido à torção dela.
- Adenite mesentérica: inflamação dos linfonodos mesentéricos, por processo infeccioso, secundário a vírus e bactérias.
- Crianças: adenite mesentérica, GECA, intussuscepção, diverticulite de Meckel, doença inflamatória intestinal.
- Meninos: torção testicular.
- Nefrolitíase e ITU em ambos os sexos.
- Ginecológicas: ruptura de cistos ovarianos, dor do meio do ciclo (ovulação), endometriose, torsão ovariana, gravidez ectópica, DIP.
- Idosos: diverticulite aguda e neoplasia.
- Neutropênico: tiflite (enterocolite neutropênica).

Você também pode gostar