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Pontifícia Universidade Católica de São Paulo

Programa de Pós-graduação em
Comunicação Humana e Saúde

Bárbara Caroline Macedo

O lugar do saber parental no processo de


implementação dos recursos de Tecnologia Assistiva

Projeto de Mestrado apresentado para


Pré-qualificação na Disciplina de
Seminário II no Programa de Pós-
graduação em Comunicação Humana
e Saúde da Pontifícia Universidade
Católica de São Paulo (PUC-SP), sob
orientação da Profa. Dra. Regina
Maria Ayres de Camargo Freire.

São Paulo
Novembro
2021
Resumo

Introdução: A a Tecnologia Assistiva (TA) preconiza a participação ativa da pessoa com


deficiência, bem como de sua família, no processo que envolve a definição do problema
que a impossibilita de ter acessibilidade, o processo de experimentação de várias
alternativas tecnológicas e a definição da solução. Para atingir seus propósitos, busca
superar o modelo médico de deficiência que a concebe como pertencente ao corpo do
indivíduo, o qual necessita de um recurso de TA específico para que ganhe
funcionalidade, e que coloca o saber como estritamente do especialista. No entanto, apesar
de ter como objetivo uma abordagem interdisciplinar e que inclui a troca de saberers entre
os vários envolvidos, são raras as pesquisas que abordem o modo como os pais são
contemplados nos serviços de TA e que tipo de escuta é feita a eles. Ainda são fortes os
resquícios da concepção organicista que faz com que a inserção dos pais na clínica, de um
modo geral, seja de meros informantes de dados da história pregressa e da evolução da
criança, devendo receber orientações a respeito de como proceder com seus filhos, o que
tem por consequência a desconsideração dos saberes espontâneos e o apagamento do
sujeito. Objetivo: Iinvestigar e analisar os modos de participação dos pais no processo de
implementação dos recursos de Tecnologia Assistiva. Método: tTrata-se de uma pesquisa
teórica com a utilização de recortes de relatos, disponibilizados em blogs e autobiografias,
de pais cujos filhos utilizam Tecnologia Assistiva.

Palavras-chave: tecnologia assistiva; pais; psicanálise.

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SUMÁRIO

1. Introdução ....................................…………………………………………….................... 4

2. Objetivo …..........……………………………………………………..……............. 8

3. Método …............……………………………..…………........................................ 9

4. Referências bibliogáficas ….............……………..……………............................ 10

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1. Introdução

A escuta dos pais na clínica é um tema que cada vez mais tem me provocado
inquietações e que, consequentemente, tem me feito rever possíveis modos de inserção
desses pais no atendimento de seus filhos e qual o tipo de intervenção a ser feita em cada
caso. Tanto na clínica psicanalítica com crianças quanto na clínica interdisciplinar da
primeiríssima infância, campos nos quais atuo, muitos pais chegam desapropriados do seu
saber sobre a criança, desinvestidos em suas funções parentais, solicitando que o clínico,
considerado “o especialista”, possa lhes dizer o que fazer com os seus filhos.
Tal ocorrência está relacionada à modalidade de relação da sociedade atual com o
saber, que é marcada pelo tecnicismo (ANCONI, 2017; JERUSALISNKY, 2017;
LAJONQUIÈRE, 2010). Na busca pelo saber técnico, não há espaço para um saber
espontâneo, que detém a marca particular de cada um a partir da sua história e de suas
experiências, promovendo um apagamento do sujeito. O saber fica nas mãos do outro, o
detentor da verdade dita científica, que tem o conhecimento das técnicas que garantirão os
resultados pretendidos. Essa concepção tem consequências no tipo de trabalho feito aos
pais na clínica com crianças.
Grande parte dos pais chega para atendimento portando um discurso, apropriado
do que já lhes foi dito sobre a criança a partir de uma lógica de patologia, que os
desvincula das questões apresentadas pela criança, uma vez que elege como protagonista
o diagnóstico. Passam a se relacionar com a criança a partir do que se estipulou
“cientificamente” como condutas adequadas para determinado quadro, o que acaba
limitando possibilidades, uma vez que os adultos não se atentam para o que há de mais
específico e particular daquela criança em suas produções e modo de se expressar no
mundo.
Diferentemente disso, ao ser devolvida aos pais a palavra a respeito de seus filhos,
suas preocupações, percepções e incômodos, acabam encontrando um lugar diferente de
todos pelos quais passam na busca de resolver o problema e se surpreendem com a
descoberta de que eles têm algo a dizer e que isso pode ser reconhecido por um outro.
Poder construir um saber sobre o próprio filho, sobre a experiência de ser quem cuida
dessa criança, e ter isso legitimado pelo olhar do clínico devolve aos pais a dimensão do
quanto eles estão implicados no modo de relação que a criança vai criando com eles,
consigo mesma e com o mundo. Isso quer dizer que a estruturação psíquica de uma

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criança não se dá de forma autônoma, mas sempre na relação com aquele que exerce os
cuidados a ela.
A partir da leitura, tanto em autobiografias como em redes sociais, de relatos de
pais de crianças que utilizam recursos de Tecnologia Assistiva (TA), pude entrar em
contato com outras possibilidades de experiências de infância e parentalidade. São pais
que, além dos cuidados básicos oferecidos aos filhos e de sua função de educação, buscam
meios para que eles tenham acesso a vivências compartilhadas e que estejam inseridos na
sociedade, uma vez que apresentam alguma deficiência.
Segundo alguns desses pais, por meio dessas ferramentas, a relação de seus filhos
com aquilo que os cerca é ampliada, os encontros são facilitados e novas formas de
comunicação se tornam possíveis. Há, também, depoimentos em que os pais não
consideram necessário o uso de determinado recurso prescrito por algum especialista, já
que observam em seus filhos um modo próprio e satisfatório de realizarem determinada
função. Esses relatos indicam a relevância da escuta ao que os pais têm construído como
saberes próprios e o quanto isso tem oportunizado vivências significativas no contexto
dessas famílias, o que acaba promovendo uma subversão a discursos generalistas e de
cunho estritamente tecnicista.
O modo como a criança é inscrita simbolicamente pelos pais, o lugar simbólico
que ocupa no interior da família e na sociedade, assim como o modo como a deficiência é
simbolizada e a posição subjetiva frente a ela, independentemente de qual seja a
deficiência, têm efeitos na constituição psíquica de uma criança. Como essa estruturação
se dá sempre na relação com um outro, consequentemente, também há efeitos no exercício
das funções parentais.
Bersch (2017) afirma que os pais são especialistas na criança e, por isso, é
fundamental que o profissional de TA considere os saberes dos pais, além dos seus e os da
criança, a fim de que os conhecimentos se encontrem para construir algo único em prol da
acessibilidade. Um dos princípios da TA é o de que o usuário e seus familiares adquiram a
habilidade de definir o problema, participar ativamente de todo o processo de
experimentação de várias alternativas tecnológicas e definir a solução.
A Tecnologia Assistiva, segundo Bersch (2017), deve ser entendida como “recurso
do usuário” e não como “recurso do profissional”, já que serve à pessoa com deficiência a
fim de que ela possa desempenhar funções do cotidiano de modo independente. Não
necessariamente é um recurso de alta tecnologia, nem pré-fabricado, podendo ser
construído conforme as necessidades daquele que precisa. Para dizer que se trata de um

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recurso de Tecnologia Assistiva é importante que aquele que o utiliza enfrente alguma
barreira em função de uma deficiência e que este recurso o auxilie na superação dessa
barreira, apoiando-o na realização de suas atividades e proporcionando a ele uma
participação autônoma na sociedade.
Atualmente as organizações de serviços em TA têm exigido a mudança do modelo
médico de deficiência. Esse modelo define a deficiência como uma propriedade do corpo
do indivíduo (BORGES; DIAS & OLIVEIRA, 2021), como um déficit individual e que
necessita da prescrição de um recurso de Tecnologia Assistiva específico (BRASIL,
SEDH, 2009). No entanto, o serviço de TA não se resume ao uso de uma ferramenta
específica para se ganhar funcionalidade. Além disso, contrariamente ao modelo médico
que dá ênfase aos médicos que irão trabalhar para que as pessoas com deficiência sejam
curadas ou tratadas, (BORGES; DIAS & OLIVEIRA, 2021), para o bom andamento do
projeto de TA, é imprescindível que, independentemente do nível tecnológico envolvido,
as escolhas devem ser definidas a partir de cada usuário, o qual participa de todo o
processo juntamente com sua família (BRASIL, SEDH, 2009).
Ainda são muito fortes os efeitos do modelo médico que considera as pessoas com
deficiência como uma responsabilidade da atenção única dos especialistas e que
necessitam ter as respostas para os seus problemas, o que acaba destituindo-as de sua
participação ativa no processo (GALVÃO FILHO, 2009). Observa-se que os
desdobramentos desse modelo médico em relação ao tipo de trabalho a ser feito com os
pais acaba considerando-os apenas como informantes de dados da história pregressa e da
evolução com o uso do recurso, e que devem receber orientações a respeito de como
proceder, realizando uma “formação” acerca do modo de utilizar o recurso de TA.
Segundo levantamento feito pelo IBGE em 2013 e divulgado em 2015, 6,2% da
população tem algum tipo de deficiência. A deficiência visual é a mais representativa,
atingindo 3,6% dos brasileiros. Em seguida, está a população acometida por algum tipo de
deficiência física (1,3%), por deficiência auditiva (1,1%) e por deficiência intelectual
(0,8%). Os maiores índices de deficiência intelectual, física e auditiva foram encontrados
em pessoas sem instrução ou com o ensino fundamental incompleto (BORGES; DIAS &
OLIVEIRA, 2021), o que pode indicar experiências de exclusão.
Apesar de alguns pais de crianças com deficiência se mobilizarem em redes
sociais, eventos e livros para contarem acerca de suas experiências com a Tecnologia
Assistiva e da participação familiar ser recomendada nos serviços de TA, há uma lacuna
no campo das pesquisas científicas em relação ao modo de participação dos pais na

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elaboração do plano de TA e de como a escuta de seus saberes é contemplada. Há
pouquíssimas pesquisas científicas que abordem a experiência da TA do ponto de vista
das famílias, sendo privilegiadas pesquisas que se atém aos conceitos envolvidos na TA,
uso de recursos de TA nas escolas e o trabalho com professores.
Foram encontrados, a partir da combinação dos descritores “família”, “pais” e
“tecnologia assistiva”, apenas dois artigos publicados em revistas brasileiras que tocam
esse tema. Um deles (BITTENCOURT et. al, 2016) com o objetivo de investigar as
expectativas de familiares de crianças com comprometimento motor grave em relação ao
uso da TA e o outro (VOLPINI et. al, 2013), compreender a percepção dos pais de
crianças com paralisia cerebral sobre a utilização da cadeira de rodas no cotidiano de seus
filhos. No entanto, não há a explicitação de como os pais estiveram envolvidos nas
decisões pelos recursos, nem que tipo de trabalho pode ser ofertado a eles frente seus
impasses e inseguranças - detectados no primeiro artigo - em relação aos recursos.
A questão que essa pesquisa pretende discutir é acerca dos modos de participação
dos pais no processo de implementação dos recursos de Tecnologia Assistiva que possam
garantir acessibilidade a seus filhos. Para tal, o caminho a ser percorrido será o de, no
primeiro capítulo, discorrer sobre o lugar dado ao saber parental na sociedade atual
marcada pelo tecnicismo, assim como os efeitos do cientificismo e da razão utilitária na
subjetividade; no segundo capítulo, explicitar os vários lugares que são atribuídos aos pais
na clínica a partir de diferentes discursos teóricos (médico, psicológico e psicanalítico); no
terceiro capítulo, abordar o conceito de Tecnologia Assistiva e seus princípios, assim
como discutir modos de participação dos pais em que se dê espaço para a escuta de sua
fala que os implica no processo de utilização dos recursos de TA.

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2. Objetivo

Investigar e analisar os modos de participação dos pais no processo de


implementação dos recursos de Tecnologia Assistiva.

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3. Método

Trata-se de uma pesquisa teórica com a utilização de recortes de relatos,


disponibilizados em blogs e autobiografias, de pais cujos filhos utilizam Tecnologia
Assistiva.

Faltou explicitar colo se dará a escolha dos blogs – mais acessados? Mais antigos? Como
se daraá a análise? Categorias? Pré-definidas? – leitura do que encontrar?

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4. Referências Bibliográficas

ANCONI, M. R. Agressividade entre pais e educadores na educação infantil: manejos


possíveis a partir do campo simbólico. 137 f. (Programa de Pós-Graduação em Psicologia.
Psicologia da Aprendizagem, do Desenvolvimento e da Personalidade) – Instituto de
Psicologia da Universidade de São Paulo, São Paulo, 2017.

BERSCH, R. Introdução à Tecnologia Assistiva – Assistiva – Tecnologia e Educação.


Porto Alegre/RS, 2017. Disponível em:
<https://www.assistiva.com.br/Introducao_Tecnologia_Assistiva.pdf>. Acesso em: 28 set.
2021.

BITTENCOURT, Z. C. L. C.; CHERAID, D. C.; MONTILHA, R. C. I,; GASPARETTO,


E. R. F. Expectativas quanto ao uso de tecnologia assistiva. Journal of Research in Special
Education Needs, v. 16, n. 1, p. 492-496, 2016.

BORGES, J. A. S.; DIAS, A. F. S.; OLIVEIRA, J. C. Deficiências e Tecnologia Assistiva:


conceitos e aplicações. In: SANTOS, E. O.; PIMENTEL, M.; SAMPAIO, F. F. (Org.).
Informática na Educação: autoria, linguagens, multiletramentos e inclusão. Porto Alegre:
Sociedade Brasileira de Computação, 2021. (Série Informática na Educação CEIE-SBC,
v.2) Disponível em: <https://ieducacao.ceie-br.org/tecnologiaassistiva>. Acesso em: 28
set. 2021.

BRASIL. Subsecretaria Nacional de Promoção dos Direitos da Pessoa com Deficiência.


Comitê de Ajudas Técnicas. Tecnologia Assistiva. – Brasília: CORDE, 2009. 138 p.

GALVÃO FILHO, T. A. Tecnologia assistiva para uma escola inclusiva: apropriação,


demandas e perspectivas. 346 f. (Programa de Pós-Graduação em Educação) –
Universidade Federal da Bahia, 2009.

JERUSALISNKY, J. Atenção: nem todo sofrimento na primeira infância é autismo, mas


precisa ser tratado favorecendo a constituição. In. Autismo e Interfaces da Rede. Correio
da APPOA, Porto Alegre, v. 266, jun. 2017, p. 32-36. Disponível em: <
https://appoa.org.br/correio/edicao/266/atencao_nem_todo_sofrimento_na_primeira_infan
cia_e_autismo_mas_precisa_ser_tratado_favorecendo_a_constituicao/455>. Acesso em
27 set. 2021.

LAJONQUIÈRE, L. Figuras do Infantil: A psicanálise na vida cotidiana com as crianças.


Petrópolis, RJ: Vozes, 2010.

VOLPINI, M.; BRANDÃO, M. B.; PEREIRA, L. A. R.; MANCINI, M. C.; ASSIS, M. G.


Mobilidade sobre rodas: a percepção de pais de crianças com paralisia cerebral. Cad. Ter.
Ocup. UFSCAR, São Carlos, v. 21, n. 3, p. 471-478, 2013.

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