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IMAGENS DE CAPA E CONTRACAPA

Fotogra ia aé rea do setor norte da Serra do Segredo, em Caçapava do Sul,


RS, onde se destacam a Pedra do Segredo, em primeiro plano, e a Pedra da
Abelha, logo à esquerda, geoformas esculpidas sobre conglomerados
luviais da Bacia do Camaquã . Ao fundo, alguns cerros formados por
rochas metamó r icas e o imponente alto de Caçapava, sobre granitoides
diversos, rochas que registram diferentes momentos do Ciclo Brasiliano
no sul do Brasil. A paisagem faz parte do Geoparque Caçapava Aspirante
Unesco e é parcialmente inserida no Parque Natural Municipal da Pedra
do Segredo. Imagem obtida por Felipe Guadagnin. Legenda de André
Weissheimer de Borba e Felipe Guadagnin.

Contato entre rochas sedimentares da Bacia do Paraná e soleira de


diabá sio do Grupo Serra Geral. Pedreira Carollo, regiã o de Montenegro,
RS. Imagem e legenda de Carlos Augusto Sommer.

Imagem de catodoluminescê ncia de cristais de zircã o pertencentes ao


Bató lito de Florianó polis. Aumento de 200 vezes. Imagem e legenda de
André a Ritter Jelinek.

Fotogra ia aé rea oblı́qua apresentando a morfologia da regiã o


correspondente ao extremo do Litoral Norte do RS, à direita observa‑se a
cidade de Torres/RS. Em primeiro plano observa‑se a morfologia do
campo de dunas localizado no Parque Estadual de Itapeva. Unidade essa
localizada sobre o sistema Laguna‑Barreira IV (holocê nico). Logo apó s o
baixio, na retaguarda do campo de dunas, ocorre a morfologia do sistema
Laguna‑Barreira III (pleistocê nico). Ao fundo, com o relevo mais elevado,
encontra‑se a Formaçã o Serra Geral pertencente à Bacia do Paraná .
Imagem obtida por Eduardo H. R. Russo. Legenda de Eduardo Guimarã es
Barboza.

Minas do Camaquã . Mineraçã o de cobre a cé u aberto. Caçapava do Sul.


Imagem e legenda de Carlos Augusto Sommer.

Derrames á cidos do Grupo Serra Geral, Bacia do Paraná , na regiã o do


Câ nion Fortaleza, Parque Nacional da Serra Geral, Cambará do Sul, RS.
Imagem licenciada de Depositphotos. Legenda de Carlos Augusto Sommer.
PUBLICAÇÃO ESPECIAL DO NÚCLEO RS/SC DA
SOCIEDADE BRASILEIRA DE GEOLOGIA

CONTRIBUIÇÕES À GEOLOGIA
DO RIO GRANDE DO SUL E
DE SANTA CATARINA

Editores
Andréa Ritter Jelinek
Carlos Augusto Sommer

Porto Alegre, RS, 2021.


E proibida a reproduçã o total ou parcial desta obra, sem autorizaçã o expressa dos autores ou da editora. A violaçã o
importará nas providê ncias judiciais previstas no artigo 102, da Lei nº 9.610/1998, sem prejuı́zo da responsabilidade
criminal. Os textos deste livro sã o de responsabilidade de seus autores.

ISBN E‑book: 978‑65‑89013‑03‑7 Conselho Editorial Compasso Lugar Cultura


Ediçã o: 1ª Alvaro Heidrich
Ano: 2021 Carlos Henrique Aigner
Clá udia Luı́za Zeferino Pires
Editora Compasso Lugar Cultura Dakir Larara Machado da Silva
Responsá vel André Suertegaray Rossato Dilermando Cattaneo da Silveira
Porto Alegre ‑ RS ‑ Brasil Dirce Maria Antunes Suertegaray
Telefones (51) 984269928 Helena Copetti Callai
compassolugarcultura@gmail.com Jaeme Luiz Callai
www.compassolugarcultura.com Joã o Osvaldo Rodrigues Nunes
Laurindo Antonio Guasselli
Editores: Maı́ra Suertegaray Rossato
André a Ritter Jelinek Nelson Rego
Carlos Augusto Sommer Roberto Verdum
Rosa Maria Vieira Medeiros
Diagramador: Gabriel Zambom Sinthia Batista
Revisã o de Texto: Gustavo Saldivar
Realização
Sociedade Brasileira de Geologia
Diretoria Núcleo RS/SC:
Diretora Presidente: André a Ritter Jelinek
Diretor Vice‑Presidente: Carlos Augusto Sommer
Diretor Secretá rio: Lucas Debatin Vieira
Diretor Financeiro: Breno Leitã o Weichel
Diretora de Programaçã o Té cnico‑Cientı́ ica: Rosemary Hoff

Dados Internacionais de Catalogaçã o na Publicaçã o (CIP)

J47c

Jelinek, André a Ritter.


Contribuiçõ es à Geologia do Rio Grande do Sul e de Santa Catarina /André a
Ritter Jelinek e Carlos Augusto Sommer, organizaçã o – Sociedade Brasileira de
Geologia ‑ Porto Alegre : Compasso Lugar‑Cultura, 2021.
504 p., il. col.

1. Geologia 2.Sociedade Brasileira de Geologia 3. Coletâ neas de textos I. Jelinek,


André a Ritter II. Sommer, Carlos Augusto III. Tı́tulo
CDD 551
CDU 551.1/.4

Bibliotecá ria Responsá vel: Catarina Strapaçã o Guedes Vianna CRB‑10/2469


Indices para catá logo sistemá tico:
1. Geologia 551
SOCIEDADE BRASILEIRA DE GEOLOGIA
DIRETORIA NÚCLEO RS/SC:

Diretora Presidente: André a Ritter Jelinek


Diretor Vice‑Presidente: Carlos Augusto Sommer
Diretor Secretá rio: Lucas Debatin Vieira
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Diretora de Programaçã o Té cnico‑Cientı́ ica: Rosemary Hoff

Apoio
LISTA DE AUTORES Karine da Rosa Arena
Laé rcio Dal Olmo‑Barbosa
Adriano Domingos dos Reis
Larissa Lanes Tononi
Ana Karina Scomazzon
Lauren da Cunha Duarte
Ana Luisa Outa Mori
Lé o Afraneo Hartmann
Ana Maria Pimentel Mizusaki
Leonardo Kerber
André Jasper
Lidia Aumond Kuhn
André Weissheimer de Borba
Lucas Del Mouro
André a Ritter Jelinek
Lucas de Magalhã es May Rossetti
Anelise Losangela Bertotti
Luı́s Alberto Dá vila Fernandes
Antô nio Liccardo
Luiz Carlos Weinschü tz
Antonio Pedro Viero
Luiz José Tomazelli
Ari Roisenberg
Marcelo Guglielmi Leite
Brenda Fragoso
Marcos Alexandre Freitas
Breno Leitã o Waichel
Margot Guerra Sommer
Bruno Becker‑Kerber
Maria Elisabeth da Rocha
Bruno Ludovico Dihl Horn
Maria Luiza Correa da Camara Rosa
Carla Cristine Porcher
Mariana Werle
Carlos Augusto Sommer
Marina Luiza Jordã o Martins
Cassiana Roberta Lizzoni Michelin
Matheus Philipe Bruckmann
Claiton Marlon dos Santos Scherer
Matheus Silva Simõ es
Cristiano Lana
Maurı́cio Barcelos Haag
Cristina Covello
Miguel Angelo Stipp Basei
Cristina Moreira Fé lix
Miriam Cazzulo‑Klepzig
Cristine Lenz
Mı́rian Liza Alves Forancelli Pacheco
Daiana Rockenbach Boardman
Nelson Luiz Chodur
Daniel Triboli Vieira
Paulo Alves de Souza
David Debruyne
Paulo Sé rgio Gomes Paim
Dé bora Sayuri Zanchi Watanabe
Pedro Antonio Roehe Reginato
Diego Skieresz de Oliveira
Pedro Luiz Juchem
Edgar do Amaral Santos
Rafael Reis Bender
Edinei Koester
Ramy Abdallah
Eduardo Guimarã es Barboza
Randell Stephenson
Eduardo Premaor
Renato Backes Macedo
Elder Yokoyama
Renato Pereira Lopes
Ernesto Luiz Correa Lavina
Roberto Iannuzzi
Evandro Fernandes de Lima
Roberto Jacques Noll Filho
Everton Wilner
Roberto Sacks de Campos
Farid Chemale Jr.
Rodrigo Chaves Ramos
Felipe Caron
Rodrigo Rodrigues Cancelli
Felipe Kipper
Ruy Paulo Philipp
Flá vio Augusto Pretto
Sandro Kucera Duarte
Gilmar Vital Bueno
Sara Nascimento
Glá ucia Nascimento Queiroga
Sé rgio Rebello Dillenburg
Guilherme Villani
Tania Mara Martini de Brum
Ilana Lehn
Tiago Vier Fischer
Isabela Degani Schmidt
Tiara Cerva‑Alves
Jaciele Carine Sell
Valesca Brasil Lemos
Jairo Francisco Savian
Vinı́cius Matté
Joã o Henrique Quoos
Viter Magalhã es Pinto
Joã o Henrique Zahdi Ricetti
Vivianne Andrade Bastos
Joã o Pacı́ ico Silveira Luiz Machado
Wagner Guimarã es da Silva
José Rafael Wanderley Benı́cio
Prefácio
Esta publicaçã o especial do Nú cleo RS/SC da Sociedade Brasileira de Geologia integra
uma coletâ nea de capı́tulos de revisã o da Geologia dos estados do Rio Grande do Sul e de Santa
Catarina, contendo os resultados dos principais grupos de pesquisa que atuam nestes dois
estados. Esta obra tem como objetivo fornecer uma visã o geral da produçã o geocientı́ ica
recente e vem estender o conhecimento gerado na academia para toda a comunidade geoló gica.
A abordagem integrada dos resultados aqui apresentados constitui uma contribuiçã o iné dita em
termos de SBG‑RS/SC, e que será de grande utilidade para a comunidade geocientı́ ica brasileira,
incluindo pesquisadores, professores e pro issionais do mercado, alé m de estudantes de
graduaçã o e de pó s‑graduaçã o em geociê ncias.
O livro apresenta o conhecimento atual sobre a Geologia dos estados do Rio Grande do
Sul e de Santa Catarina. De forma sintetizada, este conhecimento é apresentado nas mais
diversas especialidades das geociê ncias, cujas contribuiçõ es vã o da evoluçã o Proterozoica dos
escudos Sul‑Rio‑Grandense e Catarinense, até a evoluçã o de bacias intracratô nicas, passando
pela aná lise dos conteú dos fossilı́feros Paleozoicos e Mesozoicos, pela evoluçã o das margens
costeira e oceâ nica no Cenozoico e, por im, contribuiçõ es sobre temas da atualidade, como
recursos minerais e hı́dricos, e do patrimô nio geoló gico destes estados.
A publicaçã o deste volume nã o poderia ocorrer em momento mais propı́cio,
imediatamente apó s a comemoraçã o do aniversá rio de 75 anos da Sociedade Brasileira de
Geologia e dos 65 anos de criaçã o dos primeiros cursos de Geologia do Brasil, entre os quais se
inclui o curso de Geologia da UFRGS. Adicionalmente, este perı́odo tem sido completamente
atı́pico para todos nó s, devido à pandemia do Covid‑19. Constituiu‑se, portanto, num desa io,
tanto dos editores, quanto dos autores do livro, condensar e integrar os diversos resultados de
suas pesquisas num ú nico volume e inspirar o interesse e o entusiasmo de seus leitores.
Nã o acreditamos em um projeto digno de sociedade, sem investimentos em educaçã o e
em produçã o de conhecimento cientı́ ico. Este volume é nossa forma de demostrar que Ciê ncia é
investimento e que o nosso conhecimento e o nosso trabalho geram retorno à sociedade.
Dedicamos esta publicaçã o especial aos estudantes de Geologia do nosso Brasil.

Andréa Ritter Jelinek e Carlos Augusto Sommer


Proterozoico

Paleozoico
Mesozoico

Cenozoico
Sumário

A evolução crustal do Escudo Sul‑Rio‑Grandense sob a


perspectiva dos sistemas isotópicos Sr‑Nd 13
Edinei Koester, Anelise Losangela Bertotti, Carla Cristine Porcher, Cristine Lenz,
Daniel Triboli Vieira, Laé rcio Dal Olmo‑Barbosa, Rodrigo Chaves Ramos,
Vivianne Andrade Bastos, Viter Magalhã es Pinto

O Terreno Pelotas e a Orogênese Pinheiro Machado: uma


revisão da estratigra ia, da evolução magmática e tectônica 29
Carla Cristine Porcher, Cristine Lenz, Edinei Koester, Vivianne Andrade Bastos,
Laé rcio Dal Olmo‑Barbosa, Daniel Triboli Vieira, Rodrigo Chaves Ramos,
Viter Magalhã es Pinto, Anelise Losangela Bertotti, Luı́s Alberto Dá vila Fernandes

O Magmatismo Toniano do Terreno São Gabriel e a


evolução do Cinturão Dom Feliciano 43
Ruy Paulo Philipp, Miguel Angelo Stipp Basei

O Complexo Brusque e o Cinturão Dom Feliciano em Santa


Catarina 61
Roberto Sacks de Campos, Ruy Paulo Philipp

Evolução Toniana do Eclogito Três Vendas no contexto do


Arco Passinho ‑ Terreno São Gabriel 77
Viter Magalhã es Pinto, Lé o Afraneo Hartmann, David Debruyne,
Glá ucia Nascimento Queiroga, Cristiano Lana, Brenda Fragoso, Carla Cristine Porcher,
Edinei Koester

Evolução de O iolitos do Escudo Sul‑Rio‑Grandense –


Roteiro de campo 93
Lé o Afraneo Hartmann, Karine da Rosa Arena, Tiara Cerva‑Alves, Mariana Werle,
Viter Magalhã es Pinto

Sistemas vulcânicos e subvulcânicos félsicos, associados


ao Batólito Pelotas, Cinturão Dom Feliciano, RS 111
Carlos Augusto Sommer, Ruy Paulo Philipp, Evandro Fernandes de Lima,
Roberto Jacques Noll Filho, Diego Skieresz de Oliveira

O Vulcanismo Ediacarano‑Cambriano da Bacia do


Camaquã 129
Vinicius Matté , Carlos Augusto Sommer, Evandro Fernandes de Lima

Anisotropia de Susceptibilidade Magnética (ASM): uma


ferramenta para a reconstrução de sistemas vulcânicos
ácidos Neoproterozoicos da Bacia do Camaquã (RS) 149
Jairo Francisco Savian, Carlos Augusto Sommer, Maurı́cio Barcelos Haag

Crono‑correlação entre as Bacias do Camaquã (RS) e do


Itajaí (SC): implicações Paleoambientais e Paleogeográ ica 165
Paulo Sé rgio Gomes Paim, Farid Chemale Jr., Ilana Lehn, Bruno Becker‑Kerber,
Marina Luiza Jordã o Martins

Evolução termocronológica do Cinturão Dom Feliciano:


implicações na geodinâmica da margem continental sul
do Brasil 185
André a Ritter Jelinek, Joã o Pacı́ ico Silveira Luiz Machado, Edgar do Amaral Santos
Proterozoico

Paleozoico
Mesozoico

Cenozoico
Folhelho Lontras, uma Lagerstatte do Paleozoico
brasileiro 203
Lucas Del Mouro, Joã o Henrique Zahdi Ricetti, Luiz Carlos Weinschü tz,
Mı́rian Liza Alves Forancelli Pacheco

Ocorrência de Conodontes ‒ vertebrados primitivos ‒ na


Supersequência Gondwana I, Grupo Itararé, folhelho
Lontras ‑ A loramento Campaleo (SC), Cisuraliano, Bacia
do Paraná 223
Ana Karina Scomazzon, Everton Wilner, Luiz Carlos Weinschü tz, Sara Nascimento,
Valesca Brasil Lemos

Fitoestratigra ia dos estados do Rio Grande do Sul e de


Santa Catarina 241
Roberto Iannuzzi

Biocronoestratigra ia (Palinologia e Conodontes) da


Supersequência Gondwana I na porção Sul da Bacia
do Paraná 257
Paulo Alves de Souza, Ana Karina Scomazzon, Cristina Moreira Fé lix, Eduardo Premaor,
Daiana Rockenbach Boardman, Rafael Reis Bender, Ana Luisa Outa Mori, Felipe Kipper,
Marcelo Guglielmi Leite

Macro‑charcoal como indicador de incêndios em turfeiras


Permianas no Sul da Bacia do Paraná 273
Margot Guerra‑Sommer, Isabela Degani‑Schmidt, André Jasper,
José Rafael Wanderley Benı́cio, Miriam Cazzulo‑Klepzig

Estratigra ia da sucessão sedimentar mesozoica da Bacia


do Paraná no Rio Grande do Sul 289
Claiton Marlon dos Santos Scherer, Ernesto Luiz Correa Lavina,
Adriano Domingos dos Reis, Bruno Ludovico Dihl Horn

As Crateras de Impacto Cerro do Jarau (RS) e Domo do


Vargeão (SC), Brasil 305
Ruy Paulo Philipp, Carlos Augusto Sommer, Jairo Francisco Savian, Elder Yokoyama,
Matheus Philipe Brü ckmann

Estratigra ia do Grupo Serra Geral na Calha de Torres,


Sul do Brasil 321
Lucas de Magalhã es May Rossetti, Matheus Silva Simõ es, Evandro Fernandes de Lima,
Breno Leitã o Waichel, Carlos Augusto Sommer

Evolução do Complexo Novo Hamburgo de injeção de


areia e de silte 337
Lé o Afraneo Hartmann, Sandro Kucera Duarte

Depósitos de ágata e de opala no estado do Rio Grande


do Sul 355
Cassiana Roberta Lizzoni Michelin, Lauren da Cunha Duarte, Pedro Luiz Juchem,
Tania Mara Martini de Brum, Ana Maria Pimentel Mizusaki
Proterozoico

Paleozoico
Mesozoico

Cenozoico Depósitos de ametista do Rio Grande do Sul e de Santa


Catarina 371
Lauren da Cunha Duarte, Lé o Afraneo Hartmann, Pedro Luiz Juchem,
Larissa Lanes Tononi

Bacia de Pelotas em retrospectiva 389


Gilmar Vital Bueno

Sismoestratigra ia e evolução da Bacia de Pelotas 403


Joã o Pacı́ ico Silveira Luiz Machado, Randell Stephenson, André a Ritter Jelinek,
Ramy Abdallah

Contribuições palinológicas para a estratigra ia da porção


brasileira da Bacia de Pelotas 421
Paulo Alves de Souza, Wagner Guimarã es da Silva, Eduardo Premaor, Tiago Vier Fischer,
Renato Backes Macedo, Rodrigo Rodrigues Cancelli, Lidia Aumond Kuhn

Coríndon em Santa Catarina – geologia e gemologia 439


Nelson Luiz Chodur, Antonio Liccardo, Lauren da Cunha Duarte, Pedro Luiz Juchem,
Guilherme Villani

Sistemas deposicionais e evolução geológica da planície


costeira entre La Coronilla e Cabo de Santa Marta (Bacia
de Pelotas): uma revisão 455
Eduardo Guimarã es Barboza, Sé rgio Rebello Dillenburg,
Maria Luiza Correa da Camara Rosa, Felipe Caron, Renato Pereira Lopes,
Dé bora Sayuri Zanchi Watanabe, Luiz José Tomazelli

O Sistema Aquífero Serra Geral no Rio Grande do Sul e em


Santa Catarina 469
Antonio Pedro Viero, Ari Roisenberg, Marcos Alexandre Freitas,
Pedro Antonio Roehe Reginato

Patrimônio geológico e geoconservação nos estados de


Santa Catarina e Rio Grande do Sul 487
André Weissheimer de Borba, Joã o Henrique Quoos, Cristina Covello,
Maria Elisabeth da Rocha, Flá vio Augusto Pretto, Leonardo Kerber, Jaciele Carine Sell
A evolução crustal do Escudo
Sul‑Rio‑Grandense sob a perspectiva dos
sistemas isotópicos Sr‑Nd
Edinei Koester1*, Anelise Losangela Bertotti2, Carla Cristine Porcher1,
Cristine Lenz3, Daniel Triboli Vieira4, Laé rcio Dal Olmo‑Barbosa4,
Rodrigo Chaves Ramos5, Vivianne Andrade Bastos4, Viter Magalhã es Pinto6

1.
Instituto de Geociê ncias, Universidade Federal do Rio Grande do Sul;
2.
Centro de Tecnologia e Geociê ncias, Universidade Federal de Pernambuco;
3.
Departamento de Geologia, Universidade Federal do Sergipe;
4.
Programa de Pó s‑Graduaçã o em Geociê ncias, Universidade Federal do Rio Grande do Sul;
5.
Secretaria de Meio Ambiente e Preservaçã o Ecoló gica, Prefeitura Municipal de Sapiranga;
6.
Centro de Engenharias, Universidade Federal de Pelotas.

*autor correspondente: koester@ufrgs.br

Dedicado ao professor Koji Kawashita, um pesquisador sensacional;


uma pessoa brilhante.

1 INTRODUÇÃO
A utilizaçã o de isó topos radioativos e de seus produtos de decaimento constitui uma
ferramenta geoquı́mica importante no entendimento da evoluçã o crustal de crá tons e de cintu‑
rõ es mó veis. Uma das principais aplicaçõ es dos isó topos radiogê nicos consiste na dataçã o radi‑
omé trica das rochas, poré m, estes també m podem ser usados como traçadores geoquı́micos em
estudos petrogené ticos, na identi icaçã o de fontes e de processos geoló gicos. As razõ es isotó pi‑
cas constituem assinaturas caracterı́sticas da fonte dos magmas e, em geral, permanecem inal‑
teradas em eventos de fracionamento subsequentes. Entretanto, processos geoló gicos
posteriores podem modi icá ‑las, como, por exemplo, o metamor ismo, tornando mais complexas
estas interpretaçõ es (Dickin, 2018).
Os escudos pré ‑cambrianos sã o porçõ es está veis dos continentes, em que predominam
rochas metamó r icas e plutô nicas, com variaçõ es considerá veis nas composiçõ es litoló gica e
quı́mica, tanto lateral quanto verticalmente (Condie, 2005). Esses escudos podem ser individua‑
lizados em domı́nios tectô nicos, constituı́dos por diferentes unidades, com caracterı́sticas geo‑
ló gicas, geofı́sicas e isotó picas similares ou nã o. A geoquı́mica isotó pica, atravé s do uso
combinado de vá rios sistemas, é capaz de auxiliar no entendimento da evoluçã o crustal destes
segmentos.
Contribuições à Geologia do Rio Grande do Sul e de Santa Catarina

O principal objetivo deste trabalho é (Dickin, 2018). No sistema Sm‑Nd, o Nd é o


de apresentar e de discutir alguns dados iso‑ elemento mais incompatı́vel, tornando‑se,
tó picos dos sistemas Sr‑Nd combinados, dis‑ preferencialmente, enriquecido no lı́quido
ponı́veis para rochas das unidades dos magmá tico. Dessa forma, enquanto o Rb en‑
diferentes terrenos do Escudo Sul‑Rio‑Gran‑ riquece na crosta, resultando em razõ es Rb/
dense, e avaliar potenciais implicaçõ es no Sr mais altas neste reservató rio, no sistema
entendimento da sua evoluçã o crustal. Sm‑Nd ocorre o contrá rio, já que as sucessi‑
vas extraçõ es no manto deixam o mesmo em‑
2 OS SISTEMAS ISOTÓPICOS Sr E Nd pobrecido em Nd, com razõ es Sm/Nd mais
altas (Fig. 1) (DePaolo & Wasserburg, 1979).
O comportamento dos sistemas iso‑ Assim, os diferentes reservató rios terrestres
tó picos Rb‑Sr e Sm‑Nd nos processos geoló ‑ possuem assinaturas isotó picas ú nicas. Por
gicos permite delinear domı́nios crustais, exemplo, enquanto as rochas derivadas da
bem como discutir implicaçõ es no entendi‑ crosta superior apresentam razõ es 87Sr/86Sr
mento da evoluçã o de diferentes terrenos > 0,710 e 143Nd/144Nd em torno de 0,512, as
(Condie, 2005). rochas derivadas do manto empobrecido
No sistema Rb‑Sr, o Rb apresenta apresentam valores mais baixos de 87Sr/86Sr
maior incompatibilidade em relaçã o ao Sr. (< 0,703) e mais altos para 143Nd/144Nd (>
Assim, na diferenciaçã o magmá tica, o Rb ten‑ 0,513), quando comparados aos da crosta
de a se concentrar, preferencialmente, no lı́‑ (DePaolo & Wasserburg, 1979).
quido, enquanto o Sr, no só lido residual As informaçõ es isotó picas, que ca‑

Figura 1 ‒ Diagrama de correlaçã o 143Nd/144Nd vs. 87Sr/86Sr (ƐNd vs. ƐSr), apresentando as posiçõ es relativas
das fontes empobrecidas e enriquecidas para os sistemas isotó picos de Nd e de Sr (modi icado de DePaolo &
Wasserburg, 1979). Legenda: CHUR = Chondritic Uniform Reservoir, VE = valor de é psilon.

14 Edição da Sociedade Brasileira de Geologia – Núcleo RS/SC


Koester et al.

racterizam um determinado ambiente, po‑ forma de padronizar as interpretaçõ es. As


dem ser apresentadas, de forma alternativa, idades modelo Nd‑TDM foram obtidas segun‑
pelo uso do indicador petrogené tico é psilon do os modelos de Goldstein et al. (1984), e
(Ɛ) (DePaolo & Wasserburg, 1976). Este fator de Liew & Hoffmann (1988).
pode ser calculado, tanto para as razõ es 87Sr/
86
Sr quanto para as razõ es 143Nd/144Nd, po‑ 3 CONTEXTO GEOLÓGICO E TECTÔNICO
ré m, devido à s incertezas nas razõ es de Sr no DO ESCUDO SUL‑RIO‑GRANDENSE
Bulk Earth (Bulk Silicate Earth, BSE), este é ,
normalmente, mais utilizado para o Nd. Nes‑ O Escudo Sul‑Rio‑Grandense (ESRG)
te caso, o fator mede a diferença da razã o é formado, essencialmente, por uma unidade
143
Nd/144Nd de uma amostra, em relaçã o aos paleoproterozoica, a oeste, o Terreno Nico
valores do Chondritic Uniform Reservoir Pé rez, e por um cinturã o Neoproterozoico, a
(CHUR), indicando a derivaçã o crustal ou leste, denominado Cinturã o Dom Feliciano
manté lica do material. Assim, rochas ı́gneas (CDF), que se estende, desde Punta del Este,
juvenis (com valores positivos de ƐNd(t)) po‑ no Uruguai, até a porçã o NE de Santa Catari‑
dem ser distinguidas de rochas de reciclagem na, no Brasil (Fig. 2). O CDF é resultado de
de crosta antiga (com valores negativos de sucessivos processos de colagem durante o
ƐNd(t)). Ciclo Brasiliano/Pan‑Africano, os quais con‑
No sistema isotó pico Sm‑Nd, as ida‑ tribuı́ram para a amalgamaçã o da porçã o su‑
des‑modelo Nd‑TCHUR e Nd‑TDM fornecem uma doeste do paleocontinente Gondwana
estimativa do tempo que passou para um (Hueck et al., 2018; Ramos et al., 2018; e
material, desde a sua extraçã o, seja de um re‑ refs.). No ESRG, o CDF é composto pelos ter‑
servató rio condrı́tico, seja de um manto em‑ renos Sã o Gabriel, Tijucas, Pelotas e Punta
pobrecido (Depleted Mantle ‒ DM), del Este, os quais sã o delimitados por des‑
respectivamente (Dickin, 2018). Para a evo‑ continuidades geofı́sicas de grande escala
luçã o do manto empobrecido na Terra existe (Fernandes et al., 1995; Hartmann et al.,
uma variedade de modelos propostos, logo, 2016; e refs.).
podem existir diferenças no resultado de ida‑
des TDM entre um modelo e outro. Entre os 4 O TERRENO NICO PÉREZ
modelos clá ssicos para evoluçã o em um está ‑
gio, o proposto por DePaolo (1981) obedece O Terreno Nico Pé rez (TNP), també m
a uma funçã o quadrá tica para a curva de evo‑ denominado Terreno Taquarembó , na sua
luçã o do manto empobrecido, enquanto o porçã o brasileira, é uma extensã o do terreno
proposto por Goldstein et al. (1984) assume homô nimo uruguaio, nã o sendo considerado
uma evoluçã o linear, fornecendo idades‑mo‑ parte do Crá ton Rio de La Plata, em funçã o
delo ligeiramente mais antigas do que o pri‑ de seu retrabalhamento por eventos mais jo‑
meiro. Já o modelo de evoluçã o linear para vens. Compreende rochas ultramá icas, orto
dois está gios, proposto por Liew & Hoffmann e paragnaisses paleoproterozoicos do Com‑
(1988), assume valores‑padrã o para as ra‑ plexo Granulı́tico Santa Maria Chico, vincula‑
zõ es 147Sm/144Nd, ao invé s de valores medi‑ das à evoluçã o de um arco oceâ nico de 2,4
dos na amostra. Ga, metamor izadas em fá cies granulito, em
2,1 Ga (Philipp et al., 2016; Girelli et al.,
Nesta revisã o, os dados isotó picos de
2018; e refs.).
Rb‑Sr e de Sm‑Nd, extraı́dos de trabalhos an‑
teriores, foram recalculados utilizando o pro‑ Rochas metassedimentares de mé dio
grama GCDKit (Janousek et al., 2006), como grau sã o descritas no Complexo Marmeleiro

A evolução crustal do Escudo Sul‑Rio‑Grandense sob a perspectiva dos sistemas isotópicos Sr‑Nd 15
Contribuições à Geologia do Rio Grande do Sul e de Santa Catarina

Figura 2 ‒ Mapa geoló gico simpli icado, ilustrando a disposiçã o dos terrenos, das principais estruturas e da
compartimentaçã o tectô nica do Escudo Sul‑Rio‑Grandense (modi icado de Dal Olmo‑Barbosa et al., 2021, apó s
Fernandes et al., 1995, Costa, 1997, Paim et al., 2000 e Ramos et al., 2018).

e no Complexo Batovi, ambos com idades de razã o inicial 143Nd/144Nd pró xima de 0,510
proveniê ncia, sugerindo fontes dominante‑ para uma idade de 2,1 Ga. Moraes (2020)
mente paleoproterozoicas (1,7 Ga) e inter‑ apresenta caracterı́sticas isotó picas, sugerin‑
pretados como sedimentos siliciclá sticos de do que a associaçã o má ica‑ultramá ica do
margem passiva (Laux, 2018; e refs.). Local‑ complexo tem derivaçã o manté lica, com 87Sr/
86
mente, ocorrem carbonatitos de idade meso‑ Sr(2,1) 0,700924‑0,704864, 143Nd/144Nd(2,1)
proterozoica (1,1 Ga), vinculados a um 0,509903‑0,510096, ƐNd(2,1) ‑0,30 a 3,5 e Nd‑
evento extensional (Monteiro et al., 2020). TDM de 2,1‑2,4 Ga. As assinaturas isotó picas
Essas unidades sã o intrudidas e retrabalha‑ da associaçã o gabroica‑tonalı́tica també m
das pelo magmatismo ediacarano das suı́tes sugerem uma derivaçã o do manto, com 87Sr/
86
Saibro, Vauthier e Santo Afonso, e da Forma‑ Sr(2,1) 0,701254‑0,708815, 143Nd/144Nd(2,1)
çã o Acampamento Velho, dominado por lavas 0,511022‑0,512171, ƐNd(2,1) ‑3,7 a 2,2 e Nd‑
riolı́ticas e, subordinadamente, por ignimbri‑ TDM 2,3‑2,6 Ga (Fig. 3A).
tos, brechas e tufos (Wildner et al., 2008; O Carbonatito Trê s Estradas apre‑
Laux, 2018; e refs.). senta assinaturas isotó picas Sr‑Nd (Fig. 3B)
No Complexo Granulı́tico Santa Maria sugestivas de uma fonte manté lica heterogê ‑
Chico, os estudos isotó picos (Soliani Jr. et al., nea e metassomatizada, durante o Mesopro‑
143
2000) mostram razõ es iniciais de 87Sr/86Sr terozoico, com Nd/144Nd(1,1)
em torno de 0,7019‑0,7021, sugerindo uma 0,509982‑0,511432, ƐNd(1,1) ‑0,7 a 4,4 e Nd‑
contribuiçã o manté lica como a principal fon‑ TDM de 1,2 Ga a 2,3 Ga (Monteiro et al.,
te dos protó litos do complexo. Os dados Sm‑ 2020).
Nd sugerem valores ƐNd(2,1) positivos, com a As rochas vulcâ nicas neoproterozoi‑
16 Edição da Sociedade Brasileira de Geologia – Núcleo RS/SC
Koester et al.

cas da Fm. Acampamento Velho exibem assi‑ orito Passinho e interpretada como perten‑
naturas isotó picas Sr‑Nd (Fig. 3C) sugestivas cente ao Arco Passinho (Hartmann et al.,
de uma fonte manté lica, similar à do manto 2019), relacionado ao Complexo Imbicuı́
enriquecido, com 143Nd/144Nd(570) 0,512235‑ (Philipp et al., 2018), e outra, de idade crio‑
0,511566, ƐNd(570) ‑0,7 a 4,4 e Nd‑TDM 1,2‑2,3 geniana, representada por metagranitoides e
Ga (Koester et al., submetido). dioritos, por tonalitos e por trondhjemitos do
Complexo Cambaı́ (Saalmann et al., 2006;
5 O TERRENO SÃO GABRIEL Philipp et al., 2018), com idade de 675‑750
Ma, de inida pela Orogenia Sã o Gabriel (Phi‑
O Terreno Sã o Gabriel (TSG), tam‑ lipp et al., 2018; e refs.).
bé m denominado Terreno Vila Nova, é cons‑ O Complexo Imbicuı́ tem razõ es 87Sr/
tituı́do por associaçõ es petrotectô nicas 86
Sr(828) 0,703473‑0,707205, 143Nd/144Nd(828)
formadas durante o evento acrescioná rio da 0,512181‑0,512088, ƐNd(828) de 4,4 a 6,2 e Nd‑
Orogenia Brasiliana, entre os perı́odos Toni‑ TDM 0,6‑0,9 Ga, indicativas de magmas juve‑
ano e Criogeniano. O terreno compreende nis (Siviero et al., submetido). Gnaisses to‑
relictos de sequê ncias o iolı́ticas, duas nalı́ticos do Complexo Cambaı́ possuem
sequê ncias de arcos juvenis intraoceâ nicos dados isotó picos de Sr com pouca variaçã o,
(Passinho, de 879 Ma, e Sã o Gabriel, de 758‑ entre 0,7031‑0,7035 (Saalmann et al.,
700 Ma), alé m de rochas metavulcanossedi‑ 2005b), enquanto isó topos de Nd possuem
mentares. Essas rochas sã o cobertas por valores de ƐNd(750) de 4 a 6. A porçã o supra‑
sequê ncias vulcâ nicas e sedimentares edia‑ crustal do arco é representada por sucessõ es
caranas da Bacia do Camaquã , intrudidas por metavulcâ nicas e metassedimentares do
granitos pó s‑tectô nicos (Philipp et al., 2018; Grupo ou Supercomplexo Vacacaı́ (Chemale
e refs.). Jr., 2000), incluindo o Cambaizinho, Arroio
Os relictos de o iolitos incluem os Marmeleiro, parte do Passo Feio, Ibaré , Pon‑
complexos Cerro Mantiqueiras, Ibaré , Palma, tas do Salso, Bela Vista e Campestre (Saal‑
Passo do Ivo, Bossoroca e Cambaizinho, com mann et al., 2005a; Vedana et al., 2017). A
duas idades de formaçã o de crosta oceâ nica: sequê ncia supracrustal apresenta assinatu‑
a mais antiga, de 923‑890 Ma; e outra, de ras similares à s das sequê ncias Bossoroca,
750‑720 Ma (Hartmann et al., 2019; e refs.). Cambaizinho e Ponta do Salso, de 87Sr/
86
Dados isotó picos (Fig. 3D) para as Sr(750) entre 0,701 e 0,704 e ƐNd(750) positi‑
rochas ultramá icas, vinculadas aos o iolitos, vos, de 1 a 6 (Cerva‑Alves et al., 2020).
sugerem, na regiã o de Palma, razõ es 87Sr/ Granitoides pó s‑orogê nicos, como o
86
Sr(800) entre 0,7008‑0,7019 e dados de Granito Santa Zé lia e a Suı́te Lagoa da Meia
ƐNd(800) com valores positivos de 3 e 4 e Nd‑ Lua, possuem ƐNd(660) entre ‑1,6 e 1,7 e razõ es
TDM de 0,9 a 1,3 Ga. Para a regiã o do Cerro isotó picas 87Sr/86Sr(660) de 0,707 a 0,708 (Sa‑
Mantiqueira, as rochas ultramá icas e os an‑ almann et al., 2005b).
ibolitos tê m razõ es 87Sr/86Sr(730) 0,7012‑
0,7089, 143Nd/144Nd(730) 0,511033‑0,512143, 6 O TERRENO TIJUCAS
ƐNd(730) ‑3,0 a 2,0 e Nd‑TDM 0,8‑1,1 Ga (Leite et
al., 1998; Saalmann et al. (2005,a,b, 2006). O Terreno Tijucas (TJ), anteriormen‑
A estrutura do arco inclui duas asso‑ te denominado Faixa de Dobramentos Tiju‑
ciaçõ es DTTG (diorito, tonalito, trondhjemi‑ cas, Cinturã o Tijucas, alé m de Cinturã o
to, granodiorito), sendo uma de idade Porongos, é constituı́do, predominantemen‑
toniana (879 ± 14 Ma), registrada no metadi‑ te, por rochas metavulcanossedimentares

A evolução crustal do Escudo Sul‑Rio‑Grandense sob a perspectiva dos sistemas isotópicos Sr‑Nd 17
Contribuições à Geologia do Rio Grande do Sul e de Santa Catarina

neoproterozoicas (do Complexo Porongos) e idades de cristalizaçã o mais jovens, de 663


por rochas tonianas (do Complexo Vá rzea do Ma (Gruber et al., 2016) e entre 601 Ma e
Capivarita), intercaladas com rochas do em‑ 578 Ma (Saalmann et al., 2006). O metamor‑
basamento Paleoproterozoico (Gnaisses En‑ ismo, que afetou essas rochas, é de baixo a
cantadas e Complexo Arroio do Ratos). mé dio grau, com idades de 650‑600 Ma
Ocorrem, ainda, de forma localizada, o Anor‑ (Lenz, 2003, 2006).
tosito Capivarita, o metagranito Seival, de ida‑ Saalmann et al. (2006) identi icou,
de calimaniana, e o an ibolito Tupi Silveira, de ainda, dois segmentos distintos, em relaçã o à
idade estateriana, alé m de diversos granitoi‑ á rea‑fonte: um, concentrado a NW, com ida‑
des tardios (Phillip et al., 2016; Hö ‑ ig et al., des Nd‑TDM mais antigas (2,3‑2,7 Ga) e
2018; e refs.). ƐNd(780) ‑14,7 a ‑18,0; e outro, a SE, com ida‑
Os Gnaisses Encantadas a loram, do‑ des Nd‑TDM mais jovens (1,7‑1,9 Ga) e ƐNd(780)
minantemente, na parte central da Antiforme ‑6,2 a 6,9. Alé m disso, idades Nd‑TDM mais jo‑
de Santana da Boa Vista, e representam o em‑ vens, entre 1,2‑1,7 Ga, foram identi icadas no
basamento Paleoproterozoico, com Ortog‑ complexo (Lenz, 2006; Gollmann et al., 2008;
naisses (idade de cristalizaçã o de 2340‑2210 Gruber et al., 2016). Estudos de zircõ es de‑
Ma), lentes de an ibolito e metaultramá icas trı́ticos con irmaram a existê ncia de uma
(Philipp et al., 2016), com idade de metamor‑ á rea‑fonte mais antiga, de idade paleoprote‑
ismo de alto grau, em torno de 2040‑2020 rozoica (~2,20 Ga), de uma á rea‑fonte de
Ma (Hartmann et al., 2000). Tramas de mais idade mesoproterozoica e de uma á rea‑fonte
baixo grau sã o geradas em torno de 530‑500 mais jovem, com rochas de ~800 Ma (Gruber
Ma (Lenz, 2003). Os dados isotó picos Sr‑Nd et al., 2016). Pertille et al. (2017) identi ica‑
sã o apresentados por May (1990), com uma ram, ainda, uma á rea‑fonte de idade ediaca‑
variaçã o de ƐNd(2,0) entre ‑5 e ‑10 e de 87Sr/ rana (~608 Ma), sugerindo idades de
86
Sr(2,0) entre 0,710 e 0,718 (Fig. 3E). deposiçã o, para este complexo, de 650‑550
O Complexo Arroio dos Ratos (CAR) é Ma, bem como uma correlaçã o com os sedi‑
formado por associaçõ es de rochas do tipo mentos da Bacia do Camaquã , de idade simi‑
TTG, juntamente a rochas má icas, com idades lar (Fig. 3F).
de cristalizaçã o de 2148‑2077 Ma e com me‑ O Complexo Vá rzea do Capivarita é
tamor ismo de alto grau em 635 Ma. As ra‑ dominado por paragnaisses, de composiçã o
zõ es 87Sr/86Sr(2,1) estã o entre 0,7011 e 0,7115, pelı́tica e calcissilicá tica, e, subordinadamen‑
com ƐNd(2,1) entre 5,1 e 0,4 e com idades Nd‑ te, por ortognaisses e por granitos sintectô ‑
TDM entre 1,9 Ga e 2,3 Ga (Fig. 3E), con igu‑ nicos (Martil et al., 2017). As rochas
rando um magmatismo juvenil em ambiente ortoderivadas cristalizaram em ~791 Ma,
de arco magmá tico continental (Gregory et al., em um arco continental maduro, com meta‑
2017). mor ismo em condiçõ es de alta a ultra‑alta T
O Complexo Porongos é constituı́do e de baixa a mé dia P, em torno de 620 Ma
por rochas metassedimentares, associadas a (Philipp et al., 2016; e refs.). Os dados isotó ‑
rochas metavulcâ nicas bá sicas, intermediá ri‑ picos (Fig. 3F) mostram altas razõ es 87Sr/
86
as a á cidas, alé m de gnaisses alcalinos e de Sr(790) (0,71628‑0,72509) e valores de
lentes de rochas ultramá icas metamor izadas ƐNd(790) de ‑7,2 a ‑10,1, sugerindo que, ao me‑
em fá cies xistos verde a an ibolito (Hö ig et nos, em parte, as rochas do Complexo Poron‑
al., 2018; e refs.). Idades de cristalizaçã o de gos e os ortognaisses do Complexo Vá rzea do
790 Ma sã o sugeridas para as rochas metavul‑ Capivarita foram formadas no mesmo ambi‑
câ nicas (Pertille et al., 2017; e refs.), alé m de ente tectô nico (Martil et al., 2017).

18 Edição da Sociedade Brasileira de Geologia – Núcleo RS/SC


Koester et al.

O magmatismo tardio no TT está vin‑ 7 O TERRENO PELOTAS


culado à Zona de Cisalhamento Transcorren‑
te Dorsal de Canguçu, com a cristalizaçã o O Terreno Pelotas (TP), també m de‑
sintectô nica de granitos (Quité ria e Suı́te nominado Bató lito Pelotas, é constituı́do por
Cordilheira), com idades de 618 Ma e de 607 associaçõ es petrotectô nicas formadas du‑
Ma, respectivamente (Vieira et al., 2020), se‑ rante o Ciclo Orogê nico Brasiliano, entre os
guido do Sienito Piquiri, com idades de 609‑ perı́odos Toniano e Ediacarano. Os limites
583 Ma, com assinaturas isotó picas de 87Sr/ desse terreno sã o variá veis e, neste trabalho,
86
Sr(600) entre 0,706‑0,710, ƐNd(600) entre ‑8,0 o TP corresponde à parte oriental do Escudo
e 12,1 e idades Nd‑TDM entre 1,4 Ga e 1,8 Ga Sul‑Rio‑Grandense (Fig. 2), delimitado, a
(Babinski et al., 1997; Rivera, 2019). A Suı́te oeste, pela Sutura de Porto Alegre e, a sudes‑
Encruzilhada do Sul també m se insere nos te, pela Zona de Cisalhamento Ayrosa Galvã o,
eventos tardios, sendo constituı́da, dominan‑ e afetado pela Orogê nese Pinheiro Machado
temente, por monzo a sienogranitos, com (Porcher et al., 2021). O terreno é formado
idade de cristalizaçã o de ~594 Ma, ƐNd(600) de por rochas metamó r icas tonianas, intrudi‑
‑15,5 e idade Nd‑TDM de 2,1 Ga. Knijnik das por granitoides, gabros‑dioritos e vulcâ ‑
(2018) obteve dados isotó picos em granitos nicas, todas ediacaranas, com rochas
a lorantes, ao longo da Zona de Cisalhamento metamó r icas de mé dio a baixo grau subor‑
Quité ria‑Serra do Erval, obtendo idades de dinadas, alé m de ocorrê ncias restritas de ro‑
cristalizaçã o entre 635 Ma e 605 Ma, com va‑ chas sedimentares gondwâ nicas (Cruz,
lores de ƐNd(605) entre ‑10,9 e ‑3,3 e razõ es de 2019; e refs.).
87
Sr/86Sr(605) entre 0,7048 e 0,7223. Rochas de idade toniana, identi ica‑
A Bacia do Camaquã a lora, domi‑ das como septos do embasamento ou Gnais‑
nantemente, sobre as rochas do TT, sendo ca‑ ses Piratini (Wildner et al., 2008), sã o
racterizada como uma bacia extensional, com encontradas como xenó litos mé tricos a qui‑
mú ltiplos eventos de vulcanismo e de sedi‑ lomé tricos de ortognaisses, com idade de
mentaçã o, principalmente durante o ediaca‑ cristalizaçã o de cerca de 770 Ma, com meta‑
rano. Janikian et al. (2012) obtiveram dados mor ismo de fá cies an ibolito em torno de
de geoquı́mica isotó pica nas rochas vulcâ ni‑ 660 Ma, geradas em ambiente de arco mag‑
cas do Grupo Bom Jardim, da Formaçã o má tico continental (Koester et al., 2016). Os
Acampamento Velho e do Platô do Taqua‑ dados isotó picos (Fig. 3G) mostram razõ es
87
rembó , evidenciando fontes mistas, proveni‑ Sr/86Sr(770) 0,712542‑0,723154, 143Nd/
144
entes das rochas crustais do embasamento Nd(770) 0,511242‑0,511349, ƐNd(770) ‑7,9 a
adjacente, de idade paleo‑ a neoproterozoica. ‑5,8 e Nd‑TDM 2,0‑2,2 Ga para estes ortog‑
Para as rochas andesı́ticas da Formaçã o Hilá ‑ naisses.
rio (Grupo Bom Jardim), os mesmo autores O Complexo Pinheiro Machado
obtiveram valores de Nd‑TDM de 1,3 Ga e (~633‑609 Ma) é formado por rochas diorı́‑
ƐNd(590) entre ‑3,2 e ‑2,9. Para as rochas riolı́‑ ticas e por granitoides, vinculados a magma‑
ticas e para os ignimbritos da Formaçã o tismo de arco e/ou pó s‑colisional, com
Acampamento Velho, foram obtidas Nd‑TDM xenó litos e com megaxenó litos subordina‑
entre 0,8 Ga e 2,0 Ga e ƐNd(570) entre ‑13,1 e dos, de rochas orto e parametamó r icas
4,5. Por im, apresentam dados em corpos (Cruz, 2019; Loureiro et al., 2021; e refs.). As
subvulcâ nicos, de composiçõ es riolı́tica e an‑ rochas dessa unidade (Fig. 3H) exibem assi‑
desı́tica, com Nd‑TDM entre 1,9 Ga e 2,1 Ga e naturas 87Sr/86Sr(560) 0,707684‑0,715528,
143
ƐNd(550) entre ‑14,6 e ‑12,8. Nd/144Nd(560) 0,511374‑0,511660, ƐNd(560)

A evolução crustal do Escudo Sul‑Rio‑Grandense sob a perspectiva dos sistemas isotópicos Sr‑Nd 19
Contribuições à Geologia do Rio Grande do Sul e de Santa Catarina

‑10,6 a ‑5,0 e Nd‑TDM 1,4‑2,3 Ga (May, 1990; das rochas má icas‑ultramá icas e metassedi‑
Babinski et al., 1997; Silva et al., 1999; Cruz, mentares do Complexo Arroio Grande, ambas
2019). vinculadas à evoluçã o do paleo‑oceano Ada‑
Granitoides tardios no TP (Fig. 3H) mastor (Vieira et al., 2020; Ramos et al.,
incluem os monzogranitos grossos a por irı́‑ 2020). Todas essas unidades sã o intrudidas e
ticos, cá lcio‑alcalinos, da Suı́te Cerro Grande retrabalhadas pelo magmatismo ediacarano,
(610‑590 Ma), com 87Sr/86Sr(560) 0,708076, em um cená rio continental.
143
Nd/144Nd(560) 0,511415‑0,511657, ƐNd(560) O Gnaisse Arroio Pedrado apresenta
‑9,8 a ‑5,1 e Nd‑TDM 1,4‑1,9 Ga (May, 1990; razõ es 87Sr/86Sr(680) intermediá rias (0,7095‑
Babinski et al., 1997; Cruz, 2019), bem como 0,7112), ƐNd(680) entre ‑4,2 e ‑3,7 e Nd‑TDM en‑
da Suı́te Dom Feliciano (~590 Ma) (Dal Ol‑ tre 1,5 Ga e 1,6 Ga (Fig. 3I), interpretadas co‑
mo‑Barbosa et al., 2021). Esta é formada por mo o resultado de fusã o parcial, em ca. 680
feldspato alcalino granitos, por quartzo sieni‑ Ma, de crosta continental inferior espessada
tos e por monzogranitos subordinados, em má ica (Vieira et al., 2019).
geral, com a inidade alcalina (Cruz, 2019). O Complexo Arroio Grande compre‑
Suas assinaturas isotó picas apresentam 87Sr/ ende duas grandes unidades: i) os xistos e os
86
Sr(560) 0,705966‑0,715164, 143Nd/144Nd(560) Quartzitos Arroio Grande, interpretados co‑
0,511634‑0,511740, ƐNd(560) ‑5,5 a ‑3,4 e Nd‑ mo sedimentos siliciclá sticos de bacia orogê ‑
TDM 1,3‑1,7 Ga (May, 1990; Cruz, 2019). nica, que apresentam ƐNd(630) entre ‑12 e ‑7 e
O magmatismo bá sico é subordinado Nd‑TDM entre 1,2 Ga e 1,6 Ga, para os xistos; e
no TP, representado pelos Gabros Passo da ii) o O iolito Arroio Grande, que é representa‑
Fabiana, Diorito Alto Alegre e Diorito Capim do pela Sequê ncia Matarazzo, que compreen‑
Branco, alé m de outros corpos menores, po‑ de os metama itos Matarazzo (interpretados
sicionados em 590‑560 Ma (Wildner et al., como fragmentos metamor izados de um en‑
2008; Dal Olmo‑Barbosa et al., 2021). A ocor‑ xame de diques má icos) e os má rmores Ma‑
rê ncia de magmatismo peraluminoso no TP, tarazzo (e.g. Ramos et al., 2018; e refs.). Para
vinculado à atuaçã o de zonas de cisalhamen‑ os má rmores, as razõ es atuais 87Sr/86Sr entre
to regionais, está representada pela Suı́te 0,7060 e 0,7067 sugerem deposiçã o dos car‑
143
Trê s Figueiras, com Nd/144Nd(560) bonatos em 800‑700 Ma (Ramos et al., 2018).
0,511611, ƐNd(560) ‑6,0 e Nd‑TDM 1,7 Ga (Cruz, Ocorrem, també m, xistos magnesianos e, su‑
2019). bordinadamente, metagabros. Os metagabros
e os xistos magnesianos apresentam razõ es
8 O TERRENO PUNTA DEL ESTE 87
Sr/86Sr(630) entre 0,7059 e 0,7069 (metaga‑
bros) e entre 0,7071 e 0,7152 (xistos), ƐNd(630)
O Terreno Punta del Este (TPE), ou entre 0 (metagabros) e ‑3 (xistos) e Nd‑TDM
Terreno Jaguarã o, localizado ao sul da Zona entre 1,2 Ga (metagabros) e 1,5 Ga (xistos)
de Cisalhamento Ayrosa Galvã o (Fig. 2), é in‑ (Ramos et al., 2018, 2020). Os an ibolitos
terpretado como a extensã o norte do Terreno preservam assinatura isotó pica oceâ nica ju‑
Punta del Este, do Escudo Uruguaio (Ramos venil, com razõ es 87Sr/86Sr(630) de 0,703,
et al., 2018; e refs.). ƐNd(630) de +8 e Nd‑TDM de 0,7 Ga (Fig. 3I). A
O terreno compreende um embasa‑ partir de um diagrama isocrô nico 143Nd/
144
mento Toniano‑Criogeniano, representado Nd‑147Sm/144Nd, Ramos et al. (2020) suge‑
pelo Gnaisse Arroio Pedrado, interpretado riram uma idade de 704 ± 58 Ma para esses
como fragmento metamor izado do denomi‑ an ibolitos.
nado Arco Piratini (Vieira et al., 2019), alé m O magmatismo do TPE, por vezes,
20 Edição da Sociedade Brasileira de Geologia – Núcleo RS/SC
Koester et al.

sintectô nico à s zonas de cisalhamento, está Rochas com idades mesoproterozoi‑


representado pelos granitos Trê s Figueiras, cas sã o pouco representativas no escudo,
Chasqueiro, Capã o do Leã o e Bretanha (Cruz, com dados isotó picos encontrados apenas
2019; e refs.). O Granito Trê s Figueiras (Viei‑ para as rochas do TNP (Fig. 4B). O Carbona‑
ra et al., 2020) apresenta razõ es 87Sr/ tito Trê s Estradas apresenta um comporta‑
86
Sr(609) intermediá rias (0,7096‑0,7123), mento isotó pico empobrecido em Sm‑Nd e
ƐNd(609) entre ‑6,5 e ‑2,6 e Nd‑TDM entre 1,5 Ga levemente enriquecido em Rb‑Sr, com pouca
e 1,8 Ga (Fig. 3J). in luê ncia crustal.
Rochas de idades toniana a criogeni‑
9 CONSIDERAÇÕES FINAIS ana sã o encontradas, principalmente, no TSG
e, subordinadamente, no TP, TT e no TPE. No
Os modelos que inserem a tectô nica TPE e no TSG (Fig. 4C), as rochas má icas‑ul‑
de placas na evoluçã o crustal do Escudo Sul‑ tramá icas exibem valores pró ximos aos dos
Rio‑Grandense tê m evoluı́do, ao longo dos ú l‑ reservató rios manté licos atuais (e.g. manto
timos 50 anos, com importante contribuiçã o empobrecido e manto primordial), sendo as
da geologia isotó pica para estudos geocrono‑ mais empobrecidas em Sr‑Sr e as mais enri‑
ló gicos e petroló gicos. Os sistemas isotó picos quecidas em Nd‑Nd do escudo. Por sua vez,
Rb‑Sr e Sm‑Nd tê m sido utilizados para avali‑ os ortognaisses do TSG (complexos Imbicuı́ e
ar a cogeneticidade, as fontes e os processos Cambaı́) tê m um comportamento isotó pico
envolvidos na geraçã o destas rochas, permi‑ empobrecido em ambos os sistemas isotó pi‑
tindo a construçã o de modelos geoló gicos. cos, com pouca in luê ncia crustal, enquanto
No Escudo Sul‑Rio‑Grandense, a apli‑ os Gnaisses Arroio Pedrado, do TPE, tê m as‑
caçã o de isó topos na petrologia tem ocorrido sinaturas enriquecidas em Rb‑Sr e em Sm‑
de forma pontual. A integraçã o dessas infor‑ Nd, alé m de maior in luê ncia crustal. No TT,
maçõ es em evoluçõ es temporal (Paleoprote‑ os ortognaisses do Complexo Vá rzea do Capi‑
rozoico, Mesoproterozoico e Neoprotero‑ varita sã o as rochas mais enriquecidas em
zoico) e espacial (TNP, TSG, TT, TP e TPE) é Rb‑Sr e em Sm‑Nd desse perı́odo. Os metas‑
apresentada na Figura 4, em que foram inse‑ sedimentos dos trê s terrenos tê m composi‑
ridas as unidades, com dados isotó picos Sr‑ çõ es variá veis, mais empobrecidos em
Nd de uma mesma amostra, e a sua relaçã o Sm‑Nd, no TSG (Fm. Cambaizinho), e mais
tempo‑terreno. enriquecidos em Rb‑Sr, no TT (Complexo Po‑
As ocorrê ncias paleoproterozoicas rongos).
a loram no TNP e no TT (Fig. 4A). No TNP, as No perı́odo Ediacarano, com registro
rochas apresentam comportamento similar bastante representativo no escudo e domi‑
ao do arranjo manté lico (á rea do manto), nante no TP, os dados isotó picos (Fig. 4D)
com leve enriquecimento na razã o 87Sr/86Sr e mostram um empobrecimento sistemá tico
empobrecimento em Nd (Complexo Granulı́‑ no sistema Sm‑Nd e um enriquecimento no
tico Santa Maria Chico). Já para o TT, dois sistema Rb‑Sr, com ampla dominâ ncia de
comportamentos isotó picos podem ser ob‑ participaçã o crustal das rochas granitoides e
servados: um, similar ao arranjo manté lico e das ortoderivadas. A exceçã o pode ser obser‑
ao das rochas do TNP, levemente enriquecido vada na Formaçã o Acampamento Velho (in‑
em Sr (Complexo Arroio dos Ratos); e outro, trusiva, no TNP), em que o enriquecimento
enriquecido em Sr e empobrecido nas razõ es no sistema Rb‑Sr nã o é observado.
143
Nd/144Nd (Gnaisses Encantadas). Algumas consideraçõ es podem ser

A evolução crustal do Escudo Sul‑Rio‑Grandense sob a perspectiva dos sistemas isotópicos Sr‑Nd 21
Contribuições à Geologia do Rio Grande do Sul e de Santa Catarina

Figura 3 ‒ Diagramas ƐNd(t) vs. 87Sr/86Sr(i) para as rochas do Escudo Sul‑Rio‑Grandense: A; B; C) TNP, extraı́dos
de Moraes (2020), Monteiro et al. (2020) e Koester et al. (submetido); D) TSG, extraı́dos de Leite et al. (1998),
Saalmann et al. (2005a, 2005b) e Siviero et al. (submetido); E; F) TT, extraı́dos de May (1990), Lenz (2003,
2006), Saalmann et al. (2006), Gregory et al. (2016) e Martil et al. (2017); G; H) TP, extraı́dos de May (1990) e
Koester et al. (2016); I; J) TPE, extraı́dos de Ramos et al. (2018) e Vieira et al. (2019, 2020).

22 Edição da Sociedade Brasileira de Geologia – Núcleo RS/SC


Koester et al.

propostas, com a integraçã o desses dados crosta juvenil é dominante no Neoproterozoi‑


isotó picos, como similaridades e diferenças co (900‑680 Ma), no contexto do TSG e do
entre as rochas paleoproterozoicas do escu‑ TPE.
do, o cará ter dominantemente empobrecido Essas diversas inferê ncias, a partir de
em Rb‑Sr e em Sm‑Nd nas rochas mesoprote‑ dados isotó picos Sr‑Nd, aliadas a estudos de
rozoicas, a dominâ ncia de rochas com assina‑ campo, petrográ icos, geoquı́micos, estrutu‑
turas manté licas no TSG e no TPE, durante o rais e geofı́sicos, fornecem subsı́dios para
perı́odo Toniano, a expressiva contribuiçã o avaliar os modelos de evoluçã o crustal do
crustal em rochas ı́gneas e em rochas ortode‑ ESRG. Contudo, as informaçõ es isotó picas
rivadas do TP ou a sugestã o de uma fonte pa‑ ainda sã o escassas em diversas unidades ou,
leoproterozoica para as rochas do Complexo muitas vezes, sã o apresentadas de forma in‑
Vá rzea do Capivarita (TT). Dessa forma, ob‑ completa, para que outros trabalhos possam
serva‑se, no ESRG, signi icativa produçã o de utilizá ‑las e fazer os recá lculos necessá rios.
crosta durante o Neo‑ e o Paleoproterozoico. Ainda assim, a geologia isotó pica, em especial
Esta é maior no Neoproterozoico, poré m, a Sr‑Nd, constitui uma ferramenta essencial
ambos sã o resultantes de retrabalhamento na reconstruçã o de cená rios e na elaboraçã o
crustal, em sua maior parte. Já a produçã o de de modelos de evoluçã o geoló gica.

Figura 4 ‒ Diagramas ƐNd(t) vs. 87Sr/86Sr(i) para as rochas do Escudo Sul‑Rio‑Grandense: A) Paleoproterozoico;
B) Mesoproterozoico; C) Neoproterozoico (680 Ma); e D) Neoproterozoico (560 Ma). Legenda: TNP = Terreno
Nico Pé rez; TSG = Terreno Sã o Gabriel; TT = Terreno Tijucas; TP = Terreno Pelotas; e TPE = Terreno Punta del
Este.

A evolução crustal do Escudo Sul‑Rio‑Grandense sob a perspectiva dos sistemas isotópicos Sr‑Nd 23
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O Terreno Pelotas e a Orogênese
Pinheiro Machado:
uma revisão da estratigra ia,
da evolução magmática e tectônica
Carla Cristine Porcher1*, Cristine Lenz2, Edinei Koester1, Vivianne Andrade Bastos3,
Laé rcio Dal Olmo‑Barbosa3, Daniel Triboli Vieira3, Rodrigo Chaves Ramos4,
Viter Magalhã es Pinto5, Anelise Losangela Bertotti6, Luı́s Alberto Davila Fernandes1

1
Instituto de Geociê ncias, Universidade Federal do Rio Grande do Sul
2
Departamento de Geologia, Universidade Federal de Sergipe
3
Programa de Pó s‑Graduaçã o em Geociê ncias, Universidade Federal do Rio Grande do Sul
4
Secretaria de Meio Ambiente e Preservaçã o Ecoló gica, Prefeitura Municipal de Sapiranga
5
Centro de Engenharias, Universidade Federal de Pelotas
6
Centro de Tecnologia e Geociê ncias, Universidade Federal de Pernambuco

*autor correspondente: carla.porcher@ufrgs.br

Dedicado ao professor Márcio M. Pimentel, uma grande pessoa, um pro issional inspirador
e um pesquisador brilhante, que nos deixou cedo demais.

1 INTRODUÇÃO
O arcabouço geoló gico do Escudo Sul‑Rio‑Grandense (ESRG) é formado por cinco terre‑
nos principais (ver Koester et al., 2021, Capı́tulo 1 deste livro, e refs.): Terreno Nico Pé rez (TNP),
Terreno Sã o Gabriel (TSG), Terreno Tijucas (TT, incluindo o Terreno Encruzilhada), Terreno Pe‑
lotas (TP) e Terreno Punta del Este (TPE). O Terreno Pelotas (TP) (Fig. 1), foco deste capı́tulo,
corresponde a um domı́nio tectô nico do ESRG, predominantemente constituı́do por rochas
plutô nicas neoproterozoicas, a lorantes no leste do Rio Grande do Sul. Quando correlacionado
ao seu equivalente, no leste do Uruguai, e com o do estado de Santa Catarina, é denominado
Terreno Cuchilla Dionı́sio‑Pelotas‑Florianó polis (ver Vieira et al., 2020). No presente capı́tulo,
será apresentada uma revisã o dos dados publicados nas ú ltimas dé cadas sobre este segmento
do ESRG, buscando apresentar uma de iniçã o atualizada para o mesmo.
Contribuições à Geologia do Rio Grande do Sul e de Santa Catarina

Figura 1 ‒ Mapa geoló gico do Terreno Pelotas (modi icado de CPRM (2006); Cruz (2019)). a) Principais
estruturas e divisõ es dos terrenos no Escudo Sul‑Rio‑Grandense (modi icado de Dal Olmo Barbosa et al.
(2021)).

2 O TERRENO PELOTAS litosfé ricas, de direçã o predominante NE‑SW,


correspondendo à expressã o geoló gica do
O TP é um terreno de idade neopro‑ Domı́nio Geofı́sico Leste (Fernandes et al.,
terozoica, essencialmente plutô nico, delimi‑ 1995a, 1995b), excluindo‑se dele o Domı́nio
tado por estruturas transcorrentes Geofı́sico Sudeste (Ramos et al., 2014). Os

30 Edição da Sociedade Brasileira de Geologia – Núcleo RS/SC


Porcher et al.

granitoides sã o dominantemente criogenia‑ Uma de iniçã o mais precisa, segundo o mes‑
nos e ediacaranos, posicionados em contex‑ mo autor, descreve os terrenos tectonoestra‑
tos de arco magmá tico e pó s‑colisional, com tigrá icos como segmentos crustais
vá rios corpos associados a zonas de cisalha‑ (litosfé ricos), com uma evoluçã o pró pria e
mento regionais (Philipp, 1998; Bitencourt & distinta da dos segmentos circundantes, sen‑
Nardi, 2000; Koester et al., 2001; Oriolo et al., do totalmente delimitados por sistemas de
2018). falhas regionais. O Terreno Cuchilla Dionı́sio‑
Ao longo de dé cadas, o TP vem sendo Pelotas‑Florianó polis se enquadraria no
denominado de diferentes formas, como Ma‑ conceito de terreno magmá tico, segundo a
ciço Mediano de Pelotas (Hasui et al., 1975), classi icaçã o citada por Kearey et al. (2009).
Bató lito Pelotas (Fragoso Cé sar et al., 1986; A evoluçã o do TP está relacionada à
Philipp, 1998) e, mais recentemente, Terreno Orogê nese Pinheiro Machado, na qual ocor‑
Cuchilla Dionı́sio‑Pelotas (Bossi & Gaucher, reu, há ca. de 630 Ma, a geraçã o de zonas de
2004). O termo Terreno Cuchilla Dionı́sio cisalhamento NE‑SW, de escala litosfé rica,
(TCD) foi proposto por Bossi & Gaucher concomitante ao Arco Pinheiro Machado
(2004), originalmente, no Uruguai, como (APM), como resultado da convergê ncia en‑
“uma unidade tectonoestratigrá ica, compre‑ tre os crá tons Kalahari, Rı́o de la Plata e Con‑
endendo um embasamento metamó r ico de go (Ramos et al., 2018; Vieira et al., 2019b).
idade paleo‑ a mesoproterozoica, intensa‑
mente retrabalhado e intrudido por granitos 3 ESTRATIGRAFIA DO TERRENO PELO‑
orogê nicos, sin a tardi‑colisionais, entre 680 TAS
Ma e 550 Ma”, que ocorre a leste da Zona de
Cisalhamento Sierra Ballena. Posteriormente, A rocha mais antiga, identi icada re‑
pelo reconhecimento da ocorrê ncia de ro‑ centemente, no TP, ocorre na forma de um
chas o iolı́ticas do Complexo Arroio Grande e xenó lito de metagabro, com idade paleopro‑
de rochas metamó r icas e granitoides distin‑ terozoica (~2.0 Ga) (Vieira et al., 2019a), no
tos, ao sul da Zona de Cisalhamento Ayrosa Complexo Pinheiro Machado. Rochas de ida‑
Galvã o (ZCAYG), essa estrutura foi de inida de toniana‑criogeniana a loram, de forma es‑
como limite entre o TCD‑TP e o TPE (Ramos parsa, no TP, e sã o representadas pelos
et al., 2017). Em sua extensã o, desde o Uru‑ Gnaisses Piratini (Fig. 2E) (Tambara et al.,
guai, até Santa Catarina, o Terreno Cuchilla 2019) e pelos Gnaisses Chá cara das Pedras
Dionı́sio‑Pelotas‑Florianó polis compreende (Philipp & Campos, 2004; Koester et al.,
os bató litos Aiguá , no Escudo Uruguaio, Pelo‑ 2016).
tas, no Escudo Sul‑Rio‑Grandense, e Floria‑ As principais rochas do TP estã o as‑
nó polis, no Escudo de Santa Catarina (Basei sociadas ao Complexo Pinheiro Machado
et al., 2000; Bossi & Gaucher, 2004), forman‑ (Fig. 2A), com idades de cristalizaçã o U‑Pb
do um cinturã o granı́tico descontı́nuo (Basei em zircã o entre 633 Ma e 609 Ma (ver Lou‑
et al., 2000). reiro et al., 2021, e refs). Esse complexo
O termo terreno será adotado, no ocorre, ao longo do TP, ocupando uma á rea
presente capı́tulo, por ser um conceito geo‑ de ca. 10.000 km2, composto por rochas dio‑
tectô nico de ampla utilizaçã o, podendo ser rı́ticas a sienogranı́ticas, com xenó litos de
caracterizado como “contextos litotectô nicos an ibolito, alé m de ortognaisses pré ‑orogê ‑
limitados integralmente por falhas importan‑ nicos (ver Bastos et al., 2020 e refs).
tes, e cuja composiçã o e idade sã o diferentes Rochas metassedimentares sã o raras
dos terrenos vizinhos” (Brito Neves, 2011). nesse terreno, limitando‑se, até o momento,
O Terreno Pelotas e a Orogênese Pinheiro Machado 31
Contribuições à Geologia do Rio Grande do Sul e de Santa Catarina

ao Complexo Guarda Nova (Fig. 2C), anteri‑ foram interpretadas, como correlatas à s da
ormente denominado Xistos e Quartzitos Bacia do Camaquã (Noll Filho et al., 2018).
Herval (Fragoso Cé sar et al., 1986). Esse
complexo é composto, essencialmente, por 4 LIMITES DO TERRENO PELOTAS E
metassedimentos de mé dio grau metamó r i‑ MAGMATISMO SIN‑TRANSCORRÊNCIA
co (Cruz, 2019).
Os limites do TP foram estabeleci‑
Entre 610 Ma e 560 Ma, ocorrem in‑
dos, com base em geofı́sica e em geologia,
trusõ es de diversos corpos granı́ticos no TP,
marcados por estruturas transcorrentes de
sendo os principais e mais antigos, incluı́dos
escala litosfé rica, com magmatismo sin‑
nas Suı́tes Cerro Grande e Dom Feliciano
transcorrente associado. Conforme Tommasi
(Fig. 2D e 2E), que possuem á rea de exposi‑
et al. (1994), a continuidade do magmatismo
çã o semelhante à do Complexo Pinheiro Ma‑
e sua abundâ ncia ao longo dessas estruturas,
chado. O termo Suı́te Cerro Grande (Cruz,
indica que estas zonas possuem escala litos‑
2019) inclui os monzogranitos grossos a
fé rica. Bitencourt & Nardi (2000) conside‑
por irı́ticos da antiga Fá cies Cerro Grande,
ram essas zonas de cisalhamento, parte do
da Suı́te Dom Feliciano, enquanto, na ú ltima
extenso Cinturã o de Cisalhamento Sul‑Brasi‑
suı́te, predominam as composiçõ es sieno‑
leiro.
granı́ticas. Segundo o mesmo autor, a Suı́te
O limite oeste do TP com o TT (sensu
Cerro Grande é constituı́da pelos granitos
Fernandes et al., 1995b), coincide com a por‑
Arroio Moinho, Jaguarã o‑Chico, Cancelã o e
çã o sul da Zona de Cisalhamento Transcor‑
Monte Bonito, enquanto, na Suı́te Dom Feli‑
rente Dorsal de Canguçu (ZCTDC) e com a
ciano, predomina o Granito Cerro do Sandi.
Sutura de Porto Alegre (SPA) (Fig. 1). Essas
Alé m das rochas granı́ticas, ocorre,
zonas de cisalhamento NE‑SW sã o subverti‑
com idade semelhante à das suı́tes acima,
cais e apresentam movimentaçã o sinistral
uma associaçã o de rochas dominantemente
(Fernandes et al., 1995a). O magmatismo
gabroicas (Fig. 2F), na qual a principal ocor‑
sin‑transcorrê ncia é dominantemente pera‑
rê ncia é a dos Gabros Passo da Fabiana
luminoso, com a inidade cá lcio‑alcalina alto‑
(~590 Ma) (Dal Olmo‑Barbosa et al., 2021).
K (Koester et al., 2001; Philipp et al., 2013;
Conforme os mesmos autores, a lora, no su‑
Vieira et al., 2020), representado na porçã o
deste do TP, outra associaçã o bá sica, diorı́ti‑
sul da ZCTDC e correlacioná vel à Suı́te Granı́‑
ca, cujo principal corpo é o Diorito Alto
tica Cordilheira. As idades obtidas para esta
Alegre (~560 Ma), e o Diorito Capim Branco,
suı́te variam de 625 Ma a 607 Ma (Philipp et
a NE, nas imediaçõ es de Dom Feliciano.
al., 2013; Vieira et al., 2020), indicando que
A ocorrê ncia de magmatismo sin‑
as idades de formaçã o desse limite sã o con‑
transcorrê ncia peraluminoso (Suı́te Trê s Fi‑
temporâ neas à s do magmatismo do Comple‑
gueiras) ocorre, ainda, ao longo das princi‑
xo Pinheiro Machado. A geraçã o de calor
pais zonas de cisalhamento (Klein et al.,
para a fusã o e para a produçã o do magmatis‑
2018; Cruz, 2019), alé m de outros corpos
mo sin‑cinemá tico na ZCTDC, pode ser rela‑
granı́ticos, de menor escala.
cionada com shear heating, relaxamento
Por im, rochas sedimentares e vul‑ termal, aquecimento crustal, intrusã o de
câ nicas caracterizam a Formaçã o Cerro Cha‑ magma manté lico precoce, ou mesmo, des‑
to, e, em idade 560 Ma, ocorre a cristalizaçã o compressã o apó s o pico do metamor ismo
das rochas subvulcâ nicas, vinculadas aos Ri‑ da Orogê nesse Piratini (Tommasi et al.,
olitos Asperezas (Cruz, 2019). Essas rochas 1994; Bitencourt & Nardi, 2000; Koester et

32 Edição da Sociedade Brasileira de Geologia – Núcleo RS/SC


Porcher et al.

al., 2001; Philipp et al., 2013; Vieira et al., mente por Costa (1997), e con irmado por
2020). Ramos et al. (2014) e por Cruz (2019). Na
O limite sudeste do TP com o TPE é á rea afetada pelas ZCAYG e Arroio Grande
marcado pela ZCAYG (Ramos et al., 2017). (ZCAG) ocorre magmatismo sin‑transcorrê n‑
Esse limite també m apresenta mudança de cia, com destaque para o Granito Trê s Figuei‑
assinatura geofı́sica, sendo sugerido inicial‑ ras (Philipp et al., 2013; Klein et al., 2018),

Figura 2 ‒ Principais unidades do Terreno Pelotas, representativas das etapas evolutivas da Orogenia Pinheiro
Machado: A) Magmatismo pré ‑colisional: Complexo Pinheiro Machado, B) Magmatismo sin‑cinemá tico à Zona
de Cisalhamento Transcorrente Dorsal de Canguçu: Suı́te Granı́tica Cordilheira; C) Sedimentaçã o e
metamor ismo sin‑colisional: Complexo Guarda Nova; D) Magmatismo tardi a pó s‑orogê nico: Suı́te Cerro
Grande; E) Magmatismo tardi a pó s‑orogê nico: Suı́te Dom Feliciano com xenó lito pré ‑orogê nico de Gnaisse
Piratini; F) Magmatismo tardi a pó s‑orogê nico: Gabros Passo da Fabiana.

um leucogranito peraluminoso, com idade de 5 A OROGÊNESE PINHEIRO MACHADO


ca. 585 Ma, e o Granito Chasqueiro, compos‑
to por monzo a sienogranitos por irı́ticos, de As etapas evolutivas da Orogê nese
a inidade cá lcio‑alcalina alto‑K com idade de Pinheiro Machado (Tab. 1)(Fig. 3) envolvem
cristalizaçã o de 574 Ma (Vieira et al., 2016). (Ramos et al., 2018; Vieira et al., 2020): (i)

O Terreno Pelotas e a Orogênese Pinheiro Machado 33


Contribuições à Geologia do Rio Grande do Sul e de Santa Catarina

uma etapa pré ‑colisional, com geraçã o do maiores (e.g. Gnaisses Piratini, Gnaisses Chá ‑
APM (633‑609 Ma), relacionada ao fecha‑ cara das Pedras). Em estudos recentes (Koes‑
mento de bacias oceâ nicas (por exemplo, pa‑ ter et al., 2016; Tambara et al., 2019; Vieira et
leo‑oceano Adamastor Sul); (ii) uma etapa al., 2019a), foi veri icado que duas ocorrê nci‑
sin‑colisional (ca. 610 Ma), bem como uma as conhecidas apresentam idades mais anti‑
possı́vel reativaçã o das zonas de cisalhamen‑ gas do que o Neoproterozoico.
to de tendê ncia NE‑SW, com geraçã o de me‑ A presença de ortognaisses de idade
tamor ismo orogê nico; (iii) uma etapa tardi a paleoproterozoica é relatada na regiã o de
pó s‑colisional (610‑560 Ma), com intenso Porto Alegre (Philipp & Campos, 2004) e na
magmatismo. regiã o de Pelotas‑Canguçu. Nessa ú ltima loca‑
lidade, Vieira et al. (2019a) reportaram a
5. 1 Evolução Geológica Pré‑orogênese ocorrê ncia de um xenó lito de metagabro de
dimensõ es mé tricas (Fig. 2E), com idade
O TP apresenta evidê ncias de uma
magmá tica U‑Pb SHRIMP em zircã o de 2,1 Ga
crosta pré ‑orogê nica paleoproterozoica, com
(nú cleo) e metamor ismo em 616 Ma, (bor‑
restritas idades mesoproterozoicas, e regis‑
da).
tros do está gio inicial da colagem brasiliana/
Idades mais antigas do que o Neopro‑
pan‑africana (Toniano‑Criogeniano), a qual
terozoico, para a crosta do TP, també m sã o in‑
acomodou um arco continental tipo andino
dicadas por idades TDM e U‑Pb em zircõ es
(Arco Piratini ‒ ca. 790‑680 Ma), que colidiu
herdados nos granitoides neoproterozoicos.
com o Terreno Sã o Gabriel, em 650‑640 Ma
Uma sı́ntese das idades TDM publicadas para o
(Vieira et al., 2019b).
TP é apresentada por Koester et al. (2021),
O reconhecimento do embasamento
sendo que os valores variam entre 2310‑
pré ‑orogê nico nesse terreno é di icultado
1748‑1666 Ma, para os Gnaisses Piratini,
pelo intenso magmatismo ediacarano, que
2300‑1860‑1510 Ma, para as rochas do Com‑
afetou esse segmento crustal, durante a Oro‑
plexo Pinheiro Machado, 2740, para o granito
gê nese Pinheiro Machado, possivelmente,
Capã o do Leã o, e 1460 Ma, para o Granito Ar‑
també m potencializado pelo nı́vel crustal
roio Moinho. As idades U‑Pb de zircã o herda‑
atualmente exposto. O registro deste emba‑
do, obtidas nos Gnaisses Chá cara das Pedras
samento pode ser dividido em: crosta pré ‑
(Koester et al., 2016), sã o, principalmente, pa‑
brasiliana e crosta associada à Orogê nese Pi‑
leoproterozoicas (1924‑1760 Ma), com ocor‑
ratini. Os dados existentes sobre esses
rê ncia de um zircã o mesoproterozoico (1089
perı́odos da evoluçã o crustal podem ser en‑
Ma). Nos Gnaisses Piratini, idades herdadas
contrados como registro litoló gico em xenó ‑
similares, arqueanas a mesoproterozoicas
litos e em corpos mapeá veis e como
(2725‑2127‑1785‑1023 Ma), foram encontra‑
evidê ncias de herança crustal, por geoquı́mi‑
das por Tambara et al. (2019).
ca isotó pica e por idades de zircõ es herda‑
As rochas pré ‑orogê nicas de idade to‑
dos.
niana sã o registros do magmatismo da Oroge‑
Essas ocorrê ncias sã o usualmente
nê se Piratini (sensu Ramos et al., 2018),
agrupadas, sob a denominaçã o Septos do
veri icadas nos Gnaisses Piratini (Tambara et
Embasamento (Philipp & Machado, 2002),
al., 2019) e nos Gnaisses Chá cara das Pedras
que engloba as diversas ocorrê ncias de ro‑
(Koester et al., 2016). Esses ortognaisses tê m
chas metamó r icas de baixo a alto grau, en‑
composiçã o diorı́tica a granodiorı́tica, com
contradas em diferentes á reas do TP, tanto
assinatura de arco magmá tico continental
na forma de xenó litos como em ocorrê ncias
(Koester et al., 2016; Tambara et al., 2019),

34 Edição da Sociedade Brasileira de Geologia – Núcleo RS/SC


Porcher et al.

Tabela 1 ‒ Síntese da evoluçã o tectô nica do Terreno Pelotas e da Orogenia Pinheiro Machado. Ver texto para
detalhes.

Figura 3 ‒ Evoluçã o simpli icada das etapas pré ‑colisional e pó s‑colisional da Orogenia Pinheiro Machado. Ver
texto para detalhes.

O Terreno Pelotas e a Orogênese Pinheiro Machado 35


Contribuições à Geologia do Rio Grande do Sul e de Santa Catarina

com idade de cristalizaçã o magmá tica entre sobre as rochas geradas na Orogê nese Pirati‑
784 Ma e 777 Ma (Silva et al., 1999; Koester ni, durante o fechamento do paleo‑oceano
et al., 2016; Tambara et al., 2019). O meta‑ Adamastor Sul, entre ca. 640‑600 Ma (Ramos
mor ismo sin‑colisional está registrado nes‑ et al., 2020). O magmatismo desse arco se
ses ortognaisses por um bandamento bem inicia imediatamente apó s a colisã o conti‑
desenvolvido, gerado por condiçõ es de fá cies nental entre o Arco de Sã o Gabriel e o Arco
an ibolito mé dio a superior, afetado por do‑ Piratini (ca. 660‑640 Ma), com a inversã o do
bras intrafoliais e por transposiçã o (Philipp sentido de subducçã o, para o fechamento do
& Machado, 2002; Philipp & Campos, 2004). paleo‑oceano Adamastor Sul (Ramos et al.,
As idades U‑Pb SHRIMP do metamor ismo, 2020). Dessa forma, a cunha de manto, sob o
obtidas nas bordas e nos nú cleos dos zircõ es Arco Pinheiro Machado, possivelmente so‑
com zonaçõ es convolutas, sã o de ca. 660‑650 freu in luê ncia de processos associados à
Ma (Koester et al., 2016; Tambara et al., Orogê nese Piratini, tais como metassomati‑
2019). zaçã o do manto, slab break‑off e delaminaçã o
A Orogê nese Piratini ocorreu, segun‑ litosfé rica, comumente associadas à s coli‑
do Ramos et al. (2018), devido ao fechamen‑ sõ es continentais (e.g. Song et al., 2015),
to do Oceano Charrua, formando um arco do alé m dos clá ssicos processos geradores do
tipo andino, com posterior colisã o do TSG (+ magmatismo do APM.
TNP) com o embasamento do TT (Gnaisses O CPM corresponde a um expressivo
Encantadas, Granitoides Milonitizados de e importante magmatismo, de escala batolı́‑
Santana da Boa Vista e de Arroio dos Ratos). tica, na evoluçã o do Terreno Pelotas, repre‑
Rochas com assinaturas de arco continental, sentando a fase pré ‑colisional da Orogê nese
de idade toniana‑criogeniana e de metamor‑ Pinheiro Machado (Tab. 1). Fragoso Cé sar et
ismo orogê nico criogeniano, possivelmente al. (1986) inicialmente de iniram a unidade
associadas ao Arco Piratini e a sua colisã o, como Complexo Granı́tico Gná issico Pinheiro
a loram, hoje, em diferentes terrenos, tais co‑ Machado. Posteriormente, esta foi designada,
mo no TT (metavulcâ nicas do Complexo Po‑ por Philipp (1998), como Suı́te Pinheiro Ma‑
rongos, Gnaisses do Complexo Vá rzea do chado, considerando a preservaçã o predomi‑
Capivarita) e no TPE (Gnaisses Arroio Pedra‑ nante de texturas magmá ticas, com tramas
do e Cerro Bori), alé m dos a loramentos su‑ deformacionais restritas a zonas de cisalha‑
pracitados do TP. mento. No entanto, o termo Complexo Pi‑
nheiro Machado é utilizado por diversos
5. 2 Magmatismo Pré‑colisional ‑ Com‑ autores (e.g. Hueck et al., 2018; Bastos et al.,
plexo Pinheiro Machado 2020; Loureiro et al., 2021), a im de denotar
o expressivo volume de rochas plutô nicas e a
Durante o perı́odo pré ‑colisional da sua composiçã o expandida, assim como
Orogê nese Pinheiro Machado, houve a gera‑ acontece no arco magmá tico andino (e.g.
çã o de um arco magmá tico continental, du‑ Complexo Plutô nico Costeiro).
rante o Ediacarano, que originou as rochas
Os granitoides do CPM sã o cá lcio‑al‑
do Complexo Pinheiro Machado (CPM). Essas
calinos de mé dio a alto‑K, com ocorrê ncia de
rochas foram anteriormente associadas ao
monzogranitos e de granodioritos. Alé m des‑
Arco Piratini (Fragoso‑Cé sar, 1991) e, poste‑
tes, ocorrem dioritos e tonalitos, em forma
riormente, Ramos et al. (2018) interpreta‑
de enclaves, e intrusõ es tabulares de sieno‑
ram como associadas a um arco continental
granitos subordinadas (Philipp, 1998). Essas
mais jovem, desenvolvido, principalmente,
rochas possuem foliaçã o ı́gnea marcada pela
36 Edição da Sociedade Brasileira de Geologia – Núcleo RS/SC
Porcher et al.

orientaçã o de fenocristais de K‑feldspato e mo ao encerramento do magmatismo do


de schlieren de biotita. A atuaçã o de zonas APM (ca. 610 Ma), seguido, imediatamente,
de cisalhamento sub‑horizontais causa de‑ do magmatismo tardi a pó s‑colisional (610‑
formaçã o no estado só lido, com lineaçõ es 560 Ma). Nã o há registro de espessamento
orientadas NW‑SE (Fernandes et al., 1995a), crustal evidente e o movimento tectô nico
enquanto zonas de cisalhamento transcor‑ passa a ser dominantemente transcorrente,
rente tardias geram proto a ultramilonitos, o que sugere uma mudança de regime con‑
bem como ilonitos localizados (Philipp et vergente para o transpressivo, com soft doc‑
al., 2002). king.
Estudos de detalhe desenvolvidos A ocorrê ncia de rochas com registro
nas rochas das pedreiras pró ximas a Monte de metamor ismo regional no TP é bastante
Bonito indicaram a colocaçã o em mú ltiplos restrita, estando representada pelo Comple‑
pulsos magmá ticos contı́nuos para o CPM, a xo Guarda Nova (Cruz, 2019). Esse complexo
profundidades de 20 a 30 km, alé m do pro‑ é formado por uma sequê ncia de quartzitos
cesso de refusã o de fases minerais precoces, puros, micá ceos e feldspá ticos, com os quais
na presença de luidos (Bastos et al., 2020). se intercalam rochas plutô nicas deformadas
Loureiro et al. (2021) demonstram que esta (Cruz, 2019). A presença de paragê nese
porçã o do CPM cresceu, como resultado da composta por muscovita, biotita e quartzo,
interaçã o destes pulsos comagmá ticos, com granada e, localmente, sillimanita ( ibrolita),
magmatismo ativo por, pelo menos, 8 Ma e é indicativa de condiçõ es de metamor ismo
com processo de anatexia atuante por > 15 de fá cies an ibolito, associadas ao desenvol‑
Ma. vimento de foliaçã o metamó r ica, com fei‑
Dados geocronoló gicos do CPM fo‑ çõ es indicativas de luxo nã o coaxial
ram obtidos, atravé s de U‑Pb (TIMS) em zir‑ associadas (Cruz, 2019).
cã o, resultando em idades de 623 ± 2 Ma, As idades de zircã o detrı́tico entre
616 ± 2 Ma e 610 ± 5 Ma (Babinski et al., 613 ± 11 e 2144 ± 15 Ma levaram Cruz
1997). Silva et al. (1999) també m analisa‑ (2019) a descaracterizar a unidade como
ram U‑Pb (SHRIMP) em zircã o nos tonalitos Septo do Embasamento, conforme proposto,
do CPM, obtendo idade de cristalizaçã o de originalmente, por Philipp & Machado
609 ± 15 Ma. Atravé s do mé todo Pb‑Pb, Phi‑ (2002), e a considerar que a formaçã o dessa
lipp et al. (2003) indicaram a cristalizaçã o paleobacia ocorreu, no má ximo, no Ediaca‑
destas rochas, em 625 ± 4 Ma. Cruz (2019) rano. A idade de 613 Ma de zircã o detrı́tico é
calculou a idade magmá tica de 633 ± 4 Ma, sugestiva de que, tanto a sedimentaçã o
utilizando U‑Pb em zircã o, em um monzo‑ quanto o metamor ismo dessas rochas no
granito deste complexo. O estudo mais re‑ Ediacarano sã o sı́ncronas à Orogê nese Pi‑
cente de Loureiro et al. (2021) obteve idades nheiro Machado.
de cristalizaçã o de 615,5 ± 3,1 e de 607,6 ±
3,5 Ma, pelo mesmo mé todo, em diorito e 5. 4 Magmatismo Tardi a Pós‑colisional
em sienogranito, respectivamente.
De acordo com Song et al. (2015), o
5. 3 Sedimentação e Metamor ismo Co‑ magmatismo tardi‑ a pó s colisional ocorre
lisional apó s o evento colisional. Nos perı́odos inici‑
ais (tardi‑colisional), ainda existem movi‑
O perı́odo colisional da Orogê nese mentaçõ es horizontais, como falhas, rotaçã o,
Pinheiro Machado deve ter ocorrido pró xi‑ extrusã o e cisalhamento, ao longo de gran‑

O Terreno Pelotas e a Orogênese Pinheiro Machado 37


Contribuições à Geologia do Rio Grande do Sul e de Santa Catarina

des zonas. Nas etapas mais tardias (pó s‑coli‑ torno de 590 Ma, obtidas em leucosienogra‑
sionais), os processos de exumaçã o e de co‑ nitos (Dal Olmo‑Barbosa et al., 2021).
lapso predominam, com importantes Recentemente, Vö lz et al. (2020) ca‑
interaçõ es magmá ticas manto/crosta. Segun‑ racterizaram monzogranitos, incluı́dos no
do os mesmos autores, os magmas formados Granito Grupelli (578 ± 4 Ma, por U‑Pb SH‑
durante essas etapas sã o: (i) cá lcio‑alcalinos RIMP em zircã o), como representantes do
alto‑K e potá ssicos, derivados do manto me‑ magmatismo mais evoluı́do em relaçã o à s
tassomatizado; (ii) granitos peraluminosos, Suı́tes Cerro Grande e Dom Feliciano.
de fusã o crustal; e (iii) granitos do tipo I, for‑
A colocaçã o de vá rios corpos bá sicos
mados por fusã o da crosta inferior e por inte‑
també m ocorre nesta fase pó s‑colisional do
raçã o com o manto, comumente gerando
TP, em pequenas ocorrê ncias, disseminadas
magmas má icos.
em meio aos granitoides, como os Gabros
Estima‑se que o perı́odo tardi a pó s‑ Passo da Fabiana, Diorito Alto Alegre e Diori‑
colisional inicie com a intrusã o da Suı́te Cerro to Capim Branco. Estas rochas registram a
Grande, em ~610 Ma (Dal Olmo‑Barbosa et participaçã o de lı́quidos basá lticos hidrata‑
al., 2021), e que a ú ltima manifestaçã o plutô ‑ dos, cá lcio‑alcalinos alto‑alumina, posiciona‑
nica ocorra em 562 Ma (magmas diorı́ticos). dos no TP entre 590 Ma e 560 Ma (Dal
Esse perı́odo é condizente com o perı́odo es‑ Olmo‑Barbosa et al., 2021). Segundo os mes‑
timado para eventos magmá ticos tardi a pó s‑ mos autores, o in luxo destes lı́quidos de de‑
colisionais, de 10‑40 Ma (Song et al., 2015). rivaçã o manté lica é controlado e posicionado
O magmatismo registrado nas suı́tes nos nı́veis superiores da crosta, por meio de
Cerro Grande e Dom Feliciano compõ e parte descontinuidades litosfé ricas, as quais sã o
expressiva do TP. A primeira Suı́te representa comuns na estruturaçã o desta porçã o do
a antiga fá cies Cerro Grande, da Suı́te Dom ESRG.
Feliciano, com predomı́nio de monzogranitos Rochas vulcâ nicas efusivas e particu‑
grossos a por irı́ticos, de a inidade cá lcio‑al‑ ladas també m compõ em o cená rio do mag‑
calina. Na segunda, predominam sienograni‑ matismo pó s‑colisional na porçã o sul do TP,
tos, de a inidade cá lcio‑alcalina alto‑K a com idades de 630,4 ± 2,8 Ma na ocorrê ncia
predominantemente alcalina, com monzogra‑ Cerro Chato da Formaçã o Cerro Chato, corre‑
nitos, com feldspato alcalino granitos e com lacioná vel à Formaçã o Maricá (Noll Filho et
quartzo sienitos subordinados, e raras ocor‑ al., 2018).
rê ncias de enclaves e de xenó litos (Cruz,
2019). També m ocorrem, neste contexto, cor‑
5. 5 Magmatismo Pós‑orogênico
pos bá sicos e vulcâ nicos associados, de di‑
mensõ es quilomé tricas (ver Dal O está gio pó s‑orogê nico é , de modo
Olmo‑Barbosa et al., 2018 e refs). geral, representado pelo colapso orogê nico,
O posicionamento da Suı́te Cerro com extensã o associada, causando perda de
Grande é , principalmente, tardi a pó s‑colisio‑ altura e espalhamento lateral da massa oro‑
nal, com ocorrê ncia de faixas milonı́ticas, ao gê nica (e.g. Dewey et al., 1993), acompanha‑
longo da suı́te, de idade estimada entre 610 do de magmatismo pó s‑orogê nico, gerado
Ma e 595 Ma (Babinski et al., 1997; Dal Olmo‑ em condiçõ es extensionais.
Barbosa et al., 2021). A Suı́te Dom Feliciano é , O está gio pó s‑orogê nese Pinheiro
essencialmente, pó s‑colisional, com rochas Machado está representado no TP pelas ro‑
pouco ou nã o deformadas. Estima‑se que a chas subvulcâ nicas da ocorrê ncia Cerro Par‑
idade de cristalizaçã o destas rochas seja em tido, da Formaçã o Cerro Chato (561,1 ± 2,2
38 Edição da Sociedade Brasileira de Geologia – Núcleo RS/SC
Porcher et al.

Ma) (Noll Filho et al., 2018), que sã o correla‑ a pó s‑colisional, representada por grande vo‑
cionadas à etapa pó s‑orogê nica da sub‑bacia lume de magmas de a inidades cá lcio‑alcali‑
Arroio Santa Bá rbara, da Bacia do Camaquã nas alto‑K a alcalinas, das Suı́tes Cerro
(sensu Paim et al., 2014). Neste perı́odo, tam‑ Grande (~610‑595 Ma) e Dom Feliciano
bé m ocorre magmatismo, na forma de enxa‑ (~590 Ma), com magmatismo bá sico gabroi‑
mes de diques á cidos a bá sicos, bem como co concomitante (e.g. Gabros Passo da Fabia‑
rochas subvulcâ nicas associadas, na unidade na ‑ 591 Ma), e por granitos peraluminosos
Riolitos Asperezas (Cruz, 2019), nas proximi‑ sin‑transcorrentes (Suı́te Trê s Figueiras ‑575
dades de Pinheiro Machado. Estas rochas Ma). Ocorrem, posteriormente, intrusõ es bá ‑
apresentam idades de cristalizaçã o em torno sicas (dioritos Capim Branco e Alto Alegre,
de 550 Ma (Zanon et al., 2006). ca. 562 Ma). Os ú ltimos pulsos magmá ticos
registrados no Terreno Pelotas estã o repre‑
6 CONSIDERAÇÕES FINAIS sentados pelas rochas subvulcâ nicas do Cer‑
ro Partido (ca. 560 Ma), correlacioná veis à s
O TP é um terreno magmá tico de ida‑ unidades da bacia pó s‑orogê nica da Sub‑ba‑
de predominantemente ediacarana, delimita‑ cia Arroio Santa Bá rbara, da Bacia do Ca‑
do por grandes estruturas transcorrentes, maquã , representando o im da Orogê nese
com magmatismo sin‑cinemá tico associado, e Pinheiro Machado.
evoluçã o tectô nica vinculada à Orogê nese Pi‑
nheiro Machado. A Zona de Cisalhamento REFERÊNCIAS
Transcorrente Dorsal de Canguçu ‑ Sutura de
Porto Alegre estabelece o limite oeste do TP Babinski, M., Chemale Jr, F., Van Schmus, W.
com o TT, em cerca de 625‑607 Ma, concomi‑ R., Hartmann, L. A., & Silva, L. C. 1997. U‑Pb
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cerca de 575 Ma.
A crosta pré ‑orogenê se Pinheiro Ma‑ Basei, M. A. S., Siga, J. R. O., Masquelin, H., Ha‑
chado do TP é paleoproterozoica (ca. 2.0 Ga) rara O. M., Reis Neto, J. M. & Preciozzi, F.,
e foi afetada pela Orogê nese Piratini (780‑ 2000. The Dom Feliciano belt of Brazil and
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Pinheiro Machado compreendem: (i) uma Vieira, D. T., Ramos, R.C. & Cedeñ o, D.G. 2021.
etapa pré ‑colisional, representada pelo APM Contribution to the understanding of the
(633 Ma a 609 Ma) e pelo magmatismo sin‑ Pinheiro Machado Complex (Dom Feliciano
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(ii) uma etapa sin‑colisional (ca. 610 Ma), re‑
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presentada pelo metamor ismo orogê nico do
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O Terreno Pelotas e a Orogênese Pinheiro Machado 39


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O Terreno Pelotas e a Orogênese Pinheiro Machado 41


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42 Edição da Sociedade Brasileira de Geologia – Núcleo RS/SC


O Magmatismo Toniano do Terreno
São Gabriel e a evolução
do Cinturão Dom Feliciano
Ruy Paulo Philipp1, Miguel Angelo Stipp Basei2

1
Instituto de Geociê ncias, Universidade Federal do Rio Grande do Sul
2
Instituto de Geociê ncias, Universidade de Sã o Paulo

*autor correspondente: ruy.philipp@ufrgs.br

Dedicado ao professor Márcio M. Pimentel.

1 INTRODUÇÃO
O Terreno Sã o Gabriel (TSG) representa a porçã o oeste do Cinturã o Dom Feliciano, sen‑
do constituı́do por uma sucessã o de complexos metaplutô nicos, metavulcano‑sedimentares e
metamá icos‑ultramá icos (o iolitos), de idade toniana. Estas unidades estã o expostas como um
conjunto de rampas de cavalgamento, de direçã o N20‑30oE, com vergê ncia tectô nica para SE. Es‑
tes corpos registraram dois ciclos de metamor ismo orogê nico, associados a uma evoluçã o es‑
trutural polifá sica. Os complexos metavulcâ nicos e ortogná issicos do Terreno Sã o Gabriel
apresentam composiçã o geoquı́mica cá lcico‑alcalina pouco evoluı́da e isotó pos de Sr, de Nd e de
Hf com caracterı́sticas manté licas. Os dois intervalos principais do magmatismo, entre 0,9‑0,85
Ga e 0,78‑0,72 Ma, tornam estas unidades as mais bem preservadas exposiçõ es do perı́odo de
subducçã o, que caracterizou o inı́cio do Ciclo Orogê nico Brasiliano na Provı́ncia Mantiqueira.
Os limites do terreno sã o balizados pelas cidades de Sã o Gabriel, de Vila Nova do Sul, de
Caçapava do Sul e de Lavras do Sul, que delimitam o polı́gono dos metais do RS, com registro de
atividades mineiras, desde 1865. Do inal do sé culo XIX, destaca‑se, no sul de Caçapava do Sul, a
extraçã o de cobre nas Minas do Camaquã , associada à s rochas sedimentares e vulcâ nicas da Ba‑
cia do Camaquã , e as minas de ouro, vinculadas ao Granito Lavras do Sul. Entre 1970 e 1990, a
regiã o de Vila Nova do Sul foi palco de intensa exploraçã o de ouro nas minas Bossoroca, KDG,
Guardinha e Andreazza, localizadas em unidades metavulcano‑sedimentares do Complexo da
Bossoroca. Esta regiã o ainda foi o berço da estratigra ia das rochas do embasamento, como re‑
sultado dos trabalhos de mapeamento, realizados pela Escola de Geologia da UFRGS (Goni et al.,
Contribuições à Geologia do Rio Grande do Sul e de Santa Catarina

1962; Jost & Vilwoock, 1966; Jost, 1966). As das da geologia do TSG foram apresentadas
primeiras propostas estratigrá icas foram por Philipp et al. (2016, 2018).
marcos de referê ncia, forjadas com o apoio O objetivo deste capı́tulo é apresen‑
do martelo e da bú ssola, reconhecendo os tar uma sı́ntese do conhecimento geotectô ni‑
complexos o iolı́ticos, as sequê ncias metasse‑ co do Terreno Sã o Gabriel, com base em
dimentares, de fundo marinho, os metapsa‑ dados geocronoló gicos e isotó picos, com fo‑
mitos imaturos, associados a rochas co na proveniê ncia por zircã o detrı́tico dos
vulcanogê nicas, e os metassedimentos matu‑ complexos metavulcano‑sedimentares. Esta
ros de uma margem passiva, que limitava regiã o tem grande importâ ncia histó rica, pe‑
uma á rea cratô nica. Os pesquisadores desta‑ lo signi icado de sua evoluçã o, em relaçã o à s
caram a evoluçã o estrutural complexa e poli‑ construçõ es do Cinturã o Dom Feliciano
fá sica e a intrusã o tardia de corpos (CDF) e da Provı́ncia Mantiqueira, e pela sua
granı́ticos. contribuiçã o na formaçã o do pensamento es‑
As investigaçõ es que ocorreram, du‑ tratigrá ico e tectô nico de diversas geraçõ es
rante os anos 80 e 90 do sé culo XX, suporta‑ de geó logos.
das por aná lises geoquı́micas e pelos
primeiros resultados geocronoló gicos (K‑Ar, 2 CONTEXTO TECTÔNICO
Rb‑Sr e Sm‑Nd), entretanto, transformaram
as unidades de arco e os complexos o iolı́ti‑ A Provı́ncia Mantiqueira (PM) é um
cos em associaçõ es do tipo greenstone belt, sistema orogê nico neoproterozoico, de dire‑
em um cená rio continental ixista Arqueano çã o NE‑SW, que expõ e, ao longo de ca. 3.000
(Oliveira, 1981; Garcia & Hartmann, 1981; km das costas sudeste e sul do Brasil, até o
Chemale Jr., 1982; Naumann et al., 1984; Uruguai, os cinturõ es Araçuaı́, Ribeira e Dom
Koppe et al., 1985; Wildner, 1990; Remus, Feliciano (Silva et al., 2005). A construçã o
1990). Concepçõ es mobilistas, baseadas em desta provı́ncia esteve associada à formaçã o
aná lise estrutural e em dados geoquı́micos e do Gondwana, junto com sua contraparte
geocronoló gicos, foram restritas (Szubert et africana, que inclui os cinturõ es Saldania‑Ga‑
al., 1977; Silva Filho, 1984; Soliani Jr., 1986). riep, Damara, Kaoko e Oeste do Congo (Basei
O retorno à s antigas concepçõ es orogê nicas, et al., 2000).
durante os anos 1990, foi suportado pela ge‑ O CDF representa a porçã o sul da PM
ocronologia U‑Pb (SHRIMP) em zircã o e por e está dividido, de oeste para leste, em: (i)
isó topos de Nd, resultando em modelos, ba‑ Terreno Sã o Gabriel; (ii) Terreno Tijucas; (iii)
seados na subducçã o de crosta oceâ nica e na bató litos Florianó polis, Pelotas e Aiguá ; e (iv)
formaçã o de arcos magmá ticos (Fragoso‑Ce‑ terrenos Jaguarã o e Punta del Este (Fig. 1A‑
sar, 1990; Fernandes et al., 1992; Babinski et 1B). A construçã o do cinturã o envolveu trê s
al., 1996; Saalmann et al., 2005, 2006). Os re‑ eventos orogê nicos, denominados Passinho
sultados dos mapeamentos promovidos pelo (0,9‑0,85 Ga), Sã o Gabriel (0,78‑0,72 Ga) e
Instituto de Geociê ncias da UFRGS e pela Dom Feliciano (0,65‑0,54 Ga) (Saalmann et
CPRM foram integrados a novos levantamen‑ al., 2006; Hartmann et al., 2007; Philipp et
tos geocronoló gicos e isotó picos, resultando al., 2016). No RS, o embasamento do cintu‑
em importantes contribuiçõ es (Leite et al., rã o é constituı́do por orto e por paragnais‑
1998; Saalmann et al., 2005, 2006, 2011; ses, de idades paleoproterozoicas e
Hartmann et al., 2011; Lena et al., 2014; Lo‑ arqueanas, que constituem o Terreno Taqua‑
pes et al., 2015; Gubert et al., 2016; Vedana et rembó e que ocorrem como inliers no Terre‑
al., 2017; Laux et al., 2017). Revisõ es integra‑ no Tijucas e no Bató lito Pelotas (Fernandes
44 Edição da Sociedade Brasileira de Geologia – Núcleo RS/SC
Philipp & Basei

et al., 1992; Saalmann et al., 2010; Philipp et acompanhado por metamor ismo orogê nico
al., 2016). Estes fragmentos do embasamen‑ de mé dio‑alto grau, sob condiçõ es de pres‑
to constituem uma unidade maior, denomi‑ sã o mé dia. Este evento, entre 650 Ma e 620
nada Terreno Nico Perez (Oyhantçabal et al., Ma, promoveu intenso magmatismo granı́ti‑
2011). A formaçã o do CDF compreendeu co e reciclagem crustal, com movimentaçõ es
uma colagem de domı́nios oceâ nicos, de ar‑ pó s‑colisionais, que se estenderam, até o i‑
cos magmá ticos, de sedimentos de margem nal do Ediacarano (540 Ma) (Philipp et al.,
passiva e de inliers de embasamento, desen‑ 2016).
volvida entre os crá tons Rio de La Plata
(CRLP) e Luis Alves (CLA), o Terreno Nico 3 GEOLOGIA DO TERRENO
Perez (TNP) e os crá tons Kalahari e Congo. A SÃO GABRIEL
longa evoluçã o, de ca. 450 Ma, envolveu o de‑
senvolvimento de dois ciclos orogê nicos, ca‑ O TSG é constituı́do por associaçõ es
racterizados por: (i) magmatismo metaplutô nicas e metavulcano‑sedimenta‑
pré ‑colisional e formaçã o dos arcos Passinho res, relacionadas a dois arcos juvenis, de ida‑
e Sã o Gabriel; e (ii) magmatismo sin a pó s‑ des tonianas, intercaladas com complexos
colisional e formaçã o do arco Dom Feliciano o iolı́ticos e com metassedimentos de mar‑
(Chemale Jr., 2000; Saalmann et al., 2010; gem passiva. As associaçõ es magmá ticas
Philipp et al., 2016). apresentam razõ es 87Sr/86Sr < 0,705, valores
Na regiã o Sul do Brasil, a identi ica‑ positivos de ƐNd(t) (+1 a +6) e idades‑mo‑
çã o dos processos de subducçã o e a geraçã o delo Nd (TDM) entre 1,2 e 0,8 Ga, indicando
das associaçõ es metavulcano‑sedimentares e uma composiçã o manté lica e juvenil (Soliani
plutô nicas, de idade toniana, estiveram asso‑ Jr., 1986; Babinski et al., 1996; Saalmann et
ciada à s aná lises de isó topos de Nd e à s data‑ al., 2005; Vedana et al., 2017; Philipp et al.,
çõ es pelo mé todo U‑Pb em zircã o (Machado 2018). As unidades do TSG constituem cinco
et al., 1990; Babinski et al., 1996; Leite et al., segmentos, que expõ em, de noroeste para
1998; Remus et al., 1999, 2000). A identi ica‑ sudeste: (i) suı́tes granitoides, relacionadas a
çã o destas associaçõ es sugeriu a presença de um arco de margem continental; (ii) comple‑
um pequeno oceano, separando o CRLP e o xos metavulcano‑sedimentares, de composi‑
TNP, que se fundiriam, ao inal do Criogenia‑ çã o cá lcico‑alcalina, e metamá icos‑ultra‑
no (Saalmann et al., 2005, 2006; Hartmann má icos (o iolitos); (iii) complexos metasse‑
et al., 2011; Gubert et al., 2016; Laux et al., dimentares de bacias tardi‑orogê nicas; (iv)
2017; Vedana et al., 2017; Philipp et al., complexo ortogná issico de arco intraoceâ ni‑
2018). As rochas neoproterozoicas juvenis, co; e (v) complexos metassedimentares sili‑
relacionadas aos arcos intraoceâ nicos expos‑ ciclá sticos de margem passiva (Fig. 1C). Os
tos no TSG, oferecem uma oportunidade sin‑ contatos entre estas unidades sã o de inidos
gular de investigaçã o da tectô nica Brasiliana. por zonas de cisalhamento dú cteis, de dire‑
O magmatismo pré ‑colisional e de natureza çã o N20‑40oE, cujas terminaçõ es, ao sul, sã o
juvenil, que caracteriza a evoluçã o inicial do afetadas pelo Zona de Cisalhamento de Ibaré
CDF, foi referido como orogenias Passinho e (ZCI), de direçã o N70oW. A oeste e ao norte,
Sã o Gabriel (Leite et al., 1998; Saalmann et as unidades do TSG sã o cobertas por rochas
al., 2005, 2006; Hartmann et al., 2007). Um sedimentares da Bacia do Paraná . As princi‑
segundo ciclo magmá tico, associado ao fe‑ pais estruturas e as relaçõ es de contato en‑
chamento do Oceano Adamastor e à colisã o tre as unidades do TSG podem ser
continental com os crá tons africanos, foi observadas nas seçõ es geoló gicas da Figura

O Magmatismo Toniano do Terreno São Gabriel e a evolução do Cinturão Dom Feliciano 45


Contribuições à Geologia do Rio Grande do Sul e de Santa Catarina

Figura 1 ‒ A) Localizaçã o do Cinturã o Dom Feliciano na Amé rica do Sul; B) Mapa geotectô nico da porçã o sul da
Provı́ncia da Mantiqueira, mostrando as unidades do Cinturã o Dom Feliciano e do Terreno Nico Perez (zonas de
cisalhamento: 1 ‑ Itajai‑Perimbó , 2 ‑ Major Gercino, 3 ‑ Santana da Boa Vista, 4 ‑ Dorsal de Canguçu, 5 ‑ Passo do
Marinheiro, 6 ‑ Ibaré , 7 ‑ Sarandi Del Y, 8 ‑ Sierra Ballena, 9 ‑ Cerro Amaro e 10 ‑ Arroio Grande); C) Mapa
geoló gico do Terreno Sã o Gabriel, mostrando suas principais unidades (legenda: EDF ‑ Evento Dom Feliciano
(0,65‑0,57 Ga), d ‑ intervalo de dados de zircã o detrı́tico U‑Pb); zonas de cisalhamento: ZCCS ‑ Caçapava do Sul,
ZCDC ‑ Dorsal do Canguçu, ZCI ‑ Ibaré e ZCPVN ‑ Palma‑Vila Nova do Sul; seçõ es geoló gicas: I ‑ Vila Nova do Sul‑
Bossoroca, II ‑ Panorama‑Cerro do Ouro e III ‑ Coxilha do Batovi‑Palma‑Pontas do Salso; cidades: B ‑ Bagé , DP ‑
Dom Pedrito, CS ‑ Caçapava do Sul, LS ‑ Lavras do Sul, VN ‑ Vila Nova do Sul e SG ‑ Sã o Gabriel) (modi icado de
Philipp et al. (2018). Cı́rculos amarelos: localizaçã o das amostras de zircã o detrı́tico (modi icado de Philipp et
al. (2018)).

2A. As zonas de cisalhamento, que delimitam gravimé tricas e magnetomé tricas, que sepa‑
o TSG a leste e ao sul, representam uma zona ram o TSG e o Terreno Nico Perez, represen‑
de sutura profunda, de inida por anomalias tado, no RS, pelo Terreno Taquarembó e por

46 Edição da Sociedade Brasileira de Geologia – Núcleo RS/SC


Philipp & Basei

uma trilha quase contı́nua de inliers de ortog‑ Chemale Jr., 1982; Koppe et al., 1985; Remus,
naisses paleoproterozoicos no Terreno Tiju‑ 1990; Leite et al., 1998). Os complexos o iolı́‑
cas (Fernandes et al., 1992; Saalmann et al., ticos ocorrem como faixas alongadas, segun‑
2010). do a direçã o NE‑SW, com ca. de 10‑20 km de
O magmatismo dos arcos tonianos comprimento e de 1‑2 km de largura. Sã o
está representado pelos ortognaisses do concordantes com a estrutura regional e
Complexo Imbicuı́ (0,9‑0,86 Ga), por rochas mantê m contato tectô nico com os complexos
metavulcano‑sedimentares do Complexo ortogná issicos e metavulcano‑sedimentares.
Bossoroca (CB) (0,78‑0,76 Ga) e por ortog‑ Os o iolitos constituem seis corpos princi‑
naisses e metagranitoides do Complexo Cam‑ pais, denominados Cerro Mantiqueira, Ibaré ,
baı́ (CC) (0,75‑0,72 Ga) (Philipp et al., 2018). Passo do Ivo, Palma, Cambaizinho e Arroio
Os granitoides intrusivos da Suı́te Lagoa da Lajeadinho (Fig. 1C).
Meia Lua (SLML) (0,70‑0,68 Ga) caracterizam O Complexo Ibaré , situado a SW da
o magmatismo tardi‑orogê nico. A deposiçã o Palma, apresenta uma ampla exposiçã o de
dos metassedimentos dos complexos Ibaré e serpentinitos, com corpos tabulares e intru‑
Pontas do Salso caracterizam o colapso do sivos de albititos, com 40‑80 cm de espessu‑
TSG, em torno de 0,68 Ga (Vedana et al., ra, interpretados como albititos (Jost &
2017). Vilwoock, 1966; Jost, 1966). Os autores des‑
As diferentes unidades do TSG po‑ crevem a ocorrê ncia de massas irregulares
dem ser agrupadas em quatro associaçõ es de clorititos e de turmalinitos, junto ao con‑
petrotectô nicas: (i) Prisma Acrescioná rio da tato com o Granito Santa Rita. O O iolito Cer‑
Palma; (ii) associaçõ es de arco magmá tico; ro Mantiqueira, exposto na porçã o sul do
(iii) magmatismo e sedimentaçã o tardi‑oro‑ TSG, é constituı́do por corpos de serpentini‑
gê nica; e (iv) associaçã o vulcano‑sedimentar tos, envoltos por faixas restritas de tremolita
da Bacia do Camaquã e plutons associados, xistos e de talco‑clorita‑tremolita xistos (Fig.
formados no intervalo entre 0,61 Ga e 0,54 1C). Cristais reliquiares de olivina e de cro‑
Ga, associados aos processos tectô nicos do mita de metaperidotitos mostraram compo‑
perı́odo pó s‑colisional da Orogenia Dom Feli‑ siçõ es tı́picas de o iolitos (Leite et al., 1998;
ciano. Hartmann & Chemale Jr., 2003). Metaultra‑
ma itos serpentinizados, com a assembleia
Anto ilita + Forsterita + Enstatita + Diopsı́dio,
3. 1 Prisma Acrescionário da Palma
caracterizam o metamor ismo orogê nico M1
O Prisma Acrescioná rio da Palma é de grau mé dio‑alto da sé rie de baixa P/T. A
constituı́do por complexos o iolı́ticos, carac‑ formaçã o das zonas de cisalhamento dú cteis
terizados por corpos alongados de serpenti‑ de alto â ngulo, sin‑tectô nicas ao metamor is‑
nitos, envoltos por faixas mé tricas de mo M2, indicam condiçõ es retrometamó r i‑
clorita‑clinocloro xistos, de talco xistos e de cas entre a Fc. Xistos Verdes Superior e a
tremolita xistos, intercalados com metapeli‑ An ibolito Inferior. Hartmann & Chemale Jr.
tos, com cristas contı́nuas de metachert (2003) interpretaram os metamor ismos M1
(quartzito puro) e com raras formaçõ es ferrı́‑ e M2 como relacionados aos eventos Sã o Ga‑
feras bandadas (BIFs). No interior dos ser‑ briel e Dom Feliciano, respectivamente. Da‑
pentinitos, foram identi icados relictos de dos geocronoló gicos indicam que os o iolitos
metaharzburgitos, de metadunitos, de meta‑ sã o tonianos (0,93‑0,89 Ga) (Arena et al.,
piroxenitos e de metagabros (Oliveira, 1981; 2016).

O Magmatismo Toniano do Terreno São Gabriel e a evolução do Cinturão Dom Feliciano 47


Philipp et al.

Figura 2 ‒ A) Seçõ es geoló gicas, mostrando as principais estruturas e relaçõ es estratigrá icas entre as unidades
do Terreno Sã o Gabriel: I) Vila Nova do Sul‑Bossoroca, II) Panorama‑Cerrito e III) Coxilha do Batovi‑Palma‑
Pontas do Salso. Localizaçõ es no mapa da Figura 1C (modi icado de Laux et al. (2017) e de Philipp et al. (2018));
B) Composiçã o isotó pica de Nd dos complexos metavulcano‑sedimentares e plutô nicos do Terreno Sã o Gabriel.
Fontes dos dados: Saalmann et al. (2005), Philipp et al. (2018).

Associado a rochas metaultramá icas cos (meta‑arenitos), intercalados com corpos


e má icas, o Complexo Cambaizinho (CCz) é subordinados de gnaisses pelı́ticos, cá lci‑sili‑
constituı́do por gnaisses quartzo‑feldspá ti‑ cá ticos e de má rmores (Fig. 1C). Estes litó ti‑

O Magmatismo Toniano do terreno São Gabriel e a evolução do Cinturão Dom Feliciano 48


Philipp & Basei

pos sã o encontrados como xenó litos mé tri‑ superior e an ibolito inferior está caracteri‑
cos e como pendentes de teto, de algumas zado por associaçõ es com albita+actinoli‑
dezenas de metros, no interior dos ortog‑ ta+clorita+epidoto.
naisses do CC e nos granitos da SLML (Hart‑ As unidades que constituem o Arco
mann et al., 2011). Os gnaisses Sã o Gabriel sã o dominantes e incluem as ro‑
qz‑feldspá ticos sã o dominantes, com banda‑ chas metavulcano‑sedimentares do Comple‑
mento milimé trico regular e contı́nuo, alter‑ xo Bossoroca (780‑760 Ma) (Machado et al.,
nando nı́veis fé lsicos, ricos em 1990; Remus et al., 1999; Gubert et al., 2016)
quartzo‑plagioclá sio, e nı́veis má icos, ricos e os ortognaisses e os metagranitos do Com‑
em biotita e em granada, com estaurolita. As plexo Cambaı́ (750‑720 Ma) (Leite et al.,
condiçõ es metamó r icas variam entre a fá ci‑ 1998; Hartmann et al., 2011; Laux et al.,
es an ibolito inferior a superior (Remus, 2017). Ambas as unidades sã o cortadas por
1990; Lena et al., 2014). Philipp et al. (2018) corpos de granodioritos e de dioritos tardi‑
obtiveram uma isó crona de Sm‑Nd (grana‑ orogê nicos da SLML (700‑670 Ma) (Hart‑
da‑rocha total) de 807±31 Ma em granada‑ mann et al., 2011; Laux et al., 2017) e por ro‑
biotita‑plagioclá sio‑qz gnaisse. Dados isotó ‑ chas má icas‑ultramá icas estratiformes do
picos de Nd e de 18O mostraram que as Gabro‑Peridotito Mata Grande (Philipp et al.,
rochas do CCz derivaram da erosã o de ro‑ 2018). Nı́veis de meta‑arenitos conglomerá ‑
chas juvenis (Saalmann et al., 2005; Lena et ticos dos complexos Ibaré e Pontas do Salso
al., 2014; Philipp et al., 2018). apresentam seixos correlacioná veis à s ro‑
chas metavulcâ nicas do CB e de granitoides
3. 2 Associações de arco da SLML (Vedana et al., 2017).
O Complexo Bossoroca ocorre na
O magmatismo do Arco Passinho es‑ porçã o nordeste do TSG e consiste em meta‑
tá representado pelos ortognaisses do Com‑ tufos e em luxos de lava de composiçã o da‑
plexo Imbicuı́ (CI), constituı́dos, na sua cı́tica a andesı́tica, associados a metasse‑
porçã o central, por gnaisses tonalitico‑ dimentos vulcanogê nicos e a BIFs (Wildner,
trondhjemı́ticos, envoltos, ao norte e ao sul, 1990; Porcher et al., 1995; Remus et al.,
por gnaisses diorı́ticos (Kramer, 1995; Phi‑ 1999; Gubert et al., 2016). As rochas meta‑
lipp et al., 2018). O CI tem disposiçã o alon‑ vulcâ nicas tê m a inidade cá lcio‑alcalina de
gada, segundo a direçã o E‑W, e ocorre na baixo‑mé dio‑K e idades ı́gneas entre 780‑
porçã o sul do TSG, em contato com as ro‑ 760 Ma, com idades metamó r icas de 710‑
chas do O iolito Cerro Mantiqueira (Fig. 1C). 700 Ma (Remus et al., 1999; Hartmann et al.,
Os gnaisses mostram bandamento regular e 2011). As rochas metavulcanoclá sticas (Ab‑
contı́nuo, com evoluçã o estrutural complexa clo‑ep‑musc xistos), expostas na porçã o NW
e polifá sica. Apresentam composiçã o toleı́ti‑ do Complexo Passo Feio, foram correlaciona‑
ca e cá lcio‑alcalina baixo‑K e idades entre das à s rochas do CB, a partir de dados petro‑
900‑860 Ma, com contemporaneidade entre grá icos, geoquı́micos e geocronoló gicos
magmas á cidos e bá sicos. O metamor ismo (Philipp et al., 2018). O Complexo Cambaı́
orogê nico M1 é de inido pelas assembleias (CC) é constituı́do por gnaisses tonalı́ticos‑
plagioclá sio + hornblenda + biotita e plagio‑ trondhjemı́ticos e diorı́ticos e por metatona‑
clá sio + hornblenda + diopsı́dio, indicando litos, por metagranodioritos e por metadiori‑
condiçõ es metamó r icas da fá cies an ibolito tos intrusivos. Apresentam composiçã o
mé dio a superior e pressã o baixa. Um evento cá lcico‑alcalina mé dio‑K e a inidade metalu‑
retrometamó r ico (M2) de fá cies xisto verde minosa, com idades U‑Pb de 750‑720 Ma. Os
O Magmatismo Toniano do Terreno São Gabriel e a evolução do Cinturão Dom Feliciano 49
Contribuições à Geologia do Rio Grande do Sul e de Santa Catarina

gnaisses registram uma evoluçã o polifá sica, ciclá sticas maturas, dispostas ao longo dos
enquanto os metagranitoides constituem limites leste e sul do TSG, e representam as
corpos compostos, com relaçõ es de contem‑ unidades mais antigas do terreno. Estã o
poraneidade entre termos tonalı́ticos e diorı́‑ constituı́dos por metapsamitos, quartzitos,
ticos. metassiltitos, metapelitos, má rmores e
xistos cá lci‑silicá ticos, com intercalaçõ es
3. 3 Magmatismo tardi‑orogênico tectô nicas de rochas metavulcanoclá sticas e
de xistos magnesianos. Os metapsamitos sã o
A Suı́te Lagoa da Meia Lua (LMLS) é ricos em quartzo e em plagioclá sio, com ra‑
constituı́da por corpos intrusivos de tonali‑ ros fragmentos lı́ticos, indicando proveniê n‑
tos, de granodioritos e de dioritos, com ida‑ cia de á reas de reciclagem orogê nica.
des entre 700‑670 Ma, e que apresenta Mostram contatos tectô nicos com as unida‑
formas alongadas, segundo N20‑30oE (Ba‑ des juvenis e registram uma evoluçã o estru‑
binski et al., 1996; Hartmann et al., 2011; tural polifá sica, com condiçõ es metamó r icas
Laux et al., 2017). O Gabro‑Peridotito da Mata entre as fá cies xisto verde inferior e an iboli‑
Grande é um corpo estratiforme intrusivo to superior (estaurolita) da sé rie de mé dia P/
nos granitoides do CC e correlato à s unidades T. Per is colunares apresentados para o Com‑
da SLML (Philipp et al., 2018). plexo Coxilha do Batovi sugerem uma suces‑
As rochas metavulcano‑sedimentares sã o de metassedimentos, provavelmente,
dos complexos Pontas do Salso e Ibaré estã o depositados em ambiente deltaico (Philipp
expostas na porçã o sudoeste do TSG e sã o et al., 2018).
constituı́das por lentes dominantes de me‑
tapsamitos, intercaladas com metapsamitos 4 ISOTÓPOS DE Sr E DE Nd
conglomerá ticos, com metasiltitos feldspá ti‑
cos e com metapelitos. Os metassedimentos As rochas dos complexos Cambaizi‑
mostram feiçõ es de imaturidade textural e nho e Bossoroca apresentaram valores bai‑
87
clastos de rochas metavulcâ nicas e de grani‑ xos da razã o inicial Sr/86Sr
toides, correlatos à s rochas do CB e à s da (0,7014‑0,7039), similares aos ortognaisses
SLML. A composiçã o andesı́tica a dacı́tica e a do CC (0,701‑0,705), ambas indicativas de
a inidade cá lcico‑alcalina mé dio‑K indicam fontes manté licas (Soliani Jr., 1986; Silva Fi‑
que os metassedimentos derivaram de fontes lho, 1984; Remus, 1990; Babinski et al.,
manté licas juvenis (Vedana et al., 2017). A 1996). Os granitos da SLML, com razõ es en‑
proveniê ncia de zircã o detrı́tico apresentou tre 0,704 e 0,708, registram um pouco de in‑
fontes com idades entre 900‑700 Ma e com luê ncia crustal. Estes complexos
idade mı́nima de deposiçã o de 680 Ma, suge‑ apresentaram valores de é psilon Nd positi‑
rindo que os complexos foram depositados vos e idades‑modelo TDM entre 1,2 Ga e 0,77
em uma bacia tardi‑orogê nica, gerada duran‑ Ga (Fig. 2B). Os paragnaisses do CCz tê m va‑
te o colapso do Arco de Sã o Gabriel (Vedana lores de ENd(t) entre +0,39 e +5,64 e idades‑
et al., 2017; Philipp et al., 2018). modelo de 1,28‑0,86 Ga. Esta fonte juvenil foi
con irmada por dados de 18O, obtidos por
Lena et al. (2014), com valores entre +3,2 e +
3. 4 Associações de margem passiva
9,6, caracterizando trê s grupos de fontes
Os complexos Passo Feio, Arroio distintas e uma evoluçã o progressiva, a par‑
Marmeleiro e Coxilha do Batovi estã o consti‑ tir de rochas ı́gneas, geradas em um arco in‑
tuı́dos por sucessõ es metassedimentares sili‑ traoceâ nico, evoluindo para um arco de

50 Edição da Sociedade Brasileira de Geologia – Núcleo RS/SC


Philipp & Basei

margem continental. Os metassedimentos 5. 1 Magmatismo dos arcos tonianos


do Complexo Bossoroca mostraram ENd(t) Passinho e São Gabriel
entre +2,53 e +6,23 e idades‑modelo de
1,19‑0,77 Ga, enquanto as rochas metavulcâ ‑ O Arco Passinho, representado pelo
nicas apresentaram ENd(t) entre +6,0 e +7,8 Complexo Imbicuı́, mostrou gnaisses diorı́ti‑
e idades‑modelo de 0,96‑0,92 Ga (Philipp et cos, com idades de 879 ±14 Ma (Leite et al.,
al., 2018). Gnaisses tonalı́ticos‑diorı́ticos e 1998) e de 875 ±5 Ma, similares à s dos
metagranitó ides do CC exibiram valores gnaisses tonalı́ticos, de 890 ±9 Ma e de 885
ENd(t) entre +1,99 e +6,43, com idades‑mo‑ ±3 Ma (Philipp et al., 2018). Corpos intrusi‑
delo Nd de 1,04‑0,86 Ga. Os corpos intrusi‑ vos de dioritos e de tonalitos do CC apresen‑
vos da SLML produziram valores ENd(t) taram idades de 740‑710 Ma (Leite et al.,
entre +3,01 e +5,2 e idades‑modelo de 1,1‑ 1998).
0,82 Ga. Duas amostras, entretanto, apresen‑ O magmatismo sin‑orogê nico do Ar‑
taram valores de ENd(t) de ‑7,52 e ‑0,22 e co Sã o Gabriel registrou, em metadacitos do
idades‑modelo de 1,97‑1,6 Ga, con irmando Complexo Bossoroca, idades U‑Pb (TIMS) de
a participaçã o crustal no magmatismo da 753 Ma (Machado et al., 1990) e idades U‑Pb
suı́te. (SHRIMP) de 756 ±14 Ma (Remus et al.,
1999), enquanto amostras de metatufo a
cristal e de meta‑aglomerados dacı́ticos re‑
5 GEOCRONOLOGIA
sultaram em idades de 767 ±3 Ma e de 765
O entendimento das evoluçõ es es‑ ±10 Ma (Gubert et al., 2016). Philipp et al.
tratigrá ica e tectô nica do TSG está relacio‑ (2018) correlacionaram as rochas metavul‑
nado ao uso da geocronologia. As primeiras canoclá sticas (ab‑clo‑ep‑ms xistos), expostas
investigaçõ es estabeleceram idades relati‑ na porçã o noroeste do CPF, à s rochas meta‑
vas, com base no grau de complexidade es‑ vulcâ nicas do CB, apresentando dados de
trutural (Goni et al., 1962; Jost & Villwock, zircã o detrı́tico com idades entre 870‑700
1966). Aná lises de K‑Ar e de Rb‑Sr em mine‑ Ma, similares à s obtidas por Remus et al.
rais e em rocha‑total indicaram que as ro‑ (1999) e por Lopes et al. (2015). Na porçã o
chas metaı́gneas foram geradas entre 1,0 Ga plutô nica do arco, os ortognaisses do Com‑
e 0,68 Ga (Cordani et al., 1974; Teixeira, plexo Cambaı́ produziram idades magmá ti‑
1982; Silva Filho, 1984; Soliani Jr., 1986). As cas entre 750‑720 Ma (Leite et al., 1998;
microaná lises das razõ es U‑Pb em cristais de Hartmann et al., 2011; Vedana et al., 2017).
zircã o con irmaram este intervalo e as ima‑ Para o magmatismo tardi‑orogê nico da
gens de catodoluminescê ncia inseriram im‑ SLML, foram obtidas idades U‑Pb em zircã o
portantes consideraçõ es evolutivas. entre 710‑680 Ma, destacando 703 ±7 Ma
As investigaçõ es U‑Pb SHRIMP dos (Tonalito Buriti), 704 ±3 Ma (Granito Santa
complexos o iolı́ticos indicaram que os pla‑ Zé lia), 690 ±2 Ma e 694 ±5 Ma (tonalito e
giogranitos, associados ao O iolito Ibaré , tê m trondhjemito da BR‑290), 682 ±2 Ma (Gra‑
idade magmá tica de 892 ±3 Ma (Arena et al., nodiorito Cerca de Pedra) e 680 ±2 Ma (Gra‑
2016). Clorita xistos do O iolito Cerro Manti‑ nodiorito Sanga do Jobim) (Babinski et al.,
queira mostraram idade de 923 ±3 Ma em 1996; Hartmann et al., 2011; Laux et al.,
nú cleos herdados de cristais de zircã o e em 2017). Uma amostra de gabro do Gabro‑Pe‑
bordos metamó r icos de 787 ±13 Ma, inter‑ ridotito Mata Grande apresentou idade de
pretados como idade má xima de serpentini‑ 668 ±3 Ma (Philipp et al., 2018).
zaçã o e de colocaçã o dos o iolitos. Os metassedimentos dos complexos

O Magmatismo Toniano do Terreno São Gabriel e a evolução do Cinturão Dom Feliciano 51


Contribuições à Geologia do Rio Grande do Sul e de Santa Catarina

Cambaizinho, Ibaré e Pontas do Salso, que quı́mico‑exalativo associados. Os cristais de


ocorrem no interior do TSG e que represen‑ zircã o detrı́tico destes complexos provê m de
tam segmentos de bacias de arco, apresenta‑ fontes com idades entre 0,89‑0,68 Ga, deri‑
ram idades de zircã o detrı́tico entre vadas de rochas ı́gneas dos arcos Passinho
0,86‑0,70 Ga, indicando erosã o das rochas (0,9‑0,85 Ga) e Sã o Gabriel (0,78‑0,72 Ga). A
ı́gneas dos arcos Passinho e Sã o Gabriel (Fig. composiçã o dos isó topos de Sr e de Nd re‑
3A) (Lena et al., 2014; Vedana et al., 2017; força as fontes manté licas juvenis e con irma
Philipp et al., 2018). a erosã o das rochas magmá ticas pré ‑colisio‑
nais dos arcos do TSG (Babinski et al., 1996;
5. 2 Bacias de margem continental pas‑ Saalmann et al., 2005; Lena et al., 2014; Are‑
siva ou intracratônicas na et al., 2016; Vedana et al., 2017; Philipp et
al., 2018). A preservaçã o de cristais de zircã o
As sucessõ es siliciclá sticas maturas eué dricos indica que os metassedimentos
dos complexos Passo Feio, Arroio Marmelei‑ experimentaram um transporte curto. O pe‑
ro e Coxilha do Batovi, que margeiam os li‑ queno intervalo de ca. de 300 Ma entre as
mites do TSG e que se situam pró ximas à s idades de cristalizaçã o (CA) e de deposiçã o
associaçõ es do embasamento, apresentaram (DA) apontam para uma deposiçã o em baci‑
um amplo intervalo de idades U‑Pb em zir‑ as de arco sin a tardi‑orogê nicas (Fig. 3B)
cã o detrı́tico (entre 3,6 Ga e 1,0 Ga), indican‑ (Philipp et al., 2018).
do fontes variadas, com predomı́nio de Os metassedimentos siliciclá sticos
rochas paleoproterozoicas, com idades ar‑ maturos dos complexos Passo Feio, Arroio
queanas e mesoproterozoicas subordinadas Marmeleiro e Coxilha do Batovi foram deri‑
(Fig. 3A). vados de rochas‑fontes, com idades entre 3,6
e 1,0 Ga, com pico de idades entre 2,6 Ga e
6 DISCUSSÕES 1,8 Ga. Os padrõ es de distribuiçã o cumulati‑
6. 1 Idades U‑Pb em zircão detrítico e va das idades de zircã o detrı́tico mostraram
potenciais áreas de fontes uma diferença de ca. 1,5‑2,0 Ga entre as ida‑
des de cristalizaçã o e de deposiçã o (Fig. 3B).
As caracterı́sticas composicionais e Os diversos grupos de zircã o mostraram ta‑
texturais, os padrõ es de idades de zircã o de‑ manhos e formas distintas e elevado grau de
trı́tico e as idades mı́nimas de deposiçã o re‑ arredondamento, feiçõ es comuns de sedi‑
velaram dois grupos distintos de mentos com uma longa histó ria de transpor‑
rochas‑fontes e de tipos de bacias sedimen‑ te sedimentar. Estas caracterı́sticas,
tares para os complexos metamó r icos su‑ indicando a deposiçã o em uma bacia de
pracrustais do TSG: (i) bacias de arco, com margem passiva alimentada por fontes, sã o
rochas‑fontes, relacionadas ao magmatismo regionais e relacionadas à s unidades do Crá ‑
juvenil toniano; e (ii) bacias de margem con‑ ton Rio de La Plata e do Terreno Nico Perez.
tinental passiva, com fontes mistas, relacio‑ Uma discussã o detalhada sobre as principais
nadas a rochas dos nú cleos cratô nicos e das fontes, em termos de idades e de unidades
faixas mó veis, de idade paleoproterozoica, litoestratigrá icas e tectô nicas, pode ser en‑
que os envolvem (Philipp et al., 2018). contrada em Philipp et al. (2018).
Os metassedimentos dos complexos
Cambaizinho, Bossoroca, Ibaré e Pontas do 6. 2 Evolução tectônica e implicações
Salso mostraram feiçõ es texturais imaturas e geodinâmicas
importantes componentes vulcanogê nico e
52 Edição da Sociedade Brasileira de Geologia – Núcleo RS/SC
Philipp & Basei

Figura 3 ‒ A) Padrõ es de distribuiçã o da proporçã o relativa (PDP) das idades de U‑Pb em zircã o detrı́tico dos
complexos metavulcano‑sedimentares do Terreno Sã o Gabriel. Cada curva é construı́da, somando todas as
idades individuais e as incertezas e, depois, normalizando pelo nú mero de aná lises (mostrado à esquerda), de
modo que cada curva seja proporcional, em á rea; B) Curvas de proporçã o cumulativa, mostrando a variaçã o da
diferença entre a idade de cristalizaçã o (CA), medida para um grã o de zircã o detrı́tico, e a idade de deposiçã o
(DA) da sucessã o sedimentar em que ocorre. As barras com cores, ao fundo, representam os principais ciclos
orogê nicos e as unidades tectô nicas regionais, que serviram de á rea‑fonte. Fontes de dados: Arroios Marmeleiro
e Bossoroca e Coxilha do Batovi (Philipp et al., 2021), Cambaizinho (Lena et al., 2014), Ibaré (Arena et al., 2017 e
Philipp et al., 2021), Passo Feio (Lopes et al., 2015 e Remus et al., 2000), Pontas do Salso (Vedana et al., 2017).

O Magmatismo Toniano do Terreno São Gabriel e a evolução do Cinturão Dom Feliciano 53


Contribuições à Geologia do Rio Grande do Sul e de Santa Catarina

A colagem orogê nica da Provı́ncia crosta continental antiga. Estes complexos


Mantiqueira, durante o Ciclo Brasiliano, constituem uma faixa contı́nua, ao longo dos
ocorreu em quatro fases tectô nicas: a) 890‑ limites leste e sul do TSG com o Terreno Ni‑
720 Ma; b) 660‑610 Ma; c) 590‑560 Ma; e d) co Perez, afetados pelas zonas de cisalha‑
540‑520 Ma (Silva et al., 2005; Brito Neves et mento Caçapava do Sul e Ibaré , estruturas
al., 2014). Os cinturõ es Dom Feliciano, Ribei‑ interpretadas como uma zona de sutura,
ra e Araçuai registraram o perı́odo Toniano, com base em dados geoló gicos e em anoma‑
com unidades constituı́das por rochas mag‑ lias gravimé tricas e magnetomé tricas (Saal‑
má ticas juvenis, preservadas em associaçõ es mann et al., 2010).
de prisma acrescioná rio (complexos o iolı́ti‑ Os dados de zircã o detrı́tico dos
cos e metassedimentos associados), em ar‑ complexos supracrustais do TSG sustentam
cos magmá ticos intraoceâ nicos e em bacias, a formaçã o de arcos magmá ticos juvenis, du‑
relacionadas a arcos. As diferenças nos pro‑ rante o intervalo 0,89‑0,70 Ga, re letindo os
cessos tectô nicos e nos intervalos de idade protó litos plutô nicos (ortognaisses Imbicuı́
dos eventos derivam da magnitude dos blo‑ e Cambaı́) e vulcâ nicos (Bossoroca), con ir‑
cos envolvidos na formaçã o do Gondwana e mando a existê ncia de arcos intraoceâ nicos
da diversidade de cená rios paleogeográ icos e de uma bacia precursora (oceano) (Saal‑
(Brito Neves et al., 2014). mann et al., 2010; Philipp et al., 2016a,
As rampas de cavalgamento subpa‑ 2018). No modelo esquemá tico da Figura 4,
ralelas, de direçã o NE‑SW, que estruturam o tendo, como base, a reconstruçã o paleogeo‑
TSG, mostram uma zonaçã o paleogeográ ica grá ica do Rodı́nia, o CRLP e o TNP estariam
(de NW para SE), marcada pela intercalaçã o separados por um pequeno oceano, denomi‑
tectô nica de sequê ncias de prisma acrescio‑ nado Charrua, por Fragoso‑Cesar (1990),
ná rio, de rochas magmá ticas e sedimentares, que havia sido mencionado, desde os levan‑
relacionadas aos arcos e à s sucessõ es sedi‑ tamentos estratigrá icos de Jost & Villwock
mentares de margem continental passiva (1966), de Jost (1966) e de Szubert et al.
(Saalmann et al., 2010; Philipp et al., 2016a, (1977). O pequeno volume de rochas meta‑
2018). Esta estruturaçã o tem vergê ncia mó r icas geradas e a ocorrê ncia restrita de
tectô nica para sudeste e resulta do evento complexos o iolı́ticos, metavulcâ nico‑sedi‑
colisional (0,71‑0,70 Ga) entre o CRLP, os mentares e ortogná issicos, relacionados ao
sistemas de arcos tonianos e o TNP (Philipp magmatismo de arco, limitam a extensã o da
et al., 2018). O posicionamento dos corpos á rea oceâ nica. O intervalo de cristalizaçã o
tardi‑orogê nicos da SLML entre 0,70‑0,68 Ga restrito dos complexos e as fontes juvenis
foi controlado por zonas de cisalhamento suportam um curto espaço de tempo entre a
dú cteis de alto â ngulo, cuja movimentaçã o fase rift, o inı́cio da convergê ncia de placas e
soergueu blocos tectô nicos e criou espaços, a implementaçã o dos processos de subduc‑
para a deposiçã o dos metassedimentos dos çã o. Esses fatores levaram alguns autores a
complexos Ibaré e Pontas do Salso (Vedana se opor à presença de um grande domı́nio
et al., 2017). oceâ nico, antes do inı́cio de sua evoluçã o
Os metassedimentos siliciclá sticos orogê nica, propondo uma orogenia intra‑
dos complexos Passo Feio, Arroio Marmelei‑ cratô nica para a maior extensã o do sistema
ro e Coxilha do Tabuleiro caracterizam su‑ orogê nico da Provı́ncia da Mantiqueira (Ko‑
cessõ es geradas em uma bacia de margem nopá sek et al., 2020). Os autores salientam,
passiva, com idade má xima de deposiçã o de entretanto, que o desenvolvimento da crosta
1,5 Ga e situada pró xima aos limites de uma oceâ nica ocorreu apenas na parte sul do sis‑

54 Edição da Sociedade Brasileira de Geologia – Núcleo RS/SC


Philipp & Basei

Figura 4 ‒ A) Principais elementos tectô nicos, relacionados ao Gondwana Ocidental (0,95‑0.90 Ga); B) Detalhe
da porçã o sudeste, com idade entre 0,78 Ga e 0,72 Ga: crá tons: AM ‑ Amazô nico, CO ‑ Congo, KA ‑ Kalahari, LA ‑
Luı́s Alves, LAU ‑ Laurentia, RLP ‑ Rio de La Plata, SF ‑ Sã o Francisco, SM ‑ Saara e WA ‑ Oeste Africano;
fragmentos cratô nicos: BO ‑ Borborema, GO ‑ Maciço Central de Goiá s, PA ‑ Paranapanema, PB ‑ Parnaı́ba, PP ‑
Pampa e RA ‑ Rio Apa; arcos magmá ticos: A ‑ Amalaoulaou, G ‑ Goiá s, I ‑ Iskel, K ‑ Kabyé , P ‑ Passinho, SG ‑ Sã o
Gabriel e T ‑ Tilemsi; C) A ‑ Principais elementos tectô nicos do Gondwana Ocidental (1.0 Ga), B ‑ Detalhe da

O Magmatismo Toniano do Terreno São Gabriel e a evolução do Cinturão Dom Feliciano 55


Contribuições à Geologia do Rio Grande do Sul e de Santa Catarina Philipp et al.

porçã o sudeste do Oceano Charrua, mostrando a evoluçã o intraoceâ nica do Arco Passinho (0,9‑0,85 Ga) e C ‑
Desenvolvimento do Arco Sã o Gabriel e cavalgamento do Arco do Passinho e dos sedimentos de margem
passiva sobre o Terreno Nico Perez; D) Modelo evolutivo do Terreno Sã o Gabriel: A ‑ Quebra do
paleocontinente, B ‑ Abertura do Oceano Charrua, C ‑ Desenvolvimento do Arco Passinho, D ‑ Metamor ismo
orogê nico (M1) e cavalgamento do Arco Passinho e dos sedimentos de margem passiva sobre o Terreno Nico
Perez, E ‑ Desenvolvimento do Arco Sã o Gabriel, F ‑ Metamor ismo colisional (M2) entre o CRLP e o TNP, G ‑
Metamor ismo cataclá stico (M3), associado à s zonas de cisalhamento de alto â ngulo, com colocaçã o do
magmatismo pó s‑colisional da SLML e deposiçã o das bacias Ibaré e Pontas do Salso e H ‑ Reativaçã o pó s‑
orogê nica e magmatismo cá lcico‑alcalino/shoshonı́tico a alcalino (Evento Dom Feliciano) (legenda: 1 ‑
Embasamento, 2 ‑ Complexos o iolı́ticos, 3 ‑ Metassedimentos margem passiva, 4 ‑ Complexo Cambaizinho, 5 ‑
Complexo Imbicuı́, 6 ‑ Complexos Bossoroca e Cambaı́, 7/8 ‑ Tonalitos/Dioritos SLML, 9 ‑ Granitos tardi a pó s‑
orogê nicos do evento Dom Feliciano (modi icado de Philipp et al. (2018)).

tema de rift, interpretado como estreito e se‑ ra, O. M., Reis Neto, J. M. & Preciozzi, F. 2000.
melhante ao Mar Vermelho. The Dom Feliciano Belt of Brazil and Uru‑
guay and its Foreland Domain, the Rio de la
7 CONCLUSÕES Plata Craton, framework, tectonic evolution
and correlation with similar provinces of
Os dados geoló gicos, isotó picos e ge‑ Southwestern Africa. In: Cordani, U. G, Mila‑
ni, E. J., Campos, D. A. (Ed. ). Tectonic Evoluti‑
ocronoló gicos indicam que os complexos
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Cambaizinho, Ibaré e Pontas do Salso foram Janeiro, SBG, p. 311‑334.
depositados no interior do TSG em bacias
orogê nicas, com sedimentaçã o associada à Brito Neves, B. B, Fuck, R. A. & Pimentel, M.
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0,72 Ga). A paleogeogra ia dos antigos frag‑
mentos de crosta continental e as associa‑ Chemale Jr., F. 1982. Geologia da Região de
çõ es magmá ticas juvenis do TSG sugerem a Palma, São Gabriel, Rio Grande do Sul. Porto
presença de um pequeno oceano, denomina‑ Alegre, 136p. Dissertaçã o de Mestrado, Insti‑
do Charrua, localizado entre a porçã o nor‑ tuto de Geociê ncias, UFRGS.
deste do CRLP e a porçã o oeste do Terreno
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Nico Perez. O oceano Charrua nã o tem cone‑
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O Magmatismo Toniano do terreno São Gabriel e a evolução do Cinturão Dom Feliciano 58


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O Magmatismo Toniano do Terreno São Gabriel e a evolução do Cinturão Dom Feliciano 59


O Complexo Brusque e o
Cinturão Dom Feliciano em Santa Catarina

Roberto Sacks de Campos1*, Ruy Paulo Philipp2

1
Programa de Pó s‑graduaçã o em Geologia, Universidade Federal de Santa Catarina
2
Programa de Pó s‑graduaçã o em Geociê ncias, Universidade Federal do Rio Grande do Sul

* autor correspondente: roberto.campos@ufsc.br

1 INTRODUÇÃO
O Complexo Brusque é uma das principais unidades do Cinturã o Dom Feliciano em San‑
ta Catarina e sua caracterizaçã o foi objeto de projetos de mapeamento geoló gico executados pe‑
la Companhia de Pesquisa de Recursos Minerais (CPRM), de investigaçõ es petroló gicas
promovidas por teses, por dissertaçõ es e por trabalhos de conclusã o de diversas universidades
(USP, UFRGS, UFSC, UFPR, UNIPAMPA e UNISINOS). Entre as dé cadas de 50 e 80, ocorreu signi i‑
cativa contribuiçã o associada à prospecçã o e à mineraçã o de ouro.
As rochas metavulcano‑sedimentares do complexo caracterizam uma sequê ncia supra‑
crustal que repousa sobre uma crosta continental antiga caracterizada como Crá ton Luis Alves,
constituı́do por complexos ortogná issicos de mé dio a alto grau e de idade Paleoproterozoica a
Arqueana. As relaçõ es entre estas unidades remontam à reconstruçã o do Rodı́nia e da porçã o
SW do Gondwana. Os processos colisionais que afetaram estas unidades durante a construçã o
do cinturã o destruı́ram as relaçõ es estratigrá icas originais e tornaram o entendimento destas
rochas um complexo desa io.
Nas ú ltimas dé cadas, houve constante produçã o de dados geoló gicos relacionados a ati‑
vidades de mineraçã o e de expansã o da rede de infraestrutura urbana e a investigaçõ es sistemá ‑
ticas realizadas pelo Serviço Geoló gico do Brasil e pelo meio acadê mico. Neste sentido, este
capı́tulo tem como objetivo avaliar o atual está gio de conhecimento sobre o Complexo Brusque e
discutir os limites das interpretaçõ es anteriores e as novas possibilidades apontadas pelos mais
recentes dados geoquı́micos, isotó picos e geocronoló gicos.
Contribuições à Geologia do Rio Grande do Sul e de Santa Catarina

constituı́dos por suı́tes granitoides cá lcico‑


2 CONTEXTO GEOLÓGICO
alcalinas a alcalinas com idades entre 650
A Provı́ncia Mantiqueira reú ne os Ma e 550 Ma. Os complexos Brusque (SC),
cinturõ es Araçuai, Ribeira e Dom Feliciano, Porongos (RS) e Lavalleja (Uruguai) sã o
que se estendem ao longo de toda a costa su‑ constituı́dos por sucessõ es metassedimen‑
deste e sul do Brasil e leste do Uruguai como tares clá sticas e quı́micas similares, e se di‑
uma faixa de direçã o N20oE, com ca. 3000 km ferenciam por suas associaçõ es
de comprimento e com até 160 km de largu‑ vulcanogê nicas. As bacias de Itajaı́, Ca‑
ra (Silva et al. , 2005) (Fig. 1). O CDF é consti‑ maquã e Arroio El Soldado sã o compostas
tuı́do por trê s segmentos de direçã o NE‑SW por sucessõ es sedimentares e vulcâ nicas
caracterizados de sudeste a noroeste, por ba‑ pouco deformadas e anquimetamó r icas,
tó litos granı́ticos, por complexos metavulca‑ mantendo contato tectô nico a oeste com as
no‑sedimentares, por inliers do unidades do embasamento.
embasamento e por bacias de foreland. Os Em Santa Catarina, as unidades do
bató litos Florianó polis, Pelotas e Aiguá sã o CDF registram em suas foliaçõ es metamó r‑

Figura 1 ‒ A) Principais unidades cratô nicas e localizaçã o da Provı́ncia Mantiqueira; e B) Mapa tectô nico da
porçã o sul da Plataforma Sul‑Americana, destacando as unidades do Cinturã o Dom Feliciano no RS e SC, e no
Uruguai (modi icado de Philipp et al. 2016). Principais zonas de cisalhamento: 1 ‑ Itajai‑Perimbó ; 2 ‑ Major
Gercino; 3 ‑ Caçapava do Sul; 4 ‑ Dorsal de Canguçu; 5 ‑ Passo do Marinheiro; 6 ‑ Ibaré ; 7 ‑ Sarandı́ del Yı́; 8 ‑
Sierra Ballena; 9 ‑ Cerro Amaro; e 10 ‑ Arroio Grande.

icas e em suas fases de dobramento uma fases de subducçã o e colisõ es ocorridas du‑
vergê ncia tectô nica para NW, indicando um rante o Neoproterozoico, entre os crá tons
transporte principal em direçã o ao Crá ton Luis Alves, Rio de La Plata e Paranapanema,
Luis Alves (Paleoproterozoico‑Arqueano). A os terrenos Nico Perez e Camboriú (Amé rica
estruturaçã o do cinturã o envolveu sucessivas do Sul), e os crá tons Congo e Kalahari (Afri‑

62 Edição da Sociedade Brasileira de Geologia – Núcleo RS/SC


Campos & Philipp

ca) (Fernandes et al., 1992; Basei et al., 2000, embasamento (Complexo Camboriú ) e por
2011; Saalmann et al., 2011; Oyhantçabal et granitoides intrusivos (Domı́nio Intermediá ‑
al., 2011; Philipp et al., 2016). Os fenô menos rio), e, mais ao noroeste, por rochas sedi‑
de formaçã o do Gondwana Ocidental, inicia‑ mentares e vulcâ nicas fé lsicas do Grupo
ram com a abertura do Oceano Adamastor e Itajaı́ (Domı́nio Externo). No extremo norte,
de mares interiores (900‑750 Ma), cujo fe‑ os ortognaisses e os migmatitos do Comple‑
chamento inal esteve relacionado a um xo Granulı́tico de Santa Catarina caracteri‑
evento de metamor ismo colisional (650‑620 zam o Crá ton de Luis Alves.
Ma) e a processos deformacionais e magmá ‑ O Complexo Brusque (CB) é consti‑
ticos pó s‑colisionais (600‑560 Ma). Os pro‑ tuı́do por uma sequê ncia metavulcano‑sedi‑
cessos colisionais envolveram o mentar disposta na forma de duas faixas
espessamento crustal por falhas de cavalga‑ contı́nuas de direçã o N50‑60oE, separadas
mento, que evoluı́ram para zonas de cisalha‑ na sua parte central pelo bató lito granı́tico
mento oblı́quas e na sua etapa inal, para intrusivo da Suı́te Valsungana (Fig. 2A). As
zonas transcorrentes de alto â ngulo, que unidades do complexo estã o polideformadas
marcaram os processos de escape tectô nico e e sua continuidade ao longo do CDF é carac‑
os ú ltimos episó dios de deformaçã o das baci‑ terizada pelos complexos Porongos (RS) e
as de foreland (540‑530 Ma) (Basei et al., Lavalleja (Uruguai), que mostram amplas si‑
2000; Oyhantçabal et al., 2009; Philipp et al., milaridades composicionais, nos tipos e nas
2016). idades dos eventos metamó r icos, e pela
O CDF está organizado em trê s seg‑ ocorrê ncia de inliers do embasamento. A
mentos principais separados por zonas de ci‑ principal diferença está relacionada à s asso‑
salhamento dú cteis regionais. O contato ciaçõ es de rochas metavulcâ nicas e ao mag‑
entre os bató litos granı́ticos e os complexos matismo granı́tico intrusivo que afeta as
metavulcano‑sedimentares é de inido por rochas supracrustais. O Complexo Porongos
zonas de cisalhamento dú cteis contı́nuas e apresenta metariolitos e metadacitos de
denominadas em seus setores regionais, de composiçã o cá lcico‑alcalina com assinatura
Major Gercino (SC), Dorsal de Canguçu (RS) e de subducçã o e idades de 800‑770 Ma (Sa‑
Sierra Ballena (Uruguai) (Basei et al., 2000; allmann et al., 2011; Gruber et al., 2016; Per‑
Oyhantçabal et al., 2009; Passarelli et al., tille et al., 2017). Os outros complexos
2010; Philipp et al., 2016). Em SC, o contato apresentam rochas metavulcâ nicas bá sicas
entre os complexos supracrustais e a bacia de composiçã o toleı́tica com assinatura de
de foreland (Itajaı́) é de inido por falhas de contaminaçã o crustal, com ocorrê ncia restri‑
empurrã o que marcam o cavalgamento das ta de rochas á cidas com idades de 640‑620
rochas metamó r icas sobre as sedimentares. Ma (Silva et al., 2002; Campos et al., 2012a,
Nas bacias do Camaquã (RS) e Arroio El Sol‑ 2012b; Basei et al., 2011). Ambos os comple‑
dado (Uruguai) o contato é de inido por fa‑ xos estã o afetados por metamor ismo orogê ‑
lhas transcorrentes de alto â ngulo. nico em condiçõ es da fá cies xisto verde a
O segmento norte do CDF é consti‑ an ibolito superior das sé ries de baixa P/T,
tuı́do de sudeste para noroeste, pelas suı́tes em SC, e de mé dia P/T, no RS.
granitoides do Bató lito Florianó polis, que re‑
presentam as raı́zes de um arco magmá tico 3 ESTRATIGRAFIA
(Domı́nio Interno) (Basei, 1985), por uma
porçã o central composta pelas rochas meta‑ O Complexo Brusque (CB) é consti‑
mó r icas do Complexo Brusque, por inliers do tuı́do por uma sucessã o basal e dominante

O Complexo Brusque e o Cinturão Dom Feliciano em Santa Catarina 63


Contribuições à Geologia do Rio Grande do Sul e de Santa Catarina

Figura 2 ‒ A) Mapa geoló gico da porçã o leste de Santa Catarina destacando as unidades do Complexo Brusque
e do embasamento (modi icado de Basei et al., 2020): Bató lito Florianó polis ‑ Rochas sin a tardi‑
transcorrentes: CP Complexo Porto Belo, CE Complexo Estaleiro e SIZ Suı́te Intrusiva Zimbros; Rochas tardi a
pó s colissionais: GI Granito Ilha e GAN Granito Angelina; Rochas pré a sin colissionais: GF Granito Forquilinhas
e GSPA Granito Sã o Pedro de Alcâ ntara. Suı́te Nova Trento: GFA Granito Faxinal, GGUA Granito Guabiruba, GNI
Granito Nova Itá lia, GRB Granito Rio do Braço, GSM Granito Serra dos Macacos, GNT Granito Nova Trento/
Indaiá , GPC Granito Ponta do Cabeço. Complexos granı́tico‑gnaissicos e migmatı́ticos: CRP Complexo Ribeirã o
da Prata, CIT Complexo Itapema/Morro do Boi, CC Complexo Camboriú , CAM Complexo Aguas Mornas.
Cidades: BC ‑ Balneá rio Camboriú , Bg ‑ Biguaçu, Bl ‑ Blumenau, Bq ‑ Brusque, G ‑ Garcia, Gb ‑ Guabiruba, It ‑
Itajaı́, NT ‑ Nova Trento, Tj ‑ Tijucas e VR ‑ Vidal Ramos. B) Seçã o geoló gica A‑B.

64 Edição da Sociedade Brasileira de Geologia – Núcleo RS/SC


Campos & Philipp

de metassedimentos clá sticos, localmente re‑ tados pela ocorrê ncia de metabasaltos, meta‑
coberta por uma associaçã o vulcanogê nica basaltos variolı́ticos, serpentinitos e xistos
com sedimentos quı́mico‑exalativos associa‑ magnesianos (komatiitos). O levantamento
dos. O pacote clá stico ocorre em toda a á rea de seçõ es geoló gicas com coleta sistemá tica
de exposiçã o do complexo, composto por de dados estruturais e petrográ icos, integra‑
lentes de metapsamitos ricos em quartzo, in‑ dos com aná lises geocronoló gicas e isotó pi‑
tercalados com corpos de metaritmitos e cas permitiram a Basei (1985) subdividir o
com uma espessa sequê ncia de metapelitos. Grupo Brusque nas formaçõ es Botuverá , Rio
Na porçã o sul os quartzitos estã o intercala‑ do Areia e Rio do Oliveira, destacando a pri‑
dos com lentes restritas de metaconglomera‑ meira como a base estratigrá ica, proposta
dos, enquanto na porçã o noroeste, se seguida em trabalhos subsequentes (Basei et
intercalam com meta‑calcá reos. Nos extre‑ al., 2000, 2011, 2020).
mos oeste e leste do CB, ocorrem dois corpos Como resultado do mapeamento geo‑
alongados e concordantes de rochas meta‑ ló gico (1:100.000) das folhas Botuverá e
vulcâ nicas bá sicas e ultrabá sicas, intercala‑ Brusque pela CPRM (em 1:100.000), Caldas‑
dos com metapelitos, xistos calci‑silicá ticos, so et al. (1995a, 1995b) subdividiram o CB
gra ita xistos e BIFs (fá cies silicosa, hematı́ti‑ em conjuntos litoló gicos a partir dos protó li‑
ca, carboná tica e turmalı́nica). Estes corpos tos dominantes, reconhecendo as unidades
estã o expostos na regiã o dos rios Barra do clá stica, quı́mica, clá stico‑quı́mica, metavul‑
Areia (Botuverá ) e do Oliveira (Sã o Joã o Ba‑ câ nicas bá sicas e magnesiana. O mapa geoló ‑
tista) (Basei, 1985; Sander, 1992; Caldasso et gico do Instituto de Geociê ncias (UFRGS)
al., 1995a, 1995b; Philipp et al., 2004; Cam‑ para a regiã o entre Camboriú e Sã o Joã o Ba‑
pos et al., 2012a, 2012b; Basei et al., 2011, tista (em escala 1:50.000) seguiu os mesmos
2020). No presente trabalho, utilizamos o parâ metros e separou os principais corpos de
termo Complexo Brusque (CB) em detrimen‑ metapsamitos entre uma espessa sequê ncia
to de Grupo Brusque tendo em vista as reco‑ de metaritmitos e metapelitos, bem como
mendaçõ es da Subcomissã o de corpos restritos de metavulcâ nicas bá sicas e
Nomenclatura Estratigrá ica da IUGS (1994) ultrabá sicas, lentes de metamargas e má rmo‑
e do có digo estratigrá ico norte‑americano. res (Philipp et al., 2004). Mais recentemente,
A denominaçã o Sé rie Brusque (Car‑ Basei et al. (2011) separaram os principais
valho & Pinto, 1938) foi designada para ca‑ conjuntos litoló gicos que constituem as for‑
racterizar a sucessã o de corpos de maçõ es Botuverá , Rio da Areia e Rio do Oli‑
quartzitos, ilitos e calcá reos expostos na veira.
porçã o leste de Santa Catarina. Como resulta‑ Apesar da complexa estruturaçã o
do do mapeamento geoló gico das regiõ es de tectô nica do CB, a superfı́cie de deposiçã o
Rio do Sul e de Florianó polis, Schulz & Albu‑ original (S0) é reconhecida em a loramentos
querque (1969) propuseram o termo Grupo como variaçõ es de tamanho de grã o entre ca‑
Brusque, incluindo os granitos Valsungana e madas de metapsamitos, pela alternâ ncia
Guabiruba. A descoberta de rochas metavul‑ composicional entre metaritmitos e metape‑
canogê nicas intercaladas com os metassedi‑ litos, e entre metacalcá reos e metamargas.
mentos e a complexa evoluçã o estrutural, Foram reconhecidas no CB as foliaçõ es meta‑
levou Silva et al. (1983) a propor o Complexo mó r icas S1 e S2, bem como a formaçã o de
Metamó r ico Brusque. Os autores interpreta‑ grandes dobras recumbentes (F2) associadas
ram esta sequê ncia supracrustal como um com o desenvolvimento de falhas de empur‑
greenstone belt (GB Rio Itajaı́‑Mirim), supor‑ rã o ou de zonas de cisalhamento de baixo â n‑
O Complexo Brusque e o Cinturão Dom Feliciano em Santa Catarina 65
Contribuições à Geologia do Rio Grande do Sul e de Santa Catarina

gulo (Basei, 1985; Silva 1983, 1991; Caldasso com ocorrê ncia signi icativa de metamargas
et al., 1995a, 1995b; Philipp et al., 2004; Ba‑ e má rmores, e presença subordinada de me‑
sei et al., 2011, 2020). Os autores destacaram tapsamitos e quartzitos. Na porçã o Sul, pre‑
o cará ter aló ctone e reconhecem a xistosida‑ dominam metaritmitos com camadas
de S2 como foliaçã o principal, gerada por espessas de quartzitos e raras lentes de me‑
transposiçã o da S1, e associada à evoluçã o de taconglomerados matriz‑suportados. Este li‑
dobras recumbentes e isoclinais intrafoliais tó tipo apresenta seixos de quartzitos e de
(F2). O nú mero restrito de aná lises petrográ ‑ veios de quartzo envoltos em matriz arenosa
icas, a escassez de a loramentos e a falta de rica em quartzo. Estas caracterı́sticas suge‑
acesso a partes da á rea de exposiçã o do CB, rem termos intraformacionais depositados
constituem desa ios para o avanço do enten‑ por atividades tectô nicas sin‑sedimentares.
dimento estratigrá ico. Apesar da identi ica‑ Alternativamente, foram interpretados como
çã o local de estruturas primá rias, a falta de diamictitos de depó sitos glaciais ou gerados
crité rios de topo e base é sistemá tica, e os por escorregamentos em taludes continen‑
processos de deformaçã o que afetaram as tais (Basei, 1985; Basei et al., 2011).
unidades foram complexos e polifá sicos. Es‑ Os metassedimentos clá sticos pre‑
tes fatores limitam o uso da denominaçã o servam parcialmente as estruturas plano‑
Grupo Brusque, bem como sua subdivisã o paralelas e o acamadamento composicional.
em formaçõ es litoestratigrá icas. Do mesmo As variaçõ es composicionais, os contatos
modo, o reconhecimento de fá cies sedimen‑ gradacionais e a alternâ ncia composicional
tares, como apresentado por Caldasso et al. sistemá tica foram interpretadas por Caldas‑
(1995a, 1995b) é uma interpretaçã o ú til no so et al. (1995a, 1995b) como indicativas da
mapeamento geoló gico, mas que nã o descre‑ deposiçã o por correntes de turbidez de bai‑
ve a sucessã o sedimentar. Ainda nã o foi apre‑ xa densidade. Os corpos de quartzitos foram
sentada uma proposta de subdivisã o do interpretados como corpos arenosos plata‑
complexo em unidades litodê micas. formais, cordõ es litorâ neos, barras de costa
afora ou como canais de depó sitos turbidı́ti‑
4 ESTRUTURAS PRIMÁRIAS E AMBIEN‑ cos. Os nı́veis de metaritmitos apresentam
TES DE DEPOSIÇÃO texturas blastopsamı́ticas com por iroclas‑
tos de areia em metapsamitos, e os nı́veis
O reconhecimento de estruturas e metapelı́ticos apresentam por iroblastos de
texturas primá rias nas litologias do CB per‑ aluminosilicatos e outros minerais alumino‑
mitiu identi icar os protó litos sedimentares e sos. A alternâ ncia entre metamargas lamina‑
ı́gneos. Os metassedimentos clá sticos domi‑ das, má rmores dolomı́ticos silicosos e
nam a sucessã o de litó tipos, enquanto nas re‑ calcı́ticos, e metassedimentos pelı́ticos e
giõ es do rio Barra do Areia, a noroeste de areno‑pelı́ticos, també m suporta uma evolu‑
Botuverá , e do rio do Oliveira, entre Tijucas e çã o associada a depó sitos turbidı́ticos. Em
Itapema, estã o expostas duas faixas consti‑ Botuverá , foram descritos meta‑calcá reos
tuı́das por rochas metavulcâ nicas bá sicas e estromatolı́ticos de ambientes calmos de su‑
ultrabá sicas, associadas com metapelitos, pra a intermaré s, metacalcá reos oolı́ticos de
xistos calci‑silicá ticos, formaçõ es ferrı́feras ambientes de alta energia e calcá reos lami‑
bandadas, turmalinitos, ilitos e xistos gra i‑ nados relacionados a depó sitos turbidı́ticos,
tosos. indicando a deposiçã o em uma plataforma
Ao norte, o complexo é composto por carboná tica (Sander, 1992; Caldasso et al.,
metassedimentos dominantemente pelı́ticos, 1995b).

66 Edição da Sociedade Brasileira de Geologia – Núcleo RS/SC


Campos & Philipp

Os metabasaltos do Rio do Oliveira 5. 2 Magmatismo sin‑deposicional (ro‑


constituem corpos tabulares de grande ho‑ chas metavulcânicas básicas e ácidas)
mogeneidade composicional e textural
(Campos et al., 2012a). Apesar da estrutura A idade mı́nima da deposiçã o dos
xistosa, preservam textura blastopor irı́tica metassedimentos do CB é de 639 ±11 Ma (U‑
com por iroclastos ripiformes de plagioclá ‑ Pb SHRIMP), obtida em cristais de zircã o de
sio, bem como textura blastoamigdaloidal um corpo de metariolito interpretado como
com porçõ es subarredondadas de quartzo sin‑deposicional (Silva et al., 2002). Basei et
recristalizadas. Em lâ mina delgada, també m al. (2020) obtiveram a idade de 619,7 ±1,9
foram reconhecidas camadas inas e descon‑ Ma (LA‑ICP‑MS) com base na integraçã o de
tı́nuas ricas em apatita e titanita. A associa‑ idades calculadas a partir de cristais de zir‑
çã o com xistos magnesianos é restrita, e a cã o de metatufos bá sicos, metavulcâ nicas bá ‑
intercalaçã o entre metabasitos e metassedi‑ sicas e rochas cá lcio‑silicá ticas. Neste ú ltimo
mentos pelı́ticos e gra ita xistos é sugestiva trabalho, os autores destacam a proximidade
de um vulcanismo. Na mesma regiã o, os xis‑ entre as idades obtidas, e a relaçã o entre me‑
tos calci‑silicá ticos apresentam bandamento tariolitos e metabasitos, interpretando estas
composicional alternando nı́veis ricos em ac‑ como uma associaçã o bimodal de rift. Os da‑
tinolita, hornblenda, tremolita e logopita, e dos quı́micos e geocronoló gicos do metarioli‑
nı́veis fé lsicos à base de epidoto, clinozoizita, to ainda nã o foram divulgados.
plagioclá sio, quartzo e diopsı́dio, variaçõ es Na regiã o de Botuverá , Campos et al
tı́picas de metamargas. Entretanto, Silva (2012b) descreveram corpos tabulares de di‑
(1983) e Silva (1991), interpretaram estes abá sio e lampró iros cortando os metassedi‑
mesmos litó tipos como metatufos bandados mentos da Formaçã o Rio da Areia, com
e brechas de composiçã o má ico‑ultramá ica. relaçõ es tardias em relaçã o à foliaçã o S2 dos
As principais estruturas e relaçõ es estrati‑ xistos e à s dobras F3. O dique bá sico apresen‑
grá icas do Complexo Brusque podem ser tou idade U‑Pb em zircã o (LA‑ICPMS) de 618
observadas na seçã o geoló gica representati‑ ±8,7 Ma. Anteriormente, estes corpos foram
va da Figura 2B. interpretados como derrames vulcâ nicos sin‑
sedimentares.
5 GEOCRONOLOGIA
5. 3 Proveniência detrítica (idades e
5. 1 Magmatismo sin‑rift fontes)

A fase rift que caracteriza a abertura Foram analisados os dados de idade


da bacia do CB durante o Toniano é registra‑ de proveniê ncia obtidos por Hartmann et al.
da por rochas bá sicas plutô nicas e por um (2003), Basei et al. (2011, 2020) e Eiesland
granito alcalino. Dados de U‑Pb em zircã o (2018). Estes dados sã o apresentados nos
obtidos em metagabro que ocorre associado histogramas da Figura 3, onde as amostras
à s rochas metavulcâ nicas da regiã o do Rio do estã o categorizadas de acordo com a divisã o
Oliveira, resultaram numa idade de 936 ±40 de formaçõ es apresentada por Basei et al.
Ma (Yamamoto & Basei, 2009). O Granito do (2011).
Morro do Parapente, que ocorre como um Os dados obtidos em quartzitos
corpo alinhado ao longo da Zona de Cisalha‑ (amostras BB10‑B, BB14‑A, VRA‑VIII‑56), e
mento Itajaı́‑Perimbó apresentou idade de em metapelitos (amostras VRA‑VI‑17, VRA‑
843 ±12 Ma (Basei et al., 2008b). VII‑24) da Formaçã o Botuverá , de iniram

O Complexo Brusque e o Cinturão Dom Feliciano em Santa Catarina 67


Contribuições à Geologia do Rio Grande do Sul e de Santa Catarina

dois intervalos de idades para as rochas fon‑ que indicam o intervalo 640‑610 Ma como o
tes da bacia do CB, indicando contribuiçõ es perı́odo de evoluçã o do processo colisional
de idades meso‑ (1,5‑1,3 Ga e 1,3‑1,0 Ga) e (Silva et al., 2000, 2005; Basei et al., 2000;
paleoproterozoicas (2,25‑1,7 Ga), com picos Hartmann et al., 2003). O metamor ismo de
restritos no Arqueano (2,9‑2,5 Ga). Um pa‑ alto grau que afetou o Complexo Camboriú
drã o restrito com idades paleoproterozó icas foi investigado por EPMA em monazita por
(2,25‑2,19 Ga) foi observado em quartzito Philipp et al. (2009), que obtiveram idades
por Hartmann et al. (2003a) e em granada‑ entre 650 Ma e 620 Ma em uma amostra de
mica xisto (amostra ICA‑05), por Basei et al. gt‑sil‑bt gnaisse.
(2020). As idades obtidas em duas amostras O metamor ismo cataclá stico associ‑
de metaconglomerado (BA23 e TFM‑26A), ado à s zonas de cisalhamento Major Gercino
em quartzito (TFM‑30) e em xisto calci‑sili‑ e Itajaı́‑Perimbó é balizado no intervalo en‑
cá tico (TFB‑2/3/5/6) da Fm. Rio do Oliveira, tre 620 Ma e 600 Ma com base nas relaçõ es
mostraram resultados dominantes no inter‑ estruturais e nas idades U‑Pb em zircã o de
valo entre 2,3 Ga e 1,8 Ga, com idades restri‑ corpos granı́ticos sin‑transcorrê ncia (Silva et
tas ao Arqueano (entre 3,2 Ga e 2,5 Ga). O al., 2000; Passarelli et al., 2010; Chemale Jr.
quartzito (BB22) da Fm. Rio Barra do Areia et al., 2012). Os corpos tardi‑orogê nicos va‑
investigado por Eiesland (2018) mostrou re‑ riam entre 600 Ma e 580 Ma. Os corpos gra‑
sultados semelhantes. nı́ticos com registro do metamor ismo de
Os dados de zircã o detrı́tico ressal‑ contato mostram idades de cristalizaçã o en‑
tam fontes mistas com dominâ ncia de ida‑ tre 620 Ma e 580 Ma, interpretadas como a
des meso e paleoproterozoicas nos fase de descompressã o do CDF (Basei et al.,
metapsamitos da Fm. Botuverá . As rochas 2020).
metavulcano‑sedimentares das formaçõ es
Rio do Areia e Rio do Oliveira, entretanto, 6 ESTRUTURAS TECTÔNICAS
apresentam uma populaçã o com idade do‑
minante entre 2,5 Ga e 1,8 Ga. Destaca‑se A evoluçã o tectô nica do CB foi com‑
que duas amostras situadas na porçã o nor‑ plexa e polifá sica, relacionada a um evento
deste da Fm. Botuverá apresentaram somen‑ progressivo de natureza tangencial (D1‑D2),
te fontes paleoproterozoicas. cujo desenvolvimento formou as foliaçõ es S1
e S2 (Silva, 1983, 1991; Basei, 1985; Caldas‑
5. 4 Idades metamór icas so et al., 1995a, 1995b; Philipp et al., 2004;
Basei et al., 2011). A transposiçã o da foliaçã o
As idades metamó r icas sã o raras, S1, preservada em dobras isoclinais a fecha‑
entretanto, o metamor ismo orogê nico que das (F2), e a geraçã o da xistosidade principal
afetou o CB foi relacionado ao Ciclo Brasilia‑ S2, foi acompanhada pela formaçã o de zonas
no (Basei, 1985; Silva et al., 2000, 2002; Phi‑ de cisalhamento dú cteis de baixo â ngulo. Es‑
lipp et al., 2009; Basei et al., 2011). A idade tas estruturas de empurrã o re letem a tectô ‑
de Rb‑SrRT de 706 ±50 Ma obtida em bt xisto nica colisional que ocasionou o
da regiã o de Nova Trento por Basei (1985) encurtamento crustal associado à s fases de
foi interpretada como representativa do clı́‑ deformaçã o D1 e D2. Estas estruturas rompe‑
max metamó r ico e da foliaçã o S2. Outras ram o pacote estratigrá ico e promoveram
idades do metamor ismo sã o indiretas, com por processos de cavalgamento a inversã o
base na relaçã o estrutural de colocaçã o dos da bacia e a intercalaçã o tectô nica de “fatias”
corpos granı́ticos sin‑ a tardi‑orogê nicos, de segmentos crustais, formando uma estru‑

68 Edição da Sociedade Brasileira de Geologia – Núcleo RS/SC


Campos & Philipp

Figura 3 ‒ A) Diagramas mostrando os padrõ es de distribuiçã o das idades de zircã o detrı́tico de cada unidade
do Complexo Brusque. As amostras de cada formaçã o tê m curvas individuais por amostra, normalizadas para
que todas as curvas tenham proporcionalmente a mesma á rea. O nú mero de aná lises é mostrado ao lado de cada
curva. Os dados representados foram compilados dos trabalhos de Hartmann et al. (2003), Basei et al. (2008,
2020) e Eiesland (2018). As barras sombreadas verticais mostram os intervalos dos principais ciclos orogê nicos
e de á reas cratô nicas representados como rochas‑fontes de cada unidade metassedimentar. B) Diagramas
mostrando os padrõ es de distribuiçã o das idades obtidas em zircã o detrı́tico das principais unidades
metasedimentares do cinturã o Dom Feliciano em SC, RS e no Uruguai. Os intervalos dos eventos e as unidades
foram compilados de Silva et al. (2005), Saalmann et al. (2010) e Philipp et al. (2016, 2018).

O Complexo Brusque e o Cinturão Dom Feliciano em Santa Catarina 69


Contribuições à Geologia do Rio Grande do Sul e de Santa Catarina

turaçã o com vergê ncia para NW. A foliaçã o S2 cianita, estaurolita e sillimanita. Nos meta‑
tem orientaçã o NE‑SW, com amplas varia‑ basitos observou‑se as assembleias actinoli‑
çõ es de mergulho associadas em parte a do‑ ta + albita + epidoto e tremolita +
bras recumbentes (F2), mas principalmente hornblenda + plag. Ca (Philipp et al., 2004;
relacionadas à s dobras F3. A lineaçã o mineral Campos et al., 2012a).
e de estiramento, observadas em metapelitos O mapeamento geoló gico (1:50.000)
e metapsamitos, mostra uma orientaçã o ge‑ da regiã o entre Sã o Joã o Batista e Camboriú
ral leste‑oeste com baixos â ngulo de mergu‑ integrado com aná lise petrográ ica, resultou
lho, e quando afetada pelas dobras F3 no reconhecimento das zonas metamó r icas
apresenta caimentos em graus variados, para dos eventos orogê nico e termal (Philipp et
NE e SW. al., 2004). Foram descritas as zonas da clori‑
As foliaçõ es S1 e S2 foram deforma‑ ta, biotita, granada e andaluzita, atingindo,
das por evento compressivo (D3) tardio e sob de modo restrito a zona da cordierita e a fá ‑
condiçõ es de deformaçã o dú ctil a dú ctil‑rú p‑ cies an ibolito inferior. O equilı́brio entre an‑
til, formando dobras F3 do tipo normais, com daluzita e cordierita indicou condiçõ es de
formas abertas a fechadas. Estas dobras de pressã o litostá tica baixa e sugere um rá pido
escala regional, tê m eixos com baixo caimen‑ soterramento associado com o aumento
to segundo a direçã o NE‑SW, com fraturas progressivo da temperatura. O padrã o de
axiais (S3) em leque orientadas segundo a di‑ zonaçã o é concordante com a foliaçã o S2,
reçã o mé dia N40‑60oE. Em segmentos de al‑ entretanto, foi constatada a intercalaçã o
ta deformaçã o, as zonas de cisalhamento tectô nica entre fatias da seqü ê ncia meta‑
transcorrentes de alto â ngulo formaram fai‑ mó r ica. Esta interpretaçã o contrasta com
xas de milonitos com lineaçã o de estiramen‑ aquelas indicadas por Basei (1985), Silva
to direcional e cinemá tica lateral direita. (1991) e Basei et al. (2011, 2020), que vin‑
Estas zonas controlaram a ascensã o e a colo‑ cularam o aumento da temperatura a um
caçã o do magmatismo granı́tico sin a tardi‑ domo termal associado aos granitos da Suı́te
orogê nico. A ú ltima fase de deformaçã o (D4) Valsungana. Com base nos dados estruturais
tem disposiçã o ortogonal ao cinturã o e está e nas zonas do metamor ismo termal, Phi‑
caracterizada por dobras F4 abertas a suaves, lipp et al. (2004) interpretaram a colocaçã o
e por uma clivagem de fratura de superfı́cie dos granitoides como sincrô nica à fase D3 e
axial, pouco espaçada e com direçã o segundo simultâ nea à formaçã o das zonas de cisalha‑
N40‑70oW. mento transcorrentes.
O aumento do grau metamó r ico
7 METAMORFISMO coincide com a ocorrê ncia de corpos tabula‑
res de leucogranitos peraluminosos. Estes
As assembleias minerais observadas corpos mostram concordâ ncia entre as foli‑
em metapelitos do CB caracterizam uma zo‑ açõ es magmá ticas e milonı́tica, sugerindo
naçã o metamó r ica progressiva para o even‑ um posicionamento sin‑tectô nico para a S2.
to orogê nico, variando entre a fá cies xistos As condiçõ es de fá cies an ibolito superior
verdes inferior e an ibolito superior (Basei, (sillimanita) registradas em metapelitos do
1985; Sander, 1992; Caldasso et al., 1995a, Ribeirã o do Ouro (Botuverá ) (Caldasso et al.
1995b; Philipp et al., 2004). A foliaçã o S2 das 1995a), indicam o limite mı́nimo para a fu‑
rochas metapelı́ticas conté m clorita, musco‑ sã o parcial, e sugerem que a geraçã o do
vita e biotita, com por iroblastos sin‑tectô ni‑ magmatismo granı́tico peraluminoso ocor‑
cos de granada, andaluzita, cordierita, reu em nı́veis mais profundos.
70 Edição da Sociedade Brasileira de Geologia – Núcleo RS/SC
Campos & Philipp

Em parte, simultâ neo ao evento D3, T e de melanges tectô nicas com complexos
mas de ocorrê ncia restrita, o metamor ismo o iolı́ticos restringem a comparaçã o do CB
cataclá stico associado à s zonas de cisalha‑ com arcos insulares ou com arcos de margem
mento dú cteis Itajaı́‑Perimbó e Major Gerci‑ continental ativa.
no, atingiu condiçõ es de fá cies xistos verdes Fragoso‑Cesar (1980) propô s a de‑
superior e an ibolito. As assembleias do me‑ nominaçã o Cinturã o Dom Feliciano para as
tamor ismo termal afetaram o equilı́brio mi‑ unidades neoproterozoicas expostas na por‑
neral do metamor ismo orogê nico e çã o sul do Brasil e leste do Uruguai e que en‑
promoveram o crescimento de fases seme‑ volviam o Crá ton Rio de La Plata a partir da
lhantes, mas com aspectos texturais distin‑ subducçã o de uma crosta oceâ nica para NW,
tos. A intrusã o dos granitos Valsungana e gerando a formaçã o de arcos magmá ticos
Serra dos Macacos gerou cornubianitos com (bató litos granı́ticos), e onde o CB foi inter‑
auré olas de contato bem de inidas pela for‑ pretado como uma bacia de back­arc. A inter‑
maçã o em metapelitos das zonas da biotita, calaçã o entre as rochas metavulcâ nicas
andaluzita, granada, cianita, estaurolita, cor‑ bá sicas e ultrabá sicas e os metassedimentos
dierita e sillimanita, marcando condiçõ es en‑ quı́mico‑exalativos, levaram Silva (1991) a
tre a fá cies albita‑epidoto cornubianito e reconhecer o CB como o greenstone belt Rio
piroxê nio cornubianito (Sander, 1992; Cal‑ Itajaı́‑Mirim de idade Arqueana‑Proterozó ica
dasso et al., 1995a, 1995b; Philipp et al., Inferior, com evoluçã o em ambiente de rift
2004; Basei et al., 2011, 2020). Em zonas continental. Posteriormente, Caldasso et al.
mais afastadas os cornubianitos preservam (1995a, 1995b) e Philipp et al. (2004) subdi‑
parte da estrutura xistosa e do acamadamen‑ vidiram os principais grupos litoló gicos de
to composicional, envoltos por uma matriz protó litos do complexo, permitindo um avan‑
com texturas granoblá stica poligonal ina e ço na caracterizaçã o das suas unidades.
decussada, e por por iroblastos sem orienta‑ A composiçã o geoquı́mica dos meta‑
çã o. Este evento termal revela um pequeno basaltos da regiã o de Botuverá foi interpreta‑
intervalo de tempo entre o pico do metamor‑ da como transicional entre toleı́tica e alcalina
ismo orogê nico e a colocaçã o dos granitos, e do tipo intraplaca, com base no teor de á l‑
indicando o soerguimento e erosã o do cintu‑ calis (K2O+Na2O) de amostras hidrotermali‑
rã o e o resfriamento das rochas metamó r i‑ zadas e com pouco suporte de elementos
cas. traços (Sander, 1992). Entretanto, aná lises
quı́micas dos elementos maiores, traços e
8 EVOLUÇÃO TECTÔNICA ETR obtidas por Campos et al. (2012a;
2012b) apontaram uma composiçã o toleı́tica
Inicialmente, o CB foi interpretado do tipo E‑MORB, con irmada pela composi‑
como uma sucessã o de metassedimentos çã o dos isó topos de Sr e Nd e pelo padrã o en‑
plataformais da margem continental passiva riquecido em LILE e ETR leves
(Hasui et al., 1975) do Oceano Adamastor caracterı́sticos de basaltos gerados em mar‑
(Basei 1985; Basei et al., 2008a, 2011, 2020). gens continentais (Fig. 4).
Correlaçã o com ambiente de subducçã o foi
A reuniã o dos dados disponı́veis
sugerida por Trainini et al. (1978), que reco‑
aponta para um modelo de deposiçã o do CB
nheceu as rochas metavulcâ nicas como asso‑
associado a um rift intracontinental ou mar‑
ciaçõ es de um arco insular. A ausê ncia de
gem passiva pouco evoluı́da, com a deposiçã o
rochas metavulcâ nicas cá lcico‑alcalinas, de
de sedimentos clá sticos plataformais a partir
associaçõ es metamó r icas da sé rie de alta P/
de sistemas deltaicos (Fig. 5A). Novos pulsos
O Complexo Brusque e o Cinturão Dom Feliciano em Santa Catarina 71
Contribuições à Geologia do Rio Grande do Sul e de Santa Catarina

Figura 4 ‒ Diagramas geoquı́micos para as rochas metavulcâ nicas do CB: A) Diagrama TAS (total á lcalis x sı́lica)
(Middlemost, 1994) separando o campo de rochas alcalinas e nã o alcalinas (adaptado de Cox et al., 1979); B)
Diagrama triangular AFM (Irvine & Baragar, 1971); C) Diagrama SiO2 x Zr/TiO2 (Winchester & Floyd, 1977); D)
Abundâ ncia de Elementos Terras Raras normalizados pelo condrito C1 (Sun, 1982); E) Disposiçã o das amostras
estudadas no diagrama Ti/100‑Zr‑Yx3 (Pearce & Can, 1973); e F) Diagrama Th/Yb por Ta/Yb (Pearce, 1983). Os
vetores indicam a in luê ncia de componentes de subducçã o (S), enriquecimento intra‑placa (W), contaminaçã o
crustal (C) e cristalizaçã o fracionada (F).

72 Edição da Sociedade Brasileira de Geologia – Núcleo RS/SC


Campos & Philipp

tectô nicos relacionados à evoluçã o da bacia tou do fechamento da Bacia Brusque, evento
ocasionou a formaçã o de falhas extensionais relacionado à convergê ncia de placas e à co‑
profundas, que por alı́vio de pressã o fundem lisã o continental. Os processos de deforma‑
o manto e servem de conduto para a extru‑ çã o envolveram uma tectô nica tangencial
sã o de basaltos em ambiente marinho, asso‑ que resultou na formaçã o progressiva das
ciados à formaçã o de sedimentos quı́mico foliaçõ es S1 e S2 associada à inversã o da ba‑
exalativos (Fig. 5B). Os dados de U‑Pb em cia por cavalgamento sobre o Crá ton Luis Al‑
zircã o detrı́ticos indicam que a evoluçã o da ves situado a N‑NW. As zonas de
Bacia Brusque envolveu a erosã o de fontes cisalhamento de baixo â ngulo evoluı́ram
regionais, com destaque para as rochas pale‑ com o incremento do espessamento crustal
oproterozoicas do Complexo Camboriú e ar‑ para zonas oblı́quas durante a formaçã o da
queanas do Complexo Granulı́tico de Santa S2 e, inalmente para as zonas transcorren‑
Catarina, que dominam o cená rio do Crá ton tes de escala litosfé rica durante a fase D3 as‑
Luis Alvez. As idades mesoproterozó icas sã o sociada com processos de escape tectô nico
reconhecidas mais ao norte, nos estados do (Passarelli et al., 2010). As zonas de cisalha‑
Paraná e Sã o Paulo (Complexo Embu, Cam‑ mento Itajaı́‑Perimbó e Major Gercino repre‑
panha et al., 2019), e també m na porçã o su‑ sentam as principais estruturas deste
doeste da Africa, como embasamento dos perı́odo e provavelmente sã o responsá veis
cinturõ es Kaoko, Gariep e Saldania (Basei et pela atual forma alongada do CDF, adquirida
al. 2008a). no está gio pó s‑colisional do Ciclo Brasilia‑
A zonaçã o metamó r ica do CB resul‑ no.

Figura 5 ‒ Modelo das fases de preenchimento da bacia preté rita do CB: A) Preenchimento por sedimentos
deltaicos e plataformais; e B) Vulcanismo extensional submarino e sedimentaçã o quı́mica associada.

9 CONSIDERAÇÕES FINAIS acentuado tornam o entendimento da evolu‑


çã o tectô nica do Complexo Brusque um de‑
Apesar do aumento do volume de sa io a ser enfrentado pelas pró ximas
dados geoquı́micos, geocronoló gicos e iso‑ geraçõ es de geó logos.
tó picos, diversas questõ es ainda permane‑
cem em aberto, como a idade mı́nima de REFERÊNCIAS
deposiçã o da bacia, a evoluçã o estratigrá ica
e o ambiente deposicional. As di iculdades Basei, M. A. S. 1985. O Cinturão Dom Felicia‐
de acesso e o per il de alteraçã o intempé rica no em Santa Catarina. Sã o Paulo, 191p. Tese

O Complexo Brusque e o Cinturão Dom Feliciano em Santa Catarina 73


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76 Edição da Sociedade Brasileira de Geologia – Núcleo RS/SC


Evolução Toniana do Eclogito
Três Vendas no contexto
do Arco Passinho ‑ Terreno São Gabriel
Viter Magalhã es Pinto1*, Lé o Afraneo Hartmann2, David Debruyne1,
Glá ucia Nascimento Queiroga3, Cristiano Lana3, Brenda Fragoso1,
Carla Cristine Porcher2, Edinei Koester2

1
Centro de Engenharias, Universidade Federal de Pelotas
2
Instituto de Geociê ncias, Universidade Federal do Rio Grande do Sul
3
Escola de Minas, Universidade Federal de Ouro Preto

* autor correspondente: viter.pinto@gmail.com

1 INTRODUÇÃO
Quando Haü y criou o nome “eclogito”, que signi ica rocha selecionada ou escolhida, em
1822, ele estava impressionado pela cor verde‑rosa da rocha e pela peculiaridade de sua associ‑
açã o mineral. Ele nã o percebeu que esta rocha provaria ser uma rocha “escolhida” em mais de
um sentido. De fato, nos ú ltimos dois sé culos, a rocha eclogı́tica contribuiu, para o surgimento
de vá rios conceitos importantes em metamor ismo e para um melhor entendimento sobre os
processos geodinâ micos da evoluçã o da crosta terrestre (Godard, 2000; O’Brien, 2018).
Somente cerca de um sé culo, apó s sua descriçã o, Eskola (1920), atravé s de estudos ex‑
perimentais, de iniu a fá cies metamó r ica eclogito, relacionada a condiçõ es de altas pressõ es
(>1,0 GPa). Eclogito, stricto sensu, é uma rocha má ica, consistindo, essencialmente, de granada e
de clinopiroxê nio onfacı́tico (Coleman et al., 1965). Cerca de 50 anos, apó s a de iniçã o da fá cies
eclogito, e com o desenvolvimento da Teoria da Tectô nica de Placas, surgiram as primeiras in‑
terpretaçõ es da transiçã o de um metabasito (d = 2,9 g/cm3) para eclogito (d = 3,2 g/cm3 a 4,0 g/
cm3), causada por subducçã o da crosta oceâ nica (Ringwood & Green, 1966).
Um amplo espectro de reaçõ es metamó r icas faz com que as rochas se tornem mais
densas em zonas de subducçã o. Nas altas temperaturas encontradas nesses ambientes conver‑
gentes, a transformaçã o de rochas basá lticas em eclogito envolve desestabilizaçã o do plagioclá ‑
sio, adiçã o de Na2O no clinopiroxê nio e formaçã o de granada (Fig. 1). O desaparecimento do
plagioclá sio é menos de inido e depende mais da composiçã o da rocha (Hacker, 1996).
Contribuições à Geologia do Rio Grande do Sul e de Santa Catarina

Figura 1 ‒ Fá cies metamó r icas e reaçõ es, pertinentes à formaçã o de eclogito (Hacker, 1996). Os nú meros de
trê s e de dois dı́gitos para cada fá cies indicam densidade (g/cm3) e conteú do de H2O (% em peso),
respectivamente, calculados usando o modelo NCMASH, de Peacock (1993).

Eclogito é uma rocha tı́pica de alta (p. ex., Heilbron et al., 2004; Basei et al.,
pressã o, produzida por processos geodinâ ‑ 2018). A evoluçã o do Oró geno Brasiliano no
micos, relacionados à subducçã o da crosta Neoproterozoico, associada à subducçã o da
oceâ nica e à formaçã o de supercontinentes crosta oceâ nica, está registrada em arcos in‑
(Carswell & Zhang, 1999; Massone & Li, traoceâ nicos tonianos, incluindo o Arco de
2020). Os eclogitos ocorrem em oró genos Goiá s (Pimentel & Fuck, 1992), os arcos Ser‑
colisionais (Massone, 2012; Chaves & Por‑ ra da Prata e Rio Negro, no Cinturã o Ribeira
cher, 2020), que podem ser formados pela (Salgado et al., 2020), e o Terreno Sã o Gabri‑
colisã o de continente com continente ou de el, no Cinturã o Dom Feliciano (Cerva‑Alves
arcos de ilhas com continentes ou, ainda, en‑ et al., 2020). A evoluçã o destes regimes le‑
tre arcos de ilhas, ocorrendo os mais espeta‑ vou à colisã o continente‑continente, compa‑
culares exemplos atuais nos Alpes e nos rá vel aos processos alpino‑himalaianos
Himalaias (O’Brien, 2018). (Silva et al., 2005; Brito Neves et al., 2014;
No caso do Brasil, regimes tectô ni‑ Basei et al., 2018). Apesar do ambiente
cos, relacionados à subducçã o, foram sugeri‑ tectô nico favorá vel, nenhum eclogito foi do‑
dos para a construçã o do Oró geno Brasiliano cumentado no perı́odo Toniano do Oró geno

78 Edição da Sociedade Brasileira de Geologia – Núcleo RS/SC


Pinto et al.

Brasiliano. Corpos de eclogitos no Oró geno 2 AMBIENTE GEOLÓGICO


Brasiliano foram relatados no Criogeniano
Superior (~ 650 Ma) para o arco magmá tico O Eclogito Trê s Vendas ocorre na
de Santa Quité ria, na Provı́ncia Borborema parte sul do Oró geno Brasiliano, que se es‑
(Santos et al., 2015) e no sul da Faixa Brası́lia tende por mais de 4.000 km, ao longo da cos‑
(Reno et al., 2009). ta atlâ ntica da Amé rica do Sul. No extremo
sul do Oró geno Brasiliano, o CDF se estende
A á rea de estudo faz parte do Cintu‑
por mais de 1.100 km (Hueck et al., 2018) e
rã o Dom Feliciano (CDF), na Provı́ncia Manti‑
está exposto nos estados de Santa Catarina e
queira (Heilbron et al., 2004), extremo sul do
do Rio Grande do Sul, no Brasil, e no leste do
Oró geno Brasiliano. O eclogito Trê s Vendas
Uruguai (Fig. 2A).
foi descoberto no Terreno Sã o Gabriel, que
registra a evoluçã o juvenil do Cinturã o Dom O Cinturã o Dom Feliciano compreen‑
Feliciano. de uma colagem de domı́nios oceâ nicos e de
fragmentos continentais, criados atravé s da
O ponto de partida deste estudo foi a
colisã o entre os crá tons Rio de La Plata, Con‑
descriçã o, com base em trabalhos de campo e
go e Kalahari, com o fechamento do Oceano
em petrogra ia, de um granada an ibolito, por
Adamastor (p. ex., Babinski et al., 1996; Saal‑
Sue et al. (1992), no Terreno Sã o Gabriel. Os
mann et al., 2011; Cerva‑Alves et al., 2020). O
autores consideraram as rochas como perten‑
CDF faz parte do Escudo Sul‑Rio‑Grandense,
centes ao Complexo Cambaı́, com idade apro‑
de idade pré ‑Cambriana, uma associaçã o de
ximada de 750 Ma, sendo classi icadas, em
terrenos justapostos no ciclo orogê nico Bra‑
cará ter preliminar, como retroeclogitos do ti‑
siliano (Hueck et al., 2018).
po B, de acordo com Coleman et al. (1965).
Atualmente, sabe‑se que o Terreno Sã o Gabri‑ O Terreno Sã o Gabriel (Fig. 2B) está
el possui dois arcos juvenis sequenciais Neo‑ inserido no CDF (p. ex., Phillip et al., 2018;
proterozoicos (Toniano e Criogeniano) e Hartmann et al., 2011). A regiã o é coberta, a
feiçõ es remanescentes de complexos o iolı́ti‑ oeste e a norte, por unidades fanerozoicas da
cos, correspondendo aos arcos Passinho e Bacia do Paraná , e é limitada, ao sul, pela Zo‑
Sã o Gabriel, respectivamente (Philipp et al., na de Cisalhamento Ibaré (ZCI), de orienta‑
2018). çã o NW‑SE, e, a leste, pela Zona de
Cisalhamento Caçapava do Sul (ZCCS). Na
O presente capı́tulo busca desvendar
borda sudoeste deste terreno, ocorrem as ro‑
a evoluçã o inicial do eclogito Toniano Trê s
chas mais antigas do crá ton Rio de La Plata,
Vendas e sua histó ria tectono‑metamó r ica,
principalmente, as do Complexo Granulı́tico
dentro do contexto do Terreno Sã o Gabriel,
Santa Maria Chico, també m denominado Blo‑
combinando trabalho de campo, petrogra ia,
co Taquarembó . Na fronteira nordeste, zonas
aná lises de microssonda eletrô nica e aná lises
de cisalhamento, orientadas em NNE‑SSW,
quı́micas de rocha total, para deduzir a evolu‑
separam este terreno do Cinturã o Porongos,
çã o pressã o‑temperatura da rocha, com auxı́‑
de 2,35‑0,78 Ga, també m conhecido como
lio da construçã o de pseudossecçõ es. Em
Terreno Tijucas (Philipp et al., 2018; Cerva‑
cristais de zircã o foram determinados isó to‑
Alves et al., 2020). O terreno foi recoberto
pos de U‑Pb‑Hf, para o controle das condiçõ es
por rochas sedimentares e vulcâ nicas da ba‑
de tempo e de cristalizaçã o. Os resultados
cia do Camaquã e intrudido por inú meros
fornecem uma evoluçã o P‑T‑t, construı́da para
corpos granı́ticos (Chemale Jr., 2000).
este primeiro eclogito Toniano no Oró geno
Brasiliano. O Terreno Sã o Gabriel conté m rema‑

Evolução Toniana do Eclogito Três Vendas no contexto do Arco Passinho ‑ Terreno São Gabriel 79
Contribuições à Geologia do Rio Grande do Sul e de Santa Catarina

nescentes de complexos o iolı́ticos, dois arcos por dioritos, por tonalitos e por granodiori‑
neoproterozoicos (Passinho (890‑860 Ma) e tos, que pertencem aos Gnaisses Cambaı,
Sã o Gabriel (758‑700 Ma), sequê ncias meta‑ com idade de cristalizaçã o ı́gnea de 758‑
vulcanossedimentares, metassedimentares e 700 Ma (U‑Pb (LA‑ICP‑MS e SHRIMP))
granitos pó s‑tectô nicos ediacaranos (Babins‑ (Hartmann et al., 2011; Vedana et al., 2018;
ki et al., 1996; Saalmann et al., 2005, 2011; Cerva‑Alves et al., 2020). A sequê ncia Cam‑
Hartmann et al., 2011; Cerva‑Alves et al., baı́ inclui as suı́tes Lagoa da Meia Lua, San‑
2020). ga do Jobim e Vila Nova (Hartmann et al.,
Relictos da crosta oceâ nica foram im‑ 2011), que pertencem ao Arco Sã o Gabriel.
bricados tectonicamente e encaixados no As composiçõ es Sr‑Nd, com correçã o de
Terreno Sã o Gabriel e sã o representados por, idade das rochas Imbicuı́ e Cambaı́, revelam
pelo menos, seis relictos o iolı́ticos, denomi‑ a natureza juvenil dos magmas (Babinski et
nados Cerro Mantiqueiras, Ibaré , Palma, Bos‑ al., 1996; Saalmann et al., 2005).
soroca (Formaçã o Arroio Lajeadinho), A porçã o supracrustal do arco é re‑
Cambaizinho e Passo do Ivo. As aná lises de presentada pelas sucessõ es metavulcanos‑
cristalizaçã o de zircã o U‑Pb (Arena et al., sedimentares Cambaizinho, Passo Feio,
2016, 2017; Hartmann et al., 2019) de rochas Marmeleiro e Cerro Batovi, associadas a ro‑
metassomá ticas e plagiogranitos dos siste‑ chas o iolı́ticas (Philipp et al., 2018), e pelos
mas o iolı́ticos do Terreno Sã o Gabriel mos‑ metassedimentos do Complexo Pontas do
tram duas idades distintas: 923‑892 Ma e Salso (Vedana et al., 2018). As idades dos
726‑722 Ma. zircõ es detrı́ticos das rochas metassedi‑
A infraestrutura do arco inclui duas mentares do O iolito Cambaizinho apresen‑
associaçõ es DTTG (diorito, tonalito, trondhje‑ tam picos entre 817 Ma e 650 Ma, com ɛHf
mito e granodiorito), designadas Imbicuı́ e positivo, apoiando a con iguraçã o de dois
Cambaı́ (Philipp et al., 2018), que fazem parte arcos magmá ticos (Cerva‑Alves et al.,
do Complexo Cambaı́ (Hartmann et al., 2011, 2020). A associaçã o vulcanossedimentar
2019). A associaçã o Imbicuı́ faz parte do Arco Camaquã e os granitos associados se forma‑
Passinho e inclui gnaisses, que apresentam ram entre 610 Ma e 540 Ma e sã o represen‑
composiçõ es toleiı́ticas a cá lcio‑alcalinas de tados por uma bacia tipo foreland e por
baixo‑K e gnaisse diorı́tico. Essas rochas re‑ granitos, relacionados aos está gios tardios a
gistram idades de zircã o de 879 ±14 (U‑Pb pó s‑orogê nicos do evento Dom Feliciano.
(SHRIMP)) (Leite et al., 1998), de 890 ±9 Ma Este estudo se concentra na regiã o
e de 885 ±3 Ma (U‑Pb (LA‑ICP‑MS)) (Philipp adjacente ao O iolito Cerro Mantiqueiras, no
et al., 2018). A assembleia plagioclá sio + extremo sul do Terreno Sã o Gabriel, com
hornblenda + diopsı́dio de alto grau do gnais‑ ê nfase no eclogito Trê s Vendas. Um mapa
se Imbicuı́ re lete o metamor ismo de fá cies geoló gico da regiã o estudada, modi icado
an ibolito mé dio a superior de baixo P, que é de Philipp et al. (2018), é mostrado na Figu‑
interpretado como um evento metamó r ico ra 2C.
regional, ocorrido em 890 Ma (Philipp et al.,
2018). Esta assembleia foi alterada por um 3 ASPECTOS DE CAMPO
evento de fá cies xisto verde a an ibolito infe‑
rior, caracterizado por epidoto + actinolita / O Eclogito Trê s Vendas ocorre como
hornblenda + clorita + muscovita. corpos em forma de lentes, de cor escura
Os Gnaisses Imbicuı sã o intrudidos (Fig. 3A) e em contato com as rochas milo‑

80 Edição da Sociedade Brasileira de Geologia – Núcleo RS/SC


Pinto et al.

nitizados encaixantes do Gnaisse Imbicuı́. Os em por iroblastos de granadas (>70% de


gnaisses de cor branca a rosa apresentam granada), denominados garnetitos. Caracte‑
bandas centimé tricas e sã o compostos, prin‑ rı́sticas petrográ icas, representativas do
cipalmente, por quartzo, por feldspatos, por Eclogito Trê s Vendas, sã o mostradas em mi‑
muscovita e por biotita, sendo intensamente crofotogra ias, com polarizador plano‑para‑
milonitizados, localmente. Sua foliaçã o é , lelo (Figs. 3C‑3D) e em imagens MEV (Figs.
aproximadamente, E‑W (281/27), e, local‑ 3E‑3F).
mente, possuem mergulho subvertical Os por iroblastos de granada sã o
(273/78) em zonas ultramilonı́ticas. eué dricos ou hexagonais a arredondados,
A aparê ncia das rochas eclogı́ticas é com diâ metros variando entre 0,5 mm e 2
variá vel, desde an ibó lio‑plagioclá sio‑quart‑ mm, e, geralmente, exibem zoneamento con‑
zo, de granulaçã o ina, homogê neo, de tama‑ tı́nuo, com enriquecimento de Mg e com de‑
nho submilimé trico, com presença pleçã o de Fe e de Mn nas bordas, mas essas
secundá ria de granada nas porçõ es limites, tendê ncias podem ser descontı́nuas em algu‑
de borda das lentes com encaixantes, até ro‑ mas amostras. Os nú cleos das granadas po‑
chas heterogê neas, ricas em granada, com dem ser ricos em inclusõ es, enquanto as
cristais de tamanho milimé trico (Fig. 3B). A bordas contê m poucas inclusõ es. Os por iro‑
foliaçã o, nos eclogitos, é orientada para blastos de granada podem conter inclusõ es
NNW‑SSE (287/39 a 303/36) e, geralmente, de hornblenda, de quartzo, de epidoto, de bi‑
mergulha suavemente (30‑40°), em direçã o a otita e, ocasionalmente, de onfacita (Fig. 3F).
NNE, mas pode ser localmente subvertical a A granada é predominantemente almandina,
invertida (296/80). contendo, excepcionalmente, até Py29 e até
Sps20. A proporçã o de almandina, normal‑
mente, aumenta gradualmente, passando de
4 PETROGRAFIA
Alm51‑52, nos nú cleos, para Alm55‑57, nas
O Eclogito Trê s Vendas conté m 5‑25 bordas, enquanto o piropo (Mg) aumenta
vol. % de granada, 30‑40% de Mg‑hornblen‑ (Py07 a Py29). Essas mudanças composicio‑
da, de pargasita e de tschermakita (an ibó li‑ nais sã o acompanhadas por diminuiçõ es
os), 5‑10% de quartzo e 20‑40% de concomitantes nos conteú dos de grossulá ria
simplectitos (Figs. 3C e 3E‑3F), que consis‑ (Grs30‑32,5 a ~ Grs26) e de espessartina (~
tem em intercrescimentos, de granulaçã o i‑ Sps10 a ~ Sps01), do nú cleo para a borda.
na, de an ibó lio, de oligoclá sio e de Per is em grã os minerais e em mapas com‑
clinopiroxê nio (diopsı́dio ou augita) e de posicionais mostram que essas granadas tê m
quartzo, com ortoclá sio e com onfacita (piro‑ composiçã o heterogê nea do nú cleo para a
xê nio só dico) em menor quantidade, que borda (Fig. 3G‑3H). Os dados das granadas
també m sã o encontrados como inclusõ es na estudadas em microssonda eletrô nica per‑
granada. As fases menores incluem epidoto mitem classi icá ‑las como formadas em eclo‑
(0‑3 vol. %), tremolita (0‑2%), biotita (0‑ gitos de zonas de subducçã o no Grupo C (Fig.
2%), rutilo (1‑2%), titanita (1‑2%), apatita 4A), segundo Coleman et al. (1965), e mos‑
(1%), fengita (0‑1%, na amostra VYN) e clo‑ tram seu cará ter de metamor ismo progres‑
rita (0‑1%) e algumas seçõ es contê m abun‑ sivo. Do mesmo modo, as composiçõ es do
dante zircã o bipiramidado (<1%). Os nú cleo da granada correspondem aos eclogi‑
principais minerais opacos sã o magnetita e tos do tipo I, de Massonne & Li (2020), que
ilmenita (2‑3%), juntamente com pirita e sã o formados em cunhas de subducçã o e,
com calcopirita (<1%). Ocorrem nı́veis ricos posteriormente, exumados, tectonicamente.

Evolução Toniana do Eclogito Três Vendas no contexto do Arco Passinho ‑ Terreno São Gabriel 81
Contribuições à Geologia do Rio Grande do Sul e de Santa Catarina

Figura 2 – (A) Terrenos tectonoestratigrá icos do cinturã o Dom Feliciano (Toniano‑Ediacariano) e


embasamento cratô nico (Arqueano‑Mesoproterozoico) (modi icado de Cerva‑Alves et al., 2020); (B) Mapa
geoló gico do Terreno Sã o Gabriel e fragmentos do Crá ton Rio de La Plata (modi icado de Hartmann et al.,
2019); e (C) Mapa geoló gico simpli icado da regiã o do Cerro Mantiqueiras (modi icado de Philipp et al., 2018).

Clinopiroxê nio é ané drico a subé dri‑ frequentemente, como inclusõ es em grana‑
co e é encontrado em simplectitos e, menos da. A composiçã o tem um nú mero de mag‑

82 Edição da Sociedade Brasileira de Geologia – Núcleo RS/SC


Pinto et al.

né sio (Mg #) de 77 e plota no campo do di‑ zircã o resultaram em 910 ±5 Ma (MSWD
opsı́dio; augita també m está presente, mas é 0,41), com razõ es Th/U variando de 0,6 a 1,0,
menos comum. Onfacita é encontrada mais interpretada como a idade magmá tica, corres‑
raramente, mas ocorre, tanto em simplectitos pondendo, aproximadamente, à idade do
como em inclusõ es, e conté m 20‑50% de Jd Gnaisse Imbicuı́ e pró xima à do O iolito Cerro
(Fig. 4B). Mantiqueiras. Bordas metamó r icas foram da‑
O rutilo (Fig. 3C) tem cor castanho‑ tadas em 892 ±8 Ma (MSWD 1,15), com ra‑
dourada e está presente como prismas cur‑ zõ es Th/U de 0,2 a 0,4 (Pinto et al., 2021). Há
tos subarredondados, com comprimento de pouco tempo, era consenso que zircõ es meta‑
10‑150 μm, que sã o circundados por titanita mó r icos tinham razõ es Th/U abaixo de 0,1
incolor. (p. ex., Hoskin & Black, 2000; Rubatto, 2017).
As aná lises de microssonda eletrô ni‑ Baseado em robusta compilaçã o de aná lises
ca das amostras VYB, VYN e VYA do eclogito de zircõ es da Austrá lia Ocidental (>1330 aná ‑
Trê s Vendas, representativas de minerais es‑ lises de zircõ es metamó r icos e >5000 aná li‑
senciais (granada e clinopiroxê nio), sã o apre‑ ses de zircõ es ı́gneos), é mais apropriado
sentadas na Tabela 1. dizer que o zircã o ı́gneo raramente tem Th/U
<0,1 e que o zircã o metamó r ico pode ter va‑
lores, que variam de 0,01 a <10 (Yakymchuk
5 GEOQUÍMICA DE ROCHA TOTAL
et al., 2018).
Amostras representativas do Eclogito Dezessete aná lises de spots de Lu‑Hf
Trê s Vendas foram selecionadas, para aná li‑ foram obtidas em 16 grã os. Todas as composi‑
ses geoquı́micas de rocha total, e correspon‑ çõ es εHf com correçã o de idade de zircã o vari‑
dem à s seçõ es delgadas, estudadas com am entre +4 e +10, consistente com
microssonda eletrô nica. subducçã o em um cená rio de arco de ilha ju‑
Os eclogitos plotam no campo do ba‑ venil.
salto, no diagrama TAS (Fig. 4C) (Le Bas et al.,
1986) e tê m Mg #, em torno de 50. Eles sã o 7 EVOLUÇÃO P‑T
relativamente pobres em á lcalis (Na2O + K2O
= 1,8‑2,5% em peso), contê m 50,6‑51% em Pseudossecçõ es foram calculadas na
peso de SiO2, 8‑9% em peso de MgO, 10,8‑ amostra VYB, em condiçõ es de T e de P entre
12,2% em peso de FeO e 0,9‑1% em peso de 400 °C e 800 °C e 3‑20 kbar, respectivamente.
TiO2. Essas caracterı́sticas sã o tı́picas de uma O software utilizado foi o Perple X 6.8.6 (Con‑
sé rie toleı́tica. Suas caracterı́sticas Zr‑Y e Zr‑ nolly, 2009), no sistema Na‑K‑Ca‑Fe‑Mg‑Mn‑
Ti sã o consistentes com a inidade de basalto Ti‑Al‑Si‑OH, usando o banco de dados termo‑
de arco de ilha (Fig. 4D). dinâ mico Thermocalc 6.2 (Holland & Powell,
2011). Os modelos de soluçã o adotados segui‑
ram Massonne (2012), adicionando 5% de
6 DADOS DE U‑Pb EM ZIRCÃO E COM‑
H2O, para modelar as reaçõ es progressivas de
POSIÇÃO DE ISÓTOPOS DE Hf IN SITU
formaçã o de granada, e 0,135% (peso) de O2,
Os cristais de zircã o sã o subé dricos a para permitir que 10% do Fe presente em
eué dricos, com formas prismá ticas e com VYB seja trivalente. O resultado é mostrado na
comprimentos de 100‑250 μm. Seus nú cleos Figura 5, juntamente com a trajetó ria P‑T, infe‑
geralmente exibem zoneamento oscilató rio, rida com base na integraçã o de dados de mi‑
cercado por bordas, que exibem brilho uni‑ crossonda eletrô nica, de modelagem e de
forme em catodoluminescê ncia. Os dados de geotermobarometria, discutidos abaixo e de‑

Evolução Toniana do Eclogito Três Vendas no contexto do Arco Passinho ‑ Terreno São Gabriel 83
Contribuições à Geologia do Rio Grande do Sul e de Santa Catarina

Tabela 1 ‒ Aná lises de microssonda eletrô nica, representativas de granada e de piroxê nio do Eclogito Trê s
Vendas. Abreviaçõ es: nd=nã o detectado; incl.=inclusã o; simpl.=simplectito; aFerro total; Alm=almandina;
Prp=piropo; Grs=grossulá ria; Sps=espessartita; Jd=jadeı́ta; Ac=acmita; Ag=augita.

talhados em Pinto et al. (2021). de microssonda eletrô nica indicam equilı́‑


A presença de onfacita, com conteú ‑ brio entre 580 °C a 680 °C e pressõ es de
do Jd de, até , 50% requer pressõ es de pico ~14 Kbar a ~20 kbar, consistente com a
mı́nimas de 15‑17 kbar (bem acima dos 10 presença de onfacita com, até , 50% de Jd.
kbar mı́nimos) nas temperaturas má ximas Enquanto isso, inclusõ es de an ibó lio na
de soterramento inferidas de 600‑700 °C. granada fornecem estimativas de tempera‑
Jadeı́ta foi usada em isopletas como onfaci‑ tura de 710‑760 °C, enquanto Mg‑hornblen‑
ta, como é tradicionalmente usado, para es‑ da, que substitui bordas de granada, ricas
timar pressõ es mı́nimas de formaçã o de em Mg, fornece estimativa de temperaturas
eclogito (p. ex., Page et al., 2003) (Fig. 4). de 630‑680 °C, usando o termô metro de
Portanto, esta estimativa de 15‑17 kbar re‑ Krogh Ravna (Krogh Ravna, 2000). Essas
lete uma estimativa mı́nima da pressã o má ‑ temperaturas sã o interpretadas como tem‑
xima, alcançada durante o soterramento do peraturas de pico, durante a descompres‑
eclogito Trê s Vendas. sã o; as temperaturas mais baixas foram
A temperatura, durante o soterra‑ possivelmente afetadas pela troca retro‑
mento, e as condiçõ es de temperatura de pi‑ gressiva de Fe‑Mg (p. ex., Page et al., 2003).
co, alcançadas durante a exumaçã o As condiçõ es de pico de temperatura sã o,
subsequente, podem ser estimadas, a partir provavelmente, penecontemporâ neas à for‑
das isopletas de granadas modeladas (Fig. maçã o dos bordos metamó r icos de zircã o,
5) (Massonne & Li, 2020) e aplicando ter‑ datados em 892 ±8 Ma.
mometria an ibó lio‑granada em inclusõ es A trajetó ria de pressã o‑temperatura
de an ibó lio, em granadas e em bordas ricas é delimitado, ainda, pela geotermobarome‑
em Mg e em Mg‑hornblenda (Krogh Ravna, tria plagioclá sio‑tschermackita de pares
2000). A comparaçã o entre isopletas, mode‑ Hbl‑Pl, que envolvem por iroblastos de gra‑
ladas a partir da borda da granada, e dados nada, indicando equilı́brio a 570‑630 °C e a

84 Edição da Sociedade Brasileira de Geologia – Núcleo RS/SC


Pinto et al.

Figura 3 ‒ (A) Tı́pico a loramento do eclogito Trê s Vendas; (B) Amostra do eclogito Trê s Vendas, com
por iroblastos de granadas; (C) Representativo eclogito, sob microscó pio em luz plana polarizada, mostrando
agregados de rutilo (Rt) e de ilmenita/magnetita (Ilm/Mt), ao lado de granada (grt) e de hornblenda (Hbl),
circundados por simplectitos (sym), de granulaçã o ina; e (D) Grande concentraçã o de granada (garnetito), sob
microscó pio. Imagens em MEV: (E) Por iroblasto de granada (note a borda, de coloraçã o mais escura do que o
nú cleo), simplectitos e rutilo na matriz e incluso na granada; (F) Detalhe de inclusõ es de onfacita (Omp) e de
outros minerais na granada; (H) Per il e (G) mapa composicional de Mg em por iroblasto de granada. Todas as
abreviaçõ es de minerais deste capı́tulo seguiram Whitney & Evans (2010).

Evolução Toniana do Eclogito Três Vendas no contexto do Arco Passinho ‑ Terreno São Gabriel 85
Contribuições à Geologia do Rio Grande do Sul e de Santa Catarina

Figura 4 ‒ Composiçõ es minerais, medidas com microssonda eletrô nica, e aná lises quı́micas de rocha total nas
amostras VYN, VYA e VYB do eclogito Trê s Vendas: (A) Diagrama terná rio de granada, mostrando os grupos de
eclogito de Coleman et al. (1965); (B) Diagrama terná rio de classi icaçã o do clinopiroxê nio (Droop, 1987;
Matsumoto, 1988); (C) Diagrama de classi icaçã o de rocha TAS (Le Bas et al., 1986); e (D) Diagrama de
ambiente geotectô nico Zr‑Zr/Y (Pearce & Norry, 1979).

pressõ es de 7,7‑8,3 kbar. Pares de tremolita‑ rocha eclogı́tica de idade Toniana datada no
plagioclá sio indicam equilı́brio, em torno de Oró geno Brasiliano. A idade magmá tica é
500‑550 °C e de ~4,5 kbar (Anderson, consistente com a Orogenia do Passinho, do
1996). Terreno Sã o Gabriel, incluindo o arco de ilha
Os está gios regressivos inais envol‑ do Passinho (890 Ma) e o O iolito Cerro
veram a formaçã o de bordas de biotita, ao Mantiqueiras (923 Ma).
redor da granada, em algumas seçõ es (VYB), Os dados geocronoló gicos e isotó pi‑
e, inalmente, a alteraçã o da biotita em pic‑ cos apoiam a interpretaçã o do eclogito, rela‑
noclorita e em ripidolita, o que re lete as cionada ao magmatismo juvenil,
condiçõ es cada vez mais hidratadas. especialmente, os dados isotó picos Hf em
zircã o, assim como o modelo TDM, com ida‑
8 DISCUSSÃO des para extraçã o do manto, variando de 0,9
Ga a 1,22 Ga (Hf TDM), muito pró ximas à
Os cristais magmá ticos de zircã o do idade de cristalizaçã o U‑Pb (ca. 910 Ma) e
eclogito Trê s Vendas fornecem uma idade aos altos valores positivos de εHf (t) (+4,0 a
concordia de 910 ±5 Ma. Esta é a primeira +9,8).

86 Edição da Sociedade Brasileira de Geologia – Núcleo RS/SC


Pinto et al.

8. 1 Con iguração geodinâmica e impli‑ iniciou bem antes de 879 Ma, nas porçõ es
cações para a estrutura geotectônica meridionais do oró geno, em que esta fase
regional está associada à obduçã o do Arco Sã o Gabri‑
el e à exumaçã o do Arco Passinho.
A combinaçã o dos dados do Eclogito
Trê s Vendas é consistente com uma posiçã o, 8. 2 Implicações tectônicas
associada ao Arco Passinho, situado no pro‑
to‑oceano Adamastor (Hartmann et al., A formaçã o de eclogito é um fator‑
2019), també m denominado oceano Charrua chave nos oró genos, que constroem conti‑
(Philipp et al., 2018) ou, possivelmente, no nentes, por meio da coleta de material das
assoalho oceâ nico subductado (Fig. 6a). A bacias oceâ nicas e da construçã o de arcos de
subducçã o das rochas má icas, formadas a ilhas em zonas de subducçã o (Massone & Li,
910 ±5 Ma, a profundidades mı́nimas de 45‑ 2020). Os arcos de ilhas sã o o principal local
51 km (≥ 15‑17 kbar), foi seguida por exu‑ de produçã o da crosta continental juvenil na
maçã o rá pida, com temperaturas má ximas formaçã o da crosta terrestre e podem per‑
registradas de 710‑760 °C, em direçã o a pro‑ sistir de 50 Ma a >300 Ma (Condie, 2007).
fundidades de ~24 km (8 kbar), que é pene‑ O Eclogito Trê s Vendas no Terreno
contemporâ neo à s bordas de zircã o, datadas Sã o Gabriel, no Cinturã o Dom Feliciano, é
em 892 ±8 Ma (Fig. 6B). As condiçõ es de pi‑ uma associaçã o de rochas fundamental for‑
co de temperatura indicam gradientes geo‑ mada no inı́cio da fragmentaçã o do Rodı́nia e
té rmicos acima de 30 °C/km, consistentes da formaçã o do Gondwana durante a evolu‑
com um terreno juvenil, relativamente quen‑ çã o Neoproterozoica do Oró geno Brasiliano.
te, a moderadamente juvenil, o que é corro‑ Este foco em processos de cerca de 900 Ma é
borado pelos valores iniciais εHf de +4 a signi icativo (ver Arena et al., 2016, 2017;
+10. Hartmann et al., 2019; Santiago et al., 2020),
O principal processo retrogressivo é porque a fragmentaçã o do Rodı́nia é comu‑
caracterizado pelos aumentos de fO2 e de mente datada em perı́odo posterior, entre
aH2O e pela presença de simplectitos, com‑ 800‑700 Ma (Oriolo et al., 2017).
postos por an ibó lio e por plagioclá sio, subs‑ O inı́cio do Terreno Sã o Gabriel, de‑
tituindo granada, titanita ou ilmenita, e de nominado Oró geno Passinho, compreende
clinozoisita, substituindo rutilo e clinopiro‑ fragmentos de crosta oceâ nica, incluindo os
xê nio, respectivamente, indicativos de fá cies cerros Mantiqueiras e Bossoroca, parte do
an ibolito. Um evento retrogressivo de fá cies O iolito Ibaré (923‑892 Ma) (Arena et al.,
xisto verde superior em está gio avançado, é 2016, 2017), o Eclogito Trê s Vendas (910‑
documentado por clorita e por tremolita, 892 Ma) e o arco intraoceâ nico juvenil (~
substituindo biotita e hornblenda (Fig. 6C). 890 Ma) (Philipp et al., 2018). Posteriormen‑
Nossas idades de zircã o indicam que te, o Arco Passinho colidiu com o Crá ton Rio
o metamor ismo da temperatura de pico na de La Plata (um fragmento de Rodı́nia),
Orogenia Passinho coincidiu com o principal constituindo uma con iguraçã o signi icativa
evento metamó r ico regional, em 890 Ma (p. do Oró geno Brasiliano primitivo (Fig. 6B).
ex., Philipp et al., 2018), e com a obduçã o do Outros arcos intraoceâ nicos juvenis,
O iolito Ibaré no Terreno Sã o Gabriel, em de idade Toniana, sã o registrados no Oró ge‑
892 ±3 Ma (Arena et al., 2016). A prevalê ncia no Brasiliano, incluindo o Arco de Goiá s
dessa idade de 890 Ma sugere que a primei‑ (900‑862 Ma), na Faixa Brası́lia (Pimentel &
ra grande fase do ciclo orogê nico Brasiliano Fuck, 1992), e os arcos Serra da Prata (856‑

Evolução Toniana do Eclogito Três Vendas no contexto do Arco Passinho ‑ Terreno São Gabriel 87
Contribuições à Geologia do Rio Grande do Sul e de Santa Catarina

Figura 5 ‒ Pseudossecçã o dos eclogitos Trê s Vendas (a seta indica a trajetó ria de PT, estimada com base nos
resultados de modelagem e de geotermobarometria citados no texto): (A) Nú cleo de granada modelado; (B)
Jadeı́ta em onfacita; (C) Bordas de granadas modeladas e inclusõ es de hornblenda em granada; (D)
Geotermobarometria de hornblenda‑plagioclá sio; e (E) Geotermobarometria de tremolita‑plagioclá sio.

838 Ma) e Rio Negro (ca. 790 Ma), no Cintu‑ Cerva‑Alves et al. (2020), que sustentam
rã o Ribeira (Peixoto et al., 2017). Assim, os que o Arco Passinho, no Cinturã o Dom Feli‑
resultados aqui apresentados corroboram ciano, está correlacionado aos demais arcos

88 Edição da Sociedade Brasileira de Geologia – Núcleo RS/SC


Pinto et al.

Figura 6 ‒ (A) Posiçã o do eclogito Trê s Vendas, dentro do oceano proto‑Adamastor há 910 Ma; (B) Per il,
mostrando o inı́cio da primeira orogenia Brasiliano, em 892 Ma, no limite sul do Oró geno; e (C) Resumo da
evoluçã o metamó r ica do Eclogito Trê s Vendas modi icado apó s Pinto et al. (2021, submetido).

intraoceâ nicos tonianos brasileiros. magmá tica ~20 Ma mais antiga do que os
gnaisses Imbicuı́ (890 Ma), encaixantes. As
9 CONCLUSÃO composiçõ es εHf de zircã o entre +4 e +10
destacam a natureza juvenil das fontes mag‑
Os cristais de zircã o no Eclogito má ticas. A idade U‑Pb das bordas de zircã o
Trê s Vendas foram datados em 910 ±5 Ma metamó r ico indica que o pico de metamor‑
(zircã o U‑Pb (LA‑ICP‑MS)) e registram idade ismo ocorreu em 892 ±8 Ma. A onfacita, que

Evolução Toniana do Eclogito Três Vendas no contexto do Arco Passinho ‑ Terreno São Gabriel 89
Contribuições à Geologia do Rio Grande do Sul e de Santa Catarina

conté m, até , 50% de jadeı́ta, re lete o soterra‑ Brito Neves, B. B., Fuck, R. A. & Pimentel, M.
mento em >45 km. O soterramento ocorreu M. 2014. The Brasiliano collage in South
America: a review. Brazilian Journal of Geo‑
na crosta anterior ou no canal de subducçã o,
logy, 44(3): 493‑518.
seguido por uma rá pida exumaçã o, durante a
qual essas rochas experimentaram picos de Carswell, D. A. & Zhang, R. Y. 1999. Petro‑
temperatura, em torno de 710‑760 °C. Os da‑ graphic characteristics and metamorphic
dos combinados indicam que o Eclogito Trê s evolution of ultrahigh‑pressure eclogites in
Vendas pertence ao Arco Passinho e revelam plate‑collision belts. International Geology
Review, 41: 781‑798.
que este arco se originou mais cedo do que
descrito, anteriormente. Os dados do primei‑ Cerva‑Alves, T., Hartmann, L. A., Remus, M. V.
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92 Edição da Sociedade Brasileira de Geologia – Núcleo RS/SC


Evolução de O iolitos do
Escudo Sul‑Rio‑Grandense –
Roteiro de campo
Lé o Afraneo Hartmann1*, Karine da Rosa Arena1, Tiara Cerva‑Alves1,
Mariana Werle1, Viter Magalhã es Pinto2

1
Instituto de Geociê ncias, Universidade Federal do Rio Grande do Sul
2
Centro de Engenharia, Engenharia Geoló gica, Universidade Federal de Pelotas

* autor correspondente: leo.hartmann@ufrgs.br

1 INTRODUÇÃO
A crosta oceâ nica e o manto superior do proto‑Oceano Adamastor estã o preservados em
fragmentos de o iolitos, no Escudo Sul‑Rio‑Grandense. O iolitos sã o associaçõ es de rochas má i‑
cas (basalto, gabro), ultramá icas (peridotito, serpentinito) e sedimentares (chert, lamito, silti‑
to), interpretadas como fragmentos da crosta oceâ nica e do manto superior, retidos em arco de
ilhas oceâ nico e na margem continental ativa, durante a subduçã o e a colisã o orogê nica. A gera‑
çã o de o iolitos do tipo Fanerozoico iniciou no Toniano, mas, em outros oró genos, há o iolitos
datados da Era Neoproterozoica, que é dividida em Toniano (1000‑720 Ma), em Criogeniano
(720‑635 Ma) e em Ediacarano (635‑539 Ma).
No Rio Grande do Sul, dezenas de o iolitos ocorrem no Terreno Sã o Gabriel e alguns es‑
tã o presentes no cinturã o de dobras e de falhas Porongos e em septos desse cinturã o, no Bató li‑
to Pelotas. No terreno, ocorrem os o iolitos Cerro Mantiqueiras, Ibaré , Palma, Palma Leste, Passo
do Ivo, Cambaizinho, Bossoroca e Passo Feio (em parte) (Ribeiro & Fantinel, 1978; Szubert,
1978; Hartmann & Chemale, 2003; Arena et al., 2016; Hartmann et al., 2019; Cerva‑Alves et al.,
2020). No cinturã o, estã o contidos os o iolitos Capané e Candiotinha (Arena et al., 2018; Werle
et al., 2020) e, em septo desse cinturã o, ocorre o o iolito Arroio Grande (Ramos et al., 2020), en‑
quanto o Cinturã o Dom Feliciano (Fig. 1) apresenta inserçõ es de o iolitos em todos os ambientes
geoló gicos (Fernandes et al., 1995; Philipp et al., 2016; Hueck et al., 2018).
O Terreno Sã o Gabriel (Fig. 2) foi designado, inicialmente, como ‘Bloco’, por Jost & Hart‑
mann (1984), e separado do Bató lito Pelotas (‘Bloco’), com base em diferenças geoló gicas. O
acesso à geocronologia U‑Pb de zircã o possibilitou a determinaçã o da idade toniana (737 Ma)
Contribuições à Geologia do Rio Grande do Sul e de Santa Catarina

Figura 1 ‑ (a) Posicionamento do Terreno Sã o Gabriel na con iguraçã o simpli icada do supercontinente
Gondwana, em 530 Ma, com indicaçã o dos crá tons e dos cinturõ es orogê nicos neoproterozoicos; (b) Cinturã o
Dom Feliciano; (c) Mapa geoló gico da regiã o oeste do Escudo Sul‑Rio‑Grandense, com indicaçã o dos o iolitos
descritos (modi icado de Cerva‑Alves et al., 2020); (d) Distribuiçã o das idades U‑Pb em zircã o, no Terreno Sã o
Gabriel (Arena et al., 2017) (quiescê ncia tectô nica de 50 Ma entre as orogê neses); (e) Estrutura do Terreno Sã o
Gabriel (seçã o esquemá tica entre as cidades de Sã o Gabriel (W) e de Caçapava do Sul (E)) (Saalmann et al.,
2006). Legenda: RP = Rio de La Plata Crá ton; Gr. Caç. = Granito Caçapava; Alto Caç. = Alto de Caçapava; Proteroz.
= Proterozoico; Pré ‑Cambr. = Pré ‑Cambriano; S. Gabriel = Sã o Gabriel; Cryog. = Cryogeniano.

94 Edição da Sociedade Brasileira de Geologia – Núcleo RS/SC


Hartmann et al.

para a Formaçã o Campestre (Grupo Vacacaı́), serçã o no arco de ilhas e até a obduçã o do
hospedeira do o iolito Bossoroca (Machado conjunto oceâ nico sobre o crá ton. A desco‑
et al., 1990), refutando a hipó tese de idade berta de zircã o em turmalinitos, contidos em
arqueana, imaginada, anteriormente, para o cloritito e em blackwall de rodingito (ambos,
O iolito Cerro do Ouro e para as rochas hos‑ dentro de serpentinito), possibilitou a carac‑
pedeiras (Fragoso‑Cesar, 1980; Jost & Hart‑ terizaçã o do zircã o (U/Yb <0,1) incluso na
mann, 1984). As caracterı́sticas juvenis do turmalina (δ11B = 0 a +6) como sendo de
Terreno Sã o Gabriel foram identi icadas por crosta oceâ nica, formada há 920 Ma e altera‑
Babinski et al. (1996) e avaliadas por Che‑ da, até 715 Ma (Arena et al., 2016, 2018,
male Jr. (2000). Zircã o (e rutilo) de crosta 2020; Hartmann et al., 2019; Werle et al.,
oceâ nica – albitito, xistos magnesianos e me‑ 2020). Como resultado, a fase acrescioná ria
tassomatitos (turmalinito, rodingito, cloriti‑ do Oró geno Brasiliano está caracterizada,
to) – e de arcos ‒ foram datados no desde o Toniano, até o inı́cio do Criogenia‑
Toniano‑Criogeniano por SHRIMP e por LA‑ no.
ICPMS, por Arena et al. (2016, 2017, 2018), Apresentamos, neste capı́tulo, os re‑
por Hartmann et al. (2019) e por Cerva‑Al‑ sultados geoló gicos, petrográ icos, geoquı́‑
ves et al. (2020). Algumas caracterı́sticas dos micos (rocha total, minerais) e isotó picos
o iolitos estã o referidas na Tabela 1. As ida‑ (U‑Pb em zircã o e em rutilo, B em turmalina)
des principais dos o iolitos sã o 923 Ma, 786 obtidos nos o iolitos, principalmente, nos
Ma e 715 Ma, relativas ao percurso, que vai metassomatitos, associados a serpentinitos.
da cadeia meso‑Oceano Adamastor, até a in‑ Indicamos a loramentos em vá rios o iolitos,
Tabela 1‑ Estratigra ia e geotectô nica do Terreno Sã o Gabriel (arco de ilhas + o iolitos obductados) e unidades
associadas, com exemplos e com idades aproximadas. O iolitos do cinturã o de dobras e de falhas Porongos sã o
mencionados.

Evolução de O iolitos do Escudo Sul‑Rio‑Grandense – Roteiro de campo 95


Contribuições à Geologia do Rio Grande do Sul e de Santa Catarina

Figura 2 ‑ (a) Distribuiçã o da amplitude do sinal analı́tico no Escudo Sul‑Rio‑Grandense e nas á reas do
entorno. Os limites do escudo sã o indicados pela linha branca e algumas falhas, pela linha preta (modi icado de
Hartmann et al., 2016); (b) Distribuiçã o terná ria do sinal gama RGB no escudo (K%, eTh e eU) (modi icado de
Hartmann et al., 2016); (c) Modelo de evoluçã o geotectô nica do Terreno Sã o Gabriel (Cerva‑Alves et al., 2020);
(d) Mapa geoló gico do o iolito Bossoroca (Wildner et al., 2013; Gubert et al., 2016); (e) Distribuiçã o terná ria do
sinal gama RGB na regiã o oeste do escudo (K%, eTh e eU); (f) Distribuiçã o do sinal gamaespectromé trico total
na regiã o oeste do escudo.

96 Edição da Sociedade Brasileira de Geologia – Núcleo RS/SC


Hartmann et al.

que compõ em, de forma integrada, o O iolito Marcadores estruturais no O iolito


Cerro do Ouro, uma infraestrutura hospedei‑ Cerro do Ouro, no Complexo Cambaı́ e no
ra constituı́da de granitos e de gnaisses Grupo Vacacaı́, foram descritos por Remus et
(Complexo Cambaı́) e de uma superestrutura al. (1999) e por Saalmann et al. (2006,
vulcanoclá stica (Grupo Vacacaı́). Os princi‑ 2011). Os o iolitos registram as estruturas
pais conjuntos de crosta oceâ nica‑manto fo‑ S1 e S2, enquanto as estruturas S3 e S4 fo‑
calizados neste roteiro sã o os o iolitos Cerro ram descritas nessas e nas demais rochas do
Mantiqueiras, Ibaré , Cambaizinho e Bossoro‑ terreno. S1 ocorre como veios de quartzo
ca, alé m do eclogito Trê s Vendas. Sã o exami‑ dobrados, sem raiz, ao passo que S2 é uma
nadas a infraestrutura (Complexo Cambaı́) e xistosidade penetrativa, formada em condi‑
a superestrutura (Grupo Vacacaı́) do arco çõ es de fá cies an ibolito inferior. Esse grau
oceâ nico. O o iolito Capané nã o é visitado na de metamor ismo é dominante nos o iolitos,
excursã o, apesar de sua importâ ncia cientı́ i‑ mas apenas o o iolito Cerro Mantiqueiras foi
ca – Cr‑espiné lio, com composiçã o de perido‑ afetado por metamor ismo orogê nico, em fá ‑
tito abissal (Werle et al., 2020) e com idade cies an ibolito mé dio (olivina + ortopiroxê ‑
mais jovem (por U‑Pb em zircã o), de 715 Ma nio + tremolita + chlorita). As estruturas S1 e
(Arena et al., 2018). S2 sã o mais antigas do que a infraestrutura
(Complexo Cambaı́) e do que a superestrutu‑
2 CONTEXTO GEOTECTÔNICO ra (Grupo Vacacaı́), que mostram zonas de
cisalhamento a NE (S3) e zonas de falha rú p‑
No estado do Rio Grande do Sul, o teis, associadas a empurrõ es (S4). S3 é a xis‑
Escudo Sul‑Rio‑Grandense está posicionado tosidade observada nos o iolitos ou nas
no setor central‑sul, contı́nuo ao Escudo Uru‑ superfı́cies de cisalhamento mais espaçadas,
guaio, sendo recoberto pela Bacia do Paraná , nas rochas mais competentes da infraestru‑
no norte, no oeste e em parte da porçã o sul, e tura do arco de ilhas.
pela seçã o emersa da Bacia de Pelotas, ao Os o iolitos evoluı́ram, a partir de ca‑
longo do litoral (Hartmann et al., 2016). O es‑ deias meso‑oceâ nicas (albitito, turmalinito)
cudo está contido na Provı́ncia Mantiqueira e há 920 Ma, até a obduçã o em arcos de ilhas,
integra o Escudo Brasileiro (Jost & Hart‑ há 722‑715 Ma. A colisã o continental iniciou
mann, 1984). O Oró geno Brasiliano (950‑500 há 680 Ma e incluiu o empurrã o do terreno
Ma) é dominante no sul do Brasil (Cinturã o juvenil sobre o crá ton (Bologna et al., 2019)
Dom Feliciano), tendo o Crá ton Rio de La Pla‑ há 650 Ma. Os o iolitos foram integrados ao
ta (principalmente, 2,35‑2,00 Ga e, també m, continente, mas nã o deixaram registro de
1,0 Ga) como embasamento (Hartmann et al., sutura, dentro do perı́metro do Escudo Sul‑
2000, 2007; Silva et al., 2005). No estado de Rio‑Grandense, tendo sido empurrados, até
Santa Catarina, nã o sã o conhecidos o iolitos. a posiçã o atual, desde seu local de origem,
Os serpentinitos do Escudo Sul‑Rio‑ situado a NW. Apó s esse processo tectô nico,
Grandense foram caracterizados, na dé cada passaram a constituir a porçã o superior da
de 1960, como corpos metassomá ticos e po‑ crosta continental, acima e ao lado do Crá ton
sicionados em eugeossinclinal. O posiciona‑ Rio de La Plata (Figs. 3, 4, 5).
mento correto dos o iolitos no
Neoproterozoico foi feito, apó s dataçã o com 3 O OFIOLITO CERRO MANTIQUEIRAS
U‑Pb em zircã o, por SIMS (Machado et al.,
1990) e por SHRIMP (Leite et al., 1998; Hart‑ As “roches serpentineuses, Cerro
mann et al., 2000). Mantiqueiras Formation” dos estudos inici‑

Evolução de O iolitos do Escudo Sul‑Rio‑Grandense – Roteiro de campo 97


Contribuições à Geologia do Rio Grande do Sul e de Santa Catarina

ais (Goñ i, 1962) foram caracterizadas, poste‑ Imbicuı́ e Complexo Cambaı́. A rocha tem on‑
riormente, com mú ltiplas té cnicas (Leite et facita (aná lises de microssonda eletrô nica) e
al., 1998). Aná lises U‑Pb de zircã o, por SH‑ zircã o, datados em 900 Ma, e uma pseudose‑
RIMP, realizadas na Austrá lia, identi icaram çã o, de inindo pressã o de 16 kbar, em tempe‑
o diorito Passinho, de 890 Ma, atualmente ratura de 700 C (Pinto et al., 2020). O
reconhecido como parte do Arco Passinho principal a loramento é visitado na excursã o.
(Saalmann et al., 2006), etapa inicial da
construçã o do Terreno Sã o Gabriel. Os gnais‑ 5 O OFIOLITO IBARÉ
ses Imbicuı́ (Complexo Cambaı́) fazem parte
do arco. As principais idades magmá ticas do O o iolito Ibaré tem metaserpentini‑
complexo foram estabelecidas em 780 Ma e to, em fá cies an ibolito inferior (olivina + tal‑
em 733 Ma, estendendo‑se até 700 Ma co + clorita, com textura caraguatá ‒
(Hartmann et al., 2011). jackstraw), mesclado, tectonicamente, com
Estudos adicionais do o iolito, por camadas de andesito, que també m constitu‑
Hartmann & Chemale Jr. (2003), relataram em as encaixantes (Grupo Vacacaı́). O conjun‑
metamor ismo pervasivo, em condiçõ es de to apresenta os granitos Santa Rita e Jaguari
fá cies an ibolito mé dio (olivina + ortopiroxê ‑ no contato, com intenso metamor ismo té r‑
nio + cromita + clorita + tremolita), mas nã o mico. As rochas metassomá ticas sã o numero‑
foram identi icados remanescentes minera‑ sas e variadas – albitito, rodingito, cloritito,
ló gicos manté licos. A idade magmá tica U‑Pb turmalinito (Figs. 6, 7). O o iolito foi obducta‑
SHRIMP de zircã o de albitito (plagiogranito do na base da superestrutura (Arena et al.,
oceâ nico) é de 923 Ma (Arena et al., 2016), e 2016, 2017, 2020).
as bordas dos mesmos cristais revelaram
idade metamó r ica de 786 Ma. O Cr‑espiné ‑ 6 O OFIOLITO CAMBAIZINHO
lio na matriz e como inclusõ es, em ortopiro‑
xê nio e em olivina, tem composiçã o quı́mica O o iolito Cambaizinho está localiza‑
compatı́vel com a cristalizaçã o metamó r ica do na porçã o noroeste do Terreno Sã o Gabri‑
crustal. O o iolito Cerro Mantiqueiras foi ob‑ el. E caracterizado por conter corpos de
ductado na infraestrutura. rochas má icas, ultramá icas e metassedi‑
mentos quı́micos, que se estendem por uma
A loramentos de albitito, contidos
faixa de 11 km, com largura variá vel entre
em harzburgito, sã o visitados na excursã o. A
500 m e 2 km, com direçã o NE‑SW, mergu‑
assembleia mineral de fá cies an ibolito mé ‑
lhando para NW e para SE. Predominam xis‑
dio conté m olivina (preta, serpentinizada) +
tos magnesianos, incluindo talco‑clorita
enstatita (cinza), com 1‑10 cm de tamanho, e
xisto, talco‑tremolita xisto, olivina‑talco xisto,
tem ampla distribuiçã o, nos a loramentos.
sericita xisto e tremolitito. Ocorrem, ainda,
Pequenos blocos de hornblenda (+ clorita)
corpos de serpentinitos, associados a an ibo‑
fels, de origem metassomá tica, com dimen‑
litos e a sedimentos quı́micos. Ocorrê ncias de
sõ es de 10 a 50 cm, sã o comuns no harzbur‑
formaçã o ferrı́fera bandada sã o relatadas por
gito. O harzburgito é um metaserpentinito.
alguns autores (Hartmann & Remus, 2000). A
dataçã o U‑Pb em rutilos amostrados de clori‑
4 O ECLOGITO TRÊS VENDAS ta‑tremolita xisto forneceram uma idade de
O eclogito Trê s Vendas (com an ibo‑ 788 Ma para o metamor ismo de fundo oceâ ‑
lito) ocorre pró ximo ao o iolito Cerro Manti‑ nico (Cerva‑Alves et al., 2020).
queiras (5 km), e faz parte dos gnaisses O o iolito Cambaizinho foi obducta‑

98 Edição da Sociedade Brasileira de Geologia – Núcleo RS/SC


Hartmann et al.

Figura 3 ‑ (a) Foto para oeste do o iolito Palma Leste, inserido no arco de ilhas do Grupo Vacacaı́; (b) (c) Fotos
do o iolito Ibaré , mostrando rochas ultramá icas e turmalinito; (d) Foto para oeste do o iolito Ibaré , mostrando
metaserpentinito, albitito, rodingito e granitos intrusivos, com inserçõ es de amostras de albitito (acima) e de
rodingito na base de arbusto (abaixo); (e) Foto de xisto magnesiano no o iolito Cambaizinho, obductado sobre o
Granito Sanga do Jobim, na regiã o norte do o iolito; (f) Foto de xisto magnesiano (clorita‑tremolita xisto) no
o iolito Cambaizinho, proveniente da amostra 62H da rodovia BR‑290, contendo rutilo; (g) Fotomicrogra ia da
amostra 62H, mostrando rutilo acessó rio, datado em 788 2.6 Ma (U‑Pb) (Cerva‑Alves et al., 2020). Legenda:
Chl = clorita; Rt = rutilo; Tr = tremolita.

do, dentro da infraestrutura do arco juvenil infraestrutura + o iolito foi intrudido por
Sã o Gabriel, durante a subduçã o e o choque granitoides sintectô nicos, com idade de cris‑
entre arco‑de‑ilha e continente. O conjunto talizaçã o em dois pulsos, de 698 Ma e de 673
Evolução de O iolitos do Escudo Sul‑Rio‑Grandense – Roteiro de campo 99
Contribuições à Geologia do Rio Grande do Sul e de Santa Catarina

Figura 4 ‑ (a) Imagem de saté lite de parte do o iolito Cerro Mantiqueiras, mostrando tipos de rochas, inclusive
albitito; (b) Foto de amostra de mã o de harzburgito no o iolito Cerro Mantiqueiras, com forsterita + enstatita, na
fá cies an ibolito mé dio; (c) Foto de mã o de metaserpentinito no o iolito Bossoroca, com forsterita + talco
(textura caraguatá = jackstraw), na fá cies an ibolito inferior; (d) (e) (f) O iolito Bossoroca, mostrando
distribuiçã o de tipos de rochas, fotomicrogra ia com turmalina + clorita e zircã o, incluso em turmalina; (g) (h)
O iolito Bossoroca, mostrando a loramento de cromita‑talco‑magnesita fels e turmalinito com clorita. Legenda:
Chl = clorita; En = enstatita; Fo = forsterita; Ser = serpentina; Tur = turmalina; Zrn = zircã o.

100 Edição da Sociedade Brasileira de Geologia – Núcleo RS/SC


Hartmann et al.

Figura 5 ‑ (a) (b) Fotos do o iolito Cerro Mantiqueiras, mostrando a distribuiçã o dos tipos de rochas e a
ocorrê ncia de albitito (Arena et al., 2016); (c) (d) (e) (f) Fotomicrogra ias e mapas composicionais de Ca e de
Mg, em lâ mina de an ibolito no o iolito Bossoroca (Massuda et al., 2020); (g) Cr‑espiné lio com nú cleo
manté lico no o iolito Capané (imagem de elé trons retroespalhados e de mapa composicional de Cr) (Werle et
al., 2020). Legenda: Ab = albitito; Amph = an ibolito; Cr = cromita; Hz = harzburgito.

Evolução de O iolitos do Escudo Sul‑Rio‑Grandense – Roteiro de campo 101


Contribuições à Geologia do Rio Grande do Sul e de Santa Catarina

Figura 6 ‑ (a) Distribuiçã o composicional de isó topos de B em turmalinas dos o iolitos Bossoroca (A, B) (Werle
et al., 2020) e Ibaré (Arena et al., 2020); (b) Diagrama composicional de Cr‑espiné lios, com dados de o iolitos do
escudo (Werle et al., 2020), nú cleos manté licos, indicados para Cr‑espiné lios, no o iolito Capané ; (c) Diagrama
evolutivo de isó topos de Hf em zircã o do Terreno Sã o Gabriel (evoluçã o da crosta oceâ nica a continental indicada
pela seta curva (Werle et al., 2020). Legenda: CHUR = Reservató rio Uniforme Condrı́tico; CM = Cerro
Mantiqueiras; DM = Manto depletado; FA = Fá cies an ibolito; FGr = Fá cies granulito; FXVi = Fá cies xisto verde
inferior; SSZ = suprasubduçã o.

Ma, obtida pelo mé todo U‑Pb LA‑ICP‑MS, em dimentares da Formaçã o Serrinha (estauroli‑
zircã o (Cerva‑Alves et al., 2000). A loramen‑ ta xisto, granada xisto, paragnaisse e para‑an‑
tos, expondo a intrusã o do granito Sanga do ibolito), metamor izadas nos fá cies
Jobim em serpentinitos do o iolito Cambaizi‑ an ibolito e xisto verde. A Formaçã o Serrinha
nho, podem ser observados no limite norte (Cerva‑Alves, 2020, 2021) é o equivalente
do o iolito. Posteriormente, eventos tectô ni‑ metassedimentar da Formaçã o Cambaizinho,
cos colisionais colocaram lado a lado rochas de Hartmann & Remus (2000), e possui idade
geradas em ambientes diversos (Cerva‑Alves má xima de deposiçã o de 739 Ma, de inida
et al., 2021). Ao longo do limite oeste do o i‑ por dataçã o U‑Pb de zircõ es detrı́ticos (Hart‑
olito, veri icam‑se intercalaçõ es entre corpos mann et al., 2011; Cerva‑Alves et al., 2021),
o iolı́ticos desmembrados e rochas metasse‑ sendo mais jovem do que o o iolito.

102 Edição da Sociedade Brasileira de Geologia – Núcleo RS/SC


Hartmann et al.

O nome “Cambaizinho” está restrito cada na porçã o sul do o iolito. A dravita pos‑
à s rochas má icas e ultramá icas do O iolito sui δ11B = +2,50‰ e indica que a formaçã o
Cambaizinho (Cerva‑Alves et al., 2020). A les‑ dessas rochas se deu em ambiente oceâ nico,
te do corpo o iolı́tico principal, ocorrem mé‑ com in luê ncia de sedimentos marinhos ter‑
langes o iolı́ticas, em meio a ortognaisses e a rı́genos (Werle et al., 2020). O o iolito Bosso‑
paragnaisses indiferenciados do Complexo roca foi obductado na base da
Cambaı́. Os o iolitos e as rochas encaixantes superestrutura.
sã o cortadas por diques de riolitos, associa‑
dos a atividades magmá ticas relacionadas à 8 ROTEIRO DE CAMPO
Bacia do Camaquã , Formaçã o Acampamento
Velho e diques de diabá sio, mais jovens. 8. 1 Primeiro dia

7h30min ‑ Saı́da de Porto Alegre.


7 O OFIOLITO BOSSOROCA 13h ‑ Chegada ao O iolito Cerro
Mantiqueiras – harzburgito, an ibolito, albi‑
O o iolito Bossoroca é composto, tito, hornblenda fels, com visitaçã o ao re‑
predominantemente, por serpentinito, por cé m‑descoberto eclogito Trê s Vendas (16
an ibolito, por cromita‑talco‑magnesita fels e, kbar, 900 Ma), o primeiro no sul do Brasil.
de maneira subordinada, por formaçõ es fer‑
Parada 1 (30°53'47,53"S,
rı́feras e por rochas metassomá ticas (cloriti‑
53°58'4,76"W). Parte sul do nú cleo de harz‑
to, turmalinito). O o iolito possui forma
burgito. Rocha grossa (1‑10 mm), fá cies an i‑
alongada a NE, com aproximadamente 20 km
bolito mé dio – olivina (serpentina) +
de comprimento e com 2 km de largura. A
enstatita + clinocloro + tremolita + cromita
oeste, faz limite com as rochas plutô nicas do
(sem diopsı́dio e sem picotita). Foram obser‑
Complexo Cambaı́ (infraestrutura) e, a leste,
vados, neste a loramento: (1) extensos cor‑
com as rochas metavulcanoclá sticas da For‑
pos de an ibolito, com composiçã o MORB
maçã o Campestre do Grupo Vacacaı́ (supe‑
(Arena et al., 2016); (2) cromitito maciço
restrutura).
(0,5 m); (3) lentes de hornblenda magnesia‑
Um corpo de turmalinito maciço, me‑ na fels (metassomá ticas) (10‑50 cm) no fá ci‑
tassomá tico e de origem oceâ nica, foi estuda‑ es an ibolito; e (4) albitito. Segundo Arena et
do na porçã o norte do o iolito (Hartmann et al. (2016), aná lises isotó picas de U‑Pb em
al., 2019). O zircã o do turmalinito tem idade zircã o de iniram idade magmá tica de 923
de 920,4 ±9,8 Ma, ɛHf =+12 e U/Yb < 0,1, tı́‑ ±3,1 Ma e idade metamó r ica de 786 ±13 Ma
pico de zircã o cristalizado em crosta oceâ ni‑ para esta formaçã o. Adicionalmente, foram
ca. A turmalina é do tipo dravita, sendo abertas diversas trincheiras no local, para
zonada (em Tur 1, Tur 2 e Tur 3). Tur 1 pos‑ exploraçã o de asbestos. A descriçã o do o io‑
sui δ11B = +1,8‰; Tur 2, δ11B = 0‰; e Tur 3, lito foi feita por Leite et al. (1998) e por
δ11B = ‑8,5‰. Valores positivos de δ11B para Hartmann & Chemale Jr. (2003). Ocorre, ain‑
Tur 1 e Tur 2 indicam formaçã o desse mine‑ da, plagiogranito oceâ nico (trondhjemito),
ral em crosta oceâ nica alterada, enquanto o com idade U‑Pb em zircã o de 740 Ma (Dias,
valor negativo de δ11B em Tur 3 indica altera‑ informaçã o verbal). No entorno do o iolito,
çã o, sob in luê ncia de luidos de origem con‑ ocorre metatonalito, pertencente ao Comple‑
tinental (Hartmann et al., 2019). xo Cambaı́.
Outra ocorrê ncia de turmalina, asso‑ Parada 2 (3055´56,37´´S, 5403
ciada a cloritito metassomá tico, foi identi i‑ ´33,84´´W). Estrada de chã o, no eclogito Trê s

Evolução de O iolitos do Escudo Sul‑riograndense – Roteiro de campo 103


Contribuições à Geologia do Rio Grande do Sul e de Santa Catarina

Vendas, a loramento localizado a 1 km da es‑ ta (Grupo Vacacaı́), composta por andesito


trada, na direçã o oeste. Neste espaço, a lo‑ (rocha meta‑vulcanoclá stica), com idade U‑
ram rochas pertencentes ao Gnaisse Imbicuı́, Pb em zircã o de 758 ±4 Ma e com composi‑
do Complexo Cambaı́. Sã o descritos an iboli‑ çã o de arco de ilhas (Arena et al., 2017). E a
to, granada e clinopiroxê nio (inclusive, onfa‑ rocha hospedeira do o iolito.
cita). Cá lculos de pseudoseçã o fornecem uma 13h ‑ Chegada ao O iolito Cambaizi‑
condiçã o de metamor ismo, com pico em 16 nho. Ocorre xisto magnesiano portador de
kbar e em 700 C. A idade U‑Pb em zircã o é rutilo, na BR‑290. Observaçã o do Granito
de 900 Ma (Pinto et al., 2020). Este gnaisse Sanga do Jobim e da Suı́te Lagoa da Meia‑
está relacionado à Orogê nese Passinho (920‑ Lua; també m a loramento contendo estauro‑
780 Ma), com o domı́nio de dioritos, hospe‑ lita xisto (idade de zircã o e pseudoseçã o),
deiros do o iolito Cerro Mantiqueiras. granada xisto, para‑an ibolito, todos em leito
de arroio, e serpentinito.
8. 2 Segundo dia Parada 5 (30°20'21,08"S,
54°3'9,09"W). Chegada à ponte da BR‑290
7h30min ‑ Saı́da de Bagé .
sobre o Arroio Cambaizinho, em que ocorre a
8h30min ‑ Chegada ao O iolito Ibaré exposiçã o de rochas do Complexo Cambaı́,
– serpentinito, albitito, rodingito, cloritito, Suı́te Vila Nova, com idade U‑Pb em zircã o de
turmalinito, andesito. 724,6 ±3,2 Ma (Cerva‑Alves et al., 2020), com
Parada 3 (30°46'36,50"S, injeçõ es do Granito Sanga do Jobim (698,9
54°15'10,97"W). Visita à Formaçã o Corticei‑ ±4,2 Ma e 673,9 ±6,8 Ma, segundo Cerva‑Al‑
ra – fá cies an ibolito inferior. Neste a lora‑ ves et al., 2020a). A suı́te DTTG, de 725 Ma, é
mento, sã o descritos: (1) metaserpentinito a mais volumosa do Complexo Cambaı́ e
(olivina + talco + cromita + tremolita, com constitui o arcabouço da infraestrutura do
textura caraguatá ); (2) albitito magmá tico, arco de ilhas. O Granito Sanga do Jobim é o
com idade U‑Pb em zircã o de 892,4 ±2,8 Ma mais jovem do Complexo Cambaı́.
(Arena et al., 2016); (3) cloritito metassomá ‑ Parada 6 (30°20'45,33"S,
tico, com idade U‑Pb em zircã o de 726 ±2 Ma 54°2'15,77"W). Exposiçã o de magnesiohorn‑
(Arena et al., 2017); e (4) turmalinito metas‑ blenda‑clinocloro xisto, portador de rutilo,
somá tico (em 30°46'12,49"S, datado pelo mé todo U‑Pb, por LA‑ICP‑MS, em
54°15'51,62"W), com idade U‑Pb em zircã o 787,6 ±2,6 Ma (Cerva‑Alves et al., 2020). No
de 726 ±2 Ma (Arena et al., 2017) e turmali‑ a loramento, há bandas dobradas de quartzo
na δ11B = +3,5 a +5,2‰ (de crosta oceâ nica) S1, sem raiz, contidas em S2 (xistosidade NW
(Arena et al., 2020). Pró ximo ao albitito (100 dominante), zonas de cisalhamento intensas
m), há ocorrê ncia de rodingitos, com dimen‑ e zonas de falhas e de empurrõ es rú pteis, em
sõ es entre 5 m e 20 m (no nú cleo), e de S4 (Saalmann et al., 2006, 2011).
blackwall (na borda), na porçã o central de
Parada 7 (30°19'56,99"S,
arbustos e de pequenas á rvores. Metamor is‑
54°1'25,73"W). Visita à zona de falha rú ptil,
mo de contato, causado pelo Granito Jaguari
com presença de serpentinito e de tremoliti‑
(584,7 ±1,9 Ma, segundo Arena et al., 2017)
to intensamente silici icado.
ocorre nas encaixantes (o iolito Ibaré e arco
Parada 8 (30°17'42,07"S,
de ilhas do Grupo Vacacaı́).
53°59'35,17"W). Visita à porçã o norte da
Parada 4 (30°47'22,26"S,
ponte sobre o Arroio Cambaı́. Em ambos os
54°15'31,74"W). Visita à Formaçã o Bela Vis‑
lados, há exposiçã o de rochas, em corte de

104 Edição da Sociedade Brasileira de Geologia – Núcleo RS/SC


Hartmann et al.

Figura 7 ‑ (a) Mapa composicional de Fe e de cristal de turmalina do turmalinito A, no o iolito Bossoroca (trê s
zonas tê m composiçõ es diferentes); (b) Composiçã o de zircã o de rochas metassomá ticas dos o iolitos,
indicando ambiente oceâ nico; (c) Cristal de zircã o do albitito no o iolito Cerro Mantiqueiras, com nú cleo
magmá tico e com borda metamó r ica; (d) Cristal de zircã o homogê neo de albitito no o iolito Ibaré (Arena et
al., 2016); (e) Grá ico composicional de an ibó lios do o iolito Bossoroca, da infraestrutura e da superestrutura
(Massuda et al., 2020); (f) (g) Diagramas composicionais de an ibolitos no o iolito Cerro Mantiqueiras e de
andesitos no o iolito Ibaré , indicando protó litos de basalto e de andesito, alé m de um ambiente geotectô nico
distinto para os dois o iolitos – MORB e arco de ilhas. Legenda: Ig = evento ı́gneo; M1 e M2 = eventos
metamó r icos 1 e 2; c = nú cleo; r = borda.

Evolução de O iolitos do Escudo Sul‑riograndense – Roteiro de campo 105


Contribuições à Geologia do Rio Grande do Sul e de Santa Catarina

estrada. Sã o veri icadas as relaçõ es tectô ni‑ guatá , no fá cies an ibolito inferior).
cas entre o xisto ultramá ico sobrejacente Parada 12 (30°19'28,49"S,
(de textura caraguatá ) e o Granito Sanga do 53°44'31,19"W). Visita ao meta‑andesito da
Jobim subjacente (datados, por U‑Pb em zir‑ Formaçã o Campestre, no Grupo Vacacaı́ (U‑
cã o, em 698,9 ±4,2 Ma e em 673,9 ±6. 8 Ma, Pb em zircã o de 833 Ma, segundo Hartmann
de acordo com Cerva‑Alves et al., 2020). As et al., 2020). Mineralogia, mapas composici‑
relaçõ es de campo indicam que o xisto ultra‑ onais e geoquı́mica de rocha sã o apresenta‑
má ico foi empurrado sobre o granito, tendo dos por Massuda et al. (2020),
sido estabelecida uma idade de empurrã o de correspondentes à superestrutura do arco
673 Ma, semelhante à idade da colisã o esta‑ de ilhas.
belecida para os granitos no Bató lito Pelo‑ 18h ‑ Chegada a Porto Alegre.
tas.
Parada 9 (30°18'44,07"S, AGRADECIMENTOS
54°1'20,15"W). Visita à regiã o da ponte so‑
bre a Sanga do Jobim. A 500 m da sanga, Agradecemos à FAPERGS, ao CNPq, à
aproximadamente, a partir da ponte, estã o CAPES e à FINEP, pelo apoio. A UFRGS foi um
expostos a loramentos de estaurolita xisto suporte essencial, assim como vá rias insti‑
(pseudoseçã o 5,4 kbar, 575 C), datados, por tuiçõ es, que deram apoios eventuais. Muitos
U‑Pb em zircã o detrı́tico, em 817‑702 Ma, alunos e colegas contribuı́ram de maneira
turmalina acessó ria (δ11B = +2), granada xis‑ signi icativa para o entendimento dos o ioli‑
to e para‑an ibolito (U‑Pb em zircã o de 758‑ tos. O roteiro foi escrito para uso de 30 geó ‑
650 Ma, por Cerva‑Alves et al. 2020, 2021). logos, vindos de outros estados, por
20h ‑ Pernoite em Sã o Gabriel. sugestã o de Elson Paiva de Oliveira; no en‑
tanto, a excursã o prevista para maio de 2020
8. 3 Terceiro dia foi cancelada, devido à pandemia de vı́rus.

7h30min ‑ Saı́da de Sã o Gabriel. REFERÊNCIAS


Parada 10 (30°20'51,94"S,
53°49'41,38"W). No leito da Sanga do Velo‑ Arena, K. R., Hartmann, L. A. & Lana, C. 2016.
cindo, nos fundos do CTG, com extensas ex‑ Evolution of Neoproterozoic ophiolites from
posiçõ es do Complexo Cambaı́, the southern Brasiliano Orogen revealed by
zircon U‑Pb‑Hf isotopes and geochemistry.
correspondentes à infraestrutura do arco de
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ilhas. Estã o presentes as estruturas descritas
por Saalmann et al. (2006). Arena, K. R., Hartmann, L. A. & Lana, C. 2017.
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53°45'2,98"W), Acesso ao O iolito Bossoroca southern Brasiliano Orogen delimited by U‑
Pb‑Hf isotopes of zircon from metasomati‑
(Formaçã o Arroio Lajeadinho, do Complexo
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Bossoroca). Sã o descritos, nas porçõ es norte
e central: (1) turmalinito maciço (U‑Pb em Arena K. R., Hartmann, L. A. & Lana, C. 2018.
zircã o de 920,4 ±9,8 Ma e δ11B em turmalina U‑Pb‑Hf isotopes and trace elements of me‑
= +1,8 (oceâ nica), por Hartmann et al., tasomatic zircon delimit the evolution of the
2019); (2) talco‑magnesita fels (pró ximo à Capané ophiolite in the southern Brasiliano
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classi icaçã o de listvenito); e (3) talco‑olivi‑
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na fels (metaserpentinito, com textura cara‑

106 Edição da Sociedade Brasileira de Geologia – Núcleo RS/SC


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Evolução de O iolitos do Escudo Sul‑riograndense – Roteiro de campo 109


Sistemas vulcânicos e
subvulcânicos félsicos,
associados ao Batólito Pelotas,
Cinturão Dom Feliciano, RS
Carlos Augusto Sommer1*, Ruy Paulo Philipp1, Evandro Fernandes de Lima1,
Roberto Jacques Noll Filho2, Diego Skieresz de Oliveira1

1
Instituto de Geociê ncias, Universidade Federal do Rio Grande do Sul
2
Ecoplan Engenharia Ltda

*autor correspondente: carlos.sommer@ufrgs.br

1 INTRODUÇÃO
As manifestaçõ es vulcâ nicas e subvulcâ nicas riolı́ticas, de idade Neoproterozoica, do Rio
Grande do Sul, sã o correlacionadas a um intenso magmatismo á cido, vinculado a diferentes as‑
sociaçõ es petrotectô nicas do Cinturã o Dom Feliciano. Os maiores volumes deste vulcanismo
ocorrem na Bacia do Camaquã e, subordinadamente, no Bató lito Pelotas (Fig. 1). A grande mai‑
oria das rochas magmá ticas foi formada durante a orogenia Brasiliana, em um ciclo, que envol‑
veu a subducçã o de crosta oceâ nica (900‑720 Ma) e, posteriormente, eventos colisionais entre
os arcos magmá ticos gerados e o embasamento continental antigo, durante dois perı́odos prin‑
cipais, entre 720‑700 Ma e 650‑620 Ma (Fernandes et al., 1992; Saalmann et al., 2011; Philipp et
al., 2016 e referê ncias). A gê nese do Bató lito Pelotas ocorreu durante o segundo perı́odo colisio‑
nal, com associaçõ es sin a tardi‑orogê nicas geradas, principalmente, apó s o pico do metamor is‑
mo colisional. O perı́odo pó s‑colisional é caracterizado por movimentos direcionais de blocos,
ao longo de grandes zonas de cisalhamento transcorrentes, associado à geraçã o de rifts, com de‑
posiçã o de sequê ncias vulcano‑sedimentares em bacias do tipo pull‑apart (strike‑slip), e a pro‑
cessos de delaminaçã o crustal, com intenso magmatismo plutô nico, de composiçõ es granı́tica e
diorı́tico‑gabroica.
No extremo sul do Cinturã o Dom Feliciano, o limite entre o Cryogeniano e o Ediacarano
foi marcado por um amplo magmatismo e pelos eventos de sedimentaçã o da Bacia do Camaquã .
O magmatismo deste perı́odo é representado pelas suı́tes granitoides do Bató lito Pelotas, pelas
sucessõ es vulcâ nicas da Bacia do Camaquã e por corpos granı́ticos intrusivos nas unidades Pa‑
leoproterozoicas dos terrenos Taquarembó e Tijucas e nas unidades Neoproterozoicas do Terre‑
Contribuições à Geologia do Rio Grande do Sul e de Santa Catarina

no Sã o Gabriel. As principais estruturas vulcâ nicas e subvulcâ nicas, de composiçã o


transcorrentes regionais, como as zonas de á cida do Bató lito Pelotas sã o geneticamente
cisalhamento Dorsal do Canguçu, Quité ria‑ relacionadas aos granitoides da Suı́te Dom
Serra do Erval, Erval, Vila Ayrosa Galvã o, Pe‑ Feliciano (550‑570 Ma) (Philipp et al., 2000;
dro Osó rio e Arroio Grande, entre outras, Zanon et al., 2006; Oliveira et al., 2015; Noll
possibilitaram a ascensã o e o posicionamen‑ Filho et al., 2019).
to de um importante volume de fusõ es man‑ Neste capı́tulo, sã o discutidos dados
té licas e crustais (e.g. Philipp & Machado, petrográ icos, geoquı́micos e geocronoló gi‑
2005; Philipp et al., 2016). A evoluçã o das cos dos sistemas vulcâ nicos e subvulcâ nicos
zonas de cisalhamento promoveu a descom‑ riolı́ticos, associados ao Bató lito Pelotas,
pressã o em nı́veis superiores do manto, rea‑ com o objetivo de apresentar uma sı́ntese
tivando, assim, as fontes anteriores de sobre a evoluçã o do vulcanismo pó s‑colisio‑
magmatismo cá lcio‑alcalino pré ‑colisional nal na porçã o oriental do Cinturã o Dom Fe‑
(Bitencourt & Nardi, 1993, 2000). liciano.
O contato entre os terrenos Taqua‑
rembó , Sã o Gabriel e Tijucas, na porçã o cen‑ 2 O BATÓLITO PELOTAS E OS SISTE‑
tral do Cinturã o Dom Feliciano, representa a MAS VULCÂNICOS E SUBVULCÂNICOS
principal zona de fraqueza, que originou as RIOLÍTICOS
quatro fases de rifts, que controlaram os de‑
pó sitos vulcano‑sedimentares da Bacia do O Bató lito Pelotas (Fig. 1) foi de ini‑
Camaquã (650‑540 Ma). O vulcanismo da do por Fragoso‑Cesar et al. (1986), para ca‑
Formaçã o Acampamento Velho e de outros racterizar uma faixa alongada, com direçã o
corpos intrusivos correlacionados apresenta NE‑SW, interpretado como um complexo
evoluçã o geoquı́mica similar à das rochas plutô nico polifá sico e multi‑intrusivo, resul‑
vulcâ nicas e subvulcâ nicas tardias do Bató li‑ tante de processos tectô nicos sin a tardi‑
to Pelotas. orogê nicos, relacionados à evoluçã o do Ci‑
A porçã o oriental do Cinturã o Dom clo Brasiliano (Soliani Jr., 1986; Philipp et
Feliciano, no extremo sul do Brasil, é repre‑ al., 2000, 2016). E composto por suı́tes gra‑
sentada pelo Bató lito de Pelotas (Fragoso‑ nı́ticas Neoproterozoicas, geradas durante e
Cesar et al., 1986; Philipp & Machado, 2005), apó s o clı́max da orogenia Dom Feliciano.
caracterizado por um volumoso magmatis‑ Uma grande variedade de xenó litos, de ro‑
mo sin a tardi‑orogê nico, que inclui suı́tes chas metamó r icas para e ortoderivados, de
granı́ticas cá lcico‑alcalinas alto‑K, meta‑alu‑ alto e de baixo grau, é encontrada em todas
minosas e peraluminosas, granitoides, com as suı́tes granı́ticas (Philipp et al., 2000). As
a inidade shoshonı́tica, e, de modo subordi‑ suı́tes granı́ticas tê m disposiçã o alongada e
nado, granitos alcalinos metaluminosos pó s‑ concordante com a estrutura do cinturã o, e
colisionais. As suı́tes granitoides estã o asso‑ sua geraçã o e seu posicionamento foram
ciadas a magmas bá sicos, representados por controlados por zonas de cisalhamento
gabros e dioritos, por enclaves má icos mi‑ transcorrentes, de alto â ngulo. O contato
crogranulares, por enxames de diques bá si‑ oeste do bató lito é de inido pela Zona de Ci‑
cos e por corpos granı́ticos hı́bridos, todos salhamento Dorsal de Canguçu, caracteriza‑
com assinaturas de magmas toleı́ticos conti‑ da por uma espessa faixa de milonitos, com
nentais (Bitencourt & Nardi, 1993; Philipp et cinemá tica sinistral e direçã o N40‑50oE. A
al., 2000). Estudos desenvolvidos ao longo estratigra ia interna do bató lito foi de inida,
das ú ltimas dé cadas sugerem que as rochas a partir de dados petroló gicos e geocrono‑

112 Edição da Sociedade Brasileira de Geologia – Núcleo RS/SC


Sommer et al.

ló gicos, sendo caracterizadas as seguintes 2019) rati icam, atravé s de dados geoquı́mi‑
unidades granı́ticas: Granito Quité ria (~650 cos e geocronoló gicos, a correlaçã o gené tica
Ma); Suı́te Cordilheira (~640‑620 Ma); Com‑ entre as rochas vulcâ nicas e subvulcâ nicas
plexo Pinheiro Machado e suı́tes Erval e Via‑ á cidas e os granitoides mais diferenciados
mã o (~625‑615 Ma); Suı́te Piquiri da Suı́te Dom Feliciano (550‑570 Ma). Se‑
(~615‑610 Ma); Suı́te Encruzilhada do Sul gundo Sommer et al. (2012), os sistemas
(~600 Ma); Suı́te Dom Feliciano (600‑550 vulcâ nicos e subvulcâ nicos do Bató lito Pelo‑
Ma); e manifestaçõ es subvulcâ nicas sin‑ tas se encontram paralelos à s principais zo‑
plutô nicas (Riolitos Asperezas). nas de cisalhamento, de direçã o NE‑SW, e
A Suı́te Dom Feliciano (SDF) é cons‑ estã o associados, espacialmente, a trê s do‑
tituı́da pelas rochas granı́ticas mais jovens mı́nios principais: nordeste, central e sudo‑
do Bató lito Pelotas, caracterizadas por gran‑ este (Fig. 1). No domı́nio nordeste, o sistema
des homogeneidades composicional, estru‑ principal é o Riolito Ana Dias (RAD) (UFRGS,
tural e petrográ ica. Sã o intrusivas nas 1978), que ocorre na regiã o de Quité ria, co‑
demais suı́tes do bató lito, apresentando re‑ mo um corpo intrusivo raso, de dimensõ es
laçã o tardia com a movimentaçã o dú ctil das quilomé tricas, com diques associados, con‑
zonas de cisalhamento. O Granito Dom Feli‑ cordante com a Zona de Cisalhamento Qui‑
ciano é o principal corpo da suı́te, com forma té ria‑Serra do Herval, de direçã o N60oE. O
alongada, segundo N50oE, com cerca de 180 domı́nio central é caracterizado por um en‑
km de comprimento e com 15 km a 45 km xame de diques á cidos mé tricos a decamé ‑
de largura (Philipp et al., 2000). As seme‑ tricos, com orientaçõ es dominantes
lhanças composicional, geoquı́mica e geo‑ N10‑30oW e N‑S, que ocorrem na regiã o dos
cronoló gica entre as rochas granı́ticas da municı́pios de Pinheiro Machado (Riolito
SDF e as rochas riolı́ticas subvulcâ nicas pre‑ Asperezas) e de Piratini (Fragoso‑Cesar et
sentes em diversas regiõ es do bató lito suge‑ al., 1986; Almeida et al., 1990; Philipp et al.,
re o vı́nculo gené tico entre estas unidades. 2000; Zanon et al., 2006). Em Piratini, os di‑
Na regiã o de Piratini, os enxames de diques ques aproveitam as fraturas de extensã o, as‑
fé lsicos estã o intimamente associados a di‑ sociadas ao Granito Bela Vista, cujo
ques má icos, constituindo diques compos‑ posicionamento foi controlado por uma zo‑
tos (Zanon et al., 2006). na de cisalhamento rú ptil, de direçã o N45oE
Dados Rb‑Sr mostram idades de re‑ (Philipp et al., 1991; Zanon et al., 2006). No
ferê ncia de 572 ±10 Ma (Cordani et al., domı́nio sudoeste, na regiã o de Herval,
1974) e de 550 Ma (Teixeira, 1982) e idades ocorrem os ú nicos registros de manifesta‑
isocrô nicas de 547 ±17 Ma (granitos e peg‑ çõ es vulcâ nicas strictu sensu do Bató lito Pe‑
matitos da cidade de Cristal), de 544 ±5 Ma lotas, representados pelos depó sitos
(Granito Arroio dos Ladrõ es), de 550 ±6 Ma efusivos e piroclá sticos de Cerro Chato e de
(granitos equigranulares de Cristal e de Dom Cerro Partido.
Feliciano) e de 560 ±12 Ma (riolitos da Serra
das Asperezas) (Soliani Jr., 1986). A idade 2. 1 Sistema subvulcânico do domínio
obtida pelo mé todo U‑Pb TIMS em zircã o pa‑ nordeste: Riolito Ana Dias e diques re‑
ra o Granito Ponta Grossa indicou 600 Ma lacionados
(Philipp et al., 2007), mesma idade obtida
por U‑Pb (SHRIMP) para o Granito Santana. O Riolito Ana Dias constitui uma fei‑
çã o geomorfoló gica de destaque na regiã o
Trabalhos recentes (Sommer et al.,
de Quité ria, localizada cerca de 40 km ao sul
2012; Oliveira et al., 2015; Noll Filho et al.,
Sistemas vulcânicos e subvulcânicos félsicos, associados ao Batólito Pelotas, Cinturão Dom Feliciano, RS 113
Contribuições à Geologia do Rio Grande do Sul e de Santa Catarina

Figura 1 ‒ Localizaçã o e contexto geoló gico das á reas estudadas (modi icado de Philipp et al., 2007).

114 Edição da Sociedade Brasileira de Geologia – Núcleo RS/SC


Sommer et al.

do municı́pio de Butiá , marcando o ponto 2. 2 Sistema subvulcânico do domínio


mais elevado do Bató lito Pelotas (602 m) central: Enxame de Diques Piratini e As‑
(Fig. 2). O corpo subvulcâ nico tem forma perezas
alongada na direçã o NE‑SW, com dimensõ es
de 18 km x 4,5 km e é intrusivo em gnaisses O domı́nio central é caracterizado
do Complexo Arroio dos Ratos e nos granitos por um enxame de diques á cidos, que se es‑
Quité ria, Passo da Divisa e Serra do Erval tendem, desde a regiã o de Pinheiro Machado
(UFRGS, 2006, 2007). Os riolitos ocorrem, e de Pedras Altas (Riolitos Asperezas), até os
ainda, como diques mé tricos tardios, intru‑ municı́pios de Piratini e a regiã o do arroio
dindo o corpo principal e as rochas encai‑ Solidã o (Enxame de Diques Piratini) (Almei‑
xantes, tanto na regiã o do Cerro Ana Dias da et al., 1990; Fragoso‑Cesar, 1991; Philipp
como na regiã o de Porto Alegre. et al., 2000; Zanon et al., 2006) (Fig. 1 e 3). Os
diques sã o intrusivos em corpos das suı́tes
Os riolitos do corpo principal apre‑
Pinheiro Machado e Viamã o, mas ocorrem,
sentam textura por irı́tica a seriada e varia‑
preferencialmente, no entorno de granitos da
çã o gradacional para rochas equigranulares
Suı́te Dom Feliciano (SDF).
inas. Os fenocristais de quartzo facetado, de
K‑feldspato e, mais raramente, de plagioclá ‑ Os diques á cidos ocorrem, associa‑
sio e/ou hornblenda sã o subé dricos a eué ‑ dos a diques bá sicos, como centenas de cor‑
dricos e perfazem cerca de 20% a 40% do pos tabulares e subparalelos, de espessuras
volume da rocha. A matriz é inequigranular variá veis entre 5 e 50 metros e de extensõ es
hipidiomó r ica ina (<1 mm), tendendo a he‑ quilomé tricas, posicionados nas direçõ es NE‑
terogranular, e consiste de quartzo, de K‑ SW a NW‑SE (Fragoso‑Cesar et al., 1986; Phi‑
feldspato e de plagioclá sio. Faixas cataclá sti‑ lipp et al., 1991; Zanon et al., 2006). Os di‑
cas sã o observadas, de modo restrito, ques de direçã o NW‑SE sã o indeformados ou
ocasionando a cominuiçã o dos fenocristais, com catá clase incipiente, enquanto os de di‑
formando uma matriz ina de quartzo e de reçã o NE‑SW podem apresentar foliaçã o mi‑
mica branca. Variaçõ es texturais incipientes lonı́tica bem desenvolvida. Foram observadas
ocorrem em certas partes do corpo principal, intrusõ es leucogranı́ticas em alguns diques, o
caracterizadas pela diminuiçã o no grau de que sugeriu uma origem sin‑plutô nica para
cristalinidade da matriz e na porcentagem os Riolitos Asperezas (Fragoso‑Cesar et al.,
de fenocristais (<15%). Os diques de riolitos, 1986) (Fig. 3).
tanto na regiã o do Cerro Ana Dias como na Os diques á cidos apresentam peque‑
regiã o de Porto Alegre, apresentam textura nas variaçõ es texturais, principalmente, no
por irı́tica, com fenocristais eué dricos (ca. conteú do de fenocristais e no grau de crista‑
40‑50%) de K‑feldspato, de quartzo e, raro, linidade da matriz (Fig. 3). Sã o por irı́ticos a
de plagioclá sio. A matriz de composiçã o glomeropor irı́ticos, com 30‑40% de feno‑
quartzo‑feldspá tica é microcristalina a afanı́‑ cristais eué dricos de quartzo, de K‑feldspato
tica, com aspecto vı́treo (Fig. 2). As estrutu‑ e de plagioclá sio, em uma matriz constituı́da
ras de luxo magmá tico sã o raras e por intercrescimento quartzo‑feldspá tico
observadas nas bordas de alguns diques. granofı́rico. Riolitos afı́ricos ou fracamente
Medidas das razõ es de U‑Pb obtidas por irı́ticos ocorrem, de maneira subordina‑
em cristais de zircã o de riolitos indicam uma da (fenocristais < 5%). Apresentam textura
idade de cristalizaçã o de 581,9 ±1,9 Ma (Oli‑ granofı́rica, com intercrescimento entre
veira et al., 2015). quartzo e K‑feldspato e com abundâ ncia de

Sistemas vulcânicos e subvulcânicos félsicos, associados ao Batólito Pelotas, Cinturão Dom Feliciano, RS 115
Contribuições à Geologia do Rio Grande do Sul e de Santa Catarina

Figura 2 – (a) Feiçã o geomorfoló gica, relacionada ao Cerro Ana Dias (Az 140º); (b) mapa geoló gico da regiã o
do Riolito Ana Dias (modi icado de UFRGS, 2006, 2007 e de Oliveira et al., 2011); feiçõ es macroscó picas
caracterı́sticas do Riolito Ana Dias: (c) fá cies por irı́tica e diques; (d) fá cies equigranular ina a mé dia, de
aparê ncia plutô nica, predominante no corpo principal.

116 Edição da Sociedade Brasileira de Geologia – Núcleo RS/SC


Sommer et al.

esferulitos do tipo radial, com intercresci‑ lLT ocorre na porçã o basal da sequê ncia e é
mentos ibro‑radiados de quartzo e de felds‑ caracterizada por depó sitos tabulares, de es‑
pato, observados tanto ao redor de pessura mé trica, com termos mal seleciona‑
fenocristais de quartzo quanto na matriz, in‑ dos e de grau de soldagem moderado a alto,
dicativos de processos de devitri icaçã o de al‑ e com estrutura eutaxı́tica incipiente. Predo‑
ta temperatura (Fig. 3). minam os fragmentos lı́ticos de tamanho lá ‑
Dados de Rb/Sr obtidos por Soliani Jr. pili, envoltos por uma matriz tufá cea (Fig. 4).
(1986) indicam idades de 560 ±12 Ma para os Os fragmentos principais sã o de riolitos e de
diques á cidos, enquanto uma idade U‑Pb em ignimbritos e, subordinadamente, acidentais
zircã o de 550 ±27 Ma foi obtida por Philipp et de rochas encaixantes. Os piroclastos juvenis
al. (2016). Estas idades sugerem o vı́nculo sã o de fragmentos vı́treos e de cristais (20‑
deste sistema riolı́tico aos eventos magmá ti‑ 25%). Fiamme sã o comuns e quartzo, K‑
cos inais do Bató lito Pelotas. feldspato e plagioclá sio sã o os minerais pre‑
dominantes. A matriz tufá cea é extremamen‑
2. 3 Sistemas vulcânico e subvulcânico te ina e, originalmente, vı́trea. E constituı́da
do domínio sudoeste: Cerro Chato e Cer‑ por shards e por intercrescimentos quartzo‑
ro Partido feldspá ticos, como produtos de desvitri ica‑
çã o (Fig. 4). A fá cies ecLT é constituı́da por
A regiã o do Cerro Chato é constituı́da depó sitos com geometria tabular e com es‑
por duas feiçõ es geomorfoló gicas de desta‑ pessuras mé tricas. Sã o mal selecionados e
que, resultantes da açã o de falhas, de direçõ es tê m alto grau de soldagem, com abundâ ncia
NW‑SE e NE‑SW: os cerros Chato e Partido de piroclastos, de tamanho lá pili, em matriz
(Fig. 1 e Fig. 4). O embasamento desta tufá cea muito ina e de aspecto vı́treo. Feno‑
sequê ncia vulcâ nica é constituı́do por grani‑ cristais e fragmentos de cristais de K‑felds‑
toides das suı́tes Pinheiro Machado e Dom pato e de quartzo predominam e raros
Feliciano. Dados isotó picos U‑Pb obtidos em litoclastos conatos (1‑2 cm), de rochas riolı́‑
cristais de zircã o das duas unidades á cidas ticas, sã o observados. Fiamme sã o abundan‑
indicam idades de 630. 4 ±2,8 Ma para os tes e ocorrem em proporçõ es similares à dos
derrames riolı́ticos e de 561 ±2 Ma para os ri‑ cristais. A matriz é constituı́da por shards e
olı́tos hipabissais do Cerro Partido (Noll Filho por esferulitos, indicando processos de des‑
et al., 2019). vitri icaçã o de alta temperatura. O grau de
achatamento dos fragmentos de pú mices va‑
2. 3. 1 Sistema vulcânico do Cerro Chato ria, de moderado a muito forte, evidenciado
por uma forte estrutura eutaxı́tica. Em algu‑
O Cerro Chato apresenta formas dô ‑ mas porçõ es, observa‑se a presença da es‑
micas e é caracterizado por depó sitos piro‑ trutura parataxı́tica, com vá rios padrõ es de
clá sticos na porçã o basal, sucedidos por foliaçã o, sugerindo processos reomó r icos.
derrames, ambos de composiçã o riolı́tica Os derrames riolı́ticos ocorrem, cor‑
(Fig. 4). Os depó sitos piroclá sticos sã o classi‑ tando e sobrepondo os depó sitos piroclá sti‑
icados como ignimbritos, com alto grau de cos. Sã o rochas hemicristalinas, com forte
soldagem, e mostram variaçõ es incipientes e estrutura de luxo ( hR) sub‑horizontal e, su‑
gradacionais, agrupadas em duas fá cies prin‑ bordinadamente, subvertical, com diversos
cipais: lá pili‑tufo rico em lı́ticos (lLT) e lá pili‑ padrõ es de dobras. Em algumas porçõ es, ob‑
tufo rico em cristais e com forte estrutura eu‑ servam‑se a ruptura da foliaçã o e a brecha‑
taxı́tca (ecLT) (Noll Filho et al., 2019). A fá cies çã o da rocha. A fá cies riolito autobrechado
Sistemas vulcânicos e subvulcânicos félsicos, associados ao Batólito Pelotas, Cinturão Dom Feliciano, RS 117
Contribuições à Geologia do Rio Grande do Sul e de Santa Catarina

Figura 3 – (a) Mapa geoló gico da regiã o de Pinheiro‑Machado/Piratini, com representaçã o do Enxame de
Diques Asperezas; (b) imagem do sensor ASTER, com a morfologia dos diques na regiã o de Pinheiro Machado;
(c‑d) aspectos geomorfoló gicos e de campo dos diques riolı́ticos; (e‑f) exemplos de feiçõ es macro e
microscó picas de riolitos.

(bR) é monomı́tica e caracterizada pelo pa‑ foliado (Fig. 4). No geral, o riolito é por irı́ti‑
drã o textural jigsaw it, com fragmentos cen‑ co, com fenocristais (5‑10%) eué dricos de
timé tricos e angulares do pró prio riolito quartzo, de K‑feldspato e de plagioclá sio, en‑

118 Edição da Sociedade Brasileira de Geologia – Núcleo RS/SC


Sommer et al.

voltos por matriz afanı́tica, de aspecto vı́treo. mo é indicada pelas relaçõ es entre os ele‑
Em algumas porçõ es, a rocha se mostra ho‑ mentos‑traço e os maiores (Fig. 5a, Fig. 5d e
lohialina, com notá vel textura esferulı́tica Fig. 5h), por razõ es K2O/Na2O acima de 1,0 e
(Fig. 4). Processos de desvitri icaçã o de alta pelos altos teores de HFSE. E importante
temperatura em diferentes está gios sã o co‑ destacar que alguns diques, relacionados aos
muns no material originalmente vı́treo da Riolitos Asperezas, assim como certas ro‑
matriz, com presença de esferulitos e de in‑ chas, vinculadas ao Enxame de Diques Pirati‑
tercrescimento granofı́rico. ni, ao redor do Granito Bela Vista,
apresentam uma maior alcalinidade, eviden‑
2. 3. 2 Sistema subvulcânico do Cerro ciada pelo trend tipicamente alcalino e só di‑
Partido co (Fig. 5b). As rochas riolı́ticas das demais
unidades apresentam elevados valores da ra‑
O Cerro Partido é caracterizado por zã o K2O/Na2O (1,5 a 2,5), similares aos da
um corpo subvulcâ nico riolı́tico, alongado na sé rie shoshonı́tica, entretanto, com valores
direçã o NE‑SW, com 8 km de comprimento e mais baixos de Sr (< 200 ppm) (Fig. 5c). Ou‑
com 0,7 km de largura (Fig. 4). E intrusivo tras caracterı́sticas relevantes sã o os eleva‑
nos depó sitos piroclá sticos da sequê ncia dos valores de á lcalis (8‑9,2% wt), das
Cerro Chato, em granitoides das suı́tes Pi‑ razõ es FeOt/(FeOt+MgO) (0,88‑1,0) e do ı́n‑
nheiro Machado e Dom Feliciano e em ro‑ dice agpaı́tico (Na2O+K2O)/Al2O3 molar >
chas da Sequê ncia Sedimentar Cerro Chato 0,6) e os baixos conteú dos de Al2O3, de CaO e
(Noll Filho et al., 2019). de MgO. Os valores de Zr, de Rb, de Y, de Nb e
Os riolitos subvulcâ nicos tê m textu‑ de Ga sã o moderados, em comparaçã o com
ra equigranular ina a glomeropor irı́tica, os conteú dos relativamente baixos de Ba e
com fenocristais (45%) de quartzo, de K‑ de Sr. Estas caracterı́sticas sã o comuns em
feldspato e de plagioclá sio, subé dricos a eué ‑ magmas á cidos metaluminosos, de a inidade
dricos, envoltos por uma matriz equigranu‑ alcalina, semelhantes ao observado em gra‑
lar ina, composta pelas mesmas fases nitos pó s‑colisionais do tipo‑A (Nardi & Bi‑
minerais. Intercrescimento granofı́rico entre tencourt, 2009).
quartzo e feldspato ocorre, comumente, na O comportamento de alguns elemen‑
matriz, como produto avançado do está gio tos‑traço, quando normalizados, segundo va‑
de desvitri icaçã o em alta temperatura. lores de ORG (Fig. 5), mostra um
enriquecimento em elementos mais incom‑
3 CARACTERIZAÇÃO DO MAGMATISMO patı́veis. Esta caracterı́stica, juntamente com
ÁCIDO o enriquecimento em elementos‑traço in‑
compatı́veis e em ETR, as anomalias negati‑
Em termos geoquı́micos, predomi‑ vas de Ba e as positivas de Ce e o
nam riolitos, com elevados valores de SiO2 (> enriquecimento de K2O e de Rb, em relaçã o
70%), semelhantes aos dos sistemas riolı́ti‑ ao Nb, sã o caracterı́sticos de magmas deriva‑
cos alta‑sı́lica. Rochas traquidacı́ticas ocor‑ dos de fontes manté licas, enriquecidas em
rem, de maneira subordinada, e sã o elementos incompatı́veis e com participaçã o
vinculadas ao Enxame de Diques Asperezas crustal. Este comportamento é semelhante
(Fig. 5). As rochas á cidas formam uma ten‑ entre as rochas do Cerro Chato e as do Cerro
dê ncia pró xima ao limite entre as sé ries al‑ Ana Dias. O maior enriquecimento em HFSE,
calinas e as subalcalinas saturadas de sı́lica observado em alguns diques, vinculados ao
(Fig. 5a). A natureza alcalina do magmatis‑ Riolitos Asperezas, e nos Diques Piratini, é

Sistemas vulcânicos e subvulcânicos félsicos, associados ao Batólito Pelotas, Cinturão Dom Feliciano, RS 119
Contribuições à Geologia do Rio Grande do Sul e de Santa Catarina

Figura 4 – (a) Feiçã o geomorfoló gica, relacionada ao Cerro Partido (Az 180º); (b) feiçã o geomorfoló gica,
relacionada ao Cerro Chato; (c) mapa geoló gico da regiã o do Cerro Chato‑Cerro Partido (modi icado de Noll
Filho et al., 2019); (d) seçã o geoló gica esquemá tica, com a distribuiçã o facioló gica dos depó sitos vulcâ nicos
(Noll Filho et al., 2019); (e) feiçã o geomorfoló gica caracterı́stica dos derrames riolı́ticos, associados ao Cerro
Chato; (f) feiçã o macroscó pica dos ignimbritos rico em lı́ticos; (g) feiçã o macroscó pica dos ignimbritos rico em
iamme, com estrutura eutaxı́tica; feiçõ es macroscó picas caracterı́sticas de derrames riolı́ticos: (g) textura
esferulı́tica; (h) estrutura de luxo de lava.

caracterı́stico de lı́quidos alcalinos só dicos. O tes elementos e um aumento considerá vel
padrã o de ETR normalizado ao condrito (Na‑ de fracionamento em ETR, com o aumento
kamura, 1974) mostra valores elevados des‑ da diferenciaçã o. O forte enriquecimento de
120 Edição da Sociedade Brasileira de Geologia – Núcleo RS/SC
Sommer et al.

ETRL, em relaçã o aos pesados, e as fortes Machado e Piratini, os diques sã o afetados
anomalias negativas de Eu sã o feiçõ es carac‑ por zonas de cisalhamento dú ctil‑rú pteis,
terı́sticas de magmas á cidos alcalinos e me‑ que ocasionam a formaçã o de dobras de ar‑
taluminosos (Nardi & Bonin, 1991). rasto e de feiçõ es de milonitizaçã o, como ob‑
servado no Enxame de Diques Asperezas.
Em diagramas discriminantes de
ambientes tectô nicos, as rochas do Riolito Nã o há registros, no Bató lito Pelotas,
Ana Dias ocupam o campo de ambientes pó s‑ de sequê ncias sedimentares contemporâ ne‑
colisionais, enquanto as rochas do Cerro as ou que tenham atuado como embasamen‑
Chato e dos Riolitos Asperezas tendem a am‑ to para os corpos riolı́ticos subvulcâ nicos.
bientes intraplaca (Fig. 5g). Com base em di‑ Deste modo, há uma forte relaçã o entre estas
agramas de classi icaçã o de granitoides intrusõ es rasas e a estruturaçã o presente nas
(Whalen et al., 1987), as amostras ocupam o demais unidades do bató lito, cuja desconti‑
campo de granitos do tipo “A” (Fig. 5). Esta nuidade pode ter servido como conduto para
interpretaçã o é corroborada pelos valores da estes magmas fé lsicos tardios. Embora ocor‑
razã o 104*Ga/Al > 2,6, Ce+Y+Nb+Zr > 400 ram algumas zonas de cisalhamento, afetan‑
ppm e FeOt/FeOt+MgO > 0,9, como sugerido do alguns corpos riolı́ticos, o predomı́nio é a
por Nardi & Bitencourt (2009), como valores atuaçã o de forte tectô nica rú ptil sobre estas
caracterı́sticos para o magmatismo granı́tico intrusõ es. As eventuais atividades vulcano‑
do tipo “A” no sul do Brasil. sedimentares podem nã o ter sido preserva‑
das, o que pode ser justi icado pelo nı́vel
crustal a lorante. Na regiã o do Cerro Chato,
4 DISCUSSÕES
há relaçã o entre os processos vulcâ nicos e os
4. 1 Considerações petrológicas super iciais, com a preservaçã o parcial das
condiçõ es subá reas, durante as atividades
Os sistemas vulcâ nicos e subvulcâ ni‑ efusivas e piroclá sticas e a posterior erosã o e
cos riolı́ticos do Bató lito Pelotas estã o asso‑ o retrabalhamento, cujo ló cus propı́cio para
ciados aos granitos da Suı́te Dom Feliciano. A deposiçã o gerou depó sitos sedimentares
maioria dos riolitos ocorre como rochas sub‑ imaturos e com grande contribuiçã o vulcâ ni‑
vulcâ nicas, nas formas de stocks e de enxa‑ ca. Este é o ú nico registro, no bató lito, de ro‑
mes de diques, com direçã o preferencial chas sedimentares pré ‑existentes, que
NE‑SW, concordantes com as principais es‑ serviram de embasamento para os processos
truturas do bató lito. As principais variaçõ es vulcâ nicos, sendo, inclusive, afetadas tectô ni‑
facioló gicas estã o associadas a regiõ es com ca e termicamente pelos corpos hipabissais
atividades explosivas e efusivas. Nos termos riolı́ticos.
hipabissais, há a predominâ ncia de rochas Sistemas vulcâ nicos e subvulcâ nicos
com alto grau de cristalinidade, por irı́ticas a riolı́ticos, de alta sı́lica e extremamente vis‑
equigranulares, principalmente, nos corpos cosos, como os observados no Bató lito Pelo‑
com dimensõ es maiores. A ú nica ocorrê ncia tas, estã o associados, normalmente, a
de rochas vulcâ nicas strictu sensu está restri‑ reservató rios magmá ticos super iciais. E co‑
ta à regiã o do Cerro Chato, no extremo sul do mum, portanto, uma grande quantidade de
bató lito, em que ocorrem manifestaçõ es ex‑ corpos hipabissais, associados a regimes vul‑
plosivas e efusivas. Os corpos riolı́ticos sã o câ nicos efusivos, originados a partir da cris‑
rasos ou extrusivos e estã o afetados por uma talizaçã o de magmas com alta viscosidade.
tectô nica rú ptil, durante a evoluçã o inal do Magmas com altas taxas de cristalizaçã o e
bató lito. No entanto, nas regiõ es Pinheiro com baixa mobilidade aproveitam as descon‑
Sistemas vulcânicos e subvulcânicos félsicos, associados ao Batólito Pelotas, Cinturão Dom Feliciano, RS 121
Contribuições à Geologia do Rio Grande do Sul e de Santa Catarina

tinuidades, ao longo da crosta superior, como pode ter um vı́nculo com o colapso contı́nuo
condutos para as erupçõ es vulcâ nicas em su‑ de baixas colunas de erupçã o, relacionas ao
perfı́cie. Dependendo do nı́vel de erosã o e do sistema issural da regiã o (Noll Filho et al.,
nı́vel crustal a lorante, pode‑se observar cor‑ 2019). Com a desvolatizaçã o do sistema, há
pos intrusivos rasos e enxames de diques, in‑ uma migraçã o do sistema explosivo para o
trudindo o embasamento ou as unidades efusivo e a atividade passa a ser caracteriza‑
plutô nicas cogené ticas. Este processo parece da pela extrusã o de derrames riolı́ticos, pra‑
ser predominante no Bató lito Pelotas, dada a ticamente afı́ricos, nos quais o luxo laminar
caracterı́stica dos corpos subvulcâ nicos mai‑ gera uma foliaçã o de luxo bem de inida, co‑
ores e altamente cristalizados, como o do Ri‑ mumente dobrada pela di iculdade da lava
olito Ana Dias, e pela grande quantidade de em luir, em decorrê ncia da alta viscosidade
diques observados, principalmente, na por‑ do sistema. Esta caracterı́stica induz à for‑
çã o centro‑sul do bató lito (e.g. Enxame de Di‑ maçã o de morfologias dô micas, caracterı́sti‑
ques Asperezas). Contexto semelhante, mas cas de vulcanismo fé lsico. Texturas
em nı́vel muito mais raso, observa‑se na re‑ vulcanoclá sticas sã o comuns, devido à auto‑
giã o do Cerro Chato, em que o corpo subvul‑ brechaçã o das lavas altamente viscosas, du‑
câ nico Cerro Partido intrude, tanto a rante sua movimentaçã o.
sequê ncia vulcâ nica da regiã o como os grani‑ Em termos gerais, a geoquı́mica dos
toides epizonais da Suı́te Dom Feliciano. A di‑ riolitos, associados ao Bató lito Pelotas,
reçã o NE‑SW deste corpo coincide com a apresenta padrõ es similares entre si e aos
orientaçã o dos domos e dos coulées, relacio‑ dos granitoides da Suı́te Dom Feliciano. Os
nados aos derrames riolı́ticos, sugerindo ori‑ riolitos dos Diques Asperezas, da regiã o de
gens efusiva e issural, com reativaçã o da Piratini, mostram grande similaridade com‑
Zona de Cisalhamento Pedro Osó rio, principal posicional, caracterizada por um grau de al‑
descontinuidade regional. calinidade mais elevado, tendendo a
As erupçõ es geradas, a partir de câ ‑ magmas peralcalinos (Philipp et al., 1991).
maras magmá ticas rasas de alta‑sı́lica, ten‑ Sã o rochas na transiçã o entre sistema alcali‑
dem a ter cará ter explosivo. Nestes casos, a nos e subalcalinos, predominantemente, só ‑
sobrepressã o do sistema provoca um aumen‑ dicos e metaluminosos. O comportamento
to na concentraçã o de volá teis, que, ao exce‑ dos elementos‑traço corrobora estas obser‑
der a pressã o litostá tica, geram intenso vaçõ es, com a semelhança entre as rochas
fraturamento, seguido de descompressã o sú ‑ da regiã o do Cerro Chato e as do Riolito Ana
bita, ocasionando a fragmentaçã o e um regi‑ Dias, e uma tendê ncia mais alcalina das dos
me explosivo. A regiã o do Cerro Chato é a Diques Asperezas, dada pelo maior enrique‑
ú nica, no Bató ltio Pelotas, que preserva uni‑ cimento em HFSE.
dades geneticamente relacionadas com este Todas as rochas riolı́ticas estudadas
tipo de atividade vulcâ nica. A base da apresentam caracterı́sticas geoquı́micas
sequê ncia é caracterizada por ignimbritos, compatı́veis com as dos magmas granı́ticos
vinculados à s correntes de densidade piro‑ do tipo‑A e, juntamente com as relaçõ es de
clá sticas (CDPs), indicando a ocorrê ncia de campo, sã o sugestivas de magmas, associa‑
diferentes luxos ou de variaçõ es internas dos a ambientes pó s‑colisionais, como cons‑
provocadas na CDP, comuns em processos do tatado por Philipp et al. (2002), por Philipp
tipo agradaçã o progressiva. O alto grau de & Machado (2005) e por Nardi & Bitten‑
soldagem e os processos de reomor ismo dos court (2009), para o magmatismo granı́tico
depó sitos indicam que a geraçã o das CDPs do tipo “A” no sul do Brasil. Segundo estes
122 Edição da Sociedade Brasileira de Geologia – Núcleo RS/SC
Sommer et al.

Figura 5 – Diagramas, com as principais caracterı́sticas do magmatismo, relacionadas aos sistemas vulcâ nicos e
subvulcâ nicos do Bató lito Pelotas (modi icado de Noll Filho et al., 2019): (a) diagrama TAS (modi icado de Le
Bas et al., 1986); (b) diagrama SiO2 vs. Zr/TiO2 (modi icado de Winchester & Floyd, 1977); (c) diagrama de
variaçã o entre TiO2 e K2O/Na2O; (d) esquema de classi icaçã o proposta por Sylvester (1989), evidenciando a
natureza alcalina das rochas estudadas; (e) diagrama multielementar normalizado pelo ORG (Pearce et al.,
1984); (f) diagrama, com o padrã o de distribuiçã o dos elementos terra rara normalizados pelo condrito
(Nakamura, 1974); (g) diagrama discriminante de ambientes tectô nicos (modi icado de Pearce et al., 1984); (h)
diagrama de classi icaçã o de granitoides e de discriminante de ambientes tectô nicos (modi icado de Whalen et
al., 1987).
Sistemas vulcânicos e subvulcânicos félsicos, associados ao Batólito Pelotas, Cinturão Dom Feliciano, RS 123
Contribuições à Geologia do Rio Grande do Sul e de Santa Catarina

autores, a origem e a evoluçã o deste mag‑ cas e Sã o Gabriel. Estes sistemas mostram
matismo estã o relacionadas a processos de idades de ativaçã o distintas e estã o consti‑
diferenciaçã o magmá tica, de magmas man‑ tuı́dos por quatro sucessõ es, caracterizadas
té licos bá sicos ou intermediá rios, associa‑ pelos grupos Maricá , Bom Jardim (600‑590
dos à contaminaçã o crustal. Estes processos Ma), Santa Bá rbara (580‑550 Ma) e Guaritas
marcam a evoluçã o inal do Cinturã o Dom (550‑540 Ma). Estes sı́tios de deposiçã o
Feliciano e estã o relacionados à delamina‑ contracenam com os altos do embasamento,
çã o crustal, promovida pela atividade tectô ‑ representados por grandes domos e por an‑
nica transcorrente, como é o caso do tiformes regionais, de direçã o NE‑SW, com
Bató lito Pelotas cinco segmentos principais: Alto 1) Cacho‑
Os dados geocronoló gicos de U‑Pb eira do Sul, Santana da Boa Vista, Hulha Ne‑
em zircã o indicaram idades de 581,9± 1,9 gra, Candiota (composto pela antiformes
Ma para os riolitos do Cerro Ana Dias (Oli‑ Capané ), Serra dos Pedrosas, Serra do Gon‑
veira et al., 2015) e de 561 ± 2 Ma para os ri‑ dinho e Candiota (composto pelos domos
olitos subvulcâ nicos do Cerro Partido, na de Santana e da Vigia), e Jaiba‑Torrinhas; Al‑
regiã o do Cerro Chato (Noll et al., 2019). Es‑ to 2) Caçapava do Sul; Alto 3) Vila Nova do
tes dados indicam a contemporaneidade en‑ Sul‑Ibaré ; Alto 4) Bagé ‑Dom Pedrito; e Alto
tre os riolitos do Cerro Partido, com as dos 5) Bató lito Pelotas.
litotipos do Enxame de Diques Piratini (cer‑ A atual estruturaçã o do embasa‑
ca de 550 Ma) (Zanon et al., 2006) e as dos mento do RS foi desenvolvida entre 600 Ma
granitoides, associados à Suı́te Dom Felicia‑ e 550 Ma e envolveu a movimentaçã o das
no, ambos representando o magmatismo grandes zonas de cisalhamento transcor‑
tardio, relacionado à evoluçã o inal do Bató ‑ rentes, associadas ao perı́odo pó s‑colisional,
lito Pelotas. Por outro lado, a idade de 630,4 marcando a evoluçã o inal do Cinturã o Dom
± 2,8 Ma obtida para as rochas vulcâ nicas do Feliciano. Esta evoluçã o está registrada pela
Cerro Chato é concordante com a idade ob‑ transiçã o entre o perı́odo inal da colisã o
tida em clastos vulcâ nicos da base do Grupo obliqua dos crá tons Rio de La Plata e Ka‑
Maricá (630,2 ±3,4 Ma) (Borba et al., 2008), lahari, que caracterizou o pico do metamor‑
sugerindo que os riolitos do Cerro Chato ismo colisional (650‑620 Ma) e o perı́odo
possam ser as rochas fontes da deposiçã o de má ximo espessamento e de escape tectô ‑
inicial da Bacia do Camaquã . nico, que ocorreu entre 590‑550 Ma e que
marcou a formaçã o e a reativaçã o das estru‑
4. 2 Modelo tectônico turas transcorrentes, com movimentos dire‑
cionais e com lineaçõ es de estiramento, de
O signi icado do magmatismo vulcâ ‑ baixo â ngulo (Fernandes et al., 1992; Saal‑
nico/subvulcâ nico riolı́tico no Cinturã o Dom mann et al., 2011; Philipp et al., 2016).
Feliciano mostra contextos distintos, com Os principais segmentos crustais do
relaçã o à s ocorrê ncias representadas na Ba‑ Cinturã o Dom Feliciano se movimentaram
cia do Camaquã e no Bató lito de Pelotas. As entre si, de modo concordante, alternando
rochas da Formaçã o Acampamento Velho, faixas dominadas por componentes trans‑
do Grupo Santa Bá rbara, representam a ter‑ pressivos, que formaram os altos do emba‑
ceira sucessã o vulcano‑sedimentar da Bacia samento, e por componentes transtensivos,
do Camaquã . Esta bacia foi depositada sobre que formaram bacias alongadas. A atuaçã o
um sistema de rifts, de direçã o NE‑SW, situa‑ simultâ nea de cinemá ticas compressiva e
do no limite dos terrenos Taquarembó , Tiju‑ transcorrente ocasiona a formaçã o de do‑
124 Edição da Sociedade Brasileira de Geologia – Núcleo RS/SC
Sommer et al.

mos, que se alternaram, lateralmente, com subvulcâ nicas á cidas, pode ser entendida de
faixas, nas quais a extensã o e a transcorrê n‑ trê s maneiras: (i) como corpos alongados e
cia conjuntas geraram á reas deprimidas, que como enxames de diques concordantes a zo‑
constituem as sub‑bacias de pull‑apart, que nas de cisalhamento, de direçã o NE‑SW, co‑
formaram os rifts Bom Jardim, Santa Bá rba‑ mo nos casos do Riolito Ana Dias e dos
ra e Guaritas, da Bacia do Camaquã . As prin‑ corpos do Cerro Chato e do Cerro Partido;
cipais estruturas, que delimitam os rifts, sã o (ii) como enxames de diques em fraturas de
caracterizadas por diversas zonas de cisa‑ extensã o, que se desenvolvem paralelos ao
lhamento, que serviram de conduto ao mag‑ tensor principal (sigma 1) do sistema de
matismo pó s‑colisional. Deste modo, ao compressã o, que tem direçã o NW‑SE, como
observarmos a geologia da regiã o central do no caso dos diques de Porto Alegre, de Pira‑
RS, podemos caracterizar um edifı́cio crus‑ tini, de Pinheiro Machado; e (iii) como di‑
tal, de cerca de 20 km de espessura, com ques, associados a conjugados de fraturas de
segmentos de crosta superior compostos cisalhamento, com combinaçã o de aberturas
pelas sucessõ es de cada sub‑bacia (Maricá , pró xima das direçõ es E‑W e N‑S, como no
Bom Jardim, Santa Bá rbara e Guaritas), in‑ caso dos diques do Riolito Ana Dias.
trudidos por corpos granı́ticos de mesozona
(entre 600‑570 Ma) e de epizona (560‑550 5 CONCLUSÕES
Ma). Associado à deposiçã o do Grupo Bom
Jardim e à s vulcâ nicas, da Fm. Hilá rio, ocorre O inal do Neoproterozoico no Escu‑
a colocaçã o dos granitos shoshonı́ticos, que do Sul‑Rio‑Grandense é marcado por um in‑
precedem à deposiçã o do Grupo Santa Bá r‑ tenso magmatismo, representado por
bara e à extrusã o das vulcâ nicas á cidas e bá ‑ plutonismo e por vulcanismo, vinculados
sicas da Fm. Acampamento Velho, bem como aos está gios pó s‑colisionais do Ciclo Orogê ‑
à colocaçã o de diversos granitos alcalinos, nico Brasiliano/Pan‑Africano. No Bató lito
cujos registros de metamor ismo de contato Pelotas (a leste do Escudo), a maioria dos ri‑
indicam colocaçã o em profundidades de 2 olitos ocorre como rochas subvulcâ nicas,
km a 5 km. nas formas de stocks e de enxames de di‑
O Bató lito se comportou, basica‑ ques, com direçã o preferencial NE‑SW, con‑
mente, como uma unidade homogê nea, em‑ cordantes com as principais estruturas do
bora subdividida, em campo, na forma de bató lito, que podem ser agrupados em trê s
trê s compartimentos subparalelos, de dire‑ domı́nios principais, normalmente, parale‑
çã o NE‑SW, expondo nı́veis crustais distintos los a estruturas NE‑SW: nordeste (Riolito
em cada um destes trê s segmentos. Esta Ana Dias), central (Enxame de diques Aspe‑
subdivisã o mostra que o Bató lito a lora co‑ rezas/Piratini) e sudoeste (Regiã o do Cerro
mo um domo, expondo uma porçã o central Chato). Nã o há registros de bacias sedimen‑
mais profunda, separada de um segmento tares associadas, com exceçã o da regiã o de
mais raso, ao norte, e outra porçã o mais pro‑ Cerro Chato, no extremo sul do bató lito, em
funda, ao sul. Os segmentos do Bató lito se que se tem a ú nica ocorrê ncia de rochas vul‑
movimentam entre si, ao longo de zonas de câ nicas strictu sensu, com manifestaçõ es ex‑
cisalhamento, mas a grande movimentaçã o, plosivas e efusivas.
em termos de deslocamento e de abertura Grande parte das rochas vulcâ nicas
de espaço, é marcada pela Dorsal de Cangu‑ e subvulcâ nicas fé lsicas do Bató lito Pelotas
çu. Desta maneira, a geraçã o de espaço, para está associada aos granitos da Suı́te Dom Fe‑
o posicionamento das rochas vulcâ nicas e liciano. Dados geocronoló gicos sugerem

Sistemas vulcânicos e subvulcânicos félsicos, associados ao Batólito Pelotas, Cinturão Dom Feliciano, RS 125
Contribuições à Geologia do Rio Grande do Sul e de Santa Catarina

uma contemporaneidade entre as rochas Bitencourt, M. F. & Nardi, L. V. S. 2000. Tecto‑


subvulcâ nicas do Cerro Partido, na regiã o do nic setting and sources of magmatism rela‑
Cerro Chato, e as rochas dos litotipos do En‑ ted to the Southern Brazilian Shear Belt.
Revista Brasileira de Geociências, 30: 184‑
xame de Diques Piratini e do Riolito Ana Di‑
187.
as e os granitoides da Suı́te Dom Feliciano.
Ambos os grupos representariam o magma‑ Borba, A. W., Mizusaki, A. M. P., Santos, J. O. S.,
tismo tardio, relacionado à evoluçã o inal do McNaughton, N. J., Onoes, A. T. & Hartmann,
Bató lito Pelotas. Idades mais antigas, obtidas L. A. 2008. U‑Pb zircon and 40Ar‑39Ar K‑
para as rochas vulcâ nicas do Cerro Chato, feldspar dating of syn‑sedimentary volca‑
nism of the Neoproterozoic Maricá Formati‑
sã o concordantes com as dos clastos vulcâ ‑
on: constraining the age of foreland basin
nicos descritos no Grupo Maricá , sugerindo inception and inversion in the Camaquã Ba‑
que os riolitos do Cerro Chato possam ser as sin of southern Brazil. Basin Research, 20:
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Vinicius Matté1*, Carlos Augusto Sommer2,
Evandro Fernandes de Lima2

1
Campus Caçapava do Sul, Universidade Federal do Pampa
2
Instituto de Geociê ncias, Universidade Federal do Rio Grande do Sul

*autor correspondente: viniciusmatte@unipampa.edu.br

1 INTRODUÇÃO
Na regiã o sul do Brasil, foram gerados importantes depó sitos de rochas vulcâ nicas efusi‑
vas e piroclá sticas, de composiçõ es bá sicas a á cidas, durante o perı́odo pó s‑colisional da oroge‑
nia Brasiliana Pan‑Africana. Essas rochas a loram em esparsas bacias sedimentares ediacaranas/
cambrianas, desde o estado do Paraná , até o sul do Uruguai, das quais se destaca a Bacia do Ca‑
maquã (e.g. Paim et al., 2014). Esta bacia registra a evoluçã o de trê s grandes ciclos vulcâ nicos,
com rochas plutô nicas e subvulcâ nicas, geneticamente e cronologicamente associadas.
Ao inal da orogenia Brasiliana Pan‑Africana, na regiã o hoje compreendida pelo Escudo
Sul‑Rio‑Grandense, houve uma transiçã o para uma tectô nica de escape, seguida por um colapso
do oró geno, que havia sido recentemente formado. Isto possibilitou a formaçã o de profundas e
extensas zonas de cisalhamento transcorrentes, de escala crustal, as quais propiciaram fusã o
manté lica, associada a um importante retrabalhamento crustal, devido à elevaçã o da geoterma
regional (Bitencourt & Nardi, 2000; Philipp et al., 2016). Esses processos resultaram na geraçã o
de um volumoso magmatismo, que, na regiã o oeste do Escudo Sul‑Rio‑Grandense, é representa‑
do pelas rochas vulcâ nicas da Bacia do Camaquã e por corpos plutô nicos cronocorrelatos (e.g.
Hartmann et al., 2007).
A Bacia do Camaquã está inserida no contexto geoló gico do Escudo Sul‑Rio‑Grandense e
sua geraçã o envolveu complexos mecanismos tectono‑sedimentares, relacionados aos está gios
pó s‑colisionais da orogenia Brasiliana Pan‑Africana (desde o inı́cio do perı́odo Ediacarano, até o
inı́cio do Cambriano). Sua evoluçã o inicia como uma bacia de retroarco (Grupo Maricá ), passan‑
do para bacia strike‑slip (Grupo Bom Jardim) e inalizando como bacia rifte, com alguma compo‑
Contribuições à Geologia do Rio Grande do Sul e de Santa Catarina

nente transtensiva (grupos Santa Bá rbara e mente intermediá rias e de a inidade
Guaritas), conforme de inido por inú meros shoshonı́tica, formadas a aproximadamente
pesquisadores, como Brito Neves & Cordani 590 Ma (Remus et al., 1999; Janikian et al.,
(1991), Chemale Jr. (2000) e Paim et al. 2005, 2012); ii) rochas do vulcanismo
(2014). E consenso que esta bacia representa Acampamento Velho, representadas, princi‑
um ló cus deposicional, ao qual bacias meno‑ palmente, por depó sitos explosivos/efusi‑
res se sobrepuseram (sub‑bacias Boicı́‑Piqui‑ vos, de composiçã o á cida predominante e
ri, Guaritas, Santa Bá rbara, Ramada e de a inidade moderadamente alcalina só di‑
Taquarembó ), cada uma, gerada por mecanis‑ ca, desenvolvidas entre 580 Ma e 550 Ma
mos distintos e apresentando litologias carac‑ (Sommer et al., 2005, 2006; Janikian et al.,
terı́sticas e individualizá veis, a partir de 2005, 2012; Almeida et al., 2012; Matté et
crité rios tectô nicos, termomecâ nicos e geo‑ al., 2016); e iii) rochas do vulcanismo Ro‑
cronoló gicos (Paim et al., 2014). Durante a deio Velho, caracterizadas por depó sitos
evoluçã o da Bacia do Camaquã , alternaram‑se efusivos, de composiçã o dominantemente
perı́odos deposicionais, com o acú mulo de es‑ bá sica e de a inidade moderadamente alca‑
pessos pacotes sedimentares e vulcâ nicos, e lina a toleı́tica, geradas entre 547 Ma e 535
intervalos erosivos. Observa‑se um predomı́‑ Ma (Almeida et al., 2010; Almeida et al.,
nio dos episó dios vulcâ nicos nas fases de pre‑ 2012).
enchimento, normalmente, na base das O Grupo Maricá (unidade basal da
unidades de maior hierarquia, seguidos pela Bacia do Camaquã ) possui clastos vulcâ ni‑
deposiçã o de sedimentos predominantemen‑ cos em camadas de conglomerado, datados
te siliciclá sticos. Esses sedimentos deram ori‑ em 630 ±3 Ma por Borba et al. (2008), que
gem, principalmente, a siltitos, a arenitos e a evidenciam um prová vel vulcanismo á cido
conglomerados. De forma geral, registra uma contemporâ neo e que estabelecem a idade
evoluçã o de ambientes sedimentares, desde má xima para a deposiçã o deste grupo. Mais
marinho raso, passando por costeiro e por la‑ recentemente, rochas vulcâ nicas á cidas com
custre‑aluvial, até desé rtico, com episó dios esta mesma idade foram datadas na porçã o
vulcâ nicos intercalados (Paim et al., 2014), sul do Bató lito Pelotas (na regiã o do Cerro
depositados, aproximadamente, entre 630 Ma Chato, cf. Noll Filho et al., 2018) e corrobo‑
e 535 Ma. ram a hipó tese de um vulcanismo precoce
Os episó dios vulcâ nicos desta bacia no perı́odo pó s‑colisional da orogenia Bra‑
se desenvolveram, dominantemente, sobre o siliana Pan‑Africana, no Escudo Sul‑Rio‑
Terreno Juvenil Sã o Gabriel, em que se desta‑ Grandense.
cam as rochas vulcâ nicas do Platô da Ramada, Apesar da idade ediacarana/cam‑
da Serra de Santa Bá rbara, das regiõ es do cer‑ briana, os registros vulcâ nicos da Bacia do
ro Tupanci e Bom Jardim e das á reas pró xi‑ Camaquã permanecem, em parte, preserva‑
mas à cidade de Lavras do Sul (Fig. 1). dos, nã o sendo observados efeitos de meta‑
També m ocorrem rochas vulcâ nicas desta ba‑ mor ismo dinamotermal e de deformaçã o
cia na regiã o cratô nica do Terreno Taquarem‑ dú ctil, permitindo reconstruir, pelo menos
bó (no Platô do Taquarembó ) e sobre o em parte, a histó ria vulcanoló gica da re‑
Terreno Tijucas (na regiã o do Rodeio Velho). giã o.
Os trê s ciclos vulcâ nicos da Bacia do Os sistemas vulcano plutô nicos da
Camaquã sã o representados por: i) rochas do Bacia do Camaquã originaram algumas im‑
vulcanismo Hilá rio, com predomı́nio de ro‑ portantes estruturas semicirculares, comu‑
chas efusivas, de composiçõ es dominante‑ mente, na forma de altos topográ icos.
130 Edição da Sociedade Brasileira de Geologia – Núcleo RS/SC
Matté et al.

Estas feiçõ es sã o constituı́das, em grande cada das Graças) (Janikian et al., 2005). En‑
parte, por ignimbritos á cidos e/ou por ro‑ volve rochas vulcâ nicas e subvulcâ nicas, com
chas granı́ticas (e.g. Platô da Ramada e Platô grande variaçã o composicional, desde ter‑
do Taquarembó ), associadas a conjuntos de mos bá sicos, até á cidos, com predomı́nio dos
diques anelares e em cone (Fig. 1). Estas ca‑ intermediá rios, representados por derrames
racterı́sticas sã o sugestivas de sistemas vul‑ de composiçã o andesı́tica. Segundo Janikian
câ nicos relacionados a caldeiras, embora et al. (2012), essas rochas perfazem um má ‑
algumas feiçõ es representem, pelo menos ximo de 2500 metros de espessura. Esses
em parte, as raı́zes profundas de sistemas vulcanitos ocorrem, em alguns casos, inter‑
desse tipo (e.g. Associaçã o Shoshonı́tica de calados com depó sitos sedimentares, gera‑
Lavras do Sul). Outras formas geográ icas dos em ambientes com pronunciados
alongadas (e.g. Serra de Santa Bá rbara e sistemas lacustres profundos, remanescen‑
Cerro Tupanci) sugerem eventos relaciona‑ tes da Formaçã o Cerro da Angé lica (Janikian
dos a condutos issurais e/ou à deposiçã o de et al., 2005).
rochas vulcâ nicas ao longo de paleovales Rochas do vulcanismo Hilá rio se si‑
con inados. Alguns pesquisadores tê m traba‑ tuam, principalmente, na regiã o a leste da ci‑
lhado com essas hipó teses, embora as con‑ dade de Lavras do Sul e em Caçapava do Sul,
clusõ es ainda sejam muito super iciais, na na regiã o do Bom Jardim (Fig. 1). Dentre as
Associaçã o Shoshonı́tica de Lavras do Sul ocorrê ncias menos signi icativas, destacam‑
(Nardi, 1984; Gastal et al., 2015) e no Platô se as de Bagé , de Dom Pedrito, de Sã o Sepé e
da Ramada (Sommer et al., 2013; Matté , de Vila Nova do Sul, compondo, nesta ú ltima,
2016; Souza, 2019). Os altos topográ icos, depó sitos associados à porçã o basal do Platô
construı́dos, principalmente, pelas rochas da Ramada.
dos vulcanismos Hilá rio e Acampamento Ve‑ O vulcanismo Hilá rio compreende
lho, constituı́ram importantes á reas‑fonte derrames (Figs. 2A‑2B), com depó sitos ex‑
para a sedimentaçã o de boa parte da Bacia plosivos intercalados (Fig. 2C), ambos de
do Camaquã , denotando grande relevâ ncia composiçõ es traquibasá lticas e traquiandesı́‑
no preenchimento desta. ticas, espacial e temporalmente associadas a
Neste capı́tulo, sã o discutidos dados rochas subvulcâ nicas riolı́ticas, monzonı́ticas
petrográ icos, geoquı́micos e geocronoló gi‑ e lampró iros espessartı́ticos (Figs. 2D‑2F) e
cos das rochas vulcâ nicas ediacaranas‑cam‑ a minetes, alé m de rochas plutô nicas epizo‑
brianas da Bacia do Camaquã , relacionadas nais granı́ticas e leucodioritos cumulá ticos,
à s unidades Hilá rio, Acampamento Velho e agrupados na Associaçã o Shoshonı́tica de
Rodeio Velho, com o objetivo de apresentar Lavras do Sul (Nardi & Lima, 1985).
uma sı́ntese sobre o atual está gio de conhe‑ Os andesitos predominam nesta uni‑
cimento acerca da evoluçã o do vulcanismo dade e possuem, como principal caracterı́sti‑
pó s‑colisional do Escudo Sul‑Rio‑Grandense. ca petrográ ica, textura por irı́tica a
glomeropor irı́tica (Figs. 2A‑2B), com feno‑
2 VULCANISMO HILÁRIO cristais de plagioclá sio (andesina‑labradori‑
ta). Subordinadamente, ocorrem augita
A Formaçã o Hilá rio (Ribeiro & Fanti‑
(Wo38‑43, En40‑49, Fs8‑20), olivina (Fo62), Ti‑
nel, 1978) compreende o primeiro registro
magnetita e apatita, normalmente, arranja‑
vulcâ nico da Bacia do Camaquã e se situa na
das em uma estrutura de luxo. A matriz é
porçã o intermediá ria do Grupo Bom Jardim
constituı́da por cristá litos e por micró litos de
(entre as formaçõ es Cerro da Angé lica e Pi‑
plagioclá sio (oligoclá sio‑andesina).
O Vulcanismo Ediacarano‑Cambriano da Bacia do Camaquã 131
Contribuições à Geologia do Rio Grande do Sul e de Santa Catarina

Figura 1 ‒ A) Localizaçã o e compartimentaçã o geotectô nica do Escudo Sul‑Rio‑Grandense (modi icado de


Hartmann et al., 2007); e B) Contexto geoló gico regional e localizaçã o das principais ocorrê ncias do
vulcanismo da Bacia do Camaquã (modi icado de Wildner et al., 2002).

132 Edição da Sociedade Brasileira de Geologia – Núcleo RS/SC


Matté et al.

Subordinadamente, ocorrem derra‑ com Au livre subordinado, associados à


mes ou pequenas intrusõ es bá sicas, caracte‑ blenda e à galena, disseminados e em veios
rizadas como olivina‑basaltos por irı́ticos, de quartzo, na sequê ncia vulcâ nica e em cor‑
com fenocristais de olivina (Fo66‑68), de augi‑ pos plutô nicos, estabelecidos, respectiva‑
ta (Wo39‑43, En44‑49, Fs9‑15), de andesina a la‑ mente, por sistemas epitermais e por
bradorita e de ilmenita, imersos em uma sistemas do tipo pó r iro (Bongiolo, 2006).
matriz, a base de oligoclá sio a andesina, de
apatita e de vidro. També m ocorrem depó si‑ 3 VULCANISMO ACAMPAMENTO VELHO
tos vulcanoclá sticos subaé reos, formados,
tanto em regime de queda quanto em regime A Formaçã o Acampamento Velho
de luxo. Os depó sitos de queda sã o classi i‑ (Ribeiro & Fantinel, 1978) se depositou, dis‑
cados como tufos inos a grossos, com por‑ cordantemente, sobre as rochas dos grupos
çõ es ricas em cristais (Lima & Nardi, 1985). Bom Jardim e Maricá e se posicionou na base
Os depó sitos de luxo sã o ignimbritos (gra‑ do Grupo Santa Bá rbara. E representada, do‑
nulometricamente, lá pili‑tufos), ricos em pú ‑ minantemente, por depó sitos piroclá sticos e
mices e em cristaloclastos de plagioclá sio, de efusivos subaé reos, de composiçã o á cida, as‑
K‑feldspato e de quartzo, envolvidos por uma sociados a lavas e a subvulcâ nicas menos
matriz rica em fragmentos tamanho cinza abundantes, de composiçã o bá sica a á cida
(Fig. 2C). Eventualmente, ocorrem tufos, com (Wildner et al., 2002; Sommer et al., 1999,
expressiva estrati icaçã o planar, por vezes, 2005; Almeida et al., 2002).
cruzada, de baixo â ngulo, e fragmentos vul‑ As melhores exposiçõ es da Forma‑
canoclá sticos, que, em geral, variam da di‑ çã o Acampamento Velho (Fig. 1) estã o locali‑
mensã o argila, até areia mé dia. Essas rochas zadas no Platô da Ramada (Vila Nova do Sul/
sã o interpretadas como originadas, a partir Santa Margarida do Sul), nos cerros Tupanci
de correntes de turbidez de baixa densidade, e Picados (Sã o Sepé ), no Platô do Taquarem‑
tı́picas de ambientes subaquosos, abaixo do bó (Dom Pedrito/Lavras do Sul) e na Serra
nı́vel de atuaçã o das ondas, provavelmente, de Santa Bá rbara, a qual inclui os cerros Pe‑
em ambiente lacustre (Lima et al., 2002). rau, Bugio e Espinilho (Caçapava do Sul), de
A natureza epizonal e multicı́clica, que se destaca o a loramento Cascata do
bem como a geometria das intrusõ es que de‑ Pessegueiro (Fig. 3D) (Freitas, 2019).
inem o centro vulcano‑plutô nico desta asso‑ Esta unidade é constituı́da por de‑
ciaçã o shoshonı́tica na regiã o de Lavras do pó sitos, que, em alguns locais, podem ultra‑
Sul, permitem associá ‑lo a porçõ es subvulcâ ‑ passar 500 metros de espessura (Janikian et
nicas e plutô nicas de estruturas de subsidê n‑ al., 2005; Matté et al., 2016). Predominam
cia de caldeiras, como referido, inicialmente, rochas geradas por luxos piroclá sticos de
por Nardi (1984) e, mais recentemente, por alta densidade (ignimbritos), geralmente,
Gastal et al. (2015). Estes ú ltimos també m mal selecionados e granulometricamente
de iniram, atravé s da integraçã o de estudos classi icados, em sua maioria, como lá pili‑tu‑
geoló gicos, geofı́sicos e estruturais, um deta‑ fos (Figs. 3A‑3C). Estã o dispostos em cama‑
lhado esquema evolutivo para o complexo das sub‑horizontais, de modo estrati icado
sistema de intrusõ es e de mecanismos tectô ‑ ou maciço. Sã o compostos, essencialmente,
nicos envolvidos, corroborando o entendi‑ por piroclastos juvenis, como pú mices,
mento sobre o controle das importantes shards e cristaloclastos de sanidina e de
mineralizaçõ es de Au‑Cu (Pb‑Ag) da regiã o. quartzo, alé m de porçõ es ricas em litoclastos
Esses depó sitos ocorrem em pirita aurı́fera, cognatos de riolitos e ignimbritos e litoclas‑
O Vulcanismo Ediacarano‑Cambriano da Bacia do Camaquã 133
Contribuições à Geologia do Rio Grande do Sul e de Santa Catarina

Figura 2 ‒ Exemplos de rochas vulcâ nicas da Formaçã o Hilá rio: A) Amostra de andesito por irı́tico; B)
Fotomicrogra ia de andesito (nicó is perpendiculares); C) Amostra de ignimbrito andesı́tico; D) Pedreira de
lampró iro espessartı́tico na regiã o da “Parada Cota” (RS‑357); E) Amostra de lampró iro espessartı́tico; e F)
Fotomicrogra ia de lampró iro espessartı́tico, ilustrando a textura panidiomó r ica e a zonaçã o composicional da
hornblenda (nicó is paralelos).

tos acessó rios de rochas granı́ticas e meta‑ graus de soldagem, sendo que, de modo ge‑
mó r icas do embasamento (Sommer et al., ral, sã o fortemente soldados na porçã o basal
2006; Matté et al., 2016). Possuem variá veis a intermediá ria dos depó sitos, com textura

134 Edição da Sociedade Brasileira de Geologia – Núcleo RS/SC


Matté et al.

eutaxı́tica ( iamme) e, em algumas varieda‑ onam‑se ao longo de toda a sequê ncia vulcâ ‑
des, reomó r ica, gerados sob altas tempera‑ nica (Matté et al., 2016). Predominam cor‑
turas (entre 850°C e 946°C) (Sommer et al., pos de composiçã o riolı́tica, principalmente,
2013). Variaçõ es espaciais em seus consti‑ diques, com até algumas dezenas de metros
tuintes, grau de soldagem, texturas e estru‑ de espessura, com destaque para os que cir‑
turas permitiram a de iniçã o de vá rias cundam o Platô da Ramada e para os domos,
faciologias, como visto, por exemplo, no tra‑ com algumas centenas de metros de exten‑
balho de Matté et al. (2016). sã o. Os domos mostram pronunciada folia‑
A porçã o efusiva do vulcanismo çã o de luxo, principalmente, nas bordas,
Acampamento Velho é dominada por derra‑ bem como porçõ es autobrechadas. També m
mes riolı́ticos (coulées), posicionados, princi‑ ocorrem raros diques de diabá sios e gabros,
palmente, no topo desta unidade, embora, de com até 30 metros de espessura e com tex‑
maneira restrita, també m ocorram intercala‑ tura equigranular muito ina a mé dia (Cor‑
dos aos ignimbritos (Figs. 3D‑3F). Em geral, rê a, 2017).
sã o rochas por irı́ticas, com fenocristais de A porçã o de composiçã o interme‑
sanidina e de quartzo, este ú ltimo, apresen‑ diá ria do magmatismo da Formaçã o Acam‑
tando muitas vezes feiçõ es de reabsorçã o pe‑ pamento Velho é representada por rochas
la matriz, provocadas pelas altas diorı́ticas e traquı́ticas subvulcâ nicas (Figs.
temperaturas de posicionamento das lavas 3G‑3H; Matté et al., 2012, 2016). Ocorrem na
(acima dos 900°C) (Sommer et al., 2013; forma de dois corpos principais, de dimen‑
Leitzke et al., 2020). Mostram faciologias, sõ es quilomé tricas, no Platô da Ramada e,
que variam de riolitos maciços, foliados, do‑ possivelmente, marcam soleiras, posiciona‑
brados a brechados. Tanto riolitos quanto ig‑ das ao longo de descontinuidades da crosta,
nimbritos possuem porçõ es altamente que permitiram sua ascensã o (Matté et al.,
devitri icadas, caracterı́sticas das porçõ es in‑ 2016). Sã o rochas constituı́das, dominante‑
ternas de luxos e de derrames espessos, cu‑ mente, por oligoclá sio a andesina, por orto‑
jo re lexo é um arranjo granofı́rico clá sio, por an ibó lio e por augita (Wo34‑38,
quartzofeldspá tico, algumas vezes, acompa‑ En25‑38, Fs24‑36), possuem texturas equigra‑
nhado por esferulitos e textura axiolı́tica nular ina a mé dia e por irı́tica, com comuns
(Sommer et al., 2005, 2006; Matté et al., evidê ncias de desequilı́brio quı́mico, repre‑
2016). sentado pela presença da textura antirapaki‑
De modo restrito, ocorrem depó sitos vi (Fig. 3H).
de lavas bá sicas nas porçõ es de topo desta A porçã o plutô nica da Formaçã o
unidade. Sã o basaltos com poucos metros de Acampamento Velho é representada por
espessura, com textura por irı́tica, com feno‑ granitoides alcalino‑só dicos da Suı́te Intrusi‑
cristais de labradorita e de piroxê nio, com va Saibro (Hartmann & Nardi, 1982). Os cor‑
morfologia do tipo a'a', como atestado pela pos mais expressivos desta unidade, em
estrutura brechada, à s vezes, mostrando fei‑ termos de superfı́cie a lorante, ocorrem a
çõ es de interaçã o vulcano‑sedimentares, e nordeste do Lineamento de Ibaré e compre‑
com muitas vesı́culas e amı́gdalas alongadas, endem o Granito Jaguari, a Suı́te Intrusiva
de até 1 cm (Sommer et al., 2005; Matté et Ramada e o Complexo Granı́tico Sã o Sepé
al., 2016). (Fig. 1).
Rochas subvulcâ nicas, relacionadas As feiçõ es observadas nas rochas
ao magmatismo da Formaçã o Acampamento vulcâ nicas da Formaçã o Acampamento Ve‑
Velho, sã o comuns, e, temporalmente, posici‑ lho, tais como ignimbritos com alto grau de
O Vulcanismo Ediacarano‑Cambriano da Bacia do Camaquã 135
Contribuições à Geologia do Rio Grande do Sul e de Santa Catarina

soldagem, ricos em fragmentos juvenis, a Caçapava do Sul, respectivamente, nas re‑


forma semicircular dos platô s da Ramada e giõ es do Rodeio Velho (onde se destacam os
Taquarembó , associada à presença de equi‑ a loramentos do Passo do Moinho, do Fer‑
valentes plutô nicos, e a frequente ocorrê ncia vor (Fig. 4A) e da Pedra da Arara) e do Ar‑
de luxos de lavas ao longo de lineamentos, e roio Carajá , na Barragem Dotto (Fig. 1).
de corpos subvulcâ nicos anelares e/ou em O vulcanismo Rodeio Velho é com‑
cone, sugerem um vulcanismo subaé reo, es‑ posto por rochas de composiçã o bá sica,
tabelecido em condutos issurais, possivel‑ predominantemente basaltos, com andesi‑
mente, em ambientes do tipo caldeira tos associados, em derrames subaé reos e
vulcâ nica, com erupçõ es de alta temperatu‑ em intrusõ es rasas, sem evidê ncias de ativi‑
ra, geradas a baixas colunas de erupçã o dade explosiva. Sã o rochas afanı́ticas a por‑
(Sommer et al., 2013; Matté , 2016; Souza, irı́ticas (Figs. 4B‑4C), geradas a partir de
2019). lavas com grande quantidade de volá teis,
O magmatismo alcalino‑só dico da como atestado pelas abundantes vesı́culas e
Bacia do Camaquã tem sido vinculado ao es‑ amı́gdalas. Destacam‑se, nas rochas desta
tabelecimento de um sistema magmá tico/ unidade, as estruturas vulcâ nicas primá rias
epitermal, que, associado à s rochas meta‑ e as feiçõ es de interaçã o vulcano‑sedimen‑
mó r icas e sedimentares do embasamento, tares.
levou à geraçã o de inú meras mineralizaçõ es Os derrames sã o lenticulares, de
de Au, de Cu e de Pb‑Zn na porçã o oeste do pequena espessura (centimé trica a mé tri‑
Terreno Sã o Gabriel. Destas, destacam‑se os ca), com expressiva superposiçã o de ló bulos
depó sitos Camaquã e Santa Maria, na regiã o (Fig. 4D) e com visı́vel estruturaçã o interna,
das Minas do Camaquã (e.g. Ramos, 2018), dividida em crosta superior, em nú cleo e em
Crespos, na Serra de Santa Bá rbara, e as crosta inferior. Apresentam feiçõ es de su‑
ocorrê ncias na regiã o de Vila Nova do Sul perfı́cie lisa, ondulada e em corda (Fig. 4E)
(e.g. Hoerlle et al., 2019). e, mais raramente, estrias de luxo e tubos
de lava anastomosados (Fig. 4F). Nos tubos,
4 VULCANISMO RODEIO VELHO a concentraçã o dos volá teis no teto deter‑
minou a in laçã o e a deformaçã o da sua su‑
O vulcanismo Rodeio Velho (Mem‑ perfı́cie, gerando padrõ es de intumescê ncia,
bro Rodeio Velho) (Ribeiro et al., 1966) com‑ com pequenas corrugaçõ es e com depres‑
preende o ú ltimo ciclo vulcâ nico da Bacia do sõ es semicirculares (Fig. 4G), provavelmen‑
Camaquã e é vinculado ao Grupo Guaritas. te, originadas pelo rompimento da crosta
Este grupo é caracterizado por um complexo externa e pela consequente liberaçã o dos
sistema aluvial, composto por arenitos con‑ gases (Lima et al., 2002). Outra feiçã o ob‑
glomerá ticos e conglomerados de sistemas servada na parte externa dos luxos in lados
braided e fan deltas e por arenitos de siste‑ é o padrã o de cracks curvilı́neos, indicativos
mas desé rticos de dunas e de interdunas do sentido de luxo. Alé m disso, nas porçõ es
(Almeida et al., 2009). E nas porçõ es basais de topo dos derrames ocorrem pipes estrei‑
deste grupo que as rochas vulcâ nicas ocor‑ tos, corroborando a elevada atividade de
rem, compondo depó sitos com até 100 me‑ volá teis. Todas essas caracterı́sticas permi‑
tros de espessura, intercalados, tem classi icar esses derrames como tı́picos
principalmente, com arenitos eó licos. pahoehoe.
As melhores exposiçõ es ocorrem As manifestaçõ es subvulcâ nicas do
nos municı́pios de Santana da Boa Vista e de Membro Rodeio Velho ocorreram como so‑
136 Edição da Sociedade Brasileira de Geologia – Núcleo RS/SC
Matté et al.

Figura 3 ‒ Exemplos de rochas vulcâ nicas da Formaçã o Acampamento Velho: A) Padrã o caracterı́stico de
a loramento tabular dos ignimbritos densamente soldados; B) Amostra de ignimbrito de composiçã o riolı́tica,
com pú mices (cores claras) e com litoclastos cognatos (marrons) e litoclastos acidentais (cinzas); C)
Fotomicrogra ia de ignimbrito, com cristaloclasto de sanidina e matriz a base de vitroclastos (shards) (nicó is
paralelos); D) A loramento da Cascata do Pessegueiro (base do Cerro do Perau), onde se observam, em primeiro
plano, riolitos, com foliaçã o e com dobras de luxo, e, em segundo plano, o Cerro do Bugio, com depó sitos
ignimbrı́ticos tabulares; E) Amostra de riolito, com foliaçã o de luxo; F) Fotomicrogra ia de riolito, com foliaçã o
e com dobra de luxo (porçã o esquerda a nicó is perpendiculares e porçã o direita a nicó is paralelos); G) Contato
entre rochas subvulcâ nicas diorı́ticas (relevo plano, com vegetaçã o levemente mais expressiva) e ignimbritos; e
H) Fotomicrogra ia de traquito subvulcâ nico, com augitas e com fenocristal de plagioclá sio, com textura
antirapakivi (porçã o superior a nicó is paralelos e porçã o inferior a nicó is perpendiculares).

leiras má icas rasas, de pequenas extensã o e parcialmente saturados em á gua.


espessura (centimé trica a mé trica), em sedi‑ Dentre as interaçõ es vulcano‑sedi‑
mentos arenosos e em arenitos parcialmente mentares do Membro Rodeio Velho, desta‑
liti icados e saturados em á gua. Eventual‑ cam‑se (Petry, 2006): i) Peperitos, gerados,
mente, sã o encontradas apó ises nesses cor‑ principalmente, quando a frente do derrame
pos, que indicam intrusã o em um sedimento englobou sedimento inconsolidado, o que é
parcialmente liti icado, visto as formas loba‑ favorecido pela grande quantidade de volá ‑
das das apó ises e a preservaçã o parcial das teis dessas lavas; ii) Xenó litos, originados pe‑
estruturas internas do sedimento. També m la captura de fragmentos de arenitos e de
se observam estruturas tipo pillow, de inindo siltitos, em alguns casos, com estruturas se‑
feiçõ es do tipo multiple‑rind, comuns em pil‑ dimentares preservadas; iii) Diques clá sticos
lowed sills, com material sedimentar interca‑ de injeçã o e de preenchimento, gerados, res‑
lado. Estruturas do tipo pillow sã o, em geral, pectivamente, quando a lava luiu, sobrepon‑
veri icadas em rochas efusivas, em ambientes do o sedimento ú mido e luidizando‑o (Figs.
subaquosos, poré m, nesta unidade, ocorrem 4H‑4I) ou sendo soterrada por sedimento,
em rochas sedimentares ou em sedimentos que, posteriormente preencheu suas cavida‑

O Vulcanismo Ediacarano‑Cambriano da Bacia do Camaquã 137


Contribuições à Geologia do Rio Grande do Sul e de Santa Catarina

des de resfriamento superiores. nı́ticas de margem continental (Pearce,


As frequentes feiçõ es de interaçã o 1983) ou de intraplaca pó s‑colisionais. Os
vulcano‑sedimentar desta unidade, tanto em padrõ es de ETR sã o caracterizados por va‑
derrames como em intrusõ es, sugerem um lores de CeN pró ximos a 100, de YbN ao re‑
ambiente vulcâ nico e sub‑vulcâ nico, com a dor de 4 e pela ausê ncia de anomalias de Eu,
presença de á gua em quantidades razoá veis feiçõ es normalmente indicativas de magmas
(Petry, 2006; Luiz, 2019), o que evidencia um shoshonı́ticos ou cá lcio‑alcalinos alto‑K
paleoambiente relativamente ú mido, embora (Nardi & Lima, 2000) (Fig. 5E). As rochas
sejam encontrados depó sitos eó licos de am‑ á cidas sã o metaluminosas, com conteú dos
biente, pelo menos em parte, desé rtico (e.g. tipicamente elevados em Ba e em Sr e mo‑
Almeida et al., 2009; Paim et al., 2014). derados em HFSE. O comportamento dos
ETR e dos elementos‑traço incompatı́veis
sã o similares aos das rochas bá sicas e inter‑
5 GEOQUÍMICA DO MAGMATISMO NA
mediá rias, sugerindo sua cogeneticidade.
BACIA DO CAMAQUÃ
Os isó topos do magmatismo
5. 1 O magmatismo shoshonítico da shoshonı́tico da Formaçã o Hilá rio indicam
Formação Hilário razõ es 87Sr/86Sr(i) de, aproximadamente,
0,7048 (Gastal & Lafon, 1998; Nardi & Lima,
As rochas do vulcanismo Hilá rio 2000). Aná lises Sm‑Nd, obtidas por Janikian
possuem ampla variaçã o composicional, des‑ et al. (2012), sugerem uma mistura de ori‑
de termos bá sicos, até á cidos, com predomı́‑ gens neo e paleoproterozoicas, com idades‑
nio dos intermediá rios. Sã o, geralmente, modelo Sm‑Nd (TDM) de 1,34 Ga a 1,38 Ga.
saturadas em sı́lica, apresentando olivina, hi‑ Os valores de εNd(i) se situam entre ‑2 e +3
perstê nio e diopsı́dio normativos. Mostram (Gastal & Lafon, 1998; Janikian et al., 2012).
a inidade moderadamente alcalina, como po‑ Esses dados sã o sugestivos de origens a par‑
de ser visto no diagrama TAS (Fig. 5A), e po‑ tir de um manto litosfé rico do tipo EMI, for‑
tá ssica (shoshonı́tica), como evidenciado temente afetado por metassomatismo da
pelos valores de K2O maiores do que os de pré via subducçã o e fusã o de crosta oceâ nica
Na2O‑2, de acordo com o estabelecido por Le da orogenia Brasiliana Pan‑Africana (Nardi
Maitre (2002). A a inidade shoshonı́tica do & Lima, 2000).
magmatismo é també m evidenciada pelos
Dados geocronoló gicos da Associa‑
baixos teores em TiO2, por conteú dos relati‑
çã o Shoshonı́tica de Lavras do Sul mostram
vamente elevados de Sr, de Ba, de Rb e de
idades U‑Pb em zircã o de rochas granı́ticas
Al2O3 e por razõ es K2O/Na2O pró ximas da
de 594 ±4 Ma (Remus et al., 1999) e de 592
unidade.
±5 Ma (Remus et al., 1997). As rochas vulcâ ‑
Essas rochas mostram um empobre‑ nicas desta associaçã o foram datadas por Ja‑
cimento de Nb em relaçã o aos ETRL (Fig. nikian et al. (2012) e fornecem idades
5D), bem como um enriquecimento em ETRL Ar4o‑Ar39 (em plagioclá sio de andesitos) de
e em LILE (Rb, Ba, K e Sr), que, aliado à s bai‑ 590 ±6 Ma para a base da sequê ncia vulcâ ‑
xas razõ es Nb/La e La/Ba, sã o compará veis nica, e de 586 ±8 Ma e de 588 ±7 Ma para o
à quelas reportadas para andesitos orogê ni‑ topo. Os lampró iros foram datados por Al‑
cos. Os conteú dos de elementos litó ilos de meida et al. (2012), que obtiveram a idade
alto potencial iô nico (HFSE) sã o mais eleva‑ de 591 ±3 Ma. Os monzonitos mais antigos
dos do que os observados em shoshonitos desta associaçã o possuem idade de 601 ±5
oceâ nicos e similares aos das rochas shosho‑ Ma (Gastal & Lafon, 2001), enquanto os
138 Edição da Sociedade Brasileira de Geologia – Núcleo RS/SC
Matté et al.

Figura 4 ‒ Exemplos de rochas vulcâ nicas do Membro Rodeio Velho: A) A loramento “Fervor”, no Rio Camaquã ,
no qual se observa um depó sito de arenito eó lico intercalado aos derrames; B) Amostra de basalto por irı́tico,
com amı́gdalas; C) Fotomicrogra ia de basalto por irı́tico (porçã o superior a nicó is paralelos e porçã o inferior a
nicó is perpendiculares); D) Superposiçã o de ló bulos; E) Feiçõ es de superfı́cie lisa e em corda; F) Detalhe da
estrutura dos tubos de lava; G) Corrugaçõ es e depressõ es circulares, indicando feiçõ es de escape de gases; H)
Diques clá sticos de preenchimento; e I) Fotomicrogra ia de basalto (direita), em contato com arenito (esquerda)
de dique clá stico de preenchimento (porçã o superior a nicó is paralelos e porçã o inferior a nicó is
perpendiculares).

mais jovens mostram idade de 587 ±4 Ma 1999, 2005; Wildner et al., 2002; Matté et al.,
(Liz et al., 2009). 2012), e, possivelmente, por processos de
mescla de magma (Matté et al., 2021).
5. 2 O magmatismo alcalino sódico da Este magmatismo possui cará ter al‑
Formação Acampamento Velho calino‑só dico, evidenciado, no diagrama TAS,
por um trend, situado logo acima da linha
A Formaçã o Acampamento Velho que divide as rochas alcalinas das subalcali‑
apresenta uma sequê ncia vulcâ nica bimodal, nas (Fig. 5A), bem como pelos valores de
com predomı́nio de termos á cidos (riolitos e Na2O‑2 maiores do que os de K2O, como de‑
ignimbritos), em relaçã o aos bá sicos (basal‑ inido por Le Maitre (2002). Riolitos comen‑
tos), poré m o magmatismo desta unidade diı́ticos sã o predominantes na sequê ncia
evoluiu, pelo menos em parte, por processos vulcâ nica, embora algumas rochas á cidas se‑
de cristalizaçã o fracionada, desde termos jam metaluminosas subalcalinas (Sommer et
bá sicos, até á cidos, visto as ocorrê ncias de al., 2006) e as rochas bá sicas sã o representa‑
rochas intermediá rias diorı́ticas e traquı́ticas das, principalmente, por hawaitos, por ba‑
subvulcâ nicas associadas (Sommer et al., saltos e por raros mugearitos. As rochas
O Vulcanismo Ediacarano‑Cambriano da Bacia do Camaquã 139
Contribuições à Geologia do Rio Grande do Sul e de Santa Catarina

á cidas e intermediá rias possuem notá vel ca‑ litos alto‑Nb, sugerem que este magmatismo
rá ter peralcalino, comprovado, inclusive, pe‑ pode estar relacionado a fontes com menor
los seus elevados teores de Zr, conforme in luê ncia de processos metassomá ticos re‑
discutido por Leat et al. (1986). lacionados à subducçã o, quando compara‑
Sommer et al. (2005) identi icaram dos aos dos magmas do vulcanismo Hilá rio
trê s conjuntos de rochas vulcâ nicas nesta (Fig. 5F). Os padrõ es de ETR sã o tı́picos de
unidade com contrastantes conteú dos de Ti‑ sé ries alcalinas, com enriquecimento de
P e de Nb: i) basaltos‑riolitos alto‑Ti‑P; ii) ba‑ ETRL, em relaçã o aos ETRP (Fig. 5G). As ro‑
saltos‑riolitos baixo‑Ti‑P; e iii) riolitos alto‑ chas alto‑Ti apresentam um leve enriqueci‑
Nb. mento em ETR, principalmente, em ETRL
Os magmas bá sicos baixo‑Ti‑P pos‑ (LaN/YbN = 10 a 12), enquanto os riolitos al‑
suem um suave enriquecimento em ETRL, to‑Nb exibem um menor enriquecimento
em relaçã o aos ETRP, com razõ es LaN/YbN nestes elementos (LaN/YbN = 1 a 2), uma
pró ximas a 3 e com ausê ncia de anomalia de maior anomalia negativa de Eu e um forte
Eu (Fig. 5C). Os magmas bá sicos alto‑Ti‑P sã o empobrecimento em ETRL, o que pode re‑
levemente mais enriquecidos em ETRL, ten‑ letir a presença de minerais ricos nestes
do razõ es LaN/YbN entre 10 e 11. Os elemen‑ elementos entre as fases fracionadas, como a
tos‑traço das rochas bá sicas tê m um alanita, ou ainda, uma diferente fonte. Os da‑
comportamento similar aos observados em dos isotó picos das rochas intermediá rias da
basaltos de ilhas oceâ nicas (OIB), excetuan‑ Formaçã o Acampamento Velho apresentam
do‑se os conteú dos menores de Nb, de Ta e valores de 87Sr/86Sr(i) entre 0,704802 e
de P e os maiores de Ba (Fig. 5B). Os dados 0,709583, com εNd(i) de 2,96 a ‑14,19, en‑
isotó picos das rochas bá sicas da Formaçã o quanto as rochas á cidas mostram valores de
87
Acampamento Velho mostram valores de Sr/86Sr(i) entre 0,703484 e 0,717056, com
87
Sr/86Sr(i) variando de 0,704500 a 0,709000 εNd(i) de ‑7,62 a ‑9,91. As idades‑modelo
(Gastal & Lafon, 1998; Chemale Jr. et al., Sm‑Nd (TDM) para as rochas intermediá rias
1999; Wildner et al., 2002, Matté et al., variam de 0,9 Ga a 2,1 Ga e, para as rochas
2021). As idades‑modelo Sm‑Nd (TDM) vã o á cidas, de 1,6 Ga a 3,3 Ga.
do Meso ao Paleoproterozoico, com valores O magmatismo bá sico da Formaçã o
entre 1,5 Ga e 1,9 Ga. Os valores de εNd(i) pa‑ Acampamento Velho pode representar a fu‑
ra essas rochas variam de ‑0,60 a ‑7,52. sã o da cunha de um manto do tipo EMI, com
As rochas á cidas do vulcanismo maior enriquecimento em ETR, possivel‑
Acampamento Velho geralmente tê m teores mente, a partir de apatitas (cf. modelo de
de SiO2 superiores a 70% e razõ es FeOt/(Fe‑ Foley, 1992) e uma moderada participaçã o
Ot+MgO) maiores do que 0,9, tı́picos de rioli‑ crustal (e.g. Wildner et al., 2002; Sommer et
tos de sistemas alta‑sı́lica e de sé ries al., 2005, 2006). As rochas á cidas da Forma‑
alcalinas (Ewart, 1979). Os elementos‑traço çã o Acampamento Velho poderiam ter sua
nos riolitos exibem padrõ es similares aos gê nese ligada, principalmente, a processos
das rochas granı́ticas de ambiente intraplaca de contaminaçã o crustal, tendo em vista o
e a elevada razã o Ce/Nb, bem como razõ es aumento dos isó topos de Sr e de Pb e, se‑
Zr/Nb > 10, assemelha‑se a das associaçõ es cundariamente, por cristalizaçã o fracionada,
magmá ticas pó s‑orogê nicas (Leat et al., a partir de um lı́quido menos diferenciado,
1986). Os menores conteú dos de Ce e de Sm originado a partir de fontes de um manto do
e os maiores de Rb e de Ta, combinados a ra‑ tipo EMI, como sugerido para a maior parte
zõ es menores de Ce/Nb, constatadas nos rio‑ do magmatismo pó s‑colisional alcalino‑só ‑

140 Edição da Sociedade Brasileira de Geologia – Núcleo RS/SC


Matté et al.

dico no sul do Brasil (Gastal & Lafon, 1998; vem ter evoluı́do, principalmente, por pro‑
Chemale Jr. et al., 1999; Wildner et al., 2002; cessos de cristalizaçã o fracionada, e dados
Matté et al., 2021). As caracterı́sticas geoquı́‑ isotó picos sugerem que este magmatismo se
micas das rochas á cidas sã o semelhantes à s originou, a partir de um manto empobreci‑
de granitos tipo‑A, tı́picas para ambiente do, que foi enriquecido, posteriormente, em
pó s‑colisional e que, no Escudo Sul‑Rio‑ elementos incompatı́veis, como Ba. Ainda,
Grandense, sã o representados pela Suı́te In‑ aqueles autores estimam que este magma‑
trusiva Saibro. tismo prové m do manto superior, tendo sua
As informaçõ es geocronoló gicas origem relacionada a fontes do tipo EMI, en‑
compiladas por Matté (2016) permitem con‑ riquecidas em Nd e empobrecidas em Sr, e
cluir que o vulcanismo da Formaçã o Acam‑ com comportamento tı́pico para basaltos de
pamento Velho possuiu um perı́odo de ambiente intraplaca continentais. Ainda,
atividade constante, ao longo de 30 Ma, com‑ Chemale Jr. (2000) estima uma origem, para
preendido entre, aproximadamente, 580 Ma essas rochas, a partir de um manto modi ica‑
(Sommer et al., 2017) e 549 Ma (Sommer et do, visto as idades‑modelo Sm‑Nd (TDM) de
al., 2005). 1,6 Ga a 1,9 Ga.
Almeida et al. (2010) obtiveram a
5. 3 O magmatismo moderadamente al‑ idade de 535 ±1 Ma para um basalto subvul‑
calino a toleítico do Membro Rodeio Ve‑ câ nico do Membro Rodeio Velho, atravé s do
lho mé todo Ar‑Ar. Almeida et al. (2012), atravé s
de dataçã o pelo mé todo U‑Pb em um basalto
A elevada alteraçã o intempé rica e hi‑ alcalino, determinaram a idade deste mag‑
drotermal das rochas do vulcanismo Rodeio matismo em 547 ±6 Ma e concluem que, no
Velho prejudicam sua caracterizaçã o geoquı́‑ rifte Guaritas (Almeida et al., 2009), durante
mica, o que, de fato, se re lete na escassez de este intervalo de aproximadamente 12 Ma,
dados sobre esta unidade. Entretanto, Almei‑ estabeleceu‑se um sistema distensivo, com
da et al. (2000) indicam conteú dos de SiO2 falhas profundas, que teriam permitido a as‑
entre 46% e 65%, compondo basaltos e an‑ censã o do magma manté lico desta unidade.
desitos de a inidade moderadamente alcali‑
na a toleı́tica, com predomı́nio de termos 6 CONSIDERAÇÕES FINAIS
bá sicos (Fig. 5A).
O cará ter moderadamente alcalino O perı́odo pó s‑colisional no Escudo
dessas rochas també m é indicado pelos pa‑ Sul‑Rio‑Grandense é marcado pela presença
drõ es de Nb, de Y, de Zr e de TiO2 (Fig. 5B), de extensas falhas transcorrentes e extensio‑
bem como pelo suave enriquecimento em nais e de zonas de cisalhamento, que permi‑
ETRL, em relaçã o aos ETRP (Fig. 5C), o que tiram a ascensã o de lı́quidos manté licos, que
indica uma similaridade com basaltos alcali‑ evoluı́ram por cristalizaçã o fracionada e por
nos, segundo Almeida et al. (2000). Alé m contaminaçã o crustal (Bitencourt & Nardi,
disso, Almeida et al. (2012) sugerem que es‑ 2000) e constituı́ram o magmatismo pó s‑co‑
te enriquecimento em ETRL ocorreu em con‑ lisional da orogenia Brasiliana Pan‑Africana,
diçõ es de baixas taxas de fusã o parcial, em que se destaca o vulcanismo ediacarano‑
provavelmente, associado a uma fonte que cambriano da Bacia do Camaquã . Esta bacia
conté m granada. é caracterizada pela alternâ ncia de ciclos
Almeida et al. (2000) consideram vulcâ nicos e pela sedimentaçã o siliciclá stica,
que as rochas do Membro Rodeio Velho de‑ desenvolvidas, dominantemente, sob condi‑

O Vulcanismo Ediacarano‑Cambriano da Bacia do Camaquã 141


Contribuições à Geologia do Rio Grande do Sul e de Santa Catarina

Figura 5 ‒ A) Diagrama TAS (Le Bas et al., 1986). A linha pontilhada separa as rochas alcalinas das
subalcalinas; B) Diagrama de elementos‑traço e de ETR normalizados pelo NMORB (Sun & McDonough,
1989); C, E e G) Diagramas de ETR normalizados pelo condrito (Nakamura, 1974); D) Diagrama de elementos‑
traço e de ETR normalizados pelo OIB (Sun & McDonough, 1989); e F) Diagrama de elementos‑traço e de ETR
normalizados pelo ORG (Pearce et al., 1984).

142 Edição da Sociedade Brasileira de Geologia – Núcleo RS/SC


Matté et al.

çõ es subaé reas em ambientes continentais. O Almeida, D. P. M., Lopes, R. C., Lima, L. & Go‑
magmatismo da bacia perdurou intermiten‑ mes, C. H. 2000. Petrography and geochemis‑
temente, por cerca de 65 Ma, e sua evoluçã o, try of the volcanic rocks from the Rodeio
desde a a inidade alcalina potá ssica (Forma‑ Velho Formation (Ordovician of the Camaquã
Basin, RS, Brazil): preliminary results. Revis‑
çã o Hilá rio), passando a alcalina só dica (For‑
ta Brasileira de Geociências, Sã o Leopoldo,
maçã o Acampamento Velho) e inalizando 30: 769‑774.
como alcalina/toleı́tica (Membro Rodeio Ve‑
lho), re lete diferentes origens crustais e Almeida, D. P. M., Zerfass, H., Basei, M. A., Pe‑
manté licas metassomatizadas, com grande try, K. & Gomes, C. H. 2002. The Acampamen‑
in luê ncia de lı́quidos, que marcam a exaus‑ to Velho Formation, a Lower Cambrian
Bimodal Volcanic Package: Geochemical and
tã o de reservató rios manté licos hidratados,
Stratigraphic Studies from the Cerro do Bu‑
gerados na subducçã o pré via. A caracterı́sti‑ gio, Perau and Serra de Santa Bá rbara (Caça‑
ca metassomá tica deste magmatismo, relaci‑ pava do Sul, Rio Grande do Sul, RS ‑ Brazil).
onada à subducçã o das fontes manté licas, é Gondwana Research, 5(3): 721‑733.
evidenciada pelas anomalias negativas de Nb
e pelas caracterı́sticas isotó picas, tı́picas de Almeida, R. P., Janikian, L., Fragoso‑Cesar, A.
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pontual de qualquer centro emissor (centro ology, 118: 145‑161.
eruptivo) do vulcanismo da Bacia do Ca‑
maquã ainda nã o puderam ser feitas, devido Almeida, R. P., Janikian, L., Fragoso‑Cesar, A.
R. S. & Marconato, A. 2009. Evolution of a rift
à ausê ncia de dados sobre as variaçõ es late‑
basin dominated by subaerial deposits: the
rais signi icativas ou sobre as fá cies proxi‑ Guaritas Rift, Early Cambrian, Southern Bra‑
mais dos depó sitos, alé m da complexidade zil. Sedimentary Geology, 217: 30‑51.
causada pela deformaçã o rú ptil subsequen‑
te. Bitencourt, M. F. & Nardi, L. V. S. 2000. Tecto‑
nic setting and sources of magmatism rela‑
ted to the southern Brazilian Shear Belt.
AGRADECIMENTOS Revista Brasileira de Geociências, 30: 184‑
187.
Os autores agradecem ao CNPq pelo
auxı́lio inanceiro e bolsas de doutorado e Bongiolo, E. M. 2006. Integração de dados mi‑
produtividade em pesquisa (141977/2011‑ neralógicos, isótopos estáveis (O, H) e porosi‑
6, 303015/2015‑2, 441766/2014‑5, dade de rochas (14C‑PMMA) no
reconhecimento da evolução da alteração no
304036/2018‑8, 406925/2018‑6,
sistema hidrotermal de Lavras do Sul/RS, Bra‑
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146 Edição da Sociedade Brasileira de Geologia – Núcleo RS/SC


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O Vulcanismo Ediacarano‑Cambriano da Bacia do Camaquã 147


Anisotropia de Susceptibilidade Magnética (ASM):
uma ferramenta para a reconstrução de
sistemas vulcânicos ácidos Neoproterozoicos
da Bacia do Camaquã (RS)
Jairo Francisco Savian*, Carlos Augusto Sommer,
Maurı́cio Barcelos Haag

Instituto de Geociê ncias, Universidade Federal do Rio Grande do Sul

*autor correspondente: jairo.savian@ufrgs.br

1 INTRODUÇÃO
A orientaçã o preferencial dos minerais é caracterı́stica de cada tipo de rocha e é resulta‑
do de vá rios processos geoló gicos, tais como o luxo da á gua em sedimentos, o luxo de lava ou
de magma em rochas vulcâ nicas e plutô nicas ou a deformaçã o das rochas metamó r icas. Nesse
contexto, o estudo da orientaçã o dos minerais pode nos ajudar a entender diversos processos
geoló gicos. Nas rochas metamó r icas, por exemplo, a orientaçã o dos minerais é visı́vel a olho nu
e mensurá vel em campo. No entanto em rochas como basaltos e granitos maciços, esta orienta‑
çã o é observada apenas atravé s de instrumentos e de té cnicas avançadas de laborató rio.
Os minerais magné ticos, mesmo ocorrendo em quantidades pequenas nas rochas, nor‑
malmente apresentam uma orientaçã o preferencial, conhecida como fá brica ou trama magné ti‑
ca. Quando os grã os sã o orientados preferencialmente em uma rocha, ela pode apresentar uma
anisotropia de susceptibilidade magné tica (ASM). A ASM pode ser investigada, por meio da ani‑
sotropia magné tica, té cnica baseada na variabilidade direcional das propriedades magné ticas,
que permite a determinaçã o da trama estrutural (petrofá brica) das rochas (Graham, 1954). Des‑
de a publicaçã o do trabalho pioneiro de Graham (1954), a ASM tem sido amplamente utilizada
no estudo de processos geoló gicos. No Brasil, esta té cnica foi introduzida no inı́cio dos anos de
1990 (e.g. Archanjo, 1993; Raposo & Ernesto, 1995). Atualmente, vá rios trabalhos vê m contri‑
buindo para o entendimento de processos geoló gicos em diferentes tipos de rochas no sul do
Brasil (e.g. Raposo & Ernesto, 1995; Gastal et al., 2015; Guimarã es et al., 2018; Lyra et al., 2018;
Benites et al., 2020; Sbaraini et al., 2020; Tomé et al., 2020; Haag et al., 2021; Gambeta et al.,
2021, submetido).
Contribuições à Geologia do Rio Grande do Sul e de Santa Catarina

O avanço tecnoló gico e a criaçã o de tares e metamó r icas (Graham, 1954). Fluxos
novos instrumentos sensı́veis possibilita me‑ de lava e corpos subvulcâ nicos frequente‑
dir a anisotropia da maioria das rochas, com mente apresentam escassez de indicadores
uma boa precisã o, mesmo das que apresen‑ cinemá ticos macroscó picos (como, por exem‑
tam baixo grau de anisotropia, como, por ex‑ plo, minerais alongados e estruturas de linea‑
emplo, rochas vulcâ nicas e sedimentares çã o e de foliaçã o magmá tica), tornando
(Tarling & Hrouda, 1993). Alé m disso, a ASM necessá ria a aplicaçã o de uma té cnica capaz
é uma té cnica rá pida e nã o destrutiva, o que de determinar a orientaçã o da trama micros‑
a torna versá til e aplicá vel em vá rios ramos có pica presente nestas rochas. Por esse moti‑
da Geologia estrutural e da Geofı́sica. vo, a ASM tem sido amplamente utilizada em
Devido a processos erosivos, que estudos de sequê ncias vulcâ nicas, tendo em
promovem a remoçã o de partes do sistema vista as limitaçõ es das té cnicas convencionais
vulcâ nico, e tectô nicos, responsá veis pelo so‑ de campo (e.g. Cañ ó n‑Tapia, 2005).
terramento, pelo soerguimento e pela defor‑ A té cnica de ASM se baseia na obten‑
maçã o do registro geoló gico, o estudo e a çã o da susceptibilidade magné tica (k) de
reconstruçã o de sistemas vulcâ nicos em ter‑ uma amostra, por meio do uso de um suscep‑
renos antigos é sempre um desa io geoló gico. tibilı́metro. Este aparelho gera um campo
Nas ú ltimas dé cadas, a ASM vem sendo larga‑ magné tico (H) e mede a resposta da amostra
mente utilizada no entendimento do vulca‑ a este campo, ou seja, sua magnetizaçã o (M).
nismo em sistemas modernos, com exemplos A Figura 1 representa esse processo, em que
no Hawaı́ e nos Andes (e.g. Cañ ó n‑Tapia, uma amostra é submetida a um campo H em
2005; Moncinhatto et al., 2020). No entanto, diferentes posiçõ es. Tendo em vista que a
sua aplicaçã o ainda é incipiente em estudos magnetizaçã o é proporcional à susceptibili‑
relacionados a terrenos vulcâ nicos no Brasil. dade (M = k × H), medindo a amostra em di‑
Quando aplicada a sucessõ es antigas, a ASM ferentes posiçõ es é possı́vel obter um tensor
compõ e uma té cnica promissora, pois possi‑ magné tico (K). Este tensor representa a ori‑
bilita a identi icaçã o de centros emissores e entaçã o das partı́culas magné ticas na amos‑
de processos vulcanoló gicos e tectô nicos tra (sejam elas paramagné ticas,
(e.g. Haag et al., 2021; Gambeta et al., 2021, diamagné ticas ou ferromagné ticas) e é de i‑
submetido; e suas referê ncias). Todos esses nido, em orientaçã o e em magnitude, por trê s
aspectos sã o essenciais ao entendimento da eixos principais: K1 ≥ K2 ≥ K3 (Fig. 1) (Tarling
evoluçã o de sistemas geoló gicos complexos, & Hrouda, 1993). Para ins de aná lise, de
como, por exemplo, o vulcanismo pó s‑tectô ‑ comparaçã o e de estatı́stica, os eixos princi‑
nico em cinturõ es orogê nicos. Nas seçõ es se‑ pais sã o usualmente representados, usando
guintes, serã o discutidos os princı́pios da uma projeçã o estereorá ica, conforme apre‑
ASM e como ela pode ser aplicada a suces‑ sentado na Figura 1.
sõ es vulcâ nicas antigas, por meio de um es‑ A aná lise de orientaçã o e de magni‑
tudo de caso. tude dos eixos é realizada de forma seme‑
lhante à aná lise estrutural, sendo necessá rias
2 PRINCÍPIOS DA ASM E SUA APLICA‑ vá rias medidas de diversas amostras, para se
ÇÃO EM SISTEMAS VULCÂNICOS obter um resultado signi icativo. Dessa for‑
ma, o tensor magné tico obtido auxilia na de‑
A ASM consiste em uma té cnica geo‑ terminaçã o da foliaçã o (que tem seu polo
fı́sica, capaz de determinar a orientaçã o da marcado pelo eixo K3) e da lineaçã o (marcada
fá brica magné tica de rochas ı́gneas, sedimen‑ pelo eixo K1) magné ticas, feiçõ es que podem
150 Edição da Sociedade Brasileira de Geologia – Núcleo RS/SC
Savian et al.

Figura 1 ‒ Processo de obtençã o da susceptibilidade magné tica e de representaçã o do tensor magné tico
resultante.

ajudar na identi icaçã o da paleocorrente, das decorrente do luxo magmá tico, é mais in‑
fontes emissoras e dos regimes de luxo. tenso (Fig. 2A) (Cañ ó n‑Tapia & Herrero‑Ber‑
Alé m disso, com a ASM també m é possı́vel vera, 2009). Em diques, os tensores
obter informaçõ es sobre a forma do tensor magné ticos em bordas opostas tendem a ser
magné tico, por meio do parâ metro de forma distintos, possibilitando a identi icaçã o do
(T), que classi ica as amostras em oblatas, sentido de luxo, que é marcado pela conver‑
prolatas e triaxiais (Jelinek, 1981), e sobre o gê ncia dos eixos K1 de amostras obtidas em
grau de anisotropia (P’), que indica a dife‑ limites opostos do dique.
rença de proporçã o entre os eixos principais. No caso de derrames de lava e de de‑
Esses parâ metros auxiliam na de iniçã o do pó sitos de luxo piroclá sticos governados por
regime de luxo e dos processos de deforma‑ luxo laminar, a orientaçã o dos tensores
çã o. magné ticos tende a ser sub‑horizontal (Fig.
A aplicaçã o das té cnicas, relaciona‑ 2B), com o desenvolvimento de um imbrica‑
das à trama magné tica, é uma ferramenta mento basal, que permite a identi icaçã o do
muito ú til em sistemas vulcâ nicos, tendo em sentido de luxo, com base no sentido de im‑
vista sua aplicaçã o, tanto em sistemas de ali‑ bricamento do eixo K3. Em porçõ es de frente
mentaçã o quanto em processos super iciais, de derrame, pode haver o desenvolvimento
como derrames de depó sitos de luxos piro‑ de uma fá brica subvertical, que é associada à
clá sticos (e.g. Cañ ó n‑Tapia et al., 1996; progressã o do derrame (Fig. 2B) (Cañ ó n‑Ta‑
Cañ ó n‑Tapia, 2005; Moncinhatto et al., 2020; pia et al., 1996).
e suas referê ncias). Durante processos erup‑ Usualmente, o resultado obtido com
tivos, podem ocorrer signi icativas diferen‑ a ASM é satisfató rio e tem relaçã o direta com
ças na dinâ mica de luxo (e.g. Cagnoli & a trama presente nas amostras, sendo, por‑
Tarling, 1997) e, dessa forma, orientaçõ es tanto, uma anistropia de forma, que indica a
distintas de trama magné tica podem ser ob‑ direçã o preferencial dos minerais. Entretan‑
tidas, em funçã o do local de amostragem. to, é importante salientar que existem exce‑
Diques e condutos alimentadores çõ es e, nesses casos, a interpretaçã o da ASM
tendem a apresentar foliaçã o magné tica sub‑ exige estudos mais aprofundados. Essas ex‑
vertical, mais bem registrada junto aos limi‑ ceçõ es estã o geralmente associadas a fatores
tes do corpo intrusivo, onde o cisalhamento, geomé tricos, estruturais e cristalográ icos
Anisotropia de Susceptibilidade Magnética (ASM) 151
Contribuições à Geologia do Rio Grande do Sul e de Santa Catarina

Figura 2 ‒ Ambientes vulcâ nicos e as respectivas orientaçõ es dos tensores magné ticos e de suas projeçõ es
estereográ icas: A) Zonas de condutos ou de diques; e B) Derrames.

dos minerais magné ticos (Rochette et al., apresenta anisotropia de forma, ou seja, seu
1992, 1999; Moncinhatto et al., 2020; e suas eixo maior coincide com o eixo de maior
referê ncias): susceptibilidade K1 (no caso de grã os MD).
1. Geomé tricos: (i) caso as partı́culas Entretanto, existem minerais que apresen‑
presentes na amostra nã o apresentem uma tam tipos distintos de anisotropia, como, por
orientaçã o ou um formato preferencial, a exemplo, a hematita e grande parte dos sili‑
proporçã o dos eixos principais será seme‑ catos. Nesses casos, o maior eixo do mineral
lhante (K1 ~ K2 ~ K3) e, por consequê ncia, o nã o coincide, necessariamente, com o maior
tensor resultante será pouco de inido ou terá eixo de susceptibilidade magné tica. Esse ti‑
um formato de esfera, impossibilitando a de‑ po de anisotropia é conhecido como magne‑
terminaçã o con iá vel das direçõ es de K1, K2 e tocristalina e, nestes casos, K1 é paralelo a
K3; e (ii) caso as partı́culas magné ticas inte‑ um eixo cristalográ ico especı́ ico (Rochette
rajam entre si, pode ocorrer o surgimento de et al., 1992; Biedermann, 2018).
uma anisotropia de distribuiçã o (Hargraves Dessa forma, ica clara a necessida‑
et al., 1991). Dependendo da proximidade de de um estudo aprofundado, a respeito da
das partı́culas, esse efeito pode anular ou po‑ mineralogia magné tica presente na amostra
de contrariar a anisotropia de forma, levando em estudo, de forma a evitar interpretaçõ es
a interpretaçõ es distintas da ASM; errô neas da ASM. A caracterizaçã o magné ti‑
2. Estruturais: grã os magné ticos sã o ca busca identi icar as fases minerais pre‑
compostos por estruturas de domı́nio. Em sentes em uma amostra, que contribuem
funçã o dessas estruturas, podem ocorrer para a magnetizaçã o e para a anisotropia,
respostas distintas à magnetizaçã o. No caso bem como determinar o tamanho de grã o
de grã os multidomı́nio (MD), a fá brica resul‑ dos minerais. Isso se faz, por meio de diver‑
tante é normal, com K1 paralelo ao maior ei‑ sos experimentos, que permitem a identi i‑
xo do mineral (Rochette et al., 1992). Em caçã o das propriedades fı́sicas desses
contraste, grã os de domı́nio simples (DS) minerais.
apresentam fá brica inversa, o que faz com Uma das maneiras mais diretas de
que os eixos K1 e K3 da ASM sejam trocados identi icaçã o dos minerais ferromagné ticos
(Rochette et al., 1992, 1999; Moncinhatto et de uma amostra é a aná lise da variaçã o da
al., 2020); susceptibilidade magné tica, em funçã o da
3. Cristalográ icos: a magnetita com‑ temperatura, para a determinaçã o das tem‑
põ e o mineral magné tico mais comum e peraturas de Curie (e.g. Dunlop & Ozdemir,

152 Edição da Sociedade Brasileira de Geologia – Núcleo RS/SC


Savian et al.

1997). As chamadas curvas termomagné ti‑ necessá rio que as curvas sejam analisadas
cas auxiliam na identi icaçã o das temperatu‑ pela decomposiçã o da curva de MRI entre di‑
ras de transiçã o, que sã o caracterı́sticas para ferentes curvas cumulativas do tipo log‑
cada mineral (e.g. a temperatura de Curie Gaussian (Cumulative Log‑Gaussian ‒ CLG)
para magnetita ~ 580 oC e a temperatura de (Robertson & France, 1994). Dessa forma, é
Né el para hematita ~ 675 oC). Alé m disso, as possı́vel obter os valores especı́ icos de
curvas termomagné ticas també m informam MRIS, de coercividade mé dia e do ı́ndice de
sobre as mudanças de estrutura cristalina e dispersã o (DP).
sobre as reaçõ es quı́micas, que afetam os mi‑ Os ciclos de histerese permitem a
nerais, devido ao aquecimento da amostra. obtençã o simultâ nea de diversos parâ me‑
As curvas de aquecimento e de resfriamento tros, incluindo Hc, Hcr, Ms, Mrs. Estes dados
sã o ditas reversı́veis, se nã o ocorrerem podem ser interpretados, utilizando‑se o Di‑
transformaçõ es mineraló gicas durante o agrama de Day, o qual de ine as regiõ es de
aquecimento, ou seja, a susceptibilidade domı́nio do material, a partir dos parâ metros
magné tica, durante o aquecimento e o resfri‑ Mr/Mrs versus Hcr/Hc (Day et al., 1977).
amento, continua inalterada. Caso ocorram Neste diagrama, sã o de inidos campos com
transformaçõ es quı́micas e estruturais du‑ os domı́nios de grã os: domı́nio simples (SD),
rante o aquecimento, o comportamento das pseudo‑domı́nio simples (PSD) e multidomı́‑
curvas de aquecimentos e de resfriamento nio (MD).
será diverso e, assim, sã o chamadas de irre‑ Atualmente, o Diagrama de Day está
versı́veis. caindo em desuso, principalmente, porque
Uma alternativa consiste em estudar suas interpretaçõ es sã o empı́ricas e vá lidas
propriedades magné ticas em temperatura para magnetita e titanomagnetita apenas
ambiente. As curvas de magnetizaçã o rema‑ (e.g. Roberts et al., 2018). O diagrama irst
nente isotermal (MRI) e de histerese possibi‑ order reversal curve (FORC) é a té cnica mag‑
litam a obtençã o da coercividade (Hc), da né tica atualmente utilizada, para determinar
coercividade de remanê ncia (Hcr), da mag‑ a estrutura de domı́nio dos minerais (e.g.
netizaçã o de saturaçã o (Ms) e da magnetiza‑ Roberts et al., 2017). Estas curvas sã o deri‑
çã o remanente de saturaçã o (Mrs) das vadas de diversas mediçõ es de vá rios ciclos
amostras. A MRI consiste na aplicaçã o de um de histerese em uma amostra, distribuı́das
campo contı́nuo H, sucessivamente maior, em um amplo espectro de campo magné tico
em temperatura constante, até a saturaçã o aplicado. O modelamento das curvas de his‑
da amostra. Apó s cada etapa de induçã o terese, por meio de funçõ es de distribuiçõ es
magné tica, a magnetizaçã o é medida, até a bidimensionais, gera os diagramas FORC,
saturaçã o da amostra ser atingida (MRIS). que sã o conhecidos, també m, como diagra‑
Geralmente, os equipamentos atualmente mas de contorno. Os diagramas FORC tam‑
disponı́veis permitem induzir campos má xi‑ bé m fornecem informaçõ es sobre a interaçã o
mos de 2 Tesla. Dessa forma, é possı́vel obter entre partı́culas, o que é fundamental, quan‑
a magnetizaçã o de saturaçã o (MRIS) de do há variaçã o do tamanho do grã o.
grande parte dos minerais magné ticos por‑ Em certos casos, é necessá rio isolar
tadores das rochas (e.g. magnetita ~ 30‑200 a contribuiçã o dos minerais ferromagné ticos
mT e hematita > 1T). Em caso de ocorrê ncia das matrizes diamagné tica e paramagné tica,
de mistura de minerais ferromagné ticos nas o que pode ser feito, por meio da aplicaçã o
amostras, a contribuiçã o de cada mineral se da Anisotropia de Magnetizaçã o Remanente
re lete nas curvas de aquisiçã o. Neste caso, é Anisteré tica (AMRA) (Jackson, 1991). De for‑
Anisotropia de Susceptibilidade Magnética (ASM) 153
Contribuições à Geologia do Rio Grande do Sul e de Santa Catarina

ma aná loga à ASM, a AMRA é descrita por um porçã o da histó ria geoló gica no sul do Bra‑
elipsoide de remanê ncia anisteré tica, com‑ sil.
posto por trê s eixos ortogonais M1 ≥ M2 ≥
Durante o inal do Neotroterozoico
M3.
ocorre a Bacia do Camaquã , um locus depo‑
Tendo em vista os fatores apresenta‑ sional para expressivoes eventos tectono‑
dos, é necessá rio um bom reconhecimento magmá ticos e de sedimentaçã o de deforma‑
de campo e um protocolo de amostragem e çã o, de vulcanismo, de plutonismo e de
de preparaçã o das amostras (Fig. 3). A amos‑ sedimentaçã o (Lima et al., 2007). As mani‑
tragem é frequentemente realizada com uma festaçõ es vulcâ nicas ocorrem, principal‑
motosserra adaptada, contendo uma broca mente, ao longo de um perı́odo de cerca de
nã o magné tica diamantada, com diâ metro de 55 Ma (aproximadamente, 592‑535 Ma) (Li‑
~ 2,5 cm. Os cilindros amostrados sã o orien‑ ma et al., 2007), compondo um mosaico de
tados, com o auxı́lio de bú ssolas magné tica e registros, que inclui a presença de depó sitos
solar. No laborató rio, esses cilindros sã o cor‑ explosivos e efusivos (derrames de lava, lu‑
tados em espé cimes padrã o (com 2,5 cm de xos de densidade piroclá sticos, corpos sub‑
diâ metro por 2,2 cm de altura), que sã o utili‑ vulcâ nicos).
zados nas té cnicas de ASM e de AMRA. Por
De acordo com diversos autores (Li‑
im, porçõ es irregulares dos cilindros amos‑
ma et al., 2007, e referê ncias), os eventos
trados sã o separadas, para a caracterizaçã o
vulcâ nicos da Bacia do Camaquã podem ser
magné tica, essencial à determinaçã o do por‑
agrupados em trê s ciclos vulcâ nicos:
tador magné tico e à correta interpretaçã o
1. Rochas efusivas e piroclá sticas,
dos resultados (e.g. Moncinhatto et al., 2020,
subordinadas, ligadas ao vulcanismo de
e suas referê ncias).
composiçã o predominantemente interme‑
diá ria, de a inidade shoshonı́tica, agrupadas
3 O VULCANISMO NEOPROTEROZOICO na Formaçã o Hilá rio;
DA BACIA DO CAMAQUÃ
2. Rochas efusivas e piroclá sticas,
Localizado no centro‑oeste do esta‑ associadas ao vulcanismo bimodal, de a ini‑
do do Rio Grande do Sul, o Escudo Sul‑Rio‑ dade moderadamente alcalina só dica, agru‑
Grandense (ESRG) registra uma importante padas na Formaçã o Acampamento Velho;

Figura 3 ‒ Fluxograma, para amostragem paleomagné tica e de té cnicas para determinaçã o da mineralogia
magné tica e da orientaçã o da trama magné tica em rochas. (Legenda: VSM: Vibrating Sample Magnetometer).

154 Edição da Sociedade Brasileira de Geologia – Núcleo RS/SC


Savian et al.

3. Rochas predominantes efusivas, aplicaçã o da ASM, o a loramento do Cerro do


associadas ao vulcanismo de composiçã o bá ‑ Perau, em que ocorrem lavas riolı́ticas, asso‑
sica‑intermediá ria e de a inidade moderada‑ ciadas à Fm. Acampamento Velho (Fig. 4). Os
mente alcalina a toleı́tica alto‑K, agrupadas riolitos do a loramento Cerro do Perau sã o
no Membro Rodeio Velho. caracterizados por uma complexidade de es‑
Apesar de intensivos estudos durante truturas de luxo, muitas vezes, gerando ban‑
as ú ltimas dé cadas (e.g. Almeida et al., 2002; damento magmá tico e abundâ ncia de dobras
Sommer et al.,2005; Lima et al., 2007), diver‑ (Zerfass et al., 2000; Freitas, 2019; Haag et
sos aspectos relacionados à dinâ mica do vul‑ al., 2021), sugerindo uma complexa dinâ mi‑
canismo fé lsico da Bacia do Camaquã , ca de luxo nesses derrames. A im de deter‑
continuam em debate, principalmente, no minar os processos de colocaçã o e a
que tange aos aspectos fı́sicos, à s possı́veis dinâ mica de luxo deste derrame, foram rea‑
fontes e à s condiçõ es de emplacement destes lizados trabalho de campo e aná lise de ASM
depó sitos (e.g. Lima et al., 2007; Sommer et em 12 sı́tios, conforme a metodologia apre‑
al., 2013; Matté et al., 2016; Haag et al., sentada na Figura 3.
2021). Dessa forma, té cnicas alternativas,
com o uso de Geofı́sica, tê m sido aplicadas no 4. 1 Aspectos de campo e petrográ icos
estudo das sequê ncias vulcâ nicas presentes
no ESRG, com enfoque principal na Fm. Os riolitos sã o caracterizados por
Acampamento Velho (e.g. Haag et al., 2021; notá vel estrutura de luxo de lava, com pa‑
Gambeta et al., 2021, submetido). drõ es complexos e predomı́nio de diversos
tipos de dobramentos (Fig. 5A‑5B). As do‑
bras magmá ticas apresentam dimensõ es e
4 ESTUDO DE CASO
escalas variadas, mé tricas (Fig. 5A) a centi‑
Adotou‑se, como estudo de caso da mé tricas (Fig. 5B). A foliaçã o é caracterizada,

Figura 4 ‒ Mapa do ESRG, mostrando as ocorrê ncias vulcâ nicas Neoproterozoicas. Cidades: CS ‑ Caçapava do
Sul; DP ‑ Dom Pedrito; e VNS ‑ Vila Nova do Sul.

Anisotropia de Susceptibilidade Magnética (ASM) 155


Contribuições à Geologia do Rio Grande do Sul e de Santa Catarina

principalmente, por uma laminaçã o milimé ‑ com baixo teor de Ti, e com hematita (Hunt
trica, com variaçõ es colorimé tricas entre ro‑ et al., 1995; Lattard et al., 2006). Curvas de
sa e cinza. Esta laminaçã o pode ser plana ou MRI indicam amostras, que nã o alcançam
dobrada e é marcada por nı́veis alternados saturaçã o, mesmo, em campos de 1 T, suge‑
de graus de cristalinidade da rocha, resultan‑ rindo a existê ncia de uma fase magné tica de
te de desvitri icaçã o do material original‑ alta coercividade e uma de baixa (Fig. 6B).
mente vı́treo (Fig. 5B). Esse comportamento é con irmado por ci‑
Petrogra icamente, as rochas sã o he‑ clos de histerese, que apresentam um for‑
micristalinas e afanı́ticas, mas termos por i‑ mato caracterı́stico de cintura de vespa (i.e.,
riticos podem ocorrer, muito wasp‑waisted), indicativo da mistura de mi‑
subordinadamente. Em termos gerais, a ro‑ nerais com coercitividades distintas (Fig.
cha é constituı́da por um ino mosaico de mi‑ 6C) (Tauxe et al., 1996). Diagramas FORC
cró litos e de cristá litos de quartzo e de apresentam uma distribuiçã o centrada em
feldspato e por feiçõ es de desvitri icaçã o, Bu = 0, com baixo espalhamento, ao longo
principalmente, esferulitos (Fig. 5C). Os fe‑ do eixo Bc. Nesses diagramas, ocorre um pi‑
nocristais (< 3% de fenocristais) sã o repre‑ co de coercividade entre 10 mT e 15 mT,
sentados por quartzo e por K‑feldspato, em podendo representar mais de uma fase
associaçã o com microfenocristais (< 0,02 magné tica (Fig. 6D). Este padrã o é frequen‑
mm) de ó xidos de Fe‑Ti e de zircã o. Esses mi‑ temente interpretado como resultado de
nerais apresentam pouca abundâ ncia, ocor‑ grã os MD (Roberts et al., 2017). Aná lises de
rendo de forma localizada, ao longo de MEV, realizadas em duas amostras repre‑
planos de foliaçã o, e em quantidades meno‑ sentativas, indicam a existê ncia de uma pe‑
res do que 5% (Fig. 5D). Enquanto algumas quena quantidade de ó xidos de Fe‑Ti nas
lâ minas sã o geradas por nı́veis de devitri ica‑ amostras estudadas (Fig. 6E). Aná lises de
çã o, outras sã o marcadas pela presença de espectroscopia de energia dispersiva (EED)
fenocristais, o que indica a efetividade na revelam a presença de grã os equantes de ti‑
orientaçã o destes minerais, durante o luxo tanomagnetitas, com baixo conteú do de Ti
(Fig. 5D). (entre 0,56% e 9,88%) e de hematita como
. as principais fases magné ticas presentes
nas amostras estudadas, em concordâ ncia
4. 2 Mineralogia magnética
com os resultados de mineralogia magné ti‑
A caracterizaçã o magné tica foi reali‑ ca (Fig. 6E).
zada, utilizando‑se curvas termomagné ticas,
curvas de MRI, ciclos de histerese, diagramas 4. 3 Fábrica magnética e análise estru‑
FORC e microscopia eletrô nica de varredura tural
(MEV). As amostras dos riolitos sã o caracte‑
rizadas por uma ruidosa diminuiçã o gradual Os riolitos do Cerro do Perau apre‑
na susceptibilidade magné tica em tempera‑ sentam baixos valores de susceptibilidade
turas de ~ 582 oC e de 681 oC (Fig. 6A), valo‑ magné tica mé dia (Km), normalmente, na
res correspondentes à s temperaturas de faixa de 40 × 10‑6 SI (Fig. 7A, linha traceja‑
transiçã o da magnetita e da hematita (Hunt da). Estes valores estã o de acordo com os
et al., 1995; Lattard et al., 2006). Curvas ter‑ esperados para lavas de composiçã o riolı́ti‑
momagné ticas de baixa temperatura exibem ca (Hunt et al., 1995). Resultados escalares
duas transiçõ es, a ‑153 oC e a ‑50 oC (Fig. 6A), indicam graus variá veis de anisotropia (P’),
valores compatı́veis com titanomagnetita, de 1,003 a 3,18, sendo observada uma cor‑

156 Edição da Sociedade Brasileira de Geologia – Núcleo RS/SC


Savian et al.

Figura 5 ‒ Feiçõ es de campo e microscó picas do Cerro do Perau: A) Dobra mé trica recumbente; B) Sequê ncia
de dobras centimé tricas, marcadas por distintos nı́veis de recristalizaçã o; C) Matriz, marcada pela presença de
esferulitos (esf) e de cristais de quartzo (qtz) e de feldspato (felds); e D) Foliaçã o, marcada pela presença de
nı́veis ricos em cristais de quartzo e em ó xidos de Fe‑Ti. Abreviaçõ es: qtz ‑ quartzo; esf ‑ esferulito; fels ‑
feldspato alcalino.

relaçã o positiva, poré m pouco signi icativa, to (Fig. 7D), con igurando, possivelmente,
entre P’ e Km (Fig. 7A, quadrados em azul). A uma zona de alta deformaçã o magmá tica.
forma dos tensores magné ticos (T) aponta a Em relaçã o aos resultados direcio‑
predominâ ncia de tensores oblatos (T > 0), nais, os eixos magné ticos sã o geralmente
com mais de 74% dos tensores resultantes bem agrupados (Fig. 8A, com exceçã o dos sı́‑
apresentando queda neste campo (Fig. 7B). tios J, O, Q e R). Esses sı́tios compõ em os
Com exceçã o do sı́tio O, todos os outros sı́ti‑ a loramentos com menores valores de
os apresentam elipsoides oblatos ou triaxiais P’ (Fig. 7A), o que pode levar a problemas na
(Fig. 7B). de iniçã o dos eixos principais. Em diversos
Uma reconstruçã o do a loramento, sı́tios, K1 (lineaçã o magné tica) e K2 se agru‑
juntamente com os principais sı́tios amos‑ pam, sugerindo a presença de elipsoides for‑
trados, das feiçõ es estruturais e dos resulta‑ temente oblatos, com um eixo K3 bem
dos magné ticos é apresentada nas iguras 7C de inido. Os dados de trama magné tica (Fig.
e 7D, em que a á rea em cinza representa a 8B) també m indicam a predominâ ncia de fo‑
á rea do a loramento. E possı́vel observar a liaçõ es subverticais, com direçõ es NE‑SW e
predominâ ncia de elipsoides oblatos (Fig. N‑S, em concordâ ncia com grande parte dos
7C) e a presença de zonas com alto grau de dados estruturais de campo (Fig. 8C), que in‑
anisotropia na porçã o central do a loramen‑ cluem planos de foliaçã o, eixos e planos axi‑

Anisotropia de Susceptibilidade Magnética (ASM) 157


Contribuições à Geologia do Rio Grande do Sul e de Santa Catarina

Figura 6 ‒ Resultados representativos de caracterizaçã o magné tica das amostras do Cerro do Perau: A) Curvas
termomagné ticas; B) Curvas de MRI; C) Ciclo de histeres; D) Diagrama FORC; e E) MEV e espectro EED.

Figura 7 ‒ Resultados escalares da ASM: A) Diagrama P’‑Km e histograma de valores de Km (linha tracejada em
preto); B) Diagrama T‑P’; C) Distribuiçã o espacial do parâ metro de forma; e D) Distribuiçã o espacial do grau de
anistropia.

ais de dobras. Em contraste, as escassas line‑ caimento (geralmente, inferiores a 30o) e di‑
açõ es presentes, tanto magné ticas quanto es‑ reçã o NE‑SW (Fig. 8B‑8C).
truturais, apresentam baixos valores de

158 Edição da Sociedade Brasileira de Geologia – Núcleo RS/SC


Savian et al.

4. 4 Modelo de colocação logos, o padrã o estrutural e a vergê ncia das


dobras observadas no Cerro do Perau sã o
Uma caracterı́stica marcante dos rio‑ compatı́veis com os resultados esperados
litos presentes no a loramento Cerro do Pe‑ para uma zona de topo de derrame (Drago‑
rau é a ocorrê ncia notá vel de estruturas de ni et al., 1992). Apesar desta tendê ncia ge‑
luxo de lavas, principalmente, dobradas e, ral, orientaçõ es variadas podem ser
composicionalmente, com altos teores de observadas na á rea de estudo, sugerindo
SiO2 (Zerfass et al., 2000; Freitas, 2019; Haag uma complexidade estrutural para o a lora‑
et al., 2021). Do ponto de vista reoló gico, a mento Cerro do Perau.
presença pervasiva das estruturas de luxo e A predominâ ncia de tensores obla‑
de dobras magmá ticas indica um regime de tos (T > 0) é con irmada pelos dados de
deformaçã o preferencialmente planar e dú c‑ campo, que indicam a ausê ncia de feiçõ es li‑
til, com ausê ncia de deformaçã o constriccio‑ neares. O desenvolvimento preferencial de
nal, devido à ausê ncia de feiçõ es lineares uma fá brica oblata em derrames riolı́ticos
(Manley, 1992; Yang et al., 2019). pobres em cristais é comumente reportada
A presença de dobras em derrames por outros estudos de ASM, tendo sua ori‑
riolı́ticos deriva da compressã o, resultante gem associada à colocaçã o do derrame, que
do movimento do derrame, sendo a presença leva à dispersã o de micró litos, ao longo de
de lâ minas com viscosidades distintas um fa‑ planos de cisalhamento (Cañ ó n‑Tapia &
tor essencial ao desenvolvimento de dobras Castro, 2004).
(Smith & Houston, 1994). Estimativas de pa‑ Os valores mé dios de anisotropia
râ metros reoló gicos, para os derrames estu‑ (P’ = 1,25) observados na á rea de estudo
dados, indicam valores de viscosidade na sã o relativamente altos, quando compara‑
ordem de 108.5 Pa. s (Haag et al., 2021), de‑ dos com os valores reportados na literatura
notando um forte controle reoló gico sobre o para derrames riolı́ticos, que, geralmente,
desenvolvimento do derrame. De acordo apresentam valores má ximos (a nı́vel de es‑
com Fink (1980), o desenvolvimento de do‑ pé cime) de P’ < 1,50 (e.g. Cañ ó n‑Tapia,
bras se dá , preferencialmente, em zonas com 2004; Shields et al., 2016). Os valores de P’
concentraçã o de tensã o, como margens, topo observados na á rea de estudo sã o compatı́‑
e base de derrame. veis com resultados observados em zonas
Devido à ausê ncia de evidê ncias de de cisalhamento (e.g. Mertanen & Karell,
deformaçã o tectô nica na á rea de estudo, é 2011), o que sugere a presença de zonas de
possı́vel interpretar os resultados obtidos alta deformaçã o ‒ de origem magmá tica ‒
com a ASM como representantes da dinâ mi‑ no interior do derrame. A presença de zo‑
ca de colocaçã o e do regime de luxo do der‑ nas de alta deformaçã o magmá tica tem sido
rame estudado. No geral, as foliaçõ es reportada em outros derrames, incluindo o
magné ticas apresentam uma orientaçã o sub‑ derrame de Rocche Rosse (Lipari, Itá lia), em
vertical (Fig. 8A), padrã o observado em todo que elevados valores de P’ sã o observados
o a loramento (Fig. 8C) e con irmado por da‑ nas porçõ es intermediá rias e superiores do
dos estruturais de campo (Fig. 8B). A pre‑ derrame (Shields et al., 2016). E importante
sença de bandamento subvertical em rochas observar que apenas os tensores oblatos
fé lsicas é geralmente associada a zonas de apresentam altos valores de P’, sugerindo
conduto e de alimentaçã o (e.g. Simõ es et al., que altas taxas de deformaçã o foram aco‑
2018). Entretanto, quando comparados com modadas, principalmente, por meio de
modelos matemá ticos e com exemplos aná ‑ achatamento e de cisalhamento.

Anisotropia de Susceptibilidade Magnética (ASM) 159


Contribuições à Geologia do Rio Grande do Sul e de Santa Catarina

Figura 8 ‒ Resultados direcionais: A) Estereogramas, com os eixos principais da ASM; B) Distribuiçã o espacial
dos dados estruturais de campo; e C) Distribuiçã o dos dados de ASM.

5 CONCLUSÕES de dados de lineaçã o e de foliaçã o da fá brica


magné tica deve ser feita com rigor, princi‑
O vulcanismo Neoproterozoico, rela‑ palmente, com um estudo detalhado da mi‑
cionado aos está gios pó s‑colisionais do Ciclo neralogia magné tica, para se determinar o
Orogê nico Brasiliano/Pan‑Africano, tem um seu mineral portador e o seu tamanho de
papel muito importante na compreensã o da grã o. A ASM, associada a outros dados, como
evoluçã o do Escudo Sul‑Rio‑Grandense. Nes‑ trabalho de campo, geologia estrutural, ge‑
te sentido, é muito importante a reconstru‑ oquı́mica e reologia, é capaz de determinar
çã o destes sistemas vulcâ nicos, tanto do a colocaçã o de luxos riolı́ticos Neoprotero‑
ponto de vista petrogené tico, quanto paleo‑ zoicos, apesar de sua complexidade estrutu‑
geográ ico. A obtençã o de dados estruturais ral.
nestas sequencias vulcâ nicas antigas pode
ser muito complexa, devido aos processos e AGRADECIMENTOS
modi icaçõ es pó s‑deposicionais e é prejudi‑
cada, muitas vezes, pela textura muito ina Ao CNPq pelo auxı́lio inanceiro e
das rochas efusivas e piroclá sticas. Dessa for‑ bolsas de mestrado e produtividade em pes‑
ma, mé todos geofı́sicos podem ser muito quisa (303015/2015‑2, 441766/2014‑5,
ú teis na avaliaçã o de estruturas planares e li‑ 304036/2018‑8 e 406925/2018‑6).
neares. Mostramos, neste trabalho, que a
ASM pode ser uma ferramenta importante na REFERÊNCIAS
determinaçã o dos mecanismos de colocaçã o
e dos luxos riolı́ticos. Poré m, a interpretaçã o Almeida, D. P. M., Zerfass, H., Basei, M. A., Pe‑

160 Edição da Sociedade Brasileira de Geologia – Núcleo RS/SC


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Anisotropia de Susceptibilidade Magnética (ASM) 163


Crono‑correlação entre as Bacias do
Camaquã (RS) e do Itajaí (SC):
implicações Paleoambientais
e Paleogeográ ica
Paulo Sé rgio Gomes Paim1*, Farid Chemale Jr.1, Ilana Lehn1,
Bruno Becker‑Kerber2, Marina Luiza Jordã o Martins1
1
Programa de Pó s‑Graduaçã o em Geologia, Universidade do Vale do Rio dos Sinos
2
Centro de Ciê ncias Humanas e Bioló gicas, Universidade Federal de Sã o Carlos

*autor correspondente: ppaim@unisinos.br

1 INTRODUÇÃO
As bacias do Itajaı́ e do Camaquã tê m sido, há dé cadas, correlacionadas e associadas, via
de regra, mas, nã o de forma unâ nime, à s fases tardi‑ a pó s‑colisionais do Ciclo Orogê nico Brasi‑
liano. Por outro lado, desde os trabalhos basilares de Almeida (1967, 1969), a Bacia do Ca‑
maquã tem sido considerada aquela, em que o registro das fases inais da orogenia brasiliana se
encontra preservado de forma mais completa. No entanto, essa visã o, acerca da completitude
do registro vulcano‑sedimentar preservado na Bacia do Camaquã , deve, agora, ser aliada à per‑
cepçã o de que esta bacia nã o representa uma entidade tectô nica ú nica, na qual se acumulou to‑
do o registro vulcano‑sedimentar Ediacarano. Nesse sentido, o termo Bacia do Camaquã
representaria apenas um locus deposicional, em que diversas bacias, registradas na forma de
espessas unidades vulcano‑sedimentares, limitadas por discordâ ncias angulares, representam
episó dios tectono‑sedimentares distintos (tectono‑sequê ncias ou supersequê ncias), associadas
à acomodaçã o inal dos esforços, atuantes durante o inal do ciclo orogê nico. Seu registro deve
servir de base para a correlaçã o com as demais bacias, parcialmente correlatas (Almeida et al.,
2005).
Deste modo, qualquer correlaçã o direta e uniforme entre os registros das bacias do Ca‑
maquã e do Itajaı́, ou de qualquer outra bacia envolvida neste evento tectô nico maior, peca por
conceber um cená rio que envolve diferentes escalas de tempo. Assim que, em funçã o dos dados
geocronoló gicos, principalmente na forma de dataçõ es de zircã o, vulcâ nico ou detrı́tico, e pale‑
ontoló gicas, hoje disponı́veis, torna‑se possı́vel integrar os conhecimentos estratigrá ico e sedi‑
mentoló gico locais a um panorama paleogeográ ico maior, considerando, apenas, o tempo
registrado nas bacias em questã o. Abordagem similar foi empregada por Guadagnin et al.
Contribuições à Geologia do Rio Grande do Sul e de Santa Catarina

(2010) em sua comparaçã o entre as bacias do Ciclo Orogê nico Brasiliano/Pan‑Africano


do Itajaı́ e do Camaquã (Brasil), Arroyo del (900‑540 Ma). Para grande parte dos auto‑
Soldado (Uruguai) e Nama (Namı́bia). res, foi nas fases tardi‑ a pó s‑colisionais des‑
Neste sentido, apó s uma apresenta‑ te ciclo orogê nico que diversas bacias
çã o geral, este capı́tulo aborda, com maior vulcano‑sedimentares se formaram (Almei‑
detalhe, parte da histó ria da Bacia do Ca‑ da et al., 1976, 1981; Wernick et al., 1978;
maquã (Grupo Santa Bá rbara), de forma Machado & Fragoso‑Cesar, 1987; Brito Neves
comparativa ao registro completo da Bacia & Cordani, 1991), entre elas, as bacias do Ca‑
do Itajaı́ (Grupo Itajaı́). Busca‑se avaliar pa‑ maquã e do Itajaı́ (e.g. Gresse et al., 1996;
noramas sedimentoló gicos, estratigrá icos e Basei et al., 2000; Phillip et al., 2016), as
paleoambientais, que, juntos, gerem um ce‑ quais evoluı́ram entre o Cinturã o Dom Felici‑
ná rio paleogeográ ico regional, representati‑ ano e os crá tons do Rio de La Plata e Luı́s Al‑
vo do intervalo entre ca. 575 Ma e 550 Ma, ves (Fig. 1). Cabe destacar a existê ncia de
no sul do Brasil. Cabe salientar que as con‑ modelos alternativos, que vinculam a gê nese
cepçõ es estratigrá icas adotadas para os das bacias a esforços extensionais em con‑
grupos Itajaı́ e Santa Bá rbara respeitam as‑ texto interior, de forma totalmente desvincu‑
pectos gené ticos, i.e., a presença de superfı́‑ lada da orogenia Brasiliana (e.g. Almeida et
cies estratigrá icas‑chave, que denotem al., 2010).
quebras (limite de sequê ncias) e subdivisõ es
ló gicas (superfı́cies transgressivas e de má ‑ 3 AS BACIAS DO CAMAQUÃ E DO ITAJAÍ
xima inundaçã o) do registro estratigrá icos,
em consonâ ncia com as premissas da estra‑ Modelos que associam todo o regis‑
tigra ia de sequê ncias (Vail et al., 1977; Van tro da Bacia do Camaquã a uma ú nica enti‑
Wagoner et al., 1988, 1990). Esse vié s favo‑ dade tectô nica, formada em contexto
rece à compreensã o dos fenô menos subja‑ especı́ ico, sã o os mais frequentes. Usual‑
centes e serve de base para a divisã o dos mente, a gê nese desta bacia tem sido relaci‑
grupos Itajaı́ e Santa Bá rbara em unidades onada à s fases inais do Ciclo Brasiliano, seja
gené ticas. Assim, as subdivisõ es de ambos os associando‑a à subsidê ncia lexural (e.g. Iss‑
grupos podem ser entendidas e designadas ler, 1985; Jost, 1984; Gresse et al., 1996) ou à
como unidades aloestratigrá icas (NACSN, subsidê ncia mecâ nica devida à transcorrê n‑
2005). O uso concomitante de termos litoes‑ cia (e.g. Oliveira & Fernandes, 1992; Fernan‑
tratigrá icos se deve, nã o, apenas, à maior fa‑ des et al., 1992; Sommer et al., 2006). Outros
miliaridade da comunidade com esta autores sugerem um rifte anorogê nico intra‑
abordagem, mas, sobretudo, devido ao fato placa, totalmente desvinculado do Cinturã o
de as discordâ ncias serem limites ideais pa‑ Dom Feliciano (e.g. Fragoso‑Cesar et al.,
ra unidades litoestratigrá icas (NACSN, 2000, 2003; Janikian et al., 2001; Janikian,
2005). 2004; Almeida et al., 2010). Por outro lado, a
percepçã o de que a Bacia do Camaquã nã o
seria uma entidade tectô nica ú nica, na qual
2 CONTEXTO GEOLÓGICO
todo o registro vulcano‑sedimentar Ediaca‑
A aglutinaçã o do Gonduana Ociden‑ rano teria se acumulado, també m vem sen‑
tal transcorreu com a colisõ es de nú cleos do, há muito, advogada (Fragoso‑Cesar et al.,
cratô nicos e com a formaçã o de cinturõ es 1982, 1984, 1985, 1992; Beckel, 1990, 1992;
orogê nicos (Brito Neves et al., 2014; Oriolo Machado & Sayeg, 1992; Sayeg et al., 1992;
et al., 2017; Goscombe et al., 2018), ao longo Paim et al., 2000, 2014; Menegat & Fernan‑

166 Edição da Sociedade Brasileira de Geologia – Núcleo RS/SC


Paim et al.

des, 2001; Borba, 2006). Nesta linha, a Bacia em dados geocronoló gicos recentes, estima‑
do Camaquã nunca teria existido como uma se que esse locus registre ca. 65 Ma de histó ‑
bacia individual e ú nica, mas, sim, represen‑ ria, decorrida entre ca. 600 Ma e 535 Ma
taria um locus deposicional, no qual diversas (Martins et al. (submetido); Hartmann et al.,
bacias, ligadas a distintos episó dios tectono‑ 2008).
vulcano‑sedimentares, foram geradas para A Bacia do Camaquã inclui quatro
acomodar os esforços existentes, ao inal do grupos, limitados por discordâ ncias angula‑
Ciclo Brasiliano (Paim et al., 2014). Com base res (Paim et al., 2014; Bica, 2013), que com‑

Figura 1 ‒ Mapa geoló gico, contextualizando as bacias do Camaquã (1) e do Itajaı́ (2), baseado em Phillip et al.
(2016).

Crono‑correlação entre as Bacias do Camaquã (RS) e do Itajaí (SC) 167


Contribuições à Geologia do Rio Grande do Sul e de Santa Catarina

põ em o Supergrupo Camaquã e que repre‑ 4 CORRELAÇÃO ENTRE AS BACIAS DO


sentam uma sucessã o de bacias de natureza CAMAQUÃ E DO ITAJAÍ
distinta. A bacia inclui o registro das fases
tardi‑orogê nicas, nas bacias de antepaı́s Ma‑ A idade má xima de deposiçã o na Ba‑
ricá e Porongos II (Pertille et al., 2015, 2017; cia do Itajaı́ foi estimada em 563 Ma, idade
Hö ig et al., 2018; Martins et al. (submeti‑ obtida a partir de aná lises de U‑Pb em zir‑
do)) e transcorrentes Bom Jardim Leste e cõ es, provenientes de amostras de tufo e de
Bom Jardim Oeste, e pó s‑orogê nicas, nos rif‑ arenitos vulcanoclá sticos (Guadagnin et al.,
tes Santa Bá rbara Oeste e Santa Bá rbara 2010). Recentemente, outra camada de tufo,
Leste e, por im, no Rifte Guaritas (Paim et amostrada em local distinto, mas pertencen‑
al., 2014). do ao mesmo intervalo estratigrá ico datado
Essa sucessã o de bacias, separadas por Guadagnin et al. (2010), indicou uma
por hiatos de poucos milhõ es da anos entre idade deposicional muito similar (563 ±3,3
seus registros, mostram intensidade de de‑ Ma) para a porçã o inferior do Grupo Itajaı́
formaçã o decrescente e transiçã o de contex‑ (Becker‑Kerber et al., 2020). Já a idade mı́ni‑
tos marinho (Grupo Maricá ) para os de lagos ma do grupo foi estimada em 549 ±4 Ma,
profundos (Grupo Bom Jardim) e, depois, idade do Riolito Apiú na, que intrude essa
para os rasos (Grupo Santa Bá rbara), inali‑ unidade (Guadagnin et al., 2010). Assim, o
zando com os sistemas eó licos e aluviais Grupo Itajaı́ engloba cerca de 13 Ma (ca. 563
(Grupo Guaritas). Em conjunto, indicam Ma a 549 Ma).
uma gradual continentalizaçã o e um arrefe‑ A Bacia do Camaquã registra uma
cimento nos esforços tectô nicos, durante as histó ria bem mais longa (ca. 65 Ma) trans‑
fases tardi‑ a pó s‑colisionais do Ciclo Brasili‑ corrida entre ca. 605 Ma e 535 Ma (Hart‑
ano (Paim et al., 2000). Os trê s ú ltimos gru‑ mann et al., 2008; Martins et al., submetido).
pos registram eventos vulcâ nicos pró ximos Assim, uma correlaçã o pura e simples entre
à s suas bases, incluindo rochas toleı́ticas cá l‑ estas bacias é inadequada. A correlaçã o mais
cio‑alcalinas e shoshonı́ticas a alto potá ssi‑ plausı́vel se faz com o Grupo Santa Bá rbara,
cas, na base do Grupo Bom Jardim, passando o qual envolve um registro menor do que 25
por rochas vulcâ nicas bimodais, toleı́ticas a Ma, tomando por base as idades das rochas
alcalino‑só dicas, na base do Grupo Santa vulcâ nicas da Formaçã o Acampamento Ve‑
Bá rbara, culminando com os basaltos alcali‑ lho e das rochas plutô nicas cogené ticas
nos, que ocorrem na base do Grupo Guaritas (Chemale Jr., 2000; Gastal & Lafon, 2001; Al‑
(Wildner et al., 2002; Sommer et al., 2005; meida et al., 2002; Janikian et al., 2004;
Janikian et al., 2012). Sommer et al., 2005; Vedana et al., 2017). As
A Bacia do Itajaı́ també m tem sido rochas efusivas aparecem, tanto na base do
interpretada de forma variada, em funçã o do grupo como, també m, de forma isolada, a
modelo tectô nico adotado, sendo comumen‑ oeste do Rifte Santa Bá rbara Oeste, onde
te interpretada como uma bacia de antepaı́s ocorrem horizontalizadas, formando os
(Issler, 1985; Basei, 1985; Soares, 1988; platô s da Ramada e do Taquarembó , e em
Gresse et al., 1996; Rostirolla, 1991; Rosti‑ outras ocorrê ncias menores (Sommer et al.,
rolla et al., 1992; Basei et al., 2011; Costa & 2005; Vedana et al., 2017). Neste sentido,
Nascimento, 2015), mas també m transcor‑ existem, ao menos, dois episó dios de efusã o
rente (Krebs et al., 1990; Schroeder, 2006) e de lavas e de produçã o de tufos, ligados a es‑
extensional (Silva, 1987; Citroni, 1993). sa unidade.

168 Edição da Sociedade Brasileira de Geologia – Núcleo RS/SC


Paim et al.

Na base do Grupo Santa Bá rbara, na acerca do preenchimento dos riftes Santa
serra homô nima, dataçõ es de U‑Pb em zircã o Bá rbara Oeste e Santa Bá rbara Leste.
indicaram idades de 573 ±18 Ma (Chemale
Jr., 2000), de 574 ±7 Ma e de 572 ±6,5 Ma (Je‑ 5 ESTRATIGRAFIA E SISTEMAS DEPOSI‑
nikian et al., 2012). Já no Platô da Ramada, CIONAIS
basaltos andesı́ticos da base foram datados
em 553 ±5,4 Ma, enquanto derrames riolı́ti‑ 5. 1 O Grupo Itajaí
cos de nı́veis superiores apresentam idades
As distintas concepçõ es estratigrá i‑
de 549 ±5 Ma (Sommer et al., 2005). Idade
cas propostas guardam algumas caracterı́sti‑
similar (553 ±17 Ma) foi encontrada para ri‑
cas comuns. Via de regra, associam o
olitos da base do Platô do Taquarembó (Jani‑
preenchimento da bacia a um ciclo trans‑
kian et al., 2012). Quanto ao Rifte Santa
gressivo‑regressivo. Os seguintes intervalos
Bá rbara Leste, Pereira et al. (2021) dataram
integram a maior parte das colunas propos‑
dois nı́veis de traquitos, atravé s de aná lises
tas:
de U/Pb em zircã o (565 ±5 Ma). Os traquitos
ocorrem no Grupo Santa Bá rbara, na regiã o 1. Um intervalo basal transgressivo,
da jazida Santa Maria, e foram interpretados que inclui conglomerados aluviais, que gra‑
como possı́veis lavas, ligadas ao vulcanismo dam para arenitos deltaicos (Formaçã o Gas‑
Acampamento Velho. Desta forma, baseado par de Silva Dias, 1981) e que culminam com
nas idades supramencionadas, estima‑se que pelitos de á guas profundas (parte inferior da
Grupo Santa Bá rbara se acumulou entre 574 Formaçã o Garcia (Salamuni et al., 1961);
±7 Ma e 549 ±5 Ma. Sequê ncia Inferior (Appi, 1988; Appi & Sou‑
za Cruz, 1988); Unidade de Fá cies 1, 2 e 3
Por outro lado, estudos de zircõ es
(Krebs et al., 1990); Associaçã o de fá cies A
detrı́ticos apontaram idades má ximas de de‑
(Rostirolla et al., 1992); Sequê ncia 1 (Fonse‑
posiçã o compatı́veis com as do intervalo aci‑
ca, 2004); e Formaçã o Baú e parte da Forma‑
ma indicado. Para a regiã o das Minas do
çã o Ribeirã o Carvalho (Basei et al., 2011)).
Camaquã (Rifte Santa Bá rbara Leste), Olivei‑
Esse intervalo corresponde à Sequê ncia De‑
ra et al. (2014) assinalam idade má xima de
posicional I (Fig. 2), sendo limitada, na base,
deposiçã o de 567,9 ±5,9 Ma para os siltitos
por uma nã o conformidade no contato com
basais do Grupo Santa Bá rbara, enquanto
as rochas granulı́ticas do Crá ton Luis Alves;
Bicca (2013) aponta idade má xima de depo‑
siçã o de 558 ±13 Ma para os arenitos situa‑ 2. Um intervalo intermediá rio, que
dos mais acima, na base do Arenito Inferior envolve turbiditos dominantemente areno‑
da Mina do Camaquã . Estudos similares no sos, canalizados e nã o canalizados, intercala‑
Rifte Santa Bá rbara Oeste apontam idades dos e recobertos por pelitos de á guas
má ximas de deposiçã o de 568 ±6 Ma, de 563 profundas (porçã o restante da Formaçã o
±6 Ma e de 553 ±22 Ma para as unidades ba‑ Garcia (Salamuni et al., 1961); Sequê ncia Su‑
sais, intermediá rias e superiores deste grupo perior (Appi, 1988; Appi & Souza Cruz,
(Oliveira et al., 2014), equivalente à s sequê n‑ 1988); Unidade de Fá cies 4 e 5 (Krebs et al.,
cias I, II e III, de Borba & Mizusaki (2003), 1990); Associaçã o de Fá cies B e C (Rostirolla
respectivamente. Portanto, as idades má xi‑ et al., 1992); Sequê ncia 2 (Fonseca, 2004);
mas de deposiçã o entre ca. 568 Ma e 553 Ma Formaçã o Ribeirã o Carvalho (Basei et al.,
sã o compatı́veis com o intervalo indicado pe‑ 2011); e Trato Deposicional I (Costa & Nasci‑
las rochas vulcâ nicas (ca. 574 Ma e 549 Ma) mento, 2015)). Esse intervalo compreende a
e, assim, serã o consideradas na discussã o Sequê ncia Deposicional II, unidade limitada,

Crono‑correlação entre as Bacias do Camaquã (RS) e do Itajaí (SC) 169


Contribuições à Geologia do Rio Grande do Sul e de Santa Catarina

Figura 2 ‒ Seçã o colunar, representativa das principais associaçõ es de fá cies, das superfı́cies estratigrá icas e
das sequê ncias deposicionais, que constituem o preenchimento da Bacia do Itajaı́. Para localizaçã o aproximada
da seçã o, ver Fig. 4.

170 Edição da Sociedade Brasileira de Geologia – Núcleo RS/SC


Paim et al.

na base, por uma conformidade correlata tra um retorno de fontes granı́ticas e o apa‑
(Fig. 2); recimento de uma importante contribuiçã o
3. E um intervalo superior, que en‑ de rochas vulcâ nicas á cidas (Marconato,
volve fá cies marinho rasas, deltaicas e aluvi‑ 2010). Essa sucessã o registra o preenchi‑
ais (Sequê ncias 3 e 4 (Fonseca, 2004); Tratos mento de dois riftes transtensionais, de ori‑
Deposicionais II e III (Costa & Nascimento, entaçã o NE, formados a oeste e a leste do
2015); Associaçã o de Fá cies D (Rostirolla et alto de Caçapava do Sul, preenchidos de for‑
al., 1992); e formaçõ es Ribeirã o Neisse e ma simultâ nea, mas nã o idê ntica (Paim et al.,
Rincã o dos Bodes (Basei et al., 2011)). Esse 2014).
pacote equivale à s sequê ncias deposicionais No Rifte Santa Bá rbara Oeste, a su‑
III e IV, ambas limitadas por discordâ ncias cessã o sedimentar erode parcialmente e re‑
erosivas, com exposiçã o subaé rea (Fig. 2). cobre as rochas vulcâ nicas da Formaçã o
E importante salientar que, com ex‑ Acampamento Velho (Fig. 3). Superfı́cies ero‑
ceçã o do limite entre as sequê ncias deposici‑ sivas aluviais, mapeá veis em escala de bacia,
onais I e II, uma concordâ ncia correlativa, permitem subdividir o Grupo Santa Bá rbara
que ocorre na base do Complexo Turbidı́tico em cinco sequê ncias deposicionais. Logo aci‑
Apiú na (Fonseca et al., 2003), as demais ma desses limites de sequê ncia, ocorrem de‑
equivalem a limites erosivos, que justapõ em, pó sitos aluviais e luviais, usualmente de
de forma abrupta, depó sitos luviais sobre natureza conglomerá tica, os quais sã o reco‑
marinhos. Nesse caso, o rebaixamento do nı́‑ bertos, de forma abrupta (superfı́cie trans‑
vel relativo do mar e a consequente exposi‑ gressiva), por siltitos lacustres. No geral, o
çã o subaé rea sã o necessá rios. Uma preenchimento deste rifte é dominado por
concepçã o artı́stica, que ilustra, de forma ge‑ arenitos, com ocorrê ncias subordinadas de
ral, mas bastante idedigna e elegante, a evo‑ espessos intervalos conglomerá ticos, princi‑
luçã o paleogeográ ica da Bacia do Itajaı́, em palmente na base e no topo do grupo, e por
especial, no que concerne aos intervalos in‑ expressivos intervalos sı́ltico‑arenosos (Fig.
termediá rio e superior do Grupo Itajaı́, é 3 ‑ Per il A). Os conglomerados e os arenitos
apresentada na Figura 11 do artigo de Costa representam fá cies aluviais, provenientes da
& Nascimento (2015). margem ONO (leques aluviais e leques del‑
taicos), e lú vio‑deltaicas vinculadas a siste‑
5. 2 O Grupo Santa Bárbara mas entrelaçados, de natureza axial, que
luı́am para NE. A coexistê ncia destes dois
O Grupo Santa Bá rbara ocorre entre sistemas aluviais, um transversal e outro axi‑
duas importantes discordâ ncias angulares. al, repercute, em termos de paleocorrentes,
Na base, uma delas constitui seu limite com o por um vetor mé dio (ENE), intermediá rio
Grupo Bom Jardim e, no topo, a outra deli‑ entre a orientaçã o de ambos os sistemas, ca‑
neia seu contato com o Grupo Guaritas. A de‑ racterı́stica perceptı́vel no diagrama de rose‑
formaçã o dú ctil‑rú ptil, que afetou o Grupo tas apresentado na Figura 3. Essa
Bom Jardim, gerando abundantes dobras de composiçã o de paleocorrentes indica, tam‑
arraste, diminui de intensidade no Grupo bé m, que o depocentro da bacia se situava a
Santa Bá rbara. Já as falhas de empurrã o, co‑ NE. Esse padrã o de paleocorrentes é similar
muns no Grupo Bom Jardim, desaparecem ao indicado por Fambrini et al. (2006) para a
no Grupo Santa Bá rbara, em que ocorrem mesma regiã o. Já as fá cies subaquosas re le‑
apenas falhas transcorrentes e extensionais. tem lagos rasos, comumente expostos à dis‑
Alé m do mais, o Grupo Santa Bá rbara regis‑ secaçã o, que incluem delgadas, mas

Crono‑correlação entre as Bacias do Camaquã (RS) e do Itajaí (SC) 171


Contribuições à Geologia do Rio Grande do Sul e de Santa Catarina

repetidas intercalaçõ es de arenitos inos a cadas na Figura 3. Isso nos permite associar
muito inos, geradas por correntes de turbi‑ tais sequê ncias a um controle tectô nico,
dez, de origem hyperpicnal, e, por vezes, por conforme demonstrado por Silveira (2012).
luxos de reologia hı́brida (Lehn et al., 2018). Outra similaridade do Grupo Santa Bá rbara,
Arenitos inos a grossos, sigmoidais, maciços depositada nos dois riftes, manifesta‑se na
ou com estrati icaçã o cruzada sigmoidal, re‑ associaçã o de fá cies aluviais, luviais, deltai‑
lacionados a contextos de frente deltaica, cas (leques deltaicos e deltas luviais) e la‑
també m sã o comuns. custres. Assim como na regiã o das Minas do
O Rifte Santa Bá rbara Leste engloba Camaquã , as paleocorrentes da regiã o do
sucessõ es expostas nos vales do Boici e do Vale do Piquirı́ sã o, dominantemente, para
Arroio Piquiri, bem como diversas exposi‑ NNE e para NNO (Fambrini et al., 2018). Isso
çõ es, situadas abaixo do Grupo Guaritas, indica que, assim como no caso do Rifte
a lorantes entre os altos de Santana da Boa Santa Bá rbara Oeste, o depocentro da bacia
Vista e de Caçapava do Sul. A Formaçã o se situava a norte e que essa dispersã o é
Acampamento Velho estaria restrita a intru‑ compatı́vel com a dos sistemas luviais axi‑
sõ es, vinculadas aos eventos mais jovens do ais, luindo para NE, e dos leques aluviais,
vulcanismo Acampamento Velho, nã o fossem transportando material para NO. De forma
os traquitos, que ocorrem na jazida Santa similar à contraparte ocidental, as fá cies pe‑
Maria, datados em 565 ± 5Ma, ou seja, con‑ lı́ticas lacustres també m incluem delgadas,
temporâ neos aos eventos iniciais do vulca‑ mas repetidas, intercalaçõ es de arenitos i‑
nismo Acampamento Velho, os quais foram nos a muito inos, relacionados a correntes
tentativamente interpretados como possı́veis de turbidez, de origem hyperpicnal, e, por
lavas (Pereira et al., 2021). Como no rifte a vezes, a luxos de reologia hı́brida (Silveira,
oeste, neste caso, també m é possı́vel subdivi‑ 2016).
dir a sucessã o em sequê ncias deposicionais, Por outro lado, diferenças signi ica‑
limitadas por discordâ ncias com exposiçã o tivas sã o també m perceptı́veis. A maciça
subaé rea (sobreposiçã o das fá cies luviais/ presença de conglomerados, tanto na por‑
aluviais diretamente sobre depó sitos lacus‑ çã o superior do Grupo Santa Bá rbara como
tres). Esta caracterı́stica é facilmente mapeá ‑ no sentido da margem leste do rifte, sugere
vel na regiã o do Vale do Piquiri, em que estã o relevos soerguidos, pró ximos ao bordo ori‑
dispostos cerca de 4 mil metros de depó sitos ental, no sentido do Cinturã o Dom Feliciano.
deste grupo (Fig. 3 ‑ Per il C) na forma de Esse relevo se manifesta nas fá cies aluviais
uma monoclinal, que nos permite visualizar, pelo domı́nio de depó sitos de enxurradas
em vista aé rea, as variaçõ es laterais e verti‑ em lençol (sheet lood), desde a regiã o do
cais de fá cies e de superfı́cies estratigrá icas Vale do Piquirı́, até as Minas do Camaquã ,
associadas (e.g. Silveira, 2016). Nesse senti‑ comparado ao domı́nio de fá cies relaciona‑
do, superfı́cies transgressivas e de má xima das a luxos canalizados (stream lows), nos
inundaçã o, també m facilmente mapeá veis na leques aluviais do Rifte Santa Bá rbara Oeste.
regiã o do Vale do Piquirı́, sã o similares à s A menor presença de gretas de contraçã o
identi icadas no Rifte Santa Bá rbara Oeste. nas fá cies lacustres, relativamente ao Rifte
Alé m disso, pode‑se perceber uma diminui‑ Santa Bá rbara Oeste, assim como o porte
çã o no grau de deformaçã o da sucessã o da das clinoformas visualizá veis na regiã o do
base para o topo, o que se manifesta por dis‑ Vale do Piquirı́ (com vá rias dezenas a uma
cordâ ncias angulares suaves (poucos graus), centena de metros), indicam lagos mais pe‑
limitando as sequê ncias deposicionais indi‑ renes e mais profundos na margem oriental

172 Edição da Sociedade Brasileira de Geologia – Núcleo RS/SC


Paim et al.

Figura 3 ‒ Seçõ es colunares, representativas do preenchimento dos riftes Santa Bá rbara Oeste e Santa Bá rbara
Leste. Per is A e C, baseados em seçõ es de campo, e Per il B, nos furos CQP 02 e CQP 03. Diagrama de rosetas,
com medidas de paleocorrentes, realizadas no rifte Santa Bá rbara Oeste. Idades de rochas vulcâ nicas baseadas
em: (1) Jenikian et al. (2012); (2) Chemale Jr. (2000); (3) Sommer et al. (2005); e (4) Pereira et al. (2021).
Idades má ximas de deposiçã o (amostras datadas, posicionadas de forma aproximada nos per is), baseadas em:
(a) Oliveira et al. (2014); e (b) Bicca et al. (2013). Localizaçã o aproximada das seçõ es mostrada na Fig. 5.

Crono‑correlação entre as Bacias do Camaquã (RS) e do Itajaí (SC) 173


Contribuições à Geologia do Rio Grande do Sul e de Santa Catarina

do rifte. Cabe realçar que gretas de contraçã o craterion, na verdade, representam diferen‑
sã o mais comuns nas fá cies pelı́ticas, presen‑ tes tipos de fossilizaçã o de esteiras microbi‑
tes nos testemunhos da sondagem CQP 03, a anas reticuladas (Fig. 4B). Outras
qual amostrou a porçã o mais inferior deste morfologias de esteiras microbianas foram
grupo na regiã o das Minas do Camaquã . Essa encontradas, como as estruturas lineares de
caracterı́stica sugere que o Rifte Santa Bá r‑ Arumberia (Fig. 4A). Becker‑Kerber et al.
bara Leste seria um meio‑graben, com mar‑ (2020) també m reinterpretaram os fó sseis,
gem ativa, mais profunda, situada no bordo atribuı́dos a Choia e Oldhamia, como pseu‑
leste. Isto explicaria, també m, a maior espes‑ dofó sseis, formados pelo crescimento de
sura do Grupo Santa Bá rbara na margem ori‑ minerais, durante a diagê nese inicial. Prati‑
ental do que no sentido da margem passiva camente todas as formas discoides anterior‑
deste meio‑graben. mente encontradas, assim como as novas
amostras (e.g. Fig. 4C), foram classi icadas
6 O REGISTRO PALEONTOLÓGICO no plexus Aspidella, incluindo um espé cime
com possı́vel haste de fronde associada. Adi‑
Os primeiros registros de possı́veis cionalmente, foi reportada a presença de
fó sseis na Bacia de Itajaı́ remontam aos tra‑ nova forma discoide, Nimbia (Fig. 4A), de
balhos de Zucatti da Rosa et al. (1997), de a inidades incertas. Becker‑Kerber et al.
Leipnitz et al. (1997), de Netto & Zucatti da (2020) també m descreveram indubitá veis
Rosa (1997) e de Paim et al. (1997). Estes organismos ediacaranos, como o enigmá tico
autores reportaram, preliminarmente, a pos‑ fó ssil Palaeopascichnus (Fig. 4D), caracteri‑
sı́vel presença de fó sseis cambrianos, atribuı́‑ zado por seus segmentos curvos a retos, dis‑
dos a esponjas, como Choia e Chancelloria postos linearmente. Becker‑Kerber et al.
(Leipnitz et al., 1997; Paim et al., 1997), as‑ (2021) demonstraram que as estruturas i‑
sim como putativos traços fó sseis de locomo‑ lamentosas, previamente atribuı́das a traços
çã o e de alimentaçã o de invertebrados, de animais (Gordia e Helminthoidichnites),
incluindo Diplocraterion, Gordia e ?Oldhamia representam, ao invé s disso, impressõ es de
(Netto & Zucatti da Rosa, 1997). Posterior‑ microrganismos ilamentosos, similares à s
mente, Zucatti da Rosa (2005) reinterpretou atuais bacté rias gigantes oxidantes de enxo‑
os icnofó sseis Gordia como Helminthoidichni‑ fre (Fig. 4E). A ampla presença desses mi‑
tes sp, e ?Oldhamia como a anteriormente re‑ crorganismos no Ediacarano sugere que
portada Choia. O icnotá xon Diplocraterion foi possam ter tido grande in luê ncia na evolu‑
denominado “morfotipo I”, de a inidades in‑ çã o da quı́mica dos oceanos e nos primeiros
certas. Zucatti da Rosa (2005) també m des‑ ecossistemas, compostos, dominantemente,
creveu as primeiras formas discoides, sendo de organismos macroscó picos. A biota da
um morfotipo, associado aos tá xons Cyclome‑ Bacia de Itajaı́, apesar de nã o muito diversa,
dusa e Charniodiscus, e outra forma, vincula‑ apresenta fó sseis tı́picos do Perı́odo Ediaca‑
da à Aspidella. Possı́veis bilaté rios, atribuı́dos rano. Dataçõ es recentes (ca. 563 Ma) (Bec‑
à Parvancorina, també m foram descritos. ker‑Kerber et al., 2020) situam‑na como a
Trabalhos recentes retomaram os es‑ mais antiga assembleia fó ssil de organismos
tudos sobre a biota de Itajaı́ e muitos fó sseis macroscó picos complexos do Gonduana. Es‑
foram reinterpretados, assim como novos tá ‑ ses fó sseis representam organismos que nã o
xons foram descobertos. Becker‑Kerber et al. possuı́am partes duras, o que torna esta uni‑
(2020) demonstraram que fó sseis, antes con‑ dade um importante Lagerstätten do Pre‑
siderados como Chancelloria e como Diplo‑ Cambriano da Amé rica do Sul.

174 Edição da Sociedade Brasileira de Geologia – Núcleo RS/SC


Paim et al.

Figura 4 ‒ Exemplos de registro de vida nos grupos Itajaı́ (A a E) e Camaquã (F a K): A) Esteiras microbianas
Arumberia‑like, associadas com Nimbia (seta); B) Esteiras microbianas reticuladas; C) Dois espé cimes de
Aspidella; D) Palaeopascichnus; E) Filamentos microbianos, similares aos das bacté rias gigantes modernas do
gê nero Beggiatoa; F) Lâ mina delgada de siltito, com colô nia bacteriana ilamentosa permeando os grã os ( lechas
azuis), e microfó ssil, indicado por lecha vermelha (Lehn et al., 2019); G) Corte transversal de amostra de mã o,
contendo marcas discoides, associadas à MISS, no topo, e à camada orgâ nica escura, no corte ( lecha vermelha);
H) Lâ mina delgada, rica em esteiras microbianas preservadas em siltitos; I) Fragmento de esteira microbiana,
recuperado via extraçã o palinoló gica (Lehn et al. (submetido)); J) Exemplar de acritarca do gê nero
Germinosphaera sp. (Lehn et al., 2019); e K) Exemplar de acritarca da espé cie Tanarium irregulare (Lehn et al.,
2019).

Quanto à Bacia do Camaquã , os pri‑ acritarcas Pré ‑Cambrianos, presentes em ba‑


meiros registros de vida foram reportados cias nã o marinhas (Horodyski, 1994; Arouri,
por Netto (1992, 1994, 2007), baseados em 1999; Prave, 2002; Strother et al., 2011; Lehn
evidê ncias paleoicnoló gicas. No Rifte Santa et al., 2019). Alé m dos microfó sseis, foram re‑
Bá rbara Oeste, mais recentemente (Lehn et cuperados muitos fragmentos de esteiras mi‑
al., 2019) foram encontrados acritarcas de crobianas em excelente estado de
morfologia simples, sem ornamentaçã o, iden‑ preservaçã o, com conservaçã o da maté ria or‑
ti icados como pertencentes aos gê neros Lei‑ gâ nica e das estruturas ilamentosas e cocoi‑
osphaeridia sp., Lophosphaeria sp. e des das comunidades bacterianas (Lehn et al.
Germinosphaera sp., alé m de indivı́duos da (submetido b)). A presença de acritarcas em
espé cie Tanarium irregulare. A morfologia associaçã o direta com esteiras microbianas
simples desses espé cimes é condizente com pode ser veri icada em lâ minas delgadas (Fig.

Crono‑correlação entre as Bacias do Camaquã (RS) e do Itajaí (SC) 175


Contribuições à Geologia do Rio Grande do Sul e de Santa Catarina

4A‑4C) e no material orgâ nico do conteú do deformador da Bacia do Itajaı́, de natureza


palinoló gico extraı́do das rochas (Fig. 4D‑ transpressiva, com sigma 1 orientado para o
4F). A comum associaçã o entre acritarcas e a azimute 170 (Schroeder, 2006), como repre‑
comunidade bacteriana indica que esses or‑ sentativo do campo da tectô nica geradora
ganismos habitavam um corpo d’á gua com das bacias, podemos atribuir a formaçã o de
condiçõ es fı́sico‑quı́micas aprazı́veis a am‑ uma bacia de antepaı́s, em contexto trans‑
bos. Dados de geoquı́mica inorgâ nica, utili‑ pressivo, devido ao â ngulo obtuso entre o
zando proxies com elementos‑chave (Ni, Co, sigma 1 e as estruturas maiores, que condi‑
V, P e Sr), indicam que o Grupo Santa Bá rba‑ cionaram a Bacia do Itajaı́ (i.e. uma impor‑
ra apresenta valores condizentes com os de tante componente compressiva), e a um
um ambiente deposicional oxigenado e biota â ngulo agudo deste mesmo sigma 1, em rela‑
lacustre (Lehn et al., 2021b). Esses dados sã o çã o à s estruturas, que condicionaram a com‑
condizentes com as interpretaçõ es sedimen‑ partimentaçã o dos riftes transtensionais
toló gicas pré vias, que descrevem depó sitos Santa Bá rbara (importante componente dis‑
de frentes deltaicas, desenvolvidos em cor‑ tensivo) (Fig. 5).
pos lacustres rasos (Paim et al., 2000, 2014; Esse controle tectô nico teria permi‑
Lehn et al., 2018). Outro dado, que corrobora tido o ingresso do mar pela Bacia do Itajaı́,
essa interpretaçã o, é a ausê ncia de macrofó s‑ em que diversos elementos da Biota de Edia‑
seis da Biota de Ediacara, uma vez que, tem‑ cara estã o presentes. Já , a sul, formavam‑se
poralmente, o Grupo Santa Bá rbara é apenas lagos rasos, no Rifte Santa Bá rbara
correlato, nã o, apenas, ao Grupo Itajaı́, mas, Oeste, e rasos à profundos, no Rifte Santa
també m, aos registros das associaçõ es fossi‑ Bá rbara Leste (junto à margem ativa, em que
lı́feras de Avalon, de White Sea e de Nama, as ocorriam leques deltaicos mais possantes),
quais sã o associadas a depó sitos marinhos permitindo a presença de uma biota bem
rasos a profundos, mas, nã o, a lagos efê me‑ mais restrita, limitada a acritarcas e a abun‑
ros. dantes esteiras microbianas. Um depocentro,
a norte, em ambos os riftes Santa Bá rbara,
7 IMPLICAÇÕES PALEOAMBIENTAIS E está bem registrado por sistemas luviais
PALEOGEOGRÁFICAS axiais, luindo para NE, enquanto os leques
aluviais e os leques deltaicos (fan‑deltas) se
A partir de tudo o que foi apresenta‑ desenvolviam em margens opostas, em am‑
do, torna‑se possı́vel tecer, agora, algumas bos os riftes (Fig. 5). No entanto, re letiam
consideraçõ es, de cará ter mais regional. Em relevos mais acentuados, junto à margem
primeiro lugar, à luz dos dados geocronoló gi‑ oriental do Rifte Santa Bá rbara Leste, na
cos disponı́veis, coexistiram, durante o Edia‑ qual torrentes em lençol cascalhosas domi‑
carano Superior, uma bacia de antepaı́s navam os processos deposicionais, até , pelo
marinha, a norte, e bacias transtensionais, menos, a regiã o das Minas do Camaquã . Esse
continentais, a sul (Fig. 5). Considerando a padrã o de dispersã o de sedimentos nas ba‑
forma convexa do Cinturã o Dom Feliciano, o cias é condizente com o do modelo paleoge‑
campo de tensõ es, que condicionou a forma‑ ográ ico mais geral.
çã o de ambos os tipos de bacias, deve ter ti‑
do uma orientaçã o tal, que produziu
8 CONSIDERAÇÕES FINAIS
compressã o ou transpressã o, no norte, e
transtensã o ou extensã o, no sul do Brasil. Se Neste item, aproveitamos para fazer
considerarmos o primeiro e principal evento apenas algumas sugestõ es. Em termos de ge‑

176 Edição da Sociedade Brasileira de Geologia – Núcleo RS/SC


Paim et al.

Figura 5 ‒ Esboço tectô nico e paleogeográ ico das bacias do Itajaı́ (BI) e do Camaquã (BC), no caso,
representada pelos riftes Santa Bá rbara Oeste e Santa Bá rbara Leste, elementos contemporâ neos aos da Bacia
do Itajaı́. A orientaçã o dos sistemas aluviais nos blocos diagramas dos riftes Santa Bá rbara Oeste e Santa
Bá rbara Leste está fundamentada em abundantes dados de paleocorrentes. Os per is colunares, mostrados nas
iguras 2 e 3, estã o indicados, de forma aproximada, nos blocos‑diagrama especı́ icos. O mapa geoló gico foi
editado, a partir de Phillip et al. (2016), enquanto o bloco‑diagrama da Bacia do Itajaı́ foi modi icado de
Guadagnin et al. (2010). As setas indicam o sigma 1, baseado em Schroeder (2006), enquanto as linhas entre as
setas indicam a orientaçã o das bacias do Camaquã e do Itajaı́.

Crono‑correlação entre as Bacias do Camaquã (RS) e do Itajaí (SC) 177


Contribuições à Geologia do Rio Grande do Sul e de Santa Catarina

ocronologia, acreditamos que as sucessõ es, Geologia e Mineralogia DNPM. Rio de Janeiro,
que merecem uma atençã o especial, sã o DNPM, v. 241, 36p.
aquelas expostas nos vales do Boici e do Pi‑
Almeida, F. F. M., Hasui, Y., Brito Neves, B. B.
quirı́, no Rifte Santa Bá rbara Leste. Na Bacia
& Fuck, R. A. 1981. Brazilian structural pro‑
do Itajaı́, dataçõ es de tufos nos intervalos vinces: an introduction. Earth Sciences Revi‑
mé dio e superior do Grupo Itajaı́ se fazem ews, 17: 1‑29.
necessá rias, para melhor de inir a idade do
topo do grupo, bem como para nos ajudar a Almeida, F. F. M., Hasui, Y. & Brito Neves, B. B.
esclarecer o quanto existe de repetiçã o es‑ 1976. The Upper Precambrian of South
America. Boletim IG/USP, 7: 45‑80.
tratigrá ica, na medida em nos aproximamos
da margem sul dessa bacia. Dados sı́smicos, Almeida, D. P. M., Zerfass, H., Basei, M. A., Pe‑
mesmo que de natureza rasa, podem trazer à try, K. & Gomes, C. H. 2002. The Acampa‑
tona uma sé rie de dados, que nos ajudaria a mento Velho Formation, a Lower Cambrian
compreender melhor a arquitetura estrati‑ bimodal volcanic package: geochemical and
grá ica das unidades mais jovens da Bacia do stratigraphics studies from the Cerro do Bu‑
gio, Perau and Serra de Santa Bá rbara (Caça‑
Camaquã (grupos Santa Bá rbara e Guaritas).
pava do Sul, Rio Grande do Sul, RS–Brazil).
Por outro lado, o elevado grau de compacta‑ Gondwana Research, 5: 721‑733.
çã o e de diagê nese do Grupo Itajaı́ nã o favo‑
rece ao uso desta abordagem, em funçã o das Almeida, D. P. M., Conceiçã o, R. V., Chemale Jr.,
pequenas diferenças de impedâ ncia acú stica, F., Koester, E., Borba, A. W. & Petry, K. 2005.
que devem existir entre as distintas litologi‑ Evolution of Heterogeneous Mantle in the
Acampamento Velho and Rodeio Velho Vol‑
as presentes. Estudos de natureza estrutural,
canic Events, Camaquã Basin, Southern Bra‑
focados no Grupo Santa Bá rbara, ainda se fa‑ zil. Gondwana Research, 8: 479‑492.
zem necessá rios em suas diversas á reas de
ocorrê ncia. O uso de proxies geoquı́micos de Almeida, R. P., Janikian, L., Fragoso‑Cesar, A.
rocha (razõ es Ni/Co, V/Cr e Th/U, por exem‑ R. & Fambrini, G. L. 2010. The Ediacaran to
plo) e de material orgâ nico (P, Sr, Co, C e isó ‑ Cambrian rift system of Southeastern South
America: tectonic implications. Journal of Ge‑
topos C e O) constitui uma fronteira a
ology, 118: 145‑161.
explorar, visando a melhor caracterizar os
paleoambientes. Por im, os recentes acha‑ Arouri, K., Greenwood, P. F. & Walter, M.
dos paleontoló gicos em ambas as bacias, em 1999. A possible chlorophycean af inity of
um intervalo de tempo importante, em ter‑ some Neoproterozoic acritarchs. Organic Ge‑
mos de evoluçã o da vida no planeta, com‑ ochemistry, 30: 1323‑1337.
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Edgar do Amaral Santos2
1
Instituto de Geociê ncias, Universidade Federal do Rio Grande do Sul
2
Programa de Pó s‑Graduaçã o em Geociê ncias, Universidade Federal do Rio Grande do Sul

* autor correspondente: andrea.jelinek@ufrgs.br

1 INTRODUÇÃO
A formaçã o da margem Atlâ ntica Sul‑Americana ocorreu no Mesozoico, em consequê n‑
cia da ruptura do Gondwana Ocidental e do desenvolvimento do Oceano Atlâ ntico Sul. Essa mar‑
gem passiva apresenta uma extensã o de mais de 6.000 km e grande variedade de feiçõ es
geoló gicas e topográ icas, de sul a norte. Neste trabalho, será explorada a margem continental
dos estados do Rio Grande do Sul (RS) e de Santa Catarina (SC) (Fig. 1). Na margem sul‑rio‑
grandense, estã o presentes uma topogra ia suave e exposiçõ es do Cinturã o Dom Feliciano e do
Terreno Taquarembó , associadas à formaçã o do Gondwana Ocidental, durante o Neoproterozoi‑
co (Ciclo Orogê nico Brasiliano/Pan‑Africano). Já a margem Catarinense é dominada pelo Cintu‑
rã o Dom Feliciano, representado pelos altos topográ icos da Provı́ncia da Mantiqueira e pelo
Crá ton Luis Alves.
Apesar da ampla variedade de caracterı́sticas ao longo da costa, tanto onshore quanto
offshore, a porçã o da margem entre os estados do RS e de SC apresenta uma mudança signi ica‑
tiva na con iguraçã o da margem passiva sul‑americana, e representa um limite entre a porçã o
sul, de baixa topogra ia, e a norte, de relevo alto e acidentado. Esse limite está marcado pelo alto
de Florianó polis, que, alé m de limitar duas porçõ es de relevo distinto na margem continental,
marca, també m, o limite entre a Bacia de Pelotas, a sul, e a Bacia de Santos, a norte. A principal
diferença da Bacia de Pelotas para as demais, situadas mais a norte, é a ausê ncia de depó sitos
evaporı́ticos e de reservas de hidrocarbonetos, alé m de representar uma conexã o entre a crosta
continental e a Dorsal Mesoatlâ ntica, atravé s da Zona de Fratura do Rio Grande (també m conhe‑
cida como Zona de Fratura de Florianó polis), uma estrutura de sentido E‑W, que se propaga no
fundo oceâ nico e que també m limita a Elevaçã o de Rio Grande e o Platô de Sã o Paulo, dois altos
batimé tricos no Oceano Atlâ ntico.
Contribuições à Geologia do Rio Grande do Sul e de Santa Catarina

Figura 1 ‒ Mapa geotectô nico simpli icado da regiã o sul do Brasil e do Uruguai. Zonas de Cisalhamento: 1 ‑
Itajaı́‑Perimbó ; 2 ‑ Major Gercino; 3 ‑ Ibaré ; 4 ‑ Dorsal de Canguçu; 5 ‑ Passo do Marinheiro; 6 ‑ Caçapava; 7 ‑
Sierra Ballena; 8 ‑ Sarandı́ del Yı́; e 9 ‑ Colô nia (modi icado de CPRM (2008) e de Philipp et al. (2016)).

O presente estudo foi elaborado a Gondwana e está assentada sobre as rochas


partir de uma compilaçã o dos dados de ter‑ do embasamento Pré ‑Cambriano. O proces‑
mocronologia de baixa temperatura, publica‑ so de ruptura do Gondwana Ocidental e a
dos até o momento, sobre a margem consequente abertura do Oceano Atlâ ntico
continental sul do Brasil (Fig. 2), mais espe‑ Sul tiveram inı́cio na parte sul da Amé rica
ci icamente, sobre o Cinturã o Dom Feliciano do Sul, durante o Triá ssico Superior‑Jurá ssi‑
e sobre os terrenos cratô nicos adjacentes. O co Inferior, e se propagaram para o norte, al‑
principal objetivo deste trabalho é apresen‑ cançando a margem Equatorial, no Aptiano
tar uma sı́ntese da evoluçã o termocronoló gi‑ Superior‑Albiano Inferior (Nü rnberg & Mü l‑
ca do Cinturã o Dom Feliciano e expandir ler, 1991). A abertura do Oceano Atlâ ntico
nossa compreensã o sobre a evoluçã o do rifte Sul foi precedida por volumoso magmatis‑
nesta porçã o da margem continental, essen‑ mo toleı́tico, induzido pela pluma Tristã o da
cial para o entendimento da geodinâ mica de Cunha, entre 145 e 130 Ma, originando a
ruptura do Gondwana Ocidental e da propa‑ Provı́ncia Magmá tica Paraná ‑Etendeka, loca‑
gaçã o do rifte para o norte, alé m das implica‑ lizada no sul da Amé rica do Sul e oeste da
çõ es para a indú stria de petró leo e de gá s Africa.
natural. As rochas do embasamento revelam
uma segmentaçã o ao longo da margem con‑
2 CONTEXTO GEOLÓGICO tinental brasileira, que re lete diferentes
provı́ncias estruturais. Grande parte da
A margem continental brasileira re‑
margem passiva sul‑americana é domı́nio da
sulta da ruptura do paleocontinente
Provı́ncia Mantiqueira, que inclui trê s cintu‑
186 Edição da Sociedade Brasileira de Geologia – Núcleo RS/SC
Jelinek et al.

Figura 2 ‒ Modelo digital de terreno da margem continental sul brasileira, com a sobreposiçã o dos terrenos
tectono‑estratigrá icos e vulcano‑sedimentares e a localizaçã o das aná lises termocronoló gicas por traços de
issã o e por (U‑Th)/He em apatita e em zircã o, disponı́veis na bibliogra ia para o Cinturã o Dom Feliciano.

rõ es orogê nicos e é a principal entidade terrenos Taquarembó , no oeste do RS, e Luis
tectô nica ao longo da margem brasileira, Alves, em SC. No leste, o Cinturã o Dom Feli‑
com extensã o de mais de 3.000 km, largura ciano é dividido nos terrenos Sã o Gabriel e
entre 200 e 600 km e topogra ia quase intei‑ Tijucas, alé m dos bató litos Pelotas (no RS) e
ramente montanhosa (Almeida et al., 1981; Florianó polis (em SC), na parte oriental do
Brito Neves et al., 2014). A parte mais meri‑ cinturã o.
dional da provı́ncia da Mantiqueira, ou seja, As exposiçõ es dos embasamentos
o cinturã o Dom Feliciano, juntamente com os Sul‑Rio‑Grandense e Catarinense sã o limita‑
crá tons adjacentes, corresponde à á rea de lo‑ das, a norte e a oeste, principalmente, pelos
calizaçã o deste estudo (Fig. 1). depó sitos paleozoicos e mesozoicos da Ba‑
Na á rea de estudo, o Crá ton Rio de cia do Paraná . Já a margem atlâ ntica, na re‑
La Plata e o Cinturã o Dom Feliciano sã o sub‑ giã o, é domı́nio das bacias de Pelotas e de
divididos em seis terrenos tectono‑estrati‑ Santos (Meso‑Cenozoicas), formadas como
grá icos, delimitados por zonas regionais de consequê ncia da separaçã o da Amé rica do
cisalhamento (Fig. 1). O crá ton consiste nos Sul e da Africa.

Evolução termocronológica do Cinturão Dom Feliciano 187


Contribuições à Geologia do Rio Grande do Sul e de Santa Catarina

A ruptura do Gondwana Ocidental é continuadas pela dissecaçã o mais ampla do


marcada por volumosa atividade ı́gnea na sistema de drenagem do rio Itajaı́ e de seus
Bacia do Paraná e nas bacias marginais em formadores, que tê m nascentes nas forma‑
formaçã o, em que o vulcanismo precedeu ou çõ es Paleozoicas e corre em direçã o leste.
foi concomitante à abertura do Atlâ ntico Sul. A Bacia do Paraná tem seu relevo
As causas e os mecanismos atuantes, durante constituı́do por planaltos elevados (~1200
o rifte, permanecem em debate, mas há um m), o Planalto Meridional, e por cuestas con‑
consenso geral de que a dinâ mica do manto cê ntricas, drenados pelos rios Uruguai e Pa‑
está envolvida na quebra do megacontinente. raná . Em direçã o a sul, de maneira geral, a
O inı́cio do rifte é frequentemente relaciona‑ borda oeste da Bacia do Paraná forma uma
do à presença da pluma manté lica Tristã o da continuaçã o dos maciços do Sudeste brasi‑
Cunha, cujo posicionamento inicial, sob a leiro.
placa sul‑americana, provavelmente, está li‑ A parte mais interiorizada da mar‑
gado ao magmatismo Paraná ‑Etendeka, por gem sul, no limite entre os estados de SC e
volta de 132 Ma (Chang et al., 1992; Buiter & do RS, é composta por notá veis feiçõ es geo‑
Torsvik, 2014). morfoló gicas, formadas pelo corte abrupto
Durante o rifteamento, a margem do Planalto Meridional, atravé s de paredõ es
Sul‑Americana foi hiperextendida, com signi‑ verticalizados de rochas vulcâ nicas, que, por
icativo adelgaçamento da crosta e com exu‑ uma grande extensã o, mostram uma suces‑
maçã o da litosfera, devido à in luê ncia da sã o de câ nions, pró ximos à planı́cie do litoral
pluma manté lica, o que provocou a elevaçã o Atlâ ntico, cujas idades observadas estã o as‑
topográ ica da margem até a ruptura inal sociadas ao magmatismo Paraná ‑Etendeka.
(Mohriak, 2012). No processo de separaçã o Os terrenos do escudo Pré ‑cam‑
do Gondwana, formou‑se, em frente ao RS, a briano reaparecem no estado do RS (Fig. 2),
Elevaçã o de Rio Grande, um controverso na latitude de Porto Alegre, e se estendem
fragmento continental submerso, cercado até o Uruguai. A margem continental sul bra‑
por crosta oceâ nica, resultado de mú ltiplos sileira, no estado do RS, é caracterizada por
saltos de dorsal intra‑oceâ nicos (Graça et al., um relevo suavemente ondulado, com altitu‑
2019). Este mecanismo provavelmente per‑ des entre 200‑400 m, nas quais os divisores
mitiu o deslocamento de material de crosta mais elevados nã o alcançam 500 m, e por
ou manto litosfé rico continental para o do‑ uma grande planı́cie costeira.
mı́nio oceâ nico profundo.

4 TERMOCRONOLOGIA DE BAIXA TEM‑


3 CONTEXTO GEOMORFOLÓGICO PERATURA – O MÉTODO

A regiã o sul da margem continental A termocronologia é uma té cnica ge‑


brasileira (Fig. 2) é formada pela extensa ocronoló gica que fornece informaçõ es sobre
á rea de terrenos Pré ‑Cambrianos, que ocu‑ possı́veis histó rias de tempo‑temperatura
pam o norte do estado de SC, como continui‑ das rochas. Os termocronô metros compre‑
dade das escarpas da Serra do Mar, da endem combinaçõ es de um sistema de de‑
margem sudeste, estreitando‑se no sul de SC, caimento pai/ ilho, um mineral ou fase
à medida que as formaçõ es pertencentes hospedeira e um modelo ciné tico, determi‑
à Bacia do Paraná se aproximam do oceano. nado experimentalmente, que é dependente
As escarpas da Serra do Mar tê m reduçã o da perda do produto‑ ilho no tempo e na
das altitudes em SC, e sã o parcialmente des‑ temperatura (Reiners, 2021). Os produtos‑
188 Edição da Sociedade Brasileira de Geologia – Núcleo RS/SC
Jelinek et al.

ilhos podem ser manifestaçõ es fı́sicas de Grandense (ESRG) abrange 12 idades TFZ,
decaimento radioativo, como zonas de danos 16 idades ZHe, 75 idades TFA e 24 idades
na rede cristalina (traços de issã o) ou nuclı́‑ AHe, todas elas obtidas a partir de mú ltiplos
deos radiogê nicos, como o 4He (U‑Th/He). cristais. Já na regiã o do Escudo Catarinense
As aná lises termocronoló gicas en‑ (EC), foram compiladas 14 idades TFZ, 29
volvem a razã o de nuclı́deos pai/ ilho nas idades ZHe, 75 idades TFA e 24 idades AHe,
amostras e consistem da combinaçã o das obtidas a partir de mú ltiplos cristais, igual‑
mediçõ es realizadas nas amostras com in‑ mente.
formaçõ es geoló gicas, para deduzir faixas de
possı́veis histó rias té rmicas, fornecendo in‑ 5 TERMOCRONOLOGIA DO ESCUDO
terpretaçõ es associadas a eventos de fecha‑ SUL‑RIO‑GRANDENSE
mento ou de retençã o parcial. O
conhecimento dessas histó rias té rmicas po‑ O resfriamento e a exumaçã o do
de ser usado para entender o tempo e a du‑ ESRG antecedem à ruptura do Gondwana
raçã o, e, portanto, a dinâ mica de uma ampla Ocidental e à abertura do Atlâ ntico Sul em,
gama de processos geoló gicos. até , centenas de milhõ es de anos, conforme
Quatro termocronô metros de baixa registram as idades termocronoló gicas, obti‑
temperatura estã o presentes nesta discus‑ das nos vá rios estudos lá realizados (Figs. 3‑
sã o: traços de issã o em zircã o (TFZ), (U‑Th)/ 4).
He em zircã o (ZHe), traços de issã o em apa‑ Os trabalhos pioneiros, publicados
tita (TFA) e (U‑Th)/He em apatita (AHe). Es‑ no ESRG, foram desenvolvidos por Borba et
tes sistemas radioisotó picos tê m al. (2002, 2003), que obtiveram idades TFA
temperaturas de retençã o distintas e, juntos, predominantemente Paleozoicas (Fig. 3), as‑
cobrem um intervalo entre c. 320 e 45 ºC, ou sociadas a um soerguimento e à denudaçã o,
seja, temperaturas correspondentes aos durante a evoluçã o da Bacia do Paraná , in lu‑
quilô metros superiores da crosta. Cada mé ‑ enciadas por contexto tectô nico convergente
todo possui temperatura de fechamento e na margem sudoeste do Gondwana. Estes
zona de retençã o parcial especı́ icas, esta ú l‑ autores defendem que o ESRG se comportou
tima corresponde a um intervalo de tempe‑ como um alto topográ ico, durante o Carbo‑
raturas em que a acumulaçã o e a perda de nı́fero‑Permiano, devido à compressã o pre‑
produtos de decaimento radiogê nico sã o si‑ sente neste perı́odo. Eles identi icam um
multâ neas. A idade obtida pelos mé todos evento de resfriamento no Cretá ceo Superi‑
termocronoló gicos de baixa temperatura é or, possivelmente, relacionado ao rearranjo
uma idade de resfriamento, baseada no da margem costeira brasileira, devido ao so‑
equilı́brio entre o isó topo‑pai e o produto do erguimento das serras do Mar e da Manti‑
decaimento, e representa um ponto de tem‑ queira. Este argumento é corroborado por
po‑temperatura (t‑T) durante a passagem Oliveira et al. (2016), que també m colocam
pela zona de retençã o parcial do termo‑ essa nova con iguraçã o da margem conti‑
cronô metro. nental como mecanismo desencadeador do
Neste estudo, revisamos os dados resfriamento, observado em amostras do
publicados anteriormente sobre traços de Terreno Sã o Gabriel e do Bató lito Pelotas.
issã o e sobre (U‑Th)/He em apatitas e em O evento compressivo do oró geno
zircõ es, alé m dos modelamentos de histó rias Gondwanides, observado por Borba et al.
té rmicas disponı́veis. O conjunto de dados (2003), é corroborado por Bicca et al. (2013)
de termocronologia atual do Escudo Sul‑Rio‑ e por Oliveira et al. (2016) na Bacia do Ca‑

Evolução termocronológica do Cinturão Dom Feliciano 189


Contribuições à Geologia do Rio Grande do Sul e de Santa Catarina

maquã , em que foi identi icada uma compo‑ co, o qual está registrado no Terreno Taqua‑
nente de idade Devoniana, relacionada à de‑ rembó e no Bató lito Pelotas, possivelmente,
posiçã o desta bacia, a partir de idades relacionado ao ajustamento da Placa Sul‑
obtidas por TFA e por TFZ, respectivamente. Americana.
Bicca et al. (2013), Oliveira et al. (2016), Go‑ Hueck et al. (2019) e Machado et al.
mes & Almeida (2019) e Machado et al. (2019, 2021) foram os primeiros autores a
(2019) correlacionam a idade Devoniana à apresentar aná lises de AHe e de ZHe no
Orogenia Famatiniana, responsá vel por de‑ ESRG (Fig. 4), sendo que estes ú ltimos asso‑
formar e por soerguer, lentamente, parte do ciaram estes termocronô metros a aná lises
continente Gondwana Ocidental entre 510 e de TFA e de TFZ. Todos estes trabalhos for‑
360 Ma, seguida pelo resfriamento, causado necem resultados, em parte, concordantes,
pela Orogenia Gondwanides. como a correlaçã o negativa entre as idades
Os primeiros dados de TFZ no ESRG de ZHe e o conteú do efetivo de urâ nio (eU,
foram obtidos por Oliveira et al. (2016), jun‑ conteú do de U + 0,235 x conteú do de Th, em
tamente com novos dados de TFA. As idades ppm), e, em parte, discordantes, como as
de TFZ variam do Carbonı́fero ao Triá ssico histó rias té rmicas obtidas. A histó ria de res‑
(Fig. 4), enquanto as idades de TFA variam friamento reconstruı́da por Hueck et al.
do Carbonı́fero ao Cretá ceo (Fig. 3). Estes au‑ (2019), obtida a partir dos termocronô me‑
tores estimam uma denudaçã o de cerca de tros AHe e ZHe, considera que grande parte
1.560 a 3.880 m para o episó dio de resfria‑ do ESRG foi, provavelmente, exposto a con‑
mento relacionado ao soerguimento, causado diçõ es subsuper iciais, no inı́cio do Paleo‑
por estresses intraplaca advindos da orogê ‑ zoico, e reaquecido, durante a deposiçã o da
nese Gondwanides. Os dados registram, tam‑ Bacia do Paraná , indicando que a Plataforma
bé m, os ú ltimos está gios desse evento Sul‑Americana foi palco de ciclos de soterra‑
orogê nico, evidenciados por um resfriamen‑ mento e de exumaçã o, durante o Paleo‑Me‑
to durante o Permo‑Triá ssico. Idades de TFA sozoico, ainda que situada no interior
do Terreno Sã o Gabriel, do Jurá ssico Superi‑ continental. As idades de ZHe obtidas por
or, juntamente com amostras do Bató lito Pe‑ Hueck et al. (2019) sã o essencialmente Pa‑
lotas, sã o indicativas do perı́odo anterior ao leozoicas e apontam para uma diferença en‑
inı́cio da ruptura continental, que deu origem tre estes dados e aqueles de TFZ publicados
ao Oceano Atlâ ntico, e re letem reativaçã o de por Oliveira et al. (2016), que indicam ida‑
zonas de cisalhamento expressivas, que deli‑ des mais jovens, apesar de ser um termo‑
mitam o Bató lito Pelotas, como a Dorsal de cronô metro de temperatura mais alta do
Canguçu, e as zonas de cisalhamento Passo que o do sistema ZHe. Esta discordâ ncia en‑
do Marinheiro e Porto Alegre. Gomes & Al‑ tre as idades obtidas pelos vá rios termo‑
meida (2019) corroboram a presença de um cronô metros sugere que a Bacia do
evento de resfriamento, durante o Triá ssico‑ Camaquã e seu embasamento cristalino
Jurá ssico, causado pela reativaçã o de zonas possivelmente estiveram submetidos a regi‑
de cisalhamento nesta regiã o. A reativaçã o mes té rmicos distintos.
dessas zonas de cisalhamento é associada a Alé m disso, Hueck et al. (2019) su‑
um pulso té rmico, relacionado a uma fase an‑ gerem que as idades de AHe, concentradas
terior à abertura do Oceano Atlâ ntico (Passa‑ entre o Triá ssico Superior e o Cretá ceo, indi‑
relli et al., 2010). Oliveira et al. (2016), assim cam denudaçã o longa e contı́nua, possivel‑
como Gomes & Almeida (2019), relatam um mente devido aos efeitos té rmicos da
episó dio de resfriamento, durante o Cenozoi‑ sedimentaçã o da Bacia do Paraná , levando à
190 Edição da Sociedade Brasileira de Geologia – Núcleo RS/SC
Jelinek et al.

Figura 3 ‒ Mapa geotectô nico do Escudo Sul‑Rio‑Grandense, com as idades traços de issã o em apatita (TFA).
Zonas de Cisalhamento: a ‑ Ibaré ; b ‑ Caçapava; c ‑ Dorsal de Canguçu; e d ‑ Passo do Marinheiro (modi icado de
CPRM (2008) e de Machado et al. (2019)).

Evolução termocronológica do Cinturão Dom Feliciano 191


Contribuições à Geologia do Rio Grande do Sul e de Santa Catarina

Figura 4 ‒ Mapa geotectô nico do Escudo Sul‑Rio‑Grandense, com as idades traços de issã o em zircã o (TFZ) e
(U‑Th)/He em apatita (AHe) e em zircã o (ZHe). Zonas de Cisalhamento: a ‑ Ibaré ; b ‑ Caçapava; c ‑ Dorsal de
Canguçu; e d ‑ Passo do Marinheiro (modi icado de CPRM (2008) e de Machado et al. (2019)).

192 Edição da Sociedade Brasileira de Geologia – Núcleo RS/SC


Jelinek et al.

exumaçã o das rochas hospedeiras somente sugere que o escudo tenha sido minima‑
apó s a erosã o desta bacia. Entretanto, estes mente soterrado por esses basaltos.
autores sugerem diferentes histó rias de res‑ Machado et al. (2019, 2021), combi‑
friamento para cada porçã o do ESRG. En‑ nando os termocronô metros TFZ, AFT, ZHe e
quanto o Terreno Taquarembó e a Bacia do AHe, apontam que a temperatura do Terreno
Camaquã exibem idades de ZHe e de AHe Sã o Gabriel se estabilizou antes dos demais
restritas entre o Devoniano e o Permiano, os terrenos, observando um primeiro episó dio
terrenos Tijucas e Sã o Gabriel e o Bató lito de resfriamento que se inicia no Devoniano
Pelotas tê m idades, predominantemente, en‑ e que se estende até o Carbonı́fero tardio,
tre o Permiano e o Cretá ceo (Fig. 4). Em ra‑ relacionado à s orogenias Famatiniana e
zã o das diferentes idades obtidas em cada Gondwanides, as quais promoveram soer‑
terreno, Hueck et al. (2019) consideram que guimento na porçã o oeste do ESRG. Foi ob‑
houve reativaçã o das principais zonas de ci‑ servado, ainda, um segundo episó dio de
salhamento do escudo, a Dorsal do Canguçu, resfriamento iniciado no Permiano e que se
o Lineamento Caçapava e a Zona de Cisalha‑ estendeu até o Cretá ceo, també m registrado
mento Ibaré , como, anteriormente já obser‑ por Oliveira et al. (2016) no Bató lito Pelotas.
vado por Oliveira et al. (2016) e por Gomes Machado et al. (2019) argumentam que o
& Almeida (2019). No entanto, como os ter‑ Terreno Sã o Gabriel e a Bacia do Camaquã já
renos Tijucas e Sã o Gabriel e o Bató lito Pelo‑ se encontravam relativamente está veis nes‑
tas apresentam idades com comportamento se perı́odo, mas que a porçã o leste do escu‑
similar, subentende‑se que a Dorsal do Can‑ do ainda nã o estava, atribuindo o inı́cio
guçu e o Lineamento Caçapava, que separam desse resfriamento à deglaciaçã o do
estes domı́nios do escudo, exerceram pouca Gondwana e à migraçã o, para sul, do manto
ou nenhuma in luê ncia no registro termo‑ de gelo, o que expô s o ESRG ao intemperis‑
cronoló gico. Já as idades mais antigas obti‑ mo e à erosã o. O arqueamento crustal em
das na Bacia do Camaquã possivelmente domo e o soerguimento, associado à ruptura
indicam uma histó ria té rmica distinta da do do Pangea, també m foram considerados, por
escudo, enquanto, no Terreno Taquarembó , Machado et al. (2019, 2021), como os princi‑
essas idades se devem, possivelmente, a rea‑ pais mecanismos a gerar o resfriamento ob‑
tivaçõ es recentes da Zona de Cisalhamento servado. Esse arqueamento pode ocorrer,
Ibaré . Curiosamente, esta zona de cisalha‑ quando a fusã o con inada na astenosfera au‑
mento é a ú nica do escudo a ter direçã o NW‑ menta a lutuabilidade da litosfera a inada,
SE. anterior à ruptura continental. No caso, a fu‑
As idades de AHe (Fig. 4) obtidas sã o corresponde à Provı́ncia Paraná ‑Etende‑
por Hueck et al. (2019) sã o concordantes ka, que possui expressivo volume
com as idades de TFA (Fig. 3) anteriormente magmá tico, e diversos diques alimentadores
publicadas no ESRG (Borba et al., 2002, que cortam o ESRG, sugere a presença dessa
2003; Gomes, 2011; Bicca et al., 2013; Olivei‑ fusã o abaixo do escudo ou nas suas proximi‑
ra et al., 2016; Gomes & Almeida, 2019), as dades (Machado et al., 2019). Esta hipó tese
quais sã o, predominantemente, mais antigas é corroborada pela presença de depó sitos
do que 100 Ma, o que sugere exumaçã o inal sedimentares da Formaçã o Botucatu menos
em condiçõ es subsuper iciais pré a sin‑rifte. espessos em direçã o ao ESRG, que, provavel‑
O resfriamento pó s‑rifte é restrito a algumas mente, se comportou como um alto topográ ‑
amostras. O fato de as vulcâ nicas Paraná ‑ ico e como uma fonte de sedimentos para a
Etendeka nã o apagarem o sistema de AHe, Formaçã o Botucatu. Machado et al. (2019)

Evolução termocronológica do Cinturão Dom Feliciano 193


Contribuições à Geologia do Rio Grande do Sul e de Santa Catarina

sugerem que os estresses intraplaca, durante passando pela Serra do Mar, estendendo‑se
o inal da Orogenia Gondwanides, no inı́cio do até a Serra da Mantiqueira. No conjunto de
Triá ssico, levaram as rochas do escudo a se‑ dados, é evidente a correlaçã o positiva entre
rem exumadas, por meio da reativaçã o das es‑ altitudes e idades TFA, com idades do Cretá ‑
truturas do embasamento e da Bacia do ceo Superior, pró ximas à linha de costa, e
Paraná , e a um leve reaquecimento, de até 70 mais antigas (estendendo‑se até o Carbonı́‑
°C, durante o Cretá ceo, mas em seus está gios fero), em direçã o ao interior continental, o
inais. Estes autores justi icam uma perturba‑ que difere dos dados mais recentes, ao lon‑
çã o no gradiente geoté rmico sob o ESRG, de‑ go da Provı́ncia Mantiqueira, compilados
vido: (i) à intrusã o de plugs alcalinos, entre por Hueck et al. (2019) (Fig. 6). O resfria‑
99 e 76 Ma, no Terreno Tijucas; (ii) à in luê n‑ mento por exumaçã o é tido, por Gallagher et
cia té rmica da pluma de Tristã o da Cunha; e al. (1994), como o fator preponderante para
(iii) ao soerguimento manté lico, que deu inı́‑ justi icar as idades mais jovens. Hueck et al.
cio ao rifteamento continental do Pangea nes‑ (2019), por outro lado, sugerem que, na
ta regiã o e na Provı́ncia Magmá tica porçã o sul da Provı́ncia Mantiqueira, a reati‑
Paraná ‑Etendeka. Ainda, segundo estes auto‑ vaçã o das estruturas Neoproterozoicas her‑
res, essa perturbaçã o teria sido maior na por‑ dadas nã o causou deslocamentos verticais,
çã o leste do escudo, pró xima ao rifte. mas que o resfriamento observado nas his‑
O resfriamento inal, que levou todo o tó rias té rmicas pode estar relacionado à
ESRG a condiçõ es super iciais, é atribuı́do a distâ ncia ao eixo do rifte ativo.
reajustes da Placa Sul‑Americana, apó s o rif‑ Gallagher et al. (1994) encontraram
teamento continental, o que mudou a taxa de histó rias té rmicas distintas ao longo da
espalhamento oceâ nico e a geometria da pla‑ margem continental, o que re lete compor‑
ca, resultando em estresses transferidos ao tamentos té rmicos distintos para cada por‑
interior continental (Machado et al., 2019; çã o da mesma. Nas amostras pró ximas à
2021). A compensaçã o lexural, devido à acu‑ linha de costa, foram registradas taxas de
mulaçã o de sedimentos nas bacias marginais, denudaçã o e de exumaçã o mais aceleradas,
com subsidê ncia associada, teria contribuı́do com remoçã o de cerca de 3 km de seçã o de‑
com o soerguimento da costa. nudada apó s a ruptura continental. Já no in‑
terior do continente, a remoçã o de seçã o
6 TERMOCRONOLOGIA DO ESCUDO CA‑ denudada foi de cerca de 1 km, com taxas
TARINENSE mais lentas. Na regiã o do EC, as amostras
localizadas nas imediaçõ es dos derrames
O resfriamento e a exumaçã o do EC basá lticos apresentam idades que corres‑
foi, principalmente, pó s‑rifte, acompanhando pondem a esse evento. Poré m, Gallagher et
uma tendê ncia das margens sudeste e leste, al. (1994, 1995) observaram que as amos‑
conforme indicam as idades termocronoló gi‑ tras mais distantes dos derrames permane‑
cas obtidas nos vá rios estudos realizados ceram em temperaturas mais elevadas por
(Figs. 5‑6). mais tempo, devido ao soterramento pro‑
O trabalho pioneiro, nã o só no EC, co‑ movido pelos basaltos, e que isso gerou uma
mo no Brasil todo, foi de Gallagher et al. reduçã o nas idades TFA. Nos trabalhos de
(1994), usando a termocronologia por TFA Karl et al. (2013), de Hueck et al. (2018) e
(Fig. 5). Estes autores realizaram uma amos‑ de Krob et al. (2019) icam ressaltados os
tragem sistemá tica nas porçõ es sul e sudeste efeitos das altas temperaturas a que o EC foi
da margem continental brasileira, desde o EC, submetido, o que apagou, parcial ou total‑

194 Edição da Sociedade Brasileira de Geologia – Núcleo RS/SC


Jelinek et al.

Figura 5 ‒ Mapa geotectô nico do Escudo Catarinense, com as idades traços de issã o em apatita (TFA). Zonas de
Cisalhamento: a ‑ Itajaı́‑Perimbó ; e b ‑ Major Gercino (MGSZ) (modi icado de CPRM (2014)).

mente, até mesmo os sistemas de TFZ e de tar a temperatura em cerca de 60‑80 °C regi‑
ZHe (Fig. 6), que tê m temperaturas de fecha‑ onalmente, e, a partir deste novo patamar de
mento mais altas. Gallagher et al. (1995) argu‑ temperatura, promover o resfriamento da
mentam que o EC é palco de resfriamento regiã o.
contı́nuo desde a erupçã o desses basaltos, O mé todo de TFA foi utilizado por Je‑
mas que estes foram responsá veis por aumen‑ linek et al. (1999) e por Jelinek et al. (2003)
Evolução termocronológica do Cinturão Dom Feliciano 195
Contribuições à Geologia do Rio Grande do Sul e de Santa Catarina

Figura 6 ‒ Mapa geotectô nico do Escudo Catarinense, com as idades traços de issã o em zircã o (TFZ) e (U‑Th)/
He em apatita (AHe) e em zircã o (ZHe). Zonas de Cisalhamento: a ‑ Itajaı́‑Perimbó ; e b ‑ Major Gercino (MGSZ)
(modi icado de CPRM (2014)).

para datar eventos hidrotermais na porçã o responsá veis pela geraçã o do hidrotermalis‑
sudeste do EC e correlacioná ‑los à evoluçã o mo, que levou à deposiçã o de luorita ilone‑
da margem continental nesta regiã o. Jelinek ana. O principal mecanismo que estes
et al. (2003) obtiveram idades TFA do Paleo‑ autores consideram para a denudaçã o do EC
ceno‑Eoceno (Fig. 5) e episó dios de resfria‑ é a possibilidade de, localmente, na á rea do
mento iniciados no Cretá ceo Superior, distrito luorı́tico, a regiã o ter sido afetada
196 Edição da Sociedade Brasileira de Geologia – Núcleo RS/SC
Jelinek et al.

por um evento té rmico, associado ao mag‑ correlaçã o negativa com as idades de ZHe,
matismo alcalino de Lages e, regionalmente, conforme també m observado no ESRG (Hu‑
a regiã o ter sido afetada pelo magmatismo, eck et al., 2019). Já as idades AHe obtidas por
relacionado ao Lineamento de Florianó po‑ Hueck et al. (2018) estã o concentradas no
lis. Cretá ceo Superior‑Paleó geno e indicam que
Posteriormente, o EC foi estudado o conjunto de dados experimentou uma his‑
por Karl et al. (2013), utilizando os termo‑ tó ria té rmica semelhante (Fig. 6). Em contra‑
cronô metros TFA, TFZ, AHe e ZHe (Figs. 5‑ partida ao sistema ZHe, as idades AHe nã o
6). A combinaçã o destes termocronô metros apresentam correlaçã o com nenhum outro
permitiu segmentar em trê s partes o trecho parâ metro e estã o limitadas a um intervalo
entre Sã o Paulo (localizado no interior do restrito, sugerindo que as amostras sofreram
Oró geno Ribeira) e Laguna (porçã o sul do um resfriamento lento e contı́nuo (Hueck et
EC). Os segmentos levam em consideraçã o al., 2018), tendo sofrido um resfriamento
zonas de fraturas expressivas, de direçã o acelerado somente entre Cretá ceo Superior e
NW‑SE, sendo que o limite entre os blocos Paleoceno. Esse resfriamento acelerado pode
norte e central é delimitado pela Zona de estar relacionado com uma mudança no gra‑
Fratura Rio Alonzo, enquanto a Zona de Fra‑ diente geoté rmico local, devido à presença
tura de Florianó polis separa os blocos cen‑ de uma anomalia té rmica das rochas alcali‑
tral e sul. Krob et al. (2019), por outro lado, nas de Lages e do ponto quente Tristã o da
segmentaram este mesmo trecho em seis Cunha, conforme observado por Jelinek et al.
blocos, també m levando em consideraçã o (2003), anteriormente. As idades mais anti‑
zonas de fraturas NW‑SE importantes (blo‑ gas dos grã os individuais podem estar relaci‑
cos Santos, Peruı́be, Ilha Comprida, Curitiba, onadas à implantaçã o de He de cristais
Florianó polis e Laguna, de norte a sul, res‑ adjacentes, à zonaçã o interna nã o quanti ica‑
pectivamente). De acordo com Karl et al. da, a microinclusõ es, entre outros.
(2013), o bloco sul, representado, em grande De acordo com Hueck et al. (2018), o
parte, pelo nú cleo cristalino do EC (equiva‑ primeiro registro da histó ria de resfriamento
lente ao Bloco Laguna e a porçõ es do Bloco do EC é uma exumaçã o no inı́cio do Paleozoi‑
Florianó polis, de Krob et al., 2019), nã o co, apó s a fase pó s‑colisional do Oró geno
apresentou uma movimentaçã o expressiva, Dom Feliciano. Para explicar a dispersã o das
apesar de demonstrar uma complexa evolu‑ idades de ZHe, os autores consideram duas
çã o té rmica, com seçã o denudada estimada hipó teses. Na primeira, esta dispersã o indi‑
em 4,5‑5,0 km. Krob et al. (2019) també m caria que esse sistema sofreu abertura parci‑
indicam uma histó ria té rmica do bloco sul al e que essas amostras estavam hospedadas
(Bloco Laguna) completamente distinta da em rochas que foram exumadas até condi‑
dos demais blocos, com temperaturas eleva‑ çõ es pró ximas à s da superfı́cie, anteriormen‑
das, o que sugere uma alteraçã o no gradien‑ te à deposiçã o dos sedimentos da Bacia do
te geoté rmico local. Paraná . A posiçã o crustal dessas rochas era
Na regiã o continental, pró xima a de temperatura inferior a 120 °C, até a extru‑
Florianó polis (SC), Hueck et al. (2018) obti‑ sã o dos basaltos da Provı́ncia Magmá tica Pa‑
veram idades ZHe com grande dispersã o, es‑ raná ‑Etendeka, que elevaram a temperatura
tendendo‑se desde o Ordoviciano, até o o su iciente para apagar parcialmente o sis‑
Paleó geno, justi icadas pelo conteú do de ele‑ tema ZHe. A histó ria té rmica se encerra com
mentos radioativos nos cristais. Zircõ es, con‑ um está gio inal de resfriamento em condi‑
tendo eU abaixo de 1000 ppm, possuem uma çõ es super iciais entre o Cretá ceo Superior‑

Evolução termocronológica do Cinturão Dom Feliciano 197


Contribuições à Geologia do Rio Grande do Sul e de Santa Catarina

Paleó geno. A segunda hipó tese levantada pe‑ queamento dos sedimentos da Bacia do Pa‑
los autores considera que a dispersã o das raná e à formaçã o das principais zonas de
idades de ZHe poderia decorrer da longa per‑ fraturas do Oceano Atlâ ntico Sul.
manê ncia das amostras em temperaturas ele‑
vadas (160‑200 °C), especialmente durante o 7 EVOLUÇÃO TERMOTECTÔNICA FANE‑
Mesozoico, sucedida pelo evento de resfria‑ ROZOICA DO CINTURÃO DOM FELICIA‑
mento do Cretá ceo Superior‑Paleó geno. A NO
permanê ncia dessas amostras em temperatu‑
ras elevadas pode ser resultado do aumento Na margem continental sul do Bra‑
do gradiente geoté rmico, precedente à ruptu‑ sil, a partir da compilaçã o de histó rias té r‑
ra continental e à extrusã o dos basaltos da micas, basicamente com dados de TFA (Fig.
Provı́ncia Magmá tica Paraná ‑Etendeka. 7C) e, em alguns casos, acrescentado outros
A primeira hipó tese, de Hueck et al. termocronô metros (Figs. 7A‑7B e 7D), é
(2018), é favorecida pela presença do contato possı́vel reconstruir a evoluçã o termotectô ‑
entre os sedimentos da Bacia do Paraná e o nica do Cinturã o Dom Feliciano e dos crá ‑
embasamento cristalino, à cerca de 10 km de tons adjacentes, e o impacto na dinâ mica de
distâ ncia da á rea de estudo. Alé m disso, estes evoluçã o da margem de rifte.
autores sugerem que a á rea do EC, provavel‑ A compilaçã o de histó rias té rmicas
mente, foi recoberta por sedimentos dessa de dados TFA (Machado et al., 2021) mos‑
bacia, apesar deste fato nã o ser su iciente pa‑ tram que o ESRG iniciou o registro de resfri‑
ra explicar a perda de He e para induzir a dis‑ amento no Devoniano (Fig. 7A), quando a
persã o das idades de ZHe. A dispersã o teria maior parte do embasamento já estava abai‑
decorrido da presença dos basaltos da Pro‑ xo de temperaturas da ordem de 160 °C,
vı́ncia Magmá tica Paraná ‑Etendeka, mais es‑ com o Crá ton Rio de La Plata registrando
peci icamente, dos diques alimentadores da temperaturas mais amenas, quando compa‑
mesma, como o Enxame de Diques de Floria‑ radas à s do Cinturã o Dom Feliciano. Por vol‑
nó polis. A orientaçã o dos diques, paralela à li‑ ta do inı́cio do Carbonı́fero, as temperaturas
nha de costa, sugere a proximidade com a estavam pró ximas ou abaixo de 120 °C na
regiã o central do rifte do Atlâ ntico Sul, o que maior parte do embasamento (Fig. 7B), com
contribui com um gradiente té rmico elevado. a regiã o nordeste, ou seja, o Bató lito Pelotas,
Os basaltos, juntamente com os sedimentos registrando as temperaturas mais elevadas.
da Bacia do Paraná , possivelmente cobriram a Durante a transiçã o Carbonı́fero‑Permiano,
regiã o em que se localiza a á rea de estudo, o as temperaturas no crá ton e no cinturã o fo‑
que é evidenciado pela abertura do sistema ram, em sua maioria, abaixo de 100 °C, en‑
de AHe até o Cretá ceo tardio, sugerindo a quanto o Bató lito Pelotas, a nordeste,
erosã o desta sequê ncia. Hueck et al. (2018) manteve suas temperaturas mais altas,
estimam uma espessura de seçã o denudada quando comparadas à s do resto do embasa‑
de 1,6 km a 2,5 km para a regiã o, a partir das mento (Fig. 7C). Este comportamento é con‑
modelagens de histó rias té rmicas. tı́nuo durante o resfriamento, atravé s da
Karl et al. (2013), Hueck et al. (2018) transiçã o Permiano‑Triá ssica, e, també m,
e Krob et al. (2019) sã o concordantes em durante a transiçã o Triá ssico‑Jurá ssica. No
a irmar que as feiçõ es de direçã o NW‑SE sã o inal do Jurá ssico, imediatamente antes do
associadas aos está gios iniciais de ruptura magmatismo Paraná ‑Etendeka (138 a 125
continental e de rotaçã o da Placa Sul‑Ameri‑ Ma) e da abertura do Atlâ ntico Sul na regiã o
cana, alé m de estarem correlacionadas ao ar‑ (130 a 113 Ma), a maior parte do embasa‑

198 Edição da Sociedade Brasileira de Geologia – Núcleo RS/SC


Jelinek et al.

mento estava pró ximo ou abaixo de 60 °C to, estas bacias també m registram momentos
(Fig. 7D), o que indica que as rochas estavam em que houve captura de suas drenagens e a
expostas ou pró ximas à superfı́cie durante o falta de suprimento sedimentar.
rifteamento (Jurá ssico/Cretá ceo). Os locais Por im, no Eoceno, praticamente to‑
mais a leste parecem registrar as temperatu‑ do o embasamento na regiã o estava abaixo
ras mais altas no momento do evento de rif‑ de 60°C (Fig. 7D), com uma tendê ncia a tem‑
teamento/magmatismo, mas, geralmente, peraturas mais amenas para o interior. Este
nã o excedem 100 °C. Apó s a abertura do evento inal de resfriamento é apontado co‑
Atlâ ntico Sul, na transiçã o entre o Cretá ceo mo resultado de um regime compressivo in‑
Inferior e o Cretá ceo Superior, as temperatu‑ tenso, observado em vá rias fases do Oró geno
ras do embasamento ainda estavam perto de Andino, e de mudanças no regime de espa‑
60 °C. O magmatismo associado com a rup‑ lhamento da dorsal meso‑oceâ nica, entre as
tura do Gondwana provavelmente causou um placas Sul‑Americana e Africana.
distú rbio geoté rmico, que pode ser respon‑
sá vel pela dispersã o das idades AHe. 8 CONSIDERAÇÕES FINAIS
Já a histó ria de resfriamento do EC é
marcada por uma exumaçã o no inı́cio do Pa‑ Estudos de termocronologia, realiza‑
leozoico (Fig. 7A), apó s a fase pó s‑colisional dos em rochas do embasamento da margem
do Oró geno Dom Feliciano. Durante o inal continental sul do Brasil, revelam padrõ es de
do Jurá ssico e o inı́cio do Cretá ceo, deu‑se resfriamento distintos ao longo da costa. En‑
inı́cio ao rifteamento (Fig. 7B), o que gerou quanto a maior parte da margem apresenta
soerguimento e exumaçã o em grande parte exumaçã o sin a pó s‑rifte (Cretá ceo ao Ceno‑
da margem continental brasileira. Sã o con‑ zoico), como é o caso da regiã o do EC, a regi‑
temporâ neos, també m, os derrames basá lti‑ ã o do extremo sul do Brasil, o ESRG,
cos da Provı́ncia Magmá tica Paraná ‑Etende‑ apresenta principalmente exumaçã o pré ‑rif‑
ka, que cobriram grande parte do leste cata‑ te.
rinense, e os diques alimentadores, que con‑ Diversas sã o as causas, atribuı́das ao
tribuı́ram para o aumento do gradiente soerguimento e ao resfriamento observados
geoté rmico local, apagando, parcial ou total‑ na margem continental brasileira, incluindo a
mente, até mesmo os sistemas de TFZ e de regiã o do EC, como: (i) o aumento do gradi‑
ZHe (Figs. 7A‑7B). ente geoté rmico devido à s anomalias té rmi‑
A partir deste evento de ruptura cas Trindade e Tristã o da Cunha (Machado et
continental, formaram‑se as bacias da mar‑ al., 2019, 2021); (ii) o estiramento crustal,
gem leste do Brasil, as quais registram tam‑ promovido por estas anomalias, causando fa‑
bé m os pulsos de soerguimento e de lhamento e exumaçã o (Jelinek, 2019; Krob et
exumaçã o que erodiram o continente. O al., 2019; Machado et al., 2019, 2021); (iii) a
evento de resfriamento acelerado, registrado reativaçã o de estruturas NE‑SW Neoprotero‑
no Cretá ceo Superior e no inı́cio do Paleó ge‑ zoicas herdadas (Jelinek et al., 2003; Jelinek,
no (Fig. 7C), marca bem este processo de so‑ 2019); (iv) a compressã o da Placa Sul‑Ameri‑
erguimento da porçã o continental, especial‑ cana; (v) a incisã o de drenagens, que apro‑
mente na Serra do Mar. Os registros sedi‑ veitaram as feiçõ es lineares, como falhas e
mentares nas Bacias de Pelotas e de Santos lineamentos, de direçõ es NE‑SW e NW‑SE
corroboram estas fases de soerguimento e (Oliveira et al., 2016; Krob et al., 2019); (vi)
de erosã o, com espessos pacotes sedimenta‑ isostasia auxiliada por underplating magmá ‑
res, de granulometria mais grossa. No entan‑ tico (Jelinek, 2019); entre outros. Estes fato‑

Evolução termocronológica do Cinturão Dom Feliciano 199


Contribuições à Geologia do Rio Grande do Sul e de Santa Catarina

Figura 7 ‒ Modelo digital de terreno da margem continental sul brasileira, com a sobreposiçã o dos terrenos
tectono‑estratigrá icos e vulcano‑sedimentares.

res possivelmente agiram em conjunto, es‑


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Florianó polis, nã o existem evidê ncias de que
Bicca, M. M., Chemale, F., Jelinek, A. R., Olivei‑
estes fatores agiram fortemente, o que levou
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a um registro de histó rias té rmicas essenci‑ 2013. Tectonic evolution and provenance of
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202 Edição da Sociedade Brasileira de Geologia – Núcleo RS/SC


Folhelho Lontras, uma Lagerstatte
do Paleozoico brasileiro
Lucas Del Mouro1*, Joã o Henrique Zahdi Ricetti2,3,
Luiz Carlos Weinschütz3, Mı́rian Liza Alves Forancelli Pacheco4

1
Departamento de Geologia, Universidade Federal de Santa Catarina
2
Instituto de Geociê ncias, Universidade Federal do Rio Grande do Sul
3
Centro Paleontoló gico da Universidade do Contestado, Universidade do Contestado
4
Laborató rio de Estudos Paleobioló gicos, Universidade Federal de Sã o Carlos

* autor correspondente: lucas.delmouro@gmail.com

1 INTRODUÇÃO
O estudo dos fó sseis é fundamental para o entendimento da evoluçã o da vida em res‑
posta à s modi icaçõ es do planeta durante o tempo geoló gico. Sã o eles, em especial os que pos‑
suem partes moles preservadas, cruciais para avaliarmos as mudanças ocorridas no planeta e
modelarmos hipó teses para as alteraçõ es futuras. No entanto, os fó sseis de corpos moles sã o es‑
tatisticamente raros e normalmente estã o associados nos conhecidos depó sitos Konservat‑
Lagerstatten (Seilacher, 1970). Esses ú ltimos sã o de inidos como depó sitos fossilı́feros com pre‑
servaçã o incomum e, segundo Cardoso et al. (2020), apesar da importâ ncia dos
Konservat‑Lagerstatten, suas ocorrê ncias sã o escassas e restritas, delimitadas por grupos de es‑
tratos com idades, contexto paleodepositional e localizaçã o geográ ica similar. Portanto, a iden‑
ti icaçã o desses tipos de depó sitos é extremamente rara.
No Brasil, embora haja abundantes exposiçõ es fossilı́feras, tı́nhamos reconhecidamente
até o inal da dé cada de 1990, apenas os estratos da Formaçã o Santana e Romualdo, Bacia do
Araripe, como depó sitos Konservat‑Lagerstatte. Este cená rio vem‑se modi icando, em especial
pelo contı́nuo relato de fó sseis com preservaçã o incomum no Intervalo Fossilı́fero Folhelho Lon‑
tras (IFFL), Carbonı́fero‑Permiano da Fm. Campo Mourã o, Bacia do Paraná .
Descoberto em 1908 por Jay Backus Woodworth e Euzé bio Paulo de Oliveira, durante a
expediçã o por camadas glaciais no sul do Brasil, o IFFL é composto por uma diversa e bem pre‑
servada associaçã o fossilı́fera. Esse sı́tio marinho fossilı́fero, hoje encontrado no A loramento
Contribuições à Geologia do Rio Grande do Sul e de Santa Catarina

Campaleo, compreende uma combinaçã o de odworth e por Oliveira foi encoberto pela
diferentes tipos preservaçã o, incluindo par‑ construçã o de moradias populares. Apesar
tes duras e tecidos moles de organismos da abundâ ncia e da diversidade de fó sseis
aquá ticos (peixes, porı́feros e amonó ides), registradas para o Folhelho Lontras, em Ma‑
assim como de biotas terrestres (insetos e fra, apó s a precursora publicaçã o de Ruede‑
plantas). mann, complementada por Oliveira (1930),
poucas mençõ es aos fó sseis foram feitas,
2 HISTÓRIA DA DESCOBERTA DO durante as dé cadas seguintes (e.g. Carvalho,
LAGERSTATTE Miranda & Alvin, 1942; Schneider et al.,
1974; Rö sler, 1985), até a descriçã o da pri‑
A histó ria do Folhelho Lontras e de meira espé cie do Intervalo Fossilı́fero do
seus magnı́ icos fó sseis começa no inı́cio do Folhelho Lontras, i.e., Santosichtyes mafren‑
sé culo XX, quando expediçõ es geoló gicas i‑ sis Malabarba, 1988, seguida da tese de Ri‑
nanciadas pelos governos brasileiro e esta‑ chter sobre a paleoictiofauna do Folhelho
dunidense deram inı́cio a investigaçõ es por (Richter, 1991).
depó sitos minerais e por registro glaciais Em 1997, durante o processo de
(Mouro et al., 2018). terraplenagem para instalaçã o de uma em‑
Financiados pelo Shaler Memorial presa na regiã o industrial ao sul da cidade,
Fund, um fundo de inanciamento à pesquisa ainda em seu perı́metro urbano, estratos do
criado por alunos e por admiradores do pro‑ IFFL foram encontrados. O achado culminou
fessor da Universidade de Harvard, o geó lo‑ em uma mobilizaçã o de ó rgã os de iscaliza‑
go Nathaniel Southgate Shaler, Jay Backus çã o, do poder executivo, da sociedade cien‑
Woodworth e o geó logo brasileiro Euzé bio tı́ ica e da comunidade local com
Paulo de Oliveira percorreram diversas loca‑ repercussã o nacional. Um movimento da
lidades dos estados de Sã o Paulo, do Paraná Prefeitura de Mafra decretou como de inte‑
e de Santa Catarina, em 1908. Dentre as lo‑ resse pú blico para ins de preservaçã o do
calidades visitadas, descobriram e descreve‑ Patrimô nio Natural uma propriedade a 300
ram uma camada de folhelhos negros metros da á rea de instalaçã o da empresa,
fossilı́feros no bairro de Bela Vista, ao sul da antigamente explorada como lavra para in‑
cidade de Rio Negro, no Paraná , cuja exten‑ dú stria ceramista, onde o Folhelho Lontras
sã o, na é poca, compreendia, també m, o atual e seu intervalo fossilı́fero encontravam‑se
municı́pio de Mafra, em Santa Catarina. Atu‑ a lorantes. Esta á rea foi posteriormente de‑
almente, esta camada é cronocorrelata à ca‑ sapropriada e disponibilizada para realiza‑
mada do A loramento Campaleo, no çã o de pesquisas, sob os cuidados do Centro
Intervalo Fossilı́fero do Folhelho Lontras. Paleontoló gico da Universidade do Contes‑
Cerca de 200 amostras da expediçã o tado. Nascia assim o a loramento Campaleo
de Euzé bio de Oliveira em 1908, foram envi‑ (Fig. 1; Hamel, 2005; Mouro et al., 2014a;
adas por Orville Derby para o Museu do Es‑ Weinschü tz et al., 2019). A partir deste mo‑
tado de Nova Iorque (New York State mento, a pesquisa geocientı́ ica do Folhelho
Museum), onde estã o armazenadas até hoje Lontras se tornou mais constante e a quali‑
e resultaram na primeira publicaçã o cientı́ i‑ dade de preservaçã o de seus fó sseis, bem
ca acerca do IFFL (veja Ruedemann, 1929). como a riqueza de sua paleobiota, sendo
Alé m da relevâ ncia cientı́ ica, esses exempla‑ paulatinamente conhecida e, atualmente,
res possuem enorme valor histó rico, tendo considerada um Fó ssil Largesttä te do Paleo‑
em vista que o a loramento visitado por Wo‑ zoico Superior (e.g. , Scomazzon et al., 2013;

204 Edição da Sociedade Brasileira de Geologia – Núcleo RS/SC


Mouro et al.

Figura 1 ‒ Mapa de localizaçã o do A loramento Campaleo (IFFL). Em detalhe, a localizaçã o das unidades
Carbonı́feras‑Permianas a lorantes nos estados do sul do Brasil.

Iannuzzi et al., 2014; Ricetti et al., 2014a; possui, aproximadamente, 50 m de espessu‑


Mouro et al., 2016, 2017, 2020). ra, compreendendo uma sé rie de folhelhos
vá rvicos, que se alternam com pacotes de
3 CONTEXTO GEOLÓGICO siltitos e de argilitos (Weinschü tz & Castro,
2005). Essa sucessã o tem um a inamento
Localizado no topo da Formaçã o
textural e uma reduçã o de clastos caı́dos pa‑
Campo Mourã o, no Grupo Itararé , da Bacia
ra o topo, marcando a transgressã o, ligada à
do Paraná (França & Potter, 1988; Weins‑
deglaciaçã o, que culmina na inundaçã o má ‑
chü tz & Castro, 2004), o Folhelho Lontras é
xima da bacia (Weinschü tz & Castro, 2005).
considerado um marco estratigrá ico da ba‑
cia, denotando um evento de má xima trans‑ Nos ú ltimos anos, a idade atrelada
gressã o. Segundo Buso et al. (2019), esse ao Folhelho Lontras tem sido tema de dis‑
intervalo corresponde ao segundo Trato de cussã o. Enquanto Cagliari et al. (2016), Buso
Sistema de Degelo (DST2 from sub‑cycle II of et al. (2019), Grif is et al. (2018) e Grif is et
Cycle II, a 3rd‑order or high‑frequency, orbital‑ al. (2019), baseados em dataçã o de U‑Pb em
driven glacial cycles), o qual compreende de‑ zircã o, assinalaram que o topo do Grupo Ita‑
pó sitos marinhos pró ‑glaciais e representa raré corresponde, geocronologicamente, ao
ciclos de degelo, resultando no aumento rela‑ inal do Carbonı́fero Superior, a maioria dos
tivo do nı́vel do mar. O DST2 corresponde à mé todos bioestratigrá icos, baseados em da‑
sedimentaçã o marinha pró ‑glacial, oriunda dos palinoló gicos e em conodontes (zonas
de longı́nquas plumas turbidı́ticas e de sedi‑ Vittatina costabilis e Mesogondolella spp.),
mentos hemipelá gicos (Buso et al., 2019). posicionaram o Folhelho Lontras na idade
Cisuraliana (Permiano Inferior) (veja Petri &
Regionalmente, o Folhelho Lontras

Folhelho Lontras, uma Lagerstatte do Paleozoico brasileiro 205


Contribuições à Geologia do Rio Grande do Sul e de Santa Catarina

Souza, 1993; Dino & Rö sler, 2001; Souza, a inidade com as grandes á reas da pesquisa
2005; Holz et al., 2010; Scomazzon et al., paleontoló gica: paleovertebrados, paleoin‑
2013; Wilner et al., 2016a). Essa ú ltima foi vertebrados, paleo lora, microfó sseis e icno‑
rati icada por dados de Rb‑Sr detrı́tico em fó sseis (Figs. 3‑9).
amostras oriundas do A loramento Campa‑
leo (Koester et al., 2016). Essa inde iniçã o, a 5 PALEOVERTEBRADOS
respeito da idade do Folhelho Lontras, suge‑
re a possibilidade de um degelo diá crono do Peixes: ao menos, duzentos espé ci‑
Grupo Itararé , como já visto na Bacia de Pa‑ mes completos de peixes actinopterı́gios, in‑
ganzo, na Argentina (Moxness et al., 2018). cluindo juvenis e adultos, foram resgatados.
No entanto, considerando o grau de con ian‑ As espé cies Santosichtyes mafrensis (Mala‑
ça da dataçã o absoluta, é plausı́vel posicio‑ barba, 1988) e Roslerichthyies riomafrensis
nar o Folhelho Lontras na idade (Hamel, 2005) foram descritas no IFFL, alé m
Pennsilvaniana. de outras, descritas e nã o publicadas por Ri‑
O A loramento Campaleo (S 26°09′ chter (1991). A constante coleta possibilita,
30.22″, W 49°48′ 52.82″) (Fig. 1) está locali‑ ainda, a descriçã o de novas espé cies da pale‑
zado à s margens da rodovia BR‑280, a cerca oictiofauna do Folhelho Lontras (Fig. 3A‑3B).
de 2 km do trevo com a BR‑116, na regiã o Segundo Hamel (2005), os peixes fó sseis do
urbana da cidade de Mafra, em Santa Catari‑ IFFL sã o encontrados, normalmente, com‑
na. A base do a loramento é composta por 1 primidos na matriz, mas també m podem ser
m de siltito bioturbado, sobreposto pelos recuperados com suas caracterı́sticas tridi‑
1,10 m de folhelho negro macrofossı́lifero. mensionais pouco alteradas, em concreçõ es
Acima, segue um ritmito nã o fossilı́fero de 7 fosfá ticas. Por outro lado, exemplares, asso‑
m. Weinschü tz (2010) subdividiu o folhelho ciados à Classe Chondrichthyes, sã o encon‑
fossilı́fero em quatro nı́veis, denominados, trados apenas fosfatizados e, majorita‑
da base para o topo, 1, 2, 3 e 4 (Fig. 2). Cada riamente, na forma de dentes isolados (Pau‑
nı́vel foi dividido em subnı́veis, referentes à liv et al., 2014). Ocasionais escamas ganó ides
forma de desplacamento e de acamamento també m sã o encontradas, isoladas, nas lâ mi‑
das camadas, sendo re lexo direto de varia‑ nas do folhelho.
çõ es da deposiçã o e/ou de processos diage‑
né ticos. Assim, temos: nı́vel 1 (A, B, C, D); 6 PALEOINVERTEBRADOS
nı́vel 2 (A, B); nı́vel 3 (A, B, C, D); e nı́vel 4 (A,
B). E importante ressaltar que as variaçõ es Annelida: entre os subnı́veis 2B e 3B,
deposicionais, dentro da granulometria do foram descobertos cerca de 30 elementos
folhelho, sã o sutis. mandibulares de poliquetos. Normalmente,
esses escolecodontes sã o encontrados isola‑
dos no plano de acamamento, assim como
4 PALEOBIOTA DO FOLHELHO LON‑
dentro de concreçõ es fosfá ticas, em que a
TRAS
ocorrê ncia de um possı́vel corpo de polique‑
Desde a sua redescoberta, em mea‑ to, com estruturas cilı́ndricas segmentadas e
dos da dé cada de 1980, o conhecimento, a cerdas, foi reportado (Fig. 4A‑4B) (Ricetti &
respeito da assembleia fossilı́fera do Folhe‑ Weinschü tz, 2011; Ricetti et al., 2014; Mou‑
lho Lontras, vem sendo aprofundado e am‑ ro, 2017). Atualmente sob estudo, apresen‑
pliado. Uma sı́ntese de seu conteú do tam, a princı́pio, composiçã o carboná cea.
fossilı́fero é , aqui, apresentada, conforme sua Brachiopoda: um dos primeiros gru‑

206 Edição da Sociedade Brasileira de Geologia – Núcleo RS/SC


Mouro et al.

Figura 2 ‒ Detalhamento estratigrá ico do intervalo fossilı́fero do Folhelho Lontras (Formaçã o Campo Mourã o,
na Bacia do Paraná ) e sua associaçã o fossilı́fera (modi icado de Mouro et al., 2020).

Folhelho Lontras, uma Lagerstatte do Paleozoico brasileiro 207


Contribuições à Geologia do Rio Grande do Sul e de Santa Catarina

Figura 3 ‒ Fó sseis associados a vertebrados e a “proto‑vertebrados”: (a‑b) Espé cimes de peixes actinopterı́gios
(CP.V 5202a, retirado de Mouro et al., 2020); (c‑e) Aparatos mandibulares de conodontes.

pos a ser identi icado e descrito nas camadas tone marinha, preservada em soterramento
do Folhelho Lontras, durante a expediçã o de rá pido ou em ambiente de baixa energia,
Eusebio de Oliveira e de James Woodworth, com fundo anó xico.
em 1908 (veja Woodworth, 1912). Mais de Insecta: a ocorrê ncia de fó sseis des‑
trê s centenas de espé cimes de braquió podes sa classe nos sedimentos do Folhelho Lon‑
já foram coletados, sendo, na sua grande tras já é conhecida, desde a dé cada de 1990,
maioria, indivı́duos de Langella imbituvensis, e, talvez, junto com os elementos conodon‑
de Chonetes rionegrensis, de Biconvexiella ro‑ tes, os insetos compreendam as principais
xoi, de Quinquenella? sp., de Beecheria? sp. e descobertas paleontoló gicas do A loramen‑
de Orbiculoidea guaraunensis (Fig. 4C‑4D) to Campaleo, com efeitos diretos no enten‑
(Oliveira, 1930; Neves et al., 2017). Mouro dimento da evoluçã o bioló gica.
(2017) descreveu a ocorrê ncia isolada de di‑ Normalmente, eles sã o encontrados preser‑
minutos espé cimes fosfatizados e querogeni‑ vados entre os subnı́veis 1A e 3A, em trê s
zados em alguns dos subnı́veis do maneiras: comprimidos e piritizados, carbo‑
A loramento Campaleo. Todos eles se encon‑ nizados ou fosfatados. Entre as ordens iden‑
tram paralelos ao plano de acamamento. ti icadas, destaque para Blattodea e para
Crustacea: Adami‑Rodrigues et al. Grylloblattodea, que representam mais de
(2012) identi icaram e descreveram corpos e 100 espé cimes corpó reos encontrados
fragmentos de indivı́duos da Subclasse Eu‑ (Martins‑Neto, 2005; Pinto & Sedor, 2000;
malacostraca (Fig. 5A). Esses espé cimes, pre‑ Ricetti et al., 2016). Aproximadamente, 54%
servados carboni icados, impressos ou em da fauna é composta pela espé cie de Phylo‑
concreçõ es, indicam uma assembleia autó c‑ blattidae Anthracoblattina mendesi Pinto &

208 Edição da Sociedade Brasileira de Geologia – Núcleo RS/SC


Mouro et al.

Sedor, 2000, descrita para o IFFL e revisada da Bacia Sedimentar do Paraná . Os dois es‑
por Ricetti et al. (2016). Os detalhes de pre‑ pé cimes apresentam forte compactaçã o e es‑
servaçã o destes espé cimes sã o tamanhos, tã o preservados parcialmente, por
que se torna possı́vel veri icar lagelos nas piritizaçã o (espira externa), parcialmente,
antenas, escleritos torá cicos, assim como pa‑ por fosfatizaçã o (espira central) (Fig. 6E).
drõ es epicuticulares (Ricetti et al., 2016) Embora estejam em estudo, uma aná lise pre‑
(Fig. 5B, Fig. 9C‑9D). Mouro et al. (2020) re‑ liminar apontou a inidades com o gê nero
portaram a preservaçã o de ibras musculares Uraloceras, descrito no Permiano, nos Mon‑
submilimé tricas em alguns espé cimes de in‑ tes Urais (Cazaquistã o).
setos (Fig. 9E‑9H). Ainda sobre fó sseis, asso‑
ciados à Classe Insecta, o mais antigo casulo 7 ICNOFÓSSEIS
larval da Ordem Trichoptera foi encontrado e
descrito no Folhelho Lontras (Mouro et al., Nos subnı́veis inferiores do A lora‑
2016) (Fig. 5C). Esses fó sseis, nã o, apenas, mento Campaleo, foram identi icadas algu‑
aumentaram o tempo de existê ncia do há bito mas ocorrê ncias esparsas de copró litos
de fazer casulos dos Trichoptera, do Jurá ssi‑ heteropolares e de enteró spiras. Os copró li‑
co para o Carbonı́fero Superior, mas, tam‑ tos apresentam formato arredondado e cilı́n‑
bé m, lançaram uma luz sobre a ecologia e drico, com mé dias de 24 mm de
sobre o comportamento dos tricopterı́deos comprimento, de 13 mm de largura e de 6
nos está gios iniciais de evoluçã o, que teria mm de espessura (Fig. 6C) Em determinadas
iniciado em ambiente marinho calmo e sub‑ amostras, é possı́vel observar um acama‑
tidal. mento interno concê ntrico, e, em outras, po‑
de‑se notar issuras radiais (Muller et al.,
Porifera: no IFFL, sã o encontradas as
2017). As enteró spiras, que sã o exemplares
melhores preservaçõ es de porı́feros do Bra‑
de intestinos fossilizados de tubarõ es, pos‑
sil. Mouro et al. (2014) (Figs. 6A e 6B e 9A e
suem formato cilı́ndrico e comprimento mé ‑
9B) identi icaram corpos articulados e bem
dio de 22 mm, largura mé dia de 11 mm e
delimitados de hexactinellideos, descreven‑
diâ metro mé dio de 5 mm (Fig. 6D).
do a primeira espé cie paleozoica brasileira,
Microhemidiscia greinerti. Em 2017, o mes‑
8 PALEOFLORA
mo autor divulgou a ocorrê ncia de um possı́‑
vel indivı́duo demospongı́deo, que havia sido Fragmentos carbonizados milimé tri‑
coletado por Oliveira (1927) e que se encon‑ cos a centimé tricos sã o facilmente reconhe‑
trava depositado no acervo do New York Sta‑ cidos no Folhelho Lontras (Mouro, 2013)
te Museum. Ainda a respeito das esponjas, a (Fig. 7). Eles normalmente estã o associados
partir de estudos tafonô micos e geoquı́mi‑ aos demais fragmentos fossilı́feros, como
cos, Mouro et al. (2017) estabeleceram duas dentes, escamas, espı́culas e aparelhos man‑
tafofá cies do grupo nos subnı́veis do A lora‑ dibulares. Gnaedinger et al. (2012) e Urban
mento Campaleo. Em 2020, foi reportada a et al. (2012) identi icaram a ocorrê ncia de
presença de partes moles preservadas de po‑ espé cimes de lenhos Agathoxylon Hartig e
rı́feros, o que reforçou as condiçõ es ú nicas e Abietopitys Krä usel. Quando nos voltamos a
especiais desse pacote sedimentar. fragmentos micromé tricos, Mouro et al.
Ammonoidea: Weinschü tz et al. (2012) e Mouro (2013) reportaram a ocor‑
(2018) comunicaram o achado dos primei‑ rê ncia de itoclastos nã o opacos e opacos, as‑
ros exemplares de Ammonoidea no IFFL, sim como a presença de grã os de pó len e de
sendo considerados, també m, os primeiros esporos (Fig. 7E‑7G). Ainda, em Mouro et al.
Folhelho Lontras, uma Lagerstatte do Paleozoico brasileiro 209
Contribuições à Geologia do Rio Grande do Sul e de Santa Catarina

Figura 4 ‒ Biota de paleoinvertebrados: preservaçõ es associadas a anelı́deos: (a) Uma possı́vel impressã o de
somitos; (b) Aparelhos mandibulares de escolecodontes; (c‑d) Braquió podes; e (e) Ostracodes.

(2020), é apresentada uma possı́vel resina morfologia externa indicaria a ocorrê ncia de
vegetal (Fig. 7C). um foraminı́fero bentô nico aglutinante.
Contudo, as caracterı́sticas també m morfo‑
9 MICROFÓSSEIS mé tricas permitem supor a ocorrê ncia de
ovos de invertebrados. Pigã o & Mouro
Conodonta: dezenas de aparatos arti‑
(2019) rati icaram a ocorrê ncia do ilo, ao
culados e centenas de elementos isolados, do
identi icar foraminı́feros em lâ minas petro‑
gê nero Mesogondolella spp., foram recupera‑
grá icas do subnı́vel 3B (Fig. 8).
dos em cinco subnı́veis do A loramento Cam‑
Ostracoda: Kallen et al. (2014a,
paleo (Fig. 3C‑3E) (veja Scomazzon et al.,
2014b) registraram a presença de micro‑
2013; Wilner et al., 2016a). Os espé cimes
crustá ceos da classe Ostracoda. Esses mi‑
preservados sã o encontrados fosfatizados
crofó sseis possuı́am comprimento mé dio de
(por fosfato de cá lcio), paralelos ao plano de
175 μm e largura mé dia de 85 μm. A varia‑
acamamento e com alternâ ncia entre ele‑
çã o morfoló gica observada pode indicar es‑
mentos ramiformes e P1 (Mouro et al., 2020).
tá gios ontogené ticos ou a ocorrê ncia de
Foraminifera: o primeiro registro
mais de uma espé cie. As carapaças geral‑
desse grupo nas camadas do IFFL foi realiza‑
mente possuem composiçã o fosfá tica (Cá l‑
do por Lopes (2016). Segundo o autor, a
cio) e sã o encontradas articuladas, bem
210 Edição da Sociedade Brasileira de Geologia – Núcleo RS/SC
Mouro et al.

Figura 5 ‒ Biota de paleoinvertebrados: (a) Espé cime de Malacostraca, dentro de concreçã o (CP.I 887a, retirado
de Mouro et al., 2020); (b) fó ssil bem preservado de Anthracoblattina mendesi (CP.I 2182, retirado de Ricetti et
al., 2016); e (c) casulos larvais de Trichoptera (CPE 7811, retirado de Mouro et al., 2016).

preservadas, com coloraçã o â mbar a branca Ziegler et al., 1997; Buggisch et al., 2011; Is‑
e pouco ornamentadas (Fig. 4E). bell et al., 2012; Montañ ez & Poulsen, 2013;
Fedorchuk et al., 2018, 2019). Recentes tra‑
10 PALEOAMBIENTE, PALEOECOLOGIA balhos indicam que a porçã o sul do que, hoje,
E PRESERVAÇÃO é o Brasil, durante a passagem Carbonı́fera‑
Permiano, apresentava uma isiogra ia e uma
Entre o inal do Carbonı́fero e o inı́‑
morfologia de lobos glaciais, formando vales
cio do Permiano (Cisuraliano), o paleoconti‑
de sistema jord, semelhantes aos vistos, atu‑
nente Gondwana apresentava a toda sua
almente, no Chile e na Nova Zelâ ndia (Lopes
regiã o austral, sob in luê ncias deglaciais, re‑
et al., 1986; Lavina & Lopes, 1987; Dias,
lacionadas ao inal da Era do Gelo do Paleo‑
1993; Machado, 1994; Santos et al., 1996;
zoico Tardio (Late Palaeozoic Ice Age).
Holz et al., 2010; Silveira, 2000; Vesely et al.,
Apesar das discussõ es, a respeito do padrã o
2015; Tedesco et al., 2016, Mouro et al.,
de distribuiçã o das camadas de gelo na por‑
2017, 2020). Neste mesmo cená rio, Fallgat‑
çã o sul do Gondwana, sua in luê ncia está
ter & Paim (2017) reconheceram trê s ciclos
muito bem registrada nas unidades do Grupo
glaciais e a presença de um paleovale entre
Itararé , na Bacia do Paraná (Scotese, 1997;
Alfredo Wagner e Vidal Ramos, na porçã o

Folhelho Lontras, uma Lagerstatte do Paleozoico brasileiro 211


Contribuições à Geologia do Rio Grande do Sul e de Santa Catarina

Figura 6 ‒ Paleoinvertebrados e icnofó sseis: (a‑b) exemplares de porı́feros Microhemidiscia greinerti (CPI 450
e 451, retirados de Mouro et al., 2014). Exemplares de icnofó sseis: (c) enteró spira e (d) copró lito heteropolar.
(e) Exemplar de amonoide.

212 Edição da Sociedade Brasileira de Geologia – Núcleo RS/SC


Mouro et al.

Figura 7 ‒ Paleo lora do IFFL: (a) Lenho (CP.B 7196); (b) Impressã o de cutı́cula (CP.M 122); (c) Possı́vel â mbar
(CP.E 6521b); (d) Caule carbonizado; (e‑f) Pó lens; e (g) Alga prasinó ita.

central do estado de Santa Catarina, que esta‑ e o nı́vel marinho relativo aumentava, um
ria conectado, a norte, com uma grande baia, profundo sistema jord foi estabelecido. Os
em Rio do Sul (veja Canuto, 1999). Ainda, se‑ sedimentos depositados, durante o im deste
gundo esses autores, no inal do primeiro ci‑ primeiro ciclo, correspondem ao principal
clo glacial, enquanto a geleira recuava para SE marco estratigrá ico do Grupo Itararé , o Fo‑

Folhelho Lontras, uma Lagerstatte do Paleozoico brasileiro 213


Contribuições à Geologia do Rio Grande do Sul e de Santa Catarina

Figura 8 ‒ Foraminı́feros do IFFL em lâ mina petrográ ica: (a‑b) espé cimes multicameras; e (c‑d) espé cimes
globulares (retirado de Pigã o & Mouro, 2019).

lhelho Lontras (Schneider et al., 1974; França (HST), nos subnı́veis 1B, 3B a 4B. A partir
& Potter, 1988). destas aná lises, os autores observaram uma
Apesar da ausê ncia de fó sseis na recorrente euxinia na zona fó tica, assim co‑
maioria das ocorrê ncias do Folhelho Lontras, mo a predominâ ncia de condiçõ es anó xicas/
a medida em que o processo de degelo pre‑ euxı́nicas no bentos. Essas condiçõ es podem
valecia no norte do estado de Santa Catarina, estar relacionadas à ausê ncia de açã o de
as condiçõ es climá ticas favorá veis possivel‑ maré s, uma vez que a presença de microma‑
mente propiciaram o estabelecimento de um ré s é esperada em paleoambientes, relacio‑
hotspot de biodiversidade, como visto, atual‑ nados a iordes (veja Austin & Scourse,
mente, nos jords da Nova Zelâ ndia, e assina‑ 1997; Allison et al., 1998; Wells et al., 2005).
lado no horizonte, no sı́tio Campaleo. A partir Contudo, a presença de porı́feros autó ctones
de uma aná lise multiproxy (geoquı́mica orgâ ‑ assinala, ao menos, rá pidos momentos de
nica e inorgâ nica, paleontologia e palinolo‑ oxigenaçã o, portanto nã o se descarta a pos‑
gia), Mouro et al. (2017) assinalaram sibilidade de micromaré s de baixı́ssima in‑
caracterı́sticas de um ambiente marinho res‑ tensidade, como visto em mares
trito, com profundidades entre 200 m e 400 epicontinentais do Carbonı́fero na Europa.
m e, provavelmente, um embaiamento, cau‑ Portanto, combinando‑se o comple‑
sado por frente de geleira. Ademais, reconhe‑ xo contexto paleoambiental com as condi‑
ceram dois tratos de sistema: trato de çõ es paleoclimá ticas e paleogeográ icas, é
sistema transgressivo (TST), nos subnı́veis aceitá vel assinalar o IFFL como uma profun‑
1A, 1C a 3B, e trato de sistema de mar alto da baı́a de paleo jord (Mouro et al., 2020).

214 Edição da Sociedade Brasileira de Geologia – Núcleo RS/SC


Mouro et al.

Figura 9 ‒ Preservaçã o incomum no IFFL: (a) Hexactinellı́deo com possı́vel epiderme; (b) Macroscleras de
Hexactinelı́deo como microsclera hemidisco; (c‑d) Inseto tridimensional fosfatizado (CP.E 3243 a); (e‑g)
Articulaçã o femur‑tı́bia com tecido muscular preservado (CP.I 2276b); (f‑h) Articulaçã o femur‑tı́bia e mú sculo
tarsal; (i) Casulo larval de Trichoptera; (h) Detalhe da estrutura semelhante à seda, encontrada no casulo larval
(imagem de MEV).

Sistemas estuarianos semelhantes sã o ob‑ como Hamilton Fossil‑Lagerstatte (Cun‑


servados em outras paleobiotas Carbonı́fe‑ ningham et al., 1993), Mazon Creek (Kuecher
ras‑Permianas de excelente preservaçã o, et al., 1990), assembleia Kinney Brick (Ar‑

Folhelho Lontras, uma Lagerstatte do Paleozoico brasileiro 215


Contribuições à Geologia do Rio Grande do Sul e de Santa Catarina

cher & Feldman, 1990) e Folhelho Lawrence lho Lontras, há registros da ocorrê ncia de
(Zidek, 1992). intervalos semelhantes em outras duas loca‑
O Folhelho Lontras é categorizado lidades: um, na cidade de Mafra, e outro, em
como Lagerstatte, devido à ocorrê ncia de di‑ Rio dos Cedros, ambos em Santa Catarina.
ferentes tipos de preservaçã o, de amplo es‑ Entre as pesquisas realizadas, nos
pectro tafonô mico, incluindo a presença de ú ltimos anos, a associaçã o do IFFL tem pro‑
partes duras e moles de organismos aquá ti‑ porcionado informaçõ es importantes para o
cos e terrestre, como visto em outros impor‑ entendimento da evoluçã o ilogené tica, co‑
tantes Lagerstatten (e.g. Mazon Creek) (Fig. mo visto em porı́feros, em conodontes e em
9) (Mouro et al., 2020). O IFFL, mesmo apre‑ peixes paleoniscı́deos. Alé m disso, a desco‑
sentando condiçõ es favorá veis ao processo berta de casulos larvais trouxe novas hipó te‑
de piritizaçã o, conté m poucos fó sseis piriti‑ ses para a origem e para a ecologia do há bito
zados (veja Mouro et al., 2017), haja visto de produzir casulos na Ordem Trichoptera.
que sua maioria está preservada como com‑ Apesar do progresso realizado no
pressõ es carboná ceas ou fosfá ticas. A quali‑ entendimento da biota do IFFL, a partir de
dade da preservaçã o pode estar diretamente trabalhos sistemá ticos, realizados por diver‑
relacionada à grande abundâ ncia de maté ria sos paleontó logos brasileiros, importantes
orgâ nica em condiçõ es redutoras, como informaçõ es tafonô micas e taxonô micas ain‑
apontam os dados geoquı́micos e sedimento‑ da continuam em aberto. Portanto, há de se
ló gicos do IFFL (Mouro et al., 2017; Mouro et continuar a estudar e a preservar esse im‑
al., 2020). Apesar da excelente preservaçã o, portante Lagerstatte brasileiro.
existem poucas evidê ncias da açã o de micro‑
organismos (EPS ou bio ilmes) no decaimen‑
REFERÊNCIAS
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tem sido visto em outros Lagerstatten (Osé s Adami‑Rodrigues, K., Pazinato, P. G., Correa,
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bouço cronoestratigrá ico da Formaçã o Ma‑

Folhelho Lontras, uma Lagerstatte do Paleozoico brasileiro 221


Ocorrência de Conodontes ‒ vertebrados
primitivos ‒ na Supersequência Gondwana I,
Grupo Itararé, folhelho Lontras ‑
A loramento Campaleo (SC), Cisuraliano,
Bacia do Paraná
Ana Karina Scomazzon1*, Everton Wilner1,2, Luiz Carlos Weinschütz2,
Sara Nascimento1, Valesca Brasil Lemos1

1
Instituto de Geociê ncias, Universidade Federal do Rio Grande do Sul
2
Centro Paleontoló gico da Universidade do Contestado (CENPALEO), Universidade do Contestado

* autor correspondente: akscomazzon@ufrgs.br

1 INTRODUÇÃO
Conodontes sã o vertebrados primitivos, encontrados nos estratos marinhos do
Cambriano ao Triá ssico, nas bacias sedimentares mundiais. Sã o potencialmente ú teis, para a bi‑
oestratigra ia, sendo ó timos fó sseis‑guia, durante os 300 milhõ es de anos de sua existê ncia. Sã o
importantes indicadores geotermais, atravé s do Indice de Alteraçã o de Cor (IAC), pois seus ele‑
mentos podem variar de cor entre amarelo pá lido e preto (50 oC a 600 oC), constituindo‑se em
ferramenta estraté gica na pesquisa de hidrocarbonetos, nas bacias sedimentares paleozoicas
mundiais (Epstein et al., 1977).
Atravé s do avanço em equipamentos de tomogra ia computadorizada, em espectrô me‑
tros de massa, em aceleradores de partı́culas, entre outros, tem sido possı́vel utilizar estes fó s‑
seis em estudos de paleotemperaturas, de quimioestratigra ia, de correlaçã o de bacias, de
cronoestratigra ia, de bioestratigra ia, de paleoecologia, de reconstituiçõ es paleoambientais e
paleobiogeográ icas, de tafonomia, de entendimento da origem dos vertebrados, de exploraçã o
de hidrocarbonetos, entre outros.
No registro sedimentar, é possı́vel encontrar os conodontes de trê s formas distintas: (1)
o animal conodonte (Fig. 1), vertebrado primitivo, cujo corpo era composto de material orgâ ni‑
co, que se decompunha facilmente, com preservaçã o fossilı́fera extremamente rara; (2) os apa‑
relhos alimentares, formados por conjuntos de elementos conodontes; e (3) os chamados
elementos conodontes, ú nica porçã o mineralizada do organismo, os quais possuem diferentes
morfologias e formam arranjos em posiçõ es especı́ icas nos aparelhos alimentares, na regiã o ce‑
fá lica do animal (Fig. 2).
Contribuições à Geologia do Rio Grande do Sul e de Santa Catarina

Figura 1 ‒ Escultura do animal conodonte em escala de 1:25, exposta no Museu da Terra e da Vida, do Centro
Paleontoló gico da Universidade do Contestado, campus Mafra (SC), com 1,20 m de comprimento (acervo de
imagens de Everton Wilner).

Figura 2 ‒Animal conodonte. Detalhe da organizaçã o do aparelho alimentar, na regiã o cefá lica do animal, com
os elementos pectiniformes (P) e ramiformes (S e M), (extraı́do de Purnell, 1993).

Na composiçã o deste conjunto: ani‑ minados, devido a sua morfologia cô nica (do
mal conodonte, aparelhos alimentares e ele‑ grego kônos = cone e odontos = dentes). Pan‑
mentos conodontes, estes ú ltimos foram os der foi um dos fundadores da Embriologia e
primeiros a serem encontrados, sendo des‑ da Paleontologia na Rú ssia e considerou es‑
critos, pela primeira vez, por Christian Hein‑ tes elementos mineralizados isoladamente, a
rich Pander, em 1856, ao estudar estratos partir dos quais derivou o conceito de cono‑
ordovicianos da Estô nia. Foram assim deno‑ donte, designando dentes e/ou mandı́bulas
224 Edição da Sociedade Brasileira de Geologia – Núcleo RS/SC
Scomazzon et al.

de um grupo desconhecido de peixes fó s‑ ciados à deglaciaçã o do Gondwana, no inal


seis. do Carbonı́fero, inı́cio do Permiano. Por
Os elementos, que sã o microscó pi‑ constituı́rem um dos achados mais comple‑
cos, medindo 0,25‑2 mm, compostos de fos‑ tos no mundo, dada a sua excepcional pre‑
fato de cá lcio ( luorapatita > francolita), servaçã o, esses fó sseis, preservados em
formam um aparelho alimentar, localizado arranjos naturais, auxiliam nos estudos ta‑
na porçã o anterior do animal. fonô micos, no entendimento dos posiciona‑
O aparelho alimentar completo com‑ mentos paleogeográ ico, paleoclimá tico e
preende 15 ou mais elementos e sua funçã o, paleoambiental do Gondwana e, també m, no
como peças bucais mastigató rias, foi estabe‑ posicionamento bioestratigrá ico da suces‑
lecida, na dé cada de 1990 (Purnell, 1993). sã o sedimentar Supersequê ncia Gondwana
Em circunstâ ncias favorá veis, em que nã o te‑ I, na qual esses fó sseis estã o inseridos (Sco‑
nha ocorrido atividade de correntes, de es‑ mazzon et al., 2013, Wilner et al., 2016, Hen‑
cavadores ou de bioturbaçã o, os aparelhos derson, 2018).
alimentares, menos comumente, ou os ele‑
mentos conodontes, diversos e abundantes, 2 POSIÇÃO FILOGENÉTICA
podem ser preservados intactos em camadas
de rochas sedimentares, principalmente, em A a inidade ilogené tica dos cono‑
folhelhos e em carbonatos. Poré m, evidê nci‑ dontes é uma das temá ticas mais discutidas
as das partes moles, como o tecido minerali‑ entre os paleontó logos. Tais organismos já
zado fossilizado do animal conodonte, sã o foram considerados como pertencentes aos
extremamente raras (Briggs et al., 1983; Al‑ ilos Cnidá ria, Braquiopoda, Annellida, Mol‑
dridge et al., 1993). lusca, Arthropoda, bem como pertenceram a
No Brasil, o clado é representado plantas (Mü ller, 1981, p. W79). Foram tam‑
por elementos conodontes ozarkodinı́deos e bé m considerados como ilo Chaetognatha
prioniodinı́deos, encontrados como restos e, (Bengtson, 1983), como ilo Conodonta
por vezes, como moldes, estudados em po‑ (Briggs et al., 1983; Sweet, 1988) e, ainda,
ços e em a loramentos de depó sitos mari‑ como ilo Chordata (Dzik, 1986; Aldridge et
nhos epeiricos carbonı́feros, de á guas rasas e al., 1986, 1993; Briggs et al., 1987; Janvier,
quentes da regiã o norte, nas bacias sedimen‑ 1995).
tares do Solimõ es, do Amazonas, do Parnaı́‑ Pander já acreditava que os elemen‑
ba, e, no Permiano, na Bacia do Acre. Muitos tos conodontes fossem partes duras, por‑
trabalhos foram publicados pelo grupo de çõ es mineralizadas (dentes ou a mandı́bula)
pesquisa do Laborató rio de Conodontes da de um grupo extinto de peixes. Entretanto,
UFRGS, desde a dé cada de 1990, até hoje, outros pesquisadores, como Newberry
tais como artigos, resumos em eventos, mes‑ (1875 apud Sweet, 1988) e Hinde (1879
trados e doutorados, dentre eles, Lemos apud Aldridge et al., 1987), eram mais favo‑
(1992a, 1992b), Lemos & Silva (1996), Le‑ rá veis à ideia de que tais elementos seriam
mos & Scomazzon (2001), Nascimento et al. semelhantes aos dentes dos mixinó ides, co‑
(2010), Scomazzon et al. (2016). mo a Myxina, devido ao brilho e à forma se‑
Na Bacia do Paraná , elementos cono‑ melhantes, apesar de saberem que,
dontes prioniodinı́deos do gê nero Mesogon‑ internamente, ambos, Myxina e conodontes,
dolella spp. sã o encontrados no folhelho tinham estruturas completamente diferen‑
fossilı́fero Lontras, relacionado a depó sitos tes, alé m de os conodontes serem fosfá ticos
marinhos siliciclá sticos, de á guas frias, asso‑ e as estruturas dos peixe‑bruxa, orgâ nicas.

Ocorrência de Conodontes ‑ vertebrados primitivos ‑ na Supersequência Gondwana I, ... 225


Contribuições à Geologia do Rio Grande do Sul e de Santa Catarina

Ulrich & Bassler (1926 apud Sweet, 1988) com aproximadamente 4 centı́metros, com
també m aceitavam a ideia de que os cono‑ forma de enguia, com olhos proporcional‑
dontes fossem dentes ou placas dermais de mente grandes, com notocorda, com miô ‑
peixes primitivos, semelhantes aos mixinó i‑ meros (blocos de mú sculos em forma de V)
des. Gross (1954 apud Sweet, 1988), estu‑ nas laterais do corpo e com nadadeira cau‑
dando a estrutura lamelar dos elementos dal. Essas caracterı́sticas inserem os cono‑
conodontes, concluiu que estes, de fato, eram dontes no ilo Chordata (Purnell et al.,
representantes dos Cordados, poré m de um 1995). Alé m disso, foram identi icados, em
ramo distinto do dos Agnatha. alguns conodontes: tecido ó sseo, esmalte,
Com a descoberta do primeiro espé ‑ cartilagem calci icada e dentina, que sã o ca‑
cimen do animal conodonte no Granton Sh‑ racterı́sticas ú nicas dos vertebrados (San‑
rimp Bed, na Escó cia (Briggs et al., 1983), som et al., 1992, 1994).
estes autores postularam que os conodontes As evidê ncias da anatomia das par‑
nã o seriam pertencentes nem ao ilo Chae‑ tes moles e a microestrutura dos elementos
tognatha, nem aos Cordados, devido à falta conodontes indicam que esses animais es‑
de dentina ou de qualquer outra evidê ncia, tã o entre os vertebrados mais primitivos.
no fó ssil, que comprovasse seu posiciona‑ Contudo, a falta de um esqueleto minerali‑
mento em um ou em outro ilo. Assim, Briggs zado (a nã o ser o aparelho alimentar, que é
et al. (1983) concluı́ram que os conodontes fosfá tico) leva a crer que eles seriam mais
pertenciam a um ilo separado, denominado primitivos do que os Agnatha (e.g. Ostraco‑
ilo Conodonta. Mais tarde, foram descober‑ dermos = astraspı́deos, pituriaspı́deos,
tos outros espé cimes, com melhor preserva‑ etc. ), mas mais avançados do que os mixi‑
çã o, naquele mesmo local, cujas feiçõ es das nó ides (e.g. Myxina, que nã o possuem es‑
partes orgâ nicas indicaram, claramente, uma queleto fosfá tico no aparelho alimentar),
a inidade com os Agnatha (Aldridge et al., sugerindo que os conodontes seriam os ver‑
1986; Dzik, 1986; Conway‑Morris, 1989; tebrados mais primitivos, encontrados até
Briggs, 1992). hoje (Purnell et al., 1995).
Utilizando microscó pio eletrô nico de Apesar destas descobertas e dos
varredura e de transmissã o, Szaniawski trabalhos baseados na histologia dos ele‑
(1987) estudou a microestrutura e a compo‑ mentos (Sansom et al., 1994), que revela‑
siçã o do corpo basal de alguns elementos co‑ ram vá rias caracterı́sticas dos vertebrados,
nodontes. Fazendo comparaçõ es entre os alguns especialistas em vertebrados primi‑
conodontes e os Chaetognatha, Szaniawski tivos tê m, ainda, dú vidas, com relaçã o à a i‑
(1987) concluiu que, provavelmente, os co‑ nidade dos conodontes, por acreditarem
nodontes nã o seriam Chaetognatha sensu que tais caracterı́sticas nã o sã o su icientes
stricto, mas que ambos teriam se originado para considerá ‑los vertebrados (Blieck,
de um ancestral comum. 1992; Forey & Janvier, 1993; Janvier, 1988,
Com os novos espé cimens do Gran‑ 1996).
ton Shrimp Bed, Aldridge et al. (1993) consi‑
deraram os conodontes representantes de 3 O ANIMAL CONODONTE
um grupo paralelo aos Agnatha, poré m com
semelhanças pró ximas aos mixinó ides, nã o O primeiro registro de tecido fossi‑
tendo mais propó sito colocá ‑los como um i‑ lizado de conodontes foi de um ú nico espé ‑
lo separado. Estes espé cimens mostraram cimen do Carbonı́fero da Escó cia (Granton
que os conodontes eram animais pequenos, Shrimp Bed), sendo o horizonte fossilı́fero

226 Edição da Sociedade Brasileira de Geologia – Núcleo RS/SC


Scomazzon et al.

composto por dolomitos marrons, pobres por um tronco com mú sculos em V e, na re‑
em maté ria orgâ nica, e por laminaçõ es de giã o posterior, encontra‑se uma nadadeira
silte preto, ricos em maté ria orgâ nica, em fá ‑ caudal radiada (Aldridge et al., 1993).
cies proximais, de á gua rasa. O registro fossi‑ Na margem anterior da cabeça, exis‑
lı́fero continha o aparelho alimentar tem duas estruturas lobadas, de cor mais es‑
completo na regiã o cefá lica (Briggs et al., cura do que as estruturas mineralizadas do
1983). Posteriormente, foram encontrados tronco. Inicialmente, esses lobos foram con‑
mais trê s espé cimens neste mesmo horizon‑ siderados, por Aldridge & Theron (1993), co‑
te fossilı́fero, que trouxeram maiores infor‑ mo “cá psulas ó pticas”, mas essa hipó tese foi
maçõ es, com respeito à s partes orgâ nicas, logo descartada, devido ao tamanho, à forma
apesar destes serem menos completos do e à posiçã o dos lobos. Comparaçõ es com ou‑
que o primeiro animal encontrado (Aldridge tros fó sseis Agnatha, incluindo Jamoytius, um
et al., 1986). Seis novos espé cimes foram co‑ anaspı́deo do Siluriano, sugeriram que os lo‑
letados no Granton Shrimp Bed da Escó cia, bos representavam cartilagens escleró ticas,
perfazendo um total de 10 espé cimes, atual‑ que ocorriam ao redor dos olhos. No animal
mente. Alguns deles, com feiçõ es particular‑ do Granton Shrimp Bed, essa cartilagem pa‑
mente bem preservadas da cabeça e do rece ser profunda, com buracos internos, em
tronco, corroborando as primeiras interpre‑ forma de anel, indicando que os olhos eram
taçõ es. relativamente grandes e lateralmente posici‑
Um ú nico exemplar de um conodon‑ onados (Briggs et al., 1983). A presença de
te panderodontı́deo, pouco preservado, foi olhos grandes nesses espé cimes sugere um
encontrado no Siluriano, em Waukesha, Wis‑ aparelho cefá lico mais avançado do que o
consin (Smith et al., 1987) e traços de partes dos cefalocordados (e.g. Amphioxus) (Pur‑
orgâ nicas foram encontradas, em associaçã o nell, 1995).
com aparelhos alimentares gigantes (em tor‑ Traços adicionais de partes orgâ ni‑
no de 20 mm) de conodontes, no Ordovicia‑ cas na regiã o da cabeça foram, em princı́pio,
no Superior da Africa do Sul (Aldridge & relacionadas aos olhos (Aldridge & Briggs,
Theron, 1993). Os espé cimens de Waukesha 1989), mas, atualmente, sã o consideradas
e da Africa do Sul revelaram detalhes sobre cá psulas ó pticas, assim como alguns traços
estruturas na cabeça e sobre possı́veis traços transversais pá lidos, que sã o interpretados
do tronco do animal. Poré m, os espé cimens como estruturas branquiais (Aldridge et al.,
de Granton provê m as evidê ncias mais com‑ 1993).
pletas, a respeito da anatomia dos conodon‑ A maioria dos elementos do apare‑
tes. lho alimentar dos conodontes do Granton
Os conodontes do Granton Shrimp Shrimp Bed é de ozarkodinı́deos. Consistem
Bed, Carbonı́fero da Escó cia, eram animais em 11 elementos ramiformes M e S, forman‑
pequenos, com comprimento entre 21 mm e do uma espé cie de cesta, que tinha a funçã o
55 mm, largura entre 1,2 mm e 1,8 mm, late‑ de capturar a presa. Posterior a estes, exis‑
ralmente comprimidos e dominantemente tem dois pares sucessivos de elementos pec‑
formados por um corpo orgâ nico. Eram se‑ tiniformes P1 e P2, que eram utilizados para
melhantes a enguias e, provavelmente, devi‑ processar o alimento (Jeppsson, 1979;
am ser predadores livre natantes. Briggs et al., 1983; Purnell & von Bitter,
Na regiã o anterior do corpo do ani‑ 1992). O aparelho dos ozarkodinı́deos pode
mal, observa‑se a cabeça, que é pequena e ser preservado em vá rias con iguraçõ es, de‑
que acomoda o aparelho alimentar, seguida pendendo de sua orientaçã o no plano do
Ocorrência de Conodontes ‑ vertebrados primitivos ‑ na Supersequência Gondwana I, ... 227
Contribuições à Geologia do Rio Grande do Sul e de Santa Catarina

acamadamento (Aldridge et al., 1987). O sentar a outra parte da nadadeira (Briggs et


aparelho dos espé cimens do Granton Shrimp al., 1983). Apesar destas evidê ncias, a estru‑
Bed sã o achatados lateralmente, correspon‑ tura precisa da nadadeira caudal permanece
dendo à orientaçã o standard, de Aldridge et inde inida.
al. (1987). Foram encontrados elementos co‑
As principais feiçõ es encontradas no nodontes excepcionalmente grandes (de até
tronco do animal sã o notocorda, miô meros e 20 mm) e aparelhos gigantes de prioniodi‑
nadadeira caudal radiada. A notocorda é evi‑ nı́deos da espé cie Promissum pulchrum
denciada por um par de linhas axiais parale‑ (Theron et al., 1990) na porçã o basal do So‑
las, que se estendem, anteriormente, até om Shale Member, do Ordoviciano da Africa
pró ximo do aparelho alimentar, e, posterior‑ do Sul.
mente, até a ponta da cauda. A posiçã o da Associados espacialmente a estes
notocorda pode variar, ao longo do compri‑ elementos, ocorrem traços de partes moles,
mento do animal, poré m, geralmente, ocorre com feiçõ es lobadas e em pares, com tama‑
mais ou menos ao longo do eixo mediano da nhos entre 2,1 mm e 3,1 mm, representados
cauda e pode estar deslocada para a posiçã o por um ilme escuro, situados anteriormen‑
ventral no comprimento do tronco (Aldridge te ao aparelho alimentar. Tais estruturas sã o
et al., 1993). Esta estrutura foi sujeita a uma diretamente comparadas com aquelas do
sé rie de interpretaçõ es anteriores (Aldridge Granton Shrimp Bed, apesar de ambos os
et al., 1986), poré m novas evidê ncias indica‑ aparelhos serem signi icativamente diferen‑
ram que ela realmente representa a notocor‑ tes (Aldridge & Theron, 1993).
da, como sugerido por Conway‑Morris Em um ú nico espé cimen está pre‑
(1989). servado um traço linear, de cor acinzentada,
Os miô meros dos espé cimes do que se estende atrá s do aparelho alimentar.
Granton Shrimp Bed sã o uma das peças mais Tal impressã o pode representar o tronco do
importantes na discussã o da a inidade des‑ animal, entretanto nenhuma outra feiçã o é
tes animais aos Cordados. Em todos os espé ‑ observada ou associada a esta estrutura.
cimes, podem‑se observar estas estruturas, Com isso, mais espé cimens sã o necessá rios,
que consistem em um arranjo de miô meros para auxiliar na discussã o e na comparaçã o
lateralmente pareados e com forma chevron. entre os diferentes espé cimens encontra‑
A posiçã o desses mú sculos varia, em relaçã o dos.
à notocorda, ao longo do tronco do animal. Partes moles de um animal cono‑
Segundo Aldridge et al. (1993), tais mú scu‑ donte do gê nero Panderodus foram desco‑
los poderiam ser uma adaptaçã o para esca‑ bertas no Siluriano de Waukesha, em
var o sedimento. Wisconsin, nos EUA, poré m, somente a por‑
A nadadeira caudal é observada em çã o anterior do corpo foi preservada ‒ a
alguns espé cimens, mas nã o está bem pre‑ parte posterior nã o foi encontrada. Tais
servada, sendo difı́cil de inir se ela seria si‑ partes estã o impressas na rocha, como uma
mé trica ou se ela se estenderia levemente camada ina de um mineral branco (Smith
mais para a regiã o ventral ou dorsal. Em um et al., 1987).
dos espé cimens, os raios da nadadeira sã o O corpo do animal tem paredes re‑
claramente evidentes, em um dos lados da tas e possui um comprimento de 3,4 mm,
cauda, enquanto, do outro, ocorrem traços até o inal da porçã o preservada, poré m ex‑
oblı́quos indistintos, que poderiam repre‑ trapolaçõ es indicam que o comprimento

228 Edição da Sociedade Brasileira de Geologia – Núcleo RS/SC


Scomazzon et al.

má ximo seria de 5 mm. O animal foi compac‑ é proposta em vá rios modelos (Aldridge,
tado dorso‑ventralmente, contrastando com 1987), mas somente dois deles sã o compatı́‑
os espé cimens do Granton Shrimp, que estã o veis com o tamanho do animal (Briggs et al.,
preservados no seu aspecto lateral (Aldridge 1983; Aldridge et al., 1986) e com o arranjo
et al., 1986). dos elementos no aparelho alimentar (Al‑
Traços de segmentaçã o sã o eviden‑ dridge et al., 1987). Um dos modelos estaria
tes no animal de Waukesha. No mı́nimo, sete relacionado à hipó tese de que os conodontes
somitos sã o delimitados e extrapolaçõ es su‑ seriam escavadores macró fagos e que seus
gerem que seriam mais de vinte somitos na elementos seriam estruturas utilizadas para
porçã o preservada. Entretanto, os limites sã o agarrar a presa (Jeppsson, 1979). No outro
retos e quase normais, em relaçã o ao eixo sa‑ modelo, eles seriam micró fagos iltradores e
gital, em contraste com a forma em V desses seus elementos anteriores (elementos rami‑
segmentos nos espé cimens do Granton Sh‑ formes S e M) teriam funcionado como es‑
rimp (Aldridge et al., 1986). truturas ciliadas, que capturavam pequenas
A assembleia de conodontes está po‑ partı́culas de alimento, enquanto os elemen‑
sicionada no inal do traço do corpo do ani‑ tos posteriores (elementos pectiniformes P1
mal e ambos dividem o mesmo eixo de e P2) trituravam essas partı́culas (Nicoll,
simetria. Tanto a assembleia quanto as par‑ 1987). Entretanto, tais hipó teses foram refu‑
tes moles do animal sã o envolvidas por um tadas pelo estudo das taxas de crescimento
halo estreito, de cor cinza pá lido, que con‑ em alguns aparelhos dos ozarkodinı́deos
trasta com a cor avermelhada da rocha (Purnell, 1993, 1994) e pela descoberta de
(Smith et al., 1987). um revestimento, indicativo de desgaste, na
A má preservaçã o das partes moles superfı́cie de alguns elementos (Purnell,
do espé cime de Waukesha contribui muito 1995).
pouco com evidê ncias adicionais na morfolo‑ Assembleias naturais de conodontes
gia do animal. Contudo, as dimensõ es do cor‑ foram encontradas em rochas sedimentares
po do animal sugerem que Panderodus nã o do Carbonı́fero. Tais assembleias foram exa‑
era alongado, como os polygnathaceos de minadas e os especialistas perceberam que
Granton Shrimp, e a simetria preservada da elas possuı́am um padrã o de ocorrê ncia, ou
assembleia de Waukesha indica que o espé ‑ seja, uma organizaçã o de elementos no apa‑
cimen foi achatado no aspecto dorso‑ventral, relho alimentar, a qual foi denominada pa‑
diferindo do aspecto lateral dos espé cimes drã o standard. Este padrã o é produzido,
de Granton. devido ao colapso e ao achatamento da es‑
trutura tridimensional do aparelho, nã o ten‑
4 O APARELHO ALIMENTAR do sofrido modi icaçõ es entre o decaimento
e a fossilizaçã o. Modalidades diferentes des‑
Assim como a a inidade ilogené tica te padrã o podem ocorrer, devido a variaçõ es
dos conodontes, o estudo do seu aparelho no corte da rocha, sendo denominados: pa‑
alimentar tem trazido novas constataçõ es e drã o paralelo, perpendicular e linear (Al‑
tem gerado vá rias discussõ es entre os pale‑ dridge et al., 1987).
ontó logos (Jeppsson, 1979, 1980; Conway‑ Importantes achados de assembleias
Morris, 1980; Bengtson, 1980, 1983; Purnell naturais de aparelhos alimentares foram en‑
& von Bitter, 1992; Purnell, 1993) . contrados no Soom Shale Member, do Ordo‑
A funçã o dos elementos conodontes viciano Superior da Africa do Sul, com

Ocorrência de Conodontes ‑ vertebrados primitivos ‑ na Supersequência Gondwana I, ... 229


Contribuições à Geologia do Rio Grande do Sul e de Santa Catarina

ocorrê ncias de aparelhos gigantes, de 6 mm Orchard & Rieber (1999), reconstruı́am apa‑
a 10 mm, denominados Promissum pulchrum relhos multielementais de gondolelı́deos do
(Aldridge & Theron, 1993), bem como Notio‑ Triá ssico e de neogondolelı́deos do Permia‑
della keblon, com um aparelho composto por no superior e do Triá ssico Mé dio.
17 elementos, con igurando os pares P1, P2, A descriçã o dos elementos conodon‑
P3, M, S1, S2, S3, S4 e um elemento S0, que tes está em um estado de luxo, dado o dese‑
nã o tem par. Esta é a primeira ocorrê ncia jo de descrever biologicamente esses
mundial de um aparelho com essa quantida‑ elementos, no que diz respeito à sua posiçã o
de de elementos, fornecendo, assim, um novo e à sua orientaçã o, durante a vida do animal
modelo, para uso na reconstruçã o de apare‑ conodonte. Esta fase de transiçã o levará al‑
lhos, a partir das coleçõ es de elementos dis‑ gum tempo, tendo em vista que apenas uma
persos, particularmente, para aqueles com pequena porcentagem dos tá xons sã o bem
elementos P1 do tipo icrion e, talvez, para conhecidos, em termos de seus aparelhos, e,
outros balognatı́deos (Aldridge et al., 2013). també m, pelo fato de que os bioestratı́grafos
Tolmacheva & Purnell (2002) e, no costumam considerar apenas o elemento P1,
Canadá , McCracken et al. (1980), Barrick et isoladamente. Os termos utilizados na des‑
al. (1976) e Cooper (1974), reconstruı́ram o criçã o dos elementos conodontes foram re‑
aparelho multielemental de conodontes do sumidos por Sweet (1988) e,
Siluriano de Oklahoma e de Ohio, da Amé rica posteriormente, discutido por Purnell & Do‑
do Norte. noghue (1997).
Para o Devoniano, destacam‑se os Assembleias naturais de prioniodi‑
trabalhos de reconstruçã o de aparelhos ali‑ nı́deos sã o mal conhecidas ou sequer sã o co‑
mentares e de clusters feitos por Klapper & nhecidas, dependendo do tá xon (Purnell &
Philip (1972), por Nicoll (1982, 1984), por Donoghue, 1997; Henderson, 2018). Assim, a
Chauffe & Nichols (1995), por Suttner ocorrê ncia dos prioniodinı́deos do gê nero
(2009a, 2009b) e por Suttner et al. (2017). Mesogondolella spp. no Folhelho Lontras é
Estudando assembleias naturais de um achado extremamente importante e traz
Idiognathodus do Pensilvaniano, Purnell & inovaçõ es, tanto para o conhecimento dos
Donoghue (1997) produziram um modelo aparelhos alimentares da Ordem Prioniodi‑
preciso do aparelho dos ozarkodinı́deos, nida quanto para o Permiano inferior, no
considerado, por eles, um dos mais bem‑su‑ mundo, na Amé rica Latina e no Brasil.
cedidos grupos destes vertebrados. Neste
modelo, é proposto que os elementos anteri‑ 5 A BACIA DO PARANÁ
ores S e M, dos ozarkodinı́deos, seriam ixa‑
dos a uma placa cartilaginosa. Esses 5. 1 Contexto estratigrá ico
elementos fariam um movimento, no sentido
A Bacia Sedimentar do Paraná
de capturar a presa, e os elementos posterio‑
abrange, geogra icamente, a quase totalida‑
res seriam responsá veis por rasgar e por tri‑
de do centro‑sul do Brasil e, també m, regiõ es
turar o alimento (Purnell & Donoghue,
do norte do Uruguai, do nordeste da Argen‑
1997).
tina e do leste paraguaio. Trata‑se de uma
Agematsu et al. (2008, 2017) recons‑ bacia do tipo lexural intracrâ tonica, de na‑
truı́ram uma associaçã o natural de conodon‑ tureza policı́clica, que constitui uma imensa
tes do Triá ssico Inferior do Japã o. Outros sucessã o sedimentar‑magmá tica, com ida‑
trabalhos, como os de Orchard (2005) e de des entre o Ordoviciano Final (488 Ma) e o

230 Edição da Sociedade Brasileira de Geologia – Núcleo RS/SC


Scomazzon et al.

Cretá ceo Final (145 Ma) (Milani et al., 2007). quarto ciclo corresponderia à Fm. Taciba.
Diversos ciclos transgressivos/re‑ No a loramento denominado, infor‑
gressivos de um mar, que circundava o super‑ malmente, Campo do Centro Paleontoló gico
continente Gondwana, marcam o registro da Universidade do Contestado (Campaleo)
estratigrá ico da Bacia do Paraná , que, segun‑ (Figs. 3‑4), ocorre a exposiçã o do Folhelho
do Milani et al. (1997), consiste de seis uni‑ Lontras, unidade que corresponde ao topo
dades de segunda ordem, denominadas da Fm. Campo Mourã o e que marca o inal
Supersequê ncias: Rio Ivaı́ (Ordoviciano‑Silu‑ do terceiro ciclo/sequê ncia, de Weinschü tz
riano), Paraná (Devoniano), Gondwana I & Castro (2005). Este folhelho marca a fase
(Carbonı́fero‑Cretá ceo Inicial), Gondwana II inal de um evento de deglaciaçã o, que inicia
(Triá ssico Mé dio a Final), Gondwana III (Ju‑ com uma camada de, aproximadamente, 7 m
rá ssico Final‑Cretá ceo Inicial) e Bauru (Cre‑ de folhelho micrová rvico, rico em clastos
tá ceo Final). caı́dos na base e que diminuem para o topo,
A Supersequê ncia Gondwana I apre‑ sucedido por uma camada de siltito rica‑
senta espessura total má xima da ordem de mente bioturbado, com 1 m de espessura,
2.500 m e engloba o maior volume sedimen‑ sotaposto a 1,1 m de folhelho macrofossilı́fe‑
tar da Bacia do Paraná , que re lete uma gran‑ ro (fossil largersttaten do Lontras/Campa‑
de variedade de condiçõ es deposicionais. A leo), cuja biota é composta por peixes
base dessa supersequê ncia registra um even‑ ó sseos e cartilaginosos, escolecodontes,
to glacial do Permocarbonı́fero, que compre‑ crustá ceos, ostracodes, insetos, braquió po‑
ende ambientes terrestre a marinhos, des, porı́feros, amonites e fragmentos vege‑
representados pelo Grupo Itararé (Milani et tais, alé m dos conodontes, que caracterizam
al., 2007), e que atinge uma espessura supe‑ um ambiente marinho, restrito e relativa‑
rior a 1000 metros na porçã o central da ba‑ mente pró ximo à linha de costa. Este hori‑
cia, adelgaçando‑se, em direçã o à s bordas zonte fossilı́fero, em um trabalho de
norte e sul (França & Potter, 1988), sendo, re inamento estratigrá ico, foi dividido em
neste grupo, que ocorre a unidade portadora quatro nı́veis, denominados, da base para o
de conodontes. topo, 1, 2, 3 e 4, que sã o limitados por nı́veis
Holz et al. (2010) dividem a Super‑ de piritizaçã o e que estã o subdivididos em
sequê ncia Gondwana I em sete sequê ncias de intervalos, caracterizados por diferenças su‑
3ª ordem, denominadas LPTS (Late Paleozoic tis no acamamento, na granulometria e nas
Third‑Order Sequences), em que o Grupo Ita‑ feiçõ es diagené ticas (Fig. 5).
raré corresponderia à s sequê ncias LPTS 1
5. 2 Mesogondolella spp. no Folhelho
(Formaçã o Lagoa Azul) e LPTS 2 (Formaçã o
Lontras
Campo Mourã o e Formaçã o Taciba).
Na regiã o de Mafra (SC), Weinschü tz Na Amé rica Latina, ainda nã o foram
& Castro (2004) reconhecem quatro ciclos de encontrados restos ou vestı́gios do animal
granodecrescê ncia ascendente, culminando conodonte. Desde as primeiras pesquisas,
com um má ximo de inundaçã o da bacia, para quando conodontes foram descobertos, no
o Grupo Itararé , em que, comparando com as sé culo XIX, por Pander, até o inı́cio do Sé culo
unidades propostas por França & Potter XXI, nã o havia registros de aparelhos ali‑
(1988), o primeiro ciclo corresponderia à mentares conodontes na Amé rica Latina.
Fm. Lagoa Azul, o segundo e terceiro ciclos
Aparelhos alimentares e elementos
corresponderiam à Fm. Campo Mourã o e o
conodontes prioniodinı́deos do gê nero Me‑

Ocorrência de Conodontes ‑ vertebrados primitivos ‑ na Supersequência Gondwana I, ... 231


Contribuições à Geologia do Rio Grande do Sul e de Santa Catarina

Figura 3 ‒ Localizaçã o da ú nica ocorrê ncia de aparelhos alimentares de conodontes na Amé rica do Sul. A
esquerda, Bacia do Paraná , em azul, e o municı́pio de Mafra (SC), marcado pela estrela, em preto. A direita,
imagem de saté lite extraı́da do Google Earth, mostrando a á rea do A loramento Campaleo, com a estrela, em
amarelo, no municı́pio de Mafra (composiçã o da igura de Luiz Carlos Weischü tz).

Figura 4 ‒ Fotogra ia do a loramento Campaleo, no municı́pio de Mafra (SC), com detalhe do local de
escavaçã o do Folhelho Lontras (acervo de imagens de Everton Wilner).

sogondolella spp. (Kozur, 1988) foram en‑ (Fig. 5), predominantemente, como assem‑
contrados, pela primeira vez, na Amé rica La‑ bleias naturais (aproximadamente, 150
tina, no Brasil, em Mafra, Santa Catarina, em achados) e como possı́veis clusters (em tor‑
2008 (Wilner & Weinschutz, 2008), e se no de 200 exemplares), de cores â mbar,
mantê m como o ú nico registro fossilı́fero, branco e hialino (Fig. 6), constituindo as
até hoje. Seguem sendo coletados e estuda‑ primeiras ocorrê ncias de aparelhos alimen‑
dos, atualmente, em depó sitos do Grupo Ita‑ tares em bacias sedimentares da Amé rica
raré , Folhelho Lontras, no A loramento Latina (Wilner et al., 2016).
Campaleo, no municı́pio de Mafra (SC). Os aparelhos alimentares possuem,
Este importante achado está preser‑ aproximadamente, 5 mm de tamanho e
vado em alguns nı́veis do folhelho fossilı́fero ocorrem no plano do acamadamento do fo‑

232 Edição da Sociedade Brasileira de Geologia – Núcleo RS/SC


Scomazzon et al.

Figura 5 ‒ Per il estratigrá ico do A loramento Campaleo, com detalhe do Folhelho Lontras, evidenciando os
nı́veis de pirita e a ocorrê ncia dos conodontes nos nı́veis 2B, 3B, 3C e 3D (composiçã o da igura por Luiz Carlos
Weischü tz).

Ocorrência de Conodontes ‑ vertebrados primitivos ‑ na Supersequência Gondwana I, ... 233


Contribuições à Geologia do Rio Grande do Sul e de Santa Catarina

Figura 6 ‒ Detalhe do aparelho alimentar de Mesogondolella spp.: A) Microscopia Eletrô nica de Varredura do
elemento P, com aumento de 130X (imagem obtida por Mark Purnell); e B) Estereomicroscopia dos elementos
ramiformes, com aumento de 80X (imagem obtida por Everton Wilner).

lhelho fossilı́fero. Sã o observados conjuntos bisselli, do Cisuraliano, respectivamente, As‑


mais completos, com 15 elementos, e outros, seliano ‑ Artinskiano, para provı́ncias tem‑
incompletos. Em alguns exemplares, estã o peradas, correlata à biozona Sweetognathus
preservados os elementos pectiniformes P1 whitei para provı́ncias equatoriais (Hender‑
e os elementos ramiformes S e M. Em outros son, 2018). Esta atribuiçã o bioestratigrá ica
exemplares, ocorrem apenas os elementos corrobora com a idade isocrô nica Rb/Sr em
ramiformes, evidenciando que, provavel‑ rocha total de 287 + 10 Ma (Koester et al.,
mente, haja mais de um tá xon nessa locali‑ 2016), advinda do mesmo nı́vel de ocorrê n‑
dade. cia dos espé cimens de Mesogondolella do
As feiçõ es diagnó sticas, para deter‑ A loramento Campaleo.
minaçã o taxonô mica, observadas na morfo‑
logia dos elementos pectiniformes P1 6 CONSIDERAÇÕES FINAIS
auxiliaram na identi icaçã o do gê nero Meso‑
gondolella, atribuı́da à Mesogondolella spp., Conodontes sã o vertebrados primi‑
superfamı́lia Gondolelloidea, relacionada à s tivos extintos, predadores, livre natantes e
biozonas Mesogondolella belladontae e M. exclusivamente marinhos, encontrados do
Cambriano ao Triá ssico.
234 Edição da Sociedade Brasileira de Geologia – Núcleo RS/SC
Scomazzon et al.

A ú nica parte mineralizada sã o os considerado como Permocarbonı́fero. Com


elementos conodontes, compostos por fosfa‑ os achados de Mesogondolella spp., relacio‑
to de cá lcio. Partes orgâ nicas foram encon‑ nados à s biozonas Mesogondolella belladon‑
tradas no Carbonı́fero da Escó cia e tae e M. bisselli, esses depó sitos marinhos
acenderam o debate, com relaçã o à a inidade deglaciais tê m seu posicionamento estrati‑
ilogené tica desses animais, que sã o, hoje, grá ico no Cisuraliano.
considerados vertebrados primitivos. A fun‑
çã o dos elementos conodontes, como peças
mastigató rias, e a evidê ncia de macrofagia REFERÊNCIAS
nesses vertebrados primitivos, analisada
atravé s dos diversos aparelhos alimentares, Agematsu, S., Orchard, M. J. & Sashida, K.
preservados na forma de assembleias natu‑ 2008. Reconstruction of an Apparatus of Ne‑
ostrachanognathus Tahoensis from Oitate, Ja‑
rais e de clusters, suportam a hipó tese de
pan and species of Neostrachanognathus
que os primeiros vertebrados eram preda‑ from Oman. Palaeontology, 51(5): 1201‑
dores marinhos. 1211.
Eles sã o utilizados para estabelecer
a maturaçã o da maté ria orgâ nica, atravé s do Agematsu, S., Uesugi, K., Sano, H. & Sashida,
K. 2017. Reconstruction of the multielement
seu Indice de Alteraçã o de Cor (IAC), mas
apparatus of the earliest Triassic conodont,
sua maior importâ ncia se deve ao fato de Hindeodus parvus, using synchrotron radiati‑
que os conodontes tê m uma ampla ocorrê n‑ on X‑ray micro‑tomography. Journal of Pale‑
cia mundial e tê m uma ó tima variaçã o mor‑ ontology, 9: 1120‑1127.
foló gica no tempo, tornando‑os excelentes
ferramentas no zoneamento bioestratigrá i‑ Aldridge, R. J. & Briggs, D. E. G. 1989. A soft
body of evidence. Natural History, 5(89): 6‑
co do Paleozoico, alé m de serem importan‑
11.
tes indicadores das condiçõ es
paleoecoló gicas do meio em que viviam e de Aldridge, R. J., Briggs, D. E. G., Clarkson, E. N.
constituı́rem peça fundamental na discussã o K. & Smith, M. P. 1986. The af inities of cono‑
sobre a idade dos primeiros vertebrados. donts ‑ new evidence from the Carboniferous
of Edinburgh, Scotland. Lethaia, 19: 279‑
Suas ocorrê ncias fossilı́feras decor‑
291.
rem de raros achados do animal conodonte,
de poucos aparelhos alimentares e de diver‑ Aldridge, R. J., Briggs, D. E. G., Smith, M. P.,
si icados e abundantes elementos conodon‑ Clarkson, E. N. K. & Clark, N. D. L. 1993. The
tes em diversos depó sitos marinhos de anatomy of conodonts. Philosophical Tran‑
provı́ncias de á guas quentes a frias, em baci‑ saction of Royal Society of London, 340(B):
405‑421.
as sedimentares paleozoicas e triá ssicas
mundiais. Tiveram seu apogeu entre o Ordo‑ Aldridge, R. J., Duncan J. E., Murdock, D. J. E.,
viciano e o Devoniano, com ocorrê ncias re‑ Sarah, E., Gabbott, S. E. & Theron, J. N. 2013.
duzidas, a partir do Carbonı́fero, A 17‑element Conodont Apparatus from the
desaparecendo completamente no Triá ssi‑ Soom Shale Lagerstatte (Upper Ordovician).
co. South Africa Palaeontology, 56(2): 261‑276.

No Brasil, sã o encontrados, como Aldridge, R. J. & Purnell, M. A. 1996. The co‑
elementos conodontes, nas bacias do norte, nodont controversies. Tree ‑ Elsevier trends
e, como aparelhos alimentares, excepcional‑ Journals, 11(11): 463‑468.
mente bem preservados, nos folhelhos fossi‑
Aldridge, R. J., Smith, M. P., Norby, R. D. &
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Ocorrência de Conodontes ‑ vertebrados primitivos ‑ na Supersequência Gondwana I, ... 235
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238 Edição da Sociedade Brasileira de Geologia – Núcleo RS/SC


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Ocorrência de Conodontes ‑ vertebrados primitivos ‑ na Supersequência Gondwana I, ... 239


Fitoestratigra ia dos estados do
Rio Grande do Sul e de Santa Catarina
Roberto Iannuzzi

Instituto de Geociê ncias, Universidade Federal do Rio Grande do Sul

* autor correspondente: roberto.iannuzzi@ufrgs.br

1 INTRODUÇÃO
Na Europa e na Amé rica do Norte, as plantas fó sseis tê m sido tradicionalmente utiliza‑
das na bioestratigra ia, especialmente, aquelas associadas aos depó sitos de carvã o do Carbonı́fe‑
ro Superior. Tanto que elas auxiliaram no estabelecimento de está gios cronoestratigrá icos, tais
como o Vestfaliano e o Estefaniano, que, durante muito tempo, foram consideradas padrõ es para
a “Escala de Tempo Geoló gico Internacional” (Wagner, 1984). No Rio Grande do Sul (RS) e em
Santa Catarina (SC), apesar de conhecidas, desde meados do sé culo XIX, em seçõ es, que conti‑
nham camadas de carvã o (Carruthers, 1869; White, 1988), as plantas fó sseis tê m sido muito
pouco utilizadas na bioestratigra ia desses estados, bem como na Bacia do Paraná , como um to‑
do (Holz et al., 2010). De fato, a ausê ncia de correlaçõ es mais precisas entre as seçõ es a lorantes
e as de subsuperfı́cie para a Bacia do Paraná tem prevenido o estabelecimento de um arcabouço
bioestratigrá ico, com base nas associaçõ es de plantas fó sseis, principalmente, para o Permiano
Inferior, intervalo que concentra os depó sitos carvonı́feros da bacia. Essa imprecisã o decorre da
imensa extensã o da bacia (de mais de um milhã o de quilô metros quadrados) e da descontinui‑
dade lateral dos depó sitos sedimentares, ao longo da margem leste da bacia, em que a loram as
camadas itofossilı́feras. Por isso, ao se tentar estabelecer correlaçõ es fundamentadas na bioes‑
tratigra ia para a bacia, optou‑se, desde o inı́cio, pelo uso dos microfó sseis, mais especi icamen‑
te, dos palinomorfos, a partir do uso de amostras fé rteis, obtidas em testemunhos de sondagem
(ver palinozoneamentos em Daemon & Quadros, 1970, e em Souza, 2006).
Contribuições à Geologia do Rio Grande do Sul e de Santa Catarina

2 HISTÓRICO / ESTADO DA ARTE restritas ao Grupo Itararé , apresentando ida‑


des estefaniana e sakmariana precoce (i.e.
Em termos bioestratigrá icos, houve, asseliana, conforme Cohen et al., 2013, atua‑
para o estado do RS, até hoje, apenas dois es‑ lizado), respectivamente. A “Tafo lora A”
quemas (zoneamentos) itoestratigrá icos, apresenta Paranocladus e Lycopodiopis
enquanto, para o SC, nunca houve sequer um (=Brasilodendron) pedroanus como elemen‑
esquema especı́ ico (estadual), baseado no tos conspı́cuos, e a presença de Botrychiop‑
registro paleobotâ nico encontrado no esta‑ sis, de Noeggerathiopsis (=Cordaites) e de
do. Poré m, existem uns poucos esquemas ( i‑ Buriadia. Já a “Tafo lora Transicional” se ca‑
tozoneamentos), que procuraram abarcar racteriza, principalmente, pelo registro das
toda a bacia e que, por consequê ncia, vieram primeiras glossopterı́deas, especialmente re‑
a incluir o registro paleobotâ nico dos dois presentadas por folhas gangamopteró ides
estados, os quais, por conseguinte, devem ou do tipo Gangamopteris.
ser aqui abordados. No entanto, deve‑se res‑ As tafo loras “B” e “C” tê m seu regis‑
saltar que estes, em geral, sã o esquemas in‑ tro concentrado na Formaçã o Rio Bonito,
formais, os quais nã o seguiram as correspondendo à s associaçõ es itofossilı́fe‑
recomendaçõ es da Comissã o Internacional ras diretamente relacionadas aos principais
de Estratigrá ica (ICS) ou as da Uniã o Inter‑ depó sitos de carvã o da bacia. Essas tafo lo‑
nacional das Ciê ncias Geoló gicas (IUGS), pa‑ ras poderiam, inclusive, ter sido contempo‑
ra o seu estabelecimento, com exceçã o râ neas, de tal forma que Rö sler sugeriu que a
daquele proposto por Rohn & Rö sler (2000). “Tafo lora B” poderia ocorrer no intervalo
Ainda assim, dada a escassez de esquemas Sakmariano‑Artinskiano, enquanto a “Tafo‑
publicados e a relevâ ncia dos mesmos para o lora C”, no Artinskiano‑Kunguriano (Rö sler,
entendimento da sucessã o lorı́stica da ba‑ 1978, p. 89, ig. 3). Na “Tafo lora B”, Aste‑
cia, como um todo, estes serã o tratados, a se‑ rotheca, Pecopteris spp. e Annularia sã o ele‑
guir. mentos abundantes, enquanto Paranocladus,
Lycopodiopis (=Brasilodendron) pedroanus,
2. 1 Fitozoneamentos informais Gangamopteris, Glossopteris e Sphenophyllum
sã o comuns. Por outro lado, na “Tafo lora C”,
Rö sler (1978) foi o primeiro a esta‑ Gangamopteris e Glossopteris se tornam
belecer um esquema de zoneamento paleo‑ abundantes e Lycopodiopis (=Brasiloden‑
lorı́stico ( itozoneamento) para toda a Bacia dron) pedroanus e os fetos (i.e. Asterotheca e
do Paraná , tendo subdividido as sucessõ es Pecopteris spp. ) passam a ser raros. Ainda,
lorı́sticas permo‑carbonı́feras e triá ssica em segundo aquele autor, Arberia, Noeggerathi‑
seis “tafo loras” informais, referidas por le‑ opsis (=Cordaites) e Rhodeopteridium sã o
tras de “A” a “F”, da mais antiga a mais jovem, elementos comuns desta ú ltima tafo lora.
alé m de propor uma “Tafo lora Transicional”, A “Tafo lora D” se estende, estrati‑
posicionada entre as tafo loras “A” e “B”. To‑ gra icamente, pelas formaçõ es Irati e Estra‑
das essas tafo loras se caracterizam pela co‑ da Nova (Teresina), com idade variando
ocorrê ncia de certos tá xons e/ou por sua entre o Kunguriano e o Kazaniano (i.e.
abundâ ncia relativa, compondo, assim, asso‑ Guadalupiano, conforme Cohen et al., 2013,
ciaçõ es exclusivas para cada uma delas, atualizado), enquanto a “Tafo lora E” ocorre
como será discriminado abaixo. em estratos da Formaçã o Rio do Rasto, de
Conforme Rö sler (1978), as tafo lo‑ possı́vel idade tatariana (i.e. lopingiana, con‑
ras “A” e “Transicional” se encontram, ambas, forme Cohen et al., 2013, atualizado), poden‑
242 Edição da Sociedade Brasileira de Geologia – Núcleo RS/SC
Iannuzzi

do chegar, talvez, ao inı́cio do Triá ssico (Fig. ores levaram a considerar que há , també m a
1). Lycopodiopis derbyi e Krauselcladus sã o os ocorrê ncia de elementos da “Tafo lora E” no
elementos mais comuns da “Tafo lora D”, jun‑ RS (Guerra‑Sommer & Cazzulo‑Klepzig,
to com folhas de Ginkgophyta e com restos 2000).
de algas caró itas, e Rö sler (1978) salienta Mais recentemente, Iannuzzi & Souza
que muitos tá xons das tafo loras anteriores (2005) sugeriram a ocorrê ncia de quatro es‑
(A, B, C) estã o ausentes nesta tafo lora. Alé m tá gios lorı́sticos informais para o intervalo
disso, o autor propõ e a ocorrê ncia de uma Carbonı́fero Superior‑Permiano Inferior da
zona informal de Polysolenoxylon na Forma‑ bacia, denominados “ loras ou está gios lorı́s‑
çã o Irati, aparentemente, para incluir o regis‑ ticos”, a saber: Pré ‑Glossopteris, Phyllotheca‑
tro das madeiras silici icadas, comumente Gangamopteris, Glossopteris‑Brasilodendron e
encontradas nesta unidade. Já a “Tafo lora E” Polysolenoxylon‑Glossopteris. A Flora Pré ‑
registra as ú ltimas ocorrê ncias de glossopte‑ Glossopteris consiste das associaçõ es distri‑
rı́deas na bacia e tem, como elementos co‑ buı́das ao longo da porçã o mé dia do Subgru‑
muns, folhas de Glossopteris pequenas e po Itararé , de idade pennsilvaniana. A Flora
estreitas e de Sphenophyllum, alé m de raras Phyllotheca‑Gangamopteris corresponde à s
frondes de ?Dizeugotheca sp. (=Asterotheca). associaçõ es que se distribuem, desde o topo
Por im, tem‑se a “Tafo lora F”, que do Subgrupo Itararé , até as porçõ es mais ba‑
representa o registro da Flora Dicroidium na sais da Formaçã o Rio Bonito, consideradas
Formaçã o Rosá rio do Sul (=Formaçã o Santa do Cisuraliano precoce (Sakmariano tardio).
Maria), de idade triá ssica mé dia. Esta se ca‑ A partir do inal do terço basal (Membro Pa‑
racteriza pela presença de vá rias espé cies de raguaçu), até o topo da Formaçã o Rio Bonito
Dicroidium e pela ausê ncia dos elementos ca‑ (Membro Sideró polis), estendem‑se os regis‑
racterı́sticos das tafo loras anteriores (Rö sler, tros da Flora Glossopteris‑Brasilodendron, de
1978). prová vel idade artinskiana. Apó s um curto in‑
Apesar do esquema de Rö sler (1978) tervalo esté ril do ponto de vista de mega lo‑
se basear em uma considerá vel amostragem ras, correspondente aos depó sitos marinhos
de plantas fó sseis, tanto em termos estrati‑ da Formaçã o Palermo, ocorre a Flora Polyso‑
grá icos quanto geográ icos, este representa‑ lenoxylon‑Glossopteris, que equivale aos re‑
va um arcabouço totalmente informal, em gistros encontrados na Formaçã o Irati, com
que, ao invé s das amplitudes estratigrá icas idade estimada entre o Artinskiano tardio e o
dos tá xons, foram apresentadas, apenas, as Kunguriano.
prová veis extensõ es cronoestratigrá icas das A Flora Pré ‑Glossopteris é caracteri‑
tafo loras por ele de inidas (Fig. 1). Mesmo zada pela ausê ncia de elementos glossopterı́‑
assim, este esquema pioneiro teve importâ n‑ deos, e pela presença de tá xons tı́picos das
cia signi icativa, pois ordenou, pela primeira Floras de “Notorhacopteris” e “Transicional”,
vez, a sucessã o paleo lorı́stica da bacia, como do Pennsilvaniano da Argentina (Iannuzzi &
um todo, o que norteou todos os trabalhos i‑ Souza, 2005). Entre estes, destaca‑se a ocor‑
toestratigrá icos posteriores. Em relaçã o ao rê ncia dos gê neros Dwykea, Bumbudendron,
RS, apenas as tafo loras “Transicional”, “B” e Nothorhacopteris, Botrychiopsis, Eusphenop‑
“D”, permianas, e a “F”, triá ssica, estã o repre‑ teris, Buriadia e Eucerospermum. Já a Flora
sentadas em localidades itofossilı́feras, en‑ Phyllotheca‑Gangamopteris se distingue pelo
quanto, para o SC, há o registro de sı́tios, primeiro aparecimento das glossopterı́deas e
contendo elementos tı́picos das tafo loras pela abundâ ncia de folhas gangamopteró ides
permianas “C” e “E”. Poré m, achados posteri‑ e esfenó itas do tipo Phyllotheca. Entre os tá ‑
Fitoestratigra ia dos estados do Rio Grande do Sul e de Santa Catarina 243
Contribuições à Geologia do Rio Grande do Sul e de Santa Catarina

Figura 1 ‒ Esquema itoestratigrá ico informal de Rö sler (1978). Note‑se que apenas as amplitudes
estratigrá icas das tafo loras sã o apresentadas (em vermelho), mas, nã o, as dos tá xons. As tafo loras B e C, do
Permiano precoce (Cisuraliano), D e E, do Permiano tardio (Guadalupiano e Lopingiano), e F, do Triá ssico
Mé dio, sã o registradas nos estados do Rio Grande do Sul e de Santa Catarina (ver texto).

244 Edição da Sociedade Brasileira de Geologia – Núcleo RS/SC


Iannuzzi

xons tı́picos, Iannuzzi & Souza (2005) citam (2005) citam Protopodorcapitys, Myelontor‑
Phyllotheca australis (=P. indica), Stepha‑ doxylon, Tordoxylon, Kraeuselpitys, Parataxo‑
nophyllites sanpaulensis, Botrychiopsis planti‑ pitys, Trigonomyelon, Kaokoxylon,
ana, Rubidgea lanceolata, R. obovata, Brasilestiloxylon, Antarticoxylon, Taxopitys,
Gangamopteris angustifolia, G. obovata, G. bu‑ Austroscleromedulloxylon, Piracicaboxylon,
riadica, Glossopteris communis, G. indica, Chi‑ Paranasseptoxylon, Atlanticoxylon, Baraka‑
ropteris reniformis, Cheirophyllum speculare, roxylon, Polysolenoxylon, Solenobrasilioxylon e
Kawizophyllum sp., Buriadia isophylla, Cornu‑ Solenopitys. A Flora Glossopteris‑Brasiloden‑
carpus patagonicus e Arberia minasica. A so‑ dron estaria presente nos depó sitos do RS e
brejacente Flora Glossopteris‑Brasilodendron de SC, enquanto as loras Phyllotheca‑Ganga‑
se caracteriza pela dominâ ncia das folhas do mopteris e Polysolenoxylon‑Glossopteris teri‑
tipo Glossopteris, entre os elementos glos‑ am sido registradas apenas no RS, até agora.
sopterı́deos, e pela abundâ ncia dos gê neros Nã o há registro da Flora Pré ‑Glossopteris em
Glossopteris, Brasilodendron e Cordaites nas qualquer desses dois estados.
associaçõ es itofossilı́feras, especialmente, Em relaçã o ao registro paleobotâ nico
daquelas, encontradas junto aos principais triá ssico, o qual se encontra restrito à Forma‑
depó sitos de carvã o da bacia. Há um aumen‑ çã o Santa Maria e ao sotoposto “Arenito Ma‑
to signi icativo de diversidade, com o surgi‑ ta”, no RS, nunca houve a proposiçã o de
mento de novos elementos, tais como os quaisquer itozonas formais. Um dos motivos
fetos pecopterı́deos e as esfenó itas esfeno i‑ parece ser a raridade de a loramentos ito‑
laleanas. Estas representam a tı́pica “Flora fossilı́feros, no caso da chamada “Flora Di‑
Glossopteris”, associada aos depó sitos do croidium”, e a falta de achados de caules in
Gondwana. Alguns tá xons de importâ ncia bi‑ situ (inseridos na matriz rochosa) e de deter‑
oestratigrá ica sã o listados por Iannuzzi & minaçõ es taxonô micas mais precisas, com
Souza (2005) para esta lora, a saber: Brasi‑ respeito ao registro das “ lorestas petri ica‑
lodendron pedroanum, Phyllotheca griesbachi, das”, denominadas “Flora de Araucarioxy‑
Pecopteris pedrasica, Asterotheca spp., Sphe‑ lon” (Guerra‑Sommer et al., 2002). Poré m,
nopteris lobifolia, S. ischavonensis, Neomari‑ alguns dos tá xons determinados para estas
opteris sp., Botrychiopsis valida, Glossopteris loras foram utilizados, para estabelecer cor‑
occidentalis, G. taenioides, G. browniana, G. relaçõ es bioestratigrá icas com outros depó ‑
angustifolia, G. ampla, Gangamopteris inter‑ sitos gondvâ nicos mais bem posicionados,
media, G. mosesii, Paranocladus dusenii, Arbe‑ cronoestratigra icamente. Com base na dis‑
ria spp., Ottokaria spp., Plumsteadia sennes, tribuiçã o gondvâ nica (i.e. Argentina e Austrá ‑
Cordaicarpus zeillerii e Cornucarpus furcata, lia) das espé cies de Dicroidium encontradas
entre as compressõ es‑impressõ es, e Catari‑ na Formaçã o Santa Maria, com especial ê nfa‑
napitys, Paulistoxylon, Solidoxylon, Protophyl‑ se para D. odontopteroides var. remotum, foi
locladoxylon, Torosoxylon, Myelontordoxylon, possı́vel indicar uma correspondê ncia da
Schop iicaulia, Taeniopitys e Abietopitys, en‑ “Flora Dicroidium” do RS com a “Zona Oppel
tre os caules silici icados. Dicroidium odontopteroides”, da Austrá lia,
Por ú ltimo, tem‑se a Flora Polysole‑ considerada de idade triá ssica mé dia (Anisia‑
noxylon‑Glossopteris, que se distingue por ser no tardio‑Ladiniano) (Guerra‑Sommer et al.,
essencialmente composta de lenhos fó sseis, 2002). Em relaçã o à “Flora de Araucarioxy‑
com especial ê nfase aos do tipo solenoide, lon”, associada ao “Arenito Mata”, apenas a
caracterı́sticos do Gondwana. Entre os tá ‑ presença do gê nero Rhexoxylon entre as ma‑
xons mais importantes, Iannuzzi & Souza deiras petri icadas poderia sugerir uma cor‑

Fitoestratigra ia dos estados do Rio Grande do Sul e de Santa Catarina 245


Contribuições à Geologia do Rio Grande do Sul e de Santa Catarina

relaçã o com a Formaçã o Ischigualasto, mais aos depó sitos de carvã o do RS.
especi icamente, com a “Idade Ré ptil Ischi‑ Originalmente, a Zona Botrychiopsis
gualastiana”, do Triá ssico Mé dio (Guerra‑ plantiana se estenderia da porçã o superior
Sommer et al., 2002). do Grupo Itararé , representada pela Subzo‑
na Gangamopteris obovata, de idade sakma‑
2. 2 Fitozoneamentos formais riana, até a parte basal da Formaçã o Rio
Bonito, em que corresponderia ao registro
No Rio Grande do Sul, Guerra‑Som‑ da Subzona Phyllotheca indica, considerada
mer & Cazzulo‑Klepzig (1993) propuseram o do Artinskiano (Fig. 2). Já a Zona Glossopte‑
primeiro itozoneamento formal para os de‑ ris/Rhodeopteridium ocorreria na porçã o
pó sitos do Permiano Inferior, a partir dos da‑ mé dio‑superior da Formaçã o Rio Bonito,
dos de todos os a loramentos itofossilı́feros para a qual foi atribuı́da uma idade kunguri‑
descritos à é poca, o qual era composto de ana, naquele momento (Guerra‑Sommer &
duas “Zonas de Associaçã o”: uma inferior, de‑ Cazzulo‑Klepzig, 1993 – ver item seguinte).
nominada Zona Botrychiopsis plantiana, e Poré m, baseados no estudo da seçã o do
uma superior, chamada Zona Glossopteris/ Morro do Papalé o, em Mariana Pimentel,
Rhodeopteridium. A Zona Botrychiopsis plan‑ Iannuzzi et al. (2007) incluı́ram a Subzona P.
tiana estava dividida em duas subzonas: Gan‑ indica no topo do Grupo Itararé . Alé m disso,
gamopteris obovata e Phyllotheca indica (Fig. estudos subsequentes (i) acrescentaram no‑
2). vos tá xons, (ii) modi icaram as denomina‑
Segundo Guerra‑Sommer & Cazzulo‑ çõ es taxonô micas de alguns outros
Klepzig (1993), a Zona Botrychiopsis plantia‑ (especialmente, excluı́ram a ocorrê ncia do
na é caracterizada pelo primeiro apareci‑ gê nero Rubidgea) e (iii) alteraram as ampli‑
mento das glossopterı́deas, principalmente, tudes estratigrá icas de vá rios tá xons (base‑
de folhas dos tipos Gangamopteris e Rubid‑ ando‑se em novas correlaçõ es estratigrá ‑
gea, e pela abundâ ncia local da pteridó ila icas, estabelecidas entre as localidades ito‑
Botrychiopsis plantiana (Fig. 2). A Subzona fossilı́feras), fazendo com que a quantidade
Gangamopteris obovata é de inida pela am‑ de tá xons e suas amplitudes, no itozonea‑
plitude estratigrá ica (biocron) de Ganga‑ mento, se modi icassem signi icativamente,
mopteris buriadica, de G. angustifolia, de em relaçã o à proposta original de Guerra‑
Rubidgea lanceolata, de Glossopteris indica, Sommer & Cazzulo‑Klepzig (ver Iannuzzi et
de Chiropteris reniformis e de Cornucarpus al., 2007). Deste modo, uma atualizaçã o do
patagonius. A sobrejacente Subzona Phyl‑ esquema de Guerra‑Sommer & Cazzulo‑
lotheca indica é caracterizada pelo primeiro Klepzig (1993), contendo a distribuiçã o cro‑
aparecimento da espé cie, que denomina a nolitoestratigrá ica das itozonas e as ampli‑
subzona, bem como de Scutum sp. e de Buri‑ tudes estratigrá icas dos tá xons, feita com
adia isophylla. Por im, a Zona Glossopteris/ base nas correlaçõ es estratigrá icas propos‑
Rhodeopteridium se distingue pela abundâ n‑ tas por Iannuzzi et al. (2010) para os princi‑
cia de folhas do gê nero Glossopteris e de cau‑ pais a loramentos itofossilı́feros do RS, é
les de licó itas do tipo Brasilodendron, alé m apresentada na Figura 3.
do aparecimento de fetos verdadeiros (e.g. Ainda para o Permiano Inferior, Jas‑
Eupecopteris sp., Rhodeopteridium sp. e Sphe‑ per et al. (2003) propuseram um itozoena‑
nopteris ischavonensis) (Fig. 2). Associaçõ es mento alternativo para o RS, composto de
desta zona correspondem à tı́pica “Flora uma ú nica itozona, a Zona Botrychiopsis,
Glossopteris”, tradicionalmente relacionada subdividida em duas subzonas, a saber:
246 Edição da Sociedade Brasileira de Geologia – Núcleo RS/SC
Iannuzzi

Subzona Botrychiopsis plantiana e Subzona tanto, Jasper et al. (2003) nã o apresentaram
Botrychiopsis valida. De acordo com os dados formalmente e/ou apropriadamente (i) os
disponibilizados por aqueles autores, a Sub‑ tá xons‑diagnó stico acessó rios, (ii) os estra‑
zona Botrychiopsis plantiana seria equivalen‑ tró tipos, (iii) as seçõ es de referê ncia e/ou
te à Zona Botrychiopsis plantiana, de (iv) as amplitudes estratigrá icas dos tá xons
Guerra‑Sommer & Cazzulo‑Klepzig (1993), usados e, por isso, sua proposta de itozonea‑
enquanto a Subzona Botrychiopsis valida mento foi considerada invá lida por Iannuzzi
destes mesmos autores corresponderia à Zo‑ et al. (2007, 2010), pois nã o estaria em con‑
na Glossopteris/Rhodeopteridium, de Guerra‑ formidade, nã o, só , com as recomendaçõ es
Sommer & Cazzulo‑Klepzig (1993). No en‑ da ICS‑IUGS, mas, també m, com os princı́pios

Figura 2 ‒ Esquema itoestratigrá ico formal, proposto, originalmente, por Guerra‑Sommer & Cazzulo‑Klepzig
(1993) para a sucessã o lorı́stica paleozoica do Rio Grande do Sul. Note a distribuiçã o dos tá xons, que possuem
algum valor biostratigrá ico, cuja amplitude estratigrá ica se encontra destacada em vermelho (modi icado de
Guerra‑Sommer & Cazzulo‑Klepzig, 1993).

Fitoestratigra ia dos estados do Rio Grande do Sul e de Santa Catarina 247


Contribuições à Geologia do Rio Grande do Sul e de Santa Catarina

Figura 3 ‒ Atualizaçã o do esquema itoestratigrá ico formal de Guerra‑Sommer & Cazzulo‑Klepzig (1993),
proposta por Iannuzzi et al. (2007, 2010). Note‑se a distribuiçã o dos tá xons, que possuem algum valor
biostratratigrá ico, cuja amplitude estratigrá ica se encontra destacada em vermelho. Salienta‑se, em relaçã o à
proposta original de Guerra‑Sommer & Cazzulo‑Klepzig (1993): (i) o aumento no nú mero de tá xons
determinados; (ii) mudanças nas amplitudes estratigrá icas de vá rios tá xons; (iii) mudança no
posicionamento da Subzona P. indica (Phyllotheca indica) para o topo do Subgrupo Itararé ; e (iv) reduçã o
acentuada dos tá xons, que caracterizam a Subzona G. obovata (Gangamopteris obovata) (modi icado de
Iannuzzi et al., 2010).

248 Edição da Sociedade Brasileira de Geologia – Núcleo RS/SC


Iannuzzi

da bioestratigra ia (Murphy & Salvador, de Paracalamites sp. tipo 2. Há , també m,


1999). abundante registro de espé cies de Paracala‑
Ainda, em termos de zoneamentos mites e de Pecopteris, alé m de algumas espé ‑
formais, Rohn & Rö sler (2000) estabelece‑ cies de Glossopteris, de Sphenopteris e de
ram trê s itozonas de intervalo formais para Dizeugotheca (=Asterotheca).
o Permiano Superior da bacia, a saber: Lyco‑ Essas trê s itozonas foram registra‑
podiopsis derbyi, Sphenophyllum paranaense das em diferentes localidades entre o extre‑
e Schizoneura gondwanensis. A Zona Lycopo‑ mo norte e a porçã o central de SC, bem como
diopsis derby se inicia no terço basal da For‑ nos estados do Paraná e de Sã o Paulo (Rohn
maçã o Teresina, estendendo‑se até o topo & Rö sler, 2000). No RS, a presença destas i‑
desta unidade, tendo sido considerada de tozonas nunca foi totalmente con irmada,
idade guadalupiana precoce. A Zona Sphe‑ uma vez que a Formaçã o Teresina nã o é assi‑
nophyllum paranaense abrange o Membro nalada para o estado e que as associaçõ es de
Serrinha, da Formaçã o Rio do Rasto, enquan‑ itofó sseis nas camadas do Permiano Superi‑
to a Zona Schizoneura gondwanensis ocorre, or, correspondentes à Formaçã o Rio do Ras‑
ao longo do Membro Morro Pelado, da mes‑ to, sã o raras e sã o constituı́das por poucos
ma formaçã o. A primeira teria uma idade elementos fragmentados e mal preservados
guadalupiana mé dia e a segunda se estende‑ (Guerra‑Sommer & Cazzulo‑Klepzig, 2000).
ria do Guadalupiano tardio ao Lonpingiano Por outro lado, nã o há , para o Permiano Infe‑
precoce. rior, até o momento, um esquema formal es‑
A Zona Lycopodiopsis derbyi é de ini‑ tabelecido, que abranja toda a bacia; apenas,
da pela amplitude estratigrá ica da espé cie zoneamentos, de aplicaçã o regional, como o
homô nima, bem como da caró ita Leonardo‑ de Guerra‑Sommer & Cazulo‑Klepzig (1993),
sia langei (Rohn & Rö sler, 2000). Entre ou‑ já mencionado.
tros tá xons raros, que compõ e esta zona,
estã o vá rias espé cies de Glossopteris e de Pe‑ 3 IMPACTO DAS DATAÇÕES RADIOMÉ‑
copteris (em que se destaca Pecopteris ta‑ TRICAS NA FITOESTRATIGRAFIA
guaiensis), duas de Kraseucladus e
Ilexoidephyllum permicum, alé m de caules Na ú ltima dé cada, houve um re ina‑
permineralizados de Psaronius (=Tietea). Já a mento no posicionamento cronoestratigrá i‑
Zona Sphenophyllum paranaense funciona co dos depó sitos do intervalo Pennsila‑
como uma zona de transiçã o entre as outras vaniano‑Triá ssico da Bacia do Paraná , por
duas, pois compreende o intervalo entre a meio da obtençã o de dataçõ es radiomé tricas
ú ltima ocorrê ncia de Lycopodiopsis derbyi e o em diferentes horizontes a lorantes (Grif is
aparecimento de Schizoneura gondwanensis. et al., 2019; Rocha‑Campos et al., 2019;
Alé m disso, caracteriza‑se pela abundâ ncia, Schultz et al., 2020). Até entã o, as idades
em seu terço superior, de espé cies de Sphe‑ apresentadas para os pacotes sedimentares
nophyllum (Rohn & Rö sler, 2000, p. 73, ig. 4), eram baseadas, principalmente, no registro
incluindo a espé cie que dá nome à zona, e palinoló gico, com contribuiçõ es pontuais de
pela ocorrê ncia de vá rias espé cies de Glos‑ alguns macrofó sseis de vertebrados, de in‑
sopteris e de Pecopteris, e de algumas de Di‑ vertebrados e, até mesmo, de plantas (Holz et
zeugotheca (=Asterotheca), de Sphenopteris e al., 2010). As correlaçõ es dos a loramentos e/
de Paracalamites. A sobrejacente Zona Schi‑ ou dos horizontes itossilı́feros, em particu‑
zoneura gondwanensis é de inida pela ampli‑ lar, com seçõ es de subsuperfı́cie mais com‑
tude estratigrá ica da espé cie homô nima e pletas e datadas, por meio dos palinomorfos,

Fitoestratigra ia dos estados do Rio Grande do Sul e de Santa Catarina 249


Contribuições à Geologia do Rio Grande do Sul e de Santa Catarina

eram feitas, a partir de mé todos estratigrá i‑ que ocorrem na Formaçã o Rio Bonito, no RS
cos clá ssicos (Rohn & Rö sler, 2000; Tybusch e em SC. Portanto, a partir das recentes ida‑
et al., 2016) ou se utilizando dos princı́pios des radiomé tricas, obtidas por aqueles auto‑
da estratigra ia de sequê ncias (Iannuzzi et res, por meio do mé todo de aná lise de alta
al., 2010). Portanto, nã o havia outras ferra‑ resoluçã o CA‑TIMS (idades 2o6Pb/238U, obti‑
mentas, que permitissem con irmar as ida‑ das de cristais ú nicos de zircã o), houve um
des atribuı́das aos palinomorfos ou o signi icativo rearranjo no posicionamento
posicionamento estratigrá ico, relativo aos cronoestratigrá ico de alguns dos mais im‑
a loramentos itossilı́feros, uns em relaçã o portantes horizontes itofossilı́feros da mar‑
aos outros, ou, mesmo, dos itofó sseis, den‑ gem leste da bacia no RS (Grif is et al., 2018,
tro de sua pró pria unidade litoestratigrá ica 2019) e em SC (Grif is et al., 2019). Seçõ es
de ocorrê ncia. a lorantes da regiã o do municı́pio de Candio‑
A partir do inı́cio deste sé culo, os es‑ ta (RS), que oscilavam, em idade, entre o As‑
tudos geocronoló gicos passaram a ser apli‑ seliano, passando pelo Artinskiano e, até
cados na dataçã o de camadas geradas por mesmo, pelo Wordiano (conforme a Carta
cinzas vulcâ nicas, em sua grande maioria, Cronoestratigrá ica Internacional atualizada,
representando tonsteins, que foram encon‑ de Cohen et al., 2013), foram de inidas como
tradas, especialmente em boa quantidade, sendo de idade asseliana, a partir das trê s
nos depó sitos da Formaçã o Rio Bonito, mas idades congruentes, obtidas por Grif is et al.
que també m foram assinaladas no topo do (2018), por meio do mé todo CA‑TIMS de
Grupo Itararé e nas formaçõ es Irati, Rio do aná lise (i.e. 298,23 ±0,31 Ma, 297,58 +0,68/‑
Rasto e, recentemente, Santa Maria (Grif is 1,4 Ma e 297,77 +0,35/‑0,59 Ma). A seçã o da
et al., 2019; Rocha‑Campos et al., 2019; Mina do Faxinal, em Arroio dos Ratos (RS),
Schultz et al., 2020). Essas camadas de ro‑ considerada, anteriormente, de idade sak‑
chas vulcanosedimentares tê m sido detecta‑ mariana tardia, foi reavaliada como um pou‑
das, principalmente, no RS (Grif is et al., co mais jovem e reposicionada, por Grif is et
2018, 2019), mas, també m, em SC (Grif is et al. (2018), no Artinskiano mé dio (285,42
al., 2019), no Paraná e em Sã o Paulo (Rocha‑ +1,2/‑2,1 Ma). Por im, o A loramento Quité ‑
Campos et al., 2019; Jurigan et al., 2019) e, ria, situado no municı́pio de Encruzilhada do
até mesmo, no Uruguai (Rocha‑Campos et Sul (RS), que, antes, era posicionado no topo
al., 2019). Poré m, apesar de representarem, da Formaçã o Rio Bonito, por meio de corre‑
inicialmente, um avanço, as primeiras data‑ laçõ es estratigrá icas e de dataçã o relativa,
çõ es radiomé tricas obtidas usaram diferen‑ baseada no conteú do palinoló gico encontra‑
tes mé todos geocronoló gicos em diferentes do, foi considerado um dos pacotes mais an‑
laborató rios no Brasil e no exterior, gerando tigos da unidade, equivalente, em idade, à s
idades, por vezes, con litantes entre si para seçõ es de Candiota, mais ao sul do estado,
uma mesma camada. A soluçã o para esse sendo reposicionado no Asseliano, por Grif‑
problema repousaria na obtençã o de novas is et al. (2018), com idade calculada em
dataçõ es radiomé tricas para as camadas já 296,97 +0,45/‑0,72 Ma. Há outras seçõ es,
datadas, utilizando‑se, para isso, um mé todo que també m foram datadas por Grif is et al.
geocronoló gico ú nico e o mais preciso possı́‑ (2019), como a da Mina do Recreio (290,36
vel, a partir de aná lises feitas em um mesmo +0,4/‑0,32 Ma), em Butiá (RS), mas que, ape‑
laborató rio. Foi exatamente o que Grif is e sar de nã o conterem itofó sseis, sã o impor‑
colaboradores (2018, 2019) izeram, em re‑ tantes, para o posicionamento de outras
laçã o à s camadas já datadas, anteriormente, seçõ es itofossilı́feras, como a do Morro do

250 Edição da Sociedade Brasileira de Geologia – Núcleo RS/SC


Iannuzzi

Papalé o, em Mariana Pimentel. seçõ es e dos horizontes itofossilı́feros, pois


As dataçõ es radiomé tricas balizado‑ os nı́veis datados se encontram em um teste‑
ras, obtidas por Grif is et al. (2018, 2019), in‑ munho de sondagem (obtido em Anitá polis)
dicaram a ocorrê ncia de, pelo menos, trê s ou em camadas, posicionadas, estratigra ica‑
intervalos de geraçã o das camadas de carvã o mente, bem abaixo de qualquer camada ito‑
no RS: um, no Asseliano (regiã o de Candiota fossilı́fera conhecida, conforme correlaçõ es
e de Quité ria); outro, no inal do Sakmariano estabelecidas com as seçõ es a lorantes da re‑
(Mina do Recreio, em Butiá ); e o mais jovem, giã o de Alfredo Wagner. Poré m, depreende‑
no Artinskiano mé dio (Mina do Faxinal). se, das idades radiomé tricas alcançadas, que
Destas seçõ es datadas, apenas a da Mina do as associaçõ es itofossilı́feras encontradas na
Recreio nã o possui itofó sseis diretamente regiã o centro‑sul de SC sã o mais jovens do
registrados, poré m é inevitá vel que algum ti‑ que as mais antigas, de idade asseliana, assi‑
po de lora esteja associado à gê nese das ca‑ naladas para o RS, podendo ter correspon‑
madas carvonı́feras da mina e, por dê ncia, apenas, com as associaçõ es mais
conseguinte, à é poca de formaçã o deste de‑ jovens encontradas nos outros dois interva‑
pó sito, ou seja, ao inal do Sakmariano. Os in‑ los de geraçã o de carvã o do RS, ou seja, do
tervalos de geraçã o de carvã o sã o é pocas de Sakmariano tardio e do Artinskiano mé dio.
terrestrializaçã o e, portanto, de aumento na‑ Segundo Grif is et al. (2019), todo o Membro
tural da ocorrê ncia de plantas fó sseis no re‑ Sideró polis estaria contido no intervalo Sak‑
gistro sedimentar da bacia. A partir disto, mariano‑Artinskiano, unidade portadora dos
depreende‑se que, até , trê s diferentes tipos principais depó sitos de carvã o explorados
de loras podem ter sido registradas, ao lon‑ em SC.
go da Formaçã o Rio Bonito, espaçadas por Acima dos depó sitos carvonı́feros da
alguns milhõ es de anos. Poré m, a nova orde‑ Formaçã o Rio Bonito, as associaçõ es itofos‑
naçã o dos a loramentos itofossilı́feros alte‑ silı́feras voltam a ocorrer, apenas, na Forma‑
rou, contundentemente, nã o, só , as çã o Irati, como já relatado (Iannuzzi & Souza,
amplitudes estratigrá icas de vá rios tá xons, 2005). Esta unidade tem sido satisfatoria‑
como, també m, os seus signi icados cronoes‑ mente datada, pelo mé todo SHRIMP (aplica‑
tratigrá icos. Estas mudanças nã o foram for‑ do a zircõ es, extraı́dos de uma mesma
malmente introduzidas no itozoneamento camada de bentonita, encontrada no Para‑
em vigê ncia no RS, até o momento (Fig. 3). ná ), por distintos grupos de pesquisadores
Na realidade, como algumas das seçõ es e dos (Santos et al., 2006; Rocha‑Campos et al.,
horizontes itofossilı́feros tipo sofreram ex‑ 2019), que obtiveram idades concordantes e
pressiva alteraçã o no posicionamento crono‑ que posicionam esta unidade no Kuguriano
estratigrá ico, talvez, nã o seja viá vel a mé dio. Esta mesma idade pode ser atribuı́da
manutençã o do atual esquema, proposto ini‑ à “Zona informal de Polysolenoxylon da Tafo‑
cialmente por Guerra‑Sommer & Cazzulo‑ lora D”, de Rö sler (1978), e à “Flora Polysole‑
Klepzig (1993) (Fig. 2) e atualizado por Ian‑ noxylon‑Glossopteris”, de Iannuzzi & Souza
nuzzi et al. (2007, 2010) (Fig. 3). (2005), que representam o registro paleobo‑
Em relaçã o ao registro paleobotâ nico tâ nico da Formaçã o Irati, ao longo da bacia.
do Permiano Inferior de SC, associado aos Para o Permiano Superior, as novas
carvõ es, as dataçõ es radiomé tricas obtidas, idades das formaçõ es Teresina e Rio do Ras‑
até o momento (Grif is et al., 2019), nã o trou‑ to, obtidas pelo mé todo SHRIMP e publica‑
xeram, infelizmente, novidades, em termos das por Rocha‑Campos et al. (2019), sã o as
do posicionamento cronoestratigrá ico das ú nicas existentes e, por isso, aplicá veis ao
Fitoestratigra ia dos estados do Rio Grande do Sul e de Santa Catarina 251
Contribuições à Geologia do Rio Grande do Sul e de Santa Catarina

posicionamento cronoestratigrá ico das uni‑ tratigrá icas. Felizmente, surgiram, recente‑
dades itoestratigrá icas contidas nestas uni‑ mente, as primeiras dataçõ es radiomé tricas,
dades. De acordo com os autores, a feitas a partir de zircõ es detrı́ticos, encon‑
Formaçã o Teresina seria do Wordiano, mes‑ trados em sedimentos de trê s distintos nı́‑
ma idade que, por conseguinte, pode ser veis estratigrá icos (dois, na Formaçã o Santa
atribuı́da à “Tafo lora D”, de Rö sler (1978), e Maria e um, na Caturrita), que permitiram o
à Zona Lycopodiopsis derbyi, de Rohn & Rö s‑ estabelecimento de idades mı́nimas para as
ler (2000). Já a Formaçã o Rio do Rasto tem biozonas de vertebrados (Schultz et al.,
seu terço basal, equivalente ao Membro Ser‑ 2020). Como base nas idades radiomé tricas,
rinha, com idade proposta para o Capitania‑ obtidas das rochas, e nas atribuı́das à s bio‑
no. Essa idade pode ser assumida para a zonas de vertebrados, é possı́vel indicar um
base da “Tafo lora E”, de Rö sler (1978), que intervalo de tempo entre o Ladiniano tardio
equivale à Zona Sphenophyllum paranaense, e Carniano precoce para o registro da “Flora
de Rohn & Rö sler (2000). Já a porçã o mé dio‑ Dicroidium” no RS, já que ela estaria ocor‑
superior da formaçã o, correspondente ao rendo no nı́vel do pacote Santa Maria II
Membro Morro Pelado, teve seu inı́cio de de‑ (Schultz et al., 2020). Este intervalo está em
posiçã o, proposto por Rocha‑Campos et al. concordâ ncia com a idade assumida nas cor‑
(2019), para a idade subsequente, o Wuchia‑ relaçõ es bioestratigrá icas feitas, previa‑
pingiano, mas o tempo do seu té rmino per‑ mente, com base nas espé cies registradas de
manece em aberto, sendo maté ria de debate. Dicroidium (ver Guerra‑Sommer et al.,
Rocha‑Campos et al. (2019) admitiram que a 2000). Já para a “Flora de Araucarioxylon”,
unidade poderia, mesmo, estender‑se ao li‑ cuja ocorrê ncia estaria restrita ao “Arenito
mite do Permiano‑Triá ssico (251,902 ±0,024 Mata”, as novas idades sugerem que as ma‑
Ma, segundo Cohen et al., 2013, atualizado). deiras petri icadas de Mata e de Sã o Pedro
Deste modo, poder‑se‑ia assumir, de forma do Sul foram depositadas durante a ú ltima
geral, uma idade lopingiana para o Membro idade do Triá ssico, ou seja, no Ré tico
Morro Pelado, assim como para a porçã o mé ‑ (Schultz et al., 2020). Essa idade nã o coadu‑
dio‑superior da “Tafo lora E”, de Rö sler na com o proposto, previamente, com base
(1978), e sua equivalente, a Zona de Schizo‑ nas plantas fó sseis, por causa da presença
neura gondwanensis, de Rohn & Rö sler de Rhexoxylon, um tá xon associado à s plan‑
(2000). tas do tipo Dicroidium (Guerra‑Sommer et
Nas ú ltimas dé cadas, a estratigra ia e al., 2000).
a paleontologia dos depó sitos triá ssicos do A Figura 4 apresenta uma sı́ntese do
RS avançou sobremaneira, de modo que a posicionamento cronoestratigrá ico das uni‑
Formaçã o Santa Maria foi dividida em trê s dades itofossilı́feras formais e informais pa‑
pacotes sedimentares, i.e. Santa Maria I, II e ra a Bacia do Paraná (já discutida neste
III (Zerfass et al., 2003), e a relaçã o e o posi‑ texto), em relaçã o aos registros paleozoicos
cionamento cronoestratigrá ico das demais encontrados no RS e em SC.
unidades, i.e. formaçõ es Sanga do Cabral e
Caturrita, e o “Arenito Mata”, icaram mais 4 CONSIDERAÇÕES FINAIS
bem compreendidas. Poré m, as “idades‑ré p‑
Aparentemente, as mudanças signi‑
til”, sugeridas pelas biozonas de vertebrados,
icativas no posicionamento cronoestrati‑
careciam de quaisquer outras ferramentas
grá ico das seçõ es e dos horizontes
que pudessem con irmar as idades relativas,
itofossilı́feros permianos e, consequente‑
propostas com base nas correlaçõ es bioes‑

252 Edição da Sociedade Brasileira de Geologia – Núcleo RS/SC


Iannuzzi

mente, nas amplitudes estratigrá icas dos tá ‑ lhor opçã o, neste caso, será a construçã o de
xons, trazidas pelas idades radiomé tricas, ob‑ um novo esquema itoestratigrá ico para o
tidas por Grif is et al. (2018, 2019), RS, à luz dos novos dados, observando os no‑
inviabilizam o itozoneamento de Guerra‑ vos posicionamentos das seçõ es itofossilı́fe‑
Sommer & Cazzulo‑Klepzig (1993), como ori‑ ras e estabelecendo as novas amplitudes
ginalmente proposto. Há seçõ es e horizontes estratigrá icas dos tá xons, de inindo, assim,
itofossilı́feros, que, por terem mudado com‑ novas itozonas e os seus respectivos tá xons‑
pletamente de posiçã o no tempo, nã o podem guia. Para o Permiano Inferior de SC, interva‑
mais ser considerados seçõ es‑tipo e/ou es‑ lo para o qual nã o há qualquer itozonea‑
trató tipos de uma determinada itozona, pois mento proposto nesse estado, as poucas
inverteram sua posiçã o cronoestratigrá ica, dataçõ es radiomé tricas, obtidas até o mo‑
passando de estratos mais jovens a mais anti‑ mento, nã o permitem um claro posiciona‑
gos, como é o caso do A loramento Quité ria, mento cronoestratigrá ico das seçõ es e/ou
em que se encontram os estrató tipos de duas, dos horizontes itofossilı́feros. Talvez, a me‑
das trê s, itozonas de Guerra‑Sommer & Caz‑ lhor alternativa seja o estabelecimento de
zulo‑Klepzig (1993). Provavelmente, a me‑ correlaçõ es itoestratigrá icas com as seçõ es

Figura 4 ‒ Posicionamento cronoestratigrá ico das unidades itofossilı́feras formais e informais, de acordo com
as novas dataçõ es radiomé tricas, obtidas em camadas das unidades itofossilı́feras do Permiano da Bacia do
Paraná (Grif is et al., 2018, 2019). Salienta‑se que a Tafo lora A e sua equivalente, a Flora Pré ‑Glossopteris, nã o é
registrada nos estados do RS e de SC (legenda: Carbon. ‑ Carbonı́fero; Penn. ‑ Pennsilvaniano; Flora Phy‑Ganga ‑
Flora Phyllotheca‑Gangamopteris; Flora Gloss‑Bras ‑ Flora Glossopteris‑Brasilodendron; Flora Poly‑Gloss ‑ Flora
Polysolenoxylon‑Glossopteris; Zona Poly Informal ‑ Zona Polysolenoxylon Informal; Zona L. derbyi ‑ Zona
Lycopodiopsis derbyi; Zona S. paranaense ‑ Zona Sphenophyllum paranaense; e Zona S. gondwanensis ‑ Zona
Schizoneura gondwanensis).
Fitoestratigra ia dos estados do Rio Grande do Sul e de Santa Catarina 253
Contribuições à Geologia do Rio Grande do Sul e de Santa Catarina

mais bem posicionadas do RS, a im de esta‑ Guerra‑Sommer, M. & Cazzulo‑Klepzig, M.


belecer um itozoneamento para os impor‑ 1993. Biostratigraphy of the Southern Brazi‑
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254 Edição da Sociedade Brasileira de Geologia – Núcleo RS/SC


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Fitoestratigra ia dos estados do Rio Grande do Sul e de Santa Catarina 255


Biocronoestratigra ia
(Palinologia e Conodontes)
da Supersequência Gondwana I
na porção Sul da Bacia do Paraná
Paulo Alves de Souza1,2*, Ana Karina Scomazzon2,3, Cristina Moreira Félix1,
Eduardo Premaor1, Daiana Rockenbach Boardman1, Rafael Reis Bender1,
Ana Luisa Outa Mori1, Felipe Kipper2, Marcelo Guglielmi Leite1
1
Laborató rio de Palinologia Marleni Marques Toigo, Universidade Federal do Rio Grande do Sul
2
Programa de Pó s‑graduaçã o em Geociê ncias, Universidade Federal do Rio Grande do Sul
3
Laborató rio de Conodontes, Universidade Federal do Rio Grande do Sul

*autor correspondente: paulo.alves.souza@ufrgs.br

1 INTRODUÇÃO
A Supersequê ncia Gondwana I (SGI) compreende um pacote sedimentar heterogê neo e
complexo, que documenta, na Bacia do Paraná , as grandes mudanças paleoambientais ocorridas
no Gondwana Ocidental entre o inal do Carbonı́fero e o inı́cio do Triá ssico (Milani, 1997; Milani
& Zalá n, 1999). Litoestratigra icamente, esta unidade aloestratigrá ica de segunda ordem é
composta pelos grupos Itararé , Guatá e Passa Dois, localmente sobrepostos por unidades pre‑
dominantemente arenosas (formaçõ es Piramboia e Sanga do Cabral). Em seu conjunto, repre‑
sentam a passagem da fase glacial (icehouse) para pó s‑glacial (greenhouse), culminando com a
aridizaçã o do inal do Permiano e do inı́cio do Triá ssico. As unidades sedimentares constituem
rico acervo para pesquisas há mais de um sé culo, sobretudo, em decorrê ncia do interesse pelas
camadas de carvã o, pelas ocorrê ncias de urâ nio e de xisto betuminoso e pelo potencial petrolı́‑
fero (Milani et al., 2007), bem como por permitirem estudos sob mú ltiplos aspectos. De um mo‑
do geral, fazem parte do que é considerada uma bacia escola, com abundantes exposiçõ es e
com proximidade de centros de investigaçã o.
O conteú do paleontoló gico da SGI é extremamente variado, incluindo invertebrados,
vertebrados e plantas, alé m de icnofó sseis e de microfó sseis, tais como palinomorfos, ostraco‑
des e foraminı́feros. Holz et al. (2010) sintetizaram as principais ocorrê ncias fossilı́feras da
margem leste da bacia, a qual concentra a maior parte dos achados, tanto de superfı́cie quanto
de subsuperfı́cie. Essas ocorrê ncias tê m subsidiado interpretaçõ es paleoambientais das cama‑
das portadoras, correlaçõ es de curtas e de longas distâ ncias, bem como idades relativas. Contu‑
Contribuições à Geologia do Rio Grande do Sul e de Santa Catarina

do, elementos da fauna marinha, utilizados Informaçõ es detalhadas sobre a ge‑


nos estratotipos da escala‑padrã o do tempo ologia dos depó sitos, tais como os consti‑
geoló gico, tais como amonoides, conodontes tuintes litoló gicos, a geometria dos corpos e
e fusulinı́deos, sã o ausentes ou raros nesta as inconformidades entre os pacotes, estã o
porçã o do Gondwana, o que impede atribui‑ disponı́veis nos trabalhos de sı́ntese, con‑
çõ es geocronoló gicas mais acuradas. Desta tendo as mais completas e atualizadas car‑
forma, palinomorfos tê m sido amplamente tas estratigrá icas deste intervalo (Milani et
utilizados, em virtude da abundâ ncia, da di‑ al., 2007; Holz et al., 2010).
versidade e de potencial de correlaçã o entre Este trabalho objetiva apresentar o
as associaçõ es do Gondwana, bem como estado da arte das principais associaçõ es
plantas fó sseis e determinados grupos de palinoló gicas documentadas na SGI, na por‑
animais, tais como mesosaurı́deos da For‑ çã o sul da Bacia do Paraná , no Brasil, nos es‑
maçã o Irati, pelecı́podes da Formaçã o Tere‑ tados do Rio Grande do Sul (RS) e de Santa
sina, parasaurı́deos da Formaçã o Rio do Catarina (SC), ressaltando: (i) o signi icado
Rasto e as descobertas recentes de conodon‑ bioestratigrá ico; (ii) as respectivas idades
tes do Grupo Itararé . Por outro lado, somen‑ relativas; e (iii) as correlaçõ es laterais, se‑
te há pouco tempo depó sitos vulcanogê nicos jam bacinais, sejam extrabacinais. Adicio‑
tê m fornecido dataçõ es radiomé tricas de al‑ nalmente, a ocorrê ncia de conodontes será
ta precisã o, a partir da aná lise de U‑Pb em objetivo de aná lise do ponto de vista biocro‑
zircõ es, com implicaçõ es signi icativas nas noestratigrá ico, de modo a integrar as in‑
atribuiçõ es das idades de determinadas uni‑ formaçõ es de ambos os grupos de
dades lito e bioestratigrá icas. microfó sseis.

Figura 1 ‒ Contexto geoló gico da Bacia do Paraná nos estados do Rio Grande do Sul e de Santa Catarina, com
destaque para as localidades com informaçõ es palinoestratigrá icas abordadas nesta contribuiçã o
(detalhamento na Tabela 1).

258 Edição da Sociedade Brasileira de Geologia – Núcleo RS/SC


Souza et al.

2 PALINOLOGIA rochas sedimentares, seja no domı́nio terres‑


tre, seja no transicional, seja no marinho,
O histó rico das pesquisas palinoló gi‑ uma vez que podem ser transportados a lon‑
cas nas bacias sedimentares paleozoicas está gas distâ ncias, a partir da planta mã e. Nas
intimamente relacionado aos estudos estrati‑ sucessõ es estratigrá icas, denotam as mu‑
grá icos visando à exploraçã o de combustı́‑ danças lorı́sticas, que ocorrem no tempo e
veis fó sseis, com destaque para o carvã o, no espaço, sendo capazes de fornecer impor‑
para o petró leo e para o gá s natural. Com tantes informaçõ es sobre o cará ter dos bio‑
efeito, os primeiros achados de micró sporos mas lorestais e sobre as mudanças
e de megá sporos da Bacia do Paraná sã o climá ticas em todas as paleolatitudes.
oriundos das principais camadas de carvã o Tentativas de reconstruçã o de paisa‑
do sul do Brasil, o que despertou progressivo gens vegetacionais foram realizadas, em dis‑
interesse por trabalhos taxonô micos para a tintas escalas e base de dados, seja
descriçã o de assembleias palinoló gicas des‑ considerando camadas especı́ icas, tais como
conhecidas e, posteriormente, para a propo‑ os nı́veis de carvã o de Candiota e de Faxinal,
siçã o de arcabouços bioestratigrá icos, para da Formaçã o Rio Bonito, no RS (e.g. Cazzulo‑
ins de obtençã o de idades relativas, de cor‑ Klepzig et al., 2005), seja como resultado da
relaçõ es e de interpretaçã o dos paleoambi‑ aná lise da sucessã o, ao longo de toda a SGI
entes relacionados. Cistos de algas cloró itas, (e.g. Beri et al., 2020). Conforme estes ú lti‑
esporos dispersos e hifas de fungos, bem co‑ mos autores, de modo geral, os padrõ es de
mo acritarcos (cistos de a inidade bioló gica aparecimentos, de diversidade e de extinçõ es
incerta) e escolecodontes sã o també m en‑ dos tá xons de esporos e de grã os de pó len
contrados, ainda que de forma geralmente documentados nestes depó sitos sã o consis‑
subordinada, em sua maioria representando tentes com o padrã o observado na maioria
os diversos ambientes aquá ticos, de salinida‑ das bacias do Gondwana. Tais mudanças es‑
de variada. tã o diretamente relacionadas aos câ mbios
Contudo, somente com esporos e climá ticos do Gondwana Ocidental, com im‑
com grã os de pó len foi possı́vel a formulaçã o pactos nas comunidades vegetacionais. Com
de palinozonas, de modo contı́nuo, abran‑ efeito, variaçõ es composicionais nas associa‑
gendo parte parte da SGI. Tais palinomorfos çõ es de esporos e de grã os de pó len sã o re‑
constituem parte do aparelho reprodutor das gistradas na sucessã o estratigrá ica, ao longo
plantas avasculares e vasculares terrestres, do tempo, com representantes de plantas de
representadas por brió itas, por licó itas, ecossistemas glaciais, interglaciais, pó s‑glaci‑
pteridó itas, gimnospermas e angiospermas. ais e á ridos, de modo compatı́vel com os
Durante o intervalo Pennsilvaniano‑Permia‑ achados de macro itofó sseis (vide Holz et al.,
no, todos esses grupos de plantas estiveram 2010).
presentes em diversos ecossistemas do pla‑ Desta forma, esporos e grã os de pó ‑
neta, exceto o ú ltimo, cujos primeiros regis‑ len foram pioneiramente utilizados, de forma
tros datam do Mesozoico. Embora esporos e sistemá tica, nas diversas bacias paleozoicas
grã os de pó len sejam produzidos em grandes brasileiras, para a determinaçã o de palinozo‑
quantidades, apenas uma pequena parcela nas, com a inalidade maior de: (i) fornecer
destes cumpre, de fato, o seu papel na produ‑ dataçõ es relativas; e (ii) permitir a correla‑
çã o de novas plantas. A maioria é incorpora‑ çã o lateral das camadas. Neste contexto, o
da aos ambientes deposicionais, resultando ensaio palinoestratigrá ico de Daemon et al.
em uma fraçã o dos componentes bió ticos das (1966) na Bacia do Paraná constituiu o ponto
Biocronoestratigra ia(Palinologia e Conodontes) da Supersequência Gondwana I na porção sul ... 259
Contribuições à Geologia do Rio Grande do Sul e de Santa Catarina

de partida para aprimoramentos subsequen‑ a nomenclatura da ZVc, abordando o histó ri‑


tes, em diversas escalas de amostragem, se‑ co sobre a proposiçã o e sobre as razõ es do
jam estratigrá icas, sejam geográ icas. abandono de suas subzonas.

2. 1 Palinoestratigra ia da Super‑ 2. 2 Dados palinológicos das últimas


sequência Gondwana I: breve histórico duas décadas

A proposta palinoestratigrá ica mais Diversas amostras, advindas de a lo‑


abrangente para a seçã o pennsilvaniana‑per‑ ramentos e de perfuraçõ es realizadas no RS
miana da Bacia do Paraná corresponde ao e em SC, incrementaram o documentá rio pa‑
zoneamento de Daemon & Quadros (1970), o linoló gico das unidades estratigrá icas da
qual é essencialmente baseado em amostra‑ SGI, nas ú ltimas duas dé cadas, com efeito
gens de 31 poços explorató rios da PETRO‑ nas novas concepçõ es sobre a sucessã o pali‑
BRAS, distribuı́dos do estado do Mato Grosso noestratigrá ica desta porçã o da bacia. As lo‑
ao Rio Grande do Sul. O zoneamento é com‑ calidades abordadas neste perı́odo de tempo
posto por seis intervalos informais, alguns sã o apresentadas na Tabela 1, na qual sã o
dos quais compreendem subintervalos, quais especi icadas as palinozonas. Tá xons seleci‑
sejam: intervalos G, H (subintervalos H1, H2, onados sã o apresentados nas Figuras 2 e 3,
H3), I (I1, I2+3+4), J, K e L (L1, L2, L3), estabeleci‑ alguns dos quais sã o considerados diagnó s‑
dos com base na distribuiçã o de grã os de pó ‑ ticos das zonas reconhecidas.
len monossacados e bissacados, registrados Dentre os aspectos mais relevantes,
do Grupo Itararé à Formaçã o Rio do Rasto. oriundos das novas contribuiçõ es, desta‑
Zonas locais foram determinadas, subse‑ cam‑se a abrangê ncia e o controle estrati‑
quentemente, por diversos autores, mas é so‑ grá ico minucioso. Até o inal do sé culo
mente a partir de Marques‑Toigo (1991), de passado, a maior parte dos estudos palino‑
Souza & Marques‑Toigo (2005) e de Souza ló gicos da SGI era oriunda dos nı́veis de car‑
(2006) que zonas formais foram propostas, vã o da Formaçã o Rio Bonito, no RS e em SC.
incluindo reaná lises de materiais de Daemon Na ú ltima dé cada do sé culo XX, as pesquisas
& Quadros (1970), correspondendo a uma palinoló gicas nas unidades da SGI na porçã o
nova fase, caracterizada pela ampliaçã o e pe‑ nordeste da bacia receberam grande impul‑
la integraçã o dos dados. so, resultando na descriçã o de centenas de
De acordo com Souza & Marques‑Toi‑ nı́veis amostrados (sı́ntese em Souza, 2006).
go (2005) e com Souza (2006), quatro pali‑ Já nas ú ltimas duas dé cadas, houve enfoque
nozonas foram reconhecidas na SGI, em na porçã o sul da bacia, com amostragens
ordem estratigrá ica ascendente: Zona Ah‑ sistemá ticas em todas as unidades litoestra‑
rensisporites cristatus (ZAc), Zona Crucisacci‑ tigrá icas, com efeito na ampliaçã o do co‑
tes monoletus (ZCm), Zona Vittatina costabilis nhecimento palinoló gico. Desse modo,
(ZVc) e Zona Lueckisporites virkkiae (ZLv). As associaçõ es palinoló gicas iné ditas foram
duas primeiras zonas só foram reconhecidas constatadas no Grupo Itararé , em SC (Gandi‑
nas porçõ es basal e intermediá ria do Grupo ni et al., 2007; Valdez Buso et al., 2020), e
Itararé , desde Santa Catarina (em subsuper‑ nas formaçõ es Serra Alta, Teresina e Rio do
fı́cie), até o Mato Grosso, enquanto as duas Rasto (Mori, 2010; Mori & Souza, 2010,
ú ltimas (ZVc e ZLv) foram amplamente ras‑ 2012; Avelino, 2015; di Pasquo et al., 2018),
treadas em toda a á rea da bacia. Souza et al. em ambos os estados, alé m de resultados
(2021) apresentam uma breve sı́ntese sobre iné ditos de Mafra (SC), em nı́veis associados

260 Edição da Sociedade Brasileira de Geologia – Núcleo RS/SC


Souza et al.

Tabela 1 ‒ Sı́ntese das informaçõ es palinoló gicas, publicadas nas ú ltimas duas dé cadas, sobre as unidades da
Supersequê ncia Gondwana I nos estados do Rio Grande do Sul e de Santa Catarina. Abreviaçõ es: ZLv: Zona
Lueckisporites virkkiae; e ZVc: Zona Vittatina costabilis.

aos registros dos primeiros elementos cono‑ ré e aos da Formaçã o Rio Bonito, podendo
dontes documentados para a Bacia do Para‑ alcançar, em alguns raros casos, nı́veis basais
ná . da Formaçã o Palermo. A ZLv ocorre, de for‑
ma consistente, nas formaçõ es Palermo e
2. 3 Distribuição estratigrá ica e carac‑ Irati. Contudo, somente nos ú ltimos anos,
terísticas gerais das palinozonas tem sido veri icada, mais frequentemente,
nos nı́veis superiores, correspondentes à s
Os intervalos G a H2, de Daemon &
formaçõ es Serra Alta, Teresina e Rio do Ras‑
Quadros (1970), correspondentes, indistin‑
to (membro basal), como resultado do esfor‑
tamente, à s zonas ZAc e ZCm, de Souza
ço sistemá tico de amostragem e de aná lise
(2006), foram identi icados somente no Gru‑
(Mori & Souza, 2012; Avelino, 2015; di Pas‑
po Itararé em subsuperfı́cie, relativamente
quo et al., 2018; Bender et al., 2021).
aos poços 2‑MR‑1‑SP, no extremo norte do
A ZVc foi objeto de aná lise por Souza
RS, e 1‑PA‑1‑SC, 2‑LA‑1‑SC, 1‑BN‑1‑SC, 2‑TG‑
et al. (2021), com nova caracterizaçã o e no‑
1‑SC e 1‑TP‑1‑SC, em SC. Em superfı́cie, a zo‑
vo posicionamento geocronoló gico. De acor‑
na ZVc foi amplamente diagnosticada em
do com os trabalhos originais de proposiçã o
ambos os estados, em nı́veis litoestratigra i‑
(Souza & Marques‑Toigo, 2005) e com esta
camente correspondentes ao do Grupo Itara‑

Biocronoestratigra ia(Palinologia e Conodontes) da Supersequência Gondwana I na porção sul ... 261


Contribuições à Geologia do Rio Grande do Sul e de Santa Catarina

Figura 2 ‒ Fotomicrogra ias de palinomorfos selecionados, ocorrentes na Zona Vittatina costabilis: A)


Punctatisporites gretensis (Lâ mina MP‑P 3163C, coordenada England Finder N39‑4); B) Cannanoropollis janakii
(MP‑Pd 0060, M42‑2); C) Stellapollenites talchirensis (MP‑P 5170, O43); D) Vallatisporites arcuatus (MP‑P
3228, G42); E) Caheniasaccites lavatus (MP‑P 5171, C30); F) Potonieisporites neglectus (MP‑Pd 0052, L48); G)
té trade de Lundbladispora riobonitensis (MP‑P 3223C, E39‑2); H) Vittatina costabilis (MP‑P 5133, E23‑1); e I)
Protohaploxypinus goraiensis (IG‑P‑197A, H38). MP‑P e MP‑Pd: Palinoteca do Museu de Paleontologia do
Departamento de Paleontologia e Estratigra ia do IG/UFRGS (escala = 20 μm).

ú ltima concepçã o, trata‑se de uma zona de tes con luens, de Stellapollenites talchirensis e
intervalo, com limite inferior marcado pelo de Illinites unicus, embora, quantitativamen‑
primeiro aparecimento de diversas espé cies te, estas sejam pouco abundantes. Grã os de
de Vittatina (V. costabilis, V. saccata, V. wo‑ pó len monossacados, de simetrias radial e
dehousei, V. subsaccata, V. vittifera, V. corruga‑ bilateral, constituem os elementos mais co‑
ta) e de Protohaploxypinus (P. goraiensis, P. muns, principalmente, representados pelas
hartii), acompanhadas de Converrucosispori‑ espé cies dos gê neros Cannanoropollis, Plica‑

262 Edição da Sociedade Brasileira de Geologia – Núcleo RS/SC


Souza et al.

Figura 3 ‒ Fotomicrogra ias de palinomorfos selecionados, ocorrentes na Zona Lueckisporites virkkiae: A)


Laevigatosporites vulgaris (Lâ mina MP‑P 14612, coordenada England Finder P33‑1); B) Plicatipollenites
malabarensis (MP‑P 28, S35); C) Limitisporites latus (MP‑P 14608, P40); D) Thymospora thiessenii (MP‑P 14611,
R32‑1); E) Vittatina subsaccata (MP‑P 5133, U23‑1); F) Lunatisporites variesectus (MP‑P 5138, Q55); G)
Weylandites lucifer (MP‑P 5133, M24); H) Lueckisporites virkkiae (MP‑P 5146, G33‑3); e I) Staurosaccites
cordubensis (MP‑P 5133, H27). MP‑P e MP‑Pd: Palinoteca do Museu de Paleontologia do Departamento de
Paleontologia e Estratigra ia do IG/UFRGS (escala = 20 μm).

tipollenites, Caheniasaccites e Potonieispori‑ carvõ es da Formaçã o Rio Bonito.


tes, que podem atingir até 60% das associa‑ O limite superior da ZVc com a ZLv é
çõ es. Dentre os esporos, destacam‑se caracterizado pelo aparecimento consistente
espé cies dos gê neros Punctatisporites, Leio‑ de diversos tá xons de grã os de pó len bissaca‑
triletes, Horriditriletes, Vallatisporites, Crista‑ dos teniados, poliplicados e precolpados,
tisporites e Lundbladispora, os quais podem com destaque para as espé cies do gê nero Lu‑
alcançar de 80% a 90% das associaçõ es nos eckisporites (L. virkkiae, L. stenotaeniatus, L.

Biocronoestratigra ia(Palinologia e Conodontes) da Supersequência Gondwana I na porção sul ... 263


Contribuições à Geologia do Rio Grande do Sul e de Santa Catarina

nyakapendensis), Lunatisporites (L. variesec‑ na marinha de Eurydesma).


tus), acompanhadas de Staurosaccites cordu‑ Para as associaçõ es consideradas
bensis, de Corisaccites alutas, de Weylandites pennsilvanianas, poucos tá xons guias, de
lucifer e de Marsupipollenites striatus, entre maior abrangê ncia, em termos das bacias do
outros. Embora estes tá xons tenham sido Gondwana, foram veri icados, tais como as
noticiados na ZVc de forma pontual e escas‑ espé cies de esporo Ahrensisporites cristatus,
samente representados, somente na ZLv Psomospora detecta e Cristatisporites me‑
passam a ser registrados nas associaçõ es de nendezii, caracterı́sticos da ZAc. A distribui‑
modo mais frequente e mais numeroso, çã o destes varia de bacia para bacia,
quantitativamente. incluindo ocorrê ncias na base do Permiano.
Na ZLv, os grupos representados pe‑ Por outro lado, o padrã o de distribuiçã o dos
las referidas espé cies de grã os de pó len teni‑ principais grupos de esporomorfos confere
ados, poliplicados e precolpados passam a importante assinatura bioestratigrá ica à s
constituir mais de 70% das associaçõ es, en‑ bacias do Gondwana, geralmente, com do‑
quanto esporos triletes e grã os de pó len mo‑ minâ ncia de grã os de pó len monossacados,
nossacados e bissacados nã o teniados sã o de simetria radial e bilateral, atribuı́dos aos
mais raros. Esporos monoletes sã o expressi‑ gê neros Cannanoropollis, Plicatipollenites,
vos em determinados nı́veis das formaçõ es Caheniasaccites e Potonieisporites. Grã os de
Serra Alta, Teresina e Rio do Rastro, con ir‑ pó len teniados sã o pouco abundantes, en‑
mando constataçõ es pré vias em perfuraçõ es quanto a ocorrê ncia dos primeiros poliplica‑
no vizinho estado do Paraná (Neregato et al., dos do gê nero Vittatina é pontualmente
2008), com destaque para espé cies dos gê ‑ registrada. Esses padrõ es sã o veri icados
neros Laevigatosporites e Thymospora. nas zonas ZAc e ZCm e nas associaçõ es
pennsilvanianas de diversas partes do
3 CALIBRAÇÃO BIOCRONOESTRATIGRÁ‑ Gondwana (vide Fé lix et al., 2007; Stephen‑
FICA son, 2008).
Determinados tá xons foram utiliza‑
3. 1 Palinologia dos, para a atribuiçã o de idades permianas a
algumas palinozonas, tais como Converruco‑
As idades apontadas para os interva‑
sisporites con luens e Vittatina costabilis, pa‑
los e para os subintervalos propostos por
ra a ZVc, uma vez que a maior parte das
Daemon & Quadros (1970) foram baseadas,
ocorrê ncias destas espé cies no Gondwana
em sua maior parte, na comparaçã o com as‑
estava associada a depó sitos, datados a par‑
sembleias norte‑americanas e euroasiá ticas,
tir da base do Cisuraliano. A maioria dos tá ‑
tendo em vista a escassez de conhecimentos
xons guias da ZLv, representada por uma
sobre as associaçõ es do Gondwana. Para os
grande diversidade de grã os de pó len tenia‑
mesmos ins, Souza & Marques‑Toigo (2005)
dos, poliplicados e precolpados, é conheci‑
e Souza (2006) utilizaram, como crité rios: (i)
da, por sua vez, a partir do inal do
o comportamento geral da sucessã o de de‑
Cisuraliano, embora primeiros registros te‑
terminados morfogrupos de esporomorfos;
nham sido veri icados, pontualmente, em
(ii) as poucas dataçõ es absolutas disponı́veis
idades mais antigas, ainda no Permiano. A
para a Bacia do Paraná e para as bacias vizi‑
partir do ano 2000, evidencia‑se progressi‑
nhas, na Africa e na Amé rica do Sul; e (iii)
vo efervescer de uma nova fase no posicio‑
correlaçõ es com eventos transgressivos ma‑
namento geocronoló gico da Bacia do
rinhos, de alcance intercontinental (e.g. fau‑
Paraná , com o aprimoramento das dataçõ es
264 Edição da Sociedade Brasileira de Geologia – Núcleo RS/SC
Souza et al.

radiomé tricas (U‑Pb em zircõ es vulcanogê ni‑ ram encontrados, em 2008, em depó sitos do
cos) e de novos achados de grupos potencial‑ A loramento Campaleo (Folhelho Lontras),
mente ú teis dos estratotipos da coluna do Grupo Itararé , no municı́pio de Mafra (SC)
padrã o internacional (conodontes). (Scomazzon et al., 2013), preservados como
clusters e como assembleias naturais, consti‑
3. 2 Conodontes tuindo as primeiras ocorrê ncias de aparelhos
alimentares completos em bacias sedimenta‑
Conodontes sã o vertebrados primiti‑ res da Amé rica Latina (Wilner et al., 2016).
vos, que viveram nos mares, do Paleozoico Caracterı́sticas da morfologia dos elementos
ao Triá ssico. A preservaçã o do animal cono‑ P1 auxiliaram na identi icaçã o do gê nero Me‑
donte é extremamente rara, por ser compos‑ sogondolella, atribuı́da a Mesogondolella spp.,
to, eminentemente, de material orgâ nico. superfamı́lia Gondolelloidea, podendo ser re‑
Desta forma, o que é encontrado, principal‑ lacionada à s biozonas Mesogondolella bella‑
mente, sã o os denominados elementos co‑ dontae e M. bisselli, do Cisuraliano,
nodontes, correspondentes a peças bucais, respectivamente, Asseliano‑Artinskiano, para
de fosfato de cá lcio, isoladas como bioclastos provı́ncias temperadas, correlata à biozona
em sedimentos carboná ticos, em margas e Sweetognathus whitei, e para provı́ncias
em folhelhos (á guas quentes) e siliciclá sticos equatoriais (Henderson, 2018). Esta atribui‑
(á guas frias e temperadas). Compreendem çã o bioestratigrá ica corrobora a idade iso‑
tá xons marcadores da carta geocronoló gica crô nica Rb/Sr em rocha total, de 287 + 10 Ma
internacional dos andares do Cambriano ao (Koester et al., 2016), advinda do mesmo nı́‑
Triá ssico, extremamente ú teis no zoneamen‑ vel de ocorrê ncia dos espé cimes de Mesogon‑
to bioestratigrá ico, na correlaçã o e na inter‑ dolella do A loramento Campaleo.
pretaçã o paleoambiental das bacias No Carbonı́fero, particularmente, de‑
sedimentares paleozoicas e triá ssicas. Nos vido à formaçã o da Pangea e à glaciaçã o no
ú ltimos 20 anos, també m tê m sido utilizados Gondwana, diferentes padrõ es de zoneamen‑
como importante ferramenta, auxiliando em tos sã o utilizados para os hemisfé rios leste e
estudos isotó picos. oeste, ou seja, para a Eurá sia e para as á reas
Trata‑se de um grupo amplamente a ins, a leste, versus Amé rica, a oeste. Nas ú l‑
registrado e estudado nos depó sitos do timas trê s dé cadas, a sucessã o de conodon‑
Pennsilvaniano e do Permiano do hemisfé rio tes, embora com algum grau de
norte, especialmente, na Amé rica do Norte, provincialismo, tornou‑se a ferramenta mais
na Europa, na Rú ssia e na China. No hemisfé ‑ con iá vel, para a calibraçã o e para a de iniçã o
rio sul, as ocorrê ncias sã o menos numerosas, de limites geocronoló gicos, tanto desse pe‑
com documentaçã o na Bolı́via, na Austrá lia, rı́odo quanto dos subperı́odos Mississipiano
na Nova Zelâ ndia e no Timor. No Brasil, tê m e Pennsilvaniano, com base nos eventos de
sido estudados, desde a dé cada de 1960, com primeiros aparecimentos (FADs) de Shipho‑
vá rios trabalhos publicados sobre as bacias nodella sulcata e de Declinognathodus noduli‑
do Amazonas, do Solimõ es e do Parnaı́ba, a ferus, respectivamente, para os limites
partir de carbonatos pennsilvanianos, de Devoniano/Carbonı́fero e Mississipiano/
á guas rasas e quentes, recuperados como Pennsilvaniano. O Pennsilvaniano foi subdivi‑
elementos isolados, conforme sintetizado em dido, segundo o sistema internacional, em
Scomazzon et al. (2016), alé m de ocorrê ncias Bashkiriano, em Moscoviano, em Kasimovia‑
mais pontuais na Bacia do Acre. no e em Gzheliano, com base nos importan‑
Na Bacia do Paraná , conodontes fo‑ tes gê neros de conodontes Declinognathodus,

Biocronoestratigra ia(Palinologia e Conodontes) da Supersequência Gondwana I na porção sul ... 265


Contribuições à Geologia do Rio Grande do Sul e de Santa Catarina

Neognathodus, Idiognathodus e Streptog‑ menos ao redor do equador, e pelo apareci‑


nathodus, respectivamente, dos andares mais mento de elementos de á guas frias, como Me‑
inferiores para os mais superiores (Davydov sogondolella bisselli, no sul do Gondwana, em
et al., 2012). regiõ es como a Austrá lia e a Nova Zelâ ndia.
O Cisuraliano é dividido em andares, Assim, a presença de Mesogondolella
com base nos FADs de trê s linhagens especı́ i‑ na sequê ncia superior do Grupo Itararé apon‑
cas de conodontes. No primeiro, base do Per‑ ta idade asseliana‑sakmariana para o Folhe‑
miano, as zonas do Asseliano sã o lho Lontras, fornecendo evidê ncias
determinadas, de acordo com a ocorrê ncia de importantes, para a calibraçã o da idade da
vá rias espé cies de Streptognathodus, assim SGI e para as discussõ es paleogeográ icas e
como no Pennsilvaniano inal. Espé cimes des‑ climá ticas, associadas à deglaciaçã o do
se gê nero se tornam progressivamente raras e Gondwana na regiã o.
menos difundidas, apó s o inı́cio do Sakmaria‑
no, e sã o extintas no Sakmariano mé dio. O 3. 3 Idades absolutas
Sakmariano é de inido pela linhagem de Me‑
sogondolella e o Artinskiano e o Kunguriano Curiosamente, també m nas ú ltimas
sã o baseados na linhagem de Sweetognathus e duas dé cadas, intervalo temporal abordado
de seu descendente, Neostreptognathodus nesta revisã o, zircõ es oriundos de depó sitos
(Henderson, 2018). vulcanogê nicos foram amplamente utilizados
E importante considerar que, durante para dataçõ es radiomé tricas U Pb de alta re‑
o Asseliano e o Sakmariano, o sul do Gondwa‑ soluçã o, visando à calibraçã o geocronoló gica
na ainda tinha in luê ncia da glaciaçã o. Os co‑ dos depó sitos de diversas partes do Gondwa‑
nodontes do Permiano mostram uma na, especialmente, da Austrá lia, da Amé rica
distribuiçã o cosmopolita, principalmente, do Sul e da Africa. Na porçã o mais ocidental
con inada à s á reas tropicais, e o provincialis‑ do Gondwana, os zircõ es selecionados sã o
mo é indicado, apenas, por elementos endê ‑ provenientes, principalmente, de cinzas vul‑
micos, menos comuns, como os câ nicas e de tonsteins (cinzas alteradas), cuja
gondolellı́deos, no norte e no sul do Pangea. gê nese é atribuı́da à Provı́ncia Ignea de
Durante o Artinskiano, com a movimentaçã o Choiyoi, no Bloco San Rafael, localizado entre
do Pangea, as geleiras desapareceram e, como o oeste argentino e o sudeste chileno. Tais da‑
resultado, ocorre o aquecimento global, taçõ es estã o diretamente relacionadas a este,
acompanhado por uma transgressã o marinha que é considerado um dos eventos magmá ti‑
mundial, e os remanescentes carbonı́feros, cos mais duradouros do oeste do Gondwana,
como Streptognathodus e Adetognathus, foram envolvendo dezenas de milhõ es de anos,
extintos. Posteriormente, uma fauna cosmo‑ aproximadamente, desde o inal do Carbonı́‑
polita, dominada por Sweetognathus whitei e fero, até o Triá ssico (vide Rocha‑Campos et
por Mesogondolella bisselli, ocorre amplamen‑ al., 2011).
te, como fauna de sobrevivê ncia. Esse evento Dessa forma, as determinaçõ es radio‑
foi denominado crise do Permiano Inferior mé tricas obtidas na Amé rica do Sul (Argenti‑
(Henderson, 2018). O provincialismo, nesse na, Bolı́via, Brasil, Uruguai) e na Africa
momento, estava em um está gio inicial de di‑ (Namı́bia, Africa do Sul), a partir de distintas
ferenciaçã o, em uma provı́ncia tropical de té cnicas, tais como Ar‑Ar, Rb‑Sr e U‑Pb con‑
á guas quentes e em duas provı́ncias tempera‑ vencional, e de distintos mé todos analı́ticos
das bipolares, como indicado pela distribui‑ (e.g. CA‑TIMS, SHRIMP, IDTIMS, LA‑MC‑ICP‑
çã o de Sweetognathus bucaramangus, mais ou MS) trouxeram novos horizontes ao posicio‑
266 Edição da Sociedade Brasileira de Geologia – Núcleo RS/SC
Souza et al.

namento geocronoló gico das seçõ es Carbo‑ maçã o Rio Bonito. A ZLv é considerada de
nı́feras e Permianas desta parte do Gondwa‑ idade entre o inal do Artinskiano e o Guada‑
na (vide Gulbranson et al., 2010; Cé sari et al., lupiano mé dio (considerando ocorrê ncias de
2011; Cagliari et al., 2014; Grif is et al., 2018; outros fó sseis, conforme Holz et al., 2010). As
Rocha‑Campos et al., 2019). Consequente‑ dataçõ es radiomé tricas, obtidas para a For‑
mente, as associaçõ es fó sseis tê m sido obje‑ maçã o Irati, convergem para uma idade Kun‑
tivo de novas aná lises e de novas guriana.
interpretaçõ es sobre as idades e sobre a du‑ Contudo, algumas questõ es ainda
raçã o das biozonas. Cé sari (2007), Stephen‑ permanecem controversas, carentes de me‑
son (2008) e Cé sari et al. (2011) lhor aprofundamento, tais como se as poucas
apresentaram importantes sı́nteses sobre o idades absolutas obtidas para o topo do Gru‑
tema, com ê nfase nas idades atribuı́das à s po Itararé , no RS ( inal do Pennsilvaniano),
palinozonas e no potencial de correlaçã o en‑ poderiam ser aplicadas generalizadamente
tre os vá rios setores do Gondwana. Para a para toda a extensã o da bacia. Em Daemon &
Bacia do Paraná , a reavaliaçã o realizada por Quadros (1970), é indicada uma correlaçã o
Souza et al. (2021) traz novas concepçõ es a lateral entre o topo do Grupo Itararé e a base
esse respeito, incorporando os dados radio‑ da Formaçã o Rio Bonito, o que implica con‑
mé tricos e discutindo, particularmente, a ca‑ temporaneidade entre a fase terminal da gla‑
racterizaçã o e a distribuiçã o estratigrá ica da ciaçã o e a deposiçã o de fá cies pó s‑glaciais em
Zona Vittatina costabilis, reconhecida no determinadas partes da bacia. Sem dú vida,
Grupo Itararé e na Formaçã o Rio Bonito, em sã o temas de interesse estratigrá ico, cuja re‑
seu setor sul. soluçã o exige a integraçã o de mú ltiplas ferra‑
Os estratos do Grupo Itararé , porta‑ mentas de aná lise. Na Figura 4, é apresentada
dores das idades das palinozonas basais da uma sı́ntese sobre o posicionamento geocro‑
SGI (ZAc e ZCm), permanecem desprovidos noló gico das palinozonas, considerando as
de dataçõ es de alta resoluçã o, sendo posicio‑ idades absolutas disponı́veis, conforme deta‑
nados no Pennsilvaniano, ocupando está gios lhadamente apresentado em Souza et al.
mais antigos, entre o Bashkiriano e o Kasi‑ (2021).
moviano. A porçã o superior do Grupo Itararé
no RS possui apenas uma localidade com da‑ 4 CONSIDERAÇÕES FINAIS
taçã o absoluta de alta precisã o, de idade
A revisã o do conhecimento palinoló ‑
Gzheliana (Cagliari et al., 2020). Neste caso, a
gico da SGI nesta porçã o da Bacia do Paraná
ZVc é indicada por inferê ncia, tendo em vista
permite ressaltar alguns aspectos, os quais
que somente esta palinozona foi reconhecida
incluem a constataçã o de avanços e de desa i‑
nesta unidade litoestratigrá ica, no RS.
os para as pesquisas subsequentes.
Por outro lado, a maior parte das da‑
Até o inal do sé culo passado, a maior
taçõ es radiomé tricas, incluindo algumas de
parte dos dados palinoló gicos era advinda
alta precisã o, sã o advindas dos nı́veis de car‑
das camadas de carvã o e dos nı́veis associa‑
vã o e de estratos, relacionados à Formaçã o
dos da Formaçã o Rio Bonito, vinculados à
Rio Bonito, no RS, a maioria das quais tem
pesquisa explorató ria deste recurso mineral.
informaçõ es palinoló gicas relativas à ZVc.
Nas ú ltimas duas dé cadas, veri icou‑se maior
Conforme sintetizado em Souza et al. (2021),
atençã o aos depó sitos pós‑Rio Bonito, com
uma idade Gzheliana‑Artinskiana é indicada
expressivos resultados nas unidades do Gru‑
para a ZVc, com duraçã o de ca. 20 Ma, in‑
po Passa Dois, cujos registros palinoló gicos
cluindo o topo do Grupo Itararé e toda a For‑
Biocronoestratigra ia(Palinologia e Conodontes) da Supersequência Gondwana I na porção sul ... 267
Contribuições à Geologia do Rio Grande do Sul e de Santa Catarina

eram representados por associaçõ es pontu‑ perfuraçõ es.


ais e pouco abundantes. Alé m disso, os estu‑ Tendo em vista o progressivo aumen‑
dos foram signi icativamente ampliados no to das dataçõ es absolutas de alta precisã o, o
estado de SC, com descriçõ es de diversas as‑ registro das associaçõ es fossilı́feras nas ca‑
sociaçõ es iné ditas. Considerando o nú mero madas relacionadas é estraté gico, a im de
reduzido de palinomorfos registrado nas se‑ permitir a calibraçã o biocronoestratigrá ica
çõ es correspondentes à s zonas ZAc e ZCm, das biozonas. Os dados pioneiros de cono‑
identi icadas em subsuperfı́cie no RS e em dontes na Bacia do Paraná abrem uma nova
SC, e a delimitaçã o indistinta dos intervalos e fronteira para outros achados, tendo em vista
de subintervalos, ali esboçada, recomenda‑ o alto grau de resoluçã o biocronoestratigrá i‑
se maior esforço no levantamento e na re‑ ca deste grupo de microfó ssil, em nı́vel mun‑
descriçã o das associaçõ es contidas naquelas dial.

Figura 4 ‒ Distribuiçã o quantitativa dos principais grupos de esporomorfos na Supersequê ncia Gondwana I,
palinoestratigra ia e idades (modi icado de Souza et al., 2021).

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Biocronoestratigra ia(Palinologia e Conodontes) da Supersequência Gondwana I na porção sul ... 271


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Contribuições à Geologia do Rio Grande do Sul e de Santa Catarina

2016. Associaçõ es naturais de conodontes


Mesogondolella spp., Grupo Itararé , Cisuralia‑
no da Bacia do Paraná . GAEA, 9(1): 30‑36.

272 Edição da Sociedade Brasileira de Geologia – Núcleo RS/SC


Macro‑charcoal como indicador
de incêndios em turfeiras permianas
no Sul da Bacia do Paraná
Margot Guerra‑Sommer1*, Isabela Degani‑Schmidt1, André Jasper2,
José Rafael Wanderley Benício2, Miriam Cazzulo‑Klepzig1

1
Programa de Pó s‑Graduaçã o em Geociê ncias, Universidade Federal do Rio Grande do Sul
2
Programa de Pó s‑Graduaçã o em Ambiente e Desenvolvimento, Universidade do Vale do Taquari

* autor correspondente: margot.sommer@ufrgs.br

1 INTRODUÇÃO
Evidê ncias de incê ndios vegetacionais, inferidas pela ocorrê ncia de fragmentos de char‑
coal e de macerais do grupo das inertinitas, tê m sido registradas, com maior ou com menor
frequê ncia, em depó sitos sedimentares desde o Siluriano, com o advento das primeiras plantas
de ambientes terrestres, indicando a presença de fogo em uma escala global nos ú ltimos 400 mi‑
lhõ es de anos (Preston & Schmidt, 2006; Glasspool & Scott, 2010).
Alé m da in luê ncia das variaçõ es climá ticas, os nı́veis de O2 atmosfé rico (pO2) foram um
forte determinante das atividades de incê ndio, em diferentes intervalos geoló gicos. As primeiras
plantas terrestres do Siluriano, principalmente herbá ceas, já eram passı́veis de igniçã o, mas o fo‑
go só se tornou frequente no Devoniano, quando as folhas e os caules lenhosos se tornaram mais
complexos, sendo formados por tecido condutor especializado (Glasspool & Scott, 2010).
A alta representaçã o global de charcoal em camadas de carvã o e em sedimentos a elas
associados nas faixas tropicais, durante o Mississipiano‑Pensilvaniano, no continente Euroame‑
ricano, indicou que incê ndios foram intensos e frequentes, nesse intervalo. Isso poderia estar as‑
sociado aos altos nı́veis estimados de pO2 (28%), em relaçã o aos ı́ndices atuais (21%) (Fig. 1), o
que teria potencializado a combustã o do material vegetal, sob altas temperaturas e sob chuvas
moderadas (Glasspool & Scott, 2010).
As turfeiras tê m sido utilizadas como indicadores de alteraçõ es climá ticas globais, por
serem repositó rios de dados climá ticos preté ritos, contribuindo para o sequestro global de car‑
bono, funcionando como reservató rios de á gua e abrigando biodiversidades endê micas. As altas
taxas de acumulaçã o de material orgâ nico autó ctone ou hipoautó ctone e a sensibilidade hidro‑
Contribuições à Geologia do Rio Grande do Sul e de Santa Catarina

Figura 1 ‑ Evoluçã o dos sistemas de incê ndios do Neopaleozoico. O cá lculo das curvas de oxigê nio foi baseado
em teores de inertinita, em carvõ es agrupados a cada 10 milhõ es (linha preta) e a cada 15 milhõ es (tracejado
vermelho) de anos (adaptado de Glasspool et al., 2015).

climá tica (in luê ncia do clima sobre os cor‑ pó s‑glaciais e, no topo da sequê ncia permia‑
pos d’á gua continentais) guardam informa‑ na, em fases regressivas, de tendê ncia conti‑
çõ es relacionadas à dinâ mica da maté ria nental (p. ex., Jasper et al., 2011a, 2011b;
orgâ nica, à evoluçã o das paisagens, a mu‑ Degani‑Schmidt et al., 2015; Manfroi et al.,
danças climá ticas e aos ciclos de poluiçã o at‑ 2015; Benı́cio et al., 2019a, 2019b).
mosfé rica locais, regionais e globais. Esses Investigaçõ es em camadas de carvã o
sistemas fornecem um registro de inú meros e em sedimentos associados, em diferentes
indicadores (proxies), de origem bió tica e jazidas da Bacia do Paraná , suscitaram hipó ‑
abió tica, dos quais é possı́vel extrair infor‑ teses de que incê ndios lorestais poderiam
maçõ es para as reconstruçõ es ambientais (p. ter sido eventos recorrentes nestes ambien‑
ex., Van Hoof et al., 2008; Couwenberg et al., tes, incluı́dos em cinturõ es temperados, em
2011). que, potencialmente, prevaleceriam condi‑
A ocorrê ncia de incê ndios vegetacio‑ çõ es sempre ú midas (Jasper et al., 2011a;
nais no Permiano, durante aproximadamen‑ Degani‑Schmidt et al., 2015; Benı́cio et al.,
te 150 milhõ es de anos de domı́nio da Flora 2019a). Todavia, a presença de grandes
Glossopteris, no sul da Bacia do Paraná , pale‑ quantidades de inertinita e de charcoal em
ogeogra icamente localizada em latitudes carvõ es permianos do Gondwana, em cintu‑
temperadas, tem sido documentada, em di‑ rõ es climá ticos temperados, foi atribuı́da,
ferentes ambientes, representados por fá cies por Glasspool (2003), a diferentes fatores
periglaciais, bem como por fá cies relaciona‑ atuantes durante a deposiçã o das turfeiras,
das a ambientes de turfeiras luviopará licas tais como exposiçã o subaé rea, deposiçã o em
274 Edição da Sociedade Brasileira de Geologia – Núcleo RS/SC
Guerra‑Sommer et al.

clima frio e atividade fú ngica. As aná lises desenvolvidas por Degani‑
Dessa forma, na tentativa de encon‑ Schmidt et al. (2015) foram realizadas, espe‑
trar respostas a evidê ncias de possı́veis ocor‑ ci icamente, nas interfaces da camada de car‑
rê ncias de incê ndios em ambientes de vã o superior (S) com uma camada intercalada
turfeiras desenvolvidas em latitudes tempe‑ de tonstein (Fig. 3A), datada de 285,42 + 1,2 /
radas, no intervalo Sakmariano‑Artinskiano ‑2,1 Ma, correspondente ao Artinskiano (Grif‑
do Gondwana sul‑brasileiro, aná lises detalha‑ is et al., 2018). O tonstein corresponde à de‑
das, de cunho anatô mico e geoquı́mico, inte‑ posiçã o de cinza vulcâ nica sobre a turfeira
graram‑se a estudos pré vios, de cunhos (Simas et al., 2013) e representa um evento
sedimentar, palinoló gico e paleobotâ nico, geologicamente instantâ neo (Prothero, 1990;
conduzidos em amostras provenientes de ja‑ DiMichele & Falcon‑Lang, 2011). Com espes‑
zidas de carvã o do sul da Bacia do Paraná (p. sura mé dia de 10 cm, o tonstein conté m uma
ex., Jasper et al., 2011a, 2011b; Degani‑Sch‑ associaçã o bem preservada de itofó sseis da
midt et al., 2015; Benı́cio et al., 2019a). Flora Glossopteris (Guerra‑Sommer, 1988). A
Esses estudos, utilizando té cnicas di‑ macro lora, preservada como compressõ es
versas (microscopia eletrô nica de varredura carboni icadas, é predominantemente gim‑
(MEV) e microscopia ó tica de luz transmitida nospé rmica, e as folhas de glossopterı́deas
e de luz incidente com luorescê ncia), de‑ correspondem a 78% da associaçã o (Guerra‑
monstraram a e iciê ncia do charcoal como Sommer, 1992; Boardman et al., 2012).
proxy para inferir correlaçõ es entre os even‑ A ocorrê ncia de charcoal e de inerti‑
tos de incê ndio, os diferentes fatores climá ti‑ nitas em turfeiras permianas, no estado de
cos e, també m, os ı́ndices de O2 atmosfé rico Santa Catarina, foi registrada por Benı́cio et
vigentes durante a deposiçã o de turfeiras no al. (2019a), no a loramento Porongos (Fig. 2)
sul da Bacia do Paraná , no intervalo Sakmari‑ localizado no municı́pio de Lauro Mü ller (28°
ano‑Artinskiano. Os resultados integrados, 25' 21,4” S, 49° 26' 24,0” W). A camada de
obtidos por Degani‑Schmidt et al. (2015) e carvã o Barro Branco, ali exposta, é composta
por Degani‑Schmidt & Guerra‑Sommer por uma camada de carvã o na base (informal‑
(2016a, 2016b) na jazida de carvã o do Faxi‑ mente denominada Banco), por siltitos e por
nal (RS) e aqueles obtidos por Benı́cio et al. arenitos, intercalados com inas camadas in‑
(2019a) na camada Barro Branco da jazida termediá rias de carvã o (informalmente deno‑
Santa Catarina (SC), aqui sintetizados, de‑ minadas Coringa ou Quadraçã o) e uma
monstram a efetividade das aná lises. camada carboná cea, de espessura variá vel, na
parte superior (informalmente chamada For‑
2 SÍNTESE GEOLÓGICA ro). Esta camada tem uma distribuiçã o geo‑
grá ica ampla e contı́nua, com espessura
A jazida de carvã o do Faxinal (Fig. 2), mé dia variando de 1,66 m a 2,27 m.
incluı́da na supersequê ncia Gondwana I, de i‑ Dataçõ es absolutas nã o foram de ini‑
nida para a Bacia do Paraná por Milani et al. das para o intervalo de geraçã o de carvã o no
(2007), explorada a cé u aberto e já exaurida, estado de Santa Catarina. Holz et al. (2010)
estava localizada no cinturã o de a loramento sugeriram que estas jazidas, incluı́das no
sudeste da Formaçã o Rio Bonito, no estado Membro Sideró polis da Formaçã o Rio Bonito,
do Rio Grande do Sul (em 30° 15′ 52,6″ S, 51° em Santa Catarina e no Paraná , teriam idade
41′ 53,8″ W). O fechamento da mina ocorreu Artinskiana. Essa idade relativa está de acor‑
em 2009, apó s o esgotamento do carvã o e a do com a idade de 286 +/‑ 3 Ma (Artinskia‑
reabilitaçã o do local. no), obtida por Jurigan et al. (2019) para a
Macro‑charcoal como indicador de incêndios em turfeiras permianas no Sul da Bacia do Paraná 275
Contribuições à Geologia do Rio Grande do Sul e de Santa Catarina

jazida de carvã o de Figueira, no estado do preservabilidade no registro geoló gico, e a


Paraná , no nordeste da bacia, e está correla‑ anatomia vegetal permite identi icaçã o ta‑
cionada ao intervalo de deposiçã o da jazida xonô mica do material (Scott, 2010).
de Faxinal (285,42 + 1,2 / ‑2,1 Ma, conforme A identi icaçã o de charcoal deve
Grif is et al., 2018). atender aos seguintes requisitos, estabeleci‑
O conjunto das caracterı́sticas facio‑ dos por Scott (2010): sujar as mã os ao to‑
ló gicas indica que as turfeiras, que geraram que; ter coloraçã o preta; trazer brilho
as atuais jazidas de carvã o na Bacia do Para‑ acetinado; exibir textura quebradiça ou de
ná , desenvolveram‑se adjacentes a ambien‑ pó ; conter fraturamento em cubos de mate‑
tes estuarinos, deltaicos e, principalmente, rial lenhoso (macroscó picos) e em farpas/
costeiros, relacionados a sistemas laguna‑ ibras alongadas ou pulverizadas (microscó ‑
barreira (Holz, 2003). As comunidades vege‑ picas); mostrar anatomia preservada (ob‑
tais representantes da Flora Glossopteris, servada sob lupa de mã o ou sob
preservadas em fá cies sedimentares relacio‑ microscó pio estereoscó pico); e apresentar
nadas a esses ambientes, estariam incluı́das homogeneizaçã o da lamela mé dia com as
na faixa climá tica temperada, em latitude paredes celulares (sob MEV).
aproximada de 50°S, durante o perı́odo cli‑ Scott (2010) de iniu trê s tipos de
má tico pó s‑glacial (Ziegler et al., 2003; Lima‑ charcoal, com base nas dimensõ es dos frag‑
rino et al., 2014). Essas associaçõ es mentos. Sã o eles: 1) charcoal macroscó pico
litorâ neas foram sepultadas pela inundaçã o ‒ maiores do que 1 mm; 2) charcoal mesos‑
marinha, registrada como uma erosã o super‑ có pico ‒ entre 180 µm e 1 mm; 3) charcoal
icial transgressiva, observada no topo dos microscó pico ‒ menores do que 180 µm.
estratos que contê m carvã o (Holz et al., A maior parte do charcoal macros‑
2010). có pico (macro‑charcoal) é produzida por in‑
O intervalo de ocorrê ncia de jazidas cê ndios de superfı́cie. Geralmente,
de carvã o no sul da Bacia do Paraná foi rela‑ partı́culas menores de charcoal sã o resulta‑
cionado com a zona informal Glossopteris‑ do de incê ndios que atingem maiores tem‑
Brasilodendron, de Iannuzzi & Souza (2005), peraturas (incê ndios de dossel), ou de
enquanto as palino loras, em um conceito material queimado em subsuperfı́cie, como
mais amplo, foram incluı́das na zona Vittati‑ no caso de incê ndios em turfeiras (Scott,
na costabilis, dentro da estrutura palinoes‑ 2010).
tratigrá ica da Bacia do Paraná (Souza et al., A abundâ ncia e a re letâ ncia de ma‑
2021). cerais do grupo da inertinita, enquanto
componentes de camadas de carvã o e de ro‑
3 MÉTODOS DE IDENTIFICAÇÃO E DE chas associadas, identi icados em amostras
ANÁLISE DE CHARCOAL
analisadas em microscopia ó ptica de luz in‑
Fragmentos de charcoal sã o resquı́‑ cidente (Bustin et al., 1989), sã o indicativas
cios da combustã o incompleta de material de subprodutos de incê ndios lorestais e
vegetal, cujos compostos sã o volatilizados, sinô nimos de charcoal (Scott & Glasspool,
remanescendo um resı́duo de alto conteú do 2007).
de carbono, tornando o material vegetal me‑ Guo & Bustin (1998), Scott & Glass‑
nos biodegradá vel e promovendo sua preser‑ pool (2007) e McParland et al. (2009) de‑
vaçã o durante a diagê nese. O charcoal, por monstraram que existe correlaçã o positiva
ser inerte, caracteristicamente apresenta boa entre temperatura de formaçã o do charcoal

276 Edição da Sociedade Brasileira de Geologia – Núcleo RS/SC


Guerra‑Sommer et al.

Figura 2 ‑ Mapa de localizaçã o do a loramento Porongos (SC) e da mina do Faxinal (RS), e arcabouço
estratigrá ico da Bacia do Paraná (adaptado de Milani et al., 2007).

Figura 3 ‑ Nı́vel de ocorrê ncia de grandes fragmentos de lenhos queimados na mina do Faxinal (RS). A) Detalhe
do tonstein, intercalado na camada de carvã o S; B) Seçã o transversal de lenho queimado comprimido (Pb‑
4587A), em bloco polido, sob ó leo, com objetiva de 10x, em luz branca re letida, mostrando organizaçã o em
“sanduı́che” inertinita‑vitrinita‑inertinita (fusê nio transicional).

Macro‑charcoal como indicador de incêndios em turfeiras permianas no Sul da Bacia do Paraná 277
Contribuições à Geologia do Rio Grande do Sul e de Santa Catarina

e valor de re letâ ncia da parede celular (iner‑ com os crité rios de Scott (2010). A preser‑
tinita), o que permite estimar a temperatura vaçã o de delicadas estruturas celulares, co‑
de queima. Charcoals com valores de re le‑ mo cé lulas crivadas do loema secundá rio,
tâ ncia maiores do que 5%Ro requerem altas rati ica a conclusã o de que as temperaturas
temperaturas de queima ou prolongado tem‑ de queima se mantiveram brandas, tendo si‑
po de exposiçã o ao calor para se formarem. do altas o su iciente apenas para promover
Aqueles com re letâ ncias abaixo de 1%Ro a homogeneizaçã o da lamela mé dia com as
podem ter sido formados sob temperaturas paredes celulares (Degani‑Schmidt et al.,
entre 300 oC e 400 oC. A temperatura de mui‑ 2015).
tos tipos de incê ndios ica nesse intervalo, Aná lises petrográ icas em blocos
concluindo‑se que os charcoals produzidos polidos, sob ó leo, demonstraram que esses
por temperaturas mais baixas terã o valores grandes fragmentos comprimidos de lenhos
de re letâ ncia menores, no intervalo da semi‑ queimados apresentavam uma organizaçã o
fusinita. Logo, a re letâ ncia da fusinita é ad‑ em “sanduı́che”, em seçã o transversal (fusê ‑
quirida antes do processo de carboni icaçã o nio transicional, sensu Jones et al., 1993),
e, portanto, independe da idade, da litologia sendo compostos por uma clara sequê ncia
ou da diagê nese/ambiente geoló gico (Scott, de inertinita‑vitrinita‑inertinita (Fig. 3B). A
1989). transiçã o entre a semifusinita estruturada e
a vitrinita homogê nea é brusca e os valores
4 INCÊNDIOS EM AMBIENTES DE TUR‑ de re letâ ncia na transiçã o decrescem, des‑
FEIRAS NO ARTINSKIANO, NO SUL DA de a porçã o inferior de semifusinita (0,840‑
BACIA DO PARANÁ 0,609%Ro), até a vitrinita interna (0,554‑
0,596%Ro), aumentando novamente na
4. 1 Jazida do Faxinal (RS) transiçã o para a semifusinita superior
(0,632‑0,834%Ro). Essa transiçã o corres‑
A impressionante associaçã o de
ponde à carbonizaçã o da porçã o mais exter‑
fragmentos de ramos e de caules altamente
na dos lenhos e à carboni icaçã o da parte
comprimidos, horizontalizados, frequente‑
central, ou seja, a queima nã o atingiu o cer‑
mente superpostos, que ocorriam continua‑
ne dos lenhos, indicando que o incê ndio al‑
mente ao longo de toda a á rea da mina a cé u
cançou as plantas enquanto ainda estavam
aberto do Faxinal (ca. 1,6 km²), com dimen‑
em posiçã o de vida.
sõ es muito expressivas (40 cm de compri‑
mento ou mais), preservados no carvã o Os detalhes anatô micos preserva‑
imediatamente subjacente ao tonstein (Fig. dos nos fragmentos de lenhos queimados
3A, Fig. 4A, B, Fig. 5A), levou Degani‑Schmidt (Fig. 5B‑5D) permitiram a identi icaçã o de
et al. (2015) a investigarem a possibilidade uma associaçã o monotı́pica, com a inidade
de que esses fragmentos seriam resultantes taxonô mica ao gê nero Agathoxylon Hartig,
de eventos de incê ndios vegetacionais em que corresponde a um padrã o encontrado
ambientes de turfeira. em diferentes grupos gimnospé rmicos, tais
como Cordaitales, Glossopteridales e Conife‑
A observaçã o desses fragmentos
rales. Todavia, o domı́nio de pó lens com a i‑
muito comprimidos (com espessuras de 2
nidade glossopterı́dea nas associaçõ es
cm, aproximadamente) por MEV evidenciou
palinoló gicas (Cazzulo‑Klepzig et al., 2007)
paredes celulares homogeneizadas em todos
e a presença dominante de folhas de Glos‑
os espé cimes, con irmando a categorizaçã o
sopteris spp. na associaçã o paleobotâ nica
do material como macro‑charcoal, de acordo
procedente do tonstein da Mina do Faxinal

278 Edição da Sociedade Brasileira de Geologia – Núcleo RS/SC


Guerra‑Sommer et al.

Figura 4 ‑ Espé cimes macroscó picos e reconstituiçã o paleoambiental. A, B) Fragmentos de lenhos queimados
comprimidos, de grandes dimensõ es, subjacentes ao tonstein; C) Reconstruçã o da comunidade vegetal
geradora do depó sito de carvã o da mina do Faxinal, com base em palinologia e em paleobotâ nica (adaptado de
Cazzulo‑Klepzig et al., 2007).

(Boardman et al., 2012) constituem evidê n‑ probabilidade, a fragmentos de caules e de


cias indiretas de que os lenhos parcialmente ramos de glossopterı́deas. Nesse caso, o pa‑
queimados corresponderiam, com maior drã o anatô mico comum a todos os espé ci‑

Macro‑charcoal como indicador de incêndios em turfeiras permianas no Sul da Bacia do Paraná 279
Contribuições à Geologia do Rio Grande do Sul e de Santa Catarina

Figura 5 ‑ Espé cimes macroscó picos e detalhes em microscopia. A) Fragmento de lenho queimado comprimido,
proveniente do carvã o abaixo do tonstein (Pb‑2684); B) Cé lula do sistema condutor, mostrando paredes
celulares homogeneizadas (seta) (Pb‑4587b‑56); C) Traqueı́deos do xilema secundá rio, com pontuaçõ es
bisseriadas, em vista radial (Pb‑4587a‑04); D) Floema secundá rio, com placas crivadas, em vista radial (Pb‑
4587b‑56); E) Tufo de folhas glossopterı́deas carboni icadas, incluı́das no tonstein (Pb‑2790); F) Cutı́cula foliar,
em microscopia ó ptica de luz transmitida, com detalhe da ornamentaçã o epidé rmica (FXB‑84).

280 Edição da Sociedade Brasileira de Geologia – Núcleo RS/SC


Guerra‑Sommer et al.

mes analisados indica a presença de uma as‑ regionais, que ocorriam em fases cı́clicas, e
sociaçã o predominantemente monotı́pica de teriam sido transportados, por via aquá tica,
plantas (Degani‑Schmidt & Guerra‑Sommer, até as á reas de deposiçã o.
2016a). Dadas as caracterı́sticas do material
A preservaçã o de loema, sob forma analisado, as projeçõ es de temperatura de
de charcoal (Fig. 5D), que corresponde a um queima de 325‑400°C, obtidas a partir de
tecido estruturalmente muito mais delicado baixos valores de re letâ ncia da inertinita,
do que o xilema, constitui‑se em uma rele‑ sã o tı́picas de queima super icial (sensu
vante evidê ncia paleoecoló gica. As delgadas Scott, 2010), indicando a ocorrê ncia de in‑
paredes celulares das cé lulas crivadas estã o cê ndios autó ctones, de superfı́cie, em baixa
constantemente sujeitas a pressõ es hidrostá ‑ temperatura. Aná lises quantitativas da dis‑
ticas ao longo da vida da planta, favorecendo tribuiçã o de associaçõ es palinoló gicas na ca‑
seu colapso instantâ neo, mediante injú ria. mada de tonstein e nos nı́veis de carvã o a ela
Portanto, a preservaçã o de tecido tã o delica‑ sotopostos e sobrepostos permitiram con‑
do rati ica as inferê ncias, relacionadas a bai‑ cluir que houve um aumento na dominâ ncia
xas temperaturas de queima, em condiçõ es de grã os de pó len bissacados em relaçã o a
de relativa seca ambiental e de deposiçã o re‑ esporos pteridofı́ticos, apó s a queda da cin‑
lacionada a pouco ou nenhum transporte za vulcâ nica (Cazzulo‑Klepzig et al., 2007;
(Degani‑Schmidt & Guerra‑Sommer, 2016a). Simas et al., 2013). Tal evidê ncia sugeriu que
Os padrõ es epidé rmicos da associa‑ a vegetaçã o gimnospé rmica foi revigorada
çã o de folhas glossopterı́deas (Fig. 5E‑5F), pela açã o do fogo e pela perturbaçã o vulcâ ‑
preservadas como compressõ es carboni ica‑ nica e nã o se abriu um novo nicho para reco‑
das ‒ nã o queimadas, portanto ‒, que ocor‑ lonizaçã o. O reestabelecimento das
rem dispersas no tonstein, em nı́veis comunidades vegetais, apó s a ocorrê ncia de
sobrepostos aos da ocorrê ncia de lenhos expressivo incê ndio autó ctone e apó s o
queimados, també m corroboram as inferê n‑ evento de queda da cinza vulcâ nica, sugere
cias de uma comunidade arbó rea predomi‑ que as perturbaçõ es ambientais tiveram um
nantemente monotı́pica (Guerra‑Sommer, impacto de curto alcance (Degani‑Schmidt et
1992). O processo tafonô mico, que gerou as al., 2015).
compressõ es foliares, é considerado um O conjunto de evidê ncias indicou
“evento geoló gico instantâ neo” (sensu que os incê ndios ocorrentes no limite inferi‑
Prothero, 1990), capaz de re letir as condi‑ or do tonstein foram de superfı́cie, em bai‑
çõ es ambientais vigentes na turfeira no exato xas temperaturas, e que o transporte do
momento em que a cinza precipitou (DiMi‑ macro‑charcoal foi praticamente inexistente,
chele & Falcon‑Lang, 2011). sendo a deposiçã o desses fragmentos, rela‑
Os grandes fragmentos de lenhos cionada, portanto, a processos autó ctones.
queimados, em Faxinal, se distinguem dos També m foram identi icados fragmentos
centimé tricos e milimé tricos fragmentos de dispersos de macro‑charcoal, mas de meno‑
macro‑charcoal, presentes, de forma recor‑ res dimensõ es, ao longo da deposiçã o da ca‑
rente, em bandas densas, nos a loramentos mada de tonstein e no carvã o pró ximo ao
de idade Asseliana, em Quité ria e em Curva limite superior dessa camada de cinza vul‑
do Belvedere, cuja faciologia é relacioná vel a câ nica, o que sugere processos hipoautó cto‑
pâ ntanos lagunares e a terras baixas (Kubik nes de transporte, que permitiram inferir
et al., 2020). Esses macro‑charcoals seriam ocorrê ncias de incê ndios nas á reas de entor‑
provenientes, provavelmente, de incê ndios no da turfeira (Jasper et al., 2011a; Degani‑
Macro‑charcoal como indicador de incêndios em turfeiras permianas no Sul da Bacia do Paraná 281
Contribuições à Geologia do Rio Grande do Sul e de Santa Catarina

Schmidt et al., 2015). da de carvã o Santa Catarina, no a loramento


A partir de estudo integrado, Dega‑ Porongos, de idade Artinskiana (Fig. 6, Fig.
ni‑Schmidt et al. (2015) deduziram que, du‑ 7), centradas na observaçã o de macro‑char‑
rante a deposiçã o de turfeiras no Permiano coal em MEV, associada a aná lises sob mi‑
Inferior do Gondwana, sob altos teores de croscopia ó ptica de luz incidente em
O2 paleoatmosfé rico, os ambientes de tur‑ amostras do sedimento. Esse estudo inte‑
feira eram altamente suscetı́veis a incê ndios grado permitiu estimar as temperaturas de
recorrentes (Fig. 4C). As plantas glossopte‑ queima e estabelecer a correspondente
rı́deas se bene iciavam dessa dinâ mica para classi icaçã o dos paleoincê ndios, demons‑
manter sua dominâ ncia e sua abundâ ncia trando a importâ ncia da combinaçã o de mé ‑
nas comunidades, por possuı́rem grande todos para uma reconstruçã o con iá vel de
plasticidade adaptativa e capacidade de so‑ ocorrê ncias desses eventos em á reas de de‑
breviver a condiçõ es extremas, em ambien‑ posiçã o das turfas que geraram as camadas
tes altamente perturbados. de carvã o no Gondwana brasileiro.
A intensa precipitaçã o de cinza vul‑
câ nica, representada pela camada de tons‑ 4. 2. 1 Características morfológicas e
tein, levou Jasper et al. (2011a) a sugerirem anatômicas do charcoal
que eventos vulcâ nicos poderiam ter provo‑
cado a igniçã o dos incê ndios nesse ambien‑ Os fragmentos de macro‑charcoal,
te de turfeira. Entretanto, a cinza, apesar de recuperados de cada um dos seis nı́veis es‑
introduzir, de forma pontual ou frequente, tudados, possuı́am entre 3 mm e 49 mm de
partı́culas e aerossó is na atmosfera, nã o foi largura e 5 mm e 111 mm de comprimento,
o fator indutor dos incê ndios ao se deposi‑ alé m de bordas levemente abradidas (Fig.
tar sobre a superfı́cie da turfeira, dada a sua 7A), e estavam impregnados por pirita (Fig.
baixa temperatura (Simas et al., 2013). As 7B), apresentando‑se levemente comprimi‑
aná lises dos grandes fragmentos autó ctones/ dos, mas sem alteraçã o na tridimensionali‑
hipoautó ctones de lenhos queimados, pre‑ dade da anatomia vegetal (Fig. 7C‑7D). O
sentes nos limites inferior e superior do preenchimento dos lenhos carbonizados
tonstein, intercalado na camada de carvã o S, por pirita pode indicar alguma in luê ncia
indicaram que a igniçã o, a atividade e a pro‑ marinha no sistema deposicional.
pagaçã o dos incê ndios estariam vinculadas A variaçã o nã o signi icativa da ana‑
à alta disponibilidade de pO2 estimada para tomia dos lenhos, ao longo dos seis nı́veis,
o perı́odo, associadas a descargas elé tricas sugeriu que gimnospermas com xilema se‑
atmosfé ricas (Glasspool et al., 2015) e a os‑ cundá rio identi icado como Agathoxylon,
cilaçõ es climá ticas acentuadas, em ciclos ex‑ muito comum nos depó sitos do Paleozoico
tremos de seca e de inundaçõ es tardio e do Mesozoico de diferentes regiõ es
(Degani‑Schmidt et al., 2015). geográ icas de ambos os hemisfé rios (p. ex.,
Kurzawe & Merlotti, 2010; Jasper et al.,
4. 2 Camada de carvão Barro Branco, 2013; Philippe et al., 2015), foram os com‑
no a loramento Porongos (SC) ponentes mais importantes da biomassa,
responsá veis pela manutençã o desses in‑
Benı́cio et al. (2019a) desenvolve‑ cê ndios recorrentes. Degani‑Schmidt et al.,
ram aná lises integradas em cada um dos (2015), a partir da associaçã o indireta entre
seis nı́veis de siltito carbonoso, ocorrentes os lenhos carbonizados de tipo Agathoxylon
na camada de carvã o Barro Branco, na jazi‑ e as abundantes folhas de Glossopteris na ja‑

282 Edição da Sociedade Brasileira de Geologia – Núcleo RS/SC


Guerra‑Sommer et al.

Figura 6 ‑ Per il da camada Barro Branco do a loramento Porongos (SC), com destaque para as seis camadas
contendo charcoal (adaptado de Benı́cio et al., 2019a).

zida do Faxinal (no Artinskiano), sugeriram mento, sugerem transporte hipoautó ctone,
uma conexã o bioló gica entre ambos. dentro do ambiente de deposiçã o, via luxo
A ocorrê ncia nos seis nı́veis de silti‑ hidrá ulico (Scott, 2010), o qual pode ter
to carbonoso de macro‑charcoal com deta‑ exercido um vié s seletivo em favor de restos
lhes anatô micos bem preservados (Fig. de madeira carbonizados, em detrimento de
7B‑7D), sob MEV, e com paredes celulares charcoal de outros ó rgã os das plantas. Essa
homogeneizadas indica que o fogo foi um interpretaçã o tafonô mica é congruente com
elemento recorrente no sistema deposicio‑ o alto conteú do mineral presente em todos
nal e que incê ndios ocorriam nas proximi‑ os seis nı́veis de siltito carbonoso, sugerindo
dades do ambiente de formaçã o de turfa que que in luxos de á gua frequentemente trans‑
originou a camada de carvã o Barro Branco. portaram sedimentos de uma fonte externa
E importante salientar que, em cada nı́vel, para a turfeira. Todavia, o vento també m po‑
os fragmentos de charcoal nã o se dispõ em de ter agido e transportado partı́culas meno‑
em faixas contı́nuas, ricas em material car‑ res de macro‑charcoal (de cerca de 3 mm de
bonizado, nã o existindo, entã o, evidê ncias comprimento) até a turfeira.
de queima autó ctone e lenta da pró pria tur‑ A ausê ncia de charcoal nas camadas
fa. de argila maciça, intermediá rias aos siltitos
As abrasõ es observadas nas bordas carbonosos (Fig. 6), pode ser atribuı́da à au‑
da maioria do macro‑charcoal indicam sê ncia de incê ndios durante a deposiçã o
transporte desde a á rea‑fonte do incê ndio destes horizontes sedimentares, ou a um
até a turfeira. As dimensõ es dos fragmentos vié s tafonô mico, uma vez que nã o foram do‑
heteromó r icos, de até 111 mm de compri‑ cumentados itofó sseis nessas camadas.

Macro‑charcoal como indicador de incêndios em turfeiras permianas no Sul da Bacia do Paraná 283
Contribuições à Geologia do Rio Grande do Sul e de Santa Catarina

Figura 7 ‑ Amostra de mã o e observaçã o, em MEV, do charcoal proveniente do a loramento Porongos (SC). A)
Amostra contendo fragmentos de charcoal, com bordos levemente arredondados (seta) (PBUMCN 1167); B)
Charcoal impregnado por pirita (seta) (PBUMCN 1165); C) Vista transversal, demonstrando a preservaçã o
tridimensional da anatomia vegetal (PBUMCN 1168); D) Homogeneizaçã o das paredes celulares (seta)
(PBUMCN 1165).

4. 2. 2 Petrogra ia de carvão: temperatu‑ uma temperatura de queima muito elevada,


ra de queima e classi icação dos paleoin‑ de 1.045 °C.
cêndios Embora seja difı́cil classi icar o tipo
de incê ndio que produziu o charcoal, dado
O somató rio dos teores de inertini‑ que o material foi transportado, alguns fato‑
ta, ao longo dos seis nı́veis de siltito carbono‑ res, tais como a temperatura predominante
so, variaram de 1%Ro, no nı́vel carbonoso 4, de queima (405 °C a 513 °C) e a dominâ ncia
a 18,2%Ro, no nı́vel 3 (Tab. 1). A presença de de fragmentos relativamente grandes nos
inertodetrinita em todos os seis nı́veis estu‑ seis nı́veis, sugerem a ocorrê ncia de incê n‑
dados pode corresponder a macro‑charcoals dios recorrentes de superfı́cie com tempe‑
de pequenas dimensõ es, transportados pelo ratura mais baixa (Scott, 2000). No entanto,
vento, até a turfeira (Benı́cio et al., 2019a). incê ndios de dossel de alta temperatura
A mé dia dos valores de re letâ ncia (1.045 °C) ‒ intensos, mas rá pidos ‒, que
da inertinita dos seis nı́veis variou de produzem menores quantidades de charco‑
1,88%Ro a 2,79%Ro, indicando uma tempe‑ al, e de menores dimensõ es, que podem ser
ratura mé dia de queima estimada entre 405 transportados pelo vento (Scott, 2000),
°C e 513 °C para esses incê ndios recorrentes també m podem ter desempenhado um pa‑
(Tab. 1). No entanto, o valor má ximo de re‑ pel subordinado na formaçã o do macro‑
letâ ncia de 7,3%Ro, obtido no nı́vel 6, indica charcoal.

284 Edição da Sociedade Brasileira de Geologia – Núcleo RS/SC


Guerra‑Sommer et al.

Tabela 1 ‑ Valores de re letâ ncia (%Ro) das vitrinitas e das inertinitas nos seis nı́veis carbonosos do
a loramento Porongos (SC).

A baixa ocorrê ncia de macro‑charco‑ zil. PloS one, 14(3): e0213854.


al e de inertinita em todos os nı́veis analisa‑
dos pode ter sido decorrente do processo de Benı́cio, J. R. W., Jasper, A., Spiekermann, R.,
Rockenbach, C. I., Cagliari, J., Pires‑Oliveira, E.
transporte, dado que nem todos os restos
F. & Uhl, D. 2019b. The irst evidence of pala‑
carbonizados, produzidos por esses incê ndi‑
eo‑wild ire from the Itararé Group, southern‑
os, teriam atingido a turfeira. Tais incê ndios, most portion of the Paraná Basin, Brazil.
por outro lado, podem ter sido seguidos de Journal of South American Earth Sciences, 93:
aumento no intemperismo, o que poderia ex‑ 155‑160.
plicar o alto conteú do mineral presente nã o
Boardman, D. R., Iannuzzi, R., Souza, P. A. &
só nos siltitos carbonosos, como també m em
Lopes, R. C. 2012. Paleobotanical and palyno‑
muitas outras jazidas de carvã o do Gondwa‑
logical analysis of Faxinal Coal ield (lower
na, no Permiano (Scott, 2000). Permian, Rio Bonito Formation, Paraná Ba‑
A integraçã o dos resultados obtidos sin), Rio Grande do Sul, Brazil. International
por Benı́cio et al. (2019a) indicou a ocorrê n‑ Journal of Coal Geology, 102: 12‑25.
cia de incê ndios recorrentes em á reas pró xi‑
Bustin, R. M., Cameron, A. R., Grieve, D. A. &
mas à s de deposiçã o da turfeira que gerou a
Kalkreuth, W. D. 1989. Coal petrology: its
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transporte do material carbonizado, prefe‑ John’s, Geological Association of Canada, 230
rencialmente, por via aquá tica, e, subordina‑ p.
damente, por via aé rea. A temperatura de
Cazzulo‑Klepzig, M., Guerra‑Sommer, M., Me‑
queima oscilou entre, aproximadamente, 400
negat, R., Simas, M. W. & Mendonça Filho, J. G.
°C e 500 °C, atingindo, poré m, patamares al‑
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Macro‑charcoal como indicador de incêndios em turfeiras permianas no Sul da Bacia do Paraná 285
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286 Edição da Sociedade Brasileira de Geologia – Núcleo RS/SC


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Voltar ao Sumário

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288 Edição da Sociedade Brasileira de Geologia – Núcleo RS/SC


Estratigra ia da sucessão sedimentar
mesozoica da Bacia do Paraná
no Rio Grande do Sul
Claiton Marlon dos Santos Scherer1*, Ernesto Luiz Correa Lavina2,
Adriano Domingos dos Reis1, Bruno Ludovico Dihl Horn3

1
Instituto de Geociê ncias, Universidade Federal do Rio Grande do Sul
2
Universidade do Vale do Rio dos Sinos
3
Serviço Geoló gico do Brasil/CPRM

*autor correspondente: claiton.scherer@ufrgs.br

1 INTRODUÇÃO
A sucessã o sedimentar mesozoica do Rio Grande do Sul tem sido estudada desde o inı́‑
cio do sé culo passado, tendo produzido inú meros trabalhos de cunho sedimentoló gico, estrati‑
grá ico e paleontoló gico. Entretanto, o incremento progressivo do conhecimento trazido por
estes estudos també m resultou na proposiçã o de cartas estratigrá icas con litantes. Alé m dos
problemas inerentes à litoestratigra ia, parte das divergê ncias deriva do fato de que as proposi‑
çõ es tê m sido elaboradas em diferentes blocos estruturais, que apresentam sucessõ es estrati‑
grá icas distintas. Ou seja, nã o existe uma coluna estratigrá ica ú nica para o Mesozoico do Rio
Grande do Sul que possa ser correlacionada ao longo de toda a seçã o a lorante, existindo ausê n‑
cia de unidades conforme a regiã o analisada. Este trabalho apresenta uma breve sı́ntese do arca‑
bouço estratigrá ico do Mesozoico do Rio Grande do Sul, a partir de uma aná lise crı́tica da
bibliogra ia, aliada à sistematizaçã o e à organizaçã o de dados publicados por diferentes grupos
de pesquisa.
Contribuições à Geologia do Rio Grande do Sul e de Santa Catarina

2 ESTRUTURAÇÃO TECTONO‑ESTRATI‑ (Machado, 2005), estrutura rú ptil regional,


GRÁFICA de orientaçã o WNW‑ESE, associada à Sincli‑
nal de Torres.
A atual estruturaçã o das unidades
sedimentares da Bacia do Paraná está dire‑ 3 UNIDADES ESTRATIGRÁFICAS
tamente relacionada à movimentaçã o de es‑
truturas do embasamento, reativadas A sucessã o sedimentar mesozoica
durante e posteriormente à deposiçã o. As do Rio Grande do Sul pode ser subdividida
estruturas do embasamento da bacia sã o, em diferentes unidades litoestratigrá icas:
principalmente, zonas de cisalhamento anti‑ Formaçã o Sanga do Cabral, formaçõ es Santa
gas e zonas de fraturas, de direçõ es NW‑SE e Maria e Caturrita, Formaçã o Guará , Arenito
NE‑SW (Holz et al., 2006). Durante o Fanero‑ Pedreira e Formaçã o Botucatu (Fig. 1 e 2). A
zoico, estas estruturas foram reativadas co‑ seguir, será apresentada uma breve contex‑
mo falhas normais e transcorrentes, com tualizaçã o nomenclatural e de relaçõ es de
deslocamentos da ordem de dezenas de me‑ contato, seguida de uma sı́ntese dos aspec‑
tros (Philipp et al., 2018). Dados termocro‑ tos sedimentoló gicos, paleontoló gicos e de
noló gicos indicam a movimentaçã o destas estratigra ia de sequê ncias de cada unidade.
falhas desde a transiçã o Carbonı́fero‑Permi‑ Para uma discussã o mais detalhada sobre as
ano, estendendo‑se pelo Triá ssico e pelo Ju‑ diferentes propostas litoestratigrá icas exis‑
rá ssico (Jelinek et al., 2013, 2014; Oliveira et tentes para a sucessã o mesozoica do Rio
al., 2016). Considerando uma escala regio‑ Grande do Sul, recomendamos a leitura de
nal, o intervalo estatigrá ico a lorante da Ba‑ Scherer et al. (2000).
cia do Paraná no Rio Grande do Sul pode ser
dividido em trê s blocos estruturais: bloco 3.1 Formação Sanga do Cabral
Oeste, bloco Central e bloco Leste (Fig. 1).
Internamente a estes trê s blocos, existem di‑ 3.1.1 Designação litoestratigrá ica
versos blocos estruturais de escala local que
A Formaçã o Sanga do Cabral foi
compartimentam as formaçõ es (Da‑Rosa &
proposta por Andreis et al. (1980) para de‑
Faccini, 2005), combinando estruturas NW e
inir o pacote arenoso luvial entre as for‑
NE com E‑W. Os trê s grandes blocos sã o limi‑
maçõ es Santa Maria e Rio do Rasto, tendo
tados por zonas de fraqueza NW e NE, e as
como seçã o‑tipo o arroio homô nimo, locali‑
principais estruturas, que limitam esses blo‑
zado no municı́pio de Rio Pardo. Posterior‑
cos, sã o o Sistema de Falhas Jaguari‑Mata, à
mente, Faccini (1989) inclui nessa unidade
oeste, limitando o bloco Central do bloco
os arenitos eó licos que se encontram inter‑
Oeste, e o Sistema de Falhas Dorsal de Can‑
digitados com o topo da Formaçã o Rio do
guçu, que delimita o bloco Central do bloco
Rasto e que a loram, preferencialmente, no
Leste, sendo sua expressã o na bacia chama‑
bloco Oeste. Entretanto, parece mais corre‑
da de Falha do Leã o. Existem, ainda, outros
to, seguindo sua proposiçã o original, incluir
dois grandes blocos estruturais, o bloco Nor‑
na Formaçã o Sanga do Cabral somente os
te e o bloco Nordeste (Machado, 2005), nos
arenitos luviais, visto que existe uma dis‑
quais o intervalo mesozoico pode ser reco‑
cordâ ncia que os separa da sucessã o eó lica
nhecido apenas em subsuperfı́cie, nã o sendo
subjacente. A sucessã o eó lica que se interdi‑
detalhados neste capı́tulo. Estes ú ltimos sã o
gita com o topo da Formaçã o Rio do Rasto
separados dos outros trê s blocos estruturais
deve constituir uma unidade litoestratigrá ‑
pelo Lineamento Terra de Areia‑Posadas

290 Edição da Sociedade Brasileira de Geologia – Núcleo RS/SC


Scherer et al.

Figura 1 – (A) Posicionamento dos principais sistemas de falhas, que delimitam os blocos estruturais da Bacia
do Paraná no Rio Grande do Sul: ZFJM: Zona de Falha Jaguari‑Mata, ZFDC: Zona de Falha Dorsal de Canguçu,
ZFTAP: Zona de Falha Terra de Areia‑Posadas. O: Bloco Oeste, C: Bloco Central, E: Bloco Leste, NE: Bloco
Nordeste e N: Bloco Norte; (B) Mapa geoló gico simpli icado das unidades mesozoicas da Bacia do Paraná no Rio
Grande do Sul; e (C) Seçã o de correlaçã o esquemá tica das unidades mesozoicas dos blocos Oeste, Central e Les‑
te. SL: Santana do Livramento, RS: Rosá rio do Sul, SFA: Sã o Francisco de Assis, JG: Jaguari, SPS: Sã o Pedro do Sul,
SM: Santa Maria, CA: Candelá ria, SC: Santa Cruz do Sul, VA: Venâ ncio Aires, MN: Montenegro e TA: Taquara
(modi icado de Dias‑da‑Silva et al. (2017)).

ica independente, sugerindo‑se a utilizaçã o territó rio uruguaio.


da designaçã o Formaçã o Buena Vista (sensu
De Santa Ana et al., 2006), visto que esta uni‑ 3.1.2 Características sedimentológicas e
dade se encontra muito bem de inida em estratigrá icas

Estratigra ia da sucessão sedimentar mesozoica da Bacia do Paraná no Rio Grande do Sul 291
Contribuições à Geologia do Rio Grande do Sul e de Santa Catarina

Figura 2 ‒ Diagrama cronoestratigrá ico das unidades mesozoicas da Bacia do Paraná no Rio Grande do Sul:
SC: Formaçã o Sanga do Cabral, SM: Formaçã o Santa Maria, CA: Formaçã o Caturrita, GU: Formaçã o Guará , AP:
Arenito Pedreira, BO: Formaçã o Botucatu e SG: Grupo Serra Geral.

A Formaçã o Sanga do Cabral ocorre antidunas, à chute‑and‑pool e à cyclic steps,


nos blocos estruturais Central e Oeste, estan‑ indica luviais de alta variabilidade da des‑
do assentada em desconformidade sobre os carga, associada a inundaçõ es relâ mpago de
depó sitos eó licos do topo do Permiano (For‑ alta intensidade (Dario, 2017). Por vezes,
maçã o Buena Vista), e sendo sobreposta, ocorrem conglomerados intraformacionais
també m em desconformidade, pelos depó si‑ de blocos e de seixos de paleossolos areno‑
tos continentais da Formaçã o Guará (bloco sos embrioná rios, formados durante os in‑
Oeste) e da Formaçã o Santa Maria (bloco tervalos entre as inundaçõ es relâ mpago. As
Central) (Fig. 1). Essa unidade apresenta paleocorrentes luviais indicam luxo para
uma espessura de 50 a 100 metros, sendo NE (Zerfass et al., 2003).
constituı́da por areninos inos a mé dios, bem
selecionados, micá ceos, acumulados por sis‑ 3.1.3 Fósseis e idade
temas luviais (Faccini, 2000). A presença de
corpos arenosos em lençol, de 2 a 5 metros, Ré pteis procolofonı́deos e anfı́bios
compostos por estruturas transcrı́ticas e su‑ temnospondyli, entre outros vertebrados
percrı́ticas, associadas à humpback dunes, à fó sseis, ocorrem nos depó sitos luviais da

292 Edição da Sociedade Brasileira de Geologia – Núcleo RS/SC


Scherer et al.

Formaçã o Sanga do Cabral (Dias‑da‑Silva et membros por Bortoluzzi (1974): Passo das
al., 2017). Essa assembleia fó ssil apresenta Tropas e Alemoa. O Membro Passo das Tro‑
uma correlaçã o bioestratigrá ica com a Zona pas foi considerado como os depó sitos are‑
de Procolophon, da Bacia do Karoo, indican‑ nosos de canais luviais que ocorrem na base
do uma idade Induana para a Formaçã o San‑ da Formaçã o, sendo sucedidos por pelitos
ga do Cabral (Dias‑da‑Silva et al., 2017). avermelhados do Membro Alemoa. Entretan‑
to, essa proposiçã o de dois membros tem se
3.1.4 Estratigra ia de sequências e cor‑ mostrado pouco operacional, visto que exis‑
relações regionais tem vá rios corpos arenosos intercalados com
pelitos dentro da Formaçã o Santa Maria,
A Formaçã o Sanga do Cabral corres‑ sendo desconsiderada no presente trabalho.
ponde a uma ú nica sequê ncia deposicional, A Formaçã o Caturrita foi proposta por An‑
limitada no topo e na base por desconformi‑ dreis et al. (1980), tendo como base a coluna
dades (Fig. 2). Essa unidade é composta por estratigrá ica de Bortoluzzi (1974) (vide dis‑
corpos de canais luviais amalgamados, de cussã o de Scherer et al., 2000). Esta se so‑
alta variabilidade de descarga, indicando que brepõ e à Formaçã o Santa Maria em contato
a acumulaçã o ocorreu em um contexto de gradacional, marcado por uma amalgamaçã o
baixa taxa de acomodaçã o, sob um regime de corpos arenosos de canais luviais. Faccini
climá tico semiá rido. As paleocorrentes dos (1989) propõ e ainda a designaçã o informal
depó sitos luviais para NE sugerem uma de Arenito Mata para a seçã o arenosa com
á rea‑fonte a SW (Zerfass et al., 2003). A á rea troncos fó sseis, que corresponde ao topo da
deposicional original é difı́cil de ser de inida, Formaçã o Caturrita.
em decorrê ncia da tectô nica deformadora
ter preservado somente um pequena porçã o 3.2.2 Características sedimentológicas e
da bacia, que provavelmente ocupava uma estratigrá icas
á rea muito maior do que aquela circunscrita
pelos seus atuais limites erosivos. As discor‑ As formaçõ es Santa Maria e Caturrita
dâ ncias de base e de topo da Formaçã o San‑ tê m a sua á rea de ocorrê ncia restrita ao blo‑
ga do Cabral tê m as suas gê neses vinculadas co tectô nico Central (Fig. 1). A Formaçã o
a paroxismos do cinturã o de dobramento e a Santa Maria apresenta espessuras de 50 a
cavalgamentos de Sierra de La Ventana, que 100 metros, sendo limitada, na base, por
geraram soerguimentos no Gonduana e in‑ uma desconformidade com os depó sitos are‑
terrupçã o da acumulaçã o sedimentar no in‑ nosos da Formaçã o Sanga do Cabral. Essa
terior do megacontinente (Zerfass et al., unidade apresenta, no topo, um contato gra‑
2003). dacional com a Formaçã o Caturrita, cuja es‑
pessura varia de 100 a 150 metros, podendo
3.2 Formações Santa Maria e Caturrita estar ausente, por erosã o, em algumas re‑
giõ es do bloco Central. O topo da Formaçã o
3.2.1 Designação litoestratigrá ica Caturrita é marcado por uma paraconformi‑
dade com os arenitos da Formaçã o Botuca‑
A Formaçã o Santa Maria foi proposta
tu.
por Gordon Jr. (1947), sendo destacada da
A Formaçã o Santa Maria é caracteri‑
Formaçã o Rio do Rasto com base nos verte‑
zada por intervalos de corpos arenosos
brados fó sseis, que indicavam idade triá ssi‑
amalgamados de canais luviais entrelaça‑
ca. Posteriormente, foi subdividida em dois
dos, que se alternam com intervalos consti‑

Estratigra ia da sucessão sedimentar mesozoica da Bacia do Paraná no Rio Grande do Sul 293
Contribuições à Geologia do Rio Grande do Sul e de Santa Catarina

tuı́dos por depó sitos pelı́ticos de planı́cie de Santa Maria, e em 225 Ma (Noriano) para a
inundaçã o ou loess, que podem conter raros Formaçã o Caturrita (Phillip et al., 2018;
e isolados corpos arenosos de canais luviais Langer et al., 2018).
de baixa a alta sinuosidade, alé m de sistemas
lacustres efê meros (Horn et al., 2018b). A 3.2.4 Estratigra ia de sequências e cor‑
Formaçã o Caturrita corresponde a corpos relações regionais
arenosos amalgamados e dominantemente
maciços, interpretados como canais luviais As formaçõ es Santa Maria e Caturri‑
efê meros dominados por luxos hipercon‑ ta tê m sua á rea de ocorrê ncia limitada ao
centrados (Horn et al., 2018a). O Arenito Ma‑ estado do Rio Grande do Sul. Estas unidades
ta, correspondente ao topo da Formaçã o foram acumuladas em calhas rifte com ori‑
Caturrita, é caracterizado por corpos areno‑ entaçã o ESE‑WNW, desenvolvidas por esfor‑
sos amalgamados de canais luviais entrela‑ ços extensionais ocorridos no Gonduana
çados (Faccini, 1989, 2000). As durante o Triá ssico Mé dio‑Tardio (Zerfass et
paleocorrentes dos depó sitos luviais das al., 2003), sendo a sua á rea de ocorrê ncia
formaçõ es Santa Maria e Caturrita sã o para restrita, re lexo da pró pria geometria depo‑
norte‑nordeste, tendo como á rea‑fonte o Es‑ sional da bacia (Zerfass et al., 2003, 2004). O
cudo Sul‑Rio‑Grandense. Os sedimentos eó li‑ Triá ssico Mé dio e Tardio foi caracterizado
cos (loess) possuem fontes externas ao por esforços extensionais no Gonduana, que
Escudo, possuindo zircõ es com idades nã o geraram sistemas de riftes, tanto na regiã o
compatı́veis com as das rochas adjacentes atrá s do arco (e.g. Cuyo e Ishgualasto),
(Horn et al., 2018b). quanto nas porçõ es internas do superconti‑
nente (e.g. Waterberg, Zambezi e Ruhuhu)
3.2.3 Fósseis e idade (Zerfass et al., 2004).
As formaçõ es Santa Maria e Caturri‑
As formaçõ es Santa Maria e Caturrita ta correspondem a quatro sequê ncias depo‑
possuem uma paleofauna e uma paleo lora sicionais distintas, de inidas por suas
bastante diversas, sendo uma das referê ncias caracterı́sticas facioló gicas e paleofaunı́sti‑
mundiais em fó sseis do Triá ssico. A Forma‑ cas, que se justapõ em lateral e verticalmen‑
çã o Santa Maria conté m fó sseis de cinodon‑ te, resultando em um arcabouço
tes, dicinodontes, arcossauros, rincossauros estratigrá ico complexo e de difı́cil correla‑
e dinossauros (Schultz et al., 2020). Na For‑ çã o (Fig. 2). As sequê ncias sã o designadas,
maçã o Caturrita, ocorrem dinossauros, tem‑ da base para o topo, como: Pinheiros‑Chi‑
nospondyli, dicinodontes, procolofonı́deos, niquá , Santa Cruz, Candelá ria e Mata (Horn
rincocefá lios e cinodontes (Soares et al., et al., 2014; Schultz et al., 2020). As sequê n‑
2011; Schultz et al., 2020). Durante muitos cias Pinheiros‑Chiniquá e Santa Cruz, cor‑
anos, a dataçã o foi baseada em bioestratigra‑ respondentes à metade inferior da
ia, por correlaçõ es regionais com faunas Formaçã o Santa Maria, sã o compostas, na
pró ximas, como Africa do Sul e Argentina, base, por corpos arenosos amalgamados de
que indicam idades Anisiana‑Carniana para a canais luviais efê meros de baixa sinuosida‑
Formaçã o Santa Maria, e Noriana para a For‑ de, que sã o sucedidos por pelitos de planı́cie
maçã o Caturrita (Barberena, 1977; Soares et loessica retrabalhada. A Sequê ncia Candelá ‑
al., 2011). Recentemente, as unidades foram ria é caracterizada, na base, por corpos are‑
datadas por U‑Pb em zircõ es detrı́ticos, em nosos amalgamados de luviais efê meros de
233‑236 Ma (Carniano) para a Formaçã o baixa sinuosidade, que sã o sucedidos por

294 Edição da Sociedade Brasileira de Geologia – Núcleo RS/SC


Scherer et al.

depó sitos inos de planı́cies distais de leques Sanga do Cabral e, no topo, por uma para‑
terminais e de lagos associados, equivalendo conformidade com a Formaçã o Botucatu. A
à metade superior da Formaçã o Santa Maria. Formaçã o Guará apresenta uma variaçã o la‑
Em direçã o ao topo dessa sequê ncia, os cor‑ teral de associaçõ es de fá cies (Fig. 3) (Sche‑
pos arenosos de canais luviais efê meros vol‑ rer & Lavina, 2006). Na porçã o norte
tam a se amalgamar, equivalendo à base da (Jaguari e Sã o Francisco de Assis), ocorrem
Formaçã o Caturrita. A Sequê ncia Mata é arenitos mé dios a grossos, moderadamente
composta somente por corpos arenosos selecionados, depositados por sistemas lu‑
amalgamados de canais luviais entrelaçados, viais entrelaçados, que variam, segundo a
correspondendo ao topo da Formaçã o Catur‑ variabilidade de descarga, entre perenes
rita (Andreis et al., 1980) ou ao Arenito Mata (baixa variabilidade) e efê meros (mé dia a
(Faccini et al., 1989). alta variabilidade). Os luviais perenes sã o
caracterizados por corpos arenosos de 2 a 5
metros de espessuras, compostos por barras
3.3 Formação Guará
de acreçã o frontal simples ou compostas,
3.3.1 Designação litoestratigrá ica por hollows e por sets sobrepostos de dunas
aquosas cavalgantes (Reis, 2016). Os luviais
A Formaçã o Guará corresponde a um efê meros sã o compostos por lençó is de areia
pacote lú vio‑eó lico a lorante no bloco Oeste, laminados horizontalmente e formas de lei‑
que ocorre entre as formaçõ es Sanga do Ca‑ tos arenosos cavalgantes. Ambos os tipos de
bral e Botucatu (Scherer et al., 2000). Por es‑ luviais apresentam paleocorrentes consis‑
tar posicionada entre estas duas unidades, tentes para SW. Em direçã o a sul (Rosá rio do
alguns autores consideraram o pacote lú vio‑ Sul e Santana do Livramento), ocorrem are‑
eó lico como uma extensã o das formaçõ es nitos inos a mé dios, bem selecionados, vin‑
Santa Maria e Caturrita (e.g. Milani, 2000; culados a canais luviais que se intercalam
Milani et al., 2007). Entretanto, as caracterı́s‑ com depó sitos de dunas e lençó is de areia
ticas facioló gicas e o conteú do fossilı́fero de‑ eó licos, de inindo ciclos de aumento de umi‑
monstram se tratar de uma unidade dade para o topo, com espessuras de 5 a 14
sedimentar distinta (Scherer & Lavina, metros (Scherer & Lavina, 2006). Os depó si‑
2006), merecendo o status de uma formaçã o tos luviais apresentam paleocorrentes para
independente. SSW, similar ao observado na porçã o norte,
enquanto as dunas eó licas possuem um sen‑
3.3.2 Características sedimentológicas e tido preferencial de mergulho dos estratos
estratigrá icas cruzados para NE.

A Formaçã o Guará a lora somente no 3.3.3 Fósseis e idade


bloco Oeste (Fig. 1) e apresenta uma espes‑
sura variando entre 60 e 100 metros, a lo‑ O registro fó ssil da Formaçã o Guará
rando ao longo da escarpa da Serra Geral, ou é composto por pegadas de sauró podes, te‑
na forma de morros testemunhos, distribuı́‑ trá podes e ornitó podes, alé m de paleotocas
dos em uma orientaçã o norte‑sul, desde o provavelmente feitas por mamı́feros (Dent‑
municı́pio de Jaguari até o de Santana do Li‑ zien‑Dias et al., 2008; Francischini et al.,
vramento. Essa unidade é limitada, na base, 2015), majoritariamente encontradas em
por uma desconformidade com a Formaçã o lençó is de areia eó licos. Entretanto, o Mem‑
bro Batovı́ da Formaçã o Tacuarembó , exten‑

Estratigra ia da sucessão sedimentar mesozoica da Bacia do Paraná no Rio Grande do Sul 295
Contribuições à Geologia do Rio Grande do Sul e de Santa Catarina

sã o da Formaçã o Guará em territó rio uru‑ depó sitos luviais interagem com depó sitos
guaio, registra restos corporais de assem‑ eó licos e inundaçõ es em lençó is terminais
bleias fó sseis terrestres e aquá ticas. A do Membro Batovı́ da Formaçã o Tacuarem‑
paleofauna aquá tica é representada por in‑ bó (Reis, 2020). O padrã o de paleocorrentes
vertebrados, como conchostrá ceos, gastró ‑ para SSW é consistente em toda a á rea de
podes viviparidae e bivalves (representados ocorrê ncia da Formaçã o Guará . Existe uma
pelos gê neros Diplodon e Tacuaremboia), tendê ncia geral de diminuiçã o do tamanho‑
juntamente com actinopterı́gios (Lepidotes), de grã o para SSW, acompanhado o sentido
asiatoceratodontı́deos, mawsoniı́deos e tu‑ da paleocorrente, iniciando com conglome‑
barõ es de á gua doce (Perea et al., 2009). A rados e conglomerados arenosos no Paraná
fauna de tetrá podes é representada por cro‑ e terminando com arenitos inos a muito i‑
dodilos e dinossauros teró podes. Placas de nos no Uruguai (Amarante et al., 2019; Reis,
casco de tartarugas també m sã o reportadas 2020). As paleocorrentes para SSW, associa‑
(Perea et al., 2009). A associaçã o fossilı́fera das à presença de clastos sedimentares, in‑
indica uma idade Jurá ssica Tardia para o dicam que unidades sedimentares mais
Membro Batovı́ e, por extensã o, para a For‑ antigas da Bacia do Paraná serviram como
maçã o Guará (Perea et al., 2009). á rea‑fonte para a Formaçã o Guará , posicio‑
nando o seu depocentro em direçã o à Ar‑
3.3.4 Estratigra ia de sequências e cor‑ gentina. A pequena espessura dessa
relações regionais unidade, associada à dominâ ncia de corpos
arenosos amalgamados, de canais luviais e
A Formaçã o Guará corresponde a de depó sitos eó licos, sugere um contexto de
uma ú nica sequê ncia deposicional, limitada baixa geraçã o de acomodaçã o. A grande ex‑
na base por uma desconformidade (Fig. 2), tensã o areal dessa unidade indica a acumu‑
que marca um rearranjo signi icativo da ba‑ laçã o em ampla siné clise, desenvolvida na
cia de drenagem em relaçã o à s outras periferia do bulge gerado pela pluma man‑
sequê ncias permo‑mesozoicas. A Formaçã o té lica Paraná ‑Etendeka (Reis, 2020).
Guará se estende para alé m do estado do Rio
Grande do Sul, de inindo uma ampla bacia 3.4 Arenito Pedreira
sedimentar, registro de um grande sistema
3.4.1 Designação litoestratigrá ica
luvial distributivo, que apresenta uma ex‑
tensã o mı́nima de 800 km no sentido geral O Arenito Pedreira foi proposto in‑
do paleo luxo (norte‑sul) (Fig. 3). A porçã o formalmente por Nowatzki & Kern (2000).
proximal do sistema se encontra no estado Essa unidade ocorre somente no bloco Leste
do Paraná (Reis et al., 2019), sendo repre‑ (Fig. 1), principalmente em subsuperfı́cie,
sentada por canais luviais entrelaçados pe‑ correspondendo a conglomerados e areni‑
renes amalgamados, que transicionam para tos lú vio‑eó licos posicionados entre as for‑
uma zona intermediá ria (oeste do Rio Gran‑ maçõ es Rio do Rasto e Botucatu (Scherer,
de do Sul) onde luviais perenes e efê meros 2015; Freire, 2018). A presença de depó si‑
se alternam. A porçã o distal do sistema se di‑ tos lú vio‑eó licos e o posicionamento estra‑
vide em duas subzonas: entre o sudoeste do tigrá ico levou alguns autores a
Rio Grande do Sul e o noroeste do Uruguai, considerarem esse intervalo como perten‑
os canais luviais se interdigitam com cam‑ cente à Formaçã o Pirambó ia (Lavina &
pos de dunas eó licas; e, mais ao sul, no de‑ Scherer, 2002; Dias & Scherer, 2007; Soares
partamento de Tacuarembó (UY), os et al., 2008). Entretanto, conforme demons‑
296 Edição da Sociedade Brasileira de Geologia – Núcleo RS/SC
Scherer et al.

trado por Nowatzki & Kern (2000), as carac‑ Freire, 2018). Essa unidade é caracterizada
terı́sticas petrográ icas, facioló gicas e de pa‑ por um predomı́nio de arenitos conglomerá ‑
leocorrentes diferenciam o Arenito Pedreira ticos e conglomerados na base, associados a
de outras unidades permo‑mesozoicas da barras arenosas ou areno‑cascalhosas de sis‑
Bacia do Paraná , merecendo, assim, o status temas luviais, que se alternam e sã o sucedi‑
de uma unidade estratigrá ica independente. dos por arenitos inos a mé dios, com estratos
cruzados de dunas eó licas ou estratos hori‑
3.4.2 Características sedimentológicas e zontais de lençó is de areia e interdunas eó li‑
estratigrá icas cas, indicando condiçõ es gerais progressi‑
vamente mais secas.
O Arenito Pedreira possui uma es‑
pessura entre 100 e 120 metros, apresentan‑ 3.4.3 Fósseis e idade
do um contato basal em desconformidade
com os depó sitos inos da Formaçã o Rio do O Arenito Pedreira possui somente
Rasto e um contato em desconformidade ou registros esparsos de icnofó sseis que nã o
em discordâ ncia angular com os arenitos da permitem a de iniçã o da idade deposicional
Formaçã o Botucatu (Nowatzki & Kern, 2000; (Nowatzki & Kern, 2000). O seu posicio‑

Figura 3 ‒ Seçã o de correlaçã o NE‑SW regional da Formaçã o Guará (modi icado de Reis et al., 2019).

Estratigra ia da sucessão sedimentar mesozoica da Bacia do Paraná no Rio Grande do Sul 297
Contribuições à Geologia do Rio Grande do Sul e de Santa Catarina

namento estratigrá ico entre as formaçõ es que se de ina uma cronocorrelaçã o entre
Rio do Rasto e Botucatu indica uma idade in‑ elas. Possivelmente, a Sequê ncia Pedreira é
de inida entre o Neopermiano e o Neojurá s‑ mais jovem, visto que o desenvolvimento da
sico. Entretanto, a correlaçã o dessa unidade calha da Sinclinal de Torres é cronocorrelata
com o Krone Member e a Mixed Unit, da Ba‑ a outras estruturas rifte, de similar orienta‑
cia de Huab, na Namı́bia (vide discussã o a çã o (e.g. bacias de Salado e Colorado), de‑
seguir), permite posicioná ‑la no Jurá ssico senvolvidas no inal do Jurá ssico.
(Wanke et al., 2000).
3.5 Formação Botucatu
3.4.4 Estratigra ia de sequências e cor‑
relações regionais 3.5.1 Designação litostratigrá ica

O Arenito Pedreira corresponde a A Formaçã o Botucatu corresponde


uma ú nica sequê ncia deposicional, sendo li‑ ao pacote arenoso posicionado abaixo e em
mitada, na base, por uma desconformidade e, contato concordante com os derrames vul‑
no topo, por uma discordâ ncia angular ou câ nicos do Grupo Serra Geral (Rosseti et al.,
desconformidade (Fig. 2) (Freire, 2018). Es‑ 2018), que recobre diferentes unidades es‑
sa unidade tem a sua ocorrê ncia nas adja‑ tratigrá icas nos diferentes blocos estrutu‑
cê ncias do Lineamento Terra de rais. Devido a sua ı́ntima relaçã o com os
Areia‑Posadas, representando o preenchi‑ derrames vulcâ nicos, propõ em‑se que essa
mento de um graben embrioná rio com ori‑ formaçã o seja incluı́da no Grupo Serra Ge‑
entaçã o WNW‑ESE, que, na é poca da ral, em conjunto com as demais unidades
deposiçã o, conectava‑se com a Bacia de Huab vulcâ nicas (formaçõ es Torres, Vale do Sol,
(Namı́bia), formando uma calha deposicional Palmas e Esmeralda).
ú nica, vinculada aos esforços iniciais de frag‑
mentaçã o do Gonduana no inal do Jurá ssico 3.5.2 Características sedimentológicas e
(Fig. 4). O Arenito Pedreira é caracterizado estratigrá icas
por corpos luviais amalgamados intercala‑
dos com depó sitos eó licos, sendo que os de‑ A Formaçã o Botucatu a lora ao lon‑
pó sitos luviais sã o mais grossos e mais go da escarpa da Serra Geral, apresentando
comuns na base da unidade (Freire, 2018). uma espessura que varia de 0 a 120 metros,
Na bacia de Huab, ocorre uma sucessã o sedi‑ sendo limitada na base por uma discordâ n‑
mentar correlata ao Arenito Pedreira, carac‑ cia regional, recobrindo diferentes unidades
terizada pelo domı́nio de depó sitos luviais estratigrá icas (Fig. 1). Essa unidade é so‑
na base (Krone Member) que se intercalam e breposta de forma concordante pelos derra‑
sã o sucedidos por depó sitos eó licos em dire‑ mes vulcâ nicos do Grupo Serra Geral que
çã o ao topo (Mixed Unit) (Mountney et al., preservaram, integral ou parcialmente, a
1999; Wanke et al., 2000). As paleocorrentes morfologia das dunas eó licas. A Formaçã o
na Namı́bia indicam luviais vindo tanto da Botucatu é composta, na base, por depó si‑
borda sul do graben, quanto orientados axi‑ tos delgados (<2 m) de lençó is de areia eó li‑
almente com rios luindo para oeste (Mount‑ cos e por inundaçõ es em lençol, que sã o
ney et al., 1999), em direçã o ao atual recobertos por sets sobrepostos de estratos
territó rio brasileiro. A falta de continuidade cruzados de grande porte, interpretados co‑
fı́sica entre o Arenito Pedreira e a Formaçã o mo depó sitos residuais de dunas eó licas
Guará e as idades pouco precisas impedem crescentes, simples ou compostas e draas li‑

298 Edição da Sociedade Brasileira de Geologia – Núcleo RS/SC


Scherer et al.

Figura 4 ‒ Seçã o de correlaçã o entre o Bloco Leste da Bacia do Paraná no Rio Grande do Sul e a Bacia de Huab
(Namı́bia), mostrando a equivalê ncia facioló gica entre o Arenito Pedreira, o Krone Member e a Mixed Unit.

neares complexos, sendo esse ú ltimo tipo mente, por pegadas de dinossauros teró po‑
morfoló gico restrito à porçã o leste da faixa des e ornitó podes, alé m de mamı́feros, sendo
a lorante da Formaçã o Botucatu no Rio os ú ltimos representados principalmente pe‑
Grande do Sul (Scherer, 2002). O sentido la pela icnoespé cie Brasilichnium (Leonardi
preferencial de mergulho dos estratos cruza‑ et al., 2007; Francischini et al., 2015).
dos é para NE. A determinaçã o da idade de acumu‑
laçã o dos arenitos eó licos da Formaçã o Botu‑
3.5.3 Fósseis e idade catu é bastante difı́cil, uma vez que as
dataçõ es desta unidade sã o relativas, basea‑
No Rio Grande do Sul, existem rela‑ das fundamentalmente nas determinaçõ es
tos esparsos de pegadas de tetrá podes fó s‑ radiomé tricas dos derrames vulcâ nicos do
seis nos estratos cruzados de dunas eó licas Grupo Serra Geral. Dataçõ es Ar4o/ Ar39 apon‑
da Formaçã o Botucatu. As principais ocor‑ tam uma idade em torno de 134 Ma (Cretá ‑
rê ncias de registro icnoló gico se encontram ceo Inferior, Valanginiano) para as rochas
no estado de Sã o Paulo. A icnofauna da For‑ vulcâ nicas do Grupo Serra Geral no estado
maçã o Botucatu é constituı́da, dominante‑ do Rio Grande do Sul (Thiede & Vasconcellos,

Estratigra ia da sucessão sedimentar mesozoica da Bacia do Paraná no Rio Grande do Sul 299
Contribuições à Geologia do Rio Grande do Sul e de Santa Catarina

2010), oferecendo um referencial geocrono‑ rê ncia da Formaçã o Botucatu. A porçã o nor‑
ló gico seguro para o té rmino da sedimenta‑ te da bacia é caracterizada por paleoventos
çã o da Formaçã o Botucatu. Entretanto, a soprando de norte, enquanto a porçã o sul é
idade do inı́cio da sedimentaçã o é ainda bas‑ in luenciada por paleoventos oriundos de
tante imprecisa. Tendo como base os icnofó s‑ sudoeste, existindo uma con luê ncia de ven‑
seis de vertebrados identi icados nos tos na regiã o hoje ocupada pelo estado do
estratos eó licos, Bonaparte (1996) atribui Paraná (Scherer & Goldberg, 2007).
uma idade Neojurá ssica‑Eocretá cea para a A Formaçã o Botucatu é constituı́da
Formaçã o Botucatu, hipó tese admitida por essencialmente pela acumulaçã o de um sis‑
Milani (2007) para a elaboraçã o do arcabou‑ tema eó lico seco em uma ampla bacia topo‑
ço estratigrá ico do Mesozoico da Bacia do grá ica, integralmente preservado por
Paraná . No entanto, conforme discutido por derrames vulcâ nicos penecontemporâ neos
Scherer (2002), a ı́ntima relaçã o dos arenitos do Grupo Serra Geral (Scherer, 2002), asso‑
com as lavas, a pequena espessura e a inexis‑ ciados à ruptura do Gonduana. Sendo assim,
tê ncia de supersuperfı́cies (representando uma fraçã o signi icativa da acumulaçã o eó li‑
hiatos signi icativos) dentro do pacote eó lico, ca da Formaçã o Botucatu nã o seria incorpo‑
sugerem que na porçã o meridional da bacia rada ao registro geoló gico se um
do Paraná , a Formaçã o Botucatu compreende vulcanismo estocá stico e catastró ico nã o ti‑
um intervalo de tempo mais reduzido, tendo vesse ocorrido na porçã o sul do Gonduana,
a acumulaçã o eó lica ocorrido no má ximo al‑ no inı́cio do Cretá ceo. Devido ao recobri‑
gumas centenas de milhares de anos antes mento das dunas eó licas, pelos derrames
do vulcanismo Serra Geral. vulcâ nicos, e à posterior subsidê ncia lexu‑
ral decorrente do peso da pilha vulcâ nica,
3.5.4 Estratigra ia de sequências e corre‑ toda a acumulaçã o foi incorporada ao regis‑
lações regionais tro geoló gico, inclusive o intervalo que esta‑
va, inicialmente, situado acima do espaço de
A Formaçã o Botucatu corresponde, preservaçã o.
juntamente com o Grupo Serra Geral, a uma
ú nica sequê ncia deposicional, limitada, na 4 CONSIDERAÇÕES FINAIS
base, por uma paraconformidade ou discor‑
dâ ncia angular, ao longo da sua á rea de ocor‑ O intervalo estratigrá ico sedimen‑
rê ncia (Fig. 2). Essa unidade se extende por tar do Mezosoico do Rio Grande do Sul pode
uma á rea de mais de 1,5 milhã o de km2, a lo‑ ser subdividido em diferentes unidades es‑
rando ao longo de toda a borda da Bacia do tratigrá icas, sendo assim designadas: For‑
Paraná , incluindo á reas no Brasil, Uruguai, maçã o Sanga do Cabral, Formaçã o Santa
Argentina e Paraguai, alé m de apresentar de‑ Maria, Formaçã o Caturrita, Formaçã o Guará ,
pó sitos correlatos no continente africano Arenito Pedreira e Formaçã o Botucatu. A
(e.g. Formaçã o Twyfenfontein) (Stanistreet e porçã o a lorante dessas unidades ocorrem
Stollhofen, 1999). Apresenta uma uniformi‑ em trê s blocos estruturais distintos (Oeste,
dade facioló gica, ao longo da sua á rea de Central e Leste), limitados por falhas regio‑
ocorrê ncia, composta essencialmente por es‑ nais herdadas do embasamento. Cada bloco
tratos cruzados de dunas eó licas (Scherer & tectô nico apresenta uma sucessã o estrati‑
Goldberg, 2007). As paleocorrentes das du‑ grá ica especı́ ica, marcada pela ausê ncia de
nas eó licas indicam uma variaçã o no sentido uma ou mais unidades estratigrá icas. A su‑
dos paleoventos, ao longo da á rea de ocor‑ cessã o sedimentar mesozoica pode ser sub‑

300 Edição da Sociedade Brasileira de Geologia – Núcleo RS/SC


Scherer et al.

dividida em cinco sequê ncias deposicionais communities of eastern and western


distintas, limitadas por discordâ ncias de ori‑ Gondwana. Geores. Forum, 1: 427‑432.
gem tectô nica, correspondendo aos seguin‑
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Cabral, Santa Maria‑Caturrita, Guará , Pedrei‑ Sul, Brasil. Pesquisas, 4: 1‑101.
ra e Botucatu‑Serra Geral. A Sequê ncia Santa
Maria‑Caturrita ainda pode ser subdividida Da‑Rosa, A. A. S. & Faccini, U. F. 2005. Delimi‑
em quatro sequê ncias deposicionais, de mais taçã o de blocos estruturais de diferentes es‑
alta resoluçã o. Embora as sequê ncias meso‑ calas em seqü ê ncias mezosó icas do Estado
do Rio Grande do Sul: implicaçõ es bioestrati‑
zoicas tenham sido inseridas na Bacia do Pa‑
gra icas. Gaea‑Journal of Geoscience, 1(1): 16‑
raná , elas devem representar bacias 23.
distintas, com mecanismos de subsidê ncia
independentes. Dessa forma, pode‑se consi‑ Dentzien‑Dias, P. C., Schultz, C. L. & Bertoni‑
derar a Bacia do Paraná como uma bacia su‑ Machado, C. 2008. Taphonomy and paleoeco‑
cessó ria, caracterizada pela sobreposiçã o de logy inferences of vertebrate ichnofossils
from Guará Formation (Upper Jurassic),
diferentes bacias sedimentares, que ocupam
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a mesma á rea geográ ica do Gonduana. As Earth Sciences, 25: 196‑202.
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304 Edição da Sociedade Brasileira de Geologia – Núcleo RS/SC


As Crateras de Impacto
Cerro do Jarau (RS) e
Domo do Vargeão (SC), Brasil
Ruy Paulo Philipp1*, Carlos Augusto Sommer1, Jairo Francisco Savian1,
Elder Yokoyama2, Matheus Philipe Brückmann3

1
Instituto de Geociê ncias, Universidade Federal do Rio Grande do Sul
2
Instituto de Geociê ncias, Universidade de Brası́lia
3
Programa de Pó s‑graduaçã o em Geociê ncias, Universidade Federal do Rio Grande do Sul

* autor correspondente: ruy.philipp@ufrgs.br

1 INTRODUÇÃO
As evidê ncias da existê ncia de meteoros e de outros corpos celestes sã o muito antigas e
estã o registradas nas mitologias das antigas civilizaçõ es. Em tempos modernos, observamos o
impacto de corpos celestes na superfı́cie da Lua e em outros planetas, como Marte, Mercú rio e
Jú piter, por exemplo. També m sã o frequentes as imagens da passagem e os fragmentos fı́sicos
de meteoritos, que caı́ram na superfı́cie da Terra, os quais estã o conservados em museus, em
universidades e em centros de pesquisa. O impacto de meteoritos transfere elevadas taxas de
pressã o para uma á rea muito restrita, que absorve o impacto, atravé s da propagaçã o de ondas
de choque entre as rochas. O impacto resulta em uma estrutura deprimida, de forma circular e/
ou elı́ptica, que, por vezes, apresenta soerguimento central. Essa estrutura é acompanhada pela
formaçã o de rochas metamó r icas caracterı́sticas, como brechas de impacto e de fusã o, alé m de
estruturas, como cones de estilhaçamento (shatter cones), e de feiçõ es microscó picas, de defor‑
maçã o planar, que marcam a ruptura da estrutura cristalina dos minerais das rochas impacta‑
das, como Planar Fractures (PF), Planar Deformational Features (PDF) e Feather Features (FF).
Estas feiçõ es sã o diagnó sticas do metamor ismo de impacto (schock metamorphism) (French,
1998; French & Koeberl, 2010; Poelchau & Kenkmann, 2011).
Na superfı́cie da Terra, a preservaçã o das crateras de impacto é limitada, em funçã o da
dinâ mica interna do planeta e do desgaste dos processos intempé ricos na superfı́cie. As estru‑
turas de impacto mais preservadas foram geradas durante o Fanerozoico (<540 Ma), e constitu‑
em a sua maioria. Entretanto, em ambientes desé rticos e em á reas de grande estabilidade
tectô nica, como nos crá tons, estã o preservadas crateras de idades Pré ‑Cambrianas, como Vre‑
defort (Africa do Sul, 160 km, 2.02 Ga), Shoemaker (Austrá lia, 30 km, 1.63 Ga) e Sudbury (Cana‑
Contribuições à Geologia do Rio Grande do Sul e de Santa Catarina

dá , 130 km, 1.85 Ga); esta ú ltima, associada a elı́ptica, observada em antigas imagens de
um complexo ı́gneo estratiforme, cuja origem radar, em fotogra ias aé reas e em mapas to‑
dos magmas é atribuı́da ao choque do im‑ pográ icos. A partir do ano 2000, os dados
pacto (e.g. Baratoux & Reimold, 2016; Sch‑ coletados pela Missã o Topográ ica de Radar
mieder & Kring, 2020). Embarcado (Shuttle Radar Topography Missi‑
A cratera Chicxulub, com cerca de on (SRTM)), permitiram a obtençã o de mo‑
180 km de diâ metro, situada na Penı́nsula do delos digitais de alta resoluçã o de terrenos.
Iucatã , no sudeste do Mé xico, é uma das mai‑ As imagens de diversos saté lites (LANDSAT,
ores estruturas de impacto soterradas da ASTER) e as imagens do Google permitiram
Terra. Ocorrido no limite entre o Cretá ceo e o o rá pido acesso à s formas da superfı́cie da
Paleó geno (66 milhõ es anos atrá s), este im‑ Terra. Entretanto, uma feiçã o circular em
pacto é interpretado como um dos principais uma imagem pode representar outros fenô ‑
fatores envolvidos em um processo de extin‑ menos geoló gicos, como caldeiras vulcâ ni‑
çã o em massa da fauna e da lora, que incluiu cas, diques anelares e radiais, complexos
os dinossauros (Schulte et al., 2010). Anteri‑ alcalinos e/ou feiçõ es de erosã o diferencial
ormente, visto como um fenô meno restrito e em rochas sedimentares e vulcâ nicas. Desta
pouco identi icado, o reconhecimento do im‑ forma, os dados de campo sã o fundamentais,
pacto de meteoritos aumentou com o acesso para uma avaliaçã o de initiva (French, 1998;
a imagens de saté lite. Os olhares do mundo French & Koeberl, 2010). O impacto de me‑
observaram o cruzamento de cometas e de teoritos ocasiona a formaçã o de brechas de
nuvens de meteoros (Ex. Lirı́adas, Eta‑Aqua‑ impacto, de fusã o e de injeçã o nas porçõ es
ridas, Geminı́deos, entre outras), e a coleta mais super iciais e, em zonas mais profun‑
de amostras de meteoritos resultou em um das, as rochas impactadas mostram estrutu‑
grande banco de dados mineraló gico, ge‑ ras do tipo cones de estilhaçamento e
oquı́mico, geocronoló gico e isotó pico (Nor‑ microestruturas de deformaçã o planar, prin‑
ton & Chitwood, 2008). A promoçã o de cipalmente, em tectossilicatos. As brechas
simpó sios, de congressos e de outras ativida‑ tê m estrutura maciça e se caracterizam por
des, relacionadas à geologia de impacto, pro‑ clastos (fragmentos) angulosos das rochas
porcionou o envolvimento de pesquisadores impactadas e por porçõ es irregulares de vi‑
de outras linhas tradicionais (Geologia Es‑ dro vulcâ nico, envoltas por uma matriz ina,
trutural, Mineralogia, Petrologia, Geofı́sica), contendo fragmentos de minerais. Nas ro‑
que, de modo inesperado, tiveram que en‑ chas impactadas, os cones de estilhaçamento
frentar os efeitos do metamor ismo de im‑ se caracterizam por feiçõ es de forma cô nica
pacto no curso de suas investigaçõ es. As ou de leque, com dimensõ es entre 10 cm e
demandas geoló gicas mais recentes tê m 35 cm, constituı́das por um conjunto de fra‑
identi icado novos desa ios, como caracteri‑ turas curvas, que formam estrias divergen‑
zar e determinar os efeitos de impactos pre‑ tes, que se irradiam a partir de um de um
servados na superfı́cie da Terra, bem como ponto apical (Sagy et al., 2004; French & Ko‑
aplicar estes conhecimentos em problemas eberl, 2010; Baratoux & Reimold, 2016). Ao
geoló gicos signi icantes, como a prospecçã o microscó pio, as rochas impactadas conser‑
de minerais metá licos e de á gua subterrâ nea, vam suas estruturas e minerais originais e
no turismo cientı́ ico e nas atividades de pre‑ registram o choque, formando microestrutu‑
servaçã o do patrimô nio. ras denominadas feiçõ es de deformaçã o pla‑
A feiçã o mais caracterı́stica das cra‑ nar (PF, PDF e FF), que afetam a rede
teras de impacto é a sua forma circular ou cristalina do quartzo e dos feldspatos. Estas

306 Edição da Sociedade Brasileira de Geologia – Núcleo RS/SC


Philipp et al.

feiçõ es resultam de deformaçõ es, associadas 2. 1 Cerro do Jarau


à passagem da onda de choque, e caracteri‑
zam estruturas diagnó sticas de impacto de A estrutura do Cerro do Jarau é o re‑
meteoritos (French & Koeberl, 2010; Poel‑ manescente erodido de uma cratera situada
chau & Kenkmann, 2011). na porçã o sudeste da Bacia do Paraná (coor‑
As principais estruturas de impacto denadas 30o11’S/56o32’W), na Divisa entre
registradas no Brasil, como Araguainha (MT‑ Brasil e Uruguai (Fig. 1B). A cratera tem forma
GO), Serra da Cangalha (TO), entre outras, elı́ptica e possui cerca de 20 km de compri‑
mostram as feiçõ es descritas acima e compro‑ mento (E‑W) e 16 km de largura (N‑S). A por‑
vam a origem, relacionada ao impacto de me‑ çã o central soerguida é composta por dois
teoritos. A regiã o sul do Brasil se destaca no nú cleos circulares, constituı́dos por rochas se‑
cená rio nacional pelas crateras de impacto de dimentares do Jurá ssico Superior, envoltas
Vista Alegre (PR), de Vargeã o (SC) e do Cerro por lavas bá sicas da Formaçã o Torres, do Cre‑
do Jarau (RS). Estas ú ltimas estruturas tê m tá ceo Inferior (Fig. 2C). O nú cleo principal se
dimensõ es entre 10 km e 15 km e estã o situa‑ destaca, no relevo regional, por um conjunto
das na porçã o oeste dos estados do RS e de SC de cristas, constituı́das por arenitos eó licos,
(Fig. 1). A idade má xima para o impacto é a ricos em quartzo, da Formaçã o Botucatu, com
idade de resfriamento das lavas bá sicas do disposiçã o arqueada e que caracterizam o seu
Grupo Serra Geral (Formaçã o Torres), de limite externo (Figs. 2A e 2B). A porçã o cen‑
~130 Ma. Tais estruturas apresentam porçã o tral, e rebaixada, tem morfologia plana e está
central (nú cleo) soerguida, expondo, em jane‑ composta por arenitos arcoseanos alterados
las estruturais, os arenitos eó licos sotopostos, da Formaçã o Guará (Fig. 2E). Os arenitos de
pertencentes ao Grupo Sã o Bento (formaçõ es ambas as formaçõ es apresentam composiçã o
Botucatu e Guará ), de idade Juro‑Cretá cea. Es‑ rica em quartzo e ocorrê ncia subordinada de
te capı́tulo apresenta uma revisã o das crate‑ feldspatos, caracterizando uma composiçã o
ras do Cerro do Jarau e de Vargeã o, com dominada por sublitarenitos, para as rochas
destaque para a divulgaçã o de novos dados da Fm. Guará , e por sublitarenitos a quartzo‑
sobre a primeira estrutura de impacto. arenitos, para as rochas da Fm. Botucatu (Fig.
1G). A avaliaçã o da proveniê ncia detrı́tica, por
També m foram registradas quedas de
aná lise petrográ ica dos arenitos de ambas as
meteoritos no RS e em SC, com a descriçã o de
formaçõ es, indicou composiçõ es derivadas do
meteoritos pé treos (Hermenegildo, Lavras do
interior cratô nico ou de reciclagem orogê nica
Sul, Mafra, Putinga, Santa Bá rbara e Santa Vi‑
(Fig. 1H). O contato entre as rochas vulcâ nicas
tó ria do Palmar) e metá licos (Blumenau, Ca‑
e os arenitos da Fm. Botucatu está encoberto,
çapava do Sul, Cruz Alta, Nova Petró polis,
na maior parte da estrutura. Quando expos‑
Porto Alegre, Santa Catharina e Soledade). No
tos, entretanto, os contatos sã o por falha e es‑
RS, um dos meteoritos mais bem preservados
tã o marcados, em campo, por zonas de
é o Putinga (Keil et al., 1978), espé cime pé ‑
intenso fraturamento. Na porçã o leste, o con‑
treo de condrito do tipo‑L, com 45 cm de diâ ‑
tato entre as lavas basá lticas e as areias eó li‑
metro e com 300 kg de peso, coletado na
cas está caracterizado pela formaçã o de
cidade homô nima, em 1937, e mantido no
peperitos, constituindo corpos com disposi‑
Instituto de Geociê ncias, da UFRGS (Fig. 2).
çã o sub‑horizontal e com espessuras entre 30
cm e 2 metros (Philipp et al., 2010).
2 ESTRUTURAS DE IMPACTO DA REGIÃO
Inicialmente, a estrutura foi interpre‑
SUL
tada como o resultado da intrusã o de um cor‑

As Crateras de Impacto Cerro do Jarau (RS) e Domo do Vargeão (SC), Brasil 307
Contribuições à Geologia do Rio Grande do Sul e de Santa Catarina

po ı́gneo subvulcâ nico ou relacionada à evo‑ tos de modo centrı́peto, na porçã o central, e
luçã o de estruturas tectô nicas regionais. A centrı́fugo, na porçã o externa da estrutura
interpretaçã o como uma cratera de impacto (Fig. 2D). Os limites externos sã o de inidos
foi suportada pelo reconhecimento de fei‑ pelos arroios Garupá e Quaraı́‑Mirim, ao
çõ es de deformaçã o planares (PF e PDF) em norte e ao sul, e pelo rio Quaraı́, a oeste. O
grã os de quartzo e de feldspato (Hachiro et nú cleo central foi soerguido e está composto
al., 1995) e, mais tarde, por brechas de im‑ por duas estruturas circulares, situadas lado
pacto, acompanhadas por estruturas do tipo a lado, com cerca de 4 quilô metros e de 7
shatter cones em arenitos e em basaltos im‑ quilô metros de diâ metro (Fig. 2F). A porçã o
pactados (Philipp et al., 2010; Cró sta et al., externa do nú cleo principal constitui, em
2010a). Levantamentos de gravimetria na mapa, um cı́rculo quase completo, e caracte‑
estrutura constataram uma anomalia nega‑ riza, em campo, um relevo positivo, compos‑
tiva no nú cleo central, com um pequeno nú ‑ to por cristas arqueadas de arenitos eó licos
cleo positivo, relacionado a fontes da Fm. Botucatu (Fig. 2C). A porçã o interna é
magmá ticas de subsuperfı́cie, envolto por plana e rebaixada e expõ e os arenitos arco‑
anomalias positivas, que correspondem à s seanos alterados da Fm. Guará . A estrutura
cristas de arenitos eó licos, que marcam o li‑ menor, localizada a oeste, constitui uma co‑
mite externo do nú cleo soerguido (Calbo, xilha pouco elevada, composta por arenitos
2006). A aná lise estratigrá ica detalhada e da Fm. Botucatu. Ambas as estruturas cen‑
os dados termocronoló gicos de traços de trais estã o envoltas por uma á rea de relevo
issã o da apatita demonstraram que a estru‑ plano, constituı́da por derrames basá lticos
tura experimentou dois perı́odos principais da Fm. Torres. O contato entre as unidades
de erosã o, apó s o evento de impacto, entre sedimentares está marcado por uma discor‑
100‑80 Ma e 65‑22 Ma (Oliveira et al., 2016; dâ ncia angular preservada no setor sudoes‑
Machado et al., 2019). No entanto, enquanto te da estrutura. Em quase toda a extensã o do
a erosã o foi su iciente para remover os de‑ nú cleo, os contatos sã o por falha, com expo‑
pó sitos (brechas), relacionados ao impacto, siçõ es alinhadas de lajeados rochosos, com
o piso da estrutura permaneceu bem pre‑ intenso fraturamento (Fig. 3A). Os cortes de
servado e exposto, com geometria concê n‑ estrada e os lajeados situados na porçã o les‑
trica e fraturamento radial, tı́picos de uma te da estrutura, expõ em a mistura entre la‑
grande cratera de impacto (Cró sta et al., vas e areias eó licas, na forma de peperitos
2010a; Philipp et al., 2010). A evoluçã o do (Fig. 3D). A estreita coroa de “brechas vulcâ ‑
conhecimento, as principais propostas es‑ nicas” (Sá nchez et al., 2014), que envolve o
tratigrá icas e a caracterizaçã o das feiçõ es nú cleo soerguido, preserva o registro da su‑
diagnó sticas podem ser encontradas em perfı́cie de interaçã o entre as lavas e a areia
Philipp et al. (2010), em Cró sta et al. (Fig. 2C).
(2010a) e em Sá nchez et al. (2014). Observaçõ es estruturais e de senso‑
riamento remoto mostram que as feiçõ es
2. 1. 1 Aspectos morfológicos e estrutu‑ concê ntricas estã o distribuı́das em trê s á re‑
rais as, situadas a 4‑5 km, a 6‑8 km e a 10‑12 km
do centro da estrutura (Fig. 2F). As feiçõ es
A estrutura do Cerro do Jarau tem principais, situadas no nú cleo, de inem o
forma elı́ptica, ressaltada, nas imagens de contato entre as rochas sedimentares e as
saté lite, por uma rede de drenagens, com vulcâ nicas. A principal caracterı́stica sã o as
padrõ es radial e anelar complexos, dispos‑ cristas de arenitos eó licos, que delimitam e

308 Edição da Sociedade Brasileira de Geologia – Núcleo RS/SC


Philipp et al.

Figura 1 ‒ A) Localizaçã o da Bacia do Paraná , na Amé rica do Sul, e mapa geoló gico, destacando as
supersequê ncias deposicionais, as principais estruturas tectô nicas e a localizaçã o das crateras de impacto da
regiã o sul do Brasil; B) Mapa geoló gico da regiã o oeste do RS; C) Foto do Meteorito Putinga; D) Fotomicrogra ia,
em nicó is descruzados, de uma seçã o delgada do meteorito, destacando os principais minerais e cô ndrules
(Cdr); E) Mesma imagem anterior, em nicó is cruzados; F) Detalhe da imagem anterior. Legenda: Hy ‑
Hiperstê nio, M ‑ Maskelenita, NF ‑ ó xidos de ferro e nı́quel e Ol ‑ Olivina; G) Diagrama de classi icaçã o dos
arenitos das formaçõ es Guará e Botucatu; e H) Diagrama de proveniê ncia dos arenitos (OS = composiçã o dos
arenitos da Fm. Guará da regiã o de Osó rio, RS).

As Crateras de Impacto Cerro do Jarau (RS) e Domo do Vargeão (SC), Brasil 309
Contribuições à Geologia do Rio Grande do Sul e de Santa Catarina

Figura 2 ‒ A) Vista geral do Cerro do Jarau, constituı́da por uma crista arqueada de arenitos eó licos da Fm.
Botucatu, que caracterizam o limite externo do nú cleo principal da estrutura (vista para leste, seta A, Fig.2D);
B) Mesma feiçã o anterior, vista a partir do extremo oeste (seta B, Fig.2D); C) Mapa geoló gico do Cerro do Jarau,
destacando a forma elı́ptica da estrutura de impacto (linha preta tracejada) e os dois nú cleos internos (linha
vermelha tracejada) (seçõ es geoló gicas AB e CD, indicadas no mapa); D) Imagem de saté lite do Google na
mesma escala do mapa anterior, destacando o aspecto radial e anelar dos sistemas de drenagens; E) Vista do
Cerro do Jarau, a partir do centro da estrutura; e F) Interpretaçã o da imagem de saté lite da Fig.2D, destacando
os principais lineamentos tectô nicos e as estruturas anelares geradas pelo impacto do meteorito.

que circundam o nú cleo elevado, principal‑ a 6 km de comprimento. Os limites da crate‑


mente, em seu segmento norte (Fig. 3A). As ra estã o de inidos por estruturas concê ntri‑
feiçõ es concê ntricas, situadas nas porçõ es in‑ cas, observadas nos basaltos da Fm. Torres,
termediá rias e externas, estã o registradas constituindo zonas de fraturas e sistemas de
nos basaltos, que envolvem o nú cleo, como falhas, em forma de arco, separados por de‑
longas fraturas, em forma de anel, com 2 km zenas a centenas de metros. Nã o há consen‑

310 Edição da Sociedade Brasileira de Geologia – Núcleo RS/SC


Philipp et al.

so, quanto à localizaçã o da borda da estrutu‑ O soerguimento do nú cleo é o resul‑


ra, principalmente, pela ausê ncia de uma fei‑ tado da ascensã o das rochas sedimentares
çã o de relevo. A maioria sugere um diâ metro que se encontravam sotopostas pela cober‑
em torno de 13,5 km (Cró sta et al., 2010a; tura de basaltos da Fm. Torres, pelo alı́vio de
Philipp et al., 2010), poré m os arranjos con‑ carga, apó s o impacto e durante os está gios
cê ntricos observados nas imagens sugerem intermediá rios de constituiçã o da cratera.
um limite de 20 km a 22 km. Os ané is inter‑ Este soerguimento é acompanhado pela for‑
no e intermediá rio foram segmentados por maçã o de sistemas de falhas radiais e anela‑
falhas radiais (ou oblı́quas) e nã o mostram res, que sã o feiçõ es estruturais muito
evidê ncias de deslocamento lateral. Os ba‑ proeminentes na porçã o central da cratera. A
saltos externos preservam uma estrutura de duas estruturas soerguidas do nú cleo estã o
luxo sub‑horizontal (Fig. 3C). separadas por uma falha longa e contı́nua, de
A geometria do acamadamento das direçã o NW‑SE, que se estende para alé m dos
rochas sedimentares é complexa, com di i‑ limites da cratera. Esta falha é seccionada
culdades impostas pela estrati icaçã o cruza‑ pelas estruturas do impacto, sugerindo que o
da de grande porte e pela intensa rede de mesmo é posterior à formaçã o desta estrutu‑
fraturas dos arenitos. Alguns autores rela‑ ra tectô nica. Apesar das feiçõ es lineares bem
tam mergulho das camadas para fora da es‑ desenvolvidas, o reconhecimento das falhas
trutura (Cró sta et al., 2010a), enquanto em campo é raro, provavelmente, pelo inten‑
outros destacam uma disposiçã o centrı́peta so fraturamento, que afeta os arenitos, e pela
(Sá nchez et al., 2014) ou, mesmo, uma inde‑ ausê ncia de camadas marcadoras. As falhas
iniçã o, devido à natureza das estrati icaçõ es radiais estã o dispostas em toda a estrutura,
(Philipp et al., 2010). Os dados estruturais enquanto as falhas anelares se concentram
indicam um padrã o centrı́peto para o aca‑ no nú cleo, no contato entre os arenitos e os
mamento dos arenitos da Fm. Guará no nú ‑ basaltos. A continuidade das superfı́cies de
cleo central (Cró sta et al., 2010; Sá nchez et falhas varia de poucos metros a centenas de
al., 2014). A parte central da estrutura cons‑ metros, e os principais conjuntos de fraturas
titui um alto estrutural principal de 7 km de estã o dispostos ortogonalmente à s falhas ra‑
diâ metro, composto por um nú cleo plano diais e sã o subparalelos à s falhas anelares.
circular de 4‑5 km de largura, de arenitos da As falhas radiais se destacam e mostram uma
Fm. Guará , envoltos na sua porçã o norte por extensã o restrita, com relaçã o à s falhas regi‑
um colar externo de cristas de arenitos eó li‑ onais, de direçõ es NW‑SE e NE‑SW, geradas
cos da Fm. Botucatu, com cerca de 1‑2 km de antes do impacto. Outra caracterı́stica im‑
largura e 270 m de elevaçã o (Philipp et al., portante é o desenvolvimento de bandas de
2010; Cró sta et al., 2010a). Esta feiçã o ar‑ cisalhamento cataclá sticas nas zonas de fa‑
queada é afetada por falhas e por fraturas lhas.
radiais, que segmentam as cristas e que con‑ A brechaçã o dos arenitos impacta‑
trolam a instalaçã o dos principais sistemas dos do nú cleo forma diques de brechas de
de drenagens. A á rea circundante é uma de‑ impacto monomı́ticas, de até um metro de
pressã o rasa e plana, composta por luxos de espessura, alé m de veios de 1‑5 mm de es‑
basalto da Fm. Torres. Uma segunda estrutu‑ pessura (Fig. 3E). Os diques sã o raros e ocor‑
ra elı́ptica, com cerca de 5 km de diâ metro e rem, ao longo das principais falhas radiais.
delimitada por falhas anelares, ocorre a oes‑ As brechas sã o constituı́das por clastos de
te do nú cleo principal, expondo os arenitos arenitos, com formas angulosas, de tamanho
da Fm. Botucatu. milimé trico a centimé trico, envoltas por uma

As Crateras de Impacto Cerro do Jarau (RS) e Domo do Vargeão (SC), Brasil 311
Contribuições à Geologia do Rio Grande do Sul e de Santa Catarina

Figura 3 ‒ A) Crista arqueada, expondo os arenitos da Fm. Botucatu na porçã o NW do nú cleo; B)
Fotomicrogra ia do quartzo arenito da Fig.3A; C) Basalto da Fm. Torres, com estrutura de luxo suborizontal; D)
Peperito, constituı́do por fragmentos subarredondados de basaltos vesiculares/amigdaloidais, envoltos por
matriz constituı́da por grã os de quartzo (areia ina a mé dia); E) Brecha de impacto monomı́tica em forma de
dique, constituı́da por fragmentos angulosos de arenitos arcoseanos, envoltos por material afanı́tico, de cor
vermelha (vidro alterado) (Fm. Guará , na porçã o centro‑leste do nú cleo); F) Fotomicrogra ia, em nicó is
descruzados, da brecha anterior, mostrando a porçã o vı́trea alterada em tom escuro, grã os de quartzo (areia
ina‑mé dia) e uma matriz ina; G) Detalhe da imagem anterior, ressaltando as porçõ es vı́treas, com formas
ameboides; H) Brecha de impacto monomı́tica, com fragmentos de basalto por irı́tico de cor cinza, envoltos
por matriz avermelhada, constituı́da por fragmentos milimé tricos de basalto, cobertos por vidro vulcâ nico
alterado; I) Cones de estilhaçamento, em arenito eó lico, da Fm. Botucatu, na porçã o norte do nú cleo principal;
J) Mesma feiçã o, em arenitos eó licos da porçã o leste do nú cleo; K) Fotomicrogra ia de arenito da Fm. Guará ,
destacando grã o de quartzo (areia mé dia ‒ ~ 0.4 mm), com microestruturas do tipo PDF, desenvolvidas em
trê s orientaçõ es cristalográ icas (setas brancas) e com estruturas do tipo PF (seta vermelha); e L)
Fotomicrogra ia de quartzo arenito da Fm. Botucatu, destacando grã o de quartzo tamanho areia grossa (1.2
mm), com microestruturas do tipo PDF, desenvolvidas em duas orientaçõ es cristalográ icas (setas amarelas e
pretas), em parte, acompanhadas por estruturas do tipo FF (seta branca).

matriz homogê nea, de cor vermelha e de quenos fragmentos de minerais.


granulaçã o ina a criptocristalina, interpre‑ A feiçã o mais caracterı́stica dos are‑
tada como vidro vulcâ nico alterado (Figs. 3F nitos da porçã o central da estrutura é o in‑
e 3G). Os veios sã o observados, junto aos di‑ tenso fraturamento. As estruturas radiais e
ques, e sã o constituı́dos por uma matriz anelares, observadas nas imagens de saté li‑
criptocristalina vermelha (oxidada), com pe‑ te, manifestam‑se, em campo, como exten‑

312 Edição da Sociedade Brasileira de Geologia – Núcleo RS/SC


Philipp et al.

sos campos de matacõ es e como blocos inten‑ nou os sistemas luviais, que depositaram
samente afetados por sistemas de fraturas. As parte das unidades dos grupos Rosá rio do
fraturas de cisalhamento e de extensã o obser‑ Sul e Sã o Bento (Philipp et al., 2018). Estas
vadas estã o associadas com a formaçã o de estruturas també m atuaram na ascensã o e
bandas de deformaçã o cataclá stica, indicando no extravasamento das lavas do Grupo Serra
que a deformaçã o rú ptil gerada pelo impacto Geral. Os arenitos da Formaçã o Botucatu
foi absorvida pela movimentaçã o relativa das ocorrem ao longo de duas trilhas alinhadas
falhas radiais e anelares e pela quebra tectô ‑ segundo a direçã o N45oW (Uruguaiana‑Qua‑
nica dos grã os, durante o luxo cataclá stico lo‑ raı́ e Itaqui‑Alegrete) (Fig. 1B). Na fronteira
calizado. A formaçã o comum de bandas de com o Uruguai, estã o expostos em quatro ja‑
deformaçã o cataclá stica nos arenitos eó licos é nelas estruturais descontı́nuas, sugerindo
o principal elemento de deformaçã o observa‑ um controle tectô nico, embora exista a pos‑
do nas zonas afetadas pelas falhas. As bandas sibilidade de o vulcanismo nã o ter encoberto
de deformaçã o dissipam a energia mecâ nica, totalmente as dunas do deserto Botucatu. Na
associada à cinemá tica das falhas, formando regiã o do Cerro do Jarau, as dunas do deser‑
inas faixas cataclá sticas, de espessuras entre to Botucatu interagiram com os derrames
1 mm e 5 mm, constituı́das por uma matriz i‑ basá lticos e, depois, foram soterradas pelas
na, que envolve os grã os de areia. Estas estru‑ lavas bá sicas da Fm. Torres (Scherer & Lavi‑
turas diminuem a porosidade dos arenitos e na, 2006).
causam o aumento da coesã o da rocha, asso‑ As falhas de direçã o NE‑SW estive‑
ciada à cimentaçã o e à dissoluçã o do quartzo. ram relacionadas à ruptura do Gondwana e à
abertura do Oceano Atlâ ntico, bem como aos
2. 1. 2 Estruturas tectônicas e de impacto está gios pré ‑rifte e sin‑rifte da Bacia de Pelo‑
tas (Stica et al., 2013). Os movimentos de ex‑
A geologia da porçã o oeste do RS ex‑ pansã o do assoalho oceâ nico resultaram em
põ e os derrames basá lticos do Grupo Serra tensõ es compressionais de direçã o NW‑SE,
Geral, com ocorrê ncias localizadas de rochas que reativaram os sistemas de falhas desta
sedimentares do Grupo Sã o Bento. Os areni‑ direçã o e que afetaram os derrames da for‑
tos da Formaçã o Guará de inem a base estra‑ maçã o Torres. O Sistema de Falhas Uruguai‑
tigrá ica do Cerro do Jarau, e caracterizam, ana‑Quaraı́ constitui um conjunto
pela sucessã o de fá cies luviais e eó licas, um descontı́nuo de falhas normais, subparalelas,
ambiente desé rtico, de condiçõ es semiá ridas que controlam o rio Quaraı́ e que cruzam, em
(Scherer & Lavina, 2006). Os arenitos eó licos diagonal, a estrutura do Cerro do Jarau. Es‑
da Fm. Botucatu, que os recobrem, marcam a tas estruturas tectô nicas foram superpostas
evoluçã o para um amplo deserto, de condi‑ pelas estruturas geradas com a formaçã o da
çõ es á ridas. A evoluçã o inal da BP foi caracte‑ cratera do Cerro do Jarau, conforme pode‑
rizada por processos de deformaçã o rú ptil, mos observar no mapa de lineamentos, ex‑
relacionados à separaçã o continental e à traı́do da imagem de saté lite ASTER, que
abertura do Oceano Atlâ ntico Sul. Na regiã o mostra uma grande intensidade de linea‑
oeste do RS, os principais sistemas de falhas mentos, de extensã o reduzida e de disposi‑
de direçã o NW‑SE, Jaguari‑Mata e Alegrete‑ çõ es concê ntrica e radial, concentrados na
Ibaré , estiveram ativos entre o Triá ssico Mé ‑ á rea da estrutura (Fig. 2F). Na porçã o central
dio e a metade do Cretá ceo e controlaram a do mapa, observa‑se duas falhas de direçã o
estruturaçã o do Arco do Rio Grande, de dire‑ NW‑SE, que se estendem para fora da estru‑
çã o N50‑60oW, cujo soerguimento condicio‑ tura, sugerindo que as mesmas sã o anterio‑

As Crateras de Impacto Cerro do Jarau (RS) e Domo do Vargeão (SC), Brasil 313
Contribuições à Geologia do Rio Grande do Sul e de Santa Catarina

res ao impacto. Deste modo, a relaçã o entre 2. 2 Domo do Vargeão


as estruturas tectô nicas regionais e aquelas
geradas pelo impacto sugere que a formaçã o A estrutura de impacto do Domo de
da cratera ocorreu, apó s a formaçã o das fa‑ Vargeã o está situada na regiã o oeste de Santa
lhas de direçã o NW‑SE. Os principais perı́o‑ Catarina (coordenadas 26o49’S/52o10’W),
dos de ativaçã o tectô nica da Bacia de Pelotas entre os limites dos municı́pios de Vargeã o,
foram estimados entre 134 Ma e 113 Ma (Sti‑ de Faxinal dos Guedes e de Passos Maia (Fig.
ca et al., 2013), e podem sugerir que o impac‑ 4A). A estrutura tem um diâ metro de 12,4
to ocorreu, apó s este perı́odo. quilô metros e constitui uma depressã o circu‑
lar, com mú ltiplos ané is internos, constituin‑
do colinas elevadas e um nú cleo central
2. 1. 3 Feições metamór icas do impacto
soerguido, com 3 km de diâ metro (Fig. 4B).
O reconhecimento de brechas de im‑ As principais feiçõ es de impacto estã o con‑
pacto, de cones de estilhaçamento em areni‑ centradas no nú cleo soerguido e expostas em
tos e em basaltos e de feiçõ es de deformaçã o cortes de estradas e em pedreiras (Cró sta et
intracristalina con irma a estrutura de im‑ al., 2012). A feiçã o circular identi icada, inici‑
pacto (Cró sta et al., 2010a; Philipp et al., almente, em imagens de radar, foi descrita
2010). Os raros depó sitos de brechas de im‑ como uma depressã o circular, com um pa‑
pacto polimı́ticas e monomı́ticas sã o preser‑ drã o de fraturas anelares e radiais, geradas
vados no nú cleo central da estrutura. As sobre rochas vulcâ nicas do Grupo Serra Geral
brechas polimı́ticas e de fusã o contê m clastos (ver referê ncias em Cró sta et al., 2012). A
de arenito e de basalto parcialmente derreti‑ ocorrê ncia de arenitos da Fm. Botucatu na
dos e contorcidos e sã o encontradas como porçã o central foi primeiramente interpreta‑
diques e como veios, que cortam os arenitos da como uma janela estratigrá ica, relaciona‑
das formaçõ es Guará e Botucatu (Figs. 3E‑ da a uma intrusã o alcalina nã o a lorante e
3G). Cones de estilhaçamento, com tamanhos associada a outros corpos, que cortam a ba‑
entre 5 cm e 15 cm, foram observados em cia (Lajes e Anitá polis).
arenitos (Fig. 3I) e em basaltos, situados na O mapeamento da á rea do Domo do
porçã o central (Fig. 3J) (Philipp et al., 2010; Vargeã o, associado à prospecçã o de petró leo
Cró sta et al., 2010a). Microestruturas dos ti‑ e de gá s, identi icou trê s derrames de rochas
pos PF e PDF em cristais de quartzo e em bá sicas e um derrame superior, de rochas
feldspato (Philipp et al., 2010; Cró sta et al., á cidas. Os autores ressaltaram os contatos
2010a) e, recentemente, a identi icaçã o de por falha entre os arenitos e os basaltos, con‑
microfraturas do tipo FF (Reimold et al., irmados pela identi icaçã o de brechas no in‑
2018) con irmam a passagem das ondas de terior da estrutura. Foram sugeridas quatro
choque em rochas impactadas (Fig. 3L). Es‑ prová veis origens para esta estrutura: (i)
tudos petrográ icos de Cró sta et al. (2010a) e tectô nica; (ii) explosã o criptovulcâ nica, por
de Reimold et al. (2018) concluı́ram que a escape de gases ou pelo choque de um mete‑
quantidade de pressã o liberada pelo impacto orito; (iii) caldeira vulcâ nica; ou (iv) intrusã o
foi entre 2 Gpa e 10 Gpa. Essa energia esca‑ de um complexo alcalino. Posteriormente,
vou uma seçã o vertical de 300 m a 500 m, Hachiro et al. (1993), entre outros, descreve‑
atravé s das rochas sedimentares do Grupo ram PDFs em grã os de quartzo e de feldspato
Sã o Bento (Jurá ssico Superior) e dos basaltos e formaçã o de vidro diaplé tico, comprovando
de cobertura do Grupo Serra Geral (Cretá ceo a origem por impacto. A estrutura que afetou
Inferior). as rochas vulcâ nicas bá sicas e as rochas sedi‑

314 Edição da Sociedade Brasileira de Geologia – Núcleo RS/SC


Philipp et al.

Figura 4 ‒ A) Mapa geoló gico da estrutura de impacto do Domo do Vargeã o (modi icado de Wildner et al.
(2014)); B) Imagem de saté lite do Google, destacando a feiçã o circular da estrutura de impacto do Vargeã o (SC);
C) Imagem de SRTM da estrutura de impacto do Domo do Vargeã o; e D) Interpretaçã o da imagem de saté lite,
destacando as estruturas concê ntricas (em vermelho) e as radiais (em preto).

mentares da Bacia do Paraná teve sua idade 2. 2. 1 Aspectos morfológicos e estrutu‑


de impacto, de 123 Ma (Nedelec et al., 2013), rais
determinada por dataçã o U‑Pb em zircã o.
As Crateras de Impacto Cerro do Jarau (RS) e Domo do Vargeão (SC), Brasil 315
Contribuições à Geologia do Rio Grande do Sul e de Santa Catarina

Apesar do está gio avançado de ero‑ minantes da Fm. Paranapanema, do Grupo


sã o, a morfologia original da estrutura do Serra Geral, e/ou com brechas delas deriva‑
Domo de Vargeã o está preservada por um das (Fig. 4A). Ao longo de toda a porçã o leste
padrã o de drenagem controlado por falhas e da estrutura, e em partes restritas das por‑
por fraturas radiais e anelares, em parte, dis‑ çõ es NW e SW, ocorrem pequenos corpos
secado pelos rios Chapecozinho e Barra anelares, constituı́dos por basaltos da Fm.
Grande (Fig. 4D). Situada em meio aos platô s Campos Novos. Em á reas mais externas e
de derrames de basaltos da Fm. Paranapane‑ elevadas, as rochas bá sicas sã o recobertas
ma e de corpos menores, de composiçã o á ci‑ pelos riodacitos da Fm. Chapecó . Sã o reco‑
da, a estrutura de impacto do Domo do nhecidos protó litos de todas as unidades,
Vargeã o é caracterizada por um nú cleo cen‑ embora as rochas registrem graus variados
tral soerguido, que expõ e os arenitos da Fm. de deformaçã o em toda a porçã o central da
Botucatu, originalmente situados abaixo dos estrutura. Os arenitos tê m cor rosa e compo‑
derrames basá lticos. Em imagens de saté lite siçã o quartzosa, apresentando estrati icaçã o
e em modelos de elevaçã o do terreno cruzada, de mé dio porte. Ocorrem como blo‑
(SRTM), a morfologia circular é complexa, cos de dimensõ es mé tricas e estã o muito
com padrã o multianelar registrado em cam‑ brechados, com fragmentos irregulares, en‑
po por conjuntos de cristas topográ icas, voltos por uma matriz arenosa parcialmente
com desnı́veis abruptos, em sua borda, de cominuı́da e de granulaçã o variá vel. Os ba‑
até 150 m (Fig. 4C). saltos tê m cor preta a cinza escura e textura
A ascensã o do nú cleo esteve associa‑ afı́rica a por irı́tica, com fenocristais ripifor‑
da à formaçã o de falhas rú pteis na porçã o mes de plagioclá sio, imersos em uma matriz
central e nos limites da cratera. Logo apó s o ina a afanı́tica. Os derrames do tipo paho‑
contato do meteorito com a superfı́cie ter‑ ehoe apresentam estrutura de luxo, com dis‑
restre, ocorreu a fase de escavaçã o, que de i‑ posiçã o sub‑horizontal, e zonas vesiculares
ne as bordas da cratera temporá ria, as quais no topo.
evoluem e entram em colapso, ao longo de As feiçõ es de campo do metamor is‑
falhas gravitacionais concê ntricas, que alter‑ mo de impacto incluem as brechas de impac‑
nam segmentos anelares soerguidos (horsts) to e as brechas de fusã o (com clastos de
e abatidos (grabens), de inindo a formaçã o rochas basá lticas), os cones de estilhaçamen‑
inal da cratera (Cró sta et al., 2012). As prin‑ to, desenvolvidos em arenitos e em basaltos,
cipais falhas rú pteis marcam os movimentos e as feiçõ es microscó picas, associadas aos
inversos, que afetam a porçã o central, e os processos de deformaçã o intracristalina em
normais, nas porçõ es externas. Associado a grã os de quartzo e em feldspatos. Cró sta et
essas falhas, foram descritas as principais al. (2012) descrevem brechas de impacto
feiçõ es de alteraçã o hidrotermal, desenvolvi‑ monomı́ticas, constituı́das por fragmentos
das apó s o impacto (Yokoyama et al., 2015). de basaltos, envoltos em uma matriz ina e
mal selecionada, ou compostas por fragmen‑
2. 2. 2 Aspectos litológicos e feições me‑ tos de arenitos (Fig. 5A). També m sã o obser‑
tamór icas do impacto vadas brechas polimı́ticas (Fig. 5B). As
brechas de fusã o apresentam fragmentos an‑
A porçã o central do Domo do Var‑ gulosos de rochas basá lticas, envoltos por
geã o expõ e grandes blocos de arenitos eó li‑ porçõ es vı́treas, com estrutura luidal, de cor
cos da Fm. Botucatu, delimitados por falhas, preta a avermelhada (alterada), gerados pela
em contato com os derrames basá lticos do‑ fusã o parcial das rochas pré ‑existentes. Em‑

316 Edição da Sociedade Brasileira de Geologia – Núcleo RS/SC


Philipp et al.

bora de ocorrê ncia restrita, as brechas de im‑ estã o caracterizadas por basaltos fraturados,
pacto estã o concentradas no nú cleo da crate‑ por vezes, com falhas radiais incipientes (Fig.
ra, onde constituem á reas mé tricas, que 5E). A porçã o central apresenta brechas de
envolvem arenitos e basaltos nã o deforma‑ impacto monomı́ticas e polimı́ticas (Fig. 5F),
dos (Cró sta et al., 2012). As brechas constitu‑ cones de estilhaçamento em arenitos e em
em as cristas concê ntricas, que caracterizam basaltos e feiçõ es do tipo PDFs em grã os de
o nú cleo soerguido. Nesta mesma regiã o, os quartzo (Pittarrello et al., 2015).
cones de estilhaçamento, observados em ba‑
saltos e em arenitos impactados, mostram 3 CONSIDERAÇÕES FINAIS
cones individuais, de dimensõ es entre 10
As crateras de impacto do Cerro do
centı́metros e 35 centı́metros (Fig. 5C). A
Jarau, do Domo de Vargeã o e de Vista Alegre
passagem da onda de choque afetou os areni‑
estã o caracterizadas por feiçõ es circulares,
tos e os basaltos impactados, que mostram
marcadas por sistemas de falhas e de fratu‑
feiçõ es microscó picas de deformaçã o rú ptil,
ras concê ntricas e radiais. A porçã o central
como cataclase e cominuiçã o, e feiçõ es de de‑
soerguida expõ e os arenitos sotopostos das
formaçã o planares (PDFs) em grã os de
formaçõ es Guará e/ou Botucatu, envoltos por
quartzo e em feldspatos (Fig. 5D) (Cró sta et
derrames de basaltos do Grupo Serra Geral
al., 2012). Medidas de direçõ es cristalográ i‑
(formaçõ es Torres e Paranapanema). As por‑
cas de PDFs distintas indicaram que o impac‑
çõ es de nú cleo estã o muito deformadas e
to gerou picos de pressã o superiores a 20
mostram ocorrê ncias restritas de brechas de
GPa (Kazzuo‑Vieira et al., 2004). De modo se‑
impacto, acompanhadas por cones de esti‑
melhante ao das feiçõ es encontradas no Cer‑
lhaçamento em arenitos e em basaltos e tam‑
ro do Jarau, os grã os de quartzo dos arenitos
bé m mostram feiçõ es de deformaçã o planar
mostram a formaçã o de bandas de deforma‑
(PF, PDF e FF) em grã os de quartzo e em
çã o, constituindo faixas de cominuiçã o, que
feldspatos. Este conjunto de feiçõ es caracte‑
afetam os grã os e a matriz dos arenitos. Estas
riza o metamor ismo de impacto que afetou
feiçõ es sã o pó s‑deposicionais e pó s‑diagené ‑
todas estas estruturas. A forma elı́ptica da
ticas (Cró sta et al., 2012).
estrutura do Cerro do Jarau pode sugerir que
o â ngulo de impacto do meteorito, com rela‑
2. 3 Vista Alegre
çã o à superfı́cie do Terreno foi entre 60o e
A estrutura de impacto de Vista Ale‑ 80o, enquanto as formas circulares do Domo
gre, situada na porçã o oeste do Paraná (coor‑ de Vargeã o e de Vista Alegre indicam um alto
denadas 25o57’S/52o41’W), tem estruturas e â ngulo de impacto. No caso de Vista Alegre,
feiçõ es muito semelhantes à s descritas no embora o nú cleo soerguido seja pouco de i‑
Vargeã o e no Cerro do Jarau. Formada, tam‑ nido, o menor grau de erosã o favorece à pre‑
bé m, sobre rochas vulcâ nicas bá sicas, apre‑ servaçã o de uma maior quantidade de
senta diâ metro de 9,5 km e idade má xima de impactitos (i.e. brechas polimı́ticas e mono‑
120 milhõ es de anos (Cró sta et al., 2010b). mı́ticas).
Está caracterizada por uma depressã o circu‑ O conjunto de evidê ncias apresenta‑
lar, com bordas externas ı́ngremes e com um das, até o presente, confere destacada impor‑
relevo interno suave, sem um nú cleo central tâ ncia à s estruturas de impacto do Cerro do
soerguido destacado, mas també m conté m, Jarau, do Domo de Vargeã o e de Vista Alegre,
em seu interior, blocos de arenitos eó licos de como raras ocorrê ncias de crateras de im‑
camadas inferiores. As bordas da estrutura pacto em territó rio brasileiro. Tais estruturas

As Crateras de Impacto Cerro do Jarau (RS) e Domo do Vargeão (SC), Brasil 317
Contribuições à Geologia do Rio Grande do Sul e de Santa Catarina

Figura 5 ‒ A) Brecha de impacto monomı́tica, com fragmentos de arenitos; B) Brecha de impacto polimı́tica,
com clastos de arenitos e de basaltos; C) Cones de estilhaçamento (Shatter Cones), em basalto; D)
Fotomicrogra ia, em nicó is descruzados, da brecha de impacto monomı́tica da Figura 5A, destacando os clastos
de arenitos e de grã os de quartzo, envoltos por uma matriz vı́trea (cor marrom escuro); E) Aspecto do basalto
impactado da estrutura de Vista Alegre (PR), ressaltando faixas de rochas cominuı́das, ao longo das fraturas do
impacto; e F) Brecha de impacto polimı́tica de Vista Alegre.

afetaram as rochas vulcâ nicas do Grupo Ser‑ cilidade de acesso à s á reas dos eventos e
ra Geral, que apresentam idade de ca. 134‑ aos principais a loramentos representati‑
131 Ma e que delimitam a idade mı́nima do vos. Destacam‑se as caracterı́sticas cê nicas
impacto. Igualmente, estas estruturas apre‑ destacadas e a colaboraçã o da populaçã o lo‑
sentam caracterı́sticas favorá veis, enquanto cal, que se mostra atuante na divulgaçã o e
sı́tios geoló gicos, das quais se destacam a fa‑ na preservaçã o destes patrimô nios naturais.

318 Edição da Sociedade Brasileira de Geologia – Núcleo RS/SC


Philipp et al.

Nesse sentido, sua transformaçã o em sı́tio French, B. M. & Koeberl, C. 2010. The convin‑
geoló gico contribuirá , para ins de estudos cing identi ication of terrestrial meteorite
cientı́ icos e de geoturismo. impact structures: What works, what do‑
esn’t, and why. Earth‑Science Reviews, 98:
123‑170.
AGRADECIMENTOS
Hachiro, J., Coutinho, J. M. V., Frascá , M. H. B.
Os autores agradecem ao CNPq, pelo O. & Menezes C. M. 1993. O estrutura de im‑
apoio à pesquisa, atravé s da bolsa de produ‑ pacto de Vargeã o (SC): Evidê ncias petrográ ‑
tividade e da bolsa de doutorado concedida a icas de um crateramento criptoexplosivo
Matheus P. Brü ckmann, e ao prof. Heinrich T. por petardo extraterrestre. In: SIMPOSIO DE
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As Crateras de Impacto Cerro do Jarau (RS) e Domo do Vargeão (SC), Brasil 319
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320 Edição da Sociedade Brasileira de Geologia – Núcleo RS/SC


Estratigra ia do Grupo Serra Geral
na Calha de Torres, Sul do Brasil
Lucas de Magalhã es May Rossetti1*, Matheus Silva Simões2, Evandro Fernandes de Lima3,
Breno Leitã o Waichel4, Carlos Augusto Sommer3

1
Faculdade de Geociê ncias, Universidade Federal do Mato Grosso
2
Serviço Geoló gico do Brasil (CPRM‑Manaus)
3
Instituto de Geociê ncias, Universidade Federal do Rio Grande do Sul
4
Universidade Federal de Santa Catarina

* autor correspondente: lucasross@hotmail.com

1 INTRODUÇÃO
A Provı́ncia Magmá tica Paraná ‑Etendeka (PMPE) é uma Grande Provı́ncia Ignea (GPI)
do Cretá ceo Inferior, caracterizada pela acumulaçã o de volumes imensos de rochas vulcâ nicas e
intrusivas em á reas continentais do paleocontinente Gondwana (Renne et al., 1992; Peate et al.,
1997). Os produtos desse magmatismo ocupam cerca de 1.700.000 km2 (Frank et al., 2009), dos
quais 90% estã o localizados na Amé rica do Sul, sobre a bacia do Chaco‑Paraná , e sã o agrupados
estratigra icamente no Grupo Serra Geral (GSG). Uma parte pequena da provı́ncia (c. 10%)
ocorre no leste da Africa, na Namı́bia (Grupo Etendeka) (Milner et al., 1994) e em Angola (Com‑
plexo Vulcâ nico Bero) (Marsh et al., 2018) (Fig. 1). O excelente grau de exposiçã o nas regiõ es
desé rticas da Namı́bia permitiu um notá vel detalhamento estratigrá ico (Milner et al., 1994; Jer‑
ram et al., 1999) e demonstrou a grande heterogeneidade dos espessos pacotes de lava da PM‑
PE. Estudos recentes, focados na evoluçã o estratigrá ica do GSG, produziram um arcabouço
atualizado e detalhado das sequê ncias vulcâ nicas no sul do Brasil (Waichel et al., 2012; Rossetti
et al., 2018). No presente trabalho, sã o apresentados e discutidos os avanços obtidos ao longo
das ú ltimas duas dé cadas de estudo sobre a sucessã o vulcanossedimentar da porçã o sul do
GSG.
Contribuições à Geologia do Rio Grande do Sul e de Santa Catarina

Figura 1 – (A) Mapa geoló gico da Provı́ncia Magmá tica Paraná ‑Etendeka; (B) Grupo Serra Geral na regiã o sul
do Brasil (modi icado de Rossetti et al., 2018); (C) Distribuiçã o estratigrá ica das formaçõ es na escarpa sul da
Serra Geral (modi icado de Rossetti et al., 2018).

2 A PROVÍNCIA MAGMÁTICA PARANÁ‑ servada uma bimodalidade em relaçã o ao


ETENDEKA conteú do de SiO2 (Piccirilo & Mel i, 1988),
com o predomı́nio de rochas de composi‑
A PMPE, assim como muitas GPIs, é çõ es bá sica e intermediá ria (97,5%) sobre
caracterizada por subprovı́ncias de inidas as de composiçã o á cida (2,5%).
com base em padrõ es geoquı́micos. Regio‑ Internamente os grupos de alto‑Ti e
nalmente, a provı́ncia foi dividida em grupos baixo‑Ti foram subdivididos, com base em
de rochas de alto‑Ti (Ti e Zr), ao norte, e de um conjunto de caracterı́sticas quı́micas, em
baixo‑Ti (Ti, Zr e Y), ao sul (Erlank et al., magmas‑tipo (Peate et al., 1992), e esta sub‑
1984; Bellieni et al., 1984a). Em ambos, é ob‑ divisã o é utilizada como a base da estrati‑

322 Edição da Sociedade Brasileira de Geologia – Núcleo RS/SC


Rossetti et al.

gra ia regional (Fig.1A). A porçã o sul da pro‑ de & Vasconcelos, 2010; Baksi, 2018). A ativi‑
vı́ncia, dominada por rochas com baixo‑Ti dade vulcâ nica começou na porçã o sul da
(Ti/Y), é caracterizada por basaltos do tipo provı́ncia, em que as idades das rochas basá l‑
Gramado, sucedidos na estratigra ia por ro‑ ticas se agrupam entre 134,8 Ma e 134,1 Ma
chas á cidas do tipo Palmas e por basaltos do (4oAr/39Ar step‑heating) (Renne et al., 1992;
tipo Esmeralda. Basaltos de alto‑Ti (Urubici) Thiede & Vasconcelos, 2010), e a idade do
ocorrem intercalados com o tipo Gramado vulcanismo á cido é de 133,6 Ma (Rocha et al.,
ao longo da escarpa sudeste, principalmente, 2020). O vulcanismo migrou para norte, onde
em SC (Peate et al., 1999). Ao norte, uma as lavas basá lticas e os corpos intrusivos as‑
provı́ncia vulcâ nica de alto‑Ti/Y (> 300) é sociados possuem idades um pouco mais jo‑
formada por uma pequena quantidade de vens, entre 133,6 Ma e 131,5 Ma (4oAr/39Ar
rochas á cidas do tipo Chapecó e por basaltos step‑heating) (Ernesto et al., 1999) e onde as
dos tipos Ribeira, Pitanga e Paranapanema rochas á cidas possuem idades de 132,9 Ma
(Peate, 1997). (Rocha et al., 2020).
No sul do Brasil, destaca‑se a ocor‑
rê ncia de tipos quı́micos de baixo‑Ti e de 3 CONTEXTO GEOLÓGICO REGIONAL
magmas dos tipos Gramado e Esmeralda.
Com o mesmo conteú do de MgO, os basaltos No Brasil, o GSG ocupa uma á rea de,
do tipo Esmeralda possuem maiores conteú ‑ aproximadamente, 917.000 km2 sobre ro‑
dos de TiO2 e de Fe2O3(t) e menor conteú do chas sedimentares da Bacia do Paraná . A
de SiO2, bem como padrõ es de elementos‑ sequê ncia vulcâ nica atinge cerca de 1700 m
traço mais depletados. Na porçã o NW do RS, no centro da bacia (Piccirillo & Mel i, 1988;
predominam, em superfı́cie, basaltos de alto‑ Frank et al., 2009) e, nos estados do RS e de
Ti do tipo Paranapanema, que possuem alto SC, pode atingir até 1200 m de espessura. A
conteú do de Fe2O3(t), baixo conteú do de Zr/Y Calha de Torres, anteriormente de inida co‑
e Sr em relaçã o aos tipos Pitanga e Urubici mo Sinclinal de Torres (Zalá n et al., 1987),
(Peate et al., 1992). compreende um baixo estrutural entre os
As rochas á cidas, que sustentam a i‑ platô s dos Campos de Cima da Serra (om‑
siogra ia dos Campos de Cima da Serra nos breira sul), no RS, e de Sã o Joaquim (ombrei‑
estados do RS e de SC, sã o predominante‑ ra norte), em SC. A espessura do Grupo Serra
mente afanı́ticas e de baixo‑Ti, e referidas co‑ Geral varia entre 500 m e 700 m na borda
mo do tipo Palmas. Localizadamente no desta estrutura e entre 700 m e 1100 m no
norte do RS, a loram rochas á cidas por irı́ti‑ seu eixo principal (e.g. Frank et al., 2009). O
cas e com alto‑Ti do tipo Chapecó . Com base embasamento da Bacia do Paraná , sob a Ca‑
nos conteú dos relativos de Zr, de Rb, de P2O5 lha de Torres, é composto por um arranjo de
e de TiO2, as rochas de baixo‑Ti foram dividi‑ terrenos tectô nicos amalgamados durante o
das nos subtipos Caxias do Sul, Anita Gari‑ Ciclo Brasiliano‑Pan Africano no Neoprotero‑
baldi, Santa Maria, Clevelâ ndia e Jacuı́, e as zoico (Chemale Jr., 2000). Embora a orienta‑
de alto‑Ti, em Ourinhos, Guarapuava e Tama‑ çã o das estruturas geradas no Neopro‑
rana (Peate et al., 1992; Nardy et al., 2008). terozoico seja, predominantemente de dire‑
A idade da fase principal do magma‑ çã o NE‑SW, o arcabouço da bacia no sul do
tismo do GSG foi delimitada em um intervalo Brasil é controlado por estruturas oblı́quas,
de cerca de 4 Ma, começando em 135 Ma até de direçã o NW‑SE. As porçõ es relativamente
131 Ma (Janasi et al., 2011), com o pico prin‑ altas do embasamento conformam os arcos
cipal durando 1 Ma (Renne et al., 1992; Thie‑ de Ponta Grossa, ao norte, e de Rio Grande,

Estratigra ia do Grupo Serra Geral na Calha de Torres, Sul do Brasil 323


Contribuições à Geologia do Rio Grande do Sul e de Santa Catarina

ao sul da Calha de Torres (Zalá n et al., 1987). partir destes trabalhos, os temas de investi‑
gaçã o do GSG, principalmente, na Calha de
4 GRUPO SERRA GERAL: BREVE HISTÓ‑ Torres, concentraram‑se em estabelecer su‑
RICO E CARACTERIZAÇÃO ESTRATIGRÁ‑ as relaçõ es estratigrá icas, incluindo as ca‑
FICA racterı́sticas morfoló gicas e vulcâ nicas desta
unidade (cf. Lima et al., 2012; Waichel et al.,
O GSG compreende um conjunto de 2012).
rochas vulcâ nicas e sedimentares, que repre‑ A integraçã o entre litofá cies, suas
sentam a PMPE no Brasil, cuja evoluçã o está relaçõ es estratigrá icas e estruturais, apoia‑
associada à Supersequê ncia Gondwana III da da em dados petrográ icos e geoquı́micos,
Bacia do Paraná (Milani et al., 2007). Histori‑ permitiu um maior detalhamento da estrati‑
camente, o reconhecimento das formaçõ es gra ia da Serra Geral na Bacia do Paraná
rochosas da Bacia do Paraná , com ê nfase na (Barreto et al., 2014; Polo & Janasi, 2014;
descriçã o de uma ampla sequê ncia vulcanos‑ Rossetti et al., 2014; Besser et al., 2018; Polo
sedimentar nas suas porçõ es de topo tem, co‑ et al., 2018; Simõ es et al., 2018a; 2018b), a
mo principais referê ncias os trabalhos de elaboraçã o de uma proposta estratigrá ica
White (1908) e de Baker (1923), que reco‑ formal para a Formaçã o Serra Geral e a con‑
nheceram um amplo platô de rochas basá lti‑ sequente elevaçã o do seu status para Grupo
cas na Serra Geral. Os estudos com ê nfase em Serra Geral (Rossetti et al., 2018). A suces‑
aná lises petrográ icas e litogeoquı́micas das sã o vulcâ nica foi dividida em quatro unida‑
rochas vulcâ nicas, feitos por Guimarã es des principais de lavas: Formaçã o Torres
(1933), por Leinz (1949) e por Schneider (FT), Formaçã o Vale do Sol (FVS), Formaçã o
(1964), indicaram, alé m da presença de ba‑ Palmas (FP) e Formaçã o Esmeralda (FE). A
saltos, a ocorrê ncia de rochas vulcâ nicas ricas base da sequê ncia vulcâ nica é formada por
em sı́lica nesta sequê ncia, localizada no nor‑ arenitos dominantemente eó licos da Forma‑
deste do RS e no sudeste de SC. A ampla apli‑ çã o Botucatu (FB). As principais caracterı́s‑
caçã o destes mé todos percorreu as dé cadas ticas de cada uma destas unidades serã o
de 1970 e de 1980, culminando na publicaçã o descritas em detalhe, a seguir.
de Piccirilo & Mel i (1988). Esta publicaçã o
reuniu uma sé rie de trabalhos com ê nfase em 4. 1 Formação Botucatu
aspectos geoquı́micos e geofı́sicos do GSG,
simbolizando um ponto de in lexã o, cujas A Formaçã o Botucatu é constituı́da
principais consequê ncias foram o agrupa‑ predominantemente por arenitos eó licos,
mento das rochas vulcâ nicas pelas suas ca‑ que formavam um imenso campo de dunas
racterı́sticas geoquı́micas e petrogené ticas e na porçã o central do Gondwana durante o
sua designaçã o em magmas‑tipo (e.g. Peate Eo‑Cretá ceo. Na porçã o sul da PMPE, a FB
et al., 1992; Peate, 1997). ocorre sotoposta aos primeiros derrames da
Modelos deposicionais, fundamenta‑ sequê ncia vulcâ nica, com exceçã o da porçã o
dos na descriçã o de estruturas vulcâ nicas, fo‑ central do RS, em que as lavas recobrem ro‑
ram apresentados por Waichel et al. (2006, chas sedimentares triá ssicas (Scherer,
2007, 2008) e promoveram discussõ es im‑ 2000).
portantes sobre o reconhecimento de morfo‑ Esta formaçã o é composta por are‑
logias de lavas pahoehoe, as interaçõ es destas nitos rosados, com granulometria ina a mé ‑
com sedimentos e a importâ ncia destes depó ‑ dia e com grã os arredondados, de aspecto
sitos na histó ria evolutiva do vulcanismo. A fosco (Scherer, 2000). Localmente, ocorrem

324 Edição da Sociedade Brasileira de Geologia – Núcleo RS/SC


Rossetti et al.

conglomerados e arenitos conglomerá ticos inferior da formaçã o é abrupto, com os der‑


na base da formaçã o, depositados em ambi‑ rames acompanhando e fossilizando a topo‑
ente luvial (Bigarella & Salammuni, 1967; gra ia dos campos de dunas subjacentes
Soares, 1975). Existe uma relaçã o de con‑ (Jerram et al., 2000; Scherer, 2000). Em á reas
temporaneidade entre os depó sitos eó licos em que a superfı́cie das dunas está exposta,
da FB e os primeiros derrames da PMPE. O marcas de ondas e sulcos, formados pelo
deserto Botucatu foi gradativamente sendo avanço das lavas sobre os sedimentos, sã o vi‑
recoberto pelo avanço das primeiras lavas da sı́veis (Waichel et al., 2008). Localmente, a
PMPE, poré m á reas desé rticas se mantive‑ porçã o inferior da unidade é caracterizada
ram ativas nas proximidades dos campos de pelos produtos da interaçã o entre lavas e se‑
lava, e variaçõ es na direçã o dos ventos leva‑ dimentos eó licos inconsolidados, como, por
ram à deposiçã o de camadas de arenitos en‑ exemplo, peperitos e diques clá sticos.
tre as lavas. Diversos autores (e.g. Scherer, Os campos de derrames da FT sã o
2000; Petry et al., 2007; Waichel et al., 2008) constituı́dos pela intercalaçã o e pelo empi‑
descreveram feiçõ es geradas pelo recobri‑ lhamento de derrames em lençol (sheet‑like)
mento e pela interaçã o entre as primeiras la‑ (Fig. 2A), de dedos de lava (< 0,5 m) e de lo‑
vas da PMPE e as dunas eó licas da FB. bos de lava (0,5‑2,5 m), e caracterizam, em
larga escala, uma arquitetura anastomosada
4. 2 Formação Torres composta. Localmente, onde os derrames
sã o con inados pela topogra ia do campo de
A Formaçã o Torres agrupa depó sitos dunas, unidades espessas (de até 100 m)
vulcâ nicos e sedimentares, relacionados aos com disjunçõ es colunares sã o formadas (Fig.
está gios iniciais do magmatismo da PMPE, e 2B). A estrutura interna de um lobo indivi‑
compõ e a porçã o inferior do GSG na porçã o dual é constituı́da por uma porçã o inferior
sul da Bacia do Paraná . O conjunto de rochas vesicular, com vesı́culas alongadas (pipe vesi‑
que compõ e a FT se estende ao longo do li‑ cles) (Fig. 2C), por um nú cleo maciço ou com
mite sul do campo de lavas e recobre uma estruturas de segregaçã o de volá teis, tipica‑
á rea a lorante superior a 25.000 m2, princi‑ mente holocristalino, e por uma porçã o su‑
palmente, no estado do Rio Grande do Sul. A perior vesicular, com vesı́culas e com
unidade tem espessura mé dia de 150 m, va‑ amı́gdalas esfé ricas, que decrescem, em dire‑
riando entre 100 m e 290 m, e se estima que çã o ao topo do derrame (Fig. 2D). O contato
o volume mı́nimo produzido por estas erup‑ e as margens entre lobos individuais sã o oxi‑
çõ es seja superior a 3.750 km3 (Rossetti, dados, com texturas indicativas de um resfri‑
2018). Estratigra icamente, a FT é equivalen‑ amento rá pido, formando superfı́cies lisas ou
te aos basaltos toleı́ticos descritos por Bellie‑ em corda (Fig. 2F). Derrames em lençol tê m,
ni et al. (1984b); aos episó dios vulcâ nicos em geral, espessuras entre 5 m e 12 m (até
bá sicos I e II, de Waichel et al. (2012); à uni‑ 20 m), extensõ es areais signi icativas (100‑
dade I, de Rossetti et al. (2014); e aos derra‑ 1000 m) e constituem a maior parte do volu‑
mes pahoehoe compostos iniciais, de Barreto me dos campos de derrames. O limite entre
et al. (2014). os campos de derrames é marcado por uni‑
A formaçã o foi nomeada, em referê n‑ dades sedimentares formadas durante pe‑
cia a sua seçã o‑tipo, caracterizada pela so‑ rı́odos de quiescê ncia vulcâ nica (Fig. 2A).
breposiçã o dos primeiros derrames de As rochas que compõ em a FT sã o
basalto aos arenitos da FB, ao longo das prai‑ afanı́ticas a pobremente por irı́ticas (< 5‑
as de Torres (Rossetti et al., 2018). O contato 10%), compostas por plagioclá sio, augita e
Estratigra ia do Grupo Serra Geral na Calha de Torres, Sul do Brasil 325
Contribuições à Geologia do Rio Grande do Sul e de Santa Catarina

ó xidos de Fe‑Ti ± olivina. Pseudomorfos de FVS equivale aos andesitos basá lticos toleı́ti‑
olivina alterada sã o comuns, como fenocris‑ cos, de Bellieni et al. (1984b); ao episó dio
tais, nos derrames primitivos (MgO > 6%), tı́‑ vulcâ nico bá sico III, de Waichel et al. (2012);
picos da porçã o inferior da FT, enquanto à unidade II, de Rossetti et al. (2014); e aos
fenocristais de plagioclá sio ocorrem nas por‑ derrames rubbly simples, de Barreto et al.
çõ es superiores da estratigra ia. No nú cleo (2014). O contato entre a FVS e a FT é nã o
dos derrames, a matriz da rocha é tipica‑ erosional e caracterizado, na maioria dos ca‑
mente holocristalina ina a mé dia. As rochas sos, por uma camada de arenito. Excelentes
da FT representam as composiçõ es mais pri‑ exposiçõ es do contato ocorrem na seçã o‑ti‑
mitivas, dentro dos intervalos amostrados, e po (Santa Cruz‑Herveiras) e no per il Cande‑
podem ser classi icadas como basaltos e an‑ lá ria‑Sobradinho (CS). Ao longo destas
desitos basá lticos. Concentraçõ es de MgO va‑ secçõ es, o intervalo sedimentar é pouco es‑
riam de 3,3% a 8,9%, para variaçõ es de SiO2 pesso e atinge localmente 2 m. O contato en‑
entre 49,8% e 58%. As rochas sã o enriqueci‑ tre as duas unidades representa uma
das em elementos terras raras (ETRs) leves e superfı́cie‑chave, dentro da estratigra ia do
tê m fortes anomalias negativas de Nb‑Ta, em GSG, e marca um hiato da atividade vulcâ ni‑
comparaçã o aos litó ilos de ı́on grande (large ca e uma mudança importante na dinâ mica
ion lithophiles (LIL)), e anomalias negativas eruptiva.
de Ti e P. A seçã o‑tipo da FVS ocorre ao longo
da RST‑153, pró xima ao municı́pio de Vale
4. 3 Formação Vale do Sol do Sol, entre as cotas de 370 m e de 500 m.
Ao longo da seçã o, a loram trê s derrames do
A Formaçã o Vale do Sol é composta tipo rubbly pahoehoe. Derrames individuais
pelo empilhamento vertical de derrames ta‑ da FVS sã o tipicamente espessos (35‑50 m)
bulares espessos (> 25 m) de andesitos ba‑ e tabulares, com estrutura interna caracteri‑
sá lticos, que representam o está gio principal zada por: (1) uma base afanı́tica, com vesı́‑
da construçã o da sequê ncia vulcâ nica do culas esparsas (Fig. 3B); (2) um nú cleo
GSG no sul do Brasil (Fig. 4A). O conjunto de espesso afanı́tico, maciço ou com disjunçõ es
rochas que compõ e a FVS atinge uma espes‑ colunares irregulares (Fig. 3C); (3) uma zona
sura má xima acumulada de c. 550 m (11 der‑ superior vesicular grossa; e (4) uma superfı́‑
rames) no per il Terra de Areia‑Aratinga cie fragmentada (rubbly low top) (Fig. 3D‑
(TA). A unidade se estende lateralmente por, 3E).
pelo menos, 300 km, de leste (TA) para oeste Mineralogicamente, sã o compostas
(CD), e por, pelo menos, 130 km para norte, por plagioclá sio, augita e ó xidos de Fe‑Ti ±
até a Serra do Rio do Rastro. Estima‑se que a pigeonita. Plagioclá sio e augita ocorrem co‑
FVS recubra á reas superiores a 55.000 km2 e mo fenocristais isolados ou glomerocristais
o volume de material vulcâ nico seja superior envoltos por matriz microcristalina a muito
a 15.000 km3 (Rossetti, 2018). Tendo em vis‑ ina (< 0,1 mm). Microfenocristais oxidados
ta que a unidade atinge suas maiores espes‑ de olivina ocorrem nas rochas mais primiti‑
suras, ao longo dos per is costeiros (p. ex. TA vas (MgO > 5%) e pigeonita, nas composi‑
e Rio do Rastro) e que derrames similares çõ es evoluı́das (MgO < 5%). Quimicamente,
ocorrem no Grupo Etendeka, na Namı́bia as rochas da FVS sã o, predominantemente,
(Membro Tsuhasis) (Jerram et al., 1999), as intermediá rias (SiO2 entre 51,6% e 61%) e
estimativas de á rea e de volume sã o conside‑ podem ser classi icadas como andesitos ba‑
radas conservadoras. Estratigra icamente, a sá lticos e, raramente, como basaltos, sendo
326 Edição da Sociedade Brasileira de Geologia – Núcleo RS/SC
Rossetti et al.

Figura 2 – A loramentos e morfologias das lavas da Formaçã o Torres: (A) Dois derrames em lençol, separados
por intertrap (duna) de arenito eó lico, no per il Santa Cruz‑Herveiras (SH); (B) Derrame espesso con inado pela
topogra ia do campo de dunas da Formaçã o Botucatu (ponded lava) no Parque da Guarita, em Torres; (C)
Vesı́culas alongadas (pipe vesicles) na base de derrame pahoehoe; (D) Topo vesicular de derrame in lado na BR‑
386, pró ximo a Lajeado; (E) Sucessã o de lobos vesiculares, formando derrames compostos na BR‑290, pró ximo
a Osó rio; e (F) Superfı́cie em corda, situada na BR‑386, nas proximidades de Lajeado.

correlacioná veis ao magma do tipo Gramado veis. Para um intervalo de diferenciaçã o simi‑
(Peate et al., 1992). Quando comparadas à s lar, as rochas da FVS sã o enriquecidas em
rochas da FT, sã o quimicamente mais evoluı́‑ CaO e FeO* e tê m concentraçõ es menores de
das e formam tendê ncias evolutivas distintas SiO2, LIL e HFSE (High Field Strength Ele‑
para elementos maiores e traços incompatı́‑ ments).
Estratigra ia do Grupo Serra Geral na Calha de Torres, Sul do Brasil 327
Contribuições à Geologia do Rio Grande do Sul e de Santa Catarina

Figura 3 – A loramento e morfologias das lavas da Formaçã o Vale do Sol: (A) Sucessã o de derrames tabulares
das formaçõ es Vale do Sol e Palmas no topo da estratigra ia, ao longo da escarpa leste do Grupo Serra Geral, em
Santa Catarina; (B) Crosta basal pobremente vesicular; (C) Nú cleo espesso com disjunçõ es colunares
irregulares no Per il Santa Cruz‑Herveiras (SH); (D) Topo fragmentado de derrame (rubbly surface); e (E)
Detalhe da brecha de topo de derrame rubbly pahoehoe, na Serra da Rocinha (Per il RA).

4. 4 Formação Palmas ocorre nas porçõ es de topo da pilha vulcâ ‑


nica e se intercala aos andesitos basá lticos
A Formaçã o Palmas é composta por da FVS (per is Terra de Areia‑Aratinga e Ar‑
rochas á cidas e com baixo‑Ti do GSG. Estas vorezinha‑Encantado). As intercalaçõ es
unidades sustentam relevos de até 1.800 m també m foram identi icadas em outras se‑
em Santa Catarina e, de uma forma geral, çõ es e em dados de poços (Bellieni et al.,
constituem extensos platô s e camadas contı́‑ 1986; Peate et al., 1992). A á rea total esti‑
nuas ao longo de centenas de metros (Fig. mada para as rochas á cidas do GSG é de
4A). Em sua maioria representam derrames 64.000 km², com um volume mı́nimo de
tabulares, domos, lobos de lava e sistemas de 15.300 km³, dos quais a FP representa 95%
condutos complexos (Polo et al., 2018; Ros‑ da á rea e 80% do volume (Nardy et al.,
setti et al., 2018; Simõ es et al., 2018a). A FP 2008). A espessura destas unidades pode

328 Edição da Sociedade Brasileira de Geologia – Núcleo RS/SC


Rossetti et al.

atingir até 400 m no leste do RS, decrescen‑ gá s (de 10‑20 cm de diâ metro) ocorrem, lo‑
do para oeste e para norte. De acordo com calmente, em porçõ es superiores de algumas
suas caracterı́sticas quı́micas, principalmen‑ unidades. Derrames compostos por obsidia‑
te, a variaçã o dos conteú dos de TiO2 e de na ocorrem intercalados com estes tipos de
P2O5, foram divididas em subgrupos: Caxias derrames em diversas localidades do RS e de
do Sul, Santa Maria, Anita Garibaldi, Jacuı́ e SC, e podem ser delgados e homogê neos,
Clevelâ ndia (Peate et al., 1992; Nardy et al., com topo vesiculado e alterado. Estes possu‑
2008). A FP recobre derrames da FVS na em dimensõ es variadas, da ordem de cente‑
maior parte da sua á rea de ocorrê ncia (cen‑ nas de metros, e orientaçõ es alongadas em
tro e leste do RS e de SC). Os contatos com a planta, controladas pelo arcabouço estrutu‑
FVS sã o marcados por um contraste litoló gi‑ ral regional (Fig. 4F). Sã o comuns bandamen‑
co entre as autobrechas de topo da FVS e a tos verticais a horizontais nas porçõ es de
base vı́trea das lavas da FP, formando local‑ nú cleo (Fig. 4G). Porçõ es de base e de topo
mente pequenas cavernas, como resultado de derrames de grandes dimensõ es també m
da erosã o diferencial (Fig. 4B). podem conter obsidianas (Besser et al.,
2018).

4. 4. 1 Subgrupos Caxias do Sul e Santa Domos de lava a loram na estrada


Maria BR‑471, pró ximo a Soledade (RS), e foram
documentados por Polo & Janasi (2014). A
Os dacitos do subgrupo Caxias do Sul á rea expõ e unidades dacı́ticas e riolı́ticas. Os
possuem um amplo espectro de caracterı́sti‑ domos dacı́ticos possuem estruturas circula‑
cas litoló gicas. Em algumas localidades, co‑ res, com dimensõ es de 5 m a 8 m de altura e
mo nas regiõ es de Caxias do Sul (RS) e de de 30 m de extensã o, na sua base. Estes ocor‑
Sã o Joaquim (SC), os derrames basais possu‑ rem individualmente ou sã o coalescentes
em uma coloraçã o vermelha, com nú cleos com outros domos, e sã o cobertos por lavas
maciços a pouco vesiculados e com topos ve‑ riolı́ticas do subgrupo Santa Maria, mostran‑
siculados ou brechados, e sã o sobrepostos do uma clara relaçã o de sobreposiçã o estrati‑
por derrames de tonalidade cinza e de estru‑ grá ica entre os dois subgrupos.
tura similar (Fig. 4C). A ocorrê ncia de rochas sedimentares
Outras variedades de derrames, ob‑ na FP é restrita. Dunas eó licas, arenitos e
servadas no municı́pio de Guaporé (RS), conglomerados luviais sã o preservados no
mostram terminaçõ es em lobos mé tricos (2‑ limite oeste da sua á rea de ocorrê ncia, a lo‑
10 m), com porçõ es externas vesiculares e rando entre dacitos e riolitos (Polo & Janasi,
com porçõ es internas pouco vesiculares, dis‑ 2014). Camadas centimé tricas de arenitos
postas em estrutura concê ntrica, alé m de també m podem ocorrer entre dacitos verme‑
margens intemperizadas (Fig. 4E). També m lhos e acinzentados (Simõ es et al., 2018b).
ocorrem derrames com uma porçã o basal Unidades sedimentares, epiclá sticas e vulca‑
brechada, sobreposta por uma porçã o vesi‑ noclá sticas foram descritas por Riccomini et
cular e com nú cleo bandado, com juntas ho‑ al. (2016) e representam, segundo os auto‑
rizontais centimé tricas (Fig. 4F). Os nú cleos res, material piroclá stico retrabalhado con‑
sã o devitri icados, com textura granofı́rica, temporâ neo aos riolitos do subgrupo Santa
maciços ou com juntas horizontais e verti‑ Maria.
cais. Autobrechas formam bolsõ es de frag‑ Petrogra icamente, as lavas da FP sã o
mentos vı́treos angulares, imersos em uma a irı́cas a micropor irı́ticas e raramente por‑
matriz ina alterada. Grandes cavidades de irı́ticas, com fenocristais (2‑3 mm), microfe‑

Estratigra ia do Grupo Serra Geral na Calha de Torres, Sul do Brasil 329


Contribuições à Geologia do Rio Grande do Sul e de Santa Catarina

nocristais (0,1‑0,5 mm) e micró litos (<0,1 fé ricas e nã o possuem vesı́culas tubulares
mm) de plagioclá sio, augita, pigeonita e ó xi‑ (pipe vesicles). Os derrames da FE sã o tipica‑
dos de Fe‑Ti como fases mais comuns. Agre‑ mente de cor preta, com alteraçõ es localiza‑
gados glomeropor irı́ticos ocorrem de forma das para materiais argilosos, de coloraçã o
escassa. A matriz é formada por vidro hidra‑ vermelha (Fig. 5B‑5C). A coloraçã o re lete o
tado e por texturas de intercrescimento de cará ter dominantemente afanı́tico destas
quartzo + K‑feldspato, este ú ltimo ocorrendo rochas.
raramente como fenocristal, podendo estar As rochas que compõ em os derra‑
alterado e substituı́do por albita. O banda‑ mes da FE sã o basaltos e andesitos basá lti‑
mento é marcado por alternâ ncias, de di‑ cos afı́ricos a pobremente por irı́ticos, com
mensã o centimé trica a milimé trica, de texturas afanı́ticas microcristalinas e vitrofı́‑
vitró iros, com maiores ou menores graus de ricas. Nas fá cies microcristalinas ocorre pla‑
cristalinidade e de oxidaçã o. gioclá sio, como ripas eué dricas a
subé dricas, na forma de fenocristais isola‑
4. 5 Formação Esmeralda dos ou de glomerocristais, envolvidos por
matriz de granulaçã o ina (0,1‑0,3 mm)
Os derrames dessa formaçã o ocor‑ constituı́da por plagioclá sio, augita intergra‑
rem principalmente nas porçõ es internas do nular e ó xidos de Fe‑ Ti. Nas fá cies vitrofı́ri‑
campo de lavas do GSG, no topo da estrati‑ cas, cristais esqueletais e aciculares de
gra ia, ao longo do limite entre RS e SC. Ao plagioclá sio, com texturas em rabo de ando‑
longo da á rea estudada recobrem uma á rea rinha, e microcristais de augita (0,2 ‑ 0,5
de c. 5.000 km2 (Rossetti, 2018). Localmente, mm) sã o envolvidos por matriz vı́trea ou
esta unidade ocorre intercalada com unida‑ afanı́tica criptocristalina. Quimicamente, as
des distintas da FP ou com derrames da por‑ lavas sã o dominantemente basá lticas (50%
çã o superior da FVS. Em a loramento, a a 54% de SiO2 e 2,7% a 7,3% de MgO).
espessura da unidade varia entre 25 m e 150 Quando comparadas à s lavas da FT e da FVS,
m, entretanto derrames com a composiçã o em composiçõ es similares de MgO, as lavas
quı́mica da FE, i.e., magma do tipo Esmeralda da FE sã o enriquecidas TiO2, FeO* e CaO (c.
(sensu Peate et al., 1992), ocorrem em diver‑ 0,2%, 1,5% e 0,5%, respectivamente) e tê m
sos poços da Bacia do Paraná , nos quais a menores concentraçõ es de SiO2 (c. 1‑2%).
unidade atinge espessuras de até 300 m. De As rochas da FE tê m, també m, menores con‑
acordo com Peate et al. (1992), o magma do centraçõ es de Ba (c. 100 ppm) e Sr (c. 50
tipo Esmeralda pode representar entre 5% e ppm) e sã o enriquecidas em Sc (10‑15 ppm)
10% do volume total do GSG. Os depó sitos e V (c. 50 ppm), e de V (c. 50 ppm), quando
da FE constituem, originalmente, campos de comparadas à s da FT, e, para a maior parte
derrames pahoehoe compostos, diques e so‑ dos elementos‑traço, as composiçõ es se so‑
leiras (Fig. 5A). Estes campos sã o formados brepõ em à s da FVS. A distribuiçã o de ETRs
dominantemente por lobos pouco espessos na FE é relativamente horizontal, tendo o
(< 2 m). A porçã o interna dos lobos é maciça, menor fracionamento entre ETRs leves e pe‑
enquanto o topo é formado por vesı́culas es‑ sados.
fé ricas. A principal diferença, em relaçã o aos
derrames da FT, está na distribuiçã o de vesı́‑
5 SUMÁRIO E CONCLUSÕES
culas na porçã o inferior dos lobos. Os lobos
do tipo S, que compõ em a FE, tê m sua zona No sul do Brasil, o Grupo Serra Geral
vesicular inferior constituı́da de vesı́culas es‑ é caracterizado por pacotes vulcâ nicos hete‑

330 Edição da Sociedade Brasileira de Geologia – Núcleo RS/SC


Rossetti et al.

Figura 4 – A loramentos e morfologias das lavas da Formaçã o Palmas: (A) Derrames tabulares extensos no
Câ nion do Itaibezinho, em Cambará do Sul (RS); (B) Contato entre topo brechado de derrame rubbly pahoehoe
da Formaçã o Vale do Sol, em Sã o Marcos (RS); (C) Contato entre derrames dacı́ticos, de coloraçõ es vermelha e
cinza, em Sã o Joaquim (SC); (D) Lobo de dacito com borda intemperizada e com porçã o externa vesiculada,
caracterizada por vesı́culas alongadas, e com porçã o interna pouco vesiculada, com estruturas dispostas de
forma concê ntrica, em Guaporé (RS); (E) Derrame de dacito, com morfologia de coulée e com autobrecha basal,
composta por fragmentos com ~5 cm a 80 cm, sobreposto por uma camada vesicular e com uma porçã o de
nú cleo bandado, em Candelá ria (RS); (F) Derrame composto por obsidiana de composiçã o dacı́tica, alongado
nas direçõ es NE‑SW e NW‑SE, com cerca de 40 km2, em Cambará do Sul (RS); (G) Detalhe da porçã o central do
derrame de obsidiana, com bandamento dobrado vertical a horizontal.

Estratigra ia do Grupo Serra Geral na Calha de Torres, Sul do Brasil 331


Contribuições à Geologia do Rio Grande do Sul e de Santa Catarina

Figura 5 – A loramentos e morfologias das lavas da Formaçã o Esmeralda: (A) Distribuiçã o de derrames
tabulares na porçã o superior da estratigra ia, em Santa Catarina, com unidades á cidas cortadas por soleira de
composiçã o quı́mica do tipo Esmeralda; (B) Lobos mé tricos de derrames da Formaçã o Esmeralda, com topos
vesiculares e com nú cleos maciços; contato entre lobos marcado por superfı́cies oxidadas e alteradas; e (C)
Lobos vesiculares decimé tricos, com contatos marcados por margens resfriadas alteradas, nas proximidades
do municı́pio de Esmeralda.

rogê neos, que marcam momentos distintos vo dos volumes eruptivos, culminando em
da evoluçã o da provı́ncia. A porçã o inferior um mecanismo de colocaçã o distinto para a
da estratigra ia, Formaçã o Torres, é constituı́‑ FVS (derrames tabulares e espessos do tipo
da, dominantemente, por campos de derra‑ rubbly pahoehoe). O pico do magmatismo
mes compostos, formados por efusõ es de culminou na formaçã o de depó sitos vulcâ ni‑
volume restrito do tipo havaiana. Estes depó ‑ cos á cidos no topo da estratigra ia, agrupa‑
sitos recobriram, de forma passiva, o campo dos na Formaçã o Palmas. Durante o declı́nio
de dunas ativo preservado da Formaçã o Bo‑ da atividade magmá tica, erupçõ es havaianas
tucatu. Estes derrames representam as com‑ de pequeno volume deram origem aos cam‑
posiçõ es mais primitivas dentro dos pos de derrames compostos da Formaçã o
intervalos amostrados do GSG. Os derrames Esmeralda. O inal deste extenso e volumoso
da Formaçã o Vale do Sol tê m composiçã o do‑ magmatismo coincide, temporalmente, com
minantemente intermediá ria (andesitos ba‑ o inı́cio da abertura do Oceano Atlâ ntico Sul
sá lticos) e foram formados, durante a fase e com a formaçã o das bacias sedimentares
principal do magmatismo. A transiçã o entre das margens continentais brasileira e africa‑
os está gios iniciais e a fase principal do mag‑ na, durante a fragmentaçã o do Superconti‑
matismo é marcada pelo aumento signi icati‑ nente Gondwana Sul.

332 Edição da Sociedade Brasileira de Geologia – Núcleo RS/SC


Rossetti et al.

AGRADECIMENTOS & Roisenberg, A. 1984a. High‑ and Low‑TiO2


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Os autores agradecem ao apoio e ao zil): petrology and geochemical aspects bea‑
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336 Edição da Sociedade Brasileira de Geologia – Núcleo RS/SC


Evolução do Complexo
Novo Hamburgo de injeção
de areia e de silte
Lé o Afraneo Hartmann*, Sandro Kucera Duarte

Instituto de Geociê ncias, Universidade Federal do Rio Grande do Sul

* autor correspondente: leo.hartmann@ufrgs.br

1 INTRODUÇÃO
A liquefaçã o e a luidizaçã o de areia, com consequente injeçã o explosiva na camada‑selo,
podem levar ao extravasamento da mistura da lama sı́ltico‑arenosa (30% á gua, petró leo ou gá s +
70% clastos) na superfı́cie terrestre, em processo subaquoso ou subaé reo. A injeçã o é um pro‑
cesso universal, em bacias que contê m areia, e possui grande signi icado econô mico. A liquefa‑
çã o é o processo em que a areia ica saturada em á gua, formando uma pelı́cula de á gua, que
envolve cada grã o, eliminando, assim, o atrito. A luidizaçã o ocorre, quando a mistura de 30 vol.
% luido (á gua, no caso estudado) + 70% areia é injetada nas fraturas da camada‑selo, situada
acima. A formaçã o de corpos de arenito injetado pode constituir novos depó sitos de petró leo ou
pode causar fuga de petró leo de um reservató rio. A injeçã o de areia nos basaltos e nos riodacitos
do Grupo Serra Geral (GSG) foi uma etapa necessá ria (Hartmann et al., 2012a; Rosenstengel &
Hartmann, 2012; Hartmann, 2014), durante os processos hidrotermais, para formar o maior de‑
pó sito mundial de geodos de ametista e de á gata, em Ametista do Sul (com produçã o atual de
600 t/mê s) e em Los Catalanes (Uruguai).
Nó s apresentamos a evoluçã o paralela e simultâ nea do Complexo Novo Hamburgo
(CNH) de injeçã o de areia e do Grupo Serra Geral (GSG), seu hospedeiro (Fig. 1a), durante o Cre‑
tá ceo Inferior (134,5 2 Ma; e.g. Hartmann et al., 2019). Damos ê nfase à distribuiçã o nos esta‑
dos do Rio Grande do Sul e de Santa Catarina, mas acrescentamos exemplos do Paraná , do Mato
Grosso do Sul e do Uruguai (Hartmann & Baggio, 2014). A isiogra ia do grupo vulcâ nico é diver‑
si icada (Figs. 1b, 1c, 1d, 1e, 1f e 1g), com escarpas acentuadas nas cuestas e com suaves planal‑
tos, em extensas regiõ es interiores. A identi icaçã o dos processos que levaram à injeçã o de areia
e de silte no GSG (Pinto et al., 2011a, 2011b; Hartmann et al., 2010) foi possı́vel apó s os estudos
realizados nas bacias petrolı́feras offshore do Mar do Norte (e.g. Hurst et al., 2011). No Brasil, o
Contribuições à Geologia do Rio Grande do Sul e de Santa Catarina

entendimento dos processos de injeçã o e de identi icaçã o das estruturas e dos processos
efusã o de sedimentos detrı́ticos ainda exige (Arena et al., 2014).
avanços. A identi icaçã o de injetitos de areia Nó s apresentamos as estruturas de
e de silte pressupõ e trê s caracterı́sticas, por injeçã o e de efusã o de lama sı́ltico‑arenosa
parte do observador: (1) percepçã o da exis‑ do CNH e avaliamos os processos geoló gicos
tê ncia de injetitos; (2) mente atilada; e (3) envolvidos (Figs. 2, 3, 4 e 5). Utilizamos a
treinamento té cnico. O estado da arte esta‑ nomenclatura de Hurst et al. (2011), de
belece que, havendo acumulaçã o de areia em Monnier et al. (2015) e de Chan et al.
uma sequê ncia sedimentar, haverá injetitos. (2019), adaptada por Hartmann et al.
E essa relaçã o geoló gica inclui o paleoerg (2014), que inclui dique, sill, lacó lito, lopó li‑
Botucatu e a sequê ncia de selos do Grupo to, asa, brecha, vulcã o e extrudito, alé m de
Serra Geral. formas irregulares. A areia e o silte luidiza‑
Diques de areia em rochas encaixan‑ dos tê m comportamento mecâ nico seme‑
tes variadas, inclusive no GSG, sã o conheci‑ lhante ao da lava basá ltica, e isso levou ao
dos de longa data. Foram, no entanto, uso de nomenclatura aná loga. Em contraste
considerados uma curiosidade geoló gica, de‑ com complexos de injeçã o em bacias petro‑
vido à restriçã o do conhecimento ao estudo lı́feras, o CNH foi formado em ambiente vul‑
de diques de pequeno volume. Um avanço câ nico intraplaca, tornando a relaçã o dos
signi icativo no entendimento de injeçã o de arenitos com as rochas vulcâ nicas um caso
areia em rochas argilosas ocorreu há 15 ú nico nos continentes. Os processos de for‑
anos, atravé s do aumento da resoluçã o de maçã o de paralavas (Baggio et al., 2016) a
per is sı́smicos no estudo de bacias offshore 1000‑1800 C nã o serã o abordados.
(por exemplo, Hurst et al., 2011). Com isso, a
interconexã o das estruturas internas dos 2 PRINCIPAIS ESTRUTURAS E PROCES‑
complexos de injetitos foi estabelecida. Al‑ SOS
guns artigos foram publicados sobre o tema
por Zvirtes et al. (2019, 2020). Esse conheci‑ 2. 1 Arenito deposicional
mento internacional foi aplicado ao GSG,
atravé s dos estudos do Grupo de Excelê ncia A efusã o das primeiras lavas do GSG
em Minerais Estraté gicos da UFRGS. A busca recobriu as dunas ativas do paleoerg Botu‑
e a descoberta da origem dos geodos de catu. Um exemplo foi descrito por Hartmann
ametista (Duarte et al., 2009, 2011; Hart‑ et al. (2010) na regiã o de Quaraı́ (RS), em
mann et al., 2012a, 2012b, 2012c, 2013, que o primeiro derrame (colada Mata Olho,
2015, 2019) na maior provı́ncia produtora basalto) cobriu os vales interdunas. O se‑
do mundo (Ametista do Sul) identi icou sis‑ gundo derrame (colada Catalá n, andesito)
tematicamente corpos de arenito silici icado, cobriu esse derrame e tapou parte das du‑
como partes da sequê ncia de eventos hidro‑ nas.
termais (Figs. 1h, 1i e 1j). As formas diversi‑ O arenito deposicional (camada‑
icadas e as relaçõ es de intrusã o dos arenitos mã e) é a Formaçã o Botucatu (Fig. 3), de ida‑
nos basaltos levaram à comparaçã o com os de cretá cea e que ocorre interdigitado, na
processos descritos para injetitos no Mar do sua parte superior, com os primeiros derra‑
Norte e em outros lugares (Hartmann et al., mes de lava (Scherer, 2000). As areias tive‑
2012a; Duarte & Hartmann, 2014). Dessa ram movimentaçã o eó lica no paleoerg,
forma, o conhecimento de injetitos e de ex‑ durante 16 Ma (Duarte et al., 2020a, 2020b),
truditos de areia foi aplicado ao GSG, com a para formar uma camada de arenito com es‑

338 Edição da Sociedade Brasileira de Geologia – Núcleo RS/SC


Hartmann & Duarte

Figura 1 ‑ (a) Mapa geoló gico do Grupo Serra Geral, hospedeiro do Complexo Novo Hamburgo de injeçã o de
areia e de silte (Hartmann et al., 2020 e outras fontes); (b) (c) Aspectos isiográ icos do Grupo Serra Geral,
incluindo o Complexo Novo Hamburgo, na cuesta de Herveiras (RS); (d) Defronte a Torres (RS); (e) Na Serra de
Maracaju, em Nioaque (MS); (f) A norte de Campo Grande (MS); (g) Realeza (PR); (h) Primeiro evento
hidrotermal de preenchimento de cavidades, por minerais de argila e por zeolitas (H1); (i) Segundo evento
hidrotermal de injeçã o de areia (H2); (j) Terceiro evento hidrotermal de formaçã o de stockwork de quartzo,
apó s H1 e H2 (H3).
Evolução do Complexo Novo Hamburgo de injeção de areia e de silte 339
Contribuições à Geologia do Rio Grande do Sul e de Santa Catarina

Figura 2 ‑ Formaçã o Botucatu, com camadas‑mã e eó licas: (a) A loramento na seçã o‑tipo da Formaçã o
Botucatu, em Serra de Botucatu, no estado de Sã o Paulo (Rodovia Marechal Rondon, km 236); (b) A loramento
em Nioaque (MS), abaixo do primeiro derrame de basalto; (c) A loramento em Torres (RS), abaixo do primeiro
derrame de basalto; (d) Fotomicrogra ia ó tica (com luz natural) de arenito eó lico bimodal, em Nioaque (MS);
(e) Diques de arenito em zonas de falhas rú pteis, na cuesta de Herveiras (RS); (f) (g) (h) Diques de arenito em
zona de falha rú ptil, na pedreira Sultepa, em Novo Hamburgo (RS).

pessura variá vel entre 10‑200 m (em geral, 2. 2 Paleoaquífero Guarani (Hn)
80 m). Os grã os de areia tê m granulometria
O luido mobilizador da areia foi
bimodal, com cimento pouco volumoso.
á gua, com componente signi icativo de gá s

340 Edição da Sociedade Brasileira de Geologia – Núcleo RS/SC


Hartmann & Duarte

Figura 3 ‑ (a) (b) (c) Fotos de campo, com documentaçã o do percurso de injeçã o da areia, na pedreira da regiã o
de Realeza (PR); ina pelı́cula de siltito (marrom avermelhado), de 1‑3 mm, que recobre a disjunçã o colunar do
basalto; (d) (e) Fina pelı́cula de areia, de 1‑5 mm, que recobre a disjunçã o colunar e as fraturas transversais à
coluna da pedreira Sultepa, em Novo Hamburgo (RS); (f) Vista em planta de inas pelı́culas de areia, de 1‑5 mm,
preenchendo a disjunçã o colunar de basalto, em Torres (RS); (g) Quatro fraturas preenchidas por arenito
silici icado (indicadas por lechas), em Torres (RS); (h) Estrutura em asa de arenito silici icado, em dique
alimentador (abaixo, o martelo), em Novo Hamburgo (RS); (i) Seis diques subverticais de arenito silici icado
(indicados por lechas), em basalto, no Anel Viá rio Norte, em Campo Grande (MS); (j) (k) Sill de arenito
silici icado, com dique alimentador, e dique de arenito injetado no basalto sobrejacente; (l) (m) Conjunto
interligado de diques e de sills de arenito, contido em basalto, em Realeza (PR); (n) (o) Sequê ncia de
preenchimento de geodo, em Entre‑Rios (SC) ‒ base de basalto, seguida de arenito silici icado, de calcedô nia, de
quartzo e de ametista.

Evolução do Complexo Novo Hamburgo de injeção de areia e de silte 341


Contribuições à Geologia do Rio Grande do Sul e de Santa Catarina

carbô nico na regiã o Novo Hamburgo‑Torres ou dois dias por ano no deserto, encheram
(RS). A saturaçã o da areia solta (nã o liti ica‑ as areias com á gua, dentro de poucos anos
da) com á gua de chuva formou um dos maio‑ (exagerando, 1000 anos). A partir desse
res reservató rios de á gua doce dos ponto – apó s o primeiro derrame, em alguns
continentes. O paleoaquı́fero Guarani foi ins‑ locais, e apó s o segundo derrame, em gran‑
talado no Cretá ceo Inferior, nas areias do pa‑ des extensõ es do erg ‒, o paleoaquı́fero esta‑
leoerg Botucatu (e nas areias da Formaçã o va saturado em á gua. Seguiu‑se o
Guará ), e a movimentaçã o eó lica das areias aquecimento do aquı́fero a 150 C e, sob a
estava ativa, durante a efusã o dos primeiros pressã o das lavas, situadas acima, o aquı́fero
derrames de lava do GSG (Scherer, 2000). O foi liquefeito e luidizado pela açã o de terre‑
paleoerg conté m zircã o mais jovem, com 150 motos, injetando, de forma explosiva, á gua
Ma (Duarte & Hartmann, 2020), delimitando quente e vapor + areia para dentro e para ci‑
a duraçã o do erg em 150 Ma e a idade do ma do derrame mais jovem.
vulcanismo em 135 Ma (Pinto et al., 2011a;
Hartmann et al., 2019). Em algumas regiõ es 2. 3 Terremotos
(por exemplo, em Quaraı́ (RS)), o primeiro
derrame (basalto) ocupou os vales interdu‑ Atividade sı́smica é considerada
nas, vindo o erg a ser parcialmente coberto usualmente como responsá vel pela agitaçã o
pelo segundo derrame (andesito) (Hart‑ intensa da areia, causando liquefaçã o, e pelo
mann et al., 2010). O primeiro derrame (co‑ rompimento do selo, causando luidizaçã o.
lada Mata Olho) permanece pouco Abalos sı́smicos de grande intensidade (6,
caracterizado, mas o segundo (colada Cata‑ na escala Richter) causaram agitaçã o da
lá n) é produtor, em escala mundial, dos mai‑ areia saturada em á gua do paleoerg Botuca‑
ores e dos mais valiosos geodos de ametista tu (paleoaquı́fero Guarani) e sua liquefaçã o.
do grupo vulcâ nico. O terceiro derrame (co‑ Essa perda de atrito entre os grã os da areia,
lada Cordillera, basalto) també m é grande devido ao envoltó rio de pelı́cula de á gua em
produtor de geodos de ametista, tipo capeli‑ cada grã o, conduziu à liquefaçã o e à posteri‑
nha, que é semelhante ao de Ametista do Sul, or luidizaçã o, atravé s da movimentaçã o da
tendo coberto o topo das dunas, em alguns á gua entre os grã os de areia. Em decorrê n‑
locais. cia, a mistura á gua + areia ascendeu de ma‑
A colada Catalá n possui arenito sili‑ neira explosiva, injetando os derrames
ci icado injetado, enquanto a colada Cordil‑ sobrepostos. O rompimento do selo basá ltico
lera possui sills de arenito silici icado, acima foi causado por terremotos, pois, em algu‑
da camada mineralizada em geodos. Quanto mas ocorrê ncias, os diques de arenito estã o
tempo levou para encher o paleoerg de á gua associados a zonas de falha.
de chuva, para os processos hidrotermais te‑ Terrenos vulcâ nicos ativos, mesmo
rem inı́cio? As medidas sã o geoló gicas e aná ‑ em ambiente intraplaca, tem sismicidade in‑
logas à s dos desertos atuais (por exemplo, tensa. Falhas sã o formadas por fraturamento
Namı́bia e Saara). Nos ergs atuais, a á gua do e por deslocamentos de rochas, ligados a
lençol freá tico a lora em grandes extensõ es terremotos. As rochas vulcâ nicas do GSG
nos oá sis, em lagos e em banhados, com ocu‑ apresentam falhas de grande porte e outras
paçã o humana permanente. Em regiõ es mais menores. Algumas falhas sã o restritas a seg‑
distantes do oá sis, pode‑se encontrar á gua a mentos inferiores da estratigra ia do grupo,
pouca profundidade. Apó s tapar o erg com nã o alcançando o topo. As zonas de falha sã o
lava, as chuvas torrenciais, que ocorrem um rú pteis e ‘secas’ – sem mineralizaçã o associ‑

342 Edição da Sociedade Brasileira de Geologia – Núcleo RS/SC


Hartmann & Duarte

ada. A principal causa da sismicidade foi a vez que o luido escapou pelas fraturas verti‑
abertura do Oceano Atlâ ntico, com a ina‑ cais. Signi icativamente, rochas com essa es‑
mento crustal e com rotaçã o de blocos. O trutura permeá vel nã o contê m geodos de
componente direcional das falhas nã o foi ametista.
medido, mas o abatimento atinge 10‑300 m, A pressã o de á gua quente e de vapor
em Ametista do Sul (Rosenstengel & Hart‑ aumentou nas rochas subjacentes, devido ao
mann, 2012). selamento do derrame com espessura <30
O continuado aquecimento do pale‑ m. O aumento da pressã o levou à injeçã o de
oaquı́fero pelo elevado grau geoté rmico, cau‑ areia, durante o rompimento do selo, devido
sado pela fusã o parcial do manto, deixou a a terremoto.
á gua sob pressã o té rmica e litostá tica das ro‑
chas sobrejacentes. A sı́smica recorrente 2. 5 Injeção, efusão e selamento da
propiciou a repetiçã o da injeçã o de areia, areia (H2)
apó s cada evento de injeçã o de magma na
crosta e de efusã o na superfı́cie. Um exemplo Cada evento de aquecimento do pa‑
de associaçã o de fraturamento de falhas com leoaquı́fero gerou um evento hidrotermal
a injeçã o de diques de areia ica na cuesta de (Hn), que icou registrado nas rochas sobre‑
Herveiras (RS) (Hartmann & Duarte, 2020). jacentes. Houve, ao todo, trê s eventos hidro‑
termais para cada evento Hn. Apó s o evento
2. 4 Selamento do derrame (H1) de selamento do derrame mais recente (H1),
ocorreu a injeçã o explosiva de á gua e de va‑
Derrames de basalto ou de riodacito por (100 m/s). Tal evento (H2) icou regis‑
sã o porosos (30 vol. % vesı́culas e microfra‑ trado em corpos intrusivos de areia com
turas) apó s seu esfriamento, e necessitam forma variada – dique, sill, lopó lito, lacó lito,
ser selados, para que o processo de injeçã o asa e irregular. Ao atingir a superfı́cie da
explosiva de areia luidizada ocorra. Os der‑ crosta, em contato com a atmosfera (ou hi‑
rames do GSG mostram evidê ncias de oclu‑ drosfera), a força da explosã o hidrotermal
sã o da porosidade, atravé s da precipitaçã o formou corpos efusivos com geometria vari‑
de minerais hidrotermais (H1) – zeolitas, mi‑ ada – brechas de basalto, em matriz de areia,
nerais de argila e cobre nativo (Fig. 5) (Bag‑ camadas de areia, vulcõ es. A altura atingida
gio et al., 2018). Nã o há registro de vesı́culas pelos fragmentos de rocha e de areia foi de‑
remanescentes (‘vazias’) e as cavidades atu‑ pendente da força da explosã o. A efusã o da
ais sã o atribuı́das à dissoluçã o intempé rica areia luidizada na superfı́cie formou lagos
do conteú do mineraló gico das amı́gdalas. efê meros no deserto. A possibilidade da pre‑
As fraturas de esfriamento da lava sença de fó sseis nos extruditos ainda deve
(poligonais, em planta) apresentam deposi‑ ser testada.
çã o similar de minerais hidrotermais, mas A idade do zircã o detrı́tico de extru‑
sua abertura (1‑10 mm) possibilitou o conti‑ ditos de areia é semelhante à das camadas‑
nuado luxo de á gua e de vapor, ao longo de mã e da Formaçã o Botucatu. O estudo pionei‑
todos os processos geoló gicos subsequentes. ro de extrudito de areia em Iraı́ (RS) por
Essa disjunçã o colunar se apresenta apenas Pinto et al. (2011a) foi expandido por Duarte
em derrames espessos (30 m), que sã o for‑ et al. (2020b) para ampla á rea do complexo.
mados por esfriamento lento. A rocha é holo‑ A desidrataçã o dos injetitos ocorreu
cristalina, com granulaçã o ina a mé dia, e com diminuiçã o de volume, gerando estrutu‑
nã o apresenta alteraçã o hidrotermal, uma ras de dissecamento intraestratais. As fratu‑
Evolução do Complexo Novo Hamburgo de injeção de areia e de silte 343
Contribuições à Geologia do Rio Grande do Sul e de Santa Catarina

Figura 4 ‑ Estruturas de injeçã o de areia e de silte do Complexo Novo Hamburgo. (a) (b) Complexo conjunto
de diques e de sills de areia, em amarelo (b), injetados na crosta amigdaloidal superior de basalto, em Realeza
(PR); (c) Vista em planta dos canais alimentadores da injeçã o de areia, na superfı́cie amigdaloidal do derrame
de basalto, ligados ao extrudito de areia; (d) Ranhuras de arrasto no arenito silici icado (mostradas por
lechas), formadas durante injeçã o de dique de areia, no contato com o basalto, em Serra de Maracaju (MS); (e)
(f) fotos em planta de juntas de desidrataçã o intraestratais de injetito de areia, originadas por perda de á gua da
lama arenosa, apó s a injeçã o do sill de areia ‒ inserçã o em (e) mostra fraturas de dissecaçã o em â ngulo reto,
diferente dos contatos a 120 das fraturas de ressecamento de lama na superfı́cie (mudcrack). Local do
a loramento: rio Loch, no Distrito de Morro dos Bugres Baixo, em Santa Maria do Herval (RS); (g) A loramento
da amostra coletada para dataçã o por U‑Pb SHRIMP de zircã o, por Pinto et al. (2011) (primeira dataçã o de
injetito de areia no Grupo Serra Geral) ‒ ponto da coleta indicado. (h) (i) Histograma de frequê ncia das idades
datadas por U‑Pb SHRIMP de zircã o de vá rias amostras de extruditos e de camadas‑mã e da Formaçã o Botucatu
do Complexo Novo Hamburgo (Duarte et al., 2020b), mostrando idades de proveniê ncia semelhantes; (j) Dique
de siltito em basalto, em Realeza (PR); (k) Textura de siltito; (l) (m) Fotomicrogra ias de injetitos de areia, de
granulaçã o ina (unimodais) ‒ cimento de calcedô nia e de quartzo, indicados por ‘c’, em Serra de Maracaju
(MS).

344 Edição da Sociedade Brasileira de Geologia – Núcleo RS/SC


Hartmann & Duarte

Figura 5 ‑ Fotos de campo de estruturas geradas na interface superior amigdaloidal do derrame de basalto com
a atmosfera. (a) (b) Extrudito de areia (de 50 cm espessura) na parte superior de uma brecha, com blocos
angulares amigdaloidais de basalto 1, em matriz de arenito ‒ basalto 2 extravazou, posteriormente, sobre
superfı́cie do arenito, depositado em lâ mina de á gua, na pedreira Votorantim, em Campo Grande (MS); (c)
Extrudito de areia (de 1‑2 m de espessura), com diques alimentadores em forma de raiz de dente, derramado
sobre basalto e, posteriormente, soterrado por novo derrame de basalto, na pedreira Sultepa, em Novo
Hamburgo (RS); (d) (e) (f) (g) Extrudito de areia, acima de brecha de blocos de basalto amigdaloidal, com
matriz de arenito, com diques alimentadores ‒ corte da rodovia BR‑060, em Serra de Maracaju (MS); (h) (i)
Estratigra ia de detalhe da parte superior do derrame Veia Alta, inclusive, do extrudito de areia, e das partes
inferior e central do derrame Coogamai sobrejacente, mostrando uma cava (galeria) na Mina do Museu, em
Ametista do Sul (RS); (j) Brecha hidrotermal, com blocos angulosos e amigdaloidais de basalto, imersos em
matriz de siltito, em Realeza (PR); (k) (l) Vulcã o de areia e de extrudito, com dique e com sills alimentadores, na
rodovia Tenente Portela‑Trê s Passos (RS); (m) Brecha com blocos de basalto amigdaloidal imersos em arenito ‒
capa superior de extrudito foi depositada em depressã o topográ ica, à 500 m desse local, em Salto do Jacuı́ (RS);
(n) (o) (p) Extrudito de areia (acima) e gradacional, com brecha hidrotermal de blocos de basalto
amigdaloidais, imersos em arenito, em Torres (RS).

Evolução do Complexo Novo Hamburgo de injeção de areia e de silte 345


Contribuições à Geologia do Rio Grande do Sul e de Santa Catarina

ras tendem a se cruzar em â ngulo reto, dife‑ evento hidrotermal H3 foi o acontecimento
rente das fraturas de dissecaçã o na superfı́‑ preponderante para a alteraçã o de basalto e
cie (mudcracks), que se cortam a 120 e que para a geraçã o de geodos de ametista de va‑
nã o foram observadas no Complexo Novo lor econô mico. Em alguns geodos, estã o pre‑
Hamburgo. servadas as evidê ncias de evoluçã o no
Em vá rios locais, sã o observadas tempo, desde o basalto hospedeiro, recober‑
fraturas losangulares (em trê s dimensõ es) to em sequê ncia hidrotermal por arenito sili‑
preenchidas por areia. Essa evidê ncia de so‑ ci icado, por calcedô nia, por quartzo e por
erguimento do derrame de lava em exten‑ ametista.
sõ es de 1‑40 km pode ter alcançado a
pujança de uma explosã o na atmosfera, de‑ 2. 7 Geysers, fontes termais
vido à pressã o do vapor. Em Quaraı́ (RS), tal
ocorrê ncia está acompanhada por dezenas Os processos hidrotermais, que
(talvez, centenas) de estruturas circulares, ocorreram apó s a efusã o de cada derrame de
com 1‑100 m de diâ metro, contendo areia lava, levaram à formaçã o de vulcõ es de areia
nas bordas. A pouca distâ ncia, está o Cerro ou de silte e aos extruditos associados. Esse
do Jarau, uma estrutura circular de 10 km, ambiente é visualizado como favorá vel à
que tem sido considerada registro do im‑ existê ncia de nú mero elevado de paleogey‑
pacto de um meteoro. Há necessidade de re‑ sers e de fontes termais. Em outros locais
exame dessa estrutura, para testar a (por exemplo, na Islâ ndia e em Yellowstone,
hipó tese de se tratar de uma paleoduna nos EUA), a ejeçã o de á gua formou depó sitos
composta. de sı́nter (sı́lica) e de tufa (calcita ou arago‑
Os injetitos e os extruditos perde‑ nita), com 1‑100 m de extensã o e 1‑5 m de
ram seu conteú do de á gua e deixaram, como espessura. Esses depó sitos serã o encontra‑
testemunho, as estruturas de areia. A perco‑ dos no GSG, a partir de busca sistemá tica, e
laçã o continuada de á gua quente levou à serã o de grande valor cientı́ ico, para o en‑
dissoluçã o parcial dos grã os de areia e à re‑ tendimento dos processos geoló gicos do
precipitaçã o de calcedô nia e de quartzo co‑ Cretá ceo e da evoluçã o da vida. A Fronteira
mo cimento. Na regiã o de Novo Hamburgo, Oeste do RS é um ambiente geoló gico propı́‑
até Torres, o cimento é constituı́do parcial‑ cio. Um exemplo de tufa é o paleoerg jurá ssi‑
mente de calcita. O arenito silici icado é uma co de Nevada (EUA), com presença de
rocha competente, utilizada pelos povos na‑ conchas de moluscos.
tivos para a confecçã o de pontas de lechas e
de lanças (Batalla et al., 2020). Apó s essa ex‑ 2. 8 Elutriação da areia
tensa cimentaçã o, o arenito perdeu a porosi‑
A elutriaçã o da areia ina e do silte
dade e passou a ser um selo impermeá vel. O
do CNH, deixando areia grossa na camada‑
continuado aumento da pressã o de á gua
mã e, aconteceu durante a luidizaçã o da
quente e de vapor abaixo do selo efetivou o
areia do paleoerg, em que os luxos de á gua
registro do processo hidrotermal H3 nas ro‑
quente e de vapor separaram as partı́culas
chas.
inas das mais grossas. Elutriaçã o é a separa‑
çã o de partı́culas pequenas (areia ina, argi‑
2. 6 Formação de geodos de ametista
la) de partı́culas maiores (areia grossa),
(H3)
durante o luxo ascendente de á gua quente e
Do ponto de vista volumé trico, o de vapor. A e iciê ncia da separaçã o das partı́‑

346 Edição da Sociedade Brasileira de Geologia – Núcleo RS/SC


Hartmann & Duarte

culas depende do tamanho, da forma e da No primeiro tipo, o avanço da erosã o


densidade das partı́culas. A agitaçã o da areia sobre o escarpamento das cuestas, que cer‑
liquefeita desfez a estrutura das camadas eó ‑ cam a provı́ncia vulcâ nica, levou à reduçã o
licas de areia e a movimentaçã o do luido da á rea total, e podem ser observados diques
causou elutriaçã o. alimentadores injetados no embasamento
Evidê ncias de elutriaçã o sã o obser‑ Pré ‑Cambriano, no entorno da bacia, como
vadas na granulometria e na composiçã o quı́‑ testemunhos da extensã o original.
mica dos injetitos (Fig. 6) (Duarte et al., O segundo tipo de erosã o causou o
2020a, 2020b). A areia do paleoerg tende a rebaixamento da topogra ia, podendo ser or‑
ser bimodal, ao passo que os grã os dos injeti‑ ganizado em dois aspectos, baseados na au‑
tos sã o unimodais; os grã os mais grossos i‑ sê ncia ou na presença de silici icaçã o das
caram retidos na camada‑mã e. Nos injetitos, rochas vulcâ nicas. Os derrames de basalto e
é comum a presença de nı́veis de lamito na de riodacito sã o heterogê neos, ao longo de
areia ina. A elutriaçã o causou um fraciona‑ sua extensã o no GSG, na dependê ncia da his‑
mento quı́mico dos arenitos e dos siltitos, tó ria hidrotermal de cada derrame. O evento
conforme Duarte et al. (2020a, 2020b), prin‑ H1 causou a deposiçã o de minerais hidroter‑
cipalmente nas cuestas de Maracaju (MS) e de mais nos poros das rochas, resultando em
Realeza (PR). A distâ ncia vertical percorrida um maior volume, na crosta superior. Essa
pela lama injetada é um fator controlador da crosta resiste pouco à erosã o e, em locais em
extensã o de fracionamentos mineraló gico e que o derrame está exposto à superfı́cie, a
quı́mico. Os injetitos de Maracaju percorre‑ crosta foi erodida. Os eventos H2 – injeçã o de
ram colunas, com altura de 1‑100 m, ao passo areia e de silte – e H3 – silici icaçã o do derra‑
que a distâ ncia vertical percorrida em Reale‑ me e formaçã o de geodos de ametista ‒ fo‑
za foi de 400‑500 m. Em decorrê ncia, os teo‑ ram muito signi icativos, para estabelecer
res de SiO2 e de outros elementos sã o mais porçõ es do derrame muito resistentes à ero‑
altos nos injetitos de Realeza, em compara‑ sã o.
çã o com os de Maracaju. Em toda a extensã o do GSG, os mi‑
O CNH expõ e um modelo de elutria‑ lhares de morros remanescentes da erosã o
çã o em coluna vertical de 1700 m. O estudo mostram evidê ncias de mineralizaçã o de sı́li‑
dos processos de remobilizaçã o sedimentar ca, inclusive, gossans (Pertille et al., 2013;
irá trazer conhecimento geoló gico, baseado Gadens‑Marcon et al., 2014; Baggio et al.,
em situaçã o ı́mpar. 2015). As calhas dos rios circundantes nã o
contê m fragmentos de geodos de ametista,
2. 9 Erosão seletiva signi icando que a porçã o erodida do derra‑
me nã o estava silici icada e, assim, cedeu es‑
A erosã o foi ativa e integrada no GSG paço ao rio e ao seu vale.
e no CNH, desde o Cretá ceo (134,5 Ma), até o A erosã o laminar horizontal foi a
Holoceno. A espessura do conjunto de rochas mais signi icativa na evoluçã o do relevo vul‑
foi reduzida em 1500 m, a partir do original, câ nico. As porçõ es dos derrames, que nã o es‑
que tinha em torno de 3000 m (Krob et al., tavam silici icadas, foram erodidas com
2019). Os detritos resultantes foram carrea‑ maior velocidade do que as porçõ es silici i‑
dos por rios, até a captaçã o, em bacias intra‑ cadas – mineralizadas a geodos de ametista.
continentais e em bacias do Oceano Atlâ ntico. Com o tempo, mesmo o basalto ou o riodaci‑
Os processos erosivos das rochas estrati ica‑ to silici icado foi erodido, causando um re‑
das foram, principalmente, de dois tipos. baixamento geral da topogra ia da provı́ncia
Evolução do Complexo Novo Hamburgo de injeção de areia e de silte 347
Contribuições à Geologia do Rio Grande do Sul e de Santa Catarina

Figura 6 ‑ Diagramas geoquı́micos, mostrando a composiçã o dos injetitos de areia e de silte, em comparaçã o
com basalto e com arenitos da camada‑mã e. As imagens (a) e (b) mostram a composiçã o diferente dos
injetitos, em comparaçã o aos basaltos intercalados, em Realeza (PR), e as imagens (c) e (d) trazem a
composiçã o dos injetitos, em comparaçã o aos riodacitos do Grupo Serra Geral; (e) fracionamento
composicional dos injetitos, por elutriaçã o de areia do paleoerg.

vulcâ nica. Mas os degraus das escadarias erosiva do GSG e do CNH. A observaçã o do
(trap, em holandê s da provı́ncia basá ltica Ka‑ relevo remanescente atual da provı́ncia vul‑
roo) permaneceram, durante toda a histó ria câ nica mostra que um morro permanece co‑

348 Edição da Sociedade Brasileira de Geologia – Núcleo RS/SC


Hartmann & Duarte.

mo elevaçã o porque está silici icado, poten‑ inconsolidada do paleoerg Botucatu. Esse
cialmente mineralizado a geodos de ametis‑ processo ocorreu ao mesmo tempo em que o
ta. Grupo Serra Geral era formado, atravé s da
efusã o de basalto e de riodacito. A injeçã o e
3 MODELO EVOLUTIVO a efusã o de areia ocorreram, apó s cada der‑
rame de lava, ao longo de toda a estratigra ia
O Complexo Novo Hamburgo de inje‑ vulcâ nica (Fig. 7). As estruturas de injeçã o e
çã o de areia e de silte se originou por lique‑ de efusã o de areia e de silte estã o presentes
façã o e por luidizaçã o da areia em a loramento de rocha, ao longo de todo o

Figura 7 ‑ Modelo das estruturas de injetitos de areia e de silte do Complexo Novo Hamburgo, hospedadas nas
rochas vulcâ nicas do Grupo Serra Geral.

Evolução do Complexo Novo Hamburgo de injeção de areia e de silte 349


Contribuições à Geologia do Rio Grande do Sul e de Santa Catarina

Grupo Serra Geral, por exemplo, em Novo AGRADECIMENTOS


Hamburgo, em Herveiras, em Quaraı́ e em
Torres (RS), em Campo Grande, em Nioaque O nosso aprendizado sobre os injeti‑
e na cuesta de Maracaju (MS), em Botucatu tos de areia ocorreu com a participaçã o cien‑
(SP) e em Realeza (PR). Nos morros da praia tı́ ica de Lauren da Cunha Duarte, Viter
de Torres, as estruturas estã o expostas nos Magalhã es Pinto, Juliana Pertille da Silva, Ka‑
costõ es rochosos e constituem um bom ex‑ rine da Rosa Arena, Leonardo Manara Ro‑
emplo, para a avaliaçã o da hipó tese de inte‑ senstengel, Leonardo Cardoso Renner, Adelir
raçã o de lava lı́quida (1200 C) com areia de José Strieder e Pedro Luiz Juchem. As iguras
erg (Petry et al., 2007; Zerfass et al., 2020). A deste capı́tulo foram extraı́das dos artigos
recusa dessa hipó tese e a demonstraçã o dos publicados pelos autores e pelas pessoas
processos de injeçã o de areia por Hartmann mencionadas. Os estudos foram realizados
et al. (2012a) foi consolidada pelo principal com apoio inanceiro sistemá tico do Conse‑
grupo internacional de estudos de injetitos e lho Nacional do Desenvolvimento Cientı́ ico
de extruditos de areia (Zvirtes et al., 2017). e Tecnoló gico (CNPq) e da Fundaçã o de Am‑
A ascensã o explosiva da mistura paro à Pesquisa do Estado do Rio Grande do
á gua (30 vol. %) + areia e silte (70 vol. %) Sul (FAPERGS).
causou elutriaçã o do sedimento e, em partes
elevadas da estratigra ia (Realeza (PR)), o se‑ REFERÊNCIAS
dimento depositado nas estruturas de subida
foi silte. Intensa silici icaçã o tornou o sedi‑ Arena, K. R., Hartmann, L. A. & Baggio, S. B.
mento uma rocha resistente ao impacto. A 2014. Geological controls of copper, gold and
silver in the Serra Geral Group, Realeza regi‑
presença do complexo possibilitou a forma‑
on, Paraná , Brazil. Ore Geology Reviews, 63:
çã o dos geodos de ametista. 178‑200.

4 CONCLUSÃO Batalla, N., Correa, L. C. & Araú jo, A. G. M.


2020. Lithic landscapes and early inhabi‑
O CNH de injeçã o de areia e de silte é tants in southeastern Brazil: First perspecti‑
ves from a case study in Dourado, Sã o Paulo
o maior, em á rea, nos continentes, constituin‑
State. PaleoAmerica, 5(1): 44‑61.
do volume reduzido de corpos de arenito e
de silte, mas está presente em todos os der‑ Baggio, S. B., Hartmann, L. A., Andrade, R. H.
rames de basalto e de riodacito estudados do P., Rizzotto, G. J., Duarte, S. K., Knijnik, D. B. &
GSG. Semelhante aos complexos de injetitos Simõ es‑Neto, J. A. 2015. Basalt stratigraphy
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ra de Maracaju, Mato Grosso do Sul, Paraná
arenito e de silte apresentam formas geomé ‑
Volcanic Province. Ore Geology Reviews, 69:
tricas variadas – dique, sill, lopó lito, lacó lito,
73‑87.
asa, cilindro, extrudito, vulcã o e irregular. Di‑
ferente dos complexos em bacias offshore, os Baggio, S. B., Hartmann, L. A. & Bello, R. M. S.
arenitos foram intensamente silici icados e 2016. Paralavas in the Cretaceous Paraná
possuem porosidade muito baixa. A elutria‑ volcanic province, Brazil – a genetic inter‑
pretation of the volcanic rocks containing
çã o da areia na mistura com á gua ascendente
phenocrysts and glass. Anais da Academia
resultou na injeçã o de silte, em posiçõ es mais
Brasileira de Ciências, 88: 2167‑2193.
altas da estratigra ia.
Baggio, S. B., Hartmann, L. A., Lazarov, M.,
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350 Edição da Sociedade Brasileira de Geologia – Núcleo RS/SC


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Evolução do Complexo Novo Hamburgo de injeção de areia e de silte 351


Contribuições à Geologia do Rio Grande do Sul e de Santa Catarina

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352 Edição da Sociedade Brasileira de Geologia – Núcleo RS/SC


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Evolução do Complexo Novo Hamburgo de injeção de areia e de silte 353


Depósitos de ágata e de
opala no estado do
Rio Grande do Sul
Cassiana Roberta Lizzoni Michelin*, Lauren da Cunha Duarte, Pedro Luiz Juchem,
Tania Mara Martini de Brum, Ana Maria Pimentel Mizusaki

Instituto de Geociê ncias, Universidade Federal do Rio Grande do Sul

* autor correspondente: cassiana.michelin@ufrgs.br

1 INTRODUÇÃO
As variedades de minerais silicosos sã o utilizadas e apreciadas pela humanidade há
centenas de anos. A á gata e a opala, devido à sua vasta aplicaçã o e versatilidade gemoló gica, es‑
tã o entre estes minerais e sã o classi icadas como variedades de sı́lica microcristalina, que ocor‑
rem nas rochas vulcâ nicas cretá cicas da Formaçã o Serra Geral, na Bacia do Paraná (Juchem,
1999; Duarte, 2008; Hartmann et al., 2012; Michelin, 2014). A á gata é uma variedade de cal‑
cedô nia bandada, cujas bandas se dispõ em, de forma concê ntrica ou paralela, no interior de ca‑
vidades presentes nas rochas vulcâ nicas bá sicas, denominadas geodos. A opala pode ocorrer
nesses geodos, associada à á gata, mas també m é observada em fraturas, como cimento, e ao
longo de estruturas de luxo nas rochas vulcâ nicas da Formaçã o Serra Geral (Brum & Juchem,
2014). Destaca‑se que essas variedades també m podem ser encontradas nos geodos, associa‑
das com ametista, nã o, só , no Rio Grande do Sul, mas, també m, nos estados do Paraná e de San‑
ta Catarina, poré m em quantidades que inviabilizam a sua extraçã o, diferente do que acontece
no Distrito Mineiro de Ametista do Sul (RS), em que nã o é incomum o aproveitamento de á gata,
associada à ametista.
A á gata e a opala, juntamente com a ametista, compreendem importantes materiais ge‑
moló gicos na regiã o sul do Brasil e sã o muito valorizadas para exportaçã o, devido à variedade
de tamanhos e de formas e, principalmente, em funçã o do conhecimento avançado sobre seu
bene iciamento.
Aspectos sobre a origem de formaçã o dos geodos da Formaçã o Serra Geral vê m sendo
discutidos, desde Leinz, em 1949. Como a ametista representa o maior volume de extraçã o, a
maioria dos trabalhos tê m apresentado enfoque nesse mineral (Gomes, 1996; Scopel, 1997; Ju‑
Contribuições à Geologia do Rio Grande do Sul e de Santa Catarina

chem, 1999; Duarte, 2008; Hartman et al., (IBGM) e considerando o volume exportado,
2014). Estudos sobre a á gata e sobre a opala em toneladas, com exceçã o do diamante, do
vê m sendo desenvolvidos (Heemann, 1997; rubi e da esmeralda, o Brasil está posiciona‑
Augustin, 2004; Heemann, 2005; Michelin et do no 2º lugar do ranking internacional dos
al., 2013; Michelin, 2014), mas é unâ nime maiores fornecedores de pedras coradas.
que a á gata e a ametista tê m gê neses distin‑ No cená rio brasileiro, o Rio Grande
tas (Duarte, 2008; Michelin, 2014) do Sul exportou cerca de 82.000.000 t de
A opala, considerada, inicialmente, materiais gemoló gicos, em 2017 e em 2018
como uma substâ ncia amorfa, teve suas ca‑ (IBGM, 2019). Salienta‑se que estes valores
racterı́sticas estruturais estabelecidas em es‑ representam, quase na sua totalidade, mine‑
tudos realizados com difraçã o de raios‑X rais enriquecidos em sı́lica, como á gata e
(DRX). Os estudos de Jones et al. (1964), com ametista. Nos ú ltimos anos, a comercializa‑
base em crité rios de difraçã o de raios‑X, çã o no mercado interno també m demostra
mostraram que a estrutura da opala, na rea‑ um considerá vel aumento (Batisti & Tatsch,
lidade, varia de amorfa a microcristalina. Em 2012).
1971, o estudo pioneiro de Jones & Segnit re‑ A mineraçã o e a tradiçã o gemoló gica
conheceu trê s fases de sı́lica hidratada, de da á gata, da opala e da ametista no estado do
baixa temperatura: opala amorfa (opala‑A); Rio Grande do Sul pode ser acompanhada
α‑cristobalita, com empilhamento acentuado em duas regiõ es bem estudadas e conheci‑
de α‑tridimita (opala‑CT); e α‑cristobalita das: o Distrito Mineiro de Ametista do Sul
ordenada, com empilhamento mais restrito (DMAS), localizado na regiã o centro‑norte, e
de α‑tridimita (opala‑C). o Distrito Mineiro de Salto do Jacuı́ (DMSJ),
Este capı́tulo propõ e uma revisã o na regiã o central do estado. Atualmente,
das principais caracterı́sticas geoló gicas, mi‑ també m a regiã o da Fronteira Sudoeste do
neraló gicas, quı́micas e isotó picas da á gata e RS vem despontando na produçã o e na co‑
da opala que ocorrem no RS. Alé m disso, se‑ mercializaçã o de á gata. No estado, o inı́cio da
rã o apresentadas hipó teses para a gê nese atividade de explotaçã o da á gata, da ametis‑
dos depó sitos. O uso gemoló gico da á gata ta e, posteriormente, da opala se deu por
compreende etapas e processos de bene ici‑ volta de 1827, quando imigrantes alemã es,
amento, com a inalidade de comercializaçã o que dominavam té cnicas de extraçã o e de
nos mercados externo e interno. Estudos bene iciamento mineral, iniciaram minera‑
acerca dos processos de bene iciamento sã o çã o de geodos silicosos nas margens do rio
essenciais, para o avanço da comercializaçã o Taquari, nas cidades de Lajeado e de Soleda‑
desses materiais, e estes serã o feitos, ao inal de, e, posteriormente, nas margens do rio Ja‑
deste capı́tulo. cuı́ e de seus a luentes, segundo Kellermann
(1990).
2 MINERAÇÃO DE ÁGATA E DE OPALA Como a maioria dos garimpos de
NO RIO GRANDE DO SUL á gata está localizado à s margens do rio Jacuı́
e do rio Taquari e de seus a luentes, ó rgã os
O Brasil é uma das principais provı́n‑ ambientais estaduais embargaram essa ati‑
cias gemoló gicas do mundo, conforme Webs‑ vidade, que, durante muitos anos, ocorreu de
ter (1983), e se destaca pelo volume e pela forma irregular. Esta prá tica fez com que a
qualidade da produçã o e da exportaçã o das regiã o sofresse graves problemas, nã o, só ,
gemas. Por estimativa de 2019 do Instituto ambientais, mas, també m, de saú de pú blica e
Brasileiro de Gemas e Metais Preciosos de recursos humanos. Atualmente, com a re‑
356 Edição da Sociedade Brasileira de Geologia – Núcleo RS/SC
Michelin et al.

gularizaçã o da atividade mineira, existem rios. Estes autores de inem uma á rea de 250
cerca de 16 garimpos ativos, segundo estima‑ km2, localizada no Planalto da Serra Geral,
tiva do Sindipedras (2020). que compreende os municı́pios de Salto do
No DMSJ, ocorre a valorizada á gata Jacuı́, de Campos Borges, de Fortaleza dos Va‑
Umbu, de cor azul escura e com elevada mi‑ los, de Segredo, de Sobradinho, de Espumoso
croporosidade, caracterı́stica estrutural dife‑ e de Arroio do Tigre (Fig. 1).
rencial, pois permite que este mineral seja No DMSJ, os geodos, contendo á gata e
submetido a processos de tingimento e de opala, sã o extraı́dos dos derrames de rochas
tratamento té rmico. Nos ú ltimos anos, té cni‑ vulcâ nicas, que, em geral, estã o muito intem‑
cas de bene iciamento combinam a á gata perizados, e, por isto, sã o de fá cil desagrega‑
com outros materiais, agregando valor esté ti‑ çã o (Fig. 2A‑2B). O nı́vel mineralizado pode,
co à s peças produzidas com os geodos. por vezes, ser escavado com relativa facilida‑
de, utilizando‑se tratores de esteira e, em al‑
3 CARACTERIZAÇÃO GEOLÓGICA, MINE‑ guns casos, os geodos podem ser extraı́dos
RALÓGICA E QUÍMICA DA ÁGATA E DA de maneira manual.
OPALA DO RS O derrame mineralizado possui uma
zona vesı́culo‑amigdaloidal, na qual sã o en‑
Os depó sitos de á gata e de opala es‑ contrados os geodos de á gata, associados à
tã o associados à s rochas vulcâ nicas, tanto de opala; este derrame basá ltico tem uma com‑
composiçã o á cida como bá sica, da Formaçã o plexa relaçã o com outros derrames á cidos e
Serra Geral, do Cretá ceo, da Bacia do Paraná . com intertraps arenosos. Michelin (2014)
A Bacia do Paraná é uma feiçã o geoló gica im‑ descreve a relaçã o entre lava e sedimento e
portante da porçã o centro‑sul da Plataforma propõ e a seguinte sequê ncia estratigrá ica,
Sul‑Americana, conforme pode ser visto na para a á rea do DMSJ, da base para o topo:
Figura 1. E uma bacia com preenchimento derrame dacı́tico, com espessura em torno de
vulcano‑sedimentar, iniciado no Siluro‑Devo‑ 20 m, cinza escuro, com alteraçõ es incipien‑
niano e terminado no Cretá ceo, com os der‑ tes, com presença de geodos preenchidos por
rames de lavas á cidas e bá sicas da Formaçã o opala e por quartzo macrocristalino e, mais
Serra Geral (Milani, 1997). Eventualmente, raramente, por á gata. Diques de arenito sã o
esses derrames estã o intercalados com os caracterı́sticos da base do derrame e fraturas,
arenitos quartzosos eó licos da Formaçã o Bo‑ preenchidas por sedimentos, ocorrem no to‑
tucatu (Scherer, 2002). Heemann (1999) e po; derrame basá ltico, com espessura de 25
Michelin (2014), entre outros, mostram que m, cinza avermelhado, com geodos preenchi‑
os arenitos da Formaçã o Botucatu estã o rela‑ dos, sequencialmente, por calcedô nia, por
cionados com a gê nese e com a presença da á gata e por quartzo macrocristalino e, rara‑
á gata na regiã o do DMSJ. CPRM (2020) tam‑ mente, por calcita fraturas abundantes, pre‑
bé m con irma esta associaçã o, poré m desta‑ enchidas por calcita e por material argiloso.
ca a regiã o da Fronteira Sudoeste do estado Nã o sã o observados geodos preenchidos com
(Fig. 1) como outro polo de mineraçã o destas á gata nesse derrame. E o derrame potencial‑
variedades. mente mineralizado, destacando‑se diques
A á rea potencialmente produtora de de arenito e porçõ es brechadas na base; e
á gata e de opala no RS é o Distrito Mineiro do derrame dacı́tico, com aproximadamente 25‑
Salto do Jacuı́ (DMSJ), de inida e individuali‑ 29 m de espessura, cinza escuro, intensa‑
zada por Santos et al. (1998), com base nas mente alterado, quando comparado ao basá l‑
informaçõ es disponı́veis nos tı́tulos minerá ‑ tico mineralizado.
Depósitos de ágata e de opala no estado do Rio Grande do Sul 357
Contribuições à Geologia do Rio Grande do Sul e de Santa Catarina

Figura 1 ‒ Localizaçã o das principais ocorrê ncias de á gata e de opala no estado do Rio Grande do Sul (a partir
de Juchem, 1999).

Figura 2 ‑ Aspectos gerais da ocorrê ncia dos geodos: A) Garimpo na regiã o do DMSJ. Intercalaçã o de derrames
á cidos e bá sicos e feiçõ es de interaçã o entre lava e sedimento; e B) Detalhe da rocha hospedeira (dacito
inferior) e do geodo, em que se nota a camada de, aproximadamente, 3 cm de argilominerais, que fazem o
contato do geodo com o dacito.

358 Edição da Sociedade Brasileira de Geologia – Núcleo RS/SC


Michelin et al.

Os basaltos portadores dos geodos Os geodos apresentam uma grande


de á gata sã o, predominantemente, glomero‑ variedade de tamanhos e de formas e sã o
por irı́ticos, com fenocristais de plagioclá sios preenchidos por minerais predominante‑
e com piroxê nios imersos em uma fase vı́trea mente silicosos, conforme pode ser visualiza‑
intersticial, rica em cristá litos de plagioclá sio do na Figura 3. Brum et al. (1994) e Agostini
e de piroxê nio. As microfraturas e as vesı́cu‑ (1998) descrevem detalhadamente as varie‑
las sã o feiçõ es comuns. Os dacitos tê m ma‑ dades de preenchimentos dos geodos. Miche‑
triz predominantemente vı́trea, com alguns lin et al. (2013) observam que, de uma forma
cristá litos de feldspato alcalino, de plagioclá ‑ geral, os geodos do DMSJ possuem a seguinte
sio e de quartzo, e piroxê nios sã o observa‑ sequê ncia de preenchimento, da borda para
dos, de maneira subordinada. As microfra‑ o centro: calcedô nia, opala, á gata, quartzo
turas e as vesı́culas sã o relativamente raras, macrocristalino e, em alguns geodos, cristais
quando comparadas à s rochas vulcâ nicas bá ‑ de calcita. A á gata e a opala sã o as fases mais
sicas. Caracterı́stica comum e representativa comuns e mais importantes. Em alguns geo‑
dos dacitos é a corrosã o das bordas dos piro‑ dos, com bordas menos espessas de á gata,
xê nios e dos plagioclá sios. A intensa dissolu‑ ocorre quartzo macrocristalino (ametista e
çã o da matriz vı́trea intersticial nesta quartzo incolor). Os geodos preenchidos com
unidade é um ponto de interesse para a for‑ á gata apresentam, de forma geral, quatro ti‑
maçã o da á gata. As aná lises quı́micas dos pos: 1) aqueles totalmente preenchidos, com
derrames descritos indicam rochas á cidas e alternâ ncia de uma camada espessa de á gata
bá sicas, cujos teores de SiO2 variam de (até 6 cm) com uma camada de quartzo ma‑
50,60% a 69,13%; teores, estes, que, quando crocristalino (2‑5 cm) (Fig. 3A). Nesta varie‑
plotados em diagramas quı́micos, indicam dade de preenchimento, també m é comum a
uma composiçã o basá ltica e dacı́tica. O teor presença de opala. E o tipo dominante na re‑
de TiO2 varia de 1,82% a 1,86%, para os ba‑ giã o e a á gata do tipo Umbu ocorre, associa‑
saltos, e de 0,67% a 0,91%, para os dacitos. da com este padrã o de preenchimento; 2)
De maneira geral, as rochas portado‑ uma segunda situaçã o, em que, na porçã o
ras de opala sã o afanı́ticas e semivı́treas, com mais externa, há uma camada milimé trica de
cores cinza a cinza escuro e castanho aver‑ á gata, seguida por uma camada mais espessa
melhado, apresentando‑se, sempre, muito al‑ (até 15 cm) de quartzo macrocristalino, com
teradas. Podem apresentar textura vesicular, a porçã o central do geodo sem preenchimen‑
sendo que estas vesı́culas centimé tricas es‑ to (Fig. 3E); 3) geodos totalmente preenchi‑
tã o parcialmente preenchidas por calcedô nia dos por á gata Umbu; e 4) geodos, contendo
e por quartzo. Ao microscó pio petrográ ico, opala e, raramente, calcita, associados a uma
sã o identi icados microfenocristais de plagi‑ ina camada de á gata (Fig. 4D).
oclá sio (labradorita), de piroxê nio (augita) e A opala encontrada no RS é sempre
de minerais opacos (magnetita e ilmenita) microcristalina, dos tipos opala‑CT e opala‑C.
imersos em uma matriz semivı́trea. Na ma‑ Entre as variedades, algumas se destacam
triz, ocorrem micró litos de plagioclá sio e de pela qualidade gemoló gica, em especial, a
piroxê nio e cristá litos aciculares, por vezes, opala vermelha a laranja (opala de fogo) e a
dispostos em arranjos radiados a esferulı́ti‑ opala azul. Alé m dessas, outras variedades
cos. E comum a ocorrê ncia de fraturas pre‑ podem ser usadas como gema, atingindo va‑
enchidas por quartzo macrocristalino, por lores expressivos nos mercados nacional e
quartzo microcristalino granular e ibroso internacional de gemas.
(calcedô nia) e, por vezes, por opala. No RS, a opala ocorre em agregados

Depósitos de ágata e de opala no estado do Rio Grande do Sul 359


Contribuições à Geologia do Rio Grande do Sul e de Santa Catarina

Figura 3 ‒ Exemplos dos diferentes tipos de preenchimentos dos geodos: A) Geodo com preenchimento parcial
de á gata e com ina camada quartzo incolor (sem bandamento aparente); B) Fragmento de geodo com á gata
bandada; C) Fragmento de geodo com bandamento concê ntrico, com canais de percolaçã o de luido, com
intercalaçã o de nı́veis de á gata e com nı́veis de quartzo macrocristalino; D) Fragmento de geodo preenchido
por calcedô nia, por calcita e por quartzo macrocristalino; E) Detalhe da predominâ ncia de quartzo
macrocristalino como preenchimento de geodo F) Fragmento de geodo com ina camada de calcedô nia, com
quartzo macrocristalino, com opala e com á gata (legenda: á gata (Ag); quartzo macrocristalino (Qm); opala
(Op); e calcita (Cc).

maciços ou colomorfos, com cores variadas – co. A fratura é conchoidal a irregular, que‑
incolor, branco, branco azulado, rosa, amare‑ brando em lascas cortantes e, em algumas
lo, azul, azul acinzentado, castanho, preto e amostras, podem ser identi icadas fraturas
em diferentes tonalidades de laranja e de por desidrataçã o. A densidade é sempre bai‑
vermelho ‒, caracterizando a variedade xa, variando entre 1,95 e 2,25, e a dureza,
“opala de fogo” (Fig. 4A). Eventualmente, medida na escala de Mohs, varia entre 5,5 e
amostras de opala amarela, laranja e verme‑ 6,5.
lha apresentam um leve jogo de cores e foi O bandamento caracterı́stico da
identi icada, també m, opalescê ncia em á gata pode ser observado ao microscó pio,
amostras de opala incolor, amarela e laranja. pois as bandas sã o formadas pela intercala‑
O brilho é vı́treo a resinoso e pode ser trans‑ çã o de agregados criptocristalinos de quart‑
parente a translú cido e, eventualmente, opa‑ zo (Fig. 5A) e de agregados ibrosos de
360 Edição da Sociedade Brasileira de Geologia – Núcleo RS/SC
Michelin et al.

Figura 4 ‒ Modos de ocorrê ncia e caracterı́sticas microscó picas da opala do RS: A) Opala amarela, associada à
á gata, preenchendo totalmente um geodo; B) Opala branca leitosa, depositada em fraturas da rocha hospedeira;
C) Veios de opala, em meio à calcedô nia; e D) Mesma lâ mina em LP, exibindo o cará ter isó tropo da opala e a
calcedô nia, constituı́da por esferulitos de quartzo microcristalino ibroso (a partir de Brum & Juchem, 2014).

calcedô nia (Fig. 5B). Os agregados ibrosos A composiçã o quı́mica da á gata do


se caracterizam pela orientaçã o, pois os seus DMSJ apresenta valores predominantes de
eixos principais sã o alongados, ortogonais ao SiO2 (92,52% a 97,95%). Marcantes sã o os
padrã o de bandamento e orientados em di‑ valores de LOI (perda ao fogo), que variam
reçã o ao centro dos geodos. O quartzo mi‑ de 0,4% a 4,9%. Percebe‑se uma correlaçã o
crocristalino apresenta uma textura granular, entre os teores de LOI e de SiO2. Observa‑se
com grã os de dimensõ es inferiores a 20 µm. que a á gata com menor teor de SiO2 apre‑
Diversos autores mostram que a á gata tem senta, nã o, só , os maiores valores para LOI,
um grande nú mero de microporos, com diâ ‑ mas, també m, as maiores concentraçõ es de
metros da ordem de 0,1 µm, usualmente pre‑ impurezas, sob a forma de elementos‑traço e
enchidos por á gua (Midgley, 1951; Folk & maiores, conforme sugerido por Constantina
Weaver, 1952; Frondel, 1962; Heaney et al., & Moxon (2010). Alé m disso, as amostras de
1994; Hurlbut & Switzre, 1980). á gata extraı́das de diferentes geodos, de uma
A opala, ao microscó pio petrográ ico, maneira geral, mostram variaçõ es signi ica‑
apresenta um comportamento isó tropo a tivas nos conteú dos de Al, de Fe, de Cu, de Ni
fracamente anisó tropo, o que evidencia sua e de Ba. De uma forma geral, os valores para
estrutura microcristalina (Fig. 4C‑4D). Ao o Fe2O3 e para o Al2O3 nas amostras analisa‑
polariscó pio e ao refratô metro, a opala exibe das podem ser considerados relativamente
um comportamento isó tropo, no entanto o elevados, quando comparados aos dos ou‑
ı́ndice de refraçã o varia nas diferentes amos‑ tros ó xidos.
tras, exibindo valores entre 1,439 e 1,475. As aná lises quı́micas da opala do RS

Depósitos de ágata e de opala no estado do Rio Grande do Sul 361


Contribuições à Geologia do Rio Grande do Sul e de Santa Catarina

Figura 5 ‒ Fotomicrogra ias da á gata: A) Agregados criptocristalinos de quartzo (QC) e agregados ibrosos
orientados (CA) (LP, 25X); e B) Agregados ibrosos de calcedô nia (LP, 50X).

mostram variaçõ es no teor de sı́lica entre um tema que vem sendo discutido, mundial‑
92% e 98% nas amostras analisadas e foram mente (Moxon, 2009; Dumań ska‑Słowika et
identi icados, també m, teores variados de al., 2019; Powolnya et al., 2019; Gotze,
Al2O3, de CaO, de Na2O, de K2O, de Fe2O3, de 2020).
TiO2 e de MgO. A perda ao fogo medida vari‑ Muitas hipó teses já foram discuti‑
ou entre 0,9% e 6,0%, observando‑se que, das, a partir de estudos de parâ metros, co‑
quanto maior o teor de sı́lica, menor é a per‑ mo a temperatura de formaçã o e a fonte de
da ao fogo. sı́lica que os teriam originado. Estas ideias
As aná lises isotó picas constituem postulam, desde uma possı́vel origem mag‑
importantes ferramentas, para a inferê ncia má tica, a alta temperatura (Godovikov et al.,
da temperatura e dos processos de minerali‑ 1987; Blankenburg, 1988; Moxon, 2006), até
zaçã o de minerais silicosos. Nesse sentido, processos pó s‑magmá ticos, de baixa tempe‑
foram compilados os dados de Juchem ratura (Juchem, 1999; Gilg et al., 2003; Du‑
(1999), de Duarte (2008) e de Michelin arte, 2008; Michelin et al., 2013).
(2014), que obtiveram resultados de aná lises Strieder & Heemann (2006) postu‑
isotó picas de oxigê nio em á gata (δ18O), que lam que a gê nese dos geodos está relaciona‑
estã o expressos na Tabela 1. Os autores, a da com a fusã o dos arenitos eó licos da
partir do cá lculo de temperatura, chegaram à Formaçã o Botucatu pelas lavas basá lticas da
conclusã o de que, tanto a á gata associada a Formaçã o Serra Geral. Os autores descrevem
geodos de ametista, nas regiõ es do Alto Uru‑ xenó litos de arenito nas lavas vesiculares
guai e de Quaraı́, quanto a á gata de preenchi‑ basá lticas, diques de arenito, que cortam os
mento exclusivo no DMSJ cristalizam, a derrames, e a relaçã o destes com os geodos.
temperaturas baixas (mé dia de 27,88 0C). Ao estudarem as mineralizaçõ es de
ametista na regiã o de Ametista do Sul (RS) e
4 MODELOS GENÉTICOS algumas amostras do DMSJ, com aná lises de
inclusõ es luidas e com estudos geoquı́micos
Com base na aná lise integrada de e isotó picos, Gilg et al. (2003) inferem, a res‑
observaçõ es de campo e de laborató rio, sã o peito das fases dos luidos, propondo um
propostos modelos de formaçã o dos depó si‑ modelo gené tico para a formaçã o destas mi‑
tos de á gata, associados à opala. Sabe‑se que neralizaçõ es. Este modelo contempla dois
a gê nese destes depó sitos é complexa e que é está gios de formaçã o e de preenchimento

362 Edição da Sociedade Brasileira de Geologia – Núcleo RS/SC


Michelin et al.

Tabela 1 ‒ Resultados de aná lises isotó picas de oxigê nio (δ18O) em á gata (a partir de Juchem
(1999), de Duarte (2008) e de Michelin (2014)).

das cavidades: o primeiro está gio magmá tico zada, da á gua contida nas regiõ es em que o
é responsá vel pela geraçã o das cavidades de‑ nı́vel freá tico a lora (regiõ es interdunas). Co‑
nominadas protogeodos e um está gio poste‑ mo evidê ncia de uma possı́vel contribuiçã o,
rior é responsá vel pelo preenchimento por parte do lençol freá tico, tem‑se os di‑
destas cavidades, a temperatura mais baixa. ques de arenito, que, para sua formaçã o, ne‑
Para Michelin (2014), parte da fonte cessitam de luidizaçã o da areia e de
da sı́lica é atribuı́da à matriz vı́trea dos daci‑ temperaturas na faixa de 65 oC, medida obti‑
tos e é associada à percolaçã o de á guas me‑ da para exemplares de á gata do DMSJ em
teó ricas, possivelmente, de cará ter alcalino. aná lises isotó picas.
A temperatura ambiente das á guas é eviden‑ O comportamento da sı́lica em um
ciada pelas temperaturas de precipitaçã o da sistema de baixa temperatura pode ser in‑
á gata, que se situam em torno de 28 oC, de terpretado como um sistema de baixa solu‑
acordo com cá lculos, envolvendo razõ es iso‑ bilidade em á gua. A solubilidade, em geral,
tó picas de oxigê nio. Para a autora, a migra‑ depende da temperatura (100‑140 mg/l, a
çã o dos luidos silicosos mineralizantes 20 oC). O pH també m in luencia o processo e
ocorre, a partir das fraturas, das microfratu‑ se sabe que o á cido ortosilı́cico Si(OH)4 se
ras e das vesı́culas, descritas nos derrames apresenta de forma solú vel a um pH de 1 a 9
á cidos e bá sicos, que hospedam as minerali‑ e, a um pH alcalino, o silı́cio tende a icar
zaçõ es. As feiçõ es sedimentares descritas mais dissolvido (Dietzel, 2000).
por Michelin (em prep.) (diques de arenito, Segundo Michelin (2014), as hetero‑
fraturas preenchidas por sedimentos, bre‑ geneidades, em termos de distribuiçã o das
chas, intertraps, regiõ es interdunas e geodos mineralizaçõ es de sı́lica e de posicionamento
de siltitos argilosos) perfazem um sistema dos polimorfos (opala, calcedô nia, á gata e
permo‑poroso, capaz de facilitar a migraçã o quartzo macrocristalino) no derrame porta‑
dos luidos, até sua precipitaçã o, no interior dor, estã o associadas à distribuiçã o irregular
dos geodos. Ainda, nã o se descarta a hipó te‑ da porosidade e à permeabilidade (tanto nas
se de que a contribuiçã o da á gua nã o seja, rochas sedimentares como nas vulcâ nicas).
apenas, meteó rica super icial, mas que haja O crescimento dos diferentes polimorfos no
uma participaçã o, em menor escala e locali‑ interior dos geodos se dá , a partir de uma

Depósitos de ágata e de opala no estado do Rio Grande do Sul 363


Contribuições à Geologia do Rio Grande do Sul e de Santa Catarina

soluçã o supersaturada em sı́lica. Com a pre‑ tipo cabochã o (Fig. 5B). A opala branca (opa‑
cipitaçã o dos ı́ons contidos neste luido, a la‑CT) pode ser lapidada, normalmente. Já a
tendê ncia é de que os á tomos se arranjem de opala translú cida, que possui cores estetica‑
uma maneira organizada, caracterizando, en‑ mente interessantes (amarelo claro, leitosa,
tã o, o estado só lido. Formam‑se, entã o, pon‑ entre outras), precisa ser cuidadosamente
tos de nucleaçã o, desencadeando o cres‑ manuseada para ins de lapidaçã o, pois, se
cimento do cristal. Desta maneira, propõ e‑se ocorrer aumento signi icativo de temperatu‑
a seguinte sequê ncia de cristalizaçã o, para o ra, causado pelo atrito com os materiais
preenchimento dos geodos do DMSJ: opala – abrasivos e de polimento, pode desenvolver
calcedô nia – á gata – quartzo macrocristali‑ trincas, com o passar do tempo.
no. O processo de gravaçã o a laser na
á gata foi detalhadamente estudado por Cida‑
5 APROVEITAMENTO GEMOLÓGICO de (2012) e por Cidade et al. (2018). O efeito
da energia do laser CO2 na superfı́cie do ma‑
A á gata é um dos materiais gemoló ‑ terial de coloraçã o branca (Fig. 5D) gera con‑
gicos mais versá teis do Rio Grande do Sul. A traste e, assim, podem ser feitos desenhos e
con iguraçã o mineraló gica dos geodos, que, gra ismos. A á gata entra em estado de fusã o,
por vezes, sã o totalmente preenchidos, per‑ pela interaçã o com o laser, e é rapidamente
mite usos diversi icados. O corte dos geodos resfriada, tendo, como resultante, material
em chapas, associado aos processos de tingi‑ amorfo (Fig. 5C). Neste processo de fusã o/
mento, com exploraçã o esté tica das diferen‑ solidi icaçã o, sã o geradas cavidades micro‑
tes cores das bandas, favorece à seleçã o da mé tricas (Fig. 5E) e, pelo rá pido resfriamento
á gata para diversos produtos. do material, tem‑se a geraçã o de uma porosi‑
Um dos principais e mais antigos dade secundá ria, que pode abrigar microcá p‑
usos é o seu bene iciamento por glı́ptica, que sulas com quaisquer preenchimentos
sã o pequenas esculturas em relevo, em que (Duarte et al., 2011). Microcá psulas sã o mui‑
a loram as diferentes cores, formando dese‑ to utilizadas em inú meros produtos, atual‑
nhos. Os materiais que possuem intercalaçã o mente, e, na á gata, microcá psulas, contendo
de bandas de calcedô nia (cinza) e com ban‑ corante luorescente e, també m, substâ ncias
das de opala (branca) sã o os mais valoriza‑ aromá ticas, tê m sido inseridas na porosidade
dos. A regiã o de Idar‑Oberstein, na secundá ria (Fig. 5F).
Alemanha, tem tradiçã o nesta prá tica e, atu‑ O corte da á gata em chapas pode ter
almente, importa o material do RS, pois suas espessuras variadas, dependendo da inali‑
reservas foram exauridas. Pesquisas acadê ‑ dade do uso. As disponı́veis no mercado pos‑
micas sã o desenvolvidas, para que este mate‑ suem espessuras aproximadas de 2 mm e
rial possa ser bene iciado no Rio Grande do permitem o corte por jato d’á gua, que corta o
Sul (Bisinella, 2014; Kindlein et al., 2020). A material, por meio de um jato d’á gua abrasi‑
elaboraçã o de camafeus com per il humano, vo (normalmente, adicionado de granada), e
obtida por escaneamento tridimensional que consegue reproduzir trajetos elaborados
(Fig. 5A), foi feita em opala branca do RS em softwares do tipo Computer‑Aided Design
(Tessmann, 2009). A opala branca ainda é (CAD), em coordenadas X‑Y, formando dese‑
pouco utilizada, pois, diferentemente da á ga‑ nhos vazados, com inú meras aplicaçõ es
ta, sua comercializaçã o em forma de chapas (Barp, 2009; Silveira, 2011). Chapas de maior
nã o é viá vel, pois é muito quebradiça. Entã o, espessura, com 6 mm, podem ser utilizadas
uma das opçõ es de uso é a lapidaçã o lisa, do para o corte de ané is. Este processo permite
364 Edição da Sociedade Brasileira de Geologia – Núcleo RS/SC
Michelin et al.

Figura 6 – Bene iciamento de á gata e de opala: A) Escultura em relevo, feita por usinagem CNC, a partir do
modelo, obtido por digitalizaçã o tridimensional de per il humano (detalhe); B) Opala translucida e opala branca
em lapidaçã o lisa, do tipo cabochã o; C) laser, interagindo com a á gata e, no detalhe, difratograma de raios‑X,
indicando o antes e o depois da açã o do laser; D) Bracelete com á gata originalmente preta, gravada a laser
(porçõ es brancas); E) Imagem eletrô nica de varredura, mostrando a de iniçã o das zonas gravadas e nã o
gravadas a laser; F) Microporosidade secundá ria, gerada pela gravaçã o a laser, indicando microcá psulas
aromá ticas alojadas na porosidade (setas); G) Processo de corte por jato d’á gua, com o corte de quatro ané is,
feito em chapa de á gata; H) Corte modular em á gata tingida de rosa e de preto, para aproveitamento de resı́duos;
e I) Chapa de á gata tingida, indicando porçõ es, que respondem diferentemente ao tingimento, e pequena banda
de opala (seta).

espessuras de parede de aro de apenas 2 mm Os processos de bene iciamento da


(Fig. 5G), em projetos que levam em conside‑ á gata, principalmente, aqueles referentes ao
raçã o a ergonomia das mã os. Chapas menos tingimento, sã o pontos de interesse, já que,
espessas, ou, mesmo, chapas quebradas, po‑ devido à s suas propriedades microestrutu‑
dem ser recortadas em moldes encaixá veis rais, este mineral aceita muito bem tais pro‑
(Fig. 5H). Esta é uma soluçã o de projeto que cessos (Tubino, 1998; Sampaio & Tubino,
contempla pequenos fragmentos, que, uni‑ 1999; Pizzolato et al., 2002), que tornam a
dos, podem recobrir superfı́cies de grandes á gata mais valorizada, comercialmente. Os
dimensõ es, como paredes e partes de mobi‑ mé todos clá ssicos foram trazidos pelos ale‑
liá rio, por exemplo. També m, cabe ressaltar mã es, no sé culo XIX, e aplicados na á gata do
que um ú nico projeto CAD pode ser utilizado Rio Grande do Sul, desde o inı́cio do sé culo
para o recorte de inú meras peças (Silveira, XX. As peças de á gata geralmente sã o imersas
2011). em uma soluçã o, que conté m ı́ons metá licos

Depósitos de ágata e de opala no estado do Rio Grande do Sul 365


Contribuições à Geologia do Rio Grande do Sul e de Santa Catarina

ou açú car, os quais, apó s impregnarem nos estabelecimento de crité rios de prospecçã o
microporos, sã o submetidos a uma reaçã o de novos depó sitos econô micos.
quı́mica, com a inalidade de convertê ‑los em O bene iciamento de opala e de á gata
um composto colorido e insolú vel, como pro‑ mostra uma alternativa promissora para es‑
posto por Knecht (1957). tudos mais aprofundados em design e forne‑
A mudança de cor da á gata decorre ce um aporte de renda para as regiõ es do
da impregnaçã o, por corantes orgâ nicos e estado produtoras destes materiais gemoló ‑
inorgâ nicos, da microporosidade caracterı́s‑ gicos.
tica e da sua resistê ncia ao calor e aos á cidos.
A variaçã o da microporosidade nas bandas REFERÊNCIAS
faz com que o tingimento ocorra de forma ir‑
regular, pois algumas bandas sã o mais facil‑ Agostini, I. M. 1998. Agata do Rio Grande do
mente impregnadas pelo corante do que Sul. Brası́lia, DNPM, 272p. (Sé rie Difusã o Tec‑
outras, tornando as bandas mais evidente noló gica, 5)
pelo contraste de cores (Fig. 5I). Como a so‑
Augustin, A. H. 2004. Geologia e mineralogia
luçã o tingidora penetra pouco no mineral, o
dos depó sitos de opala da regiã o do Salto do
tingimento costuma ser feito, apó s a peça ser Jacuı́, RS, Brasil. Porto Alegre, 77p. Monogra‑
cortada e desbastada, para facilitar a pene‑ ia de Conclusã o do Curso, Curso de Geologia,
traçã o do corante (Branco & Gil, 2000). Esti‑ Instituto de Geociê ncias, Universidade Fede‑
ma‑se que cerca de 40% dos exemplares de ral do Rio Grande do Sul.
á gata comercializados no estado passem por
Bard, D. R. A. 2009. Design e materiais: con‑
este processo de tingimento. No entanto, es‑
tribuiçã o ao estudo do processo de corte de
te ı́ndice ainda é inferior à mé dia mundial, á gata por jato d’á gua em formas complexas.
considerada superior a 50% (Branco & Gil, Porto Alegre, 95p. Programa de Pó s‑gradua‑
2000). çã o em Design, Escola de Engenharia, Facul‑
dade de Arquitetura, Universidade Federal
do Rio Grande do Sul.
6 CONCLUSÕES
Batisti, V. S. & Tatsch, A. L. 2012. O Arranjo
O Rio Grande do Sul apresenta um Produtivo Local (APL) gaú cho de gemas e
grande potencial, como produtor de á gata e joias: estruturas produtiva e comercial, ar‑
de opala, com depó sitos, associados à s ro‑ ranjos institucional e educacional e relaçõ es
chas vulcâ nicas á cidas da Formaçã o Serra interorganizacionais. Ensaios FEE, Porto Ale‑
Geral, da Bacia do Paraná . Esses depó sitos, gre, 33(2): 513‑538.
que sã o explotados até hoje, rendem um vo‑
Bisinella, R. C. 2014. Design de gemas: Fresa‑
lume apreciá vel de material, representando dora pantográ ica para glı́ptica em á gata.
uma nova fonte de divisas para as regiõ es Porto Alegre, 117p. Programa de Pó s‑gradu‑
produtoras. açã o em Design, Escola de Engenharia, Facul‑
As caracterı́sticas geoló gicas, mine‑ dade de Arquitetura, Universidade Federal
raló gicas e geoquı́micas apontam para uma do Rio Grande do Sul.
origem de baixa temperatura para esses de‑ Blankenburg, H. J. 1988. Agate. Dt. Verl.
pó sitos, posterior ao vulcanismo Serra Geral. Grundstof ind, Leipzig, 321p.
Os modos de ocorrê ncia em rochas vulcâ ni‑
cas (em geodos, em estruturas de luxo, em Bossi, J. & Caggiano, W. 1974. Contribuició n a
fraturas e em brechas cimentadas) sã o ca‑ la geologia de los yacimentos de amatista del
Departamento de Artigas (Uruguay). In:
racterı́sticas geoló gicas importantes, para o

366 Edição da Sociedade Brasileira de Geologia – Núcleo RS/SC


Michelin et al.

CONGRESSO BRASILEIRO DE GEOLOGIA, 28., L. 2011. Design de produto para a á gata:


Porto Alegre. Anais… Porto Alegre, SBG, v. 3, aplicaçã o de microcá psulas luorescentes em
p. 301‑318. superfı́cies gravadas a laser. Design e tecno‑
logia, 1(2): 114‑118.
Branco, P. M. & Gil, C. A. A. 2000. Mapa Ge‑
moló gico do Estado do Rio Grande do Sul. Duarte, L. C. 2008. Evoluçã o geoló gica, ge‑
Porto Alegre: CPRM, escala 1:1.000. 000. oquı́mica e isotó pica das mineralizaçõ es de
geodos com ametista, Artigas, Repú blica Ori‑
Brum, T. M. M. & Juchem, P. L. 2014. Opala no ental do Uruguai. Porto Alegre, 167p. Tese de
Rio Grande do Sul. In: Hinrichs, R. Té cnicas Doutorado, Programa de Pó s‑graduaçã o em
instrumentais nã o destrutivas aplicadas a Geociê ncias, Instituto de Geociê ncias, Uni‑
gemas do Rio Grande do Sul. Porto Alegre, versidade Federal do Rio Grande do Sul.
IGEO/UFRGS, p. 27‑43.
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370 Edição da Sociedade Brasileira de Geologia – Núcleo RS/SC


Depósitos de ametista do
Rio Grande do Sul e
de Santa Catarina
Lauren da Cunha Duarte1*, Lé o Afraneo Hartmann2,
Pedro Luiz Juchem1, Larissa Lanes Tononi2

1
Instituto de Geociê ncias, Universidade Federal do Rio Grande do Sul
2
Programa de Pó s‑graduaçã o em Geociê ncias, Universidade Federal do Rio Grande do Sul

*autor correspondente: lauren.duarte@ufrgs.br

1 INTRODUÇÃO
A ametista ‒ variedade de quartzo de cor violeta – é a mais apreciada e valorizada, entre
os minerais da famı́lia da sı́lica, sendo utilizada desde a Antiguidade, quando era proveniente do
Egito, do sudeste asiá tico, dos Montes Urais e de parte do oeste europeu (Frondel, 1962; O’Do‑
noghue, 1987). Atualmente, entre os vá rios paı́ses produtores, o Brasil é um dos maiores forne‑
cedores mundiais desse bem mineral, destacando‑se o Rio Grande do Sul como o maior
produtor nacional, devido à qualidade e ao volume produzido.
A maioria dos materiais gemoló gicos do Rio Grande do Sul está associado à s rochas do
Grupo Serra Geral, da Bacia do Paraná , sendo a ametista uma das gemas mais importantes, com
o mesmo tipo de depó sito ocorrendo, també m, em Santa Catarina. A Figura 1 mostra as princi‑
pais unidades geoló gicas do RS e de SC, com a localizaçã o dos principais depó sitos de ametista
(em explotaçã o ou que mostram potencial de aproveitamento econô mico), indicando, ainda, as
quatro principais regiõ es de extraçã o desse bem mineral. Nesses depó sitos, a ametista ocorre
preenchendo cavidades centimé tricas a mé tricas (geodos), podendo ocorrerem associados á ga‑
ta, ô nix, cornalina, cristal de rocha, quartzo rosa, calcita, gipsita, barita, jaspe, apo ilita, zeó litas e
opala. Esses minerais sã o aproveitados economicamente nos mercados brasileiro e internacio‑
nal, como minerais de coleçã o, como gemas ornamentais ou como gemas lapidadas.
Muitos trabalhos acadê micos foram desenvolvidos, para o entendimento das condiçõ es
de mineralizaçã o destes importantes depó sitos de classe mundial do Brasil (e.g. Gomes, 1996;
Scopel, 1998; Juchem, 1999; Gilg et al., 2003, 2014; Proust & Fontaine, 2007a, 2007b; Juchem et
Contribuições à Geologia do Rio Grande do Sul e de Santa Catarina

Figura 1 ‒ Esboço geoló gico do RS e de SC, com a localizaçã o dos principais depó sitos de ametista, indicando as
quatro regiõ es, em que, atualmente, existe extraçã o desse bem mineral: 1) Distrito Mineiro de Ametista do Sul;
2) Regiã o da Fronteira Oeste do RS; 3) Regiã o de Nova Bré scia‑Progresso e Caxias do Sul; e 4) Regiã o de Entre
Rios (SC) (modi icado de Juchem, 2014).

al., 2009; Hartmann et al., 2010, 2012a,


2 GEOLOGIA DOS DEPÓSITOS
2015; Juchem & Hartmann, 2011; Rosens‑
tengel & Hartmann, 2012; Pertille et al., 2. 1 Distrito Mineiro de Ametista do
2013) e, també m, do Uruguai (Bossi & Caggi‑ Sul
ano, 1974; Duarte, 2008; Duarte et al., 2009,
2010; Techera, 2009), que possui continui‑ Os principais depó sitos de ametista
dade com os depó sitos da fronteira sudoeste estã o localizados no norte do Rio Grande do
do RS. Questõ es referentes aos episó dios de Sul, na regiã o do Alto Uruguai, denominada
mineralizaçã o e à cronologia dos eventos Distrito Mineiro de Ametista do Sul (DMAS).
ainda sã o investigadas, com hipó teses distin‑ A produçã o se concentra, principalmente,
tas para esses importantes depó sitos mine‑ nos municı́pios de Ametista do Sul, de Pla‑
rais. nalto, de Frederico Westphalen, de Iraı́ e de
O material gemoló gico explorado e Rodeio Bonito, ocorrendo també m á reas de
que é comercializado, inclui, preferencial‑ produçã o em Alpestre, em Cristal do Sul, em
mente, geodos preenchidos por ametista de Gramado dos Loureiros e em Trindade do
boa qualidade. Para materiais com caracte‑ Sul. Em Santa Catarina, foram identi icados
rı́sticas esté ticas de qualidade inferior, po‑ garimpos de ametista no municı́pio de En‑
dem ser feitos tratamentos, para melhoria e tre Rios, mas existem registros de depó sitos
para modi icaçã o da cor (Fischer, 1999; To‑ explotados esporadicamente em Pinhalzi‑
noni et al., 2020), que geram considerá vel in‑ nho, em Saudades, em Palmitos, em Maravi‑
cremento de valor comercial. lha, em Sã o Miguel do Oeste, em Chapecó e

372 Edição da Sociedade Brasileira de Geologia – Núcleo RS/SC


Duarte et al.

em Sã o Carlos (Juchem, 1999). peiros, atravé s de lavra subterrâ nea. Sã o
Nesse distrito mineiro, foram identi‑ abertos tú neis horizontais (com extensõ es
icados trê s derrames mineralizados do tipo de 100 m a 400 m) no basalto maciço, com o
basalto toleı́tico (Rosenstengel & Hartmann, uso de explosivos caseiros à base de pó lvora,
2012). O maior produtor é o derrame Veia de salitre e de carvã o, e os geodos sã o ex‑
Alta, tendo, subjacentes a ele, os derrames traı́dos com marteletes pneumá ticos, com
Veia do Meio e Veia Baixa (Fig. 2A). Esses martelos manuais, com ponteiras e com ta‑
derrames sã o do tipo quı́mico Pitanga e po‑ lhadeiras (Figs. 2B e 2C) (Juchem, 1999).
dem ser classi icados como tipo I, na classi i‑ O nı́vel dos geodos mineralizados
caçã o proposta por Gomes (1996). ocorre em um basalto cinza a cinza esverde‑
Os geodos tê m, em geral, dimensõ es ado, com poucas fraturas horizontais e verti‑
decimé tricas a mé tricas e estã o parcialmente cais, à s vezes irregulares, mas sempre muito
preenchidos por uma camada milimé trica a espaçadas, o que confere à rocha uma por‑
centimé trica de quartzo microcristalino (cal‑ çã o maciça, com 2 a 3 m de espessura, deno‑
cedô nia, por vezes bandada, caracterizando a minada pelos garimpeiros de "laje". Acima
variedade á gata), seguida de uma camada da zona mineralizada, ocorre um nı́vel de
centimé trica de quartzo macrocristalino in‑ basalto cinza escuro a preto (de 0,5 a 1,0 m
color a leitoso, que grada progressivamente de espessura), com um sistema de fraturas
para ametista. E comum ocorrer calcita cres‑ irregulares bastante marcante, que origina
cida sobre a ametista e, mais raro, gipsita blocos decimé tricos, denominado pelos ga‑
(variedade selenita), alé m de barita e de rimpeiros de "cascalho"e que constitui o to‑
quartzo rosa, representando episó dios de po das galerias subterrâ neas (Fig. 2B).
cristalizaçã o mais tardios (Fig. 3). A extraçã o O principal derrame portador, o Veia
dos geodos mineralizados é feita por garim‑ Alta (Rosenstengel & Hartmann, 2012), é um

Figura 2 ‒ Distrito Mineiro de Ametista do Sul: A) Per il esquemá tico mostrando o empilhamento dos derrames
mineralizados, com as principais estruturas relacionadas (modi icado de Hartmann et al., 2012); B) Frente de
lavra mostrando o sistema de exploraçã o em galerias subterrâ neas horizontais; e C) Garimpeiro no processo de
retirada de um geodo.

Depósitos de ametista do Rio Grande do Sul e de Santa Catarina 373


Contribuições à Geologia do Rio Grande do Sul e de Santa Catarina

Figura 3 ‒ Exemplos de geodos mineralizados com ametista e minerais associados. : A) e B) Geodos


parcialmente preenchidos por ametista, partidos ao meio e expostos para comercializaçã o ‒ observa‑se que
alguns foram submetidos a tratamento té rmico que transformou a ametista em citrino; em (B) o geodo maior
tem 3,16 m e pode‑se observar alguns cristais de calcita tardia; C) Detalhe de um geodo, com um agregado de
cristais de calcita crescidos sobre ametista; D) Geodo preenchido parcialmente com quartzo incolor a leitoso e
uma fase inal de quartzo rosa; E) Detalhe de um geodo com um agregado radiado de cristais tabulares de
barita; e F) Agregado paralelo de cristais tabulares de gipsita (variedade selenita), crescidos sobre cristais de
quartzo violeta acinzentados.

basalto afanı́tico a afı́rico. A textura, em ge‑ em uma textura seriada com os fenocristais,
ral, é holocristalina seriada a por irı́tica, po‑ gradando de microcristais ou micró litos a
dendo ser intergranular, intersertal e, por grã os de 0,5 mm de comprimento. Alé m do
vezes, localmente glomeropor irı́tica e plagioclá sio e da augita, é comum a presença
traquı́tica (Fig. 6A). Ocorrem algumas vesı́‑ de minerais opacos, identi icados como il‑
culas milimé tricas, ovó ides a irregulares, menita e como magnetita titanı́fera. Todos
preenchidas por argila de cor verde e/ou por esses minerais, em geral, estã o envoltos por
á gata e por quartzo. Os fenocristais (0,5‑1,2 uma massa muito ina, identi icando‑se, por
mm) perfazem em torno de 5% da rocha e vezes, pequenas porçõ es de vidro muito al‑
sã o de difı́cil identi icaçã o macroscó pica, terado.
sendo constituı́dos por plagioclá sio (An 40‑ As rochas mineralizadas dessa re‑
60), em geral, zonados (teor de An diminuin‑ giã o foram afetadas pela percolaçã o de lui‑
do do centro para o bordo), e, mais raro, por dos hidrotermais, que alteraram a matriz
augita. E comum a alteraçã o do piroxê nio pa‑ vı́trea e os cristais de piroxê nio para uma
ra celadonita (argila verde). Muitas vezes, os mineralogia secundá ria. Esta alteraçã o hi‑
fenocristais mostram feiçõ es de desequilı́‑ drotermal está bem caracterizada pela per‑
brio com a matriz, produzindo reaçõ es que colaçã o de luidos das porçõ es mais
formam massas argilosas e ó xidos de ferro inferiores da bacia, desde a base da forma‑
nos seus bordos. Na matriz podem ocorrer çã o Botucatu (Gilg et al., 2003). Resultante
as mesmas fases minerais identi icadas nos da alteraçã o, a celadonita é um importante
fenocristais, as quais, muitas vezes, constitu‑ guia prospectivo para os garimpeiros da re‑
374 Edição da Sociedade Brasileira de Geologia – Núcleo RS/SC
Duarte et al.

giã o e indica os está gios mais avançados dos mineralizadas a ametista de Artigas, no Uru‑
processos de mineralizaçã o (Duarte et al., guai, onde Techera (2009) identi icou seis
2010). derrames. Dois desses derrames sã o minera‑
lizados e denominados Colada Catalá n e Cola‑
2. 2 Região da Fronteira Sudoeste do RS da Cordillera (Duarte, 2008), sendo colada a
(Quaraí e Livramento) palavra em espanhol para derrame. Posteri‑
ormente, Hartmann et al. (2010) indicaram
Nessa regiã o, a sequê ncia de derra‑ que os derrames sã o cinco, tendo a Colada
mes está em contato direto com os arenitos Catalá n um nú cleo maciço e um nı́vel de
eó licos da Formaçã o Botucatu (Fig. 4) e o aproximadamente 10 m de mineralizaçã o
pacote vulcâ nico possui por volta de 200 m pervasiva, e a Colada Cordillera, um derrame
de espessura. As rochas, classi icadas como espesso, com a porçã o mineralizada maciça e
do fá cies Alegrete, como proposto por Wild‑ com disjunçã o colunar.
ner (2003), sã o andesitos a andesitos basá l‑ Segundo Acauan (2004), os geodos
ticos, classi icados como baixo‑Ti, tipo mineralizados do lado brasileiro ocorrem
Gramado, de acordo com a proposiçã o de principalmente, em colú vios e em aluviõ es,
Peate et al. (1992). Essas rochas sã o petro‑ mas també m podem ser encontrados na ro‑
gra icamente semelhantes e tê m continuida‑ cha vulcâ nica, com diferentes graus de altera‑
de estratigrá ica com as rochas çã o. Esses geodos, tê m em mé dia 40 cm de

Figura 4 ‒ Regiã o de Quaraı́/Artigas: A) Per il esquemá tico, indicando os derrames mineralizados, com as
principais estruturas relacionadas à mineralizaçã o e a proximidade com a Formaçã o Botucatu (modi icado de
Hartmann et al., 2012); B) Frente de lavra, representativa do derrame Catalá n, em Artigas, em que se observa a
parte superior de onde se extraem os geodos de á gata, em extraçã o que evoluiu de lavra a cé u aberto à porçã o
desenvolvida em galerias horizontais subterrâ neas, para a extraçã o de geodos de ametista; C) Geodos
mineralizados com ametista, a lorando em corte feito na rocha menos alterada, no Garimpo do Vivi, em
Livramento; D) Geodos mineralizados com á gata e com ametista, extraı́dos do solo (camada mais superior da
Colada Catalá n) na regiã o de Quaraı́/Livramento.

Depósitos de ametista do Rio Grande do Sul e de Santa Catarina 375


Contribuições à Geologia do Rio Grande do Sul e de Santa Catarina

diâ metro e ocorrem parcial ou totalmente do volume das rochas, nas quais a alteraçã o
preenchidos por calcedô nia/á gata; quando foi mais severa.
em preenchimento parcial, essa fase micro‑
cristalina ocorre como bandas milimé tricas 2. 3 Região de Progresso‑Nova Bréscia
a centimé tricas, seguidas de quartzo incolor e Caxias do Sul
a leitoso, que grada progressivamente para
ametista. Na porçã o brasileira, a Colada Ca‑ Alguns depó sitos de interesse
talá n a lora no Garimpo do Vivi (em Livra‑ econô mico ocorrem em rochas vulcâ nicas
mento), uma das poucas explotaçõ es que á cidas, em Caxias do Sul (Sirtoli et al., 2005;
possui um histó rico de ser economicamente Fianco et al., 2006; Juchem, 2014) e na re‑
ativa. Na porçã o superior da cava, devido ao giã o entre os municı́pios de Progresso, de
grau de alteraçã o dessa rocha, o desmonte Nova Bré scia e de Fontoura Xavier (Hoppe,
podia ser feito por escavadeiras, que retira‑ 2012; Juchem, 2014). Na classi icaçã o litoge‑
ram predominantemente geodos de á gata. oquı́mica proposta por Bellieni et al. (1986),
Desde 2009, a cava chegou na rocha mais sã por Peate et al. (1992) e por Nardy et al.
e passou a ter ocorrê ncias de geodos de (2008), essas rochas apresentam caracterı́s‑
ametista (Hartmann et al., 2010; Bergmann ticas do tipo magmá tico Palmas (ATP), com
et al., 2020). Os cristais de ametista sã o, em aspecto macroscó pico afanı́tico a afı́rico e
geral, lı́mpidos e apresentam tonalidades de com textura hipohialina, ao microscó pio. Vá ‑
cor agradá veis, com boa aceitaçã o no merca‑ rias rochas tê m caracterı́sticas petrográ icas
do de gemas (Augustin et al., 2007). e geoquı́micas do subgrupo Caxias do Sul,
O derrame portador (Colada Cata‑ enquanto outras nã o se enquadram em
lá n) é afanı́tico, com cor cinza escuro a aver‑ qualquer um dos outros subtipos propostos
melhado. E constituı́do de microfenocristais (Juchem et al., 2015).
de plagioclá sio e de piroxê nio (por vezes, Nesses depó sitos, as mineralizaçõ es
formando glomeropó r iros), dispersos em estã o associadas a rochas vı́treas, com dife‑
uma matriz, composta també m por plagio‑ rentes graus de alteraçã o. Na regiã o de Pro‑
clá sio e por piroxê nio, alé m de minerais opa‑ gresso‑Nova Bré scia (NB), foram estudados
cos ‒ magnetita titanı́fera e ilmenita. Todos cinco garimpos e identi icados cinco nı́veis
esses minerais estã o envoltos por uma mas‑ mineralizados, enquanto que na regiã o de
sa de restos de vidro vulcâ nico alterados pa‑ Caxias do Sul, ocorrem mais dois nı́veis mi‑
ra argilominerais. Observam‑se també m, neralizados (Fig. 5A). A rocha mineralizada
fraturas, vesı́culas e cavidades polié dricas tem uma espessura em torno de 2,0 m a 5,0
preenchidas por argilominerais, alé m de m e é constituı́da por uma rocha preta, de
quartzo ino e de calcedô nia. Os microfeno‑ aspecto vı́treo a resinoso (pitchstone), nã o
cristais de plagioclá sio sã o labradorita (An alterada ou com diferentes graus de altera‑
50‑60), enquanto o plagioclá sio da matriz é çã o. Intercaladas com esses nı́veis vı́treos
de composiçã o mais só dica (An 40‑50). Já o ocorrem rochas afanı́ticas a afı́ricas, de cor
piroxê nio (augita), tanto na matriz como os cinza a cinza acastanhado, com diferentes
fenocristais, pode apresentar bordos trans‑ graus de alteraçã o e que podem conter vesı́‑
formados em pigeonita (Fig. 6B). A rocha mi‑ culas, preenchidas por calcedô nia e por
neralizada da Colada Catalá n está quartzo. Como os nı́veis vı́treos mineraliza‑
intensamente alterada na zona mineralizada, dos podem estar bem preservados, por ve‑
destruindo principalmente a pigeonita, que é zes a explotaçã o é feita em cavas horizontais
alterada para esmectita, ocupando até 60% subterrâ neas, com 30 a 50 m de extensã o

376 Edição da Sociedade Brasileira de Geologia – Núcleo RS/SC


Duarte et al.

(Figs. 5C e 5D), ocorrendo, també m, minera‑ dispostos por vezes em agregados radiados
çã o a cé u aberto, onde as rochas estã o em es‑ a esferulı́ticos, como nú cleos de desvitri ica‑
tado mais avançado de alteraçã o (Fig. 5B). çã o e como alteraçã o para minerais argilo‑
As rochas portadoras de ametista dos sos (Fig. 6C). A principal diferença
depó sitos estudados sã o semelhantes entre observada entre as rochas de aspecto vı́treo
si, contendo sempre vidro vulcâ nico em dife‑ em amostra de mã o e as rochas afanı́ticas/
rentes proporçõ es, com microfenocristais de afı́ricas é que as primeiras, ao microscó pio,
plagioclá sio (labradorita/andesina) e de pi‑ apresentam uma massa vı́trea, em geral,
roxê nio (augita/pigeonita) e opacos (magne‑ igual ou superior a 60% do volume da rocha,
tita titanı́fera) e micró litos de mesma enquanto nas rochas que nã o apresentam tal
composiçã o, inseridos em matriz vı́trea. Po‑ aspecto em amostra de mã o, a matriz vı́trea
dem ocorrer texturas glomerpor irı́tica e cu‑ ocupa cerca de 40% do volume da rocha (Ju‑
mulopor irı́tica, envolvendo, principalmente, chem, 2014). A proporçã o de vidro é um dos
microfenocristais de plagioclá sio e de piroxê ‑ pontos relevantes para o desenvolvimento
nio e, por vezes, opacos. Na matriz, sã o iden‑ de condiçõ es de mineralizaçã o por luidos
ti icados inı́cios de cristalizaçã o de minerais, hidrotermais no modelo epigené tico (Duarte
na forma de cristá litos ibrosos a aciculares, et al., 2010).

Figura 5 – Regiã o de Progresso‑Nova Bré scia e Caxias do Sul: A) Per is litoló gicos esquemá ticos indicando o
empilhamento e a distribuiçã o dos derrames mineralizados e nã o mineralizados, identi icados nas rochas
á cidas; B) Frente de lavra a cé u aberto de onde sã o retirados geodos de ametista em dois nı́veis vı́treos de um
vitró iro á cido, seguidos por um nı́vel de topo menos alterado (riodacito semi‑vı́treo); C) Entrada de uma galeria
de extraçã o de geodos de ametista, aberta na rocha vı́trea; D) Detalhe do interior dessa galeria, onde se observa
nas paredes a rocha vı́trea de cor preta e geodos centimé tricos mineralizados.

Depósitos de ametista do Rio Grande do Sul e de Santa Catarina 377


Contribuições à Geologia do Rio Grande do Sul e de Santa Catarina

3 MODELOS GENÉTICOS çã o Botucatu. As fontes sugeridas de sı́lica


sã o as porçõ es vı́treas intersticiais da rocha
Os depó sitos de ametista, pelo seu hospedeira ou a sı́lica lixiviada das rochas se‑
grande volume e pela sua importâ ncia econô ‑ dimentares da Bacia do Paraná (e.g. Forma‑
mica, necessitam de entendimento de seus çã o Botucatu).
processos de mineralizaçã o, para viabilizar a Um modelo epigené tico foi apresen‑
prospecçã o de novos depó sitos econô micos. tado pela primeira vez, por Duarte et al.
Existem diferentes hipó teses para a formaçã o (2005). Em observaçõ es feitas nas galerias
e para o preenchimento dos geodos: forma‑ de extraçã o em Ametista do Sul, foram iden‑
çã o das cavidades por coalescê ncia de fases ti icadas fraturas sub‑horizontais que acom‑
luidas, a temperaturas de 1150 °C; formaçã o panham toda a sua extensã o, e que estã o
das cavidades por processos de dissoluçã o e muito bem expostas na Mina da Vinı́cola e na
de deformaçã o da rocha, a 150 °C; por incor‑ Mina Ametista Parque, locais adaptados à vi‑
poraçã o de areia, pelo magma; por participa‑ sitaçã o turı́stica, que tiveram os assoalhos re‑
çã o de luidos hidrotermais, provenientes das baixados em relaçã o aos assoalhos das
litologias subjacentes; e por luidos do pró ‑ demais galerias ativas. A ocorrê ncia de “geo‑
prio magma. Os processos nã o sã o excluden‑ dos alongados”, alojados ao longo destas fra‑
tes entre si, podendo ser observados turas, que em nada lembram as formas de
aspectos de um dos processos sendo corro‑ bolhas de desgasei icaçã o (Figs. 7A‑7B), e,
borados por aspectos de outro. també m, de geodos conectados por fraturas
Leinz (1949) sugeriu a presença de (Figs. 7C e 7E) a canais de preenchimento
uma zona superior amigdaloidal nos derra‑ (Fig. 7F) indicam processos rú pteis atuantes
mes, formada pelo enriquecimento em gases durante a mineralizaçã o epigené tica. A inter‑
sob alta pressã o, que foram aprisionados, pa‑ rupçã o do preenchimento, pelas fases mine‑
ra explicar a formaçã o dos geodos (Correa et rais, pode se dar pelo escape de luido,
al., 1994). Trabalhos mais recentes (Proust & associado a fraturas observadas no topo dos
Fontaine, 2007a) sugerem que magmas su‑ geodos (Fig. 7D).
persaturados em á gua formam geodos por Estruturas importantes relacionadas
coalescê ncia das fases volá teis (Correa et al., à mineralizaçã o epigené tica, sã o as brechas
1984; Juchem, 1999; Gilg et al., 2003; Scopel na base dos geodos (Fig. 8), constituı́das por
et al., 1998; Gomes et al., 2005). Magma ba‑ blocos da rocha cimentados por calcedô nia
sá ltico supersaturado em á gua pode ser gera‑ (adicionada de zeó lita, no Uruguai). Na Cola‑
do pela passagem da lava sobre um substrato da Catalá n, a brecha é cimentada por clinop‑
saturado, que, em ambientes desé rticos, esta‑ tilolita e por heulandita (Duarte et al., 2010).
ria relacionado a interdunas. Para esse mode‑ A razã o (Ca+Mg)/(Na+K) destas zeó litas po‑
lo, o volume de volá teis seria responsá vel de indicar variaçã o nos conteú dos de Na e de
pela abertura das cavidades e o preenchi‑ K, relacionada a variaçõ es na temperatura do
mento destas se daria pelo restante do luido, luido, durante os processos de mineraliza‑
que interage com as porçõ es vı́treas da rocha, çã o.
lixiviando sı́lica e precipitando‑a nos geodos. O aporte de luido hidrotermal, com
Gilg et al. (2003, 2014) indicam, també m, a temperatura da ordem de até 150 °C, conse‑
formaçã o dos protogeodos na fase magmá ti‑ gue desenvolver explosã o freá tica, pois exce‑
ca, mas com o preenchimento em está gio tar‑ de a pressã o exercida pela espessura de
dio, devido ao aporte de luidos hidrotermais rocha, de até 20 m (Duarte et al., 2009), ge‑
e salinos, proveniente dos arenitos da Forma‑ rando uma rede de fraturas sub‑horizontais.
378 Edição da Sociedade Brasileira de Geologia – Núcleo RS/SC
Duarte et al.

Figura 6 – Imagens representativas das caracterı́sticas microscó picas das rochas portadoras de geodos com
ametista: A) Distrito Mineiro de Ametista do Sul (RS) e da regiã o de Entre Rios (SC) – microfenocristais de
plagioclá sio (pl ‑ Na 40‑60) e de piroxê nio (px ‑ augita) e opacos (op ‑ ilmenita e magnetita titanı́fera), envoltos
por uma matriz de mesma composiçã o e, por vezes, de vidro alterado; B) Regiã o de Quaraı́/Livramento –
microfenocristais de plagioclá sio (pl ‑ An 50‑60) e de piroxê nio (px ‑ augita/pigeonita), envoltos por micró litos
de plagioclá sio (pl ‑ An 40‑50) e de piroxê nio (px ‑ augita/pigeonita) e em uma matriz de vidro muito alterado
para argilo‑minerais; C) Regiã o de Progresso‑Nova Bré scia e Caxias do Sul ‒ microfenocristais e micró litos de
plagioclá sio (pl ‑ labradorita/andesina) e de piroxê nio (px ‑ augita/pigeonita) e opacos (op ‑ magnetita
titanı́fera), inseridos em uma matriz vı́trea, com cristalitos aciculares a ibrosos (V1), com nú cleos de
desvitri icaçã o e, por vezes, com cristalitos radiados (V2) e com alteraçõ es para minerais argilosos.

O derrame, para possibilitar esta sobrepres‑ na regiã o de Progresso‑Nova Bré scia.


sã o do luido, deve ter comportamento de um Para a formaçã o dos geodos com for‑
aquitardo, em relaçã o ao Botucatu. Morteani matos oblatos e prolatos, processos de defor‑
et al. (2010) també m indicam o papel dos maçã o por empuxo do luido foram
derrames como o de um aquitardo. O sistema simulados em softwares de aná lise de ele‑
de fraturas viabiliza a continuidade de aporte mentos initos (Duarte, 2008; Hartmann et
do luido, que passa a alcançar as porçõ es al., 2012b; Hartmann et al., 2015), indicando
maciças do derrame pela migraçã o, atravé s que uma rocha alterada para argilominerais e
da porosidade dictitaxı́tica (Duarte et al., saturada em á gua pode evoluir para a aber‑
2010), ou, mesmo, por porosidade secundá ‑ tura de vazios. O luido migra em pulsos, des‑
ria, desenvolvida em derrames do tipo paho‑ de as porçõ es sedimentares subjacentes, até
ehoe (Barreto et al., 2017). Um intenso as unidades vulcâ nicas da Bacia do Paraná
processo de alteraçã o hidrotermal modi ica a (Duarte et al., 2010; Gilg et al., 2014). Esses
reologia da rocha, devido à alteraçã o da mi‑ eventos sã o marcados por sequê ncias e por
neralogia primá ria (e.g. pigeonita) para mi‑ repetiçõ es de sequê ncias de minerais silico‑
nerais secundá rios (esmectita+celadonita) sos, depositados dentro dos geodos, ou por
(Duarte et al., 2009; Rosenstengel & Hart‑ eventos de escala regional. Hartmann et al.
mann, 2012). Para exceder a pressã o exercida (2012a) identi icaram trê s eventos hidroter‑
pela espessura de rocha sobrejacente, os mais (H1‑H2‑H3), que descrevem uma
eventos de mineralizaçã o devem ocorrer der‑ sequê ncia de eventos, relacionada ao proces‑
rame‑a‑derrame (Duarte et al., 2009), a partir so epigené tico de mineralizaçã o. Esses even‑
de uma zona preferencial de aporte de lui‑ tos sã o conexos ao selamento da porosidade
dos, desde as porçõ es mais basais da Bacia. do derrame (H1), à introduçã o de areia por
Esta canalizaçã o de luidos para uma regiã o injetitos (H2) e à formaçã o e ao preenchi‑
especı́ ica corrobora o fato de sempre ocorrer mento dos geodos (H3) predominantemente
mais de um nı́vel mineralizado no mesmo pelas fases silicosas (Hartmann et al., 2012a),
distrito mineiro: dois, em Artigas/Quaraı́ (Ca‑ mas, també m, pelas fases carboná ticas ou
talá n e Cordillera); trê s, em Ametista do Sul sulfatadas tardias (Juchem & Hartmann,
(Veia Alta, Veia do Meio e Veia Baixa); e cinco, 2011).
Depósitos de ametista do Rio Grande do Sul e de Santa Catarina 379
Contribuições à Geologia do Rio Grande do Sul e de Santa Catarina

Figura 7 ‒ Marcadores de processos epigené ticos: A) Fratura sub‑horizontal preenchida pela mesma sequê ncia
de mineralizaçã o que está presente nos geodos; (B) Fratura sub‑horizontal, preenchida por calcedô nia,
observada na base das galerias de extraçã o de geodos no nı́vel mineralizado; C) Sequê ncia de geodos
conectados por fraturas indicando conexã o tridimensional do sistema de cavidades; (E) Detalhe da fratura de
conexã o, com um dos limites bem de inido, preenchida pelas mesmas fases minerais que preenchem os geodos;
(D) Geodo com brecha na base e com canal de escape de luido, associado à porçã o de topo da cavidade; (F)
Geodo com dois canais de preenchimento associados à base; (G) Detalhe das fraturas associadas à s bordas, e da
brecha, associada ao canal de preenchimento, formada por clastos da rocha hospedeira, envoltos pelos minerais
de sı́lica.

Para a abertura das cavidades, tam‑ brechas da base dos geodos, os clastos ci‑
bé m há a contribuiçã o de processos de dis‑ mentados pela matriz de zeó litas mostram
soluçã o de alguns minerais má icos (Duarte processo avançado de dissoluçã o, com cavi‑
et al., 2009). A pigeonita é totalmente altera‑ dades neo‑formadas sendo preenchidas pe‑
da para esmectita (Duarte et al., 2010), ten‑ las fases silicosas (calcedô nia).
do, como relictos, cristais de plagioclá sios, Recentemente, processos diagené ti‑
imersos em mesó stase neo‑formada. Nas cos foram atribuı́dos à s mineralizaçõ es de

380 Edição da Sociedade Brasileira de Geologia – Núcleo RS/SC


Duarte et al.

Figura 8 – Brechas hidrá ulicas associadas a geodos: (A) Base de geodo formada por grandes blocos brechados,
envoltos pela mineralizaçã o (Artigas, UY); (B) Clastos da brecha progressivamente alterados que tendem a
apresentar bordas arredondadas (Artigas, UY); C) Brecha observada na parede da galeria de exploraçã o
(Ametista do Sul, RS); D) Clasto envoltos pela mineralizaçã o na base de geodos, prontos para serem
comercializados (Ametista do Sul, RS); E) Clastos de diferentes dimensõ es e de diferentes contornos envoltos
pela mineralizaçã o (Progresso, RS); (F) Brecha associada à fratura e à base de geodo, observada em bloco
retirado da lavra (Progresso, RS).

á gata e de ametista na regiã o da fronteira no, 1974; Techera, 2009) e, també m, para os
sudoeste (Bergmann et al., 2020). Associado depó sitos de á gata do Salto do Jacuı́ (Hee‑
a estes processos de diagê nese para a mine‑ mann & Strieder, 1999; Michelin, 2014). Bossi
ralizaçã o, tem‑se a contribuiçã o de areias e & Caggiano (1974) descrevem que a entrada
de sedimentos inconsolidados e incorpora‑ de areia ocorre com a incorporaçã o dos grã os
dos pela lava para a fonte de sı́lica, para a de areia do sistema desé rtico ativo, durante a
formaçã o da á gata e de ametista, que é aven‑ erupçã o das lavas. Essa entrada de areia pode
tada para a porçã o uruguaia (Bossi & Caggia‑ ocorrer pela porçã o de topo, com a areia pre‑

Depósitos de ametista do Rio Grande do Sul e de Santa Catarina 381


Contribuições à Geologia do Rio Grande do Sul e de Santa Catarina

enchendo as zonas de auto‑brecha, ou pela cos, foi possı́vel sugerir que um mesmo pul‑
porçã o de base, com a areia sendo incorpora‑ so pode mineralizar derrames sobrepostos.
da pelo luxo de lava. Para a transformaçã o Estes pulsos podem ser individualizados pe‑
da areia em calcedô nia, em quartzo incolor e la repetiçã o completa ou incompleta da
em ametista, a á gua presente, dissolvida no sequê ncia de minerais calcedô nia‑quartzo
magma basá ltico, solubiliza a sı́lica; se a incolor‑ametista (Fig. 8B e 8D) (Duarte et
pressã o for su iciente, haverá a formaçã o de al., 2011).
soluçõ es ricas em sı́lica, que tendem a ascen‑ As aná lises de isó topos δ18O, combi‑
der e a formar as cavidades, que serã o preen‑ nadas aos dados de δD, sugerem fonte me‑
chidas, tã o logo a temperatura diminua. Os teó rica e soluçõ es salinas das porçõ es mais
autores se reportam a Holland (1967 apud profundas do Sistema Aquı́fero Guarani para
Bossi & Caggiano, 1974), para a irmar que, o hidrotermalismo (Gilg et al., 2014). A per‑
em condiçõ es de altas temperatura e pressã o, colaçã o de luido em grande escala e, até ,
a á gua liberada pelo magma seria capaz de por unidades sedimentares abaixo do Botu‑
dissolver grandes quantidades de sı́lica. Os catu també m podem ser aventadas, sugeri‑
guias prospectivos, sugeridos por Bossi & da pelas assinaturas de isó topos de enxofre
Caggiano (1974), sã o derrames que conte‑ de rochas mineralizadas e alteradas, hidro‑
nham uma signi icativa presença de brechas termalmente (Duarte et al., 2010; Juchem &
no topo, com veios ou com ilõ es de areia. Hartmann, 2011). O intervalo de valores de
isó topos δ34S, obtidos no nı́vel mineralizado
4 PREENCHIMENTO DOS GEODOS – MI‑ (‑15‰ a ‑0,3‰) do distrito mineiro de Los
NERALOGIA E CONDIÇÕES DE CRISTALI‑ Catalanes, e a depleçã o destes em enxofre
ZAÇÃO vulcâ nico, sugerem contaminaçã o
relacionada à s rochas sedimentares, duran‑
O preenchimento dos geodos é atri‑
te a alteraçã o causada pelos luidos hidro‑
buı́do a processos de baixas temperaturas
termais, que mineralizaram o basalto.
(Juchem, 1999) e tem, por base, estudos de
inclusõ es luidas e dados de isó topos de oxi‑
gê nio. Os luidos sã o aquosos e de baixa sali‑
5 CONTEXTO ESTRUTURAL E GEO‑
TECTÔNICO DOS DERRAMES MINERALI‑
nidade, com inclusõ es luidas monofá sicas
ZADOS
(Juchem, 1999; Duarte et al., 2010; Gilg et al.,
2003, 2014). Gilg e colaboradores (2014), in‑ O desenvolvimento de estruturas
dicam quatro está gios de mineralizaçã o para aptas a conter os luidos hidrotermais que
o DMAS, marcados por diferenças de salini‑ venham a exercer sobrepressã o, é um dos
dade do luido, obtidas em inclusõ es luidas. pontos considerados, para que ocorra o de‑
A salinidade do luido indica soluçõ es hidro‑ senvolvimento das condiçõ es de mineraliza‑
termais, que evoluem de condiçõ es redutoras çã o. O processo de mineralizaçã o no Grupo
para oxidantes, com salinidades de 5,3, de Serra Geral é considerado, aqui, epigené tico
3,4 e de 0,3 wt% NaCl, respectivamente, para (Duarte et al., 2009). O aporte de luido hi‑
os está gios II, III e IV. O está gio I, constituı́do drotermal foi universal no grupo vulcâ nico,
por celadonita, por calcedô nia e por pirita, pois foram mineralizados os derrames que
nã o possui inclusõ es luidas. Em depó sitos retiveram o luido hidrotermal nas porçõ es
de Artigas (Uruguai), també m foram identi i‑ maciças pelo tempo necessá rio, resultando
cados vá rios está gios de preenchimento ou na alteraçã o dos minerais primá rios para
pulsos de mineralizaçã o. Por dados isotó pi‑ secundá rios (em 500 anos, sugere‑se). A ca‑

382 Edição da Sociedade Brasileira de Geologia – Núcleo RS/SC


Duarte et al.

da evento de aquecimento da Bacia do Para‑ a alteraçã o hidrotermal, os minerais má icos


ná , devido à fusã o parcial do manto e ao es‑ (piroxê nios ‒ preferencialmente, pigeonita)
friamento de sills, houve o aumento do grau sã o alterados intensamente para argilomine‑
geoté rmico e o aquecimento do Aquı́fero rais (esmectita, celadonita), fornecendo duc‑
Guarani “ancestral”. A cada evento de hidro‑ tilidade ao basalto, quando saturado em
termalismo (Hn), corresponderam os regis‑ á gua, e podendo ter empuxo, como mecanis‑
tros H1, H2 e H3 no basalto (Hartmann et al., mo de abertura das cavidades (Hartmann et
2012a). al., 2015). Minerais fé lsicos (plagioclá sio) sã o
Há minas de geodos de ametista em pouco afetados pela alteraçã o e persistem,
basaltos de todos os tipos quı́micos, como mesmo nas porçõ es mais alteradas da rocha.
alto‑Ti, mé dio‑Ti e baixo‑Ti. O derrame Veia Ao aumentar o teor de sı́lica da rocha (e.g. ri‑
Alta é do tipo alto‑Ti, enquanto os derrames odacitos), o volume total de minerais hidra‑
Catalá n e Cordillera (no Uruguai) sã o baixo‑ tados de baixa temperatura diminui. O
Ti. No extremo, geodos ocorrem em riodaci‑ resultado sã o geodos de tamanho menor
tos e em riolitos. A composiçã o quı́mica das (e.g. regiã o de Progresso).
rochas nã o determina a presença ou a au‑ Geodos tendem a estar concentrados
sê ncia de geodos de ametista (Juchem, 1999; em “bolsõ es”, dentro das galerias. Estas por‑
Duarte, 2008; Rosenstengel & Hartmann, çõ es sã o limitadas por “levante” e por “rebai‑
2012; Hartmann et al., 2010). xo” do “cascalho” do topo das galerias, como
O Grupo Serra Geral é o ú nico pro‑ ocorre em Ametista do Sul. Essas estruturas
dutor de ametista em escala mundial, dentre sã o bons guias prospectivos para as mais de
as grandes provı́ncias basá lticas dos conti‑ 300 minas ativas de Ametista do Sul e podem
nentes. Um fator diferenciador foi o clima estar relacionadas à s estruturas do tipo “tu‑
á rido, pois o aporte de á gua da chuva, de la‑ muli de lavas”, comuns em derrames do tipo
gos e de rios causa a formaçã o de fratura‑ pahoehoe (Hartmann et al., 2017).
mentos do tipo entablatura, durante o A permanê ncia do pacote vulcâ nico
esfriamento da lava (Long & Wood, 1986). A em posiçã o horizontal, para o con inamento
permeabilidade dada por estas estruturas do luido hidrotermal na porçã o maciça do
diminui o tempo de permanê ncia dos luidos nú cleo, é requerida. A posiçã o intraplaca do
e, em consequê ncia, impede a alteraçã o da Grupo Serra Geral favoreceu a ixaçã o hori‑
rocha, para a posterior formaçã o de geodos. zontal dos derrames e a sua mineralizaçã o.
Geodos de ametista sã o produzidos Todos os basaltos intraplaca poderiam estar
em vá rios nı́veis estratigrá icos do Grupo mineralizados a geodos de ametista, no en‑
Serra Geral, incluindo o primeiro e o segun‑ tanto a exceçã o está no Grupo Serra Geral. Os
do derrames, em contato com o paleoerg Bo‑ derrames e suas estruturas sã o semelhantes
tucatu (derrame Catalá n, em Quaraı́ e em em todas as provı́ncias, mas o substrato é di‑
Artigas, no Uruguai, e derrame Cordillera, ferente. Somente o Grupo Serra Geral extru‑
em Artigas). O derrame Veia Alta, em Ame‑ sionou sobre um paleoerg‑transforma‑
tista do Sul, está , em mé dia, 1.000 m acima do‑em‑Aquı́fero Guarani e, assim, obteve um
do contato com a Formaçã o Botucatu, po‑ volume de á gua su iciente para a formaçã o
dendo estar acima de mais de 50 derrames dos geodos, e a trajetó ria ascendente desse
de basalto e de riodacito. luido deixou marcas sequenciais nas rochas:
A composiçã o mineraló gica do der‑ H1 (selamento do derrame), H2 (injeçã o ex‑
rame basá ltico exerce um efeito fundamental plosiva de areia luidizada e novo selamento)
na formaçã o de geodos de ametista. Durante e H3 (formaçã o e preenchimento de geodos)

Depósitos de ametista do Rio Grande do Sul e de Santa Catarina 383


Contribuições à Geologia do Rio Grande do Sul e de Santa Catarina

(Hartmann et al., 2012a). Foi mineralizado o material gemoló gico, desde o perı́odo neolı́‑
derrame que tinha a estrutura necessá ria tico, enquanto a variedade verde acinzenta‑
para a formaçã o dos geodos, em qualquer nı́‑ da entrou no mercado somente no inı́cio
vel estratigrá ico. dos anos 2000 (McClure et al., 2010). Para
essa variedade, a cor é associada ao defeito
6 APROVEITAMENTO GEMOLÓGICO estrutural Non‑Bridging‑Oxygen Hole Center
(NBOHC), um centro de cor desenvolvido
A ametista é o principal produto co‑ pela exposiçã o à radiaçã o, que possui janela
mercializado no mercado gemoló gico, para de transmissã o na faixa de 490 a 540 nm,
ins ornamentais ou de joalheria. Existe uma que corresponde à faixa verde no espectro
classi icaçã o de cores pela saturaçã o, que vai eletromagné tico (Henn & Gü ttler, 2012;
de fraca a extra. Sob tratamento té rmico, a Enokihara, 2013). As doses recebidas para
ametista desenvolve o amarelo acastanhado desenvolvimento da cor em quartzo incolor,
(citrino), com temperatura em torno de 500‑ variam de 200 a 900 kGy, para cristais pro‑
600 oC (Fischer, 1999) e, recentemente, venientes da regiã o do Alto Uruguai (Mene‑
Cheng & Guo (2020) indicaram a temperatu‑ zes, 2019), e sã o de 900 kGy para os cristais
ra de 560 oC para a formaçã o do citrino. Sã o da regiã o de Progresso (Tononi et al., 2020).
selecionadas para tratamento té rmico, ame‑ A dose a ser recebida, e que desenvolverá
tista de cor fraca, associadas a cristais bem cor, pode ser calculada pelo fator Ametista
desenvolvidos e a outros fatores esté ticos, (Lameiras et al., 2012). Cabe salientar que a
como transparê ncia (Fig. 9A). ametista e o quartzo verde perdem a cor, se
O quartzo incolor, també m conheci‑ expostos à radiaçã o ultravioleta (Juchem,
do como cristal‑de‑rocha, possui baixo valor 1999; Enokihara, 2013).
agregado no comé rcio, em comparaçã o com
as outras variedades. Té cnicas de tratamen‑ 7 CONSIDERAÇÕES FINAIS
to, a im de induzir ou de melhorar a cor, sã o
comuns e sã o uma alternativa recorrente, A ametista é um dos mais impor‑
pois resultam em um aumento no valor tantes bens minerais do RS. Entender os
agregado do produto. O tratamento por radi‑ processos gené ticos auxilia na prospecçã o
açã o ionizante é uma dessas té cnicas. No de novos alvos economicamente viá veis. A
Brasil, a radiaçã o gama, com fonte Cobalto‑ hipó tese epigené tica agrega estruturas de
60, é muito utilizada para esta inalidade. As escalas local e regional (eventos H1‑H2‑H3),
cores resultantes apó s o tratamento, estã o que indicam possı́veis novos alvos. Cabe sa‑
relacionadas à origem gené tica do depó sito, lientar que a nã o restriçã o de mineraliza‑
a impurezas e à quantidade de dose aplicada çõ es a tipos quı́micos e litoló gicos é
(Rossman, 1994). importante, para indicar fatores exó genos
O quartzo incolor do Rio Grande do ao magmatismo relacionados à mineraliza‑
Sul, ao ser exposto à radiaçã o ionizante, po‑ çã o. O RS é o maior produtor de ametista e o
de desenvolver as cores verde acinzentada e aproveitamento gemoló gico destes minerais
violeta (Enokihara, 2013; Menezes, 2019; deve ser tratado como questã o de desenvol‑
Tononi et al., 2020) (Fig. 9B‑9C). O Fe4+ é o vimento econô mico para as regiõ es produ‑
agente responsá vel pela cor violeta da ame‑ toras, aumentando a diversidade de
tista, ao substituir ı́ons de Si4+ na rede crista‑ materiais gemoló gicos disponı́veis, bem co‑
lina do quartzo (Rossman, 1994). Esta mo a qualidade das gemas.
variedade do quartzo é muito utilizada como

384 Edição da Sociedade Brasileira de Geologia – Núcleo RS/SC


Duarte et al.

Figura 9 ‒ Aproveitamento gemoló gico: A) Ametista e citrino, obtido por tratamento té rmico, lapidados em
facetas para uso em joalheria; B) Coloraçã o obtida por exposiçã o à radiaçã o gama Co60, que desenvolveu
zonaçã o de cor, indicando zonaçã o quı́mica no cristal; C) Quartzo verde obtido apó s à exposiçã o à radiaçã o
gama Co60. Em (B) e em (C) os cristais eram originalmente incolores.

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Bacia de Pelotas
em retrospectiva
Gilmar Vital Bueno

Universidade Federal Fluminense

*autor correspondente:vboa.geo@gmail.com

1 INTRODUÇÃO
A Bacia de Pelotas se situa entre o Alto de Florianó polis, limite com a Bacia de Santos, e
o Alto de Polô nio, no Uruguai. Esta pode ser dividida em duas sub‑bacias: Norte e Sul (Fig. 1). O
marco divisor entre os dois segmentos é representado pelo Lineamento estrutural de Porto Ale‑
gre e pelo seu prolongamento oceâ nico, a Zona de Fratura de Porto Alegre (Martins Neto et al.,
2006).
No embasamento da sub‑bacia Sul predominam litologias pertencentes ao Cinturã o
Dom Feliciano, faixa mó vel gerada durante o Ciclo Brasiliano, identi icada como fonte de clá sti‑
cos para o preenchimento da Bacia de Pelotas (Villwock & Tomazelli, 1995). Por meio de dados
do poço 1‑TO‑1, perfurado sobre a Sinclinal de Torres, pela Petrobras, constatou‑se a presença
da sequê ncia sedimentar Permo‑Triá ssica (grupos Guatá e Passa Dois) e da sequê ncia vulcano‑
sedimentar Juro‑Cretá cea (formaçõ es Serra Geral e Botucatu), con irmando a atuaçã o da Bacia
do Paraná , como embasamento dominante na sub‑bacia Norte e, també m, como á rea fonte de
sedimentaçã o clá stica.
As principais feiçõ es geoló gicas na sub‑bacia Norte sã o a Plataforma de Florianó polis
(PF) e a Sinclinal de Torres (ST). A primeira é uma feiçã o elevada e alongada de direçã o N‑S, es‑
tabelecida sobre a á rea de ocorrê ncia das vulcâ nicas Aptianas (Fig. 2), e que se comportou como
alto estrutural até o inal do Cretá ceo, enquanto a segunda consiste de um graben alinhado a
NW‑SE, que se prolonga para o continente e que preserva no seu interior, rochas mesozoicas da
Bacia do Paraná , principalmente, dos derrames da Formaçã o Serra Geral.
Contribuições à Geologia do Rio Grande do Sul e de Santa Catarina

Figura 1 ‒ Localizaçã o e limites da Bacia de Pelotas, a frente dos estados do Rio Grande do Sul e de Santa
Catarina, sobre o mapa estrutural do embasamento. A bacia é dividida pelo Lineamento e pela Zona de Fratura
de Porto Alegre, em duas sub‑bacias: Norte e Sul. A concentraçã o de grabens antité ticos a sul, o espessamento
da faixa de Seaward Dipping Re lectors (SDR) a norte, e o deslocamento para leste do limite Crosta Continental‑
Oceâ nica (COB) atestam a distinta evoluçã o do rifte propagante, ao qual a margem meridional brasileira foi
submetida (modi icado de Petrobras/UFOP, 2006).

Na sub‑bacia Sul, denominado Gra‑ do cone. Os dois ú ltimos, atualmente, desá ‑


ben de Mostardas (GM), ocorre uma depres‑ guam na Laguna dos Patos e suas drena‑
sã o estrutural orientada a NW‑SE, abaixo da gens estã o enfraquecidas, como resultado
Zona de Fratura de Porto Alegre, gerada na da inversã o de curso produzida pelo bascu‑
fase rifte e ativa até o inal do Paleoceno. lamento desta á rea para oeste, poré m teri‑
Mais ao sul encontra‑se a notá vel feiçã o de‑ am sido importantes no transporte de
posicional do Cone de Rio Grande (CRG), o sedimentos do Escudo Sul‑Rio‑Grandense e
qual é interpretado como um ambiente del‑ da Bacia do Paraná para a Bacia de Pelotas
taico, com uma á rea aproximada de 40.000 (Silveira & Pinheiro Machado, 2004).
km2 em lâ mina de á gua, variando entre 200
m e 2.700 m, e com uma espessura sedimen‑ 2 ESTRUTURAÇÃO
tar superior a 11 km. O entendimento da
construçã o desta feiçã o continua inde inido, A distinçã o reoló gica no substrato,
uma vez que, atualmente, nenhum rio de a sul e a norte da Bacia de Pelotas, pode ter
grande porte desá gua nesta regiã o. Interpre‑ sido o principal controle do comportamen‑
ta‑se que os rios da Prata, Camaquã e Jacuı́ to tectono‑sedimentar diferenciado obser‑
tenham sido os sistemas luviais formadores vado durante as fases rifte, sag e drifte.

390 Edição da Sociedade Brasileira de Geologia – Núcleo RS/SC


Bueno

Figura 2 ‒ Posiçã o das principais feiçõ es geoló gicas situadas nas duas sub‑bacias sobre o mapa estrutural das
vulcâ nicas aptianas, as quais se concentram na sub‑bacia Norte e que representam o prová vel eixo de centro de
espalhamento oceâ nico abortado, que posteriormente, controlou a instalaçã o da Plataforma de Florianó polis
(PF). Ainda a norte, observa‑se a Sinclinal de Torres, um graben NW‑SE continental, que se projeta por baixo da
Bacia de Pelotas. Abaixo do Lineamento de Porto Alegre, na sub‑bacia Sul, depara‑se com o Graben de
Mostardas, també m de orientaçã o NW‑SE e que foi atuante até o Paleoceno. No extremo sul, encontra‑se o Cone
do Rio Grande, feiçã o deposicional que registra as dimensõ es de um amplo sistema deltaico, construı́do a partir
do Mioceno (modi icado de Petrobras/UFOP, 2006).

Entre eles, ressaltam‑se: a) a quase ausê ncia Tal como o Lineamento de Capricó r‑
dos meio‑grabens antité ticos da fase rifte na nio, que divide a Bacia de Santos em sul e
sub‑bacia Norte, que estã o ostensivamente norte (Bueno et al., 2004a), interpreta‑se
presentes na sub‑bacia Sul (Fig. 1); b) predo‑ que o Lineamento de Porto Alegre, herança
minantemente formados durante a fase rifte, do embasamento, tenha tido o mesmo com‑
os Seaward Dipping Re lectors (SDR) sofrem portamento, sendo reativado como uma zo‑
brusca variaçã o na largura da á rea de ocor‑ na de acomodaçã o de direçã o NW, durante a
rê ncia, ao cruzar o limite entre as sub‑bacias fase rifte eocretá cea, passando a atuar como
(Fig. 1); c) a expressiva subsidê ncia termal, uma zona de fratura oceâ nica na fase drifte.
propiciando o amplo desenvolvimento da ge‑ A velocidade no processo de abertura que se
ometria sag na sub‑bacia Norte, que é pouco desenvolvia de sul para norte, sofreu um re‑
desenvolvida na sub‑bacia Sul (Figs. 3‑4); e tardo, ao se encontrar com o Lineamento de
d) o comportamento da subsidê ncia se in‑ Porto Alegre, registrado no amplo desenvol‑
verte drasticamente entre ambas as sub‑ba‑ vimento do vulcanismo durante a fase rifte,
cias, durante a fase drifte (Figs. 3‑4). que produziu a colossal seçã o de SDR na

Bacia de Pelotas em retrospectiva 391


Contribuições à Geologia do Rio Grande do Sul e de Santa Catarina

Figura 3 ‒ Interpretaçã o da seçã o sı́smica em profundidade (S). Observam‑se os grabens antité ticos e o tı́pico
padrã o dos SDR associados à seçã o rifte, superimpostos por espessa seçã o da margem passiva‑drifte e por
inexpressiva seçã o sag. Localizaçã o nas iguras 1 e 2 (modi icado de Stica et al., 2013).

Figura 4 ‒ Interpretaçã o da seçã o sı́smica em profundidade (N). Observa‑se que a á rea de ocorrê ncia lateral da
atividade rifte, tipicamente preenchida por SDR, praticamente triplica, em relaçã o à da sub‑bacia Sul,
deslocando o COB para leste. Alto estrutural ı́gneo a menos de 13 km de profundidade, representa o centro de
espalhamento oceâ nico abortado (CEOA) na sub‑bacia Norte. Ainda, em oposiçã o ao veri icado na sub‑bacia
Sul, ampla e espessa seçã o sag se desenvolve, coberta por uma seçã o drifte delgada. Localizaçã o nas iguras 1 e
2 (modi icado de Stica et al., 2013).

sub‑bacia Norte e que provocou o desloca‑ forma episó dica, ao longo de uma extensa
mento do limite crosta continental‑crosta faixa, com mú ltiplas fases de rifteamento e
oceâ nica (COB) para leste, embora o eixo de de oceanizaçã o, processo conhecido como
um centro de espalhamento oceâ nico abor‑ rifte propagante. Isto é , ao longo da separa‑
tado possa ser identi icado na sub‑bacia çã o, enquanto um determinado segmento se
Norte, o qual se alinha com o COB observado encontra na fase de espalhamento oceâ nico,
na sub‑bacia Sul (Fig. 2 e 4), evidê ncia de outros ainda se encontram na fase rifte, em
que algum processo interrompeu a propaga‑ graus diferenciados de extensã o de crosta,
çã o linear S‑N, observada no breakup ao lon‑ trazendo implı́citos os conceitos de evoluçã o
go da Margem Sul‑Americana. progressiva e diá crona.
Em geral, aceita‑se que o desenvolvi‑ Com base nas variaçõ es das larguras
mento de separaçõ es continentais ocorra de de ocorrê ncia da provı́ncia de Seaward Dip‑

392 Edição da Sociedade Brasileira de Geologia – Núcleo RS/SC


Bueno

ping Re lectors (SDR) Sã o Jorge‑Pelotas e nas termo pó s‑rifte. Por ú ltimo, foi introduzida
diferentes idades, indicadas pelos lineamen‑ uma coluna, posicionando temporalmente os
tos magné ticos a ela associados, Bueno elementos do sistema petrolı́fero, atualmen‑
(2001, 2004) propô s uma evoluçã o polifá sica te, estabelecido para a bacia (Fig. 5).
para o espalhamento oceâ nico colocado à Apesar das diferenças observadas
frente da margem brasileira, sustentando nas duas sub‑bacias, que compõ em a Bacia
que, na regiã o da atual Bacia de Pelotas, teria de Pelotas, manteve‑se as denominaçõ es lito‑
ocorrido um primeiro está gio de breakup, estratigrá icas contidas em Dias et al. (1994),
junto à Sinclinal de Torres, em que se encon‑ e a estrutura de uma ú nica carta para o arca‑
tram os a loramentos basá lticos da Provı́ncia bouço estratigrá ico, para as feiçõ es geoló gi‑
Vulcâ nica Paraná , contudo, aqui, assume‑se o cas, para os eventos tectono‑magmá ticos e
Lineamento de Porto Alegre como o marco para as sequê ncias deposicionais que carac‑
do desenvolvimento da propagaçã o do brea‑ terizam a bacia, já apresentadas em Bueno et
kup. Assim, enquanto a sub‑bacia Norte ain‑ al. (2007).
da sofria o processo de rifteamento, a Cabe o registro de uma curiosidade
sub‑bacia Sul já experimentava o está gio de sobre um ciclo nã o programado, mas realiza‑
subsidê ncia lexural, produzido pelo resfria‑ do. Como visto acima, a primeira integraçã o
mento e pela contraçã o termal da crosta de dados de sub‑superfı́cie sobre a Bacia de
oceâ nica (Martins‑Neto et al., 2006). Pelotas ocorreu em 1994. Treze anos depois,
em 2007, foi realizada uma atualizaçã o e,
3 ESTRATIGRAFIA agora, em 2020, será disponibilizada uma
nova versã o, uma fotogra ia do conhecimen‑
A carta estratigrá ica da Bacia de Pe‑ to progressivo, passados mais treze anos.
lotas, aqui apresentada, difere da versã o de Apesar da assunçã o, aqui exposta,
Bueno et al. (2007) em alguns pontos. Pri‑ quanto a considerar os derrames da Forma‑
meiro, foi ajustado o intervalo de duraçã o da çã o Serra Geral como uma fase dissociada do
Fm. Serra Geral, segundo os dados isotó picos está gio rifte, uma interpretaçã o do desenvol‑
apresentados em Janasi et al. (2011), produ‑ vimento da Sinclinal de Torres provoca dú vi‑
zidos por aná lise U‑Pb em cristais de bade‑ das a esse respeito, pois observaçõ es de
leı́ta/zircã o, que resultaram num intervalo campo, a partir de seçõ es estratigrá icas,
de 3 Ma para a extrusã o de toda a suı́te vul‑ conduzem a uma possı́vel contemporaneida‑
câ nica. Segundo, introduziu‑se o Mb. Nova de de boa parte do magmatismo à evoluçã o
Prata na estratigra ia da Fm. Serra Geral, o do rifte Eocretá ceo (Petrobras/Profex,
que conduziu a outras duas mudanças: 1o) a 2011). Isto se traduz como um desa io a ser
desvinculaçã o dos derrames da Fm. Serra elucidado e a retornar na pró xima atualiza‑
Geral da fase rifte da Bacia de Pelotas, dei‑ çã o sobre a evoluçã o geoló gica da Bacia de
xando sem cores a sua representaçã o na car‑ Pelotas, talvez, daqui a outros 13 anos (Fig.
ta estratigrá ica (Fig. 6), pró pria de litologias 6).
consideradas embasamento de bacia; e 2o) o Assim, apesar do predomı́nio do Cin‑
abandono do termo pré ‑rifte, como de inido turã o Dom Feliciano no embasamento da
por Magnavita (1992), para estas litologias, sub‑bacia Sul, o poço 1‑RSS‑3 registrou a
que as pressupunham integrantes do proces‑ ocorrê ncia da sequê ncia mesozoica vulcâ ni‑
so de rifteamento. Adicionalmente, foi intro‑ ca da Bacia do Paraná , abaixo de meio‑gra‑
duzido o termo sag, relacionado ao intervalo ben desenvolvido durante a fase rifte da
de subsidê ncia té rmica, em substituiçã o ao bacia de Pelotas (Fig. 7).
Bacia de Pelotas em retrospectiva 393
Contribuições à Geologia do Rio Grande do Sul e de Santa Catarina

Figura 5 ‒ Carta estratigrá ica da Bacia de Pelotas ajustada as mais recentes e precisas aná lises
geocronoló gicas relativas à seçã o pré ‑drifte. Na seçã o drifte é realçado o padrã o transgressivo até o inal do
Oligoceno e, a partir do Mioceno, dá ‑se o predomı́nio de um padrã o francamente regressivo. Sã o indicadas as
idades dos principais elementos do sistema petrolı́fero interpretado para a bacia.

394 Edição da Sociedade Brasileira de Geologia – Núcleo RS/SC


Bueno

Figura 6 ‒ Modelo evolutivo da Sinclinal de Torres. A partir dos primeiros derrames sobre os depó sitos eó licos
da Formaçã o Botucatu, observa‑se a geraçã o de um graben, o qual passa a canalizar a atividade vulcâ nica,
demonstrando sua contemporaneidade à atividade de falhas normais (Petrobras/Profex, 2011).

Aná lise petrográ ica de amostra do discordâ ncia inicial do rifte na Bacia de Pelo‑
intervalo entre a Fm. Imbituba e os basaltos tas, bem como demonstra o diacronismo en‑
subjacentes con irmou a presença de um ri‑ tre os basaltos da Bacia do Paraná e os da
olito, com xenó lito de basalto (Fig. 7), identi‑ Bacia de Pelotas, també m con irmado pelos
icado como o Membro Nova Prata, no topo dados geocronoló gicos (Fig. 5).
da Fm. Serra Geral (Petrobras/UFOP, 2006). Essa relaçã o foi referendada pela
Adicionalmente, o tı́pico padrã o sı́smico di‑ aná lise de sı́smica profunda, realizada por
vergente, indicativo de deposiçã o sin‑tectô ‑ Stica et al. (2013), que interpretou a evoluçã o
nica na fase rifte, é observado no intervalo da Large Igneous Province (LIP) Paraná ‑Eten‑
correspondente à Fm. Imbituba, a qual se as‑ deka em dois está gios tectono‑vulcâ nicos:
senta discordantemente sobre um padrã o 1o) derrames tabulares, de grande extensã o,
sı́smico de re letores subparalelos, caracte‑ da Fm. Serra Geral; e 2o) focalizaçã o do vul‑
rı́stico do empilhamento vertical dos derra‑ canismo no rifte Pelotas, com deposiçã o de
mes basá lticos da Fm. Serra Geral (Fig. 7). SDR até a ruptura inal, representados pelas
Esta associaçã o permite a caracterizaçã o da fms. Imbituba e Curumim.
Bacia de Pelotas em retrospectiva 395
Contribuições à Geologia do Rio Grande do Sul e de Santa Catarina

Figura 7 ‒ Relaçã o estratigrá ico‑sı́smica‑sı́smica‑rocha no poço 1‑RSS‑3. A identi icaçã o do empilhamento


drifte‑rifte‑embasamento no poço e sua transposiçã o para a sı́smica, validado pelos dados geocronoló gicos
(rifte) e petroló gicos (riolito com xenó lito de basalto), adicionados ao padrã o sı́smico divergente, posicionado
sobre discordâ ncia angular na seçã o sı́smica, proporciona interpretar a Fm. Imbituba como preenchendo um
graben, discordantemente assentada sobre os riolitos do Mb. Nova Prata da Bacia do Paraná .

Cunhas de SDR, de diferentes idades, as mecâ nica, do rifte, e té rmica, do sag, che‑
podem ser vistas em seçõ es sı́smicas ao lon‑ ga‑se ao está gio de margem passiva, onde
go do contato crosta continental‑crosta oceâ ‑ atuarã o, conjuntamente, a contraçã o termal
nica na Bacia de Pelotas. Uma integraçã o de da litosfera e a sobrecarga de sedimentos e
dados geoló gico‑geofı́sicos permite interpre‑ vulcâ nicas, gerando o espaço de acomoda‑
tar as cunhas mais velhas na sub‑bacia Sul, já çã o, que será preenchido, sob o controle do
na idade da Formaçã o Imbituba inseridas no binô mio aporte sedimentar‑variaçã o do nı́‑
rifte, passando as mais jovens, da Formaçã o vel do mar. Neste tema, nã o houve altera‑
Curumim, restritas à sub‑bacia Norte, sendo çõ es de interpretaçã o na carta estratigrá ica
a representaçã o da continuidade do vulca‑ da Bacia de Pelotas, na qual, desde o Cretá ‑
nismo na fase sag. Uma visã o regional permi‑ ceo (horizonte vermelho), até o Oligoceno
te traçar uma analogia entre a migraçã o (horizonte verde), ocorre o predomı́nio de
lateral da atividade vulcâ nica da LIP Paraná ‑ um ciclo transgressivo, para, a partir do Mi‑
Etendeka e o modelo de Geoffroy (2005) oceno, o forte cará ter progradante registrar
(Fig. 8). o inı́cio de um ciclo regressivo, no qual está
Passados os está gios das subsidê nci‑ inserido o Cone de Rio Grande (Fig. 9).

396 Edição da Sociedade Brasileira de Geologia – Núcleo RS/SC


Bueno

4 HIDROCARBONETOS E HIDRATOS ta foi realizada até o presente momento. A


atividade explorató ria mais recente aconte‑
A Bacia de Pelotas passou por fases ceu em 2001, com a perfuraçã o do poço 1‑
pontuais, direcionadas à prospecçã o de hi‑ RSS‑4, sob responsabilidade do consó rcio Pe‑
drocarbonetos, contudo nenhuma descober‑ trobras/Esso/British Gas.

Figura 8 ‒ Analogia da sucessã o de eventos tectono‑magmá ticos registrados na evoluçã o da Bacia de Pelotas até
o inal da fase sag com o modelo de Geoffroy (2005). Basaltos da Fm. Serra Geral e Mb. Nova Prata,
representando derrames numa bacia continental pré ‑breakup; os SDR internos sendo a representaçã o da Fm.
Imbituba preenchendo meio‑grabens; e a Fm. Curumim, sendo o registro dos SDR externos.

Figura 9 ‒ Seçã o sı́smica em profundidade exibindo entre os horizontes vermelho (base do Cretá ceo) e verde
(topo do Oligoceno), o predomı́nio do empilhamento transgressivo sotoposto ao padrã o regressivo, registrado a
partir do Mioceno.

Bacia de Pelotas em retrospectiva 397


Contribuições à Geologia do Rio Grande do Sul e de Santa Catarina

A perfuraçã o ocorreu sobre o Cone colapso das paredes do poço, fazendo com
de Rio Grande e tinha, como objetivo princi‑ que a profundidade inal, prevista para 3.100
pal, a busca de arenitos deltaicos/turbidı́ti‑ m, acabasse se realizando em 2.379 m, impe‑
cos miocê nicos numa estrutura em rollover, dindo testar o modelo geoló gico idealizado.
situada em um cinturã o gravitacional (Fig. Embora reservató rios miocê nicos tenham si‑
10). Estas estruturas se originam na foz de do previstos, estes nã o foram constatados no
rios de grande porte, cujos deltas sã o cons‑ poço, devido a uma armadilha na interpreta‑
truı́dos rapidamente, com um excepcional çã o de atributos sı́smicos, isto é , a aná lise de
volume de sedimentos, o que provoca o sur‑ per is do poço mostrou que os supostos re‑
gimento de uma superfı́cie de descolamento servató rios correspondiam a folhelhos hi‑
e o movimento do pacote sedimentar sobre dratados, com pressã o de poros acima dos
ela em direçã o a á guas profundas, a seme‑ folhelhos sobrepostos, o que gerou sismofá ‑
lhança do observado na foz do Rio Amazo‑ cies de alta re letividade, sendo interpreta‑
nas. dos, em sı́smica, como corpos arenosos.
Esta estruturaçã o faz surgir toda Poré m, feiçõ es erosivas, com forte evidê ncia
classe de trapas: estratigrá icas, estruturais e de preenchimento arenoso (contornitos) po‑
mistas. Em uma trapa estrutural, pretendeu‑ dem ser vistas na bacia (Fig. 11), con irman‑
se testar o poço 1‑RSS‑4, contudo esforços do a presença de rochas reservató rio, de
tangenciais dentro do cinturã o provocaram o idade Eoceno/Oligoceno, para o acú mulo de

Figura 10 ‒ Seçã o geoló gica exibindo na elipse vermelha, uma feiçã o deformacional denominada cinturã o
gravitacional, cuja origem deposicional é tı́pica de regiõ es com possante acú mulo sedimentar, caso do Cone de
Rio Grande na Bacia de Pelotas. Possı́vel identi icar uma zona distensiva proximal (D) e uma zona compressiva
distal (C), separadas por uma zona de translaçã o (T), sem ou com pouca deformaçã o, sob uma superfı́cie de
descolamento no Mioceno Inferior. Mecanismo gerador de trapas para hidrocarbonetos.

398 Edição da Sociedade Brasileira de Geologia – Núcleo RS/SC


Bueno

hidrocarbonetos. possı́vel ocorrer, até , 164 m3 de gá s. Sã o for‑


Na sub‑bacia Norte, a constataçã o de mados, sob condiçõ es de alta pressã o, de bai‑
Carbono Orgâ nico Total (COT) de 4,2% e de xa temperatura (inferior a +4oC) e com
maté ria orgâ nica tipo I (pró pria para geraçã o concentraçõ es adequadas de molé culas de
de ó leo) em um intervalo maturo do Paleoce‑ gá s na á gua dos poros dos sedimentos (Sad et
no Superior, produzida por aná lise geoquı́mi‑ al., 1998).
ca em amostras do poço 2‑BPS‑6A, Ocorrê ncias de hidratos de gá s estã o
credencia‑o como um excelente gerador de relacionadas a á reas com elevadas taxas de
hidrocarbonetos, poré m fortes erosõ es pos‑ sedimentaçã o e com rá pido soterramento,
teriores reduziram sua á rea de ocorrê ncia na assim como as encontradas no Cone de Rio
bacia. Rochas selantes, representadas por Grande. Sã o essencialmente constituı́das por
sismofá cies transparente sã o amplamente metano de origem biogê nica. Hidratos ocor‑
distribuı́das, tanto em á rea quanto na seçã o rem, principalmente, sob a forma de cimento,
vertical, nã o se caracterizando como um fa‑ preenchendo o espaço poroso dos sedimen‑
tor de risco. As posiçõ es temporais destes tos presentes e desenvolvendo uma capa de
elementos do sistema petrolı́fero estã o ex‑ gelo entre o fundo do mar e uma superfı́cie, a
pressas na Figura 5. ele paralela Bottom Simulating Re lector
Hidratos de gá s sã o compostos só li‑ (BSR). Esta camada congelada, que se forma
dos congelados, formados por á gua e por gá s em profundidades determinadas pela tempe‑
natural. Sua estrutura cristalina comprime o ratura, pela pressã o e pelo luxo té rmico lo‑
gá s de tal forma, que, em 1 m3 de hidrato, é cais, recebe o nome de Zona de Estabilidade

Figura 11 ‒ Seçã o sı́smica em tempo, proporcionando a interpretaçã o de canal preenchido por depó sitos
contornı́ticos (detalhe), indicativo da presença de reservató rios arenosos na bacia, de idade oligocê nica.

Bacia de Pelotas em retrospectiva 399


Contribuições à Geologia do Rio Grande do Sul e de Santa Catarina

dos Hidratos (Hydrate Stability Zone ‒ HSZ) taçã o de seus recursos, de forma economica‑
(Fig. 12). O BSR se caracteriza por ser um re‑ mente viá vel.
letor paralelo ao fundo marinho, com um
coe iciente de re lexã o negativo, causado pe‑ 5 CONCLUSÕES
lo contraste de impedâ ncia acú stica entre a
HSZ (de alta velocidade sı́smica) e a camada Procurou‑se, aqui, fazer convergi‑
de gá s livre, situada abaixo desta (de baixa rem os conhecimentos acumulados, até en‑
velocidade sı́smica), sendo seu mapeamento tã o, sobre a Bacia de Pelotas, sejam
determinante para delimitar as ocorrê ncias acadê micos, sejam oriundos da indú stria pe‑
de hidratos no CRG (Barros et al., 2009). trolı́fera, para uma resenha evolutiva contex‑
Descrita pela primeira vez por Fon‑ tualizada na abertura do Oceano Atlâ ntico
tana & Mussumeci (1994), a ocorrê ncia de Sul. No â mbito explorató rio, a bacia pode ser
hidratos na Bacia de Pelotas se distribui so‑ considerada como nã o avaliada, sob o ponto
bre uma á rea aproximada de 45.000 km2, de vista de seu potencial petrolı́fero, tanto
tem caracterı́sticas e reservas similares a dos em á guas rasas quanto em á guas profundas,
maiores depó sitos do mundo, mas aguarda entretanto os elementos do sistema petrolı́‑
avanços tecnoló gicos, que permitam a explo‑ fero atualmente aceitos para a bacia foram

Figura 12 ‒ Mapa da ocorrê ncia de hidratos entre as isó batas de 1.000 m e de 3.000 m no Cone de Rio Grande
(I); seçã o sı́smica em tempo, que permite interpretar o Bottom Simulating Re lector (BSR) e a Hydrate Stability
Zone (HSZ), em direçã o a á guas profundas (Sad et al., 1998) (II).

400 Edição da Sociedade Brasileira de Geologia – Núcleo RS/SC


Bueno

introduzidos na carta estratigrá ica. Já as co‑ deiros, R. A. 2009. Aná lise de atributos sı́smi‑
lossais reservas de hidratos de gá s identi i‑ cos para caracterizaçã o de hidratos de gá s no
cadas, aguardam, no mundo todo, por uma Cone do Rio Grande. In: SIMPOSIO DE GEO‑
LOGIA DE SUDESTE, XI., 2009, Sã o Pedro.
tecnologia segura e e iciente para a sua pro‑
Anais… Sã o Pedro, SBG, v. 1, p. 111.
duçã o, assim, trata‑se de um campo aberto
para a pesquisa de ponta. Bueno, G. V. 2001. Discordância pré‑Aratu:
O conhecimento geoló gico tem avan‑ marco tectono‑isotópico no rifte afro‑brasilei‑
çado em vá rias frentes. A litoestratigra ia ro. Porto Alegre, 149p. Tese de Doutorado,
Programa de Pó s‑graduaçã o em Geociê ncias,
publicada em 1984 foi sucedida pela estrati‑
Instituto de Geociê ncias, Universidade Fede‑
gra ia de sequê ncias, em 2007, a qual foi ba‑ ral do Rio Grande do Sul.
seada na interpretaçã o dos dados sı́smicos
disponı́veis para a bacia, e, hoje, esta está Bueno, G. V. 2004. Diacronismo de eventos no
sendo atualizada, em funçã o de novos dados rifte Sul‑Atlâ ntico. Boletim de Geociências da
petroló gicos e geocronoló gicos, os quais nos Petrobras, 12(2): 203‑229.
proporcionam maior precisã o no posiciona‑
Bueno, G. V., Machado Jr., D. L., Oliveira, J. A. B.
mento estratigrá ico de eventos geoló gicos, & Marques, E. J. J. 2004a. A in luê ncia do Li‑
como o perı́odo da atividade vulcâ nica da neamento Capricó rnio na evoluçã o tectono‑
Provı́ncia Magmá tica Paraná ‑Etendeka e da sedimentar da Bacia de Santos. In: CONGRES‑
Formaçã o Imbituba, na fase rifte. SO BRASILEIRO DE GEOLOGIA, 52., 2004,
Araxá . Anais. . . Araxá , SBG, Simpó sio 28 – Pe‑
A aplicaçã o de novas tecnologias, co‑
tró leo: geologia e exploraçã o, T 773.
mo a da sı́smica ultraprofunda, proporciona
uma visualizaçã o da geologia de subsuperfı́‑ Bueno, G. V., Zacharias, A. A., Oreiro, S. G., Cu‑
cie em nı́vel de crosta‑manto, que nos permi‑ pertino, J. A., Falkenhein, F. U. H. & Martins‑
te avançar no modelo de desenvolvimento de Neto, M. A. 2007. Bacia de Pelotas. Boletim de
ruptura e oceanizaçã o do Gondwana Leste Geociências da Petrobras, 15(2): 551‑559.
aqui colocado, assim como evoluir no enten‑
Dias, J. L., Sad, A. R. E., Fontana, R. L. & Feijó ,
dimento dos SDR, durante a transiçã o entre F. J. 1994. Bacia de Pelotas. Boletim de Geoci‑
as subsidê ncias mecâ nica e termal. ências da Petrobras, 8(1): 235‑245.
Permanecem questõ es, como a do
entendimento da evoluçã o da Sinclinal de Fontana, R. L. & Mussumeci, A. 1994. Hydra‑
tes offshore Brazil. Annals of the New York
Torres e a da presença de geradores e de re‑
Acad. of Sciences, 715: 106‑113.
servató rios, as quais nos remete à evidente
necessidade de projetos regionais multidis‑ Geoffroy, L. 2005. Volcanic Passive Margins.
ciplinares, que tenham a premissa de inte‑ Comptes Rendus Geoscience, 337: 1395‑1408.
graçã o e de interpretaçã o de dados, voltados
Janasi, V. A., Freitas, V. A. & Heaman, L. H.
a consolidar e a alavancar o conhecimento,
2011. The onset of lood basalt volcanism,
direcionado a uma melhor alocaçã o de re‑ Northern Paraná Basin, Brazil: A precise U–
cursos, visando ao desenvolvimento econô ‑ Pb baddeleyite/zircon age for a Chapecó ‑ty‑
mico latente da margem meridional do pe dacite. Earth and Planetary Science Letters,
Brasil. 302: 147‑153.

Lobo, J. T. 2007. Petrogênese das rochas basál‑


REFERÊNCIAS ticas do Eocretáceo das Bacias de Campos e
Pelotas e implicações na Geodinâmica de Rif‑
Barros, C. S., Silva, C. G., Santos, R. A. & Me‑ teamento do Gondwana Ocidental. Rio de Ja‑

Bacia de Pelotas em retrospectiva 401


Voltar ao Sumário

Contribuições à Geologia do Rio Grande do Sul e de Santa Catarina

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Estratigrá ico e Estrutural da bacia de Pelo‑
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Petrobras/Profex. 2011. Evolução estratigrá‑


ica das sucessões Pré‑Rifte e Rifte das bacias
de Sergipe‑Alagoas, Recôncavo, Tucano Sul,
Camamu‑Almada e Pelotas. Rio de Janeiro,
Petrobras, 1 DVD.

Sad, A. R. E., Silveira, D. P., Silva, S. R. P., Maci‑


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Silveira, D. P. & Machado, M. A. P. 2004. Baci‑


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Stica, J. M., Zalá n, P. V. & Ferrari, A. L. 2013.


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nicas do Centro de Estudos de Geologia
Costeira e Oceânica, Universidade Federal do
Rio Grande do Sul. Porto Alegre, 8: 1‑45.

402 Edição da Sociedade Brasileira de Geologia – Núcleo RS/SC


Sismoestratigra ia e evolução
da Bacia de Pelotas

Joã o Pacı́ ico Silveira Luiz Machado1,2,3*, Randell Stephenson2,


André a Ritter Jelinek3, Ramy Abdallah2

1
Serviço Geoló gico do Brasil (CPRM)
2
School of Geosciences, University of Aberdeen
3
Instituto de Geociê ncias, Universidade Federal do Rio Grande do Sul

* autor correspondente: j.paci icomachado@gmail.com

1 INTRODUÇÃO
A abertura do Oceano Atlâ ntico Sul se iniciou na parte austral do megacontinente
Gondwana Oeste e se propagou para NNE durante o Mesozoico, seguindo zonas de fraqueza li‑
tosfé rica que haviam sido formadas durante o Ciclo Brasiliano (Neoproterozoico) (Chang et al.,
1992; Stica et al., 2014; Buiter & Torsvik, 2014; Will & Frimmel, 2018). A ruptura do megaconti‑
nente levou à formaçã o da Amé rica do Sul e da Africa, assim como de vá rias bacias ao longo de
suas margens passivas. Dentre elas está a Bacia de Pelotas, a mais meridional das bacias brasi‑
leiras e que també m se prolonga pelo territó rio uruguaio (Fig. 1). Estudos pioneiros na Bacia de
Pelotas datam do inı́cio dos anos 1960, com signi icativos avanços nos anos 1990 nos campos da
sismoestratigra ia e da geotectô nica, de forma que um histó rico de trabalhos sobre a bacia pode
ser consultado em Fontana (1996) e em ANP/UFRGS (2008). Contudo, por se tratar de uma ba‑
cia marginal, essencialmente submersa pelas á guas do Oceano Atlâ ntico Sul e que nã o possui
reservas comerciais conhecidas de hidrocarbonetos, o entendimento sobre a subsuperfı́cie da
Bacia de Pelotas ainda é bastante limitado. Neste capı́tulo, buscamos fornecer um breve panora‑
ma dos conhecimentos geoló gicos acumulados, durante dé cadas, sobre a Bacia de Pelotas, assim
como apresentaremos uma aná lise semiqualitativa das unidades sı́smicas da bacia e de sua his‑
tó ria deposicional. Ao inal, é inequı́voco que a Bacia de Pelotas ainda apresenta diversas opor‑
tunidades de pesquisa, cujo fomento pode resultar tanto numa melhor compreensã o da
tectô nica global quanto na viabilizaçã o da exploraçã o de recursos energé ticos nela contidos.
Contribuições à Geologia do Rio Grande do Sul e de Santa Catarina

2 CONTEXTO GEOTECTÔNICO associada ao magmatismo da formaçã o Ser‑


ra Geral e das bacias marginais em forma‑
A ruptura do Gondwana Oeste foi çã o (e.g. Chang et al., 1992; Brown et al.,
marcada por volumosa atividade ı́gnea, ante‑ 2000; Buiter & Torsvik, 2014). O empurrã o
rior e concomitante ao rifte, especialmente da pluma Tristã o da Cunha sob a crosta, so‑
ao longo da margem entre o Uruguai e o su‑ mado ao a inamento e à extensã o da ú ltima,
deste do Brasil (Mohriak, 2012; Stica et al., parece ter mantido a regiã o como um alto
2014). Nessa regiã o, no continente, a loram topográ ico até a ruptura total (Aslanian et
os extensos derrames vulcâ nicos da forma‑ al., 2009; Beglinger et al., 2012), condiçã o
çã o Serra Geral (Cretá ceo Inferior), da Bacia també m sugerida por dados de termocro‑
do Paraná , que cobrem uma á rea de mais de nologia de baixa temperatura na margem
900.000 km2 (Rossetti et al., 2018), enquanto adjacente à Bacia de Pelotas, que indicam
que sob as á guas do Oceano Atlâ ntico ocor‑ soerguimento regional precedente ao rifte
rem os seaward‑dipping re lectors (SDRs), in‑ (e.g. de Oliveira et al., 2016; Machado et al.,
terpretados como pacotes vulcâ nicos 2019, 2020, 2021). Dessa forma, o processo
associados à ruptura continental, com espes‑ de ruptura do megacontinente Gondwana
sura de até 12 km, na margem sul‑brasileira na regiã o da Bacia de Pelotas pode ser clas‑
(McDermott et al., 2019). O rifte se propagou si icado como de um rifte ativo, com intenso
de sul para norte e, na regiã o da Bacia de Pe‑ magmatismo extrusivo e atividade manté li‑
lotas, també m em pulsos de oeste para leste, ca durante o Cretá ceo Inferior (Mohriak,
caracterizando um processo de rifteamento 2012). Apó s a fase rifte (c. 110 Ma), a Bacia
diacrô nico e segmentado (Stica et al., 2014). de Pelotas passa a ser identi icada como
Em uma compilaçã o de modelos das taxas de uma bacia de margem passiva, condiçã o que
abertura do Atlâ ntico Sul, Colli et al. (2014) persiste até hoje. Segundo Contreras et al.
demonstram um aumento contı́nuo, mas nã o (2010), a taxa de subsidê ncia da bacia so‑
linear, da abertura oceâ nica durante o Cretá ‑ freu uma queda gradual durante o Cretá ceo
ceo, até um platô de velocidade alta e cons‑ Inferior, chegando a um mı́nimo na transi‑
tante, iniciado no Aptiano. Esse platô persiste çã o entre as eras Mesozoica e Cenozoica.
por cerca de 40 Ma e é seguido de uma redu‑ Durante o Paleoceno, ocorre uma mudança
çã o da velocidade, até uma taxa mı́nima de de comportamento e a taxa de subsidê ncia
espalhamento oceâ nico no Paleoceno, segui‑ da bacia passa a aumentar. No inı́cio do Ce‑
do de uma nova aceleraçã o no Eoceno e de nozoico, a Bacia de Pelotas possuı́a abun‑
relativa estabilidade desde entã o. Na mar‑ dante espaço de acomodaçã o, o qual veio a
gem adjacente ao Uruguai, a geraçã o de cros‑ ser preenchido, principalmente, por sedi‑
ta oceâ nica teve inı́cio em torno de 127 Ma, mentos de granulaçã o muito ina (Contreras
enquanto na á rea de Florianó polis, no sul do et al., 2010).
Brasil e limite entre as bacias de Pelotas e de Atualmente, a Bacia de Pelotas se
Santos, ela foi iniciada apenas na transiçã o encontra situada entre os paralelos 28° e
do Aptiano para o Albiano (c. 113 Ma) 34° sul. Seu limite, ao sul, é o Alto de Polô ‑
(Chang et al., 1992; Stica et al., 2014). nio, no Uruguai, e, ao norte, é o Alto de Flo‑
As causas e os mecanismos atuantes rianó polis, no Brasil (Fig. 1). O limite norte é
durante o rifteamento permanecem em de‑ pouco de inido e é parte de um complexo de
bate, contudo o inı́cio da ruptura costuma ser estruturas da crosta oceâ nica na regiã o, co‑
relacionado à presença da pluma manté lica mo a Dorsal (ou Crista) de Sã o Paulo, o
Tristã o da Cunha na regiã o, que també m é Platô de Sã o Paulo, a Zona de Fratura de

404 Edição da Sociedade Brasileira de Geologia – Núcleo RS/SC


Machado et al.

Florianó polis (prolongamento da Zona de Fra‑ quanto por correntes marı́timas. Ao menos
tura de Rio Grande), entre outras, associadas à trê s correntes oceâ nicas profundas erodem,
pluma Tristã o da Cunha e à rotaçã o da Amé ri‑ transportam e distribuem sedimentos pela
ca do Sul durante o rifte (Salomon et al., 2017). bacia (Schattner et al., 2019). Na porçã o su‑
A Bacia de Pelotas ainda pode ser dividida em baé rea, quatro sistemas laguna‑barreira se
duas sub‑bacias: norte, entre o Alto de Floria‑ encontram expostos e foram desenvolvidos
nó polis e o Terraço de Rio Grande; e sul, do nos ú ltimos 0,5 Ma, provavelmente em res‑
Terraço, até o Alto de Polô nio (Bueno et al., posta a ciclos glacioeustá ticos de alta
2007). Ela també m se caracteriza como um frequê ncia (Rosa et al., 2017). Reservas eco‑
ambiente deposicional de mar aberto e de nomicamente viá veis de hidrocarbonetos ain‑
pouco relevo costeiro, com baixa topogra ia e da nã o foram con irmadas na Bacia de
com litoral bastante retilı́neo. Por conseguinte, Pelotas, mas há um crescente interesse na ex‑
é constante o retrabalhamento dos sedimen‑ ploraçã o destes e de hidratos de gá s na regiã o
tos ali depositados, tanto pela açã o de ondas (Beglinger et al., 2012; Miller et al., 2015).

Figura 1 ‒ Mapa de localizaçã o da Bacia de Pelotas no extremo sul do Brasil. A Bacia de Pelotas compreende o
ambiente oceâ nico e a margem continental, em que estã o expostos os sistemas de laguna/barreira. O limite
norte da bacia se encontra na regiã o de Florianó polis, enquanto o limite sul se estende até o Uruguai (nã o
visı́vel na imagem). As linhas sı́smicas e a á rea mapeada (polı́gono amarelo) nã o abrangem a bacia em sua
totalidade.
Sismoestratigra ia e evolução da Bacia de Pelotas 405
Contribuições à Geologia do Rio Grande do Sul e de Santa Catarina

3 LITOESTRATIGRAFIA grossa a ina, polimı́ticos, com abundantes


fragmentos vulcâ nicos. Basaltos oxidados e
O reduzido nú mero de poços perfu‑ conglomerados, observados em testemunho
rados na Bacia de Pelotas representa um de poço, indicam exposiçã o subaé rea da re‑
obstá culo à adequada caracterizaçã o de seu giã o durante o rifteamento, possivelmente
preenchimento vulcano‑sedimentar. Os da‑ caracterizando um planalto vulcâ nico eleva‑
dos disponı́veis indicam que a maior parte da do acima do nı́vel do mar (Barboza et al.,
bacia é preenchida por sedimentos de granu‑ 2008; Beglinger et al., 2012). Tal condiçã o
lometria ina, principalmente na forma de fo‑ condiz com os primeiros com os primeiros
lhelhos, e que ela carece de extensos depó sitos sedimentares na Bacia de Pelotas
depó sitos evaporı́ticos, caracterı́sticos das apó s o rifte, compostos, principalmente, de
bacias adjacentes ao norte (Bueno et al., carbonatos e margas, com caracterı́sticas de
2007). Sua coluna estratigrá ica inclui, tam‑ um ambiente marinho raso no inı́cio da fase
bé m, conglomerados, rochas carboná ticas e drifte.
arenitos, alé m de vastos depó sitos ı́gneos as‑ A Supersequê ncia Pó s‑Rifte é carac‑
sociados ao rifte. A sequê ncia deposicional terizada pelo magmatismo da Formaçã o Cu‑
da bacia compreende nove unidades litoes‑ rumim, formada por rochas traquian‑
tratigrá icas, de inidas por Dias et al. (1994), desı́ticas de cor cinza‑esverdeada. Ela é , em
e que foram agrupadas por Bueno et al. parte, recoberta por depó sitos evaporı́ticos
(2007) nas supersequê ncias Pré ‑Rifte, Rifte, da Formaçã o Ariri, presentes na porçã o nor‑
Pó s‑Rifte e Drifte (Fig. 2). te da Bacia de Pelotas. A aná lise da fauna de
A Supersequê ncia Pré ‑Rifte repre‑ ostracodes do Cretá ceo e inı́cio do Paleoge‑
senta o embasamento da Bacia de Pelotas, no sugere á guas mornas e rasas na bacia, ca‑
caracterizado por rochas do Cinturã o Dom racterizando um ambiente nerı́tico, com
Feliciano e por depó sitos da Bacia do Paraná , condiçõ es normais de salinidade (Ceolin et
principalmente pelo vulcanismo issural da al., 2011).
Formaçã o Serra Geral, ligado à ascensã o da Por im, a Supersequê ncia Drifte
astenosfera nos está gios iniciais da ruptura corresponde ao principal pacote sedimentar
(Stica et al., 2014; Rosa et al., 2017). Os pro‑ da Bacia de Pelotas. A supersequê ncia pode
cessos té rmicos, ligados à exumaçã o do man‑ ser dividida nas fases inicial (rasa, durante o
to/crosta inferior, mantiveram a margem Albiano), intermediá ria (transgressiva, do
elevada ao longo da costa brasileira durante Albiano ao Oligoceno) e inal (regressiva,
o Cretá ceo Inferior (Aslanian et al., 2009). durante o Neogeno). A fase inicial é repre‑
A Supersequê ncia Rifte inclui basal‑ sentada pela Formaçã o Portobelo, composta
tos de idade Barremiana‑Aptiana da Forma‑ por calcarenitos bioclá sticos e oolı́ticos, e
çã o Imbituba e depó sitos siliciclá sticos da por calcilutitos, depositados de um contexto
Formaçã o Cassino. Esses basaltos apresen‑ de plataforma mista. Em direçã o ao conti‑
tam textura por irı́tica a subafanı́tica, amı́g‑ nente, esses depó sitos sã o lateralmente in‑
dalas, e cor cinza escuro a castanho terdigitados aos arenitos da Formaçã o
avermelhada. A Formaçã o Imbituba é corre‑ Tramandaı́. Essa formaçã o é composta por
lacionada aos SDRs, que podem ser facilmen‑ arenitos inos cinzentos, intercalados com
te identi icados nos per is sı́smicos da Bacia siltitos e calcá rios. Com o inı́cio do ciclo
de Pelotas. A Formaçã o Cassino, restrita a transgressivo no Albiano, ocorre a deposiçã o
meio‑grabens de idade Aptiana, compreende da Formaçã o Atlâ ntida, composta por sedi‑
depó sitos conglomerá ticos de granulaçã o mentos clá sticos e carboná ticos inos, que

406 Edição da Sociedade Brasileira de Geologia – Núcleo RS/SC


Machado et al.

Figura 2 ‒ Carta cronoestratigrá ica da Bacia de Pelotas, modi icada a partir de Bueno et al. (2007) e Beglinger
et al. (2012). Legendas: formaçõ es BOT ‑ Botucatu; SG ‑ Serra Geral; CAS ‑ Cassino; CRM ‑ Curumim; ARI ‑ Ariri;
PBL ‑ Porto Belo; TRA ‑ Tramandaı́; ATL ‑ Atlâ ntida; CID ‑ Cidreira; e IMB ‑ Imbé ; Sup. Seq. ‑ Supersequê ncias de
Bueno et al. (2007); Con. Dep. ‑ Contexto deposicional; T. ‑ Transicional; e Uni. Sis. ‑ unidades sı́smicas.

compreendem folhelhos e siltitos cinzentos, ogeno ocorre um ciclo regressivo e a Forma‑


camadas de arenito muito ino e de marga çã o Cidreira passa a progradar sobre a For‑
cinzenta. Esses depó sitos sã o sobrepostos maçã o Imbé (Fig. 2).
pelos depó sitos marinhos da Formaçã o Im‑
bé , que sã o interdigitados com os depó sitos 4 SISMOESTRATIGRAFIA
costeiros da Formaçã o Cidreira na porçã o
mais proximal. Juntas, essas duas ú ltimas A Bacia de Pelotas possui um acervo
formaçõ es compõ em o principal preenchi‑ limitado de dados sı́smicos 2D e nenhum le‑
mento da Bacia de Pelotas, depositadas des‑ vantamento em 3D. A maioria das linhas sı́s‑
de o Cretá ceo Superior. A Formaçã o Cidreira micas disponı́veis foi obtida pela Petrobras
é caracterizada por arenitos de granulaçã o entre as dé cadas de 1970 e de 1990, mesmo
grossa a ina, cinzentos, enquanto a Forma‑ perı́odo no qual foram perfurados cerca de
çã o Imbé representa uma sucessã o de folhe‑ uma dú zia de poços de exploraçã o offshore.
lhos e de pelitos, com raros arenitos Um novo conjunto de levantamentos sı́smi‑
turbidı́ticos intercalados. Finalmente, no Ne‑ cos, realizado por companhias pú blicas e

Sismoestratigra ia e evolução da Bacia de Pelotas 407


Contribuições à Geologia do Rio Grande do Sul e de Santa Catarina

privadas, tê m permitido avanços recentes no çã o Cassino. Apesar da complexa transiçã o
entendimento sobre o preenchimento e a entre as sucessõ es Pré e Sin‑rifte, a ú ltima
evoluçã o da bacia (e.g. Conti et al., 2017; geralmente apresenta re letores com carac‑
Morales et al., 2017; McDermott et al., 2019; terı́sticas bastante diagnó sticas, com alta
Schattner et al., 2019). A partir de um con‑ amplitude, empilhamento subparalelo, boa
junto de dados sı́smicos de re lexã o e infor‑ continuidade lateral, e com macroformas em
maçõ es de alguns poços, fornecidos pela cunhas, limitadas por falhas antité ticas ao
Agê ncia Nacional de Petró leo, Gá s Natural e mergulho da bacia. Tais falhas antité ticas sã o
Biocombustı́veis (ANP), aqui é apresentado identi icadas em diversas linhas dip e corres‑
um mapeamento sismoestratigrá ico da Ba‑ pondem à fase de fragmentaçã o crustal du‑
cia de Pelotas. Tal produto prové m da aná lise rante o rifteamento (Fontana, 1990). O
de 17 linhas sı́smicas (11 dip e 6 strike, com aumento da espessura das cunhas contra es‑
um total de mais de 5.000 km de extensã o) e sas estruturas sugere deposiçã o vulcano‑se‑
do mapeamento sistemá tico de re letores dimentar concomitante ao tectonismo e ao
sı́smicos a partir de suas terminaçõ es e do desenvolvimento de meio‑grabens. A suces‑
mé todo loop‑tie (e.g. Payton, 1977; Catunea‑ sã o Sin‑rifte é limitada, no topo, pelo trunca‑
nu, 2006), realizados com o software Pe‑ mento dos re letores em uma superfı́cie
trel® 2017, da Schlumberger. As unidades erosiva. Por im, a sucessã o Pó s‑rifte repre‑
sı́smicas aqui discriminadas sã o baseadas senta a maior parte do preenchimento da
nos trabalhos de ANP/UFRGS (2008) e de Bacia de Pelotas. Essa sucessã o se empilha
Contreras et al. (2010). Ambos os estudos acima da superfı́cie erosiva e conté m diver‑
concordam amplamente sobre quais re leto‑ sas superfı́cies‑chave, de forma que a suces‑
res delimitam as unidades sı́smicas da bacia, sã o Pó s‑rifte foi subdividida em 11 unidades
todavia apresentam diferenças quanto à sı́smicas (Figs. 2‑3).
quantidade de unidades sı́smicas e a seus in‑ Cada unidade sı́smica é limitada, no
tervalos de tempo. As maiores discrepâ ncias topo, por uma superfı́cie produto de varia‑
correspondem ao intervalo entre o Cretá ceo çõ es no nı́vel de base, um limite de sequê n‑
Superior e o Eoceno, aqui reunido numa uni‑ cia, associado a tectonismo na bacia e/ou a
dade sı́smica, perı́odo no qual o registro se‑ variaçõ es glacioeustá ticas globais. De manei‑
dimentar apresenta hiatos e os re letores ra geral e, principalmente, nas porçõ es mais
sı́smicos descontinuidades laterais, o que di‑ proximais da bacia, essas superfı́cies trun‑
iculta seu mapeamento. cam os re letores da unidade abaixo, devido
Trê s sucessõ es sı́smicas principais a processos erosivos, enquanto a unidade
foram discriminadas para a Bacia de Pelotas: acima, desenvolvida posteriormente, apre‑
Pré , Sin e Pó s‑rifte (Fig. 3). A sucessã o Pré ‑ senta re letores com padrã o de onlap na su‑
rifte inclui re letores de geometria caó tica, perfı́cie nas porçõ es proximais e de downlap
que representam o embasamento da bacia. A nas regiõ es mais distais. As unidades sı́smi‑
superfı́cie‑topo dessa sucessã o é ambı́gua, cas aqui utilizadas sã o:
devido à continuidade da natureza de parte 1. SU1: representa a transiçã o entre
dos depó sitos Pré e Sin‑rifte na bacia, ambos os está gios Sin e Pó s‑rifte. Durante esse pe‑
marcados por depó sitos vulcâ nicos das for‑ rı́odo o vulcanismo diminuiu e o aporte sedi‑
maçõ es Serra Geral (Bacia do Paraná ) e Im‑ mentar aumentou, de forma que a SU1
bituba (Bacia de Pelotas). A sucessã o incorpora as rochas vulcâ nicas da Formaçã o
Sin‑rifte engloba os SDRs da Formaçã o Imbi‑ Curumim, possı́veis depó sitos siliciclá sticos
tuba e os depó sitos siliciclá sticos da Forma‑ da Formaçã o Cassino, e os limitados evapori‑
408 Edição da Sociedade Brasileira de Geologia – Núcleo RS/SC
Machado et al.

Figura 3 ‒ Linha sı́smica dip da parte central da Bacia de Pelotas (linha branca no mapa superior direito). No
topo, as trê s sucessõ es sı́smicas principais sã o discriminadas. Abaixo, linhas coloridas representam a
superfı́cie‑topo de cada unidade sı́smica (SU#). També m é possı́vel observar os re letores sı́smicos no padrã o
seaward‑dipping re lectors (SDR), caracterı́sticos do vulcanismo sin‑rifte na bacia.

tos da Formaçã o Ariri. Os re letores dessa ambiente mais profundo e com maior aporte
unidade apresentam boa continuidade late‑ clá stico;
ral, geralmente com alta amplitude na base 3. SU3: esta e as unidades sı́smicas
da unidade, e gradando a re letores com me‑ seguintes correspondem à s formaçõ es Imbé
nor amplitude acima; e Cidreira, ambas caracterizadas por depó si‑
2. SU2: compreende os depó sitos tos siliciclá sticos de grã os inos a mé dios, e
carboná ticos e siliciclá sticos das formaçõ es que preenchem a maior parte da bacia. Os
Tramandaı́, Porto Belo e Atlâ ntida. Estas re‑ horizontes sı́smicos que limitam esta e as
presentam um ambiente de á guas rasas, fa‑ unidades seguintes correspondem a superfı́‑
vorá vel à precipitaçã o carboná tica, que foi cies regressivas, associadas a ciclos de subi‑
gradualmente afogado durante uma trans‑ da e de descida do nı́vel de base. Os
gressã o marinha. Os re letores desta unida‑ re letores da SU3 apresentam mé dias a bai‑
de exibem uma variaçã o vertical e, xas amplitude e frequê ncia, paralelismo ou
geralmente, os mais basais tê m alta amplitu‑ pequenas ondulaçõ es, boa continuidade la‑
de, baixa frequê ncia e boa continuidade late‑ teral, e um padrã o de onlap na parte proxi‑
ral, e gradam, mais para o topo da unidade, mal da bacia;
para re letores de menor amplitude, mas de 4. SU4: a base desta unidade é mar‑
continuidade lateral similar. Essa variaçã o é cada por um re letor bem de inido, de alta
decorrente, provavelmente, da mudança de amplitude, um horizonte contı́nuo por quase
uma plataforma carboná tica rasa para um toda a á rea mapeada. Na porçã o proximal da

Sismoestratigra ia e evolução da Bacia de Pelotas 409


Contribuições à Geologia do Rio Grande do Sul e de Santa Catarina

bacia, os re letores acima dessa superfı́cie 10. SU10: unidade pouco espessa,
apresentam um padrã o de onlap nesse hori‑ apresenta re letores subparalelos com boa
zonte, enquanto que, na porçã o distal, a SU4 continuidade lateral. Na regiã o proximal e
apresenta menor espessura e re letores pa‑ junto ao talude as terminaçõ es dos re letores
ralelos, com baixa amplitude. Esta unidade tendem a ser em downlap, enquanto que, nas
tende a ser mais espessa no talude; porçõ es distais, os re letores exibem baixa
5. SU5: na parte proximal, os re leto‑ amplitude e boa continuidade lateral;
res desta unidade apresentam padrã o de on‑ 11. SU11: unidade sı́smica de topo
lap na superfı́cie abaixo, enquanto que da Bacia de Pelotas, caracterizada por re le‑
donwlaps foram identi icados junto ao talude. tores com alta frequê ncia, com baixa ampli‑
Os re letores da SU5 apresentam alta ampli‑ tude e boa continuidade lateral, frequente‑
tude na regiã o proximal da bacia, os quais mente afetados por falhas. Terminaçõ es em
gradam para amplitudes mais baixas na re‑ downlap sã o comuns na regiã o proximal e no
giã o distal, profunda; talude, enquanto re letores paralelos predo‑
6. SU6: apresenta re letores de baixa minam na regiã o distal. A SU11 també m é
a mé dia amplitude, ondulados, e, na regiã o afetada pela duplicaçã o do re letor de fundo
distal, mais retos e contı́nuos lateralmente. oceâ nico (sea‑bottom simulator re letctor),
Na regiã o proximal os re letores apresentam indicativo da presença de hidratos de gá s na
terminaçõ es com padrã o onlap; parte rasa da bacia (e.g. Miller et al., 2015).
7. SU7: unidade sı́smica menos es‑ Dois altos batimé tricos se destacam
pessa da bacia, possivelmente parcialmente na á rea mapeada da Bacia de Pelotas: o Ter‑
removida em um evento erosivo regional. Os raço de Rio Grande, ao norte, e o Cone de Rio
re letores da SU7 apresentam mé dia a alta de Grande, ao sul (Fig. 1 e Fig. 4). O Terraço
amplitude, sendo principalmente ondulados, de Rio Grande já representava um alto do
com boa continuidade lateral, e exibem pa‑ embasamento nos está gios iniciais de evolu‑
drã o de onlap na regiã o proximal; çã o da bacia (ANP/UFRGS, 2008). O poço
8. SU8: unidade de pouca espessura, BPS6, perfurado no Terraço de Rio Grande,
caracterizada por re letores de mé dia ampli‑ alcançou rochas vulcâ nicas da Formaçã o Im‑
tude, paralelos na regiã o proximal, mais on‑ bituba (Sin‑rifte), a uma profundidade de
dulados junto ao talude, e, novamente, 5.368 metros, sem de inir o limite entre essa
paralelos na regiã o distal da bacia, em que a formaçã o e o embasamento abaixo, inferido
amplitude dos re letores també m diminui. A també m como sendo composto de rochas
SU8 apresenta grande espessura na regiã o do vulcâ nicas da Formaçã o Serra Geral (Bacia
Cone de Rio Grande; do Paraná ). Outrossim, o limite entre as su‑
9. SU9: caracterizada por re letores cessõ es Pré e Sin‑rifte é de difı́cil diferencia‑
com padrã o de onlap na porçã o mais proxi‑ çã o nas imagens sı́smicas da á rea. Em linha
mal da bacia e de downlap na regiã o pró xima sı́smica strike (Fig. 4), pode‑se observar que
ao talude. No topo da unidade, os re letores, os re letores sob o Terraço de Rio Grande
por vezes, aparentam terminaçõ es of lap. Na apresentam um comportamento dominante‑
regiã o proximal, os re letores possuem alta mente caó tico, com alguns pacotes de re le‑
frequê ncia, amplitude mé dia a alta e sua con‑ tores subparalelos nas bordas norte e sul do
tinuidade lateral é afetada por falhas; na par‑ alto do embasamento, por vezes com mergu‑
te distal, os re letores apresentam baixa lho aparente para longe deste alto e limita‑
amplitude e continuidade lateral, por vezes dos por falhas. Esses pacotes podem
até padrã o caó tico; corresponder a intrusõ es do tipo sill no em‑

410 Edição da Sociedade Brasileira de Geologia – Núcleo RS/SC


Machado et al.

basamento ou a SDRs, formados durante a Cone de Rio Grande (Schattner et al., 2019),
abertura do Oceano Atlâ ntico. A sucessã o de forma que a rá pida acumulaçã o sedimen‑
Pó s‑rifte, depositada acima, tende a apresen‑ tar causaria instabilidade dos pacotes e co‑
tar pouca espessura no Terraço de Rio Gran‑ lapsos gravitacionais (Beglinger et al., 2012),
de, se comparada com outras regiõ es da resultando, assim, nos padrõ es caó ticos e na
bacia, e há indı́cios de erosã o de parte das baixa continuidade lateral dos re letores sı́s‑
unidades sı́smicas na porçã o sul deste terra‑ micos.
ço. De maneira oposta, no extremo sul da O mapeamento sistemá tico dessas
á rea mapeada, o Cone de Rio Grande repre‑ unidades nas linhas sı́smicas 2D, expandido
senta um alto batimé trico formado pela acu‑ em toda á rea atravé s do mé todo loop‑tie, e in‑
mulaçã o de sedimentos da sucessã o terpolado no espaço entre as linhas com au‑
Pó s‑rifte. De maneira geral, as unidades sı́s‑ xı́lio computacional, permite a criaçã o de
micas tendem a ser mais espessas no Cone, mapas de topo para cada unidade sı́smica.
com re letores de continuidade mé dia a boa Como as linhas sı́smicas possuem seu eixo
na parte mais basal (SU1 a SU4), gradando vertical em unidade de tempo (ms), esses
para o topo para padrõ es caó ticos e de baixa mapas sã o gerados em medida de tempo até
continuidade lateral. Em especial as unidades a superfı́cie em questã o. Contudo, a partir de
sı́smicas SU7 a SU11, acumuladas desde o i‑ modelos de velocidade das ondas sı́smicas
nal do Oligoceno, apresentam considerá vel em subsuperfı́cie, é possı́vel converter tais
espessura e re letores pouco contı́nuos. Esti‑ mapas de tempo para distâ ncia (profundida‑
ma‑se que desde o Mioceno mé dio mais de 1 de). Aqui utilizamos a relaçã o tempo‑profun‑
km vertical de sedimentos se acumularam no didade obtida a partir da aná lise de logs

Figura 4 ‒ Painel com linhas sı́smicas representativas da Bacia de Pelotas (linhas brancas no mapa inferior
direito). No topo, linha sı́smica strike que abrange o Cone de Rio Grande e o Terraço de Rio Grande, em que se
observa a variabilidade da espessura das sucessõ es sı́smicas pré , sin e pó s‑rifte. Na esquerda, detalhes de
ambos os altos batimé tricos, nos quais se observa o espesso pacote sedimentar correspondente ao Cone de Rio
Grande (A), e o Terraço de Rio Grande (B), onde as unidades sı́smicas sedimentares sã o delgadas e o
embasamento representa um alto topográ ico. Na direita, linha dip que cruza o Cone de Rio Grande, em que se
observa duas quebras na declividade.

Sismoestratigra ia e evolução da Bacia de Pelotas 411


Contribuições à Geologia do Rio Grande do Sul e de Santa Catarina

Figura 5 ‒ Conjunto de mapas que mostram a profundidade de topo de superfı́cie de cada unidade sı́smica
mapeada, com linhas de contorno a cada 500 metros. Apó s o abrangente vulcanismo associado ao rifteamento,

412 Edição da Sociedade Brasileira de Geologia – Núcleo RS/SC


Machado et al.

as unidades sı́smicas SU1 a SU11 gradualmente cobrem a á rea mapeada e ilustram o avanço do talude em
direçã o a á guas profundas. Destaca‑se a proeminê ncia topográ ica do Terraço de Torres nos está gios iniciais de
desenvolvimento da bacia e o avanço do Cone de Rio Grande nos está gios inais, especialmente a partir da SU7.

sô nicos dos poços offshore, para, entã o, gerar quando o resfriamento e a subsidê ncia da li‑
mapas de profundidade para cada superfı́cie tosfera oceâ nica causaram uma elevaçã o do
(Fig. 5). Apesar de nã o ser ideal, a conversã o nı́vel de base, ampliando o espaço de acomo‑
de dados sô nicos permite uma boa aproxima‑ daçã o na bacia (Contreras et al., 2010). Asla‑
çã o nas estimativas de profundidade e de es‑ nian et al. (2009) sugerem, para as bacias do
pessura de cada unidade sı́smica, e os sudeste brasileiro, que o manto se movia rá ‑
resultados aqui apresentados sã o compatı́‑ pida e horizontalmente durante a ruptura
veis com os de outros estudos na bacia (e.g. continental, o que favoreceria um colapso
Bueno et al., 2007; ANP/UFRGS, 2008; Con‑ quase vertical de parte das bacias nos está gi‑
treras et al., 2010). E recomendado que, para os iniciais pó s‑rifte. Apó s o volumoso mag‑
cá lculos de profundidade e de espessura mais matismo da fase rifte, ocorreu a deposiçã o de
re inados, outros mé todos de conversã o tem‑ carbonatos de plataforma rasa, seguida do
po‑profundidade sejam aplicados, utilizando, gradual aprofundamento da bacia. Com o
por exemplo, dados de check‑shot de poço, e progressivo aumento na entrada de sedimen‑
que os mapas aqui apresentados sejam em‑ tos terrı́genos continentais e com a concomi‑
pregues com diligê ncia e como referê ncia pa‑ tante elevaçã o do nı́vel de base, ocorreram a
ra estudos mais detalhados na bacia. agradaçã o e a retrogradaçã o dos depó sitos
sedimentares na bacia (ANP/UFRGS, 2008;
5 EVOLUÇÃO DEPOSICIONAL Schattner et al., 2019). A taxa de subsidê ncia
diminuiu durante o inal do Cretá ceo (Con‑
A partir dos mapas de topo, pode‑se treras et al., 2010), mas foi acompanhada por
estimar a espessura de cada unidade sı́smica uma elevaçã o global no nı́vel do mar (Haq et
(espessura entre duas superfı́cies‑topo) e sua al., 1987), com a transgressã o da linha de
variaçã o na á rea mapeada. Dessa forma, os costa, o que manteve a criaçã o de espaço de
mapas de espessura (mapas de isó pacas) acomodaçã o e o padrã o agradacional/retro‑
permitem inferir as variaçõ es espaciais e gradacional dos pacotes sedimentares até o
temporais dos depocentros de uma bacia, Paleoceno (Barboza et al., 2008). A partir do
alé m de indicar locais de nã o‑deposiçã o e/ou Eoceno, a taxa de subsidê ncia voltou a au‑
de erosã o durante um evento de queda do nı́‑ mentar, juntamente com uma gradual queda
vel de base. Ainda que os mapas de topo das do nı́vel do mar, o que causou a regressã o da
unidades sı́smicas da Bacia de Pelotas apre‑ linha de costa e a transiçã o dos pacotes sedi‑
sentem superfı́cies bastante uniformes (Fig. mentares de padrõ es agradacionais para pro‑
5), os mapas de isó pacas de cada unidade evi‑ gradacionais (ANP/UFRGS, 2008; Barboza et
denciam a variabilidade espaço‑temporal da al., 2008; Contreras et al., 2010; Schattner et
espessura sedimentar e dos depocentros na al., 2019). Essa histó ria deposicional da Bacia
á rea mapeada (Fig. 6). A maior espessura vul‑ de Pelotas foi afetada por variaçõ es de alta
cano‑sedimentar acumulada na bacia corres‑ frequê ncia no nı́vel de base, responsá veis pe‑
ponde à regiã o do Cone de Rio Grande, em la formaçã o dos limites de sequê ncia que ba‑
que mais de 7.500 metros da coluna estrati‑ lizam as unidades sı́smicas.
grá ica estã o preservados. Os pacotes sedimentares preserva‑
A transiçã o entre as fases rifte e drifte dos na Bacia de Pelotas, aqui mapeados como
na Bacia de Pelotas ocorreu no Aptiano, unidades sı́smicas, podem ter seus volumes
Sismoestratigra ia e evolução da Bacia de Pelotas 413
Contribuições à Geologia do Rio Grande do Sul e de Santa Catarina

estimados a partir dos mapas de isó pacas. Bacia de Pelotas em direçã o ao sul. A taxa de
Essa estimativa permite inferir volumes e ta‑ sedimentaçã o apresenta diminuiçã o entre
xas de aporte sedimentar na bacia durante o SU7 e SU10 (Oligoceno a Mioceno), com de‑
seu desenvolvimento. Todavia, para cá lculos pocentros principais na regiã o do Cone de
precisos do volume sedimentar de cada uni‑ Rio Grande. O mapeamento dessas unidades
dade, é necessá rio considerar o volume ocu‑ sugere a migraçã o lateral de macroformas
pado pela porosidade, o tipo de sedimento (como deltas) na á rea do Cone, algo a ser ca‑
acumulado, e suas variaçõ es com a profundi‑ racterizado em estudos de detalhe. Destaca‑
dade. Dessa forma, para estimar valores mı́‑ se a unidade SU9, depositada no Mioceno
nimos e má ximos de volume de cada unidade mé dio, que representa um pico de aporte se‑
sı́smica, foram utilizadas as informaçõ es lito‑ dimentar, ligado ao avanço do Cone bacia
ló gicas do poço BPS6 (Fig. 1) e as curvas de adentro. Por im, a unidade SU11 també m
porosidade contra profundidade para rochas apresenta alta taxa de sedimentaçã o, com
carboná ticas e para folhelhos de Allen & Al‑ acú mulo de sedimentos na regiã o do talude
len (2013). Esses parâ metros combinados e em partes mais profundas da bacia. Há in‑
permitem cá lculos semi‑qualitativos dos vo‑ dı́cios de um suave soerguimento epirogê ni‑
lumes e das taxas de sedimentaçã o na bacia co da margem continental nos ú ltimos
(Tab. 1), que podem fomentar estudos futu‑ milhõ es de anos (Carreñ o et al., 1999; Ma‑
ros sobre a evoluçã o deposicional. Conside‑ chado et al., 2019, 2021), o que poderia ter
rando a ampla á rea da bacia e a limitaçã o dos contribuı́do para um maior aporte sedimen‑
dados aqui utilizados, sugere‑se o uso de da‑ tar na bacia. Todavia, a resoluçã o temporal
dos de poço adicionais para a obtençã o de re‑ dos dados de soerguimento da margem e de
sultados mais robustos. De qualquer forma, deposiçã o sedimentar na bacia nã o permite
os presentes resultados fornecem um pano‑ uma correlaçã o precisa.
rama sobre o aporte e a taxa de acumulaçã o
sedimentar mı́nima (m3/Ma) na Bacia de Pe‑ 6 CONSIDERAÇÕES FINAIS
lotas, em especial durante o Cenozoico, era
geoló gica mais bem detalhada na bacia. Apó s Em sı́ntese, a Bacia de Pelotas é uma
a deposiçã o da unidade transicional SU1, in‑ bacia de margem passiva, desenvolvida a
terpretada como de natureza essencialmente partir da abertura do Oceano Atlâ ntico des‑
ı́gnea, ocorre a deposiçã o, em taxas menores, de o Cretá ceo. Sua coluna estratigrá ica é do‑
da unidade SU2, caracterizada por depó sitos minada por rochas de granulometria ina,
carboná ticos e siliciclá sticos formados em como folhelhos e pelitos, mas seu está gio
um ambiente de á guas rasas (Ceolin et al., inicial compreende rochas vulcâ nicas e car‑
2011). A abrangente e complexa SU3 apre‑ boná ticas. Devido à ausê ncia de extensos
senta taxas de sedimentaçã o relativamente depó sitos evaporı́ticos, a bacia nã o apresen‑
baixas, todavia essa unidade incorpora even‑ ta estruturas geradas por halocinese e seus
tos erosivos pervasivos que removeram parte re letores sı́smicos tendem a apresentar boa
dos sedimentos depositados, de forma que se continuidade lateral por toda a bacia. O es‑
faz necessá ria uma investigaçã o em detalhe pesso pacote sedimentar, caracterizado por
dos depó sitos formados entre o Cretá ceo Su‑ rochas inas e por ocasionais camadas de
perior e o Paleogeno. As unidades SU4 a SU6 arenitos, pode favorecer à formaçã o de tra‑
(Eoceno a Oligoceno) sã o caracterizadas por pas estratigrá icas para hidrocarbonetos.
altas taxas de sedimentaçã o e por uma pro‑ Todavia, uma caracterizaçã o mais re inada
gressiva migraçã o do depocentro principal da da sequê ncia deposicional da Bacia de Pelo‑

414 Edição da Sociedade Brasileira de Geologia – Núcleo RS/SC


Machado et al.

Figura 6 ‒ Conjunto de mapas de isó pacas (mapas de espessura) da Bacia de Pelotas, com linhas de contorno a
cada 500 metros no mapa de espessura total e a cada 100 metros nos demais. O mapa de espessura total indica

Sismoestratigra ia e evolução da Bacia de Pelotas 415


416
Tabela 1 ‒ Estimativas da extensã o de cada unidade sı́smica mapeada na Bacia de Pelotas. Area e volume total das unidades foram
obtidos a partir do mapeamento sistemá tico das linhas sı́smicas observadas na Figura 1. O volume total considera cada unidade como um
volume só lido, sem descontar a porosidade. A profundidade para cada unidade sı́smica é baseada nas informaçõ es do poço BPS6.
Estimativas de porosidades mı́nima e má xima, para as litologias de cada unidade, foram obtidas a partir de Allen & Allen (2013), de
forma que os volumes mı́nimos e má ximos das unidades se referem apenas aos sedimentos, descontada a porosidade inferida. O
intervalo de tempo de cada unidade sı́smica é aproximado, visto a baixa resoluçã o temporal dos pacotes vulcano‑sedimentares. Valores
aqui apresentados devem ser usados como referê ncia para estudos mais detalhados na bacia.

tas é essencial para aperfeiçoar a compreen‑

Ocidental, assim como para melhor avaliar


sã o da geodinâ mica de ruptura do Gondwana
nos está gios mais recentes de desenvolvimento da bacia.
Contribuições à Geologia do Rio Grande do Sul e de Santa Catarina

Edição da Sociedade Brasileira de Geologia – Núcleo RS/SC


energé ticos.
hipó teses de exploraçã o de seus recursos
apresenta a menor espessura de depó sitos pó s‑rifte. Destaca‑se o depocentro na regiã o do Cone de Rio Grande
7.500 metros da coluna estratigrá ica estã o preservados, enquanto a regiã o do Terraço de Rio Grande
que o maior pacote vulcano‑sedimentar da bacia se encontra na regiã o do Cone de Rio Grande, onde mais de
Machado et al.

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418 Edição da Sociedade Brasileira de Geologia – Núcleo RS/SC


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Sismoestratigra ia e evolução da Bacia de Pelotas 419


Contribuições palinológicas
para a estratigra ia da porção brasileira
da Bacia de Pelotas
Paulo Alves de Souza1,2*, Wagner Guimarã es da Silva1, Eduardo Premaor1, Tiago Vier Fischer1,
Renato Backes Macedo1, Rodrigo Rodrigues Cancelli1, Lidia Aumond Kuhn1,2

1
Instituto de Geociê ncias, Universidade Federal do Rio Grande do Sul
2
Programa de Pó s‑graduaçã o em Geociê ncias, Universidade Federal do Rio Grande do Sul

*autor correspondente: paulo.alves.souza@ufrgs.br

1 INTRODUÇÃO
Microfó sseis tê m sido amplamente utilizados como ferramentas estratigrá icas nas baci‑
as sedimentares brasileiras. Com relaçã o à queles de parede orgâ nica (palinomorfos), as contri‑
buiçõ es de Regali et al. (1974a, 1974b), baseadas essencialmente na sucessã o de esporos e de
grã os de pó len para todas as bacias da margem costeira, excetuando a Bacia de Pelotas (BP),
constituem um marco pioneiro para o arcabouço bioestratigrá ico dos depó sitos mesozoicos e
cenozoicos do paı́s. Somente nas ú ltimas duas dé cadas, os dados sobre os palinomorfos da seçã o
pré ‑quaterná ria desta bacia foram progressivamente revelados, a partir da descriçã o e das aná li‑
ses bioestratigrá ica e paleoambiental das seçõ es atravessadas por poços profundos, perfurados
pela Petrobras. Por outro lado, a seçã o quaterná ria é conhecida, em termos palinoló gicos, por
meio de perfuraçõ es rasas na á rea emersa da bacia, com trabalhos, versando sobre as dinâ micas
da sedimentaçã o costeira e da evoluçã o da vegetaçã o nesta porçã o do continente, com maior
concentraçã o de estudos no Rio Grande do Sul (RS). Anjos‑Zerfass et al. (2008) realizaram a
mais recente sı́ntese sobre a importâ ncia bioestratigrá ica de determinados microfó sseis ocor‑
rentes na BP. De forma complementar, este trabalho objetiva apresentar uma sı́ntese das contri‑
buiçõ es palinoló gicas disponı́veis para a bacia, enfatizando: (i) a variedade dos palinomorfos
registrados e os signi icados (ii) biocronoestratigrá ico e (iii) paleoambiental das associaçõ es.
Contribuições à Geologia do Rio Grande do Sul e de Santa Catarina

2 CONTEXTO GEOLÓGICO E AMOSTRA‑ perfuraçõ es realizadas na porçã o emersa se‑


GEM PALINOLÓGICA ja restrita a depó sitos de idade entre o Pleis‑
toceno e o Holoceno, poços mais profundos
A porçã o brasileira da BP abrange tê m alcançado idades miocê nicas, datadas
á reas do RS e de SC, extremo sul do paı́s, por mé todos micropaleontoló gicos, confor‑
aproximadamente entre os paralelos 28oS e me sintetizado em Anjos‑Zerfass et al.
34oS. Como um todo, a bacia se limita, a nor‑ (2008).
te, com a Bacia de Santos, e se estende, em Na Figura 1 é apresentada a locali‑
territó rio uruguaio, até sua fronteira sul, zaçã o dos poços sobre os quais há informa‑
com a Cuenca de Punta del Este no Cabo de çõ es palinoló gicas publicadas, incluindo as
Polô nio. Em superfı́cie, confronta‑se com o perfuraçõ es profundas na porçã o offshore e
embasamento cristalino do RS, em que do‑ as perfuraçõ es rasas onshore. O detalhamen‑
minam granitoides e cinturõ es paleoprote‑ to geográ ico e os resultados geocronoló gi‑
rozoicos metamor izados, alé m de algumas cos de cada sı́tio constam na Tabela 1.
unidades pertencentes à Bacia do Paraná . A
origem e a evoluçã o desta bacia estã o inti‑
3 PALINOMORFOS
mamente relacionadas ao rifteamento do
Gondwana e à abertura e evoluçã o do Ocea‑ De modo geral, esporos, grã os de
no Atlâ ntico, resultando em um preenchi‑ pó len e dino lagelados (protistas aquá ticos,
mento sedimentar‑magmá tico, que pode principalmente, marinhos) sã o os palino‑
chegar a cerca de 8 km de espessura, de ida‑ morfos comumente registrados nas bacias
des entre o Cretá ceo e o Holoceno, distribuı́‑ sedimentares mesozoicas e cenozoicas bra‑
do em uma á rea de aproximadamente sileiras. Esporos e hifas de fungos, palinofo‑
210.000 km2. O detalhamento estratigrá ico raminı́feros, cistos de algas das classes
mais completo da bacia foi apresentado em Prasinophyceae, Chlorophyceae e Zygne‑
Gonçalves et al. (1979), em Dias et al. (1994) maphyceae també m podem ser encontrados,
e em Fontana (1996), com base em dados li‑ bem como acritarcos (vesı́culas de a inidade
toestratigrá icos, de estratigra ia de sequê n‑ bioló gica incerta), representantes do micro‑
cias e de sismoestratigra ia, respectiva‑ plâ ncton, ovos de copé podes, escolecodon‑
mente. De acordo com a carta estratigrá ica tes e tintinomorfos (assemelhados a restos
mais recente para a bacia (Bueno et al., orgâ nicos de protistas tintinı́deos), geral‑
2007), os depó sitos basais correspondem à s mente, em quantidades subordinadas. A se‑
supersequê ncias Rifte e Pó s‑Rifte (Cretá ceo guir, serã o apresentadas as principais
Inferior). A Supersequê ncia Drifte é a mais contribuiçõ es palinoló gicas para a BP, de
expressiva, em termos de representaçã o vo‑ acordo com os grupos de palinomorfos re‑
lumé trica, incluindo complexa heterogenei‑ gistrados.
dade de fá cies, distribuı́das entre o Albiano
e o Recente. A porçã o emersa da bacia é ca‑
3. 1 Grãos de pólen e esporos
peada por depó sitos continentais litorâ neos,
em que se destaca o registro de, pelo menos, Os dados mais robustos, registrados
quatro sistemas laguna‑barreiras, decorren‑ até o momento, sobre esporomorfos foram
tes de fases transgressivo‑regressivas, ao apresentados por Premaor (2016), envol‑
longo dos ú ltimos 400 ka (Villwock et al., vendo espesso pacote estratigrá ico do Albi‑
1986; Villwock & Tomazelli, 1995; Tomazelli ano ao Plioceno, ampliando os dados
& Villwock, 2000). Embora a maioria das apresentados por Premaor et al. (2010), por

422 Edição da Sociedade Brasileira de Geologia – Núcleo RS/SC


Souza et al.

Figura 1 ‒ Localizaçã o da á rea de abrangê ncia da Bacia de Pelotas e dos sı́tios amostrados, com informaçõ es
palinoló gicas. Pontos representados por cı́rculos: ocorrê ncias quaterná rias; por triâ ngulos: ocorrê ncias pré ‑
quaterná rias (detalhamento na Tabela 1).

Silva et al. (2011, 2015) e por Fischer et al. tos do Cretá ceo. Para o Paleoceno e para o
(2013). A partir da aná lise de 535 nı́veis dos Eoceno, sã o constatadas baixa frequê ncia e
poços BP‑01 e BP‑02, Premaor (2016) iden‑ riqueza, com registros dos gê neros angio‑
ti icou 91 tá xons de esporos e de grã os de pé rmicos Ulmoideipites, Tricolpites, Retitri‑
pó len, incluindo cinco, relativos a brió itas, colporites e Scabraperiporites, alé m de
27, a pteridó itas, 21, a gimnospermas e 38, Podocarpidites (Coniferophyta). A seçã o oli‑
a angiospermas. gocena é caracterizada por expressiva con‑
Durante o Cretá ceo, a associaçã o de tribuiçã o de elementos continentais e por
mió sporos é diversi icada, com destaque aos alta riqueza de grã os de pó len, destacando‑
gê neros Inaperturopollenites, Circulina, Clas‑ se os gê neros Ephedripites, Retitricolporites,
sopollis e Callialasporites, representantes da Podocarpidites e Tricolpites, enquanto grã os
lora gimnospé rmica, alé m de Exesipolleni‑ de pó len tricolporados e porados (Perisyn‑
tes, de Equisetosporites, de Gnetaceapolleni‑ colporites pokorny) e espé cimes dos gê neros
tes, de Steevesispollenites, de Anacolosidites e Scabraperiporites e Malvacipollis passam a
de Tricesticillus. Entre os esporos, destacam‑ apresentar maiores riqueza e frequê ncia. A
se os dos gê neros Cicatricosisporites, Interu‑ recuperaçã o na riqueza e na frequê ncia, ob‑
lobites, Triporoletes e Foveosporites. O regis‑ servada nos registros de mió sporos, durante
tro de esporomorfos na seçã o paleogê nica o Oligoceno, se manté m, a partir do Neó ge‑
da bacia apresenta um decré scimo de repre‑ no. Para o Mioceno, os gê neros Podocarpidi‑
sentatividade, quando comparada aos estra‑ tes, Retitricolporites, Araucariacites,

Contribuições palinológicas para a estratigra ia da porção brasileira da Bacia de Pelotas 423


Contribuições à Geologia do Rio Grande do Sul e de Santa Catarina

Tricolpites, Ephedripites, Psilaperiporites, compara ao registro botâ nico dos tá xons
Echiperiporites e Echitricolporites sã o ex‑ modernos, conquanto há diversos processos
pressivos e, entre os esporos, destacam‑se tafonô micos, que resultam em uma enorme
os dos gê neros Verrucatosporites, Lycopo‑ perda de informaçã o ecoló gica.
diumsporites, Laevigatosporites e Polypodia‑
ceoisporites. A maioria dos tá xons do 3. 2 Fungos
neogê nicos se manté m nos depó sitos do Pli‑
oceno. Nas associaçõ es palinoló gicas pré ‑
A lora continental em seçõ es qua‑ quaterná rias, fungos dispersos estã o fre‑
terná rias é testemunhada, por meio de am‑ quentemente representados em alguns in‑
pla riqueza palinoló gica, em sua maioria, tervalos do Cretá ceo (Premaor et al., 2010),
relacionada à s angiospermas. As associaçõ es do Paleó geno (Fischer et al., 2013) e do
de grã os de pó len e de esporos nas amostras Neó geno (Silva et al., 2015). Entretanto, es‑
sedimentares, concomitantemente à presen‑ tes elementos ainda sã o pouco detalhados,
ça de outros elementos, revelam distintas i‑ do ponto de vista taxonô mico, e pratica‑
to isionomias, como, por exemplo, mente subutilizados, como marcadores bio‑
comunidades higró ilas e haló itas, campos e estratigrá icos. O trabalho mais relevante,
matas. As seguintes famı́lias sã o representa‑ envolvendo as ocorrê ncias destes organis‑
das: Amaranthaceae, Anacardiaceae, Apiace‑ mos na BP, foi realizado por Premaor et al.
ae, Aquifoliaceae, Apocynaceae, Arecaceae, (2018a), a partir de sedimentos marinhos
Asteraceae (subfamı́lias Asteroideae e Ci‑ miocê nicos dos poços BP‑01 e CBM001‑ST‑
chorioideae), Boraginaceae, Bignoniaceae, RS. Entre os 89 morfotipos de fungos docu‑
Bromeliaceae, Cannabaceae, Caryophyllace‑ mentados, destaca‑se a presença de diver‑
ae, Combretaceae, Convolvulaceae, Cucurbi‑ sos exemplares dos grupos Amerosporae,
taceae, Cunoniaceae, Cyperaceae, Didymosporae, Phragmosporae e Microthy‑
Droseraceae, Ericaceae, Eriocaulaceae, riales, alguns dos quais sã o utilizados como
Euphorbiaceae, Fabaceae, Gunneraceae, Iri‑ importantes fó sseis‑guia do Mioceno. A
daceae, Lamiaceae, Lentibulariaceae, Liliace‑ ocorrê ncia destes tá xons, em conjunto com
ae, Loranthaceae, Lythraceae, Malpighiaceae, esporos pteridó itos e com grã os de pó len,
Malvaceae, Melastomataceae, Meliaceae, tem auxiliado nas inferê ncias paleoambien‑
Moraceae, Myrtaceae, Onagraceae, Passi lo‑ tais, reforçando a hipó tese de condiçõ es de
raceae, Poaceae, Polygalaceae, Polygonaceae, umidade em climas nã o tropicais, durante o
Portulacaceae, Plantaginaceae, Primulaceae, Mioceno.
Proteaceae, Rhamnaceae, Rubiaceae, Sapin‑
daceae, Scrophulariaceae, Smilacaceae, 3. 3 Dino lagelados
Typhaceae, Thymelaeaceae, Urticaceae, Va‑
lerianaceae, Verbenaceae e Winteraceae (an‑ Cistos de dino lagelados tê m sido
giospermas); Ephedraceae e Podocarpaceae abundantemente documentados em seçõ es
(gimnospermas); Lycopodiaceae e Selaginel‑ pré ‑quaterná rias, principalmente, nos poços
lacea (licó itas): Osmundaceae, Blechnaceae, offshore. Na seçã o quaterná ria, ocorrem
Pteridaceae, Salviniaceae, Polypodiaceae, mais pontualmente em determinados inter‑
Cyatheaceae e Dryopteridaceae (moniló i‑ valos. Os registros mais antigos destes mi‑
tas); e Notothyladaceae e Sphagnaceae crofó sseis foram noticiados por Arai et al.
(brió itas). E importante ressaltar que a ri‑ (2006), os quais identi icaram assembleias
queza palinoló gica, aqui mencionada, nã o se palinoló gicas aptianas em um intervalo do

424 Edição da Sociedade Brasileira de Geologia – Núcleo RS/SC


Souza et al.

Tabela 1 ‒ Relaçã o dos sı́tios palinoló gicos na Bacia de Pelotas, localizados na Figura 1. Abreviaçõ es sobre a
geocronologia: A) Bioestratigra ia com foraminı́feros; B) Bioestratigra ia com palinomorfos; e C) Idades
radiomé tricas.

poço 2‑BPS‑6A. Posteriormente, novos acha‑ (2013) divulgaram associaçõ es paleocê nicas
dos foram realizados por Premaor et al. e eocê nicas dos mesmos poços. Estudos de
(2010) na seçã o cretá cea, datada entre o Al‑ natureza paleoambiental com esses palino‑
biano e o Campaniano, advindas dos poços morfos foram apresentados por Menezes
BP‑01 e BP‑02, enquanto Fischer et al. (2014) e por Menezes et al. (2016), para in‑

Contribuições palinológicas para a estratigra ia da porção brasileira da Bacia de Pelotas 425


Contribuições à Geologia do Rio Grande do Sul e de Santa Catarina

tervalos selecionados entre o Cretá ceo e o dos”. Em sedimentos marinhos da platafor‑


Neó geno. Associaçõ es miocê nicas, neogê nicas ma continental do RS (sı́tio 31 da Fig. 1), Gu
e neogê nicas‑pliocê nicas foram recuperadas et al. (2018) apresentaram uma lista mais
nos poços CBM001‑ST‑RS (Premaor et al., numerosa de tá xons cistos de dino lagela‑
2021), 2‑TG‑96‑RS (Silva et al., 2015) e 2‑CA‑ dos. Recentemente, Silva & Souza (2019)
1‑RS (Silva et al., 2011), respectivamente. aplicaram té cnicas de processamento dife‑
renciadas em amostras da Planı́cie Costeira
O estudo mais relevante sobre cistos
de SC, visando à recuperaçã o de cistos de di‑
de dino lagelados, em termos de abrangê ncia
no lagelados heterotró icos. Como resulta‑
estratigrá ica, é o de Premaor (2016), com
do, alé m dos gê neros comumente
base na distribuiçã o vertical das associaçõ es
registrados (Operculodinium e Spiniferites),
de cistos de dino lagelados recuperadas de
foram constatados, pela primeira vez para
535 nı́veis dos poços BP‑01 e BP‑02 em depó ‑
depó sitos da porçã o emersa da bacia, os tá ‑
sitos do Albiano ao Plioceno da porçã o offsho‑
xons Brigantedinium spp., Brigantedinium
re. Os resultados taxonô micos foram
simplex, Lejeunecysta spp., Slenopemphix
divulgados em Premaor et al. (2017, 2018b):
nephroides e Selenopemphix quanta.
entre os 214 tá xons reconhecidos, quatro sã o
referentes à Ordem Ptychodiscales, 139 sã o
pertencentes à Ordem Gonyaulacales e 76 3. 4 Palinoforaminíferos
compreendem à Ordem Peridiniales.
Embora geralmente subordinados,
Nas seçõ es quaterná rias da bacia, cis‑
quantitativamente, a outros palinomorfos,
tos de dino lagelados tê m sido frequente‑
palinoforaminı́feros tê m sido recuperados
mente identi icados, em conjunto com outros
com frequê ncia nas seçõ es cretá cea (Prema‑
elementos marinhos, representados por um
or et al., 2010; Premaor, 2016), paleó gena
nú mero reduzido de tá xons, geralmente, refe‑
(Fischer et al., 2013) e neó gena (Silva et al.,
ridos como Operculodinium spp., Operculodi‑
2011, 2015; Premaor et al., 2021). Depó sitos
nium centrocarpum, Spiniferites spp. e
quaterná rios, quando presentes, constituem
Spiniferites mirabilis. Alé m da baixa riqueza
elementos indicativos de in luê ncia mari‑
de gê neros identi icados, a representaçã o
nha, juntamente aos cistos de dino lagela‑
quantitativa de espé cimes, em relaçã o à as‑
dos e aos acritarcos. Esforços tê m sido
sembleia palinoló gica, també m é bastante re‑
realizados na comparaçã o morfoló gica de
duzida: ca. 5% das associaçõ es (e.g. Macedo
espé cies calcá rias, ocorrentes em associaçã o
et al., 2007; Kuhn et al., 2017). Nesses estu‑
com os palinoforaminı́feros, buscando mai‑
dos, a maior atençã o foi empregada na identi‑
or acurá cia nas suas identi icaçõ es, com re‑
icaçã o detalhada dos esporomorfos, a im de
sultados ainda iné ditos.
obter resultados sobre a dinâ mica da vegeta‑
çã o.
3. 5 Acritarcos
No trabalho desenvolvido na porçã o
mé dia do Cone do Rio Grande (Lorscheitter & Fischer et al. (2013) recuperaram
Romero, 1985) (sı́tio 3 da Fig. 1), em deter‑ acritarcos pertencentes à espé cie Baltispha‑
minadas amostras, cistos de dino lagelados eridium angulosum em associaçõ es, relacio‑
constituem, até , 99,8% da associaçã o, assig‑ nadas à passagem Cretá ceo‑Paleó geno
nados a Operculodinium centrocarpum e a Spi‑ (poço BP‑01), junto a cistos de dino lagela‑
niferites mirabilis; os demais foram referidos dos, a palinoforaminı́feros, a ovos de copé ‑
como “cistos de dino lagelados indetermina‑ podes e a grã os de pó len. Silva et al. (2011)

426 Edição da Sociedade Brasileira de Geologia – Núcleo RS/SC


Souza et al.

registraram acritarcos nã o determinados no 4 BIOESTRATIGRAFIA


topo de uma seçã o do poço 2‑CA‑1‑RS, posi‑
cionada entre o Plioceno e o Quaterná rio, em Anjos‑Zerfass et al. (2008) realiza‑
associaçã o com cistos de dino lagelados, com ram a revisã o mais completa sobre as pro‑
foraminı́feros e com ostracodes. Espé cimes postas de zoneamento bioestratigrá ico, com
atribuı́dos à Quadrina? condita foram consta‑ base em microfó sseis calcá rios (foraminı́fe‑
tados na base de uma seçã o miocê nica do ros, ostracodes, nanofó sseis) registrados da
poço 2‑TG‑96‑RS, juntamente com cistos de bacia. Contudo, até aquele momento, os da‑
dino lagelados e com foraminı́feros bentô ni‑ dos palinoló gicos correspondiam a estudos
cos e planctô nicos. Quadrina? condita tam‑ preliminares. Posteriormente, intervalos es‑
bé m foi documentada nos depó sitos pecı́ icos dos poços BP‑01, CBM‑001‑ST‑RS, 2‑
miocê nicos do poço CBM001‑ST‑RS por Pre‑ CA‑1‑RS e 2‑TG‑96‑RS foram detalhadamente
maor et al. (2021). Em seçõ es quaterná rias estudados, revelando associaçõ es palinoló gi‑
da bacia, o gê nero Michrystridium tem sido cas do Campaniano (Premaor et al., 2010), da
frequentemente recuperado, em nı́veis em passagem Cretá ceo‑Paleó geno (Fischer et al.,
que cistos de dino lagelados e de palinofora‑ 2013), do Mioceno (Premaor et al., 2021) e
minı́feros ocorrem, sempre associados a nı́‑ do Mioceno‑Plioceno (Silva et al., 2011,
veis com in luê ncia marinha (e.g. Cordeiro & 2015).
Lorcheitter, 1994; Medeanic et al., 2001). A contribuiçã o iné dita de Premaor
Kuhn et al. (2017) identi icaram dois espé ci‑ (2016) abordou um intervalo estratigrá ico
mes de acritarcos (Acritarco sp. 1 e Acritarco mais robusto, em termos de espessura e de
sp. 2) e formas atribuı́veis ao gê nero Mi‑ representaçã o temporal, incluindo amostras
crhystridium. As duas primeiras sã o compa‑ dos poços BP‑01 e BP‑02, de idades entre o
rá veis a ocorrê ncias na costa argentina, em Albiano e o Plioceno. Um total de 16 palino‑
nı́veis holocê nicos, com in luê ncia marinha. zonas foram discriminadas, com base nos nı́‑
veis de desaparecimento de tá xons de cistos
3. 6 Tintinomorfos de dino lagelados, calibradas pelas zonas de
nanofó sseis calcá rios (Gomide, 1989). A inte‑
A revisã o realizada por Silva et al. graçã o dos dados palinoestratigrá icos de tais
(2017) constitui o primeiro esforço de des‑ poços é materializada na Figura 2, com tenta‑
criçã o e de ilustraçã o detalhada deste grupo tivas de correlaçã o lateral, a partir do reco‑
na BP e, provavelmente, para a margem con‑ nhecimento de idades. O padrã o de
tinental brasileira, incluindo seis tipos mor‑ distribuiçã o estratigrá ica observado corro‑
foló gicos, originalmente propostos por Van bora dados anteriores de microfó sseis calcá ‑
Waveren (1994), com base em material do rios, com representaçã o de idades
Holoceno do Mar de Banda (Indoné sia). Os pré ‑miocê nicas, restritas aos poços offshore,
autores trazem comparaçõ es das formas po‑ mais profundos; associaçõ es miocê nicas a
sicionadas neste grupo com outras ocorrê n‑ pliocê nicas foram reconhecidas, de modo
cias do sul do Brasil, do sul da Amé rica do mais amplo, em toda a bacia.
Sul e de outras regiõ es do mundo. Ainda que
de forma subordinada, estes ocorrem na BP, 5 EVOLUÇÃO PALEOAMBIENTAL
junto a outros palinomorfos de natureza ma‑
A maior completitude dos dados pa‑
rinha, tais como cistos de dino lagelados, pa‑
linoló gicos pré ‑quaterná rios é advinda da
linoforaminı́feros, acritarcos e ovos de
aná lise dos poços BP‑01 e BP‑02. As associa‑
copé podes.

Contribuições palinológicas para a estratigra ia da porção brasileira da Bacia de Pelotas 427


Contribuições à Geologia do Rio Grande do Sul e de Santa Catarina

çõ es registradas sã o numerosas e diversi ica‑ nú mero de espé cies, em relaçã o aos do Eo‑
das, com o registro de representantes da pa‑ ceno. Um incremento signi icativo de espé ci‑
lino lora terrestre e de tá xons de natureza es de cistos de dino lagelados ocorre no
marinha. Cistos e dino lagelados, esporos Mioceno, enquanto esporomorfos sã o me‑
(brió itas e pteridó itas) e grã os de pó len se nos abundantes. Para o Pliocone, esporos e
destacam em frequê ncia e em nú mero de es‑ grã os de pó len apresentam caracterı́sticas
pé cies. Os dados apresentados na Figura 3 similares à quelas registradas para os do Mi‑
tê m base na riqueza de espé cies destes tá ‑ oceno, em nú mero de espé cies; já cistos de
xons nos poços supramencionados, nã o re‑ dino lagelados demonstram decré scimo sig‑
letindo, necessariamente, a participaçã o ni icativo.
relativa dos grupos. Para o Quaterná rio, os dados palino‑
De forma geral, as associaçõ es do ló gicos dos poços perfurados na porçã o
Cretá ceo Inferior apresentam baixa riqueza emersa da BP sã o mais robustos do que
especı́ ica, ao contrá rio dos conjuntos pali‑ aqueles, advindos dos poços offshore. Os tra‑
noló gicos veri icados no Cretá ceo Superior, balhos relacionados objetivaram o estudo
em cujos depó sitos é constatado aumento das oscilaçõ es do nı́vel relativo do mar, bem
signi icativo do nú mero de tá xons. No Cretá ‑ como variaçõ es climá ticas e dinâ micas de
ceo Superior, cistos de dino lagelados pas‑ distribuiçã o da vegetaçã o, a maioria dos
sam a ter maior representatividade de quais, com controle geocronoló gico de data‑
formas peridinioides e gonyaulacoides, seçã o çõ es radiocarbô nicas (Tabela 1). Na Figura
també m marcada por expressiva contribui‑ 4, é apresentada uma sı́ntese sobre os resul‑
çã o de elementos continentais. Nas associa‑ tados obtidos, enfatizando a in luê ncia mari‑
çõ es paleocê nicas, cistos de dino lagelados nha nos diversos sı́tios palinoló gicos,
de natureza mais cosmopolita foram veri i‑ denotada pelo reconhecimento de tá xons de
cados, tais como Palaeoperidinium pyropho‑ cistos de dino lagelados, de palinoforaminı́‑
rum, Cerodinium striatum, Trithyrodinium feros e de acritarcos. Para retratar os even‑
evittii, Eisenackia reticulata e Disphaerogena tos paleoambientais entre o Pleistoceno
carposphaeropsis. Esporos e grã os de pó len Superior e o Recente da bacia, quatro fases
mostram um decré scimo signi icativo da ri‑ sã o discriminadas aqui, com ê nfase no signi‑
queza de espé cies, representados, mais rara‑ icado das mudanças nos ecossistemas vege‑
mente, por Ulmoideipites krempii. tais. A distribuiçã o dos sı́tios em que
ocorrem é representada na Figura 5, na qual
Expressivo nú mero de elementos
os ambientes foram agrupados, a partir das
marinhos foi documentado nos intervalos
interpretaçõ es paleoambientais, advindas
eocê nicos, com tá xons de cará ter endê mico
dos trabalhos consultados, com registro de
de altas latitudes do Hemisfé rio Sul, tais co‑
tá xons da lora terrestre de distintos subam‑
mo Enneadocysta dictyostila, De landrea an‑
bientes (campo, banhado, turfeira, pâ ntano,
tarctica e Octodinium askiniae; esporomorfos
mata de restinga, mata paludosa, laguna, la‑
sã o menos numerosos, representados, mais
goa, lago e estuá rio) e de tá xons marcadores
localmente, por Clovifera triplex e por Ulmoi‑
de in luê ncia marinha (cistos de dino lagela‑
deipites krempii. Nos intervalos correspon‑
dos, acritarcos e palinoforaminı́feros).
dentes ao Oligoceno, ocorre um decré scimo
signi icativo de riqueza especı́ ica dos cistos Na Fase I (41.000‑11.000 anos AP),
de dino lagelados; esporos e grã os de pó len ocorre o domı́nio de formaçõ es campestres
apresentam tendê ncia de estabilidade em e raros tá xons, correspondentes à vegetaçã o
arbó reo‑arbustiva pioneira. Palinomorfos

428 Edição da Sociedade Brasileira de Geologia – Núcleo RS/SC


Souza et al.

Figura 2 ‒ Correlaçã o estratigrá ica dos poços, com informaçõ es palinoestratigrá icas disponı́veis para a seçã o
do Albiano ao Plioceno da Bacia de Pelotas (Silva et al., 2011, 2015; Premaor, 2016; Premaor et al., 2020).

Contribuições palinológicas para a estratigra ia da porção brasileira da Bacia de Pelotas 429


Contribuições à Geologia do Rio Grande do Sul e de Santa Catarina

Figura 3 ‒ Grá ico de riqueza dos tá xons de esporos, dos grã os de pó len e dos cistos de dino lagelados,
distribuı́dos nos poços BP‑01 e BP‑02, na porçã o offshore da Bacia de Pelotas (iné dito de Premaor, 2016).

marinhos (cistos de dino lagelados, palinofo‑ (sı́tios 5, 12, 13, 19 e 27). Na maioria dos sı́‑
raminı́feros e acritarcos) foram registrados tios (4, 6, 7, 9, 10, 11, 14, 15, 18, 23, 24, 26,
na base do testemunho do sı́tio 36 (ca. 28, 32, 33, 34, 35 e 37), a ingressã o marinha
41.000 anos AP). Na Fase II (11.000‑7.000 foi documentada, por meio do registro de
anos AP), a ito isionomia continua marcada cistos de dino lagelados, de acritarcos e de
pela vegetaçã o campestre, poré m a lora ar‑ palinoforaminı́feros. Na Fase IV (4.000 anos
bó reo‑arbustiva pioneira recrudesce, em res‑ AP‑Recente), concomitantemente ao evento
posta ao clima mais quente do Holoceno. regressivo marinho, registra‑se expansã o da
Neste contexto, a Mata Atlâ ntica migrou gra‑ Mata Atlâ ntica (de oeste para leste), con igu‑
dualmente da regiã o Sudeste para a regiã o rando as distintas ito isionomias arbó reo‑
Sul. Nessa fase, já é possı́vel identi icar os arbustivas nos campos litorâ neos, tais como
efeitos da ingressã o marinha sobre a planı́cie as matas de restinga psamó ilas e paludosas
costeira (sı́tios 9, 16, 35 e 37) (Fig. 4‑5). Na (e.g. Lorscheitter, 2003).
Fase III (7.000‑4.000 anos AP), a vegetaçã o Embora a transgressã o tenha sido
arbó reo‑arbustiva nos campos litorâ neos generalizada, alguns sı́tios palinoló gicos (5,
continua a se desenvolver, sobretudo, em 12, 13, 19, 27) nã o documentam a in luê ncia
á reas mais interiorizadas da planı́cie costeira marinha, o que pode ser resultante do grau

430 Edição da Sociedade Brasileira de Geologia – Núcleo RS/SC


Souza et al.

Figura 4 ‒ Fases ambientais reconhecidas nas perfuraçõ es, com informaçõ es palinoló gicas realizadas na
Planı́cie Costeira do Rio Grande do Sul (PCRS) e na Planı́cie Costeira de Santa Catarina (PCSC), em um transecto
sudoeste‑nordeste. As seçõ es hachuradas em azul indicam o registro da in luê ncia marinha nos sı́tios
(detalhamento dos sı́tios na Tabela 1).

de isolamento e da distâ ncia que os distintos 6 CONSIDERAÇÕES FINAIS


sı́tios deposicionais possuem, em relaçã o à li‑
nha de costa (Figs. 4 e 5). As evidê ncias pali‑ A revisã o do conhecimento palinoló ‑
noló gicas das oscilaçõ es marinhas estã o de gico da BP permite destacar alguns aspectos
acordo com os resultados de importantes relevantes, com relaçã o aos avanços e à s
trabalhos, que versam sobre a evoluçã o cos‑ perspectivas de estudos. O conhecimento pa‑
teira do paı́s (e.g. Tomazelli & Villwock, linoló gico da bacia foi expressivamente incre‑
1995; Angulo et al., 2006; Dillenburg et al., mentado nas ú ltimas duas dé cadas, advindo,
2009). exclusivamente, de perfuraçõ es, seja na por‑

Contribuições palinológicas para a estratigra ia da porção brasileira da Bacia de Pelotas 431


Contribuições à Geologia do Rio Grande do Sul e de Santa Catarina

Figura 5 ‒ Sı́tios palinoló gicos perfurados, ao longo da Planı́cie Costeira do Rio Grande do Sul e de Santa
Catarina, com ou sem registro de tá xons de in luê ncia marinha, organizados cronologicamente, conforme fases
apresentadas no texto: A) Fase I: 41.000‑11.000 anos AP; B) Fase II: 11.000‑7.000 anos AP; C) Fase III: 7.000‑
4.000 anos AP; D) Fase IV: 4.000 anos AP‑atual (a á rea em cinza escuro representa a porçã o emersa atual da
Bacia de Pelotas).

çã o onshore, com maior nú mero de sı́tios, se‑ ditos apontam para a subdivisã o dos depó si‑
ja na porçã o offshore, a partir de pouco poços tos cretá ceos a pliocê nicos em, pelo menos,
disponı́veis. Contudo, a seçã o atravessada 16 palinozonas, com atribuiçõ es de idades e
nos poços offshore corresponde ao trecho es‑ de correlaçã o entre os poços offshore e
tratigrá ico de maiores amplitude volumé tri‑ onshore, alguns dos quais com integraçã o bi‑
ca e abrangê ncia temporal (Cretá ceo Inferior cronoestratigrá ica de nanofó sseis e de fora‑
ao Recente). Estudos bioestratigrá icos iné ‑ minı́feros calcá rios. Idades do Cretá ceo

432 Edição da Sociedade Brasileira de Geologia – Núcleo RS/SC


Souza et al.

Inferior ao Plioceno tê m sido veri icadas nos the Early Cretaceous history of the South
poços profundos offshore e onshore; estes ú l‑ Atlantic. In: SIMPOSIO DO CRETACEO DO
timos, documentando depó sitos de idade BRASIL e SIMPOSIO DO TERCIARIO DO BRA‑
SIL, 7., 2006, Rio Claro. Boletim de Resumos.
miocê nica ao Recente. Em termos taxonô mi‑
Rio Claro, p. 12.
cos, destaca‑se o aprofundamento na identi‑
icaçã o de cistos de dino lagelados das Bauermann, S. G. 2003. Análises palinológicas
associaçõ es do Cretá ceo ao Recente, com re‑ e mudanças paleovegetacionais nas turfeiras
sultados descritivos publicados, colaborando de Barrocadas e Águas Claras, Planície Costei‑
no preenchimento desta lacuna de conheci‑ ra do Rio Grande do Sul, Brasil. Porto Alegre,
139p. Tese de Doutorado, Programa de Pó s‑
mento para a margem costeira brasileira.
graduaçã o em Geociê ncias, Instituto de Geo‑
Té cnicas de recuperaçã o e de aná lise tê m si‑ ciê ncias, Universidade Federal do Rio Grande
do particularmente empregadas para os ma‑ do Sul.
teriais quaterná rios, resultando na
recuperaçã o de um nú mero expressivo de Bueno, G. V., Zacharias, A. A., Oreiro, S. G., Cu‑
determinados palinomorfos, tais como de pertino, J. A., Falkenhein, F. U. H. & Martins
Neto, M. A. 2007. Bacia de Pelotas. Boletim de
cistos de dino lagelados desconhecidos,
Geociências da Petrobras, 15(2): 551‑559.
alé m do aprimoramento taxonô mico dos tin‑
tinomorfos, grupo, até entã o, com pouco Burjack, M. I. A. & Marques‑Toigo, M. M.
aprofundamento sistemá tico. 1980. Caracterizaçã o palinoló gica da turfeira
da regiã o de Aguas Claras, municı́pio de Via‑
AGRADECIMENTOS mã o – RS, Brasil. Boletim IG‑USP, 11: 181‑
189.
Os autores agradecem à FAPERGS,
pelo subsı́dio a alguns dos trabalhos de con‑ Cancelli, R. R. 2012. Evoluçã o paleoambiental
da Planı́cie Costeira sul‑catarinense (Lagoa
clusã o de curso e de pó s‑graduaçã o dos co‑
do Sombrio) durante o Holoceno, com base
autores (Processo 1012119). PAS e LAK sã o em dados palinoló gicos. Porto Alegre, 159p.
bolsistas do CNPq (processos 313340/2018‑ Tese de Doutorado, Programa de Pó s‑gradu‑
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Contribuições palinológicas para a estratigra ia da porção brasileira da Bacia de Pelotas 437


Coríndon em Santa Catarina –
geologia e gemologia
Nelson Luiz Chodur1*, Antonio Liccardo2, Lauren da Cunha Duarte3,
Pedro Luiz Juchem3, Guilherme Villani4

1
Universidade Federal do Paraná
2
Universidade Estadual de Ponta Grossa
3
Instituto de Geociê ncias, Universidade Federal do Rio Grande do Sul
4
Programa de Pó s‑graduaçã o em Geologia, Universidade Federal do Rio Grande do Sul

*autor correspondente: nlchodur@gmail.com

1 INTRODUÇÃO
Rubi, sa ira e corı́ndon industrial, provenientes da regiã o nordeste de Santa Catarina, fo‑
ram descobertos em meados da dé cada de 1980 e vê m sendo estudados desde entã o, em ter‑
mos mineraló gicos, geoló gicos, gemoló gicos e econô micos (Scangarelli, 1985; Ripoll et al., 1987;
Brum et al., 1990; Chodur, 1997; Chodur & Liccardo, 2000; Liccardo, 2003; Liccardo & Chodur,
2006). As ocorrê ncias sã o caracteristicamente esparsas, do tipo depó sitos colú vio‑aluvionares,
associados ao contexto do Complexo Granulı́tico de Santa Catarina. Esses depó sitos estã o distri‑
buı́dos por cerca de 800 km2 pelos territó rios que se estendem entre os municı́pios de Joinville,
Itajaı́, Luı́s Alves e Massaranduba, com jazidas conhecidas em Barra Velha e em Sã o Joã o do Ita‑
periú (Fig. 1).
Mineralogicamente e em termos gemoló gicos, foram identi icados cristais de rubi e sa i‑
ra, alguns com efeitos ó pticos especiais, mas que raramente apresentam transparê ncia, em vir‑
tude do excesso de inclusõ es, o que parece ter limitado o mercado para essas gemas. No
entanto, a presença desses minerais na regiã o revela, para alé m de seu potencial econô mico,
uma geodiversidade importante e uma informaçã o geoló gica peculiar, já que o corı́ndon, por sua
gê nese e por sua resistê ncia ao intemperismo, é um remanescente dos processos ocorridos e
testemunha boa parte da histó ria geoló gica regional antiga.
Contribuições à Geologia do Rio Grande do Sul e de Santa Catarina

Figura 1 – Mapa geoló gico da regiã o NE de Santa Catarina, indicando a localizaçã o das ocorrê ncias de corı́ndon
em terrenos do Complexo Granulı́tico de Santa Catarina.

440 Edição da Sociedade Brasileira de Geologia – Núcleo RS/SC


Chodur et al.

2 CLASSIFICAÇÃO GEOLÓGICA DOS DE‑ mo sedimentares (Tipo III). Os depó sitos


PÓSITOS DE CORÍNDON magmá ticos sã o divididos em dois subtipos:
(1) corı́ndon como xenocristais ou xenó litos
Os depó sitos de corı́ndon sã o classi‑ em matriz magmá tica, como basaltos alcali‑
icados em dois grandes grupos: primá rios e nos (Madagascar, Austrá lia, Sri Lanka, etc.); e
secundá rios. Os depó sitos primá rios sã o ı́g‑ (2) xenocristais de corı́ndon em kimberlitos
neos ou metamó r icos, que contê m corı́ndon (Repú blica Democrá tica do Congo). Assim
cristalizado in situ ou na forma de xenocris‑ como os depó sitos magmá ticos, os depó sitos
tais. Os depó sitos secundá rios sã o placeres, metamó r icos sã o divididos em dois subti‑
formados a partir da erosã o dos depó sitos pos: (1) depó sitos metamó r icos strictu sen‑
primá rios e se dividem entre coluviais, eluvi‑ su em rochas má icas e ultramá icas
ais e aluviais. metamor izadas e em má rmore; e (2) depó ‑
De acordo com Giuliani et al. (2007), sitos metamó r icos‑metassomá ticos, carac‑
a distribuiçã o global dos depó sitos de corı́n‑ terizados por alta interaçã o luido‑rocha,
don está intrinsecamente ligada aos proces‑ que correspondem a pegmatitos dessilici i‑
sos geodinâ micos que compõ em o Ciclo de cados, associados a metassomatitos. Os de‑
Wilson (colisã o, rifteamento e subducçã o), e pó sitos secundá rios ou sedimentares sã o
esses autores reconhecem quatro perı́odos classi icados em subtipos, de acordo com o
principais de formaçã o de corı́ndon: (1) O ambiente em que os placeres de corı́ndon se
mais antigo depó sito, localizado na Groelâ n‑ encontram: (1) placeres em ambientes de
dia, com rubi de idade arquena, de 2,71 Ga; basalto alcalino; (2) placeres em ambientes
(2) a Orogenia Pan‑Africana (750‑450 Ma), metamó r icos; e (3) placeres com corı́ndon
principal perı́odo de formaçã o de rubi gemo‑ de fontes mú ltiplas e desconhecidas.
ló gico, relacionada a processos colisionais
entre Gondwana Leste e Oeste, que gerou de‑ 3 CONTEXTO GEOLÓGICO DA REGIÃO
pó sitos primá rios de importâ ncia econô mica
no Quê nia, em Madagascar, na Tanzâ nia, na A regiã o de ocorrê ncia desse mineral
India e no Sri Lanka; (3) a Orogenia Alpina está inserida em um domı́nio gná issico de
(55 Ma – Quaterná rio), que produziu os de‑ alto grau metamó r ico, de idades arqueanas
pó sitos em matriz de má rmore no sudeste e paleoproterozoicas, que constitui parte do
asiá tico e na Asia Central; e (4) a extrusã o de Complexo Granulı́tico de Santa Catarina
basaltos alcalinos no Cenozoico (65 Ma – (Hartmann et al., 1979). Litologicamente, a
Quaterná rio), em que o corı́ndon ocorre na regiã o é representada principalmente por
forma de xenocristais, em xenó litos ou em ortognaisses granulı́ticos bandados a maci‑
enclaves, incorporados em magmas basá lti‑ ços, de composiçã o tonalito‑granodiorı́tica,
cos durante sua ascençã o. com frequentes variaçõ es a sequê ncias de
Giuliani et al. (2020) propõ em uma natureza bá sica e ultrabá sica, afetadas por
classi icaçã o mais elaborada para os depó si‑ intensos processos tectô nicos. Adicional‑
tos primá rios e secundá rios, dividindo‑os em mente, ocorrem migmatitos, ultramá icas,
trê s tipos principais, com seus respectivos granulitos piroxenı́ticos, quartzitos, gnaisses
subtipos. Os depó sitos primá rios de corı́n‑ kinzigı́ticos e formaçõ es ferrı́feras.
don foram divididos, de acordo com o ambi‑ Os depó sitos sedimentares cenozoi‑
ente geoló gico de formaçã o, em magmá ticos cos regionais se apresentam sobre as rochas
(Tipo I) e metamó r icos (Tipo II), enquanto desse Complexo, como depó sitos de encosta
os depó sitos secundá rios foram de inidos co‑ (colú vio‑aluviais) e como depó sitos luviais

Coríndon em Santa Catarina – geologia e gemologia 441


Contribuições à Geologia do Rio Grande do Sul e de Santa Catarina

(canais e planı́cies aluvionares). Depó sitos uma á rea cratô nica arqueana e o detalha‑
luviais e aluviais atuais inconsolidados, com‑ ram como sendo compostos por gnaisses
postos por sedimentos de granulometrias va‑ granulı́ticos leucocrá tı́cos, por milonitos
riadas, desde argilas até grâ nulos, por seixos granulı́ticos, por blastomilonitos de deriva‑
e por calhaus, sã o encontrados nos vales e çã o granulı́tica, por ultrama itos, por gnais‑
nas planı́cies de inundaçã o de vá rios rios da ses calcossilicatados, por gnaisses
regiã o. Rampas coluviais sã o constituı́das por kinzigı́ticos, por anortositos, por quartzitos,
sedimentos detrı́ticos grosseiros e mal‑sele‑ por formaçõ es ferrı́feras e por gnaisses ca‑
cionados, formadas ao longo das baixas ver‑ taclá sticos. Sã o rochas metamó r icas de fá ‑
tentes e ocorrem regionalmente de maneira cies granulito e an ibolito que ocorrem no
muito expressiva. Nesses compartimentos, os nordeste catarinense, em uma á rea de apro‑
depó sitos de corı́ndon se acumulam onde o ximadamente 8.500 km2, estendendo‑se até
gradiente diminui no limite do relevo aciden‑ a divisa com o Paraná .
tado (Chodur, 2007). Silva (1984, 1987) distinguiu nesses
Os depó sitos sedimentares portado‑ granulitos, trê s fases deformacionais supe‑
res de corı́ndon, estã o localizados nos alu‑ rimpostas a estas rochas. A primeira mostra
viõ es quaterná rios do rio Itapocu e em vá rios um padrã o de dobramento aberto D1, com
de seus a luentes, ou em colú vios. Esses de‑ foliaçã o S1 de baixo e de mé dio â ngulo; a
pó sitos sã o rampas coluviais, aluviõ es, colu‑ segunda, ligada a fenô menos de cisalha‑
viõ es e terraços aluviais, originados das mento dú ctil, com transposiçõ es, resultando
rochas do Complexo Granulı́tico. Encontram‑ em uma foliaçã o de alto â ngulo; e a terceira,
se em zonas aplainadas, propı́cias aos pro‑ originou uma foliaçã o milonı́tica, transpon‑
cessos deposicionais, e sã o depó sitos des‑ do as duas anteriores. A fá cies an ibolito, a
contı́nuos, com ampla distribuiçã o que o Complexo Granulı́tico foi submetido, é
geográ ica, variando conforme a topogra ia representada pela hornblendizaçã o parcial
do substrato em que estã o localizados. a total dos piroxê nios. A hornblenda encon‑
O corı́ndon se concentra principal‑ trada na litologia regional, é provavelmente
mente nos depó sitos rudá ceos existentes no retrometamó r ica, sugerindo um metamor‑
sopé das elevaçõ es, sendo detectados tam‑ ismo regional da fá cies an ibolito, posterior
bé m nas planı́cies aluvionares da regiã o, po‑ à fá cies granulito. Ainda, pode‑se detectar a
ré m de forma mais dispersa, nas fá cies presença de clorita e de epidoto nessas ro‑
constituı́das por nı́veis de cascalhos. Em al‑ chas, de inindo um metamor ismo de baixo
guns locais, esse mineral també m pode ser grau, principalmente em zonas de falhas
encontrado na superfı́cie dos solos de cober‑ (Hartmann et al., 1979).
tura existentes nas porçõ es mais elevadas, A mineralogia dos gnaisses se com‑
principalmente em canais de escoamento na‑ põ e principalmente de quartzo e de feldspa‑
tural de á guas pluviais. tos, predominando amplamente o
plagioclá sio (oligoclá sio) sobre o ortoclá sio,
3. 1 Granulitos podendo ocorrer ainda o microclı́nio. A mi‑
neralogia dos má icos é constituı́da por hi‑
Silva & Dias (1981a, 1981b, 1981c) e perstê nio (paragê nese da fá cies granulito),
Silva (1984, 1987), com base em cartogra ia e por diopsı́dio, por hornblenda verde‑casta‑
em estudos de petrogra ia e de petrogê nese nha e por biotita titanı́fera, e os acessó rios
da regiã o, apresentaram o Complexo Granulı́‑ mais comuns sã o o zircã o, a magnetita, o ru‑
tico de Santa Catarina como pertencente a tilo e, mais raramente, a pirrotita (Chodur,
442 Edição da Sociedade Brasileira de Geologia – Núcleo RS/SC
Chodur et al.

1997). corı́ndon, sã o encontrados nos vales e nas


Corpos representados por quartzitos planı́cies de inundaçã o de vá rios rios e de
sã o encontrados com muita frequê ncia, asso‑ có rregos da regiã o. Como aluviõ es de origem
ciados à s unidades dos gnaisses granulı́ticos luvial, foram classi icadas as porçõ es dos
do Complexo. Hartmann et al. (1979) admi‑ depó sitos recentes, constituı́dos por casca‑
tem que os quartzitos, que as formaçõ es fer‑ lhos, por areias e por argilas, ocorrendo nas
rı́feras e que as rochas calciossilicatadas da planı́cies de inundaçã o e nos sopé s das ele‑
regiã o sã o metassedimentares e considera os vaçõ es (Guerra, 1975). Foram englobados
ultrama itos como meta‑ı́gneos e como re‑ como colú vios, os depó sitos das encostas dos
manescentes da crosta primordial, os quais morros, constituı́dos por materiais detrı́ticos
poderiam ter sido originados també m pelo transportados a curta distâ ncia, por efeito de
metamor ismo regional de fá cies granulito gravidade (Guerra, 1975). Os colú vios só
sobre sedimentos margosos de composiçã o aparecem nos sopé s das vertentes, ou pró xi‑
adequada. A maioria dos trabalhos da á rea mos a elas, sendo muitas vezes, difı́ceis de
cogita uma origem metassedimentar para os separar dos aluviõ es, que també m sã o asso‑
gnaisses quartzo‑feldspá ticos e conclui que ciados a esses locais.
as rochas granulı́ticas, em geral, foram sub‑ Os terraços aluviais formam patama‑
metidas a eventos polimetamó r icos. res, que vã o margeando os vales e que de‑
marcam nı́veis mais antigos. Formam‑se por
processos erosivos verticais e laterais, po‑
3. 2 Depósitos sedimentares recentes
dendo ser entalhados no pró prio embasa‑
A regiã o nordeste catarinense se ca‑ mento ou em aluviõ es depositados pelo rio.
racteriza por apresentar contrastes entre as Rampas coluvionares sã o constituı́das por
amplas planı́cies costeiras e as á reas com sedimentos detrı́ticos grosseiros e mal‑sele‑
presença de rochas cristalinas. Nesse caso, cionados, sendo formadas ao longo das bai‑
sã o depó sitos cenozoicos que podem ser di‑ xas vertentes. Nesses compartimentos, os
vididos em continentais, transicionais e ma‑ depó sitos se acumulam onde o gradiente di‑
rinhos. Os depó sitos continentais, associados minui, no limite do relevo acidentado.
à presença do corı́ndon, estã o relacionados a Martin et al. (1988) consideraram os
processos luviais e marinhos e aos movi‑ depó sitos sedimentares da regiã o nordeste
mentos oscilató rios que vê m ocorrendo des‑ de Santa Catarina representativos de antigos
de o Plioceno Superior até os dias atuais. leques aluviais, diretamente associados aos
Normalmente essas acumulaçõ es de material processos gravitacionais de encosta, os quais
detrı́tico formam depó sitos residuais e rudá ‑ podem atingir cotas de 30 m a 40 m. De mo‑
ceos, originados por pedimentaçã o. Os depó ‑ do geral, os depó sitos recentes da regiã o se
sitos continentais, relacionados à planı́cie originaram das litologias do Complexo Gra‑
costeira, sã o subdivididos, ainda, em depó si‑ nulı́tico de Santa Catarina, unidade que pre‑
tos de encosta (colú vio‑aluvionares) e em valece na á rea. O intemperismo dos gnaisses
depó sitos luviais (canais e planı́cies aluvio‑ granulı́ticos teria liberado os constituintes
nares). rudá ceos mais frequentes, entre os quais se
Os depó sitos luviais e aluviais atu‑ destacam os fragmentos de quartzo leitoso e
ais, inconsolidados, compostos por sedimen‑ de quartzito, notadamente angulosos, que
tos de granulometrias variadas, desde argilas compõ em os nı́veis de cascalhos. Os demais
até grâ nulos, por seixos e por calhaus, com constituintes dos depó sitos incluem argilas,
potencial para mineralizaçã o em argila e em que recobrem os nı́veis de cascalhos ou que

Coríndon em Santa Catarina – geologia e gemologia 443


Contribuições à Geologia do Rio Grande do Sul e de Santa Catarina

formam bolsõ es em proporçõ es variá veis, branca (caulim), de espessura variada.


alé m de areias de diversas granulometrias e As caracterı́sticas dos sedimentos
alguns minerais pesados. permitiram dividir a coluna de deposiçã o
Observaçõ es sistemá ticas mostra‑ em trê s segmentos distintos, da base para o
ram que o corı́ndon se concentra, principal‑ topo, aqui, denominados A, B e C. A porçã o A
mente, nos depó sitos rudá ceos existentes no representa um nı́vel de cascalhos constituı́‑
sopé das elevaçõ es, sendo detectado tam‑ do por fragmentos de quartzo leitoso e de
bé m nas planı́cies aluviais da regiã o, poré m quartzito, cuja granulometria varia de grâ ‑
de forma mais dispersa. No sopé das eleva‑ nulos a seixos, ocorrendo, esporadicamente,
çõ es e em vales internos dos canais secundá ‑ alguns calhaus. Esses constituintes estã o
rios, as fá cies constituı́das por nı́veis de dispersos em uma matriz arenosa, que gra‑
cascalhos, apresentam concentraçõ es variá ‑ da para lamı́tica nas porçõ es superiores da
veis de cristais de corı́ndon, tendo sido cons‑ sequê ncia. Na porçã o basal da unidade, nas
tatados em certos pontos, teores de até proximidades do contato com a rocha gná is‑
1.200 g/m3. Em alguns locais, esse mineral sica, ocorre uma intensa cimentaçã o por
també m pode ser encontrado na superfı́cie ó xidos de ferro e de manganê s. A porçã o B
dos solos de cobertura, existentes nas por‑ representa nı́veis de argila cinza ou branca,
çõ es mais elevadas, principalmente em ca‑ que podem ocorrer com espessuras varia‑
nais de escoamento natural de á guas
pluviais.
A
Os depó sitos portadores de corı́n‑
don que ocorrem na á rea, estã o localizados
nos nı́veis de cascalho encontrados nas uni‑
dades quaterná rias das drenagens locais.
Encontram‑se em zonas aplainadas, em que
se desenvolveram processos deposicionais
relativos à construçã o de planı́cies alú vio‑
luviais. Sã o depó sitos descontı́nuos e de pe‑
quena espessura, variando conforme a topo‑
gra ia do substrato em que estã o localizados.
Esses depó sitos tê m sua origem principal as‑ B
sociadas à s rochas do Complexo Granulı́tico
de Santa Catarina e se constituem basica‑
mente, de rampas coluvionares, de aluviõ es,
de colú vios e de terraços aluviais.
O corı́ndon ocorre associado a sedi‑
mentos argilo‑arenosos, com cascalhos de
até 1 metro de espessura e com geometria
tabular ou lenticular, concentrando‑se prefe‑
rencialmente nas partes basais do per il (Fig.
2) e o pacote mostra uma estruturaçã o em
gradaçã o normal, embora incipiente, assen‑ Figura 2 – Modo de ocorrê ncia do corı́ndon. A)
Nı́vel de cascalho mineralizado com corı́ndon, em
tando diretamente sobre rochas alteradas, colú vio, no municı́po de Sã o Joã o do Itaperiú ; B)
que apresentam estrutura gná issica ainda Detalhe de um cristal de corı́ndon no colú vio (fotos:
A. Liccardo).
preservada ou sobre uma camada de argila
444 Edição da Sociedade Brasileira de Geologia – Núcleo RS/SC
Chodur et al.

das, em mé dia de 40 cm. No topo da coluna,


encontra‑se um solo de pouca espessura A
(porçã o C), desenvolvido sobre o pacote de
sedimentos, o qual apresenta coloraçã o cinza
a preta, com textura argilo‑arenosa, podendo
conter fragmentos de quartzo e de quartzito,
alé m de algum conteú do em fragmentos de
corı́ndon.
Os fragmentos de corı́ndon possuem
uma distribuiçã o granulomé trica ampla, indo
da fraçã o areia muito ina a fraçã o seixos.
Nas fraçõ es mais inas, o corı́ndon ocorre na
forma de fragmentos irregulares, resultantes
B
da quebra de cristais maiores durante o
transporte (Fig. 3). A quantidade relativa‑
mente pequena desses fragmentos parece
indicar que o transporte até os sı́tios atuais
foi relativamente pequeno. O quartzo leitoso
é o componente mais frequente nos casca‑
lhos, ocorrendo na forma de fragmentos irre‑
gulares, geralmente angulosos, que se
estendem desde a fraçã o areia ina até o ta‑
manho de seixos.
Outros constituintes sã o os fragmen‑
Figura 3 – Extraçã o do corı́ndon em meio a
tos quartzo‑feldspá ticos alterados, proveni‑ sedimentos quartzosos A) Fragmentos de rubi
entes provavelmente dos gnaisses recuperados em peneira; B) Fragmentos de sa ira
rosa. (fotos: A. Liccardo).
granulı́ticos regionais. Nesse caso, a fraçã o
granulomé trica se encontra na faixa entre ganizaçã o.
areia mé dia e grâ nulos. Fragmentos de Os processos de formaçã o dos depó ‑
quartzito també m estã o presentes, em quan‑ sitos enriquecidos com corı́ndon, que ocor‑
tidades subordinadas, estendendo‑se da fra‑ rem na regiã o, parecem estar associados
çã o areia mé dia até seixos. Ainda de forma essencialmente, à evoluçã o de vertentes. O
subordinada, ocorrem fragmentos de ó xidos arredondamento praticamente inexistente,
de ferro secundá rios, ocupando a faixa entre tanto dos grã os de quartzo quanto do mate‑
areia ina e grâ nulos. O concentrado de mi‑ rial lı́tico associado, atesta um transporte a
nerais pesados no fundo da bateia nã o é curta distâ ncia.
muito abundante e é representado pelas fa‑
ses magnetita, ilmenita, hematita, epidoto,
4 CONSIDERAÇÕES GENÉTICAS SOBRE O
hornblenda, rutilo e zircã o, alé m do pró prio
CORÍNDON
corı́ndon. Os fragmentos constituintes dos
cascalhos nã o apresentam arredondamento, A gê nese do corı́ndon é normalmen‑
sugerindo uma deposiçã o rá pida, seja por te associada a metamor ismo de alto grau so‑
luxos gravitacionais, seja por enxurradas, e bre rochas ricas em alumı́nio, a processos
os constituintes das cascalheiras se distribu‑ metassomá ticos ou, ainda, à formaçã o de
em em seu arcabouço com baixo grau de or‑ complexos alcalinos e á lcali‑basá lticos (Lic‑
Coríndon em Santa Catarina – geologia e gemologia 445
Contribuições à Geologia do Rio Grande do Sul e de Santa Catarina

cardo, 2003). Os depó sitos dessa regiã o sã o nulito mais ricas em alumı́nio poderiam ter
associados ao Complexo Granulı́tico de San‑ cristalizado o corı́ndon, com a saı́da do
ta Catarina, mas sã o caracteristicamente se‑ quartzo (enriquecimento residual), e, ao
cundá rios (coluvionares e, eventualmente, mesmo tempo, esse processo tornaria essas
aluvionares), de distribuiçã o geográ ica am‑ rochas muito suscetı́veis ao intemperismo,
pla, com localizaçã o restrita e com alta con‑ conforme citado por Jordt‑Evangelista & Lic‑
centraçã o de corı́ndon em cascalheiras de cardo (2002) e Liccardo (2003) em estudos
quartzo leitoso. Na á rea em questã o, rochas‑ comparativos de corı́ndon, em gnaisses de
fonte do corı́ndon nã o foram encontradas Catingal (BA). O mecanismo de dessilici ica‑
em dé cadas de estudos, provavelmente por çã o é , portanto, fundamental para uma gê ne‑
terem sido completamente alteradas pela se localizada do corı́ndon nas antigas rochas
açã o intempé rica. Como os terrenos nos granulı́ticas e explica a ausê ncia desse mine‑
quais se localizam os depó sitos sã o meta‑ ral nas rochas atualmente presentes na re‑
mó r icos, de fá cies an ibolito superior ou giã o, pois o enriquecimento em alumı́nio
granulito, considera‑se como premissa, que teria sido restrito à s zonas de metassomatis‑
o mineral tenha sido formado nesse ambi‑ mo. Para Chodur (1997), a granulitizaçã o que
ente metamó r ico. A correlaçã o entre a gê ‑ afetou as rochas regionalmente, poderia ter
nese do corı́ndon nessa regiã o e os afetado també m os sedimentos pré ‑existen‑
processos tectô nicos, geoquı́micos, intem‑ tes, ricos em alumı́nio, gerando dessa forma,
pé ricos e deposicionais, apresenta especial corı́ndon a partir de minerais aluminosos.
importâ ncia no estudo geoló gico e econô mi‑ Um metassomatismo entre o granuli‑
co das jazidas e é fundamental como contro‑ to e as rochas ultramá icas nã o estaria des‑
le prospectivo regional. cartado, pois regionalmente esses litotipos
Os depó sitos apresentam como foram descritos e isso explicaria a origem do
principais caracterı́sticas: intemperismo in‑ elemento cromo, causador da cor vermelha
tenso da rocha‑mã e, com liberaçã o de cris‑ nos cristais de rubi e de sa ira rosa encontra‑
tais; evidê ncias de proximidade entre fonte dos nos depó sitos. A associaçã o do corı́ndon
e á rea de deposiçã o; e concentraçã o em cas‑ com blocos angulosos de quartzo leitoso e de
calheiras, compostas exclusivamente por quartzo cataclasado nos depó sitos coluvio‑
blocos de quartzo leitoso, com alta angulosi‑ nares e a proximidade destes a zonas de fra‑
dade, dentro de leques aluviais holocê nicos. turamentos e de falhas, sã o també m
Alé m disso, esses depó sitos coluvionares indicativos da gê nese sugerida. A presença
normalmente estã o pró ximos de zonas de de argila caulinı́tica nos depó sitos, é possi‑
fraturamento e de falhas de rochas granulı́‑ velmente, fruto de alteraçã o de auré olas de
ticas, com presença de argila caulinı́tica as‑ feldspato, que originalmente teriam envolvi‑
sociada. do os cristais de corı́ndon, como ocorre em
Uma possı́vel interpretaçã o dos pro‑ outros lugares do mundo (Liccardo, 2003;
cessos que atuaram na gê nese do corı́ndon Liccardo & Jordt‑Evangelista, 2006). Ausê n‑
indica que nã o existe mais uma rocha‑fonte. cia de sinais de transporte e a associaçã o
Os eventos tectô nicos, ocorridos durante o com grandes blocos de quartzo leitoso e de
Ciclo Brasiliano, causaram um fraturamento quartzo com feiçõ es cataclá sticas, bem como
generalizado nas rochas, que muitas vezes a proximidade dos depó sitos a zonas de fra‑
foi preenchido por quartzo, formando veios turamento, apontam uma estreita relaçã o en‑
e causando a dessilici icaçã o das encaixan‑ tre os processos gené tico‑tectô nicos e os
tes nas zonas de contato. As porçõ es de gra‑ mecanismos deposicionais.

446 Edição da Sociedade Brasileira de Geologia – Núcleo RS/SC


Chodur et al.

5 CARACTERÍSTICAS DO CORÍNDON perceber com facilidade a existê ncia de pla‑


nos romboé dricos de partiçã o, produzidos a
O corı́ndon é um mineral com carac‑ partir das geminaçõ es (Fig. 5).
terı́sticas especiais, nã o somente por seu va‑ E comum a ocorrê ncia de zonaçã o de
lor comercial ou por sua beleza, mas també m crescimento no corı́ndon, em que se pode
por suas propriedades e caracterı́sticas de perceber a presença de hexá gonos circuns‑
formaçã o, pois as associaçõ es litoló gicas das critos ao plano basal dos cristais. Geralmente
diversas provı́ncias produtoras indicam que as faixas ou linhas hexagonais variam em cor
esse mineral é formado em condiçõ es especi‑ e em espessura, produzindo um aspecto
ais e pouco frequentes na crosta terrestre. muito interessante no material.
O corı́ndon encontrado na regiã o
nordeste de Santa Catarina ocorre na forma 6 ASPECTOS GEMOLÓGICOS DO RUBI E
de cristais eué dricos e subé dricos e de frag‑ DA SAFIRA
mentos irregulares centimé tricos, principal‑
mente na cor vermelha (rubi) e, em menor Vá rios lotes de amostras, provenien‑
frequê ncia, nas cores branca, ró sea, cinza, tes dessa regiã o de Santa Catarina, foram es‑
azulada e preta (variedades de sa ira). Apre‑ tudados ao longo dos ú ltimos anos, por meio
senta há bito em barrilete caracterı́stico ou, de microscopia ó ptica, de MEV‑EDS, de mi‑
ainda, prismá tico e bipiramidado, ocorrendo crossonda eletrô nica, de espectroscopia mi‑
també m fragmentos quebrados e sem um há ‑ cro‑RAMAN e de microtermometria das
bito caracterı́stico (Fig. 4). Possui transpa‑ inclusõ es luidas. Entre as inclusõ es só lidas
rê ncia limitada e dimensõ es que vã o de mais frequentes, encontram‑se: diá sporo,
milı́metros até 5 cm de comprimento. preenchendo os planos de geminaçã o polis‑
Os cristais de corı́ndon observados sinté tica e que pode ser proveniente da alte‑
macroscopicamente ou por meios ó pticos, raçã o do pró prio corı́ndon (Fig. 6); biotita,
revelam a existê ncia de uma superfı́cie bas‑ dispersa algumas vezes em folhas empilha‑
tante rugosa, à s vezes com canais circulares das; clorita, em dimensõ es maiores do que as
de dimensõ es milimé tricas, vazios ou preen‑ da biotita, poré m totalmente ausente em al‑
chidos por minerais secundá rios. Pode‑se gumas amostras. Alé m destas, monazita, zir‑

Figura 4 – Cristais de corı́ndon com há bitos caracterı́sticos encontrados em depó sitos de Barra Velha (0,5 a 2,0
cm) e um fragmento irregular (3 cm), onde se observa a geminaçã o polissinté tica caracterı́stica desse mineral
(fotos: A. Liccardo).

Coríndon em Santa Catarina – geologia e gemologia 447


Contribuições à Geologia do Rio Grande do Sul e de Santa Catarina

Figura 5 – Geminaçã o e partiçã o nos cristais de corı́ndon. A) Representaçã o do plano de partiçã o em uma face
do cristal; B) Representaçã o da interseçã o dos planos de partiçã o; C) Representaçã o da projeçã o dos planos de
partiçã o nas faces do cristal, gerando partiçã o romboé drica; D) Representaçã o da partiçã o romboé drica, vista
perpendicularmente ao eixo cristalográ ico “c” do cristal; E) Imagem em lupa binocular, indicando a partiçã o
romboé drica observada na face basal de um cristal de corı́ndon; e F) Imagem em lupa binocular, indicando a
partiçã o romboé drica observada na face lateral do prisma hexagonal de um cristal de corı́ndon (fotos e iguras:
G. Villani).

cã o, rutilo e o pró prio corı́ndon constituem o frequê ncia, sã o cristais negativos, o zonea‑
conjunto das inclusõ es só lidas caracterı́sticas mento de cor, um padrã o de estrutura em
nessas gemas. Pirita, pirrotita, ó xidos de Fe e rede em que as faixas correspondem à zona
de Mn e argilominerais sã o frequentes, mas, de alteraçã o do corı́ndon em diá sporo, cana‑
possivelmente de origem secundá ria; alé m lı́culos orientados segundo as direçõ es cris‑
disso, ocorrem feiçõ es aciculares que foram talográ icas e que podem resultar num
identi icadas como cavidades vazias (Fig. 7) efeito seda ou asterismo em algumas amos‑
(Chodur, 1997). tras, alé m da geminaçã o polissinté tica, mui‑
O estudo ó ptico dos cristais revelou a to evidente na maior parte dos cristais
presença de inclusõ es luidas primá rias, se‑ (Chodur, 1997).
cundá rias e pseudosecundá rias, com dimen‑ No rubi e na sa ira dessa regiã o, é
sõ es variá veis (> 5‑30 μm ou, mesmo, comum o aparecimento de asterismo apó s a
maiores), constituı́das essencialmente por lapidaçã o na forma de cabochã o, originando
CO2, podendo conter fases só lidas. Muitas in‑ estrelas de seis pontas com â ngulos de 60
clusõ es exibem seccionamentos paralelos à s entre os raios. Apesar de frequente, o efeito
direçõ es cristalográ icas, parecendo subdivi‑ é de baixa intensidade, ou seja, as estrelas
didas em duas ou em mais partes (Fig. 8). sã o tê nues, destacando‑se apenas sob a açã o
Outras feiçõ es internas observadas com certa de luz intensa (Chodur, 1997). Outro efeito

448 Edição da Sociedade Brasileira de Geologia – Núcleo RS/SC


Chodur et al.

incluindo exemplares de coloraçã o vermelha


A acentuada, com certo grau de transparê ncia e
com a presença de efeitos ó pticos especiais
(Fig. 9A e B). Esse nú mero pode ser ampliado
mediante tratamentos té rmicos, a exemplo
do que é feito em outros centros produtores
importantes.
Cristais do corı́ndon de Santa Catari‑
na, selecionados aleatoriamente e com as co‑
res branca, cinza, preta, ró sea e vermelha,
foram submetidos por Chodur (1997), à aná ‑
B lise té rmica diferencial e, simultaneamente, à
aná lise termogravimé trica. Os resultados da
aná lise té rmica diferencial indicam que em
todas as amostras houve um inı́cio de reaçã o
endoté rmica a 460 oC, com inal a 590 oC. A
partir deste ponto, a curva apresentou com‑
portamento inerte, até cerca de 1.000 oC. Com
o aumento da temperatura acima de 1.000 oC,
até o inal da aná lise (em 1.600 oC), a curva
teve uma ascensã o, tendendo a atingir a linha
de base inicial. Este resultado é consistente
Figura 6 – Diá sporo no corı́ndon. A) Imagem em
microscopia ó ptica dos planos de geminaçã o com os experimentos de Herold & Dodd
polissinté tica, preenchidos por diá sporo; B) (1939), os quais observaram que argilas con‑
Imagem obtida ao MEV do diá sporo nos planos de
geminaçã o, cuja composiçã o foi con irmada por tendo diá sporo, podem formar corı́ndon e
aná lises com EDS (foto e imagem MEV: N. Chodur). gama alumina em temperaturas ao redor de
400 oC; poré m, entre 400 oC e 750 oC, o corı́n‑
ó ptico exibido pelos cristais lapidados em don formado apresenta certa expansã o nos
cabochã o, é o efeito seda, o qual consiste em parâ metros de cela unitá ria. Com a continui‑
um brilho sedoso e localizado, à s vezes me‑ dade do tratamento, a temperaturas mais al‑
talizado em tons de dourado ou de prateado, tas a cela unitá ria gradualmente se reduz
que aparenta estar abaixo da superfı́cie poli‑ para suas dimensõ es normais.
da (Fig. 9 A). Este efeito, que em alguns casos A aná lise termogravimé trica con ir‑
pode ser confundido com chatoyance, parece ma as mesmas temperaturas da aná lise té r‑
ter sua origem relacionada à presença de mica diferencial, ou seja, de 460 oC para o
diá sporo ao longo dos planos de geminaçã o inı́cio e de 590 oC para o inal da perda de
romboé drica do corı́ndon. massa, em todas as amostras analisadas. Os
O entendimento do comportamento resultados das aná lises té rmicas mostram,
té rmico do corı́ndon de Barra Velha é muito portanto, variaçõ es que con irmam a presen‑
importante, pois possibilita a determinaçã o ça de pequenas proporçõ es de diá sporo asso‑
das temperaturas a serem utilizadas na ten‑ ciado, fase mineral que també m foi detectada
tativa de melhorar sua transparê ncia, atravé s e identi icada por aná lises ó pticas, por difra‑
de aquecimento controlado. Estima‑se que a tometria de raios X e por microssonda eletrô ‑
porcentagem de corı́ndon com potencial ge‑ nica, ocorrendo sob a forma de inas lamelas
moló gico na regiã o oscile em torno de 10%, ou de ilmes, principalmente ao longo dos

Coríndon em Santa Catarina – geologia e gemologia 449


Contribuições à Geologia do Rio Grande do Sul e de Santa Catarina

Figura 7 – Imagens em microscopia ó ptica de inclusõ es em corı́ndon da regiã o de Barra Velha: A)


Concentraçã o de agulhas, formando bandas; B) Detalhe das agulhas vistas em A; C) Agulhas vistas em seçã o
paralela ao eixo cristalográ ico “c”; e D) Agulhas vistas sob luz re letida (fotos: N. Chodur).

Figura 8 – Inclusõ es luidas em rubi e em sa ira de Barra Velha (20 a 30 µm). Muitas inclusõ es exibem
seccionamentos paralelos à s direçõ es cristalográ icas (fotos: N. Chodur).

450 Edição da Sociedade Brasileira de Geologia – Núcleo RS/SC


Chodur et al.

A aná lise. Sob a açã o de luz ultravioleta de on‑


das curtas, todos os cristais permaneceram
inertes. E muito prová vel que as variaçõ es
observadas no comportamento do corı́ndon
analisado estejam relacionadas ao conteú do
de cromo nas amostras.

7 CONSIDERAÇÕES FINAIS
O Brasil é considerado a maior Pro‑
vı́ncia Gemoló gica do planeta, nã o só devido
à variedade e à quantidade de materiais ge‑
moló gicos produzidos, mas també m pela sua
B
extensã o geográ ica, pois todos os estados
brasileiros produzem algum tipo de gema.
Estima‑se que cerca de 70% do volume de
gemas de cor que circulam no mercado in‑
ternacional, seja proveniente do Brasil. No
entanto, o paı́s nã o é um grande fornecedor
de rubi e de sa ira, registrando‑se um produ‑
çã o restrita e esporá dica em certos estados,
como Minas Gerais e Bahia. Os depó sitos de
rubi e de sa ira da regiã o de Barra Velha (SC)
foram descobertos na segunda metade dos
Figura 9 – Rubi e sa ira lapidados, provenientes de
Barra Velha. A) Sa ira rosa lapidada em cabochã o (2 anos 1980. Apesar dos trabalhos de pesquisa
cm), apresentando zonaçã o de crescimento e efeito lá desenvolvidos, os depó sitos ainda nã o fo‑
seda; B) Cristais de rubi translú cidos, lapidados em
cabochã o, provenientes de Sã o Joã o do Itaperiú ram convenientemente explorados e, até o
(fotos: A. Liccardo). momento, poucos sã o os registros de extra‑
planos romboé dricos e basais dos cristais. çã o comercial desses materiais. As caracte‑
rı́sticas dos depó sitos e do miné rio
O comportamento luorescente des‑
apresentadas neste capı́tulo podem contri‑
ses cristais de rubi e de sa ira foi estudado
buir para a prospecçã o desse bem mineral,
por Chodur (1997), utilizando lâ mpadas de
com a indicaçã o de possı́veis novos alvos de
luz ultravioleta de ondas longas
exploraçã o. O aproveitamento desse recurso,
(UVL=366nm) e curtas (UVC=253,7nm). Sob
alé m de trazer desenvolvimento econô mico
ondas longas, algumas amostras se mostra‑
para as regiõ es produtoras, aumentaria a di‑
ram inertes, enquanto outras apresentaram
versidade de materiais gemoló gicos produzi‑
uma forte luorescê ncia na cor vermelha.
dos no Brasil.
Nesse caso, os cristais de coloraçã o verme‑
lha mais acentuada se apresentaram muito
luorescentes, havendo uma queda gradual REFERÊNCIAS
deste comportamento em exemplares de co‑
loraçõ es ró seas mais claras. Os cristais de Basei, M. S. A. 1985. O cinturão Dom Feliciano
em Santa Catarina. Sã o Paulo, 190p. Tese de
corı́ndon com coloraçõ es cinza, preta e bran‑
Doutorado, Instituto de Geociê ncias, Univer‑
ca nã o apresentaram reaçõ es a este tipo de
sidade de Sã o Paulo.

Coríndon em Santa Catarina – geologia e gemologia 451


Contribuições à Geologia do Rio Grande do Sul e de Santa Catarina

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452 Edição da Sociedade Brasileira de Geologia – Núcleo RS/SC


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Coríndon em Santa Catarina – geologia e gemologia 453


Sistemas deposicionais e evolução geológica
da planície costeira entre La Coronilla e Cabo de
Santa Marta (Bacia de Pelotas): uma revisão
Eduardo Guimarã es Barboza1,2*, Sé rgio Rebello Dillenburg1,
Maria Luiza Correa da Camara Rosa1, Felipe Caron2,
Renato Pereira Lopes1, Dé bora Sayuri Zanchi Watanabe1, Luiz José Tomazelli1

1
Instituto de Geociê ncias, Universidade Federal do Rio Grande do Sul
2
Campus Litoral Norte, Universidade Federal do Rio Grande do Sul

*autor correspondente: eduardo.barboza@ufrgs.br

1 INTRODUÇÃO
Ao longo das ú ltimas seis dé cadas, o conhecimento acerca da evoluçã o costeira da por‑
çã o emersa da Bacia de Pelotas, a qual, morfologicamente, corresponde, principalmente, à Planı́‑
cie Costeira do Rio Grande do Sul (PCRS), foi inicialmente apresentado à comunidade cientı́ ica,
no â mbito da litoestratigra ia (dé cadas de 1960 e 1970), passando pela concepçã o cronoestrati‑
grá ica (dé cadas de 1980 e 1990), e, mais recentemente (dé cadas de 2000 e 2010), tem sido
apresentado, segundo os conceitos da Estratigra ia de Sequê ncias. Essa evoluçã o do conheci‑
mento foi natural, decorrente, principalmente, da atuaçã o de uma comunidade cientı́ ica especi‑
alizada, cujo trabalho foi facilitado pela cé lere evoluçã o das ferramentas de investigaçã o, ou seja,
das ferramentas geotecnoló gicas. Essas ferramentas, englobadas nas geotecnologias, atravé s de
imagens de saté lites, dos modelos digitais de elevaçã o, da Geocronologia, da Geofı́sica de alta re‑
soluçã o e do Geoprocessamento, permitiram a obtençã o de dados com maior resoluçã o, cuja in‑
tegraçã o viabilizou a concepçã o de modelos tridimensionais, que permitiram observar com
maior detalhe e clareza o arranjo geomé trico dos sistemas deposicionais costeiros.
A PCRS foi classi icada, por Carraro et al. (1974), como uma das quatro provı́ncias geo‑
morfoló gicas do estado, constituı́da de uma ampla á rea de terras baixas, possuidora de algumas
peculiaridades, que a distingue no cená rio das regiõ es costeiras brasileiras. Essa unidade geo‑
morfoló gica, formada, principalmente, durante o Perı́odo Quaterná rio, destaca‑se pelo excelente
grau de preservaçã o dos registros morfoló gico e estratigrá ico, o que lhe confere a condiçã o de
um ó timo laborató rio natural no estudo da evoluçã o de regiõ es costeiras, submetidas à s suces‑
Contribuições à Geologia do Rio Grande do Sul e de Santa Catarina

sivas transgressõ es e à s regressõ es mari‑ campo, para estudos sedimentoló gicos, es‑
nhas, que ocorreram neste perı́odo geoló gi‑ tratigrá icos e evolutivos, o que resultou em
co. Tais eventos foram acompanhados de um signi icativo avanço do conhecimento
fatores ambientais locais (autogê nicos), co‑ sobre a Geologia da regiã o.
mo o estoque sedimentar e os processos eó ‑ Esse capı́tulo procura sintetizar o
licos e hidrodinâ micos (ondas e correntes), estado da arte (produzido, a partir de 1969)
que geraram importantes e evidentes regis‑ sobre a Geologia da porçã o emersa da Bacia
tros erosivos e deposicionais. de Pelotas, entre o Cabo de Santa Marta
As primeiras observaçõ es sobre a (Brasil) e La Coronilla (Uruguai), abordando
paisagem costeira, na primeira metade do a natureza e a distribuiçã o dos seus siste‑
Sé culo XX, de cunho essencialmente descriti‑ mas deposicionais e analisando sua histó ria
vo, sã o atribuı́das aos pesquisadores Lind‑ evolutiva. Essa revisã o está embasada em
man, Backeuser, Lamego e Rambo (Villwock muitos dos trabalhos supracitados e em no‑
& Tomazelli, 1995). Entre os vá rios aspectos vos estudos, realizados a partir deste sé cu‑
observados, chamou a atençã o destes pes‑ lo. As abordagens aqui apresentadas
quisadores o importante papel exercido pelo re letem as contribuiçõ es trazidas pelos
vento no modelado da paisagem, as dimen‑ pesquisadores, ligados ao Centro de Estu‑
sõ es dos campos de dunas eó licas e o grande dos de Geologia Costeira e Oceâ nica (CECO),
nú mero de corpos lagunares existente na re‑ do Instituto de Geociê ncias da UFRGS.
giã o.
Pesquisas mais aprofundadas, de cu‑ 2 CARACTERÍSTICAS GERAIS DA PLANÍ‑
nho geoló gico, tiveram inı́cio, a partir da se‑ CIE COSTEIRA DA BACIA DE PELOTAS
gunda metade do Sé culo XX. Conforme Closs
(1970), campanhas de sondagens estratigrá ‑ 2. 1 Contexto geológico e geomorfoló‑
icas, realizadas pela Petrobras, entre os gico
anos de 1958 e de 1963, permitiram uma
A Bacia de Pelotas está localizada
primeira abordagem da estratigra ia de sub‑
entre o Cabo de Santa Marta (Santa Catari‑
superfı́cie. A contribuiçã o de Delaney (1965)
na) e La Coronilla (Uruguai). Sua planı́cie
apresenta o primeiro mapa geoló gico, acom‑
costeira possui o registro mais completo de
panhado da primeira coluna estratigrá ica
eventos quaterná rios, ao longo da costa bra‑
das formaçõ es a lorantes na PCRS. Essa pu‑
sileira (Fig. 1), distribuı́dos ao longo dos
blicaçã o pode ser considerada um marco pa‑
seus 770 km de extensã o e dos seus 10 a 15
ra o conhecimento geoló gico da regiã o.
km de largura (trecho Tramandaı́‑Torres),
A partir de 1969, esses estudos geo‑ alcançado um valor má ximo de 100 km,
ló gicos pioneiros da PCRS receberam um pró ximo à Porto Alegre.
forte impulso, quando, sob a iniciativa do
A Bacia de Pelotas é uma bacia mar‑
Prof. Luiz Roberto Silva Martins, foi fundado
ginal aberta (sem limites fı́sicos, ao leste),
o Centro de Estudos de Geologia Costeira e
possuindo uma á rea de, aproximadamente,
Oceâ nica (CECO). Nesta mesma é poca, a con‑
210.000 km2. Faz fronteira com a Bacia de
comitante criaçã o do Programa de Pó s‑gra‑
Santos, ao norte, atravé s do Alto Florianó ‑
duaçã o em Geociê ncias, da UFRGS, com as
polis (Gamboa & Rabinowitz, 1981), e com a
á reas de concentraçã o Geologia Marinha, Es‑
Bacia de Punta Del Este, ao sul, atravé s do
tratigra ia e Paleontologia, contribuiu, para
Alto de Polô nio, no Uruguai (Urien & Mar‑
que a PCRS passasse a ser um laborató rio de
tins, 1978). Seus limites, no sentido oeste,

456 Edição da Sociedade Brasileira de Geologia – Núcleo RS/SC


Barboza et al.

Figura 1 – Mapa geoló gico/geomorfoló gico simpli icado da Bacia de Pelotas. As barreiras costeiras se
estendem, longitudinalmente, entre Cabo de Santa Marta (SC) (Brasil) e La Coronilla (Uruguai) (modi icado de
Dillenburg & Barboza, 2014; Rosa et al., 2017; Bitencourt et al., 2020).

correspondem aos embasamentos rochosos Ao longo desta extensa planı́cie cos‑


do Escudo Uruguaio‑Sul‑Rio‑Grandense, do teira, sã o identi icados sistemas de leques
Escudo de Santa Catarina, e à s formaçõ es aluviais e a justaposiçã o lateral de quatro
vulcano‑sedimentares da Bacia do Paraná . sistemas deposicionais do tipo laguna‑bar‑
As principais etapas do preenchimento da reira, inicialmente, de inidos para o Rio
Bacia sã o descritas nos trabalhos de Fontana Grande do Sul, por Villwock et al. (1986). Es‑
(1996), de Abreu (1998), de Bueno et al. ses sistemas deposicionais evoluı́ram, du‑
(2007) e de Barboza et al. (2008). rante o Quaterná rio Superior, devido à
Sistemas deposicionais e evolução geológica da planície costeira entre La Coronilla e Cabo de Santa Marta (Bacia de Pelotas) 457
Contribuições à Geologia do Rio Grande do Sul e de Santa Catarina

combinaçã o de processos alogê nicos e auto‑ 2. 3 Hidrodinâmica costeira


gê nicos, como: a eustasia (Delaney, 1965;
Em consequê ncia do regime de mi‑
Villwock & Tomazelli, 1995; Tomazelli &
cromaré s, com amplitude mé dia da maré as‑
Villwock, 1996), a tectô nica (Rosa et al.,
tronô mica situada em torno de 0,5 m, o
2009), o clima (Martinho et al., 2008), a di‑
transporte e a deposiçã o de sedimentos sã o
nâ mica costeira e o estoque sedimentar (Dil‑
dominados pela açã o das ondas e das cor‑
lenburg et al., 2000; Toldo Jr. et al., 2004;
rentes litorâ neas a elas associadas. Confor‑
Gruber et al., 2006; Dillenburg & Barboza,
me Motta (1967), o regime de ondas é
2014), e sua estratigra ia se caracteriza por
caracterizado pela ocorrê ncia de uma ondu‑
um padrã o de empilhamento estratigrá ico
laçã o (swell waves) de longo perı́odo, prove‑
variá vel (Barboza et al., 2011; Oliveira et al.,
niente de SE, e por vagas locais (sea waves),
2019; Bitencourt et al., 2020).
provenientes, principalmente, de E‑NE. Es‑
pecialmente, durante os meses de outono e
2. 2 Clima e regime de ventos de inverno, o regime normal de ondas é epi‑
sodicamente perturbado pela ocorrê ncia de
Sua posiçã o geográ ica inclui a re‑
ondas de tempestade (storm waves), associa‑
giã o emersa da Bacia de Pelotas, dentro da
das à passagem de frentes frias, provenien‑
zona subtropical ú mida, sob o controle bá si‑
tes do sul (Calliari et al., 1996).
co de massas de ar marı́timas, de origens
tropical e polar. O clima é subtropical cons‑
tantemente ú mido (Cfa), sem estaçã o seca, 3 SISTEMAS DEPOSICIONAIS DA PLANÍ‑
com verã o quente e com uma taxa de preci‑ CIE COSTEIRA DA BACIA DE PELOTAS
pitaçã o mé dia entre 1.300 e 1.900 mm, bem
3. 1 Introdução
distribuı́da, ao longo do ano (Alvares et al.,
2014). Partindo do modelo proposto por
O clima da regiã o sofre uma in luê n‑ Villwock et al. (1986) para a costa do Rio
cia fundamental de dois centros de alta Grande do Sul, podemos replicá ‑lo para toda
pressã o: o Anticiclone Semipermanente do a planı́cie costeira da Bacia de Pelotas. A
Atlâ ntico Sul (Anticiclone de Santa Helena) e planı́cie costeira se desenvolveu, sob o con‑
o Anticiclone Mó vel Polar (Nimer, 1977). O trole das variaçõ es climá ticas e das lutua‑
regime de ventos, um dos agentes mais im‑ çõ es do nı́vel relativo do mar, ao longo do
portantes na morfogê nese da planı́cie cos‑ Quaterná rio, acumulando sedimentos em
teira, é controlado pela açã o destes dois dois tipos principais de sistemas deposicio‑
centros dinâ micos. nais: (1) um sistema de leques aluviais, que
O vento predominante, proveniente ocupa uma faixa contı́nua, ao longo da parte
das bordas do Anticiclone do Atlâ ntico Sul, mais interna da planı́cie; e (2) quatro distin‑
incide de NE e se torna mais ativo nos meses tos sistemas deposicionais transgressivos‑
de primavera e de verã o. O vento secundá ‑ regressivos do tipo laguna‑barreira (Figs. 1 e
rio, associado à atividade do Anticiclone Mó ‑ 2).
vel Polar, incide de W‑SW e se torna mais
importante nos meses de outono e de inver‑ 3. 2 Sistema de leques aluviais
no (Tomazelli, 1993). E caracterizado como
O sistema de leques aluviais engloba
um regime de ventos com alta energia e de
um conjunto de fá cies sedimentares, resul‑
natureza bimodal.
tante de processos de transporte, associados

458 Edição da Sociedade Brasileira de Geologia – Núcleo RS/SC


Barboza et al.

aos ambientes de encosta das terras altas, mento dos sistemas deposicionais do tipo la‑
adjacentes à planı́cie costeira. O sistema de guna‑barreira. Quatro desses sistemas depo‑
leques aluviais, provavelmente, começou a se sicionais foram preservados no registro
formar ainda no Terciá rio, e evoluiu, ao longo estratigrá ico e podem ser identi icados na
do Quaterná rio, controlado, em grande parte, paisagem da atual PCRS, sendo trê s de idade
pelas oscilaçõ es climá ticas e eustá ticas, que pleistocê nica e um de idade holocê nica
ocorreram nesse intervalo de tempo. Duran‑ (Villwock et al., 1986).
te os perı́odos climá ticos mais ú midos, as
formas originais dos leques aluviais foram 3. 3. 1 Sistemas laguna‑barreira pleisto‑
suavizadas e alteradas, resultando, no inal, cênicos
na formaçã o de uma rampa de depó sitos alu‑
viais, que mergulha suavemente, no sentido Villwock et al. (1986) denominaram,
da bacia (Tomazelli et al., 2007). os sistemas deposicionais pleistocê nicos
mais antigos para os mais jovens, como: sis‑
3. 3 Sistemas do tipo laguna‑barreira temas I, II e III. A Barreira I se encontra pre‑
servada na parte NW da PCRS, na qual da
Durante o Quaterná rio, as lutuaçõ es planı́cie costeira, na qual ocupa, atualmente,
glá cio‑eustá ticas do nı́vel do mar produziram uma faixa de terreno, com cerca de 150 km
grandes deslocamentos laterais da linha de de comprimento e 5 a 15 km de largura. Nes‑
costa. Esses deslocamentos ocorreram, ao ta regiã o, a barreira cresceu, principalmente,
longo das feiçõ es morfoló gicas, que conhece‑ a partir do acú mulo de areias eó licas, que se
mos, hoje, como plataforma continental e ancoraram sobre altos do embasamento (To‑
planı́cie costeira. Os diversos ciclos trans‑ mazelli et al., 2007). Recentes aquisiçõ es de
gressivos‑regressivos, a baixa declividade dados de subsuperfı́cie com Georadar (GPR),
destas feiçõ es morfoló gicas, a energia ambi‑ apoiados por um sistema de posicionamento
ental, dominada pela açã o das ondas, e a alta GNSS pó s‑processado, permitiram identi i‑
disponibilidade de sedimentos arenosos fo‑ car re lexõ es do substrato de depó sitos prai‑
ram fatores, que estimularam o desenvolvi‑ ais, de pó s‑praia e de estirâ ncio, que indicam

Figura 2 – Per il esquemá tico transversal dos sistemas deposicionais da Planı́cie Costeira do Rio Grande do Sul,
pró ximos à latitude de Porto Alegre (ver Fig.1). O per il da seçã o transversal A‑A' mostra a justaposiçã o lateral
dos sistemas laguna‑barreira, com as altitudes estimadas de cada elevaçã o, correspondente ao nı́vel do mar, e a
correlaçã o com os ú ltimos principais picos da curva isotó pica de oxigê nio, de acordo com Imbrie et al. (1984)
(modi icado de Tomazelli & Villwock, 2000; Rosa et al., 2017; Bitencourt et al., 2020).

Sistemas deposicionais e evolução geológica da planície costeira entre La Coronilla e Cabo de Santa Marta (Bacia de Pelotas) 459
Contribuições à Geologia do Rio Grande do Sul e de Santa Catarina

um nı́vel relativo do mar situado a, aproxi‑ Dillenburg, 2007; Martins et al., 2018). A
madamete, 15 m acima do nı́vel atual, na presença destes ichnofó sseis caracteriza um
é poca da formaçã o dessa barreira (Eduardo paleo‑nı́vel marinho, atingido durante o ú lti‑
Barboza, informaçã o verbal). Rosa et al. mo interglacial, situado 8 m acima do nı́vel
(2017), a partir de correlaçõ es com dados atual (Rosa et al., 2017).
sı́smicos e cronoló gicos da porçã o submersa
Os depó sitos sedimentares, corres‑
da Bacia, propõ em uma idade de formaçã o,
pondentes à s fá cies lagunares, associadas
relacionada ao está gio isotó pico de oxigê nio
aos sistemas pleistocê nicos I, II e III, sã o re‑
9 (Imbrie et al., 1984).
presentadas por areias sı́ltico‑argilosas, mal
A Barreira II está associada a um se‑ selecionadas, maciças ou com laminaçã o
gundo ciclo transgressivo‑regressivo pleisto‑ plano‑paralela. Nesses depó sitos, é comum a
cê nico, e estudos mais recentes indicaram ocorrê ncia de concreçõ es pedogené ticas, de
que se desenvolveu, em resposta à transgres‑ composiçõ es carboná tica ou ferruginosa.
sã o, relacionada ao está gio isotó pico de oxi‑ Conforme Tomazelli et al. (2007), é observa‑
gê nio 7, ao invé s do está gio de oxigê nio 9, do que, em alguns locais, as concreçõ es pe‑
conforme proposto, anteriormente, por dogené ticas apresentam altas
Villwock & Tomazelli (1995). Essas novas in‑ concentraçõ es, formando camadas enrique‑
formaçõ es tê m, como base, idades obtidas cidas em carbonatos de, até , 1 m de espessu‑
por termoluminescê ncia em depó sitos de ra, o que re lete, provavelmente, a
quartzos e por ressonâ ncia do spin de elé ‑ ocorrê ncia de condiçõ es paleoclimá ticas se‑
tron em dentes fossilizados de animais da miá ridas. Fó sseis de uma fauna extinta de
megafauna pleistocê nica (Lopes et al., 2010). mamı́feros pleistocê nicos (Megafauna Pam‑
Assim, segundo esses autores, o Sistema II peana) tê m sido encontrados, associados
foi depositado, em torno de 230 ka AP, e foi aos depó sitos lagunares pleistocê nicos, es‑
formado em um nı́vel relativo do mar na or‑ pecialmente, na regiã o sul da planı́cie costei‑
dem de 9,5 m acima do nı́vel atual (Rosa et ra, pró xima à fronteira com o Uruguai (Paula
al., 2017). Couto, 1953; Lopes et al., 2010).
Conforme Tomazelli & Dillenburg
(2007), a Barreira III, associada ao ú ltimo in‑
3. 3. 2 Sistema laguna‑barreira holocê‑
terglacial, de 125 ka AP (subestá gio isotó pico
nico
de oxigê nio 5e), é a que apresenta melhor
preservaçã o entre os sistemas pleistocê ni‑ O mais jovem sistema deposicional
cos. Os depó sitos a ela correlacioná veis se do tipo laguna‑barreira, observado ao longo
estendem, de maneira quase contı́nua, ao da Bacia, desenvolveu‑se durante o Holoce‑
longo de toda a planı́cie costeira da Bacia de no. A partir dos está gios inais da ú ltima
Pelotas. Assim, o desenvolvimento da Barrei‑ transgressã o pó s‑glacial, com a desacelera‑
ra III possibilitou a formaçã o dos grandes çã o da subida do nı́vel do mar, a evoluçã o
corpos lagunares, que ainda se destacam na costeira, ao longo da Bacia, passou a ser in‑
paisagem da regiã o costeira (Lagoa dos Pa‑ luenciada fortemente pela topogra ia ante‑
tos (RS), Complexo Lagunar Santo Antô nio cedente, tanto na con iguraçã o da
dos Anjos, Imaruı́ e Mirim (SC)). Em alguns morfologia da costa como, també m, na de‑
locais da Barreira III, encontra‑se uma alta terminaçã o do tipo de barreira formada
concentraçã o de tubos fó sseis de Ophio‑ (Dillenburg et al., 2000). Assim, a barreira
morpha, formados, provavelmente, por crus‑ holocê nica foi desenvolvida por dois proces‑
tá ceos do gê nero Callichirus (Tomazelli & sos bá sicos: deposiçã o, ao longo das grandes

460 Edição da Sociedade Brasileira de Geologia – Núcleo RS/SC


Barboza et al.

reentrâ ncias da costa, levando à formaçã o de a lorante na parte interna da planı́cie costei‑
sistemas progradantes; e erosã o, ao longo ra, assentou‑se sobre camadas marinhas mi‑
das protuberâ ncias costeiras, levando ao de‑ ocê nicas e teve o apogeu de seu
senvolvimento de sistemas retrogradantes desenvolvimento, durante o evento regressi‑
(Dillenburg et al., 2000; Barboza et al., 2011; vo. Nessa primeira fase, a paleogeogra ia era
Dillenburg & Barboza, 2014; Rosa et al., de uma grande planı́cie, construı́da por le‑
2017). ques deltaicos coalescentes, alimentados por
Os indicadores do paleo nı́vel relati‑ luxos torrenciais, provenientes das terras
vo do mar e do sistema laguna‑barreira holo‑ altas, submetidas a um clima semiá rido (To‑
cê nico na Bacia estã o relacionados à s feiçõ es mazelli et al., 2007).
geomorfoló gicas, como terraços lagunares Estima‑se que o primeiro ciclo
(Barboza & Tomazelli, 2003), à posiçã o das transgressivo‑regressivo, de que se tem re‑
feiçõ es de praias e das zona de surf, observa‑ gistro, retrabalhou a porçã o distal dos leques
das em a loramentos, em furos de sondagem deltaicos e deu origem a um sistema laguna‑
e em per is de GPR (Barboza et al., 2011; Dil‑ barreira, que icou bem preservado na parte
lenburg et al., 2017), e correlacionados à NW da PCRS. Esta antiga linha de costa
curva do nı́vel relativo do mar de Imbituba pleistocê nica é correlacioná vel ao está gio
(SC), obtidos a partir de dataçõ es de C14 em isotó pico de oxigê nio 9, há , aproximadamen‑
vermitı́deos (Angulo et al., 2006). Esses indi‑ te, 325 ka AP (Rosa et al., 2017).
cadores propõ em um nı́vel relativo do mar O segundo ciclo, responsá vel pelo
má ximo na ordem de 2‑3 m acima do atual, inı́cio da construçã o da barreira arenosa,
há 5,6 ka AP. que isolou a Lagoa dos Patos e a Lagoa Mi‑
rim, foi denominado “Barreira Mú ltipla Com‑
4 EVOLUÇÃO GEOLÓGICA DA PLANÍCIE plexa” por Villwock (1984). O má ximo da
COSTEIRA DA BACIA DE PELOTAS transgressã o esculpiu uma escarpa erosiva
na superfı́cie dos leques aluviais e construiu
O modelo evolutivo aqui apresenta‑ alguns pontais arenosos, marcando uma se‑
do é , na sua sı́ntese, o proposto por Villwock gunda linha de costa pleistocê nica, correlaci‑
et al. (1986), o qual é re inado com os dados oná vel ao está gio isotó pico de oxigê nio 7, há ,
disponibilizados pelas geotecnologias, até o aproximadamente, 230 ka AP (Lopes et al.,
momento. De acordo com este modelo, um 2010; Rosa et al., 2017). Na margem oceâ ni‑
pacote de sedimentos clá sticos terrı́genos se ca, ao sul da Bacia, uma barreira arenosa iso‑
acumulou, a partir do inal do Terciá rio, em lou a Lagoa Mirim e, ao norte, um pontal
um sistema de leques aluviais coalescentes, arenoso recurvado, ancorado na base das
desenvolvido ao longo da margem oeste da encostas do planalto da Serra Geral (Bacia
borda da Bacia, na base das terras altas. Es‑ do Paraná ), com segmentaçõ es, ao sul de
tes depó sitos foram retrabalhados, em suas Palmares do Sul, começou a isolar a á rea,
porçõ es distais, por, no mı́nimo, quatro ciclos que viria a ser ocupada pela Lagoa dos Patos
transgressivos‑regressivos, correlacioná veis (Tomazelli et al., 2007).
aos quatro ú ltimos eventos glaciais, que ca‑ O terceiro ciclo adicionou mais um
racterizaram o inal do Cenozoico (Tomazelli sistema do tipo laguna‑barreira, completan‑
et al., 2007). do o fechamento da Lagoa dos Patos (RS) e o
A primeira fase se estendeu do Plio‑ Complexo Lagunar Santo Antô nio dos Anjos,
ceno ao Pleistoceno Inferior, quando a por‑ Imaruı́ e Mirim (SC). Pertence a este evento,
çã o superior do sistema de leques aluviais, també m, a depressã o lagunar, que, hoje, é
Sistemas deposicionais e evolução geológica da planície costeira entre La Coronilla e Cabo de Santa Marta (Bacia de Pelotas) 461
Contribuições à Geologia do Rio Grande do Sul e de Santa Catarina

drenada pelo arroio Chuı́ no sul da Bacia, na ordem de ‑5 m do atual.


qual foram encontrados muitos exemplares A ú ltima transgressã o pó s‑glacial,
de mamı́feros fó sseis da Megafauna Pampea‑ iniciada no inal do Pleistoceno, avançou ra‑
na. O setor norte da Bacia, regiã o em se loca‑ pidamente pela planı́cie costeira, que ocupa‑
liza a Lagoa da Ibiraquera (SC), també m se va a atual plataforma continental (Corrê a,
encontra neste contexto. No interior desses 1996). A elevaçã o do nı́vel relativo do mar
sistemas lagunares, a terceira linha de costa teve seu má ximo há cerca de 5,6 ka AP, atin‑
pleistocê nica está muito bem preservada, gindo em torno de 2 a 3 m acima do nı́vel
sob a forma de uma escarpa, no limite inter‑ atual. Uma escarpa muito bem preservada,
no de um terraço, com altitudes entre 8‑15 esculpida por á guas lagunares nos depó sitos
m, de remanescentes de cristas de praia e de das barreiras e dos terraços lagunares pleis‑
pontais arenosos. A Barreira III, que conti‑ tocê nicos, é testemunha da posiçã o alcança‑
nuou a se desenvolver na fase regressiva, é , da por esta linha de costa no má ximo
entre as barreiras pleistocê nicas, a que pos‑ transgressivo (Villwock & Tomazelli, 1998;
sui o registro estratigrá ico mais bem pre‑ Barboza & Tomazelli, 2003).
servado, apresentando depó sitos praiais e A desaceleraçã o na taxa de subida
marinhos rasos e contendo abundantes do nı́vel do mar e a estabilizaçã o temporá ria
Ophiomorpha (Callichirus sp. ), cobertos por no inal deste evento de elevaçã o do nı́vel do
um manto de areias eó licas. Correlacioná vel mar (highstand) foram responsá veis pela im‑
aos depó sitos muito semelhantes, que ocor‑ plantaçã o de uma barreira transgressiva,
rem, ao longo de quase toda a costa brasilei‑ que, muito provavelmente, migrou desde o
ra, a idade deste sistema tem sido bordo da plataforma continental e que, pro‑
considerada como de 125 ka AP, subestá gio vavelmente, possuı́a dimensõ es reduzidas,
isotó pico de oxigê nio 5e, corroborada por tendo em vista o limitado suprimento de
idades obtidas por Lopes et al. (2020). areia, fornecido pelos poucos rios que alcan‑
De acordo com Tomazelli et al. çavam a paleo linha de costa (Tomazelli et
(2007), a fase regressiva, que se seguiu, atin‑ al., 2007). Desde esse evento de elevaçã o
giu seu má ximo há , aproximadamente, 17 ka má xima do nı́vel do mar, a maior parte da
AP. Uma ampla planı́cie costeira ocupava o carga arenosa, transportada pelos principais
que, hoje, é a plataforma continental, en‑ rios que chegam à planı́cie costeira, ica reti‑
quanto os sistemas lagunares se comporta‑ da nos ambientes lagunares, instalados nos
vam como grandes planı́cies luviais, á reas espaços de retrobarreira.
de passagem de cursos de á gua, que, erodin‑ A estabilizaçã o e a posterior queda
do depó sitos antigos, aprofundavam seus va‑ do nı́vel relativo do mar, apó s 3 ka (Kuhn et
les (Barboza et al., 2021a), até chegar à linha al., 2017; Barboza et al., 2021b) AP, fez com
de costa, situada a, aproximadamente, 120 m que a Barreira IV evoluı́sse de forma diferen‑
abaixo do atual nı́vel do mar. ciada, ao longo da costa, devido à s variaçõ es
Estudo recente, apresentado por Dil‑ na topogra ia antecedente à ú ltima trans‑
lenburg et al. (2020), a partir de um conjun‑ gressã o (morfologia da superfı́cie pré ‑holo‑
to de idades, obtidas atravé s do mé todo cê nica) e à sua in luê ncia na variabilidade do
isotó pico C14, propõ e a presença de um siste‑ â ngulo de ataque e na altura das ondas, ao
ma do tipo laguna‑barreira, de idade em tor‑ longo da costa (Dillenburg et al., 1998, 2000,
no de 43‑45 ka AP, relacionado ao está gio 2003; Dillenburg & Barboza, 2014). Basica‑
isotó pico de oxigê nio 3 (MIS 3). Esse sistema mente, sã o reconhecidos trê s tipos bá sicos
foi formado em um nı́vel relativo do mar na de barreiras, que se desenvolveram nos ú lti‑

462 Edição da Sociedade Brasileira de Geologia – Núcleo RS/SC


Barboza et al.

mos 6‑5 ka: regressivas (ou progradacio‑ horizontais paralelas, relacionadas aos de‑
nais), transgressivas (ou retrogradacionais) pó sitos eó licos de campos de dunas trans‑
e estacioná rias (ou agradacionais). gressivos, (Dillenburg & Barboza, 2014; Rosa
A interpretaçã o de seçõ es de GPR so‑ et al., 2017).
bre estes trê s tipos bá sicos permitiu identi i‑ A de iniçã o do empilhamento estra‑
car trê s padrõ es principais de empilhamento tigrá ico, com base na con iguraçã o das re‑
estratigrá ico: retrogradacional, progradaci‑ lexõ es em subsuperfı́cie, e a sucessã o de
onal e agradacional. O padrã o de empilha‑ radarfá cies permitiu identi icar as principais
mento retrogradacional (Fig. 3A) é superfı́cies internas e delimitadoras dos sis‑
caracterizado por re lexõ es, mergulhando temas laguna‑barreira. Cada sistema laguna‑
em direçã o ao continente (Barboza et al., barreira pleistocê nico (II, III e IV) é separado
2011; Lima et al., 2013; Dillenburg & Barbo‑ por inconformidades, representando uma
za, 2014; Rosa et al., 2016, 2017; Oliveira et sequê ncia deposicional, caracterizada por
al., 2019; Bitencourt et al., 2020). As radarfá ‑ uma sucessã o de estratos, com relaçã o de
cies estã o relacionadas a depó sitos de fun‑ conformidade. O padrã o arquitetô nico ob‑
dos lagunares cobertos por depó sitos de servado nos sistemas II, III e IV é , basica‑
margens lagunares e aos depó sitos eó licos mente, o mesmo. Dessa forma, o estudo de
de campos de dunas transgressivos, sendo detalhe realizado na Barreira IV (marcada
que estes ú ltimos caracterizam a morfologia por registros mais bem preservados e menos
da barreira retrogradacional. Em algumas afetados pela diagê nese), com base em um
seçõ es de GPR, é possı́vel reconhecer a trans‑ elevado nú mero de testemunhos de sonda‑
gressã o má xima da linha de costa (Barboza gem, de idades geocronoló gicas e de levanta‑
et al., 2011), em que as re lexõ es, mergulhan‑ mentos geofı́sicos (GPR), com registros de
do para o continente, atingem sua posiçã o extraordiná ria qualidade, tem sido a chave,
mais interiorizada (Rosa et al., 2017). para a interpretaçã o dos sistemas II e III.
Em alguns setores da planı́cie costei‑ A determinaçã o do empilhamento
ra, o padrã o de empilhamento progradacio‑ estratigrá ico dos quatros sistemas laguna‑
nal (Fig. 3B) é observado e caracterizado por barreira permitiu de inir pacotes deposicio‑
conjuntos contı́nuos de depó sitos de praia e nais, relacionados aos tratos de sistemas
marinhos, com mergulho em direçã o ao oce‑ transgressivo e nı́vel alto/está gio de queda
ano. Nas seçõ es de GPR, o empilhamento (Rosa et al., 2017). O trato de sistemas de nı́‑
progradacional é composto por radarfá cies, vel baixo foi recentemente reconhecido em
relacionadas a depó sitos eó licos, praiais e de um vale inciso, relacionado ao sistema holo‑
antepraia (shoreface), formando um conjun‑ cê nico (Barboza et al., 2021a). O empilha‑
to de re lexõ es, mergulhando em direçã o à mento estratigrá ico degradacional (també m
Bacia (Barboza et al., 2011; Biancini da Silva conhecido como está gio de queda ou regres‑
et al., 2014; Dillenburg & Barboza, 2014; Leal sã o forçada) nã o foi separado do trato de
et al., 2016; Rosa et al., 2017; Leandro et al., sistemas de nı́vel alto, devido à baixa resolu‑
2019). A morfologia da barreira é represen‑ çã o dos dados. Dillenburg et al. (2017), estu‑
tada, principalmente, por cordõ es de dunas dando a Barreira IV na porçã o sul da planı́cie
frontais e por lençó is de areias transgressi‑ costeira (regiã o do balneá rio Cassino), apre‑
vos (Dillenburg et al., 2000; Hesp et al., 2007; sentam uma separaçã o dos tratos de siste‑
Martinho et al., 2008). mas de nı́vel alto e está gio de queda.
O terceiro padrã o de empilhamento A aná lise integrada dos quatro siste‑
é de inido como agradacional, com re lexõ es mas laguna‑barreira (Fig. 2) indica que, no
Sistemas deposicionais e evolução geológica da planície costeira entre La Coronilla e Cabo de Santa Marta (Bacia de Pelotas) 463
Contribuições à Geologia do Rio Grande do Sul e de Santa Catarina

Figura 3 – Seçõ es coletadas com um sistema de GPR, utilizando uma antena aé rea, com frequê ncia central de
80 MHz, demonstrando os padrõ es de empilhamentos estratigrá icos observados na barreira holocê nica: A)
Padrã o de empilhamento retrogradacional, interpretado na regiã o do Jardim do Eden (RS), em que se observam
re lexõ es, com mergulho, em direçã o ao continente; B) Padrã o de empilhamento progradacional, interpretado
na regiã o da Praia Paraı́so (RS), em que se observam re lexõ es, com mergulho, em direçã o ao oceano.

intervalo de tempo de formaçã o destes siste‑ um dos quatro ciclos transgressivos‑regres‑


mas (ú ltimos 325 ka), o conjunto dos quatro sivos. Esses ciclos foram responsá veis pela
sistemas deposicionais apresenta um padrã o formaçã o de quatro sistemas deposicionais
de empilhamento degradacional, caracteri‑ do tipo laguna‑barreira, hoje, identi icados
zando, assim, uma 4ª ordem: um trato de sis‑ na morfologia da planı́cie costeira. També m
temas em está gio de queda. foi identi icado um ciclo (MIS 3), que origi‑
nou um sistema laguna‑barreira que nã o
5 CONSIDERAÇÕES FINAIS a lora na planı́cie costeira.
Cada barreira interiorizada na pla‑
O sistema de leques aluviais, desen‑ nı́cie costeira teve sua origem, provavelmen‑
volvido na parte interna da planı́cie costeira, te, no limite má ximo atingido por uma
ao longo da Bacia de Pelotas, foi retrabalha‑ transgressã o e foi preservada, devido à re‑
do, durante o Quaterná rio, por, pelo menos, gressã o da linha de costa, forçada pela sub‑

464 Edição da Sociedade Brasileira de Geologia – Núcleo RS/SC


Barboza et al.

sequente queda glacio‑eustá tica do nı́vel do Barboza, E. G. & Tomazelli, L. J. 2003. Erosio‑
mar. Os quatro sistemas laguna‑barreira, nal features of the eastern margin of the Pa‑
identi icados na morfologia da planı́cie cos‑ tos Lagoon, southern Brazil: signi icance for
teira, sã o interpretados como tendo se for‑ Holocene history. J. Coas. Res., SI 35: 260‑
264.
mado nos ú ltimos 325 ka, assumindo‑se uma
correlaçã o com os perı́odos de mar alto, re‑ Barboza, E. G., Rosa, M. L. C. C., Hesp, P. A.,
presentados pelos picos das curvas do regis‑ Dillenburg, S. R., Tomazelli, L. J. & Ayup‑Zou‑
tro isotó pico de oxigê nio e por dataçõ es ain, R. N. 2011. Evolution of the Holocene co‑
radiomé tricas. astal barrier of Pelotas Basin (southern
Brazil) – a new approach with GPR data.
A aplicaçã o dos conceitos da Estrati‑
Journal of Coastal Research, SI 64: 646‑650.
gra ia de Sequê ncias permite estabelecer um
arcabouço cronoestratigrá ico, que, aliado ao Barboza, E. G., Dillenburg, S. R., Lopes, R. P.,
empilhamento estratigrá ico observado, con‑ Rosa, M. L. C. C., Caron, F., Abreu, V. S., Man‑
tribui para a prediçã o evolutiva da Bacia de zolli, R. P., Nunes, J. C. R., Weschenfelder, J. &
Pelotas. Tomazelli, L. J. 2021a. Geomorphological and
Stratigraphic Evolution of a Fluvial Incision
A á rea de estudo representa um ex‑ in the Coastal Plain and Inner Continental
celente exemplo de como sistemas do tipo Shelf in Southern Brazil. Marine Geology.
laguna‑barreira podem se desenvolver e pre‑ (submetido)
servar seus depó sitos sedimentares em cos‑
tas dominadas pela açã o de ondas, durante Barboza, E. G., Dillenburg, S. R., Caron, F., Ri‑
ter, M. N., Rosa, M. L. C. C. 2021b. Holocene
ciclos transgressivos‑regressivos de 4ª or‑
sea‑level oscillations in southern Brazil ba‑
dem. sed on high‑resolution radar stratigraphy.
Geosciences. (submetido)
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468 Edição da Sociedade Brasileira de Geologia – Núcleo RS/SC


O Sistema Aquífero Serra Geral no
Rio Grande do Sul e em Santa Catarina
Antonio Pedro Viero1*, Ari Roisenberg1,
Marcos Alexandre Freitas2, Pedro Antonio Roehe Reginato1

1
Universidade Federal do Rio Grande do Sul
2
Serviço Geoló gico do Brasil (CPRM)

*autor correspondente: antonio.viero@ufrgs.br

1 INTRODUÇÃO
O Sistema Aquı́fero Serra Geral (SASG), de natureza issural e livre, representa uma das
principais unidades hidroestratigrá icas e a mais explotada do sul do Brasil, principalmente em
razã o do vasto territó rio que abrange, da boa qualidade da á gua que possui, da boa vazã o (mé ‑
dia de 14 m3/h) e dos custos relativamente baixos de instalaçã o de poços tubulares. O Sistema
de Informaçõ es de Aguas Subterrâ neas (SIAGAS) registra cerca de 13.000 poços tubulares em
funcionamento no SASG, o que permite estimar uma retirada anual da ordem de 1,02 bilhã o de
metros cú bicos.
Provı́ncias basá lticas, como a da Bacia do Paraná , formam bons sistemas aquı́feros, por‑
que contê m á gua de excelente qualidade, geralmente caracterizada por baixa salinidade, possu‑
em grandes extensõ es lateral e vertical e apresentam alta densidade de falhas e de fraturas, que
lhe conferem boa condutividade hidrá ulica e a capacidade de acumular enormes volumes de
luı́dos. A intensidade e a anisotropia estrutural do SASG representam os registros atectô nicos
do ambiente deposicional vulcâ nico (derrames e luxos piroclá sticos), assim como estruturas
tectô nicas, relacionadas aos eventos deformacionais superimpostos, ocorridos ao longo da evo‑
luçã o tectô nica da Bacia do Paraná .
A recarga do SASG ocorre, principalmente, pela in iltraçã o de á gua da chuva, mas tam‑
bé m recebe a contribuiçã o importante dos aquı́feros sedimentares sotopostos da Bacia do Para‑
ná , que tê m luxo ascendente, atravé s de falhas e de fraturas, devido ao elevado con inamento.
Essa recarga ascendente resulta na salinizaçã o das á guas do SASG, com intensidades variadas,
chegando a comprometer a potabilidade em um nú mero pouco expressivo de poços para os pa‑
Contribuições à Geologia do Rio Grande do Sul e de Santa Catarina

râ metros Só dio, Sulfato, Flú or e Ferro, alé m 917.000 km2 do setor meridional da Amé ri‑
de Arsê nio e de Selê nio. ca do Sul (Frank et al., 2009), enquanto a
sequê ncia em Etendeka (Namı́bia) repre‑
2 CONTEXTOS GEOLÓGICO E ESTRUTU‑ senta um pequeno fragmento da Provı́ncia.
RAL No RS, o pacote vulcâ nico cobre
mais de 50% da superfı́cie do estado, alcan‑
A ruptura continental do Gondwana, çando espessura má xima da ordem de 1.000
causada pela açã o de plumas manté licas, du‑ metros na escarpa da regiã o nordeste, dos
rante o Cretá ceo Inferior, determinou a aber‑ quais 600 metros correspondem aos derra‑
tura do Oceano Atlâ ntico do sul para o norte e mes bá sicos a intermediá rios. A espessura
o extravasamento de um espesso pacote vul‑ total decresce para oeste, onde possui 50 a
câ nico basá ltico sobre a superfı́cie sedimen‑ 100 metros na fronteira com a Argentina e
tar, constituı́da pelas formaçõ es Botucatu, com o Uruguai (Fig. 1). O pacote vulcâ nico
Guará , Sanga do Cabral e Piramboia, que á cido possui espessura total de, até , 400
ocorrem nos estados de RS e de SC. O pacote metros no per il da estrada que liga Lageado
vulcâ nico em pauta constitui o chamado Gru‑ a Soledade (RS) e na escarpa leste do esta‑
po Serra Geral, unidade litoestratigrá ica do.
constituı́da por intrusõ es hipoabissais (solei‑ Em SC, a espessura do Grupo Serra
ras e diques) e por derrames de basaltos e de Geral atinge, até , 1.200 metros na escarpa, à
andesitos (escassos), de natureza toleı́tica e leste, correspondente à regiã o de Urubici,
de cará ter issural, intercalados no topo ou onde o pacote á cido registra cerca de 450
sobrepostos por um pacote de natureza á cida, metros no Morro da Igreja, com 1.712 me‑
de composiçã o riolı́tica. Em seu conjunto, o tros de altitude. Tal como no Rio Grande do
pacote vulcâ nico representa a Provı́ncia Vul‑ Sul, as cotas de topo do pacote vulcâ nico
câ nica Paraná ‑Etendeka, que cobre cerca de tendem a diminuir, em direçã o a oeste.

Figura 1 ‒ Mapa geoló gico simpli icado do RS e de SC, mostrando os principais compartimentos geoló gicos,
hidrogeoló gicos e estruturais do Grupo Serra Geral, que constitui o SASG nos dois estados.

470 Edição da Sociedade Brasileira de Geologia – Núcleo RS/SC


Viero et al.

Sob o ponto de vista geoquı́mico, o rochas basá lticas possuem uma sensibilidade
vulcanismo bá sico a intermediá rio é com‑ maior à alteraçã o intempé rica, razã o pela
partimentado em dois tipos principais. A qual a espessura dos solos é maior, podendo
partir do Lineamento do Rio Piquiri (SC‑PR), constituir unidades pedoló gicas com mais de
para o norte, predominam amplamente ba‑ 10 m de espessura, como no oeste do RS e de
saltos tipo alto‑TiO2, enquanto na regiã o situ‑ SC. Já nas rochas á cidas, a espessura de solos
ada ao sul do Rio Pelotas o tipo baixo‑TiO2 é é relativamente pequena, como na regiã o da
dominante, correspondendo ao pacote vul‑ escarpa nordeste dos estados em estudo, on‑
câ nico encontrado no estado gaú cho. Ao nor‑ de pode nã o ultrapassar um metro, deixando
te do Rio Pelotas, até o Lineamento do Rio as litologias a lorantes.
Piquiri (SC), situa‑se uma zona de transiçã o e O contexto tectô nico na regiã o é de
os dois tipos litogeoquı́micos aparecem e se extrema relevâ ncia para o entendimento da
interdigitam, mostrando origem, a partir de circulaçã o e da composiçã o da á gua subter‑
sistemas alimentadores independentes. râ nea no Sistema Aquı́fero Serra Geral, tendo
O pacote á cido do Grupo Serra Geral sido objeto de inú meros estudos regionais
també m é representado nos estados do RS e (Machado, 2005; Nanni et al., 2009; Freitas et
de SC por dois tipos, petrogra icamente dis‑ al., 2016, entre outros), utilizando té cnicas
tintos. O tipo Chapecó se caracteriza pelo ca‑ de sensoriamento remoto, associadas ou nã o
rá ter notadamente por irı́tico e ocorre no à aná lise estatı́stica, e de geofı́sica. Os linea‑
noroeste do RS e no sul de SC, enquanto o ti‑ mentos tectô nicos observados representam,
po Palmas, de cará ter afı́rico, domina ampla‑ em muitos casos, a reativaçã o de falhamen‑
mente no RS, constituindo uma unidade tos, a partir do Escudo Cristalino, que consti‑
tabular, que pode se estender, de forma con‑ tui o embasamento da Bacia do Paraná , que
tı́nua, por dezenas de quilô metros. Esta é possuem, segundo Zalá n et al. (1991), trê s
uma das evidê ncias que levaram Roisenberg grupos de orientaçõ es principais, NW‑SE, NE‑
& Viero (2002) a indicar se tratar, na maior SW e E‑W, das quais as duas primeiras sã o as
parte, de rheoignimbritos. Na regiã o nordes‑ mais importantes. CPRM (2002), em estudo
te do RS, Lima et al. (2012) registram, em vá ‑ estrutural da regiã o oeste de SC, destaca, co‑
rios locais, a existê ncia de condutos mo principais, as direçõ es N30‑50E e N40‑
alimentadores e de derrames riolı́ticos asso‑ 60W, registrando falhas com direçã o N70E,
ciados. que possuem, até , 135 km de extensã o. Den‑
tro desta perspectiva, Machado et al. (2012)
E importante destacar, pelas implica‑
descrevem que, na borda leste da escarpa
çõ es no condicionamento hidrogeoló gico,
vulcâ nica de SC, lineamentos, com direçõ es
que a espessura individual dos derrames bá ‑
N‑S e E‑W, sã o coincidentes com as direçõ es
sicos varia, em geral, entre 15 a 20 metros e
encontradas na regiã o do Domo de Lages,
que é frequente o registro de lentes arenosas
marcando a in luê ncia das intrusõ es alcalinas
entre as unidades vulcâ nicas, constituindo,
na geraçã o de falhas, na regiã o.
com a zona de contato entre derrames, os se‑
tores preferenciais para a surgê ncia de á gua
subterrâ nea. 3 CONTEXTO HIDROGEOLÓGICO
Os solos sã o igualmente diferentes 3. 1 Circulação de água no sistema aquí‑
nas unidades bá sicas e á cidas, o que consti‑ fero
tui parâ metro importante, que in luencia as
caracterı́sticas das á guas subterrâ neas. As A movimentaçã o da á gua no SASG

O Sistema Aquífero Serra Geral no Rio Grande do Sul e em Santa Catarina 471
Contribuições à Geologia do Rio Grande do Sul e de Santa Catarina

ocorre de diferentes formas, tendo inı́cio no clima. Tem um papel importante na forma‑
manto de alteraçã o, existente sobre as ro‑ çã o de nascentes e de fontes e na contribui‑
chas, e continuando no conjunto de estrutu‑ çã o do luxo de base dos rios.
ras, que formam o aquı́fero fraturado (Fig. A circulaçã o e o armazenamento de
2). á gua nas rochas vulcâ nicas sã o condiciona‑
O luxo da á gua pelo manto de altera‑ dos pelas estruturas tectô nicas, pelos tipos e
çã o e a possibilidade de formaçã o de um estruturas dos derrames de rochas vulcâ ni‑
aquı́fero granular livre já foi estudada por di‑ cas e pelas condiçõ es geomorfoló gicas. Em
ferentes autores (Reginato, 2003; Reginato et geral, as fraturas tectô nicas conectam as es‑
al., 2012; Bortolin, 2018). Esse aquı́fero pos‑ truturas internas dos derrames, dando ori‑
sui dimensõ es reduzidas e pequenas espes‑ gem a diferentes tipos de aquı́feros
suras saturadas, sendo condicionado pelos fraturados. As principais estruturas, associ‑
tipos de solos (menor quantidade de argila e adas aos derrames, que tê m in luê ncia nos
maiores espessuras), pela litologia (tipo e processos de circulaçã o e de armazenamen‑
grau de fraturamento), pela topogra ia e pelo to de á gua, sã o as zonas: vesiculares a amig‑

Figura 2 ‒ Mecanismos de circulaçã o da á gua subterrâ nea nas rochas vulcâ nicas do SASG: A) circulaçã o no
contato de derrames (formaçã o de fonte); B) circulaçã o por estruturas sub‑horizontais.

472 Edição da Sociedade Brasileira de Geologia – Núcleo RS/SC


Viero et al.

daloides, de brechas e autobrechas, de dis‑ a divergente e com solos com maiores espes‑
junçõ es horizontais e verticais e de contato suras sã o as que apresentam maior potencial
entre derrames. Deve‑se destacar, també m, para a recarga. Já as á reas mais ı́ngremes e
que a circulaçã o de á gua vai ocorrer, de for‑ dissecadas sã o as que possuem menor po‑
ma diferenciada, nos derrames bá sicos e á ci‑ tencial e sã o favorá veis à descarga.
dos, sendo mais facilitada nos primeiros De acordo com Bortolin (2018), o
(Hausman, 1995; Freitas et al., 2002; Regina‑ processo de recarga ocorre em duas etapas,
to, 2003; Lisboa et al., 2004; Freitas et al., sendo, a primeira, no manto de alteraçã o e, a
2012; Machado, 2013; Reginato et al., 2015; segunda, pelo sistema de fraturas e de estru‑
Freitas, 2016). turas, existente nas rochas vulcâ nicas. Inici‑
A profundidade de circulaçã o da almente, a á gua in iltra no solo, podendo
á gua subterrâ nea é variá vel e pode ser avali‑ recarregar o aquı́fero granular livre (quando
ada, por meio da aná lise de entradas de esse existir) e, depois, dependendo do grau
á gua, identi icadas em poços tubulares. Em de fraturamento das rochas, haverá a recarga
vá rios estudos realizados (Reginato, 2003; do aquı́fero fraturado. Assim, nem toda a
Freitas et al., 2012; Machado, 2013; Frenzel á gua que in iltra no solo recarrega o aquı́fero
& Reginato, 2018), o intervalo de profundi‑ fraturado. Alé m disso, o autor identi icou
dade entre 0 m e 100 m está associado à que a resposta da recarga à precipitaçã o é
maior ocorrê ncia de entradas de á gua (80% rá pida, para o aquı́fero granular (taxas de
a 90%), sendo que 63% a 70% das entradas elevaçã o de nı́veis de á gua de, até , 1,5 m/
estã o localizadas entre 20 m e 100 m. Deve‑ dia), e mais lenta, para o aquı́fero fraturado
se salientar que, em diferentes regiõ es, sã o (taxas entre 0,02 m/dia e 0,3 m/dia). Com
encontrados poços, que apresentam entra‑ base no uso de diferentes mé todos, també m
das de á gua em profundidades superiores a foram identi icados valores mé dios de recar‑
150 metros. No entanto, Hausman (1995) ga entre 20% e 26%, sendo que, nas bacias
considera que, em profundidades superiores que possuem relevo mais dissecado, ocorrem
a 300 metros, há uma di iculdade na circula‑ as menores taxas de recarga.
çã o de á gua. Vá rios estudos demonstram que há
recarga ascendente de aquı́feros sotopostos,
3. 2 Recarga sendo que a mesma é responsá vel por mistu‑
ras de á guas entre os aquı́feros e por altera‑
A recarga do Sistema Aquı́fero Serra çõ es das composiçõ es fı́sico‑quı́micas das
Geral ocorre por precipitaçã o pluviomé trica, á guas do SASG. Entre vá rios estudos, devem
sendo condicionada por diversos fatores. Pa‑ ser destacados os trabalhos de Lisboa
ra Lisboa (1996), Freitas et al. (2002), Lisboa (1996), de Freitas (2016), de Teixeira & Vie‑
et al. (2004) e Machado (2013), as condiçõ es ro (2016), de Nanni (2018), de Tomasi &
geomorfoló gicas e estruturais tê m grande Roisenberg (2019), de Matos (2020) e de
importâ ncia nos processos de recarga e de Teixeira (2020). Para esses autores, a recarga
descarga. Segundo Descovi Filho (2015), a ascendente ocorre, em funçã o da existê ncia
recarga vai ocorrer em á reas com maior co‑ de grandes sistemas de falhas, que cortam o
bertura vegetal, com manto de alteraçã o bem pacote de rochas vulcâ nicas e sedimentares
desenvolvido e com topogra ia pouco aciden‑ e que propiciam a interligaçã o entre os dife‑
tada. Para Bortolin (2018), as á reas localiza‑ rentes sistemas aquı́feros. Alé m disso, a re‑
das em altos topográ icos, com menores carga só vai ocorrer, se també m houver
declividades, com curvatura do topo convexa condiçõ es hidrá ulicas propı́cias.
O Sistema Aquífero Serra Geral no Rio Grande do Sul e em Santa Catarina 473
Contribuições à Geologia do Rio Grande do Sul e de Santa Catarina

A recarga descendente do SASG para de á gua estã o situados acima das entradas
os aquı́feros sotopostos pode ocorrer, tendo de á gua. Deve‑se salientar que há ocorrê ncia
sido avaliada em alguns trabalhos, como nos de poços jorrantes no SASG (Freitas et al.,
de Descovi Filho (2015), de Matos (2020) e 2002).
de Teixeira (2020). A mesma pode ocorrer Os dados de transmissividade (T)
em algumas regiõ es, quando houver a exis‑ indicam a ocorrê ncia de valores entre 0,005
tê ncia de estruturas (falhas e fraturas), que m2/h e 3,61 m2/h, sendo que a maior parte
conectam os sistemas aquı́feros, alé m de é inferior a 1 m2/h, com mé dias entre 0,39
condiçõ es potenciomé tricas favorá veis. m2/h e 0,49 m2/h. Essas variaçõ es estã o de
acordo com o tipo de aquı́fero, que possui
3. 3 Avaliação hidrogeológica e hidrodi‑ baixa capacidade de transmissã o de á gua e
nâmica elevada anisotropia. Os dados de capacidade
ou vazã o especı́ ica sã o mais abundantes e
Para o SASG, os principais parâ me‑ variam entre 0,004 m3/h/m e 37,5 m3/h/m,
tros hidrogeoló gicos e hidrodinâ micos, que sendo que a maior parte se encontra abaixo
podem ser avaliados, sã o o nı́vel está tico de 1 m3/h/m, com mé dias entre 0,36 m3/h/
(NE), a transmissividade (T), a capacidade m e 1,81 m3/h/m. Os dados també m estã o
ou vazã o especı́ ica (q) e a vazã o de explota‑ condizentes com o tipo de aquı́fero e indi‑
çã o (Q). Por ser um sistema aquı́fero hetero‑ cam que há regiõ es que possuem maior pro‑
gê neo, que apresenta elevada anisotropia, dutividade do que outras.
cada regiã o ou á rea de estudo poderá apre‑
As vazõ es de estabilizaçã o, obtidas
sentar diferentes valores para cada um dos
de ensaios de bombeamento, indicam varia‑
parâ metros. Parâ metros como condutividade
çõ es entre 0,6 m3/h e 86 m3/h, sendo que a
hidrá ulica (K) e coe iciente de armazena‑
maior parte dos valores sã o inferiores a 20
mento (S) sã o difı́ceis de serem determina‑
m3/h (entre 80% e 91%, dependendo da re‑
dos, pois há di iculdade em se de inir a
giã o estudada), com mé dias entre 6,8 m3/h
espessura saturada do aquı́fero fraturado,
e 17 m3/h. Esses resultados indicam que,
bem como em promover testes de bombea‑
dependendo da regiã o, bem como de onde o
mento com poços de observaçã o.
poço foi locado, há possibilidade de se obter
Na Tabela 1, sã o apresentados al‑ diferentes vazõ es de explotaçã o. Alguns es‑
guns resultados de parâ metros hidrogeoló gi‑ tudos foram realizados, com o objetivo de se
cos e hidrodinâ micos, obtidos em trabalhos avaliar diferenças hidrogeoló gicas entre os
regionais e locais sobre o SASG. derrames bá sicos e á cidos. Alguns dos re‑
Com base nos dados de profundida‑ sultados sã o apresentados na Tabela 2 e in‑
de, pode‑se avaliar que a mesma é variá vel dicam que os aquı́feros associados à s rochas
(entre 14 m e 512 m), com valores mé dios bá sicas tendem a apresentar maiores capa‑
entre 110 m e 132m. Os valores mé dios es‑ cidade de produçã o e vazã o.
tã o dentro do esperado, visto que, em pro‑
fundidades superiores a 100 m, o nú mero de 4 ASPECTOS HIDROGEOQUÍMICOS
entradas de á gua é bastante reduzido (10% a
20%). Os dados de nı́vel está tico sã o variá ‑ A relevâ ncia do Sistema Aquı́fero
veis (entre 0 m e 176 m), mas a maioria dos Serra Geral para os estados do Rio Grande
nı́veis está situada entre 0 m e 20 m (73% a do Sul e de Santa Catarina reside, tanto na
83%), com predomı́nio entre 0 m e 10m ampla distribuiçã o espacial e na disponibili‑
(59% a 69%), sendo que, em geral, os nı́veis dade hı́drica quanto na qualidade e na pota‑

474 Edição da Sociedade Brasileira de Geologia – Núcleo RS/SC


Viero et al.

Tabela 1 ‒ Principais parâ metros hidrogeoló gicos e hidrodinâ micos do SASG.

Tabela 2 ‒ Dados hidrogeoló gicos e hidrodinâ micos para os aquı́feros fraturados, associados a unidades
vulcâ nicas bá sicas e á cidas.

bilidade das á guas. Estudos hidroquı́micos, tos, 2020). A salinidade das á guas é baixa,
realizados em toda a á rea de abrangê ncia do em especial, nos tipos bicarbonatada cá lcica
sistema aquı́fero, revelam que suas á guas e magnesiana, com valores mé dios de só li‑
tê m composiçã o bicarbonatada dominante, dos totais dissolvidos (STD) da ordem de
com amplo predomı́nio do tipo bicarbonata‑ 200 mg/L (SASG I) e de 250 mg/L (SASG II)
da cá lcica e, com menor incidê ncia, bicarbo‑ no Rio Grande do Sul (CPRM, 2005). Em
natada magnesiana. Os estudos registram, Santa Catarina, a assinatura hidroquı́mica
ainda, a ocorrê ncia menos frequente de nã o é diferente, em termos gerais, registran‑
á guas bicarbonatadas só dicas, sulfatadas só ‑ do concentraçõ es de STD, geralmente, infe‑
dicas e sulfatadas ou cloretadas só dicas (Lis‑ riores a 250 mg/L na porçã o leste do
boa, 1996; Machado, 2005; Nanni et al., sistema aquı́fero, pró xima à escarpa da Ser‑
2009; Freitas et al., 2012; Reginato et al., ra Geral, e menores do que 500 mg/L nas
2013; Freitas et al., 2016; Freitas, 2016; Ma‑ regiõ es central e oeste, onde a recarga as‑

O Sistema Aquífero Serra Geral no Rio Grande do Sul e em Santa Catarina 475
Contribuições à Geologia do Rio Grande do Sul e de Santa Catarina

cendente é mais intensa (CPRM, 2002; CPRM, cá lcio e a alcalinidade total. A aná lise dos
2013). dados hidroquı́micos, publicados por CPRM
Embora predominem amplamente as (2005), revela um comportamento similar
á guas com baixo conteú do iô nico, a composi‑ em Santa Catarina, indicando a atuaçã o dos
çã o hidroquı́mica do SASG registra, em quan‑ mesmos mecanismos de recarga e dos mes‑
tidade pouco expressiva de amostras, mos processos de interaçã o á gua/rocha nos
elevadas concentraçõ es de todos os principais dois estados e, provavelmente, em toda a
ı́ons dissolvidos ( lú or, só dio, cloreto, sulfato, extensã o do sistema aquı́fero. A recarga as‑
ferro e STD), chegando a comprometer a pota‑ cendente é vinculada a grandes falhas e a
bilidade em pequeno nú mero de poços (Tab. fraturas e ocorre em toda a extensã o do
3). Aguas nã o potá veis, em razã o do arsê nio, SASG no RS e em SC, o que promove o au‑
do selê nio e do vaná dio, també m sã o inventa‑ mento da concentraçã o de vá rios ı́ons na
riadas em alguns poços do SASG, no noroeste á gua, em particular, a condutividade elé tri‑
do RS (Silveira, 2019). Para o uso na indú stria, ca, alterando as correlaçõ es interelementa‑
as á guas desse sistema aquı́fero nã o apresen‑ res, em resposta à grande variabilidade
tam restriçõ es, exceto em casos localizados, composicional e à hidrodinâ mica das unida‑
com excesso de carbonato, que podem invia‑ des hidroestratigrá icas subjacentes, alé m
bilizar a utilizaçã o em caldeiras. Na agricultu‑ da maior intensidade e da diversidade dos
ra, por outro lado, as á guas se prestam para a processos de interaçã o á gua/rocha. O só dio,
irrigaçã o das mais variadas culturas. o sulfato, o luoreto, o cloreto e o STD, alé m
da condutividade elé trica, sã o os parâ me‑
Elevada condutividade elé trica, com
tros quı́micos maiores, que tê m, nas altas
valores que chegam a 4.200 S/cm, estã o pre‑
concentraçõ es, indicadores tı́picos de recar‑
sentes em á guas termais, captadas em fontes
ga ascendente, em razã o da ausê ncia dos
e em poços tubulares jorrantes, na regiã o do
mesmos nos minerais solú veis e disponı́veis
Alto Uruguai, no RS, e em SC (Freitas et al.,
a reaçõ es com a á gua do SASG. Elevados te‑
2016). Nestas á guas, os autores registram,
ores de cá lcio, de magné sio e de alcalinida‑
ainda, concentraçõ es altas de luoreto, com
de total (HCO3‑+CO32‑) també m derivam da
mé dia da ordem de 1,52 mg/L.
contaminaçã o com á guas de prolongada re‑
A ampla variabilidade composicional
sidê ncia nos aquı́feros sedimentares soto‑
das á guas do SASG deriva da grande comple‑
postos, portadores de calcita e/ou de
xidade dos mecanismos de recarga, que con‑
dolomita. As á guas de circulaçã o restrita no
sistem na in iltraçã o direta da precipitaçã o
SASG, mesmo que tipicamente bicarbonata‑
pluviomé trica e na ascensã o de á guas, prove‑
das cá lcicas, apresentam conteú dos relati‑
nientes das inú meras unidades hidroestrati‑
vamente baixos de cá lcio e de bicarbonato
grá icas sedimentares subjacentes da Bacia do
(Teixeira, 2020) e ainda menores dos de‑
Paraná (Kern et al., 2008; Reginato et al.,
mais ı́ons.
2013; Freitas et al., 2016; Freitas, 2016; Ma‑
Nas rochas vulcâ nicas bá sicas e á ci‑
tos, 2020).
das do SASG, a hidró lise e a dissoluçã o dos
Estudos de Teixeira (2020) mostram
minerais formadores do aquı́fero é limitada
que, no Rio Grande do Sul, as á guas subterrâ ‑
ou, mesmo, inoperante, até , devido à fraca
neas de recarga direta e de circulaçã o restrita
interaçã o á gua/rocha e à baixa solubilidade
ao SASG, sem contribuiçã o dos aquı́feros sedi‑
de silicatos, quando comparadas com as dos
mentares, sã o essencialmente bicarbonatadas
sais (Chou & Wollast, 1985; Delany et al.,
cá lcicas e exibem uma boa correlaçã o entre o
1986). A natureza fraturada do aquı́fero

476 Edição da Sociedade Brasileira de Geologia – Núcleo RS/SC


Viero et al.

Tabela 3 ‒ Dados quı́micos dos principais ı́ons das á guas subterrâ neas do SASG (legenda: nq ‑ nã o quanti icado;
sn ‑ sem normatizaçã o).

restringe fortemente a interaçã o á gua/rocha, cá lcica, está intimamente associada à hidró li‑
por conta da pequena á rea de contato das fa‑ se de calcita, largamente distribuı́da em
ses só lidas com a lı́quida. A superfı́cie especı́‑ amı́gdalas e em fraturas, mantendo a boa
ica do aquı́fero é fator determinante da correlaçã o positiva entre cá lcio e alcalinidade
ciné tica de reaçã o (dn/dt), conforme a Equa‑ total (Eq. 2). Contribuem, de forma subordi‑
çã o 1. nada, ainda, a dissoluçã o de CO2 atmosfé rico
e alguma lixiviaçã o de metais, especialmente,
Mg, Fe e Na, adsorvidos em argilominerais,
em que k é a constante de dissolu‑ presentes em solos atuais jovens, em paleos‑
çã o (mol. m‑2. s‑1), s é a superfı́cie especı́ ica solos pouco lixiviados e em rochas alteradas,
do só lido (m2. m‑3), aH é a atividade de hidro‑ localizadas no topo de derrames bá sicos e de
gê nio, n é um fator de ajuste e Q/Keq repre‑ unidades piroclá sticas á cidas.
senta o ı́ndice de saturaçã o do mineral. A A maior parte da carga iô nica das
superfı́cie especı́ ica de um aquı́fero fratura‑ á guas de recarga ascendente do SASG tam‑
do, considerando fraturas espaçadas em um bé m é devida à hidró lise de carbonatos (cal‑
metro, é da ordem de 4.000 a 2.000 vezes cita e, em algumas á reas, dolomita), ao que se
menor do que a de um arenito ino e do que soma a dissoluçã o de sulfatos e de haletos e a
a de um arenito mé dio, respectivamente. troca catiô nica do cá lcio e do magné sio pelo
Quanto maior é o espaçamento das fraturas, só dio. A hidró lise de carbonatos (Equaçõ es 2
menor é a superfı́cie especı́ ica do aquı́fero. e 3) é intensa, elevando as concentraçõ es de
Por conta da interaçã o tê nue da á gua cá lcio, de magné sio e de alcalinidade total a
com as rochas vulcâ nicas nos setores do patamares da ordem de 180 mg/L, de 90 mg/
SASG em que a recarga pluviomé trica é ú nica L e de 640 mg/L, respectivamente. A calcita é
ou amplamente dominante, a assinatura hi‑ registrada como cimento, como concreçõ es
drogeoquı́mica, tipicamente bicarbonatada ou como nó dulos em vá rias unidades hidro‑

O Sistema Aquífero Serra Geral no Rio Grande do Sul e em Santa Catarina 477
Contribuições à Geologia do Rio Grande do Sul e de Santa Catarina

estratigrá icas da Bacia do Paraná , dentre as magné sio é subtraı́da da soluçã o, pela troca
quais merecem destaque o Grupo Itararé e as catiô nica com o só dio, dentro das unidades
formaçõ es Rio Bonito, Irati, Estrada Nova, Pi‑ sedimentares portadoras de argilo‑minerais
ramboia e Botucatu. Alé m da calcita, de solu‑ (Eq. 5), sendo esta a principal fonte deste
bilidade mé dia a alta, a anidrita, muito metal nas á guas subterrâ neas do SASG. O
solú vel e presente nos sedimentitos do Gru‑ só dio pode ter origem, ainda, na dissoluçã o
po Itararé e das formaçõ es Rio Bonito, Irati e da halita, descrita, principalmente, na For‑
Piramboia, contribui para o cá lcio dissolvido, maçã o Irati, e, neste caso, as á guas regis‑
con igurando, ainda, a fonte das elevadas tram, també m, enriquecimento em cloreto,
concentraçõ es de sulfato, que chegam perto o que é observado em nú mero reduzido de
de 1.000 mg/L (Eq. 4). Parte do cá lcio e do poços.

A preponderâ ncia da hidró lise da cal‑ cassos e restritos ao manto de alteraçã o e a


cita na salinizaçã o das á guas no SASG e, tam‑ raros paleossolos. Ademais, o solo predomi‑
bé m, nas unidades aquiferas sedimentares da nante é o latossolo, evoluı́do, profundo e li‑
Bacia do Paraná , em que dolomita, sulfatos e xiviado, composto, essencialmente, por
haletos estã o ausentes ou presentes, em caulinita e por ó xidos de ferro e de alumı́‑
quantidades subordinadas, ica patente no nio, que exibem baixa capacidade de troca
diagrama de dispersã o da alcalinidade total catiô nica.
contra o cá lcio (Fig. 3A). Nesse diagrama, o A hidró lise de carbonatos e a troca
conjunto de todas as amostras revela grande de cá tions responde satisfatoriamente pela
dispersã o de pontos, com coe iciente de re‑ assinatura quı́mica de 85% ou mais das
gressã o da ordem de 0,1, enquanto aquelas, á guas subterrâ neas do SASG, em termos de
vinculadas a esses ambientes, con iguram cá tions e de â nions maiores, sejam aquelas
uma tendê ncia de boa correlaçã o positiva en‑ de circulaçã o restrita a este sistema aquı́fe‑
tre os dois parâ metros, icando as do SASG no ro, sejam aquelas com contribuiçã o de re‑
segmento abaixo de 50 mg/L de cá lcio e de carga ascendente. A parcela restante requer
200 mg/L de alcalinidade total. outros processos de interaçã o á gua/rocha,
A troca catiô nica, expressa na Equa‑ atuando nos aquı́feros, e a dissoluçã o de
çã o 5, ica evidenciada no diagrama biná rio anidrita/gipsita é o mais relevante, confor‑
da alcalinidade contra o somató rio de cá lcio e me pode ser constatado na Figura 3C. Este
de só dio (Fig. 3B). Aqui, um maior nú mero de diagrama mostra que, adicionando o sulfato
amostras é incorporado ao trend, que assume à alcalinidade, a quase totalidade das amos‑
melhor de iniçã o e aumenta o coe iciente de tras se reú ne em um só trend, de boa corre‑
regressã o, agregando aquelas de baixo cá lcio laçã o e com coe iciente de regressã o da
e com só dio, provenientes da dessorçã o das ordem de 0,75. As poucas amostras posicio‑
argilas. Os processos de troca de cá tions nã o nadas acima do trend, que tê m excesso de
sã o ativos no SASG, uma vez que, neste siste‑ só dio, em relaçã o à alcalinidade, mais sulfa‑
ma aquı́fero, os minerais adsorventes sã o es‑ to, acusam a dissoluçã o de halita e pratica‑
478 Edição da Sociedade Brasileira de Geologia – Núcleo RS/SC
Viero et al.

mente todas se acomodam no trend com a 5. 1 Os usos atuais da água nos abaste‑
adiçã o de cloreto ao sulfato e à alcalinidade cimentos público e privado
(Fig. 3D). Neste diagrama, a dispersã o é pe‑
A crescente demanda por recursos
quena e o coe iciente de regressã o sobe para
hı́dricos, decorrente do crescimento econô ‑
0,82.
mico e das frequentes estiagens, veri icadas
A presença de luoreto em concentra‑
nos ú ltimos anos, tem incrementado a explo‑
çõ es signi icativas nas á guas do SASG tam‑
taçã o das á guas subterrâ neas. Estas sã o uma
bé m re lete recarga ascendente (Nanni et al.,
alternativa bastante atraente para abasteci‑
2009) e sua prová vel origem reside na disso‑
mento, em virtude da sua abundâ ncia, da sua
luçã o de luorita, que, segundo Kern et al.
qualidade e do seu relativo baixo custo de
(2008), ocorre, principalmente, nos folhelhos
captaçã o, principalmente, considerando‑se a
betuminosos das formaçõ es Irati e Ponta
degradaçã o da qualidade das á guas super i‑
Grossa, como mineral diagené tico, associado
ciais, associada ao elevado custo do trata‑
a outros sais, como barita, anidrita, calcita,
mento dessas á guas, para os diversos usos.
dolomita, pirita e outros. Tal paragê nese neo‑
Assim, as á guas subterrâ neas vê m se tornan‑
formada, em especial, a dos sulfetos, que
do estraté gicas nos desenvolvimentos econô ‑
també m aparecem nos folhelhos carbonosos
mico e social do paı́s.
da Formaçã o Rio Bonito, é a prová vel fonte do
Neste contexto, enquadra‑se o Siste‑
arsê nio e do selê nio encontrados em poços
ma Aquı́fero Serra Geral, que, dos sistemas
do noroeste do estado gaú cho.
aquı́feros existentes no sul do Brasil, é o que
O comportamento relativo dos prin‑
possui maior abrangê ncia e maior utilizaçã o,
cipais ı́ons das á guas subterrâ neas, revelado
fato que decorre de sua boa explotabilidade
na geometria dos diagramas de dispersã o bi‑
e da excelente qualidade fı́sico‑quı́mica de
ná rios, é indicativo da inexpressiva in luê ncia
suas á guas. Explotado, atravé s de poços tu‑
da composiçã o quı́mica e da mineraló gica
bulares e de captaçõ es de fontes, tem suas
dos vulcanitos na assinatura hidroquı́mica do
á guas utilizadas para consumo humano, in‑
SASG. A independê ncia da quı́mica da á gua
dustrial, pastoril e, també m, para balneabili‑
subterrâ nea, em relaçã o à mineralogia e à ge‑
dade. Uma breve consulta ao Sistema de
oquı́mica do aquı́fero, també m é reconhecida
Informaçõ es de Aguas Subterrâ neas (SIA‑
no Sistema Aquı́fero Cristalino III, formado
GAS), do Serviço Geoló gico do Brasil, revela a
por granitos e por gnaisses, na regiã o metro‑
magnitude e a importâ ncia deste sistema
politana de Porto Alegre (Viero et al., 2009).
aquı́fero no Rio Grande do Sul e em Santa Ca‑
Como esperado, a partir dos princı́pios ter‑
tarina. O SIAGAS exibe um panorama parcial
modinâ micos, sã o os minerais de maior solu‑
do nú mero de poços perfurados neste siste‑
bilidade e os mais expostos a reaçõ es com a
ma aquı́fero, registrando, atualmente, cerca
á gua que conferem as propriedades quı́micas
de 17.000 poços tubulares, dos quais 77% se
das á guas subterrâ neas do sistema Aquı́fero
encontra em funcionamento, para os abaste‑
Serra Geral, tanto para aquelas mais jovens,
cimentos pú blico e industrial e para a desse‑
de recarga pluviomé trica descendente, quan‑
dentaçã o de animais. Considerando a vazã o
to para aquelas mais antigas, de recarga as‑
mé dia dos poços em utilizaçã o, que é de 13,7
cendente.
m3/h, e um perı́odo de bombeamento de 12
horas diá rias, estima‑se, nesses poços, uma
5 POTENCIAL HÍDRICO E RELEVÂNCIA retirada anual de á gua aproximada de 1,02 x
SOCIOECONÔMICA 109 m3.

O Sistema Aquífero Serra Geral no Rio Grande do Sul e em Santa Catarina 479
Contribuições à Geologia do Rio Grande do Sul e de Santa Catarina

Figura 3 ‒ Diagramas de dispersã o, mostrando correlaçõ es entre os principais ı́ons do SASG e a in luê ncia da
recarga ascendente: A) trend, decorrente da hidró lise da calcita, marcado pela elipse vermelha; B) trend,
decorrente da hidró lise da calcita, mais troca de cá tions, marcado pela elipse vermelha; C) trend, decorrente da
hidró lise da calcita e da anidrita, mais troca de cá tions, marcado pela elipse vermelha; d) trend, decorrente da
hidró lise da calcita, da anidrita e da halita, mais troca de cá tions.

480 Edição da Sociedade Brasileira de Geologia – Núcleo RS/SC


Viero et al.

Segundo dados da ANA (2010), no fató rias, como observado nos capı́tulos ante‑
Rio Grande do Sul, 59% das sedes munici‑ riores.
pais sã o abastecidas exclusivamente por Outro importante fator é de que suas
á guas subterrâ neas e, em 13% destas, o á guas, na grande maioria das vezes, caracte‑
abastecimento é realizado de forma mista rizam‑se por apresentar baixas concentra‑
(por mananciais super iciais e subterrâ ne‑ çõ es de sais dissolvidos, possibilitam o uso
os). A Companhia Riograndense de Sanea‑ nas mais variadas atividades econô micas, es‑
mento (CORSAN) opera, no SASG, 456 poços pecialmente, na indú stria. Outro nobre uso
tubulares, em 103 municı́pios, totalizando das á guas do SASG consiste no abastecimen‑
uma explotaçã o mensal de 14,24 x 106 m3. to de comunidades rurais, para as quais, ge‑
Em Santa Catarina, os municı́pios localizados ralmente, o poder pú blico municipal
na porçã o oeste tê m, como principal fonte de constró i os poços e os cede a associaçõ es ou
abastecimento de á gua, os mananciais sub‑ a condomı́nios de á gua administrados pelos
terrâ neos, sendo que 23% dos municı́pios pró prios moradores. També m há muitos po‑
sã o abastecidos exclusivamente por manan‑ ços particulares em granjas integradas com
ciais subterrâ neos e 20%, de forma mista os grandes frigorı́ icos de aves e de suı́nos,
(ANA, 2010). A Companhia Catarinense de nos quais predominam o abastecimento ani‑
Aguas e Saneamento (CASAN) e os serviços mal e o uso geral das á guas do SASG.
municipais de á gua e de esgoto abastecem
87 municı́pios com á gua subterrâ nea extraı́‑
5. 3 Vulnerabilidade natural e risco de
da do SASG.
contaminação do aquífero

5. 2 Potencialidade de abastecimento A vulnerabilidade natural à contami‑


nos diversos setores socioeconômicos naçã o é uma propriedade intrı́nseca do meio
aquı́fero e tem intensa relaçã o com suas ca‑
O SASG é um dos aquı́feros mais ex‑ racterı́sticas hidrogeoló gicas. No SASG, como
plotados do paı́s, no qual inú meras empre‑ observado por Freitas et al. (2012), deve‑se
sas, sobretudo, indú strias e considerar, basicamente, os seguintes aspec‑
estabelecimentos comerciais, utilizam poços, tos, fundamentais para a avaliaçã o da vulne‑
para suprir, total ou parcialmente, as suas rabilidade natural à contaminaçã o: nı́vel da
demandas. A despeito de sua vazã o modera‑ á gua no aquı́fero, espessura do regolito, grau
da, quando comparada à dos grandes aquı́fe‑ de fraturamento da rocha e topogra ia do
ros porosos, como, por exemplo, o sistema terreno.
aquı́fero Guarani, o SASG leva vantagem pela O nı́vel da á gua subterrâ nea é um
sua acessibilidade e pelo baixo custo de importante fator, quando se trata da vulne‑
construçã o de poços. Para exempli icar, um rabilidade do aquı́fero, principalmente, em
poço construı́do no SASG custa, em mé dia, aquı́feros porosos. No sistema aquı́fero Serra
um terço do valor de um poço construı́do no Geral, de cará ter fraturado, o nı́vel da á gua
aquı́fero Guarani. A principal diferença é de nem sempre representa o nı́vel freá tico, pois
que os poços perfurados no SASG possuem resulta do somató rio das pressõ es de cada
menor diâ metro (6 polegadas) e sã o parcial‑ descontinuidade no corpo rochoso (fraturas,
mente revestidos, nã o necessitando de iltros juntas e contatos interderrames). Poré m, no
e de pré ‑ iltros. Geralmente, desde que bem horizonte regolı́tico, é possı́vel o desenvolvi‑
locados, estes poços nã o superam a profun‑ mento de um aquı́fero livre suspenso ou in‑
didade de 100 metros, obtendo vazõ es satis‑ terligado ao aquı́fero fraturado. Neste caso, a
O Sistema Aquífero Serra Geral no Rio Grande do Sul e em Santa Catarina 481
Contribuições à Geologia do Rio Grande do Sul e de Santa Catarina

distâ ncia até o nı́vel da á gua é um importante associaçã o entre alta vulnerabilidade natural
fator no controle da vulnerabilidade do aquı́‑ e uma fonte potencial de contaminaçã o. Nas
fero. á reas urbanas, as atividades industriais, os
O regolito, formado por solo ou por postos de combustı́veis, os lixõ es, os vaza‑
saprolito, desempenha crucial papel na pro‑ mentos nas redes de esgoto, entre outros,
teçã o do aquı́fero fraturado subjacente, so‑ con iguram essas fontes potenciais de conta‑
bretudo, se possuir composiçã o predo‑ minaçã o. Em muitos municı́pios mé dios a
minantemente argilosa. Em terrenos em que grandes, situados sobre as rochas interme‑
a rocha fraturada estiver exposta, a vulnera‑ diá rias a á cidas, os e luentes sã o descartados
bilidade do aquı́fero é maior, caso muito fre‑ em fossas sé pticas, que, muitas vezes, estã o
quente nas regiõ es em que predomina a instaladas em solos muito rasos ou em rocha
ocorrê ncia de rochas á cidas. Por outro lado, alterada, elevando muito o risco de contami‑
se o regolito for espesso e argiloso, a vulne‑ naçã o do SASG. Na á rea rural, os riscos estã o
rabilidade é bem menor, por vezes, insigni i‑ relacionados à s culturas que utilizam fertili‑
cante, especialmente, quando nã o há nı́vel zantes e agrotó xicos, bem como à criaçã o in‑
freá tico presente no horizonte. tensiva de animais. Rios in luentes poluı́dos
Como visto nos itens anteriores, as podem contaminar o aquı́fero Serra Geral,
zonas aquı́feras desenvolvidas nas rochas sobretudo, nas á reas muito fraturadas.
vulcâ nicas do Grupo Serra Geral estã o inti‑
mamente ligadas à presença de fraturamen‑ 6 CONSIDERAÇÕES FINAIS
tos de natureza tectô nica ou por
resfriamento da lava ou, mesmo, por alı́vio de O SASG representa a unidade hidro‑
pressã o. E natural a irmar que, quanto mais estratigrá ica com a maior abrangê ncia e de
fraturada uma rocha, melhor aquı́fero ela se‑ maior utilizaçã o em Santa Catarina e no Rio
rá e, també m, mais vulnerá vel à contamina‑ Grande do Sul, ocupando cerca de 50% da
çã o a mesma icará . á rea territorial de cada estado. E formado
A topogra ia do terreno, entre outros pelas rochas vulcâ nicas bá sicas e á cidas do
fatores, controla o escoamento super icial Grupo Serra Geral, as quais se estendem por,
das á guas originá rias da chuva. Um terreno aproximadamente, 290.000 km2 nos dois es‑
com alta declividade propicia um forte escoa‑ tados, com espessuras de, até , 1.000 m no RS
mento das á guas. Por outro lado, em um ter‑ e de, até , 1.200 m em SC. No estado gaú cho,
reno plano ou com baixa declividade, as 103 municı́pios sã o abastecidos por poços
á guas tendem a icar estagnadas por mais do SASG, enquanto, no estado catarinense,
tempo na superfı́cie e a in iltrarem no aquı́fe‑ sã o 93. A alta densidade de fraturas e de fa‑
ro, deixando a á rea mais vulnerá vel à conta‑ lhas tectô nicas, associadas a abundantes
minaçã o. juntas de contraçã o, conferem boa porosida‑
Em suma, uma determinada á rea do de e boa permeabilidade ao sistema aquı́fe‑
Sistema Aquı́fero Serra Geral pode apresen‑ ro, permitindo o acú mulo de grande volume
tar alta vulnerabilidade, se a rocha estiver de á gua e a captaçã o de elevadas vazõ es em
muito fraturada e a lorante em um terreno muitos poços tubulares.
plano ou pouco declivoso, enquanto a vulne‑ Os poços explotados, em nú mero
rabilidade será baixa em uma á rea declivosa, pró ximo de 13.000, de acordo com registros
com cobertura regolı́tica e com rochas pouco do SIAGAS, possuem vazã o mé dia da ordem
fraturadas. O risco de contaminaçã o do Siste‑ de 14 m3/h e á gua de excelente qualidade,
ma Aquı́fero Serra Geral ocorre, quando há a sem restriçã o de uso para qualquer im em

482 Edição da Sociedade Brasileira de Geologia – Núcleo RS/SC


Viero et al.

mais de 95% deles. Poços que nã o atendem dade Federal do Rio Grande do Sul.
aos padrõ es de potabilidade tê m á gua com ex‑
Chou, L. & Wollast, R. 1985. Steady‑state ki‑
cesso de Flú or, de Sulfato, de Só dio, de Cloro e
netics and dissolution mechanisms of albite.
de Ferro, alé m de Arsê nio e de Selê nio, em ra‑
Am. J. Sci., 85: 963‑993.
rı́ssimos casos.
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ao SASG tê m assinatura hidroquı́mica marca‑
Santa Catarina. Porto Alegre, CPRM, 110p.
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cá lcica, pelas baixas concentraçõ es de só lidos CPRM. Companhia de Pesquisa de Recursos
totais dissolvidos e pela ausê ncia de impediti‑ Minerais. 2005. Mapa Hidrogeológico do Rio
vos de uso para todos os ins. As á guas que Grande do Sul. Porto Alegre. 2v., escala
tê m contribuiçã o da recarga ascendente, por 1:750.000.
outro lado, sã o mais salinizadas, com concen‑
CPRM. Companhia de Pesquisa de Recursos
traçõ es mais elevadas de Só dio, de Sulfato, de Minerais. 2002. Mapa hidrogeológico do esta‑
Cá lcio, de Flú or e, em alguns casos, de Cloro, e do de Santa Catarina. Porto Alegre: Porto
vá rios poços apresentam restriçã o de potabili‑ Alegre, 2v., escala 1:500.000.
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Contribuições à Geologia do Rio Grande do Sul e de Santa Catarina

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484 Edição da Sociedade Brasileira de Geologia – Núcleo RS/SC


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Federal do Rio Grande do Sul.

O Sistema Aquífero Serra Geral no Rio Grande do Sul e em Santa Catarina 485
Patrimônio geológico e
geoconservação nos estados de
Santa Catarina e Rio Grande do Sul
André Weissheimer de Borba1*, Joã o Henrique Quoos2,
Cristina Covello2, Maria Elisabeth da Rocha3, Flá vio Augusto Pretto4,
Leonardo Kerber4, Jaciele Carine Sell5

1
Programa de Pó s‑graduaçã o em Geogra ia, Universidade Federal de Santa Maria,
2
Campus Garopaba, Curso Superior em Gestã o Ambiental, Instituto Federal de Santa Catarina,
3
Geoparque Caminhos dos Câ nions do Sul Aspirante UNESCO, Prefeitura Municipal de Torres/RS
4
Centro de Apoio à Pesquisa Paleontoló gica em Sã o Joã o do Polê sine, Universidade Federal de Santa Maria
5
Projeto Institucional Geoparques, Universidade Federal de Santa Maria

*autor correspondente: andre.w.borba@ufsm.br

1 INTRODUÇÃO, CONTEXTO E CONCEITOS FUNDAMENTAIS


A geoconservaçã o constitui um emergente ramo das geociê ncias (Henriques et al.,
2011), cujas preocupaçõ es sã o o (re)conhecimento, o inventá rio, a avaliaçã o, a conservaçã o e a
promoçã o turı́stica e educativa de elementos destacados da geodiversidade. A partir da reda‑
çã o, em 1991, por iniciativa de geocientistas europeus, da Carta de Digne‑les‑Bains, sobre a pro‑
teçã o dos direitos à memó ria da Terra, percebeu‑se uma progressiva mudança na percepçã o de
muitos geocientistas sobre o seu objeto de pesquisa, de ensino e de conhecimento. A natureza
fı́sica do planeta, na dimensã o de seus processos e de seus produtos, nã o poderia mais ser vista,
apenas, como um conjunto de “recursos minerais” a serem explorados e colocados à disposiçã o
da indú stria, para seu aproveitamento econô mico. Agora, esses materiais sã o percebidos como
“elementos da geodiversidade”, que guardam as caracterı́sticas e a memó ria dos processos ter‑
restres e que podem, pela relevâ ncia atribuı́da a eles, pelas geociê ncias e/ou pela sociedade, ad‑
quirir status patrimonial e merecer iniciativas de proteçã o e de valorizaçã o (e.g. Borba & Sell,
2018).
A geodiversidade corresponde à totalidade dos processos e dos produtos da natureza
fı́sica/abió tica do planeta Terra, no presente e no passado geoló gico, expressos na “(. . . ) varie‑
dade natural de feiçõ es geoló gicas (minerais, rochas, fó sseis), geomorfoló gicas (formas de rele‑
vo e processos ativos) e de solo, incluindo suas assembleias, relaçõ es, propriedades,
interpretaçõ es e sistemas” (Gray, 2004, p. 8, traduçã o dos autores). O patrimô nio geoló gico, por
sua vez, é composto pelos locais geoló gicos de interesse, ou geossı́tios (ocorrê ncias in situ), e
Contribuições à Geologia do Rio Grande do Sul e de Santa Catarina

pelos materiais geoló gicos já extraı́dos (ex si‑ dade local, pode resultar em uma certi ica‑
tu, como fó sseis, por exemplo) que melhor çã o outorgada pelo Programa de Geopar‑
representam a geodiversidade de uma uni‑ ques Mundiais da UNESCO. E nesse contexto
dade territorial, em seus valores nã o consun‑ que serã o discutidas a geodiversidade e o
tivos (cientı́ ico, educativo, esté tico, cultural, patrimô nio geoló gico dos estados de Santa
funcional, ecoló gico). O patrimô nio geoló gico Catarina e do Rio Grande do Sul, bem como
deve ser inventariado, preferencialmente, de as iniciativas de levantamento, de conserva‑
acordo com as seguintes etapas (adaptadas çã o e de promoçã o desses atributos natu‑
de Lima et al., 2010): (a) revisã o da literatu‑ rais na regiã o, ao longo das ú ltimas
ra; (b) consulta a especialistas; (c) estabele‑ dé cadas.
cimento de crité rios uniformes de seleçã o de
geossı́tios; (d) adoçã o de um conjunto de ar‑ 2 GEODIVERSIDADE DOS ESTADOS DE
cabouços geoló gico‑geomorfoló gicos, em es‑ SANTA CATARINA E DO RIO GRANDE
cala adequada; e (e) identi icaçã o e DO SUL
caracterizaçã o dos geossı́tios.
A partir de um inventá rio do pa‑ O mais importante esforço de levan‑
trimô nio geoló gico, pode ser realizada uma tamento e de cartogra ia da geodiversidade
avaliaçã o quali‑quantitativa dos potenciais sul‑brasileira, no sé culo XXI, processou‑se
turı́stico e educativo e da necessidade de no â mbito da Companhia de Pesquisa de
proteçã o dos locais e dos materiais que o Recursos Minerais (CPRM), o Serviço Geoló ‑
compõ em, mediante uma sé rie de diferentes gico do Brasil, com a publicaçã o dos mapas
metodologias (e.g. Lima et al., 2010; Fassou‑ estaduais de geodiversidade do Rio Grande
las et al., 2012; Brilha, 2016). De acordo com do Sul (CPRM, 2009) e de Santa Catarina
os resultados dessa avaliaçã o, podem ser (CPRM, 2010). Em consonâ ncia com as dire‑
adotadas estraté gias diversas, constituindo trizes e com a iloso ia da empresa executo‑
os pilares de qualquer estraté gia de geocon‑ ra, esses mapas tiveram o intuito de
servaçã o: (a) medidas de proteçã o ou de representar cartogra icamente e de disponi‑
conservaçã o dos elementos da geodiversida‑ bilizar “(. . . ) informaçõ es sobre o meio fı́si‑
de, tanto do ponto de vista prá tico quanto da co para subsidiar macro‑diretrizes de
legislaçã o aplicá vel; (b) iniciativas de educa‑ planejamento, gestã o ambiental e ordena‑
çã o geopatrimonial, ou de geoeducaçã o, tan‑ mento territorial” (CPRM, 2010). Assim, tais
to no ambiente escolar, no â mbito da publicaçõ es traziam, alé m de mapas de do‑
educaçã o formal, quanto na educaçã o infor‑ mı́nios e de unidades geoló gico‑ambientais,
mal, atravé s de eventos de aprendizado lú di‑ subprodutos especı́ icos, focalizando: as in‑
co; e (c) estı́mulo ao geoturismo, um turismo fraestruturas de transportes, de geraçã o e
de interpretaçã o e de conhecimento, consci‑ de transmissã o de energia; as á reas de inte‑
ente e sustentá vel, pró ximo do turismo de resse mineral e de preservaçã o ambiental;
base comunitá ria, em que os principais atra‑ as potencialidades hidrogeoló gicas; os prin‑
tivos sejam elementos da geodiversidade e cipais atrativos geoturı́sticos; e a suscetibili‑
do patrimô nio geoló gico (ver discussã o em dade geoló gica de riscos socioambientais.
Borba & Sell, 2018). Por im, em territó rios De maneira geral, o a loramento dos
que possuam geossı́tios de comprovada rele‑ diferentes domı́nios e das unidades geoló gi‑
vâ ncia cientı́ ica internacional, a adoçã o co‑ambientais em Santa Catarina e no Rio
bem‑sucedida dessas estraté gias, por organi‑ Grande do Sul está condicionado pelos so‑
zaçõ es formais, com amplo apoio da comuni‑ erguimentos e pelos dobramentos do inal

488 Edição da Sociedade Brasileira de Geologia – Núcleo RS/SC


Borba et al.

do Mesozoico e do inı́cio do Cenozoico, no consolidados de idade quaterná ria, como re‑


contexto da separaçã o Brasil‑Africa, respon‑ gistro mais recente da chamada Bacia de Pe‑
sá veis pela estruturaçã o da Serra do Mar e lotas, em um dos mais extensos sistemas
do Planalto Meridional Brasileiro, bem como laguna‑barreira atualmente conhecidos no
pela reativaçã o de estruturas tectô nicas, que mundo (com 750 quilô metros, em linha re‑
atuaram na justaposiçã o de blocos ou de ter‑ ta), que se inicia na Laguna do Imaruı́, segue
renos de naturezas, de nı́veis crustais e de pela Laguna dos Patos e pela Lagoa Mirim e
idades distintas. Sobrepõ e‑se a isso, ainda, adentra o territó rio uruguaio, caracterizado
uma evoluçã o sedimentar quaterná ria, em por barreiras praiais, com campos de dunas
contexto de laguna‑barreira, que contribui mó veis, lagoas e lagunas, banhados e turfei‑
com a diversidade de macroestruturas do re‑ ras.
levo, de ambientes e de paisagens. Assim, em A geodiversidade dos estados de
linhas gerais (Fig. 1), distinguem‑se: (1) dois Santa Catarina e do Rio Grande do Sul con‑
compartimentos de embasamento, em senti‑ templa, ainda, um substancial conteú do fos‑
do amplo: o Escudo Sul‑Rio‑Grandense, na silı́fero permiano e triá ssico, com destaque
porçã o sul/sudeste do RS, e o Escudo Catari‑ para a diversidade de tetrá podes, de grande
nense, na porçã o leste/litorâ nea de SC, com‑ relevâ ncia paleontoló gica. Os registros do
postos por rochas ı́gneas (intrusivas e Permiano incluem lora fó ssil (Glossopteris,
extrusivas), metamó r icas (gnaisses, granuli‑ conı́feras), bivalves, artró podes, anfı́bios, si‑
tos, má rmores e xistos diversos) e sedimen‑ ná psidos e pararré pteis. Os mesossaurı́deos
tares (conglomerados, arenitos e siltitos das da Formaçã o Irati (Brazilosaurus, Stereoster‑
bacias do Camaquã , Itajaı́ e Campo Alegre) num e Mesosaurus), que ocorrem na Amé rica
do pré ‑Cambriano, com origem e evoluçã o do Sul e, també m, na Africa, foram de initivos
variadas, incluindo fragmentos de crá tons do para o reconhecimento de uma conexã o pre‑
Arqueano/Paleoproterozoico (La Plata, En‑ té rita entre os dois continentes e para a no‑
cantadas e Luı́s Alves); (2) dois comparti‑ çã o da “deriva continental”. De forma similar,
mentos marcados pela ocorrê ncia de rochas os tetrá podes permianos da Formaçã o Rio
sedimentares (arenitos e folhelhos costeiros/ do Rasto (e.g. Provelosaurus, Pampaphoneus,
marinhos, camadas de carvã o, alé m de peli‑ Endothiodon, Rastodon, Australerpeton,
tos e de arenitos continentais) da Bacia do Konzhukovia) reforçam proximidades nas as‑
Paraná , que delimitam os terrenos muito sembleias faunı́sticas da Amé rica do Sul com
baixos e planos da Depressã o Central no RS e as do sul da Africa e com as da Plataforma
que, em SC, pelo soerguimento da Serra do Russa, sugerindo importantes rotas de dis‑
Mar, formam o chamado Planalto Paleozoico; persã o pelo Pangea, durante o inal do Per‑
(3) uma extensa á rea de ocorrê ncia de ro‑ miano.
chas vulcâ nicas da Formaçã o Serra Geral, de Por sua vez, os registros do Triá ssico,
composiçõ es variadas (desde basaltos, até restritos ao Rio Grande do Sul, incluem conı́‑
riodacitos), com registro de um vulcanismo feras e pteridó itas, alé m de uma fauna de te‑
issural do tipo platô , que cobre toda a meta‑ trá podes, que oferece importantes
de norte do RS e todo o centro e o oeste de vislumbres da recuperaçã o dos ecossiste‑
SC, no contexto do Planalto Meridional Bra‑ mas, apó s a massiva extinçã o permo‑triá ssi‑
sileiro, estendendo‑se, ainda, por grande ca, que marca o limite entre as eras
parte do interior sul‑americano; e (4) uma Paleozoica e Mesozoica: (a) no Triá ssico in‑
Planı́cie Costeira, com sedimentos siliciclá s‑ ferior, aparecem procolofonı́deos (Proco‑
ticos e orgâ nicos inconsolidados ou pouco lophon), arcossauromorfos (Teyujagua) e

Patrimônio geológico e geoconservação nos estados de Santa Catarina e Rio Grande do Sul 489
Contribuições à Geologia do Rio Grande do Sul e de Santa Catarina

Figura 1 – Mapa, ilustrando os aspectos de geodiversidade e de patrimô nio geoló gico do RS e de SC, a partir
dos mapas de geodiversidade da CPRM, com os compartimentos gerais citados no texto, com suas distintas
complexidades geoló gicas. Sobre o mapa, estã o espacializados os 17 sı́tios gaú chos ou catarinenses inscritos
na lista SIGEP, indicados por nú meros ará bicos, conforme seu có digo na SIGEP: (3) Dunas do Albardã o; (8)
A loramento Quité ria; (9) Sı́tios Paleobotâ nicos do Arenito Mata; (22) Tetrá podes triá ssicos do RS; (24)
Coluna White; (45) Predebom; (48) Paleotoca de Cristal; (50) Itaimbezinho e Fortaleza; (64) Minas do
Camaquã ; (75) Complexo Lagunar Sul‑Catarinense; (76) Guaritas do Camaquã ; (82) A loramento Bainha; (84)
Passo das Tropas; (101) Morro do Papalé o; (114) Domo de Vargeã o; (119) Barrancas fossilı́feras do arroio
Chuı́; (126) A loramento Canoinhas. Alé m deles, estã o plotados, no mapa, os outros locais ou contextos citados
no texto, marcados por letras: (a) falé sias da praia de Torres; (b) areais do Cerro da Esquina; (c) Cerro do

490 Edição da Sociedade Brasileira de Geologia – Núcleo RS/SC


Borba et al.

Jarau; (d) Salto do Yucumã ; (e) Itapema; (f) Garopaba; (g) monó lito Bico do Papagaio; (h) Morro dos Conventos;
(i1) ocorrê ncias de ametista de Planalto e de Ametista do Sul (RS); (i2) ocorrê ncias de ametista de Entre Rios
(SC); (j) á rea de a loramento natural de á guas minerais; (l) rochas alcalinas de Lages, ‘Pedras Brancas’, futuro
projeto de geoparque; (m) Parque Estadual da Serra do Tabuleiro. Por im, encontram‑se localizados no mapa
os contornos dos territó rios Caminhos dos Câ nions do Sul (CS), Quarta Colô nia (QC) e Caçapava (CP),
candidatos à certi icaçã o de Geoparques Mundiais UNESCO.

temnospô ndilos (Sangaia, Tomeia), entre ou‑ em Quaraı́), há signi icativa quantidade e di‑
tros, coletados nas fá cies luviais da Forma‑ versidade de fó sseis, recuperados de ambi‑
çã o Sanga do Cabral; (b) no Ladiniano/ entes luviais, que, coletivamente,
Carniano, as camadas e os fó sseis re letem representam a megafauna do Pleistoceno. A
ambientes, em geral, mais secos e faunas do‑ fauna registrada nessas camadas é caracteri‑
minadas por siná psidos, como dicinodontes zada pela presença de mamı́feros de grande
(Dinodontosaurus, Stahleckeria) e cinodontes porte, como preguiças‑gigantes (Megathe‑
(e.g. Massetognathus, Aleodon, Santacruzo‑ rium, Eremotherium, Glossotherium e Lesto‑
don, Menadon, Chiniquodon), mas com um don, (Fig. 2B)), gliptodontes (Glyptodon,
importante registro de arcossauromorfos, Doedicurus e Panochthus), pampaté rios
incluindo rincossauros (Brasinorhynchus) e (Pampatherium e Holmesina), cavalos (Equus
imponentes pseudossú quios carnı́voros e Hippidion), cervı́deos (Antifer), mastodon‑
(Prestosuchus, Decuriasuchus, Dagasuchus), tes (Notiomastodon), toxodontes e ma‑
entre outros; (b) já no Carniano/Noriano, crauquê nias (Toxodon e Macrauchenia),
condiçõ es climá ticas de maior umidade favo‑ entre outros. Devido a sua localizaçã o geo‑
receram ao predomı́nio dos diá psidos, com grá ica, a regiã o apresenta fó sseis pleistocê ‑
abundantes rincossauros (Hyperodapedon nicos com uma mescla de a inidades
(Fig. 2A), Teyumbaita), proterocâ mpsios biogeográ icas, com registros de tá xons cujos
(Proterochampsa), aetossauros (Aetosauroi‑ fó sseis ocorrem, predominantemente, em
des), alé m dos primeiros dinossauros regis‑ porçõ es mais austrais da Amé rica do Sul (e.g.
trados globalmente (e.g. Staurikosaurus, Doedicurus, Macrauchenia), bem como regis‑
Gnathovorax, Buriolestes, Bagualosaurus). Os tros de formas de a inidade intertropical (e.g.
cinodontes, contudo, se mantê m presentes Eremotherium). Ao inal do Pleistoceno e no
nas assembleias fossilı́feras, incluindo for‑ inı́cio do Holoceno, todas essas formas foram
mas de mé dio porte, como Exaeretodon, Si‑ extintas, restando somente os mamı́feros da
riusgnathus e Trucidocynodon. Estes sã o fauna atual. Embora as causas desse evento
substituı́dos, no inal do registro Triá ssico do de extinçã o de proporçõ es continentais ain‑
RS, por microvertebrados, como os cinodon‑ da sejam discutidas, infere‑se que ele nã o te‑
tes Riograndia, Irajatherium e Brasilodon nha ocorrido exatamente ao mesmo tempo,
(Fig. 2A) (cruciais ao entendimento da ori‑ e, sim, em um intervalo de tempo de alguns
gem dos mamı́feros), que viveram à sombra milhares de anos.
dos primeiros grandes dinossauros, como
Guaibasaurus, Unaysaurus e Macrocollum
3 PATRIMÔNIO GEOLÓGICO DE SANTA
(Fig. 2A).
CATARINA E DO RIO GRANDE DO SUL
Nos depó sitos da Planı́cie Costeira,
especialmente, nos da porçã o meridional, Os estados de Santa Catarina e do
junto ao arroio Chuı́, na fronteira com o Uru‑ Rio Grande do Sul nunca foram objeto, até o
guai, bem como em depó sitos quaterná rios momento, de campanhas sistemá ticas ou
no centro‑sul (Caçapava do Sul) e na frontei‑ metodologicamente consistentes de inventá ‑
ra oeste do RS (sobretudo, em Uruguaiana e rio de seu patrimô nio geoló gico, em escala

Patrimônio geológico e geoconservação nos estados de Santa Catarina e Rio Grande do Sul 491
Contribuições à Geologia do Rio Grande do Sul e de Santa Catarina

estadual, conforme as diretrizes sugeridas ontoló gicos, mas do perı́odo Triá ssico da
por Lima et al. (2010), por sua vez, inspira‑ Era Mesozoica, estã o os sı́tios Passo das
das nas experiê ncias de Portugal e da Espa‑ Tropas, em Santa Maria (RS) (SIGEP 084 (Da
nha. O presente trabalho també m nã o Rosa et al., 2013)), de conteú do paleo lorı́s‑
constitui uma tentativa de inventá rio, e, sim, tico, e Predebon, em Sã o Joã o do Polê sine
uma breve revisã o e atualizaçã o dos traba‑ (RS) (SIGEP 045 (Silva et al., 2013)), alé m de
lhos desenvolvidos. A iniciativa que mais se dois capı́tulos que descrevem, na verdade,
aproximou desse tipo de inventá rio foi a Co‑ em vez de sı́tios especı́ icos, contextos mais
missão Brasileira de Sítios Geológicos e Paleo‑ amplos: o contexto dos Sı́tios Paleobotâ ni‑
biológicos do Brasil, a chamada SIGEP, um cos do Arenito Mata (SIGEP 009 (Guerra‑
esforço de diversas entidades (ABEQUA, Sommer & Scherer, 2002)), que descreve
CPRM, DNPM, IBGE, ICMBio, IPHAN, Petro‑ uma das mais importantes lorestas petri i‑
bras, SBE, SBG, SBP e UGB) para compor um cadas do continente, distribuı́da pelos mu‑
panorama do patrimô nio geoló gico brasilei‑ nicı́pios de Sã o Pedro do Sul e de Mata (RS)
ro. Mesmo que seu â mbito tenha sido nacio‑ (Fig. 2C e 2D); e o contexto dos Tetrá podes
nal, essa lista pode dar uma ideia inicial triá ssicos do Rio Grande do Sul (SIGEP 022
desse patrimô nio regional, ainda que seu ca‑ (Barberena et al., 2002)), que agrupa o con‑
rá ter ad hoc, baseado na adesã o voluntá ria teú do fossilı́fero de vertebrados, já detalha‑
de pesquisadores, descrevendo sı́tios rele‑ do acima, de uma faixa de a loramentos de
vantes desde os seus pontos de vista, tenha quase 200 quilô metros de extensã o, orien‑
deixado as listas notadamente incompletas e tada leste‑oeste no centro do RS, que se dis‑
tenha re letido um pouco das desigualdades tribui entre Candelá ria e Sã o Vicente do Sul,
do paı́s. passando pela porçã o sul do territó rio da
Juntos, RS e SC possuem 17 sı́tios ou Quarta Colô nia, candidato a Geoparque
contextos geopatrimoniais inscritos na SI‑ Mundial UNESCO. Esse ú ltimo contexto, em
GEP (Fig. 1) e dez deles estã o diretamente que há frequente descoberta de novos fó s‑
relacionados à paleontologia. Isso, talvez, re‑ seis, foi recentemente atualizado pelo traba‑
lita a mais direta atribuiçã o de um cará ter lho de Schultz et al. (2020).
patrimonial aos fó sseis (inclusive, como pa‑ Associado, també m, à evoluçã o da
trimô nio cultural) do que a outros elemen‑ Bacia do Paraná , mas desde um ponto de
tos da geodiversidade, como minerais, vista estratigrá ico e da histó ria das geoci‑
rochas ou formas de relevo. Os sı́tios A lora‑ ê ncias no sul do Brasil, está o sı́tio Coluna
mento Quité ria, em Encruzilhada do Sul (RS) White, Serra do Rio do Rastro (SIGEP 024
(SIGEP 008 (Jasper et al., 2009)), Morro do (Orlandi Filho et al., 2009)), que recebeu
Papalé o, em Mariana Pimentel (RS) (SIGEP uma das primeiras iniciativas, no sentido da
101 (Ianuzzi et al., 2009)), A loramento Bai‑ divulgaçã o geocientı́ ica, com paradas e com
nha, em Criciú ma (SC) (SIGEP 082 (Ianuzzi, placas informativas no trajeto asfaltado, po‑
2002)) e A loramento de Canoinhas, em Ca‑ ré m sinuoso, entre Orleans e Bom Jardim da
noinhas (SC) (SIGEP 126 (Fanton et al., Serra (SC) (Fig. 2E). Esse é um verdadeiro
2009)) representam sı́tios paleobotâ nicos “itinerá rio geoló gico”, com cerca de 1000
com registros do Permiano, no inı́cio da de‑ metros de desnı́vel topográ ico e uma via‑
posiçã o da Bacia do Paraná na regiã o, ainda gem por mais de 160 milhõ es de anos de
na Era Paleozoica, ao inal da glaciaçã o que evoluçã o sedimentar, iniciando com o limite
dominou o Gondwana no Carbonı́fero. Itararé /Rio Bonito (Permiano inferior) e i‑
També m vinculados a aspectos pale‑ nalizando com os basaltos Serra Geral (Cre‑

492 Edição da Sociedade Brasileira de Geologia – Núcleo RS/SC


Borba et al.

tá ceo inferior). Sobre esses basaltos, formou‑ ao ar livre para as geociê ncias no sul do Bra‑
se, pelo singular e instantâ neo evento de sil.
queda de um meteoro, o geossı́tio Astroble‑ Os conteú dos fossilı́feros associados
ma Domo de Vargeã o, uma cratera de 12,4 ao Pleistoceno, descritos antes, estã o repre‑
quilô metros de diâ metro, que ocupa porçõ es sentados pelos sı́tios Barrancas fossilı́feras do
dos municı́pios de Vargeã o, Faxinal dos Gue‑ arroio Chuı́, em Chuı́ (RS) (SIGEP 119 (Lopes
des e Passos Maia, no oeste catarinense (SI‑ et al., 2009)), de onde foram resgatados fó s‑
GEP 114 (Cró sta et al., 2009)). seis de mamı́feros herbı́voros diversos, in‑
Grandes desnı́veis topográ icos tam‑ cluindo preguiças‑gigantes, e Paleotoca do
bé m constituem a marca dos sı́tios Itaimbe‑ Municı́pio de Cristal, em Cristal (RS) (SIGEP
zinho e Fortaleza, na divisa entre Cambará 048 (Buchmann et al., 2013)), cujas feiçõ es
do Sul (RS) e Praia Grande (SC) (SIGEP 050 indicam escavaçõ es feitas por um tatu‑gigante
(Wildner et al., 2009)), constituı́dos por dois (Xenarthra, Dasypodidae). A Planı́cie Costeira,
longos (quase 6 mil metros de extensã o) e como palco de processos sedimentares ativos,
profundos (mais de 720 metros de desnı́vel) está representada em outros dois sı́tios: as
câ nions, encaixados em estruturas tectô nicas Dunas do Albardã o, em Santa Vitó ria do Pal‑
SSE‑NNW (Itaimbezinho) e ENE‑WSW (For‑ mar (RS) (SIGEP 003 (Lopes et al., 2009)),
taleza), expondo paredõ es verticais (Fig. 2F e que registram os processos eó licos (dunas
2G), com a sequê ncia de derrames basá lticos frontais, dunas mó veis) dominantes na atual
da Formaçã o Serra Geral. Esses câ nions, jun‑ barreira arenosa; e o Complexo Lagunar Cen‑
tamente com as falé sias da praia gaú cha de tro‑Sul Catarinense, entre Jaguaruna e Garo‑
Torres (Fig. 2H), sã o os elementos mais im‑ paba (SC) (SIGEP 075 (Gianinni, 2002)),
portantes do territó rio dos Caminhos dos importante nã o só do ponto de vista geomor‑
Câ nions do Sul, també m candidato a Geopar‑ foló gico/sedimentar, mas també m arqueoló ‑
que Mundial UNESCO. gico, pela presença de sambaquis.
També m localizados em um territó ‑ Alé m da lista SIGEP, é importante
rio que pleiteia a certi icaçã o de Geoparque mencionar alguns esforços de inventá rio de
Mundial UNESCO, neste caso, o municı́pio de geossı́tios para á reas ou para territó rios espe‑
Caçapava do Sul (RS), estã o os sı́tios: Minas cı́ icos, realizados ao longo dos ú ltimos anos.
do Camaquã (SIGEP 064 (Paim, 2002)), re‑ O municı́pio de Caçapava do Sul, ou á reas
gistrando as ocorrê ncias de minerais metá li‑ mais extensas, englobando aquele municı́pio,
cos em rochas sedimentares antigas (Fig. foram objeto dos levantamentos de Degrandi
3A), bem como o patrimô nio mineiro (Fig. (2011), de Borba et al. (2013) e de Peixoto
3B) das diferentes fases dos mais de 100 (2017), cada um com foco e com abrangê ncia
anos de extraçã o de cobre e de metais asso‑ diferentes. O territó rio do Conselho Regional
ciados, nas imediaçõ es do Rio Camaquã ; e de Desenvolvimento da Regiã o da Campanha
Guaritas do Camaquã (SIGEP 076 (Paim et Gaú cha (COREDE Campanha), que integra,
al., 2013)), singular relevo ruiniforme (Fig. alé m de Caçapava do Sul, os municı́pios de
3C) desenvolvido sobre arenitos e conglome‑ Aceguá , Bagé , Candiota, Dom Pedrito, Hulha
rados de origens aluvial e eó lica do Cambria‑ Negra e Lavras do Sul, teve geossı́tios e con‑
no, que tem continuidade a leste, em Santana textos geopatrimoniais de potencial turı́stico
da Boa Vista. Caçapava do Sul, o icialmente descritos por Borba et al. (2019a e 2019b).
reconhecida como “capital gaú cha da geodi‑ Houve, ainda, levantamentos de aspectos cul‑
versidade”, pela Lei Estadual nº turais (Borba et al., 2014), ecoló gicos (Silva,
14.708/2015, é uma importante sala de aula 2016; Borba et al., 2016) e esté ticos (Borba,
Patrimônio geológico e geoconservação nos estados de Santa Catarina e Rio Grande do Sul 493
Contribuições à Geologia do Rio Grande do Sul e de Santa Catarina

Figura 2 – Aspectos da geodiversidade e do patrimô nio geoló gico de SC e do RS: (A) crâ nios fó sseis dos
tetrá podes triá ssicos Hyperodapedon (à esquerda, barra de escala de 10cm), Macrocollum (à direita, na parte
superior, barra de escala de 5 cm) e do pequeno cinodonte Brasilodon (barra de escala de 1 cm); (B) fó sseis do
pé de uma preguiça‑gigante do gê nero Lestodon (a escala em preto‑e‑branco, interna ao cartã o, é de 5 cm),
coletados em Caçapava do Sul (RS); (C) lenhos fó sseis triá ssicos in situ, a lorantes no Sı́tio da Piscina, em Sã o
Pedro do Sul (RS); (D) grandes fragmentos de lenhos fó sseis ex situ, dispostos em praça pú blica, na cidade de
Mata (RS); (E) a rodovia sinuosa, que cruza a Coluna White, na Serra do Rio do Rastro, vista a partir de um
mirante, em Bom Jardim da Serra (SC); (F) trilha do Rio do Boi, em Praia Grande (SC), curso d’á gua encaixado
nos paredõ es do câ nion Itaimbezinho; (G) vista do câ nion Fortaleza, em Cambará do Sul (RS), com ocorrê ncia
do fenô meno da ‘viraçã o’; (H) falé sias basá lticas da praia de Torres (RS). Fotogra ias de Flá vio Pretto (A), de
André Borba (B, C, D, E, F e H) e de Maria Elizabeth da Rocha (G).

494 Edição da Sociedade Brasileira de Geologia – Núcleo RS/SC


Borba et al.

2017), bem como da histó ria e da marca pai‑ nos trabalhos de Fontana (2012) e de Fonta‑
sagı́stica da mineraçã o (Von Ahn & Simon, na et al. (2015). Em anterior trabalho de re‑
2019), em locais especı́ icos de Caçapava do visã o e de perspectivas, Borba (2014) havia
Sul. mencionado, ainda, geossı́tios situados no
Ainda no Rio Grande do Sul, houve norte do RS, em diferentes porçõ es da bacia
os levantamentos realizados no territó rio da hidrográ ica do alto rio Uruguai, alguns en‑
Quarta Colô nia, composto por nove municı́‑ volvendo contextos com continuidade fı́sica
pios da regiã o central do RS (Agudo, Dona em SC, como: (a) as á reas de ocorrê ncia de
Francisca, Faxinal do Soturno, Ivorá , Nova espetaculares geodos de ametista, em Planal‑
Palma, Pinhal Grande, Restinga Sê ca, Sã o to e Ametista do Sul (RS) e em Entre Rios
Joã o do Polê sine e Silveira Martins), sempre (SC); (b) as faixas de a loramentos naturais
com foco na eventual candidatura ao selo de de á guas termais, com complexos balneá rios
Geoparque Mundial UNESCO. A partir do le‑ de diferentes nı́veis de infraestrutura, inte‑
vantamento inicial de Godoy et al. (2012a), grando os municı́pios catarinenses de Caibi,
por iniciativa do Consó rcio de Desenvolvi‑ Palmitos e Sã o Carlos, alé m de Iraı́, no RS, e,
mento Sustentá vel (CONDESUS) da Quarta mais a leste, entre Marcelino Ramos (RS) e
Colô nia, adiçõ es, supressõ es e reavaliaçõ es Piratuba (SC); e (c) o Salto do Yucumã (Fig.
de geossı́tios (e.g. Ziemann & Figueiró , 3E), em Derrubadas (RS), como uma singular
2017) foram se incorporando ao panorama queda d’á gua longitudinal (ao longo da dire‑
geopatrimonial daquele territó rio. Da mes‑ çã o do rio), inserida no Parque Estadual do
ma forma, no territó rio Caminhos dos Câ ni‑ Turvo.
ons do Sul, a partir do trabalho inicial de Em Santa Catarina, alé m das já cita‑
Godoy et al. (2012b), houve readequaçõ es, das á reas de divisa com o Rio Grande do Sul,
inclusive territoriais, que obrigaram à pro‑ destacam‑se, como levantamentos de pa‑
posiçã o de modi icaçõ es na lista de geossı́ti‑ trimô nio geoló gico em locais ou em territó ri‑
os. Alé m dos câ nions já inscritos na lista os especı́ icos (Fig. 1), trabalhos de
SIGEP, os morros e as falé sias da praia de identi icaçã o de geossı́tios em dois municı́pi‑
Torres tiveram um destaque internacional, os da regiã o litorâ nea: (1) Itapema, onde
ao serem descritos no artigo de Zerfass et al. houve levantamento da geodiversidade e
(2020). proposiçã o de prá ticas de educaçã o ambien‑
Outros elementos da geodiversidade tal e de geoturismo (Covello, 2011); e (2) a
gaú cha tê m sido focalizados desde o ponto capital Florianó polis (Figs. 3F e 3G), onde fo‑
de vista geopatrimonial (Fig. 1). E o caso dos ram propostas estraté gias de geoconserva‑
areais da Fronteira Oeste gaú cha, com suas çã o e planos de gestã o da geodiversidade
implicaçõ es paleoclimá ticas e ambientais, (Covello et al., 2017, 2018). També m no lito‑
estudados, especi icamente, no Cerro da Es‑ ral, há pesquisas direcionadas: ao municı́pio
quina, em Sã o Francisco de Assis (Gass et al., de Garopaba, uma á rea de substancial geodi‑
2019). També m merece destaque a cratera versidade (Quoos & Figueiró , 2018); a locali‑
de impacto (astroblema) do Cerro do Jarau, dades especı́ icas na ilha de Santa Catarina
em Quaraı́ (Sá nchez & Garcia, 2013), geossı́‑ (Fig. 3G), como Lagoinha do Leste (Santos &
tio de singular relevâ ncia cultural para o po‑ Valdatti, 2017); e a unidades de conservaçã o,
vo gaú cho, por ter sido local de inspiraçã o como o Parque Estadual da Serra do Tabulei‑
para a lenda da Salamanca do Jarau (Fig. ro (Pimenta, 2016). No caso de geossı́tios es‑
3D). Os aspectos geopatrimoniais da capital pecı́ icos, o recente trabalho de Miranda &
gaú cha, Porto Alegre, tê m sido focalizados Horn Filho (2020) traz o cará ter patrimonial

Patrimônio geológico e geoconservação nos estados de Santa Catarina e Rio Grande do Sul 495
Contribuições à Geologia do Rio Grande do Sul e de Santa Catarina

do Monó lito Bico do Papagaio, em Itajaı́, en‑ esportes de aventura. Outro elemento im‑
quanto Cristiano (2018) avalia a interface portante é a ocorrê ncia de diversas paleoto‑
entre a geoconservaçã o e a gestã o costeira cas, estruturas biogê nicas na forma de
no municı́pio de Araranguá , onde se localiza tú neis e salõ es escavados por mamı́feros da
um importante geossı́tio, o Morro dos Con‑ megafauna do Plioceno e do Pleistoceno nos
ventos. No interior de Santa Catarina, desta‑ arenitos eó licos da Formaçã o Botucatu, que
ca‑se o recente trabalho de Rapanos (2020), a loram na base das encostas, abaixo das ro‑
em uma á rea de rochas alcalinas na zona ru‑ chas vulcâ nicas. També m se destaca o a lo‑
ral de Lages, Painel e Bocaina do Sul, como ramento de peperitos, no contato entre o
uma iniciativa preliminar, com vistas à cons‑ arenito e o basalto, sobretudo, em Torres,
truçã o de um futuro projeto de geoparque (o nas falé sias e nos blocos, que se desprende‑
territó rio Pedras Brancas, segundo aquele ram das mesmas. Esses elementos, e mais
autor). um importante sistema de lagoas e de cam‑
pos de dunas, estã o inseridos no bioma Ma‑
4 FUTUROS GEOPARQUES MUNDIAIS ta Atlâ ntica e na correspondente Reserva da
DA UNESCO EM SANTA CATARINA E Biosfera, certi icada pela UNESCO. Sobre es‑
NO RIO GRANDE DO SUL se contexto fı́sico e bió tico se encontram os
aspectos culturais do territó rio, que remon‑
Em 2020, trê s territó rios (Fig. 1) in‑ tam aos povos indı́genas e à s imigraçõ es
seridos nos estados de SC e RS trabalham no portuguesa, alemã e italiana, alé m dos re‑
sentido de buscar a certi icaçã o do Programa manescentes quilombolas, que in luencia‑
de Geoparques Mundiais da UNESCO. O mais ram na gastronomia, na religiosidade, na
adiantado desses territó rios é denominado arquitetura e nos costumes caracterı́sticos
Caminhos dos Câ nions do Sul (Fig. 1), e reú ‑ da regiã o.
ne sete municı́pios, sendo trê s do Rio Grande A equipe té cnica do Consó rcio Pú ‑
do Sul (Cambará do Sul, Mampituba e Tor‑ blico Intermunicipal vem buscando parceri‑
res) e quatro de Santa Catarina (Praia Gran‑ as com instituiçõ es pú blicas e privadas, para
de, Jacinto Machado, Morro Grande e Timbé a disseminaçã o do conhecimento das geoci‑
do Sul), em um Consó rcio Intermunicipal ê ncias e da sua relaçã o com os patrimô nios
constituı́do especialmente para a inalidade natural e cultural do territó rio, visando ao
de implantaçã o dessa estraté gia. O Geopar‑ desenvolvimento e à valorizaçã o de produ‑
que Aspirante Caminhos dos Câ nions do Sul tos vinculados à identidade sociocultural
teve seu dossiê de candidatura enviado à regional. Das parcerias já estabelecidas, re‑
UNESCO, em novembro de 2019, mas, devido sultaram vá rias açõ es: georroteiros, implan‑
à pandemia de Covid‑19, ainda nã o havia re‑ taçã o de centros de interpretaçã o, placas e
cebido a missã o de avaliaçã o da UNESCO. painé is interpretativos, eventos, cursos de
Reunindo os câ nions Itaimbezinho e Fortale‑ capacitaçã o de guias/condutores e profes‑
za, nos Parques Nacionais dos Aparados da sores, entre outros. Como o territó rio carece
Serra e da Serra Geral, e as falé sias da praia de instituiçõ es de pesquisas nas geociê nci‑
gaú cha de Torres, o territó rio registra, ao as, estã o sendo feitas parcerias com vá rias
mesmo tempo, o episó dio vulcâ nico gigan‑ universidades, o que está resultando em te‑
tesco da Formaçã o Serra Geral, e os vales ses e em cursos de capacitaçã o, em diferen‑
profundamente escavados ao longo de suas tes á reas. A estraté gia geoparque també m
fraturas, dando origem a câ nions de grande atraiu o interesse dos governos estaduais
beleza cê nica e de potencial para lazer e para do RS e de SC e do governo federal, que es‑

496 Edição da Sociedade Brasileira de Geologia – Núcleo RS/SC


Borba et al.

tã o investindo na infraestrutura da regiã o, na costumes e idiomas sã o atrativos que com‑
melhoria das estradas e da sinalizaçã o. Entre plementam a singularidade da Quarta Colô ‑
os principais desa ios, estã o: a acessibilidade nia.
reduzida aos atrativos turı́sticos, a manuten‑ Como açã o estraté gica de proteçã o e
çã o permanente dos geossı́tios e a gestã o de de salvaguarda do patrimô nio fó ssil, por ini‑
á reas de riscos de desastres naturais, dadas ciativa do CONDESUS/QC, foi criado o Centro
as caracterı́sticas morfoló gicas do territó rio. de Apoio à Pesquisa Paleontoló gica da Quar‑
Para enfrentar esses desa ios, a estraté gia ta Colô nia (CAPPA), hoje administrado pela
conta com o engajamento das comunidades e UFSM. Alé m de possuir um corpo de pro issi‑
das entidades parceiras, tendo em vista a vo‑ onais da paleontologia e gestores, o CAPPA
caçã o turı́stica do territó rio Caminhos dos conta com um conjunto de laborató rios equi‑
Câ nions do Sul. pados para receber cientistas de diferentes
O territó rio da Quarta Colô nia, na re‑ instituiçõ es, e oferece apoio té cnico, logı́stico
giã o central do Rio Grande do Sul (Fig. 1), e acadê mico para a pesquisa paleontoló gica
reú ne os nove municı́pios do CONDESUS/QC, na á rea da Quarta Colô nia. Desde a sua fun‑
conforme mencionado anteriormente, e tem daçã o, manté m tombados todos os fó sseis
como principais instituiçõ es envolvidas em coletados na regiã o, mediante acordos com
sua constituiçã o e em sua gestã o, o pró prio instituiçõ es de pesquisa que atuam no seu
CONDESUS e a Universidade Federal de Santa territó rio de abrangê ncia. Alé m de ser refe‑
Maria (UFSM), alé m das nove prefeituras. rê ncia em pesquisa de paleodiversidade, pa‑
Apó s diversas audiê ncias pú blicas, realizadas leoecologia e paleontologia virtual, o CAPPA
em 2019, foi constituı́do um comitê gestor, atua junto à UFSM na graduaçã o e na pó s‑
com ampla participaçã o da comunidade e do graduaçã o, e estende suas atividades a ou‑
poder pú blico dos nove municı́pios. O Geo‑ tras instituiçõ es e à rede bá sica de ensino,
parque Aspirante Quarta Colô nia enviou, em atravé s de o icinas, de cursos de curta dura‑
junho de 2020, a carta de intençõ es (letter of çã o, da instrumentalizaçã o de docentes, da
intent) ao escritó rio da UNESCO, em Paris, manutençã o de uma mostra paleontoló gica e
com a chancela do Ministé rio das Relaçõ es da incorporaçã o da paleontologia aos currı́‑
Exteriores do Brasil (Itamaraty) e, atualmen‑ culos escolares do territó rio. Ainda no cam‑
te (dezembro de 2020), prepara o dossiê de po da educaçã o, o Geoparque Aspirante
candidatura. O territó rio tem, como principal Quarta Colô nia promoveu: (a) de forma vir‑
elemento geopatrimonial, o contexto interna‑ tual, ao longo do ano de 2020, uma Jornada
cionalmente reconhecido (detalhado acima) de Educaçã o Patrimonial, para 300 docentes
dos fó sseis de tetrá podes do Triá ssico (250 da educaçã o bá sica; e (b) trê s ediçõ es anuais
Ma a 200 Ma), com destaque para os dinos‑ (2017, 2018 e 2019) do Paleodia da Quarta
sauros mais antigos do mundo, com 233 mi‑ Colô nia, com atividades de lazer, de cultura e
lhõ es de anos, bem como uma importante de conhecimento sobre todos os aspectos do
fauna de cinodontes, vinculados à origem dos territó rio, cuja ú ltima ediçã o acumulou cerca
mamı́feros, datados em 225 milhõ es de anos. de 1000 visitantes.
Estes fó sseis a loram junto a um contexto de Por sua vez, o municı́pio de Caçapava
transiçã o entre a Depressã o Central e o Pla‑ do Sul, no centro‑sul do RS (Fig. 1), constitui
nalto Meridional Brasileiro, bem como entre o territó rio proposto para o Geoparque Aspi‑
os biomas Pampa e Mata Atlâ ntica. A herança rante Caçapava, uma estraté gia capitaneada
cultural de imigrantes italianos e alemã es, pela Universidade Federal de Santa Maria
sua gastronomia, religiosidade, arquitetura, (UFSM) e pela Universidade Federal do Pam‑
Patrimônio geológico e geoconservação nos estados de Santa Catarina e Rio Grande do Sul 497
Contribuições à Geologia do Rio Grande do Sul e de Santa Catarina

Figura 3 – Mais aspectos da geodiversidade e do patrimô nio geoló gico de SC e do RS: (A) manchas do mineral
malaquita (carbonato de cobre) sobre conglomerados da Bacia do Camaquã , em Caçapava do Sul (RS); (B)
instalaçõ es do Cine Rodeio, na vila Minas do Camaquã , em Caçapava do Sul (RS), marco da mineraçã o de cobre
na regiã o; (C) geossı́tio Guaritas do Camaquã , em Caçapava do Sul, relevo ruiniforme sobre arenitos e
conglomerados do inı́cio do Paleozoico; (D) Cerro do Jarau, em Quaraı́ (RS), expressã o paisagı́stica de uma
cratera de impacto (astroblema), em meio ao pampa; (E) Salto do Yucumã , extensa queda d’á gua longitudinal,
ao longo do rio Uruguai, em Derrubadas (RS); (F) campo de dunas da praia da Joaquina, em Florianó polis (SC),
com morro granı́tico, ao fundo; (G) praia de Lagoinha do Leste e, em primeiro plano, blocos residuais de rochas
piroclá sticas no Morro da Coroa, em Florianó polis (SC). Fotogra ias de André Borba (A, B, C, D e E) e de Cristina
Covello (F e G).

498 Edição da Sociedade Brasileira de Geologia – Núcleo RS/SC


Borba et al.

pa (Unipampa), com apoio da Prefeitura Mu‑ pampa, oferecem exposiçõ es, jogos, brinca‑
nicipal e de uma entidade criada em 2018, a deiras, contaçõ es de histó rias, prá ticas de es‑
Associaçã o para o Desenvolvimento do Geo‑ calada, planetá rio itinerante, caminhadas
turismo de Caçapava do Sul (AGEOTUR). Esse interpretativas pelo centro histó rico e excur‑
conjunto de instituiçõ es, com o apoio da Casa sõ es aos principais geossı́tios, alé m de feiras
Civil do Governo do Estado do RS e com a de artesanato e de produtos locais. Por im,
chancela do Itamaraty, també m enviou carta em 2019, houve a inauguraçã o de um novo
de intençõ es à UNESCO, em junho de 2020, espaço educativo no acesso ao campus da
prepara dossiê de candidatura e tenta mon‑ Unipampa: o Jardim da Geodiversidade Pro‑
tar sua estrutura de gestã o. O territó rio tem, fessor Maurı́cio Ribeiro, com grandes blocos
como destaque geopatrimonial, o contexto de rocha e com uma reconstituiçã o paleoar‑
da Bacia do Camaquã , o mais completo, es‑ tı́stica de uma preguiça‑gigante (Megathe‑
pesso e abrangente registro da “fase de tran‑ rium), com todos os elementos interpre‑
siçã o” da Plataforma Sul‑americana, exposto tados, atravé s de painé is explicativos sobre a
em geossı́tios de grande beleza cê nica, como origem e sobre a localizaçã o no territó rio.
a Serra de Santa Bá rbara, a Serra do Segredo, Nos campos do geoturismo e do desenvolvi‑
as Minas do Camaquã e as Guaritas. Ecossis‑ mento local sustentá vel, é importante desta‑
temas ú nicos e ameaçados, adaptados ao car o estabelecimento de novas empresas
substrato rochoso, com destaque para os en‑ dedicadas à conduçã o (geo)turı́stica, de no‑
demismos de cactá ceas, pontuam a isiono‑ vas opçõ es de hospedagem integradas à pai‑
mia de campos nativos, cuja ocupaçã o sagem das Guaritas e, també m, vinculadas à
tradicional, por pecuaristas familiares, ga‑ olivicultura, alé m da criaçã o de novos produ‑
rante a sustentabilidade ambiental e paisa‑ tos com identidade local e com inspiraçã o
gı́stica do meio rural. Na cidade, um centro patrimonial, desde cervejas artesanais a pro‑
histó rico de construçõ es antigas e tombadas dutos em lã . O artesanato de Caçapava do Sul
(embora, em mau estado de conservaçã o) teve, també m, um salto de qualidade, sobre‑
tem, como principal atrativo, a ú nica fortale‑ tudo, a partir de capacitaçõ es fornecidas pe‑
za preservada do RS, com muralhas construı́‑ lo Geoparque Aspirante Caçapava, e, hoje,
das com blocos do granito autó ctone: o Forte sã o encontrados muitos suvenires com refe‑
Dom Pedro II, do sé culo XIX. rê ncias aos geossı́tios, aos cactos e à pregui‑
O Geoparque Aspirante Caçapava ça‑gigante, entre outros. Nos quesitos
tem realizado uma sé rie de açõ es na á rea da conservaçã o da natureza e uso sustentá vel
educaçã o ambiental e (geo)patrimonial. Em da geodiversidade, Caçapava do Sul, que
2015 e em 2016, houve o icinas para a quali‑ nunca teve unidades de conservaçã o (UC)
icaçã o de docentes da educaçã o bá sica em em seu territó rio, conta, hoje, com o Parque
aspectos da geodiversidade local e de geoci‑ Natural Municipal da Cascata do Salso, em
ê ncias em geral e, em 2019, ocorreu o lança‑ vias de regularizaçã o, junto aos ó rgã os ambi‑
mento de um guia didá tico gratuito sobre os entais do RS, e com um trabalho muito con‑
geomonumentos do municı́pio, editado pela sistente junto ao Parque Municipal da Pedra
Pró ‑Reitoria de Extensã o da UFSM. Desde do Segredo, á rea de lazer concedida à inicia‑
novembro de 2015, realizam‑se, anualmente, tiva privada local.
os eventos Geodia, promovendo a integraçã o
entre a comunidade e o conhecimento geoci‑ 5 CONSIDERAÇÕES FINAIS
entı́ ico. Tais eventos, realizados na praça
central da cidade e nas dependê ncias da Uni‑ Em sı́ntese, o territó rio compreendi‑

Patrimônio geológico e geoconservação nos estados de Santa Catarina e Rio Grande do Sul 499
Contribuições à Geologia do Rio Grande do Sul e de Santa Catarina

do pelos estados de Santa Catarina e do Rio Queiroz, E. T., Winge, M. & Berbert‑Born, M.
Grande do Sul possui aspectos de geodiversi‑ (Eds. ) Sítios geológicos e paleontológicos do
dade e de patrimô nio geoló gico de substan‑ Brasil – SIGEP, vol. I, p. 11‑22.
cial importâ ncia cientı́ ica/educativa, bem
Borba, A. W. 2014. Perspectivas para a pes‑
como, para diversos conteú dos, de beleza cê ‑
quisa e a atuaçã o em geoconservaçã o na
nica associada e de forte atratividade turı́sti‑ Universidade Federal de Santa Maria
ca. Conta, també m, com relevantes iniciativas (UFSM) com foco nas á reas menos desenvol‑
de geoconservaçã o, de educaçã o geopatri‑ vidas do Brasil meridional. Ciência e Natura,
monial e de estı́mulo ao geoturismo, muito 36 (Ed. Especial 35 anos): 166‑172.
bem representadas nos atuais trê s territó ri‑
Borba, A. W. 2017. Geomonumentos de Ca‑
os candidatos ao selo de Geoparque Mundial
çapava do Sul (centro‑sul do RS, Brasil) e
da UNESCO. O futuro da geoconservaçã o no seu destaque na paisagem: a quanti icaçã o
extremo sul do Brasil implica, necessaria‑ do valor esté tico do geopatrimô nio e suas
mente: (a) realizaçã o de inventá rio sistemá ‑ aplicaçõ es. Geogra ia Ensino e Pesquisa,
tico e de avaliaçã o de seu patrimô nio 21(1): 216‑225.
geoló gico, inclusive, em termos de estado de
Borba, A. W. & Sell, J. C. 2018. Uma re lexã o
conservaçã o; (b) inclusã o do patrimô nio ge‑
crı́tica sobre os conceitos e prá ticas da geo‑
oló gico nas polı́ticas pú blicas de conservaçã o conservaçã o. Geographia Meridionalis, 4(1):
da natureza e nos processos de EIA‑RIMA e 2‑28.
de licenciamento ambiental, nos â mbitos es‑
tadual e municipal; (c) inserçã o de aspectos Borba, A. W., Souza, L. F., Mizusaki, A. M. P.,
geopatrimoniais nas polı́ticas de educaçã o e Almeida, D. P. M. & Stumpf, P. P. 2013. Inven‑
tá rio e avaliaçã o quantitativa de geossı́tios:
de turismo das diversas instâ ncias de gover‑
exemplo de aplicaçã o ao patrimô nio geoló ‑
nança local e regional; (d) construçã o de no‑ gico do municı́pio de Caçapava do Sul (RS,
vos projetos de geoparques, onde haja Brasil). Pesquisas em Geociências, 40(3):
conteú dos de comprovada relevâ ncia inter‑ 275‑294.
nacional, sempre considerando limites admi‑
nistrativos e a dimensã o do territó rio. Por Borba, A. W., Sell, J. C. & Figueiró , A. S. 2014.
Dimensã o cultural da geodiversidade e do
im, salienta‑se que a geodiversidade, o pa‑
geopatrimô nio de Caçapava do Sul, Rio
trimô nio geoló gico e a geoconservaçã o cons‑ Grande do Sul, Brasil. In: I Encontro Luso‑
tituem novos e importantes campos de Brasileiro de Patrimô nio Geomorfoló gico e
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504 Edição da Sociedade Brasileira de Geologia – Núcleo RS/SC


Esse livro foi editorado pela Compasso
Lugar‑Cultura em 2021.
Na composiçã o foi utilizada a fonte
Cambria.
Contribuições à Geologia do Rio Grande do Sul e de Santa Catarina

506 Edição da Sociedade Brasileira de Geologia – Núcleo RS/SC

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