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Original Article 27
1 Programa de Pós-Graduação em Saúde da Mulher (Mestrado) da Address for correspondence Caroline San Severino Teixeira,
Universidade Federal de Minas Gerais, Belo Horizonte, MG, Brasil Nutricionista, Rua Raimundo Ludgero Alves, 05. Centro, Paula
2 Faculdade de Medicina da Universidade Federal de Minas Gerais, Belo Cândido, MG, Brasil CEP: 36544-000
Horizonte, MG, Brasil (e-mail: carolinesanseverino@yahoo.com.br).
renda, principalmente no interior, indicador que pode ser pouco favorável à nutrição
das gestantes neste período. Estudos de associação entre hábito alimentar e saúde do
recém-nascido irão contribuir para maiores informações sobre a nutrição no período
gestacional.
O presente estudo teve como objetivo verificar se existem alimentos na Pirâmide Alimentar Adaptada para gestantes2 e
diferenças importantes em alguns aspectos nutricionais foi utilizado o parâmetro recomendado pelo Instituto de
entre dois grupos de gestantes acompanhadas em serviços Medicina12 para ganho de peso em gestantes, de acordo com
de atenção pré-natal, na região metropolitana e em uma o trimestre.
pequena cidade do interior do Estado de Minas Gerais, Brasil. Em relação à análise estatística, foi realizado uma análise
descritiva para as variáveis quantitativas e qualitativas, com
o uso de medidas de tendência central (usou-se o teste t para
Métodos
comparação de médias, uma vez que as suposições de
O presente trabalho teve a participação de 240 gestantes, em normalidade foram garantidas).
idade entre 18 a 40 anos, em atendimento pré-natal no Em um segundo momento, foi realizado uma comparação
Ambulatório Jenny Faria, em Belo Horizonte (BH) e Posto entre região metropolitana e interior, relacionando o ganho
de Saúde Padre Antônio Mendes, situado na cidade de Paula de peso com as variáveis de alimentação. A comparação foi
Cândido (PC), MG. As gestantes foram divididas em grupos, feita de forma inferencial, utilizando o teste qui-quadrado de
de acordo com cada trimestre, sendo 30 gestantes por Independência para avaliar relação do ganho de peso com a
trimestre na cidade do interior e 50 por trimestre na região alimentação, diferenciando para cada região. O nível de
metropolitana, totalizando 90 gestantes acompanhadas em significância para todos os testes foi de 5%, e utilizado o
Paula Cândido e 150 em Belo Horizonte. O quantitativo programa SPSS versão 15.0.
amostral foi baseado a partir da metodologia de diversos
estudos publicados. O trabalho apresentou modelo do tipo
Resultados
transversal, havendo um contato com cada gestante.
Foi aplicado um questionário de frequência alimentar(QFA) Em relação às variáveis socioeconômicas, em ambos os
contendo informações como idade, cor, escolaridade, estado grupos, houve predomínio das gestantes que são casadas
civil, trabalho fora de casa e renda mensal. Além disto, foram (BH ¼ 56,6%; PC ¼ 46,6%) e não trabalham fora de casa
aferidos o peso e estatura atual, assim como questionado o (BH ¼ 54,6%; PC ¼ 84,4%), a variável escolaridade apresen-
peso habitual anterior à gestação (peso pré-gestacional). Caso tou maior porcentagem de ensino médio completo na região
a gestante não se lembrasse, foi utilizado o primeiro peso no metropolitana (46%) e ensino fundamental incompleto na
cartão da gestante, posteriormente foi calculado o IMC (índice região interior (28,8%) (►Fig. 1).
de massa corpórea) pré-gestacional e atual. A comparação das médias entre interior e região metro-
Em relação à alimentação foram analisadas questões politana foi significante no trimestre 2 para as variáveis idade
como: quantas refeições fazem ao dia, se tem costume de (p ¼ 0,002), peso pré-gestacional (p ¼ 0,005), peso atual
tomar café (com açúcar) toda hora, óleo utilizado nas refei- (p ¼ 0,0106) IMC pré-gestacional (p ¼ 0,02) e IMC atual
ções e consumo de refrigerante. (p ¼ 0,04). No 3° trimestre houve significância apenas para
O QFA foi dividido em grupos alimentares e considerando os variável peso atual (p ¼ 0,03) (►Tabela 1).
hábitos regionais. Utilizou-se como referência o questionário A frequência das refeições diárias obtiveram predomínio
específico para gestantes, validado por Giacomello et al.11 Não de 3 a 4 refeições por dia no 1° e 2° trimestres (BH ¼ 54,0 e
foi utilizado lista de alimentos, como proposto pelo autor. Já 46%, respectivamente; PC ¼ 66,7 e 63,3%, respectivamente),
que este é um trabalho qualitativo e visa conhecer a alimenta- exceto entre as gestantes do 3° trimestre de BH, que consu-
ção habitual das gestantes de acordo com a pirâmide alimen- miam 5 a 6 refeições ao dia (44%; n ¼ 22). O ganho de peso foi
tar. O QFA foi dividido nas seguintes frequências de consumo: dividido por trimestre e calculado o ganho ponderal signi-
todos os dias, 5 a 6 dias por semana, 3 a 4 dias por semana, 1 a 2 ficativo ou não, baseado nas recomendações propostas pelo
dias por semana, 1 a 3 vezes por mês e raramente/nunca. IOM.12 Portanto, foram classificadas como “não houve ganho
Foram incluídas a frequência de quantas vezes almoça ou janta de peso” as gestantes que estavam dentro da faixa aceitável a
fora de casa; troca almoço e jantar por lanche; consome frutas; partir do seu estado nutricional pré-gestacional. Sendo
consome salada de vegetais crus; salada de vegetais cozidos assim, de acordo com os resultados, houve ganho de peso
(exceto batata, mandioca, inhame); consome carne; consome somente no primeiro trimestre, nas regiões metropolitana e
frituras; se utiliza gordura de porco nas refeições e qual interior (58,0 e 53,3%, respectivamente) (►Tabela 2).
frequência; consumo de leite; consumo de café; consumo de Posteriormente, comparou se o ganho de peso é influen-
pão, biscoito ou bolo; produtos de padaria integral; arroz, ciável ou não por diversos hábitos alimentares. Houve dife-
macarrão; angu; fastfood; alimentos ricos em açúcares e/ou rença para as variáveis “almoça ou janta fora de casa,” no 1°
gorduras; refrigerante e doces. trimestre para as gestantes de BH (p ¼ 0,006); “quantas
Os critérios de exclusão para o estudo foi a presença de vezes consome leite,” no 1° trimestre do grupo do interior
diabetes ou outras doenças endócrinas, eclâmpsia ou pré- (p ¼ 0,03); “quantas vezes consome fastfood,” no 3° trimes-
eclâmpsia, anemia ou outra deficiência nutricional previa- tre das gestantes de BH (p ¼ 0,009) (►Tabela 3).
mente detectada em exame, além de vegetarianismo e
intolerância a glúten e/ou lactose, pois poderia influenciar
no hábito alimentar.
A tabela completa, com todas as informações e valores de
A ingestão alimentar habitual foi avaliada levando em significância podem ser vistas em material suplementar (rbgo.
consideração as porções recomendadas para cada grupo de com.br).
Tabela 1 Comparação das médias, por região, das variáveis idade, peso pré gestacional, peso atual, altura, IMC pré gestacional e
IMC atual
Abreviações: IMCPG, índice de massa corporal pré-gestacional; IMCA, índice de massa corporal atual; PA, peso atual; PPG, peso pré-gestacional.
Teste x2: associação significativa parap < 0,05.
Tabela 2 Número de refeições realizadas por dia e ganho de peso acima do recomendado, por trimestre gestacional e região
menos gestantes se encontram inseridas no mercado de alimentos.6 Por outro lado, em Recife, a baixa escolaridade
trabalho. A literatura refere que condições socioeconômicas contribuiu para o ganho de peso excessivo, o nível de
desfavoráveis produzem resultados insatisfatórios na saúde escolaridade reflete a situação socioeconômica, sendo assim,
da população em geral, e quanto maior a renda, maior o as gestantes com menor poder aquisitivo priorizam o con-
poder de compra e acesso a alimentação variada,18 o que sumo de alimentos mais calóricos (ricos em gorduras, parti-
pode influenciar na saúde materna e fetal. A baixa escolari- cularmente de origem animal, açúcar e alimentos refinados,
dade pode ser vista como agravante na saúde das mulheres, em detrimento aos carboidratos complexos e fibras) por
pois é considerado pelo Ministério da Saúde como fator de terem menor custo.20
risco obstétrico.19 Apesar da maioria das gestantes entrevis- O número de refeições diárias é menor que o preconizado
tadas não ter alta escolaridade no interior, houve busca pelo por Accioly et al,21 que recomenda 5 a 6 refeições por dia. A
serviço de saúde para do pré-natal, o que pode revelar uma dieta deve ser fracionada com menores porções (café da
tendência ao interesse pela sua saúde e de seus filhos. manhã, lanche - opcional, almoço, merenda, jantar, ceia –
Como dito anteriormente, foi observado nas gestantes de opcional com intervalo de 3/3h) para que ao longo do dia,
BH uma tendência a sobrepeso e maior nível de escolaridade, haja aporte de nutrientes e energia necessários. No entanto, o
tal como em estudo realizado em São Paulo, em que gestan- estudo demonstrou predominância de 3 a 4 refeições por dia,
tes com quatro anos ou mais de estudo apresentaram ganho estando adequado somente na região metropolitana no
de quase dois quilos a mais quando comparadas às demais, terceiro trimestre. A análise do consumo alimentar não
sendo a escolaridade considerada um marcador de acesso aos demonstrou grande discrepância com o recomendado pela
Tabela 3 Hábitos alimentares e sua relação com o ganho de peso dentro do recomendado (valores significativos)
Vol. 38
1–2 dias 7 4 11 6 1 7
3–4 dias 0 2 2 1 0 1
5–6 dias 0 1 1 0 1 1
No. 1/2016
Todos os dias 5 0 5 0 0 0
Total 21 29 50 14 16 30
Trimestre 1 Quantas vezes consome leite Ganho de peso Total Valor p Ganho de peso Total Valor p
Não houve ganho Houve ganho Não houve ganho Houve ganho
Raramente/Nunca 5 2 7 0,183 1 1 2 0,030
1–3 vezes/mês 2 1 3 0 1 1
1–2 dias 4 3 7 5 1 6
3–4 dias 2 1 3 4 0 4
5–6 dias 1 3 4 1 3 4
Avaliação nutricional de gestantes em serviços de pré-natal distintos
Todos os dias 7 19 26 3 10 13
Total 21 29 50 14 16 30
Trimestre 3 Quantas vezes consome fastfood Ganho de peso Total Valor p Ganho de peso Total Valor p
Não houve ganho Houve ganho Não houve ganho Houve ganho
Raramente/nunca 19 15 34 0,009 15 4 19 0,682
Teixeira, Cabral
1–3 vezes/mês 8 0 8 5 0 5
1–2 dias 0 3 3 4 1 5
3–4 dias 4 0 4 0 0 0
5–6 dias 1 0 1 1 0 1
Todos os dias 0 0 0 0 0 0
Total 32 18 50 25 5 30
pirâmide alimentar. Houve prevalência no consumo diário de dos e favoráveis à manutenção da saúde, rico em frutas e
frutas, verduras e vegetais, leguminosas, cereais, leite e verduras. Porém, também se verificou um perfil sociodemo-
carnes e baixo consumo de fastfood, alimentos ricos em gráfico pouco favorável ao período gestacional, com baixa
açúcares e/ou gorduras e refrigerante. Isto pode ser conse- escolaridade e renda das entrevistadas, principalmente no
quência do fato de uma nutricionista aplicar os questioná- interior. Sugere-se que estudos mais detalhados sejam re-
rios, levando as gestantes a informar uma alimentação alizados, verificando a associação entre o perfil alimentar da
saudável, já que as mesmas possuem informações sobre gestante e a saúde do recém-nascido, para que seja possível
alimentação saudável, porém, nem sempre as colocam em identificar os fatores de risco gestacionais para a saúde da
prática.22 mãe e do concepto.
Uma limitação do estudo foi a utilização do QFA como
método de avaliação do consumo alimentar, uma vez que ele
contém grupos de alimentos, limitando uma comparação Agradecimentos
com história dietética.23 À Coordenação de Aperfeiçoamento de Pessoal de Nível
Estudos recentes demonstram que alimentos processados Superior – CAPES, pelo auxílio recebido (bolsa de
e industrializados tem sido identificado entre as gestantes mestrado).
em diversas regiões do mundo e reflete as mudanças ocorri-
das no mundo moderno, como a busca por maior comodi-
dade, praticidade e rapidez, que afetam diretamente a
alimentação da população.24–27 No Brasil, similarmente às
Referências
demais regiões do mundo, essas modificações estão relacio-
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30 anos. Rev Nutr 2010;23(5):763–778
padrão de consumo alimentar comprova a tendência de
3 Kowal C, Kuk J, Tamim H. Characteristics of weight gain in
modificação dos hábitos alimentares registrados por pesqui- pregnancy among Canadian women. Matern Child Health J
sas ao longo do tempo.28 2012;16(3):668–676
Nota-se prevalência de consumo de frutas, leite e salada 4 Padilha PC, Saunders C, Machado RCM, et al. [Association between
de vegetais crus ou cozidos (folhas, leguminosas, raízes, etc). pre-gestational nutritional status and prediction of the risk of
Estes hábitos contribuem com a adequação de proteínas e adverse pregnancy outcome]. Rev Bras Ginecol Obstet 2007;29-
(10):511–518
carboidratos simples e complexos e dos micronutrientes
5 Nomura RMY, Paiva LV, Costa VN, Liao AW, Zugaib M. [Influence of
(vitaminas e minerais). Assim, podem estar associados a maternal nutritional status, weight gain and energy intake on
melhores condições de saúde da gestante e ao crescimento fetal growth in high-risk pregnancies]. Rev Bras Ginecol Obstet
e desenvolvimento fetal. Deve-se salientar que esses padrões 2012;34(3):107–112 Portuguese.
apresentam em suas composições nutrientes essenciais para 6 Konno SC, Benicio D’ Aquino MH, Barros AJD. Fatores associados à
evolução ponderal de gestantes: uma análise multinível. Rev
a saúde humana e são considerados os mais próximos das
Saude Publica 2007;41(6):995–1002
recomendações dietéticas emanadas atualmente para gesta-
7 Phelan S, Phipps MG, Abrams B, Darroch F, Schaffner A, Wing RR.
ção e como tal, pode ser o mais intuitivamente associado às Randomized trial of a behavioral intervention to prevent exces-
melhores condições de saúde na gestação, ao crescimento e sive gestational weight gain: the Fit for Delivery Study. Am J Clin
desenvolvimento adequado do feto.29 Em estudo realizado Nutr 2011;93(4):772–779
por Belarmino et al30 foi investigado o consumo alimentar de 8 Cade J, Thompson R, Burley V, Warm D. Development, validation
and utilisation of food-frequency questionnaires - a review. Public
acordo com os grupos de alimentos que compõem a pirâmide
Health Nutr 2002;5(4):567–587
alimentar, sendo categorizados nos seis grupos de alimentos: 9 Pinto E, Severo M, Correia S, dos Santos Silva I, Lopes C, Barros H.
grupo A (pão, arroz, cereais e massas); grupo B (vegetais e Validity and reproducibility of a semi-quantitative food frequency
frutas); grupo C (carnes, aves, peixes e ovos); grupo D (feijão e questionnaire for use among Portuguese pregnant women. Ma-
nozes); grupo E (leite, iogurte e queijo); e grupo F (gorduras, tern Child Nutr 2010;6(2):105–119
óleos e doces). No trabalho supracitado, verificou-se o baixo 10 Slater B, Philippi ST, Marchioni DML, Fisberg RM. Validação de
Questionários de Frequência Alimentar - QFA: considerações
consumo de alimentos do grupo B, diferente do que foi
metodológicas. Rev Bras Epidemiol 2003;6(3):200–208
encontrado no presente estudo. 11 Giacomello A, Schmidt MI, Nunes MAA, et al. Validação relativa de
Muito ainda há que ser feito para que mais gestantes Questionário de Frequência Alimentar em gestantes usuárias de
atentem para educação nutricional satisfatória. Só assim, elas serviços do Sistema Único de Saúde em dois municípios no Rio
poderão compreender melhor o período e as mudanças que Grande do Sul, Brasil. Rev Bras Saude Mater Infant 2008;8(4):
estão vivenciando e poderão praticar hábitos alimentares 445–454
12 National Academy of Science. Institute of Medicine. Nutrition
saudáveis.
during pregnancy: Part I: weight gain, Part II: nutrient supple-
O presente estudo permitiu concluir que as gestantes da ments. Washington (DC): National Academies Press; 1990
região metropolitana e interior, de modo geral, se alimentam 13 Parizzi MR, Fonseca JGM. Nutrição na gravidez e na lactação. Rev
de maneira adequada, com hábitos alimentares diversifica- Med Minas Gerais 2010;20(3):341–353
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