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1ª EDIÇÃO
ANAP
Tupã/SP
2020
2
EDITORA ANAP
Associação Amigos da Natureza da Alta Paulista
Pessoa de Direito Privado Sem Fins Lucrativos, fundada em 14 de setembro de 2003.
Rua Bolívia, nº. 88, Jardim América, Cidade de Tupã, São Paulo. CEP 17.605-310.
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Ficha Catalográfica
CDD: 710
CDU: 710/49
BAURU EM TEMAS URBANOS 3
6
BAURU EM TEMAS URBANOS 7
Com muito orgulho, faço a apresentação do livro Bauru em temas urbanos do
colega Prof. Dr. Nilson Ghirardello, Arquiteto e Urbanista, contemporâneo de uma
trajetória que ultrapassa três décadas entre Prefeitura Municipal de Bauru e Faculdade
de Arquitetura, Artes e Comunicação da Unesp - Bauru.
Sua dissertação de Mestrado Aspectos do direcionamento urbano de Bauru
(1992), onde analisa a formação da cidade até os anos 40, é referência obrigatória a
todos os pesquisadores que se debruçam sobre a história de Bauru.
Na atual publicação, estende sua pesquisa até os dias atuais, preenchendo
uma lacuna na história mais contemporânea, fazendo um registro temporal com a
técnica de pesquisador cuidadoso e a sensibilidade e memória afetiva de morador.
Tendo vivido aqui grande parte da sua vida, muito do que é relatado, foi
vivenciado.
Junta fatos descritos nos jornais da época com fotos garimpadas nos museus
e textos sobre Bauru, subsidiando comentários muito pertinentes que ajudam o leitor,
seja ele um interessado na história da cidade ou pesquisador, a ter um novo olhar
sobre o nosso passado e entender as transformações por que passamos.
Os Capítulos têm autonomia, podem ser apreciados independentemente, mas
ao final se completam dando um panorama da formação da urbe, da expansão
horizontal e vertical, da legislação que induziu algumas características peculiares,
concluindo com a análise do patrimônio arquitetônico como registro desta história.
Prof. Dr. Nilson Ghirardello1
Quando se inicia uma pesquisa sempre tentamos entender o que nos move a
empreendê-la e o porquê da escolha de determinado tema. Como docentes
universitários, quase sempre buscamos respostas cerebrais, voltadas a nossa
atuação dentro da instituição e aos interesses acadêmicos. Contudo, não se pode
deixar de invocar o lado emocional nesse processo, que é bastante poderoso. Sendo
"da terra", e ao se trabalhar com o tema Bauru, sobrepõe-se um peso maior do que
imaginávamos: fala forte o lado sentimental, as raízes no espaço da cidade e as
lembranças de uma vida inteira. Nesse aspecto, o processo de leitura urbana se une
e se confunde, inevitavelmente, com as memórias afetivas.
Não foram poucas as vezes que recordações urbanas da adolescência e até
mesmo da infância, meio adormecidas, foram reavivadas a partir da escrita deste texto
e das imagens buscadas para guiá-lo. No processo despertaram-se as longas e
preguiçosas conversas com as avós, vizinhos e conhecidos, que se não integralmente
confiáveis, ao menos nos dão pistas a respeito de episódios e situações que deveriam
ser checadas. Voltam à mente paisagens, construções, espaços verdes e,
certamente, pessoas que por eles passavam. Escrevê-lo foi um processo que uniu a
racionalidade e rigores da produção acadêmica com as lembranças armazenadas no
âmbito pessoal.
Este livro é associado e consequência do nosso mestrado defendido em 1992
na antiga Escola de Engenharia de São Carlos da USP, atualmente denominado
Instituto de Arquitetura e Urbanismo, IAU/USP. A dissertação chama-se Aspectos do
Direcionamento Urbano de Bauru, e nela tentamos entender o processo de formação
urbana da cidade iniciado no século XIX, finalizando o arco temporal por volta dos
meados de 1940, ao término do Estado Novo, fechando-se um ciclo, portanto.
A pesquisa nunca foi editada integralmente, apenas sob forma de artigos
esparsos e, mesmo assim, para nossa felicidade, é referência utilizada pelos
terras de um patrimônio religioso2; trata das bases legais para o arruamento da cidade
e o traçado produzido pelo arruador. Mostramos, após um período inicial de
expectativa, como chegaram as ferrovias e com elas as radicais transformações
físicas e humanas ocorridas no solo urbano. Esse capítulo é o que está mais vinculado
à pesquisa de mestrado e, de certa maneira, faz resumo da criação do traçado urbano,
tratado com mais detalhes na pesquisa anterior.
O capítulo A Praça Rui Barbosa e os três templos versa sobre a formação
desse importante espaço urbano; de sua passagem de um largo voltado quase
exclusivamente às atividades religiosas, para a praça laica republicana, sendo
finalizado com a reforma que a descaracterizou no final do século XX. Trata, também,
das três construções religiosas católicas daquele espaço: a capela primitiva, a antiga
matriz e a atual catedral, descritas e analisadas arquitetonicamente a partir das
poucas imagens fotográficas e relatos que dispomos, com exceção da última que ali
está para ser vista.
Primeiros parcelamentos e ocupações fora do Patrimônio busca estudar a
expansão inicial da cidade além de seus limites representados pela área do
aforamento inicial. Elenca quais são e de que maneira se implantam os primeiros
parcelamentos ao redor do Patrimônio logo nas primeiras décadas do século XX.
Ainda, diferencia aqueles que tiveram que transpor córregos e trilhos, daqueles junto
à área foreira.
A Zona Sul tenta entender como e por que essa região da cidade se tornou a
área nobre e disputada pelas camadas mais favorecidas da população e, após essa
primeira ocupação, os motivos dos setores de serviços e comércio para lá se dirigirem
a partir do centro urbano.
Falcão e Bela Vista trata das características principais de dois antigos e
importantes bairros populares da cidade, formados a partir de diversos loteamentos.
Buscam-se elementos que os aproximam e também os particularizam do momento de
formação inicial de total isolamento, até quando se ligam ao centro da cidade através
dos grandes viadutos de concreto.
A verticalização aborda o início da construção dos prédios no centro da
cidade, suas tipologias iniciais, o ingresso na arquitetura modernista e como e por
2 Desenvolveremos a questão mais adiante, contudo, para maior aprofundamento sugerimos nosso
trabalho: GHIRARDELLO, N. A formação dos patrimônios religiosos no processo de expansão
urbana paulista (1850-1900). São Paulo: Editora UNESP, 2010.
12
3 MONBEIG, P. Pioneiros e fazendeiros de São Paulo. São Paulo: HUCITEC-POLIS, 1984, p. 133.
16
Sylvio de Vasconcellos (1997) assim trata aquele que seria o rancho primitivo
do mineiro, certamente transplantado para essas bandas. Acreditamos que a tipologia
descrita tanto serviria para as propriedades rurais como para as primeiras moradias
nos precários povoados nascentes,
4VASCONCELLOS, S. de. A arquitetura colonial mineira. In: ÁVILA, A. Barroco: Teoria e Análise. São
Paulo: Perspectiva, 1997. p.11.
BAURU EM TEMAS URBANOS 17
Bauru há bem pouco tempo era uma villa e a sua fama não se
desdobrava em conceitos de animação, de paz e de ordem; e só o
falar-se neste pedaço de terra, hoje tão procurado e cheio de tanta
vida, era o suficiente para causar em certos espíritos mal informados,
o receio e o terror.
Historias pavorosas, de bugres, echoavam por toda a parte e só
aquelles mais ousados, na sêde da fortuna, demandavam para esta
paragem e seguiam sertão em fora em trabalhos da “Noroeste do
Brasil”, e por esses antros de feras e de homens incultos o que sofriam
proclamavam como dotes de Bauru5.
8 Sobre o assunto ver: QUEIROZ, M. I. P. de. Bairros rurais paulistas. São Paulo: Duas cidades,
1973.
9 FERNANDES, J. As origens da cidade de Bauru. Jornal Correio Paulistano, 1945.
BAURU EM TEMAS URBANOS 19
Figura 1: Mapa com a reconstituição do sítio natural de Bauru, por volta de 1850, e os
prováveis caminhos do local onde seria implantada a cidade
Figura 2: Mapa com a reconstituição da primeira doação foreira para Bauru, de 1884,
destinada a formação dos "chãos" da cidade
12DEAN, W. A ferro e fogo, a história e a devastação da Mata Atlântica brasileira. São Paulo:
Companhia das Letras, 1996, p. 199-200.
22
13 Na cidade romana as duas principais vias eram o cardo e o decumanus, com essa orientação.
14 MUNFORD, L. A cidade na história, suas origens, transformações e perspectivas. São Paulo:
Martins Fontes, 1982.
15 GHIRARDELLO, N. A formação dos patrimônios religiosos no processo de expansão urbana
16Idem, p. 76.
17 GHIRARDELLO, N. Aspectos do Direcionamento urbano de Bauru. 1992. 196 f. Dissertação
(Mestrado em Arquitetura) – Escola de Engenharia de São Carlos, Universidade de São Paulo. São
Carlos (SP), 1992, p. 54.
24
Por mais que a ciência no final do século XIX já estivesse adiantada e a teoria
microbiana fosse uma realidade, a crença nos miasmas permanecerá nos Códigos de
Posturas que indicavam o afastamento dos presídios, cemitérios, matadouros e
hospitais do perímetro urbano.
As frequentes epidemias que grassavam na região e continuarão a grassar
durante boa parte do século XX, mesmo com suporte científico da medicina moderna,
seguirão contraindicando as margens dos córregos e águas paradas devido aos
vetores de transmissão, entre os quais, os mosquitos. Dessa forma as áreas de
baixada serão evitadas, ao menos, por aqueles que tivessem condições de fazê-lo.
As diretrizes básicas para o traçado de Bauru vieram do Código de Posturas
de Lençóis que, assim como tantos outros na Província, passou a contar com
orientações ligadas à regularidade e direitura das vias, buscando maior higiene do
ambiente urbano, questão profusamente difundida e discutida a partir dos meados dos
oitocentos. Os Códigos previam dimensões relativamente rígidas de vias e quadras,
que acabavam por ser adaptadas ao sítio e a alguma preexistência, como foi o caso
de Bauru e de tantas outras cidades paulistas. Em tese, os arruamentos deveriam ser
de quadrícula perfeita, na prática, se mostraram muito adaptáveis às situações postas.
Em São Paulo, a Assembleia Provincial trabalhou de forma sistemática no
sentido de que os Códigos de Posturas absorvessem tais medidas de regularidade,
pois todos, embora elaborados pelas Câmaras Municipais, obrigatoriamente deveriam
ser aprovados pela Assembleia, resultando em diretrizes semelhantes e forma
análoga para as novas vilas criadas dentro do território dos municípios paulistas nos
oitocentos.
Certamente a doação da gleba para a formação urbana não foi o início do
povoamento de Bauru, ele já vinha ocorrendo ao menos um pouco antes de sua oferta,
no referido caminho, atual Rua Araújo Leite, onde se estabeleceram as primeiras
edificações da futura cidade. Essas, muito modestas, se aproveitavam da situação
favorável junto à estrada para abrigarem o comércio básico e servirem de pousada.
18VASCONCELLOS, S. de. A arquitetura colonial mineira. In: ÁVILA, A. Barroco: Teoria e Análise.
São Paulo: Perspectiva, 1997, p.13.
BAURU EM TEMAS URBANOS 25
Atendiam aos viajantes e davam algum suporte à ocupação urbana e rural que se
estabelecia nas redondezas.
Em 1888, a Diocese, através da Câmara Eclesiástica de São Paulo, a qual a
vila de Bauru era subordinada, em única provisão, cria a Capela do povoado19 e funda
um cemitério,
como braço do Estado, fundar uma necrópole e não a Câmara Municipal competente,
no caso, a de Lençóis. Outro dado interessante apontado no raro documento é a
necessidade de se registrarem esclarecimentos sobre os óbitos dos filhos das
escravas, provavelmente devido à Lei do Ventre Livre, de 1871. A abolição se daria
apenas alguns meses adiante.
A criação do cemitério viria a resolver um problema grave, que seria onde se
enterrariam os defuntos do povoado e redondezas, os quais tinham os corpos levados
à distância para sepultamento em campo santo. Com a inauguração do Cemitério da
Saudade em 1908, a primeira necrópole deixou de existir, havendo exumação dos
restos mortais e a transferência das lápides, sendo a área posteriormente loteada.
Devido ao seu desaparecimento, a localização original não é muito precisa, ficava fora
do Patrimônio Religioso, ao que parece em uma região entre a Vila Antárctica e o atual
Cemitério da Saudade. Alguns memorialistas, ainda, apontam que o primeiro cemitério
era na região do bairro de Aymorés, e que esse próximo à Vila Antarctica foi um
segundo campo santo; não há, contudo, comprovação do fato.
Em relação às construções do povoado, é possível serem visualizadas a partir
das imagens iniciais da Rua Araújo Leite. A tipologia construtiva era de base
vernacular, trazida pelos mineiros, os primeiros ocupantes da cidade, e se tratava de
modestas casas de "porta e janela" e sem porão. A estrutura principal era formada por
elementos de madeira nobre no baldrame, esteios e frechal. Era um pequeno passo
adiante do “rancho” rural, dispondo internamente de ambientes diferenciados de
acordo com suas limitadas funções: estar, dormir e cozinhar21.
Devido ao surgimento das primeiras olarias na cidade, as edificações já
contavam com telhas de barro do tipo capa e canal, mas muitas delas continuavam
com os panos de vedação em taipa de mão, pois o custo do tijolo o restringia para
poucos. As varas na qual o barro era fixado vinha das palmeiras do tipo Jerivá,
abundante na região, que eram fatiadas em tiras longitudinais para serem trançadas
e depois receberem a massa de barro. A mesma planta era utilizada, também, para a
estrutura do telhado.
Percebe-se pela imagem de 1908, que as construções parecem não se
adaptar bem às largas datas da vila, pois eram advindas da velha cidade colonial
composta por terrenos estreitos. As edificações afiguram-se "perdidas" na ampla
21VASCONCELLOS, S. de. A arquitetura colonial mineira. In: ÁVILA, A. Barroco: Teoria e Análise.
São Paulo: Perspectiva, 1997, p.11.
BAURU EM TEMAS URBANOS 27
testada dos lotes, diferentemente da situação que as originou, onde os recuos laterais
não existiam e as casas se uniam umas às outras. Esse aspecto pode ser constatado
na fotografia, em que os flancos das moradias não possuem aberturas devido à
tradição que as “colava” às suas vizinhas.
Sobre as cidades e a casa colonial urbana brasileira, assim aponta Nestor
Goulart Reis Filho (1976): “As vilas e cidades apresentavam ruas de aspecto uniforme,
com casas térreas e sobrados construídos sobre o alinhamento das vias públicas e
sobre os limites laterais dos terrenos”22.
Figura 3: Rua Araújo Leite em foto de 1908. A primeira rua ocupada da cidade e sua edificação
tradicional, nada adaptada às largas datas urbanas
22 REIS FILHO, N. G. Quadro da arquitetura no Brasil. São Paulo: Perspectiva, 1976, p.21.
28
setor, as datas urbanas serão aforadas pela Fábrica da Igreja aos interessados e não
vendidas. A Fábrica, por sua vez, era a instituição que cuidava dos bens da igreja e
que, em tese, tinha como objetivo final conseguir recursos para a construção,
aformoseamento e manutenção da matriz.
Em 1892, outro passo é dado no sentido da autonomia de Bauru: a criação do
Distrito Policial; com ele a vila poderia contar com um subdelegado, quem, por
intermédio dos inspetores de quarteirão, também zelaria pela zona rural. No ano
seguinte é estabelecido o Distrito de Paz pela Lei n°. 209, de 30 de agosto de 1893.
O Distrito garantiria a figura de um Juiz de Paz eleito, que resolveria algumas questões
básicas de ordem legal.
Também no ano de 1892 Lençóis deixa de ser sede municipal da vila de
Bauru, assumindo o encargo Espirito Santo de Fortaleza, cidade situada mais
próxima. Contudo, Fortaleza possuía população reduzida, havendo, até mesmo,
dificuldade de se encontrar moradores idôneos para ocupar os cargos públicos.
Somado a isso, ocorria imensa rivalidade política entre os dois núcleos23.
Na eleição municipal de 1895, a vila, que já possuía mais habitantes que a
cidade mãe, elege a maioria dos vereadores da Câmara de Espirito Santo de
Fortaleza. Como não poderia deixar de ser, na primeira sessão da nova legislatura,
em 07 de Janeiro de 1896, é aprovada a transferência da sede da municipalidade para
Bauru24. De forma totalmente irregular, os livros de atas e demais apetrechos da
Câmara de Fortaleza são transferidos à força para Bauru, que se tornará sede
municipal oficialmente, apenas com a aprovação do Governo do Estado, em 01 de
Agosto de 1896. Interessante observar que não houve a criação de novo município e
sim a transferência de sede que abandona o Patrimônio do Espírito Santo de
Fortaleza.
A Lei n°. 428, assinada pelo Presidente do Estado, Campos Salles é bastante
curta: “Artigo 1.º - O municipio do Espirito Santo da Fortaleza passa a denominar-se
Bahurú, mudando-se a sua séde para esta ultima povoação”25.
Santo da Fortaleza para a povoação do Bahurú, com a denominação desta ultima localidade.
Legislação do Estado de São Paulo, São Paulo, 1º ago. 1896. Disponível em:
<https://www.al.sp.gov.br/repositorio/legislacao/lei/1896/lei-428-01.08.1896.html>.
BAURU EM TEMAS URBANOS 29
Com a força das lideranças locais, Bauru ganha o status de cidade e pode
administrar-se de forma direta, através do mandonismo dos coronéis, conforme a
ordem política estabelecida na Primeira República. Dominavam na cidade o poderoso
fazendeiro Coronel Araújo Leite e seu genro, Azarias Leite, chegados à cidade em
1889. Eram ligados a José Ferreira de Figueiredo, o Coronel Figueiredo, proprietário
da Fazenda Val de Palmas, primeiro grande latifundiário da região.
Pode-se dizer que esses anos iniciais da jovem cidade são de crescimento
das lavouras de café no extensíssimo município que chegava até as divisas do Estado
do Mato Grosso e de espera pela vinda de uma companhia ferroviária que
possibilitaria alavancar o crescimento urbano. Seriam tempos de expectativa, com
inversão de poucos recursos privados em solo citadino, afinal, não se sabia ao certo
se a nova cidade “vingaria”. Tal fato podia ser visto claramente em relação ao vizinho
Patrimônio do Espírito Santo de Fortaleza, antiga sede de Bauru, que se
desestruturava aos olhos de todos, perdendo sucessivamente seus moradores,
transformando-se em um “povoado fantasma” com o nome de Piatã e finalmente,
vindo a desaparecer no século XX26. Mais Patrimônios da região também teriam o
mesmo destino, como Santa Cruz dos Inocentes, criado em 1895 ao lado de
Piratininga, também não mais existente. Alguns com sorte um pouco melhor se
transformaram em sedes distritais orbitando ao redor de uma cidade maior.
O futuro de Bauru era alvissareiro, pois o Decreto nº. 374, de 15 de julho de
1896, da Assembleia Legislativa do Estado, concedia à Companhia União Sorocabana
e Ituana, como era denominada no período, licença para linha de Lençóis para
Bauru27. No ano seguinte, outro Decreto, o de nº. 493, seguido pelo de nº. 504, de 18
de dezembro de 1897, já aprovava os estudos definitivos referentes à vinda da
Companhia Paulista, de Dois Córregos para Bauru, sinal que as ferrovias brevemente
chegariam28.
26 Sobre esse e outros povoados fantasmas ver: GHIRARDELLO, N. Povoados fantasmas. In:
BENINCASA, V; SALCEDO, R. F. B.; GOMES, S. H. T. Arquitetura, Urbanismo e Paisagismo: Novos
Contextos e Desafios. Bauru: Cultura Acadêmica, 2019.
27 BRASIL. Decreto nº. 374, de 15 de julho de 1896. CONCEDE À COMPANHIA UNIÃO
SOROCABANA E ITUANA, LICENÇA PARA CONSTRUIR, USAR E GOZAR UMA LINHA FÉRREA DA
CIDADE DE LENÇÓIS A POPULAÇÃO DO BAURU, EM PROLONGAMENTO DA CONCEDIDA POR
DECRETO Nº 319, DE 29 DE NOVEMBRO ULTIMO. Diário Oficial da União. 02 ago. 1896. p. 17557.
28 BRASIL. Decreto nº. 504, de 18 de dezembro de 1897. APROVA OS ESTUDOS DEFINITIVOS
Figura 4: Mapa com a reconstituição da segunda doação foreira de Bauru, de 1893, para a
formação dos "chãos" da cidade
29PINTO, A. A. História da viação pública em São Paulo; introdução e notas de Célio Debes. São
Paulo: Governo do Estado de São Paulo, 1977, p.85.
BAURU EM TEMAS URBANOS 31
33 Conforme CUNHA, E. A margem da história. São Paulo: Editora da UNESP, 2019, p.195.
34 Denominação da ferrovia até 1917, quando é encampada pela União quando recebe a denominação
de oficial de Estrada de Ferro Noroeste do Brasil (NOB), mas tratada geralmente de Noroeste do Brasil
ou apenas Noroeste.
35 GHIRARDELLO, N. À beira da linha: formações urbanas da Noroeste Paulista. São Paulo: Editora
UNESP, 2002.
BAURU EM TEMAS URBANOS 33
Pacífico. 1995. Tese (Doutorado) – Universidade de São Paulo. São Paulo, 1995.
39 Idem.
34
Chegará o que pode ser chamada de segunda leva de imigrantes, agora mais
envolvidos com as atividades urbanas; alguns vindos diretamente de seus países para
a cidade, outros que desistiram da lida nas lavouras para tentar a sorte com as
profissões citadinas.
Junto com imigrantes virão moradores de outros cantos do país no sentido de
conseguirem trabalho na ferrovia, entretanto, devido ao perigo das atividades, às
doenças, à má fama dos indígenas e às centenas de mortes nas obras da CEFNOB,
haverá dificuldade de se conseguir a quantidade necessária de operários. Para tanto
os empreiteiros lançarão mão de prisioneiros que trarão mais violência ao processo
de ocupação da zona,
Os Deportados
Com uma pontualidade extraordinária continua a remessa, duas
ou três vezes por semana, das turmas dos deportados para a Zona
Noroeste considerada, pela segurança publica da capital a Sibéria do
Estado de São Paulo40.
42 SILVA, A. Roteiro histórico: Uma cidade e uma instituição. Bauru: Tipografia Comercial, 1957, p.89.
43 PELEGRINA, G. R.; BASTOS, I. A. Bauru: Origens históricas. Bauru: Canal 6, 2015.
36
1913.
BAURU EM TEMAS URBANOS 37
Fazendeiros!...
Todos Podem Ser
Fernando Milanez, autorizado de pessoas competentes para
effectuar a venda de mais DUZENTOS MIL ALQUEIRES de terras, de
PRIMEIRA QUALIDADE, em diferentes pontos das Estações da E.
FERRO NOROESTE DO BRAZIL, no Estado de São Paulo, Continua
A VENDER POR PREÇOS BARATOS LOTES DE TERRAS DE 10,
20, 50, 100 E MAIS ALQUEIRES, Á VONTADE.
Temos terras, á venda, a partir do Rio Feio (Presidente Alves)
até á barranca do Rio Paraná48.
Ribeirão Bauru, se poderia fazer pelas Ruas Araújo Leite e Antônio Alves, que são as
únicas edificadas e continuarão abertas ao tranzito publico”49.
Em reunião do dia 16 de Abril de 1910, a Câmara acata a solicitação de forma
integral, ressalvando que deveria haver passagem livre de pedestres e veículos sobre
uma ponte na Rua Araújo Leite e porteiras de controle na Rua Antônio Alves, a rigor,
os mesmos indicativos constantes no ofício da Companhia Paulista50. Sua aceitação
se dava, até mesmo, porque as obras já estavam finalizadas.
Essa ponte, ainda existente, será a primeira alta e de grande porte executada
na cidade. Juntamente com os trilhos da ferrovia, demarcará e segregará um setor do
extremo norte do Patrimônio, atravessado, a partir daí, apenas pelas duas vias
indicadas acima. Entendemos que a Câmara já dava como certo que outro setor da
cidade, em direção ao leste e no rumo das estações ferroviárias, estava se
desenvolvendo e que a zona triangular da baixada, não faria maior diferença.
Em cinco anos o cenário da cidade muda completamente. Forma-se um dos
maiores entroncamentos ferroviários do país, sendo que Bauru, geograficamente
central no Estado, vê suas perspectivas de crescimento expandirem-se
exponencialmente. A população salta para 10 mil habitantes51.
Recursos da iniciativa privada passam a afluir à cidade desde a chegada da
primeira estação e solidificam-se durante as décadas seguintes do século XX. As
ferrovias Sorocabana, CEFNOB e Paulista, implantadas no espaço urbano, dariam a
Bauru todas as condições necessárias para se desenvolver. Os investimentos
particulares poderiam ter retorno garantido nos vários ramos da construção civil, com
a exploração da infraestrutura, passando-se pelo comércio e serviços. A cidade seria
vista como base real e viável de aplicação dos lucros do café. E tudo havia para ser
feito!
São criadas as atuais avenidas Rodrigues Alves e Pedro de Toledo, ambas
relacionadas às ferrovias52. Também é instalada a telefonia, é construído o Cemitério
da Saudade e o prédio da Câmara, ambos projetados pelo engenheiro João Argenta,
de Lençóis Paulista53. Na década seguinte são implantadas as infraestruturas básicas
49 Oficio enviado à Câmara Municipal pela Companhia Paulista de Vias Férreas e Fluviais. 10 mar.
1910. Arquivo da Câmara Municipal de Bauru.
50 Ata da Câmara Municipal de Bauru. 16 abr. 1910. Arquivo da Câmara Municipal de Bauru.
51 Plano Diretor de Bauru de 1996, p. 17.
52 Ver Capítulo 7: Avenida Rodrigues Alves.
53 NEVES, C. das. No velho Bauru (Crônicas do Bauru antigo). Bauru: Tipografia Comercial, 1961,
p. 106.
BAURU EM TEMAS URBANOS 39
sob concessão pública, como a rede de água, de esgoto e luz elétrica. É estruturada
a Praça Rui Barbosa54 e erguido o primeiro Grupo Escolar. As construções privadas
crescem exponencialmente, assim como os negócios ligados ao comércio e serviços.
A velha tipologia vernacular e com ela a técnica do pau-a-pique somem da zona
urbana e novas edificações ecléticas de tijolos sobre porões são construídas por
mestres de obras, principalmente italianos.
No campo da saúde cria-se a Santa Casa de Misericórdia, em 1911 e a
Beneficência Portuguesa, em 1914, ambas as entidades implantadas em prédios
provisórios. A Santa Casa, sob forma de irmandade, deveria atender aos mais pobres
e particularmente, aos trabalhadores da CEFNOB que sofriam acidentes e contraíam
malária e leishmaniose na construção da ferrovia. De início, a companhia tenta
resolver a situação improvisando hospital de emergência, mas sem conseguir dar
conta do número altíssimo de casos, repassa o problema para o município resolver.
O coronelismo dará as cartas durante a Velha República em todo Brasil e, é
certo, também, na cidade de Bauru. As disputas entre coronéis não diziam respeito,
necessariamente, à nobre arte da política. Poderia até passar por ela, mas o que
estava em jogo era prioritariamente dinheiro. Todas as novas cidades paulistas,
criadas na esteira de imensos cafezais, propiciarão fartos recursos que desaguarão
no espaço urbano. A infraestrutura urbana precisava ser criada, tudo estava por se
fazer. O coronel e seu grupo serão os intermediários no processo, administrarão
diretamente as concessionárias dos serviços ou mesmo através de seus "laranjas".
Atuará na aprovação dos loteamentos, das construções, de novas Posturas, das
arrecadações de impostos e empréstimos municipais. O poder era imenso e o controle
externo quase nenhum. Brigas, empastelamentos de jornais rivais e mortes nessas
cidades acontecerão com frequência, conforme fica expresso nas matérias do Correio
da Noroeste e do Diário Popular, devido aos grandes interesses econômicos aí
envolvidos.
Conseguir o estabelecimento da sede da Comarca, palco onde as disputas
políticas, mortes e principalmente a luta pela usurpação da terra devoluta do Estado
serão definidas, será dos passos cruciais entre as atividades do coronel e de seu
grupo, e praticamente troféu que poucos conseguiriam, como vimos em Bauru. Outro
aspecto relevante era o fato de a Comarca trazer um pouco mais de paz para a região,
moldada sob a força da violência e da bala. Todavia, tal instância era habitualmente
cooptada pelos poderes locais e ficavam longe da necessária imparcialidade atribuída
à justiça, favorecendo grupos de interesse.
O grande fluxo de novos moradores vindos para a construção das ferrovias,
em particular da CEFNOB, encontrará uma cidade com terrenos extremamente caros,
pois, mesmo sob aforamento e sem propriedade plena, era necessário pagar-se uma
joia para sua ocupação, além das demais taxas exigidas pela Fábrica da Igreja. A área
foreira, portanto, era destinada para classes mais altas, comerciantes e profissionais
liberais, única zona a dispor de infraestrutura básica e mesmo assim bastante
precária.
Na década de 1920, em situação muito peculiar, os direitos sobre o
aforamento e todas as relações deles advindas são repassados pela Igreja e sua
Fábrica à empresa privada da cidade denominada Cintra & Cia, pertencente a Antônio
de Almeida Cintra. Em 1942, o comprador da enfiteuse, assim apresenta os motivos
da Fábrica em vender o aforamento na Revista do Instituto Histórico e Geográfico de
São Paulo:
Figura 5: Vistas da cidade de Bauru no ano de 1918. Essas imagens, feitas pela Companhia
Paulista de Estradas de Ferro em um álbum comemorativo onde foca as cidades por onde
passavam seus trilhos, mostram o "melhor" da cidade no período, incluindo-se as estações
ferroviárias da Paulista, Noroeste e Sorocabana
57 Idem p.76.
58 FERRAZ, B. Cidades Vivas. São Paulo: Monteiro Lobato Comp. Editores, 1924. p.53.
BAURU EM TEMAS URBANOS 43
59 Parcialmente baseado no artigo publicado na Revista Mimesis da USC, v.15, n.1, p.69/85, 1994.
60 SILVA, A. Roteiro histórico: Uma cidade e uma instituição. Bauru: Tipografia Comercial, 1957, p.53.
61 PAIVA, C. F. de. Narrativas sintéticas dos fatos que motivaram a fundação de Bauru. Bauru:
Por último, exigia a Câmara Episcopal de São Paulo, que a capela tivesse
condições litúrgicas mínimas para que funcionasse, entre as quais as alfaias e
paramentos. Seria a partir dos recursos advindos do Patrimônio Religioso que se
ergueria a capela e se efetuaria a compra dos muitos itens em metal nobre,
necessários aos cultos, como o crucifixo, castiçais, ostensório, turibulo, cálice, cibório,
teca eucarística, carrilhão, patena, galhetas, lavabo, sacrário, naveta e as muitas
alfaias de tecido. Isso sem falar do altar propriamente dito e das imagens dos santos.
A posição pretendida estava de acordo com os preceitos da Igreja, no ponto
mais alto da primeira doação para formação do Patrimônio, até aquele momento a
única a ter sido ofertada, justamente na divisa de águas do Ribeirão Bauru e Córrego
das Flores. Vale observar que a primeira capela e seu largo são considerados
liturgicamente o espaço e o local de nascimento da cidade, onde futuramente se
estabeleceria a “Matriz ou Igreja Mãe”. Não estavam ao centro do traçado urbano, pois
o procedimento definido pela Igreja havia sido determinado “em lugar alto”, situação
62Livro de Registro de Provisões 1887-1889. Cota 9-1-6. São Paulo: Arquidiocese de São Paulo,
1887-1889, p. 88 e verso, 15 mar. 1888. Pesquisa realizada pelo mestrando Fabrício Forganes Santos.
BAURU EM TEMAS URBANOS 45
que não coincidia com o centro geométrico do Patrimônio. Ao redor do largo da capela
e do templo se dariam as construções mais importantes, como pode ser visto na
tradição colonial portuguesa e brasileira.
É, sobretudo, definição muito diferente daquela relativa à formação da cidade
romana, como exemplo, cujo centro urbano caracterizado pelo “Fórum” se dava no
entroncamento das vias norte/sul e leste/oeste (cardo-decumanus), de forma
independente à topografia. Tampouco possui semelhança com a cidade hispânica
implantada na América, onde havia a Plaza Mayor ao centro do traçado.
Nesse momento a praça não existia conforme nossa concepção atual, era um
largo, grande descampado arenoso, tratado pela população jocosamente de "Saara".
Nele era possível a permanência, com folga, de todos moradores da vila estimados
em 500 pessoas. A Igreja o utilizava para as procissões, quermesses e demais
atividades religiosas. Entretanto, a capela não foi alocada ao centro do largo e sim no
alinhamento daquela que se tornaria importante via comercial, a Rua Batista de
Carvalho, ainda sem ocupação.
Quando o engenheiro da Comissão Geográfica e Geológica, Cornélio Schmidt
passa por Bauru, assim descreve a cidade que consistia basicamente da Rua Araújo
Leite, ocupada há mais tempo devido ter sido uma estrada anteriormente, e o largo
em formação: “Bauru está numa lombada, de espigão comprido, e é só areia. Tem
uma só rua no rumo norte-sul e agora está se formando um pátio perto da Igreja
situada no lado oeste”63.
Schmidt também identifica a característica de solo, que outrora possuía vasta
cobertura vegetal, destruída para a ocupação urbana e plantações ao redor, deixando
nua sua superfície de textura arenosa e facilmente erosiva. Esse será problema de
difícil resolução na cidade até nossos dias, devido à rápida formação de voçorocas na
área urbana. Nos primeiros momentos do Patrimônio, a destruição provocada pelas
águas da chuva buscava ser contida a partir de colocação de sarjetas, no sentido de
reduzir a sua velocidade e preservar as estruturas construídas. As primeiras sarjetas,
inclusive, eram de madeira64.
63 SCHMIDT, C. Diário de uma viagem pelo sertão de São Paulo, realizada em 1914. Anais do Museu
Paulista, São Paulo, v.15, p.337/55, 1961.
64 Relatório da Administração do Município durante o anno de 1917 sendo Prefeito Municipal o
Dr. Luiz Vicente Figueira de Mello. São Paulo: Sessão de obras de O Estado de São Paulo, 1917,
p.64.
46
telhado sejam jogadas para longe das paredes de barro, que por causa do material,
devem evitar o contato direto com a água.
A fachada frontal era composta apenas pela porta de acesso em duas folhas
com verga em arco abatido tipicamente colonial e duas aberturas retangulares ao alto,
logo acima da peça de madeira do frechal, de onde se supõe que não haveria forro
interno. Essas aberturas não são comuns nas capelas brasileiras; estas geralmente
possuem janelas duplas sobre a porta principal, formando, com essa, desenho em
“V”, inexistentes no exemplar bauruense. Todo conjunto seria branco, pintado à cal,
como de praxe, e os caixilhos de madeira em cor viva.
Na cumeeira a cruz deixa clara a função religiosa da obra. Não dispunha de
campanário, substituído por modesta estrutura de madeira independente da
construção, em seu lado esquerdo.
A obra do pequeno templo havia sido trabalho conjunto da comunidade, onde
o congraçamento e união coletiva tiveram papel relevante, possuindo sentido
simbólico importante, muito embora fosse edificação visivelmente provisória.
Até hoje não se encontraram imagens internas, mas a julgar-se pela
simplicidade do externo, as suposições apontam total singeleza.
48
Figuras 6 e 7: Fotografia superior, a Praça Rui Barbosa ainda sem seu ajardinamento com a
velha Capela. À esquerda do templo a Casa Paroquial e ao fundo, à direita, já se vê o primeiro
Grupo Escolar da cidade situado na Avenida Rodrigues Alves e inaugurado em 1913. Abaixo,
em detalhe, a antiga Capela do Divino Espírito Santo de Bauru e sua tipologia vernacular. Não
há identificação de autor ou mesmo data, contudo a foto é anterior a agosto de 1913 quando
o templo é demolido
Figura 8: Imagem do enterro de Azarias Leite, tendo ao fundo a Capela, onde provavelmente
o corpo foi velado
65
Recibo datado de 31 de março de 1895. Arquivo Metropolitano de São Paulo, pesquisado pelo
mestrando Fabrício Forganes Santos.
50
66 A pedra fundamental do edifício foi lançada em 15/11/1907, conforme Jornal O Bauru, 17 nov. 1907.
BAURU EM TEMAS URBANOS 51
67BRASIL. Decreto nº. 119-A, de 7 de janeiro de 1890. Prohibe a intervenção da autoridade federal
e dos Estados federados em materia religiosa, consagra a plena liberdade de cultos, extingue o
padroado e estabelece outras providencias. Diário Oficial da União. 07 jan. 1890.
52
públicos constantes. Mesmo com a separação formal entre Igreja e Fábrica, para o
cuidado com as questões temporais, o vínculo entre ambas era óbvio.
Irineu Bastos (1996) cita alguns Fabriqueiros, todos indicados e de absoluta
confiança do bispo: Francisco Gomes dos Santos (1905); Nelson de Noronha Gustavo
(1907); Manoel Antônio Gandra (1915); André José de Prince (1919) e Padre
Francisco Van der Mass (1921)68.
Deffontaines (1944) assim comenta sobre os padres Fabriqueiros:
Um pouco mais adiante, deixa claro que o Fabriqueiro possuía inúmeras datas
para negócio próprio e que ainda dava preferência a determinados compradores, que
se assenhoreavam de muitas delas com o consentimento do mesmo,
70Oficio encaminhado ao Arcebispado de São Paulo pelo Pároco Cônego Antonio Pereira
Reimão, em 20 de Agosto de 1904. Pasta Bauru II, do Arquivo Metropolitano de São Paulo,
pesquisado pelo mestrando Fabrício Forganes Santos.
54
Tal matéria mostra a rápida valorização das datas urbanas e sua relação com
a chegada das ferrovias e mais ainda, o quanto a Igreja era vista como especuladora
imobiliária de terrenos.
Anos depois, no Correio de Bauru de 23 de setembro de 1917 é possível ler
o seguinte anúncio da Fábrica, assinado por seu Fabriqueiro Manuel Antonio Gandra:
contariam com dispositivo de "resgate", mesmo assim, possível apenas após vinte
anos depois de constituídas.
Há que se apontar também que os líderes nacionais da República Velha eram
majoritariamente membros da maçonaria, com forte tendência anticlerical. Bancarão
a nova Constituição de 1891, na qual a Igreja, depois de séculos, se separa do Estado.
Eram assumidamente anticlericais embora fossem quase sempre católicos. Tinham
embates frequentes com o clero tradicional, de base popular, considerado corrupto,
enriquecido por meios nada transparentes e pouco devotados às determinações
morais da Igreja, entre as quais o celibato.
Na cidade, a presença da maçonaria data de 1889, através da Loja Arquitetos,
vindo posteriormente a Loja Ormuz em 191773, e sua força era significativa na política
e entre políticos.
Em Bauru e na região escândalos sucessivos envolviam o clero, pois alguns
padres tinham amantes e filhos e muitos se enriqueciam, particularmente através dos
aforamentos urbanos. A própria Igreja tinha ciência de fatos dessa natureza a partir
da tentativa forçada de romanização do clero no início do século XX. Visava com isso
disciplinar suas atividades e torná-la menos livre e independente da autoridade da
Santa Sé.
Conforme Aquino (2012, p. 104), até 1908, São Paulo, que era a única sede
de bispado do Estado, cria mais cinco em direção ao interior do Estado em um
processo que o autor chama de “diocesanização”. São elas: Botucatu, Campinas,
Ribeirão Preto, São Carlos e Taubaté.
Botucatu cuidaria de toda zona esquerda do Tietê, praticamente metade do
Estado de São Paulo. Eram múltiplas as intenções da Sede da Província Eclesiástica
com a criação da Diocese. Entre eles a necessidade de cuidar melhor dos bens da
Igreja, particularmente dos Patrimônios Religiosos de cidades que enriqueciam a
olhos vistos, úteis após a Igreja perder o Padroado. Temia-se, também, o crescimento
de outros credos religiosos, como se deu durante a formação das cidades da zona
noroeste a partir da ferrovia, onde as Igrejas Protestantes tiveram papel mais
relevante que a católica74. A catequização dos povos indígenas também seria questão
73 PAIVA, C. F. de. Complemento as Narrativas sintéticas dos fatos que motivaram a fundação de
Bauru. Bauru: Conselho Municipal de Educação de Bauru, 1977, p.63-65.
74
GHIRARDELLO, N. À beira da linha: formações urbanas da Noroeste Paulista. São Paulo: Editora
UNESP, 2002.
56
a ser enfrentada, por ser essa área de ocupação ainda em andamento pelo homem
branco. Não menos importante, era forçar que os párocos e fiéis do “sertão” se
enquadrassem às regras do catolicismo romanizado. Para tanto, é indicado como
primeiro Bispo de Botucatu o ultramontano D. Lucio Antunes de Souza.
Mauricio de Aquino, em seu trabalho sobre o Bispado de Botucatu, informa
que em 1915, D. Lucio escreve carta ao núncio apostólico do Brasil, D. Giuseppe
Aversa, mostrando os problemas relativos ao comportamento inadequado de diversos
padres da região. As situações envolviam amasiamento, quebra do celibato e
participação na política partidária. Dedicou especial destaque ao pároco de Bauru,
Francisco Elias Vartolo,
Pe. Francisco Elias Vartolo – Foi maçon, diz ter renunciado à seita;
vive longos annos amasiado com uma senhora, que faleceu em
companhia dele há cerca de 3 annos (...) Padre Vartolo, in, articolo
mortis, casou-se civilmente no dia 20 de novembro de 1914. Foi
suspenso de ordens e todavia continua a celebrar missas, mas, afinal,
mercê de Deus, submeteu-se as suspensão de ordens75.
(Mestrado) – Faculdade de Ciências e Letras de Assis, Universidade Estadual “Júlio de Mesquita Filho”
(UNESP). Assis (SP), 1992, p. 9.
BAURU EM TEMAS URBANOS 57
79 Oficio encaminhado ao Vigário Geral do Bispado de São Paulo, pelo Pároco Francisco Elias
Vartolo, datado de 10 de Dezembro de 1907. Acervo do Arquivo Metropolitano de São Paulo,
pesquisado pelo mestrando Fabrício Forganes Santos.
80 A justificativa formal para tal fato era a construção da casa paroquial contigua. Jornal O Bauru. 08
mar. 1910.
58
deixadas cada vez mais de lado. A posição da capela no importante espaço público
paulatinamente perdia sentido, ainda mais por interromper aquela que se transformara
na principal rua comercial, acesso às estações.
A mudança de vocação dessa fração urbana relaciona-se como a
transposição do espaço sacro, o “Largo da Igreja”, para o espaço laico, a “Praça
Municipal”81. Se antes, na cidade colonial e mesmo durante o Império, o largo continha
as igrejas do clero ou das ordens religiosas, com o advento da República, as agora
denominadas Praças Municipais tornam-se espaços ajardinados, frequentemente
ostentando edifícios públicos da nova ordem política e social: estação, grupo escolar,
fórum, delegacia, correio, etc.
Sem entendimento entre as partes, a capela e seu terreno são declarados de
utilidade pública e em 13 de agosto de 1913, o templo é posto abaixo à força pela
Câmara Municipal. Significativamente entre os vários argumentos utilizados pela
edilidade para o desmonte consta o cumprimento das Posturas Municipais, em função
de problemas estruturais na edificação, habitualmente relegadas pela própria Câmara,
porém útil em situações como esta.
O vigário à época, Frei Felicíssimo, assim descreve o fato no Livro de Tombo
da Paróquia:
& Oliveira de São Paulo executa o coreto; o lago, bem como o paisagismo, ficam a
cargo da Manzo & Casadio, também de São Paulo85.
A nova praça municipal, inaugurada em 1914, ainda na gestão do prefeito
Manoel Bento da Cruz, é destinada, basicamente, pela sua forma e equipamentos, à
eventos mundanos em detrimento das atividades religiosas. Sua concepção segue
padrões formais corretíssimos para a época e a sofisticação de todo projeto contrasta
com a pobreza arquitetônica do entorno e de Bauru. Mesmo os elementos em ferro
fundido, como coreto e bancos jamais serão igualados em qualquer outro espaço
público da cidade.
A iluminação era fornecida a partir de altos e elaborados postes ornamentais
em ferro fundido, possuindo, cada um deles, três lâmpadas a arco voltaico, em
quantidade maior que qualquer outro ponto local. Todo equipamento que os fazia
funcionar era importado, assim como as luminárias e lâmpadas. Os postes decorativos
eram nacionais, fabricados pela Companhia de Fundição do Rio de Janeiro; estes, até
o ano de 1917, mesmo com notificação judicial, não tinham sido pagos pela Câmara,
devido a seu custo elevado86. São similares aos utilizados na Avenida Central do Rio
de Janeiro, cuja iluminação foi inaugurada em 1905 e também aos da Avenida Beira
Mar, aberta um pouco depois, que também contavam com tecnologia estrangeira para
o funcionamento87.
O grande lago com capacidade para 337.000 litros era maior que o
reservatório para fornecimento de água à população. Possuía desenho orgânico e
tentava imitar um lago natural com seu desenho sinuoso, bordas arredondadas e
pedras falsas em concreto. Sobre ele estavam dispostas duas pontes também em
concreto armado, que utilizavam uma técnica de ornamentação rústica comum nos
jardins da época, onde a estrutura e, particularmente, os guarda-corpos, imitavam
troncos e galhos de árvore. As alamedas eram pavimentadas com asfalto e pó de
pedra, sendo os únicos passeios públicos a possuírem calçamento em Bauru.
A vegetação implantada formada por plátanos, alfeneiros, magnólias, buxos e
roseiras se constituía, em grande maioria, de espécies exóticas e criava,
85 Jornal O Bauru, 14 set. 1913. Originalmente no Núcleo de Pesquisa História da USC, pertencente
a coleção Gabriel Ruiz Pelegrina.
86 Relatório da Administração do Municipio durante o anno de 1917 sendo Prefeito Municipal o
Dr. Luiz Vicente Figueira de Mello. São Paulo: Sessão de obras de O Estado de São Paulo, 1917,
p.45.
87 História da iluminação no Rio de Janeiro, A modernização da metrópole. Revista Iluminação Brasil,
Rio de Janeiro, Ano 03, n°. 14, Capitulo IV, mar./abr. 1989, p.47.
BAURU EM TEMAS URBANOS 61
embora a autoria da arquitetura seja incerta, é sabido que Guido Padovani realmente
ergueu a Igreja Matriz como mestre de obras.
A Matriz, assim como a imensa maioria das novas Igrejas Católicas
construídas no país entre o final do século XIX e início do XX, seguirá a vertente
determinada pela Igreja Romanizada, buscará inspiração na idade média,
Assim como a primitiva Capela, não existem muitas imagens onde a antiga
Matriz do Divino Espírito Santo possa ser vista em detalhes, em quase todas o templo
está presente como parte da Praça Rui Barbosa e raramente é protagonista. O fato é
bastante curioso porque nas cidades do interior a Matriz era alvo frequente de
fotografias e cartões postais. Em Bauru, a Praça parece ter cumprido esse papel,
eternizada em diversos ângulos, sendo grande parte deles voltados ao imponente
Automóvel Club e, muitos, a partir da torre da Matriz.
Acreditamos que os conflitos gerados pelo aforamento, e sendo o templo sua
representação física, gerava certa restrição à Igreja Católica na cidade; também é
válido apontar que a pouca imponência da edificação contribuísse para que a mesma
estivesse ausente como foco da maioria das imagens. Mesmo assim, a partir de um
grupo de fotografias da Praça, da Batista de Carvalho e da Rodrigues Alves,
analisaremos a sua arquitetura.
Não fosse pela torre, a estrutura neogótica da Igreja passaria despercebida
no conjunto da quadra. Se comparada com outros templos das cidades ao redor, como
Jaú, por exemplo, a nova igreja deixava a desejar para uma urbe que crescia de forma
expressiva e se impunha como centro regional.
O conjunto era acanhado, possuía recuos laterais e frontal, onde era disposta
a escadaria principal; junto ao passeio havia mureta com gradil fechando o terreno da
igreja. A entrada se dava pelo centro da fachada do edifício em um nicho em forma
de tímpano, abaixo do corpo da torre. Essa era baixa, meio atarracada, impressão
ampliada devido aos falsos contrafortes dispostos ao seu redor. Nas laterais da torre
dois corpos simétricos proeminentes de três faces fechavam o conjunto de
ornamentação neogótica bastante discreta. Todas as aberturas possuíam arco ogival,
além de ao menos três pequenas aberturas circulares. A torre, dividida em quatro
sessões horizontais, era arrematada por estrutura piramidal octogonal coberta por
metal e encimada pela cruz.
Figura 9: Praça Rui Barbosa. Parte do Jardim Público em imagem poucos anos depois de
encerradas as obras. Foto de 01/01/1916, Fotografo Tognetti. Anos depois os postes da praça
irão para a Machado de Mello
Figura 10: Praça Rui Barbosa, vista da torre da matriz. Em primeiro plano a Praça Rui
Barbosa, ao fundo o Automóvel Club e a antiga Câmara Municipal, a sua direita. Foto,
provavelmente, da década de 1940
A planta era em cruz latina com transepto, tendo a ábside, também facetada,
voltada para a Avenida Rodrigues Alves. Sua pequena dimensão e capacidade farão
com que, passados alguns anos, se cogite em reformas e ampliações, sendo
finalmente demolida quarenta anos depois.
Não conseguimos fotos internas, mas acreditamos que a matriz possuísse
nave única intuída a partir do telhado simples em duas águas. Não havia cúpula ou
mesmo forro de estuque em abóbada de cruzaria, como era típico nesse tipo de
edificação.
A nova Praça Municipal reforçará a importância da Rua Batista de Carvalho
que passará a abrigar o comércio de relevo à custa da perda de interesse da Araújo
Leite. Mesmo os hotéis, inicialmente localizados nessa via, se transferem para a
região da nova Praça Machado de Mello, outro grande areão vazio criado como área
livre para carga/descarga e embarque/desembarque em frente à estação da NOB.
66
Figura 11: Fotografia da antiga Matriz do Divino Espírito Santo, em linguagem neogótica, vista
a partir da Praça Rui Barbosa. Foto sem data especificada
Como não poderia deixar de ser, a demolição da capela leva a Igreja a acionar
medidas judiciais91 que resultariam na obrigatoriedade do pagamento, por parte do
município, dos almejados quinze contos de reis exigidos como indenização pela
Capela, praças e ruas da cidade92, condição a contragosto, ratificada pela Lei
Municipal nº. 85 de 12/08/2014.
A partir de então, o jardim público da Praça Municipal torna-se um espaço de
especial cuidado, como se verifica no Relatório da Administração do Município de
1917, a vegetação era zelada pelo jardineiro Victorino Cardoso que tratava da
adubação e da rega das “plantas mais delicadas”. No período, reparos foram
realizados no coreto, os postes foram pintados e, embora os caminhos precisassem
de algum reparo em seu recobrimento, devido ao alto custo do pixe, o serviço estava
à espera de “uma baixa de preços”93. No mesmo Relatório aponta-se que a Praça
possuía custeio próprio no valor de 600$000 e que a cidade toda contava com 275
lâmpadas para iluminação pública e só o Jardim dispunha de 32 dessas94.
Em 1923, logo após a morte de Rui Barbosa, um dos autores da nova
Constituição de 1891, a praça receberá seu nome, mantido até os dias atuais,
reforçando a identidade republicana do espaço95.
Desde a inauguração o lugar torna-se o centro de convivência social local,
ponto de encontros após as missas, das retretas das bandas musicais no coreto, dos
corsos carnavalescos, quermesses beneficentes e dos passeios com as crianças que
se entretinham com os peixes e, muito depois, com os jacarés do lago. Era um espaço
para ver e ser visto, livremente aberto e sem grades, relativamente acessível, pois
aceitava a quase todos desde que estivessem "decentemente vestidos" 96 e tivessem
comportamento adequado dentro das regras sociais do período. As exceções,
conforme o Código de Posturas de 1928 ficavam por conta dos “mendigos” e
“ciganos”97. Esses, logo ao chegar à cidade e quando descobertos, eram rapidamente
91 BAURU. Processo nº. 245, de 19 de agosto de 2013. Autos de embargo de obra nova, fábrica da
matriz do Divino Espírito Santo de Bauru x Câmara Municipal de Bauru. Cartório do Primeiro Oficio
de Bauru.
92 BAURU. Atas da Câmara Municipal de Bauru, 30 de julho de 2014, pertencentes ao seu arquivo.
Dr. Luiz Vicente Figueira de Mello. São Paulo: Sessão de obras de O Estado de São Paulo, 1917.
94 Idem, p. 78.
95 Serão bastante comuns, em muitas cidades, as denominações de praças centrais ligadas ao novo
1991.
70
Figura 12: Prédio da Agência do Correio, ainda existente, em foto sem data, provavelmente
dos anos 1930
102 A velha matriz está sendo demolida!. Jornal Diário de Bauru. 07 mai. 1955.
103 É difícil construir uma catedral. Jornal Correio da Noroeste. 27 ago. 1967.
BAURU EM TEMAS URBANOS 71
104 Idem.
72
Figura 13: Estrutura em concreto armado da futura Catedral do Divino Espírito Santo. Na
imagem ainda se vê parte do muro frontal da antiga Matriz neogótica
105 Idem.
BAURU EM TEMAS URBANOS 73
106 Idem.
107 Idem.
108 BASTOS, I. A. Falcão/Independência, Nossa gente e nossa história. Bauru: Document Center
Figura 16: A nova Praça Rui Barbosa tendo ao fundo o coreto e a Catedral
margem esquerda. Ribeirão das Flores, Córrego Água Comprida e Vargem Limpa, à
direita do Ribeirão Bauru111.
Com o tempo, nas encostas serão estabelecidos loteamentos entre os cursos
d’água. Tais vilas, formadas a partir de pequenos sítios e chácaras, geravam espaços
desconexos entre si tendo em vista a inexistência de parâmetros urbanísticos
municipais que apontassem sua agregação. Cada uma das encostas onde se
formarão as vilas possuirá relativa independência das demais, em função da ausência
de ligações físicas para a transposição dos córregos. Quando existiam passagens,
eram precárias e direcionadas ao centro da cidade, sendo que em muitas situações a
ferrovia reforçará tais barreiras naturais. Em um segundo momento, somar-se-á às
barreiras naturais e às da ferrovia, aquelas das rodovias.
Em relação ao relevo, as diferenças entre as cotas de nível na área urbana
não são expressivas, saindo dos 500 metros na região do Ribeirão Bauru e chegando
a uma máxima de 615 metros no local onde funcionará o Aero Club em trajeto de
quase quatro quilômetros em linha reta.
A primeira implantação pela Câmara, em caráter oficial, fora do Patrimônio e
dos limites urbanos, ocorre em 1908, quando é inaugurado o Cemitério da Saudade.
A obra se efetivou graças à doação da gleba por João Henrique Dix, que de forma
triste e curiosa, após se matar, acabou por ser seu primeiro ocupante. A edilidade
fechará o cemitério construído pela Igreja anteriormente à emancipação política,
considerado espaço precário que nunca chegou a receber um muro de fechamento,
apenas cerca. Agora haveria outro, laico, gerido pela Câmara Municipal, onde todos
poderiam ser enterrados sem as restrições religiosas do campo santo anterior.
A exigência de sua posição além dos limites urbanos estava expressa nos
Códigos de Posturas do período, que atendiam ao primeiro Código Sanitário Paulista
do final do século XIX. Tais determinações ainda se pautavam pela Teoria dos
Miasmas, popular a partir do século XVII, onde se acreditava que a putrefação exalava
odores fétidos que causariam doenças, por isso a distância da cidade.
Para acesso ao Cemitério da Saudade, a Rua Primeiro de Agôsto será
estendida até seu portão principal. A partir da expansão, junto à via, ocorre rápida
ocupação, não caracterizada como parcelamento, fato que, pelo visto, se sobrepôs
aos temidos e superados princípios miasmáticos. Esse talvez seja o primeiro exemplo
112 BASTOS, I. A. Falcão/Independência, Nossa gente e nossa história. Bauru: Document Center
Xerox-USC, 2002, p.14.
113 Jornal O Bauru. 13 nov. 1915.
114 Idem, p. 14.
82
a venda tendo em vista a redução do custo total. As medidas também eram modulares
no sentido de perfazerem quadra de 88x88 metros e geralmente possuíam dimensões
de 11x22, 11x33 e 11x44 metros. Tais parâmetros serão utilizados na maioria dos
novos parcelamentos, buscando ampliar abrangência de compradores. Fato que se
manterá é a valorização do lote de esquina, devido à situação favorável para eventual
uso comercial.
Figura 17: Planta cadastral de Bauru, organizada por ordem da Prefeitura, 1924. Nela já se
veem fora da área do patrimônio inicial, à direita, a Vila Falcão, e à esquerda, a Vila Antárctica,
bem como o Cemitério da Saudade no prolongamento da Rua Primeiro de Agosto
Esse novo grupo de pessoas que acorre a Bauru com a mudança da sede da
NOB, chega a mudar o panorama da cidade, até mesmo em seu aspecto cultural,
fazendo da década de 1920 momento único na vida artística local.
A Vila Falcão, como novidade, possuía o fato de as terras poderem ser
compradas livremente de sua proprietária sem a interveniência da Igreja. Dessa forma
inauguram-se, com ela, as relações abertamente capitalistas na ocupação urbana de
Bauru, fato que se dará em todos os outros parcelamentos seguintes. Sua localização
será além dos cursos d'água e ferrovias, o que tornava seus lotes baratos para os
mais pobres. Contudo, mesmo ela, por causa do crescimento da cidade nos anos
BAURU EM TEMAS URBANOS 83
1920, também tem seus preços elevados: “Com o encarecimento dos terrenos e
habitações, a Villa Falcão, perto das Officinas da Noroeste, toma impulso, subindo a
dois, tres contos o valor de uma data de terra”115.
A proximidade das companhias ferroviárias fazia com que a Falcão fosse
escolhida como local de moradia para os funcionários menos qualificados das
empresas. Embora a NOB, Paulista e Sorocabana dispusessem de vilas ferroviárias
próprias, elas de forma alguma darão conta de atender ao número crescente de
funcionários. Ali residiriam apenas os mais qualificados e próximos às políticas
internas das empresas.
Com a construção das grandes oficinas da NOB, formada por vários galpões
industriais para a construção de vagões de madeira, no início da década de 1920,
outros loteamentos surgirão junto e ao redor da Vila Falcão, como a Vila Souto, para
abrigar a grande massa de operários, dessa que pode ser considerada a maior
unidade fabril da cidade até nossos dias.
Desde a implantação das ferrovias, uma característica da geografia local é
reforçada. Devido à situação dos trilhos em baixada, junto aos cursos d'água, as novas
áreas parceladas, localizadas em direção ao norte, oeste e parcialmente a leste terão
que transpor as esplanadas, os trilhos de ferro e a água, situação que por si só
desvalorizaria todos esses novos setores urbanos.
Deve-se frisar que as esplanadas das ferrovias em Bauru, especialmente a da
NOB, junto às várzeas, terá proporção maior do que em qualquer cidade do interior,
devido ao porte da Companhia. A área será sucessivamente ampliada, em particular
quando as três empresas, Sorocabana, Paulista e NOB ocuparem o mesmo prédio
central pertencente à NOB, em 1939 e todas as composições dali passarem a sair e
chegar.
115 FERRAZ, B. Cidades Vivas. São Paulo: Monteiro Lobato & Comp. Editores, 1924, p.53.
84
Figura 18: Parte das Oficinas da NOB em Bauru, imagem sem data definida
116
Atas de Câmara de Bauru. 19 set. 1908.
117GHIRARDELLO, N. Aspectos do Direcionamento urbano de Bauru. 1992. 196 f. Dissertação
(Mestrado em Arquitetura) – Escola de Engenharia de São Carlos, Universidade de São Paulo. São
Carlos (SP), 1992, p. 120.
BAURU EM TEMAS URBANOS 85
criava pequenos ramais até a área de produção das unidades fabris, e terras de baixo
custo, favorecerão as grandes construções industriais.
O nome do bairro vem justamente da primeira fábrica ali instalada na década
de 1920. Posteriormente são estabelecidas as Indústrias Reunidas Francisco
Matarazzo, depois a Anderson Clayton, na década de 1930 e, por último, a Tilibra. A
partir da Antárctica outras vilas se formarão seguindo-se a estrada para Pederneiras
como indução, entre as quais Vila Cardia, das Flores e Santo Antônio.
A ligação da Vila Antárctica com o Patrimônio se fazia pela antiga Rua Tupy,
atual Marcondes Salgado, que transpondo o Córrego das Flores, daria acesso a esse
setor manufatureiro e fabril. Tal via era caminho para Pederneiras e talvez por esse
motivo tenha recebido rápida ocupação.
Também na região seria implantado, no ano de 1927, o Quarto Batalhão de
Polícia Militar do Interior, na época denominado de Quarto Batalhão de Caçadores. O
agrupamento cuidaria da manutenção da ordem na cidade e em toda a região
Noroeste e Central do Estado, se defrontando, principalmente, com problemas
voltados às disputas pela terra e grilagem.
Com usos assemelhados ao da Vila Antárctica, se encontrará o setor do
Patrimônio situado entre a linha da Companhia Paulista, Córrego das Flores e o
Ribeirão Bauru, área segregada pela empresa que fechou diversas vias com seus
trilhos118. A zona, que forma um desenho triangular, situada em baixada e sujeita a
alagamento, conterá datas a preços módicos e se prestará à construção de galpões
de beneficiamento e manufaturas. A única via que fugirá desse tipo de ocupação será
a Rua Araújo Leite, em função do pontilhão ali implantado pela Paulista, que a
manteve como eixo de relevo.
A Villa Bella, em direção ao norte, possui referências desde 1925 quando
podem ser vistas no Diário da Noroeste propagandas de seu lançamento. Os pontos
de destaque do anúncio diziam respeito ao fato de estar próxima às oficinas da
Noroeste119, bem como possuir lotes que poderiam ser pagos à prestação.
Também a Vila Seabra, ao norte, na baixada onde a Rua Araújo Leite se
iniciou, já havia sido criada pelo coronel Alves Seabra. No ano de 1927, contava com
trinta e cinco habitações, estando cinco em construção120.
Figura 19: Planta de Bauru, 1930. Nele já se encontram vários bairros ao redor do núcleo
formador da cidade
Esse será um dos loteamentos aonde seu proprietário irá, futuramente, fazer
reloteamento de quadras no sentido de dispor terrenos de dimensões menores,
variadas e voltados a todas as ruas ao redor, no sentido de facilitar a venda.
Pode-se dizer que antigas estradas que iam para as cidades vizinhas foram
fatores de indução na criação de novos bairros, como ocorreu em relação à Vila
Antárctica. Constantino (2008)126 nos esclarece sobre estradas que se tornaram vias
urbanas, como a Rua Floresta, antigo caminho para Iacanga; Rua Salvador Filardi que
se dirigia para Duartina e Avenida Elias Miguel Maluf no rumo da Fazenda Val de
Palmas.
Nesse momento, as estradas de terra, longe de representarem obstáculo à
expansão urbana, agregavam às suas margens algum tipo de comércio e serviços
esparsos que, com o passar do tempo, se integrariam aos loteamentos lançados em
suas cercanias. Ou seja, de início eram fatores de atração e de indução de
crescimento. Sua preexistência se manifesta nos novos parcelamentos sob forma de
vias que fogem ao traçado reticulado, por vezes cortando-o com um desenho diverso.
Com isso pode-se deduzir que nesses caminhos já havia algum tipo de construção
precedente, absorvida pelo novo parcelamento devido aos interesses ali já
estabelecidos.
125 BAURU. Certidão de Registro da Villa Santa Thereza. Secretaria de Planejamento (SEPLAN).
Prefeitura Municipal de Bauru.
126 CONSTANTINO, N. R. T. A construção da paisagem dos fundos de vale em Bauru. In: FONTES, S.
Fonte: Certidão de Registro da Villa Santa Thereza. Arquivo SEPLAN, Prefeitura Municipal de
Bauru.
para a Zona Noroeste Paulista: “Por ali transitam dia e noite, os moradores das duas
villas situadas além do córrego "Bauru" a Villa Seabra e a Villa Formosa”127.
A infraestrutura de água, esgoto, energia elétrica e telefone da cidade,
bastante deficiente, obviamente não acompanhava tamanha expansão. O processo
se inicia a partir de capitais locais que formam empresas amadoras, sem qualquer
condição técnica e raramente prestarão serviços condignos. Eram viabilizadas apenas
para lucrar rapidamente e, sem exceção, recebiam reclamações da população. As
empresas rapidamente mudavam de mãos, seja devido à troca do poder político, seja
por conta de pressões devido aos maus serviços ou mesmo por “quebrarem”. Aos
poucos são formadas empresas maiores, um pouco mais profissionais, que absorvem
as pequenas das diversas cidades, possibilitando integração dos sistemas, em
particular quanto à energia elétrica.
Ainda no início da década de 1920, a empresa de eletricidade local, chamada
Empresa de Eletricidade de Bauru, será comprada pela Companhia Paulista de Força
e Luz surgida em 1912, e adquirida em 1927 pela American & Foreign Power (Amforp)
até 1964, quando passa para o sistema Eletrobrás128.
Os telefones, desde 1910, quando se iniciam os serviços na cidade, estavam
a cargo da Empreza Telephonica Bauruense que, após alguns anos, é incorporada
pela Cia. de Eletricidade de Bauru, saindo a posterior da esfera das pequenas
sociedades municipais para a Companhia Telefônica Brasileira, originalmente
Brazilian Telephone Company, de capital canadense, em processo de concentração
das outrora pequenas empresas transformadas em gigantes de seu ramo.
A partir do início dos anos 1920 os serviços de água e esgoto, implantados na
década anterior pelo Engenheiro Saint Martin da NOB, através da Companhia Água e
Esgotos de Bauru, são arrendados à Empresa Barros, Oliva e Cia. Ltda., que também
geria o sistema em Corumbá, no atual Mato Grosso do Sul. Entretanto, os trabalhos
continuam tão deficientes quanto antes e recebem repetidos protestos da população.
Em 1927, a Câmara Municipal autoriza a Prefeitura a encampar os serviços 129, porém,
faltavam os recursos para tanto. Foi apenas na gestão de Ernesto Monte que vieram
Entretanto, sua anexação à área urbana ocorria quando a ocupação das vilas
alcançasse número significativo de pessoas. É o que sucede com as Vilas Seabra,
Jardim Bela Vista, Camargo, Santa Thereza Vieira, Gimenez, Ascensão, Bom Jesus,
Bela, Formosa, Chácara das Flores e Chácara Noroeste que possuíam moradores já
no final dos anos 1920, contudo são incorporadas ao Patrimônio apenas com a Lei
Municipal n°. 74, de 1937135. Interessante observar que a lei aponta, em seu Artigo 1°,
que a anexação ocorria ao mesmo tempo em que ficavam “aprovadas as plantas” das
vilas, o que significa que a autorização municipal para sua comercialização não havia
ocorrido anteriormente, mesmo que já estivessem parcialmente povoadas.
A ausência de exigências legais relativas às contrapartidas de infraestrutura
mínima impulsionou a conversão dos alqueires de fazendas, sítios e chácaras em
metros quadrados de loteamentos, tornando-o negócio bastante rentável. Frise-se que
tais parcelamentos não precisavam estar situados, necessariamente, dentro do
perímetro urbano. Poderiam ser estabelecidos fora de tais limites com todas as
características e dimensões de quadras e lotes urbanos, pois não havia lei que
impedisse tal situação.
Também era desnecessária a implantação de equipamentos urbanos,
comunitários ou espaços livres de uso público, como se exige atualmente. Quando
muito as vias eram consideradas "áreas de doação". Por vezes uma praça constava
de projeto, no sentido de valorizar o parcelamento, contudo, ao menos até 1947, como
veremos adiante, sob livre arbítrio do loteador.
Bastava um engenheiro ou topógrafo desenhar o bairro que seria formado por
ruas, quadras e lotes para o mesmo poder ser vendido. Nem sempre o registro em
cartório era no mesmo período, conforme se pode observar na Vila Antárctica,
registrada apenas no ano de 1938136 e considerada existente desde o final da segunda
década do século XX.
O impacto ambiental das implantações era fator totalmente desconsiderado:
a mata original era derrubada, especialmente em parcelamentos mais próximos ao
Patrimônio. Se a gleba estivesse às margens de cursos d’água, os traçados dos
loteamentos chegariam até seus limites. Aspecto absolutamente desconsiderado era
o das várias nascentes, ou olhos d’água, que em sua somatória formavam os
135 BAURU. Lei n°. 74 de 23 de junho de 1937, anexando ao patrimônio municipal as ruas de diversas
Villas.
136 Registro da Vila Antárctica. Cópia arquivada na DEPLAN.
BAURU EM TEMAS URBANOS 93
Figura 21: Vista aérea de Bauru, provavelmente do final da década de 1940. À direita parte
do Jardim Bela Vista e ao fundo a baixada da Vila Falcão. A região com maior número de
construções é o centro da cidade e em direção ao alto da imagem a ocupação ao sul, os Altos
da Cidade
Fonte: AZEVEDO (1950, p. 144) (Imagem atribuída pelo autor ao Diretório Regional de
Geografia de São Paulo).
Figura 22: Mapa de Bauru, 1940. Notar a relação entre linhas ferroviárias e parcelamentos
140 ROLNIK, R. A cidade e a lei: legislação, política urbana e territórios na cidade de São Paulo. São
Paulo: Nobel, FAPESP, 2003, p. 203.
141 Plano Diretor de Bauru de 1996, p.17.
142 Guia Bauruense. Publicação Anual, Setembro de 1949, p. 70 e 71, Acervo do NUPHIS.
BAURU EM TEMAS URBANOS 99
Em 1953, durante o aniversário da cidade, nova alcunha vai ser dada para
Bauru "Cidade Sem Limites", que passou a substituir a "Capital da Terra Branca".
Conforme Losnak (2004), ela foi criada pelo jornalista Euzébio de Carvalho em poema
publicado no Diário de Bauru. Seu autor, depois de muitos anos, relatou que o
cognome surgiu em função do “crescimento desordenado dos núcleos populares, pois
Bauru possuía muitas vilas nos lugares mais extremos da cidade"143. O epíteto, assim
como o anterior, refletia claramente a situação real observada por todos os moradores
independentemente de sua formação.
Para as classes menos privilegiadas, ou mesmo investidores, serão criados
diversos loteamentos populares em áreas sem qualquer infraestrutura urbana e
voltadas à investimentos a médio e longo prazo. É o caso do Parque Bauru e do
Jardim Carolina, vendidos pela Morato Investimentos Imobiliários e lançados nos anos
1950. Entre as dezenas de adquirentes do Loteamento Parque Bauru, por exemplo,
divulgada juntamente com a propaganda dos bairros no jornal Folha do Povo, grande
parte é formada por moradores de São Paulo e outras localidades do interior 144,
atestando que a compra de terrenos na cidade era também investimento para
preservação de capital diante da inflação e não para construção imediata.
Dessa maneira, nos dias atuais, ainda existem no solo urbano áreas loteadas
nos anos 1950 que estão sendo ocupadas, mais de 70 anos depois, como as Vilas
Aviação A e B, Jardim Santos Dumont, Jardim Mary, na zona sul da cidade. O Plano
Diretor de 1996 apontava o mesmo em relação a parcelamentos como: Santa
Edwirges, Parque Jaraguá, Jardim Carolina, Parque Bauru, Vila Santa Rosa, Parque
Vista Alegre, Parque Giansante, Vila São Paulo145 e outros. Vários deles só serão
abrangidos pelo perímetro urbano muito posteriormente a sua criação, com a Lei nº.
2.118/79146.
A rigor, percebe-se que os parcelamentos em direção ao Norte, Noroeste e
Sudoeste ocorreram de forma livre após a travessia dos cursos d'água e ferrovias e
se contiveram apenas onde as declividades do terreno começam a se acentuar.
Ocorre que a grande totalidade da área urbana da cidade está situada em declividades
que vão de 0 a 12%, consideradas relativamente planas, conforme a Carta Geotécnica
de Bauru elaborada pelo IPT147. Contudo, nas zonas apontadas acima até os limites
do município, as inclinações sobem para 20% ou mais, sendo também bastante
erosivo, o que ajuda a explicar, em parte, a ausência de parcelamentos nesses
setores. Por outro lado, as regiões nordeste, leste, sudoeste e sul, até às divisas com
as cidades vizinhas, conservam extensas áreas fora dos limites urbanos com
declividade de 0 a 12%.
Outro aspecto a se considerar é a ocupação radial da cidade, sempre a partir
do centro em direção aos bairros. O desenho do sistema de transportes públicos
reflete essa situação, com a passagem obrigatória de quase todos os itinerários pela
Avenida Rodrigues Alves. A criação das novas vias se deu do centro em direção às
ocupações urbanas ao redor do Patrimônio inicial a cidade. A ligação entre os bairros,
por sua vez, tornou-se um problema secundário a ser resolvido posteriormente.
Certamente a urbanização "livre e espontânea” da cidade, definida pelo mercado de
terras e sua evolução a partir do relevo e das antigas estradas que iam para as cidades
e fazendas vizinhas, ajudam a explicar seu desenho radial.
Salienta-se que o processo de parcelamento pelo mercado está longe de ser
apenas local, ocorreu na maioria das cidades brasileiras e em cada uma delas com
suas características próprias em função do relevo, desenho urbano, ferrovias,
rodovias e outras características locais, mas, particularmente, devido à frouxidão ou à
inexistência de leis específicas sobre a divisão do solo urbano. Tais normas
começarão a aparecer apenas no final da década de 1970, como a Lei Federal nº.
6.766 de dezembro de 1979, que trata do parcelamento do solo urbano e define
porcentagem de áreas públicas, infraestrutura mínima a ser implantado pelo loteador,
preceito conhecido como Lei Lehmann. Esta logo será acompanhada em Bauru pela
Lei Municipal 2.339/82 - Normas para Parcelamento, Uso e Ocupação do Solo, que
passou a exigir algumas contrapartidas dos loteadores148.
A legislação mais severa relativa aos parcelamentos urbanos, a partir da
década de 1980, melhorou as condições de habitabilidade e retirou do poder público
parte do ônus que recaía sobre ele na implantação da infraestrutura. Entretanto, todos
os serviços implantados pela iniciativa privada tinham o custo repassado
inevitavelmente ao comprador. Dessa forma, paradoxalmente, os preços dos terrenos
dos novos loteamentos, mesmo aqueles em regiões menos valorizadas, cresceram
A Zona Sul foi o único setor que não possuiu qualquer obstáculo relacionado
à paisagem natural para a sua expansão ilimitada, a partir do Patrimônio Religioso
que constituiu o início da cidade. Não havia cursos d'água, topografia acidentada,
trilhos ferroviários ou qualquer outro impedimento físico, o qual ocorrerá apenas
muitos anos depois e em situação longínqua, com a Rodovia Bauru-Ipaussu (SP-225).
Diante de topografia levemente ascendente em continuidade com a do centro,
se desenvolverão os parcelamentos destinados às classes mais altas da cidade.
Ainda devido a essa continuidade, a maioria dos novos loteamentos possuirá o
mesmo tipo de malha do centro urbano, seguindo o traçado da área inicial do
Patrimônio.
Esse é o motivo principal que explica historicamente a valorização imobiliária
do sul de Bauru e não como se supõe, de forma geral e equivocada, que "o sul", por
si só, é fator de atração para as zonas nobres das cidades em geral. Tal situação é
explicada pela história, usos, topografia e características de cada um dos espaços
urbanos e não condição posta e determinante, como frequentemente se ouve.
Os investimentos, tanto os privados como os públicos, ocorrerão a partir dos
anos 1920 e de forma sequencial, levando para o sul as construções mais importantes,
públicas e privadas, aproveitando-se ainda da situação mais alta, ventilada e salubre
da região, naturalmente mais desejada e valorizada.
Nessa zona será construída a Beneficência Portuguesa, com projeto
neocolonial de Ricardo Severo, em 1925; o Externato e depois Colégio São José
destinado às filhas das elites na década de 1920; o Colégio Guedes de Azevedo,
criado em 1925 na Batista de Carvalho, que transfere sua sede para grande prédio na
Rua Antônio Alves.
104
que constituídos por diversos e pequenos loteamentos individuais como Vila Noemy,
Vila Santa Thereza, Vila Mesquita, Vila Regis, etc.
Altos da Cidade certamente era um título considerado adequado visto à cota
de altitude mais elevada, mas também em virtude dos costumes vigentes. Contrastava
deliberadamente com as áreas de baixada da cidade, em relação às características
topográficas, mas, sobretudo, morais. Deve-se apontar que o posicionamento da
antiga zona do meretrício era próximo à estação da Paulista e ao Ribeirão Bauru.
Na poesia Bauru criada na década de 1920, Rodrigues de Abreu (1897-1927)
assim apresenta a diferenciação entre os bairros da cidade, incluindo-se a beleza
emanada dos bairros nobres e a diversão "proibida" na zona boêmia:
Cidade de espantos!
Eu canto a estesia suave dos teus bairros chics,
as chispas e os ruídos do bairro industrial,
a febre do lucro que move os teus homens nas ruas do centro,
e a pecaminosa alegria dos teus bairros baixos
(...)
Recebe o meu canto, cidade moderna!150
150 Poemas Rodrigues de Abreu. Portal São Francisco, 2020. Disponível em:
<https://www.portalsaofrancisco.com.br/obras-literarias/poemas-rodrigues-de-abreu#16>.
151 Certidão de Registro de Imóveis. DEPLAN, Prefeitura Municipal de Bauru.
152 Jornal Diário da Noroeste, 10 nov. 1925.
106
Bauru” de 1930 (ver figuras). Sua gênese fica expressa quando se verifica o desenho
do loteamento da Vila Santa Thereza, onde se veem demarcadas três de suas
quadras. Nele, até mesmo a denominação "Avenida Duque de Caxias", já se encontra
grafada. Não conseguimos dados sobre quem determinou a criação da via, pois não
foram encontrados documentos a respeito. Acreditamos que tenha sido uma decisão
da Prefeitura, contudo não há como afirmar. O certo é que na aprovação dos
loteamentos seguintes em direção a leste e oeste, a via continuou sendo exigida e a
somatória geral resultou na Avenida Duque de Caxias que conhecemos.
A Avenida Duque de Caxias, com o passar do tempo, se ombreará, ao sul,
com a Rodrigues Alves em termos de importância. Receberá, em um primeiro
momento, residências de alto padrão, sendo via considerada bastante nobre e
elegante nas décadas de 1950 e 1960. Acompanhando o status para a "Duque" como
é tratada, foram transferidos muitos dos desfiles que se faziam na Rodrigues Alves,
particularmente, quando essa última ganha importância como via arterial.
O Diário de Bauru, em matéria de 1955 sobre desapropriações na cidade,
trata da necessidade da expansão da artéria, pois o calçamento já havia sido feito,
sendo que duas casas de madeira travavam o prolongamento "da aristocrática
avenida", no sentido oeste, como forma de dar a ela,
153Duas casas de madeira entravam a expansão da aristocrática Avenida Duque de Caxias. Jornal
Diário de Bauru. 20 abr. 1955.
BAURU EM TEMAS URBANOS 107
154Jornal Diário de Bauru, de 27 de julho de 1985 noticia a abertura de concorrência pública para o
viaduto da avenida Duque de Caxias sobre a rodovia Marechal Rondon, (SP-300).
108
deve desprezar ainda, o prazer em assistir pousos e decolagens dos voos de carreira
e dos aeroplanos como passatempo divertido para os bauruenses e moradores da
região. Situação que também ocorria na capital, certamente em outras proporções,
com o aeroporto de Congonhas, inaugurado apenas três anos antes do Aero Club de
Bauru.
O Parque Jardim Europa, parte da Fazenda Campo Redondo, registrado em
1952, mas vendido a partir de 1949, conforme as propagandas inseridas no Jornal
Diário de Bauru, é prova inconteste de como o Aero Club teve papel relevante na
ocupação do sul da cidade. O parcelamento possui como divisas a Vila Aviação,
Jardim América, gleba de Ângelo Franciscato, Ribeirão Bauru e Aero Club155. Em um
de seus anúncios de vendas é apontado que a compra pode se dar a partir de entrada
de 20% e prestações sem juros e que, “Está situado na parte alta da cidade, a 610
metros de altitude, dispondo de água, luz e telefone. Urbanização moderna e no
prolongamento da Rua Rio Branco por onde já passam 18 ônibus diários. Em frente
ao Aeroporto, em redor do qual a cidade cresce”156.
O imenso loteamento de propriedade de Augusto João Costa, contava com
1069 lotes, 5 praças, 50 quadras, 03 avenidas e 19 ruas, com área de 1.069.838 m².
Seu projeto tentava se adequar à topografia e aos parcelamentos mais antigos ao
redor. A proposta cria pequenas praças centrais, cruzadas por vias, hoje parcialmente
anexadas, ocupadas pela Igreja São Cristóvão e por creche municipal. Estabelece a
ligação da antiga Avenida Santos Dumont, atual Nossa Senhora de Fátima, com a
Avenida Aviação, atual Getúlio Vargas e determina a Avenida Odilon Braga na
cabeceira do Aero Club. Como curiosidade, devido à localização, suas vias possuíam
nomes de aviadores, como o próprio Santos Dumont, Sacadura Cabral, Edu Chaves,
Charles Lindenberg, etc.
Importante frisar que o acesso para o Aero Club, ou Aeroporto, para essa
fração da zona sul onde estava situado o Jardim Europa, dava-se através da Rua Rio
Branco, como fica exposto no anúncio. Mais ainda, era ao seu "redor" que a cidade
se expandia, mesmo que fosse local distante e tivesse que ser acessado por ônibus,
Municipal. Revista Bauru. São Paulo: Editora Habitat Editora Limitada, 1952. Original Acervo do Museu
Ferroviário Regional.
BAURU EM TEMAS URBANOS 109
Figura 23: Loteamento Parque Jardim Europa, um dos maiores loteamentos implantados na
zona sul da cidade
159 BASTOS, I. A. Falcão/Independência, Nossa gente e nossa história. Bauru: Document Center
Xerox-USC, 2002, p.355.
160 Escola SENAI em Bauru. Revista Acrópole. Ano XXII, nº. 258, abril de 1960, p. 130-133.
161 Jornal Diário de Bauru. 12 jun. 1955. Conforme o anúncio, projetadas pelo arquiteto Alberto A.
Nassralla.
162 Ver Capítulo 6: A verticalização.
BAURU EM TEMAS URBANOS 111
Figura 24: Propaganda do Banco Hipotecário Lar Brasileiro S/A e seu empreendimento na
Rua Antônio Alves com 7 de Setembro
163CAPELOZZA, A. C. A. Os bairros Jardim Estoril: A atuação das empresas Martha no setor sul de
Bauru-SP (1957-2008). Dissertação (Mestrado em Arquitetura e Urbanismo) – Instituto de Arquitetura
e Urbanismo, Universidade de São Paulo. São Paulo (SP), 2016, p. 56-57.
112
164 A pré-história da Indústria Automobilística no Brasil. Quatro Rodas Abril, 2020. Disponível em:
<https://quatrorodas.abril.com.br/noticias/a-pre-historia-da-industria-automobilistica-no-brasil/>.
165 Idem.
BAURU EM TEMAS URBANOS 113
ocorrida com as 20 casas da quadra isolada nos altos da cidade. O traço do arquiteto
garantiria a manutenção da qualidade arquitetônica das unidades, bem como o
cumprimento rigoroso das diretrizes do loteamento.
As casas planejadas por Fernando Pinho, mais de quarenta, perfazendo duas
quadras, eram elaboradas exclusivamente para seus interessados, conforme suas
necessidades, não havendo reprodução de projetos. Possuem como características
inovadoras: volumes mais soltos no terreno em busca da criação de jardins laterais e
internos, evitando-se corredores regulares e operativos ao redor da edificação; a
ausência da tradicional edícula, mesmo que o recuo de fundo não fosse obrigatório
pelo loteamento; a presença de áreas de serviço agregadas ao corpo da casa e, em
alguns exemplares, junto à fachada166. E certamente todas as moradias ostentavam
o símbolo máximo de status do período: a garagem frontal e incorporada à edificação,
onde poderia ser exibido, com orgulho, o veículo da família.
O empreendimento, de grande êxito, dará início a outros bairros de mesmo
nome seguidos de numeral. Nas décadas seguintes, será praticamente grife e atributo
de loteamentos de alto padrão em Bauru, sucesso como negócio imobiliário e símbolo
de posição social elevada para seus moradores. Na planta do Jardim Estoril,
elaborada no ano de 1963, já se esboça o que seria sua continuidade, a partir do
Jardim Estoril II, loteado em 1977 e que estará situado após Avenida das Mangueiras.
Em um dos anúncios publicitários do Jardim Estoril, são apontados aspectos
bastante sedutores para a efetivação da compra de lote, para aqueles que
dispusessem de recursos,
166 GHIRARDELLO, G. O Bairro Estoril I: Imã de crescimento da zona sul de Bauru (SP). Trabalho de
Iniciação Cientifica, UNIP, 2013, p.32 e 33.
167 Informativo publicitário do Residencial Estoril V. Jornal da Cidade. Novembro de 2008, p. 5.
Figura 25: Reprodução de folheto publicitário do ano de 1966, o qual mostra duas realizações
importantes da Martha & Pinho: o Edifício Brasil Portugal e o Jardim Estoril e as casas
projetadas pelo Arquiteto Fernando Pinho
no final dos anos 1940, localizado em área topograficamente acidentada e que adota vias curvilíneas
e interessante desenho urbano. O empreendimento foi executado em terras de Joaquim R. Madureira
e urbanizado pelo Escritório Técnico de Engenharia Reis & Siqueira de Bauru. Fonte: Revista
BRASILITAS. Revista Cultural de Bauru, Ano 1, nº. 3, setembro de 1948, n.p. (trata-se de uma
propaganda na revista em página que antecede o corpo da mesma).
116
Alto de Pinheiros, por exemplo, projetados pela Companhia City 170 em São Paulo.
Todavia, são muitos os méritos do projeto do Jardim Estoril elaborado pelo Arquiteto
Fernando Pinho e o Engenheiro José da Silva Martha Filho, entre os quais, fazer a
delicada e precisa continuidade física com os loteamentos vizinhos Vila Samaritana e
Vila Santa Clara a partir do paralelismo com a Avenida das Mangueiras. Ou seja, o
Jardim Estoril não ignora os parcelamentos vizinhos e se “costura” de forma precisa a
eles.
No memorial descritivo do loteamento o Engenheiro José da Silva Martha
Filho confirma o procedimento:
170 Ver: ANDRADE, C. R. M de. Barry Parker um arquiteto inglês na cidade de São Paulo. Tese
(Doutorado em Arquitetura e Urbanismo) – Faculdade de Arquitetura e Urbanismo, Universidade de
São Paulo. São Paulo (SP), 1998.
171 CAPELOZZA, A. C. A. Os bairros Jardim Estoril: A atuação das empresas Martha no setor sul de
vegetação nas calçadas e nos recuos frontais obrigatórios de 4,5 metros das
residências.
Figura 27: Vista do Jardim Estoril (ao fundo), a Avenida das Mangueiras e em construção o
Santuário Nossa Senhora de Fátima (à direita)
Fonte: Informativo publicitário do Residencial Estoril V. Jornal da Cidade, nov. 2008, p. 14.
Figura 28: Mapa da cidade focando parte da Vila Falcão, Independência, Centro e os Altos da
Cidade, elaborado a lápis sobre cartão, provavelmente da década de 1940
industriais, políticos e artistas de todo Brasil e funcionará até 1983 quando é fechado
em virtude de dívidas, da liberalização sexual e pela concorrência com os motéis 174.
Outro caminho no setor sul, que vai modelar todo uma zona, contudo em
menor escala, é a Alameda Otávio Pinheiro Brisola, inicialmente tratada de Alameda
Universitária. Está igualmente disposta em ângulo a partir da Vila Perroca, nas
proximidades da Avenida Duque de Caxias e foge ao desenho das vias originais da
cidade. Era vereda de acesso para o Aero Clube e para a estrada que seguia em
direção a Agudos. Da mesma forma que as anteriores, sua precedência, importância
na circulação e ocupações estabelecidas às suas margens ensejarão novo desenho
para os loteamentos lançados posteriormente no seu entorno.
Na região, como parte da Vila Samaritana, registrada no ano de 1941 175, de
propriedade do Comendador José da Silva Martha, será projetada ampla praça
denominada Praça Portugal. De início o espaço contará com obelisco dedicado à
colônia portuguesa ao centro de rotatória que defletirá o trânsito para o entorno,
formado por importantes vias como, Avenida Getúlio Vargas e Avenida das
Mangueiras (Comendador José da Silva Martha).
Junto à rotatória funcionaria, desde a década de 1950, a “Refrigerantes Bauru
S/A”, fabricante da Crush, que anos após produziria a Coca-Cola, ponto de referência
na região. O papel da Praça Portugal vai além da reserva do espaço verde e acaba
por ser um elemento urbano articulador entre a quadrícula norte-sul advinda da cidade
e as avenidas Getúlio Vargas e das Mangueiras, que estavam posicionadas com outra
angulação.
Em 1973, a Praça Portugal é integralmente urbanizada e ajardinada com a
configuração próxima da atual. A rotatória situada originalmente um pouco acima é
trazida para junto ao alinhamento da Avenida das Mangueiras (Comendador da Silva
Martha) com seu monumento, ficando na posição presente. O trecho da Avenida
Getúlio Vargas, que se iniciava na Rua Rio Branco e cruzava a praça, é fechado.
A Praça Portugal, com sua extensa área de desenho triangular, não obstante
seja espaço verde importante para a zona sul, é prejudicada em sua integridade física
174 Conforme Lucius de Mello, Eny dizia antes de cerrar as portas de seu estabelecimento que: “Está
na hora de fechar. Nunca vi profissional perder para amador”. Idem, p.242.
175 Certidão de Registro da Vila Samaritana, arquivo da DEPLAN, Prefeitura Municipal. Na Planta da
Vila Samaritana preservada na SEPLAN o Comendador José da Silva Martha consta como o
proprietário, contudo, no registro, aparecem como proprietários o Sr. Evaristo Gonçalves da Silva e
esposa.
BAURU EM TEMAS URBANOS 121
Figura 29: Primeiro projeto para a Praça Portugal. Note-se que a rotatória se encontra acima
da posição atual, no desenho ainda está demarcado o acesso para a Avenida Getúlio Vargas
(ou Avenida Aviação), atualmente fechado
Figura 30: A Praça Portugal nos anos 1960, vista da primeira rotatória onde estava o
Monumento construído em homenagem à Colônia Portuguesa. À esquerda encontra-se a
fábrica “Refrigerantes Bauru”, na esquina da continuação da Rua Rio Branco
182 Jornal Diário de Bauru de agosto de 1973 anuncia a doação de mudas de Sibipirunas.
BAURU EM TEMAS URBANOS 125
para o fato de haver dependência da "cidade". Da mesma forma, pode-se dizer que
os "Altos da Cidade" contavam também um sentido de “bairro”, assim como a Vila
Falcão e Jardim Bela Vista, contudo, nesses dois últimos a personalidade do lugar se
dava mais devido às bases culturais, sociais e de apropriação do espaço, enquanto
com relação aos “Altos”, imperava a homogeneidade da posição econômica.
A partir da década de 1980 e 1990, o Altos da Cidade atraem para si a parte
mais nobre do comércio do centro, tornando-se ele próprio o "novo centro".
A ocupação dessa zona prossegue em destino à rodovia Bauru-Ipaussu (SP-
225), onde se encontram muitos loteamentos com controle de acesso. Também são
erguidos edifícios de apartamento em áreas loteadas ainda nos meados do século
XX, como a Vila Aviação. Duas avenidas importantes têm sido vetores de crescimento:
Getúlio Vargas e Nossa Senhora de Fátima, essa última com menor expressão.
Durante os anos e devido sua ocupação cada vez mais nobre, a Avenida
Getúlio Vargas foi sendo estendida e tratada cosmeticamente com a criação de
canteiros, a construção da Praça da Copaíba e rotatórias. Em suas margens, junto às
calçadas do Aero Club, se institui a primeira e mais famosa área de caminhada da
cidade, disputada durante todo o dia e mais nos finais de semana. Faltava seu
prolongamento até a rodovia Marechal Rondon (SP-300), que se deu através da
Avenida Mario Mattozinho, transformando a Getúlio na primeira via de acesso à Bauru,
para aqueles que vêm da Capital, potencializando sua importância para a zona e a
cidade.
Aos poucos, e dependendo do momento econômico do país, toda região no
entorno do Aero Club vai sendo ocupada. No ano de 2019, a Prefeitura propôs acordo
com a Associação do Aero Club em virtude de ação de usucapião movida por esta
contra o poder público em 2006. A disputa versava sobre a propriedade da área de
mais de 461 mil metros quadrados, onde funcionava o antigo aeroporto, na zona mais
nobre e valiosa da cidade. O trato fechado entre as partes define que o Aero Club
ficará com as áreas construídas e seu entorno, entre as quais os hangares, conjunto
tombado pelo CODEPAC. A pista de pouso, decolagem e área de segurança ficará
para o município, mas deverá ser considerada de "uso especial" para se manter
permanentemente a finalidade pela qual foi criada, devendo ser tombada pelo
CODEPAC. O Município ainda deterá áreas ao redor da gleba entre as quais as de
126
borda com a Avenida Getúlio Vargas, podendo fazer exploração econômica, desde
que ao menos 50% dela sejam destinadas a uso público183.
O acordo firmado é bom para o Aero Club e para a municipalidade resolvendo-
se um impasse de muitos anos. O fato de o Aero Club poder manter suas tradicionais
atividades é, a nosso ver, ponto de destaque da proposta, pois a entidade possui
história importante no vôo à vela nacional e o espaço também integra a memória
afetiva da cidade. Cabe a Prefeitura fazer bom uso de sua extensa fração, de forma
que se estabeleça um entorno entre a área densa da Getúlio Vargas e a superfície
livre do Aero Club, em um intermédio gradual.
Nos próximos anos veremos a maneira com que será feita a ocupação das
margens do Aero Club pela prefeitura e esperamos que a pura especulação imobiliária
não dê as cartas sozinha. Trata-se de um patrimônio importantíssimo para a
população da cidade e de grande valor comercial, que precisa ter um destino voltado
ao interesse público. Boas diretrizes poderão possibilitar melhor acesso à região do
Bauru Shopping e à marginal da Rondon (SP-300) em construção, dependendo de
como forem estabelecidos os parâmetros para seu uso.
183Gazzeta propõe acordo e põe fim a litígio entre Prefeitura e Aeroclube de Bauru. Prefeitura de
Bauru, Cidade em Movimento, 2019. Disponível em:
<http://www2.bauru.sp.gov.br/materia.aspx?n=35450>.
BAURU EM TEMAS URBANOS 127
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A Villa Jardim Bella Vista está localisada na parte mais alta da
cidade.
Com lindo panorama, luz electrica, telephone, construcções
modernas188.
com as mesmas divisas com que o foi o distrito de paz de igual nome, estabelecido pela Lei n. 2.623,
de 14 de janeiro de 1936. Diário Oficial da União. 09 abr. 1938, p.1.
188 Jornal Correio da Noroeste. 21 jun. 1931.
BAURU EM TEMAS URBANOS 129
Figuras 31 e 32: Acima mapa do Distrito de Paz da Villa Falcão, datado de 1938. Abaixo
detalhe do mapa mostrando a Vila Falcão à esquerda, além dos trilhos e o restante da cidade
de Bauru
A situação elevada do bairro com vista para o centro da cidade era real, mas
o ingresso tornou-se grande problema para os moradores, o que talvez tenha feito
dele bairro destinado a público um pouco mais popular do que o inicialmente
imaginado pelos loteadores que, tentando dar conotação mais nobre, o chamaram de
"Jardim".
Figura 33: Em primeiro plano, beneficiadoras de algodão junto à linha da Paulista, tendo ao
fundo da parte baixa do Jardim Bela Vista no final da década de 1930. A imagem mostra
pequenos bangalôs e a total ausência de infraestrutura, entre as quais guias e sarjetas
189SANTOS, K. G. D. O. Bangalôs em Bauru: Uma Nova Forma de Morar para o Século XX. 2016.
Dissertação (Mestrado em Arquitetura e Urbanismo) – Faculdade de Arquitetura, Artes e Comunicação,
Universidade Estadual Paulista “Júlio de Mesquita Filho” (UNESP). Bauru (SP), 2016.
BAURU EM TEMAS URBANOS 131
190 Idem.
191 Jornal Correio da Noroeste. 21 jun. 1931.
132
Figura 34: Grupo de carpinteiros que construíram o primeiro vagão da NOB. Foto
provavelmente do início da década de 1920 quando as Oficinas são inauguradas
Figura 36: Um antigo bangalô de madeira, ainda praticamente original, encontrado na Vila
Falcão
pressões para que o Catolicismo deixasse de ser o popular e fosse Romanizado, pois,
em 1929, uma nova Capela de alvenaria é concluída, sendo a antiga demolida em
1930192.
evasão da lida diária, de diversão, encontros e namoros. O Cine São Raphael estava
situado na Avenida Alfredo Maia, na entrada da Vila Falcão, por onde eram acessadas
as oficinas da NOB. Longe de ser um bom local era área de frequentes alagamentos
que ocorrem até nossos dias.
Parte do lazer se concentrava nas proximidades das praças Epitácio Pessoa,
na Falcão, e Dos Expedicionários, na Bela Vista. O terreno dessa última praça foi
desapropriado e ajardinado na década de 1950, a partir da solicitação do vereador
Horácio Alves Cunha, sendo a área da praça constituída de apenas meia quadra. Ao
seu redor se posicionava a Radio PRG-8, o comércio e o Cine Bela Vista. Não havia
relação entre o espaço do jardim público e a Igreja Santo Antônio, situada em rua mais
acima.
Os espaços públicos tentavam reproduzir, da melhor forma possível, a Praça
Rui Barbosa, com vegetação bem cuidada, bancos, pérgulas, luminárias e até mesmo
coreto. Nelas circulavam as moças dos bairros, vigiadas atentamente pelos rapazes
das respectivas vilas, que raramente aceitavam os jovens forasteiros da “cidade”.
Nas proximidades o comércio também se fez relevante, com pequenos
negócios, destacando-se os mercadinhos, alfaiatarias, açougues, sapatarias,
serrarias, bares, vendas, padarias e farmácias.
Ainda, como amostragem da importância desses bairros, alguns exemplos:
A Bauru Rádio Club, PRG-8, situada no Jardim Bela Vista, criada em 1934,
foi a primeira emissora de rádio da cidade e a segunda do interior paulista. Inicialmente
funcionou no centro e em 1946 inaugura o novo prédio em ponto alto do bairro. Seus
equipamentos e instalações eram moderníssimos para a época, possuía estúdio-palco
com auditório para 300 pessoas, estúdio para apresentações privadas, bar, sala de
controle, discoteca com milhares de gravações, salas para escritório comercial,
direção artística de ensaio e uma torre de 67 metros de altura. Seu idealizador foi o
arrojado empreendedor João Simonetti, quem construiu o belo prédio ainda existente
em frente à Praça dos Expedicionários. A rádio chegou a receber muitas estrelas
musicais do período como Silvio Caldas, Orlando Silva e Francisco Alves. As
apresentações desses grandes nomes atraíam para os estúdios do Jardim Bela Vista
centenas de pessoas para verem de perto seus ídolos.
No mesmo local, e pelo mesmo Simonetti, no ano de 1960, será fundada a
primeira e pioneira emissora de televisão do interior brasileiro, a TV Bauru - Canal 2.
BAURU EM TEMAS URBANOS 139
Sua sede atualmente é ocupada pela TV TEM, rede que abrange hoje quase 100
cidades do interior de São Paulo, ligada ao sistema Globo de Televisão.
O bairro abrigou, também, o Sanatório Salles Gomes, com 200 leitos, criado
pela NOB na década de 1940, posteriormente transformado em Hospital Psiquiátrico
privado e por último demolido para dar lugar a um Condomínio Residencial Vertical de
pequenos prédios da MRV.
Nos limites do bairro e bem próximo do centro da cidade, foi instalado o Fórum
no ano de 1972, a partir de diretrizes emanadas do primeiro Plano Diretor da Cidade
do CPEU/USP, e reelaboradas pelo Plano Diretor de Bauru logo após, sendo
posteriormente construída a Secretaria Estadual da Fazenda ao seu lado 200.
Figura 38: Ao centro o conjunto poliesportivo do Noroeste, ainda em construção, bem como a
vasta área ao redor sendo ainda ocupada. Foto provavelmente da década de 1960
A Vila Falcão, por sua vez, sedia o Club Noroeste, criado em 1910 pelos
ferroviários da NOB. Com o incêndio de seu estádio em 1958, transferiu-se para o
bairro, em terras doadas por Daniel Pacífico. O novo complexo, formado por piscinas
201 Ginásio da EFNB. Revista Acrópole. Ano XIX, nº. 223, Maio de 1957, p. 239-241.
202 Hospital Manoel de Abreu: 63 anos de história, 6 de renovação. FAMESP, 2020. Disponível em:
<https://www.famesp.org.br/noticias.php?ID=0000115>.
203 BASTOS, I. A. Falcão/Independência, Nossa gente e nossa história. Bauru: Document Center
Leite. Será o Mauá, de concreto armado e construído em cota bastante elevada sobre
a passagem dos trens da Sorocabana e do curso d'água. Fará a ligação do centro
com a Vila Falcão e as instalações da NOB. A obra foi iniciada ainda no final dos anos
1950205, na gestão do prefeito Octavio Pinheiro Brisolla, com ajuda da ferrovia, que
precisava de acesso mais confiável para suas grandes oficinas. Outro viaduto, o Nuno
de Assis, junto e paralelo ao Mauá será inaugurado em 1971, no sentido de duplicar
a capacidade de vazão.
Em 1981, na administração Oswaldo Sbeghen, outra grande obra de arte
ampliará o acesso para a Falcão e também para a Vila Independência a partir da
continuidade da Avenida Duque de Caxias: o extenso Viaduto Antônio Eufrásio de
Toledo, com 300 metros, alcunhado de “Gigante do Vale”, viabilizado a partir de
verbas federais.
Em direção ao Jardim Bela Vista houve (e ainda há totalmente assoreada)
passagem sob os trilhos da Companhia Paulista, no prolongamento da Rua Azarias
Leite, que devido sua cota baixa inundava em todas as chuvas mais fortes.
Para substituir a passagem precária, na administração de Nicola Avallone
Junior entre 1956 e 1959, um primeiro viaduto alto e em concreto foi construído, em
continuidade à Rua Azarias Leite, sobre a velha passagem e denominado Juscelino
Kubitschek (JK).
Em 1973, é erguido outro viaduto, com um braço para acesso à nova Avenida
Nuno de Assis, marginal do Ribeirão Bauru, chamado João Simonetti, no
prolongamento da Rua 13 de Maio.
Os dois viadutos do Jardim Bela Vista deveriam garantir ingresso e
viabilização da construção do Centro Cívico, que seria edificado no bairro conforme o
Plano Diretor de Bauru do ano de 1967.
Tais obras de arte atuarão no sentido de o mercado imobiliário valorizar essas
zonas da cidade, fazendo com que as mesmas passassem a comportar, não só o
operariado, como parcela da classe média, em que pese o processo de gentrificação
daí decorrente, em especial na Vila Falcão. Novos loteamentos serão viabilizados
bairro adentro e as zonas mais próximas ao centro comportarão moradores de classe
média.
206Embora a mudança da UB para o novo campus tenha sido feita de forma gradual, sendo o IPMET
o primeiro setor a ser transferido devido às características de seu equipamento, ainda na década de
1970, ocorre que, com a encampação da UB pela UNESP em 1988, toda estrutura para lá se transfere.
O novo campus, ainda nos nossos dias, será uma área apartada da cidade, em que pese alguns novos
bairros que se formaram ao redor. Relação com a cidade bastante similar a outros tantos campi
universitários implantados no país a partir dos anos 1940.
BAURU EM TEMAS URBANOS 143
Figura 39: Vila Falcão universitária: em primeiro plano a antiga Fundação Educacional de
Bauru e logo acima a Instituição Toledo de Ensino
Fonte: Bauru, Cidade Sem Limites. Álbum Fotorevista Municipal Focaliza. Núcleo de
Pesquisas Históricas (NUPHIS) da UNISAGRADO.
207 BASTOS, I. A. Falcão/Independência, Nossa gente e nossa história. Bauru: Document Center
Xerox-USC, 2002, p.130/31.
208 A Igreja do bairro terá como padroeiro São Benedito, um santo negro.
144
Alguns dias depois o mesmo jornal fala da festa, porém, com tom crítico:
Interessante observar que os batuques dos anos 1920, tratados com desprezo
pela imprensa da época, acabarão por gerar a primeira escola de samba, que se
tornou orgulho da cidade, no final do mesmo século.
As duas regiões de Bauru, formadas pelos bairros Vila Falcão e Jardim Bela
Vista, embora situadas uma ao lado da outra, só obterão ligação física na década de
1970 com a construção das avenidas Daniel Pacifico e Waldemar G. Ferreira as quais
transporão os trilhos da NOB e o Córrego da Grama. Obra com tal propósito de junção,
realizada entre os dois populosos setores urbanos, é necessário que se concretize em
outros tantos territórios da cidade, também cindidos pela ferrovia, cursos d'água e
rodovias.
Embora, atualmente, as igrejas católicas mantenham papel relevante junto às
suas comunidades, outras religiões agregam a sua volta novas coletividades, em
particular as evangélicas, que se instalam em espaços diversificados e muitas vezes
improvisados.
O Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE) indicou em seu Censo
de 2010 que havia um aumento de 61% de evangélicos na população brasileira em
apenas 10 anos211. Isso tem alterado significativamente a paisagem urbana
reconfigurando os bairros e seus "centros" que giravam antes quase exclusivamente
ao redor do santuário católico. A facilidade de abertura de templos pentecostais e
neopentecostais, alojados em espaços mínimos, pequenas garagens ou salões
minúsculos onde iniciam as pregações junto às comunidades pobres e favelas nas
franjas dos bairros, garante sua extrema capilaridade, o que tem alterado as noções
anteriores de centralidade de bairro.
Nos dias atuais o comércio de bairro mantém-se bastante vivo na Vila Falcão,
onde se pode perceber um centro junto ao Supermercado Confiança, grande rede
supermercadista que iniciou suas atividades na Falcão com a denominação de Casa
Confiança. Ao seu redor, agências bancárias, lojas de roupas, postos de combustíveis
mostram força e vitalidade. Os novos parcelamentos mais adiante também abrigam
seus pequenos comércios de bairro como àqueles das Vilas Pacífico, Industrial e
Rocha.
O mesmo não ocorre no Jardim Bela Vista cujo "centro" junto à Praça dos
Expedicionários sofreu certo esvaziamento em favor do comércio espalhado pelas
ruas principais do bairro, em direção ao Santa Edwiges, Jaraguá, Alto Alegre.
Mantem-se junto à Praça algumas agências bancárias, a TV TEM e um mercado.
Serviços públicos de relevância como a Unidade de Pronto Atendimento
(UPA) do Bela Vista também parece trazer para seu redor uma série de serviços e
comércios. Dando-se o mesmo às margens da Avenida Nuno de Assis, pelo porte da
avenida e devido à maior proximidade desse eixo com o centro da cidade.
146
BAURU EM TEMAS URBANOS 147
212Planta Cadastral de Bauru de 1924, organizada por ordem da Prefeitura. Original no Museu
Histórico de Bauru.
148
Figura 40: Rara foto aérea de Bauru, sem data ou autor, mas provavelmente do final da
década de 1930. Nela ainda não se veem prédios, contudo a estação da NOB já aparece, não
é possível saber se em obras ou já inaugurada. Ao fundo encontra-se o Jardim Bela Vista
Nestor Goulart Reis Filho (1978) indica que em São Paulo os primeiros prédios
também empregaram terrenos residenciais:
213 REIS FILHO. N. G. Quadro da arquitetura no Brasil. São Paulo: Perspectiva, 1978, p.79.
BAURU EM TEMAS URBANOS 149
Mesmo tal medida não parece ter sido cumprida em Bauru, pois, no período,
são raros os edifícios dotados de escadas secundárias.
São poucas as pistas que a Lei nos dá a respeito da presença de prédios na
cidade. Tal fato denota o quanto, ainda no final da década de 1920, a legislação local
218 PRADO JR., C. História econômica do Brasil. São Paulo: Brasiliense, 1994, p.292.
152
219 A primeira visita de Getúlio Vargas ao Estado de São Paulo, enquanto presidente inicia-se por Bauru,
em 20 de julho de 1938. O governante visitará as obras da estação, o que demonstra a relevância
estratégica da NOB nesse momento.
220 BAURU. Decreto Lei n°. 2.013, de fevereiro de 1940. Cópia do autor.
221 Como Jaú, São Carlos, Araraquara e outras cidades um pouco mais velhas onde a atividade cafeeira
Figura 41: Fachada Principal do Projeto para a Estação da NOB, em Bauru, datado de 1922.
Obra não executada
Figura 42: O monumental edifício art déco da NOB construído em Bauru e inaugurado em
1939, que concentrará as três ferrovias da cidade. Perspectiva do projeto executivo
mais espontânea que oficial"223, o que entendemos querer dizer sobre as mudanças
ocorrerem a partir de investimentos privados.
Figura 43: Emes Hotel e posto de gasolina no térreo. Belo exemplar do art déco na cidade. O
prédio ainda é existente com algumas modificações
223
Jornal Correio da Noroeste. 18 dez. 1938.
224
Conforme tabela com a "Relação dos Edifícios Aprovados" fornecidos pela SEPLAN, Prefeitura
Municipal de Bauru.
BAURU EM TEMAS URBANOS 155
225 Revista BRASILITAS. Revista Cultural de Bauru. Ano XIV, nº. 5, 1950. Conforme propaganda da
construtora inserida na revista.
226 BASTOS, I. A. Falcão/Independência, Nossa gente e nossa história. Bauru: Document Center
misto, mantendo-se o comércio junto ao térreo com pé direito mais alto e, por vezes,
dotado de sobreloja, sempre abaixo de uma marquise que os fronteava. São edifícios
que podem ser considerados modernistas227. Longe de seus projetistas escolherem e
aderirem aos cinco pontos da arquitetura moderna, de tentarem mostrar inovação e
peripécias estruturais ou arroubos plásticos, são sim de tipologia moderna. Entre eles
apontamos o Edifício Santa Maria, aprovado em 1951, na quadra seis da Batista de
Carvalho, de seis pisos, com suas extensas varandas e limpeza plástica. Ou o Edifício
Caetano Sampieri, aprovado em 1957, na quadra sete da Rodrigues Alves, também
de seis pisos, cuja fachada é formada por composição racional de vigas e pilares e
alternância na posição das aberturas, onde tenta expor a modulação dos ambientes
internos.
Nos meados da década de 1950 a Rodrigues é ampliada para o leste em
direção à Vila Cardia e o trecho entre a Rua Antônio Alves e a Nações Unidas recebe
dois exemplares importantes de arranha-céus de uso residencial dispondo de térreo
comercial. São os edifícios Terra Branca e Bauru, que a partir de sua designação
fazem homenagem a própria cidade. Diferentemente dos pequenos prédios
anteriores, esses serão construídos para venda de unidades individualizadas e não
para locação de suas unidades, comercializados através do sistema de condomínio,
como apontava o Diário de Bauru.
O Edifício Terra Branca, aprovado em 1952, com nove andares foi erguido
pela conceituada e muito ativa Construtora Raffaele Mercadante e está situado na
esquina da Rodrigues Alves com Antônio Alves. Possui 36 apartamentos de dois
dormitórios, sala, vestíbulo, cozinha e dependências sanitárias “todos perfeitamente
claros e banhados pelo sol”228. Outro aspecto realçado era o fato de o edifício contar
com duas caixas d’água de 15 e 20 mil litros, dispositivos que atenderiam a todos os
condôminos em uma cidade onde a falta desse precioso líquido era constante. Sua
planta em “L” com fachadas para as duas vias com apartamentos voltados para elas
e para os pátios internos garantiam, realmente, boa iluminação e ventilação às
227 FERRAZ (2003), investiga as marcas do moderno na década de 50 concebidas pelos arquitetos
Zenon Lotufo, Ícaro de Castro Mello, Roberto José Goulart Tibau e Oswaldo Corrêa Gonçalves, e
apresenta o redesenho dos projetos originais bem como o levantamento iconográfico e fotográfico.
Analisa a trajetória de seus atores, as principais atuações e realizações que identificam suas
referências teóricas e projetuais, tecendo um capítulo para cada arquiteto e respectivos projetos
idealizados para a cidade. Aborda a visão do desenvolvimento arquitetônico que antecedeu este
período e se estendeu até 1970, destacando obras de outros arquitetos como João Cacciola e
Fernando Ferreira de Pinho.
228 Edifício Terra Branca. Jornal Diário de Bauru. 10 abr. 1955.
BAURU EM TEMAS URBANOS 157
229Edifício Bauru. Jornal Diário de Bauru. 18 abr. 1955. Outro expressivo testemunho de progresso
da cidade.
158
Figura 44: Edifício Santa Maria, situado na quadra 06 da Rua Batista de Carvalho, aprovado
em 1951
230 Idem.
160
231 Conforme propaganda inserida na Monografia editada sob os auspícios da Prefeitura Municipal. São
Paulo, Editora Habitat Editora Limitada, Abril de 1952. Original Acervo do Museu Ferroviário Regional.
232 Em pleno centro da cidade uma homenagem a um pioneiro de Bauru. Jornal Diário de Bauru. 16
abr. 1955.
233 BAURU. Lei nº. 5.762, de 14 de dezembro de 1971.
BAURU EM TEMAS URBANOS 161
Figura 45: Edifício Pagani elegante construção modernista de 1948, situado na esquina da
Rua Batista de Carvalho com Virgílio Malta
Fonte: Monografia editada sob os auspícios da Prefeitura Municipal. São Paulo: Editora
Habitat/Editora Limitada, abr. 1952. Museu Ferroviário Regional de Bauru.
234
AZEVEDO, S. de; ANDRADE, L. A. G. Habitação e Poder: Da Fundação da Casa Popular ao Banco
Nacional de Habitação. Rio de Janeiro: Zahar Editores, 1982, p.91.
162
Figura 46: Edifício Ester Sebastião com projeto do engenheiro Murillo Villaça Maringoni, na
esquina da rua Primeiro de Agosto com Agenor Meira, meados dos anos 1950, construído
para o Hotel Cidade de Bauru
Fonte: Monografia editada sob os auspícios da Prefeitura Municipal. São Paulo: Editora
Habitat/Editora Limitada, abr. 1952. Museu Ferroviário Regional de Bauru.
BAURU EM TEMAS URBANOS 163
Figura 47: À esquerda da fotografia Edifício Julio Maringoni, localizado na esquina da Rua 13
de Maio com Batista de Carvalho, imagem sem data
Figura 48: Construções consideradas relevantes para Bauru na década de 1950, no sentido
horário: Edifício Terra Branca, Hospital Regional, Anderson Clayton, Edifício Bauru, ao centro,
Estação da NOB e a Panela de Pressão. Imagens do fascículo Sinopse Estatística do
Município de Bauru, editadas pela Prefeitura Municipal de Bauru, 1955
as ruas Rio Branco e Júlio Maringoni, unidades de três dormitórios, com área útil de
90 m². Essa foi a primeira experiência na cidade no sentido de “convencer” a alta
classe média a trocar uma casa de boa dimensão por apartamento, devido aos
espaços amplos, generosos e a sofisticação arquitetônica. Até então, na cidade e
mesmo no Brasil Portugal, os apartamentos eram de padrão apenas mediano.
O Edifício Vila Real estará situado junto à Praça Portugal, antes de a mesma
ter sido ajardinada, bastante distante do centro e na zona sul. De uso misto, com nove
lojas no térreo, será junto com o Brasil-Portugal ícone modernista da cidade235. É
provável que o espaço disposto no térreo seja explicado pela situação frontal à praça
de vocação comercial, ou até mesmo a proximidade do Jardim Estoril, que carecia de
serviços de vizinhança dessa natureza.
Interessante verificar que o arquiteto Fernando Pinho, com suas duas obras,
aponta em direção a caminhos relevantes para as construções residenciais
multifamiliares em Bauru: torre solta no lote, garagens e uso exclusivamente
residencial, a partir do Brasil Portugal e a nova zona de direcionamento vertical da
cidade com o Vila Real.
Realmente, veremos que, a partir do final da década de 1970 e
particularmente na década de 1980, a classe média desejará morar nas torres
residenciais em situação de isolamento no lote, situadas na zona sul da cidade, mas
rechaçará o comércio junto à mesma. Preferia-se, assim, o uso exclusivamente
residencial do edifício.
Uma nova legislação urbanística implantada na cidade nos anos 1980, como
veremos a seguir, acompanhará as diretrizes precoces e modernistas do Brasil
Portugal, resultando em tipologia que se tornará dominante em Bauru e em boa parte
das cidades brasileiras.
Na década de 1960 vemos alguns prédios residenciais de vários pisos serem
erguidos fora das vias comerciais de Bauru, rumo ao sul, mas ainda assim
considerados centrais, como o Edifício Tokyo, aprovado em 1967, ao lado da Igreja
Santa Terezinha, acompanhado depois pelo Edifício São Francisco, aprovado em
1972, ao redor do mesmo templo. Contudo, outros ainda eram edificados no centro
como o Edifício Carmem, aprovado em 1965, de 13 andares, na esquina da Rua
Ezequiel Ramos com Agenor Meira; o Edifício Cristina, aprovado em 1960, em frente
235Sobre a obra de Fernando Pinho ver: PUPIM, R. G. Arquitetura moderna em Bauru, a obra do
arquiteto Fernando Pinho. Revista Risco, nº. 06, 2007.
BAURU EM TEMAS URBANOS 167
Figura 49: Edifício São José localizado na Rua Antônio Alves atrás do antigo BTC. Pequeno
e interessante exemplar modernista pouco lembrado
236 BENEVOLO. L. História da arquitetura moderna. São Paulo: Perspectiva, 1976, p. 426-431.
BAURU EM TEMAS URBANOS 171
no subsolo, situarem-se acima da calçada. Mesmo que a torre esteja isolada ao centro
do lote, geralmente se encontra em cota elevada. A situação transforma os edifícios,
a maioria deles ao menos, em espaços amuralhados devido aos fechamentos dos
pisos das garagens que afloram à superfície. Sem dúvida alguma, a elevação, mesmo
que parcial, do subsolo oferece custo de construção muito mais atrativo, ao invés de
mantê-lo totalmente encravado no solo, fato que impede ou pouco incentiva o prédio
ao nível do passeio.
As exigências de acessibilidade universal, a partir da Lei Federal nº. 10.098,
de 19/12/2000, têm feito os empreendedores repensarem a questão devido à
necessidade de criação de rampas imensas para se atingir o térreo da torre, além de
extensas escadarias já encontradas nos exemplares anteriores. Alguns
empreendimentos têm lançado mão de elevadores para essa mesma função, contudo
é um processo ainda em andamento que pode vir a mudar a posição acima da calçada
dos estacionamentos.
Até a última década do século XX os edifícios erguidos na cidade e suas
unidades visavam correntemente às classes médias, eram dotados de razoável área
interna, mas dimensões ainda modestas. O Edifício Vila Real, como vimos, possuía
as unidades voltadas à Praça Portugal com boa área interna, entretanto a mescla de
apartamentos com tamanhos variados, o uso misto residencial e comercial, as novas
necessidades voltadas ao esporte e lazer, bem como o número reduzido de vagas de
garagem, conduziu a outro tipo de proposta para os mais ricos.
O primeiro condomínio vertical multifamiliar que simboliza as aspirações das
classes altas, indo ao encontro do seu desejo de substituir uma grande residência
térrea por apartamento, é o Condomínio Edifício Francisco de Assis Moura. Buscou
pressuposto de exclusividade de uso e homogeneidade no padrão das unidades para
todos os seus condôminos de alta renda. Idealizado nos anos 1990, situa-se em uma
região nobre da cidade, próximo à Avenida Nossa Senhora de Fátima. Dispõe de
grande terreno onde se implanta uma série de espaços livres e de lazer como jardins,
quadras, piscinas, salão de festas, etc. É formado por três torres conjugadas e
independentes, dispõe de um apartamento por andar em cada uma delas, com cerca
de 400 m² e 04 vagas de garagem. Foi construído sob forma de condomínio,
mobilizando a alta sociedade local sob a liderança de conhecido delegado da cidade
que dá nome ao empreendimento. A partir dele, outros tantos edifícios de alto padrão
foram lançados por construtoras, visando um grupo social de maior exigência e renda.
BAURU EM TEMAS URBANOS 173
portão ainda hoje existente, no início da atual Rodrigues Alves. Ou seja, a estação
ficava em nível baixo em relação à Avenida Sorocabana e não possuía acesso direto,
apenas através do portão lateral, distante mais ou menos 150 metros. A péssima
implantação, que pode ser vista até os dias atuais, talvez aponte no sentido de que a
construção seria provisória, mas, mesmo assim, é difícil entender tamanha imperícia
em sua situação.
A estação da NOB em Bauru, também construída no final do ano de 1905,
estará locada a mais ou menos 150 metros daquela da Sorocabana e em mesma cota,
pois seriam complementares em seus serviços. Será uma pequena estação provisória
erguida em alvenaria, sucessivamente ampliada em madeira, que deveria ser
substituída assim que possível. Ao seu lado foram erguidos galpões, também
temporários, para servirem como oficinas de máquinas e depósito de carros.
A entrada para as duas estações se dará a partir do grande portão da
Rodrigues Alves. Em relação à NOB tal situação permanece até 1917, quando área
de terreno triangular será doada à Prefeitura, criando-se um largo à frente da estação.
Na ocasião, 18 de outubro de 1917240, inaugura-se um busto em homenagem a
Machado de Mello, que dará seu nome ao novo espaço público. A partir de então a
estação da Noroeste passa a ter acesso pela Batista de Carvalho, através da Praça
Machado de Mello, contudo o ingresso à Sorocabana se mantém pelo grande portão
da Rodrigues.
Da mesma forma que a Companhia Sorocabana sugeriu a Avenida
Sorocabana, em função da entrada se dar pelo grande portão, recomendará uma
grande via que se chamará Avenida Alfredo Maia, em homenagem ao superintendente
da empresa à época. Tais situações mostram bem o quanto a ferrovia era fundamental
para a jovem cidade, pois, além de exigir a construção de duas avenidas, as nomeia
com referências a si mesma: Sorocabana e Alfredo Maia.
240 SOBREIRA, M. R. N. A praça Machado de Mello. Blog Nossa Bauru, 2020. Disponível em:
<http://nossabauru.blogspot.com/2012/01/praca-machado-de-mello.html>.
BAURU EM TEMAS URBANOS 177
Figura 50: Foto tirada provavelmente no ano de 1938, período da construção da nova estação
da NOB. Nela é possível ver a relação da Avenida Rodrigues Alves com o portão que dava
acesso às estações da NOB e Sorocabana, o que motivou a construção da larga via. Ainda é
possível observar a antiga estação da Noroeste, à esquerda, que logo seria demolida para
dar lugar à nova gare e plataforma de concreto armado. A estação da Sorocabana, que está
situada à direita, não aparece na imagem
A Avenida Alfredo Maia, depois nomeada Rodrigues Alves, foi aberta a partir
de via projetada no arruamento inicial do Patrimônio, que teve sua largura mais que
dobrada a partir da desapropriação e corte das quadras entre ela e a Rua Batista de
Carvalho. Os quarteirões entre as duas importantes vias centrais são reduzidos de
tamanho para o espaço ser destinado à nova avenida. A via, que originalmente deveria
ter 14 metros de dimensão total, passa a mais de 26 metros de largura e por volta de
900 metros de extensão, tendo ponto inicial o portão da Companhia Sorocabana e
NOB.
Ocorre que, devido às desapropriações das quadras da Rua Batista para o
alargamento da Rodrigues Alves, o arruamento da cidade se desloca em toda
extensão da avenida, que ia até a Rua Antônio Alves naquele momento. A parcela do
Patrimônio além da Rua Araújo Leite não foi alterada permanecendo na situação
178
original, o que pode ser constatado até nossos dias com o desencontro das vias leste-
oeste, a partir desse ponto.
O traçado em quadrícula, como se pode perceber por Bauru, mostrou-se
desenho de simples implantação, sem caráter e bastante maleável para eventuais
reformas, podendo, com alguns cortes, ampliações e remembramentos, ganhar,
suprimir, ou ampliar vias e quadras, ao sabor dos interesses do momento. A falta de
maior personalidade do desenho permitia mudanças de oportunidade sem maiores
problemas, desde, como foi o caso na cidade, que não houvesse ocupação anterior.
Figura 51: Mapa da cidade por volta de 1911, com as três ferrovias no solo urbano e as
mudanças realizadas no traçado para a criação da Avenida Rodrigues Alves
É certo que a cidade ainda era muito pequena e nessa região não deveria
haver quase nenhuma ocupação, mesmo assim as referências relativas a essa grande
reforma urbana são quase inexistentes nos documentos e atas do poder público.
Apenas duas citações, ambas em cessões da Câmara Municipal, uma delas no dia 17
de março de 1905 no sentido de “mandar proceder o alinhamento das ruas e avenidas
que estavam sendo abertas”241. E, em 31 de dezembro do mesmo ano, quando a
Noroeste já estava em solo urbano novamente é citada a Avenida Alfredo Maia “em
projeto, que saindo do centro urbano, ia ter até o local onde deverá ser levantado o
ponto terminal dos trilhos daquela via férrea”242.
Figura 52: A larga Avenida Rodrigues Alves em foto, provavelmente, da década de 1920, ao
fundo vê-se as novas Oficinas da NOB inauguradas em 1921
241 PAIVA, C. F. de. Narrativas sintéticas dos fatos que motivaram a fundação de Bauru. Bauru:
Conselho Municipal de Educação de Bauru, 1975, p.61.
242 Idem, p. 61.
180
ser boulevares, são abertos em São Paulo, como as avenidas Angélica e Higienópolis,
no bairro de mesmo nome, e também a Paulista. O Rio de Janeiro havia acabado de
passar por extensa reforma urbana, sendo o seu elemento mais marcante a Avenida
Central, inaugurada em 1905, com seus espantosos 33 metros de largura após muitos
arrasamentos.
Tais inovações chegaram a Bauru na esteira da modernidade trazida pelas
ferrovias, beneficiado pela circunstância de que na cidade o alargamento de vias era
algo fácil de ser realizado devido ao traçado reticulado e à baixa densidade na região
onde se implantaram as estações, pois a concentração de edificações se dava no
entorno da Rua Araújo Leite, sentido norte-sul.
Também, diferentemente do Rio de Janeiro que abriu vias a partir de um casco
urbano colonial, densamente apropriado e irregular, seu rasgo em uma cidade em
quadricula seria menos complexo, próximo do desenho original e, sobretudo, barato.
Aspecto que não pode ser desprezado em uma reforma urbana na escala da
que ocorreu em Bauru é o fato da presença da Estrada de Ferro Noroeste do Brasil
(NOB)243 e, com ela, seu grupo de engenheiros franceses que para esta cidade se
dirigiram para construir a nova ferrovia que se dirigiria ao Mato Grosso.
Muitos desses profissionais se envolverão na implantação dos serviços
públicos locais e, devido à reputada formação técnica, suas determinações serão
muito respeitadas. É o caso do engenheiro Charles Pittet, da NOB, que propôs à
Câmara Municipal, em 1906, criar os serviços de água, luz e telefone à cidade244. Obra
executada apenas em 1912 por outro Engenheiro da NOB, Sylvio Saint Martin, que
projetará e executará o sistema de abastecimento de águas e esgotamento sanitário
de Bauru. Outro engenheiro de grande poder foi o superintendente da ferrovia durante
sua implantação, Eugenio Lafon, francês, nascido em Limóges, que naturalmente,
devido ao cargo, teve atuação ativa nas questões locais e grande prestígio na região.
É interessante imaginar como deve ter se comportado a pequena população diante
de estrangeiros, considerados muito ilustrados, sendo que no período vigorava forte
etnocentrismo em relação aos hábitos, a técnica e a cultura francesa.
243A rigor nesse momento a ferrovia se chamava Companhia Estrada de Ferro Noroeste do Brasil.
244GULINELLI, E. L. O saneamento e as águas de Bauru: Uma perspectiva histórica (1896-1940).
Dissertação (Mestrado em Arquitetura e Urbanismo) – Faculdade de Arquitetura, Artes e Comunicação,
Universidade Estadual Paulista “Júlio de Mesquita Filho” (UNESP). Bauru (SP), 2016, p. 114.
BAURU EM TEMAS URBANOS 181
245 BENEVOLO. L. História da arquitetura moderna. São Paulo: Perspectiva, 1976, p. 114.
246 Se necessário, retomar Capítulo 5: Falcão e Bela Vista.
182
pérgula no ano de 1933, em que pese na esquina, junto à Rua Bandeirantes, já haver,
desde 1913, a Delegacia de Polícia e, na confluência da Avenida Rodrigues Alves, em
1930, ter sido construído o prédio do Fórum da cidade. A praça inaugura, com a
construção da Delegacia e do Fórum, a prática corrente de lotearem-se áreas da
comunidade para destiná-las a edificações públicas, e, por vezes, privadas,
reduzindo-se sobremaneira os raros espaços verdes na cidade248.
Nessa via bastante larga, dotada de canteiro central e duas mãos de direção,
foi construído o imponente palacete do Coronel Figueiredo, dono da Fazenda Val de
Palmas; anos depois tal palacete se transformaria em casa de saúde. A partir dele,
outras obras residenciais nobres foram erguidas dando à Rodrigues prestígio só
igualado ao entorno da Praça Rui Barbosa.
Também na Rodrigues será implantado o primeiro Grupo Escolar da Cidade,
em 1913, a maior obra executada pelo Governo Estadual em Bauru no período, e que
tomava metade de uma quadra. Em 1939, o Grupo recebeu a denominação de
Rodrigues de Abreu, em homenagem ao poeta que na cidade viveu e produziu grande
parte de seus versos modernistas. Na década de 1950, para a criação da Faculdade
de Filosofia, Ciências e Letras o prédio foi permutado com o Estado pelas Irmãs do
Sagrado Coração, por outro situado na Avenida Duque de Caxias com a Rua Virgílio
Malta249.
Na via, também funcionou, em grande casarão de esquina, o conhecido
Instituto Dramático Musical, que se transformou em espaço cultural de relevo na
cidade. Em sua quadra inicial, no ano de 1931, foi inaugurado o primeiro posto de
serviços para autos, e em 1937, o comerciante José Salmen, abre uma grande
concessionária de veículos da Ford, na esquina com a Rua Virgilio Malta 250.
248 Essa mesma praça virá a comportar a Câmara Municipal e os Correios, restando, nos dias atuais,
uma modesta faixa de área verde ao redor do prédio da Câmara.
249 PAIVA, C. F. Narrativas sintéticas dos fatos que motivaram a fundação de Bauru. Bauru:
Figura 53: A Rodrigues Alves e sua paisagem ainda bucólica na década de 1950. Foto Giaxa
toda comunidade. Após mudança para outro local da avenida, devido à demolição do
canteiro central, anos depois foi desmontado e levado para a lateral do Cemitério da
Saudade e por último, para o pátio do Batalhão da Policia Militar.
O memorialista Gabriel Ruiz Pelegrina transcreve o jornalista e historiador
José Fernandes em um de seus textos sobre a Avenida Rodrigues Alves. Fernandes
aponta as paulatinas melhorias efetuadas na via:
252 PELEGRINA, G. R. Avenida Rodrigues Alves (VI). Notas Históricas. Jornal da Cidade. 17 mai.
1992.
253 Idem.
254 PELEGRINA, G. R. Avenida Rodrigues Alves (V). Notas históricas. Jornal da Cidade.
255 PELEGRINA, G. R. Avenida Rodrigues Alves. Notas históricas. Jornal da Cidade.
186
Figura 54: O novo trecho da Avenida Rodrigues Alves aberto no início da década de 1940. De
imediato torna-se setor nobre onde dois edifícios modernistas terão grande presença visual,
Edifícios Terra Branca e Bauru. Foto, provavelmente, do final da década de 1950
Figura 55: Mais uma vista da Avenida Rodrigues Alves, vendo-se em destaque o Edifício Terra
Branca. Na quadra seguinte, à direita, é possível ver o transepto da Matriz em fase de
demolição. Nota-se ainda o canteiro central da avenida com seus “fícus Benjamin”,
caprichosamente podados. Foto, provavelmente, dos meados da década de 1950
Figura 56: Vista aérea de Bauru, tendo ao centro a Avenida Rodrigues Alves e muitos de seus
primeiros prédios, situados nessa via e na Batista de Carvalho, entre os quais o Bauru e o
Terra Branca. É possível visualizar as duas primeiras quadras da Avenida Nações Unidas na
confluência com a Rodrigues Alves, o novo prédio modernista do SENAC e, ainda, a ausência
do Edifício Brasil Portugal. Foto provavelmente do final da década de 1950. Foto Postal
Colombo
260CAPELOZZA, A. C. A. Os bairros Jardim Estoril: A atuação das empresas Martha no setor sul de
Bauru-SP (1957-2008). Dissertação (Mestrado em Arquitetura e Urbanismo) – Instituto de Arquitetura
e Urbanismo, Universidade de São Paulo. São Paulo (SP), 2016, p. 57.
BAURU EM TEMAS URBANOS 191
Milagrosamente ainda hoje estão integras, mas infelizmente mal cuidadas. A falta de
arborização e a ausência de sombra tornam a circulação a pé, pelos passeios da
avenida, tarefa mais difícil ainda.
Na administração de Octavio Pinheiro Brisolla (1948-51), a rota da maioria dos
ônibus circulares é transferida para a avenida261. A partir dos anos 1970, com a
construção do viaduto João Coube sobre a Rodovia Rondon, a via se fortaleceu ainda
mais como eixo leste-oeste e passou a receber a totalidade das linhas de ônibus
circulares da cidade. Isso praticamente a transformou em terminal linear a céu aberto.
A largura das calçadas na zona central permitiu o estabelecimento de pontos
de ônibus sem a obstrução integral do passeio, e para tanto, foi suprimido de forma
total o estacionamento de veículos junto aos passeios. A via, que recebia trânsito
menos veloz devido, justamente, ao estacionamento a meio fio e seu consequente
estreitamento, com a maior fluidez passa a permitir aumento da velocidade dos
veículos privados e ônibus circulares.
A medida resultou na saída paulatina de muitos negócios ali implantados
devido à dificuldade de estacionamento, pois eram prédios antigos e não dispunham
de vagas próprias. O movimento rápido e elevado de veículos, o asfalto deformado, a
poluição sonora, visual e ambiental, além da proibição de estacionamento degradam
sobremaneira a Rodrigues, que passa a dispor de muitos prédios sem ocupação.
Atualmente o início da Rodrigues conta com comércio popular, lojas de
móveis usados, velhos hotéis, sendo alguns abandonados, estacionamentos e
brechós. Também ao longo da via se encontram serviços ligados à saúde, em especial
muitos consultórios dentários a preços acessíveis. Fazem-se presentes cabeleireiros,
escolas para cabeleireiros, bares, lanchonetes, óticas e lojas de 1,99. Parte dos
negócios ali instalados, particularmente os pequenos, é efêmero; se transformam
alterando de ramo rapidamente. Contudo, uma peculiaridade não muda: os melhores
pontos comerciais sempre são aqueles junto às paradas de ônibus, o que demonstra
a simbiose entre o transporte público e o comprador/usuário dos serviços de toda
região.
O futuro da Rodrigues Alves, como parte do centro comercial262, depende das
medidas de revitalização a serem tomadas para ele; não há como desligá-los. Mas é
261 PELEGRINA, G. R. Avenida Rodrigues Alves (XI). Notas históricas. Jornal da Cidade. 06 set. 1992.
262 Assunto a ser tratado no Capítulo a seguir, com este nome.
192
certo que qualquer plano para a zona central deve, necessária e obrigatoriamente,
passar pela Avenida.
BAURU EM TEMAS URBANOS 193
263
FERNANDES, J. As origens da cidade de Bauru. Jornal Correio Paulistano. 1945. Arquivo do
Museu Municipal de Bauru.
194
Batista de Carvalho, expandiu-se para a Rua Primeiro de Agosto e, até certo modo,
para a Avenida Rodrigues Alves, em um quadrilátero, não absolutamente preciso, que
vai da estação da NOB até a Rua Antônio Alves. Nele se avultou durante décadas,
um comércio vibrante que fez da chamada "Capital da Terra Branca" centro regional
importante. Com a formação das cidades "à beira da linha" da noroeste 264, teria
impacto até as divisas com o Estado de Mato Grosso.
No quadrilátero central as vias principais tinham características próprias.
Pode-se dizer que havia gradação de uso que passava pela topografia e pelas
correlações morais. A Avenida Rodrigues Alves, em cota mais alta, abrigaria
residências importantes que, com o tempo, se transformariam em prédios, algum
comércio e os primeiros postos de combustíveis; talvez fosse a seu início a via mais
nobre e aristocrática da cidade.
A Rua Batista de Carvalho disporá do grande comércio, fato que persiste até
nossos dias com o calçadão. A Rua Primeiro de Agosto será mais voltada ao lazer,
com bares, restaurantes, hotéis, bancos e os principais cinemas como o pioneiro Bijou
Theatre, de 1922. Depois veio o Cine Bauru, inaugurado em 1938, em belo prédio art
déco projetado pelo arquiteto João Caciolla, o Cine São Paulo e o Cine Capri, sendo
o setor tratado como a “Cinelândia” de Bauru. Era via de negócios e também de
diversão e que, de certa forma, prenunciava e antecedia as ruas paralelas e abaixo,
destinadas aos cabarés e a prostituição.
O nome da rua, Batista de Carvalho, homenageia de forma justa um
comerciante pioneiro que possuía estabelecimento na via. Lenda urbana local afirma
que Batista de Carvalho colocou uma placa em frente ao seu comércio tratando-a por
“Rua dos Esquecidos” devido a mesma não ter sido denominada em momento em que
as ruas da cidade ganhavam tratamento próprio. Na realidade, por um período, a rua
era identificada como “Rua da Estação” por destinar-se a elas, fato que pode ser
constatado nos anúncios das lojas encontrados nos jornais da época. Afinal, mesmo
considerando-se os rudimentares princípios de marketing da época, tratá-la por “Rua
dos Esquecidos”, seria péssima ideia para o comércio ali estabelecido. Após a morte
do pioneiro, a Câmara Municipal a denominou definitivamente de Rua Batista de
Carvalho em 31/11/1904265. Contudo, a denominação parece não ter "pegado" de
264 GHIRARDELLO, N. À beira da linha: formações urbanas da Noroeste Paulista. São Paulo: Editora
UNESP, 2002.
265 Atas de Câmara. 31 nov. 104, p.51.
BAURU EM TEMAS URBANOS 195
pronto, pois, em anúncio da Casa Vermelha no ano de 1911, constava que a loja
estava situada na Rua Batista de Carvalho, “antiga da Estação”266.
As ferrovias, mais que tudo, trarão à cidade acessibilidade fácil,
transformando a pequena urbe no maior entroncamento férreo do interior do país em
apenas cinco anos, de 1905 a 1910. A acessibilidade do lugar, o fato de estar situada
em região central do Estado e também ser entrada para nova e vasta zona em
expansão, concederam à Bauru primazia em relação a outras cidades da região. Tais
fatos, somados à condição natural do solo arenoso de baixa produtividade para as
atividades agrícolas, conduziram a economia local com certa naturalidade ao
comércio e serviços. Nesse processo, e garantidores de sua viabilização, há que se
destacar a presença dos imigrantes que aqui também chegaram junto com as
ferrovias, sendo que muitos deles visavam as atividades urbanas como meta primeira,
entre as quais o comércio e não a lavoura.
Após a demolição da pequena Capela do Divino Espírito Santo, em agosto de
1913, e o imediato ajardinamento da Praça Rui Barbosa, se estabelece o mais nobre
eixo da cidade, através da Rua Batista de Carvalho, em direção às estações da
Sorocabana e Noroeste. Em 1917, durante o período de encampação da NOB pela
União, Machado de Mello doa o terreno triangular e frontal à estação que ganhará seu
nome, fazendo o eixo ir de uma praça a outra.
O Engenheiro Joaquim Machado de Mello foi o proprietário da empresa que
construiu a ferrovia, dono de glebas e áreas de Bauru a Três Lagoas267, no atual Mato
Grosso do Sul. Consta que adquiriu a bela propriedade erguida pelo Engenheiro da
NOB, José Praxedes, um grande casarão assobradado e avarandado ao centro de
um belo jardim. Situava-se na esquina daquela que viria a ser a Praça Machado de
Mello, em frente à estação da NOB, e foi considerada por muito tempo a maior e mais
rica residência da cidade. Nessa morada se deram as festividades de inauguração da
estrada de ferro e outras tantas comemorações importantes ligadas à ferrovia.
266Jornal o Tempo. Ano I, número 138, de 29 out. 1911. Acervo do Museu Municipal.
267ROSA, A. S. A formação urbana de Três Lagoas (MS): o ideário de uma “Cidade Portal” e os
conflitos da terra. 2020. 305 f. Dissertação (Mestrado em Arquitetura e Urbanismo) – Faculdade de
Arquitetura Artes e Comunicação, Universidade Estadual Paulista “Júlio de Mesquita Filho”
(FAAC/UNESP). Bauru (SP), 2020.
196
268 Relatório da Administração do Municipio durante o anno de 1917 sendo Prefeito Municipal o
Dr. Luiz Vicente Figueira de Mello. São Paulo: Sessão de obras de O Estado de São Paulo, 1917,
p.71.
269 PELEGRINA, G. R. Avenida Rodrigues Alves. Notas Históricas. Jornal da Cidade. 23 set. 1992.
270 “Um veiculo de quatro rodas, raios de madeira trabalhado por marceneiro, com assento atrás para
duas ou três pessoas e a boleia na frente para o cocheiro, coberto com capa de couro ou lona
resistentes à inclemência atmosférica, tirados por juntas de cavalos, uma ou duas parelhas, domados
para o mister”. Conforme: PAIVA, C. F. de. Complemento as Narrativas sintéticas dos fatos que
motivaram a fundação de Bauru. Bauru: Conselho Municipal de Educação de Bauru, 1977, p. 39.
BAURU EM TEMAS URBANOS 197
e o espaço persistirá como uma cada vez maior rodoviária improvisada, até o início
da década de 1980, quando é inaugurado o atual terminal rodoviário.
A Machado de Mello nunca se constituiu como acesso digno e condizente com
a cidade, sempre foi, sobretudo, espaço operacional vinculado à ferrovia. Era breve
transposição descampada destinada ao eixo nobre e principal de Bauru, constituído
pela Rua Batista de Carvalho, essa sim, com a Praça Rui Barbosa ao final, o
verdadeiro “cartão postal” da urbe.
A primitiva estação da NOB, como vimos, teve sua entrada transferida em
1917 para posição frontal a Batista, sendo a praça apenas passagem obrigatória.
Entretanto, a nova e monumental estação art déco, inaugurada em 1939, com quase
150 metros de fachada, encerra completamente um dos lados do triângulo que
compõe a Praça Machado de Mello. Com isso, a área livre ganha relevo, não como
acesso nobre à cidade, por se manter como improvisado estacionamento, mas sob
forma de espaço vazio destinado ao enquadramento e visualização do prédio
imponente. A ausência de vegetação e a implantação da estação em cota ligeiramente
mais baixa que a esquina da Rua Batista, oferecia posicionamento visual perfeito para
aquele que seria o “edifício símbolo” da cidade. São inúmeras as imagens fotográficas
a partir desse ângulo, nas quais se percebe o quanto era conveniente existir uma área
livre sem qualquer elemento que pudesse concorrer com o prédio e “distrair” o olhar.
A praça continuava a serviço da NOB.
A Machado de Mello receberá paisagismo somente na primeira administração
de Nuno de Assis (1952-1956), quando se estabelecem os canteiros, caminhos em
mosaico português, postes decorativos e são plantadas árvores ao redor, mantendo-
se o monumento dedicado ao seu doador ao centro. Na reforma são retirados os belos
postes de ferro fundido que lembravam os da Avenida Central do Rio de Janeiro,
“herdados” da Praça Rui Barbosa. Com o crescimento da vegetação, paulatinamente,
a grandiosa perspectiva do prédio da NOB vai sendo encoberta e se perdendo.
Antes mesmo do ajardinamento da praça e talvez preparando o caminho para
sua urbanização, os caminhões e carroças que ali faziam ponto são transferidos para
outros setores nas proximidades, como a Praça das Bandeiras, Rua Júlio Prestes,
Avenida Pedro de Toledo, etc. Era o que exigia a Lei nº. 178 da Câmara Municipal,
divulgada pelo Diário de Bauru no dia 24 de fevereiro de 1950, que estabelecia
também, diversas disposições ligadas ao sistema viário. Ficaram ali, ao redor da praça
ajardinada, apenas os táxis, os ônibus circulares e os intermunicipais. Como não havia
198
Figura 57: Praça Machado de Mello vendo-se o eixo da Rua Monsenhor Claro. Espaço livre
vinculado a NOB. Na foto, ainda, se veem os bonitos postes "herdados" da Praça Rui Barbosa
e o bebedouro para animais, tendo ao centro o monumento e busto de Machado de Mello.
Foto provavelmente dos meados da década 1930 devido às obras da nova estação já estarem
em andamento (à direita)
Figura 58: Vista aérea da cidade com destaque para o imenso prédio da NOB. Na imagem é
possível ver claramente a importância do espaço frontal formado pela Praça Machado de
Mello no sentido de se descortinar o edifício. Como curiosidade, na imagem ainda é possível
ser visto o casarão construído por Machado de Mello envolto em denso jardim, na esquina da
praça com a Rua Primeiro de Agosto
A ferrovia coloca Bauru em posição de destaque, e com ela seu comércio, que
começava a ir além dos limites da cidade. Tal fato fica manifesto no Relatório da
Administração Municipal do Prefeito Dr. Luiz Vicente Figueira de Mello (1915-18),
referente ao ano de 1917:
Dr. Luiz Vicente Figueira de Mello. São Paulo: Sessão de obras de O Estado de São Paulo, 1917,
p.127.
BAURU EM TEMAS URBANOS 201
que as duas horas retiradas da jornada diária de 11 horas, poderia ser utilizada para
o estudo do empregado do comércio275.
Os comerciantes, mesmo individualmente muito poderosos, juntaram suas
forças e fundaram em 1931, a Associação Comercial de Bauru (ACIB), de grande peso
político e social, atuando decisivamente a favor de seus interesses enquanto
proprietários de estabelecimentos comerciais e no sentido de solidificar a cidade como
centro comercial de relevo. A data é significativa, pois traz com ela novo momento
político para o país e período de crescimento para a cidade, que rapidamente se
urbanizava. A ACIB trabalhará por muitas causas no sentido de conquistar melhorias
para a localidade tornando-se centro político de relevo que atuou em questões tão
diversificadas como a construção da Rodovia São Paulo-Mato Grosso, atual Marechal
Rondon, a obtenção da bitola larga da Companhia Paulista e a vinda de órgãos
estaduais para o Município, como a Regional do Departamento Estadual do
Trabalho276.
Em relação aos temas voltados diretamente ao comércio, trabalhará
vigorosamente para que o setor estivesse na vanguarda do Estado, buscando
experiências bem sucedidas da capital para serem aplicadas na cidade. Como
exemplo temos o concurso patrocinado pelo Jornal Correio da Noroeste, com apoio
da ACIB, com chamadas publicadas em várias de suas edições de julho de 1931 277,
no sentido de que o comércio local participasse da “Semana das Vitrines e
Exposições”, que ocorreria juntamente com o período de aniversário da cidade no
início de agosto. Tais promoções que visavam aumentar as vendas e atrair novos
consumidores serão bastante frequentes em toda a história do comércio local.
Poucos anos depois, em 1° de janeiro de 1934 é fundado o Sindicato dos
Empregados do Comércio, presidido pelo empresário Mario Ramos Monteiro278, e em
1948 se estabelece o Sindicato dos Empregados no Comércio de Bauru.
Em 25 de junho de 1944 é criada outra entidade patronal, a Associação
Profissional do Comércio Varejista de Bauru, que atua nas relações trabalhistas de
275 Oficio dos empregados do comércio de Bauru, com data de encaminhamento para a Comissão
de Justiça da Câmara, em 22 de outubro de 1925. Arquivo da Câmara Municipal de Bauru.
276 Bauru Ilustrado. Setembro de 2000, p. 03-04.
277 Jornal Correio da Noroeste. 28 jul. 1931.
278 PIRES, L. Primeiros tempos da nossa Bauru. Fascículo publicado pela Prefeitura Municipal de
Continua fria a
Opinião Publica a
respeito das eleições
municipaes enquanto que
a da Cooperativa da Noroeste
está animadíssima.
(VOX POPOLE)280.
280 Jornal O Trabalho. Ano II, n°. 91, de 26 de novembro de 1925. Acervo do Museu Municipal de
Bauru.
281 FERRAZ, B. Cidades Vivas. São Paulo: Monteiro Lobato & Companhia Editores, 1924.
282 A presença da NOB era tão importante que antes mesmo da formação do Sindicato dos Ferroviários
foram criadas sociedades beneficentes e mutualistas em prol dos trabalhadores da Noroeste, como a
Sociedade Beneficente dos Empregados da Estrada de Ferro Noroeste do Brasil, de 1909, e a
Sociedade Beneficente 19 de Junho de 1927. Histórico. Sindicato dos Trabalhadores em Empresas
Ferroviárias de Bauru e Mato Grosso do Sul, 2020. Disponível em:
<http://www.sindferroviariosbauru.com.br/historico.php>.
283 Com a construção do novo prédio da NOB todas as ferrovias aportadas na cidade, ali passam se
concentrar, cada uma delas ocupando área especifica do edifício. Para tanto houve permissão do
Presidente Getúlio Vargas, através de Decreto Federal.
204
constituído pela Rua Batista de Carvalho até a Praça Rui Barbosa, será o local mais
bem cuidado, recebendo fartos investimentos públicos e privados durante várias
décadas. Era o coração da cidade.
Nos versos modernistas da poesia Bauru do poeta Rodrigues de Abreu (1897-
1927), capivariense radicado na cidade, a Batista de Carvalho era também o centro
dos negócios e local por onde circulavam os muitos forasteiros que por Bauru
passavam:
284 Poemas Rodrigues de Abreu. Portal São Francisco, 2020. Disponível em:
<https://www.portalsaofrancisco.com.br/obras-literarias/poemas-rodrigues-de-abreu#16>.
BAURU EM TEMAS URBANOS 205
um- importante para a economia local. Parece-nos, ainda, que a questão principal
não era necessariamente, a existência dos bordéis, mas sua presença escancarada,
aos olhos de todos em área nobre.
Figura 59: O movimentado eixo da Rua Batista de Carvalho a partir da Praça Machado de
Mello
Fonte: Revista Ouro Verde, Revista Mensal da Zona Noroeste, Bauru, Ano 1, nº. II, jul. 1931.
Museu Ferroviário Regional de Bauru.
285A prefeitura indicou uma área no Jardim das Orquídeas, zona afastada e popular no extremo leste
da cidade, para abrigar a zona de prostituição, alcunhada de “Formigueiro”. A exceção se dá apenas
para a Casa da Eny que se transfere para um grande complexo situado no trevo da Rodovia Marechal
Rondon com a Bauru-Ipaussu, ao sul da cidade, momento em que ganha projeção nacional. Sobre o
assunto ver: MELLO, L. Eny e o grande bordel brasileiro. Rio de Janeiro: Objetiva, 2002.
206
A zona central era espaço a ser preservado de pessoas não desejadas, entre
elas os mendigos, andarilhos e os muitos doentes que perambulavam pelas cidades
da Zona Noroeste pela ferrovia. Havia grande esforço das autoridades em afastá-los
das áreas mais nobres. Entretanto, só mesmo através da força eles eram escondidos
dos olhos de todos, já que as estações situavam-se nas áreas centrais. Dos problemas
mais graves era a lepra, doença infectocontagiosa que até aquele momento não
possuía cura. Seus portadores eram desprezados e humilhados em todas as cidades
por onde passavam. Os municípios da zona formaram, em 1927, o “Convênio das
Municipalidades”, com o objetivo de arrecadar fundos para a criação de um grande
asilo286. Em 1933 foi estabelecido em Bauru o Asilo Colônia Aymorés para tratamento
da hanseníase, amparado por medidas jurídicas do Estado e com o apoio do meio
cientifico da época. Constituía-se, praticamente em outra cidade, afastada do centro
urbano, dotada de inúmeras instalações como casino, cinema, igreja, praça, coreto,
correio, quadras, cemitério, carviles, residências para famílias, parlatório, áreas de
produção agrícola, etc. Era local de isolamento compulsório, quase uma prisão. Com
sua exclusão forçada e obrigatória do cenário urbano, e a constituição de uma “cidade
paralela”, o problema da hanseníase será “resolvido” na região, afastando-se aqueles
antes considerados inconvenientes das áreas nobres e centrais.
Assim como a demanda do Asilo Colônia, de forma frequente Bauru
capitaneará os interesses da Região Noroeste frente às inúmeras reinvindicações
junto ao Governo do Estado, entre as quais aquelas que diziam respeito às estradas
de rodagem que as ligasse entre si e em direção a capital. Dessa forma, a estrada
para veículos já começa a mostrar sua importância para a economia da região 287
expresso claramente no Congresso Regional da Noroeste no ano de 1926288.
286 Histórico. Instituto Lauro de Souza Lima (ILSL), 2020. Disponível em:
<http://www.ilsl.br/museu/museu2.php>.
287 Tal situação começa a ocorrer de forma mais constante a partir da construção das ferrovias que se
destinavam ao extremo oeste do Estado, durante o início do século XX, como a Alta Sorocabana, Alta
Paulista e Noroeste. Essas vão possuir privilégio de zona, podendo explorar sem concorrência os
trechos entre os cursos d’água praticamente paralelos, que deságuam no Rio Paraná. Alta Sorocabana,
entre Rio Paranapanema e Peixe; Alta Paulista, entre Peixe e Rio Aguapei; e Noroeste do Brasil, entre
Aguapei e Rio Tietê. Apenas as cidades por onde passavam os trilhos das empresas serão beneficiadas
pela ferrovia, ficando todo o restante das respectivas zonas entre os rios, dependente de outras formas
de transporte. Caminhões, jardineiras e automóveis particulares seriam a solução, desde que houvesse
estradas de rodagem com qualidade mínima.
288 Em 23 de março de 1926, o Diário da Noroeste divulga o Congresso Regional da Noroeste onde
participariam as urbes e povoações da zona e pelo texto percebe-se a ansiedade geral para que vias
e estradas chegassem até o "pé da linha" com destino às cidades e propriedades rurais não atingidas
pela ferrovia. Enfatizam as dificuldades em se escoar os produtos plantados nos sítios e fazendas
devido à precariedade dos caminhos vicinais. Jornal Diário da Noroeste. 23 mar. 1926.
BAURU EM TEMAS URBANOS 207
Figura 60: Rua Batista de Carvalho provavelmente na década de 1950. Nesse momento
reúnem-se na via exemplares da arquitetura eclética, art déco e moderna
empresa, inclusive, passou a contar com Diretoria Regional em Bauru, ainda nos anos
1960.
Tais órgãos acolhiam milhares de funcionários públicos que davam à cidade
perfil de classe média, atendida exclusivamente pelo comércio e serviços locais,
ajudando-os a tornarem-se mais fortes e dinâmicos.
A boa acessibilidade por estradas de rodagem, ferrovias e até mesmo por
aerovia favorecia os negócios, àqueles direcionados à Zona Noroeste e ao Estado do
Mato Grosso. A presença dos "caixeiros viajantes", "mascates", "mercadores
ambulantes" e "vendedores de porta a porta", era constante, garantindo, já no ano de
1926, a ocupação dos 24 hotéis e 12 pensões292, do centro comercial.
A quantidade de hotéis é surpreendente, visto que no Plano Diretor de 1996
é apontado que, passados quase quarenta anos e a cidade ter crescido muito, havia
31 hotéis em Bauru293. Frise-se que, nesse computo de 1926, certamente não estão
consideradas as dezenas de “pensões” ligadas às atividades de prostituição,
consideradas “não familiares”. Essas eram listadas em categoria a parte, tendo em
tese, sob controle da polícia local, os livros de registro dos hóspedes.
Os hotéis eram serviços importantes em uma cidade cuja centralidade e
acessibilidade eram qualidades fundamentais, tanto é assim que serão altos os
investimentos nesse tipo de negócio. Durante as primeiras décadas eles se
concentrarão junto à estação da Sorocabana e NOB, como os Hotéis Cariane, Estoril,
Milanese, Progresso e outros tantos menores. A partir dos anos 1940, passam a
ocupar as quadras acima em direção à leste, como na esquina da Rodrigues Alves
com 13 de Maio, onde será erguido o grande e luxuoso Emes Hotel, em estilo art déco.
Também um dos primeiros prédios modernistas, inaugurado em 1954, será o hotel
Cidade de Bauru, localizado ainda hoje na esquina da Rua Primeiro de Agosto com
Agenor Meira, secundado pelo Alvorada Palace Hotel, também na Primeiro de Agosto,
e o Hotel Colonial junto à praça Rui Barbosa, todos um pouco posteriores. Outros
existiram e já foram demolidos, como o Hotel Central, porém, em novas áreas do
centro que não nas imediações das estações.
O comércio inicial, muito generalista, com o tempo ganha maior
especialização em ramos diversificados, para atender a clientela que se tornava mais
294 Guia Bauruense. Publicação Anual, Setembro de 1949, p. 70 e 71. Acervo do NUPHIS.
295 Jornal Diário de Bauru. 04 ago. 1949.
BAURU EM TEMAS URBANOS 211
Figura 61: Propaganda da Loja Pagani situada na Batista de Carvalho, essa será a primeira
sede da loja transferida para o Palacete Pagani no final dos anos 1930
Fonte: Revista Ouro Verde, Revista Mensal da Zona Noroeste, Bauru, Ano 1, nº. II, jul. 1931.
Museu Ferroviário Regional de Bauru.
O fato é que, aos poucos, as jardineiras vão se impondo para transporte das
pessoas às cidades vizinhas que não dispunham de acesso por trem. A partir dos
212
anos 1920, as demandas nesse sentido são bastante comuns para a Câmara da
cidade, como aquela que chegou à sessão de 23/10/1922 que solicita a organização
de, “transporte de passageiros e cargas, por meio de auto-band, auto-ominibus,
jardineiras e outros vehiculos permanentes com motor a gazolina, pelas estradas
deste municipio”296.
Na sessão de 11/11/1922 a Câmara Municipal acata a concessão de um
serviço de ônibus de Bauru a Piratininga a ser realizado pelo senhor Eugenio
Paulucci297. Contudo, pedidos semelhantes não eram raridade e são encontrados nas
atas durante toda década e destinados a cidades variadas como Cabrália, Agudos,
etc.
As rodovias, por sua vez, melhoravam de qualidade e o transporte individual,
ainda um luxo, conquistava as famílias endinheiradas. Os caminhões também eram
vistos frequentemente nas atividades laborais da cidade. Dessa forma os veículos
automotores privados se colocavam como opção de futuro e os planos de rodoviária
no centro da cidade e, de preferência ao lado da estação da NOB, era desejo até
mesmo de seu Superintendente. Frise-se que o uso da Praça Machado de Mello como
local de carga e descarga, embarque e desembarque e estacionamento de veículos
para a estação, somados à improvisada e cada vez mais demandada rodoviária,
causava transtornos frequentes ao setor. Deslocar a rodoviária para a lateral da NOB
poderia ser uma solução bastante razoável.
O anteprojeto modernista da Rodoviária para Bauru era do Arquiteto
bauruense João Cacciolla, através da Construtora Módulo S/A, da capital do Estado,
na qual também faziam parte o Arquiteto Ariosto Mila e o Engenheiro também
bauruense, Murilo Vilaça Maringoni. Deveria se localizar na quadra 01 da Rua
Primeiro de Agosto previa a demolição dos antigos escritórios da Noroeste,
construídos em 1905 e, da Vila de seus funcionários denominada Machado de Mello;
ao lado, duas quadras que formavam um desenho triangular, contíguo à grande
estação.
A proposta se constituía de espaços abertos, com quatro marquises de
concreto alinhadas para parada dos ônibus entre dois edifícios modernistas de dez
pisos. As marquises lembram muito as plataformas construídas no prolongamento da
gare da NOB para parada de trens, bastante elegantes e com apoio central, também
projetadas e calculadas pelo Engenheiro Murilo Vilaça Maringoni.
Os prédios seriam dotados de comércio no térreo e os andares superiores
destinados a hotel, residências dos funcionários da NOB e escritórios da ferrovia
realocados devido à demolição do conjunto existente, indicada pelos arquitetos. Era
um projeto grandioso e multiuso, em sintonia com a sua localização central. Se
construídos, a um custo estimado de 15 milhões de cruzeiros, seriam os primeiros
arranha-céus modernistas da cidade e a rodoviária, uma das maiores do interior do
Estado.
Assim é descrita a nova estação pelo Diário de Bauru:
A parte térrea será ocupada com uma serie de salões para lojas e
casas comerciais, e nos pavimentos superiores, em numero de dez,
serão feitas acomodações para escritórios da Estrada, residências de
empregados, apartamentos de um grande hotel, com salões para
festas e recepções298.
Figura 62: Projeto para rodoviária de Bauru, no centro da cidade, no local onde hoje funcionam
o Museu Ferroviário Regional e a Vila da Noroeste, ao lado da gare da NOB. Interessante
notar a arquitetura modernista bastante inovadora para a cidade
299 Na realidade, todo processo de opção pelo rodoviário começa antes no Estado, com a formação do
Departamento de Estradas de Rodagem DER, em 1934. Em 1946, torna-se autarquia e, em 1948,
forma as cinco primeiras Divisões Regionais, entre as quais a de Bauru. No segundo mandato de
Ademar de Barros (1963-1966) inicia-se a construção das "super-autoestradas", como eram tratadas,
e justamente pela rodovia Castelo Branco, que se destinava até o oeste paulista. Seria o início de malha
que hoje conta com 35 mil quilômetros de vias pavimentadas e duro golpe nas ferrovias do Estado.
Memória do DER. Departamento de Estradas de Rodagem (DER), 2019. Disponível em:
<www.der.sp.gov.br/WebSite/Institucional/MemoriaTransporte.aspx>.
300 Ver sub-capítulo referente à legislação municipal.
301 LOSNAK, C. J. Polifonia Urbana. Bauru: EDUSC, 2004, p. 201.
BAURU EM TEMAS URBANOS 215
Figura 63: Rua Batista de Carvalho, esquina com a Rua Azarias Leite, em foto provavelmente
dos anos 1950. Foto Giaxa
302
Rua Batista de Carvalho, uma rua de personalidade (ou a Augusta bauruense). Jornal Diário de
Bauru. 01 ago. 1967.
216
Uma das pontas do eixo e sua grande força desde o início do século, se
extingue definitivamente no ano de 1996 com a concessão privada da ferrovia que se
volta apenas ao transporte de cargas, dando as costas à cidade e abandonando as
edificações principais. O transporte de passageiros deixa definitivamente de existir,
muito embora já estivesse precário e decadente há pelo menos duas décadas, sendo
seu encerramento apenas a última gota do agonizante processo.
O reflexo logo é sentido nas primeiras quadras da Batista, que começa a
abrigar comércio mais popular. Os hotéis da região que recebiam os viajantes da
ferrovia reduzem o padrão de clientela para sobreviver e anos depois muitos estarão
fechados.
Na década de 1980, é construído um pequeno posto policial na Praça
Machado de Mello, paulatinamente ampliado, sendo mais um exemplo de interferência
espúria no espaço público. No aniversário de 100 anos da cidade, em 1996, quando
parte do comércio ao redor já estava fechado e as construções do entorno em fase de
abandono, a Praça foi totalmente remodelada sem qualquer ganho maior para ela ou
para a vizinhança.
Na outra extremidade, a Praça Rui Barbosa sofre com o abandono e
descuido309 a partir dos anos 1980, perdendo a força de atração primordial para a
cidade, mesmo com a reforma de 1991.
Aos poucos o eixo comercial leste-oeste deixa de ser relevante e é retomada
a histórica vocação da cidade, no destino norte-sul, como já havia sido nos tempos da
Araújo Leite, a partir do redirecionamento dos negócios para os Altos da Cidade.
Se as ruas relativamente largas do centro por decênios comportaram de forma
eficiente o movimento comercial e com ele o de veículos, por volta dos anos 1980 a
estrutura viária da região parecia ter chegado ao seu limite. O trânsito de veículos no
centro tornar-se-á congestionado e as dificuldades de estacionamento se faziam
sentir, acabando por prejudicar a acessibilidade ao comércio. Para tentar minorar o
problema, o revezamento do estacionamento público é implantado com experiências
que vão da zona azul até os parquímetros, voltando-se novamente para a área azul,
ou verde.
Tal situação facultou com que algumas vias direcionadas aos bairros mais
ricos, ao sul da cidade, como Rio Branco e Gustavo Maciel, prenunciassem novo
310 Lançado oficialmente o Projeto do nosso shopping. Jornal Diário de Bauru. 05 set. 1985.
220
311
Tal empreendimento encontra-se paralisado até nossos dias.
312
Não só os shoppings buscaram posição como essa, em Bauru a Loja Havan, ocupará área frontal à
Rondon, no local onde estava situado o "Auto Cine Pop Top".
BAURU EM TEMAS URBANOS 221
313 Ver: BRAMBILLA, R.; LONGO, G. For Pedestrians Only: Planning, Design and Management of
Traffic-Free Zones. New York: Witney Library of Design, 1977.
314 BONI, D. M. S. Paisagem cultural da rua para pedestres em centro urbano consolidado. 2018.
mais bonita, tranquila, sem a poluição sonora e do ar que havia antes e ainda
possibilitou maior liberdade de acesso às lojas pelos consumidores. A obra dotou a
via de novo piso, escoamento de águas pluviais por grelhas e a equipou de mobiliário
urbano trazendo mais conforto ao usuário. Nova iluminação mais baixa foi executada,
mas os antigos postes de concreto padrão CPFL permaneceram e sua fiação
continuou exposta, devido ao alto custo em torná-la subterrânea.
O calçadão não acabou com o conflito total entre o trânsito motorizado e os
pedestres, ao menos nas esquinas das transversais, que possuem livre fluxo de
veículos. Com o tempo, semáforos foram instalados nos cruzamentos na tentativa de
disciplinar a passagem das pessoas e dos automotores.
No ano de 1999, a Prefeitura Municipal trouxe a arquiteta Regina Meyer,
coordenadora do Viva o Centro de São Paulo, para discutir, em workshop organizado
pela Unesp, Prefeitura e Sincomércio, o Centro de Bauru. Várias medidas foram
elencadas, dentre as quais, a revitalização de fachadas317.
Foi criado incentivo fiscal a partir de Lei Municipal, onde o valor gasto nas
reformas dos exteriores das lojas poderia ser abatido no IPTU dos anos 2003 e 2004.
Muitos comerciantes se animaram a remodelar seus estabelecimentos, voltando-se à
arquitetura original a partir da retirada das estruturas metálicas e dos luminosos
desproporcionais318. Diversas construções históricas foram "redescobertas" e
valorizadas nesse momento pelo fato de estarem escondidas há muitos anos. Houve,
ainda, maior controle dos elementos visuais em razão destes "brigarem" e interferirem
nas coberturas dos arcos da via. Infelizmente, tais medidas, muito adequadas, foram
sazonais e não se mantiveram à posterior.
O calçadão, mesmo com as sucessivas reformas cosméticas feitas nele nos
anos seguintes, não conseguiu deter o processo de transferência do comércio e
serviços para outros setores da cidade. É bem possível que tenha acelerado seu
andamento devido à ausência de medidas complementares que precisam ser
previstas em projetos dessa ordem. Entre as quais, aquelas no sentido de se resolver
questões como a inacessibilidade e insegurança noturna, redução de vagas de
estacionamento, a preservação do patrimônio histórico e o abandono paulatino do
centro como área de moradia. A falta de vida a noite é fator preocupante para região,
317 RIGITANO, M. H. C.; ANANIAN, P. Intervenções urbanas em áreas centrais, o caso de Bauru.
Bauru: Workshop organizado pela Unesp, Prefeitura e Sincomércio, 1999.
318 Idem.
BAURU EM TEMAS URBANOS 225
pois, como aponta Jane Jacobs (2000) em seu clássico livro Morte e Vida de Grandes
Cidades, “uma rua movimentada consegue garantir a segurança; uma rua deserta,
não..." pois, "devem existir olhos para a rua, os olhos daqueles que podem chamar de
proprietários naturais da rua”319.
A ênfase dada ao projeto de calçadão foi àquela relativa aos fatores
econômicos relacionados com a perda de lojas que saíam do centro para outras zonas
e shopping, concentrando-se quase exclusivamente na questão do fechamento e
tratamento da via. Faltaram diretrizes que abordassem o centro e seus problemas
como conjunto.
A bem da verdade, atribuir unicamente à rua de pedestres todas as mazelas
posteriores do centro seria injusto, pois parte delas já havia ocorrendo há mais tempo
em processo multifatorial.
O calçadão, juntamente com a reforma equivocada da Praça Rui Barbosa,
que ao invés de apontar pela preservação, indicava o descompromisso com a história
local, somado à ausência de providências complementares que pudessem tratar o
centro como um todo e não apenas a Batista de Carvalho, concorreram para criar
novos problemas na área. As obras do centro e a descaracterização do principal
espaço público da cidade, serviram de aval e incentivo para a destruição ou mutilação
de diversas construções privadas centrais de interesse histórico.
Após as obras, e a partir da década de 1990, não se veem maiores
investimentos na zona central, tanto da iniciativa privada como do poder público. As
construções verticais que inicialmente estavam ali concentradas, da mesma forma que
parte do comércio, buscaram outras regiões consideradas mais nobres. Tal processo
não ocorreu apenas com os prédios comerciais; migraram os novos edifícios
residenciais que também estrearam na cidade pelo centro. Dessa forma, a região
deixa de ser interessante como locus do investimento privado para a construção
multifamiliar colaborando para sua monofuncionalidade atual. Os imóveis residenciais
em andares ali existentes permanecem, mas, assim como seus antigos moradores,
envelhecem.
Os edifícios históricos continuam padecendo do pouco caso habitual. As
estruturas construídas dessa região têm sofrido com o tempo e a falta de conservação.
Apenas pequenas obras e reformas de superfície tem ocorrido, principalmente devido
319 JACOBS, J. Morte e Vida de Grandes Cidades. São Paulo: Martins Fontes, 2000, p.35.
226
320 Jornal Diário de Bauru. 15 mar. 1992. Matéria publicitária de uma página.
BAURU EM TEMAS URBANOS 227
quadrado lá chega a custar até R$4,5 mil. Boa parte do dinheiro que circula em Bauru
passa por essa rua"321. Isso denota que a via ainda possui muita força, e os imóveis
ali existentes, alto valor enquanto propriedade.
Curioso apontar que, paulatinamente, o nome Batista de Carvalho vai sendo
deixado de lado a favor do termo Calçadão, que o tem substituído nos últimos tempos.
Dessa forma a rua que já foi Da Estação, para alguns Dos Esquecidos, e durante
dezenas de anos Rua Batista de Carvalho, vai adquirindo, no dia-a-dia, outra
denominação.
Os bancos, embora tenham aberto filiais nos novos setores de serviços da
cidade, ainda mantém suas principais agências no centro, todavia, as revoluções
tecnológicas conduzem à necessidade cada vez menor de atendimento físico, o que
certamente acarretará mutações nesses espaços também.
A livre acessibilidade provocada pelos veículos privados, somados a outros
fatores, descentralizou os negócios, atualmente espalhados pelas principais avenidas
arteriais e a zona sul em particular. A mudança desse modelo está muito além das
questões locais, e não há como desprezá-las. Cabe aos comerciantes mais
inovadores do centro e seus órgãos de representação, a partir da realidade brasileira
e local, ambicionar outros conceitos.
Incorreto seria dizer que o centro se exauriu com o passar do tempo.
Acreditamos que essa é falsa premissa, e, por vezes, carregada de preconceito, mas
certamente teve mudado o perfil de sua clientela, tornando-se mais popular.
Apresenta grande vitalidade a partir da gama variada de pessoas que o frequenta. O
ambiente é plural, não obstante os problemas com a população em situação de rua e
drogados, mais visíveis no centro, mas não privilégio dessa zona. A diversidade e a
heterogeneidade humana, somada a de grupos como ONG’s, artistas de rua,
cooperativas, etc., podem vir a ser um ganho para a região e não sua ruína.
A recuperação e revitalização do centro ainda dependem da busca de outras
formas de atração, além daquelas patrocinadas naturalmente pelo comércio e
serviços. Novos parâmetros precisam ser buscados para que o comércio central tenha
condições de rivalizar, e de outra forma, com espaços climatizados, limpos, seguros
e com os imensos estacionamentos como os dos shoppings centers.
Cabe à zona central e seus líderes sempre tão atuantes buscarem outras
referências a se somar a seus valores, passando, a nosso ver, necessariamente pela
preservação e restauração de seu patrimônio histórico e o cuidado com os espaços
livres. Diferentemente do que muitos creem ser problema, o tombamento de bens
públicos e privados, em grande parte situados no centro, podem vir a ser fator
fundamental para o início da requalificação da área. É o que pode distingui-la de outras
zonas mais novas e vulgares; é o que pode vir a reforçar a sua identidade e a atrair
novos olhares àquela região.
Grande erro seria sanear o centro da cidade e despossuí-lo de sua nova
identidade, mais popular e heterogênea, de seus novos comerciantes imigrantes
coreanos e chineses. Não há mais como retomar o centro aos moldes anteriores, onde
havia consumo mais elitizado. Não há a mais remota chance para o saudosismo. O
que pode ser buscado é outra configuração para a zona, a partir da forma com que
ela hoje se apresenta, intensificando-se o uso para a população de maneira geral ao
mesmo tempo em que ocorrem intervenções na paisagem com algum controle. Ou
seja, não há como se voltar no tempo e buscar-se retomar a velha identidade do
centro, há que se buscar outra a partir dos elementos hoje ali dispostos alicerçados
em suas memórias entre as quais a arquitetônica.
Propostas voltadas à construção de um novo centro direcionado ao turismo,
requalificando-o totalmente, a simples limpeza das estruturas no sentido de criar-se
cenário falso, maquiado e a higienização social seriam completos desastres, desses
que se encontram em cidades turísticas – fake – de alguns países. Tais diretrizes,
além de fantasiosas, seriam irreais, desumanas e despropositadas.
A habitação popular pode ser caminho em busca de emprego ainda mais
intenso e socialmente justo para a área central, em particular para a intensificação de
uso nos horários noturnos. As ruas abaixo da Ezequiel Ramos até a ferrovia e as
primeiras quadras da Quinze de Novembro, Sete de Setembro, Cussy Junior,
Bandeirantes e Avenida Pedro de Toledo poderiam abrigar conjuntos de prédios
populares a partir de aprovação de legislação menos restritiva e algum impulso
através de isenções.
O Plano Diretor de 2008, percebendo a questão, em seu Artigo 25 reconhece
o "esvaziamento" da área central e aponta algumas diretrizes:
323
Lei de Primeiro de Outubro de 1828, criando em cada cidade e vila do Império Câmaras Municipais.
Sobre os Códigos de Posturas ver artigos 71, 72 e 73.
232
indicava sutilmente o desenho reticulado: “Art. 1º Todas as ruas e travessas que forem
abertas nesta Villa terão 13 metros e 20 centímetros de largura, e as praças e largos
serão quadrados, sempre que ao terreno o permitir”324.
O artigo que tratava do arruamento, devido à importância, era sempre o
primeiro nos Códigos de Posturas e no geral se pareciam muito, com termos
semelhantes, fato que ajuda a explicar os repetidos desenhos em xadrez das cidades
paulistas do período325. A Assembleia Provincial parece conduzir tais documentos a
um "modelo" de cidade com vias amplas e de largura semelhante e também com
desenho similar, como pode ser observado pelo centro urbano das cidades do interior
criadas nesse tempo.
Será apenas em 19/02/1906, com a vinda de duas das mais importantes
ferrovias, que a Câmara Municipal de Bauru elaborará um Código de Posturas próprio.
Em 1914 foi editado novo Código de Posturas, Lei nº. 56, de 24/01/1914326, e
seu foco dizia respeito à manutenção da limpeza pública e doméstica, devido às
doenças que graçavam no espaço urbano. Outro aspecto que se tornou praticamente
obsessão para as administrações públicas nessas cidades era a regularização das
vias e seu alinhamento, fato que se refletia nos artigos da lei.
Em Bauru isso fica expresso na matéria do Jornal O Dilúculo em 20/08/1916,
que apontava tal medida para as duas principais ruas do eixo central e também a
avenida que depois se chamaria Rodrigues Alves: “
Soubemos que é intenção do Sr. Dr. L.V. Figueira de Mello muito digno
e zeloso Prefeito Municipal, mandar alinhar as guias dos passeios das
ruas 1º De Agosto, Baptista de Carvalho e Avenida Alfredo Maia, em
uma largura de 3m327.
324 Código de Posturas Municipal da Villa de Espírito Santo da Fortaleza. 05 nov. 1892.
325 GHIRARDELLO, N. A formação dos patrimônios religiosos no processo de expansão urbana
paulista (1850-1900). São Paulo: Editora UNESP, 2010.
326 Código de Posturas de 1914 encontrado parcialmente reproduzido no Jornal A Gazeta de Bauru.
330
Código de Posturas de Bauru de 1928, p.5.
331GHIRARDELLO, N. Aspectos do Direcionamento urbano de Bauru. 1992. 196 f. Dissertação
(Mestrado em Arquitetura) – Escola de Engenharia de São Carlos, Universidade de São Paulo. São
Carlos (SP), 1992, p. 163.
BAURU EM TEMAS URBANOS 235
A lei não foi criada para regular os loteamentos em si, contudo, ao tratar da
venda de lotes em prestações, sua finalidade primeira acabou por fornecer algumas
diretrizes quanto às exigências de aprovação local.
Em 1965, através da Lei Federal nº. 4.778 é acrescentado um parágrafo novo
na Lei:
Para atender o Decreto Federal n°. 58 a Prefeitura de Bauru vai criar o Decreto
nº. 25 muitos anos depois, em 03 de junho de 1947. Na lei são expostos alguns
motivos para sua criação, entre os quais:
332 BAURU. Lei nº. 4.778, de 22 de Setembro de 1965. Dispõe sobre a obrigatoriedade de serem
ouvidas as autoridades florestais na aprovação de plantas e planos de loteamento para venda de
terrenos em prestações.
333 CONSTANTINO, N. R. T. A construção da paisagem de fundos de vale: O caso de Bauru.
334 Idem.
BAURU EM TEMAS URBANOS 237
335 BRASIL. Decreto-lei nº. 58, de 10 de Dezembro de 1937. Dispôe sôbre o loteamento e a venda de
terrenos para pagamento em prestações. Diário Oficial da União. Disponível em:
<http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/Decreto-Lei/1937-1946/Del058.htm>.
238
336 BRASIL. Lei nº. 5.172, de 25 de Outubro de 1966. Denominado Código Tributário Nacional.
337 BRASIL. Decreto nº. 59.917, de 30 de dezembro de 1996. Regulamenta o SERFHAU - Serviço
Federal de Habitação e Urbanismo, estabelece suas finalidades e modo de operação, cria o Fundo de
Financiamento de Planos de Desenvolvimento Local Integrado, e dá outras providências. Diário Oficial
da União. Seção 1 de 9 de Janeiro de 1967, p. 310. Disponível em:
<https://www2.camara.leg.br/legin/fed/decret/1960-1969/decreto-59917-30-dezembro-1966-400520-
publicacaooriginal-1-pe.html>.
338 Plano Diretor de Bauru de 1996, p.01.
BAURU EM TEMAS URBANOS 239
Angela Martins Napoleão Braz e Silva, em seu trabalho sobre o VIII CIAM,
indica que a concepção espacial do Centro Cívico deveria possuir três características
básicas:
342 BRAZ E SILVA, A. M. N. 8º CIAM: Ideias antigas e uma nova atitude para o planejamento urbano.
Cadernos de Arquitetura e Urbanismo, vol. 17, nº. 20, 2010, p. 71.
343 Publicação de "El Corazón de La Ciudad - VIII CIAM". Cronologia do Pensamento Urbanístico,
Figura 67: Maquete volumétrica do Centro Cívico de Bauru, proposto pelo Plano Diretor do
CPEU/USP
trabalho elaborado pelo CPEU. Seu nome será "Plano Diretor de Bauru", forma como
será tratado para distingui-lo do "Plano Diretor do CPEU/USP".
Na publicação Bauru, Cidade Sem Limites, que se ocupa da administração do
prefeito Alcides Franciscato, encontramos a explicação de Bueno Filho para esse
novo plano, em um artigo intitulado O Plano Diretriz de Desenvolvimento de Bauru,
onde dizia que, em sua opinião, era inviável se elaborar Plano Diretor nos moldes
clássicos para Bauru. Contudo, seria necessária a realização de “ideias” para orientar
os programas e orçamentos municipais evitando-se o desperdício de recursos, mas
com a necessária “visão de conjunto”: “Assim, foi abandonada a ambiciosa idéia de
um “Plano Diretor Formal”, nos moldes dos países desenvolvidos e se procurou (...)
chegar a um conjunto de diretrizes básicas”347.
O novo documento denominado "Plano Diretor de Bauru", bastante sintético,
faz análise e diagnóstico abreviado dos principais problemas locais, que em parte
coincidem com aquelas apresentadas no Plano do CPEU/USP:
1) a setorização da cidade em três partes: Falcão, Bela Vista e "Cidade";
2) rodovias e tributários do Rio Bauru completando a cisão;
3) duas vilas (Bela Vista e Falcão) com 2/3 da população e maior crescimento
demográfico;
4) o centro encontra-se deteriorado;
5) o comércio central é polarizado e o dos bairros disperso;
6) sistema de abastecimento local concentrado em feiras livres e
supermercados;
7) quase inexistência de áreas verdes;
8) indústrias maiores ao longo dos eixos ferroviários e as menores junto as
áreas comerciais e habitações;
9) o traçado viário é homogêneo, sem hierarquização, ineficiente no centro e
excessivo nos bairros;
10) as rodovias devido a expansão urbana estão sendo incorporadas pela
área urbana, setores urbanos ainda não estão ligados entre si;
11) loteamentos são excessivos e dispersos trazendo para a prefeitura a
responsabilidade de implantação de infraestrutura348.
347
Bauru, Cidade Sem Limites. Administração Alcides Franciscato, 1971. Fascículo do Museu
Ferroviário Regional de Bauru.
348 O Plano Diretor de Bauru. Documento resumido da proposta. Arquivo da SEPLAN. p. 2 e 3.
248
Figura 68: Capa de O Plano Diretor de Bauru. Documento elaborado pelo Escritório Técnico
da Prefeitura Municipal de Bauru tomando como base o Plano Diretor do CEPEU/USP
Nas pranchas não fica claro onde estariam situados cada um dos prédios
apontados para o Centro Cívico, nem suas massas. A área é apenas delimitada como
250
um todo. Seu polígono fica bem menor que na proposta original, passa a ser
circunscrito pelas primeiras quadras da Avenida Rodrigues Alves, até a Rua Azarias
Leite, um grande viaduto projetado sobre o pátio ferroviário a partir da quadra 01 dessa
avenida, toda a baixada do Jardim Bela Vista, fechando-se com o Viaduto JK e a Rua
Azarias Leite. Não se define área exclusiva para pedestres, ou mesmo passarelas
privativas para transeuntes ligando os dois setores cortados pelo Ribeirão Bauru e
ferrovia, ao contrário, a circulação se daria por vias convencionais utilizando-se o
veículo automotor.
Com o passar dos anos alguns dos edifícios imaginados para o Centro Cívico
de Bauru foram erguidos nas duas extremidades do viaduto JK, como o Fórum, a
Secretaria da Fazenda do Estado, o INSS e a Delegacia Regional de Polícia. Contudo,
à exceção do Fórum e Secretaria da Fazenda, um ao lado do outro, o pretenso
conjunto é disperso e desagregado, de forma alguma lembrando um Centro Cívico.
Soma-se o desnível topográfico existente entre o centro da cidade e o Jardim Bela
Vista que concorre, ainda mais, para falta de coesão do que poderia vir a ser um pólo
político/cultural/administrativo. A amarração pretendida jamais se deu e a
denominação de "Centro Cívico" para o setor ficou muito mais como uma “herança
formal” do primeiro Plano do CPEU USP, do que situação física real.
O Plano Diretor de Bauru ainda apontava as obras em execução pela
prefeitura, elaboradas a partir do Escritório Técnico. Entre elas figuravam a
canalização de parte do Ribeirão Bauru; o projeto de trevo ligando a Marginal do
Ribeirão Bauru à Bela Vista (não efetivado); Avenida Nações Unidas, trecho
Rodrigues Alves até a Marechal Rondon (nesse momento efetivado até a Rua Aviador
Gomes Ribeiro); a duplicação do viaduto Mauá em direção à Vila Falcão; a
remodelação da Pedro de Toledo; construção da Avenida Daniel Pacifico unindo Bela
Vista e Falcão; a construção do viaduto João Coube na Rodrigues Alves sobre a
Rodovia Marechal Rondon (SP-300), duplicada pelo DER; construção de prédios
escolares; dois estádios distritais; um novo distrito industrial às margens da Bauru-
Ipaussu, próximo do prolongamento da Avenida Rodrigues Alves e diversas praças
públicas, entre elas: República do Líbano, Espanha, Luiz Zuiani, Portugal, Santos
Dumont, Alemanha, Da Bíblia, Pioneiros e Carlos Cariani.
Para os quatro anos seguintes de administração as obras deveriam avançar
focadas nas conclusões dos serviços acima, particularmente o prosseguimento da
Avenida Nações Unidas e da Nuno de Assis.
BAURU EM TEMAS URBANOS 251
351 O Plano Diretor de Bauru. Documento resumido da proposta. Arquivo da SEPLAN. p. 10 a 13.
252
Figura 69: Prancha do Sistema Viário do Plano Diretor de Bauru, onde, entre outras novas
vias e extensões, encontra-se o traçado da Avenida Nações Unidas quase por completo,
incluindo-se o setor norte sem o parque
Figura 70: Prancha do Sistema Viário do Plano Diretor de Bauru, detalhe da região onde
estaria situado o Centro Cívico, área compreendida entre: Avenida Rodrigues Alves, um novo
viaduto sobre a ferrovia, a atual Avenida Nuno de Assis e Rua 13 de Maio
vias principais certos empregos que até então se instalavam onde bem entendiam.
Tal procedimento reforça as avenidas, já naturalmente relevantes, para comércio e
serviços, como áreas de prestígio e valor.
Contudo, o excessivo detalhamento dos usos, a proibição de alguns
considerados totalmente inofensivos à vizinhança e a inexistência de muitos deles na
Lei de Zoneamento, que apareceram a posterior, fizeram com que a lei fosse revista
diversas vezes, trazendo, com as retificações, maiores benefícios aos interesses
imobiliários.
A norma tinha clara influência do urbanismo modernista que apontava para
um rigoroso e excessivo zoneamento da cidade, desnecessariamente complexo,
ainda sob luzes da Carta de Atenas, reverberados pelos indicativos do Plano Diretor
do CPEU/USP de 1967. Muito embora seu efeito tenha sido bastante salutar para o
corpo urbano de Bauru, o descomedido da lei justificou alterações em seu texto. Com
o passar dos anos e devido às demandas, especialmente de vereadores, vários
dispositivos foram sucessivamente alterados de forma pontual e relativamente
aleatória, atendendo reinvindicações e pressões específicas de grupos, com reflexos
danosos para a cidade.
A definição de taxas de ocupação e coeficiente de aproveitamento, de acordo
com as áreas do zoneamento urbano, foram medidas essenciais para Bauru, que
passou a dispor de construções e particularmente, de edifícios, com áreas construídas
mais equilibradas em relação aos seus terrenos. Tais medidas, ainda, dariam maior
possibilidade de planejamento em relação a expansão da infraestrutura urbana e para
a cidade como um todo.
Outra questão que se coloca com a criação das Leis para Parcelamento, Uso
e Ocupação do Solo (Lei de Zoneamento) e Normas para Edificações (Código de
Obras), foi o aumento do que pode ser considerado como "cidade ilegal", que está
fora dos códigos municipais e por um motivo ou outro não consegue se submeter a
eles. É fundamental afirmar que situações de ilegalidade já existiam antes das
referidas leis, não obstante, acentuam-se mais a partir delas, seja devido à ausência
de fiscalização, má fé e falta de recursos do cidadão no sentido de poder atendê-las.
A Lei Municipal nº. 3.089/89 transforma o Escritório Técnico em Secretaria
Municipal de Planejamento, dando a ele novas e amplas atribuições353. Ao mesmo
Figura 71: Avenida Nuno de Assis, ainda em construção, margeando o Ribeirão Bauru. Na
imagem a via está finalizada até a Avenida Nações Unidas e sendo construída em direção a
Marechal Rondon SP-300. Abaixo, à esquerda, o novo Terminal Rodoviário da cidade. Foto
provavelmente do início da década de 1980
A Constituição de 1988 aponta nos artigos 24, 182 e 183 o Plano Diretor
Municipal como parte do Direito Urbanístico para que a função social da propriedade
fosse cumprida. Dessa forma, todas as cidades com mais de vinte mil habitantes
deveriam obrigatoriamente possuir um Plano Diretor. A Constituição Estadual Paulista
de 1989 reafirma a obrigatoriedade da Lei Maior, incluindo as zonas rurais nos Planos.
A Lei Orgânica do Município de Bauru, de 05/04/1990, estende ao Município
a norma da Constituição Estadual de 1989356 relativas à questão urbana (artigos 180
a 183) e a obrigatoriedade de criação de Plano Diretor local. A Secretaria de
à Sociedade Enéas Carvalho de Aguiar (Lauro de Souza Lima), o que tornaria tais
glebas vizinhas um parque de dimensões imensas. A APA-3, por sua vez, na nascente
do Córrego da Água Parada, é reservada como futuro e eventual manancial de
abastecimento. Por fim, define a área que viria a ser a Avenida Nações Norte, e seu
parque como de interesse de preservação. Em relação aos fundos de vale urbanos
cria as SECs, Setores Especiais de Conservação de Fundo de Vale, reconhecendo
esses espaços como significativos para a cidade, contudo, ainda amparados de forma
relativamente precária357.
O terceiro Plano Diretor, Lei nº. 5.631, de 22 de agosto de 2008, denomina-
se oficialmente Plano Diretor Participativo do Município de Bauru, se dá durante a
segunda administração Tuga Angerami, prefeito de tendência mais à esquerda.
Assenta-se na Lei Federal nº. 10.257/2001, conhecida como Estatuto da Cidade, que
garante o uso social da terra urbana e teve como destaque a participação social em
sua elaboração. Propõe fornecer diretrizes ao Município como um todo, incluindo-se
a zona rural e não apenas a área urbana.
Entender como os diagnósticos dos grupos de trabalho de transformaram no
produto apresentado é um dos problemas de quem analisa tais documentos sem ter
participado diretamente do processo de elaboração dos mesmos. Tais pesquisas não
aparecem no site da Prefeitura, ao passo que há forte ênfase política em mostrar que
ocorreu efetiva participação popular, todavia, não é possível saber, ao menos pelo
endereço eletrônico citado, qual o produto intermediário gerado por ela, que resultou
na proposta final.
A proposta apresentada através de cartografia se vale de todo arsenal
indicado pelo Estatuto da Cidade. Como instrumentos de indução do desenvolvimento
urbano apontam: parcelamento, edificação ou utilização compulsória, outorga onerosa
do direito de construir, direito de superfície e transferência do direito de construir 358.
Também assinala instrumentos de Regularização Fundiária como: usucapião especial
de imóvel urbano e zonas especiais de interesse social.
O resultado apresentado na cartografia de Bauru bidimensionaliza os
instrumentos elencados acima359. São definidos no primeiro dos mapas os
O século XXI vai iniciar com forte orientação a negócios imobiliários sob forma
de grupo de edifícios em condomínios, loteamentos fechados ou residenciais
fechados, tanto na cidade de Bauru como em muitas do interior paulista. São
amparados pela Lei Federal nº 4.591-64 e em diversos artigos do Código Civil
Brasileiro, que entre tantas questões trata da obrigatoriedade de cobrança de taxas
de manutenção, nas incorporações horizontais ou verticais.
A Lei Federal nº 13.465 de julho de 2017 veio solidificar o entendimento e
ampliar a concepção de Condomínio a partir do seu Capítulo VI que trata do
Condomínio de Lotes e do Capitulo VIII que trata do Condomínio Urbano Simples 361,
como veremos adiante.
O condomínio é termo jurídico que regula a copropriedade e ordena a
convivência entre pessoas que habitam o mesmo espaço. Surgiu como noção na
361BRASIL. Lei nº. 13.465, de 11 de julho de 2017. Dispõe sobre a regularização fundiária rural e
urbana, sobre a liquidação de créditos concedidos aos assentados da reforma agrária e sobre a
regularização fundiária no âmbito da Amazônia Legal; institui mecanismos para aprimorar a eficiência
dos procedimentos de alienação de imóveis da União; altera as Leis n os 8.629, de 25 de fevereiro de
1993 , 13.001, de 20 de junho de 2014 , 11.952, de 25 de junho de 2009, 13.340, de 28 de setembro
de 2016, 8.666, de 21 de junho de 1993, 6.015, de 31 de dezembro de 1973, 12.512, de 14 de outubro
de 2011 , 10.406, de 10 de janeiro de 2002 (Código Civil), 13.105, de 16 de março de 2015 (Código de
Processo Civil), 11.977, de 7 de julho de 2009, 9.514, de 20 de novembro de 1997, 11.124, de 16 de
junho de 2005, 6.766, de 19 de dezembro de 1979, 10.257, de 10 de julho de 2001, 12.651, de 25 de
maio de 2012, 13.240, de 30 de dezembro de 2015, 9.636, de 15 de maio de 1998, 8.036, de 11 de
maio de 1990, 13.139, de 26 de junho de 2015, 11.483, de 31 de maio de 2007, e a 12.712, de 30 de
agosto de 2012, a Medida Provisória nº 2.220, de 4 de setembro de 2001, e os Decretos-Leis n º 2.398,
de 21 de dezembro de 1987, 1.876, de 15 de julho de 1981, 9.760, de 5 de setembro de 1946, e 3.365,
de 21 de junho de 1941; revoga dispositivos da Lei Complementar nº 76, de 6 de julho de 1993, e da
Lei nº 13.347, de 10 de outubro de 2016; e dá outras providências. Diário Oficial da União. 6 set. 2017.
Disponível em: <http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/_Ato2015-2018/2017/Lei/L13465.htm>.
266
Grécia antiga, sendo que a palavra vem do latim DOMUS, o mesmo que "casa", e seu
proprietário, quem comandava era chamado de DOMINIUS362. No século XIX com o
crescimento das cidades e o início da verticalização, novas regras de uso e
convivência comum precisavam ser estabelecidas. Havia necessidade, ainda, de se
definir o que era propriedade de cada um dos moradores e o que pertencia ao domínio
comum.
Com o passar dos anos ganharam "arsenais de defesa" como guaritas junto
às calçadas, grades mais altas, muros, câmeras, gaiolas, concertinas, cercas elétricas
no sentido de se proteger do entorno e da cidade, e pode-se dizer, seguramente, com
similar desejo de exclusão e segregação, que os residenciais horizontais fechados ou
loteamentos com controle de acesso. Nesse processo crescem as empresas de
segurança especializadas na proteção desses espaços, bem como aquelas de
terceirização de mão de obra que cuidam do conjunto de serviços voltados à
administração dos condomínios (jardinagem, portaria, contabilidade, assessoria
jurídica, cobranças, etc).
Atualmente, parte expressiva dos condomínios verticais é formada por
conjuntos de prédios construídos sobre gleba ou inúmeros terrenos anexados, devido
à escala de construção ser mais lucrativa. Iniciaram-se na cidade nos anos 1990,
através de financiamento do INOCOOP com os Conjuntos Camélias e Flamboyant,
seguidos de outros como Vila Inglesa, Monte Verde Residencial, Sábias e Andorinhas,
sendo todos prédios pequenos com poucos andares, garagens no nível do solo e sem
elevadores.
A MRV, considerada a maior construtora do país, tem sido a líder nos
lançamentos desse tipo de imóvel abrangendo praticamente todos os setores da
cidade como Higienópolis, Jardim Bela Vista, Jardim Estrela Dalva, Jardim Samburá,
Parque Bauru, Parque Roosevelt, Geisel, Shangri-lá, Região do Tívoli, Região do Vila
Serrão e Terra Branca365, financiados pela Caixa Econômica Federal a partir do
Programa Minha Casa Minha Vida (PMCMV).
Para as classes mais abastadas, conjuntos de torres sofisticadas tem sido
praxe. Plantas flexíveis, ao menos duas vagas na garagem sob laje, cozinha
americana, varanda gourmet e suítes constituem-se no programa de necessidades do
momento. Possuem amplas áreas comuns e todos os elementos de moda para atrair
sua clientela, formando o que é chamado pelo mercado imobiliário e pelo marketing
do setor de "condomínio clube", ou nomenclatura similar, sempre em inglês. Deve-se
notar que tais grupos de edifícios possuem grau de impacto na vizinhança muito
semelhante, ou talvez maior, que os residenciais fechados devido ao sombreamento,
túneis de vento, etc. Parte das vezes, inclusive, situam-se ao lado dos residenciais
fechados como forma de garantir as suas vistas livres para o horizonte, mas também
para seus vizinhos imediatos.
A vida em condomínio parece ser situação irreversível, particularmente nas
cidades grandes e médias. O último Censo Demográfico de 2010, aponta que um em
cada dez brasileiros vivia em condomínio. Matéria do Jornal Estado de São Paulo, do
ano de 2014 indicava que um terço dos moradores da capital paulista vivia nos 21 mil
condomínios da cidade366, que a força de trabalho empregada em empreendimentos
desse tipo chegava a seis mil pessoas, movimentando R$ 13,2 bilhões ao ano, mais
que o orçamento de capitais como Curitiba e Porto Alegre367.
Em relação aos residenciais fechados, ou loteamentos com controle de
acesso, o Alphaville é considerado o primeiro do Brasil. Foi lançado na grande São
Paulo a partir do início dos anos 1970, viabilizado pela Empresa Albuquerque
Takaoka, com projeto urbano dos arquitetos José de Almeida Pinto e Reinaldo
Pestana. De início, o empreendimento deveria atender a demanda dos executivos das
empresas que se implantavam na região de Barueri e por algum tempo, antes de
totalmente viabilizado, o uso oscilou entre moradias definitivas e de final de
semana368. A proposta tinha inspiração nos bairros de subúrbio americanos, afastados
dos centros urbanos e destinados às classes médias que ali chegariam a partir do
veículo privado. Embora também existentes nos EUA, apenas pequena porcentagem
possui fechamento. No Brasil, invariavelmente, ganharam muros, segurança privada
e portaria.
A experiência não demora a chegar a Bauru através do Parque Residencial
Paineiras, aprovado pela Prefeitura em 13/11/1972 a partir de um reloteamento da
Vila Aviação A, registrada por James Russel em 1947.
Em 07/10/1976 é aprovado o Jardim Shangrilá, a sudoeste da cidade, no
término da Avenida Comendador da Silva Martha, com grandes lotes inicialmente
destinados para Chácaras de Recreio369 quando ainda em área rural. Sofreu da
mesma experiência do Alphaville em São Paulo, unindo em seu começo, vocação de
366 Mapa dos Condomínios de São Paulo. Lello Condomínios, 2020. Disponível em:
<https://www.lellocondominios.com.br/wp-content/uploads/2016/12/Indicadores.pdf>.
367 21 mil trocam casa por prédio em 5 anos e 1/3 de São Paulo vive em condomínio. Estadão Notícias.
<https://pt.wikipedia.org/wiki/Alphaville_(bairro_de_Barueri_e_Santana_de_Parna%C3%ADba)>.
369 Rua 1 – Plínio Ferraz. Jardim Shangrilá, 2020. Disponível em:
<http://www.jardimshangrila.com.br/rua-1-plinio-ferraz>.
BAURU EM TEMAS URBANOS 269
uso para final de semana e moradia definitiva, até que a última situação aos poucos
se define, em especial quando se torna área urbana.
Após, vem o Jardim Samambaia, loteado pela Indústria Granolplast e vizinho
do Paineiras, sendo ambos localizados nos limites finais da Avenida Getúlio Vargas,
sua aprovação se deu em 31/08/1979.
Todos foram parcelados em área de cerrado e dotados de amplos lotes com
guias, sarjetas, asfalto em sua parcialidade e água a partir de poços artesianos
próprios, mas sem serviço de esgoto substituído, durante décadas pelas fossas. Os
lotes variam de 560 ou 1000 metros quadrados no Samambaia; 2.500 metros
quadrados, ou fração, no Paineiras e 8.500 metros quadrados, ou fração, no
Shangrilá. Foram concebidos como verdadeiras chácaras urbanas, inicialmente
distantes do centro e destinados às classes altas com algum espírito de aventura
devido à dificuldade de acesso em seu início. Dada a lonjura e isolamento os valores
iniciais dos lotes, considerando-se por metro quadrado, eram baixos.
Tais empreendimentos são loteamentos "horizontais fechados", "residenciais
fechados" ou mais corretamente "loteamentos com controle de acesso", muito embora
comumente e erroneamente tratados como "condomínios fechados", com muros ou
cercas e restrição de acesso por portaria. Foram regidos pela Lei Federal nº 6.766\79,
assim como todos os abertos, à exceção dos condomínios de fato, até 1982 quando
o governo municipal promulga a Lei nº 2339/82. A diferença está que, no caso dos
condomínios, a área comum pertence aos moradores enquanto fração ideal e nos
loteamentos/residenciais fechados/loteamentos com controle de acesso, isso não
ocorre, sendo apenas o lote individual de propriedade privada.
Após muitas discussões judiciais, os loteamentos com controle de acesso
puderam se manter como tal, em que pese a questão das áreas comuns serem
tratadas como públicas, mas, usualmente conservadas por associação de bairro
formada pelos seus residentes. As prefeituras também tendem a aceitar a situação
dos loteamentos fechados, através de atos administrativos de comodato, permitindo
a restrição de acesso através de portarias, contudo, em caráter não definitivo, é o caso
da Prefeitura de Bauru, que possui lei específica que regulamenta tais loteamentos.
Em Bauru ainda não são muitos os condomínios fechados horizontais, ou
"condomínios deitados", em geral pequenos, onde todos os proprietários possuem a
fração ideal das áreas comuns. Em parte, lançamentos dessa natureza sofriam
resistência das incorporadoras e compradores devido às dúvidas referentes à unidade
270
autônoma individual, entregue pronta ao comprador, e por alguns entendida como não
passível de ser alterada ou ampliada, da mesma forma que um apartamento em um
edifício. Tal fato provocava problemas quanto ao registro do bem, caso houvesse
alguma intervenção externa, mesmo que dentro do lote individual, situação atualmente
"pacificada".
A Lei Federal 13.465\2017 veio tratar de diversas questões urbanísticas entre
as quais, às relativas ao projeto de regularização fundiária urbana (REURB); direito
real da laje; uso comum de lotes e mesmo edificações. Entre as suas diversas
providências no capitulo VI, cria o condomínio de lotes onde:
Nessa situação, o proprietário pode erguer o imóvel que quiser em seu lote e
possuir a fração ideal das áreas comuns o que transforma o conjunto em condomínio
real.
A lei também cria o condomínio urbano simples:
370 BRASIL. Lei nº. 13.465, de 11 de julho de 2017. Dispõe sobre a regularização fundiária rural e
urbana, sobre a liquidação de créditos concedidos aos assentados da reforma agrária e sobre a
regularização fundiária no âmbito da Amazônia Legal; institui mecanismos para aprimorar a eficiência
dos procedimentos de alienação de imóveis da União; altera as Leis n os 8.629, de 25 de fevereiro de
1993 , 13.001, de 20 de junho de 2014 , 11.952, de 25 de junho de 2009, 13.340, de 28 de setembro
de 2016, 8.666, de 21 de junho de 1993, 6.015, de 31 de dezembro de 1973, 12.512, de 14 de outubro
de 2011 , 10.406, de 10 de janeiro de 2002 (Código Civil), 13.105, de 16 de março de 2015 (Código de
Processo Civil), 11.977, de 7 de julho de 2009, 9.514, de 20 de novembro de 1997, 11.124, de 16 de
junho de 2005, 6.766, de 19 de dezembro de 1979, 10.257, de 10 de julho de 2001, 12.651, de 25 de
maio de 2012, 13.240, de 30 de dezembro de 2015, 9.636, de 15 de maio de 1998, 8.036, de 11 de
maio de 1990, 13.139, de 26 de junho de 2015, 11.483, de 31 de maio de 2007, e a 12.712, de 30 de
agosto de 2012, a Medida Provisória nº 2.220, de 4 de setembro de 2001, e os Decretos-Leis n º 2.398,
de 21 de dezembro de 1987, 1.876, de 15 de julho de 1981, 9.760, de 5 de setembro de 1946, e 3.365,
de 21 de junho de 1941; revoga dispositivos da Lei Complementar nº 76, de 6 de julho de 1993, e da
Lei nº 13.347, de 10 de outubro de 2016; e dá outras providências. Diário Oficial da União. 6 set. 2017.
Disponível em: <http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/_Ato2015-2018/2017/Lei/L13465.htm>.
371 Idem.
BAURU EM TEMAS URBANOS 271
Figura 72: Propaganda com lançamento de condomínio fechado para população de renda
média na cidade de Bauru
Novos loteamentos com controle de acesso são lançados cada vez mais longe
do centro urbano de Bauru, principalmente na zona sul da cidade, destinados as
classes sociais mais altas: Estoril V; Ilha de Capri; Villaggio I, II e III; Spazio Verde
Residencial; Cidade Jardim, etc. Atualmente, às margens da Bauru-Ipassu (SP 225)
tem sido o eixo preferencial para os residenciais fechados através de liberações
constantes, por parte da Câmara, de extensões do perímetro urbano. São eles:
Alphaville, Lago Sul, Cyrela Estoril, Tamboré, etc.
Tais empreendimentos, geralmente demonizados pelos urbanistas e
acadêmicos, embora campo fértil de trabalho para os escritórios de arquitetura, tentam
ser resposta a virtual violência urbana, nem sempre manifesta intensamente em
cidades do interior. Buscam, também, por ambiente de exclusividade e status sem
admissão de outras classes sociais, a não ser para os trabalhos domésticos, ou em
suas obras.
Além da segregação social, os loteamentos com controle de acesso utilizam
de forma privada espaços públicos, como ruas, praças e demais áreas verdes dentro
de seus muros. A entrada também é controlada por portaria, acedida apenas pelos
moradores ou, funcionários e visitantes autorizados.
Outra crítica comum é que, devido à sua dimensão, isolam grandes setores
da cidade, não permitindo a transposição livre para outros loteamentos adiante.
Seus moradores podem contar com parques, salões de festas, jardins, lagos
e equipamentos esportivos de uso comum. As residências não podem receber muros
frontais ou grades em suas fachadas, os recuos são obrigatórios, bem como se
submetem a exigências severas de coeficiente de aproveitamento e taxa de ocupação
e aprovação prévia de uma comissão do bairro. Alarmes, grades, câmeras e outros
dispositivos de segurança são deslocados para a portaria e junto aos muros ao redor
do residencial, que invariavelmente possui corpo de segurança privado em circulação
permanente.
Certamente, essa não é das melhores formas de convivência urbana, quando
determinados grupos sociais se isolam em espaços bloqueados, transformando a
cidade em peças de um quebra cabeças, por vezes sem conexão. Embora não
desejável, nos parece que tais diretrizes de crescimento e ocupação urbana não vão
deixar de existir tão cedo. Ao contrário, pois o interesse em sua permanência está nas
duas pontas, no mercado ávido por lançamentos desse tipo e também no poder
público.
BAURU EM TEMAS URBANOS 273
O fato dos moradores, a partir das associações dos bairros, arcarem com
todas as despesas internas, como o recolhimento do lixo, cuidado com os jardins,
passeios, iluminação das vias, asfaltamento, recapeamento e manutenção geral, faz
com que as prefeituras considerem esses empreendimentos áreas urbanas de
baixíssima exigência quanto aos serviços a serem prestados. Em contraste, geram
alta arrecadação de IPTU. Podendo ser feita comparação com os loteamentos abertos
destinados às classes altas, onde serviços semelhantes são arcados exclusivamente
pelo poder público, com arrecadação de impostos igual ou menor.
Os loteamentos com controle de acesso são, portanto, empreendimentos auto
gerenciáveis, preocupação a menos para a administração da cidade e fonte de
arrecadação certa e privilegiada. Por outro lado, seus moradores vivem em situação
de isolamento e contraste, não apenas no aspecto da segregação social, como
naqueles voltados às rotineiras mazelas urbanas de nossas cidades (má qualidade da
pavimentação, áreas verdes mal cuidadas, iluminação pública deficiente, estruturas
pichadas, falta de segurança, etc), de uma forma ou de outra, resolvidas privadamente
dentro do espaço fechado.
Ainda, por estarem claramente demarcados na cidade, fornecem elevados
recursos de ITBI - Imposto de Bens Imóveis Inter-vivos, de esfera municipal, que incide
sobre transmissão de bens imóveis e de direitos relativos a ele.
Tais diretivas de fechamento, por sinal, se alastram seguidamente para
bairros mais populares por trazerem igual simbolismo que, para as classes médias e
altas, mesmo que implantados em zonas menos valorizadas, dispondo de lotes
menores, mais baratos e edificações não tão luxuosas. Afinal, o fechamento em
relação ao entorno cria situação interna que o desprende de qualquer zona urbana
específica. Os muros passam a representar os limites do residencial e o que está fora
se torna distante. Certamente, se situado em zonas de prestígio seu valor de mercado
será maior, mas caso não seja a situação, o fechamento em si e o sistema de
segurança garantirá seu "ilhamento" do entorno imediato372.
Aspecto relativo à aprovação de empreendimentos dessa natureza que
necessita ser corrigido é que, parte dos loteamentos com controle de acesso, não
apresentam as desejáveis vias internas que deveriam contornar seu perímetro,
resultando com que muitos lotes possuam seus limites de fundo nos muros do próprio
372 Não são poucos os residenciais fechados situados próximos de áreas de favelas.
274
373 Chegou a hora de Bauru, Piratininga e Agudos se somarem. Jornal da Cidade. 29 jan. 2020.
374 Idem.
BAURU EM TEMAS URBANOS 275
375 Informativo promocional do Residencial Jardim Estoril V. Jornal da Cidade. Nov. 2008.
276
BAURU EM TEMAS URBANOS 277
376 BASTOS, I. A. Falcão/Independência, Nossa gente e nossa história. Bauru: Document Center
Xerox-USC, 2002, p.190.
377 Idem p.190.
278
378Idem, p. 193.
379Nesse aspecto, na história da urbanização do país, se salva a cidade de Petrópolis, como exemplo
raro e relevante de preservação das águas e da natureza, projetada pelo major alemão Julio Frederic
Koeler em 1843, a mando de D. Pedro II.
BAURU EM TEMAS URBANOS 279
nas fazendas ou nas chácaras aos arredores das povoações, locais considerados
mais salubres.
Nas zonas rurais onde vivia a maioria dos habitantes do país, ocorria maior
integração entre os cursos d’água e os moradores. A pesca, a navegação e até
mesmo o lazer, tinham o rio como foco principal. As águas atraiam os animais para
caça e serviam como demarcação de propriedades rurais. Nelas a roda d’água era
peça fundamental para a moagem do milho, do trigo e da cana, para o resfriamento
dos alambiques e dar de beber aos animais380.
No século XX, pode-se dizer que o rio e, em particular suas águas, começam
a ser vistos como bens de consumo. O bombeamento das águas dos cursos d’água,
seu transporte por tubos, a reservação em caixas d’água municipais e a oferta do
líquido nas torneiras, se constituíam na mais básica exigência coletiva em relação à
infraestrutura urbana. Apesar disso, surpreendentemente, parecia não haver relação
entre tal necessidade e a preservação das nascentes e dos cursos d’água. Se nas
centúrias antecedentes ocorria inegável aproximação entre os homens e os rios no
espaço rural, a partir do século XX, com o processo acelerado de urbanização e o
distanciamento da natureza, há o afastamento das águas,
Parte do desprezo pelos cursos d’água urbanos em Bauru também pode ser
explicado a partir da mudança, em 1942, dos serviços de captação e tratamento de
água do Córrego Vargem Limpa, em área mais central, para o Rio Batalha, distante e
nos limites do município. Tal fato pode ter significado sinal verde para que os rios
situados dentro do perímetro da cidade pudessem ser tratados com total indiferença.
Afinal não eram mais “úteis”, serviriam apenas para levar os esgotos.
Fator que contribuía para estigmatizar as águas fluviais da cidade era que
suas margens se constituíam em locais de reprodução de mosquitos. Os insetos eram
responsáveis pela transmissão de doenças, como febre amarela (erradicada nas
380 CORRÊA, D. S.; ALVIM, Z. M. F. A água no olhar da historia. São Paulo: Secretaria do Meio
Ambiente, 2000, p.13-14.
381 Idem, p. 18.
280
cidades apenas na década de 1940), malária, febre oropouche, elefantíase, etc. Não
estavam longínquos na memória coletiva os motivos que guiaram a criação da Santa
Casa de Misericórdia de Bauru no início do século, entidade destinada a atender
especialmente os trabalhadores da ferrovia infectados por essas enfermidades na
cidade e em toda zona noroeste.
No Relatório da Administração do Município, durante o ano de 1917, durante
a gestão do Dr. Luiz Vicente Figueira de Mello, é demonstrada a preocupação com os
açudes e barragens que provocavam epidemias em certas épocas do ano. Aponta
que, como medida profilática, chegou a arrombar um açude urbano, “situado no
Córrego da Grama, açude este que determinava todos os anos uma epidemia local,
com casos de morte no bairro do mesmo nome”382.
Figueira de Mello atribui também, ao Rio Batalha, outro foco da Malária: “Um
rio temos, que atravessa o nosso município em diagonal, e que nos causa os maiores
males em relação ao paludismo – é o Batalha, em cuja zona a malária é endêmica”383.
Dessa forma, desde o início da ocupação urbana, os rios e suas margens são
considerados áreas insalubres passíveis de serem “resgatados” por intervenções
civis, através de canais, assim como já havia ocorrido nas reformas urbanas das
cidades do Rio de Janeiro e Santos, conduzidas respectivamente, por Pereira Passos
e Saturnino de Brito.
Apenas os rios urbanos de maior porte seriam, a contragosto, respeitados.
Devido à dimensão, se impunham inegavelmente a paisagem, como elemento de
incontornável convivência, mesmo que fossem esgotos a céu aberto, como o Rio Tietê
ou Pinheiros, em São Paulo. O tamanho e a grande vazão dos mesmos impediram
sua completa canalização há mais tempo.
Retificar e canalizar eram consideradas manifestações de progresso urbano.
E o mesmo procedimento ocorrerá em grande parte das cidades brasileiras dessa
época. O primeiro trecho da Marginal Tietê foi inaugurado em 1957, no mesmo ano
em que se iniciam as obras da Avenida Nações Unidas em Bauru, e a Marginal
Pinheiros foi implantada em 1970.
382 Relatório da Administração do Município durante o anno de 1917 sendo Prefeito Municipal o
Dr. Luiz Vicente Figueira de Mello. São Paulo: Sessão de obras de O Estado de São Paulo, 1917,
p.102-103.
383 Idem, p. 103.
BAURU EM TEMAS URBANOS 281
384 Bauru Cidade Sem Limites. Segundo ano do governo Avallone Jr., 1957, p.17. Arquivo do Museu
Ferroviário Regional de Bauru.
385 Retomar Capítulo 6: A verticalização.
386 Plano Diretor de Bauru de 1996, p.85.
387 A Lei nº. 7.803 de 18 de julho de 1889, altera a redação da Lei nº. 4771 de 15/09/1965 e revoga as
Leis nº. 6.535 de 15/06/1978 e nº. 7.511 de 07/07/1986. Nela se define a largura dos rios e o espaço a
ser deixado livre até ele, no caso do ribeirão Bauru que está entre 10 a 50 metros de largura a distância
até uma via deveria ser de 50 metros.
BAURU EM TEMAS URBANOS 283
acaba por ser melhor, ou menos pior, que a canalização subterrânea, devido ao rio
ainda estar presente na paisagem e em caso de enchentes o mesmo voltar
naturalmente ao seu leito com danos menores ao entorno.
Figura 73 e 74: Trecho da Nações Unidas ao lado da antiga fábrica da Antárctica, em dois
momentos. À esquerda, o Córrego das Flores canalizado e à direita, em obras para seu
tamponamento. Vê-se, ao fundo, o pontilhão da antiga Paulista, local de transposição, onde
atualmente ocorrem frequentes inundações e à esquerda o atual Poupatempo. Sem data
também já havia sido lançado. No mesmo lado, além da Avenida Duque de Caxias,
se formava o Jardim Brasil, outro bairro de alta classe média.
Na baixada do Córrego das Flores, e um pouco ao seu longo, próximo à
Avenida Rodrigues Alves, dava-se ocupação irregular, considerada por muitos como
uma feira livre permanente, por outros como a raiz de uma favela. Os moradores dos
bairros próximos, assim como o poder público, entendiam que esse não era uso
adequado e condizente com a zona central e, ao mesmo tempo, a entrada principal
da cidade. A nova avenida cumpriria a função de despejá-los em momento político
onde não seriam toleradas maiores contestações por parte dos ocupantes. A proposta
da Prefeitura era que as barracas fossem transferidas para o novo Mercado Municipal,
em finalização de obras, porém seu uso não seria gratuito e muitos não tinham como
arcar com as despesas de manutenção do novo espaço.
O projeto da avenida tenta unir o traçado do baixo Higienópolis com aquele
do centro, tendo como recurso a criação de pequenas praças triangulares, a partir de
"sobras" da Avenida Nações Unidas, em áreas que pertenciam à várzea do Córrego
das Flores, situação nem sempre resolvida a contento. Essas pequenas praças,
fazendo jus à denominação da avenida, deveriam ganhar nome de países como a
aquela na confluência da Rodrigues Alves, denominada Praça do Líbano.
O trecho acima da Duque situava-se em parte da cidade com ocupação
bastante rarefeita, sendo as obras públicas mais conhecidas da região a Faculdade
de Odontologia da USP, do início da década de 1960, voltada para a Alameda Otávio
Pinheiro Brizola; o Tiro de Guerra, de 1947; e o Ginásio Silvério São João 389. Outro
espaço de destaque, esse privado e mais recente, foi o Auto Cine Pop Top 390,
inaugurado em 1973 que contava com quinze mil metros quadrados de área asfaltada,
capacidade para 240 automóveis e cujo acesso se dava pela Avenida Otávio Pinheiro
Brisola, chamada inicialmente de Alameda Universitária, conforme aponta o mapa da
propaganda de inauguração.
Nessa seção da Avenida Nações Unidas, a presença paisagística ganha
relevo, em particular, com a construção do Parque Vitória Régia, com 57 mil metros
quadrados e considerado o primeiro parque público de Bauru 391. Sua viabilização se
389 A FOB-USP ocupou o prédio do Silvério São João entre 1962 e 1965 antes de construir sua sede
própria.
390 No local hoje funciona a Loja Havan.
391 Junto à Estação de Tratamento de Água, inaugurada em 1942, se falou da criação de um Parque
392 Como vimos o Teatro Municipal acabou sendo construído no primeiro trecho da avenida.
BAURU EM TEMAS URBANOS 287
Embora tais viadutos pudessem vir a facilitar a comunicação entre as bordas opostas
da Nações, comprometeriam sobremaneira a qualidade ambiental do espaço e
reforçariam ainda mais a avenida como via expressa de alta velocidade.
Esse trecho da avenida será aquele mais valorizado, tornar-se-á a entrada
"oficial" da cidade e, de certa forma, a sua imagem. O próprio arquiteto Jurandyr
Bueno conceberá obras relevantes às suas margens, como o Sindicato do Comércio,
o Centrinho da USP, a OAB, Ordem dos Advogados do Brasil (bastante
descaracterizada) e a COHAB. Grandes redes de fast food, lojas, hotéis, bares,
restaurantes e supermercados para ali acorrerão em busca de um público local, mas
também de passagem. A fácil acessibilidade e os grandes estacionamentos das redes
permitirão consumo rápido e retorno imediato para a rodovia próxima. À noite, a
avenida transforma-se em espaço de lazer e diversão com foco nos bares e
restaurantes atingindo fregueses da cidade e região.
Aspecto para o qual gostaríamos de chamar atenção é que, pela segunda vez,
se tomarmos a Avenida Rodrigues Alves como precedente393, a municipalidade
ordena o espaço urbano em ampla região da cidade. De forma geral, sempre coube à
Prefeitura a extensão de vias, elaboração de praças ou modestas intervenções
pontuais. A Nações será em outra escala, pois procurou-se um desenho que fugisse
do lugar comum dos prolongamentos retilíneos ou do traçado em quadrícula. Para
Bauru, que tinha, desde o início, seu arruamento alicerçado sob as diretrizes das
linhas retas, duras e ortogonais, uma via que parecia se submeter aos caprichos da
natureza, livre, curvilínea e solta em meio ao verde era algo espantoso e muito
inovador. Um respiro no espaço urbano.
Em cidade desenhada pela iniciativa privada, essa foi das poucas vezes onde
o poder público se colocou de forma mais solta e original. Todavia, tal manifestação
só vai se dar porque a mesma, até então, era área de pouco interesse do mercado de
terras, um fundo de vale brejoso considerado economicamente pouco atrativo na sua
configuração original. Essa também passa a ser uma das características das
intervenções públicas em áreas junto aos cursos d’água, que buscam sanear o espaço
e, dessa forma, valorizar o entorno para os investimentos privados.
Sobre esse trecho da Nações Unidas assim se refere Losnak (2004):
Pode-se dizer que a cidade é território particular, apenas com suas dobras, os
fundos de vale, ainda livres para intervenções públicas, mesmo que, para tanto, em
alguns momentos, haja necessidade de se remover os ocupantes desse espaço,
sempre gente pobre e despossuída.
Figura 75: Nações Unidas executada até pouco antes do viaduto da Avenida Duque de
Caxias. No centro da foto é possível ver a extensa área erodida que será tomada pelo Parque
Vitória Regia e a rala ocupação do setor. Foto sem data
Figura 76: A preservação de algumas árvores antigas junto aos canteiros da Avenida Nações
Unidas, durante suas obras. Foto sem data
A região cruzada pela Avenida Nações Unidas tem, ainda, como perspectiva
futura, a viabilização do Parque da Água Comprida, onde se encontra o sambódromo,
e o prolongamento da Avenida Jorge Zaidem, às suas margens, projetada com
intenção de se ligar às Avenidas Cruzeiro do Sul, Rodrigues Alves e posteriormente
chegar ao Núcleo Habitacional Mary Dota.
Um dos pontos mais importantes dessa fração da Nações é a Companhia de
Entrepostos e Armazéns Gerais de São Paulo (CEAGESP), situada em gleba de 100
mil metros quadrados, com quase 7.500 metros quadrados de construção, inaugurada
na década de 1980, em um processo de descentralização da empresa em direção ao
interior do Estado395.
No final desse trecho da Avenida também se reservou área de 30 mil metros
quadrados, doados pela Prefeitura, para a "Cidade Judiciária", onde se concentrariam
as atividades do Poder Judiciário Estadual, Federal e do Trabalho em Bauru. Sua
localização será ao lado do Hospital Estadual de Bauru, outra grande obra de alcance
regional inaugurada no ano de 2002 e considerado atualmente o maior hospital da
cidade396.
A quarta e última etapa da avenida é conhecida como Nações Norte, com 3,5
km de extensão. Foi construída de uma só vez, a partir de investimento previamente
estimado em 47 milhões de reais397, pagos pelo Governo Estadual. Finalizou-se ao
custo de 58,6 milhões de reais. O município ainda dispendeu 17 milhões para as
desapropriações, parte da iluminação, rede de interceptores, água e esgoto 398. Fecha
a última etapa da longa via que foge do fundo do vale, mas que, devido ao relevo e
ao solo, é zona propícia a processos erosivos. Corre parcialmente paralela a pequeno
curso d’água denominado Água do Castelo, também tributário ao Ribeirão Bauru.
A avenida nesse trecho possui aclive em direção à rodovia Bauru-Marilia (SP-
294) e ao novo Distrito Industrial III. O acesso para a área onde hoje se encontra a
Nações Norte era bastante difícil, sendo a única opção a Avenida Coronel Alves
Seabra, o que ajuda a explicar, em parte, a baixa densidade da região.
Outros fatores que limitaram a ocupação foram a Lei de Zoneamento da
década de 1980 e o Plano Diretor de 1996, que restringiram o parcelamento na área
em função do projeto de continuidade da avenida e do parque. O espaço verde,
inicialmente, seria denominado Parque do Castelo devido ao córrego de mesmo
nome. Na planta do Sistema Viário Básico constante do Plano Diretor de 1996, a
Nações Norte já aparece com desenho próximo ao atual, incluindo-se o novo parque.
Sendo que a partir de então todos os parcelamentos aprovados ao seu redor pela
Prefeitura tiveram suas áreas verdes inscritas dentro do parque, no sentido de ampliar
sua dimensão.
Assim como o trecho da Nações construído a partir da Avenida Rodrigues
Alves na década de 1970, para obras também será necessário remover uma favela
próxima à baixada do Silvino, no início de seu percurso, chamada "Maria Célia",
constituída por 34 barracos, cujas famílias foram inscritas no Minha Casa Minha
Vida399. A mesma favela havia sido transferida anteriormente por estar situada em
área de risco, contudo voltou, em parte devido a seus moradores não se acostumarem
a mudanças para regiões distantes400.
Por ter sido viabilizada a partir de recursos do Estado, com licitação elaborada
pelo Departamento Estadual de Estradas de Rodagem (DER), a avenida possui
parâmetros rodoviários e realmente se assemelha a uma autoestrada, com direito a
guard rail, defensas e barreiras de proteção em concreto. A ausência de intersecções
e a presença de retornos e acessos controlados fazem dela uma “rodovia urbana”.
Tais dispositivos incentivam a alta velocidade dos veículos.
Possui trechos com aterros altos e outros com cortes profundos junto às suas
marginais, o que poderá significar difícil ligação com as margens imediatas. É o trecho
onde a avenida mais fortemente segrega dois setores urbanos, possuindo
transponibilidade difícil devido à largura, desníveis com o entorno e o número de faixas
de rolamento.
Em função de ser considerada via expressa, seus acessos são hierarquizados
e estão assim localizados: "através de ruas lindeiras em 06 pontos da via expressa à
401
Prefeito recebe Governador para inauguração da Avenida Nações Norte. Prefeitura Municipal de
Bauru, 2019. Disponível em: <http://www2.bauru.sp.gov.br/Materia.aspx?n=4709>.
294
Figura 77: Avenida Nações Norte e seu aspecto rodoviário. À esquerda da imagem o espaço
destinado ao novo Parque Municipal
Será também área de lazer importante para Bauru como um todo, mas em
especial para uma zona carente, formada por diversos loteamentos populares, todos
baseados na lógica especulativa da desconexão física e da imersão em amplos vazios
urbanos. É também setor de possível e desejável adensamento para uso de moradias
populares e de classe média.
A Nações Norte, somada à Avenida Moussa Nakhl Tobias, anteriormente
denominada Avenida Jânio da Silva Quadros, que se liga ao trevo da Bauru-Iacanga
(SP-321) a partir da rotatória/praça Ricardo Jazon Nogueira, representam eixos
importantes para esse setor da cidade que, de todos os quadrantes, sempre
apresentou quantidade elevada de vazios urbanos, resultando no índice populacional
rarefeito. O Distrito Industrial III, na rodovia Bauru-Marília (SP-294), ao final da Nações
Norte, consiste em mais um eixo indutor para o crescimento da zona. Reforça a
necessidade de adensamento o fato de a região norte da cidade estar na direção onde
BAURU EM TEMAS URBANOS 295
o Município é mais extenso, não obstante sua topografia mais acidentada e solo
sujeito a erosões.
296
BAURU EM TEMAS URBANOS 297
402
Entrevista com o professor Laranjeira sobre duas de suas esculturas, a Pomba da Paz e o Leão da
Nações elaborado para o Lions Club. [Bauru 119] A pomba da Paz e o leão das Nações. Repórter
Unesp, 2015. Disponível em: <https://www.youtube.com/watch?v=L33lzaNoofU>.
298
dois níveis na extremidade direita vista frontalmente. Ainda à direita, na praça inferior,
seria implantado renque com trinta e cinco palmeiras imperiais criando-se um volume
com a vegetação, outra ideia "emprestada", essa de Lucio Costa, que criou conjunto
de palmeiras similar ao lado do Congresso Nacional em Brasília.
Figura 78: Praça da Paz, a pomba sobre o espelho d’água e seus canteiros geométricos
Figura 79: Praça da Paz vista da Marginal da Avenida Nações Unidas, vendo-se a escultura
da pomba e o palanque com os mastros das bandeiras, atualmente não mais existentes
plano, possibilitava a brincadeira das crianças de forma livre, o trânsito dos carrinhos
de bebê, assim como o uso pelos skatistas. Como à época não havia outra área para
os praticantes do skate, a prática de looping's no muro curvo se tornava conflituoso
com os demais usuários e bancos em concreto acabaram sendo dispostos em sua
base.
Aos poucos, o espaço frontal tornou-se espécie de praça de alimentação
aberta e pública com os trailer's estacionados ao seu redor, vendendo churros,
cachorros quentes, hamburgueres, espetinhos, etc., dispondo mesas para seus
fregueses. Entretanto, com o tempo e até nossos dias, tais veículos se tornaram
imóveis e permanentes, cercando todo espaço e não apenas as áreas das baías,
causando grande prejuízo estético. O espaço carece de urgente regulação de uso
como forma de manter livre, ao menos, a vista da praça, a partir da marginal da
Avenida Nações Unidas.
As palmeiras imperiais nunca chegaram à dimensão pretendida sendo que
muitas morreram, resultando em falhas no volume planejado inicialmente. Os mastros
metálicos das bandeiras rapidamente desapareceram. O espelho d'água, que possuía
revestimento em cerâmica bege, foi pintado de azul piscina, a cascata deixou de
funcionar e perdeu a iluminação subaquática, o muro de arrimo foi parcialmente
pintado e a vegetação encontra-se mal cuidada.
A rigor, nada muito diferente do descaso que ocorre nos demais espaços
públicos da cidade.
302
BAURU EM TEMAS URBANOS 303
de ferro existentes no paiz, uma caixa de aposentadoria e pensões para os respectivos ernpregados.
Diário Oficial da União. Seção 1, 13 abr. 1923, p. 10859. Disponível em:
<https://www2.camara.leg.br/legin/fed/decret/1920-1929/decreto-4682-24-janeiro-1923-538815-
publicacaooriginal-90368-pl.html>.
408 BONDUKI, N. G. Origens da habitação social no Brasil. Arquitetura moderna, Lei do Inquilinato e
421CARMO, E. C. do. A Política Habitacional no Brasil pós Plano Real (1995-2002) - Diretrizes,
Princípios, Produção e Financiamento: uma análise centrada na Caixa Econômica Federal. Tese
(Doutorado em Concentração e Economia Social do Trabalho) – UNICAMP. Campinas (SP), 2006, p.
30-31.
308
422Extinção da Cohab após investigação que apreendeu R$ 1,6 milhão será feita em 4 etapas. G1
Globo, 2019. Disponível em: <https://g1.globo.com/sp/bauru-marilia/noticia/2019/12/23/extincao-da-
cohab-apos-investigacao-que-apreendeu-r-16-milhao-sera-feita-em-4-etapas.ghtml>.
BAURU EM TEMAS URBANOS 309
no trecho entre a Rondon e a divisa com Piratininga em área nobre da zona sul onde
estão sendo implantados loteamentos com controle de acesso de alto padrão, como
apontado anteriormente.
Paulatinamente as rodovias que circundam a cidade têm recebido marginais
para redução do uso das estradas pelo trânsito citadino. Fato positivo é que o
transporte de carga vindo pelas autoestradas pode se valer de tais vias para não entrar
na cidade. Tal melhoria já ocorreu junto a Bauru-Iacanga (SP-321) durante a
duplicação para acesso ao novo Aeroporto Bauru-Arealva, tornando mais seguro o
trânsito de moradores de diversos bairros populares da zona, como Colina Verde,
Pagani, Pousada da Esperança e Vila São Paulo.
A partir de 2017, inicia-se pela atual Concessionária ViaRondon a criação de
marginais junto à Marechal Rondon no perímetro urbano de Bauru. A obra foi encetada
em virtude da rodovia ter se tornado extensão das avenidas locais, levando
insegurança para o tráfego no anel viário de Bauru, resultando em muitos acidentes e
engavetamentos. Uma sequência de dispositivos está sendo criado, como rotatórias
e fechamentos de acessos os quais poderão mudar o entorno e trazer novos usos
para tais setores rapidamente. Com grande certeza, as vias marginais rapidamente
contarão com novos negócios e usos relativos a esse tipo de perímetro urbano como
aqueles voltados à galpões logísticos que alterarão a dinâmica dos bairros por onde
tais vias passarão.
Como as residências dos Núcleos Habitacionais eram reservadas às famílias
com renda a partir de cinco salários mínimos, ficavam de fora todas aquelas que não
chegavam a esse patamar. Dessa forma tentou-se a experiência de mutirões
habitacionais, com gerenciamento da COHAB. Para sua viabilização as terras não
eram compradas de particulares, mas doadas pela Prefeitura, sendo parte delas áreas
verdes de outros empreendimentos. Citam-se o Severina Sbeghen (1981), 9 de Julho
(1982), Luiz Edmundo Coube (1983), Darcy Cesar Improta (1984), Primavera (1988),
e Leão XII (1991). Os mutirões eram destinados a moradores com baixíssima renda.
As unidades eram produzidas a menor custo devido à terra ser ofertada pela
municipalidade e a mão de obra pertencer aos seus futuros ocupantes. Estes
edificavam todas as casas igualitariamente, que depois seriam sorteadas entre os
mesmos. Algumas favelas, principalmente aquelas situadas em zonas de risco, foram
extintas a partir dos mutirões. Talvez, o maior problema dos mutirões habitacionais na
cidade tenha sido a ocupação de algumas áreas verdes, retiradas do domínio público,
312
Figura 80: Conjunto Habitacional Mary Dota, em construção as quadras alongadas, os vazios
urbanos e a cidade ao fundo. Março de 1989
428 História de moradores do Minha Casa Minha Vida em quatro livros. Jornal da Cidade. 07 fev. 2020.
318
430 Plano Diretor de Bauru de 2008. Lei 5.631 de 22 de agosto de 2008, p.12.
431 Apenas um dos grandes viadutos foi finalizado, mesmo assim, depois de muitos anos de iniciado,
ligando a Vila Falcão ao Jardim Bela Vista.
BAURU EM TEMAS URBANOS 321
Outro conjunto de relevo é aquele do Aero Club de Bauru, que teve como um
dos fundadores o major do exército carioca Américo Marinho Lutz, que havia
assumido a superintendência da NOB, em Bauru, durante o Estado Novo. As obras
contarão com o suporte dos engenheiros e operários da ferrovia. O prédio principal,
torre e hangares foram inaugurados em 1939, com predominância da linguagem art
déco. Tem como destaque o hangar mais antigo, cuja estrutura primorosa de madeira,
erguida pelos carpinteiros da NOB, é exemplo da alta capacidade e da técnica desses
profissionais que trabalhavam para a estrada de ferro. O conjunto também possui
relevo histórico em virtude da importante Escola de Aviação, ao início precoce do
esporte do vôo a vela ali praticado e, aos diversos prêmios conquistados por seus
pilotos em certames nacionais e internacionais. Destaca-se, particularmente, a
atuação do alemão Hendrich Kurt incentivador do voo sem motor, que fabricou
diversos planadores no local432. O acordo efetivado entre o Aero Club e a Prefeitura
para divisão da área, em muito pode viabilizar o uso público e social para o entorno
do complexo, mantendo suas atividades quase centenárias.
No mais, Bauru possui construções isoladas de interesse mais local,
representativas de sua história, cuja abertura de tombamento, ou tombamento
definitivo, ficou por conta do Conselho de Defesa do Patrimônio Cultural de Bauru
(CODEPAC), criado no ano de 1992433 na esteira da malfadada reforma da Praça Rui
Barbosa, mas que se efetivou na prática a partir de sua constituição e primeira reunião
apenas em 1996434.
Em nossos anos de atuação junto ao CODEPAC como primeiro presidente,
vice presidente e membro, conseguimos verificar algumas situações típicas
relacionadas a preservação concernentes a Bauru e também a outras cidades do
mesmo porte:
A) A preservação do patrimônio sofre grandes pressões em cidades médias e
pequenas devido às políticas advindas dos proprietários de imóveis e construtoras
435 Plano Diretor de Bauru de 1996, Prancha Unidades de Conservação Ambiental, s/p.
BAURU EM TEMAS URBANOS 325
para todos os cidadãos, mesmo que a princípio não se façam os projetos dos parques.
Tais espaços garantiriam que as várzeas desses vales não fossem ocupadas,
reduzindo-se as chances de enchentes nesses setores, ou mesmo possibilitando a
criação de dispositivos para controle de enchentes em forma de lagos ou mini
represas.
Os emissários direcionados à futura Estação de Tratamento de Esgoto (ETE)
já estão prontos. A Estação, em si, às margens do Ribeirão Bauru e próximo ao Distrito
Industrial I, permanece em obras. Sua inauguração poderá vir a melhorar
significativamente a qualidade das águas desses pequenos córregos que cruzam a
cidade e também a do Ribeirão Bauru, colaborando ainda mais para que no futuro se
tornem importantes espaços públicos.
326
BAURU EM TEMAS URBANOS 327
AZEVEDO, F. Um trem corre para o oeste. São Paulo: Livraria Martins S/A, 1950.
CONDE, L. P. F. Art déco: a modernidade antes do movimento moderno. In: Art déco
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1928.
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BAURU EM TEMAS URBANOS 337
21 mil trocam casa por prédio em 5 anos e 1/3 de São Paulo vive em condomínio.
Estadão Notícias. Disponível em: <https://sao-
paulo.estadao.com.br/noticias/geral,210-mil-pessoas-trocam-casa-por-predio-em-5-
anos-e-13-de-sp-vive-em-condominio,1534756>.
Entrevista com o professor Laranjeira sobre duas de suas esculturas, a Pomba da Paz
e o Leão da Nações elaborado para o Lions Club. [Bauru 119] A pomba da Paz e o
338
Extinção da Cohab após investigação que apreendeu R$ 1,6 milhão será feita em 4
etapas. G1 Globo, 2019. Disponível em: <https://g1.globo.com/sp/bauru-
marilia/noticia/2019/12/23/extincao-da-cohab-apos-investigacao-que-apreendeu-r-
16-milhao-sera-feita-em-4-etapas.ghtml>.
Gazzeta propõe acordo e põe fim a litígio entre Prefeitura e Aeroclube de Bauru.
Prefeitura de Bauru, Cidade em Movimento, 2019. Disponível em:
<http://www2.bauru.sp.gov.br/materia.aspx?n=35450>.
Mapa dos Condomínios de São Paulo. Lello Condomínios, 2020. Disponível em:
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Municipal de Bauru.
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15 de setembro de 1965 e revoga as Leis nº. 6.535 de 15 de junho de 1978 e nº. 7.511
de 7 de julho de 1986.
BRASIL. Decreto nº. 4.682, de 24 de Janeiro de 1923. Crea, em cada uma das
emprezas de estradas de ferro existentes no paiz, uma caixa de aposentadoria e
pensões para os respectivos ernpregados. Diário Oficial da União. Seção 1, 13 abr.
1923, p. 10859. Disponível em: <https://www2.camara.leg.br/legin/fed/decret/1920-
1929/decreto-4682-24-janeiro-1923-538815-publicacaooriginal-90368-pl.html>.
BRASIL. Lei nº. 9.088 de 08/04/1938. Cria, no município de Bauru, o distrito policial
de Vila Falcão, com as mesmas divisas com que o foi o distrito de paz de igual nome,
estabelecido pela Lei n. 2.623, de 14 de janeiro de 1936. Diário Oficial da União. 09
abr. 1938, p.1.
BRASIL. Lei nº. 13.465, de 11 de julho de 2017. Dispõe sobre a regularização fundiária
rural e urbana, sobre a liquidação de créditos concedidos aos assentados da reforma
agrária e sobre a regularização fundiária no âmbito da Amazônia Legal; institui
mecanismos para aprimorar a eficiência dos procedimentos de alienação de imóveis
da União; altera as Leis n os 8.629, de 25 de fevereiro de 1993 , 13.001, de 20 de
344
<https://www.al.sp.gov.br/repositorio/legislacao/constituicao/1989/compilacao-
constituicao-0-05.10.1989.html>.
SÃO PAULO (Estado). Lei nº. 428, de 1 de agosto de 1896. Muda a sede do
municipio do Espirito Santo da Fortaleza para a povoação do Bahurú, com a
denominação desta ultima localidade. Legislação do Estado de São Paulo, São Paulo,
1º ago. 1896. Disponível em:
<https://www.al.sp.gov.br/repositorio/legislacao/lei/1896/lei-428-01.08.1896.html>.
BAURU. Autos de embargo de obra nova, fábrica da matriz do Divino Espírito Santo
de Bauru x Câmara Municipal de Bauru. Cartório do Primeiro Oficio de Bauru,
processo nº. 245 de 19/08/2013.
BAURU. Processo nº. 245, de 19 de agosto de 2013. Autos de embargo de obra nova,
fábrica da matriz do Divino Espírito Santo de Bauru x Câmara Municipal de Bauru.
Cartório do Primeiro Oficio de Bauru.
194, 197, 207, 208, 209, 230, 321,
Automóvel Club, 62, 64, 68, 68, 74, 210
Avenida Comendador da Silva Martha, bangalô, 130, 131, 134, 135, 304, 313,
90, 268 Bauru Tênis Club, 68, 104
Avenida das Mangueiras, 90, 113, 116, boca de sertão, 61
118, 119, 120,
350
catedral, 72, 73, 75
CEFNOB, 32, 35, 38, 39, 81
cemitério, 25, 26, 38, 80, 82, 184, 186 edificação, 12, 27, 47, 62, 110, 131,
Centro Cívico, 141, 214, 216, 239, 240, 154, 314, 316, 154, 165, 260, 315
241, 242, 243, 244, 245, 246, 248, Edifício Bauru, 157, 164
249, 250, 251, 253 Edifício Brasil Portugal, 114, 165, 189,
centro comercial, 12, 174, 191, 201, 266, 282, 323
209, 214 Edifício Terra Branca, 156, 164, 188
chãos, 10, 19, 21, 30, 43 Edifício Vila Real, 165, 166, 171, 172
CIAM, 242 EMDURB, 256, 257
CODEPAC, 70, 125, 150, 154, 165, Eny, 119, 204
321, 322, 324, espaço urbano, 11, 12, 38, 39, 43, 127,
Código de Obras, 170, 254, 255, 313 160, 185, 232, 233, 259, 287, 297,
Código de Posturas, 24, 67, 131, 150, 327
231, 232, 233 estrada de ferro, 19, 32, 57, 81, 136,
COHAB, 305, 306, 308, 312 152, 180, 195, 196, 251, 303, 321,
Comarca, 17, 35, 36, 39 Estrada de Ferro Noroeste do Brasil,
CONDEPHAAT, 229, 319, 320, 32, 57, 81, 180,
condomínio fechado, 271 expansão urbana, 87, 247, 259, 309
conjuntos habitacionais, 12, 101, 259,
304, 305, 307, 309, 310, 312, 313,
314, 315, 316, 317
coronelismo, 39 ferrovias, 11, 12, 29, 30, 33, 34, 38, 40,
CPEU, 94, 95, 139, 214, 216, 238, 239, 42, 49, 50, 54, 82, 83, 99, 100, 131,
241, 243, 244, 245, 246, 247, 248, 153, 159, 178, 180, 195, 202, 203,
250, 252, 255, 257, 324 207, 209, 220, 232, 239, 310, 313,
319, 323,
BAURU EM TEMAS URBANOS 351
habitação social, 12, 229, 312 Martha & Pinho, 111, 114
Mary Dota, 251, 259, 291, 313, 314,
315
nave, 46, 65, 71, 73, 279
Jardim Bela Vista, 92, 95, 125, 127, núcleos habitacionais, 305, 306, 307,
128, 130, 131, 138, 140, 141, 144, 145, 310, 311, 313, 315, 316
148, 229, 240, 242, 244, 248, 250, 267,
278, 284
Jardim Estoril, 112, 113, 114, 115, 116,
117, 118, 121, 123, 166, 173 patrimônio histórico, 12, 224, 227, 320
Jardim Europa, 108, 109 patrimônio religioso, 11, 19, 22, 26, 27,
Jardim Redentor, 189, 251, 305, 306, 43, 44, 52, 54, 79, 86, 88, 103
308 Plano Diretor de Bauru, 31, 38, 80, 94,
Jurandyr Bueno Filho, 74, 217, 246, 98, 99, 123, 139, 141, 171, 209, 214,
252, 275, 284, 293 216, 238, 239, 241, 246, 247, 248,
249, 250, 251, 252, 253, 254, 255,
Praça Portugal, 120, 121, 122, 165, 177, 193, 194, 195, 197, 200, 203,
166, 171, 172 204, 205, 208, 210, 214, 215, 221,
Praça Rui Barbosa, 11, 39, 43, 48, 50, 223, 227, 323
62, 63, 64, 66, 68, 76, 77, 104, 105, Rua Primeiro de Agosto, 19, 21, 69, 82,
138, 167, 183, 184, 195, 197, 198, 154, 155, 159, 162, 194, 197, 199,
204, 209, 218, 221, 222, 225, 321, 204, 209, 212, 216, 277, 283
323
shopping center, 219, 220
quadricula, 22, 24, 79, 93, 104, 112, sistema viário,197, 228, 239, 248, 251,
119, 120, 178, 233, 287 252, 253, 256, 257, 261, 284, 292
Sorocabana, 29, 31, 33, 42, 49, 83, 119,
110, 183, 197, 201, 202, 207, 210,
285, 291, 312, 321
República, 29, 32, 39, 42, 55, 58, 59, taipa de mão, 26, 46
67, 135, 142, 250, 290 tombamento, 165, 228, 319, 321, 322,
republicano, 34 323
Ribeirão Bauru, 18, 19, 38, 44, 79, 80, traçado, 11, 12, 21, 22, 24, 44, 45, 87,
85, 105, 107, 108, 127, 140, 141, 92, 93, 94, 103, 104, 115, 116, 119,
175, 181, 242, 250, 251, 258, 277, 178, 180, 181, 247, 251, 252, 285,
278, 281, 282, 283, 291, 325 287
Ribeirão das Flores, 80 trilhos, 11, 30, 32, 33, 38, 41, 83, 84, 85,
Rua Antônio Alves, 38, 103, 104, 110, 88, 90, 91, 103, 119, 127, 129, 140,
111, 156, 167, 169, 177, 181, 185, 141, 142, 144, 175, 179, 181, 190,
186, 194 193, 202, 206, 278, 284, 318, 320
Rua Araújo Leite, 21, 24, 26, 27, 33, 36,
38, 45, 50, 69, 85, 88, 140, 141, 177,
180, 193, 230, 278, 282
Rua Batista de Carvalho, 37, 45, 49, 50, UNESP, 7, 13, 142, 297, 324
61, 65, 74, 147, 153, 158, 160, 161,
BAURU EM TEMAS URBANOS 353
verticalização, 11, 147, 149, 165, 170,
171, 289
Viaduto JK, 216, 242, 248, 250
Viaduto Mauá, 185, 250
Vila Antarctica, 26
Vila Falcão, 81, 124, 125, 127, 128,
129, 131, 135, 136, 140, 141, 142,
143, 144, 251, 320
Vila Santa Clara, 116
Vila Seabra, 85, 278
zona central, 112, 119, 122, 191, 192,
206, 216, 217, 220, 221, 227, 229,
248, 285
zona noroeste, 12, 32, 34, 42, 55, 89,
206, 209
zona sul, 11, 99, 103, 108, 109, 110,
113, 122, 123, 166, 227, 272, 311
zoneamento, 115, 234, 239, 244, 248,
251, 255, 261, 292
354