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RESUMO
A presente pesquisa apresenta o levantamento de casas de fazenda no Estado do Ceará e propõe uma
discussão sobre o quadro de conservação deste patrimônio e uma contribuição para o estudo da
arquitetura vernacular cearense. O recorte espacial, nas áreas rurais, e temporal, entre os séculos XVIII
e a segunda metade do século XX, justificam-se tomando como referência o período da intensificação
da colonização portuguesa no Estado, que ocorreu graças à expansão da pecuária, e anterior ao
processo de migração da população das zonas rurais para urbanas. Foi nesse período em que ocorreu
a implantação das primeiras fazendas de gado, a partir do sistema de sesmarias, possibilitando, com o
tempo, a criação de vilas à beira da rota do charque. Após a independência do Brasil e do início da
Revolução Industrial, a atividade econômica cearense se modificou, dando lugar às culturas de cana-
de-açúcar, café e algodão no século XX. Assim, este trabalho tem como objetivo descobrir, através de
pesquisas documentais, de campo, levantamentos e entrevistas, exemplares de arquitetura vernacular,
compreendendo a importância das casas de fazenda como patrimônio edificado e registro cultural,
conforme definição da Carta do Patrimônio Vernáculo Construído, ratificada na XII Assembleia Geral
ICOMOS/UNESCO (1999). Este artigo traz, como resultado, o levantamento e análise do Sítio São
Luís, localizado na cidade de Pacoti, Ceará.
ABSTRACT
This work presentes a Ceará farm houses survey and propose a discuss about the conservation stage
from this heritage and a contribution to the Ceará vernacular architecture study. The time and space
delimitation in the rural área between the century XVII and the XX second half, refer to intensification
Portuguese colonization in the state, that happens thanks to livestock and a previous rural zone
migration process for the city. Develops int this period, the implantation to the first cattle farm from to
sesmaria system, making possible, on course of the time, the village creation beside of the meat rote.
After Brasil Independence and Industrial Revolution begining, the Ceará economic activity modified,
giving place to the sugar cane, coffee and cotton culture in the XX century. Like this, this work have the
objective to descovery, through to documents research, field visit, survey and interviews, vernacular
architecture exemplar, understanding the farm house importance as a built heritage and cultural record,
according to Charter on the Built Vernacular Heritage, ratified by the ICOMOS 12 th General Assembly
(1999). This article bring as a result the Sítio São Luís survey and analysis, in Pacoti, Ceará.
(1: Docente no Centro Universitário Estácio do Ceará, Centro Universitário Christus e no Centro
Universitário 7 de Setembro; kelmapinheiro@gmail.com), (2: Docente no Centro Universitário Estácio
do Ceará e no Centro Universitário Christus; larissaporto.estacio@gmail.com), (3: Discente no Centro
Universitário Estácio do Ceará; spiller.naiara@gmail.com), (4: Discente no Centro Universitário Estácio
do Ceará; grasielyaquino@gmail.com), (5: Discente no Centro Universitário Estácio do Ceará;
inesafernandes79@gmail.com)
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Temas relativos a conservação do patrimônio vem sendo discutidos desde Roma, por
volta de 1420, quando os humanistas passaram a reivindicar a manutenção das
antiguidades locais. Porém, a consagração do monumento histórico, com
amadurecimento das ideias e a intervenção do Governo, se deu apenas, a partir da
Revolução Francesa, conforme expõe Choay (2006).
Entretanto, para compreensão da importância da preservação, é importante
apreendermos, primeiramente, o conceito e fatores atrelados a esse amplo conjunto
de bens. O patrimônio histórico, segundo Lemos (1981), é dividido em três grandes
categorias de elementos, que são: elementos pertencentes a natureza; elementos
relacionados ao conhecimento; e os bens culturais em si, que englobam todas as
coisas.
No Brasil, a Constituição Federal de 1988, em seu Artigo 216, ampliou o conceito de
patrimônio estabelecido pelo Decreto-lei nº 25, de 30 de novembro de 1937, trazendo
a seguinte definição para o patrimônio cultural brasileiro:
Art. 216. Constituem patrimônio cultural brasileiro os bens de natureza
material e imaterial, tomados individualmente ou em conjunto, portadores de
referência à identidade, à ação, à memória dos diferentes grupos formadores
da sociedade brasileira, nos quais se incluem:
I - as formas de expressão;
II - os modos de criar, fazer e viver;
III - as criações científicas, artísticas e tecnológicas;
IV - as obras, objetos, documentos, edificações e demais espaços destinados
às manifestações artístico-culturais;
V - os conjuntos urbanos e sítios de valor histórico, paisagístico, artístico,
arqueológico, paleontológico, ecológico e científico.
Notamos assim, que as abordagens atrelam o patrimônio histórico à cultura e ao modo
de vida de uma sociedade, seja esse bem material ou imaterial, expressando assim,
as características daquela população. Sobre isso, vale destacar o pensamento de
Choay (2006, p. 11) sobre a expressão em questão:
Patrimônio histórico. A expressão designa um bem destinado ao usufruto de
uma comunidade que se ampliou a dimensões planetárias, constituído pela
acumulação contínua de uma diversidade de objetos que se congregam por
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seu passado comum: obras e obras primas das belas-artes e das artes
aplicadas, trabalhos e produtos de todos os saberes e savoir-faire dos seres
humanos.
Analisando esse argumento, entendemos a estima pelo bem histórico, pois, como
abordado, ele nasce das características culturais de uma comunidade, e
posteriormente se torna um patrimônio comum para toda população, que pode estudar
e compreender a evolução de uma sociedade.
No campo arquitetônico, estudar um bem histórico é analisar os métodos construtivos,
os materiais utilizados, além das soluções adotadas no desenvolvimento da edificação
com produtos e conhecimentos disponíveis naquele dado momento histórico.
Diante do exposto, podemos ter em mente o grande valor dos bens históricos para
toda sociedade. Diante disso nasce a necessidade da preservação dos patrimônios,
sobre o assunto LEMOS (1981, p. 29) destaca:
Preservar é manter vivos, mesmo que alterados, usos e costumes populares.
É fazer também, levantamentos, levantamentos de qualquer natureza, de
sítios variados, de cidades, de bairros, de quarteirões significativos dentro do
contexto urbano. É fazer levantamentos de construções, especialmente
aquelas sabiamente condenadas ao desaparecimento decorrente da
especulação imobiliária.
Portanto podemos apreender a importância agregada da conservação e registro dos
nossos patrimônios, como cita LEMOS (1981, p. 29) desta forma "estaremos
garantindo a compreensão de nossa memória social preservando o que for
significativo dentro de nosso vasto repertório de elementos componentes do
Patrimônio Cultural."
ARQUITETURA VERNACULAR/POPULAR
saber do povo”, ou seja, que pode ou não ter tido auxílio técnico na fase de projeto,
mas o modo de construir é aquele baseado no conhecimento local.
Dentre as características deste tipo de edificações, podemos destacar:
Simplicidade formal;
Características formais e funcionais semelhantes entre as edificações
de uma população;
Características plásticas definidas pelos materiais empregados;
Forma de construir comum entre um povo;
Tecnologia construtiva transmitida informalmente de geração em
geração;
Materiais encontrados na natureza
Arquitetura adaptada ao meio ambiente onde está inserida
TÉCNICAS CONSTRUTIVAS
O Ceará é uma das 27 unidades federativas o Brasil (26 estados e 1 distrito federal),
localizado na região Nordeste do país. Sua capital a cidade de Fortaleza, está situada
na região litorânea do estado, onde iniciaram-se as tentativas de ocupação do
território cearense pela colonização portuguesa. O Ceará é composto por uma vasta
faixa litorânea, na qual estão presentes dunas e mangues; e o seu sertão é
caracterizado por clima semi- árido com presença pontual de alguns maciços e serras
de clima ameno. A colonização cearense deu-se de forma tardia se compararmos aos
demais estados do nordeste brasileiro.
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Temos no século XIX o início dos ciclos da borracha, do café e do algodão. O Ceará
participa como estado produtor de café, mas se destaca na produção e exportação do
algodão, que veio a substituir a pecuária como sua principal atividade econômica. No
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é desenvolvida a plantação de algodão, fazendo com que a parcela que adotou esse
tipo cultivo, tenha uma rápida expansão econômica.
Características sócio econômicas do território
JUSTIFICATIVA DA PESQUISA
Propõe-se para esse projeto de pesquisa a busca por casas de fazenda construídas
entre o século XVIII até a segunda metade do século XX, em áreas rurais, de forma a
conhecê-los, utilizando de ferramentas fotográficas e programas de computador
específicos para registrar dimensões, características formais interiores e exteriores,
para, ao final, estudá-los. Se trata, então, de um trabalho, em grande parte, campal.
O projeto pode se desenvolver nas cidades de Aracati, Icó, Santa Quitéria, Saboeiro,
Iguatu, Granja, Aquiraz, Quixeramobim, Baturité, Crato, Sobral, Tauá, Russas e
demais cidades fundadas no mesmo período, as quais foram importantes no
desenvolvimento do estado Ceará. Segundo Neto (2012), essas cidades surgiram dos
assentamentos que cresceram em torno das primeiras capelas e fazendas que foram
erguidas na região. Estes eram pontos de conexão da atividade pecuária, que durante
os séculos XVIII e XIX movimentou a economia do cearense, entre o sertão e o
restante do país. Ainda de acordo com o mesmo autor, pautando a classificação das
vilas mais importantes do período setecentista segundo a posição estratégica para os
pecuaristas, as duas principais seriam a vila de Icó e a do Aracati. Neto (2012) também
cita que entre 1700 e 1822 foram criadas dezoito vilas no estado do Ceará, algumas
delas descritas acima como possíveis objetos de estudo. Porém, se visa não apenas
estudar as casas deste período como também as construídas até a metade do século
XX, de modo abranger o maior número de possibilidades de edificações vernaculares,
e também pela incerteza da existência das construídas nos primeiros anos de
ocupação do Ceará.
No cerne do projeto, o intuito é encontrar edifícios que foram ignorados, ora por sua
simplicidade, já que tal modo de construir era realizado por pessoas que não eram
instruídas, de acordo com ensinamentos passados de geração em geração, ora pela
falta de conhecimento da população relativos à história local, e coloca-los em
destaque como patrimônio arquitetônico e cultural.
OBJETIVOS GERAIS
OBJETIVOS ESPECÍFICOS
REFERENCIAL TEÓRICO
UNESCO. Carta sobre o Patrimônio Vernacular edificado. 12ª Assembleia Geral do ICOMOS. Cidade
do México – México, outubro de 1999.
"Vernáculo es lo proprio del país, y Popular es lo proprio del pueblo, aceptado por el
pueblo, vulgar."
TELLES, Dr. Augusto da Silva. Arquitetura Vernacular no Brasil: necessidade de inventário e estudo. I
Congreso Internacional de Arquitectura Vernácula en el mundo Iberico, Carmona - Espanha,
outubro/2005.
TELLES, Dr. Augusto da Silva. Arquitetura Vernacular no Brasil: necessidade de inventário e estudo. I
Congreso Internacional de Arquitectura Vernácula en el mundo Iberico, Carmona - Espanha,
outubro/2005.
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METODOLOGIA
Essa fase inicial será de importante ajuda também na eleição do(s) município(s) onde
se concentrarão os estudos, de acordo com a data de fundação, importância
geopolítica no período, etc.
ANÁLISE CRÍTICA
O Sítio São Luís, nosso objeto de estudo, está localizado na área rural de Pacoti,
Ceará, na serra de Baturité, que nas últimas décadas de 1800 tinha como impulsores
econômicos o ciclo do algodão e do café. Segundo JUCA, Levi (p.67, 2014) a
construção que conhecemos é oriunda da reforma da casa grande original no final do
século XIX. Acredita-se que a obra se deu para concorrer esteticamente com outro
edifício do mesmo porte de outra propriedade da região, o sobrado Pau d’Alho, que já
não existe. Com sua exuberância, a edificação encanta com sua arquitetura quase
única, pois na cidade de Maranguape encontra-se outra com fachada muito
semelhante, onde funcionava uma agência da Caixa Econômica Federal. Construída
em adobe, com pintura caiada, seu piso original era em assoalho de madeira, hoje
substituído por cimento queimado, circundada por uma varanda que ajuda a controlar
a temperatura interior. Suas portas e janelas, que permanecem praticamente originais,
são de cedro maciço, que foi retirado da mata envoltória.
Foram feitas certas modificações na sua pintura interna, principalmente na sala de
jantar, já que a casa serviu de cenário para dois longa-metragem, “Eu não conhecia
Tururu” de Florinda Bolkan e “Bezerra de Menezes – o diário de um espírito” de
Glauber Filho e Joe Pimentel. Além disso, algumas portas foram transformadas em
janelas e vice-versa por conta de alterações de uso de alguns ambientes. Mesmo
com essas alterações, a casa permanece com seu aspecto praticamente original.
LEVANTAMENTO ARQUITETÔNICO
4 Planta de Cobertura
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6 Corte transversal
7 Corte Longitudinal
LEVANTAMENTO FOTOGRÁFICO
14 Piso original da casa - foto cedida pelos proprietários do Sítio São Luís
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15 Imagem de 1900 da casa - foto cedida pelos proprietários do Sítio São Luís
16 Imagem do telhado antigo da biblioteca - foto cedida pelos proprietários do Sítio São Luís
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MAQUETE ELETRÔNICA
DETALHES CONSTRUTIVOS
19 Detalhe tirante - apoio estrutural existente no sentido transversal da casa – desenho dos autores
CONCLUSÃO
Resultado de duas etapas, uma teórica e outra em campo, da pesquisa “O memorial
das casas de fazenda do estado do Ceará”, este artigo ressalta a importância da
preservação da arquitetura vernacular, como aquela que expressa a cultura do povo
que a constrói, a partir da compreensão da história da região, mais especifica da
cidade de Pacoti, para entender a tecnologia construtiva usada até a inserção de
novos materiais, como o concreto, tendo como exemplo de edificação a sede do Sítio
São Luís.
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AGRADECIMENTOS
Os autores desse trabalho agradecem o apoio do Centro Universitário Estácio do
Ceará através do Programa de Iniciação Científica (PIC) e da Coordenação do curso
de Arquitetura e Urbanismo do campus Via Corpus e Centro. Também ao professor
André Almeida que iniciou este projeto, a participação dos alunos Natália de Oliveira
do Nascimento, Ronoaldo Câmara, Roberta de Paula, Isabella Araújo, Lucas
Wargnier, Julia Jereissati e Lia Pinheiro. Agradecem ainda ao professor Frederico
Barros e Wagner Aquino pela contribuição dada e a Laura Goes por ceder o Sítio São
Luís para o desenvolvimento da pesquisa e também pelas imagens e depoimentos
concedidos.
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BIBLIOGRAFIA
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