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Leitura e Escrita

na Era Digital
Cleide J. M. Pareja

2ª Edição

Curitiba
2018
Ficha Catalográfica elaborada pela Fael. Bibliotecária – Cassiana Souza CRB9/1501

P227l Pareja, Cleide J. M.


Leitura e escrita na era digital / Cleide J. M. Pareja. – 2. ed. –
Curitiba: Fael, 2018.
139 p.: il.
ISBN 978-85-5337-009-2

Nota: conforme Novo Acordo Ortográfico da Língua


Portuguesa.
1. Leitura e escrita. 2. Produção textual. 3. Tecnologia da
informação e comunicação. I. Título.
CDD 302.2

Direitos desta edição reservados à Fael.


É proibida a reprodução total ou parcial desta obra sem autorização expressa da Fael.

FAEL
Direção Acadêmica Francisco Carlos Sardo
Coordenação Editorial Raquel Andrade Lorenz
Revisão Fernanda Calvetti Corrêa
Projeto Gráfico Sandro Niemicz
Capa Quieliton Camargo Batista
Shutterstock.com/Suat Gursozlu/Toria/Yura-
Imagens da Capa
laits Albert
Arte-Final Evelyn Caroline dos Santos Betim
Apresentação

Atualmente, sabe-se que o estudo da língua portuguesa


na Era Digital mostra-se absolutamente necessário, posto que o
domínio da palavra escrita e falada não mais representa um talento
particular, mas um atributo essencial do profissional competente,
atualizado, moderno e eficaz.
No entanto, pergunta-se: quem nunca teve dúvidas
sobre a língua portuguesa na hora de falar ou de escrever? Muitas
pessoas, apesar de lerem e de escreverem diariamente, apresen-
tam dificuldades.
A proposta da autora Cleide J. M. Pareja é de facilitar a
comunicação, assim como de mostrar, de forma simplificada, como
os atos de escrever e de falar bem não são tão difíceis, como muitos
Leitura e Escrita na Era Digital

imaginam. Também deixa claro que, em um mundo no qual a comunicação


é o elemento propulsor do desenvolvimento, profissionais, dos mais variados
ramos de atividade, precisam expressar-se corretamente, com clareza e obje-
tividade, mostrando-se capazes e produtivos.
A autora também objetiva expor um trabalho prático e incessante a fim
de que os indivíduos desenvolvam a habilidade de realizar a comunicação de
forma coerente, tanto na modalidade escrita quanto na oral. Ou seja, ela pro-
cura trabalhar o domínio da linguagem a partir de uma perspectiva da diver-
sidade linguística, sobretudo em relação à oposição entre a fala e a escrita,
às diferentes formas como a linguagem é apresentada e à maneira como os
falantes de uma língua fazem uso dela.
Na obra, aborda, ainda, em cada capítulo, noções teóricas e exemplos de
situações práticas de comunicação e de linguagem que auxiliarão o leitor no
desenvolvimento da língua falada e escrita, promovendo, dessa forma, uma
produção textual bem redigida.
Assim, apoiada em referenciais teóricos que envolvem a conceituação
e o estudo da linguagem, bem como o estudo de gêneros virtuais e tex­tuais,
a autora está, também, atenta à aplicação prática do assunto, ou seja, empe-
nha-se em destacar a contribuição da leitura para o desenvolvimento do
potencial criativo da experiência existencial do indivíduo.
As reflexões aqui veiculadas abrem um leque de possibilidades de uso da
língua que, se colocadas em prática, certamente contribuirão para transfor-
mar o estudo na Leitura e Escrita na Era Digital na competência de ouvir, ver
e praticar a linguagem de forma a ampliar o conhecimento já interiorizado
pelo usuário da língua e aumentar sua capacidade de expressar-se e interagir
nos mais diferentes contextos e circunstâncias que a vida moderna exige.

Veridiana Almeida*

* Doutora em Literatura e Mestre em Literatura Brasileira pela Universidade Federal de


Santa Catarina. É autora das obras Fundamentos e Metodologia do Ensino de Língua Portuguesa
(2010), Alfabetização, Fundamentos e Métodos (2010) e Literatura Infantojuvenil (2011). Atu-
almente, é professora titular da Fael, nas modalidades presencial e a distância, nos níveis de
graduação e de pós-graduação.

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Sumário

Prefácio | 7

1. Homem e linguagem  |  9

2. Leitura e escrita  |  31

3. Construção do texto  |  51

4. Tecendo os parágrafos  |  67

5. Gêneros textuais e tipos de textos  |  83

6. Tecnologias da Informação e da Comunicação  |  113

Referências | 129
Prefácio

O espaço universitário caracteriza-se como um espaço


letrado que exige pessoas proficientes na leitura e na produção tex-
tual, portanto, é necessário ofertar, no primeiro ano, um ensino de
leitura e escrita que atenda à demanda exigida pelo próprio meio.
No entanto, a maioria dos currículos do ensino superior não
assumem para si a responsabilidade do desenvolvimento dessas com-
petências nos alunos, o que acabará interferindo na aprendizagem
dos conteúdos ensinados nas diversas disciplinas do curso escolhido
Neste livro, os conceitos básicos para o ensino das compe-
tências indispensáveis de leitura e escrita situam-se na visão socio-
interacionista do letramento acadêmico, ao se concentrarem em seu
desenvolvimento para interagir com o mundo na posição de escritor
e leitor de textos, em especial de textos acadêmicos. A linguagem é
então vista como um conjunto de atividades e uma forma de ação.
Leitura e Escrita na Era Digital

O objetivo desta obra é possibilitar aos alunos o domínio das habilida-


des de leitura e produção de textos acadêmicos para facilitar a entrada em
todas as áreas do conhecimento.
A forma como a obra foi estruturada é fruto de anos de experiência com
alunos ingressantes na graduação e em diferentes cursos. É possível perceber
que, seguindo este caminho, ao final do semestre os acadêmicos conseguem
ler, escrever e entender melhor os textos com os quais têm contato. Desven-
da-se o mistério da leitura e da escrita.
São seis capítulos: o primeiro discorre sobre a importância da linguagem
para o homem, as variedades linguísticas e as funções da linguagem, apre-
sentando conceitos fundamentais sobre linguagem, língua e fala; o segundo,
sobre leitura e escrita, apresenta os procedimentos de leitura e sua estreita
relação com a produção do resumo; o terceiro foca sua atenção no estudo
do parágrafo, sua estrutura e tipos de desenvolvimento; o quarto incide sobre
a forma e recursos para manter a coesão e a coerência no texto; o quinto
apresenta os diversos gêneros e tipologias textuais e no sexto capítulo são
apresentados os gêneros textuais virtuais, a leitura e a escrita na Era Digital.
Com a clareza dos conceitos trabalhados e um exercício contínuo de
produção e revisão dos textos escritos, certamente os professores que intera-
gem com os alunos conscientizam a todos de que a língua deve ser aprendida
como um instrumento social, interativo e dinâmico.
A autora.*

* Cleide J. M. Pareja é doutoranda em educação pela Universidade Católica de Santa Fé,


Mestre em Letras pela Universidade Federal de Santa Catarina e Especialista em Letras pela
Universidade Federal do Paraná. Graduada em Letras pela Universidade do Contestado, é
professora de graduação e pós-graduação da Universidade do Vale do Itajaí. Pesquisadora
do Grupo Cultura, Escola e Educação, criadora do mestrado e doutorado em educação da
Univali. Autora de vários livros didáticos para o curso de letras EaD da Univali. Bolsista
da CAPES como coordenadora de área no programa institucional de bolsas de incentivo à
­docência (PIBID/LETRAS) da Univali.

–  8  –
1

Homem e linguagem

Neste capítulo, realizaremos uma reflexão sobre


os conceitos linguísticos fundamentais para a aprendizagem e o
ensino da língua portuguesa.
Serão abordados os conceitos de linguagem, língua e fala,
as diferentes formas como a linguagem é apresentada e a maneira
como os falantes de uma língua fazem uso dela. Serão apresentadas
ainda as funções da linguagem e suas variações.
Leitura e Escrita na Era Digital

Ao final do capítulo, será possível identificar os elementos da comuni-


cação, além de distinguir as funções da linguagem em relação aos elementos
do processo comunicativo. Também será possível diferenciar os conceitos de
linguagem, língua e fala e reconhecer a variação linguística como uma mani-
festação decorrente das influências recebidas no contato com as diversas cul-
turas existentes em nosso país.
A língua é, sem dúvida, um dos mais importantes produtos da cultura,
porque é o código utilizado em grande parte dos nossos atos de comunicação.

1.1 Linguagem, língua e fala


No dia a dia, costuma-se afirmar – o que cientificamente comprova-se –
que a linguagem diferencia o homem dos demais animais. Dessa forma, no
Dicionário de comunicação (RABAÇA, 1987, p. 367), encontramos a seguinte
definição: “a linguagem é um fato exclusivamente humano, um método de
comunicação racional de ideias, emoções e desejos por meio de símbolos
produzidos de maneira deliberada”. Isso porque a linguagem humana pode
ser articulada por seu usuário, pode envolver o pensamento e o simbólico,
a representação da sua realidade e suas relações nos atos comunicativos.
Assim, a linguagem, a língua possibilita ao homem criar e agir sobre a rea-
lidade. Segundo Vygotsky, “o momento de maior significado no curso do
desenvolvimento intelectual, que dá origem às formas puramente humanas
de inteligência prática e abstrata, acontece quando a fala e a atividade prá-
tica, então duas linhas completamente independentes de desenvolvimento,
convergem” (VYGOTSKY, 2010, p. 12).
No texto a seguir, o filósofo Louis Hjelmslev (1975, p. 15) apresenta,
de modo filosófico e literário, a indiscutível importância da linguagem para
o homem:
A linguagem, a fala humana é uma inesgotável riqueza de
múltiplos valores. A linguagem é inseparável do homem e
segue-o em todos os seus atos. A linguagem é o instrumento
graças ao qual o homem modela seu pensamento, seus senti-
mentos, suas emoções, seus esforços, sua vontade e seus atos,
o instrumento graças ao qual ele influencia e é influenciado,
a base última e mais profunda da sociedade humana. Mas é
também o recurso último e indispensável do homem, seu refú-
gio nas horas solitárias em que o espírito luta com a existên-
cia, e quando o conflito se resolve no monólogo do poeta e na

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Homem e linguagem

meditação do pensador. Antes mesmo do primeiro despertar


de nossa consciência, as palavras já ressoavam à nossa volta,
prontas para envolver os primeiros germes frágeis de nosso
pensamento e a nos acompanhar inseparavelmente através
da vida, desde as mais humildes ocupações da vida quotidiana
aos momentos mais sublimes e mais íntimos dos quais a vida
de todos os dias retira, graças às lembranças encarnadas pela
linguagem, força e calor A linguagem não é um simples acom-
panhante, mas sim um fio profundamente tecido na trama do
pensamento; para o indivíduo, ela é o tesouro da memória e a
consciência vigilante transmitida de pais para filhos. Para seu
bem e para o mal, a fala é a marca da personalidade, da terra
natal e da nação, o título de nobreza da humanidade.

Para dominar a linguagem como língua, é preciso que a pessoa desen-


volva várias habilidades necessárias ao processo de comunicação. Ouvir,
falar, ler e escrever são as ações que, gradualmente, vão propiciar o desenvol-
vimento desse domínio.
A partir do nascimento (alguns estudiosos afirmam que até antes),
começa-se a ouvir todos que estão próximos; pelo processo de imitação,
associado com o desenvolvimento físico, inicia-se a repetição do que se ouve.
Nasce a fala, no início restrita, com pouquíssimas palavras que, em geral,
servem para várias situações e objetos, tais como: “mamá” (comida), “mãma”
(mãe); “papá” (comida), “pápa” (pai), e assim por diante. Por volta dos sete
anos, chegamos a 1 mil ou 1,2 mil palavras e, por volta dos 14 anos, a 15 ou 20
mil, dependendo do contexto e das situações relacionadas com a linguagem.
Na sequência, a oralidade irá se transformar em linguagem simbólica,
a partir do momento em que as habilidades de leitura e escrita passam a ser
dominadas. Essas duas habilidades necessitam de aprendizagens diferencia-
das, pois “para escrever é preciso ter um acervo de recursos e ter o que dizer
sobre o assunto. Para ler, é preciso ter um acervo de recursos que permita
compreender o texto” (LIMA, 2002, p. 15). Se, por um lado, é ruim apren-
der as duas habilidades separadamente e não como um conhecimento auto-
mático, por outro, é salutar, porque, em caso de qualquer problema físico,
pode-se ficar com uma ou com outra (se tiver sorte).
Após o processo de domínio das quatro habilidades, adquire-se uma com-
petência muito mais importante do que simplesmente o domínio de uma ­língua,

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é a competência de pensar, que torna o homem, segundo a tradição, efetivamente


humano. Ou seja, se há linguagem, há pensamento ou, como diz o filósofo Des-
cartes: “Cogito, ergo sum” (“Penso, logo existo”). Vygotsky pondera que
a relação entre o pensamento e a palavra não é uma coisa
mas um processo, um movimento contínuo de vaivém entre
a palavra e o pensamento: nesse processo a relação entre o
pensamento e a palavra sofre alterações que, também elas,
podem ser consideradas como um desenvolvimento no sen-
tido funcional. As palavras não se limitam a exprimir o pen-
samento: é por elas que este acede à existência [...]. O pensa-
mento e a palavra não são talhados no mesmo modelo: em
certo sentido há mais diferenças do que semelhanças entre
eles. A estrutura da linguagem não se limita a refletir como
num espelho a estrutura do pensamento; é por isso que não
se pode vestir o pensamento com palavras, como se de um
ornamento se tratasse. O pensamento sofre muitas altera-
ções ao transformar-se em fala. Não se limita a encontrar
expressão na fala; encontra nela a sua realidade e a sua forma
(VYGOTSKY apud IANNI, 1999, p. 40).

No entanto, linguagem e língua aproximam-se e diferem de que modo?


Muitas palavras, utilizadas para explicar o processo de comunicação, pare-
cem sinônimas, mas apresentam conceitos diferentes cuja compreensão é
importante, tanto para o ensino, quanto para a aprendizagem de uma língua,
são elas: linguagem, língua, fala, discurso, sistema, norma, palavra, vocábulo
e léxico. Portanto, o conhecimento da importância da palavra para todo o
processo de interação por meio da linguagem é fundamental. Isso porque
cada palavra tem seu sentido reconhecido plenamente desde que se conheça
o contexto no qual ela está inserida. O contexto é que definirá o real sentido
de cada palavra. A compreensão do sentido da palavra, num determinado
texto e contexto, é que possibilitará, também, a compreensão da mensagem.

Contexto

Texto

Palavra

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Homem e linguagem

Tal concepção fica evidente na música Palavras, do grupo Titãs, pois,


a partir dela, é possível inferir que é o falante que dá vida às palavras, pelo
contexto e pela compreensão de mundo do usuário. Vamos observar o trecho
a seguir:

Palavras
Palavras são iguais
Sendo diferentes
Palavras não são frias
Palavras não são boas
Os números pra os dias
E os nomes pra as pessoas
[...]
Palavras. Marcelo Fromer e Sérgio Britto, Titãs,
1989 © Warner Chappel Music.

A linguagem é uma característica humana universal, visto que utiliza


todos os códigos, signos, sinais para que sejam expressados pensamentos, per-
cepções e sentimentos e para que a comunicação seja efetivada. Pode-se dizer
que a linguagem vai se desenvolvendo por meio de um sistema de signos (algo
que está no lugar de um objeto ou fenômeno, sob algum aspecto).
Os signos estabelecem relações de sentido com o objeto que represen-
tam, das mais simples às mais complexas. É necessário passar por essas rela-
ções para se chegar ao domínio da linguagem. São elas:
2 r elação de semelhança – o signo é o objeto apresentado; ícone:
exemplo – as imagens em geral;
2 relação de causa e efeito – afeta a existência do objeto ou por ele
é afetado; índice: exemplo – pegadas na lama – alguém passou
por aqui;
2 relação arbitrária – regida por convenção; símbolo: exemplo – as
representações, continuamente usadas na linguagem e no entendi-
mento pessoal, tornam-se convenções, símbolos.

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Leitura e Escrita na Era Digital

Já a língua é uma linguagem de caráter regional, é um sistema organi-


zado de sons e sinais que a caracterizarão como o código de signos linguísticos
de um determinado povo. Desse modo, todas as línguas (para a comunidade
lusófona, a língua portuguesa) têm uma estrutura própria para combinar os
signos linguísticos.
Sendo assim, a língua constitui-se por: um repertório/conjunto de sig-
nos que vão compô-la; as regras de combinação que incluem as de organiza-
ção dos sons e suas combinações; as regras que determinam a organização
interna das palavras e as que especificam a forma como serão ordenadas as
palavras e a diversidade de tipos de frase. Estamos nos referindo à fonologia,
à morfologia, à sintaxe da língua e às regras de uso, as quais englobam as
regras reguladoras do uso da linguagem em contextos sociais – no que diz
respeito às funções e intenções comunicativas e à escolha de códigos a uti-
lizar – e que devem ser aceitas pela sociedade para que haja inteligibilidade
entre os atos de comunicação.
O terceiro conceito a ser compreendido no processo de comunicação é a
fala, o uso individual da língua, o discurso que se realiza a partir da compre-
ensão da língua e do conhecimento de mundo de cada um. Por esses motivos,
falantes de uma mesma língua, de uma mesma região e de uma mesma for-
mação terão falas, discursos diferentes. Por se tratar de oralidade, o falante
pode desrespeitar as regras de combinação; se este desrespeito tornar-se
padrão, poderá alterar e criar uma nova regra, promovida pelo uso.
Podemos afirmar que dominamos uma língua quando conhecemos seu
repertório de signos, as regras de combinação e as regras de uso desses signos.
Segundo Saussure (1977, p. 196), “nada entra na língua sem ter sido expe-
rimentado na fala, e todos os fenômenos evolutivos têm sua raiz na esfera
do indivíduo”. De acordo com o linguista, o que diferencia a língua da fala é
que a primeira é sistemática, tem certa regularidade, é potencial, coletiva; a
segunda é assistemática, possui certa variedade, é concreta, real, individual.
A língua, então, pode ser escrita e falada. São duas formas de uso que
acabam tendo regras diferenciadas, uma vez que, ao falar, temos maior liber-
dade e despreocupação com a obediência às normas impostas pelo sistema
linguístico. Porém, a escrita deve atender às normas, motivo pelo qual é con-
siderada pelos usuários uma modalidade mais difícil.

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Homem e linguagem

As diferenças entre a língua falada e a língua escrita são muitas,


como podemos observar no quadro a seguir, adaptado de Mesquita
(1995, p. 25).

Língua falada Língua escrita


2 Palavra sonora. 2 Palavra gráfica.
2 A mensagem é transmitida de 2 A mensagem é transmitida de forma não
forma imediata. imediata.
2 O emissor e o receptor conhecem
2 O receptor não conhece de forma direta a situa­
bem a situação e as circunstâncias
ção do emissor e o contexto da mensagem.
que os rodeiam.
2 A mensagem é mais longa do que na língua
2 A mensagem é breve.
falada.
2 São permitidos os elementos pro­ 2 Não é possível a utilização de elementos
sódicos, como entonação, pausa, prosódicos. O emprego dos sinais de pon­
ritmo e gestos, que enfatizam o tuação tenta reconstruir alguns desses ele­
significado. mentos.
2 É admitido o emprego de cons­ 2 Exigem-se construções mais complexas,
truções simples, com ênfase para mais elaboradas, com ênfase para orações
orações coordenadas e presença de subordinadas, e a ordenação da mensagem
frases incompletas. melhor planejada.
2 É mais subjetiva e pode ser repro­ 2 É mais objetiva. É possível esquecer o inter­
cessada a cada momento a partir locutor. O escritor pode processar o texto a
das reações do interlocutor. partir das possíveis reações do leitor.
2 O contexto extralinguístico tem 2 O contexto extralinguístico tem menos
grande influência. Criação coletiva. influência. Criação individual.
Estas são algumas características que diferenciam a possibilidade de uso
da língua. Saber transitar pelas duas modalidades e ter controle de suas varie-
dades, usando-as no lugar e no momento certo, é fator decisivo na comuni-
cação interpessoal.
A respeito da importância do domínio da variedade oral da língua, em
situação formal, recomendamos o filme O discurso do Rei, que tem esta ques-
tão como tema principal.

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Leitura e Escrita na Era Digital

Dica de filme

O filme O discurso do Rei apresenta, de forma envol-


vente e com grandes detalhes, o trabalho realizado por
um profissional que tem um método um tanto radical
para os padrões da época, para liberar a fala do Rei
George. O jovem herdeiro da coroa britânica sofria de
gagueira e tinha pânico de falar em público. Para supe-
rar suas dificuldades, contará com o empenho de sua
esposa e do professor nada convencional de oratória.
O tema é atual, uma vez que a maioria dos profissionais
precisa ter o domínio da fala com propriedade para
desempenhar bem suas funções.

O DISCURSO do Rei. Direção de Tom Hooper. Ingla-


terra: Paris Filmes, 2010. 1 filme (118 min), sonoro, legenda,
color., 35 mm.

A língua, além de oral e escrita, pode ser, pelo uso, classificada de dois
modos: a modalidade culta ou língua-padrão e a modalidade popular, ou lín-
gua cotidiana.
A modalidade culta é aquela associada à escrita, à tradição gramatical,
é a registrada nos dicionários e, portanto, é a que traduz a tradição cultural e
a identidade de uma nação.
A modalidade popular é uma variante informal, considerada de pouco
prestígio quando comparada à linguagem padrão. Sua característica é afas-
tar-se da norma na construção sintática, usar um vocabulário comum, repe-
tições constantes, gírias.
Segundo Mattoso Câmara Jr. (1978, p. 177), “norma é um conjunto
de hábitos linguísticos vigentes no lugar ou na classe social mais pres-
tigiosa no país”. Logo, com essa classificação, podemos entender que há
várias classes que não adotam a norma e, portanto, há outras modalida-
des em uso.

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Homem e linguagem

1.1.1 Variedades linguísticas


As variedades linguísticas são determinadas por vários fatores, entre os
quais se destacam os geográficos, históricos, sociais e estilísticos.
A variação geográfica está relacionada com as diferenças de pronún-
cia, de vocabulário e de sintaxe, que ocorrem de região para região do Brasil.
O texto a seguir ilustra bem esta variedade com ênfase na pronúncia.

Receita cazêra minêra de môi de repôi nu ái i ói

Ingredientes
2 5 denti di ái
2 3 cuié de ói
2 1 cabessa de repôi
2 1 cuié di mastomati
2 Sár agosto

Modi fazê
2 Casca o ái, pica o ái i soca o ái cum sá;
2 Quenta o ói na cassarola;
2 Foga o ái socado no ói quenti;
2 Pica o repôi beeemmm finimm...
2 Foga o repôi no ói quenti junto cum ái fogado;
2 Põi a mastomati i mexi cum a cuié prá fazê o môi;
2 Sirva cum rôis e melete...
Pção: cumpanha filezim de pescadim beemmm fritim.
RECEITA cazêra minera de môi de repôi nu ái i ói. Disponível em:
<http://www.alapinha.com.br/Cardapio%20introducao.htm>.
Acesso em: 22 out. 2012.

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Leitura e Escrita na Era Digital

A música Cuitelinho, do folclore nacional, apresenta a questão do uso


dos plurais, tão comum em certas regiões brasileiras.

Cuitelinho
Cheguei na beira do porto
Onde as onda se espaia
As garça dá meia volta
E senta na beira da praia
E o cuitelinho não gosta
Que o botão de rosa caia, ai, ai
Ai quando eu vim
da minha terra
Despedi da parentália
Eu entrei no Mato Grosso
Dei em terras paraguaia
Lá tinha revolução
Enfrentei fortes batáia, ai, ai
A tua saudade corta
Como aço de naváia
O coração fica aflito
Bate uma, a outra faia
E os óio se enche d´água
Que até a vista se atrapáia, ai...
Autoria desconhecida.

A variação histórica ocorre pelo processo de evolução do homem que,


com suas novas invenções, ou com o abandono de objetos, hábitos e costu-
mes, acaba interferindo na língua, que também é viva. O léxico que cai em
desuso chama-se arcaísmo e as palavras novas que surgem são classificadas
como neologismos. A seguir, citamos um exemplo de arcaísmo, o trecho
está com a escrita da língua portuguesa do passado, do século XVIII, a qual
transformou-se a ponto de pessoas não identificarem o sentido de algumas
palavras pelas diferenças ortográficas. Leia as duas versões e compare-as.

–  18  –
Homem e linguagem

“Este rrey Leyr nom ouue filho, mas ouue tres filhas muy fermosas
e amauaa-as muito. E huum dia sas rrazõoess com ellas e disse-lhess que
lhe dissessem verdade, qual d’ellas o amaua mais. Disse a mayor que nom
auia cousa no mundo que tanto amasse como elle; e disse a outra que o
amaua tanto com a ssy mesma; e disse a terçeira, que era a meor, que o
amaua tanto como deue dámar filha a padre.” (VASCONCELOS apud
FARACO, 1991, p. 11).
“Este Rei Lear não teve filhos, mas teve três filhas muito for-
mosas e amava-as muito. E um dia teve com elas uma discussão e
­disse-lhes que lhe dissessem a verdade, qual delas o amava mais. Disse
a maior que não havia coisa no mundo que amasse tanto como a ele;
e disse a outra que o amava tanto como a si mesma; e disse a terceira
que o amava tanto como deve uma filha amar um pai.”
FARACO, C. A. Linguística histórica. São Paulo: Ática, 1991.

A variação social, como afirma Mattoso Câmara (1978), decorre não


somente do poder aquisitivo, mas também do grau de educação, da idade
e do sexo dos usuários da língua. Vejamos os usos diversos da conjugação
verbal: nós vamos/nóis vai/nóis imo/nós vamo. A música Chopis centis, do
grupo musical Mamonas Assassinas, brinca com a questão das variedades
linguísticas, colocando o falar popular na linguagem escrita.

Chopis centis
Eu “di”um beijo nela
E chamei pra passear.
A gente fomos no shopping,
Prá “mode” a gente lanchar.
Comi uns bicho estranho, com um tal de gergelim
Até que tava gostoso, mas eu prefiro aipim. [...]
Chopis Centis. Dinho e Julio Rasec, Mamonas Assassinas,
1995 © Edições Musicais Tapajós Ltda.

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Leitura e Escrita na Era Digital

A variação estilística é provocada pelo ato da fala e pela escrita.


Dependendo da situação comunicativa, a pessoa pode usar uma modalidade
ou outra. De acordo com os ouvintes, o falante definirá qual o vocabulário a
ser utilizado, o grau de formalidade ou informalidade. Na escrita, o usuário
poderá, pelo seu estilo, tornar-se um modelo ou um padrão.
O potencial estilístico de José Paulo Paes, por exemplo, é evidenciado
no poema a seguir, quando o autor brinca com a possibilidade de trocar
algumas letras, ou a escrita das palavras, e interferir no significado. Além
disso, com um poema curtíssimo, consegue passar uma grande mensa-
gem. Vejamos:

Prolixo?
Pro lixo.
Conciso?
Com siso.
PAES, J. P. Poesia completa. Sao Paulo:
Companhia das Letras, 2008. p. 27.

Todas estas classificações acabaram por criar alguns preconceitos


linguísticos com relação às variedades prestigiadas e às estigmatizadas.
Quanto mais próxima está a variedade utilizada do que se denomina lín-
gua padrão, mais prestígio social o falante terá, quanto mais distante, mais
estigmatizado será. Ao relacionar língua padrão com gramática, estabele-
ceu-se a noção de que, se a regra não for cumprida, ocorre um “erro”, o que
torna o falante um sujeito desprestigiado socialmente. ­Marcos Bagno, em
sua “novela” sociolinguística intitulada A língua de Eulália (1999), apre-
senta, de forma clara, envolvente e literária, o argumento de que falar
diferente não é falar errado e justifica linguística, histórica, socioló-
gica e psicologicamente o uso das variedades linguísticas. É de sua obra
­Preconceito linguístico – o que é, como se faz (BAGNO, 2006, ­p.­142-145)
o texto a seguir, que apresenta uma síntese sobre como ensinar a língua
sem criar tanto preconceito.

–  20  –
Homem e linguagem

Dez cisões
Para um ensino de língua não (ou menos) preconceituoso
1. Conscientizar-se de que todo falante nativo de uma língua é um
usuário competente dessa língua, por isso ele sabe essa língua.
Entre os 3 e 4 anos de idade, uma criança já domina integralmente
a gramática de sua língua.
2. Aceitar a ideia de que não existe erro de português. Existem dife-
renças de uso ou alternativa de uso em relação à regra única pro-
posta pela gramática normativa.
3. Não confundir erro de português (que, afinal, não existe) com sim-
ples erro de ortografia. A ortografia é artificial, ao contrário da lín-
gua, que é natural. A ortografia é uma decisão política, é imposta por
decreto, por isso ela pode mudar, e muda de uma época para outra.
Em 1899 as pessoas estudavam psychologia e história do Egypto;
em 1999 elas estudavam psicologia e história do Egito. Línguas que
não têm escrita nem por isso deixam de ter sua gramática.
4. Reconhecer que tudo o que a Gramática Tradicional chama de
erro é na verdade um fenômeno que tem uma explicação cien-
tífica perfeitamente demonstrável. Se milhões de pessoas (cultas
inclusive) estão optando por um uso que difere das regras pres-
critas nas gramáticas normativas é porque há alguma nova regra
sobrepondo-se à antiga. Assim, o problema está com a regra tra-
dicional, e não com as pessoas, que são falantes nativos e perfeita-
mente competentes de sua língua. Nada é por acaso.
5. Conscientizar-se que toda língua muda e varia. O que hoje é visto
como “certo” já foi “erro” no passado. O que hoje é considerado
“erro” pode vir a ser perfeitamente considerado como “certo” no
futuro da língua. Um exemplo: no português medieval existia um
verbo leixar (que aparece até na carta de Pero Vaz de Caminha ao
rei D. Manuel I). Com o tempo, esse verbo foi sendo pronunciado
deixar porque [d] e [l] são consoantes aparentadas, o que permitiu
a troca de uma pela outra.

–  21  –
Leitura e Escrita na Era Digital

Hoje quem pronunciar leixar vai cometer um “erro” (vai ser acu-
sado de desleixo), muito embora essa forma seja mais próxima da
origem latina, laxare (compare-se, por exemplo, o francês laisser
e o italiano lasciare). Por isso é bom evitar classificar algum fenô-
meno gramatical de “erro”: ele pode ser, na verdade, um indício do
que será a língua no futuro.
6. Dar-se conta de que a língua portuguesa não vai nem bem, nem
mal. Ela simplesmente vai, isto é, segue seu rumo, prossegue em
sua evolução, em sua transformação, que não pode ser detida (a
não ser com a eliminação física de todos os seus falantes).
7. Respeitar a variedade linguística de toda e qualquer pessoa, pois
isso equivale a respeitar a integridade física e espiritual dessa pes-
soa como ser humano.
8. A língua permeia tudo, ela nos constitui enquanto seres huma-
nos. Nós somos a língua que falamos. A língua que falamos molda
nosso modo de ver o mundo e nosso modo de ver o mundo molda
a língua que falamos. Para os falantes de português, por exemplo,
a diferença entre ser e estar é fundamental: eu estou infeliz é radi-
calmente diferente, para nós, de eu sou infeliz. Ora línguas como o
inglês, o francês e o alemão têm um único verbo para exprimir as
duas coisas. Outras, como o russo, não têm verbo nenhum, dizendo
algo assim como: Eu-infeliz (o russo, na escrita, usa mesmo um
travessão onde nós inserimos um verbo de ligação).
9. Uma vez que a língua está em tudo e tudo está na língua, o pro-
fessor de português é professor de tudo. (Alguém já me disse que
talvez por isso o professor de português devesse receber um salário
igual à soma dos salários de todos os outros professores!).
10. Ensinar bem é ensinar para o bem. Ensinar para o bem significa res-
peitar o conhecimento intuitivo do aluno, valorizar o que ele já sabe
do mundo, da vida, reconhecer na língua que ele fala a sua própria
identidade como ser humano. Ensinar para o bem é acrescentar e
não suprimir, é elevar e não rebaixar a autoestima do indivíduo.
Somente assim, no início de cada ano letivo este indivíduo poderá
comemorar a volta às aulas, em vez de lamentar a volta às jaulas!
BAGNO, M. Preconceito linguistico: o que é, como se faz.
47. ed. São Paulo: Edições Loyola, 2006.

–  22  –
Homem e linguagem

Dica de filme
Para compreender melhor a relação da língua com
as diversas culturas, assista ao filme Língua, vidas em
português. Este documentário premiado de Victor
Lopes apresenta uma viagem pelo mundo com entradas
em todos os países em que há falantes da língua portu-
guesa. Sua estrutura narrativa circular prende o interlo-
cutor. São histórias de vidas de pessoas com suas dife-
renças culturais, mas que têm em comum serem usuários
da língua portuguesa. É importante ressaltar a presença
de pessoas ilustres que participam com depoimentos,
como José Saramago (escritor português), João Ubaldo
Ribeiro (escritor brasileiro), Martinho da Vila (cantor e
compositor), Teresa Salgueiro (do grupo Madredeus) e
Mia Couto (escritor moçambicano contemporâneo que
escreve o roteiro).
LÍNGUA, vidas em português. Direção de Victor Lopes.
Brasil/Portugal: Paris Filmes, 2002. 1 filme (105 min), sonoro,
legenda, color., 35 mm.

Como pode-se perceber, a própria compreensão de língua como um


sistema regido por normas é constantemente questionada pelos efeitos que
produz, uma vez que a comunicação confunde-se com a própria vida e a
língua é viva.

1.1.2 Funções da linguagem


O processo de leitura e escrita constitui-se enquanto um ato comu-
nicativo. Para tal, ele precisa de um emissor, aquele que fala ou escreve,
um receptor, aquele que lê ou escuta, um referente, que é constituído
pelo contexto, situação ou objetos reais ao qual a mensagem remete, um
código, que é o conjunto de signos e regras de combinação a ser usado,
um canal de comunicação, que é a via de circulação da mensagem, e a

–  23  –
Leitura e Escrita na Era Digital

­ ensagem, que é o conteúdo da comunicação. Roman Jakobson (2001),


m
em seus estudos linguísticos, estabeleceu a cada uma das situações do ato
comunicativo uma função da linguagem. Dependendo da ênfase que se
dá a cada um dos processos comunicativos, a linguagem apresenta uma
função com recursos linguísticos próprios. Temos, assim, a função expres-
siva, a função conativa, a função metalinguística, a função fática, a função
poética e a função referencial. Sabe-se que não há na linguagem uma fun-
ção pura, várias podem aparecer ao mesmo tempo no processo comunica-
tivo, no entanto, conhecê-las ajudará a melhorar a elaboração da fala e da
escrita ( JAKOBSON, 2001).

Referente: função
referencial

Canal de ­comunicação:
Emissor função fática Receptor
Função Função
expressiva Mensagem: função conativa
­poética

Código: função
metalinguística

Fonte: Jakobson (2001, p. 17).


Na sequência, vamos identificar as características de cada função.

1.1.2.1 Função expressiva


É centrada no emissor da mensagem, exprime a sua relação com o
conteúdo transmitido, a sua opinião, emoções, avaliações. Pode-se sentir no
texto a presença do emissor (que pode ser clara ou sutil). É uma ­comunicação

–  24  –
Homem e linguagem

s­ ubjetiva, faz uso de frase exclamativa, de interjeições, superlativos, aumen-


tativos, diminutivos, hipérboles, entonação máxima.

Resenha sobre o filme O discurso do rei


[...] Pode-se dizer, porém, que a cena mais impactante do filme é
o momento em que o rei deve realizar seu primeiro discurso. Não vou
além, pois não quero estragar as surpresas que aguardam o público
ao longo da história e, com certeza, no seu final. Ao contrário do que
muitos podem imaginar o roteiro não é baseado no livro de mesmo
título; a versão literária foi escrita pelo neto de Lionel, Mark Logue,
com a ajuda do jornalista Peter Conradi.
Ele decidiu escrever esta obra a partir do momento em que foi
procurado pela produção do filme para revelar detalhes sobre a bio-
grafia do australiano Lionel. Curioso em saber mais a respeito de seu
avô, ele saiu à procura de outras informações, as quais deram origem
ao livro. As passagens mais importantes, porém, estão certamente
concentradas nas telas cinematográficas.
Esta produção, que guarda em si um sabor delicioso de história
à moda antiga, ganhou os Oscars de melhor roteiro original, ator –
super merecido! –, direção e filme.
O DISCURSO do Rei. Direção de Tom Hooper. Inglaterra: Paris filmes,
2010. 1 filme (118 min), sonoro, legenda, color.
Elenco: Colin Firth, Helena Bonham Carter, Geoffrey Rush, Michael
­Gambon. Drama.
SANTANA, A. L. O discurso do rei. Disponível em: <http://www.
infoescola.com/cinema/o-discurso-do-rei/>. Acesso em: 30 jul. 2012.

Como podemos observar durante a leitura, o autor da resenha afirma:


“Não vou além, pois não quero estragar as surpresas que aguardam o público
ao longo da história”. Usando a primeira pessoa do singular, ele deixa clara
a sua opinião sobre o filme. Mais adiante continua: “Esta produção, que
guarda em si um sabor delicioso de história à moda antiga, ganhou os Oscars
de melhor roteiro original, ator – super merecido!”. São evidentes as marcas
linguísticas de expressão pessoal.

–  25  –
Leitura e Escrita na Era Digital

1.1.2.2 Função conativa


É centrada no receptor da mensagem, com a intenção de persuadi-lo,
seduzi-lo. É uma comunicação imperativa, faz uso dos verbos no modo
imperativo afirmativo ou negativo.
Observe a imagem a seguir, de uma propaganda persuasiva para com-
bate ao tabagismo.

HAAP Media Ltd/Sebastian Fissore


E tem gente que diz que isto não é droga!

Acetona
Acetona: Formol
Formol: Amônia
Amônia:
removedor conservante desinfetantes para pisos,
de esmaltes de cadáver azulejos e privadas
Naftalina
Naftalina:
mata-baratas

Fósforo P4/P6
P4/P6:
Terebintina
Terebintina: componente de
diluidor de tinta a óleo veneno para ratos

Cigarro: faz mal até na propaganda.

Este é um exemplo muito forte da função conativa, uma vez que, após o
autor dirigir-se ao receptor com a expressão “tem gente que diz [...]”, é apre-
sentada uma série de provas que mostram os perigos do tabaco. Ao terminar,
afirma, imperativamente, “cigarro faz mal”.

1.1.2.3 Função referencial


É centrada no referente da mensagem, valoriza o objeto da mensa-
gem. É uma comunicação objetiva, impessoal, com preferência pela frase
declarativa.

–  26  –
Homem e linguagem

A palavra “pinchar”, em castelhano tem os sentidos de “cutucar,


espetar, ferir” (no lunfardo, também “morrer” e “fazer sexo”). Coromi-
nas imagina que “pinchar” do castelhano tenha vindo de uma mistura
de punchar (variante de punzar) com picar e que, pela diferença de
sentido, nada tenha a ver com o “pinchar” português. No castelhano,
a palavra aparece desde o século 15, mas pode remontar ao latim vul-
gar, como vemos no italiano pinzare, [...] no francês pincer e no inglês
to pinch (beliscar).
VIARO, M. E. Palavras jogadas fora. Revista Língua Portuguesa,
n. 77, p. 52-55, mar., 2012. São Paulo.

Observou-se um exemplo de uma comunicacão centrada na mensa-


gem, ou seja, o emissor quer explicar o sentido da palavra.

1.1.2.4 Função fática


É centrada no contato, demonstra o desejo de abertura para a comu-
nicação, que se dá com uso de frases breves, consagradas pelo uso. No texto
escrito, costuma-se usar imagens, tamanho diferenciado das letras, cores
para chamar atenção.

Macabéa e Olímpico
Ele — Pois é!
Ela — Pois é o quê?
Ele — Eu só disse, pois é!
Ela — Mas, pois é o quê?
Ele — Melhor mudarmos de assunto porque você não me entende.
Ela — Entende o quê?
Ele — Santa virgem Macabéa, vamos mudar de assunto e já!
LISPECTOR, C. A hora da estrela. São Paulo: Rocco, 1998. p. 45.

–  27  –
Leitura e Escrita na Era Digital

No diálogo do box de exemplo não há preocupação com a men-


sagem, apenas os falantes estão mantendo uma abertura do canal de
­comunicação.

1.1.2.5 Função metalinguística


É centrada no código, é tudo o que, em uma mensagem, serve para dar
explicações ou tornar preciso o código utilizado pelo emissor no ato comuni-
cativo. É uma comunicação explicativa, faz uso de sinônimos, ­definições.

Exemplo: poemas que discutem como se faz poesia.

Poética
1
O que é poesia?
Uma ilha
Cercada
De palavras
Por todos
Os lados.

2
O que é poeta?
Um homem
Que trabalha o poema
Com o suor do seu rosto.
Um homem
Que tem fome
Como qualquer outro
Homem.
RICARDO, C. Jeremias sem-chorar. Rio de Janeiro:
José Olympio, 1968.

–  28  –
Homem e linguagem

A metalinguística ocorre em todas as áreas, por exemplo, quando um


pintor pinta a si mesmo num quadro, o roteirista de um filme cria protago-
nistas que querem produzir roteiros de filmes e assim por diante.

1.1.2.6 Função poética


É centrada na elaboração da mensagem, usa formas inovadoras com
combinações inusitadas, ofertadas pela própria língua. É uma comunicação
artística com predomínio da conotação. Pode ser usada em todos os gêneros
textuais, é a marca textual do gênero literário.

Epitáfio para um banqueiro


negócio
ego
ócio
cio
o
PAES, J. P. Melhores poemas. São Paulo: Global, 2003.

A função poética está presente em qualquer texto no qual o autor


preocupe-se com a elaboração estilística, como no caso do poema anterior.
O poeta desmancha o negócio com a fragmentação da própria palavra que
termina com o “o”, assemelhando-se, graficamente, a zero. É importante
ressaltar que, na linguagem conativa presente no discurso publicitário, é
intenso o uso da função poética para envolver ainda mais o receptor pela
beleza textual.
Conclusivamente, pode-se afirmar que, ao se reconhecer a estrutura
lexical, argumentativa, discursiva e estilística do texto, juntamente com a
intenção do autor, a recepção do texto será muito maior e melhor.

Da teoria para a prática


Muitos textos que circulam nas esferas sociais podem auxiliar o leitor
na compreensão das variedades linguísticas. Tal questão costuma causar

–  29  –
Leitura e Escrita na Era Digital

muita polêmica entre a sociedade e os meios de comunicação quando dis-


cutida em escolas ou mesmo abordada nos livros didáticos, o que acaba
gerando muitos debates. A professora Ângela Paiva Dionísio escreve a esse
respeito um artigo intitulado “Língua padrão e variedades linguísticas:
calos na vida do professor de português”, no qual analisa a fala da mídia e
dos textos dos livros didáticos no trato da variedade linguística. O texto
é interessante não apenas para conhecimento e aprimoramento docente,
mas, também, para a sociedade de uma forma geral.

Síntese
No primeiro capítulo, fizemos uma introdução aos conceitos de lin-
guagem, língua e fala. Foram verificadas as diferenças entre língua oral
e escrita, as funções da linguagem e as variedades linguísticas. Estes são
conhecimentos fundamentais para a compreensão dos estudos tex­tuais,
sua prática e produção. Portanto, as ideias aqui apresentadas, de uma
forma ou de outra, permeiam não apenas o ensino da língua, mas também
o seu uso.
A linguagem classifica-se como um processo universal, considera-se
tudo o que o homem faz para manter a comunicação ao longo de sua exis-
tência. Assim, ele preocupa-se em criar e recriar meios de comunicação
que sirvam de condutores de conhecimento que, ao possibilitar a transmis-
são do pensamento, identifiquem a condição humana.
A língua é um elemento cultural elaborado pelo homem, com um
código específico a ser aprendido pelos membros da comunidade. A fala é a
aplicação que cada sujeito faz com a língua para promover a comunicação.
Daí nasce a marca de cada sujeito no seu meio: somos iguais, falamos a
mesma língua, mas somos diferentes, pelo modo de empregá-la.
As variedades linguísticas auxiliam na compreensão do que é erro e
do que é diferença, possibilitando a aceitação social dessas diferenças cul-
turais. As funções da linguagem orientam o reconhecimento de suas carac-
terísticas, a intenção do emissor sobre o receptor da mensagem. Depen-
dendo do que eu quero do meu interlocutor farei as escolhas sintáticas,
morfológicas, lexicais e estilísticas da minha fala ou do meu texto.

–  30  –
2

Leitura e escrita

Neste capítulo, vamos identificar as relações que os atos


de ler e escrever possuem. A leitura da qual trataremos é a aquela
que tem como meta adquirir novos conhecimentos nas diversas
áreas nas quais se busca aprimoramento. Podemos afirmar que
é uma leitura diferente da leitura fruitiva de um poema, de um
romance ou da leitura informativa de um periódico, para se saber
os acontecimentos do dia ou da semana.
Leitura e Escrita na Era Digital

Vamos abordar algumas estruturas textuais de grande utilização no


meio acadêmico: o resumo, o esquema, a resenha e o fichamento. De modo
geral, todos eles podem ser classificados como resumos, mas o objetivo de
cada um pode torná-los diferentes.
Enquanto o resumo procura destacar as ideias essenciais do texto, o
esquema trabalha somente com as palavras-chave e a resenha é usada para
apresentar e avaliar um determinado texto. Já o fichamento é um texto de
controle pessoal das leituras realizadas para futuras pesquisas a respeito dos
conceitos encontrados e produção de novos conhecimentos.

2.1 Como ler e escrever


O processo de leitura é um dos mais importantes a ser desenvolvido
com as pessoas e o seu ensino, bem como aprendizagem, exige um grande
cuidado daqueles que trabalham com ele.
Há vários tipos de leitura. Geraldi (1984) apresenta quatro tipos de
motivação para esta competência, que são a busca de informações, o estudo
de um determinado texto, um pretexto para fazer uma atividade indireta
(ou seja, exercícios de acentuação, análise literária, resumo ou fichamento) e
a leitura por fruição. Cada um dos tipos exige do leitor posturas diversas na
condução da própria leitura. Tais posturas devem ser muito bem compre-
endidas para que, ao final, o objetivo da leitura seja alcançado. Para isso, é
necessário ter à disposição um acervo diverso de textos que contemplem as
diferentes motivações.
O desenvolvimento do leitor depende de cinco capacidades cognitivas
que, segundo Bloom (apud FAULSTICH, 1987), independe da faixa etária
de quem lê.
1. Compreensão: é a primeira leitura, quando se identifica o tema, a
tese, busca-se o significado no dicionário para a palavra desconhe-
cida, ou seja, é a decodificação do texto.
2. Análise: é quando se busca compreender as ideias contidas em
cada segmento do texto, percebendo que o todo é composto de
partes que se relacionam entre si: os parágrafos nos textos, os capí-
tulos nos livros.

–  32  –
Leitura e escrita

3. Síntese: é quando somos capazes de reconstituir o todo decom-


posto anteriormente atendo-nos às ideias essenciais, do ponto de
vista do original, nem nos importando com a sequência oferecida
pelo autor do texto.
4. Avaliação: é a capacidade de emitir um juízo de valor a respeito do
que o autor veicula no texto.
5. Aplicação: é o momento mais importante do ato de ler, pois, se
há compreensão, há assimilação e, portanto, as ideias, os concei-
tos poderão ser aplicados em situações semelhantes, ou para criar
novas ideias.
Estas capacidades fazem com que o leitor, ao ler, examine cuidadosa-
mente o real significado de cada palavra naquele contexto, encontre cada uma
das partes constitutivas do texto, observe as diversas escolhas lexicais, estrutu-
rais, argumentativas e estilísticas feitas pelo autor que tramou a teia do texto.
Com essa caminhada, ao ler, já se está fazendo o esboço do que será
escrito a respeito do texto. Pode-se dizer que, no momento da síntese,
da identificação das ideias essenciais do autor, constrói-se o resumo, no
momento da avaliação do que se leu, constrói-se a resenha e no momento
da aplicação, quando se vai utilizar as ideias assimiladas por meio da leitura
constrói-se o ensaio, o artigo, a palestra, etc. Deste modo, dependendo do
objetivo que a leitura tem para o leitor, ele pode projetar a construção de um
determinado gênero textual.
Há, portanto, uma relação estreita entre leitura e produção, desde que
se conheça a estrutura de cada um dos textos que se irá escrever.

2.2 Produção de texto como


resultado de leitura

2.2.1 Resumo
O resumo é um tipo de texto que consiste na redução fiel de outro texto,
mantendo suas ideias principais sem repetir os comentários, julgamentos e

–  33  –
Leitura e Escrita na Era Digital

exemplos. A característica principal do resumo é não permitir o acréscimo


de novas ideias e avaliações a respeito do tema que está sendo lido. Logo, ao
condensar um texto, o leitor deve se ater às questões essenciais, apresentá-las
na mesma progressão em que aparecem no original e manter a correlação
entre cada uma das partes.
Segundo o Dicionário Escolar da Língua Portuguesa (BECHARA, 2008),
há muitos sinônimos para a palavra “resumo”, tais como: compêndio, epí-
tome, resenha, esquema, sinopse, sumário, síntese. Apesar da semelhança no
quesito de condensamento, a estrutura de cada um é diferente.
Os mais utilizados no meio acadêmico são o resumo, o esquema, a
resenha e o fichamento, com intuito de assimilar informações e dominar
um instrumental teórico-metodológico para realizar as práticas de trabalho
intelectual, com o objetivo da produção de conhecimentos. Todos os qua-
tro tipos de textos procuram sintetizar, para registrar de uma forma concisa,
coerente e objetiva, o conhecimento adquirido pela leitura.
Como, então, fazer um resumo?
Inicia-se com a leitura atenta do texto, podendo-se usar como ajuda
a técnica de sublinhar as ideias essenciais e a técnica de esquematizar as
palavras-chave. Autores como Salomon (1999), Lakatos e Marconi (1991),
entre outros, sugerem alguns procedimentos para a atividade de sublinhar.
A técnica de sublinhar consiste em:
2 primeiramente, ler todo o texto;
2 a seguir, é necessário esclarecer dúvidas de vocabulário;
2 na sequência, reler o texto identificando as ideias principais e
sublinhando-as;
2 por fim, ler o que foi sublinhado, verificando se há sentido e, então,
reconstruir o texto, que se transformará no resumo, como veremos
no box a seguir. Porém, antes disso, é importante ressaltar que, uti-
lizando essa técnica, iremos construir um novo texto, e não efetuar
a cópia de pedaços do texto original. O resumo é um texto com
começo, meio e fim que transmite as ideias principais do texto lido.

–  34  –
Leitura e escrita

Observe o exemplo de como sublinhar.

Quatro funções básicas têm sido convencionalmente atri-


buídas aos meios de comunicação de massa: informar, divertir,
persuadir e ensinar. A primeira diz respeito à difusão de notí-
cias, relatos, comentários etc. sobre a realidade, acompanhada, ou
não de interpretações ou explicações. A segunda função atende
à procura da distração, de evasão, de divertimento, por parte do
público. Uma terceira função é persuadir o indivíduo – conven-
cê-lo a adquirir certo produto, a votar em certo candidato, a se
comportar de acordo com os desejos do anunciante. A quarta
função – ensinar – é realizada de modo direto ou indireto, inten-
cional ou não, por meio de material que contribui para a forma-
ção do indivíduo ou para ampliar seu acervo de conhecimentos,
planos, destrezas, etc.
ANDRADE, M. M. de. Introdução à metodologia do trabalho científico:
elaboração de trabalho na graduação. São Paulo: Atlas, 1997. p. 38.

Após sublinhar, pode-se produzir o esquema que, além de resumir


o texto com palavras-chave, possibilita conduzir uma palestra ou uma
aula. É a espinha dorsal do texto. Se você é leitor, desconstrói o texto para
encontrar esta espinha dorsal; se você é o autor, ela é o ponto de partida
para produzi-lo.

Quatro funções básicas dos meios de comunicação de massa:


1. Informar – transmite a realidade.
2. Divertir – diverte o público.
3. Persuadir – convence o receptor a se comportar conforme os
desejos do locutor.
4. Ensinar – forma o indivíduo.

–  35  –
Leitura e Escrita na Era Digital

Após sublinhar e produzir o esquema, é possível resumir o texto em


formato discursivo, mantendo as ideias principais do autor, como vemos no
modelo a seguir.

As funções básicas dos meios de comunicação de massa são qua-


tro. Informar, que fala sobre a propagação de notícias. Divertir, que
diz respeito à diversão das pessoas. Persuadir, que comenta sobre o
convencimento do interlocutor. Ensinar, que contribui para a forma-
ção do indivíduo e amplia conhecimentos.

De modo geral, costuma-se afirmar que um resumo deve se aproximar


de um terço do texto original.

2.2.2 Resenha crítica


De acordo com a Associação Brasileira de Normas Técnicas (ABNT,
1990), a resenha crítica é o mesmo que o resumo crítico. Andrade (1997)
define a resenha como
[...] um tipo de resumo crítico mais abrangente, que permite
comentários e opiniões; um tipo de trabalho mais completo
que exige conhecimento do assunto, para estabelecer com-
paração com outras obras na mesma área e maturidade
intelectual para fazer avaliação e emitir juízos de valor
(ANDRADE, 1997, p. 61-67).

A resenha é um texto no qual leitor e autor têm objetivos que se aproxi-


mam: um busca e o outro fornece uma opinião crítica sobre um livro, filme,
peça teatral, enfim, todas as produções humanas.
Portanto, o resenhista apresenta, descreve e avalia uma obra a partir
de um ponto de vista que possui a respeito do assunto analisado, devendo
ser amplo e consistente. Na apresentação, identifica a obra em seus aspec-
tos de referência bibliográfica e sintetiza o assunto. Na descrição, faz o
resumo das ideais essenciais da obra. Por fim, na avaliação, o resenhista
destaca a contribuição do autor e da obra para produção de novos conhe-
cimentos na área em questão, caso seja de cunho científico, e a qualidade

–  36  –
Leitura e escrita

da escrita no que diz respeito à clareza na apresentação das ideias (ou a


riqueza estilística, caso seja literária. Além disso, o resenhista pode con-
frontar a obra resenhada com outras obras do mesmo tema para estabele-
cer ­comparações.
A estrutura da resenha, conforme sugerem Lakatos e Marconi (1991,
p. 245-246), apresenta-se assim:
2 referências – autor(es); título da obra; edição; local; editora e data
de publicação; número de páginas; preço;
2 credenciais do autor – informações gerais sobre o autor e sua qua-
lificação acadêmica, profissional ou especialização; títulos e cargos
exercidos; obras publicadas;
2 resumo da obra – resumo das ideias principais, descrição breve do
conteúdo dos capítulos ou partes da obra. Pensar: de que trata a
obra? O que diz? Qual sua característica principal? O autor apre-
senta ou não conclusão?
2 crítica do resenhista – como se situa o autor da obra em rela-
ção às escolas ou correntes científicas ou filosóficas e em relação
ao contexto social, econômico, político, histórico, etc.? Quanto
ao mérito da obra: qual a contribuição dada? As ideias são
originais, criativas? As abordagens do conhecimento são ino-
vadoras? Quanto ao estilo: é conciso, objetivo, claro, coerente,
preciso? A linguagem é correta? Quanto à forma: é lógica, sis-
tematizada? Utiliza recursos explicativos para elucidar o conte-
údo? Quanto a quem se destina a obra: grande público, especia-
listas, ­e studantes?
Evidentemente que, na avaliação de alguma obra, talvez não seja possí-
vel responder a todas essas questões. Elas servem como um roteiro para você
construir o seu parágrafo de avaliação da resenha.
Costuma-se dar um título à resenha, caso seja exigido. Também no pró-
prio título pode vir uma expressão que já denote a avaliação e que tenha
uma estreita relação com algum atributo mais destacado da obra, segundo
o resenhista.

–  37  –
Leitura e Escrita na Era Digital

Observemos os exemplos a seguir.

Modelo de Resenha 1
[...] este é um conto que aborda um tema oculto da alma de todo
ser humano: a crueldade. Machado de Assis cria um cenário onde
o recém-formado médico Garcia conhece o espirituoso Fortunato,
dono de uma misteriosa compaixão pelos doentes e feridos, apesar de
ser muito frio, até mesmo com sua própria esposa.
Através de uma linguagem bastante acessível, que não encon­
tramos em muitas obras de Assis (*1), o texto mescla momentos de
narração – que é feita em terceira pessoa – com momentos de diálo-
gos diretos, que dão maior realidade à história.
Uma característica marcante é a tensão permanente que
ambienta cada episódio (*2). Desde as primeiras vezes em que
Garcia vê Fortunato – na Santa Casa, no teatro e quando o segue na
volta para casa, no mesmo dia – percebemos o ar de mistério que o
envolve.
Da mesma forma, quando ambos se conhecem devido ao caso
do ferido que Fortunato ajuda, a simpatia que Garcia adquire é exa-
tamente por causa de seu estranho comportamento, velando por dias
um pobre coitado que sequer conhece.
A história transcorre com Garcia e Fortunato tornando-se ami-
gos, a apresentação de Maria Luiza, esposa de Fortunato e ainda com
a abertura de uma casa de saúde em sociedade.
O clímax então acontece quando Maria Luiza e Garcia flagram
Fortunato torturando um pequeno rato, cortando-lhe pata por pata
com uma tesoura e levando-lhe ao fogo, sem deixar que morresse. É
assim que se percebe a causa secreta dos atos daquele homem: o sofri-
mento alheio lhe é prazeroso. Isso ocorre ainda quando sua esposa
morre por uma doença aguda e quando vê Garcia beijando o cadáver
daquela que amava secretamente. Fortunato aprecia até mesmo seu
próprio sofrimento.

–  38  –
Leitura e escrita

É possível afirmar que este conto é um expoente máximo da téc-


nica de Machado de Assis, deixando o leitor impressionado com um
desfecho inesperado, mas que demonstra – de forma exponencial, é
verdade – a natureza cruel do ser humano. É uma obra excelente para
os que gostam dos textos de Assis, mas acham cansativa a linguagem
rebuscada usada em alguns deles (*3). [...]
GAZOLA, A. A. Resenha. Disponível em: <http://www.lendo.org/
wp-content/uploads/2007/06/a-causa-secreta-resenha.pdf>.
Acesso em: 22 nov. 2012.

No exemplo, o autor da resenha colocou críticas em três momentos


de sua análise (*1,*2 e *3, identificados em negrito). Ele não se estende na
apresentação de Machado de Assis, com base na suposição de que o autor é
conhecido por todos os leitores da resenha.

Modelo de Resenha 2
Resenha de Maria Auxiliadora Versiani Cunha,
citada por Eduardo Kenedy.

*1 (Apresentação)
BETTELHEIM, Bruno. A psicanálise dos contos de fadas.
Rio de Janeiro, Paz e Terra, 1978.

Psicanalista, fundador da Escola Ortogência de Chicago,


onde há mais de trinta anos lida com crianças perturbadas men-
talmente, Bruno Bettelheim revela em “A psicanálise dos contos
de fadas” os significados profundos das tramas e personagens das
histórias infantis. Mostra como esses significados vão agir direta-
mente sobre o inconsciente e pré-consciente da criança normal,
levando-a pouco a pouco a resolver seus conflitos.

–  39  –
Leitura e Escrita na Era Digital

*2 (Resumo da obra)
Tais conflitos são universais, constituídos pelos dilemas eternos
que o homem enfrenta ao longo de seu amadurecimento emocional: a
conquista da independência em relação aos pais, a rivalidade fraterna,
a construção da identidade e da afirmação e a relação heterossexual
adulta. A dicotomização dos personagens em bons e maus, em boni-
tos e feios, facilita à criança a apreensão desses traços. Ela é levada a se
identificar com o herói bom; não por sua bondade, mas por ser ele a
própria personificação de sua problemática infantil.
Inspirada pelo herói, a criança vai ser conduzida a resolver sua
própria situação, sobrepondo-se ao medo que a inibe e enfrentando
os perigos e ameaças até alcançar o equilíbrio adulto. Assim, o efeito
terapêutico dos contos de fadas está em provocar a mobilização das
ansiedades básicas da criança, tais como o medo de abandono, o de
crescer, o de se lançar sozinha no mundo etc., para depois conduzi-la
à resolução dessas mesmas ansiedades. Bettelheim faz cuidadosa sele-
ção de contos clássicos, tratando-os na ordem aproximada do apare-
cimento na criança dos conflitos neles implícitos.
Dessa maneira, a luta do princípio de realidade contra o princípio
de prazer é vista em “Os três porquinhos”. O problema da rivalidade
entre irmãos, em “Cinderela”. O medo de ser abandonado, em “João e
Maria”. A resolução do complexo de Édipo, em “Branca de Neve”, em
“a Bela e a Fera” e em “João e o pé de feijão”.
Tais conflitos, afirma o autor, concernem unicamente o mundo
interno (ou psicológico) da criança. Não obstante, é apresentado ao
leitor como, ao ajudar uma criança a resolver esses problemas, os con-
tos reforçam sua personalidade, proporcionando maior capacidade de
adaptação ao mundo exterior.
Enquanto as histórias da moderna literatura infantil procu-
ram pintar a vida, ou “cor-de-rosa”, ou exageradamente “tecnológica”,
­Bettelheim demonstra como a mensagem dos contos de fadas é radi-
calmente outra, ensinando que, na vida real, é inevitável estar sempre
preparado para enfrentar dificuldades graves. Portanto, a criança é
levada a encontrar no conto a coragem e o otimismo necessários a

–  40  –
Leitura e escrita

atravessar e a vencer as numerosas crises de crescimento. A criança


chega à compreensão de que as histórias, embora irreais, não são falsas:
ocorrem não no plano do real, mas no plano das experiências inter-
nas de desenvolvimento pessoal. O autor ressalta que a finalidade dos
contos é de não deixar dúvidas quanto à necessidade de se suportar a
dor e de se correr riscos para se adquirir a própria identidade.
Os contos sugerem que, apesar de todas as ansiedades que acom-
panham tal processo, a criança pode ficar esperançosa quanto a um
final feliz.
*3 (Avaliação)
O grande interesse, a maior importância e a profunda origina-
lidade do tema são enriquecidos pela análise detalhada e sistemática
que Bettelheim faz do material dos contos, revelando segura compre-
ensão psicanalítica e clareza didática de suas conclusões. A psicanálise
dos contos de fadas é um excelente trabalho sobre a mente humana e
as intrincações de seu desenvolvimento.
Nos Estados Unidos, Bruno Bettelheim é lido por leigos e por espe-
cialistas e sua obra conta com ampla divulgação entre os estudiosos do
comportamento humano. No Brasil, não só os profissionais, como tam-
bém pais e educadores podem ficar satisfeitos por terem acesso a este
trabalho que virá, sem dúvida, constituir um marco no acervo de obras
que esclarecem a todos os que têm a difícil tarefa de orientar a infância.
Atualmente, quando tanto se fala em reformulação e renova-
ção da literatura infantojuvenil, o livro de Bruno Bettelheim se faz
indispensável no estabelecimento de um critério de avaliação do que
seja realmente literatura infantojuvenil, não mero e malsão aprovei-
tamento de uma “onda”.
*4 (Credenciais do autor da resenha)
Maria Auxiliadora Versiani Cunha. Psicóloga clínica no Rio de Janeiro.
Autora do livro Didática fundamentada na teoria de Piaget (Rio de
Janeiro, Forense-Universitária, 1976).
KENEDY, E. Resumo e resenha. Disponível em: <http://xa.yimg.com/
kq/groups/24179228/1848767481/name/Resumo+e+resenha.pdf>.
Acesso em: 31 jul. 2012.

–  41  –
Leitura e Escrita na Era Digital

Nessa resenha, a autora, no item 1, apresentou o autor e a obra.


No item 2, a descreveu resumidamente; no item 3, a avaliou e, no item 4,
forneceu as credenciais.

2.2.3 Fichamento
O fichamento é o ato de registrar os estudos de um livro e/ou um texto.
O trabalho de fichamento possibilita ao estudante, além da facilidade na exe-
cução dos trabalhos acadêmicos, a assimilação do conhecimento. De acordo
com diversos autores, o fichamento deve apresentar a seguinte estrutura:
cabeçalho indicando o assunto, a referência completa da obra, isto é, a auto-
ria, o título, o local de publicação, a editora e o ano da publicação. Existem
três tipos básicos de fichamento: o fichamento bibliográfico, o fichamento
temático e o fichamento textual.
O fichamento bibliográfico, como o próprio nome esclarece, caracte-
riza-se como o resumo, resenha ou comentário no qual o autor registra a
ideia tratada no livro. É fundamental a referência completa da obra. Usa-se,
também, para coletânea de artigos ou capítulos de livros, preferencialmente
agrupando-se por área.

ANDRADE, M. M. de.; MEDEIROS, J. B. Comunicação em língua


portuguesa: para os cursos de jornalismo, propaganda e letras. 2. ed.
São Paulo: Atlas, 2000.
Esta obra tem como preocupação geral apresentar a estrutura
da língua portuguesa e oferecer noções de produção textual, especial-
mente voltados para os cursos superiores de jornalismo, publicidade
e propaganda e letras.

O fichamento temático tem como meta transcrever trechos lite-


rais da obra lida, podendo acrescentar algumas considerações do leitor.
Preferencialmente, deve-se colocar o título e subtítulos conforme a obra
original. As citações literais devem vir entre aspas e o número da página
entre parênteses.

–  42  –
Leitura e escrita

Educação da mulher: a perpetuação da injustiça (p. 30-132).


S­ egundo capítulo.
TELES, M. A. de A. Breve história do feminismo no Brasil. São
Paulo: Brasiliense, 1993.
1. “uma das primeiras feministas do Brasil, Nísia Floresta Augusta
defendeu a abolição da escravatura, ao lado de propostas como a
educação e a emancipação da mulher e a instauração da Repú-
blica.” (p. 30).
2. “na justiça brasileira, é comum os assassinos de mulheres serem
absolvidos sob a defesa de honra.” (p. 132).
3. “a mulher buscou com todas as forças sua conquista no mundo
totalmente masculino.” (p. 43).

O fichamento textual capta a estrutura do texto, percorrendo a sequên-


-cia do pensamento do autor e destacando: ideias principais e secundárias;
argumentos, justificações, exemplos, fatos, etc., ligados às ideias princi-
pais. Traz, de forma racionalmente visualizável – em itens e, de preferên-
cia, incluindo esquemas, diagramas ou quadro sinóptico –, uma espécie de
“radiografia” do texto. A seguir, apresentamos uma ficha de leitura que tra-
balha os conceitos de signo e imagem, para exemplificação, retirada da obra
Como se faz uma tese, de Umberto Eco (2002), na qual você encontrará exem-
plos dos tipos de fichamento que estamos verificando.

Ficha de leitura
T. Simb
MARITAIN, Jacques.
Revue Thomiste, abril 1938, p. 299.
Na expectativa de uma pesquisa profunda sobre o tema
(da Idade Média até hoje), propõe-se chegar a uma teoria filosófica do
signo e a reflexões sobre o signo mágico.

–  43  –
Leitura e Escrita na Era Digital

[insuportável como sempre: modernizar sem fazer filologia; não


se refere, por exemplo, a São Tomás, mas a João de São Tomás!].
Desenvolve a teoria deste último (ver minha ficha): “Signum est
id quod repraesentat aliud a se potentiae cognoscenti”. (Lóg II, p. 21, I).
Mas o signo não é sempre imagem e vice-versa (o filho é a ima-
gem e não signo do Pai, o grito é o signo e não imagem da dor).
Diz então Maritain que o símbolo é um signo-imagem: ­“quelque
chose de sensible signifiant un objet em raison d`une rélation
­presupposée d´analogie” (303).
Isto me deu a ideia de consultar ST. De ver. VIII, 5.
ECO, U. Como se faz uma tese. São Paulo: Perspectiva, 2002.
Grifos do autor.

Portanto, a leitura consciente seletiva e informativa é fundamental para


a pesquisa e produção textual. Como o universo acadêmico trabalha com o
registro, é preciso aliar a leitura e a escrita. É importante ressaltar que a con-
dição de produzir resumos deve ocorrer desde muito cedo na vida do estu-
dante, tal o seu papel de destaque para incorporar os conceitos estudados.

Da teoria para a prática


Segundo os Parâmetros Curriculares Nacionais (PCN), os alunos
devem ler autonomamente diferentes textos dos diversos gêneros, desde os
anos iniciais, sabendo identificar aqueles que respondem às suas necessida-
des imediatas, e selecionar estratégias adequadas para abordá-los (BRASIL,
1997). É importante, ainda, compreender o sentido nas mensagens orais e
escritas de que é destinatário direto ou indireto, desenvolvendo sensibilidade
para reconhecer a intencionalidade implícita, especialmente nas mensagens
veiculadas pelos meios de comunicação.
Esses objetivos atingidos resultarão no desenvolvimento das capacida-
des leitoras dos alunos, que são avaliadas nos diferentes sistemas de avaliação

–  44  –
Leitura e escrita

do ensino fundamental, como Exame Nacional do Ensino Médio (Enem),


Prova Brasil, Provinha Brasil e, também, no ensino superior, com o Exame
Nacional de Educação Superior (Enade). A seguir, são apresentadas algumas
questões destes exames para que se possa entender melhor o novo formato
de avaliação pela leitura e compreensão dos gêneros.

1. Prova Enade de Administração – 2009


Questão 4
Leia o trecho:
O movimento antiglobalização apresenta-se, na virada deste
novo milênio, como uma das principais novidades na arena política e
no cenário da sociedade civil, dada a sua forma de articulação/atua-
ção em redes com extensão global. Ele tem elaborado uma nova gra-
mática no repertório das demandas e dos conflitos sociais, trazendo
novamente as lutas sociais para o palco da cena pública, e a política
para a dimensão, tanto na forma de operar, nas ruas, como no con-
­teúdo do debate que trouxe à tona: o modo de vida capitalista oci-
dental moderno e seus efeitos destrutivos sobre a natureza (humana,
animal e vegetal) (GOHN, 2003).
É incorreto afirmar que o movimento antiglobalização referido
nesse trecho
a) cria uma rede de resistência, expressa em atos de desobe-
diência civil e propostas alternativas à forma atual da glo-
balização, considerada como o principal fator da exclusão
social existente.
b) defende um outro tipo de globalização, baseado na solida-
riedade e no respeito às culturas, voltado para um novo tipo
de modelo civilizatório, com desenvolvimento econômico,
mas também com justiça e igualdade social.
c) é composto por atores sociais tradicionais, veteranos nas
lutas políticas, acostumados com o repertório de protes-
tos políticos, envolvendo, especialmente, os trabalhado-
res sindicalizados e suas respectivas centrais sindicais.

–  45  –
Leitura e Escrita na Era Digital

d) recusa as imposições de um mercado global, uno, voraz,


além de contestar os valores impulsionadores da sociedade
capitalista, alicerçada no lucro e no consumo de mercado-
rias supérfluas.
e) utiliza-se de mídias, tradicionais e novas, de modo relevante
para suas ações com o propósito de dar visibilidade e legi-
timidade mundiais ao divulgar a variedade de movimentos
de sua agenda.
ENADE 2009 – prova de Administração. Disponível em: <http://
public.inep.gov.br/enade2009/ADMINISTRACAO.pdf>.
Acesso em: 24 out. 2012.

2. Prova Enade de Letras – 2011


Questão 3 – formação geral

A cibercultura pode ser vista como herdeira legítima embora dis-


tante do projeto progressista dos filósofos do século XVII. De fato, ela
valoriza a participação das em comunidades de debate e argumenta-
ção. Na linha reta das morais da igualdade, ela incentiva uma forma
de reciprocidade essencial nas relações humanas. Desenvolveu-se a
partir de uma prática assídua de trocas de informações e conhecimen-
tos, coisa que os filósofos do Iluminismo viam como principal motor
do progresso. (...) A cibercultura não seria pós-moderna, mas estaria
inserida perfeitamente na continuidade dos ideais revolucionários
e republicanos de liberdade, igualdade e fraternidade. A diferença é
apenas que, na cibercultura, esses “valores” se encarnam em disposi-
tivos técnicos concretos. Na era das mídias eletrônicas, a igualdade
se concretiza na possibilidade de cada um transmitir a todos; a liber-
dade toma forma nos softwares de codificação e no acesso a múltiplas

–  46  –
Leitura e escrita

comunidades virtuais, atravessando fronteiras, enquanto a fraterni-


dade finalmente, se traduzem interconexão mundial.
LEVY, P. Revolução virtual. Folha de S. Paulo. Caderno Mais,
16 ago. 1998, p. 3 (adaptado).
O desenvolvimento de redes de relacionamento por meio de
computadores e a expansão da Internet abriram novas perspectivas
para a cultura, a comunicação e a educação.
De acordo com as ideias do texto acima, a cibercultura:
a) representa uma modalidade de cultura pós-moderna de
liberdade de comunicação e ação.
b) constituiu negação dos valores progressistas defendidos
pelos filósofos do Iluminismo.
c) banalizou a ciência ao disseminar o conhecimento nas redes
sociais.
d) valorizou o isolamento dos indivíduos pela produção de
­softwares de codificação.
e) incorpora valores do Iluminismo ao favorecer o compar-
tilhamento de informações e conhecimentos.
ENADE 2011 – prova de Letras. Disponível em: <http://download.uol.
com.br/educacao/Enade2011/ENADE_2011_PROVA1_LETRAS.pdf>.
Acesso em: 24 out. 2012.

Questão 20 – específica
De ordinário, quando se diz que certo termo deve concordar
com outro, tem-se em vista a forma gramatical do termo de refe-
rência. Dúzia, povo, embora exprimam pluralidade e multidão de
seres, consideram-se, por causa da forma, como nomes no singular.
Há, contudo, condições em que se despreza o critério da forma e,

–  47  –
Leitura e Escrita na Era Digital

atendendo apenas à ideia representada pela palavra, se faz a concor-


dância com aquilo que se tem em mente.
Consiste a sínese em fazer a concordância de uma palavra não
diretamente com outra palavra, mas com a ideia que esta última sugere.
SAID ALI, M. Gramática histórica da língua portuguesa. 7. ed.
Rio de Janeiro: Melhoramentos, 1971 (com adaptações).
A definição extraída de Said Ali, reproduzida acima, apresenta
uma figura de sintaxe, a sínese, identificada, na maioria das vezes, em
variantes mais populares da língua.
Assinale a opção que apresenta um exemplo desse tipo de fenô-
meno sintático.
a) A maioria dos porcos ainda estava sendo recolhidos
naquela hora.
b) Ao pobre homem mesquinho, basta-lhe um burrico e uma
cangalha.
c) Chegaram o pai, a irmã e o cunhado com uma pressa que
assustava.
d) Pretendia implantar um monopólio de café e tabaco na
região.
e) No fundo, a multidão se consolava. Para isso, pensavam
em nós mesmos.

3. Prova Enade de Pedagogia – 2011


Questão 2 – Formação geral
Exclusão digital é um conceito que diz respeito às extensas
camadas sociais que ficaram à margem do fenômeno da sociedade da
informação e da extensão das redes digitais. O problema da exclusão
digital se apresenta como um dos maiores desafios dos dias de hoje,

–  48  –
Leitura e escrita

com implicações diretas e indiretas sobre os mais variados aspectos


da sociedade contemporânea.
Nessa nova sociedade, o conhecimento é essencial para aumen-
tar a produtividade e a competição global. É fundamental para a
invenção, para a inovação e para a geração de riqueza. As tecnologias
de informação e comunicação (TICs) proveem uma fundação para a
construção e aplicação do conhecimento nos setores públicos e priva-
dos. É nesse contexto que se aplica o termo exclusão digital, referente
à falta de acesso às vantagens e aos benefícios trazidos por essas novas
tecnologias, por motivos sociais, econômicos, políticos ou culturais.
Considerando as ideias do texto, avalie as afirmações a seguir:
I. Um mapeamento da exclusão digital no Brasil permite aos
gestores de políticas públicas escolher o público alvo de pos-
síveis ações de inclusão digital.
II. O uso das TICs pode cumprir um papel social, ao prover
informações àqueles que tiveram esse direito negado ou
negligenciado e, portanto, permitir maiores graus de mobi-
lidade social e econômica.
III. O direito à informação diferencia-se dos direitos sociais, uma
vez que estes estão focados nas relações entre os indivíduos e,
aquele, na relação entre o indivíduo e o conhecimento.
IV. O maior problema de acesso digital no Brasil está na defi-
citária tecnologia existente em território nacional, muito
aquém da disponível na maior parte dos países do pri-
meiro mundo.
É correto apenas o que se afirma em:
a) I e II
b) II e IV
c) III e IV
d) I, II e III
e) I, III e IV

–  49  –
Leitura e Escrita na Era Digital

Com esses exemplos, fica evidente a necessidade do ensino para o


entendimento da estrutura formal e, ainda, dos objetivos de cada um dos
diferentes gêneros.

Síntese
Neste capítulo, discutimos a relação dos procedimentos de leitura e
escrita. Chegamos à conclusão de que as duas são interdependentes, ou seja,
uma boa leitura necessita de boas anotações escritas para auxiliar no domí-
nio do conhecimento que se busca.
Foram trabalhados quatro tipos de estruturas textuais de grande utili-
zação no meio acadêmico: o resumo, o esquema, a resenha e o fichamento.
De modo geral, todos podem ser classificados como resumos, cada um pos-
suindo seus próprios objetivos. Enquanto o resumo tem como meta desta-
car todas as ideias essenciais do texto, o esquema destaca somente as pala-
vras‑chave e a resenha é usada para apresentar e avaliar um determinado
texto. Já o fichamento é um texto de controle pessoal das leituras realizadas
para futuras pesquisas a respeito dos conceitos encontrados e para produção
de novos conhecimentos.
Em determinados momentos, é possível produzir um fichamento com-
pleto, no qual o leitor fará um resumo das ideias essenciais, colocará algu-
mas citações diretas e, ainda, deverá fazer uma análise pessoal dos conteúdos
estudados, no estilo de resenha.

–  50  –
3

Construção do texto

Neste capítulo, vamos desvendar os mistérios da cons-


trução do texto. Como vimos no capítulo 1, tudo começa com a
escolha da palavra certa para o contexto certo. Constrói-se, então,
os parágrafos que, uns após os outros, bem costurados pelos ele-
mentos coesivos, tecem esta teia de significados que queremos
transmitir no diálogo com o leitor, que se chama texto.
Leitura e Escrita na Era Digital

Para produzir um bom parágrafo, temos que conhecer a sua estrutura,


compreender a noção de introdução, desenvolvimento e conclusão. Além
disso, é bom diversificar a produção dos parágrafos, utilizando várias estraté-
gias para desenvolvimento do texto.

3.1 Conceito de parágrafo


O parágrafo é uma unidade que transmite uma ideia e tem como inten-
ção atingir um objetivo. São consideradas qualidades suas a unidade, a coe-
rência e a ênfase. Othon M. Garcia define o parágrafo padrão como “uma
unidade de composição constituída por um ou mais de um período, em que
se desenvolve determinada ideia central, ou nuclear, a que se agregam outras,
secundárias, intimamente relacionadas pelo sentido e logicamente decor-
rentes dela” (GARCIA, 2010, p. 203).
A unidade está relacionada com a questão de apresentar apenas uma
ideia central em torno da qual gravitam as ideias secundárias. A coerência
consiste na transposição de um parágrafo para outro, na ordenação das ideias
de maneira lógica. A ênfase tem como característica a escolha das palavras
adequadas, o tamanho dos períodos e a combinação de todos os elementos
para que se consiga produzir um texto fluido, com beleza e força.
Para Garcia, o parágrafo-padrão é composto por três partes, a
introdução, com um ou dois períodos curtos iniciais na qual se apre-
senta de forma sucinta a ideia-núcleo, também chamada de tópico fra-
sal; o desenvolvimento, no qual se faz a explicação, ou argumentação
da ideia-núcleo e a conclusão, que fecha o parágrafo ou remete ao pró-
ximo para acrescentar novas ideias. Deste modo, cada unidade tem a
mesma estrutura do texto. Ou seja, “o princípio que orienta a formação
de um parágrafo é o mesmo que orienta um texto com vários parágra-
fos: há sempre necessidade de introdução, desenvolvimento e conclusão”
(MEDEIROS, 1988, p. 145).
Um procedimento que auxilia a conduzir bem a produção textual é
estabelecer o objetivo de cada parágrafo. Para tal, deve-se perguntar qual é a
finalidade do texto, aonde se quer chegar e a quem se escreve.

–  52  –
Construção do texto

O tópico frasal orienta o desenvolvimento do parágrafo de introdução e


faz com que o autor mantenha-se coerente e não fuja do objetivo estabelecido.
O parágrafo pode variar muito de texto para texto, segundo as intenções
do autor. Os manuais de redação de jornais costumam recomendar tamanho
limite para os parágrafos. Contudo, de maneira alguma ele deve representar
uma “camisa de força” para a produção do texto.
Na verdade, é na divisão do assunto que se afigura o tamanho do pará-
grafo, se há muito ou pouco a dizer em torno da ideia nele desenvolvida.
Depende, também, do gênero produzido, se é uma narração, cujo núcleo é
um incidente; uma descrição, que apresenta fragmentos de paisagem, pes-
soas, ou ambiente em um determinado instante; ou uma dissertação, que
apresenta e discute ideias.
Segundo Geraldi (2003, p. 137), para produzir um texto é necessário ter
em mente algumas posturas, ou seja:
a) o que dizer;
b) uma razão para dizer o que se tem a dizer;
c) para quem dizer o que se tem a dizer;
d) o locutor que se constitua como tal, enquanto sujeito que diz o que
diz para quem diz;
e) escolha de estratégias para realizar.
É apenas nesta circunstância, de efetiva interação, que o autor pode se
tornar um sujeito do que expressa.

3.2 Formas de desenvolvimento do parágrafo


Há inúmeras formas de se iniciar e, em seguida, desenvolver os parágra-
fos. O parágrafo intitulado de tópico frasal deve apenas apontar a questão a
ser desenvolvida, logo, deve ser sintética para que, nos parágrafos seguintes,
seja possível discutir amplamente o tema a ser trabalhado. Um parágrafo deve
retomar o outro e acrescentar uma nova ideia, ou reapresentá-la com novas
colocações, o que os torna interdependentes. Já o parágrafo final deve retomar
o inicial, apresentando soluções e reafirmando a sua linha de discussão.

–  53  –
Leitura e Escrita na Era Digital

O modelo de parágrafo convincente, proposto por Stefhen Toulmin


(2006), na obra Os usos do argumento, é aquele que apresenta três elementos
essenciais, a saber: a afirmação, a informação e a garantia. É possível usar
estes elementos de várias maneiras na construção do parágrafo. No entanto,
a afirmação apresenta a ideia principal, a informação contém os dados que
suportam a afirmação e a garantia é a ligação entre os dois elementos ante-
riores, reforçando a importância da informação para defender a afirmação.
No parágrafo a seguir encontram-se os três elementos:

“Totó certamente pensa que estamos loucos porque paramos o carro


em pleno campo. Corre e late agitadamente como se perguntasse se
há algo de errado” (SERAFINI, 1991, p. 57).

Identificamos a afirmação na frase: “Totó certamente pensa que esta-


mos loucos”; para ser compreendida, ela precisa da informação: “corre e late
agitadamente”, que será reforçada pela garantia: “como se perguntasse se há
algo errado”.
Neste outro exemplo podemos perceber que a garantia não está explí-
cita como no primeiro, mas é facilmente subentendida pelo leitor.

“Artur está nervoso: sua e ri sem parar” (SERAFINI, 1991, p. 57).


2 Afirmação: “Artur está nervoso.”
2 Informação: “sua e ri sem parar.”
2 Garantia: subentende-se que estas são características que
expressam seu nervosismo.

Possuindo consciência destes elementos podemos, então, usar as várias


formas de desenvolvimento de um parágrafo. Entre elas, destacam-se as
seguintes: por tempo e espaço; enumeração de pormenores ou fatos; contraste
de ideias; razões, causas e consequências; explicitação; analogias, comparação
e metáforas; resposta a uma interrogação; citações diretas ou indiretas.

–  54  –
Construção do texto

Leia o texto a seguir para identificar os diferentes tipos de desenvolvi-


mento de parágrafos.

Homo connectus
Uma charge em recente número da revista The New Yorker mos-
trava uma animada mulher, ao telefone, convidando os amigos para
uma festinha em sua casa. “Vai ser daquelas reuniões com todo mundo
olhando para seu iPhone”, ela diz.
O leitor captou? A leitora achou graça? Cartunistas são mais
rápidos do que antropólogos e mais diretos do que romancistas.
Captam o fenômeno quase no momento mesmo em que vem à luz.
O fenômeno em questão é o poder magnético dos iPhones,
­ lackBerries e similares. O ato de compra desses aparelhinhos é um
B
contrato que vincula mais que casamento. As pessoas se obrigam a
partilhar a vida com eles.
Na charge da New Yorker, a mulher estava convidando para uma
festa em que, ela sabia – e até se entusiasmava com isso –, as pessoas
ficariam olhando para seus iPhones ainda mais do que umas para as
outras. É assim, desde a sensacional erupção dos tais aparelhinhos, e
não só nas ocasiões sociais.

Até nas sessões do Supremo


O mesmo ocorre nas reuniões de trabalho. Chegam os partici-
pantes e cada um já vai depositando à mesa o respectivo smartphone
(o nome do gênero a que pertencem as espécies). Dali para frente será
um olho lá e outro cá, um na reunião e outro na telinha. Não dá para
desgarrar dela. De repente pode chegar uma mensagem, aparecer uma
notícia importante, surgir a necessidade de uma consulta no Google.
O que vale para reuniões sociais e de trabalho vale também
para as sessões do Supremo Tribunal Federal. Quem assistiu pela TV
­Justiça, na semana passada, ao início do julgamento das competências
do Conselho Nacional de Justiça, assistiu a uma cena exemplar.

–  55  –
Leitura e Escrita na Era Digital

Falava o representante da Associação dos Magistrados Bra-


sileiros. A TV Justiça, com seu apego pela câmera parada, modelo
­Jean-Luc Godard, enquadrava o orador e, atrás dele, quatro cadeiras
da primeira fila da assistência.
Três delas estavam ocupadas, a primeira por uma moça que, coi-
tada, não conseguia se livrar de um ataque de espirros, e as outras duas
por cavalheiros cujo tormento, igualmente compulsivo, era não conseguir
se livrar dos smartphones. (Se o leitor ainda não se deu conta, o melhor, na
TV Justiça ou na TV Câmara, é observar o que se passa ao fundo.)
Os dois cavalheiros apresentavam reações características
do  Homo connectus. Um olho lá, outro cá. De vez em quando, um
deles guardava o telefoninho no bolso. Será que agora vai sossegar?
Não; minutos depois, sacava-o de novo. E se chega uma mensagem?
Uma notícia?
Às vezes o smartphone exigia mais que um simples olhar. Reque-
ria o afago dos dedos, naquele gesto que antes servia para espanar uma
sujeirinha na roupa, e hoje é o modo de conversar com a telinha.
Quando o representante da Associação dos Magistrados termi-
nou o discurso, veio ocupar a cadeira que estava vazia. Agora era sua
vez! Sacou o smartphone e, olho lá e olho cá, ele o põe no bolso, tira,
olha, consulta de novo, enquanto o orador seguinte se apresentava.
Silenciosos, os smartphones são socialmente mais aceitáveis
O telefoninho esperto vem provocando decisivas alterações na
ordem das coisas. O ser humano é instigado a desenvolver novas habi-
lidades, como a de tocar na tela e conduzi-la ao fim desejado, sem que
desande, furiosa e insubmissa.
Implantam-se novos hábitos sociais. No tempo do celular puro
e simples, aquele bicho que só telefonava, havia restrições a seu uso.
Não em ambientes mais debochados, como a Câmara dos Deputados,
por exemplo, onde sempre foi e continua a ser usado sem peias.
Em lugares de maior compostura, os celulares são evitados por-
que fazem barulho – disparam a tocar campainhas ou musiquinhas e
só permitem comunicação via voz. Já os smartphones podem ser desa-
tivados na função telefone, mas continuar, em respeitoso silêncio, na
função telinha.

–  56  –
Construção do texto

Daí serem socialmente mais aceitáveis. Há uma grande desvan-


tagem, porém. O aparelhinho parte a pessoa ao meio. Metade dela
está na festa, metade no smartphone. Concluída sua oração, metade
do senhor da Associação dos Magistrados continuou na sessão do
Supremo, metade evadiu-se para o aparelhinho.
Pode ser que o aparelhinho lhe tenha trazido informações fun-
damentais para sua causa. Mas pode ser também que tenha perdido
informações fundamentais, ao não acompanhar o orador seguinte.
Qual o remédio, para a divisão da pessoa em duas, metade ela mesma,
metade seu smartphone?
Se abrir mão do aparelhinho está fora de questão, como fazer?
Abrir mão do aparelhinho, depois de todas as facilidades que
trouxe, está fora de questão. Se é para abrir mão de um dos dois lados,
que seja o da pessoa. Por exemplo: inventando-se um smartphone
capaz de sugá-la e reproduzi-la em seu bojo. As reuniões sociais, as de
trabalho e as sessões do Supremo seriam feitas só de smartphones, sem
a intermediação humana.
Delírio? O leitor esquece-se do que a Apple é capaz.
E se chega uma mensagem? Uma notícia?
TOLEDO, R. P. de. Homus connectus. Disponível em: <http://veja.
abril.com.br/blog/ricardo-setti/tema-livre/roberto-pompeu-de-
toledo-homo-connectus/>. Acesso em: 1 ago. 2012. © Editora Abril

Passaremos agora a identificar os diferentes tipos de desenvolvimento


de parágrafos tendo como suporte o texto acima.

3.2.1 Desenvolvimento por tempo e espaço


Ao redigir, muitas vezes utilizamos a apresentação do quando e do
onde, respectivamente, o tempo e o lugar dos fatos e ideias discutidas. Há
várias palavras que dão a noção de tempo e lugar. Tempo: agora, antes,
afinal, após, enfim, frequentemente. Lugar: aqui, ali, ao lado de, abaixo de,
defronte, além.

–  57  –
Leitura e Escrita na Era Digital

“Uma charge em recente número da revista  The New


Yorker  mostrava uma animada mulher, ao telefone, convidando os
amigos para uma festinha em sua casa. “Vai ser daquelas reuniões
com todo mundo olhando para seu iPhone”, ela diz. [...] Dali para
frente, será um olho lá e outro cá, um na reunião outro na telinha. [...]
Quem assistiu pela TV Justiça, na semana passada, ao início do jul-
gamento das competências do Conselho Nacional de Justiça, assistiu
a uma cena exemplar” (TOLEDO, 2012, grifo nosso).

3.2.2 Desenvolvimento por enumeração


de pormenores ou fatos
A enumeração pode ser feita com expressões próprias da ideia de enume-
rar, como: em primeiro lugar, a segunda, na fase inicial, na sequência. É possí-
vel, ainda, escrever os fatos em sequência natural, que dá também esta noção.

“A TV Justiça, com seu apego pela câmera parada, modelo


Jean‑Luc Godard, enquadrava o orador e, atrás dele, quatro cadei-
ras da primeira fila da assistência. Três delas estavam ocupadas, a
primeira por uma moça que, coitada, não conseguia se livrar de um
ataque de espirros, e as outras duas por cavalheiros cujo tormento,
igualmente compulsivo, era não conseguir se livrar dos smartphones.
[...] Agora era sua vez! Sacou o smartphone e, olho lá e olho cá, ele
o põe no bolso, tira, olha, consulta de novo, enquanto o orador
seguinte se apresentava” (TOLEDO, 2012, grifo nosso).

3.2.3 Ordenação do parágrafo


mediante contraste de ideias
O contraste tem por meta evidenciar as diferenças entre as ideias apre-
sentadas. Pode-se contrastar elemento por elemento ou se dizer tudo sobre
um fato ou objeto e depois sobre o outro. Depende do estilo que se quer dar

–  58  –
Construção do texto

ao texto. Algumas palavras que evidenciam o contraste são: aqui, lá, ao con-
trário, mas e no entanto.
No exemplo a seguir, temos uma contradição de ideias em torno do
mesmo objeto:

“O leitor captou? A leitora achou graça? Cartunistas são mais


rápidos do que antropólogos e mais diretos do que romancistas.
Captam o fenômeno quase no momento mesmo em que vem à luz.”
[...] Pode ser que o aparelhinho lhe tenha trazido informações
fundamentais para sua causa. Mas pode ser também que tenha
perdido informações fundamentais, ao não acompanhar o orador
seguinte. Qual o remédio, para a divisão da pessoa em duas, metade
ela mesma, metade seu smartphone?” (TOLEDO, 2012, grifo nosso).

3.2.4 Ordenação do parágrafo por


razões, causas e consequências
Este é um processo muito presente nos parágrafos dissertativos, uma vez
que o autor quer convencer, persuadir o leitor. Muitas são as palavras e expres-
sões que relacionam causas e consequências: com efeito, portanto, como con-
sequência, por conta disso, pois, por isso. Vejamos o exemplo a seguir.

“O telefoninho esperto vem provocando decisivas alterações


na ordem das coisas. O ser humano é instigado a desenvolver novas
habilidades, como a de tocar na tela e conduzi-la ao fim desejado,
sem que desande, furiosa e insubmissa. Implantam-se novos hábitos
sociais. No tempo do celular puro e simples, aquele bicho que só tele-
fonava, havia restrições a seu uso” (TOLEDO, 2012, grifo nosso).

3.2.5 Ordenação por explicitação


Explicitar é esclarecer, definir, justificar, exemplificar. As definições
incluem o verbo ser ou outras expressões, como: não só, mas também, ou

–  59  –
Leitura e Escrita na Era Digital

seja. Os exemplos são ilustrativos, buscam na realidade elementos concretos,


fatos ocorridos para concretizar a ideia que se apresenta. Palavras que intro-
duzem a exemplificação: por exemplo, como tal.

“Uma charge em recente número da revista The New Yorker [...].


Qual o remédio, para a divisão da pessoa em duas, metade ela mesma,
metade seu smartphone? Abrir mão do aparelhinho, depois de todas as
facilidades que trouxe, está fora de questão. Se é para abrir mão de um dos
dois lados, que seja o da pessoa. Por exemplo: inventando-se um smar-
tphone capaz de sugá-la e reproduzi-la em seu bojo. As reuniões sociais, as
de trabalho e as sessões do Supremo seriam feitas só de ­smartphones, sem
a intermediação humana” (TOLEDO, 2012, grifo nosso).

3.2.6 Desenvolvimento por analogia,


comparação e metáfora
Para tal, o autor vale-se de palavras ou ideias que estabelecem seme-
lhanças no caso da analogia e comparação. São palavras comparativas: como,
assim como, do mesmo modo, da mesma forma. A analogia é “um fenômeno
de ordem psicológica, que consiste na tendência de nivelar palavras ou cons-
truções que de certo modo se aproximam pela forma ou pelo sentido, levando
uma delas a se modelar por outra” (LIMA apud GARCIA, 2010, p. 219).
Por esta capacidade de instaurar um princípio de identidade entre elementos
desiguais, a analogia aproxima-se de figuras como a alegoria, a comparação e
a metáfora. Na metáfora, a comparação não necessita das palavras compara-
tivas, como vemos no exemplo a seguir.

“O fenômeno em questão é o poder magnético dos iPhones,


BlackBerries e similares. O ato de compra desses aparelhinhos é um
contrato que vincula mais que casamento. As pessoas se obrigam
a partilhar a vida com eles. [...] O telefoninho esperto vem provo-
cando decisivas alterações na ordem das coisas” (TOLEDO, 2012,
grifo nosso).

–  60  –
Construção do texto

3.2.7 Desenvolvimento por perguntas


A pergunta serve para chamar a atenção do leitor e será respondida no
decorrer do texto. É uma pergunta retórica porque não exige resposta; seu
objetivo é forçar o leitor a respondê-la mentalmente e avaliar suas implica-
ções. Quintiliano (35-100 d.C.), retórico romano, afirmou que as perguntas
retóricas aumentam a força e a irrefutabilidade da prova.

“O leitor captou? A leitora achou graça? [...] Qual o remédio,


para a divisão da pessoa em duas, metade ela mesma, metade seu
smartphone? [...] Delírio? O leitor esquece-se do que a Apple é capaz.”
(TOLEDO, 2012, grifo nosso).

3.2.8 Desenvolvimento por citações


diretas ou indiretas
A citação caracteriza-se como um argumento de autoridade e é lar-
gamente utilizada para reforçar o ponto de vista. Se direta, deve-se colocar
entre aspas, se não, faz-se uma paráfrase. No texto em questão, o autor faz
uma citação indireta ao referir-se ao diretor de cinema:
Há uma citação direta na introdução, como vemos a seguir.

“‘Vai ser daquelas reuniões com todo mundo olhando para seu
iPhone’, ela diz” (TOLEDO, 2012, grifo nosso).

Para se chegar ao final de um parágrafo ou de um texto, vários caminhos


foram trilhados:
� escolheu-se o tema;
� delimitou-se o assunto;
� traçou-se o objetivo do texto;
� fez-se a introdução do texto;
� desenvolveu-se o texto com diferentes tipos de parágrafos possíveis.

–  61  –
Leitura e Escrita na Era Digital

Chegou o momento do parágrafo de conclusão. Nele pode-se fazer uma


revisão dos aspectos apresentados no desenvolvimento e ainda reforçar o
ponto de vista do autor. Deve-se evitar usar as expressões “em minha opinião”,
“no meu ponto de vista” ou “acho que” uma vez que isso já está implícito.
Portanto, quando se domina as estratégias de construção de parágrafos
tornam-se evidentes as três qualidades fundamentais do mesmo: a unidade,
a coerência e a ênfase.

Reflita
A arte de escrever
Há, portanto, uma arte de escrever – que é a redação.
Não é uma prerrogativa dos literatos, senão uma ativi-
dade social indispensável, para a qual falta, não obstante,
muitas vezes, uma preparação preliminar.
A arte de falar, necessária à exposição oral, é mais fácil,
na medida em que se beneficia da prática da fala coti-
diana, de cujos elementos partem em princípio.
O que há de comum, antes de tudo, entre a exposição
oral e a escrita, é a necessidade da boa composição, isto
é, uma distribuição metódica e compreensível de ideias.
Impõe-se igualmente a visualização de um objetivo defi-
nido. Ninguém é capaz de escrever bem se não sabe
bem o que vai escrever.
Justamente por causa disso, as condições para a reda-
ção, no exercício da vida profissional ou no intercâm-
bio amplo dentro da sociedade, são muito diversas das
da redação escolar. A convicção do que vamos dizer,
a importância que há em dizê-lo e o domínio de um
assunto da nossa especialidade destituem a redação do
caráter negativo de mero exercício formal, como tem na
escola. Qualquer um de nós, senhor de um assunto,
é, em princípio, capaz de escrever sobre ele. Não há
–  62  –
Construção do texto

um jeito especial para a redação, ao contrário do que


muita gente pensa.
Há apenas uma falta de preparação inicial, que o esforço
e a prática vencem. Por outro lado, a arte de escrever,
na medida em que consubstancia a nossa capacidade de
expressão do pensar e do sentir, tem de firmar raízes na
nossa própria personalidade e decorre, em grande parte,
de um trabalho nosso para desenvolver a personalidade
por este ângulo. […]
A arte de escrever precisa assentar em uma atividade pre-
liminar já radicada, que parte do ensino escolar e de um
hábito de leitura inteligentemente conduzido; depende
muito, portanto, de nós mesmos, de uma disciplina men-
tal adquirida pela autocrítica e pela observação cuidadosa
do que outros com bom resultado escreveram.
CAMARA JR., J. M. Manual de expressão oral
& escrita. Petrópolis: Vozes, 1983. p. 29.

Da teoria para a prática


É importante que os cidadãos brasileiros saibam que, nas Diretrizes
­Curriculares Nacionais para o Ensino Fundamental (BRASIL, 2010, p. 2-3),
vamos encontrar, no Art. 7°, a seguinte determinação:
De acordo com esses princípios, e em conformidade com o
art. 22 e o art. 32 da Lei nº 9.394/96 (LDB), as propostas cur-
riculares do Ensino Fundamental visarão desenvolver o edu-
cando, assegurar-lhe a formação comum indispensável para
o exercício da cidadania e fornecer-lhe os meios para pro-
gredir no trabalho e em estudos posteriores, mediante os
objetivos previstos para esta etapa da escolarização, a saber:
I – o desenvolvimento da capacidade de aprender, tendo
como meios básicos o pleno domínio da leitura, da escrita
e do cálculo;

–  63  –
Leitura e Escrita na Era Digital

II – a compreensão do ambiente natural e social, do sistema


político, das artes, da tecnologia e dos valores em que se fun-
damenta a sociedade;
III – a aquisição de conhecimentos e habilidades, e a forma-
ção de atitudes e valores como instrumentos para uma visão
crítica do mundo;
IV – o fortalecimento dos vínculos de família, dos laços de
solidariedade humana e de tolerância recíproca em que se
assenta a vida social. (grifo nosso).

Desse modo, o princípio fundamental para tornar-se um cidadão, com


inserção no mercado de trabalho e nos espaços sociais, é o domínio da escrita
e da leitura com conhecimento dos gêneros textuais, ou seja, dos vários tipos
de escrita para cada situação social que possibilitarão a interação e comuni-
cação nos espaços sociais.
Ler e escrever são, portanto, compromissos de todos, em todas as áreas;
transforma-se em um projeto multidisciplinar, pois, em ciências, é possível
extrapolar os conceitos cristalizados pela linguagem científica; em matemá-
tica, transitar suas diferentes linguagens: aritmética, geométrica, algébrica,
gráfica; em geografia, fazer trabalho de campo e realizar pesquisa bibliográ-
fica variada; em história, trabalhar exemplares de todo tipos: cartas, decre-
tos, escrituras, notícias, legislação variada, diários de viagem, documentos
pessoais. No entanto, a realidade nos mostra que, nos primeiros anos dos
cursos superiores de diversas áreas, a falta de domínio da escrita e seus gêne-
ros textuais é evidente. Por esse motivo, há pesquisas para a implantação do
“letramento acadêmico” no ensino superior, para que todos possam transitar
pelo meio acadêmico usando a língua escrita com qualidade e eficiência.

Dica de filme
O filme Escritores da liberdade traz essa concepção na
prática. A professora assume uma escola totalmente
adversa, composta por alunos de diferentes culturas, eco-
nomicamente carentes e vivendo em locais extremamente
violentos, dominados pela droga. É uma história real e a
personagem principal adota a metodologia dos gêneros
textuais para resgatar a vida e a atenção dos adolescentes.
–  64  –
Construção do texto

Inicia com a escrita de um diário, faz a leitura de um livro de


memórias e vai construindo um sentido na vida de todos.
Escritores da liberdade é baseado no best-seller O diário
dos escritores da liberdade.
ESCRITORES da liberdade. Direção de Richard La­Gravenese.
Estados Unidos: Paramount Pictures, 2007. 1 filme (122 min),
sonoro, legenda, color., 35 mm.

Síntese
Neste capítulo, estudamos a estrutura do parágrafo. Percebemos que se
trata de uma unidade de comunicação composta por introdução, desenvolvi-
mento e conclusão. Quanto maior for a nossa intenção comunicativa, a fina-
lidade de nossa interlocução, mais ideias precisamos apresentar e, portanto,
mais parágrafos, uma vez que cada parágrafo é responsável pelo transporte
de uma ideia. Ideias novas, novos parágrafos.
A introdução do parágrafo – o tópico frasal – e a do texto deve ser obje-
tiva, concisa e precisa, para que o leitor entenda o que queremos transmitir e
como iremos defender nossas ideias nos outros parágrafos, que serão escritos
com uma relação de interdependência.
Para desenvolver os parágrafos, podemos usar vários formatos. Entre
eles destacamos o uso de tempos e espaços, causas e consequências, exem-
plos, definições, enumerações, contrastes e analogias e interrogações. Não se
pode esquecer que o último parágrafo é o fecho e deve retomar a tese apre-
sentada no tópico frasal. Quanto maior o número de estratégias utilizadas,
mais claro e convincente será o nosso diálogo com o leitor.

–  65  –
4

Tecendo os parágrafos

Neste capítulo, vamos continuar com a tessitura do texto


como uma unidade linguística concreta que busca uma interação
comunicativa entre leitor e escritor, ouvinte e falante.
Trataremos de dois conceitos fundamentais para a cons-
trução da unidade e do sentido do texto: a coerência e a coesão.
Estes dois aspectos caminham juntos como dois fatores interde-
pendentes, pois, para haver coerência, é necessária a coesão que,
por seu lado, promove a coerência.
Leitura e Escrita na Era Digital

No entanto, no ato da escrita ou fala pode acontecer de se produzir um


texto com todos os recursos de coesão e, ainda assim, ele não ser coerente, ou
produzir um texto coerente mesmo sem a coesão.
Vamos ao estudo de cada um desses conceitos, com suas particularida-
des, para adentrar no mundo do bom texto.

4.1 Coerência textual


É importante pensar, antes de discutir coerência textual, sobre o signifi-
cado que esta palavra transmite. Segundo o dicionário on-line Caldas Aulete,
coerência é:
1. Relação lógica e harmônica entre ideias, atos, situações;
lógica, nexo. Ex. A coerência do depoimento com os fatos
reais. A coerência entre o discurso e a prática.
2. Qualidade, condição, estado do que tem coerência.
Conhecendo suas ideias, é notória a coerência de seus atos.
3. Lógica interna entre os elementos de um sistema, como
entre argumentos, ideias, ações etc., ausência de contradi-
ções ou paradoxos entre eles: Seus textos são todos de uma
grande coerência.
4. Prevalência de uma uniforme maneira de alguém pensar,
proceder, julgar, etc. (AULETE, 2012, s. p., grifos nossos).

Logo, a coerência enquanto qualidade está presente no imaginário cole-


tivo como algo que se deve ter para ser levado a sério pelos outros, uma vez
que, sem ela, fica-se confuso, alienado, não se é entendido. Por este motivo,
é comum ouvirmos alguns comentários, como “Nossa, como você é incoe-
rente” ou “O que você está dizendo não tem sentido”, entre outros.
Assim, coerência textual é o atributo responsável pelo estabelecimento
do sentido produzido pelos leitores no ato da leitura. Deve encontrar-se tanto
em quem escreve quanto em quem lê, em outras palavras, ela desenvolve-se
no entrelugar autor-texto-leitor durante o ato de leitura. Ou seja, tem-se a
coerência interna – projetada no processo de produção do texto, na codifica-
ção – e a coerência externa, que ocorre no encontro do leitor com o texto no
processo de decodificação e interpretação.

–  68  –
Tecendo os parágrafos

A coerência interna é centrada no escritor e na compatibilidade entre o


texto como um todo e as partes que o compõem, e concretiza-se na interação
que se estabelece durante o ato de leitura, logo ela existe antes da leitura,
como potencial do texto, sendo concretizada durante e após este ato. A inco-
erência ocorre motivada por vários fatores, como problemas de acentuação,
ortografia, junção das frases e parágrafos, uso inadequado de vocabulário,
aspectos relacionados à coesão textual e que comprometem a lógica na expo-
sição das ideias.

João Carlos vivia em uma pequena casa construída no alto de


uma colina árida, cuja frente dava para o leste. Desde o pé da colina se
espalhava em todas as direções, até o horizonte, uma planície coberta
de areia. Na noite em que completava 30 anos, João, sentado nos
degraus da escada colocada à frente de sua casa, olhava o sol poente e
observava como a sua sombra ia diminuindo no caminho coberto de
grama. De repente, viu um cavalo que descia para sua casa. As árvo-
res e as folhagens não lhe permitiam ver distintamente; entretanto,
observou que o cavalo era manco. Ao olhar de mais perto, verificou
que o visitante era seu filho Guilherme, que há 20 anos tinha partido
para alistar-se no Exército; e, em todo esse tempo, não havia dado
sinal de vida. Guilherme, ao ver o pai, desmontou imediatamente,
correu até ele, lançando-se nos seus braços e começando a chorar
(KOCK; TRAVAGLIA, 1990, p. 32).

O que torna incoerente, sem sentido, o texto destacado anteriormente,


não é apenas a extensão que ele possui, mas sua inaceitabilidade. Ele contém
profundas contradições, entre elas: João tem trinta anos e seu filho tinha
partido há vinte, com 18 anos; a planície era coberta de areia e depois coberta
de grama; ele morava no alto da colina e o cavalo descia para chegar, etc. No
entanto, apesar de todas estas contradições, o texto poderia, numa leitura
desatenta, passar por um texto coerente.
Portanto, ao se escrever um anúncio, um cartaz, um recado, a leitura
atenta deve ser redobrada – para evitar erros e não provocar confusão na
lógica do texto – e efetivada pelo leitor.

–  69  –
Leitura e Escrita na Era Digital

HAAP Media Ltd/Michal Zacharzewski

HAAP Media Ltd/Ilker


Restaurante
beira mar
Aberto todos os dias!
Descanso semanal: segunda-feira

No primeiro anúncio, pode-se entender também que domingo não é


dia e, no segundo, que um dia você trabalha descansando.
A coerência externa está centrada no leitor. Ele, porém, pode não enten-
der o que o texto quer dizer e não conseguir compreender a lógica do autor,
por mais que a coerência interna tenha sido bem arquitetada. Desta forma, o
leitor considerará o texto incoerente.
Conforme vimos nos exemplos dados, muitas vezes textos mal elabora-
dos acabam afirmando algo diferente da real intenção do autor. Outra possi-
bilidade é de que o leitor não domine a linguagem utilizada pelo autor ou não
conheça o contexto no qual e para o qual o texto foi produzido. Para Koch e
Travaglia (1990, p. 61), “o conhecimento de mundo é visto como uma espécie
de dicionário enciclopédico do mundo e da cultura arquivado na memória”.
A coerência, portanto, longe de constituir “mera qualidade ou pro-
priedade do texto, é resultado de uma construção feita pelos interlocutores,
numa situação de interação dada, pela atuação conjunta de uma série de fato-
res de ordem cognitiva, situacional, sociocultural e interacional” (KOCH;
­TRAVAGLIA apud KOCH, 2005, p. 52).
Cada tipo de texto tem sua estrutura própria, por isso, os mecanismos
de coerência e de coesão (esta sendo uma costura entre as partes do texto
que se faz com uso de elementos conectores, os quais englobam numerais,
artigos, conjunções, pronomes entre outras classes gramaticais) também vão
se manifestar de forma diferente, conforme se trate de um texto narrativo,
descritivo ou dissertativo-argumentativo.

–  70  –
Tecendo os parágrafos

No texto narrativo, a coerência está relacionada com a ordem tempo-


ral, cronológica, adotada para apresentar os fatos.

[...] as vidas não começam quando as pessoas nascem, se assim


fosse, cada dia era um dia ganho, as vidas principiam mais tarde,
quantas vezes tarde demais, para não falar naquelas que, mal tendo
começado já se acabaram. [...] Ah, quem escreverá a história do que
poderia ter sido? (SARAMAGO, 1988, p. 16).

Neste fragmento, Saramago afirma que “as vidas não começam”, na


sequência diz “as vidas principiam mais tarde”, depois “tarde demais” e “mal
tendo começado já se acabaram”. Isso nos dá uma noção evidente de sequen-
cialidade dos fatos.
No texto descritivo, a coerência está relacionada em função de uma
ordem espacial das características daquilo que se descreve, seja uma pessoa,
um cenário, um objeto. A coerência se dá quando o leitor consegue visuali-
zar, com a forte adjetivação das cores, volume, odor, textura, dimensões, o
todo a partir dessas características.

[…] algumas características […] sinais importantes […] vamos


descrever. Observem os olhos, que têm a prega nos cantos, e a pálpebra
oblíqua […] o dedo mindinho das mãos, arqueado para dentro […]
achatamento da parte posterior do crânio […] a hipotonia muscular
[…] a baixa implantação da orelha e […] (TEZZA, 2008, p. 45).

Cristóvão Tezza, nesta descrição, nos faz uma apresentação biológica


fotográfica do personagem (seu filho), uma criança com Síndrome de Down.
No texto dissertativo-argumentativo, é muito importante para a coe-
rência a ordem lógica das ideias. Na dissertação, são apresentados argumen-
tos, dados, opiniões, a fim de defender uma ideia ou questionar um assunto.
Para tal, é necessário usar adequadamente conectivos específicos para expres-
sar a causa, finalidade, conclusão, condição, etc. É importante, também, que
a argumentação esteja de acordo com a tese levantada e a conclusão deve ser
a decorrência lógica dessa argumentação.

–  71  –
Leitura e Escrita na Era Digital

A contemporaneidade se caracteriza pelo tempo abreviado.


Falta de tempo. Falta de tempo de ler e de escrever. Falta de contato
com textos e contextos que incentivem a leitura como experiência.
Nela vivemos o paradoxo: muito se fala sobre leitura, muito se pro-
põe, mas os livros mais vendidos continuam sendo os didáticos. No
Brasil, em mais de 90% dos municípios não há livrarias, além de serem
muito precárias ou quase inexistirem as bibliotecas.
Quando não é assim, a quantidade de textos e de estímulos
acentua a leitura interrompida. Aos poucos e cada vez mais, além da
incompletude que marca o ato de ler, faz-se uma leitura fragmentada.
E aqui é preciso diferenciar a escrita em fragmentos (onde cada parte,
como uma ruína no sentido benjaminiano, contém as leis do todo) da
fragmentação a que assistimos, que nos afeta e que praticamos. Frag-
mentação também da leitura. Leem-se pedaços de textos cada vez mais
curtos, mensagens, trechos, resumos, informações. De que maneira as
crianças e os jovens respondem a todas essas transformações?
Em geral, a leitura impressiona de modo diferente aquele que lê se
é feita na juventude ou na maturidade, ainda que as ideias, ações, valo-
res e sentimentos possam ir se plantando mesmo se o leitor disso não se
dá conta. Mas na vida contemporânea há tempo e espaço para leituras
que sejam feitas como experiência? Há livros disponíveis e políticas cul-
turais que favoreçam tais práticas? (KRAMER, 2000, p. 20).

Essa é uma reflexão pertinente para todos os usuários da língua uma vez
que, se não houver tempo e espaço para a leitura em nosso cotidiano, haverá
um apagão da leitura. Para que isso não ocorra, é importante a presença de
políticas públicas de incentivo à leitura, o que responde a pergunta feita por
Sonia Kramer.
Seis são os tipos de coerência, segundo Koch e Elias (2006, p. 23): sintá-
tica, semântica, temática, pragmática, estilística e genérica.
1. Coerência sintática: depende do conhecimento linguístico dos
usuários da língua. Exige o domínio do léxico, do uso dos conecti-
vos, o respeito à ordem dos elementos da frase.

–  72  –
Tecendo os parágrafos

2. Coerência semântica: evidencia-se pelo uso adequado das pala-


vras ou expressões e suas relações de sentidos produzidos no
texto.
3. Coerência temática: ocorre quando os enunciados presentes no
texto são importantes para o tema que se está discutindo.
4. Coerência pragmática: precisa que em uma sequência de atos de
fala eles estejam relacionados adequadamente, não podendo em
um mesmo ato realizarem-se diferentes ações, como perguntar e
dar ordem, ou dar ordem e cantar.
5. Coerência estilística: depende das situações interativas em que
o usuário da língua irá se encontrar. Para cada uma há um estilo
apropriado que deve ser respeitado.
6. Coerência genérica: recai sobre as características do gênero tex-
tual, como finalidade, conteúdo, estilo e forma em conformidade
com a prática social a ser realizada.
Portanto, o que se busca com a coerência é a unidade do texto. Inde-
pendentemente da forma que o autor dá a ele, se houver unidade de sentido,
haverá coerência. Veja, a seguir, um exemplo de texto que tem um conjunto
aleatório de referências e, mesmo assim, consegue deixar evidente o sentido.

— Que pão!
Doce? de mel? de açúcar? de ló? de mico? de trigo? de mistura?
de rapa? de saruga? de soborralho? do céu? dos anjos? brasileiro? fran-
cês? italiano? alemão? do Chile? de forma? de bugio? de porco? de gali-
nha? de pássaros? de minuto? ázimo? bento? branco? dormindo? duro?
sabido? saloio? seco? segundo? nosso de cada dia? ganho com o suor do
rosto? que o diabo amassou?

ANDRADE, C. D. A eterna imprecisão da linguagem.


In: SILVEIRA, M. H. A. Comunicação, expressão e
cultura brasileira. Petrópolis: Vozes, 1971. n. 3.

–  73  –
Leitura e Escrita na Era Digital

Neste texto, a coerência foi possível a partir do título proposto por


Drummond ao leitor e comprovada com a enumeração de várias palavras e
expressões que se aproximam e se afastam no sentido.

4.2 Coesão textual


Para que um texto não seja um amontoado de frases e parágrafos, há
necessidade de se realizar a costura destas partes que o formam. A costura
é feita com elos que promovem a transição de uma frase para outra, de um
parágrafo para outro, de uma ideia para outra. Algumas vezes, o elo retoma o
que já foi dito e, outras vezes, sugere o acrescentar de novas ideias. Ou seja, é
um processo de olhar para trás e para adiante. A coesão ocorre, então, dentro
da frase e entre as frases e parágrafos.
Koch e Travaglia (1990, p. 13) conceituam a coesão como “o fenômeno
que diz respeito ao modo como os elementos linguísticos presentes na super-
fície textual se encontram interligados, por meio de recursos também lin-
guísticos, formando sequências veiculadoras de sentido”. Para Platão e Fiorin
(1996, p. 35), a coesão textual “é a ligação, a relação, a conexão entre as pala-
vras, expressões ou frases do texto.”
Para se produzir a coesão, é necessário utilizar os recursos do sistema
léxico-gramatical da língua. Ora serão utilizados recursos da gramática, ora
do léxico. Os autores Halliday e Hasan elencam várias possibilidades de se
fazer a coesão como por meio de referência, substituição, elipse, conjunção
e, ainda, lexicalmente entre um elemento do texto e algum outro elemento
importante para a sua interpretação (KOCH, 1990, p. 18).
A seguir, apresentaremos os elementos mais importantes a serem
empregados para assegurar a coesão.

4.2.1 Coesão referencial


A referência é feita por pronomes pessoais, possessivos, demonstrativos
ou advérbios e expressões adverbiais que indicam localização. Observe os
exemplos a seguir.

–  74  –
Tecendo os parágrafos

2 O estádio é um dos melhores da cidade. Seus dirigentes se preo-


cupam muito com a limpeza e segurança. Ele recebeu o prêmio
destaque esportivo 2011.
2 Há uma grande diferença entre João e José. Este guarda rancor de
todos, enquanto aquele tende a perdoar.
2 Não podíamos deixar de ir ao Louvre. Lá está a obra-prima de
Leonardo da Vinci, a Mona Lisa.
2 Vamos fazer um exercício que é igual ao de ontem.

4.2.2 Coesão por substituição


A substituição é usada quando a referência não é idêntica e um item pode
ser colocado em lugar de outro, ou de uma frase inteira. Observe os exemplos.
2 Margarete comprou uma camisa cor-de-rosa, mas Cristina prefe-
riu uma vermelha.
2 O padre ajoelhou-se. Todos fizeram o mesmo.
2 Mate um frango ativo e roliço. Prepare-o e corte-o. Asse-o
durante uma hora.

4.2.3 Coesão lexical


A coesão lexical depende da utilização de palavras já ditas, com o uso
de sinônimos, hiperônimos, nomes genéricos ou palavras do mesmo campo
semântico (ou seja, são palavras diferentes, mas que se aproximam pelo sen-
tido, como no caso aluno/estudante; quadrados/retângulos, losangos/qua-
driláteros). Podemos afirmar que se designa como semântica a ciência que se
preocupa com o significado das manifestações linguísticas que é construído
pelas informações culturais. Observe os exemplos:
2 repetição – O diretor entrou na sala. O diretor estava atrasado.
2 sinônimo – A secretária entrou na sala. A secretária estava
atrasada.

–  75  –
Leitura e Escrita na Era Digital

2 hiperônimo – Pedro desenhou quadrados, retângulos e losangos.


Os quadriláteros estavam corretos.
2 nome genérico – Pedro desenhou quadrados, retângulos e losan-
gos. As figuras geométricas estavam corretas.
2 palavras do mesmo campo – A empresa estava aberta. Dezenas de
diretores e funcionários circulavam nos corredores.

4.2.4 Coesão por elipse


Os pronomes, os verbos, os nomes e sentenças, em muitas frases, podem
estar implícitos e não precisam ser repetidos. Observe os exemplos.
2 Eles acordaram e [...] viajaram. (pronome – eles)
2 O ministro foi o primeiro a chegar. [...] Abriu a sessão às oito em
ponto e [...] fez então seu discurso emocionado. (nome – ministro)
2 Eu comprei camisas, minha irmã, [...] saias. (verbo – comprou)
2 Você já leu todo o livro? – Li. (frase – já li todo o livro)

4.2.5 Coesão por conjunção


As conjunções estabelecem relações significativas específicas entre
os elementos do texto. São conectores responsáveis pelo encadeamento
entre orações ou partes do texto, estabelecendo relações de sentido.
Observe os exemplos.
2 Fomos ao Rio de Janeiro. Depois, jantamos em Petrópolis.
2 Não adianta tomar atitudes radicais nem fazer de conta que o pro-
blema não existe.
2 Você devia estar preocupado com seu futuro, isto é, com a sua
sobrevivência.
2 Não estou descontente com seu desempenho, mas com sua
arrogância.

–  76  –
Tecendo os parágrafos

4.2.6 Sentidos estabelecidos pelos conectivos


4.2.6.1 Conectivos coordenativos
São realizados pelas conjunções coordenadas elencadas a seguir.
2 Adição: e, nem, também, não só... mas também.
Exemplo: Ela faz esportes e trabalha.
2 Alternância: ou... ou, quer... quer, seja... seja.
Exemplo: Ou ela viaja ou trabalha.
2 Oposição, contraste: mas, porém, todavia, contudo, entretanto,
senão, que. Também as locuções: no entanto, não obstante, ainda
assim, apesar disso.
Exemplo: Ela trabalha, no entanto não estuda.
2 Conclusão (em relação à oração anterior): logo, portanto, pois
(posposto ao verbo). Também as locuções: por isso, por conse-
guinte, pelo que…
Exemplo: Ela trabalhou com dedicação, logo o projeto deverá
ser aprovado.
2 Explicação (justificam a proposição da oração anterior): que,
porque, porquanto…
Exemplo: Vamos preparar as pautas que as reuniões começam amanhã.

4.2.6.2 Conectivos subordinativos


São aqueles que unem duas orações que dependem sintaticamente uma
da outra, ou seja, não fazem sentido se ficarem sozinhas.
2 Causa: expressam a causa do efeito ou da consequência apresenta-
dos na oração principal: que, como, pois, porque, porquanto. Tam-
bém as locuções: por isso que, pois que, já que, visto que.
Exemplo: Ela deverá ser aceita, pois seu currículo é muito bom.

–  77  –
Leitura e Escrita na Era Digital

2 Comparação: estabelecem uma comparação com a oração princi-


pal: menos…do que, assim como, bem como, que nem…
Exemplo: Ela é mais dedicada do que a maioria dos seus colegas.
2 Concessão: apresentam um fato que contraria a oração principal,
mas permite que ele aconteça: que, embora, conquanto. Também
as locuções: ainda que, mesmo que, bem que, se bem que, nem que,
apesar de que, por mais que, por menos que…
Exemplo: Ela não foi aprovada para o cargo, apesar de que sua
entrevista foi muito convincente.
2 Condição: como a própria palavra diz, expressam a condição para
que o fato mencionado na oração principal se realize: se, caso.
Também as locuções: contanto que, desde que, dado que, a menos
que, a não ser que, exceto se.
Exemplo: Ela poderá ser aprovada, se apresentar um ótimo desem-
penho em língua estrangeira.
2 Finalidade: Esclarecem o objetivo do fato apresentado na oração
principal. Vejamos as locuções para que, a fim de que, por que.
Exemplo: É necessário preparar-se com dedicação, para que se
obtenha boa classificação nos testes admissionais.
2 Tempo: expressam uma circunstância de tempo em relação ao
fato mencionado na oração principal: quando, apenas, enquanto.
Também as locuções: antes que, depois que, logo que, assim que,
desde que, sempre que.
Exemplo: Ela deixou de estudar com dedicação, quando foi aprovada.
2 Consequência: demonstram o efeito a respeito de um fato men-
cionado na oração principal: que (precedido de tão, tanto, tal) e

–  78  –
Tecendo os parágrafos

também as locuções: de modo que, de forma que, de sorte que, de


maneira que.
Exemplo: Ela trabalhava tanto, que pouco tempo tinha para dedi-
car-se à família.
Não esqueça que, com estas palavras, mantemos o sentido, que é
construído com a coerência e a coesão, que faz a costura entre as partes
de um texto.

Dica de leitura
Para recordar o que é artigo, numeral, pronome, advér-
bio, conjunção consulte as relações completas dessas
classes gramaticais em gramáticas da língua portuguesa,
como:
BECHARA, E. Moderna gramática portuguesa. São
Paulo: Lucerna, 2009.
CEGALLA, D. P. Novíssima gramática da língua por-
tuguesa. 48. ed. São Paulo: Companhia Editora Nacio-
nal, 2008.
LINDLEY, C.; CUNHA, C. Nova gramática do por-
tuguês contemporâneo. São Paulo: Lexikon, 2009.

Leia o texto de Rubem Alves, destacado a seguir, e perceba a presença


dos elementos de coesão na frase, entre as frases, entre os parágrafos e os senti-
dos que eles revelam. Somente alguns elementos foram destacados, deixando-
-se sem destaque todas as elipses nominais e verbais, bem como as referências
por meio de pronomes pessoais, possessivos, que são evidentes ao leitor.

–  79  –
Leitura e Escrita na Era Digital

Os urubus e sabiás
Tudo aconteceu numa terra distante, no tempo em que os bichos
falavam... Os urubus, aves por natureza becadas, mas sem grandes dotes
para o canto, decidiram que, mesmo contra a natureza eles haveriam
de se tornar grandes cantores. E para isto fundaram escolas e impor-
taram professores, gargarejaram dó-ré-mi-fá, mandaram imprimir
diplomas, e fizeram competições entre si, para ver quais deles seriam
os mais importantes e teriam a permissão para mandar nos outros.
Foi assim que eles organizaram concursos e se deram nomes
pomposos, e o sonho de cada urubuzinho, instrutor em início de car-
reira, era se tornar um respeitável urubu titular, a quem todos cha-
mam de Vossa Excelência.
Tudo ia muito bem até que a doce tranquilidade da hierarquia
dos urubus foi estremecida. A floresta foi invadida por bandos de pin-
tassilgos tagarelas, que brincavam com os canários e faziam serenatas
para os sabiás...
Os velhos urubus entortaram o bico, o rancor encrespou a testa,
e eles convocaram pintassilgos, sabiás e canários para um inquérito.
— Onde estão os documentos dos seus concursos?
E as pobres aves se olharam perplexas, porque nunca haviam
imaginado que tais coisas houvesse. Não haviam passado por esco-
las de canto, porque o canto nascera com elas. E nunca apresen-
taram um diploma para provar que sabiam cantar, mas cantavam
simplesmente...
— Não, assim não pode ser. Cantar sem a titulação devida é um
desrespeito à ordem. E os urubus, em uníssono, expulsaram da flo-
resta os passarinhos que cantavam sem alvarás.
Moral: em terra de urubus diplomados não se houve canto de
sabiá (ALVES, 1995, p. 81, grifos nossos).

–  80  –
Tecendo os parágrafos

Da teoria para a prática


Em todas as profissões, no dia a dia, existe a necessidade do uso coe-
rente da linguagem. Uma pesquisa recente mostrou que saber escrever
bem é o principal requisito para chegar aos cargos mais altos em uma
empresa. Na pesquisa, foram analisadas redações de 580 pessoas empre-
gadas em empresas de diferentes ramos. O resultado mostrou que aquelas
com cargos de chefia (e salários maiores) obtiveram uma nota média 43%
maior em seus textos.
É por isso que testes de redação estão presentes nos processos seletivos
de muitas empresas. Em outras tantas, a fluência da comunicação tem um
significativo peso na carreira profissional. “É uma competência bastante con-
siderada quando se pensa em promover alguém”, confirma Vera ­Vasconcellos,
consultora da Career Center, em matéria recentemente publicada no caderno
de empregos do jornal O Estado de S.Paulo.
Thiene Marcondes (2012), em reportagem recente, reforça esta ques-
tão quando afirma:
que expectativa o diretor de uma empresa criaria sobre o tra-
balho de alguém que lhe manda um e-mail assim:
Presado sr. silva
p/ meio desta gostaria de estar encaminhando anexo prop de trab
da equipe que sou cordenador , projetos integrados apresentando
soluçoes que nossa empresa precisa devido os prob logísticos ante-
riormente apresentados.
A sua disposiçao. abs... (MARCONDES, 2012, s. p.).

Cita ainda que Laila Vanetti, diretora e fundadora da Scritta, empresa


que oferece cursos e consultoria em linguagem escrita, faz um alerta: “falar
e escrever bem é uma condição de empregabilidade” (VANETTI apud
­MARCONDES, 2012, s. p.). Segundo Laila, as empresas procuram profis-
sionais que saibam organizar ideias, que tenham argumentos lógicos e que
sejam bem articulados. Sabe-se, portanto, que no mundo corporativo a alma
do negócio anda de mãos dadas com a comunicação. Telefonando, conver-
sando, enviando cartas e, na atualidade, com o uso contínuo de e-mail. Todos

–  81  –
Leitura e Escrita na Era Digital

estes meios de comunicação exigem bom conhecimento da língua para que a


mensagem seja entendida. 
No âmbito educacional a linguagem sempre foi o instrumento essencial
e, atualmente, com o advento do ensino a distância, o domínio desta ferra-
menta tornou-se mais fundamental ainda, pois o professor precisa dominar
um conhecimento, apropriar-se dele e transmiti-lo não só oralmente, mas,
também, por escrito.

Síntese
Como foi possível perceber, coerência é o resultado da articulação das
ideias de um texto; é a estrutura lógico-semântica que faz com que, numa
situação discursiva, palavras e frases componham um todo significativo para
os interlocutores.
Algumas vezes, a incoerência resulta do uso inadequado dos elementos
de coesão na construção dos períodos e de parágrafos. Pode ser, ainda, provo-
cada pelo erro no emprego dos mecanismos gramaticais e lexicais. Quando
todos estes aspectos forem respeitados, o texto terá a unidade formal e o sen-
tido preservados.
A coesão é responsável pela ligação, relação, nexo entre os elementos
que realizam a tessitura do texto. As várias palavras que são usadas como
conectivos, tais como as preposições, as conjunções, os pronomes, os advér-
bios vão conferir a unidade ao texto e contribuir para a clareza das ideias
transmitidas. Já o uso inadequado causa problemas de compreensão do que
se está querendo dizer.

–  82  –
5
Gêneros textuais e
tipos de textos

Após conhecer a forma de estruturar os parágrafos de


modo claro, objetivo e lógico, o passo seguinte é produzi-los com
intuito de escrever um texto de acordo com um determinado
modelo adequado a cada uma das situações sociais nas quais inte-
ragimos com a linguagem e que se chama gênero textual.
Leitura e Escrita na Era Digital

É a linguagem que se inscreve por meio do texto como sistema


mediador de todos os discursos para trocas materiais e culturais de infor-
mações e, depois, para a construção de conhecimentos. Por este motivo,
torna-se relevante e necessário o correto uso dos diferentes gêneros tex-
tuais, seja para declarar e negociar mediando ações sobre o mundo, seja
para persua­d ir os outros de nossas ideias, seja para representar e avaliar
as relações humanas, fazendo-se indispensável um letramento adequado
ao contexto contemporâneo.

5.1 Gênero textual, tipo textual


e gênero discursivo
Os gêneros foram discutidos e estudados na Grécia Antiga (384-322
a.C.) por vários filósofos. Aristóteles, discípulo de Platão, na obra Arte Poé-
tica, classificou em lírico, dramático e épico os gêneros literários. É desse
período a distinção das obras em poesia e prosa.
Para compreendermos melhor a questão do gênero neste momento, é
importante relembrar que toda manifestação literária é fruto resultante da
visão do homem de acordo com o mundo que o rodeia, que diz respeito ao
conteúdo, ou seja, ao produto artístico em si, materializado por meio de uma
técnica e com uma estilística própria que lhe dá a forma.
Portanto, para se escrever um texto sobre qualquer situação vivida,
existe a necessidade de se decidir se ela será narrada, descrita, se irá rea-
lizar uma reflexão teórica sobre o fato ou se tentará convencer o leitor
sobre o ponto de vista adotado ao apresentar o fato. Tem-se, desta forma,
a possibilidade de uma narração, uma descrição e uma dissertação expo-
sitiva ou argumentativa.
Na sequência, deve-se pensar se a pessoa a ser utilizada no discurso é
a primeira pessoa do plural (eu/nós) ou singular, o que dá a ideia de partici-
pação da pessoa que escreve o texto; ou será em terceira pessoa (ele). Outra
escolha diz respeito ao grau de linguagem a ser adotado – objetivo, subjetivo,
formal, informal ou coloquial. Tal decisão vai interferir na estrutura da frase,
na escolha do vocabulário e na forma de como se dirigir ao leitor, fatores que

–  84  –
Gêneros textuais e tipos de textos

definirão o modo de recepção do texto por aqueles que o leem. Todas essas
atividades dizem respeito ao gênero de texto que se vai produzir.
Na atualidade, a questão do gênero passou a ser discutida no meio lin-
guístico e deixou de ser exclusivo do meio literário. Bakhtin (1997, p. 279)
assevera que:
A utilização da língua efetua-se em forma de enunciados
(orais e escritos), concretos e únicos, que emanam dos inte-
grantes duma ou doutra esfera da atividade humana. O
enunciado reflete as condições específicas e as finalidades
de cada uma dessas esferas, não só por seu conteúdo (temá-
tico) e por seu estilo verbal, ou seja, pela seleção operada nos
recursos da língua – recursos lexicais, fraseológicos e gra-
maticais –, mas também, e sobretudo, por sua construção
composicional. Estes três elementos (conteúdo temático,
estilo e construção composicional) fundem-se indissoluvel-
mente no todo do enunciado, e todos eles são marcados pela
especificidade de uma esfera de comunicação. Qualquer
enunciado considerado isoladamente é, claro, individual,
mas cada esfera de utilização da língua elabora seus tipos
relativamente estáveis de enunciados, sendo isso que denomi-
namos gêneros do discurso.

A variedade dos gêneros do discurso pode revelar a variedade dos estra-


tos e dos aspectos da personalidade individual, e o estilo individual pode rela-
cionar-se de diferentes maneiras com a língua comum. Saber o que na língua
cabe respectivamente ao uso corrente e ao indivíduo é justamente problema
do enunciado (apenas no enunciado a língua comum encarna-se numa forma
individual). A definição de um estilo em geral e de um estilo individual em
particular requer um estudo aprofundado da natureza do enunciado e da
diversidade dos gêneros do discurso.
Bakhtin optou por dividir os gêneros em dois tipos: o gênero primário
(simples) e o gênero secundário (complexo). Primários são os gêneros usa-
dos em comunicação verbal espontânea, como diálogos em família, reuniões
informais, oralidade de um modo geral. Os secundários fazem uso de uma
linguagem mais elaborada, normalmente escrita, para situações de comuni-
cações formais. O que diferencia um do outro é o grau de complexidade e
elaboração que cada um exige, dependendo, como já vimos, em que esfera
de atuação e práticas sociais nas quais está sendo utilizado o gênero. Com o

–  85  –
Leitura e Escrita na Era Digital

surgimento da internet e a nova forma de comunicação virtual – o ciber ou


hiper espaço –, nasce o chamado gênero terciário, que se refere aos gêneros
adotados para comunicação digital.
Todos os gêneros interessam, uma vez que, numa sociedade letrada, ler
e escrever são atos necessários a todo momento, no entanto, aqui serão tra-
tados apenas alguns gêneros.

5.2 Modos discursivos


Um texto pode ser classificado de acordo com a forma como a ideia é
organizada discursivamente. São os chamados “modos discursivos”, que, nor-
malmente, mesclam-se e podem estar presentes em vários tipos de textos
(SERAFINI, 1991).
Os modos discursivos presentes nos gêneros textuais são destacados
a seguir.

5.2.1 Narração
Apresenta episódios e acontecimentos costurados por uma evolução
cronológica das ações. Essas ações são vistas sob determinada lógica e cons-
troem uma história transmitida por um narrador. No texto narrativo, há
sempre presente quem, quando, onde e como.
Observe o exemplo a seguir.

Tragédia brasileira
Misael, funcionário da Fazenda, com 63 anos de idade. Conhe-
ceu Maria Elvira na Lapa, prostituída, com sífilis, dermite nos dedos,
uma aliança empenhada e os dentes em petição de miséria. Misael
tirou Maria Elvira da vida, instalou-a num sobrado no Estácio, pagou
médico, dentista, manicura... Dava tudo quanto ela queria. Quando
Maria Elvira se apanhou de boca bonita, arranjou logo um namo-
rado. Misael não queria escândalo. Podia dar uma surra, um tiro, uma
facada. Não fez nada disso: mudou de casa.

–  86  –
Gêneros textuais e tipos de textos

Viveram três anos assim. Toda vez que Maria Elvira arranjava
namorado, Misael mudava de casa. Os amantes moraram no Está-
cio, Rocha, Catete, Rua General Pedra, Olaria, Ramos, Bom Sucesso,
Vila Isabel, Rua Marquês de Sapucaí, Niterói, Encantado, Rua Clapp,
outra vez no Estácio, Todos os Santos, Catumbi, Lavradio, Boca do
Mato, Inválidos...
Por fim na Rua da Constituição, onde Misael, privado de senti-
dos e inteligência, matou-a com seis tiros, e a polícia foi encontrá-la
caída em decúbito dorsal, vestida de organdi azul (BANDEIRA,
1991, p. 27).

Analisando pelos quesitos próprios da narração, identificamos:


2 Quem? Misael e Maia Elvira.
2 Quando? Tempo indeterminado, pode ser a qualquer tempo.
2 Onde? Bairros do Rio de Janeiro.
2 Como? Encontro, casamento, mudanças e morte.

5.2.2 Descrição
Apresenta objetos, pessoas, lugares e sentimentos, utilizando deta-
lhes concretos. Evidencia a percepção que o autor tem dos objetos e dos
sentimentos através dos cinco sentidos. É a fotografia verbal dos fatos ou
dados apresentados.
Leia, como exemplo, o texto destacado a seguir.

Darcy Ribeiro
Um dos mais brilhantes cidadãos brasileiros, Darcy Ribeiro pro-
vou ao mundo que um homem de nada mais precisa além da coragem
e da força de vontade para modificar aquilo que, por covardia, sim-
plesmente ignoramos. Ouvi-lo, mesmo que por alguns instantes, nos

–  87  –
Leitura e Escrita na Era Digital

levava a conhecer sua sabedoria e simplicidade. Era um verdadeiro


intelectual cuja convivência com os índios o fez adquirir invejável for-
mação humanística.
Darcy tinha a pele clara, olhos negros e curiosos, lábios finos e
trazia em seu rosto marcas de quem já deixou sua marca na história,
as quais harmoniosamente faziam-lhe inspirar profunda confiança.
Apesar de diabético e lutar contra dois cânceres, não fez disso des-
culpa para o comodismo ante seus ideais maiores, ele sabia o que que-
ria, e não mediu esforços para conseguir.
Com seu espírito jovem e obstinado, Darcy Ribeiro estava sem-
pre aprendendo e ensinando, ele sabia como ninguém pensar com
serenidade e defender aquilo em que acreditava, porém era realista o
suficiente para não se perder em “devaneios utópicos”.
Acima de tudo, ele amava as crianças do Brasil, e em nome
dessas fundou os CIEPs, no Rio de Janeiro, tendo também parti-
cipação fundamental na criação da Lei de Diretrizes e Bases da
Educação. Seus esforços foram reconhecidos internacionalmente,
valendo-lhe prêmios e homenagens por instituições de diversos
países. Devido ao seu carisma, destacou-se como etnólogo, antro-
pólogo, político, educador, escritor e historiador, tendo vários
livros publicados.
Mais que uma sucessão interminável de adjetivos pomposos,
Darcy Ribeiro representou um exemplo a ser seguido por qualquer
um que tenha a consciência de seu dever para com a sociedade a que
pertence. Portanto, homenageá-lo é dever de cada brasileiro.

Neste texto, André Luiz Diniz Costa faz uma descrição geral de
Darcy Ribeiro, exaltando suas qualidades de homem e de intelectual. No
primeiro parágrafo do desenvolvimento suas características físicas é que
são apresentadas. No terceiro e quarto parágrafos, os aspectos psicológicos
são mostrados. Na conclusão, reafirma a descrição com novos atributos de
caráter geral.

–  88  –
Gêneros textuais e tipos de textos

5.2.3 Dissertação
Apresenta ou explica ideias, esclarecendo-as, organizando-as, confron-
tando-as, definindo-as sem, no entanto, tomar uma posição com relação a
elas. É uma exposição. Veja o texto a seguir.

Mercado brasileiro de livros cresce e já aparece


como 9º no mundo
Até então “protegido” pela língua nacional, o mercado editorial
brasileiro atingiu tamanho de gente grande e começa a atrair impor-
tantes grupos internacionais.
Com R$ 6,2 bilhões de faturamento e 469,5 milhões exempla-
res vendidos, o Brasil é o nono maior mercado editorial do mundo,
segundo estudo recém-publicado da Associação Internacional dos
Editores (IPA, na sigla em inglês).
É o primeiro estudo que traz a movimentação total do mercado
nacional, considerando o preço pago pelo consumidor. O faturamento
das editoras, medido pela Câmara Brasileira do Livro (CBL), foi de
R$ 4,8 bilhões em 2011.
A compra de 45% da Companhia das Letras pela britânica Pen-
guin no final de 2011 foi o início de um movimento que deve se inten-
sificar, avalia o consultor Carlo Carrenho, do site PublishNews.
Diferentemente do que acontece em setores como meios de
comunicação, não há impedimento para a entrada de estrangeiros no
mercado editorial. Os espanhóis já estão no país há alguns anos e a
portuguesa LeYa comprou a Casa da Palavra no ano passado. [...]

BARBOSA, M. Mercado brasileiro de livros cresce e já


aparece como 9º no mundo. Folha de S.Paulo, São Paulo, 3 nov. 2012.
Disponível em: <http://www1.folha.uol.com.br/mercado/1178540-merca-
do-brasileiro-de-livros-cresce-e-ja-aparece-como-9-no-mundo.shtml>.
Acesso em: 24 nov. 2012.

–  89  –
Leitura e Escrita na Era Digital

5.2.4 Argumentação
Apresenta fatos, problemas, raciocínios que fundamentarão, sustenta-
rão a tese defendida, ou seja, o ponto de vista assumido na argumentação
em uma opinião. Argumentar significa provar, demonstrar ou defender um
ponto de vista particular sobre determinado assunto (KÖCHE, 2008).
Para uma boa argumentação, o produtor do texto pode se servir de dife-
rentes tipos de argumentos, entre os quais destacamos alguns a seguir.
2 Argumento de autoridade
Consiste no uso de citações de conceitos de autores renomados e
de autoridades em alguma das áreas do saber (educadores, filóso-
fos, físicos, administradores, economistas), servem para reforçar,
fundamentar uma ideia, uma tese, um ponto de vista. Este tipo
de argumento torna o texto mais consistente à medida que outras
vozes reforçam o que o autor do texto está dizendo.
2 Argumento baseado no consenso, com exemplos
O uso de exemplos conhecidos e aceitos desperta a familiaridade
do leitor com o tema, conquistando a sua adesão e tornando o
texto mais fácil de ser compreendido.
2 Argumento baseado em provas concretas
As provas concretas são argumentos de difícil contestação porque
dão concretude ao discurso. Destacam-se os dados estatísticos, os
relatos de fatos, exemplos e ilustrações retirados, inclusive, da his-
tória universal, que apresentam detalhes, são longos, minuciosos e
reforçam as informações abstratas dos conceitos.
2 Argumento lógico
Este tipo de argumento faz-se pelo raciocínio. É um conjunto
de enunciados que estão relacionados uns com os outros de tal
forma que enquanto um apresenta uma tese, os demais enun-
ciados são justificativas ou premissas para a conclusão (TOUL-
MIN, 2006).

–  90  –
Gêneros textuais e tipos de textos

A favor dos videogames


O cérebro humano é um órgão que absorve quase 25% da glicose
que consumimos e 20% do oxigênio que respiramos. Carregar neurô-
nios ou sinapses que interligam os neurônios em demasia é uma des-
vantagem evolutiva, e não uma vantagem, como se costuma afirmar.
Todos nós nascemos com muito mais sinapses do que precisa-
mos. Aqueles que crescem em ambientes seguros e tranquilos vão
perdendo essas sinapses, que acabam não se conectando entre si,
fenômeno chamado de regressão sináptica.
Portanto, toda criança nasce com inteligência, mas aquelas que
não a usam vão perdendo-a com o tempo. Por isso, menino de rua
é mais esperto do que filho de classe média que fica tranquilamente
assistindo às aulas de um professor. Estimular o cérebro da criança
desde cedo é uma das tarefas mais importantes de toda mãe e todo
pai modernos.
Sempre fui a favor de videogames, considerados uma praga pela
maioria dos educadores e pedagogos. Só que bons videogames impe-
dem a regressão sináptica, porque enganam o cérebro fazendo-o achar
que seus filhos nasceram num ambiente hostil e perigoso, sinal de que
vão precisar de todas as sinapses disponíveis. O truque é encontrar
bons jogos, mas não é tarefa impossível.
O primeiro videogame que comprei para meus filhos foi o famoso
SimCity, um jogo em que você é o prefeito de uma pequena vila, e,
dependendo de suas decisões, ela pode se tornar uma megalópole ou
não. Se você for um péssimo prefeito, a população se mudará para a
cidade vizinha, e fim do jogo. Em vez de eleger prefeitos, seria muito
melhor se empossássemos o vencedor do campeonato de SimCity em
cada cidade.
Um dia eu estava brincando de “prefeito” quando meus filhos de
11 e 13 anos de idade, analisando meu “planejamento urbano” inicial,
balançaram a cabeça em desaprovação: “Tsc, tsc, tsc. Pai, daqui a cin-
quenta anos você vai dar com os burros n’água”. Eu, literalmente, caí
da cadeira.

–  91  –
Leitura e Escrita na Era Digital

Quantos de nós, aos 11 anos, tínhamos consciência de que atos


feitos na época poderiam ter consequências nefastas cinquenta
anos depois? Quantos de nós pensaríamos em prever um futuro
para dali a cinquenta anos?
A lição que me deram com o famoso videogame Mario Bro-
thers foi ainda melhor. Não tendo a paciência de meus filhos, eu
vivia cortando caminho pelos vários atalhos existentes no jogo,
quando novamente me deram o seguinte conselho: “Não se podem
queimar etapas, senão você não adquire a experiência e a compe-
tência necessárias para as situações mais difíceis que estão por vir”.
A frase não foi exatamente essa, mas foi o suficiente para me deixar
com os cabelos em pé. Dois garotos estavam me ensinando que cada
etapa da vida tem seu tempo e aprendizado, e nela não se pode ser
um apressado.
No jogo Médico, as crianças aprendem a fazer um diagnóstico
diferencial, a pior das alternativas sendo uma apendicite. Nesses
casos, elas têm de operar “virtualmente” o paciente seguindo con-
dutas médicas corretas. Um dos procedimentos é a assepsia da pele,
e ai de quem não escovar o peito do paciente, com o mouse nesse
caso, por três minutos, o que é uma eternidade num videogame e
para uma criança. Quem gasta menos do que isso é sumariamente
expulso do hospital por erro médico. Que matéria ou professor
ensina esse tipo de autodisciplina?
Em A-Train, o jogador é um administrador de empresa fer-
roviária. A criança tem de investir enormes somas colocando tri-
lhos e locomotivas sem contar com muitos passageiros no início
das operações. Aprende-se logo cedo que uma empresa começa
com prejuízo social e tem de ter recursos para suportar os vários
anos deficitários.
Aos 12 anos, meus filhos já tinham noção de que os primeiros
anos de um negócio são os mais difíceis, e controlar o capital de
giro é essencial. Avaliar riscos e administrar o capital de giro, nem
grandes empresários sabem fazer isso até hoje.

–  92  –
Gêneros textuais e tipos de textos

Como em tudo na vida, é necessário ter moderação nas horas


devotadas ao videogame. Mas ele é uma ótima forma de estimular o
cérebro da criança e impedir sua regressão sináptica, além de ensinar
planejamento, paciência, disciplina e raciocínio, algo que nem sempre
se aprende numa sala de aula.
KANITZ, S. A favor dos videogames. Veja. São Paulo: Abril,
ano 38, n. 41, p. 22, out. 2005. © Editora Abril.

Podemos notar neste texto argumentativo que a tese do autor é apresen-


tada no título “a favor dos vídeos games”: para defendê-la o autor faz citações
da fala de seus filhos, usa exemplo de jogos considerados por ele de qualidade.
Uma concepção científica para sua argumentação já é apresentada nos pará-
grafos iniciais quando diz “O cérebro humano é um órgão que absorve quase
25% da glicose que consumimos e 20% do oxigênio que respiramos. Carregar
neurônios ou sinapses que interligam os neurônios em demasia é uma des-
vantagem evolutiva, e não uma vantagem, como se costuma afirmar”.

5.3 Gêneros textuais e práticas sociais


Os gêneros textuais são modelos comunicativos e fazem parte de nosso
cotidiano. São orais e escritos e nos conduzem no processo comunicativo
social. Desde a conversa com o vizinho até o relatório da última reunião, esta-
mos exercitando gêneros textuais. Para cada situação vivida há necessidade
de conhecimento de um determinado gênero. Se vamos à missa, o gênero
utilizado é o religioso, se vamos a um jogo de futebol, o gênero é esportivo, se
vamos a uma exposição, o gênero é estético e assim por diante.
Na área acadêmica, educacional e empresarial a comunicação deve ser
redigida em linguagem apropriada ao contexto e à técnica, com característi-
cas próprias dos gêneros dessas áreas.
Existem gêneros para todas as situações comunicativas. Entre eles, des-
tacamos alguns.

–  93  –
Leitura e Escrita na Era Digital

Os enumerativos servem para lembrar e transmitir dados. São eles:


listas de compras, etiquetas, horários, guias, formulários, impressos oficiais,
índices, enciclopédias, menus, agenda, tarefas pendentes, cadernos de notas,
listas de material, diário pessoal ou escolar, cartazes, catálogos, arquivos.
Os informativos servem para compreender ou comunicar as carac-
terísticas principais de um tema. Destacam-se cartas, telegramas, notas e
avisos, notícias, reportagens, convites, entrevistas, correspondência, anún-
cios, artigos e reportagens, folhetos, artigos de divulgação, jornais, revistas,
propagandas, etc.
Os prescritivos são utilizados para dar instruções: escolares, receitas
culinárias, regulamentos, códigos, normas de jogos, de comportamento, ins-
truções para a realização de trabalhos, manuais, etc.
Os expositivos e argumentativos são usados para estudar, comparti-
lhar e discutir conhecimentos através de um estudo mais aprofundado. São
resenhas, relatórios, livro-texto escolar, divulgação, apontamentos, exercí-
cios, informes, artigos científicos, biografia, preparação de exposições orais
e conferências, ensaios, etc.
Os literários servem para induzir no leitor sentimentos e emoções
especiais, para momentos de diversão, comunicar fantasias, transmitir
valores culturais, sociais e morais. Destacam-se contos, narrações, len-
das, poemas, canções, adivinhações, teatro, histórias em quadrinhos, gibis,
entre outros.
É importante ressaltar que os modos discursivos de descrição, narra-
ção, exposição ou argumentação estudados podem ser utilizados nos dife-
rentes gêneros.
Há alguns gêneros que são importantes em todas as áreas profissionais,
como: relatório, ata, currículo, carta comercial e oficial, ofício, ensaio, artigo
acadêmico e análise crítica.
O relatório e a ata têm como modo discursivo a narração, auxiliada
pela descrição. O currículo é descritivo. Já na carta, no ofício, no ensaio, no
artigo acadêmico e na análise crítica, o modo discursivo em evidência é o
dissertativo opinativo ou argumentativo.

–  94  –
Gêneros textuais e tipos de textos

Na sequência serão apresentados modelos destes gêneros fundamentais


para sua prática profissional e educacional.

5.3.1 Relatório
É um gênero utilizado em muitas situações práticas e sociais, uma vez
que se tem que prestar contas das atividades realizadas, ou na família, oral-
mente, para comunicar nossos atos. Portanto, relatar é escrever, para alguém
ausente, os acontecimentos, fatos ou discussões ocorridos em um determi-
nado local, descrevendo, narrando e, muitas vezes, dissertando.
A estrutura do relatório vai depender do espaço social no qual ele será
produzido, quais os objetivos a que ele deve atender. Do mesmo modo, o grau
de formalidade ou informalidade da estrutura linguística a ser seguida.
No meio escolar o professor deve produzir relatório de notas, relatório de
avaliação descritiva nas séries iniciais. Os alunos podem ser chamados a pro-
duzir relatório de visitas a exposições, viagens, prática e estágio. Já no mundo
corporativo, os relatórios estão relacionados com custos, despesas, lucros.
Quanto à estrutura, este gênero classifica-se em formal, informal e
semi-informal (FLÔRES, 1994).
2 Relatório formal: é rigoroso na forma de apresentação e estru-
tura, seguindo todas as normas de um trabalho técnico. É extenso,
contendo mais de 15 páginas, e o assunto é tratado com muita pro-
fundidade. Os relatórios de estágio ou de término de curso entram
nesta categoria.
2 Relatório informal: trata de um único assunto, sua apresentação
é breve, é redigido em poucas páginas (uma ou duas), às vezes ape-
nas com um parágrafo, não exigindo cabeçalho nem título. Pode
ser manuscrito ou digitado. São exemplos de relatório informal o
memorando e a ­carta-relatório.
2 Relatório semi-informal: é identificado pela sua extensão, con-
tendo de 5 a 15 páginas, maior que o informal. Trata de assunto de
certa complexidade, exigindo pesquisa ou investigação. O relató-
rio de visita, com objetivo predeterminado, é um exemplo de rela-
tório semi-informal.

–  95  –
Leitura e Escrita na Era Digital

Quanto à maneira de tratar o assunto, os relatórios podem ser classi-


ficados em informativo e analítico.
2 Relatório informativo: transmite informações sem se preocupar
em avaliar ou analisar e não faz recomendações. É pouco extenso e
apresenta-se informal e semi-informalmente. Subdivide-se em rela-
tório de progresso, relatório de posição e relatório narrativo.
2 Relatório informativo de progresso: relata modificações ocor-
ridas em determinadas condições e durante um tempo. Pode
ser de dois tipos:

1. relatório informativo de progresso periódico – relata


determinada atividade num período de tempo fixo (anual,
mensal, semanal);

2. relatório informativo de progresso até determinada data –


o assunto tratado pode ter maior complexidade, tornando-o
longo, podendo ser superior a um ano, e tem como finalidade
relatar o histórico do progresso de um projeto até determi-
nada data. Não faz recomendações.
2 Relatório informativo de posição: descreve ocorrência ou fatos
num momento temporal, ou seja, numa data estabelecida. Neste
tipo de relatório não há análise, avaliação ou recomendação.
2 Relatório informativo narrativo (ou de viagem, estágio ou
administrativo): relata a história de ocorrências ou eventos sem
tempo limitado, não se preocupando em oferecer recomendações:

1. relatório de viagem – na introdução é importante colocar a


data, o destino e o objetivo da viagem. No desenvolvimento
designam-se os membros participantes, suas funções, os luga-
res visitados e os objetivos alcançados. Se houver roteiro, pro-
grama, deve-se inclui-lo. Na conclusão faz-se uma crítica com
relação aos resultados alcançados;

–  96  –
Gêneros textuais e tipos de textos

2. relatório de estágio ou de visita – apresentação na qual é


colocado o objetivo do estágio ou visita. No desenvolvimento,
devem estar presentes a descrição do local do estágio, as ativi-
dades desenvolvidas e as técnicas aplicadas. Por fim, uma con-
clusão, destacando o aproveitamento do estágio ou da visita;
3. relatório administrativo – possui objetivo preestabelecido
e bem definido. Em geral, é utilizado quando há julgamento
de determinados processos com fins administrativos em
empresas, instituições de ensino e outros, ou quando são
feitos estudos em determinadas áreas ou departamentos,
os quais exigem alguma reformulação ou acerto em termos
curriculares, pessoal-profissional, ou administrativo.
2 Relatório analítico: objetiva analisar os fatos ou as observações
obtidas e apresenta conclusões e recomendações. Os relatórios
analíticos dividem-se em três formatos:
1. relatório analítico para solucionar problemas – dimensionar os
problemas para que sejam analisados sem a preocupação de busca
científica para solucioná-los;
2. relatório analítico pessoal (ou de proposição, ou consulta) –
tem como finalidade apresentar sugestões ou recomendar alguma
melhoria, mostrando objetivamente os dados que favorecem essa
mudança, observando o tempo atual ou um tempo futuro;
3. relatório analítico de pesquisa – descreve experiências científicas
que estão sendo feitas por pesquisadores. Há subdivisões de relató-
rio de pesquisa, a básica, que é um caminho a ser seguido em vista
de um determinado resultado, tendo conclusão e recomendação
devido a resultados evidentes, e a aplicada, que irá descrever os
meios de como empregar um produto novo ou uma nova técnica.
A linguagem do relatório deve primar pela clareza na exposição,
pela concisão, precisão e unidade. Pode-se escrever em 1ª pessoa do
plural, ou de modo impessoal, na 3ª pessoa. Observe o modelo de rela-

–  97  –
Leitura e Escrita na Era Digital

tório a seguir, que está disponível no site da Fundação Universidade do


­Tocantins (­ Unitins).

O estágio supervisionado III – passo a passo


Este momento exige do estagiário o trabalho do relatório expan-
dido analítico-descritivo.
Aqui, cada componente irá sistematizar suas observações, cons-
truindo um relatório que será arquivado na pasta, no polo e será uti-
lizado, posteriormente, para a conclusão do Estágio.
Observação: cada integrante da equipe fará o seu relatório com
base nos dados observados, lembrando sempre que é preciso ter obje-
tividade e imparcialidade. Para elaborar o relatório analítico-expan-
dido, vocês irão seguir o seguinte roteiro, lembrando que este relató-
rio deverá ser escrito individualmente e não deverá ser postado e,
sim, colocado em sua pasta no polo.
CAPA
2 Na parte superior da capa, centralizado, com letra maiúscula
deverá estar escrito:
FUNDAÇÃO UNIVERSIDADE DO TOCANTINS/FACUL-
DADE EDUCACIONAL
DA LAPA
CURSO DE LICENCIATURA EM PEDAGOGIA – EAD
ESTÁGIO SUPERVISIONADO III
� No centro da folha, deverá estar o título do trabalho:
ESTÁGIO SUPERVISIONADO III – RELATÓRIO ANALÍ-
TICO-DESCRITIVO
EXPANDIDO DA OBSERVAÇÃO DA DOCÊNCIA NOS ANOS
INICIAIS DO
ENSINO FUNDAMENTAL
–  98  –
Gêneros textuais e tipos de textos

2 Embaixo (centralizado)
NOME DOS(AS) ACADÊMICOS(AS)
LOCAL – ANO/SEMESTRE
FOLHA DE ROSTO
2 Na parte superior (centralizado/maiúsculo)
FUNDAÇÃO UNIVERSIDADE DO TOCANTINS/FACUL-
DADE EDUCACIONAL DA LAPA
CURSO DE PEDAGOGIA
ESTÁGIO SUPERVISIONADO III
2 No centro:
TÍTULO DO TRABALHO
Abaixo do título, recuado à direita, com letra fonte 10, vai a nota
indicativa da natureza do trabalho, escrito:
Relatório analítico-descritivo expandido como exigência legal
do curso de pedagogia da Fundação Universidade do Tocantins/
Faculdade Educacional da Lapa.
� Embaixo da folha deverá constar o nome dos integrantes da
equipe, local, ano/semestre.
SUMÁRIO
1. INTRODUÇÃO
2. IDENTIFICAÇÃO DA ESCOLA/ANÁLISE DO ESPAÇO
ESCOLAR
3. FUNDAMENTAÇÃO TEÓRICA SOBRE A OBSERVAÇÃO
DA DOCÊNCIA NOS ANOS INICIAIS DO ENSINO FUNDA-
MENTAL
3.1 Descrição, análise e interpretação da observação da docência no
1º ano
3.2 Descrição, análise e interpretação da observação da docência no
2º ano
–  99  –
Leitura e Escrita na Era Digital

3.3 Descrição, análise e interpretação da observação da docência no


3º ano
3.4 Descrição, análise e interpretação da observação da docência no
4º ano
3.5 Descrição, análise e interpretação da observação da docência do
5º ano
4. CONSIDERAÇÕES FINAIS
5. REFERÊNCIAS
6. ANEXOS
PIENTA, A. C.; METZ, M. C. Orientações para o estágio
s­ upervisionado III. Observação da docência nos anos iniciais do ensino
fundamental. Disponível em: <http://www.unitins.br/pedagogia/arquivos/
estagio/4_periodo/OrientEstagio_4_periodo.pdf> Acesso em: 22 set. 2012.

5.3.2 Ata
A ata é o registro escrito de uma reunião, sessão, assembleia geral ordi-
nária ou extraordinária, que tem efeitos legais. Quando não houver necessi-
dade de formalidades legais, pode-se fazer apenas um relatório de reunião.
Uma ata deve ser escrita em um só parágrafo, os assuntos seguem em
ordem cronológica, com o verbo no pretérito perfeito do indicativo e os nume-
rais registrados por extenso. Não pode conter rasuras. Se houver algum erro e
for percebido, escreve-se a correção precedida da observação “em tempo”.
Para o seu registro deve haver um livro próprio, com páginas numera-
das e rubricadas por quem fez o “termo de abertura”.
São partes componentes da ata:
2 título;
2 introdução com data, local e hora;
2 registro dos presentes; composição da mesa; discriminação das
publicações relacionadas com a reunião, como relatórios, editais;
2 deliberações;

–  100  –
Gêneros textuais e tipos de textos

2 encerramento.

Ata da Assembleia Geral de Constituição


de Associação ou Sociedade Civil
Ao...........dia do mês de....................................do ano de...............,
às..............horas, reuniram-se, em Assembleia Geral, no ende-
reço.......................................................as pessoas a seguir relacio-
nadas: (nominar as pessoas, profissão, estado civil, endereço
residencial e número do CPF). Os membros presentes esco-
lheram, por aclamação, para presidir os trabalhos (nome de
membro)....................................., e para secretariar (nome mem-
bro).................................................. Em seguida, o Presidente declarou
abertos os trabalhos e apresentou a pauta de reunião, contendo
os seguintes assuntos: 1º) discussão e aprovação do Estatuto da
associação; 2º) escolha dos associados ou sócios que integrarão os
órgãos internos da associação; e 3º) designação de sede provisó-
ria da associação. Em seguida, começou-se a discussão do estatuto
apresentado que, após ter sido colocado em votação, foi aprovado
por unanimidade, com a seguinte redação: (transcrever redação
do estatuto aprovado); Passou-se, em seguida, ao item “2” da pauta,
em que foram escolhidos os seguintes membros para comporem os
órgãos internos: DIRETORIA EXECUTIVA: (nominar os mem-
bros, estado civil, profissão, endereço residencial, numero do CPF
e cargo). Por fim, passou-se à discussão do item “3” da pauta e foi
deliberado que a sede provisória da associação será no seguinte
endereço: (discriminar o endereço completo).
Nada mais havendo, o Presidente fez um resumo dos trabalhos
do dia, bem como das deliberações, agradeceu pela participação de
todos os presentes e deu por encerrada a reunião, da qual eu, (nome
do secretário da reunião), secretário ad hoc reunião, lavrei a presente
ata, que foi lida, achada conforme e firmada por todos os presentes
abaixo relacionados.

–  101  –
Leitura e Escrita na Era Digital

Os órgãos internos apresentados são apenas sugestivos, ou seja,


não há obrigatoriedade de utilizarem-se as mesmas denominações.
Em regra, as funções de deliberação são exercidas por uma Assem-
bleia Geral, integrada por todos os associados ou sócios, porém, é per-
feitamente possível a existência de um segundo órgão de deliberação,
como, por exemplo, um Conselho Superior, com atribuições serão
fixadas no estatuto.
A ata deverá ser assinalada por todos os associados ou sócios
fundadores, que serão identificados pelo nome e número de CPF.
Fonte: BAHIA. Ministério Público. Ata da Assembleia Geral de
Constituição de Associação ou Sociedade Civil. Disponível em:
<http://www.mp.ba.gov.br/atuacao/caocif/fundacoes/pecas/
modelo_ata.pdf>. Acesso em: 22 set. 2012.

5.3.3 Currículo ou curriculum vitae


É um texto de apresentação, no qual, por meio de informações sucin-
tas, o sujeito descreve as suas qualificações pessoais para submeter-se a
uma avaliação para um possível emprego. A linguagem deve ser extre-
mamente concisa, com observações objetivas a respeito da formação e
experiência profissionais rigorosamente verdadeiras. As partes devem
ser claramente destacadas e muito bem digitadas. Deve ser redigido em
terceira pessoa.

Nome Completo
[Endereço completo]. Telefone: [Telefone com DDD] – E-mail:
[E-mail]. Idade: [Idade] anos – estado civil: [estado civil].
Objetivo: [vaga ou oportunidade pretendida]

–  102  –
Gêneros textuais e tipos de textos

Formação acadêmica:
2 curso do ensino médio
2 curso profissionalizante ou técnico
2 curso superior
(data de início e término, escola e universidade)
Experiência profissional:
2 data de início e término
2 nome da empresa
2 cargo exercido
2 atividades realizadas
Qualificações e atividades complementares:
2 descrição de outros cursos realizados
2 descrição de atividade relevantes realizadas
Informações adicionais:
� tem algo de especial que ocorreu com você, como algum
prêmio, publicação de algum artigo, livro – descrever

5.3.4 Artigo acadêmico/científico


É um dos mais importantes textos, tanto para leitura quanto para a
escrita, para os universitários. Serve para divulgar e veicular conhecimen-
tos novos que já estão ou serão sistematizados em breve. Essencialmente, no
artigo, mostra-se um problema, discute-se a respeito e apresenta-se soluções.
Na sua construção, são usados os diferentes modos discursivos: narra-
ção, descrição, informação e argumentação. Os temas abordados são livres,
uma vez que se escreve tudo o que for de interesse de cada área e de todas as
áreas. É o conhecimento sendo construído.
Para produzir um artigo, é importante observar os seguintes passos:

–  103  –
Leitura e Escrita na Era Digital

1. seleção da bibliografia sobre o assunto;


2. delimitação do assunto;
3. elaboração da abordagem para análise do assunto;
4. elaboração do esquema de trabalho;
5. elaboração dos tópicos e da análise pessoal;
6. organização das anotações na ordem apresentada no esquema;
7. escolha do tempo verbal mais indicado para ser usado no artigo;
8. escrita da primeira versão do trabalho;
9. revisão da escrita;
10. submissão do artigo ao orientador ou a outra pessoa para avaliar a pro-
dução;
11. escrita da versão final.

A estrutura do artigo exige as seguintes partes:


1. identificação – nesse tópico, coloca-se o título do artigo, a autoria e a
titulação do autor;
2. resumo e palavras-chave – o resumo apresenta, de forma sintética, todos
os dados do artigo, tema, objetivos, metodologia e resultados. Antecede
o corpo do artigo. Abaixo do resumo são colocadas as palavras-chave;
3. corpo do artigo
a) situação-problema – apresenta o problema (o quê), os objetivos
(para que serviu). Nessa parte, que é a introdução, pode-se fazer
referências às partes que compõem o artigo, e, ainda, à sua funda-
mentação teórica.
b) discussão – é o desenvolvimento do artigo e pode ser dividida em
quantos itens forem necessários. Serão apresentadas todas as infor-
mações, referências aos autores consultados e o autor deve valer-se
de todos os argumentos para defender os resultados conseguidos.
c) solução/avaliação – caracteriza-se como a conclusão do artigo e
são ressaltados os resultados e/ou limites do estudo desenvolvido,
bem como, se possível, recomendações para novas descobertas.

–  104  –
Gêneros textuais e tipos de textos

O artigo possui, ainda, referências, anexos ou apêndices, se necessário,


e a data da produção.

Considerações Sobre as Faces das Desigualdades


Entre os Seres Humanos
Francisco Fernandes Ladeira
Especialista em: Brasil, Estado e Sociedade pela UFJF
E-mail: ffl@site.com.br
Resumo: O presente trabalho apresenta breves considerações sobre as
diversas faces das desigualdades entre os seres humanos. Para as concep-
ções clássicas, as desigualdades sociais estão relacionadas, sobretudo, à
distribuição irregular da renda e dos bens materiais. Em contrapartida,
de acordo com as concepções contemporâneas, os estudos sobre as desi-
gualdades devem ir além da distribuição de bens materiais e do fator
renda. Dessa forma, as desigualdades também devem ser associadas a
fatores extra-econômicos e às oportunidades de vida.
Considerações Iniciais
Compreender as causas das desigualdades entre os seres huma-
nos é um dos principais desafios dos cientistas sociais.
Na Grécia Antiga, berço do pensamento ocidental, acreditava-se
que as desigualdades entre os homens eram inatas. Desse modo, certos
indivíduos eram naturalmente propensos a serem escravos, outros a
serem senhores, alguns adaptados a trabalhos manuais e outros exclu-
sivamente às atividades intelectuais.
Há [...] por obra da natureza e para a conservação
das espécies, um ser que ordena e um ser que obe-
dece. Porque aquele que possui inteligência capaz de
previsão tem naturalmente autoridade e poder de
chefe; o que nada mais possui além da força física
para executar, deve, forçosamente, obedecer e servir
[...] Os bárbaros a mulher e o escravo se confundem
na mesma classe. Isso acontece pelo fato de não
lhes ter dado a natureza o instinto do mando [...]
(ARISTÓTELES, s. d., p. 14).

–  105  –
Leitura e Escrita na Era Digital

Evidentemente, essa concepção equivocada não é mais admi-


tida. Sabemos que as desigualdades não são naturais, mas socialmente
construídas ao longo de um processo histórico marcado pelas diferen-
ciações entre os seres humanos.
Para a concepção clássica, representada principalmente pelos
pensamentos de Karl Marx e Max Weber, as desigualdades sociais
estão relacionadas, essencialmente, à distribuição irregular da renda
e dos bens materiais. Em contrapartida, para alguns intelectuais con-
temporâneos, os estudos sobre as desigualdades devem ir além da dis-
tribuição de bens materiais e do fator renda. Para estes autores, as
desigualdades também devem ser associadas a fatores extra-econômi-
cos (raça, gênero, nacionalidade) e às oportunidades de vida.
Concepção Clássica
Um dos primeiros pensadores modernos a tratar exaustivamente
o tema das desigualdades sociais foi Jean-Jaques Rousseau:
Concebo na espécie humana duas espécies de desi-
gualdade. Uma, que chamo de natural ou física, por
que é estabelecida pela natureza e que consiste na
diferença das idades, da saúde, das forças do corpo e
das qualidades do espírito ou da alma. A outra, que
pode ser chamada de desigualdade moral ou polí-
tica porque depende de uma espécie de convenção
e que é estabelecida ou pelo menos autorizada pelo
consentimento dos homens. Esta consiste nos dife-
rentes privilégios de que gozam alguns em prejuízo
dos outros, como ser mais ricos, mais honrados, mais
poderosos do que os outros ou mesmo fazer-se obe-
decer por eles (ROUSSEAU, s. d., p. 27).
Sendo assim, segundo Rousseau, o chamado mundo civilizado,
através dos séculos, fomentou profundas diferenças entre os homens,
sendo que as desigualdades sociais surgem com o aparecimento da
propriedade privada.
O primeiro homem que cercou um pedaço de terra, que veio com
a ideia de dizer “isto é meu” e encontrou gente simples o bastante para
acreditar nele, foi o verdadeiro fundador da sociedade civil. Quantos
crimes, guerras e assassinatos derivam desse ato! De quanta miséria
e horror a raça humana poderia ter sido poupada se alguém sim-
plesmente tivesse arrancado as estacas, enchido os buracos e gritado
para seus companheiros: “Não deem ouvidos a este impostor. Estarão

–  106  –
Gêneros textuais e tipos de textos

perdidos se esquecerem que os frutos da terra pertencem a todos,


e que a terra, ela mesma, não pertence a ninguém” (­ROUSSEAU,
s. d., p. 14).
Para Marx, as desigualdades sociais podem ser compreendidas
através da irregular distribuição dos meios de produção. Segundo o
pensamento marxiano, a história se desenvolve de forma linear, em
diferentes etapas, movidas, sobretudo, pelas contradições originadas
da organização do sistema de produção (luta de classes). “Em um
caráter amplo, os modos de produção asiático, antigo, feudal e bur-
guês moderno podem ser considerados como épocas progressivas da
formação econômica da sociedade.” (MARX, 1977, p. 23).
Na sociedade capitalista, existem duas classes sociais básicas: de
um lado a burguesia, detentora dos meios de produção; e de outro
lado o proletariado, que possui somente a sua força de trabalho.¹ “[...]
Opressores e oprimidos, sempre estiveram em constante oposição uns
aos outros [...].” (MARX, 2000, p. 45).
Sendo assim, a classe operária, explorada pelos patrões, deve se
organizar e promover a revolução socialista, transformando os meios
de produção em propriedades coletivas.² Portanto, para o pensamento
marxiano, o fim das desigualdades sociais passa, inexoravelmente,
pela destruição do modo de produção capitalista, culminando com
o advento do comunismo. “Em lugar da antiga sociedade burguesa,
com suas classes e seus antagonismos de classes, surge uma associação
na qual o livre desenvolvimento de cada um é condição para o livre
desenvolvimento de todos.” (MARX, 2000, p. 67).
Max Weber percebe as diferenciações entre os indivíduos a par-
tir das variáveis propriedade, poder e prestígio. Assim, as diferenças
de propriedade criam as classes; as diferenças de poder criam os par-
tidos políticos; e as diferenças de prestígio criam os agrupamentos de
status ou estratos.
Concepção Contemporânea
Por outro lado, autores contemporâneos, apesar de não nega-
rem as interpretações clássicas sobre as desigualdades, procuram
incluir fatores imateriais e extra-econômicos nas análises sobre as
distinções sociais.

–  107  –
Leitura e Escrita na Era Digital

Para Amartya Sen, as análises sobre as desigualdades devem se


deslocar dos espaços de renda para o espaço de funcionamentos. De
acordo com o economista indiano, funcionamentos são os desejos e
aspirações que um indivíduo consegue realizar vivendo de uma deter-
minada maneira. Assim, mais importante do que a questão monetá-
ria, é focalizar como determinado rendimento pode se transformar
em realizações e melhorar a autoestima individual.
Jessé Souza, sociólogo da Universidade Federal de Juiz de Fora,
salienta que os estudos sobre as classes sociais precisam superar as
abordagens tradicionais. Rejeita, assim, tanto o liberalismo economi-
cista, que vincula classe ao rendimento monetário; quanto o pensa-
mento marxista clássico, que associa classe à posição de um indivíduo
em relação ao modo de produção vigente. Aspectos econômicos e
ocupacionais são condições necessárias, porém não suficientes, para
definir uma classe.
Classes sociais não são determinadas pela renda, nem pelo simples
lugar na produção, mas sim por uma visão de mundo “prática” que se
mostra em todos os comportamentos e atitudes. [...] O economicismo
liberal, assim como o marxismo tradicional, percebe a realidade das
classes sociais apenas “economicamente” (SOUZA, 2010, p. 22, 45).
Desse modo, essas interpretações não levam em conta “[...] o
mais importante, que é a transferência de valores imateriais na repro-
dução das classes sociais e de seus privilégios no tempo” (SOUZA,
2010, p. 23).
Considerações Finais
Entretanto, é controverso menosprezar a importância do fator
renda para se aferir as desigualdades sociais. Basta levarmos em
conta que, em uma sociedade capitalista como a nossa, onde prati-
camente todas as relações sociais são regidas pela lógica mercantil,
um rendimento monetário básico é condição sine qua non para que
um indivíduo possa viver com o mínimo de dignidade e suprir suas
necessidades vitais.
Contudo, ao focalizar somente a variável renda para se analisar
as desigualdades, cometemos o equívoco de apresentar uma visão
incompleta e simplista sobre o tema.

–  108  –
Gêneros textuais e tipos de textos

As verdadeiras faces das desigualdades não se manifestam ape-


nas no aspecto econômico. Estão presentes nos antagonismos raciais,
sexuais, nacionais comportamentais, etc.
É importante salientar que nos Estados Unidos, por exemplo,
para se medir o status de um indivíduo, a cor da pele, em várias oca-
siões, é mais importante do que a conta bancária.
Já em países extremamente religiosos, notadamente nas socie-
dades muçulmanas, as mulheres, mesmo possuindo uma condição
financeira favorável, são menos valorizadas socialmente do que os
homens pobres.
Em suma, as causas das desigualdades sociais são extremamente
complexas, não podem ser atribuídas a um único fator.
Contudo, as desigualdades, ao serem historicamente construí-
das, também podem ser historicamente minimizadas.
Desse modo, mais importante do que entender as origens das
desigualdades entre os seres humanos, é propor formas pragmáticas
de extirpá-las.³
E esta tarefa não está a cargo apenas dos intelectuais. Con-
siste, talvez, no maior desafio para a nossa sociedade neste início
de século.
Notas
1. “O operário moderno, [...] ao invés de se elevar com o progresso da
indústria, desce cada vez mais, caindo inclusive abaixo das condições
de existência de sua própria classe.” (MARX, 2000, p. 56).
2. “[...] A burguesia não forjou apenas as armas que lhe trarão a
morte; produziu também os homens que empunharão essas armas –
os operários modernos, os proletários.” (MARX, 2000, p. 51).
3. Lembrando as palavras de Marx, mais importante do que inter-
pretar o mundo, é ter o atrevimento de transformá-lo.

–  109  –
Leitura e Escrita na Era Digital

Referências bibliográficas
ARISTÓTELES. A Política. Tradução de Nestor Silveira Chaves. São
Paulo: Escala, s. d.
MARX, K. Contribuição à crítica da economia política. São Paulo:
Martins Fontes, 1977.
MARX, K; ENGELS, F. Manifesto do Partido Comunista. Tradu-
ção de Pietro Nassetti. 2. ed. São Paulo: Martin Claret, 2000.
ROUSSEAU, J. J. Discurso sobre a origem da desigualdade entre os
homens. São Paulo: Escala, s. d.
SEN, A. Desigualdade Reexaminada. 2. ed. Rio de Janeiro: Record,
2008.
SOUZA, J. Os Batalhadores Brasileiros – Nova classe média ou
nova classe trabalhadora? Belo Horizonte: UFMG, 2010.
WEBER, M. Ensaios de Sociologia. 5. ed. Rio de Janeiro: Guana-
bara, 1982.
Fonte: LADEIRA, F. F. Considerações sobre as faces das desigualdades
entre os seres humanos. Disponível em: <http://artigocientifico.uol.com.
br/uploads/artc_1325883740_70.pdf>. Acesso em: 19 set. 2012.

Da teoria para a prática


É indiscutível a necessidade do domínio da teoria dos gêneros textuais
para todo cidadão que vive em uma sociedade letrada, ou seja, que exige o
domínio da língua para que se tenha acesso aos bens culturais, práticas sociais
de leitura e escrita, cidadania efetiva. Deste modo, em todas as circunstâncias
acadêmicas e profissionais, precisamos dominar a estrutura dos textos e dis-
cursos que fazem parte de nossas relações e práticas sociais.
Desta forma, além dos textos apresentados no material, há necessidade
de se buscar outros tipos de textos, compreender sua função e estrutura,

–  110  –
Gêneros textuais e tipos de textos

para poder comunicar-se com competência. Para alçarmos títulos acadê-


micos, desde o ensino fundamental até especializações, como o doutorado,
devemos dominar a produção de textos dissertativos. Para entrarmos em um
curso superior, o teste mais importante é o que exige a produção de uma
argumentação a respeito de um tema polêmico. Para concluir a graduação,
temos que produzir um relatório de estágio ou um artigo. Para concluir uma
especialização, devemos produzir uma monografia. Para sermos aceitos em
um mestrado, precisamos apresentar um projeto de pesquisa e, na conclusão,
para recebermos o título, devemos escrever uma dissertação.
Esta dissertação pode se transformar em um projeto para fazermos um
doutorado que, ao final, exige a defesa de uma tese. Portanto, para que tenha-
mos sucesso acadêmico e profissional, saber escrever é fundamental.

Síntese
Neste capítulo, dialogamos sobre os gêneros textuais e vimos que eles
são inumeráveis, uma vez que, em cada situação de interação verbal, há
necessidade de se saber qual é a melhor maneira de utilizar a linguagem.
Necessário é observar os três elementos essenciais: os conteúdos ideologi-
camente conformados, que se tornam dizíveis por meio do gênero; a forma
de composição, a estrutura formal dos textos pertencentes ao gênero; e as
marcas linguísticas ou de estilo, que levam em conta as questões individuais
de seleção e opção: vocabulário, estruturas frasais, preferências gramaticais.
Vimos, também, alguns textos que fazem parte da vida dos profissionais
de qualquer área, como o relatório, a ata, o currículo, o artigo e cada um com
os seus elementos essenciais.
Destacamos, ainda, a importância do conhecimento dos modos discur-
sivos que podem ser usados em todos os gêneros, dependendo do objetivo
que se quer alcançar com as palavras, que são: a narração, a descrição, a dis-
sertação opinativa ou argumentativa.

–  111  –
6
Tecnologias da
Informação e da
Comunicação

Neste capítulo, a proposta é estudar os gêneros v­ irtuais surg-


Neste capítulo, a proposta é estudar os gêneros virtuais surgidos
com o advento da internet no mundo contemporâneo, presen-
tes no ciber ou hiperespaço. São os gêneros que surgem com as
novas tecnologias, em um novo suporte – o computador, e todas
as suas variações – que na sua maioria, têm similares em outros
ambientes, tanto na oralidade como na escrita.
O meio virtual, portanto, transformou a maneira de ler e
escrever, trazendo o hipertexto como um novo espaço em que
leitor e escritor encontram-se diante de novos processos de pro-
dução e compreensão textuais, de novas formas de linguagem e
interagindo com sua multiplicidade, de um novo código que usa
o teclado para “conversar”, ou seja, fala escrevendo (ou será que
escreve falando?), exigindo, para tal, novos recursos linguísticos
Leitura e Escrita na Era Digital

6.1 Cibercultura e hipertexto


Pierre Lévy é considerado o filósofo da informação. Sua obra trata da
transformação sofrida pela sociedade após o advento da internet, a cha-
mada Era da Comunicação. Segundo o estudioso, as tecnologias digitais
colocam a humanidade em um caminho sem volta. As práticas, atitudes,
modos de pensar e valores estão transformados por causa desse novo
espaço de comunicação, o espaço da inteligência coletiva.
Lévy (2005) define ciberespaço deste modo:
O ciberespaço é uma espécie de objetivação ou de simulação da
consciência humana global que afeta realmente essa consciên-
cia, exatamente como fizeram o fogo, a linguagem, a técnica, a
religião, a arte e a escrita, cada etapa integrando as precedentes e
levando-as mais longe ao longo de uma progressão de dimensão
exponencial (LÉVY, 2005, p. 22).

Isso ocorre porque “(...) a internet é um hipertexto produzido cole-


tivamente num contexto ciberespacial, tecnicamente interligado por uma
imensidade de computadores plugados em rede universal” (COSTA,
2000, p. 22).
O hipertexto é um texto que vem acompanhado de vários links, possi-
bilitando uma leitura não linear, já que o leitor se encontra livre para modi-
ficar o caminho de sua leitura quando os acessa. A palavra inglesa link
é usada para designar as hiperligações do hipertexto. Significa “atalho”,
“caminho” ou “ligação”. Por meio dos links, é possível produzir docu-
mentos não lineares, interconectados com outros documentos ou arqui-
vos a partir de palavras, imagens ou outros objetos. Navegar, como se
diz usualmente, é seguir uma sequência de links, agregando interatividade
ao documento e somando rapidamente outros conteúdos sobre o assunto
específico de que se está tratando.
Para Marchuschi (2005), o hipertexto não pode ser tratado como
um gênero e, sim, como um modo de produção textual que pode
estender-se a todos os gêneros, dando-lhes, nesse caso, algumas
propriedades específicas.

– 114 –
Tecnologias da Informação e da Comunicação

Segundo Lévy (1999), as pessoas têm a possibilidade de organizar e


classificar os conteúdos analisados na rede. Dessa forma, a obra, na ciber-
cultura, é aberta, móvel, em contínuo processo de transformação.
Marcuschi (2005) define as características do hipertexto:
a) não linearidade – significa flexibilidade para definir o trajeto da
leitura entre os vários nós do texto;
b) volatilidade – implica a não estabilidade do texto impresso, as
escolhas são tão passageiras quanto as conexões executadas
pelos leitores;
c) topografia – o espaço de escrita e de leitura não possui limite
definido;
d) fragmentariedade – em geral, as ligações são breves, com
possíveis retornos ou saídas;
e) acessibilidade ilimitada – permite o acesso a todo tipo de fonte:
dicionários, museus, obras científicas, literárias;
f) multissemiose – possibilita a junção, ao mesmo tempo, da
lingua-gem verbal e da não verbal;
g) interatividade – refere-se à interconexão interativa, pela facili-
dade de estabelecer contatos com muitos autores;
h) intertextualidade – diz respeito à presença de textos variados,
citações, notas.
No mapa destacado a seguir, foi construído um encaminhamento
dos processos que ocorrem na comunicação virtual mostrando grandes
linhas. Temos as possibilidades do ciberespaço – como a Internet e a
realidade virtual – os fundamentos – como a cibernética, o hipertexto
ciborgue e ciberarte –, as condições tecnossociais, as redes sociais e os
problemas que podem advir no uso desta tecnologia de comunicação –
como dependência, isolamento e sobrecarga cognitiva e as informações
duvidosas. Por meio dele, podemos nos aprofundar neste caminho.

– 115 –
tekhné: saber fazer humano X fazer da natureza
técnica X homem: uma relação recursiva

PRIMO,
LEMOS,
Internet: raízes Vida digital: bits X átomos (Negroponte)
militar e acadêmica real X hiper-seal: comunicação X simulação
Razão
(Baudrillard)

A.

A.
interface tecnológica
real X potencial velocidade e indústria do esquecimento (Virilio)
atual X virtual realidade virtual e Ciberespaço tautismo: repetição e isolamento (Sfez)
games telepresença Tecnologia ciberdemocracia (Lévy)
comunicação ubíqua agentes de Fases do desenvolvimento indiferença (até a idade média)
inteligência artificial Condições conforto (modernidade)
Leitura e Escrita na Era Digital

tecnológico (Lemos) ubiquidade (pós-modernidade)

Interação
tecnossociais

Cibercultura:
sociedade em sujeito fragmentado; persona, sinceridades sucessivas
rede (Castells) Socialidade
formismo, vitalismo (Maffesoli)
pós-moderna
Inteligência coletiva Redes sociais ética da estética (Maffesoli) tribalismo (estar-junto)
e-mail, IM presenteísmo e o efêmero

contemporânea. Porto Alegre: Sulina, 2002.

mediada
portal comunidades virtuais

LÉVY, P. Cibercultura. São Paulo: 34, 1999.


homepage hedonísmo
fórum

tecnologia
Web 1.0:
livro de visita

– 116 –
cibercultura, cognição. Porto Alegre: Sulina, 2007.
(publicação)
álbum de fotos

por
informação/meme

e
blogs cibernética (Wiener)
cibernética de segunda ordem
marketing viral Cibercultura interação mútua e
redes de relacionamento interação mediada reativa (Primo) produção biopolítica
Web 2.0:

vida
social bookmarking e por computador Conflito e tragédia do comunal 
folksonomia (cooperação) dilema do prisioneiro
cooperação
webjornalismo Fundamentos Memex e Xanadu
copyright, copyleft,
participativo creative commons
Hipertexto links

computador:
social
escrita coletiva tipos: potencial, colagem, cooperativo (Primo)
dependência Ciborgue
ética hacker: “toda informação deve ser livre”
dominação e vigilância

na
Ciberpunk “faça você mesmo”
informação duvidosa Problemas ativismo e resistência na rede
isolamento e sobrecarga obra aberta
Ciberarte autoria coletiva
cognitiva

comunicação,
cultura
Tecnologias da Informação e da Comunicação

Considerando esses aspectos do mundo virtual, a imagem a seguir


representa o hipertexto, conceito essencial quando tratamos da comuni-
cação e dos gêneros virtuais. Ao contrário de um texto tradicional, o qual
lemos e, a partir dele, podemos procurar outro, e assim por diante. Como
em uma leitura linear, o hipertexto possui links dentro dele que podem
levar-nos automaticamente para outros, todos conectados como uma
imensa rede de informação. A leitura deixa de ser linear.

Fonte: O que é hipertexto?. Disponível em: https://www.todamateria.com.br/o-que-e-


hipertexto/. Acesso em 06 de março de 2021.

6.2 Gêneros virtuais


Gêneros virtuais são as novas modalidades de gêneros textuais sur-
gidos com a internet, que permitem a comunicação e a interação entre
duas ou mais pessoas, mediadas pelo computador.
O tipo de comunicação que prospera na internet se relaciona com
a liberdade de expressão, a emissão livre de mensagens, a comuni-
cação orientada para uma determinada criação coletiva, surgindo

– 117 –
Leitura e Escrita na Era Digital

desta forma um sistema hipertextual global verdadeiramente inte-


rativo (CASTELLS, 2003, p. 24).

A linguagem da internet reflete a “necessidade de diminuir o tempo


de escrita e se aproximar do tempo de fala levou os usuários a ser cada
vez mais objetivos e compactos.” (XAVIER, 2007, p. 90). O já chamado
“internetês” é uma demonstração desse novo tipo de escrita. É a redução
das palavras, como ocorre em pq, vc, kd, tb, hj, fds, flw. A par disso,
é comum modificar a ortografia das palavras com letras que refletem
os sons da fala, como em naum, amow, tah, jah, eh. Também faz parte
dessa linguagem o uso de letras de forma que intensifiquem o sentido
das palavras, como se transmitisse animação, como nos termos gatee-
nha, bjãoooo, abssssssssss, demonstrando a criatividade dos usuários e
inovando a construção da linguagem virtual.
Sobre a escrita dos discursos eletrônicos, Crystal (apud MARCUS-
CHI, 2005, p. 5) menciona três aspectos que devem ser verificados:
1. do ponto de vista dos usos da linguagem – tem-se uma pontua-
ção minimalista, uma ortografia um tanto bizarra, abundância de
siglas, abreviaturas nada convencionais, estruturas frasais pouco
ortodoxas e uma escrita semialfabética;
2. do ponto de vista da natureza enunciativa dessa linguagem –
integram-se mais semioses1 do que usualmente, tendo em vista a
natureza do meio com a participação mais intensa e menos pes-
soal, surgindo a hiperpessoalidade;
3. do ponto de vista dos gêneros realizados – a internet trans-
muta, de maneira bastante complexa, gêneros existentes, desen-
volve alguns realmente novos e mescla vários outros.
Com todas essas inovações na linguagem, alguns gêneros virtuais
universalmente utilizados são: os e-mails, os chats ou salas de bate-papo,
os blogs e tantos outros que surgirão em um espaço muito breve de tempo,
porque a tecnologia avança de forma espetacularmente veloz.
Marchuschi (2005, p. 13) estabelece um paralelo entre os gêneros
emer-gentes e os já existentes.

1 Semiose tem a ver com o Processo de Significação, ou seja, com a Produção de Significados.

– 118 –
Tecnologias da Informação e da Comunicação

Gêneros emergentes Gêneros já existentes


E-mail Carta pessoal/bilhete/correio
Bate-papo virtual em aberto Conversações (em grupos abertos?)
Bate papo virtual reservado Conversações duais (casuais)
Bate-papo ICQ (agendado) Encontros pessoais (agendados)
Bate-papo virtual em salas privadas Conversações (fechadas?)
Entrevista com convidado Entrevista com pessoa convidada
Aula virtual Aulas presenciais
Bate-papo educacional Reunião
Vídeoconferência Reunião de grupo/conferência/debate
Lista de discussão Circulares
Endereço eletrônico Endereço postal
Fonte: Marchuschi (2002, p. 13, grifo nosso).

6.2.1 E-mail
É o texto que desempenha o papel de correio eletrônico. É um similar da
carta, do memorando, do bilhete, da conversa informal, das cartas comerciais
e até mesmo de um telegrama. A principal característica do e-mail é o assin-
cronismo das mensagens – ou seja, a interação não ocorre ao mesmo tempo,
os usuários enviam as mensagens e elas podem ser respondidas em um outro
momento futuro, ao contrário de interações síncronas, que funcionam como
uma conversa ao vivo – e o fato de possibilitar o envio de sons e imagens
rapidamente. No geral, os interlocutores são conhecidos ou amigos e rara-
mente ocorre o anonimato, o que é uma violação de normas do gênero (tal
como uma carta anônima). Essa característica o diferencia dos bate-papos.
Por outro lado, os e-mails, em geral, são pessoais, o que os diferencia das
listas de grupos ou de fóruns de discussão (MARCUSCHI, 2005, p. 21-24).
No meio educativo, o e-mail também se tornou um instrumento impor-
tante para comunicação entre os pares, tanto no ensino a distância (em espe-
cial) quanto no presencial, pois todas as determinações ficarão registradas
para possíveis embates entre professores e alunos. Além disso, com a possi-

– 119 –
Leitura e Escrita na Era Digital

bilidade de intercâmbio com outras comunidades escolares, a produção do


conhecimento torna-se plural pelo acesso a diferentes culturas.
No entanto, alguns problemas podem ocorrer no uso desse gênero,
tais como o retorno da mensagem se o endereço não estiver correto ou
se a caixa de correspondência do receptor estiver cheia. Contudo, o mais
grave é quando a comunicação vem contaminada com vírus, falsificada,
podendo causar danos irreversíveis no seu aparelho eletrônico.

Fonte: ATIVIDADE SOBRE O GÊNERO E-MAIL. Disponível em: http://


professorjeanrodrigues.blogspot.com/2019/05/atividade-sobre-o-genero-e-mail.html.
Acesso em 06 de março de 2021

6.2.2 Chats – bate-papos virtuais


Compreende o gênero da conversa seja formal ou informal, no caso,
virtual. Tornou-se um dos mais populares gêneros praticados, trata-se de um
sistema gratuito oferecido na internet que permite uma interação sincrônica
e simultânea, em tempo real, e pode ser compartilhado com muitas pessoas
ao mesmo tempo. Possui como característica uma linguagem própria, pre-
sença de abreviações em muitos casos, etiquetas e, ainda, o uso de emojis.

As interações realizam-se nas mais diversas plataformas: em aplica-


tivos de conversa, como o Whatsapp, em chats de ajuda, como os encon-
trados em diversos sites, sejam de lojas ou instituições de ensino, ou em
grupos de discussões. Cada uma dessas plataformas exige de seu usuário

–  120  –
Tecnologias da Informação e da Comunicação

um determinado comportamento, seja relacionado ao conteúdo a ser con-


versado, seja na forma com que ele será escrito.
Esse é um dos pontos principais a ser observado quanto a essa forma
de interação. Como se trata de um contexto de conversa, muitos assumem
a fala informal como guia. No entanto, deve-se pensar onde estamos con-
versando. A informalidade, abreviações e emojis são aceitos, sim, mas
apenas quando estamos interagindo com amigos. Esse tipo de escrita não é
adequado em um contexto de fórum acadêmico, chat de ajuda ou situações
mais profissionais.

Fonte: Google Chat: veja como funciona e quais são os recursos do mensageiro. Disponível
em: https://www.techtudo.com.br/listas/2020/06/google-chat-entenda-como-funciona-e-
quais-sao-as-funcoes-do-programa.ghtml. Acesso em 06 de março de 2021.

Esse é um dos grandes gêneros aliados do ensino a distância, uma


vez que é possível a interação face a face com os alunos para as mais
variadas atividades, seja para o trato de questões de ensino-aprendiza-
gem, seja para videoconferência.

6.2.3 Weblog
É um modo de comunicação assíncrona e com arquivamento dos dados
para consulta. Pode-se colocar imagens, links e desenhar a página de apre-

–  121  –
Leitura e Escrita na Era Digital

sentação com criatividade. É possível a interação, uma vez que os leitores


podem fazer comentários ou críticas sobre tudo o que foi postado pelo dono
do blog, conhecido como “blogueiro”. Caracteriza-se como um diário virtual
público, logo, as postagens podem ser diárias e aparecem numa ordem
cronológica reversa, ou seja, a mais atual aparece sempre em primeiro lugar.
Esse gênero foi rapidamente assimilado para os mais variados fins, como
divulgação de serviços, literária, política, religiosa, culinária.

Fonte: NASCIMENTO, J. Cisposeremo. Disponível em: <http://danieljaque


sisposeranno.blogspot.com.br/>. Acesso em: 26 out. 2012.

O blog, no ambiente escolar, pode contribuir consideravelmente para


o processo de ensino e aprendizagem, pois dá autonomia ao aluno na cons-
trução do conhecimento da área, permite a troca de informações entre os
pares e a comunidade, melhora a escrita e a leitura e amplia a pesquisa.

6.2.4 Listas de discussão


São “(...) comunidades virtuais que se agrupam em torno de inte-
resses bem determinados e operam via e-mails como forma de contato.
São gêneros fun- dados numa comunicação assíncrona” (MARCUSCHI,
2005, p. 36, grifo nosso). Enquanto no e-mail e no chat predomina a lin-

–  122  –
Tecnologias da Informação e da Comunicação

guagem informal, nas listas de discussão, em geral, são colocados em


pauta tópicos acadêmicos ou profissionais que levam os participantes a
usarem uma linguagem formal.
A principal característica da lista de discussões é a transmissão de
informações sobre os tópicos da lista, úteis ao grupo, não permitindo men-
sagens pessoais ou de interesses individuais.

6.2.5 Videoconferência interativa


A videoconferência interativa, também conhecida como audioconfe-
rência interativa, é “um gênero que se aproxima dos bate-papos virtuais

–  123  –
Leitura e Escrita na Era Digital

com convidados, mas têm tema fixo e tempo claro de realização com
parceiros definidos” (MARCUSCHI, 2005, p. 36).
Como se estivessem em um mesmo local, os participantes que estão
em lugares diferentes podem ver e ouvir uns aos outros. Também é possí-
vel a interação em tempo real em áudio e vídeo, simultaneamente. Muitas
empresas usam esse sistema para suas intercomunicações empresariais
entre as várias localidades de suas empresas. O mesmo pode ser feito na
educação, em especial, por ocasião de palestras e conferências, como o
Zoom, Teams e Google Meet.

Fonte: Shutterstock/Avava

6.2.6 Fórum de discussão


É um espaço virtual privilegiado na construção colaborativa do
conhe- cimento, que desenvolve relações sociais e afetivas por discursos
escritos e compartilhados. É um espaço de conversação, interação e diá-
logo escritos. Percebe-se, assim: “a fronteira entre escritor e leitor mais
imprecisa, pois o leitor-navegador não é um mero consumidor passivo,
mas um produtor do texto que está lendo, um coautor ativo, capaz de ligar
os diferentes materiais disponí- veis, escolhendo seu próprio itinerário de
navegação” (COSTA, 2000, p. 4).
A comunicação é assíncrona e permite que, antes de enviar a mensa-
gem, o autor reflita, faça correções e envie, com bastante convicção, suas
ideias e percepções sobre o assunto. É possível, também, realizar fóruns

–  124  –
Tecnologias da Informação e da Comunicação

previamente agendados pelo organizador, o qual permitirá a comunicação


sincrônica. A grande vantagem, em termos de pesquisa, é que as mensa-
gens ficam registradas para futuras análises.

Fonte: Guia de acesso ao Moodle – Alunos. Disponível em: http://ead.ifce.edu.br/mod/


book/view.php?id=4190&chapterid=7. Acesso em 06 de março de 2021.

6.3 Gêneros virtuais e redes sociais


Para dar suporte a essa gama de interações textuais virtuais, existe
uma série de redes sociais, como Instagram, Facebook, Twitter, Tiktok e
LinkedIn, que permitem aos usuários da internet vivenciar as mais diver-
sas relações para além das suas comunidades locais.
Por este motivo, as pessoas estão se relacionando a todo instante e
qualquer informação que surge, automaticamente, já está circulando na
rede. Não podemos esquecer de que contatos, sejam no mundo real ou no
virtual, são importantes para o sucesso das pessoas, pois, por meio deles,
ampliamos o conhecimento técnico ou não do mundo que nos cerca e,
dessa forma, o conhecimento pode transformar-se em poder. Assim, quanto
mais pessoas você conhece, melhor será para aumentar o seu networking,
a sua rede de contatos, e maior será a possibilidade de conseguir uma

–  125  –
Leitura e Escrita na Era Digital

boa colocação profissional. Ou seja, deve-se procurar ser competente,


comunicando-se efetivamente, não apenas com seus pares, funcionários e
chefes, mas, também, com todos com os quais você tenha contatos.

6.4 Gêneros virtuais e leitura


A leitura, assim como a escrita, foi totalmente renovada: nasceu o
texto aberto, interativo. Além dos artefatos eletrônicos criados para ela,
os meios eletrônicos possibilitaram uma revolução na estrutura narrativa,
tendo em vista todos os recursos de que o mundo virtual dispõe: “A inte-
ratividade estabelece uma nova conceituação e uma nova relação entre o
leitor e o texto.” (NEITZEL, 2009, p. 193).
O livro que se lê em meio virtual é chamado de e-book ou livro digi-
tal. Na rede, já existe uma infinidade de livros disponíveis para download.
Para arquivar essa demanda, existe um website chamado EbookCult, uma
biblio- teca virtual com centenas de livros eletrônicos.
O lançamento, em 2011, do romance policial Grau 26: a origem, escrito
por Anthony E. Zuiker, em parceria com Duane Swierczynski, os mesmos
autores da série americana CSI, tornou a teoria uma realidade. A obra per-
tence a uma trilogia, mescla leitura, elementos cinematográficos e interativi-
dade com todas as redes digitais – Facebook, Twitter, Instagram – e oferece,
ainda, o “Jogo do Assassino”. Foi classificado como um “digilivro”.
Para facilitar a leitura virtual, libertando o usuário da imobilidade
do computador, foram criados outros aparelhos eletrônicos. Um deles é o
Kindle, lançado em 2007 pela empresa americana Amazon. Além da fun-
ção principal, que é ler e-books, o aparelho possibilita o acesso a outros
tipos de mídia digital.
Com a mesma função, foi lançado, em 2010, pela Apple, o iPad, um
aparelho em formato de prancheta digital que já está na sua terceira ver-
são. Além de leitor de livro digital, une computador, videogame, aparelho
de som e vídeo. Os livros disponibilizados no tablet são chamados de
iBooks. Seu criador, Steve Jobs, classificou-o como aparelho mágico e
revolucionário. O iPad tem mais recursos que o Kindle, entre os quais
se destaca o menu do aplicativo, que apresenta uma espécie de prateleira

–  126  –
Tecnologias da Informação e da Comunicação

digital, mostrando os títulos que o usuário já possui. Além disso, a tela


mostra a página do livro digital como se o leitor olhasse para o produto
em formato de papel.
Esse mercado de livros eletrônicos vem crescendo a cada dia. Embora
ainda minoritário em comparação com o consumo de livros físicos, apenas
4% do mercado brasileiro, esse tipo de produto teve 115% de aumento de
aumento em seu faturamento entre os anos de 2016 e 20172 . As vantagens
desse novo serviço é que os leitores podem comprar os livros pelo site, ler
em dispositivos eletrônicos e, ainda, armazenar os títulos adquiridos em
suas contas.

6.6 O mundo digital na prática


Todos os que se iniciam na arte da tecnologia e, principalmente, para
os que ficam muito conectados, ou fazem parte da “geração internet”, os
meios eletrônicos de comunicação transformaram-se em uma extensão de
si, um modo de vida.
Essas mudanças provocaram uma nova forma de viver. Segundo
Bauman (2001), da solidez caminhou-se para a fluidez nos aspectos essen-
ciais da vida humana: na individualidade, no tempo e espaço, no trabalho
e na comunidade. Não há como fugir desse novo estado de coisas. Ele já
se instalou: ou você busca o letramento digital, ou está fora do processo
profissional, educacional e social.

Síntese
Neste capítulo, fizemos um passeio pelos caminhos da comunicação
virtual. Vimos que o texto da internet é o hipertexto, ou seja, um texto com
proporções gigantescas, possibilitadas pela abertura dos links.
Com o advento do hipertexto e das novas possibilidades de comuni-
cação pela internet, vários novos gêneros textuais foram surgindo para se

2 Venda de livros digitais cresce 115% em três anos, mostra pesquisa. Disponível em: ht-
tps://www1.folha.uol.com.br/ilustrada/2020/08/venda-de-livros-digitais-cresce-115-em-
-tres-anos-mostra-pesquisa.shtml. Acesso em 07 de março de 2021.

–  127  –
Leitura e Escrita na Era Digital

adequarem a essa nova modalidade de produção. Entre eles, destacam-se


os e-mails, os chats ou salas de bate-papo e os blogs. Em todos pode-
-se fazer uso da linguagem formal, quando em situações educacionais e
profissionais, e da linguagem informal, quando em situações de relações
interpessoais amigáveis. Esses textos podem ser produzidos sincrônica ou
assincronicamente entre os usuários. Para otimizar e ampliar as comu-
nicações e informações, foram criadas plataformas para as redes sociais
virtuais, com suas regras e objetivos, facilitando a interação mundial.
Foi possível compreender, também, que a leitura sofreu mudanças
significativas, uma vez que o leitor pode interagir com a obra interferindo
na relação entre os personagens ou dialogar virtualmente com outros leito-
res da mesma obra. É fácil de ser acessada por meio dos suportes digitais,
como os tablets, os celulares e computadores, aos sites que disponibilizam
livros, revistas e jornais, muitos deles gratuitos. O mais importante foi
compreender as características da linguagem por meios eletrônicos:
não linear, volátil, topograficamente livre, fragmentada, com acessibi-
lidade ilimitada, interativa e intertextual.

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Referências
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