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Creatina - Pra acabar com as dúvidas!

Para a manutenção e realização de suas diversas funções, o organismo humano necessita


receber um suprimento de energia contínuo, de maneira ininterrupta, sendo que essa energia
é proveniente da alimentação. No entanto, a mesma não é liberada subitamente, pois se isso
ocorresse um indivíduo ao se alimentar se transformaria em "chamas". Na verdade as
células do nosso organismo utilizam apenas a energia química, extraindo-a das moléculas
dos nutrientes (carboidratos, gorduras e proteínas) contida nos alimentos. Esse processo de
extração é lento, e ocorre em pequenas quantidades, reduzindo a perda de energia na forma
de calor. Dessa forma, o organismo transforma energia térmica em energia química,
disponibilizando essa última para o trabalho celular.
A maneira pela qual o organismo recolhe e conduz essa energia, e a torna disponível na
forma de energia química, se dá através de um composto denominado ATP (trifosfato de
adenosina), que funciona como um receptor-doador de energia. O ATP é o principal
composto rico em energia, e é formado pelos nucleotídios adenina e ribose (resultando em
adenosina), ligados a 3 moléculas de fosfato (átomos de fósforo e oxigênio), unidos por
ligações de alta energia.
A hidrólise do ATP libera uma molécula de fosfato formando um composto denominado de
ADP (difosfato de adenosina), reação essa que libera aproximadamente 7,3 Kcal por
molécula de ATP hidrolisado. Quando o ATP libera 2 moléculas de fosfato, forma-se o
AMP (monofosfato de adenosina). A hidrólise do ATP ocorre com ou sem a disponibilidade
de oxigênio, sendo essa uma reação rápida e anaeróbica. Esse processo permite a liberação
de energia rápida para uso imediato, o que não ocorreria se o processo em questão fosse
dependente do oxigênio.
O ATP é armazenado em pequenas quantidades nas células e essa molécula não pode ser
fornecida através do sangue, sendo que sua concentração está confinada a uma ressíntese
contínua, que deverá ocorrer no mesmo ritmo com que essa molécula é utilizada.
A quantidade total de ATP no organismo encontra-se por volta de 80 a 100g, sendo
suficiente para a manutenção de um exercício físico máximo por apenas alguns segundos.
Nos momentos iniciais do exercício ou numa situação onde seja exigido uma contração
muscular rápida e explosiva, onde as concentrações de ATP diminuem significativamente, a
ressíntese de ATP ocorre a partir de outro composto de alta energia denominado CP (fosfato
de creatina), sendo esse essencial durante a passagem de uma baixa para uma alta demanda
energética.
O CP é considerado "reservatório" de fosfato de alta energia, sendo que sua concentração
celular é 4 vezes maior que a de ATP. A hidrólise do CP aciona a ressíntese de ADP, sendo
que se houver energia em quantidades suficientes, a creatina (C) e o fosfato (P) podem
novamente formar o CP.
Assim sendo, fica evidente que a energia perdida por algumas moléculas pode ser
transferida para a estrutura química de outra molécula, sem ser perdida na forma de calor,
sendo essa característica de vital importância para a manutenção do trabalho celular e, no
caso do exercício físico, para a contração dos músculos nos momentos iniciais da atividade.
A creatina foi identificada em 1835, sendo que sua suplementação tomou popularidade a
partir dos Jogos Olímpicos de 1992, onde atletas britânicos, incluindo medalhistas de ouro,
declararam utilizar esse tipo de suplemento.
A creatina ou ácido metil acético-guanidina é encontrado em abundância no músculo
esquelético, e em menor quantidade no cérebro, fígado, rins e testículos. No homem com
um peso médio de aproximadamente 70kg, a quantidade total de creatina é de cerca de
120g .
Além de estar presente nos alimentos, principalmente os de origem animal (carnes em
geral), a creatina pode ser sintetizada (Figura-1), no fígado, através de 3 aminoácidos
(Glicina, Arginina e Metionina), sendo transportada posteriormente para o tecido muscular,
onde aproximadamente 95% do seu total se encontra estocado. Aproximadamente 60% da
creatina presente no músculo, em repouso, se encontra na forma de fosfato de creatina
(CP). A suplementação oral de creatina parece diminuir sua produção endógena, mas essa
diminuição é revertida quando a suplementação é interrompida. A quantidade de creatina
corporal é relativamente instável, com uma reposição diária de aproximadamente 2g. No
entanto essa quantidade depende de vários fatores, tais como: ingestão pela dieta, idade,
sexo, e quantidade de massa muscular.

Tem sido proposto dois mecanismos para esclarecer as altas concentrações de creatina
dentro do músculo. O primeiro envolve o transporte de creatina por um processo saturável
específico de entrada, o segundo requer a captura da creatina dentro do músculo. Recentes
estudos demonstram que a entrada de creatina dentro dos músculos ocorre ativamente
contra um gradiente de concentração, possivelmente envolvendo a interação entre a creatina
e um sítio específico de membrana, o qual reconhece o grupo amida.
Recentemente, foi identificado um transportador de creatina sódio dependente, no músculo
esquelético, coração e cérebro. Isso sugere que na musculatura esquelética o sistema de
transporte não seja saturável, desse modo suportando a idéia de captura intracelular desse
ácido. Essa captura irá resultar na geração de um gradiente de concentração, mas a
fosforilação parece não ser o único mecanismo celular de retenção de creatina. Outros
mecanismos têm sido propostos, inclusive a ligação de componentes intracelulares e a
existência de membranas celulares restritivas.
A creatinina é o único produto final da degradação de creatina, sendo formada por uma
reação reversível não enzimática. Sendo o músculo esquelético o principal estoque de
creatina corporal, esse se torna o principal sítio de produção de creatinina. Diariamente a
excreção renal de creatinina é relativamente constante, mas pode variar individualmente, e
é dependente da massa muscular total em indivíduos saudáveis. Uma vez gerada, a
creatinina entra na circulação por difusão simples e é filtrada pelos rins por um processo
independente de energia, sendo posteriormente excretada na urina.
Em indivíduos vegetarianos, a maior captação de creatina ocorre durante a fase de
"loading" da suplementação, sugerindo que a síntese endógena pode não suprir o
requerimento de creatina nesses indivíduos. Recentes estudos demonstram que a ingestão
de creatina resulta num pequeno aumento na excreção de creatinina e, em geral, a excreção
urinária de creatinina aumenta levemente com a suplementação após 5 semanas, retornando
aos seus valores iniciais posteriormente a esse período.
A ingestão de 20g de creatina/dia, durante um período de 5 dias, pode elevar em mais de
20% a concentração total de creatina muscular, da qual aproximadamente 20% está na
forma de fosfato de creatina. A maioria dos estudos envolvem a ingestão de 5 gramas de
creatina, quatro vezes ao dia, em líquido morno, onde se torna mais fácil dissolver a
creatina. Indivíduos que apresentam perdas nas concentrações de creatina muscular
respondem melhor à suplementação. No entanto, algumas pessoas podem ter um benefício
maior que outras.
O procedimento supra citado está de acordo com recentes estudos onde foi demonstrado
que o maior consumo de creatina pelos tecidos ocorre nos primeiros dias de suplementação,
sendo que 30% dessa retenção acontece nos primeiros 2 dias, e 15% nos dias sucessivos até
o 4o dia. Essa manobra suplementar se mostrou mais eficiente do que a ingestão de 3g
creatina/dia, durante 3 semanas, porém, após um período de 4 semanas as concentrações
musculares de creatina não apresentaram diferenças com a utilização desses dois métodos.
Os indivíduos do sexo feminino, parecem ter um aumento ligeiramente menor no conteúdo
de creatina quando comparado com os homens. Provavelmente, isso seja conseqüência da
menor massa muscular. Dessa forma, a sobrecarga de 20g de creatina/dia, durante 6 dias, e
2g/dia como dose de manutenção, parece ser a maneira mais rápida de se aumentar o
conteúdo muscular de creatina. Além disso, quando um exercício submáximo é realizado
durante o período de suplementação, a captação de creatina pelo músculo aumenta em
aproximadamente 10%.
A ingestão de creatina junto com carboidratos parece aumentar a retenção de creatina nos
músculos por volta de 60%, quando comparado a ingestão de uma solução contendo apenas
creatina, porém, o músculo tem um limite superior para armazenamento de creatina que não
pode ser excedido (160mmol/kg-1 de músculo seco). Isso significa que, uma vez atingido o
referido limite, a concentração de creatina não irá aumentar mesmo que se ingira altas
doses desse elemento.
Como citado anteriormente, dentro do músculo, o CP é utilizado para regenerar o ATP a
partir do ADP, dessa forma, a utilização do CP pode ser um fator limitante para a
performance muscular durante exercícios de alta intensidade e de curta duração, quando a
suplementação de creatina poderia auxiliar no aumento da concentração da CP tendo um
efeito ergogênico auxiliar para esse tipo de atividade física.
No entanto, existem controvérsias quanto a esse papel da creatina. Essa discrepância parece
ser devido a uma série de fatores, como por exemplo:
não aumento da creatina muscular em resposta à suplementação devido a maior
concentração inicial de creatina;
a creatina muscular não é o fator limitante em alguns protocolos de exercício utilizados, tal
como sprint de natação;
a recuperação longa e de maneira ativa entre os intervalos de exercício aplicados em vários
estudos.
Dessa forma, o efeito ergogênico da creatina é ainda debatido, e parece depender do tipo de
exercício, de suas concentrações iniciais e outros fatores associados à performance.
Nos próximos artigos serão discutidos aspectos como: os diferentes sistemas energéticos
que atuam durante o exercício físico; a suplementação de creatina como agente ergogênico
na performance física; e os riscos associados à suplementação de creatina.

Creatina - Parte 2

Como discutido no artigo anterior, o organismo humano necessita receber um suprimento


de energia contínuo e de maneira ininterrupta. Essa energia presente nos alimentos não
pode ser transferida diretamente para realização do trabalho biológico, tornando-se
acessível, na forma química, através do ATP.
Em média, um indivíduo que contém uma massa muscular de cerca de 30 kg, a quantidade
total dos fosfagênios de alta energia (ATP e CP) é suficiente para a manutenção de um
exercício físico máximo por apenas 5 a 6 segundos. Durante esse tipo de exercício, a
produção de energia pelos músculos ativos pode chegar a ser cerca de 70 vezes maior,
quando comparado a um exercício menos intenso, e até 100 vezes maior, quando
comparado ao estado de repouso. Dessa forma, a liberação de energia dos estoques de ATP
e CP, de maneira rápida e imediata, para a realização de atividades físicas (como 25m de
natação, saltos, 100 metros de corrida, e levantamento de pesos), é limitada.
Se tomarmos como exemplo a corrida de 100 m, cujo o tempo de realização é de cerca de
10 segundos, a velocidade máxima de corrida será mantida por um período de até 5 a 6
segundos, sendo que após esse período, será acionado o sistema glicolítico de fornecimento
de energia, a fim de regenerar o ATP gasto. Esse sistema de transferência de energia é mais
lento que o dos fosfagênios, fazendo com que a velocidade de corrida diminua a partir do 6º
segundo de prova. Dessa forma, a quantidade de fosfagênios armazenados na musculatura
determina um melhor ou pior desempenho, estando esse dado de acordo com o fato de que
o vencedor costuma ser aquele que reduz menos ou consegue manter sua velocidade nos
últimos segundos de prova.
Deve ser ressaltado que alguns pesquisadores acreditam que o sistema dos fosfagênios é
capaz de contribuir, em grande proporção, por um período de até 20 segundos de atividade
intensa.
Partindo-se dessa hipótese, não seria espantoso acreditarmos que atletas mais treinados e
com uma massa muscular bem desenvolvida, comportariam um estoque maior de CP nessa
musculatura, consequentemente podendo regenerar o ATP em quantidades adequada, além
de fornecer a energia requerida de forma veloz o suficiente.
Na verdade, todos os tipos de atividade física necessitam de energia proveniente dos
fosfagênios, e isso se dá principalmente nos momentos iniciais do exercício, porém, muitas
contam quase exclusivamente com esse tipo de transferência de energia para sua realização,
como por exemplo: beisebol, futebol americano, vôlei.
Além da formação de ATP pela quebra da CP, o músculo esquelético também pode utilizar
outras vias para produção de ATP, como por exemplo: a via glicolítica (anaeróbia e aeróbia)
- formação de ATP via degradação de glicose e glicogênio, na presença ou ausência de
oxigênio; via ou sistema oxidativo - formação de ATP através de processos celulares de
oxidação. A formação do ATP através da via CP e glicolítica anaeróbia, não envolve a
utilização de oxigênio e são chamadas de vias anaeróbias. Já a formação do ATP pelos
processos oxidativos, que envolvem a utilização de oxigênio, é denominado de
metabolismo aeróbio. Esse último envolve a oxidação de glicose e glicogênio na presença
de oxigênio, como também, a oxidação de gorduras e proteínas.

Via glicolítica Anaeróbia


Com a continuidade do exercício, já que o fornecimento de energia derivado dos
fosfagênios são limitados, a atividade física é mantida pela energia vinda dos estoques de
glicogênio muscular e glicose, que são utilizados para fosforilação do ADP durante a
glicogenólise ou glicólise (degradação do glicogênio e glicose, respectivamente) anaeróbia,
o que resulta na formação de lactato. Sem o adequado suprimento ou utilização de oxigênio
todas as moléculas de hidrogênio serão transformadas de piruvato para lactato

Piruvato + 2H Lactato
A formação de lactato é de prima importância para o metabolismo anaeróbio pois, permite
uma contínua e rápida produção do ATP, através da via glicolítica anaeróbia.
A energia anaeróbia para ressíntese de ATP fornecida pela degradação da glicose e do
glicogênio muscular, através da via glicolítica, pode ser vista como uma "reserva de
combustível" que é ativada quando a razão oferta de oxigênio/utilização for igual a 1.0,
como ocorre, por exemplo, durante a última fase de uma corrida de 1,5km, onde o
indivíduo aumenta e acelera seus passos. A produção anaeróbia do ATP permanece crucial
durante, por exemplo, corridas de 400m ou 100m de natação, ou ainda, durante esportes
que incluem tiros curtos como futebol. Essas atividades requerem uma rápida transferência
de energia que excede o suprimento pelos estoques de fosfagênios. Se a intensidade
máxima do exercício diminuir, como ocorre com a aumento da duração da atividade física,
o acúmulo de lactato diminui correspondentemente.
Embora a produção de energia pela via glicolítica anaeróbia seja rápida, apenas uma
quantidade relativamente pequena de ATP é formado por essa via. Por outro lado, o
metabolismo aeróbio fornece uma contribuição maior na transferência de energia para
formação do ATP, particularmente quando a duração do exercício se estende por mais de 2 a
3 minutos.

Sistema Oxidativo ou Fosforilação Oxidativa


A medida que o exercício se prolonga a produção de energia derivada do metabolismo
anaeróbio vai gradativamente sendo menos importante, dando lugar aos processos
oxidativos. Além disso, com o aumento da duração do exercício ocorre um aumento da
demanda metabólica que deverá ser suprida pelos processos aeróbios de produção de
energia.
A mitocôndria é uma organela que está localizada dentro da célula muscular, e é o principal
sítio de produção de energia durante exercícios prolongados, aproximadamente acima de 2
a 3 minutos de atividade física.
A degradação de carboidratos e gorduras através dos processos oxidativos, dentro das
mitocôndrias, servem como importantes substratos para a ressíntese do ATP. Porém, existe
uma importância relativa na utilização de carboidratos ou gorduras, como fonte energética,
que irá depender da intensidade e duração do exercício.
Se o exercício físico for realizado por um tempo prolongado, mas executado numa
intensidade baixa (até aproximadamente 60% do consumo máximo de oxigênio), a
principal fonte de energia utilizada será os ácidos graxos livres (gorduras). A medida que a
intensidade do exercício aumenta (acima de 60% do VO2máx a contribuição da glicólise
aeróbia (oxidação da glicose através dos processos oxidativos, dependentes de O2) como
fonte energética também aumenta. Nessa situação, a demanda desse substrato de seus
estoques musculares e na corrente sanguínea se encontram, também, aumentadas. Dessa
forma, o conteúdo de glicogênio muscular e glicogênio hepático (que mantém a
concentração de glicose no sangue constante) se tornam um fator limitante para a
manutenção da intensidade do exercício, já que os seus estoques são limitados. A
importância da glicose sanguínea durante o exercício tem sido amplamente estudada, sendo
que o aparecimento da hipoglicemia pode limitar o exercício prolongado (endurance).
Se houver uma diminuição do glicogênio muscular, a concentração de ácidos graxos livres
no sangue aumenta 5 a 6 vezes os seus valores de repouso, e a musculatura passa a oxidar
maiores quantidade de gorduras como fonte de energia a fim de regenerar o ATP. É sabido
que a produção de ácido láctico pelas células musculares interfere com a mobilização de
ácidos graxos livres (AGL) dos seus estoques (tecido adiposo) durante o exercício.
Com o aumento da intensidade do exercício, onde ocorre um acúmulo de ácido láctico, a
utilização de AGL como fonte de energia parece ser inibida. Contudo, se o exercício se
prolongar, o ácido láctico irá ser utilizado como substrato energético pelos músculos e
outros tecidos e, toma lugar novamente a oxidação de gorduras como principal fonte
energética.
Após o treinamento é observado um concentração menor de lactato, a qual tem sido
atribuída a um menor déficit de oxigênio, assim como, a uma rápida metabolização do
lactato produzido. Contudo, valores elevados de lactato são freqüentemente observados
após corridas de longa distância. Isso demonstra a importante participação da via
glicolítica, em corredores de longa distância, para o sprint final característico desse tipo de
prova.
A quantidade relativa da utilização de carboidratos e gorduras utilizados durante
competições e treinamentos depende, em parte, do nível de treinamento dos atletas. É
sabido que a fadiga e a redução da capacidade de trabalho estão intimamente associados
com o esgotamento dos estoques de glicogênio hepático e muscular. Com o aumento da
capacidade de utilização de gorduras e a conseqüente diminuição da utilização de
glicogênio e glicose, como ocorre em atletas bem treinados e adaptados ao exercício de
endurance, ocorre o efeito chamado de glycogen-sparing, o qual poderia adiar a fadiga e
proporcionar uma tolerância maior ao exercício.
Fica evidente, até o momento, que durante os diferentes tipos de exercício, diferentes
sistemas energéticos estão atuando simultaneamente com a finalidade de regenerar o ATP
para a manutenção do fornecimento de energia para o trabalho muscular. No entanto,
dependendo da intensidade e duração do exercício, a contribuição relativa de cada um
desses sistemas pode ocorrer com uma contribuição maior de uma via, e menor de outra.
Dessa forma, fica fácil enxergar-mos de que maneira a creatina poderia contribuir como um
agente ergogênico para melhorar a performance. Assim, o efeito da suplementação de
creatina como agente ergogênico na performance física, e os riscos associados à
suplementação serão discutidos no próximo artigo (creatina parte-3).

Creatina - Parte 3

Após termos feito uma breve explanação sobre a creatina e os diferentes sistemas
energéticos que atuam durante o exercício físico; abordaremos, nessa 3º parte, alguns
aspectos como: Será que a creatina aumenta mesmo a performance durante o exercício
físico? Existem riscos à saúde associados à suplementação de creatina? Numa tentativa de
responder a essas questões faremos uma breve revisão da literatura.
Aproximadamente 70% dos estudos que investigam a capacidade ergogênica da creatina,
tanto durante curtos períodos de tempo (5 a 7 dias), quanto em períodos mais longos (7 a
140 dias) demonstram que a suplementação de creatina aumenta significantemente a
capacidade de força e potência, a capacidade de desenvolver velocidade, e/ou a capacidade
de executar exercícios de maneira repetitiva numa intensidade de contração muscular muito
alta. O aumento dessas capacidades tem sido atribuído ao aumento do conteúdo de creatina
total (CT) e de creatina fosfato (CP), particularmente na fibra muscular do tipo II; à ótima
ressíntese de CP; ao aumento da eficiência metabólica; e/ou ao aumento da qualidade de
treinamento promovendo uma ótima adaptação ao mesmo.
Para os fisiculturista e levantadores de pesos, o ganho de força e potência são
freqüentemente acompanhados por uma hipertrofia muscular. Consequentemente, parece
ser benéfico ingerir suplementos nutricionais que poderiam promover ganho de força
durante o treinamento. Alguns estudos indicam que a suplementação de creatina durante o
treinamento pode aumentar o ganho de força ou potência em uma repetição máxima (1RM).
Num estudo realizado por Ernest e col. (1995), foi verificado que indivíduos suplementados
com creatina por 28 dias, 20g/dia, durante o treinamento com sobrecarga, apresentaram um
aumento de 8,2 kg a mais na realização do supino, quando comparados aos indivíduos que
não receberam a suplementação.
Outro estudo realizado por Vandenberghe e col. (1997), descreve que a suplementação com
creatina (20g/dia por 4 dias, seguido por 5g/dia por 66 dias) promoveu um grande aumento
(20 a 25%) em 1RM em mulheres engajadas em um programa de treinamento com
sobrecarga após 70 dias, quando comparadas com aquelas que não foram suplementadas.
Outros estudos também indicam que a suplementação de creatina por períodos curtos de
tempo pode aumentar o pico de potência. Um estudo feito por Dawson e col. (1995),
relatou que a suplementação de creatina (20g/dia por 5 dias) aumenta significantemente o
pico de potência durante a primeira série de 6 x 6 segundos de tiros de velocidade.
Similarmente, num outro estudo realizado por Birch e col (1994), foi demonstrado que a
suplementação de creatina aumentou o pico de potência durante 3 séries de 30 repetições de
esforço em velocidade máxima na bicicleta. Também, tem sido demonstrado que a
suplementação de creatina por períodos curtos de tempo aumenta o pico de potência
concêntrica e excêntrica, bem como o desempenho do pulo vertical.
É interessante ressaltar que o pico de potência gerado durante o exercício explosivo (1RM)
não é inteiramente dependente da quantidade de ATP e CP muscular e sim, também da
hipertrofia muscular, e da adaptação neural devido ao treinamento. Consequentemente,
desde que a disponibilidade de ATP e CP não seja fator limitante de 1RM explosiva,
ninguém iria esperar que a suplementação de creatina por um período curto de tempo
aumentasse o pico de potência.
É importante relatar que nem todos os estudos estão de acordo com os efeitos ergogênicos
atribuídos à creatina. Segundo Vandenberghe e col. (1999), durante a fase de loading, a
ressíntese de CP, em exercícios intermitentes e isométricos, não é afetada. Segundo Snow e
col.(1998), durante um estudo feito com oito indivíduos, não treinados, utilizando um
protocolo de 20 segundos de sprint em bicicleta cicloergométrica, houve um aumento total
no conteúdo de CP muscular, porém, esse aumento não foi capaz de induzir a melhora da
performance ou alterações no metabolismo anaeróbico muscular.
A maior parte dos estudos sobre os efeitos ergogênicos em conseqüência da suplementação
de creatina foram realizados em ambiente laboratorial a fim de imitar as condições de
campo, assim como, esses tiveram como foco principal a melhoria do desempenho em
exercícios de alta intensidade e curta duração devido a evidente relação entre esse tipo de
suplemento e o sistema ATP-CP (sistema anaeróbio). Até o momento, existem poucos
dados dando suporte ao referido efeito ergogênico em condições de campo. O conflito
gerado em função dos resultados obtidos nos diferentes estudos é, em parte, fruto da
aplicação de diferentes protocolos em tipos diferentes de esporte ou exercícios físicos,
assim como, das diferentes concentrações iniciais de creatina em cada estudo, e a falta de
controle adequado da dieta dos indivíduos analisados. Entretanto, vale a pena ressaltar que
evidências sugerem a existência de um aumento de força, potência, e torque com a
suplementação de creatina.
A suplementação com creatina parece também favorecer o aumento do desempenho em
tarefas de alta intensidade mais prolongadas, com duração maior do que 30 segundos, e
menor ou igual a 150 segundos, como no caso de tarefas de corridas ou em cicloergômetro,
observados em condições laboratoriais. Sabidamente as referidas atividades dependem
essencialmente da produção de energia (ATP) via glicólise anaeróbia.
Com relação ao exercício com característica aeróbia, parece que existe um efeito
ergogênico sobre o desempenho de atletas engajados em exercícios físicos intervalados,
dependentes primariamente do metabolismo aeróbio para a produção de energia. Segundo
Stroud e col. (1994), a suplementação com creatina pode modificar a utilização de
substratos, e conseqüentemente melhorar o desempenho durante o exercício prolongado
submáximo, e em exercícios com múltiplos sprints periódicos, como ocorre durante o
ciclismo de uma competição de triathlon de curta e média distância.
É sabido que, apesar de alguns relatos indicarem que atletas de elite têm utilizado a
suplementação com creatina desde os anos 60, seu uso disseminado só ocorreu a partir dos
anos 90. Em estudos com pacientes em estados pré e pós-operatório, com indivíduos
destreinados, e atletas de elite, os quais ingeriram quantidades entre 1,5 a 25 gramas/dia por
um período de até 1 ano, o único efeito colateral encontrado foi o ganho de peso corporal.
De fato, a suplementação com creatina pode promover um aumento do peso corporal
através da retenção hídrica no organismo, entretanto, existe uma teoria que postula haver
um aumento do peso corporal através, também, do aumento do volume muscular devido ao
estimulo da síntese protéica. No entanto, os mecanismos metabólicos e fisiológicos que
estão por trás do aumento do peso corporal em conseqüência do aumento da massa magra
não estão, até o momento, claramente elucidados. Também, têm sido relatados outros
efeitos colaterais atribuídos a suplementação dessa substância, porém, esses são
mencionados em publicações não especializadas.
Devido a suplementação de creatina ser utilizada em larga escala à apenas 12 anos, poucos
estudos existem a respeito dos seus efeitos colaterais, principalmente em longo prazo.
Entretanto, relatos de atletas e treinadores têm sugerido haver efeitos como câimbras ou
estiramento muscular, desidratação, diarréia, tonturas e vertigens. É sabido que a creatina é
osmoticamente ativa, e que sua alta concentração dentro da célula pode redirecionar a água
dos espaços extracelulares e/ou da circulação geral, para dentro da célula muscular
causando um desequilíbrio iônico. No entanto, a suplementação com creatina parece ser
bem tolerada.
Teoricamente, o ganho de força e massa corporal pode adicionalmente estressar os ossos,
juntas e ligamentos. Porém, nenhum estudo tem documentado um aumento de injúrias
seguido da suplementação de creatina, mesmo avaliando atletas de elite durante períodos de
treinamento intenso. Alguns autores relatam uma significante redução na produção de urina
durante os estágios iniciais da suplementação, além de um aumento no volume da
musculatura esquelética, água corporal total, e do volume dos fluidos intracelulares. Vale a
pena destacar que o ganho excessivo de peso devido à retenção hídrica pode ser prejudicial
para atletas engajados em atividades de endurance.
A suplementação com creatina tem se mostrado capaz de aumentar a concentração de
creatina sérica significantemente, no entanto, a concentração sérica desse elemento
permanece entre 1 e 1,5 mg/dl, considerada normal para um indivíduo engajado em
treinamento físico intenso. Dessa forma, dados na literatura sugerem que indivíduos
saudáveis com suas funções renais consideradas normais e preservadas, apresentam
capacidade de eliminar o aumento da carga de creatina resultado da suplementação.
Entretanto, alguns experts no assunto alertam para o seu uso crônico, sugerindo que nem
todos os pacientes são capazes de processar o excesso de creatina da maneira adequada.
Os efeitos colaterais encontrados em alguns estudos de casos, referentes a problemas renais,
reportam-se ao uso abusivo de creatina com doses quase que dez vezes maiores que o
recomendado, e em indivíduos com pré-disposição à doenças renais. Além disso, é
importante ressaltar que a creatina extraída de forma inadequada, devido à falta de um
controle de padrões higiênicos sanitários adequados, pode gerar produtos contaminados por
substâncias tóxicas, as quais poderiam estar relacionadas com alguns efeitos colaterais
atribuídos ao suplemento, inclusive os renais.
Assim sendo, podemos concluir que a utilização da creatina como um suplemento
ergogênico é valida apenas para atividades físicas que são dependentes exclusivamente do
sistema ATP-CP como fonte de energia, ou ainda, dentro de atividades intermitentes onde o
período de recuperação necessite desse tipo de metabolismo para a manutenção adequada
de uma próxima repetição explosiva. Aparentemente não existem efeitos colaterais
atribuídos à suplementação, exceto o aumento do peso corporal. No entanto, deve-se adotar
sua utilização de forma criteriosa, levando-se em consideração o tipo de atividade ou
exercício envolvido, assim como, o estado de saúde geral do indivíduo em questão.

Fonte: http://www.treinohardcore.com

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