Escolar Documentos
Profissional Documentos
Cultura Documentos
análises contemporâneas.
Cristiane Bertoco1
Resumo: O município de Bento Gonçalves, originado da colonização italiana no Rio Grande do Sul, é
valorizado em roteiros culturais e turísticos distribuídos por todo o município. O processo de
imigração de diferentes etnias ocorrido no final do século XIX originou uma arquitetura
majoritariamente vernacular, que se modernizou a partir de 1920, com as ferrovias, industrialização e
novas influências culturais. A ocupação do território ao longo de itinerários coloniais moldou
identidades e territorialidades peculiares que se materializam em conjuntos edificados e paisagens em
cada roteiro. O patrimônio cultural do município é identificado pelo Inventário do patrimônio
edificado elaborado entre 1994 e 1996, o qual é reconhecido pelo Plano Diretor municipal. A gestão
eficiente desse patrimônio depende da atualização com informações mais completas, bem como
integração aos novos conceitos e instrumentos de preservação, gestão e planejamento urbano. Com o
objetivo de subsidiar a elaboração de políticas públicas a partir do Inventário, esse estudo segue as
metodologias de revisão bibliográfica, revisão documental e pesquisas de campo, para apresentar os
trabalhos de diagnóstico realizados entre 2013 e 2021. Primeiramente é realizada a revisão
bibliográfica sobre Inventários, modelos de fichamento e órgãos responsáveis pela sua elaboração. Na
sequência, é apresentada revisão documental sobre o inventário existente e o regramento dado pelo
Plano Diretor municipal acerca do tema. Por fim, são apresentados os resultados dos estudos de
campo, definindo a metodologia para cadastro sob a ótica dos conjuntos edificados e roteiros culturais,
apontando instrumentos de planejamento e gestão necessários para sua preservação.
Palavras chave: Patrimônio histórico, inventário, paisagem cultural, roteiros culturais.
1. INTRODUÇÃO
O Município de Bento Gonçalves, na Serra Gaúcha, é um dos berços da colonização
italiana no Rio Grande do Sul, tendo, atualmente, grande projeção como destino indutor do
turismo no Brasil. O marco de seu processo histórico ocorre ao final do século XIX, quando
ocorre o processo de imigração europeia, através do qual a região recebeu diferentes etnias,
como poloneses, suecos, franceses e em maior número, os italianos, que conformaram a
diversidade cultural da cidade. Inicialmente denominada Colônia Dona Isabel, criada em 1870
na região conhecida como Cruzinha, começou a receber imigrantes em 1875, tornando-se
município em 1890, passando a denominar-se Bento Gonçalves (DE PARIS, 2006).
Até o primeiro decênio do século XX, o território foi ocupado de forma relativamente
isolada, uma vez que os transportes eram realizados em muares ou carroças, por meio de um
1
crisbertoco.arq@gmail.com Arquiteta e Urbanista na Prefeitura Municipal de Bento Gonçalves - Museu do
Imigrante de Bento Gonçalves. Especialista em Reabilitação ambiental sustentável arquitetônica e urbanística.
antigo caminho de tropeiros, junto ao qual se desenvolveram estradas de integração regional 2,
e estradas denominadas linhas, picadas que foram a base para a demarcação dos lotes
coloniais e interligação das comunidades imigrantistas (POSENATO, 1983). Nessa época,
também era utilizado o transporte fluvial junto ao Rio das Antas e Rio Taquari.
A partir da década de 1920, com a chegada do transporte ferroviário, desenvolveu-se a
industrialização que permitiu maior integração da ex-colônia à capital, melhorando o
escoamento de produtos, a circulação de pessoas e diversificando as influências arquitetônicas
e culturais. Em um terceiro momento, com a instalação do 1º Batalhão Ferroviário entre 1943
e 19713, a cidade recebeu diferentes trabalhadores para as obras, de engenheiros e militares a
civis e recrutas, provenientes de diferentes regiões do Estado, causando grande impacto na
urbanização e integração étnica no município (DE PARIS, 2006).
Por fim, marcos como a criação da Fenavinho – Festa Nacional do Vinho – a partir de
1966, o desenvolvimento rodoviário ocorrido a partir da década de 1970, e ações para
preservação arquitetônica, ferroviária e vitivinícola a partir das décadas de 1980 e 1990,
deram impulso ao desenvolvimento turístico no município. Atualmente, os roteiros e atrativos
turísticos oferecidos na região estão relacionados à intenção de preservar e valorizar a cultura,
tradições e o patrimônio histórico, tendo como âncoras os roteiros Caminhos de Pedra, Vale
dos Vinhedos e Maria Fumaça. Com base nesses, outros roteiros de base cultural foram
criados, em todos os distritos, nas zonas urbanas e rurais (BERTOCO, 2014).
Sendo assim, a preservação do patrimônio histórico e cultural é muito importante para
o desenvolvimento local, tomando-se os bens culturais edificados e a imagem da cidade como
recursos turísticos. Por sua vez, o turismo e a economia criativa são as principais fontes de
sustentabilidade econômica da reabilitação de conjuntos históricos e comunidades, bem como
de geração de empregos e fomento a projetos culturais (BERTOCO, 2014).
Em Bento Gonçalves, o patrimônio histórico e a paisagem cultural são reconhecidos
pelo Plano Diretor instituído pela Lei Municipal nº 200 de 27 de julho de 2018, que define a
proteção à Paisagem Cultural, aos Itinerários Culturais e ao patrimônio histórico e cultural
edificado integrante do Inventário e conjuntos formados em seu entorno, sendo registrados em
mapa os itinerários, as edificações tombadas, inventariadas e de interesse para preservação
(BENTO GONÇALVES, 2018).
2
A Estrada Buarque de Macedo integrava as colônias alemãs e italianas de sul a norte, ligando Montenegro a
Lagoa Vermelha e as Estradas Silveira Martins e Júlio de Castilhos ligavam à Colônia Caxias, de oeste a leste.
3
Construção do Tronco Principal Sul, ligação ferroviária do Rio Grande do Sul com o centro do país.
O patrimônio cultural edificado do município é identificado pelo Inventário do
Patrimônio Cultural do Rio Grande do Sul, elaborado entre 1994 e 1996, sendo esse o
levantamento mais completo realizado das edificações históricas de Bento Gonçalves e Pinto
Bandeira. É constituído de 385 edificações ou sítios históricos, totalizando 472 fichas de
inventário, entre os mais diversos usos e atividades. Entretanto, existe a necessidade da
atualização dos dados com informações mais completas, uma vez que as fichas existentes
possuem mais de vinte anos, sendo necessários estudos históricos e levantamentos
arquitetônicos mais detalhados. Por outro lado, a preservação de bens de interesse patrimonial
não abrangidos naquele inventário, também depende da sua identificação e cadastro.
Buscando referências para a atualização do inventário do patrimônio histórico do
município, adotam-se as metodologias de revisão bibliográfica, análise documental e pesquisa
de campo. No campo teórico, busca-se primeiramente a discussão relativa ao conceito de
inventário, os órgãos responsáveis pela sua elaboração e modelos de fichas para
levantamento. Em um segundo tópico, busca-se uma revisão documental referente ao
Inventário existente e à proteção dada ao mesmo através do novo Plano Diretor municipal.
Na sequência, apresentam-se pesquisas de campo e documentais, com o fim de
analisar a situação do patrimônio cultural edificado em Bento Gonçalves, para subsidiar a sua
atualização, apresentando a metodologia adotada para o diagnóstico do patrimônio cultural
realizado entre 2013 e 2019. O diagnóstico foi realizado através da elaboração de um
mapeamento e banco de dados sobre o inventário existente, analisando a sua situação atual.
Através da análise documental e vistorias nos locais, foram realizados registros fotográficos
das edificações inventariadas e seus conjuntos, registrando-se também as edificações antigas
localizadas em seu entorno.
A partir de 2020, inicia-se o projeto Laços Patrimoniais: Construindo um inventário
colaborativo para Bento Gonçalves, com recursos da Secretaria de Estado da Cultura do Rio
Grande do Sul. Trata-se de um projeto de educação patrimonial, que teve ações adaptadas em
função da pandemia de COVID-19, tornando-se um programa permanente do Museu do
Imigrante. Apresenta-se neste estudo a metodologia de elaboração de fichas de inventário
adotada, bem como as propostas de gestão e planejamento urbano voltada ao patrimônio
edificado e paisagístico, resultantes do programa.
O estudo aponta a caracterização do patrimônio cultural do município, diretrizes para
elaboração das fichas de cadastro de edificações, conjuntos históricos e roteiros culturais.
Indica-se a necessidade de continuidade do diagnóstico em paralelo à elaboração de fichas de
bens edificados e paisagens, tendo em vista a dinâmica da apropriação desse patrimônio pelos
usuários e comunidades depositárias. Além disso, propõe a abordagem do cadastro de
conjuntos históricos e itinerários culturais, fazendo referência ao patrimônio imaterial, à
paisagem e aos potenciais de reabilitação, identificando formas alternativas e sustentáveis de
preservação.
4
Planta ou croqui do terreno, fotografias das fachadas e detalhes importantes, descrição arquitetônica, citação de
existência de levantamento arquitetônico existente e outros levantamentos. A parte de múltipla escolha identifica
tipologia (religiosa, civil, oficial, militar, industrial, ferroviária, outra), época ou data de construção, uso original
e atual, topografia do terreno, pavimentos, medidas gerais da edificação e observações.
5
Planta ou croqui com escala gráfica, edificações na propriedade listadas por função (denominação, época de
construção, características gerais), existência de levantamento arquitetônico, entre outros.
6
Informações básicas como município e localidade, denominação do bem, endereço/ localização, proprietário,
uso original e atual, localização geográfica, proteção existente e proposta, existência de bens moveis, valores
estabelecidos, fotografias e imagens complementares (entorno, edificações, etc).
inventariados, divididos nas instâncias cultural, morfológica, funcional, técnica, paisagística e
legal7.
Já o projeto VICTUR/URB-AL – Valorização do Turismo integrado à Identidade
Cultural dos Territórios, foi uma iniciativa realizada no ano de 2007, envolvendo os
municípios de Caxias do Sul, Bento Gonçalves e Flores da Cunha, que tinha por objetivo o
estímulo ao desenvolvimento turístico integrado à cultura das comunidades (TONUS, 2007).
Entre as ações realizadas, estudou-se a metodologia do Inventário do Patrimônio Histórico
Rural de Caxias do Sul, coordenado pela Secretaria Municipal de Cultura de Caxias do Sul e
executado pela Universidade de Caxias do Sul, através do ECIRS – Elementos Culturais das
Antigas Colônias Italianas do Rio Grande do Sul – e do Departamento de Arquitetura e
Urbanismo.
Esse modelo realizou a identificação baseada na formação cultural de preponderância,
definindo como objeto de estudo o conjunto de edificações das comunidades e seu entorno,
levando em conta a formação territorial gerada pela coesão de grupo em torno à religiosidade
católica. O inventário sondou as múltiplas identidades existentes no município, com foco no
território cultural, de interação do homem com o ambiente, gerando acervos fotográficos,
expositivos, audiovisuais, entrevistas temáticas e inventário arquitetônico. O trabalho
realizado identificou, além do patrimônio edificado, algumas referências de patrimônio
imaterial, representado pelos saberes, fazeres e lugares a eles associados (TONUS, 2007).
Dentro deste tema foram inventariadas as capelas e a arquitetura civil, tendo como
premissa não a busca de uma imagem pré-concebida, mas sim a descoberta ou não
de novos signos que caracterizem a identidade dos grupos sociais. O produto final
consiste de mapas temáticos localizando os bens edificados levantados e fichas de
inventário de identificação desses edifícios. (TONUS, 2007, p.61).
Como resultado, o inventário arquitetônico é composto de três tipos de fichas: a ficha
de identificação da localidade, que identifica os conjuntos comunitários com mapas,
fotografias e elementos que constituem o sítio, destacando os que possuem valor histórico e
cultural. As fichas de registro fotográfico correspondem a elementos com valor cultural
mapeadas, em que não foi possível, naquele momento, o registro arquitetônico e histórico.
Assim, constam apenas da denominação, comunidade e endereço do bem, com registros
fotográficos relevantes.
7
Valores de referência histórica, valor de antiguidade, valor tradicional ou evocativo e referência coletiva; valor
arquitetônico, referência historiográfica, raridade formal, elemento referencial e compatibilidade dos anexos;
compatibilização com a estrutura urbana, potencial de reciclagem, uso tradicional e uso peculiar; raridade na
técnica construtiva, raridade no emprego de materiais, risco de desaparecimento e bom estado de conservação;
compatibilização com a paisagem urbana, conjunto de unidades – cenário, estruturação do cenário da quadra e
elemento referencial; proteção federal, estadual e municipal, através de incidência de legislação de preservação.
A ficha de identificação do objeto, que corresponde ao inventário de bem
arquitetônico, com localização, croqui, fotografias da fachada principal e complementares,
informações históricas da edificação, caracterização arquitetônica do objeto, informações
complementares e fontes documentais. A análise arquitetônica é realizada na forma de
múltipla escolha, identificando data de construção, implantação, grau de originalidade,
critérios de salvaguarda, tipologia, elementos formais (base, corpo e coroamento), entre
outros.
8
As fichas digitalizadas podem ser acessadas na íntegra, na coleção Inventário Municipal, do Museu do
Imigrante, disponível em: http://museudoimigrante.bentogoncalves.rs.gov.br/inventario-municipal/
Verifica-se, no material analisado, que a maioria dos bens inventariados corresponde a
edificações características da arquitetura da imigração italiana, datadas entre 1880 e 1955,
representativas do modo de viver na zona rural, em características vernaculares9
(POSENATO, 1983) ou ocupações urbanas da sede, de arquitetura eclética historicista e Art
Déco10 (COSTA et al, 2011). A maioria das fichas identifica os imóveis por sobrenomes
italianos, havendo poucas referências às outras etnias, como a polonesa e alemã. Também
foram identificadas algumas fichas por sobrenomes de origem portuguesa, relacionados
principalmente a autoridades municipais do período colonial ou seus descendentes.
As edificações identificadas nas fichas estão distribuídas por quase todo o município,
com exceção para áreas ocupadas posteriormente ao período citado. Suas localizações
identificam o distrito e as estradas ou linhas em que se situam, porém não são descritos nas
fichas as contextualizações históricas dos imóveis com as comunidades ou conjuntos dos
quais fazem parte, embora algumas fichas apresentem dados históricos da edificação, obtidos
por meio de entrevistas.
A maioria das fichas faz referência às características arquitetônicas principais, como
uso, número de pavimentos, características da fachada, cobertura e estrutura, citando outros
elementos externos, observações e eventualmente, mobiliário significativo. Todas as fichas
possuem apenas uma foto, mapa de situação e localização, porém a maioria não possui
levantamento arquitetônico, nem constam preenchidos os dados referentes à
compartimentação e elementos arquitetônicos internos, à área de terreno e de construção.
Verifica-se assim, a necessidade de complementação dos dados referentes às
edificações inventariadas, especialmente com fotografias internas e externas da edificação,
que demonstrem suas características peculiares, bem como dados históricos e levantamentos
arquitetônicos mais completos. Já quanto à diversidade do patrimônio inventariado, identifica-
se a pouca representatividade de reconhecimento de arquiteturas de outras etnias que tiveram
grande contribuição para o desenvolvimento do município, como a polonesa, assim como boa
9
Posenato (1983) indica quatro períodos para a arquitetura das colônias antigas, dentro dos quais os materiais
locais como pedra, madeira e tijolos eram produzidos segundo a tecnologia, economia e valores culturais de cada
época e lugar. Tem como características o emprego de trabalho humano livre, diversidade de soluções,
linguagem arquitetônica própria primando a simplicidade, uso de materiais existentes no entorno, realizado
através da habilidade artesanal e ideologia do trabalho.
10
Costa et al (2011) identifica como “moderna” a arquitetura construída a partir da crise econômica da década de
1930, incorporando elementos art déco e neocoloniais, principalmente nas fachadas, sendo influenciada pelo
modernismo a partir da década de 1950. Para a autora, o ecletismo ocorrido a partir de 1910, como resultado dos
Códigos de Posturas, também pode ser considerado parte da modernidade na Serra Gaúcha, uma vez que a
chegada do trem a Caxias do Sul impulsionou a urbanização e facilitou as trocas comerciais.
parte do patrimônio ferroviário e arquitetura protomoderna e modernista construídos na
segunda metade do século XX.
Figura 2: Parte de ficha de roteiro cultural e conjunto histórico: São Valentim, no Distrito de Tuiuty.
Fonte: BERTOCO et al, 2021.
11
As fichas de inventário já elaboradas, bem como todo o acervo gerado pelo projeto, estão disponíveis na
íntegra na Coleção Laços Patrimoniais, do Museu do Imigrante. Disponível em:
http://museudoimigrante.bentogoncalves.rs.gov.br/colecao-lacos-patrimoniais/
Todas as fichas contarão com identificação da localidade, denominação, endereço,
coordenadas geográficas, roteiro turístico e Linha. A ficha de roteiros culturais e conjuntos
será dividida em páginas complementares, sendo a primeira obrigatória, com mapa e
localização do conjunto e roteiro, fotografias gerais; a segunda página, com síntese histórica,
análise arquitetônica, fotos das edificações, outra página complementar com iconografia, fotos
dos elementos da paisagem, identificação de elementos culturais, turísticos e outras
modalidades de patrimônio, citação das referências e nome dos pesquisadores. Essa divisão
das páginas possibilitou o resumo de informações para o livro, bem como a adaptação dos
levantamentos durante o estado de emergência da pandemia do Coronavirus, possibilitando
complementações de acordo com o andamento da pesquisa.
A ficha de inventário arquitetônico das edificações tem caráter de identificação
externa (possibilitando visita interna complementar), sendo dividida em três páginas, sendo a
primeira obrigatória, para o reconhecimento do bem, com localização, fotografias gerais da
edificação e entorno e síntese histórica. A segunda página corresponde à análise arquitetônica
e do entorno paisagístico, citações iconográficas e documentais, observações quando à
existência de outras modalidades de patrimônio relacionadas à edificação, valores para
inventário e indicação de classificação em níveis de acordo com o Plano Diretor.
A terceira página, de caráter complementar, é destinada ao levantamento arquitetônico
elaborado nos estágios curriculares, podendo também ser preenchida posteriormente na
continuidade do projeto. Nessa ficha complementar, constam a situação do bem no itinerário
cultural, croqui da planta de localização ou de cobertura, croquis arquitetônicos (fachada ou
planta baixa), fotografias complementares das fachadas, interiores e detalhes arquitetônicos.
Essa divisão de páginas é proposta de forma a possibilitar a continuidade do projeto, de
acordo com o nível de detalhamento alcançado a cada etapa.
Dessa forma, as fichas propostas são divididas em páginas complementares, de forma
a possibilitar o levantamento dos roteiros e das edificações de acordo com o possível e com o
necessário a cada etapa, permitindo a continuidade do trabalho através de ações continuadas
do Museu do Imigrante e da Secretaria de Cultura, articuladas com o COMPAHC, IPURB e
Universidades locais, com as associações de roteiros turísticos e culturais e organizações
comunitárias existentes no município. Além disso, o fichamento propõe registrar a inter-
relação do patrimônio arquitetônico com outras modalidades, como arqueológico, etnográfico
e imaterial, citando informações relativas a acervos (iconográficos, documentais, acadêmicos,
do Museu do Imigrante ou de particulares), bens móveis e obras de arte integradas, assim
como paisagens relacionadas ao objeto de estudo, de forma a permitir um panorama da
paisagem cultural do município, instituições e coleções relacionadas.
Além disso, os valores atribuídos às edificações, conjuntos e roteiros, devem embasar
a aplicação dos instrumentos do Plano Diretor municipal para a preservação e gestão do
patrimônio cultural, identificando os níveis de preservação que devem ser levados em conta
para levantamentos e projetos arquitetônicos.
5. CONSIDERAÇÕES FINAIS
O diagnóstico realizado deve fornecer subsídios à nova fase da atualização do
Inventário trazida pelo programa Laços Patrimoniais, que consiste na elaboração de fichas
cadastrais de edificações, sítios históricos e roteiros culturais, mas ao mesmo tempo deverá
ser complementado na medida em que forem realizadas novas visitas de campo aos locais que
ainda não foram avaliados. Ao mesmo tempo, percebe-se o trabalho de diagnóstico e
Inventário como uma lista aberta, para a qual é necessária constante atualização, já que o
patrimônio cultural é dinâmico, apresentando alterações de suas estruturas materiais e
imateriais ao longo dos anos. A cada visita realizada, é possível identificar as alterações de
uso, de estado de conservação, de risco de desaparecimento e de valorização e conhecimento
pela população local.
Também se verificam as mudanças ocorridas através do uso turístico ao longo dos
itinerários onde os bens culturais edificados se localizam, gerando impactos positivos ou
negativos. Com a sua avaliação contínua, será possível identificar as demandas e
possibilidades de fomento cultural em cada local, possibilitando outras formas de
revitalização e preservação do patrimônio cultural.
O Plano Diretor municipal define quais as edificações da zona urbana devem ser
incluídas no Inventário, dando o respaldo legal para a sua proteção mediante cadastro e
definição de níveis de preservação. Assim, entende-se que, previsto através de Lei, esse
mapeamento é a base onde deve ser realizada a atualização do inventário, as ações de
educação patrimonial e de fomento cultural. Esse documento possibilitará uma resposta mais
rápida à sociedade quanto às características dos bens mapeados pelo Plano Diretor, atendendo
a uma demanda para facilitar suas análises, mas também norteará o nível de levantamento que
cada edificação terá na formulação de sua ficha de cadastro.
Na zona rural, é necessário avaliar, além das características arquitetônicas das
edificações, os elementos relevantes que compõe a paisagem, como vinhedos históricos, áreas
de mata nativa, hidrografia e itinerários culturais. Também é relevante identificar o
patrimônio imaterial relacionado a essas edificações, como os saberes e fazeres do vinho,
jogos, festas e celebrações comunitárias. Essa avaliação é necessária para conhecimento da
paisagem cultural e está relacionada à valorização do lugar pela população e pelo visitante, o
qual busca autenticidade nas expressões culturais a serem conhecidas.
Os roteiros turísticos e culturais do município são a principal alternativa utilizada na
cidade para a preservação do patrimônio cultural, porém muito da diversidade desse
patrimônio encontra-se distante das rotas turísticas. Muito desse patrimônio encontra-se em
estado de abandono, mas ao mesmo tempo mantém características preservadas em sua
autenticidade. Se por um lado o desenvolvimento turístico devolveu a vida a algumas rotas
principais, a economia criativa e a agroindústria têm incentivado o empreendedorismo de base
cultural, principalmente os relacionados ao patrimônio cultural material e imaterial. Assim, a
fase de levantamento cadastral das edificações deve levar em conta essa complexidade, tendo
em vista não apenas o planejamento e regramento para a preservação das edificações, mas
também a educação patrimonial para conhecimento das características das construções, da
cultura e da realidade local.
REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS E DOCUMENTAIS
ARROYO, Michele Abreu. Para além do tombamento: possibilidades de instrumentos de
proteção do patrimônio cultural nas políticas públicas municipais. In: ARAÚJO, Guilherme
Maciel; ASKAR, Jorge Abdo; MIRANDA, Marcos Paulo de Souza (org.). Mestres e
Conselheiros: Manual de atuação dos agentes do Patrimônio Cultural. Belo Horizonte: IEDS,
2009. p. 69-74.
COSTA, Ana Elisia et al. Arquitetura moderna na Serra Gaucha. Santa Cruz do Sul, RS:
EDUNISC, 2011. 1 CD-Rom
CURTIS, Júlio Nicolau Barros de. Vivências com a arquitetura tradicional do Brasil:
registros de uma experiência técnica e didática. Porto Alegre: Ed. Ritter dos Reis, 2003.
IPHAE. Sistema de rastreamento cultural: M01 Bens edificados Inventário. [Porto Alegre]:
Governo do Estado do Rio Grande do Sul, Secretaria de Cultura, [2013].
TONUS, João Wianey; TRAVI, Claudete Maria Taiarol. PROJETO URB- AL/VICTUR.
Projeto Victur: valorização do turismo integrado à identidade cultural dos territórios. Caxias do
Sul, RS: Belas Artes, c2007. 237 p. + 01 CD-ROM + 01 DVD.