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PSICANÁLISE
SÃO PAULO – SP
2021
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RESUMO
O presente trabalho tem como objetivo identificar o contexto científico que permitiu o surgimento da
psicanálise, bem como as primeiras ideias freudianas voltadas a colocar suas descobertas a serviço
das ciências naturais, como foi dado como certo no projeto de uma psicologia para neurologistas.
Posteriormente, definem-se os desdobramentos teóricos e clínicos que permitiram a Freud abandonar
seu "ideal de cientificidade", construindo um método de investigação de fenômenos psíquicos
inacessíveis de outras formas. Por fim, após a releitura do cogito cartesiano por Lacan, especifica-se
a diferença radical entre o objeto psicanalítico e o objeto da ciência, concluindo com isso que a
psicanálise guarda um lugar estimável entre as ciências. Dessa forma, como metodologia de estudo
optou-se por um levantamento bibliográfico sobre a psicanálise, sua história e as críticas
epistemológicas. De tal modo que foram utilizados como aporte teórico as contribuições de alguns
especialistas deste campo do saber.
1. INTRODUÇÃO
seu limite para a ciência de sua época abriram as portas da pesquisa freudiana para
a construção de um saber próprio (KUHN, 2014).
O pensamento freudiano elaborado durante 1873 e 1882 que contempla o
período mais forte de sua formação médica, foi enormemente influenciado pela
fisiologia de Brücke, levando-o até a aceitar sem preconceitos que o organismo vivo
é um sistema dinâmico que se aplicam às leis da física e química. Daí talvez o seu
profundo interesse, durante os primeiros esboços teóricos, por conduzir as suas
formulações no quadro de uma ciência exata. Podemos ver alguns outros vestígios
de suas formulações neste campo em seus escritos sobre a "histeria" de 1888, onde
destaca a forma teórico-prática de seu comportamento com seus pacientes, que em
nada discordam das "técnicas" utilizadas por Charcot e Breuer com o mesmo
propósito. Porém, por volta de 1886, logo após concluir sua estada em Paris com
Charcot, já havia dado sinais do caminho que mais tarde seguiria liderado por suas
teorias clínicas ((KUHN, 2014).).
A obra intitulada "O discurso do método", escrita por René Descartes durante
o século XVII, lançou as bases do que viria a receber o nome de ciência moderna. A
constatação desta resultou na hipótese de que, para construir um conhecimento
verdadeiramente científico sobre os fenômenos ocorridos no mundo, era necessário
manter o caráter de objetividade em sua abordagem (ASKAFARÉ, 2012).
É preciso reconhecer que a proposta cartesiana do cogito também favoreceu
o avanço de um pensamento que acabaria por conseguir tirar do discurso religioso o
critério da verdade sobre os objetos. Para Japiassu (2009), o cogito cartesiano foi a
proposta que permitiu dar o passo decisivo para colocar a racionalidade científica
acima do dogmatismo religioso, o mesmo que serviu na Idade Média como forma
categórica de explicar todos os fenômenos.
Nessas coordenadas floresceu a chamada ciência moderna, na época em
que a proposta do cogito cartesiano se posicionava como a fórmula de toda
representação do sujeito no pensamento ocidental, aludindo ao propósito de
encontrar um pilar indubitável que daria o passo para a construção de um
conhecimento sobre os objetos.
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O resultado acima descrito foi o que Freud superou, não sem a preocupação
de se separar dessa doutrina com a qual por muitos anos manteve uma interlocução
constante, produto de suas tentativas de legitimar suas descobertas sob tais regras.
Uma vez minados seus anseios de objetividade científica, Freud insistirá em apontar
que suas hipóteses não são fruto de mera especulação, pelo contrário, surgem de
uma laboriosa investigação de cada paciente e são conduzidas sob extremo
cuidado. Em outras palavras:
3 O PROJETO FREUDIANO
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Entre 1882-1962, discípula favorita de Freud; obteve as cartas e manuscritos que se originaram
durante o período de correspondência entre Freud e Fliess.
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econômico, segundo Jones (2007) foi graças ao fato de que nessa perspectiva
Freud se dedicou a pesar a função da experiência de satisfação sobre o objeto.
Dito isto, apesar das recusas expressas por Freud de que as ideias contidas
em seu "projeto" não vieram à luz pública, os postulados aí expressos claramente
tornaram-se uma espécie de matriz de trabalho pelo menos até a elaboração das
"Obras de Metapsicologia" estabelecidas por volta de 1915.
5 CONCLUSÃO
Dito isso, onde a ciência pressupõe que por meio de um controle racional do
sujeito sobre o objeto, se propicia a condição necessária para posteriormente
elaborar um conhecimento exato sobre ele, a psicanálise assumirá que o objeto
(também sujeito) não pode ser submetido a esses controles e, portanto, o
conhecimento sobre eles só podem ser parciais.
Ou seja, ao contrário da soberba racionalidade científica de circunscrever o
pesquisador e o objeto a uma mecânica orquestrada para congelar suas qualidades,
a psicanálise colocou como essa suposta autoridade de controle é ilusória e, pior
ainda, historicamente, tem indicado que tudo o que diz respeito ao pesquisador traz
efeitos ao abordar seu objeto.
Por outro lado, uma das críticas mais fortes que Lacan propôs para definir
mais claramente a distância que a psicanálise mantém em relação à ciência
moderna foi a tese de que em seu objeto esta esconde o próprio cerne da verdade
que estrutura e, portanto, em sua abordagem há sempre algo que lhe escapa.
Essa observação coloca o objeto da psicanálise como “indefinido” para a
investigação científica. A fórmula que Freud tentou construir, a fim de estabelecer
um método capaz de trazer à tona aquilo que ao próprio sujeito aparece como – a
internamente excluído – e que pela palavra pode atingir seu aspecto de causa
material, parece que à luz dos nossos dias, não atingiu maior determinação. Nesse
sentido, a responsabilidade assumida por Freud e Lacan de conceder à psicanálise
um lugar de exclusão no que diz respeito à dita ciência, não foi plenamente
alcançada, o que se confirma ao nos encontrarmos hoje com as chamadas práticas
psicanalíticas com claras aspirações objetivistas e carentes de rigorosidade
metodológica.
REFERÊNCIAS
FOCCHI, M. Psicanálise: uma ética para o século XXI. São Paulo: Perspectiva,
2017.
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JONES, Ernest. Vida e Obra de Sigmund Freud. Rio de Janeiro: Jorge Zahar,
2007.