Escolar Documentos
Profissional Documentos
Cultura Documentos
Dezembro 2014
1
FIG. 1 -‐ Almada Negreiros, vitral de Oeiras, 1954 -‐ pormenor do cisne -‐ foto de Paulo Neto
Carlos
Filipe
Guerra
da
Anunciação
Reis,
Dez.
2014
-‐
Almada
Negreiros
e
o
Templo
de
Oeiras.
A
obra
em
vitral
de
1954
“DE
1
A
65
N’adhérez
jamais
GEORGES
BRACQUE
Nasci
d’asas
Com
asas
Cortaram-‐me
as
guias
De
pé
no
chão
Vieram
os
filhos
Cortaram-‐me
os
pés
Cresceram
as
asas
Sei
só
voar
Sem
pé
em
terra
Sem
pé
no
ar
Tenho
pé
no
ar
Filho
d’asas
Sabe
voar”
2
3
FIG. 2 -‐ Almada Negreiros, vitral de Oeiras, 1954 -‐ foto de Paulo Neto
Num
ápice,
à
velocidade
da
luz
o
tempo
passou
pela
mão
de
um
luminoso
artista!
São
sessenta
anos
de
presença
de
Almada
Negreiros
no
edifício
da
antiga
biblioteca
municipal,
a
casa
do
conhecimento,
hoje
integrado
nos
paços
do
Concelho
de
Oeiras
numa
presença
serena
e
discreta
que
colaboradores
e
público
partilham
sem
o
ver
mas
conscientes
de
que
ali
está.
Aquela
fonte
de
luz
suave
afaga
o
espaço
e
conforta
o
transeunte
indiferente
nas
suas
preocupações
burocráticas.
Carlos
Filipe
Guerra
da
Anunciação
Reis,
Dez.
2014
-‐
Almada
Negreiros
e
o
Templo
de
Oeiras.
A
obra
em
vitral
de
1954
Não
temos
conhecimento
de
outro
município
que
na
sua
casa
ostente
obra
de
tão
distinto
artista.
O
vitral
assinado
por
Almada
de
seu
nome
José
Sobral
de
Almada
Negreiros,
datado
de
1954,
de
proporções
generosas
ilumina
de
cor
quente
a
escadaria
de
acesso
ao
salão
nobre
e
1º
andar.
O
austero
edifício
foi
em
boa
hora
atingido
pela
obra
do
artista
que,
já
consagrado
à
época,
ali
deixou
uma
criação
baseada
em
estudos
sobre
a
geometria,
a
estética
e
a
filosofia
que
ocupavam
há
muito
a
sua
mente
complexa
num
registo
enriquecedor
do
espaço
público
patrimonial
do
município.
Almada
é
convidado
a
compor
uma
obra
para
Oeiras
pelo
neto
do
marquês
de
Pombal.
Sente
essa
responsabilidade
e
obriga-‐se
a
conhecer
profundamente
a
singular
propriedade
que
no
pós-‐terramoto
de
1755
foi
idealizada
por
Sebastião
José
de
Carvalho
construtor
desse
território
único
pensado
em
cada
pormenor,
tal
como
engendrara
o
novo
centro
administrativo
de
Lisboa.
Rodeado
dos
melhores
artistas
o
príncipe
deixa
um
conjunto
de
marcas
de
qualidade
onde
sobressaem
dois
soberbos
conjuntos
arquitectónicos
-‐
a
baixa
de
Lisboa
e
a
quinta
e
palácio
de
Oeiras,
com
o
arrojo
de
um
autêntico
paço
real.
Os
dois
territórios
são
traçados
a
régua
e
esquadro,
com
linhas
definidoras
de
sentidos,
de
segundos
sentidos,
de
regras
claras
e
aparentes,
de
hierarquias,
numa
geometria
depurada.
Nascem
dois
territórios
eruditos
dos
mais
belos
de
Portugal,
arrisco
a
escrever,
de
toda
a
europa,
complementares
inequivocamente
um
do
outro.
Carlos
Filipe
Guerra
da
Anunciação
Reis,
Dez.
2014
-‐
Almada
Negreiros
e
o
Templo
de
Oeiras.
A
obra
em
vitral
de
1954
O
major
do
exército
João
de
Saldanha
Oliveira
e
Sousa
pede
a
Almada
Negreiros
algo
simbólico
e
contemporâneo
que
valorizasse
o
novo
equipamento
cultural
a
construir
nas
ruínas
da
antiga
estufa
de
plantas
concebidas
pelo
príncipe
seu
antepassado.
O
ano
de
1954
revelou-‐se
de
grande
criação
artística
para
Almada
e
no
seu
atelier
(uma
singela
cabana
de
madeira
de
planta
quadrada
no
meio
de
vegetação
cerrada
em
Bicesse,
Cascais,
vendo-‐se
a
norte
a
serra
de
Sintra
e
o
palácio
da
Pena)
brotam
o
célebre
óleo
do
seu
companheiro
e
amigo
Fernando
Pessoa
e
os
vitrais
do
Restelo
e
de
Oeiras.
O
óleo
destinava-‐se
ao
restaurante
“irmãos
unidos”,
em
Lisboa,
frequentado
por
Fernando
Pessoa,
Mário
de
Sá
Carneiro,
o
próprio
Almada
e
outros
colaboradores
da
revista
“Orpheu”,
da
qual
saíram
apenas
dois
números
e
daí
aparecer
no
canto
da
mesa
o
nº
2
da
revista.
É
uma
obra
de
grande
fôlego
que
reforça
o
nome
de
Almada
no
panorama
artístico
português.
O
pintor
dos
olhos
grandes
executa
dois
vitrais
com
destinos
e
enquadramentos
diversos,
mas
certamente
com
alguns
pontos
em
comum;
o
vitral
de
Oeiras
que
aqui
tratamos
e
o
vitral
Eros
e
Psique
para
a
residência
do
seu
amigo,
o
poeta
José
Manuel
Fróis
Ferrão,
na
rua
de
Alcolena
no
Restelo.
Este
exemplar
está
assinado
mas
não
Carlos
Filipe
Guerra
da
Anunciação
Reis,
Dez.
2014
-‐
Almada
Negreiros
e
o
Templo
de
Oeiras.
A
obra
em
vitral
de
1954
datado,
apesar
de
se
saber
ter
sido
executado
em
1954
(vd.
Cátia
Mourão,
Eros
e
Psique,
AR
2004,p.10).
É
atualmente
propriedade
da
Assembleia
da
República.
Ambos
os
vitrais
apresentam
alguma
relação
cromática
e
formal
(com
o
mesmo
nº
de
painéis
-‐
5
-‐
do
vão
central
e
dimensões
gerais).
Poderão
ter
sido
produzidos
na
mesma
oficina.
Também
neste
caso
a
fabricação
é
desconhecida,
sendo
possível
que
ambos
fossem
provenientes
do
atelier
de
Ricardo
Leone
na
Rua
da
Escola
Politécnica
com
quem
Almada
trabalhara
noutras
obras,
como
é
o
caso
do
também
triplo
vitral
para
a
igreja
de
Nossa
Senhora
de
Fátima
em
Lisboa
em
1936.
Contudo,
ressalva-‐se
que
este
conceituado
vitralista
conhecido
pelo
restauro
dos
vitrais
do
Mosteiro
da
Batalha,
tinha
por
hábito
assinar
as
suas
obras,
o
que
não
é
o
caso
nem
do
vitral
de
Oeiras,
nem
do
Restelo.
6
FIG.
3–
Almada
Negreiros,
Eros
e
Psique
(1954).
O
vitral
da
rua
de
Alcolena
no
Restelo.
Hoje
encontra-‐se
na
Assembleia
da
República
O
novo
edifício
adjacente
aos
Paços
do
Concelho
foi
inaugurado
a
26
de
Março
de
1955
destinando-‐se
à
primeira
sede
dos
Serviços
Municipalizados
de
Água
e
Saneamento
e
à
nova
Biblioteca
Municipal
de
Oeiras.
Foi
construído
de
raiz
no
local
Carlos
Filipe
Guerra
da
Anunciação
Reis,
Dez.
2014
-‐
Almada
Negreiros
e
o
Templo
de
Oeiras.
A
obra
em
vitral
de
1954
onde
funcionavam
as
antigas
estufas
da
Câmara,
cujas
robustas
paredes
exteriores
se
mantiveram.
A
sua
construção
terá
levado
cerca
de
cinco
anos.
Segundo
notícia
publicada
no
Diário
de
Lisboa
dessa
tarde,
o
projeto
de
arquitetura
do
edifício
é
da
responsabilidade
do
arquiteto
José
Magalhães
e
teve
como
responsável
pela
estabilidade
o
engenheiro
civil
Kaúlza
de
Arriaga,
que
mais
tarde
se
destacaria
na
carreira
das
armas
como
oficial
general.
Era
presidente
da
Câmara
o
3º
marquês
de
Rio
Maior,
o
major
engenheiro
João
António
de
Saldanha
Oliveira
e
Sousa
descendente
do
marquês
de
Pombal.
A
inauguração
contou
com
a
presença
do
ministro
do
Interior
Dr.
Trigo
de
Negreiros.
7
FIG.
4
–
Em
26.3.1955
-‐
Inauguração
do
edifício
vendo-‐se
o
ministro
do
Interior
em
primeiro
plano
e
o
presidente
da
Câmara
a
seu
lado,
ao
fundo
é
perceptível
a
fachada
do
Palácio
do
Marquês
de
Pombal
–
Note-‐se
o
alinhamento
quase
milimétrico
das
janelas
e
o
eixo
da
entrada.
O
vitral
encontra-‐se
na
escadaria
em
frente
a
esta
porta,
no
mesmo
eixo.
Foto
in
Jornal
Correio
da
Linha,
Jun.2009.
Carlos
Filipe
Guerra
da
Anunciação
Reis,
Dez.
2014
-‐
Almada
Negreiros
e
o
Templo
de
Oeiras.
A
obra
em
vitral
de
1954
Noutro
ângulo
de
leitura
Almada
coloca
na
sua
obra
duas
colunas
de
pedra
e
em
sobreposição
invoca
a
unidade
das
duas
cruzes
(a
swástica
e
savástica)
que
na
antiguidade
clássica,
estando
enlaçadas
numa
única
cruz
simbolizam
a
harmonia
do
eterno
retorno
e
do
eterno
devir,
a
inseparabilidade
do
sagrado
e
do
sensível
(Almada,
Ver,
p.132).
O
entrelaçamento
das
cruzes
é
um
jogo
secular
que
se
inicia
em
Creta
e
chega
a
Lisboa
que
a
adota
na
sua
bandeira.
Também
a
nossa
portuguesa
cruz
de
Cristo
é
esquematicamente
o
mesmo
entrelaçado
das
duas
cruzes
(Almada,
Ver,
p.135).
A
regra
da
vexiolologia
portuguesa
aponta
para
que
às
vilas
correspondem
as
bandeiras
esquarteladas
com
coroa
mural
de
4
torres,
como
é
o
caso
de
Oeiras,
enquanto
às
cidades,
seguindo
o
exemplo
de
Lisboa,
correspondem
as
bandeiras
gironadas
e
coroas
murais
de
5
torres.
2
João
Furtado
Coelho,“A
bandeira
de
Lisboa
e
as
das
demais
…”
in
Almada
dixit,
p.
236-‐264.
Carlos
Filipe
Guerra
da
Anunciação
Reis,
Dez.
2014
-‐
Almada
Negreiros
e
o
Templo
de
Oeiras.
A
obra
em
vitral
de
1954
Almada
Negreiros
sabia
que
Oeiras
tinha
o
estatuto
de
vila,
mas
de
forma
intencional
seguiu
o
exemplo
da
bandeira
de
Lisboa,
a
cidade
de
Ulisses,
a
cidade
das
7
colinas
pelo
forte
simbolismo
associado
ao
entrelaçamento
das
cruzes.
Em
paralelo
com
o
redesenho
da
bandeira
o
artista
estava
a
apontar
para
a
elevação
de
Oeiras
à
dignidade
da
cidade,
deixando
as
4
torres
para
que
permanecesse
alguma
dúvida
no
ar.
Sintomaticamente
a
Amadora
que
na
altura
estava
integrada
no
concelho
de
Oeiras
foi
elevada
a
cidade
após
a
sua
separação
de
Oeiras
em
1979.
Premonitório
Almada
viu
condições
para
a
elevação
do
concelho
de
Oeiras
a
cidade,
o
que
em
parte
se
concretizou
com
a
Amadora
25
anos
depois.
9
FIG.5
-‐
Brasão
de
armas
original
-‐
bandeira
do
município
esquartelada
de
branco
e
de
púrpura
cardinalíssimo
Carlos
Filipe
Guerra
da
Anunciação
Reis,
Dez.
2014
-‐
Almada
Negreiros
e
o
Templo
de
Oeiras.
A
obra
em
vitral
de
1954
10
FIG.6 -‐ O Brasão recriado por Almada Negreiros, sob bandeira gironada de cidade
O
brasão
como
elemento
central
da
obra
encomendada
foi
objeto
por
parte
de
Almada
de
um
trabalho
de
depuração
com
alteração
de
proporção,
de
composição
com
redesenho,
simplificação
de
elementos
e
apuramento
cromático
e
de
traço.
A
Coroa
mural
de
prata
de
quatro
torres
teve
uma
alteração
na
forma
e
cor
das
portas,
desaparecendo
propositadamente
o
Listel
branco
com
a
legenda
"
Vila
de
Oeiras
"
a
letras
negras.
O
cisne
adquiriu
outra
elegância
pelo
apuramento
e
redesenho.
Cortaram-‐me
as
guias.
O
toque
do
artista
está
bem
visível
aqui,
nomeadamente,
na
forma
das
asas
que
agora
se
abrem
de
forma
protetora,
adquirindo
volume
pelo
sombreado.
Filho
d’asas
/
Sabe
voar”
reconhece
o
artista
que
nasceu
com
asas
para
altos
voos
e
que
Carlos
Filipe
Guerra
da
Anunciação
Reis,
Dez.
2014
-‐
Almada
Negreiros
e
o
Templo
de
Oeiras.
A
obra
em
vitral
de
1954
evidentemente
se
enamorou
pela
luz
e
pureza
simbólica
da
ave
oeirense,
que
tanto
pode
ser
Zeus
transfigurado,
como
o
cisne
que
guia
o
filho
de
Parsifal
ou
o
fiel
acompanhante
de
Apolo,
mas
onde
Almada
reconhece
que
a
si
mesmo,
tal
como
no
poema
que
irá
escrever,
lhe
Cresceram
as
asas
/
Sei
só
voar
/Sem
pé
em
terra.
As
asas
do
cisne,
ave
que
remete
para
os
cavaleiros
da
Távola
Redonda,
são
a
ligação
visível
e
invisível
ao
vitral
Eros
e
Psique
que
anteriormente
abordámos.
Já
vimos
que
o
elemento
alado
é
importante
na
reflexão
almadiana,
e
se
na
psique
elas
estão
desfalecidas,
em
Oeiras
estão
em
posição
de
imponência
e
garbo.
Querem
ser
vistas,
são
atrativas!
Veremos
mais
à
frente
se
não
aparentam
outra
mensagem.
Almada
trabalha
as
patas
do
cisne
dando-‐lhe
mais
volume
e
solidez
de
sustentação,
orientando-‐as
a
régua
e
esquadro
como
que
solidificando
os
alicerces
do
símbolo.
Amplifica
a
estrela
pombalina
de
oito
pontas
que
decora
o
peito
da
ave,
qual
rosa
dos
ventos
que
indica
a
direção.
Que
direção
será
essa?
Estará
aqui
o
sinal?
A
direção
única.
A
subtil
para
não
dizer
dissimulada
axialidade
presente
nos
traçados
arquitectónicos
de
Pombal.
Estes
elementos
são
retocados,
as
dimensões
aumentadas
para
melhoria
da
11
proporção
e
simultaneamente
acentuação
das
leituras
imanentes,
esotéricas
(interiorizadas)
e
exotéricas
(exteriorizadas).
A
cor
do
cisne
muda
de
cinza
para
branco.
Também
os
bagos
de
uva
recebem
volume
e
brilho.
O
folhado
das
parras
dos
cachos
de
uva
muda
de
forma,
ficando
com
ouro
mais
vivo,
sendo
acantonados
de
forma
diferente.
O
contra-‐chefe
de
cinco
faixas
ondadas
da
base
é
transformado
em
ondas
mais
suaves
e
de
tonalidade
diferente.
O
azul
cobalto
mate
envolvendo
o
cisne
é
também
transformado
em
azul
de
tom
mais
luminoso
e
natural
sugestivo
de
Céu
e
de
Lua.
Relembrando
a
sabedoria
superior
dos
pedreiros
construtores
de
catedrais,
obras
maiores
da
capacidade
humana,
que
na
pedra
que
gravavam
a
sua
sigla
reservada
aos
iniciados,
marca
dissimulada
mas
identificadora,
cunho
de
verdade.
Também
Almada
Negreiros
neste
elemento
central
vai
colocar
duas
cifras
identificadoras
da
verdade
da
obra:
o
L
dourado
da
pata
do
formoso
cisne
e
a
confirmação
traduzida
na
mais
fina
linha
ondulada
do
olho
do
cisne.
Uma
autêntica
“marca
de
pedreiro”
medieval.
Carlos
Filipe
Guerra
da
Anunciação
Reis,
Dez.
2014
-‐
Almada
Negreiros
e
o
Templo
de
Oeiras.
A
obra
em
vitral
de
1954
FIG.
7–
o
L
de
Almada
na
pata
do
cisne
em
rigorosa
esquadria
12
FIG.
8
–
o
olho
do
cisne
a
“marca
de
canteiro”
de
Almada
Carlos
Filipe
Guerra
da
Anunciação
Reis,
Dez.
2014
-‐
Almada
Negreiros
e
o
Templo
de
Oeiras.
A
obra
em
vitral
de
1954
O
cunho
de
artista
ampliado
com
a
leitura
transcendente
ou
“invisível”
do
vitral,
à
semelhança
do
que
o
autor
segue
em
todas
as
suas
obras
é
valor
significativo.
É
descoberta!
Misterioso,
Almada
deixa
sempre
em
cada
registo,
por
mais
despojado
que
pareça,
pistas,
sinais
a
diversos
níveis
sensoriais
ao
ritmo
de
uma
mente
inebriante.
Almada
não
dá
ponto
sem
nó!
O
outro
vitral
Nada
pode
ser
concebido
sem
o
número,
dizia
Filolau
e
a
simetria
é
a
porta
de
13
entrada
da
Harmonia,
acrescenta
Almada
(Ver,
p.215).
Almada
entende
que
as
duas
gerações,
divina
e
humana,
têm
uma
relação
directa
com
os
números
2
e
3
respetivamente.
O
dois
de
uma
simetria
perfeita,
do
par,
da
obra
divina,
do
Dionisismo
e
do
Orfismo
a
que
corresponde
a
filosofia
acusmática.
À
geração
do
três,
do
ímpar,
da
obra
do
homem,
dos
matemáticos
e
dos
homens
da
ciência,
corresponde
ao
pitagorismo.
Na
geração
par
temos:
Zeus
2,
Apolo
4,
Hermes
6
e
Dionisos
8
(Almada,Ver,
p.98,
270).
Na
geração
impar,
a
de
Prometeu,
a
humana
Carlos
Filipe
Guerra
da
Anunciação
Reis,
Dez.
2014
-‐
Almada
Negreiros
e
o
Templo
de
Oeiras.
A
obra
em
vitral
de
1954
temos
os
números
3,
5,
7e
o
9.
A
série
dos
números
Par-‐Ímpar
é
o
casamento
do
Céu
e
da
Terra
(Almada,Ver,
p.216).
Os
números
são
a
síntese
dada
por
Deus
para
a
compreensão
do
universo.
Dez
são
os
dígitos
de
zero
a
nove
e
nenhum
deles
o
dez.
O
dez
é
o
primeiro
da
segunda
dezena
e
o
total
dos
números
da
primeira
dezena.
«O
dez
enquanto
total
dos
números
dígitos
está
presente
e
expresso
em
quantidade
na
série
infinita
dos
números»
(Almada,Ver,
p.
179).
Em
síntese
nestes
dez
números
estão
presentes
um
total
(divisível
e
simples)
e
um
todo,
a
série
infinita
dos
números,
o
universo.
«Será
possível
esta
cadência
do
dez
representada
nos
números
dígitos
e
tomada
14
isoladamente
de
todas
as
outras
dezenas
formar
por
si
a
concepção
conjunta
do
macrocosmos
e
do
microcosmos?
Foi
possível.
E
foi
o
que
Pitágoras
encontrou
ao
pôr
os
números
no
monumento
dórico,
o
templo
seu
antepassado.»
(Almada,Ver,
p.180)
Almada
concluiu
que
a
síntese
só
é
possível
após
a
análise.
E
que
essa
capacidade
de
processar
a
síntese
«é
a
forma
do
entendimento
humano».
A
nudez
na
natureza
é
o
simples
no
belo.
A
natureza
e
o
seu
oposto
que
a
“imita”
só
criam
nus
e
simples.
Na
natureza
todos
os
berços
são
individuais,
tudo
nasce
nu
e
a
sua
Carlos
Filipe
Guerra
da
Anunciação
Reis,
Dez.
2014
-‐
Almada
Negreiros
e
o
Templo
de
Oeiras.
A
obra
em
vitral
de
1954
nudez
é
a
única
portadora
da
sua
própria
florescência.
É
o
que
pretende
o
belo
com
a
sua
criação
do
simples.
Porém
o
belo
não
se
fica
apenas
no
estético,
o
qual
é
apenas
uma
quarta
parte
do
belo,
com
as
outras
três:
ético,
lógico
e
religioso.
“O
belo
achado
da
aritmética”
(Ésquilo,
Prometeu
Acorrentado)
não
pode
deixar
de
ter
encontrado
o
número
formado
pelos
quatro
ângulos
rectos
no
círculo
perfeito:
o
bom,
o
verdadeiro,
o
formoso
e
o
santo.»
(Almada,Ver,
p.181)
FIG.9
–
«O
raio
do
círculo
vai
do
ponto
ao
infinito.
Inscrevendo
o
quadrado
no
círculo,
como
o
quadrado
e
o
círculo
conservam
a
mesma
forma
até
ao
infinito,
são
iguais
no
infinito
e
temos
a
razão
primeira
entre
o
finito
e
infinito,
(…)»
(Ver,
p.182)
FIG.10 –
Carlos
Filipe
Guerra
da
Anunciação
Reis,
Dez.
2014
-‐
Almada
Negreiros
e
o
Templo
de
Oeiras.
A
obra
em
vitral
de
1954
FIG.11
–
«Com
os
diâmetros
vertical
e
horizontal
ficam
igualmente
a
um
tempo
divididos,
em
quatro
partes
iguais,
o
quadrado
e
o
círculo.»
FIG.12–
Este
sintético
desenho
geométrico
serve
para
Almada
demonstrar
que
apesar
do
quadrado
e
do
círculo
serem
divisíveis
a
sua
justaposição
torna-‐se
indivisível,
tal
como
o
uno
é
indivisível.
Assim
a
sua
sobreposição
faz
que
aquelas
divisões
em
separado
não
tenham
correspondência
quando
entendidas
em
conjunto.
Almada
considera-‐a
a
legítima
ficção
humana
ou
divina:
a
prévia
justaposição
do
que
é
intangível.
O
quadrado
inscrito
representa
o
domínio
do
sensível,
faz
parte
do
sagrado,
do
uno
e
não
cobre
o
todo
do
círculo
(perfeito).
Contudo,
o
sagrado
e
o
sensível
são
a
mesma
essência
e
ambos
o
mesmo
movimento
desde
o
ponto
até
ao
círculo
com
o
raio
infinito.»
(Almada,Ver,
p.184)
São
estes
os
caminhos
que
levam
ao
domínio
do
belo.
São
estes
os
caminhos
percorridos
por
Almada
na
sua
obra
.
O
sagrado
quaternário
está
presente
no
cacho
de
uvas,
mas
com
o
pormenor
de
se
encontrar
invertido
e
por
isso
passar
despercebido,
quase
oculto.
Mas
é
neste
trecho
que
que
o
autor
dá
o
sinal
do
seu
pensamento.
Quase
como
uma
segunda
assinatura
de
convicção
no
exato
e
perfeito
da
sua
obra.
O
verdadeiro,
o
bom,
o
formoso
e
o
santo
são-‐no
de
dois
modos.
Dessa
forma
nem
o
belo
se
limita
ao
estético,
muito
menos
o
sagrado
se
reduz
ao
religioso.
FIG. 13 -‐ o sagrado quaternário e o cacho de uvas de Almada – ilustração de Carlos Reis
Carlos
Filipe
Guerra
da
Anunciação
Reis,
Dez.
2014
-‐
Almada
Negreiros
e
o
Templo
de
Oeiras.
A
obra
em
vitral
de
1954
18
FIG.
14
-‐
sobreposição
do
vitral
de
Oeiras
a
amarelo
no
vão
da
igreja
de
Nª
Sra.
de
Fátima
em
Lisboa.
Ilustração
com
fotomontagem
de
Carlos
Reis
sobre
foto
de
Mário
Novais.
Carlos
Filipe
Guerra
da
Anunciação
Reis,
Dez.
2014
-‐
Almada
Negreiros
e
o
Templo
de
Oeiras.
A
obra
em
vitral
de
1954
19
FIG.
15
–
sobreposição
do
vitral
de
Oeiras
e
o
rectângulo
de
ouro.
Este
obtém-‐se
partindo
de
um
quadrado
e
da
sua
linha
mediana
de
onde
no
ponto
de
interseção
se
traça
uma
diagonal.
A
medida
da
diagonal
colocada
sobre
o
lado
do
quadrado
a
partir
do
ponto
de
interseção
resulta
no
nº
de
ouro
e
aí
é
possível
traçar
o
retângulo
áureo.
Desenho
de
Carlos
Reis
sobre
foto
de
Paulo
Neto
A
presença
divina
pressente-‐se
nas
diversas
elipses
que
do
centro
da
composição
integrando
a
coroa
mural,
as
asas
do
cisne,
e
os
crescentes
de
prata
que
o
envolvem,
qual
ovo
protector
quebrado
e
origem
de
tudo,
invadindo
as
espigas.
Estas
linhas
circulares
numa
aparência
subtil
mas
na
quantidade
certa
recriam
os
“círculos
órficos”
do
“cubismo
lírico”
pintados
pela
ucraniana
em
fuga
da
guerra,
Sonia
Delaunay
a
amiga
de
Eduardo
Viana,
Almada
e
Amadeo
de
Sousa
Cardoso,
que
deixa
Vila
do
Conde
onde
foi
feliz
em
1917.
A
guerra
ainda
hoje
massacra
a
sua
terra
de
leste
e
a
paz
a
encontram
por
aqui
os
seus
filhos.
Os
círculos
fluem
por
toda
a
parte.
São
a
perfeição
da
obra
divina.
São
os
planetas
e
as
estrelas,
são
2
conjuntos
de
17
espigas
que
culminam
em
foice
na
obra
de
Oeiras,
debruando
em
simetria
vertical
o
brasão,
como
acontece
com
as
17
colunas
que
envolvem
Atena,
a
deusa
da
guerra,
no
Parténon
e
lhe
suportam
templo.
Também
duas
colunas
de
pedra
envolvem
o
brasão
abrigando-‐o
Carlos
Filipe
Guerra
da
Anunciação
Reis,
Dez.
2014
-‐
Almada
Negreiros
e
o
Templo
de
Oeiras.
A
obra
em
vitral
de
1954
como
um
templo.
Esta
díade
assumida
por
Almada
aponta
para
a
dualidade
presente
na
vida,
na
criação
e
na
ordem,
a
complementaridade,
o
macho
e
fêmea,
o
Sol
e
a
Lua
presentes
no
templo
fronteiro
do
palácio
do
Marquês
de
Pombal
e
Conde
de
Oeiras
ali
do
outro
lado
da
rua.
O conjunto vitralístico é formado por 17 painéis, tal como as espigas.
O corpo é o ponto no centro do universo – do nó, do infinito.
FIG
.
16
–
esquema
apresentado
no
artigo
“Novos,
Diário
de
Lisboa,
de
19
de
Dezembro
de
1921
Carlos
Filipe
Guerra
da
Anunciação
Reis,
Dez.
2014
-‐
Almada
Negreiros
e
o
Templo
de
Oeiras.
A
obra
em
vitral
de
1954
O
17
remete
para
o
ano
da
publicação
do
seu
“Ultimatum
Futurista
às
Gerações
Portuguesas
do
Século
XX”,
o
ano
em
que
se
assume
como
pintor,
onde
se
confessa
um
construtor
(de
catedrais
pensamos
nós)
e
não
um
revolucionário
mas
onde
adverte
“Eu
não
tenho
culpa
nenhuma
de
ser
português,
mas
sinto
a
força
para
não
ter,
como
21
1917
é
o
ano
em
que
sai
o
único
número
da
revista
Portugal
Futurista.
Ano
em
que
Almada,
Amadeo
de
Sousa
Cardoso
e
Santa
Rita
celebram
um
pacto
“futurista”,
«diante
da
tábua
quinhentista
de
ECCE-‐HOMO
no
museu
de
Arte
Antiga»,
para
aprofundamento
do
estudo
dos
painéis
de
Nuno
Gonçalves,
mas
que
de
forma
inesperada
é
rompida
pelos
dois
últimos,
deixando
surpreendido
e
desgostoso
Almada
Carlos
Filipe
Guerra
da
Anunciação
Reis,
Dez.
2014
-‐
Almada
Negreiros
e
o
Templo
de
Oeiras.
A
obra
em
vitral
de
1954
22
FIG
.
17
–
“Ecce
Homo”.
A
investigação
geométrica
incessante
de
Almada
em
busca
do
cânone.
Trabalho
patente
na
exposição
“Almada
Negreiros
–
o
que
nunca
ninguém
soube
que
houve”,
de
12.12.2014
a
27.03.2015
-‐
Museu
da
Eletricidade,
fundação
EDP,
Lisboa.
Note-‐se
as
afinidades
geométricas
e
simbólicas
com
o
vitral
de
Oeiras
nas
figuras
2
e
24,
por
exemplo.
que
no
ano
seguinte
e
de
forma
dramática
veria
morrer
aqueles
dois
amigos,
numa
sequência
macabra,
sendo
obrigado
a
trilhar
sozinho
a
sua
obsessiva
vontade
a
que
nos
anos
50
se
dedica
de
forma
mais
intensa,
com
as
decifrações
dos
enigmas
dos
painéis
e
a
tentativa
de
descoberta
da
chave
d´Os
famosos
painéis
como
duas
elipses
Carlos
Filipe
Guerra
da
Anunciação
Reis,
Dez.
2014
-‐
Almada
Negreiros
e
o
Templo
de
Oeiras.
A
obra
em
vitral
de
1954
em
torno
das
duas
figuras
sagradas
ao
centro
de
cada,
tendo
em
seu
torno
uma
vastidão
de
figuras
laico-‐históricas
que
nos
surgem
na
tradição
dos
doadores
que
espreitam
a
cena
ou
figura
sagrada
em
adoração
(cf.
Fernando
Rosa
Dias,
A
arte
moderna
portuguesa
…p.
29
a
31).
Não
resisto
a
dar
nota
de
um
testemunho
real
de
quem
presenciou
uma
sessão
ao
vivo
com
o
mestre
pouco
tempo
depois
de
executado
o
vitral
de
Oeiras;
«O
Número
de
ouro!
O
Número
de
Ouro!
Gritava
lá
à
frente.
Eu
via-‐o
por
cima
das
cabeças
da
plateia
que
enchia
a
sala.
O
número
de
Ouro!
O
desafio
enchia
o
salão,
fazia
ricochete
nas
paredes
e
nas
telas
e
ribombava
nas
nossas
caras
atónitas.
Era
Almada
Negreiros.
O
Mestre
Almada
no
seu
melhor
a
provocar
os
artistas,
os
estudantes,
os
homens
de
letras
e
outros
amantes
das
artes
que
enchiam
a
Sociedade
Nacional
de
Belas
Artes
(SNBA)
na
Rua
Barata
Salgueiro,
em
Lisboa,
no
recuado
ano
de
1956».
O
jovem
Raimundo
Narciso
consegue
sintetizar
de
forma
clara
o
fervor
que
o
artista
punha
na
defesa
das
suas
ideias.
A
conferência
«girou
em
torno
do
NÚMERO!
O
número
Mágico,
o
número
Sagrado
da
Estética.
O
7!
O
9!
o
13!
A
relação
misteriosa
entre
altura
e
largura,
o
quadrado,
o
círculo,
o
triângulo,
as
proporções
do
objecto,
segredo
do
Belo,
23
encomenda
mais
relevante
que
encheu
Almada
de
satisfação
pela
liberdade
que
teve
para
a
conceber
e
como
obra
derradeira
de
uma
longa
carreira.
Em
jeito
desafiante
chamou-‐lhe
“Começar”,
como
se
só
nesse
tempo
estivesse
em
condições
de
plenitude
de
conhecimentos
e
sabedoria
necessários
à
criação
sublime.
Para
que
não
sobrassem
dúvidas,
os
números
7
e
1.7
e
17
estão
ostensivamente
presentes
na
obra
derradeira
de
Almada
na
Gulbenkian.
Morreu
em
1970
aos
77
anos
de
idade.
O
Templo
Oeirense
24
FIG.
18
–
Almada
Negreiros,
vitral
de
Oeiras
num
espaço
arquitectónico
de
sublime
composição
onde
o
olhar
converge
para
um
misterioso
ponto
de
fuga.
Tão
invisível
como
presente.
O
austero
templo
de
paredes
brancas.
A
casa
dos
degraus.
foto
Paulo
Neto
Almada
construiu
em
Oeiras
o
seu
templo
de
conhecimento.
Um
templo
austero.
Da
cor
branca
de
todas
as
cores.
Espaço
carregado
de
sinais
dispostos
em
harmonia,
tem
simbolicamente
um
altar
de
madeira,
a
forma
das
catedrais,
a
forma
da
arca
sagrada,
nele
refletindo
a
lux
em
duas
direções;
a
horizontal
-‐
dos
vidros
dos
homens
e
a
vertical
do
céu
de
Deus.
Na
escadaria
em
Y,
pré-‐anunciando
o
“Caminho”
do
Carlos
Filipe
Guerra
da
Anunciação
Reis,
Dez.
2014
-‐
Almada
Negreiros
e
o
Templo
de
Oeiras.
A
obra
em
vitral
de
1954
conhecimento
e
da
virtude,
colocou
12
degraus
em
cada
um
dos
três
lanços,
mais
um
no
seu
início,
com
a
simbologia
do
12+1
para
lhe
dar
a
natureza
UNA
e
divina.
25
FIG.
19
–
o
reflexo
do
vitral
de
Almada
Negreiros
no
antigo
estandarte
municipal
com
e
cruz
de
Santo
André
onde
se
impõe
o
escudo
real
de
D.
José.
Conhecido
como
o
segundo
brazão
data
de
1898.
Pode
ver-‐se
o
escudo
dos
condes
de
Oeiras
ao
centro
logo
abaixo
do
escudo
real.
Foto
de
Carlos
Reis
Em
reflexo
místico
deparamo-‐nos,
frente
a
frente,
com
dois
altares
que
se
completam
em
permanência.
Nos
dois
a
cruz
de
Santo
André
em
X,
a
visível
e
invisível,
a
cruz
do
virtuoso
santo
mártir
que
por
humildade
não
quis
que
a
sua
cruz
fosse
igual
à
de
Jesus.
Em
diálogo
místico
as
armas
antigas
e
as
armas
novas
de
Oeiras.
As
da
monarquia
e
da
república
consolidando
o
tempo
histórico.
As
quatro
esferas
armilares
colocadas
no
altar
mais
alto,
o
escudo
real
de
D.
José
e
a
bandeira
com
as
duas
listas
cruzadas
azuis
de
Dom
Afonso
Henriques,
a
primordial,
da
conquista
de
Lisboa
feita
com
os
monges
cavaleiros
da
segunda
cruzada
que
o
ajudaram
na
tomada
da
cidade
em
Outubro
de
1147
e
do
nascimento
de
Portugal
em
frente
ao
cisne.
Em
ambos
permanecem
a
Carlos
Filipe
Guerra
da
Anunciação
Reis,
Dez.
2014
-‐
Almada
Negreiros
e
o
Templo
de
Oeiras.
A
obra
em
vitral
de
1954
caderna
de
crescentes
de
prata
e
a
estrela
de
oito
raios
em
ouro
do
escudo
dos
condes
de
Oeiras.
No
primeiro
grande
patamar
forrou
o
chão
com
52
quadrados
de
pedra,
para
que
o
7
(5+2)
estivesse
presente
e
colocou
as
duas
longas
colunas
de
pedra
simples
em
simetria
ao
eixo
visual.
Apoiando
a
escadaria,
ao
centro,
que
em
simultâneo
é
princípio
e
fim,
colocou
quatro
colunas
de
pedra
coroadas
com
a
flor-‐de-‐Lis
da
realeza
divina
e
decorou
tudo
com
o
azulejo
simétrico,
da
mesma
flor,
entrelaçado
com
a
cruz
orbicular,
a
cruz
dos
cavaleiros
deste
Templo.
Do seu Templo.
A
cruz
invisível
do
Templo
está
bem
no
centro
do
Todo,
aparente,
inserida
nos
quatro
crescentes
que
envolvem
o
cisne
mítico.
A
cruz
orbicular
ficando
visível
cobre
o
cisne
branco
que
mais
não
é
que
o
coração
revelado
e
imaculado
de
Maria.
A
virgem
venerada
pelos
pobres
cavaleiros
de
Cristo.
A
pomba
branca
do
sagrado
Espirito
Santo.
26
Fig.
20
-‐
A
decoração
em
azulejo
-‐
A
cruz
orbicular
na
caderna
de
crescentes
de
prata
e
a
flor-‐de-‐Lis.
foto
Paulo
Neto
Carlos
Filipe
Guerra
da
Anunciação
Reis,
Dez.
2014
-‐
Almada
Negreiros
e
o
Templo
de
Oeiras.
A
obra
em
vitral
de
1954
Fig.
21
-‐
A
cruz
orbicular
sobre
o
cisne,
a
mesma
de
ECCE
HOMO
–
ilustração
de
Carlos
Reis
27
Fig. 22 -‐ A cruz orbicular sobre o cisne e o coração revelado de Maria – ilustração de Carlos Reis
Carlos
Filipe
Guerra
da
Anunciação
Reis,
Dez.
2014
-‐
Almada
Negreiros
e
o
Templo
de
Oeiras.
A
obra
em
vitral
de
1954
Mãe
Mãe!
Vem
ouvir
a
minha
cabeça
a
contar
histórias
ricas
que
ainda
não
viajei!
Traz
tinta
encarnada
para
escrever
estas
coisas!
Tinta
cor
de
sangue
verdadeiro,
encarnado!
Eu
ainda
não
fiz
viagens
E
a
minha
cabeça
não
se
lembra
senão
de
viagens!
Eu
vou
viajar.
Tenho
sede!
Eu
prometo
saber
viajar.
Quando
voltar
é
para
subir
os
degraus
da
tua
casa,
um
por
um.
Eu
vou
aprender
de
cor
os
degraus
da
nossa
casa.
Depois
venho
sentar-‐me
a
teu
lado.
Tu
a
coseres
e
eu
a
contar-‐te
as
minhas
viagens,
aquelas
que
eu
viajei,
tão
28
parecidas
com
as
que
não
viajei,
escritas
ambas
com
as
mesmas
palavras.
Mãe!
Ata
as
tuas
mãos
às
minhas
e
dá
um
nó-‐cego
muito
apertado!
Eu
quero
ser
qualquer
coisa
da
nossa
casa.
Eu
também
quero
ter
um
feitio,
um
feitio
que
sirva
exatamente
para
a
nossa
casa,
como
a
mesa.
Como
a
mesa.
Mãe!
Passa
a
tua
mão
pela
minha
cabeça!
Quando
passas
a
tua
mão
na
minha
cabeça
é
tudo
tão
verdade!
(...)
Carlos
Filipe
Guerra
da
Anunciação
Reis,
Dez.
2014
-‐
Almada
Negreiros
e
o
Templo
de
Oeiras.
A
obra
em
vitral
de
1954
Estamos sem dúvida perante um poema feliz. Puro. Pueril. Dos mais felizes de Almada.
O
poema
verdadeiro
«Quando
passas
a
tua
mão
na
minha
cabeça
é
tudo
tão
verdade!».
Esta
maravilhosa
sensação
que
se
exprime
no
prazer
da
criação.
Quando
cria
Almada
é
feliz
porque
refresca
a
sua
sede
na
casa
da
mãe.
A
casa
dos
degraus.
A
Revelação
A
obra
aqui
analisada
é
motivo
de
orgulho
para
Oeiras.
À
vila
que
Almada
Negreiros
considera
a
polis
erigiu-‐lhe
um
templo.
O
austero
vitral
é
em
justaposição
entrada
e
altar.
Como
qualquer
obra
do
mestre
é
enigmática
e
intencionalmente
geradora
de
leituras
e
sentimentos
diversos.
Mesmo
que
aparentemente
se
apresente
simples
como
simples
era
a
figura
do
criador,
a
reflexão
de
maior
profundidade
leva-‐
nos
a
descobrir
caminhos
fantásticos,
visões
e
sonhos.
Numa
palavra
poesia.
29
No
vitral
de
Oeiras
cada
traço
tem
significado.
O
pouco
é
muito.
O
simples
é
grandioso.
As
espigas
também
simulam
foices.
«Aos
que
gritam
a
vida
cala-‐os.
Parece
lei.
Em
Portugal,
no
nosso
século,
dois
gritos
de
Poesia
se
ouviram:
Mário
de
Sá
Carneiro
e
Amadeo
de
Souza-‐Cardoso.
Poesia
das
letras
e
Poesia
das
cores.
Grito
do
verso
que
é
arte
precoce
e
grito
das
cores
que
é
a
arte
não
precoce.
Ceifados
ambos.»
(Diário
de
Lisboa,
21.5.1949)
Cinco
anos
depois,
nos
dois
conjuntos
vegetais
simétricos
do
vitral
de
Oeiras,
Almada
evocará
ainda
os
dois
poetas
geniais
ceifados
prematuramente,
ou
quiçá,
Santa
Rita
e
Pessoa?
Só
ele
sabe.
Carlos
Filipe
Guerra
da
Anunciação
Reis,
Dez.
2014
-‐
Almada
Negreiros
e
o
Templo
de
Oeiras.
A
obra
em
vitral
de
1954
manifestada
no
cisne,
O
Criador
que
também
é
Zeus
pai
de
Apolo
virado
para
nós
vê.
E
depois
em
escala
microscópica
estará
uma
revelação
enigmática
algures
no
sétimo
triângulo
da
estrela.
A
ponta
da
estrela
virada
a
sudoeste
define
a
direcção
única
a
do
amor
maternal.
30
FIG. 23 -‐ A microscópica figura azul da confirmação a sudoeste – o Coração da Mãe é-‐nos revelado!
Num
pequeno
coração
azul.
O
mesmo
amor
do
coração
branco
que
se
esconde
atrás
da
cruz
dos
monges
cavaleiros
das
cruzadas
-‐
o
Sagrado
Coração.
O
coração
da
Mãe.
A
mãe
mítica,
plena
e
permanente
intrínseca
em
si,
corpórea,
pela
construção
mental
do
filho
«Mãe!
Ata
as
tuas
mãos
às
minhas
e
dá
um
nó-‐cego
muito
apertado!».
A
mãe
presente
e
física
que
«Quando
passas
a
tua
mão
na
minha
cabeça
é
tudo
tão
verdade!».
A
mãe
vive
na
casa
dos
degraus.
Um
simples
ponto
azul.
Um
cérebro
de
menino
que
na
geometria
descobriu
o
refúgio
sagrado
da
criação
superior,
o
caminho,
o
afago
maternal.
O
Génio.
Que outros segredos estão escritos no espaço? Almada nunca dá . sem ∞
Carlos
Filipe
Guerra
da
Anunciação
Reis,
Dez.
2014
-‐
Almada
Negreiros
e
o
Templo
de
Oeiras.
A
obra
em
vitral
de
1954
31
Carlos
Filipe
Guerra
da
Anunciação
Reis,
Dez.
2014
-‐
Almada
Negreiros
e
o
Templo
de
Oeiras.
A
obra
em
vitral
de
1954
32
FIG. 24 – uma geometria oculta do vitral – ilustração de Carlos Reis
Carlos
Filipe
Guerra
da
Anunciação
Reis,
Dez.
2014
-‐
Almada
Negreiros
e
o
Templo
de
Oeiras.
A
obra
em
vitral
de
1954
Bibliografia,
• Almada
Negreiros,
obras
completas,
Vol.I,
Poesia,
INCM,
1990,
2ª
ed.
• Almada
Negreiros,
obras
completas,
Vol.V,
Ensaios,
INCM,
1992,
• Cátia
Mourão,
Eros
e
Psique
–
um
vitral
gnóstico
de
Almada
Negreiros,
Assembleia
da
República,
s.d,
(2004).
• Conferência
futurista,
teatro
República,
sáb.14.4.1917,
às
17horas,
Ultimatum
futurista
à
gerações
portuguesas
do
século
XX,
in
Almada
Negreiros,
obras
completas,
Vol.VI,
Textos
de
Intervenção,
INCM,
1993,
p.37
a
p.43
• Correio
da
Linha,
nº
243
de
Junho
de
2009,
fotos
inauguração
em
1955.
• D.
F.
Ferraz,
‘A
Oficina
de
Ricardo
Leone’,
in
O
vitral:
história,
conservação
e
restauro.
Encontro
Internacional,
Mosteiro
da
Batalha,
27-‐29
de
Abril
de
1995,
IPPAR,
Lisboa,
2000,
pp.
86-‐93.
• Diário
de
Lisboa,
nº
11604,
sábado,
26
de
Março
de
1955,
p.8
• Diário
de
Lisboa,
nº1,
5ª
fª
7
de
Abril
de
1921
• Diário
de
Lisboa,
nº218,
2ª
fª,
19
de
Dezembro
de
1921
• Fernando
Rosa
Dias,
A
arte
moderna
portuguesa
-‐
PDF
• Jayro
Luna,
Almada
Negreiros
contando
“De
1
A
65”,
in
Gazeta
Acadêmica,
2006
• João
Furtado
Coelho,
Almada
dixit,
Livros
Horizonte,
2009,pp.
302
• José
carreiro,
Blogue
folha
de
poesia
–
poema
mãe
de
Almada
Negreiros,
http://comunidade.sol.pt/blogs/josecarreiro/archive/2008/09/01/Mae.Almada.Negreiro
33
s.aspx;
com
a
conferência
“
Almada
Negreiros
poeta”
de
Jorge
de
Sena
no dia 12 de
Fevereiro de 1969, e em boa hora gravada por Ernesto de Sousa; consultado
em
1.8.2014,
15:50h.
• José
de
Almada
Negreiros,
Amadeo
de
Souza
Cardoso,
in
Diário
de
Lisboa,
nº
13092,
5ªfª,
21
de
Maio
de
1959,
p.17
e
p.20
• José
de
Almada
Negreiros,
Ver,
Notas
e
prefácio
de
Lima
de
Freitas,
Lisboa,
Arcádia,
Fevº
1982.
1ª
edição
• José
Tudela,
Os
painéis
de
D.
Afonso
V,
Livros
Horizonte,
2005,pp.
101
• Juan
G.
Atienza,
A
meta
secreta
dos
Templários,
• Livro
de
actas
da
CMO;
sessão
de
Câmara
de
23
de
Março
de
1955,
fl.60
• Luís
Reis,
Começar
por
Almada
Negreiros
ou
Ode
à
Geometria,
revista
da
APM,
Mar.
Abril
2007.
• Paulo
Alexandre
Loução,
Os
Templários
na
formação
de
Portugal,
Ésquilo,
8ª
ediç,
Dez
2003.
• Raimundo
Narciso,
blogue
memória
do
presente,
post
Almada
Negreiros
em
10.7.2004;
visto
em
22.1.2014,
11:30h
• Rute
Viegas
Vaz,
COMEÇAR
de
Almada
Negreiros(…),
dissertação
de
mestrado,
UNL,
2007
Carlos
Filipe
Guerra
da
Anunciação
Reis,
Dez.
2014
-‐
Almada
Negreiros
e
o
Templo
de
Oeiras.
A
obra
em
vitral
de
1954