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ISSN 1983-9731

Foto: Rodiney de Arruda Mauro


COMUNICADO
TÉCNICO Métodos de destino
144 final de animais mortos
de médio e grande
Brasília, DF
porte no Brasil
Setembro, 2019

Rodiney de Arruda Mauro


Marta Pereira da Silva
2

Métodos de destino final de


animais mortos de médio e
grande porte no Brasil1
1
Rodiney de Arruda Mauro, Biólogo, Doutor em Ecologia Tropical, pesquisador da Embrapa Gado de
Corte. Marta Pereria da Silva, Zootecnista, Doutora em Ecologia Tropical, pesquisadora da Embrapa
Gado de Corte.

O objetivo deste trabalho é relatar


Introdução e avaliar cada processo utilizado nas
áreas rurais do Brasil, e em outros paí-
O descarte de cadáveres de mamí-
ses, no descarte de animais mortos de
feros herbívoros domésticos de médio
médio e grande porte, avaliando vanta-
e grande porte é um problema comum
gens e desvantagens de cada um.
nas propriedades que praticam a pecu-
ária extensiva. A legislação ambiental
brasileira preconiza regulamentações Metodologia
para a prevenção da poluição do ar,
solo, água, proteção a mananciais e Foram realizados levantamentos em
manejo adequado de resíduos. bases bibliográficas sobre os principais
processos de destinação final de animais
mortos de médio e grande porte.
Os cadáveres de animais em pro- Evitamos utilizar aqui o termo “car-
priedades rurais podem ser um risco caça”, que apesar de ser correto para
e também uma oportunidade para o animais mortos, é mais utilizado para
produtor. A legislação brasileira que
animais que passam por um processo
trata desse assunto é ainda incipiente.
para consumo humano. Em razão disso
Existem algumas propostas de padro-
seguimos o presente texto: “Entende-se
nização de destino final para animais
por carcaça o bovino abatido, sangrado,
mortos de médio e grande porte que
esfolado, eviscerado, desprovido de ca-
trataremos de descrever neste docu-
beça, patas, rabada, glândula mamária
mento. O nosso país tem dimensões
(na fêmea), verga, exceto suas raízes, e
continentais e com grandes diferenças
testículos (no macho). Após a sua divisão
regionais, culturais, econômicas e so-
em meias carcaças retiram-se ainda os
cioambientais de forma que uma única
rins, gorduras perirrenal e inguinal, ‘feri-
alternativa de descarte pode ser prati-
da-de-sangria’, medula espinhal, diafrag-
cável em uma região e na outra não.
ma e seus pilares” (BRASIL, 1988). Neste
trabalho denominaremos os animais
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mortos com o termo “cadáver”. Desse Segundo o IBGE (2017), o Brasil


modo não haverá confusão com outros possuía 218,23 milhões de cabeças de
termos já consagrados como: rendimento bovinos em 2016, com uma mortalidade
de carcaça, tipificação de carcaças, etc. média de 6%. O descarte de cadáveres
de mamíferos herbívoros domésticos de
Em todo o mundo existem alguns médio e grande porte é um problema
métodos básicos como o enterro, dispo- comum nas propriedades que praticam
sição no ambiente, queima, incineração, a bovinocultura extensiva. A legislação
processamento do animal morto, com- ambiental brasileira preconiza
postagem, digestão anaeróbica, hidrólise regulamentações para a prevenção
alcalina, disposição no oceano, ou a da poluição do ar, água, proteção a
alimentação de espécies não suscetíveis mananciais e manejo adequado de
que apresentaremos posteriormente. resíduos. Acompanhando as informações
no Brasil, sobre esse tema, constatamos

Métodos de Destinação que os métodos mais utilizados pelos


produtores são o enterro e disposição
Final de Animais de no ambiente devido ao menor custo. É,
também, utilizada a compostagem, a
Médio e Grande Porte qual é considerada por muitos como um

Foto: Rodiney de Arruda Mauro

Figura 1. O rebanho brasileiro alcança, atualmente, cerca de 220 milhões de cabeças.


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método econômico e ambientalmente atrativo para animais carniceiros que


correto de destinação de animais mortos. podem expor os cadáveres e disseminar
No entanto existem outros métodos doenças e, implica em custos perma-
que podem ser utilizados variando em nentes de prevenção e monitoramento
eficiência e custo de aplicação. Em todos dos locais de enterro.
os países que são grandes produtores de
proteína animal existe essa preocupação
do correto descarte de animais mortos de Disposição no ambiente
grande porte.
A disposição no ambiente envolve a
oferta de alimento, que é o animal morto,
Enterro para a população local de carniceiros e
predadores. Este método necessita de
A técnica de enterro tem algumas
pouco trabalho porem, o risco de trans-
variações. Basicamente é cavada uma
missão de doenças é alto. Na maioria
cova de 1 a 1,2 metro de profundidade,
dos países este método é proibido.
sendo que a largura e comprimento va-
Com o aumento do aproveitamento dos
ria de acordo com o tamanho do animal
animais mortos pelas indústrias ocorre
morto. Deve-se evitar enterrar animais
naturalmente a diminuição de carniceiros
onde o lençol freático é próximo da su-
perfície. Devemos manter uma distância e predadores.
mínima de 150 metros de fontes de As vantagens são: método fácil e
águas. Não se deve enterrar em lugares econômico e aumento da biodiversidade
propensos a inundações ou à erosão. local de aves, mamíferos e insetos, com
Utiliza-se a cal com frequência para dieta detritívora, necrofágica e carnicei-
controle do mau cheiro. A adição de cal ra. Esse aumento das relações tróficas
limita a atividade microbiana que acelera incrementa o potencial do agroturismo.
a degradação, e por isso esses cadáve- As desvantagens são muitas, por isso
res demoram mais a degradar. Os locais em muitos países esse processo é ilegal.
de enterro devem ser bem sinalizados e Pode ocorrer contaminação do solo e
cercados evitando-se a contaminação e água, risco de organismos patogênicos
entrada acidental de gado e pessoas. As no ar, e as possíveis doenças das causa
vantagens do processo são: contenção mortis ficam sem um controle efetivo.
permanente de surtos de doenças e Outro efeito colateral é o aumento de
pode ser a escolha mais adequada para animais carniceiros e possíveis predado-
as mais diversas topografias onde o uso res do gado bovino, como onça pintada
de uma retroescavadeira é facilitado. (Panthera onca) e parda (Puma conco-
As desvantagens desse processo lor), pois, devido ao aumento da oferta
são: uma má escolha pode levar a con- de comida, a população bem alimentada
taminação da água subterrânea, os odo- tende a se multiplicar criando problemas
res de um local de enterro é um grande para a bovinocultura extensiva.
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Foto: Mariana de Aragão Pereira


Figura 2. Cadáver de bovino deixado no ambiente para decomposição natural, proibido em
muitos países, ainda é praticado em países com baixa tecnologia e falta de regras legais.

Queima haja fluxo de ar suficiente para uma boa


combustão.
Podemos definir a “queima” como um
processo de descarte de animais mortos
utilizando vários materiais combustíveis
Incineração
como: palha, galhos de árvores e restos
A incineração envolve a queima de
de madeira em geral. Aqui podemos in-
material orgânico em um sistema cons-
cluir estratégias como a construção de
pira, queima de cadáveres em fossas truído com material refratário (container,
abertas e utilização de caixas de concre- câmara, recipiente) utilizando ar forçado.
to, metal, etc. com fluxo de ar. Um soprador força um fluxo de ar dentro
A queima de pira envolve o uso de de uma câmara criando um ambiente
material lenhoso, briquetes, etc. Os com alta temperatura que aumenta a efi-
cadáveres são depositados sobre o ciência da incineração. As temperaturas
material combustível garantindo que podem chegar a 1.000°C.
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A Embrapa Suínos e Aves, em aeroportos, abatedouros, propriedades


Concórdia (estado de Santa Catarina) rurais, prefeituras, hospitais, e labora-
desenvolveu um incinerador específi- tórios de diagnóstico incluindo unidades
co para animais de médio porte para de necropsia.
ser utilizado em granjas e criadouros
As desvantagens que podem ser
de suínos. Os primeiros testes foram
consideradas são: equipamento mais
realizados utilizando estes animais. O custoso, devido a tecnologia mais de-
incinerador possui uma câmara na qual senvolvida; uso de combustíveis que
ocorre a queima dos cadáveres. Num encarecem o processo, e a necessidade
segundo estágio (sob uma temperatura de um tempo maior para eliminar gran-
mais elevada) são incinerados os gases des mortandades, entre outras.
produzidos durante a primeira queima.
Este incinerador pode ser utilizado para
outros tipos de animais de pequeno a Processamento
médio porte. Comporta até 60 quilos de
animais mortos ou restos por hora. Se
do animal morto
for utilizado para grandes animais, estes (reciclagem industrial
devem ser retalhados para fazer o pro-
cesso de maneira fracionada. de animais)
O combustível utilizado é o Gás Este processo é utilizado quando a
Liquefeito de Petróleo (GLP) e dentro da causa mortis é conhecida e atestada
câmara a temperatura pode atingir até por um profissional indicando a não
800º C. O preço para aquisição hoje é patogenicidade. São normalmente ani-
de R$ 123 mil. mais mortos em atropelamento, por raio,
As vantagens do incinerador são: queda em buracos, por picada de cobra,
evita a disseminação de agentes in- intoxicação alimentar, entre outros. O
fecciosos nocivos, controlando, desse animal morto é removido da fazenda
modo, doenças consideradas graves; com destino a uma empresa do ramo de
evita a poluição da água, solo e atmos- reciclagem. Os custos de processamen-
fera por meio da queima dos animais to são acordados previamente com os
mortos, incineradores móveis possuem produtores. A farinha de carne e osso,
a vantagem de fácil deslocamento, após o advento da BSE, tem uma série
poluição atmosférica mínima, pouca de controles rígidos para sua utilização
em vários países.
emissão de odores devido ao emprego
de alta temperatura. É muito versátil O processo aqui descrito está
podendo ser utilizado em fábricas de contemplado no Projeto de Lei no.
farinhas de origem animal, frigoríficos, 5.851/2016, do Deputado Federal
clínicas e hospitais veterinários, pos- Valdir Colatto, aprovado em 21/11/2017
tos de fiscalização sanitária, portos, e seguiu para o Senado Federal. Este
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trata exclusivamente do disciplinamen- brasileira de reciclagem animal, repre-


to do aproveitamento de carcaças de sentada pela Associação Brasileira de
animais de produção e resíduos ani- Reciclagem Animal (ABRA).
mais no campo para fins não comes-
Este processo tem as seguintes van-
tíveis. A lei diz o seguinte: Capitulo I:
tagens: excelente controle de doenças
Das disposições preliminares - Art. 1º
na fazenda, sem resíduos ou outros res-
Esta Lei disciplina o aproveitamento de
tos, sem animais carniceiros e/ou necró-
carcaças de animais de produção e re-
fagos. Eliminação é facilitada, pois basta
síduos animais no campo para fins não
contatar os serviços para o transporte,
comestíveis, estabelecendo requisitos
aproveitando-se ainda a produção de
mínimos para a gestão desses resídu-
couro cru e sebo reciclado entre outros
os. Parágrafo único. Os resíduos de
coprodutos.
que trata o caput são compostos pelas
carcaças de animais mortos em condi- Algumas desvantagens levantadas
ções usuais, com exceção das mortes são: o transporte pode ser oneroso para
causadas por Doenças Animais de produtores dependendo da distância da
Notificação Obrigatória, por restos de fabrica processadora, mas a fábrica ou
parto, de cortes de cauda, de castra- a administração municipal ou estadual
ção e de dentes. Art. 2º - As carcaças podem minimizar esses custos, pode
e demais resíduos animais devem ser existir uma exigência de um peso mí-
oriundos de estabelecimentos rurais nimo para o recolhimento devido aos
devidamente autorizados pelos órgãos custos de transporte, o recolhimento
competentes. de animais mortos pode não estar dis-
ponível em todos os municípios, e pode
O projeto de Lei mencionado trata ocorrer também uma demora excessiva
de resíduos animais em geral como, antes da retirada do animal morto em
por exemplo: peixes, suínos, aves, etc. uma propriedade rural.
e não somente de animais de médio
e grande porte. Ainda no texto no seu
Art. 10, diz o seguinte “O processo de Compostagem
reciclagem deve gerar produtos “não
comestíveis”, como sólidos proteináce- Compostagem é um processo natu-
os, gordura fundida e água, podendo ral em que bactérias, fungos e outros
sólidos e gorduras ser utilizados como microrganismos convertem material
ingredientes de ração para animais, orgânico em um produto estabilizado
adubos, biodiesel, saboarias, produtos chamado composto.
de higiene e limpeza e indústria quími- A compostagem de gado morto en-
ca, devendo a água seguir para o sis- volve duas fases. Na primeira fase, os
tema de tratamento adequado segundo cadáveres dos animais são colocados
legislação vigente”. Portanto, neste em uma caixa de compostagem ou em
artigo resguarda a importante industrial
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um amontoado de palha. Um agente ainda mais o crescimento de micróbios


volumoso, com muito carbono, como que degradam os príons.
serragem ou palha, é adicionado para
A compostagem requer algum tempo
cobrir completamente os cadáveres.
e esforço, embora os custos das maté-
Juntamente com o animal morto pode-
rias-primas sejam mínimos. O controle
mos acrescentar estrume, o que acelera
de doenças é bom e o composto resul-
o processo de decomposição.
tante pode ser usado como fertilizante
A segunda fase envolve a revolvi- ou para estruturar o solo. A construção
mento da pilha de compostagem a cada inicial da pilha de compostagem é fun-
tempo e a introdução de ar para ali- damental para o sucesso. Uma monta-
mentar microrganismos aeróbicos, que gem ruim, p.ex. muito úmida ou muito
necessitam de oxigênio, os quais de- seca, com pouca fonte de carbono, não
gradam esses materiais produzidos pela é fácil de corrigir para a obtenção de um
primeira etapa em dióxido de carbono bom coproduto.
(CO2) livre de mau cheiro e água (H2O).
Uma umidade inicial de 50 a 60% é
Este estágio faz com que aumente a
o ideal para o início de uma compos-
temperatura da pilha matando os vírus
tagem. O próprio bovino é uma fonte
mais comuns e bactérias.
de umidade. Ao adicionar estrume e
A compostagem científica foi desen- serragem, quando não temos os valo-
volvida pela primeira vez direcionada res medidos de matéria seca, devemos
para a indústria avícola, utilizando-se espremê-los para avaliar a quantidade
caixas de madeira e serragem em uma de umidade. Se estiver muito úmido
construção coberta. Após o advento soltará água entre os dedos. A umidade
da Encefalopatia Espongiforme Bovina ideal é quando o material forma uma
(EEB, BSE ou mal da vaca louca) e bola nas mãos, mas que se desintegra
“scrapie” (ou mal da roda) em ovinos, ao cair no chão. Após a construção da
estudou-se também a efetividade da pilha, aumentar a umidade não é tarefa
compostagem para bovinos. Xu et fácil. As pilhas pequenas com um ou
al. (2014), em testes realizados com dois animais mortos secam mais rapi-
cadáveres de bovinos, chegaram a damente, e também têm risco maior de
conclusão que é improvável que a ficarem muito úmidas quando expostas
compostagem destrua completamente a chuva, por isso faz-se necessário uma
todos os príons devido à variabilidade cobertura compacta de palha para que
nas condições de compostagem e na a água escorra pelos lados da pilha.
atividade microbiana. No entanto, lon-
O crescimento de bactérias aeróbi-
gos períodos de compostagem podem
cas é essencial para a compostagem.
reduzir a viabilidade dos príons da BSE
Se o composto estiver muito úmido
em pelo menos 90%. A adição de penas
ele oferecerá resistência à passagem
de aves ao composto pode incentivar
de ar. O resultado é a multiplicação de
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bactérias anaeróbicas que geram mau


cheiro na compostagem.
Digestão anaeróbica
A adição de palha com estrume O processo de digestão anaeróbica
auxilia no bom funcionamento do com- de cadáveres ainda está em desenvolvi-
posto devido a melhor aeração. Se for mento em vários países do mundo. Este
adicionar serragem no composto o im- processo requer um equilíbrio de várias
portante é selecionar lascas de madei- populações microbianas. Consiste na
ra com um tamanho maior evitando-se criação de um ambiente, que podemos
serragens muito finas que acabam por denominar de ecossistema bacteriano
selar a pilha impedindo o fluxo de ar. misto, sem oxigênio, que transforma o
animal morto em metano, dióxido de
Para que o composto seja utilizado
carbono e lodo. Ocorre incialmente a
depois como fertilizante, deve-se apor-
hidrólise, quebra dos lipídios, polissaca-
tar fontes de carbono (C) e nitrogênio
rídeos, proteínas e a transformação de
(N) na proporção de C:N 20:1 e 40:1 .
ácidos nucleicos em ácidos graxos, mo-
Palhas e serragens são ótimas fontes
nossacarídeos, aminoácidos e purinas e
de carbono.
pirimidinas. As bactérias acetogênicas os
Aconselha-se utilizar como base convertem em ácidos orgânicos, dióxido
um pallet (estrado) para a colocação de carbono e hidrogênio. Os ácidos orgâ-
do bovino. Nesta base deve-se formar nicos são então convertidos em metano e
uma cama de palha e/ou serragem de dióxido de carbono (BAUER et al., 2008).
40 a 45 cm. Após a colocação do animal
A digestão anaeróbica converte o ani-
morto na pilha é importante acrescentar
mal morto em biogás (metano) que pode
a palha e/ou serragem misturada com
ser utilizado para a geração de energia
esterco até cobrir o animal morto com
elétrica e também no aquecimento de
uma espessura de 1 metro. Sempre lem-
várias instalações rurais. Essas mesmas
brando manter a relação C:N acima ci-
instalações também podem ser utiliza-
tada. O bovino morto deve ser colocado
das em um Plano de Ação Emergencial
45 cm da borda da pilha para assegurar
de Doenças Animais. Este processo eli-
uma cobertura e nutrientes adequados.
mina efluentes e cadáveres de animais
Existem variações nas orientações de
contaminados (NABC, 2004).
como proceder nesse processo de com-
postagem. Atualmente, a compostagem
foi aprovada em vários estados dos EUA Hidrólise alcalina
como um método para descarte roti-
neiro ou de emergência (SCHWARZ & A hidrólise alcalina, também conheci-
BONHOTAL 2015). A Embrapa Gado de da como cremação líquida ou cremação
Leite publicou um comunicado técnico aquática ou biocremação, é considerada
detalhando o processo ao alcance de uma das formas mais ecológicas de dar
qualquer produtor (OTÊNIO et al. 2010). um destino final a cadáveres humanos.
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Esta também está sendo testada para


animais mortos. É um processo comum
Alimentação de
de decomposição usando calor, pressão espécies não suscetíveis
e uma substância alcalina, como o hidró-
xido de potássio ou hidróxido de sódio. É uma alternativa praticada quando
Este processo emite poucos gases de os mamíferos mortos eram destinados
efeito estufa e gasta pouca energia. Os para alimentar crocodilianos em zooló-
custos do processo ainda devem ser ava- gicos. Com o aumento do conhecimen-
liados devido ao tamanho dos animais to da transmissão de doenças entre
envolvidos. A hidrólise alcalina é eficaz Ordens de animais, como p.ex. gripe
contra todos os patógenos conhecidos, aviária, essa prática não é recomendada
inclusive os príons, que são os respon- quando se conhece a causa mortis por
sáveis pela encefalopatia espongiforme. uma doença contagiosa.

Disposição no oceano Procedimentos


O Brasil é o quinto maior país do na Comunidade
mundo em extensão territorial, com
8.514.876 km2. O país possui um litoral
Europeia e nos EUA
com 7.367 km, banhado a leste pelo Na Europa temos diversas legisla-
oceano Atlântico. O contorno da costa ções sobre o destino final de animais
brasileira aumenta para 9.200 km se mortos. Gwyther et al. (2011) fizeram
forem consideradas as saliências e re- um estudo que inclui uma discussão
entrâncias do litoral (DECICINO, 2007). sobre os países europeus e de outros
Este processo merece um amplo continentes quanto a aspectos socio-
estudo devido às consequências que econômicos e de biossegurança pós
podem influenciar na vida selvagem doença da vaca louca (Tabela 1). E, na
marinha. A oferta de cadáveres de ani- Tabela 2, são apresentadas avaliações
mais nesse ambiente pode aumentar dos impactos ambientais dos métodos
populações de peixes alterando a estru- utilizados em todo o mundo para a elimi-
tura trófica. Os países que assinaram a nação da mortalidade rotineira de gado
Convenção das Nações Unidas sobre o em propriedades rurais.
Direito do Mar têm a obrigação de manter Nos Estados Unidos, também devido
e zelar pela qualidade e integridade dos à dimensão continental e a existências
ecossistemas marinhos, e o Brasil é um de vários biomas, cada estado possui lei
dos signatários, e, portanto a alternativa especifica sobre o descarte de bovinos
de descarte de cadáveres que podem mortos. Existem muitas cartilhas orien-
prejudicar ecossistemas marinhos está tando o produtor sobre os procedimentos
praticamente descartada. a serem adotados para cada caso.
Tabela 1. Classificação dos aspectos socioeconômicos e de biossegurança dos métodos utilizados em todo o mundo para a elimi-
nação da mortalidade rotineira de gado; utilizando as melhores práticas. Avaliações: * muito ruim; ** ruim; *** moderado; **** bom;
***** muito bom; MPN mais pesquisas são necessárias; N / A não aplicável (adaptado de GWYTHER et al., 2011).

Saúde
Aspectos de biossegurança
Aspectos socioeconômicos humana
Contaminação de patógenos de: Transporte
Método De
Velocidade Praticidade de animais Destruição
Custo Dioxinas Ar Solo e resíduos
do (para o Água fora da de príon
relativo / Furano (bioaerossóis) vegetação produzidos
processo fazendeiro) fazenda

Enterro *** ***** **** ***** **** *** MPN N/A ***** *
Queima **** **** *** ** MPN MPN MPN MPN ***** ***
Incineração
***** ** *** **** ***** b ***** b ***** b MPN ***** *****
(na fazenda) a
Incineração
(em grandes
***** ** ***** *** ***** b ***** b ***** b MPN * *****
instalações
centrais)
Processamento ***** *** ***** MPN ***** N /A MPN N/A * ****
c
Compostagem ** **** *** MPN *** *** MPN MPN ***** ***
Digestão
** *** d *** MPN **** *** *** MPN ***** **
anaeróbica
Hidrólise
**** ** e *** MPN ***** ***** ***** ***** ***** *****
alcalina
a. Seguem especificações ABPR (1774/2002) da Comunidade Europeia, p.ex. uso de pós-combustão. b. Omite o manuseio e armazenagem da fase antes da incineração
do cadáver que podem constituir potenciais riscos de biossegurança (Seção 2.3). c. Pilha estática sem base impermeabilizada e sem aeração forçada. d. Não considerado
benefícios da produção de metano (biogás para produção de energia). E. Não adequado para pequenas fazendas. Torna-se rentável com o aumento do tamanho da
propriedade e rebanho.
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Tabela 2. Avaliação dos impactos ambientais dos métodos utilizados em todo o mundo para a
eliminação da mortalidade rotineira de gado; utilizando as melhores práticas. Avaliações: * muito
ruim; ** ruim; *** moderado; **** bom; ***** muito bom; MPN mais pesquisas são necessárias;
N/A não aplicável (adaptado de GWYTHER et al., 2011).

Impactos ambientais
Emissão de Poluição e contaminação de: Descarte no
Método
Odor gases de Solo e solo de resíduos
efeito estufa Ar Água produzidos
vegetação
Enterro *** **** ***** ** *** N/A
Queima * MPN MPN MPN MPN MPN
Incineração (na
**** ** **** b **** b **** b MPN
fazenda)
Incineração
(em grandes
***** ** *** b *** b **** b MPN
instalações
centrais)
Processamento *** **** MPN ***** *** MPN
Compostagem **** **** MPN *** MPN ****
Digestão
**** ***** ***** MPN MPN ****
anaeróbica
Hidrólise
*** MPN MPN **** *** ***
alcalina
a. Seguem especificações ABPR (1774/2002) da Comunidade Europeia, p.ex. uso de pós-combustão. b. Omite o manuseio
e armazenagem da fase antes da incineração do cadáver que podem constituir potenciais riscos de biossegurança (Seção
2.3).

Conclusões de compostagem e que os ossos sejam


descartados adequadamente.
Os descartes de corpos de animais A compostagem é considerada um
domésticos, de médio e grande porte, método econômico e ambientalmente
podem ser uma oportunidade de apro- corretos de destinação de resíduos ani-
veitamento dos seus coprodutos, desde mais. O processo de compostagem, se
que o motivo da causa mortis não seja bem aplicado, ainda é a alternativa viá-
uma doença contaminante para os re- vel para a destinação final de cadáveres
banhos e para o ser humano. A causa de mamíferos herbívoros domésticos de
tem que ser necessariamente atestada médio e grande porte nas propriedades
por um profissional da área. Se houver rurais devido ao menor custo e indepen-
dúvidas sobre a mesma o mais indicado dência externa à propriedade.
é que o animal seja incinerado, quei-
Atualmente a Embrapa conduz
mado ou que passe por um processo
um projeto com o nome de TEC-DAM
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(EMBRAPA, 2016). O objetivo nesse abandonar uma boa ideia em detrimento


projeto é disponibilizar soluções tecno- de outras, mas devemos sim incentivar o
lógicas para o tratamento de cadáveres desenvolvimento desses aprimoramen-
de animais mortos nas propriedades, tos quanto ao custo x benefício, priori-
bem como subsidiar a normatização do zando os três eixos da sustentabilidade:
seu transporte e destinação final. É uma social, ambiental e econômico.
iniciativa que pretende contribuir para o
pequeno, médio e grande produtor.
Referências
Um passo grande foi dado no que se
refere ao Projeto de Lei apresentado re- ABPR 177/2002. Regulation (EC) No. 177/2002
of the European Parliament and Council of 3rd
centemente que torna possível o aprovei- October 2002. Official Journal of the European
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animais também no campo, juntamente BAUER, C.; KORTHALS, M.; GRONAUER,
com dispositivos já previstos na regula- A.; LEBUHN, M. 208. Methanogens in biogas
production from renewable resources – a
mentação do Ministério da Agricultura, novel molecular population analysis approach.
Pecuária e Abastecimento para estabele- Water Science and Technology., 58, No. 7, S.
cimentos de abate, tais como, a Instrução 1433–1439, 2008.
Normativa nº 34/2008, que “Aprova BRASIL. Ministério da Agricultura e
o Regulamento Técnico da Inspeção Abastecimento. Portaria nº5, de 08 de
novembro de 1988. Padronização dos Cortes
Higiênico Sanitária e Tecnológica do de Carne Bovina. Disponível em: www.defesa.
Processamento de Resíduos de Animais agricultura.sp.gov.br/legislacoes/portaria-sipa-5-
de-08-11-1988,17.html. Acessado em: 01/11/2016.
e o Modelo de Documento de Transporte
de Resíduos Animais”. DECICINO, R. Litoral brasileiro: Costa tem
grande importância e deve ser preservada
Todos os processos aqui apresen- - Pesquisa Escolar - UOL Educação. 2007. //
educacao.uol.com.br/disciplinas/geografia/litoral-
tados possuem vantagens e desvanta- brasileiro-costa-tem-grande-importancia-e-deve-
gens e não se deve menosprezar um em ser-preservada.htm . Acessado em 10/11/2017.
função do outro. Aqui vemos algumas EMBRAPA. KUNZ, A. ; KRABBE, E.; LIMA, G.
diferenças entre países. E ressaltamos J. M. M.; RIBEIRO, J. B.; CARON, L.; OTÊNIO,
aqui que no Brasil possuímos diferenças M; H.; MIELE, M.; PEREIRA, M. L.; MORÉS, N.
E NICOLOSO, R. S. . NOTA TÉCNICA. In: 2º
regionais ainda mais profundas quanto Workshop do projeto Tecnologias para destinação
a transporte, infraestrutura e capacidade de animais mortos - TEC-DAM, Embrapa
por parte dos poderes constituídos de Suínos e Aves, Concórdia (SC), . Acessada em
09/11/2016.
orientar e fiscalizar o cumprimento das
GWYTHER, C. L.; WILLEIAMS, P. A.; GOLYSHIN,
leis existentes. P. N.; EDWARDS-JONES, G., JONE, D. L. The
environmental and biosecurity characteristics of
Atualmente, todos os destinos finais
livestock carcass disposal methods: a review.
de animais mortos estão sendo ava- Waste Management, 31(4):767-78, 2011.
liados e melhorados com pesquisas MACHADO, G. B. Geração e Aproveitamento
cientificas que pretendem aumentar a Energético do Biogás. PROJETO PROBIOGÁS
eficiência de cada um. Não podemos 2016.
14

NABC - National Agricultural Biosecurity Center. STANFORD, K.; NELSON, V.; SEXTON, B.;
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1ª edição (2019): eletrônica Rodiney de Arruda Mauro, Wilson Werner
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Supervisão editorial
Rodrigo Carvalho Alva
Revisão de texto
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Tratamento das ilustrações
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Projeto gráfico da coleção
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Editoração eletrônica
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