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UNIVERSIDADE ESTADUAL DE MONTES CLAROS – UNIMONTES

CCH – CENTRO DE CIÊNCIAS HUMANAS


DEPARTAMENTO DE HISTÓRIA

Ary Batista Neto

Mangás e Animês: A cultura pop japonesa no Brasil

São Francisco/MG
2017
Ary Batista Neto

Mangás e Animês: A cultura pop japonesa no Brasil

Trabalho de Conclusão de Curso apresentado como


requisito parcial para obtenção de título de
licenciado em História, pela Universidade Estadual
de Montes Claros – UNIMONTES
Orientadora: Prof.ª M.ª Andréa Helena Puydinger
De Fazio

São Francisco/MG
2017
Ary Batista Neto

Mangás e Animês: A cultura pop japonesa no Brasil

Trabalho de Conclusão de Curso apresentado como


requisito parcial para obtenção de título de licenciado
em História, pela Universidade Estadual de Montes
Claros – UNIMONTES

São Francisco, ____ de _______________ de 2017.

BANCA EXAMINADORA

__________________________________________________
Orientadora Prof.ª M.ª Andréa Helena Puydinger De Fazio
Professora da Universidade Estadual de Montes Claros – Unimontes

__________________________________________________
Prof. Dr. Alysson Luiz Freitas
Professor da Universidade Estadual de Montes Claros - Unimontes

__________________________________________________
Prof. Dr. Alessandro de Almeida
Professor da Universidade Estadual de Montes Claros - Unimontes
Agradecimentos

A Mariana, que me deu o apoio mais importante durante todo este curso.
A toda Universidade, o corpo docente que tanto me ensinou, e meus colegas de sala e
de campus, pela convivência prazerosa e pelas boas experiências.
A Andréa, minha orientadora, por todas as correções minuciosas e o cuidado em fazer
deste um bom trabalho. Sem sua orientação este seria, sem dúvidas, um trabalho muito
inferior.
A toda minha família que me incentivou e me deu todo o suporte necessário.
Especialmente os meus amados avós Clarice e Ary (in memoriam).
A todos mais que, por quaisquer meios, me ajudaram nessa jornada.
Resumo

O presente trabalho analisa a presença da cultura pop japonesa no Brasil, focando no que
consideramos ser o principal produto dessa cultura no exterior: os animês e mangás. Para esta
tarefa, utilizamos o conceito de indústria cultural, desenvolvido pelos pensadores
frankfurtianos Adorno e Horkheimer, a fim de entender o que são, em essência, os produtos
da cultura pop as implicações dessa cultura no seu público consumidor. Revisitamos através
de análise bibliográfica alguns dos materiais mais relevantes já produzidos no Brasil sobre a
cultura pop japonesa, e inserimos as informações obtidas sobre a história dos mangás e
animês dentro do contexto histórico do desenvolvimento político e econômico do Japão, a fim
de entender suas relações. Por fim, afunilamos ainda mais a análise e separamos dois mangás
de gerações diferentes para, ao analisar comparativamente as produções, perceber suas
diferenças através de suas relações com seus respectivos contextos históricos.

Palavras-chave: mangá; animê; indústria cultural; Japão; Brasil.


Abstract

This paper works on the japanese pop culture in Brazil by focusing which we consider the
main products of this culture outside of Japan: the animes and mangas. In order to fulfil this
task, we used the concept of cultural industry, developed by the Frankfurt School
philosophers Adorno and Horkheimer. Then, we tried to understand what are in essence the
pop culture products and its implications over its consumer public. By bibliographic analysis,
we revisited some of the most relevant works produced in Brazil about the Japanese pop
culture, we inserted the informations obtained about the history of manga and anime within
the context of the political and economic development of Japan, in order to understand its
relations. Lastly, we narrowed the analysis by picking two mangas from different generations
to compare its differences, from the relations with they respective historical contexts.

Keywords: manga; anime; cultural industry; Japan; Brazil.


“Já não posso meditar no que vejo. As imagens em
movimento substituem meus próprios pensamentos.”
(Georges Duhamel)
Lista de Figuras

Figura 1: Imagem do primeiro rolo do chojugiga……………………………………............23.


Figura 2: A Grande Onda de Kanagawa..................................................................................24.
Figura 3: Astro Boy.................................................................................................................27.
Figura 4: Capa de Dragon Ball................................................................................................40.
Figura 5: Os chapéus de palha de One Piece...........................................................................46.
Figura 6: Os Gorousei de One Piece........................................................................................47.
Figura 7: Figure art de One Piece……………………………………………………………50.
Sumário

INTRODUÇÃO .................................................................................................................................... 10

1 A INDÚSTRIA CULTURAL E A CULTURA POP JAPONESA .................................................... 13

1.1 A indústria cultural ...................................................................................................................... 13

1.2 A indústria cultural no Japão: a formação do pop japonês.......................................................... 19

1.2.1 O mangá ................................................................................................................................... 22

1.2.2 O animê .................................................................................................................................... 28

2 A INTERNACIONALIZAÇÃO DO POP JAPONÊS: ANIMÊS E MANGÁS NO BRASIL .......... 29

2.1 Mangás e animês ganham o mundo ...................................................................................... 29

2.2 Mangás e animês no Brasil.................................................................................................... 30

2.3 Os otakus: Influências do pop japonês no Brasil .................................................................. 33

3 DRAGON BALL E ONE PIECE: A CONSTRUÇÃO DOS UNIVERSOS FICTÍCIOS DOS

MANGÁS E SUA RELAÇÃO COM SEU CONTEXTO HISTÓRICO .............................................. 37

3.1 Dragon Ball: a antropofagia da cultura pop ............................................................................... 38

3.2 One Piece: A liberdade como valor supremo ............................................................................. 44

3.3 A influência do contexto histórico na construção dos universos fictícios dos mangás .............. 49

CONSIDERAÇÕES FINAIS ................................................................................................................ 52

FONTES....................................................................................................................................54

REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS .................................................................................................. 54


10

INTRODUÇÃO

Animês e mangás – animações e quadrinhos japoneses – já não são novidade no


Brasil: as mídias audiovisuais japonesas estão presentes no país desde a década de 1960,
porém foi apenas entre os anos 1990 e 2000 que os animês e mangás viraram febre nacional.
Títulos como Dragon Ball, Os Cavaleiros do Zodíaco, Pokémon e Samurai X trataram de
estabelecer um público concreto, contribuindo para que as editoras pudessem investir
pesadamente na publicação de mangás e para que houvesse programas na TV aberta, e em
canais por assinatura, dedicados exclusivamente à transmissão de animês (CARLOS, 2010, p.
1-3).
Com o advento da internet, surgiram o fansubing e o scanlation, que são,
respectivamente, a legenda de animês e a tradução de mangás, ambos feitos de fã para fã, sem
intuito comercial. Essa prática, que pode ser identificada como pirataria, por um lado
prejudica comercialmente as edições brasileiras dos mangás e animês, mas, por outro, foi
fundamental para a explosão de público, criando um clima propício para a difusão da cultura
pop japonesa e as atividades comerciais ligadas à mesma. Além disso, a internet também
acabou por disseminar outros elementos do pop japonês no Brasil, que, por sua vez, são
consumidos pelo mesmo público, ajudando a criar uma subcultura voltada para o pop japonês,
que engloba não apenas os animês e mangás, mas também vídeo-games, música pop e live-
actions1 (CARLOS, 2010, p. 3).
Atualmente, no Brasil, ocorrem grandes encontros e eventos voltados para o público
otaku2, que envolvem atividades como concursos de cosplay3, campeonatos de jogos
eletrônicos e apresentações de youtubers famosos e dubladores de animês. Mesmo em Montes
Claros, encontros como esses já acontecem anualmente, chamando a atenção da mídia local
pela dimensão dos eventos e pela mobilização regional que provoca4.
Dessa forma, notamos que é cada vez mais evidente a força e representatividade que
essa cultura possui atualmente no Brasil, bem como a necessidade do aprofundamento de seu
estudo. Para tal, buscaremos, como objetivos desta pesquisa, entender o desenvolvimento dos
quadrinhos japoneses e as condições históricas que permitiram com que os mangás e animês

1
Histórias fantásticas filmadas com atores reais.
2
“Otaku” é um termo usado para designar os fãs de animês, mangás, cosplays, e outros gêneros da cultura pop
japonesa.
3
Abreviação do inglês “costume play”. Ato de se vestir e interpretar um determinado personagem.
4
G1 Grande Minas. Montes Claros sediou o III Anime King. Disponível em: http://g1.globo.com/mg/grande-
minas/mgintertv-1edicao/videos/t/edicoes/v/montes-claros-sediou-o-iii-anime-king/2598587/. Acesso em
21/03/2015.
11

japoneses emergissem no Ocidente e pudessem competir, em igualdade de importância, com


as comics e animações americanas.
Assim, será necessária uma análise sobre a reprodução de bens culturais no
capitalismo, uma vez que a cultura pop, ou de massa, está essencialmente ligada à técnica
industrial e a emergência da comunicação de massa (LUYTEN, 2011, p. 75). Para isso, é
indispensável recorrer ao pensamento da Escola de Frankfurt, mais especificamente de
Theodor Adorno e seu conceito de “Indústria Cultural”, a partir do qual ele enfatiza o caráter
dominador da produção em massa de bens culturais (ADORNO; HORKHEIMER, 1985, p.
105). Referente à historiografia nacional, utilizaremos, no desenvolvimento desta análise,
diversas pesquisas e artigos que analisam as ideias frankfurtianas, além do trabalho de Ecléa
Bosi “Cultura de Massa e Cultura Popular: Leituras operárias”, no qual ela apresenta os
principais pensamentos sociológicos sobre o tema.
A produção historiográfica no Brasil sobre cultura pop japonesa, por sua vez, é
pequena, e a escassa produção acadêmica sobre o tema se concentra nos cursos de
comunicação. Destacam-se, nas pesquisas relativas ao tema em questão, os trabalhos de Sonia
Bibe Luyten, que publicou diversas obras sobre o tema5. Exploraremos também, além do
material já citado, alguns trabalhos de monografia e publicações em periódicos, assim como a
também pequena produção sobre o tema fora do mundo acadêmico, onde se destaca a obra de
Cristiane Sato “Japop: O Poder da Cultura Pop Japonesa”.
Os objetivos desta pesquisa se dividem em duas categorias: a primeira tem relação
com os aspectos externos aos mangás e animês, a realidade que os rodeia, que os cria e os
consome. A segunda, com os aspectos internos dos mangás, sua estrutura, seu enredo e como
esses elementos internos se relacionam com o contexto histórico. Assim, buscaremos
inicialmente entender como opera a indústria cultural, analisar seu desenvolvimento no Japão
e a internacionalização da cultura pop japonesa, bem como os grupos consumidores dessa
produção. Resumidamente, os objetivos se dividem em compreender as condições históricas
que levaram ao surgimento dos mangás e animês e a relação desses com seu próprio tempo.
Terminada a contextualização, passaremos às fontes e analisaremos os elementos
internos dos mangás através de sua relação com seus respectivos contextos históricos.
Escolhemos como fontes os mangás Dragon Ball e One Piece. Esses dois títulos foram
escolhidos por serem os títulos mais populares, do gênero mais popular, de suas respectivas
5
Também se destaca o trabalho de Alexandre Nagado. O autor, além de ser pesquisador do tema, é desenhista,
roteirista, e escreve para diversas revistas especializadas, além de ter um blog pessoal sobre pop japonês. Entre
suas obras, destacamos: Almanaque da cultura pop japonesa (Ed. Via Lettera, 2007) e Cultura pop japonesa:
histórias e curiosidades (E-BOOK, 2011).
12

gerações, de modo que pintam bem um quadro geral, ainda que um tanto superficial, de
algumas características básicas dos mangás, suas mensagens, sentidos e suas relações com
seus contextos.
Para cumprir nossas propostas, dividiremos esta pesquisa em 3 capítulos. No primeiro,
conceituaremos a “indústria cultural”, analisando, ainda, a trajetória desse tipo de produção
cultural no Japão, buscando sempre traçar paralelos com o contexto histórico, a fim de
entender as continuidades e rupturas que marcam a produção de mangás e animês.
No segundo capítulo, abordaremos a internacionalização da cultura pop japonesa,
concentrando-nos principalmente no desenvolvimento político e econômico do Japão a partir
de seu contato com o Ocidente. Para temática, julgamos mais importante compreender as
modificações estruturais da sociedade japonesa e do mercado de consumo e sua inserção no
capitalismo global, elementos que se mostram mais elucidativos para o tema do que a análise
da difusão da cultura japonesa através da emigração nos séculos XIX e XX. Analisaremos
ainda neste capítulo, a influência do pop japonês nos seus consumidores brasileiros, a fim de
entender concretamente qual o papel dessa cultura na realidade nacional.
No terceiro capítulo, passaremos a analisar os mangás e animês enquanto fontes
históricas. Para tal, selecionamos dois mangás do estilo shonen (Dragon Ball e One Piece),
que são produzidos para o público masculino jovem. São desse estilo a maioria dos
mangás/animês mais populares do Brasil, aqueles que passam ou passaram em TV aberta, que
ficaram mais tempo em exibição e que obtiveram maior êxito no mercado editorial nacional.
13

1. A INDÚSTRIA CULTURAL E A CULTURA POP JAPONESA

Diferente do que geralmente se entende por cultura popular, isto é, como um conjunto
de saberes e fazeres de um povo, o termo “cultura pop” tem um sentido próprio6. O pop está
ligado não só a um modo particular de se expressar artisticamente, o qual se faz,
principalmente, através da técnica industrial e dos meios de comunicação de massa, mas
também está ligado a uma finalidade própria: a venda e o consumo em massa. Assim, a
cultura pop está relacionada ao que os estudiosos da Escola de Frankfurt convencionaram
chamar “indústria cultural”.
Ecléa Bosi identifica a indústria cultural como um sistema de comunicação de ideias.
“O sistema é a indústria cultural. Indústria enquanto complexo de produção de bens. Cultural
enquanto o tipo desses bens” (Bosi, 2009, p. 61). Neste sentido, acreditamos que a chamada
cultura pop deve ser vista como um conjunto de bens culturais produzidos por esse sistema.
Importante ressaltar que, neste trabalho, nos afastaremos do conceito de cultura
“emprestado” da antropologia, que frequentemente é abordada nos trabalhos de História
Cultural, uma vez que as especificidades desta obra requerem também um conceito específico
de cultura, que foge à conceituação usual, mais adequada aos trabalhos que se debruçam sobre
a cultura popular tradicional. A “cultura” abordada neste trabalho se refere especificamente à
produção material de bens artísticos voltados para o consumo, sem dissociação entre as
estruturas materiais nas quais esses bens são produzidos e os elementos humanos que
compõem esse sistema (práticas, representações, imaginários, etc.).

1.1. A indústria cultural

O termo indústria cultural, no sentido que o utilizaremos neste trabalho – enquanto um


substituto para o termo “cultura de massas” – foi cunhado no conhecido livro “Dialética do
Esclarecimento”, por Adorno e Horkheimer, mais especificamente no momento em que os
autores fazem uma crítica pioneira à cultura produzida através dos mecanismos capitalistas.
Segundo Adorno (1991), “indústria cultural” foi um termo cunhado especialmente
para dissociar a indústria cultural de uma cultura nascida espontaneamente das massas.

6
O surgimento do termo “pop” está ligado à pop art dos anos de 1950 e 60, que foi um movimento artístico que
visava criticar – de forma um tanto cínica – o vazio, alienação e repetição mimética da sociedade de consumo
produzindo em massa obras que retratavam ícones da indústria cultural. Para mais informações sobre o assunto,
ler: MCARTY, David. Arte pop. São Paulo: Cosac Naify, 2002.
14

Entendemos, dessa forma, que há um caráter de imposição intrínseco à cultura produzida pela
indústria cultural, de modo que ela será sempre, e em alguma medida, externa às massas.
Porém, esse caráter dominador, ou mercantil, da cultura, não pode ser visto como uma
novidade capitalista, conforme analisam Adorno e Horkheimer (1985):

O novo não é o caráter mercantil da obra de arte, mas o fato de que, hoje, ele se
declara deliberadamente como tal (...). As puras obras de arte, que negam o caráter
mercantil da sociedade pelo simples fato de seguirem sua própria lei, sempre foram
ao mesmo tempo mercadorias: até o século dezoito, a proteção dos patronos
preservava os artistas do mercado, mas, em compensação, eles ficavam nesta mesma
medida submetidos a seus patronos e aos objetivos destes (ADORNO,
HORKHEIMER, 1985, p. 130).

Com isso, os autores tentam evitar que se caia em um posicionamento puramente


reacionário a partir da crítica da indústria cultural, como se, em um passado glorioso, a arte e
a cultura estivessem livres de qualquer dominação. O que acontece, no entanto, é que a
produção cultural se insere em um contexto econômico mais amplo, e se submete às
hierarquias e ideologia desse contexto, de modo que a cultura produzida no seio do
capitalismo não criou, mas apenas modificou seus aspectos dominadores e até mesmo os
intensificou, uma vez que a arte agora é deliberadamente feita para o comércio. O agravante é
que o sistema capitalista, mais que promover uma mudança da ideologia que guia o processo
criativo, isto é, das finalidades da cultura, promove uma mudança no próprio modo de se
produzir, decorrente da produção em massa. Assim, essa dominação não apenas mudou de
aspecto, como se intensificou enormemente. Tudo isso, por baixo de uma ideologia burguesa
que se diz livre e autônoma.
É claro que, alteradas as finalidades da arte, altera-se também o modo pelo qual uma
obra de arte é valorada, isto é, quais são os critérios que a qualificam, o que a faz valiosa.
Adorno e Horkheimer (1985) explicam sobre essa mudança na valoração da arte derivada da
produção em massa:

Tudo só tem valor na medida em que se pode trocá-lo, não na medida em que é algo
em si mesmo. O valor de uso da arte, seu ser, é considerado como um fetiche, e o
fetiche, a avaliação social que é erroneamente entendida como hierarquia das obras
de arte – torna-se seu único valor de uso, a única qualidade que elas desfrutam
(ADORNO, HORKHEIMER, 1985, p. 131).

Nesta mesma direção argumenta Walter Benjamin (1975), ao dizer que “as técnicas de
reprodução aplicadas à obra de arte modificam a atitude da massa com relação à arte”
(BENJAMIN, 1975, p. 27). Se a arte, ainda que patrocinada, anteriormente era valorizada a
partir de si própria, na indústria cultural ela gira sobre um novo eixo, que é a massa para a
15

qual é endereçada. Neste aspecto, Benjamin é tão pessimista quanto Adorno e Horkheimer
sobre a indústria cultural ao dizer que “a massa é a matriz de onde emana, no momento atual,
todo um conjunto de novas atitudes em relação à arte. A quantidade tornou-se qualidade”
(idem, p. 31).
Como a mercadoria produzida pela indústria cultural não preza pelo valor que ela
carrega em si, mas pelo seu potencial comercial, a indústria cultural rompe as barreiras antes
bem definidas entre cultura erudita e cultura popular, tais quais elas se apresentavam na
sociedade pré-industrial. Por um lado, ela cria o kitsch7 como contrafação da cultura erudita,
por outro, o popularesco como contrafação da cultura popular (BOSI, 2009, p. 84).
Assim, ela se apropria tanto do erudito quanto do popular, porém de maneira
vulgarizada e negativa. A indústria cultural se livra do conteúdo que essas culturas
precedentes possuem e se apropria de sua forma, ressignificando-a de acordo com o interesse
comercial, ou mesmo esvaziando-a de qualquer substância.
Um exemplo disso na cultura popular é o rap. Ritmo oriundo das periferias negras dos
Estados Unidos, que tem entre suas principais características uma feroz crítica social. Ainda
assim, é um tipo de música altamente comercializável e muitos rappers lotam casas noturnas
de classe média, fazem shows com grande aparato técnico e midiático e tem suas carreiras
tocadas por empresários, produtores e gravadoras. A própria crítica ao sistema, neste caso,
acaba por ser uma porta de entrada no mesmo.
O alcance do pop é tamanho que, até mesmo seus mais ferozes críticos não encontram
meios de o criticarem senão dentro do pop. Essa “iluminação” é, inclusive, o que inspira o
movimento artístico do Pop Art, que “foi um movimento artístico que criticava a sociedade de
consumo e a massificação da cultura. De maneira irônica e bem-humorada, também usava a
reprodutibilidade como aliada para defender essa crítica” (CORREA DE SÁ; SOCORRO, s/d,
p. 3).
Seria simplista, portanto, apenas chamar “hipócritas” os artistas que conseguem seu
sucesso profissional através da crítica do próprio pop e da indústria cultural. O problema não
é o sucesso comercial, a reprodutibilidade ou o trabalho, afinal, o artista é um trabalhador
como qualquer outro. O problema é a finalidade para a qual essa indústria opera e que esvazia
o conteúdo dos produtos, transformando, mesmo a obra mais crítica, em mero entretenimento,
em mera mercadoria. Isso se exemplifica no caso dos americanos de classe média, brancos em

7
Kitsch é um termo usado para se referir a objetos de mau gosto e baixa qualidade. Estes são produzidos em
massa e aspiram uma influência erudita, mas não possuem, porém, real significado artístico e cultural. Foi um
termo cunhado para separar a arte de vanguarda deste que é considerado um produto da indústria cultural.
16

sua esmagadora maioria, se divertindo em seus ambientes fechados ao som do mesmo rap que
acusa o status quo e a realidade social dos americanos negros e pobres.
Com isto fica claro que, apesar do aspecto dominador da indústria cultural, ela não dita
a produção de maneira autônoma. A produção gira em torno da massa consumidora; ela é
direcionada a públicos-alvo e regulada e quantificada por pesquisas de opinião, metas e
tabelas. Há um conjunto de valores que são anteriores à indústria cultural e aos quais ela tem
que se adaptar. Como afirma Ortiz (1985), “a indústria cultural organiza estas necessidades de
modo que o consumidor a ela se prenda, sempre e tão-só como eterno consumidor” (ORTIZ,
1985, s/p).
Assim, a indústria cultural age, não criando modelos de consciência, mas
padronizando modelos pré-existentes, a partir de sua produção em massa. As tendências
ditadas por essa indústria não são, assim, criadas sem base concreta, mas a partir dos valores
da época. Ela não apenas dita a moda, como é também ditada pela moda. Caímos aqui em um
paradoxo: a indústria cultural diz dar ao povo “o que o povo quer” ao mesmo tempo em que
tenta condicionar e padronizar os desejos populares, principalmente através da publicidade.
Nessa direção, Bosi (2009) ressalta que “não é a comunidade de receptores que se exprime
através dos meios, mas a mentalidade dos detentores desses meios, os quais supõem uma certa
visão do mundo na massa dos consumidores” (BOSI, 2009, p. 70). A cultura pop é produzida
não para um sujeito concreto, mas para uma massa abstrata, nivelada (geralmente) a priori e
por baixo.
É nesse ponto que vem à tona o problema da identidade na sociedade de consumo. Se
nas sociedades tradicionais o indivíduo tem uma identidade fixa e estável, papéis sociais bem
determinados e um conjunto de tradições que embasam suas práticas, na sociedade de
consumo, a identidade se torna móvel e múltipla, se prende mais ao visual, que expõe o tipo
de cultura que o indivíduo consome. A identidade se perde na forma e o conteúdo se torna
meramente superficial. Ela deixa, então, de se definir através de um papel social e passa a se
centrar unicamente no indivíduo e no que ele consome (CARLOS, 2010). Ou, como
argumenta Mogendorff (2012):

Para os frankfurtianos, a cultura de mercado fez com que a subjetividade passe a se


identificar com a posse dos bens; consequentemente, a satisfação das necessidades
passa a estar muito mais relacionada com o ato da compra, uma vez que é o mercado
que vai apontar quais são esses valores culturais que precisam ser “adquiridos”
(MOGENDORFF, 2012, p. 155).
17

Caímos, portanto, em um novo paradoxo, ao mesmo tempo em que a identidade passa


a ser valorada subjetivamente a partir da posse de bens, é o mercado que aponta quais são
esses bens que “precisam” ser adquiridos. Por um lado, a indústria cultural exalta a
subjetividade, por outro, força uma homogeneização.
É preciso se ter em mente, porém, que ao falar dessa homogeneização da indústria
cultural, o principal interesse dos frankfurtianos é atacar o totalitarismo que à época da
publicação de Dialética do Esclarecimento, imperava na Europa. Dialética do Esclarecimento
é, antes de tudo, um ataque à racionalidade do esclarecimento, do controle técnico, funcional
do mundo, que por sua vez estava a ser usado em prol de uma verdadeira máquina da morte.
Nas sociedades modernas, a razão instrumental passava a fazer o papel de Deus, como
justificativa de qualquer dominação:

Quando Adorno e Horkheimer afirmam que o Iluminismo “se relaciona com as


coisas assim como o ditador se relaciona com os homens”, que ele “os conhece na
medida em que os pode manipular”, de uma certa forma eles condensam seu
pensamento a respeito da sociedade moderna. O conhecimento manipulatório
pressupõe uma técnica e uma previsibilidade que possa controlar de antemão o
comportamento social. Para ele o mundo pode ser pensado como uma série de
variáveis que integram um sistema único. A possibilidade de controle se vincula à
capacidade que o sistema possui de eliminar as diferenças, reduzindo-as ao mesmo
denominador comum, o que garantiria a previsibilidade das manifestações sociais. A
crítica da racionalidade desvenda desta forma uma crítica do processo de
uniformização. (ORTIZ, 1985, s/p).

O que se percebe, então, é que a Escola de Frankfurt trata da indústria cultural com
extremo pessimismo. Não veem na sociedade de consumo nenhuma possibilidade de uma
emancipação humana, e apesar de sua poderosa capacidade de publicidade e produção, não há
nela qualquer possibilidade de esclarecimento. É aí que mora a grande crítica frankfurtiana ao
fracasso do esclarecimento. Ao contrário do otimismo, surgido no esclarecimento, em relação
ao desenvolvimento técnico e a razão humana, o que estes produziram foi não uma massa
esclarecida, mas uma massa sem rosto, que apenas possui medos e desejos: medos que a torna
presa fácil de soluções totalitárias, e desejos que a indústria promete saciar. Nas palavras de
Hanna Arendt, que corrobora com a visão frankfurtiana:

Acreditar que uma tal sociedade se torne mais culta à medida que o tempo passa e
que a educação fizer seu trabalho, é, penso eu, um erro fatal. Uma sociedade de
consumidores não pode, possivelmente, saber como cuidar de um mundo e das
coisas que pertencem exclusivamente ao espaço de fenômenos do mundo, porque
sua atitude central para com todos os objetos, atitude de consumação, provoca ruína
em tudo o que ela toca (ARENDT apud BOSI, 2009, p. 34).
18

Bosi (2009) também sintetiza o pessimismo de Adorno quanto à indústria cultural ao


dizer que, para Adorno:

[...] a indústria cultural tem como objetivo único a dependência e a servidão dos
homens, como se a alienação fosse o fim da angústia. Para Adorno, o imperativo
categórico da indústria cultural é: “deves submeter-te porque todos os submetem”.
As criaturas se reconhecem em suas mercadorias (BOSI, 2009, p. 34).

Tal visão demasiado pessimista é o principal foco das críticas à leitura frankfurtiana da
indústria cultural. Umberto Eco os chamou “apocalípticos”, por produzirem “teorias da
decadência”. Sua função, nessa perspectiva seria “de consolar o leitor, já que, em meio à
catástrofe, se elevariam os “super-homens”, ou seja, aqueles acima da média, que olhariam
para o mundo com desconfiança. Para Eco, essa atitude seria um convite à passividade”
(MOGENDORFF, 2012, p. 157).
Outras críticas se baseiam na aparente posição elitista dos frankfurtianos, assim vista
pelo fato deles elogiarem e defenderem o erudito frente uma rejeição da cultura de massa. Eco
ataca a visão de que a cultura de massa é algo essencialmente mau. Para ele, é preciso, aceitar
que vivemos em uma sociedade industrial e pensar em meios de transmitir valores culturais a
partir dessa realidade. Por sua vez, os defensores da Escola de Frankfurt rebatem essas
acusações alegando que os ditos autores não são contrários à cultura popular ou a tecnologia,
mas sim críticos a esse sistema que os produz e instrumentaliza (MOGENDORF, 2012, p.
158-159).
Além disso, essas críticas que os associam a uma visão elitista dão a entender que os
frankfurtianos analisaram o fenômeno da cultura de massa de maneira isolada, como uma
mera crítica de arte, quando na verdade:

Os pensadores da Escola de Frankfurt não pretenderam analisar os fenômenos da


comunicação de maneira isolada. A indústria cultural, portanto faz parte de uma
teoria crítica da sociedade mais abrangente, e a transformação da cultura em
mercadoria precisa ser compreendida dentro de um contexto que contemple as
relações que as pessoas travam entre si dentro do sistema capitalista
(MOGENDORF, 2012 p. 155).

A finalidade da crítica frankfurtiana é, portanto, apontar as novas formas de


dominação surgidas dos ideais modernos, e nesse contexto, a indústria cultural, responsável
pela produção intelectual e artística da sociedade, tem um papel fundamental no controle das
massas.
Um fator que deve ser ressaltado, é que a indústria cultural, surgida através de
fenômenos (materiais e ideológicos) ligados ao desenvolvimento do capitalismo no ocidente,
19

se apresenta como um aspecto ocidentalizante onde quer que esta chegue. Por isso, optamos
por analisar seu desenvolvimento no Japão a partir das relações que o país estabeleceu com o
Ocidente capitalista moderno.

1.2. A indústria cultural no Japão: a formação do pop japonês

O Japão de meados do século XIX ainda vivia um regime feudal, e há mais de 200
anos não mantinha relações comerciais com o exterior. Até que, em 1853, uma esquadra
norte-americana comandada pelo Comodoro Mattew Perry impressionou os japoneses com
seus armamentos e equipamentos modernos, como o telégrafo. Após uma série de
negociações e intrigas no governo japonês, os portos do país foram abertos para algumas das
principais potências da época (EUA, Inglaterra, França, Holanda e Rússia) (YAMASHIRO,
1964, p. 138).
A partir daí as forças feudais desmoronaram. Em 1868 o imperador Meiji deixou a
tradicional capital, Kyoto, e “fixou residência em Tóquio (a nova capital imperial),
assinalando o início da era moderna no arquipélago nipônico” (LUYTEN, 2011, p. 86). A
chamada “Restauração de Meiji” instituiu uma série de reformas políticas, econômicas,
sociais, diplomáticas e administrativas, para adequar o Japão aos tempos modernos. Houve,
portanto, uma grande abertura cultural do Japão com o exterior. “O governo resolveu manter
relações externas amistosas, para introduzir no país o que havia de bom no exterior, com o
fito de estimular o progresso do novo Japão” (YAMASHIRO, 1964, p. 147).
Foi nesse contexto que os cartuns nos moldes ocidentais foram introduzidos no Japão.
O principal responsável pela novidade foi Charles Wirgman (1835-1891) que foi para o Japão
como correspondente do jornal “Illustrated London News”, mas acabou por se casar e fixar
residência ali. É considerado o patrono da charge moderna japonesa, tendo editado a primeira
revista de charges nipônica, a “The Japan Punch” (LUYTEN, 2011, p. 86-87).
Ao mesmo tempo, nos EUA, a concorrência entre grandes jornais dos magnatas da
imprensa americana (Pulitzer e Hearst) impulsionava o desenvolvimento dos quadrinhos em
uma verdadeira luta para atrair novos leitores. Essa nova geração de quadrinhos americanos
influenciou fortemente o caricaturista Rakuten Kitazawa (1876-1955), um dos responsáveis
pela popularização do termo “mangá” para designar histórias em quadrinhos. Foi ele quem
criou os primeiros quadrinhos com personagens regulares e o primeiro cartunista japonês a ser
20

premiado internacionalmente (LUYTEN, 2011, p. 89). Assim, o início do século XX no


Japão, é marcado por essa absorção da cultura ocidental:

Conselheiros estrangeiros eram convidados (e pagos a preço de ouro) para promover


a introdução e assimilação das instituições e tecnologias ocidentais. [...] A elite
vinha entusiasticamente adotando a cultura ocidental, perseguindo o que era
chamado cultural enlightment (literalmente, iluminação cultural). Com os
quadrinhos, aconteceu algo semelhante à cultura no processo de absorção das novas
ideias. (LUYTEN, 2011, p. 90).

Não foi a primeira vez, porém, que os japoneses assimilaram uma grande influência
cultural externa. Entre os séculos VI e VIII os japoneses já haviam “achinesado” sua cultura,
porém, sintetizaram essa influência em algo próprio. Algo semelhante ao que aconteceu com a
influência ocidental do século XIX e início do século XX – os japoneses absorveram muito da
cultura ocidental, mas colocaram essa cultura a serviço de seu próprio gosto.
Em 1927, o imperador Hiroito sobe ao poder, e, no contexto da Grande Depressão, as
ideias fascistas se fortalecem no Japão. Nessa época, os mangás passam a cumprir a função
que o entretenimento costuma ter em tempos de crise: dar alento às pessoas, oferecer uma
fuga da realidade. Os mangás também ganham um tom nacionalista, condizente com o regime
em que se encontrava o país. Com o início da Segunda Guerra Mundial, os heróis das
histórias, de ambos os lados do conflito, passam a lutar contra os inimigos reais de seus
países, um grande exemplo disso é o Capitão América, declaradamente inimigo dos nazistas.
No Japão:

os artistas que não cooperavam eram punidos, banidos da profissão de escritor ou


ficavam no ostracismo [...] Os artistas que não tinham sido banidos do trabalho
encontravam-se numa dessas três áreas: produzindo quadrinhos de cunho familiar,
que eram totalmente inofensivos, ou promoviam solidariedade nacional, desenhando
painéis, ilustrações, que difamavam o inimigo nas revistas ou outro meio de
comunicação, trabalhando para o governo ou serviço mitilar, criando propaganda a
ser usada contra as tropas de oposição (LUYTEN, 2011, p. 102).

Com a derrota japonesa na guerra, o país foi ocupado pelos americanos, sob o
“supremo comando do general Douglas McArthur, até 1952” (LUYTEN, 2011, p. 105). Os
EUA, como de praxe, “falavam em democracia, igualdade e justiça; todavia por baixo dessa
aparência, muitos americanos pensavam em estratégias, padrões de comércio, no controle das
rotas marítimas e supremacia aérea” (GUEDES, 2010, p. 12).
O principal interesse americano era garantir uma base de apoio contra a influência
soviética na Ásia e no pacífico, e para garantir que o Japão não sucumbisse à influência
soviética, os EUA tiveram de ir além de simplesmente impor sanções, e passaram a ajudar na
21

revitalização da economia do Japão. Os Estados Unidos também influenciaram diretamente na


produção da nova constituição Japonesa. Em meados da década de 50, o Japão havia se
transformado “de uma Nação pobre e arrasada, no moderno gigante industrial conhecido e
que desafia o mundo com sua tecnologia” (GUEDES, 2010, p. 18).
Após a ocupação americana, e as reformas que transformaram o Japão em um país
liberal, também houve uma nova onda de influência Ocidental, desta vez, marcadamente
americana, no Japão.

De repente, tudo que havia sido proibido ao público japonês, ou desprezado pelos
japoneses durante a guerra por serem considerados “símbolos do inimigo”, invadia
as rádios, os cinemas, os jornais e as revistas, como as músicas das big bands, as
produções de Hollywood e as comics. Coisas antes inaceitáveis, como expressões
em inglês no vocabulário diário e Coca-Cola fazendo parte do cardápio de bares e
restaurantes, tornaram-se corriqueiras. (SATO, 2007, p. 14)

Porém, como já foi dito, o Japão não apenas assimilou essa influência estrangeira, mas
moldou-a a sua própria cultura:

[...] ao invés de cultuar ídolos alheios como se seus fossem, os japoneses criaram
seus próprios ídolos. A fórmula da produção e consumo em massa podia ser
americana, mas o produto final tinha que ser culturalmente japonês. [...] E assim se
formou o pop japonês contemporâneo: ocidentalizado na forma, mas nipônico no
conteúdo (SATO, 2007, p. 14).

Nos anos 50 e 60, com as pessoas ainda abaladas pela derrota na guerra e a penosa
reconstrução do Japão, foi forte a busca dos japoneses por entretenimento. E mesmo com a
poderosa concorrência de Hollywood, o nascente cinema japonês “criou seus próprios ídolos”
e conseguiu concorrer de igual para igual. Em 1954 surgia o ícone do monstro gigante
japonês. Godzilla, um monstro criado a partir dos efeitos da bomba atômica, foi um sucesso
de bilheteria. De acordo com Sato (2007), “em 1958 os cinemas japoneses receberam o
público pagante de 1.1 bilhão de pessoas, e calcula-se que em 1960 o Japão tinha 7.457
cinemas em atividade” (SATO, 2007, p. 15). No ramo musical, o kayõnkyoku, a “música
popular japonesa”, formado por bandas ocidentalizadas, mas com arranjos japoneses,
dominou o mercado fonográfico. Atualmente, o chamado j-pop, abreviação de “pop japonês”
já é um estilo bem estabelecido e basicamente ocidental em sua forma, pouco se diferenciando
da música pop ocidental (Idem, p. 16).
Podemos perceber, portanto, que o surgimento de uma indústria cultural no Japão está
relacionado à ocidentalização nos campos econômicos e culturais. O surgimento do Japão
como uma potência capitalista no pós-guerra e uma cultura voltada para o consumo é o que dá
as condições para que o pop japonês se desenvolva. Assim, por mais que a cultura pop
22

japonesa tenha suas muitas peculiaridades, ela está essencialmente condicionada e dominada
por todas as questões analisados anteriormente. O objetivo desta cultura não se configura em
traduzir uma nova consciência nacional, mas adequar essa consciência à nova sociedade de
mercado japonesa. A identidade nipônica se divide, assim, entre os deveres da honra e o
hedonismo do mercado.
Influenciados pelo “american way” o Japão abraçou a nova cultura consumista. Nos
anos 60, talvez a década mais próspera desde o pós-guerra, a indústria cultural japonesa foi
beneficiada por todas as condições ideais para seu funcionamento. Nessa época o Japão não
teve conflitos internos, passou por um grande crescimento econômico, grande distribuição de
renda, o que criou uma das classes médias mais ricas do mundo. O ideal consumista tornou
fácil o acesso a bens de consumo industrializados, além disso, o Japão passou a ter uma das
mais altas taxas de alfabetização do mundo (SATO, 2007, p. 17), fator fundamental para o
desenvolvimento da indústria dos mangás e animês, os carros-chefes do pop japonês.

1.2.1. O mangá

Atualmente, mangá é o nome que se dá a qualquer história em quadrinhos produzida


no Japão. Apesar do mangá, em sua forma moderna, ser um fenômeno próprio da
comunicação em massa, não podemos deixar de considerar suas raízes culturais. Para tal,
separaremos seu desenvolvimento em três “fases”, a primeira através da influência chinesa
dos primeiros tempos, a segunda através da inserção do Japão no mercantilismo com os
europeus e os novos modos de vida urbanos, e a terceira através da inserção do Japão no
capitalismo ao fim da Era Meiji e o contato com a charge e posteriormente os quadrinhos
ocidentais.
As primeiras ilustrações no Japão estão ligadas à influência Chinesa sofrida a partir do
século II d.C. Foi através da China que chegaram no Japão o cultivo do arroz, o budismo, as
artes, a escrita e mesmo formas de organização social no Japão foram influenciadas pelos
chineses (LUYTEN, 2011, p. 76). É dessa série de influências chinesas assimiladas pelo Japão
que derivam os Ê-Makimono, considerados a origem dos quadrinhos no Japão.
Os Ê-Makimono eram “desenhos pintados sobre um grande rolo e contavam uma
história cujos temas iam aparecendo gradativamente à medida que ia sendo desenrolado”.
Muito populares, principalmente a partir do século XII, quando a maioria deles foi desenhada,
eram feitos geralmente por monges budistas e retratavam desde temas religiosos até batalhas e
23

histórias sobre proezas sexuais. O Chojugiga, um conjunto de quatro rolos atribuídos ao


Bonzo8 Kakuyu Toba (1053-1140), é o mais famoso dos Ê-makimono e considerado um
clássico satírico. Nele são retratados animais antropomorfizados realizando atividades da
época de forma satírica (LUYTEN, 2011, p 77-78).

Figura 1: imagem do primeiro rolo do Chojugiga, retratando um macaco ladrão fugindo de outros animais
armados com galhos.

Fonte: http://cooljapannow.jp/enlargement.html?KEY=NEOART-599

A ilustração japonesa seria modificada no século XVI pela introdução dos tipos
móveis trazidos da Coréia após a invasão japonesa na Guerra Imjin10. No século XVII a
impressão já era prática generalizada no Japão e “quase todas as obras da literatura japonesa
foram impressas, com numerosas ilustrações” (LUYTEN, 2001, p. 82).
É interessante notar como o próprio surgimento da palavra mangá, na sua acepção
moderna, está ligada ao desenvolvimento do capitalismo no Japão. Como já foi dito, no
período Edo (1660-1867) anterior “Revolução Meiji”, o Japão vivia em um regime feudal
fechado para o exterior. Os Portugueses, que anteriormente eram a maior influência europeia
no arquipélago, haviam sido expulsos. “Somente uma pequena ilha artificial, no porto de
Nagasaki, foi reservada às visitas anuais de navios holandeses e chineses. Os holandeses, ao
contrário dos lusitanos, haviam prometido limitar-se exclusivamente ao comércio dentro das
normas ditadas pelas autoridades japonesas”. (Idem, p. 82).

8
Monge budista
9
Acesso em 05/05/2016.
10
Conflito do final do século XVI envolvendo Japão, China e Coreia.
24

De acordo com Luyten (2011), a classe mercadora no Japão, protegida da concorrência


internacional, enriqueceu. Com mercadores e artesãos enriquecidos, surgiu a demanda por um
entretenimento de caráter popular. A influência disso na arte foi o surgimento de gravuras que
retratavam a vida cotidiana e livros com histórias ilustradas, que por sua vez inspiraram o
surgimento de gravuras em madeira chamadas ukiyo-ê, que significa “vida mundana”, pois
era exatamente isso que essas gravuras retratavam, aspectos comuns da vida cotidiana
(LUYTEN, 2011, p. 83).
A pessoa que cunhou a palavra “mangá” foi o pintor e artista de ukiyo-ê Katsushita
Hokusai. Nascido em 1760, Hokusai foi fortemente influenciado por grandes artistas europeus
como Monet e Van Gogh e também os influenciou, através de gravuras contrabandeadas que
conseguiam furar a censura japonesa. Ele produziu “uma série de estudos sobre movimentos e
expressões que ficou denominado Hokusai Manga” (LUYTEN, 2014, p. 3). Os Hokusai
Manga caricaturavam a vida e sociedade japonesa, além de retratar a natureza e os animais. A
palavra manga, algo como “desenho irreverente” cabia bem aos desenhos de Hokusai que
exploravam bem o movimento dos corpos.

Figura 2: “A grande onda de Kanagawa”. A mais famosa obra de Hokusai, parte da série de gravuras “Trinta e
seis vistas do Monte Fuji”.

Fonte: http://madeinjapan.com.br/2004/04/06/ukiyo-e/11

11
Acesso em 05/05/2016.
25

A partir do século XIX, como já foi dito, a ilustração japonesa foi marcada pela
influência das charges inglesas, tanto na questão do traço dos desenhos, quanto dos conteúdos
dos quadrinhos. Segundo Luyten (2014), no início do século XX houve dois grandes marcos
para os mangás: a tradução dos cartoons americanos para o japonês e a separação entre os
públicos adulto e infantil. Após a Segunda Guerra Mundial, e com o sucesso da tirinha Sazae-
san12, que conquistou o público feminino, mais uma divisão, agora a produção para o público
infantil e adolescente se dividia também por gênero: o “shojo manga” para as meninas e o
“shonen manga” para os meninos.
As revistas shojo têm suas histórias produzidas em grande maioria por mulheres. As
histórias focam nos temas românticos e se passam em lugares comuns, como a escola, a casa e
a cidade, mas há também as histórias mais fantasiosas, semelhantes aos contos de fadas. Já as
revistas shonen focam em temas de aventura, esporte, luta e guerra. Cenários de ficção
científica aparecem tanto no shojo quanto no shonen, em cada caso, sempre dentro dos temas
próprios de cada público-alvo. As maiores marcas dos enredos shonen são, portanto, a
violência, a competição, a disciplina, além das alusões ao sexo e mesmo cenas de nudez e
sexo. Há um estilo próprio para jovens e adultos também, que é o “seinen”, com tramas mais
elaboradas, outras mais violentas e outras mais eróticas (LUYTEN, 2011, p. 40-50).
Os heróis das histórias japonesas também apresentam peculiaridades que os
distanciam dos ocidentais. Diferente dos tradicionais super-heróis ocidentais, altos,
invencíveis, justiceiros e musculosos, os heróis dos mangás partem da própria realidade
cotidiana, de modo que o leitor tem maior identificação (LUYTEN, 2011, p. 55). As histórias
japonesas ressaltam seus valores tradicionais, a honra, a sinceridade e a perseverança. O herói
japonês, longe de ser superpoderoso logo de início, ganha poder com o decorrer da história,
através de seu próprio esforço para alcançar o sucesso. Nessas histórias, é fundamental a
relação entre aprendiz e mestre, onde o aprendiz tem que ser disciplinado e esforçado para
superar seu tutor (Idem, p. 60). Mesmo o suicídio, regatando a tradição samurai, tem valor, na
medida em que purga a honra do herói fracassado. Numa visão weberiana, podemos perceber
que a própria ética japonesa retratada nas histórias se mostra um terreno fértil para o
desenvolvimento do capitalismo no Japão, e, consequentemente, o sucesso comercial de suas
histórias enquanto produtos capitalistas.
As heroínas estão muito mais associadas a características físicas idealizadas, como a
magreza, altura, pernas largas e à vestimenta impecável. Os olhos grandes que não denotam

12
Publicada em tiras de jornal, Sazae-san era uma história humorística “cuja heroína, uma mulher casada, com
filhos, representava o novo ideal de reconstrução do Japão” (LUYTEN, 2011, p. 43).
26

nacionalidade é outra marca das marcas registradas dos mangás. Nas revistas shojo, a
representação dos homens, também idealizada, é a do “príncipe encantado”. Tais aspectos
denotam que os mangás femininos, apesar de escritos por mulheres, reforçam os aspectos
tradicionais dos papéis de gênero na sociedade japonesa. Um exemplo disso é o papel da mãe
nos mangás, que representam a figura ideal da mulher. “É com a condição de mãe que as
mulheres no Japão adquirem sua posição social e, com isso, ganham muita força” (LUYTEN,
2011, p. 66).
Talvez o maior marco na modernização do mangá, tenha sido a obra de Osamu Tezuka
(1928-1989). Sua história “Shin Takarajima” (A Nova Ilha do Tesouro) foi o primeiro best-
seller do pós-guerra no Japão, vendendo mais de 400 mil exemplares, e deu o impulso para a
produção de mangás a partir daquele período. Ele implantou métodos de produção em massa,
contratando assistentes e fez várias inovações, tanto em questão de desenho, como os traços
simplificados, cabelos espetados e os já citados olhos grandes e expressivos, quanto em
narrativa. Suas histórias, longas, cheias de balões de falas e onomatopeias, carregavam
“mensagens humanísticas profundas, alto teor dramático, e frequentemente com finais tristes”
(SATO, 2007, p. 127).
Tezuma foi autor de clássicos como “Astro-boy” (Tetsuwan Atomu), “A Princesa e o
Cavaleiro” (Ribon no Kishi) e “Kimba, O Leão Branco” (Jungle Taitei). Também adaptou
lendas e clássicos da literatura para o mangá, como a história de Buda, Fausto de Goethe e As
Mil e Uma Noites. A obra de Tezuka significou o início do mercado de animações no Japão.
A TV foi inserida no Japão na década de 50, junto ao boom do consumismo ligado à
política de recuperação da economia. Tezuka, ávido por criar animações de qualidade, como
as da Disney, porém impedido pelos altos custos financeiros para fazê-las, inseriu uma série
de técnicas para baixar os custos de produção. Além disso, Tezuka “formou o ovo de todo um
sistema de financiamento privado de produção de animações, envolvendo a produtora, a rede
de TV e fabricantes de produtos licenciados” (SATO, 2007, p. 130).
Apostando nos personagens já consagrados nos mangás, como Astro Boy e A Princesa
e o Cavaleiro, Tezuka praticamente inaugurou o atual mercado bilionário de animês no Japão,
que são em sua esmagadora maioria, adaptações de mangás de sucesso, além de dar o impulso
inicial para sua internacionalização. Boa parte dos assistentes de Tezuka também se tornaram
mangakás (nome que se dá no Japão aos autores de mangás) de sucesso.
27

Figura 3: Tetsuwan Atomu, ou Astro Boy, no Ocidente, a obra-prima de Tezuka. Capa do Vol. 14 para a versão
estadunidense do mangá, publicado pela DarkHorseComics.

Fonte: https://www.darkhorse.com/Books/12-337/Astro-Boy-Volume-14-TPB13

Apesar da histórica influência ocidental, a produção dos mangás no Japão se dá de


maneira mais independente e autoral que nos EUA, por exemplo, onde os autores trabalham
para os “syndicates”, empresas responsáveis por distribuir conteúdo para as editoras. Essas
empresas possuem os direitos sobre os títulos e personagens da história, e, portanto, decidem
os rumos das mesmas. No Japão, os autores são independentes e trabalham diretamente com
as editoras, além disso, e talvez graças à Tezuka, o status social de um mangaká de sucesso, é
de um popstar. (LUYTEN, 2011, p. 36).

13
Acesso em 05/05/2016.
28

1.2.2. O animê

Diferente do Ocidente, onde a palavra “animê” designa especificamente as animações


nipônicas, no Japão, animê é o nome dado a qualquer animação. Como ocorre com muitas
palavras do japonês moderno, a palavra deriva de um termo já existente no inglês, no caso a
palavra “animation” (SATO, 2007, p. 31).
As primeiras animações exibidas no Japão aconteceram em 1909, paralelamente às
pioneiras animações americanas e francesas. A primeira animação japonesa formalmente
reconhecida data de 1917, porém, na era pré-televisão elas existiram apenas a nível
experimental, além das produções de cunho militar no período da Segunda Guerra Mundial.
De acordo com Nagado (2011), foi com a criação do Estúdio Toei, em 1958, até hoje um dos
maiores estúdios de animação do Japão, que a indústria da animação do Japão começou a
crescer. Com a chegada da TV, os animês tomaram outra proporção.
Astro Boy, de Osamu Tezuka, foi a primeira série de animê com personagens fixos
exibida na TV japonesa. Estreada em 1963, a série contou com 193 episódios, um grande
sucesso desde o início. A partir de então, os animês se tornaram um fenômeno nacional.
Ainda na década de 60 foram lançados títulos de sucesso como A Princesa e o Cavaleiro,
também de Tezuka, e Speed Racer de Tatsuo Yoshida. Desde então, os animês de sucesso na
TV, bem como aqueles que alcançam o público internacional, tem sido quase sempre
adaptações de mangás exitosos, a ponto de serem considerados por Nagado (2011) como
“mangás em movimento” (NAGADO, 2011, p. 50-51).
Os animês, seja na TV ou no cinema, são produzidos e distribuídos por estúdios de
animação, o que faz com que seu modelo empregatício se assemelhe mais ao dos syndicates
que ao mais independente das editoras de mangás, apesar dessa indústria sobreviver à custa
dos mangás que são adaptados para a TV e cinema. Mangás e animês, enfim, não se
diferenciam tanto em conteúdo, apesar de suas diferenças de formato e produção.
29

2. A INTERNACIONALIZAÇÃO DO POP JAPONÊS: ANIMÊS E MANGÁS NO


BRASIL

Entender como a cultura pop japonesa, principalmente na figura dos quadrinhos e


animações, chegou ao topo do mercado mundial, rivalizando mesmo com os gigantes
americanos do ramo, foi uma das motivações primeiras deste trabalho. Para tal, nada mais
essencial do que entender o contexto e as condições históricas nas quais se deram essa
internacionalização dos produtos culturais japoneses.

2.1. Mangás e animês ganham o mundo

A cultura Japonesa, e oriental como um todo, sempre foi vista como “excêntrica” no
Ocidente, portanto, nada mais natural que essa difusão começasse por seus vizinhos, países
com uma história muito mais longa de contato e influências mútuas com a cultura japonesa.
Durante a primeira metade do século XX, a relação do Japão com seus vizinhos
asiáticos foi sangrenta. O Japão se tornou a principal potência imperialista da Ásia, tendo
ocupado militarmente boa parte destes, inclusive a China, que havia sido a influência inicial
da civilização japonesa, inclusive na arte do desenho, como já foi mencionado acima.
Com o fim da Segunda Guerra Mundial, fracassadas as aspirações imperialistas do
Japão, as relações deste com seus vizinhos mudam em sua natureza: se antes o Japão se
impunha militarmente como potência, agora precisava fazê-lo economicamente,

[...] comprando matéria-prima e exportando máquinas, utensílios domésticos


e, posteriormente, automóveis. Numa fase posterior, os japoneses
implantaram filiais de algumas de suas indústrias, mesma forma que os países
industrializados fazem na América Latina (LUYTEN, 2011, p. 141).

Claro que as relações econômicas que o Japão passou a ter com seus vizinhos
englobaram também a indústria cultural. A partir das décadas de 1970 e 1980, a influência do
mangá e dos animês nas produções vizinhas do Japão se torna mais notória. Na China, por
exemplo, Astro Boy de Osamu Tezuka, um garoto robô que salvava a humanidade através do
uso da ciência e tecnologia, representava os valores que o governo chinês tentava emplacar no
país. (LUYTEN, 2011, p. 144)
Assim, se no período anterior à Segunda Guerra Mundial o que mais caracterizava os
quadrinhos ou animações, seja no Japão ou no Ocidente, era uma preocupação educacional
nacionalista, no pós-guerra essas produções ganham caráter mais mercadológico. O
30

liberalismo que toma o Japão pós-ocupação pelos Estados Unidos atinge os mangás, de modo
que suas histórias ganham contornos e pretensões mais universais. Os horrores do
nacionalismo na Segunda Grande Guerra tornam os heróis dos mangás em heróis da
humanidade, defensores da paz.
Agora um dos mais bem-sucedidos países capitalistas do pós-guerra, a influência da
indústria cultural japonesa não tardaria a chegar no Ocidente. Segundo Santos (2011) foi a
partir da história “Ronin”14, publicada em nos Estados Unidos em 1983 por Frank Miller, que
o estilo mangá começou a ganhar espaço no Ocidente. Ronin abriu as portas do mercado
americano para heróis de outro tipo, que não os tradicionais e uniformizados heróis
americanos (SANTOS, 2011, p. 5).
A influência do pop japonês nos EUA, porém, tem antecedentes, alguns sucessos do
cinema japonês, como Godzilla, e as já citadas séries tokusatsus, sempre acompanhados de
merchandising e brinquedos, já eram uma realidade no Ocidente. Ou seja, os mangás foram
secundários na expansão do pop japonês pelo Ocidente, o carro-chefe sempre foram os
animês. O poder de alcance da televisão, nesse caso, superava em muito a folha impressa.

2.2. Mangás e animês no Brasil

A relação da cultura japonesa com o Brasil tem uma origem anterior ao sucesso da
indústria cultural japonesa devido à imigração japonesa no Brasil. Foi intensa a imigração
japonesa para as Américas durante a chamada “Era Meiji”, período de transformações
estruturais que abriu o Japão para o mundo. As dificuldades do campesinato e do proletariado
emergente numa nação que passava por um processo de industrialização, foram motivos mais
que suficientes para que muitos japoneses se interessassem em oportunidades nas Américas.
Os EUA foram o primeiro país a importar mão de obra japonesa, para trabalhar no recém-
incorporado território do Hawaii. No início do Século XX, os países norte-americanos
passaram a dificultar o processo de imigração dos japoneses, o que incentivou sua vinda para
países sul-americanos, principalmente Peru e Brasil.
A primeira metade do Século XX foi um período de intensa imigração de japoneses
para o Brasil. O principal destino desses imigrantes eram as lavouras de café, principalmente
no Estado de São Paulo. A chegada do navio Kasato-Maru em 1908 no porto de Santos, com
781 imigrantes, marca o início dessa imigração. Porém, é entre os anos de 1924 e 1941 que a

14
No Japão feudal, os ronins eram samurais que não estavam juramentados a um daimyo (senhor feudal), o que
era visto como uma grande desonra.
31

imigração se deu de forma mais intensa. À época, eram grandes os subsídios do governo
japonês para os imigrantes, ao mesmo tempo em que se fechavam as portas em outros grandes
destinos de imigrantes japoneses. (DADALTO; FOEGER, 2010, p. 2-3).
Luyten (2011) destaca que, dadas as diferenças culturais, a assimilação dos japoneses
na sociedade brasileira foi muito mais difícil que a de italianos e alemães por exemplo. Um
ponto comum entre eles, porém, foi o esforço por preservar sua cultura de um processo de
“caboclização”, isto é, eles temiam que um contato muito amplo e aberto com as comunidades
locais interioranas empobreceria a bagagem cultural de seus filhos. Assim,

[...] além da preocupação do envio dos filhos à escola brasileira, fosse no meio rural
ou posteriormente no urbano, tomou-se também a iniciativa de criação de escolas
japonesas, cujo principal objetivo era a manutenção da língua[...]. Além da escola
japonesa, as crianças dispunham de outros elementos para um contato permanente
com a língua, tais como livros e revistas de histórias em quadrinhos [...] (LUYTEN,
2011, p. 153).

O mangá foi, portanto, para além de entretenimento massificado, um importante


instrumento para a manutenção da cultura japonesa no Brasil, e incentivou também a
produção nacional de quadrinistas nipo-brasileiros fortemente influenciados pelo mangá desde
sua alfabetização. Muitos desses descendentes de japoneses foram responsáveis por parte da
produção nacional de quadrinhos nas editoras paulistas, mais notadamente a partir da década
de 60 (LUYTEN, 2011, p. 158).
Porém, para a população brasileira em geral, a difusão da cultura pop japonesa
começou através das mídias audiovisuais. A televisão foi a grande força motriz para a
divulgação do pop japonês no Brasil. A partir dos anos de 1960 o número de séries japonesas
exibidas na TV aberta apenas aumentou. Segundo Carlos (2010), 8 séries, entre live-actions e
animês, passaram na TV aberta durante a década de 1960. Nos anos 1970, o número passou
para 24, sendo 17 desses animês, entre os quais, os clássicos Speed Racer e A Princesa e o
Cavaleiro. Na década de 1980, foram exibidas 38 séries, sendo 22 delas animês. O sucesso de
live-actions como Jaspion e Changeman abriram as portas para o grande sucesso dos animês
na década de 1990 (CARLOS, 2010, p. 2).
Os anos 1990 marcam a decadência dos live-actions e o boom do animê. A partir daí,
“praticamente, todos os canais brasileiros exibiram, em certo momento, alguma dessas
produções, quando muito não criaram horários especiais para elas” (CARLOS, 2010, p. 3).
Entre algumas produções que marcaram os anos 1990 no Brasil estão: Cavaleiros do Zodíaco,
Dragon Ball, YuYu Hakusho e Sailor Moon. Outro grande sucesso que merece ser destacado
é Pokemón, exibido no início dos anos 2000.
32

O sucesso dos animês impulsionou também a exibição de longas-metragens e a


tradução e publicação de mangás pelas editoras brasileiras. Apesar dos mangás terem
começado a ser publicados no Brasil desde o final dos anos 80, foi no início dos anos 2000,
que, impulsionados pelo sucesso dos animês, mangás de títulos exitosos como Dragon Ball e
Cavaleiros do Zodíaco abriram caminho para o mercado editorial de mangás no Brasil. “A
partir daqui, só aumentou o volume de histórias nipônicas nas bancas e livrarias. Hoje podem
ser encontrados cerca de 200 títulos de mangás publicados pelas editoras JBC, Corand, Panini
e NewPop, as principais do ramo” (CARLOS, 2010, p. 4).
É importante citar que essas obras são traduções dos mangás feitos no Japão tendo em
vista primariamente o público japonês, e não o fenômeno, também crescente na época, dos
quadrinhos nacionais influenciados pelos mangás. É a partir da década de 1990 também, o
boom das revistas especializadas em animês e no pop japonês, além das convenções, voltadas
ao pop japonês, os “animencontros” (CARLOS, 2009, p. 3).
Outro aspecto importante desse processo de popularização do pop japonês nos anos
1990, é que ele passa a acontecer à margem do mercado ocidental. Surge o fansubbing no
Brasil, a tradução e legenda de obras feitas “de fã para fã”, e seu correspondente nos
quadrinhos, a scanlation, mistura entre as palavras “scan” e “translation”, isto é,
escaneamento e tradução de mangás feitos de forma gratuita, ambos foram fatores essenciais
para a divulgação dos animês e mangás. O fansubbing e a scanlation tem por objetivo a
divulgação da obra, portanto, há avisos de que a venda de cópias de tal material é proibida,
bem como de que se deve cessar sua distribuição caso o material venha a ser licenciado no
país.
Carlos (2009) pontua duas questões chave nesse processo, que influenciaram o
surgimento do fansubbing: a demanda que não se equivale à oferta e a questão da censura das
obras. Não são poucos os casos em que as versões dos animês transmitidos na TV aberta
recebem cortes e censuras, como a edição para que não apareça o sangue dos personagens, ou
nas cenas mais violentas. A autora cita o caso do animê “One Piece”, que trataremos mais
adiante neste trabalho, onde um personagem fumante, em sua versão distribuída no Ocidente,
tem seu cigarro editado, sendo substituído por um pirulito. Segundo ela, esse, bem como
outros fatores, “levou a comunidade ocidental de otakus a se organizar para a circulação dos
quadrinhos e animações japonesas originais, assim como para a divulgação de um
conhecimento maior desses materiais” (CARLOS, 2009, p. 5-6).
É importante ressaltar essa recusa do público de animês em relação ao material
“adulterado” veiculado pela grande mídia Ocidental, isto é, censurado, cortado ou adaptado
33

para se adequar aos padrões locais, pois esta pode ser vista como uma recusa de um aspecto
muito importante da indústria cultural, que é a massificação. Denota também a superação de
certas barreiras e tabus culturais que são empobrecedores na troca entre diferentes culturas. A
indústria cultural japonesa acaba, completamente sem querer, fazendo com que o Ocidente
tenha que repensar a sua própria.
Os anos 2000 foram responsáveis por trazer um novo elemento que mudaria a maneira
do público ter acesso ao pop japonês: a internet. A internet potencializa ao extremo o poder de
alcance do fansubbing, além disso, toda a comunidade de fãs de animês ganha visibilidade.
Surgem os fóruns online, onde se discute apenas a cultura pop japonesa e os usuários trocam
indicações (CARLOS, 2009, p. 5). Com a internet, passa a ganhar forma no Ocidente um
novo grupo, uma nova “tribo urbana”, a dos “otakus”.

2.3 Os otakus: Influências do pop japonês no Brasil

O termo “otaku” foi cunhado pelo jornalista japonês Akio Nakamori, e designa um
“indivíduo que vive ‘fechado em um casulo’, isolado do mundo real e dedicado a um hobby”
(NAGADO apud CARLOS, 2009, p. 2). Além do teor pejorativo que era original ao termo,
deve-se ter em mente que é um termo originalmente usado para descrever qualquer aficionado
a um hobby e não necessariamente os aficionados por cultura pop. No Japão, a presença dos
otakus começou a ser notada a partir de 1980.
No Brasil, a palavra é usada especificamente para descrever os fãs da cultura pop
japonesa. O termo foi popularizado no início dos anos 2000 por uma revista especializada em
animês, a “Animax”. Diferente do Japão, onde o termo é pejorativo, no Brasil os otakus
demonstram orgulho de pertencer a esse grupo, porém, pelo fato de se distanciarem dos
padrões sociais, os otakus brasileiros também tendem a ser mal vistos socialmente e como
pessoas “infantilizadas”, por gostarem de desenhos, além do estranhamento causado pela
estética influenciada pelo pop japonês. Além disso,

Os Otakus brasileiros vivem a partir de uma outra cultura, antes estranha, pois não
estava dentro dos padrões culturais do seu país. E a identificação e exposição das
experiências desse grupo no Brasil, encontrados em diversas regiões, ainda causam
estranhamento quando se apresentam com suas roupas características e atitudes de
consumo da animação japonesa (BRITO, 2009, p. 37).

Os otakus são identificados como “tribo urbana”, uma vez que seu relacionamento se
dá em um nível acima de tudo, afetivo. Segundo a ideia do sociólogo francês Michel
34

Maffesoli, as tribos urbanas constituem uma organização informal, ligada por relações
afetivas, o “estar junto à-toa” (MAFFESOLI apud BRITO, 2009, p. 37). Uma vez que são
relações emocionais e imediatistas, esses espaços “neotribais” têm como uma de suas
principais características o distanciamento de qualquer projeto político, sua realidade se dá no
presente vivido em coletividade, isto é, nos espaços de convivência e no compartilhamento de
símbolos, sendo que estes, por sua vez, estão intrinsecamente ligados, ou são gerados pela
indústria cultural e o mundo do consumo. Tal panorama relembra imediatamente o
pessimismo frankfurtiano, quando estes afirmam que

[...] o mecanismo da oferta e da procura continua atuante na superestrutura como


mecanismo de controle em favor dos dominantes. Os consumidores são os
trabalhadores e os empregados, os lavradores e os pequenos burgueses. A produção
capitalista os mantém tão bem presos em corpo e alma que eles sucumbem sem
resistência ao que lhes é oferecido (ADORNO; HORKHEIMER, 1985, p. 110).

Guardadas as proporções, já expostas anteriormente, acerca do pessimismo


frankfurtiano, não se pode negar que o establishment que se beneficia com essa ordem das
coisas e com essa orientação meramente consumista da cultura, perpetua um modelo que, por
um lado empobrece a vida humana, despojando-a de uma de suas faces mais elementares (a
política), e por outro perpetua ideologicamente um modelo econômico de exploração do
trabalhador, no caso, o artista, diminuído entre os interesses editoriais.
Sobre os otakus, Carlos (2009) destaca que “não se tratam de simples colecionadores,
pois não se contentam com o produto comercial: extrapolam, transformam, transcendem,
adaptam o produto, apropriando-se completamente dele” (CARLOS, 2009, p. 2). A partir
disso, os otakus se tornam a viva expressão da importância da indústria cultural na
constituição das identidades nas sociedades modernas. Porém, de certa forma, eles subvertem
a lógica da indústria na medida em que se apropriam da cultura pop japonesa, ressignificando-
a de acordo com seus próprios interesses e realidade social. Os otakus, facilitados pelo poder
da internet, cortam intermediários entre a cultura pop japonesa e o Ocidente, de certa forma
extrapolando a natureza mercadológica dessas produções. A influência do pop japonês,
entretanto, ultrapassa as tribos urbanas. Animês e mangás, e já são quase um dado natural
para as gerações urbanas contemporâneas, que já cresceram sob a influência da internet.
A internet é atualmente o principal meio pelo qual se tem acesso ao pop japonês no
Brasil. São milhares os portais, canais de vídeo, blogs, páginas em redes sociais fóruns e lojas
virtuais, onde o público pode ter acesso a produtos da indústria cultural japonesa. Apenas para
ter uma ideia da dimensão desses portais, o Anitube, um portal de visualização online de
35

animês, possui um acervo de quase 50.000 vídeos, conta com mais de 2.6 bilhões de
visualizações e geralmente tem, simultaneamente, mais de 100.000 usuários online15.
De certa forma, e apesar de ainda atrair um público bastante específico, o pop japonês
já não é tão estranho à cultura urbana brasileira, e se misturou a outros elementos de variadas
origens. Por exemplo, os numerosos eventos de animês, ou “animencontros”, que há muito
tempo congregam consumidores do pop japonês por todo Brasil, não se limitam a esse tipo
específico de entretenimento, mas suas atrações englobam outros elementos da cultura pop e
também de outras origens geográficas, como o cinema americano, o RPG, jogos eletrônicos,
bandas de rock e personalidades da internet.
A dimensão desses eventos pode ser exemplificada através do “Anime Friends”,
atualmente o maior evento do gênero em toda a América Latina, ocorre anualmente em São
Paulo. Em 2014 o evento recebeu mais de 100.000 pessoas, rivalizando, em adesão, ao
famoso Comic-Con, maior evento de cultura pop do mundo que acontece em San Diego nos
Estados Unidos e que concentra alguns dos principais lançamentos de Hollywood
(MIYAZAWA, 2014).
É nesses eventos ocorrem as principais práticas de expressão e socialização desse
grupo, de modo que se tornam espaços fundamentais para o próprio exercício da identidade
dos otakus. Neles, os indivíduos trazem no seu repertório cultural o gosto pelos mangás e
animês, e podem se reconhecer e compartilhar simbolicamente valores em comum, fatores
essenciais para a construção da identidade, sendo que

[...] a identidade do sujeito é construída a partir das suas relações com o meio que o
cerca. Nessa vertente, o consumo está presente diariamente, integrando-se nesse
ciclo. Valendo disso, as marcas constroem suas identidades de acordo com que o
consumidor almeja, a fim de complementá-lo. A partir do ato do consumo, a marca
transfere seus valores conceituais e simbólicos a quem a utiliza, influenciando
diretamente o posicionamento social e a identidade do público. (KAMINSKI, 2010,
p. 38).

Os animencontros devem ser vistos, portanto, essencialmente como lugares de


consumo. O compartilhamento desses símbolos tribais se liga ao próprio ambiente de
consumo criado nos eventos. Ali, o público “se veste” à medida que consome os produtos
vendidos no local. Camisetas, pingentes, anéis, capas, bandanas, sempre relacionados ao
mundo dos animês e mangás, vão incrementando o figurino do público à medida que o evento
acontece (BRITO, 2009, p. 39). De forma que essas aquisições, mais que meras mercadorias,

15
Dados de novembro de 2015. As estatísticas do site estavam disponíveis para o público na página inicial do
site, porém, este foi derrubado em meados de 2016, mudando de domínio, de modo que se perderam os dados
sobre o seu número de visitantes.
36

tem um valor simbólico para quem as usa, expressa seus gostos, sua individualidade, ao
mesmo tempo em que sucumbe seus consumidores à massificação.
Percebe-se que todos os espaços permeados pela cultura pop são essencialmente
espaços de entretenimento e diversão, corroborando a afirmação de Adorno (1985) de que o
controle da indústria cultural sobre os consumidores se dá através da diversão (ADORNO;
HORKHEIMER, 1985, p 112). É essa diversão forçada e condicionada pela indústria, vista
pelos frankfurtianos como uma tentativa de fuga da realidade mecânica do capitalismo tardio,
que empobrece não só os produtos da indústria cultural, mas também as identidades dos
grupos sociais ligados a ela. Daí o pessimismo de que, sem a superação da cultura como
negócio, o fim do domínio, material e ideológico sobre os indivíduos não pode acontecer. Se
por um lado, a presença do pop japonês acrescenta na cultura brasileira com um hibridismo
interessante, que nos enriquece de especificidades, por outro, não leva a nada do ponto de
vista político, dada a sua natureza.
37

3. DRAGON BALL E ONE PIECE: A CONSTRUÇÃO DOS UNIVERSOS


FICTÍCIOS DOS MANGÁS E SUA RELAÇÃO COM SEU CONTEXTO HISTÓRICO

Apesar de toda sua abordagem teórica da Indústria Cultural e a contextualização do


pop japonês e sua difusão no Brasil, sem o apropriado estudo de fontes, dificilmente este
poderia ser chamado um trabalho historiográfico. Portanto, para a análise dos mangás e
animês enquanto fontes, separamos dois títulos que figuram entre os mais populares, tanto no
Japão quanto no Brasil: Dragon Ball, lançado originalmente de 1984 a 1995 e One Piece, o
mangá mais vendido da história16, lançado desde 1997 e ainda inconcluso. Duas minas de
ouro da Shueisha, a maior editora de mangás do Japão, One Piece é praticamente o sucessor
de Dragon Ball como carro-chefe da revista semanal da editora – e de maior sucesso no Japão
– a “Weekly Shonen Jump”. A revista possui tanto sucesso que é publicada também em
outros países – sua versão americana, por exemplo, foi lançada em 2002 e continua sendo
publicada até hoje17.
Ambos os títulos contribuíram muito para a divulgação dos mangás e animês no
Brasil, principalmente a partir dos anos 90 e, apesar de serem recentes, se considerada a
história dos mangá, servem bem para nossa finalidade, pois ajudaram a formar o imaginário
sobre os mangás e animês no Brasil por fazerem parte da geração que transformou o animê
em fenômeno nacional. São, portanto, referências primárias nos meios onde se trata do pop
japonês. Além disso, também as escolhemos por serem perfeitas representantes do gênero
shonen, que são as histórias produzidas com foco no público masculino juvenil, sem dúvida, o
gênero mais popular no Brasil e fora do Japão em geral. Por sua temática menos aprofundada
e complexa, dado o público alvo, são geralmente shonen os animês de maior sucesso na TV
brasileira. Dessa maneira os shonen correspondem como a superfície, ou ao primeiro contato
com a cultura pop japonesa pelos brasileiros.
Antes de tudo, temos de tratar de dois pontos chave na produção dos mangás, que são
a importância do público-alvo na produção das revistas e a multiplicidade de referências que
compõem os universos onde se passam as histórias. Quanto à primeira ponderação, Nagado
(2011) lembra que:

16
http://g1.globo.com/pop-arte/noticia/2015/06/one-piece-manga-com-321-milhoes-de-exemplares-entra-para-o-
guinness.html. Acesso em 05/05/2016.
17
http://icv2.com/articles/comics/view/1499/dbz-yu-gi-oh-headline-us-shonen-jump. Entrevista concedida pelo
gerente de marketing da Viz, parceira da Shueisha que publica a WeeklyShonenJump nos EUA. Acesso em
05/05/2016.
38

Enquetes são feitas periodicamente perguntando a seus leitores 3 questões: 1- Qual a


palavra que mais aquece seus corações, 2- O que eles sentem ser a coisa mais
importante na vida e 3- O que os deixa mais felizes. As respostas são, amizade,
esforço e vitória, respectivamente. Basta uma lida em duas séries campeãs de épocas
diferentes, como Naruto e Cavaleiros do Zodíaco, para ver que essa política vem
sendo seguida nas séries de maior apelo popular (NAGADO, 2011, p. 24).

Dessa fala podemos extrair algo importantíssimo, tendo em vista a perspectiva


histórica das análises. Essas enquetes revelam que há valores comuns ao público que servem
de guias para as editoras, assim, concluímos que mangás de diferentes épocas trarão em suas
histórias variados valores-guias, que se adequam às preferencias do público. Nesse ponto, se
torna evidente a necessidade de trabalhar com dois grandes mangás de gerações diferentes,
pois é através dessa análise que podemos verificar como as transformações na sociedade
japonesa – entendendo que esta faz parte de um contexto global – alteram as obras produzidas
por sua indústria cultural.
Porém, que não se tome essas enquetes como um controle do público sobre as obras,
pois, conforme exposto anteriormente, a relação entre massa e indústria é muito mais
complexa. Poderíamos por exemplo, questionar “como e por que são esses os valores
escolhidos pelo público” antes de afirmar que o público está exercendo uma regulação efetiva
na produção dos mangás, ainda que essa regulação aconteça sob a forma de consumo.
Sobre o segundo ponto, os mangás, especialmente os do tipo shonen, tem suas
histórias vividas em mundos um tanto mais fantasiosos que seus pares americanos, cujas
histórias comumente se passam nos próprios Estados Unidos, resguardando mais abertamente
uma ideologia política americana. Essa característica também se faz presente em alguns
mangás, porém é mais frequente que deles surjam mundos completamente alternativos que
tomam características reais apenas como referências primárias, isto é, a humanidade dos
personagens, as referências culturais, históricas, etc. Trabalharemos melhor essa construção
de mundo nos mangás no decorrer do capítulo. A princípio, introduziremos as características
mais gerais de cada título para que posteriormente possamos analisa-las à luz da história.

3.1. Dragon Ball: a antropofagia da cultura pop

Dragon Ball foi criado por Akira Toriyama (1955-) – que à época já era famoso por
“Dr. Slump”, um mangá escrito anteriormente – e publicado pela revista Weekly Shonen
Jump de 1984 a 1995. As séries de mangá publicadas semanalmente costumam ser
compiladas em volumes após as publicações originais nas revistas. Dragon Ball contou com
39

519 capítulos, compilados em 42 volumes. Três séries de animês foram produzidas baseadas
em Dragon Ball: a primeira, homônima com 153 episódios e baseada nos primeiros 16
volumes do mangá; a segunda, Dragon Ball Z, foi baseada nos volumes restantes; a terceira,
Dragon Ball GT, não foi baseada no mangá, portanto não constitui conteúdo considerado
“canônico”, ou oficial da história. A série Dragon Ball Z ainda recebeu um remake,
denominado Dragon Ball Kai, que contou com 159 episódios e foi ao ar no Japão de 2009 a
2015. A série ainda contou com 19 filmes, sendo que apenas dois destes, os mais recentes,
contém conteúdo que segue a linha do tempo da série, e seu sucesso originou uma nova série
animada, Dragon Ball Super que começou a ser produzida em 2015 conjuntamente com um
mangá. Dragon Ball também possui quase uma centena de jogos eletrônicos lançados, sendo
uma das poucas franquias que seguem fazendo sucesso desde os anos 80 com os primeiros
consoles de videogames. Além disso, segundo um catálogo de 2014 da FUNimation, maior
distribuidora de animês dos Estados Unidos, a franquia Dragon Ball já vendeu mais de 40
milhões de jogos eletrônicos no mundo todo e mais de $5 bilhões em merchandising18.
No Brasil, Dragon Ball foi publicado pela Conrad Editora, uma das maiores do gênero
no país, em 83 volumes quinzenais de 2000 a 2002. Dragon Ball e Cavaleiros do Zodíaco,
publicados pela mesma editora, marcaram o boom de vendas de mangás no Brasil, no começo
dos anos 2000. Dessa leva inicial de Dragon Ball, foram vendidos mais de seis milhões de
exemplares19. Porém, fazendo o movimento inverso ao japonês, onde os mangás de maior
sucesso se tornam animês, no Brasil, os animês que fazem maior sucesso na TV é que atraem
o interesse da publicação de seus mangás pelas editoras. Foi Assim com Dragon Ball, cuja
série animada começou a ser exibida no Brasil ainda em 1996 no SBT e desde então tem
estado presente de forma contínua nos programas infantis de diferentes emissoras.

18
https://www.thecnl.com/FunimationNov2014Catalog.pdf. Acesso em 18/05/2016.
19
http://www1.folha.uol.com.br/fsp/ilustrad/fq2611200219.htm. Acesso em 05/05/2016.
40

Figura 4: capa da 1ª edição de Dragon Ball pela Conrad Editora. Com Goku em primeiro plano e o dragão
ShenLong em segundo plano.

Fonte:http://www.guiadosquadrinhos.com/edicao/dragon-ball-n-1/dr033101/2236520

A história de Dragon Ball gira em torno da procura por sete esferas mágicas, as
Esferas do Dragão (as Dragon Balls), que quando reunidas, invocam um dragão mágico, Shen
Long, que realiza um desejo daquele que o invocar. A história se inicia quando Bulma, uma
jovem herdeira da maior empresa de tecnologia do mundo, a Corporação Capsula (Capsule

20
Acesso em 05/05/2016.
41

Corp.), cujos serviços consistem como o nome deixa antever, em guardar em capsulas
basicamente qualquer objeto, de armas a veículos, ou até casas, procura pelas esferas com a
ajuda de um radar que ela mesma desenvolveu. Guiada por seu radar, Bulma se encontra com
o jovem Son Goku, que possui uma das esferas. Goku é uma criança anormalmente forte e
possuidora de um intrigante rabo de macaco, que, sozinha no mundo após a morte de seu avô
adotivo, e tendo salvado a vida de Bulma após um bandido tê-la atacado, passa a acompanha-
la em sua busca.
Em cada saga, aparecem novos e mais poderosos inimigos, de forma que elas seguem
mais ou menos o mesmo padrão: Goku é derrotado pelo novo inimigo que planeja dominar ou
destruir a Terra; Goku encontra maneiras de ficar mais forte; Goku retorna e derrota o
inimigo. Por vezes também, nosso protagonista morre e é revivido por seus amigos através
das esferas do Dragão. Também acontece de, mesmo morto, ele arranjar meios de treinar e se
fortalecer no “Outro Mundo”. Essas aparições de inimigos cada vez mais poderosos são
intercaladas por um evento que reúne os mais poderosos guerreiros da Terra, o Torneio de
Artes Marciais (Tenkaichi Budoukai).
Outra marca do desenvolvimento do enredo de Dragon Ball é a expansão do universo
da história enquanto ela se desenrola. Cada saga explora elementos novos, colocando-os sobre
o mesmo padrão exibido acima. Como o universo de Dragon Ball não se limita de
possibilidades, uma vez que desde o começo da história coexistem esferas mágicas, carros
voadores, animais antropomorfos falantes, etc., a história tende a inserir novos seres assim
que os anteriores se esgotam. Assim que os humanos chegam ao limite enquanto recursos para
o desenvolvimento do poder de Goku, aparecem androides, demônios, deuses, alienígenas e
deuses ainda mais poderosos na complexa hierarquia celestial do mangá. Enfim, cada saga é
um exercício de criatividade de como o autor irá colocar na história um vilão ainda mais
poderoso que o anterior. Essa forma de narrativa deixa a impressão de que a história não tem
finalidade alguma, continua, basicamente enquanto fizer sucesso e for do interesse do autor. A
própria estrutura permite e encoraja isso. Tudo gira em torno do desenvolvimento ad
infinitum do poder do herói. É nisso, acreditamos, que está um dos mais importantes aspectos
dos mangás, principalmente os shonen.
Uma grande diferença dos heróis dos mangás e animês, se comparados com seus pares
ocidentais, é que eles não são naturalmente, ou acidentalmente dotados de grandes dons, ou,
se o são, esse dom geralmente não se vale por si só. Nos enredos dos mangás, os heróis, ainda
que dotados de habilidades naturais, precisam treiná-los e aperfeiçoá-los sob a ameaça de
ficarem obsoletos em suas histórias. Ao analisarmos três dos personagens principais – Goku,
42

Vegeta e Gohan – podemos perceber de forma clara essas características. Ambos os


personagens são sayiajins, a mais poderosa raça alienígena de guerreiros do Universo na
trama. Ao nascerem, os sayajins plebeus são enviados para planetas a fim de conquista-los e
anexá-los ao seu Império, que vende planetas em uma espécie de Capitalismo Universal. O
primeiro, nasce sem talento algum, literalmente seu poder de luta ao nascer é “1”, o mais
baixo possível, e por isso é enviado à Terra, um planeta considerado muito fraco. Porém,
através da educação fornecida por seu falecido avô adotivo, combinada com uma batida na
cabeça sofrida quando bebê, Goku supera sua natureza violenta de sayajin e se torna um fiel
defensor da terra, e, ao decorrer da história, através de puro esforço e força de vontade ao
defender a Terra e seus amigos, se torna o lutador mais forte do Universo. Vegeta, príncipe
sayajin é um perfeito prodígio das artes marciais, porém, ao ser derrotado por Goku passa a
treinar intensamente na tentativa de superar o plebeu vitorioso. Gohan, filho de Goku, é tido
durante a história como o portador da mais poderosa força interior (ki) e potencial, porém,
prefere os estudos às lutas, de modo que ao fim da trama não consegue mais lutar com os
inimigos, cada vez mais fortes à medida que a história prossegue, e fica em segundo plano,
raramente voltando a aparecer. Ironicamente, o início do crepúsculo de Gohan acontece
justamente quando este para de treinar e passa a imitar super-heróis ocidentais, lutando com
bandidos de rua e escondendo sua identidade, por vergonha de seus colegas de classe,
acontecimento que leva o personagem Gohan do posto de mais poderoso guerreiro e centro da
trama a mero recurso cômico durante alguns arcos da história.
Vemos que Dragon Ball é formado a partir de um implacável canibalismo cultural,
uma antropofagia bem à moda japonesa. Em sua base temos a mitologia, a literatura e as
superstições japonesa e chinesa, principalmente. O personagem Son Goku é baseado em Sun
Wukong, do romance chinês “Jornada ao Oeste”, publicado em 1570. Wukong é um rei-
macaco que acompanha o monge protagonista em suas peregrinações, inclusive há o
personagem Kuririn, baseado no monge, porém esse vai se tornando secundário à medida que
a história se afasta dessa referência original. A partir dessa base tradicional o autor incorpora
temas futuristas, que tem maior fundamento na realidade. Exemplo disso é a saga “Red
Ribbon” (fita vermelha, em tradução livre), onde uma organização oriunda de um país gelado,
aparentemente baseado na União Soviética, tenta dominar o mundo através de alta tecnologia
e, principalmente através do desenvolvimento de guerreiros androides. É através desse
futurismo que as influências do momento histórico vivido, o Japão dos anos 80, escapam das
entrelinhas e se escancaram na história.
43

Tudo isso, porém, é apresentado em Dragon Ball com um forte teor cômico, o que
também é uma característica marcante do gênero. Dessa forma, muitas dessas referências
culturais, é importante que se diga, entram na história como paródia, como um modo de dizer
que o autor não leva tão a sério a obra que produz. Talvez também seja um modo de
individualizar na obra caracteres que pertencem a outros contextos, ao mesmo tempo em que
suaviza a falta de originalidade e se desculpa por isso, através de elementos cômicos, como se
os próprios personagens estivessem cientes que são deformações de outros personagens.
Na contracapa do primeiro volume da versão americana de Dragon Ball, Toriyama
aborda a versatilidade da história de Dragon Ball para se adequar aos seus interesses, dada a
liberdade com que trata suas referências básicas:

O cenário de Dragon Ball tem uma espécie de atmosfera chinesa, mas não é
necessariamente a China. Exatamente onde ele acontece é incerto. A história em
geral é muito simples, mas eu gostaria de continuar criando mais detalhes e
ilustrações à medida que eu prossigo. Dessa forma, eu posso desenhar qualquer
coisa que eu quiser e aproveitar a tensão e excitação de descobrir o que eu vou
desenhar em seguida (TORIYAMA, 2006)21.

Sobre o modo como a cultura de massa se relaciona com suas referências, Umberto
Eco (2011) pontua, por exemplo, que uma das características da cultura de massa é “pegar
emprestados” elementos da vanguarda artística por sua funcionalidade. Principalmente se
considerarmos que Dragon Ball emprega elementos da alta cultura (o clássico Jornada ao
Oeste, por exemplo) apenas em sua dimensão estética, ignorando o conteúdo, bem como o já
estudado uso do enquadramento cinemático nos quadrinhos22 a análise de Eco é precisa
quando este diz que o kitsch se apresenta como gozo de efeitos sentimentais revestidos de
experiência estética, e que “o Kitsch renova-se e prospera justamente tirando um contínuo
proveito das descobertas da vanguarda” (ECO, 2011, p. 79-80). Característica da qual One
Piece, mangá sobre o qual passaremos a falar, não se distancia.

21
Tradução livre de: The setting of Dragon Ball has a sort of Chinese feel to it, but it’s not necessarily China.
Exactly where it takes place is uncertain. The Overall story is very simple, but I’d like to keep making up more
details and illustrations as I go along. This way, I can draw anything I want to and enjoy the tension and
excitement of figuring out what I’ll draw next.
22
Através da leitura de “Steve Canyon”, popular tira de jornal americana no final dos anos 40, Umberto Eco faz
um estudo pormenorizado da linguagem das estórias em quadrinhos no terceiro capítulo de “Apocalípticos e
Integrados”, já referenciado neste trabalho.
44

3.2. One Piece: A liberdade como valor supremo

One Piece é escrito e ilustrado por Eiichiro Oda (1975-), fã declarado de Akira
Toryiama23, o que já deixa implícito algumas influências de Toryiama sobre sua obra. Já
citado neste trabalho como o mangá mais vendido de todos os tempos, One Piece estreou na
revista Weekly Shonen Jump em dezembro de 1997 e continua em publicação, contando com
mais de 800 capítulos compilados em 81 volumes. Uma adaptação para a televisão foi
produzida pela Toei Animation e estreou no Japão em 1999. Atualmente, o animê já conta
com mais de 700 episódios. One Piece conta também com 13 filmes lançados e dezenas de
jogos eletrônicos, além dos tradicionais e altamente lucrativos merchandisings que seguem
todo mangá de sucesso.
A série de mangá foi publicada no Brasil primeiramente pela Conrad Editora entre
2002 e 2008, sendo descontinuada na edição de número 70, porém voltou a ser publicada pela
Panini em 2012 e já conta com 110 edições licenciadas. Comparativamente com Dragon Ball,
a versão animada de One Piece obteve pouco êxito na TV aberta brasileira, tendo apenas sua
primeira temporada (com 54 episódios) exibida brevemente pelo SBT.
Este fato pode encontrar explicação em dois fatores sui generis: a geração anterior de
franquias japonesas havia feito sucesso no Brasil primeiramente através das animações, visto
que na época não havia no Brasil mercado editorial para os mangás que tornasse viável a
tradução e distribuição desses títulos a nível nacional. Conforme exposto anteriormente, os
animês criaram a demanda pelos mangás, de modo que o mercado editorial afunilava o
público do pop japonês no Brasil. Basicamente, aqueles que já eram fãs dos títulos através das
animações é que compravam os mangás. Com One Piece, aconteceu o contrário: surgiu num
momento em que já havia esse mercado editorial no Brasil, de forma que o mangá foi
publicado antes do animê e acabou sendo, nesse primeiro momento, uma obra para iniciados,
ao contrário de Dragon Ball, por exemplo.
Outro fator é que a versão exibida na TV brasileira é a versão americana do animê,
produzida pela empresa americana 4kids Entertainment. Essa versão é famigerada entre a

23
https://one-piecex.com.br/primeira-entrevista-do-oda/. Primeira entrevista de Oda como mangaka, traduzida e
comentada por fãs. Em certo ponto ele comenta como o estilo de desenhar de Toryiama influenciou o seu.
Acessa em 18/05/2016.
https://www.kamisama.com.br/?p=68. Entrevista concedida por Oda e Toryiama, autores de One Piece e Dragon
Ball respectivamente, em forma de diálogo. Oda se refere ao autor de Dragon Ball como “um deus” quando
perguntado como se sente em relação ao seu interlocutor. Acessa em 18/05/2016.
45

fandom24 de One Piece no Brasil por conter censuras significativas em relação à versão
original, cortes e alterações de diálogos, em uma tentativa de adequar o produto aos padrões
norte-americanos (trabalharemos melhor a questão da censura num tópico posterior). Além de
não ter conseguido boa aceitação pela fandom, o americanizado animê foi exibido a partir de
2008 na TV aberta brasileira, momento em que os programas infantis já se encontravam em
franca decadência, sendo substituídos por programas de variedades, e também quando a
internet já se mostrava uma ferramenta muito mais eficaz para a propagação do pop japonês.
Uma característica importante de One Piece, é que ele surge num momento em que os
mangás shonen apresentam, de forma geral, a mesma estrutura, seguindo os clichês
identificados como responsáveis pelo sucesso de seus antecessores. Como já foi pontuado,
não se pode subestimar a importância da visão mercadológica das editoras. Dessa forma, tanto
em forma como em conteúdo os shonen são bastante parecidos, visto que são produzidos para
o mesmo público, e agraciam os mesmos valores escolhidos por este público como os mais
importantes. O que mais diferencia os shonen é sua temática principal.
Cada título se passa em um mundo especialmente desenhado tendo em vista sua
temática. No caso de One Piece, a temática principal é a pirataria, de modo que o universo da
história é um universo marítimo e que faz referência à realidade da era dos “descobrimentos”,
cheio de mares inexplorados e povos desconhecidos. Em One Piece mesmo os maiores países
não passam de ilhas, muitas das quais baseadas em países reais, e o único continente é uma
fina linha de terra que circunda o planeta verticalmente, a “Red Line”. O mundo é dividido
em quatro Oceanos, marcando os quatro pontos cardeais, e tem no seu centro a Grande Rota,
o maior e mais perigoso Oceano do mundo, para onde todas as aventuras convergem. É um
universo naturalmente possuidor de grande capacidade de expansão, o que em parte explica a
longevidade da série. Porém, One Piece, como muitos outros títulos, segue a deixa de Dragon
Ball, misturando diferentes temáticas àquela central. Temas futuristas, mitológicos,
sobrenaturais e mesmo referências ao mundo real abundam em One Piece.
O enredo segue a tripulação dos “chapéus de palha”, cujo capitão, Monkey D. Luffy,
sonha em ser o “Rei dos Piratas” após ter se maravilhado quando criança com o senso de
liberdade e companheirismo de seu mentor, Shanks O Ruivo, um pirata que sacrificou seu
braço direito para salvar a vida do protagonista. O título de Rei dos Piratas será concedido
àquele que consegue chegar ao fim da Grande Rota e se apoderar do grande tesouro, o One
Piece, escondido ali por Gol D Roger, Rei dos Piratas anterior.

24
Termo de origem inglesa utilizado para caracterizar uma comunidade de fãs de um determinado produto
midiático.
46

A tripulação dos chapéus de palha é marcada pela diversidade de interesses. Cada


tripulante tem seu próprio sonho, porém é apenas com a ajuda uns dos outros que esses
sonhos se concretizam durante a história. Além disso, todos são, em alguma medida, ou párias
de seus locais de origem ou sobreviventes solitários desses locais, são indivíduos
completamente diversos que encontram amizade e companheirismo na diferença. Talvez essa
seja uma manifestação contemporânea da tradicional ética japonesa: cada um vive e se esforça
ao máximo para concretizar suas ambições, porém, deve estar disposto a dar a vida pela
coletividade. Por trás da narrativa está sempre a defesa de um mundo que permita a cada
indivíduo a perseguição de seus interesses e o aprimoramento de suas potencialidades sem o
prejuízo da coletividade.

Figura 5: Os chapéus de palha. A amizade e as ambições, ou sonhos, aparecem sempre como valor supremo nos
shonen.

Fonte: http://images2.wikia.nocookie.net/__cb20110210034323/onepiece/pt/images/7/76/Strawhatse.jpg25

Em One Piece, o poder político aparece muito bem retratado, o que não é tão comum
se tratando de shonens. Há um único governo central, o “Governo Mundial”, formado por
uma coligação de países e liderado por uma pequena elite de nobres, os “Tenryuubito”
(Dragões Celestiais), descendentes das famílias reais dos países que formaram o Governo
Mundial, e pelos “Gorousei”, um pequeno conselho composto por cinco homens. Os Gorousei

25
Acesso em 19/05/2016.
47

comandam a Marinha, que corresponde ao poder militar no mundo de One Piece. A marinha é
a principal antagonista dos piratas e coloca recompensas por suas cabeças. O Governo
Mundial também se utiliza de corsários, os “Shichibukai”, sete famosos piratas que passaram
a trabalhar para o Governo em troca de carta branca para suas ações. É informado na série que
o poder do mundo é equilibrado entre o Governo Mundial, os Shicibukai e os Yonkou, os
quatro piratas mais poderosos e que dominam o território conhecido como “Novo Mundo”
(Shinsekai), na Grande Rota.
Há também disputas de poder dentro da própria marinha, impulsionadas por diferentes
ideias do que é justiça e de como esta deve ser aplicada. Existem marinheiros que são
implacáveis contra qualquer ato criminoso, existem marinheiros corruptos que abusam de
suas posições e há ainda aqueles que se utilizam qualquer meio em nome da “justiça”. Entre
os piratas também há os que apenas viajam em busca de aventuras e sem prestar qualquer
satisfação ao Governo Mundial, quanto os que se notabilizam pela crueldade. Há ainda na
série um exército revolucionário, que pretende acabar com o injusto Governo Mundial. Esse
exército é liderado por “Monkey D. Dragon”, pai do protagonista, e tratado como “o homem
mais procurado do mundo”.

Figura 6: Os Gorousei, líderes do Governo Mundial de One Piece. Entre eles, um baseado em Mikhail
Gorbatchev, um que lembra a figura de Mahatma Gandhi e um homem atarracado de aparência judia que lembra
Karl Marx, além de outros de aparência europeia.

Fonte: https://one-piecex.com.br/mangas/leitor/594/#326

26
Acesso em 19/05/2016.
48

Um dos motes da narrativa é o fato de o Governo Mundial proibir o estudo de um


longo período da história, conhecido como “Século Perdido”, de modo que ninguém possa
saber como o próprio Governo Mundial se formou. Um membro da tripulação dos chapéus de
palha, a arqueóloga Nico Robin, teve seu país inteiro destruído pelo Governo e passou a ser
perseguida desde criança, porque acadêmicos daquele país ousaram estudar o Século Perdido,
que apenas pode ser conhecido através dos “poneglyphs”, grandes monólitos escritos numa
língua perdida que, após o genocídio de seus conterrâneos, apenas ela sabe ler.
Cada saga da história repete, de forma geral, o seguinte enredo: o vilão geralmente
possui um plano de obtenção de poder para fins individuais que coloca em risco toda a
população da ilha em que ele se encontra, a tripulação dos chapéus de palha chega a essa ilha
e logo cria laços de amizade com os moradores oprimidos, derrotando o vilão e devolvendo a
estabilidade política na região. É curioso, porém, que eles jamais se intrometem nos regimes
internos nem questionam a organização política dos lugares onde passam, não estão
preocupados, por exemplo, em derrubar monarquias. Os vilões, apesar de agentes políticos,
são antes sabotadores, corruptos e aproveitadores de suas posições de poder. Nisso One Piece
pode ser considerado mais sofisticado que seu antecessor, Dragon Ball, onde a dicotomia bem
versus mal aparece em termos morais muito mais simplórios, com um vilão que apenas
pretende causar caos e destruição contra o herói que se dispõe a salvar a Terra.
Porém, a sofisticação nos enredos dos shonen não se restringe ao caso comparativo
entre Dragon Ball e One Piece. Mesmo se analisarmos dois títulos do mesmo autor, os
mangás “Yu Yu Hakusho” e “Hunter X Hunter”, ambos de Yoshihiro Togashi e grandes
sucessos no Brasil, o primeiro publicado sob a égide de Dragon Ball, e o outro pertencente a
atual geração de mangás, percebemos mudanças que apontam na mesma direção. O primeiro
apresenta similares limitações de enredo que Dragon Ball, com uma dicotomia moral muito
clara, enquanto o segundo, assim como One Piece, apresenta um mundo muito mais
complexo, onde as aspirações individuais se mesclam com disputas políticas. A mesma
sofisticação acontece com outros grandes títulos atuais, como Naruto, Fairy Tail ou Bleach se
comparados com a geração anterior. A principal mudança, podemos perceber, é a aparição das
instituições políticas, de conflitos ideológicos mais complexos, além de uma maior
diversidade humana entre os personagens das séries. Com isto em mente, e tomando Dragon
Ball e One Piece como fontes centrais, analisaremos a seguir esse desenvolvimento narrativo
através do contexto histórico japonês.
49

3.3. A influência do contexto histórico na construção dos universos fictícios dos


mangás

Dois grandes acontecimentos são fundamentais para entender as diferenças entre a


primeira grande geração de mangás que fizeram sucesso no Brasil, da qual Dragon Ball faz
parte, e a segunda, da qual One Piece faz parte. O primeiro é o fim da Guerra Fria e o segundo
a crise econômica enfrentada pelo Japão nos anos de 1990.
Já mostramos que o Japão se reinseriu internacionalmente após a Segunda Guerra
Mundial como um país liberal e democrático, fortemente influenciados pelos Estados Unidos,
que ocuparam o Japão após o conflito e influenciaram ativamente na reconstrução japonesa.
Ao fim da ocupação, os estadunidenses temiam que os japoneses pudessem aliar-se à
União Soviética, e para prevenir que isso acontecesse, durante os anos 50, os EUA assinaram
diversos acordos com o Japão, de modo a garantir o alinhamento do Japão aos seus interesses.
Essa política de alinhamento entre o Japão e os EUA ficou conhecida no Japão como
“Doutrina Yoshida”, em referência à Yoshida Shigeru, Primeiro-Ministro japonês no Pós-
Guerra e peça-chave na política interna japonesa na segunda metade do Século XX. “Através
do alinhamento com os EUA, o Japão conseguiu ao longo da década de 70, atingir o PIB
equivalente ao da França e do Reino Unido juntos, sendo comparável à metade do PIB norte-
americano” (KENNEDY, 1989 apud WATANABE, 2011).
Através desse alinhamento com os EUA, e com o sucesso econômico das décadas
seguintes, o Japão se tornou o grande bastião do capitalismo no Extremo Oriente. A partir de
1953 até 1991, o PIB japonês sempre cresceu acima de 4%, muito acima das potências
europeias e EUA no mesmo período, chegando até a ameaçar a hegemonia econômica
americana durante os anos de 1980 (TORRES FILHO, 1997, p. 6).
O “Milagre Econômico Japonês”, contudo, teve fim em 1992, com o colapso da bolha
financeira e imobiliária japonesa, fruto de um surto especulativo. O estrago dessa crise na
economia foi tão grande que a década de 1990 ficou conhecida no Japão como “a década
perdida”27.
Dragon Ball, bem como a primeira geração de mangás a fazer sucesso no Brasil, são
da década de 1980, onde o Japão ainda era afetado pela tensão da Guerra Fria e fazia seu
papel geopolítico de potência capitalista no Extremo-Oriente. Além disso, a economia

27
Para uma análise mais aprofundada sobre a crise econômica japonesa dos anos de 1990, ler: TORRES FILHO,
Ernanes Teixeira. A crise da economia japonesa nos anos 90: impactos da bolha especulativa. Revista de
Economia Política, vol. 17, nº 1 (65), janeiro-março/97. São Paulo, 1997.
50

japonesa era a que mais crescia no mundo. A polarização geopolítica, assim como o clima de
otimismo econômico, podem ser vistos nos mangás da época através de suas construções de
mundo: lugares com uma dicotomia bem clara entre bem e mal, onde a política e as ideologias
não aparecem, e a principal tarefa dos heróis, aqui, é defender o mundo das forças do mal. São
ameaças externas que ameaçam um mundo que, sem essas exterioridades instabilizadoras, vai
muito bem. Uma boa ordem instituída contra a ameaça iminente do caos e da destruição.
Por outro lado, os mangás de meados da década de 1990, como One Piece, mesmo
pertencendo ao mesmo gênero de Dragon Ball e tendo o mesmo público-alvo, construíram
seus mundos de forma bastante distinta da geração de mangás anterior. Nessas obras, o
mundo já é visto como um lugar onde diversas forças, grupos e indivíduos, com objetivos
diversos lutam por seus interesses. Agora, os heróis lutam por seus próprios sonhos, e não
mais simplesmente para defender o mundo ou uma ideia abstrata. Ainda existem heróis e
vilões, mas mesmo os vilões não são mais simplesmente “maus”, eles têm ideologias, projetos
próprios de poder e interesses que são mais bem trabalhados. Há um interesse maior em
explicar a origem do mal nos vilões, em justificar suas visões de mundo.
Outra característica interessante da nova geração de mangás é o cuidado em apresentar
maior diversidade humana nos seus personagens, principalmente em questão de gênero. As
mulheres são bem mais numerosas nos mangás shonen mais recentes do que nos da geração
de Dragon Ball. Porém, ainda pode e deve ser problematizada a representação das
personagens femininas nos mangás, que são muito utilizadas como recursos de fan service28
ou apresentadas de forma hiperssexualizada.

Figura 7: figure art da personagem Tashigi, uma oficial da Marinha de One Piece. Exemplo de fan service.

28
Elementos irrelevantes na história, mas que são inseridos como forma de atrair audiência e agradar os fãs,
muitas vezes através de situações com conotação sexual.
51

Fonte:https:www.facebook.comonepieceexoficialphotosa.906358949425512.1073741828.906347252760015109
3892277338844type=3&theater29.

Um caso que merece atenção nesse sentido, é em One Piece existir uma ilha habitada
somente por homossexuais e travestis, tratadas todas pela mesma terminologia, “okama”, gíria
japonesa que significa tanto homossexual quanto travesti. Assim como no caso das mulheres,
a retratação é dúbia, se por um lado eles são retratados de maneira extremamente
estereotipada e como recurso cômico, por outro são retratados como pessoas valorosas,
corajosas e que, muitas vezes salvam os protagonistas. A ilha dos okamas é, inclusive, uma
importante aliada do Exército Revolucionário da série na luta para derrubar o Governo
Mundial.
O tema racial também aparece na série através dos “homens-peixe”. Meio humanos e
meio peixes, discriminados, segregados e escravizados pelo Governo Mundial, inicialmente
aparecem como vilões, mas à medida que a história se desenrola somos apresentados às
atrocidades cometidas contra eles e a verdadeira luta de alguns deles para viver em paz com
os humanos e a pura revolta e ódio contra os humanos de outros, causados por séculos de
maus-tratos.
Mais interessante ainda é o fato de parte do fandom de One Piece buscar ressaltar a
mensagem contra o preconceito e os valores humanistas apresentados no mangá. Um exemplo
é a “One Piece Ex”, maior site de One Piece em português que, em apresenta um podcast
sobre o animê e um dos programas, denomidado “quebrando preconceitos em One Piece”30,
tratou exclusivamente dessas temáticas. Muitos dos canais e páginas sobre o animê nas redes
sociais também costumam tratar dessas temáticas sociais e políticas do mangá. Apesar de
todas as implicações negativas da indústria, há ainda um esforço ativo dos fãs de ressaltar o
significado social da obra, para além do mero entretenimento.

29
Acesso em 16/08/2016.
30
Disponível em: https://one-piece-x.com.br/opexcast-46-quebrando-preconceitos-com-one-piece/. Acesso em:
06/03/2017.
52

CONSIDERAÇÕES FINAIS

Constatamos, a partir do desenvolvimento deste trabalho, que todo o desenvolvimento


e distribuição dos mángás e animês pelo mundo está inserida num contexto maior de
desenvolvimento do próprio capitalismo global e da inserção do Japão neste sistema.
Os produtos da Indústria Cultural japonesa, que o mundo assimilou tão bem, nascem
de uma série de reorganizações políticas e econômicas no Japão e de elementos absorvidos a
partir das relações internacionais que surgem desses eventos. Do mesmo modo, as obras
sofrem profundas influências de sua época, refletem de certa forma o zeitgeist de onde são
produzidas, por mais que a Indústria Cultural tente encobrir essa relação e que muitas vezes
passe completamente despercebida pelo público.
Porém, para além das mudanças de enredo, de temática e de conteúdo dos mangás, e a
relação que estes estabelecem com seu tempo, em última instância é o capital que rege todo o
processo que envolve a cultura pop, sua disseminação e assimilação. Temos uma produção
aparentemente diversa, mas que é engessada de tal modo pelos modelos mais lucrativos, que a
forma muitas vezes acaba por suplantar o conteúdo. A forma já está lá para ser seguida, e o
conteúdo geralmente se adapta aos moldes pré-fabricados de cada revista e de acordo com
cada público-alvo.
Vimos que, longe de inserir elementos ideológicos e comportamentais novos, devido à
diferença cultural entre o Brasil e o Japão, o que normalmente se pensa quando se trabalha
com essa temática, o pop japonês age sobretudo na esfera do consumo e entretenimento, e
seus grupos consumidores não se diferem, na forma como estabelecem suas relações e sua
coesão, com outras tribos urbanas. Pelo contrário, há uma grande interseção entre os
diferentes nichos de consumo voltados para o público jovem, o que se evidencia nos
animencontros, que desenvolvem atividades voltadas para muitas outras temáticas que não os
animês e mangás, porém, sempre ligados à cultura pop.
Os efeitos mais notáveis dessa cultura voltada para o consumo é um afastamento entre
a cultura e a vida concreta. Não é à toa que a palavra Otaku designa, originalmente, alguém
que vive “isolado num casulo”. Tal definição corrobora muito bem ao fenômeno das tribos
urbanas: bolhas de consumo que pouco dizem sobre seus consumidores devido ao desalinho
entre os produtos da indústria cultural, que os unem, e uma base concreta de valores que
determinasse de algum modo aquele grupo.
Aqui, é bom retomar as duas categorias que Eco (2011) expõe em sua obra. De um
lado, os otimistas, que o autor chama de “integrados”, para quem os novos modos de se fazer
53

cultura são positivos pois serviram para um alargamento nunca antes visto do campo cultural,
tirando-o do domínio de poucos eruditos e do consumo quase exclusivo das classes altas. De
outro, os “apocalípticos” que dizem que a Indústria Cultural significa o fim da cultura como
bem superior, dotado de valor intelectual e que serve sobretudo como ferramenta da ideologia
dominante (ECO, 2011, p. 8-9).
Creio que não podemos ignorar nenhum dos posicionamentos, e apesar deste trabalho,
por limitações que são próprias de sua natureza, não os abarcar todos, cada um desses
direcionamentos teóricos acabam preenchendo as lacunas um do outro, muito mais que se
contradizendo.
54

FONTES

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