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Contabilidade e fraude contábil, onde estamos errando?

Na busca de melhores formas de salvaguardar os ativos das empresas, o assunto de prevenção à


fraude sempre está na mídia e ultimamente nos meios acadêmicos seja como tema de palestras, seja
nas disciplinas de prevenção à fraude, gestão de riscos e governança corporativa, o que evidencia a
necessidade de entendimento do perfil do fraudador e como as empresas tratam o assunto.

Weill e Ross (2006) apresentam que a informação sempre foi importante para as empresas, mas,
com o desenvolvimento tecnológico dos últimos anos, seu papel e valor mudaram
significativamente. A informação:

 É cada vez mais fácil de coletar e digitalizar;


 Tem crescente importância para produtos e serviços;
 É muito difícil avaliar ou apreçar;
 Tem meia-vida decrescente;
 Tem crescente exposição a riscos;
 É uma despesa significativa na maioria das empresas.

Sobre análise e gestão de riscos, Oliveira, Faria, Oliveira e Alves (2008), comentam que: A
preocupação de executivos de empresas, com relação à possibilidade de incorrer perdas decorrentes
de situações que nem sempre estão diretamente sob o seu controle, causa a necessidade de serem
utilizadas ferramentas de identificação, gerenciamento e proteção de riscos de perdas inseridas nos
processos operacionais. Soma-se isso à existência de muitos processos operacionais mal
estruturados, controles internos deficientes ou inexistentes ou fraudes internas ou externas, entre
outras inúmeras ocorrências, que podem prejudicar o desempenho na busca de criação de valor para
a empresa e seus acionistas.

Vale a pena salientar que os controles internos são uma forma de identificação de possibilidades de
fraudes além de outras formas de identificação. Por esse motivo adotamos a metodologia de
melhores práticas e avaliação de necessidades de controles tendo como foco o controle interno e
contábil.

Para melhor compreensão dessa visão, é necessário estabelecer níveis diferentes para tratamento
sistêmico dos controles internos e contábeis. Devem estar relacionados às diversas situações de
risco a que estão expostas, variáveis sobre as quais esses controles devem agir para minimizar os
efeitos.

Identificam-se essas necessidades e implementam-se procedimentos que assegurem as várias fases


do processo decisório e do fluxo de informações para que se revistam da necessária confiabilidade
na prevenção de perdas, na repressão aos crimes de fraude financeira, contábil e de lavagem de
dinheiro, assuntos estes, tão evidenciados na mídia ultimamente.

Ainda, sobre o tema de controles, são evidenciadas algumas fraudes ocorridas nos últimos anos, que
demonstram ausência de controle, negligência operacional, ausência de índole e despreparo das
auditorias e dos órgãos reguladores.

Exemplos de Casos Reais de Fraudes:


O Caso Enron – EUA (2001) – Era a sétima maior empresa dos Estados Unidos e uma das maiores
companhias do setor de energia do mundo, com negócios em mais de 40 países, pediu concordata.
Após dez dias. O Congresso americano iniciou uma análise sobre a quebra do grupo, que
apresentava em seu balanço uma dívida de US$ 22 bilhões de dólares. No Brasil, na mesma época,
a organização tinha participações no Gasoduto Brasil-Bolívia, na Usina Termoelétrica de Cuiabá, na
Eletrobolt, na Gaspart, na CEG/CEGRio e na Elektro Eletricidade e Serviços. O Economista
Kenneth Lay fundou em 1984 a Enron, localizada em Houston, no Texas; foi uma das maiores
empresas beneficiadas pela desregulamentação do mercado de energia dos Estados Unidos e pela
alta de preços em 2000, quando o custo de energia no mercado atacadista americano subiu de US$
32 para US$ 317.

Sempre houve falta de divulgação das informações financeiras sobre a companhia; essa pratica era
difundida pelo próprio Lay, então presidente da Enron, junto aos funcionários. Isso não atrapalhava
o mercado americano, porque suas ações se traduziam em lucro Houston. Detentora de um
faturamento anual de US$ 100 bilhões, a Enron valia US$ 64 bilhões em janeiro de 2001. Uma das
maiores companhias de auditoria e consultoria do mundo, a Arthur Andersen, era a responsável por
conferir a contabilidade da Enron. Durante o processo de falência da Enron, a Arthur Andersen foi
arrolada pelo Departamento de Justiça norte-americano depois de ficar provado que havia
autorizado a destruição de papéis referentes aos contratos de parcerias em prestações de serviço,
usados pelo grupo para esconder as dividas e inflar os lucros. A empresa admitiu ter inflado os
lucros em aproximadamente US$ 600 milhões em quatro anos. Assim, se inicia o maior escândalo
financeiro na história recente dos Estados Unidos, que teve repercussão mundial.

O Caso Arthur Andersen – EUA (2002) – Estava há 89 anos no mercado e considerada uma das
cinco principais dos Estados Unidos, a empresa foi condenada pela Corte Federal de Houston a
cinco anos de prisão e a uma multa de cerca de US$ 500 mil por obstrução de justiça no caso da
Enron, e perdeu o direito de realizar auditorias de empresas públicas nos Estados Unidos, é um
gesto simbólico, já que a empresa encerrou suas atividades em agosto de 2002, e como a
condenação se refere a companhia, ninguém foi para a prisão. O julgamento contra a companhia,
que tinha cerca de 85 mil empregados por todo o mundo e em 2001 faturou US$ 9,3 bilhões, foi o
primeiro caso criminal que surge do escândalo financeiro causado pela quebra da Enron.

Em 2000, a Enron, segunda maior cliente da Andersen nos Estados Unidos, pagou US$ 52 milhões
pela auditoria e mais US$ 27 milhões por outros serviços. Além de realizar a auditoria externa da
Enron Corp., a Arthur Andersen também prestava serviços de auditoria interna para a empresa de
energia, suscitando questões ainda maiores sobre sua competência para auditar seu próprio trabalho.

O Caso WorldCom – EUA (2002) – A cada trimestre, a empresa revisava os números contábeis
para adequá-los às estimativas dos analistas. Era a segunda maior operadora americana de
telecomunicações a longa distância e a primeira operadora mundial de serviços de internet, a
WorldCom representava no final dos anos 90 uma empresa símbolo da euforia americana.

Da mesma forma que a Enron, a WorldCom foi cobiçada pelos investidores que, de meados de 1998
à metade de 1999, multiplicaram por seis a sua cotação. Assim como Kenneth Lay, CEO da Enron,
Bernard Ebbers, CEO da WorldCom era também considerado um gênio dos negócios.
Assim como a Enron, a WorldCom teve uma ascensão tão rápida quanto a sua queda, uma dívida de
US$ 41 bilhões e a descoberta de desvios contábeis de aproximadamente US$ 4 bilhões para
esconder suas perdas, o que originou outro escândalo.

O Caso Xerox – EUA (2002) – Depois do escândalo da WorldCom, a Xerox dos Estados Unidos
admitiu em junho de 2002 ter inflado seu faturamento em US$ 1,9 bilhão nos últimos cinco anos,
contabilizando de uma única vez vendas de equipamentos que seriam pagos a longo prazo. A
empresa encaminhou à SEC seu relatório revisado para o exercício de 2001. O ajuste contábil era
exigência do acordo fechado com SEC em abril de 2002, quando o “chefão” do mercado de capitais
americano descobriu as falhas contábeis, mas superou o estimado pela agencia na época, US$ 1,5
bilhão. Sem admitir ou negar a culpa, a Xerox concordou, em abril de 2002, em pagar a multa de
US$ 10 milhões à SEC, a maior já paga por uma companhia, por ter informado erradamente o
registro contábil das receitas. A empresa não utilizou o princípio da competência para contratos de
longo prazo, reconhecendo seus resultados no primeiro ano e inflando a receita. A KPMG pagou
multa de US$ 22 milhões por atuação neste caso.

O Caso Parmalat – Itália (2003) – Dia 11 de novembro de 2003, dia em que avaliadores da
contabilidade da empresa expressam suas dúvidas acerca de um projeto de investimento de 500
milhões de euros efetuado no fundo Epicurum, situado nas Ilhas Caiman. No mesmo instante, a
agência Standard & Poors baixou a nota dos títulos da Parmalat, cujo valor das ações reduziram
drasticamente. Com a preocupação crescente dos credores da Parmalat, a direção do grupo
apresentou documento anunciando possuir a empresa uma conta de 3,95 bilhões de euros no Bank
of America nas Ilhas Caiman. O banco afirma ser falso o tal documento exibido pela direção da
Parmalat. A ação da Parmalat conhece, então, uma derrocada: mais de 115 mil investidores e
pequenos poupadores perderam, globalmente, cerca de 11 bilhões de euros (segundo dados do Le
Monde Diplomatique, de fevereiro de 2004).

A fraude nas contas da empresa é uma das maiores na história do capitalismo. Segundo a SEC
(Security and Exchange Commission) dos EUA, foi descoberto um rombo financeiro de 8 bilhões
de euros. O caso da Parmalat é chamado na imprensa como o Enron Europeu; Calisto Tanzi, o PDG
da Parmalat, foi preso em 2003. Outros 20 funcionários importantes também respondem atualmente
por processo;

Além de tentar melhorar os números, mascaram-se os esquemas de fraude do próprio controlador. O


caso veio à tona quando um dos bancos se recusou a confirmar o valor que teria a pagar à Parmalat,
declarado em um dos seus balanços. A Parmalat, maior empresa do setor alimentício da Itália, pediu
concordata, um dia após o governo italiano editar um novo decreto que facilita os trâmites
burocráticos e as negociações com credores por parte de empresas em dificuldades financeiras..

Banco Santos (2004): Em maio de 2004 o BACEN interveio no Banco Santos instalando cerca de
30 fiscais desencadeando uma série de saques dos correntistas. Posteriormente, mesmo com caixa
positivo recorreu ao redesconto solicitando R$ 700 milhões para cobrir novos saques e segundo
Edemar Cid Ferreira, controlador do banco, o BACEN recusou o pedido e em seguida interveio no
banco. No momento da intervenção, o Banco Central do Brasil estimava que o Banco Santos tivesse
um patrimônio negativo de R$ 100 milhões, porém, ao final da fiscalização, o interventor
apresentou relatório no qual constava um ativo de R$ 751 milhões e passivo de R$ 2,987 bilhões.
Então o rombo no Banco Santos foi declarado em R$ 2,236 bilhões. Desde a intervenção, várias
irregularidades e operações obscuras foram descobertas, dentre elas, a concessão de empréstimos a
empresas brasileiras com dificuldades financeiras em troca de compra de papéis e investimentos em
empresas localizadas em paraísos fiscais. O Banco Santos teve sua falência decretada em 20 de
setembro de 2005.

O caso Sadia – Brasil – (2008) – As operações com derivativos cambiais levaram a Sadia a ter um
prejuízo de R$ 2,484 bilhões em 2008, o maior de sua história ao longo de 64 anos. Balanço
divulgado em 2009 apontou que a companhia perdeu nada menos que R$ 2,55 bilhões com os
instrumentos que ficaram conhecidos como “derivativos tóxicos”.

O caso Aracruz Celulose – Brasil – (2008) – A empresa divulgou um comunicado informando que a
exposição da companhia a instrumentos de derivativos foi “fortemente” afetada pelo dólar e que
contratou uma empresa especializada para verificar o tamanho do estrago. O diretor financeiro
pediu licença do cargo. Também por apostar excessivamente neste instrumento, a fabricante de
celulose Aracruz anunciou um prejuízo de R$ 4,2 bilhões em Banco Société Générale – França –
(2008) – A ministra de Economia e Finanças da França, Christine Lagarde, disse que alguns dos
controles internos do banco, que sofreu em 2007 uma perda de cerca de US$ 7 bilhões (EUR$ 4,9
bilhões) com um esquema de fraude sobre as operações realizadas pelo operador Jérôme Kerviel,
falharam ou não foram levados em consideração antes do golpe.

Satyam Computer Service – Índia – (2009) – Em uma carta ao conselho de administração da


empresa, que foi apresentado à Bombay Stock Exchange, disse que a empresa havia inflado seu
lucro operacional nos três meses encerrado em 30 de setembro de US$ 12,2 milhões para US$ 136
milhões, enquanto as receitas foram inflacionadas de US$ 430 milhões para US$ 550 milhões. A
empresa havia relatado uma margem operacional de 24%, quando na verdade ela foi de 3%. A
acusação da polícia é que os auditores participaram ativamente da “maquiagem” dos números, que
já vem sendo considerada pior fraude corporativa da Índia.

Banco PanAmericano – Brasil – (2010) – No dia 9 de novembro de 2010, foi anunciada à imprensa
a fraude do banco PanAmericano. O problema havia sido detectado cerca de seis semanas antes, em
setembro, quando técnicos do BACEN estavam fazendo uma fiscalização especial focada em cessão
de créditos entre todos os bancos. De acordo com o diretor de fiscalização do BACEN, a supervisão
do órgão é baseada em risco, e como a prática de cessão de créditos tinha aumentado resolveram
fazer uma investigação mais a fundo. Em meio a rumores de que estaria prestes a quebrar, o Banco
PanAmericano, especializado em financiamento de automóveis e empréstimos consignados (com
débito em folha), com forte atuação junto às classes C e D, informou que receberia um aporte de R$
2,5 bilhões do Grupo Silvio Santos, seu principal acionista controlador.

Os recursos foram tomados do Fundo Garantidor de Créditos (FGC), criado pelos próprios bancos
para proteger correntistas e poupadores, depois de terem sido verificadas “inconsistências
contábeis”. Segundo o Banco Central (BC), havia duplicidade de carteiras de crédito nos balanços,
ou seja, o PanAmericano vendia carteiras de crédito para outras instituições, mas continuava
contabilizando esses recursos. O BC chegou a considerar intervir no banco, o que foi descartado
após pedidos do grupo controlador. Para obter o financiamento inicial de R$ 2,5 bilhões do FGC, o
empresário teve de apresentar como garantia mais quatro empresas, além do próprio PanAmericano:
Baú Financeira, Liderança Capitalização, Jequiti (da área de cosméticos) e SBT, avaliados em R$
2,7 bilhões. Na realidade investigações a avaliações apontaram que o rombo no banco era ainda
maior superior a R$ 5 bilhões.

Banco UBS AG – Suiça – (2011) – Conforme publicou o jornal Valor Econômico em em 18 de


setembro de 2011, o operador Kweku Adoboli, preso no dia anterior pela polícia de Londres após o
banco UBS revelar que um funcionário realizou operações não autorizadas que causaram prejuízo
de US$ 2 bilhões ao banco, foi acusado de fraude e também por contabilidade ilícita em dois
episódios ocorridos a partir de outubro de 2008, durante o pico da crise econômica.

Segundo a acusação, Adoboli teria se aproveitado de sua posição de operador sênior para realizar
operações contra o interesse do UBS, em vez de prezar pela segurança do banco. Adoboli trabalhou
na divisão do banco de investimento chamada Delta One, que realiza operações para clientes,
normalmente ajudando-os a especular ou proteger o desempenho de uma cesta de papéis. Os
operadores dessa divisão também assumem posições de risco usando o dinheiro do próprio banco
para realizar determinadas transações. Segundo informou o UBS, nenhum cliente foi prejudicado
pelas operações realizadas por Adoboli. A prisão do operador ocorre justamente quando os
reguladores globais estão pressionando os bancos a controlar operações com recursos próprios,
aumentar seus sistemas de controle de risco e separar a área de banco de investimento da área de
varejo. Pouco antes de ser preso, na madrugada de quinta-feira, Adoboli teria escrito em sua página
pessoal, no Facebook: “eu preciso de um milagre”.

O que mais impressiona é a forma como as fraudes foram tratadas e como causaram inúmeros
prejuízos a colaboradores, investidores, governos e ao próprio mercado, sem contar a questão de
imagem e reputação dos contadores, empresas de auditoria e órgãos reguladores.

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