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SERGIO CANARIM

como vir-a-ser Deus-que-ultrapassa-a-si-mesmo


Ao descobrir que Deus, aquele que
não pode ser maior, deve ser ainda mais,
descobriu Deus-que-ultrapassa-a-si-mes-
mo, processo de uma existência relativa-
mente curta, porém mui inspiradora,
Sérgio Kroeff Canarim relegou seus
próprios conceitos a um recôndito no retro-
visor da vida. Trata-se de um processo de
descoberta e de evolução, desnudo em
formato de poesia, empacotado nestas
páginas e entregue à aferição do leitor e de
seus próprios valores. Que não se espere
concordância, mas reflexão e mutação no
concurso de uma obra filosófica e, por que
não, ousada.
Da pretensão de Sérgio, surgiu um
novo viés para encarar o cotidiano. Aqui,
falamos não de filosofia pura nem de
conceitos ou tão somente ideias vagas, mas
de aspectos concretos incrustados no
âmago de cada um - a quem cabe identificá-
-los nas entrelinhas do poeta. E ele não
deixa o leitor só nesta tarefa, visto que
estreou na literatura em 2015 com os
poemas de “Filhos do Vácuo: cartas ao
homem-Deus” (Buqui, 2015).
Fruto de divagações iniciadas
quando tinha 20 anos e comprou um cader-
ninho azul, Sérgio soergueu em “Filhos do
Vácuo” as estruturas fundamentais para
este projeto ambicioso e que, neste
momento, repousa em suas mãos, leitor.
O ABSOLUTO E O POS-HOMEM
como vir-a-ser Deus-que-ultrapassa-a-si-mesmo
Editora
Alexandra Zanela

Capa, projeto gráfico e editoração


Diego Borges

Revisão
Arthur B. Telló
Raquel Belisario
André Roca

Foto do autor
Pedro Poeta

ISBN: 978-85-93577-00-0

PADRINHO AGÊNCIA DE CONTEÚDO


Porto Alegre - RS
www.padrinhoconteudo.com

100 Canarim, Sérgio.


O absoluto e o pós-home : como vir-a-ser Deus-que-ultrapassa-a-si-
mesmo / Sérgio Canarim. – 1ª. ed – Porto Alegre : Padrinho, 2017.
196 p.

ISBN: 978.85.93577-00-0

1. Filosofia e Psicilogia. 2. Ensaio. 3. CANARIM, Sérgio. 4. Título.


SERGIO CANARIM

como vir-a-ser Deus-que-ultrapassa-a-si-mesmo

PORTO ALEGRE, 2017


“É só o óbvio ululante, o bem em si (a grande inocência) é
controlar a evolução, ou seja, a re-evolução.”

“A ideia é como uma chuva que precisa cair.’’21

“6.45 A intuição do mundo sub specie aeterni é sua intuição


como totalidade - limitada. O sentimento do mundo como
totalidade limitada é o sentimento místico.”22

“O ser humano é capaz de conceber-incorporar o absoluto


enquanto máxima totalidade radical, o qual é imanente e
transcendental aos conceitos de finito, infinito e afinito.”23

21
Canarim, Kroeff Sérgio. São proposições inéditas.
22
Wittgenstein, Ludwig. Tractatus Lógico-Philosophicus. 3. Ed. 2 reimpressão. Editora da Universidade de
São Paulo. São Paulo/ 2010. Pág. 279
23
Canarim, Kroeff Sérgio. Contraponto a tese de Wittgenstein.
SUMÁRIO
PREFÁCIO 13
INTRODUÇÃO 17
GLOSSÁRIO 21

CAPÍTULO I 27
I.I 29

O QUE É O ABSOLUTO?

I.II 33

ABSOLUTO ENQUANTO MÁXIMA TOTALIDADE RADICAL


VERSUS LÓGICO, ILÓGICO E ALÓGICO

I.III 35

ALGUMAS CONSIDERAÇÕES A RESPEITO DO ABSOLUTO:


ALGUM-TODO-NENHUM-AQUÉM-ENTRE-ALÉM-SER-NÃO-SER-IMANENTE-
TRANSCENDENTAL-A-SI-MESMO

I.III.I 37
PARCIALMENTE VERDADEIRO, PARCIALMENTE FALSO E INCOMPLETO

I.IV 39

LÓGICA E ONTOLOGIA

I.V 41

O ACENO-ONIPRESENTE-DA-ONISCIÊNCIA-DE-MUNDOS

I.VI 43

A NOVA METAFÍSICA
I.VII 44

O PENSAMENTO E ALGUM-TODO-NENHUM-AQUÉM-ENTRE-ALÉM-SER-
NÃO-SER-IMANENTE-TRANSCENDENTAL-A-SI-MESMO

I.VIII 46

DA SUPERAÇÃO HUMANA

I.IX 49

O PÓS-HOMEM

I.X 52

DA EXISTÊNCIA DE DEUS

I.XI 55

DEUS-QUE-ULTRAPASSA-A-SI-MESMO

I.XII 57

POSSIBILIDADES PARA EXISTÊNCIA DE INFINITOS UNIVERSOS

I.XIII 60

DEUS É O NADA OU O CAMPO ENERGÉTICO EXTRAMULTIVERSO?

I.XIV 62

ALGUNS ESCLARECIMENTOS SOBRE AS PROPOSIÇÕES

I.XV 66

DA EVOLUÇÃO DO CONHECIMENTO – DO DESEJO INCONSCIENTE DE VIR-A-SER DEUS


PARA O DESEJO ONIPRESENTE DE VIR-A-SER DEUS-QUE-ULTRAPASSA-A-SI-MESMO

I.XVI 72

NOVAS POSSIBILIDADES DE COMPREENDER SER E NÃO SER

I.XVII 75

DA INCOMENSURABILIDADE DA POSSIBILIDADE DE EXPANSÃO DE


ALGUM-TODO-NENHUM-AQUÉM-ENTRE-ALÉM-SER-NÃO-SER-IMANENTE-
TRANSCENDENTAL-A-SI-MESMO

I.XVIII 77

SENTIDO DA VIDA INTELIGENTE


I.XVIII.I 80
A INTENSIDADE

I.XVIII.II 82
A GRANDE MODERAÇÃO TOLERANTE

I.XVIII.III 84
SENTIDO GERAL E INDIVIDUAL DA VIDA INTELIGENTE

I.XIX 85

VERDADE E COMPLETUDE

I.XX 87

INFINITO VERSUS FINITO VERSUS ALGUM-TODO-NENHUM-AQUÉM-


ENTRE-ALÉM-SER-NÃO-SER-IMANENTE-TRANSCENDENTAL-A-SI-MESMO

I.XXI 89

PENSAMENTO II VERSUS ALGUM-TODO-NENHUM-AQUÉM-ENTRE-ALÉM-


SER-NÃO-SER-IMANENTE-TRANSCENDENTAL-A-SI-MESMO

I.XXII 91

UMA CONVERSA SOBRE ALGUM-TODO-NENHUM-AQUÉM-ENTRE-ALÉM-


SER-NÃO-SER-IMANENTE-TRANSCENDENTAL-A-SI-MESMO ENTRE UM
PENSADOR E UM PSICANALISTA

CAPÍTULO II 95
II.I 97

LIVRE ARBÍTRIO

II.II 100

AUTOANÁLISE

II.III 103

MONISMO VERSUS DUALISMO VERSUS ALGUM-TODO-NENHUM-AQUÉM-


ENTRE-ALÉM-SER-NÃO-SER-IMANENTE-TRANSCENDENTAL-A-SI-MESMO

II.IV 104

EXPERIÊNCIAS
II.IV.I 107
ALTERADORES DA TOTALIDADE-DO-NOSSO-SER-RACIONAL-INTUITIVO-
PULSIONAL-SENSITIVO-SENSÍVEL-INSTINTIVO-IMAGINATIVO-MÍSTICO-
CONSCIENTE-INCONSCIENTE-MEDITATIVO-VOLITIVO

II.IV.II 108
HOMENS DE GÊNIO

II.IV.III 109
NOVOS CONTATOS ONTOLÓGICOS

II.V 111

CIÊNCIA

II.VI 114

SISTEMAS SOCIAIS POLÍTICOS E ECONÔMICOS

II.VII 118

FINITUDE

II.VIII 123

CRENÇAS

II.VIII.I 127
CRENÇAS PRÁTICAS

II. IX 129

A LINGUAGEM

II.X 133

EXISTÊNCIA

II.XI 138

AMOR

II.XII 142

A QUESTÃO DO SER VERSUS ALGUM-TODO-NENHUM-AQUÉM-ENTRE-


ALÉM-SER-NÃO-SER-IMANENTE-TRANSCENDENTAL-A-SI-MESMO
II.XIII 149

EU, ALMA, CORPO E MENTE

II. XIII.I 153


IDENTIDADE PESSOAL

II.XIV 155

ESTÉTICA

II.XV 158

IDEOLOGIAS

II.XVI 163

AÇÕES

II.XVII 168

VALORES E MORAL

II.XVIII 172

CICLOS EVOLUTIVO

II.XIX 179

LÓGICA E ALGUM-TODO-NENHUM-AQUÉM-ENTRE-ALÉM-SER-NÃO-SER-
IMANENTE-TRANSCENDENTAL-A-SI-MESMO: PARA UMA PÓS-LÓGICA

II.XX 182

OBSCURIDADE VERSUS CLAREZA

II.XXI 185

FELICIDADE VERSUS ALGUM-TODO-NENHUM-AQUÉM–ENTRE-ALÉM-SER-


NÃO-SER-IMANENTE-TRANSCENDENTAL-A-SI-MESMO

II.XXII 187

OS METAFÍSICOS

EPÍLOGO 191
BIBLIOGRAFIA 193
PREFÁCIO

Em 2004, oito anos antes de iniciar a escritura desta obra, escrevi


um poema que continha o diamante bruto de algumas das principais ideias que
fizeram com que este livro fosse possível. Cito duas estrofes, a primeira e a última:

A verdade geral de todas as coisas

Eu a vislumbrei num estado de vácuo além do espaço tempo


Só nós dois...
Ela ia vinha girava em todas as direções e depois se fechava
mas eu não a vi fechar
Nem ninguém verá antes do futuro longínquo
onde ela se fecha
Só os nós-deuses verão onisciente onipresente onipotente
todas as cores
mas eu a vi branco-cinza que fosforesce
Quem são os nós-deuses?
A vida inteligente no futuro mais longínquo
14 que se pôde vislumbrar se ela futuro possuir
cujo cérebro é o ponto que é tudo e vê tudo e pode tudo
O ABSOLUTO E O PÓS-HOMEM

e sabe tudo e interage com tudo


ao mesmo tempo todo real e virtual
que não pode ser vislumbrado por nós
o todo além de regras-limites-fraquezas,
a-própria-intensidade-pura-concreta-palpável,
a-própria-luz-geral-de-todas-as-coisas,
a-própria-escuridão-geral-de-todas-não-coisas21

Da primeira estrofe, podemos extrair uma inquietude em relação às


limitações humanas e um aceno em direção a um ultrapassamento de nós mes-
mos. Da segunda, podemos extrair o vir-a-ser de uma entidade que chamamos
de nós-Deus como o cume teleológico da vida inteligente. Entidade essa cujo de-
senvolvimento de seus atributos nesta obra a transformou numa nova entidade:
Deus-que-ultrapassa-a-si-mesmo.

Quando fiz esse poema, em 2004, minha formação acadêmica era


de bacharel em Direito. De modo geral, havia feito a leitura de boa parte dos clás-
sicos da Literatura e alguns poucos da Filosofia e, ainda, cursado a faculdade de
Ciências Sociais, que abandonei após dois semestres. Tanto na Literatura quanto
na Filosofia, minha formação era autodidata. Em 2007, três anos depois, após
uma longa jornada pela Europa, muitos poemas foram escritos (destes, a maior
parte foi perdida em um acidente incontrolável), os quais progressivamente de-
safiavam os limites da linguagem. Decidi que finalmente estava pronto para uma
obra de maior fôlego, com todas as ideias que povoavam meu ser. Então, nasceu
o que chamo de Livro 0. Uma obra muito intuitiva e pouco calcada na tradição
filosófica que continha boa parte das ideias que viriam a ser desenvolvidas nesta
obra. A diferença crucial é que, por seis anos, estive estudando Filosofia na Aca-
demia e, no mesmo período, estive realizando um tratamento psicanalítico com

21
Canarim, Sérgio. Filhos do Vácuo: Cartas ao homem-Deus. Porto Alegre: Buqui. 2015. p.10-11.
fortes influências de Lacan e algumas influências de Bion. Esses fatores influen-
ciaram drasticamente minha escrita para uma maior clareza e um maior domínio
conceitual dos termos filosóficos e da própria História da Filosofia. Confesso que
ainda poderia estudar a vida inteira e, mesmo assim, jamais dominaria a história 15
do pensamento filosófico. Essa base que adquiri, todavia, é suficiente para a ela-

O ABSOLUTO E O PÓS-HOMEM
boração desta obra.

Por outro lado, na vida prática, vivencio a labuta do mundo capi-


talista dirigindo uma empresa. Enquanto gestor, observei o quanto a filosofia
prática passa ao largo das deliberações dos empresários bem sucedidos, que, a
despeito do desejo dos teóricos da Política e da Ética, dominam a vida prática na
sociedade juntamente com os políticos profissionais.

Na introdução que se seguirá, os objetivos desta obra serão descri-


tos ponto a ponto. Boa viagem, caros amigos!
INTRODUÇÃO

ESTE LIVRO TEM ALGUNS OBJETIVOS PRINCIPAIS.

Primeiro, determinar a pergunta mais importante, mais geral, mais


primeira possível de ser respondida, cuja resposta propiciará o ultrapassamento
de nós mesmos. Este ultrapassamento transformará toda e qualquer criação da-
queles que forem capazes de incorporá-lo-concebê-lo, seja ela artística, filosófica,
científica, religiosa, e a própria existência particular daquele que atingir este ul-
trapassamento.

Segundo, determinar que, a partir da grande moderação tolerante,


uma proposição teórica será sempre parcialmente verdadeira, parcialmente falsa
e incompleta. Assim como uma proposição prática será sempre parcialmente cer-
ta, parcialmente errada e incompleta.

Terceiro, trazer à tona os limites humanos. Não os limites racionais,


mas da totalidade-do-nosso-ser-racional-intuitivo-pulsional-sensitivo-sensível-ener-
gético-imaginativo-místico-instintivo-consciente-inconsciente. Mostrar que, através
dessas mesmas forças que nos compõem, podemos ultrapassar nossos limites.

Quarto, determinar os sentidos individual e geral da vida inteligen-


18 te. Mostrar como ambos convergem em suas formulações mais densas e intensas
no desígnio de vir-a-ser Deus-que-ultrapassa-a-si-mesmo.
O ABSOLUTO E O PÓS-HOMEM

Quinto, expandir a linguagem, modificando e criando sentidos da e


para a linguagem, assim como criando novas possibilidades de referência.

ESTE LIVRO TEM TAMBÉM ALGUNS OBJETIVOS SECUNDÁRIOS.

Através da luz das primeiras investigações, responder outras per-


guntas importantes, as quais foram formuladas ao longo dos séculos pelos ho-
mens que tinham a mesma necessidade de buscar a compreensão do grande
mistério. Mistério este que pode ser resumido com uma pergunta formulada por
Leibniz (embora não saibamos se foi o primeiro que a formulou - e também não
importa se o foi): “Por que há algo ao invés de nada?”.

Por fim, tornar o pensamento que era caótico em analítico, quando


ele pode e deve ser estruturado de acordo com as regras da lógica e preservar a
obscuridade, quando ela pode e deve ser preservada. Cabe ressaltar que o autor
reconhece a dificuldade das tarefas deste livro. Sabendo-se um pobre homo sa-
piens finito e histórico, assim como, se não todos21, muitos dos possíveis leitores
desta obra, todavia, entende que não há nada a perder com o fracasso, e muito
a ganhar se algum sucesso for obtido nesta empreitada. Um homem só escreve
porque lhe é necessário.

A história me julgará.

21
Com esta ressalva queremos manter aberta a possibilidade de haver outras formas de vida inteligente;
caso haja, no presente ou no futuro, este autor que vos fala seria muito feliz em compartilhar os seus es-
critos com todas elas.
21

O ABSOLUTO E O PÓS-HOMEM
GLOSSÁRIO

PARA AJUDAR NA LEITURA DE


NOVOS CONCEITOS E NEOLOGISMOS

Aceno-onipresente-da-onisciência-de-mundos: Aceno é usado de


acordo com a definição da página 41, as demais palavras estão no significado
usual da língua portuguesa. O prefixo “oni” significa todo, pois uma vez que in-
corporamos-concebemos a extrapolação e expansão da linguagem, da descrição
da realidade, das possibilidades do pensamento, da nossa existência propos-
tas neste livro para sempre estaremos conscientes da possibilidade de infinitos
mundos lógicos-ilógicos-alógicos. Aquilo que chamamos de “visão de mundo”, a
totalidade de crenças que compõem aquilo que um indivíduo entende por mun-
do, transformamos no Aceno-onipresente-da-onisciência-de-mundos. Queremos
expressar a expansão daquilo que era o nosso mundo singular lógico, quiçá even-
tualmente ilógico, ou a possibilidade de mundos múltiplos da lógica modal, para
a possibilidade de infinitos mundos lógicos-ilógicos-alógicos. Temos o subtítulo
I.V que trata deste conceito.

Aconsistente (alógico) - neologismo que acrescenta o prefixo “a”


ao termo consistente, prefixo (a) significa “sem”. Sem consistência é diferente
de inconsistente, embora os prefixos possam ser sinônimos de negação lexical
nós queremos distinguir os termos inconsistente de aconsistente. Inconsistente
segue seu significado usual de negação de princípios lógicos, contrário as regras
da lógica. Enquanto o termo aconsistente quer dizer que não é nem contrário nem
de acordo com a lógica: é completamente alheio as possibilidades da lógica.

Consistente-inconsistente-aconsistente (lógico-ilógico-alógico) -
22 na junção das três possibilidades da realidade: consistente - queremos dizer que
algo está de acordo com a lógica; inconsistente - algo que é contrário a lógica;
O ABSOLUTO E O PÓS-HOMEM

aconsistente - algo que é alheio a lógica.

Por exemplo, quando atribuímos ao nosso universo este adjetivo


composto de três termos ligados por hífen queremos dizer que: nosso universo é
tanto lógico, pode ser interpretado de acordo com as regras lógicas, quanto ilógi-
co, viola os princípios fundamentais da lógica, quanto alógico, totalmente alheio
a lógica, portanto, não pode nem ser interpretado, nem viola a lógica. Queremos
dizer que o universo é composto desta fusão de possibilidades, pode ser interpre-
tado destas três formas ao mesmo tempo.

Afinito: neologismo cunhado com a mesma intenção de aconsistente


e alógico, algo pode ser alheio as quantidades finitas e infinitas. Exemplo, o nada.

Finito-infinito-afinito: a junção também serve para que possamos


atribuir a algo, nosso universo por exemplo, a possibilidade de ter uma quantida-
de determinada (finito); uma quantidade indeterminada (infinito); assim como
não ter nenhuma ou outra característica e ser afinito. O universo em que vivemos
é finito-infinito-afinito, as três possiblidades ao mesmo tempo.

algum-todo-nenhum-aquém-entre-além-ser-não-ser-imanente-
-transcendental-a-si-mesmo: este conceito é formulado para expandir a lingua-
gem que até então estava restrita aos domínios do ser e não ser, por isso, dizemos
que essa expressão é a explosão e implosão dos conceitos mais gerais da lingua-
gem e da estrutura metafísica do mundo. Este conceito será analisado sobre diver-
sos aspectos em diferentes subtítulos do texto. É um conceito aberto que permite
novas possibilidades de expansão acrescentando novos termos.

Deus-que-ultrapassa-a-si-mesmo: com este novo conceito quere-


mos atribuir a Deus a propriedade de ser lógico-ilógico-alógico, assim como a
capacidade de agir por meio de ações que respeitam a lógica, ações que desres-
peitem a lógica, ações ilógicas, e ações completamente alheias a lógica, isto é,
alógicas. Normalmente as concepções de Deus não atribuem ao conceito divino a
possibilidade de ser lógico-ilógico-alógico, e nem contam com essas três vias de
ação para Deus ao mesmo tempo, então, para que ele possa ser e agir nessas três
vias, com isso, igualar-se ao absoluto enquanto máxima totalidade, é necessário
expandir sua perfeição, assim cunhamos o termo Deus-que-ultrapassa-a-si-mes- 23
mo. Temos o subtítulo I.XI que trata desse conceito.

O ABSOLUTO E O PÓS-HOMEM
Homo Sapiens finito e histórico: homo sapiens é o nome da espécie
do homem tradicionalmente definida pela ciência, acrescentamos o termo finito
para que tenhamos em mente a nossa limitação diante do absoluto enquanto má-
xima totalidade radical que é finito-infinito-afinito. Acrescentamos, ainda, o ter-
mo histórico, pois o indivíduo é sempre vinculado ao momento histórico em que
vive, as questões que um determinado indivíduo se coloca são as questões do seu
tempo. Ambas as expressões também significam um fim no horizonte do homo
sapiens, todo homem que nasce também morre é, portanto, tanto finito quanto
histórico. Finito, pois sua vida acaba, e histórico, pois sua vida se dá dentro de um
lapso temporal com início e fim.

Pós-homem: chamamos de pós-homem a espécie que, acreditamos,


será criada pelo homo sapiens finito e histórico superando a si mesmo. Nosso
intuito nesta obra é que o pós-homem seja o homem expandido em todas suas
forças e faculdades e não apenas nas forças racionais e morais como os transhu-
manistas geralmente pautam a modificação do homem pelo homem por meio da
ciência e tecnologia.

Totalidade-do-nosso-ser-racional-intuitivo-pulsional-sensitivo-
-sensível-instintivo-imaginativo-místico-consciente-inconsciente-meditati-
vo-volitivo: este conceito visa fundir todas as forças e faculdades atribuídas por
nós mesmos a nossa espécie homo sapiens finito e histórico. Cada um dos termos
preserva seu significado original na língua portuguesa. Juntos eles unem todas as
forças e as faculdades que compõem o ser humano, ao contrário da maioria das
ideias transhumanistas que desejam aumentar a razão ou a bondade da nossa es-
pécie, nós queremos uma expansão radical de todas as forças e faculdades que nos
compõem. É um conceito aberto que permite novas possibilidades de expansão
acrescentando novos termos, nós queremos representar a totalidade do Ser de um
indivíduo da raça humana, nada impede que novas forças e faculdades sejam des-
cobertas no nosso ser, mesmo não as mencionando, já queremos expandi-las, pois
queremos expandir todas as possibilidades do homo sapiens finito e histórico.
Incorporar-conceber ou conceber-incorporar: Estes verbos estão
com seu uso corrente na língua portuguesa, conceber: ser fecundado (por); dar
à luz; parir, gerar. Incorporar: dar ou tomar corpo. Integrar(-se) um elemento a
24 (um conjunto); juntar(-se). Podemos substituir conceber-incorporar por gerar-in-
tegrar, por exemplo. O conceber-incorporar se dá quando a totalidade de forças
O ABSOLUTO E O PÓS-HOMEM

que nos compõem são cultivadas ao máximo, isto é, a totalidade-do-nosso-ser-


-racional-intuitivo-pulsional-sensitivo-sensível-instintivo-imaginativo-místico-
-consciente-inconsciente-meditativo-volitivo é cultivado em uma fusão sinérgi-
ca, possibilitando conceber-incorporar a extrapolação e expansão dos limites da
linguagem, consequentemente, conceber-incorporar a extrapolação e expansão
daquilo que pode ser descrito sobre a realidade. Por fim, incorporar-conceber no-
vas possibilidades de descrever o absoluto enquanto máxima totalidade radical.
CAPÍTULO I
29

O ABSOLUTO E O PÓS-HOMEM
I.I

O QUE É O ABSOLUTO?

A pergunta “o que é o absoluto?” é a versão sintética da nossa inves-


tigação, podemos estendê-la com o seguinte complemento: “enquanto a máxima
totalidade radical”. Então, a versão extensa e determinada da nossa pergunta é: “o
que é o absoluto enquanto máxima totalidade radical?”. Não podemos responder
está pergunta de modo direto, definindo o conceito, pois é o conceito mais geral,
mais geral do que o Ser. Então, vamos descrever o absoluto enquanto a máxima
totalidade radical em relação as suas partes mais gerais, as quais são constituídas
por este Universo consistente-inconsistente-aconsistente; todo Universo possível
consistente-inconsistente-aconsistente; o nada e o ser internos a este Universo
consistente-inconsistente-aconsistente; o possível nada e o possível ser externos
a este Universo consistente-inconsistente-aconsistente e a todo Universo possível
consistente-inconsistente-aconsistente; o possível nada e o possível ser internos
a todo Universo possível consistente-inconsistente-aconsistente; todo pensamento
possível consistente-inconsistente-aconsistente e toda ação possível consistente-
-inconsistente-aconsistente. O que acabamos de fazer é apenas caracterizar o que
compõe de modo mais geral o absoluto enquanto máxima totalidade radical. Se
fossemos capazes de responder a pergunta “O que é o absoluto?” de modo absolu-
tamente verdadeiro e absolutamente completo, seria equivalente a descrever todas
estas partes gerais que o compõe e cada possibilidade interna a estas partes gerais
de modo absolutamente verdadeiro e absolutamente completo, desvelando em to-
dos os detalhes o absoluto enquanto máxima totalidade radical. Seríamos além dos
deuses na sua mais absoluta concepção de onisciência, onipresença, onipotência.

30 Não é necessário maiores investigações para sabermos que não nos


cabe sermos deuses, muito menos para além dos deuses, no sentido de ter todos
O ABSOLUTO E O PÓS-HOMEM

os seus poderes e de ultrapassá-los para o que um deus não é capaz, como Deus-
que-ultrapassa-a-si-mesmo21. Ao longo da história, foi demonstrado que, pelo
contrário, o conhecimento humano tem uma série de fragilidades intransponí-
veis. Somos finitos, tal totalidade é imanente e transcendental ao finito, infinito e
afinito22. Jamais conseguimos responder a questões muito mais elementares que
esta: quem nos criou? Deus existe? Por que existimos? Qual o sentido da vida? É
possível conhecer a realidade absolutamente? É possível conhecer qualquer ente
existente absolutamente?

Diante de tal ignorância, fica claro que o máximo que podemos fazer
é conceber um caminho para a pergunta “o que é o absoluto”? Todavia, avança-
mos muito sob certos aspectos, construímos uma ciência capaz de produzir co-
nhecimentos suficientes para criarmos soluções tecnológicas, fazermos previsões
e até mesmo explicarmos certos aspectos da realidade.

Na filosofia, a lógica modal nos abriu a possibilidade de pensar em


mundos possíveis, respeitando apenas a consistência lógica dos entes e das re-
lações entre entes em cada mundo possível, não sendo eles provas ontológicas
da existência de outros universos. Embora haja quem defenda que um mundo
possível é um mundo ontologicamente existente, como David Lewis, defensor do
realismo modal, “This book defends modal realism: the thesis that the world we
are part of is one of a pluraty of worlds, and that we who inhabit this world are
only a few out all inhabitant of all words.”23

As especulações mais ambiciosas da física, porém mais frágeis do

21
Deus-que-ultrapassa-a-si-mesmo, é a entidade capaz de igualar-se ao absoluto enquanto máxima totali-
dade radical. Faremos uma subseção sobre a transformação do desejo obscuro, em parte inconsciente de
vir-a-ser Deus para o desejo consciente de vir-a-ser Deus-que-ultrapassa-a-si-mesmo.
(A)finito: estamos utilizando o “A” como prefixo de negação, uma maneira de utilizá-lo vigente na língua
22

portuguesa. Faremos uma subseção para explicar porque julgamos necessário cunhar esta nova expressão.
23
Lewis, David. On the Plurality of Worlds. Blackwell Publishing. Oxford. 2011. Pág. vii.
que as das ciências empíricas em geral, permitem que sejamos capazes de conce-
ber uma totalidade mais radical do que nossos antepassados, além de representar
um respaldo ontológico para pluralidade de mundos. Por exemplo, já somos ca-
pazes de ao menos imaginar que além deste universo que habitamos possa haver 31
uma infinita possibilidade de outros universos com realidades das mais variadas.

O ABSOLUTO E O PÓS-HOMEM
Essas visões do realismo modal e da física especulativa, apesar de
serem quase impossíveis de qualquer demonstração empírica24, podem ser muito
fecundas para apontar um novo caminho.

Caminho este que é a formulação de uma resposta nova e profícua


para a pergunta que fizemos no início desta seção. Se concordarmos que responder
de modo absolutamente verdadeiro e absolutamente completo a pergunta “o que
é o absoluto?” é tarefa para um ser que ultrapassa a onisciência, a onipresença, a
onipotência e quiçá outras possibilidades de concepções com o prefixo oni- (radi-
cal de origem latina que significa todo), automaticamente devemos admitir que a
separação analítica em conceitos é impossível de ser usada para tal tarefa. Logo,
devemos criar uma nova forma de representar sentidos da e para a linguagem, e
esta forma inaudita de representar o absoluto enquanto máxima totalidade radi-
cal deve significar novas possibilidades de sentido numa única expressão. Novas
possibilidades de sentido para a linguagem, isto é, novas possibilidades de uso da
linguagem, portanto, externas à linguagem, assim como novas possibilidades de
sentido da linguagem, isto é, novas possibilidades de sentido internas à própria lin-
guagem. Se buscamos uma expressão que acene para o absoluto enquanto máxima
totalidade radical, obviamente esta deve incluir todo o sentido para e da linguagem
já existentes também. Assim, incluir as possibilidades de sentido externas e inter-
nas à linguagem já existentes e às novas possibilidades que desejamos criar numa
fusão. Todas estas novas possibilidades de sentido da e para a linguagem permi-
tem a abertura de possibilidades de novos referentes que até então permaneciam
velados. Todas estas mudanças serão representadas por uma única expressão que
transforma a visão de mundo no aceno-onipresente-da-onisciência-de-mundos25.

Alguns físicos estão em busca de provas empíricas da existência de outros universos além do nosso, estão
24

em busca de alguma “marca” de outros universos dentro do nosso universo observável.


25
A transformação da visão de mundo no aceno-onipresente-da-onisciência-de-mundos é uma das con-
sequências de responder a pergunta “o que é o absoluto?” com o propósito de abrir o máximo de novas
possibilidades de verdade e completude do absoluto enquanto máxima totalidade radical, igualmente, será
explicada em uma subseção.
Até então a totalidade que compreendemos como mundo era re-
presentada analiticamente como ser e não ser, e nos referimos não só aos entes
externos, mas também às ações e aos pensamentos internos a entidades com ca-
32 pacidade de conceber imagens ou proposições. Estes conceitos eram suficientes
para abarcar o Mundo e, mesmo sendo os conceitos mais obscuros da história hu-
O ABSOLUTO E O PÓS-HOMEM

mana, deram origem a todo espaço lógico. Dividido pela maior parte da tradição
filosófica por verdadeiro e falso, com exceções: alguns, por exemplo, defendem
um terceiro termo, o indeterminado.

O-aceno-onipresente-da-onisciência-de-mundos gerado pela for-


mulação de uma resposta inaudita à pergunta “o que é absoluto?” não pode se
limitar, portanto, à razão. Deve ser algo que incorporamos-concebemos com a
totalidade-do-nosso-ser-racional-intuitivo-pulsional-sensitivo-sensível-instinti-
vo-imaginativo-místico-consciente-inconsciente-meditativo-volitivo; deve tratar
de toda possibilidade de gradação dos conceitos ser e não ser; de toda possi-
bilidade de quantidade dos conceitos ser e não ser; e, ainda, apontando nossa
ignorância, deve conter a ultrapassagem de si mesmo, que sabemos necessária.
Sendo, portanto, imanente e transcendental a si mesmo. Expande as possibili-
dades da linguagem para descrever o que não havia antes sido perguntado da
mesma forma. Tão geral que a simples união dos conceitos mais gerais - ser e
não ser – ainda estaria aquém desta totalidade. Portanto, nos resta explodir e
implodir os conceitos mais gerais da linguagem para expandir a linguagem que
antes era binária. Para que possamos expandir as possibilidades de sentido da e
para a linguagem. Fragmentando os sentidos existentes da e para a linguagem,
criando novos sentidos e cultivando a constante abertura de novas possibilidades
de sentido da e para a linguagem. Este aceno será a expressão que traduz esta
expansão: algum-todo-nenhum-aquém-entre-além-ser-não-ser-imanente-trans-
cendental-a-si-mesmo, incorporar-conceber esta expressão é transformar a nossa
visão de mundo no aceno-onipresente-da-onisciência-de-mundos, o qual é criado
através da incorporação-concepção da resposta que abre mais possibilidades de
verdade e completude à pergunta: “o que é o absoluto?” ou na sua versão extensa
“o que é o absoluto enquanto a máxima totalidade radical?”. A resposta absoluta-
mente verdadeira e absolutamente completa não nos é acessível, já que isso seria
possibilidade para deuses ou quiçá para alguma entidade que os ultrapasse. Dado
nossa limitação, nosso caminho é criar a expressão que acena para o absoluto
enquanto máxima totalidade radical, inspirando criações artísticas, filosóficas,
científicas, e uma existência que ultrapassa a si mesma em cada ser capaz de con-
ceber-incorporar algum-todo-nenhum-aquém-entre-além-ser-não-ser-imanente-
transcendental-a-si-mesmo. Será guia para novas formas de criação que estarão
expandindo a possibilidade de responder a principal pergunta formulável. Sa-
bendo que jamais, enquanto homo sapiens finito e histórico, seremos capazes de 33
respondê-la de modo absolutamente verdadeiro e absolutamente completo, mas

O ABSOLUTO E O PÓS-HOMEM
deixando em aberto se é possível que alguma forma de inteligência possa cum-
prir este objetivo.

I.II

ABSOLUTO ENQUANTO MÁXIMA TOTALIDADE RADICAL


VERSUS LÓGICO, ILÓGICO E ALÓGICO 26

O que queremos dizer com universo possível? É importante deixarmos


clara a distinção entre nossa concepção de universo possível e a concepção da lógica
modal utilizada pela filosofia analítica contemporânea. Essa distinção é justamente a
razão de havermos criado a expressão consistente-inconsistente-aconsistente.

Nós não acreditamos que a realidade de qualquer universo possí-


vel ontologicamente, não apenas logicamente como na concepção tradicional de
mundos possíveis, possa ser reduzida aos princípios da lógica. No entanto, nós
acreditamos que este universo no qual somos, e qualquer outro universo possível

26
De acordo com Dicionário Houaiss da Língua Portuguesa. Alógico. 1. Que não necessita de demonstração para
ser tido como certo e verdadeiro; que é evidente. 2. FIL que não possui lógica, coerência interna, consistência
ou concatenação em sua organização interior; ilógico irracional. 3. FIL que não se submete a um tipo particular
de lógica, a uma lógica particular ou especifica (p.ex. ao raciocínio silogístico ou a lógica dialética). Pag. 164

Nós não estamos usando o vocábulo de acordo com o uso oficial estabelecido nesse dicionário. Nós usamos
o prefixo (a) como negação no sentido de privação. Mesmo assim, queremos ressaltar uma diferença entre
ilógico e alógico. O primeiro, definimos como algo que desrespeita os princípios da lógica, principalmente
o princípio de não contradição. Ora, se algo desrespeita as regras da lógica é porque poderia respeitá-las.
O segundo, definimos como algo completamente privado de sentido lógico. Isto é, não respeita e nem des-
respeita as regras da lógica, pois não possui estas possibilidades em si.
ontologicamente, seja composto de aspectos lógicos, ilógicos e alógicos. Isto é,
todo universo possível ontologicamente pode ser lógico-ilógico-alógico. Obvia-
mente, não há provas da existência de outros universos; por essa razão, não po-
34 demos afirmar que esses universos possíveis possuem ou não possuem qualquer
propriedade. Supomos, a partir da nossa experiência neste universo, que univer-
O ABSOLUTO E O PÓS-HOMEM

sos possíveis ontologicamente devam ser tão complexos quanto o universo no


qual vivemos, portanto, devam possuir aspectos lógicos-ilógicos-alógicos.

Mesmo através da ciência que produz proposições que respeitam


a lógica, a matemática fundamenta a existência de entidades subatômicas que
possuem comportamentos contraditórios, como as singularidades estudadas pela
física quântica. Ora, se a física quântica afirma matematicamente a existência de
entidades que são ilógicas uma vez que desrespeitam o princípio de não contradi-
ção, não seríamos nós, os quais incorporaram-conceberam algum-todo-nenhum-
-aquém-entre-além-ser-não-ser-imanente-transcendental-a-si-mesmo como a
expressão com maior abertura de possibilidades de verdade e completude em
relação ao absoluto enquanto máxima totalidade radical que iríamos desconside-
rar a ilogicidade deste universo. Assim, como na nossa experiência diária temos
contato com o não ser de diversos entes com os quais nos deparamos cotidia-
namente, ora quando um ente deixa de ser aquilo que é, o não ser aquilo que é
torna-se uma experiência do nada. Se o nada faz parte dos processos de criação
e corrupção de entes deste universo, precisamos igualmente considerá-lo como
parte possível desse e de todo universo possível. Ora, o nada não possui proprie-
dades, não podemos afirmar ou negar proposições ao seu respeito, assim como
também não lhe podemos atribuir proposições contraditórias. Logo, o nada não é
nem lógico, nem ilógico. Resta que o nada seja alógico.

Sendo assim, se no nosso universo, que possui realidade ontológica,


há aspectos lógicos, ilógicos e alógicos, deve haver os mesmos aspectos em outros
universos ontológicos possíveis ao menos não temos qualquer razão para negar
essa possibilidade.

O absoluto enquanto máxima totalidade radical envolve não só este


universo possível ontologicamente, como todo universo possível ontologicamen-
te, todo pensamento possível, toda ação possível, o ser e o nada possível interno
ou externo a este universo e a todo universo possível ontologicamente. Portanto,
uma das razões da nossa expressão algum-todo-nenhum-aquém-entre-além-ser-
-não-ser-imanente-transcendental-a-si-mesmo ser a implosão e a explosão dos
conceitos mais gerais ser e não ser se dá justamente do fato de que pretendemos
abrir possibilidades de sentido para os aspectos ilógicos e alógicos do absoluto
enquanto máxima totalidade radical. 35

O ABSOLUTO E O PÓS-HOMEM
O absoluto enquanto máxima totalidade radical é lógico-ilógico-alógico.

I.III

ALGUMAS CONSIDERAÇÕES A RESPEITO DO ABSOLUTO:


ALGUM-TODO-NENHUM-AQUÉM-ENTRE-ALÉM-SER-NÃO-SER-
IMANENTE-TRANSCENDENTAL-A-SI-MESMO

Já foi apontado na seção anterior que o absoluto enquanto algum-to-


do-nenhum-aquém-entre-além-ser-não-ser-imanente-transcendental-a-si-mes-
mo deve ser a máxima totalidade radical já concebida-incorporada numa única
expressão. Portanto, não é possível conceber-incorporar separadamente por meio
de conceitos.

Nós, seres humanos finitos e históricos ocidentais (e parece que os


orientais veem alterando seu modo de construir a linguagem nos seguindo neste
modo de ser), organizamos nossa visão de mundo, nosso ser como eu, outros se-
res com o eu, entes em geral e as relações recíprocas destas entidades por meio
de conceitos. Deixar o nosso ser encontrar em si, nos outros seres e na totalidade
de entes em geral a ideia do absoluto enquanto máxima totalidade radical por
meio da concepção-incorporação de algum-todo-nenhum-aquém-entre-além-ser-
-não-ser-imanente-transcendental-a-si-mesmo é tarefa árdua, é a transformação
de visão de mundo enquanto totalidade de entes deste Universo para o aceno-o-
nipresente-da-onisciência-de-mundos.

Nosso objetivo é imanente e transcendental ao finito, ao infinito e


ao afinito. Não se trata de demonstrar que entidades existentes externamente a
nós, ações e pensamentos são o que entendemos por totalidade finita ou infinita
não é essa questão. Imanente ao que se refere ao nosso universo com espaço e
tempo, como razoavelmente somos capazes de perceber; transcendental, pois, a
36 um possível nada, conceitos como finito e infinito não se aplicam, assim como,
em possíveis outros universos, não sabemos de seus mecanismos de funciona-
O ABSOLUTO E O PÓS-HOMEM

mento, nem mesmo se são consistentes a nossa lógica, como defende o realismo
modal, nem mesmo se são inconsistentes. Posso conceber um mundo inconsis-
tente, então a máxima totalidade radical deve contemplá-lo, assim como a mun-
dos possíveis consistentes. Nós acreditamos que ontologicamente todo universo é
consistente-inconsistente-aconsistente, mas podemos conceber mundos apenas
inconsistentes ou apenas consistentes. Estes mundos lógicos ou ilógicos são, so-
bretudo, pensáveis. Sendo assim, estes mundos são parte do absoluto enquanto
máxima totalidade radical.

Ao concebermos-incorporarmos algum-todo-nenhum-aquém-en-
tre-além-ser-não-ser-imanente-transcendental-a-si-mesmo, ultrapassamos a nós
mesmos explodindo e implodindo a linguagem através da explosão e implosão de
seus conceitos mais gerais: ser e não ser. Expressão que contém todas as possi-
bilidades de sentido da e para a linguagem, fragmentando-a, cria novos sentidos
e abre o caminho para constante criação de novos sentidos da e para a lingua-
gem. Abre, igualmente, possibilidade de novos referentes virem à tona, os quais
antes jaziam velados. Assim, esperamos que traga o inaudito nas nossas inves-
tigações filosóficas ou particulares da ciência, nas nossas criações artísticas, na
nossa existência, na totalidade-do-nosso-ser-racional-intuitivo-pulsional-sensiti-
vo-sensível-instintivo-imaginativo-místico-consciente-inconsciente-meditativo-
volitivo.

Algum-todo-nenhum-aquém-entre-além-ser-não-ser-imanente-
transcendental-a-si-mesmo requer sob certos aspectos a suspensão do juízo ló-
gico, trazendo à tona nossas limitações constantemente, ao mesmo tempo reve-
lando o ultrapassamento dos nossos limites ontológicos, epistêmicos, lógicos,
éticos, políticos, sociais, estéticos e existenciais. Uma vez concebido-incorporado
o absoluto enquanto máxima totalidade radical, temos a consequência de que
nenhum pensamento, mundo possível (consistente-inconsistente-aconsistente)
ser ou nada possível, pode estar absolutamente em desacordo com algum-todo-
nenhum-aquém-entre-além-ser-não-ser-imanente-transcendental-a-si-mesmo.
Uma nova concepção de valor de verdade vem à tona. A ilustração
desta ideia particular requer uma subseção que virá a seguir.

37

I.III.I

O ABSOLUTO E O PÓS-HOMEM
PARCIALMENTE VERDADEIRO, PARCIALMENTE FALSO E INCOMPLETO

“Mas esta é uma antiga, eterna história: o que ocorreu então aos estoicos su-
cede ainda hoje, tão logo uma filosofia começa acreditar em si mesma. Ela
sempre cria o mundo à sua imagem, não consegue evitá-lo, filosofia é esse
impulso tirânico mesmo, a mais espiritual vontade de poder, de “criação do
mundo”, de causa prima (causa primeira).”27

Provavelmente esta seção soará absurda a qualquer seguidor da


analítica enquanto regras de determinação da verdade e falsidade das propo-
sições. Deve ficar claro que não buscamos aqui tentar refutar a analítica. Aliás,
estamos utilizando a lógica cada vez que fazemos afirmações, como Aristóteles
muito bem expôs na sua defesa do princípio lógico de não contradição. Ou mesmo
para os que negam a defesa do estagirita, ainda estamos comprometidos com o
princípio de identidade. Pelo menos até a concepção-incorporação algum-todo-
nenhum-aquém-entre-além-ser-não-ser-imanente-transcendental-a-si-mesmo,
pois depois disto estaremos sob certos aspectos diante de um époche. Époche
entendido como suspensão do juízo lógico.

O que pretendemos é mostrar que as regras até então da linguagem, ao


contrário do que a tradição visou defender, são uma redução da realidade a estruturas
confortáveis ao tipo de inteligência humana e não fiéis retratos ontológicos da mesma.

À luz de algum-todo-nenhum-aquém-entre-além-ser-não-ser-ima-
nente-transcendental-a-si-mesmo, expressão qual serve como um caminho que
abre constantemente novas possibilidades de verdade e completude do absoluto
enquanto máxima totalidade radical, qualquer proposição estará sempre parcial
e incompleta em relação à verdade e à falsidade. Qualquer proposição é sempre
uma tentativa de descrever um estado de coisas na realidade ou na mente de

27
Nietzsche, Friedrich Wilhelm. Além do Bem do Mal: Prelúdio a uma filosofia do futuro. Companhia das
Letras. São Paulo 2005. Pág. 15
quem a pronuncia. Um recorte que, de acordo com a tradição, se correspondente
ao que deseja descrever, será verdadeiro e, se não correspondente ao que deseja
descrever, será falso. Não entraremos na discussão de se é possível atribuir valor
38 de verdade aos estados mentais.
O ABSOLUTO E O PÓS-HOMEM

Nós, que concebemos-incorporamos algum-todo-nenhum-aquém-


-entre-além-ser-não-ser-imanente-transcendental-a-si-mesmo, transformamos
a nossa visão de mundo no aceno-onipresente-da-onisciência-de-mundos. Para
nós, o absoluto enquanto máxima totalidade radical é a única verdade completa,
imparcial. Nós, entretanto, não podemos atingi-lo em sua absoluta completude
e absoluta verdade. Portanto, as proposições referentes à realidade externa ou à
interna de quem as pronuncia já sempre são descrições incompletas, parcialmen-
te verdadeiras e parcialmente falsas em relação ao absoluto enquanto máxima
totalidade radical. Incompletas, pois só o absoluto enquanto máxima totalidade
radical é completo; parcialmente verdadeiras, porque só o absoluto enquanto má-
xima totalidade radical é a verdade imparcial. Qualquer recorte visando uma afi-
guração de objetos do mundo ou estados mentais será sempre uma redução dessa
própria afiguração em relação à verdade total e completa do absoluto enquanto
máxima totalidade radical. Não só por desconhecermos a totalidade das relações
e dos objetos em si envolvidos nessa afiguração, mas porque a totalidade de uma
afiguração de objetos, ou mesmo de um único objeto, depende da verdade abso-
luta e da completude absoluta do absoluto enquanto máxima totalidade radical.
Este só pode ser apreendido de modo verdadeiro absolutamente, imparcialmen-
te e completamente por um ser que possa igualar-se a algum-todo-nenhum-a-
quém-entre-além-ser-não-ser-imanente-transcendental-a-si-mesmo, que possa
ultrapassar ser, estar e possuir o absoluto. As justificativas para parcialidade de
verdade e incompletude já seriam suficientes para tornar qualquer proposição
parcialmente falsa, pois, por mais que possamos apreender o maior número de
propriedades e relações de uma afiguração de objetos num determinado momen-
to, num determinado espaço, sempre estaremos parcialmente falsos por des-
conhecermos todas as propriedades desta afiguração em si, e muito menos das
relações desta afiguração com o absoluto enquanto máxima totalidade radical.
Embora ainda haja outra razão para haver parcialidade de falsidade, o homem
também faz combinações e separações arbitrárias das possibilidades do absoluto
enquanto máxima totalidade radical e até mesmo de uma simples afiguração.

Ainda provavelmente restará uma dúvida: por que todas as proposições


seriam parcialmente verdadeiras, não poderia haver proposições simplesmente falsas?
Repito que estamos à luz de uma nova visão de mundo que não é
mais uma visão de mundo, é algo menos determinado, não é uma totalidade fini-
ta, nem mesmo infinita. É imanente e transcendental ao finito, infinito, afinito.
É o-aceno-onipresente-da-onisciência-de-mundos, busca abarcar este Universo 39
atual consistente-inconsistente-aconsistente; todo Universo possível consistente-

O ABSOLUTO E O PÓS-HOMEM
-inconsistente-aconsistente; o ser e o nada que possa separar este Universo atual
consistente-inconsistente-aconsistente de todo universo possível consistente-in-
consistente-aconsistente; o ser e o nada que possa separar todo Universo possível
consistente-inconsistente-aconsistente de algum Universo possível consistente-
-inconsistente-aconsistente; o ser e o nada que possa haver internamente neste
Universo atual consistente-inconsistente-aconsistente e em todo Universo possí-
vel consistente-inconsistente-aconsistente; todo pensamento consistente-incon-
sistente-aconsistente e toda ação consistente-inconsistente-aconsistente. Ora,
nenhuma proposição, objeto, pensamento pode estar absolutamente em desacor-
do com isso. Conterá sim, uma infinita possibilidade de proporções de verdade,
falsidade e completude em relação a algum-todo-nenhum-aquém-entre-além-ser-
-não-ser-imanente-transcendental-a-si-mesmo.

Somente na tradição há falsidade e verdade do ponto de vista propo-


sicional, para nós que concebemos-incorporamos algum-todo-nenhum-aquém-en-
tre-além-ser-não-ser-imanente-transcendental-a-si-mesmo transformando nossa
visão de mundo em o-aceno-onipresente-da-onisciência-de-mundos há apenas
proporções de verdade, falsidade e completude.

I.IV

LÓGICA E ONTOLOGIA

Quando a lógica foi estabelecida como uma disciplina propriamen-


te por Aristóteles, era para ser a disciplina formadora das regras do bom pensar
enquanto representação da realidade. Tanto que Aristóteles, ao elaborar o pri-
meiro princípio Metafísico no Livro Gama da Metafísica, o faz em diferentes ver-
sões (1005b1 19-32)28: o princípio (princípio de não contradição) numa versão é
o primeiro princípio lógico; em outra, é o primeiro princípio epistemológico; há,
ainda, a versão em que ele é o primeiro princípio ontológico. Isso significa que
40 estas disciplinas são regidas por um mesmo primeiro princípio. Ergo, a lógica era
compreendida como forma com a qual se dá os estados de coisas do mundo. Isto
O ABSOLUTO E O PÓS-HOMEM

é, a realidade não poderia ser ilógica para Aristóteles e, na verdade, para muitos
filósofos até hoje.

Como foi dito na seção anterior, nós não estamos negando a lógica
nesta obra, e sim, apenas sugerindo que a realidade em sua totalidade radical é
também ilógica e alógica. Isto é, a lógica é apenas uma forma humana de descre-
ver a realidade limitada pelo modo de perceber e pensar humanos. Nada mais
que isso. Extremamente útil para formarmos uma ciência universal para com-
preensão da linguagem. Não estamos negando-lhe valor.

Não é apenas agora que podemos suspeitar das limitações da lógica.


Ora, a própria razão da qual a lógica é derivada é sabida e historicamente limitada
para compreender o mistério da existência.

Na filosofia, temos Mc Taggart com o famoso argumento da irrea-


lidade do tempo. O filósofo demonstra que a existência objetiva do tempo gera
contradição, pois a única forma de haver tempo objetivo é que as propriedades
passado, presente e futuro sejam e não sejam atribuídas a um mesmo evento.
Assim, ou o tempo não existe, ou devemos rever outros princípios fundamentais
da realidade.

Uma dessas opções é aceitar a inconsistência da realidade, ou seja,


que a realidade possa não estar de acordo com princípio lógico mais fundamen-
tal: o princípio de não contradição (algo não pode ser e não ser sob mesmo aspec-
to ao mesmo tempo). Ergo, que a realidade pode ser ilógica. Ninguém, dentro da
tradição filosófica respeitando os princípios argumentativos lógicos, conseguiu
refutar Mc Taggart até os dias de hoje.

Na física quântica, os físicos afirmam haver provas matemáticas de

28
Aristotle. The Complete Works of Aristotle. Volume II (Bollingenseries ; 71:2). Princeton University Press.
New Jersey. 1994. Pág. 1588.
que uma partícula desrespeita o princípio de não contradição. Uma singularida-
de quando testada mostra comportamentos contraditórios. Isto é, está e não está
num determinado ponto do espaço ao mesmo tempo, por exemplo. Embora saiba-
mos que a ciência seja problemática e limitada, acreditamos que pelo menos sob 41
alguns aspectos ela seja capaz de representar a realidade.

O ABSOLUTO E O PÓS-HOMEM
Se, no próprio universo da qual a lógica foi derivada, há provas de
suas falhas ontológicas, no nada interno a este universo ou interno a possíveis
universos ontológicos, no pensamento, na ação, em possíveis outros universos
ontológicos, no nada e no ser que possa haver externo a este universo e a todo
possível universo menos razões teremos para crer na lógica como única estrutura.

Portanto, a lógica é uma possível leitura da ontologia altamente efi-


ciente para os processos de representação através da linguagem humana. Não é
a própria ontologia. Nosso desejo de reduzir o nosso universo a uma estrutura
lógica é mais um antropomorfismo como tantos outros.

I.V

O ACENO-ONIPRESENTE-DA-ONISCIÊNCIA-DE-MUNDOS

O que queremos dizer com esta expressão inusitada?

Aceno deve ser entendido no sentido que Heidegger emprega no seu


livro “A Caminho da Linguagem”, na seção “De Uma Conversa Sobre a Linguagem
entre um Japonês e um Pensador” : “É o que significa aceno. Os acenos são miste-
riosos. Acenam para nós e acenam para fora de nós. Mas nos acenam, sobretudo,
com a fonte de onde repentinamente nos advêm.”29

29
Heidegger, Martin. A Caminho da Linguagem. 3 ed. Vozes. Editora Universitária São Francisco. 2003.
Pág.93
O aceno é onipresente porque, uma vez concebido-incorporado al-
gum-todo-nenhum-aquém-entre-além-ser-não-ser-imanente-transcendental-a-
si-mesmo, não há como regressar, os sentidos da e para a linguagem são expandi-
42 dos, fragmentando-se, criando novos sentidos e trazendo a constante abertura de
novas possibilidades de novos sentidos da e para a linguagem. Assim como abre
O ABSOLUTO E O PÓS-HOMEM

possibilidade de novos referentes virem à tona, os quais antes jaziam velados. A


existência em todas suas possibilidades será afetada por esta presença até a fini-
tude daquele que concebe-incorpora.

Este aceno que vem a nós vai para fora de nós e é desde a fonte
de onde repentinamente nos advém, transforma o que era visão de mundo para
o constante conceber-incorporar, o para sempre conceber-incorporar este Uni-
verso consistente-inconsistente-aconsistente; todo Universo possível consisten-
te-inconsistente-aconsistente; o nada e o ser internos a este Universo consisten-
te-inconsistente-aconsistente; o possível nada e o possível ser externos a este
Universo consistente-inconsistente-aconsistente e a todo Universo possível con-
sistente-inconsistente-aconsistente; o possível nada e o possível ser internos a
todo Universo possível consistente-inconsistente-aconsistente; todo pensamento
possível consistente-inconsistente-aconsistente e toda ação possível consistente-
-inconsistente-aconsistente.

A transformação da visão de mundo em o aceno-onipresente-da-o-


nisciência-de-mundos é inexorável, é o fim de uma compreensão de mundo na
qual a totalidade é limitada. Para nós a totalidade é o absoluto enquanto máxima
totalidade radical. Inacessível em sua verdade absoluta e completude absolu-
ta. Todavia, ao concebermos-incorporarmos algum-todo-nenhum-aquém-entre-
-além-ser-não-ser-imanente-transcendental-a-si-mesmo como caminho que abre
o máximo de possibilidades de verdade e completude do absoluto enquanto má-
xima totalidade radical descobrimos que a totalidade não é nem apenas limitada
ou apenas ilimitada, mas imanente e transcendental ao finito, ao infinito e ao
afinito.
I.VI

A NOVA METAFÍSICA
43

O ABSOLUTO E O PÓS-HOMEM
Será que estamos falando de uma nova metafísica? Eu diria que, em
parte, sim. A Metafísica surgiu originariamente como estudo do ser enquanto ser, pri-
meiros princípios, ciência suprema ou primeira, contemplação do primeiro motor.

Então, num certo sentido, era a busca do fundamento e o estudo das


propriedades mais gerais daquilo que existe.

Na Idade Moderna, ela começou a ser derrubada, sendo demonstra-


da como uma potencialidade do aparato intelectual humano composta de uma
irracionalidade intrínseca, e – ironicamente – até então era a ciência suprema
dos alicerces da razão.

No início do século XX, foi totalmente eliminada do processo filosó-


fico por uma das principais vertentes da filosofia contemporânea: a filosofia ana-
lítica. Em outra das principais vertentes, a fenomenologia, foi tratada de modo
radicalmente diferente.

Para Heidegger, um dos principais representantes da fenomenolo-


gia, houve um encurtamento hermenêutico e uma ultrapassagem da Metafísica,
enquanto que, para vários dos principais expoentes da analítica da época, as pro-
posições que falam de temas metafísicos, por exemplo, sobre o ser, simplesmente
são sem sentido, e, portanto, devem ser silenciadas.

Não vamos nos adentrar numa história da Metafísica aqui, por duas
razões principais: não a conheço suficientemente para tanto; o objetivo deste li-
vro não é fazer história da filosofia e, sim, apontar novas possibilidades de pensa-
mento, linguagem, criação, ontologia, conhecimento, ética, política religião, arte
e existência.

Algum-todo-nenhum-aquém-entre-além-ser-não-ser-imanente-
transcendental-a-si-mesmo é uma nova metafísica porque é um novo represen-
tante do que foi no passado um fundamento. Embora não seja um fundamento,
é o aceno-onipresente-da-onisciência-de-mundos, onipresença na vida humana,
a abertura da e para a linguagem dos antigos e novos sentidos em fusão. Gera a
fragmentação de sentidos da e para a linguagem, criação de sentidos da e para a
44 linguagem e constante abertura de possibilidades de sentido da e para a lingua-
gem. Assim como abre possibilidade de novos referentes virem à tona, os quais
O ABSOLUTO E O PÓS-HOMEM

antes jaziam velados.

Deve, todavia, ficar claro que é muito mais que uma metafísica, a
sua concepção-incorporação pela totalidade-do-nosso-ser-racional-intuitivo-pul-
sional-sensitivo-sensível-instintivo-imaginativo-místico-consciente-inconscien-
te-meditativo-volitivo gera a transformação da visão de mundo. O resultado desta
transformação não é mais uma visão de mundo como uma totalidade finita ou
infinita como já dissemos na seção anterior. Sendo assim, há consequências em
todas as possibilidades do homo sapiens finito e histórico. Metafísica, epistemolo-
gia, lógica, ética, política, cultura, religião, ciência, arte, existência em si daquele
que concebe-incorpora devem ser ultrapassadas para novas possibilidades geran-
do uma complexidade inaudita e, portanto, com consequências sem número e
sem uma possível previsão exata.

I.VII

O PENSAMENTO E ALGUM-TODO-NENHUM-AQUÉM-ENTRE-
ALÉM-SER-NÃO-SER-IMANENTE-TRANSCENDENTAL-A-SI-MESMO

Até aqui talvez tenhamos feito uma pequena confusão a respeito de


algum-todo-nenhum-aquém-entre-além-imanente-transcendental-a-si-mesmo
como um caminho para a resposta à pergunta “o que é o absoluto?”, exclusiva-
mente ontológica. Na verdade, estamos diante de algo que inclui e ainda é mui-
to mais abrangente do que a ontologia. Entendemos ontologia como a disciplina
que trata dos princípios mais gerais das coisas do mundo que são independentes
do homo sapiens finito e histórico, que podem ser percebidas, mas não depen-
dem de nós para existir. Não são só os movimentos do mundo exterior que essa
resposta representa. O absoluto enquanto máxima totalidade radical é também
toda possibilidade imaginável e concebível por um homo sapiens finito e histó-
rico e por todo ser possível que possua conteúdo mental. Isto significa incluir,
também, todo pensamento e toda ação, toda possibilidade de ser e não ser, todas 45
as possíveis gradações entre esses dois conceitos, todas as possibilidades lógicas

O ABSOLUTO E O PÓS-HOMEM
de quantidade entre esses conceitos, e ainda os conceitos de imanente e trans-
cendental a si mesmo. Nenhum conteúdo mental deve escapar das possibilidades
do absoluto enquanto máxima totalidade radical. Por isso, criamos a expressão
algum-todo-nenhum-aquém-entre-além-ser-não-ser-imanente-transcendental-
-a-si-mesmo para abrir toda possibilidade de verdade e completude possível a
nós – homines sapientes finitos e históricos - e, além disso, para manter em aber-
to o surgimento de novas possibilidades de verdade e completude do absoluto
enquanto máxima totalidade radical. Ora, já dissemos que a visão de mundo de
quem concebe-incorpora algum-todo-nenhum-aquém-entre-além-ser-não-ser-
-imanente-transcendental-a-si-mesmo transforma-se em o aceno-onipresente-da-
-onisciência-de-mundos, o qual torna aquele que concebe-incorpora algum-todo-
nenhum-aquém-entre-além-ser-não-ser-imanente-transcendental-a-si-mesmo
onipresente à abertura de novas possibilidades de verdade e completude deste
mundo consistente-inconsistente-aconsistente, de todo o mundo possível consis-
tente-inconsistente-aconsistente e do possível nada e do possível ser externo e
interno a este mundo consistente-inconsistente-aconsistente e de todo mundo
consistente-inconsistente-aconsistente.

Todo pensamento é uma possível combinação parcial de algum-to-


do-nenhum-aquém-entre-além-ser-não-ser-imanente-transcendental-a-si-mes-
mo. Por isso, será sempre parcialmente verdadeiro, parcialmente falso e incom-
pleto em relação ao absoluto enquanto máxima totalidade radical. O pensamento
é comprovadamente arbitrário, já é estabelecido como tal desde Platão, nos diá-
logos Teeteto e Sofista. A possibilidade de o pensamento ser falso, analiticamente
falando, foi aceita no mundo como a visão vencedora. Pode ser chamada de dou-
trina da verdade objetiva.

Foi determinado que o pensamento pode ser falso, justamente por


ser livre para fazer qualquer combinação com as possibilidades de representação
extraídas do mundo. Porém, concebendo-incorporando algum-todo-nenhum-a-
quém-entre-além-ser-não-ser-imanente-transcendental-a-si-mesmo com a totali-
dade-do-nosso-ser-racional-intuitivo-pulsional-sensitivo-sensível-instintivo-ima-
ginativo-místico-consciente-inconsciente-meditativo-volitivo, compreendemos que
qualquer combinação é uma parcial representação do absoluto enquanto máxima
totalidade radical, pois nada pode absolutamente não estar contido nele. Assim como
46 nada pensável pode conter a verdade absoluta e a completude absoluta do absoluto
enquanto máxima totalidade radical, pois algum-todo-nenhum-aquém-entre-além-
O ABSOLUTO E O PÓS-HOMEM

ser-não-ser-imanente-transcendental-a-si-mesmo nos mostra justamente o ultrapas-


samento de nós mesmos quando transforma nossa visão de mundo em o aceno-o-
nipresente-da-onisciência-de-mundos. A partir dessa concepção-incorporação até
nossa finitude, sabemos que esse é só o começo do possível - mas não provável - en-
contro da vida inteligente com a verdade absoluta e a completude absoluta do absolu-
to enquanto máxima totalidade radical.

I.VIII

DA SUPERAÇÃO HUMANA

Ao leitor, provavelmente, já ficou claro a pequenez humana diante


do mistério de algum-todo-nenhum-aquém-entre-além-ser-não-ser-imanente-
transcendental-a-si-mesmo. Não é, pois, nenhuma novidade histórica que não
somos capazes de compreender e de conhecer aquilo que entendemos por mun-
do, em sua verdade absoluta e em sua completude absoluta. Transformando a
nossa antiga visão de mundo em o aceno-onipresente-da-onisciência-de-mun-
dos, igualmente ainda não seremos capazes de compreender e conhecer em sua
verdade absoluta e em sua completude absoluta o absoluto enquanto máxima
totalidade radical. A ideia de que só aos deuses cabe conhecer a verdade absoluta
é vastamente difundida em praticamente todas as culturas humanas.

Mas, então, o que faremos quanto ao problema essencial da nossa


existência?

Na nossa antiga visão de mundo, somente Deus poderia desvendar


a verdade sobre o mistério da existência, porém nada sabemos sobre o que ou
quem nos criou. O Deus da tradição ocidental, assim como quaisquer deuses de
qualquer tradição, foi historicamente silencioso, caso Ele e eles existam. Esse si-
lêncio tem levado de modo crescente, ao longo dos últimos dois ou quiçá três
séculos, mais indivíduos a crer que esses são apenas conceitos ideias e não reais. 47
Estes indivíduos - nos quais nos incluímos, autor e possíveis leitores - estão agru-

O ABSOLUTO E O PÓS-HOMEM
pados no conjunto denominado de espécie homo sapiens finito e histórico (finito
e histórico são propriedades atribuídas a esta espécie por nós mesmos).

Na história empírica da vida inteligente, é inegável a nossa impo-


tência em relação à nossa inexorável finitude. Aliás, nossa experiência empírica
afirma que todo ser deve ser igualmente finito, a não ser que, apesar de não se
revelar no mundo, exista pelo menos um Deus eterno. Resta-nos uma única alter-
nativa para alterar o nosso destino finito e impotente. Quando digo nós, me refiro
a vida inteligente representada, por falta de qualquer outro representante, pelo
homo sapiens finito e histórico. Na verdade essa alternativa foi sempre buscada,
mesmo que obscuramente, mesmo que na maior parte das vezes inconsciente-
mente. Nós sempre desejamos vir-a-ser Deus.

Diante desta impotência com que vemos os movimentos do absolu-


to, nos resta finalmente tentar, de modo consciente e não mais como um desejo
inconsciente, lutar para que a vida inteligente possa vir-a-ser Deus. Uma vez conce-
bido-incorporado algum-todo-nenhum-aquém-entre-além-ser-não-ser-imanente-
transcendental-a-si-mesmo, Deus como máximo conceito lógico possível não será
mais suficiente para igualar-se ao absoluto enquanto máxima totalidade radical.
Aprendemos que o absoluto enquanto máxima totalidade radical é lógico, ilógico
e alógico (o nada não é nem lógico e nem ilógico e deve estar contido no absoluto
enquanto máxima totalidade radical, por exemplo). É necessário que transforme-
mos nosso desejo velado de vir-a-ser-Deus, já que o absoluto, enquanto máxima
totalidade radical, contém a possibilidade de haver Deus e não o seu contrário. O
único modo de atingir a verdade absoluta e a completude absoluta é igualar-se a
algum-todo-nenhum-aquém-entre-além-ser-não-ser-imanente-transcendental-a-
si-mesmo, e isto só é possível a Deus-que-ultrapassa-a-si-mesmo.

Na verdade, ainda é uma falácia que nos resta uma única alternati-
va, restam-nos duas: permanecermos impotentes vítimas do acaso e necessárias
vítimas da morte; ou lutar para atingir nosso sentido geral enquanto classe de
seres especialmente inteligentes: vir-a-ser-Deus-que-ultrapassa-a-si-mesmo.
O todo da vida como conhecemos corre risco de ser extinta no futu-
ro. Principalmente nós, homo sapiens finito e histórico, tipo de seres que são os
únicos conhecidos com as propriedades necessárias para denominação de vida
48 inteligente. Obviamente, aceitando que há uma possibilidade de infinitos univer-
sos separados pelo nada surgirem a todo instante (embora instante não seja algo
O ABSOLUTO E O PÓS-HOMEM

que possa ser dito sobre o nascer de um universo, sabido que espaço e tempo são
qualidades deste universo específico no qual vivemos, e visto que não sabemos
sobre outros universos e certamente também não sobre o nada em si) provavel-
mente poderá haver vida inteligente além da nossa. Logo, a dúvida nos obriga
a buscar uma solução para nossa impotência. Se o caminho entre nós e Deus já
era incalculável, imaginemos, então, a Deus-que-ultrapassa-a-si-mesmo. Sendo
assim, seguir o sentido geral do homo sapiens finito e histórico é criar o nosso
sucessor para que este crie o sucessor do sucessor e assim sucessivamente até
que a vida possa vir-a-ser Deus-que-ultrapassa-a-si-mesmo ou se extinga tentan-
do vir-a-sê-lo.

O que é ser Deus-que-ultrapassa-a-si-mesmo para aqueles que con-


cebem-incorporam algum-todo-nenhum-aquém-entre-além-ser-não-ser-imanen-
te-transcendental-a-si-mesmo?

Se aquele que concebe-incorpora com a totalidade-do-seu-ser-ra-


cional-intuitivo-pulsional-sensitivo-sensível-instintivo-imaginativo-místico-cons-
ciente-inconsciente-medititativo-volitivo o absoluto enquanto máxima totalidade
radical e transforma sua visão de mundo em o-aceno-onipresente-da-onisciência-
de-mundos, sua visão de Deus deve igualmente se transformar em o criador do
mundo para o ser que se iguala a algum-todo-nenhum-aquém-entre-além-ser-não-
ser-imanente-transcendental-a-si-mesmo. O ser que se iguala ao absoluto, enquan-
to máxima totalidade radical, não é limitado ao logicamente possível. Igualar-se
a algum-todo-nenhum-aquém-entre-além-ser-não-ser-imanente-transcendental-a-
si-mesmo só pode ser a melhor concepção de sentido para existência da vida inte-
ligente. Visto que o sentido em si, caso exista, foi-nos silenciado. Todo discurso é
apenas ecos de nós mesmos enquanto únicos representantes da vida inteligente.
Neste caso, o sentido em si só pode ser criado por nós mesmos.
I.IX

O PÓS-HOMEM
49

O ABSOLUTO E O PÓS-HOMEM
“Os mais preocupados perguntam hoje como fazer para conservar o
homem?” Mas Zaratustra pergunta – e é o primeiro e único a fazê-lo: - “Como fazer
para que o homem seja superado?”30

Conceituaremos o conhecer como a abertura de novas possibili-


dades de verdade e completude de algum-todo-nenhum-aquém-entre-além-ser-
-não-ser-imanente-transcendental-a-si-mesmo. Imaginamos que ao homem pode
haver um desvelamento de possibilidades de verdade e completude do absoluto
enquanto máxima totalidade radical sem fim. Todavia, devido à nossa natureza
limitada – a qual estranhamente aponta sua própria superação -, por mais que
avancemos, jamais seremos capazes de igualar-nos a algum-todo-nenhum-a-
quém-entre-além-ser-não-ser-imanente-transcendental-a-si-mesmo. Conceber-
-incorporar esta expressão é justamente um caminho que abre infinitas novas
possibilidades de verdade e completude do absoluto enquanto máxima totalida-
de radical e nos mostra que podemos ultrapassar a nós mesmos, e mesmo assim
jamais atingir o absoluto enquanto máxima totalidade radical.

Falemos de maneira mais clara sobre nossa limitação, tomemos to-


das as principais perguntas que sempre fizemos e sempre respondemos de modo
impreciso demais a ponto de firmar qualquer certeza absoluta. Aqui me refiro a
perguntas como: Deus existe? Como se deu a criação? Há um início para existên-
cia? Se há, viemos do nada? Qual o sentido da vida? É possível conhecer os entes
do mundo absolutamente? É possível conhecer qualquer ente absolutamente, o
que inclui a nós mesmos?

Tudo isso aponta de modo cristalino uma limitação. Sem mencio-


nar que, mesmo nos campos que caminhamos com alguma segurança, sempre se
perderam conhecimentos e se adquiriram novos, talvez havendo mais acumulo
do que perda. De qualquer modo, no entanto, podemos pouco diante do mistério.

30
Nietzsche, Fredriech. Assim falava Zaratustra. Pág. 359.
Assim, para que um dia a vida inteligente possa igualar-se a algum-todo-nenhum-
-aquém-entre-além-ser-não-ser-imanente-transcendental-a-si-mesmo, devemos
tomar as rédeas da evolução, e não mais permitir que ela ocorra naturalmente,
50 mas sim artificialmente como uma re-evolução artificial. O passo que nós, ho-
mens, podemos dar é criar o nosso sucessor: o pós-homem.
O ABSOLUTO E O PÓS-HOMEM

É claro que temos avanços tecnológicos em ramoscomo a engenha-


ria da computação e inteligência artificial, assim como no reconhecimento do có-
digo genético humano. O pós-homem enquanto homem modificado pelo homem,
isto é, na sua versão menos determinada, já começa a despontar independente de
uma ordem específica, ou melhor, de um objetivo específico para sua criação.31

Um dos principais objetivos deste escrito é justamente definir um


sentido geral para vida inteligente. A única classe de seres na nossa experiência
empírica denominada de inteligente é o homem, o qual chamamos, para uma de-
terminação mais precisa, de homo sapiens finito e histórico, embora sejam sinôni-
mos. O sentido geral foi, então, definido por nós: como igualar-se algum-todo-ne-
nhum-aquém-entre-além-ser-não-ser-imanente-transcendental-a-si-mesmo. Como
não podemos atingir este sentido, criamos o que pode ser chamado de sentido geral
da vida do homo sapiens finito e histórico ou a contribuição do homo sapiens finito
e histórico para o sentido geral da vida inteligente: criar o pós-homem. Através des-
te sentido, determinaremos as pesquisas científicas para alcançá-lo. Nós dedicare-
mos uma seção para clarificar o sentido geral da vida inteligente.

Ao contrário da filosofia tradicional, nosso instrumento principal


não é apenas a razão, ele é a totalidade-do-nosso-ser-racional-intuitivo-pulsional-
sensitivo-sensível-instintivo-imaginativo-místico-consciente-inconsciente-medi-
titativo-volitivo. A criação do pós-homem deve dar-se no sentido de expandir
a totalidade do ser do homo sapiens finito e histórico e não apenas a sua capa-
cidade racional. Para que este futuro ser possa nos transcender em tudo, como
um passo multidirecional à possibilidade de igualar-se a algum-todo-nenhum-
-aquém-entre-além-imanente-transcendental-a-si-mesmo. Assim, com o devido
tempo, o pós-homem poderá criar aquele que irá além de si mesmo (o sucessor do

31
“Transhumanism” é um movimento cultural e intelectual internacional com o objetivo de transformar
fundamentalmente a condição humana através do desenvolvimento científico e tecnológico, para aumen-
tar consideravelmente intelectual humano, aprimorar o corpo físico e as capacidades psicológicas. Para
saber mais: http://en.wikipedia.org/wiki/Transhumanism
sucessor do homo sapiens finito e histórico) e, assim, até que nosso objetivo seja
alcançado ou desvaneça junto com a vida inteligente deste universo.

Pode ser levantada a hipótese de que tal ser seria capaz de nos dizi- 51
mar, e estaríamos, então, criando o maior genocídio da história, até mesmo nossa

O ABSOLUTO E O PÓS-HOMEM
própria extinção. Uma alternativa certamente plausível, entretanto não iremos
igualmente ser aniquilados pelo tempo? E, mais grave do que isso, seguir num
universo que aniquila todo e qualquer ente com que tivemos contato até hoje ao
longo da história. Assim, seguirá eternamente havendo novas possibilidades de
vida e muitas não possibilidades também. Talvez um deserto cósmico se instau-
re após nossa aniquilação natural, quando algum fenômeno maior do que nosso
poderio tecnológico ocorrer, ou talvez apenas o tempo cumpra sua função inexo-
rável de transformação de tudo que é.

Qual é o risco que verdadeiramente corremos? O de acabar com esta


estrada do nada ao nada que tem sido a existência até onde somos capazes de
conhecer. De tomar as rédeas do destino. Aliás, não há qualquer garantia de que
um pós-homem necessite nos aniquilar pela força. Talvez fosse muito mais fácil
deixar que ao longo das gerações nos extingamos naturalmente?

Não conviveríamos em paz, pois uma guerra entre um homem e um


pós-homem seria uma guerra de muito mais perdas e talvez o fim da vida inte-
ligente. Será que um ser superior a nós em sua totalidade não perceberia que a
morte é desnecessária?

Por fim, para olhos atentos, os experimentos rumo ao pós-homem


já vêm acontecendo. Sendo assim, é interessante dirigirmos tal empreitada para
que o pós-homem seja a superação da totalidade de-nosso-ser-racional-intuitivo-
-pulsional-sensitivo-sensível-instintivo-imaginativo-místico-consciente-incons-
ciente, e não um fruto do acaso, ou de modificações específicas sem um propósito
em comum. Seremos superados pela nossa própria força de criação, e não por
uma natureza evolutiva tão imprecisa como foi a caminhada até nós. Após nossa
contribuição, deixaremos com que nossos sucessores sigam nesta empreitada li-
mite, de sucessores após sucessores. Obviamente não podemos garantir que haja
essa sequência quando saímos de cena. A responsabilidade, como um bastão
de corrida de revezamento, é passada adiante, cabendo ao pós-homem decidir
se criará aquele que o superará. Contamos apenas com a nossa intenção de que
nossa criação seja aquele que nos supere em relação a totalidade-do-nosso-ser-
-racional-intuitivo-pulsional-sensitivo-sensível-instintivo-imaginativo-místico-
consciente-inconsciente-meditativo-volitivo.
52
O ABSOLUTO E O PÓS-HOMEM

I.X

DA EXISTÊNCIA DE DEUS

Os leitores teístas devem estar com uma aflição a esta altura. Não
seria a grande blasfêmia teleológica querer tornar-se Deus? Deus é a perfeição
aos olhos do homo sapiens finito e histórico, então, mais grave, é querer tornar-se
Deus-que-ultrapassa-a-si-mesmo.

Analisemos o que se sabe sobre Deus até o nosso momento histórico.

É bem claro para quem estudou um pouco de História da Filosofia


que qualquer possibilidade de argumentação racional, nos moldes analíticos, em
prol da existência de Deus, foi demolida pelos pensadores modernos, tal como
Hume e Kant. Depois o famoso “Deus está morto”, de Nietzsche, foi o ato de cora-
gem de dizer o não dito pelos pensadores anteriores. Todos os argumentos caíram
por terra, como da cadeia causal que precisa de um primeiro motor não causado
ou da perfeição divina como uma prerrogativa para sua existência. Argumentos a
priori, assim como a posteriori, como qualificou Kant, nas provas físico-teológica,
cosmológica e ontológica. A, decadência da concepção racional de Deus atingiu
até mesmo o grande Descartes, no famoso argumento “boot strapping”, formu-
lado nas meditações, o qual defendia a possibilidade da concepção positiva do
infinito como provada possibilidade da concepção de Deus.

Os pensadores antigos, de modo geral, tentaram argumentar sobre


Deus, dos Pré-Socráticos aos Medievais. Eles tinham certeza sobre Deus. Eles confun-
diam a necessidade lógica com a necessidade de respostas, cultura com ontologia,
Deus com o absoluto. Ainda não enquanto máxima totalidade radical, pois o absoluto
concebido-incorporado assim transcende tanto Deus quanto à lógica. Independente
das variadas provas produzidas desde os antigos até os medievais, todo e qualquer ar-
gumento ficou claramente suspendido depois destes geniais pensadores modernos.
A única a afirmação correta é que não sabemos sobre Deus, nem mesmo se o modo 53
como nós compreendemos esta entidade está no caminho correto.

O ABSOLUTO E O PÓS-HOMEM
Por exemplo, entre outras propriedades, Deus é o ser que possui a
propriedade da máxima perfeição. Todavia, nós não sabemos se a máxima perfei-
ção lógica concebida por nós é realmente a máxima perfeição ontológica possível.
Ou se limitá-lo a princípios lógicos já não seria uma blasfêmia. Claro que estamos
falando do Deus da tradição filosófica e religiosa ocidental, que foi caracterizado
por aqueles que tentaram fazê-lo como um ser sem contradições de propriedades.
Não sabemos sobre as concepções orientais, talvez haja concepções que aceitem
que Deus possa possuir propriedades contraditórias. Falta-nos conhecimento da
cultura oriental para afirmar ou negar, apenas supomos para fins ilustrativos.
Todavia, sendo na concepção ocidental ou na concepção oriental parece haver
mais razões para não contarmos com ele, pois até hoje não houve uma revelação
sequer do seu ser no mundo. Vivemos sob seu silêncio.

Mais plausível é acreditar que Deus era nosso ponto de apoio mí-
tico. Como disse Heidegger, a concepção mítica do mundo era nossa concessão
de apoio pré-ciência. Além disso, por mais que adquiramos novos conhecimen-
tos, sempre haverá explicações razoáveis para os fenômenos sem necessidade de
qualquer força suprassensível.

Mesmo assim, diriam os cautelosos: como tu disseste, caro autor,


não há como saber sobre Deus. Se contra estas evidências plausíveis ele realmen-
te existir, e sua ausência seja uma oportunidade de fazermos por merecer a sal-
vação? Será que esta ambição de vir-a-ser Deus-que-ultrapassa-a-si-mesmo não é
mais radical tentativa de pecado original? Neste caso, poderíamos dizer que não
há como ter certeza. Assim como as evidências apontam para um mundo sem
Deus, criar o pós-homem aponta para estar de acordo com nossa constituição,
dada por Ele caso Ele exista. Quanto à salvação, jamais houve qualquer prova de
vida após a morte, logo contar com esta única e finita vida parece mais sensato.

Concedendo aos teístas que seja verdade que Deus existe, pergunto:
se Deus nos deu este poder criativo de manipular a nossa própria evolução, será
que não é este o caminho para voltarmos a ele? Por nossos próprios méritos de
modo muito mais árduo, realista e merecedor chegaríamos a ele neste mundo e
não em outro, construindo nossa deidade ao custo de séculos ou milênios de re-e-
54 volução artificial. Ademais, Deus tornou-se irrelevante para as nossas decisões e
concepções sobre o absoluto enquanto máxima totalidade radical. Uma vez que
O ABSOLUTO E O PÓS-HOMEM

percebemos que nem mesmo Deus seria suficiente para igualar-se a algum-todo-
nenhum-ser-não-ser-aquém-entre-além-imanente-transcendental-a-si-mesmo.

Além disso, a criação do pós-homem é independente da existência de


qualquer deidade. Deus é o ideal humano, portanto, esta é a parcialidade de verda-
de, falsidade e incompletude nos quais milhares de homens de gênio buscaram cer-
teza. Num certo sentido, os medievais, tentando definir o conceito de Deus, fizeram
algumas formulações incompletas sobre a totalidade. Ao invés de investigarem o
absoluto enquanto máxima totalidade radical concebendo-incorporando algum-to-
do-nenhum-aquém-entre-além-ser-não-ser-imanente-transcendental-a-si-mesmo,
pensaram em um único ser absoluto. Estavam falando do que sempre estivemos
em busca na maior parte do tempo inconscientemente: do desejo de vir-a-ser Deus.
Concebido-incorporadoalgum-todo-nenhum-aquém-entre-além-ser-não-ser-trans-
cendental-a-si-mesmo transformamos nosso antigo desejo mais ambicioso. Agora
queremos vir-a-ser Deus-que-ultrapassa-a-si-mesmo.

A intuição do absoluto, mesmo inconscientemente, moveu esses ho-


mens do período medieval a pesquisar sobre um conceito. Atrever-nos-emos a di-
zer que, a despeito do limitado conhecimento do Oriente, em algumas das culturas
orientais o absoluto é melhor compreendido do que no Ocidente, pois a concepção
de Deus é a de um ser imanente e transcendente ao mundo ao mesmo tempo. Já o
Deus da tradição Cristã e da tradição filosófica ocidental está fora do mundo sensí-
vel e teria apenas o criado com suas magníficas intuição e benevolência infinitas.
I.XI

DEUS-QUE-ULTRAPASSA-A-SI-MESMO
55

O ABSOLUTO E O PÓS-HOMEM
Deus, em qualquer tradição ocidental ou oriental, não seria o ser
mais perfeito, o maior ser que é ou, em último caso, o conceito ideal que reúna
todas as propriedades máximas que um ser poderia possuir? Por exemplo, na
tradição judaico-cristã, Deus é onipotente, onisciente, onipresente. Contudo, esta
entidade não possui matéria, portanto está fora do mundo sensível apesar de es-
tar onipresente no mesmo. O que poderia parecer uma contradição lógica, não
o é. Deus se conecta de fora com cada evento de cada cadeia causal do mundo
simultaneamente. Assim como no lado oriental, onde temos estruturas em que
Deus, mundo e alma humana são uma unidade; como também são uma dualida-
de, na versão cristã em que a hierarquia se constrói por Deus e mundo sensível
subordinado a ele.

Nenhuma destas concepções tradicionais contempla o absoluto en-


quanto máxima totalidade radical, o qual não é nem a unidade entre Deus e mun-
do, e nem a dualidade entre Deus e mundo, sendo toda possibilidade de quanti-
dade de ser e não ser, assim como toda possibilidade de gradação de qualidade
de ser e não ser, imanente e transcendente a todas estas possibilidades de quan-
tidade e gradação de qualidades em fusão. A explosão e implosão dos conceitos
mais gerais da linguagem ser e não ser. Para nós, que incorporamos-concebemos
algum-todo-nenhum-aquém–entre-além-ser-não-ser-imanente-transcendental-
-a-si-mesmo, unidade ou dualidade não são suficientes para descrever o absolu-
to enquanto máxima totalidade radical, pois a dualidade e a unidade ainda não
escapam o âmbito da lógica, e o absoluto enquanto máxima totalidade radical é
composto de aspectos lógicos, ilógicos e alógicos, o que significa que o absoluto,
enquanto máxima totalidade radical, é lógico-ilógico-alógico.

Todavia, vimos que para nós que transformamos nossa antiga vi-
são de mundo que poderia ser una ou dualista em algo muito mais complexo
de possibilidades, estas visões de mundo estão ultrapassadas. Para nós, o mun-
do entendido pelo nosso universo na sua totalidade de possibilidades que são
lógicas, ilógicas e alógicas não é equivalente à totalidade de possibilidades. So-
mente o absoluto enquanto máxima totalidade radical é equivalente à totalidade
de possibilidades. Isto inclui não só o nosso universo em seus aspectos lógicos,
ilógicos e alógicos, como todo universo possível em seus aspectos lógicos, ilógi-
56 cos e alógicos, assim como o nada interno ou externo a este universo em seus
aspectos lógicos, ilógicos e alógicos e a todo universo possível em seus aspectos
O ABSOLUTO E O PÓS-HOMEM

lógicos, ilógicos e alógicos, além de todo pensamento possível em seus aspectos


lógico, ilógico e alógico e toda ação possível em seus aspectos lógica, ilógica e aló-
gica. Por isso, Deus, que é sempre o máximo conceito lógico no ocidente ou, em
algumas versões, o máximo conceito uno no oriente, não é mais suficiente para
atingir a verdade absoluta e a completude absoluta do absoluto enquanto máxi-
ma totalidade radical, pois a verdade absoluta e a completude absoluta só podem
ser propriedades de uma entidade capaz de igualar-se a algum-todo-nenhum-a-
quém–entre-além-ser-não-ser-imanente-transcendental-a-si-mesmo. Isso exige
que esta entidade seja lógica-ilógica-alógica para igualar-se ao absoluto enquanto
máxima totalidade radical que é lógico-ilógico-alógico. Absoluto, esse composto
deste universo lógico-ilógico-alógico, de todo universo possível lógico-ilógico-aló-
gico, assim como do nada interno ou externo a este universo lógico-ilógico-alógi-
co e a todo universo possível lógico-ilógico-alógico, de todo pensamento possível
lógico-ilógico-alógico e de toda ação possível lógica-ilógica-alógica. Assim, Deus
era o conceito ideal, o qual era capaz de estar no todo, saber o todo e possuir
o todo, a verdade absoluta e a completude absoluta na antiga visão de mundo.
Para nós que concebemos-incorporamos algum-todo-nenhum-aquém–entre-
-além-ser-não-ser-imanente-transcendental-a-si-mesmo, todo é apenas uma das
partes que compõem o absoluto em sua máxima totalidade radical. Portanto,
Deus-que-ultrapassa-a-si-mesmo será o nosso novo ideal. O ideal daqueles que
transformaram a visão de mundo no aceno-onipresente-da-onisciência-de-mun-
dos. Deus-que-ultrapassa-a-si-mesmo é capaz de ser a verdade absoluta e a com-
pletude absoluta do absoluto enquanto máxima totalidade radical, pois é capaz
de igualar-se a algum-todo-nenhum-aquém–entre-além-ser-não-ser-imanente-
transcendental-a-si-mesmo.
I.XII

POSSIBILIDADES PARA EXISTÊNCIA DE INFINITOS UNIVERSOS


57

O ABSOLUTO E O PÓS-HOMEM
É possível, através da experiência empírica, aceitar a afirmação on-
tológica: todo ser carrega a potencialidade de não ser. Estamos interessados no
conceito de ser da Ontologia. Para tanto, utilizaremos duas concepções de ser32. Na
primeira, como o que está presente na experiência de vida do homo sapiens finito e
histórico pelo menos em algum ponto no espaço e no tempo no qual viveu. São algu-
mas relações de sua compreensão de si: como um, com a multiplicidade de outros,
nesse todo ordenado que chama de mundo. Na segunda concepção, envolve toda e
qualquer coisa, assim como todo e qualquer pensamento atualizados neste universo,
em todo universo possível, ou no ser que possa haver fora de todo universo possível.
O não ser, neste caso, tem o significado determinado como aquilo que não existe,
ou o nada. Estamos a par de todas as controvérsias sobre o não ser de modo geral;
todavia, enquanto o nada, ele é o polo oposto desta relação binária e será dito por
nós, na primeira concepção, como o que não está presente na experiência de vida do
homo sapiens finito e histórico, pelo menos em algum ponto no espaço e no tempo
no qual viveu. O que não é alguma relação de sua compreensão de si: como um, com
a multiplicidade de outros, nesse todo ordenado que chama de mundo. Na segunda
concepção, não é uma coisa e não é um pensamento atualizados neste universo, em
todo universo possível, ou no ser que possa haver fora de todo universo possível.

Podemos pensar no surgimento de universos de várias formas.


Exemplo, que todo universo possível surja do nada. Outros universos podem exis-
tir sem que tenhamos acesso do nosso universo para eles. Isso significa que cada
possibilidade de universo é separada de outra possibilidade de universo. Se não
há ser fora deste universo existente ou fora dos universos possíveis, o que existe
está inserido neste universo e nos possíveis universos efetivamente existentes.
Ergo, para que haja separação de universos e que todos eles sejam a totalidade
do ser, a separação de um universo do outro só pode ser causada pelo não ser en-
quanto o nada, no qual este universo e os possíveis universos têm como “o outro

32
Falaremos mais das concepções ontológicas do ser na seção II.XII A questão do ser versus algum-todo-
nenhum-aquém-entre-além-ser-não-ser-imanente-transcendental-a-si-mesmo.
lado dos limites de si”. Se aceitarmos que o não ser carrega potencialidade para
ser, isso significa que de todo não ser, além dos limites de cada universo possível,
poderá nascer um novo universo, implicando uma possibilidade de infinitos uni-
58 versos surgirem de desagregações de não ser. Não ser é sem espaço e tempo. Não
é nem infinito nem finito, mas é capaz de trazer à tona infinitas possibilidades de
O ABSOLUTO E O PÓS-HOMEM

ser. Assim configurada, a totalidade é todos os universos possíveis, separados por


todo não ser possível que gerará infinitos novos universos. Isto é, se concebermos
o não ser sob o aspecto ontológico como conceito contrário ao ser, a potenciali-
dade para o ser poderá estar no não ser. A desagregação dos entes (do ser) e a de-
sagregação da privação de entes (do não ser) geram os movimentos do universo.

Podemos, também, refletir sobre a hipótese de haver ser fora deste


universo, assim como fora de todo universo possível, e deste ser surgirem os uni-
versos possíveis; poderíamos chamá-lo de “campo energético”, segundo alguns
físicos especulativos. Este campo energético se assemelharia ao primeiro motor
aristotélico, ou ao Deus de várias tradições. Porém, o campo energético postulado
pelos físicos é diferente de Deus, pois não tem qualquer consciência ou inten-
ção. No caso aristotélico, o primeiro motor é um pensamento que “pensa” sobre o
“pensar”, numa tradução livre; no caso do campo energético, não há pensamento.

Ou ainda, na física quântica, há outras possibilidades para existên-


cia de outros universos. Nesse caso, temos como exemplo elétrons no teste da
dupla fenda33: um único elétron é lançado e, como resultado, ele passa pelas duas
fendas ao mesmo tempo; haveria uma bifurcação em que este elétron chegaria
num ponto A deste universo e num ponto B em um outro universo, que se criaria
quando o elétron passa pelas duas fendas ao mesmo tempo, e assim teríamos um
número gigantesco de bifurcações criando muitos universos desde o Big Bang.

Por outro lado, as hipóteses que acabamos de ver estão dentro das
possibilidades da Física e da Filosofia tradicionais, ou melhor, da Física e da Me-
tafísica tradicionais. A compreensão exclusivamente racional do mundo nos obri-
gou a reduzir as nossas experiências empíricas, a própria realidade do mundo, as
possibilidades dualísticas lógicas, como: ser e não ser, verdade e falsidade, bem

33
Feynman’s double-slit experiment, este é o nome original do experimento. É possível encontrar mui-
to material na internet sobre o assunto, como no link: <http://physicsworld.com/cws/article/news/2013/
mar/14/feynmans-double-slit-experiment-gets-a-makeover>.
e mal, belo e feio. Com a concepção-incorporação de algum-todo-nenhum-aquém-
-entre-além-ser-não-ser-imanente-transcendental-a-si-mesmo atingida pela to-
talidade-do-nosso-ser-racional-intuitivo-pulsional-sensitivo-sensível-instintivo-
-imaginativo-místico-consciente-inconsciente-meditativo-volitivo, há a expansão 59
dessa dualidade, pois nós explodimos e implodimos os conceitos mais gerais da

O ABSOLUTO E O PÓS-HOMEM
linguagem ser e não ser. Assim, nós fragmentamos os sentidos existentes da e
para a linguagem, criamos novos sentidos da e para a linguagem e, doravante,
manteremos a possibilidade de criação de novos sentidos da e para a linguagem
para sempre em abertura. Assim como abrimos possibilidade de novos referentes
virem à tona, os quais antes jaziam velados.

Compreender a possibilidade de infinitos universos – multiverso -


brotando do nada, brotando de um campo energético ou pelas bifurcações das
partículas - entre outras hipóteses levantadas por físicos em todo mundo - é tam-
bém uma expansão do ser e não ser. Há ainda todas as possibilidades de gradação
nos processos de ser e não ser enquanto conceitos opostos. Os movimentos do ab-
soluto passam por estar aquém, entre, além, imanente e transcendental às grada-
ções de ser e se dá em todas as possíveis quantidades de ser; o não ser igualmente
passa por estar aquém, entre, além, imanente e transcendental a essas gradações
e se dá em todas as possíveis quantidades de não ser.

A possibilidade de infinitos universos existirem de fato, e não ape-


nas como possibilidades lógicas, é algo comum na Filosofia. Como já foi citado,
possuímos até mesmo um nome para o conjunto de defensores desta ideia: realis-
mo modal. Nós, todavia, queremos algo mais, queremos a expansão da linguagem
pela concepção-incorporação de algum-todo-nenhum-aquém-entre-além-ser-
-não-ser-imanente-transcendental-a-si-mesmo, pela qual transformamos a visão
de mundo no aceno-onipresente-da-onisciência-de-mundos, não nos permitindo
compactuar completamente com o realismo modal, pois nós acreditamos que
este universo, assim como todo universo possível, não é possível ou existente de
acordo com normas da lógica. Para nós, tanto este universo como todo universo
possível é ao mesmo tempo lógico, ilógico e alógico. Ergo, todo universo possível
ontologicamente é consistente-inconsistente-aconsistente, por isso o termo uni-
verso possível deve ter uma distinção. Precisamos acrescentar à expressão “uni-
verso possível” uma nova expressão “consistente-inconsistente-aconsistente”,
pois não acreditamos na lógica como necessidade ontológica da mesma maneira
que os defensores do realismo modal, e precisamos determinar essa diferença.
I.XIII

DEUS É O NADA OU O CAMPO ENERGÉTICO


60 EXTRAMULTIVERSO?
O ABSOLUTO E O PÓS-HOMEM

Deus, na tradição greco-romana-judaico-cristã, é o criador do mun-


do e o necessário criador de qualquer mundo possível, o que poderia ser o lugar
do nada ou não ser. O não ser carrega uma série de características semelhantes
à tradicional conceituação ocidental de Deus. O criador, nessa tradição, é eterno,
perfeito, absolutamente simples, e toda criação parte dele, tudo que existe é rea-
lização do que está no intelecto divino. Ele mesmo, todavia, não é material. Com
essas propriedades, é conceituado como o puro ser formal.

Como vimos no subtítulo anterior, é possível defender que o nada


tem a potencialidade de ser. Tudo o que é pode ser entendido como a desagrega-
ção de um sistema de privação de propriedades. A desagregação de um sistema
de privação de propriedades gera um sistema de não privação de propriedades.
A não privação de propriedades é equivalente a haver propriedades. Onde há
propriedades, há ser.

O nada só pode ser absolutamente simples, pois é apenas privação


de propriedades. Ele é igualmente eterno, pois só a matéria é afetada pelo tempo.
A privação não contém matéria, logo não é afetada pelo tempo. Aquilo que é afe-
tado pelo tempo é chamado de temporal, aquilo que não é afetado pelo tempo é
chamado de atemporal. A eternidade de Deus é fora do tempo, portanto atempo-
ral. Logo, o nada é eterno, simples e gera todo o ser quando é desagregado.

É claro que os defensores da metafísica tradicional diriam: “Deus é


ser formal não é não ser. Não ser não produz ser.” Ora, um ser formal não passa
de um conceito tão vazio quanto o não ser. Na experiência empírica, nunca po-
demos entrar em contato com um ser formal. Temos a experiência diária do não
ser de dois modos: o primeiro modo, mais fraco, se dá a cada momento que as
coisas do mundo mudam, de uma maneira que um homo sapiens histórico e finito
possa ser capaz de perceber, havendo perda de propriedades e aquisição de novas
propriedades; o segundo, modo mais forte, se dá quando alguma coisa muda o su-
ficiente para perder a sua identidade, ou perder o seu “tipo” ou sua “essência”34,
e se transforma em uma(s) nova(s) coisa(s) com uma(s) nova(s) identidade(s).
Até então, teríamos muitas razões para acreditar mais no não ser do que num ser
formal. Coisas e propriedades de coisas existem e deixam de existir, assim como 61
coisas e propriedades de coisas não existem e passam a existir. Tais experiências

O ABSOLUTO E O PÓS-HOMEM
vividas diariamente podem permitir uma associação mental entre ser e não ser,
a ponto de ambos possuírem uma possibilidade de relação causal, enquanto que
ser formal, isto é, existência sem matéria nunca pode ser experimentada de forma
alguma, pois sua própria definição exige estar fora do mundo.

Muito mais perto do papel de Deus como o puro ser formal está a hipó-
tese do ser enquanto campo energético fora dos possíveis universos. Inclusive, se al-
gum dia conseguirmos descobrir a existência de ser fora dos universos possíveis, este
fará uma grande justiça às tradições aristótélica, cristã e, até mesmo, algumas versões
orientais de Deus que se assemelham muito à noção de primeiro motor aristotélica.

A diferença principal é que o primeiro motor é ser formal, não tem


matéria e tem pensamento; ou, nas versões cristãs ou orientais, deus tem cons-
ciência de si e do mundo. Já na concepção da Física, o ser fora dos universos
possíveis é energia pura sem pensamento e sem consciência de si ou do mundo.
Embora não saibamos, talvez possa ter várias propriedades semelhantes a Deus:
incriado, eterno, simples, imutável, criador dos mundos possíveis, mas com a di-
ferença crucial de não saber sobre si ou sobre o mundo, ser apenas energia pura
tão sem consciência quanto a matéria em geral.

Qual é, então, o objetivo de estabelecer esses comparativos entre o


nada, o campo energético extra multiverso e Deus? Na verdade, o objetivo é mos-
trar que a ideia de absoluto enquanto máxima totalidade radical, conceituada na
primeira seção, é maior que a ideia de Deus, pois a engloba e a transcende.

O absoluto concebido-incorporado como algum-todo-nenhum-a-


quém-entre-além-ser-não-ser-imanente-transcendental-a-si-mesmo é o caminho

34
Essência é o conceito da filosofia antiga que serve para determinarmos aquilo que forma a identidade
de um ser em particular ou de uma classe de seres tal como “homem”. Não podemos extrair essência de
objetos fabricados por nós, por exemplo, “caneta” não possui essência. Tipo entendemos como aquilo que
dá a classe de uma determinada coisa contemporaneamente para a filosofia analítica. Pode ser atribuído a
objetos fabricados por nós, como, por exemplo, “caneta”.
que abre o maior número de possibilidades de verdade e completude do absoluto
enquanto máxima totalidade radical. O que significa que, se Deus na tradição
ocidental é equivalente ao não ser enquanto o nada, ou o ser enquanto extra mul-
62 tiverso, então é apenas parte do absoluto e não equivalente a ele. Já em algumas
tradições orientais (a despeito do nosso parco conhecimento das mesmas, já ad-
O ABSOLUTO E O PÓS-HOMEM

mitido anteriormente), há uma completude maior para Deus, o conceituam como


imanente e transcendente ao mundo. O que significa que está dentro de cada ente
do mundo, isto é, pode ser comparado ao ser, ao mesmo tempo em que é infinito
e está fora do mundo e pode ser comparado ao não ser.

Todavia, já vimos que os conceitos mais gerais da linguagem ser e


não ser são insuficientes para nossos objetivos de abertura do maior número de
possibilidades de verdade e completude do absoluto enquanto máxima totalidade
radical. Portanto, explodimos e implodimos os conceitos mais gerais da linguagem
ser e não ser, e o resultado disso é a criação da expressão à qual a deidade suprema
deveria igualar-se para atingir o status desejado pelas religiões em geral. Para nós,
a verdade absoluta e a completude absoluta são acessíveis apenas a uma entidade
capaz de igualar-se a algum-todo-nenhum-aquém-entre-além-ser-não-ser-imanen-
te-transcendental-a-si-mesmo; essa entidade é Deus-que-ultrapassa-a-si-mesmo.

I.XIV

ALGUNS ESCLARECIMENTOS SOBRE AS PROPOSIÇÕES

Quando uma proposição é proferida, por exemplo: “Esta bola é ver-


melha”, nós olhamos para bola e conferimos: um, a coisa é uma bola; dois, é uma
bola com a propriedade cor vermelha. Isso para tradição é suficiente para que
possamos dizer que a proposição “Esta bola é vermelha” é verdadeira. Não há
nenhum problema com isso, pode-se dizer isso da bola. É um método bastante
útil de sistematizar a linguagem. O que pretendemos nesta obra não é invalidar
esta ideia tão útil e simples, nem pretendemos que, de agora em diante, as pes-
soas digam que esta proposição é parcialmente verdadeira, parcialmente falsa e
incompleta em suas conversas comuns do dia a dia.

Nosso objetivo é outro. O novo modo de valoração de verdade dis-


cutido neste livro visa manter viva a concepção-incorporação algum-todo-nenhum- 63
-aquém-entre-além-ser-não-ser-imanente-transcendental-a-si-mesmo enquanto

O ABSOLUTO E O PÓS-HOMEM
resposta ou caminho que abre infinitas novas possibilidades de verdade e comple-
tude a pergunta “O que é o absoluto?”. Pois, como já dito, a verdade absoluta e a
completude absoluta do absoluto enquanto máxima totalidade radical só pode ser
unidade indivisível. Qualquer divisão perde conexões tornando tal recorte parcial-
mente verdadeiro, parcialmente falso e incompleto em relação ao absoluto enquan-
to máxima totalidade radical. Todas as descrições da realidade, sejam exteriores, ou
sejam sobre estados mentais, são simplificações da complexidade que nos escapa.

Poderia citar uma coisa bastante sabida: a cor vermelha não está na
bola, é o resultado da interação da luz com o ente bola. Isso seria, no entanto, tam-
bém uma simplificação da bola vermelha determinada por axiomas da física. Esta,
por sua vez, reduz a realidade, a fim de servir suas previsões e construções úteis, a
propriedades quantificáveis. Portanto, a bola já é sempre muito mais do que uma
bola vermelha, seja do ponto de vista empírico da sensibilidade de quem a vê, ou
seja do ponto de vista científico que analisa apenas o ser enquanto este aspecto.

Trabalhando com a ciência e todas as suas limitações (entraremos


em detalhe sobre as limitações da ciência numa seção dedicada a ela), podería-
mos, entrando no mundo da física atômica, ainda dizer que ela é um conjunto
de átomos. Estes, por sua vez, são conjuntos de partículas que estão, de maneira
caótica, contidas nos mesmos. Para completar, há um enorme vazio separando
um átomo do outro, e um vazio muito maior – proporcionalmente - separando
uma partícula interna do átomo a outra partícula igualmente componente dele.

O retrato com mais proporção de verdade e completude teria que


descrever todos os movimentos dos átomos e suas partículas, trocando fluidos
com vazio, deixando de ser, formando novos seres com o ar, o chão onde bola
está pousada, as partículas de luz que permitem que a vermelhidão apareça a
meus olhos etc.. Isso ainda seria uma descrição da coisa em si, “Esta bola verme-
lha”, parcial e incompleta. Nem tentamos descrever a conexão deste ente com a
totalidade deste mundo, e, mesmo que o fizéssemos, essa descrição ainda seria
incomensuravelmente parcial e incompleta em relação a algum-todo-nenhum-a-
quém-entre-além-ser-não-ser-imanente-transcendental-a-si-mesmo.

Diriam os defensores da tradição: o que a bola vermelha tem a ver


64 com o absoluto enquanto máxima totalidade radical? A resposta é muito sim-
ples: só haveria verdade absoluta e completude absoluta se algum ser fosse capaz
O ABSOLUTO E O PÓS-HOMEM

de igualar-se a algum-todo-nenhum-aquém-entre-além-ser-não-ser-imanente-
transcendental-a-si-mesmo. Não conhecemos tal ser, e nem mesmo nosso con-
ceito ideal de ser (Deus) poderia igualar-se a algum-todo-nenhum-aquém-entre-
-além-ser-não-ser-imanente-transcendental-a-si-mesmo. Pois, para nós, apenas
Deus-que-ultrapassa-a-si-mesmo poderia igualar-se ao absoluto enquanto máxi-
ma totalidade radical. O homo sapiens finito e histórico poderá continuar dizen-
do que a proposição é verdadeira sic et simpliciter. Para nós, contudo, ela será
parcialmente verdadeira, parcialmente falsa e incompleta em relação ao abso-
luto enquanto máxima totalidade radical. Isso não nos impede de proferir fra-
ses normalmente como aqueles que não conceberam-incorporaram algum-todo-
nenhum-aquém-entre-além-ser-não-ser-imanente-transcendental-a-si-mesmo,
pois, como já dissemos, não negamos a utilidade dessa forma de valoração de
verdade, apenas negamos parcialmente sua verdade em relação ao absoluto en-
quanto máxima totalidade radical.

A manutenção das mudanças, as quais compreendemos como gan-


hos, obtidas pela incorporação-concepção de algum-todo-nenhum-aquém-en-
tre-além-ser-não-ser-imanente-transcendental-a-si-mesmo, tais como a parciali-
dade de verdade, parcialidade de falsidade e incompletude de toda proposição
em relação ao absoluto enquanto máxima totalidade radical, são acenos para os
sentidos da vida inteligente. Assim como a transformação da visão de mundo no
aceno-onipresente-da-onisciência-de-mundos.

O primeiro grande ganho com a formulação de algum-todo-nenhum-


-aquém-entre-além-ser-não-ser-imanente-transcendental-a-si-mesmo é, finalmen-
te, expressar em palavras aquilo que alguns homens especiais puderam experi-
mentar dentro de si, sem jamais serem capazes de transformar em linguagem essa
experiência. Eles não puderam expressar na linguagem aquilo que a totalidade-do-
nosso-ser-racional-intuitivo-pulsional-sensitivo-sensível-instintivo-imaginativo-
místico-consciente-inconsciente incorporou-concebeu, pois é um epoché sob certos
aspectos, o que torna indizível tal experiência. Incorporamos-concebemos algum-
todo-nenhum-aquém-entre-além-ser-não-ser-imanente-transcendental-a-si-mesmo
quando ultrapassamos as regras do falar, até então determinadas como as estruturas
do discurso inteligível, por meio da explosão e implosão dos conceitos mais gerais
da linguagem ser e não ser. Geramos a fragmentação dos sentidos existentes da e
para a linguagem, a criação de novos sentidos da e para a linguagem, assim como a 65
constante abertura para criação de novos sentidos da e para a linguagem, da mesma

O ABSOLUTO E O PÓS-HOMEM
maneira como abre possibilidade de novos referentes virem à tona, os quais antes
jaziam velados. Numa expansão inaudita das possibilidades da e para a linguagem,
aquele que concebe-incorpora terá a onipresença da imanência e transcendência
da finitude, infinitude e afinitude do absoluto enquanto máxima totalidade radical.

O segundo grande ganho é o de como superar a limitação de ser como


somos. A incorporação-concepção de algum-todo-nenhum-aquém-entre-além-ser-
-não-ser-imanente-transcendental-a-si-mesmo dá-nos acesso onisciente da limitação
e do ultrapassamento de nós mesmos, de todo homo sapiens finito e histórico que
conceber-incorporar algum-todo-nenhum-aquém-entre-além-ser-não-ser-imanente-
transcendental-a-si-mesmo. A onisciência da nossa limitação e do nosso ultrapassa-
mento permite que conceituemos os sentidos individual e geral para vida inteligente.

O terceiro grande ganho (diretamente ligado a esta seção) é a grande


moderação tolerante em relação a toda proposição que passa a ser parcialmente
verdadeira, parcialmente falsa e incompleta em todas as possibilidades de pro-
porção de verdade, falsidade e completude. Cada proposição terá a sua proporção
específica de verdade, de falsidade e de completude em relação ao absoluto en-
quanto máxima totalidade radical.
I.XV

DA EVOLUÇÃO DO CONHECIMENTO – DO DESEJO INCONSCIENTE


66 DE VIR-A-SER DEUS PARA O DESEJO ONIPRESENTE DE VIR-A-
SER DEUS-QUE-ULTRAPASSA-A-SI-MESMO
O ABSOLUTO E O PÓS-HOMEM

É inegável que, dentro de suas limitações, o homem foi capaz de


evoluir em relação ao conhecimento. É inegável também que muito do conhe-
cido foi igualmente perdido com passar do tempo pelas mais variadas razões:
esquecimento, dificuldade de registro, desuso, desatenção, mudanças culturais,
de crenças, de paradigmas, de dogmas.

A síntese da história do conhecimento é, apesar das incomensurá-


veis perdas, uma evolução. Evolução, definiremos como acúmulo de descrições
parcialmente verdadeiras, parcialmente falsas e incompletas. Este acúmulo não
é uma simples complementação das ideias antigas com ideias novas, ele é muito
mais complexo, é um acúmulo errante, muitas vezes não compatível. Nós acredi-
tamos, porém, que, mesmo que ele seja um acúmulo errante, abra mais possibi-
lidades de verdade e completude de algum-todo-nenhum-aquém-entre-além-ser-
-não-ser-imanente-transcendental-a-si-mesmo do que se não houvesse qualquer
acúmulo e apenas mudássemos de crenças de tempos em tempos, esquecendo as
crenças antigas completamente.

Existem, todavia, diferentes concepções do conceito conhecimento.


Para os antigos, os sentidos sob condições ideais apreendiam a coisa; para os mo-
dernos, os sentidos perderam esse status, e a mente com suas representações era o
centro; nós, os pós-modernos, temos uma série de diferentes doutrinas filosóficas no
que tange ao conhecer. O que todas elas têm em comum do ponto de vista da tradição
da teoria do conhecimento é conectá-lo com crenças justificáveis racionalmente.

Iremos utilizar outra forma de conceituar o conhecimento. Visto que


adquirimos uma transformação da visão de mundo, a substituímos pelo aceno-o-
nipresente-da-onisciência-de-mundos. Religião, filosofia e ciência serão nossas
formas institucionalizadas de adquirir conhecimento enquanto descrições parcial-
mente verdadeiras, parcialmente falsas e incompletas de algum-todo-nenhum-a-
quém-entre-além-ser-não-ser-imanente-transcendental-a-si-mesmo. Cada uma
dessas formas institucionalizadas possui distintas proporções de verdade, falsida-
de e completude em relação ao absoluto enquanto máxima totalidade radical.
67
Toda e qualquer forma de conhecimento não institucionalizada

O ABSOLUTO E O PÓS-HOMEM
será por meio de descrições particulares parcialmente verdadeiras, parcialmente
falsas e incompletas de algum-todo-nenhum-aquém-entre-além-ser-não-ser-ima-
nente-transcendental-a-si-mesmo. Neste caso, não limitaremos o conhecimento
a descrições, as incorporações-concepções do absoluto enquanto máxima tota-
lidade radical podem se dar sem uma descrição correspondente, pois são parti-
culares de cada indivíduo homo sapiens finito e histórico. Elas se dão por meio
totalidade-do-nosso-ser-racional-intuitivo-pulsional-sensitivo-sensível-instinti-
vo-imaginativo-místico-consciente-inconsciente-meditativo-volitivo.

Admitimos que toda proposição é parcialmente verdadeira, parcial-


mente falsa e incompleta em relação ao absoluto enquanto máxima totalidade
radical. Podemos, assim, entender que arte e religião podem produzir conheci-
mento, assim como a ciência e a filosofia. A diferença estará na proporcionalida-
de de verdade, falsidade e completude. As primeiras são mais facilmente levadas
a menor proporcionalidade de verdade e completude e maior proporcionalidade
de falsidade por terem menos mecanismos racionais de segurança.

Analisando cada uma dessas formas institucionalizadas de criação


humana veremos as diferentes possibilidades de contribuição.

A religião, através de revelações de seus profetas, constitui leis e dog-


mas que dificilmente podem ser alterados, pois eles são considerados revelações de
Deus, ou apenas revelações místicas. Obviamente aquilo que é aceito sem qualquer
forma de crítica como verdades divinas ou místicas terá menores proporções de ver-
dade, completude e maiores proporções de falsidade. Todavia, as revelações lidam
com o sentido obscuro da vida inteligente de vir-a-ser a Deus de forma inconsciente
e mítica, trazendo, se bem depuradas, grandes contribuições neste sentido.

Na verdade, o que os religiosos chamam de revelação é in-


corporado-concebido de algum-todo-nenhum-aquém-entre-além-ser-não-
ser-imanente-transcendental-a-si-mesmo pelos profetas por meio da
totalidade-do-seu-ser-racional-intuitivo-pulsional-sensitivo-sensível-instintivo-
-imaginativo-místico-consciente-inconsciente. Neste processo, a razão é muito
pouco acionada enquanto poder crítico de analisar as revelações. Obviamente
estes são os diamantes brutos das doutrinas, depois, no processo de institucio-
68 nalização, os mais diversos colaboradores irão dar forma à fundação da religião
específica na qual creem ou, por alguma outra razão, seja ela poder, ambição,
O ABSOLUTO E O PÓS-HOMEM

entre outras muitas possíveis razões, têm interesse em tornar institucionalizada.

Por outro lado, a identificação absoluta com uma única religião tor-
na o homo sapiens finito e histórico ainda muito mais finito e histórico, pois o
cega diante de todas as outras religiões e formas de conhecimento institucionali-
zadas. A arte é mais livre das formas institucionalizadas de incorporar-conceber
algum-todo-nenhum-aquém-entre-além-ser-não-ser-imanente-transcendental-
-a-si-mesmo. Levaremos em conta o artista de gênio, isto é, o capaz de uma obra
original com poder de trazer novas descrições do absoluto enquanto máxima to-
talidade radical. Deixaremos de lado o artista clichê.

Então, o artista de gênio, por meio da totalidade-de-seu-ser-racio-


nal-intuitivo-sensitivo-sensível-imaginativo-místico-consciente-inconsciente,
cria obras únicas. Neste processo, diferentemente do processo de revelações di-
vinas ou místicas do profeta, existem observações de conceitos racionais criados
historicamente pelos movimentos artísticos e às vezes até mesmo por um único
artista. Há também um maior acionamento do poder crítico da razão de avaliar a
qualidade do que está sendo expressado, e, nos melhores artistas, há uma grande
abertura de possibilidades de verdade e completude do absoluto enquanto máxi-
ma totalidade radical em suas obras.

A filosofia nasceu para ser a mãe das ciências, para tratar dos temas ra-
cionais mais importantes da razão: metafísica, teoria do conhecimento, ética, política,
lógica, estética, poderiam ser ditas como as principais disciplinas historicamente da
filosofia. Embora sempre calcada na razão, demonstrou-se incapaz de produzir certe-
zas, o grande sonho dos filósofos dogmáticos. Isto é, os que acreditam numa verdade
objetiva e que são os componentes da principal tradição filosófica de Sócrates, Platão
e Aristóteles a Frege, Russell, Wittgenstein e os analíticos contemporâneos.

A filosofia tradicional possui instrumentos lógicos que são capazes


de instituir um rigor que permite alta segurança ao discurso. Embora os temas de
que trate possuam tamanha abstração do mundo empírico que não sejam com-
prováveis, havendo diferentes paradigmas filosóficos ao longo da história. Estes
estiveram sempre servindo de base ou primeiros princípios e axiomas à cultura
e à ciência ao longo dos tempos. Para alguns nos dias de hoje, ao fim e ao cabo, é
apenas a faxineira do bom pensar, abrindo caminho para as ciências. Para outros, 69
ainda é a única possibilidade de abordar o ser enquanto conceito mais geral, ba-

O ABSOLUTO E O PÓS-HOMEM
silar e obscuro do projeto de desvelamento da verdade.

É uma das formas mais importantes de pensar sobre o absoluto


enquanto máxima totalidade radical. Embora, algum-todo-nenhum-aquém-en-
tre-além-ser-não-ser-imanente-transcendental-a-si-mesmo requeira sob certos
aspectos a suspensão do juízo lógico, ou a realização de um epoché. Esta formula-
ção é inspirada na metafísica clássica, logo imanente a mesma. Todavia, tão ultra-
passante de si mesma que deve ser transcendental a qualquer projeto metafísico
representando a iluminação de cada possibilidade humana.

Por fim, entre as formas institucionalizadas, temos a ciência, a


forma mais bem equipada em termos de método e mais específica no modo de
compreender algum-todo-nenhum-aquém-entre-além-ser-não-ser-imanente-
transcendental-a-si-mesmo. Mesmo com alto grau de incompletude, ela possui os
resultados mais seguros já elaborados pelo homem, tendo a capacidade de mani-
pular entes para a busca de novos objetos previstos em seus cálculos ou suas pro-
posições. Ela será de grande valia para o nascimento do pós-homem, por meio de
suas propriedades de manipular os entes com resultados previsíveis, guiada pela
incorporação-concepção de algum-todo-nenhum-aquém-entre-além-ser-não-ser-
-imanente-transcendental-a-si-mesmo poderá dar à luz a nossa superação.

Não institucionalmente falando, algum homo sapiens finito e his-


tórico tem ao longo de sua vida novas incorporações-concepções constantes de
algum-todo-nenhum-aquém-entre-além-ser-não-ser-imanente-transcenden-
tal-a-si-mesmo com as mais variadas proporções de verdade, de falsidade e de
completude nas suas crenças. Talvez o indivíduo particular (homo sapiens finito
e histórico) seja o ente que tenha maior completude na sua totalidade enquanto
ser em relação a algum-todo-nenhum-aquém-entre-além-ser-não-ser-imanente-
transcendental-a-si-mesmo; todavia, suas proposições ao utilizar a linguagem
não possuem nem o menor compromisso com a verdade e com a completude, e
nenhum método rigoroso de controle de enganos ou acertos.
Há, entretanto, uma crença da qual todo homem particular em sua fi-
nitude, em seu momento histórico, sempre soube e que é de grande valia para nosso
projeto. Todo homo sapiens histórico e finito sempre soube de sua limitação diante
70 do mistério da existência, ele fez sempre parte de algum-todo-nenhum-aquém-en-
tre-além-ser-não-ser-imanente-transcendental-a-si-mesmo sem jamais ter uma de-
O ABSOLUTO E O PÓS-HOMEM

terminação exata da ideia mística de totalidade que carregava no seu ser. Nasceu
ignorante quanto às principais perguntas; mesmo que fiel a alguma explicação reli-
giosa, morreu com dúvidas quanto a cada uma delas. Portanto, dentro de nós, sempre
houve o desejo velado, inconsciente, de finalmente possuir a revelação do mistério, o
que só pode ser traduzido numa ação ainda muito menor em relação à tal impotência:
criar nosso sucessor, e este, o seu sucessor, para que haja ainda uma esperança de que
a vida inteligente chegue a vir-a-ser Deus-que-ultrapassa-a-si-mesmo.

O que é a evolução do conhecimento humano e por que este nunca


ultrapassará a humanidade? Pois ser humano é ser finito. O absoluto enquanto
máxima totalidade radical é imanente e transcendental ao finito, infinito e afi-
nito. O ser humano só é capaz de pensar de modo sucessivo no tempo. Por esta
razão, só é capaz de pensar em um objeto em cada momento no tempo. Para atin-
gir a verdade absoluta e a completude absoluta do absoluto enquanto máxima
totalidade radical, é necessário ser para além de Deus, que é eterno e, ainda sim,
limitado a princípios lógicos. Geralmente, para os teóricos Deus é lógico ou ilógi-
co. Jamais é tanto lógico quanto ilógico, muito menos lógico, ilógico e alógico. O
absoluto enquanto máxima totalidade radical é lógico-ilógico-alógico. Para igua-
lar-se a algum-todo-nenhum-aquém-entre-além-ser-não-ser-imanente-transcen-
dental-a-si-mesmo é necessário ser Deus-que-ultrapassa-a-si-mesmo.

Dentro do espaço de nossa finitude, podemos infinitamente descobrir


e esquecer novas verdades parciais, que igualmente serão parcialmente falsas e in-
completas em relação ao absoluto enquanto máxima totalidade radical. Com a to-
talidade-do-nosso-ser-racional-intuitivo-pulsional-sensitivo-sensível-instintivo-ima-
ginativo-místico-consciente-inconsciente-meditativo-volitivo, abriremos caminho
para inauditas possibilidades de algum-todo-nenhum-aquém-entre-além-ser-não-ser-
-imanente-transcendental-a-si-mesmo; mas não recuperaremos todas as antigas pos-
sibilidades perdidas no passado, pois nossa finitude é espacial e temporal. Espacial,
dado que somos limitados pelo corpo e pelo tempo, nosso ser é no presente rumo ao
futuro. O que não foi registrado por nossos antepassados estará perdido. É provável,
que de modo geral, tenhamos muito mais acúmulo do que perda. Nunca sairemos
deste espaço delimitado pela nossa finitude; por mais que incessantemente procure-
mos novas verdades, sempre estaremos limitados a nossa humanidade.

O único movimento para ultrapassar esses limites é incorporar-con- 71


ceber por meio da totalidade-do-nosso-ser-racional-intuitivo-pulsional-sensitivo-

O ABSOLUTO E O PÓS-HOMEM
sensível-instintivo-imaginativo-místico-consciente-inconsciente e outras forças
ou formas de ser que possam ser atualizadas mesmo desconhecidas algum-todo-
nenhum-aquém-entre-além-ser-não-ser-imanente-transcendental-a-si-mesmo.
Diante da transformação da visão de mundo em o aceno-onipresente-da-onis-
ciência-de-mundos, tanto a consciência de limite quanto de ultrapassamento de
si mesmo deverão tornar-se onipresente no nosso ser. Saberemos igualmente que
poderemos, no máximo, criar nosso próprio sucessor nesta busca de verdade e
completude. Busca incessante de igualar-se a algum-todo-nenhum-aquém-entre-
-além-ser-não-ser-imanente-transcendental-a-si-mesmo.

Com a generosidade adquirida da grande moderação tolerante, sa-


bemos, também, que toda e qualquer crença humana é parcialmente verdadeira,
parcialmente falsa e incompleta.

Por fim, nesta evolução do conhecimento, descobrimos a única


possibilidade de superação de nós mesmos: criar aquele que irá nos suceder, o
pós-homem, buscando que este nos ultrapasse em relação a totalidade-do-nosso-
ser-racional-intuitivo-pulsional-sensitivo-sensível-instintivo-imaginativo-místi-
co-consciente-inconsciente. Então, que o pós-homem seja capaz de criar aquele
que o superará e, assim por diante, até que deixemos de existir ou nos transfor-
memos em Deus-ultrapassa-a-si-mesmo.
I.XVI

NOVAS POSSIBILIDADES DE COMPREENDER SER E NÃO SER


72
O ABSOLUTO E O PÓS-HOMEM

Na tradição filosófica, o ser é o conceito mais geral e mais obscuro.


Podemos dizer que ser está presente de diversas formas em todos os entes do
mundo, sejam eles animados (inteligentes ou não) ou inanimados: nas proprie-
dades dos entes; nos entes em si; em relações entre propriedades dos entes; em
relações entre entes em si; naquilo que compreendemos por mundo; nos pensa-
mentos, sejam proposições ou imagens representacionais, sejam reais ou ficcio-
nais; e nas ações. Não é à toa que não há respostas definitivas sobre o ser, pois o
conceito de não ser é tão obscuro quanto o ser. A tradição costuma não discursar
sobre o não ser enquanto o nada, mas o faz de diversas formas, como possibilida-
de do discurso falso, como uma forma de alteridade do ser, enquanto alguma for-
ma de negação de ser, entre outras. Assim, estaria dado o mundo como dividido
por esses dois conceitos mais gerais formulados até hoje. Obviamente, diferentes
pensadores em diferentes épocas abordaram os conceitos mais gerais e primeiros
da filosofia de diferentes modos.

Há quem julgue não fazer qualquer sentido falar sobre conceitos tão
gerais. É possível defender que o ser é um conceito vazio, não agrega nada perten-
cer ao conjunto lógico do ser. A não ser aquilo que já está dado num ente quando
estamos diante dele: estar-aí-no-mundo. O não ser é ainda mais complicado; al-
guns dizem que não se pode falar diretamente sobre ele, pois enquanto conceito
deduzido da negação do ser, não tem propriedades.

Na experiência deste universo, é inegável que chamamos - apesar


de todas as possíveis críticas - a totalidade de entes que o compõem de ser. Aquilo
que existe. Referimo-nos ao que existe externamente a nós e ao que existe em
nós, tanto nosso próprio ser e as propriedades que o compõem, como nossos pen-
samentos. Obviamente, o ser está presente nas ações também. Os movimentos
que geram a sua desintegração trazem à tona o não ser enquanto aquilo que não
existe, pois tudo aquilo que existe na nossa experiência empírica num determi-
nado momento no tempo (t1) não existia, sendo que em outro determinado mo-
mento no tempo (t2) passou a existir e em outro determinado momento no tempo
(t3) pereceu não existindo mais. Até aqui não há nada de novo, estamos falando
de concepções comuns para a Filosofia.

Aos que incorporam-concebem algum-todo-nenhum-aquém-en- 73


tre-além-ser-não-ser-imanente-transcendental-a-si-mesmo se dá uma expansão

O ABSOLUTO E O PÓS-HOMEM
das possibilidades que eram, até então, binárias. Ou, então, predicávamos ser ou
predicávamos não ser de algo. No máximo, havia a indeterminação entre esses
dois conceitos na tradição filosófica. Nós, desde que incorporamos-concebemos
algum-todo-nenhum-aquém-entre-além-ser-não-ser-imanente-transcendental-
-a-si-mesmo, percebemos que são reduções da experiência do absoluto enquanto
máxima totalidade radical transformar todos os seus movimentos apenas em va-
riações de ser e não ser, ou quiçá indeterminação entre esses dois conceitos.

No âmbito da tradição, ainda é possível sustentar que o ser carrega


a potencialidade de não ser e ser outro que não o mesmo, assim como o não ser,
enquanto aquilo que não existe, carrega potencialidade de ser algo distinto da
privação de ser. No devir dá-se a atualização, criam-se novos entes, aniquilam-se
outros e dá-se a formação de novas potencialidades na sucessão do tempo. Sem
necessidade de aceitarmos uma doutrina de fluxo total, admitimos que há uma
identidade que permanece diante de propriedades que deixam de ser em cada
ente. Essa identidade permite a distinção dos entes do mundo, até que um deter-
minado ente tenha seu total aniquilamento enquanto tal, transformando-se em
outro que não o mesmo, ou outros, e gerando um novo vazio não ser.

A expansão se dá principalmente na compreensão de que cada


ente possui uma incomensurável quantidade de propriedades que gradam o ser
de modo muito mais complexo que apenas com a dualidade ser versus não ser.
Nestes processos cíclicos, escapam das nossas possibilidades de apreensão movi-
mentos aquém, entre, além, ser não ser.

Ainda, nossa resposta à pergunta “o que é absoluto?” nos obriga a


admitir a possibilidade de outras formas de gradação que não são contempladas
nas categorias aquém, entre, além ser e não ser, pois a nossa resposta é um ca-
minho que abre infinitas possibilidades de verdade e completude do absoluto
enquanto máxima totalidade radical. Nossa visão de mundo foi transformada no
aceno-onipresente-da-onisciência-de-mundos; assim, expandimos a totalidade
que era constituída deste mundo, de pensamentos, ações e mundos logicamente
possíveis. Para nós, o absoluto enquanto máxima totalidade radical é constituí-
do em seus elementos mais gerais por este universo consistente-inconsistente-
-aconsistente, todo universo possível consistente-inconsistente-aconsistente, o
74 nada e o ser internos a este universo consistente-inconsistente-aconsistente, o
possível nada e o possível ser externos a este universo consistente-inconsistente-
O ABSOLUTO E O PÓS-HOMEM

-aconsistente e a todo universo possível consistente-inconsistente-aconsistente,


o possível nada e o possível ser internos a todo universo possível consistente-in-
consistente-aconsistente, todo pensamento possível consistente-inconsistente-a-
consistente e toda ação possível consistente-inconsistente-aconsistente. Tama-
nha complexidade de possibilidades traz à tona que o absoluto enquanto máxima
totalidade radical deve, além das gradações, conter todas as possibilidades lógi-
cas de quantidade: algum, todo, nenhum. Simultaneamente, para que não haja
quantidades alienígenas ao absoluto enquanto máxima totalidade radical. Obvia-
mente, há um problema lógico nesta fusão de quantidades, que não é problema
para nós, pois, como descrevemos, o absoluto é lógico-ilógico-alógico.

Com a concepção dessa nova totalidade, precisamos acrescentar a


imanência aos movimentos do absoluto, pois este universo, de onde viemos, é
interno a nossa experiência e, imaginando as possibilidades das quais infinitos
universos possam brotar do nada, do ser enquanto campo energético extra multi-
verso, ou no movimento dos elétrons (como nas hipóteses de multiverso da física
quântica, universos que podem expandir-se e contrair-se eternamente), precisa-
mos acrescentar a ideia de transcendência da nossa experiência neste universo.

Finalmente, fundindo todos os atributos mais gerais do absoluto en-


quanto máxima totalidade radical, chegamos ao já incorporado-concebido algum-
todo-nenhum-aquém-entre-além-ser-não-ser-imanente-transcendental-a-si-mes-
mo. O ultrapassamento de si mesmo. O ultrapassamento do próprio homem.

Ser versus não ser, verdade versus falsidade, certo versus errado, belo
versus feio tomam finalmente seu lugar de simplificadores do absoluto enquanto
máxima totalidade radical, recortes que fizemos para adequá-lo à compreensão
do intelecto humano.
I.XVII

DA INCOMENSURABILIDADE DA POSSIBILIDADE DE EXPANSÃO


DE ALGUM-TODO-NENHUM-AQUÉM-ENTRE-ALÉM-SER-NÃO- 75

SER-IMANENTE-TRANSCENDENTAL-A-SI-MESMO

O ABSOLUTO E O PÓS-HOMEM
Objetivo é descrever na linguagem uma experiência que, somente
sendo reduzida em riqueza existencial, poderá simbolizar algo incomensurável.
É a experiência de incorporação-concepção de algum-todo-nenhum-aquém-en-
tre-além-ser-não-ser-imanente-transcendental-a-si-mesmo pela totalidade-do-
nosso-ser-racional-intuitivo-pulsional-sensitivo-sensível-instintivo-imaginativo-
místico-consciente-inconsciente e outras forças ou formas de ser que possam ser
criadas ou descobertas no homo sapiens finito e histórico. Esta experiência não
pode ser descrita na linguagem sem uma drástica redução em relação a incorpo-
ração-concepção em si do absoluto enquanto máxima totalidade radical.

Por isso, algum-todo-nenhum-aquém-entre-além-ser-não-ser-ima-


nente-transcendental-a-si-mesmo é a expressão criada como caminho e aceno ao
absoluto enquanto máxima totalidade radical. Queremos lidar com todas as possi-
bilidades lógicas, ilógicas e alógicas, essa é a expansão dos limites da linguagem.
Ser e não ser; verdade e falsidade; certo e errado; belo e feio. O caminho aberto por
algum-todo-nenhum-aquém-entre-além-ser-não-ser-imanente-transcendental-a-si-
mesmo é tão radical que seu desvelamento absolutamente verdadeiro e absoluta-
mente completo é toda possibilidade de desvelamento absolutamente verdadeiro e
absolutamente completo. O absoluto, enquanto máxima totalidade radical, deve ter
todos os sentidos da e para a linguagem, a fragmentação destes sentidos, a criação
de novos sentidos e a constante abertura para criação de novos sentidos da e para a
linguagem. Os novos sentidos da e para linguagem apontam para possibilidade de
novos referentes nesta nova totalidade, entidades que jaziam veladas pela redução
da linguagem binária. Provisoriamente, o caminho do nosso ultrapassamento será
expressado assim: algum-todo-nenhum-aquém-entre-além-ser-não-ser-imanente-
transcendental-a-si-mesmo todo e qualquer acréscimo será bem-vindo, se propor-
cionar novas possibilidades de verdade e completude do absoluto enquanto máxima
totalidade radical, obviamente queremos acrescentar novos vocábulos a esta expres-
são se os mesmos trouxerem novos sentidos que ainda permaneçam velados.
O absoluto enquanto máxima totalidade radical é o ultrapassa-
mento da nossa mundanidade, expressá-lo como algum-todo-nenhum-aquém-
-entre-além-ser-não-ser-imanente-transcendental-a-si-mesmo é um caminho de
76 abertura de possibilidades de verdade e completude para expressar o que antes
nunca havia sido expressado. Provisório, por ultrapassar qualquer possibilidade
O ABSOLUTO E O PÓS-HOMEM

de simbolização sem que os símbolos percam verdade e completude.

Já que estamos lidando com o ultrapassar do homem, isso não pode


ser expresso no discurso corrente da filosofia que respeita a regras da lógica ou
pelo menos objetiva respeitá-las, visto que não é de modo puramente analítico
que se dá este ultrapassar. O modo como concebemos a capacidade de expressar
proposições com sentido, pelo menos tradicionalmente, é por definição incompa-
tível com o epoché sob certos aspectos. A saber, aspectos estes que são os aspectos
ilógicos e alógicos do absoluto enquanto máxima totalidade radical. Esta suspen-
são lógica que compõe algum-todo-nenhum-aquém-entre-além-ser-não-ser-ima-
nente-transcendental-a-si-mesmo é movida pelo desejo teleológico de vir-a-ser
Deus-que-ultrapassa-a-si-mesmo para igualar-se a algum-todo-nenhum-aquém-
-entre-além-ser-não-ser-imanente-transcendental-a-si-mesmo. Sabendo que o
caminho é muito longo e incerto rumo a este cume teleológico, esta expressão
é um caminho, um aceno. Ela designa a máxima abertura de possibilidades de
sentidos da e para a linguagem: afirmações, negações, contradições, tautologias
com todas as possibilidades de gradação (aquém, entre, além) de ser e não ser;
afirmações, negações, contradições, tautologias com todas as possibilidades ló-
gicas de quantidade (algum, todo, nenhum) aquém, entre, além, ser e não ser;
afirmações, negações, contradições, tautologias imanentes e transcendentes às
possibilidades lógicas-ilógicas-alógicas deste universo, do nada interno a este
universo lógico-ilógico-alógico, de todo universo possível lógico-ilógico-alógico,
do nada possível externo a este universo lógico-ilógico-alógico e a todo universo
possível lógico-ilógico-alógico, do nada possível interno a todo universo possí-
vel lógico-ilógico-alógico, todo pensamento possível lógico-ilógico-alógico e toda
ação possível lógica-ilógica-alógica. A nossa expressão ainda carrega, por fim,
a capacidade de ultrapassar a si mesma, o que aponta o caráter provisório de
algum-todo-nenhum-aquém-entre-além-ser-não-ser-imanente-transcendental-
-a-si-mesmo como expressão que traz fragmentação, criação e abertura de pos-
sibilidades de criação de sentidos da e para a linguagem. Assim como abre possi-
bilidade de novos referentes virem à tona, os quais antes jaziam velados, os quais
serão novos objetos desta nova linguagem. Ao mesmo tempo, esta expressão é
parte da própria linguagem e será, enquanto tal, transformada pelas inovações
da e para linguagem que carrega em si mesma como representação da implosão e
explosão dos conceitos mais gerais da linguagem ser e não ser.
77

O ABSOLUTO E O PÓS-HOMEM
I.XVIII

SENTIDO DA VIDA INTELIGENTE

Definiremos o sentido da vida inteligente como objetivo, desígnio, pro-


pósito de existirmos individualmente e como o conjunto de indivíduos pertencentes
ao conjunto mais geral chamado de vida inteligente. Nós somos parte do subconjunto
dentro do conjunto mais geral da vida inteligente chamado pelo senso-comum de hu-
manidade ou homo sapiens e por nós de homo sapiens finito e histórico. Estendemos
estes sentidos individuais e gerais para toda vida inteligente, caso haja alguma além do
conjunto constituído por nós, pois acreditamos que estes sentidos se adequam a demais
formas de vida inteligente que possuam ao menos as mesmas forças que nos compõem.

Qual o sentido da vida? Esta é mais uma das perguntas eternas da


vida inteligente. Assim como todas as demais principais e clássicas perguntas, não
conseguimos achar uma resposta plenamente satisfatória para ela, uma vez que a
vida, como temos acesso empiricamente, é finita e silenciosa quanto a qualquer ra-
zão para nascermos e morrermos. Analisada através somente da experiência empí-
rica, ela é desprovida de qualquer sentido existencial. Logo, as respostas ao sentido
de existirmos foram geralmente dependentes da existência de três entidades: Deus,
alma e mundo suprassensível, cujas existências não podemos provar. Empirica-
mente, somos inclusive levados a crer que nenhum dos três existe. As muitas tenta-
tivas elaboradas ao longo da história de definir o sentido da vida ficaram vazias com
a retirada destas três entidades da argumentação filosófica na pós-modernidade.

Ao longo deste livro, para um leitor passivo, talvez ainda não tenha
ficado claro o sentido geral da vida inteligente, e consequentemente do seu sub-
conjunto chamado de humanidade.
Elaboramos, nas seções anteriores, as limitações cognitivas huma-
nas, não apenas racionais, mas da totalidade-do-nosso-ser-racional-intuitivo-pul-
sional-sensitivo-sensível-instintivo-imaginativo-místico-consciente-inconscien-
78 te-meditativo-volitivo. Incorporamos-concebemos nossa resposta à pergunta “o
que é absoluto?” enquanto máxima totalidade radical, passamos a ter presente o
O ABSOLUTO E O PÓS-HOMEM

ultrapassamento das limitações humanas. Por meio da incorporação-concepção


de algum-todo-nenhum-aquém-entre-além-ser-não-ser-imanente-transcenden-
tal-a-si-mesmo ultrapassamento e limitação serão onipresentes no nosso ser.

Sabendo disso, de que há algo apontado para além do humano, e


sabendo-nos incapazes de transpor tal incomensurável diferença de capacidades
para igualar-se ao absoluto enquanto máxima totalidade radical, o homem primei-
ro pensaria na sua superação, o pós-homem. Porém, este poderá ainda pouco em
relação à onisciência, à onipresença, à onipotência. “Oni” é o prefixo latim para
todo. Ora, o caminho que incorporamos-concebemos para o absoluto enquanto má-
xima totalidade radical tem o quantificador lógico “todo” apenas como parte desta
nova totalidade incorporada-concebida, portanto as propriedades onisciência, oni-
presença, onipotência que compõem o nosso conceito ideal chamado de Deus, mes-
mo estando incomensuravelmente além de nossas capacidades, ainda não são sufi-
cientes para a verdade absoluta e para a completude absoluta do absoluto enquanto
máxima totalidade radical, pois tais propriedades são apenas parte de algum-todo-
nenhum-aquém-entre-além-ser-não-ser-imanente-transcendental-a-si-mesmo.

Além disso, são limitadas pela lógica, enquanto o absoluto como máxima
totalidade radical é lógico-ilógico-alógico. Concluímos que a verdade absoluta e a com-
pletude absoluta dependem da existência de uma entidade que não seja apenas parte,
mas a qual seja capaz de igualar-se a algum-todo-nenhum-aquém-entre-além-ser-não-
ser-imanente-transcendental-a-si-mesmo. Uma entidade que deve superar Deus. No
entanto, não temos nenhum conceito que supere Deus, então criamos Deus-que-ultra-
passa-a-si-mesmo para designar tal entidade. Nós também sabemos que um ser assim,
ou pelo menos o mais próximo que conseguimos imaginar em nossa breve história da
humanidade, jamais poderia ser criado diretamente por nós ou pelo pós-homem. Ele terá
que criar sua respectiva superação e, assim, sucessivamente até que a vida inteligente
possa igualar-se a algum-todo-nenhum-aquém-entre-além-ser-não-ser-imanente-trans-
cendental-a-si-mesmo ou extinguir-se por causas naturais ou artificiais. Na nossa expe-
riência empírica, jamais tivemos contato com algum ente que não fosse aniquilado. Isto
é, na pior das hipóteses, a existência segue como sempre foi a nossa percepção.
Este é o sentido geral da vida inteligente: vir-a-ser Deus-que-ultra-
passa-a-si-mesmo, a máxima ambição nascida da incorporação-concepção de
algum-todo-nenhum-aquém-entre-além-ser-não-ser-imanente-transcendental-
-a-si-mesmo. Tudo bem, pois um homem igualmente finito e histórico do meu 79
tempo poderia perguntar: “afinal, o que nós homens contemporâneos e normais

O ABSOLUTO E O PÓS-HOMEM
ganharemos com isso?” Responderíamos, eu e o leitor atento, que simplesmente
igualar-se ao absoluto enquanto máxima totalidade radical. Isso significa ultra-
passar a onisciência, a onipotência e a onipresença do que concebíamos como
conceito ideal. Ele ainda argumentaria, “mas eu vou morrer em breve, em 20 ou
30 anos, estarei fora do mundo. Se não houver um Deus, não houver alma, ou
vida após a morte de qualquer forma eu estou fora para sempre da existência.”

Sim, mas se contribuirmos para o sentido geral da vida inteligente,


poderemos ser levados pelos nossos sucessores máximos para que todos nós das
diversas etapas re-evolutivas da vida inteligente possamos vir-a-ser Deus-que-ul-
trapassa-a-si-mesmo.

Novamente meu amigo falaria, “por que diabos um ser infinitamen-


te superior a nós teria qualquer lembrança de pobres homens como nós?”

Primeiro, igualar-se a algum-todo-nenhum-aquém-entre-além-ser-


-não-ser-imanente-transcendental-a-si-mesmo é o absoluto enquanto máxima
totalidade radical. Isso inclui a totalidade deste universo, a qual é composta, en-
tre outras propriedades, por passado, presente e futuro. Assim como de qualquer
universo que possua ou não possua uma dimensão temporal. Ou seja, não é uma
decisão de nos recompensar por termos feito nossa parte, é necessário estarmos
incluídos, pois não há o que não esteja.

Segundo, mesmo que o passado deste universo seja destruído com-


pletamente a medida que o tempo avança, é um risco que corremos. Mas não
estamos fadados a desaparecer nesta hipótese citada por ti mesmo? Por que não
correr o risco de impor nossa vontade enquanto parte do milagre da vida inteli-
gente? Assim, correremos o risco que esta eterna estrada do nada ao nada seja
finalmente controlada por nossos sucessores e não pelo acaso.

Obviamente, nosso papel é extremamente limitado, podemos ape-


nas criar o pós-homem e podemos fracassar nesta criação. Logo, devemos criar
um segundo sentido para vida. Este não mais geral, mas individual, para que
dentro de cada existência humana possa se ter a possibilidade de tirar o máximo
sumo da vida e não só dedicar-se algo incerto.
80
Para determinarmos melhor o sentido individual da vida inteligen-
O ABSOLUTO E O PÓS-HOMEM

te iremos introduzir uma subseção.

I.XVIII.I

A INTENSIDADE

Intenso: que se manifesta ou faz sentir com força, com vigor, com
abundância. Ativo, agudo, enérgico, extraordinário, forte, poderoso, profundo,
veemente, vigoroso, violento, vivo.

Conceituaremos como intensidade toda possibilidade que gera uma


maior agitação da totalidade-do-nosso-ser-racional-intuitivo-pulsional-sensiti-
vo-sensível-instintivo-imaginativo-místico-consciente-inconsciente. Isto é, tudo
aquilo que torna nosso ser mais vivo, o que abre mais possibilidades lógicas, iló-
gicas e alógicas de verdade e completude de algum-todo-nenhum-aquém-entre-
-além-ser-não-ser-imanente-transcendental-a-si-mesmo.

A intensidade nos aproxima dos limites da totalidade-do-nosso-ser-


-racional-intuitivo-pulsional-sensitivo-sensível-instintivo-imaginativo-místico-
consciente-inconsciente, além de gerar felicidade, prazer para alimentar nossa
sensibilidade, como diria Kant. Também geram conhecimento e poder.

Quando utilizamos nossas faculdades com vigor, podemos abrir mais


possibilidades lógicas, ilógicas, alógicas de verdade e completude de algum-todo-
nenhum-aquém-entre-além-ser-não-ser-imanente-transcendental-a-si-mesmo
num determinado espaço e tempo. Como somos finitos, isto é, com uma vida limita-
da na determinação de sua duração, precisamos escolher, dentre as possibilidades
que se abrem a todo instante, qual a experiência que queremos ter (claro que não
podemos escolher todas as experiências que vamos ter, algumas acontecem inde-
pendente da nossa vontade). Enquanto isto que somos, um ser com consciência de
si e da finitude de si, temos algumas dezenas de anos de expectativa de existir. Até
que se prove que exista outra forma de vivermos, fora desta vida e deste corpo, te-
mos um determinado período para gozar e aprender. Assim, mais intensidade, mais
abertura de possibilidades de verdade e completude do absoluto enquanto máxima
totalidade radical, mais perto de igualar-se a (obviamente dentro das limitações do 81
homo sapiens finito e histórico) algum-todo-nenhum-aquém-entre-além-ser-não-

O ABSOLUTO E O PÓS-HOMEM
ser-imanente-transcendental-a-si-mesmo. Quanto mais sábios, mais poder nos será
dado, mais possibilidades de gozo e compreensão.

A atividade intensa é toda atividade que rompe com a névoa da ro-


tina ordinária. Quase toda experiência nova traz o novo como exigência de novas
respostas de nós. A busca de novas respostas nos obriga a sair da inércia. Todo de-
safio, todo medo, paixão, estudo, arte, empreitada, empreendedorismo de qual-
quer forma, alterações de consciência artificiais ou naturais. Tudo aquilo que nos
tira do conforto de conhecer mecanicamente a ordem dos fatos na manipulação
dos entes rotineiros.

Pela mesma razão que devemos buscar a intensidade a fim de extrair


o máximo sumo da vida, precisamos de descanso, pois nossa finitude será abrevia-
da por uma vida de intensidade máxima ininterrupta. Ainda não estamos tratando
de nada que não pudesse ser dito antes da incorporação-concepção de algum-todo-
nenhum-aquém-entre-além-ser-não-ser-imanente-transcendental-a-si-mesmo.

Aquele que transforma a visão de mundo no aceno-onipresente-


da-onisciência-de-mundos estará para sempre aberto a toda possibilidade deste
Universo consistente-inconsistente-aconsistente; todo Universo possível consisten-
te-inconsistente-aconsistente; o nada e o ser internos a este Universo consistente-in-
consistente-aconsistente; o possível nada e o possível ser externos a este Universo
consistente-inconsistente-aconsistente e a todo Universo possível consistente-in-
consistente-aconsistente; o possível nada e o possível ser internos a todo Universo
possível consistente-inconsistente-aconsistente; todo pensamento possível consis-
tente-inconsistente-aconsistente e toda ação possível consistente-inconsistente-a-
consistente. Além disso, saberá que todo pensamento é parcialmente verdadeiro,
parcialmente falso e incompleto em relação ao absoluto enquanto máxima totalida-
de radical. É a grande moderação tolerante que guiará a intensidade com intervalos
de descanso. Para explicarmos esta ideia precisaremos de mais uma subseção.
I.XVIII.II

A GRANDE MODERAÇÃO TOLERANTE

82
Na verdade, a busca por intensidade é a busca também por igua-
lar-se a algum-todo-nenhum-aquém-entre-além-ser-não-ser-imanente-transcen-
O ABSOLUTO E O PÓS-HOMEM

dental-a-si-mesmo, por isso é também a grande moderação tolerante. Já que a


incorporação-concepção de algum-todo-nenhum-aquém-entre-além-ser-não-ser-
-imanente-transcendental-a-si-mesmo nos mostra que toda ideia é parcialmente
verdadeira, parcialmente falsa e incompleta em relação ao absoluto enquanto
máxima totalidade radical. Moderação, no sentido que nos interessa, é adotar a
posição em que todas as posições se convergem. Assim, como Kant foi o modera-
dor entre as posições racionalistas e empiristas da idade moderna, e Platão foi o
moderador entre as posições pré-socráticas na antiguidade, nós seremos modera-
dos a ponto de crer que toda proposição, todo pensamento, toda imagem tenham
uma parcialidade de verdade, uma parcialidade de falsidade e sejam incompletos
em relação ao absoluto enquanto máxima totalidade radical.

Esta inaudita moderação tem como consequência uma igualmente


inaudita tolerância, no sentido de aceitação de todas as posições possíveis, mesmo
entre duas posições contraditórias, pois não há posições absolutamente verdadeiras e
nem absolutamente falsas. Assim, aceitaremos todo o pensamento, proposição, dog-
ma, doutrina, teoria, sistema religioso, filosófico e científico como parte integrante
do absoluto enquanto máxima totalidade radical; além disso, toda a proposição é em
alguma proporcionalidade verdadeira, falsa e incompleta em relação a algum-todo-
nenhum-aquém-entre-além-ser-não-ser-imanente-transcendental-a-si-mesmo.

A grande moderação tolerante permite experimentar todas as possi-


bilidades da vida. Toda visão ideológica radical exclui as possibilidades que vão
contra suas premissas, limitando, assim, as possibilidades de intensidade, de novas
experiências, de desafios, limitando o quanto do sumo da vida poderemos extrair.
Por isso, aquele que incorpora-concebe algum-todo-nenhum-aquém-entre-além-ser-
-não-ser-imanente-transcendental-a-si-mesmo terá como uma das consequências
na totalidade-de-seu-ser-racional-intuitivo-pulsional-sensitivo-sensível-instintivo-
-imaginativo-místico-consciente-inconsciente a grande moderação tolerante.

Ora, não significa que nos tornamos ingênuos diante da arbitrarie-


dade das crenças humanas, mas, pelo contrário, sabemos que a verdade absolu-
ta e a completude absoluta do absoluto enquanto máxima totalidade radical só
são acessíveis a um ser que possa igualar-se a algum-todo-nenhum-aquém-entre-
-além-ser-não-ser-imanente-transcendental-a-si-mesmo. Este ser, nós já determi- 83
namos, não pode ser finito como nós e nem mesmo Deus na concepção tradicio-

O ABSOLUTO E O PÓS-HOMEM
nal, mas apenas Deus-que-ultrapassa-a-si mesmo.

Todavia, sabemos também que o absoluto enquanto máxima to-


talidade radical abrange qualquer possibilidade lógica, ilógica e alógica. Sendo
assim, é impossível haver qualquer proposição, pensamento ou imagem mental
absolutamente falsos. Há diferentes proporções de verdade, falsidade e comple-
tude. Cabe-nos, por meio da totalidade-do-nosso-ser-racional-intuitivo-pulsio-
nal-sensitivo-sensível-instintivo-imaginativo-místico-consciente-inconsciente-
meditativo-volitivo, descobrir estas proporcionalidades. Já discutimos os graus
de segurança nas formas institucionalizadas de conhecimento na seção dedicada
a isso. Em relação a experiência pessoal de cada homo sapiens finito e histórico, é
muito mais difícil obtermos graus de segurança no conhecimento.

O que significa a adotar a grande moderação tolerante?

É a máxima abertura que podemos nos proporcionar. Todas as cria-


ções humanas na religião, na ciência, na filosofia, na arte, no senso comum pas-
sam a ter alguma proporção de verdade, falsidade e completude em relação ao
absoluto enquanto máxima totalidade radical.

Quando incorporamos-concebemos algum-todo-nenhum-aquém-entre-


-além-ser-não-ser-imanente-transcendental-a-si-mesmo nosso ser ultrapassa a com-
preensão de mundo que tínhamos até então. Essa visão se transforma no-aceno-oni-
presente-da-onisciência-de-mundos. Qualquer construção de mundo não nos será mais
passível de ser considerada absolutamente verdadeira e absolutamente completa.
I.XVIII.III

SENTIDO GERAL E INDIVIDUAL DA VIDA INTELIGENTE

84
Uma vida intercalada de intensidade e descanso, crivada de expe-
riências novas, simultâneas e sucessivas, julgadas por meio da grande moderação
O ABSOLUTO E O PÓS-HOMEM

tolerante - intensidade que brota do cultivo da totalidade-do-nosso-ser-racional-


-intuitivo-pulsional-sensitivo-sensível-instintivo-imaginativo-místico-consciente-
-inconsciente - é o sentido individual da vida inteligente. Vir-a-ser Deus-que-ul-
trapassa-a-si-mesmo é nosso sentido geral da vida inteligente. Nós, homo sapiens
finito e histórico enquanto classe pertencente a este conjunto mais geral que cha-
mamos de vida inteligente, temos como sentido geral do homo sapiens finito e
histórico: criar o pós-homem, criar nossa superação como contribuição para o
sentido geral da vida inteligente, pois é tudo que podemos fazer em relação ao
cume teleológico da vida inteligente.

Ambos os sentidos da vida inteligente são vivenciados a partir da


incorporação-concepção de algum-todo-nenhum-aquém-entre-além-ser-não-ser-
-imanente-transcendental-a-si-mesmo. Ambos mantém a totalidade-do-nosso-ser-
-racional-intuitivo-pulsional-sensitivo-sensível-instintivo-imaginativo-místico-
consciente-inconsciente em constante expansão de possibilidades de verdade e
completude do absoluto enquanto máxima totalidade radical, portanto se comple-
tam no aproximar-se ao igualar-se a algum-todo-nenhum-aquém-entre-além-ser-
-não-ser-imanente-transcendental-a-si-mesmo. Aproximar-se? Pois, no fundo, em
suas formulações mais sintéticas e densas, ambos os sentidos da vida inteligente
têm como fim igualar-se a algum-todo-nenhum-aquém-entre-além-ser-não-ser-
-imanente-transcendental-a-si-mesmo. Todavia, nós sabemos que só Deus-que-ul-
trapassa-a-si-mesmo pode igualar-se a algum-todo-nenhum-aquém-entre-além-
ser-não-ser-imanente-transcendental-a-si-mesmo. Todos os seres inteligentes que
não forem esta entidade têm como desígnio aproximar-se individualmente ou
enquanto coletividade do igualar-se algum-todo-nenhum-aquém-entre-além-ser-
-não-ser-imanente-transcendental-a-si-mesmo. Pois essa é a melhor vida possível
para um ser inteligente e a melhor contribuição possível para que um dia a vida
inteligente possa vir-a-ser Deus-que-ultrapassa-a-si-mesmo.

Podemos, no entanto, enfrentar conflitos, os sentidos individual e


geral da vida inteligente podem servir como princípios contraditórios de ação em
determinados momentos, o agente decidirá seguir na contradição ou qual princí-
pio seguir, todas as possibilidades de ambos os sentidos da vida inteligente nos
levam ao ultrapassamento de nós mesmos. Todos aqueles que incorporarem-con-
ceberem por meio da totalidade-de-seu-ser-racional-intuitivo-pulsional-sensiti- 85
vo-sensível-instintivo-imaginativo-místico-consciente-inconsciente algum-todo-

O ABSOLUTO E O PÓS-HOMEM
nenhum-aquém-entre-além-ser-não-ser-imanente-transcendental-a-si-mesmo já
estarão sempre individualmente, ou enquanto classe, contribuindo para o vir-a-
ser Deus-que-ultrapassa-a-si-mesmo. Cabe a cada um de nós indivíduos inteli-
gentes que incorporamos-concebemos algum-todo-nenhum-aquém-entre-além-
ser-não-ser-imanente-transcendental-a-si-mesmo decidir o quanto dedicaremos
ao sentido individual ou ao sentido geral da vida inteligente.

I.XIX

VERDADE E COMPLETUDE

Afinal, não estaremos perdidos numa grande confusão considerando


que toda proposição tem uma proporcionalidade de verdade, uma proporcionalida-
de de falsidade e uma proporcionalidade de completude em relação a algum-todo-
nenhum-aquém-entre-além-ser-não-ser-imanente-transcendental-a-si-mesmo?

Já admitimos com a incorporação-concepção de algum-todo-nenhum-


-aquém-entre-além-ser-não-ser-imanente-transcendental-a-si-mesmo que a verda-
de está sempre presente em alguma proporcionalidade nas proposições em geral.
A dificuldade está em determinar as proporções de verdade, de falsidade e de com-
pletude nas proposições. Na verdade, não sabemos as verdadeiras proporções de
verdade, de falsidade e de completude contidas numa proposição qualquer.

O que podemos saber é a tendência de uma proposição em relação


a verdade, falsidade e completude. Por exemplo, uma proposição como “A bola é
vermelha”. Quando olhamos para a bola apontada, vemos que sua superfície esfé-
rica reflete a cor vermelha aos nossos nervos ópticos que, por sua vez, transmitem
tal impressão ao cérebro. Sabemos que esta frase é verdadeira sob certo aspecto:
da percepção do sujeito da propriedade vermelhidão instanciada no objeto obser-
vado. Sabemos da utilidade da linguagem em apontar propriedades perceptíveis
86 dos objetos. Isso garante uma alta proporcionalidade de verdade a esta proposição;
todavia, ela permanece com alguma proporcionalidade de falsidade e com alguma
O ABSOLUTO E O PÓS-HOMEM

proporcionalidade de incompletude em relação ao próprio fenômeno “um sujeito


determinado perceber a vermelhidão na superfície desta bola determinada”.

O sujeito não sabe se o vermelho está na bola ou se é o modo como


ele percebe a superfície da bola e não a bola em si. O sujeito também não sabe o
que é o vermelho, nem o que é uma esfera. Desconhece a composição subatômica
dos átomos que compõem a vermelhidão e que dão o aspecto esférico da bola.
Desconhece a totalidade de relações entre o ambiente que circunda a bola e as
propriedades da bola em si. Desconhece, ainda mais profundamente, as relações
entre esta afiguração com o absoluto enquanto máxima totalidade radical.

A verdade absoluta e completude absoluta são equivalentes a igualar-se


a algum-todo-nenhum-aquém-entre-além-ser-não-ser-imanente-transcendental-a-si-
mesmo. Este igualar-se é possibilidade exclusiva de Deus-que-ultrapassa-a-si-mesmo.
O absoluto enquanto máxima totalidade radical não pode ser divido em afigurações
da realidade no sentido de um quadro pictórico que mostra um conjunto de entes com
suas propriedades constitutivas e relacionais, ou um único ente e suas propriedades
constitutivas e relacionais. As proposições que atribuem estas propriedades aos obje-
tos por sua própria forma de operar fazem recortes descritivos na realidade.

O recorte, por sua própria definição, é sempre parte de algo. Sendo


parte, será incompleto em relação à verdade absoluta e à completude absoluta
de algum-todo-nenhum-aquém-entre-além-ser-não-ser-imanente-transcenden-
tal-a-si-mesmo. Toda proposição é, também, parcialmente falsa, pois aquilo que
não é a verdade absoluta e a completude absoluta é sempre em relação ao abso-
luto enquanto máxima totalidade radical parcialmente falso. Parcialmente falso
porque a proposição “a bola é vermelha” pode representar uma percepção de um
sujeito diante de um objeto, não garantindo que a propriedade pertença ao objeto
independente do fenômeno entre sujeito e objeto. O ato de perceber a vermelhi-
dão neste fenômeno “sujeito diante da bola” não pode garantir que a vermelhidão
não seja uma propriedade que surge tão somente quando um observador está
diante do objeto.
Além disso, a descrição de um fenômeno será sempre uma redução
das possibilidades da relação entre o sujeito e o objeto, será sempre uma redução
ao que percebemos do objeto. Jamais será o objeto em sua totalidade, nem o fenô-
meno sujeito-objeto em sua totalidade, nem mesmo a totalidade da experiência 87
de perceber uma única propriedade no objeto. As relações entre o ambiente cir-

O ABSOLUTO E O PÓS-HOMEM
cundante e o fenômeno são ignoradas quase que completamente, e as relações
entre o ambiente circundante, o fenômeno e o absoluto enquanto máxima totali-
dade radical são completamente desconhecidas, pelo menos até a incorporação-
concepção de algum-todo-nenhum-aquém-entre-além-ser-não-ser-imanente-
transcendental-a-si-mesmo. Depois, estaremos constantemente abertos a novas
possibilidades de verdade e completude que podem surgir em toda experiência.

I.XX

INFINITO VERSUS FINITO VERSUS ALGUM-TODO-NENHUM-AQUÉM-


ENTRE-ALÉM-SER-NÃO-SER-IMANENTE-TRANSCENDENTAL-A-SI-MESMO

Afinal, o homem é capaz de conceber o infinito a despeito de sua


empírica finitude?

Essa já foi uma questão importante na filosofia, principalmente para os


Modernos. Descartes, tido como um dos grandes racionalistas (para alguns é o prin-
cipal pensador Moderno, dando as cartas da problematização filosófica tanto para
racionalistas quanto para empiristas), acreditava numa intuição capaz de conceber
uma ideia positiva de infinito, enquanto os empiristas, como Hume, acreditavam que
o homem só é capaz de conceber uma ideia negativa de infinito, concepção que se dá
por oposição à observação do mundo sensível onde todas as coisas são finitas.

Qual o ganho nesta discussão com a incorporação-concepção de algum-


todo-nenhum-aquém-entre-além-ser-não-ser-imanente-transcendental-a-si-mesmo
por meio da totalidade-do-nosso-ser-racional-intuitivo-pulsional-sensitivo-sensível-
-instintivo-imaginativo-místico-consciente-inconsciente-meditativo-volitivo?
O absoluto enquanto máxima totalidade radical é imanente e trans-
cendental ao finito, infinito e afinito. Finito, pois nós somos finitos, assim como
todos os objetos do mundo sensível deste universo lógico-ilógico-alógico. Infinito,
88 pois nos obriga a admitir a hipótese de incontáveis universos haver existido, exis-
tirem, e virem a existir. Embora a ideia de tempo seja inadequada para expressar
O ABSOLUTO E O PÓS-HOMEM

a possibilidade de surgimento de infinitos universos com características próprias,


a única forma de haver separação entre os universos seria que eles fossem envol-
vidos pelo nada de onde surgem, sendo assim isolados uns dos outros, ou talvez
ainda podendo haver uma comunicação entre eles. Assim, um dia poderemos ter
teorias físicas mais robustas sobre os possíveis universos além deste. Afinito, pois
no nada interno a este universo lógico-ilógico-alógico, e no nada possível interno
a todo universo possível lógico-ilógico-alógico, e externo a este universo lógico-
-ilógico-alógico, e a todo universo possível lógico-ilógico-alógico não faz senti-
do falar de finito e infinito. No nada, não há qualquer dimensão nem qualquer
propriedade, mesmo que, no nada possível externo a este universo lógico-ilógico-
-alógico e a todo universo possível lógico-ilógico-alógico, nasça algum universo
possível lógico-ilógico-alógico. Logo, não faz sentido qualificá-lo de finito e nem
de infinito, para tanto fomos obrigados a cunhar o termo afinito35.

O absoluto enquanto máxima totalidade radical contém este uni-


verso lógico-ilógico-alógico, o nada interno a este universo lógico-ilógico-alógi-
co, todo universo possível lógico-ilógico-alógico, o possível nada externo a este
universo lógico-ilógico-alógico e a todo universo possível lógico-ilógico-alógico,
o possível nada interno a todo universo lógico-ilógico-alógico, todo pensamen-
to lógico-ilógico-alógico e toda ação lógica-ilógica-alógica. Incorporar-conceber
algum-todo-nenhum-aquém-entre-além-ser-não-ser-imanente-transcendental-
-a-si-mesmo pela totalidade-do-nosso-ser-racional-intuitivo-pulsional-sensitivo-
sensível-instintivo-imaginativo-místico-consciente-inconsciente-meditativo-vo-
litivo é expandir nossas concepções de tal maneira que possamos vislumbrar esta
totalidade, que é imanente e transcendental aos conceitos finito, infinito e afinito.

35
O prefixo “a” de (a)finito tem o sentido de negação. Afinito é aquilo que não tem extensão nenhuma, nem
determinada nem indeterminada.
I.XXI

PENSAMENTO II VERSUS ALGUM-TODO-NENHUM-AQUÉM-ENTRE-


ALÉM-SER-NÃO-SER-IMANENTE-TRANSCENDENTAL-A-SI-MESMO 89

O ABSOLUTO E O PÓS-HOMEM
Será o pensamento capaz de ser mais imaginativo do que o absoluto
enquanto máxima totalidade radical na qual se insere o ser pensante?

O homem que pensa é finito e histórico, possuindo uma capacidade


limitada de pensar. Nós (homo sapiens finito e histórico, único possuidor de lin-
guagem conhecido empiricamente até então) temos uma limitação estrutural no
próprio modo de conceber um pensamento, sendo apenas capazes de ocuparmo-
nos com um objeto de pensamento em cada momento no tempo. Se entendermos
pensamento por elaboração de cadeias de proposição visando definir um obje-
to, ou mesmo que consideremos pensamento criação de imagens representando
objetos ou conclusões de cadeias de proposições, ou até mesmo meras imagens
indeterminadas, torna-se totalmente impossível que possamos pensar em infini-
tos objetos ao mesmo tempo, seja em proposições como em imagens. Isso se dá
pela simples razão de ir essencialmente contra as possibilidades de qualquer ser
finito, pois o ser finito pensa no tempo de modo sucessivo.

Toda possibilidade pensável, sendo lógica, ilógica ou alógica, é já uma


possibilidade enquanto possibilidades de algum-todo-nenhum-aquém-entre-além-
ser-não-ser-imanente-transcendental-a-si-mesmo. O absoluto é imanente e transcen-
dental ao finito, infinito e afinito. Isto é, como um ser finito, contido no absoluto, inca-
paz de conceber o mesmo absoluto em sua absoluta verdade e absoluta completude,
seria capaz de conceber um pensamento totalmente alienígena ao próprio absoluto
enquanto máxima totalidade radical na qual desde sempre é onde pode estar?

Não parece possível, é por isso que toda proposição é parcialmente ver-
dadeira, parcialmente falsa e incompleta em relação ao absoluto enquanto máxima
totalidade radical. Todas as combinações de representações que formam proposições
são formas de separar ou agregar as possibilidades de algum-todo-nenhum-aquém-
-entre-além-ser-não-ser-imanente-transcendental-a-si-mesmo. Portanto, jamais se-
rão descrições absolutamente verdadeiras, absolutamente falsas e absolutamente
completas do absoluto enquanto máxima totalidade radical. Elas são parcialmente
falsas, pois envolvem um sem número de imprecisões que não são consideradas.

90 O que é o ente que está sendo enunciado, o que é a propriedade que


está sendo enunciada, qual a relação do fenômeno sujeito-objeto com o meio cir-
O ABSOLUTO E O PÓS-HOMEM

cundante deste fenômeno, e, finalmente, qual a relação do fenômeno com o abso-


luto enquanto máxima totalidade radical, são proposições parcialmente verdadei-
ras, pois, por mais criativo que possa ser o homem que pensa, sua criatividade está
contida nas possibilidades de algum-todo-nenhum-aquém-entre-além-ser-não-ser-
-imanente-transcendental-a-si-mesmo. Ergo, não é capaz de formular proposições
absolutamente alienígenas ao absoluto enquanto máxima totalidade radical, visto
que elas são incompletas, pois só a verdade absoluta e a completude absoluta do
absoluto enquanto máxima totalidade radical é absolutamente completa.

Se penso em algum-todo-nenhum-aquém-entre-além-ser-não-ser-
-imanente-transcendental-a-si-mesmo, é obviamente possível pensar no absoluto
enquanto máxima totalidade radical como algum-todo-nenhum-aquém-entre-além-
ser-não-ser-imanente-transcendental-a-si-mesmo. Entretanto, ao mesmo tempo,
não é totalmente compreensível para minha razão, por isso dizemos que há sus-
pensão lógica, ou epoché, sob certos aspectos. Ainda que, com a totalidade-do-meu-
ser-racional-intuitivo-pulsional-sensitivo-sensível-instintivo-imaginativo-místico-
consciente-inconsciente, eu seja capaz de incorporar-conceber essa expressão sem
a entender completamente. É como uma passagem para ultrapassar a mim mesmo.

Da mesma forma, Deus sempre foi nosso conceito ideal. Inconsciente-


mente, sempre quisemos ser nosso ideal e não apenas o adorar. A impotência diante
da nossa limitação fizera com que amassemos um conceito ideal, conhecedor de to-
das as respostas a todas as perguntas que geram nossas angústias. Para nós, entre-
tanto, Deus não é capaz de conhecer a verdade absoluta e a completude absoluta do
absoluto enquanto máxima totalidade radical, mas apenas Deus-que-ultrapassa-a-si-
mesmo é capaz de cumprir a condição necessária para verdade absoluta e a comple-
tude absoluta do absoluto enquanto máxima totalidade radical: igualar-se a algum-
todo-nenhum-aquém-entre-além-ser-não-ser-imanente-transcendental-a-si-mesmo.
I.XXII

UMA CONVERSA SOBRE ALGUM-TODO-NENHUM-AQUÉM-


ENTRE-ALÉM-SER-NÃO-SER-IMANENTE-TRANSCENDENTAL-A- 91

SI-MESMO ENTRE UM PENSADOR E UM PSICANALISTA

O ABSOLUTO E O PÓS-HOMEM
Pensador – Bom, o livro começa com uma pergunta. A pergunta mais
geral e, portanto, mais primeira de todas. É um passo atrás das per-
guntas historicamente primeiras sobre o ser. É a pergunta sobre o ab-
soluto enquanto máxima totalidade radical. Tão geral que nada pode
lhe escapar. Numa metáfora reducionista, como nenhuma matéria
pode escapar a gravidade do buraco negro. A resposta absolutamente
verdadeira e absolutamente completa a essa pergunta infelizmente
não é acessível a seres finitos e históricos, tais quais somos nós e
qualquer outro ser que possa haver com inteligência que já tivemos
contato empírico. Então, nosso trabalho é apenas apontar o caminho
que possa ser mais rico e capaz de maior abertura de possibilidades
de verdade e completude em relação ao nosso desígnio. Desígnio este
que é responder de modo absolutamente verdadeiro e absolutamen-
te completo a pergunta mais geral de todas. Este caminho provisório
visa ultrapassar a totalidade daquilo que somos através da própria
totalidade-do-nosso-ser-racional-intuitivo-pulsional-sensitivo-sensí-
vel-instintivo-imaginativo-místico-consciente-inconsciente.

A resposta à pergunta “o que é o absoluto?”, se dá na criação de uma


expressão que possa expandir a linguagem a novos limites até então
considerados impossíveis. Essa expressão será onipresente na totali-
dade daquilo que somos. Então, caro doutor, a expressão é algum-to-
do-nenhum-aquém-entre-além-ser-não-ser-imanente-transcendental-
-a-si-mesmo.

Psicanalista – algum-todo-nenhum-aquém-entre-além-ser-não-
ser-transcendental-a-si-mesmo?

Pensador – Não, algum-todo-nenhum-aquém-entre-além-ser-não-


ser-imanente-transcendental-a-si-mesmo.

Psicanalista – Deixa-me anotar para pensar sobre isto.


92
Pensador – Então, essa é a expressão para designar a expansão da
O ABSOLUTO E O PÓS-HOMEM

linguagem. É a implosão e a explosão dos conceitos mais gerais da


linguagem ser e não ser. Assim, além da abertura constante e inau-
dita de novas possibilidades de verdade e completude do absoluto
enquanto máxima totalidade radical, poderemos abrir um caminho
na linguagem para descrever o que hoje chamamos de aspectos iló-
gicos e alógicos da realidade.

Psicanalista – Hum... Interessante. Vou pensar sobre essa expres-


são durante a semana.

UMA SEMANA DEPOIS.

Psicanalista – Eu pensei sobre essa expressão que tu criaste. O que


me vem à cabeça quando penso algum-todo-nenhum-aquém-entre-
-além-ser-não-ser-imanente-transcendental-a-si-mesmo é bastardo.

Pensador – Hum...Interessante. Fale mais sobre isso.

Psicanalista – Pois é, não sei, mas isso me vem à cabeça, é como se


fosse um não-lugar.

Pensador – Quer dizer, bastardo por que não tem origem?

Psicanalista – É isso.

Pensador – Pois o bastardo não conhece seus progenitores, logo


não conhece sua origem.

Psicanalista – Penso também em algumas leituras que fiz sobre


pensamento complexo.
Pensador – O que tu queres dizer com pensamento complexo, Ed-
gar Morin? Acho que não seria bem isso...

Psicanalista – Não saberia lhe dar referências agora. Mas não, Ed- 93
gar Morin tem um método que respeita certas regras tradicionais.

O ABSOLUTO E O PÓS-HOMEM
Pensador – Sim, não conheço bem a obra dele. Mas, pelo pouco
que vi, me parece que ele ainda está no âmbito da lógica clássica,
enquanto nós queremos uma abertura para além da questão do ser.
Buscamos responder a pergunta “o que é o absoluto?” Ou, mais de-
terminadamente, “o que é o absoluto enquanto máxima totalidade
radical?” Nós queremos descrevê-lo em todas as suas possibilidades,
sobre todos os seus aspectos, tanto lógicos, quanto ilógicos e alógicos.

Psicanalista – Hum... Bom... Ao meu ver, uma teoria contemporâ-


nea deve ter muitos espaços vazios para que possam caber muitas
coisas dentro dela.

Pensador – Exato. Algum-todo-nenhum-aquém-entre-além-ser-não-


ser-imanente-transcendental-a-si-mesmo gera o que chamo de a
grande moderação tolerante, realizando uma transformação na an-
tiga visão de mundo, a que chamo de aceno-onipresente-da-onis-
ciência-de-mundos. Não temos tempo para que eu lhe explique estes
conceitos, mas posso garantir que há lugar para todas as proposições.
Para nós (digo eu e o leitor que decidir seguir por esse caminho), todo
pensamento é parcialmente verdadeiro, parcialmente falso e incom-
pleto em relação ao absoluto enquanto máxima totalidade radical,
portanto não haverá proposições, pensamentos, ações, universos
possíveis (refiro-me a universos ontologicamente possíveis e não
logicamente possíveis) e o próprio nada que possa haver interno e
externo aos universos possíveis, os quais possam ser completamente
alienígenas ao absoluto enquanto máxima totalidade radical.
CAPÍTULO II
97

O ABSOLUTO E O PÓS-HOMEM
II.I

LIVRE ARBÍTRIO

Somos determinados pelos entrelaçamentos de causa e efeito? Ou,


através de nossa intencionalidade, podemos agir de acordo com nossa vontade
independente dos movimentos causais da natureza?

Existe livre arbítrio? Obviamente, mais uma pergunta sem respos-


tas definitivas. A última solução moderada que julgamos original data ainda do
período moderno: separar em dois campos distintos relações causais naturais e
intencionalidade. Assim, manteríamos a útil e eficiente lei causal tão necessária
para nossas diversas disciplinas da ciência natural e manteríamos nosso deses-
pero controlado, afirmando que nossa intencionalidade é distinta da causação
natural, permitindo-nos o delicioso alento do livre arbítrio.

Em filosofia, há sempre defesas plausíveis para todas as posições,


mais uma razão histórica que aponta para a grande moderação tolerante trazida
pelo absoluto enquanto máxima totalidade radical. Corroborando esta tese, Niet-
zsche postulou o contrário da solução moderada citada acima, a qual é atribuída
a Kant. Para aquele, grande adversário da tradição, desde Platão até seu próprio
surgimento, a filosofia tem sido um grande erro, pois é guiada pela moral apesar
de se autoproclamar a investigadora imparcial do conhecimento. Nietzsche ela-
bora uma teoria da evolução da vontade de poder, afirmando, a respeito do livre
arbítrio, que ambas as posições - tanto a determinista, baseada na causalidade
natural, quanto a vertente que crê na liberdade da intencionalidade humana - es-
tão na verdade baseadas em preceitos morais para seguir uma ou outra posição.
98
Os deterministas não desejam se responsabilizar por nada, eles são
O ABSOLUTO E O PÓS-HOMEM

os de vontade fraca e travestiriam a sua vontade fraca através da religião do sofri-


mento. Enquanto os outros não querem perder a responsabilidade, a fé em si, eles
seriam as raças vaidosas. Ambas as teses seriam ficções, e a única força vigente
seria a vontade de poder. O que vale para Nietzsche são as vontades fracas ou fortes,
que seriam instintivamente ou pulsionalmente ativadas como parte do metabolis-
mo dos superiores- os de vontade forte – e dos inferiores – os de vontade fraca21.

Para nós que incorporamos-concebemos algum-todo-nenhum-a-


quém-entre-além-ser-não-ser-imanente-transcendental-a-si-mesmo, nenhuma
possibilidade pode estar em total desacordo com o absoluto enquanto máxima
totalidade radical, pois o absoluto enquanto máxima totalidade radical envolve
toda e qualquer possibilidade lógica, ilógica, alógica seja em relação a objetos ex-
ternos a nós, entes e suas relações; seja em relação ao conteúdo interno a nós ou
realizado por nós através de ações; seja em relação a outros universos possíveis
ontologicamente22; seja no nada interno ou externo a universos possíveis ontolo-
gicamente. Isto tenderia a crer que não há qualquer possibilidade de escapar das
possibilidades ilimitadas de algum-todo-nenhum-aquém-entre-além-ser-não-ser-
-imanente-transcendental-a-si-mesmo.

Todo homo sapiens é finito e histórico, o absoluto enquanto má-


xima totalidade radical é imanente e transcendental ao finito, infinito e afinito.
Não parece razoável que um ser finito possa pensar ou imaginar qualquer enti-
dade completamente alienígena ao absoluto enquanto máxima totalidade radi-
cal. Tudo que nos diz respeito, ou seja, nossa relação com nós mesmos, com os

21
Esta concepção está em Nietzsche, Friedrich Wilhelm. Além do Bem do Mal: Prelúdio a uma filosofia do
futuro. Companhia das Letras. São Paulo 2005. Parágrafo 260. Pág. 155
22
Cabe lembrar que universos possíveis ontologicamente, na nossa concepção, devem possuir aspectos lógicos,
ilógicos e alógicos. Enquanto universos possíveis são compreendidos pela tradição como universos possíveis
logicamente e não ontologicamente. Embora haja defensores do chamado realismo modal, essa escola acredita
que todo universo possível logicamente é um universo existente ontologicamente. Nós não ratificamos essa tese,
pois quem concebe-incorpora algum-todo-nenhum-aquém-entre-além-ser-não-ser-imanente-transcendental-a-
si-mesmo acredita que todo o universo possível ontologicamente é lógico-ilógico-alógico. Portanto, universos
possíveis logicamente existem enquanto pensamentos, não enquanto entidades materiais na realidade.
outros que supomos semelhantes a nós, ou de nós com o conjunto de entes que
compreendemos como mundo, será limitado às nossas possibilidades, enquanto
aquilo que somos e não enquanto ao mundo que julgamos compreender. Agora,
se não somos capazes de compreender nem mesmo o universo do qual somos par- 99
te de modo absolutamente verdadeiro e absolutamente completo, muito menos

O ABSOLUTO E O PÓS-HOMEM
ainda seríamos capazes de compreender o absoluto enquanto máxima totalidade
radical de modo absolutamente verdadeiro e absolutamente completo.

Se quiséssemos defender o determinismo, poderíamos supor que é


possível aceitar que tudo aquilo que somos: a totalidade-do-nosso-ser-racional-
-intuitivo-pulsional-sensitivo-sensível-instintivo-imaginativo-místico-consciente-
-inconsciente-meditativo-volitivo juntamente com a totalidade de experiências
que vivemos - do nascimento até o presente no qual nos encontramos no momen-
to da suposição - nos faz, dentro das possibilidades limitadas de ação, ter sempre
escolhas que se pré-determinam. Mesmo que pensemos estarmos escolhendo
livremente, não poderíamos escolher diferente, pois aquilo que somos no mo-
mento da escolha determina a ação de modo inconsciente. Sendo assim, seriamos
incapazes de qualquer ação livre.

Por outro lado, se quiséssemos defender o livre arbítrio, temos os


exemplos de acaso no universo, ao menos no que tange ao mundo subatômico.
Sabemos que a física possui vários problemas, e, em níveis subatômicos, ela é
ainda mais especulativa. A experiência empírica é sempre indireta com objetos
tão pequenos, mas estamos, quando falamos de átomos, inclusos no absoluto
enquanto máxima totalidade radical, portanto com alguma proporção de verda-
de, alguma proporção de falsidade e alguma proporção de completude. Ergo, o
mundo subatômico pode servir como exemplo de incerteza na natureza. Na física
quântica, não somos capazes de determinar onde uma partícula vai estar, nem
sua velocidade ao mesmo tempo. Além de haver a possibilidade de que ela se en-
contre em repouso e em movimento, numa posição ou noutra no mesmo instante.
Isso seria um indício de que o acaso estaria por traz dos processos de algum-todo-
nenhum-aquém-entre-além-ser-não-ser-imanente-transcendental-a-si-mesmo, o
que traria a possibilidade de liberdade nas nossas ações.

Diante da impossibilidade de definir se há ou não liberdade, é possí-


vel concluir que viver como se houvesse liberdade é mais vantajoso do que viver
pensando que tudo está pré-determinado. Porém, continuamos diante de nos-
sa ignorância em relação às principais perguntas elaboradas historicamente. A
suspensão de juízo em relação a: Deus; existência e salvação da alma; o quanto
conhecemos de nós mesmos e da realidade.
100
Se somos desde o nascimento ser-no-mundo com diria Heidegger,
O ABSOLUTO E O PÓS-HOMEM

ou, pelo menos, esta é uma proposição com alta proporcionalidade de verdade e
completude dentro das proporções de parcialidade de verdade, parcialidade de
falsidade e completude que qualquer proposição pode ter em relação a algum-to-
do-nenhum-aquém-entre-além-ser-não-ser-imanente-transcendental-a-si-mesmo.
Temos tudo para agarrar-nos aos entes sempre dados do mundo, de sua sempre
dada transformação e aniquilação, e para não crer no não dado, isto é, Deus, alma,
salvação da alma, nem que podemos conhecer absolutamente a nós mesmos ou a
realidade. Ergo, nasce aí uma liberdade tal que simplesmente se ultrapassa a ques-
tão do livre arbítrio. A liberdade já é sempre um fardo nascido do mistério.

A liberdade, onde não há conhecimento dos mistérios da existência


também, é um fardo enorme de angústia. Curiosamente, defendemos que isso é
bom. Por que é bom o fardo angustiante da liberdade gerada pela ignorância a res-
peito do absoluto enquanto máxima totalidade radical? Porque só a liberdade do
vazio de não haver certezas pode gerar a concepção do sentido geral e individual
da vida inteligente. Isto é, de todo breu que nos foi dado sobre as questões cruciais
da nossa existência, nasceram nossas próprias concepções de sentido para a vida.

II.II

AUTOANÁLISE

Entenderemos autoanálise como o voltar-se do homem finito e his-


tórico a si mesmo com uma visão crítica, descobrindo quais suas fraquezas. Fra-
quezas compreendidas como forças involuntárias que impedem nossas ações de
ocorrerem como o previamente deliberado por nós. Em última análise, investigar
quais as razões mais originárias que nos impedem de atingir a felicidade.
Nós, os quais concebemos-incorporamos algum-todo-nenhum-a-
quém-entre-além-ser-não-ser-imanente-transcendental-a-si-mesmo, temos a vi-
são de mundo transformada em o aceno-onipresente-da-onisciência-de-mundos.
Nossa felicidade está para sempre conectada aos sentidos geral e individual da 101
vida inteligente, estipulados por nós no primeiro capítulo desta obra. Sentidos

O ABSOLUTO E O PÓS-HOMEM
para vida inteligente que, em sua versão sintética de densidade máxima, tornam-
se equivalentes a viver no sentido de aproximar-se ao máximo, que uma vida
finita e histórica possa permitir, de igualar-se a algum-todo-nenhum-aquém-en-
tre-além-ser-não-ser-imanente-transcendental-a-si-mesmo. Sabemos que jamais
atingiremos absolutamente o igualar-se a algum-todo-nenhum-aquém-entre-
-além-ser-não-ser-imanente-transcendental-a-si-mesmo. Tanto enquanto con-
junto homo sapiens finito e histórico, quanto enquanto indivíduos constituídos
por uma complexa rede de forças que chamamos totalidade-do-nosso-ser-racio-
nal-intuitivo-pulsional-sensitivo-sensível-instintivo-imaginativo-místico-cons-
ciente-inconsciente-meditativo-volitivo.

Fraquezas, aquilo que nos impede de vivenciar a explosão e implo-


são dos conceitos mais gerais da linguagem – ser e não ser -, assim como de agir
para se aproximar dos sentidos individual e geral da vida inteligente. Em última
instância, fraquezas nos impedem de agir ou pensar de forma a abrir o maior
número possível de possibilidades de verdade e completude de algum-todo-ne-
nhum-aquém-entre-além-ser-não-ser-imanente-transcendental-a-si-mesmo. O
aproximar-se do igualar-se a algum-todo-nenhum-aquém-entre-além-ser-não-
ser-imanente-transcendental-a-si-mesmo é viver de acordo com os sentidos geral
e individual da vida inteligente. É o que nós, homo sapiens finito e histórico,
podemos vivenciar em relação a ser Deus-que-ultrapassa-a-si-mesmo.

As fraquezas são como propriedades internas que impedem tota-


lidade-do-nosso-ser-racional-intuitivo-pulsional-sensitivo-sensível-instintivo-
-imaginativo-místico-consciente-inconsciente-meditativo-volitivo de fruir e agir
de modo compatível com a incorporação-concepção de algum-todo-nenhum-a-
quém-entre-além-ser-não-ser-imanente-transcendental-a-si-mesmo, o que reduz
uma vida em relação às suas possibilidades antes da finitude de cada um que é e
antes da extinção daquilo que compreendemos por vida inteligente. Impede que
tenhamos coragem para a intensidade e para a grande moderação tolerante en-
quanto sentido individual do homo sapiens finito e histórico. Enquanto o sentido
geral nos impede de defender a criação do pós-homem enquanto aquele que nos
superará na totalidade-do-nosso-ser-racional-intuitivo-pulsional-sensitivo-sensí-
vel-instintivo-imaginativo-místico-consciente-inconsciente-meditativo-volitivo.

102 A incorporação-concepção de algum-todo-nenhum-aquém-entre-


-além-ser-não-ser-imanente-transcendental-a-si-mesmo deixa-nos cientes da limi-
O ABSOLUTO E O PÓS-HOMEM

tação e, entrementes, da possibilidade de ultrapassamento da condição humana.


Permite admitir duas categorias de qualidade: a da limitação: nós somos frágeis, ig-
norantes e finitos; a da potência: se podemos extrapolar a nós mesmos explodindo
e implodindo os conceitos mais gerais da nossa linguagem para conceber-incorpo-
rar algum-todo-nenhum-aquém-entre-além-ser-não-ser-imanente-transcendental-
-a-si-mesmo, significa que temos uma força indescritível de superação.

Estas duas categorias, geradas pela concepção-incorporação al-


gum-todo-nenhum-aquém-entre-além-ser-não-ser-imanente-transcendental-a-
si-mesmo, permitem uma vida inteira de descobertas. Assim, descobrir novas
fraquezas e iniciar sua apreensão em todos os possíveis aspectos pela totalida-
de-do-nosso-ser-racional-intuitivo-pulsional-sensitivo-sensível-instintivo-imagi-
nativo-místico-consciente-inconsciente-meditativo-volitivo. Superá-las e seguir
o ciclo: descoberta, superação; descoberta, superação; eventualmente impossi-
bilidades de superação, seguir tentando até o fim, isto é, até a morte. Falhando
definitivamente em alguns pontos e superando a maioria deles.

A busca de viver de acordo com o conceber-incorporar algum-todo-


nenhum-aquém-entre-além-ser-não-ser-imanente-transcendental-a-si-mesmo é
a busca do ultrapassamento do ideal sempre almejado inconscientemente de ser
Deus. É uma busca fadada à incompletude, à parcial verdade e à parcial falsida-
de. Os movimentos de intensidade gerados pela grande moderação tolerante, no
entanto, abrem sempre novas possibilidades de compreensão de determinadas
fraquezas serem abordadas por novas estratégias geradas pela constante abertura
de novas possibilidades de verdade e completude de algum-todo-nenhum-aquém-
-entre-além-ser-não-ser-imanente-transcendental-a-si-mesmo.
II.III

MONISMO VERSUS DUALISMO VERSUS ALGUM-TODO-NENHUM-AQUÉM-


ENTRE-ALÉM-SER-NÃO-SER-IMANENTE-TRANSCENDENTAL-A-SI-MESMO
103

O ABSOLUTO E O PÓS-HOMEM
Da tradição platônica até a tradição analítica dos dias de hoje, o es-
paço lógico é binário enquanto concepção de verdade; dualista enquanto relação
sujeito-objeto, ou, no caso platônico, dualista também é o mundo enquanto sensí-
vel e suprassensível, ou, para Descartes, enquanto corpo e alma; ou monista para
algumas tradições religiosas orientais, nas quais o mundo é dividido em duas for-
ças, yin e yang, forças que se complementam, harmonizam-se e se interpenetram.
Monistas, também, para algumas escolas filosóficas como na pré-socrática de Par-
mênides, em que o ser é uno, indivisível, simples, eterno e imutável. Na contempo-
raneidade, a fenomenologia, na qual o conhecimento originário dissolve a relação
sujeito-objeto, levado à radicalidade por Heidegger, em que ser-no-mundo já é sem-
pre ser-com-outro, e a manualidade da relação com os entes do homo sapiens finito
e histórico, chamado por Heidegger de Dasein -traduzível por ser-aí -, se dá antes da
formação de proposições capazes de possuírem um valor de verdade.

A partir da concepção-incorporação de algum-todo-nenhum-aquém-


-entre-além-ser-não-ser-imanente-transcendental-a-si-mesmo, o mundo não é
mais nosso limite e, sim, o absoluto enquanto máxima totalidade radical. Este é
imanente e transcendental a todas as visões de mundo dualistas e monistas. Para
atingirmos a maior abertura possível de possibilidades de verdade e completude
do absoluto enquanto máxima totalidade radical, precisamos explodir e implodir
os conceitos mais gerais da linguagem – ser e não ser – de agora em diante os
sentidos da e para a linguagem são expandidos. Há fragmentação dos sentidos
da e para a linguagem, a criação de novos sentidos e a constante abertura de
possibilidades de criação de novos sentidos da e para a linguagem, pois agora nós
abrimos a linguagem para os aspectos não só lógicos, como ilógicos e alógicos do
absoluto enquanto máxima totalidade radical. Assim como abrimos a possibilida-
de de novos referentes virem à tona, os quais antes jaziam velados.

Algum-todo-nenhum-aquém-entre-além-ser-não-ser-imanente-
transcendental-a-si-mesmo é compreensível sob alguns aspectos, embora in-
compreensível sob outros aspectos. Tanto a incompreensão da complexidade da
máxima totalidade radical, agora concebida-incorporada, quanto a compreensão,
devem nos aproximar dos sentidos geral e individual da vida inteligente determi-
nados na seção I.XVIII. SENTIDO DA VIDA INTELIGENTE e nas suas subseções.
104
O ABSOLUTO E O PÓS-HOMEM

II.IV

EXPERIÊNCIAS

Experiência, poderíamos a definir como o já sempre dado contato


com os entes do mundo. Por necessidades históricas, saímos de uma teoria da sen-
sibilidade peripatética, quando Descartes reduziu (praticamente excluiu, diriam os
mais radicais) o papel dos sentidos no processo de conhecimento certo e seguro
que buscava demonstrar em suas meditações. O objetivo era reafirmar a verdade, os
princípios certos e seguros da razão. Copérnico havia demonstrado que a Terra gira
em torno do Sol e não o contrário, como se tornara tradicional no mundo antigo,
cujos alicerces eram a Física Aristotélica. Para Aristóteles, os sentidos nas condi-
ções ideais apreendiam as coisas, porém, se o sol esteve sempre parado, os sentidos
eram ilusórios. Então, não podíamos confiar na nossa capacidade sempre dada de
lidar com os entes, extrair suas propriedades através da experiência de já sempre
estar junto a eles e a outros indivíduos homo sapiens finito e histórico.

Contemporaneamente, parece que a visão do sujeito encapsulado


nele mesmo, de Descartes, já não funciona tão bem. Seria fácil dizer que suas
teses metafísicas eram simplesmente equivocadas, coisa que aprendemos com a
grande moderação tolerante a duvidar. Todo pensador tem alguma parcialidade
de verdade no seu pensamento, assim como de falsidade e incompletude em re-
lação ao absoluto enquanto máxima totalidade radical.

Nós que concebemos-incorporamos, com a totalidade-do-nosso-ser-ra-


cional-intuitivo-pulsional-sensitivo-sensível-instintivo-imaginativo-místico-conscien-
te-inconsciente-meditativo-volitivo, o ultrapassamento da nossa visão de mundo, a sua
transformação no aceno-onipresente-da-onisciência-de-mundos necessitamos de um
conceito mais amplo de experiência. Queremos estar agora e até a comprovação de nos-
sa finitude com a morte fragmentando os sentidos existentes da e para a linguagem,
criando novos sentidos da e para a linguagem, e sustentando a constante abertura de
possibilidades de criação de novos sentidos da e para a linguagem. Abrindo e mantendo 105
em abertura possibilidade de novos referentes pelo desvelamento de novas entidades.

O ABSOLUTO E O PÓS-HOMEM
Definiremos, finalmente, experiência: no todo daquilo que chama-
mos vida, entre nascimento (não excluímos a possibilidade de haver experiências
na vida pós-concepção e pré-nascimento) e morte, a totalidade-do-nosso-ser-ra-
cional-intuitivo-pulsional-sensitivo-sensível-instintivo-imaginativo-místico-
consciente-inconsciente-meditativo-volitivo foi, é e será crivada de sucessivos e
simultâneos contatos com os entes já sempre dados no mundo, com outros in-
divíduos homo sapiens finito e histórico, com outros pensamentos que não os
produzidos em nós mesmos, mas recebidos externamente e experiências mentais
no sentido de experiências internas ao nosso ser.

As experiências podem abrir novas possibilidades de verdade e com-


pletude de algum-todo-nenhum-aquém-entre-além-ser-não-ser-imanente-trans-
cendental-a-si-mesmo. Há contato com mais possibilidades do absoluto enquanto
máxima totalidade radical, mas não há qualquer certeza de que isso mudará a
proporção de verdade e completude que temos do mesmo, pois isso dependerá de
cada homo sapiens finito e histórico e como, a totalidade-do-seu-ser-racional-in-
tuitivo-pulsional-sensitivo-sensível-instintivo-imaginativo-místico-consciente-in-
consciente, é capaz de distinguir aquilo que leva a uma concepção-incorporação
de algum-todo-nenhum-aquém-entre-além-ser-não-ser-imanente-transcendental-
-a-si-mesmo com maior proporcionalidade verdade e completude daquilo que leva
a aumentar a proporcionalidade de falsidade e incompletude.

Se somos finitos, então o número de experiências que podemos


realizar em nosso intervalo de vida é também finito. O que podemos fazer para
otimizar nossas experiências limitadas em número pela nossa finitude? Escolher
dentre as possibilidades que a todo instante se apresentam a nós ao longo da
vida. Direcionar a totalidade-de-nosso-ser às experiências de mais intensidade.

Como foi desenvolvido na subseção a seu respeito, a intensidade é a


forma de ampliar as possibilidades de cada experiência, assim, se uma experiência
já é novas possibilidades de verdade e completude de algum-todo-nenhum-aquém-
-entre-além-ser-não-ser-imanente-transcendental-a-si-mesmo, uma experiência
intensa tem uma riqueza muito maior de abertura de possibilidades de verdade e
completude do absoluto enquanto máxima totalidade radical. De qualquer forma,
106 todo o vivenciar neste intervalo entre vida e morte é um aprendizado com alguma
proporcionalidade de verdade, alguma proporcionalidade de falsidade e alguma
O ABSOLUTO E O PÓS-HOMEM

proporcionalidade de completude do absoluto enquanto máxima totalidade radical.

Todavia, como também desenvolvido na subseção a respeito da in-


tensidade, as experiências intensas podem ser perigosas e capazes de diminuir o
intervalo entre vida e morte. Por isso, nos concluímos que intervalos de descanso,
no quais procuramos diminuir a intensidade com que a totalidade-do-nosso-ser-
-racional-intuitivo-pulsional-sensitivo-sensível-instintivo-imaginativo-místico-
consciente-inconsciente recebe contatos de entidades físicas no sentido de entes
externos a nosso ser, no sentido de pensamentos igualmente externos a nosso ser
e mentais no sentido de experiências internas ao nosso ser, são condições para o
melhor aproveitamento da vida.

Logo, deveríamos buscar - respeitando nossa necessidade de des-


canso – o maior número de experiências intensas a fim de otimizar nosso tempo
em direção à máxima abertura de possibilidades de verdade e de completude de
algum-todo-nenhum-aquém-entre-além-ser-não-ser-imanente-transcendental-
-a-si-mesmo. Otimizar, pois este intervalo composto entre nascimento e morte é
finito. Fora deste intervalo, não podemos determinar qualquer revelação passada
ou presente que prove a continuação de nossas existências individuais após a
morte, nada que prove a permanência do que compreendemos por totalidade-do-
nosso-ser-racional-intuitivo-pulsional-sensitivo-sensível-instintivo-imaginativo-
místico-consciente-inconsciente.

Exploraremos formas que podem proporcionar experiências inten-


sas, para tanto, precisaremos de algumas subseções: alteradores da totalidade-
de-nosso-ser; homens de gênio; novos contatos ontológicos.
II.IV.I

ALTERADORES DA TOTALIDADE-DE-NOSSO-SER-RACIONAL-
INTUITIVO-PULSIONAL-SENSITIVO-SENSÍVEL-INSTINTIVO-
IMAGINATIVO-MÍSTICO-CONSCIENTE-INCONSCIENTE
107

O ABSOLUTO E O PÓS-HOMEM
Esta subseção é dedicada às experiências que naturalmente ou artifi-
cialmente alterem o modo de ser da totalidade-do-nosso-ser-racional-intuitivo-pul-
sional-sensitivo-sensível-instintivo-imaginativo-místico-consciente-inconsciente.
Um ser humano finito e histórico, durante as contingências de sua vida, experi-
mentará incontáveis diferentes estados de seu ser, contudo, através de indutores
naturais e artificiais, poderá experimentar alguns estados que não se atinge pela
experiência sem uso desses indutores. Assim, poderíamos dizer que podemos expe-
rimentar induções de alteração da totalidade-do-nosso-ser-racional-intuitivo-pul-
sional-sensitivo-sensível-instintivo-imaginativo-místico-consciente-inconsciente
de forma artificial através das drogas, substâncias que possuem propriedades que
alteram nosso ser por determinando lapso temporal; e natural que se dá através
dos mais diversos métodos de meditação. Alguns adeptos da meditação insistem
em que ela seria suficiente para revelar o absoluto independente de outras formas.
Todavia, é uma experiência não passível de descrição através da linguagem.

Para nós, que concebemos-incorporamos algum-todo-nenhum-a-


quém-entre-além-ser-não-ser-imanente-transcendental-a-si-mesmo pela tota-
lidade-do-nosso-ser-racional-intuitivo-pulsional-sensitivo-sensível-instintivo-
-imaginativo-místico-consciente-inconsciente, a limitação e o ultrapassamento
das nossas possibilidades em relação ao absoluto enquanto máxima totalidade
radical estarão onipresentes no nosso ser até o fim de nossa existência. Assim
como a grande moderação tolerante que, por toda nossa existência, tornará oni-
presente que todo o pensamento é parcialmente verdadeiro, parcialmente falso
e incompleto em relação ao absoluto enquanto máxima totalidade radical, nós
estaremos desde a concepção-incorporação de algum-todo-nenhum-aquém-en-
tre-além-ser-não-ser-imanente-transcendental-a-si-mesmo abertos à experiência
de novos estados da totalidade-do-nosso-ser-racional-intuitivo-pulsional-sensiti-
vo-sensível-instintivo-imaginativo-místico-consciente-inconsciente, pois estas
alterações abrem novas possibilidades de verdade e completude, podendo, as-
sim, nos proporcionar uma maior proporcionalidade de verdade e completude
em relação ao absoluto enquanto máxima totalidade radical.
Saberemos, todavia, que não poderemos jamais conceber-incor-
porar o absoluto enquanto máxima totalidade radical de forma absolutamente
verdadeira e absolutamente completa, pois isso pode ocorrer somente a uma en-
108 tidade capaz de igualar-se a algum-todo-nenhum-aquém-entre-além-ser-não-ser-
-imanente-transcendental-a-si-mesmo. Esta entidade é Deus-que-ultrapassa-a-si-
O ABSOLUTO E O PÓS-HOMEM

mesmo. Assim, alteradores artificiais criam possibilidades que a meditação não


pode criar, assim como as variadas formas de meditação criam outras possibilida-
des que os alteradores artificiais não podem criar. Portanto, ambas as formas de
alterar os estados da totalidade-do-nosso-ser-racional-intuitivo-pulsional-sensiti-
vo-sensível-instintivo-imaginativo-místico-consciente-inconsciente geram expe-
riências que só assim podem ser possíveis. Porém, assim como finitos, nós somos
frágeis em relação aos efeitos colaterais dos alteradores de consciência artificial,
restando a observação da devida parcimônia no uso de tais instrumentos para
que os danos não superem os benefícios da experiência.

II.IV.II

HOMENS DE GÊNIO

Esta subseção trata da intensidade através das obras produzidas


por homens de gênio. Chamamos de homens de gênio aqueles que expressaram
ideias originais em qualquer forma possível: seja escrita na Literatura, na Filoso-
fia, na Religião ou na Ciência; ou não escrita, através da Música (partituras não
contam como escrita neste caso), Pintura, Escultura, Cinema; ou qualquer mani-
festação que seja capaz de transmitir algo. Não podemos conhecer todas as obras
de gênio, já que nossa vida é finita. O que podemos fazer é direcionar nossa aten-
ção ao que nos parece original. Obviamente, é bastante complexo e difícil saber
o que é uma obra original, pois, muitas vezes, os homens que inauguram escolas
nas mais diversas áreas não são os maiores autores das mesmas. Se a intensidade
é capaz de aumentar a densidade da experiência, busquemos as obras mais den-
sas de possibilidades de verdade e completude do absoluto enquanto máxima
totalidade radical. É claro que haverá certa arbitrariedade nas nossas escolhas, se
pelo menos as obras com que entrarmos em contato forem inauditas para nós já
serão experiências de intensidade.
Entrar em contato com pensamento de um ser de gênio é abrir pos-
sibilidades antes inexistentes. É como ser aquilo que somos enquanto capazes de
interpretar do outro o que transcende a nós mesmos, aquilo que não pensamos so-
zinhos, ou, mais forte ainda, o que não foi concebido-incorporado totalidade-do- 109
nosso-ser-racional-intuitivo-pulsional-sensitivo-sensível-instintivo-imaginativo-

O ABSOLUTO E O PÓS-HOMEM
místico-consciente-inconsciente-meditativo-volitivo. São novas possibilidades de
abertura de verdade e completude, as quais podem aumentar a proporcionalidade
de verdade e completude de algum-todo-nenhum-aquém-entre-além-ser-não-ser-
-imanente-transcendental-a-si-mesmo, as quais nos estariam vedadas se não co-
nhecessemos aquele escrito, aquela teoria, tal revelação, certa obra de arte, etc.

O acúmulo que há de conhecimento é um somatório aparentemen-


te caótico de ideias de todos os tempos, mesmo que muitas delas tenham sido
deturpadas pelos tradutores, copiadores, guardadores ao longo dos séculos. Mes-
mo que tenhamos perdido uma imensa quantidade de criações nesse processo.
Mesmo que não haja muitas vezes conexões entre um pensamento e outro. Com
a grande moderação tolerante, aprendemos que sempre haverá um ponto de en-
contro entre qualquer possibilidade, pois toda possibilidade, seja lógica, ilógica
e alógica, é parte integrante do absoluto enquanto máxima totalidade radical.
Por mais que pareça que o conhecimento não passa de uma esfera de cores que
jamais se expande, mas sim troca de cores.

Nesses processos, sempre algo permanece, e esse algo que perma-


nece é um acréscimo de conhecimento rumo aos nossos sentidos da vida indivi-
dual e geral. Só o conhecimento permitirá a criação do pós-homem.

II.IV.III

NOVOS CONTATOS ONTOLÓGICOS

No plano do mundo, poderíamos dizer na ontologia, equivalente ao


contato com obras originais, nós temos o contato com novos entes?

Não. Infelizmente, nosso ser costuma fazer associações que nos


ligam a classes de coisas ou tipos de coisas. Assim, costumamos ignorar a sin-
gularidade de cada ente do mundo apenas percebendo as características gerais
num conjunto de entes. Estes são capazes de formar uma afiguração na qual per-
110 cebemos conexões entre entes particulares e entre as propriedades destes entes
formando um quadro pictórico descritível. Podemos pensar ou falar proposições
O ABSOLUTO E O PÓS-HOMEM

verdadeiras ou falsas deste quadro pictórico, segundo a tradição analítica. Nós


que concebemos-incorporamos algum-todo-nenhum-aquém-entre-além-ser-não-
ser-imanente-transcendental-a-si-mesmo devemos estar sempre abertos a desve-
lar novas possibilidades que antes estavam ocultas nesse quadro pictórico.

Portanto, a intensidade no contato ontológico pode se dar de dois mo-


dos: novos aspectos de entes cotidianos, ou contato com novos entes. Assim, como
na nossa cotidianidade deixamos de ver aquilo que sempre vemos, podemos fazer
o exercício contrário: perscrutar naquilo que sempre vemos algo que nunca vimos.
Um novo aspecto que tenha nos passado despercebido até então naquele ente ou
conjunto de entes; ou naquele animal ou conjunto de animais; ou naquele homo
sapiens finito e histórico ou conjunto de homo sapiens finito e histórico.

Por outro lado, teremos uma probabilidade de maior intensidade se


tivermos contato com um novo ente, ou conjunto de entes num inaudito quadro
pictórico. Quando nos submetemos a experiências novas, abrimos a porta para
contato com novos entes, novos lugares, novas pessoas ou animais.

Por que probabilidade e não certeza de maior intensidade na ex-


periência no contato com novos entes? Porque depende do quanto se investiga
um ente já conhecido. Por exemplo, um cientista se debruça por longos períodos
a compreender novos aspectos de entes já conhecidos por ele, buscando algum
aspecto ainda velado daquele grupo de estudo para posteriormente fazer uma
generalização a respeito do tipo de grupo de seres que aqueles entes são conside-
rados como parte integrante.

Provavelmente, poucas pessoas do senso-comum ou da tradição


filosófica ou científica negariam o que foi dito nessa subseção. Agora, adentrare-
mos um terreno mais obscuro. Nós, que incorporamos-concebemos algum-todo-
nenhum-aquém-entre-além-ser-não-ser-imanente-transcendental-a-si-mesmo,
não mais perscrutaremos novos aspectos dos entes cotidianos ou contatos com
novos entes através dos nossos sentidos, da nossa razão e, quiçá, da nossa intui-
ção. Nós somos e seremos cônscios da participação da totalidade-do-nosso-ser-
-racional-intuitivo-pulsional-sensitivo-sensível-instintivo-imaginativo-místico-
consciente-inconsciente em cada experiência sucessiva ou simultânea.
111
Além disso, nós agora explodimos e implodimos os conceitos mais

O ABSOLUTO E O PÓS-HOMEM
gerais da linguagem ser e não ser. Doravante contamos com os sentidos já exis-
tentes da e para a linguagem, com a fragmentação desses sentidos, com a criação
de novos sentidos da e para a linguagem, e com a constante abertura de possi-
bilidades de criação de novos sentidos da e para a linguagem. Assim como abre
possibilidade de novos referentes virem à tona, os quais antes jaziam velados. Te-
remos formas inauditas de descrição disponíveis para cada experiência sucessiva
ou simultânea que vivenciarmos.

Se antes descrevíamos os aspectos lógicos dos entes do mundo sen-


sível, agora descreveremos os aspectos lógicos, ilógicos e alógicos dos entes do
mundo sensível. Consequência da explosão e implosão dos conceitos mais gerais
da linguagem ser e não ser. Seu efeito é a criação da expressão capaz de acenar
para o absoluto lógico-ilógico-alógico enquanto máxima totalidade radical. Ex-
pressão que concebemos-incorporamos como aquilo que iria abrir a linguagem
para descrições lógicas-ilógicas-alógicas.

II.V

CIÊNCIA

Rimbaud escreveu, ainda no século XIX, que a ciência seria nosso


novo evangelho. Havia algo de profético no verso desse poeta francês.

O problema é fundamental: nós sempre precisamos de algum abrigo


mítico devido a nossa ignorância diante do mistério da existência. Antes foram os
mitos propriamente ditos, os deuses e mundos suprassensíveis; depois foram as
religiões institucionalizadas, perdurando até os dias de hoje. Todavia, o caminho
entendido como da razão prevaleceu com advento da ciência nos moldes moder-
nos, e ela se tornou a nova autoridade a ditar a verdade.

112 A ciência é um caminho para previsões, manipulações tecnológicas


e conhecimento de alguns aspectos dos objetos que estuda, contudo sempre há al-
O ABSOLUTO E O PÓS-HOMEM

guns problemas graves: primeiro, a ciência trabalha com universais, isto é, com gru-
pos de indivíduos que foram definidos como portadores de propriedades, as quais
definem a identidade enquanto tipo de indivíduos, ou, no passado, diriam os filó-
sofos: são indivíduos que possuem a mesma essência. Não vamos nos adentrar nas
discussões nominalistas ou realistas sobre o conceito de universal, não precisamos
destas distinções para o ponto em questão. O que nos importa é a abstração que é
feita para agrupar sob um mesmo nome estes indivíduos, pois é assim que nascem
conceitos, como o de homem, definido como animal racional. A questão é que não
existe o homem no mundo, ele é apenas um conceito abstrato para identificar e
diferenciar os animais racionais dos outros entes do mundo, onde existem apenas
indivíduos totalmente únicos, cada qual com uma identidade inconfundível.

Segundo, a ciência não pode, nem mesmo dentro de um grupo de uni-


versais, medir absolutamente suas conclusões, pois, seguindo o exemplo do concei-
to de homem, se quiséssemos ter certeza científica sobre uma proposição científica
a cerca desta espécie - grupo de indivíduos - deveríamos ser capazes de examinar
todos os homens passados, presentes e futuros. O que a ciência faz é trabalhar com
probabilidades, através de um grupo limitado de experimentação empírica produz
suas máximas. Um certo evento que ocorreu unanimemente no grupo estudado é
induzido para toda espécie. Isto é, cria leis através de generalizações.

Ainda, o método científico exige a separação de um objeto em as-


pectos. Por exemplo, a física estuda o movimento dos corpos, a biologia estuda
apenas os seres vivos, a química estuda as relações entre os elementos da na-
tureza, diferenciados pelo modo que se relacionam com os demais elementos,
suas quantidades de átomos e como se apresentam na natureza (sólido, liquido,
gasoso). Nenhuma dessas ciências é capaz de estabelecer todas as interconexões
entre os determinados aspectos que estudam e o objeto estudado. Muito menos
em relação às incontáveis relações que este grupo de indivíduos tem com o mun-
do, muito menos com o absoluto enquanto máxima totalidade radical.

No sentido de pelo menos conectar as proposições extraídas de uma


ciência com as demais, existem estudos transdisciplinares, tentando, com dificulda-
des e muito ceticismo por parte de alguns cientistas, unir o que a ciência, por seu mé-
todo, é obrigada a separar. Uma vez que cada disciplina científica trata de um aspecto
específico do objeto estudado, tendo seus próprios primeiros axiomas e princípios. 113

O ABSOLUTO E O PÓS-HOMEM
Além de estudar o objeto apenas sob certo aspecto, há outros que es-
capam aos métodos científicos. A física, por exemplo, estuda fenômenos através
de suas propriedades quantitativas, diferenciando um tipo de som de outro por
características como frequência e comprimento de onda. Isto é, apenas proprie-
dades quantitativas, deixando em aberto as propriedades qualitativas.

Ainda, a ciência é baseada em teorias que visam se adequar com


todos estes problemas à realidade, dependendo da criação de pessoas de gênio
criativo. Não se pode saber se as leis da natureza são padrões naturais que desco-
brimos, mesmo que nossas descobertas possam não cobrir completamente estes
padrões, ou se são interpretações antropomórficas dos fenômenos.

Com todos esses defeitos e obscuridades, a ciência ainda é a fonte


da qual poderemos criar o pós-homem. Não por ser nosso evangelho, nem por ser
capaz de revelar qualquer verdade absoluta, mas por ser capaz de manipular os
entes, criar máquinas, robôs, equipamentos em geral, de acordo com as funções
que deseja que eles cumpram. Ela é capaz de conhecer o suficiente para impedir
o andamento natural do mundo, para manipulá-lo e para prever acontecimentos
que fugiriam de nosso poder de manipulação sem o seu auxílio.

Mas o que devemos esperar da ciência em relação ao absoluto en-


quanto máxima totalidade radical?

Primeiro: esperar do cientista que incorpore-conceba algum-todo-


-nenhum-aquém-entre-além-ser-não-ser-imanente-transcendental-a-si-mesmo
através da totalidade de seu ser racional-intuitivo-pulsional-sensitivo-sensível-
-instintivo-imaginativo-místico-consciente-inconsciente, que descubra a grande
moderação tolerante que rege tudo aquilo que pode ser pensável. Isto é, que suas
descobertas sejam parcialmente falsas, parcialmente verdadeiras e incompletas
em relação ao absoluto enquanto máxima totalidade radical. Segundo: esperar
que busque radicalmente as interconexões transdisciplinares, pois saberá que a
verdade absoluta e a completude absoluta só podem ser acessíveis a uma enti-
dade que possa igualar-se algum-todo-nenhum-aquém-entre-além-ser-não-ser-
-imanente-transcendental-a-si-mesmo. Saberá, consequentemente, que não é
possível haver verdade absoluta e completude absoluta, descrevendo afigurações
114 que fazem as vezes de recortes no absoluto enquanto máxima totalidade radi-
cal. Assim, a fusão das ciências pode ao menos aumentar a proporcionalidade
O ABSOLUTO E O PÓS-HOMEM

de verdade e completude do objeto estudado em relação a algum-todo-nenhum-


-aquém-entre-além-ser-não-ser-imanente-transcendental-a-si-mesmo, otimizan-
do as possibilidades de realizar o melhoramento total do homem. Isto é, criar o
pós-homem enquanto ultrapassamento da totalidade-do-nosso-ser-racional-in-
tuitivo-pulsional-sensitivo-sensível-instintivo-imaginativo-místico-consciente-
-inconsciente-meditativo-volitivo.

Se pensarmos pelo lado da construção material do pós-homem, te-


mos: biologia, física, química, ciências da computação, cibernética, inteligência
artificial. Pelo lado da psique, temos: psiquiatria, psicanálise, psicologia cogni-
tiva, esquizoanálise, antropologia, sociologia, política, história. Não é tão difícil
imaginar uma união dessas ciências em prol do desenvolvimento do pós-homem.
Desenvolvendo-o com a união de todas as ciências, visando o objetivo de ultra-
passar a totalidade-do-nosso-ser-racional-intuitivo-pulsional-sensitivo-sensível-
-instintivo-imaginativo-místico-consciente-inconsciente. Será que já não conse-
guiríamos resultados surpreendentes?

II.VI

SISTEMAS SOCIAIS POLÍTICOS E ECONÔMICOS

O homo sapiens finito e histórico sempre esteve reunido em grupos.


Nos grupos, sempre houve os mais aptos a possuir poder, tanto por conhecimento,
como força bruta, habilidade social ou posse de recursos naturais, ou qualquer outra
vantagem competitiva. Até então, não havia problema, talvez, num certo sentido,
fosse a supremacia dos fortes, como Nietzsche dizia. Nós fomos criando conceitos,
sociedades mais complexas, sistemas políticos e sociais cada vez mais sofisticados.
A ciência moderna e a revolução industrial trouxeram o advento de tecnologias
inauditas, proporcionando abundância de produção de bens de consumo e o surgi-
mento de ideologias sociais políticas e econômicas com os mais diversos princípios.
115
Depois desta longa caminhada, mais de 23 séculos do nascimento

O ABSOLUTO E O PÓS-HOMEM
de Platão, e pouco mais de 21 séculos após a aparição da personagem Jesus Cristo,
ainda continuamos seguindo este velho padrão de exploração do homem pelo
homem. Seja nas sociedades primitivas, na antiguidade, no feudalismo, no mer-
cantilismo, no capitalismo ou no comunismo, há sempre a luta por poder, e a elite
que domina, em qualquer sistema, age em prol de seus interesses, explorando a
grande massa de pobres ou remediados.

Esta talvez seja simplesmente nossa natureza egoísta, administrada


por impulsos e instintos básicos, por vontade de poder e uma mentalidade incapaz
de enxergar o todo, ou mesmo por estruturas mais gerais das relações entre os ho-
mens, capazes apenas de pensar em um objeto a cada momento na sucessão tempo-
ral. Talvez nós não possamos mudar completamente isso. Incorporando-concebendo
algum-todo-nenhum-aquém-entre-além-ser-não-ser-imanente-transcendental-a-
si-mesmo, tornamos onipresente, na totalidade-do-nosso-ser-racional-intuitivo-
-pulsional-sensitivo-sensível-instintivo-imaginativo-místico-consciente-incons-
ciente, nossos limites e nosso ultrapassamento.

Para vivermos de acordo com os sentidos individual e geral da vida


inteligente algumas coisas devem mudar nesse panorama histórico. O sentido
individual da vida inteligente: cultivar as forças que nos compõem para que a
totalidade-do-nosso-ser-racional-intuitivo-pulsional-sensitivo-sensível-instin-
tivo-imaginativo-místico-consciente-inconsciente atinja a máxima intensidade
possível; ao mesmo tempo, manter as devidas pausas de descanso para compor a
vida mais longa possível, com a maior intensidade possível.

Através da intensidade e da grande moderação tolerante, buscar


experiências que possam abrir o maior número de possibilidades de verdade e
completude de algum-todo-nenhum-aquém-entre-além-ser-não-ser-imanente-
transcendental-a-si-mesmo. Isto é, enquanto indivíduo particular, aproximar-se
de vir-a-ser Deus-que-ultrapassa-a-si-mesmo. O sentido geral da vida inteligente:
vir-a-ser Deus-que-ultrapassa-a-si-mesmo. Como não podemos realizá-lo direta-
mente, realizaremos nossa contribuição através da união das ciências enquanto
aparato teórico instrutivo para manipulação de entes e previsão de resultados,
direcionar os processos práticos da experimentação empírica para a criação do
pós-homem. Enquanto espécie homo sapiens finito e histórico aproximar-se do
116 vir-a-ser Deus-que-ultrapassa-a-si-mesmo.
O ABSOLUTO E O PÓS-HOMEM

A grande moderação tolerante nos acompanhará da incorporação-


concepção de algum-todo-nenhum-aquém-entre-além-ser-não-ser-imanente-
transcendental-a-si-mesmo até nossa morte, nos proporcionará aceitar a parcia-
lidade de verdade, a parcialidade de falsidade e a parcialidade de completude
de todas as formas de conhecimento, tais como filosofia, ciência, arte, religião,
senso-comum, além das concepções particulares que teremos determinadas pelo
sentido individual. Assim, esperamos direcionar essa criação do pós-homem para
o ultrapassamento da totalidade-do-nosso-ser-racional-intuitivo-pulsional-sensi-
tivo-sensível-instintivo-imaginativo-místico-consciente-inconsciente, e não ape-
nas para o aprimoramento de um ou alguns aspectos do nosso ser.

Então, o pós-homem deverá criar o pós-pós-homem e, assim, suces-


sivamente (ou simultaneamente, não sabemos como se dará qualquer processo
após a criação do pós-homem) até que a vida inteligente possa igualar-se algum-
todo-nenhum-aquém-entre-além-ser-não-ser-imanente-transcendental-a-si-
mesmo, isto é, possa vir-a-ser Deus-que-ultrapassa-a-si-mesmo.

Algumas ações políticas devem finalmente ser executadas, sob


pena de nos aniquilarmos antes de concretizar, pelo menos, o primeiro passo,
isto é, o nosso sucessor. Primeiro: é necessário que haja um governo mundial
com representantes de todos os conglomerados políticos, econômicos e sociais.
Estes seriam eleitos pela população de cada conglomerado. Quando falamos de
conglomerados, estamos pensando na união de países tal como o mercado co-
mum europeu, visando a evolução do homo sapiens finito e histórico em todos
os lugares do planeta. Mesmo que ainda haja problemas de poder envolvendo os
conglomerados mais poderosos e os menos poderosos. Para nós que incorpora-
mos-concebemos algum-todo-nenhum-aquém-entre-além-ser-não-ser-imanen-
te-transcendental-a-si-mesmo, isto é possível, pois compreendemos que a nossa
única contribuição para além do acaso evolutivo é lutarmos pela criação do pós-
-homem, e, também, que a existência individual de cada indivíduo particular seja
uma oportunidade única e miraculosa. Não é uma questão de bondade, mas sim
o desejo de quebrar o eterno ciclo de perecimento de tudo aquilo que é em prol da
nossa única chance de salvação concreta: através de nós mesmos.

Segundo: se somos finitos e históricos, isto significa que surgem novas


oportunidades e que estas oportunidades devem ser aproveitadas antes que deixem 117
de existir. Heidegger achava que a tecnologia gerava o ser-máquina e o esquecimen-

O ABSOLUTO E O PÓS-HOMEM
to do ser, perda do que nos é mais fundamental, ou mais originário. A mesma tec-
nologia também traz vantagens, novas possibilidades surgem. Por exemplo, dentro
de algum tempo, poderemos ter máquinas capazes de fazer todo o trabalho manual.
Neste possível futuro, precisaremos apenas fazer o trabalho intelectual, e, mesmo
assim, alguns destes trabalhos poderiam ser feitos por máquinas também.

Atualmente, todavia, ainda vivemos num caos de desigualdades


entre as nações. Se não houver um esforço mundial civilizatório das massas des-
qualificadas intelectualmente, poderemos perecer num mundo de miséria ainda
mais elitista, onde os educados intelectualmente farão a gestão das máquinas, e o
resto viverá sendo subjugado pelos primeiros. Uma revolta dos oprimidos poderá
ser o pior cenário nesta possibilidade de futuro.

Terceiro: o planeta precisa permanecer habitável, o que já é óbvio


para o senso-comum. Não precisamos salvar a natureza, afinal tudo que existe
um dia deixará de existir, contudo precisamos - enquanto não tivermos capaci-
dade de artificialmente manter a vida sustentável - tentar manter o ecossistema
para que a vida não seja extinta como um todo.

Talvez, não seja mesmo possível a nossa espécie dominar as forças da


natureza a ponto de dispensá-la na manutenção da vida. Pode ser que só para um
futuro longínquo isto seja possível. O que não importa, apenas é preciso manter o
planeta em equilíbrio ecológico para que não extinguamos a fauna e a flora enquan-
to for necessária a vida inteligente. Não significa que queiramos a substituição da
natureza por um sistema totalmente artificial, se conseguirmos salvar a natureza
não há razão para não o fazermos. Aliás, salvar a fauna e a flora é uma atitude lou-
vável se possível. O ponto é que, pelo menos nós e nossos sucessores, precisamos
sobreviver, imaginando um cenário pessimista de extinção da vida na Terra.

Quarto: uma educação que esclareça outras inerentes tendências


humanas: a guerra, a crença em ideologias como se fosse a própria verdade ab-
soluta, a intolerância ao pensamento divergente. Nós que incorporamos-conce-
bemos algum-todo-nenhum-aquém-entre-além-ser-não-ser-imanente-transcen-
dental-a-si-mesmo teremos onipresente em nossas existências a impossibilidade
de atingirmos a verdade absoluta. Nossa visão de mundo foi transformada no
118 aceno-onipresente-da-onisciência-de-mundos. Nossa noção de uma totalidade li-
mitada é agora a noção de uma totalidade imanente e transcendental ao finito, in-
O ABSOLUTO E O PÓS-HOMEM

finito e afinito. Nossas crenças agora são parciais verdades, parciais falsidades e
sempre incompletas em relação ao absoluto enquanto máxima totalidade radical.

Logo, qualquer razão para ideologias, intolerância ou guerra serão


parciais verdades, jamais verdades absolutas que devam ser defendidas a qual-
quer custo, é o benefício trazido pela grande moderação tolerante. Guerras, ideo-
logias e intolerância dependem da falta de visão do todo e da crença que alguns
de nós podem atingir a verdade absoluta sobre qualquer aspecto. Pois, na com-
preensão lógica clássica - com a qual estamos acostumados a operar nosso pensa-
mento – a verdade da proposição “A” implica na necessária falsidade da proposi-
ção “não A”. Ao longo dos tempos, deturpamos este princípio lógico para: temos
certeza na falsidade das crenças alheias, quando estas são contraditórias com as
nossas. Na verdade, pode ser ainda pior, a certeza na verdade de uma crença traz
a intolerância a qualquer crença minimamente divergente àquela.

II.VII

FINITUDE

Entenderemos ente finito como toda entidade que é empiricamente


verificável. Podemos defini-lo como um conjunto de propriedades formando uma
unidade com identidade, diferença e de que podemos extrair uma essência, ou
estendendo o conceito ao seu substituto contemporâneo mais geral que a antiga
essência, podemos classificar como pertencente a um tipo. Todo ente verificável
no mundo é limitado em sua extensão, isto é, limitado espacialmente. Também,
tem sua duração existencial limitada enquanto ser o que é em sua identidade e
diferença, e da qual se pode atribuir uma essência ou tipo, isto é, limitado tempo-
ralmente. Não vamos discutir se conceitos como tipo ou essência, com os quais
agrupamos entes particulares do mundo sensível, são formados por entidades
que possuem propriedades em comum reais objetivas. Portanto, determinadas
pela natureza e não por nós, ou se são formados por entidades determinadas por 119
convenções humanas, e essas convenções humanas são determinadas pelo tipo

O ABSOLUTO E O PÓS-HOMEM
de ser que somos e não são propriedades reais objetivas.

No caso, homem ou homo sapiens é o conjunto a que julgamos per-


tencer, ironicamente criador e crítico do conjunto que coloca a si mesmo como
pertencente. Não queremos nos aprofundar nesse assunto, apenas estamos, no
âmbito da tradição, definindo os entes finitos que formam o mundo sensível atra-
vés da descrição de suas características mais gerais.

Por que estamos definindo entes finitos? Pois queremos determi-


nar uma diferença: o que não é um ente finito é apenas imaginável. Estamos nos
referindo a entidades infinitas como Deus, o universo no caso de não ser finito,
universos possíveis que igualmente não sejam finitos, o espaço, o tempo e os nú-
meros. Não podemos verificar a existência de entidades infinitas na realidade,
como podemos fazer com conceitos que descrevem entes finitos particulares. Até
aqui, estamos no âmbito da tradição filosófica, ou mesmo da tradição humana em
geral. Pois, mesmo na tradição oriental, o infinito é o máximo imaginável, é pro-
priedade atribuída à realidade deste universo, assim como nas culturas orientais
deístas é uma propriedade atribuída a Deus.

Todavia, a partir da formulação da nossa resposta à pergunta “o que é


o absoluto?” estamos num novo âmbito imaginável. A nossa incorporação-concep-
ção de algum-todo-nenhum-aquém-entre-além-ser-não-ser-imanente-transcen-
dental-a-si-mesmo é imanente e transcendental aos conceitos de finito, infinito e
afinito (conceito cunhado por nós, pois o nada não é nem finito nem infinito. Como
nossa formulação visa ser um caminho para o absoluto enquanto máxima totalida-
de radical, o nada deve ser expressado). Nós transformamos nossa visão de mundo
no aceno-onipresente-da-onisciência-de-mundos, teremos, em nossa existência
onipresente, a nossa limitação e o nosso ultrapassamento. Algum-todo-nenhum-a-
quém-entre-além-ser-não-ser-imanente-transcendental-a-si-mesmo é um caminho
para que a totalidade-do-nosso-ser-racional-intuitivo-pulsional-sensitivo-sensí-
vel-instintivo-imaginativo-místico-consciente-inconsciente possa criar os sentidos
geral e individual da vida. Continuamos seres finitos enquanto entidades existentes
no mundo sensível com identidade, diferença e uma essência ou tipo, os quais são
denominados pelo senso-comum de homem e pela ciência de homo sapiens (nós
acrescentamos finito e histórico a esta denominação).
120
Enquanto tipo homo sapiens, nós pertencemos a um conjunto mais
O ABSOLUTO E O PÓS-HOMEM

geral chamado de seres vivos. Ser finito enquanto ser vivo significa não apenas
limitado espacialmente e temporalmente, mas que nossa finitude é a morte. Ou
seja, existimos hoje e não existiremos em um tempo ainda indeterminado, mas
certo no futuro. Não há pós-vida garantida.

Neste caso, lutar pela melhor vida possível através da formulação


de um sentido individual para vida parece ser tudo que temos. Nós que incorpora-
mos-concebemos algum-todo-nenhum-aquém-entre-além-ser-não-ser-imanente-
transcendental-a-si-mesmo criamos nosso sentido individual para vida inteligen-
te, com o qual, através da intensidade, com pausas de descanso, vivenciaremos
experiências densas que abrem mais possibilidades de verdade e de completu-
de do absoluto enquanto máxima totalidade radical, podem, assim, aumentar a
proporcionalidade de verdade e completude que incorporamos-concebemos de
algum-todo-nenhum-aquém-entre-além-ser-não-ser-imanente-transcendental-
-a-si-mesmo. Portanto, podem enriquecer a totalidade-do-nosso-ser-racional-in-
tuitivo-pulsional-sensitivo-sensível-instintivo-imaginativo-místico-consciente-
-inconsciente, não temos mais quaisquer outras garantias.

Para ilustrar esta atitude de incerteza, podemos citar uma das pos-
síveis interpretações do eterno retorno de Nietzsche, que, a despeito do conteúdo
metafísico da infinitude do espaço e tempo, foca no conteúdo existencial. O que
constitui um sentido individual para vida criado pelo filósofo do martelo: permi-
tir, incentivar e hierarquizar as forças ativas e reativas – dionisíacas e apolíneas
- a ponto de ter uma vontade de potência para vida tal que aceitemos viver a mes-
ma vida eternamente. Isto é, fazer da nossa vida a nossa obra de arte, pois é tudo
que temos na temporalidade da sucessão do tempo. Assim como na eternidade,
não podemos mais contar com qualquer mundo supra-sensível, a que se apega-
ram nossos antepassados.

Mas nós criamos um sentido geral para vida inteligente, por quê?
Nós não estamos negando nosso sentido geral, apenas refletimos que não temos
controle sobre o seu fim. Criar o pós-homem para que este crie o pós-pós-homem
e, assim, sucessivamente (quiçá em algum momento simultaneamente) para que
a vida inteligente venha a ser Deus-que-ultrapassa-a-si-mesmo é um sentido que
depende de nós apenas na primeira etapa (criar o pós-homem). Igualar-se a al-
gum-todo-nenhum-aquém-entre-além-ser-não-ser-imanente-transcendental-a- 121
si-mesmo é o máximo sentido geral para vida inteligente possível, todavia não

O ABSOLUTO E O PÓS-HOMEM
depende de nós após a primeira etapa, e nada garante que a vida não seja aniqui-
lada antes de chegar a tal estágio. Ou, ainda, nada garante que este estágio seja
atingível. Ou, pior ainda, nada garante que teremos sucesso em criar um sucessor
que expanda a totalidade-do-nosso-ser-racional-intuitivo-pulsional-sensitivo-
sensível-instintivo-imaginativo-místico-consciente-inconsciente, cumprindo, as-
sim, a primeira etapa para que nosso sucessor possa criar o seu próprio sucessor
cumprindo a próxima etapa, etc.

Ironicamente, somente a busca do sentido geral da vida inteligente


pode nos dar uma chance de mudar a nossa sorte neste mundo. Através dos entes fini-
tos deste mundo, e não de outro, criamos um sentido geral para vida inteligente capaz
de tornar-nos eternos. Pois, se a vida inteligente igualar-se ao absoluto enquanto má-
xima totalidade radical, nós seremos como eles. Não só nós, homo sapiens finitos e
históricos, mas tudo que houve, há e haverá neste universo lógico-ilógico-alógico, em
todo possível universo lógico-ilógico-alógico, assim como o nada interno ou externo a
este universo lógico-ilógico-alógico e a todo possível universo lógico-ilógico-alógico.
Tornando os homens, pós-homens, pós-pós-homens e assim sucessivamente (ou si-
multaneamente) em Deus-que-ultrapassa-a-si-mesmo através de si mesmos.

Poderíamos dizer que Aristóteles, guardadas as proporções, tinha


uma ideia compatível com a salvação de todo ente, talvez mais fortemente de
todo ser vivo. Pois, para o estagirita, todo ente tem um princípio interno de movi-
mento que tende a um fim. Os seres inanimados, como as pedras, tendem a ir ao
centro da terra, este é seu único movimento. Já os seres vivos, mais fortemente,
tendem a buscar a eternidade através do cumprimento de funções de suas almas.
Funções vegetativas, no caso dos vegetais; vegetativas e sensíveis, no caso dos
animais; e vegetativas, sensíveis e racionais, no caso do homem. No fundo, todos
querem a eternidade lutando por sua sobrevivência. Tendo o perecimento como
certo, reproduzem descendentes para perpetuarem suas respectivas espécies.

Todos querem ir de encontro ao primeiro motor, ele é a causa pri-


meira, equivalente a Deus, mas não tão poderoso quanto o Deus cristão. Aristóte-
les acreditava que era necessário postular uma causa primeira, pois o infinito de
causas causadas, sem uma causa primeira não causada, soava mal aos gregos e,
ao inventor da lógica, causava ojeriza, pois impedia a possibilidade de um univer-
122 so logicamente arquitetado. Assim, o primeiro motor resolvia o problema dando
ao universo um ordenamento construído com base numa causa primeira não cau-
O ABSOLUTO E O PÓS-HOMEM

sada, um universo logicamente válido.

Neste caso, parece que uma das ideias centrais sugeridas neste livro:
“toda ação humana foi, é, e será realizada com o fim inconsciente ou consciente
de vir-a-ser Deus-que-ultrapassa-a-si-mesmo” faz um sentido histórico compatível
com a tradição. Embora estejamos sugerindo que a vida inteligente efetivamente
venha a ser, através de ações neste mundo, não apenas o primeiro motor, caso hou-
vesse um, mas o próprio absoluto enquanto máxima totalidade radical, criando a
re-evolução artificial. Os homens criando o pós-homem, e este, seus sucessores, até
que a vida inteligente iguale-se algum-todo-nenhum-aquém-entre-além-ser-não-
ser-imanente-transcendental-a-si-mesmo ou deixe de existir. Se houver sucesso,
será independente da existência prévia de qualquer Deus e exclusivamente pelos
méritos da vida inteligente efetivamente existente no mundo sensível.

Todavia, o alcance e o desejo de uma vida inteligente que possa se


igualar a algum-todo-nenhum-aquém-entre-além-ser-não-ser-imanente-transcen-
dental-a-si-mesmo são, por definição, a nós vedados. Simplesmente não nos cabe
compreender uma entidade tão grandiosamente superior a nós, talvez nunca caiba
a nenhum ser compreender uma entidade assim. O que vale é lutarmos pelo fim da
impotência diante da sempre observada aniquilação dos entes finitos. Em última
análise, lutarmos diante da nossa impotência em relação a nossa própria morte.
II.VIII

CRENÇAS
123

O ABSOLUTO E O PÓS-HOMEM
Crença sobre o mundo, consideraremos toda opinião humana ge-
rada pela convicção em sua verdade, seja injustificadamente ou racionalmente
justificada. É um ato de crer numa determinada proposição como correta repre-
sentação da realidade. No âmbito da tradição de Platão à analítica contempo-
rânea, segue-se esta definição, apenas filosofias alternativas existencialistas ou
fenomenológicas lidam com outro enfoque em relação as crenças sobre o mundo.

Nós que, através da totalidade-do-nosso-ser-racional-intuitivo-pul-


sional-sensitivo-sensível-instintivo-imaginativo-místico-consciente-inconsciente
incorporamos-concebemos algum-todo-nenhum-aquém-entre-além-ser-não-ser-
-imanente-transcendental-a-si-mesmo, temos que aceitar nossa incapacidade em
relação à verdade absoluta e à completude absoluta de qualquer possível objeto
do mundo e do pensamento. Descobrimos que a verdade absoluta e a completude
absoluta são indissociáveis, e, portanto, compatíveis apenas com uma entidade ca-
paz de igualar-se a algum-todo-nenhum-aquém-entre-além-ser-não-ser-imanente-
transcendental-a-si-mesmo. Cientes disso, aderimos à grande moderação toleran-
te, aceitamos que todas as proposições que somos capazes de conceber não serão
jamais absolutamente verdadeiras, mas parcialmente verdadeiras, parcialmente
falsas e incompletas em relação a algum-todo-nenhum-aquém-entre-além-ser-não-
ser-imanente-transcendental-a-si-mesmo. Logo, nossas crenças perderam o caráter
de verdades que antes pareciam tão claras e seguras, passaram a ser parciais verda-
des, parciais falsidades, além de possuírem os mais variados graus de incompletu-
de em relação ao absoluto enquanto máxima totalidade radical.

Essas transformações permitem um novo olhar sobre nossa pró-


pria capacidade de criar crenças, olhar da grande moderação tolerante. Todo o
pensável está, em alguma proporção, de acordo com absoluto enquanto máxima
totalidade radical, por que todas as possibilidades lógicas, ilógicas e alógicas es-
tão contidas no mesmo. Não é possível pensar em algo totalmente alienígena ao
absoluto enquanto máxima totalidade radical.

No âmbito da tradição filosófica racional, se observado com profun-


didade, veremos que todo sistema filosófico humano já criado parte de princípios
que toma como verdadeiros universalmente. Ora, por definição, primeiros prin-
cípios não são demonstrados, pois, se o fossem, como poderiam ser primeiros?
124 Além disso, as argumentações regrediriam ao infinito se a cada vez fosse neces-
sário uma nova demonstração. Assim, também na argumentação, nossa finitude
O ABSOLUTO E O PÓS-HOMEM

se mostra, toda argumentação precisa de limites ou regredirá ao infinito. O homo


sapiens finito e histórico só é capaz de lidar com argumentações finitas. Argu-
mentações finitas para lidar com o absoluto enquanto máxima totalidade radical,
que é imanente e transcendental ao finito, infinito e afinito.

A resposta que criamos para pergunta “o que é o absoluto” só pode


ser um caminho para o absoluto enquanto máxima totalidade radical, por que,
por mais que ultrapassemos a nós mesmos, nunca poderemos nos igualar a al-
gum-todo-nenhum-aquém-entre-além-ser-não-ser-imanente-transcendental-a-
si-mesmo. Isto não significa que não conheçamos nada e nem que nossos limites
epistemológicos, ontológicos, lógicos, estéticos, artísticos, existenciais, políticos,
éticos, científicos, místicos não possam ser expandidos. Em última análise, não
significa que a totalidade-do-nosso-ser-racional-intuitivo-pulsional-sensitivo-
sensível-instintivo-imaginativo-místico-consciente-inconsciente-meditativo-vo-
litivo também não possa ser expandida.

Um dos objetivos desta obra é justamente admitir que conhecemos


parcial e incompletamente; outro objetivo é propor uma expansão, um ultrapas-
samento de nós mesmos. Ultrapassamento que se dá de várias formas, mas pode-
mos dizer que o seu cerne ou estopim se dá com explosão e implosão dos conceitos
mais gerais da linguagem ser e não ser. Este acontecimento gera consequências
inauditas na linguagem: a fragmentação dos sentidos da e para a linguagem exis-
tentes; a criação de novos sentidos da e para a linguagem; e a constante abertura
de possibilidades de novos sentidos da e para a linguagem. Assim como abre a
possibilidade de novos referentes virem à tona, os quais antes jaziam velados.

Algum-todo-nenhum-aquém-entre-além-ser-não-ser-imanente-
transcendental-a-si-mesmo é o resultado destas explosão e implosão dos con-
ceitos ser e não ser, os conceitos mais gerais da linguagem. Não visa ser uma
crença diretamente, embora traga em si esta possibilidade. É a própria expansão
da linguagem para além da bipolaridade, para que possa se aproximar mais do
absoluto enquanto máxima totalidade radical. Expansão da linguagem para além
de qualquer conceito, para além da própria capacidade analítica de criá-los, pois
intencionalmente desejamos abrir a linguagem para os aspectos ilógicos e alógi-
cos do absoluto enquanto máxima totalidade radical, além de manter os aspectos
lógicos da linguagem, obviamente. Este é um caminho em construção, pois so- 125
mos seres finitos que pensam e lidam com entes na sucessão temporal. Portanto,

O ABSOLUTO E O PÓS-HOMEM
lidamos com uma quantidade finita de entes no mundo, no tempo, e pensamos
em imagens ou proposições singularmente e sequencialmente no tempo.

O incorporar-conceber algum-todo-nenhum-aquém-entre-além-ser-
-não-ser-imanente-transcendental-a-si-mesmo trará novas crenças, e é através
delas que avançamos para novas formas de viver. Neste renovar constante de
crenças, a vida inteligente poderá ter como futuro possível igualar-se algum-to-
do-nenhum-aquém-entre-além-ser-não-ser-imanente-transcendental-a-si-mes-
mo. As novas crenças são consequência do ultrapassamento de nós mesmos, e
ele se dá de várias formas que trazem em si a possibilidade de virem a ser novas
crenças: com a transformação da nossa visão de mundo no aceno-onipresente-
da-onisciência-de-mundos; com a explosão e a implosão dos conceitos mais ge-
rais da linguagem ser e não ser, nos permitindo incorporar-conceber algum-todo-
nenhum-aquém-entre-além-ser-não-ser-imanente-transcendental-a-si-mesmo;
com a mudança na defesa de nossas crenças pessoais pela defesa da grande mo-
deração tolerante. A finitude enquanto morte pelo pós-homem. A morte de Deus
pelo vir-a-ser Deus-que-ultrapassa-a-si-mesmo.

Ao fim e ao cabo, a tese mais controversa deste escrito não é com-


pletamente nova, ela é nosso sentido geral para vida: a possibilidade da vida
inteligente vir-a-ser Deus-que-ultrapassa-a-si-mesmo. Entendemos que, sempre
obscura e veladamente, o homo sapiens finito e histórico desejou ser Deus, desde
a criação dos primeiros Deuses. Nossa inovação, ao ultrapassar a nós mesmos,
foi compreender que para igualar-se ao absoluto enquanto máxima totalidade
radical, deveríamos alterar nosso velho ideal, o qual chamamos de Deus, para o
que chamamos Deus-que-ultrapassa-a-si-mesmo.

Não há qualquer certeza na realização desta tese no futuro ontológico deste


mundo no qual sempre estivemos. Afirmar a certeza nesta tese seria negar nosso próprio
ultrapassamento, seria um retrocesso às crenças proféticas do mundo pré-científico. A pro-
posta que nos é aberta é aceitar a nossa tese mais ambiciosa como um possível mundo num
futuro longínquo, o que nos permite criar o sentido geral da vida inteligente nesta obra.
Algum-todo-nenhum-aquém-entre-além-ser-não-ser-imanente-trans-
cendental-a-si-mesmo é incorporado–concebido por quem de nós eleva a totalidade
de seu ser racional-intuitivo-pulsional-sensitivo-sensível-instintivo-imaginativo-mís-
126 tico-consciente-inconsciente a uma intensidade tal que se torna capaz de suportar a
explosão e a implosão dos conceitos mais gerais da linguagem. Abrir-se-á para os as-
O ABSOLUTO E O PÓS-HOMEM

pectos ilógicos e alógicos, entrementes, continuará compreendendo tão bem quanto


antes os aspectos lógicos. Isso gerará um epoché sob certos aspectos, ao menos quan-
to aos aspectos ilógicos, alógicos do absoluto enquanto máxima totalidade radical e a
manutenção do uso da operação lógica em simultaneidade com estes aspectos.

Não estamos prescindindo da argumentação analítica sem uma


justificação analítica, nós a prescindimos apenas no momento certo, o momento
da implosão e da explosão dos conceitos mais gerais (ser e não ser) da nossa
linguagem, pois este processo exige o cultivo, a convivência, o crescimento da
totalidade-do-nosso-ser-racional-intuitivo-pulsional-sensitivo-sensível-instinti-
vo-imaginativo-místico-consciente-inconsciente e a razão é como uma navalha
que corta a linguagem a fim de garantir a verdade.

Para expressar a incorporação-concepção de algum-todo-nenhum-


-aquém-entre-além-ser-não-ser-imanente-transcendental-a-si-mesmo como ex-
pressão que abre o caminho lógico-ilógico-alógico ao absoluto enquanto máxima
totalidade radical, nada poderá ser separado. Pelo contrário, nós explodimos e im-
plodimos os conceitos mais gerais da linguagem ser e não ser, mas nós não sepa-
ramos o resultado deste processo, pois é justamente a unidade do resultado deste
processo que nos leva ao ultrapassamento do que sempre fomos, à transformação
da nossa visão de mundo no aceno–onipresente-da-onisciência-de-mundos.

O corte racional é necessário para manter as relações lógicas entre


as proposições quando desejamos que uma conclusão seja necessária para garan-
tir a validade de um argumento, embora o absoluto enquanto máxima totalidade
radical seja lógico-ilógico-alógico. Não nos aproximaremos dele com o argumen-
to válido, pois argumento válido tem sua utilidade em outros objetivos. Desde a
incorporação-concepção de algum-todo-nenhum-aquém-entre-além-ser-não-ser-
-imanente-transcendental-a-si-mesmo e desde este evento para sempre na nos-
sa existência até a finitude, conviveremos com uma suspensão lógica sob certos
aspectos: a ilogicidade e a alogicidade. Nossa visão de mundo transformada no
aceno-onipresente-da-onisciência-de-mundos traz em si a logicidade, ilogicida-
de, alogicidade do absoluto enquanto máxima totalidade radical.

Note-se, não queremos negar a razão, pois seria loucura, mas apenas
ultrapassá-la, enquanto a fundimos com a totalidade-do-nosso-ser-racional-intuiti- 127
vo-pulsional-sensitivo-sensível-instintivo-imaginativo-místico-consciente-incons-

O ABSOLUTO E O PÓS-HOMEM
ciente. Isso não nos impedirá de elaborar um argumento válido no contexto ade-
quado, poiso absoluto enquanto máxima totalidade radical é também lógico. Além
disso, aceitar crenças particulares sem uma avaliação racional seria um retrocesso
à era mítica. Não queremos isso, utilizamos as regras do bem pensar até quando
isto é possível num caminho que, por definição, deve, sob certos aspectos, romper
com estas regras, pois nosso caminho é lógico, ilógico e alógico. Algum-todo-ne-
nhum-aquém-entre-além-ser-não-ser-imanente-transcendental-a-si-mesmo é um
caminho de fragmentação, criação e constante abertura para a criação de sentidos
da e para a linguagem; de criação de sentidos para a vida inteligente (o que deno-
minamos de sentido individual e sentido geral da vida inteligente); e de mistério, se
tentarmos compreendê-lo apenas através da razão, fracassaremos. Devemos estar
no limiar entre lógica e suspensão lógica, pois é este limiar que nos apresenta novas
possibilidades inauditas. Este limiar nos apresenta nosso próprio ultrapassamento.

II.VIII.I

CRENÇAS PRÁTICAS

No campo da filosofia prática, uma crença pode ser definida como


ato de crer que uma determinada ação é a melhor a ser realizada num determi-
nado caso. Para nós a resposta à pergunta “o que é o absoluto?”, compreendido
como máxima totalidade radical, envolve a filosofia prática também. Não temos
mais como auferir qual ação é absolutamente certa, nem podemos aceitar ape-
nas a vontade de potência como orientadora da ação. Assim, é possível dizermos,
analogicamente no campo prático, que nossas escolhas são parcialmente certas,
parcialmente erradas e incompletas em relação ao absoluto enquanto máxima
totalidade radical. A ação é parte do absoluto enquanto máxima totalidade ra-
dical, assim como as descrições teóricas do mundo, e só pode ser parcialmente
verdadeira, parcialmente falsa e incompleta em relação ao mesmo.
Isto que compreendemos como totalidade-do-nosso-ser-racional-
-intuitivo-pulsional-sensitivo-sensível-instintivo-imaginativo-místico-consciente-
-inconsciente-meditativo-volitivo gera ações arbitrárias. Alguma hora, nossas for-
128 ças cooperam umas com as outras em busca de um fim; outras vezes, lutam para
subjugar umas às outras; outras vezes, aceitam seguir um caminho não racional
O ABSOLUTO E O PÓS-HOMEM

pelo prazer, pela dor, ou para provar nossa liberdade, como diria Dostoievski.

Para nós que incorporamos-concebemos algum-todo-nenhum-a-


quém-entre-além-ser-não-ser-imanente-transcendental-a-si-mesmo, o sentido
individual da vida inteligente e o sentido geral da vida inteligente estarão oni-
presentes em nós, assim como a grande moderação tolerante. Tanto os sentidos
da vida inteligente quanto a grande moderação tolerante irão determinar nossas
crenças práticas. Nosso modo de ser nos impede de seguir qualquer propósito de
modo inequívoco, e a totalidade que compõe nosso ser, a qual denominamos de
totalidade-do-nosso-ser-racional-intuitivo-pulsional-sensitivo-sensível-instinti-
vo-imaginativo-místico-consciente-inconsciente-meditativo-volitivo, é o que nos
permite incorporar-conceber, com a maior abertura de possibilidades de verdade
e completude, o absoluto enquanto máxima totalidade radical. Uma vez dada a
incorporação-concepção de algum-todo-nenhum-aquém-entre-além-ser-não-ser-
-imanente-transcendental-a-si-mesmo, teremos onipresentes nossos limites e
nosso ultrapassamento.

Essa abertura deve gerar o aceite da arbitrariedade de nossas forças


internas, de modo que possamos, na maioria das vezes, mas não sempre, agir de
acordo com nossas crenças práticas, determinadas pela grande moderação tole-
rante, pelo sentido geral e individual da vida inteligente. Estes, em última análi-
se, e numa formulação mais densa, têm como fim último igualar-se a algum-todo-
nenhum-aquém-entre-além-ser-não-ser-imanente-transcendental-a-si-mesmo.
Este igualar-se ao absoluto enquanto máxima totalidade radical é equivalente
à verdade absoluta e à completude absoluta no campo teórico, assim como, na
vida prática, é equivalente ao bem supremo. A nós, enquanto homo sapiens fini-
tos e históricos, cabe apenas aproximar-nos do igualar-se a algum-todo-nenhum-
-aquém-entre-além-ser-não-ser-imanente-transcendental-a-si-mesmo, dando o
próximo passo, inaugurando a re-evolução artificial da vida inteligente.
II. IX

A LINGUAGEM
129

O ABSOLUTO E O PÓS-HOMEM
“Therefore it must be itself that thought thinks (since it is the most
excellent of things), and its thinking is a thinking on thinking.”(1074b1 33-35)23

A linguagem é um dos conceitos mais difíceis de se definir. Quan-


do pensamos na linguagem, já estamos utilizando a própria linguagem. Aquilo
que a define já o faz através dela mesma. Logo, é como um círculo da linguagem
para linguagem com a linguagem. Tudo aquilo que nos dá diferença e identidade
enquanto espécie ou tipo é construído a partir da linguagem. Nossa essência ou
propriedade distinta enquanto espécie ou tipo é definida pela racionalidade. A
racionalidade é a partir da linguagem, ela só é possível a partir da linguagem.

Não é à toa que a filosofia contemporânea em suas principais ver-


tentes, analítica e fenomenologia, tem a linguagem como questão central. Hei-
degger dedicou o final da sua vida à essência da linguagem, enquanto alguns
dos principais analíticos trataram de determinar a estrutura lógica da linguagem.
Alguns chegam a considerar que esta seria a única função que restou à filosofia:
determinar e esclarecer as estruturas lógicas da linguagem a fim de varrer da filo-
sofia todas as questões que consideravam sem sentido.

Sob certos aspectos incorporar-conceber algum-todo-nenhum-aquém-


-entre-além-ser-não-ser-imanente-transcendental-a-si-mesmo é também um lidar
com a essência da linguagem, entretanto não a fim de determiná-la. Nem mesmo
estamos interessados em determinar onde nasce a linguagem, como Heidegger
buscou no final de sua vida, mas a fim de abrir um novo âmbito de possibilidades
para o discurso, capaz de fragmentar os sentidos existentes da e para a linguagem,
criar novos sentidos da e para a linguagem, e de manter uma constante abertura de
possibilidades de novos sentidos da e para a linguagem, assim como abre possibili-
dade de novos referentes virem à tona, os quais antes jaziam velados.

Aristotle. The Complete Works of Aristotle. Volume II (Bollingen series; 71:2). Princeton University Press.
23

New Jersey. 1994. Pag. 1698.


Esta expansão da linguagem se dá por meio da implosão e da explo-
são dos conceitos mais gerais ser e não ser. Assim, não estaremos mais restritos a
bipolaridade e, ao mesmo tempo, seguimos capazes de utilizá-la e de compreendê-
130 -la como antes. Na bipolaridade temos proposições verdadeiras ou falsas, mesmo
que para alguns ainda existam proposições indeterminadas. Nós continuaremos
O ABSOLUTO E O PÓS-HOMEM

no âmbito da tradição, sendo capazes de criar ou julgar proposições que se res-


trinjam aos valores de verdade tradicionais. A diferença é que saberemos que,
em relação ao absoluto enquanto máxima totalidade radical, não existem propo-
sições absolutamente verdadeiras, mas apenas proposições parcialmente verda-
deiras, parcialmente falsas e incompletas em infinitas proporções.

Quando incorporamos-concebemos algum-todo-nenhum-aquém-en-


tre-além-ser-não-ser-imanente-transcendental-a-si-mesmo, expressamos na lin-
guagem o que sempre foi experimentado em silêncio por seres inteligentes, sutis e
extremamente privilegiados. Por que não se poderia falar sobre o absoluto? Ora, por
que a nossa estrutura mental era baseada apenas na razão e não possui equilíbrio
em relação à totalidade das forças que nos compõem, entrando em colapso quando
transcendemos as contradições e as tautologias enquanto limites do espaço lógico.

Além disso, antes da incorporação-concepção de algum-todo-ne-


nhum-aquém-entre-além-ser-não-ser-imanente-transcendental-a-si-mesmo,
para todo homo sapiens finito e histórico, as proposições eram verdadeiras ou
falsas, no máximo, para alguns, podiam ser indeterminadas. Não estávamos pre-
parados para lidar com infinitas proporcionalidades de verdade, falsidade e com-
pletude de uma proposição em relação ao absoluto enquanto máxima totalidade
radical. Também não estávamos preparados para falar com os sentidos existentes
da e para a linguagem, para fragmentá-los, para criar novos sentidos da e para
a linguagem, para manter uma constante abertura de possibilidades de novos
sentidos da e para a linguagem, e todas estas atitudes diferentes em relação ao
lidar com a linguagem sendo realizadas simultaneamente. O novo lidar com a
linguagem é uma expansão e um ultrapassamento do modo logicista clássico de
lidar com ela, é um lidar de modo logicista, ilogicista e alogicista, e por isso não é
analisável sob certos aspectos.

Algum-todo-nenhum-aquém-entre-além-ser-não-ser-imanente-
transcendental-a-si-mesmo aponta os limites da linguagem, ao mesmo tempo, ele
ultrapassa estes limites. É, na verdade, a expressão do ultrapassamento de nós mes-
mos em todos os possíveis aspectos: lógicos, epistemológicos, ontológicos, linguís-
ticos, éticos, políticos, estéticos, científicos, artísticos, místicos e existenciais.

A originalidade desta expansão dos limites humanos se dá princi- 131


palmente na linguagem. Estamos expressando, de certo modo, aquilo que era

O ABSOLUTO E O PÓS-HOMEM
chamado Samadhi pelos orientais, experiências divinas pelos ocidentais, ou de
modo geral experiências místicas. Todavia, salvo as diferenças que possa haver,
devido à visão de mundo de cada indivíduo que vivenciou a experiência, nós,
pela primeira vez, estamos expressando linguisticamente o absoluto enquanto
máxima totalidade radical. É o fim do silêncio.

Obviamente, é esperado que as principais vertentes filosóficas não


aceitem isso, pois este lidar com aspectos ilógicos e alógicos parece entrar em
conflito direto com a razão. Esta aparência, porém, é baseada em uma crença,
que, assim como toda crença, não é absolutamente verdadeira, mas parcialmente
verdadeira, parcialmente falsa e incompleta. Sob certos aspectos, nos é exigido
suspender o juízo lógico. Simultaneamente, nosso desejo jamais foi, é ou será de
abandonar a lógica, nosso interesse sempre foi, é e será o de fundir os aspectos
lógicos com os aspectos ilógicos e alógicos do absoluto enquanto máxima totali-
dade radical para que possamos expandir nossa capacidade de descrição.

A argumentação tradicional silogística e demonstrativa, por sua pró-


pria definição, é impossibilitada de utilizar seus instrumentos quando se ultrapassa
a lógica. O aparato tradicional de construir provas não é mais possível. Nem provas,
nem mesmo contra provas, como nos primeiros princípios tradicionais.

Aqui o pedido é outro. Não vamos pedir que os adversários falem,


vamos pedir que os adversários permitam que a totalidade de seus seres racional-
-intuitivo-pulsional-sensitivo-sensível-instintivo-imaginativo-místico-conscien-
te-inconsciente se desenvolvam, promovendo uma fusão de suas forças numa
intensidade tal que possam incorporar-conceber algum-todo-nenhum-aquém-en-
tre-além-ser-não-ser-imanente-transcendental-a-si-mesmo como a expressão do
absoluto enquanto máxima totalidade radical no qual sempre estiveram incluídos.

Todos os pensamentos (o que inclui, obviamente, os pensamentos dos


adversários) já estão parcialmente de acordo com algum-todo-nenhum-aquém-en-
tre-além-ser-não-ser-imanente-transcendental-a-si-mesmo. Todos os pensamentos
possíveis já sempre são parcialmente verdadeiros, parcialmente falsos e incompletos
em relação ao absoluto enquanto máxima totalidade radical. Assim, os nossos limites
e o nosso ultrapassamento serão onipresentes na totalidade-do-nosso-ser-racional-
132 -intuitivo-pulsional-sensitivo-sensível-instintivo-imaginativo-místico-consciente-in-
consciente. Os sentidos da e para a linguagem, suas fragmentações, os novos sentidos
O ABSOLUTO E O PÓS-HOMEM

que nasceram desse novo lidar com a linguagem brotarão como flores na primavera.
Sem artificialidade.

Falando na expansão das possibilidades de sentido, falemos dos


sentidos não proposicionais: sentido geral e sentido individual da vida inteligen-
te desenvolvido por nós. Wittgenstein, no Tractatus, comenta que o problema da
vida tem sua solução no desaparecimento desse problema, pois, para ele, as pes-
soas que afirmaram que o sentido da vida se fez claro foram incapazes de falar no
que consiste esse sentido. Ora, é justamente isso que a expansão da linguagem
gerada pela incorporação-concepção de algum-todo-nenhum-aquém-entre-além-
ser-não-ser-imanente-transcendental-a-si-mesmo deve alterar. Nós queremos
expressar o antes impossível, a abertura de possibilidades de expressar qualquer
pensamento sendo ele lógico, ilógico e alógico. Assim, nos tornamos capazes de
elaborar um sentido individual e geral para vida inteligente.

O sentido individual da vida inteligente permite viver sob a ótica da


grande moderação tolerante. A aceitação de que todo pensamento seja parcialmen-
te verdadeiro, parcialmente falso e incompleto permite uma tolerância inaudita a
opiniões alheias e o desejo da intensidade máxima suportável. Porém, com pausas
de descanso, pois aquele que incorpora-concebe algum-todo-nenhum-aquém-entre-
-além-ser-não-ser-imanente-transcendental-a-si-mesmo deseja viver a mais longa
e mais intensa vida possível, crivada de experiências novas regidas pela grande
moderação tolerante. Gerando, assim, novas possibilidades de verdade e completu-
de em relação ao absoluto enquanto máxima totalidade radical, embora aquele que
incorpora-concebe permaneça sendo um indivíduo com uma vida finita, portanto
com possibilidades de experiências finitas em quantidade e duração.

Quanto ao sentido geral da vida inteligente, a saber, vir-a-ser Deus-que-


-ultrapassa-a-si-mesmo é re-evolução. Re-evolução só é possível por uma espécie
que seja capaz de expandir e acumular possibilidades de verdade e de completude
de algum-todo-nenhum-aquém-entre-além-ser-não-ser-imanente-transcendental-
-a-si-mesmo. Ora, acumular e adquirir possibilidades de verdade e de completude
da máxima totalidade radical é também acumular e adquirir novas possibilidades
de conhecimento em relação ao absoluto enquanto máxima totalidade radical. De-
pende do desenvolvimento de uma linguagem para descrever este conhecimento
e armazená-lo para além do indivíduo. Isto é, armazená-lo através da linguagem. 133

O ABSOLUTO E O PÓS-HOMEM
Linguagem é reconstruir o absoluto tal qual ele já é, mas sempre com
defeitos, pois é a nossa limitação enquanto homo sapiens finito e histórico. Por ser-
mos finitos, não podemos reconstruir através da linguagem o absoluto de modo ab-
solutamente verdadeiro e absolutamente completo, já que algum-todo-nenhum-a-
quém-entre-além-ser-não-ser-imanente-transcendental-a-si-mesmo é imanente e
transcendental ao finito, infinito e afinito. Porém, ser capaz de reconstruí-lo através
da linguagem é a chave da possibilidade de vir-a-ser Deus-que-ultrapassa-a-si-mes-
mo, mesmo sendo esta reconstrução parcialmente verdadeira, parcialmente falsa e
incompleta, por que é através do conhecimento que teremos a possibilidade de dar
o primeiro passo para vida inteligente vir-a-ser Deus-que-ultrapassa-a-si-mesmo.
Do conhecimento possibilitado pela linguagem poderemos criar o pós-homem.

II.X

EXISTÊNCIA

A existência é um dos mais cruciais e obscuros conceitos, ela ge-


rou uma das perguntas mais misteriosas da história da filosofia, conhecida pela
formulação de Leibniz: “Por que há algo ao invés de nada?” Permanece até hoje
sem resposta. Talvez seja justamente por ser mal formulada. Se há um criador da
existência, esse criador é Deus. Se Ele não se mostra no mundo, devemos escolher
entre duas possibilidades: Deus não existe ou Deus existe, mas não temos acesso
a sua existência. Sendo assim, a pergunta perde o sentido, pois só o criador da
existência poderia respondê-la. Se não há nenhum criador, então não há um por-
quê para existência, ela simplesmente se deu, dá e dará. E se há um criador, como
ele não se revela no mundo, isto é, de sua parte temos apenas silêncio, então
nunca saberemos a resposta a esta pergunta.
Na tradição filosófica analítica, vem sendo travada uma grande dis-
cussão acerca da existência enquanto predicado de primeira ou segunda ordem.
Essa problematização começou antes da vertente filosófica analítica se instau-
134 rar. Kant ,em Crítica da Razão Pura, destruiu os argumentos para existência de
Deus, principalmente o argumento ontológico, o qual colocava a necessidade da
O ABSOLUTO E O PÓS-HOMEM

existência de tal entidade dentro da definição das propriedades que formavam o


próprio conceito de Deus.

Interpretando Kant, diríamos: um conceito não pode conter a per-


feição especial chamada existência. A demonstração de não contradição das
propriedades de um conceito não é suficiente para fazer uma demonstração da
possibilidade de existência deste conceito. Isto é apenas uma demonstração da
possibilidade lógica de um conceito, não há qualquer garantia que haja, no mun-
do real, um objeto que corresponda a este conceito. Utilizando o vocabulário kan-
tiano, não há síntese, só análise. Não posso garantir a possibilidade de existência
através de um juízo meramente lógico (analítico).

Assim, surgiu o cerne do que seria elaborado por Frege, que acredi-
tava em duas possibilidades de predicação: uma de primeira ordem, isto é, das
propriedades que formam os conceitos; e outra de segundo, das propriedades de
propriedades. Frege acreditava que a existência era uma predicação de segunda
ordem, na qual se determinam a existência dos conceitos na realidade e não den-
tro de sua própria definição. A existência é a atribuição de um número um ao con-
ceito, ela determina que o conjunto formado por este conceito não é vazio. Logo,
não pode fazer parte das notas características deste conceito. Isto é, a existência
não pode fazer parte das propriedades definidoras de um conceito, pode apenas
ser uma propriedade externa às propriedades que definem um conceito. Portanto,
só pode ser propriedade de propriedades e não propriedade de um conceito.

Não vamos discorrer sobre o modo como outras vertentes trataram a


existência, como os existencialistas ou a fenomenologia. Apenas falemos um pouco
de um grande expoente desta última: Heidegger que, investigando o sentido do
ser, criou categorias existenciais para o que chama de ser-aí, o qual seria uma re-
presentação deste ente que nós já sempre somos, no entanto sem os pressupostos
tradicionais que já encobrem nosso ser, definições tais como homem ou homo sa-
piens. Com o intuito de determinar as estruturas básicas do homem para, de posse
destes fundamentos mais originários, chegar à questão do sentido do ser em geral.
Portanto, dá um tratamento radicalmente diferente à questão da existência.

Voltemos a Frege, considerado um dos expoentes, que também deu


origem, da tradição filosófica analítica, talvez a principal influência desta escola, 135
já que foi o pai da lógica contemporânea. Frege, assim como qualquer filósofo,

O ABSOLUTO E O PÓS-HOMEM
cometeu acertos e erros. No que tange a existência, estão surgindo críticas à solu-
ção Fregeana. Colin McGinn, por exemplo, apontou no seu livro Logical Properties
uma série de problemas em tirar da existência a capacidade de ser um predicado
de primeira ordem, assim como torná-la mista. Em determinados casos, ser um
predicado de primeira ordem e, em outros, ser um predicado de segunda ordem.

McGinn, tem quatro teses contra o que ele chama de formulação


ortodoxa, a qual é fortemente influenciada pela concepção Fregeana, todavia ele
se utiliza da formulação de Russel como a visão mais adotada contemporanea-
mente pelos analíticos. Russel formula-a: “existência é expressa de forma correta
logicamente quando consiste em uma propriedade ser instanciada na realidade.
Existe um x em que a propriedade F é instanciada”. O primeiro passo apontado
por McGinn é definir o que é ser instanciado, para ele a instanciação pressupõe
a importação do conceito de existência; o segundo é considerar que enunciados
de existência possam ser traduzidos em enunciados que utilizam quantificadores
existenciais, o que não pode ser correto, pois enunciados com quantificadores
existenciais podem ser interpretados como um predicado de existência. Esta é
apenas parte da primeira objeção, não vamos nos alongar descrevendo em de-
talhes este problema e muito menos os outros quatro apontados pelo autor em
determinar a existência como predicado de segunda ordem. Sua conclusão é: a
visão ortodoxa hipertrofiou uma visão correta sobre enunciados gerais de exis-
tência, concebendo a visão errônea, na qual a existência não é uma propriedade.

Como foi dito anteriormente, não vamos nos ater em determinar a


história da filosofia, nosso objetivo é apenas mostrar como a existência é um con-
ceito muito problemático, não havendo consenso nem mesmo entre os filósofos
considerados da mesma vertente.

Nos conceitos mais fundamentais da filosofia, pode-se começar


a vislumbrar a necessidade de um ultrapassamento. São nestes pontos de ex-
trema controvérsia que podemos perceber a finitude humana diante do misté-
rio, são como a primeira luz da manhã desvelando um abismo. O prenúncio da
incorporação-concepção de algum-todo-nenhum-aquém-entre-além-ser-não-
ser-imanente-transcendental-a-si-mesmo pela totalidade-do-nosso-ser-racional-
-intuitivo-pulsional-sensitivo-sensível-instintivo-imaginativo-místico-conscien-
136 te-inconsciente-meditativo-volitivo. Estes conceitos fundamentais, que deveriam
servir de alicerces para todas as nossas certezas, mostram o porquê da grande mo-
O ABSOLUTO E O PÓS-HOMEM

deração tolerante. Não somos capazes de conceber uma única verdade absoluta so-
bre os conceitos fundamentais. A razão cria sistemas hierárquicos de determinação
da realidade nos quais princípios mais fundamentais determinam a validade de
princípios menos fundamentais. Logo, se desconhecemos conceitos fundamentais,
desconhecemos princípios fundamentais, os quais são hierarquicamente superio-
res nos nossos sistemas racionais de determinação da realidade. O que significa
duas coisas: primeiro, nossa capacidade em relação a desvelar a verdade absoluta
e a completude absoluta do absoluto enquanto máxima totalidade radical é limi-
tada, pois nós descobrimos nossos princípios racionais como incertos alicerces da
realidade; segundo, só nos resta utilizarmos nossa capacidade para criar nossa su-
peração. Aqueles que expandirão as possibilidades de verdade e completude para
as questões fundamentais e para quaisquer questões, para que, de posse destas no-
vas possibilidades de verdade e completude, possam criar o sucessor do sucessor
e assim sucessivamente (ou quiçá, no futuro longínquo, simultaneamente). Nosso
poder, apesar de limitado é ainda o máximo poder com que tivemos contato.

Uma vez incorporado-concebido algum-todo-nenhum-aquém-en-


tre-além-ser-não-ser-imanente-transcendental-a-si-mesmo devemos dar um
novo tratamento à existência, visto que descrevemos os graves problemas em li-
dar com este conceito. Além disso, se há alguma concordância entre os filósofos
é a de estarmos tratando de um dos conceitos fundamentais mencionados acima.

Para nós, a abertura e a fragmentação dos sentidos da e para a lin-


guagem, juntamente com a criação de novos sentidos da e para a linguagem e
constante abertura de possibilidades de criação de novos sentidos da e para a lin-
guagem, assim como a abertura a possibilidades de novos referentes, que antes
jaziam velados, virem à tona, mostram que a existência em relação ao absoluto
enquanto máxima totalidade radical só pode ser considerada parte do mesmo.
Nós concebemos-incorporamos algum-todo-nenhum-aquém-entre-além-ser-não-
ser-imanente-transcendental-a-si-mesmo como expressão capaz de abrir o má-
ximo de possibilidades de verdade e completude do absoluto enquanto máxima
totalidade radical. Para nós, qualquer recorte do absoluto enquanto máxima to-
talidade radical será descrito por proposições parcialmente verdadeiras, parcial-
mente falsas e incompletas. Pois acreditamos que a verdade absoluta e completu-
de absoluta só podem ser atingidas sem recortes em relação ao absoluto enquanto
máxima totalidade radical. Só pode ser atingida pelo igualar-se a algum-todo- 137
nenhum-aquém-entre-além-ser-não-ser-imanente-transcendental-a-si-mesmo.

O ABSOLUTO E O PÓS-HOMEM
Este igualar-se só é possível a uma entidade que transcenda o conceito de Deus. A
entidade capaz deste igualar-se é Deus-que-ultrapassa-a-si-mesmo.

A existência é parte, como tal está indissociável dos processos de


algum-todo-nenhum-aquém-entre-além-ser-não-ser-imanente-transcendental-
-a-si-mesmo. Como tal, não é mais importante que outras partes do absoluto en-
quanto máxima totalidade radical. Não é mais importante, por exemplo, que a não
existência, ou as gradações entre estes dois conceitos sugeridas por algum-todo-
nenhum-aquém-entre-além-ser-não-ser-imanente-transcendental-a-si-mesmo.

Nós, contemporâneos, homo sapiens finitos e históricos, os quais incor-


poramos-concebemos algum-todo-nenhum-aquém-entre-além-ser-não-ser-imanente-
transcendental-a-si-mesmo como a resposta com maior abertura de possibilidades de
verdade e completude em relação ao absoluto enquanto máxima totalidade radical, es-
taremos até o fim de nossa vida sob a transformação da nossa visão de mundo no aceno-
-onipresente-da-onisciência-de-mundos. É uma transformação completa e irreversível
da totalidade-do-nosso-ser-racional-intuitivo-pulsional-sensitivo-sensível-instintivo-
-imaginativo-místico-consciente-inconsciente-meditativo-volitivo. Apoia-se na lógica e
a ultrapassa, gerando um epoché sob certos aspectos, pois é lógico, ilógico e alógico, a
sua incorporação-concepção não exige apenas uma compreensão racional com concei-
tos analíticos, exige um desenvolvimento da totalidade-do-nosso-ser-racional-intuitivo-
-pulsional-sensitivo-sensível-instintivo-imaginativo-místico-consciente-inconsciente
capaz de gerar uma intensidade tal que funde as forças que nos compõem, causando
uma explosão e uma implosão dos conceitos mais gerais da linguagem ser e não ser,
para que assim possamos fundar uma nova linguagem. Esta linguagem irá nos propor-
cionar novas possibilidades de sentidos da e para a linguagem, novas possibilidades de
verdade e completude do absoluto enquanto máxima totalidade radical.

É claro que haver existência é condição fundamental para estarmos


refletindo sobre a mesma, mas estamos nesta obra em busca de uma noção de
totalidade maximamente originária e maximamente geral para que nada possa
lhe ser absolutamente alienígena. É a noção que chamamos de absoluto enquan-
to máxima totalidade radical, inclui, e é condição de possibilidade da existência.
Como dito anteriormente, não há hierarquia entre as partes que formam o ab-
soluto, seja no ser, no não ser, na totalidade de gradações e quantidades destes
138 dois conceitos, seja na imanência e na transcendência destes conceitos e destas
gradações e quantidades de ser e não ser.
O ABSOLUTO E O PÓS-HOMEM

Nosso problema diante da existência é na verdade mais crucialmente


de ordem não conceitual, mas de sobrevivência da vida inteligente, não bastando
que o absoluto não tenha início ou fim. Uma consequência que promete o aniquila-
mento e o surgimento de existência em universos possíveis consistentes-inconsis-
tentes-aconsistentes. Tal vislumbre não nos consola diante da impotência da vida in-
teligente de continuar sendo criada ou aniquilada eventualmente nestes processos.
Nossa única esperança continua sendo que a vida inteligente, em algum momento
de suas possibilidades, iguale-se a algum-todo-nenhum-aquém-entre-além-ser-não-
ser-imanente-transcendental-a-si-mesmo para não mais ser fruto de possibilidades
independentes a si mesma. Para ser Deus-que-ultrapassa-a-si-mesmo.

II.XI

AMOR

O que é o amor? Alguns dizem desejo, outros dizem vontade. Al-


guns dizem aquilo que nos leva a Deus. Santo Agostinho acreditava que a própria
criação do mundo foi um ato infinito de amor de Deus. A maldade era o não ser,
a privação de substância, pois toda criação divina era o ser, e todo ser era o bem.

“Procurei o que era a maldade e não encontrei uma substância, mas sim uma
perversão da vontade desviada da substância suprema — de Vós, ó Deus — e
tendendo para as coisas baixas: vontade que derrama as suas entranhas e se
levanta com intumescência”24.

24
Agostinho, Santo. Confissões. Coleção Pensadores. 2ed. Abril Cultural. São Paulo. 1980. Pág. 156.
Homo sapiens finito e histórico – “espécie” (não vamos discutir
aqui se espécie é uma arbitrariedade que tomou forma com a confusão gerada
por um conceito central na obra aristotélica: a substância) incapaz de descrever
o absoluto enquanto máxima totalidade radical de modo absolutamente verda- 139
deiro e absolutamente completo, ser finito que é na sucessão do tempo e em um

O ABSOLUTO E O PÓS-HOMEM
determinado lugar no espaço, pensa no amor através de categorias. Um ser que
pensa por meio de conceitos analíticos. Amor à sabedoria, amor erótico, amor
materno, amor paterno, amor filial, amor aos amigos, amor aos irmãos; amor à
humanidade, aos animais, amor aos seres vivos, amor ao planeta, amor à vida,
amor a Deus, amor ao mundo, amor aos entes, amor ao universo. Embora seja
incapaz de definir o amor de modo unívoco, define então através destas diversas
categorias. De qualquer modo, pode-se dizer que é um sentimento de ligação de
um ente com outro, uma tentativa de re-ligação, de ser-com-o-outro-um-só, de
um ente com entes, de ser-com-outros-um-só. De entes entre entes, ou um ou
uns entes com uma suposta totalidade de entes que é o mundo ou universo de
ser-com-mundo-um-só, ou dos homens com o suposto ser formal ou perfeito que
é Deus, ser-com-ser-supremo-um-só.

O que é uma ligação pode gerar sua aniquilação, trazendo indiferen-


ça, ou pode tornar-se o desejo de destruição de um ente pelo outro ou de um ente
para vários entes, destruição do mundo, do universo, de Deus. Até o niilismo, do
latim nihil, que pode ser traduzido como nada. Niilismo pode ser definido como o
desejo de nada. Desejo de nada, se levado a sua radicalidade máxima, é a destrui-
ção do ser e a autodestruição: não-ser-com-nada-um-só.O que sabemos ao certo é
que não conseguimos tratar univocamente os diversos modos de amor.

Mas que novas possibilidades se abrem para o amor quando incor-


poramos-concebemos algum-todo-nenhum-aquém-entre-além-ser-não-ser-ima-
nente-transcendental-a-si-mesmo?

O amor absoluto e não categorial é o igualar-se a algum-todo-nenhum-


-aquém-entre-além-ser-não-ser-imanente-transcendental-a-si-mesmo, amar o ab-
soluto enquanto máxima totalidade radical, isto é, amar a si mesmo. Ora, toda esta
obra é baseada na impossibilidade do homo sapiens finito e histórico de igualar-se
a algum-todo-nenhum-aquém-entre-além-ser-não-ser-imanente-transcendental-a-
si-mesmo. Suas próprias estruturas existências impedem isso. Somos finitos, o ab-
soluto enquanto máxima totalidade radical é imanente e transcendental à finitude,
à infinitude e à afinitude. Somos históricos enquanto o absoluto é imanente e trans-
cendental a qualquer forma de sucessão e à eternidade. Somos parte do absoluto
enquanto máxima totalidade radical quando deveríamos igualarmo-nos a ele. Sen-
140 do assim, o amor absoluto seria o amor do absoluto enquanto máxima totalidade
radical por si mesmo. O que compreendemos como o amor de Deus-que-ultrapas-
O ABSOLUTO E O PÓS-HOMEM

sa-a-si-mesmo como a única entidade capaz de igualar-se ao absoluto enquanto


máxima totalidade radical, portanto, igualar-se a algum-todo-nenhum-aquém-en-
tre-além-ser-não-ser-imanente-transcendental-a-si-mesmo.

Diante do exposto o que resta a nós, homo sapiens finitos e históri-


cos, diante do amor?

Uma vez incorporado-concebido algum-todo-nenhum-aquém-en-


tre-além-ser-não-ser-imanente-transcendental-a-si-mesmo através da totalida-
de-do-nosso-ser-racional-intuitivo-pulsional-sensitivo-sensível-instintivo-imagi-
nativo-místico-consciente-inconsciente estaremos preparados para uma nova e
radical moderação tolerante. O que chamamos de a grande moderação tolerante
deverá nos tornar capazes de amar de maneira inaudita, pois há uma conver-
gência em todo ser homo sapiens finito e histórico: todas as suas crenças sobre
a realidade são parcialmente verdadeiras, parcialmente falsas e incompletas, as-
sim como também todas as ações são parcialmente certas, parcialmente erradas
e incompletas. Essa convergência permite-nos uma identificação diante do mis-
tério do absoluto enquanto máxima totalidade radical, do nosso limite e do nosso
ultrapassamento, até mesmo na contradição de nossas crenças ou ações.

Talvez a maior transformação venha da transformação da fala gera-


da por algum-todo-nenhum-aquém-entre-além-ser-não-ser-imanente-transcen-
dental-a-si-mesmo. Desde sempre, o logos polissêmico, embora no seu significa-
do mais originário possa ser traduzido por fala, como diria Heidegger, “Quando
dizemos que o significado básico de λóςγоς é fala (...) A fala deixa e faz ver (...)
a partir daquilo αττÒ (...) sobre o que fala.”25, permitiu-nos formas de expressão
até então inimagináveis. Aquele que possui fala é capaz de trazer os entes à re-
presentação da linguagem, portanto, capaz de abstração. Assim, capaz de criar
conceitos, como o amor. Agora somos capazes de algo ainda mais originário, in-

25
Heidegger, Martin. Ser e Tempo. 2ed. Vozes. Vozes. Editora Universitária São Francisco. Bragança Pau-
lista.2007.Pág.
corporamos-concebemos o absoluto enquanto máxima totalidade radical na qual
já sempre somos. Abrimos novas possibilidades de fala, temos a abertura de no-
vas possibilidades de amar. A totalidade-do-nosso-ser-racional-intuitivo-pulsio-
nal-sensitivo-sensível-instintivo-imaginativo-místico-consciente-inconsciente 141
criará novas categorias e abrirá possibilidades para o amor transcategorial.

O ABSOLUTO E O PÓS-HOMEM
Amor à sabedoria, amor erótico, amor materno, amor paterno, amor
filial, amor aos amigos, amor aos irmãos. Amor à humanidade, aos animais, amor
aos seres vivos, amor ao planeta, amor à vida, amor a Deus, amor ao mundo, amor
aos entes, amor ao universo. Até aqui estávamos no âmbito da antiga visão de
mundo. Nós a transformamos no aceno-onipresente-da-onisciência-de-mundos,
para nós novas possibilidades de amor abrem-se: amor a este universo consis-
tente-inconsistente-aconsistente; amor ao nada e ao ser interno a este universo
consistente-inconsistente-aconsistente; amor a todo possível universo consistente-
-inconsistente-aconsistente; ao possível nada e ao possível ser interno a todo uni-
verso possível consistente-inconsistente-aconsistente, amor ao possível nada e ao
possível ser externos a este universo consistente-inconsistente-aconsistente, amor
ao possível nada e ao possível ser externos a todo universo possível consistente-in-
consistente-aconsistente, amor a todo pensamento possível consistente-inconsis-
tente-aconsistente e a toda a ação possível consistente-inconsistente-aconsistente;
amor ao pós-homem; amor a Deus-que-ultrapassa-a-si-mesmo. Todas essas formas
de amar tradicionais e as novas formas que se abrem com a incorporação-concep-
ção algum-todo-nenhum-aquém-entre-além-ser-não-ser-imanente-transcenden-
tal-a-si-mesmo poderão ser na totalidade-do-nosso-ser-racional-intuitivo-pulsio-
nal-sensitivo-sensível-instintivo-imaginativo-místico-consciente-inconsciente
dirigidas simultaneamente ou sucessivamente. Mas somos indivíduos particulares
da “espécie” homo sapiens finito e histórico, não atingimos nem mesmo os ideais
que estão incorporados-concebidos pela totalidade-de-nosso-ser, pois isso seria a
perfeição do que nos é possível. Não a máxima perfeição, mas a perfeição de ser
finito e histórico. Mesmo assim, a perfeição nos é vedada. A nossa constitutiva
imperfeição é, por definição e empiricamente verificada ao longo da existência
individual de todo homo sapiens finito e histórico que vive no presente e viveu no
passado, presumida dos que virão no futuro.

Caber-nos-á a cada dia buscar as novas formas de amar, sabendo


que a cada dia poderemos mais e que mesmo assim jamais seremos a nossa pró-
pria possibilidade finita de amor, pois nossa própria possibilidade finita de amor
é um ideal e todo ideal é proveniente de uma análise do homo sapiens finito e his-
tórico, espécie de ser no qual as limitações foram descritas nos parágrafos acima.
Sendo o que é, não pode mais que formular conclusões parcialmente verdadeiras,
142 parcialmente falsas e incompletas em relação ao absoluto enquanto a máxima
totalidade radical. Além disso, em nossa vida prática, no embate de forças que é a
O ABSOLUTO E O PÓS-HOMEM

totalidade-do-nosso-ser-racional-intuitivo-pulsional-sensitivo-sensível-instinti-
vo-imaginativo-místico-consciente-inconsciente, muitas vezes o resultado é uma
ação arbitrária que não visa a realizar os objetivos deliberados.

Portanto, nossos ideais serão, enquanto nossas possibilidades sis-


temáticas de planejar uma situação futura mais favorável que a atual, sempre
impossíveis de realizar em plenitude total e completa. Afinal, admitimos que os
seres que os originam são constitutivamente imperfeitos.

Ainda no campo do amor entre nós, homo sapiens finitos e históri-


cos, poderíamos amar um grande número de semelhantes numa fusão de todas
as formas de amor que um homo sapiens finito e histórico possa vivenciar por
outro homo sapiens finito e histórico, embora enfrentando as mesmas dificulda-
des do primeiro caso. Todavia, há uma esperança: criemos o pós-homem de modo
que possa nos ultrapassar no amor também.

II.XII

A QUESTÃO DO SER VERSUS ALGUM-TODO-NENHUM-AQUÉM-ENTRE-


ALÉM-SER-NÃO-SER-IMANENTE-TRANSCENDENTAL-A-SI-MESMO

É fundamental para todas as correntes filosóficas a questão do ser,


mesmo aquelas que reclamam a inexistência de sentido nas perguntas sobre o
conceito mais geral do entendimento. O que é o ser? Qual o sentido do ser? O que
compreende ser enquanto ser? O ser está nas categorias de substância enquanto
essência e quantidade, qualidade, lugar e tempo enquanto acidentes? O ser é tam-
bém pensamentos? Serão também entidades ficcionais criadas por nossas mentes
que subsistem, como unicórnios, anjos etc.? Serão formas eternas?

Desde que falamos, talvez, de modo encoberto e desde que fazemos


Filosofia propriamente dita de modo explícito, nós temos o ser e o não ser como 143
condições centrais do entendimento. Principalmente, depois dos diálogos Tee-

O ABSOLUTO E O PÓS-HOMEM
teto e Sofista de Platão, o não ser tem sido tão essencial quanto o ser para com-
preensão humana. A questão do ser e a possibilidade de atribuirmos verdade ou
falsidade a uma proposição nasceram simultânea e intimamente relacionadas,
permitindo-nos a criação de uma lógica binária, modo pelo qual a Filosofia e a
Ciência construíram seus discursos. A lógica permite, através de algo inexplica-
do - chamaremos de intuição de modo ilustrativo -, possuir a mais eficiente forma
de universalidade de compreensão ao homo sapiens finito e histórico. Por isso, é
óbvio que os conceitos mais centrais serão a máxima totalidade binária imagi-
nável. Assim, conceituamos e instituímos os primeiros princípios da linguagem
racional, através de propriedades que pudéssemos atribuir a todas as entidades
contidas nos conceitos mais gerais da razão; objetivávamos abarcar a “totalidade”
na qual sempre estivemos inseridos. Totalidade, mas dentro dos limites em repre-
sentar o mundo através de uma linguagem de fundamentação lógica, isto é, divi-
dida em dois campos contraditórios. De um lado do espaço lógico, a verdade, e,
do outro, a falsidade. Assim, instituíram-se os princípios fundamentais da lógica:
princípio de não contradição, algo não pode ser e não ser sob o mesmo aspecto ao
mesmo tempo; princípio de identidade, todo objeto é idêntico a si mesmo; princí-
pio do terceiro excluído, quando duas proposições se opõem contraditoriamente
não podem ambas ser falsas ou verdadeiras. Existem variações nas definições
destes princípios, mas estas são formulações clássicas dos mesmos. Estamos ape-
nas as utilizando como ilustração das consequências de uma lógica binária.

O ser poderia ser dito de várias formas, diria Aristóteles, embora


não possa ser definido, pois definir é problemático com o conceito mais geral no
qual se pretendeu estabelecer os fundamentos do mundo, do conhecimento e da
lógica. Não se pode deixar nenhuma coisa, ou será nenhum predicado, fora do
conceito ser? Já que é a máxima totalidade de uma estrutura comum de lingua-
gem, daquilo que de alguma forma participa da experiência humana em sempre
se compreender através destes espaços mentais opostos, é compreendido intui-
tivamente: ser é aquilo que existe, sem pensarmos naturalmente nos diversos
problemas que descrever este conceito assim proporcionou aos filósofos.
Na contemporaneidade, é possível utilizarmos duas concepções
fundamentais de ser: uma delas parte do homo sapiens finito e histórico como
aquele que faz a pergunta sobre o ser; a outra - poderíamos chamar de tradicio-
144 nal - tenta abarcar a maior generalidade de predicados, independente do homo
sapiens finito e histórico que se pergunta pelo ser. Na primeira concepção, ser
O ABSOLUTO E O PÓS-HOMEM

como algo que está presente na experiência de vida de todo homo sapiens finito e
histórico em algum momento entre o nascimento e a morte, é alguma relação de
sua compreensão de si como um com a multiplicidade de outros neste todo orde-
nado que chama de mundo. Na segunda concepção, ser é toda a coisa, toda a ação
e todo pensamento atualizados em algum ponto do espaço e tempo.

O não ser, enquanto polo oposto dessa relação binária, na primeira


concepção, é o que não está presente na experiência de vida de todo homo sa-
piens finito e histórico pelo menos em algum momento entre o nascimento e a
morte. É o que não é alguma relação de sua compreensão de si como um com a
multiplicidade de outros neste todo ordenado que chama de mundo. Na segunda
concepção, não é uma coisa, não é uma ação e nem um pensamento atualizados
em algum ponto no espaço e tempo.

Este conjunto, ou esta espécie, a que denominamos homo sapiens


finito e histórico é um específico representante daquilo que é abarcado pelo con-
ceito mais geral de ser na segunda concepção, ou na concepção objetiva e tra-
dicional. É o único conjunto de seres (conhecidos empiricamente) que possui a
propriedade de perguntar-se sobre o ser. Compreende-se enquanto um na multi-
plicidade de outros e um num conjunto que é capaz de ordenar, interligando re-
lações entre si e a multiplicidade de outros. Compreende-se como tal num estado
de coisas que forma uma totalidade que chama de mundo.

Parece que há algo que é mais originário do que o ser e o não ser
enquanto conceitos mais gerais humanos. Tentamos, nesta obra, trazer a nós,
enquanto homo sapiens finitos e históricos, a ideia de que esses conceitos não
compreendem a totalidade de modo radical e máximo. A investigação a respeito
de uma outra pergunta, a qual não envolve esses conceitos explicitamente na sua
formulação, é capaz de abarcar uma generalidade que inclui os conceitos ser, não
ser e ainda outras possibilidades não contidas nesses conceitos mais gerais do
entendimento até então. A pergunta a qual nos referimos é: “o que é o absoluto?”,
compreendido nesta obra como absoluto enquanto máxima totalidade radical.
Obviamente, a investigação de uma pergunta busca gerar uma res-
posta. Ora, se dissemos que a pergunta pelo absoluto enquanto máxima tota-
lidade radical inclui os conceitos de ser e não ser e os ultrapassa, a resposta
que buscamos deve expandir essa concepção de mundo binária. Não por capri- 145
cho, já que a realidade dividida em dois polos opostos é um bom princípio de

O ABSOLUTO E O PÓS-HOMEM
compreensão universal, ou, quem sabe, a única possível forma de compreen-
são universal do homo sapiens finito e histórico - dúvida insolúvel. Algum-todo-
nenhum-aquém-entre-além-ser-não-ser-imanente-transcendental-a-si-mesmo
incorporado-concebido através da totalidade-do-nosso-ser-racional-intuitivo-
-pulsional-sensitivo-sensível-instintivo-imaginativo-místico-consciente-incons-
ciente-meditativo-volitivo permite que estes representantes do ser homo sapiens
finito e histórico possam pela primeira vez expressar na linguagem o absoluto
enquanto máxima totalidade radical. Não como o absoluto é em sua verdade
absoluta e completude absoluta, mas em um novo caminho de complexidade
inaudita, gerado pela explosão e implosão dos conceitos mais gerais ser e não
ser. Descrição que transcende os limites até então binários de descrição proposi-
cional. Assim, vislumbramos o outro lado do limite da linguagem, sem uma com-
preensão sob todos os aspectos, mas ultrapassando a nós mesmos, pois quem
acessa os dois lados de seu próprio limite ultrapassa o seu limite em si mesmo. É
o caminho para o pós-homem, quiçá a sua futura linguagem.

Ora, o ser já é um recorte na totalidade que é algum-todo-nenhum-


-aquém-entre-além-ser-não-ser-imanente-transcendental-a-si-mesmo. Portanto,
se a primeira pergunta, ou a pergunta mais originária, que serviria de base para
toda compreensão humana for sobre o ser, ou sobre o sentido do ser, nós seguire-
mos partindo do que é parte do absoluto enquanto máxima totalidade radical no
qual sempre estamos inseridos. Logo, significa partir da segunda pergunta mais
fundamental em vez da primeira e mais geral, que é “o que é o absoluto?”, pois o
ser faz parte do absoluto, mas não é o absoluto em si.

Ultrapassando a concepção binária de ser e não ser, abrimos a lingua-


gem humana para um novo espaço multidimensional de possibilidades de verdade
e completude do absoluto enquanto máxima totalidade radical. Estas explosão e
implosão dos conceitos mais gerais da linguagem ser e não ser fragmentam os sen-
tidos da e para a linguagem, criam novos sentidos da e para a linguagem, e abrem a
constante possibilidade de criação de novos sentidos da e para a linguagem. Assim
como abrem possibilidade de novos referentes virem à tona, os quais antes jaziam
velados. Para realizar esse ultrapassamento, deve-se envolver não apenas ser e não
ser, mas todas as possibilidades lógicas destes conceitos (aquilo que poderia ser
dito de uma coisa com um predicado de existência, mas contemporaneamente na
146 lógica são chamados de quantificadores existenciais: algum, todo, nenhum).
O ABSOLUTO E O PÓS-HOMEM

Ora, o absoluto enquanto máxima totalidade radical é a fusão de


todas as possibilidades de quantidades. Algum ser é pelo menos uma entidade;
todo ser é o conjunto completo de entidades; nenhum ser, o seu oposto, o não ser
enquanto o nada. No entanto, para abarcar a máxima totalidade radical, teremos
ainda que incluir não só toda quantidade possível de ser e não ser, como também
as gradações geradas pelas implosão e explosão dos conceitos ser e não ser. En-
tendemos gradações como processos em que entidades estão em posições nas
quais não conseguimos determiná-las como pertencente ao ser, e a negação de
suas propriedades como pertencendo ao não ser, mas posições tais como entre,
aquém, além ser e não ser. Na posição entre ser e não ser, essas entidades são
contraditórias em si, isto é, pode-se atribuir delas todos os predicados que fazem
parte da totalidade do ser. Podemos dizer que essas entidades possuem e não
possuem uma propriedade ao mesmo tempo. Temos como exemplo as singulari-
dades da Física. As singularidades podem ser observadas com comportamentos
contraditórios, existindo e não existindo, por exemplo, em um mesmo ponto do
espaço e do tempo. Poderiam arguir contra nosso exemplo das singularidades,
essas entidades não são suficientemente conhecidas para termos certeza de que
não são entidades ficcionais da física quântica, que nós aprovaríamos. O impor-
tante para a incorporação-concepção de algum-todo-nenhum-aquém-entre-além-
ser-não-ser-imanente-transcendental-a-si-mesmo como a resposta que abre mais
possibilidades de verdade e completude do absoluto enquanto máxima totalida-
de radical é que essas entidades sejam possíveis e não necessariamente existen-
tes. Chamamos essa gradação de possibilidade entre ser e não ser.

Em outra possibilidade de posição em relação ao absoluto, entidades po-


dem, no devir, estar em uma posição inferior ao ser e não ser. Isso é, são capazes de estar
fora dessas totalidades lógicas binárias referidas nesses conceitos, estar aquém de ser e
não ser. Possibilidade a que não se pode atribuir nenhum predicado e nenhuma nega-
ção de predicado. Predicados cuja afirmação se pode atribuir como integrantes ao con-
ceito de ser. Lembrando que estamos trabalhando o conceito de ser por meio de duas
concepções. Na primeira concepção, ser como algo que está presente na experiência
de vida de todo homo sapiens finito e histórico em algum momento entre o nascimento
e a morte, é alguma relação de sua compreensão de si como um com a multiplicidade
de outros nesse todo ordenado que se chama de mundo. Na segunda concepção, toda a
coisa, toda a ação e todo o pensamento atualizados em algum ponto do espaço e tempo.
Predicados cuja negação podemos atribuir como integrantes ao conceito de não ser. O 147
não ser, enquanto polo oposto desta relação binária, na primeira concepção, como o que

O ABSOLUTO E O PÓS-HOMEM
não está presente na experiência de vida de todo homo sapiens finito e histórico pelo
menos em algum momento entre o nascimento e a morte, o que não é alguma relação
de sua compreensão de si como um com a multiplicidade de outros neste todo ordena-
do que chama de mundo. Na segunda concepção, não é uma coisa, não é uma ação e
nem um pensamento atualizados em algum ponto no espaço e tempo.

Na última possibilidade de gradação, temos a posição superior a


esses conceitos, essas entidades podem, no devir deste universo consistente-in-
consistente-aconsistente ou de todo universo possível consistente-inconsisten-
te-aconsistente, do nada e do ser interno a este universo consistente-inconsis-
tente-aconsistente, do possível nada e do possível ser interno a todo universo
possível consistente-inconsistente-aconsistente, e do possível nada e do possível
ser externo a este universo consistente-inconsistente-aconsistente e a todo uni-
verso possível consistente-inconsistente-aconsistente, todo pensamento possível
consistente-inconsistente-aconsistente, toda ação possível consistente-incon-
sistente-aconsistente estar em uma posição superior a essas totalidades lógicas,
estar além de ser e não ser. Neste caso, temos duas possibilidades. Na primeira,
haver possíveis predicados cuja afirmação não poderia estar contida no conceito
de ser e nem cuja negação poderia estar contida no conceito de não ser. Na segun-
da possibilidade, uma entidade que pode estar numa posição de tal superioridade
que seja possível atribuir a ela todos os predicados que compõem o ser e, conse-
quentemente, as negações que compõem o não ser e, ainda, predicados que não
podem estar contidos nessas totalidades lógicas opostas.

Por fim, o ultrapassamento ontológico, lógico, epistêmico, ético,


político, estético, artístico, científico e existencial exige uma última categoria
de abertura. O absoluto enquanto máxima totalidade radical deve ser interno
a todas as possibilidades descritas como possibilidades lógicas, possibilidades
de gradações, entre a totalidade composta pelo ser e por sua totalidade oposta
não ser, portanto imanente a si mesmo. Por outro lado, compreendemos que so-
mos limitados e finitos. Deve haver ainda aquilo que nos escape totalmente, que
não esteja contido em toda a possibilidade de quantidade lógica, nem em toda
a possibilidade de gradação entre ser e não ser. Este apontar para fora de si é o
ultrapassamento de si mesmo. A expressão para designar o absoluto enquanto
máxima totalidade radical deve acenar para sua própria superação. Chamamos
148 esse atributo de transcendente a si mesmo. Chegamos, então, à fusão da explo-
são e da implosão dos conceitos mais gerais da linguagem ser e não ser. Toda a
O ABSOLUTO E O PÓS-HOMEM

possibilidade de quantidade lógica, toda a possibilidade de gradação, seu caráter


imanente e transcendente a si mesmo: o que é o absoluto? Algum-todo-nenhum-
-aquém-entre-além-ser-não-ser-imanente-transcendental-a-si-mesmo.

A incorporação-concepção de algum-todo-nenhum-aquém-entre-
-além-ser-não-ser-imanente-transcendental-a-si-mesmo nos apresenta as possi-
bilidades que possam ser mais sutis que esses dois conceitos no devir das entida-
des que compõem o absoluto. São geradas pela implosão e explosão dos conceitos
mais gerais do entendimento ser e não ser.

Na verdade, “O que é absoluto?”, diferente do que foi dito, no início,


da Metafísica, sobre “O que é o ser?”, não é a primeira pergunta, mas a pergunta
onipresente não só no campo teórico, mas também na existência individual de
cada indivíduo, pois, quando elaboramos a melhor resposta acessível a nós, en-
quanto homo sapiens finitos e históricos, estamos diante da transformação de uma
totalidade que antes era o mundo ou este universo. Compreensão que chamamos
de visão de mundo, para o absoluto enquanto máxima totalidade radical, o qual
não é apenas este mundo ou este universo consistente-inconsistente-aconsisten-
te, mas também todo universo possível consistente-inconsistente-aconsistente,
o nada e o ser interno a este universo consistente-inconsistente-aconsistente, o
possível nada e o possível ser interno a todo universo possível consistente-in-
consistente-aconsistente, o possível nada e o possível ser externo a este universo
consistente-inconsistente-aconsistente e a todo universo possível consistente-in-
consistente-aconsistente, todo pensamento possível consistente-inconsistente-a-
consistente, toda ação possível consistente-inconsistente-aconsistente.

Quando a totalidade-do-nosso-ser-racional-intuitivo-pulsional-sen-
sitivo-sensível-instintivo-imaginativo-místico-consciente-inconsciente atinge
uma intensidade inaudita por meio do cultivo dessa totalidade de forças que nos
compõem, incorporamos-concebemos algum-todo-nenhum-aquém-entre-além-
ser-não-ser-imanente-transcendental-a-si-mesmo. Essa incorporação-concepção
altera de várias formas a totalidade-do-nosso-ser-racional-intuitivo-pulsional-sen-
sitivo-sensível-instintivo-imaginativo-místico-consciente-inconsciente. Nossa vi-
são de mundo é transformada no aceno-onipresente-da-onisciência-de-mundos. A
grande moderação tolerante é nosso novo critério em relação às crenças teóricas,
crenças práticas e ações. Nossos novos sentidos geral e individual da vida são ela- 149
borados. Fragmentamos, criamos e mantemos em abertura os sentidos da e para a

O ABSOLUTO E O PÓS-HOMEM
linguagem. O antigo desejo velado de vir-a-ser Deus torna-se o desejo da totalidade-
do-nosso-ser-racional-intuitivo-pulsional-sensitivo-sensível-instintivo-imaginati-
vo-místico-consciente-inconsciente de vir-a-ser Deus-que-ultrapassa-a-si-mesmo.

II.XIII

EU, ALMA, CORPO E MENTE

Será que conseguimos distinguir os conceitos eu, corpo, alma e mente?

Na antiguidade, Platão acreditava que a alma era a única que tinha


contato com o Mundo das Ideias. Lar das essências, o verdadeiro ser da pura forma.
Enquanto o mundo sensível, único mundo possível ao corpo, era um mero reflexo,
inferior e imperfeito, do ideal das formas, em que repousava o ser, o belo e o bem.
Esses três conceitos eram na verdade um só. Unidade imutável, perfeita e eterna.
Já seu discípulo Aristóteles acreditava no contrário, a ontologia (exceto no caso de
uma entidade especial, o primeiro motor, que era pura forma, como as entidades do
Mundo das Ideias) era extraída dos particulares do mundo sensível. A alma era a
unidade que projetava os modos de ser do homem. Unidade com funções distintas,
todavia. Entre elas estava a razão, a diferença específica que distinguia a essência
do homo sapiens finito e histórico dos outros animais. As funções da alma eram
dividas em razão, sensibilidade e funções vegetativas, tais como crescer, nutrir-se,
reproduzir-se, perecer. Contudo, ambos não responderam de modo plenamente
satisfatório como se dá a união entre corpo, alma e mente. Aliás, a ideia de uma
consciência capaz de organizar estas entidades em uma unidade que chamamos de
eu não era posta em pauta antes dos modernos, principalmente nos moldes em que
estamos acostumados a entender a consciência na contemporaneidade.
Muitos filósofos tentaram distinguir o corpo da alma. Séculos mais
tarde no período moderno, esta divisão era chamada de dualismo. Quanto aos
dualistas, Descartes, um dos principais representantes, foi fundo nas represen-
150 tações mentais. Autor da famosa frase “penso, logo existo”, proposição, a qual
tem o eu como premissa implícita, não resolveu com a divisão entre corpo e alma
O ABSOLUTO E O PÓS-HOMEM

as questões quanto ao que é a alma; o que é o corpo; o que é a mente; e o que é a


unidade que une essas entidades, isto é, o eu já que o pressupõe porque pensa.

Outros tentaram reduzir a totalidade que chamamos homem em re-


lações causais naturais, ou fisicalistas. São os materialistas. É uma forma bem útil
de pensar o ser do homem, no entanto tem alguns problemas sérios.

O primeiro é como colocar o pensamento cujo conteúdo não é material


em uma relação causal que é, por essência, uma relação física entre corpos, e estes
são materiais. Como explicar o pensamento com relações causais, portanto, relações
físicas, com outro pensamento que é dito através de um conjunto de proposições que
não são entidades físicas e assim justificar a materialidade do primeiro pensamento?

Segundo, as leis causais, são leis físicas, e a física, da modernidade à


contemporaneidade, só lida com o ser sob um certo aspecto. Lida com o movimento
dos corpos. Ora, o movimento é medido através de propriedades quantitativas e não
qualitativas. As perguntas “o que é o eu?”, “o que é alma?”, “o que é o corpo?” e “o que
é a mente?” são perguntas metafísicas, as quais envolvem a totalidade de proprie-
dades que essas entidades possam possuir em suas respectivas constituições. Sendo
metafísicas, são perguntas anteriores à física, visto que são mais fundamentais.

Como sempre, as dificuldades dos filósofos nos mostram de onde


nasce a nossa pergunta, “o que é o absoluto?”. Toda a história da metafísica é a
busca de respostas às questões mais fundamentais da existência ou, como diria
Mc Taggart, na frase inaugural da sua obra Some Dogmas of Religion, “By Meta-
physics I mean the sistematic study of the ultimate nature of reality,(...)”26.

Praticamente, todos os grandes filósofos tentaram estabelecer prin-


cípios fundamentais da existência ou da realidade, cada qual ao seu modo, e to-

26
McTaggart, John Elis McTaggart. Some Dogmas of Religion. Edward Arnold 41 & 43v Madox Street, Bond
Street. W. Londres.1906. Pág.21.
dos obtiveram sucesso parcial, pois a investigação filosófica sempre se pautou na
razão como instrumental para entender a realidade. Pela sua própria definição, a
razão é algo finito que analisa passo a passo as conexões entre as proposições de
um argumento para verificar sua validade lógica. Método que foge do regresso ao 151
infinito, pois uma cadeia infinita de proposições não pode gerar uma conclusão.

O ABSOLUTO E O PÓS-HOMEM
O que não seria problema se o absoluto, enquanto máxima totalidade radical,
fosse finito e fosse possível de separá-lo em objetos ainda menores, capazes de
serem desvelados de modo absolutamente verdadeiro e absolutamente completo.

Nós, todavia, através das investigações que geraram nossa resposta à


pergunta “o que é o absoluto?”, deparamo-nos com a impossibilidade de determi-
nar o absoluto enquanto máxima totalidade radical como finito e divisível. Nós o in-
corporamos-concebemos como imanente e transcendente ao finito, infinito e afinito
(sentimos-nos obrigados a criar este neologismo, para lidar com relações do nada
com o absoluto). As questões fundamentais investigadas na disciplina metafísica pe-
los filósofos são parte do absoluto enquanto máxima totalidade radical, assim como
qualquer possibilidade lógica, ilógica e alógica (outro neologismo que nos sentimos
na obrigação de criar). É, então, a nossa razão impossibilitada de responder qualquer
questão de modo absolutamente verdadeiro e absolutamente completo.

Sendo assim, o desejo inconsciente e ou velado de ser aquele que é


capaz de responder, se não todas as perguntas, pelo menos alguma pergunta de
modo absolutamente verdadeiro e absolutamente completo esteve presente na
história da humanidade. Nós compreendemos este desejo velado e ou incons-
ciente do homo sapiens finito e histórico como desejo de vir-a-ser Deus.

Agora, nós não só tornamos tal desejo consciente como o transformamos


num desejo mais profundo: desejamos vir-a-ser Deus-que-ultrapassa-a-si-mesmo.27

27
Estas mudanças, assim como outras mudanças radicais, são possíveis graças à explosão e à
implosão dos conceitos mais gerais da linguagem que geram a expressão que designa o abso-
luto enquanto máxima totalidade radical como algum-todo-nenhum-aquém-entre-além-ser-
-não-ser-imanente-transcendental-a-si-mesmo. O fato de podermos elaborar tal expressão prova a capa-
cidade para além da lógica vigente de nosso pensamento. Sob certos aspectos, somos capazes de pensar
o ilógico e o alógico também. Aliás, já existem lógicos como os de Amsterdam que admitem desconhe-
cer os limites do pensável. Não negando tais limites apenas admitindo sua incapacidade de concebê-los.
Já sabem, todavia, estes vanguardistas da lógica que o princípio de não contradição (o qual veda a possibi-
lidade de duas proposições p e ~p serem verdadeiras ao mesmo tempo) não é o limite do pensável. Isto por
si só abre a possibilidade para que sejamos capazes de uma nova lógica no futuro, quem sabe de alguma
maneira mais próxima da fusão entre lógica, ilógica e alógica.
Depois dessa explicação sobre as razões do surgimento das novas
possibilidades para a filosofia que estamos propondo nesta obra, voltemos ao
tema propriamente dito da seção.
152
Nós, em vista do exposto, incorporamos-concebemos algum-todo-ne-
O ABSOLUTO E O PÓS-HOMEM

nhum-aquém-entre-além-ser-não-ser-imanente-transcendental-a-si-mesmo, portanto
somos obrigados a não separar mais alma, corpo, mente e eu, pois o próprio processo
de elaboração dessa expressão para designar o absoluto enquanto máxima totalidade
radical nos leva a fusão da totalidade-do-nosso-ser-racional-intuitivo-pulsional-sensi-
tivo-sensível-instintivo-imaginativo-místico-consciente-inconsciente. Para podermos
implodir e explodir os conceitos mais gerais da linguagem ser e não ser, precisamos
nos elevar a uma intensidade tal, que só pode ser gerada pela fusão das forças que nos
compõem. Isto é, pela fusão da totalidade-do-nosso-ser-racional-intuitivo-pulsional-
sensitivo-sensível-instintivo-imaginativo-místico-consciente-inconsciente.

Então, se para responder a pergunta que julgamos ser a mais fun-


damental de todas as perguntas fundamentais da metafísica, precisamos elevar a
totalidade-do-nosso-ser-racional-intuitivo-pulsional-sensitivo-sensível-instintivo-
-imaginativo-místico-consciente-inconsciente a uma intensidade inaudita, em que
a fusão de nossas forças gera a incorporação-concepção de algum-todo-nenhum-a-
quém-entre-além-ser-não-ser-imanente-transcendental-a-si-mesmo como a res-
posta que abre um número indeterminado de novas possibilidades de verdade e
completude do absoluto enquanto máxima totalidade radical. Parece-nos, então,
sem sentido falar de separação do nosso ser em alma, corpo, mente e eu. Nosso ser
atinge seu limite e seu ultrapassamento quando funde a totalidade de suas forças.

As separações do nosso ser, mesmo que conceitualmente em entidades


distintas, diminui as possibilidades de verdade e completude conceitual da totalida-
de de forças que nos compõem. Numa analogia, para abrirmos novas possibilidades
de verdade e completude do absoluto enquanto máxima totalidade radical, devemos
compreendê-lo sem separá-lo em objetos, para que possamos abrir novas possibilida-
des de verdade e completude da totalidade de forças que compõem nosso próprio ser,
não devendo, assim, separá-lo em objetos. Já que a resposta à pergunta mais funda-
mental deve iluminar toda possibilidade de resposta a toda possibilidade de pergunta.

No plano prático, concebermos a nós mesmos em partes como obje-


tos que nos compõem, que diminuem nossa potencialidade, dificultando ainda mais
vivermos de acordo com o sentido individual e o sentido geral da vida inteligente.
Aprendemos que a fusão das nossas potencialidades cria possibilidades de aproxima-
ção aos sentidos geral e individual da vida inteligente. Ambos os sentidos da vida in-
teligente têm como propósito estar sempre abrindo novas possibilidades de verdade 153
e completude do absoluto enquanto máxima totalidade radical; tem como fim a nós,

O ABSOLUTO E O PÓS-HOMEM
homo sapiens finito e histórico, aproximarmo-nos de Deus-que-ultrapassa-a-si-mes-
mo; e tem como fim último da vida inteligente: ser Deus-que-ultrapassa-a-si-mesmo.

II. XIII.I

IDENTIDADE PESSOAL

A essência do ser-aí28 está em sua existência. As características que se


podem extrair deste ente não são, portanto, “propriedades” simplesmente dadas de
um ente simplesmente dado que possui esta ou aquela “configuração”. As caracte-
rísticas constitutivas do ser-aí são sempre modos possíveis de ser e somente isso.”29

É possível aceitar que, quanto à identidade de particulares a exce-


ção de nós indivíduos particulares - representantes do universal homo sapiens
finito e histórico -, Leibniz formulou um conceito satisfatório para identidade
sincrônica, isto é, sem passagem do tempo. Princípios conhecidos como da indis-
cernibilidade dos idênticos e da identidade dos indiscerníveis são critérios úteis,
mas reducionistas. Ora, não existe não passagem do tempo, que existe é não per-
cepção das mudanças nos entes na passagem do tempo. Há de se pressupor que
qualquer ente está a todo tempo com os mais variados processos de mudança
relativos às suas propriedades.

Todavia, houve uma complementação que chamam de identidade

28
A formulação “ser-aí” não está de acordo com a obra citada que prefere a tradução “presença”. Não
concordo com esta definição por isso optei por alterar o termo na citação por “ser-aí”, o qual é largamente
aceito pelos comentadores e na opinião deste autor está mais próximo do termo original “Dasein”.
29
Heidegger, Martin. Ser e Tempo.2ed. Vozes. Vozes. Editora Universitária São Francisco. Bragança Paulis-
ta.2007.Pág. 85-86.
diacrônica, na qual a mudança é visível, o que pode ser resumido como conti-
nuidade qualitativa, continuidade espaço-temporal e a manutenção do que hoje
chamam de sortal. Sortal seria o tipo de coisa no qual um objeto particular é des-
154 crito como pertencente, por exemplo, sortal caneta, o qual representa todas as ca-
netas particulares do mundo. Embora, todos esses critérios sejam questionáveis
O ABSOLUTO E O PÓS-HOMEM

para uma determinação absoluta de identidade, nosso objetivo é tratar do mais


controverso critério de identidade nesta subseção: a identidade pessoal, afinal o
que torna um homem o que ele é? Será sua memória, como queria Locke, será seu
corpo, como querem os materialistas, ou será sua consciência?

Como sempre, há defesas e há problemas em todas teses. Ainda


dentro da tradição do ser, embora seja considerada uma vertente alternativa à
tradição tomada hoje em dia como metafísica analítica que trata questões como
identidade, a fenomenologia, representada por Heidegger, parece estabelecer
melhor o que torna um homem o que ele é do que a memória, o corpo ou a cons-
ciência. Heidegger, ao constituir o ser-aí (o que, grosso modo, podemos chamar
de homem, palavra que autor tentou evitar para não cair na definição da tradi-
ção de animal racional) com sua analítica existencial, estabelece que o homem
já sempre tem uma compreensão ôntica, pré-ontológica de si mesmo. Essa com-
preensão de que já sempre temos de nosso ser, como um em relação aos outros
seres e a totalidade que já sempre estabelecemos como mundo, juntamente com o
trecho que citamos no início da seção, o qual determina a essência do ser-aí como
modos de ser, parece mais interessante como critério de identidade pessoal que
os esforços da tradição de Locke aos analíticos30.

Mas nós, que incorporamos-concebemos algum-todo-nenhum-a-


quém-entre-além-ser-não-ser-imanente-transcendental-a-si-mesmo, não podemos
aceitar nada menos que a fusão da totalidade-do-nosso-ser-racional-intuitivo-pul-
sional-sensitivo-sensível-instintivo-imaginativo-místico-consciente-inconsciente-
meditativo-volitivo para estabelecer a nossa identidade pessoal. Um homo sapiens
finito e histórico é o que é devido à totalidade que o compõe. O resto são reduções
úteis, que podem resolver problemas de mundos possíveis, no entanto sempre en-
contrando algum problema insolúvel.

30
Alguns devem argüir que não existe uma tradição em comum entre Locke e os analíticos. O que posso
concordar sobre certos aspectos. Todavia, o que chamo de tradição é sobre tudo o dogmatismo, que em
essência acredita que as proposições podem revelar verdades objetivas a respeito do mundo ou da realida-
de. Sob este aspecto há uma tradição que possui representantes de Platão aos analíticos contemporâneos.
Contudo, nós somos adeptos da grande moderação tolerante: toda
proposição é parcialmente verdadeira, parcialmente falsa e incompleta em rela-
ção ao absoluto enquanto máxima totalidade radical. Só haveria verdade absoluta
e completude absoluta se um ser fosse capaz de igualar-se algum-todo-nenhum-a- 155
quém-entre-além-ser-não-ser-imanente-transcendental-a-si-mesmo. Uma vez que

O ABSOLUTO E O PÓS-HOMEM
este ser não existe, ou pelo menos qualquer contato com um ser assim nos foi ve-
dado, o máximo que podemos esperar é que a fusão das forças que nos compõem,
atotalidade-do-nosso-ser-racional-intuitivo-pulsional-sensitivo-sensível-instintivo-
-imaginativo-místico-consciente-inconsciente-meditativo-volitivo, seja um critério
que abra o máximo de possibilidades de verdade e completude da identidade pes-
soal em relação ao absoluto enquanto máxima totalidade radical, cônscios de que
nunca será um critério absolutamente verdadeiro e absolutamente completo.

II.XIV

ESTÉTICA

Vamos determinar o artista de gênio como sujeito criador da obra


de arte. Para facilitar nossa análise, excluiremos o artista clichê, ou o artista não
original, pois estamos interessados naquele que cria uma forma inaudita de inter-
pretação da sua relação com o mundo através da sua expressão artística.

Não será o artista de gênio aquele que brinca de criar mundos? Se


há um criador para o mundo, Deus seria esse criador para o senso-comum e para a
tradição filosófica. Para nós, que incorporamos-concebemos algum-todo-nenhum-
-aquém-entre-além-ser-não-ser-imanente-transcendental-a-si-mesmo, seria Deus-
que-ultrapassa-a-si-mesmo. Então, para uma melhor determinação, o artista de
gênio é aquele que cria uma obra original no sentido da relação da totalidade de
seu ser racional-intuitivo-pulsional-sensitivo-sensível-instintivo-imaginativo-mís-
tico-consciente-inconsciente com o mundo. Se somos finitos e históricos, essa rela-
ção se dá no tempo deste artista, ou seja, na contemporaneidade de sua existência.
Da fusão entre artista e mundo, dá-se a obra de arte, que, por si, é um novo mundo.
Então, como definir o que é estética, se o conceito parece ser exterior ao mundo em
que foi criado? Se é um outro, o filósofo por exemplo, que vai conceituar aquilo que
lhe é alheio, embora apenas parcialmente alheio, pois ambos – filósofo e artista -
156 são no mundo na mesma contemporaneidade. Ademais nada é radicalmente alheio
a ponto de ser absolutamente falso em relação a algum-todo-nenhum-aquém-entre-
O ABSOLUTO E O PÓS-HOMEM

-além-ser-não-ser-imanente-transcendental-a-si-mesmo.

Avancemos. Resta-nos responder as perguntas que criamos, ainda


que nossas respostas jamais possam ser absolutamente verdadeiras. A estética tra-
dicionalmente está ligada a julgamentos de beleza, como toda tradição é baseada
numa bivalência: belo e feio. As discussões são das mais variadas. Kant considerava
aquilo que dá prazer ao sujeito que observa a natureza ou uma obra de arte impor-
tante no julgamento estético. Alguns pensadores contemporâneos agregaram mais
algumas distinções à concepção de kantiana, como elegância e delicadeza. Simbley,
em contrapartida, formulou uma concepção que depende de uma sensibilidade es-
pecial, para ele nem todos podem enxergar a beleza da arte ou da natureza.

Por outro lado, Nietzsche, que não é contemporâneo, mas certamente


é uma grande influência para todas as vertentes contemporâneas, considerava a
arte como uma das demonstrações mais importantes da vida, de afirmação da vida,
expressão de potência para vida. Entretanto, dividia arte em romântica e clássica,
dando preferência a esta: a arte clássica como representante do melhor desenvolvi-
mento das forças que nos compõem. Ativas e reativas, hierarquizando seus embates
para que ambas possam ser na máxima intensidade. Esse cultivar da totalidade de
forças que nos compõem tem seu apogeu no artista clássico. Mas, se Nietzsche criou
um conceito de übermensch, imaginamos que não era com intuito de apenas voltar
ao passado, e sim para que pudéssemos evoluir a ponto de tornarmo-nos um ser
que não pode mais ser chamado de homem, porém é a superação do homem.

Nósqueincorporamos-concebemosalgum-todo-nenhum-aquém-entre-
-além-ser-não-ser-imanente-transcendental-a-si-mesmo com intuito de abrir o máxi-
mo de possibilidades de ultrapassarmos a nós mesmos, acreditamos que os filósofos
posteriores a Nietzsche devem ter aprendido o sentido da terra no lugar do sentido
do supra-terreno. O filósofo-artista é o futuro filósofo pós-nietzscheano. Em um certo
sentido, possui o domínio do estético e, em outro, o domínio da razão e da lógica.

Para nós a beleza é tudo aquilo que abre novas possibilidades de


verdade e completude do absoluto enquanto máxima totalidade radical. Quanto
mais complexo de significações for a nossa relação com uma paisagem natural ou
obra de arte, estaremos abrindo mais possibilidades de ultrapassar a nós mesmos,
e mais interpretações essa relação poderá proporcionar, maior será seu aceno rumo 157
à explosão e à implosão do ser e não ser. Mais rica de possibilidades de verdade

O ABSOLUTO E O PÓS-HOMEM
e completude de algum-todo-nenhum-aquém-entre-além-ser-não-ser-imanente-
transcendental-a-si-mesmo. As experiências estéticas podem ocorrer tanto quando
trazem à tona aquilo que de alguma forma - inconscientemente ou conscientemen-
te - em nós se encontrava, quanto quando revelam aspectos ainda totalmente des-
conhecidos por nós. Atingem o sujeito em um grau ainda mais elevado de beleza,
pois tudo aquilo que obscuramente sempre quisemos é vir-a-ser Deus, e ser Deus é
ser onisciente, onipotente, onipresente. Esse era o ideal que tínhamos antes de atin-
gir a explosão e a implosão dos conceitos mais gerais da linguagem ser e não ser,
pois ainda não conhecíamos o significado mais profundo da existência: igualar-se
a algum-todo-nenhum-aquém-entre-além-ser-não-ser-imanente-transcendental-a-
si-mesmo, possibilidade reservada a Deus-que-ultrapassa-a-si-mesmo.

Para nós, que incorporamos-concebemos algum-todo-nenhum-a-


quém-entre-além-ser-não-ser-imanente-transcendental-a-si-mesmo, a beleza
está diretamente ligada a tudo aquilo que busca o igualar-se com Deus-que-ul-
trapassa-a-si-mesmo.

Enquanto seres finitos que somos, tudo que podemos fazer é aproxi-
mar nossa existência do igualar-se a Deus-que-ultrapassa-a-si-mesmo. Esse igua-
lar-se abre caminho para a sua plenitude a partir do cultivo das forças que nos
compõem. Quando a totalidade-do-nosso-ser-racional-intuitivo-pulsional-sensi-
tivo-sensível-instintivo-imaginativo-místico-consciente-inconsciente ascende à
intensidade em um grau tão elevado de potência, nosso ser funde-se, gerando
a incorporação-concepção de algum-todo-nenhum-aquém-entre-além-ser-não-
ser-imanente-transcendental-a-si-mesmo. Este homem, que todos nós somos ou
podemos ser, é capaz de viver a máxima intensidade dessa totalidade que o com-
põe, será o novo criador de mundos, será aquele que o filósofo, e não o próprio
artista criador, definirá com um determinado conceito estético. Para nós, além
do artista, igualmente será um criador estético o filósofo, o cientista, o profeta,
o político, que tenha incorporado-concebido algum-todo-nenhum-aquém-entre-
-além-ser-não-ser-imanente-transcendental-a-si-mesmo.
A própria vida daqueles que ascenderem a totalidade-do-
seu-ser-racional-intuitivo-pulsional-sensitivo-sensível-instintivo-imagina-
tivo-místico-consciente-inconsciente à intensidade em um grau capaz de
158 incorporar-conceber algum-todo-nenhum-aquém-entre-além-ser-não-ser-imanen-
te-transcendental-a-si-mesmo será um evento estético. Ascender que é regulado
O ABSOLUTO E O PÓS-HOMEM

pela finitude. A máxima intensidade possível por mais tempo, é o que desejamos,
finitos que somos. Por isso, dizemos que o sentido individual da vida é elevar a
intensidade da totalidade-do-nosso-ser-racional-intuitivo-pulsional-sensitivo-sen-
sível-instintivo-imaginativo-místico-consciente-inconsciente até que nossas forças
fundam-se incorporando-concebendo algum-todo-nenhum-aquém-entre-além-ser-
-não-ser-imanente-transcendental-a-si-mesmo, intensidade que é intercalada com
pausas de descanso devido à nossa fragilidade enquanto seres finitos que perecem
e morrem. É a otimização máxima de intensidade qualitativa e quantitativa de vida.

Assim como no sentido geral da vida, aquele que cria na ciência, na


política, ou em qualquer outra área do conhecimento, da vida prática ou teórica,
inovações rumo à criação do pós-homem será igualmente um criador estético.

II.XV

IDEOLOGIAS

Na concepção tradicional de ideologia, o termo foi cunhado por Claude


Destutt de Tracy, pensador francês do século XIX, no seu estudo sobre o Iluminismo.
Para Tracy, ideologia era o estudo das ideias e de suas origens. Nós não estamos tra-
tando o termo com este significado nessa seção. Esclareceremos nossa intenção.

O homem sofre de um problema insolúvel, ele deseja saber a ver-


dade absoluta e a completude absoluta do mundo, no entanto jamais atingiu ou
atingirá a satisfação deste desejo. Para nós que incorporamos-concebemos al-
gum-todo-nenhum-aquém-entre-além-ser-não-ser-imanente-transcendental-a-
si-mesmo, indivíduos parte deste conjunto, ou em termos biológicos parte desta
espécie chamada de homem, ou ser humano, ou homo sapiens, ou homo sapiens
sapiens, ou preferimos, ainda, ser chamados de homo sapiens finito e histórico,
compreendemos que só haveria acesso à verdade deste mundo se houvesse aces-
so à verdade absoluta e à completude absoluta do absoluto enquanto máxima 159
totalidade radical, embora a nossa constituição de ser finito e histórico torne im-

O ABSOLUTO E O PÓS-HOMEM
possível o conhecimento absolutamente verdadeiro. Assim, não apenas nós, mas
todo homem vive sempre angustiado com o mistério de existir, e, principalmente,
com uma asserção ainda mais terrível: um dia deixará de existir. Não há dúvidas,
pela experiência empírica que tudo aquilo que é um determinado ente, com uma
determinada identidade e um determinado tipo (ou essência) no presente dei-
xará de sê-lo no futuro. Qualquer outra crença suprassensível não pode negar a
experiência diária de todos nós da finitude dos entes. Aliás, as crenças suprassen-
síveis pouco importam, a morte é real, tão real quanto a vida. O pós-morte é que
é imaginado, tanto quando é o nada quanto quando é outra vida que não esta em
que sempre existimos enquanto este ser que somos.

Desde sempre precisamos dar sentido a nossa existência através de


crenças com maior ou menor proporção de verdade, falsidade e completude em
relação ao absoluto enquanto máxima totalidade radical. Assim como no plano mo-
ral, há crenças em maior ou menor proporção de correção em relação ao bem, isto
é, parcialmente certas, parcialmente erradas e incompletas em relação ao absoluto
enquanto máxima totalidade radical. Logo, desde que constituímos uma lingua-
gem capaz de formar proposições, criamos crenças que serviram de apoio existen-
cial para viver no absurdo de desconhecer a razão de um dia termos nascido neste
mundo e a razão de um dia termos de morrer neste mundo. Estas crenças, quando
são práticas e coletivas, podem ser chamadas de ideologias no sentido que entende-
mos o termo no senso-comum da contemporaneidade. Há outros significados para
o termo. Nós, entretanto, concentraremo-nos na ideologia enquanto crenças práti-
cas e coletivas, mais especificamente enquanto crenças políticas.

Neste sentido, uma das últimas ideologias que parece haver morri-
do no mundo contemporâneo é o Comunismo, ideal que tinha em sua essência a
união dos homens em prol da igualdade: o fim da propriedade privada, do Estado
e das classes sociais. Todo ideal é uma utopia, a qual seus defensores buscam
tornar realidade numa situação futura. Assim foi o Comunismo, uma ideia que
teve um funcionamento desastroso na prática, pois seu princípio primeiro, “cada
um faz de acordo com sua capacidade e cada um recebe de acordo com sua neces-
sidade”, não passava de uma proposição mal projetada enquanto possibilidade
de cenário das relações políticas econômicas e sociais do futuro. Eles desejavam
que esta proposição fosse universalmente válida, o modo de viver mais justo para
160 a sociedade mundial constituída pelo homo sapiens finito e histórico. Acontece
que na prática o homem não quer viver de modo igualitário e não quer dar sua
O ABSOLUTO E O PÓS-HOMEM

capacidade para o bem comum da sociedade planetária do homo sapiens finito


e histórico. Nem sequer existem meios de medir a necessidade de cada homo
sapiens finito e histórico, do mesmo modo, não podemos medir se um indivíduo
está realmente dando o máximo de si. Esta proposição pressupõe que a maioria,
se não todo homem, daria tudo de si num modelo como este de sociedade. Crença
sem qualquer respaldo empírico na realidade.

Atualmente, a ideologia mais difundida é a preservação ambiental.


Devido a nossa sede de poder, o processo tecnológico e industrial vem destruindo
o planeta a ponto de obrigar-nos a repensar o modo como vivemos, pois, pela
primeira vez na história, há possibilidade de destruirmos o meio ambiente, com
risco de tornarmos a vida impossível no nosso planeta.

Nós que incorporamos-concebemos algum-todo-nenhum-aquém-


-entre-além-ser-não-ser-imanente-transcendental-a-si-mesmo postulamos novos
sentidos para a vida inteligente, consequentemente novos sentidos para vida do
homo sapiens finito e histórico. Para nós o ideal ecológico é necessário proviso-
riamente como único modo de manutenção da vida. Salvar o planeta não resolve
o problema da nossa morte e nem o da nossa ignorância diante do mistério de
existir. Acreditamos que a manutenção do meio ambiente é uma razão neces-
sária, mas não suficiente para atingirmos os sentidos individual e geral da vida
inteligente criados por nós. Em analogia ao que diria Aristóteles sobre os bens
externos como riqueza, família e amigos: são razões necessárias para nossa felici-
dade, mas não são razões suficientes para nossa felicidade.

Desafiaremos agora os opositores aos sentidos individual e geral da


vida inteligente que nasceram da composição da resposta à pergunta “o que é o
absoluto?”. Será possível que haja um sentido mais radicalmente ambicioso para
resolver nossa ignorância diante da existência e nossa fragilidade diante da fini-
tude do que nosso sentido geral da vida inteligente? Concebemos o sentido geral
da vida inteligente e, por consequência, do homo sapiens finito e histórico como
único representante da vida inteligente conhecido. Tornar-se o máximo Deus con-
cebível, na verdade aquele que ultrapassa a concepção tradicional de Deus, para
nós o sentido geral da vida inteligente levado à máxima radicalidade é vir-a-ser
Deus-que-ultrapassa-a-si-mesmo, pois só uma entidade como esta pode igualar-se
a algum-todo-nenhum-aquém-entre-além-ser-não-ser-imanente-transcendental-a- 161
si-mesmo. Em outras palavras, uma entidade como esta pode conhecer a verdade

O ABSOLUTO E O PÓS-HOMEM
absoluta e a completude absoluta do absoluto enquanto máxima totalidade radical.

Infelizmente, este é um longo e incerto caminho. A nós, homo sa-


piens finito e histórico, caberá apenas o primeiro passo em direção ao sentido
geral da vida inteligente: a criação do pós-homem, e ele criará aquele que o ultra-
passará, até que surja um tipo de vida inteligente capaz de igualar-se a algum-to-
do-nenhum-aquém-entre-além-ser-não-ser-imanente-transcendental-a-si-mes-
mo ou até a extinção da vida inteligente.

Quanto ao nosso sentido individual para vida, será que pode haver
um sentido que celebre a vida mais radicalmente do que cultivar a máxima inten-
sidade possível da totalidade-do-nosso-ser-racional-intuitivo-pulsional-sensitivo-
sensível-instintivo-imaginativo-místico-consciente-inconsciente, com intervalos
de descanso, e assim abrir incessantemente novas possibilidades de verdade e
completude de algum-todo-nenhum-aquém-entre-além-ser-não-ser-imanente-
transcendental-a-si-mesmo até o fim de nossas existências. Será que nossos oposi-
tores poderão conceber sentidos para a vida inteligente melhores que estes?

Em última análise, os dois sentidos da vida inteligente se vivencia-


dos são o ultrapassar a nós mesmos existencialmente e enquanto espécie homo
sapiens finito e histórico, ou único representante da vida inteligente conhecido.
Vida inteligente concebida como vida de um ser cuja a totalidade que o compõe é
pelo menos racional-intuitiva-pulsional-sensitiva-sensível-instintiva-imaginati-
va-mística-consciente-inconsciente. Este ultrapassar a nós mesmos é com intuito
de aproximarmo-nos de igualar-se a Deus-que-ultrapassa-a-si-mesmo.

O leitor deve estar se perguntando: mas o sentido geral da vida inte-


ligente e o sentido individual de cada ser inteligente são ideias políticas?

Não há dúvidas que a criação do pós-homem é uma ideia também


política, pois, para atingirmos tal objetivo só com o esforço da coletividade, só
com esta ideia sendo levada a público pelo menos aos principais países de ponta
nas ciências, teríamos chance de orientar tal empreitada. O curioso é que ações
no sentido de modificar o homem já ocorrem, mas sem um objetivo determinado.
O que pode ser perigoso, porque experimentos sem o propósito de expandir a
162 totalidade-do-nosso-ser-racional-intuitivo-pulsional-sensitivo-sensível-instinti-
vo-imaginativo-místico-consciente-inconsciente-meditativo-volitivo podem ge-
O ABSOLUTO E O PÓS-HOMEM

rar algum efeito indesejado no futuro da espécie. Na atualidade ocorrem pesqui-


sas científicas no intuito de modificar o homem, mas elas são isoladas e desejam
atender demandas específicas. De qualquer modo, obtemos avanços na inteligên-
cia artificial, na genética e na neurociência, para citar alguns ramos da ciência
que trabalham em algum grau com a modificação do homem pelo homem.

O pós-homem, caso venha a ser criado e caso nos supere em relação


à totalidade-do-nosso-ser-racional-intuitivo-pulsional-sensitivo-sensível-instin-
tivo-imaginativo-místico-consciente-inconsciente criará novos sistemas políti-
cos, é uma consequência óbvia da nossa superação.

Se, no caso de nosso sucesso, criemos um pós-homem cuja totali-


dade de seu ser é a expansão de nosso ser e quem sabe criação de novas forças
não encontradas na totalidade-do-nosso-ser-racional-intuitivo-pulsional-sensiti-
vo-sensível-instintivo-imaginativo-místico-consciente-inconsciente, e se este ser
seguir nosso projeto adiante, criando com sucesso o seu próprio sucessor, este
superará aquele em relação à totalidade de suas forças e quiçá terá um número
ainda muito maior de novas forças. Obviamente, este sucessor do sucessor do
homo sapiens finito e histórico criará novos sistemas políticos e assim, sucessi-
vamente, ou em algum momento desta sucessão de cenários otimista, em algum
momento futuro, quem sabe, simultaneamente.

Quanto ao sentido individual da vida inteligente, é político porque


ele envolve a totalidade da vida de todo homo sapiens finito e histórico que o
tomar como seu sentido pessoal de existência, assim envolvendo ações políticas
também, como viver de acordo com a intensidade, com intervalos de descanso,
buscando sempre abrir novas possibilidades de verdade e completude de algum-
todo-nenhum-aquém-entre-além-ser-não-ser-imanente-transcendental-a-si-
mesmo trará opositores. Ainda mais que pode envolver agir em prol do sentido
geral da vida inteligente também.

São modos de vida que envolvem o engajamento político, pois aque-


le que lutar pela liberdade de experiências pessoais e pelo pós-homem acabará
em discutir estas ideias na política também. Haverá entraves morais para liber-
dade de certas experiências existenciais, e muito maior ainda será o número de
opositores políticos aos estudos científicos a respeito da criação do pós-homem, 163
principalmente, aos experimentos empíricos. Também, aquele que vive intensa-

O ABSOLUTO E O PÓS-HOMEM
mente a totalidadede-seu-ser-racional-intuitivo-pulsional-sensitivo-sensível-ins-
tintivo-imaginativo-místico-consciente-inconsciente abrirá o maior número de
possibilidades de verdade e completude do absoluto enquanto máxima totalidade
radical, ele consequentemente será mais sábio e adepto da grande moderação to-
lerante. Terá, portanto, qualidades importantíssimas no âmbito político. Assim,
parece que a política se liga de várias formas às ideias que defendemos nesta obra.

II.XVI

AÇÕES

Nossas ações emergem da totalidade-do-nosso-ser-racional-intuiti-


vo-pulsional-sensitivo-sensível-instintivo-imaginativo-místico-consciente-incons-
ciente. Estas forças que nos compõe não nos coabitam apenas de forma harmoniosa,
vivem também - e talvez mais intensamente que de forma harmônica - combates caó-
ticos em busca de supremacia. Quando os interesses são conflitantes, muitas vezes
os resultados são arbitrários em relação aos fins que desejamos atingir. Nossas ações
não são nem sempre racionais, nem sempre irracionais, nem sempre motivadas por
nenhuma força especifica subjugando-a outra. Há também ações originadas de fu-
sões destas forças, são nestes momentos que atingimos maior intensidade no agir.

Não nos reduzimos a ações que visam um fim previamente delibe-


rado, ao mesmo tempo, não somos apenas a batalha entre duas forças como diria
Nietzsche: duas pulsões dionisíaca e apolínea. A poética e a racional. Nós somos
um número indeterminado de forças em combate, em fusão, algumas inativas
enquanto outras estão ativas.
As forças que nos compõe alteram mais variados modos de ser na su-
cessão do tempo e simultaneamente. Podemos ser capazes de usar uma única força.
Ou combinar duas ou mais forças em fusão. Ou anular alguma ou algumas forças
164 pelo combate com alguma ou algumas forças. Provisoriamente batizamos isto que
somos de totalidade-do-nosso-ser-racional-intuitivo-pulsional-sensitivo-sensível-ins-
O ABSOLUTO E O PÓS-HOMEM

tintivo-imaginativo-místico-consciente-inconsciente. Somos capazes de atingir fins,


tanto pequenos como grandes e gerais, em relação a nossa existência. As ações têm
algo de randômico e arbitrário, concomitantemente, algo de racional e deliberado até
atingirmos os fins determinados - os quais podem ser imediatos e não imediatos.

A arte da vida é conviver com as forças que nos compõe de modo


que possamos torná-las mais intensas, não obstante, tenhamos consciência de
suas possibilidades de independência umas das outras, de interdependência de
umas com as outras e de sua inexorável unidade dentro do ser que nós somos.
Devemos cultivar o crescimento das forças que compõe a totalidade-do-nosso-
ser-racional-intuitivo-pulsional-sensitivo-sensível-instintivo-imaginativo-místi-
co-consciente-inconsciente e devemos, também, sermos capazes de direcioná-las
enquanto unidade que somos até que possamos fundi-las. Através desta fusão
incorporar-conceber algum-todo-nenhum-aquém-entre-além-ser-não-ser-ima-
nente-transcendental-a-si-mesmo. Então seremos o ultrapassamento de nós
mesmos. Aqueles que individualmente e coletivamente buscam igualar-se a
algum-todo-nenhum-aquém-entre-além-ser-não-ser-imanente-transcendental-
-a-si-mesmo. Este igualar-se é a síntese dos nossos sentidos individual e geral
da vida inteligente na formulação mais densa e intensa possível. Algum-todo-
nenhum-aquém-entre-além-ser-não-ser-imanente-transcendental-a-si-mesmo é
a expressão gerada pela explosão e pela implosão dos conceitos mais gerais da
linguagem ser e não ser. Expande a linguagem contemplando o absoluto enquan-
to máxima totalidade radical de forma inaudita, abre novas possibilidades da e
para a linguagem. Fragmenta os sentidos da e para a linguagem, cria novos senti-
dos da e para a linguagem e mantém em constante abertura as possibilidades de
criação de novos sentidos da e para a linguagem. Assim como abre possibilidade
de novos referentes virem à tona, os quais antes jaziam velados. Trata pela pri-
meira vez de aspectos lógicos, ilógicos e alógicos do absoluto enquanto máxima
totalidade radical. Consequentemente deve gerar novas possibilidades de ações
como, quem sabe, ações deliberadamente ilógicas e alógicas antes impensadas
por violarem no primeiro caso e estarem alheias no segundo caso a razão. Ações
deliberadamente lógicas-ilógicas-alógicas. Ações que não serão advindas apenas
da razão, ou pulsão ou qualquer outra força que mova nossa vontade, mas delibe-
radamente advindas da fusão da totalidade-do-nosso-ser-racional-intuitivo-pul-
sional-sensitivo-sensível-instintivo-imaginativo-místico-consciente-inconscien-
te-meditativo-volitivo. O que não significa que perdemos o modo como agíamos 165
até então. Pelo contrário, o intuito da expansão da linguagem é agregar novas

O ABSOLUTO E O PÓS-HOMEM
possibilidades jamais substituir ou anular as possibilidades que existiam antes
da incorporação-concepção de algum-todo-nenhum-aquém-entre-além-ser-não-
ser-imanente-transcendental-a-si-mesmo.

Alguém pode defender a seguinte afirmação: não há relação neces-


sária entre os campos teórico e prático da filosofia. Pois o primeiro trata-se da
verdade e falsidade das coisas do mundo externo. E o segundo, trata de averiguar
qual a melhor ação em determinado momento, isto é, trata do certo e errado em
relação à vida prática do homo sapiens finito e histórico. Alguém, contrariamen-
te, pode defender uma relação necessária entre os campos teórico e prático. Pois a
verdade implica na consciência necessária para bondade, assim como a bondade
implica no caráter necessário para verdade.

Nós que incorporamos-concebemos algum-todo-nenhum-aquém-


-entre-além-ser-não-ser-imanente-transcendental-a-si-mesmo, implodimos e ex-
plodimos os conceitos mais gerais da linguagem ser e não ser. Com esta expansão
da linguagem descobrimos que não há possibilidades alienígenas ao absoluto
enquanto máxima totalidade radical, nem lógicas, nem ilógicas e nem alógicas.
Sendo as ações, obviamente, parte integrante do absoluto enquanto máxima to-
talidade radical. Não há campo do conhecimento completamente independente
de outros campos do conhecimento e todos eles estão diretamente incluídos no
absoluto enquanto máxima totalidade radical.

Quando decidimos investigar o absoluto enquanto máxima totalida-


de radical incorporamos-concebemos algum-todo-nenhum-aquém-entre-além-
ser-não-ser-imanente-transcendental-a-si-mesmo como expressão capaz de abrir
o maior número de possibilidades de verdade e completude em relação ao mes-
mo. E por consequência dessa incorporação-concepção criamos muitos novos
conceitos. Entre eles, criamos os sentidos geral e individual da vida inteligente,
desde então estes são os sentidos da nossa existência. Viver de acordo com estes
sentidos para vida inteligente envolve agir com este propósito.
Infelizmente, os sentidos individual e geral da vida inteligente não po-
dem ser atingidos diretamente por nossas ações em absoluta plenitude. Nosso pro-
pósito é apenas viver individualmente e coletivamente para aproximarmo-nos do
166 igualar-se a algum-todo-nenhum-aquém-entre-além-ser-não-ser-imanente-transcen-
dental-a-si-mesmo. Para nós apenas Deus-que-ultrapassa-a-si-mesmo teria acesso à
O ABSOLUTO E O PÓS-HOMEM

verdade absoluta e à completude absoluta do absoluto enquanto máxima totalidade


radical. Isto é, só Deus-que-ultrapassa-a-si-mesmo pode igualar-se algum-todo-ne-
nhum-aquém-entre-além-ser-não-ser-imanente-transcendental-a-si-mesmo.

Em relação ao sentido individual da vida inteligente, desejamos


realizar ações que aumentem a intensidade da totalidade-do-nosso-ser-racional-
-intuitivo-pulsional-sensitivo-sensível-instintivo-imaginativo-místico-consciente-
-inconsciente, pois isto abrirá mais possibilidades de verdade e completude do
absoluto enquanto máxima totalidade radical e fará com que nos aproximemos
enquanto indivíduos que somos do igualar-se a algum-todo-nenhum-aquém-en-
tre-além-ser-não-ser-imanente-transcendental-a-si-mesmo.

Quanto ao sentido geral da vida inteligente, primeiro devemos agir


para que a ética, a ontologia, a epistemologia, a lógica, a política, a estética, a arte,
a religião e a ciência possam convergir com independência, interdependência e
unidade enquanto partes da mesma totalidade na qual sempre foram o que são.
Para que todas estas disciplinas fundam-se (assim como nós o fizemos com nosso
próprio ser quando incorporamos-concebemos algum-todo-nenhum-aquém-entre-
-além-ser-não-ser-imanente-transcendental-a-si-mesmo). Segundo, nós homo sa-
piens finito e histórico devemos também realizar ações para criação do pós-homem
nesta jornada incerta da vida inteligente vir-a-ser Deus-que-ultrapassa-a-si-mesmo.

E o que a criação deste novo ideal vir-a-ser Deus-que-ultrapassa-a-


si-mesmo pode nos ensinar sobre as ações?

Ora se Deus-que-ultrapassa-a-si-mesmo é a entidade capaz de igua-


lar-se algum-todo-nenhum-aquém-entre-além-ser-não-ser-imanente-transcen-
dental-a-si-mesmo isso nos permite dizer que esta entidade poderia produzir
ações absolutamente corretas e, portanto, também absolutamente completas em
relação ao bem sob a perspectiva do absoluto enquanto máxima totalidade radi-
cal. Todavia, esta entidade não existe ou sua existência não foi provada até a con-
temporaneidade desta obra. Na verdade, nunca foi provada a existência de algum
Deus. Nós, que somos seres finitos e históricos, somos incapazes de igualarmo-
nos a algum-todo-nenhum-aquém-entre-além-ser-não-ser-imanente-transcen-
dental-a-si-mesmo, ergo, incapazes de produzir ações absolutamente corretas e
absolutamente completas em relação ao bem. Portanto, capazes de realizar ações 167
parcialmente corretas, parcialmente erradas e incompletas em relação ao bem.

O ABSOLUTO E O PÓS-HOMEM
Ora, até esta seção dizíamos que Deus-que-ultrapassa-a-si-mesmo é
a única entidade capaz de conhecer a verdade absoluta e a completude absoluta,
agora estamos dizendo que esta entidade é também capaz de ações absolutamen-
te corretas e absolutamente completas e relação ao bem. Diante desta convergên-
cia das possibilidades práticas e teóricas do absoluto enquanto máxima totali-
dade radical, a nós - homo sapiens finito e histórico - há a mesma convergência
no aproximar-se ao igualar-se a algum-todo-nenhum-aquém-entre-além-ser-não-
ser-imanente-transcendental-a-si-mesmo. Ser parcialmente verdadeiro no cam-
po teórico é equivalente a ser parcialmente certo no campo prático, parcialmente
falso no plano teórico é equivalente parcialmente errado no plano prático e a
incompletude das ações e das proposições à cerca da realidade são também equi-
valentes em relação ao absoluto enquanto máxima totalidade radical.

Portanto, para nós viver individualmente e coletivamente realizando


ações para aproximarmo-nos do igualar-se a algum-todo-nenhum-aquém-entre-
-além-ser-não-ser-imanente-transcendental-a-si-mesmo é viver para aproximarmo-
nos de vir-a-ser Deus-que-ultrapassa-a-si-mesmo. Vida esta que busca abrir mais pos-
sibilidades de verdade e completude, assim como busca abrir mais possibilidades de
bondade e completude do absoluto enquanto máxima totalidade radical.
II.XVII

VALORES E MORAL
168
O ABSOLUTO E O PÓS-HOMEM

“E tudo isso por um motivo insignificante que não valeria a pena mencionar:
precisamente pelo fato de que o homem, invariavelmente e em todo lugar,
quem quer que ele seja, sempre gostou de fazer o que quis, e não como man-
dão a razão e o interesse próprio; ele, inclusive, pode querer algo contra seus
próprios interesses, e às vezes até deve indubitavelmente querê-lo.”31

Quantas vezes ouvimos sobre a virtude? O bem? A ação boa em si?


O ato virtuoso? Ou na voz do algoz da tradição, o velho Nietzsche, que nada disso
importa? Apenas a vontade de poder, aquele que tem mais instintiva vontade de
dominar subjuga aquele que tem menos instintiva vontade de dominar e os valores
não passam de tentativas de impor a vontade dos fortes ou a vontade dos fracos?

Como nós somos adeptos da grande moderação tolerante, não quere-


mos dizer que o ato nobre de Aristóteles, ou ação universalmente válida do imperati-
vo categórico Kantiano estão completamente errados. Bem pelo contrário, funcionam
bem para vida prática em vários casos. Assim como Nietzsche, ao refutá-los, também
estava parcialmente certo. Pois o homem muitas vezes age pela natureza de sua força,
da constituição que a natureza lhe proporcionou para ser um aristocrata ou um servo.

Na vida prática social da contemporaneidade, o homo sapiens fi-


nito e histórico (salvo exceções) vive entre o moralmente correto de acordo com
senso-comum, os valores culturais da comunidade na qual vive e os seus inte-
resses pessoais. E na maioria dos casos, este prevalece em relação a aqueles. E
quanto mais poder tiver o indivíduo mais ele tende a agir de acordo com seus
interesses pessoais. Mesmo que isso não seja bom em si, nobre, ou moralmente
correto de acordo com senso-comum. Mesmo que os seus desejos não contem-
plem os valores culturais ou os interesses da comunidade.

Os principais representantes da tradição, no que diz respeito à éti-


ca, parecem ser utópicos diante da realidade do mundo quando desejam que as

31
Fiodor Dostoiévski. Memórias do Subsolo.
pessoas ajam de acordo com o bem si ou a moral quando estes se opõem aos inte-
resses pessoais dos agentes. E por outro lado, o radicalismo nietzschiano também
parece estar exagerado demais, como se o homem nem se perguntasse pela ação
boa em si e devesse seguir sua natureza, mas de que adiantaria ser homem se não 169
escapamos da nossa constituição primária que nos adaptou apenas a sobrevivên-

O ABSOLUTO E O PÓS-HOMEM
cia e não a busca de proposições universalmente válidas?

Não sabemos exatamente por quê, mas essa mesma natureza nos
dotou de linguagem, sendo assim, não vamos ao menos entreter perguntas como:
o que é o bem do homo sapiens finito e histórico enquanto coletividade? O que é o
bem do homem individual em relação a sua existência finita e histórica?

Nós não queremos refutar absolutamente ninguém nesta obra.

A Incorporação-concepção de algum-todo-nenhum-aquém-entre-
-além-ser-não-ser-imanente-transcendental-a-si-mesmo trouxe à tona máximas
inauditas: todo pensamento humano em relação à realidade é parcialmente ver-
dadeiro, parcialmente falso e incompleto; em relação a moral é parcialmente cer-
to, parcialmente errado e incompleto. Como discutimos na seção anterior, as pos-
sibilidades práticas e teóricas são equivalentes em relação ao absoluto enquanto
máxima totalidade radical. Acreditamos que qualquer moral criada pelo homo
sapiens finito e histórico será - em relação ao absoluto enquanto máxima totali-
dade radical - parcialmente verdadeira, parcialmente falsa e incompleta. Assim,
como parcialmente certa, parcialmente errada e incompleta.

Então, devido à equivalência entre a filosofia teórica e prática, nos


guiaremos pelos sentidos geral e individual da vida inteligente gerados pela in-
corporação-concepção algum-todo-nenhum-aquém-entre-além-ser-não-ser-ima-
nente-transcendental-a-si-mesmo.

Não podemos mais aceitar a supremacia dos fortes, ou as ações vir-


tuosas, ou boas em si segundo um princípio universal racional.

Nós agora operamos sobre uma nova complexidade, não mais apenas
vontade de potência ou racionalidade prática. Não acreditamos mais em ações iso-
ladas boas em si. Nem numa mediania baseada em concepções do senso-comum
como valentia, liberalidade, temperança. Ou numa força denominada de vontade
de potência, como uma inexorável máxima ontológica que no fundo tem um quê
aristotélico teleológico. Nós agora temos uma nova teleologia. Nós agora não quere-
mos contemplar, crer, ou matar Deus. Nós agora queremos ser Deus-que-ultrapas-
170 sa-a-si-mesmo. Queremos a vida inteligente igualando-se a algum-todo-nenhum-a-
quém-entre-além-ser-não-ser-imanente-transcendental-a-si-mesmo. Esta é nossa
O ABSOLUTO E O PÓS-HOMEM

re-evolução ontológica, epistemológica, lógica, política, estética, ética, artística,


religiosa e existencial. Pois o sentido geral busca o máximo bem imaginável a vida
inteligente representada atualmente pela coletividade denominada nesta obra de
homo sapiens finito e histórico. E este bem é tornar-se a entidade capaz de igualar-
se ao absoluto enquanto máxima totalidade radical. Nós sabemos, todavia, que a
nossa contribuição será apenas um passo nesta direção: a criação do pós-homem.

Por outro lado, nós queremos o máximo bem da única vida que te-
mos, já que não podemos contar com a vida após a morte, além de estarmos cien-
tes que a criação do pós-homem é uma empreitada incerta. Por isso, concebemos
um sentido individual para vida de todo e cada homo sapiens finito e histórico.
Viver através da máxima intensidade, com pausas de descanso para otimizar a
intensidade em relação a finitude – viver o máximo de tempo possível com a má-
xima intensidade possível. Através desta intensidade, abrir novas possibilidades
de verdade e completude de algum-todo-nenhum-aquém-entre-além-ser-não-ser-
-imanente-transcendental-a-si-mesmo.

O sentido geral da vida inteligente, vir-a-ser Deus-que-ultrapassa-a-


si-mesmo, não será atingido por nós, nos cabe apenas a criação do pós-homem,
primeiro passo na direção do sentido geral. O sentido geral abre novas possibili-
dades de verdade e completude de algum-todo-nenhum-aquém-entre-além-ser-
-não-ser-imanente-transcendental-a-si-mesmo, assim como sentido individual
da vida inteligente. No fundo ambos os sentidos geral e individual da vida inte-
ligente são vir-a-ser Deus-que-ultrapassa-a-si-mesmo. Já que ambos têm o como
fim igualar-se a algum-todo-nenhum-aquém-entre-além-ser-não-ser-imanente-
transcendental-a-si-mesmo. Nós, todavia, atingiremos parcialmente este fim. No
caso do sentido geral, com a criação do pós-homem; no caso do sentido individual,
com o cultivo das forças que nos compõe, isto é, com o cultivo da totalidade-do-
nosso-ser-racional-intuitivo-pulsional-sensitivo-sensível-instintivo-imaginati-
vo-místico-consciente-inconsciente-meditativo-volitivo para elevar-nos a máxi-
ma intensidade (com as devidas pausas de descanso para que possamos viver
o maior tempo possível intensamente). Mas estes dois conceitos podem gerar
impasses nas ações individuais. Afinal, qual a medida entre o interesse existen-
cial individual e o interesse da coletividade? Mais precisamente, do conjunto de
indivíduos aqui denominados homo sapiens finito e histórico e da vida de cada
representante deste conjunto? 171

O ABSOLUTO E O PÓS-HOMEM
Sabiamente, Aristóteles já disse na sua obra Ética a Nicômaco que o
estudo da razão prática, do bem do homem é um estudo inexato. E como o estagi-
rita diz, é tolice exigir maior exatidão do que o assunto permite. Resta-nos, com-
preender os sentidos individual e geral como fins da vida inteligente, mas cada
um deverá decidir por si mesmo o quanto deseja sacrificar em prol da criação
do pós-homem e o quanto necessita ter uma existência individual intensa. Não
podemos fazer uma fórmula universal. E, ao mesmo tempo, os dois sentidos são
como um espiral virtuoso. Pois ambos os sentidos abrem novas possibilidades
de verdade e completude de algum- todo-nenhum-aquém-entre-além-ser-não-
ser-imanente-transcendental-a-si-mesmo. Assim, viver para ambos é viver pelo
ultrapassamento de si mesmo e pelo ultrapassamento do próprio homo sapiens
finito e histórico. Quanto mais sábio diante do absoluto um homem é, se é capaz
de evoluir sempre na proporção de verdade e completude do seu pensamento em
relação ao absoluto enquanto máxima totalidade radical, ele estará indiretamen-
te sendo mais capaz de contribuir para criação do pós-homem. Ou o contrário,
trabalhando em prol do pós-homem com intuito final da vida inteligente vir-a-ser
Deus-que-ultrapassa-a-si-mesmo um homo sapiens finito e histórico particular
estará certamente tendo uma experiência de alta intensidade.

Aquele que através do cultivo da intensidade das forças que nos com-
põe, atinge uma intensidade tal que realiza a fusão da totalidade de seu ser racional-
-intuitivo-pulsional-sensitivo-sensível-instintivo-imaginativo-místico-consciente-
-inconsciente explodi e implodi os conceitos mais gerais da linguagem ser e não
serincorporando-concebendoalgum-todo-nenhum-aquem-entre-além-ser-não-ser-
-imanente-transcendental-a-si-mesmo existencialmente e enquanto pertencente
ao conjunto homo sapiens finito e histórico se aproximará de vir-a-ser Deus-que-
-ultrapassa-a-si-mesmo. Assim, ambos os sentidos se completam. Cada situação
específica exigirá mais ou menos atenção ao sentido geral e ao sentido individual
da vida inteligente. Nós vivemos na incerteza, logo não podemos exigir sacrifícios
de vida e morte de ninguém. Cada homem na proporção que desejar deve balan-
cear os sentidos geral e individual no seu próprio ser. E pode tanto morrer pela
coletividade, se assim o quiser, como o contrário, sabendo que não há garantias
de sucesso no sentido geral da vida inteligente vir-a-ser Deus-que-ultrapassa-a-si-
mesmo, nem mesmo na criação do pós-homem, pode não sacrificar nada pelos seus
semelhantes. Embora, nos parece pobre e contrário a grande moderação tolerante
172 viver absolutamente de acordo com qualquer dos sentidos da vida inteligente em
detrimento absoluto do outro sentido. A vida mais rica para nós é que tenta harmo-
O ABSOLUTO E O PÓS-HOMEM

nizar os sentidos individual e geral da vida inteligente.

II.XVIII

CICLOS EVOLUTIVO

Ciclos evolutivos, quando pela primeira vez me deparei com esta


curiosa forma interpretativa pela qual é possível compreender as transformações
de visão de mundo, dos modos de ser e das crenças fundamentais na saga do
homo sapiens finito e histórico, já sabia como sei hoje que não há como provar
esta ideia. Os processos históricos do homo sapiens finito e histórico são altamen-
te complexos e é impossível reduzi-los a um padrão único.

Mas esta forma - ciclos evolutivos - é um modo de compreender, por-


tanto, uma possibilidade de interpretação do modo de ser do homo sapiens finito
e histórico, das transformações da sua visão de mundo e das transformações de
algumas de suas mais fundamentais crenças. Os ciclos não são exatamente idênti-
cos. Os aparentes retornos de visão de mundo, das crenças passadas e dos modos
de ser são como espirais evolutivos. Evolutivos porque somos otimistas em rela-
ção ao acúmulo de conhecimentos adquiridos no processo histórico, e achamos até
mesmo que são evidentes estes acúmulos. Não negamos, todavia, que seja possível
defender que não são evolutivos os processos destes ciclos. O que não é possível
defender é que os períodos de retomada de visão de mundo, de modos de ser e de
algumas crenças determinadas e fundamentais gerem algum ente físico ou imagi-
nado idêntico a algum ente físico ou imaginado do passado. Ou que as novas visões
de mundo, modos de ser e novas crenças sejam idênticos às visões de mundo, aos
modos de ser, e às crenças que ocorreram no passado e estão sendo retomadas.
No subtítulo Evolução do Conhecimento, constatamos que a evolu-
ção do acúmulo de conhecimento se dá de modo caótico com ganhos e perdas em
todas as áreas. Acreditamos que o resultado final é um acúmulo mesmo com as
enormes perdas ao longo da história. 173

O ABSOLUTO E O PÓS-HOMEM
O que queremos dizer com ciclos evolutivos? Podemos defini-los
como modos de ser do desenvolvimento da civilização do homo sapiens finito e
histórico, como fenômeno no qual se verifica que visões de mundo, modos de ser
e crenças que respondem a questões fundamentais mudam de Abc para não Abc e
depois são retomadas como algo novo Aby com novas propriedades e com a perda
de propriedades anteriores. São posições mais evoluídas, pois possuem a consciên-
cia histórica de outras posições em relação a visões de mundo, a modos de ser e a
crenças fundamentais do homo sapiens finito e histórico. São como espirais que
ciclicamente alternam visões de mundo, modos de ser e crenças fundamentais.

O que torna ainda mais frágil esta noção é o fato de estarmos suge-
rindo, nos exemplos a seguir, visões de mundo, modos de ser e crenças funda-
mentais para o homo sapiens finito e histórico que ainda não foram totalmente
conceituados nas ciências sociais e humanas, estão apenas no inconsciente cole-
tivo, ou são previsões para o futuro baseadas na interpretação determinada pelos
próprios ciclos evolutivos que estamos defendendo nesta seção da obra.

EXEMPLO 1

Sem Deus
Com Deus
Morte de Deus
Vir-a-ser-Deus
Não se sabe ao certo quando a noção de Deus surgiu para a vida
inteligente, mas parece correto presumir que diante da ignorância em relação a
entes e fenômenos do mundo foram criados sistemas míticos. A compreensão dos
mistérios do mundo se dava através da força causal de deuses. Eles eram entes
especiais do mundo: as estrelas, o sol, a lua, o trovão, o vento, o raio, o mar, o rio,
a chuva etc. É como se o ser humano finito e histórico precisasse antropomorfizar
sua visão de mundo, compreendendo as coisas à luz de seu próprio modo de ser
causal. Assim, o sol torna-se um Deus que permite a vida com seu calor e luz. O
trovão, o Deus que anuncia a chuva ou ato de um Deus-chuva, assim como vento
que sopra e zuni ao ouvido etc. Na verdade o primeiro grande passo é constituir
174 uma totalidade baseada em um sistema de compreensão metafísico primitivo.
Assim, saímos dos pobres de mundo, como diria Heidegger, para os capazes de
O ABSOLUTO E O PÓS-HOMEM

interpretar e criar mundos míticos.

Acontece que, em determinado momento na história do homo sa-


piens finito e histórico, houve um passo para além - metafisicamente e racional-
mente falando: quando o homem constitui um Deus único. Seja o primeiro motor,
seja Deus onipotente, seja a constituição consciente do próprio universo em si como
sendo o próprio Deus máximo, organizamos nossa causação de maneira fantastica-
mente reconfortante, pois havia algo maior que nós que compreendia todo misté-
rio, fechava as cadeias causais para explicar a criação do mundo e geralmente de-
sejava nosso bem. O problema é que, em conjunto com a fé, evoluía a razão. Assim,
num determinado momento, podemos chamar de período moderno sem intuito de
precisão absoluta, mas de marcar um novo ciclo, houve a formação de uma crítica
a esta até então união entre fé e razão. Foram criados argumentos racionais que
destruíram as possibilidades da união entre fé e razão. Deus era suspenso a um
epoché filosófico. Agora ninguém nunca mais poderia racionalmente, com as regras
da argumentação lógica, sustentar a existência ou inexistência de Deus. Quod erat
demonstrandum tornava-se impossível na metafísica e segue assim até os dias de
hoje. Os críticos modernos mais radicais cunharam o termo “morte de Deus”.

Porém nós agora inauguramos o futuro. A expressão do absoluto en-


quanto máxima totalidade radical tal qual foi cunhada coma implosão e a explosão
dos conceitos mais gerais ser e não ser nos permitiu vislumbrar o nosso limite e o
nosso ultrapassamento. O desejo obscuro de vir-a-ser-Deus que constituiu nossa
saga veio à tona, e ainda descobrimos que, para igualar-se a algum-todo-nenhum-a-
quém-entre-além-ser-não-ser-imanente-transcendental-a-si-mesmo, precisávamos
conceituar uma nova entidade mais poderosa que Deus, isto é, nosso desejo cons-
ciente é agora o de vir-a-ser Deus-que-ultrapassa-a-si-mesmo. Nossas limitações
nos permitem apenas dar um passo rumo a esse sonho: a criação do pós-homem e
que este busque a sua própria superação: o pós-pós-homem e assim sucessivamen-
te – quiçá no futuro longínquo simultaneamente - até que a vida inteligente igua-
lando-se ao absoluto enquanto máxima totalidade radical ultrapassará o próprio
conceito de Deus tornando-se Deus-que-ultrapassa-a-si-mesmo ou se extinguirá.
EXEMPLO 2

Sustentabilidade primitiva
Nas primeiras comunidades humanas, o modo de viver era equilibrado 175
com a natureza, pois o equilíbrio ecológico era necessário para sobrevivência. Através

O ABSOLUTO E O PÓS-HOMEM
do equilíbrio entre fauna, flora e outros elementos, a vida em todas as suas formas
é conservada num determinado ambiente. O homem dependia dessa relação com a
natureza para se alimentar das diversas formas de vida sem extinguir essas mesmas
diversas formas de vida, não havendo uma consciência de proteção do mundo, pois
a possibilidade de destruição do mundo pelas próprias mãos do homem não estava
em questão, a falta de aparatos tecnológicos para tanto impediam esta reflexão. Havia
uma relação harmoniosa com a natureza, entretanto através de uma visão de mundo
mítica que geralmente atribui status divino a entidades naturais.

Consumo autodestrutivo
Com a ascensão da ciência moderna, o fim da visão preponderante-
mente mítica da natureza e a passagem para visão preponderantemente científica
através de leis universais sem a influência de entidades divinas proporcionaram
um avanço tecnológico nunca antes vislumbrado pelo homo sapiens finito e histó-
rico. Houve a revolução industrial, e passamos a produzir bens de consumo numa
escala inaudita. Assim, ainda sem saber, começávamos o processo de destruição
do mundo. A técnica é cega em relação ao equilíbrio ambiental que permite a vida.

Nos tempos atuais, a consciência da progressiva destruição do mun-


do que a produção em escala da industrialização proporcionou e ainda proporciona
nos fez repensar esse modelo de consumo exacerbado. Pouco a pouco, buscamos
uma forma de produção sustentável, visto que sabemos que o modelo capitalista
clássico não é mais possível. Conscientemente, estamos buscando opções tecno-
lógicas de produção que não sigam destruindo o mundo, estamos no processo de
criação de uma nova produção autossustentável, capaz de suprir as necessidades
de um mundo tecnológico, mas preservando as fontes de energia e o equilíbrio eco-
lógico entre os incontáveis organismos vivos que tornam a vida possível no planeta.
Consumo destrutivo do mundo consciente
Uma possibilidade de futuro é atingirmos tal evolução tecnológica
(ou quem sabe o pós-homem atinja) que não mais dependamos das relações de
176 equilíbrio da natureza deste planeta, ou de qualquer outro planeta que venhamos
a colonizar para sobreviver. Nesse cenário, poderemos produzir comida, oxigênio,
O ABSOLUTO E O PÓS-HOMEM

calor e todas as demais necessidades hoje dependentes da natureza de modo artifi-


cial. Assim, poderemos dispensar o mundo natural se necessário for para a sobre-
vivência, com a consciência de que as leis naturais e os fenômenos naturais não
mais importam para sustentar a vida inteligente. Obviamente, não devemos e nem
desejamos destruir o mundo natural sem necessidade, nem queremos mal a outras
formas de vida. Pelo contrário, queremos bem, pois nossa existência se deu graças
à existência de outras formas de vida. Apenas entretemos esta possibilidade, como
um possível futuro. Queremos com isso ilustrar a ideia de ciclos evolutivos.

EXEMPLO 3

Sexo livre instintivo


Há relatos históricos (não sabemos do grau de veracidade dos mes-
mos, mas parece ser bem aceito pelos estudiosos da liberdade sexual primitiva) da
sexualidade do homem pré-histórico, os quais descrevem a ação sexual como um
ato livre de moral. Se um macho simplesmente visse uma fêmea por trás, numa
posição que mostrasse sua vagina ou ativasse o seu desejo sexual de alguma forma,
já seria suficiente para que este mesmo macho a penetrasse - sem necessidade de
permissão prévia - até o gozo sem nenhum pudor. Mesmo nos casos de parentesco
próximo – mãe, irmã, pai, entre outros – era um simples ato natural. Inclusive, di-
zem que no homo sapiens finito e histórico houve grandes adaptações do aparato
sexual, até mesmo nos lábios da boca, que ganharam um desenho mais sensual,
uma vez que o homo sapiens finito e histórico decidiu-se por praticar sexo não mais
apenas pelas costas da fêmea, mas também macho e fêmea frente a frente. Por mui-
to tempo o sexo foi livre sem uma completa noção de suas consequências causais e
principalmente sem grandes preocupações morais.
Sexo moralmente restrito
Com desenvolvimento das sociedades, o sexo se tornou um tema
moral. Principalmente, as mulheres, as quais só podem gerar um indivíduo por
gestação, foram coibidas em relação a sua liberdade sexual. O incesto foi proibi- 177

do, pois semelhanças genéticas aumentam as chances de reproduzir patologias

O ABSOLUTO E O PÓS-HOMEM
e anomalias congênitas. Embora todos estes regramentos sejam justificados por
mitos ou dogmas religiosos, eles tinham o intuito mesmo que intuitivo e às vezes
inconsciente de organizar a sociedade e principalmente os responsáveis por cada
criança. Se sabemos que a mulher é fiel ao seu companheiro, é presumido que o
filho gerado provém do sêmen do mesmo, logo, que este está passando seus ge-
nes adiante para continuação da espécie e igualmente será responsabilizado pela
sobrevivência do infante. Ou, no caso do incesto, verificou-se na experiência em-
pírica problemas nas crianças que são geradas por parentes consanguíneos pró-
ximos com mais frequência que nos nascidos de pais sem parentesco próximo.

É presumível que uma cultura baseada em mitos ou dogmas religio-


sos inferirá um castigo dos deuses para união entre parentes consanguíneos pró-
ximos. A conjunção proporcionalmente mais constante ente parentesco próximo
e doenças, isto é, pais de parentesco próximo têm proporcionalmente mais filhos
com deformações ou patologias congênitas que pais sem parentesco próximo era
justificada por uma causa divina. Ora, causa esta que só pode ser um castigo, pois,
se união entre parentes próximos traz mais patologias e deformações, deve ser
por que tais uniões não são aceitas pelos deuses e quem as faz a despeito disso é
castigado através do fruto dessas uniões: os filhos.

Sexo livre consciente


Com advento dos anticoncepcionais concomitante com movimen-
tos culturais de libertação da mulher e do sexo, as relações sexuais mudaram.
A partir dos anos 1970 até os dias de hoje, voltamos a um novo período de sexo
livre, pois podemos controlar o nascimento através dos novos métodos anticon-
cepcionais advindos da tecnologia cientifica. Além disso, a mulher lutou por seus
direitos de indivíduo com capacidades semelhantes às capacidades dos homens.
Além de não engravidarem se não quiserem, ou pelo menos diminuírem radical-
mente tal possibilidade, conquistaram o direito de realizar sexo com mais de um
parceiro, ou com quantos parceiros e parceiras quiserem.
EXEMPLO 4

Pequenas comunidades
Impérios
178
Comunidade mundial
O ABSOLUTO E O PÓS-HOMEM

Os primeiros indivíduos do conjunto homo sapiens finito e histórico


se reuniam em comunidades ou tribos, e eventualmente guerreavam com tribos
ou comunidades vizinhas por disputas de suprimentos ou por desejo de poder,
formar escravos, entre outras razões.

Assim, as tribos mais poderosas conquistaram tribos menos pode-


rosas. Na medida em que as sociedades foram avançando, surgiram os primei-
ros impérios. Estes dominavam e exploravam as civilizações estrangeiras, assim
subjugando-as. Escravizando-as, adquiriam novos territórios para seus domínios
se tornando cada vez mais fortes. Mas tudo que existe está fadado a corrupção,
assim impérios nasceram, cresceram, chegaram ao seu ápice e depois lentamente
ruíram até que outros impérios surgissem. Desse modo, vivemos até hoje. O impé-
rio mais importante da atualidade é os Estados Unidos da América.

Agora surge uma nova sociedade interligada de modo simultâneo pela


rede mundial de computadores. O mundo virtual nos tornou um mundo conectado.
Não é difícil pensar que logo teremos um governo mundial., ainda havendo diferenças
de poder entre os Estados, mas ao menos em tese pensando no mundo como um todo.

EXEMPLO 5

Nomadismo primitivo
Os primeiros representantes do conjunto denominado homo sapiens
finito e histórico não sabiam produzir alimentos e cultivar animais de abate, forne-
cedores de ovos ou leite. Viviam se alimentando do mundo natural com frutas, ve-
getais e animais selvagens abatidos por eles mesmos. Eram caçadores e coletores de
alimentos. Então, obviamente deveriam se mover em busca do alimento. Quando
faltava num lugar, era hora de achar outro para morar, com bons suprimentos. Isso
era o nomadismo primitivo, não havia consciência sobre o sedentarismo, isto é, que
é possível cultivar alimentos e domesticar animais e ter um lar fixo.
Sedentarismo
Com o advento da agricultura e da domesticação de animais, final-
mente podia-se descansar da vida dura de buscar alimentos todo tempo. Podiam
agora construir casas mais complexas e assim fundavam a sociedade como a co- 179

nhecemos com comunidades fixas num determinado território. Com uma organi-

O ABSOLUTO E O PÓS-HOMEM
zação social capaz de atingir graus de complexidade antes inconcebíveis baseada
nessa possibilidade de estar sempre num mesmo local.

Nomadismo por opção


Acontece que agora há uma nova sociedade surgindo. A comunida-
de virtual mundial permite que muitas pessoas voltem a ser nômades por opção.
Vários tipos de empregos podem ser feitos através de computadores de qualquer
lugar no mundo. Outros tantos exigem a mudança constante como parte do traba-
lho. É um novo nomadismo surgindo, o nomadismo por opção, pois a regra ainda
é o sedentarismo para maioria.

II.XIX

LÓGICA E ALGUM-TODO-NENHUM-AQUÉM-ENTRE-ALÉM-
SER-NÃO-SER-IMANENTE-TRANSCENDENTAL-A-SI-MESMO:
PARA UMA PÓS-LÓGICA

O doutor em lógica, José Alexandre Durry Gerzoni, afirmou, em uma


de suas aulas, que as lógicas paraconsistentes só funcionariam se alterassem a
noção de consequência lógica ou a morfologia da lógica clássica. Ora, aprende-
mos que o caminho da grande moderação tolerante é o mais sábio. Assim, nos
parece, apesar de não sermos especialistas em lógica, que, se fizéssemos uma
fusão entre lógicas paraconsistentes e a lógica clássica compatibilizando-as, po-
deríamos abrir mais possibilidades em relação à linguagem que a utilização de
apenas uma destas lógicas isoladamente. Mas, como dissemos, nós não somos
lógicos profissionais, portanto não sabemos como seria possível realizar tal fusão.

180 O que sabemos é que incorporamos-concebemos algum-todo-nenhum-


-aquém-entre-além-ser-não-ser-imanente-transcendental-a-si-mesmo por meio da to-
O ABSOLUTO E O PÓS-HOMEM

talidade-do-nosso-ser-racional-intuitivo-pulsional-sensitivo-sensível-instintivo-ima-
ginativo-místico-consciente-inconsciente, abrimos novas possibilidades de sentido
da e para a linguagem: fragmentamos os sentidos existentes da e para a linguagem;
criamos novos sentidos da e para a linguagem; e mantemos aberta a possibilidade de
criação constante de novos sentidos da e para a linguagem. Assim como abrimos a
possibilidade de novos referentes virem à tona, os quais antes jaziam velados.

Abrimos, finalmente, a possibilidade de descrever não só os aspectos


lógicos, mas os aspectos ilógicos e alógicos de algum-todo-nenhum-aquém-entrea-
-lém-ser-não-ser-imanente-transcendental-a-si-mesmo, pois esta expressão responde
à pergunta “o que é o absoluto?” com intuito de abrir maior número de possibilidades
de verdade e completude do absoluto enquanto máxima totalidade radical. Isto se dá
com a explosão e a implosão dos conceitos mais gerais da linguagem ser e não ser, per-
mite que tenhamos acesso aos limites do espaço lógico bivalente e ao ultrapassamento
destes limites para que possamos lidar com os aspectos ilógicos e alógicos do absoluto
enquanto máxima totalidade radical, sem perder tudo que conquistamos sobre os as-
pectos lógicos da realidade. Queremos uma linguagem que nos permita lidar com os
aspectos lógicos, ilógicos e alógicos do absoluto enquanto máxima totalidade radical.

A grande moderação tolerante gerada pela incorporação-concepção


de algum-todo-nenhum-aquém-entre-além-ser-não-ser-imanente-transcendental-a-
si-mesmo, nos mostra que toda proposição, todo pensamento, é parcialmente ver-
dadeiro, parcialmente falso e incompleto em relação ao absoluto enquanto máxima
totalidade radical, pois só a verdade absoluta e a completude absoluta do absoluto
enquanto máxima totalidade radical não são parciais. Isso nos mostra que o mais
sábio é considerar sempre todas as possibilidades de posicionamento diante de toda
questão como posições parcialmente corretas, parcialmente falsas e incompletas em
relação à pergunta que desejam responder de modo absolutamente verdadeiro.

Assim, o lógico do futuro terá um grande desafio pela frente ou


quem sabe desafio nenhum, pois ou nós seremos capazes de criar uma lógica que
não só seja a conciliação entre a lógica clássica e as lógicas paraconsistentes, mas
que seja capaz de incluir o que hoje chamamos de aspectos ilógicos e alógicos do
absoluto enquanto máxima totalidade radical. Ou estes aspectos permanecerão
intocados no que tange a ciência das estruturas da linguagem.
181
Nós não sabemos qual será o resultado desse desafio, mas sabemos o

O ABSOLUTO E O PÓS-HOMEM
que esperar do lógico do futuro. Para que possa compreender esse projeto, deverá
elevar a totalidade de seu ser racional-intuitivo-pulsional-sensitivo-sensível-instin-
tivo-imaginativo-místico-consciente-inconsciente a uma intensidade tal que possa
realizar a fusão das forças que o compõem para incorporar-conceber algum-todo-ne-
nhum-aquém-entre-além-ser-não-ser-imanente-transcendental-a-si-mesmo, e, as-
sim, incorporar-conceber os aspectos lógicos, ilógicos e alógicos do absoluto enquanto
máxima totalidade radical. Terá de permitir a totalidade de seu ser racional-intuitivo-
-pulsional-sensitivo-sensível-instintivo-imaginativo-místico-consciente-inconscien-
te tornar-se em ato toda a potencialidade que dentro de si mesmo é possibilidade de
vir-a-ser. Intensificará suas forças não racionais e não intuitivas aos mesmos níveis de
intensidade das forças racionais e intuitivas, as quais exercem - geralmente - supre-
macia neste tipo de homo sapiens finito e histórico em particular.

Queremos uma nova lógica para um novo homem. Aquele que ultra-
passa a si mesmo. Aquele que transforma a antiga visão de mundo no aceno-oni-
presente-da-onisciência-de-mundos. Aquele que transforma o desejo inconsciente
de vir-a-ser Deus no desejo consciente de vir-a-ser Deus-que-ultrapassa-a-si-mes-
mo. Aquele que julgava que a totalidade era o mundo, o qual tinha suas estruturas
mais fundamentais subordinadas às regras da lógica para o absoluto enquanto
máxima totalidade radical composto deste Universo consistente-inconsistente-
-aconsistente; todo Universo possível consistente-inconsistente-aconsistente; o
nada e o ser internos a este Universo consistente-inconsistente-aconsistente; o
possível nada e o possível ser externos a este Universo consistente-inconsistente-
-aconsistente e a todo Universo possível consistente-inconsistente-aconsistente;
o possível nada e o possível ser internos a todo Universo possível consistente-in-
consistente-aconsistente; todo pensamento possível consistente-inconsistente-a-
consistente e toda ação possível consistente-inconsistente-aconsistente. As estru-
turas mais gerais que compõem o absoluto enquanto máxima totalidade radical
que acabamos de citar são melhor descritas como estruturas fundamentais que
não são apenas lógicas, mas lógicas, ilógicas e alógicas. Talvez a lógica do futuro
não seja mais chamada de lógica, mas tenha um novo batismo: lógica-ilógica-aló-
gica a ciência das estruturas da linguagem do homem que ultrapassa a si mesmo.
II.XX

182
OBSCURIDADE VERSUS CLAREZA
O ABSOLUTO E O PÓS-HOMEM

Afinal, dirão os analíticos: o que você ganha com esse “epoché sob
certos aspectos”? Qual a vantagem de conceber um conceito inconsistente? Por
que você não fala claramente?

No auge de sua fúria, um apóstolo lógico bradaria: “Aposto que se


você realmente quisesse, poderia traduzir esta expressão sem sentido, este conjun-
to de vocábulos que não significam nada, a sua criação não possui nem mesmo
sentido puramente formal, muito menos poderia designar qualquer propriedade
instanciada na realidade. Você, o obscuro, diria: “Desculpe, mas é impossível tra-
duzir esta expressão”. Eu responderia: “é claro! Não há como traduzir porque não
há nenhum significado que possa ser tornado inteligível, essa expressão é pior do
que um conjunto vazio, ela não tem sentido na linguagem. É um mero agrupamento
de palavras, conceitos contraditórios quando mencionados como parte do mesmo
conjunto e uma listagem inconsequente dos quantificadores lógicos. Se você des-
crevesse de modo claro e consistente quais as suas intenções com a criação dessa
expressão, ficaria cristalino que você não diz nada quando diz algum-todo-nenhum-
-aquém-entre-além-ser-não-ser-imantente-transcendental-a-si-mesmo.”

É amigos, eu não nego as dificuldades de responder a essas pergun-


tas e observações. O discurso inflamado do meu opositor percebe com perspicácia
a dificuldade de compreender apenas por meio da razão nossa incorporação-con-
cepção de algum-todo-nenhum-aquém-entre-além-ser-não-ser-imantente-trans-
cendental-a-si-mesmo. Isso nunca foi negado, caros amigos.

Aliás, isso sempre foi afirmado. Ele ainda poderia afirmar que, de-
pendendo da combinação feita com os conceitos desta expressão, podem ser com-
postas contradições e tautologias, mas que todas elas juntas se transformam num
curto-circuito do entendimento.

Afinal, por que criar tal expressão? A expressão criada é nossa obs-
cura resposta à pergunta “o que é o absoluto?”, pergunta que pode ser estendida
com o seguinte complemento: “enquanto máxima totalidade radical”. E aí, te-
remos na versão extensa e determinada: “O que é o absoluto enquanto máxima
totalidade radical?”. O intuito é responder a esta pergunta de modo a abrir o má-
ximo de possibilidades de verdade e completude, o que significa dizer infinitas 183
possibilidades de verdade e completude do absoluto enquanto máxima totalida-

O ABSOLUTO E O PÓS-HOMEM
de radical, já que não podemos criar uma resposta que seja absolutamente verda-
deira e absolutamente completa a esta pergunta.

Tal empreitada exige a abertura de possibilidades não só dos as-


pectos lógicos como dos aspectos ilógicos e alógicos, pois acreditamos que o
absoluto, enquanto máxima totalidade radical, é composto por este Universo
consistente-inconsistente-aconsistente; todo Universo possível consistente-in-
consistente-aconsistente; o nada e o ser internos a este Universo consistente-in-
consistente-aconsistente; o possível nada e o possível ser externos a este Universo
consistente-inconsistente-aconsistente e a todo Universo possível consistente-in-
consistente-aconsistente; o possível nada e o possível ser internos a todo Uni-
verso possível consistente-inconsistente-aconsistente; todo pensamento possível
consistente-inconsistente-aconsistente e toda ação possível consistente-inconsis-
tente-aconsistente. Quando dizemos que estas estruturas mais gerais do absoluto
enquanto máxima totalidade radical são consistente-inconsistente-aconsistente,
estamos incluindo os aspectos lógicos, ilógicos e alógicos do absoluto enquan-
to máxima totalidade radical. Quando incluímos os aspectos ilógicos e alógicos,
geramos um epoché sob estes aspectos. Este epoché pode ser provisório, caso no
futuro surja uma nova lógica (talvez nem seja este o nome de tal disciplina uma
vez que envolve aquilo que é ilógico e alógico. Quem sabe chamar-se-á disciplina
da lógica-ilógica-alógica) capaz de incluir estes aspectos do absoluto enquanto
máxima totalidade radical em seus cálculos.

Algum-todo-nenhum-aquém-entre-além-ser-não-ser-imantente-
transcendental-a-si-mesmo é uma expressão gerada pela implosão e explosão dos
conceitos mais gerais da linguagem ser e não ser. Consequentemente, inaugura
novas possibilidades da e para a linguagem, fragmenta os sentidos existentes até
então da e para a linguagem, cria novos sentidos da e para a linguagem e forma
uma constante abertura de possibilidades para o surgimento de novos sentidos da e
para a linguagem. Assim como abre possibilidade de novos referentes virem à tona,
os quais antes jaziam velados. O ultrapassamento da linguagem vigente represen-
ta o ultrapassamento de nós mesmos. Este ultrapassamento gera a expansão dos
limites lógicos, epistemológicos, ontológicos, estéticos, científicos, artísticos, políti-
cos, éticos, religiosos, existenciais, de visão de mundo, da concepção de Deus e dos
sentidos geral e individual da vida inteligente qua homo sapiens finito e histórico.
184
Justamente o que por meio de uma análise analítica não se pode ver,
O ABSOLUTO E O PÓS-HOMEM

pois analisar é decompor, o absoluto enquanto máxima totalidade radical é a fu-


são de toda possibilidade lógica, ilógica e alógica. Ou seja, o absoluto, enquanto
máxima totalidade radical, é toda possibilidade lógica-ilógica-alógica. Algum-to-
do-nenhum-aquém-entre-além-ser-não-ser-imantente-transcendental-a-si-mesmo
não pode ser incorporado-concebido apenas por meio da razão. Só a totalidade-
do-nosso-ser-racional-intuitivo-pulsional-sensitivo-sensível-instintivo-imaginati-
vo-místico-consciente-inconsciente-meditativo-volitivo pode incorporar-conceber
algum-todo-nenhum-aquém-entre-além-ser-não-ser-imantente-transcendental-a-
si-mesmo. Para tanto, precisamos cultivar as forças que formam a totalidade-do-
nosso-ser-racional-intuitivo-pulsional-sensitivo-sensível-instintivo-imaginativo-
místico-consciente-inconsciente-meditativo-volitivo a uma intensidade tal que
possamos atualizar toda nossa potencialidade nessa incorporação-concepção.

Nós não falamos obscuramente em determinados pontos desta obra


porque somos contra a clareza. Inclusive, podemos propor um argumento real-
mente claro para a questão.

A filosofia analítica tem a propriedade da clareza nas suas construções


conceituais. Esta clareza é obtida pelo cumprimento de um regramento rígido no ato
de argumentar. Este regramento rígido é a disciplina da lógica. Ergo, a clareza é obti-
da através lógica. O absoluto enquanto máxima totalidade radical é lógico, ilógico e
alógico. Se a clareza é obtida através da lógica, então não é possível obter clareza dos
aspectos ilógicos e alógicos do absoluto enquanto máxima totalidade radical. Portan-
to, se pretendemos descrever estes aspectos, não poderemos fazê-lo com clareza.

Aquilo que não é claro é obscuro. Portanto, obteremos obscuridade


dos aspectos ilógicos e alógicos do absoluto enquanto máxima totalidade radical.
Porém, obteremos igualmente clareza,na medida em que pretendemos descre-
ver tanto os aspectos ilógicos e alógicos quanto os aspectos lógicos do absoluto
enquanto máxima totalidade radical. Assim, nosso discurso será claro sob um
aspecto e obscuro sob outros aspectos.
II.XXI

FELICIDADE VERSUS ALGUM-TODO-NENHUM-AQUÉM–ENTRE-


ALÉM-SER-NÃO-SER-IMANENTE-TRANSCENDENTAL-A-SI-MESMO 185

O ABSOLUTO E O PÓS-HOMEM
Aristóteles, na sua obra Ética a Nicômaco buscava o bem do homem.
Concluiu que o homem busca a felicidade através de um conjunto de bens, estes
bens não são absolutamente determinados. Existem os bens externos ao agente, que
são condições necessárias, mas não são condições suficientes para felicidade, tais
como riqueza, amigos, família. Existem os bens internos ao agente, os quais acom-
panhados dos bens externos são causa suficiente para felicidade, tais como atingir a
excelência nas atividades que se exerce e realizar ações de acordo com os princípios
da ética de Aristóteles. Porém, entre esses bens internos ao agente, existe um es-
sencial para a máxima felicidade: a vida contemplativa do filósofo, mais especifica-
mente a contemplação da filosofia primeira, o que chamamos de Metafísica. É o bem
necessário para que o homem atinja seu cume teleológico enquanto espécie animale
racionale. A vida contemplativa era a observação rigorosa do primeiro motor, o ente
suprassensível, imóvel, simples, eterno, imutável e imaterial, cuja única atividade é
um pensar que só pensa em si mesmo. Único ser puramente formal, motor imóvel
de todo movimento, ser não causado e causa primeira que deu origem ao Cosmos.

Nós que incorporamos-concebemos algum-todo-nenhum-aquém-


-entre-além-ser-não-ser-imanente-transcendental-a-si-mesmo não podemos
mais nos contentar com um conjunto de bens e a contemplação da causa pri-
meira. Ou, citando o grande expoente Moderno, não podemos igualmente nos
contentar com a ação boa em si de Kant, a qual diz que, através de um princípio
metafísico da razão prática, o imperativo categórico, o agente agiria sempre de
acordo com o bem universal em questões morais. Através da vontade que é uma
espécie da “causação especial” que não é natural dos fenômenos da natureza,
mas intencional. Ou, citando o primeiro pós-moderno32, não queremos igualmen-
te apenas a vontade de potência nietzschiana. Para Nietzsche, no que diz respeito
ao sentido da vida, o que vale é viver individualmente a melhor vida possível de

32
Há muitas controvérsias sobre Nietzsche. Alguns o consideram o primeiro pós-moderno, nós concorda-
mos com isso nesta obra. Como já dito anteriormente esta obra não é uma obra de história da filosofia ou
de interpretação das doutrinas filosóficas dos filósofos citados. Tais citações são meramente ilustrativas as
teses originais sustentadas.
acordo com a vontade de potência, a qual atingimos através da hierarquização e
o cultivo das nossas forças internas ativas (dionisíacas) e reativas (apolíneas). Há
esperança transcendente no que diz respeito tão somente ao indivíduo que pode
186 vir a ser o super-homem (übermesch). Essa transcendência se dá aqui e agora
no mundo sensível, o super-homem é o homem que modifica a si mesmo. Nós,
O ABSOLUTO E O PÓS-HOMEM

enquanto adeptos da grande moderação tolerante, consideramos todas as filoso-


fias práticas citadas e as outras que não foram citadas como parcialmente certas,
parcialmente erradas e incompletas em relação ao absoluto enquanto máxima
totalidade radical. Nossa felicidade é viver com o propósito de aproximarmo-nos
constantemente dos nossos sentidos geral e individual da vida inteligente. Am-
bos podem ser formulados sintética e densamente: igualar-se a algum-todo-ne-
nhum-aquém-entre-além-ser-não-ser-imanente-transcendental-a-si-mesmo.

Na existência individual através da elevação da intensidade da tota-


lidade-do-nosso-ser-racional-intuitivo-pulsional-sensitivo-sensível-instintivo-ima-
ginativo-místico-consciente-inconsciente, respeitando pausas de descanso numa
síntese de longevidade e intensidade, abrir constantemente novas possibilidades de
verdade e completude do absoluto enquanto a máxima totalidade radical, o que é um
modo de viver para aproximar-se do igualar-se algum-todo-nenhum-aquém-entre-
-além-ser-não-ser-imanente-transcendental-a-si-mesmo. Só podemos aproximar-
mo-nos enquanto homo sapiens finito histórico deste igualar-se, embora tenhamos
ultrapassado a nós mesmos quando elevamos a intensidade da totalidade-do-nos-
so-ser-racional-intuitivo-pulsional-sensitivo-sensível-instintivo-imaginativo-mís-
tico-consciente-inconsciente até que pudéssemos incorporar-conceber algum-to-
do-nenhum-aquém-entre-além-ser-não-ser-imanente-transcendental-a-si-mesmo.
Estamos incomensuravelmente aquém de Deus-que-ultrapassa-a-si-mesmo, a úni-
ca entidade que concebemos como capaz de realizar o igualar-se a algum-todo-ne-
nhum-aquém-entre-além-ser-não-ser-imanente-transcendental-a-si-mesmo.

No sentido geral, o aproximar-se do igualar-se algum-todo-nenhum-a-


quém-entre-além-ser-não-ser-imanente-transcendental-a-si-mesmo se dá com o aceite
de nosso desaparecimento enquanto representantes da vida inteligente pela advinda do
nosso sucessor: o pós-homem, e, assim, sucessivamente (ou quiçá no futuro longínquo
simultaneamente), o pós-homem dará lugar ao pós-pós-homem, este ao pós-pós-pós-
-homem etc. Até que igualar-se ao absoluto enquanto máxima totalidade radical seja
em ato e não mais um ideal norteador e inalcançável em sua plenitude absolutamente
verdadeira e absolutamente completa. Os sentidos da vida inteligente não têm limites
determinados, pois sua teleologia não pode ser atingida por aqueles que os conceberam.

Enquanto sentido para a coletividade e enquanto sentido para indiví- 187


duos particulares, os sentidos geral e individual da vida inteligente foram concebidos

O ABSOLUTO E O PÓS-HOMEM
com o objetivo de serem os mais ambiciosos possíveis. Todavia, esta nova teleologia
pode ser um caminho sem fim, e é um caminho sem fim no que diz respeito a nós –
homo sapiens finito e histórico. O que não significa que num futuro longínquo não
possa haver a satisfação desta teleologia. A beleza de ser isso que somos é a possibi-
lidade de ultrapassar a nós mesmos, mas a realização da nova teleologia não cabe a
nós, apenas caberá a Deus-que-ultrapassa-a-si-mesmo. Não há absolutamente qual-
quer garantia de sucesso na jornada da vida inteligente para vir-a-ser Deus-que-ultra-
passa-a-si-mesmo, e, talvez, até mesmo nunca se complete de modo absolutamente
verdadeiro e absolutamente completo esta teleologia, mas desejar ser Deus-que-ul-
trapassa-a-si-mesmo é desejar igualar-se algum-todo-nenhum-aquém-entre-além-ser-
-não-ser-imanente-transcendental-a-si-mesmo. Isso é a máxima fusão dos dois senti-
dos da vida inteligente, individual e geral. Logo, é também o caminho para felicidade.

II.XXII

OS METAFÍSICOS

Alguns homo sapiens finito e histórico particulares são propensos


a reflexões metafísicas, sonham em encontrar as estruturas básicas da realidade.
Nós - autor e leitor – pertencemos a este subconjunto da humanidade, o primeiro
por haver escrito este livro, que trata da pergunta ainda mais fundamental que
a pergunta pelo ser, e o segundo por haver acompanhado o primeiro até aqui.
Nós investigamos os tradicionais primeiros princípios do entendimento humano
e não encontramos as bases sólidas que os filósofos julgavam haver construído.
Nós não o fizemos por despeito, pois sofremos a angústia do mistério de existir. Se
algum primeiro princípio absoluto realmente houvesse que não fosse alicerçado
num solo movediço, seríamos radicais defensores deste princípio. Ofereceríamos
nosso próprio sangue para assegurar a virtude humana de saber absolutamen-
te em quais princípios as estruturas mais gerais da realidade estão alicerçadas.
Como seria mais fácil o caminho para compreender o mistério em si mesmo, o
absoluto em sua máxima totalidade radical.
188
Agora, quando chegamos a tais solos incertos, depois de um certo
O ABSOLUTO E O PÓS-HOMEM

desespero gerado pela consciência da fragilidade do nosso conhecimento, nos


resignamos à descoberta dos fundamentos como frágeis e incertos princípios me-
tafísicos. Estes parecem submeter-se a primeiros princípios lógicos devido a sua
falta de robustez. Quando compreendemos esta inversão hierárquica da ontologia
subordinando-se à lógica, percebemos que nosso desejo tão ardente de conhecer,
juntamente com nossa ingenuidade e egocentrismo, nos levaram a crer que a rea-
lidade poderia ser descrita de modo absoluto através das regras do nosso pensar.
Afinal, sempre desejamos inconscientemente vir-a-ser Deus. Diante deste quadro
assustador de incertezas, estamos teoricamente preparados para a incorporação-
concepção de algum-todo-nenhum-aquém-entre-além-ser-não-ser-imanente-
transcendental-a-si-mesmo.

A constatação teórica não é ainda suficiente para realização da in-


corporação-concepção, precisamos elevar a intensidade da totalidade-do-nos-
so-ser-racional-intuitivo-pulsional-sensitivo-sensível-instintivo-imaginativo-
místico-consciente-inconsciente até que o desejo ardente de ultrapassar a nós
mesmos, ultrapassar a nossa linguagem, possa abrir possibilidades de sermos
essa ultrapassagem. Então, realizamos a explosão e a implosão dos conceitos
mais gerais da linguagem ser e não ser. Geramos a grande moderação tolerante;
transformamos a nossa antiga visão de mundo no aceno-onipresente-da-onis-
ciência-de-mundos. Expandimos a linguagem regida pela lógica para uma nova
linguagem lógica-ilógica-alógica.

Apesar de nossa investigação ter obtido um início negativo, criamos no-


vas possibilidades positivas para o futuro da nossa existência e da vida inteligente de
modo geral. Descobrimos a despeito da nossa ignorância um caminho possível para a
verdade absoluta e a completude absoluta do absoluto enquanto máxima totalidade
radical: vir-a-ser Deus-que-ultrapassa-a-si-mesmo para igualar-se a algum-todo-ne-
nhum-aquém-entre-além-ser-não-ser-imanente-transcendental-a-si-mesmo.
191

O ABSOLUTO E O PÓS-HOMEM
EPÍLOGO

algum-todo-nenhum-aquém–entre-além-ser-não-ser-imanente-
transcendental-a-si-mesmo algum-todo-nenhum-aquém–entre-além-
ser-não-ser-imanente-transcendental-a-si-mesmo grande moderação
tolerante aceno-onipresente-da-onisciência-de-mundos algum-todo-
nenhum-aquém–entre-além-ser-não-ser-imanente-transcendental-a-
si-mesmo consistente-inconsistente-aconsistente algum-todo-nenhum-
aquém–entre-além-ser-não-ser-imanente-transcendental-a-si-mesmo
algum-todo-nenhum-aquém–entre-além-ser-não-ser-imanente-
transcendental-a-si-mesmo algum-todo-nenhum-aquém–entre-além-
ser-não-ser-imanente-transcendental-a-si-mesmo algum-todo-nenhum-
aquém–entre-além-ser-não-ser-imanente-transcendental-a-si-mesmo
totalidade-do-nosso-ser-racional-intuitivo-pulsional-sensitivo-
sensível-instintivo-imaginativo-místico-consciente-inconsciente
algum-todo-nenhum-aquém–entre-além-ser-não-ser-imanente-
transcendental-a-si-mesmo algum-todo-nenhum-aquém–entre-além-
ser-não-ser-imanente-transcendental-a-si-mesmo algum-todo-nenhum-
aquém–entre-além-ser-não-ser-imanente-transcendental-a-si-mesmo
algum-todo-nenhum-aquém–entre-além-ser-não-ser-imanente-
transcendental-a-si-mesmo algum-todo-nenhum-aquém–entre-além-
ser-não-ser-imanente-transcendental-a-si-mesmo algum-todo-nenhum-
aquém–entre-além-ser-não-ser-imanente-transcendental-a-si-mesmo
igualar-se algum-todo-nenhum-aquém–entre-além-ser-não-ser-
imanente-transcendental-a-si-mesmo
193

O ABSOLUTO E O PÓS-HOMEM
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PADRINHO AGÊNCIA DE CONTEÚDO
Porto Alegre - RS
www.padrinhoconteudo.com
Qu
Igu
E um parêntese faz-se muito válido:
ambição, aqui, nada tem a ver com conota-
ção negativa. De nada adianta vir ao
mundo e acomodar-se, contemplar. Pois
Sérgio inquietou-se a ponto de submeter-se
ao escrutínio com “O Absoluto e o Pós-ho-
mem: como vir-a-ser-Deus-que-ultrapassa-
-a-si-mesmo”.
Guiado pela metafísica neste longo
caminho da poesia, o escritor deparou-se
com o questionamento mais fundamental,
a fronteira dos primeiros princípios da
realidade, o Absoluto enquanto máxima
totalidade radical. Em um português até
raso para um leitor do seu gabarito, mas vá
lá, a vida é de provocações e de um tanti-
nho de picardia e de perdões e, dito isso e
de volta ao ponto, pois o escritor abre
portas para além da razão e encontra
rumos para o até então proibido de ser dito.
Como ele chegou a este ponto é uma
excelente pergunta, e nada melhor do que
localizar as respostas nestas páginas.
Sérgio nasceu em Porto Alegre,
formou-se em Direito pela PUCRS, pós-gra-
duou-se em Gestão Empresarial pela ESPM
e é também bacharel em Filosofia pela
UFRGS. Pequenos aspectos de uma existên-
cia que se revelou infinita e, por si só,
imprevisível.

Carlos Guilherme Ferreira


Qual o sentido da vida?
Igualar-se ao

OOque
queééooAbsoluto
Absolutoenquanto
enquantomáxima
máximatotalidade
totalidaderadical?
radical?
Algum-todo-nenhum-aquém-entre-além-ser-não
Algum-todo-nenhum-aquém-entre-além-ser-não
ser-imanente-transcendental-a-si-mesmo.
ser-imanente-transcendental-a-si-mesmo.

Como
Comoser
serooAbsoluto?
Absoluto?
Criando
Criando o pós-homem e este o seu sucessor atéque
o pós-homem e este o seu sucessor até quevida
vida
inteligente
inteligentese
setorne
torneDeus-que-ultrapassa-a-si-mesmo.
Deus-que-ultrapassa-a-si-mesmo.

Desde que a filosofia existe, ser e não ser são os limites da linguagem.
As grandes revoluções se dão em momentos de grande perigo, e Sérgio
se joga com todo o seu ser neste perigo pois é chegada a hora de um
novo homem e de uma nova linguagem que o acompanhe.

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