Você está na página 1de 4

A mulher de vermelho (Adaptado)

Agatha Christie
O relógio da catedral soava as 00:00. O frio da madrugada invadia as ruas. Janelas fechadas.
Silêncio. Um bairro tranquilo, todos ocupados demais com suas vidas não sabiam quem morava ao lado.
Talvez por isso, a viatura da polícia local assustasse com sua presença.
Ninguém vira ou ouvira nada, mas havia um corpo no chão. Uma mulher.
(...)
– Meu Deus! Um assassinato? Que horror! Como foi?
(…)
Todos assustados, não tinham muito a dizer. Os policiais olhavam o corpo e coçavam as próprias
cabeças. “Como, diabos, isso foi acontecer?”
O detetive examinava o corpo agora. Mandara chamar a denunciante do caso. A mulher chegou,
enrolada em um roupão atoalhado, cachecol no pescoço e bobes na cabeça. (...)
– Acalme-se, senhora! Não sou pago para pensar a respeito do que fazem os outros a hora de
dormir… por favor continue… – E, virando-se para o policial que o assistia, disse, em tom imperativo: – Vá
buscar uma cadeira e um café para a senhora…
– Eyelesbarrow! – Respondeu com certa empáfia.
– Muito bem, Sr.ª Eyelesbarrow. Por volta de que horas a senhora olhou para fora?
– Eram onze horas… ah! Obrigada, meu jovem! Que café gostoso! Minha mãe costumava…
O detetive pigarreou e a gorda senhora retomou seu relato, um tanto envergonhada pelo deslize.
– Bem, como já disse, eram onze horas da noite. Eu sempre olho a rua toda pela minha janela. Dá
para se fazer isso olhando lá de cima, do meu quarto, mas esta noite, eu estava tricotando na sala e acabei
cochilando. Um leve ruído me acordou. No início, achei que havia sonhado, mas fui recobrando a
consciência e percebi que se tratava de um barulho como o de um motor.
– E… – O detetive a encorajava.
– E me dei conta de que não podia ser de um motor de carro, pois estava muito abafado, a não ser
que viesse de longe… olhei o relógio da sala e eram exatamente 22:45. Fiquei quieta, esperando ouvir mais,
mas ele logo parou, como se houvesse sumido… então fui espiar pela cortina e foi então que vi! Alguém ou
algo embrulhado em um tecido cinza estava jogado em frente à casa da nova vizinha.
(...)
Mais uma vez, aqueles olhos envelhecidos e assustados da nobre senhora caíram sobre o detetive,
mas este por conhecer nobres senhoras como aquela, resolveu dar por encerrada a questão, dando-lhe algo
com que pudesse se contentar:
– Obrigado, senhora! Assim que tivermos mais informações, entraremos em contato! Pode ser que a
chame outra vez para futuros esclarecimentos…
– Oh, detetive! Foi uma honra ajudar! Só cumpri com meu dever de cidadã! –Respondeu, orgulhosa
de si mesma.
– O policial aqui a acompanhará até a sua casa… até logo!
– Oh! Até logo! – E saiu, ajeitando um bobe, muito cheia de si…
Assim que a senhora Eyelesbarrow afastou-se, o detetive pensou em voz alta: - Esta velha é bastante
intrometida! – um policial ouvindo aquilo, sorriu em resposta.
Voltando-se para a casa da morta, o detetive recomeçou a examinar o cadáver. “A resposta só posso
encontrar em você!” – Pensou. O que havia nele?
Uma mulher caída em frente à porta de sua casa. Lily era o nome gravado na chave encontrada em
sua bolsa de cetim preto. Além da chave, um frasco de perfume sem rótulo e um batom vermelho. Não havia
documentos e nem dinheiro. Apenas isto.
Ela trajava um vestido vermelho bem decotado. Estava bem maquiada. Um casaco cinza bastante
pesado para a estação. Não fazia tanto frio assim. Não possuía marcas visíveis e, para ser sincero, nem
parecia estar morta! Qualquer um diria que morreu dormindo, não fosse o local onde havia sido encontrada.
E assim, não havendo nada mais urgente a se fazer no local, decidiu que o corpo deveria ser removido
imediatamente.
(...)
No necrotério, John esperava o resultado da autópsia.
(...)
– Bem, pelo menos a faixa de horário cabe exatamente no depoimento daquela senhora… Mas, e as
marcas de pneus…? Um carro parou na frente da casa, alguém a viu morrer ou a matou e depois foi embora.
– Eram recentes também. Tudo indica que estavam limpos antes, pois não encontrei nenhum vestígio
de solo que seja diferente do jardim.
– Havia pegadas, Mike? – perguntou John ao legista.
– Não, John, sem pegadas. Se alguém esteve lá, ficou tempo suficiente para deixar aquelas marcas e
ver a garota morrer sem descer do carro. E olhe que foi por pouco tempo! Ela morreu quase que
instantaneamente! Um tremendo colapso!
– Jovem demais para um infarto! Há tantos indícios e vestígios de assassinato e mesmo assim não
parece assassinato…
– Parece que os dois nunca viram um caso de envenenamento antes!
O detetive e o legista viraram-se assustados com a voz repentina atrás deles. Era Melissa Harven, a
“especialista” como era conhecida entre os policiais. Chegara de repente, como era seu costume e também
como de costume solucionaria o caso sem pestanejar.
– Envenenamento?! Como? Se não há indícios de que nada tenha sido ingerido pela morta!
– Mike, querido, se fizer uma autópsia mais detalhada, descobrirá que ela morreu de infarto, causado
pela alteração de íons potássio em seu metabolismo, o que pode ocorrer naturalmente…
– Mas, então…?
– Não, meu bem, ela não ingeriu potássio…
– Explique-se! – Ordenou John impaciente.
– O frasco de perfume. – Respondeu enigmática.
(...)
Melissa calçou as luvas e pôs-se a analisar o frasco e seu conteúdo. Cinco minutos depois, ia falar
com o detetive. Todos os policiais se reuniram à volta dela, com rostos apreensivos.
– Um frasco sem rótulo, o aroma é característico de fabricação artesanal. A julgar pelos gostos da
morta, não era uma garota acostumada a luxos, e por isso, não poderia distinguir um perfume original de um
fabricado no quintal de casa. Provavelmente, e de acordo com os testes preliminares, vários sais de potássio,
incluindo o cianeto, foram misturados em concentrações diferentes que não causam lesões a epiderme, mas
que ao penetrar a pele e cair na corrente sanguínea, fazem um grande estrago. Ela passou o perfume no
andar de cima, no quarto, e quando desceu os últimos degraus, começou a sentir frio e suar intensamente,
para disfarçar pôs o casaco. Mas, o casaco também tinha outra finalidade. Não era interessante chamar
atenção para si, vestida daquele jeito. A escolha do local onde ela morava mostra isto. As pessoas que vivem
ali são muito discretas. Tão discreta que vivia ali a quatro meses e ninguém sabia nada dela. Mas não acaba
aí. – Avisou aos presentes.
– Prossiga então! – Pediu o detetive, incomodado por ela outra vez roubar-lhe o caso.
– Como queira, detetive! O homem com quem ela ia se encontrar furtivamente é casado, e ele
querendo livrar-se da amante, que começava a exigir muito dele, resolve matá-la sem deixar pistas, porém, a
maior pista que ele pôde deixar foi este perfume. Agindo premeditadamente, deu-lhe o perfume de presente,
pedindo que o usasse em seu próximo encontro, provavelmente iludindo-a com alguma mentira… Então, foi
até a casa dela como combinado, para certificar-se de que tudo ia correr bem. Ele queria ter certeza de que
ela morreria. Com esse intuito, calculou o tempo de reação do cianeto e parou o carro na frente da casa dela
e por um descuido, o fez sobre o jardim e não sobre a calçada. E, no exato momento em que ela havia
acabado de trancar a porta e guardado a chave em sua bolsa, calculo eu, às 22:40, caiu morta. Ali, ele ficou
por uns minutos, tentando ver se ela agonizava ou já estava morta mesmo. Preferiu não correr o risco de
descer do carro e, em baixa velocidade, evitando ruídos do motor do veículo, foi embora.
(...)
Um pesado silêncio de segundos recaiu entre os dois. John a fitava com desespero até que a luz veio
à sua mente:
– Oras! Mas isto é… O chefe do laboratório da universidade! – Bradou John, dando um salto da
cadeira.
– Mas como pode ter certeza que é ele? – Perguntou Mike subitamente.
– Elementar, meu caro Mike! É o único homem casado que trabalha lá. – Melissa respondeu
sorrindo, triunfante.
http://www.recantodasletras.com.br/contospoliciais/595485

a) O texto que você acabou de ler pode ser considerado um enigma? Por quê?
b) Você acha que a mulher de bobes ajudou na investigação? Comente.
c) O detetive recomeçou a examinar o cadáver para encontrar a resposta do assassinato. O que ele
encontrou?
d) Diante dessas provas encontradas em frente à porta da vítima, o detetive chegou a alguma conclusão?
Escreva a respeito.
e) Descreva a moça encontrada morta.
f) Você não achou estranho a moça estar usando um casaco bastante pesado para a estação? Por quê?
g) Qual foi o resultado da autópsia feita pelo legista? O que lhe causou espanto? h) Por que o legista não
pensou em envenenamento ao fazer a autopsia do cadáver?
h) Por que o legista não pensou em envenenamento ao fazer a autopsia do cadáver?
i) “Há tantos indícios e vestígios, de assassinatos e mesmo assim não parece assassinato...” Por que John
disse isso?
j) Quem resolveu o enigma?
k) Que enigma era?
l) O que passou despercebido aos olhos do legista e do detetive John?
m) Quem era o assassino da moça do conto que você acabou de ler e por quê?

Encontre semelhanças do texto de Conan Doyle e da Agatha Christie. O que eles têm em comum?

a) Existem diferenças nos crimes entre o texto do Módulo I e o que você acabou de ler? Quais?
b) Qual texto você encontrou maior facilidade de interpretação? Por quê?
c) Qual o enigma a ser desvendado tanto no primeiro texto quanto neste?
d) Qual o texto que você achou que houve mais suspense? Por quê?

Você também pode gostar