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Tribunal Regional Eleitoral de Santa Catarina

PJe - Processo Judicial Eletrônico

11/03/2022

Número: 0600050-33.2022.6.24.0000
Classe: AÇÃO DE JUSTIFICAÇÃO DE DESFILIAÇÃO PARTIDÁRIA/PERDA DE CARGO ELETIVO
Órgão julgador colegiado: Colegiado do Tribunal Regional Eleitoral
Órgão julgador: Relatoria Juiz de Direito 2
Última distribuição : 08/03/2022
Valor da causa: R$ 0,00
Processo referência: 0600048-63.2022.6.24.0000
Assuntos: Justificação de Desfiliação Partidária
Segredo de justiça? NÃO
Justiça gratuita? NÃO
Pedido de liminar ou antecipação de tutela? SIM
Partes Procurador/Terceiro vinculado
KLEBER ROBERTO LOPES ROSA (REQUERENTE) ENIO FRANCISCO DEMOLY NETO (ADVOGADO)
PAULO FRETTA MOREIRA (ADVOGADO)
LUIZA CESAR PORTELLA (ADVOGADO)
UNIÃO BRASIL (UNIÃO) - NACIONAL (REQUERIDO)
PARTIDO SOCIAL LIBERAL (PSL) - ESTADUAL - SC
(REQUERIDO)
PARTIDO SOCIAL LIBERAL - MUNICIPAL - LAGUNA - SC
(REQUERIDO)
PROCURADOR REGIONAL ELEITORAL - SC (FISCAL DA
LEI)
Documentos
Id. Data da Documento Tipo
Assinatura
18755 11/03/2022 18:54 Decisão Decisão
535
index: AÇÃO DE JUSTIFICAÇÃO DE DESFILIAÇÃO PARTIDÁRIA/PERDA DE CARGO
ELETIVO (12628)-0600050-33.2022.6.24.0000-[Justificação de Desfiliação Partidária]-SANTA
CATARINA-Laguna

TRIBUNAL REGIONAL ELEITORAL DE SANTA CATARINA


AÇÃO DE JUSTIFICAÇÃO DE DESFILIAÇÃO PARTIDÁRIA/PERDA DE CARGO ELETIVO
(12628) Nº 0600050-33.2022.6.24.0000 - Laguna - SANTA CATARINA
RELATOR(A): LUIS FRANCISCO DELPIZZO MIRANDA
REQUERENTE: KLEBER ROBERTO LOPES ROSA
ADVOGADO: ENIO FRANCISCO DEMOLY NETO - OAB/SC29472-A
ADVOGADO: PAULO FRETTA MOREIRA - OAB/SC19086-A
ADVOGADO: LUIZA CESAR PORTELLA - OAB/SC39144-A
REQUERIDO: UNIÃO BRASIL (UNIÃO) - NACIONAL
REQUERIDO: PARTIDO SOCIAL LIBERAL (PSL) - ESTADUAL - SC
REQUERIDO: PARTIDO SOCIAL LIBERAL - MUNICIPAL - LAGUNA - SC
DECISÃO

Trata-se de ação de justificação de desfiliação de cargo eletivo, com pedido de liminar, movida
por Kleber Roberto Lopes Rosa em face dos órgãos Estadual de Santa Catarina e Nacional do
União Brasil e dos órgãos Estadual de Santa Catarina e Municipal de Laguna do Partido Social
Liberal (PSL), visando a declaração de existência de justa causa para sua desfiliação partidária.

Alega o requerente que, “em dia 08/02/2022 o Tribunal Superior Eleitoral deferiu o pedido de
registro de fusão dos partidos Democratas e PSL em julgamento nos autos n. 0600641-
95.2021.6.00.0000 (doc. 02). Dessa forma, nasceu oficialmente o União Brasil, partido novo e
distinto dos anteriores”.

Aduz que é “vereador e foi eleito em 2020 pelo PSL (doc 03), sigla com a qual tinha afinidade e
identificação. Com a fusão adveio novo estatuo inteiramente diverso (doc. 04), não havendo
qualquer discussão acerca da mudança substancial do seu programa”.

Sustenta que “a fusão do partido implica em mudança substancial do programa partidário, o que
configura justa causa para a desfiliação”, pois “não se está mais diante do mesmo partido”,
arguindo que “a agremiação decidiu, à revelia do Autor, alterar a integralidade do seu programa,
adotando outro completamente diferente” e que “a ideologia adotada pelo União Brasil (doc. 06) é
substancialmente diversa do programa do PSL (doc. 07).

Aponta, por meio do cotejo entre os programas partidários do PSL e do União Brasil, diversos
pontos em que teria havido mudanças substanciais, alegando que “o programa do PSL possui
apenas 14 pontos, enquanto o do União Brasil amplia para 44. Ou seja, nitidamente se percebe a
mudança mais do que substancial no programa”.

Realça, ainda, que, “dentre os 44 pontos do programa do União Brasil, nenhum deles aborda 5
dos pontos essenciais do programa do PSL”, e que, “dos 14 alicerces expostos no programa do
PSL, 4 conflitam diretamente com princípios defendidos pelo União Brasil e 5 são completamente
ignorados pelo novo partido, de modo que mais de dois terços do programa foi alterado”.

Argumenta que “a Resolução não colide com a Lei, apenas prevê uma hipótese de mudança

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substancial do programa consistente na fusão de partidos distintos, haja vista a substituição
integral dos programas dos partidos fusionados e a criação do novo”, aduzindo que “o próprio
TSE divulga, em sua página na internet, a orientação de que a fusão partidária atrai a hipótese de
justa causa o que, em nome dos princípios da segurança jurídica e da confiança nas
instituições, deve garantir a desfiliação sem a perda de mandato”.

Conclui estar caracterizada, no caso, a existência de justa causa, “seja pela aplicação direta do
inciso I, § 1º, art. 1º, da Res. TSE n. 22.610, seja pela compreensão de que a fusão do PSL com
o Democratas, que resultou no partido União Brasil, com a consequente adoção de novo estatuto
e programa partidário”, implicaram mudança substancial do programa, impondo a autorização
para sua desfiliação sem a perda do mandato conquistado nas eleições de 2020.

Sustenta, ainda, restarem demonstrados a probabilidade do direito, ante “a alteração substancial


do programa partidário decorrente da fusão do PSL com o Democratas como demonstrado por
meio do cotejo de programas”, e o perigo da demora, em razão da proximidade do prazo mínimo
de filiação de 6 meses para os que pretendem disputar cargo nas Eleições de 2022 (02/04/2022).

Por fim, requer: 1) a concessão de medida liminar, para reconhecer a existência de justa causa e
autorizar sua desfiliação sem a perda do mandato até o julgamento final da presente
demanda; 2) o julgamento antecipado da lide, diante da desnecessidade de dilação
probatória; 3) subsidiariamente, caso assim não se entenda, seja determinada a oitiva das
testemunhas arroladas, o mais rapidamente possível; e, 4) ao final, seja julgada procedente a
ação, a fim de que seja declarada a existência de justa causa para a desfiliação partidária.

É o relatório. Decido.

Consabido que a tutela de urgência é medida excepcional que “será concedida quando houver
elementos que evidenciem a probabilidade do direito e o perigo de dano ou o risco ao
resultado útil do processo” (art. 300 do Código de Processo Civil - grifei).

Cumpre consignar que há precedente da Corte Superior Eleitoral no sentido de não ser possível a
antecipação de tutela em se tratando das ações que observam o procedimento da Res. TSE n.
22.610/2007, mais especificamente em Ação de Perda de Mandato Eletivo por Desfiliação
Partidária (MS n. 3.671, Rel. Min. Ayres Britto, j. em 27.11.2007).

Entretanto, esse posicionamento se mostrou diferente quando do enfrentamento de Ação


Declaratória de Justa Causa Para Desfiliação Partidária, conforme se extrai do seguinte julgado:

DECISÃO:

[...]

I. POSSIBILIDADE DE CONCESSÃO DE TUTELA ANTECIPADA EM AÇÃO DE


JUSTIFICAÇÃO DE FIDELIDADE PARTIDÁRIA

13. Assento, de início, a possibilidade, em tese, de concessão de tutela antecipada em


ação de justificação de fidelidade partidária.

14. Assinalo que há precedente desta Corte que indica não ser possível a antecipação de
tutela nas ações que observam o procedimento da Res.–TSE nº 22.610/2007 (MS nº 3.671,
Rel. Min. Ayres Britto, j. em 27.11.2007). Todavia, esse precedente e outros julgados que o
citam referem–se à ação de perda de mandato. Nesses casos, é acertado evitar–se a

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convocação de suplente para ocupar o cargo sem que haja decisão definitiva de mérito.
Isso porque a medida acarreta o afastamento do eleito, e os dias em que este estiver
distante de seu cargo são irreparáveis. Assim, a reversibilidade, requisito específico para
o deferimento de antecipação de tutela, não se mostra presente na ação de perda de
mandato.

15. Diversa é a situação em que a ação é ajuizada pelo eleito, para ver reconhecida a justa
causa para se desligar do partido. Nessa hipótese, a concessão da tutela antecipada
apenas permite que o eleito possa exercer o mandato, caso se desfilie no curso da ação.
Sem dúvida, mesmo nesse caso, a antecipação da tutela será excepcional. Somente se
forem demonstrados elementos de apontem de forma muito segura para a existência da
justa causa é que se poderá declará–la liminarmente.

II. PLAUSIBILIDADE DO DIREITO

16. A plausibilidade do direito postulado decorre da redação expressa e inequívoca do § 6º do


art. 17 da Constituição, inserido pela EC nº 111, de 28.09.2021, in verbis:

“Art. 17, § 6º Os Deputados Federais, os Deputados Estaduais, os Deputados Distritais e os


Vereadores que se desligarem do partido pelo qual tenham sido eleitos perderão o mandato,
salvo nos casos de anuência do partido ou de outras hipóteses de justa causa estabelecidas em
lei, não computada, em qualquer caso, a migração de partido para fins de distribuição de
recursos do fundo partidário ou de outros fundos públicos e de acesso gratuito ao rádio e à
televisão”. (Incluído pela Emenda Constitucional nº 111, de 2021).

17. Com isso, fica superada a jurisprudência que até aqui prevalecera no Plenário, recentemente
reiterada, no sentido de que “a carta de anuência oferecida pelos partidos políticos aos
representantes individuais, eleitos pela legenda, não configura, por si só, justa causa para a
desfiliação partidária” (PET nº 0600482–26 e 0600607–91, Rel. Min. Edson Fachin, j. em
25.11.2021). Tal entendimento, que se aplicava a fatos ocorridos antes da vigência EC nº
111/2021, já não prevalece.

19. No caso em análise, a ação se encontra instruída com cópia de documento, datado de
7.12.2021, assinado pelo presidente nacional do PL, Valdemar Costa Neto, em que a
agremiação: (i) reconhece que se tornou insustentável a permanência do requerente nos
quadros do partido, com “constrangimentos de natureza política para ambas as partes”; e (ii)
consigna sua anuência com a desfiliação e a posição por não se utilizar da ação de perda de
mandato. Transcrevo o inteiro teor do documento (ID 157116851):

“O Órgão Nacional do Partido Liberal tomou conhecimento das divergências doutrinárias e


políticas existentes entre V. Exa. E nossa legenda partidária, o que, no nosso entendimento,
torna insustentável sua permanência em nossa agremiação e justificaria sua desfiliação de
nosso quadro de filiados.

Em que pese o fato de lamentarmos a manifesta divergência apresentada de caráter público e


notório, afirmamos que, em virtude da linha político–partidária de atuação de nossa legenda, sua
manutenção em nosso quadro de filiados causará indiscutivelmente constrangimentos de
natureza política para ambas as partes. Em face de tais considerações, manifestamos nossa
posição de não utilizar as prerrogativas da Resolução nº 22.610, do TSE c/c art. 26 [sic] da Lei
9.096/95, que trata da fidelidade partidária e consignamos nossa anuência a sua desfiliação, nos
termos do expresso no Art. 1º, da Emenda Constitucional nº 111, de 28 de setembro de 2021,
que acrescentou o §6º, ao artigo 17, da Constituição Federal, não postulando perante a Justiça
Eleitoral o mandato de Deputado Federal, obtido por V. Exa. por expressa vontade do povo do
Estado do Amazonas, por motivo de desfiliação partidária, em respeito aos princípios
constitucionais, concluindo assim ser incompatível a permanência de V. Exa. no Partido Liberal”.

20. Observa–se que os termos em que manifestada a anuência com a desfiliação são
inequívocos, deles se extraindo a plena ciência do partido de que o efeito da declaração será a
conservação do mandato pelo parlamentar após seu desligamento da legenda. O teor da carta

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é, ainda, coerente com a narrativa do autor, no sentido de que sua relação com o partido se
desgastou após a filiação do Presidente da República ao PL, tal como ilustrado pelas
declarações públicas de dirigentes locais a respeito da inadequação do requerente à nova
configuração política do partido. Tais informações são aqui mencionadas como parte do
contexto em que a comunicação foi expedida, não sendo necessário examiná-las sob a ótica da
grave discriminação pessoal (art. 22–A, parágrafo único, II, da Lei nº 9.096/1995), já que é
suficiente ao exame do requerimento de tutela de urgência a análise dos fatos à luz do § 6º do
art. 17 da Constituição.

22. Há, portanto, elementos suficientes para concluir, em cognição sumária, que a pretensão do
autor está legitimamente amparada no § 6º do art. 17 da Constituição.

III. PERIGO NA DEMORA

23. Por fim, considero configurada a urgência que justifica a antecipação da tutela.

24. A divergência política entre o requerente e o PL se instalou e se tornou aguda de forma


rápida. Transcorreram apenas 7 dias entre a filiação de Jair Messias Bolsonaro e a comunicação
ao parlamentar de que sua permanência na legenda causaria constrangimento insustentável.
Essa tensão é corroborada por prints de reportagens de dois veículos de comunicação (portal
CM7 e ABN) em que transcrita fala do presidente regional do Partido Liberal (PL), no sentido de
que “Ele [Marcelo Ramos] vai ter que sair, já que não concorda com a filiação do presidente” (ID
157116850).

26. Em suma: agentes públicos eletivos dependem de uma identidade política que atraia seus
eleitores. Uma mudança substancial de rumo no partido pode afetar essa identidade. Se isso se
der às vésperas de um ano eleitoral, o fato se torna mais grave, sendo que a demora na
desfiliação pode causar ao futuro candidato dano irreparável.

27. Não há, por outro lado, risco de dano reverso, notadamente pelo fato de que o próprio
partido, ao anuir com a desfiliação, deixou claro que não se valerá da ação de perda de
mandato.

28. Por essa razão, deve–se assegurar ao requerente a continuidade do exercício livre de seu
mandato pelo tempo remanescente.

IV. CONCLUSÃO

29. Diante do exposto, com fundamento no art. 17 do RITSE, defiro a antecipação da tutela,
para reconhecer, liminarmente, a existência de justa causa para a desfiliação partidária do
deputado federal Marcelo Ramos do PL, consubstanciada na anuência do partido, nos termos
do § 6º do art. 17 da Constituição.

31. Encaminhem–se os autos ao relator, para a continuidade da tramitação do feito, inclusive


para fins de referendo da presente decisão pelo colegiado.

Brasília, 21 de dezembro de 2021.

Ministro LUÍS ROBERTO BARROSO - Presidente [TSE. Decisão monocrática em Ação de


Justificação de Desfiliação Partidária - AJDesCargEle n. 060076663 - Manaus –
AM, de 21/12/2021, Min. Luís Roberto Barroso, DJE - Diário da Justiça Eletrônica,
Tomo 13, Data 03/02/2022 – grifei].

Como se vê, ainda que se possa vislumbrar a possibilidade de antecipação de tutela quando a
ação é ajuizada pelo eleito, para ver reconhecida a justa causa a fim de se desligar do partido
sem perder o mandato, trata-se de medida excepcional, a ser deferida "somente se restarem
demonstrados elementos que apontem de forma segura para a existência da alegada justa causa

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é que se poderá declará–la liminarmente".

Na hipótese, o requerente defende que a fusão dos partidos PSL e DEM e a consequente criação
de um novo partido, o União Brasil, constitui justa causa para a sua desfiliação, alegando,
outrossim, que, com isso, houve mudança substancial do programa partidário e do seu estatuto.

Como se sabe a fusão partidária não está mais prevista como hipótese de justa causa para a
desfiliação partidária após as alterações promovidas pela Lei n. 13.165/2015 (minirreforma
eleitoral 2015) na Lei n. 9.096/1995 (Lei dos Partidos Políticos).

Outrossim, o Supremo Tribunal Federal já decidiu que “A superveniência da Lei nº 13.165/2015,


inserindo o art. 22-A na Lei nº 9.096/95, ao dispor de forma taxativa e exaustiva sobre as
hipóteses de justa causa para a desfiliação partidária, revogou tacitamente o § 1º do artigo 1º da
Res.-TSE nº 22.610/2007” (ADI 4583. Relatora ROSA WEBER, Tribunal Pleno, julgado em
23.11.2020, PROCESSO ELETRÔNICO DJe-285 DIVULG 02.12.2020, PUBLIC 03.12.2020)

Logo, as hipóteses de justa causa para a desfiliação partidária são apenas aquelas previstas no
parágrafo único do art. 22-A da Lei n. 9.096/1995.

Já a respeito da “mudança substancial ou o desvio reiterado do programa partidário”, destaco o


entendimento assentado pelo Tribunal Superior Eleitoral:

RECURSO INOMINADO RECEBIDO COMO AGRAVO REGIMENTAL. PETIÇÃO. AÇÃO DE


JUSTIFICAÇÃO DE DESFILIAÇÃO PARTIDÁRIA. DEPUTADO FEDERAL INTEGRANTE DA
EXECUTIVA NACIONAL DO PARTIDO. ALEGAÇÕES DE GRAVE DISCRIMINAÇÃO PESSOAL
E MUDANÇA SUBSTANCIAL DO PROGRAMA PARTIDÁRIO NÃO COMPROVADAS.
AUSÊNCIA DE JUSTA CAUSA. IMPROCEDÊNCIA. DESPROVIMENTO.

1. O recurso cabível contra decisão monocrática do Relator é o Agravo Regimental, nos termos
do art. 36, § 8º, do Regimento Interno desta Corte. Precedentes.

2. É facultado ao Relator apreciar, monocraticamente, os recursos que lhe são distribuídos, nos
termos do art. 36, §§ 6º e 7º, do Regimento Interno do TRIBUNAL SUPERIOR ELEITORAL.

3. "O indeferimento da produção de provas consideradas inúteis ou meramente protelatórias


pelo magistrado não caracteriza cerceamento do direito de defesa, nem violação aos princípios
constitucionais da ampla defesa e do contraditório" (AgR–REspe nº 59–46/PR, Rel. Min. Luiz
Fux, j. em 25.05.2017). Ainda: RO nº 0600870–81/MA, Rel. Min. Tarcisio Vieira, j. em
13.11.2018. Inteligência do art. 355, I, do CPC.

4. A fidelidade partidária constitui imposição legal que visa a preservar a vontade popular
e assim a legitimar o próprio processo eleitoral, podendo ser excepcionada quando
efetivamente demonstradas as estritas hipóteses de justa causa previstas no art. 22–A da
Lei 9.096/1995, quais sejam: (i) mudança substancial ou desvio reiterado do programa
partidário; (ii) grave discriminação política pessoal; e (iii) migração de partido efetuada
durante o período de trinta dias que antecede o prazo de filiação exigido em lei para
concorrer à eleição, majoritária ou proporcional, ao término do mandato vigente.

5. A mudança substancial ou o desvio reiterado do programa partidário devem ser tais


que subvertam o programa e a própria ideologia do partido, o que inequivocamente é algo
ostensivo, devendo "ter caráter nacional, e não apenas regional ou local. Isso porque, por
determinação constitucional, o partido deve ter caráter nacional, sendo, pois, necessário
que se demonstre o desvio reiterado de diretriz nacional ou de postura que a legenda
historicamente tenha adotado sobre tema de natureza político–social relevante'' (RO
263/PR – Rel. Min. HENRIQUE NEVES DA SILVA, DJE de 31/3/2014).

6. A grave discriminação social, embora de subjetiva análise, deve ser analisada diante das

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circunstâncias do caso concreto, a impedir uma atuação livre, de modo a tornar insustentável
sua permanência no âmbito partidário. Nessa linha: "a hipótese de discriminação pessoal que
caracteriza justa causa para a desfiliação exige a demonstração de fatos certos e determinados
que tenham o condão de afastar o mandatário do convívio da agremiação ou revelem situações
claras de desprestígio ou perseguição". (RO 14826 – Rel. Min. TARCISIO VIEIRA DE
CARVALHO NETO, DJe de 20/11/2017).

7. Discussões sobre o alinhamento político do Partido, disputas internas que não interfiram no
programa e nos ideais partidários nem gerem grave discriminação pessoal não são aptas a
configurar a justa causa para a desfiliação.

8. Agravo Interno desprovido [TSE. PET - Agravo Regimental em Petição nº 060008904


- BRASÍLIA – DF, Acórdão de 22/04/2021, Relator(a) Min. Alexandre de Moraes,
Publicação: DJE - Diário da justiça eletrônica, Tomo 89, Data 18/05/2021, Página 0
– grifei].

Em análise de cognição sumária e não exauriente compatível com a fase em que se encontra o
processo, é possível vislumbrar a presença dos pressupostos necessários à concessão do
provimento liminar pleiteado.

Verifico que a inicial foi instruída com as cópias dos Estatutos e dos Programas do PSL (IDs
18754394 e 18754395) e do União Nacional (IDs 18754391 e 18754393), os quais foram
devidamente cotejados pelo requerente, a fim de demonstrar a configuração da justa causa
prevista no inciso I do parágrafo único do art. 22-A da Lei n. 9.096/1995 (mudança substancial do
programa partidário).

Cumpre destacar os seguintes pontos ressaltados na exordial:

[...] verifica-se que a ideologia adotada pelo União Brasil (doc. 06) é substancialmente diversa do programa do
PSL (doc. 07):

[...]

Veja-se que enquanto o PSL tem por base programático a redução do Estado, ou seja, a adoção do Estado
Mínimo, o União Brasil adota como princípio imutável e inegociável o Estado como garantidor da
população e, ainda, nega a ideia de Estado Mínimo.

[...]

Outro ponto de divergência é o incentivo absoluto da iniciativa privada pelo PSL, enquanto o União Brasil
repudia a priorização do interesse individual, entendendo que deve prevalecer o interesse coletivo acima de
qualquer outro.

[...]

Mais uma alteração substancial diz respeito à ideologia de gênero. Esta representa, de forma sucinta, a
ideia de que gênero é uma construção social e, portanto, não é pré-definida pelo órgão genital no momento do
nascimento. O seu combate implica, pois, no combate à naturalização de pessoas transgênero e da
homossexualidade. O União Brasil, por sua vez, adota postura firma de combate a esse pensamento,
valorizando e estimulando a aceitação da diversidade.

[...]

Ainda se vislumbra a alteração substancial no que diz respeito às quotas. O PSL era declaradamente
contrário a qualquer tipo de privilégio em razão de classe social, sexo, cor. O União Brasil, por sua vez, valoriza
programas de transferência de renda, ou seja, divisão do povo em razão da condição social concedendo-lhes
recursos financeiros e o estímulo à participação das mulheres e das minorias na política, garantindo espaço

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privilegiado a esses grupos.

[...]

Além disso, dentre os 44 pontos do programa do União Brasil, nenhum deles aborda 5 dos pontos essenciais
do programa do PSL:

“c) políticas de proteção às nossas fronteiras, minimizando o contrabando e o tráfico de armas e de drogas;

d) políticas de esclarecimento à população, que visem a conscientização a respeito dos males provocados pelo
comunismo e socialismo;

e) proteção à propriedade privada e garantia de que cada cidadão de bem tenha o direito de proteger seu
principal patrimônio: sua vida. Para tanto, é necessária a revogação do Estatuto do Desarmamento e a criação
de condições para que os cidadãos possam ter a posse de armas de fogo, se assim o desejarem;

j) combate à censura, ao constrangimento e aos desequilíbrios morais e sociais decorrentes do discurso


‘politicamente correto’;

k) combate à sexualização precoce de crianças;”

Pois bem, as discrepâncias supracitadas, a meu ver, estão a sugerir, repito, pelo menos numa
análise superficial, haver alterações substanciais no programa partidário do União Brasil, partido
ao qual o requerente passou a ser filiado em face da fusão do PSL com o DEM, que subverteriam
a própria ideologia do partido ao qual o requerente foi eleito (PSL), evidenciando, assim, a
probabilidade do seu direito.

Outrossim, resta igualmente evidenciado o perigo de dano, senão vejamos.

O art. 9º, caput, da Lei n. 9.504/1997, dispõe que, "Para concorrer às eleições, o candidato
deverá possuir domicílio eleitoral na respectiva circunscrição pelo prazo de seis meses e estar
com a filiação deferida pelo partido no mesmo prazo".

Considerando que a data para realização das Eleições de 2022 será 02/10/2022, o prazo de 6
meses supramencionado para o requerente estar filiado a outro partido findará em 1°/04/2022.

Por outro lado, observo que, a despeito da celeridade imposta pelo rito da Resolução TSE n.
22.610/2007, o art. 12 da referida resolução estabelece o prazo de 60 dias para que as ações
sejam finalizadas, lapso temporal que, no caso em apreço, ultrapassaria a data final (1°/04/2022)
para a sua filiação a outro partido visando concorrer às Eleições de 2022.

Diante desse contexto, a tutela de urgência deve ser concedida, a fim de que, em sede de liminar,
seja reconhecida a justa causa para a desfiliação do requerente do União Brasil, sem prejuízo de
melhor análise após estabelecido o contraditório e eventual instrução do processo.

Realço ainda que, em razão da fusão, restaram extintos os partidos PSL e DEM, a teor do
disposto no art. 27 da Lei n. 9.096/1995, logo, não há razão para o PSL de Santa Catarina e o
PSL de Laguna figurarem no polo passivo da presente demanda, devendo constar apenas o
Órgão Nacional do União Brasil, já que, conforme certidão da Coordenadoria de Registro e
Informação Processual, inexiste órgão desse partido em Santa Catarina e no Município de
Laguna.

Diante do exposto, defiro a liminar, determinando:

a) a reautuação dos presentes autos para a exclusão do PSL de Santa Catarina e do Município

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de Laguna do polo passivo da presente ação, em razão da extinção do referido partido ao fundir-
se ao DEM para a formação do partido União Brasil (art. 27 da Lei n. 9.096/1995);

b) a citação do Diretório Nacional do União Brasil para, querendo, apresentar resposta no prazo
de 5 dias (arts. 4° e 5° da Resolução TSE n. 22.610/2007);

d) transcorrido o prazo de resposta, o encaminhamento dos autos à Procuradoria Regional


Eleitoral para manifestação (art. 6° da Resolução TSE n. 23.610/2007).

Intime-se.

À CRIP, para as providências a seu cargo.

Florianópolis, 11 de março de 2022.

LUIS FRANCISCO DELPIZZO MIRANDA, Relator(a)

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