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Como Compor Ementas

abril 2010
48 Por Maria da Glória Barbosa

Uma publicação eletrônica do TRF 1ª Região

Este artigo, que se destina em especial aos profissionais da área jurídica, retoma o tema básico que
o norteia, qual seja, a produção de textos jurídicos e sua gramática aplicada.
Tentaremos, ao longo de três números, traçar as coordenadas da construção de um acórdão, desde
a sua ementa, passando pelo relatório, o voto e, finalmente, sua parte dispositiva, ou seja, a decisão.
Comecemos então pela construção da...

EMENTA
A ementa é o texto que apresenta, de forma resumida, o fato processual em si. Nela se configura o
raciocínio básico norteador do julgamento, com a indicação da lei que o respalda. Seu último enunciado
traz a decisão do colegiado em relação ao processo e consiste em uma declaração, que passa a valer
como lei para as partes envolvidas.
Para se construir uma ementa, é preciso resgatar mentalmente todo o roteiro do processo, represen-
tando-o em forma resumida.
A sugestão é que o autor do texto pense inicialmente por meio de palavras-chaves (duas, três, cinco,
vai depender da complexidade do processo). Tais palavras-chaves podem servir como título da ementa,
bem como ser a base de sua estruturação em itens, que não devem ser muito numerosos.
Vamos em seguida mostrar os passos necessários para a construção desse resumo-emblema de um
processo e sua resolução.
A última parte de uma minuta de acórdão a ser feita é a Ementa. O autor do texto (relator) só tem
condições de escrevê-la após a análise total dos autos, seguida de sua proposta de voto. Dessa forma,
vamos primeiramente fazer a narrativa dos fatos processuais.
Trouxemos aqui um processo administrativo e civil, cujo autor omitimos, por preservação de privaci-
dade, mas que está baseado em apelação cível, da lavra do Desembargador Federal Daniel Paes Ribeiro,
publicada na Revista do Tribunal Regional Federal da Primeira Região, n.12/1, ano 22, jan/2010.
Um cidadão, ao ser exonerado de seu emprego, em cargo comissionado, não desocupou o imóvel
funcional que lhe fora disponibilizado em função do referido cargo. Passaram-se quatro meses desde a
sua exoneração sem que ele desocupasse o imóvel. A União entrou então com uma ação de reintegração
de posse e o réu recebeu ordem de despejo, sendo condenado a pagar: a taxa de ocupação irregular, pelo
período de quatro meses, mais multa de dez vezes o valor desta taxa por período de trinta dias; as despe-
sas do condomínio e os honorários advocatícios em percentual de 10% sobre o valor da condenação.
O cidadão interpôs apelação, pedindo primeiramente a reforma da sentença, especialmente quanto
à data indicada para o início do prazo de incidência da multa e da taxa de ocupação, que na sentença foi
a data de sua exoneração, 9/1/2003. O argumento utilizado foi o de que a ocupação do imóvel somente
se tornou irregular depois dos trinta dias permitidos pelo inciso I do § 3° do art. 16 do Decreto 980/1993.
Assim, a contagem deveria começar no dia 9/2/2003, e não 9/1/2003 (data de sua exoneração), como
determinou a sentença.
Quanto aos honorários advocatícios, em que foi condenado a pagar o percentual de 10% sobre o
valor da condenação, o réu pediu que sejam reduzidos para 5%, sem, todavia, indicar qualquer disposi-
tivo legal que embase seu pedido.
Esses foram os fatos. O raciocínio do julgamento deu-se da forma que se seguirá.
O apelante, segundo o magistrado, tem razão quanto ao dia inicial da contagem para efeito da taxa
de ocupação e da multa, e defende seu pedido alegando que a ocupação do imóvel só se tornou irregular

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após trinta dias de sua exoneração. Seu argumento está baseado no inciso I do § 3° do art. 16 do Decreto
980/1993, não havendo como não conceder-lhe o pedido. Não tem razão, porém, quando pede a redu-
ção do percentual relativo aos honorários advocatícios, pois, além de não ter encontrado uma lei para
respaldar seu pedido, existe dispositivo legal que trata do assunto, qual seja, o art. 20, § 3°, do Código
de Processo Civil, que estabelece um mínimo de 10% e o máximo de 20% sobre o valor da condenação.
Utilizando-se dessa base legal, os juízes lhe negam essa parte do apelo.
Observe agora como foi montada a ementa do nosso acórdão. As palavras-chaves encontram-se em
seu título, que, por sua vez configura-se em um resumo do resumo.

“Administrativo e processual civil. Imóvel funcional. Ação de reintegração de posse. Ocu-


pação irregular. Data inicial da incidência da taxa. Art. 16, § 3°, do Decreto 980/1990.
Honorários. Aplicação do art. 20, § 3º, do Código de Processo Civil (CPC).”

Palavras-chaves:
a) administrativo e processual civil – trata-se da especificação do ramo do Direito que será tratado no
acórdão;
b) imóvel funcional – o objeto da controvérsia;
c) ação de reintegração de posse – o tipo do processo;
d) ocupação irregular – a infringência cometida pelo réu;
e) data inicial da incidência da taxa – primeiro item da controvérsia;
f) art. 16, § 3°, do Decreto 980/1990 – o diploma legal que embasará a decisão sobre a primeira parte
da controvérsia;
g) honorários – segundo item da controvérsia;
h) aplicação do art. 20, § 3°, do Código de Processo Civil (CPC) – o diploma legal que embasará a deci-
são sobre a segunda parte da controvérsia.

Segue-se o corpo da ementa.


O processo trata de dois assuntos: a contagem de tempo para o efeito da taxa de ocupação mais
multa e o pedido de reforma quanto aos honorários advocatícios. Teremos então dois itens que noticiam
como as coisas devem ocorrer de acordo com a lei e especificamente quanto aos dois pedidos, tanto para
a contagem do tempo quanto no que diz respeito aos honorários de advogado. Vejamos:

I - O marco inicial da ocupação irregular é o trigésimo dia após a data em que cessou o
direito de uso do imóvel funcional, nos termos do art. 16, § 3º, do Decreto 980/1990.
II - Caracterizado o cunho condenatório do provimento jurisdicional, a fixação de hono-
rários advocatícios deve observar o disposto no art. 20, § 3º, do CPC, que estabelece um
mínimo de 10 % e o máximo de 20% sobre o valor da condenação.

Cada item indica o raciocínio da lei que embasa a decisão, a qual estará expressa no fechamento da
ementa. A saber:
III - Apelação parcialmente provida, para determinar que a taxa de ocupação e a respectiva
multa incidam no período de 9/2/2003 a 4/9/2003.

A palavra “parcialmente”, que vemos na primeira oração do período, indica que apenas esta parte
do apelo foi aceita: o adiamento por trinta dias da data de início da contagem para efeito da taxa de
ocupação e respectiva multa. E este é o resultado do processo, não sendo necessário mencionar que o
segundo item não foi concedido.
Uma ementa deverá, finalmente, apresentar uma linguagem impessoal, “enxuta”, sem muitos adje-
tivos. Nada de usar as primeiras pessoas do discurso (eu/nós). Use a voz passiva sempre que possível, uma

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boa dica para tornar o texto impessoal, já que o centro de atenção do enunciado é desviado do agente
para o objeto que recebe a ação. Podemos observar em nosso modelo a opção que o autor faz por essa
voz. Seguem-se exemplos:

1.
Caracterizado o cunho condenatório do provimento jurisdicional... (voz passiva)
Em lugar de:
A sentença caracterizou o cunho condenatório do provimento jurisdicional... (voz ativa)

2.
Apelação parcialmente provida, para... (voz passiva)
Em lugar de:
(Eu) Dou provimento parcial à apelação, para... (voz ativa)

Finalmente, utilize na ementa orações curtas, bem pontuadas, mais coordenadas do que subordina-
das, o que tornará o texto rápido e de fácil entendimento, como um conjunto de palavras símbolos em
que colocamos os olhos e deciframos ali a controvérsia processual e o seu deslinde.
No próximo número trataremos do relatório de um acórdão.

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Como Compor o Relatório
de um Acórdão

maio 2010
49 Por Maria da Glória Barbosa

Uma publicação eletrônica do TRF 1ª Região

O relatório de um acórdão é a narrativa dos acontecimentos que estão documentados nos


autos, e, no caso daqueles que têm seguimento para instâncias de grau superior, é nessa parte que
se descreve a trajetória percorrida pelo processo, apresentando-se cada etapa, até o último grau
de julgamento que chegar a alcançar. Portanto, a linguagem adequada ao relatório é, em primeiro
plano, a narrativa e, em segundo, a descritiva.
No começo dele, anuncia-se a natureza do processo. Exemplo: “Trata-se de Mandado de
Segurança Coletivo impetrado contra ato omissivo atribuído ao Coordenador-Geral de Recursos
Humanos do MA, objetivando garantir aos impetrantes...”
Em seguida vem um resumo das razões e o pedido da parte autora. Uma estrutura que
pode ser assim construída: Os fatos que desencadearam o processo foram tais e tais. O autor, sen-
tindo-se ferido em seu direito, pretende ver sanada a injustiça que julga lhe foi feita. Ele pediu tais
coisas demonstrando tais motivos e baseando-se em tais diplomas legais. [Em caso de instância de
segundo grau, há a continuação.] O juiz de primeira instância julgou o pedido de tal forma. O autor
(ou parte contrária), inconformado, recorre da decisão de primeiro grau. Ele alega tais violações de
lei, cometidas pela decisão anterior, e reitera alguns motivos favoráveis a seu pedido inicial. Contrar-
razões às fls. tais. Parecer do Ministério Público às fls. tais. É o relatório.
A linguagem do relato deve deixar claro tratar-se ali do ponto de vista do autor/apelante/
recorrente, ou qualquer outra denominação que possa ter a parte, de acordo com a tipologia do
processo. Estamos no campo em que os envolvidos argumentam e pretendem. Porém, os fatos
podem ser bem diferentes do ponto de vista defendido por eles. Portanto, na narrativa do relatório,
não se afirma que as coisas são exatamente assim, mas que a parte alega que são assim e pretende
que sejam de outra forma.
Algumas expressões do tipo segundo a parte ou a suposta ofensa da lei alegada pela parte,
ou, ainda, na hipótese da parte darão sempre destaque ao fato de que nada ali é do pensamento
do relator do processo, que ele não endossa nem contesta qualquer daquelas afirmações, apenas
reproduz o discurso de um terceiro e o desejo deste último em relação à causa.
Como já dito, o discurso será indireto, ou seja, haverá sempre uma enunciação do tipo: a
parte diz que, argumenta que, alega que. Além dos exemplificados, existem vários outros verbos que
podem ser usados para introduzir a fala das partes ao defender seu ponto de vista. Veremos alguns,
quando analisarmos o texto que servirá como exemplo.
Nesta parte do acórdão, ainda não há lugar para as argumentações do relator do processo,
nem para o uso da primeira pessoa.
Transcreveremos, assim, um relatório a título de exemplo. Vamos nos valer de um acórdão
publicado na Revista do Tribunal Regional Federal da Primeira Região (n. 12, dez./jan. 2010), da lavra
do Desembargador Federal Daniel Paes Ribeiro.
O Exmo. Sr. Desembargador Federal Daniel Paes Ribeiro: – Trata-se de
ação de reparação de dano moral e material ajuizada por M. J. A. contra a FUFMT,

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pleiteando a condenação da ré ao pagamento de indenização por dano material no


valor de R$ 18.466,69 (dezoito mil, quatrocentos e sessenta e seis reais e sessenta
e nove centavos) e por dano moral em valor correspondente a 1.000 (mil) salários
mínimos.
Narra a autora, para tanto, que participou de concurso público para sele-
ção de professor substituto, promovido pela FUFMT, registrando desde o início a sua
nacionalidade argentina, tendo sido aprovada em todas as fases do certame e, por
conseguinte, considerada apta para ocupar o cargo vago.
Afirma, contudo, que, quando já estava prestes a ser contratada, o respec-
tivo processo administrativo foi encaminhado à Procuradoria Jurídica da requerida,
que emitiu parecer em que opinava pela impossibilidade da contratação, tendo em
conta a nacionalidade estrangeira ostentada pela demandante.
Sustenta que a conduta da FUFMT causou-lhe grandes transtornos, visto
que, tendo logrado êxito na seleção, desfez-se de tudo, inclusive de boa parte de
seus bens, privando-se da convivência de seus amigos e familiares, na certeza de que
poderia se dedicar ao exercício do cargo almejado longe do seu país de origem, vindo
a ser frustrada em seus planos.
Assevera que o parecer da Procuradoria “constitui-se num cabedal de erro-
nias que culminam num erro maior: a capitulação da conclusão sobre o caso nos
mencionados dispositivos!” (fl. 07), porquanto o art. 5º da Lei 8.112/1990 trata da
investidura em cargo público e não da contratação temporária para atender a excep-
cional interesse público, acrescentando que, à espécie, aplicam-se o art. 37, inciso
IX, da Constituição Federal e a Lei 8.745/1993, com as alterações impostas pela Lei
9.849/1999.
Assegura, por outro lado, que experimentou danos morais, por conta da
atitude da FUFMT, que a impediu de obter experiência profissional significativa repre-
sentada pela oportunidade de lecionar em outro país, situação que proporcionaria
qualificação diferenciada.
O pedido de assistência judiciária gratuita foi deferido (fl. 13).
Por sentença que se encontra às fls. 165-168, o ilustre Juiz Federal da 5ª
Vara da Seção Judiciária do Estado de Mato Grosso, Dr. José Pires da Cunha, julgou
parcialmente procedente o pedido e condenou a ré ao pagamento de R$ 8.907,47
(oito mil, novecentos e sete reais e quarenta e sete centavos) a título de danos mate-
riais, acrescidos de correção monetária e de juros de mora fixados em 0,5% (cinco
décimos por cento) ao mês, contados da citação. Considerando que a autora foi
sucumbente em maior proporção, condenou-a ao pagamento das custas e de hono-
rários advocatícios, estes fixados em 10% (dez por cento) sobre o valor da condena-
ção, ficando suspensa a cobrança, em razão do benefício da assistência judiciária.
Apelam ambas as partes.
A autora, com razões às fls. 176-188, insurge-se contra o indeferimento
do pedido de indenização relativo ao segundo ano de vigência do contrato a que
faria jus, sob o argumento de que, embora se tratando de discricionariedade da
administração, a candidata não pôde sequer lecionar pelo primeiro ano por culpa
única e exclusiva da FUFMT, “a qual, agindo como agiu, retirou da Apelante o direito
de demonstrar as suas qualificações profissionais, para, oportunamente, submeter-se

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à plausível prorrogação contratual” (fls. 178-179).


Salienta que a norma inscrita no art. 402 do Código Civil determina a com-
posição do prejuízo causado, que deve abranger não só o que o prejudicado perdeu,
mas aquilo que razoavelmente deixou de lucrar, e afirma que, no caso, os lucros
cessantes não precisam ser certos, bastando que sejam razoáveis ou potenciais, con-
forme entendimento jurisprudencial e doutrinário que colaciona.
Em relação ao dano moral, repisa os argumentos já expendidos na inicial.
A FUFMT, por seu turno (fls. 192-195), assevera que a autora, embora
ciente de que não seria contratada desde 24/5/2000, somente veio a se sentir pre-
judicada em 2/7/2001. Entende, assim, que o pedido de indenização não merece
acolhimento, visto que a interessada não tomou nenhuma providência no sentido de
reverter a situação, na via administrativa, demonstrando falta do interesse de agir.
Ressalta que as despesas enumeradas pela demandante não foram devida-
mente comprovadas e não se referem à contratação pela FUFMT, pois a vinda ao Bra-
sil estava relacionada à possibilidade de emprego em outra instituição universitária.
Defende, outrossim, que a aprovação da candidata não lhe confere o direi-
to à almejada contratação, mas mera expectativa de direito, inclusive, em relação à
prorrogação do contrato.
Em contrarrazões, a FUFMT (fls. 196-201) e a autora (fls. 211-215) reque-
rem o desprovimento dos recursos de apelação interpostos.
É o relatório.
No primeiro parágrafo, temos definida a natureza do processo e o pleito da autora. Seguem-
se cinco parágrafos, nos quais se narra o que a autora diz ter ocorrido, e podemos notar que são
curtos, trazendo, em média, cinco ou seis orações, que se coordenam com certa frequência com
orações reduzidas de gerúndio, utilizadas aqui na tentativa de uma melhor fluência do texto.
Para não repetir indefinidamente o verbo dizer ou contar, o autor traz aqui uma série de
verbos que os substituem, evitando as repetições bem como a banalização da linguagem.
Temos então:
a) narrar;
b) afirmar;
c) sustentar;
d) asseverar;
e) assegurar.
Desses verbos, o menos conhecido do comum dos cidadãos é o verbo asseverar, cujo signi-
ficado assim está no dicionário Aurélio: “1. Afirmar com certeza, segurança; assegurar. Ex.: ‘Asseve-
rou que me ama extremosamente desde muito tempo.’ 2. Dar como certo; certificar, atestar, provar.
Ex.: ‘Quem assevera que o criminoso seja ele mesmo?’.”
Outro verbo muito usado (e pouco conhecido do leigo) é o verbo aduzir. Apesar de não ter
aparecido neste texto que nos serviu de exemplo, registramos a sua significação quando se trata de
relatórios. “Aduzir: expor ou apresentar (razões, argumentos, provas, etc.). Ex.: ‘O advogado aduziu
seus motivos.’ / ‘O promotor aduziu ao juiz novas provas.”

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Após contar a história da autora, vem o relato do que já foi decidido em primeira instância,
e, consequentemente (já que estamos tratando de segunda instância), diz-se do inconformismo da
parte – no caso de nosso exemplo, das partes, pois ambas recorreram. Aqui há uma mudança de
ambiente processual e começa-se a relatar a fase atual. São usados então termos que indicam a não
aceitação do resultado do julgamento que está sendo contestado, a exemplo de: Inconformada, a
parte autora recorre (...) reivindicando (...) sob as razões que apresenta em seu recurso de fls. tais. No
caso de nosso acórdão, é usado o verbo insurgir-se: A autora, com razões às fls. 176-188, insurge-
se contra o indeferimento do pedido de indenização relativo ao segundo ano... Um adjetivo também
frequente nessa etapa: Irresignada, a parte autora recorre...
Em seguida vem o novo pedido da parte, e aqui se pode usar desde o próprio verbo pedir,
como outros, a exemplo de: reivindicar, pugnar, pleitear, pretender, pelejar, postular, reclamar, reque-
rer e até bater-se (no sentido de lutar por alguma coisa).
Destaque-se que a regência do verbo insurgir-se pela preposição contra está correta, não
sendo considerada como redundância, pelo menos assim aparece no Dicionário Prático de Regência
Verbal, de Celso Pedro Luft, bem como em vários exemplos trazidos com a referida preposição no
dicionário Houaiss.
No trecho referente à parte contrária (que neste processo também é apelante), além de
o verbo asseverar novamente ser utilizado, registramos os verbos ressaltar e defender. Todos eles
nada mais são que variações dos verbos dizer e contar, ou seja, recursos utilizados para se evitarem
repetições deselegantes.
O último verbo do texto é requerer, ambas as partes requerem alguma coisa, e o relatório
termina com o fechamento: É o relatório.
Em geral, registra-se a existência (ou não) de contrarrazões e o número das folhas em que
se encontram. Pode haver também referência à opinião expressa no parecer da Procuradoria-Geral
bem como a referência às folhas em que este último se encontra.
Como se pode notar, existe certa simplicidade na feitura de um relatório. Não é preciso ser
da área jurídica para compô-lo, já que se trata aqui de contar a história do processo, que está regis-
trada por meio dos documentos e, para isso, basta ter um bom entendimento do seu teor e uma
boa redação. Não será preciso ainda debater a causa, nos moldes de um magistrado ou advogado,
nem filosofar, tampouco recorrer à doutrina. Toda essa habilidade ficará para o voto do acórdão,
que é o campo da argumentação e do julgamento do magistrado que atua como relator. Isso ficará
para o próximo artigo.

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outubro 2010
Como Compor o Voto de
um Acórdão em Apelação
52 Por Elizabeth Alves de Oliveira

Uma publicação eletrônica do TRF 1ª Região

O voto de um acórdão é o campo da argumentação e do julgamento do magistra-


do que atua como relator e nele estão contidos os fundamentos sobre as questões de
fato e de direito. A linguagem do voto é pessoal e nele o magistrado exporá seu conven-
cimento a partir dos fatos e das circunstâncias constantes dos autos.

A fundamentação é exigência constitucional (art. 93, IX, da CF) e legal (art. 458,
II, do CPC), em que serão analisadas as preliminares e o mérito.

A elaboração do voto deve ser limitada às razões do recurso, uma vez que é
vedado ao Tribunal decidir fora dos limites da lide (arts. 128 e 460 do CPC), fazendo-se
indispensável uma leitura atenta dos fundamentos do recurso.

Por questão de estilo, consta inicialmente de alguns votos a narrativa do pedido


em breves palavras, a saber:

1. A autora, menor, nascida em 26/08/1986, representada por sua mãe, requer o


benefício de pensão por morte de seu avô, viúvo, falecido em 30/06/2001, fl. 07.

2. Como visto, trata-se de remessa oficial em ação ordinária que julgou proceden-
te o pedido de pensão por morte, em razão de ter sido reconhecida a dependên-
cia econômica de Vilma Thereza Ferreira em relação à sua filha Telma Regina
Ferreira, falecida em 24/12/2000.

Se houver questões preliminares, elas serão decididas antes do mérito (art. 560
do CPC). As expressões utilizadas são: rejeito ou acolho a preliminar. Exemplo:

Analiso, de início, as preliminares suscitadas.


Com relação à prescrição, a orientação jurisprudencial desta Corte é no sentido
de que, em se tratando de benefícios de natureza previdenciária, a prescrição
alcança apenas as prestações vencidas no quinquênio anterior ao ajuizamento
da ação. No caso, a r.sentença já reconheceu a prescrição das parcelas anterio-
res 27/02/1992.
A preliminar de inépcia da inicial arguida pelo INSS também não prospera, visto
que se fazem presentes na exordial os requisitos previstos nos arts. 282 e 283
do CPC, além do que inocorre, na espécie, qualquer das situações do art. 295 do
CPC que ensejam a inépcia da petição inicial.
A preliminar de falta de interesse de agir, por sua vez, versa conteúdo atinente ao
mérito da lide e com ele será analisada.

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Por fim, o INSS argui preliminar de nulidade da sentença, ao fundamento de que


o magistrado a quo, ao reconhecer à autora o direito à revisão do seu benefí-
cio com base no art. 144 da Lei 8.213/1991, teria incorrido em julgamento extra
petita, malferindo os arts. 128 e 460 do CPC.
A análise dos autos revela que a autora postula nesta ação a revisão do cálculo
da RMI dos benefícios anteriores de auxílio-doença e de aposentadoria por inva-
lidez do seu cônjuge falecido, bem como a revisão do cálculo inicial do seu bene-
fício de pensão por morte, concedido em 04/08/1989, insurgindo-se ela contra os
critérios adotados pelo INSS na via administrativa, de modo que o magistrado a
quo, ao analisar a questão posta em exame, decidiu a lide em conformidade com
o pedido inicial.
Assim, rejeito todas as preliminares.

Observe-se no exemplo que a linguagem do voto reflete o pensamento do relator


do processo; o discurso é direto, na primeira pessoa, consoante as seguintes expressões:
Analiso, de início, as preliminares suscitadas e Assim, rejeito todas as preliminares.

Após a questão preliminar, passa-se ao mérito. Segundo o Dicionário Técnico


Jurídico, mérito é tudo quanto diz respeito à substância do pedido, ao conteúdo do feito,
razão de ser de uma petição, arrazoado ou causa.

No mérito, o relator analisará o pedido e dirá quem tem razão no processo. Trans-
creve-se um voto, a título de exemplo, proferido pela Desembargadora Federal Neuza
Alves, na AC 2009.01.99.055624-4/GO, julgada em 02/08/2010:
VOTO
A EXMª SRª DESEMBARGADORA FEDERAL NEUZA ALVES
(RELATORA):
A concessão do benefício especial de aposentadoria rural por idade desafia o
preenchimento de três requisitos fundamentais: a existência de início de prova
material da atividade rural exercida, a corroboração dessa prova indiciária por
robusta prova testemunhal e, finalmente, a idade mínima necessária à concessão
do benefício.
Os documentos trazidos aos autos não indicam ser a autora trabalhadora rural
que faz jus ao benefício de índole assistencial que requer.
Com efeito, a escritura de fls. 14 e verso dá conta de que seu marido, à época
da lavratura desse documento, já se qualificava como “fazendeiro”, tendo, pois,
adquirido outro imóvel rural com cerca de 122 ha.
Aliando-se a isso o fato de a autora ter contribuído por muito tempo como segura-
da urbana, entendo não demonstrado o labor rural apto à concessão do benefício
almejado.
Ante o exposto, nego provimento à apelação.
É o voto.

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No primeiro parágrafo, fez-se a análise da questão de direito; no segundo e ter-


ceiro parágrafos, foi exposta a questão de fato, a apreciação das provas. A matéria de
fato ou a apreciação das provas é afeta às instâncias ordinárias — no presente caso:
Justiça Federal e TRF–1ª Região — e a apelação sendo um recurso de cognição ampla,
em que o interesse individual das partes é preponderante, possibilita a extensa discus-
são da questão de fato e de direito. Ressalte-se que no recurso especial, bem como no
recurso extraordinário não há a possibilidade de se reverem fatos e de se reexaminarem
provas.

As colocações do relator são assertivas, explicitando os motivos de seu conven-


cimento e, como já dito, o discurso é na primeira pessoa, como visto no quarto parágra-
fo: entendo não demonstrado o labor rural apto à concessão do benefício almejado.

A parte dispositiva é a conclusão do voto, é a resposta do magistrado ao pedido


da parte autora e fica revestida de coisa julgada material, isto é, passa a ter valor de lei
entre as partes, tornando imutável e indiscutível o comando que emerge da parte dispo-
sitiva da sentença de mérito, consoante Nelson Nery Júnior e Rosa Maria de Andrade
Nery, Código de Processo Civil Comentado, 11ª edição.

Nas decisões de mérito, como é o caso da AC 2009.01.99.055624-4/GO, des-


taca-se a expressão utilizada na parte dispositiva: Ante o exposto, nego provimento à
apelação. Verifica-se, no presente caso, que o pedido da parte autora não foi acolhido
e, por último, o voto termina com a frase: É o voto.

Este roteiro visou a uma breve descrição dos requisitos de um voto em Apelação,
art. 513 do CPC, de forma simples, a fim de facilitar a compreensão de todos.

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Como compor o voto de um acórdão
em embargos de declaração

janeiro 2011
55 Por Elizabeth Alves de Oliveira

Uma publicação eletrônica do TRF 1ª Região

Os embargos de declaração, recurso previsto no art. 535 do CPC, visam a sanar eventual
omissão, contradição ou obscuridade nas decisões judiciais. O prazo para sua apresentação é de
cinco dias contados a partir da data da publicação do acórdão no órgão oficial, e os embargos não
estão sujeitos a preparo. Cabe ao relator apresentar os embargos de declaração em mesa para o
julgamento, interrompendo-se os prazos para a interposição de outros recursos.
A omissão é o silêncio do órgão julgador quanto à questão levantada pelas partes ou pelo
Ministério Público e também quanto à matéria de ordem pública.
A contradição é a incompatibilidade entre as proposições constantes do julgado. Pode-se dar
entre o relatório e a fundamentação, entre a fundamentação e o dispositivo, entre o dispositivo e a
ementa, entre os pontos da própria ementa, da fundamentação, da parte dispositiva e do relatório.
A obscuridade dá-se quando a decisão judicial não é clara, é incompreensível.
Admitem-se também os embargos de declaração para corrigir erros materiais existentes na
decisão recorrida.
Vê-se o seguinte exemplo do voto proferido nos embargos de declaração pela Desembargadora
Federal Neuza Alves, na AC 2007.38.00.039265-9/MG, julgados em 21/06/2010:
Os presentes embargos de declaração foram opostos sob a alegação de omissão
no tocante ao exame dos honorários advocatícios, que deixaram de ser examinados
pela remessa oficial, ao mesmo tempo em que impugnam o percentual de 10%
fixado pela sentença, que considera excessivo.
De fato o acórdão embargado foi omisso acerca da questão. Embora considerando
que a condenação no referido percentual conforma-se com os parâmetros legais a
respeito da questão e com a jurisprudência que reconhece que, nas ações em que
tenha havido condenação, aplica-se a regra do art. 20, § 3º, do CPC, afastada a
aplicação da norma do § 4º, ainda que vencida a Fazenda Pública. Por conseguinte,
nenhuma irregularidade há na incidência do percentual fixado sobre o valor da
condenação, sendo indevida a utilização do valor da causa como base de cálculo da
referida verba, como pretende a apelante.
Pois bem, a constatação da omissão apontada pelo ente público poderia simples-
mente ensejar a explicitação do julgado com base nessa diretriz. Todavia, em atenção
ao entendimento que vem sendo firmado por este Tribunal, tratando o processado,
na espécie, de causa singela, que versa sobre matéria repetida e eminentemente
de direito, não exigindo maior esforço e tempo do profissional, a redução da verba
honorária para 5% (cinco por cento) do valor da condenação se revela suficiente
para a condigna remuneração dos patronos dos autores, atendendo aos critérios
dos §§ 3° e 4° do artigo 20 do CPC.
Em face do exposto, acolho os embargos de declaração, reconhecendo a omissão
apontada, determinando a redução dos honorários advocatícios ao percentual de
5% sobre o valor da condenação.
É o voto.

Observe-se no exemplo que a expressão utilizada é foram opostos, uma vez que o art. 536

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do CPC dispõe que os embargos de declaração serão opostos. Na parte dispositiva consta: Em
face do exposto, acolho os embargos de declaração, porquanto a expressão destacada refere-se
a uma manifestação favorável da relatora em relação ao ponto omisso. Como ilustração, algumas
expressões comumente utilizadas na parte dispositiva:

Em face do exposto (e não “em face a, em face o”),


Ante o exposto (e não “ante do”),
Diante do exposto (e não “diante ao”).

Por questão de estilo, constaram no primeiro parágrafo os motivos pelos quais foram opos-
tos os embargos de declaração. No segundo e terceiro, a relatora expôs o seu pensamento sobre o
ponto omisso.
A questão da omissão ganhou relevância com a Súmula 356 do Supremo Tribunal Federal,
estabelecendo que “o ponto omisso da decisão, sobre o qual não foram opostos embargos declaratórios,
não pode ser objeto de recurso extraordinário, por faltar o requisito do prequestionamento”.
A oposição dos embargos de declaração é também utilizada para suprir o prequestionamento,
quando as questões constitucionais em que se apoia o recurso extraordinário não foram apreciadas
pela instância a qua (Súmula 282/STF), uma vez que o Supremo Tribunal Federal não admite o pre-
questionamento implícito da questão constitucional.
Ressalte-se que os embargos de declaração podem ter, excepcionalmente, caráter infringente,
se a correção do vício acarretar a alteração do resultado do julgamento. Nesse caso, embora não
haja previsão de norma que garanta o contraditório nos embargos de declaração quando se imprimir
efeito modificativo, o Supremo Tribunal Federal tem entendido no sentido da exigência de intimação
do Embargado quando os declaratórios veiculem pedido de efeito modificativo (RE 250396/RJ;
relator: Ministro Marco Aurélio; 2ª Turma; data de julgamento: 14/12/1999).
Por fim, há a previsão legal de se aplicar multa para o embargante que utilizar os embargos de
declaração para protelar o feito.
Este estudo propôs-se a uma abordagem sintética dos aspectos doutrinários para melhor
explicar a elaboração do voto dos embargos de declaração.

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