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LI S'rJl Universidad e de São Paulo

B R A S f l

FAUSTO ROBERTO POÇO VIANA

O FIGURINO DAS

RENOVAÇÕES CÊNICAS DO SÉCULO XX

UM ESTUDO DE SETE ENCENADORES

VOLUME 11

SÃO PAULO
2004
UNIVERSIDADE DE SÃO PAULO
ESCOLA DE COMUNICAÇÕES E ARTES
DEPARTAMENTO DE ARTES CÊNICAS

..

CAPÍTULO 6

O FIGURINO
DE
BERTOLT BRECHT

380
Fig. 1- Bertolt Brecht (final da década de 20)

"Os figurinos e cenários do grande Neher


São feitos de material barato:
De madeira, trapos e cores
Ele faz o casebre do pescador basco
E a Roma Imperial".

(trecho de Os Mestres Compram Barato, Brecht)

" De todas as obras humanas, as que mais amo


São as que foram usadas.
Os recipientes de cobre com as bordas achatadas e com mossas
Os garfos e facas cujos cabos de madeira
Foram gastos por muitas mãos: tais formas
São para mim as mais nobres."

(Trecho de De Todas as Obras, Brecht)

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INTRODUÇÃO

A maior dificuldade neste trabalho de pesquisa sobre os figurinos das


renovações cênicas do século XX foi justamente Bertolt Brecht. Porque como
disse Heiner Müller, "há muitos Brechts".l

Brecht é mesmo muitos - ele é dramaturgo e encenador - moderno, pós-


moderno, didático, épico, etc .. Grande teórico de teatro, fundamenta e
justifica suas experimentaçõ es. Para completar o quadro, é poeta! Um poeta
muito bom que faz teatro.

Brecht não é alguém que se possa separar de sua obra. Um artista que
reflete na obra sua história pessoal, suas dificuldades, seus momentos de
alegria, de crença, de fé, seus amores. Mas que não hesita em retratar suas
dores e suas preocupações. Que são, acima de tudo, preocupações
universais, voltadas para o todo da humanidade.

Este capítulo cumpre a difícil tarefa de abordar os figurinos usados nas


encenações de Brecht.

Para traçar um panorama do que seriam estes trajes, optou-se pela


realização do trabalho da seguinte forma:

• Análise das fotografias de espetáculos de Brecht que mostram


claramente suas opções por uma estética de teatro oriental
• Análise do processo conjunto de trabalho estabelecido com Caspar
Neher, seu cenógrafo e figurinista "oficial" direto até 1 933. As
encenações deste período incluem Baal, Na selva das Cidades, Um
Homem é um Homem, A Ópera dos Três Vinténs, Happy End,
Mahagonny, Santa Joana dos Matadouros, A Mãe e Os Sete Pecados
Capitais do Pequeno Burguês (esta última em Paris, 1931 ). A dupla só
voltaria a se encontrar em 1948, para a encenação da Antígona.
• Análise das encenações realizadas com Teo Otto, que incluem títulos
como A Vida de Ga!ileu Galilei, A Alma Boa de Setsuã e a arquifamosa
montagem de Mãe Coragem, com Helene Weigel no papel título.
• Reconstrução do figurino de seis personagens de Mãe Coragem.

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Além disso, utilizou-se como embasamento teórico os textos que o próprio
Brecht escreve para falar sobre seus figurinos, seja nos model/e2, seja nas
publicações sobre teatro que faz.

O processo colaborativo de criação nos seus espetáculos criou chances para


que a cenografia e os figurinos interferissem diretamente na realização do
espetáculo, inclusive do ponto de vista dramatúrgico, como será visto, num
processo tão rico que raramente se vê igual.

Brecht é muito simples. Mas dentro desta simplicidade, atinge uma


complexidade que só mesmo os mestres orientais saberiam explicar.

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BRECHT E O TEATRO ORIENTAL

No dia 08 de dezembro de 1 939, Brecht faz um inventário do que possuía:

"Possuo: Um pergaminho chinês, chamado 'Aquele que duvida'; Três máscaras


japonesas; 02 pequenas almofadas chinesas; 02 facas camponesas da Baviera; Uma
faca de caça da Baviera; 01 cadeira inglesa; Vasilhas, cinzeiros e potes de cobre; Uma
banheira de latão; 02 Grandes desenhos do cenógrafo Neher, 'O Velho' e 'Baal'; 06
desenhos de Neher para minha obra 'A Decisão"; um par de desenhos de 'O Senhor
dos Peixes' de Neher; uma garrafa de whisky feita de prata; um cachimbo Dunhill ;
'César', encadernado em couro; 'Lucrécia', numa velha edição; a coleção completa de
'Neue Zeit'; 'Me-Ti' em couro; uma antiga cama de madeira; um cobertor cinzento;
um relógio de bolso; dois volumes de obras minhas publicadas; um aparelho Leika
com lentes para teatro; moldes da minha cara em gesso; bustos da minha mulher,
feitos por Ninann Santesson; uma pasta com fotos; os manuscritos de minhas peças
'Santa Joana dos Matadouros', 'Cabeças Pontudas, Cabeças Redondas', 'Vida de
Galileu', 'Mãe Coragem e seus Filhos'; dois volumes com reproduções de Brueghel;
um dicionário encadernado em couro; uma tabaqueira de couro; um sobretudo de
couro escuro; uma velha mesa redonda." 3

Analisar esta lista abre uma grande possibilidade de entendimento da obra


de Brecht. Ela começa com uma das suas principais referências visuais : o
quadro que ficava ao lado da sua cama, no seu quarto, na última casa em
que viveu, na Chaussestrasse, 125, Berlim. Este quadro é Aquele que duvida
(figura 2, página seguinte), para o qual Brecht escreveu o poema de mesmo
título (vide Anexo 11).

As casas de Brecht nunca tiveram paredes repletas de obras de arte: sempre


eram de preferência brancas e livres. Acessórios orientais, como as
máscaras, eram pertences dos quais Brecht não se separava.

Brecht tinha nitidamente uma preferência pelo sistema representacional


oriental, particularmente o chinês. Sobre esta arte milenar, que Brecht dá
mostras de ser profundo conhecedor, ele escreve "Efeitos de distanciamento
na arte dramática chinesa", onde resume em algumas páginas o que a arte
chinesa busca, comparando-a com sua proposta de teatro épico, analisando
como os atores obtém o efeito de distanciamento através, em primeiro
lugar, da consciência de que o público está ali e assistindo, sem a quarta
parede . "O artista é um expectador de si próprio", ele continua, porque além

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de representar ainda estabelece contato com a platéia para mostrar que está
atuando. Ele deseja que o ator mostre que está mostrando.

Fig. 2- Aquele que duvida

Brecht comenta que alguns julgam que a interpretação dos orientais era
muito fria, acusação que ele mesmo enfrentou em suas peças. No entanto,
ele diz que "o ator oriental representa acontecimento s que contém uma forte
tensão emocional: todavia, o seu desempenho jamais denota qualquer
calor. "4 Ele ainda cita que o ator oriental jamais entra em transe, ou busca
uma metamorfose completa para "encarnar" uma personagem.

O cenário das peças orientais (ver fig. 3) é praticamente fixo, mudando


apenas alguns móveis ao longo do espetáculo.

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Fig.3- Um cenário de espetáculo chinês

Tudo parece levar a uma síntese, uma busca pelo que é essencial.

Isto é o que Brecht também deseja para sua encenação: em cena, deve estar
apenas o que é fundamental para que o ator possa realizar seu trabalho. Os
figurinos que ele usou ou desejou não saíram deste esquema. Ao mesmo
tempo em que busca esta simplicidade, seus figurinos acabam por receber
um corte ou um estilo que remetem à uma estética oriental. Veja na figura 4
que a encenação tem cores fortemente representativas das culturais
orientais: o dourado, o preto e o vermelho vivo.

Fig. 4- O Círculo de Giz Caucasiano- Desenho de Van Appen

Esta característica orientalizante é bastante freqüente em outras montagens.


Nese caso, do Círculo de Giz Caucasiano, por exemplo, a ação foi transposta

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para a Geórgia feudal, antes da invenção das armas de fogo. Mas não é o
que mostram seus trajes. (Figuras 5 e 6).

Fig. 5 e 6- Helene Weigel como esposa do governado r-O Círculo de Giz

Fig. 7- Reconstrução moderna dos trajes de O Círculo-


o amarelo/d ourado é o traje de Helene Weigel.

Os trajes da figura 7 mostram claramen te a influência do estilo oriental - o


que nos remete a um outro diretor desta pesquisa - o inglês Gordon Craig.
Craig queria que as roupas dos artistas em suas encenações fossem o mais
possível integrada s com o cenário e o todo da encenaçã o.Como visto no
capítulo 2, foi assim que as roupas do Hamlet produzid o com Stanislavski
foram feitas - - roupas com longas caudas e linhas retas, que permitiam que
a linha corporal fosse interligad a ao traje, que se ligaria ao cenário, que
estaria integrado com a luz, etc .. O vestido amarelo de Helene Weigel, que

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fez a esposa do governador, apesar de ser de uma cor muito mais viva,
poderia ser o de Gertrudes, a Mãe de Hamlet: as características do corte em
linhas retas conferem dignidade e sobriedade à figura.

Os trajes da figura 8, de A Condenação de Lúcu/o, também revelam esta


influência oriental. Os trajes dos membros sentados se parecem
grandemente com os participantes do coro do teatro japonês tradicional. No
entanto, a ação de A Condenação se passa na Roma Antiga.

Fig. 8 - Foto de A Condenação de Lúculo.

Turandot ou O Congresso das Lavadeiras é outra das peças de Brecht cuja


ação se desenrola na China, bem como A Alma Boa de Setsuã. A Mongólia
será pano de fundo para A Exceção e a Regra. Como se vê, não faltarão
exemplos que levem diretamente à associação com o Oriente.

Mas o mais curioso de notar, como veremos, é que esta busca pela
simplificação - e sabe-se bem o quanto de trabalho isso traz, pois a busca
do simples, do sucinto, da síntese é difícil - está nas outras peças de Brecht.
Os trajes e cenários carregam um clima europeu, mais adequado para
aquelas encenações que não tem sua localização nos países do Oriente. Mas
é como se a presença filosófica do Oriente estivesse sempre presente.

Só por curiosidade, a figura do Cozinheiro a seguir (fig.9) revela um ser


totalmente oriental- chinês? A peça é : Mãe Coragem.

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Fig. 9- A figura da direita é o Cozinheiro

Brecht iria mais longe ainda ao juntar num mesmo espetáculo suas teorias
novas sobre a interpretação, a peça didática e figurinos chineses: era
"Horácios e Curiácios'.

UMA SÍNTESE EM HORÁC/05 E CURIÁC/05

Horácios e Curiácios é uma peça didáticas. Segundo lngrid D. Koudela,

"peças didáticas são para Brecht, em primeiro lugar dramaturgia.


Texto e música das peças didáticas colocam á disposição modelos de
1

determinadas maneiras de agir, determinadas atitudes e determinadas


falas. ' Desta forma a peça didática se aproxima da peça de teatro
convencional e se distancia do simples desempenho de papéis. Nesse
sentido ela não é tampouco uma simples representação improvisada
que parte unicamente das experiências pessoais dos jogadores ou do
contexto grupal.

A peça didática, por outro lado, se diferencia da peça convencional a


partir da função exercida pelo texto. O texto é um modelo de ação, o
pré-texto e ponto de partida da imitação e crítica que são introduzidas
através da atuação e discussão. Para clarificar o princípio da peça
didática devemos esclarecer a função que o modelo de ação (texto)
tem para o processo educacional.

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Aos jogadores que são ao mesmo tempo aprendizes, é proposto um
caso social que não se relaciona necessariamente com a sua
experiência pessoal {as peças didáticas de Brecht se passam na China,
em Roma, etc.).

A peça didática se apresenta ao jogador como um complexo de


relatório e comentário de um caso social que o desafia a tomar
partido. Esse processo que será incorporado na peça de espetáculo
épica {mas que ainda se realiza no plano do participante, a partir do
jogador 'pensante') adquire no processo educacional com a peça
didática uma nova qualidade - a discussão.

O modelo de ação {texto) recebe a função de desencadear esse


processo de discussão. A peça didática é ao mesmo tempo parábola e
desafio para a discussão das contradições sociais a partir da
experiência. O modelo de ação tem a função de uma tese dentro de
um processo de argumentação. Ou seja, não transmite o
conhecimento apenas por si mesmo, mas provoca um processo através
do qual o conhecimento é atingido. O processo de educação com a
peça didática é portanto ao mesmo tempo um processo de
conhecimento.

Foi com o objetivo de transmitir o conhecimento, provocando mudanças na


forma de pensar que o espetáculo Horácios e Curiácios recebeu uma
montagem em São Paulo. No programa da montagem brasileira encontra-se
o seguinte resumo do espetáculo:

"Façam suas apostas, senhores! Quem vencerá esta luta?

De um lado os Curiácios que querem se apoderar do solo e do sub-solo dos


Horácios. Do outro lado os Horácios que precisam deter os Curiácios, aos quais
combaterão até a derrota final. Do lado curiácio encontramos as melhores e maiores
armas. Do outro, os Horácios poucas armas possuem para se defender.

Dos dois lados o coro e as mulheres cantam e exortam seus exércitos à luta. O
poder e a agressão curiácios . A astúcia e a coragem horácias. Ambos exércitos se
organizam. De cada lado três combatentes: o arqueiro, o lanceiro e o espadachim
representam os batalhões. É a guerra!

Façam suas apostas! Quem vencerá esta luta?

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'Horácios e Curiácios' foi definida por seu autor, Bertolt Brecht, como 'uma peça
didática para estudantes, que trata da dialética'7. Escrita em 1934, só foi encenada
em 195 8 com música de Kurt Schwaen. É baseada num episódio da História romana,
e na forma propõe técnicas de representação do Teatro Chinês. É a mais compacta e
a mais hábil do Teatro Didático de Brecht.

O autor propõe a dialética como um esporte praticado por aqueles que acreditam na
inteligência exercitando-a de todas as formas possíveis. Uma forma de prazer. A
ênfase na peça é no "pensar dialeticamente"; usar todas as armas disponíveis de
todas as maneiras possíveis; saber aproveitar o terreno conhecido; saber usar o
próprio adversário, conhecê-lo, dividi-lo; e não hesitar em fugir quando a medida é
a mais justa, sob um ponto de vista tático, para ter melhores condições de conseguir
a vitória.

Nesta obra Brecht propõe ao demonstrar o uso da lança: "Há muitos objetos num só
objeto". A peça é um exercício de inteligência destinado à inteligência. Seu heroísmo
é demonstrado por alguém que não é herói, que utiliza a astúcia somando-se à
disciplina e à estratégia para dividir e vencer o inimigo. É uma guerra de guerrilhas
numa fascinante demonstração teatral da importância e do significado prático da
utilização do pensamento dialético. Uma forma de prazer.

Façam suas apostas, senhores! Quem vencerá esta luta?"s

O que mais interessa neste momento é que "na forma propõe técnicas de
representação do teatro Chinês". Brecht estava preocupado com o todo da
encenação: teria então que considerar que seria impossível trabalhar
técnicas de atuação chinesas sem trabalhar os figurinos ligados à elas.
Brecht salienta em seu texto sobre o teatro chinês que

"Sabemos que o teatro chinês emprega uma porção de símbolos. Cito


alguns exemplos: um general traz ao ombro uma porção de pequenas
bandeiras (ver fig. 1 O, como exemplo), em número precisamente igual
ao dos regimentos que comanda. Indica-se a pobreza cosendo
irregularmente sobre os trajes de seda alguns pedaços do mesmo
material, mas de cor diversa, que representam remendos. Os
caracteres são indicados por meio de máscaras, ou seja, por meio da
pintura".9

391
Fig. 10- Foto da Ópera de Pequim, com as bandeiras.

Mas é do texto, ou melhor, das instruções que BRECHT fornece para a


montagem que vamos extrair o que ele deseja dos aspectos visuais e de
interpretação da montagem:

"INSTRUÇOES PARA OS ATORES

1. Os chefes das forças armadas representam ao mesmo tempo as respectivas tropas.


Segundo uma praxe do teatro chinês, as unidades armadas podem simbolizar-se por meio de
bandeirinhas, que os chefes trazem enfiadas numa pala de madeira sobre a nuca,
ultrapassando a largura dos ombros. Os movimentos dos atores devem ser lentos, por terem
consciência das dragonas que usam e da gravidade que deve caracterizá-los . Os atores
indicam a destruição e perda de suas unidades armadas, arrancando das palas de madeira, e
jogando fora, com amplos gestos, um certo número de bandeirinhas.

2. A paisagem é marcada no palco. Os atores e os espectadores vêem o rio e o vale


desenhados. Em palcos inclinados pode-se construir o cenário, com o campo de
batalha, as florestas até à altura dos joelhos, montes, etc. Tal cenário, entretanto,
não deverá ser carregado demais (não deverá ser colorido, por exemplo, antes
parecendo-s e com os mapas antigos). No episódio "das sete maneiras de usar a
lança", os obstáculos (fenda na rocha, camada de neve, etc.) podem ser indicados
por meio de pequenas tabuletas na armação nua do palco.

3. Os passos dos atores devem ser marcados: os atores, de certo modo, caminham
sobre marcas de pés no chão. Isso é necessário porque o tempo deve ser medido.
Na primeira batalha, quem dá a medida do tempo é o ator que passa portando o sol.
Na segunda batalha, durante as "Sete maneiras de usar a lança"', o tempo mede-se
pela movimentaçã o do lanceiro Curiácio: os aconteciment os são representados
vagarosamente, como em câmara lenta.

4. Na batalha dos Arqueiros, as setas não são necessárias.

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S. Para simbolizar a tempestade de neve, poderão jogar-se sobre o Lanceiro Horácio
alguns punhados de papel picado.

6. Quanto ao modo de dizer os versos do texto: a voz recomeça no inicio de cada


linha, mas a dicção não deve dar a impressão de fala fragmentada.

7. Pode-se também dispensar qualquer música, e usar apenas tambores. Ao cabo de


algum tempo, os tambores poderão produzir uma espécie de monotonia, mas só por
pouco tempo.

8. Os títulos dos episódios ou cenas devem ser pintados em faixas ou projetados em


slides"To

Como se vê, Brecht cerca até mesmo a sua peça didática de instruções,
acerca dos vários aspectos da montagem: voz (item 6), a música (7), cenários
( 2) e figurinos (1 ).

A proposta dele para figurino é excelente. A idéia é simples - basta colocar


nas costas o suporte onde ficarão as bandeirinhas. Os trajes propriamente
ditos poderão ser aqueles desejados pelos jogadores, ou seja, os que forem
acessíveis para o grupo que realiza a peça. É uma forma de trabalhar com
elementos visuais que a platéia, mesmo não sendo especializada em teatro
chinês, consegue apreender o sentido e codificar o que os trajes propõem,
sem maiores envolvimentos, é claro. A encenação não tem cenário, o que faz
com que ela possa ser representada em qualquer lugar sem maiores
transtornos. Os trajes farão as vezes de figurino, indicando ao público a
época, o local e a razão da encenação.

Parece ser a síntese ideal de todas as propostas de Brecht, da interpretação


até a participação do público, passando pela realização artística de todos os
envolvidos no fazer da peça teatral. Não deixa de contemplar também sua
preocupação política e a função didática de ensinar através do teatro, não
pelo efeito da catarse mas sim pelo efeito de distanciamentoll.

Podemos destacar ainda do texto sobre teatro chinês uma frase muito
importante: "O hábito de encarar uma representação de caráter artístico
como um todo não se destrói facilmente".12

Brecht, ao longo dos anos, vai estabelecendo parcerias com diversos artistas
que contribuem para sua realização dramatúrgica e cênica. Ele acreditava

393
que no processo de criação do espetáculo a cooperação dos diversos
artistas, que poderiam contribuir individualmente para o todo, era
fundamental na busca de uma obra de arte total.

Não é à toa que fundaria mais tarde o Berliner Ensemble, ou seja, um grupo
que trabalha junto, co laborando.

No Pequeno Organon para o teatro, Brecht diz que "A interpretação da fábula
e a sua transmissão por intermédio de efeitos de distanciamento adequados
deverão ser a tarefa capital do teatro. Mas não é o ator que precisa fazer
tudo, ainda que nada se deva fazer que não esteja com ele relacionado. A
fabula é interpretada, produzida e apresentada pelo teatro como um todo,
constituído pelos atores, cenógrafos, maquiladores, encarregados dos
guarda-roupas, músicos e coreógrafos. Todos eles conjugam suas artes para
um empreendimento comum, sem renunciar, no entanto, à sua
autonomia.''l3

Desta colaboração, na dramaturgia, podemos citar a presença forte de


Elisabeth Hauptmannl4 e Ruth Berlaul s. Na música, Kurt Weill e Paul
DessaulG. Na interpretação, acima de todos, Helene Weigel. Na área de
interesse deste capítulo, os figurinos, e na cenografia duas grandes figuras
criativas: Caspar Neher e Teo Otto.

Foi a partir da criatividade destes dois que as ambições cênicas de Brecht


puderam se concretizar.

394
BRECHT E CASPAR NEHER

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Brecht e Caspar Neher

Fig. 11- O designer Caspar Neher em 1931 .

A parceria de trabalho entre Brecht e Neher é um dos casos mais bem


sucedidos que poderia ser relatado nesta pesquisa. O nível de colabor ação e
entrosamento visando a obra artística atingido pelos dois é notável: não se
sabe onde termina a influênc ia de um e onde começa a do outro nas
montagens que fizeram juntos. Sabe-se que este fenôme no é comum entre
artistas que trabalha m juntos por muito tempo - a colabor ação vai se
estabelecendo e se afinand o ao longo dos anos, sendo que a principa l
beneficiada é a obra de arte.

No entanto , o que assusta neste princípi o colabor ativo que Brecht e Neher
fazem é o grau de envolvi mento que a criação atinge.

Brecht descreve em vários relatos seus process os de trabalho . Um grupo de


atores se junta, eles criam a partir do texto propost o por Brecht, que depois
leva o texto para casa, faz suas anotações e re-escre ve as cenas de acordo
com o que foi ensaiad o. (Ruth Berlau descreve este seu trabalho em Laí- Tu a
amiga de Brecht, seu livro autobio gráfico - na verdade , muitas vezes eram as
colaboradoras que reescre viam tudo).

Só que Caspar Neher vai além.

Participando do ensaio, o designe r vai fazendo desenho s e croquis que,


juntamente com todo materia l realizad o pelos outros artistas durante aquele
dia, são entregu es a Brecht, que os leva para casa.

396
Os desenhos que Neher vai fazendo durante o dia não são apenas sobre as
cenas que ele vê. Ele propõe soluções cênicas, cria locais para cenas que
Brecht e os atores não sabem onde realizar (o banho do senhor Puntila, por
exemplo) e vai desenhando desdobramentos da história que Brecht insere na
sua dramaturgia. É o trabalho do designer modificando a dramaturgia.

Pode até soar como um processo comum, inovador e moderno hoje. Mas
esta parceria é iniciada em 1 922.

Brecht e Neher estudaram juntos quando crianças em Augsburg. Neher, que


viria a falecer em 1962, fez a maior parte dos cenários das peças de Brecht
"antes de 1933 e voltou a trabalhar com Brecht depois de 1945 na Antígone,
Senhor Puntila, a montagem de Mãe Coragem de Munique, O Tutor e Die
Mutter' 7" .1s

Neher dizia que "copiar a realidade não é suficiente; a realidade precisa não
só ser reconhecida mas também entendida".19

No processo de criação de cenários, Neher estabelece o que Brecht vai


classificar mais tarde como O Princípio Neher de construção de cenários - "o
cenário deve ser construído de acordo com as necessidades estabelecidas
pelos atores em cena, o que permite que o designer se beneficie da
colaboração com o ator e também o influencie na troca". 2o

Se houvesse um ponto de discórdia entre ambos, o diretor (Brecht) e o


cenógrafo (Neher) - Brecht sempre tinha diferenças com seus colaboradores
masculinos, que não aceitavam sua imposição- este seria a opção de Brecht
pela limpeza cênica - o orientalismo discutido na primeira parte deste
capítulo. Brecht queria o palco sempre limpo, livre de tudo que não fosse
necessário para a cena. Um cenógrafo pode não ter campo para manifestar
seus ideais/ vontades com um direcionamento assim.

No entanto, o desenho a seguir mostra que a mesma busca empreendida por


Brecht era feita por Neher: a síntese, a busca pelo essencial para a
encenação.

397
Fig. 1 2 - Aquele que duvida, de Neher.

"Os cenários de Neher são importantes testemunhos da realidade.


Trabalhando os problemas com uma ampla visão, Neher jamais se separa,
com detalhes secundários ou ornamentos, do depoimento que pretende
apresentar e que é de ordem estética e ideológica. Tudo, nestas decorações,
é belo, e os detalhes essenciais são preparados com grande amor",2 1

A mesma atenção de Neher com o cenário é dispensada aos figurinos. Neste


período histórico, o cenógrafo e o figurinista eram classificados como
decoradores, pois esta divisão de trabalho é posterior.22

A criação de Brecht e Neher foi afinando ao longo dos anos, como veremos
pelos desenhos e fotografias de alguns espetáculos que os dois fizeram
juntos. Também a jornada foi longa de 1922- a peça Tambores na Noite (fig.
13) - até a evoluída e madura concepção da Antígona, baseada na obra de
Sófocles. Não foi só a maturidade artística que os dois desenvolveram.

A 11 Guerra Mundial aconteceu e Brecht teve que ir embora da Alemanha, em


função da ascensão dos nazistas. Empreendeu com a família uma longa
jornada por países europeus: primeiro a Escandinávia, sendo que ficou na
Dinamarca até 1939. Mudam depois para a Suécia, depois Finlândia e depois
passam pela Rússia até finalmente embarcar rumo aos Estados Unidos, onde

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fica exilado por longos anos, até que pudesse retornar para a Alemanha sem
riscos.

Uma discussão sempre levantada sobre este momento de vida de Brecht era
porque ele, ao fugir dos nazistas, não se refugiou na União Soviética, que era
comunista. O próprio Brecht era comunista, em princípio, apesar de nunca
ter aderido abertament e ao partido comunista. Umas das explicações é que
ele não concordava com o tipo de comunismo que se desenvolvia na União
Soviética de então.

É certo que este período de distância foi bom para Brecht e Neher porque
eles desenvolve ram novas experiência s no palco. Mas houve perdas, danos,
dores, separações.

Fig. 13- Tambores na Noite, 1922 Fig. 14- Baal, 1923

Fig. 15- Na Selva das Cidades, 1923 Fig. 16- Um Homem é um Homem, 1926

399
Fig. 17- Mahagonny, 1930 Fig.18- Terror e Miséria do 111 Reich, 1938

Pode-se notar que até mesmo a natureza do desenho de Neher - as figuras


13 a 18 são dele - mostram uma evolução no traço, o que é comum e
bastante positivo .

Neste mesmo período também temos a encenação de Die Mutter (7 932),


com Helene Weigel, que visualmente vai ser um guia para o cenógrafo Teo
Otto em Mãe Coragem de 1941 e 1949.

Fig. 19- Helene Weigel 1Die Mutter Fig. 20- Foto de cena de Die Mutter, 1932.

As figuras do espetáculo Die Mutter(fig. 19 e 20) dão claros indícios do


material com que Caspar Neher gostava de trabalhar.

"Os figurinos e cenários do grande Neher


São feitos de material barato:
De madeira, trapos e cores
Ele faz o casebre de pescador basco
E a Roma lmperial"23

Neher tem plena consciência que tudo aquilo que não é votado para a
execução da cena não deve ser utilizado. Todos os cenários, trajes, adereços
e figurinos devem ter uma história, as marcas que as personagens deixaram
neles através do uso. Os adereços, que Brecht tanto reverenciava, eram
executados com maestria por profissionais que fariam deles os melhores
apoios para o trabalho dos atores. "Muitos dos adereços são peças de
museu. Estes pequenos objetos que põe nas mãos dos atores - armas,
instrumentos, bolsas, talheres, etc. - são sempre autênticos e resistem à
análise mais detalhada".24

"Quase tudo o que é, em geral, ofício do decorador- tudo o que pertence ao


domínio estético, estilístico - é tratado por Neher com sobriedade. A Roma
de Shakespeare era, evidentemente,
distinta da de Racine. As suas
construções cênicas para estes poetas são magníficas. Consegue realizar
obra mais rica, utilizando vários cinzentos e brancos dispostos em
estruturas diversas, do que muitos com todas as cores da paleta. É um
grande pintor. Mas é, sobretudo, um hábil narrador. Sabe, como ninguém,
que tudo o que não esteja ao serviço de uma história a prejudica. Contenta-
se, sempre, com alusões, quando se trata de coisas que não 'entram' na
representação. Tais alusões são, evidentemente, sugestivas. Ativam a
fantasia do espectador, que, perante o 'todo completo', fica paralisada". 2s

As opções de tecido recaem sempre sobre tecidos naturais ou material


natural - o linho, o algodão puro, o couro. No pós-guerra, vemos Brecht
"reclamando" que os tecidos sintéticos - que eles julgavam não serem
convenientes para o teatro - estavam sendo usados demais, mas que o
governo já estava conseguindo lotes de tecido natural, como o linho e o
algodão.

Um exemplo de preparação de figurino está em Theaterbeit,26 o "manual" em


que Brecht descreve com sua equipe seis montagens do Berliner Ensemble.
Na montagem de Die Mutter, eles decidiram usar em primeiro lugar roupas
ve lhas, usadas, que já trariam em si uma história. Não deu certo. Assim,
Neher mandou fazer as roupas e elas passaram por um processo de
envelhecimento: jogaram as roupas no cloro, "para decompô-los. Isto dava

401
a impressão de que as roupas foram usadas muitas vezes. Em seguida, era
chamuscada a florescência do tecido. O aparelho de pirogravura desbotava
a cor e dava uma coloração antiga ao material. Emprestava-lhe tons
amarelados. Em seguida os tecidos eram raspados com lâmina de barbear.
Com cera, com esmalte, com ácido graxo produzíamos manchas. Com a
lâmpada de soldar queimávamos furos no tecido e os remendávamos em
seguida. Para os trabalhadores na peça arrumamos macacões novos de
ferreiros - que reformamos para se igualarem àqueles usados na Rússia
naquela época.". 27 os cerzidos eram deixados à mostra.

Os macacões novos que eles conseguiriam precisaram ser desbotados,


"dando-lhes a aparência de terem sido lavados centenas de vezes.
Rasgamos o tecido com escovas de aço e esfregávamos nele grafite e pó de
ferro manualmente. Em seguida, trabalhava-se com pincéis, como se fosse
a base de um quadro. Para a atriz que representava Die Mutter, usamos uma
blusa velha, bem normal. No ateliê ela parecia estar em ordem, mas no
palco não tinha efeito algum, ao contrário, parecia feia. O estampado era
pequeno demais. ( ... ) Tratamos de estampar o tecido (genuíno). Usamos um
estampado maior e o cauterizamos na cor básica. De repente a blusa ficou
bonita na iluminação do palco. Pois no palco, a peça pobre e barata também
precisa ter aparência bonita". 2s

No Anexo IV deste capítulo, no texto Conversa entre o figurinista e o


maqui/ador, uma tradução de Clara C.W. Sackiewicz para texto de Brecht e
Willi Schwabe, no Theaterbeit, há uma explicação sobre a criação dos
figurinos de o Senhor Punti/a e seu Criado Matti, de como eles usaram
tecidos rústicos- basicamente feltro - para criar todo o traje do espetáculo.

Este Anexo IV não deve deixar de ser lido, em função da curiosa abordagem
dos figurinos e da maquiagem, que não é o tema principal deste capítulo.

Uma outra grande obra de Brecht, a Antígona, é o nosso próximo objetivo.

402
AANTÍGONA

A absoluta ruína material e espiritual em que caímos suscitou


sem dúvida, neste nosso desventurado e funesto país, uma
vaga sede de novidade, e, no domínio da arte, tal sede, ao que
consta, tem-se animado, aqui e ali, a tentar novos rumos. Mas
reina grande confusão, parece, quando se trata de distinguir o
que é velho do que é novo. Por tudo isso, e também porque os
vencidos estão sendo ensinados em muitos locais a superarem
o nazismo apenas mental e emocionalme nte, é conveniente
que os artistas não confiem cegamente na afirmação de que
tudo o que é novo é bem vindo.
(B. Brecht, no

A Antígona 2 9 de Sófocles tem um sabor especial na vida de Brecht. Depois do


exílio, uma peregrinaçã o de mais de dez anos mundo afora, ele agora estava
de volta "ao trabalho, seu primeiro retorno às condições pré-1933. Era seu
primeiro trabalho como diretor num teatro em que se falava alemão, sua
primeira colaboraçã o pós-guerra com Neher (que nunca havia se exilado) e a
primeira participaçã o de sua esposa num espetáculo em mais de dez
anos".3o

Brecht escreveu um novo prólogo para a peça, cuja ação se passa em Berlim,
no final da guerra. A estréia do espetáculo foi em fevereiro de 1 948, e Brecht
começou com a Antígona o hábito de fotografar os espetáculos e depois
publicar estas fotos com textos explicativos sobre os espetáculos : os
Model/e3 1•

Fig. 21 - O prólogo

403
Os figurinos do prólogo (fig. 21) mostram roupas alemãs, contemporâneas,
de cores escuras, de alguma forma já introduzindo a cor de cena que Brecht
e Neher vão adotar - um tom de cinza permeia o espetáculo inteiro. É a
analogia com a destruição causada pela guerra que recentemente acabou -
1945.

O desenho de Neher (fig. 22) a seguir dá uma idéia do dispositivo cênico


criado por ele para a encenação.

Fig. 22- Desenho de Neher para o cenário

Fig. 23- Foto de uma cena

A Figura 22 e a figura 23 são da mesma cena. Como se vê, elas diferem


muito pouco. Neher dá ao seu desenho um aspecto quase fotográfico! A
cena é uma reprodução fiel deste seu planejamento, desde o cenário aos
figurinos, passando até pela postura corporal dos atores, o que não é tão
comum assim. Às vezes, na execução do projeto, ou nos ensaios, um pouco

404
do projeto se perde, o que não deixa de ser um pouco frustran te para o
cenógrafo. Neste caso, até o cenário , que Brecht descreve a seguir, é igual!

O cenário : "Diante de um semicír culo de biombo s coberto s de juncos


pintados de vermelh o, bancos comprid os onde ficarão os atores que
aguardam a deixa. ( ... ) A área de represe ntação é delimita da por quatro
estacas, das quais pendem as cabeças de cavalos (que foram colocad as para
representar símbolo s bárbaro s do culto da guerra). Em primeir o plano, do
lado esquerd o, vemos uma banca com os acessór ios necessários para a
representação - as égides de Baco, a coroa de louros, em cobre, de Creonte ,
a taça com milho painço e o jarro de vinho de Antígon a, e o banquin ho de
Tirésias. ( ... ) Para o Prólogo fez-se descer, com o auxílio de arames, uma
parede caiada de branco. Nela vemos uma porta e um armário . ( ... ) Não há
cortina. Os atores ficam, pois, sentado s à vista de todos, no palco, e só ao
pisarem a área de represe ntação (intensa mente ilumina da) compõe m as
atitudes previam ente marcadas para as persona gens. Assim será impossí vel
ao público imagina r-se transpo rtado para o local da ação; sentir-s e-á,
antes, convida do a assistir à represe ntação de um poema que, por muito
restaurado que se encontr e, é antigo". 32

Fig. 24- Foto de cena da Antígone

405
Os trajes masculinos da encenação eram de "aniagem (tecido rústico quase
como juta) de cor natural e a indumentária feminina de algodão. Os trajes
de Hermón e de Creonte (fig. 26) tinham aplicações de couro vermelho. Para
Antígona (fig. 28 e 29) e lsmênia, os trajes eram cinzentos33, de seda.
Ded icou-se atenção especial aos acessórios, que foram encomendados a
artesãos competentes. O nosso intuito não era dar ao público e aos atores
uma aparência de autenticidade, mas apenas proporcionar-l hes belos
acessórios". 34

Fig. 25- Desenho de Neher- Fig. 26- Creonte e Fig. 27- Desenho de Neher-
Antígona Hemon Tirésias

A combinação dos tecidos ficou muito interessante em cena. A fig. 29


mostra claramente que a seda usada na roupa de Antígona tinha uma função
de separá-la do todo, mostrando sua coragem de lutar pelo que desejava -
neste caso, enterrar o irmão. Criou-se assim, uma distinção através do
material. Creonte recebe um traje bastante masculino, de linhas retas, mas
que decerto modo o coloca no mesmo nível das Criadas da fig. 28, que têm
na verdade a aparência de enfermeiras. Não acho que isso seja um erro - as
enfermeiras dão suporte e curam, também. Esta possivelmente seja mais
uma alusão à guerra e os seus efeitos danosos.

406
Fig. 28 - Antígona e as Criadas Fig. 29- Creonte e Antígona

Não passa desape rcebido também o aspecto religios o, sacerdo tal, da roupa
de Creonte .

O figurino foi usado para estabele cer uma simbolo gia muito maior do que
uma observa ção inicial poderia vislumb rar. Brecht e Neher mostram
claramente que a encenação tem um fio conduto r: se o Prólogo do início,
com as duas mulhere s é aparent emente descone ctado visualm ente do resto
da peça, com roupas alemãs contem porânea s, o figurino de cada
personagem foi trabalha do para fazer com que este tema - a guerra e seus
malefícios - não fosse perdido .

Neste caso, Creonte represe nta o poder, mas sua roupa sacerdo tal faz
alusão à Igreja como instituição que assistiu a todos os horrore s da guerra
impassível.

Nada numa montag em de Brecht é por acaso.

407
BRECHT E TEO OTTO

408
BRECHT E TEO OTTO

Teo Otto cumpriu a função de entrar no lugar de Caspar Neher depois que
Brecht deixa Berlim e vai se refugiar na Escandinávia. Ali, ele e Bertolt Brecht
iniciariam um novo trabalho conjunto - que a julgar pelos títulos das peças a
seguir, só poderia ter sido bem sucedido. Algumas das peças realizadas por
Brecht e Otto incluem: A Vida de Galileu Galilei, A Condenação de Lúculus e
A Alma Boa de Setsuã.

Mas acima de todas, está Mãe Coragem. Qual designer não gostaria de ter
entrado para a história do teatro mundial por ter criado os cenários e
figurinos de um espetáculo deste?

Teo Otto assinou esta montagem, mas como será visto, a influência de
Neher foi mais profunda do que se possa imaginar.

Não deve ter sido nada fácil entrar na vida de um artista como Brecht, que
escreveu até mesmo um poema (Os Amigos) sobre a interrupção do
trabalho, causada pela guerra, com Neher:

A mim, o teatrólogo
A Guerra separou de meu amigo, o cenógrafo.
As cidades em que trabalhamos já não existem.
Andando pelas cidades que ainda existem
Digo por vezes: aquela peça azul de roupa
Meu amigo a teria colocado em lugar melhor.

Teo Otto, que nasceu em 1904, começou estudando mecânica e depois


abandonou esta carreira apara estudar artes plásticas. Estudou na Academia
de Belas Artes em Castel. Foi professor assistente na Escola de Arquitetura
de Segundo Grau em Weimar, e depois foi para Paris. Aos 23 anos já
desenhava para a Kroll Ópera de Berlim e aos 27 se tornou chefe do Berlim
Staadstheatrer. Partiu de Berlim para Zurique, exilado por suas idéias
políticas. Em 1933, começa o trabalho com Brecht.

Suas opiniões sobre cenografia são muito importantes e encontram respaldo


nos maiores movimentos de renovação cênica da primeira metade do século.

409
" Para cada peça, o designer tem que encontrar um novo estilo, já que cada
peça exige o seu próprio."3s

Os trabalhos que realizou antes e depois da parceria com Brecht dão conta
de sua genialidade. Os pontos a seguir foram estabelecidos por ele como
sendo fundamentais para qualquer um que deseje trabalhar como designer
de um espetáculo:

"A primeira qualidade de um designerde palco é seu completo controle deste ofício. Ele
deve saber como usar e combinar todas as potencialidades da cor, linha, superfície,
volume, densidade, luz e sombra. O estudo avançado destes meios constitui tanto a
parte mais excitante da empreitada artística em geral como a parte mais essencial do
desenho de cena.

Os materiais devem ser a preocupação principal de um designer. Ele deve ser curioso,
investigando constantemente e procurando por coisas novas. Não é suficiente para ele
saber o valor decorativo de seus materiais, ele deve pesar e verificar sempre seu valor
sensorial (dureza, aspereza, brilho, leveza, transparência). Neste campo, o designer deve
ser um descobridor.

• Por falar em técnica, esta não deve ter segredos para ele, ainda que ele não deva super
estimar sua importância. Uma máquina que manufatura produtos é ótima: porque ela foi
cuidadosamente preparada e ajustada para se adaptar àquela função. Infelizmente, o
mesmo não acontece com a maquinaria teatral, que tem sido exagerada e mal pensada.
Um designer deveria ser capaz de conseguir uma boa performance com os meios
técnicos mais simples."36

O trabalho de Teo Otto, apesar de todas estas prerrogativas, é descrito por


Kurt Hirschfeld, diretor do Schauspie/haus de Zurique, como "sendo muito
intuitivo, e usa instinto e experiência para descobrir os pontos principais de
uma peça, das quais ele apreende os meios para dar-lhe vida. Além disso,
ele adiciona a tudo isso um bom senso artístico, temperado pela vida e suas
vicissitudes, o que o deixa sempre pronto para discutir e trocar. Ele é de fato
um designer capaz de encontrar o corolário da verdade artística no palco".37

Hirschfeld tem plena razão. O trabalho de Teo Otto demonstra uma


maturidade artística que aliada à sua experiência de vida tem rara beleza e
adequação às diferentes propostas cênicas com que trabalhou. Sinto, porém,
que o trabalho com Bertolt Brecht não foi tão fácil assim, por vários motivos.

410
Em primeiro lugar, sabia-se que o cenógrafo favorito de Brecht era Neher.
Contra isso, nada poderia ser feito - não se obriga alguém a deixar de gostar
de uma pessoa. O fato é que além de Brecht gostar como amigo de Neher,
ele também o admira como artista.

Este é o fator complicador - Otto chega porque a Guerra separou Brecht de


Neher. Outra verdade a ser dita é que trabalhar com Brecht não era tão fácil:
era impositivo, queria que tudo fosse feito a seu modo. Desta forma, suas
melhores colaboradoras eram as mulheres, com quem não raro estabelecia
relações amorosas.

Estaria Teo Otto livre para criar, sem as sombras da obra genial de Neher, de
quem Brecht não se separou por opção, mas sim por força das
circunstâncias da Guerra? Naturalmente, Brecht teria rompido em algum
momento com Neher, padrão que manteve com vários colaboradores,
inclusive as mulheres - que depois de um tempo seguiam sozinhas. Ser o
novo cenógrafo de Brecht assim seria mais fácil. Mas neste caso, o vínculo
não foi rompido.

É o que veremos em Mãe Coragem.

411
Mãe Coragem

412
Mãe Coragem- Um resumo geral

Mãe Coragem viria a se tornar o carro chefe do Berliner Ensemble e é


provavelmente o espetáculo brechtiano mais conhecido no mundo todo. Mãe
Coragem é sobretudo, um alerta sobre os malefícios do mercantilismo
selvagem e suas conseqüências, bem como dos resultados destruidores de
uma guerra.

John Willett resume a peça da seguinte maneira:

"Mãe Coragem. Uma crônica teatralizada da Guerra dos Trinta Anos.

As cenas desenrolam-se na Suécia, Polônia e Alemanha, entre 1624 e 1636.

Mãe Coragem, que é dona de uma carroça de víveres e ganha a vida


vendendo seus produtos à tropa, perde seus dois filhos para o exército
protestante. Chegam os católicos e ela muda de lado, mas eles agarram e
matam um dos filhos. O outro é morto pelos próprios protestantes por ter
sido surpreendido a saquear durante um armistício temporário. Kattrin, a
filha muda de Mãe Coragem, perde a vida quando tentava dar o alarme de
um ataque de surpresa dos católicos. Através de todas essas tragédias (que
ela sente profundamente), a principal preocupação de Mãe Coragem é
manter seu negócio em marcha; contra um fundo de grandes
acontecimentos históricos, ela representa o ponto de vista prosaico e
materialista da guerra. No fim, ela fica sozinha com a sua carroça, velha a e
aniquilada, mas ainda decidida a ganhar a vida". 38

Esperava-se que Mãe Coragem tivesse aprendido com a guerra a ser menos
ambiciosa, menos mercantilista e mais preocupada com o todo da
sociedade. Mas Brecht insiste que não. Ele próprio diz que todas as perdas
não contribuíram para que Mãe Coragem se tornasse um ser humano
melhor, e que sua esperança era que o texto causasse na platéia este
sentimento de que eles poderiam mudar, já que ela passou por tudo aquilo e
não se flexibilizou. "Se Coragem não tira, apesar de tudo que lhe aconteceu,
nenhuma lição, eu, de minha parte, creio que o público pode aprender
alguma coisa observando-a". (Brecht)3 9

413
No Couragemode/1 Brecht deixou muitas fotografias de cena, que foi o
material usado na reconstrução dos trajes deste espetáculo.

De acordo com Willet, na criação dos aspectos visuais de Mãe Coragem, " a
mesma regra do adereços permaneceu para os figurinos: a busca do
realismo sem historicidade. Brecht queria que os figurinos de Mãe Coragem
revelassem o personagem, a classe social e experiência da guerra. Ele
proibiu expressamente a abordagem de 'festival folclórico' e preocupação
excessiva com detalhes históricos. 'Aprenda com a história', ele disse para
Wolfgang Roth na década de 40, "mas na hora certa jogue a história fora.
Não fique limitado pela precisão histórica"'4°. Ainda, ele cita que "Brecht
dizia que seus objetos de cena, principalmente os de comer e de trabalhar
deveriam ser feitos de maneira mais amorosa possível. Para o cenário, Brecht
comumente invocava uma 'bela aproximação' apenas. Mas dos adereços ele
exigia mais, porque eles estavam intimamente ligados ao comportamento.
Assim, a 'imaginação do espectador não tem que criar mais nada'". 41

Brecht tinha por Breughel uma admiração especial, conforma relata jonathan
Jones :

"Bertolt Brecht vividamente elogiava 'o grande quadro de guerra Dulle


Griet (ver quadro no capítulo sobre Artaud) ... A fúria com que defende
seus utensílios domésticos patéticos com a espada. O mundo no final,
por um fio.' A Mãe Coragem de Brecht é uma Du//e Griet moderna,
sobrevivendo num mundo destruído pela guerra. Brecht a concebeu
para ser um estudo da loucura burguesa, mas não conseguiu evitar
que ela acabasse ficando simpática".42 (vide nota, Brecht sobre Dulle
Grief)4 3

Além do curioso interesse comum de Brecht e Artaud pelo quadro, o que


mais chama atenção aqui é que Brecht vai criar em cena um retrato pictórico
que vai fazer uso do mesmo esquema de cores que Brueghel propõe para
Dul/e Griet. Brecht adota, no entanto, os tons cinzas para esta montagem,
como resultado do que acontece depois da guerra, da destruição, do fogo,
dos campos desertos e queimados.

414
Roland Barthes, motivado pelos espetáculos de Brecht que assiste em Paris,
escreve o texto As Doenças do Figurino Teatral, em que compara o nível de
profundidade que Brecht atingiu na concepção e execução de seus trajes
com a superficialidade dos trajes usados na França em 1955.

"O colorido do qual nossos simples cenógrafos fazem uso, é apenas a


forma mítica da cor, o signo pelo qual declaramos uma intenção de
cor; a pintura (salvo precisamente a má pintura) nunca é colorida,
tampouco a cena brechtiana. Toda a plástica brechtiana (daremos aqui
a Brecht a responsabilidade por seus cenários e seus costumes) e a
destruição do colorido como símbolo e restituição da cor como
substância; em Brecht, bem como na pintura, é difícil de nomear a cor,
ao contrario do que acontece na ilustração e no cenário significante
(mesmo e sobretudo estilizado), a cor provoca sempre um nome. Mais
ainda, no teatro brechtiano, a submissão das cores a uma tinta
genérica, a um tipo de idéia geral da cor ( é o cinza na Mãe Coragem,
o marrom em Calí/eu. As únicas metáforas substanciais, lona, couro,
bronze, podem dar conta desta realidade), distancia a tentação dos
contrastes ou das harmonias, coloca, ao contrário, as nuanças como
verdadeiras funções. Por tratar-se de fazer existir o objeto, não como
um signo verossímil, mas como um utensílio, mediador entre o
homem e suas empresas; cabe a sua matéria, então dizer a sua
origem, sua resistência e talvez até os obscuros movimentos da
familiaridade ou de desagrado que seu contato provoca àquele que
dela faz uso."44

Brecht afirmava que não havia feito Mãe Coragem para que o público
simpatizasse com ela, como aconteceu. Ele disse que o que ocasionou esta
identificação foi a tendência excessiva do nosso público de carregar de
emotividade cenas que deveriam mostrar uma outra realidade.

"A guerra é também, nesta forma de representação, puramente


negativa, mas Mãe Coragem sobrevive, se bem que desfigurada. Em
contrapartida, Helene Weigel, empregando uma técnica que lhe
impedia completa empatia para com a personagem, conferiu à
profissão de vendedora não um caráter natural, mas,sim, histórico, ou
seja, enquadrou-a numa época histórica e transitória; quanto à guerra,
apresentou-a como sendo a melhor época para o comércio." 45

415
Ainda quanto à temática dos figurinos, Brecht diz no Couragemode/1 que "O
que conta numa representação realista são os detalhes cuidadosamente
trabalhados dos figurinos e objetos"46.

Este era o tema da peça com que Teo Otto iniciou sua colaboração com
Brecht. Como ele se sairia e as soluções encontradas pela dupla é o que será
visto na seqüência.

416
O Figurino de Mãe Coragem

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417
O Figurino de Mãe Coragem

Os figurinos a seguir, na figura 30, foram fotografa dos em uma exposiçã o


recente na Alemanh a. Esta fotografia foi consegui da no Bertolt Brecht Archiv,
em Berlim, mas nem o chefe do arquivo nem a bibliotecá ria encarreg ada do
acervo souberam precisar se eram os trajes originais. Tudo leva a crer que
sim, pois estão expostas apenas algumas peças, que podem ser as únicas
que sobraram . Podem ter sido usadas em alguma encenação posterior do
próprio Berliner Ensemble. Se for uma reconstru ção, os trajes são fiéis aos
trajes originais - não podemos deixar de notar que foram feitos na
Alemanha, país em que Brecht trabalhou e que tem pesquisa dores muito
sérios que poderiam fazer esta reconstru ção muito bem.

O fato é: são trajes de uma das peças mais renomada s no mundo todo, que
tem um caráter quase mítico no universo teatral. Esta nesta foto a síntese do
trabalho de Brecht com figurinos : a busca para atingir a simplicida de,
colocand o o todo da encenação a serviço do intérprete .

Fig. 30- Trajes da montagem de Mãe Coragem (exposição recente na Alemanha)

418
Fig. 31, 32 e 33 - Mudanças sutis nas peças de roupa de Mãe Coragem

O traje da Mãe Coragem - De acordo com Kenney, "Mãe Coragem desperto u


nas platéias uma simpatia maior do que Brecht queria. É preciso então,
primeiram ente, lembrarm o-nos de seus vícios. Ela é, como o Capelão disse,
uma hiena, uma carniceira . Seus ganhos são baseados na miséria dos outros,
e ela mostra muito pouca empatia por qualquer outro além de seus
familiares. As mortes de seus filhos podem ser ligadas, direta ou
indiretam ente, aos seus instintos comercia is. É seu desejo ganhar dinheiro
com a guerra que coloca todos eles em perigo. Ela está pechinch ando de um
jeito ou de outro quando Eilif decide se alistar, quando Queijinho leva um
tiro, quando Eilif aparece a caminho da execução e quando Kattrin é
assassinada. Além do mais, ela é incapaz de se auto conhecer e de aprender
com as experiênc ias. Ainda assim nós nos tocamos com seu destino. Talvez
porque sua aflição seja verdadeir a, assim como seu amor pelos filhos. Ou
talvez porque apreenda mos algo heróico na sua tenaz luta por
sobrevivência. Talvez, também, a resposta seja que nós reconhec emos o
quanto de Mãe Coragem existe em todos nós. Se nós não podemos
condená- la, talvez seja porque não podemos nos condenar '. 47

Todos os princípio s que Brecht segue, e aos quais Neher se integrava tão
bem, estão presentes nos trajes de Mãe Coragem. Só que quem assinou
estes figurinos foi Teo Otto! As figuras 19 e 20, na página 400, são fotos da
encenação de 1932, dirigida por Brecht com cenários e figurinos de Neher

419
para a peça Die Mutter (que não tem nada a ver com Mãe Coragem. O
subtítulo desta peça é A Vida da revolucio nária Pe/agea W/assowa, segundo o
romance de Máximo Gorki). No entanto, as figuras mostrand o Mãe Coragem ,
montagem que Brecht só estreou em 1 941 , parecem cópias da produção de
Die Mutter, de 1932. O que pode nos levar a duas conclusõ es:

o Foi uma imposiçã o de Brecht- Como diretor, ele impôs a Teo Otto que
queria manter a mesma linha seguida por Neher, apesar de os temas
de Die Mutter e Mãe Coragem serem diferente s, o que comprov aria
que trabalhar com Brecht era seguir suas ordens estritame nte.
o Foi acomoda ção de Teo Otto- De alguma forma, Teo Otto pode ter ido
buscar num sucesso do passado uma forma de entrar no universo
brechtian o para depois liberar sua criativida de nos espetácu los
seguintes .

São suposiçõ es. O fato é que o figurino assinado por Teo Otto parece feito
por Caspar Neher. A técnica de envelhec imento usada foi a mesma descrita
na página 402.

Pequenos detalhes vão sendo colocado s no traje de Weigel (figs. 34 e 3 5), de


forma que ela vai mostrand o a passagem do tempo e as dificuldad es da
guerra. São os adereços da Weigel, como Brecht descreveu no poema Os
Apetrech os da Weigel. (ver anexo 111)

Fig. 34,35 e 36- Mudanças ao longo do espetáculo

420
Figs. 37 e 38- Rusticidade dos tecidos

Fig. 39 e 40 - Reconstrução dos trajes de Mãe Coragem, ainda sem a fase do


envelhecimen to.

De forma geral, os tecidos são naturais: algodão (fig. 39), linho (fig. 30,
camisa amarela, por exemplo) e lã (fig. 30, as calças dos meninos). Os
metais entram como diferenciaç ão de status - os militares, os oficiais, usam
metais. O que não impede que eles sejam envelhecido s, porque precisam
contar uma história. (fig. 38)

421
OS FILHOS

Kattrin (fig. 50)- "Kattrin é, o tempo todo, uma vítima. Sua tontice é o
resultado de ter sido abusada por soldados quando era criança. Ela é
estuprada e desfigurada, e o pathos disto fica intensificado quando sabemos
que ela deseja casar-se. Seu traço mais óbvio é a bondade, especialmente
em relação às crianças, e é isto que motiva seu sacrifício final. Mas note-se a
habilidade de Brecht em sentimentalizá-la, por exemplo, quando sugere que
ela é vaidosa e por surpresas evidentes de vigor quando ameaça bater em
Mãe Coragem, na cena cinco". 48

Eilif e Queijinho (fig. 41 )- "Se o traço dominante de Kattrin é a bondade, o de


Eilif é a bravura. Ainda assim é uma bravura repleta de tolice e brutalidade .
O ' heroísmo' final de Eilif consiste de assassinato e roubo. Mãe Coragem
criou Queijinho para ser honesto porque ele não era muito inteligente. E ele
não é. Sua honestidade soa essencialmente como falta de imaginação". 49

Fig. 41 - O Oficial conversa Fig. 42 - A dança do sabre de Eilif- Ver uniforme de metal
com Queijinho e Eilif do oficial a direita

OUTROS PERSONAGENS

O Capelão (fig. 45) - O Capelão é um dos personagens mais complexos da


peça. Ele é capaz de ser covarde, quando saúda a bandeira católica para
evitar ser levado como prisioneiro. Porém ele é capaz de mostrar seus
sentimentos humanos e ações, como quando cuida dos feridos na Cena
Cinco. Ele é dado a filosofias e é freqüentemente pomposo, mas raramente
há sabedoria no que diz".so

422
O Cozinheiro (fig.SO) - "O Cozinhe iro é o par perfeito de Mãe Corage m. Ele é
totalme nte egoísta e inescru puloso. Por não ter o insight do Capelão, ele não
entende porque Mãe Corage m nunca abando na a filha".

Com a exceção de Yvette (fig. 48), que é trabalha da de forma a parecer


sensual e até mesmo um contrap onto à figura de Kattrin, outras figuras
também são tratadas com tecidos rústicos . (figuras 43 e 44)

Fig. 43- Elenco Fig. 44 - Reparar no homem que negocia o enterro de Katrin

Figs. 45 e 46- O capelão na foto original e na reconstru ção atual do traje.

423
Fig. 47- A Dança do Sabre de Eilif Figs. 48 e 49- Yvette e seu traje

Fig. 50 - O cozinheiro , Kattrin e Mãe Coragem

424
CONCLUSÃO

425
CONCLUSÃO

Brecht tem extrema preocupação e sabe da importância dos figurinos em


suas montagens. Ele próprio escolhe por vezes os trajes que acha que são
adequados para depois submetê-los ao crivo do designer, para aprovação.

Na descrição das fases de produção, que Brecht descreve em 1 5 itens, da


análise da peça até a noite da estréia, o figurino aparece já no item dois -
Discussão do cenário. O figurino vai sendo desenvolvido continuamente com
os outros pontos da encenação, até voltar ao foco principal no item 09-
Discussão de Figurinos e Máscaras. "Uma vez que os agrupamentos possam
ser vistos como um todo e as personagens surjam individualment e, aí os
figurinos e máscaras são discutidos e começa-se o trabalho sobre eles. Os
saltos altos, saias longas, casacos, barbas, etc, já foram testados
experimentalm ente nos ensaios anteriores".sl

Fig. 51 - O Berliner Ensemble em foto atual (2002)

Roland Barthes em várias ocasiões expressou opiniões sobre Brecht e suas


encenações.

"O descolorido na superfície brechtiana ( que significa a destruição da cor)


mostra a preparação prévia dos objetos. Percebe-se que em Brecht nunca se
tem um meio tom. Sabe-se pelas notas de trabalho que ele publicou no
Theaterbeit que o rigoroso tratamento que Brecht e seu grupo faziam com
seus objetos, para dar a aparência de uso, a sujeira, etc. Mas é necessário

426
entender bem: não mais do que na pintura, os objetos não são verdadeiros
apenas por serem; o dramaturgo pede por eles, não são uma ilusão, eles são
significantes ( não pelo que são, mas pelo seu uso) ; o que se deve ler neles
é uma história, que se relaciona com os homens. O traje de um personagem
brechtiano não é um traje literalmente falando. Nem um símbolo de
vestimenta. É uma linguagem que a roupa fala com o homem,as memórias,
as misérias, e as lutas que caíram sobre ele; idéia plena mas também
questionamento pleno, a substância brechtiana é verdadeiramente dialética.
Não concorda em existir com aquele nome, não do discurso humano, mas
pelo fazer humano ; significa que o homem faz o mundo e o mundo resiste a
ele, e é por causa disso que a história deve ser o mais clara possível aos
olhos do espectador, que o dramaturgo não pode iludir." s2

Como salientou-se neste capítulo, Neher - "é um grande pintor, mas em


primeiro lugar era um narrador cheio de genialidade".s3 Ele foi um apoio
fundamental no desenvolvimento da obra artística de Brecht.

Não se pode deixar de notar também que a obra dos dois não parece
desconhecer a obra de um grande europeu que lançou suas teorias antes de
os dois começarem a trabalhar - Edward Gordon Craig. As linhas, as formas,
a interação com o cenário, a ação vista como um todo, o teatro visto não
como divertimento fútil mas como obra de arte mostram que Neher e Brecht
- não, não se pode isolar a criação cênica de Brecht de Neher - não
passaram incólumes à obra do inglês.

Claro que o trabalho dos dois não teria sentido se Brecht não tivesse para
seus projetos o grupo de excelentes atores que montou - entre eles, a genial
Helene Weigel. Ernst Busch. Ekhehard Schall... Sem contar os outros
colaboradores: Ruth Berlau, Elisabeth Hauptmann, Paul Dessau, Kurt Weill. ..

Apesar de toda a simplicidade, as conquistas dos figurinos de Brecht são


imensas . No aparente despojamento está a grandiosidade, a capacidade de
revelar tanto com tão pouco. Um dos pontos mais significativos dentro de
todas as conquistas - e não se pode negar uma grande admiração pelo
visual da Antígona - é um pequeno detalhe que faz parte de um dos
figurinos mais amplamente divulgados de Brecht.

427
O pequeno detalhe é uma colher. "A colher de chumbo que a Mãe Coragem
enfia numa casa de botão do seu casaco mongol".

Porque ela é parte do traje. Em nenhum dos materiais consultados há uma


referência direta a ela. A genialidade deste símbolo é tão importante que
talvez responda a muitos questionamentos sobre Mãe Coragem: o que a
motiva a ir adiante, porque ela se importa tanto com dinheiro, porque suas
ações são voltadas ao comércio, no meio de tanta desgraça.

Porque uma colher pendurada num casaco? Poderia estar no bolso, na


carroça, numa bolsa. Mas a colher está ali porque é no peito que Mãe
Coragem traz aquilo que mais a assusta - a fome. A sua e a de seus filhos -
que ela até coloca em posição de importância, mas no fundo, ela quer
garantir a própria sobrevivência. Assim, se a carroça for destruída, se seus
filhos partirem, se tudo o mais der errado, ela tem em si a força de lutar pelo
alimento, que é a fonte inicial da vida.

Acima de tudo, Mãe Coragem deseja viver.

"E assim o maior dramaturgo alemão do século XX foi bem sucedido em


encontrar para as suas próprias peças seus mais verdadeiros meios de
expressão - aqueles de performance autêntica, realizada por um grupo de
atores altamente hábeis num teatro subsidiado onde seus próprios desejos
diretoriais poderiam, sem objeção, se tornar realidade artística".s4

428
ANEXOS

429
Anexo I -Algumas obras de Bertolt Brecht

Peça Escrita local em que Estréia em Local da Estréia Notas


em foi escrita
Baal 1918 Baviera 08/12/1923 Altes Theater de Direção de
(Baal) Leipzig Alwin
Kronacher
Cenários de
Paul Thiersch

Remontada Deutsches Direção de BB


14/02/26 Theater de Cenários de
Berlim Caspar Neher
Tambores na Noite (1918- Baviera 30/09/22 Munich
(Trommeln in Der 1920) Karnmerspiele
Nacht)
Na Selva das Cidades 1921- Baviera 09/05/23 Residenztheater Direção de
(Im Dickicht der Stiidte) 24 de Munique Erich Engel,
cenários de
Neher
Eduardo Segundo 18/03/24 Muni ch Direção de BB
(Leben Edwards des Karnmerspiele Cenários de
Zweiten von England) Caspar Neher
O Mendigo ou o Cão Antes
Morto de 1923
(Der Betttler oder der
Tote Hund)
O Casamento Antes 11/12/26 Schauspielhaus Direção e
(Die Hochzeit) de 1923 De Munique montagem de
Melchior
Vischer
A Expulsão do Diabo Antes
(Er Treibt einen Teufel de 1923
Aus)
Lux in Tenebris Antes
de 1923
Um Homem é um 1924- Berlim 25/07/26 Landstheater de Direção de
Homem 26 Darmstadt Jacob Geis
(Mann ist Mann) Cenários de
Neher
A Opera dos Três 1928 Berlim 31/08/28 Theater am Direção de
Vinténs Schifibauerdarnm Engel,
(Di e Dreigroschenoper) Cenário de
Neher
HappyEnd 1929? Berlim Setembro de Theater am Direção de BB
29 Schiftbauerdamm e Engel,
Cenário de
Neher
Ascensão e queda da 1928- Berlim 09/03/30 Leipzig Direção de
Cidade de Mahagonny 29 Walther
(Aufstieg und Fali der Brugmann
Stadt Mahagonny) Cenários de
Neher
Santa Joana dos Entre Berlim 30/04/59 Deutsches Direção de
Matadouros 1929- Schauspielhaus Gründgens
(Die Heilige Johanna 31 Cenários de
der Sch/achthoje) Neher
O que Diz Sim/ O que 1929- Berlim 23/06/1930 Berlim Direção de
diz não 30 Brecht e Weill
(Der Jasager! Der
Neínsa:;(er)
A Mãe 1930- Berlim 17/01/32 Berlim Encenação de
(Die Mutter) 31 Burri
Cenários de
Neher
Os Horácios e os 1933- Berlim 26/04/58 Halle, Theatre der
Curiácios 34 Jungen Garde
(Die Horatier und
Kuriatier)
As Cabeças Redondas e 1931- Escandinávia 04/11/36 Copenhague, Direção de Per
as Cabeças Pontudas 34 Dinamarca Knutzon
(Die Rundkopfe und di e
Spítzkõpfe)
Os Sete Pecados 07/06/33 Paris, Théatre des Música de
Escandinávia
Capitais do Pequeno Champs Elysées Weiil
Burguês Cenários de
( Díe Sieben Todsünden Neher
der Kleinbürger) Coreografia de
Balanchine
Terror e Miséria do ill 1935- Escandinávia 21/05/38 Paris Direção de
Rei ch 38 Brecht com
(Furcht und Elend des Weigel como
Drítten Reiches) atriz
Os Fuzis Da Senhora 1937 16 de outubro Paris Direção de
Carrar de 1937 Dudow
(Díe Gewehre der Frau
Carrar)
Galileu 1937- Escandinávia 09/07/43 Schauspielhaus de Encenação de
(Leben des Gali/ei) 39 Zurique Leonard
Steckel
Cenário de
Theo Otto
Agosto de Coronet Theater Direção de BB
1947 de Los Angeles e Joseph
Losey
Cenário de
Robert
Davison
Mãe Coragem 1938- Escandinávia 19/04/41 Schauspielhaus de Encenação de
(J.futter Courage und 39 Zurique Leopold
Ihre Kinder) Lindtbergl
Cenário de
Theo Otto
11101/49 Deutsches Direção de BB
Theater de Cenário de
Berlim Theo Otto
A Condenação de 17/05/51 Berlim Encenação de
Lúculo Wolkel
(Di e Verurteilung des Cenários de
Lukullus) Neher
A Alma Boa de setsuã 1938- Escandinávia 04/02/43 Schauspielhaus de Encenação de
(Der Gute Mensch von 41 Zurique Steckel
Sezuan) Cenários de
Otto
O senhor Puntilla e seu 1940 Escandinávia 05/06/48 Schauspielhaus de Encenação de
Criado Matti Zurique BB eKurt
(Herr Puntila und sein Hirschfeld
Knecht Matti)
O Círculo de Giz 1943- Estados 15/06/54 Theater Dirigida por
Caucasiano 45 Unidos Schiffbauerdamm BB
(der Kaukasische Berlim Cenários de
Kreidekreis) VonAppen
Antígona 1947 Zurique Fevereiro de Stadttheater de Direção de
1948 Chur, na Suíça Brecht
(Die Antigone des Com Weigel
Sophok/es) eHans
Gougler
Cenários de
Neher
O Tutor 15 de abril de Berliner Ensemble Encenação de
1950 Brecht e
(Der Hojmeister) Neher
Cenários de
Neher
Turandot ou O
Congresso das
Lavadeiras

(Turandot oder des


Kongress der
Weisswascher)
Anexo 11 -Aquele que duvida

Sempre que parecia


Que nós tínhamos encontrado a resposta de uma pergunta
Um de nós pegava a cordinha do velho e enrolado
Pergaminho de papel na parede, para que ele caísse e
Revelasse para nós o homem no banco que
Duvidava tanto.
Eu, ele dizia para nós
Sou aquele que duvida. Eu tenho dúvida se
o trabalho que devorou seus dias foi tão bem feito.
Se o que você disse ainda teria valor para alguém se
Tivesse sido menos bem dito.
Se talvez você tenha falado bem mas talvez
Não estivesse convencido da verdade do que disse.
Se o que disse não foi ambíguo; cada possível erro de entendimento
É responsabilidade sua. Ou talvez não seja ambíguo
E retire as contradições das coisas; isto será
não ambíguo?
Se assim for, o que você diz é inútil. Não tem vida em si.
Você está verdadeiramente na corrente dos acontecimentos? Você aceita
tudo que se desenvolve? Você está se desenvolvendo? Quem é você? A
Quem
você fala? Quem acha o que você diz útil? E, por falar
Nisso:
É sóbrio? Pode ser lido pela manhã?
Está conectado ao que já está lá? As sentenças
que foram
ditas na sua frente foram usadas, ou pelo menos refutadas? É
tudo verificável?
Por experiência? Por qual? Mas acima de tudo
sempre acima de tudo mais: como alguém se comporta
se acredita no que você diz? Acima de tudo: como alguém se comporta?
De forma reflexiva, curiosa, nós estudamos o homem azul que duvida
no papiro, nos olhamos e
Recomeçamos tudo de novo.
Berto/t Brecht
Anexo 111 - Os Apetrechos da Weigel
(texto de Brecht, tradução de Geir Campos)

Como o plantador de milho em seu setor de experiência


escolhe os grãos mais pesados, e como para o poema
escolhe o poeta as palavras mais adequadas, assim
escolhe ela os objetos que os personagens carregam em cena. A colher de
chumbo
que a Mãe Coragem enfia numa casa de botão
do seu casaco mongol, a carteira do partido
da simpática senhora Vlassova, e a rede de pescaria
da outra mãe espanhola, a bacia de latão
de Antígona pôr o pó. Inconfundíveis
o saco já todo rasgado da trabalhadora para os volantes do filho e a sacola
do dinheiro
da esperta mercadora! Cada coisa
do seu acervo é escolhida, a fivela e o cinto,
o vaso e a cartucheira, escolhidos também
o frango e o porrete que no final
a velha enrola na corda,
a prancha onde a basca prepara o pão,
e o tronco da vergonha que a grega leva aos ombros
com dois buracos onde vão as mãos, e o pote de gordura
da russa tão pequeno nas mãos do policia, tudo
de acordo com a época, a serventia e a beleza,
escolhido com olhos de quem conhece bem
as mãos de quem faz o pão, de quem faz rede,
de quem cozinha sopa, e compreende
a realidade.
Anexo IV- Conversa entre o figurinista e o maquilador, tradução
de Clara C.W. Sackiewicz para texto de Brecht e Willi Schwabe,, no
Theaterbeit

CONVERSA COM O FIGURINISTA E O MAQUILADOR

A cooperarão entre o Diretor Artístico. o Figurinista e Maguilador

O contato de trabalho técnico entre o Encenador - Figurinista e Maquilador


tornou-se muito informal nos dias que correm. Contudo, no Berliner
Ensemble ainda existe um esforço para abordar o detalhe ótico com grandes
cuidados. Nesse caso esse aspecto é encarado como um elemento decisivo
do realismo. O encenador fornece ao Figurinista uma série de incentivos,
uma vez que já havia se aprofundado em estudos preliminares. Suas
exigências são consideráveis e ele absorve qualquer pensamento, qualquer
estímulo. Nenhum outro profissional dedica mais tempo a discussões tão
prolongadas e abrangentes com o Figurinista. Agora mesmo, por exemplo,
tivemos uma discussão sobre a encenação planejada de "Coriolano". Agora
estou grávido com a peça. Eu repito a história romana desde os seus
primórdios e leio as cenas repetidas vezes. Na primeira reunião de trabalho
já estarei bem familiarizado com a peça. A propósito, antes de começar com
os esboços de figurinos, eu distribuo os papéis da peça na imaginação ...

O interesse dos atores na máscara diminuiu. Muitas vezes o Maquilador


chega a sentir certa resistência. Na maioria das vezes o ator acredita que
basta o seu rosto para fazer frente a um papel. Isto naturalmente quase
nunca acontece.

Nos teatros parisienses reina muito mais disciplina no que diz respeito à
máscara. Para alcançar resultados importantes na arte da máscara, e preciso
que a equipe de maquiladores seja investida dos necessários poderes. Isto
não acontecia até agora.

A RESPEITO DA NOVA GERAÇÃO

A arte da confecção de figurinos vem regredindo muito desde 1945. Nesse


caso a guerra inclusive causou muitos danos. Encontra-se em andamento a
instalação de uma escola de figurinistas e maquiladores. Deverão ser
treinadas pessoas jovens com habilidades artísticas, geralmente
provenientes da área de costura. Um figurinista e maquilador deverá ter
habilidades manuais: ele necessita de uma mente voltada para a
dramaturgia. Ele deverá ser capaz de ler uma peça como um diretor artístico.
Precisa ter os figurinos diante dos olhos plasticamente. Não basta que ele
apenas descreva a peça. O ideal seria que ele passasse por uma escola de
arte dramática. Ouvi muitas vezes pessoas jovens que começavam agora
com o ofício, dizer que seria necessano superar expenencias e
conhecimentos transmitidos e começar tudo de novo. Eles pretendem criar a
partir da totalidade da sua fantasia. Naturalmente eles acabaram
encontrando o vazio da sua ignorância. De que vale toda a fantasia, quando
os jovens não conseguem realizar artesanalmente aquilo que imaginam? O
resultado não passa de calça e paletó.

Qualquer um que abrace o teatro deverá entender, que isto representa uma
boa quantidade de trabalho. Uma vez precisei ajustar um simples paletó
num ator. Precisei de três horas para isto. Isto é necessário para que o
figurino se funda completamente com o personagem. É preciso auscultar o
ator como um diretor. O mais importante é que o ator se sinta bem no
figurino. E precisamos convencê-lo disto. Quando ele usa o figurino no
palco pela primeira vez, em geral ele procura novos movimentos e novas
entonações. O Figurinista deverá constatar então se o figurino e o papel se
completam.

DIFICULDADES COM O MATERIAL E PROMOÇÃO GOVERNAMENTAL

Desde 1945 foram feitos grandes progressos. Não obstante, ainda


enfrentamos dificuldades. Até o presente tivemos que nos contentar quase
exclusivamente com fibras sintéticas que não se prestam bem para o teatro.
Mas agora já conseguimos algodão puro e linho puro. O Ministério da
Educação Popular oferece apoio a todos nós, mas no departamento de
abastecimento de material do Ministério da Economia, os pontos de vista,
por sua própria natureza, não são muito artisticamente inclinados. O que foi
a melhor fábrica de tecidos de fantasia antigamente, precisa produzir agora
tecidos de primeiranecessidade. O equipamento do nosso teatro é
excelente. Nenhum teatro no ocidente tem condições de trabalhar, mesmo
aproximadame nte, como nós. Por exemplo, nos equipamos cada peça de
teatro de novo. Precisamos fazê-lo desde o começo, uma vez que o estoque
do Teatro de Berlim foi acomodado numa salina e posteriormente atribuído
ao Estado de Hessen. Da mesma forma, a biblioteca de figurinos de Berlim,
a mais maravilhosa do mundo, possivelmente permaneceu em Marburg.

OS COSTUMES EM "A MÃE"

Primeiro experimentamo s com roupa usada: mas à luz forte do palco e em


razão da grande distância, o seu efeito no palco era fraco. Além disto,
tratava-se de naturalismo puro, isto é, faltava uma escolha e um reforço
conscientes das principais características das roupas já anteriormente
usadas. Para chegar a figurinos realistas, tínhamos que produzir o tempo de
uso e o desgaste das roupas pelo caminho artificial. Os tecidos
tratados inicialmente com cloro, para decompô-los. Isto dava a impressão
de que as roupas foram usadas muitas vezes. Em seguida, era chamuscada
a florescência do tecido. O aparelho de pirogravura desbotava a cor e dava
uma coloração antiga ao material. Emprestava-lhe tons amarelados. Em
seguida os tecidos eram raspados com lâmina de barbear. Com cera, com
esmalte, com ácido graxo produzíamos manchas. Com a lâmpada de soldar
queimávamos furos no tecido e os remendávamos em seguida. Para os
trabalhadores na peça arrumamos macacões novos de ferreiros - que
reformamos para se igualarem àqueles usados na Rússia naquela época.

Foi extraída a cor deles, dando-lhes a aparência de terem sido lavados


centenas de vezes. Rasgamos o tecido com escovas de aço e esfregávamos
nele grafite e pó de ferro manualmente. Em seguida, trabalhava-se com
pincéis, como se fosse a base de um quadro. Para a atriz que representava a
mãe, usamos uma blusa velha, bem normal. No ateliê ela parecia estar em
ordem, mas no palco não tinha efeito algum, ao contrário, parecia feia. O
estampado era pequeno demais (patente registrada). Tratamos de estampar
o tecido (genuíno). Usamos um estampado maior e o cauterizamos na cor
básica. De repente a blusa ficou bonita na iluminação do palco. Pois no
palco, a peça pobre e barata também precisa ter aparência bonita.

Os sapatos da intérprete da mãe foram um caso à parte. Eles foram


fabricados pelo processo de inversão, com sola presa por crochê, de acordo
com a tecnologia de sapatilhas de balé. Isto tem a grande vantagem, de
sapatos, com uma espessura de solado de apenas 31 /2mm aderirem de
forma excelente ao assoalho do palco. Tal sapato facilita muito as
caminhadas em papéis extensos. A produção de tais sapatos, todavia, exige
um perito excelente. Infelizmente muitos ótimos peritos não regressaram
da guerra, outros foram aliciados com ofertas melhores. Antes da guerra,
tínhamos em estoque 3000 pares de sapatos, agora só temos 200 e sapatos
rococós só possuímos 24.

OS FIGURINOS EM "O SENHOR PUNTILA E O SEU CRIADO MATTI"

Em vista da peculiaridade poética desta peça, procurávamos um elemento


formador de estilo. Resolvemos: um tipo de tecido para todos os figurinos.
E escolhemos feltro. Feltro é um material sintético que "marca" bastante
devido à sua pequena elasticidade. Para o figurino do diplomata usamos,
por exemplo, feltro milimetrado, e para outros figurinos feltro em outras
espessuras.

Para traduzir a beleza gráfica dos efeitos de luz e sombra dos esboços de
Neher para o palco, combinamos um figurino constando de duas partes de
coloração diferente. Do ponto de vista da tecnologia de costura procedemos
da seguinte forma: para que a linha entre as duas tonalidades diferentes não
tivesse a aparência de uma costura, todas elas foram executadas com
overlock. Inclusive para as mulheres, inicialmente, só usávamos feltro. Para
o nosso espanto, verificamos que esse tecido transformava as mulheres no
palco em bonecas. Os figurinos das mulheres de Kurgela pareciam finos
demais ...

Bastante complicado, mas também gratificante, é o palco totalmente


iluminado do Berliner Ensemble. Nesse caso cada figurino precisa ser
realmente bom. Existe uma regra básica para figurinos: eles precisam
transmitir o efeito de serem resistentes na oficina de costura, para que
também surtam este efeito no palco. Um exemplo: Eu vesti Schwabe, que
faz o maitre em "Puntila" experimentalmente num fraque de garçom normal.
Em vez da figura pretendida, a representação dela parecia subalterna.
Somente um fraque de feltro logrou transmitir aquele ar especial, típico.
Agora o ator era um maitre que nas primeiras horas da manhã, esgotado e
uma sombra de si mesmo, ainda precisa servir bem um freguês abastado.

Parecia complicado o figurino das mulheres de Kurgula. Primeiro fiz provas


gerais com todo o estoque. Finalmente, usei como modelo figurinos do ano
1905. Eu os despi de todo o aspecto folclórico e de todos os enfeites,
tomei as cores de Neher como adicional, e as simples sainhas de lã,
acrescidas de uma fita de veludo, um laço, se transformavam em algo de
verdadeiramente bonito.

Tudo fica fácil para o figurinista que consegue traduzir Caspar Neher. Neher
é um mestre da cor e da forma. Os figurinos históricos no "Hofmeister" por
exemplo, parecem feitos de encomenda para as pessoas daquela época, isto
mediante toda a transposição para o moderno, muito cheia de variedades.
(este trecho até aqui foi escrito por Brecht)
MAQUILAR

Maquilar, criar máscaras para um papel, faz parte do ofício de um ator. A


seguir tentarei dar algumas orientações da minha experiência. Para cada
rosto valem leis de maquilagem diversificadas. Trata-se de experimentar e
tornar a experimentar.

Para começar: É melhor maquilar de menos do que a mais. E: não desenhar


nada que não esteja esboçado no próprio rosto, mesmo que só se trate de
uma sugestão. Portanto, não produzir rugas onde elas não existem - só
devem ser reforçadas rugas naturais, e o lápis cosmético só deve ser usado
em local onde um dia se formarão rugas. Isto pode ser verificado,
repuxando-se levemente os músculos faciais. O ideal é familiarizar-se com
a anatomia do rosto. Para maquilar rugas deve-se observar que os traços de
maquilagem não devem ficar como estão, mas sim levemente esfumaçados.
É preciso maquilar a linha de luz e a linha de sombra. Para conseguir rugas
especialmente mercantes, é preciso contrapor cosmético branco muito
delicadamente a cosmético escuro nas rugas. A propósito, cosmético preto
quase nunca se torna necessário. Para colorações pretas ou escuras usa-se
o marrom. Se por exemplo, sobrancelhas são retocadas em preto, o olho
parece duro e sem vida. O preto "salta para fora" como se diz na linguagem
profissional. Sobrancelhas escuras quase nunca precisam ser retocadas. É
preferível maquilar as órbitas e têmporas, com vermelho, claro, escuro,
dependendo do caráter do papel.

Sobrancelhas louras, retocadas com dermatógrafo vermelho, tornam o rosto


vivaz e jovem. (Mas é preciso ficar muito o atento aos tons de sombra do
rosto. Só eles podem ser reforçados com maquilagem.).

Um erro básico é a assim-chamada maquilagem de máscara, isto é, a


máscara termina nos ossos do maxilar. Então a garganta não maquilada se
destaca fortemente e parece que o ator está usando uma máscara no rosto.
Por isto é preciso que a maquilagem vá decrescendo gradativamente ao
longo da garganta. Isto, porém, não basta quando se está maquilando com
uma tonalidade forte, marrom avermelhado, muito claro, mais claro do que a
própria tez. Nesse caso a garganta e a nuca, até a linha dos cabelos,
precisam ser maquiladas exatamente da mesma forma do que o rosto (não
esquecer as orelhas). Isto, naturalmente, vale também para as mãos, e com
figurinos de manga curta, para os braços.

É preciso cuidar, para que os olhos - no caso das mulheres também os


lábios - só sejam maquilados após a aplicação de pó de arroz na máscara.
Do contrário, o pó deixa os olhos sem vida, e mesmo abobalhados. Para os
papéis pertinentes, isto se transforma num truque de maquilagem.

Quando fizo Conde Wermuth em "Hofmeister" precisei me afastar


completamente do preceito básico - pouca maquilagem. O conde deveria ser
fortemente maquilado e empoado, como o exigia a moda (rococó). Eu usei
uma base bem clara, não branca, mas sim um amarelo-rosado fraco - a luz
da ribalta iria colorir o branco de azul e lhe daria uma aparência dura. As
órbitas e as pálpebras inferiores pintei de azul, o que deixou os olhos
cansados . As pálpebras superiores foram maquiladas de branco, o que dava
uma aparência tola ao rosto. A máscara forte deu grande sustentação ao
papel do Conde Wermuth, que foi interpretado com gesticulação rígida e
quase sem expressão mímica.

Quando interpretei Glasenapp na peça "Biberpelz und roter Hahn" parti da


suposição que esse escrivão só respirava o ar mofado de escritórios
pruss ianos, e não apliquei nenhuma base: Pois um rosto não maquilado,
pouco irrigado de sangue, adquire à luz do palco uma tonalidade insalubre,
doentia. (Isto deve ser observado quando fazemos o papel de um doente. Eu
só cobri as minhas sobrancelhas espessas e escuras com cosmético. Antes,
eu esfreguei sabão nelas, para que ficassem aderentes à pele e a base
poderia cobri-las. Em seguida as pálpebras superiores foram clareadas com
um pouco de branco? assim criou-se o efeito de uma pessoa não muito
alerta mentalmente. Além disto, reforcei um pouco as minhas rugas junto à
boca. o resto foi feito com peruca e óculos. A máscara do escrivão
Giasenapp sempre parecia muito autêntica e, contudo, foi produzida com
pouquíssimos recursos.

Isto também se aplica ao soldado em "Mãe coragem e os seus filhos".


Consegui o aspecto brutal, degenerado, servil de subalterno no rosto,
fazendo a maquilagem de tal forma que o rosto parecia não-barbeado. Uma
pequena cicatriz entre as sobrancelhas, emprestava-lhe um ar atrevido.
Para cada máscara, um ponto é vital. Ela precisa corresponder aos gestos, à
cadência, aos sons, ao figurino. Se o ator trabalha com a sua máscara, ele
constrói o papel; se ele trabalha contra a sua máscara, ele o destrói.
(trecho escrito por um dos atores do Berliner Ensemble)
NOTAS AO CAPÍTULO 6

1
in KOUDELA, Ingrid Donnien. Brecht na Pós modernidade. São Paulo: Perspectiva, 2001,p.20.
2
Mode/1-tenno em alemão, que significa modelo. O plural é modelle.
3
in PEIXOTO, Fernando. Brecht: Vida e Obra. Rio: Paz e Terra, 1991, p.293
4
in BRECHT. Estudos sobre o Teatro . Rio de Janeiro: Nova Fronteira, 1978, p. 56. Texto: Efeitos de
Dstanciamento na Arte Dramática Chinesa.
5
"Reiner Steinweg desenvolveu a regra básica da peça didática. Tal regra pode ser subdividida em quatro
pontos principais: 1- A peça didática é para Brecht sinônimo de exercício coletivo; 2- A peça didática visa ao
autoconhecimento; 3- Auto significa um Eu coletivo e não um Eu individualizado; 4 - O público não é passivo,
porém atuante"(p. 35 do livro Um Vôo Brechtiano)
Texto de Ingrid D. Koudela, no programa da montagem brasileira de 1986, no Centro Cultural São Paulo.
Tradução também de Koudela, direção de Paulo Yutaka e Hugo Villavincenzio, cenários e figurinos de Paulo
Moraes.
7
"Brecht acabará falando em teatro dialético para administrar a contradição entre interpretar (mostrar) e viver
(identificar-se)". 7 "Expressão proposta pelo dramaturgo e encenador Bertolt Brecht para designar o teatro épico,
e com que procura definir sua produção da maturidade, na qual se evidencia a análise dialética da realidade."
Dicionário Aurélio)
Programa do espetáculo.
9
in BRECHT. Estudos sobre o Teatro. Rio de Janeiro: Nova Fronteira, 1978, p. 56. Texto: Efeitos de
Distanciamento na Arte Dramática Chinesa.
10
na peça didática Horácios e Curiácios, em Brecht, Bertolt, Teatro Completo (Volume 5) . Rio de Janeiro: Paz e
Terra, 1991.
11
"Procedimento de tomada de distância da realidade representada. ( ... ) O distanciamento é 'um procedimento
que pennite descrever os processos representados como processos bizarros.( ... ) Para Brecht, o distanciamento
não é apenas um ato estético, mas, sim, político: o efeito de estranhamento não se prende a uma nova percepção
ou a um efeito cômico, mas a uma desalienação ideológica. O distanciamento faz a obra de arte passar do plano
do seu procedimento estético ao da responsabilidade ideológica da obra de arte" Pavis, Dicionário de Teatro .
12
in BRECHT. Estudos sobre o Teatro. Rio de Janeiro: Nova Fronteira, 1978, p. 56. Texto: Efeitos de
Distanciamento na Arte Dramática Chinesa.
13
in BRECHT, Bertolt, Estudos sobre o Teatro, Rio: Nova Fronteira, 1978, p.131 .
14
Elisabeth Hauptmann participou de quase todas as produções de Brecht entre 1923 e 1933- de onze peças
dele, ela aparece em nove. Param de trabalhar juntos porque ela escolhe outro país para seu exílio durante a
Em seu lugar, entra Margarete Steffin.
5
Ruth Berlau foi também colaboradora de Brecht e entrou no lugar de Maragrete Steffin. Muito importante foi
o trabalho de Berlau no registro fotográfico dos espetáculos de Brecht: foi ela que fotografou os seusModel/e.
No plano pessoal, foram amantes por maís de 20 anos, e ela chegou a engravidar, mas perdeu um filho dele.
16
Weill e Dessau produziram músicas para os espetáculos de Brecht.Separaram-se e foram para países
diferentes durante a guerra.
17
Die Mutter, ou A Mãe, foi escrita em 1931 e estreou em 1932. Mantenho o titulo original em alemão para não
criar confusão com a peça Mãe Coragem, que não tem nada a ver com essa Die Mutter.
18
in WllLET, John. Brecht on Theater. London: Methuen, 1965, p.232.
19
ibidem, p.233 .
20
ibidem, p. 134.
21
in BRECHT. Estudos sobre o Teatro. Rio de Janeiro: Nova Fronteira, 1978, p. 197. Texto: Palavras do
Dramaturgo sobre o Cenógrafo Caspar Neher.
22
Esta divisão na tarefa de cenógrafo e figurinista é extremamente complicada na minha opinião. Perde-se
muito em unidade e estilo se as equipes que cuidam das duas áreas não forem muito afinadas- o que raramente
acontece em função do pouco tempo, pouco dinheiro, etc ..
23
Trecho do poema Os Mestres Compram Barato, de Brecht.
24
in BRECHT. Estudos sobre o Teatro. Rio de Janeiro: Nova Fronteira, 1978, p. 199. Texto: Palavras do
Dramaturgo sobre o Cenógrafo Caspar Neher.
25
idem
26
O Theaterbeit é um livro escrito por Brecht e vários colaboradores sobre vários aspectos da encenação dos
seis primeiros espetáculos do Berliner Ensemble. Também traria comentároios sobre projetos futuros do grupo.
Os dados do livro são: BRECHT, BERLAU, HUBALEK e outros. Theaterbeit. Berlim: Henschelverlag Kunst,
1961 .
27
in BRECHT, BERLAU, HUBALEK e outros. Theaterbeit. Berlim: Henschelverlag Kunst, 1961.

442
28
idem
29
Brecht escolheu a Antígona porque, nas suas palavras, " do ponto de vista do tema, podia conseguir uma certa
atualidade e, do ponto de vista da forma, levantar problemas interessantes. (... )O prólogo não podia ousar mais
do que apresentar um tópico atual e esboçar o problema do recurso à força quando da queda dos dirigentes de
um estado. O drama Antígona, em seguida, desenrola a sua ação objetivamente, no plano dos governantes, plano
nos é alheio". Como se vê, Brecht mantém suas preocupações políticas e com o todo.
3
in WILLET, John. Brecht on lheater. London: Methuen, 1965, p.215
31
O Couragemodell, por exemplo, da peça Mãe Coragem, é um dos livros que Brecht fez com diversos
colaboradores para "orientar" quem fosse fazer montagens de texto seus em outros teatros ou países. Críticos
dizem que esta seria uma tentativa de Brecht de manter a sua produção sob seu severo controle, mesmo ele
estando ausente. Ele dizia que não, que era apenas um guia de referência, que poderia ser utilizado ou não,
dependendo da criatividade do encenador.
32
in BRECHT. Estudos sobre o Teatro. Rio de Janeiro: Nova Fronteira, 1978, pp. 171-172
33
No Antigonemode/1, p. 90, o traje de Antígona é descrito com o sendo feito de seda cinza.
34
in BRECHT. Estudos sobre o Teatro. Rio de Janeiro: Nova Fronteira, 1978, p. 172
35
in Le lhéâtre Dans Le Monde, Volume li, Número 4, p. 36
36
idem, pp.38-39.
37
idem, pp.40-42
38
in WILLET, John. Brecht on lheater. London: Methuen, 1965, p.56.
39
in PEIXOTO, Fernando. Brecht: Vida e Obra. Rio: Paz e Terra, 1991, p.195.
40
in JONES, David Richard. Great Directors at Work: Stanislavsky, Brecht, Kazan, Brook. Berkeley:University
of California Press, 1986, p. 129
41
idem
42
Artigo publicado no jornal lhe Guardian, em 14 de dezembro de 2002. Texto de Jonathan Jones.
43
Brecht escreve no seu texto Efeitos da Alienação nas Pinturas Narrativas de Brueghel o Velho, que : "Na
grande pintura de guerra Du/le Griet não é a atmosfera de terror da guerra que inspira o artista a pintar o
instigador, a Fúria da Guerra, como inútil e aleijada, e de dar a ela as feições de uma servente. O terror que ele
cria neste sentido é muito mais profundo. Sempre que um pico Alpino é colocado numa paisagem flamenga ou
quando velhos figurinos asiáticos confrontam trajes europeus modernos, aí um denuncia o outro e marca sua
estranheza enquanto que ao mesmo tempo nós entendemos a paisagem como tal, pessoas por todos os lados.
Tais pinturas não criam apenas uma atmosfera mas uma variedade de atmosferas. Apesar de Brueghel conseguir
balancear seus contrastes, ele nunca funde um no outro, nem pratica a separação entre cômico e trágico; sua
tragédia contém um elemento cômico e sua comédia um trágico".
44
in BARTHES, Rolland. Oeuvres Completes. Paris: Éditions de Seuil, 2002. Texto: As Doenças do Figurino
Teatral.
45
in BRECHT. Estudos sobre o Teatro. Rio de Janeiro: Nova Fronteira, 1978, p. 159.
46
in WILLET, John. Brecht on lheater. London: Methuen, 1965, p.220
47
in KENNEY, William. lhe Plays of B.Brecht. NY: Simon & Schuster, 1965, p. 65.
48
idem.
49
idem
50
idem
51
in WILLET, John. Brecht on lheater. London: Methuen, 1965, p.241. Texto: Theaterbeit, An Editorial Note.
52
in BARTHES, Rolland. Oeuvres Completes. Paris: Éditions de Seuil, 2002. Texto: Preface a Brecht "Mere
Courage".
53
Texto do próprio Brecht
54
in LEITER, Samuel. From Stanislavski to Barrault, NY: Greenwood Press, 1991, p. 179.

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