Você está na página 1de 12

Quem gosta de esportes terá mais facilidade para

compreender o princípio da estratégia de se associar com


empresas que apresentam alto rendimento sobre o capital
próprio e que, mesmo assim, operam com baixos múltiplos
na relação entre preço e lucro da ação. Afinal, se fossem
times de futebol disputando um campeonato de pontos
corridos com turno e returno, as companhias que combinam
os melhores ataques com as melhores defesas seriam
sempre as favoritas.

Quando você se interessa por investimentos em renda variável e começa a


negociar ativos via bolsa de valores, levando o assunto a sério, logo terá
acesso a opiniões de especialistas, alertando que não existe essa história
de enriquecimento rápido e fácil (em Wall Street ou em qualquer lugar do
mundo) e que não existem fórmulas secretas, mirabolantes ou mágicas
para escolher as ações certas.

Em seguida, constatará que vários investidores bem-sucedidos são do tipo


“contrarian”, ou seja, não seguem necessariamente os movimentos de
manada para comprar ativos da moda na euforia ou para vendê-los
desesperadamente durante ciclos de baixa na economia.
Joel Greenblatt é um contrarian em vários sentidos. Em primeiro lugar, é
um investidor bem-sucedido e respeitado, um expoente do value investing,
filantropo, professor universitário e fundador do Gotham Capital – um
fundo de investimentos que maneja recursos na casa dos bilhões de
dólares. Em segundo lugar, ele se propôs a desenvolver uma fórmula
mágica para ganhar da média do mercado. Só isso. Ocorre que seu método
de investimento tem se mostrado realmente eficaz ao longo dos anos, não
por ser mágico, mas por ser elementarmente lógico.

A fórmula mágica de Greenblatt é tão promissora que, mesmo seu autor


não sendo um grande escritor, o fez vender milhões de exemplares do livro
The Little Book That Beats The Market1, traduzido no Brasil como A
Fórmula Mágica de Joel Greenblatt para Bater o Mercado de Ações2.

Em sua obra mais conhecida, Greenblatt se expressou de modo que até


seus filhos adolescentes (na época, por volta de 2005) pudessem
compreender o funcionamento do mercado de capitais. Desse modo,
somos apresentados ao promissor Jason, um garoto que vende gomas de
mascar para seus colegas na escola. Sua contrapartida é personificada por
Jimbo, dono da fictícia empresa “Só Brócolis”.

1
<https://amzn.to/2Lt0lNx>.
2
<https://amzn.to/2XuZA90>.
Analisando o negócio de vender gomas de mascar versus o ramo das folhas
verdes pouco populares, Greenblatt apresenta as referências básicas para
estimar o potencial de crescimento das empresas – algo primordial, que
todo investidor deve considerar. Não espere muita erudição do escritor: a
grande âncora cultural para exemplificar o modo como o leitor pode
assimilar conceitos que ele pretende transmitir é o filme Karatê Kid.

Numa linguagem pretensamente bem-humorada (quem é entusiasta de


sitcoms norte-americanas concordará), Greenblatt relata que deixar
dinheiro embaixo do colchão ou em uma aplicação bancária não costuma
ser um bom negócio; que comprar títulos da dívida do governo americano
(vale também para o caso brasileiro) é seguro, porém não muito rentável;
que comprar títulos vendidos por empresas (debêntures) pode ser melhor,
embora mais arriscado; e que bom mesmo pode ser comprar ações.

Greenblatt lembra que aportar dinheiro em uma ação significa comprar um


pedaço de uma empresa e de seus lucros futuros. Portanto, para calcular o
valor de um negócio é preciso estimar quanto capital ele pode amealhar no
futuro. Uma ação só deve ser comprada se ela tiver potencial de retorno
superior aos juros convencionais de um título público no longo prazo. Caso
contrário, o risco não compensa.

Reconhecendo a importância de Benjamin Graham e fazendo referências


ao Senhor Mercado, figura mítica criada pelo pai do value investing, o autor
da fórmula mágica explica que os preços das ações podem variar
drasticamente em períodos curtos, sem que isso seja refletido no valor real
das companhias. Logo, é uma boa ideia adotar a margem de segurança,
comprando ações de empresas que ofereçam grandes descontos em
relação ao seu valor estimado como justo, pois isso abre a possibilidade de
receber lucros maiores no futuro.

Se o negócio em vista oferece margem de segurança combinada com alto


rendimento de resultado, então fica estabelecido o critério da
oportunidade, especialmente quando a empresa em voga é capaz de
investir o capital próprio com altos índices de retorno, ou seja, que
possibilitam elevadas receitas convertidas em lucro em relação ao
montante do capital empregado.

Aqui reside o princípio da fórmula mágica: selecionar empresas que


combinam valuation atrativo (atendendo ao princípio do preço descontado
da ação) com indicadores altos de rentabilidade (revelando o critério de
qualidade da companhia).

Antes de entregar a fórmula mágica mastigada para o leitor, Greenblatt se


encarrega de demonstrar que ela funciona ao longo dos anos, sob diversos
prismas de análises e comparações. Ele as faz com foco no mercado
acionário dos Estados Unidos, que conta com milhares de empresas de
capital aberto, ao passo que no Brasil a contagem fica restrita à casa das
poucas centenas.
Considerando a realidade norte-americana, a fórmula mágica parece
funcionar para todos os portes de companhias, das pequenas às
gigantescas. Empresas com patrimônio líquido de poucos milhões de
dólares ou companhias multibilionárias respondem à mesma lógica
identificada por Joel Greenblatt, que faz a ressalva sobre sua fórmula
mágica não funcionar o tempo todo. Nos vários backtests conduzidos por
ele e por uma série de analistas que se debruçaram sobre seu método,
verificou-se que, durante alguns anos, as ações escolhidas nesse sistema
perdem para o mercado, embora no longo prazo os resultados sejam bem
acima da média. Isso coloca o investidor no impasse de se manter fiel à
estratégia adotada em períodos de resultados negativos.

Greenblatt reconhece que muitos investidores com algum grau mais


aprofundado de conhecimento sobre o mercado acabam abandonando a
fórmula mágica, pois acreditam que podem selecionar ações por conta
própria, ao invés de confiar cegamente num processo automatizado para
composição de portfólio. Então, sem deixar de registrar comentários
críticos sobre o sistema educacional dos Estados Unidos, o autor afirma
que a maioria absoluta dos pequenos investidores, enquanto pessoas
físicas, não tem condições de analisar as ações de suas carteiras.

O leitor mais atento, tratado como um adolescente no começo do livro,


talvez desconfie de ter sido tachado de incompetente para gerir os
próprios investimentos. Depois do tapa com luva de pelica, vem o assopro.
Greenblatt expõe que muitos gestores profissionais de fundos de
investimentos também não conseguem bater o mercado de forma
recorrente, então tece loas aos ETFs, fundos de índices geridos
passivamente, seguindo regras claras para aquisição ou venda de ações.
Desse modo, eles obtêm melhores retornos para seus cotistas por, entre
outros aspectos, atuarem com taxas de administração reduzidas.

A fórmula mágica de Greenblatt implica que o investidor deve aceitar fazer


a gestão passiva de sua carteira, mas nada impede que ele mescle o
princípio dessa estratégia com os conhecimentos eventualmente
adquiridos ao longo de sua jornada, reduzindo, dessa forma, a
diversificação de seu portfólio. Assim, ele concentra os aportes nas
empresas que, além de estarem com preços descontados e operarem com
alto rendimento sobre o capital próprio, apresentem sinais de lucros
normalizados num período futuro de longo prazo, com riscos controlados.

O caminho mais fácil para empregar a fórmula mágica é acessar o site que
Joel Greenblatt criou para automatizar a seleção de ações:
▪ Magic Formula Investing – <www.magicformulainvesting.com>.

Essa página, porém, apresenta dois problemas:


1. Tem um design pobre, para não dizer horrível.
2. Só funciona para o mercado de ações dos Estados Unidos.
Então, a alternativa para o investidor brasileiro, que opera na Bolsa de São
Paulo, é montar seu portfólio na unha, seguindo as orientações gerais da
fórmula mágica.

Greenblatt sugere uma carteira composta de 20 a 30 ações, com aportes


realizados a cada dois ou três meses, em cinco a sete companhias que
sejam as mais bem classificadas na combinação de dois rankings.

O primeiro ranking mede o ROA (índice de retorno sobre os ativos), que


deve considerar o valor mínimo de 25%. Quanto mais alta a classificação da
empresa nesse quesito, menor sua pontuação. Por exemplo: a companhia
que ficou em primeiro lugar recebe apenas um ponto, a segunda recebe
dois pontos e assim por diante. No lugar do ROA, pode-se medir também o
ROE ou RPL (retorno sobre o patrimônio líquido). Nossa sugestão, no caso
do ROE, é operar com um valor mínimo de 8%.

O segundo ranking mede o P/L das empresas. Quanto mais baixo, melhor.
O sarrafo para o P/L mínimo, porém, seria um múltiplo de cinco vezes o
preço sobre o lucro por ação. Igualmente, as empresas com as melhores
classificações nesse quesito recebem menos pontos.

Então, quando a pontuação dos rankings é somada, encontramos as


empresas que combinam alto rendimento sobre o próprio capital e baixa
relação entre preço da ação e lucro da ação, estabelecendo a mescla de
empresas de bons fundamentos que apresentam o critério da
oportunidade de compra com margem de segurança.
Dentre os sites brasileiros que podem auxiliar o investidor a negociar ações
na Bolsa de São Paulo com base na fórmula mágica, destacamos dois: o
Fundamentus e o Status Invest.
▪ Fundamentus – <www.fundamentus.com.br/buscaavancada.php>.
▪ Status Invest – <https://statusinvest.com.br/acoes/busca-avancada>.

Greenblatt sugere eliminar ações do setor financeiro (como bancos e


seguradores) e de utilidade pública (como empresas de energia elétrica e
saneamento básico). Porém, como o universo de ações brasileiras é
restrito, cabe ao investidor considerar esse aspecto à parte. A mesma
lógica se aplica aos BDRs.

Depois de nove ou dez meses seguindo esse processo, o investidor


finalmente completa uma carteira bem diversificada de ações, obtendo
proteção natural contra os riscos de concentração de aportes em poucos
negócios, para aqueles que não têm as ferramentas adequadas de análise
mais profunda de cada caso.

Segundo o criador da fórmula mágica, cada ação deve permanecer um ano


na carteira do investidor, sendo substituída por outra ação bem classificada
no ranking combinado de ROA (ou ROE) alto com P/L baixo.

O processo deve ser repetido indefinidamente, por vários anos, sempre


com distribuição de capital entre as ações de forma que nenhuma –
inicialmente – pese mais que 5% na carteira, tendo em vista que a
tendência é que elas se valorizem ao longo do tempo.

Você pode perguntar se a fórmula mágica já foi testada no Brasil e se deu


certo. A resposta é um duplo “sim”. Analistas profissionais da Suno
Research já realizaram backtests: todos apresentaram resultados positivos
quando a estratégia foi empregada por períodos alongados. Os estudos
brasileiros, inclusive, já foram encaminhados diretamente a Joel
Greenblatt, quem melhor define o conceito dessa estratégia:

“Comprar companhias acima da média a preços abaixo da


média faz sentido em todas as bolsas de valores. Portanto,
temos poucas dúvidas de que a lógica na base da fórmula
mágica vai se mostrar muito poderosa nos mercados
desenvolvidos e em desenvolvimento do mundo todo, no
longo prazo.”

O próprio Tiago Reis, fundador da Suno, reconhece que o livro de


Greenblatt foi um dos que mais o ajudaram a obter bons resultados no
começo de sua jornada como investidor. Sobre a fórmula mágica e o
mercado brasileiro de ações, ele escreveu o seguinte:
“No Brasil, a equipe da Set Investimentos fez o backtest
dessa estratégia e o retorno de quem tivesse simplesmente
seguido essa abordagem é excelente: superior a 30% ao ano
desde 2000 até 2017.

Não acredito que esse retorno irá se repetir nos próximos


anos, mesmo porque o valuation da Bolsa de São Paulo no
começo dos anos 2000 era muito baixo. Hoje, não temos o
mesmo cenário daquela época. Além disso, os mercados são
mais arbitrados, com mais competição por boas
oportunidades.

Porém, acredito que quem seguir essa estratégia será bem-


sucedido e deverá superar o Ibovespa no longo prazo. É
sempre difícil fazer previsões, mas acredito que comprar
algo bom e barato seja uma boa estratégia para tudo na
vida: nunca ninguém quebrou fazendo isso.”

Você também pode gostar