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CONTRIBUIÇÕES À GEOLOGIA
DO RIO GRANDE DO SUL E
DE SANTA CATARINA
Editores
Andréa Ritter Jelinek
Carlos Augusto Sommer
J47c
Apoio
LISTA DE AUTORES Karine da Rosa Arena
Laé rcio Dal Olmo‑Barbosa
Adriano Domingos dos Reis
Larissa Lanes Tononi
Ana Karina Scomazzon
Lauren da Cunha Duarte
Ana Luisa Outa Mori
Lé o Afraneo Hartmann
Ana Maria Pimentel Mizusaki
Leonardo Kerber
André Jasper
Lidia Aumond Kuhn
André Weissheimer de Borba
Lucas Del Mouro
André a Ritter Jelinek
Lucas de Magalhã es May Rossetti
Anelise Losangela Bertotti
Luı́s Alberto Dá vila Fernandes
Antô nio Liccardo
Luiz Carlos Weinschü tz
Antonio Pedro Viero
Luiz José Tomazelli
Ari Roisenberg
Marcelo Guglielmi Leite
Brenda Fragoso
Marcos Alexandre Freitas
Breno Leitã o Waichel
Margot Guerra Sommer
Bruno Becker‑Kerber
Maria Elisabeth da Rocha
Bruno Ludovico Dihl Horn
Maria Luiza Correa da Camara Rosa
Carla Cristine Porcher
Mariana Werle
Carlos Augusto Sommer
Marina Luiza Jordã o Martins
Cassiana Roberta Lizzoni Michelin
Matheus Philipe Bruckmann
Claiton Marlon dos Santos Scherer
Matheus Silva Simõ es
Cristiano Lana
Maurı́cio Barcelos Haag
Cristina Covello
Miguel Angelo Stipp Basei
Cristina Moreira Fé lix
Miriam Cazzulo‑Klepzig
Cristine Lenz
Mı́rian Liza Alves Forancelli Pacheco
Daiana Rockenbach Boardman
Nelson Luiz Chodur
Daniel Triboli Vieira
Paulo Alves de Souza
David Debruyne
Paulo Sé rgio Gomes Paim
Dé bora Sayuri Zanchi Watanabe
Pedro Antonio Roehe Reginato
Diego Skieresz de Oliveira
Pedro Luiz Juchem
Edgar do Amaral Santos
Rafael Reis Bender
Edinei Koester
Ramy Abdallah
Eduardo Guimarã es Barboza
Randell Stephenson
Eduardo Premaor
Renato Backes Macedo
Elder Yokoyama
Renato Pereira Lopes
Ernesto Luiz Correa Lavina
Roberto Iannuzzi
Evandro Fernandes de Lima
Roberto Jacques Noll Filho
Everton Wilner
Roberto Sacks de Campos
Farid Chemale Jr.
Rodrigo Chaves Ramos
Felipe Caron
Rodrigo Rodrigues Cancelli
Felipe Kipper
Ruy Paulo Philipp
Flá vio Augusto Pretto
Sandro Kucera Duarte
Gilmar Vital Bueno
Sara Nascimento
Glá ucia Nascimento Queiroga
Sé rgio Rebello Dillenburg
Guilherme Villani
Tania Mara Martini de Brum
Ilana Lehn
Tiago Vier Fischer
Isabela Degani Schmidt
Tiara Cerva‑Alves
Jaciele Carine Sell
Valesca Brasil Lemos
Jairo Francisco Savian
Vinı́cius Matté
Joã o Henrique Quoos
Viter Magalhã es Pinto
Joã o Henrique Zahdi Ricetti
Vivianne Andrade Bastos
Joã o Pacı́ ico Silveira Luiz Machado
Wagner Guimarã es da Silva
José Rafael Wanderley Benı́cio
Prefácio
Esta publicaçã o especial do Nú cleo RS/SC da Sociedade Brasileira de Geologia integra
uma coletâ nea de capı́tulos de revisã o da Geologia dos estados do Rio Grande do Sul e de Santa
Catarina, contendo os resultados dos principais grupos de pesquisa que atuam nestes dois
estados. Esta obra tem como objetivo fornecer uma visã o geral da produçã o geocientı́ ica
recente e vem estender o conhecimento gerado na academia para toda a comunidade geoló gica.
A abordagem integrada dos resultados aqui apresentados constitui uma contribuiçã o iné dita em
termos de SBG‑RS/SC, e que será de grande utilidade para a comunidade geocientı́ ica brasileira,
incluindo pesquisadores, professores e pro issionais do mercado, alé m de estudantes de
graduaçã o e de pó s‑graduaçã o em geociê ncias.
O livro apresenta o conhecimento atual sobre a Geologia dos estados do Rio Grande do
Sul e de Santa Catarina. De forma sintetizada, este conhecimento é apresentado nas mais
diversas especialidades das geociê ncias, cujas contribuiçõ es vã o da evoluçã o Proterozoica dos
escudos Sul‑Rio‑Grandense e Catarinense, até a evoluçã o de bacias intracratô nicas, passando
pela aná lise dos conteú dos fossilı́feros Paleozoicos e Mesozoicos, pela evoluçã o das margens
costeira e oceâ nica no Cenozoico e, por im, contribuiçõ es sobre temas da atualidade, como
recursos minerais e hı́dricos, e do patrimô nio geoló gico destes estados.
A publicaçã o deste volume nã o poderia ocorrer em momento mais propı́cio,
imediatamente apó s a comemoraçã o do aniversá rio de 75 anos da Sociedade Brasileira de
Geologia e dos 65 anos de criaçã o dos primeiros cursos de Geologia do Brasil, entre os quais se
inclui o curso de Geologia da UFRGS. Adicionalmente, este perı́odo tem sido completamente
atı́pico para todos nó s, devido à pandemia do Covid‑19. Constituiu‑se, portanto, num desa io,
tanto dos editores, quanto dos autores do livro, condensar e integrar os diversos resultados de
suas pesquisas num ú nico volume e inspirar o interesse e o entusiasmo de seus leitores.
Nã o acreditamos em um projeto digno de sociedade, sem investimentos em educaçã o e
em produçã o de conhecimento cientı́ ico. Este volume é nossa forma de demostrar que Ciê ncia é
investimento e que o nosso conhecimento e o nosso trabalho geram retorno à sociedade.
Dedicamos esta publicaçã o especial aos estudantes de Geologia do nosso Brasil.
Paleozoico
Mesozoico
Cenozoico
Sumário
Paleozoico
Mesozoico
Cenozoico
Folhelho Lontras, uma Lagerstatte do Paleozoico
brasileiro 203
Lucas Del Mouro, Joã o Henrique Zahdi Ricetti, Luiz Carlos Weinschü tz,
Mı́rian Liza Alves Forancelli Pacheco
Paleozoico
Mesozoico
1.
Instituto de Geociê ncias, Universidade Federal do Rio Grande do Sul;
2.
Centro de Tecnologia e Geociê ncias, Universidade Federal de Pernambuco;
3.
Departamento de Geologia, Universidade Federal do Sergipe;
4.
Programa de Pó s‑Graduaçã o em Geociê ncias, Universidade Federal do Rio Grande do Sul;
5.
Secretaria de Meio Ambiente e Preservaçã o Ecoló gica, Prefeitura Municipal de Sapiranga;
6.
Centro de Engenharias, Universidade Federal de Pelotas.
1 INTRODUÇÃO
A utilizaçã o de isó topos radioativos e de seus produtos de decaimento constitui uma
ferramenta geoquı́mica importante no entendimento da evoluçã o crustal de crá tons e de cintu‑
rõ es mó veis. Uma das principais aplicaçõ es dos isó topos radiogê nicos consiste na dataçã o radi‑
omé trica das rochas, poré m, estes també m podem ser usados como traçadores geoquı́micos em
estudos petrogené ticos, na identi icaçã o de fontes e de processos geoló gicos. As razõ es isotó pi‑
cas constituem assinaturas caracterı́sticas da fonte dos magmas e, em geral, permanecem inal‑
teradas em eventos de fracionamento subsequentes. Entretanto, processos geoló gicos
posteriores podem modi icá ‑las, como, por exemplo, o metamor ismo, tornando mais complexas
estas interpretaçõ es (Dickin, 2018).
Os escudos pré ‑cambrianos sã o porçõ es está veis dos continentes, em que predominam
rochas metamó r icas e plutô nicas, com variaçõ es considerá veis nas composiçõ es litoló gica e
quı́mica, tanto lateral quanto verticalmente (Condie, 2005). Esses escudos podem ser individua‑
lizados em domı́nios tectô nicos, constituı́dos por diferentes unidades, com caracterı́sticas geo‑
ló gicas, geofı́sicas e isotó picas similares ou nã o. A geoquı́mica isotó pica, atravé s do uso
combinado de vá rios sistemas, é capaz de auxiliar no entendimento da evoluçã o crustal destes
segmentos.
Contribuições à Geologia do Rio Grande do Sul e de Santa Catarina
Figura 1 ‒ Diagrama de correlaçã o 143Nd/144Nd vs. 87Sr/86Sr (ƐNd vs. ƐSr), apresentando as posiçõ es relativas
das fontes empobrecidas e enriquecidas para os sistemas isotó picos de Nd e de Sr (modi icado de DePaolo &
Wasserburg, 1979). Legenda: CHUR = Chondritic Uniform Reservoir, VE = valor de é psilon.
A evolução crustal do Escudo Sul‑Rio‑Grandense sob a perspectiva dos sistemas isotópicos Sr‑Nd 15
Contribuições à Geologia do Rio Grande do Sul e de Santa Catarina
Figura 2 ‒ Mapa geoló gico simpli icado, ilustrando a disposiçã o dos terrenos, das principais estruturas e da
compartimentaçã o tectô nica do Escudo Sul‑Rio‑Grandense (modi icado de Dal Olmo‑Barbosa et al., 2021, apó s
Fernandes et al., 1995, Costa, 1997, Paim et al., 2000 e Ramos et al., 2018).
e no Complexo Batovi, ambos com idades de razã o inicial 143Nd/144Nd pró xima de 0,510
proveniê ncia, sugerindo fontes dominante‑ para uma idade de 2,1 Ga. Moraes (2020)
mente paleoproterozoicas (1,7 Ga) e inter‑ apresenta caracterı́sticas isotó picas, sugerin‑
pretados como sedimentos siliciclá sticos de do que a associaçã o má ica‑ultramá ica do
margem passiva (Laux, 2018; e refs.). Local‑ complexo tem derivaçã o manté lica, com 87Sr/
86
mente, ocorrem carbonatitos de idade meso‑ Sr(2,1) 0,700924‑0,704864, 143Nd/144Nd(2,1)
proterozoica (1,1 Ga), vinculados a um 0,509903‑0,510096, ƐNd(2,1) ‑0,30 a 3,5 e Nd‑
evento extensional (Monteiro et al., 2020). TDM de 2,1‑2,4 Ga. As assinaturas isotó picas
Essas unidades sã o intrudidas e retrabalha‑ da associaçã o gabroica‑tonalı́tica també m
das pelo magmatismo ediacarano das suı́tes sugerem uma derivaçã o do manto, com 87Sr/
86
Saibro, Vauthier e Santo Afonso, e da Forma‑ Sr(2,1) 0,701254‑0,708815, 143Nd/144Nd(2,1)
çã o Acampamento Velho, dominado por lavas 0,511022‑0,512171, ƐNd(2,1) ‑3,7 a 2,2 e Nd‑
riolı́ticas e, subordinadamente, por ignimbri‑ TDM 2,3‑2,6 Ga (Fig. 3A).
tos, brechas e tufos (Wildner et al., 2008; O Carbonatito Trê s Estradas apre‑
Laux, 2018; e refs.). senta assinaturas isotó picas Sr‑Nd (Fig. 3B)
No Complexo Granulı́tico Santa Maria sugestivas de uma fonte manté lica heterogê ‑
Chico, os estudos isotó picos (Soliani Jr. et al., nea e metassomatizada, durante o Mesopro‑
143
2000) mostram razõ es iniciais de 87Sr/86Sr terozoico, com Nd/144Nd(1,1)
em torno de 0,7019‑0,7021, sugerindo uma 0,509982‑0,511432, ƐNd(1,1) ‑0,7 a 4,4 e Nd‑
contribuiçã o manté lica como a principal fon‑ TDM de 1,2 Ga a 2,3 Ga (Monteiro et al.,
te dos protó litos do complexo. Os dados Sm‑ 2020).
Nd sugerem valores ƐNd(2,1) positivos, com a As rochas vulcâ nicas neoproterozoi‑
16 Edição da Sociedade Brasileira de Geologia – Núcleo RS/SC
Koester et al.
cas da Fm. Acampamento Velho exibem assi‑ orito Passinho e interpretada como perten‑
naturas isotó picas Sr‑Nd (Fig. 3C) sugestivas cente ao Arco Passinho (Hartmann et al.,
de uma fonte manté lica, similar à do manto 2019), relacionado ao Complexo Imbicuı́
enriquecido, com 143Nd/144Nd(570) 0,512235‑ (Philipp et al., 2018), e outra, de idade crio‑
0,511566, ƐNd(570) ‑0,7 a 4,4 e Nd‑TDM 1,2‑2,3 geniana, representada por metagranitoides e
Ga (Koester et al., submetido). dioritos, por tonalitos e por trondhjemitos do
Complexo Cambaı́ (Saalmann et al., 2006;
5 O TERRENO SÃO GABRIEL Philipp et al., 2018), com idade de 675‑750
Ma, de inida pela Orogenia Sã o Gabriel (Phi‑
O Terreno Sã o Gabriel (TSG), tam‑ lipp et al., 2018; e refs.).
bé m denominado Terreno Vila Nova, é cons‑ O Complexo Imbicuı́ tem razõ es 87Sr/
tituı́do por associaçõ es petrotectô nicas 86
Sr(828) 0,703473‑0,707205, 143Nd/144Nd(828)
formadas durante o evento acrescioná rio da 0,512181‑0,512088, ƐNd(828) de 4,4 a 6,2 e Nd‑
Orogenia Brasiliana, entre os perı́odos Toni‑ TDM 0,6‑0,9 Ga, indicativas de magmas juve‑
ano e Criogeniano. O terreno compreende nis (Siviero et al., submetido). Gnaisses to‑
relictos de sequê ncias o iolı́ticas, duas nalı́ticos do Complexo Cambaı́ possuem
sequê ncias de arcos juvenis intraoceâ nicos dados isotó picos de Sr com pouca variaçã o,
(Passinho, de 879 Ma, e Sã o Gabriel, de 758‑ entre 0,7031‑0,7035 (Saalmann et al.,
700 Ma), alé m de rochas metavulcanossedi‑ 2005b), enquanto isó topos de Nd possuem
mentares. Essas rochas sã o cobertas por valores de ƐNd(750) de 4 a 6. A porçã o supra‑
sequê ncias vulcâ nicas e sedimentares edia‑ crustal do arco é representada por sucessõ es
caranas da Bacia do Camaquã , intrudidas por metavulcâ nicas e metassedimentares do
granitos pó s‑tectô nicos (Philipp et al., 2018; Grupo ou Supercomplexo Vacacaı́ (Chemale
e refs.). Jr., 2000), incluindo o Cambaizinho, Arroio
Os relictos de o iolitos incluem os Marmeleiro, parte do Passo Feio, Ibaré , Pon‑
complexos Cerro Mantiqueiras, Ibaré , Palma, tas do Salso, Bela Vista e Campestre (Saal‑
Passo do Ivo, Bossoroca e Cambaizinho, com mann et al., 2005a; Vedana et al., 2017). A
duas idades de formaçã o de crosta oceâ nica: sequê ncia supracrustal apresenta assinatu‑
a mais antiga, de 923‑890 Ma; e outra, de ras similares à s das sequê ncias Bossoroca,
750‑720 Ma (Hartmann et al., 2019; e refs.). Cambaizinho e Ponta do Salso, de 87Sr/
86
Dados isotó picos (Fig. 3D) para as Sr(750) entre 0,701 e 0,704 e ƐNd(750) positi‑
rochas ultramá icas, vinculadas aos o iolitos, vos, de 1 a 6 (Cerva‑Alves et al., 2020).
sugerem, na regiã o de Palma, razõ es 87Sr/ Granitoides pó s‑orogê nicos, como o
86
Sr(800) entre 0,7008‑0,7019 e dados de Granito Santa Zé lia e a Suı́te Lagoa da Meia
ƐNd(800) com valores positivos de 3 e 4 e Nd‑ Lua, possuem ƐNd(660) entre ‑1,6 e 1,7 e razõ es
TDM de 0,9 a 1,3 Ga. Para a regiã o do Cerro isotó picas 87Sr/86Sr(660) de 0,707 a 0,708 (Sa‑
Mantiqueira, as rochas ultramá icas e os an‑ almann et al., 2005b).
ibolitos tê m razõ es 87Sr/86Sr(730) 0,7012‑
0,7089, 143Nd/144Nd(730) 0,511033‑0,512143, 6 O TERRENO TIJUCAS
ƐNd(730) ‑3,0 a 2,0 e Nd‑TDM 0,8‑1,1 Ga (Leite et
al., 1998; Saalmann et al. (2005,a,b, 2006). O Terreno Tijucas (TJ), anteriormen‑
A estrutura do arco inclui duas asso‑ te denominado Faixa de Dobramentos Tiju‑
ciaçõ es DTTG (diorito, tonalito, trondhjemi‑ cas, Cinturã o Tijucas, alé m de Cinturã o
to, granodiorito), sendo uma de idade Porongos, é constituı́do, predominantemen‑
toniana (879 ± 14 Ma), registrada no metadi‑ te, por rochas metavulcanossedimentares
A evolução crustal do Escudo Sul‑Rio‑Grandense sob a perspectiva dos sistemas isotópicos Sr‑Nd 17
Contribuições à Geologia do Rio Grande do Sul e de Santa Catarina
A evolução crustal do Escudo Sul‑Rio‑Grandense sob a perspectiva dos sistemas isotópicos Sr‑Nd 19
Contribuições à Geologia do Rio Grande do Sul e de Santa Catarina
‑10,6 a ‑5,0 e Nd‑TDM 1,4‑2,3 Ga (May, 1990; das rochas má icas‑ultramá icas e metassedi‑
Babinski et al., 1997; Silva et al., 1999; Cruz, mentares do Complexo Arroio Grande, ambas
2019). vinculadas à evoluçã o do paleo‑oceano Ada‑
Granitoides tardios no TP (Fig. 3H) mastor (Vieira et al., 2020; Ramos et al.,
incluem os monzogranitos grossos a por irı́‑ 2020). Todas essas unidades sã o intrudidas e
ticos, cá lcio‑alcalinos, da Suı́te Cerro Grande retrabalhadas pelo magmatismo ediacarano,
(610‑590 Ma), com 87Sr/86Sr(560) 0,708076, em um cená rio continental.
143
Nd/144Nd(560) 0,511415‑0,511657, ƐNd(560) O Gnaisse Arroio Pedrado apresenta
‑9,8 a ‑5,1 e Nd‑TDM 1,4‑1,9 Ga (May, 1990; razõ es 87Sr/86Sr(680) intermediá rias (0,7095‑
Babinski et al., 1997; Cruz, 2019), bem como 0,7112), ƐNd(680) entre ‑4,2 e ‑3,7 e Nd‑TDM en‑
da Suı́te Dom Feliciano (~590 Ma) (Dal Ol‑ tre 1,5 Ga e 1,6 Ga (Fig. 3I), interpretadas co‑
mo‑Barbosa et al., 2021). Esta é formada por mo o resultado de fusã o parcial, em ca. 680
feldspato alcalino granitos, por quartzo sieni‑ Ma, de crosta continental inferior espessada
tos e por monzogranitos subordinados, em má ica (Vieira et al., 2019).
geral, com a inidade alcalina (Cruz, 2019). O Complexo Arroio Grande compre‑
Suas assinaturas isotó picas apresentam 87Sr/ ende duas grandes unidades: i) os xistos e os
86
Sr(560) 0,705966‑0,715164, 143Nd/144Nd(560) Quartzitos Arroio Grande, interpretados co‑
0,511634‑0,511740, ƐNd(560) ‑5,5 a ‑3,4 e Nd‑ mo sedimentos siliciclá sticos de bacia orogê ‑
TDM 1,3‑1,7 Ga (May, 1990; Cruz, 2019). nica, que apresentam ƐNd(630) entre ‑12 e ‑7 e
O magmatismo bá sico é subordinado Nd‑TDM entre 1,2 Ga e 1,6 Ga, para os xistos; e
no TP, representado pelos Gabros Passo da ii) o O iolito Arroio Grande, que é representa‑
Fabiana, Diorito Alto Alegre e Diorito Capim do pela Sequê ncia Matarazzo, que compreen‑
Branco, alé m de outros corpos menores, po‑ de os metama itos Matarazzo (interpretados
sicionados em 590‑560 Ma (Wildner et al., como fragmentos metamor izados de um en‑
2008; Dal Olmo‑Barbosa et al., 2021). A ocor‑ xame de diques má icos) e os má rmores Ma‑
rê ncia de magmatismo peraluminoso no TP, tarazzo (e.g. Ramos et al., 2018; e refs.). Para
vinculado à atuaçã o de zonas de cisalhamen‑ os má rmores, as razõ es atuais 87Sr/86Sr entre
to regionais, está representada pela Suı́te 0,7060 e 0,7067 sugerem deposiçã o dos car‑
143
Trê s Figueiras, com Nd/144Nd(560) bonatos em 800‑700 Ma (Ramos et al., 2018).
0,511611, ƐNd(560) ‑6,0 e Nd‑TDM 1,7 Ga (Cruz, Ocorrem, també m, xistos magnesianos e, su‑
2019). bordinadamente, metagabros. Os metagabros
e os xistos magnesianos apresentam razõ es
8 O TERRENO PUNTA DEL ESTE 87
Sr/86Sr(630) entre 0,7059 e 0,7069 (metaga‑
bros) e entre 0,7071 e 0,7152 (xistos), ƐNd(630)
O Terreno Punta del Este (TPE), ou entre 0 (metagabros) e ‑3 (xistos) e Nd‑TDM
Terreno Jaguarã o, localizado ao sul da Zona entre 1,2 Ga (metagabros) e 1,5 Ga (xistos)
de Cisalhamento Ayrosa Galvã o (Fig. 2), é in‑ (Ramos et al., 2018, 2020). Os an ibolitos
terpretado como a extensã o norte do Terreno preservam assinatura isotó pica oceâ nica ju‑
Punta del Este, do Escudo Uruguaio (Ramos venil, com razõ es 87Sr/86Sr(630) de 0,703,
et al., 2018; e refs.). ƐNd(630) de +8 e Nd‑TDM de 0,7 Ga (Fig. 3I). A
O terreno compreende um embasa‑ partir de um diagrama isocrô nico 143Nd/
144
mento Toniano‑Criogeniano, representado Nd‑147Sm/144Nd, Ramos et al. (2020) suge‑
pelo Gnaisse Arroio Pedrado, interpretado riram uma idade de 704 ± 58 Ma para esses
como fragmento metamor izado do denomi‑ an ibolitos.
nado Arco Piratini (Vieira et al., 2019), alé m O magmatismo do TPE, por vezes,
20 Edição da Sociedade Brasileira de Geologia – Núcleo RS/SC
Koester et al.
A evolução crustal do Escudo Sul‑Rio‑Grandense sob a perspectiva dos sistemas isotópicos Sr‑Nd 21
Contribuições à Geologia do Rio Grande do Sul e de Santa Catarina
Figura 3 ‒ Diagramas ƐNd(t) vs. 87Sr/86Sr(i) para as rochas do Escudo Sul‑Rio‑Grandense: A; B; C) TNP, extraı́dos
de Moraes (2020), Monteiro et al. (2020) e Koester et al. (submetido); D) TSG, extraı́dos de Leite et al. (1998),
Saalmann et al. (2005a, 2005b) e Siviero et al. (submetido); E; F) TT, extraı́dos de May (1990), Lenz (2003,
2006), Saalmann et al. (2006), Gregory et al. (2016) e Martil et al. (2017); G; H) TP, extraı́dos de May (1990) e
Koester et al. (2016); I; J) TPE, extraı́dos de Ramos et al. (2018) e Vieira et al. (2019, 2020).
Figura 4 ‒ Diagramas ƐNd(t) vs. 87Sr/86Sr(i) para as rochas do Escudo Sul‑Rio‑Grandense: A) Paleoproterozoico;
B) Mesoproterozoico; C) Neoproterozoico (680 Ma); e D) Neoproterozoico (560 Ma). Legenda: TNP = Terreno
Nico Pé rez; TSG = Terreno Sã o Gabriel; TT = Terreno Tijucas; TP = Terreno Pelotas; e TPE = Terreno Punta del
Este.
A evolução crustal do Escudo Sul‑Rio‑Grandense sob a perspectiva dos sistemas isotópicos Sr‑Nd 23
Contribuições à Geologia do Rio Grande do Sul e de Santa Catarina
(920 Ma) described in Brasiliano Orogen continental arc magmatism in Eastern Dom
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A evolução crustal do Escudo Sul‑Rio‑Grandense sob a perspectiva dos sistemas isotópicos Sr‑Nd 25
Contribuições à Geologia do Rio Grande do Sul e de Santa Catarina
Koester et al.
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A evolução crustal do Escudo Sul‑Rio‑Grandense sob a perspectiva dos sistemas isotópicos Sr‑Nd 27
O Terreno Pelotas e a Orogênese
Pinheiro Machado:
uma revisão da estratigra ia,
da evolução magmática e tectônica
Carla Cristine Porcher1*, Cristine Lenz2, Edinei Koester1, Vivianne Andrade Bastos3,
Laé rcio Dal Olmo‑Barbosa3, Daniel Triboli Vieira3, Rodrigo Chaves Ramos4,
Viter Magalhã es Pinto5, Anelise Losangela Bertotti6, Luı́s Alberto Davila Fernandes1
1
Instituto de Geociê ncias, Universidade Federal do Rio Grande do Sul
2
Departamento de Geologia, Universidade Federal de Sergipe
3
Programa de Pó s‑Graduaçã o em Geociê ncias, Universidade Federal do Rio Grande do Sul
4
Secretaria de Meio Ambiente e Preservaçã o Ecoló gica, Prefeitura Municipal de Sapiranga
5
Centro de Engenharias, Universidade Federal de Pelotas
6
Centro de Tecnologia e Geociê ncias, Universidade Federal de Pernambuco
Dedicado ao professor Márcio M. Pimentel, uma grande pessoa, um pro issional inspirador
e um pesquisador brilhante, que nos deixou cedo demais.
1 INTRODUÇÃO
O arcabouço geoló gico do Escudo Sul‑Rio‑Grandense (ESRG) é formado por cinco terre‑
nos principais (ver Koester et al., 2021, Capı́tulo 1 deste livro, e refs.): Terreno Nico Pé rez (TNP),
Terreno Sã o Gabriel (TSG), Terreno Tijucas (TT, incluindo o Terreno Encruzilhada), Terreno Pe‑
lotas (TP) e Terreno Punta del Este (TPE). O Terreno Pelotas (TP) (Fig. 1), foco deste capı́tulo,
corresponde a um domı́nio tectô nico do ESRG, predominantemente constituı́do por rochas
plutô nicas neoproterozoicas, a lorantes no leste do Rio Grande do Sul. Quando correlacionado
ao seu equivalente, no leste do Uruguai, e com o do estado de Santa Catarina, é denominado
Terreno Cuchilla Dionı́sio‑Pelotas‑Florianó polis (ver Vieira et al., 2020). No presente capı́tulo,
será apresentada uma revisã o dos dados publicados nas ú ltimas dé cadas sobre este segmento
do ESRG, buscando apresentar uma de iniçã o atualizada para o mesmo.
Contribuições à Geologia do Rio Grande do Sul e de Santa Catarina
Figura 1 ‒ Mapa geoló gico do Terreno Pelotas (modi icado de CPRM (2006); Cruz (2019)). a) Principais
estruturas e divisõ es dos terrenos no Escudo Sul‑Rio‑Grandense (modi icado de Dal Olmo Barbosa et al.
(2021)).
granitoides sã o dominantemente criogenia‑ Uma de iniçã o mais precisa, segundo o mes‑
nos e ediacaranos, posicionados em contex‑ mo autor, descreve os terrenos tectonoestra‑
tos de arco magmá tico e pó s‑colisional, com tigrá icos como segmentos crustais
vá rios corpos associados a zonas de cisalha‑ (litosfé ricos), com uma evoluçã o pró pria e
mento regionais (Philipp, 1998; Bitencourt & distinta da dos segmentos circundantes, sen‑
Nardi, 2000; Koester et al., 2001; Oriolo et al., do totalmente delimitados por sistemas de
2018). falhas regionais. O Terreno Cuchilla Dionı́sio‑
Ao longo de dé cadas, o TP vem sendo Pelotas‑Florianó polis se enquadraria no
denominado de diferentes formas, como Ma‑ conceito de terreno magmá tico, segundo a
ciço Mediano de Pelotas (Hasui et al., 1975), classi icaçã o citada por Kearey et al. (2009).
Bató lito Pelotas (Fragoso Cé sar et al., 1986; A evoluçã o do TP está relacionada à
Philipp, 1998) e, mais recentemente, Terreno Orogê nese Pinheiro Machado, na qual ocor‑
Cuchilla Dionı́sio‑Pelotas (Bossi & Gaucher, reu, há ca. de 630 Ma, a geraçã o de zonas de
2004). O termo Terreno Cuchilla Dionı́sio cisalhamento NE‑SW, de escala litosfé rica,
(TCD) foi proposto por Bossi & Gaucher concomitante ao Arco Pinheiro Machado
(2004), originalmente, no Uruguai, como (APM), como resultado da convergê ncia en‑
“uma unidade tectonoestratigrá ica, compre‑ tre os crá tons Kalahari, Rı́o de la Plata e Con‑
endendo um embasamento metamó r ico de go (Ramos et al., 2018; Vieira et al., 2019b).
idade paleo‑ a mesoproterozoica, intensa‑
mente retrabalhado e intrudido por granitos 3 ESTRATIGRAFIA DO TERRENO PELO‑
orogê nicos, sin a tardi‑colisionais, entre 680 TAS
Ma e 550 Ma”, que ocorre a leste da Zona de
Cisalhamento Sierra Ballena. Posteriormente, A rocha mais antiga, identi icada re‑
pelo reconhecimento da ocorrê ncia de ro‑ centemente, no TP, ocorre na forma de um
chas o iolı́ticas do Complexo Arroio Grande e xenó lito de metagabro, com idade paleopro‑
de rochas metamó r icas e granitoides distin‑ terozoica (~2.0 Ga) (Vieira et al., 2019a), no
tos, ao sul da Zona de Cisalhamento Ayrosa Complexo Pinheiro Machado. Rochas de ida‑
Galvã o (ZCAYG), essa estrutura foi de inida de toniana‑criogeniana a loram, de forma es‑
como limite entre o TCD‑TP e o TPE (Ramos parsa, no TP, e sã o representadas pelos
et al., 2017). Em sua extensã o, desde o Uru‑ Gnaisses Piratini (Fig. 2E) (Tambara et al.,
guai, até Santa Catarina, o Terreno Cuchilla 2019) e pelos Gnaisses Chá cara das Pedras
Dionı́sio‑Pelotas‑Florianó polis compreende (Philipp & Campos, 2004; Koester et al.,
os bató litos Aiguá , no Escudo Uruguaio, Pelo‑ 2016).
tas, no Escudo Sul‑Rio‑Grandense, e Floria‑ As principais rochas do TP estã o as‑
nó polis, no Escudo de Santa Catarina (Basei sociadas ao Complexo Pinheiro Machado
et al., 2000; Bossi & Gaucher, 2004), forman‑ (Fig. 2A), com idades de cristalizaçã o U‑Pb
do um cinturã o granı́tico descontı́nuo (Basei em zircã o entre 633 Ma e 609 Ma (ver Lou‑
et al., 2000). reiro et al., 2021, e refs). Esse complexo
O termo terreno será adotado, no ocorre, ao longo do TP, ocupando uma á rea
presente capı́tulo, por ser um conceito geo‑ de ca. 10.000 km2, composto por rochas dio‑
tectô nico de ampla utilizaçã o, podendo ser rı́ticas a sienogranı́ticas, com xenó litos de
caracterizado como “contextos litotectô nicos an ibolito, alé m de ortognaisses pré ‑orogê ‑
limitados integralmente por falhas importan‑ nicos (ver Bastos et al., 2020 e refs).
tes, e cuja composiçã o e idade sã o diferentes Rochas metassedimentares sã o raras
dos terrenos vizinhos” (Brito Neves, 2011). nesse terreno, limitando‑se, até o momento,
O Terreno Pelotas e a Orogênese Pinheiro Machado 31
Contribuições à Geologia do Rio Grande do Sul e de Santa Catarina
ao Complexo Guarda Nova (Fig. 2C), anteri‑ foram interpretadas, como correlatas à s da
ormente denominado Xistos e Quartzitos Bacia do Camaquã (Noll Filho et al., 2018).
Herval (Fragoso Cé sar et al., 1986). Esse
complexo é composto, essencialmente, por 4 LIMITES DO TERRENO PELOTAS E
metassedimentos de mé dio grau metamó r i‑ MAGMATISMO SIN‑TRANSCORRÊNCIA
co (Cruz, 2019).
Os limites do TP foram estabeleci‑
Entre 610 Ma e 560 Ma, ocorrem in‑
dos, com base em geofı́sica e em geologia,
trusõ es de diversos corpos granı́ticos no TP,
marcados por estruturas transcorrentes de
sendo os principais e mais antigos, incluı́dos
escala litosfé rica, com magmatismo sin‑
nas Suı́tes Cerro Grande e Dom Feliciano
transcorrente associado. Conforme Tommasi
(Fig. 2D e 2E), que possuem á rea de exposi‑
et al. (1994), a continuidade do magmatismo
çã o semelhante à do Complexo Pinheiro Ma‑
e sua abundâ ncia ao longo dessas estruturas,
chado. O termo Suı́te Cerro Grande (Cruz,
indica que estas zonas possuem escala litos‑
2019) inclui os monzogranitos grossos a
fé rica. Bitencourt & Nardi (2000) conside‑
por irı́ticos da antiga Fá cies Cerro Grande,
ram essas zonas de cisalhamento, parte do
da Suı́te Dom Feliciano, enquanto, na ú ltima
extenso Cinturã o de Cisalhamento Sul‑Brasi‑
suı́te, predominam as composiçõ es sieno‑
leiro.
granı́ticas. Segundo o mesmo autor, a Suı́te
O limite oeste do TP com o TT (sensu
Cerro Grande é constituı́da pelos granitos
Fernandes et al., 1995b), coincide com a por‑
Arroio Moinho, Jaguarã o‑Chico, Cancelã o e
çã o sul da Zona de Cisalhamento Transcor‑
Monte Bonito, enquanto, na Suı́te Dom Feli‑
rente Dorsal de Canguçu (ZCTDC) e com a
ciano, predomina o Granito Cerro do Sandi.
Sutura de Porto Alegre (SPA) (Fig. 1). Essas
Alé m das rochas granı́ticas, ocorre,
zonas de cisalhamento NE‑SW sã o subverti‑
com idade semelhante à das suı́tes acima,
cais e apresentam movimentaçã o sinistral
uma associaçã o de rochas dominantemente
(Fernandes et al., 1995a). O magmatismo
gabroicas (Fig. 2F), na qual a principal ocor‑
sin‑transcorrê ncia é dominantemente pera‑
rê ncia é a dos Gabros Passo da Fabiana
luminoso, com a inidade cá lcio‑alcalina alto‑
(~590 Ma) (Dal Olmo‑Barbosa et al., 2021).
K (Koester et al., 2001; Philipp et al., 2013;
Conforme os mesmos autores, a lora, no su‑
Vieira et al., 2020), representado na porçã o
deste do TP, outra associaçã o bá sica, diorı́ti‑
sul da ZCTDC e correlacioná vel à Suı́te Granı́‑
ca, cujo principal corpo é o Diorito Alto
tica Cordilheira. As idades obtidas para esta
Alegre (~560 Ma), e o Diorito Capim Branco,
suı́te variam de 625 Ma a 607 Ma (Philipp et
a NE, nas imediaçõ es de Dom Feliciano.
al., 2013; Vieira et al., 2020), indicando que
A ocorrê ncia de magmatismo sin‑
as idades de formaçã o desse limite sã o con‑
transcorrê ncia peraluminoso (Suı́te Trê s Fi‑
temporâ neas à s do magmatismo do Comple‑
gueiras) ocorre, ainda, ao longo das princi‑
xo Pinheiro Machado. A geraçã o de calor
pais zonas de cisalhamento (Klein et al.,
para a fusã o e para a produçã o do magmatis‑
2018; Cruz, 2019), alé m de outros corpos
mo sin‑cinemá tico na ZCTDC, pode ser rela‑
granı́ticos, de menor escala.
cionada com shear heating, relaxamento
Por im, rochas sedimentares e vul‑ termal, aquecimento crustal, intrusã o de
câ nicas caracterizam a Formaçã o Cerro Cha‑ magma manté lico precoce, ou mesmo, des‑
to, e, em idade 560 Ma, ocorre a cristalizaçã o compressã o apó s o pico do metamor ismo
das rochas subvulcâ nicas, vinculadas aos Ri‑ da Orogê nesse Piratini (Tommasi et al.,
olitos Asperezas (Cruz, 2019). Essas rochas 1994; Bitencourt & Nardi, 2000; Koester et
al., 2001; Philipp et al., 2013; Vieira et al., mente por Costa (1997), e con irmado por
2020). Ramos et al. (2014) e por Cruz (2019). Na
O limite sudeste do TP com o TPE é á rea afetada pelas ZCAYG e Arroio Grande
marcado pela ZCAYG (Ramos et al., 2017). (ZCAG) ocorre magmatismo sin‑transcorrê n‑
Esse limite també m apresenta mudança de cia, com destaque para o Granito Trê s Figuei‑
assinatura geofı́sica, sendo sugerido inicial‑ ras (Philipp et al., 2013; Klein et al., 2018),
Figura 2 ‒ Principais unidades do Terreno Pelotas, representativas das etapas evolutivas da Orogenia Pinheiro
Machado: A) Magmatismo pré ‑colisional: Complexo Pinheiro Machado, B) Magmatismo sin‑cinemá tico à Zona
de Cisalhamento Transcorrente Dorsal de Canguçu: Suı́te Granı́tica Cordilheira; C) Sedimentaçã o e
metamor ismo sin‑colisional: Complexo Guarda Nova; D) Magmatismo tardi a pó s‑orogê nico: Suı́te Cerro
Grande; E) Magmatismo tardi a pó s‑orogê nico: Suı́te Dom Feliciano com xenó lito pré ‑orogê nico de Gnaisse
Piratini; F) Magmatismo tardi a pó s‑orogê nico: Gabros Passo da Fabiana.
uma etapa pré ‑colisional, com geraçã o do maiores (e.g. Gnaisses Piratini, Gnaisses Chá ‑
APM (633‑609 Ma), relacionada ao fecha‑ cara das Pedras). Em estudos recentes (Koes‑
mento de bacias oceâ nicas (por exemplo, pa‑ ter et al., 2016; Tambara et al., 2019; Vieira et
leo‑oceano Adamastor Sul); (ii) uma etapa al., 2019a), foi veri icado que duas ocorrê nci‑
sin‑colisional (ca. 610 Ma), bem como uma as conhecidas apresentam idades mais anti‑
possı́vel reativaçã o das zonas de cisalhamen‑ gas do que o Neoproterozoico.
to de tendê ncia NE‑SW, com geraçã o de me‑ A presença de ortognaisses de idade
tamor ismo orogê nico; (iii) uma etapa tardi a paleoproterozoica é relatada na regiã o de
pó s‑colisional (610‑560 Ma), com intenso Porto Alegre (Philipp & Campos, 2004) e na
magmatismo. regiã o de Pelotas‑Canguçu. Nessa ú ltima loca‑
lidade, Vieira et al. (2019a) reportaram a
5. 1 Evolução Geológica Pré‑orogênese ocorrê ncia de um xenó lito de metagabro de
dimensõ es mé tricas (Fig. 2E), com idade
O TP apresenta evidê ncias de uma
magmá tica U‑Pb SHRIMP em zircã o de 2,1 Ga
crosta pré ‑orogê nica paleoproterozoica, com
(nú cleo) e metamor ismo em 616 Ma, (bor‑
restritas idades mesoproterozoicas, e regis‑
da).
tros do está gio inicial da colagem brasiliana/
Idades mais antigas do que o Neopro‑
pan‑africana (Toniano‑Criogeniano), a qual
terozoico, para a crosta do TP, també m sã o in‑
acomodou um arco continental tipo andino
dicadas por idades TDM e U‑Pb em zircõ es
(Arco Piratini ‒ ca. 790‑680 Ma), que colidiu
herdados nos granitoides neoproterozoicos.
com o Terreno Sã o Gabriel, em 650‑640 Ma
Uma sı́ntese das idades TDM publicadas para o
(Vieira et al., 2019b).
TP é apresentada por Koester et al. (2021),
O reconhecimento do embasamento
sendo que os valores variam entre 2310‑
pré ‑orogê nico nesse terreno é di icultado
1748‑1666 Ma, para os Gnaisses Piratini,
pelo intenso magmatismo ediacarano, que
2300‑1860‑1510 Ma, para as rochas do Com‑
afetou esse segmento crustal, durante a Oro‑
plexo Pinheiro Machado, 2740, para o granito
gê nese Pinheiro Machado, possivelmente,
Capã o do Leã o, e 1460 Ma, para o Granito Ar‑
també m potencializado pelo nı́vel crustal
roio Moinho. As idades U‑Pb de zircã o herda‑
atualmente exposto. O registro deste emba‑
do, obtidas nos Gnaisses Chá cara das Pedras
samento pode ser dividido em: crosta pré ‑
(Koester et al., 2016), sã o, principalmente, pa‑
brasiliana e crosta associada à Orogê nese Pi‑
leoproterozoicas (1924‑1760 Ma), com ocor‑
ratini. Os dados existentes sobre esses
rê ncia de um zircã o mesoproterozoico (1089
perı́odos da evoluçã o crustal podem ser en‑
Ma). Nos Gnaisses Piratini, idades herdadas
contrados como registro litoló gico em xenó ‑
similares, arqueanas a mesoproterozoicas
litos e em corpos mapeá veis e como
(2725‑2127‑1785‑1023 Ma), foram encontra‑
evidê ncias de herança crustal, por geoquı́mi‑
das por Tambara et al. (2019).
ca isotó pica e por idades de zircõ es herda‑
As rochas pré ‑orogê nicas de idade to‑
dos.
niana sã o registros do magmatismo da Oroge‑
Essas ocorrê ncias sã o usualmente
nê se Piratini (sensu Ramos et al., 2018),
agrupadas, sob a denominaçã o Septos do
veri icadas nos Gnaisses Piratini (Tambara et
Embasamento (Philipp & Machado, 2002),
al., 2019) e nos Gnaisses Chá cara das Pedras
que engloba as diversas ocorrê ncias de ro‑
(Koester et al., 2016). Esses ortognaisses tê m
chas metamó r icas de baixo a alto grau, en‑
composiçã o diorı́tica a granodiorı́tica, com
contradas em diferentes á reas do TP, tanto
assinatura de arco magmá tico continental
na forma de xenó litos como em ocorrê ncias
(Koester et al., 2016; Tambara et al., 2019),
Tabela 1 ‒ Síntese da evoluçã o tectô nica do Terreno Pelotas e da Orogenia Pinheiro Machado. Ver texto para
detalhes.
Figura 3 ‒ Evoluçã o simpli icada das etapas pré ‑colisional e pó s‑colisional da Orogenia Pinheiro Machado. Ver
texto para detalhes.
com idade de cristalizaçã o magmá tica entre sobre as rochas geradas na Orogê nese Pirati‑
784 Ma e 777 Ma (Silva et al., 1999; Koester ni, durante o fechamento do paleo‑oceano
et al., 2016; Tambara et al., 2019). O meta‑ Adamastor Sul, entre ca. 640‑600 Ma (Ramos
mor ismo sin‑colisional está registrado nes‑ et al., 2020). O magmatismo desse arco se
ses ortognaisses por um bandamento bem inicia imediatamente apó s a colisã o conti‑
desenvolvido, gerado por condiçõ es de fá cies nental entre o Arco de Sã o Gabriel e o Arco
an ibolito mé dio a superior, afetado por do‑ Piratini (ca. 660‑640 Ma), com a inversã o do
bras intrafoliais e por transposiçã o (Philipp sentido de subducçã o, para o fechamento do
& Machado, 2002; Philipp & Campos, 2004). paleo‑oceano Adamastor Sul (Ramos et al.,
As idades U‑Pb SHRIMP do metamor ismo, 2020). Dessa forma, a cunha de manto, sob o
obtidas nas bordas e nos nú cleos dos zircõ es Arco Pinheiro Machado, possivelmente so‑
com zonaçõ es convolutas, sã o de ca. 660‑650 freu in luê ncia de processos associados à
Ma (Koester et al., 2016; Tambara et al., Orogê nese Piratini, tais como metassomati‑
2019). zaçã o do manto, slab break‑off e delaminaçã o
A Orogê nese Piratini ocorreu, segun‑ litosfé rica, comumente associadas à s coli‑
do Ramos et al. (2018), devido ao fechamen‑ sõ es continentais (e.g. Song et al., 2015),
to do Oceano Charrua, formando um arco do alé m dos clá ssicos processos geradores do
tipo andino, com posterior colisã o do TSG (+ magmatismo do APM.
TNP) com o embasamento do TT (Gnaisses O CPM corresponde a um expressivo
Encantadas, Granitoides Milonitizados de e importante magmatismo, de escala batolı́‑
Santana da Boa Vista e de Arroio dos Ratos). tica, na evoluçã o do Terreno Pelotas, repre‑
Rochas com assinaturas de arco continental, sentando a fase pré ‑colisional da Orogê nese
de idade toniana‑criogeniana e de metamor‑ Pinheiro Machado (Tab. 1). Fragoso Cé sar et
ismo orogê nico criogeniano, possivelmente al. (1986) inicialmente de iniram a unidade
associadas ao Arco Piratini e a sua colisã o, como Complexo Granı́tico Gná issico Pinheiro
a loram, hoje, em diferentes terrenos, tais co‑ Machado. Posteriormente, esta foi designada,
mo no TT (metavulcâ nicas do Complexo Po‑ por Philipp (1998), como Suı́te Pinheiro Ma‑
rongos, Gnaisses do Complexo Vá rzea do chado, considerando a preservaçã o predomi‑
Capivarita) e no TPE (Gnaisses Arroio Pedra‑ nante de texturas magmá ticas, com tramas
do e Cerro Bori), alé m dos a loramentos su‑ deformacionais restritas a zonas de cisalha‑
pracitados do TP. mento. No entanto, o termo Complexo Pi‑
nheiro Machado é utilizado por diversos
5. 2 Magmatismo Pré‑colisional ‑ Com‑ autores (e.g. Hueck et al., 2018; Bastos et al.,
plexo Pinheiro Machado 2020; Loureiro et al., 2021), a im de denotar
o expressivo volume de rochas plutô nicas e a
Durante o perı́odo pré ‑colisional da sua composiçã o expandida, assim como
Orogê nese Pinheiro Machado, houve a gera‑ acontece no arco magmá tico andino (e.g.
çã o de um arco magmá tico continental, du‑ Complexo Plutô nico Costeiro).
rante o Ediacarano, que originou as rochas
Os granitoides do CPM sã o cá lcio‑al‑
do Complexo Pinheiro Machado (CPM). Essas
calinos de mé dio a alto‑K, com ocorrê ncia de
rochas foram anteriormente associadas ao
monzogranitos e de granodioritos. Alé m des‑
Arco Piratini (Fragoso‑Cé sar, 1991) e, poste‑
tes, ocorrem dioritos e tonalitos, em forma
riormente, Ramos et al. (2018) interpreta‑
de enclaves, e intrusõ es tabulares de sieno‑
ram como associadas a um arco continental
granitos subordinadas (Philipp, 1998). Essas
mais jovem, desenvolvido, principalmente,
rochas possuem foliaçã o ı́gnea marcada pela
36 Edição da Sociedade Brasileira de Geologia – Núcleo RS/SC
Porcher et al.
des zonas. Nas etapas mais tardias (pó s‑coli‑ torno de 590 Ma, obtidas em leucosienogra‑
sionais), os processos de exumaçã o e de co‑ nitos (Dal Olmo‑Barbosa et al., 2021).
lapso predominam, com importantes Recentemente, Vö lz et al. (2020) ca‑
interaçõ es magmá ticas manto/crosta. Segun‑ racterizaram monzogranitos, incluı́dos no
do os mesmos autores, os magmas formados Granito Grupelli (578 ± 4 Ma, por U‑Pb SH‑
durante essas etapas sã o: (i) cá lcio‑alcalinos RIMP em zircã o), como representantes do
alto‑K e potá ssicos, derivados do manto me‑ magmatismo mais evoluı́do em relaçã o à s
tassomatizado; (ii) granitos peraluminosos, Suı́tes Cerro Grande e Dom Feliciano.
de fusã o crustal; e (iii) granitos do tipo I, for‑
A colocaçã o de vá rios corpos bá sicos
mados por fusã o da crosta inferior e por inte‑
també m ocorre nesta fase pó s‑colisional do
raçã o com o manto, comumente gerando
TP, em pequenas ocorrê ncias, disseminadas
magmas má icos.
em meio aos granitoides, como os Gabros
Estima‑se que o perı́odo tardi a pó s‑ Passo da Fabiana, Diorito Alto Alegre e Diori‑
colisional inicie com a intrusã o da Suı́te Cerro to Capim Branco. Estas rochas registram a
Grande, em ~610 Ma (Dal Olmo‑Barbosa et participaçã o de lı́quidos basá lticos hidrata‑
al., 2021), e que a ú ltima manifestaçã o plutô ‑ dos, cá lcio‑alcalinos alto‑alumina, posiciona‑
nica ocorra em 562 Ma (magmas diorı́ticos). dos no TP entre 590 Ma e 560 Ma (Dal
Esse perı́odo é condizente com o perı́odo es‑ Olmo‑Barbosa et al., 2021). Segundo os mes‑
timado para eventos magmá ticos tardi a pó s‑ mos autores, o in luxo destes lı́quidos de de‑
colisionais, de 10‑40 Ma (Song et al., 2015). rivaçã o manté lica é controlado e posicionado
O magmatismo registrado nas suı́tes nos nı́veis superiores da crosta, por meio de
Cerro Grande e Dom Feliciano compõ e parte descontinuidades litosfé ricas, as quais sã o
expressiva do TP. A primeira Suı́te representa comuns na estruturaçã o desta porçã o do
a antiga fá cies Cerro Grande, da Suı́te Dom ESRG.
Feliciano, com predomı́nio de monzogranitos Rochas vulcâ nicas efusivas e particu‑
grossos a por irı́ticos, de a inidade cá lcio‑al‑ ladas també m compõ em o cená rio do mag‑
calina. Na segunda, predominam sienograni‑ matismo pó s‑colisional na porçã o sul do TP,
tos, de a inidade cá lcio‑alcalina alto‑K a com idades de 630,4 ± 2,8 Ma na ocorrê ncia
predominantemente alcalina, com monzogra‑ Cerro Chato da Formaçã o Cerro Chato, corre‑
nitos, com feldspato alcalino granitos e com lacioná vel à Formaçã o Maricá (Noll Filho et
quartzo sienitos subordinados, e raras ocor‑ al., 2018).
rê ncias de enclaves e de xenó litos (Cruz,
2019). També m ocorrem, neste contexto, cor‑
5. 5 Magmatismo Pós‑orogênico
pos bá sicos e vulcâ nicos associados, de di‑
mensõ es quilomé tricas (ver Dal O está gio pó s‑orogê nico é , de modo
Olmo‑Barbosa et al., 2018 e refs). geral, representado pelo colapso orogê nico,
O posicionamento da Suı́te Cerro com extensã o associada, causando perda de
Grande é , principalmente, tardi a pó s‑colisio‑ altura e espalhamento lateral da massa oro‑
nal, com ocorrê ncia de faixas milonı́ticas, ao gê nica (e.g. Dewey et al., 1993), acompanha‑
longo da suı́te, de idade estimada entre 610 do de magmatismo pó s‑orogê nico, gerado
Ma e 595 Ma (Babinski et al., 1997; Dal Olmo‑ em condiçõ es extensionais.
Barbosa et al., 2021). A Suı́te Dom Feliciano é , O está gio pó s‑orogê nese Pinheiro
essencialmente, pó s‑colisional, com rochas Machado está representado no TP pelas ro‑
pouco ou nã o deformadas. Estima‑se que a chas subvulcâ nicas da ocorrê ncia Cerro Par‑
idade de cristalizaçã o destas rochas seja em tido, da Formaçã o Cerro Chato (561,1 ± 2,2
38 Edição da Sociedade Brasileira de Geologia – Núcleo RS/SC
Porcher et al.
Ma) (Noll Filho et al., 2018), que sã o correla‑ a pó s‑colisional, representada por grande vo‑
cionadas à etapa pó s‑orogê nica da sub‑bacia lume de magmas de a inidades cá lcio‑alcali‑
Arroio Santa Bá rbara, da Bacia do Camaquã nas alto‑K a alcalinas, das Suı́tes Cerro
(sensu Paim et al., 2014). Neste perı́odo, tam‑ Grande (~610‑595 Ma) e Dom Feliciano
bé m ocorre magmatismo, na forma de enxa‑ (~590 Ma), com magmatismo bá sico gabroi‑
mes de diques á cidos a bá sicos, bem como co concomitante (e.g. Gabros Passo da Fabia‑
rochas subvulcâ nicas associadas, na unidade na ‑ 591 Ma), e por granitos peraluminosos
Riolitos Asperezas (Cruz, 2019), nas proximi‑ sin‑transcorrentes (Suı́te Trê s Figueiras ‑575
dades de Pinheiro Machado. Estas rochas Ma). Ocorrem, posteriormente, intrusõ es bá ‑
apresentam idades de cristalizaçã o em torno sicas (dioritos Capim Branco e Alto Alegre,
de 550 Ma (Zanon et al., 2006). ca. 562 Ma). Os ú ltimos pulsos magmá ticos
registrados no Terreno Pelotas estã o repre‑
6 CONSIDERAÇÕES FINAIS sentados pelas rochas subvulcâ nicas do Cer‑
ro Partido (ca. 560 Ma), correlacioná veis à s
O TP é um terreno magmá tico de ida‑ unidades da bacia pó s‑orogê nica da Sub‑ba‑
de predominantemente ediacarana, delimita‑ cia Arroio Santa Bá rbara, da Bacia do Ca‑
do por grandes estruturas transcorrentes, maquã , representando o im da Orogê nese
com magmatismo sin‑cinemá tico associado, e Pinheiro Machado.
evoluçã o tectô nica vinculada à Orogê nese Pi‑
nheiro Machado. A Zona de Cisalhamento REFERÊNCIAS
Transcorrente Dorsal de Canguçu ‑ Sutura de
Porto Alegre estabelece o limite oeste do TP Babinski, M., Chemale Jr, F., Van Schmus, W.
com o TT, em cerca de 625‑607 Ma, concomi‑ R., Hartmann, L. A., & Silva, L. C. 1997. U‑Pb
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cerca de 575 Ma.
A crosta pré ‑orogenê se Pinheiro Ma‑ Basei, M. A. S., Siga, J. R. O., Masquelin, H., Ha‑
chado do TP é paleoproterozoica (ca. 2.0 Ga) rara O. M., Reis Neto, J. M. & Preciozzi, F.,
e foi afetada pela Orogê nese Piratini (780‑ 2000. The Dom Feliciano belt of Brazil and
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Bastos, V. A., Koester, E., Lenz, C., Dal Olmo‑
As etapas evolutivas da Orogê nese Barbosa, L., Porcher, C. C., Loureiro, P. O.,
Pinheiro Machado compreendem: (i) uma Vieira, D. T., Ramos, R.C. & Cedeñ o, D.G. 2021.
etapa pré ‑colisional, representada pelo APM Contribution to the understanding of the
(633 Ma a 609 Ma) e pelo magmatismo sin‑ Pinheiro Machado Complex (Dom Feliciano
transcorrê ncia da Suı́te Granı́tica Cordilheira; Belt, Brazil): A study of textures, mineral
chemistry, and crystallization conditions.
(ii) uma etapa sin‑colisional (ca. 610 Ma), re‑
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presentada pelo metamor ismo orogê nico do
Complexo Guarda Nova; (iii) uma etapa tardi
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421‑437.
1
Instituto de Geociê ncias, Universidade Federal do Rio Grande do Sul
2
Instituto de Geociê ncias, Universidade de Sã o Paulo
1 INTRODUÇÃO
O Terreno Sã o Gabriel (TSG) representa a porçã o oeste do Cinturã o Dom Feliciano, sen‑
do constituı́do por uma sucessã o de complexos metaplutô nicos, metavulcano‑sedimentares e
metamá icos‑ultramá icos (o iolitos), de idade toniana. Estas unidades estã o expostas como um
conjunto de rampas de cavalgamento, de direçã o N20‑30oE, com vergê ncia tectô nica para SE. Es‑
tes corpos registraram dois ciclos de metamor ismo orogê nico, associados a uma evoluçã o es‑
trutural polifá sica. Os complexos metavulcâ nicos e ortogná issicos do Terreno Sã o Gabriel
apresentam composiçã o geoquı́mica cá lcico‑alcalina pouco evoluı́da e isotó pos de Sr, de Nd e de
Hf com caracterı́sticas manté licas. Os dois intervalos principais do magmatismo, entre 0,9‑0,85
Ga e 0,78‑0,72 Ma, tornam estas unidades as mais bem preservadas exposiçõ es do perı́odo de
subducçã o, que caracterizou o inı́cio do Ciclo Orogê nico Brasiliano na Provı́ncia Mantiqueira.
Os limites do terreno sã o balizados pelas cidades de Sã o Gabriel, de Vila Nova do Sul, de
Caçapava do Sul e de Lavras do Sul, que delimitam o polı́gono dos metais do RS, com registro de
atividades mineiras, desde 1865. Do inal do sé culo XIX, destaca‑se, no sul de Caçapava do Sul, a
extraçã o de cobre nas Minas do Camaquã , associada à s rochas sedimentares e vulcâ nicas da Ba‑
cia do Camaquã , e as minas de ouro, vinculadas ao Granito Lavras do Sul. Entre 1970 e 1990, a
regiã o de Vila Nova do Sul foi palco de intensa exploraçã o de ouro nas minas Bossoroca, KDG,
Guardinha e Andreazza, localizadas em unidades metavulcano‑sedimentares do Complexo da
Bossoroca. Esta regiã o ainda foi o berço da estratigra ia das rochas do embasamento, como re‑
sultado dos trabalhos de mapeamento, realizados pela Escola de Geologia da UFRGS (Goni et al.,
Contribuições à Geologia do Rio Grande do Sul e de Santa Catarina
1962; Jost & Vilwoock, 1966; Jost, 1966). As das da geologia do TSG foram apresentadas
primeiras propostas estratigrá icas foram por Philipp et al. (2016, 2018).
marcos de referê ncia, forjadas com o apoio O objetivo deste capı́tulo é apresen‑
do martelo e da bú ssola, reconhecendo os tar uma sı́ntese do conhecimento geotectô ni‑
complexos o iolı́ticos, as sequê ncias metasse‑ co do Terreno Sã o Gabriel, com base em
dimentares, de fundo marinho, os metapsa‑ dados geocronoló gicos e isotó picos, com fo‑
mitos imaturos, associados a rochas co na proveniê ncia por zircã o detrı́tico dos
vulcanogê nicas, e os metassedimentos matu‑ complexos metavulcano‑sedimentares. Esta
ros de uma margem passiva, que limitava regiã o tem grande importâ ncia histó rica, pe‑
uma á rea cratô nica. Os pesquisadores desta‑ lo signi icado de sua evoluçã o, em relaçã o à s
caram a evoluçã o estrutural complexa e poli‑ construçõ es do Cinturã o Dom Feliciano
fá sica e a intrusã o tardia de corpos (CDF) e da Provı́ncia Mantiqueira, e pela sua
granı́ticos. contribuiçã o na formaçã o do pensamento es‑
As investigaçõ es que ocorreram, du‑ tratigrá ico e tectô nico de diversas geraçõ es
rante os anos 80 e 90 do sé culo XX, suporta‑ de geó logos.
das por aná lises geoquı́micas e pelos
primeiros resultados geocronoló gicos (K‑Ar, 2 CONTEXTO TECTÔNICO
Rb‑Sr e Sm‑Nd), entretanto, transformaram
as unidades de arco e os complexos o iolı́ti‑ A Provı́ncia Mantiqueira (PM) é um
cos em associaçõ es do tipo greenstone belt, sistema orogê nico neoproterozoico, de dire‑
em um cená rio continental ixista Arqueano çã o NE‑SW, que expõ e, ao longo de ca. 3.000
(Oliveira, 1981; Garcia & Hartmann, 1981; km das costas sudeste e sul do Brasil, até o
Chemale Jr., 1982; Naumann et al., 1984; Uruguai, os cinturõ es Araçuaı́, Ribeira e Dom
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1990). Concepçõ es mobilistas, baseadas em desta provı́ncia esteve associada à formaçã o
aná lise estrutural e em dados geoquı́micos e do Gondwana, junto com sua contraparte
geocronoló gicos, foram restritas (Szubert et africana, que inclui os cinturõ es Saldania‑Ga‑
al., 1977; Silva Filho, 1984; Soliani Jr., 1986). riep, Damara, Kaoko e Oeste do Congo (Basei
O retorno à s antigas concepçõ es orogê nicas, et al., 2000).
durante os anos 1990, foi suportado pela ge‑ O CDF representa a porçã o sul da PM
ocronologia U‑Pb (SHRIMP) em zircã o e por e está dividido, de oeste para leste, em: (i)
isó topos de Nd, resultando em modelos, ba‑ Terreno Sã o Gabriel; (ii) Terreno Tijucas; (iii)
seados na subducçã o de crosta oceâ nica e na bató litos Florianó polis, Pelotas e Aiguá ; e (iv)
formaçã o de arcos magmá ticos (Fragoso‑Ce‑ terrenos Jaguarã o e Punta del Este (Fig. 1A‑
sar, 1990; Fernandes et al., 1992; Babinski et 1B). A construçã o do cinturã o envolveu trê s
al., 1996; Saalmann et al., 2005, 2006). Os re‑ eventos orogê nicos, denominados Passinho
sultados dos mapeamentos promovidos pelo (0,9‑0,85 Ga), Sã o Gabriel (0,78‑0,72 Ga) e
Instituto de Geociê ncias da UFRGS e pela Dom Feliciano (0,65‑0,54 Ga) (Saalmann et
CPRM foram integrados a novos levantamen‑ al., 2006; Hartmann et al., 2007; Philipp et
tos geocronoló gicos e isotó picos, resultando al., 2016). No RS, o embasamento do cintu‑
em importantes contribuiçõ es (Leite et al., rã o é constituı́do por orto e por paragnais‑
1998; Saalmann et al., 2005, 2006, 2011; ses, de idades paleoproterozoicas e
Hartmann et al., 2011; Lena et al., 2014; Lo‑ arqueanas, que constituem o Terreno Taqua‑
pes et al., 2015; Gubert et al., 2016; Vedana et rembó e que ocorrem como inliers no Terre‑
al., 2017; Laux et al., 2017). Revisõ es integra‑ no Tijucas e no Bató lito Pelotas (Fernandes
44 Edição da Sociedade Brasileira de Geologia – Núcleo RS/SC
Philipp & Basei
et al., 1992; Saalmann et al., 2010; Philipp et acompanhado por metamor ismo orogê nico
al., 2016). Estes fragmentos do embasamen‑ de mé dio‑alto grau, sob condiçõ es de pres‑
to constituem uma unidade maior, denomi‑ sã o mé dia. Este evento, entre 650 Ma e 620
nada Terreno Nico Perez (Oyhantçabal et al., Ma, promoveu intenso magmatismo granı́ti‑
2011). A formaçã o do CDF compreendeu co e reciclagem crustal, com movimentaçõ es
uma colagem de domı́nios oceâ nicos, de ar‑ pó s‑colisionais, que se estenderam, até o i‑
cos magmá ticos, de sedimentos de margem nal do Ediacarano (540 Ma) (Philipp et al.,
passiva e de inliers de embasamento, desen‑ 2016).
volvida entre os crá tons Rio de La Plata
(CRLP) e Luis Alves (CLA), o Terreno Nico 3 GEOLOGIA DO TERRENO
Perez (TNP) e os crá tons Kalahari e Congo. A SÃO GABRIEL
longa evoluçã o, de ca. 450 Ma, envolveu o de‑
senvolvimento de dois ciclos orogê nicos, ca‑ O TSG é constituı́do por associaçõ es
racterizados por: (i) magmatismo metaplutô nicas e metavulcano‑sedimenta‑
pré ‑colisional e formaçã o dos arcos Passinho res, relacionadas a dois arcos juvenis, de ida‑
e Sã o Gabriel; e (ii) magmatismo sin a pó s‑ des tonianas, intercaladas com complexos
colisional e formaçã o do arco Dom Feliciano o iolı́ticos e com metassedimentos de mar‑
(Chemale Jr., 2000; Saalmann et al., 2010; gem passiva. As associaçõ es magmá ticas
Philipp et al., 2016). apresentam razõ es 87Sr/86Sr < 0,705, valores
Na regiã o Sul do Brasil, a identi ica‑ positivos de ƐNd(t) (+1 a +6) e idades‑mo‑
çã o dos processos de subducçã o e a geraçã o delo Nd (TDM) entre 1,2 e 0,8 Ga, indicando
das associaçõ es metavulcano‑sedimentares e uma composiçã o manté lica e juvenil (Soliani
plutô nicas, de idade toniana, estiveram asso‑ Jr., 1986; Babinski et al., 1996; Saalmann et
ciada à s aná lises de isó topos de Nd e à s data‑ al., 2005; Vedana et al., 2017; Philipp et al.,
çõ es pelo mé todo U‑Pb em zircã o (Machado 2018). As unidades do TSG constituem cinco
et al., 1990; Babinski et al., 1996; Leite et al., segmentos, que expõ em, de noroeste para
1998; Remus et al., 1999, 2000). A identi ica‑ sudeste: (i) suı́tes granitoides, relacionadas a
çã o destas associaçõ es sugeriu a presença de um arco de margem continental; (ii) comple‑
um pequeno oceano, separando o CRLP e o xos metavulcano‑sedimentares, de composi‑
TNP, que se fundiriam, ao inal do Criogenia‑ çã o cá lcico‑alcalina, e metamá icos‑ultra‑
no (Saalmann et al., 2005, 2006; Hartmann má icos (o iolitos); (iii) complexos metasse‑
et al., 2011; Gubert et al., 2016; Laux et al., dimentares de bacias tardi‑orogê nicas; (iv)
2017; Vedana et al., 2017; Philipp et al., complexo ortogná issico de arco intraoceâ ni‑
2018). As rochas neoproterozoicas juvenis, co; e (v) complexos metassedimentares sili‑
relacionadas aos arcos intraoceâ nicos expos‑ ciclá sticos de margem passiva (Fig. 1C). Os
tos no TSG, oferecem uma oportunidade sin‑ contatos entre estas unidades sã o de inidos
gular de investigaçã o da tectô nica Brasiliana. por zonas de cisalhamento dú cteis, de dire‑
O magmatismo pré ‑colisional e de natureza çã o N20‑40oE, cujas terminaçõ es, ao sul, sã o
juvenil, que caracteriza a evoluçã o inicial do afetadas pelo Zona de Cisalhamento de Ibaré
CDF, foi referido como orogenias Passinho e (ZCI), de direçã o N70oW. A oeste e ao norte,
Sã o Gabriel (Leite et al., 1998; Saalmann et as unidades do TSG sã o cobertas por rochas
al., 2005, 2006; Hartmann et al., 2007). Um sedimentares da Bacia do Paraná . As princi‑
segundo ciclo magmá tico, associado ao fe‑ pais estruturas e as relaçõ es de contato en‑
chamento do Oceano Adamastor e à colisã o tre as unidades do TSG podem ser
continental com os crá tons africanos, foi observadas nas seçõ es geoló gicas da Figura
Figura 1 ‒ A) Localizaçã o do Cinturã o Dom Feliciano na Amé rica do Sul; B) Mapa geotectô nico da porçã o sul da
Provı́ncia da Mantiqueira, mostrando as unidades do Cinturã o Dom Feliciano e do Terreno Nico Perez (zonas de
cisalhamento: 1 ‑ Itajai‑Perimbó , 2 ‑ Major Gercino, 3 ‑ Santana da Boa Vista, 4 ‑ Dorsal de Canguçu, 5 ‑ Passo do
Marinheiro, 6 ‑ Ibaré , 7 ‑ Sarandi Del Y, 8 ‑ Sierra Ballena, 9 ‑ Cerro Amaro e 10 ‑ Arroio Grande); C) Mapa
geoló gico do Terreno Sã o Gabriel, mostrando suas principais unidades (legenda: EDF ‑ Evento Dom Feliciano
(0,65‑0,57 Ga), d ‑ intervalo de dados de zircã o detrı́tico U‑Pb); zonas de cisalhamento: ZCCS ‑ Caçapava do Sul,
ZCDC ‑ Dorsal do Canguçu, ZCI ‑ Ibaré e ZCPVN ‑ Palma‑Vila Nova do Sul; seçõ es geoló gicas: I ‑ Vila Nova do Sul‑
Bossoroca, II ‑ Panorama‑Cerro do Ouro e III ‑ Coxilha do Batovi‑Palma‑Pontas do Salso; cidades: B ‑ Bagé , DP ‑
Dom Pedrito, CS ‑ Caçapava do Sul, LS ‑ Lavras do Sul, VN ‑ Vila Nova do Sul e SG ‑ Sã o Gabriel) (modi icado de
Philipp et al. (2018). Cı́rculos amarelos: localizaçã o das amostras de zircã o detrı́tico (modi icado de Philipp et
al. (2018)).
2A. As zonas de cisalhamento, que delimitam gravimé tricas e magnetomé tricas, que sepa‑
o TSG a leste e ao sul, representam uma zona ram o TSG e o Terreno Nico Perez, represen‑
de sutura profunda, de inida por anomalias tado, no RS, pelo Terreno Taquarembó e por
uma trilha quase contı́nua de inliers de ortog‑ Chemale Jr., 1982; Koppe et al., 1985; Remus,
naisses paleoproterozoicos no Terreno Tiju‑ 1990; Leite et al., 1998). Os complexos o iolı́‑
cas (Fernandes et al., 1992; Saalmann et al., ticos ocorrem como faixas alongadas, segun‑
2010). do a direçã o NE‑SW, com ca. de 10‑20 km de
O magmatismo dos arcos tonianos comprimento e de 1‑2 km de largura. Sã o
está representado pelos ortognaisses do concordantes com a estrutura regional e
Complexo Imbicuı́ (0,9‑0,86 Ga), por rochas mantê m contato tectô nico com os complexos
metavulcano‑sedimentares do Complexo ortogná issicos e metavulcano‑sedimentares.
Bossoroca (CB) (0,78‑0,76 Ga) e por ortog‑ Os o iolitos constituem seis corpos princi‑
naisses e metagranitoides do Complexo Cam‑ pais, denominados Cerro Mantiqueira, Ibaré ,
baı́ (CC) (0,75‑0,72 Ga) (Philipp et al., 2018). Passo do Ivo, Palma, Cambaizinho e Arroio
Os granitoides intrusivos da Suı́te Lagoa da Lajeadinho (Fig. 1C).
Meia Lua (SLML) (0,70‑0,68 Ga) caracterizam O Complexo Ibaré , situado a SW da
o magmatismo tardi‑orogê nico. A deposiçã o Palma, apresenta uma ampla exposiçã o de
dos metassedimentos dos complexos Ibaré e serpentinitos, com corpos tabulares e intru‑
Pontas do Salso caracterizam o colapso do sivos de albititos, com 40‑80 cm de espessu‑
TSG, em torno de 0,68 Ga (Vedana et al., ra, interpretados como albititos (Jost &
2017). Vilwoock, 1966; Jost, 1966). Os autores des‑
As diferentes unidades do TSG po‑ crevem a ocorrê ncia de massas irregulares
dem ser agrupadas em quatro associaçõ es de clorititos e de turmalinitos, junto ao con‑
petrotectô nicas: (i) Prisma Acrescioná rio da tato com o Granito Santa Rita. O O iolito Cer‑
Palma; (ii) associaçõ es de arco magmá tico; ro Mantiqueira, exposto na porçã o sul do
(iii) magmatismo e sedimentaçã o tardi‑oro‑ TSG, é constituı́do por corpos de serpentini‑
gê nica; e (iv) associaçã o vulcano‑sedimentar tos, envoltos por faixas restritas de tremolita
da Bacia do Camaquã e plutons associados, xistos e de talco‑clorita‑tremolita xistos (Fig.
formados no intervalo entre 0,61 Ga e 0,54 1C). Cristais reliquiares de olivina e de cro‑
Ga, associados aos processos tectô nicos do mita de metaperidotitos mostraram compo‑
perı́odo pó s‑colisional da Orogenia Dom Feli‑ siçõ es tı́picas de o iolitos (Leite et al., 1998;
ciano. Hartmann & Chemale Jr., 2003). Metaultra‑
ma itos serpentinizados, com a assembleia
Anto ilita + Forsterita + Enstatita + Diopsı́dio,
3. 1 Prisma Acrescionário da Palma
caracterizam o metamor ismo orogê nico M1
O Prisma Acrescioná rio da Palma é de grau mé dio‑alto da sé rie de baixa P/T. A
constituı́do por complexos o iolı́ticos, carac‑ formaçã o das zonas de cisalhamento dú cteis
terizados por corpos alongados de serpenti‑ de alto â ngulo, sin‑tectô nicas ao metamor is‑
nitos, envoltos por faixas mé tricas de mo M2, indicam condiçõ es retrometamó r i‑
clorita‑clinocloro xistos, de talco xistos e de cas entre a Fc. Xistos Verdes Superior e a
tremolita xistos, intercalados com metapeli‑ An ibolito Inferior. Hartmann & Chemale Jr.
tos, com cristas contı́nuas de metachert (2003) interpretaram os metamor ismos M1
(quartzito puro) e com raras formaçõ es ferrı́‑ e M2 como relacionados aos eventos Sã o Ga‑
feras bandadas (BIFs). No interior dos ser‑ briel e Dom Feliciano, respectivamente. Da‑
pentinitos, foram identi icados relictos de dos geocronoló gicos indicam que os o iolitos
metaharzburgitos, de metadunitos, de meta‑ sã o tonianos (0,93‑0,89 Ga) (Arena et al.,
piroxenitos e de metagabros (Oliveira, 1981; 2016).
Figura 2 ‒ A) Seçõ es geoló gicas, mostrando as principais estruturas e relaçõ es estratigrá icas entre as unidades
do Terreno Sã o Gabriel: I) Vila Nova do Sul‑Bossoroca, II) Panorama‑Cerrito e III) Coxilha do Batovi‑Palma‑
Pontas do Salso. Localizaçõ es no mapa da Figura 1C (modi icado de Laux et al. (2017) e de Philipp et al. (2018));
B) Composiçã o isotó pica de Nd dos complexos metavulcano‑sedimentares e plutô nicos do Terreno Sã o Gabriel.
Fontes dos dados: Saalmann et al. (2005), Philipp et al. (2018).
pos sã o encontrados como xenó litos mé tri‑ superior e an ibolito inferior está caracteri‑
cos e como pendentes de teto, de algumas zado por associaçõ es com albita+actinoli‑
dezenas de metros, no interior dos ortog‑ ta+clorita+epidoto.
naisses do CC e nos granitos da SLML (Hart‑ As unidades que constituem o Arco
mann et al., 2011). Os gnaisses Sã o Gabriel sã o dominantes e incluem as ro‑
qz‑feldspá ticos sã o dominantes, com banda‑ chas metavulcano‑sedimentares do Comple‑
mento milimé trico regular e contı́nuo, alter‑ xo Bossoroca (780‑760 Ma) (Machado et al.,
nando nı́veis fé lsicos, ricos em 1990; Remus et al., 1999; Gubert et al., 2016)
quartzo‑plagioclá sio, e nı́veis má icos, ricos e os ortognaisses e os metagranitos do Com‑
em biotita e em granada, com estaurolita. As plexo Cambaı́ (750‑720 Ma) (Leite et al.,
condiçõ es metamó r icas variam entre a fá ci‑ 1998; Hartmann et al., 2011; Laux et al.,
es an ibolito inferior a superior (Remus, 2017). Ambas as unidades sã o cortadas por
1990; Lena et al., 2014). Philipp et al. (2018) corpos de granodioritos e de dioritos tardi‑
obtiveram uma isó crona de Sm‑Nd (grana‑ orogê nicos da SLML (700‑670 Ma) (Hart‑
da‑rocha total) de 807±31 Ma em granada‑ mann et al., 2011; Laux et al., 2017) e por ro‑
biotita‑plagioclá sio‑qz gnaisse. Dados isotó ‑ chas má icas‑ultramá icas estratiformes do
picos de Nd e de 18O mostraram que as Gabro‑Peridotito Mata Grande (Philipp et al.,
rochas do CCz derivaram da erosã o de ro‑ 2018). Nı́veis de meta‑arenitos conglomerá ‑
chas juvenis (Saalmann et al., 2005; Lena et ticos dos complexos Ibaré e Pontas do Salso
al., 2014; Philipp et al., 2018). apresentam seixos correlacioná veis à s ro‑
chas metavulcâ nicas do CB e de granitoides
3. 2 Associações de arco da SLML (Vedana et al., 2017).
O Complexo Bossoroca ocorre na
O magmatismo do Arco Passinho es‑ porçã o nordeste do TSG e consiste em meta‑
tá representado pelos ortognaisses do Com‑ tufos e em luxos de lava de composiçã o da‑
plexo Imbicuı́ (CI), constituı́dos, na sua cı́tica a andesı́tica, associados a metasse‑
porçã o central, por gnaisses tonalitico‑ dimentos vulcanogê nicos e a BIFs (Wildner,
trondhjemı́ticos, envoltos, ao norte e ao sul, 1990; Porcher et al., 1995; Remus et al.,
por gnaisses diorı́ticos (Kramer, 1995; Phi‑ 1999; Gubert et al., 2016). As rochas meta‑
lipp et al., 2018). O CI tem disposiçã o alon‑ vulcâ nicas tê m a inidade cá lcio‑alcalina de
gada, segundo a direçã o E‑W, e ocorre na baixo‑mé dio‑K e idades ı́gneas entre 780‑
porçã o sul do TSG, em contato com as ro‑ 760 Ma, com idades metamó r icas de 710‑
chas do O iolito Cerro Mantiqueira (Fig. 1C). 700 Ma (Remus et al., 1999; Hartmann et al.,
Os gnaisses mostram bandamento regular e 2011). As rochas metavulcanoclá sticas (Ab‑
contı́nuo, com evoluçã o estrutural complexa clo‑ep‑musc xistos), expostas na porçã o NW
e polifá sica. Apresentam composiçã o toleı́ti‑ do Complexo Passo Feio, foram correlaciona‑
ca e cá lcio‑alcalina baixo‑K e idades entre das à s rochas do CB, a partir de dados petro‑
900‑860 Ma, com contemporaneidade entre grá icos, geoquı́micos e geocronoló gicos
magmas á cidos e bá sicos. O metamor ismo (Philipp et al., 2018). O Complexo Cambaı́
orogê nico M1 é de inido pelas assembleias (CC) é constituı́do por gnaisses tonalı́ticos‑
plagioclá sio + hornblenda + biotita e plagio‑ trondhjemı́ticos e diorı́ticos e por metatona‑
clá sio + hornblenda + diopsı́dio, indicando litos, por metagranodioritos e por metadiori‑
condiçõ es metamó r icas da fá cies an ibolito tos intrusivos. Apresentam composiçã o
mé dio a superior e pressã o baixa. Um evento cá lcico‑alcalina mé dio‑K e a inidade metalu‑
retrometamó r ico (M2) de fá cies xisto verde minosa, com idades U‑Pb de 750‑720 Ma. Os
O Magmatismo Toniano do Terreno São Gabriel e a evolução do Cinturão Dom Feliciano 49
Contribuições à Geologia do Rio Grande do Sul e de Santa Catarina
gnaisses registram uma evoluçã o polifá sica, ciclá sticas maturas, dispostas ao longo dos
enquanto os metagranitoides constituem limites leste e sul do TSG, e representam as
corpos compostos, com relaçõ es de contem‑ unidades mais antigas do terreno. Estã o
poraneidade entre termos tonalı́ticos e diorı́‑ constituı́dos por metapsamitos, quartzitos,
ticos. metassiltitos, metapelitos, má rmores e
xistos cá lci‑silicá ticos, com intercalaçõ es
3. 3 Magmatismo tardi‑orogênico tectô nicas de rochas metavulcanoclá sticas e
de xistos magnesianos. Os metapsamitos sã o
A Suı́te Lagoa da Meia Lua (LMLS) é ricos em quartzo e em plagioclá sio, com ra‑
constituı́da por corpos intrusivos de tonali‑ ros fragmentos lı́ticos, indicando proveniê n‑
tos, de granodioritos e de dioritos, com ida‑ cia de á reas de reciclagem orogê nica.
des entre 700‑670 Ma, e que apresenta Mostram contatos tectô nicos com as unida‑
formas alongadas, segundo N20‑30oE (Ba‑ des juvenis e registram uma evoluçã o estru‑
binski et al., 1996; Hartmann et al., 2011; tural polifá sica, com condiçõ es metamó r icas
Laux et al., 2017). O Gabro‑Peridotito da Mata entre as fá cies xisto verde inferior e an iboli‑
Grande é um corpo estratiforme intrusivo to superior (estaurolita) da sé rie de mé dia P/
nos granitoides do CC e correlato à s unidades T. Per is colunares apresentados para o Com‑
da SLML (Philipp et al., 2018). plexo Coxilha do Batovi sugerem uma suces‑
As rochas metavulcano‑sedimentares sã o de metassedimentos, provavelmente,
dos complexos Pontas do Salso e Ibaré estã o depositados em ambiente deltaico (Philipp
expostas na porçã o sudoeste do TSG e sã o et al., 2018).
constituı́das por lentes dominantes de me‑
tapsamitos, intercaladas com metapsamitos 4 ISOTÓPOS DE Sr E DE Nd
conglomerá ticos, com metasiltitos feldspá ti‑
cos e com metapelitos. Os metassedimentos As rochas dos complexos Cambaizi‑
mostram feiçõ es de imaturidade textural e nho e Bossoroca apresentaram valores bai‑
87
clastos de rochas metavulcâ nicas e de grani‑ xos da razã o inicial Sr/86Sr
toides, correlatos à s rochas do CB e à s da (0,7014‑0,7039), similares aos ortognaisses
SLML. A composiçã o andesı́tica a dacı́tica e a do CC (0,701‑0,705), ambas indicativas de
a inidade cá lcico‑alcalina mé dio‑K indicam fontes manté licas (Soliani Jr., 1986; Silva Fi‑
que os metassedimentos derivaram de fontes lho, 1984; Remus, 1990; Babinski et al.,
manté licas juvenis (Vedana et al., 2017). A 1996). Os granitos da SLML, com razõ es en‑
proveniê ncia de zircã o detrı́tico apresentou tre 0,704 e 0,708, registram um pouco de in‑
fontes com idades entre 900‑700 Ma e com luê ncia crustal. Estes complexos
idade mı́nima de deposiçã o de 680 Ma, suge‑ apresentaram valores de é psilon Nd positi‑
rindo que os complexos foram depositados vos e idades‑modelo TDM entre 1,2 Ga e 0,77
em uma bacia tardi‑orogê nica, gerada duran‑ Ga (Fig. 2B). Os paragnaisses do CCz tê m va‑
te o colapso do Arco de Sã o Gabriel (Vedana lores de ENd(t) entre +0,39 e +5,64 e idades‑
et al., 2017; Philipp et al., 2018). modelo de 1,28‑0,86 Ga. Esta fonte juvenil foi
con irmada por dados de 18O, obtidos por
Lena et al. (2014), com valores entre +3,2 e +
3. 4 Associações de margem passiva
9,6, caracterizando trê s grupos de fontes
Os complexos Passo Feio, Arroio distintas e uma evoluçã o progressiva, a par‑
Marmeleiro e Coxilha do Batovi estã o consti‑ tir de rochas ı́gneas, geradas em um arco in‑
tuı́dos por sucessõ es metassedimentares sili‑ traoceâ nico, evoluindo para um arco de
Figura 3 ‒ A) Padrõ es de distribuiçã o da proporçã o relativa (PDP) das idades de U‑Pb em zircã o detrı́tico dos
complexos metavulcano‑sedimentares do Terreno Sã o Gabriel. Cada curva é construı́da, somando todas as
idades individuais e as incertezas e, depois, normalizando pelo nú mero de aná lises (mostrado à esquerda), de
modo que cada curva seja proporcional, em á rea; B) Curvas de proporçã o cumulativa, mostrando a variaçã o da
diferença entre a idade de cristalizaçã o (CA), medida para um grã o de zircã o detrı́tico, e a idade de deposiçã o
(DA) da sucessã o sedimentar em que ocorre. As barras com cores, ao fundo, representam os principais ciclos
orogê nicos e as unidades tectô nicas regionais, que serviram de á rea‑fonte. Fontes de dados: Arroios Marmeleiro
e Bossoroca e Coxilha do Batovi (Philipp et al., 2021), Cambaizinho (Lena et al., 2014), Ibaré (Arena et al., 2017 e
Philipp et al., 2021), Passo Feio (Lopes et al., 2015 e Remus et al., 2000), Pontas do Salso (Vedana et al., 2017).
Figura 4 ‒ A) Principais elementos tectô nicos, relacionados ao Gondwana Ocidental (0,95‑0.90 Ga); B) Detalhe
da porçã o sudeste, com idade entre 0,78 Ga e 0,72 Ga: crá tons: AM ‑ Amazô nico, CO ‑ Congo, KA ‑ Kalahari, LA ‑
Luı́s Alves, LAU ‑ Laurentia, RLP ‑ Rio de La Plata, SF ‑ Sã o Francisco, SM ‑ Saara e WA ‑ Oeste Africano;
fragmentos cratô nicos: BO ‑ Borborema, GO ‑ Maciço Central de Goiá s, PA ‑ Paranapanema, PB ‑ Parnaı́ba, PP ‑
Pampa e RA ‑ Rio Apa; arcos magmá ticos: A ‑ Amalaoulaou, G ‑ Goiá s, I ‑ Iskel, K ‑ Kabyé , P ‑ Passinho, SG ‑ Sã o
Gabriel e T ‑ Tilemsi; C) A ‑ Principais elementos tectô nicos do Gondwana Ocidental (1.0 Ga), B ‑ Detalhe da
porçã o sudeste do Oceano Charrua, mostrando a evoluçã o intraoceâ nica do Arco Passinho (0,9‑0,85 Ga) e C ‑
Desenvolvimento do Arco Sã o Gabriel e cavalgamento do Arco do Passinho e dos sedimentos de margem
passiva sobre o Terreno Nico Perez; D) Modelo evolutivo do Terreno Sã o Gabriel: A ‑ Quebra do
paleocontinente, B ‑ Abertura do Oceano Charrua, C ‑ Desenvolvimento do Arco Passinho, D ‑ Metamor ismo
orogê nico (M1) e cavalgamento do Arco Passinho e dos sedimentos de margem passiva sobre o Terreno Nico
Perez, E ‑ Desenvolvimento do Arco Sã o Gabriel, F ‑ Metamor ismo colisional (M2) entre o CRLP e o TNP, G ‑
Metamor ismo cataclá stico (M3), associado à s zonas de cisalhamento de alto â ngulo, com colocaçã o do
magmatismo pó s‑colisional da SLML e deposiçã o das bacias Ibaré e Pontas do Salso e H ‑ Reativaçã o pó s‑
orogê nica e magmatismo cá lcico‑alcalino/shoshonı́tico a alcalino (Evento Dom Feliciano) (legenda: 1 ‑
Embasamento, 2 ‑ Complexos o iolı́ticos, 3 ‑ Metassedimentos margem passiva, 4 ‑ Complexo Cambaizinho, 5 ‑
Complexo Imbicuı́, 6 ‑ Complexos Bossoroca e Cambaı́, 7/8 ‑ Tonalitos/Dioritos SLML, 9 ‑ Granitos tardi a pó s‑
orogê nicos do evento Dom Feliciano (modi icado de Philipp et al. (2018)).
tema de rift, interpretado como estreito e se‑ ra, O. M., Reis Neto, J. M. & Preciozzi, F. 2000.
melhante ao Mar Vermelho. The Dom Feliciano Belt of Brazil and Uru‑
guay and its Foreland Domain, the Rio de la
7 CONCLUSÕES Plata Craton, framework, tectonic evolution
and correlation with similar provinces of
Os dados geoló gicos, isotó picos e ge‑ Southwestern Africa. In: Cordani, U. G, Mila‑
ni, E. J., Campos, D. A. (Ed. ). Tectonic Evoluti‑
ocronoló gicos indicam que os complexos
on of South American Platform. Rio de
Cambaizinho, Ibaré e Pontas do Salso foram Janeiro, SBG, p. 311‑334.
depositados no interior do TSG em bacias
orogê nicas, com sedimentaçã o associada à Brito Neves, B. B, Fuck, R. A. & Pimentel, M.
erosã o de rochas ı́gneas juvenis dos arcos M. 2014. The Brasiliano collage in South
Passinho (0,90‑0,85 Ga) e Sã o Gabriel (0,78‑ America: a review. Brazilian Journal of Geo‑
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O Magmatismo Toniano do terreno São Gabriel e a evolução do Cinturão Dom Feliciano 57
Philipp et al.
1
Programa de Pó s‑graduaçã o em Geologia, Universidade Federal de Santa Catarina
2
Programa de Pó s‑graduaçã o em Geociê ncias, Universidade Federal do Rio Grande do Sul
1 INTRODUÇÃO
O Complexo Brusque é uma das principais unidades do Cinturã o Dom Feliciano em San‑
ta Catarina e sua caracterizaçã o foi objeto de projetos de mapeamento geoló gico executados pe‑
la Companhia de Pesquisa de Recursos Minerais (CPRM), de investigaçõ es petroló gicas
promovidas por teses, por dissertaçõ es e por trabalhos de conclusã o de diversas universidades
(USP, UFRGS, UFSC, UFPR, UNIPAMPA e UNISINOS). Entre as dé cadas de 50 e 80, ocorreu signi i‑
cativa contribuiçã o associada à prospecçã o e à mineraçã o de ouro.
As rochas metavulcano‑sedimentares do complexo caracterizam uma sequê ncia supra‑
crustal que repousa sobre uma crosta continental antiga caracterizada como Crá ton Luis Alves,
constituı́do por complexos ortogná issicos de mé dio a alto grau e de idade Paleoproterozoica a
Arqueana. As relaçõ es entre estas unidades remontam à reconstruçã o do Rodı́nia e da porçã o
SW do Gondwana. Os processos colisionais que afetaram estas unidades durante a construçã o
do cinturã o destruı́ram as relaçõ es estratigrá icas originais e tornaram o entendimento destas
rochas um complexo desa io.
Nas ú ltimas dé cadas, houve constante produçã o de dados geoló gicos relacionados a ati‑
vidades de mineraçã o e de expansã o da rede de infraestrutura urbana e a investigaçõ es sistemá ‑
ticas realizadas pelo Serviço Geoló gico do Brasil e pelo meio acadê mico. Neste sentido, este
capı́tulo tem como objetivo avaliar o atual está gio de conhecimento sobre o Complexo Brusque e
discutir os limites das interpretaçõ es anteriores e as novas possibilidades apontadas pelos mais
recentes dados geoquı́micos, isotó picos e geocronoló gicos.
Contribuições à Geologia do Rio Grande do Sul e de Santa Catarina
Figura 1 ‒ A) Principais unidades cratô nicas e localizaçã o da Provı́ncia Mantiqueira; e B) Mapa tectô nico da
porçã o sul da Plataforma Sul‑Americana, destacando as unidades do Cinturã o Dom Feliciano no RS e SC, e no
Uruguai (modi icado de Philipp et al. 2016). Principais zonas de cisalhamento: 1 ‑ Itajai‑Perimbó ; 2 ‑ Major
Gercino; 3 ‑ Caçapava do Sul; 4 ‑ Dorsal de Canguçu; 5 ‑ Passo do Marinheiro; 6 ‑ Ibaré ; 7 ‑ Sarandı́ del Yı́; 8 ‑
Sierra Ballena; 9 ‑ Cerro Amaro; e 10 ‑ Arroio Grande.
icas e em suas fases de dobramento uma fases de subducçã o e colisõ es ocorridas du‑
vergê ncia tectô nica para NW, indicando um rante o Neoproterozoico, entre os crá tons
transporte principal em direçã o ao Crá ton Luis Alves, Rio de La Plata e Paranapanema,
Luis Alves (Paleoproterozoico‑Arqueano). A os terrenos Nico Perez e Camboriú (Amé rica
estruturaçã o do cinturã o envolveu sucessivas do Sul), e os crá tons Congo e Kalahari (Afri‑
ca) (Fernandes et al., 1992; Basei et al., 2000, embasamento (Complexo Camboriú ) e por
2011; Saalmann et al., 2011; Oyhantçabal et granitoides intrusivos (Domı́nio Intermediá ‑
al., 2011; Philipp et al., 2016). Os fenô menos rio), e, mais ao noroeste, por rochas sedi‑
de formaçã o do Gondwana Ocidental, inicia‑ mentares e vulcâ nicas fé lsicas do Grupo
ram com a abertura do Oceano Adamastor e Itajaı́ (Domı́nio Externo). No extremo norte,
de mares interiores (900‑750 Ma), cujo fe‑ os ortognaisses e os migmatitos do Comple‑
chamento inal esteve relacionado a um xo Granulı́tico de Santa Catarina caracteri‑
evento de metamor ismo colisional (650‑620 zam o Crá ton de Luis Alves.
Ma) e a processos deformacionais e magmá ‑ O Complexo Brusque (CB) é consti‑
ticos pó s‑colisionais (600‑560 Ma). Os pro‑ tuı́do por uma sequê ncia metavulcano‑sedi‑
cessos colisionais envolveram o mentar disposta na forma de duas faixas
espessamento crustal por falhas de cavalga‑ contı́nuas de direçã o N50‑60oE, separadas
mento, que evoluı́ram para zonas de cisalha‑ na sua parte central pelo bató lito granı́tico
mento oblı́quas e na sua etapa inal, para intrusivo da Suı́te Valsungana (Fig. 2A). As
zonas transcorrentes de alto â ngulo, que unidades do complexo estã o polideformadas
marcaram os processos de escape tectô nico e e sua continuidade ao longo do CDF é carac‑
os ú ltimos episó dios de deformaçã o das baci‑ terizada pelos complexos Porongos (RS) e
as de foreland (540‑530 Ma) (Basei et al., Lavalleja (Uruguai), que mostram amplas si‑
2000; Oyhantçabal et al., 2009; Philipp et al., milaridades composicionais, nos tipos e nas
2016). idades dos eventos metamó r icos, e pela
O CDF está organizado em trê s seg‑ ocorrê ncia de inliers do embasamento. A
mentos principais separados por zonas de ci‑ principal diferença está relacionada à s asso‑
salhamento dú cteis regionais. O contato ciaçõ es de rochas metavulcâ nicas e ao mag‑
entre os bató litos granı́ticos e os complexos matismo granı́tico intrusivo que afeta as
metavulcano‑sedimentares é de inido por rochas supracrustais. O Complexo Porongos
zonas de cisalhamento dú cteis contı́nuas e apresenta metariolitos e metadacitos de
denominadas em seus setores regionais, de composiçã o cá lcico‑alcalina com assinatura
Major Gercino (SC), Dorsal de Canguçu (RS) e de subducçã o e idades de 800‑770 Ma (Sa‑
Sierra Ballena (Uruguai) (Basei et al., 2000; allmann et al., 2011; Gruber et al., 2016; Per‑
Oyhantçabal et al., 2009; Passarelli et al., tille et al., 2017). Os outros complexos
2010; Philipp et al., 2016). Em SC, o contato apresentam rochas metavulcâ nicas bá sicas
entre os complexos supracrustais e a bacia de composiçã o toleı́tica com assinatura de
de foreland (Itajaı́) é de inido por falhas de contaminaçã o crustal, com ocorrê ncia restri‑
empurrã o que marcam o cavalgamento das ta de rochas á cidas com idades de 640‑620
rochas metamó r icas sobre as sedimentares. Ma (Silva et al., 2002; Campos et al., 2012a,
Nas bacias do Camaquã (RS) e Arroio El Sol‑ 2012b; Basei et al., 2011). Ambos os comple‑
dado (Uruguai) o contato é de inido por fa‑ xos estã o afetados por metamor ismo orogê ‑
lhas transcorrentes de alto â ngulo. nico em condiçõ es da fá cies xisto verde a
O segmento norte do CDF é consti‑ an ibolito superior das sé ries de baixa P/T,
tuı́do de sudeste para noroeste, pelas suı́tes em SC, e de mé dia P/T, no RS.
granitoides do Bató lito Florianó polis, que re‑
presentam as raı́zes de um arco magmá tico 3 ESTRATIGRAFIA
(Domı́nio Interno) (Basei, 1985), por uma
porçã o central composta pelas rochas meta‑ O Complexo Brusque (CB) é consti‑
mó r icas do Complexo Brusque, por inliers do tuı́do por uma sucessã o basal e dominante
Figura 2 ‒ A) Mapa geoló gico da porçã o leste de Santa Catarina destacando as unidades do Complexo Brusque
e do embasamento (modi icado de Basei et al., 2020): Bató lito Florianó polis ‑ Rochas sin a tardi‑
transcorrentes: CP Complexo Porto Belo, CE Complexo Estaleiro e SIZ Suı́te Intrusiva Zimbros; Rochas tardi a
pó s colissionais: GI Granito Ilha e GAN Granito Angelina; Rochas pré a sin colissionais: GF Granito Forquilinhas
e GSPA Granito Sã o Pedro de Alcâ ntara. Suı́te Nova Trento: GFA Granito Faxinal, GGUA Granito Guabiruba, GNI
Granito Nova Itá lia, GRB Granito Rio do Braço, GSM Granito Serra dos Macacos, GNT Granito Nova Trento/
Indaiá , GPC Granito Ponta do Cabeço. Complexos granı́tico‑gnaissicos e migmatı́ticos: CRP Complexo Ribeirã o
da Prata, CIT Complexo Itapema/Morro do Boi, CC Complexo Camboriú , CAM Complexo Aguas Mornas.
Cidades: BC ‑ Balneá rio Camboriú , Bg ‑ Biguaçu, Bl ‑ Blumenau, Bq ‑ Brusque, G ‑ Garcia, Gb ‑ Guabiruba, It ‑
Itajaı́, NT ‑ Nova Trento, Tj ‑ Tijucas e VR ‑ Vidal Ramos. B) Seçã o geoló gica A‑B.
de metassedimentos clá sticos, localmente re‑ tados pela ocorrê ncia de metabasaltos, meta‑
coberta por uma associaçã o vulcanogê nica basaltos variolı́ticos, serpentinitos e xistos
com sedimentos quı́mico‑exalativos associa‑ magnesianos (komatiitos). O levantamento
dos. O pacote clá stico ocorre em toda a á rea de seçõ es geoló gicas com coleta sistemá tica
de exposiçã o do complexo, composto por de dados estruturais e petrográ icos, integra‑
lentes de metapsamitos ricos em quartzo, in‑ dos com aná lises geocronoló gicas e isotó pi‑
tercalados com corpos de metaritmitos e cas permitiram a Basei (1985) subdividir o
com uma espessa sequê ncia de metapelitos. Grupo Brusque nas formaçõ es Botuverá , Rio
Na porçã o sul os quartzitos estã o intercala‑ do Areia e Rio do Oliveira, destacando a pri‑
dos com lentes restritas de metaconglomera‑ meira como a base estratigrá ica, proposta
dos, enquanto na porçã o noroeste, se seguida em trabalhos subsequentes (Basei et
intercalam com meta‑calcá reos. Nos extre‑ al., 2000, 2011, 2020).
mos oeste e leste do CB, ocorrem dois corpos Como resultado do mapeamento geo‑
alongados e concordantes de rochas meta‑ ló gico (1:100.000) das folhas Botuverá e
vulcâ nicas bá sicas e ultrabá sicas, intercala‑ Brusque pela CPRM (em 1:100.000), Caldas‑
dos com metapelitos, xistos calci‑silicá ticos, so et al. (1995a, 1995b) subdividiram o CB
gra ita xistos e BIFs (fá cies silicosa, hematı́ti‑ em conjuntos litoló gicos a partir dos protó li‑
ca, carboná tica e turmalı́nica). Estes corpos tos dominantes, reconhecendo as unidades
estã o expostos na regiã o dos rios Barra do clá stica, quı́mica, clá stico‑quı́mica, metavul‑
Areia (Botuverá ) e do Oliveira (Sã o Joã o Ba‑ câ nicas bá sicas e magnesiana. O mapa geoló ‑
tista) (Basei, 1985; Sander, 1992; Caldasso et gico do Instituto de Geociê ncias (UFRGS)
al., 1995a, 1995b; Philipp et al., 2004; Cam‑ para a regiã o entre Camboriú e Sã o Joã o Ba‑
pos et al., 2012a, 2012b; Basei et al., 2011, tista (em escala 1:50.000) seguiu os mesmos
2020). No presente trabalho, utilizamos o parâ metros e separou os principais corpos de
termo Complexo Brusque (CB) em detrimen‑ metapsamitos entre uma espessa sequê ncia
to de Grupo Brusque tendo em vista as reco‑ de metaritmitos e metapelitos, bem como
mendaçõ es da Subcomissã o de corpos restritos de metavulcâ nicas bá sicas e
Nomenclatura Estratigrá ica da IUGS (1994) ultrabá sicas, lentes de metamargas e má rmo‑
e do có digo estratigrá ico norte‑americano. res (Philipp et al., 2004). Mais recentemente,
A denominaçã o Sé rie Brusque (Car‑ Basei et al. (2011) separaram os principais
valho & Pinto, 1938) foi designada para ca‑ conjuntos litoló gicos que constituem as for‑
racterizar a sucessã o de corpos de maçõ es Botuverá , Rio da Areia e Rio do Oli‑
quartzitos, ilitos e calcá reos expostos na veira.
porçã o leste de Santa Catarina. Como resulta‑ Apesar da complexa estruturaçã o
do do mapeamento geoló gico das regiõ es de tectô nica do CB, a superfı́cie de deposiçã o
Rio do Sul e de Florianó polis, Schulz & Albu‑ original (S0) é reconhecida em a loramentos
querque (1969) propuseram o termo Grupo como variaçõ es de tamanho de grã o entre ca‑
Brusque, incluindo os granitos Valsungana e madas de metapsamitos, pela alternâ ncia
Guabiruba. A descoberta de rochas metavul‑ composicional entre metaritmitos e metape‑
canogê nicas intercaladas com os metassedi‑ litos, e entre metacalcá reos e metamargas.
mentos e a complexa evoluçã o estrutural, Foram reconhecidas no CB as foliaçõ es meta‑
levou Silva et al. (1983) a propor o Complexo mó r icas S1 e S2, bem como a formaçã o de
Metamó r ico Brusque. Os autores interpreta‑ grandes dobras recumbentes (F2) associadas
ram esta sequê ncia supracrustal como um com o desenvolvimento de falhas de empur‑
greenstone belt (GB Rio Itajaı́‑Mirim), supor‑ rã o ou de zonas de cisalhamento de baixo â n‑
O Complexo Brusque e o Cinturão Dom Feliciano em Santa Catarina 65
Contribuições à Geologia do Rio Grande do Sul e de Santa Catarina
gulo (Basei, 1985; Silva 1983, 1991; Caldasso com ocorrê ncia signi icativa de metamargas
et al., 1995a, 1995b; Philipp et al., 2004; Ba‑ e má rmores, e presença subordinada de me‑
sei et al., 2011, 2020). Os autores destacaram tapsamitos e quartzitos. Na porçã o Sul, pre‑
o cará ter aló ctone e reconhecem a xistosida‑ dominam metaritmitos com camadas
de S2 como foliaçã o principal, gerada por espessas de quartzitos e raras lentes de me‑
transposiçã o da S1, e associada à evoluçã o de taconglomerados matriz‑suportados. Este li‑
dobras recumbentes e isoclinais intrafoliais tó tipo apresenta seixos de quartzitos e de
(F2). O nú mero restrito de aná lises petrográ ‑ veios de quartzo envoltos em matriz arenosa
icas, a escassez de a loramentos e a falta de rica em quartzo. Estas caracterı́sticas suge‑
acesso a partes da á rea de exposiçã o do CB, rem termos intraformacionais depositados
constituem desa ios para o avanço do enten‑ por atividades tectô nicas sin‑sedimentares.
dimento estratigrá ico. Apesar da identi ica‑ Alternativamente, foram interpretados como
çã o local de estruturas primá rias, a falta de diamictitos de depó sitos glaciais ou gerados
crité rios de topo e base é sistemá tica, e os por escorregamentos em taludes continen‑
processos de deformaçã o que afetaram as tais (Basei, 1985; Basei et al., 2011).
unidades foram complexos e polifá sicos. Es‑ Os metassedimentos clá sticos pre‑
tes fatores limitam o uso da denominaçã o servam parcialmente as estruturas plano‑
Grupo Brusque, bem como sua subdivisã o paralelas e o acamadamento composicional.
em formaçõ es litoestratigrá icas. Do mesmo As variaçõ es composicionais, os contatos
modo, o reconhecimento de fá cies sedimen‑ gradacionais e a alternâ ncia composicional
tares, como apresentado por Caldasso et al. sistemá tica foram interpretadas por Caldas‑
(1995a, 1995b) é uma interpretaçã o ú til no so et al. (1995a, 1995b) como indicativas da
mapeamento geoló gico, mas que nã o descre‑ deposiçã o por correntes de turbidez de bai‑
ve a sucessã o sedimentar. Ainda nã o foi apre‑ xa densidade. Os corpos de quartzitos foram
sentada uma proposta de subdivisã o do interpretados como corpos arenosos plata‑
complexo em unidades litodê micas. formais, cordõ es litorâ neos, barras de costa
afora ou como canais de depó sitos turbidı́ti‑
4 ESTRUTURAS PRIMÁRIAS E AMBIEN‑ cos. Os nı́veis de metaritmitos apresentam
TES DE DEPOSIÇÃO texturas blastopsamı́ticas com por iroclas‑
tos de areia em metapsamitos, e os nı́veis
O reconhecimento de estruturas e metapelı́ticos apresentam por iroblastos de
texturas primá rias nas litologias do CB per‑ aluminosilicatos e outros minerais alumino‑
mitiu identi icar os protó litos sedimentares e sos. A alternâ ncia entre metamargas lamina‑
ı́gneos. Os metassedimentos clá sticos domi‑ das, má rmores dolomı́ticos silicosos e
nam a sucessã o de litó tipos, enquanto nas re‑ calcı́ticos, e metassedimentos pelı́ticos e
giõ es do rio Barra do Areia, a noroeste de areno‑pelı́ticos, també m suporta uma evolu‑
Botuverá , e do rio do Oliveira, entre Tijucas e çã o associada a depó sitos turbidı́ticos. Em
Itapema, estã o expostas duas faixas consti‑ Botuverá , foram descritos meta‑calcá reos
tuı́das por rochas metavulcâ nicas bá sicas e estromatolı́ticos de ambientes calmos de su‑
ultrabá sicas, associadas com metapelitos, pra a intermaré s, metacalcá reos oolı́ticos de
xistos calci‑silicá ticos, formaçõ es ferrı́feras ambientes de alta energia e calcá reos lami‑
bandadas, turmalinitos, ilitos e xistos gra i‑ nados relacionados a depó sitos turbidı́ticos,
tosos. indicando a deposiçã o em uma plataforma
Ao norte, o complexo é composto por carboná tica (Sander, 1992; Caldasso et al.,
metassedimentos dominantemente pelı́ticos, 1995b).
dois intervalos de idades para as rochas fon‑ que indicam o intervalo 640‑610 Ma como o
tes da bacia do CB, indicando contribuiçõ es perı́odo de evoluçã o do processo colisional
de idades meso‑ (1,5‑1,3 Ga e 1,3‑1,0 Ga) e (Silva et al., 2000, 2005; Basei et al., 2000;
paleoproterozoicas (2,25‑1,7 Ga), com picos Hartmann et al., 2003). O metamor ismo de
restritos no Arqueano (2,9‑2,5 Ga). Um pa‑ alto grau que afetou o Complexo Camboriú
drã o restrito com idades paleoproterozó icas foi investigado por EPMA em monazita por
(2,25‑2,19 Ga) foi observado em quartzito Philipp et al. (2009), que obtiveram idades
por Hartmann et al. (2003a) e em granada‑ entre 650 Ma e 620 Ma em uma amostra de
mica xisto (amostra ICA‑05), por Basei et al. gt‑sil‑bt gnaisse.
(2020). As idades obtidas em duas amostras O metamor ismo cataclá stico associ‑
de metaconglomerado (BA23 e TFM‑26A), ado à s zonas de cisalhamento Major Gercino
em quartzito (TFM‑30) e em xisto calci‑sili‑ e Itajaı́‑Perimbó é balizado no intervalo en‑
cá tico (TFB‑2/3/5/6) da Fm. Rio do Oliveira, tre 620 Ma e 600 Ma com base nas relaçõ es
mostraram resultados dominantes no inter‑ estruturais e nas idades U‑Pb em zircã o de
valo entre 2,3 Ga e 1,8 Ga, com idades restri‑ corpos granı́ticos sin‑transcorrê ncia (Silva et
tas ao Arqueano (entre 3,2 Ga e 2,5 Ga). O al., 2000; Passarelli et al., 2010; Chemale Jr.
quartzito (BB22) da Fm. Rio Barra do Areia et al., 2012). Os corpos tardi‑orogê nicos va‑
investigado por Eiesland (2018) mostrou re‑ riam entre 600 Ma e 580 Ma. Os corpos gra‑
sultados semelhantes. nı́ticos com registro do metamor ismo de
Os dados de zircã o detrı́tico ressal‑ contato mostram idades de cristalizaçã o en‑
tam fontes mistas com dominâ ncia de ida‑ tre 620 Ma e 580 Ma, interpretadas como a
des meso e paleoproterozoicas nos fase de descompressã o do CDF (Basei et al.,
metapsamitos da Fm. Botuverá . As rochas 2020).
metavulcano‑sedimentares das formaçõ es
Rio do Areia e Rio do Oliveira, entretanto, 6 ESTRUTURAS TECTÔNICAS
apresentam uma populaçã o com idade do‑
minante entre 2,5 Ga e 1,8 Ga. Destaca‑se A evoluçã o tectô nica do CB foi com‑
que duas amostras situadas na porçã o nor‑ plexa e polifá sica, relacionada a um evento
deste da Fm. Botuverá apresentaram somen‑ progressivo de natureza tangencial (D1‑D2),
te fontes paleoproterozoicas. cujo desenvolvimento formou as foliaçõ es S1
e S2 (Silva, 1983, 1991; Basei, 1985; Caldas‑
5. 4 Idades metamór icas so et al., 1995a, 1995b; Philipp et al., 2004;
Basei et al., 2011). A transposiçã o da foliaçã o
As idades metamó r icas sã o raras, S1, preservada em dobras isoclinais a fecha‑
entretanto, o metamor ismo orogê nico que das (F2), e a geraçã o da xistosidade principal
afetou o CB foi relacionado ao Ciclo Brasilia‑ S2, foi acompanhada pela formaçã o de zonas
no (Basei, 1985; Silva et al., 2000, 2002; Phi‑ de cisalhamento dú cteis de baixo â ngulo. Es‑
lipp et al., 2009; Basei et al., 2011). A idade tas estruturas de empurrã o re letem a tectô ‑
de Rb‑SrRT de 706 ±50 Ma obtida em bt xisto nica colisional que ocasionou o
da regiã o de Nova Trento por Basei (1985) encurtamento crustal associado à s fases de
foi interpretada como representativa do clı́‑ deformaçã o D1 e D2. Estas estruturas rompe‑
max metamó r ico e da foliaçã o S2. Outras ram o pacote estratigrá ico e promoveram
idades do metamor ismo sã o indiretas, com por processos de cavalgamento a inversã o
base na relaçã o estrutural de colocaçã o dos da bacia e a intercalaçã o tectô nica de “fatias”
corpos granı́ticos sin‑ a tardi‑orogê nicos, de segmentos crustais, formando uma estru‑
Figura 3 ‒ A) Diagramas mostrando os padrõ es de distribuiçã o das idades de zircã o detrı́tico de cada unidade
do Complexo Brusque. As amostras de cada formaçã o tê m curvas individuais por amostra, normalizadas para
que todas as curvas tenham proporcionalmente a mesma á rea. O nú mero de aná lises é mostrado ao lado de cada
curva. Os dados representados foram compilados dos trabalhos de Hartmann et al. (2003), Basei et al. (2008,
2020) e Eiesland (2018). As barras sombreadas verticais mostram os intervalos dos principais ciclos orogê nicos
e de á reas cratô nicas representados como rochas‑fontes de cada unidade metassedimentar. B) Diagramas
mostrando os padrõ es de distribuiçã o das idades obtidas em zircã o detrı́tico das principais unidades
metasedimentares do cinturã o Dom Feliciano em SC, RS e no Uruguai. Os intervalos dos eventos e as unidades
foram compilados de Silva et al. (2005), Saalmann et al. (2010) e Philipp et al. (2016, 2018).
turaçã o com vergê ncia para NW. A foliaçã o S2 cianita, estaurolita e sillimanita. Nos meta‑
tem orientaçã o NE‑SW, com amplas varia‑ basitos observou‑se as assembleias actinoli‑
çõ es de mergulho associadas em parte a do‑ ta + albita + epidoto e tremolita +
bras recumbentes (F2), mas principalmente hornblenda + plag. Ca (Philipp et al., 2004;
relacionadas à s dobras F3. A lineaçã o mineral Campos et al., 2012a).
e de estiramento, observadas em metapelitos O mapeamento geoló gico (1:50.000)
e metapsamitos, mostra uma orientaçã o ge‑ da regiã o entre Sã o Joã o Batista e Camboriú
ral leste‑oeste com baixos â ngulo de mergu‑ integrado com aná lise petrográ ica, resultou
lho, e quando afetada pelas dobras F3 no reconhecimento das zonas metamó r icas
apresenta caimentos em graus variados, para dos eventos orogê nico e termal (Philipp et
NE e SW. al., 2004). Foram descritas as zonas da clori‑
As foliaçõ es S1 e S2 foram deforma‑ ta, biotita, granada e andaluzita, atingindo,
das por evento compressivo (D3) tardio e sob de modo restrito a zona da cordierita e a fá ‑
condiçõ es de deformaçã o dú ctil a dú ctil‑rú p‑ cies an ibolito inferior. O equilı́brio entre an‑
til, formando dobras F3 do tipo normais, com daluzita e cordierita indicou condiçõ es de
formas abertas a fechadas. Estas dobras de pressã o litostá tica baixa e sugere um rá pido
escala regional, tê m eixos com baixo caimen‑ soterramento associado com o aumento
to segundo a direçã o NE‑SW, com fraturas progressivo da temperatura. O padrã o de
axiais (S3) em leque orientadas segundo a di‑ zonaçã o é concordante com a foliaçã o S2,
reçã o mé dia N40‑60oE. Em segmentos de al‑ entretanto, foi constatada a intercalaçã o
ta deformaçã o, as zonas de cisalhamento tectô nica entre fatias da seqü ê ncia meta‑
transcorrentes de alto â ngulo formaram fai‑ mó r ica. Esta interpretaçã o contrasta com
xas de milonitos com lineaçã o de estiramen‑ aquelas indicadas por Basei (1985), Silva
to direcional e cinemá tica lateral direita. (1991) e Basei et al. (2011, 2020), que vin‑
Estas zonas controlaram a ascensã o e a colo‑ cularam o aumento da temperatura a um
caçã o do magmatismo granı́tico sin a tardi‑ domo termal associado aos granitos da Suı́te
orogê nico. A ú ltima fase de deformaçã o (D4) Valsungana. Com base nos dados estruturais
tem disposiçã o ortogonal ao cinturã o e está e nas zonas do metamor ismo termal, Phi‑
caracterizada por dobras F4 abertas a suaves, lipp et al. (2004) interpretaram a colocaçã o
e por uma clivagem de fratura de superfı́cie dos granitoides como sincrô nica à fase D3 e
axial, pouco espaçada e com direçã o segundo simultâ nea à formaçã o das zonas de cisalha‑
N40‑70oW. mento transcorrentes.
O aumento do grau metamó r ico
7 METAMORFISMO coincide com a ocorrê ncia de corpos tabula‑
res de leucogranitos peraluminosos. Estes
As assembleias minerais observadas corpos mostram concordâ ncia entre as foli‑
em metapelitos do CB caracterizam uma zo‑ açõ es magmá ticas e milonı́tica, sugerindo
naçã o metamó r ica progressiva para o even‑ um posicionamento sin‑tectô nico para a S2.
to orogê nico, variando entre a fá cies xistos As condiçõ es de fá cies an ibolito superior
verdes inferior e an ibolito superior (Basei, (sillimanita) registradas em metapelitos do
1985; Sander, 1992; Caldasso et al., 1995a, Ribeirã o do Ouro (Botuverá ) (Caldasso et al.
1995b; Philipp et al., 2004). A foliaçã o S2 das 1995a), indicam o limite mı́nimo para a fu‑
rochas metapelı́ticas conté m clorita, musco‑ sã o parcial, e sugerem que a geraçã o do
vita e biotita, com por iroblastos sin‑tectô ni‑ magmatismo granı́tico peraluminoso ocor‑
cos de granada, andaluzita, cordierita, reu em nı́veis mais profundos.
70 Edição da Sociedade Brasileira de Geologia – Núcleo RS/SC
Campos & Philipp
Em parte, simultâ neo ao evento D3, T e de melanges tectô nicas com complexos
mas de ocorrê ncia restrita, o metamor ismo o iolı́ticos restringem a comparaçã o do CB
cataclá stico associado à s zonas de cisalha‑ com arcos insulares ou com arcos de margem
mento dú cteis Itajaı́‑Perimbó e Major Gerci‑ continental ativa.
no, atingiu condiçõ es de fá cies xistos verdes Fragoso‑Cesar (1980) propô s a de‑
superior e an ibolito. As assembleias do me‑ nominaçã o Cinturã o Dom Feliciano para as
tamor ismo termal afetaram o equilı́brio mi‑ unidades neoproterozoicas expostas na por‑
neral do metamor ismo orogê nico e çã o sul do Brasil e leste do Uruguai e que en‑
promoveram o crescimento de fases seme‑ volviam o Crá ton Rio de La Plata a partir da
lhantes, mas com aspectos texturais distin‑ subducçã o de uma crosta oceâ nica para NW,
tos. A intrusã o dos granitos Valsungana e gerando a formaçã o de arcos magmá ticos
Serra dos Macacos gerou cornubianitos com (bató litos granı́ticos), e onde o CB foi inter‑
auré olas de contato bem de inidas pela for‑ pretado como uma bacia de backarc. A inter‑
maçã o em metapelitos das zonas da biotita, calaçã o entre as rochas metavulcâ nicas
andaluzita, granada, cianita, estaurolita, cor‑ bá sicas e ultrabá sicas e os metassedimentos
dierita e sillimanita, marcando condiçõ es en‑ quı́mico‑exalativos, levaram Silva (1991) a
tre a fá cies albita‑epidoto cornubianito e reconhecer o CB como o greenstone belt Rio
piroxê nio cornubianito (Sander, 1992; Cal‑ Itajaı́‑Mirim de idade Arqueana‑Proterozó ica
dasso et al., 1995a, 1995b; Philipp et al., Inferior, com evoluçã o em ambiente de rift
2004; Basei et al., 2011, 2020). Em zonas continental. Posteriormente, Caldasso et al.
mais afastadas os cornubianitos preservam (1995a, 1995b) e Philipp et al. (2004) subdi‑
parte da estrutura xistosa e do acamadamen‑ vidiram os principais grupos litoló gicos de
to composicional, envoltos por uma matriz protó litos do complexo, permitindo um avan‑
com texturas granoblá stica poligonal ina e ço na caracterizaçã o das suas unidades.
decussada, e por por iroblastos sem orienta‑ A composiçã o geoquı́mica dos meta‑
çã o. Este evento termal revela um pequeno basaltos da regiã o de Botuverá foi interpreta‑
intervalo de tempo entre o pico do metamor‑ da como transicional entre toleı́tica e alcalina
ismo orogê nico e a colocaçã o dos granitos, e do tipo intraplaca, com base no teor de á l‑
indicando o soerguimento e erosã o do cintu‑ calis (K2O+Na2O) de amostras hidrotermali‑
rã o e o resfriamento das rochas metamó r i‑ zadas e com pouco suporte de elementos
cas. traços (Sander, 1992). Entretanto, aná lises
quı́micas dos elementos maiores, traços e
8 EVOLUÇÃO TECTÔNICA ETR obtidas por Campos et al. (2012a;
2012b) apontaram uma composiçã o toleı́tica
Inicialmente, o CB foi interpretado do tipo E‑MORB, con irmada pela composi‑
como uma sucessã o de metassedimentos çã o dos isó topos de Sr e Nd e pelo padrã o en‑
plataformais da margem continental passiva riquecido em LILE e ETR leves
(Hasui et al., 1975) do Oceano Adamastor caracterı́sticos de basaltos gerados em mar‑
(Basei 1985; Basei et al., 2008a, 2011, 2020). gens continentais (Fig. 4).
Correlaçã o com ambiente de subducçã o foi
A reuniã o dos dados disponı́veis
sugerida por Trainini et al. (1978), que reco‑
aponta para um modelo de deposiçã o do CB
nheceu as rochas metavulcâ nicas como asso‑
associado a um rift intracontinental ou mar‑
ciaçõ es de um arco insular. A ausê ncia de
gem passiva pouco evoluı́da, com a deposiçã o
rochas metavulcâ nicas cá lcico‑alcalinas, de
de sedimentos clá sticos plataformais a partir
associaçõ es metamó r icas da sé rie de alta P/
de sistemas deltaicos (Fig. 5A). Novos pulsos
O Complexo Brusque e o Cinturão Dom Feliciano em Santa Catarina 71
Contribuições à Geologia do Rio Grande do Sul e de Santa Catarina
Figura 4 ‒ Diagramas geoquı́micos para as rochas metavulcâ nicas do CB: A) Diagrama TAS (total á lcalis x sı́lica)
(Middlemost, 1994) separando o campo de rochas alcalinas e nã o alcalinas (adaptado de Cox et al., 1979); B)
Diagrama triangular AFM (Irvine & Baragar, 1971); C) Diagrama SiO2 x Zr/TiO2 (Winchester & Floyd, 1977); D)
Abundâ ncia de Elementos Terras Raras normalizados pelo condrito C1 (Sun, 1982); E) Disposiçã o das amostras
estudadas no diagrama Ti/100‑Zr‑Yx3 (Pearce & Can, 1973); e F) Diagrama Th/Yb por Ta/Yb (Pearce, 1983). Os
vetores indicam a in luê ncia de componentes de subducçã o (S), enriquecimento intra‑placa (W), contaminaçã o
crustal (C) e cristalizaçã o fracionada (F).
tectô nicos relacionados à evoluçã o da bacia tou do fechamento da Bacia Brusque, evento
ocasionou a formaçã o de falhas extensionais relacionado à convergê ncia de placas e à co‑
profundas, que por alı́vio de pressã o fundem lisã o continental. Os processos de deforma‑
o manto e servem de conduto para a extru‑ çã o envolveram uma tectô nica tangencial
sã o de basaltos em ambiente marinho, asso‑ que resultou na formaçã o progressiva das
ciados à formaçã o de sedimentos quı́mico foliaçõ es S1 e S2 associada à inversã o da ba‑
exalativos (Fig. 5B). Os dados de U‑Pb em cia por cavalgamento sobre o Crá ton Luis Al‑
zircã o detrı́ticos indicam que a evoluçã o da ves situado a N‑NW. As zonas de
Bacia Brusque envolveu a erosã o de fontes cisalhamento de baixo â ngulo evoluı́ram
regionais, com destaque para as rochas pale‑ com o incremento do espessamento crustal
oproterozoicas do Complexo Camboriú e ar‑ para zonas oblı́quas durante a formaçã o da
queanas do Complexo Granulı́tico de Santa S2 e, inalmente para as zonas transcorren‑
Catarina, que dominam o cená rio do Crá ton tes de escala litosfé rica durante a fase D3 as‑
Luis Alvez. As idades mesoproterozó icas sã o sociada com processos de escape tectô nico
reconhecidas mais ao norte, nos estados do (Passarelli et al., 2010). As zonas de cisalha‑
Paraná e Sã o Paulo (Complexo Embu, Cam‑ mento Itajaı́‑Perimbó e Major Gercino repre‑
panha et al., 2019), e també m na porçã o su‑ sentam as principais estruturas deste
doeste da Africa, como embasamento dos perı́odo e provavelmente sã o responsá veis
cinturõ es Kaoko, Gariep e Saldania (Basei et pela atual forma alongada do CDF, adquirida
al. 2008a). no está gio pó s‑colisional do Ciclo Brasilia‑
A zonaçã o metamó r ica do CB resul‑ no.
Figura 5 ‒ Modelo das fases de preenchimento da bacia preté rita do CB: A) Preenchimento por sedimentos
deltaicos e plataformais; e B) Vulcanismo extensional submarino e sedimentaçã o quı́mica associada.
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ciê ncias, UFRGS.
1
Centro de Engenharias, Universidade Federal de Pelotas
2
Instituto de Geociê ncias, Universidade Federal do Rio Grande do Sul
3
Escola de Minas, Universidade Federal de Ouro Preto
1 INTRODUÇÃO
Quando Haü y criou o nome “eclogito”, que signi ica rocha selecionada ou escolhida, em
1822, ele estava impressionado pela cor verde‑rosa da rocha e pela peculiaridade de sua associ‑
açã o mineral. Ele nã o percebeu que esta rocha provaria ser uma rocha “escolhida” em mais de
um sentido. De fato, nos ú ltimos dois sé culos, a rocha eclogı́tica contribuiu, para o surgimento
de vá rios conceitos importantes em metamor ismo e para um melhor entendimento sobre os
processos geodinâ micos da evoluçã o da crosta terrestre (Godard, 2000; O’Brien, 2018).
Somente cerca de um sé culo, apó s sua descriçã o, Eskola (1920), atravé s de estudos ex‑
perimentais, de iniu a fá cies metamó r ica eclogito, relacionada a condiçõ es de altas pressõ es
(>1,0 GPa). Eclogito, stricto sensu, é uma rocha má ica, consistindo, essencialmente, de granada e
de clinopiroxê nio onfacı́tico (Coleman et al., 1965). Cerca de 50 anos, apó s a de iniçã o da fá cies
eclogito, e com o desenvolvimento da Teoria da Tectô nica de Placas, surgiram as primeiras in‑
terpretaçõ es da transiçã o de um metabasito (d = 2,9 g/cm3) para eclogito (d = 3,2 g/cm3 a 4,0 g/
cm3), causada por subducçã o da crosta oceâ nica (Ringwood & Green, 1966).
Um amplo espectro de reaçõ es metamó r icas faz com que as rochas se tornem mais
densas em zonas de subducçã o. Nas altas temperaturas encontradas nesses ambientes conver‑
gentes, a transformaçã o de rochas basá lticas em eclogito envolve desestabilizaçã o do plagioclá ‑
sio, adiçã o de Na2O no clinopiroxê nio e formaçã o de granada (Fig. 1). O desaparecimento do
plagioclá sio é menos de inido e depende mais da composiçã o da rocha (Hacker, 1996).
Contribuições à Geologia do Rio Grande do Sul e de Santa Catarina
Figura 1 ‒ Fá cies metamó r icas e reaçõ es, pertinentes à formaçã o de eclogito (Hacker, 1996). Os nú meros de
trê s e de dois dı́gitos para cada fá cies indicam densidade (g/cm3) e conteú do de H2O (% em peso),
respectivamente, calculados usando o modelo NCMASH, de Peacock (1993).
Eclogito é uma rocha tı́pica de alta (p. ex., Heilbron et al., 2004; Basei et al.,
pressã o, produzida por processos geodinâ ‑ 2018). A evoluçã o do Oró geno Brasiliano no
micos, relacionados à subducçã o da crosta Neoproterozoico, associada à subducçã o da
oceâ nica e à formaçã o de supercontinentes crosta oceâ nica, está registrada em arcos in‑
(Carswell & Zhang, 1999; Massone & Li, traoceâ nicos tonianos, incluindo o Arco de
2020). Os eclogitos ocorrem em oró genos Goiá s (Pimentel & Fuck, 1992), os arcos Ser‑
colisionais (Massone, 2012; Chaves & Por‑ ra da Prata e Rio Negro, no Cinturã o Ribeira
cher, 2020), que podem ser formados pela (Salgado et al., 2020), e o Terreno Sã o Gabri‑
colisã o de continente com continente ou de el, no Cinturã o Dom Feliciano (Cerva‑Alves
arcos de ilhas com continentes ou, ainda, en‑ et al., 2020). A evoluçã o destes regimes le‑
tre arcos de ilhas, ocorrendo os mais espeta‑ vou à colisã o continente‑continente, compa‑
culares exemplos atuais nos Alpes e nos rá vel aos processos alpino‑himalaianos
Himalaias (O’Brien, 2018). (Silva et al., 2005; Brito Neves et al., 2014;
No caso do Brasil, regimes tectô ni‑ Basei et al., 2018). Apesar do ambiente
cos, relacionados à subducçã o, foram sugeri‑ tectô nico favorá vel, nenhum eclogito foi do‑
dos para a construçã o do Oró geno Brasiliano cumentado no perı́odo Toniano do Oró geno
Evolução Toniana do Eclogito Três Vendas no contexto do Arco Passinho ‑ Terreno São Gabriel 79
Contribuições à Geologia do Rio Grande do Sul e de Santa Catarina
nescentes de complexos o iolı́ticos, dois arcos por dioritos, por tonalitos e por granodiori‑
neoproterozoicos (Passinho (890‑860 Ma) e tos, que pertencem aos Gnaisses Cambaı,
Sã o Gabriel (758‑700 Ma), sequê ncias meta‑ com idade de cristalizaçã o ı́gnea de 758‑
vulcanossedimentares, metassedimentares e 700 Ma (U‑Pb (LA‑ICP‑MS e SHRIMP))
granitos pó s‑tectô nicos ediacaranos (Babins‑ (Hartmann et al., 2011; Vedana et al., 2018;
ki et al., 1996; Saalmann et al., 2005, 2011; Cerva‑Alves et al., 2020). A sequê ncia Cam‑
Hartmann et al., 2011; Cerva‑Alves et al., baı́ inclui as suı́tes Lagoa da Meia Lua, San‑
2020). ga do Jobim e Vila Nova (Hartmann et al.,
Relictos da crosta oceâ nica foram im‑ 2011), que pertencem ao Arco Sã o Gabriel.
bricados tectonicamente e encaixados no As composiçõ es Sr‑Nd, com correçã o de
Terreno Sã o Gabriel e sã o representados por, idade das rochas Imbicuı́ e Cambaı́, revelam
pelo menos, seis relictos o iolı́ticos, denomi‑ a natureza juvenil dos magmas (Babinski et
nados Cerro Mantiqueiras, Ibaré , Palma, Bos‑ al., 1996; Saalmann et al., 2005).
soroca (Formaçã o Arroio Lajeadinho), A porçã o supracrustal do arco é re‑
Cambaizinho e Passo do Ivo. As aná lises de presentada pelas sucessõ es metavulcanos‑
cristalizaçã o de zircã o U‑Pb (Arena et al., sedimentares Cambaizinho, Passo Feio,
2016, 2017; Hartmann et al., 2019) de rochas Marmeleiro e Cerro Batovi, associadas a ro‑
metassomá ticas e plagiogranitos dos siste‑ chas o iolı́ticas (Philipp et al., 2018), e pelos
mas o iolı́ticos do Terreno Sã o Gabriel mos‑ metassedimentos do Complexo Pontas do
tram duas idades distintas: 923‑892 Ma e Salso (Vedana et al., 2018). As idades dos
726‑722 Ma. zircõ es detrı́ticos das rochas metassedi‑
A infraestrutura do arco inclui duas mentares do O iolito Cambaizinho apresen‑
associaçõ es DTTG (diorito, tonalito, trondhje‑ tam picos entre 817 Ma e 650 Ma, com ɛHf
mito e granodiorito), designadas Imbicuı́ e positivo, apoiando a con iguraçã o de dois
Cambaı́ (Philipp et al., 2018), que fazem parte arcos magmá ticos (Cerva‑Alves et al.,
do Complexo Cambaı́ (Hartmann et al., 2011, 2020). A associaçã o vulcanossedimentar
2019). A associaçã o Imbicuı́ faz parte do Arco Camaquã e os granitos associados se forma‑
Passinho e inclui gnaisses, que apresentam ram entre 610 Ma e 540 Ma e sã o represen‑
composiçõ es toleiı́ticas a cá lcio‑alcalinas de tados por uma bacia tipo foreland e por
baixo‑K e gnaisse diorı́tico. Essas rochas re‑ granitos, relacionados aos está gios tardios a
gistram idades de zircã o de 879 ±14 (U‑Pb pó s‑orogê nicos do evento Dom Feliciano.
(SHRIMP)) (Leite et al., 1998), de 890 ±9 Ma Este estudo se concentra na regiã o
e de 885 ±3 Ma (U‑Pb (LA‑ICP‑MS)) (Philipp adjacente ao O iolito Cerro Mantiqueiras, no
et al., 2018). A assembleia plagioclá sio + extremo sul do Terreno Sã o Gabriel, com
hornblenda + diopsı́dio de alto grau do gnais‑ ê nfase no eclogito Trê s Vendas. Um mapa
se Imbicuı́ re lete o metamor ismo de fá cies geoló gico da regiã o estudada, modi icado
an ibolito mé dio a superior de baixo P, que é de Philipp et al. (2018), é mostrado na Figu‑
interpretado como um evento metamó r ico ra 2C.
regional, ocorrido em 890 Ma (Philipp et al.,
2018). Esta assembleia foi alterada por um 3 ASPECTOS DE CAMPO
evento de fá cies xisto verde a an ibolito infe‑
rior, caracterizado por epidoto + actinolita / O Eclogito Trê s Vendas ocorre como
hornblenda + clorita + muscovita. corpos em forma de lentes, de cor escura
Os Gnaisses Imbicuı sã o intrudidos (Fig. 3A) e em contato com as rochas milo‑
Evolução Toniana do Eclogito Três Vendas no contexto do Arco Passinho ‑ Terreno São Gabriel 81
Contribuições à Geologia do Rio Grande do Sul e de Santa Catarina
Clinopiroxê nio é ané drico a subé dri‑ frequentemente, como inclusõ es em grana‑
co e é encontrado em simplectitos e, menos da. A composiçã o tem um nú mero de mag‑
né sio (Mg #) de 77 e plota no campo do di‑ zircã o resultaram em 910 ±5 Ma (MSWD
opsı́dio; augita també m está presente, mas é 0,41), com razõ es Th/U variando de 0,6 a 1,0,
menos comum. Onfacita é encontrada mais interpretada como a idade magmá tica, corres‑
raramente, mas ocorre, tanto em simplectitos pondendo, aproximadamente, à idade do
como em inclusõ es, e conté m 20‑50% de Jd Gnaisse Imbicuı́ e pró xima à do O iolito Cerro
(Fig. 4B). Mantiqueiras. Bordas metamó r icas foram da‑
O rutilo (Fig. 3C) tem cor castanho‑ tadas em 892 ±8 Ma (MSWD 1,15), com ra‑
dourada e está presente como prismas cur‑ zõ es Th/U de 0,2 a 0,4 (Pinto et al., 2021). Há
tos subarredondados, com comprimento de pouco tempo, era consenso que zircõ es meta‑
10‑150 μm, que sã o circundados por titanita mó r icos tinham razõ es Th/U abaixo de 0,1
incolor. (p. ex., Hoskin & Black, 2000; Rubatto, 2017).
As aná lises de microssonda eletrô ni‑ Baseado em robusta compilaçã o de aná lises
ca das amostras VYB, VYN e VYA do eclogito de zircõ es da Austrá lia Ocidental (>1330 aná ‑
Trê s Vendas, representativas de minerais es‑ lises de zircõ es metamó r icos e >5000 aná li‑
senciais (granada e clinopiroxê nio), sã o apre‑ ses de zircõ es ı́gneos), é mais apropriado
sentadas na Tabela 1. dizer que o zircã o ı́gneo raramente tem Th/U
<0,1 e que o zircã o metamó r ico pode ter va‑
lores, que variam de 0,01 a <10 (Yakymchuk
5 GEOQUÍMICA DE ROCHA TOTAL
et al., 2018).
Amostras representativas do Eclogito Dezessete aná lises de spots de Lu‑Hf
Trê s Vendas foram selecionadas, para aná li‑ foram obtidas em 16 grã os. Todas as composi‑
ses geoquı́micas de rocha total, e correspon‑ çõ es εHf com correçã o de idade de zircã o vari‑
dem à s seçõ es delgadas, estudadas com am entre +4 e +10, consistente com
microssonda eletrô nica. subducçã o em um cená rio de arco de ilha ju‑
Os eclogitos plotam no campo do ba‑ venil.
salto, no diagrama TAS (Fig. 4C) (Le Bas et al.,
1986) e tê m Mg #, em torno de 50. Eles sã o 7 EVOLUÇÃO P‑T
relativamente pobres em á lcalis (Na2O + K2O
= 1,8‑2,5% em peso), contê m 50,6‑51% em Pseudossecçõ es foram calculadas na
peso de SiO2, 8‑9% em peso de MgO, 10,8‑ amostra VYB, em condiçõ es de T e de P entre
12,2% em peso de FeO e 0,9‑1% em peso de 400 °C e 800 °C e 3‑20 kbar, respectivamente.
TiO2. Essas caracterı́sticas sã o tı́picas de uma O software utilizado foi o Perple X 6.8.6 (Con‑
sé rie toleı́tica. Suas caracterı́sticas Zr‑Y e Zr‑ nolly, 2009), no sistema Na‑K‑Ca‑Fe‑Mg‑Mn‑
Ti sã o consistentes com a inidade de basalto Ti‑Al‑Si‑OH, usando o banco de dados termo‑
de arco de ilha (Fig. 4D). dinâ mico Thermocalc 6.2 (Holland & Powell,
2011). Os modelos de soluçã o adotados segui‑
ram Massonne (2012), adicionando 5% de
6 DADOS DE U‑Pb EM ZIRCÃO E COM‑
H2O, para modelar as reaçõ es progressivas de
POSIÇÃO DE ISÓTOPOS DE Hf IN SITU
formaçã o de granada, e 0,135% (peso) de O2,
Os cristais de zircã o sã o subé dricos a para permitir que 10% do Fe presente em
eué dricos, com formas prismá ticas e com VYB seja trivalente. O resultado é mostrado na
comprimentos de 100‑250 μm. Seus nú cleos Figura 5, juntamente com a trajetó ria P‑T, infe‑
geralmente exibem zoneamento oscilató rio, rida com base na integraçã o de dados de mi‑
cercado por bordas, que exibem brilho uni‑ crossonda eletrô nica, de modelagem e de
forme em catodoluminescê ncia. Os dados de geotermobarometria, discutidos abaixo e de‑
Evolução Toniana do Eclogito Três Vendas no contexto do Arco Passinho ‑ Terreno São Gabriel 83
Contribuições à Geologia do Rio Grande do Sul e de Santa Catarina
Tabela 1 ‒ Aná lises de microssonda eletrô nica, representativas de granada e de piroxê nio do Eclogito Trê s
Vendas. Abreviaçõ es: nd=nã o detectado; incl.=inclusã o; simpl.=simplectito; aFerro total; Alm=almandina;
Prp=piropo; Grs=grossulá ria; Sps=espessartita; Jd=jadeı́ta; Ac=acmita; Ag=augita.
Figura 3 ‒ (A) Tı́pico a loramento do eclogito Trê s Vendas; (B) Amostra do eclogito Trê s Vendas, com
por iroblastos de granadas; (C) Representativo eclogito, sob microscó pio em luz plana polarizada, mostrando
agregados de rutilo (Rt) e de ilmenita/magnetita (Ilm/Mt), ao lado de granada (grt) e de hornblenda (Hbl),
circundados por simplectitos (sym), de granulaçã o ina; e (D) Grande concentraçã o de granada (garnetito), sob
microscó pio. Imagens em MEV: (E) Por iroblasto de granada (note a borda, de coloraçã o mais escura do que o
nú cleo), simplectitos e rutilo na matriz e incluso na granada; (F) Detalhe de inclusõ es de onfacita (Omp) e de
outros minerais na granada; (H) Per il e (G) mapa composicional de Mg em por iroblasto de granada. Todas as
abreviaçõ es de minerais deste capı́tulo seguiram Whitney & Evans (2010).
Evolução Toniana do Eclogito Três Vendas no contexto do Arco Passinho ‑ Terreno São Gabriel 85
Contribuições à Geologia do Rio Grande do Sul e de Santa Catarina
Figura 4 ‒ Composiçõ es minerais, medidas com microssonda eletrô nica, e aná lises quı́micas de rocha total nas
amostras VYN, VYA e VYB do eclogito Trê s Vendas: (A) Diagrama terná rio de granada, mostrando os grupos de
eclogito de Coleman et al. (1965); (B) Diagrama terná rio de classi icaçã o do clinopiroxê nio (Droop, 1987;
Matsumoto, 1988); (C) Diagrama de classi icaçã o de rocha TAS (Le Bas et al., 1986); e (D) Diagrama de
ambiente geotectô nico Zr‑Zr/Y (Pearce & Norry, 1979).
pressõ es de 7,7‑8,3 kbar. Pares de tremolita‑ rocha eclogı́tica de idade Toniana datada no
plagioclá sio indicam equilı́brio, em torno de Oró geno Brasiliano. A idade magmá tica é
500‑550 °C e de ~4,5 kbar (Anderson, consistente com a Orogenia do Passinho, do
1996). Terreno Sã o Gabriel, incluindo o arco de ilha
Os está gios regressivos inais envol‑ do Passinho (890 Ma) e o O iolito Cerro
veram a formaçã o de bordas de biotita, ao Mantiqueiras (923 Ma).
redor da granada, em algumas seçõ es (VYB), Os dados geocronoló gicos e isotó pi‑
e, inalmente, a alteraçã o da biotita em pic‑ cos apoiam a interpretaçã o do eclogito, rela‑
noclorita e em ripidolita, o que re lete as cionada ao magmatismo juvenil,
condiçõ es cada vez mais hidratadas. especialmente, os dados isotó picos Hf em
zircã o, assim como o modelo TDM, com ida‑
8 DISCUSSÃO des para extraçã o do manto, variando de 0,9
Ga a 1,22 Ga (Hf TDM), muito pró ximas à
Os cristais magmá ticos de zircã o do idade de cristalizaçã o U‑Pb (ca. 910 Ma) e
eclogito Trê s Vendas fornecem uma idade aos altos valores positivos de εHf (t) (+4,0 a
concordia de 910 ±5 Ma. Esta é a primeira +9,8).
8. 1 Con iguração geodinâmica e impli‑ iniciou bem antes de 879 Ma, nas porçõ es
cações para a estrutura geotectônica meridionais do oró geno, em que esta fase
regional está associada à obduçã o do Arco Sã o Gabri‑
el e à exumaçã o do Arco Passinho.
A combinaçã o dos dados do Eclogito
Trê s Vendas é consistente com uma posiçã o, 8. 2 Implicações tectônicas
associada ao Arco Passinho, situado no pro‑
to‑oceano Adamastor (Hartmann et al., A formaçã o de eclogito é um fator‑
2019), també m denominado oceano Charrua chave nos oró genos, que constroem conti‑
(Philipp et al., 2018) ou, possivelmente, no nentes, por meio da coleta de material das
assoalho oceâ nico subductado (Fig. 6a). A bacias oceâ nicas e da construçã o de arcos de
subducçã o das rochas má icas, formadas a ilhas em zonas de subducçã o (Massone & Li,
910 ±5 Ma, a profundidades mı́nimas de 45‑ 2020). Os arcos de ilhas sã o o principal local
51 km (≥ 15‑17 kbar), foi seguida por exu‑ de produçã o da crosta continental juvenil na
maçã o rá pida, com temperaturas má ximas formaçã o da crosta terrestre e podem per‑
registradas de 710‑760 °C, em direçã o a pro‑ sistir de 50 Ma a >300 Ma (Condie, 2007).
fundidades de ~24 km (8 kbar), que é pene‑ O Eclogito Trê s Vendas no Terreno
contemporâ neo à s bordas de zircã o, datadas Sã o Gabriel, no Cinturã o Dom Feliciano, é
em 892 ±8 Ma (Fig. 6B). As condiçõ es de pi‑ uma associaçã o de rochas fundamental for‑
co de temperatura indicam gradientes geo‑ mada no inı́cio da fragmentaçã o do Rodı́nia e
té rmicos acima de 30 °C/km, consistentes da formaçã o do Gondwana durante a evolu‑
com um terreno juvenil, relativamente quen‑ çã o Neoproterozoica do Oró geno Brasiliano.
te, a moderadamente juvenil, o que é corro‑ Este foco em processos de cerca de 900 Ma é
borado pelos valores iniciais εHf de +4 a signi icativo (ver Arena et al., 2016, 2017;
+10. Hartmann et al., 2019; Santiago et al., 2020),
O principal processo retrogressivo é porque a fragmentaçã o do Rodı́nia é comu‑
caracterizado pelos aumentos de fO2 e de mente datada em perı́odo posterior, entre
aH2O e pela presença de simplectitos, com‑ 800‑700 Ma (Oriolo et al., 2017).
postos por an ibó lio e por plagioclá sio, subs‑ O inı́cio do Terreno Sã o Gabriel, de‑
tituindo granada, titanita ou ilmenita, e de nominado Oró geno Passinho, compreende
clinozoisita, substituindo rutilo e clinopiro‑ fragmentos de crosta oceâ nica, incluindo os
xê nio, respectivamente, indicativos de fá cies cerros Mantiqueiras e Bossoroca, parte do
an ibolito. Um evento retrogressivo de fá cies O iolito Ibaré (923‑892 Ma) (Arena et al.,
xisto verde superior em está gio avançado, é 2016, 2017), o Eclogito Trê s Vendas (910‑
documentado por clorita e por tremolita, 892 Ma) e o arco intraoceâ nico juvenil (~
substituindo biotita e hornblenda (Fig. 6C). 890 Ma) (Philipp et al., 2018). Posteriormen‑
Nossas idades de zircã o indicam que te, o Arco Passinho colidiu com o Crá ton Rio
o metamor ismo da temperatura de pico na de La Plata (um fragmento de Rodı́nia),
Orogenia Passinho coincidiu com o principal constituindo uma con iguraçã o signi icativa
evento metamó r ico regional, em 890 Ma (p. do Oró geno Brasiliano primitivo (Fig. 6B).
ex., Philipp et al., 2018), e com a obduçã o do Outros arcos intraoceâ nicos juvenis,
O iolito Ibaré no Terreno Sã o Gabriel, em de idade Toniana, sã o registrados no Oró ge‑
892 ±3 Ma (Arena et al., 2016). A prevalê ncia no Brasiliano, incluindo o Arco de Goiá s
dessa idade de 890 Ma sugere que a primei‑ (900‑862 Ma), na Faixa Brası́lia (Pimentel &
ra grande fase do ciclo orogê nico Brasiliano Fuck, 1992), e os arcos Serra da Prata (856‑
Evolução Toniana do Eclogito Três Vendas no contexto do Arco Passinho ‑ Terreno São Gabriel 87
Contribuições à Geologia do Rio Grande do Sul e de Santa Catarina
Figura 5 ‒ Pseudossecçã o dos eclogitos Trê s Vendas (a seta indica a trajetó ria de PT, estimada com base nos
resultados de modelagem e de geotermobarometria citados no texto): (A) Nú cleo de granada modelado; (B)
Jadeı́ta em onfacita; (C) Bordas de granadas modeladas e inclusõ es de hornblenda em granada; (D)
Geotermobarometria de hornblenda‑plagioclá sio; e (E) Geotermobarometria de tremolita‑plagioclá sio.
838 Ma) e Rio Negro (ca. 790 Ma), no Cintu‑ Cerva‑Alves et al. (2020), que sustentam
rã o Ribeira (Peixoto et al., 2017). Assim, os que o Arco Passinho, no Cinturã o Dom Feli‑
resultados aqui apresentados corroboram ciano, está correlacionado aos demais arcos
Figura 6 ‒ (A) Posiçã o do eclogito Trê s Vendas, dentro do oceano proto‑Adamastor há 910 Ma; (B) Per il,
mostrando o inı́cio da primeira orogenia Brasiliano, em 892 Ma, no limite sul do Oró geno; e (C) Resumo da
evoluçã o metamó r ica do Eclogito Trê s Vendas modi icado apó s Pinto et al. (2021, submetido).
intraoceâ nicos tonianos brasileiros. magmá tica ~20 Ma mais antiga do que os
gnaisses Imbicuı́ (890 Ma), encaixantes. As
9 CONCLUSÃO composiçõ es εHf de zircã o entre +4 e +10
destacam a natureza juvenil das fontes mag‑
Os cristais de zircã o no Eclogito má ticas. A idade U‑Pb das bordas de zircã o
Trê s Vendas foram datados em 910 ±5 Ma metamó r ico indica que o pico de metamor‑
(zircã o U‑Pb (LA‑ICP‑MS)) e registram idade ismo ocorreu em 892 ±8 Ma. A onfacita, que
Evolução Toniana do Eclogito Três Vendas no contexto do Arco Passinho ‑ Terreno São Gabriel 89
Contribuições à Geologia do Rio Grande do Sul e de Santa Catarina
conté m, até , 50% de jadeı́ta, re lete o soterra‑ Brito Neves, B. B., Fuck, R. A. & Pimentel, M.
mento em >45 km. O soterramento ocorreu M. 2014. The Brasiliano collage in South
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temperatura, em torno de 710‑760 °C. Os da‑ graphic characteristics and metamorphic
dos combinados indicam que o Eclogito Trê s evolution of ultrahigh‑pressure eclogites in
Vendas pertence ao Arco Passinho e revelam plate‑collision belts. International Geology
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que este arco se originou mais cedo do que
descrito, anteriormente. Os dados do primei‑ Cerva‑Alves, T., Hartmann, L. A., Remus, M. V.
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1
Instituto de Geociê ncias, Universidade Federal do Rio Grande do Sul
2
Centro de Engenharia, Engenharia Geoló gica, Universidade Federal de Pelotas
1 INTRODUÇÃO
A crosta oceâ nica e o manto superior do proto‑Oceano Adamastor estã o preservados em
fragmentos de o iolitos, no Escudo Sul‑Rio‑Grandense. O iolitos sã o associaçõ es de rochas má i‑
cas (basalto, gabro), ultramá icas (peridotito, serpentinito) e sedimentares (chert, lamito, silti‑
to), interpretadas como fragmentos da crosta oceâ nica e do manto superior, retidos em arco de
ilhas oceâ nico e na margem continental ativa, durante a subduçã o e a colisã o orogê nica. A gera‑
çã o de o iolitos do tipo Fanerozoico iniciou no Toniano, mas, em outros oró genos, há o iolitos
datados da Era Neoproterozoica, que é dividida em Toniano (1000‑720 Ma), em Criogeniano
(720‑635 Ma) e em Ediacarano (635‑539 Ma).
No Rio Grande do Sul, dezenas de o iolitos ocorrem no Terreno Sã o Gabriel e alguns es‑
tã o presentes no cinturã o de dobras e de falhas Porongos e em septos desse cinturã o, no Bató li‑
to Pelotas. No terreno, ocorrem os o iolitos Cerro Mantiqueiras, Ibaré , Palma, Palma Leste, Passo
do Ivo, Cambaizinho, Bossoroca e Passo Feio (em parte) (Ribeiro & Fantinel, 1978; Szubert,
1978; Hartmann & Chemale, 2003; Arena et al., 2016; Hartmann et al., 2019; Cerva‑Alves et al.,
2020). No cinturã o, estã o contidos os o iolitos Capané e Candiotinha (Arena et al., 2018; Werle
et al., 2020) e, em septo desse cinturã o, ocorre o o iolito Arroio Grande (Ramos et al., 2020), en‑
quanto o Cinturã o Dom Feliciano (Fig. 1) apresenta inserçõ es de o iolitos em todos os ambientes
geoló gicos (Fernandes et al., 1995; Philipp et al., 2016; Hueck et al., 2018).
O Terreno Sã o Gabriel (Fig. 2) foi designado, inicialmente, como ‘Bloco’, por Jost & Hart‑
mann (1984), e separado do Bató lito Pelotas (‘Bloco’), com base em diferenças geoló gicas. O
acesso à geocronologia U‑Pb de zircã o possibilitou a determinaçã o da idade toniana (737 Ma)
Contribuições à Geologia do Rio Grande do Sul e de Santa Catarina
Figura 1 ‑ (a) Posicionamento do Terreno Sã o Gabriel na con iguraçã o simpli icada do supercontinente
Gondwana, em 530 Ma, com indicaçã o dos crá tons e dos cinturõ es orogê nicos neoproterozoicos; (b) Cinturã o
Dom Feliciano; (c) Mapa geoló gico da regiã o oeste do Escudo Sul‑Rio‑Grandense, com indicaçã o dos o iolitos
descritos (modi icado de Cerva‑Alves et al., 2020); (d) Distribuiçã o das idades U‑Pb em zircã o, no Terreno Sã o
Gabriel (Arena et al., 2017) (quiescê ncia tectô nica de 50 Ma entre as orogê neses); (e) Estrutura do Terreno Sã o
Gabriel (seçã o esquemá tica entre as cidades de Sã o Gabriel (W) e de Caçapava do Sul (E)) (Saalmann et al.,
2006). Legenda: RP = Rio de La Plata Crá ton; Gr. Caç. = Granito Caçapava; Alto Caç. = Alto de Caçapava; Proteroz.
= Proterozoico; Pré ‑Cambr. = Pré ‑Cambriano; S. Gabriel = Sã o Gabriel; Cryog. = Cryogeniano.
para a Formaçã o Campestre (Grupo Vacacaı́), serçã o no arco de ilhas e até a obduçã o do
hospedeira do o iolito Bossoroca (Machado conjunto oceâ nico sobre o crá ton. A desco‑
et al., 1990), refutando a hipó tese de idade berta de zircã o em turmalinitos, contidos em
arqueana, imaginada, anteriormente, para o cloritito e em blackwall de rodingito (ambos,
O iolito Cerro do Ouro e para as rochas hos‑ dentro de serpentinito), possibilitou a carac‑
pedeiras (Fragoso‑Cesar, 1980; Jost & Hart‑ terizaçã o do zircã o (U/Yb <0,1) incluso na
mann, 1984). As caracterı́sticas juvenis do turmalina (δ11B = 0 a +6) como sendo de
Terreno Sã o Gabriel foram identi icadas por crosta oceâ nica, formada há 920 Ma e altera‑
Babinski et al. (1996) e avaliadas por Che‑ da, até 715 Ma (Arena et al., 2016, 2018,
male Jr. (2000). Zircã o (e rutilo) de crosta 2020; Hartmann et al., 2019; Werle et al.,
oceâ nica – albitito, xistos magnesianos e me‑ 2020). Como resultado, a fase acrescioná ria
tassomatitos (turmalinito, rodingito, cloriti‑ do Oró geno Brasiliano está caracterizada,
to) – e de arcos ‒ foram datados no desde o Toniano, até o inı́cio do Criogenia‑
Toniano‑Criogeniano por SHRIMP e por LA‑ no.
ICPMS, por Arena et al. (2016, 2017, 2018), Apresentamos, neste capı́tulo, os re‑
por Hartmann et al. (2019) e por Cerva‑Al‑ sultados geoló gicos, petrográ icos, geoquı́‑
ves et al. (2020). Algumas caracterı́sticas dos micos (rocha total, minerais) e isotó picos
o iolitos estã o referidas na Tabela 1. As ida‑ (U‑Pb em zircã o e em rutilo, B em turmalina)
des principais dos o iolitos sã o 923 Ma, 786 obtidos nos o iolitos, principalmente, nos
Ma e 715 Ma, relativas ao percurso, que vai metassomatitos, associados a serpentinitos.
da cadeia meso‑Oceano Adamastor, até a in‑ Indicamos a loramentos em vá rios o iolitos,
Tabela 1‑ Estratigra ia e geotectô nica do Terreno Sã o Gabriel (arco de ilhas + o iolitos obductados) e unidades
associadas, com exemplos e com idades aproximadas. O iolitos do cinturã o de dobras e de falhas Porongos sã o
mencionados.
Figura 2 ‑ (a) Distribuiçã o da amplitude do sinal analı́tico no Escudo Sul‑Rio‑Grandense e nas á reas do
entorno. Os limites do escudo sã o indicados pela linha branca e algumas falhas, pela linha preta (modi icado de
Hartmann et al., 2016); (b) Distribuiçã o terná ria do sinal gama RGB no escudo (K%, eTh e eU) (modi icado de
Hartmann et al., 2016); (c) Modelo de evoluçã o geotectô nica do Terreno Sã o Gabriel (Cerva‑Alves et al., 2020);
(d) Mapa geoló gico do o iolito Bossoroca (Wildner et al., 2013; Gubert et al., 2016); (e) Distribuiçã o terná ria do
sinal gama RGB na regiã o oeste do escudo (K%, eTh e eU); (f) Distribuiçã o do sinal gamaespectromé trico total
na regiã o oeste do escudo.
ais (Goñ i, 1962) foram caracterizadas, poste‑ Imbicuı́ e Complexo Cambaı́. A rocha tem on‑
riormente, com mú ltiplas té cnicas (Leite et facita (aná lises de microssonda eletrô nica) e
al., 1998). Aná lises U‑Pb de zircã o, por SH‑ zircã o, datados em 900 Ma, e uma pseudose‑
RIMP, realizadas na Austrá lia, identi icaram çã o, de inindo pressã o de 16 kbar, em tempe‑
o diorito Passinho, de 890 Ma, atualmente ratura de 700 C (Pinto et al., 2020). O
reconhecido como parte do Arco Passinho principal a loramento é visitado na excursã o.
(Saalmann et al., 2006), etapa inicial da
construçã o do Terreno Sã o Gabriel. Os gnais‑ 5 O OFIOLITO IBARÉ
ses Imbicuı́ (Complexo Cambaı́) fazem parte
do arco. As principais idades magmá ticas do O o iolito Ibaré tem metaserpentini‑
complexo foram estabelecidas em 780 Ma e to, em fá cies an ibolito inferior (olivina + tal‑
em 733 Ma, estendendo‑se até 700 Ma co + clorita, com textura caraguatá ‒
(Hartmann et al., 2011). jackstraw), mesclado, tectonicamente, com
Estudos adicionais do o iolito, por camadas de andesito, que també m constitu‑
Hartmann & Chemale Jr. (2003), relataram em as encaixantes (Grupo Vacacaı́). O conjun‑
metamor ismo pervasivo, em condiçõ es de to apresenta os granitos Santa Rita e Jaguari
fá cies an ibolito mé dio (olivina + ortopiroxê ‑ no contato, com intenso metamor ismo té r‑
nio + cromita + clorita + tremolita), mas nã o mico. As rochas metassomá ticas sã o numero‑
foram identi icados remanescentes minera‑ sas e variadas – albitito, rodingito, cloritito,
ló gicos manté licos. A idade magmá tica U‑Pb turmalinito (Figs. 6, 7). O o iolito foi obducta‑
SHRIMP de zircã o de albitito (plagiogranito do na base da superestrutura (Arena et al.,
oceâ nico) é de 923 Ma (Arena et al., 2016), e 2016, 2017, 2020).
as bordas dos mesmos cristais revelaram
idade metamó r ica de 786 Ma. O Cr‑espiné ‑ 6 O OFIOLITO CAMBAIZINHO
lio na matriz e como inclusõ es, em ortopiro‑
xê nio e em olivina, tem composiçã o quı́mica O o iolito Cambaizinho está localiza‑
compatı́vel com a cristalizaçã o metamó r ica do na porçã o noroeste do Terreno Sã o Gabri‑
crustal. O o iolito Cerro Mantiqueiras foi ob‑ el. E caracterizado por conter corpos de
ductado na infraestrutura. rochas má icas, ultramá icas e metassedi‑
mentos quı́micos, que se estendem por uma
A loramentos de albitito, contidos
faixa de 11 km, com largura variá vel entre
em harzburgito, sã o visitados na excursã o. A
500 m e 2 km, com direçã o NE‑SW, mergu‑
assembleia mineral de fá cies an ibolito mé ‑
lhando para NW e para SE. Predominam xis‑
dio conté m olivina (preta, serpentinizada) +
tos magnesianos, incluindo talco‑clorita
enstatita (cinza), com 1‑10 cm de tamanho, e
xisto, talco‑tremolita xisto, olivina‑talco xisto,
tem ampla distribuiçã o, nos a loramentos.
sericita xisto e tremolitito. Ocorrem, ainda,
Pequenos blocos de hornblenda (+ clorita)
corpos de serpentinitos, associados a an ibo‑
fels, de origem metassomá tica, com dimen‑
litos e a sedimentos quı́micos. Ocorrê ncias de
sõ es de 10 a 50 cm, sã o comuns no harzbur‑
formaçã o ferrı́fera bandada sã o relatadas por
gito. O harzburgito é um metaserpentinito.
alguns autores (Hartmann & Remus, 2000). A
dataçã o U‑Pb em rutilos amostrados de clori‑
4 O ECLOGITO TRÊS VENDAS ta‑tremolita xisto forneceram uma idade de
O eclogito Trê s Vendas (com an ibo‑ 788 Ma para o metamor ismo de fundo oceâ ‑
lito) ocorre pró ximo ao o iolito Cerro Manti‑ nico (Cerva‑Alves et al., 2020).
queiras (5 km), e faz parte dos gnaisses O o iolito Cambaizinho foi obducta‑
Figura 3 ‑ (a) Foto para oeste do o iolito Palma Leste, inserido no arco de ilhas do Grupo Vacacaı́; (b) (c) Fotos
do o iolito Ibaré , mostrando rochas ultramá icas e turmalinito; (d) Foto para oeste do o iolito Ibaré , mostrando
metaserpentinito, albitito, rodingito e granitos intrusivos, com inserçõ es de amostras de albitito (acima) e de
rodingito na base de arbusto (abaixo); (e) Foto de xisto magnesiano no o iolito Cambaizinho, obductado sobre o
Granito Sanga do Jobim, na regiã o norte do o iolito; (f) Foto de xisto magnesiano (clorita‑tremolita xisto) no
o iolito Cambaizinho, proveniente da amostra 62H da rodovia BR‑290, contendo rutilo; (g) Fotomicrogra ia da
amostra 62H, mostrando rutilo acessó rio, datado em 788 2.6 Ma (U‑Pb) (Cerva‑Alves et al., 2020). Legenda:
Chl = clorita; Rt = rutilo; Tr = tremolita.
do, dentro da infraestrutura do arco juvenil infraestrutura + o iolito foi intrudido por
Sã o Gabriel, durante a subduçã o e o choque granitoides sintectô nicos, com idade de cris‑
entre arco‑de‑ilha e continente. O conjunto talizaçã o em dois pulsos, de 698 Ma e de 673
Evolução de O iolitos do Escudo Sul‑Rio‑Grandense – Roteiro de campo 99
Contribuições à Geologia do Rio Grande do Sul e de Santa Catarina
Figura 4 ‑ (a) Imagem de saté lite de parte do o iolito Cerro Mantiqueiras, mostrando tipos de rochas, inclusive
albitito; (b) Foto de amostra de mã o de harzburgito no o iolito Cerro Mantiqueiras, com forsterita + enstatita, na
fá cies an ibolito mé dio; (c) Foto de mã o de metaserpentinito no o iolito Bossoroca, com forsterita + talco
(textura caraguatá = jackstraw), na fá cies an ibolito inferior; (d) (e) (f) O iolito Bossoroca, mostrando
distribuiçã o de tipos de rochas, fotomicrogra ia com turmalina + clorita e zircã o, incluso em turmalina; (g) (h)
O iolito Bossoroca, mostrando a loramento de cromita‑talco‑magnesita fels e turmalinito com clorita. Legenda:
Chl = clorita; En = enstatita; Fo = forsterita; Ser = serpentina; Tur = turmalina; Zrn = zircã o.
Figura 5 ‑ (a) (b) Fotos do o iolito Cerro Mantiqueiras, mostrando a distribuiçã o dos tipos de rochas e a
ocorrê ncia de albitito (Arena et al., 2016); (c) (d) (e) (f) Fotomicrogra ias e mapas composicionais de Ca e de
Mg, em lâ mina de an ibolito no o iolito Bossoroca (Massuda et al., 2020); (g) Cr‑espiné lio com nú cleo
manté lico no o iolito Capané (imagem de elé trons retroespalhados e de mapa composicional de Cr) (Werle et
al., 2020). Legenda: Ab = albitito; Amph = an ibolito; Cr = cromita; Hz = harzburgito.
Figura 6 ‑ (a) Distribuiçã o composicional de isó topos de B em turmalinas dos o iolitos Bossoroca (A, B) (Werle
et al., 2020) e Ibaré (Arena et al., 2020); (b) Diagrama composicional de Cr‑espiné lios, com dados de o iolitos do
escudo (Werle et al., 2020), nú cleos manté licos, indicados para Cr‑espiné lios, no o iolito Capané ; (c) Diagrama
evolutivo de isó topos de Hf em zircã o do Terreno Sã o Gabriel (evoluçã o da crosta oceâ nica a continental indicada
pela seta curva (Werle et al., 2020). Legenda: CHUR = Reservató rio Uniforme Condrı́tico; CM = Cerro
Mantiqueiras; DM = Manto depletado; FA = Fá cies an ibolito; FGr = Fá cies granulito; FXVi = Fá cies xisto verde
inferior; SSZ = suprasubduçã o.
Ma, obtida pelo mé todo U‑Pb LA‑ICP‑MS, em dimentares da Formaçã o Serrinha (estauroli‑
zircã o (Cerva‑Alves et al., 2000). A loramen‑ ta xisto, granada xisto, paragnaisse e para‑an‑
tos, expondo a intrusã o do granito Sanga do ibolito), metamor izadas nos fá cies
Jobim em serpentinitos do o iolito Cambaizi‑ an ibolito e xisto verde. A Formaçã o Serrinha
nho, podem ser observados no limite norte (Cerva‑Alves, 2020, 2021) é o equivalente
do o iolito. Posteriormente, eventos tectô ni‑ metassedimentar da Formaçã o Cambaizinho,
cos colisionais colocaram lado a lado rochas de Hartmann & Remus (2000), e possui idade
geradas em ambientes diversos (Cerva‑Alves má xima de deposiçã o de 739 Ma, de inida
et al., 2021). Ao longo do limite oeste do o i‑ por dataçã o U‑Pb de zircõ es detrı́ticos (Hart‑
olito, veri icam‑se intercalaçõ es entre corpos mann et al., 2011; Cerva‑Alves et al., 2021),
o iolı́ticos desmembrados e rochas metasse‑ sendo mais jovem do que o o iolito.
O nome “Cambaizinho” está restrito cada na porçã o sul do o iolito. A dravita pos‑
à s rochas má icas e ultramá icas do O iolito sui δ11B = +2,50‰ e indica que a formaçã o
Cambaizinho (Cerva‑Alves et al., 2020). A les‑ dessas rochas se deu em ambiente oceâ nico,
te do corpo o iolı́tico principal, ocorrem mé‑ com in luê ncia de sedimentos marinhos ter‑
langes o iolı́ticas, em meio a ortognaisses e a rı́genos (Werle et al., 2020). O o iolito Bosso‑
paragnaisses indiferenciados do Complexo roca foi obductado na base da
Cambaı́. Os o iolitos e as rochas encaixantes superestrutura.
sã o cortadas por diques de riolitos, associa‑
dos a atividades magmá ticas relacionadas à 8 ROTEIRO DE CAMPO
Bacia do Camaquã , Formaçã o Acampamento
Velho e diques de diabá sio, mais jovens. 8. 1 Primeiro dia
Figura 7 ‑ (a) Mapa composicional de Fe e de cristal de turmalina do turmalinito A, no o iolito Bossoroca (trê s
zonas tê m composiçõ es diferentes); (b) Composiçã o de zircã o de rochas metassomá ticas dos o iolitos,
indicando ambiente oceâ nico; (c) Cristal de zircã o do albitito no o iolito Cerro Mantiqueiras, com nú cleo
magmá tico e com borda metamó r ica; (d) Cristal de zircã o homogê neo de albitito no o iolito Ibaré (Arena et
al., 2016); (e) Grá ico composicional de an ibó lios do o iolito Bossoroca, da infraestrutura e da superestrutura
(Massuda et al., 2020); (f) (g) Diagramas composicionais de an ibolitos no o iolito Cerro Mantiqueiras e de
andesitos no o iolito Ibaré , indicando protó litos de basalto e de andesito, alé m de um ambiente geotectô nico
distinto para os dois o iolitos – MORB e arco de ilhas. Legenda: Ig = evento ı́gneo; M1 e M2 = eventos
metamó r icos 1 e 2; c = nú cleo; r = borda.
estrada. Sã o veri icadas as relaçõ es tectô ni‑ guatá , no fá cies an ibolito inferior).
cas entre o xisto ultramá ico sobrejacente Parada 12 (30°19'28,49"S,
(de textura caraguatá ) e o Granito Sanga do 53°44'31,19"W). Visita ao meta‑andesito da
Jobim subjacente (datados, por U‑Pb em zir‑ Formaçã o Campestre, no Grupo Vacacaı́ (U‑
cã o, em 698,9 ±4,2 Ma e em 673,9 ±6. 8 Ma, Pb em zircã o de 833 Ma, segundo Hartmann
de acordo com Cerva‑Alves et al., 2020). As et al., 2020). Mineralogia, mapas composici‑
relaçõ es de campo indicam que o xisto ultra‑ onais e geoquı́mica de rocha sã o apresenta‑
má ico foi empurrado sobre o granito, tendo dos por Massuda et al. (2020),
sido estabelecida uma idade de empurrã o de correspondentes à superestrutura do arco
673 Ma, semelhante à idade da colisã o esta‑ de ilhas.
belecida para os granitos no Bató lito Pelo‑ 18h ‑ Chegada a Porto Alegre.
tas.
Parada 9 (30°18'44,07"S, AGRADECIMENTOS
54°1'20,15"W). Visita à regiã o da ponte so‑
bre a Sanga do Jobim. A 500 m da sanga, Agradecemos à FAPERGS, ao CNPq, à
aproximadamente, a partir da ponte, estã o CAPES e à FINEP, pelo apoio. A UFRGS foi um
expostos a loramentos de estaurolita xisto suporte essencial, assim como vá rias insti‑
(pseudoseçã o 5,4 kbar, 575 C), datados, por tuiçõ es, que deram apoios eventuais. Muitos
U‑Pb em zircã o detrı́tico, em 817‑702 Ma, alunos e colegas contribuı́ram de maneira
turmalina acessó ria (δ11B = +2), granada xis‑ signi icativa para o entendimento dos o ioli‑
to e para‑an ibolito (U‑Pb em zircã o de 758‑ tos. O roteiro foi escrito para uso de 30 geó ‑
650 Ma, por Cerva‑Alves et al. 2020, 2021). logos, vindos de outros estados, por
20h ‑ Pernoite em Sã o Gabriel. sugestã o de Elson Paiva de Oliveira; no en‑
tanto, a excursã o prevista para maio de 2020
8. 3 Terceiro dia foi cancelada, devido à pandemia de vı́rus.
Arena, K. R., Hartmann, L. A., Lana, C., Queiro‑ ques et serpentineuses du pré cambrien de
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America, and its metacratonic eastern mar‑
Hartmann et al.
1
Instituto de Geociê ncias, Universidade Federal do Rio Grande do Sul
2
Ecoplan Engenharia Ltda
1 INTRODUÇÃO
As manifestaçõ es vulcâ nicas e subvulcâ nicas riolı́ticas, de idade Neoproterozoica, do Rio
Grande do Sul, sã o correlacionadas a um intenso magmatismo á cido, vinculado a diferentes as‑
sociaçõ es petrotectô nicas do Cinturã o Dom Feliciano. Os maiores volumes deste vulcanismo
ocorrem na Bacia do Camaquã e, subordinadamente, no Bató lito Pelotas (Fig. 1). A grande mai‑
oria das rochas magmá ticas foi formada durante a orogenia Brasiliana, em um ciclo, que envol‑
veu a subducçã o de crosta oceâ nica (900‑720 Ma) e, posteriormente, eventos colisionais entre
os arcos magmá ticos gerados e o embasamento continental antigo, durante dois perı́odos prin‑
cipais, entre 720‑700 Ma e 650‑620 Ma (Fernandes et al., 1992; Saalmann et al., 2011; Philipp et
al., 2016 e referê ncias). A gê nese do Bató lito Pelotas ocorreu durante o segundo perı́odo colisio‑
nal, com associaçõ es sin a tardi‑orogê nicas geradas, principalmente, apó s o pico do metamor is‑
mo colisional. O perı́odo pó s‑colisional é caracterizado por movimentos direcionais de blocos,
ao longo de grandes zonas de cisalhamento transcorrentes, associado à geraçã o de rifts, com de‑
posiçã o de sequê ncias vulcano‑sedimentares em bacias do tipo pull‑apart (strike‑slip), e a pro‑
cessos de delaminaçã o crustal, com intenso magmatismo plutô nico, de composiçõ es granı́tica e
diorı́tico‑gabroica.
No extremo sul do Cinturã o Dom Feliciano, o limite entre o Cryogeniano e o Ediacarano
foi marcado por um amplo magmatismo e pelos eventos de sedimentaçã o da Bacia do Camaquã .
O magmatismo deste perı́odo é representado pelas suı́tes granitoides do Bató lito Pelotas, pelas
sucessõ es vulcâ nicas da Bacia do Camaquã e por corpos granı́ticos intrusivos nas unidades Pa‑
leoproterozoicas dos terrenos Taquarembó e Tijucas e nas unidades Neoproterozoicas do Terre‑
Contribuições à Geologia do Rio Grande do Sul e de Santa Catarina
ló gicos, sendo caracterizadas as seguintes 2019) rati icam, atravé s de dados geoquı́mi‑
unidades granı́ticas: Granito Quité ria (~650 cos e geocronoló gicos, a correlaçã o gené tica
Ma); Suı́te Cordilheira (~640‑620 Ma); Com‑ entre as rochas vulcâ nicas e subvulcâ nicas
plexo Pinheiro Machado e suı́tes Erval e Via‑ á cidas e os granitoides mais diferenciados
mã o (~625‑615 Ma); Suı́te Piquiri da Suı́te Dom Feliciano (550‑570 Ma). Se‑
(~615‑610 Ma); Suı́te Encruzilhada do Sul gundo Sommer et al. (2012), os sistemas
(~600 Ma); Suı́te Dom Feliciano (600‑550 vulcâ nicos e subvulcâ nicos do Bató lito Pelo‑
Ma); e manifestaçõ es subvulcâ nicas sin‑ tas se encontram paralelos à s principais zo‑
plutô nicas (Riolitos Asperezas). nas de cisalhamento, de direçã o NE‑SW, e
A Suı́te Dom Feliciano (SDF) é cons‑ estã o associados, espacialmente, a trê s do‑
tituı́da pelas rochas granı́ticas mais jovens mı́nios principais: nordeste, central e sudo‑
do Bató lito Pelotas, caracterizadas por gran‑ este (Fig. 1). No domı́nio nordeste, o sistema
des homogeneidades composicional, estru‑ principal é o Riolito Ana Dias (RAD) (UFRGS,
tural e petrográ ica. Sã o intrusivas nas 1978), que ocorre na regiã o de Quité ria, co‑
demais suı́tes do bató lito, apresentando re‑ mo um corpo intrusivo raso, de dimensõ es
laçã o tardia com a movimentaçã o dú ctil das quilomé tricas, com diques associados, con‑
zonas de cisalhamento. O Granito Dom Feli‑ cordante com a Zona de Cisalhamento Qui‑
ciano é o principal corpo da suı́te, com forma té ria‑Serra do Herval, de direçã o N60oE. O
alongada, segundo N50oE, com cerca de 180 domı́nio central é caracterizado por um en‑
km de comprimento e com 15 km a 45 km xame de diques á cidos mé tricos a decamé ‑
de largura (Philipp et al., 2000). As seme‑ tricos, com orientaçõ es dominantes
lhanças composicional, geoquı́mica e geo‑ N10‑30oW e N‑S, que ocorrem na regiã o dos
cronoló gica entre as rochas granı́ticas da municı́pios de Pinheiro Machado (Riolito
SDF e as rochas riolı́ticas subvulcâ nicas pre‑ Asperezas) e de Piratini (Fragoso‑Cesar et
sentes em diversas regiõ es do bató lito suge‑ al., 1986; Almeida et al., 1990; Philipp et al.,
re o vı́nculo gené tico entre estas unidades. 2000; Zanon et al., 2006). Em Piratini, os di‑
Na regiã o de Piratini, os enxames de diques ques aproveitam as fraturas de extensã o, as‑
fé lsicos estã o intimamente associados a di‑ sociadas ao Granito Bela Vista, cujo
ques má icos, constituindo diques compos‑ posicionamento foi controlado por uma zo‑
tos (Zanon et al., 2006). na de cisalhamento rú ptil, de direçã o N45oE
Dados Rb‑Sr mostram idades de re‑ (Philipp et al., 1991; Zanon et al., 2006). No
ferê ncia de 572 ±10 Ma (Cordani et al., domı́nio sudoeste, na regiã o de Herval,
1974) e de 550 Ma (Teixeira, 1982) e idades ocorrem os ú nicos registros de manifesta‑
isocrô nicas de 547 ±17 Ma (granitos e peg‑ çõ es vulcâ nicas strictu sensu do Bató lito Pe‑
matitos da cidade de Cristal), de 544 ±5 Ma lotas, representados pelos depó sitos
(Granito Arroio dos Ladrõ es), de 550 ±6 Ma efusivos e piroclá sticos de Cerro Chato e de
(granitos equigranulares de Cristal e de Dom Cerro Partido.
Feliciano) e de 560 ±12 Ma (riolitos da Serra
das Asperezas) (Soliani Jr., 1986). A idade 2. 1 Sistema subvulcânico do domínio
obtida pelo mé todo U‑Pb TIMS em zircã o pa‑ nordeste: Riolito Ana Dias e diques re‑
ra o Granito Ponta Grossa indicou 600 Ma lacionados
(Philipp et al., 2007), mesma idade obtida
por U‑Pb (SHRIMP) para o Granito Santana. O Riolito Ana Dias constitui uma fei‑
çã o geomorfoló gica de destaque na regiã o
Trabalhos recentes (Sommer et al.,
de Quité ria, localizada cerca de 40 km ao sul
2012; Oliveira et al., 2015; Noll Filho et al.,
Sistemas vulcânicos e subvulcânicos félsicos, associados ao Batólito Pelotas, Cinturão Dom Feliciano, RS 113
Contribuições à Geologia do Rio Grande do Sul e de Santa Catarina
Figura 1 ‒ Localizaçã o e contexto geoló gico das á reas estudadas (modi icado de Philipp et al., 2007).
Sistemas vulcânicos e subvulcânicos félsicos, associados ao Batólito Pelotas, Cinturão Dom Feliciano, RS 115
Contribuições à Geologia do Rio Grande do Sul e de Santa Catarina
Figura 2 – (a) Feiçã o geomorfoló gica, relacionada ao Cerro Ana Dias (Az 140º); (b) mapa geoló gico da regiã o
do Riolito Ana Dias (modi icado de UFRGS, 2006, 2007 e de Oliveira et al., 2011); feiçõ es macroscó picas
caracterı́sticas do Riolito Ana Dias: (c) fá cies por irı́tica e diques; (d) fá cies equigranular ina a mé dia, de
aparê ncia plutô nica, predominante no corpo principal.
esferulitos do tipo radial, com intercresci‑ lLT ocorre na porçã o basal da sequê ncia e é
mentos ibro‑radiados de quartzo e de felds‑ caracterizada por depó sitos tabulares, de es‑
pato, observados tanto ao redor de pessura mé trica, com termos mal seleciona‑
fenocristais de quartzo quanto na matriz, in‑ dos e de grau de soldagem moderado a alto,
dicativos de processos de devitri icaçã o de al‑ e com estrutura eutaxı́tica incipiente. Predo‑
ta temperatura (Fig. 3). minam os fragmentos lı́ticos de tamanho lá ‑
Dados de Rb/Sr obtidos por Soliani Jr. pili, envoltos por uma matriz tufá cea (Fig. 4).
(1986) indicam idades de 560 ±12 Ma para os Os fragmentos principais sã o de riolitos e de
diques á cidos, enquanto uma idade U‑Pb em ignimbritos e, subordinadamente, acidentais
zircã o de 550 ±27 Ma foi obtida por Philipp et de rochas encaixantes. Os piroclastos juvenis
al. (2016). Estas idades sugerem o vı́nculo sã o de fragmentos vı́treos e de cristais (20‑
deste sistema riolı́tico aos eventos magmá ti‑ 25%). Fiamme sã o comuns e quartzo, K‑
cos inais do Bató lito Pelotas. feldspato e plagioclá sio sã o os minerais pre‑
dominantes. A matriz tufá cea é extremamen‑
2. 3 Sistemas vulcânico e subvulcânico te ina e, originalmente, vı́trea. E constituı́da
do domínio sudoeste: Cerro Chato e Cer‑ por shards e por intercrescimentos quartzo‑
ro Partido feldspá ticos, como produtos de desvitri ica‑
çã o (Fig. 4). A fá cies ecLT é constituı́da por
A regiã o do Cerro Chato é constituı́da depó sitos com geometria tabular e com es‑
por duas feiçõ es geomorfoló gicas de desta‑ pessuras mé tricas. Sã o mal selecionados e
que, resultantes da açã o de falhas, de direçõ es tê m alto grau de soldagem, com abundâ ncia
NW‑SE e NE‑SW: os cerros Chato e Partido de piroclastos, de tamanho lá pili, em matriz
(Fig. 1 e Fig. 4). O embasamento desta tufá cea muito ina e de aspecto vı́treo. Feno‑
sequê ncia vulcâ nica é constituı́do por grani‑ cristais e fragmentos de cristais de K‑felds‑
toides das suı́tes Pinheiro Machado e Dom pato e de quartzo predominam e raros
Feliciano. Dados isotó picos U‑Pb obtidos em litoclastos conatos (1‑2 cm), de rochas riolı́‑
cristais de zircã o das duas unidades á cidas ticas, sã o observados. Fiamme sã o abundan‑
indicam idades de 630. 4 ±2,8 Ma para os tes e ocorrem em proporçõ es similares à dos
derrames riolı́ticos e de 561 ±2 Ma para os ri‑ cristais. A matriz é constituı́da por shards e
olı́tos hipabissais do Cerro Partido (Noll Filho por esferulitos, indicando processos de des‑
et al., 2019). vitri icaçã o de alta temperatura. O grau de
achatamento dos fragmentos de pú mices va‑
2. 3. 1 Sistema vulcânico do Cerro Chato ria, de moderado a muito forte, evidenciado
por uma forte estrutura eutaxı́tica. Em algu‑
O Cerro Chato apresenta formas dô ‑ mas porçõ es, observa‑se a presença da es‑
micas e é caracterizado por depó sitos piro‑ trutura parataxı́tica, com vá rios padrõ es de
clá sticos na porçã o basal, sucedidos por foliaçã o, sugerindo processos reomó r icos.
derrames, ambos de composiçã o riolı́tica Os derrames riolı́ticos ocorrem, cor‑
(Fig. 4). Os depó sitos piroclá sticos sã o classi‑ tando e sobrepondo os depó sitos piroclá sti‑
icados como ignimbritos, com alto grau de cos. Sã o rochas hemicristalinas, com forte
soldagem, e mostram variaçõ es incipientes e estrutura de luxo ( hR) sub‑horizontal e, su‑
gradacionais, agrupadas em duas fá cies prin‑ bordinadamente, subvertical, com diversos
cipais: lá pili‑tufo rico em lı́ticos (lLT) e lá pili‑ padrõ es de dobras. Em algumas porçõ es, ob‑
tufo rico em cristais e com forte estrutura eu‑ servam‑se a ruptura da foliaçã o e a brecha‑
taxı́tca (ecLT) (Noll Filho et al., 2019). A fá cies çã o da rocha. A fá cies riolito autobrechado
Sistemas vulcânicos e subvulcânicos félsicos, associados ao Batólito Pelotas, Cinturão Dom Feliciano, RS 117
Contribuições à Geologia do Rio Grande do Sul e de Santa Catarina
Figura 3 – (a) Mapa geoló gico da regiã o de Pinheiro‑Machado/Piratini, com representaçã o do Enxame de
Diques Asperezas; (b) imagem do sensor ASTER, com a morfologia dos diques na regiã o de Pinheiro Machado;
(c‑d) aspectos geomorfoló gicos e de campo dos diques riolı́ticos; (e‑f) exemplos de feiçõ es macro e
microscó picas de riolitos.
(bR) é monomı́tica e caracterizada pelo pa‑ foliado (Fig. 4). No geral, o riolito é por irı́ti‑
drã o textural jigsaw it, com fragmentos cen‑ co, com fenocristais (5‑10%) eué dricos de
timé tricos e angulares do pró prio riolito quartzo, de K‑feldspato e de plagioclá sio, en‑
voltos por matriz afanı́tica, de aspecto vı́treo. mo é indicada pelas relaçõ es entre os ele‑
Em algumas porçõ es, a rocha se mostra ho‑ mentos‑traço e os maiores (Fig. 5a, Fig. 5d e
lohialina, com notá vel textura esferulı́tica Fig. 5h), por razõ es K2O/Na2O acima de 1,0 e
(Fig. 4). Processos de desvitri icaçã o de alta pelos altos teores de HFSE. E importante
temperatura em diferentes está gios sã o co‑ destacar que alguns diques, relacionados aos
muns no material originalmente vı́treo da Riolitos Asperezas, assim como certas ro‑
matriz, com presença de esferulitos e de in‑ chas, vinculadas ao Enxame de Diques Pirati‑
tercrescimento granofı́rico. ni, ao redor do Granito Bela Vista,
apresentam uma maior alcalinidade, eviden‑
2. 3. 2 Sistema subvulcânico do Cerro ciada pelo trend tipicamente alcalino e só di‑
Partido co (Fig. 5b). As rochas riolı́ticas das demais
unidades apresentam elevados valores da ra‑
O Cerro Partido é caracterizado por zã o K2O/Na2O (1,5 a 2,5), similares aos da
um corpo subvulcâ nico riolı́tico, alongado na sé rie shoshonı́tica, entretanto, com valores
direçã o NE‑SW, com 8 km de comprimento e mais baixos de Sr (< 200 ppm) (Fig. 5c). Ou‑
com 0,7 km de largura (Fig. 4). E intrusivo tras caracterı́sticas relevantes sã o os eleva‑
nos depó sitos piroclá sticos da sequê ncia dos valores de á lcalis (8‑9,2% wt), das
Cerro Chato, em granitoides das suı́tes Pi‑ razõ es FeOt/(FeOt+MgO) (0,88‑1,0) e do ı́n‑
nheiro Machado e Dom Feliciano e em ro‑ dice agpaı́tico (Na2O+K2O)/Al2O3 molar >
chas da Sequê ncia Sedimentar Cerro Chato 0,6) e os baixos conteú dos de Al2O3, de CaO e
(Noll Filho et al., 2019). de MgO. Os valores de Zr, de Rb, de Y, de Nb e
Os riolitos subvulcâ nicos tê m textu‑ de Ga sã o moderados, em comparaçã o com
ra equigranular ina a glomeropor irı́tica, os conteú dos relativamente baixos de Ba e
com fenocristais (45%) de quartzo, de K‑ de Sr. Estas caracterı́sticas sã o comuns em
feldspato e de plagioclá sio, subé dricos a eué ‑ magmas á cidos metaluminosos, de a inidade
dricos, envoltos por uma matriz equigranu‑ alcalina, semelhantes ao observado em gra‑
lar ina, composta pelas mesmas fases nitos pó s‑colisionais do tipo‑A (Nardi & Bi‑
minerais. Intercrescimento granofı́rico entre tencourt, 2009).
quartzo e feldspato ocorre, comumente, na O comportamento de alguns elemen‑
matriz, como produto avançado do está gio tos‑traço, quando normalizados, segundo va‑
de desvitri icaçã o em alta temperatura. lores de ORG (Fig. 5), mostra um
enriquecimento em elementos mais incom‑
3 CARACTERIZAÇÃO DO MAGMATISMO patı́veis. Esta caracterı́stica, juntamente com
ÁCIDO o enriquecimento em elementos‑traço in‑
compatı́veis e em ETR, as anomalias negati‑
Em termos geoquı́micos, predomi‑ vas de Ba e as positivas de Ce e o
nam riolitos, com elevados valores de SiO2 (> enriquecimento de K2O e de Rb, em relaçã o
70%), semelhantes aos dos sistemas riolı́ti‑ ao Nb, sã o caracterı́sticos de magmas deriva‑
cos alta‑sı́lica. Rochas traquidacı́ticas ocor‑ dos de fontes manté licas, enriquecidas em
rem, de maneira subordinada, e sã o elementos incompatı́veis e com participaçã o
vinculadas ao Enxame de Diques Asperezas crustal. Este comportamento é semelhante
(Fig. 5). As rochas á cidas formam uma ten‑ entre as rochas do Cerro Chato e as do Cerro
dê ncia pró xima ao limite entre as sé ries al‑ Ana Dias. O maior enriquecimento em HFSE,
calinas e as subalcalinas saturadas de sı́lica observado em alguns diques, vinculados ao
(Fig. 5a). A natureza alcalina do magmatis‑ Riolitos Asperezas, e nos Diques Piratini, é
Sistemas vulcânicos e subvulcânicos félsicos, associados ao Batólito Pelotas, Cinturão Dom Feliciano, RS 119
Contribuições à Geologia do Rio Grande do Sul e de Santa Catarina
Figura 4 – (a) Feiçã o geomorfoló gica, relacionada ao Cerro Partido (Az 180º); (b) feiçã o geomorfoló gica,
relacionada ao Cerro Chato; (c) mapa geoló gico da regiã o do Cerro Chato‑Cerro Partido (modi icado de Noll
Filho et al., 2019); (d) seçã o geoló gica esquemá tica, com a distribuiçã o facioló gica dos depó sitos vulcâ nicos
(Noll Filho et al., 2019); (e) feiçã o geomorfoló gica caracterı́stica dos derrames riolı́ticos, associados ao Cerro
Chato; (f) feiçã o macroscó pica dos ignimbritos rico em lı́ticos; (g) feiçã o macroscó pica dos ignimbritos rico em
iamme, com estrutura eutaxı́tica; feiçõ es macroscó picas caracterı́sticas de derrames riolı́ticos: (g) textura
esferulı́tica; (h) estrutura de luxo de lava.
caracterı́stico de lı́quidos alcalinos só dicos. O tes elementos e um aumento considerá vel
padrã o de ETR normalizado ao condrito (Na‑ de fracionamento em ETR, com o aumento
kamura, 1974) mostra valores elevados des‑ da diferenciaçã o. O forte enriquecimento de
120 Edição da Sociedade Brasileira de Geologia – Núcleo RS/SC
Sommer et al.
ETRL, em relaçã o aos pesados, e as fortes Machado e Piratini, os diques sã o afetados
anomalias negativas de Eu sã o feiçõ es carac‑ por zonas de cisalhamento dú ctil‑rú pteis,
terı́sticas de magmas á cidos alcalinos e me‑ que ocasionam a formaçã o de dobras de ar‑
taluminosos (Nardi & Bonin, 1991). rasto e de feiçõ es de milonitizaçã o, como ob‑
servado no Enxame de Diques Asperezas.
Em diagramas discriminantes de
ambientes tectô nicos, as rochas do Riolito Nã o há registros, no Bató lito Pelotas,
Ana Dias ocupam o campo de ambientes pó s‑ de sequê ncias sedimentares contemporâ ne‑
colisionais, enquanto as rochas do Cerro as ou que tenham atuado como embasamen‑
Chato e dos Riolitos Asperezas tendem a am‑ to para os corpos riolı́ticos subvulcâ nicos.
bientes intraplaca (Fig. 5g). Com base em di‑ Deste modo, há uma forte relaçã o entre estas
agramas de classi icaçã o de granitoides intrusõ es rasas e a estruturaçã o presente nas
(Whalen et al., 1987), as amostras ocupam o demais unidades do bató lito, cuja desconti‑
campo de granitos do tipo “A” (Fig. 5). Esta nuidade pode ter servido como conduto para
interpretaçã o é corroborada pelos valores da estes magmas fé lsicos tardios. Embora ocor‑
razã o 104*Ga/Al > 2,6, Ce+Y+Nb+Zr > 400 ram algumas zonas de cisalhamento, afetan‑
ppm e FeOt/FeOt+MgO > 0,9, como sugerido do alguns corpos riolı́ticos, o predomı́nio é a
por Nardi & Bitencourt (2009), como valores atuaçã o de forte tectô nica rú ptil sobre estas
caracterı́sticos para o magmatismo granı́tico intrusõ es. As eventuais atividades vulcano‑
do tipo “A” no sul do Brasil. sedimentares podem nã o ter sido preserva‑
das, o que pode ser justi icado pelo nı́vel
crustal a lorante. Na regiã o do Cerro Chato,
4 DISCUSSÕES
há relaçã o entre os processos vulcâ nicos e os
4. 1 Considerações petrológicas super iciais, com a preservaçã o parcial das
condiçõ es subá reas, durante as atividades
Os sistemas vulcâ nicos e subvulcâ ni‑ efusivas e piroclá sticas e a posterior erosã o e
cos riolı́ticos do Bató lito Pelotas estã o asso‑ o retrabalhamento, cujo ló cus propı́cio para
ciados aos granitos da Suı́te Dom Feliciano. A deposiçã o gerou depó sitos sedimentares
maioria dos riolitos ocorre como rochas sub‑ imaturos e com grande contribuiçã o vulcâ ni‑
vulcâ nicas, nas formas de stocks e de enxa‑ ca. Este é o ú nico registro, no bató lito, de ro‑
mes de diques, com direçã o preferencial chas sedimentares pré ‑existentes, que
NE‑SW, concordantes com as principais es‑ serviram de embasamento para os processos
truturas do bató lito. As principais variaçõ es vulcâ nicos, sendo, inclusive, afetadas tectô ni‑
facioló gicas estã o associadas a regiõ es com ca e termicamente pelos corpos hipabissais
atividades explosivas e efusivas. Nos termos riolı́ticos.
hipabissais, há a predominâ ncia de rochas Sistemas vulcâ nicos e subvulcâ nicos
com alto grau de cristalinidade, por irı́ticas a riolı́ticos, de alta sı́lica e extremamente vis‑
equigranulares, principalmente, nos corpos cosos, como os observados no Bató lito Pelo‑
com dimensõ es maiores. A ú nica ocorrê ncia tas, estã o associados, normalmente, a
de rochas vulcâ nicas strictu sensu está restri‑ reservató rios magmá ticos super iciais. E co‑
ta à regiã o do Cerro Chato, no extremo sul do mum, portanto, uma grande quantidade de
bató lito, em que ocorrem manifestaçõ es ex‑ corpos hipabissais, associados a regimes vul‑
plosivas e efusivas. Os corpos riolı́ticos sã o câ nicos efusivos, originados a partir da cris‑
rasos ou extrusivos e estã o afetados por uma talizaçã o de magmas com alta viscosidade.
tectô nica rú ptil, durante a evoluçã o inal do Magmas com altas taxas de cristalizaçã o e
bató lito. No entanto, nas regiõ es Pinheiro com baixa mobilidade aproveitam as descon‑
Sistemas vulcânicos e subvulcânicos félsicos, associados ao Batólito Pelotas, Cinturão Dom Feliciano, RS 121
Contribuições à Geologia do Rio Grande do Sul e de Santa Catarina
tinuidades, ao longo da crosta superior, como pode ter um vı́nculo com o colapso contı́nuo
condutos para as erupçõ es vulcâ nicas em su‑ de baixas colunas de erupçã o, relacionas ao
perfı́cie. Dependendo do nı́vel de erosã o e do sistema issural da regiã o (Noll Filho et al.,
nı́vel crustal a lorante, pode‑se observar cor‑ 2019). Com a desvolatizaçã o do sistema, há
pos intrusivos rasos e enxames de diques, in‑ uma migraçã o do sistema explosivo para o
trudindo o embasamento ou as unidades efusivo e a atividade passa a ser caracteriza‑
plutô nicas cogené ticas. Este processo parece da pela extrusã o de derrames riolı́ticos, pra‑
ser predominante no Bató lito Pelotas, dada a ticamente afı́ricos, nos quais o luxo laminar
caracterı́stica dos corpos subvulcâ nicos mai‑ gera uma foliaçã o de luxo bem de inida, co‑
ores e altamente cristalizados, como o do Ri‑ mumente dobrada pela di iculdade da lava
olito Ana Dias, e pela grande quantidade de em luir, em decorrê ncia da alta viscosidade
diques observados, principalmente, na por‑ do sistema. Esta caracterı́stica induz à for‑
çã o centro‑sul do bató lito (e.g. Enxame de Di‑ maçã o de morfologias dô micas, caracterı́sti‑
ques Asperezas). Contexto semelhante, mas cas de vulcanismo fé lsico. Texturas
em nı́vel muito mais raso, observa‑se na re‑ vulcanoclá sticas sã o comuns, devido à auto‑
giã o do Cerro Chato, em que o corpo subvul‑ brechaçã o das lavas altamente viscosas, du‑
câ nico Cerro Partido intrude, tanto a rante sua movimentaçã o.
sequê ncia vulcâ nica da regiã o como os grani‑ Em termos gerais, a geoquı́mica dos
toides epizonais da Suı́te Dom Feliciano. A di‑ riolitos, associados ao Bató lito Pelotas,
reçã o NE‑SW deste corpo coincide com a apresenta padrõ es similares entre si e aos
orientaçã o dos domos e dos coulées, relacio‑ dos granitoides da Suı́te Dom Feliciano. Os
nados aos derrames riolı́ticos, sugerindo ori‑ riolitos dos Diques Asperezas, da regiã o de
gens efusiva e issural, com reativaçã o da Piratini, mostram grande similaridade com‑
Zona de Cisalhamento Pedro Osó rio, principal posicional, caracterizada por um grau de al‑
descontinuidade regional. calinidade mais elevado, tendendo a
As erupçõ es geradas, a partir de câ ‑ magmas peralcalinos (Philipp et al., 1991).
maras magmá ticas rasas de alta‑sı́lica, ten‑ Sã o rochas na transiçã o entre sistema alcali‑
dem a ter cará ter explosivo. Nestes casos, a nos e subalcalinos, predominantemente, só ‑
sobrepressã o do sistema provoca um aumen‑ dicos e metaluminosos. O comportamento
to na concentraçã o de volá teis, que, ao exce‑ dos elementos‑traço corrobora estas obser‑
der a pressã o litostá tica, geram intenso vaçõ es, com a semelhança entre as rochas
fraturamento, seguido de descompressã o sú ‑ da regiã o do Cerro Chato e as do Riolito Ana
bita, ocasionando a fragmentaçã o e um regi‑ Dias, e uma tendê ncia mais alcalina das dos
me explosivo. A regiã o do Cerro Chato é a Diques Asperezas, dada pelo maior enrique‑
ú nica, no Bató ltio Pelotas, que preserva uni‑ cimento em HFSE.
dades geneticamente relacionadas com este Todas as rochas riolı́ticas estudadas
tipo de atividade vulcâ nica. A base da apresentam caracterı́sticas geoquı́micas
sequê ncia é caracterizada por ignimbritos, compatı́veis com as dos magmas granı́ticos
vinculados à s correntes de densidade piro‑ do tipo‑A e, juntamente com as relaçõ es de
clá sticas (CDPs), indicando a ocorrê ncia de campo, sã o sugestivas de magmas, associa‑
diferentes luxos ou de variaçõ es internas dos a ambientes pó s‑colisionais, como cons‑
provocadas na CDP, comuns em processos do tatado por Philipp et al. (2002), por Philipp
tipo agradaçã o progressiva. O alto grau de & Machado (2005) e por Nardi & Bitten‑
soldagem e os processos de reomor ismo dos court (2009), para o magmatismo granı́tico
depó sitos indicam que a geraçã o das CDPs do tipo “A” no sul do Brasil. Segundo estes
122 Edição da Sociedade Brasileira de Geologia – Núcleo RS/SC
Sommer et al.
Figura 5 – Diagramas, com as principais caracterı́sticas do magmatismo, relacionadas aos sistemas vulcâ nicos e
subvulcâ nicos do Bató lito Pelotas (modi icado de Noll Filho et al., 2019): (a) diagrama TAS (modi icado de Le
Bas et al., 1986); (b) diagrama SiO2 vs. Zr/TiO2 (modi icado de Winchester & Floyd, 1977); (c) diagrama de
variaçã o entre TiO2 e K2O/Na2O; (d) esquema de classi icaçã o proposta por Sylvester (1989), evidenciando a
natureza alcalina das rochas estudadas; (e) diagrama multielementar normalizado pelo ORG (Pearce et al.,
1984); (f) diagrama, com o padrã o de distribuiçã o dos elementos terra rara normalizados pelo condrito
(Nakamura, 1974); (g) diagrama discriminante de ambientes tectô nicos (modi icado de Pearce et al., 1984); (h)
diagrama de classi icaçã o de granitoides e de discriminante de ambientes tectô nicos (modi icado de Whalen et
al., 1987).
Sistemas vulcânicos e subvulcânicos félsicos, associados ao Batólito Pelotas, Cinturão Dom Feliciano, RS 123
Contribuições à Geologia do Rio Grande do Sul e de Santa Catarina
autores, a origem e a evoluçã o deste mag‑ cas e Sã o Gabriel. Estes sistemas mostram
matismo estã o relacionadas a processos de idades de ativaçã o distintas e estã o consti‑
diferenciaçã o magmá tica, de magmas man‑ tuı́dos por quatro sucessõ es, caracterizadas
té licos bá sicos ou intermediá rios, associa‑ pelos grupos Maricá , Bom Jardim (600‑590
dos à contaminaçã o crustal. Estes processos Ma), Santa Bá rbara (580‑550 Ma) e Guaritas
marcam a evoluçã o inal do Cinturã o Dom (550‑540 Ma). Estes sı́tios de deposiçã o
Feliciano e estã o relacionados à delamina‑ contracenam com os altos do embasamento,
çã o crustal, promovida pela atividade tectô ‑ representados por grandes domos e por an‑
nica transcorrente, como é o caso do tiformes regionais, de direçã o NE‑SW, com
Bató lito Pelotas cinco segmentos principais: Alto 1) Cacho‑
Os dados geocronoló gicos de U‑Pb eira do Sul, Santana da Boa Vista, Hulha Ne‑
em zircã o indicaram idades de 581,9± 1,9 gra, Candiota (composto pela antiformes
Ma para os riolitos do Cerro Ana Dias (Oli‑ Capané ), Serra dos Pedrosas, Serra do Gon‑
veira et al., 2015) e de 561 ± 2 Ma para os ri‑ dinho e Candiota (composto pelos domos
olitos subvulcâ nicos do Cerro Partido, na de Santana e da Vigia), e Jaiba‑Torrinhas; Al‑
regiã o do Cerro Chato (Noll et al., 2019). Es‑ to 2) Caçapava do Sul; Alto 3) Vila Nova do
tes dados indicam a contemporaneidade en‑ Sul‑Ibaré ; Alto 4) Bagé ‑Dom Pedrito; e Alto
tre os riolitos do Cerro Partido, com as dos 5) Bató lito Pelotas.
litotipos do Enxame de Diques Piratini (cer‑ A atual estruturaçã o do embasa‑
ca de 550 Ma) (Zanon et al., 2006) e as dos mento do RS foi desenvolvida entre 600 Ma
granitoides, associados à Suı́te Dom Felicia‑ e 550 Ma e envolveu a movimentaçã o das
no, ambos representando o magmatismo grandes zonas de cisalhamento transcor‑
tardio, relacionado à evoluçã o inal do Bató ‑ rentes, associadas ao perı́odo pó s‑colisional,
lito Pelotas. Por outro lado, a idade de 630,4 marcando a evoluçã o inal do Cinturã o Dom
± 2,8 Ma obtida para as rochas vulcâ nicas do Feliciano. Esta evoluçã o está registrada pela
Cerro Chato é concordante com a idade ob‑ transiçã o entre o perı́odo inal da colisã o
tida em clastos vulcâ nicos da base do Grupo obliqua dos crá tons Rio de La Plata e Ka‑
Maricá (630,2 ±3,4 Ma) (Borba et al., 2008), lahari, que caracterizou o pico do metamor‑
sugerindo que os riolitos do Cerro Chato ismo colisional (650‑620 Ma) e o perı́odo
possam ser as rochas fontes da deposiçã o de má ximo espessamento e de escape tectô ‑
inicial da Bacia do Camaquã . nico, que ocorreu entre 590‑550 Ma e que
marcou a formaçã o e a reativaçã o das estru‑
4. 2 Modelo tectônico turas transcorrentes, com movimentos dire‑
cionais e com lineaçõ es de estiramento, de
O signi icado do magmatismo vulcâ ‑ baixo â ngulo (Fernandes et al., 1992; Saal‑
nico/subvulcâ nico riolı́tico no Cinturã o Dom mann et al., 2011; Philipp et al., 2016).
Feliciano mostra contextos distintos, com Os principais segmentos crustais do
relaçã o à s ocorrê ncias representadas na Ba‑ Cinturã o Dom Feliciano se movimentaram
cia do Camaquã e no Bató lito de Pelotas. As entre si, de modo concordante, alternando
rochas da Formaçã o Acampamento Velho, faixas dominadas por componentes trans‑
do Grupo Santa Bá rbara, representam a ter‑ pressivos, que formaram os altos do emba‑
ceira sucessã o vulcano‑sedimentar da Bacia samento, e por componentes transtensivos,
do Camaquã . Esta bacia foi depositada sobre que formaram bacias alongadas. A atuaçã o
um sistema de rifts, de direçã o NE‑SW, situa‑ simultâ nea de cinemá ticas compressiva e
do no limite dos terrenos Taquarembó , Tiju‑ transcorrente ocasiona a formaçã o de do‑
124 Edição da Sociedade Brasileira de Geologia – Núcleo RS/SC
Sommer et al.
mos, que se alternaram, lateralmente, com subvulcâ nicas á cidas, pode ser entendida de
faixas, nas quais a extensã o e a transcorrê n‑ trê s maneiras: (i) como corpos alongados e
cia conjuntas geraram á reas deprimidas, que como enxames de diques concordantes a zo‑
constituem as sub‑bacias de pull‑apart, que nas de cisalhamento, de direçã o NE‑SW, co‑
formaram os rifts Bom Jardim, Santa Bá rba‑ mo nos casos do Riolito Ana Dias e dos
ra e Guaritas, da Bacia do Camaquã . As prin‑ corpos do Cerro Chato e do Cerro Partido;
cipais estruturas, que delimitam os rifts, sã o (ii) como enxames de diques em fraturas de
caracterizadas por diversas zonas de cisa‑ extensã o, que se desenvolvem paralelos ao
lhamento, que serviram de conduto ao mag‑ tensor principal (sigma 1) do sistema de
matismo pó s‑colisional. Deste modo, ao compressã o, que tem direçã o NW‑SE, como
observarmos a geologia da regiã o central do no caso dos diques de Porto Alegre, de Pira‑
RS, podemos caracterizar um edifı́cio crus‑ tini, de Pinheiro Machado; e (iii) como di‑
tal, de cerca de 20 km de espessura, com ques, associados a conjugados de fraturas de
segmentos de crosta superior compostos cisalhamento, com combinaçã o de aberturas
pelas sucessõ es de cada sub‑bacia (Maricá , pró xima das direçõ es E‑W e N‑S, como no
Bom Jardim, Santa Bá rbara e Guaritas), in‑ caso dos diques do Riolito Ana Dias.
trudidos por corpos granı́ticos de mesozona
(entre 600‑570 Ma) e de epizona (560‑550 5 CONCLUSÕES
Ma). Associado à deposiçã o do Grupo Bom
Jardim e à s vulcâ nicas, da Fm. Hilá rio, ocorre O inal do Neoproterozoico no Escu‑
a colocaçã o dos granitos shoshonı́ticos, que do Sul‑Rio‑Grandense é marcado por um in‑
precedem à deposiçã o do Grupo Santa Bá r‑ tenso magmatismo, representado por
bara e à extrusã o das vulcâ nicas á cidas e bá ‑ plutonismo e por vulcanismo, vinculados
sicas da Fm. Acampamento Velho, bem como aos está gios pó s‑colisionais do Ciclo Orogê ‑
à colocaçã o de diversos granitos alcalinos, nico Brasiliano/Pan‑Africano. No Bató lito
cujos registros de metamor ismo de contato Pelotas (a leste do Escudo), a maioria dos ri‑
indicam colocaçã o em profundidades de 2 olitos ocorre como rochas subvulcâ nicas,
km a 5 km. nas formas de stocks e de enxames de di‑
O Bató lito se comportou, basica‑ ques, com direçã o preferencial NE‑SW, con‑
mente, como uma unidade homogê nea, em‑ cordantes com as principais estruturas do
bora subdividida, em campo, na forma de bató lito, que podem ser agrupados em trê s
trê s compartimentos subparalelos, de dire‑ domı́nios principais, normalmente, parale‑
çã o NE‑SW, expondo nı́veis crustais distintos los a estruturas NE‑SW: nordeste (Riolito
em cada um destes trê s segmentos. Esta Ana Dias), central (Enxame de diques Aspe‑
subdivisã o mostra que o Bató lito a lora co‑ rezas/Piratini) e sudoeste (Regiã o do Cerro
mo um domo, expondo uma porçã o central Chato). Nã o há registros de bacias sedimen‑
mais profunda, separada de um segmento tares associadas, com exceçã o da regiã o de
mais raso, ao norte, e outra porçã o mais pro‑ Cerro Chato, no extremo sul do bató lito, em
funda, ao sul. Os segmentos do Bató lito se que se tem a ú nica ocorrê ncia de rochas vul‑
movimentam entre si, ao longo de zonas de câ nicas strictu sensu, com manifestaçõ es ex‑
cisalhamento, mas a grande movimentaçã o, plosivas e efusivas.
em termos de deslocamento e de abertura Grande parte das rochas vulcâ nicas
de espaço, é marcada pela Dorsal de Cangu‑ e subvulcâ nicas fé lsicas do Bató lito Pelotas
çu. Desta maneira, a geraçã o de espaço, para está associada aos granitos da Suı́te Dom Fe‑
o posicionamento das rochas vulcâ nicas e liciano. Dados geocronoló gicos sugerem
Sistemas vulcânicos e subvulcânicos félsicos, associados ao Batólito Pelotas, Cinturão Dom Feliciano, RS 125
Contribuições à Geologia do Rio Grande do Sul e de Santa Catarina
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Philipp, R. P., Pimentel, M. M. & Chemale Jr., F. UNIVERSIDADE FEDERAL DO RIO GRANDE
Sistemas vulcânicos e subvulcânicos félsicos, associados ao Batólito Pelotas, Cinturão Dom Feliciano, RS 127
Voltar ao Sumário
1
Campus Caçapava do Sul, Universidade Federal do Pampa
2
Instituto de Geociê ncias, Universidade Federal do Rio Grande do Sul
1 INTRODUÇÃO
Na regiã o sul do Brasil, foram gerados importantes depó sitos de rochas vulcâ nicas efusi‑
vas e piroclá sticas, de composiçõ es bá sicas a á cidas, durante o perı́odo pó s‑colisional da oroge‑
nia Brasiliana Pan‑Africana. Essas rochas a loram em esparsas bacias sedimentares ediacaranas/
cambrianas, desde o estado do Paraná , até o sul do Uruguai, das quais se destaca a Bacia do Ca‑
maquã (e.g. Paim et al., 2014). Esta bacia registra a evoluçã o de trê s grandes ciclos vulcâ nicos,
com rochas plutô nicas e subvulcâ nicas, geneticamente e cronologicamente associadas.
Ao inal da orogenia Brasiliana Pan‑Africana, na regiã o hoje compreendida pelo Escudo
Sul‑Rio‑Grandense, houve uma transiçã o para uma tectô nica de escape, seguida por um colapso
do oró geno, que havia sido recentemente formado. Isto possibilitou a formaçã o de profundas e
extensas zonas de cisalhamento transcorrentes, de escala crustal, as quais propiciaram fusã o
manté lica, associada a um importante retrabalhamento crustal, devido à elevaçã o da geoterma
regional (Bitencourt & Nardi, 2000; Philipp et al., 2016). Esses processos resultaram na geraçã o
de um volumoso magmatismo, que, na regiã o oeste do Escudo Sul‑Rio‑Grandense, é representa‑
do pelas rochas vulcâ nicas da Bacia do Camaquã e por corpos plutô nicos cronocorrelatos (e.g.
Hartmann et al., 2007).
A Bacia do Camaquã está inserida no contexto geoló gico do Escudo Sul‑Rio‑Grandense e
sua geraçã o envolveu complexos mecanismos tectono‑sedimentares, relacionados aos está gios
pó s‑colisionais da orogenia Brasiliana Pan‑Africana (desde o inı́cio do perı́odo Ediacarano, até o
inı́cio do Cambriano). Sua evoluçã o inicia como uma bacia de retroarco (Grupo Maricá ), passan‑
do para bacia strike‑slip (Grupo Bom Jardim) e inalizando como bacia rifte, com alguma compo‑
Contribuições à Geologia do Rio Grande do Sul e de Santa Catarina
nente transtensiva (grupos Santa Bá rbara e mente intermediá rias e de a inidade
Guaritas), conforme de inido por inú meros shoshonı́tica, formadas a aproximadamente
pesquisadores, como Brito Neves & Cordani 590 Ma (Remus et al., 1999; Janikian et al.,
(1991), Chemale Jr. (2000) e Paim et al. 2005, 2012); ii) rochas do vulcanismo
(2014). E consenso que esta bacia representa Acampamento Velho, representadas, princi‑
um ló cus deposicional, ao qual bacias meno‑ palmente, por depó sitos explosivos/efusi‑
res se sobrepuseram (sub‑bacias Boicı́‑Piqui‑ vos, de composiçã o á cida predominante e
ri, Guaritas, Santa Bá rbara, Ramada e de a inidade moderadamente alcalina só di‑
Taquarembó ), cada uma, gerada por mecanis‑ ca, desenvolvidas entre 580 Ma e 550 Ma
mos distintos e apresentando litologias carac‑ (Sommer et al., 2005, 2006; Janikian et al.,
terı́sticas e individualizá veis, a partir de 2005, 2012; Almeida et al., 2012; Matté et
crité rios tectô nicos, termomecâ nicos e geo‑ al., 2016); e iii) rochas do vulcanismo Ro‑
cronoló gicos (Paim et al., 2014). Durante a deio Velho, caracterizadas por depó sitos
evoluçã o da Bacia do Camaquã , alternaram‑se efusivos, de composiçã o dominantemente
perı́odos deposicionais, com o acú mulo de es‑ bá sica e de a inidade moderadamente alca‑
pessos pacotes sedimentares e vulcâ nicos, e lina a toleı́tica, geradas entre 547 Ma e 535
intervalos erosivos. Observa‑se um predomı́‑ Ma (Almeida et al., 2010; Almeida et al.,
nio dos episó dios vulcâ nicos nas fases de pre‑ 2012).
enchimento, normalmente, na base das O Grupo Maricá (unidade basal da
unidades de maior hierarquia, seguidos pela Bacia do Camaquã ) possui clastos vulcâ ni‑
deposiçã o de sedimentos predominantemen‑ cos em camadas de conglomerado, datados
te siliciclá sticos. Esses sedimentos deram ori‑ em 630 ±3 Ma por Borba et al. (2008), que
gem, principalmente, a siltitos, a arenitos e a evidenciam um prová vel vulcanismo á cido
conglomerados. De forma geral, registra uma contemporâ neo e que estabelecem a idade
evoluçã o de ambientes sedimentares, desde má xima para a deposiçã o deste grupo. Mais
marinho raso, passando por costeiro e por la‑ recentemente, rochas vulcâ nicas á cidas com
custre‑aluvial, até desé rtico, com episó dios esta mesma idade foram datadas na porçã o
vulcâ nicos intercalados (Paim et al., 2014), sul do Bató lito Pelotas (na regiã o do Cerro
depositados, aproximadamente, entre 630 Ma Chato, cf. Noll Filho et al., 2018) e corrobo‑
e 535 Ma. ram a hipó tese de um vulcanismo precoce
Os episó dios vulcâ nicos desta bacia no perı́odo pó s‑colisional da orogenia Bra‑
se desenvolveram, dominantemente, sobre o siliana Pan‑Africana, no Escudo Sul‑Rio‑
Terreno Juvenil Sã o Gabriel, em que se desta‑ Grandense.
cam as rochas vulcâ nicas do Platô da Ramada, Apesar da idade ediacarana/cam‑
da Serra de Santa Bá rbara, das regiõ es do cer‑ briana, os registros vulcâ nicos da Bacia do
ro Tupanci e Bom Jardim e das á reas pró xi‑ Camaquã permanecem, em parte, preserva‑
mas à cidade de Lavras do Sul (Fig. 1). dos, nã o sendo observados efeitos de meta‑
També m ocorrem rochas vulcâ nicas desta ba‑ mor ismo dinamotermal e de deformaçã o
cia na regiã o cratô nica do Terreno Taquarem‑ dú ctil, permitindo reconstruir, pelo menos
bó (no Platô do Taquarembó ) e sobre o em parte, a histó ria vulcanoló gica da re‑
Terreno Tijucas (na regiã o do Rodeio Velho). giã o.
Os trê s ciclos vulcâ nicos da Bacia do Os sistemas vulcano plutô nicos da
Camaquã sã o representados por: i) rochas do Bacia do Camaquã originaram algumas im‑
vulcanismo Hilá rio, com predomı́nio de ro‑ portantes estruturas semicirculares, comu‑
chas efusivas, de composiçõ es dominante‑ mente, na forma de altos topográ icos.
130 Edição da Sociedade Brasileira de Geologia – Núcleo RS/SC
Matté et al.
Estas feiçõ es sã o constituı́das, em grande cada das Graças) (Janikian et al., 2005). En‑
parte, por ignimbritos á cidos e/ou por ro‑ volve rochas vulcâ nicas e subvulcâ nicas, com
chas granı́ticas (e.g. Platô da Ramada e Platô grande variaçã o composicional, desde ter‑
do Taquarembó ), associadas a conjuntos de mos bá sicos, até á cidos, com predomı́nio dos
diques anelares e em cone (Fig. 1). Estas ca‑ intermediá rios, representados por derrames
racterı́sticas sã o sugestivas de sistemas vul‑ de composiçã o andesı́tica. Segundo Janikian
câ nicos relacionados a caldeiras, embora et al. (2012), essas rochas perfazem um má ‑
algumas feiçõ es representem, pelo menos ximo de 2500 metros de espessura. Esses
em parte, as raı́zes profundas de sistemas vulcanitos ocorrem, em alguns casos, inter‑
desse tipo (e.g. Associaçã o Shoshonı́tica de calados com depó sitos sedimentares, gera‑
Lavras do Sul). Outras formas geográ icas dos em ambientes com pronunciados
alongadas (e.g. Serra de Santa Bá rbara e sistemas lacustres profundos, remanescen‑
Cerro Tupanci) sugerem eventos relaciona‑ tes da Formaçã o Cerro da Angé lica (Janikian
dos a condutos issurais e/ou à deposiçã o de et al., 2005).
rochas vulcâ nicas ao longo de paleovales Rochas do vulcanismo Hilá rio se si‑
con inados. Alguns pesquisadores tê m traba‑ tuam, principalmente, na regiã o a leste da ci‑
lhado com essas hipó teses, embora as con‑ dade de Lavras do Sul e em Caçapava do Sul,
clusõ es ainda sejam muito super iciais, na na regiã o do Bom Jardim (Fig. 1). Dentre as
Associaçã o Shoshonı́tica de Lavras do Sul ocorrê ncias menos signi icativas, destacam‑
(Nardi, 1984; Gastal et al., 2015) e no Platô se as de Bagé , de Dom Pedrito, de Sã o Sepé e
da Ramada (Sommer et al., 2013; Matté , de Vila Nova do Sul, compondo, nesta ú ltima,
2016; Souza, 2019). Os altos topográ icos, depó sitos associados à porçã o basal do Platô
construı́dos, principalmente, pelas rochas da Ramada.
dos vulcanismos Hilá rio e Acampamento Ve‑ O vulcanismo Hilá rio compreende
lho, constituı́ram importantes á reas‑fonte derrames (Figs. 2A‑2B), com depó sitos ex‑
para a sedimentaçã o de boa parte da Bacia plosivos intercalados (Fig. 2C), ambos de
do Camaquã , denotando grande relevâ ncia composiçõ es traquibasá lticas e traquiandesı́‑
no preenchimento desta. ticas, espacial e temporalmente associadas a
Neste capı́tulo, sã o discutidos dados rochas subvulcâ nicas riolı́ticas, monzonı́ticas
petrográ icos, geoquı́micos e geocronoló gi‑ e lampró iros espessartı́ticos (Figs. 2D‑2F) e
cos das rochas vulcâ nicas ediacaranas‑cam‑ a minetes, alé m de rochas plutô nicas epizo‑
brianas da Bacia do Camaquã , relacionadas nais granı́ticas e leucodioritos cumulá ticos,
à s unidades Hilá rio, Acampamento Velho e agrupados na Associaçã o Shoshonı́tica de
Rodeio Velho, com o objetivo de apresentar Lavras do Sul (Nardi & Lima, 1985).
uma sı́ntese sobre o atual está gio de conhe‑ Os andesitos predominam nesta uni‑
cimento acerca da evoluçã o do vulcanismo dade e possuem, como principal caracterı́sti‑
pó s‑colisional do Escudo Sul‑Rio‑Grandense. ca petrográ ica, textura por irı́tica a
glomeropor irı́tica (Figs. 2A‑2B), com feno‑
2 VULCANISMO HILÁRIO cristais de plagioclá sio (andesina‑labradori‑
ta). Subordinadamente, ocorrem augita
A Formaçã o Hilá rio (Ribeiro & Fanti‑
(Wo38‑43, En40‑49, Fs8‑20), olivina (Fo62), Ti‑
nel, 1978) compreende o primeiro registro
magnetita e apatita, normalmente, arranja‑
vulcâ nico da Bacia do Camaquã e se situa na
das em uma estrutura de luxo. A matriz é
porçã o intermediá ria do Grupo Bom Jardim
constituı́da por cristá litos e por micró litos de
(entre as formaçõ es Cerro da Angé lica e Pi‑
plagioclá sio (oligoclá sio‑andesina).
O Vulcanismo Ediacarano‑Cambriano da Bacia do Camaquã 131
Contribuições à Geologia do Rio Grande do Sul e de Santa Catarina
Figura 2 ‒ Exemplos de rochas vulcâ nicas da Formaçã o Hilá rio: A) Amostra de andesito por irı́tico; B)
Fotomicrogra ia de andesito (nicó is perpendiculares); C) Amostra de ignimbrito andesı́tico; D) Pedreira de
lampró iro espessartı́tico na regiã o da “Parada Cota” (RS‑357); E) Amostra de lampró iro espessartı́tico; e F)
Fotomicrogra ia de lampró iro espessartı́tico, ilustrando a textura panidiomó r ica e a zonaçã o composicional da
hornblenda (nicó is paralelos).
tos acessó rios de rochas granı́ticas e meta‑ graus de soldagem, sendo que, de modo ge‑
mó r icas do embasamento (Sommer et al., ral, sã o fortemente soldados na porçã o basal
2006; Matté et al., 2016). Possuem variá veis a intermediá ria dos depó sitos, com textura
eutaxı́tica ( iamme) e, em algumas varieda‑ onam‑se ao longo de toda a sequê ncia vulcâ ‑
des, reomó r ica, gerados sob altas tempera‑ nica (Matté et al., 2016). Predominam cor‑
turas (entre 850°C e 946°C) (Sommer et al., pos de composiçã o riolı́tica, principalmente,
2013). Variaçõ es espaciais em seus consti‑ diques, com até algumas dezenas de metros
tuintes, grau de soldagem, texturas e estru‑ de espessura, com destaque para os que cir‑
turas permitiram a de iniçã o de vá rias cundam o Platô da Ramada e para os domos,
faciologias, como visto, por exemplo, no tra‑ com algumas centenas de metros de exten‑
balho de Matté et al. (2016). sã o. Os domos mostram pronunciada folia‑
A porçã o efusiva do vulcanismo çã o de luxo, principalmente, nas bordas,
Acampamento Velho é dominada por derra‑ bem como porçõ es autobrechadas. També m
mes riolı́ticos (coulées), posicionados, princi‑ ocorrem raros diques de diabá sios e gabros,
palmente, no topo desta unidade, embora, de com até 30 metros de espessura e com tex‑
maneira restrita, també m ocorram intercala‑ tura equigranular muito ina a mé dia (Cor‑
dos aos ignimbritos (Figs. 3D‑3F). Em geral, rê a, 2017).
sã o rochas por irı́ticas, com fenocristais de A porçã o de composiçã o interme‑
sanidina e de quartzo, este ú ltimo, apresen‑ diá ria do magmatismo da Formaçã o Acam‑
tando muitas vezes feiçõ es de reabsorçã o pe‑ pamento Velho é representada por rochas
la matriz, provocadas pelas altas diorı́ticas e traquı́ticas subvulcâ nicas (Figs.
temperaturas de posicionamento das lavas 3G‑3H; Matté et al., 2012, 2016). Ocorrem na
(acima dos 900°C) (Sommer et al., 2013; forma de dois corpos principais, de dimen‑
Leitzke et al., 2020). Mostram faciologias, sõ es quilomé tricas, no Platô da Ramada e,
que variam de riolitos maciços, foliados, do‑ possivelmente, marcam soleiras, posiciona‑
brados a brechados. Tanto riolitos quanto ig‑ das ao longo de descontinuidades da crosta,
nimbritos possuem porçõ es altamente que permitiram sua ascensã o (Matté et al.,
devitri icadas, caracterı́sticas das porçõ es in‑ 2016). Sã o rochas constituı́das, dominante‑
ternas de luxos e de derrames espessos, cu‑ mente, por oligoclá sio a andesina, por orto‑
jo re lexo é um arranjo granofı́rico clá sio, por an ibó lio e por augita (Wo34‑38,
quartzofeldspá tico, algumas vezes, acompa‑ En25‑38, Fs24‑36), possuem texturas equigra‑
nhado por esferulitos e textura axiolı́tica nular ina a mé dia e por irı́tica, com comuns
(Sommer et al., 2005, 2006; Matté et al., evidê ncias de desequilı́brio quı́mico, repre‑
2016). sentado pela presença da textura antirapaki‑
De modo restrito, ocorrem depó sitos vi (Fig. 3H).
de lavas bá sicas nas porçõ es de topo desta A porçã o plutô nica da Formaçã o
unidade. Sã o basaltos com poucos metros de Acampamento Velho é representada por
espessura, com textura por irı́tica, com feno‑ granitoides alcalino‑só dicos da Suı́te Intrusi‑
cristais de labradorita e de piroxê nio, com va Saibro (Hartmann & Nardi, 1982). Os cor‑
morfologia do tipo a'a', como atestado pela pos mais expressivos desta unidade, em
estrutura brechada, à s vezes, mostrando fei‑ termos de superfı́cie a lorante, ocorrem a
çõ es de interaçã o vulcano‑sedimentares, e nordeste do Lineamento de Ibaré e compre‑
com muitas vesı́culas e amı́gdalas alongadas, endem o Granito Jaguari, a Suı́te Intrusiva
de até 1 cm (Sommer et al., 2005; Matté et Ramada e o Complexo Granı́tico Sã o Sepé
al., 2016). (Fig. 1).
Rochas subvulcâ nicas, relacionadas As feiçõ es observadas nas rochas
ao magmatismo da Formaçã o Acampamento vulcâ nicas da Formaçã o Acampamento Ve‑
Velho, sã o comuns, e, temporalmente, posici‑ lho, tais como ignimbritos com alto grau de
O Vulcanismo Ediacarano‑Cambriano da Bacia do Camaquã 135
Contribuições à Geologia do Rio Grande do Sul e de Santa Catarina
Figura 3 ‒ Exemplos de rochas vulcâ nicas da Formaçã o Acampamento Velho: A) Padrã o caracterı́stico de
a loramento tabular dos ignimbritos densamente soldados; B) Amostra de ignimbrito de composiçã o riolı́tica,
com pú mices (cores claras) e com litoclastos cognatos (marrons) e litoclastos acidentais (cinzas); C)
Fotomicrogra ia de ignimbrito, com cristaloclasto de sanidina e matriz a base de vitroclastos (shards) (nicó is
paralelos); D) A loramento da Cascata do Pessegueiro (base do Cerro do Perau), onde se observam, em primeiro
plano, riolitos, com foliaçã o e com dobras de luxo, e, em segundo plano, o Cerro do Bugio, com depó sitos
ignimbrı́ticos tabulares; E) Amostra de riolito, com foliaçã o de luxo; F) Fotomicrogra ia de riolito, com foliaçã o
e com dobra de luxo (porçã o esquerda a nicó is perpendiculares e porçã o direita a nicó is paralelos); G) Contato
entre rochas subvulcâ nicas diorı́ticas (relevo plano, com vegetaçã o levemente mais expressiva) e ignimbritos; e
H) Fotomicrogra ia de traquito subvulcâ nico, com augitas e com fenocristal de plagioclá sio, com textura
antirapakivi (porçã o superior a nicó is paralelos e porçã o inferior a nicó is perpendiculares).
Figura 4 ‒ Exemplos de rochas vulcâ nicas do Membro Rodeio Velho: A) A loramento “Fervor”, no Rio Camaquã ,
no qual se observa um depó sito de arenito eó lico intercalado aos derrames; B) Amostra de basalto por irı́tico,
com amı́gdalas; C) Fotomicrogra ia de basalto por irı́tico (porçã o superior a nicó is paralelos e porçã o inferior a
nicó is perpendiculares); D) Superposiçã o de ló bulos; E) Feiçõ es de superfı́cie lisa e em corda; F) Detalhe da
estrutura dos tubos de lava; G) Corrugaçõ es e depressõ es circulares, indicando feiçõ es de escape de gases; H)
Diques clá sticos de preenchimento; e I) Fotomicrogra ia de basalto (direita), em contato com arenito (esquerda)
de dique clá stico de preenchimento (porçã o superior a nicó is paralelos e porçã o inferior a nicó is
perpendiculares).
mais jovens mostram idade de 587 ±4 Ma 1999, 2005; Wildner et al., 2002; Matté et al.,
(Liz et al., 2009). 2012), e, possivelmente, por processos de
mescla de magma (Matté et al., 2021).
5. 2 O magmatismo alcalino sódico da Este magmatismo possui cará ter al‑
Formação Acampamento Velho calino‑só dico, evidenciado, no diagrama TAS,
por um trend, situado logo acima da linha
A Formaçã o Acampamento Velho que divide as rochas alcalinas das subalcali‑
apresenta uma sequê ncia vulcâ nica bimodal, nas (Fig. 5A), bem como pelos valores de
com predomı́nio de termos á cidos (riolitos e Na2O‑2 maiores do que os de K2O, como de‑
ignimbritos), em relaçã o aos bá sicos (basal‑ inido por Le Maitre (2002). Riolitos comen‑
tos), poré m o magmatismo desta unidade diı́ticos sã o predominantes na sequê ncia
evoluiu, pelo menos em parte, por processos vulcâ nica, embora algumas rochas á cidas se‑
de cristalizaçã o fracionada, desde termos jam metaluminosas subalcalinas (Sommer et
bá sicos, até á cidos, visto as ocorrê ncias de al., 2006) e as rochas bá sicas sã o representa‑
rochas intermediá rias diorı́ticas e traquı́ticas das, principalmente, por hawaitos, por ba‑
subvulcâ nicas associadas (Sommer et al., saltos e por raros mugearitos. As rochas
O Vulcanismo Ediacarano‑Cambriano da Bacia do Camaquã 139
Contribuições à Geologia do Rio Grande do Sul e de Santa Catarina
á cidas e intermediá rias possuem notá vel ca‑ litos alto‑Nb, sugerem que este magmatismo
rá ter peralcalino, comprovado, inclusive, pe‑ pode estar relacionado a fontes com menor
los seus elevados teores de Zr, conforme in luê ncia de processos metassomá ticos re‑
discutido por Leat et al. (1986). lacionados à subducçã o, quando compara‑
Sommer et al. (2005) identi icaram dos aos dos magmas do vulcanismo Hilá rio
trê s conjuntos de rochas vulcâ nicas nesta (Fig. 5F). Os padrõ es de ETR sã o tı́picos de
unidade com contrastantes conteú dos de Ti‑ sé ries alcalinas, com enriquecimento de
P e de Nb: i) basaltos‑riolitos alto‑Ti‑P; ii) ba‑ ETRL, em relaçã o aos ETRP (Fig. 5G). As ro‑
saltos‑riolitos baixo‑Ti‑P; e iii) riolitos alto‑ chas alto‑Ti apresentam um leve enriqueci‑
Nb. mento em ETR, principalmente, em ETRL
Os magmas bá sicos baixo‑Ti‑P pos‑ (LaN/YbN = 10 a 12), enquanto os riolitos al‑
suem um suave enriquecimento em ETRL, to‑Nb exibem um menor enriquecimento
em relaçã o aos ETRP, com razõ es LaN/YbN nestes elementos (LaN/YbN = 1 a 2), uma
pró ximas a 3 e com ausê ncia de anomalia de maior anomalia negativa de Eu e um forte
Eu (Fig. 5C). Os magmas bá sicos alto‑Ti‑P sã o empobrecimento em ETRL, o que pode re‑
levemente mais enriquecidos em ETRL, ten‑ letir a presença de minerais ricos nestes
do razõ es LaN/YbN entre 10 e 11. Os elemen‑ elementos entre as fases fracionadas, como a
tos‑traço das rochas bá sicas tê m um alanita, ou ainda, uma diferente fonte. Os da‑
comportamento similar aos observados em dos isotó picos das rochas intermediá rias da
basaltos de ilhas oceâ nicas (OIB), excetuan‑ Formaçã o Acampamento Velho apresentam
do‑se os conteú dos menores de Nb, de Ta e valores de 87Sr/86Sr(i) entre 0,704802 e
de P e os maiores de Ba (Fig. 5B). Os dados 0,709583, com εNd(i) de 2,96 a ‑14,19, en‑
isotó picos das rochas bá sicas da Formaçã o quanto as rochas á cidas mostram valores de
87
Acampamento Velho mostram valores de Sr/86Sr(i) entre 0,703484 e 0,717056, com
87
Sr/86Sr(i) variando de 0,704500 a 0,709000 εNd(i) de ‑7,62 a ‑9,91. As idades‑modelo
(Gastal & Lafon, 1998; Chemale Jr. et al., Sm‑Nd (TDM) para as rochas intermediá rias
1999; Wildner et al., 2002, Matté et al., variam de 0,9 Ga a 2,1 Ga e, para as rochas
2021). As idades‑modelo Sm‑Nd (TDM) vã o á cidas, de 1,6 Ga a 3,3 Ga.
do Meso ao Paleoproterozoico, com valores O magmatismo bá sico da Formaçã o
entre 1,5 Ga e 1,9 Ga. Os valores de εNd(i) pa‑ Acampamento Velho pode representar a fu‑
ra essas rochas variam de ‑0,60 a ‑7,52. sã o da cunha de um manto do tipo EMI, com
As rochas á cidas do vulcanismo maior enriquecimento em ETR, possivel‑
Acampamento Velho geralmente tê m teores mente, a partir de apatitas (cf. modelo de
de SiO2 superiores a 70% e razõ es FeOt/(Fe‑ Foley, 1992) e uma moderada participaçã o
Ot+MgO) maiores do que 0,9, tı́picos de rioli‑ crustal (e.g. Wildner et al., 2002; Sommer et
tos de sistemas alta‑sı́lica e de sé ries al., 2005, 2006). As rochas á cidas da Forma‑
alcalinas (Ewart, 1979). Os elementos‑traço çã o Acampamento Velho poderiam ter sua
nos riolitos exibem padrõ es similares aos gê nese ligada, principalmente, a processos
das rochas granı́ticas de ambiente intraplaca de contaminaçã o crustal, tendo em vista o
e a elevada razã o Ce/Nb, bem como razõ es aumento dos isó topos de Sr e de Pb e, se‑
Zr/Nb > 10, assemelha‑se a das associaçõ es cundariamente, por cristalizaçã o fracionada,
magmá ticas pó s‑orogê nicas (Leat et al., a partir de um lı́quido menos diferenciado,
1986). Os menores conteú dos de Ce e de Sm originado a partir de fontes de um manto do
e os maiores de Rb e de Ta, combinados a ra‑ tipo EMI, como sugerido para a maior parte
zõ es menores de Ce/Nb, constatadas nos rio‑ do magmatismo pó s‑colisional alcalino‑só ‑
dico no sul do Brasil (Gastal & Lafon, 1998; vem ter evoluı́do, principalmente, por pro‑
Chemale Jr. et al., 1999; Wildner et al., 2002; cessos de cristalizaçã o fracionada, e dados
Matté et al., 2021). As caracterı́sticas geoquı́‑ isotó picos sugerem que este magmatismo se
micas das rochas á cidas sã o semelhantes à s originou, a partir de um manto empobreci‑
de granitos tipo‑A, tı́picas para ambiente do, que foi enriquecido, posteriormente, em
pó s‑colisional e que, no Escudo Sul‑Rio‑ elementos incompatı́veis, como Ba. Ainda,
Grandense, sã o representados pela Suı́te In‑ aqueles autores estimam que este magma‑
trusiva Saibro. tismo prové m do manto superior, tendo sua
As informaçõ es geocronoló gicas origem relacionada a fontes do tipo EMI, en‑
compiladas por Matté (2016) permitem con‑ riquecidas em Nd e empobrecidas em Sr, e
cluir que o vulcanismo da Formaçã o Acam‑ com comportamento tı́pico para basaltos de
pamento Velho possuiu um perı́odo de ambiente intraplaca continentais. Ainda,
atividade constante, ao longo de 30 Ma, com‑ Chemale Jr. (2000) estima uma origem, para
preendido entre, aproximadamente, 580 Ma essas rochas, a partir de um manto modi ica‑
(Sommer et al., 2017) e 549 Ma (Sommer et do, visto as idades‑modelo Sm‑Nd (TDM) de
al., 2005). 1,6 Ga a 1,9 Ga.
Almeida et al. (2010) obtiveram a
5. 3 O magmatismo moderadamente al‑ idade de 535 ±1 Ma para um basalto subvul‑
calino a toleítico do Membro Rodeio Ve‑ câ nico do Membro Rodeio Velho, atravé s do
lho mé todo Ar‑Ar. Almeida et al. (2012), atravé s
de dataçã o pelo mé todo U‑Pb em um basalto
A elevada alteraçã o intempé rica e hi‑ alcalino, determinaram a idade deste mag‑
drotermal das rochas do vulcanismo Rodeio matismo em 547 ±6 Ma e concluem que, no
Velho prejudicam sua caracterizaçã o geoquı́‑ rifte Guaritas (Almeida et al., 2009), durante
mica, o que, de fato, se re lete na escassez de este intervalo de aproximadamente 12 Ma,
dados sobre esta unidade. Entretanto, Almei‑ estabeleceu‑se um sistema distensivo, com
da et al. (2000) indicam conteú dos de SiO2 falhas profundas, que teriam permitido a as‑
entre 46% e 65%, compondo basaltos e an‑ censã o do magma manté lico desta unidade.
desitos de a inidade moderadamente alcali‑
na a toleı́tica, com predomı́nio de termos 6 CONSIDERAÇÕES FINAIS
bá sicos (Fig. 5A).
O cará ter moderadamente alcalino O perı́odo pó s‑colisional no Escudo
dessas rochas també m é indicado pelos pa‑ Sul‑Rio‑Grandense é marcado pela presença
drõ es de Nb, de Y, de Zr e de TiO2 (Fig. 5B), de extensas falhas transcorrentes e extensio‑
bem como pelo suave enriquecimento em nais e de zonas de cisalhamento, que permi‑
ETRL, em relaçã o aos ETRP (Fig. 5C), o que tiram a ascensã o de lı́quidos manté licos, que
indica uma similaridade com basaltos alcali‑ evoluı́ram por cristalizaçã o fracionada e por
nos, segundo Almeida et al. (2000). Alé m contaminaçã o crustal (Bitencourt & Nardi,
disso, Almeida et al. (2012) sugerem que es‑ 2000) e constituı́ram o magmatismo pó s‑co‑
te enriquecimento em ETRL ocorreu em con‑ lisional da orogenia Brasiliana Pan‑Africana,
diçõ es de baixas taxas de fusã o parcial, em que se destaca o vulcanismo ediacarano‑
provavelmente, associado a uma fonte que cambriano da Bacia do Camaquã . Esta bacia
conté m granada. é caracterizada pela alternâ ncia de ciclos
Almeida et al. (2000) consideram vulcâ nicos e pela sedimentaçã o siliciclá stica,
que as rochas do Membro Rodeio Velho de‑ desenvolvidas, dominantemente, sob condi‑
Figura 5 ‒ A) Diagrama TAS (Le Bas et al., 1986). A linha pontilhada separa as rochas alcalinas das
subalcalinas; B) Diagrama de elementos‑traço e de ETR normalizados pelo NMORB (Sun & McDonough,
1989); C, E e G) Diagramas de ETR normalizados pelo condrito (Nakamura, 1974); D) Diagrama de elementos‑
traço e de ETR normalizados pelo OIB (Sun & McDonough, 1989); e F) Diagrama de elementos‑traço e de ETR
normalizados pelo ORG (Pearce et al., 1984).
çõ es subaé reas em ambientes continentais. O Almeida, D. P. M., Lopes, R. C., Lima, L. & Go‑
magmatismo da bacia perdurou intermiten‑ mes, C. H. 2000. Petrography and geochemis‑
temente, por cerca de 65 Ma, e sua evoluçã o, try of the volcanic rocks from the Rodeio
desde a a inidade alcalina potá ssica (Forma‑ Velho Formation (Ordovician of the Camaquã
Basin, RS, Brazil): preliminary results. Revis‑
çã o Hilá rio), passando a alcalina só dica (For‑
ta Brasileira de Geociências, Sã o Leopoldo,
maçã o Acampamento Velho) e inalizando 30: 769‑774.
como alcalina/toleı́tica (Membro Rodeio Ve‑
lho), re lete diferentes origens crustais e Almeida, D. P. M., Zerfass, H., Basei, M. A., Pe‑
manté licas metassomatizadas, com grande try, K. & Gomes, C. H. 2002. The Acampamen‑
in luê ncia de lı́quidos, que marcam a exaus‑ to Velho Formation, a Lower Cambrian
Bimodal Volcanic Package: Geochemical and
tã o de reservató rios manté licos hidratados,
Stratigraphic Studies from the Cerro do Bu‑
gerados na subducçã o pré via. A caracterı́sti‑ gio, Perau and Serra de Santa Bá rbara (Caça‑
ca metassomá tica deste magmatismo, relaci‑ pava do Sul, Rio Grande do Sul, RS ‑ Brazil).
onada à subducçã o das fontes manté licas, é Gondwana Research, 5(3): 721‑733.
evidenciada pelas anomalias negativas de Nb
e pelas caracterı́sticas isotó picas, tı́picas de Almeida, R. P., Janikian, L., Fragoso‑Cesar, A.
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eruptivo) do vulcanismo da Bacia do Ca‑
maquã ainda nã o puderam ser feitas, devido Almeida, R. P., Janikian, L., Fragoso‑Cesar, A.
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à ausê ncia de dados sobre as variaçõ es late‑
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rais signi icativas ou sobre as fá cies proxi‑ Guaritas Rift, Early Cambrian, Southern Bra‑
mais dos depó sitos, alé m da complexidade zil. Sedimentary Geology, 217: 30‑51.
causada pela deformaçã o rú ptil subsequen‑
te. Bitencourt, M. F. & Nardi, L. V. S. 2000. Tecto‑
nic setting and sources of magmatism rela‑
ted to the southern Brazilian Shear Belt.
AGRADECIMENTOS Revista Brasileira de Geociências, 30: 184‑
187.
Os autores agradecem ao CNPq pelo
auxı́lio inanceiro e bolsas de doutorado e Bongiolo, E. M. 2006. Integração de dados mi‑
produtividade em pesquisa (141977/2011‑ neralógicos, isótopos estáveis (O, H) e porosi‑
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nal of South American Earth Sciences, 47:
Ramos, D. P. 2018. Estudo Geoquímico e Isotó‑ 152‑165.
pico dos Processos Metalogenéticos Associa‑
Matté et al.
1 INTRODUÇÃO
A orientaçã o preferencial dos minerais é caracterı́stica de cada tipo de rocha e é resulta‑
do de vá rios processos geoló gicos, tais como o luxo da á gua em sedimentos, o luxo de lava ou
de magma em rochas vulcâ nicas e plutô nicas ou a deformaçã o das rochas metamó r icas. Nesse
contexto, o estudo da orientaçã o dos minerais pode nos ajudar a entender diversos processos
geoló gicos. Nas rochas metamó r icas, por exemplo, a orientaçã o dos minerais é visı́vel a olho nu
e mensurá vel em campo. No entanto em rochas como basaltos e granitos maciços, esta orienta‑
çã o é observada apenas atravé s de instrumentos e de té cnicas avançadas de laborató rio.
Os minerais magné ticos, mesmo ocorrendo em quantidades pequenas nas rochas, nor‑
malmente apresentam uma orientaçã o preferencial, conhecida como fá brica ou trama magné ti‑
ca. Quando os grã os sã o orientados preferencialmente em uma rocha, ela pode apresentar uma
anisotropia de susceptibilidade magné tica (ASM). A ASM pode ser investigada, por meio da ani‑
sotropia magné tica, té cnica baseada na variabilidade direcional das propriedades magné ticas,
que permite a determinaçã o da trama estrutural (petrofá brica) das rochas (Graham, 1954). Des‑
de a publicaçã o do trabalho pioneiro de Graham (1954), a ASM tem sido amplamente utilizada
no estudo de processos geoló gicos. No Brasil, esta té cnica foi introduzida no inı́cio dos anos de
1990 (e.g. Archanjo, 1993; Raposo & Ernesto, 1995). Atualmente, vá rios trabalhos vê m contri‑
buindo para o entendimento de processos geoló gicos em diferentes tipos de rochas no sul do
Brasil (e.g. Raposo & Ernesto, 1995; Gastal et al., 2015; Guimarã es et al., 2018; Lyra et al., 2018;
Benites et al., 2020; Sbaraini et al., 2020; Tomé et al., 2020; Haag et al., 2021; Gambeta et al.,
2021, submetido).
Contribuições à Geologia do Rio Grande do Sul e de Santa Catarina
O avanço tecnoló gico e a criaçã o de tares e metamó r icas (Graham, 1954). Fluxos
novos instrumentos sensı́veis possibilita me‑ de lava e corpos subvulcâ nicos frequente‑
dir a anisotropia da maioria das rochas, com mente apresentam escassez de indicadores
uma boa precisã o, mesmo das que apresen‑ cinemá ticos macroscó picos (como, por exem‑
tam baixo grau de anisotropia, como, por ex‑ plo, minerais alongados e estruturas de linea‑
emplo, rochas vulcâ nicas e sedimentares çã o e de foliaçã o magmá tica), tornando
(Tarling & Hrouda, 1993). Alé m disso, a ASM necessá ria a aplicaçã o de uma té cnica capaz
é uma té cnica rá pida e nã o destrutiva, o que de determinar a orientaçã o da trama micros‑
a torna versá til e aplicá vel em vá rios ramos có pica presente nestas rochas. Por esse moti‑
da Geologia estrutural e da Geofı́sica. vo, a ASM tem sido amplamente utilizada em
Devido a processos erosivos, que estudos de sequê ncias vulcâ nicas, tendo em
promovem a remoçã o de partes do sistema vista as limitaçõ es das té cnicas convencionais
vulcâ nico, e tectô nicos, responsá veis pelo so‑ de campo (e.g. Cañ ó n‑Tapia, 2005).
terramento, pelo soerguimento e pela defor‑ A té cnica de ASM se baseia na obten‑
maçã o do registro geoló gico, o estudo e a çã o da susceptibilidade magné tica (k) de
reconstruçã o de sistemas vulcâ nicos em ter‑ uma amostra, por meio do uso de um suscep‑
renos antigos é sempre um desa io geoló gico. tibilı́metro. Este aparelho gera um campo
Nas ú ltimas dé cadas, a ASM vem sendo larga‑ magné tico (H) e mede a resposta da amostra
mente utilizada no entendimento do vulca‑ a este campo, ou seja, sua magnetizaçã o (M).
nismo em sistemas modernos, com exemplos A Figura 1 representa esse processo, em que
no Hawaı́ e nos Andes (e.g. Cañ ó n‑Tapia, uma amostra é submetida a um campo H em
2005; Moncinhatto et al., 2020). No entanto, diferentes posiçõ es. Tendo em vista que a
sua aplicaçã o ainda é incipiente em estudos magnetizaçã o é proporcional à susceptibili‑
relacionados a terrenos vulcâ nicos no Brasil. dade (M = k × H), medindo a amostra em di‑
Quando aplicada a sucessõ es antigas, a ASM ferentes posiçõ es é possı́vel obter um tensor
compõ e uma té cnica promissora, pois possi‑ magné tico (K). Este tensor representa a ori‑
bilita a identi icaçã o de centros emissores e entaçã o das partı́culas magné ticas na amos‑
de processos vulcanoló gicos e tectô nicos tra (sejam elas paramagné ticas,
(e.g. Haag et al., 2021; Gambeta et al., 2021, diamagné ticas ou ferromagné ticas) e é de i‑
submetido; e suas referê ncias). Todos esses nido, em orientaçã o e em magnitude, por trê s
aspectos sã o essenciais ao entendimento da eixos principais: K1 ≥ K2 ≥ K3 (Fig. 1) (Tarling
evoluçã o de sistemas geoló gicos complexos, & Hrouda, 1993). Para ins de aná lise, de
como, por exemplo, o vulcanismo pó s‑tectô ‑ comparaçã o e de estatı́stica, os eixos princi‑
nico em cinturõ es orogê nicos. Nas seçõ es se‑ pais sã o usualmente representados, usando
guintes, serã o discutidos os princı́pios da uma projeçã o estereorá ica, conforme apre‑
ASM e como ela pode ser aplicada a suces‑ sentado na Figura 1.
sõ es vulcâ nicas antigas, por meio de um es‑ A aná lise de orientaçã o e de magni‑
tudo de caso. tude dos eixos é realizada de forma seme‑
lhante à aná lise estrutural, sendo necessá rias
2 PRINCÍPIOS DA ASM E SUA APLICA‑ vá rias medidas de diversas amostras, para se
ÇÃO EM SISTEMAS VULCÂNICOS obter um resultado signi icativo. Dessa for‑
ma, o tensor magné tico obtido auxilia na de‑
A ASM consiste em uma té cnica geo‑ terminaçã o da foliaçã o (que tem seu polo
fı́sica, capaz de determinar a orientaçã o da marcado pelo eixo K3) e da lineaçã o (marcada
fá brica magné tica de rochas ı́gneas, sedimen‑ pelo eixo K1) magné ticas, feiçõ es que podem
150 Edição da Sociedade Brasileira de Geologia – Núcleo RS/SC
Savian et al.
Figura 1 ‒ Processo de obtençã o da susceptibilidade magné tica e de representaçã o do tensor magné tico
resultante.
ajudar na identi icaçã o da paleocorrente, das decorrente do luxo magmá tico, é mais in‑
fontes emissoras e dos regimes de luxo. tenso (Fig. 2A) (Cañ ó n‑Tapia & Herrero‑Ber‑
Alé m disso, com a ASM també m é possı́vel vera, 2009). Em diques, os tensores
obter informaçõ es sobre a forma do tensor magné ticos em bordas opostas tendem a ser
magné tico, por meio do parâ metro de forma distintos, possibilitando a identi icaçã o do
(T), que classi ica as amostras em oblatas, sentido de luxo, que é marcado pela conver‑
prolatas e triaxiais (Jelinek, 1981), e sobre o gê ncia dos eixos K1 de amostras obtidas em
grau de anisotropia (P’), que indica a dife‑ limites opostos do dique.
rença de proporçã o entre os eixos principais. No caso de derrames de lava e de de‑
Esses parâ metros auxiliam na de iniçã o do pó sitos de luxo piroclá sticos governados por
regime de luxo e dos processos de deforma‑ luxo laminar, a orientaçã o dos tensores
çã o. magné ticos tende a ser sub‑horizontal (Fig.
A aplicaçã o das té cnicas, relaciona‑ 2B), com o desenvolvimento de um imbrica‑
das à trama magné tica, é uma ferramenta mento basal, que permite a identi icaçã o do
muito ú til em sistemas vulcâ nicos, tendo em sentido de luxo, com base no sentido de im‑
vista sua aplicaçã o, tanto em sistemas de ali‑ bricamento do eixo K3. Em porçõ es de frente
mentaçã o quanto em processos super iciais, de derrame, pode haver o desenvolvimento
como derrames de depó sitos de luxos piro‑ de uma fá brica subvertical, que é associada à
clá sticos (e.g. Cañ ó n‑Tapia et al., 1996; progressã o do derrame (Fig. 2B) (Cañ ó n‑Ta‑
Cañ ó n‑Tapia, 2005; Moncinhatto et al., 2020; pia et al., 1996).
e suas referê ncias). Durante processos erup‑ Usualmente, o resultado obtido com
tivos, podem ocorrer signi icativas diferen‑ a ASM é satisfató rio e tem relaçã o direta com
ças na dinâ mica de luxo (e.g. Cagnoli & a trama presente nas amostras, sendo, por‑
Tarling, 1997) e, dessa forma, orientaçõ es tanto, uma anistropia de forma, que indica a
distintas de trama magné tica podem ser ob‑ direçã o preferencial dos minerais. Entretan‑
tidas, em funçã o do local de amostragem. to, é importante salientar que existem exce‑
Diques e condutos alimentadores çõ es e, nesses casos, a interpretaçã o da ASM
tendem a apresentar foliaçã o magné tica sub‑ exige estudos mais aprofundados. Essas ex‑
vertical, mais bem registrada junto aos limi‑ ceçõ es estã o geralmente associadas a fatores
tes do corpo intrusivo, onde o cisalhamento, geomé tricos, estruturais e cristalográ icos
Anisotropia de Susceptibilidade Magnética (ASM) 151
Contribuições à Geologia do Rio Grande do Sul e de Santa Catarina
Figura 2 ‒ Ambientes vulcâ nicos e as respectivas orientaçõ es dos tensores magné ticos e de suas projeçõ es
estereográ icas: A) Zonas de condutos ou de diques; e B) Derrames.
dos minerais magné ticos (Rochette et al., apresenta anisotropia de forma, ou seja, seu
1992, 1999; Moncinhatto et al., 2020; e suas eixo maior coincide com o eixo de maior
referê ncias): susceptibilidade K1 (no caso de grã os MD).
1. Geomé tricos: (i) caso as partı́culas Entretanto, existem minerais que apresen‑
presentes na amostra nã o apresentem uma tam tipos distintos de anisotropia, como, por
orientaçã o ou um formato preferencial, a exemplo, a hematita e grande parte dos sili‑
proporçã o dos eixos principais será seme‑ catos. Nesses casos, o maior eixo do mineral
lhante (K1 ~ K2 ~ K3) e, por consequê ncia, o nã o coincide, necessariamente, com o maior
tensor resultante será pouco de inido ou terá eixo de susceptibilidade magné tica. Esse ti‑
um formato de esfera, impossibilitando a de‑ po de anisotropia é conhecido como magne‑
terminaçã o con iá vel das direçõ es de K1, K2 e tocristalina e, nestes casos, K1 é paralelo a
K3; e (ii) caso as partı́culas magné ticas inte‑ um eixo cristalográ ico especı́ ico (Rochette
rajam entre si, pode ocorrer o surgimento de et al., 1992; Biedermann, 2018).
uma anisotropia de distribuiçã o (Hargraves Dessa forma, ica clara a necessida‑
et al., 1991). Dependendo da proximidade de de um estudo aprofundado, a respeito da
das partı́culas, esse efeito pode anular ou po‑ mineralogia magné tica presente na amostra
de contrariar a anisotropia de forma, levando em estudo, de forma a evitar interpretaçõ es
a interpretaçõ es distintas da ASM; errô neas da ASM. A caracterizaçã o magné ti‑
2. Estruturais: grã os magné ticos sã o ca busca identi icar as fases minerais pre‑
compostos por estruturas de domı́nio. Em sentes em uma amostra, que contribuem
funçã o dessas estruturas, podem ocorrer para a magnetizaçã o e para a anisotropia,
respostas distintas à magnetizaçã o. No caso bem como determinar o tamanho de grã o
de grã os multidomı́nio (MD), a fá brica resul‑ dos minerais. Isso se faz, por meio de diver‑
tante é normal, com K1 paralelo ao maior ei‑ sos experimentos, que permitem a identi i‑
xo do mineral (Rochette et al., 1992). Em caçã o das propriedades fı́sicas desses
contraste, grã os de domı́nio simples (DS) minerais.
apresentam fá brica inversa, o que faz com Uma das maneiras mais diretas de
que os eixos K1 e K3 da ASM sejam trocados identi icaçã o dos minerais ferromagné ticos
(Rochette et al., 1992, 1999; Moncinhatto et de uma amostra é a aná lise da variaçã o da
al., 2020); susceptibilidade magné tica, em funçã o da
3. Cristalográ icos: a magnetita com‑ temperatura, para a determinaçã o das tem‑
põ e o mineral magné tico mais comum e peraturas de Curie (e.g. Dunlop & Ozdemir,
1997). As chamadas curvas termomagné ti‑ necessá rio que as curvas sejam analisadas
cas auxiliam na identi icaçã o das temperatu‑ pela decomposiçã o da curva de MRI entre di‑
ras de transiçã o, que sã o caracterı́sticas para ferentes curvas cumulativas do tipo log‑
cada mineral (e.g. a temperatura de Curie Gaussian (Cumulative Log‑Gaussian ‒ CLG)
para magnetita ~ 580 oC e a temperatura de (Robertson & France, 1994). Dessa forma, é
Né el para hematita ~ 675 oC). Alé m disso, as possı́vel obter os valores especı́ icos de
curvas termomagné ticas també m informam MRIS, de coercividade mé dia e do ı́ndice de
sobre as mudanças de estrutura cristalina e dispersã o (DP).
sobre as reaçõ es quı́micas, que afetam os mi‑ Os ciclos de histerese permitem a
nerais, devido ao aquecimento da amostra. obtençã o simultâ nea de diversos parâ me‑
As curvas de aquecimento e de resfriamento tros, incluindo Hc, Hcr, Ms, Mrs. Estes dados
sã o ditas reversı́veis, se nã o ocorrerem podem ser interpretados, utilizando‑se o Di‑
transformaçõ es mineraló gicas durante o agrama de Day, o qual de ine as regiõ es de
aquecimento, ou seja, a susceptibilidade domı́nio do material, a partir dos parâ metros
magné tica, durante o aquecimento e o resfri‑ Mr/Mrs versus Hcr/Hc (Day et al., 1977).
amento, continua inalterada. Caso ocorram Neste diagrama, sã o de inidos campos com
transformaçõ es quı́micas e estruturais du‑ os domı́nios de grã os: domı́nio simples (SD),
rante o aquecimento, o comportamento das pseudo‑domı́nio simples (PSD) e multidomı́‑
curvas de aquecimentos e de resfriamento nio (MD).
será diverso e, assim, sã o chamadas de irre‑ Atualmente, o Diagrama de Day está
versı́veis. caindo em desuso, principalmente, porque
Uma alternativa consiste em estudar suas interpretaçõ es sã o empı́ricas e vá lidas
propriedades magné ticas em temperatura para magnetita e titanomagnetita apenas
ambiente. As curvas de magnetizaçã o rema‑ (e.g. Roberts et al., 2018). O diagrama irst
nente isotermal (MRI) e de histerese possibi‑ order reversal curve (FORC) é a té cnica mag‑
litam a obtençã o da coercividade (Hc), da né tica atualmente utilizada, para determinar
coercividade de remanê ncia (Hcr), da mag‑ a estrutura de domı́nio dos minerais (e.g.
netizaçã o de saturaçã o (Ms) e da magnetiza‑ Roberts et al., 2017). Estas curvas sã o deri‑
çã o remanente de saturaçã o (Mrs) das vadas de diversas mediçõ es de vá rios ciclos
amostras. A MRI consiste na aplicaçã o de um de histerese em uma amostra, distribuı́das
campo contı́nuo H, sucessivamente maior, em um amplo espectro de campo magné tico
em temperatura constante, até a saturaçã o aplicado. O modelamento das curvas de his‑
da amostra. Apó s cada etapa de induçã o terese, por meio de funçõ es de distribuiçõ es
magné tica, a magnetizaçã o é medida, até a bidimensionais, gera os diagramas FORC,
saturaçã o da amostra ser atingida (MRIS). que sã o conhecidos, també m, como diagra‑
Geralmente, os equipamentos atualmente mas de contorno. Os diagramas FORC tam‑
disponı́veis permitem induzir campos má xi‑ bé m fornecem informaçõ es sobre a interaçã o
mos de 2 Tesla. Dessa forma, é possı́vel obter entre partı́culas, o que é fundamental, quan‑
a magnetizaçã o de saturaçã o (MRIS) de do há variaçã o do tamanho do grã o.
grande parte dos minerais magné ticos por‑ Em certos casos, é necessá rio isolar
tadores das rochas (e.g. magnetita ~ 30‑200 a contribuiçã o dos minerais ferromagné ticos
mT e hematita > 1T). Em caso de ocorrê ncia das matrizes diamagné tica e paramagné tica,
de mistura de minerais ferromagné ticos nas o que pode ser feito, por meio da aplicaçã o
amostras, a contribuiçã o de cada mineral se da Anisotropia de Magnetizaçã o Remanente
re lete nas curvas de aquisiçã o. Neste caso, é Anisteré tica (AMRA) (Jackson, 1991). De for‑
Anisotropia de Susceptibilidade Magnética (ASM) 153
Contribuições à Geologia do Rio Grande do Sul e de Santa Catarina
ma aná loga à ASM, a AMRA é descrita por um porçã o da histó ria geoló gica no sul do Bra‑
elipsoide de remanê ncia anisteré tica, com‑ sil.
posto por trê s eixos ortogonais M1 ≥ M2 ≥
Durante o inal do Neotroterozoico
M3.
ocorre a Bacia do Camaquã , um locus depo‑
Tendo em vista os fatores apresenta‑ sional para expressivoes eventos tectono‑
dos, é necessá rio um bom reconhecimento magmá ticos e de sedimentaçã o de deforma‑
de campo e um protocolo de amostragem e çã o, de vulcanismo, de plutonismo e de
de preparaçã o das amostras (Fig. 3). A amos‑ sedimentaçã o (Lima et al., 2007). As mani‑
tragem é frequentemente realizada com uma festaçõ es vulcâ nicas ocorrem, principal‑
motosserra adaptada, contendo uma broca mente, ao longo de um perı́odo de cerca de
nã o magné tica diamantada, com diâ metro de 55 Ma (aproximadamente, 592‑535 Ma) (Li‑
~ 2,5 cm. Os cilindros amostrados sã o orien‑ ma et al., 2007), compondo um mosaico de
tados, com o auxı́lio de bú ssolas magné tica e registros, que inclui a presença de depó sitos
solar. No laborató rio, esses cilindros sã o cor‑ explosivos e efusivos (derrames de lava, lu‑
tados em espé cimes padrã o (com 2,5 cm de xos de densidade piroclá sticos, corpos sub‑
diâ metro por 2,2 cm de altura), que sã o utili‑ vulcâ nicos).
zados nas té cnicas de ASM e de AMRA. Por
De acordo com diversos autores (Li‑
im, porçõ es irregulares dos cilindros amos‑
ma et al., 2007, e referê ncias), os eventos
trados sã o separadas, para a caracterizaçã o
vulcâ nicos da Bacia do Camaquã podem ser
magné tica, essencial à determinaçã o do por‑
agrupados em trê s ciclos vulcâ nicos:
tador magné tico e à correta interpretaçã o
1. Rochas efusivas e piroclá sticas,
dos resultados (e.g. Moncinhatto et al., 2020,
subordinadas, ligadas ao vulcanismo de
e suas referê ncias).
composiçã o predominantemente interme‑
diá ria, de a inidade shoshonı́tica, agrupadas
3 O VULCANISMO NEOPROTEROZOICO na Formaçã o Hilá rio;
DA BACIA DO CAMAQUÃ
2. Rochas efusivas e piroclá sticas,
Localizado no centro‑oeste do esta‑ associadas ao vulcanismo bimodal, de a ini‑
do do Rio Grande do Sul, o Escudo Sul‑Rio‑ dade moderadamente alcalina só dica, agru‑
Grandense (ESRG) registra uma importante padas na Formaçã o Acampamento Velho;
Figura 3 ‒ Fluxograma, para amostragem paleomagné tica e de té cnicas para determinaçã o da mineralogia
magné tica e da orientaçã o da trama magné tica em rochas. (Legenda: VSM: Vibrating Sample Magnetometer).
Figura 4 ‒ Mapa do ESRG, mostrando as ocorrê ncias vulcâ nicas Neoproterozoicas. Cidades: CS ‑ Caçapava do
Sul; DP ‑ Dom Pedrito; e VNS ‑ Vila Nova do Sul.
principalmente, por uma laminaçã o milimé ‑ com baixo teor de Ti, e com hematita (Hunt
trica, com variaçõ es colorimé tricas entre ro‑ et al., 1995; Lattard et al., 2006). Curvas de
sa e cinza. Esta laminaçã o pode ser plana ou MRI indicam amostras, que nã o alcançam
dobrada e é marcada por nı́veis alternados saturaçã o, mesmo, em campos de 1 T, suge‑
de graus de cristalinidade da rocha, resultan‑ rindo a existê ncia de uma fase magné tica de
te de desvitri icaçã o do material original‑ alta coercividade e uma de baixa (Fig. 6B).
mente vı́treo (Fig. 5B). Esse comportamento é con irmado por ci‑
Petrogra icamente, as rochas sã o he‑ clos de histerese, que apresentam um for‑
micristalinas e afanı́ticas, mas termos por i‑ mato caracterı́stico de cintura de vespa (i.e.,
riticos podem ocorrer, muito wasp‑waisted), indicativo da mistura de mi‑
subordinadamente. Em termos gerais, a ro‑ nerais com coercitividades distintas (Fig.
cha é constituı́da por um ino mosaico de mi‑ 6C) (Tauxe et al., 1996). Diagramas FORC
cró litos e de cristá litos de quartzo e de apresentam uma distribuiçã o centrada em
feldspato e por feiçõ es de desvitri icaçã o, Bu = 0, com baixo espalhamento, ao longo
principalmente, esferulitos (Fig. 5C). Os fe‑ do eixo Bc. Nesses diagramas, ocorre um pi‑
nocristais (< 3% de fenocristais) sã o repre‑ co de coercividade entre 10 mT e 15 mT,
sentados por quartzo e por K‑feldspato, em podendo representar mais de uma fase
associaçã o com microfenocristais (< 0,02 magné tica (Fig. 6D). Este padrã o é frequen‑
mm) de ó xidos de Fe‑Ti e de zircã o. Esses mi‑ temente interpretado como resultado de
nerais apresentam pouca abundâ ncia, ocor‑ grã os MD (Roberts et al., 2017). Aná lises de
rendo de forma localizada, ao longo de MEV, realizadas em duas amostras repre‑
planos de foliaçã o, e em quantidades meno‑ sentativas, indicam a existê ncia de uma pe‑
res do que 5% (Fig. 5D). Enquanto algumas quena quantidade de ó xidos de Fe‑Ti nas
lâ minas sã o geradas por nı́veis de devitri ica‑ amostras estudadas (Fig. 6E). Aná lises de
çã o, outras sã o marcadas pela presença de espectroscopia de energia dispersiva (EED)
fenocristais, o que indica a efetividade na revelam a presença de grã os equantes de ti‑
orientaçã o destes minerais, durante o luxo tanomagnetitas, com baixo conteú do de Ti
(Fig. 5D). (entre 0,56% e 9,88%) e de hematita como
. as principais fases magné ticas presentes
nas amostras estudadas, em concordâ ncia
4. 2 Mineralogia magnética
com os resultados de mineralogia magné ti‑
A caracterizaçã o magné tica foi reali‑ ca (Fig. 6E).
zada, utilizando‑se curvas termomagné ticas,
curvas de MRI, ciclos de histerese, diagramas 4. 3 Fábrica magnética e análise estru‑
FORC e microscopia eletrô nica de varredura tural
(MEV). As amostras dos riolitos sã o caracte‑
rizadas por uma ruidosa diminuiçã o gradual Os riolitos do Cerro do Perau apre‑
na susceptibilidade magné tica em tempera‑ sentam baixos valores de susceptibilidade
turas de ~ 582 oC e de 681 oC (Fig. 6A), valo‑ magné tica mé dia (Km), normalmente, na
res correspondentes à s temperaturas de faixa de 40 × 10‑6 SI (Fig. 7A, linha traceja‑
transiçã o da magnetita e da hematita (Hunt da). Estes valores estã o de acordo com os
et al., 1995; Lattard et al., 2006). Curvas ter‑ esperados para lavas de composiçã o riolı́ti‑
momagné ticas de baixa temperatura exibem ca (Hunt et al., 1995). Resultados escalares
duas transiçõ es, a ‑153 oC e a ‑50 oC (Fig. 6A), indicam graus variá veis de anisotropia (P’),
valores compatı́veis com titanomagnetita, de 1,003 a 3,18, sendo observada uma cor‑
Figura 5 ‒ Feiçõ es de campo e microscó picas do Cerro do Perau: A) Dobra mé trica recumbente; B) Sequê ncia
de dobras centimé tricas, marcadas por distintos nı́veis de recristalizaçã o; C) Matriz, marcada pela presença de
esferulitos (esf) e de cristais de quartzo (qtz) e de feldspato (felds); e D) Foliaçã o, marcada pela presença de
nı́veis ricos em cristais de quartzo e em ó xidos de Fe‑Ti. Abreviaçõ es: qtz ‑ quartzo; esf ‑ esferulito; fels ‑
feldspato alcalino.
relaçã o positiva, poré m pouco signi icativa, to (Fig. 7D), con igurando, possivelmente,
entre P’ e Km (Fig. 7A, quadrados em azul). A uma zona de alta deformaçã o magmá tica.
forma dos tensores magné ticos (T) aponta a Em relaçã o aos resultados direcio‑
predominâ ncia de tensores oblatos (T > 0), nais, os eixos magné ticos sã o geralmente
com mais de 74% dos tensores resultantes bem agrupados (Fig. 8A, com exceçã o dos sı́‑
apresentando queda neste campo (Fig. 7B). tios J, O, Q e R). Esses sı́tios compõ em os
Com exceçã o do sı́tio O, todos os outros sı́ti‑ a loramentos com menores valores de
os apresentam elipsoides oblatos ou triaxiais P’ (Fig. 7A), o que pode levar a problemas na
(Fig. 7B). de iniçã o dos eixos principais. Em diversos
Uma reconstruçã o do a loramento, sı́tios, K1 (lineaçã o magné tica) e K2 se agru‑
juntamente com os principais sı́tios amos‑ pam, sugerindo a presença de elipsoides for‑
trados, das feiçõ es estruturais e dos resulta‑ temente oblatos, com um eixo K3 bem
dos magné ticos é apresentada nas iguras 7C de inido. Os dados de trama magné tica (Fig.
e 7D, em que a á rea em cinza representa a 8B) també m indicam a predominâ ncia de fo‑
á rea do a loramento. E possı́vel observar a liaçõ es subverticais, com direçõ es NE‑SW e
predominâ ncia de elipsoides oblatos (Fig. N‑S, em concordâ ncia com grande parte dos
7C) e a presença de zonas com alto grau de dados estruturais de campo (Fig. 8C), que in‑
anisotropia na porçã o central do a loramen‑ cluem planos de foliaçã o, eixos e planos axi‑
Figura 6 ‒ Resultados representativos de caracterizaçã o magné tica das amostras do Cerro do Perau: A) Curvas
termomagné ticas; B) Curvas de MRI; C) Ciclo de histeres; D) Diagrama FORC; e E) MEV e espectro EED.
Figura 7 ‒ Resultados escalares da ASM: A) Diagrama P’‑Km e histograma de valores de Km (linha tracejada em
preto); B) Diagrama T‑P’; C) Distribuiçã o espacial do parâ metro de forma; e D) Distribuiçã o espacial do grau de
anistropia.
ais de dobras. Em contraste, as escassas line‑ caimento (geralmente, inferiores a 30o) e di‑
açõ es presentes, tanto magné ticas quanto es‑ reçã o NE‑SW (Fig. 8B‑8C).
truturais, apresentam baixos valores de
Figura 8 ‒ Resultados direcionais: A) Estereogramas, com os eixos principais da ASM; B) Distribuiçã o espacial
dos dados estruturais de campo; e C) Distribuiçã o dos dados de ASM.
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1 INTRODUÇÃO
As bacias do Itajaı́ e do Camaquã tê m sido, há dé cadas, correlacionadas e associadas, via
de regra, mas, nã o de forma unâ nime, à s fases tardi‑ a pó s‑colisionais do Ciclo Orogê nico Brasi‑
liano. Por outro lado, desde os trabalhos basilares de Almeida (1967, 1969), a Bacia do Ca‑
maquã tem sido considerada aquela, em que o registro das fases inais da orogenia brasiliana se
encontra preservado de forma mais completa. No entanto, essa visã o, acerca da completitude
do registro vulcano‑sedimentar preservado na Bacia do Camaquã , deve, agora, ser aliada à per‑
cepçã o de que esta bacia nã o representa uma entidade tectô nica ú nica, na qual se acumulou to‑
do o registro vulcano‑sedimentar Ediacarano. Nesse sentido, o termo Bacia do Camaquã
representaria apenas um locus deposicional, em que diversas bacias, registradas na forma de
espessas unidades vulcano‑sedimentares, limitadas por discordâ ncias angulares, representam
episó dios tectono‑sedimentares distintos (tectono‑sequê ncias ou supersequê ncias), associadas
à acomodaçã o inal dos esforços, atuantes durante o inal do ciclo orogê nico. Seu registro deve
servir de base para a correlaçã o com as demais bacias, parcialmente correlatas (Almeida et al.,
2005).
Deste modo, qualquer correlaçã o direta e uniforme entre os registros das bacias do Ca‑
maquã e do Itajaı́, ou de qualquer outra bacia envolvida neste evento tectô nico maior, peca por
conceber um cená rio que envolve diferentes escalas de tempo. Assim que, em funçã o dos dados
geocronoló gicos, principalmente na forma de dataçõ es de zircã o, vulcâ nico ou detrı́tico, e pale‑
ontoló gicas, hoje disponı́veis, torna‑se possı́vel integrar os conhecimentos estratigrá ico e sedi‑
mentoló gico locais a um panorama paleogeográ ico maior, considerando, apenas, o tempo
registrado nas bacias em questã o. Abordagem similar foi empregada por Guadagnin et al.
Contribuições à Geologia do Rio Grande do Sul e de Santa Catarina
des, 2001; Borba, 2006). Nesta linha, a Bacia em dados geocronoló gicos recentes, estima‑
do Camaquã nunca teria existido como uma se que esse locus registre ca. 65 Ma de histó ‑
bacia individual e ú nica, mas, sim, represen‑ ria, decorrida entre ca. 600 Ma e 535 Ma
taria um locus deposicional, no qual diversas (Martins et al. (submetido); Hartmann et al.,
bacias, ligadas a distintos episó dios tectono‑ 2008).
vulcano‑sedimentares, foram geradas para A Bacia do Camaquã inclui quatro
acomodar os esforços existentes, ao inal do grupos, limitados por discordâ ncias angula‑
Ciclo Brasiliano (Paim et al., 2014). Com base res (Paim et al., 2014; Bica, 2013), que com‑
Figura 1 ‒ Mapa geoló gico, contextualizando as bacias do Camaquã (1) e do Itajaı́ (2), baseado em Phillip et al.
(2016).
Na base do Grupo Santa Bá rbara, na acerca do preenchimento dos riftes Santa
serra homô nima, dataçõ es de U‑Pb em zircã o Bá rbara Oeste e Santa Bá rbara Leste.
indicaram idades de 573 ±18 Ma (Chemale
Jr., 2000), de 574 ±7 Ma e de 572 ±6,5 Ma (Je‑ 5 ESTRATIGRAFIA E SISTEMAS DEPOSI‑
nikian et al., 2012). Já no Platô da Ramada, CIONAIS
basaltos andesı́ticos da base foram datados
em 553 ±5,4 Ma, enquanto derrames riolı́ti‑ 5. 1 O Grupo Itajaí
cos de nı́veis superiores apresentam idades
As distintas concepçõ es estratigrá i‑
de 549 ±5 Ma (Sommer et al., 2005). Idade
cas propostas guardam algumas caracterı́sti‑
similar (553 ±17 Ma) foi encontrada para ri‑
cas comuns. Via de regra, associam o
olitos da base do Platô do Taquarembó (Jani‑
preenchimento da bacia a um ciclo trans‑
kian et al., 2012). Quanto ao Rifte Santa
gressivo‑regressivo. Os seguintes intervalos
Bá rbara Leste, Pereira et al. (2021) dataram
integram a maior parte das colunas propos‑
dois nı́veis de traquitos, atravé s de aná lises
tas:
de U/Pb em zircã o (565 ±5 Ma). Os traquitos
ocorrem no Grupo Santa Bá rbara, na regiã o 1. Um intervalo basal transgressivo,
da jazida Santa Maria, e foram interpretados que inclui conglomerados aluviais, que gra‑
como possı́veis lavas, ligadas ao vulcanismo dam para arenitos deltaicos (Formaçã o Gas‑
Acampamento Velho. Desta forma, baseado par de Silva Dias, 1981) e que culminam com
nas idades supramencionadas, estima‑se que pelitos de á guas profundas (parte inferior da
Grupo Santa Bá rbara se acumulou entre 574 Formaçã o Garcia (Salamuni et al., 1961);
±7 Ma e 549 ±5 Ma. Sequê ncia Inferior (Appi, 1988; Appi & Sou‑
za Cruz, 1988); Unidade de Fá cies 1, 2 e 3
Por outro lado, estudos de zircõ es
(Krebs et al., 1990); Associaçã o de fá cies A
detrı́ticos apontaram idades má ximas de de‑
(Rostirolla et al., 1992); Sequê ncia 1 (Fonse‑
posiçã o compatı́veis com as do intervalo aci‑
ca, 2004); e Formaçã o Baú e parte da Forma‑
ma indicado. Para a regiã o das Minas do
çã o Ribeirã o Carvalho (Basei et al., 2011)).
Camaquã (Rifte Santa Bá rbara Leste), Olivei‑
Esse intervalo corresponde à Sequê ncia De‑
ra et al. (2014) assinalam idade má xima de
posicional I (Fig. 2), sendo limitada, na base,
deposiçã o de 567,9 ±5,9 Ma para os siltitos
por uma nã o conformidade no contato com
basais do Grupo Santa Bá rbara, enquanto
as rochas granulı́ticas do Crá ton Luis Alves;
Bicca (2013) aponta idade má xima de depo‑
siçã o de 558 ±13 Ma para os arenitos situa‑ 2. Um intervalo intermediá rio, que
dos mais acima, na base do Arenito Inferior envolve turbiditos dominantemente areno‑
da Mina do Camaquã . Estudos similares no sos, canalizados e nã o canalizados, intercala‑
Rifte Santa Bá rbara Oeste apontam idades dos e recobertos por pelitos de á guas
má ximas de deposiçã o de 568 ±6 Ma, de 563 profundas (porçã o restante da Formaçã o
±6 Ma e de 553 ±22 Ma para as unidades ba‑ Garcia (Salamuni et al., 1961); Sequê ncia Su‑
sais, intermediá rias e superiores deste grupo perior (Appi, 1988; Appi & Souza Cruz,
(Oliveira et al., 2014), equivalente à s sequê n‑ 1988); Unidade de Fá cies 4 e 5 (Krebs et al.,
cias I, II e III, de Borba & Mizusaki (2003), 1990); Associaçã o de Fá cies B e C (Rostirolla
respectivamente. Portanto, as idades má xi‑ et al., 1992); Sequê ncia 2 (Fonseca, 2004);
mas de deposiçã o entre ca. 568 Ma e 553 Ma Formaçã o Ribeirã o Carvalho (Basei et al.,
sã o compatı́veis com o intervalo indicado pe‑ 2011); e Trato Deposicional I (Costa & Nasci‑
las rochas vulcâ nicas (ca. 574 Ma e 549 Ma) mento, 2015)). Esse intervalo compreende a
e, assim, serã o consideradas na discussã o Sequê ncia Deposicional II, unidade limitada,
Figura 2 ‒ Seçã o colunar, representativa das principais associaçõ es de fá cies, das superfı́cies estratigrá icas e
das sequê ncias deposicionais, que constituem o preenchimento da Bacia do Itajaı́. Para localizaçã o aproximada
da seçã o, ver Fig. 4.
na base, por uma conformidade correlata tra um retorno de fontes granı́ticas e o apa‑
(Fig. 2); recimento de uma importante contribuiçã o
3. E um intervalo superior, que en‑ de rochas vulcâ nicas á cidas (Marconato,
volve fá cies marinho rasas, deltaicas e aluvi‑ 2010). Essa sucessã o registra o preenchi‑
ais (Sequê ncias 3 e 4 (Fonseca, 2004); Tratos mento de dois riftes transtensionais, de ori‑
Deposicionais II e III (Costa & Nascimento, entaçã o NE, formados a oeste e a leste do
2015); Associaçã o de Fá cies D (Rostirolla et alto de Caçapava do Sul, preenchidos de for‑
al., 1992); e formaçõ es Ribeirã o Neisse e ma simultâ nea, mas nã o idê ntica (Paim et al.,
Rincã o dos Bodes (Basei et al., 2011)). Esse 2014).
pacote equivale à s sequê ncias deposicionais No Rifte Santa Bá rbara Oeste, a su‑
III e IV, ambas limitadas por discordâ ncias cessã o sedimentar erode parcialmente e re‑
erosivas, com exposiçã o subaé rea (Fig. 2). cobre as rochas vulcâ nicas da Formaçã o
E importante salientar que, com ex‑ Acampamento Velho (Fig. 3). Superfı́cies ero‑
ceçã o do limite entre as sequê ncias deposici‑ sivas aluviais, mapeá veis em escala de bacia,
onais I e II, uma concordâ ncia correlativa, permitem subdividir o Grupo Santa Bá rbara
que ocorre na base do Complexo Turbidı́tico em cinco sequê ncias deposicionais. Logo aci‑
Apiú na (Fonseca et al., 2003), as demais ma desses limites de sequê ncia, ocorrem de‑
equivalem a limites erosivos, que justapõ em, pó sitos aluviais e luviais, usualmente de
de forma abrupta, depó sitos luviais sobre natureza conglomerá tica, os quais sã o reco‑
marinhos. Nesse caso, o rebaixamento do nı́‑ bertos, de forma abrupta (superfı́cie trans‑
vel relativo do mar e a consequente exposi‑ gressiva), por siltitos lacustres. No geral, o
çã o subaé rea sã o necessá rios. Uma preenchimento deste rifte é dominado por
concepçã o artı́stica, que ilustra, de forma ge‑ arenitos, com ocorrê ncias subordinadas de
ral, mas bastante idedigna e elegante, a evo‑ espessos intervalos conglomerá ticos, princi‑
luçã o paleogeográ ica da Bacia do Itajaı́, em palmente na base e no topo do grupo, e por
especial, no que concerne aos intervalos in‑ expressivos intervalos sı́ltico‑arenosos (Fig.
termediá rio e superior do Grupo Itajaı́, é 3 ‑ Per il A). Os conglomerados e os arenitos
apresentada na Figura 11 do artigo de Costa representam fá cies aluviais, provenientes da
& Nascimento (2015). margem ONO (leques aluviais e leques del‑
taicos), e lú vio‑deltaicas vinculadas a siste‑
5. 2 O Grupo Santa Bárbara mas entrelaçados, de natureza axial, que
luı́am para NE. A coexistê ncia destes dois
O Grupo Santa Bá rbara ocorre entre sistemas aluviais, um transversal e outro axi‑
duas importantes discordâ ncias angulares. al, repercute, em termos de paleocorrentes,
Na base, uma delas constitui seu limite com o por um vetor mé dio (ENE), intermediá rio
Grupo Bom Jardim e, no topo, a outra deli‑ entre a orientaçã o de ambos os sistemas, ca‑
neia seu contato com o Grupo Guaritas. A de‑ racterı́stica perceptı́vel no diagrama de rose‑
formaçã o dú ctil‑rú ptil, que afetou o Grupo tas apresentado na Figura 3. Essa
Bom Jardim, gerando abundantes dobras de composiçã o de paleocorrentes indica, tam‑
arraste, diminui de intensidade no Grupo bé m, que o depocentro da bacia se situava a
Santa Bá rbara. Já as falhas de empurrã o, co‑ NE. Esse padrã o de paleocorrentes é similar
muns no Grupo Bom Jardim, desaparecem ao indicado por Fambrini et al. (2006) para a
no Grupo Santa Bá rbara, em que ocorrem mesma regiã o. Já as fá cies subaquosas re le‑
apenas falhas transcorrentes e extensionais. tem lagos rasos, comumente expostos à dis‑
Alé m do mais, o Grupo Santa Bá rbara regis‑ secaçã o, que incluem delgadas, mas
repetidas intercalaçõ es de arenitos inos a cadas na Figura 3. Isso nos permite associar
muito inos, geradas por correntes de turbi‑ tais sequê ncias a um controle tectô nico,
dez, de origem hyperpicnal, e, por vezes, por conforme demonstrado por Silveira (2012).
luxos de reologia hı́brida (Lehn et al., 2018). Outra similaridade do Grupo Santa Bá rbara,
Arenitos inos a grossos, sigmoidais, maciços depositada nos dois riftes, manifesta‑se na
ou com estrati icaçã o cruzada sigmoidal, re‑ associaçã o de fá cies aluviais, luviais, deltai‑
lacionados a contextos de frente deltaica, cas (leques deltaicos e deltas luviais) e la‑
també m sã o comuns. custres. Assim como na regiã o das Minas do
O Rifte Santa Bá rbara Leste engloba Camaquã , as paleocorrentes da regiã o do
sucessõ es expostas nos vales do Boici e do Vale do Piquirı́ sã o, dominantemente, para
Arroio Piquiri, bem como diversas exposi‑ NNE e para NNO (Fambrini et al., 2018). Isso
çõ es, situadas abaixo do Grupo Guaritas, indica que, assim como no caso do Rifte
a lorantes entre os altos de Santana da Boa Santa Bá rbara Oeste, o depocentro da bacia
Vista e de Caçapava do Sul. A Formaçã o se situava a norte e que essa dispersã o é
Acampamento Velho estaria restrita a intru‑ compatı́vel com a dos sistemas luviais axi‑
sõ es, vinculadas aos eventos mais jovens do ais, luindo para NE, e dos leques aluviais,
vulcanismo Acampamento Velho, nã o fossem transportando material para NO. De forma
os traquitos, que ocorrem na jazida Santa similar à contraparte ocidental, as fá cies pe‑
Maria, datados em 565 ± 5Ma, ou seja, con‑ lı́ticas lacustres també m incluem delgadas,
temporâ neos aos eventos iniciais do vulca‑ mas repetidas, intercalaçõ es de arenitos i‑
nismo Acampamento Velho, os quais foram nos a muito inos, relacionados a correntes
tentativamente interpretados como possı́veis de turbidez, de origem hyperpicnal, e, por
lavas (Pereira et al., 2021). Como no rifte a vezes, a luxos de reologia hı́brida (Silveira,
oeste, neste caso, també m é possı́vel subdivi‑ 2016).
dir a sucessã o em sequê ncias deposicionais, Por outro lado, diferenças signi ica‑
limitadas por discordâ ncias com exposiçã o tivas sã o també m perceptı́veis. A maciça
subaé rea (sobreposiçã o das fá cies luviais/ presença de conglomerados, tanto na por‑
aluviais diretamente sobre depó sitos lacus‑ çã o superior do Grupo Santa Bá rbara como
tres). Esta caracterı́stica é facilmente mapeá ‑ no sentido da margem leste do rifte, sugere
vel na regiã o do Vale do Piquiri, em que estã o relevos soerguidos, pró ximos ao bordo ori‑
dispostos cerca de 4 mil metros de depó sitos ental, no sentido do Cinturã o Dom Feliciano.
deste grupo (Fig. 3 ‑ Per il C) na forma de Esse relevo se manifesta nas fá cies aluviais
uma monoclinal, que nos permite visualizar, pelo domı́nio de depó sitos de enxurradas
em vista aé rea, as variaçõ es laterais e verti‑ em lençol (sheet lood), desde a regiã o do
cais de fá cies e de superfı́cies estratigrá icas Vale do Piquirı́, até as Minas do Camaquã ,
associadas (e.g. Silveira, 2016). Nesse senti‑ comparado ao domı́nio de fá cies relaciona‑
do, superfı́cies transgressivas e de má xima das a luxos canalizados (stream lows), nos
inundaçã o, també m facilmente mapeá veis na leques aluviais do Rifte Santa Bá rbara Oeste.
regiã o do Vale do Piquirı́, sã o similares à s A menor presença de gretas de contraçã o
identi icadas no Rifte Santa Bá rbara Oeste. nas fá cies lacustres, relativamente ao Rifte
Alé m disso, pode‑se perceber uma diminui‑ Santa Bá rbara Oeste, assim como o porte
çã o no grau de deformaçã o da sucessã o da das clinoformas visualizá veis na regiã o do
base para o topo, o que se manifesta por dis‑ Vale do Piquirı́ (com vá rias dezenas a uma
cordâ ncias angulares suaves (poucos graus), centena de metros), indicam lagos mais pe‑
limitando as sequê ncias deposicionais indi‑ renes e mais profundos na margem oriental
Figura 3 ‒ Seçõ es colunares, representativas do preenchimento dos riftes Santa Bá rbara Oeste e Santa Bá rbara
Leste. Per is A e C, baseados em seçõ es de campo, e Per il B, nos furos CQP 02 e CQP 03. Diagrama de rosetas,
com medidas de paleocorrentes, realizadas no rifte Santa Bá rbara Oeste. Idades de rochas vulcâ nicas baseadas
em: (1) Jenikian et al. (2012); (2) Chemale Jr. (2000); (3) Sommer et al. (2005); e (4) Pereira et al. (2021).
Idades má ximas de deposiçã o (amostras datadas, posicionadas de forma aproximada nos per is), baseadas em:
(a) Oliveira et al. (2014); e (b) Bicca et al. (2013). Localizaçã o aproximada das seçõ es mostrada na Fig. 5.
do rifte. Cabe realçar que gretas de contraçã o craterion, na verdade, representam diferen‑
sã o mais comuns nas fá cies pelı́ticas, presen‑ tes tipos de fossilizaçã o de esteiras microbi‑
tes nos testemunhos da sondagem CQP 03, a anas reticuladas (Fig. 4B). Outras
qual amostrou a porçã o mais inferior deste morfologias de esteiras microbianas foram
grupo na regiã o das Minas do Camaquã . Essa encontradas, como as estruturas lineares de
caracterı́stica sugere que o Rifte Santa Bá r‑ Arumberia (Fig. 4A). Becker‑Kerber et al.
bara Leste seria um meio‑graben, com mar‑ (2020) també m reinterpretaram os fó sseis,
gem ativa, mais profunda, situada no bordo atribuı́dos a Choia e Oldhamia, como pseu‑
leste. Isto explicaria, també m, a maior espes‑ dofó sseis, formados pelo crescimento de
sura do Grupo Santa Bá rbara na margem ori‑ minerais, durante a diagê nese inicial. Prati‑
ental do que no sentido da margem passiva camente todas as formas discoides anterior‑
deste meio‑graben. mente encontradas, assim como as novas
amostras (e.g. Fig. 4C), foram classi icadas
6 O REGISTRO PALEONTOLÓGICO no plexus Aspidella, incluindo um espé cime
com possı́vel haste de fronde associada. Adi‑
Os primeiros registros de possı́veis cionalmente, foi reportada a presença de
fó sseis na Bacia de Itajaı́ remontam aos tra‑ nova forma discoide, Nimbia (Fig. 4A), de
balhos de Zucatti da Rosa et al. (1997), de a inidades incertas. Becker‑Kerber et al.
Leipnitz et al. (1997), de Netto & Zucatti da (2020) també m descreveram indubitá veis
Rosa (1997) e de Paim et al. (1997). Estes organismos ediacaranos, como o enigmá tico
autores reportaram, preliminarmente, a pos‑ fó ssil Palaeopascichnus (Fig. 4D), caracteri‑
sı́vel presença de fó sseis cambrianos, atribuı́‑ zado por seus segmentos curvos a retos, dis‑
dos a esponjas, como Choia e Chancelloria postos linearmente. Becker‑Kerber et al.
(Leipnitz et al., 1997; Paim et al., 1997), as‑ (2021) demonstraram que as estruturas i‑
sim como putativos traços fó sseis de locomo‑ lamentosas, previamente atribuı́das a traços
çã o e de alimentaçã o de invertebrados, de animais (Gordia e Helminthoidichnites),
incluindo Diplocraterion, Gordia e ?Oldhamia representam, ao invé s disso, impressõ es de
(Netto & Zucatti da Rosa, 1997). Posterior‑ microrganismos ilamentosos, similares à s
mente, Zucatti da Rosa (2005) reinterpretou atuais bacté rias gigantes oxidantes de enxo‑
os icnofó sseis Gordia como Helminthoidichni‑ fre (Fig. 4E). A ampla presença desses mi‑
tes sp, e ?Oldhamia como a anteriormente re‑ crorganismos no Ediacarano sugere que
portada Choia. O icnotá xon Diplocraterion foi possam ter tido grande in luê ncia na evolu‑
denominado “morfotipo I”, de a inidades in‑ çã o da quı́mica dos oceanos e nos primeiros
certas. Zucatti da Rosa (2005) també m des‑ ecossistemas, compostos, dominantemente,
creveu as primeiras formas discoides, sendo de organismos macroscó picos. A biota da
um morfotipo, associado aos tá xons Cyclome‑ Bacia de Itajaı́, apesar de nã o muito diversa,
dusa e Charniodiscus, e outra forma, vincula‑ apresenta fó sseis tı́picos do Perı́odo Ediaca‑
da à Aspidella. Possı́veis bilaté rios, atribuı́dos rano. Dataçõ es recentes (ca. 563 Ma) (Bec‑
à Parvancorina, també m foram descritos. ker‑Kerber et al., 2020) situam‑na como a
Trabalhos recentes retomaram os es‑ mais antiga assembleia fó ssil de organismos
tudos sobre a biota de Itajaı́ e muitos fó sseis macroscó picos complexos do Gonduana. Es‑
foram reinterpretados, assim como novos tá ‑ ses fó sseis representam organismos que nã o
xons foram descobertos. Becker‑Kerber et al. possuı́am partes duras, o que torna esta uni‑
(2020) demonstraram que fó sseis, antes con‑ dade um importante Lagerstätten do Pre‑
siderados como Chancelloria e como Diplo‑ Cambriano da Amé rica do Sul.
Figura 4 ‒ Exemplos de registro de vida nos grupos Itajaı́ (A a E) e Camaquã (F a K): A) Esteiras microbianas
Arumberia‑like, associadas com Nimbia (seta); B) Esteiras microbianas reticuladas; C) Dois espé cimes de
Aspidella; D) Palaeopascichnus; E) Filamentos microbianos, similares aos das bacté rias gigantes modernas do
gê nero Beggiatoa; F) Lâ mina delgada de siltito, com colô nia bacteriana ilamentosa permeando os grã os ( lechas
azuis), e microfó ssil, indicado por lecha vermelha (Lehn et al., 2019); G) Corte transversal de amostra de mã o,
contendo marcas discoides, associadas à MISS, no topo, e à camada orgâ nica escura, no corte ( lecha vermelha);
H) Lâ mina delgada, rica em esteiras microbianas preservadas em siltitos; I) Fragmento de esteira microbiana,
recuperado via extraçã o palinoló gica (Lehn et al. (submetido)); J) Exemplar de acritarca do gê nero
Germinosphaera sp. (Lehn et al., 2019); e K) Exemplar de acritarca da espé cie Tanarium irregulare (Lehn et al.,
2019).
Figura 5 ‒ Esboço tectô nico e paleogeográ ico das bacias do Itajaı́ (BI) e do Camaquã (BC), no caso,
representada pelos riftes Santa Bá rbara Oeste e Santa Bá rbara Leste, elementos contemporâ neos aos da Bacia
do Itajaı́. A orientaçã o dos sistemas aluviais nos blocos diagramas dos riftes Santa Bá rbara Oeste e Santa
Bá rbara Leste está fundamentada em abundantes dados de paleocorrentes. Os per is colunares, mostrados nas
iguras 2 e 3, estã o indicados, de forma aproximada, nos blocos‑diagrama especı́ icos. O mapa geoló gico foi
editado, a partir de Phillip et al. (2016), enquanto o bloco‑diagrama da Bacia do Itajaı́ foi modi icado de
Guadagnin et al. (2010). As setas indicam o sigma 1, baseado em Schroeder (2006), enquanto as linhas entre as
setas indicam a orientaçã o das bacias do Camaquã e do Itajaı́.
ocronologia, acreditamos que as sucessõ es, Geologia e Mineralogia DNPM. Rio de Janeiro,
que merecem uma atençã o especial, sã o DNPM, v. 241, 36p.
aquelas expostas nos vales do Boici e do Pi‑
Almeida, F. F. M., Hasui, Y., Brito Neves, B. B.
quirı́, no Rifte Santa Bá rbara Leste. Na Bacia
& Fuck, R. A. 1981. Brazilian structural pro‑
do Itajaı́, dataçõ es de tufos nos intervalos vinces: an introduction. Earth Sciences Revi‑
mé dio e superior do Grupo Itajaı́ se fazem ews, 17: 1‑29.
necessá rias, para melhor de inir a idade do
topo do grupo, bem como para nos ajudar a Almeida, F. F. M., Hasui, Y. & Brito Neves, B. B.
esclarecer o quanto existe de repetiçã o es‑ 1976. The Upper Precambrian of South
America. Boletim IG/USP, 7: 45‑80.
tratigrá ica, na medida em nos aproximamos
da margem sul dessa bacia. Dados sı́smicos, Almeida, D. P. M., Zerfass, H., Basei, M. A., Pe‑
mesmo que de natureza rasa, podem trazer à try, K. & Gomes, C. H. 2002. The Acampa‑
tona uma sé rie de dados, que nos ajudaria a mento Velho Formation, a Lower Cambrian
compreender melhor a arquitetura estrati‑ bimodal volcanic package: geochemical and
grá ica das unidades mais jovens da Bacia do stratigraphics studies from the Cerro do Bu‑
gio, Perau and Serra de Santa Bá rbara (Caça‑
Camaquã (grupos Santa Bá rbara e Guaritas).
pava do Sul, Rio Grande do Sul, RS–Brazil).
Por outro lado, o elevado grau de compacta‑ Gondwana Research, 5: 721‑733.
çã o e de diagê nese do Grupo Itajaı́ nã o favo‑
rece ao uso desta abordagem, em funçã o das Almeida, D. P. M., Conceiçã o, R. V., Chemale Jr.,
pequenas diferenças de impedâ ncia acú stica, F., Koester, E., Borba, A. W. & Petry, K. 2005.
que devem existir entre as distintas litologi‑ Evolution of Heterogeneous Mantle in the
Acampamento Velho and Rodeio Velho Vol‑
as presentes. Estudos de natureza estrutural,
canic Events, Camaquã Basin, Southern Bra‑
focados no Grupo Santa Bá rbara, ainda se fa‑ zil. Gondwana Research, 8: 479‑492.
zem necessá rios em suas diversas á reas de
ocorrê ncia. O uso de proxies geoquı́micos de Almeida, R. P., Janikian, L., Fragoso‑Cesar, A.
rocha (razõ es Ni/Co, V/Cr e Th/U, por exem‑ R. & Fambrini, G. L. 2010. The Ediacaran to
plo) e de material orgâ nico (P, Sr, Co, C e isó ‑ Cambrian rift system of Southeastern South
America: tectonic implications. Journal of Ge‑
topos C e O) constitui uma fronteira a
ology, 118: 145‑161.
explorar, visando a melhor caracterizar os
paleoambientes. Por im, os recentes acha‑ Arouri, K., Greenwood, P. F. & Walter, M.
dos paleontoló gicos em ambas as bacias, em 1999. A possible chlorophycean af inity of
um intervalo de tempo importante, em ter‑ some Neoproterozoic acritarchs. Organic Ge‑
mos de evoluçã o da vida no planeta, com‑ ochemistry, 30: 1323‑1337.
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1 INTRODUÇÃO
A formaçã o da margem Atlâ ntica Sul‑Americana ocorreu no Mesozoico, em consequê n‑
cia da ruptura do Gondwana Ocidental e do desenvolvimento do Oceano Atlâ ntico Sul. Essa mar‑
gem passiva apresenta uma extensã o de mais de 6.000 km e grande variedade de feiçõ es
geoló gicas e topográ icas, de sul a norte. Neste trabalho, será explorada a margem continental
dos estados do Rio Grande do Sul (RS) e de Santa Catarina (SC) (Fig. 1). Na margem sul‑rio‑
grandense, estã o presentes uma topogra ia suave e exposiçõ es do Cinturã o Dom Feliciano e do
Terreno Taquarembó , associadas à formaçã o do Gondwana Ocidental, durante o Neoproterozoi‑
co (Ciclo Orogê nico Brasiliano/Pan‑Africano). Já a margem Catarinense é dominada pelo Cintu‑
rã o Dom Feliciano, representado pelos altos topográ icos da Provı́ncia da Mantiqueira e pelo
Crá ton Luis Alves.
Apesar da ampla variedade de caracterı́sticas ao longo da costa, tanto onshore quanto
offshore, a porçã o da margem entre os estados do RS e de SC apresenta uma mudança signi ica‑
tiva na con iguraçã o da margem passiva sul‑americana, e representa um limite entre a porçã o
sul, de baixa topogra ia, e a norte, de relevo alto e acidentado. Esse limite está marcado pelo alto
de Florianó polis, que, alé m de limitar duas porçõ es de relevo distinto na margem continental,
marca, també m, o limite entre a Bacia de Pelotas, a sul, e a Bacia de Santos, a norte. A principal
diferença da Bacia de Pelotas para as demais, situadas mais a norte, é a ausê ncia de depó sitos
evaporı́ticos e de reservas de hidrocarbonetos, alé m de representar uma conexã o entre a crosta
continental e a Dorsal Mesoatlâ ntica, atravé s da Zona de Fratura do Rio Grande (també m conhe‑
cida como Zona de Fratura de Florianó polis), uma estrutura de sentido E‑W, que se propaga no
fundo oceâ nico e que també m limita a Elevaçã o de Rio Grande e o Platô de Sã o Paulo, dois altos
batimé tricos no Oceano Atlâ ntico.
Contribuições à Geologia do Rio Grande do Sul e de Santa Catarina
Figura 1 ‒ Mapa geotectô nico simpli icado da regiã o sul do Brasil e do Uruguai. Zonas de Cisalhamento: 1 ‑
Itajaı́‑Perimbó ; 2 ‑ Major Gercino; 3 ‑ Ibaré ; 4 ‑ Dorsal de Canguçu; 5 ‑ Passo do Marinheiro; 6 ‑ Caçapava; 7 ‑
Sierra Ballena; 8 ‑ Sarandı́ del Yı́; e 9 ‑ Colô nia (modi icado de CPRM (2008) e de Philipp et al. (2016)).
Figura 2 ‒ Modelo digital de terreno da margem continental sul brasileira, com a sobreposiçã o dos terrenos
tectono‑estratigrá icos e vulcano‑sedimentares e a localizaçã o das aná lises termocronoló gicas por traços de
issã o e por (U‑Th)/He em apatita e em zircã o, disponı́veis na bibliogra ia para o Cinturã o Dom Feliciano.
rõ es orogê nicos e é a principal entidade terrenos Taquarembó , no oeste do RS, e Luis
tectô nica ao longo da margem brasileira, Alves, em SC. No leste, o Cinturã o Dom Feli‑
com extensã o de mais de 3.000 km, largura ciano é dividido nos terrenos Sã o Gabriel e
entre 200 e 600 km e topogra ia quase intei‑ Tijucas, alé m dos bató litos Pelotas (no RS) e
ramente montanhosa (Almeida et al., 1981; Florianó polis (em SC), na parte oriental do
Brito Neves et al., 2014). A parte mais meri‑ cinturã o.
dional da provı́ncia da Mantiqueira, ou seja, As exposiçõ es dos embasamentos
o cinturã o Dom Feliciano, juntamente com os Sul‑Rio‑Grandense e Catarinense sã o limita‑
crá tons adjacentes, corresponde à á rea de lo‑ das, a norte e a oeste, principalmente, pelos
calizaçã o deste estudo (Fig. 1). depó sitos paleozoicos e mesozoicos da Ba‑
Na á rea de estudo, o Crá ton Rio de cia do Paraná . Já a margem atlâ ntica, na re‑
La Plata e o Cinturã o Dom Feliciano sã o sub‑ giã o, é domı́nio das bacias de Pelotas e de
divididos em seis terrenos tectono‑estrati‑ Santos (Meso‑Cenozoicas), formadas como
grá icos, delimitados por zonas regionais de consequê ncia da separaçã o da Amé rica do
cisalhamento (Fig. 1). O crá ton consiste nos Sul e da Africa.
ilhos podem ser manifestaçõ es fı́sicas de Grandense (ESRG) abrange 12 idades TFZ,
decaimento radioativo, como zonas de danos 16 idades ZHe, 75 idades TFA e 24 idades
na rede cristalina (traços de issã o) ou nuclı́‑ AHe, todas elas obtidas a partir de mú ltiplos
deos radiogê nicos, como o 4He (U‑Th/He). cristais. Já na regiã o do Escudo Catarinense
As aná lises termocronoló gicas en‑ (EC), foram compiladas 14 idades TFZ, 29
volvem a razã o de nuclı́deos pai/ ilho nas idades ZHe, 75 idades TFA e 24 idades AHe,
amostras e consistem da combinaçã o das obtidas a partir de mú ltiplos cristais, igual‑
mediçõ es realizadas nas amostras com in‑ mente.
formaçõ es geoló gicas, para deduzir faixas de
possı́veis histó rias té rmicas, fornecendo in‑ 5 TERMOCRONOLOGIA DO ESCUDO
terpretaçõ es associadas a eventos de fecha‑ SUL‑RIO‑GRANDENSE
mento ou de retençã o parcial. O
conhecimento dessas histó rias té rmicas po‑ O resfriamento e a exumaçã o do
de ser usado para entender o tempo e a du‑ ESRG antecedem à ruptura do Gondwana
raçã o, e, portanto, a dinâ mica de uma ampla Ocidental e à abertura do Atlâ ntico Sul em,
gama de processos geoló gicos. até , centenas de milhõ es de anos, conforme
Quatro termocronô metros de baixa registram as idades termocronoló gicas, obti‑
temperatura estã o presentes nesta discus‑ das nos vá rios estudos lá realizados (Figs. 3‑
sã o: traços de issã o em zircã o (TFZ), (U‑Th)/ 4).
He em zircã o (ZHe), traços de issã o em apa‑ Os trabalhos pioneiros, publicados
tita (TFA) e (U‑Th)/He em apatita (AHe). Es‑ no ESRG, foram desenvolvidos por Borba et
tes sistemas radioisotó picos tê m al. (2002, 2003), que obtiveram idades TFA
temperaturas de retençã o distintas e, juntos, predominantemente Paleozoicas (Fig. 3), as‑
cobrem um intervalo entre c. 320 e 45 ºC, ou sociadas a um soerguimento e à denudaçã o,
seja, temperaturas correspondentes aos durante a evoluçã o da Bacia do Paraná , in lu‑
quilô metros superiores da crosta. Cada mé ‑ enciadas por contexto tectô nico convergente
todo possui temperatura de fechamento e na margem sudoeste do Gondwana. Estes
zona de retençã o parcial especı́ icas, esta ú l‑ autores defendem que o ESRG se comportou
tima corresponde a um intervalo de tempe‑ como um alto topográ ico, durante o Carbo‑
raturas em que a acumulaçã o e a perda de nı́fero‑Permiano, devido à compressã o pre‑
produtos de decaimento radiogê nico sã o si‑ sente neste perı́odo. Eles identi icam um
multâ neas. A idade obtida pelos mé todos evento de resfriamento no Cretá ceo Superi‑
termocronoló gicos de baixa temperatura é or, possivelmente, relacionado ao rearranjo
uma idade de resfriamento, baseada no da margem costeira brasileira, devido ao so‑
equilı́brio entre o isó topo‑pai e o produto do erguimento das serras do Mar e da Manti‑
decaimento, e representa um ponto de tem‑ queira. Este argumento é corroborado por
po‑temperatura (t‑T) durante a passagem Oliveira et al. (2016), que també m colocam
pela zona de retençã o parcial do termo‑ essa nova con iguraçã o da margem conti‑
cronô metro. nental como mecanismo desencadeador do
Neste estudo, revisamos os dados resfriamento, observado em amostras do
publicados anteriormente sobre traços de Terreno Sã o Gabriel e do Bató lito Pelotas.
issã o e sobre (U‑Th)/He em apatitas e em O evento compressivo do oró geno
zircõ es, alé m dos modelamentos de histó rias Gondwanides, observado por Borba et al.
té rmicas disponı́veis. O conjunto de dados (2003), é corroborado por Bicca et al. (2013)
de termocronologia atual do Escudo Sul‑Rio‑ e por Oliveira et al. (2016) na Bacia do Ca‑
maquã , em que foi identi icada uma compo‑ co, o qual está registrado no Terreno Taqua‑
nente de idade Devoniana, relacionada à de‑ rembó e no Bató lito Pelotas, possivelmente,
posiçã o desta bacia, a partir de idades relacionado ao ajustamento da Placa Sul‑
obtidas por TFA e por TFZ, respectivamente. Americana.
Bicca et al. (2013), Oliveira et al. (2016), Go‑ Hueck et al. (2019) e Machado et al.
mes & Almeida (2019) e Machado et al. (2019, 2021) foram os primeiros autores a
(2019) correlacionam a idade Devoniana à apresentar aná lises de AHe e de ZHe no
Orogenia Famatiniana, responsá vel por de‑ ESRG (Fig. 4), sendo que estes ú ltimos asso‑
formar e por soerguer, lentamente, parte do ciaram estes termocronô metros a aná lises
continente Gondwana Ocidental entre 510 e de TFA e de TFZ. Todos estes trabalhos for‑
360 Ma, seguida pelo resfriamento, causado necem resultados, em parte, concordantes,
pela Orogenia Gondwanides. como a correlaçã o negativa entre as idades
Os primeiros dados de TFZ no ESRG de ZHe e o conteú do efetivo de urâ nio (eU,
foram obtidos por Oliveira et al. (2016), jun‑ conteú do de U + 0,235 x conteú do de Th, em
tamente com novos dados de TFA. As idades ppm), e, em parte, discordantes, como as
de TFZ variam do Carbonı́fero ao Triá ssico histó rias té rmicas obtidas. A histó ria de res‑
(Fig. 4), enquanto as idades de TFA variam friamento reconstruı́da por Hueck et al.
do Carbonı́fero ao Cretá ceo (Fig. 3). Estes au‑ (2019), obtida a partir dos termocronô me‑
tores estimam uma denudaçã o de cerca de tros AHe e ZHe, considera que grande parte
1.560 a 3.880 m para o episó dio de resfria‑ do ESRG foi, provavelmente, exposto a con‑
mento relacionado ao soerguimento, causado diçõ es subsuper iciais, no inı́cio do Paleo‑
por estresses intraplaca advindos da orogê ‑ zoico, e reaquecido, durante a deposiçã o da
nese Gondwanides. Os dados registram, tam‑ Bacia do Paraná , indicando que a Plataforma
bé m, os ú ltimos está gios desse evento Sul‑Americana foi palco de ciclos de soterra‑
orogê nico, evidenciados por um resfriamen‑ mento e de exumaçã o, durante o Paleo‑Me‑
to durante o Permo‑Triá ssico. Idades de TFA sozoico, ainda que situada no interior
do Terreno Sã o Gabriel, do Jurá ssico Superi‑ continental. As idades de ZHe obtidas por
or, juntamente com amostras do Bató lito Pe‑ Hueck et al. (2019) sã o essencialmente Pa‑
lotas, sã o indicativas do perı́odo anterior ao leozoicas e apontam para uma diferença en‑
inı́cio da ruptura continental, que deu origem tre estes dados e aqueles de TFZ publicados
ao Oceano Atlâ ntico, e re letem reativaçã o de por Oliveira et al. (2016), que indicam ida‑
zonas de cisalhamento expressivas, que deli‑ des mais jovens, apesar de ser um termo‑
mitam o Bató lito Pelotas, como a Dorsal de cronô metro de temperatura mais alta do
Canguçu, e as zonas de cisalhamento Passo que o do sistema ZHe. Esta discordâ ncia en‑
do Marinheiro e Porto Alegre. Gomes & Al‑ tre as idades obtidas pelos vá rios termo‑
meida (2019) corroboram a presença de um cronô metros sugere que a Bacia do
evento de resfriamento, durante o Triá ssico‑ Camaquã e seu embasamento cristalino
Jurá ssico, causado pela reativaçã o de zonas possivelmente estiveram submetidos a regi‑
de cisalhamento nesta regiã o. A reativaçã o mes té rmicos distintos.
dessas zonas de cisalhamento é associada a Alé m disso, Hueck et al. (2019) su‑
um pulso té rmico, relacionado a uma fase an‑ gerem que as idades de AHe, concentradas
terior à abertura do Oceano Atlâ ntico (Passa‑ entre o Triá ssico Superior e o Cretá ceo, indi‑
relli et al., 2010). Oliveira et al. (2016), assim cam denudaçã o longa e contı́nua, possivel‑
como Gomes & Almeida (2019), relatam um mente devido aos efeitos té rmicos da
episó dio de resfriamento, durante o Cenozoi‑ sedimentaçã o da Bacia do Paraná , levando à
190 Edição da Sociedade Brasileira de Geologia – Núcleo RS/SC
Jelinek et al.
Figura 3 ‒ Mapa geotectô nico do Escudo Sul‑Rio‑Grandense, com as idades traços de issã o em apatita (TFA).
Zonas de Cisalhamento: a ‑ Ibaré ; b ‑ Caçapava; c ‑ Dorsal de Canguçu; e d ‑ Passo do Marinheiro (modi icado de
CPRM (2008) e de Machado et al. (2019)).
Figura 4 ‒ Mapa geotectô nico do Escudo Sul‑Rio‑Grandense, com as idades traços de issã o em zircã o (TFZ) e
(U‑Th)/He em apatita (AHe) e em zircã o (ZHe). Zonas de Cisalhamento: a ‑ Ibaré ; b ‑ Caçapava; c ‑ Dorsal de
Canguçu; e d ‑ Passo do Marinheiro (modi icado de CPRM (2008) e de Machado et al. (2019)).
exumaçã o das rochas hospedeiras somente sugere que o escudo tenha sido minima‑
apó s a erosã o desta bacia. Entretanto, estes mente soterrado por esses basaltos.
autores sugerem diferentes histó rias de res‑ Machado et al. (2019, 2021), combi‑
friamento para cada porçã o do ESRG. En‑ nando os termocronô metros TFZ, AFT, ZHe e
quanto o Terreno Taquarembó e a Bacia do AHe, apontam que a temperatura do Terreno
Camaquã exibem idades de ZHe e de AHe Sã o Gabriel se estabilizou antes dos demais
restritas entre o Devoniano e o Permiano, os terrenos, observando um primeiro episó dio
terrenos Tijucas e Sã o Gabriel e o Bató lito de resfriamento que se inicia no Devoniano
Pelotas tê m idades, predominantemente, en‑ e que se estende até o Carbonı́fero tardio,
tre o Permiano e o Cretá ceo (Fig. 4). Em ra‑ relacionado à s orogenias Famatiniana e
zã o das diferentes idades obtidas em cada Gondwanides, as quais promoveram soer‑
terreno, Hueck et al. (2019) consideram que guimento na porçã o oeste do ESRG. Foi ob‑
houve reativaçã o das principais zonas de ci‑ servado, ainda, um segundo episó dio de
salhamento do escudo, a Dorsal do Canguçu, resfriamento iniciado no Permiano e que se
o Lineamento Caçapava e a Zona de Cisalha‑ estendeu até o Cretá ceo, també m registrado
mento Ibaré , como, anteriormente já obser‑ por Oliveira et al. (2016) no Bató lito Pelotas.
vado por Oliveira et al. (2016) e por Gomes Machado et al. (2019) argumentam que o
& Almeida (2019). No entanto, como os ter‑ Terreno Sã o Gabriel e a Bacia do Camaquã já
renos Tijucas e Sã o Gabriel e o Bató lito Pelo‑ se encontravam relativamente está veis nes‑
tas apresentam idades com comportamento se perı́odo, mas que a porçã o leste do escu‑
similar, subentende‑se que a Dorsal do Can‑ do ainda nã o estava, atribuindo o inı́cio
guçu e o Lineamento Caçapava, que separam desse resfriamento à deglaciaçã o do
estes domı́nios do escudo, exerceram pouca Gondwana e à migraçã o, para sul, do manto
ou nenhuma in luê ncia no registro termo‑ de gelo, o que expô s o ESRG ao intemperis‑
cronoló gico. Já as idades mais antigas obti‑ mo e à erosã o. O arqueamento crustal em
das na Bacia do Camaquã possivelmente domo e o soerguimento, associado à ruptura
indicam uma histó ria té rmica distinta da do do Pangea, també m foram considerados, por
escudo, enquanto, no Terreno Taquarembó , Machado et al. (2019, 2021), como os princi‑
essas idades se devem, possivelmente, a rea‑ pais mecanismos a gerar o resfriamento ob‑
tivaçõ es recentes da Zona de Cisalhamento servado. Esse arqueamento pode ocorrer,
Ibaré . Curiosamente, esta zona de cisalha‑ quando a fusã o con inada na astenosfera au‑
mento é a ú nica do escudo a ter direçã o NW‑ menta a lutuabilidade da litosfera a inada,
SE. anterior à ruptura continental. No caso, a fu‑
As idades de AHe (Fig. 4) obtidas sã o corresponde à Provı́ncia Paraná ‑Etende‑
por Hueck et al. (2019) sã o concordantes ka, que possui expressivo volume
com as idades de TFA (Fig. 3) anteriormente magmá tico, e diversos diques alimentadores
publicadas no ESRG (Borba et al., 2002, que cortam o ESRG, sugere a presença dessa
2003; Gomes, 2011; Bicca et al., 2013; Olivei‑ fusã o abaixo do escudo ou nas suas proximi‑
ra et al., 2016; Gomes & Almeida, 2019), as dades (Machado et al., 2019). Esta hipó tese
quais sã o, predominantemente, mais antigas é corroborada pela presença de depó sitos
do que 100 Ma, o que sugere exumaçã o inal sedimentares da Formaçã o Botucatu menos
em condiçõ es subsuper iciais pré a sin‑rifte. espessos em direçã o ao ESRG, que, provavel‑
O resfriamento pó s‑rifte é restrito a algumas mente, se comportou como um alto topográ ‑
amostras. O fato de as vulcâ nicas Paraná ‑ ico e como uma fonte de sedimentos para a
Etendeka nã o apagarem o sistema de AHe, Formaçã o Botucatu. Machado et al. (2019)
sugerem que os estresses intraplaca, durante passando pela Serra do Mar, estendendo‑se
o inal da Orogenia Gondwanides, no inı́cio do até a Serra da Mantiqueira. No conjunto de
Triá ssico, levaram as rochas do escudo a se‑ dados, é evidente a correlaçã o positiva entre
rem exumadas, por meio da reativaçã o das es‑ altitudes e idades TFA, com idades do Cretá ‑
truturas do embasamento e da Bacia do ceo Superior, pró ximas à linha de costa, e
Paraná , e a um leve reaquecimento, de até 70 mais antigas (estendendo‑se até o Carbonı́‑
°C, durante o Cretá ceo, mas em seus está gios fero), em direçã o ao interior continental, o
inais. Estes autores justi icam uma perturba‑ que difere dos dados mais recentes, ao lon‑
çã o no gradiente geoté rmico sob o ESRG, de‑ go da Provı́ncia Mantiqueira, compilados
vido: (i) à intrusã o de plugs alcalinos, entre por Hueck et al. (2019) (Fig. 6). O resfria‑
99 e 76 Ma, no Terreno Tijucas; (ii) à in luê n‑ mento por exumaçã o é tido, por Gallagher et
cia té rmica da pluma de Tristã o da Cunha; e al. (1994), como o fator preponderante para
(iii) ao soerguimento manté lico, que deu inı́‑ justi icar as idades mais jovens. Hueck et al.
cio ao rifteamento continental do Pangea nes‑ (2019), por outro lado, sugerem que, na
ta regiã o e na Provı́ncia Magmá tica porçã o sul da Provı́ncia Mantiqueira, a reati‑
Paraná ‑Etendeka. Ainda, segundo estes auto‑ vaçã o das estruturas Neoproterozoicas her‑
res, essa perturbaçã o teria sido maior na por‑ dadas nã o causou deslocamentos verticais,
çã o leste do escudo, pró xima ao rifte. mas que o resfriamento observado nas his‑
O resfriamento inal, que levou todo o tó rias té rmicas pode estar relacionado à
ESRG a condiçõ es super iciais, é atribuı́do a distâ ncia ao eixo do rifte ativo.
reajustes da Placa Sul‑Americana, apó s o rif‑ Gallagher et al. (1994) encontraram
teamento continental, o que mudou a taxa de histó rias té rmicas distintas ao longo da
espalhamento oceâ nico e a geometria da pla‑ margem continental, o que re lete compor‑
ca, resultando em estresses transferidos ao tamentos té rmicos distintos para cada por‑
interior continental (Machado et al., 2019; çã o da mesma. Nas amostras pró ximas à
2021). A compensaçã o lexural, devido à acu‑ linha de costa, foram registradas taxas de
mulaçã o de sedimentos nas bacias marginais, denudaçã o e de exumaçã o mais aceleradas,
com subsidê ncia associada, teria contribuı́do com remoçã o de cerca de 3 km de seçã o de‑
com o soerguimento da costa. nudada apó s a ruptura continental. Já no in‑
terior do continente, a remoçã o de seçã o
6 TERMOCRONOLOGIA DO ESCUDO CA‑ denudada foi de cerca de 1 km, com taxas
TARINENSE mais lentas. Na regiã o do EC, as amostras
localizadas nas imediaçõ es dos derrames
O resfriamento e a exumaçã o do EC basá lticos apresentam idades que corres‑
foi, principalmente, pó s‑rifte, acompanhando pondem a esse evento. Poré m, Gallagher et
uma tendê ncia das margens sudeste e leste, al. (1994, 1995) observaram que as amos‑
conforme indicam as idades termocronoló gi‑ tras mais distantes dos derrames permane‑
cas obtidas nos vá rios estudos realizados ceram em temperaturas mais elevadas por
(Figs. 5‑6). mais tempo, devido ao soterramento pro‑
O trabalho pioneiro, nã o só no EC, co‑ movido pelos basaltos, e que isso gerou uma
mo no Brasil todo, foi de Gallagher et al. reduçã o nas idades TFA. Nos trabalhos de
(1994), usando a termocronologia por TFA Karl et al. (2013), de Hueck et al. (2018) e
(Fig. 5). Estes autores realizaram uma amos‑ de Krob et al. (2019) icam ressaltados os
tragem sistemá tica nas porçõ es sul e sudeste efeitos das altas temperaturas a que o EC foi
da margem continental brasileira, desde o EC, submetido, o que apagou, parcial ou total‑
Figura 5 ‒ Mapa geotectô nico do Escudo Catarinense, com as idades traços de issã o em apatita (TFA). Zonas de
Cisalhamento: a ‑ Itajaı́‑Perimbó ; e b ‑ Major Gercino (MGSZ) (modi icado de CPRM (2014)).
mente, até mesmo os sistemas de TFZ e de tar a temperatura em cerca de 60‑80 °C regi‑
ZHe (Fig. 6), que tê m temperaturas de fecha‑ onalmente, e, a partir deste novo patamar de
mento mais altas. Gallagher et al. (1995) argu‑ temperatura, promover o resfriamento da
mentam que o EC é palco de resfriamento regiã o.
contı́nuo desde a erupçã o desses basaltos, O mé todo de TFA foi utilizado por Je‑
mas que estes foram responsá veis por aumen‑ linek et al. (1999) e por Jelinek et al. (2003)
Evolução termocronológica do Cinturão Dom Feliciano 195
Contribuições à Geologia do Rio Grande do Sul e de Santa Catarina
Figura 6 ‒ Mapa geotectô nico do Escudo Catarinense, com as idades traços de issã o em zircã o (TFZ) e (U‑Th)/
He em apatita (AHe) e em zircã o (ZHe). Zonas de Cisalhamento: a ‑ Itajaı́‑Perimbó ; e b ‑ Major Gercino (MGSZ)
(modi icado de CPRM (2014)).
para datar eventos hidrotermais na porçã o responsá veis pela geraçã o do hidrotermalis‑
sudeste do EC e correlacioná ‑los à evoluçã o mo, que levou à deposiçã o de luorita ilone‑
da margem continental nesta regiã o. Jelinek ana. O principal mecanismo que estes
et al. (2003) obtiveram idades TFA do Paleo‑ autores consideram para a denudaçã o do EC
ceno‑Eoceno (Fig. 5) e episó dios de resfria‑ é a possibilidade de, localmente, na á rea do
mento iniciados no Cretá ceo Superior, distrito luorı́tico, a regiã o ter sido afetada
196 Edição da Sociedade Brasileira de Geologia – Núcleo RS/SC
Jelinek et al.
por um evento té rmico, associado ao mag‑ correlaçã o negativa com as idades de ZHe,
matismo alcalino de Lages e, regionalmente, conforme també m observado no ESRG (Hu‑
a regiã o ter sido afetada pelo magmatismo, eck et al., 2019). Já as idades AHe obtidas por
relacionado ao Lineamento de Florianó po‑ Hueck et al. (2018) estã o concentradas no
lis. Cretá ceo Superior‑Paleó geno e indicam que
Posteriormente, o EC foi estudado o conjunto de dados experimentou uma his‑
por Karl et al. (2013), utilizando os termo‑ tó ria té rmica semelhante (Fig. 6). Em contra‑
cronô metros TFA, TFZ, AHe e ZHe (Figs. 5‑ partida ao sistema ZHe, as idades AHe nã o
6). A combinaçã o destes termocronô metros apresentam correlaçã o com nenhum outro
permitiu segmentar em trê s partes o trecho parâ metro e estã o limitadas a um intervalo
entre Sã o Paulo (localizado no interior do restrito, sugerindo que as amostras sofreram
Oró geno Ribeira) e Laguna (porçã o sul do um resfriamento lento e contı́nuo (Hueck et
EC). Os segmentos levam em consideraçã o al., 2018), tendo sofrido um resfriamento
zonas de fraturas expressivas, de direçã o acelerado somente entre Cretá ceo Superior e
NW‑SE, sendo que o limite entre os blocos Paleoceno. Esse resfriamento acelerado pode
norte e central é delimitado pela Zona de estar relacionado com uma mudança no gra‑
Fratura Rio Alonzo, enquanto a Zona de Fra‑ diente geoté rmico local, devido à presença
tura de Florianó polis separa os blocos cen‑ de uma anomalia té rmica das rochas alcali‑
tral e sul. Krob et al. (2019), por outro lado, nas de Lages e do ponto quente Tristã o da
segmentaram este mesmo trecho em seis Cunha, conforme observado por Jelinek et al.
blocos, també m levando em consideraçã o (2003), anteriormente. As idades mais anti‑
zonas de fraturas NW‑SE importantes (blo‑ gas dos grã os individuais podem estar relaci‑
cos Santos, Peruı́be, Ilha Comprida, Curitiba, onadas à implantaçã o de He de cristais
Florianó polis e Laguna, de norte a sul, res‑ adjacentes, à zonaçã o interna nã o quanti ica‑
pectivamente). De acordo com Karl et al. da, a microinclusõ es, entre outros.
(2013), o bloco sul, representado, em grande De acordo com Hueck et al. (2018), o
parte, pelo nú cleo cristalino do EC (equiva‑ primeiro registro da histó ria de resfriamento
lente ao Bloco Laguna e a porçõ es do Bloco do EC é uma exumaçã o no inı́cio do Paleozoi‑
Florianó polis, de Krob et al., 2019), nã o co, apó s a fase pó s‑colisional do Oró geno
apresentou uma movimentaçã o expressiva, Dom Feliciano. Para explicar a dispersã o das
apesar de demonstrar uma complexa evolu‑ idades de ZHe, os autores consideram duas
çã o té rmica, com seçã o denudada estimada hipó teses. Na primeira, esta dispersã o indi‑
em 4,5‑5,0 km. Krob et al. (2019) també m caria que esse sistema sofreu abertura parci‑
indicam uma histó ria té rmica do bloco sul al e que essas amostras estavam hospedadas
(Bloco Laguna) completamente distinta da em rochas que foram exumadas até condi‑
dos demais blocos, com temperaturas eleva‑ çõ es pró ximas à s da superfı́cie, anteriormen‑
das, o que sugere uma alteraçã o no gradien‑ te à deposiçã o dos sedimentos da Bacia do
te geoté rmico local. Paraná . A posiçã o crustal dessas rochas era
Na regiã o continental, pró xima a de temperatura inferior a 120 °C, até a extru‑
Florianó polis (SC), Hueck et al. (2018) obti‑ sã o dos basaltos da Provı́ncia Magmá tica Pa‑
veram idades ZHe com grande dispersã o, es‑ raná ‑Etendeka, que elevaram a temperatura
tendendo‑se desde o Ordoviciano, até o o su iciente para apagar parcialmente o sis‑
Paleó geno, justi icadas pelo conteú do de ele‑ tema ZHe. A histó ria té rmica se encerra com
mentos radioativos nos cristais. Zircõ es, con‑ um está gio inal de resfriamento em condi‑
tendo eU abaixo de 1000 ppm, possuem uma çõ es super iciais entre o Cretá ceo Superior‑
Paleó geno. A segunda hipó tese levantada pe‑ queamento dos sedimentos da Bacia do Pa‑
los autores considera que a dispersã o das raná e à formaçã o das principais zonas de
idades de ZHe poderia decorrer da longa per‑ fraturas do Oceano Atlâ ntico Sul.
manê ncia das amostras em temperaturas ele‑
vadas (160‑200 °C), especialmente durante o 7 EVOLUÇÃO TERMOTECTÔNICA FANE‑
Mesozoico, sucedida pelo evento de resfria‑ ROZOICA DO CINTURÃO DOM FELICIA‑
mento do Cretá ceo Superior‑Paleó geno. A NO
permanê ncia dessas amostras em temperatu‑
ras elevadas pode ser resultado do aumento Na margem continental sul do Bra‑
do gradiente geoté rmico, precedente à ruptu‑ sil, a partir da compilaçã o de histó rias té r‑
ra continental e à extrusã o dos basaltos da micas, basicamente com dados de TFA (Fig.
Provı́ncia Magmá tica Paraná ‑Etendeka. 7C) e, em alguns casos, acrescentado outros
A primeira hipó tese, de Hueck et al. termocronô metros (Figs. 7A‑7B e 7D), é
(2018), é favorecida pela presença do contato possı́vel reconstruir a evoluçã o termotectô ‑
entre os sedimentos da Bacia do Paraná e o nica do Cinturã o Dom Feliciano e dos crá ‑
embasamento cristalino, à cerca de 10 km de tons adjacentes, e o impacto na dinâ mica de
distâ ncia da á rea de estudo. Alé m disso, estes evoluçã o da margem de rifte.
autores sugerem que a á rea do EC, provavel‑ A compilaçã o de histó rias té rmicas
mente, foi recoberta por sedimentos dessa de dados TFA (Machado et al., 2021) mos‑
bacia, apesar deste fato nã o ser su iciente pa‑ tram que o ESRG iniciou o registro de resfri‑
ra explicar a perda de He e para induzir a dis‑ amento no Devoniano (Fig. 7A), quando a
persã o das idades de ZHe. A dispersã o teria maior parte do embasamento já estava abai‑
decorrido da presença dos basaltos da Pro‑ xo de temperaturas da ordem de 160 °C,
vı́ncia Magmá tica Paraná ‑Etendeka, mais es‑ com o Crá ton Rio de La Plata registrando
peci icamente, dos diques alimentadores da temperaturas mais amenas, quando compa‑
mesma, como o Enxame de Diques de Floria‑ radas à s do Cinturã o Dom Feliciano. Por vol‑
nó polis. A orientaçã o dos diques, paralela à li‑ ta do inı́cio do Carbonı́fero, as temperaturas
nha de costa, sugere a proximidade com a estavam pró ximas ou abaixo de 120 °C na
regiã o central do rifte do Atlâ ntico Sul, o que maior parte do embasamento (Fig. 7B), com
contribui com um gradiente té rmico elevado. a regiã o nordeste, ou seja, o Bató lito Pelotas,
Os basaltos, juntamente com os sedimentos registrando as temperaturas mais elevadas.
da Bacia do Paraná , possivelmente cobriram a Durante a transiçã o Carbonı́fero‑Permiano,
regiã o em que se localiza a á rea de estudo, o as temperaturas no crá ton e no cinturã o fo‑
que é evidenciado pela abertura do sistema ram, em sua maioria, abaixo de 100 °C, en‑
de AHe até o Cretá ceo tardio, sugerindo a quanto o Bató lito Pelotas, a nordeste,
erosã o desta sequê ncia. Hueck et al. (2018) manteve suas temperaturas mais altas,
estimam uma espessura de seçã o denudada quando comparadas à s do resto do embasa‑
de 1,6 km a 2,5 km para a regiã o, a partir das mento (Fig. 7C). Este comportamento é con‑
modelagens de histó rias té rmicas. tı́nuo durante o resfriamento, atravé s da
Karl et al. (2013), Hueck et al. (2018) transiçã o Permiano‑Triá ssica, e, també m,
e Krob et al. (2019) sã o concordantes em durante a transiçã o Triá ssico‑Jurá ssica. No
a irmar que as feiçõ es de direçã o NW‑SE sã o inal do Jurá ssico, imediatamente antes do
associadas aos está gios iniciais de ruptura magmatismo Paraná ‑Etendeka (138 a 125
continental e de rotaçã o da Placa Sul‑Ameri‑ Ma) e da abertura do Atlâ ntico Sul na regiã o
cana, alé m de estarem correlacionadas ao ar‑ (130 a 113 Ma), a maior parte do embasa‑
mento estava pró ximo ou abaixo de 60 °C to, estas bacias també m registram momentos
(Fig. 7D), o que indica que as rochas estavam em que houve captura de suas drenagens e a
expostas ou pró ximas à superfı́cie durante o falta de suprimento sedimentar.
rifteamento (Jurá ssico/Cretá ceo). Os locais Por im, no Eoceno, praticamente to‑
mais a leste parecem registrar as temperatu‑ do o embasamento na regiã o estava abaixo
ras mais altas no momento do evento de rif‑ de 60°C (Fig. 7D), com uma tendê ncia a tem‑
teamento/magmatismo, mas, geralmente, peraturas mais amenas para o interior. Este
nã o excedem 100 °C. Apó s a abertura do evento inal de resfriamento é apontado co‑
Atlâ ntico Sul, na transiçã o entre o Cretá ceo mo resultado de um regime compressivo in‑
Inferior e o Cretá ceo Superior, as temperatu‑ tenso, observado em vá rias fases do Oró geno
ras do embasamento ainda estavam perto de Andino, e de mudanças no regime de espa‑
60 °C. O magmatismo associado com a rup‑ lhamento da dorsal meso‑oceâ nica, entre as
tura do Gondwana provavelmente causou um placas Sul‑Americana e Africana.
distú rbio geoté rmico, que pode ser respon‑
sá vel pela dispersã o das idades AHe. 8 CONSIDERAÇÕES FINAIS
Já a histó ria de resfriamento do EC é
marcada por uma exumaçã o no inı́cio do Pa‑ Estudos de termocronologia, realiza‑
leozoico (Fig. 7A), apó s a fase pó s‑colisional dos em rochas do embasamento da margem
do Oró geno Dom Feliciano. Durante o inal continental sul do Brasil, revelam padrõ es de
do Jurá ssico e o inı́cio do Cretá ceo, deu‑se resfriamento distintos ao longo da costa. En‑
inı́cio ao rifteamento (Fig. 7B), o que gerou quanto a maior parte da margem apresenta
soerguimento e exumaçã o em grande parte exumaçã o sin a pó s‑rifte (Cretá ceo ao Ceno‑
da margem continental brasileira. Sã o con‑ zoico), como é o caso da regiã o do EC, a regi‑
temporâ neos, també m, os derrames basá lti‑ ã o do extremo sul do Brasil, o ESRG,
cos da Provı́ncia Magmá tica Paraná ‑Etende‑ apresenta principalmente exumaçã o pré ‑rif‑
ka, que cobriram grande parte do leste cata‑ te.
rinense, e os diques alimentadores, que con‑ Diversas sã o as causas, atribuı́das ao
tribuı́ram para o aumento do gradiente soerguimento e ao resfriamento observados
geoté rmico local, apagando, parcial ou total‑ na margem continental brasileira, incluindo a
mente, até mesmo os sistemas de TFZ e de regiã o do EC, como: (i) o aumento do gradi‑
ZHe (Figs. 7A‑7B). ente geoté rmico devido à s anomalias té rmi‑
A partir deste evento de ruptura cas Trindade e Tristã o da Cunha (Machado et
continental, formaram‑se as bacias da mar‑ al., 2019, 2021); (ii) o estiramento crustal,
gem leste do Brasil, as quais registram tam‑ promovido por estas anomalias, causando fa‑
bé m os pulsos de soerguimento e de lhamento e exumaçã o (Jelinek, 2019; Krob et
exumaçã o que erodiram o continente. O al., 2019; Machado et al., 2019, 2021); (iii) a
evento de resfriamento acelerado, registrado reativaçã o de estruturas NE‑SW Neoprotero‑
no Cretá ceo Superior e no inı́cio do Paleó ge‑ zoicas herdadas (Jelinek et al., 2003; Jelinek,
no (Fig. 7C), marca bem este processo de so‑ 2019); (iv) a compressã o da Placa Sul‑Ameri‑
erguimento da porçã o continental, especial‑ cana; (v) a incisã o de drenagens, que apro‑
mente na Serra do Mar. Os registros sedi‑ veitaram as feiçõ es lineares, como falhas e
mentares nas Bacias de Pelotas e de Santos lineamentos, de direçõ es NE‑SW e NW‑SE
corroboram estas fases de soerguimento e (Oliveira et al., 2016; Krob et al., 2019); (vi)
de erosã o, com espessos pacotes sedimenta‑ isostasia auxiliada por underplating magmá ‑
res, de granulometria mais grossa. No entan‑ tico (Jelinek, 2019); entre outros. Estes fato‑
Figura 7 ‒ Modelo digital de terreno da margem continental sul brasileira, com a sobreposiçã o dos terrenos
tectono‑estratigrá icos e vulcano‑sedimentares.
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Universidade Federal do Rio Grande do Sul. ESTUDOS TECTONICOS, XVI, 2017, Salvador.
Evolução termocronológica do Cinturão Dom Feliciano 201
Voltar ao Sumário
1
Departamento de Geologia, Universidade Federal de Santa Catarina
2
Instituto de Geociê ncias, Universidade Federal do Rio Grande do Sul
3
Centro Paleontoló gico da Universidade do Contestado, Universidade do Contestado
4
Laborató rio de Estudos Paleobioló gicos, Universidade Federal de Sã o Carlos
1 INTRODUÇÃO
O estudo dos fó sseis é fundamental para o entendimento da evoluçã o da vida em res‑
posta à s modi icaçõ es do planeta durante o tempo geoló gico. Sã o eles, em especial os que pos‑
suem partes moles preservadas, cruciais para avaliarmos as mudanças ocorridas no planeta e
modelarmos hipó teses para as alteraçõ es futuras. No entanto, os fó sseis de corpos moles sã o es‑
tatisticamente raros e normalmente estã o associados nos conhecidos depó sitos Konservat‑
Lagerstatten (Seilacher, 1970). Esses ú ltimos sã o de inidos como depó sitos fossilı́feros com pre‑
servaçã o incomum e, segundo Cardoso et al. (2020), apesar da importâ ncia dos
Konservat‑Lagerstatten, suas ocorrê ncias sã o escassas e restritas, delimitadas por grupos de es‑
tratos com idades, contexto paleodepositional e localizaçã o geográ ica similar. Portanto, a iden‑
ti icaçã o desses tipos de depó sitos é extremamente rara.
No Brasil, embora haja abundantes exposiçõ es fossilı́feras, tı́nhamos reconhecidamente
até o inal da dé cada de 1990, apenas os estratos da Formaçã o Santana e Romualdo, Bacia do
Araripe, como depó sitos Konservat‑Lagerstatte. Este cená rio vem‑se modi icando, em especial
pelo contı́nuo relato de fó sseis com preservaçã o incomum no Intervalo Fossilı́fero Folhelho Lon‑
tras (IFFL), Carbonı́fero‑Permiano da Fm. Campo Mourã o, Bacia do Paraná .
Descoberto em 1908 por Jay Backus Woodworth e Euzé bio Paulo de Oliveira, durante a
expediçã o por camadas glaciais no sul do Brasil, o IFFL é composto por uma diversa e bem pre‑
servada associaçã o fossilı́fera. Esse sı́tio marinho fossilı́fero, hoje encontrado no A loramento
Contribuições à Geologia do Rio Grande do Sul e de Santa Catarina
Campaleo, compreende uma combinaçã o de odworth e por Oliveira foi encoberto pela
diferentes tipos preservaçã o, incluindo par‑ construçã o de moradias populares. Apesar
tes duras e tecidos moles de organismos da abundâ ncia e da diversidade de fó sseis
aquá ticos (peixes, porı́feros e amonó ides), registradas para o Folhelho Lontras, em Ma‑
assim como de biotas terrestres (insetos e fra, apó s a precursora publicaçã o de Ruede‑
plantas). mann, complementada por Oliveira (1930),
poucas mençõ es aos fó sseis foram feitas,
2 HISTÓRIA DA DESCOBERTA DO durante as dé cadas seguintes (e.g. Carvalho,
LAGERSTATTE Miranda & Alvin, 1942; Schneider et al.,
1974; Rö sler, 1985), até a descriçã o da pri‑
A histó ria do Folhelho Lontras e de meira espé cie do Intervalo Fossilı́fero do
seus magnı́ icos fó sseis começa no inı́cio do Folhelho Lontras, i.e., Santosichtyes mafren‑
sé culo XX, quando expediçõ es geoló gicas i‑ sis Malabarba, 1988, seguida da tese de Ri‑
nanciadas pelos governos brasileiro e esta‑ chter sobre a paleoictiofauna do Folhelho
dunidense deram inı́cio a investigaçõ es por (Richter, 1991).
depó sitos minerais e por registro glaciais Em 1997, durante o processo de
(Mouro et al., 2018). terraplenagem para instalaçã o de uma em‑
Financiados pelo Shaler Memorial presa na regiã o industrial ao sul da cidade,
Fund, um fundo de inanciamento à pesquisa ainda em seu perı́metro urbano, estratos do
criado por alunos e por admiradores do pro‑ IFFL foram encontrados. O achado culminou
fessor da Universidade de Harvard, o geó lo‑ em uma mobilizaçã o de ó rgã os de iscaliza‑
go Nathaniel Southgate Shaler, Jay Backus çã o, do poder executivo, da sociedade cien‑
Woodworth e o geó logo brasileiro Euzé bio tı́ ica e da comunidade local com
Paulo de Oliveira percorreram diversas loca‑ repercussã o nacional. Um movimento da
lidades dos estados de Sã o Paulo, do Paraná Prefeitura de Mafra decretou como de inte‑
e de Santa Catarina, em 1908. Dentre as lo‑ resse pú blico para ins de preservaçã o do
calidades visitadas, descobriram e descreve‑ Patrimô nio Natural uma propriedade a 300
ram uma camada de folhelhos negros metros da á rea de instalaçã o da empresa,
fossilı́feros no bairro de Bela Vista, ao sul da antigamente explorada como lavra para in‑
cidade de Rio Negro, no Paraná , cuja exten‑ dú stria ceramista, onde o Folhelho Lontras
sã o, na é poca, compreendia, també m, o atual e seu intervalo fossilı́fero encontravam‑se
municı́pio de Mafra, em Santa Catarina. Atu‑ a lorantes. Esta á rea foi posteriormente de‑
almente, esta camada é cronocorrelata à ca‑ sapropriada e disponibilizada para realiza‑
mada do A loramento Campaleo, no çã o de pesquisas, sob os cuidados do Centro
Intervalo Fossilı́fero do Folhelho Lontras. Paleontoló gico da Universidade do Contes‑
Cerca de 200 amostras da expediçã o tado. Nascia assim o a loramento Campaleo
de Euzé bio de Oliveira em 1908, foram envi‑ (Fig. 1; Hamel, 2005; Mouro et al., 2014a;
adas por Orville Derby para o Museu do Es‑ Weinschü tz et al., 2019). A partir deste mo‑
tado de Nova Iorque (New York State mento, a pesquisa geocientı́ ica do Folhelho
Museum), onde estã o armazenadas até hoje Lontras se tornou mais constante e a quali‑
e resultaram na primeira publicaçã o cientı́ i‑ dade de preservaçã o de seus fó sseis, bem
ca acerca do IFFL (veja Ruedemann, 1929). como a riqueza de sua paleobiota, sendo
Alé m da relevâ ncia cientı́ ica, esses exempla‑ paulatinamente conhecida e, atualmente,
res possuem enorme valor histó rico, tendo considerada um Fó ssil Largesttä te do Paleo‑
em vista que o a loramento visitado por Wo‑ zoico Superior (e.g. , Scomazzon et al., 2013;
Figura 1 ‒ Mapa de localizaçã o do A loramento Campaleo (IFFL). Em detalhe, a localizaçã o das unidades
Carbonı́feras‑Permianas a lorantes nos estados do sul do Brasil.
Souza, 1993; Dino & Rö sler, 2001; Souza, a inidade com as grandes á reas da pesquisa
2005; Holz et al., 2010; Scomazzon et al., paleontoló gica: paleovertebrados, paleoin‑
2013; Wilner et al., 2016a). Essa ú ltima foi vertebrados, paleo lora, microfó sseis e icno‑
rati icada por dados de Rb‑Sr detrı́tico em fó sseis (Figs. 3‑9).
amostras oriundas do A loramento Campa‑
leo (Koester et al., 2016). Essa inde iniçã o, a 5 PALEOVERTEBRADOS
respeito da idade do Folhelho Lontras, suge‑
re a possibilidade de um degelo diá crono do Peixes: ao menos, duzentos espé ci‑
Grupo Itararé , como já visto na Bacia de Pa‑ mes completos de peixes actinopterı́gios, in‑
ganzo, na Argentina (Moxness et al., 2018). cluindo juvenis e adultos, foram resgatados.
No entanto, considerando o grau de con ian‑ As espé cies Santosichtyes mafrensis (Mala‑
ça da dataçã o absoluta, é plausı́vel posicio‑ barba, 1988) e Roslerichthyies riomafrensis
nar o Folhelho Lontras na idade (Hamel, 2005) foram descritas no IFFL, alé m
Pennsilvaniana. de outras, descritas e nã o publicadas por Ri‑
O A loramento Campaleo (S 26°09′ chter (1991). A constante coleta possibilita,
30.22″, W 49°48′ 52.82″) (Fig. 1) está locali‑ ainda, a descriçã o de novas espé cies da pale‑
zado à s margens da rodovia BR‑280, a cerca oictiofauna do Folhelho Lontras (Fig. 3A‑3B).
de 2 km do trevo com a BR‑116, na regiã o Segundo Hamel (2005), os peixes fó sseis do
urbana da cidade de Mafra, em Santa Catari‑ IFFL sã o encontrados, normalmente, com‑
na. A base do a loramento é composta por 1 primidos na matriz, mas també m podem ser
m de siltito bioturbado, sobreposto pelos recuperados com suas caracterı́sticas tridi‑
1,10 m de folhelho negro macrofossı́lifero. mensionais pouco alteradas, em concreçõ es
Acima, segue um ritmito nã o fossilı́fero de 7 fosfá ticas. Por outro lado, exemplares, asso‑
m. Weinschü tz (2010) subdividiu o folhelho ciados à Classe Chondrichthyes, sã o encon‑
fossilı́fero em quatro nı́veis, denominados, trados apenas fosfatizados e, majorita‑
da base para o topo, 1, 2, 3 e 4 (Fig. 2). Cada riamente, na forma de dentes isolados (Pau‑
nı́vel foi dividido em subnı́veis, referentes à liv et al., 2014). Ocasionais escamas ganó ides
forma de desplacamento e de acamamento també m sã o encontradas, isoladas, nas lâ mi‑
das camadas, sendo re lexo direto de varia‑ nas do folhelho.
çõ es da deposiçã o e/ou de processos diage‑
né ticos. Assim, temos: nı́vel 1 (A, B, C, D); 6 PALEOINVERTEBRADOS
nı́vel 2 (A, B); nı́vel 3 (A, B, C, D); e nı́vel 4 (A,
B). E importante ressaltar que as variaçõ es Annelida: entre os subnı́veis 2B e 3B,
deposicionais, dentro da granulometria do foram descobertos cerca de 30 elementos
folhelho, sã o sutis. mandibulares de poliquetos. Normalmente,
esses escolecodontes sã o encontrados isola‑
dos no plano de acamamento, assim como
4 PALEOBIOTA DO FOLHELHO LON‑
dentro de concreçõ es fosfá ticas, em que a
TRAS
ocorrê ncia de um possı́vel corpo de polique‑
Desde a sua redescoberta, em mea‑ to, com estruturas cilı́ndricas segmentadas e
dos da dé cada de 1980, o conhecimento, a cerdas, foi reportado (Fig. 4A‑4B) (Ricetti &
respeito da assembleia fossilı́fera do Folhe‑ Weinschü tz, 2011; Ricetti et al., 2014; Mou‑
lho Lontras, vem sendo aprofundado e am‑ ro, 2017). Atualmente sob estudo, apresen‑
pliado. Uma sı́ntese de seu conteú do tam, a princı́pio, composiçã o carboná cea.
fossilı́fero é , aqui, apresentada, conforme sua Brachiopoda: um dos primeiros gru‑
Figura 2 ‒ Detalhamento estratigrá ico do intervalo fossilı́fero do Folhelho Lontras (Formaçã o Campo Mourã o,
na Bacia do Paraná ) e sua associaçã o fossilı́fera (modi icado de Mouro et al., 2020).
Figura 3 ‒ Fó sseis associados a vertebrados e a “proto‑vertebrados”: (a‑b) Espé cimes de peixes actinopterı́gios
(CP.V 5202a, retirado de Mouro et al., 2020); (c‑e) Aparatos mandibulares de conodontes.
pos a ser identi icado e descrito nas camadas tone marinha, preservada em soterramento
do Folhelho Lontras, durante a expediçã o de rá pido ou em ambiente de baixa energia,
Eusebio de Oliveira e de James Woodworth, com fundo anó xico.
em 1908 (veja Woodworth, 1912). Mais de Insecta: a ocorrê ncia de fó sseis des‑
trê s centenas de espé cimes de braquió podes sa classe nos sedimentos do Folhelho Lon‑
já foram coletados, sendo, na sua grande tras já é conhecida, desde a dé cada de 1990,
maioria, indivı́duos de Langella imbituvensis, e, talvez, junto com os elementos conodon‑
de Chonetes rionegrensis, de Biconvexiella ro‑ tes, os insetos compreendam as principais
xoi, de Quinquenella? sp., de Beecheria? sp. e descobertas paleontoló gicas do A loramen‑
de Orbiculoidea guaraunensis (Fig. 4C‑4D) to Campaleo, com efeitos diretos no enten‑
(Oliveira, 1930; Neves et al., 2017). Mouro dimento da evoluçã o bioló gica.
(2017) descreveu a ocorrê ncia isolada de di‑ Normalmente, eles sã o encontrados preser‑
minutos espé cimes fosfatizados e querogeni‑ vados entre os subnı́veis 1A e 3A, em trê s
zados em alguns dos subnı́veis do maneiras: comprimidos e piritizados, carbo‑
A loramento Campaleo. Todos eles se encon‑ nizados ou fosfatados. Entre as ordens iden‑
tram paralelos ao plano de acamamento. ti icadas, destaque para Blattodea e para
Crustacea: Adami‑Rodrigues et al. Grylloblattodea, que representam mais de
(2012) identi icaram e descreveram corpos e 100 espé cimes corpó reos encontrados
fragmentos de indivı́duos da Subclasse Eu‑ (Martins‑Neto, 2005; Pinto & Sedor, 2000;
malacostraca (Fig. 5A). Esses espé cimes, pre‑ Ricetti et al., 2016). Aproximadamente, 54%
servados carboni icados, impressos ou em da fauna é composta pela espé cie de Phylo‑
concreçõ es, indicam uma assembleia autó c‑ blattidae Anthracoblattina mendesi Pinto &
Sedor, 2000, descrita para o IFFL e revisada da Bacia Sedimentar do Paraná . Os dois es‑
por Ricetti et al. (2016). Os detalhes de pre‑ pé cimes apresentam forte compactaçã o e es‑
servaçã o destes espé cimes sã o tamanhos, tã o preservados parcialmente, por
que se torna possı́vel veri icar lagelos nas piritizaçã o (espira externa), parcialmente,
antenas, escleritos torá cicos, assim como pa‑ por fosfatizaçã o (espira central) (Fig. 6E).
drõ es epicuticulares (Ricetti et al., 2016) Embora estejam em estudo, uma aná lise pre‑
(Fig. 5B, Fig. 9C‑9D). Mouro et al. (2020) re‑ liminar apontou a inidades com o gê nero
portaram a preservaçã o de ibras musculares Uraloceras, descrito no Permiano, nos Mon‑
submilimé tricas em alguns espé cimes de in‑ tes Urais (Cazaquistã o).
setos (Fig. 9E‑9H). Ainda sobre fó sseis, asso‑
ciados à Classe Insecta, o mais antigo casulo 7 ICNOFÓSSEIS
larval da Ordem Trichoptera foi encontrado e
descrito no Folhelho Lontras (Mouro et al., Nos subnı́veis inferiores do A lora‑
2016) (Fig. 5C). Esses fó sseis, nã o, apenas, mento Campaleo, foram identi icadas algu‑
aumentaram o tempo de existê ncia do há bito mas ocorrê ncias esparsas de copró litos
de fazer casulos dos Trichoptera, do Jurá ssi‑ heteropolares e de enteró spiras. Os copró li‑
co para o Carbonı́fero Superior, mas, tam‑ tos apresentam formato arredondado e cilı́n‑
bé m, lançaram uma luz sobre a ecologia e drico, com mé dias de 24 mm de
sobre o comportamento dos tricopterı́deos comprimento, de 13 mm de largura e de 6
nos está gios iniciais de evoluçã o, que teria mm de espessura (Fig. 6C) Em determinadas
iniciado em ambiente marinho calmo e sub‑ amostras, é possı́vel observar um acama‑
tidal. mento interno concê ntrico, e, em outras, po‑
de‑se notar issuras radiais (Muller et al.,
Porifera: no IFFL, sã o encontradas as
2017). As enteró spiras, que sã o exemplares
melhores preservaçõ es de porı́feros do Bra‑
de intestinos fossilizados de tubarõ es, pos‑
sil. Mouro et al. (2014) (Figs. 6A e 6B e 9A e
suem formato cilı́ndrico e comprimento mé ‑
9B) identi icaram corpos articulados e bem
dio de 22 mm, largura mé dia de 11 mm e
delimitados de hexactinellideos, descreven‑
diâ metro mé dio de 5 mm (Fig. 6D).
do a primeira espé cie paleozoica brasileira,
Microhemidiscia greinerti. Em 2017, o mes‑
8 PALEOFLORA
mo autor divulgou a ocorrê ncia de um possı́‑
vel indivı́duo demospongı́deo, que havia sido Fragmentos carbonizados milimé tri‑
coletado por Oliveira (1927) e que se encon‑ cos a centimé tricos sã o facilmente reconhe‑
trava depositado no acervo do New York Sta‑ cidos no Folhelho Lontras (Mouro, 2013)
te Museum. Ainda a respeito das esponjas, a (Fig. 7). Eles normalmente estã o associados
partir de estudos tafonô micos e geoquı́mi‑ aos demais fragmentos fossilı́feros, como
cos, Mouro et al. (2017) estabeleceram duas dentes, escamas, espı́culas e aparelhos man‑
tafofá cies do grupo nos subnı́veis do A lora‑ dibulares. Gnaedinger et al. (2012) e Urban
mento Campaleo. Em 2020, foi reportada a et al. (2012) identi icaram a ocorrê ncia de
presença de partes moles preservadas de po‑ espé cimes de lenhos Agathoxylon Hartig e
rı́feros, o que reforçou as condiçõ es ú nicas e Abietopitys Krä usel. Quando nos voltamos a
especiais desse pacote sedimentar. fragmentos micromé tricos, Mouro et al.
Ammonoidea: Weinschü tz et al. (2012) e Mouro (2013) reportaram a ocor‑
(2018) comunicaram o achado dos primei‑ rê ncia de itoclastos nã o opacos e opacos, as‑
ros exemplares de Ammonoidea no IFFL, sim como a presença de grã os de pó len e de
sendo considerados, també m, os primeiros esporos (Fig. 7E‑7G). Ainda, em Mouro et al.
Folhelho Lontras, uma Lagerstatte do Paleozoico brasileiro 209
Contribuições à Geologia do Rio Grande do Sul e de Santa Catarina
Figura 4 ‒ Biota de paleoinvertebrados: preservaçõ es associadas a anelı́deos: (a) Uma possı́vel impressã o de
somitos; (b) Aparelhos mandibulares de escolecodontes; (c‑d) Braquió podes; e (e) Ostracodes.
(2020), é apresentada uma possı́vel resina morfologia externa indicaria a ocorrê ncia de
vegetal (Fig. 7C). um foraminı́fero bentô nico aglutinante.
Contudo, as caracterı́sticas també m morfo‑
9 MICROFÓSSEIS mé tricas permitem supor a ocorrê ncia de
ovos de invertebrados. Pigã o & Mouro
Conodonta: dezenas de aparatos arti‑
(2019) rati icaram a ocorrê ncia do ilo, ao
culados e centenas de elementos isolados, do
identi icar foraminı́feros em lâ minas petro‑
gê nero Mesogondolella spp., foram recupera‑
grá icas do subnı́vel 3B (Fig. 8).
dos em cinco subnı́veis do A loramento Cam‑
Ostracoda: Kallen et al. (2014a,
paleo (Fig. 3C‑3E) (veja Scomazzon et al.,
2014b) registraram a presença de micro‑
2013; Wilner et al., 2016a). Os espé cimes
crustá ceos da classe Ostracoda. Esses mi‑
preservados sã o encontrados fosfatizados
crofó sseis possuı́am comprimento mé dio de
(por fosfato de cá lcio), paralelos ao plano de
175 μm e largura mé dia de 85 μm. A varia‑
acamamento e com alternâ ncia entre ele‑
çã o morfoló gica observada pode indicar es‑
mentos ramiformes e P1 (Mouro et al., 2020).
tá gios ontogené ticos ou a ocorrê ncia de
Foraminifera: o primeiro registro
mais de uma espé cie. As carapaças geral‑
desse grupo nas camadas do IFFL foi realiza‑
mente possuem composiçã o fosfá tica (Cá l‑
do por Lopes (2016). Segundo o autor, a
cio) e sã o encontradas articuladas, bem
210 Edição da Sociedade Brasileira de Geologia – Núcleo RS/SC
Mouro et al.
Figura 5 ‒ Biota de paleoinvertebrados: (a) Espé cime de Malacostraca, dentro de concreçã o (CP.I 887a, retirado
de Mouro et al., 2020); (b) fó ssil bem preservado de Anthracoblattina mendesi (CP.I 2182, retirado de Ricetti et
al., 2016); e (c) casulos larvais de Trichoptera (CPE 7811, retirado de Mouro et al., 2016).
preservadas, com coloraçã o â mbar a branca Ziegler et al., 1997; Buggisch et al., 2011; Is‑
e pouco ornamentadas (Fig. 4E). bell et al., 2012; Montañ ez & Poulsen, 2013;
Fedorchuk et al., 2018, 2019). Recentes tra‑
10 PALEOAMBIENTE, PALEOECOLOGIA balhos indicam que a porçã o sul do que, hoje,
E PRESERVAÇÃO é o Brasil, durante a passagem Carbonı́fera‑
Permiano, apresentava uma isiogra ia e uma
Entre o inal do Carbonı́fero e o inı́‑
morfologia de lobos glaciais, formando vales
cio do Permiano (Cisuraliano), o paleoconti‑
de sistema jord, semelhantes aos vistos, atu‑
nente Gondwana apresentava a toda sua
almente, no Chile e na Nova Zelâ ndia (Lopes
regiã o austral, sob in luê ncias deglaciais, re‑
et al., 1986; Lavina & Lopes, 1987; Dias,
lacionadas ao inal da Era do Gelo do Paleo‑
1993; Machado, 1994; Santos et al., 1996;
zoico Tardio (Late Palaeozoic Ice Age).
Holz et al., 2010; Silveira, 2000; Vesely et al.,
Apesar das discussõ es, a respeito do padrã o
2015; Tedesco et al., 2016, Mouro et al.,
de distribuiçã o das camadas de gelo na por‑
2017, 2020). Neste mesmo cená rio, Fallgat‑
çã o sul do Gondwana, sua in luê ncia está
ter & Paim (2017) reconheceram trê s ciclos
muito bem registrada nas unidades do Grupo
glaciais e a presença de um paleovale entre
Itararé , na Bacia do Paraná (Scotese, 1997;
Alfredo Wagner e Vidal Ramos, na porçã o
Figura 6 ‒ Paleoinvertebrados e icnofó sseis: (a‑b) exemplares de porı́feros Microhemidiscia greinerti (CPI 450
e 451, retirados de Mouro et al., 2014). Exemplares de icnofó sseis: (c) enteró spira e (d) copró lito heteropolar.
(e) Exemplar de amonoide.
Figura 7 ‒ Paleo lora do IFFL: (a) Lenho (CP.B 7196); (b) Impressã o de cutı́cula (CP.M 122); (c) Possı́vel â mbar
(CP.E 6521b); (d) Caule carbonizado; (e‑f) Pó lens; e (g) Alga prasinó ita.
central do estado de Santa Catarina, que esta‑ e o nı́vel marinho relativo aumentava, um
ria conectado, a norte, com uma grande baia, profundo sistema jord foi estabelecido. Os
em Rio do Sul (veja Canuto, 1999). Ainda, se‑ sedimentos depositados, durante o im deste
gundo esses autores, no inal do primeiro ci‑ primeiro ciclo, correspondem ao principal
clo glacial, enquanto a geleira recuava para SE marco estratigrá ico do Grupo Itararé , o Fo‑
Figura 8 ‒ Foraminı́feros do IFFL em lâ mina petrográ ica: (a‑b) espé cimes multicameras; e (c‑d) espé cimes
globulares (retirado de Pigã o & Mouro, 2019).
lhelho Lontras (Schneider et al., 1974; França (HST), nos subnı́veis 1B, 3B a 4B. A partir
& Potter, 1988). destas aná lises, os autores observaram uma
Apesar da ausê ncia de fó sseis na recorrente euxinia na zona fó tica, assim co‑
maioria das ocorrê ncias do Folhelho Lontras, mo a predominâ ncia de condiçõ es anó xicas/
a medida em que o processo de degelo pre‑ euxı́nicas no bentos. Essas condiçõ es podem
valecia no norte do estado de Santa Catarina, estar relacionadas à ausê ncia de açã o de
as condiçõ es climá ticas favorá veis possivel‑ maré s, uma vez que a presença de microma‑
mente propiciaram o estabelecimento de um ré s é esperada em paleoambientes, relacio‑
hotspot de biodiversidade, como visto, atual‑ nados a iordes (veja Austin & Scourse,
mente, nos jords da Nova Zelâ ndia, e assina‑ 1997; Allison et al., 1998; Wells et al., 2005).
lado no horizonte, no sı́tio Campaleo. A partir Contudo, a presença de porı́feros autó ctones
de uma aná lise multiproxy (geoquı́mica orgâ ‑ assinala, ao menos, rá pidos momentos de
nica e inorgâ nica, paleontologia e palinolo‑ oxigenaçã o, portanto nã o se descarta a pos‑
gia), Mouro et al. (2017) assinalaram sibilidade de micromaré s de baixı́ssima in‑
caracterı́sticas de um ambiente marinho res‑ tensidade, como visto em mares
trito, com profundidades entre 200 m e 400 epicontinentais do Carbonı́fero na Europa.
m e, provavelmente, um embaiamento, cau‑ Portanto, combinando‑se o comple‑
sado por frente de geleira. Ademais, reconhe‑ xo contexto paleoambiental com as condi‑
ceram dois tratos de sistema: trato de çõ es paleoclimá ticas e paleogeográ icas, é
sistema transgressivo (TST), nos subnı́veis aceitá vel assinalar o IFFL como uma profun‑
1A, 1C a 3B, e trato de sistema de mar alto da baı́a de paleo jord (Mouro et al., 2020).
Figura 9 ‒ Preservaçã o incomum no IFFL: (a) Hexactinellı́deo com possı́vel epiderme; (b) Macroscleras de
Hexactinelı́deo como microsclera hemidisco; (c‑d) Inseto tridimensional fosfatizado (CP.E 3243 a); (e‑g)
Articulaçã o femur‑tı́bia com tecido muscular preservado (CP.I 2276b); (f‑h) Articulaçã o femur‑tı́bia e mú sculo
tarsal; (i) Casulo larval de Trichoptera; (h) Detalhe da estrutura semelhante à seda, encontrada no casulo larval
(imagem de MEV).
cher & Feldman, 1990) e Folhelho Lawrence lho Lontras, há registros da ocorrê ncia de
(Zidek, 1992). intervalos semelhantes em outras duas loca‑
O Folhelho Lontras é categorizado lidades: um, na cidade de Mafra, e outro, em
como Lagerstatte, devido à ocorrê ncia de di‑ Rio dos Cedros, ambos em Santa Catarina.
ferentes tipos de preservaçã o, de amplo es‑ Entre as pesquisas realizadas, nos
pectro tafonô mico, incluindo a presença de ú ltimos anos, a associaçã o do IFFL tem pro‑
partes duras e moles de organismos aquá ti‑ porcionado informaçõ es importantes para o
cos e terrestre, como visto em outros impor‑ entendimento da evoluçã o ilogené tica, co‑
tantes Lagerstatten (e.g. Mazon Creek) (Fig. mo visto em porı́feros, em conodontes e em
9) (Mouro et al., 2020). O IFFL, mesmo apre‑ peixes paleoniscı́deos. Alé m disso, a desco‑
sentando condiçõ es favorá veis ao processo berta de casulos larvais trouxe novas hipó te‑
de piritizaçã o, conté m poucos fó sseis piriti‑ ses para a origem e para a ecologia do há bito
zados (veja Mouro et al., 2017), haja visto de produzir casulos na Ordem Trichoptera.
que sua maioria está preservada como com‑ Apesar do progresso realizado no
pressõ es carboná ceas ou fosfá ticas. A quali‑ entendimento da biota do IFFL, a partir de
dade da preservaçã o pode estar diretamente trabalhos sistemá ticos, realizados por diver‑
relacionada à grande abundâ ncia de maté ria sos paleontó logos brasileiros, importantes
orgâ nica em condiçõ es redutoras, como informaçõ es tafonô micas e taxonô micas ain‑
apontam os dados geoquı́micos e sedimento‑ da continuam em aberto. Portanto, há de se
ló gicos do IFFL (Mouro et al., 2017; Mouro et continuar a estudar e a preservar esse im‑
al., 2020). Apesar da excelente preservaçã o, portante Lagerstatte brasileiro.
existem poucas evidê ncias da açã o de micro‑
organismos (EPS ou bio ilmes) no decaimen‑
REFERÊNCIAS
to e na preservaçã o dos espé cimes, como
tem sido visto em outros Lagerstatten (Osé s Adami‑Rodrigues, K., Pazinato, P. G., Correa,
et al., 2016). Mas isso se deve à falta de estu‑ R. C., Ricetti, J. H. Z. & Weinschü tz, L. C. 2012.
dos mais detalhados sobre esta açã o no IFFL. Malacostraca da Formaçã o Rio do Sul, Grupo
Desta forma, o Folhelho Lontras, em Mafra, é Itararé , Bacia do Paraná , Mafra, SC, Brasil. In:
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1
Instituto de Geociê ncias, Universidade Federal do Rio Grande do Sul
2
Centro Paleontoló gico da Universidade do Contestado (CENPALEO), Universidade do Contestado
1 INTRODUÇÃO
Conodontes sã o vertebrados primitivos, encontrados nos estratos marinhos do
Cambriano ao Triá ssico, nas bacias sedimentares mundiais. Sã o potencialmente ú teis, para a bi‑
oestratigra ia, sendo ó timos fó sseis‑guia, durante os 300 milhõ es de anos de sua existê ncia. Sã o
importantes indicadores geotermais, atravé s do Indice de Alteraçã o de Cor (IAC), pois seus ele‑
mentos podem variar de cor entre amarelo pá lido e preto (50 oC a 600 oC), constituindo‑se em
ferramenta estraté gica na pesquisa de hidrocarbonetos, nas bacias sedimentares paleozoicas
mundiais (Epstein et al., 1977).
Atravé s do avanço em equipamentos de tomogra ia computadorizada, em espectrô me‑
tros de massa, em aceleradores de partı́culas, entre outros, tem sido possı́vel utilizar estes fó s‑
seis em estudos de paleotemperaturas, de quimioestratigra ia, de correlaçã o de bacias, de
cronoestratigra ia, de bioestratigra ia, de paleoecologia, de reconstituiçõ es paleoambientais e
paleobiogeográ icas, de tafonomia, de entendimento da origem dos vertebrados, de exploraçã o
de hidrocarbonetos, entre outros.
No registro sedimentar, é possı́vel encontrar os conodontes de trê s formas distintas: (1)
o animal conodonte (Fig. 1), vertebrado primitivo, cujo corpo era composto de material orgâ ni‑
co, que se decompunha facilmente, com preservaçã o fossilı́fera extremamente rara; (2) os apa‑
relhos alimentares, formados por conjuntos de elementos conodontes; e (3) os chamados
elementos conodontes, ú nica porçã o mineralizada do organismo, os quais possuem diferentes
morfologias e formam arranjos em posiçõ es especı́ icas nos aparelhos alimentares, na regiã o ce‑
fá lica do animal (Fig. 2).
Contribuições à Geologia do Rio Grande do Sul e de Santa Catarina
Figura 1 ‒ Escultura do animal conodonte em escala de 1:25, exposta no Museu da Terra e da Vida, do Centro
Paleontoló gico da Universidade do Contestado, campus Mafra (SC), com 1,20 m de comprimento (acervo de
imagens de Everton Wilner).
Figura 2 ‒Animal conodonte. Detalhe da organizaçã o do aparelho alimentar, na regiã o cefá lica do animal, com
os elementos pectiniformes (P) e ramiformes (S e M), (extraı́do de Purnell, 1993).
Na composiçã o deste conjunto: ani‑ minados, devido a sua morfologia cô nica (do
mal conodonte, aparelhos alimentares e ele‑ grego kônos = cone e odontos = dentes). Pan‑
mentos conodontes, estes ú ltimos foram os der foi um dos fundadores da Embriologia e
primeiros a serem encontrados, sendo des‑ da Paleontologia na Rú ssia e considerou es‑
critos, pela primeira vez, por Christian Hein‑ tes elementos mineralizados isoladamente, a
rich Pander, em 1856, ao estudar estratos partir dos quais derivou o conceito de cono‑
ordovicianos da Estô nia. Foram assim deno‑ donte, designando dentes e/ou mandı́bulas
224 Edição da Sociedade Brasileira de Geologia – Núcleo RS/SC
Scomazzon et al.
Ulrich & Bassler (1926 apud Sweet, 1988) com aproximadamente 4 centı́metros, com
també m aceitavam a ideia de que os cono‑ forma de enguia, com olhos proporcional‑
dontes fossem dentes ou placas dermais de mente grandes, com notocorda, com miô ‑
peixes primitivos, semelhantes aos mixinó i‑ meros (blocos de mú sculos em forma de V)
des. Gross (1954 apud Sweet, 1988), estu‑ nas laterais do corpo e com nadadeira cau‑
dando a estrutura lamelar dos elementos dal. Essas caracterı́sticas inserem os cono‑
conodontes, concluiu que estes, de fato, eram dontes no ilo Chordata (Purnell et al.,
representantes dos Cordados, poré m de um 1995). Alé m disso, foram identi icados, em
ramo distinto do dos Agnatha. alguns conodontes: tecido ó sseo, esmalte,
Com a descoberta do primeiro espé ‑ cartilagem calci icada e dentina, que sã o ca‑
cimen do animal conodonte no Granton Sh‑ racterı́sticas ú nicas dos vertebrados (San‑
rimp Bed, na Escó cia (Briggs et al., 1983), som et al., 1992, 1994).
estes autores postularam que os conodontes As evidê ncias da anatomia das par‑
nã o seriam pertencentes nem ao ilo Chae‑ tes moles e a microestrutura dos elementos
tognatha, nem aos Cordados, devido à falta conodontes indicam que esses animais es‑
de dentina ou de qualquer outra evidê ncia, tã o entre os vertebrados mais primitivos.
no fó ssil, que comprovasse seu posiciona‑ Contudo, a falta de um esqueleto minerali‑
mento em um ou em outro ilo. Assim, Briggs zado (a nã o ser o aparelho alimentar, que é
et al. (1983) concluı́ram que os conodontes fosfá tico) leva a crer que eles seriam mais
pertenciam a um ilo separado, denominado primitivos do que os Agnatha (e.g. Ostraco‑
ilo Conodonta. Mais tarde, foram descober‑ dermos = astraspı́deos, pituriaspı́deos,
tos outros espé cimes, com melhor preserva‑ etc. ), mas mais avançados do que os mixi‑
çã o, naquele mesmo local, cujas feiçõ es das nó ides (e.g. Myxina, que nã o possuem es‑
partes orgâ nicas indicaram, claramente, uma queleto fosfá tico no aparelho alimentar),
a inidade com os Agnatha (Aldridge et al., sugerindo que os conodontes seriam os ver‑
1986; Dzik, 1986; Conway‑Morris, 1989; tebrados mais primitivos, encontrados até
Briggs, 1992). hoje (Purnell et al., 1995).
Utilizando microscó pio eletrô nico de Apesar destas descobertas e dos
varredura e de transmissã o, Szaniawski trabalhos baseados na histologia dos ele‑
(1987) estudou a microestrutura e a compo‑ mentos (Sansom et al., 1994), que revela‑
siçã o do corpo basal de alguns elementos co‑ ram vá rias caracterı́sticas dos vertebrados,
nodontes. Fazendo comparaçõ es entre os alguns especialistas em vertebrados primi‑
conodontes e os Chaetognatha, Szaniawski tivos tê m, ainda, dú vidas, com relaçã o à a i‑
(1987) concluiu que, provavelmente, os co‑ nidade dos conodontes, por acreditarem
nodontes nã o seriam Chaetognatha sensu que tais caracterı́sticas nã o sã o su icientes
stricto, mas que ambos teriam se originado para considerá ‑los vertebrados (Blieck,
de um ancestral comum. 1992; Forey & Janvier, 1993; Janvier, 1988,
Com os novos espé cimens do Gran‑ 1996).
ton Shrimp Bed, Aldridge et al. (1993) consi‑
deraram os conodontes representantes de 3 O ANIMAL CONODONTE
um grupo paralelo aos Agnatha, poré m com
semelhanças pró ximas aos mixinó ides, nã o O primeiro registro de tecido fossi‑
tendo mais propó sito colocá ‑los como um i‑ lizado de conodontes foi de um ú nico espé ‑
lo separado. Estes espé cimens mostraram cimen do Carbonı́fero da Escó cia (Granton
que os conodontes eram animais pequenos, Shrimp Bed), sendo o horizonte fossilı́fero
composto por dolomitos marrons, pobres por um tronco com mú sculos em V e, na re‑
em maté ria orgâ nica, e por laminaçõ es de giã o posterior, encontra‑se uma nadadeira
silte preto, ricos em maté ria orgâ nica, em fá ‑ caudal radiada (Aldridge et al., 1993).
cies proximais, de á gua rasa. O registro fossi‑ Na margem anterior da cabeça, exis‑
lı́fero continha o aparelho alimentar tem duas estruturas lobadas, de cor mais es‑
completo na regiã o cefá lica (Briggs et al., cura do que as estruturas mineralizadas do
1983). Posteriormente, foram encontrados tronco. Inicialmente, esses lobos foram con‑
mais trê s espé cimens neste mesmo horizon‑ siderados, por Aldridge & Theron (1993), co‑
te fossilı́fero, que trouxeram maiores infor‑ mo “cá psulas ó pticas”, mas essa hipó tese foi
maçõ es, com respeito à s partes orgâ nicas, logo descartada, devido ao tamanho, à forma
apesar destes serem menos completos do e à posiçã o dos lobos. Comparaçõ es com ou‑
que o primeiro animal encontrado (Aldridge tros fó sseis Agnatha, incluindo Jamoytius, um
et al., 1986). Seis novos espé cimes foram co‑ anaspı́deo do Siluriano, sugeriram que os lo‑
letados no Granton Shrimp Bed da Escó cia, bos representavam cartilagens escleró ticas,
perfazendo um total de 10 espé cimes, atual‑ que ocorriam ao redor dos olhos. No animal
mente. Alguns deles, com feiçõ es particular‑ do Granton Shrimp Bed, essa cartilagem pa‑
mente bem preservadas da cabeça e do rece ser profunda, com buracos internos, em
tronco, corroborando as primeiras interpre‑ forma de anel, indicando que os olhos eram
taçõ es. relativamente grandes e lateralmente posici‑
Um ú nico exemplar de um conodon‑ onados (Briggs et al., 1983). A presença de
te panderodontı́deo, pouco preservado, foi olhos grandes nesses espé cimes sugere um
encontrado no Siluriano, em Waukesha, Wis‑ aparelho cefá lico mais avançado do que o
consin (Smith et al., 1987) e traços de partes dos cefalocordados (e.g. Amphioxus) (Pur‑
orgâ nicas foram encontradas, em associaçã o nell, 1995).
com aparelhos alimentares gigantes (em tor‑ Traços adicionais de partes orgâ ni‑
no de 20 mm) de conodontes, no Ordovicia‑ cas na regiã o da cabeça foram, em princı́pio,
no Superior da Africa do Sul (Aldridge & relacionadas aos olhos (Aldridge & Briggs,
Theron, 1993). Os espé cimens de Waukesha 1989), mas, atualmente, sã o consideradas
e da Africa do Sul revelaram detalhes sobre cá psulas ó pticas, assim como alguns traços
estruturas na cabeça e sobre possı́veis traços transversais pá lidos, que sã o interpretados
do tronco do animal. Poré m, os espé cimens como estruturas branquiais (Aldridge et al.,
de Granton provê m as evidê ncias mais com‑ 1993).
pletas, a respeito da anatomia dos conodon‑ A maioria dos elementos do apare‑
tes. lho alimentar dos conodontes do Granton
Os conodontes do Granton Shrimp Shrimp Bed é de ozarkodinı́deos. Consistem
Bed, Carbonı́fero da Escó cia, eram animais em 11 elementos ramiformes M e S, forman‑
pequenos, com comprimento entre 21 mm e do uma espé cie de cesta, que tinha a funçã o
55 mm, largura entre 1,2 mm e 1,8 mm, late‑ de capturar a presa. Posterior a estes, exis‑
ralmente comprimidos e dominantemente tem dois pares sucessivos de elementos pec‑
formados por um corpo orgâ nico. Eram se‑ tiniformes P1 e P2, que eram utilizados para
melhantes a enguias e, provavelmente, devi‑ processar o alimento (Jeppsson, 1979;
am ser predadores livre natantes. Briggs et al., 1983; Purnell & von Bitter,
Na regiã o anterior do corpo do ani‑ 1992). O aparelho dos ozarkodinı́deos pode
mal, observa‑se a cabeça, que é pequena e ser preservado em vá rias con iguraçõ es, de‑
que acomoda o aparelho alimentar, seguida pendendo de sua orientaçã o no plano do
Ocorrência de Conodontes ‑ vertebrados primitivos ‑ na Supersequência Gondwana I, ... 227
Contribuições à Geologia do Rio Grande do Sul e de Santa Catarina
má ximo seria de 5 mm. O animal foi compac‑ é proposta em vá rios modelos (Aldridge,
tado dorso‑ventralmente, contrastando com 1987), mas somente dois deles sã o compatı́‑
os espé cimens do Granton Shrimp, que estã o veis com o tamanho do animal (Briggs et al.,
preservados no seu aspecto lateral (Aldridge 1983; Aldridge et al., 1986) e com o arranjo
et al., 1986). dos elementos no aparelho alimentar (Al‑
Traços de segmentaçã o sã o eviden‑ dridge et al., 1987). Um dos modelos estaria
tes no animal de Waukesha. No mı́nimo, sete relacionado à hipó tese de que os conodontes
somitos sã o delimitados e extrapolaçõ es su‑ seriam escavadores macró fagos e que seus
gerem que seriam mais de vinte somitos na elementos seriam estruturas utilizadas para
porçã o preservada. Entretanto, os limites sã o agarrar a presa (Jeppsson, 1979). No outro
retos e quase normais, em relaçã o ao eixo sa‑ modelo, eles seriam micró fagos iltradores e
gital, em contraste com a forma em V desses seus elementos anteriores (elementos rami‑
segmentos nos espé cimens do Granton Sh‑ formes S e M) teriam funcionado como es‑
rimp (Aldridge et al., 1986). truturas ciliadas, que capturavam pequenas
A assembleia de conodontes está po‑ partı́culas de alimento, enquanto os elemen‑
sicionada no inal do traço do corpo do ani‑ tos posteriores (elementos pectiniformes P1
mal e ambos dividem o mesmo eixo de e P2) trituravam essas partı́culas (Nicoll,
simetria. Tanto a assembleia quanto as par‑ 1987). Entretanto, tais hipó teses foram refu‑
tes moles do animal sã o envolvidas por um tadas pelo estudo das taxas de crescimento
halo estreito, de cor cinza pá lido, que con‑ em alguns aparelhos dos ozarkodinı́deos
trasta com a cor avermelhada da rocha (Purnell, 1993, 1994) e pela descoberta de
(Smith et al., 1987). um revestimento, indicativo de desgaste, na
A má preservaçã o das partes moles superfı́cie de alguns elementos (Purnell,
do espé cime de Waukesha contribui muito 1995).
pouco com evidê ncias adicionais na morfolo‑ Assembleias naturais de conodontes
gia do animal. Contudo, as dimensõ es do cor‑ foram encontradas em rochas sedimentares
po do animal sugerem que Panderodus nã o do Carbonı́fero. Tais assembleias foram exa‑
era alongado, como os polygnathaceos de minadas e os especialistas perceberam que
Granton Shrimp, e a simetria preservada da elas possuı́am um padrã o de ocorrê ncia, ou
assembleia de Waukesha indica que o espé ‑ seja, uma organizaçã o de elementos no apa‑
cimen foi achatado no aspecto dorso‑ventral, relho alimentar, a qual foi denominada pa‑
diferindo do aspecto lateral dos espé cimes drã o standard. Este padrã o é produzido,
de Granton. devido ao colapso e ao achatamento da es‑
trutura tridimensional do aparelho, nã o ten‑
4 O APARELHO ALIMENTAR do sofrido modi icaçõ es entre o decaimento
e a fossilizaçã o. Modalidades diferentes des‑
Assim como a a inidade ilogené tica te padrã o podem ocorrer, devido a variaçõ es
dos conodontes, o estudo do seu aparelho no corte da rocha, sendo denominados: pa‑
alimentar tem trazido novas constataçõ es e drã o paralelo, perpendicular e linear (Al‑
tem gerado vá rias discussõ es entre os pale‑ dridge et al., 1987).
ontó logos (Jeppsson, 1979, 1980; Conway‑ Importantes achados de assembleias
Morris, 1980; Bengtson, 1980, 1983; Purnell naturais de aparelhos alimentares foram en‑
& von Bitter, 1992; Purnell, 1993) . contrados no Soom Shale Member, do Ordo‑
A funçã o dos elementos conodontes viciano Superior da Africa do Sul, com
ocorrê ncias de aparelhos gigantes, de 6 mm Orchard & Rieber (1999), reconstruı́am apa‑
a 10 mm, denominados Promissum pulchrum relhos multielementais de gondolelı́deos do
(Aldridge & Theron, 1993), bem como Notio‑ Triá ssico e de neogondolelı́deos do Permia‑
della keblon, com um aparelho composto por no superior e do Triá ssico Mé dio.
17 elementos, con igurando os pares P1, P2, A descriçã o dos elementos conodon‑
P3, M, S1, S2, S3, S4 e um elemento S0, que tes está em um estado de luxo, dado o dese‑
nã o tem par. Esta é a primeira ocorrê ncia jo de descrever biologicamente esses
mundial de um aparelho com essa quantida‑ elementos, no que diz respeito à sua posiçã o
de de elementos, fornecendo, assim, um novo e à sua orientaçã o, durante a vida do animal
modelo, para uso na reconstruçã o de apare‑ conodonte. Esta fase de transiçã o levará al‑
lhos, a partir das coleçõ es de elementos dis‑ gum tempo, tendo em vista que apenas uma
persos, particularmente, para aqueles com pequena porcentagem dos tá xons sã o bem
elementos P1 do tipo icrion e, talvez, para conhecidos, em termos de seus aparelhos, e,
outros balognatı́deos (Aldridge et al., 2013). també m, pelo fato de que os bioestratı́grafos
Tolmacheva & Purnell (2002) e, no costumam considerar apenas o elemento P1,
Canadá , McCracken et al. (1980), Barrick et isoladamente. Os termos utilizados na des‑
al. (1976) e Cooper (1974), reconstruı́ram o criçã o dos elementos conodontes foram re‑
aparelho multielemental de conodontes do sumidos por Sweet (1988) e,
Siluriano de Oklahoma e de Ohio, da Amé rica posteriormente, discutido por Purnell & Do‑
do Norte. noghue (1997).
Para o Devoniano, destacam‑se os Assembleias naturais de prioniodi‑
trabalhos de reconstruçã o de aparelhos ali‑ nı́deos sã o mal conhecidas ou sequer sã o co‑
mentares e de clusters feitos por Klapper & nhecidas, dependendo do tá xon (Purnell &
Philip (1972), por Nicoll (1982, 1984), por Donoghue, 1997; Henderson, 2018). Assim, a
Chauffe & Nichols (1995), por Suttner ocorrê ncia dos prioniodinı́deos do gê nero
(2009a, 2009b) e por Suttner et al. (2017). Mesogondolella spp. no Folhelho Lontras é
Estudando assembleias naturais de um achado extremamente importante e traz
Idiognathodus do Pensilvaniano, Purnell & inovaçõ es, tanto para o conhecimento dos
Donoghue (1997) produziram um modelo aparelhos alimentares da Ordem Prioniodi‑
preciso do aparelho dos ozarkodinı́deos, nida quanto para o Permiano inferior, no
considerado, por eles, um dos mais bem‑su‑ mundo, na Amé rica Latina e no Brasil.
cedidos grupos destes vertebrados. Neste
modelo, é proposto que os elementos anteri‑ 5 A BACIA DO PARANÁ
ores S e M, dos ozarkodinı́deos, seriam ixa‑
dos a uma placa cartilaginosa. Esses 5. 1 Contexto estratigrá ico
elementos fariam um movimento, no sentido
A Bacia Sedimentar do Paraná
de capturar a presa, e os elementos posterio‑
abrange, geogra icamente, a quase totalida‑
res seriam responsá veis por rasgar e por tri‑
de do centro‑sul do Brasil e, també m, regiõ es
turar o alimento (Purnell & Donoghue,
do norte do Uruguai, do nordeste da Argen‑
1997).
tina e do leste paraguaio. Trata‑se de uma
Agematsu et al. (2008, 2017) recons‑ bacia do tipo lexural intracrâ tonica, de na‑
truı́ram uma associaçã o natural de conodon‑ tureza policı́clica, que constitui uma imensa
tes do Triá ssico Inferior do Japã o. Outros sucessã o sedimentar‑magmá tica, com ida‑
trabalhos, como os de Orchard (2005) e de des entre o Ordoviciano Final (488 Ma) e o
Cretá ceo Final (145 Ma) (Milani et al., 2007). quarto ciclo corresponderia à Fm. Taciba.
Diversos ciclos transgressivos/re‑ No a loramento denominado, infor‑
gressivos de um mar, que circundava o super‑ malmente, Campo do Centro Paleontoló gico
continente Gondwana, marcam o registro da Universidade do Contestado (Campaleo)
estratigrá ico da Bacia do Paraná , que, segun‑ (Figs. 3‑4), ocorre a exposiçã o do Folhelho
do Milani et al. (1997), consiste de seis uni‑ Lontras, unidade que corresponde ao topo
dades de segunda ordem, denominadas da Fm. Campo Mourã o e que marca o inal
Supersequê ncias: Rio Ivaı́ (Ordoviciano‑Silu‑ do terceiro ciclo/sequê ncia, de Weinschü tz
riano), Paraná (Devoniano), Gondwana I & Castro (2005). Este folhelho marca a fase
(Carbonı́fero‑Cretá ceo Inicial), Gondwana II inal de um evento de deglaciaçã o, que inicia
(Triá ssico Mé dio a Final), Gondwana III (Ju‑ com uma camada de, aproximadamente, 7 m
rá ssico Final‑Cretá ceo Inicial) e Bauru (Cre‑ de folhelho micrová rvico, rico em clastos
tá ceo Final). caı́dos na base e que diminuem para o topo,
A Supersequê ncia Gondwana I apre‑ sucedido por uma camada de siltito rica‑
senta espessura total má xima da ordem de mente bioturbado, com 1 m de espessura,
2.500 m e engloba o maior volume sedimen‑ sotaposto a 1,1 m de folhelho macrofossilı́fe‑
tar da Bacia do Paraná , que re lete uma gran‑ ro (fossil largersttaten do Lontras/Campa‑
de variedade de condiçõ es deposicionais. A leo), cuja biota é composta por peixes
base dessa supersequê ncia registra um even‑ ó sseos e cartilaginosos, escolecodontes,
to glacial do Permocarbonı́fero, que compre‑ crustá ceos, ostracodes, insetos, braquió po‑
ende ambientes terrestre a marinhos, des, porı́feros, amonites e fragmentos vege‑
representados pelo Grupo Itararé (Milani et tais, alé m dos conodontes, que caracterizam
al., 2007), e que atinge uma espessura supe‑ um ambiente marinho, restrito e relativa‑
rior a 1000 metros na porçã o central da ba‑ mente pró ximo à linha de costa. Este hori‑
cia, adelgaçando‑se, em direçã o à s bordas zonte fossilı́fero, em um trabalho de
norte e sul (França & Potter, 1988), sendo, re inamento estratigrá ico, foi dividido em
neste grupo, que ocorre a unidade portadora quatro nı́veis, denominados, da base para o
de conodontes. topo, 1, 2, 3 e 4, que sã o limitados por nı́veis
Holz et al. (2010) dividem a Super‑ de piritizaçã o e que estã o subdivididos em
sequê ncia Gondwana I em sete sequê ncias de intervalos, caracterizados por diferenças su‑
3ª ordem, denominadas LPTS (Late Paleozoic tis no acamamento, na granulometria e nas
Third‑Order Sequences), em que o Grupo Ita‑ feiçõ es diagené ticas (Fig. 5).
raré corresponderia à s sequê ncias LPTS 1
5. 2 Mesogondolella spp. no Folhelho
(Formaçã o Lagoa Azul) e LPTS 2 (Formaçã o
Lontras
Campo Mourã o e Formaçã o Taciba).
Na regiã o de Mafra (SC), Weinschü tz Na Amé rica Latina, ainda nã o foram
& Castro (2004) reconhecem quatro ciclos de encontrados restos ou vestı́gios do animal
granodecrescê ncia ascendente, culminando conodonte. Desde as primeiras pesquisas,
com um má ximo de inundaçã o da bacia, para quando conodontes foram descobertos, no
o Grupo Itararé , em que, comparando com as sé culo XIX, por Pander, até o inı́cio do Sé culo
unidades propostas por França & Potter XXI, nã o havia registros de aparelhos ali‑
(1988), o primeiro ciclo corresponderia à mentares conodontes na Amé rica Latina.
Fm. Lagoa Azul, o segundo e terceiro ciclos
Aparelhos alimentares e elementos
corresponderiam à Fm. Campo Mourã o e o
conodontes prioniodinı́deos do gê nero Me‑
Figura 3 ‒ Localizaçã o da ú nica ocorrê ncia de aparelhos alimentares de conodontes na Amé rica do Sul. A
esquerda, Bacia do Paraná , em azul, e o municı́pio de Mafra (SC), marcado pela estrela, em preto. A direita,
imagem de saté lite extraı́da do Google Earth, mostrando a á rea do A loramento Campaleo, com a estrela, em
amarelo, no municı́pio de Mafra (composiçã o da igura de Luiz Carlos Weischü tz).
Figura 4 ‒ Fotogra ia do a loramento Campaleo, no municı́pio de Mafra (SC), com detalhe do local de
escavaçã o do Folhelho Lontras (acervo de imagens de Everton Wilner).
sogondolella spp. (Kozur, 1988) foram en‑ (Fig. 5), predominantemente, como assem‑
contrados, pela primeira vez, na Amé rica La‑ bleias naturais (aproximadamente, 150
tina, no Brasil, em Mafra, Santa Catarina, em achados) e como possı́veis clusters (em tor‑
2008 (Wilner & Weinschutz, 2008), e se no de 200 exemplares), de cores â mbar,
mantê m como o ú nico registro fossilı́fero, branco e hialino (Fig. 6), constituindo as
até hoje. Seguem sendo coletados e estuda‑ primeiras ocorrê ncias de aparelhos alimen‑
dos, atualmente, em depó sitos do Grupo Ita‑ tares em bacias sedimentares da Amé rica
raré , Folhelho Lontras, no A loramento Latina (Wilner et al., 2016).
Campaleo, no municı́pio de Mafra (SC). Os aparelhos alimentares possuem,
Este importante achado está preser‑ aproximadamente, 5 mm de tamanho e
vado em alguns nı́veis do folhelho fossilı́fero ocorrem no plano do acamadamento do fo‑
Figura 5 ‒ Per il estratigrá ico do A loramento Campaleo, com detalhe do Folhelho Lontras, evidenciando os
nı́veis de pirita e a ocorrê ncia dos conodontes nos nı́veis 2B, 3B, 3C e 3D (composiçã o da igura por Luiz Carlos
Weischü tz).
Figura 6 ‒ Detalhe do aparelho alimentar de Mesogondolella spp.: A) Microscopia Eletrô nica de Varredura do
elemento P, com aumento de 130X (imagem obtida por Mark Purnell); e B) Estereomicroscopia dos elementos
ramiformes, com aumento de 80X (imagem obtida por Everton Wilner).
No Brasil, sã o encontrados, como Aldridge, R. J. & Purnell, M. A. 1996. The co‑
elementos conodontes, nas bacias do norte, nodont controversies. Tree ‑ Elsevier trends
e, como aparelhos alimentares, excepcional‑ Journals, 11(11): 463‑468.
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Aldridge, R. J., Smith, M. P., Norby, R. D. &
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2020.
1 INTRODUÇÃO
Na Europa e na Amé rica do Norte, as plantas fó sseis tê m sido tradicionalmente utiliza‑
das na bioestratigra ia, especialmente, aquelas associadas aos depó sitos de carvã o do Carbonı́fe‑
ro Superior. Tanto que elas auxiliaram no estabelecimento de está gios cronoestratigrá icos, tais
como o Vestfaliano e o Estefaniano, que, durante muito tempo, foram consideradas padrõ es para
a “Escala de Tempo Geoló gico Internacional” (Wagner, 1984). No Rio Grande do Sul (RS) e em
Santa Catarina (SC), apesar de conhecidas, desde meados do sé culo XIX, em seçõ es, que conti‑
nham camadas de carvã o (Carruthers, 1869; White, 1988), as plantas fó sseis tê m sido muito
pouco utilizadas na bioestratigra ia desses estados, bem como na Bacia do Paraná , como um to‑
do (Holz et al., 2010). De fato, a ausê ncia de correlaçõ es mais precisas entre as seçõ es a lorantes
e as de subsuperfı́cie para a Bacia do Paraná tem prevenido o estabelecimento de um arcabouço
bioestratigrá ico, com base nas associaçõ es de plantas fó sseis, principalmente, para o Permiano
Inferior, intervalo que concentra os depó sitos carvonı́feros da bacia. Essa imprecisã o decorre da
imensa extensã o da bacia (de mais de um milhã o de quilô metros quadrados) e da descontinui‑
dade lateral dos depó sitos sedimentares, ao longo da margem leste da bacia, em que a loram as
camadas itofossilı́feras. Por isso, ao se tentar estabelecer correlaçõ es fundamentadas na bioes‑
tratigra ia para a bacia, optou‑se, desde o inı́cio, pelo uso dos microfó sseis, mais especi icamen‑
te, dos palinomorfos, a partir do uso de amostras fé rteis, obtidas em testemunhos de sondagem
(ver palinozoneamentos em Daemon & Quadros, 1970, e em Souza, 2006).
Contribuições à Geologia do Rio Grande do Sul e de Santa Catarina
do chegar, talvez, ao inı́cio do Triá ssico (Fig. ores levaram a considerar que há , també m a
1). Lycopodiopis derbyi e Krauselcladus sã o os ocorrê ncia de elementos da “Tafo lora E” no
elementos mais comuns da “Tafo lora D”, jun‑ RS (Guerra‑Sommer & Cazzulo‑Klepzig,
to com folhas de Ginkgophyta e com restos 2000).
de algas caró itas, e Rö sler (1978) salienta Mais recentemente, Iannuzzi & Souza
que muitos tá xons das tafo loras anteriores (2005) sugeriram a ocorrê ncia de quatro es‑
(A, B, C) estã o ausentes nesta tafo lora. Alé m tá gios lorı́sticos informais para o intervalo
disso, o autor propõ e a ocorrê ncia de uma Carbonı́fero Superior‑Permiano Inferior da
zona informal de Polysolenoxylon na Forma‑ bacia, denominados “ loras ou está gios lorı́s‑
çã o Irati, aparentemente, para incluir o regis‑ ticos”, a saber: Pré ‑Glossopteris, Phyllotheca‑
tro das madeiras silici icadas, comumente Gangamopteris, Glossopteris‑Brasilodendron e
encontradas nesta unidade. Já a “Tafo lora E” Polysolenoxylon‑Glossopteris. A Flora Pré ‑
registra as ú ltimas ocorrê ncias de glossopte‑ Glossopteris consiste das associaçõ es distri‑
rı́deas na bacia e tem, como elementos co‑ buı́das ao longo da porçã o mé dia do Subgru‑
muns, folhas de Glossopteris pequenas e po Itararé , de idade pennsilvaniana. A Flora
estreitas e de Sphenophyllum, alé m de raras Phyllotheca‑Gangamopteris corresponde à s
frondes de ?Dizeugotheca sp. (=Asterotheca). associaçõ es que se distribuem, desde o topo
Por im, tem‑se a “Tafo lora F”, que do Subgrupo Itararé , até as porçõ es mais ba‑
representa o registro da Flora Dicroidium na sais da Formaçã o Rio Bonito, consideradas
Formaçã o Rosá rio do Sul (=Formaçã o Santa do Cisuraliano precoce (Sakmariano tardio).
Maria), de idade triá ssica mé dia. Esta se ca‑ A partir do inal do terço basal (Membro Pa‑
racteriza pela presença de vá rias espé cies de raguaçu), até o topo da Formaçã o Rio Bonito
Dicroidium e pela ausê ncia dos elementos ca‑ (Membro Sideró polis), estendem‑se os regis‑
racterı́sticos das tafo loras anteriores (Rö sler, tros da Flora Glossopteris‑Brasilodendron, de
1978). prová vel idade artinskiana. Apó s um curto in‑
Apesar do esquema de Rö sler (1978) tervalo esté ril do ponto de vista de mega lo‑
se basear em uma considerá vel amostragem ras, correspondente aos depó sitos marinhos
de plantas fó sseis, tanto em termos estrati‑ da Formaçã o Palermo, ocorre a Flora Polyso‑
grá icos quanto geográ icos, este representa‑ lenoxylon‑Glossopteris, que equivale aos re‑
va um arcabouço totalmente informal, em gistros encontrados na Formaçã o Irati, com
que, ao invé s das amplitudes estratigrá icas idade estimada entre o Artinskiano tardio e o
dos tá xons, foram apresentadas, apenas, as Kunguriano.
prová veis extensõ es cronoestratigrá icas das A Flora Pré ‑Glossopteris é caracteri‑
tafo loras por ele de inidas (Fig. 1). Mesmo zada pela ausê ncia de elementos glossopterı́‑
assim, este esquema pioneiro teve importâ n‑ deos, e pela presença de tá xons tı́picos das
cia signi icativa, pois ordenou, pela primeira Floras de “Notorhacopteris” e “Transicional”,
vez, a sucessã o paleo lorı́stica da bacia, como do Pennsilvaniano da Argentina (Iannuzzi &
um todo, o que norteou todos os trabalhos i‑ Souza, 2005). Entre estes, destaca‑se a ocor‑
toestratigrá icos posteriores. Em relaçã o ao rê ncia dos gê neros Dwykea, Bumbudendron,
RS, apenas as tafo loras “Transicional”, “B” e Nothorhacopteris, Botrychiopsis, Eusphenop‑
“D”, permianas, e a “F”, triá ssica, estã o repre‑ teris, Buriadia e Eucerospermum. Já a Flora
sentadas em localidades itofossilı́feras, en‑ Phyllotheca‑Gangamopteris se distingue pelo
quanto, para o SC, há o registro de sı́tios, primeiro aparecimento das glossopterı́deas e
contendo elementos tı́picos das tafo loras pela abundâ ncia de folhas gangamopteró ides
permianas “C” e “E”. Poré m, achados posteri‑ e esfenó itas do tipo Phyllotheca. Entre os tá ‑
Fitoestratigra ia dos estados do Rio Grande do Sul e de Santa Catarina 243
Contribuições à Geologia do Rio Grande do Sul e de Santa Catarina
Figura 1 ‒ Esquema itoestratigrá ico informal de Rö sler (1978). Note‑se que apenas as amplitudes
estratigrá icas das tafo loras sã o apresentadas (em vermelho), mas, nã o, as dos tá xons. As tafo loras B e C, do
Permiano precoce (Cisuraliano), D e E, do Permiano tardio (Guadalupiano e Lopingiano), e F, do Triá ssico
Mé dio, sã o registradas nos estados do Rio Grande do Sul e de Santa Catarina (ver texto).
xons tı́picos, Iannuzzi & Souza (2005) citam (2005) citam Protopodorcapitys, Myelontor‑
Phyllotheca australis (=P. indica), Stepha‑ doxylon, Tordoxylon, Kraeuselpitys, Parataxo‑
nophyllites sanpaulensis, Botrychiopsis planti‑ pitys, Trigonomyelon, Kaokoxylon,
ana, Rubidgea lanceolata, R. obovata, Brasilestiloxylon, Antarticoxylon, Taxopitys,
Gangamopteris angustifolia, G. obovata, G. bu‑ Austroscleromedulloxylon, Piracicaboxylon,
riadica, Glossopteris communis, G. indica, Chi‑ Paranasseptoxylon, Atlanticoxylon, Baraka‑
ropteris reniformis, Cheirophyllum speculare, roxylon, Polysolenoxylon, Solenobrasilioxylon e
Kawizophyllum sp., Buriadia isophylla, Cornu‑ Solenopitys. A Flora Glossopteris‑Brasiloden‑
carpus patagonicus e Arberia minasica. A so‑ dron estaria presente nos depó sitos do RS e
brejacente Flora Glossopteris‑Brasilodendron de SC, enquanto as loras Phyllotheca‑Ganga‑
se caracteriza pela dominâ ncia das folhas do mopteris e Polysolenoxylon‑Glossopteris teri‑
tipo Glossopteris, entre os elementos glos‑ am sido registradas apenas no RS, até agora.
sopterı́deos, e pela abundâ ncia dos gê neros Nã o há registro da Flora Pré ‑Glossopteris em
Glossopteris, Brasilodendron e Cordaites nas qualquer desses dois estados.
associaçõ es itofossilı́feras, especialmente, Em relaçã o ao registro paleobotâ nico
daquelas, encontradas junto aos principais triá ssico, o qual se encontra restrito à Forma‑
depó sitos de carvã o da bacia. Há um aumen‑ çã o Santa Maria e ao sotoposto “Arenito Ma‑
to signi icativo de diversidade, com o surgi‑ ta”, no RS, nunca houve a proposiçã o de
mento de novos elementos, tais como os quaisquer itozonas formais. Um dos motivos
fetos pecopterı́deos e as esfenó itas esfeno i‑ parece ser a raridade de a loramentos ito‑
laleanas. Estas representam a tı́pica “Flora fossilı́feros, no caso da chamada “Flora Di‑
Glossopteris”, associada aos depó sitos do croidium”, e a falta de achados de caules in
Gondwana. Alguns tá xons de importâ ncia bi‑ situ (inseridos na matriz rochosa) e de deter‑
oestratigrá ica sã o listados por Iannuzzi & minaçõ es taxonô micas mais precisas, com
Souza (2005) para esta lora, a saber: Brasi‑ respeito ao registro das “ lorestas petri ica‑
lodendron pedroanum, Phyllotheca griesbachi, das”, denominadas “Flora de Araucarioxy‑
Pecopteris pedrasica, Asterotheca spp., Sphe‑ lon” (Guerra‑Sommer et al., 2002). Poré m,
nopteris lobifolia, S. ischavonensis, Neomari‑ alguns dos tá xons determinados para estas
opteris sp., Botrychiopsis valida, Glossopteris loras foram utilizados, para estabelecer cor‑
occidentalis, G. taenioides, G. browniana, G. relaçõ es bioestratigrá icas com outros depó ‑
angustifolia, G. ampla, Gangamopteris inter‑ sitos gondvâ nicos mais bem posicionados,
media, G. mosesii, Paranocladus dusenii, Arbe‑ cronoestratigra icamente. Com base na dis‑
ria spp., Ottokaria spp., Plumsteadia sennes, tribuiçã o gondvâ nica (i.e. Argentina e Austrá ‑
Cordaicarpus zeillerii e Cornucarpus furcata, lia) das espé cies de Dicroidium encontradas
entre as compressõ es‑impressõ es, e Catari‑ na Formaçã o Santa Maria, com especial ê nfa‑
napitys, Paulistoxylon, Solidoxylon, Protophyl‑ se para D. odontopteroides var. remotum, foi
locladoxylon, Torosoxylon, Myelontordoxylon, possı́vel indicar uma correspondê ncia da
Schop iicaulia, Taeniopitys e Abietopitys, en‑ “Flora Dicroidium” do RS com a “Zona Oppel
tre os caules silici icados. Dicroidium odontopteroides”, da Austrá lia,
Por ú ltimo, tem‑se a Flora Polysole‑ considerada de idade triá ssica mé dia (Anisia‑
noxylon‑Glossopteris, que se distingue por ser no tardio‑Ladiniano) (Guerra‑Sommer et al.,
essencialmente composta de lenhos fó sseis, 2002). Em relaçã o à “Flora de Araucarioxy‑
com especial ê nfase aos do tipo solenoide, lon”, associada ao “Arenito Mata”, apenas a
caracterı́sticos do Gondwana. Entre os tá ‑ presença do gê nero Rhexoxylon entre as ma‑
xons mais importantes, Iannuzzi & Souza deiras petri icadas poderia sugerir uma cor‑
relaçã o com a Formaçã o Ischigualasto, mais aos depó sitos de carvã o do RS.
especi icamente, com a “Idade Ré ptil Ischi‑ Originalmente, a Zona Botrychiopsis
gualastiana”, do Triá ssico Mé dio (Guerra‑ plantiana se estenderia da porçã o superior
Sommer et al., 2002). do Grupo Itararé , representada pela Subzo‑
na Gangamopteris obovata, de idade sakma‑
2. 2 Fitozoneamentos formais riana, até a parte basal da Formaçã o Rio
Bonito, em que corresponderia ao registro
No Rio Grande do Sul, Guerra‑Som‑ da Subzona Phyllotheca indica, considerada
mer & Cazzulo‑Klepzig (1993) propuseram o do Artinskiano (Fig. 2). Já a Zona Glossopte‑
primeiro itozoneamento formal para os de‑ ris/Rhodeopteridium ocorreria na porçã o
pó sitos do Permiano Inferior, a partir dos da‑ mé dio‑superior da Formaçã o Rio Bonito,
dos de todos os a loramentos itofossilı́feros para a qual foi atribuı́da uma idade kunguri‑
descritos à é poca, o qual era composto de ana, naquele momento (Guerra‑Sommer &
duas “Zonas de Associaçã o”: uma inferior, de‑ Cazzulo‑Klepzig, 1993 – ver item seguinte).
nominada Zona Botrychiopsis plantiana, e Poré m, baseados no estudo da seçã o do
uma superior, chamada Zona Glossopteris/ Morro do Papalé o, em Mariana Pimentel,
Rhodeopteridium. A Zona Botrychiopsis plan‑ Iannuzzi et al. (2007) incluı́ram a Subzona P.
tiana estava dividida em duas subzonas: Gan‑ indica no topo do Grupo Itararé . Alé m disso,
gamopteris obovata e Phyllotheca indica (Fig. estudos subsequentes (i) acrescentaram no‑
2). vos tá xons, (ii) modi icaram as denomina‑
Segundo Guerra‑Sommer & Cazzulo‑ çõ es taxonô micas de alguns outros
Klepzig (1993), a Zona Botrychiopsis plantia‑ (especialmente, excluı́ram a ocorrê ncia do
na é caracterizada pelo primeiro apareci‑ gê nero Rubidgea) e (iii) alteraram as ampli‑
mento das glossopterı́deas, principalmente, tudes estratigrá icas de vá rios tá xons (base‑
de folhas dos tipos Gangamopteris e Rubid‑ ando‑se em novas correlaçõ es estratigrá ‑
gea, e pela abundâ ncia local da pteridó ila icas, estabelecidas entre as localidades ito‑
Botrychiopsis plantiana (Fig. 2). A Subzona fossilı́feras), fazendo com que a quantidade
Gangamopteris obovata é de inida pela am‑ de tá xons e suas amplitudes, no itozonea‑
plitude estratigrá ica (biocron) de Ganga‑ mento, se modi icassem signi icativamente,
mopteris buriadica, de G. angustifolia, de em relaçã o à proposta original de Guerra‑
Rubidgea lanceolata, de Glossopteris indica, Sommer & Cazzulo‑Klepzig (ver Iannuzzi et
de Chiropteris reniformis e de Cornucarpus al., 2007). Deste modo, uma atualizaçã o do
patagonius. A sobrejacente Subzona Phyl‑ esquema de Guerra‑Sommer & Cazzulo‑
lotheca indica é caracterizada pelo primeiro Klepzig (1993), contendo a distribuiçã o cro‑
aparecimento da espé cie, que denomina a nolitoestratigrá ica das itozonas e as ampli‑
subzona, bem como de Scutum sp. e de Buri‑ tudes estratigrá icas dos tá xons, feita com
adia isophylla. Por im, a Zona Glossopteris/ base nas correlaçõ es estratigrá icas propos‑
Rhodeopteridium se distingue pela abundâ n‑ tas por Iannuzzi et al. (2010) para os princi‑
cia de folhas do gê nero Glossopteris e de cau‑ pais a loramentos itofossilı́feros do RS, é
les de licó itas do tipo Brasilodendron, alé m apresentada na Figura 3.
do aparecimento de fetos verdadeiros (e.g. Ainda para o Permiano Inferior, Jas‑
Eupecopteris sp., Rhodeopteridium sp. e Sphe‑ per et al. (2003) propuseram um itozoena‑
nopteris ischavonensis) (Fig. 2). Associaçõ es mento alternativo para o RS, composto de
desta zona correspondem à tı́pica “Flora uma ú nica itozona, a Zona Botrychiopsis,
Glossopteris”, tradicionalmente relacionada subdividida em duas subzonas, a saber:
246 Edição da Sociedade Brasileira de Geologia – Núcleo RS/SC
Iannuzzi
Subzona Botrychiopsis plantiana e Subzona tanto, Jasper et al. (2003) nã o apresentaram
Botrychiopsis valida. De acordo com os dados formalmente e/ou apropriadamente (i) os
disponibilizados por aqueles autores, a Sub‑ tá xons‑diagnó stico acessó rios, (ii) os estra‑
zona Botrychiopsis plantiana seria equivalen‑ tró tipos, (iii) as seçõ es de referê ncia e/ou
te à Zona Botrychiopsis plantiana, de (iv) as amplitudes estratigrá icas dos tá xons
Guerra‑Sommer & Cazzulo‑Klepzig (1993), usados e, por isso, sua proposta de itozonea‑
enquanto a Subzona Botrychiopsis valida mento foi considerada invá lida por Iannuzzi
destes mesmos autores corresponderia à Zo‑ et al. (2007, 2010), pois nã o estaria em con‑
na Glossopteris/Rhodeopteridium, de Guerra‑ formidade, nã o, só , com as recomendaçõ es
Sommer & Cazzulo‑Klepzig (1993). No en‑ da ICS‑IUGS, mas, també m, com os princı́pios
Figura 2 ‒ Esquema itoestratigrá ico formal, proposto, originalmente, por Guerra‑Sommer & Cazzulo‑Klepzig
(1993) para a sucessã o lorı́stica paleozoica do Rio Grande do Sul. Note a distribuiçã o dos tá xons, que possuem
algum valor biostratigrá ico, cuja amplitude estratigrá ica se encontra destacada em vermelho (modi icado de
Guerra‑Sommer & Cazzulo‑Klepzig, 1993).
Figura 3 ‒ Atualizaçã o do esquema itoestratigrá ico formal de Guerra‑Sommer & Cazzulo‑Klepzig (1993),
proposta por Iannuzzi et al. (2007, 2010). Note‑se a distribuiçã o dos tá xons, que possuem algum valor
biostratratigrá ico, cuja amplitude estratigrá ica se encontra destacada em vermelho. Salienta‑se, em relaçã o à
proposta original de Guerra‑Sommer & Cazzulo‑Klepzig (1993): (i) o aumento no nú mero de tá xons
determinados; (ii) mudanças nas amplitudes estratigrá icas de vá rios tá xons; (iii) mudança no
posicionamento da Subzona P. indica (Phyllotheca indica) para o topo do Subgrupo Itararé ; e (iv) reduçã o
acentuada dos tá xons, que caracterizam a Subzona G. obovata (Gangamopteris obovata) (modi icado de
Iannuzzi et al., 2010).
eram feitas, a partir de mé todos estratigrá i‑ que ocorrem na Formaçã o Rio Bonito, no RS
cos clá ssicos (Rohn & Rö sler, 2000; Tybusch e em SC. Portanto, a partir das recentes ida‑
et al., 2016) ou se utilizando dos princı́pios des radiomé tricas, obtidas por aqueles auto‑
da estratigra ia de sequê ncias (Iannuzzi et res, por meio do mé todo de aná lise de alta
al., 2010). Portanto, nã o havia outras ferra‑ resoluçã o CA‑TIMS (idades 2o6Pb/238U, obti‑
mentas, que permitissem con irmar as ida‑ das de cristais ú nicos de zircã o), houve um
des atribuı́das aos palinomorfos ou o signi icativo rearranjo no posicionamento
posicionamento estratigrá ico, relativo aos cronoestratigrá ico de alguns dos mais im‑
a loramentos itossilı́feros, uns em relaçã o portantes horizontes itofossilı́feros da mar‑
aos outros, ou, mesmo, dos itofó sseis, den‑ gem leste da bacia no RS (Grif is et al., 2018,
tro de sua pró pria unidade litoestratigrá ica 2019) e em SC (Grif is et al., 2019). Seçõ es
de ocorrê ncia. a lorantes da regiã o do municı́pio de Candio‑
A partir do inı́cio deste sé culo, os es‑ ta (RS), que oscilavam, em idade, entre o As‑
tudos geocronoló gicos passaram a ser apli‑ seliano, passando pelo Artinskiano e, até
cados na dataçã o de camadas geradas por mesmo, pelo Wordiano (conforme a Carta
cinzas vulcâ nicas, em sua grande maioria, Cronoestratigrá ica Internacional atualizada,
representando tonsteins, que foram encon‑ de Cohen et al., 2013), foram de inidas como
tradas, especialmente em boa quantidade, sendo de idade asseliana, a partir das trê s
nos depó sitos da Formaçã o Rio Bonito, mas idades congruentes, obtidas por Grif is et al.
que també m foram assinaladas no topo do (2018), por meio do mé todo CA‑TIMS de
Grupo Itararé e nas formaçõ es Irati, Rio do aná lise (i.e. 298,23 ±0,31 Ma, 297,58 +0,68/‑
Rasto e, recentemente, Santa Maria (Grif is 1,4 Ma e 297,77 +0,35/‑0,59 Ma). A seçã o da
et al., 2019; Rocha‑Campos et al., 2019; Mina do Faxinal, em Arroio dos Ratos (RS),
Schultz et al., 2020). Essas camadas de ro‑ considerada, anteriormente, de idade sak‑
chas vulcanosedimentares tê m sido detecta‑ mariana tardia, foi reavaliada como um pou‑
das, principalmente, no RS (Grif is et al., co mais jovem e reposicionada, por Grif is et
2018, 2019), mas, també m, em SC (Grif is et al. (2018), no Artinskiano mé dio (285,42
al., 2019), no Paraná e em Sã o Paulo (Rocha‑ +1,2/‑2,1 Ma). Por im, o A loramento Quité ‑
Campos et al., 2019; Jurigan et al., 2019) e, ria, situado no municı́pio de Encruzilhada do
até mesmo, no Uruguai (Rocha‑Campos et Sul (RS), que, antes, era posicionado no topo
al., 2019). Poré m, apesar de representarem, da Formaçã o Rio Bonito, por meio de corre‑
inicialmente, um avanço, as primeiras data‑ laçõ es estratigrá icas e de dataçã o relativa,
çõ es radiomé tricas obtidas usaram diferen‑ baseada no conteú do palinoló gico encontra‑
tes mé todos geocronoló gicos em diferentes do, foi considerado um dos pacotes mais an‑
laborató rios no Brasil e no exterior, gerando tigos da unidade, equivalente, em idade, à s
idades, por vezes, con litantes entre si para seçõ es de Candiota, mais ao sul do estado,
uma mesma camada. A soluçã o para esse sendo reposicionado no Asseliano, por Grif‑
problema repousaria na obtençã o de novas is et al. (2018), com idade calculada em
dataçõ es radiomé tricas para as camadas já 296,97 +0,45/‑0,72 Ma. Há outras seçõ es,
datadas, utilizando‑se, para isso, um mé todo que també m foram datadas por Grif is et al.
geocronoló gico ú nico e o mais preciso possı́‑ (2019), como a da Mina do Recreio (290,36
vel, a partir de aná lises feitas em um mesmo +0,4/‑0,32 Ma), em Butiá (RS), mas que, ape‑
laborató rio. Foi exatamente o que Grif is e sar de nã o conterem itofó sseis, sã o impor‑
colaboradores (2018, 2019) izeram, em re‑ tantes, para o posicionamento de outras
laçã o à s camadas já datadas, anteriormente, seçõ es itofossilı́feras, como a do Morro do
posicionamento cronoestratigrá ico das uni‑ tratigrá icas. Felizmente, surgiram, recente‑
dades itoestratigrá icas contidas nestas uni‑ mente, as primeiras dataçõ es radiomé tricas,
dades. De acordo com os autores, a feitas a partir de zircõ es detrı́ticos, encon‑
Formaçã o Teresina seria do Wordiano, mes‑ trados em sedimentos de trê s distintos nı́‑
ma idade que, por conseguinte, pode ser veis estratigrá icos (dois, na Formaçã o Santa
atribuı́da à “Tafo lora D”, de Rö sler (1978), e Maria e um, na Caturrita), que permitiram o
à Zona Lycopodiopsis derbyi, de Rohn & Rö s‑ estabelecimento de idades mı́nimas para as
ler (2000). Já a Formaçã o Rio do Rasto tem biozonas de vertebrados (Schultz et al.,
seu terço basal, equivalente ao Membro Ser‑ 2020). Como base nas idades radiomé tricas,
rinha, com idade proposta para o Capitania‑ obtidas das rochas, e nas atribuı́das à s bio‑
no. Essa idade pode ser assumida para a zonas de vertebrados, é possı́vel indicar um
base da “Tafo lora E”, de Rö sler (1978), que intervalo de tempo entre o Ladiniano tardio
equivale à Zona Sphenophyllum paranaense, e Carniano precoce para o registro da “Flora
de Rohn & Rö sler (2000). Já a porçã o mé dio‑ Dicroidium” no RS, já que ela estaria ocor‑
superior da formaçã o, correspondente ao rendo no nı́vel do pacote Santa Maria II
Membro Morro Pelado, teve seu inı́cio de de‑ (Schultz et al., 2020). Este intervalo está em
posiçã o, proposto por Rocha‑Campos et al. concordâ ncia com a idade assumida nas cor‑
(2019), para a idade subsequente, o Wuchia‑ relaçõ es bioestratigrá icas feitas, previa‑
pingiano, mas o tempo do seu té rmino per‑ mente, com base nas espé cies registradas de
manece em aberto, sendo maté ria de debate. Dicroidium (ver Guerra‑Sommer et al.,
Rocha‑Campos et al. (2019) admitiram que a 2000). Já para a “Flora de Araucarioxylon”,
unidade poderia, mesmo, estender‑se ao li‑ cuja ocorrê ncia estaria restrita ao “Arenito
mite do Permiano‑Triá ssico (251,902 ±0,024 Mata”, as novas idades sugerem que as ma‑
Ma, segundo Cohen et al., 2013, atualizado). deiras petri icadas de Mata e de Sã o Pedro
Deste modo, poder‑se‑ia assumir, de forma do Sul foram depositadas durante a ú ltima
geral, uma idade lopingiana para o Membro idade do Triá ssico, ou seja, no Ré tico
Morro Pelado, assim como para a porçã o mé ‑ (Schultz et al., 2020). Essa idade nã o coadu‑
dio‑superior da “Tafo lora E”, de Rö sler na com o proposto, previamente, com base
(1978), e sua equivalente, a Zona de Schizo‑ nas plantas fó sseis, por causa da presença
neura gondwanensis, de Rohn & Rö sler de Rhexoxylon, um tá xon associado à s plan‑
(2000). tas do tipo Dicroidium (Guerra‑Sommer et
Nas ú ltimas dé cadas, a estratigra ia e al., 2000).
a paleontologia dos depó sitos triá ssicos do A Figura 4 apresenta uma sı́ntese do
RS avançou sobremaneira, de modo que a posicionamento cronoestratigrá ico das uni‑
Formaçã o Santa Maria foi dividida em trê s dades itofossilı́feras formais e informais pa‑
pacotes sedimentares, i.e. Santa Maria I, II e ra a Bacia do Paraná (já discutida neste
III (Zerfass et al., 2003), e a relaçã o e o posi‑ texto), em relaçã o aos registros paleozoicos
cionamento cronoestratigrá ico das demais encontrados no RS e em SC.
unidades, i.e. formaçõ es Sanga do Cabral e
Caturrita, e o “Arenito Mata”, icaram mais 4 CONSIDERAÇÕES FINAIS
bem compreendidas. Poré m, as “idades‑ré p‑
Aparentemente, as mudanças signi‑
til”, sugeridas pelas biozonas de vertebrados,
icativas no posicionamento cronoestrati‑
careciam de quaisquer outras ferramentas
grá ico das seçõ es e dos horizontes
que pudessem con irmar as idades relativas,
itofossilı́feros permianos e, consequente‑
propostas com base nas correlaçõ es bioes‑
mente, nas amplitudes estratigrá icas dos tá ‑ lhor opçã o, neste caso, será a construçã o de
xons, trazidas pelas idades radiomé tricas, ob‑ um novo esquema itoestratigrá ico para o
tidas por Grif is et al. (2018, 2019), RS, à luz dos novos dados, observando os no‑
inviabilizam o itozoneamento de Guerra‑ vos posicionamentos das seçõ es itofossilı́fe‑
Sommer & Cazzulo‑Klepzig (1993), como ori‑ ras e estabelecendo as novas amplitudes
ginalmente proposto. Há seçõ es e horizontes estratigrá icas dos tá xons, de inindo, assim,
itofossilı́feros, que, por terem mudado com‑ novas itozonas e os seus respectivos tá xons‑
pletamente de posiçã o no tempo, nã o podem guia. Para o Permiano Inferior de SC, interva‑
mais ser considerados seçõ es‑tipo e/ou es‑ lo para o qual nã o há qualquer itozonea‑
trató tipos de uma determinada itozona, pois mento proposto nesse estado, as poucas
inverteram sua posiçã o cronoestratigrá ica, dataçõ es radiomé tricas, obtidas até o mo‑
passando de estratos mais jovens a mais anti‑ mento, nã o permitem um claro posiciona‑
gos, como é o caso do A loramento Quité ria, mento cronoestratigrá ico das seçõ es e/ou
em que se encontram os estrató tipos de duas, dos horizontes itofossilı́feros. Talvez, a me‑
das trê s, itozonas de Guerra‑Sommer & Caz‑ lhor alternativa seja o estabelecimento de
zulo‑Klepzig (1993). Provavelmente, a me‑ correlaçõ es itoestratigrá icas com as seçõ es
Figura 4 ‒ Posicionamento cronoestratigrá ico das unidades itofossilı́feras formais e informais, de acordo com
as novas dataçõ es radiomé tricas, obtidas em camadas das unidades itofossilı́feras do Permiano da Bacia do
Paraná (Grif is et al., 2018, 2019). Salienta‑se que a Tafo lora A e sua equivalente, a Flora Pré ‑Glossopteris, nã o é
registrada nos estados do RS e de SC (legenda: Carbon. ‑ Carbonı́fero; Penn. ‑ Pennsilvaniano; Flora Phy‑Ganga ‑
Flora Phyllotheca‑Gangamopteris; Flora Gloss‑Bras ‑ Flora Glossopteris‑Brasilodendron; Flora Poly‑Gloss ‑ Flora
Polysolenoxylon‑Glossopteris; Zona Poly Informal ‑ Zona Polysolenoxylon Informal; Zona L. derbyi ‑ Zona
Lycopodiopsis derbyi; Zona S. paranaense ‑ Zona Sphenophyllum paranaense; e Zona S. gondwanensis ‑ Zona
Schizoneura gondwanensis).
Fitoestratigra ia dos estados do Rio Grande do Sul e de Santa Catarina 253
Contribuições à Geologia do Rio Grande do Sul e de Santa Catarina
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1 INTRODUÇÃO
A Supersequê ncia Gondwana I (SGI) compreende um pacote sedimentar heterogê neo e
complexo, que documenta, na Bacia do Paraná , as grandes mudanças paleoambientais ocorridas
no Gondwana Ocidental entre o inal do Carbonı́fero e o inı́cio do Triá ssico (Milani, 1997; Milani
& Zalá n, 1999). Litoestratigra icamente, esta unidade aloestratigrá ica de segunda ordem é
composta pelos grupos Itararé , Guatá e Passa Dois, localmente sobrepostos por unidades pre‑
dominantemente arenosas (formaçõ es Piramboia e Sanga do Cabral). Em seu conjunto, repre‑
sentam a passagem da fase glacial (icehouse) para pó s‑glacial (greenhouse), culminando com a
aridizaçã o do inal do Permiano e do inı́cio do Triá ssico. As unidades sedimentares constituem
rico acervo para pesquisas há mais de um sé culo, sobretudo, em decorrê ncia do interesse pelas
camadas de carvã o, pelas ocorrê ncias de urâ nio e de xisto betuminoso e pelo potencial petrolı́‑
fero (Milani et al., 2007), bem como por permitirem estudos sob mú ltiplos aspectos. De um mo‑
do geral, fazem parte do que é considerada uma bacia escola, com abundantes exposiçõ es e
com proximidade de centros de investigaçã o.
O conteú do paleontoló gico da SGI é extremamente variado, incluindo invertebrados,
vertebrados e plantas, alé m de icnofó sseis e de microfó sseis, tais como palinomorfos, ostraco‑
des e foraminı́feros. Holz et al. (2010) sintetizaram as principais ocorrê ncias fossilı́feras da
margem leste da bacia, a qual concentra a maior parte dos achados, tanto de superfı́cie quanto
de subsuperfı́cie. Essas ocorrê ncias tê m subsidiado interpretaçõ es paleoambientais das cama‑
das portadoras, correlaçõ es de curtas e de longas distâ ncias, bem como idades relativas. Contu‑
Contribuições à Geologia do Rio Grande do Sul e de Santa Catarina
Figura 1 ‒ Contexto geoló gico da Bacia do Paraná nos estados do Rio Grande do Sul e de Santa Catarina, com
destaque para as localidades com informaçõ es palinoestratigrá icas abordadas nesta contribuiçã o
(detalhamento na Tabela 1).
Tabela 1 ‒ Sı́ntese das informaçõ es palinoló gicas, publicadas nas ú ltimas duas dé cadas, sobre as unidades da
Supersequê ncia Gondwana I nos estados do Rio Grande do Sul e de Santa Catarina. Abreviaçõ es: ZLv: Zona
Lueckisporites virkkiae; e ZVc: Zona Vittatina costabilis.
aos registros dos primeiros elementos cono‑ ré e aos da Formaçã o Rio Bonito, podendo
dontes documentados para a Bacia do Para‑ alcançar, em alguns raros casos, nı́veis basais
ná . da Formaçã o Palermo. A ZLv ocorre, de for‑
ma consistente, nas formaçõ es Palermo e
2. 3 Distribuição estratigrá ica e carac‑ Irati. Contudo, somente nos ú ltimos anos,
terísticas gerais das palinozonas tem sido veri icada, mais frequentemente,
nos nı́veis superiores, correspondentes à s
Os intervalos G a H2, de Daemon &
formaçõ es Serra Alta, Teresina e Rio do Ras‑
Quadros (1970), correspondentes, indistin‑
to (membro basal), como resultado do esfor‑
tamente, à s zonas ZAc e ZCm, de Souza
ço sistemá tico de amostragem e de aná lise
(2006), foram identi icados somente no Gru‑
(Mori & Souza, 2012; Avelino, 2015; di Pas‑
po Itararé em subsuperfı́cie, relativamente
quo et al., 2018; Bender et al., 2021).
aos poços 2‑MR‑1‑SP, no extremo norte do
A ZVc foi objeto de aná lise por Souza
RS, e 1‑PA‑1‑SC, 2‑LA‑1‑SC, 1‑BN‑1‑SC, 2‑TG‑
et al. (2021), com nova caracterizaçã o e no‑
1‑SC e 1‑TP‑1‑SC, em SC. Em superfı́cie, a zo‑
vo posicionamento geocronoló gico. De acor‑
na ZVc foi amplamente diagnosticada em
do com os trabalhos originais de proposiçã o
ambos os estados, em nı́veis litoestratigra i‑
(Souza & Marques‑Toigo, 2005) e com esta
camente correspondentes ao do Grupo Itara‑
ú ltima concepçã o, trata‑se de uma zona de tes con luens, de Stellapollenites talchirensis e
intervalo, com limite inferior marcado pelo de Illinites unicus, embora, quantitativamen‑
primeiro aparecimento de diversas espé cies te, estas sejam pouco abundantes. Grã os de
de Vittatina (V. costabilis, V. saccata, V. wo‑ pó len monossacados, de simetrias radial e
dehousei, V. subsaccata, V. vittifera, V. corruga‑ bilateral, constituem os elementos mais co‑
ta) e de Protohaploxypinus (P. goraiensis, P. muns, principalmente, representados pelas
hartii), acompanhadas de Converrucosispori‑ espé cies dos gê neros Cannanoropollis, Plica‑
radiomé tricas (U‑Pb em zircõ es vulcanogê ni‑ ram encontrados, em 2008, em depó sitos do
cos) e de novos achados de grupos potencial‑ A loramento Campaleo (Folhelho Lontras),
mente ú teis dos estratotipos da coluna do Grupo Itararé , no municı́pio de Mafra (SC)
padrã o internacional (conodontes). (Scomazzon et al., 2013), preservados como
clusters e como assembleias naturais, consti‑
3. 2 Conodontes tuindo as primeiras ocorrê ncias de aparelhos
alimentares completos em bacias sedimenta‑
Conodontes sã o vertebrados primiti‑ res da Amé rica Latina (Wilner et al., 2016).
vos, que viveram nos mares, do Paleozoico Caracterı́sticas da morfologia dos elementos
ao Triá ssico. A preservaçã o do animal cono‑ P1 auxiliaram na identi icaçã o do gê nero Me‑
donte é extremamente rara, por ser compos‑ sogondolella, atribuı́da a Mesogondolella spp.,
to, eminentemente, de material orgâ nico. superfamı́lia Gondolelloidea, podendo ser re‑
Desta forma, o que é encontrado, principal‑ lacionada à s biozonas Mesogondolella bella‑
mente, sã o os denominados elementos co‑ dontae e M. bisselli, do Cisuraliano,
nodontes, correspondentes a peças bucais, respectivamente, Asseliano‑Artinskiano, para
de fosfato de cá lcio, isoladas como bioclastos provı́ncias temperadas, correlata à biozona
em sedimentos carboná ticos, em margas e Sweetognathus whitei, e para provı́ncias
em folhelhos (á guas quentes) e siliciclá sticos equatoriais (Henderson, 2018). Esta atribui‑
(á guas frias e temperadas). Compreendem çã o bioestratigrá ica corrobora a idade iso‑
tá xons marcadores da carta geocronoló gica crô nica Rb/Sr em rocha total, de 287 + 10 Ma
internacional dos andares do Cambriano ao (Koester et al., 2016), advinda do mesmo nı́‑
Triá ssico, extremamente ú teis no zoneamen‑ vel de ocorrê ncia dos espé cimes de Mesogon‑
to bioestratigrá ico, na correlaçã o e na inter‑ dolella do A loramento Campaleo.
pretaçã o paleoambiental das bacias No Carbonı́fero, particularmente, de‑
sedimentares paleozoicas e triá ssicas. Nos vido à formaçã o da Pangea e à glaciaçã o no
ú ltimos 20 anos, també m tê m sido utilizados Gondwana, diferentes padrõ es de zoneamen‑
como importante ferramenta, auxiliando em tos sã o utilizados para os hemisfé rios leste e
estudos isotó picos. oeste, ou seja, para a Eurá sia e para as á reas
Trata‑se de um grupo amplamente a ins, a leste, versus Amé rica, a oeste. Nas ú l‑
registrado e estudado nos depó sitos do timas trê s dé cadas, a sucessã o de conodon‑
Pennsilvaniano e do Permiano do hemisfé rio tes, embora com algum grau de
norte, especialmente, na Amé rica do Norte, provincialismo, tornou‑se a ferramenta mais
na Europa, na Rú ssia e na China. No hemisfé ‑ con iá vel, para a calibraçã o e para a de iniçã o
rio sul, as ocorrê ncias sã o menos numerosas, de limites geocronoló gicos, tanto desse pe‑
com documentaçã o na Bolı́via, na Austrá lia, rı́odo quanto dos subperı́odos Mississipiano
na Nova Zelâ ndia e no Timor. No Brasil, tê m e Pennsilvaniano, com base nos eventos de
sido estudados, desde a dé cada de 1960, com primeiros aparecimentos (FADs) de Shipho‑
vá rios trabalhos publicados sobre as bacias nodella sulcata e de Declinognathodus noduli‑
do Amazonas, do Solimõ es e do Parnaı́ba, a ferus, respectivamente, para os limites
partir de carbonatos pennsilvanianos, de Devoniano/Carbonı́fero e Mississipiano/
á guas rasas e quentes, recuperados como Pennsilvaniano. O Pennsilvaniano foi subdivi‑
elementos isolados, conforme sintetizado em dido, segundo o sistema internacional, em
Scomazzon et al. (2016), alé m de ocorrê ncias Bashkiriano, em Moscoviano, em Kasimovia‑
mais pontuais na Bacia do Acre. no e em Gzheliano, com base nos importan‑
Na Bacia do Paraná , conodontes fo‑ tes gê neros de conodontes Declinognathodus,
namento geocronoló gico das seçõ es Carbo‑ maçã o Rio Bonito. A ZLv é considerada de
nı́feras e Permianas desta parte do Gondwa‑ idade entre o inal do Artinskiano e o Guada‑
na (vide Gulbranson et al., 2010; Cé sari et al., lupiano mé dio (considerando ocorrê ncias de
2011; Cagliari et al., 2014; Grif is et al., 2018; outros fó sseis, conforme Holz et al., 2010). As
Rocha‑Campos et al., 2019). Consequente‑ dataçõ es radiomé tricas, obtidas para a For‑
mente, as associaçõ es fó sseis tê m sido obje‑ maçã o Irati, convergem para uma idade Kun‑
tivo de novas aná lises e de novas guriana.
interpretaçõ es sobre as idades e sobre a du‑ Contudo, algumas questõ es ainda
raçã o das biozonas. Cé sari (2007), Stephen‑ permanecem controversas, carentes de me‑
son (2008) e Cé sari et al. (2011) lhor aprofundamento, tais como se as poucas
apresentaram importantes sı́nteses sobre o idades absolutas obtidas para o topo do Gru‑
tema, com ê nfase nas idades atribuı́das à s po Itararé , no RS ( inal do Pennsilvaniano),
palinozonas e no potencial de correlaçã o en‑ poderiam ser aplicadas generalizadamente
tre os vá rios setores do Gondwana. Para a para toda a extensã o da bacia. Em Daemon &
Bacia do Paraná , a reavaliaçã o realizada por Quadros (1970), é indicada uma correlaçã o
Souza et al. (2021) traz novas concepçõ es a lateral entre o topo do Grupo Itararé e a base
esse respeito, incorporando os dados radio‑ da Formaçã o Rio Bonito, o que implica con‑
mé tricos e discutindo, particularmente, a ca‑ temporaneidade entre a fase terminal da gla‑
racterizaçã o e a distribuiçã o estratigrá ica da ciaçã o e a deposiçã o de fá cies pó s‑glaciais em
Zona Vittatina costabilis, reconhecida no determinadas partes da bacia. Sem dú vida,
Grupo Itararé e na Formaçã o Rio Bonito, em sã o temas de interesse estratigrá ico, cuja re‑
seu setor sul. soluçã o exige a integraçã o de mú ltiplas ferra‑
Os estratos do Grupo Itararé , porta‑ mentas de aná lise. Na Figura 4, é apresentada
dores das idades das palinozonas basais da uma sı́ntese sobre o posicionamento geocro‑
SGI (ZAc e ZCm), permanecem desprovidos noló gico das palinozonas, considerando as
de dataçõ es de alta resoluçã o, sendo posicio‑ idades absolutas disponı́veis, conforme deta‑
nados no Pennsilvaniano, ocupando está gios lhadamente apresentado em Souza et al.
mais antigos, entre o Bashkiriano e o Kasi‑ (2021).
moviano. A porçã o superior do Grupo Itararé
no RS possui apenas uma localidade com da‑ 4 CONSIDERAÇÕES FINAIS
taçã o absoluta de alta precisã o, de idade
A revisã o do conhecimento palinoló ‑
Gzheliana (Cagliari et al., 2020). Neste caso, a
gico da SGI nesta porçã o da Bacia do Paraná
ZVc é indicada por inferê ncia, tendo em vista
permite ressaltar alguns aspectos, os quais
que somente esta palinozona foi reconhecida
incluem a constataçã o de avanços e de desa i‑
nesta unidade litoestratigrá ica, no RS.
os para as pesquisas subsequentes.
Por outro lado, a maior parte das da‑
Até o inal do sé culo passado, a maior
taçõ es radiomé tricas, incluindo algumas de
parte dos dados palinoló gicos era advinda
alta precisã o, sã o advindas dos nı́veis de car‑
das camadas de carvã o e dos nı́veis associa‑
vã o e de estratos, relacionados à Formaçã o
dos da Formaçã o Rio Bonito, vinculados à
Rio Bonito, no RS, a maioria das quais tem
pesquisa explorató ria deste recurso mineral.
informaçõ es palinoló gicas relativas à ZVc.
Nas ú ltimas duas dé cadas, veri icou‑se maior
Conforme sintetizado em Souza et al. (2021),
atençã o aos depó sitos pós‑Rio Bonito, com
uma idade Gzheliana‑Artinskiana é indicada
expressivos resultados nas unidades do Gru‑
para a ZVc, com duraçã o de ca. 20 Ma, in‑
po Passa Dois, cujos registros palinoló gicos
cluindo o topo do Grupo Itararé e toda a For‑
Biocronoestratigra ia(Palinologia e Conodontes) da Supersequência Gondwana I na porção sul ... 267
Contribuições à Geologia do Rio Grande do Sul e de Santa Catarina
Figura 4 ‒ Distribuiçã o quantitativa dos principais grupos de esporomorfos na Supersequê ncia Gondwana I,
palinoestratigra ia e idades (modi icado de Souza et al., 2021).
AGRADECIMENTOS REFERÊNCIAS
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268 Edição da Sociedade Brasileira de Geologia – Núcleo RS/SC
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C., Wilner, E., Moutinho, L. P. & Nascimento, S. cia do Paraná . Ameghiniana, 49(3): 319‑
1
Programa de Pó s‑Graduaçã o em Geociê ncias, Universidade Federal do Rio Grande do Sul
2
Programa de Pó s‑Graduaçã o em Ambiente e Desenvolvimento, Universidade do Vale do Taquari
1 INTRODUÇÃO
Evidê ncias de incê ndios vegetacionais, inferidas pela ocorrê ncia de fragmentos de char‑
coal e de macerais do grupo das inertinitas, tê m sido registradas, com maior ou com menor
frequê ncia, em depó sitos sedimentares desde o Siluriano, com o advento das primeiras plantas
de ambientes terrestres, indicando a presença de fogo em uma escala global nos ú ltimos 400 mi‑
lhõ es de anos (Preston & Schmidt, 2006; Glasspool & Scott, 2010).
Alé m da in luê ncia das variaçõ es climá ticas, os nı́veis de O2 atmosfé rico (pO2) foram um
forte determinante das atividades de incê ndio, em diferentes intervalos geoló gicos. As primeiras
plantas terrestres do Siluriano, principalmente herbá ceas, já eram passı́veis de igniçã o, mas o fo‑
go só se tornou frequente no Devoniano, quando as folhas e os caules lenhosos se tornaram mais
complexos, sendo formados por tecido condutor especializado (Glasspool & Scott, 2010).
A alta representaçã o global de charcoal em camadas de carvã o e em sedimentos a elas
associados nas faixas tropicais, durante o Mississipiano‑Pensilvaniano, no continente Euroame‑
ricano, indicou que incê ndios foram intensos e frequentes, nesse intervalo. Isso poderia estar as‑
sociado aos altos nı́veis estimados de pO2 (28%), em relaçã o aos ı́ndices atuais (21%) (Fig. 1), o
que teria potencializado a combustã o do material vegetal, sob altas temperaturas e sob chuvas
moderadas (Glasspool & Scott, 2010).
As turfeiras tê m sido utilizadas como indicadores de alteraçõ es climá ticas globais, por
serem repositó rios de dados climá ticos preté ritos, contribuindo para o sequestro global de car‑
bono, funcionando como reservató rios de á gua e abrigando biodiversidades endê micas. As altas
taxas de acumulaçã o de material orgâ nico autó ctone ou hipoautó ctone e a sensibilidade hidro‑
Contribuições à Geologia do Rio Grande do Sul e de Santa Catarina
Figura 1 ‑ Evoluçã o dos sistemas de incê ndios do Neopaleozoico. O cá lculo das curvas de oxigê nio foi baseado
em teores de inertinita, em carvõ es agrupados a cada 10 milhõ es (linha preta) e a cada 15 milhõ es (tracejado
vermelho) de anos (adaptado de Glasspool et al., 2015).
climá tica (in luê ncia do clima sobre os cor‑ pó s‑glaciais e, no topo da sequê ncia permia‑
pos d’á gua continentais) guardam informa‑ na, em fases regressivas, de tendê ncia conti‑
çõ es relacionadas à dinâ mica da maté ria nental (p. ex., Jasper et al., 2011a, 2011b;
orgâ nica, à evoluçã o das paisagens, a mu‑ Degani‑Schmidt et al., 2015; Manfroi et al.,
danças climá ticas e aos ciclos de poluiçã o at‑ 2015; Benı́cio et al., 2019a, 2019b).
mosfé rica locais, regionais e globais. Esses Investigaçõ es em camadas de carvã o
sistemas fornecem um registro de inú meros e em sedimentos associados, em diferentes
indicadores (proxies), de origem bió tica e jazidas da Bacia do Paraná , suscitaram hipó ‑
abió tica, dos quais é possı́vel extrair infor‑ teses de que incê ndios lorestais poderiam
maçõ es para as reconstruçõ es ambientais (p. ter sido eventos recorrentes nestes ambien‑
ex., Van Hoof et al., 2008; Couwenberg et al., tes, incluı́dos em cinturõ es temperados, em
2011). que, potencialmente, prevaleceriam condi‑
A ocorrê ncia de incê ndios vegetacio‑ çõ es sempre ú midas (Jasper et al., 2011a;
nais no Permiano, durante aproximadamen‑ Degani‑Schmidt et al., 2015; Benı́cio et al.,
te 150 milhõ es de anos de domı́nio da Flora 2019a). Todavia, a presença de grandes
Glossopteris, no sul da Bacia do Paraná , pale‑ quantidades de inertinita e de charcoal em
ogeogra icamente localizada em latitudes carvõ es permianos do Gondwana, em cintu‑
temperadas, tem sido documentada, em di‑ rõ es climá ticos temperados, foi atribuı́da,
ferentes ambientes, representados por fá cies por Glasspool (2003), a diferentes fatores
periglaciais, bem como por fá cies relaciona‑ atuantes durante a deposiçã o das turfeiras,
das a ambientes de turfeiras luviopará licas tais como exposiçã o subaé rea, deposiçã o em
274 Edição da Sociedade Brasileira de Geologia – Núcleo RS/SC
Guerra‑Sommer et al.
clima frio e atividade fú ngica. As aná lises desenvolvidas por Degani‑
Dessa forma, na tentativa de encon‑ Schmidt et al. (2015) foram realizadas, espe‑
trar respostas a evidê ncias de possı́veis ocor‑ ci icamente, nas interfaces da camada de car‑
rê ncias de incê ndios em ambientes de vã o superior (S) com uma camada intercalada
turfeiras desenvolvidas em latitudes tempe‑ de tonstein (Fig. 3A), datada de 285,42 + 1,2 /
radas, no intervalo Sakmariano‑Artinskiano ‑2,1 Ma, correspondente ao Artinskiano (Grif‑
do Gondwana sul‑brasileiro, aná lises detalha‑ is et al., 2018). O tonstein corresponde à de‑
das, de cunho anatô mico e geoquı́mico, inte‑ posiçã o de cinza vulcâ nica sobre a turfeira
graram‑se a estudos pré vios, de cunhos (Simas et al., 2013) e representa um evento
sedimentar, palinoló gico e paleobotâ nico, geologicamente instantâ neo (Prothero, 1990;
conduzidos em amostras provenientes de ja‑ DiMichele & Falcon‑Lang, 2011). Com espes‑
zidas de carvã o do sul da Bacia do Paraná (p. sura mé dia de 10 cm, o tonstein conté m uma
ex., Jasper et al., 2011a, 2011b; Degani‑Sch‑ associaçã o bem preservada de itofó sseis da
midt et al., 2015; Benı́cio et al., 2019a). Flora Glossopteris (Guerra‑Sommer, 1988). A
Esses estudos, utilizando té cnicas di‑ macro lora, preservada como compressõ es
versas (microscopia eletrô nica de varredura carboni icadas, é predominantemente gim‑
(MEV) e microscopia ó tica de luz transmitida nospé rmica, e as folhas de glossopterı́deas
e de luz incidente com luorescê ncia), de‑ correspondem a 78% da associaçã o (Guerra‑
monstraram a e iciê ncia do charcoal como Sommer, 1992; Boardman et al., 2012).
proxy para inferir correlaçõ es entre os even‑ A ocorrê ncia de charcoal e de inerti‑
tos de incê ndio, os diferentes fatores climá ti‑ nitas em turfeiras permianas, no estado de
cos e, també m, os ı́ndices de O2 atmosfé rico Santa Catarina, foi registrada por Benı́cio et
vigentes durante a deposiçã o de turfeiras no al. (2019a), no a loramento Porongos (Fig. 2)
sul da Bacia do Paraná , no intervalo Sakmari‑ localizado no municı́pio de Lauro Mü ller (28°
ano‑Artinskiano. Os resultados integrados, 25' 21,4” S, 49° 26' 24,0” W). A camada de
obtidos por Degani‑Schmidt et al. (2015) e carvã o Barro Branco, ali exposta, é composta
por Degani‑Schmidt & Guerra‑Sommer por uma camada de carvã o na base (informal‑
(2016a, 2016b) na jazida de carvã o do Faxi‑ mente denominada Banco), por siltitos e por
nal (RS) e aqueles obtidos por Benı́cio et al. arenitos, intercalados com inas camadas in‑
(2019a) na camada Barro Branco da jazida termediá rias de carvã o (informalmente deno‑
Santa Catarina (SC), aqui sintetizados, de‑ minadas Coringa ou Quadraçã o) e uma
monstram a efetividade das aná lises. camada carboná cea, de espessura variá vel, na
parte superior (informalmente chamada For‑
2 SÍNTESE GEOLÓGICA ro). Esta camada tem uma distribuiçã o geo‑
grá ica ampla e contı́nua, com espessura
A jazida de carvã o do Faxinal (Fig. 2), mé dia variando de 1,66 m a 2,27 m.
incluı́da na supersequê ncia Gondwana I, de i‑ Dataçõ es absolutas nã o foram de ini‑
nida para a Bacia do Paraná por Milani et al. das para o intervalo de geraçã o de carvã o no
(2007), explorada a cé u aberto e já exaurida, estado de Santa Catarina. Holz et al. (2010)
estava localizada no cinturã o de a loramento sugeriram que estas jazidas, incluı́das no
sudeste da Formaçã o Rio Bonito, no estado Membro Sideró polis da Formaçã o Rio Bonito,
do Rio Grande do Sul (em 30° 15′ 52,6″ S, 51° em Santa Catarina e no Paraná , teriam idade
41′ 53,8″ W). O fechamento da mina ocorreu Artinskiana. Essa idade relativa está de acor‑
em 2009, apó s o esgotamento do carvã o e a do com a idade de 286 +/‑ 3 Ma (Artinskia‑
reabilitaçã o do local. no), obtida por Jurigan et al. (2019) para a
Macro‑charcoal como indicador de incêndios em turfeiras permianas no Sul da Bacia do Paraná 275
Contribuições à Geologia do Rio Grande do Sul e de Santa Catarina
Figura 2 ‑ Mapa de localizaçã o do a loramento Porongos (SC) e da mina do Faxinal (RS), e arcabouço
estratigrá ico da Bacia do Paraná (adaptado de Milani et al., 2007).
Figura 3 ‑ Nı́vel de ocorrê ncia de grandes fragmentos de lenhos queimados na mina do Faxinal (RS). A) Detalhe
do tonstein, intercalado na camada de carvã o S; B) Seçã o transversal de lenho queimado comprimido (Pb‑
4587A), em bloco polido, sob ó leo, com objetiva de 10x, em luz branca re letida, mostrando organizaçã o em
“sanduı́che” inertinita‑vitrinita‑inertinita (fusê nio transicional).
Macro‑charcoal como indicador de incêndios em turfeiras permianas no Sul da Bacia do Paraná 277
Contribuições à Geologia do Rio Grande do Sul e de Santa Catarina
e valor de re letâ ncia da parede celular (iner‑ com os crité rios de Scott (2010). A preser‑
tinita), o que permite estimar a temperatura vaçã o de delicadas estruturas celulares, co‑
de queima. Charcoals com valores de re le‑ mo cé lulas crivadas do loema secundá rio,
tâ ncia maiores do que 5%Ro requerem altas rati ica a conclusã o de que as temperaturas
temperaturas de queima ou prolongado tem‑ de queima se mantiveram brandas, tendo si‑
po de exposiçã o ao calor para se formarem. do altas o su iciente apenas para promover
Aqueles com re letâ ncias abaixo de 1%Ro a homogeneizaçã o da lamela mé dia com as
podem ter sido formados sob temperaturas paredes celulares (Degani‑Schmidt et al.,
entre 300 oC e 400 oC. A temperatura de mui‑ 2015).
tos tipos de incê ndios ica nesse intervalo, Aná lises petrográ icas em blocos
concluindo‑se que os charcoals produzidos polidos, sob ó leo, demonstraram que esses
por temperaturas mais baixas terã o valores grandes fragmentos comprimidos de lenhos
de re letâ ncia menores, no intervalo da semi‑ queimados apresentavam uma organizaçã o
fusinita. Logo, a re letâ ncia da fusinita é ad‑ em “sanduı́che”, em seçã o transversal (fusê ‑
quirida antes do processo de carboni icaçã o nio transicional, sensu Jones et al., 1993),
e, portanto, independe da idade, da litologia sendo compostos por uma clara sequê ncia
ou da diagê nese/ambiente geoló gico (Scott, de inertinita‑vitrinita‑inertinita (Fig. 3B). A
1989). transiçã o entre a semifusinita estruturada e
a vitrinita homogê nea é brusca e os valores
4 INCÊNDIOS EM AMBIENTES DE TUR‑ de re letâ ncia na transiçã o decrescem, des‑
FEIRAS NO ARTINSKIANO, NO SUL DA de a porçã o inferior de semifusinita (0,840‑
BACIA DO PARANÁ 0,609%Ro), até a vitrinita interna (0,554‑
0,596%Ro), aumentando novamente na
4. 1 Jazida do Faxinal (RS) transiçã o para a semifusinita superior
(0,632‑0,834%Ro). Essa transiçã o corres‑
A impressionante associaçã o de
ponde à carbonizaçã o da porçã o mais exter‑
fragmentos de ramos e de caules altamente
na dos lenhos e à carboni icaçã o da parte
comprimidos, horizontalizados, frequente‑
central, ou seja, a queima nã o atingiu o cer‑
mente superpostos, que ocorriam continua‑
ne dos lenhos, indicando que o incê ndio al‑
mente ao longo de toda a á rea da mina a cé u
cançou as plantas enquanto ainda estavam
aberto do Faxinal (ca. 1,6 km²), com dimen‑
em posiçã o de vida.
sõ es muito expressivas (40 cm de compri‑
mento ou mais), preservados no carvã o Os detalhes anatô micos preserva‑
imediatamente subjacente ao tonstein (Fig. dos nos fragmentos de lenhos queimados
3A, Fig. 4A, B, Fig. 5A), levou Degani‑Schmidt (Fig. 5B‑5D) permitiram a identi icaçã o de
et al. (2015) a investigarem a possibilidade uma associaçã o monotı́pica, com a inidade
de que esses fragmentos seriam resultantes taxonô mica ao gê nero Agathoxylon Hartig,
de eventos de incê ndios vegetacionais em que corresponde a um padrã o encontrado
ambientes de turfeira. em diferentes grupos gimnospé rmicos, tais
como Cordaitales, Glossopteridales e Conife‑
A observaçã o desses fragmentos
rales. Todavia, o domı́nio de pó lens com a i‑
muito comprimidos (com espessuras de 2
nidade glossopterı́dea nas associaçõ es
cm, aproximadamente) por MEV evidenciou
palinoló gicas (Cazzulo‑Klepzig et al., 2007)
paredes celulares homogeneizadas em todos
e a presença dominante de folhas de Glos‑
os espé cimes, con irmando a categorizaçã o
sopteris spp. na associaçã o paleobotâ nica
do material como macro‑charcoal, de acordo
procedente do tonstein da Mina do Faxinal
Figura 4 ‑ Espé cimes macroscó picos e reconstituiçã o paleoambiental. A, B) Fragmentos de lenhos queimados
comprimidos, de grandes dimensõ es, subjacentes ao tonstein; C) Reconstruçã o da comunidade vegetal
geradora do depó sito de carvã o da mina do Faxinal, com base em palinologia e em paleobotâ nica (adaptado de
Cazzulo‑Klepzig et al., 2007).
Macro‑charcoal como indicador de incêndios em turfeiras permianas no Sul da Bacia do Paraná 279
Contribuições à Geologia do Rio Grande do Sul e de Santa Catarina
Figura 5 ‑ Espé cimes macroscó picos e detalhes em microscopia. A) Fragmento de lenho queimado comprimido,
proveniente do carvã o abaixo do tonstein (Pb‑2684); B) Cé lula do sistema condutor, mostrando paredes
celulares homogeneizadas (seta) (Pb‑4587b‑56); C) Traqueı́deos do xilema secundá rio, com pontuaçõ es
bisseriadas, em vista radial (Pb‑4587a‑04); D) Floema secundá rio, com placas crivadas, em vista radial (Pb‑
4587b‑56); E) Tufo de folhas glossopterı́deas carboni icadas, incluı́das no tonstein (Pb‑2790); F) Cutı́cula foliar,
em microscopia ó ptica de luz transmitida, com detalhe da ornamentaçã o epidé rmica (FXB‑84).
mes analisados indica a presença de uma as‑ regionais, que ocorriam em fases cı́clicas, e
sociaçã o predominantemente monotı́pica de teriam sido transportados, por via aquá tica,
plantas (Degani‑Schmidt & Guerra‑Sommer, até as á reas de deposiçã o.
2016a). Dadas as caracterı́sticas do material
A preservaçã o de loema, sob forma analisado, as projeçõ es de temperatura de
de charcoal (Fig. 5D), que corresponde a um queima de 325‑400°C, obtidas a partir de
tecido estruturalmente muito mais delicado baixos valores de re letâ ncia da inertinita,
do que o xilema, constitui‑se em uma rele‑ sã o tı́picas de queima super icial (sensu
vante evidê ncia paleoecoló gica. As delgadas Scott, 2010), indicando a ocorrê ncia de in‑
paredes celulares das cé lulas crivadas estã o cê ndios autó ctones, de superfı́cie, em baixa
constantemente sujeitas a pressõ es hidrostá ‑ temperatura. Aná lises quantitativas da dis‑
ticas ao longo da vida da planta, favorecendo tribuiçã o de associaçõ es palinoló gicas na ca‑
seu colapso instantâ neo, mediante injú ria. mada de tonstein e nos nı́veis de carvã o a ela
Portanto, a preservaçã o de tecido tã o delica‑ sotopostos e sobrepostos permitiram con‑
do rati ica as inferê ncias, relacionadas a bai‑ cluir que houve um aumento na dominâ ncia
xas temperaturas de queima, em condiçõ es de grã os de pó len bissacados em relaçã o a
de relativa seca ambiental e de deposiçã o re‑ esporos pteridofı́ticos, apó s a queda da cin‑
lacionada a pouco ou nenhum transporte za vulcâ nica (Cazzulo‑Klepzig et al., 2007;
(Degani‑Schmidt & Guerra‑Sommer, 2016a). Simas et al., 2013). Tal evidê ncia sugeriu que
Os padrõ es epidé rmicos da associa‑ a vegetaçã o gimnospé rmica foi revigorada
çã o de folhas glossopterı́deas (Fig. 5E‑5F), pela açã o do fogo e pela perturbaçã o vulcâ ‑
preservadas como compressõ es carboni ica‑ nica e nã o se abriu um novo nicho para reco‑
das ‒ nã o queimadas, portanto ‒, que ocor‑ lonizaçã o. O reestabelecimento das
rem dispersas no tonstein, em nı́veis comunidades vegetais, apó s a ocorrê ncia de
sobrepostos aos da ocorrê ncia de lenhos expressivo incê ndio autó ctone e apó s o
queimados, també m corroboram as inferê n‑ evento de queda da cinza vulcâ nica, sugere
cias de uma comunidade arbó rea predomi‑ que as perturbaçõ es ambientais tiveram um
nantemente monotı́pica (Guerra‑Sommer, impacto de curto alcance (Degani‑Schmidt et
1992). O processo tafonô mico, que gerou as al., 2015).
compressõ es foliares, é considerado um O conjunto de evidê ncias indicou
“evento geoló gico instantâ neo” (sensu que os incê ndios ocorrentes no limite inferi‑
Prothero, 1990), capaz de re letir as condi‑ or do tonstein foram de superfı́cie, em bai‑
çõ es ambientais vigentes na turfeira no exato xas temperaturas, e que o transporte do
momento em que a cinza precipitou (DiMi‑ macro‑charcoal foi praticamente inexistente,
chele & Falcon‑Lang, 2011). sendo a deposiçã o desses fragmentos, rela‑
Os grandes fragmentos de lenhos cionada, portanto, a processos autó ctones.
queimados, em Faxinal, se distinguem dos També m foram identi icados fragmentos
centimé tricos e milimé tricos fragmentos de dispersos de macro‑charcoal, mas de meno‑
macro‑charcoal, presentes, de forma recor‑ res dimensõ es, ao longo da deposiçã o da ca‑
rente, em bandas densas, nos a loramentos mada de tonstein e no carvã o pró ximo ao
de idade Asseliana, em Quité ria e em Curva limite superior dessa camada de cinza vul‑
do Belvedere, cuja faciologia é relacioná vel a câ nica, o que sugere processos hipoautó cto‑
pâ ntanos lagunares e a terras baixas (Kubik nes de transporte, que permitiram inferir
et al., 2020). Esses macro‑charcoals seriam ocorrê ncias de incê ndios nas á reas de entor‑
provenientes, provavelmente, de incê ndios no da turfeira (Jasper et al., 2011a; Degani‑
Macro‑charcoal como indicador de incêndios em turfeiras permianas no Sul da Bacia do Paraná 281
Contribuições à Geologia do Rio Grande do Sul e de Santa Catarina
Figura 6 ‑ Per il da camada Barro Branco do a loramento Porongos (SC), com destaque para as seis camadas
contendo charcoal (adaptado de Benı́cio et al., 2019a).
zida do Faxinal (no Artinskiano), sugeriram mento, sugerem transporte hipoautó ctone,
uma conexã o bioló gica entre ambos. dentro do ambiente de deposiçã o, via luxo
A ocorrê ncia nos seis nı́veis de silti‑ hidrá ulico (Scott, 2010), o qual pode ter
to carbonoso de macro‑charcoal com deta‑ exercido um vié s seletivo em favor de restos
lhes anatô micos bem preservados (Fig. de madeira carbonizados, em detrimento de
7B‑7D), sob MEV, e com paredes celulares charcoal de outros ó rgã os das plantas. Essa
homogeneizadas indica que o fogo foi um interpretaçã o tafonô mica é congruente com
elemento recorrente no sistema deposicio‑ o alto conteú do mineral presente em todos
nal e que incê ndios ocorriam nas proximi‑ os seis nı́veis de siltito carbonoso, sugerindo
dades do ambiente de formaçã o de turfa que que in luxos de á gua frequentemente trans‑
originou a camada de carvã o Barro Branco. portaram sedimentos de uma fonte externa
E importante salientar que, em cada nı́vel, para a turfeira. Todavia, o vento també m po‑
os fragmentos de charcoal nã o se dispõ em de ter agido e transportado partı́culas meno‑
em faixas contı́nuas, ricas em material car‑ res de macro‑charcoal (de cerca de 3 mm de
bonizado, nã o existindo, entã o, evidê ncias comprimento) até a turfeira.
de queima autó ctone e lenta da pró pria tur‑ A ausê ncia de charcoal nas camadas
fa. de argila maciça, intermediá rias aos siltitos
As abrasõ es observadas nas bordas carbonosos (Fig. 6), pode ser atribuı́da à au‑
da maioria do macro‑charcoal indicam sê ncia de incê ndios durante a deposiçã o
transporte desde a á rea‑fonte do incê ndio destes horizontes sedimentares, ou a um
até a turfeira. As dimensõ es dos fragmentos vié s tafonô mico, uma vez que nã o foram do‑
heteromó r icos, de até 111 mm de compri‑ cumentados itofó sseis nessas camadas.
Macro‑charcoal como indicador de incêndios em turfeiras permianas no Sul da Bacia do Paraná 283
Contribuições à Geologia do Rio Grande do Sul e de Santa Catarina
Figura 7 ‑ Amostra de mã o e observaçã o, em MEV, do charcoal proveniente do a loramento Porongos (SC). A)
Amostra contendo fragmentos de charcoal, com bordos levemente arredondados (seta) (PBUMCN 1167); B)
Charcoal impregnado por pirita (seta) (PBUMCN 1165); C) Vista transversal, demonstrando a preservaçã o
tridimensional da anatomia vegetal (PBUMCN 1168); D) Homogeneizaçã o das paredes celulares (seta)
(PBUMCN 1165).
Tabela 1 ‑ Valores de re letâ ncia (%Ro) das vitrinitas e das inertinitas nos seis nı́veis carbonosos do
a loramento Porongos (SC).
Macro‑charcoal como indicador de incêndios em turfeiras permianas no Sul da Bacia do Paraná 285
Contribuições à Geologia do Rio Grande do Sul e de Santa Catarina
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Permian palaeo‑wild ire on Gondwana: char‑ mation of inertinite group macerals.
Macro‑charcoal como indicador de incêndios em turfeiras permianas no Sul da Bacia do Paraná 287
Voltar ao Sumário
1
Instituto de Geociê ncias, Universidade Federal do Rio Grande do Sul
2
Universidade do Vale do Rio dos Sinos
3
Serviço Geoló gico do Brasil/CPRM
1 INTRODUÇÃO
A sucessã o sedimentar mesozoica do Rio Grande do Sul tem sido estudada desde o inı́‑
cio do sé culo passado, tendo produzido inú meros trabalhos de cunho sedimentoló gico, estrati‑
grá ico e paleontoló gico. Entretanto, o incremento progressivo do conhecimento trazido por
estes estudos també m resultou na proposiçã o de cartas estratigrá icas con litantes. Alé m dos
problemas inerentes à litoestratigra ia, parte das divergê ncias deriva do fato de que as proposi‑
çõ es tê m sido elaboradas em diferentes blocos estruturais, que apresentam sucessõ es estrati‑
grá icas distintas. Ou seja, nã o existe uma coluna estratigrá ica ú nica para o Mesozoico do Rio
Grande do Sul que possa ser correlacionada ao longo de toda a seçã o a lorante, existindo ausê n‑
cia de unidades conforme a regiã o analisada. Este trabalho apresenta uma breve sı́ntese do arca‑
bouço estratigrá ico do Mesozoico do Rio Grande do Sul, a partir de uma aná lise crı́tica da
bibliogra ia, aliada à sistematizaçã o e à organizaçã o de dados publicados por diferentes grupos
de pesquisa.
Contribuições à Geologia do Rio Grande do Sul e de Santa Catarina
Figura 1 – (A) Posicionamento dos principais sistemas de falhas, que delimitam os blocos estruturais da Bacia
do Paraná no Rio Grande do Sul: ZFJM: Zona de Falha Jaguari‑Mata, ZFDC: Zona de Falha Dorsal de Canguçu,
ZFTAP: Zona de Falha Terra de Areia‑Posadas. O: Bloco Oeste, C: Bloco Central, E: Bloco Leste, NE: Bloco
Nordeste e N: Bloco Norte; (B) Mapa geoló gico simpli icado das unidades mesozoicas da Bacia do Paraná no Rio
Grande do Sul; e (C) Seçã o de correlaçã o esquemá tica das unidades mesozoicas dos blocos Oeste, Central e Les‑
te. SL: Santana do Livramento, RS: Rosá rio do Sul, SFA: Sã o Francisco de Assis, JG: Jaguari, SPS: Sã o Pedro do Sul,
SM: Santa Maria, CA: Candelá ria, SC: Santa Cruz do Sul, VA: Venâ ncio Aires, MN: Montenegro e TA: Taquara
(modi icado de Dias‑da‑Silva et al. (2017)).
Estratigra ia da sucessão sedimentar mesozoica da Bacia do Paraná no Rio Grande do Sul 291
Contribuições à Geologia do Rio Grande do Sul e de Santa Catarina
Figura 2 ‒ Diagrama cronoestratigrá ico das unidades mesozoicas da Bacia do Paraná no Rio Grande do Sul:
SC: Formaçã o Sanga do Cabral, SM: Formaçã o Santa Maria, CA: Formaçã o Caturrita, GU: Formaçã o Guará , AP:
Arenito Pedreira, BO: Formaçã o Botucatu e SG: Grupo Serra Geral.
Formaçã o Sanga do Cabral (Dias‑da‑Silva et membros por Bortoluzzi (1974): Passo das
al., 2017). Essa assembleia fó ssil apresenta Tropas e Alemoa. O Membro Passo das Tro‑
uma correlaçã o bioestratigrá ica com a Zona pas foi considerado como os depó sitos are‑
de Procolophon, da Bacia do Karoo, indican‑ nosos de canais luviais que ocorrem na base
do uma idade Induana para a Formaçã o San‑ da Formaçã o, sendo sucedidos por pelitos
ga do Cabral (Dias‑da‑Silva et al., 2017). avermelhados do Membro Alemoa. Entretan‑
to, essa proposiçã o de dois membros tem se
3.1.4 Estratigra ia de sequências e cor‑ mostrado pouco operacional, visto que exis‑
relações regionais tem vá rios corpos arenosos intercalados com
pelitos dentro da Formaçã o Santa Maria,
A Formaçã o Sanga do Cabral corres‑ sendo desconsiderada no presente trabalho.
ponde a uma ú nica sequê ncia deposicional, A Formaçã o Caturrita foi proposta por An‑
limitada no topo e na base por desconformi‑ dreis et al. (1980), tendo como base a coluna
dades (Fig. 2). Essa unidade é composta por estratigrá ica de Bortoluzzi (1974) (vide dis‑
corpos de canais luviais amalgamados, de cussã o de Scherer et al., 2000). Esta se so‑
alta variabilidade de descarga, indicando que brepõ e à Formaçã o Santa Maria em contato
a acumulaçã o ocorreu em um contexto de gradacional, marcado por uma amalgamaçã o
baixa taxa de acomodaçã o, sob um regime de corpos arenosos de canais luviais. Faccini
climá tico semiá rido. As paleocorrentes dos (1989) propõ e ainda a designaçã o informal
depó sitos luviais para NE sugerem uma de Arenito Mata para a seçã o arenosa com
á rea‑fonte a SW (Zerfass et al., 2003). A á rea troncos fó sseis, que corresponde ao topo da
deposicional original é difı́cil de ser de inida, Formaçã o Caturrita.
em decorrê ncia da tectô nica deformadora
ter preservado somente um pequena porçã o 3.2.2 Características sedimentológicas e
da bacia, que provavelmente ocupava uma estratigrá icas
á rea muito maior do que aquela circunscrita
pelos seus atuais limites erosivos. As discor‑ As formaçõ es Santa Maria e Caturrita
dâ ncias de base e de topo da Formaçã o San‑ tê m a sua á rea de ocorrê ncia restrita ao blo‑
ga do Cabral tê m as suas gê neses vinculadas co tectô nico Central (Fig. 1). A Formaçã o
a paroxismos do cinturã o de dobramento e a Santa Maria apresenta espessuras de 50 a
cavalgamentos de Sierra de La Ventana, que 100 metros, sendo limitada, na base, por
geraram soerguimentos no Gonduana e in‑ uma desconformidade com os depó sitos are‑
terrupçã o da acumulaçã o sedimentar no in‑ nosos da Formaçã o Sanga do Cabral. Essa
terior do megacontinente (Zerfass et al., unidade apresenta, no topo, um contato gra‑
2003). dacional com a Formaçã o Caturrita, cuja es‑
pessura varia de 100 a 150 metros, podendo
3.2 Formações Santa Maria e Caturrita estar ausente, por erosã o, em algumas re‑
giõ es do bloco Central. O topo da Formaçã o
3.2.1 Designação litoestratigrá ica Caturrita é marcado por uma paraconformi‑
dade com os arenitos da Formaçã o Botuca‑
A Formaçã o Santa Maria foi proposta
tu.
por Gordon Jr. (1947), sendo destacada da
A Formaçã o Santa Maria é caracteri‑
Formaçã o Rio do Rasto com base nos verte‑
zada por intervalos de corpos arenosos
brados fó sseis, que indicavam idade triá ssi‑
amalgamados de canais luviais entrelaça‑
ca. Posteriormente, foi subdividida em dois
dos, que se alternam com intervalos consti‑
Estratigra ia da sucessão sedimentar mesozoica da Bacia do Paraná no Rio Grande do Sul 293
Contribuições à Geologia do Rio Grande do Sul e de Santa Catarina
tuı́dos por depó sitos pelı́ticos de planı́cie de Santa Maria, e em 225 Ma (Noriano) para a
inundaçã o ou loess, que podem conter raros Formaçã o Caturrita (Phillip et al., 2018;
e isolados corpos arenosos de canais luviais Langer et al., 2018).
de baixa a alta sinuosidade, alé m de sistemas
lacustres efê meros (Horn et al., 2018b). A 3.2.4 Estratigra ia de sequências e cor‑
Formaçã o Caturrita corresponde a corpos relações regionais
arenosos amalgamados e dominantemente
maciços, interpretados como canais luviais As formaçõ es Santa Maria e Caturri‑
efê meros dominados por luxos hipercon‑ ta tê m sua á rea de ocorrê ncia limitada ao
centrados (Horn et al., 2018a). O Arenito Ma‑ estado do Rio Grande do Sul. Estas unidades
ta, correspondente ao topo da Formaçã o foram acumuladas em calhas rifte com ori‑
Caturrita, é caracterizado por corpos areno‑ entaçã o ESE‑WNW, desenvolvidas por esfor‑
sos amalgamados de canais luviais entrela‑ ços extensionais ocorridos no Gonduana
çados (Faccini, 1989, 2000). As durante o Triá ssico Mé dio‑Tardio (Zerfass et
paleocorrentes dos depó sitos luviais das al., 2003), sendo a sua á rea de ocorrê ncia
formaçõ es Santa Maria e Caturrita sã o para restrita, re lexo da pró pria geometria depo‑
norte‑nordeste, tendo como á rea‑fonte o Es‑ sional da bacia (Zerfass et al., 2003, 2004). O
cudo Sul‑Rio‑Grandense. Os sedimentos eó li‑ Triá ssico Mé dio e Tardio foi caracterizado
cos (loess) possuem fontes externas ao por esforços extensionais no Gonduana, que
Escudo, possuindo zircõ es com idades nã o geraram sistemas de riftes, tanto na regiã o
compatı́veis com as das rochas adjacentes atrá s do arco (e.g. Cuyo e Ishgualasto),
(Horn et al., 2018b). quanto nas porçõ es internas do superconti‑
nente (e.g. Waterberg, Zambezi e Ruhuhu)
3.2.3 Fósseis e idade (Zerfass et al., 2004).
As formaçõ es Santa Maria e Caturri‑
As formaçõ es Santa Maria e Caturrita ta correspondem a quatro sequê ncias depo‑
possuem uma paleofauna e uma paleo lora sicionais distintas, de inidas por suas
bastante diversas, sendo uma das referê ncias caracterı́sticas facioló gicas e paleofaunı́sti‑
mundiais em fó sseis do Triá ssico. A Forma‑ cas, que se justapõ em lateral e verticalmen‑
çã o Santa Maria conté m fó sseis de cinodon‑ te, resultando em um arcabouço
tes, dicinodontes, arcossauros, rincossauros estratigrá ico complexo e de difı́cil correla‑
e dinossauros (Schultz et al., 2020). Na For‑ çã o (Fig. 2). As sequê ncias sã o designadas,
maçã o Caturrita, ocorrem dinossauros, tem‑ da base para o topo, como: Pinheiros‑Chi‑
nospondyli, dicinodontes, procolofonı́deos, niquá , Santa Cruz, Candelá ria e Mata (Horn
rincocefá lios e cinodontes (Soares et al., et al., 2014; Schultz et al., 2020). As sequê n‑
2011; Schultz et al., 2020). Durante muitos cias Pinheiros‑Chiniquá e Santa Cruz, cor‑
anos, a dataçã o foi baseada em bioestratigra‑ respondentes à metade inferior da
ia, por correlaçõ es regionais com faunas Formaçã o Santa Maria, sã o compostas, na
pró ximas, como Africa do Sul e Argentina, base, por corpos arenosos amalgamados de
que indicam idades Anisiana‑Carniana para a canais luviais efê meros de baixa sinuosida‑
Formaçã o Santa Maria, e Noriana para a For‑ de, que sã o sucedidos por pelitos de planı́cie
maçã o Caturrita (Barberena, 1977; Soares et loessica retrabalhada. A Sequê ncia Candelá ‑
al., 2011). Recentemente, as unidades foram ria é caracterizada, na base, por corpos are‑
datadas por U‑Pb em zircõ es detrı́ticos, em nosos amalgamados de luviais efê meros de
233‑236 Ma (Carniano) para a Formaçã o baixa sinuosidade, que sã o sucedidos por
depó sitos inos de planı́cies distais de leques Sanga do Cabral e, no topo, por uma para‑
terminais e de lagos associados, equivalendo conformidade com a Formaçã o Botucatu. A
à metade superior da Formaçã o Santa Maria. Formaçã o Guará apresenta uma variaçã o la‑
Em direçã o ao topo dessa sequê ncia, os cor‑ teral de associaçõ es de fá cies (Fig. 3) (Sche‑
pos arenosos de canais luviais efê meros vol‑ rer & Lavina, 2006). Na porçã o norte
tam a se amalgamar, equivalendo à base da (Jaguari e Sã o Francisco de Assis), ocorrem
Formaçã o Caturrita. A Sequê ncia Mata é arenitos mé dios a grossos, moderadamente
composta somente por corpos arenosos selecionados, depositados por sistemas lu‑
amalgamados de canais luviais entrelaçados, viais entrelaçados, que variam, segundo a
correspondendo ao topo da Formaçã o Catur‑ variabilidade de descarga, entre perenes
rita (Andreis et al., 1980) ou ao Arenito Mata (baixa variabilidade) e efê meros (mé dia a
(Faccini et al., 1989). alta variabilidade). Os luviais perenes sã o
caracterizados por corpos arenosos de 2 a 5
metros de espessuras, compostos por barras
3.3 Formação Guará
de acreçã o frontal simples ou compostas,
3.3.1 Designação litoestratigrá ica por hollows e por sets sobrepostos de dunas
aquosas cavalgantes (Reis, 2016). Os luviais
A Formaçã o Guará corresponde a um efê meros sã o compostos por lençó is de areia
pacote lú vio‑eó lico a lorante no bloco Oeste, laminados horizontalmente e formas de lei‑
que ocorre entre as formaçõ es Sanga do Ca‑ tos arenosos cavalgantes. Ambos os tipos de
bral e Botucatu (Scherer et al., 2000). Por es‑ luviais apresentam paleocorrentes consis‑
tar posicionada entre estas duas unidades, tentes para SW. Em direçã o a sul (Rosá rio do
alguns autores consideraram o pacote lú vio‑ Sul e Santana do Livramento), ocorrem are‑
eó lico como uma extensã o das formaçõ es nitos inos a mé dios, bem selecionados, vin‑
Santa Maria e Caturrita (e.g. Milani, 2000; culados a canais luviais que se intercalam
Milani et al., 2007). Entretanto, as caracterı́s‑ com depó sitos de dunas e lençó is de areia
ticas facioló gicas e o conteú do fossilı́fero de‑ eó licos, de inindo ciclos de aumento de umi‑
monstram se tratar de uma unidade dade para o topo, com espessuras de 5 a 14
sedimentar distinta (Scherer & Lavina, metros (Scherer & Lavina, 2006). Os depó si‑
2006), merecendo o status de uma formaçã o tos luviais apresentam paleocorrentes para
independente. SSW, similar ao observado na porçã o norte,
enquanto as dunas eó licas possuem um sen‑
3.3.2 Características sedimentológicas e tido preferencial de mergulho dos estratos
estratigrá icas cruzados para NE.
Estratigra ia da sucessão sedimentar mesozoica da Bacia do Paraná no Rio Grande do Sul 295
Contribuições à Geologia do Rio Grande do Sul e de Santa Catarina
sã o da Formaçã o Guará em territó rio uru‑ depó sitos luviais interagem com depó sitos
guaio, registra restos corporais de assem‑ eó licos e inundaçõ es em lençó is terminais
bleias fó sseis terrestres e aquá ticas. A do Membro Batovı́ da Formaçã o Tacuarem‑
paleofauna aquá tica é representada por in‑ bó (Reis, 2020). O padrã o de paleocorrentes
vertebrados, como conchostrá ceos, gastró ‑ para SSW é consistente em toda a á rea de
podes viviparidae e bivalves (representados ocorrê ncia da Formaçã o Guará . Existe uma
pelos gê neros Diplodon e Tacuaremboia), tendê ncia geral de diminuiçã o do tamanho‑
juntamente com actinopterı́gios (Lepidotes), de grã o para SSW, acompanhado o sentido
asiatoceratodontı́deos, mawsoniı́deos e tu‑ da paleocorrente, iniciando com conglome‑
barõ es de á gua doce (Perea et al., 2009). A rados e conglomerados arenosos no Paraná
fauna de tetrá podes é representada por cro‑ e terminando com arenitos inos a muito i‑
dodilos e dinossauros teró podes. Placas de nos no Uruguai (Amarante et al., 2019; Reis,
casco de tartarugas també m sã o reportadas 2020). As paleocorrentes para SSW, associa‑
(Perea et al., 2009). A associaçã o fossilı́fera das à presença de clastos sedimentares, in‑
indica uma idade Jurá ssica Tardia para o dicam que unidades sedimentares mais
Membro Batovı́ e, por extensã o, para a For‑ antigas da Bacia do Paraná serviram como
maçã o Guará (Perea et al., 2009). á rea‑fonte para a Formaçã o Guará , posicio‑
nando o seu depocentro em direçã o à Ar‑
3.3.4 Estratigra ia de sequências e cor‑ gentina. A pequena espessura dessa
relações regionais unidade, associada à dominâ ncia de corpos
arenosos amalgamados, de canais luviais e
A Formaçã o Guará corresponde a de depó sitos eó licos, sugere um contexto de
uma ú nica sequê ncia deposicional, limitada baixa geraçã o de acomodaçã o. A grande ex‑
na base por uma desconformidade (Fig. 2), tensã o areal dessa unidade indica a acumu‑
que marca um rearranjo signi icativo da ba‑ laçã o em ampla siné clise, desenvolvida na
cia de drenagem em relaçã o à s outras periferia do bulge gerado pela pluma man‑
sequê ncias permo‑mesozoicas. A Formaçã o té lica Paraná ‑Etendeka (Reis, 2020).
Guará se estende para alé m do estado do Rio
Grande do Sul, de inindo uma ampla bacia 3.4 Arenito Pedreira
sedimentar, registro de um grande sistema
3.4.1 Designação litoestratigrá ica
luvial distributivo, que apresenta uma ex‑
tensã o mı́nima de 800 km no sentido geral O Arenito Pedreira foi proposto in‑
do paleo luxo (norte‑sul) (Fig. 3). A porçã o formalmente por Nowatzki & Kern (2000).
proximal do sistema se encontra no estado Essa unidade ocorre somente no bloco Leste
do Paraná (Reis et al., 2019), sendo repre‑ (Fig. 1), principalmente em subsuperfı́cie,
sentada por canais luviais entrelaçados pe‑ correspondendo a conglomerados e areni‑
renes amalgamados, que transicionam para tos lú vio‑eó licos posicionados entre as for‑
uma zona intermediá ria (oeste do Rio Gran‑ maçõ es Rio do Rasto e Botucatu (Scherer,
de do Sul) onde luviais perenes e efê meros 2015; Freire, 2018). A presença de depó si‑
se alternam. A porçã o distal do sistema se di‑ tos lú vio‑eó licos e o posicionamento estra‑
vide em duas subzonas: entre o sudoeste do tigrá ico levou alguns autores a
Rio Grande do Sul e o noroeste do Uruguai, considerarem esse intervalo como perten‑
os canais luviais se interdigitam com cam‑ cente à Formaçã o Pirambó ia (Lavina &
pos de dunas eó licas; e, mais ao sul, no de‑ Scherer, 2002; Dias & Scherer, 2007; Soares
partamento de Tacuarembó (UY), os et al., 2008). Entretanto, conforme demons‑
296 Edição da Sociedade Brasileira de Geologia – Núcleo RS/SC
Scherer et al.
trado por Nowatzki & Kern (2000), as carac‑ Freire, 2018). Essa unidade é caracterizada
terı́sticas petrográ icas, facioló gicas e de pa‑ por um predomı́nio de arenitos conglomerá ‑
leocorrentes diferenciam o Arenito Pedreira ticos e conglomerados na base, associados a
de outras unidades permo‑mesozoicas da barras arenosas ou areno‑cascalhosas de sis‑
Bacia do Paraná , merecendo, assim, o status temas luviais, que se alternam e sã o sucedi‑
de uma unidade estratigrá ica independente. dos por arenitos inos a mé dios, com estratos
cruzados de dunas eó licas ou estratos hori‑
3.4.2 Características sedimentológicas e zontais de lençó is de areia e interdunas eó li‑
estratigrá icas cas, indicando condiçõ es gerais progressi‑
vamente mais secas.
O Arenito Pedreira possui uma es‑
pessura entre 100 e 120 metros, apresentan‑ 3.4.3 Fósseis e idade
do um contato basal em desconformidade
com os depó sitos inos da Formaçã o Rio do O Arenito Pedreira possui somente
Rasto e um contato em desconformidade ou registros esparsos de icnofó sseis que nã o
em discordâ ncia angular com os arenitos da permitem a de iniçã o da idade deposicional
Formaçã o Botucatu (Nowatzki & Kern, 2000; (Nowatzki & Kern, 2000). O seu posicio‑
Figura 3 ‒ Seçã o de correlaçã o NE‑SW regional da Formaçã o Guará (modi icado de Reis et al., 2019).
Estratigra ia da sucessão sedimentar mesozoica da Bacia do Paraná no Rio Grande do Sul 297
Contribuições à Geologia do Rio Grande do Sul e de Santa Catarina
namento estratigrá ico entre as formaçõ es que se de ina uma cronocorrelaçã o entre
Rio do Rasto e Botucatu indica uma idade in‑ elas. Possivelmente, a Sequê ncia Pedreira é
de inida entre o Neopermiano e o Neojurá s‑ mais jovem, visto que o desenvolvimento da
sico. Entretanto, a correlaçã o dessa unidade calha da Sinclinal de Torres é cronocorrelata
com o Krone Member e a Mixed Unit, da Ba‑ a outras estruturas rifte, de similar orienta‑
cia de Huab, na Namı́bia (vide discussã o a çã o (e.g. bacias de Salado e Colorado), de‑
seguir), permite posicioná ‑la no Jurá ssico senvolvidas no inal do Jurá ssico.
(Wanke et al., 2000).
3.5 Formação Botucatu
3.4.4 Estratigra ia de sequências e cor‑
relações regionais 3.5.1 Designação litostratigrá ica
Figura 4 ‒ Seçã o de correlaçã o entre o Bloco Leste da Bacia do Paraná no Rio Grande do Sul e a Bacia de Huab
(Namı́bia), mostrando a equivalê ncia facioló gica entre o Arenito Pedreira, o Krone Member e a Mixed Unit.
neares complexos, sendo esse ú ltimo tipo mente, por pegadas de dinossauros teró po‑
morfoló gico restrito à porçã o leste da faixa des e ornitó podes, alé m de mamı́feros, sendo
a lorante da Formaçã o Botucatu no Rio os ú ltimos representados principalmente pe‑
Grande do Sul (Scherer, 2002). O sentido la pela icnoespé cie Brasilichnium (Leonardi
preferencial de mergulho dos estratos cruza‑ et al., 2007; Francischini et al., 2015).
dos é para NE. A determinaçã o da idade de acumu‑
laçã o dos arenitos eó licos da Formaçã o Botu‑
3.5.3 Fósseis e idade catu é bastante difı́cil, uma vez que as
dataçõ es desta unidade sã o relativas, basea‑
No Rio Grande do Sul, existem rela‑ das fundamentalmente nas determinaçõ es
tos esparsos de pegadas de tetrá podes fó s‑ radiomé tricas dos derrames vulcâ nicos do
seis nos estratos cruzados de dunas eó licas Grupo Serra Geral. Dataçõ es Ar4o/ Ar39 apon‑
da Formaçã o Botucatu. As principais ocor‑ tam uma idade em torno de 134 Ma (Cretá ‑
rê ncias de registro icnoló gico se encontram ceo Inferior, Valanginiano) para as rochas
no estado de Sã o Paulo. A icnofauna da For‑ vulcâ nicas do Grupo Serra Geral no estado
maçã o Botucatu é constituı́da, dominante‑ do Rio Grande do Sul (Thiede & Vasconcellos,
Estratigra ia da sucessão sedimentar mesozoica da Bacia do Paraná no Rio Grande do Sul 299
Contribuições à Geologia do Rio Grande do Sul e de Santa Catarina
2010), oferecendo um referencial geocrono‑ rê ncia da Formaçã o Botucatu. A porçã o nor‑
ló gico seguro para o té rmino da sedimenta‑ te da bacia é caracterizada por paleoventos
çã o da Formaçã o Botucatu. Entretanto, a soprando de norte, enquanto a porçã o sul é
idade do inı́cio da sedimentaçã o é ainda bas‑ in luenciada por paleoventos oriundos de
tante imprecisa. Tendo como base os icnofó s‑ sudoeste, existindo uma con luê ncia de ven‑
seis de vertebrados identi icados nos tos na regiã o hoje ocupada pelo estado do
estratos eó licos, Bonaparte (1996) atribui Paraná (Scherer & Goldberg, 2007).
uma idade Neojurá ssica‑Eocretá cea para a A Formaçã o Botucatu é constituı́da
Formaçã o Botucatu, hipó tese admitida por essencialmente pela acumulaçã o de um sis‑
Milani (2007) para a elaboraçã o do arcabou‑ tema eó lico seco em uma ampla bacia topo‑
ço estratigrá ico do Mesozoico da Bacia do grá ica, integralmente preservado por
Paraná . No entanto, conforme discutido por derrames vulcâ nicos penecontemporâ neos
Scherer (2002), a ı́ntima relaçã o dos arenitos do Grupo Serra Geral (Scherer, 2002), asso‑
com as lavas, a pequena espessura e a inexis‑ ciados à ruptura do Gonduana. Sendo assim,
tê ncia de supersuperfı́cies (representando uma fraçã o signi icativa da acumulaçã o eó li‑
hiatos signi icativos) dentro do pacote eó lico, ca da Formaçã o Botucatu nã o seria incorpo‑
sugerem que na porçã o meridional da bacia rada ao registro geoló gico se um
do Paraná , a Formaçã o Botucatu compreende vulcanismo estocá stico e catastró ico nã o ti‑
um intervalo de tempo mais reduzido, tendo vesse ocorrido na porçã o sul do Gonduana,
a acumulaçã o eó lica ocorrido no má ximo al‑ no inı́cio do Cretá ceo. Devido ao recobri‑
gumas centenas de milhares de anos antes mento das dunas eó licas, pelos derrames
do vulcanismo Serra Geral. vulcâ nicos, e à posterior subsidê ncia lexu‑
ral decorrente do peso da pilha vulcâ nica,
3.5.4 Estratigra ia de sequências e corre‑ toda a acumulaçã o foi incorporada ao regis‑
lações regionais tro geoló gico, inclusive o intervalo que esta‑
va, inicialmente, situado acima do espaço de
A Formaçã o Botucatu corresponde, preservaçã o.
juntamente com o Grupo Serra Geral, a uma
ú nica sequê ncia deposicional, limitada, na 4 CONSIDERAÇÕES FINAIS
base, por uma paraconformidade ou discor‑
dâ ncia angular, ao longo da sua á rea de ocor‑ O intervalo estratigrá ico sedimen‑
rê ncia (Fig. 2). Essa unidade se extende por tar do Mezosoico do Rio Grande do Sul pode
uma á rea de mais de 1,5 milhã o de km2, a lo‑ ser subdividido em diferentes unidades es‑
rando ao longo de toda a borda da Bacia do tratigrá icas, sendo assim designadas: For‑
Paraná , incluindo á reas no Brasil, Uruguai, maçã o Sanga do Cabral, Formaçã o Santa
Argentina e Paraguai, alé m de apresentar de‑ Maria, Formaçã o Caturrita, Formaçã o Guará ,
pó sitos correlatos no continente africano Arenito Pedreira e Formaçã o Botucatu. A
(e.g. Formaçã o Twyfenfontein) (Stanistreet e porçã o a lorante dessas unidades ocorrem
Stollhofen, 1999). Apresenta uma uniformi‑ em trê s blocos estruturais distintos (Oeste,
dade facioló gica, ao longo da sua á rea de Central e Leste), limitados por falhas regio‑
ocorrê ncia, composta essencialmente por es‑ nais herdadas do embasamento. Cada bloco
tratos cruzados de dunas eó licas (Scherer & tectô nico apresenta uma sucessã o estrati‑
Goldberg, 2007). As paleocorrentes das du‑ grá ica especı́ ica, marcada pela ausê ncia de
nas eó licas indicam uma variaçã o no sentido uma ou mais unidades estratigrá icas. A su‑
dos paleoventos, ao longo da á rea de ocor‑ cessã o sedimentar mesozoica pode ser sub‑
Estratigra ia da sucessão sedimentar mesozoica da Bacia do Paraná no Rio Grande do Sul 301
Contribuições à Geologia do Rio Grande do Sul e de Santa Catarina
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Volcanology and Geothermal Research, 355: Paraná : o contato entre duas seqü ê ncias e
98‑114. implicaçõ es na con iguraçã o espacial do
Estratigra ia da sucessão sedimentar mesozoica da Bacia do Paraná no Rio Grande do Sul 303
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1
Instituto de Geociê ncias, Universidade Federal do Rio Grande do Sul
2
Instituto de Geociê ncias, Universidade de Brası́lia
3
Programa de Pó s‑graduaçã o em Geociê ncias, Universidade Federal do Rio Grande do Sul
1 INTRODUÇÃO
As evidê ncias da existê ncia de meteoros e de outros corpos celestes sã o muito antigas e
estã o registradas nas mitologias das antigas civilizaçõ es. Em tempos modernos, observamos o
impacto de corpos celestes na superfı́cie da Lua e em outros planetas, como Marte, Mercú rio e
Jú piter, por exemplo. També m sã o frequentes as imagens da passagem e os fragmentos fı́sicos
de meteoritos, que caı́ram na superfı́cie da Terra, os quais estã o conservados em museus, em
universidades e em centros de pesquisa. O impacto de meteoritos transfere elevadas taxas de
pressã o para uma á rea muito restrita, que absorve o impacto, atravé s da propagaçã o de ondas
de choque entre as rochas. O impacto resulta em uma estrutura deprimida, de forma circular e/
ou elı́ptica, que, por vezes, apresenta soerguimento central. Essa estrutura é acompanhada pela
formaçã o de rochas metamó r icas caracterı́sticas, como brechas de impacto e de fusã o, alé m de
estruturas, como cones de estilhaçamento (shatter cones), e de feiçõ es microscó picas, de defor‑
maçã o planar, que marcam a ruptura da estrutura cristalina dos minerais das rochas impacta‑
das, como Planar Fractures (PF), Planar Deformational Features (PDF) e Feather Features (FF).
Estas feiçõ es sã o diagnó sticas do metamor ismo de impacto (schock metamorphism) (French,
1998; French & Koeberl, 2010; Poelchau & Kenkmann, 2011).
Na superfı́cie da Terra, a preservaçã o das crateras de impacto é limitada, em funçã o da
dinâ mica interna do planeta e do desgaste dos processos intempé ricos na superfı́cie. As estru‑
turas de impacto mais preservadas foram geradas durante o Fanerozoico (<540 Ma), e constitu‑
em a sua maioria. Entretanto, em ambientes desé rticos e em á reas de grande estabilidade
tectô nica, como nos crá tons, estã o preservadas crateras de idades Pré ‑Cambrianas, como Vre‑
defort (Africa do Sul, 160 km, 2.02 Ga), Shoemaker (Austrá lia, 30 km, 1.63 Ga) e Sudbury (Cana‑
Contribuições à Geologia do Rio Grande do Sul e de Santa Catarina
dá , 130 km, 1.85 Ga); esta ú ltima, associada a elı́ptica, observada em antigas imagens de
um complexo ı́gneo estratiforme, cuja origem radar, em fotogra ias aé reas e em mapas to‑
dos magmas é atribuı́da ao choque do im‑ pográ icos. A partir do ano 2000, os dados
pacto (e.g. Baratoux & Reimold, 2016; Sch‑ coletados pela Missã o Topográ ica de Radar
mieder & Kring, 2020). Embarcado (Shuttle Radar Topography Missi‑
A cratera Chicxulub, com cerca de on (SRTM)), permitiram a obtençã o de mo‑
180 km de diâ metro, situada na Penı́nsula do delos digitais de alta resoluçã o de terrenos.
Iucatã , no sudeste do Mé xico, é uma das mai‑ As imagens de diversos saté lites (LANDSAT,
ores estruturas de impacto soterradas da ASTER) e as imagens do Google permitiram
Terra. Ocorrido no limite entre o Cretá ceo e o o rá pido acesso à s formas da superfı́cie da
Paleó geno (66 milhõ es anos atrá s), este im‑ Terra. Entretanto, uma feiçã o circular em
pacto é interpretado como um dos principais uma imagem pode representar outros fenô ‑
fatores envolvidos em um processo de extin‑ menos geoló gicos, como caldeiras vulcâ ni‑
çã o em massa da fauna e da lora, que incluiu cas, diques anelares e radiais, complexos
os dinossauros (Schulte et al., 2010). Anteri‑ alcalinos e/ou feiçõ es de erosã o diferencial
ormente, visto como um fenô meno restrito e em rochas sedimentares e vulcâ nicas. Desta
pouco identi icado, o reconhecimento do im‑ forma, os dados de campo sã o fundamentais,
pacto de meteoritos aumentou com o acesso para uma avaliaçã o de initiva (French, 1998;
a imagens de saté lite. Os olhares do mundo French & Koeberl, 2010). O impacto de me‑
observaram o cruzamento de cometas e de teoritos ocasiona a formaçã o de brechas de
nuvens de meteoros (Ex. Lirı́adas, Eta‑Aqua‑ impacto, de fusã o e de injeçã o nas porçõ es
ridas, Geminı́deos, entre outras), e a coleta mais super iciais e, em zonas mais profun‑
de amostras de meteoritos resultou em um das, as rochas impactadas mostram estrutu‑
grande banco de dados mineraló gico, ge‑ ras do tipo cones de estilhaçamento e
oquı́mico, geocronoló gico e isotó pico (Nor‑ microestruturas de deformaçã o planar, prin‑
ton & Chitwood, 2008). A promoçã o de cipalmente, em tectossilicatos. As brechas
simpó sios, de congressos e de outras ativida‑ tê m estrutura maciça e se caracterizam por
des, relacionadas à geologia de impacto, pro‑ clastos (fragmentos) angulosos das rochas
porcionou o envolvimento de pesquisadores impactadas e por porçõ es irregulares de vi‑
de outras linhas tradicionais (Geologia Es‑ dro vulcâ nico, envoltas por uma matriz ina,
trutural, Mineralogia, Petrologia, Geofı́sica), contendo fragmentos de minerais. Nas ro‑
que, de modo inesperado, tiveram que en‑ chas impactadas, os cones de estilhaçamento
frentar os efeitos do metamor ismo de im‑ se caracterizam por feiçõ es de forma cô nica
pacto no curso de suas investigaçõ es. As ou de leque, com dimensõ es entre 10 cm e
demandas geoló gicas mais recentes tê m 35 cm, constituı́das por um conjunto de fra‑
identi icado novos desa ios, como caracteri‑ turas curvas, que formam estrias divergen‑
zar e determinar os efeitos de impactos pre‑ tes, que se irradiam a partir de um de um
servados na superfı́cie da Terra, bem como ponto apical (Sagy et al., 2004; French & Ko‑
aplicar estes conhecimentos em problemas eberl, 2010; Baratoux & Reimold, 2016). Ao
geoló gicos signi icantes, como a prospecçã o microscó pio, as rochas impactadas conser‑
de minerais metá licos e de á gua subterrâ nea, vam suas estruturas e minerais originais e
no turismo cientı́ ico e nas atividades de pre‑ registram o choque, formando microestrutu‑
servaçã o do patrimô nio. ras denominadas feiçõ es de deformaçã o pla‑
A feiçã o mais caracterı́stica das cra‑ nar (PF, PDF e FF), que afetam a rede
teras de impacto é a sua forma circular ou cristalina do quartzo e dos feldspatos. Estas
As Crateras de Impacto Cerro do Jarau (RS) e Domo do Vargeão (SC), Brasil 307
Contribuições à Geologia do Rio Grande do Sul e de Santa Catarina
po ı́gneo subvulcâ nico ou relacionada à evo‑ tos de modo centrı́peto, na porçã o central, e
luçã o de estruturas tectô nicas regionais. A centrı́fugo, na porçã o externa da estrutura
interpretaçã o como uma cratera de impacto (Fig. 2D). Os limites externos sã o de inidos
foi suportada pelo reconhecimento de fei‑ pelos arroios Garupá e Quaraı́‑Mirim, ao
çõ es de deformaçã o planares (PF e PDF) em norte e ao sul, e pelo rio Quaraı́, a oeste. O
grã os de quartzo e de feldspato (Hachiro et nú cleo central foi soerguido e está composto
al., 1995) e, mais tarde, por brechas de im‑ por duas estruturas circulares, situadas lado
pacto, acompanhadas por estruturas do tipo a lado, com cerca de 4 quilô metros e de 7
shatter cones em arenitos e em basaltos im‑ quilô metros de diâ metro (Fig. 2F). A porçã o
pactados (Philipp et al., 2010; Cró sta et al., externa do nú cleo principal constitui, em
2010a). Levantamentos de gravimetria na mapa, um cı́rculo quase completo, e caracte‑
estrutura constataram uma anomalia nega‑ riza, em campo, um relevo positivo, compos‑
tiva no nú cleo central, com um pequeno nú ‑ to por cristas arqueadas de arenitos eó licos
cleo positivo, relacionado a fontes da Fm. Botucatu (Fig. 2C). A porçã o interna é
magmá ticas de subsuperfı́cie, envolto por plana e rebaixada e expõ e os arenitos arco‑
anomalias positivas, que correspondem à s seanos alterados da Fm. Guará . A estrutura
cristas de arenitos eó licos, que marcam o li‑ menor, localizada a oeste, constitui uma co‑
mite externo do nú cleo soerguido (Calbo, xilha pouco elevada, composta por arenitos
2006). A aná lise estratigrá ica detalhada e da Fm. Botucatu. Ambas as estruturas cen‑
os dados termocronoló gicos de traços de trais estã o envoltas por uma á rea de relevo
issã o da apatita demonstraram que a estru‑ plano, constituı́da por derrames basá lticos
tura experimentou dois perı́odos principais da Fm. Torres. O contato entre as unidades
de erosã o, apó s o evento de impacto, entre sedimentares está marcado por uma discor‑
100‑80 Ma e 65‑22 Ma (Oliveira et al., 2016; dâ ncia angular preservada no setor sudoes‑
Machado et al., 2019). No entanto, enquanto te da estrutura. Em quase toda a extensã o do
a erosã o foi su iciente para remover os de‑ nú cleo, os contatos sã o por falha, com expo‑
pó sitos (brechas), relacionados ao impacto, siçõ es alinhadas de lajeados rochosos, com
o piso da estrutura permaneceu bem pre‑ intenso fraturamento (Fig. 3A). Os cortes de
servado e exposto, com geometria concê n‑ estrada e os lajeados situados na porçã o les‑
trica e fraturamento radial, tı́picos de uma te da estrutura, expõ em a mistura entre la‑
grande cratera de impacto (Cró sta et al., vas e areias eó licas, na forma de peperitos
2010a; Philipp et al., 2010). A evoluçã o do (Fig. 3D). A estreita coroa de “brechas vulcâ ‑
conhecimento, as principais propostas es‑ nicas” (Sá nchez et al., 2014), que envolve o
tratigrá icas e a caracterizaçã o das feiçõ es nú cleo soerguido, preserva o registro da su‑
diagnó sticas podem ser encontradas em perfı́cie de interaçã o entre as lavas e a areia
Philipp et al. (2010), em Cró sta et al. (Fig. 2C).
(2010a) e em Sá nchez et al. (2014). Observaçõ es estruturais e de senso‑
riamento remoto mostram que as feiçõ es
2. 1. 1 Aspectos morfológicos e estrutu‑ concê ntricas estã o distribuı́das em trê s á re‑
rais as, situadas a 4‑5 km, a 6‑8 km e a 10‑12 km
do centro da estrutura (Fig. 2F). As feiçõ es
A estrutura do Cerro do Jarau tem principais, situadas no nú cleo, de inem o
forma elı́ptica, ressaltada, nas imagens de contato entre as rochas sedimentares e as
saté lite, por uma rede de drenagens, com vulcâ nicas. A principal caracterı́stica sã o as
padrõ es radial e anelar complexos, dispos‑ cristas de arenitos eó licos, que delimitam e
Figura 1 ‒ A) Localizaçã o da Bacia do Paraná , na Amé rica do Sul, e mapa geoló gico, destacando as
supersequê ncias deposicionais, as principais estruturas tectô nicas e a localizaçã o das crateras de impacto da
regiã o sul do Brasil; B) Mapa geoló gico da regiã o oeste do RS; C) Foto do Meteorito Putinga; D) Fotomicrogra ia,
em nicó is descruzados, de uma seçã o delgada do meteorito, destacando os principais minerais e cô ndrules
(Cdr); E) Mesma imagem anterior, em nicó is cruzados; F) Detalhe da imagem anterior. Legenda: Hy ‑
Hiperstê nio, M ‑ Maskelenita, NF ‑ ó xidos de ferro e nı́quel e Ol ‑ Olivina; G) Diagrama de classi icaçã o dos
arenitos das formaçõ es Guará e Botucatu; e H) Diagrama de proveniê ncia dos arenitos (OS = composiçã o dos
arenitos da Fm. Guará da regiã o de Osó rio, RS).
As Crateras de Impacto Cerro do Jarau (RS) e Domo do Vargeão (SC), Brasil 309
Contribuições à Geologia do Rio Grande do Sul e de Santa Catarina
Figura 2 ‒ A) Vista geral do Cerro do Jarau, constituı́da por uma crista arqueada de arenitos eó licos da Fm.
Botucatu, que caracterizam o limite externo do nú cleo principal da estrutura (vista para leste, seta A, Fig.2D);
B) Mesma feiçã o anterior, vista a partir do extremo oeste (seta B, Fig.2D); C) Mapa geoló gico do Cerro do Jarau,
destacando a forma elı́ptica da estrutura de impacto (linha preta tracejada) e os dois nú cleos internos (linha
vermelha tracejada) (seçõ es geoló gicas AB e CD, indicadas no mapa); D) Imagem de saté lite do Google na
mesma escala do mapa anterior, destacando o aspecto radial e anelar dos sistemas de drenagens; E) Vista do
Cerro do Jarau, a partir do centro da estrutura; e F) Interpretaçã o da imagem de saté lite da Fig.2D, destacando
os principais lineamentos tectô nicos e as estruturas anelares geradas pelo impacto do meteorito.
As Crateras de Impacto Cerro do Jarau (RS) e Domo do Vargeão (SC), Brasil 311
Contribuições à Geologia do Rio Grande do Sul e de Santa Catarina
Figura 3 ‒ A) Crista arqueada, expondo os arenitos da Fm. Botucatu na porçã o NW do nú cleo; B)
Fotomicrogra ia do quartzo arenito da Fig.3A; C) Basalto da Fm. Torres, com estrutura de luxo suborizontal; D)
Peperito, constituı́do por fragmentos subarredondados de basaltos vesiculares/amigdaloidais, envoltos por
matriz constituı́da por grã os de quartzo (areia ina a mé dia); E) Brecha de impacto monomı́tica em forma de
dique, constituı́da por fragmentos angulosos de arenitos arcoseanos, envoltos por material afanı́tico, de cor
vermelha (vidro alterado) (Fm. Guará , na porçã o centro‑leste do nú cleo); F) Fotomicrogra ia, em nicó is
descruzados, da brecha anterior, mostrando a porçã o vı́trea alterada em tom escuro, grã os de quartzo (areia
ina‑mé dia) e uma matriz ina; G) Detalhe da imagem anterior, ressaltando as porçõ es vı́treas, com formas
ameboides; H) Brecha de impacto monomı́tica, com fragmentos de basalto por irı́tico de cor cinza, envoltos
por matriz avermelhada, constituı́da por fragmentos milimé tricos de basalto, cobertos por vidro vulcâ nico
alterado; I) Cones de estilhaçamento, em arenito eó lico, da Fm. Botucatu, na porçã o norte do nú cleo principal;
J) Mesma feiçã o, em arenitos eó licos da porçã o leste do nú cleo; K) Fotomicrogra ia de arenito da Fm. Guará ,
destacando grã o de quartzo (areia mé dia ‒ ~ 0.4 mm), com microestruturas do tipo PDF, desenvolvidas em
trê s orientaçõ es cristalográ icas (setas brancas) e com estruturas do tipo PF (seta vermelha); e L)
Fotomicrogra ia de quartzo arenito da Fm. Botucatu, destacando grã o de quartzo tamanho areia grossa (1.2
mm), com microestruturas do tipo PDF, desenvolvidas em duas orientaçõ es cristalográ icas (setas amarelas e
pretas), em parte, acompanhadas por estruturas do tipo FF (seta branca).
sos campos de matacõ es e como blocos inten‑ nou os sistemas luviais, que depositaram
samente afetados por sistemas de fraturas. As parte das unidades dos grupos Rosá rio do
fraturas de cisalhamento e de extensã o obser‑ Sul e Sã o Bento (Philipp et al., 2018). Estas
vadas estã o associadas com a formaçã o de estruturas també m atuaram na ascensã o e
bandas de deformaçã o cataclá stica, indicando no extravasamento das lavas do Grupo Serra
que a deformaçã o rú ptil gerada pelo impacto Geral. Os arenitos da Formaçã o Botucatu
foi absorvida pela movimentaçã o relativa das ocorrem ao longo de duas trilhas alinhadas
falhas radiais e anelares e pela quebra tectô ‑ segundo a direçã o N45oW (Uruguaiana‑Qua‑
nica dos grã os, durante o luxo cataclá stico lo‑ raı́ e Itaqui‑Alegrete) (Fig. 1B). Na fronteira
calizado. A formaçã o comum de bandas de com o Uruguai, estã o expostos em quatro ja‑
deformaçã o cataclá stica nos arenitos eó licos é nelas estruturais descontı́nuas, sugerindo
o principal elemento de deformaçã o observa‑ um controle tectô nico, embora exista a pos‑
do nas zonas afetadas pelas falhas. As bandas sibilidade de o vulcanismo nã o ter encoberto
de deformaçã o dissipam a energia mecâ nica, totalmente as dunas do deserto Botucatu. Na
associada à cinemá tica das falhas, formando regiã o do Cerro do Jarau, as dunas do deser‑
inas faixas cataclá sticas, de espessuras entre to Botucatu interagiram com os derrames
1 mm e 5 mm, constituı́das por uma matriz i‑ basá lticos e, depois, foram soterradas pelas
na, que envolve os grã os de areia. Estas estru‑ lavas bá sicas da Fm. Torres (Scherer & Lavi‑
turas diminuem a porosidade dos arenitos e na, 2006).
causam o aumento da coesã o da rocha, asso‑ As falhas de direçã o NE‑SW estive‑
ciada à cimentaçã o e à dissoluçã o do quartzo. ram relacionadas à ruptura do Gondwana e à
abertura do Oceano Atlâ ntico, bem como aos
2. 1. 2 Estruturas tectônicas e de impacto está gios pré ‑rifte e sin‑rifte da Bacia de Pelo‑
tas (Stica et al., 2013). Os movimentos de ex‑
A geologia da porçã o oeste do RS ex‑ pansã o do assoalho oceâ nico resultaram em
põ e os derrames basá lticos do Grupo Serra tensõ es compressionais de direçã o NW‑SE,
Geral, com ocorrê ncias localizadas de rochas que reativaram os sistemas de falhas desta
sedimentares do Grupo Sã o Bento. Os areni‑ direçã o e que afetaram os derrames da for‑
tos da Formaçã o Guará de inem a base estra‑ maçã o Torres. O Sistema de Falhas Uruguai‑
tigrá ica do Cerro do Jarau, e caracterizam, ana‑Quaraı́ constitui um conjunto
pela sucessã o de fá cies luviais e eó licas, um descontı́nuo de falhas normais, subparalelas,
ambiente desé rtico, de condiçõ es semiá ridas que controlam o rio Quaraı́ e que cruzam, em
(Scherer & Lavina, 2006). Os arenitos eó licos diagonal, a estrutura do Cerro do Jarau. Es‑
da Fm. Botucatu, que os recobrem, marcam a tas estruturas tectô nicas foram superpostas
evoluçã o para um amplo deserto, de condi‑ pelas estruturas geradas com a formaçã o da
çõ es á ridas. A evoluçã o inal da BP foi caracte‑ cratera do Cerro do Jarau, conforme pode‑
rizada por processos de deformaçã o rú ptil, mos observar no mapa de lineamentos, ex‑
relacionados à separaçã o continental e à traı́do da imagem de saté lite ASTER, que
abertura do Oceano Atlâ ntico Sul. Na regiã o mostra uma grande intensidade de linea‑
oeste do RS, os principais sistemas de falhas mentos, de extensã o reduzida e de disposi‑
de direçã o NW‑SE, Jaguari‑Mata e Alegrete‑ çõ es concê ntrica e radial, concentrados na
Ibaré , estiveram ativos entre o Triá ssico Mé ‑ á rea da estrutura (Fig. 2F). Na porçã o central
dio e a metade do Cretá ceo e controlaram a do mapa, observa‑se duas falhas de direçã o
estruturaçã o do Arco do Rio Grande, de dire‑ NW‑SE, que se estendem para fora da estru‑
çã o N50‑60oW, cujo soerguimento condicio‑ tura, sugerindo que as mesmas sã o anterio‑
As Crateras de Impacto Cerro do Jarau (RS) e Domo do Vargeão (SC), Brasil 313
Contribuições à Geologia do Rio Grande do Sul e de Santa Catarina
Figura 4 ‒ A) Mapa geoló gico da estrutura de impacto do Domo do Vargeã o (modi icado de Wildner et al.
(2014)); B) Imagem de saté lite do Google, destacando a feiçã o circular da estrutura de impacto do Vargeã o (SC);
C) Imagem de SRTM da estrutura de impacto do Domo do Vargeã o; e D) Interpretaçã o da imagem de saté lite,
destacando as estruturas concê ntricas (em vermelho) e as radiais (em preto).
bora de ocorrê ncia restrita, as brechas de im‑ estã o caracterizadas por basaltos fraturados,
pacto estã o concentradas no nú cleo da crate‑ por vezes, com falhas radiais incipientes (Fig.
ra, onde constituem á reas mé tricas, que 5E). A porçã o central apresenta brechas de
envolvem arenitos e basaltos nã o deforma‑ impacto monomı́ticas e polimı́ticas (Fig. 5F),
dos (Cró sta et al., 2012). As brechas constitu‑ cones de estilhaçamento em arenitos e em
em as cristas concê ntricas, que caracterizam basaltos e feiçõ es do tipo PDFs em grã os de
o nú cleo soerguido. Nesta mesma regiã o, os quartzo (Pittarrello et al., 2015).
cones de estilhaçamento, observados em ba‑
saltos e em arenitos impactados, mostram 3 CONSIDERAÇÕES FINAIS
cones individuais, de dimensõ es entre 10
As crateras de impacto do Cerro do
centı́metros e 35 centı́metros (Fig. 5C). A
Jarau, do Domo de Vargeã o e de Vista Alegre
passagem da onda de choque afetou os areni‑
estã o caracterizadas por feiçõ es circulares,
tos e os basaltos impactados, que mostram
marcadas por sistemas de falhas e de fratu‑
feiçõ es microscó picas de deformaçã o rú ptil,
ras concê ntricas e radiais. A porçã o central
como cataclase e cominuiçã o, e feiçõ es de de‑
soerguida expõ e os arenitos sotopostos das
formaçã o planares (PDFs) em grã os de
formaçõ es Guará e/ou Botucatu, envoltos por
quartzo e em feldspatos (Fig. 5D) (Cró sta et
derrames de basaltos do Grupo Serra Geral
al., 2012). Medidas de direçõ es cristalográ i‑
(formaçõ es Torres e Paranapanema). As por‑
cas de PDFs distintas indicaram que o impac‑
çõ es de nú cleo estã o muito deformadas e
to gerou picos de pressã o superiores a 20
mostram ocorrê ncias restritas de brechas de
GPa (Kazzuo‑Vieira et al., 2004). De modo se‑
impacto, acompanhadas por cones de esti‑
melhante ao das feiçõ es encontradas no Cer‑
lhaçamento em arenitos e em basaltos e tam‑
ro do Jarau, os grã os de quartzo dos arenitos
bé m mostram feiçõ es de deformaçã o planar
mostram a formaçã o de bandas de deforma‑
(PF, PDF e FF) em grã os de quartzo e em
çã o, constituindo faixas de cominuiçã o, que
feldspatos. Este conjunto de feiçõ es caracte‑
afetam os grã os e a matriz dos arenitos. Estas
riza o metamor ismo de impacto que afetou
feiçõ es sã o pó s‑deposicionais e pó s‑diagené ‑
todas estas estruturas. A forma elı́ptica da
ticas (Cró sta et al., 2012).
estrutura do Cerro do Jarau pode sugerir que
o â ngulo de impacto do meteorito, com rela‑
2. 3 Vista Alegre
çã o à superfı́cie do Terreno foi entre 60o e
A estrutura de impacto de Vista Ale‑ 80o, enquanto as formas circulares do Domo
gre, situada na porçã o oeste do Paraná (coor‑ de Vargeã o e de Vista Alegre indicam um alto
denadas 25o57’S/52o41’W), tem estruturas e â ngulo de impacto. No caso de Vista Alegre,
feiçõ es muito semelhantes à s descritas no embora o nú cleo soerguido seja pouco de i‑
Vargeã o e no Cerro do Jarau. Formada, tam‑ nido, o menor grau de erosã o favorece à pre‑
bé m, sobre rochas vulcâ nicas bá sicas, apre‑ servaçã o de uma maior quantidade de
senta diâ metro de 9,5 km e idade má xima de impactitos (i.e. brechas polimı́ticas e mono‑
120 milhõ es de anos (Cró sta et al., 2010b). mı́ticas).
Está caracterizada por uma depressã o circu‑ O conjunto de evidê ncias apresenta‑
lar, com bordas externas ı́ngremes e com um das, até o presente, confere destacada impor‑
relevo interno suave, sem um nú cleo central tâ ncia à s estruturas de impacto do Cerro do
soerguido destacado, mas també m conté m, Jarau, do Domo de Vargeã o e de Vista Alegre,
em seu interior, blocos de arenitos eó licos de como raras ocorrê ncias de crateras de im‑
camadas inferiores. As bordas da estrutura pacto em territó rio brasileiro. Tais estruturas
As Crateras de Impacto Cerro do Jarau (RS) e Domo do Vargeão (SC), Brasil 317
Contribuições à Geologia do Rio Grande do Sul e de Santa Catarina
Figura 5 ‒ A) Brecha de impacto monomı́tica, com fragmentos de arenitos; B) Brecha de impacto polimı́tica,
com clastos de arenitos e de basaltos; C) Cones de estilhaçamento (Shatter Cones), em basalto; D)
Fotomicrogra ia, em nicó is descruzados, da brecha de impacto monomı́tica da Figura 5A, destacando os clastos
de arenitos e de grã os de quartzo, envoltos por uma matriz vı́trea (cor marrom escuro); E) Aspecto do basalto
impactado da estrutura de Vista Alegre (PR), ressaltando faixas de rochas cominuı́das, ao longo das fraturas do
impacto; e F) Brecha de impacto polimı́tica de Vista Alegre.
afetaram as rochas vulcâ nicas do Grupo Ser‑ cilidade de acesso à s á reas dos eventos e
ra Geral, que apresentam idade de ca. 134‑ aos principais a loramentos representati‑
131 Ma e que delimitam a idade mı́nima do vos. Destacam‑se as caracterı́sticas cê nicas
impacto. Igualmente, estas estruturas apre‑ destacadas e a colaboraçã o da populaçã o lo‑
sentam caracterı́sticas favorá veis, enquanto cal, que se mostra atuante na divulgaçã o e
sı́tios geoló gicos, das quais se destacam a fa‑ na preservaçã o destes patrimô nios naturais.
Nesse sentido, sua transformaçã o em sı́tio French, B. M. & Koeberl, C. 2010. The convin‑
geoló gico contribuirá , para ins de estudos cing identi ication of terrestrial meteorite
cientı́ icos e de geoturismo. impact structures: What works, what do‑
esn’t, and why. Earth‑Science Reviews, 98:
123‑170.
AGRADECIMENTOS
Hachiro, J., Coutinho, J. M. V., Frascá , M. H. B.
Os autores agradecem ao CNPq, pelo O. & Menezes C. M. 1993. O estrutura de im‑
apoio à pesquisa, atravé s da bolsa de produ‑ pacto de Vargeã o (SC): Evidê ncias petrográ ‑
tividade e da bolsa de doutorado concedida a icas de um crateramento criptoexplosivo
Matheus P. Brü ckmann, e ao prof. Heinrich T. por petardo extraterrestre. In: SIMPOSIO DE
GEOLOGIA DO SUDESTE, III., 1993, Rio de Ja‑
Frank pelas fotos do Meteorito Putinga.
neiro. Boletim de Resumos. Rio de Janeiro,
SBG, p. 276‑281.
REFERÊNCIAS
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1
Faculdade de Geociê ncias, Universidade Federal do Mato Grosso
2
Serviço Geoló gico do Brasil (CPRM‑Manaus)
3
Instituto de Geociê ncias, Universidade Federal do Rio Grande do Sul
4
Universidade Federal de Santa Catarina
1 INTRODUÇÃO
A Provı́ncia Magmá tica Paraná ‑Etendeka (PMPE) é uma Grande Provı́ncia Ignea (GPI)
do Cretá ceo Inferior, caracterizada pela acumulaçã o de volumes imensos de rochas vulcâ nicas e
intrusivas em á reas continentais do paleocontinente Gondwana (Renne et al., 1992; Peate et al.,
1997). Os produtos desse magmatismo ocupam cerca de 1.700.000 km2 (Frank et al., 2009), dos
quais 90% estã o localizados na Amé rica do Sul, sobre a bacia do Chaco‑Paraná , e sã o agrupados
estratigra icamente no Grupo Serra Geral (GSG). Uma parte pequena da provı́ncia (c. 10%)
ocorre no leste da Africa, na Namı́bia (Grupo Etendeka) (Milner et al., 1994) e em Angola (Com‑
plexo Vulcâ nico Bero) (Marsh et al., 2018) (Fig. 1). O excelente grau de exposiçã o nas regiõ es
desé rticas da Namı́bia permitiu um notá vel detalhamento estratigrá ico (Milner et al., 1994; Jer‑
ram et al., 1999) e demonstrou a grande heterogeneidade dos espessos pacotes de lava da PM‑
PE. Estudos recentes, focados na evoluçã o estratigrá ica do GSG, produziram um arcabouço
atualizado e detalhado das sequê ncias vulcâ nicas no sul do Brasil (Waichel et al., 2012; Rossetti
et al., 2018). No presente trabalho, sã o apresentados e discutidos os avanços obtidos ao longo
das ú ltimas duas dé cadas de estudo sobre a sucessã o vulcanossedimentar da porçã o sul do
GSG.
Contribuições à Geologia do Rio Grande do Sul e de Santa Catarina
Figura 1 – (A) Mapa geoló gico da Provı́ncia Magmá tica Paraná ‑Etendeka; (B) Grupo Serra Geral na regiã o sul
do Brasil (modi icado de Rossetti et al., 2018); (C) Distribuiçã o estratigrá ica das formaçõ es na escarpa sul da
Serra Geral (modi icado de Rossetti et al., 2018).
gra ia regional (Fig.1A). A porçã o sul da pro‑ de & Vasconcelos, 2010; Baksi, 2018). A ativi‑
vı́ncia, dominada por rochas com baixo‑Ti dade vulcâ nica começou na porçã o sul da
(Ti/Y), é caracterizada por basaltos do tipo provı́ncia, em que as idades das rochas basá l‑
Gramado, sucedidos na estratigra ia por ro‑ ticas se agrupam entre 134,8 Ma e 134,1 Ma
chas á cidas do tipo Palmas e por basaltos do (4oAr/39Ar step‑heating) (Renne et al., 1992;
tipo Esmeralda. Basaltos de alto‑Ti (Urubici) Thiede & Vasconcelos, 2010), e a idade do
ocorrem intercalados com o tipo Gramado vulcanismo á cido é de 133,6 Ma (Rocha et al.,
ao longo da escarpa sudeste, principalmente, 2020). O vulcanismo migrou para norte, onde
em SC (Peate et al., 1999). Ao norte, uma as lavas basá lticas e os corpos intrusivos as‑
provı́ncia vulcâ nica de alto‑Ti/Y (> 300) é sociados possuem idades um pouco mais jo‑
formada por uma pequena quantidade de vens, entre 133,6 Ma e 131,5 Ma (4oAr/39Ar
rochas á cidas do tipo Chapecó e por basaltos step‑heating) (Ernesto et al., 1999) e onde as
dos tipos Ribeira, Pitanga e Paranapanema rochas á cidas possuem idades de 132,9 Ma
(Peate, 1997). (Rocha et al., 2020).
No sul do Brasil, destaca‑se a ocor‑
rê ncia de tipos quı́micos de baixo‑Ti e de 3 CONTEXTO GEOLÓGICO REGIONAL
magmas dos tipos Gramado e Esmeralda.
Com o mesmo conteú do de MgO, os basaltos No Brasil, o GSG ocupa uma á rea de,
do tipo Esmeralda possuem maiores conteú ‑ aproximadamente, 917.000 km2 sobre ro‑
dos de TiO2 e de Fe2O3(t) e menor conteú do chas sedimentares da Bacia do Paraná . A
de SiO2, bem como padrõ es de elementos‑ sequê ncia vulcâ nica atinge cerca de 1700 m
traço mais depletados. Na porçã o NW do RS, no centro da bacia (Piccirillo & Mel i, 1988;
predominam, em superfı́cie, basaltos de alto‑ Frank et al., 2009) e, nos estados do RS e de
Ti do tipo Paranapanema, que possuem alto SC, pode atingir até 1200 m de espessura. A
conteú do de Fe2O3(t), baixo conteú do de Zr/Y Calha de Torres, anteriormente de inida co‑
e Sr em relaçã o aos tipos Pitanga e Urubici mo Sinclinal de Torres (Zalá n et al., 1987),
(Peate et al., 1992). compreende um baixo estrutural entre os
As rochas á cidas, que sustentam a i‑ platô s dos Campos de Cima da Serra (om‑
siogra ia dos Campos de Cima da Serra nos breira sul), no RS, e de Sã o Joaquim (ombrei‑
estados do RS e de SC, sã o predominante‑ ra norte), em SC. A espessura do Grupo Serra
mente afanı́ticas e de baixo‑Ti, e referidas co‑ Geral varia entre 500 m e 700 m na borda
mo do tipo Palmas. Localizadamente no desta estrutura e entre 700 m e 1100 m no
norte do RS, a loram rochas á cidas por irı́ti‑ seu eixo principal (e.g. Frank et al., 2009). O
cas e com alto‑Ti do tipo Chapecó . Com base embasamento da Bacia do Paraná , sob a Ca‑
nos conteú dos relativos de Zr, de Rb, de P2O5 lha de Torres, é composto por um arranjo de
e de TiO2, as rochas de baixo‑Ti foram dividi‑ terrenos tectô nicos amalgamados durante o
das nos subtipos Caxias do Sul, Anita Gari‑ Ciclo Brasiliano‑Pan Africano no Neoprotero‑
baldi, Santa Maria, Clevelâ ndia e Jacuı́, e as zoico (Chemale Jr., 2000). Embora a orienta‑
de alto‑Ti, em Ourinhos, Guarapuava e Tama‑ çã o das estruturas geradas no Neopro‑
rana (Peate et al., 1992; Nardy et al., 2008). terozoico seja, predominantemente de dire‑
A idade da fase principal do magma‑ çã o NE‑SW, o arcabouço da bacia no sul do
tismo do GSG foi delimitada em um intervalo Brasil é controlado por estruturas oblı́quas,
de cerca de 4 Ma, começando em 135 Ma até de direçã o NW‑SE. As porçõ es relativamente
131 Ma (Janasi et al., 2011), com o pico prin‑ altas do embasamento conformam os arcos
cipal durando 1 Ma (Renne et al., 1992; Thie‑ de Ponta Grossa, ao norte, e de Rio Grande,
ao sul da Calha de Torres (Zalá n et al., 1987). partir destes trabalhos, os temas de investi‑
gaçã o do GSG, principalmente, na Calha de
4 GRUPO SERRA GERAL: BREVE HISTÓ‑ Torres, concentraram‑se em estabelecer su‑
RICO E CARACTERIZAÇÃO ESTRATIGRÁ‑ as relaçõ es estratigrá icas, incluindo as ca‑
FICA racterı́sticas morfoló gicas e vulcâ nicas desta
unidade (cf. Lima et al., 2012; Waichel et al.,
O GSG compreende um conjunto de 2012).
rochas vulcâ nicas e sedimentares, que repre‑ A integraçã o entre litofá cies, suas
sentam a PMPE no Brasil, cuja evoluçã o está relaçõ es estratigrá icas e estruturais, apoia‑
associada à Supersequê ncia Gondwana III da da em dados petrográ icos e geoquı́micos,
Bacia do Paraná (Milani et al., 2007). Histori‑ permitiu um maior detalhamento da estrati‑
camente, o reconhecimento das formaçõ es gra ia da Serra Geral na Bacia do Paraná
rochosas da Bacia do Paraná , com ê nfase na (Barreto et al., 2014; Polo & Janasi, 2014;
descriçã o de uma ampla sequê ncia vulcanos‑ Rossetti et al., 2014; Besser et al., 2018; Polo
sedimentar nas suas porçõ es de topo tem, co‑ et al., 2018; Simõ es et al., 2018a; 2018b), a
mo principais referê ncias os trabalhos de elaboraçã o de uma proposta estratigrá ica
White (1908) e de Baker (1923), que reco‑ formal para a Formaçã o Serra Geral e a con‑
nheceram um amplo platô de rochas basá lti‑ sequente elevaçã o do seu status para Grupo
cas na Serra Geral. Os estudos com ê nfase em Serra Geral (Rossetti et al., 2018). A suces‑
aná lises petrográ icas e litogeoquı́micas das sã o vulcâ nica foi dividida em quatro unida‑
rochas vulcâ nicas, feitos por Guimarã es des principais de lavas: Formaçã o Torres
(1933), por Leinz (1949) e por Schneider (FT), Formaçã o Vale do Sol (FVS), Formaçã o
(1964), indicaram, alé m da presença de ba‑ Palmas (FP) e Formaçã o Esmeralda (FE). A
saltos, a ocorrê ncia de rochas vulcâ nicas ricas base da sequê ncia vulcâ nica é formada por
em sı́lica nesta sequê ncia, localizada no nor‑ arenitos dominantemente eó licos da Forma‑
deste do RS e no sudeste de SC. A ampla apli‑ çã o Botucatu (FB). As principais caracterı́s‑
caçã o destes mé todos percorreu as dé cadas ticas de cada uma destas unidades serã o
de 1970 e de 1980, culminando na publicaçã o descritas em detalhe, a seguir.
de Piccirilo & Mel i (1988). Esta publicaçã o
reuniu uma sé rie de trabalhos com ê nfase em 4. 1 Formação Botucatu
aspectos geoquı́micos e geofı́sicos do GSG,
simbolizando um ponto de in lexã o, cujas A Formaçã o Botucatu é constituı́da
principais consequê ncias foram o agrupa‑ predominantemente por arenitos eó licos,
mento das rochas vulcâ nicas pelas suas ca‑ que formavam um imenso campo de dunas
racterı́sticas geoquı́micas e petrogené ticas e na porçã o central do Gondwana durante o
sua designaçã o em magmas‑tipo (e.g. Peate Eo‑Cretá ceo. Na porçã o sul da PMPE, a FB
et al., 1992; Peate, 1997). ocorre sotoposta aos primeiros derrames da
Modelos deposicionais, fundamenta‑ sequê ncia vulcâ nica, com exceçã o da porçã o
dos na descriçã o de estruturas vulcâ nicas, fo‑ central do RS, em que as lavas recobrem ro‑
ram apresentados por Waichel et al. (2006, chas sedimentares triá ssicas (Scherer,
2007, 2008) e promoveram discussõ es im‑ 2000).
portantes sobre o reconhecimento de morfo‑ Esta formaçã o é composta por are‑
logias de lavas pahoehoe, as interaçõ es destas nitos rosados, com granulometria ina a mé ‑
com sedimentos e a importâ ncia destes depó ‑ dia e com grã os arredondados, de aspecto
sitos na histó ria evolutiva do vulcanismo. A fosco (Scherer, 2000). Localmente, ocorrem
ó xidos de Fe‑Ti ± olivina. Pseudomorfos de FVS equivale aos andesitos basá lticos toleı́ti‑
olivina alterada sã o comuns, como fenocris‑ cos, de Bellieni et al. (1984b); ao episó dio
tais, nos derrames primitivos (MgO > 6%), tı́‑ vulcâ nico bá sico III, de Waichel et al. (2012);
picos da porçã o inferior da FT, enquanto à unidade II, de Rossetti et al. (2014); e aos
fenocristais de plagioclá sio ocorrem nas por‑ derrames rubbly simples, de Barreto et al.
çõ es superiores da estratigra ia. No nú cleo (2014). O contato entre a FVS e a FT é nã o
dos derrames, a matriz da rocha é tipica‑ erosional e caracterizado, na maioria dos ca‑
mente holocristalina ina a mé dia. As rochas sos, por uma camada de arenito. Excelentes
da FT representam as composiçõ es mais pri‑ exposiçõ es do contato ocorrem na seçã o‑ti‑
mitivas, dentro dos intervalos amostrados, e po (Santa Cruz‑Herveiras) e no per il Cande‑
podem ser classi icadas como basaltos e an‑ lá ria‑Sobradinho (CS). Ao longo destas
desitos basá lticos. Concentraçõ es de MgO va‑ secçõ es, o intervalo sedimentar é pouco es‑
riam de 3,3% a 8,9%, para variaçõ es de SiO2 pesso e atinge localmente 2 m. O contato en‑
entre 49,8% e 58%. As rochas sã o enriqueci‑ tre as duas unidades representa uma
das em elementos terras raras (ETRs) leves e superfı́cie‑chave, dentro da estratigra ia do
tê m fortes anomalias negativas de Nb‑Ta, em GSG, e marca um hiato da atividade vulcâ ni‑
comparaçã o aos litó ilos de ı́on grande (large ca e uma mudança importante na dinâ mica
ion lithophiles (LIL)), e anomalias negativas eruptiva.
de Ti e P. A seçã o‑tipo da FVS ocorre ao longo
da RST‑153, pró xima ao municı́pio de Vale
4. 3 Formação Vale do Sol do Sol, entre as cotas de 370 m e de 500 m.
Ao longo da seçã o, a loram trê s derrames do
A Formaçã o Vale do Sol é composta tipo rubbly pahoehoe. Derrames individuais
pelo empilhamento vertical de derrames ta‑ da FVS sã o tipicamente espessos (35‑50 m)
bulares espessos (> 25 m) de andesitos ba‑ e tabulares, com estrutura interna caracteri‑
sá lticos, que representam o está gio principal zada por: (1) uma base afanı́tica, com vesı́‑
da construçã o da sequê ncia vulcâ nica do culas esparsas (Fig. 3B); (2) um nú cleo
GSG no sul do Brasil (Fig. 4A). O conjunto de espesso afanı́tico, maciço ou com disjunçõ es
rochas que compõ e a FVS atinge uma espes‑ colunares irregulares (Fig. 3C); (3) uma zona
sura má xima acumulada de c. 550 m (11 der‑ superior vesicular grossa; e (4) uma superfı́‑
rames) no per il Terra de Areia‑Aratinga cie fragmentada (rubbly low top) (Fig. 3D‑
(TA). A unidade se estende lateralmente por, 3E).
pelo menos, 300 km, de leste (TA) para oeste Mineralogicamente, sã o compostas
(CD), e por, pelo menos, 130 km para norte, por plagioclá sio, augita e ó xidos de Fe‑Ti ±
até a Serra do Rio do Rastro. Estima‑se que a pigeonita. Plagioclá sio e augita ocorrem co‑
FVS recubra á reas superiores a 55.000 km2 e mo fenocristais isolados ou glomerocristais
o volume de material vulcâ nico seja superior envoltos por matriz microcristalina a muito
a 15.000 km3 (Rossetti, 2018). Tendo em vis‑ ina (< 0,1 mm). Microfenocristais oxidados
ta que a unidade atinge suas maiores espes‑ de olivina ocorrem nas rochas mais primiti‑
suras, ao longo dos per is costeiros (p. ex. TA vas (MgO > 5%) e pigeonita, nas composi‑
e Rio do Rastro) e que derrames similares çõ es evoluı́das (MgO < 5%). Quimicamente,
ocorrem no Grupo Etendeka, na Namı́bia as rochas da FVS sã o, predominantemente,
(Membro Tsuhasis) (Jerram et al., 1999), as intermediá rias (SiO2 entre 51,6% e 61%) e
estimativas de á rea e de volume sã o conside‑ podem ser classi icadas como andesitos ba‑
radas conservadoras. Estratigra icamente, a sá lticos e, raramente, como basaltos, sendo
326 Edição da Sociedade Brasileira de Geologia – Núcleo RS/SC
Rossetti et al.
Figura 2 – A loramentos e morfologias das lavas da Formaçã o Torres: (A) Dois derrames em lençol, separados
por intertrap (duna) de arenito eó lico, no per il Santa Cruz‑Herveiras (SH); (B) Derrame espesso con inado pela
topogra ia do campo de dunas da Formaçã o Botucatu (ponded lava) no Parque da Guarita, em Torres; (C)
Vesı́culas alongadas (pipe vesicles) na base de derrame pahoehoe; (D) Topo vesicular de derrame in lado na BR‑
386, pró ximo a Lajeado; (E) Sucessã o de lobos vesiculares, formando derrames compostos na BR‑290, pró ximo
a Osó rio; e (F) Superfı́cie em corda, situada na BR‑386, nas proximidades de Lajeado.
correlacioná veis ao magma do tipo Gramado veis. Para um intervalo de diferenciaçã o simi‑
(Peate et al., 1992). Quando comparadas à s lar, as rochas da FVS sã o enriquecidas em
rochas da FT, sã o quimicamente mais evoluı́‑ CaO e FeO* e tê m concentraçõ es menores de
das e formam tendê ncias evolutivas distintas SiO2, LIL e HFSE (High Field Strength Ele‑
para elementos maiores e traços incompatı́‑ ments).
Estratigra ia do Grupo Serra Geral na Calha de Torres, Sul do Brasil 327
Contribuições à Geologia do Rio Grande do Sul e de Santa Catarina
Figura 3 – A loramento e morfologias das lavas da Formaçã o Vale do Sol: (A) Sucessã o de derrames tabulares
das formaçõ es Vale do Sol e Palmas no topo da estratigra ia, ao longo da escarpa leste do Grupo Serra Geral, em
Santa Catarina; (B) Crosta basal pobremente vesicular; (C) Nú cleo espesso com disjunçõ es colunares
irregulares no Per il Santa Cruz‑Herveiras (SH); (D) Topo fragmentado de derrame (rubbly surface); e (E)
Detalhe da brecha de topo de derrame rubbly pahoehoe, na Serra da Rocinha (Per il RA).
atingir até 400 m no leste do RS, decrescen‑ gá s (de 10‑20 cm de diâ metro) ocorrem, lo‑
do para oeste e para norte. De acordo com calmente, em porçõ es superiores de algumas
suas caracterı́sticas quı́micas, principalmen‑ unidades. Derrames compostos por obsidia‑
te, a variaçã o dos conteú dos de TiO2 e de na ocorrem intercalados com estes tipos de
P2O5, foram divididas em subgrupos: Caxias derrames em diversas localidades do RS e de
do Sul, Santa Maria, Anita Garibaldi, Jacuı́ e SC, e podem ser delgados e homogê neos,
Clevelâ ndia (Peate et al., 1992; Nardy et al., com topo vesiculado e alterado. Estes possu‑
2008). A FP recobre derrames da FVS na em dimensõ es variadas, da ordem de cente‑
maior parte da sua á rea de ocorrê ncia (cen‑ nas de metros, e orientaçõ es alongadas em
tro e leste do RS e de SC). Os contatos com a planta, controladas pelo arcabouço estrutu‑
FVS sã o marcados por um contraste litoló gi‑ ral regional (Fig. 4F). Sã o comuns bandamen‑
co entre as autobrechas de topo da FVS e a tos verticais a horizontais nas porçõ es de
base vı́trea das lavas da FP, formando local‑ nú cleo (Fig. 4G). Porçõ es de base e de topo
mente pequenas cavernas, como resultado de derrames de grandes dimensõ es també m
da erosã o diferencial (Fig. 4B). podem conter obsidianas (Besser et al.,
2018).
nocristais (0,1‑0,5 mm) e micró litos (<0,1 fé ricas e nã o possuem vesı́culas tubulares
mm) de plagioclá sio, augita, pigeonita e ó xi‑ (pipe vesicles). Os derrames da FE sã o tipica‑
dos de Fe‑Ti como fases mais comuns. Agre‑ mente de cor preta, com alteraçõ es localiza‑
gados glomeropor irı́ticos ocorrem de forma das para materiais argilosos, de coloraçã o
escassa. A matriz é formada por vidro hidra‑ vermelha (Fig. 5B‑5C). A coloraçã o re lete o
tado e por texturas de intercrescimento de cará ter dominantemente afanı́tico destas
quartzo + K‑feldspato, este ú ltimo ocorrendo rochas.
raramente como fenocristal, podendo estar As rochas que compõ em os derra‑
alterado e substituı́do por albita. O banda‑ mes da FE sã o basaltos e andesitos basá lti‑
mento é marcado por alternâ ncias, de di‑ cos afı́ricos a pobremente por irı́ticos, com
mensã o centimé trica a milimé trica, de texturas afanı́ticas microcristalinas e vitrofı́‑
vitró iros, com maiores ou menores graus de ricas. Nas fá cies microcristalinas ocorre pla‑
cristalinidade e de oxidaçã o. gioclá sio, como ripas eué dricas a
subé dricas, na forma de fenocristais isola‑
4. 5 Formação Esmeralda dos ou de glomerocristais, envolvidos por
matriz de granulaçã o ina (0,1‑0,3 mm)
Os derrames dessa formaçã o ocor‑ constituı́da por plagioclá sio, augita intergra‑
rem principalmente nas porçõ es internas do nular e ó xidos de Fe‑ Ti. Nas fá cies vitrofı́ri‑
campo de lavas do GSG, no topo da estrati‑ cas, cristais esqueletais e aciculares de
gra ia, ao longo do limite entre RS e SC. Ao plagioclá sio, com texturas em rabo de ando‑
longo da á rea estudada recobrem uma á rea rinha, e microcristais de augita (0,2 ‑ 0,5
de c. 5.000 km2 (Rossetti, 2018). Localmente, mm) sã o envolvidos por matriz vı́trea ou
esta unidade ocorre intercalada com unida‑ afanı́tica criptocristalina. Quimicamente, as
des distintas da FP ou com derrames da por‑ lavas sã o dominantemente basá lticas (50%
çã o superior da FVS. Em a loramento, a a 54% de SiO2 e 2,7% a 7,3% de MgO).
espessura da unidade varia entre 25 m e 150 Quando comparadas à s lavas da FT e da FVS,
m, entretanto derrames com a composiçã o em composiçõ es similares de MgO, as lavas
quı́mica da FE, i.e., magma do tipo Esmeralda da FE sã o enriquecidas TiO2, FeO* e CaO (c.
(sensu Peate et al., 1992), ocorrem em diver‑ 0,2%, 1,5% e 0,5%, respectivamente) e tê m
sos poços da Bacia do Paraná , nos quais a menores concentraçõ es de SiO2 (c. 1‑2%).
unidade atinge espessuras de até 300 m. De As rochas da FE tê m, també m, menores con‑
acordo com Peate et al. (1992), o magma do centraçõ es de Ba (c. 100 ppm) e Sr (c. 50
tipo Esmeralda pode representar entre 5% e ppm) e sã o enriquecidas em Sc (10‑15 ppm)
10% do volume total do GSG. Os depó sitos e V (c. 50 ppm), e de V (c. 50 ppm), quando
da FE constituem, originalmente, campos de comparadas à s da FT, e, para a maior parte
derrames pahoehoe compostos, diques e so‑ dos elementos‑traço, as composiçõ es se so‑
leiras (Fig. 5A). Estes campos sã o formados brepõ em à s da FVS. A distribuiçã o de ETRs
dominantemente por lobos pouco espessos na FE é relativamente horizontal, tendo o
(< 2 m). A porçã o interna dos lobos é maciça, menor fracionamento entre ETRs leves e pe‑
enquanto o topo é formado por vesı́culas es‑ sados.
fé ricas. A principal diferença, em relaçã o aos
derrames da FT, está na distribuiçã o de vesı́‑
5 SUMÁRIO E CONCLUSÕES
culas na porçã o inferior dos lobos. Os lobos
do tipo S, que compõ em a FE, tê m sua zona No sul do Brasil, o Grupo Serra Geral
vesicular inferior constituı́da de vesı́culas es‑ é caracterizado por pacotes vulcâ nicos hete‑
Figura 4 – A loramentos e morfologias das lavas da Formaçã o Palmas: (A) Derrames tabulares extensos no
Câ nion do Itaibezinho, em Cambará do Sul (RS); (B) Contato entre topo brechado de derrame rubbly pahoehoe
da Formaçã o Vale do Sol, em Sã o Marcos (RS); (C) Contato entre derrames dacı́ticos, de coloraçõ es vermelha e
cinza, em Sã o Joaquim (SC); (D) Lobo de dacito com borda intemperizada e com porçã o externa vesiculada,
caracterizada por vesı́culas alongadas, e com porçã o interna pouco vesiculada, com estruturas dispostas de
forma concê ntrica, em Guaporé (RS); (E) Derrame de dacito, com morfologia de coulée e com autobrecha basal,
composta por fragmentos com ~5 cm a 80 cm, sobreposto por uma camada vesicular e com uma porçã o de
nú cleo bandado, em Candelá ria (RS); (F) Derrame composto por obsidiana de composiçã o dacı́tica, alongado
nas direçõ es NE‑SW e NW‑SE, com cerca de 40 km2, em Cambará do Sul (RS); (G) Detalhe da porçã o central do
derrame de obsidiana, com bandamento dobrado vertical a horizontal.
Figura 5 – A loramentos e morfologias das lavas da Formaçã o Esmeralda: (A) Distribuiçã o de derrames
tabulares na porçã o superior da estratigra ia, em Santa Catarina, com unidades á cidas cortadas por soleira de
composiçã o quı́mica do tipo Esmeralda; (B) Lobos mé tricos de derrames da Formaçã o Esmeralda, com topos
vesiculares e com nú cleos maciços; contato entre lobos marcado por superfı́cies oxidadas e alteradas; e (C)
Lobos vesiculares decimé tricos, com contatos marcados por margens resfriadas alteradas, nas proximidades
do municı́pio de Esmeralda.
rogê neos, que marcam momentos distintos vo dos volumes eruptivos, culminando em
da evoluçã o da provı́ncia. A porçã o inferior um mecanismo de colocaçã o distinto para a
da estratigra ia, Formaçã o Torres, é constituı́‑ FVS (derrames tabulares e espessos do tipo
da, dominantemente, por campos de derra‑ rubbly pahoehoe). O pico do magmatismo
mes compostos, formados por efusõ es de culminou na formaçã o de depó sitos vulcâ ni‑
volume restrito do tipo havaiana. Estes depó ‑ cos á cidos no topo da estratigra ia, agrupa‑
sitos recobriram, de forma passiva, o campo dos na Formaçã o Palmas. Durante o declı́nio
de dunas ativo preservado da Formaçã o Bo‑ da atividade magmá tica, erupçõ es havaianas
tucatu. Estes derrames representam as com‑ de pequeno volume deram origem aos cam‑
posiçõ es mais primitivas dentro dos pos de derrames compostos da Formaçã o
intervalos amostrados do GSG. Os derrames Esmeralda. O inal deste extenso e volumoso
da Formaçã o Vale do Sol tê m composiçã o do‑ magmatismo coincide, temporalmente, com
minantemente intermediá ria (andesitos ba‑ o inı́cio da abertura do Oceano Atlâ ntico Sul
sá lticos) e foram formados, durante a fase e com a formaçã o das bacias sedimentares
principal do magmatismo. A transiçã o entre das margens continentais brasileira e africa‑
os está gios iniciais e a fase principal do mag‑ na, durante a fragmentaçã o do Superconti‑
matismo é marcada pelo aumento signi icati‑ nente Gondwana Sul.
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1 INTRODUÇÃO
A liquefaçã o e a luidizaçã o de areia, com consequente injeçã o explosiva na camada‑selo,
podem levar ao extravasamento da mistura da lama sı́ltico‑arenosa (30% á gua, petró leo ou gá s +
70% clastos) na superfı́cie terrestre, em processo subaquoso ou subaé reo. A injeçã o é um pro‑
cesso universal, em bacias que contê m areia, e possui grande signi icado econô mico. A liquefa‑
çã o é o processo em que a areia ica saturada em á gua, formando uma pelı́cula de á gua, que
envolve cada grã o, eliminando, assim, o atrito. A luidizaçã o ocorre, quando a mistura de 30 vol.
% luido (á gua, no caso estudado) + 70% areia é injetada nas fraturas da camada‑selo, situada
acima. A formaçã o de corpos de arenito injetado pode constituir novos depó sitos de petró leo ou
pode causar fuga de petró leo de um reservató rio. A injeçã o de areia nos basaltos e nos riodacitos
do Grupo Serra Geral (GSG) foi uma etapa necessá ria (Hartmann et al., 2012a; Rosenstengel &
Hartmann, 2012; Hartmann, 2014), durante os processos hidrotermais, para formar o maior de‑
pó sito mundial de geodos de ametista e de á gata, em Ametista do Sul (com produçã o atual de
600 t/mê s) e em Los Catalanes (Uruguai).
Nó s apresentamos a evoluçã o paralela e simultâ nea do Complexo Novo Hamburgo
(CNH) de injeçã o de areia e do Grupo Serra Geral (GSG), seu hospedeiro (Fig. 1a), durante o Cre‑
tá ceo Inferior (134,5 2 Ma; e.g. Hartmann et al., 2019). Damos ê nfase à distribuiçã o nos esta‑
dos do Rio Grande do Sul e de Santa Catarina, mas acrescentamos exemplos do Paraná , do Mato
Grosso do Sul e do Uruguai (Hartmann & Baggio, 2014). A isiogra ia do grupo vulcâ nico é diver‑
si icada (Figs. 1b, 1c, 1d, 1e, 1f e 1g), com escarpas acentuadas nas cuestas e com suaves planal‑
tos, em extensas regiõ es interiores. A identi icaçã o dos processos que levaram à injeçã o de areia
e de silte no GSG (Pinto et al., 2011a, 2011b; Hartmann et al., 2010) foi possı́vel apó s os estudos
realizados nas bacias petrolı́feras offshore do Mar do Norte (e.g. Hurst et al., 2011). No Brasil, o
Contribuições à Geologia do Rio Grande do Sul e de Santa Catarina
entendimento dos processos de injeçã o e de identi icaçã o das estruturas e dos processos
efusã o de sedimentos detrı́ticos ainda exige (Arena et al., 2014).
avanços. A identi icaçã o de injetitos de areia Nó s apresentamos as estruturas de
e de silte pressupõ e trê s caracterı́sticas, por injeçã o e de efusã o de lama sı́ltico‑arenosa
parte do observador: (1) percepçã o da exis‑ do CNH e avaliamos os processos geoló gicos
tê ncia de injetitos; (2) mente atilada; e (3) envolvidos (Figs. 2, 3, 4 e 5). Utilizamos a
treinamento té cnico. O estado da arte esta‑ nomenclatura de Hurst et al. (2011), de
belece que, havendo acumulaçã o de areia em Monnier et al. (2015) e de Chan et al.
uma sequê ncia sedimentar, haverá injetitos. (2019), adaptada por Hartmann et al.
E essa relaçã o geoló gica inclui o paleoerg (2014), que inclui dique, sill, lacó lito, lopó li‑
Botucatu e a sequê ncia de selos do Grupo to, asa, brecha, vulcã o e extrudito, alé m de
Serra Geral. formas irregulares. A areia e o silte luidiza‑
Diques de areia em rochas encaixan‑ dos tê m comportamento mecâ nico seme‑
tes variadas, inclusive no GSG, sã o conheci‑ lhante ao da lava basá ltica, e isso levou ao
dos de longa data. Foram, no entanto, uso de nomenclatura aná loga. Em contraste
considerados uma curiosidade geoló gica, de‑ com complexos de injeçã o em bacias petro‑
vido à restriçã o do conhecimento ao estudo lı́feras, o CNH foi formado em ambiente vul‑
de diques de pequeno volume. Um avanço câ nico intraplaca, tornando a relaçã o dos
signi icativo no entendimento de injeçã o de arenitos com as rochas vulcâ nicas um caso
areia em rochas argilosas ocorreu há 15 ú nico nos continentes. Os processos de for‑
anos, atravé s do aumento da resoluçã o de maçã o de paralavas (Baggio et al., 2016) a
per is sı́smicos no estudo de bacias offshore 1000‑1800 C nã o serã o abordados.
(por exemplo, Hurst et al., 2011). Com isso, a
interconexã o das estruturas internas dos 2 PRINCIPAIS ESTRUTURAS E PROCES‑
complexos de injetitos foi estabelecida. Al‑ SOS
guns artigos foram publicados sobre o tema
por Zvirtes et al. (2019, 2020). Esse conheci‑ 2. 1 Arenito deposicional
mento internacional foi aplicado ao GSG,
atravé s dos estudos do Grupo de Excelê ncia A efusã o das primeiras lavas do GSG
em Minerais Estraté gicos da UFRGS. A busca recobriu as dunas ativas do paleoerg Botu‑
e a descoberta da origem dos geodos de catu. Um exemplo foi descrito por Hartmann
ametista (Duarte et al., 2009, 2011; Hart‑ et al. (2010) na regiã o de Quaraı́ (RS), em
mann et al., 2012a, 2012b, 2012c, 2013, que o primeiro derrame (colada Mata Olho,
2015, 2019) na maior provı́ncia produtora basalto) cobriu os vales interdunas. O se‑
do mundo (Ametista do Sul) identi icou sis‑ gundo derrame (colada Catalá n, andesito)
tematicamente corpos de arenito silici icado, cobriu esse derrame e tapou parte das du‑
como partes da sequê ncia de eventos hidro‑ nas.
termais (Figs. 1h, 1i e 1j). As formas diversi‑ O arenito deposicional (camada‑
icadas e as relaçõ es de intrusã o dos arenitos mã e) é a Formaçã o Botucatu (Fig. 3), de ida‑
nos basaltos levaram à comparaçã o com os de cretá cea e que ocorre interdigitado, na
processos descritos para injetitos no Mar do sua parte superior, com os primeiros derra‑
Norte e em outros lugares (Hartmann et al., mes de lava (Scherer, 2000). As areias tive‑
2012a; Duarte & Hartmann, 2014). Dessa ram movimentaçã o eó lica no paleoerg,
forma, o conhecimento de injetitos e de ex‑ durante 16 Ma (Duarte et al., 2020a, 2020b),
truditos de areia foi aplicado ao GSG, com a para formar uma camada de arenito com es‑
Figura 1 ‑ (a) Mapa geoló gico do Grupo Serra Geral, hospedeiro do Complexo Novo Hamburgo de injeçã o de
areia e de silte (Hartmann et al., 2020 e outras fontes); (b) (c) Aspectos isiográ icos do Grupo Serra Geral,
incluindo o Complexo Novo Hamburgo, na cuesta de Herveiras (RS); (d) Defronte a Torres (RS); (e) Na Serra de
Maracaju, em Nioaque (MS); (f) A norte de Campo Grande (MS); (g) Realeza (PR); (h) Primeiro evento
hidrotermal de preenchimento de cavidades, por minerais de argila e por zeolitas (H1); (i) Segundo evento
hidrotermal de injeçã o de areia (H2); (j) Terceiro evento hidrotermal de formaçã o de stockwork de quartzo,
apó s H1 e H2 (H3).
Evolução do Complexo Novo Hamburgo de injeção de areia e de silte 339
Contribuições à Geologia do Rio Grande do Sul e de Santa Catarina
Figura 2 ‑ Formaçã o Botucatu, com camadas‑mã e eó licas: (a) A loramento na seçã o‑tipo da Formaçã o
Botucatu, em Serra de Botucatu, no estado de Sã o Paulo (Rodovia Marechal Rondon, km 236); (b) A loramento
em Nioaque (MS), abaixo do primeiro derrame de basalto; (c) A loramento em Torres (RS), abaixo do primeiro
derrame de basalto; (d) Fotomicrogra ia ó tica (com luz natural) de arenito eó lico bimodal, em Nioaque (MS);
(e) Diques de arenito em zonas de falhas rú pteis, na cuesta de Herveiras (RS); (f) (g) (h) Diques de arenito em
zona de falha rú ptil, na pedreira Sultepa, em Novo Hamburgo (RS).
pessura variá vel entre 10‑200 m (em geral, 2. 2 Paleoaquífero Guarani (Hn)
80 m). Os grã os de areia tê m granulometria
O luido mobilizador da areia foi
bimodal, com cimento pouco volumoso.
á gua, com componente signi icativo de gá s
Figura 3 ‑ (a) (b) (c) Fotos de campo, com documentaçã o do percurso de injeçã o da areia, na pedreira da regiã o
de Realeza (PR); ina pelı́cula de siltito (marrom avermelhado), de 1‑3 mm, que recobre a disjunçã o colunar do
basalto; (d) (e) Fina pelı́cula de areia, de 1‑5 mm, que recobre a disjunçã o colunar e as fraturas transversais à
coluna da pedreira Sultepa, em Novo Hamburgo (RS); (f) Vista em planta de inas pelı́culas de areia, de 1‑5 mm,
preenchendo a disjunçã o colunar de basalto, em Torres (RS); (g) Quatro fraturas preenchidas por arenito
silici icado (indicadas por lechas), em Torres (RS); (h) Estrutura em asa de arenito silici icado, em dique
alimentador (abaixo, o martelo), em Novo Hamburgo (RS); (i) Seis diques subverticais de arenito silici icado
(indicados por lechas), em basalto, no Anel Viá rio Norte, em Campo Grande (MS); (j) (k) Sill de arenito
silici icado, com dique alimentador, e dique de arenito injetado no basalto sobrejacente; (l) (m) Conjunto
interligado de diques e de sills de arenito, contido em basalto, em Realeza (PR); (n) (o) Sequê ncia de
preenchimento de geodo, em Entre‑Rios (SC) ‒ base de basalto, seguida de arenito silici icado, de calcedô nia, de
quartzo e de ametista.
carbô nico na regiã o Novo Hamburgo‑Torres ou dois dias por ano no deserto, encheram
(RS). A saturaçã o da areia solta (nã o liti ica‑ as areias com á gua, dentro de poucos anos
da) com á gua de chuva formou um dos maio‑ (exagerando, 1000 anos). A partir desse
res reservató rios de á gua doce dos ponto – apó s o primeiro derrame, em alguns
continentes. O paleoaquı́fero Guarani foi ins‑ locais, e apó s o segundo derrame, em gran‑
talado no Cretá ceo Inferior, nas areias do pa‑ des extensõ es do erg ‒, o paleoaquı́fero esta‑
leoerg Botucatu (e nas areias da Formaçã o va saturado em á gua. Seguiu‑se o
Guará ), e a movimentaçã o eó lica das areias aquecimento do aquı́fero a 150 C e, sob a
estava ativa, durante a efusã o dos primeiros pressã o das lavas, situadas acima, o aquı́fero
derrames de lava do GSG (Scherer, 2000). O foi liquefeito e luidizado pela açã o de terre‑
paleoerg conté m zircã o mais jovem, com 150 motos, injetando, de forma explosiva, á gua
Ma (Duarte & Hartmann, 2020), delimitando quente e vapor + areia para dentro e para ci‑
a duraçã o do erg em 150 Ma e a idade do ma do derrame mais jovem.
vulcanismo em 135 Ma (Pinto et al., 2011a;
Hartmann et al., 2019). Em algumas regiõ es 2. 3 Terremotos
(por exemplo, em Quaraı́ (RS)), o primeiro
derrame (basalto) ocupou os vales interdu‑ Atividade sı́smica é considerada
nas, vindo o erg a ser parcialmente coberto usualmente como responsá vel pela agitaçã o
pelo segundo derrame (andesito) (Hart‑ intensa da areia, causando liquefaçã o, e pelo
mann et al., 2010). O primeiro derrame (co‑ rompimento do selo, causando luidizaçã o.
lada Mata Olho) permanece pouco Abalos sı́smicos de grande intensidade (6,
caracterizado, mas o segundo (colada Cata‑ na escala Richter) causaram agitaçã o da
lá n) é produtor, em escala mundial, dos mai‑ areia saturada em á gua do paleoerg Botuca‑
ores e dos mais valiosos geodos de ametista tu (paleoaquı́fero Guarani) e sua liquefaçã o.
do grupo vulcâ nico. O terceiro derrame (co‑ Essa perda de atrito entre os grã os da areia,
lada Cordillera, basalto) també m é grande devido ao envoltó rio de pelı́cula de á gua em
produtor de geodos de ametista, tipo capeli‑ cada grã o, conduziu à liquefaçã o e à posteri‑
nha, que é semelhante ao de Ametista do Sul, or luidizaçã o, atravé s da movimentaçã o da
tendo coberto o topo das dunas, em alguns á gua entre os grã os de areia. Em decorrê n‑
locais. cia, a mistura á gua + areia ascendeu de ma‑
A colada Catalá n possui arenito sili‑ neira explosiva, injetando os derrames
ci icado injetado, enquanto a colada Cordil‑ sobrepostos. O rompimento do selo basá ltico
lera possui sills de arenito silici icado, acima foi causado por terremotos, pois, em algu‑
da camada mineralizada em geodos. Quanto mas ocorrê ncias, os diques de arenito estã o
tempo levou para encher o paleoerg de á gua associados a zonas de falha.
de chuva, para os processos hidrotermais te‑ Terrenos vulcâ nicos ativos, mesmo
rem inı́cio? As medidas sã o geoló gicas e aná ‑ em ambiente intraplaca, tem sismicidade in‑
logas à s dos desertos atuais (por exemplo, tensa. Falhas sã o formadas por fraturamento
Namı́bia e Saara). Nos ergs atuais, a á gua do e por deslocamentos de rochas, ligados a
lençol freá tico a lora em grandes extensõ es terremotos. As rochas vulcâ nicas do GSG
nos oá sis, em lagos e em banhados, com ocu‑ apresentam falhas de grande porte e outras
paçã o humana permanente. Em regiõ es mais menores. Algumas falhas sã o restritas a seg‑
distantes do oá sis, pode‑se encontrar á gua a mentos inferiores da estratigra ia do grupo,
pouca profundidade. Apó s tapar o erg com nã o alcançando o topo. As zonas de falha sã o
lava, as chuvas torrenciais, que ocorrem um rú pteis e ‘secas’ – sem mineralizaçã o associ‑
ada. A principal causa da sismicidade foi a vez que o luido escapou pelas fraturas verti‑
abertura do Oceano Atlâ ntico, com a ina‑ cais. Signi icativamente, rochas com essa es‑
mento crustal e com rotaçã o de blocos. O trutura permeá vel nã o contê m geodos de
componente direcional das falhas nã o foi ametista.
medido, mas o abatimento atinge 10‑300 m, A pressã o de á gua quente e de vapor
em Ametista do Sul (Rosenstengel & Hart‑ aumentou nas rochas subjacentes, devido ao
mann, 2012). selamento do derrame com espessura <30
O continuado aquecimento do pale‑ m. O aumento da pressã o levou à injeçã o de
oaquı́fero pelo elevado grau geoté rmico, cau‑ areia, durante o rompimento do selo, devido
sado pela fusã o parcial do manto, deixou a a terremoto.
á gua sob pressã o té rmica e litostá tica das ro‑
chas sobrejacentes. A sı́smica recorrente 2. 5 Injeção, efusão e selamento da
propiciou a repetiçã o da injeçã o de areia, areia (H2)
apó s cada evento de injeçã o de magma na
crosta e de efusã o na superfı́cie. Um exemplo Cada evento de aquecimento do pa‑
de associaçã o de fraturamento de falhas com leoaquı́fero gerou um evento hidrotermal
a injeçã o de diques de areia ica na cuesta de (Hn), que icou registrado nas rochas sobre‑
Herveiras (RS) (Hartmann & Duarte, 2020). jacentes. Houve, ao todo, trê s eventos hidro‑
termais para cada evento Hn. Apó s o evento
2. 4 Selamento do derrame (H1) de selamento do derrame mais recente (H1),
ocorreu a injeçã o explosiva de á gua e de va‑
Derrames de basalto ou de riodacito por (100 m/s). Tal evento (H2) icou regis‑
sã o porosos (30 vol. % vesı́culas e microfra‑ trado em corpos intrusivos de areia com
turas) apó s seu esfriamento, e necessitam forma variada – dique, sill, lopó lito, lacó lito,
ser selados, para que o processo de injeçã o asa e irregular. Ao atingir a superfı́cie da
explosiva de areia luidizada ocorra. Os der‑ crosta, em contato com a atmosfera (ou hi‑
rames do GSG mostram evidê ncias de oclu‑ drosfera), a força da explosã o hidrotermal
sã o da porosidade, atravé s da precipitaçã o formou corpos efusivos com geometria vari‑
de minerais hidrotermais (H1) – zeolitas, mi‑ ada – brechas de basalto, em matriz de areia,
nerais de argila e cobre nativo (Fig. 5) (Bag‑ camadas de areia, vulcõ es. A altura atingida
gio et al., 2018). Nã o há registro de vesı́culas pelos fragmentos de rocha e de areia foi de‑
remanescentes (‘vazias’) e as cavidades atu‑ pendente da força da explosã o. A efusã o da
ais sã o atribuı́das à dissoluçã o intempé rica areia luidizada na superfı́cie formou lagos
do conteú do mineraló gico das amı́gdalas. efê meros no deserto. A possibilidade da pre‑
As fraturas de esfriamento da lava sença de fó sseis nos extruditos ainda deve
(poligonais, em planta) apresentam deposi‑ ser testada.
çã o similar de minerais hidrotermais, mas A idade do zircã o detrı́tico de extru‑
sua abertura (1‑10 mm) possibilitou o conti‑ ditos de areia é semelhante à das camadas‑
nuado luxo de á gua e de vapor, ao longo de mã e da Formaçã o Botucatu. O estudo pionei‑
todos os processos geoló gicos subsequentes. ro de extrudito de areia em Iraı́ (RS) por
Essa disjunçã o colunar se apresenta apenas Pinto et al. (2011a) foi expandido por Duarte
em derrames espessos (30 m), que sã o for‑ et al. (2020b) para ampla á rea do complexo.
mados por esfriamento lento. A rocha é holo‑ A desidrataçã o dos injetitos ocorreu
cristalina, com granulaçã o ina a mé dia, e com diminuiçã o de volume, gerando estrutu‑
nã o apresenta alteraçã o hidrotermal, uma ras de dissecamento intraestratais. As fratu‑
Evolução do Complexo Novo Hamburgo de injeção de areia e de silte 343
Contribuições à Geologia do Rio Grande do Sul e de Santa Catarina
Figura 4 ‑ Estruturas de injeçã o de areia e de silte do Complexo Novo Hamburgo. (a) (b) Complexo conjunto
de diques e de sills de areia, em amarelo (b), injetados na crosta amigdaloidal superior de basalto, em Realeza
(PR); (c) Vista em planta dos canais alimentadores da injeçã o de areia, na superfı́cie amigdaloidal do derrame
de basalto, ligados ao extrudito de areia; (d) Ranhuras de arrasto no arenito silici icado (mostradas por
lechas), formadas durante injeçã o de dique de areia, no contato com o basalto, em Serra de Maracaju (MS); (e)
(f) fotos em planta de juntas de desidrataçã o intraestratais de injetito de areia, originadas por perda de á gua da
lama arenosa, apó s a injeçã o do sill de areia ‒ inserçã o em (e) mostra fraturas de dissecaçã o em â ngulo reto,
diferente dos contatos a 120 das fraturas de ressecamento de lama na superfı́cie (mudcrack). Local do
a loramento: rio Loch, no Distrito de Morro dos Bugres Baixo, em Santa Maria do Herval (RS); (g) A loramento
da amostra coletada para dataçã o por U‑Pb SHRIMP de zircã o, por Pinto et al. (2011) (primeira dataçã o de
injetito de areia no Grupo Serra Geral) ‒ ponto da coleta indicado. (h) (i) Histograma de frequê ncia das idades
datadas por U‑Pb SHRIMP de zircã o de vá rias amostras de extruditos e de camadas‑mã e da Formaçã o Botucatu
do Complexo Novo Hamburgo (Duarte et al., 2020b), mostrando idades de proveniê ncia semelhantes; (j) Dique
de siltito em basalto, em Realeza (PR); (k) Textura de siltito; (l) (m) Fotomicrogra ias de injetitos de areia, de
granulaçã o ina (unimodais) ‒ cimento de calcedô nia e de quartzo, indicados por ‘c’, em Serra de Maracaju
(MS).
Figura 5 ‑ Fotos de campo de estruturas geradas na interface superior amigdaloidal do derrame de basalto com
a atmosfera. (a) (b) Extrudito de areia (de 50 cm espessura) na parte superior de uma brecha, com blocos
angulares amigdaloidais de basalto 1, em matriz de arenito ‒ basalto 2 extravazou, posteriormente, sobre
superfı́cie do arenito, depositado em lâ mina de á gua, na pedreira Votorantim, em Campo Grande (MS); (c)
Extrudito de areia (de 1‑2 m de espessura), com diques alimentadores em forma de raiz de dente, derramado
sobre basalto e, posteriormente, soterrado por novo derrame de basalto, na pedreira Sultepa, em Novo
Hamburgo (RS); (d) (e) (f) (g) Extrudito de areia, acima de brecha de blocos de basalto amigdaloidal, com
matriz de arenito, com diques alimentadores ‒ corte da rodovia BR‑060, em Serra de Maracaju (MS); (h) (i)
Estratigra ia de detalhe da parte superior do derrame Veia Alta, inclusive, do extrudito de areia, e das partes
inferior e central do derrame Coogamai sobrejacente, mostrando uma cava (galeria) na Mina do Museu, em
Ametista do Sul (RS); (j) Brecha hidrotermal, com blocos angulosos e amigdaloidais de basalto, imersos em
matriz de siltito, em Realeza (PR); (k) (l) Vulcã o de areia e de extrudito, com dique e com sills alimentadores, na
rodovia Tenente Portela‑Trê s Passos (RS); (m) Brecha com blocos de basalto amigdaloidal imersos em arenito ‒
capa superior de extrudito foi depositada em depressã o topográ ica, à 500 m desse local, em Salto do Jacuı́ (RS);
(n) (o) (p) Extrudito de areia (acima) e gradacional, com brecha hidrotermal de blocos de basalto
amigdaloidais, imersos em arenito, em Torres (RS).
ras tendem a se cruzar em â ngulo reto, dife‑ evento hidrotermal H3 foi o acontecimento
rente das fraturas de dissecaçã o na superfı́‑ preponderante para a alteraçã o de basalto e
cie (mudcracks), que se cortam a 120 e que para a geraçã o de geodos de ametista de va‑
nã o foram observadas no Complexo Novo lor econô mico. Em alguns geodos, estã o pre‑
Hamburgo. servadas as evidê ncias de evoluçã o no
Em vá rios locais, sã o observadas tempo, desde o basalto hospedeiro, recober‑
fraturas losangulares (em trê s dimensõ es) to em sequê ncia hidrotermal por arenito sili‑
preenchidas por areia. Essa evidê ncia de so‑ ci icado, por calcedô nia, por quartzo e por
erguimento do derrame de lava em exten‑ ametista.
sõ es de 1‑40 km pode ter alcançado a
pujança de uma explosã o na atmosfera, de‑ 2. 7 Geysers, fontes termais
vido à pressã o do vapor. Em Quaraı́ (RS), tal
ocorrê ncia está acompanhada por dezenas Os processos hidrotermais, que
(talvez, centenas) de estruturas circulares, ocorreram apó s a efusã o de cada derrame de
com 1‑100 m de diâ metro, contendo areia lava, levaram à formaçã o de vulcõ es de areia
nas bordas. A pouca distâ ncia, está o Cerro ou de silte e aos extruditos associados. Esse
do Jarau, uma estrutura circular de 10 km, ambiente é visualizado como favorá vel à
que tem sido considerada registro do im‑ existê ncia de nú mero elevado de paleogey‑
pacto de um meteoro. Há necessidade de re‑ sers e de fontes termais. Em outros locais
exame dessa estrutura, para testar a (por exemplo, na Islâ ndia e em Yellowstone,
hipó tese de se tratar de uma paleoduna nos EUA), a ejeçã o de á gua formou depó sitos
composta. de sı́nter (sı́lica) e de tufa (calcita ou arago‑
Os injetitos e os extruditos perde‑ nita), com 1‑100 m de extensã o e 1‑5 m de
ram seu conteú do de á gua e deixaram, como espessura. Esses depó sitos serã o encontra‑
testemunho, as estruturas de areia. A perco‑ dos no GSG, a partir de busca sistemá tica, e
laçã o continuada de á gua quente levou à serã o de grande valor cientı́ ico, para o en‑
dissoluçã o parcial dos grã os de areia e à re‑ tendimento dos processos geoló gicos do
precipitaçã o de calcedô nia e de quartzo co‑ Cretá ceo e da evoluçã o da vida. A Fronteira
mo cimento. Na regiã o de Novo Hamburgo, Oeste do RS é um ambiente geoló gico propı́‑
até Torres, o cimento é constituı́do parcial‑ cio. Um exemplo de tufa é o paleoerg jurá ssi‑
mente de calcita. O arenito silici icado é uma co de Nevada (EUA), com presença de
rocha competente, utilizada pelos povos na‑ conchas de moluscos.
tivos para a confecçã o de pontas de lechas e
de lanças (Batalla et al., 2020). Apó s essa ex‑ 2. 8 Elutriação da areia
tensa cimentaçã o, o arenito perdeu a porosi‑
A elutriaçã o da areia ina e do silte
dade e passou a ser um selo impermeá vel. O
do CNH, deixando areia grossa na camada‑
continuado aumento da pressã o de á gua
mã e, aconteceu durante a luidizaçã o da
quente e de vapor abaixo do selo efetivou o
areia do paleoerg, em que os luxos de á gua
registro do processo hidrotermal H3 nas ro‑
quente e de vapor separaram as partı́culas
chas.
inas das mais grossas. Elutriaçã o é a separa‑
çã o de partı́culas pequenas (areia ina, argi‑
2. 6 Formação de geodos de ametista
la) de partı́culas maiores (areia grossa),
(H3)
durante o luxo ascendente de á gua quente e
Do ponto de vista volumé trico, o de vapor. A e iciê ncia da separaçã o das partı́‑
Figura 6 ‑ Diagramas geoquı́micos, mostrando a composiçã o dos injetitos de areia e de silte, em comparaçã o
com basalto e com arenitos da camada‑mã e. As imagens (a) e (b) mostram a composiçã o diferente dos
injetitos, em comparaçã o aos basaltos intercalados, em Realeza (PR), e as imagens (c) e (d) trazem a
composiçã o dos injetitos, em comparaçã o aos riodacitos do Grupo Serra Geral; (e) fracionamento
composicional dos injetitos, por elutriaçã o de areia do paleoerg.
vulcâ nica. Mas os degraus das escadarias erosiva do GSG e do CNH. A observaçã o do
(trap, em holandê s da provı́ncia basá ltica Ka‑ relevo remanescente atual da provı́ncia vul‑
roo) permaneceram, durante toda a histó ria câ nica mostra que um morro permanece co‑
mo elevaçã o porque está silici icado, poten‑ inconsolidada do paleoerg Botucatu. Esse
cialmente mineralizado a geodos de ametis‑ processo ocorreu ao mesmo tempo em que o
ta. Grupo Serra Geral era formado, atravé s da
efusã o de basalto e de riodacito. A injeçã o e
3 MODELO EVOLUTIVO a efusã o de areia ocorreram, apó s cada der‑
rame de lava, ao longo de toda a estratigra ia
O Complexo Novo Hamburgo de inje‑ vulcâ nica (Fig. 7). As estruturas de injeçã o e
çã o de areia e de silte se originou por lique‑ de efusã o de areia e de silte estã o presentes
façã o e por luidizaçã o da areia em a loramento de rocha, ao longo de todo o
Figura 7 ‑ Modelo das estruturas de injetitos de areia e de silte do Complexo Novo Hamburgo, hospedadas nas
rochas vulcâ nicas do Grupo Serra Geral.
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1 INTRODUÇÃO
As variedades de minerais silicosos sã o utilizadas e apreciadas pela humanidade há
centenas de anos. A á gata e a opala, devido à sua vasta aplicaçã o e versatilidade gemoló gica, es‑
tã o entre estes minerais e sã o classi icadas como variedades de sı́lica microcristalina, que ocor‑
rem nas rochas vulcâ nicas cretá cicas da Formaçã o Serra Geral, na Bacia do Paraná (Juchem,
1999; Duarte, 2008; Hartmann et al., 2012; Michelin, 2014). A á gata é uma variedade de cal‑
cedô nia bandada, cujas bandas se dispõ em, de forma concê ntrica ou paralela, no interior de ca‑
vidades presentes nas rochas vulcâ nicas bá sicas, denominadas geodos. A opala pode ocorrer
nesses geodos, associada à á gata, mas també m é observada em fraturas, como cimento, e ao
longo de estruturas de luxo nas rochas vulcâ nicas da Formaçã o Serra Geral (Brum & Juchem,
2014). Destaca‑se que essas variedades també m podem ser encontradas nos geodos, associa‑
das com ametista, nã o, só , no Rio Grande do Sul, mas, també m, nos estados do Paraná e de San‑
ta Catarina, poré m em quantidades que inviabilizam a sua extraçã o, diferente do que acontece
no Distrito Mineiro de Ametista do Sul (RS), em que nã o é incomum o aproveitamento de á gata,
associada à ametista.
A á gata e a opala, juntamente com a ametista, compreendem importantes materiais ge‑
moló gicos na regiã o sul do Brasil e sã o muito valorizadas para exportaçã o, devido à variedade
de tamanhos e de formas e, principalmente, em funçã o do conhecimento avançado sobre seu
bene iciamento.
Aspectos sobre a origem de formaçã o dos geodos da Formaçã o Serra Geral vê m sendo
discutidos, desde Leinz, em 1949. Como a ametista representa o maior volume de extraçã o, a
maioria dos trabalhos tê m apresentado enfoque nesse mineral (Gomes, 1996; Scopel, 1997; Ju‑
Contribuições à Geologia do Rio Grande do Sul e de Santa Catarina
chem, 1999; Duarte, 2008; Hartman et al., (IBGM) e considerando o volume exportado,
2014). Estudos sobre a á gata e sobre a opala em toneladas, com exceçã o do diamante, do
vê m sendo desenvolvidos (Heemann, 1997; rubi e da esmeralda, o Brasil está posiciona‑
Augustin, 2004; Heemann, 2005; Michelin et do no 2º lugar do ranking internacional dos
al., 2013; Michelin, 2014), mas é unâ nime maiores fornecedores de pedras coradas.
que a á gata e a ametista tê m gê neses distin‑ No cená rio brasileiro, o Rio Grande
tas (Duarte, 2008; Michelin, 2014) do Sul exportou cerca de 82.000.000 t de
A opala, considerada, inicialmente, materiais gemoló gicos, em 2017 e em 2018
como uma substâ ncia amorfa, teve suas ca‑ (IBGM, 2019). Salienta‑se que estes valores
racterı́sticas estruturais estabelecidas em es‑ representam, quase na sua totalidade, mine‑
tudos realizados com difraçã o de raios‑X rais enriquecidos em sı́lica, como á gata e
(DRX). Os estudos de Jones et al. (1964), com ametista. Nos ú ltimos anos, a comercializa‑
base em crité rios de difraçã o de raios‑X, çã o no mercado interno també m demostra
mostraram que a estrutura da opala, na rea‑ um considerá vel aumento (Batisti & Tatsch,
lidade, varia de amorfa a microcristalina. Em 2012).
1971, o estudo pioneiro de Jones & Segnit re‑ A mineraçã o e a tradiçã o gemoló gica
conheceu trê s fases de sı́lica hidratada, de da á gata, da opala e da ametista no estado do
baixa temperatura: opala amorfa (opala‑A); Rio Grande do Sul pode ser acompanhada
α‑cristobalita, com empilhamento acentuado em duas regiõ es bem estudadas e conheci‑
de α‑tridimita (opala‑CT); e α‑cristobalita das: o Distrito Mineiro de Ametista do Sul
ordenada, com empilhamento mais restrito (DMAS), localizado na regiã o centro‑norte, e
de α‑tridimita (opala‑C). o Distrito Mineiro de Salto do Jacuı́ (DMSJ),
Este capı́tulo propõ e uma revisã o na regiã o central do estado. Atualmente,
das principais caracterı́sticas geoló gicas, mi‑ també m a regiã o da Fronteira Sudoeste do
neraló gicas, quı́micas e isotó picas da á gata e RS vem despontando na produçã o e na co‑
da opala que ocorrem no RS. Alé m disso, se‑ mercializaçã o de á gata. No estado, o inı́cio da
rã o apresentadas hipó teses para a gê nese atividade de explotaçã o da á gata, da ametis‑
dos depó sitos. O uso gemoló gico da á gata ta e, posteriormente, da opala se deu por
compreende etapas e processos de bene ici‑ volta de 1827, quando imigrantes alemã es,
amento, com a inalidade de comercializaçã o que dominavam té cnicas de extraçã o e de
nos mercados externo e interno. Estudos bene iciamento mineral, iniciaram minera‑
acerca dos processos de bene iciamento sã o çã o de geodos silicosos nas margens do rio
essenciais, para o avanço da comercializaçã o Taquari, nas cidades de Lajeado e de Soleda‑
desses materiais, e estes serã o feitos, ao inal de, e, posteriormente, nas margens do rio Ja‑
deste capı́tulo. cuı́ e de seus a luentes, segundo Kellermann
(1990).
2 MINERAÇÃO DE ÁGATA E DE OPALA Como a maioria dos garimpos de
NO RIO GRANDE DO SUL á gata está localizado à s margens do rio Jacuı́
e do rio Taquari e de seus a luentes, ó rgã os
O Brasil é uma das principais provı́n‑ ambientais estaduais embargaram essa ati‑
cias gemoló gicas do mundo, conforme Webs‑ vidade, que, durante muitos anos, ocorreu de
ter (1983), e se destaca pelo volume e pela forma irregular. Esta prá tica fez com que a
qualidade da produçã o e da exportaçã o das regiã o sofresse graves problemas, nã o, só ,
gemas. Por estimativa de 2019 do Instituto ambientais, mas, també m, de saú de pú blica e
Brasileiro de Gemas e Metais Preciosos de recursos humanos. Atualmente, com a re‑
356 Edição da Sociedade Brasileira de Geologia – Núcleo RS/SC
Michelin et al.
gularizaçã o da atividade mineira, existem rios. Estes autores de inem uma á rea de 250
cerca de 16 garimpos ativos, segundo estima‑ km2, localizada no Planalto da Serra Geral,
tiva do Sindipedras (2020). que compreende os municı́pios de Salto do
No DMSJ, ocorre a valorizada á gata Jacuı́, de Campos Borges, de Fortaleza dos Va‑
Umbu, de cor azul escura e com elevada mi‑ los, de Segredo, de Sobradinho, de Espumoso
croporosidade, caracterı́stica estrutural dife‑ e de Arroio do Tigre (Fig. 1).
rencial, pois permite que este mineral seja No DMSJ, os geodos, contendo á gata e
submetido a processos de tingimento e de opala, sã o extraı́dos dos derrames de rochas
tratamento té rmico. Nos ú ltimos anos, té cni‑ vulcâ nicas, que, em geral, estã o muito intem‑
cas de bene iciamento combinam a á gata perizados, e, por isto, sã o de fá cil desagrega‑
com outros materiais, agregando valor esté ti‑ çã o (Fig. 2A‑2B). O nı́vel mineralizado pode,
co à s peças produzidas com os geodos. por vezes, ser escavado com relativa facilida‑
de, utilizando‑se tratores de esteira e, em al‑
3 CARACTERIZAÇÃO GEOLÓGICA, MINE‑ guns casos, os geodos podem ser extraı́dos
RALÓGICA E QUÍMICA DA ÁGATA E DA de maneira manual.
OPALA DO RS O derrame mineralizado possui uma
zona vesı́culo‑amigdaloidal, na qual sã o en‑
Os depó sitos de á gata e de opala es‑ contrados os geodos de á gata, associados à
tã o associados à s rochas vulcâ nicas, tanto de opala; este derrame basá ltico tem uma com‑
composiçã o á cida como bá sica, da Formaçã o plexa relaçã o com outros derrames á cidos e
Serra Geral, do Cretá ceo, da Bacia do Paraná . com intertraps arenosos. Michelin (2014)
A Bacia do Paraná é uma feiçã o geoló gica im‑ descreve a relaçã o entre lava e sedimento e
portante da porçã o centro‑sul da Plataforma propõ e a seguinte sequê ncia estratigrá ica,
Sul‑Americana, conforme pode ser visto na para a á rea do DMSJ, da base para o topo:
Figura 1. E uma bacia com preenchimento derrame dacı́tico, com espessura em torno de
vulcano‑sedimentar, iniciado no Siluro‑Devo‑ 20 m, cinza escuro, com alteraçõ es incipien‑
niano e terminado no Cretá ceo, com os der‑ tes, com presença de geodos preenchidos por
rames de lavas á cidas e bá sicas da Formaçã o opala e por quartzo macrocristalino e, mais
Serra Geral (Milani, 1997). Eventualmente, raramente, por á gata. Diques de arenito sã o
esses derrames estã o intercalados com os caracterı́sticos da base do derrame e fraturas,
arenitos quartzosos eó licos da Formaçã o Bo‑ preenchidas por sedimentos, ocorrem no to‑
tucatu (Scherer, 2002). Heemann (1999) e po; derrame basá ltico, com espessura de 25
Michelin (2014), entre outros, mostram que m, cinza avermelhado, com geodos preenchi‑
os arenitos da Formaçã o Botucatu estã o rela‑ dos, sequencialmente, por calcedô nia, por
cionados com a gê nese e com a presença da á gata e por quartzo macrocristalino e, rara‑
á gata na regiã o do DMSJ. CPRM (2020) tam‑ mente, por calcita fraturas abundantes, pre‑
bé m con irma esta associaçã o, poré m desta‑ enchidas por calcita e por material argiloso.
ca a regiã o da Fronteira Sudoeste do estado Nã o sã o observados geodos preenchidos com
(Fig. 1) como outro polo de mineraçã o destas á gata nesse derrame. E o derrame potencial‑
variedades. mente mineralizado, destacando‑se diques
A á rea potencialmente produtora de de arenito e porçõ es brechadas na base; e
á gata e de opala no RS é o Distrito Mineiro do derrame dacı́tico, com aproximadamente 25‑
Salto do Jacuı́ (DMSJ), de inida e individuali‑ 29 m de espessura, cinza escuro, intensa‑
zada por Santos et al. (1998), com base nas mente alterado, quando comparado ao basá l‑
informaçõ es disponı́veis nos tı́tulos minerá ‑ tico mineralizado.
Depósitos de ágata e de opala no estado do Rio Grande do Sul 357
Contribuições à Geologia do Rio Grande do Sul e de Santa Catarina
Figura 1 ‒ Localizaçã o das principais ocorrê ncias de á gata e de opala no estado do Rio Grande do Sul (a partir
de Juchem, 1999).
Figura 2 ‑ Aspectos gerais da ocorrê ncia dos geodos: A) Garimpo na regiã o do DMSJ. Intercalaçã o de derrames
á cidos e bá sicos e feiçõ es de interaçã o entre lava e sedimento; e B) Detalhe da rocha hospedeira (dacito
inferior) e do geodo, em que se nota a camada de, aproximadamente, 3 cm de argilominerais, que fazem o
contato do geodo com o dacito.
Figura 3 ‒ Exemplos dos diferentes tipos de preenchimentos dos geodos: A) Geodo com preenchimento parcial
de á gata e com ina camada quartzo incolor (sem bandamento aparente); B) Fragmento de geodo com á gata
bandada; C) Fragmento de geodo com bandamento concê ntrico, com canais de percolaçã o de luido, com
intercalaçã o de nı́veis de á gata e com nı́veis de quartzo macrocristalino; D) Fragmento de geodo preenchido
por calcedô nia, por calcita e por quartzo macrocristalino; E) Detalhe da predominâ ncia de quartzo
macrocristalino como preenchimento de geodo F) Fragmento de geodo com ina camada de calcedô nia, com
quartzo macrocristalino, com opala e com á gata (legenda: á gata (Ag); quartzo macrocristalino (Qm); opala
(Op); e calcita (Cc).
maciços ou colomorfos, com cores variadas – co. A fratura é conchoidal a irregular, que‑
incolor, branco, branco azulado, rosa, amare‑ brando em lascas cortantes e, em algumas
lo, azul, azul acinzentado, castanho, preto e amostras, podem ser identi icadas fraturas
em diferentes tonalidades de laranja e de por desidrataçã o. A densidade é sempre bai‑
vermelho ‒, caracterizando a variedade xa, variando entre 1,95 e 2,25, e a dureza,
“opala de fogo” (Fig. 4A). Eventualmente, medida na escala de Mohs, varia entre 5,5 e
amostras de opala amarela, laranja e verme‑ 6,5.
lha apresentam um leve jogo de cores e foi O bandamento caracterı́stico da
identi icada, també m, opalescê ncia em á gata pode ser observado ao microscó pio,
amostras de opala incolor, amarela e laranja. pois as bandas sã o formadas pela intercala‑
O brilho é vı́treo a resinoso e pode ser trans‑ çã o de agregados criptocristalinos de quart‑
parente a translú cido e, eventualmente, opa‑ zo (Fig. 5A) e de agregados ibrosos de
360 Edição da Sociedade Brasileira de Geologia – Núcleo RS/SC
Michelin et al.
Figura 4 ‒ Modos de ocorrê ncia e caracterı́sticas microscó picas da opala do RS: A) Opala amarela, associada à
á gata, preenchendo totalmente um geodo; B) Opala branca leitosa, depositada em fraturas da rocha hospedeira;
C) Veios de opala, em meio à calcedô nia; e D) Mesma lâ mina em LP, exibindo o cará ter isó tropo da opala e a
calcedô nia, constituı́da por esferulitos de quartzo microcristalino ibroso (a partir de Brum & Juchem, 2014).
Figura 5 ‒ Fotomicrogra ias da á gata: A) Agregados criptocristalinos de quartzo (QC) e agregados ibrosos
orientados (CA) (LP, 25X); e B) Agregados ibrosos de calcedô nia (LP, 50X).
mostram variaçõ es no teor de sı́lica entre um tema que vem sendo discutido, mundial‑
92% e 98% nas amostras analisadas e foram mente (Moxon, 2009; Dumań ska‑Słowika et
identi icados, també m, teores variados de al., 2019; Powolnya et al., 2019; Gotze,
Al2O3, de CaO, de Na2O, de K2O, de Fe2O3, de 2020).
TiO2 e de MgO. A perda ao fogo medida vari‑ Muitas hipó teses já foram discuti‑
ou entre 0,9% e 6,0%, observando‑se que, das, a partir de estudos de parâ metros, co‑
quanto maior o teor de sı́lica, menor é a per‑ mo a temperatura de formaçã o e a fonte de
da ao fogo. sı́lica que os teriam originado. Estas ideias
As aná lises isotó picas constituem postulam, desde uma possı́vel origem mag‑
importantes ferramentas, para a inferê ncia má tica, a alta temperatura (Godovikov et al.,
da temperatura e dos processos de minerali‑ 1987; Blankenburg, 1988; Moxon, 2006), até
zaçã o de minerais silicosos. Nesse sentido, processos pó s‑magmá ticos, de baixa tempe‑
foram compilados os dados de Juchem ratura (Juchem, 1999; Gilg et al., 2003; Du‑
(1999), de Duarte (2008) e de Michelin arte, 2008; Michelin et al., 2013).
(2014), que obtiveram resultados de aná lises Strieder & Heemann (2006) postu‑
isotó picas de oxigê nio em á gata (δ18O), que lam que a gê nese dos geodos está relaciona‑
estã o expressos na Tabela 1. Os autores, a da com a fusã o dos arenitos eó licos da
partir do cá lculo de temperatura, chegaram à Formaçã o Botucatu pelas lavas basá lticas da
conclusã o de que, tanto a á gata associada a Formaçã o Serra Geral. Os autores descrevem
geodos de ametista, nas regiõ es do Alto Uru‑ xenó litos de arenito nas lavas vesiculares
guai e de Quaraı́, quanto a á gata de preenchi‑ basá lticas, diques de arenito, que cortam os
mento exclusivo no DMSJ cristalizam, a derrames, e a relaçã o destes com os geodos.
temperaturas baixas (mé dia de 27,88 0C). Ao estudarem as mineralizaçõ es de
ametista na regiã o de Ametista do Sul (RS) e
4 MODELOS GENÉTICOS algumas amostras do DMSJ, com aná lises de
inclusõ es luidas e com estudos geoquı́micos
Com base na aná lise integrada de e isotó picos, Gilg et al. (2003) inferem, a res‑
observaçõ es de campo e de laborató rio, sã o peito das fases dos luidos, propondo um
propostos modelos de formaçã o dos depó si‑ modelo gené tico para a formaçã o destas mi‑
tos de á gata, associados à opala. Sabe‑se que neralizaçõ es. Este modelo contempla dois
a gê nese destes depó sitos é complexa e que é está gios de formaçã o e de preenchimento
Tabela 1 ‒ Resultados de aná lises isotó picas de oxigê nio (δ18O) em á gata (a partir de Juchem
(1999), de Duarte (2008) e de Michelin (2014)).
das cavidades: o primeiro está gio magmá tico zada, da á gua contida nas regiõ es em que o
é responsá vel pela geraçã o das cavidades de‑ nı́vel freá tico a lora (regiõ es interdunas). Co‑
nominadas protogeodos e um está gio poste‑ mo evidê ncia de uma possı́vel contribuiçã o,
rior é responsá vel pelo preenchimento por parte do lençol freá tico, tem‑se os di‑
destas cavidades, a temperatura mais baixa. ques de arenito, que, para sua formaçã o, ne‑
Para Michelin (2014), parte da fonte cessitam de luidizaçã o da areia e de
da sı́lica é atribuı́da à matriz vı́trea dos daci‑ temperaturas na faixa de 65 oC, medida obti‑
tos e é associada à percolaçã o de á guas me‑ da para exemplares de á gata do DMSJ em
teó ricas, possivelmente, de cará ter alcalino. aná lises isotó picas.
A temperatura ambiente das á guas é eviden‑ O comportamento da sı́lica em um
ciada pelas temperaturas de precipitaçã o da sistema de baixa temperatura pode ser in‑
á gata, que se situam em torno de 28 oC, de terpretado como um sistema de baixa solu‑
acordo com cá lculos, envolvendo razõ es iso‑ bilidade em á gua. A solubilidade, em geral,
tó picas de oxigê nio. Para a autora, a migra‑ depende da temperatura (100‑140 mg/l, a
çã o dos luidos silicosos mineralizantes 20 oC). O pH també m in luencia o processo e
ocorre, a partir das fraturas, das microfratu‑ se sabe que o á cido ortosilı́cico Si(OH)4 se
ras e das vesı́culas, descritas nos derrames apresenta de forma solú vel a um pH de 1 a 9
á cidos e bá sicos, que hospedam as minerali‑ e, a um pH alcalino, o silı́cio tende a icar
zaçõ es. As feiçõ es sedimentares descritas mais dissolvido (Dietzel, 2000).
por Michelin (em prep.) (diques de arenito, Segundo Michelin (2014), as hetero‑
fraturas preenchidas por sedimentos, bre‑ geneidades, em termos de distribuiçã o das
chas, intertraps, regiõ es interdunas e geodos mineralizaçõ es de sı́lica e de posicionamento
de siltitos argilosos) perfazem um sistema dos polimorfos (opala, calcedô nia, á gata e
permo‑poroso, capaz de facilitar a migraçã o quartzo macrocristalino) no derrame porta‑
dos luidos, até sua precipitaçã o, no interior dor, estã o associadas à distribuiçã o irregular
dos geodos. Ainda, nã o se descarta a hipó te‑ da porosidade e à permeabilidade (tanto nas
se de que a contribuiçã o da á gua nã o seja, rochas sedimentares como nas vulcâ nicas).
apenas, meteó rica super icial, mas que haja O crescimento dos diferentes polimorfos no
uma participaçã o, em menor escala e locali‑ interior dos geodos se dá , a partir de uma
soluçã o supersaturada em sı́lica. Com a pre‑ tipo cabochã o (Fig. 5B). A opala branca (opa‑
cipitaçã o dos ı́ons contidos neste luido, a la‑CT) pode ser lapidada, normalmente. Já a
tendê ncia é de que os á tomos se arranjem de opala translú cida, que possui cores estetica‑
uma maneira organizada, caracterizando, en‑ mente interessantes (amarelo claro, leitosa,
tã o, o estado só lido. Formam‑se, entã o, pon‑ entre outras), precisa ser cuidadosamente
tos de nucleaçã o, desencadeando o cres‑ manuseada para ins de lapidaçã o, pois, se
cimento do cristal. Desta maneira, propõ e‑se ocorrer aumento signi icativo de temperatu‑
a seguinte sequê ncia de cristalizaçã o, para o ra, causado pelo atrito com os materiais
preenchimento dos geodos do DMSJ: opala – abrasivos e de polimento, pode desenvolver
calcedô nia – á gata – quartzo macrocristali‑ trincas, com o passar do tempo.
no. O processo de gravaçã o a laser na
á gata foi detalhadamente estudado por Cida‑
5 APROVEITAMENTO GEMOLÓGICO de (2012) e por Cidade et al. (2018). O efeito
da energia do laser CO2 na superfı́cie do ma‑
A á gata é um dos materiais gemoló ‑ terial de coloraçã o branca (Fig. 5D) gera con‑
gicos mais versá teis do Rio Grande do Sul. A traste e, assim, podem ser feitos desenhos e
con iguraçã o mineraló gica dos geodos, que, gra ismos. A á gata entra em estado de fusã o,
por vezes, sã o totalmente preenchidos, per‑ pela interaçã o com o laser, e é rapidamente
mite usos diversi icados. O corte dos geodos resfriada, tendo, como resultante, material
em chapas, associado aos processos de tingi‑ amorfo (Fig. 5C). Neste processo de fusã o/
mento, com exploraçã o esté tica das diferen‑ solidi icaçã o, sã o geradas cavidades micro‑
tes cores das bandas, favorece à seleçã o da mé tricas (Fig. 5E) e, pelo rá pido resfriamento
á gata para diversos produtos. do material, tem‑se a geraçã o de uma porosi‑
Um dos principais e mais antigos dade secundá ria, que pode abrigar microcá p‑
usos é o seu bene iciamento por glı́ptica, que sulas com quaisquer preenchimentos
sã o pequenas esculturas em relevo, em que (Duarte et al., 2011). Microcá psulas sã o mui‑
a loram as diferentes cores, formando dese‑ to utilizadas em inú meros produtos, atual‑
nhos. Os materiais que possuem intercalaçã o mente, e, na á gata, microcá psulas, contendo
de bandas de calcedô nia (cinza) e com ban‑ corante luorescente e, també m, substâ ncias
das de opala (branca) sã o os mais valoriza‑ aromá ticas, tê m sido inseridas na porosidade
dos. A regiã o de Idar‑Oberstein, na secundá ria (Fig. 5F).
Alemanha, tem tradiçã o nesta prá tica e, atu‑ O corte da á gata em chapas pode ter
almente, importa o material do RS, pois suas espessuras variadas, dependendo da inali‑
reservas foram exauridas. Pesquisas acadê ‑ dade do uso. As disponı́veis no mercado pos‑
micas sã o desenvolvidas, para que este mate‑ suem espessuras aproximadas de 2 mm e
rial possa ser bene iciado no Rio Grande do permitem o corte por jato d’á gua, que corta o
Sul (Bisinella, 2014; Kindlein et al., 2020). A material, por meio de um jato d’á gua abrasi‑
elaboraçã o de camafeus com per il humano, vo (normalmente, adicionado de granada), e
obtida por escaneamento tridimensional que consegue reproduzir trajetos elaborados
(Fig. 5A), foi feita em opala branca do RS em softwares do tipo Computer‑Aided Design
(Tessmann, 2009). A opala branca ainda é (CAD), em coordenadas X‑Y, formando dese‑
pouco utilizada, pois, diferentemente da á ga‑ nhos vazados, com inú meras aplicaçõ es
ta, sua comercializaçã o em forma de chapas (Barp, 2009; Silveira, 2011). Chapas de maior
nã o é viá vel, pois é muito quebradiça. Entã o, espessura, com 6 mm, podem ser utilizadas
uma das opçõ es de uso é a lapidaçã o lisa, do para o corte de ané is. Este processo permite
364 Edição da Sociedade Brasileira de Geologia – Núcleo RS/SC
Michelin et al.
Figura 6 – Bene iciamento de á gata e de opala: A) Escultura em relevo, feita por usinagem CNC, a partir do
modelo, obtido por digitalizaçã o tridimensional de per il humano (detalhe); B) Opala translucida e opala branca
em lapidaçã o lisa, do tipo cabochã o; C) laser, interagindo com a á gata e, no detalhe, difratograma de raios‑X,
indicando o antes e o depois da açã o do laser; D) Bracelete com á gata originalmente preta, gravada a laser
(porçõ es brancas); E) Imagem eletrô nica de varredura, mostrando a de iniçã o das zonas gravadas e nã o
gravadas a laser; F) Microporosidade secundá ria, gerada pela gravaçã o a laser, indicando microcá psulas
aromá ticas alojadas na porosidade (setas); G) Processo de corte por jato d’á gua, com o corte de quatro ané is,
feito em chapa de á gata; H) Corte modular em á gata tingida de rosa e de preto, para aproveitamento de resı́duos;
e I) Chapa de á gata tingida, indicando porçõ es, que respondem diferentemente ao tingimento, e pequena banda
de opala (seta).
ou açú car, os quais, apó s impregnarem nos estabelecimento de crité rios de prospecçã o
microporos, sã o submetidos a uma reaçã o de novos depó sitos econô micos.
quı́mica, com a inalidade de convertê ‑los em O bene iciamento de opala e de á gata
um composto colorido e insolú vel, como pro‑ mostra uma alternativa promissora para es‑
posto por Knecht (1957). tudos mais aprofundados em design e forne‑
A mudança de cor da á gata decorre ce um aporte de renda para as regiõ es do
da impregnaçã o, por corantes orgâ nicos e estado produtoras destes materiais gemoló ‑
inorgâ nicos, da microporosidade caracterı́s‑ gicos.
tica e da sua resistê ncia ao calor e aos á cidos.
A variaçã o da microporosidade nas bandas REFERÊNCIAS
faz com que o tingimento ocorra de forma ir‑
regular, pois algumas bandas sã o mais facil‑ Agostini, I. M. 1998. Agata do Rio Grande do
mente impregnadas pelo corante do que Sul. Brası́lia, DNPM, 272p. (Sé rie Difusã o Tec‑
outras, tornando as bandas mais evidente noló gica, 5)
pelo contraste de cores (Fig. 5I). Como a so‑
Augustin, A. H. 2004. Geologia e mineralogia
luçã o tingidora penetra pouco no mineral, o
dos depó sitos de opala da regiã o do Salto do
tingimento costuma ser feito, apó s a peça ser Jacuı́, RS, Brasil. Porto Alegre, 77p. Monogra‑
cortada e desbastada, para facilitar a pene‑ ia de Conclusã o do Curso, Curso de Geologia,
traçã o do corante (Branco & Gil, 2000). Esti‑ Instituto de Geociê ncias, Universidade Fede‑
ma‑se que cerca de 40% dos exemplares de ral do Rio Grande do Sul.
á gata comercializados no estado passem por
Bard, D. R. A. 2009. Design e materiais: con‑
este processo de tingimento. No entanto, es‑
tribuiçã o ao estudo do processo de corte de
te ı́ndice ainda é inferior à mé dia mundial, á gata por jato d’á gua em formas complexas.
considerada superior a 50% (Branco & Gil, Porto Alegre, 95p. Programa de Pó s‑gradua‑
2000). çã o em Design, Escola de Engenharia, Facul‑
dade de Arquitetura, Universidade Federal
do Rio Grande do Sul.
6 CONCLUSÕES
Batisti, V. S. & Tatsch, A. L. 2012. O Arranjo
O Rio Grande do Sul apresenta um Produtivo Local (APL) gaú cho de gemas e
grande potencial, como produtor de á gata e joias: estruturas produtiva e comercial, ar‑
de opala, com depó sitos, associados à s ro‑ ranjos institucional e educacional e relaçõ es
chas vulcâ nicas á cidas da Formaçã o Serra interorganizacionais. Ensaios FEE, Porto Ale‑
Geral, da Bacia do Paraná . Esses depó sitos, gre, 33(2): 513‑538.
que sã o explotados até hoje, rendem um vo‑
Bisinella, R. C. 2014. Design de gemas: Fresa‑
lume apreciá vel de material, representando dora pantográ ica para glı́ptica em á gata.
uma nova fonte de divisas para as regiõ es Porto Alegre, 117p. Programa de Pó s‑gradu‑
produtoras. açã o em Design, Escola de Engenharia, Facul‑
As caracterı́sticas geoló gicas, mine‑ dade de Arquitetura, Universidade Federal
raló gicas e geoquı́micas apontam para uma do Rio Grande do Sul.
origem de baixa temperatura para esses de‑ Blankenburg, H. J. 1988. Agate. Dt. Verl.
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mian volcanics from “Boró wno” quarry do Rio Grande do Sul.
1
Instituto de Geociê ncias, Universidade Federal do Rio Grande do Sul
2
Programa de Pó s‑graduaçã o em Geociê ncias, Universidade Federal do Rio Grande do Sul
1 INTRODUÇÃO
A ametista ‒ variedade de quartzo de cor violeta – é a mais apreciada e valorizada, entre
os minerais da famı́lia da sı́lica, sendo utilizada desde a Antiguidade, quando era proveniente do
Egito, do sudeste asiá tico, dos Montes Urais e de parte do oeste europeu (Frondel, 1962; O’Do‑
noghue, 1987). Atualmente, entre os vá rios paı́ses produtores, o Brasil é um dos maiores forne‑
cedores mundiais desse bem mineral, destacando‑se o Rio Grande do Sul como o maior
produtor nacional, devido à qualidade e ao volume produzido.
A maioria dos materiais gemoló gicos do Rio Grande do Sul está associado à s rochas do
Grupo Serra Geral, da Bacia do Paraná , sendo a ametista uma das gemas mais importantes, com
o mesmo tipo de depó sito ocorrendo, també m, em Santa Catarina. A Figura 1 mostra as princi‑
pais unidades geoló gicas do RS e de SC, com a localizaçã o dos principais depó sitos de ametista
(em explotaçã o ou que mostram potencial de aproveitamento econô mico), indicando, ainda, as
quatro principais regiõ es de extraçã o desse bem mineral. Nesses depó sitos, a ametista ocorre
preenchendo cavidades centimé tricas a mé tricas (geodos), podendo ocorrerem associados á ga‑
ta, ô nix, cornalina, cristal de rocha, quartzo rosa, calcita, gipsita, barita, jaspe, apo ilita, zeó litas e
opala. Esses minerais sã o aproveitados economicamente nos mercados brasileiro e internacio‑
nal, como minerais de coleçã o, como gemas ornamentais ou como gemas lapidadas.
Muitos trabalhos acadê micos foram desenvolvidos, para o entendimento das condiçõ es
de mineralizaçã o destes importantes depó sitos de classe mundial do Brasil (e.g. Gomes, 1996;
Scopel, 1998; Juchem, 1999; Gilg et al., 2003, 2014; Proust & Fontaine, 2007a, 2007b; Juchem et
Contribuições à Geologia do Rio Grande do Sul e de Santa Catarina
Figura 1 ‒ Esboço geoló gico do RS e de SC, com a localizaçã o dos principais depó sitos de ametista, indicando as
quatro regiõ es, em que, atualmente, existe extraçã o desse bem mineral: 1) Distrito Mineiro de Ametista do Sul;
2) Regiã o da Fronteira Oeste do RS; 3) Regiã o de Nova Bré scia‑Progresso e Caxias do Sul; e 4) Regiã o de Entre
Rios (SC) (modi icado de Juchem, 2014).
em Sã o Carlos (Juchem, 1999). peiros, atravé s de lavra subterrâ nea. Sã o
Nesse distrito mineiro, foram identi‑ abertos tú neis horizontais (com extensõ es
icados trê s derrames mineralizados do tipo de 100 m a 400 m) no basalto maciço, com o
basalto toleı́tico (Rosenstengel & Hartmann, uso de explosivos caseiros à base de pó lvora,
2012). O maior produtor é o derrame Veia de salitre e de carvã o, e os geodos sã o ex‑
Alta, tendo, subjacentes a ele, os derrames traı́dos com marteletes pneumá ticos, com
Veia do Meio e Veia Baixa (Fig. 2A). Esses martelos manuais, com ponteiras e com ta‑
derrames sã o do tipo quı́mico Pitanga e po‑ lhadeiras (Figs. 2B e 2C) (Juchem, 1999).
dem ser classi icados como tipo I, na classi i‑ O nı́vel dos geodos mineralizados
caçã o proposta por Gomes (1996). ocorre em um basalto cinza a cinza esverde‑
Os geodos tê m, em geral, dimensõ es ado, com poucas fraturas horizontais e verti‑
decimé tricas a mé tricas e estã o parcialmente cais, à s vezes irregulares, mas sempre muito
preenchidos por uma camada milimé trica a espaçadas, o que confere à rocha uma por‑
centimé trica de quartzo microcristalino (cal‑ çã o maciça, com 2 a 3 m de espessura, deno‑
cedô nia, por vezes bandada, caracterizando a minada pelos garimpeiros de "laje". Acima
variedade á gata), seguida de uma camada da zona mineralizada, ocorre um nı́vel de
centimé trica de quartzo macrocristalino in‑ basalto cinza escuro a preto (de 0,5 a 1,0 m
color a leitoso, que grada progressivamente de espessura), com um sistema de fraturas
para ametista. E comum ocorrer calcita cres‑ irregulares bastante marcante, que origina
cida sobre a ametista e, mais raro, gipsita blocos decimé tricos, denominado pelos ga‑
(variedade selenita), alé m de barita e de rimpeiros de "cascalho"e que constitui o to‑
quartzo rosa, representando episó dios de po das galerias subterrâ neas (Fig. 2B).
cristalizaçã o mais tardios (Fig. 3). A extraçã o O principal derrame portador, o Veia
dos geodos mineralizados é feita por garim‑ Alta (Rosenstengel & Hartmann, 2012), é um
Figura 2 ‒ Distrito Mineiro de Ametista do Sul: A) Per il esquemá tico mostrando o empilhamento dos derrames
mineralizados, com as principais estruturas relacionadas (modi icado de Hartmann et al., 2012); B) Frente de
lavra mostrando o sistema de exploraçã o em galerias subterrâ neas horizontais; e C) Garimpeiro no processo de
retirada de um geodo.
basalto afanı́tico a afı́rico. A textura, em ge‑ em uma textura seriada com os fenocristais,
ral, é holocristalina seriada a por irı́tica, po‑ gradando de microcristais ou micró litos a
dendo ser intergranular, intersertal e, por grã os de 0,5 mm de comprimento. Alé m do
vezes, localmente glomeropor irı́tica e plagioclá sio e da augita, é comum a presença
traquı́tica (Fig. 6A). Ocorrem algumas vesı́‑ de minerais opacos, identi icados como il‑
culas milimé tricas, ovó ides a irregulares, menita e como magnetita titanı́fera. Todos
preenchidas por argila de cor verde e/ou por esses minerais, em geral, estã o envoltos por
á gata e por quartzo. Os fenocristais (0,5‑1,2 uma massa muito ina, identi icando‑se, por
mm) perfazem em torno de 5% da rocha e vezes, pequenas porçõ es de vidro muito al‑
sã o de difı́cil identi icaçã o macroscó pica, terado.
sendo constituı́dos por plagioclá sio (An 40‑ As rochas mineralizadas dessa re‑
60), em geral, zonados (teor de An diminuin‑ giã o foram afetadas pela percolaçã o de lui‑
do do centro para o bordo), e, mais raro, por dos hidrotermais, que alteraram a matriz
augita. E comum a alteraçã o do piroxê nio pa‑ vı́trea e os cristais de piroxê nio para uma
ra celadonita (argila verde). Muitas vezes, os mineralogia secundá ria. Esta alteraçã o hi‑
fenocristais mostram feiçõ es de desequilı́‑ drotermal está bem caracterizada pela per‑
brio com a matriz, produzindo reaçõ es que colaçã o de luidos das porçõ es mais
formam massas argilosas e ó xidos de ferro inferiores da bacia, desde a base da forma‑
nos seus bordos. Na matriz podem ocorrer çã o Botucatu (Gilg et al., 2003). Resultante
as mesmas fases minerais identi icadas nos da alteraçã o, a celadonita é um importante
fenocristais, as quais, muitas vezes, constitu‑ guia prospectivo para os garimpeiros da re‑
374 Edição da Sociedade Brasileira de Geologia – Núcleo RS/SC
Duarte et al.
giã o e indica os está gios mais avançados dos mineralizadas a ametista de Artigas, no Uru‑
processos de mineralizaçã o (Duarte et al., guai, onde Techera (2009) identi icou seis
2010). derrames. Dois desses derrames sã o minera‑
lizados e denominados Colada Catalá n e Cola‑
2. 2 Região da Fronteira Sudoeste do RS da Cordillera (Duarte, 2008), sendo colada a
(Quaraí e Livramento) palavra em espanhol para derrame. Posteri‑
ormente, Hartmann et al. (2010) indicaram
Nessa regiã o, a sequê ncia de derra‑ que os derrames sã o cinco, tendo a Colada
mes está em contato direto com os arenitos Catalá n um nú cleo maciço e um nı́vel de
eó licos da Formaçã o Botucatu (Fig. 4) e o aproximadamente 10 m de mineralizaçã o
pacote vulcâ nico possui por volta de 200 m pervasiva, e a Colada Cordillera, um derrame
de espessura. As rochas, classi icadas como espesso, com a porçã o mineralizada maciça e
do fá cies Alegrete, como proposto por Wild‑ com disjunçã o colunar.
ner (2003), sã o andesitos a andesitos basá l‑ Segundo Acauan (2004), os geodos
ticos, classi icados como baixo‑Ti, tipo mineralizados do lado brasileiro ocorrem
Gramado, de acordo com a proposiçã o de principalmente, em colú vios e em aluviõ es,
Peate et al. (1992). Essas rochas sã o petro‑ mas també m podem ser encontrados na ro‑
gra icamente semelhantes e tê m continuida‑ cha vulcâ nica, com diferentes graus de altera‑
de estratigrá ica com as rochas çã o. Esses geodos, tê m em mé dia 40 cm de
Figura 4 ‒ Regiã o de Quaraı́/Artigas: A) Per il esquemá tico, indicando os derrames mineralizados, com as
principais estruturas relacionadas à mineralizaçã o e a proximidade com a Formaçã o Botucatu (modi icado de
Hartmann et al., 2012); B) Frente de lavra, representativa do derrame Catalá n, em Artigas, em que se observa a
parte superior de onde se extraem os geodos de á gata, em extraçã o que evoluiu de lavra a cé u aberto à porçã o
desenvolvida em galerias horizontais subterrâ neas, para a extraçã o de geodos de ametista; C) Geodos
mineralizados com ametista, a lorando em corte feito na rocha menos alterada, no Garimpo do Vivi, em
Livramento; D) Geodos mineralizados com á gata e com ametista, extraı́dos do solo (camada mais superior da
Colada Catalá n) na regiã o de Quaraı́/Livramento.
diâ metro e ocorrem parcial ou totalmente do volume das rochas, nas quais a alteraçã o
preenchidos por calcedô nia/á gata; quando foi mais severa.
em preenchimento parcial, essa fase micro‑
cristalina ocorre como bandas milimé tricas 2. 3 Região de Progresso‑Nova Bréscia
a centimé tricas, seguidas de quartzo incolor e Caxias do Sul
a leitoso, que grada progressivamente para
ametista. Na porçã o brasileira, a Colada Ca‑ Alguns depó sitos de interesse
talá n a lora no Garimpo do Vivi (em Livra‑ econô mico ocorrem em rochas vulcâ nicas
mento), uma das poucas explotaçõ es que á cidas, em Caxias do Sul (Sirtoli et al., 2005;
possui um histó rico de ser economicamente Fianco et al., 2006; Juchem, 2014) e na re‑
ativa. Na porçã o superior da cava, devido ao giã o entre os municı́pios de Progresso, de
grau de alteraçã o dessa rocha, o desmonte Nova Bré scia e de Fontoura Xavier (Hoppe,
podia ser feito por escavadeiras, que retira‑ 2012; Juchem, 2014). Na classi icaçã o litoge‑
ram predominantemente geodos de á gata. oquı́mica proposta por Bellieni et al. (1986),
Desde 2009, a cava chegou na rocha mais sã por Peate et al. (1992) e por Nardy et al.
e passou a ter ocorrê ncias de geodos de (2008), essas rochas apresentam caracterı́s‑
ametista (Hartmann et al., 2010; Bergmann ticas do tipo magmá tico Palmas (ATP), com
et al., 2020). Os cristais de ametista sã o, em aspecto macroscó pico afanı́tico a afı́rico e
geral, lı́mpidos e apresentam tonalidades de com textura hipohialina, ao microscó pio. Vá ‑
cor agradá veis, com boa aceitaçã o no merca‑ rias rochas tê m caracterı́sticas petrográ icas
do de gemas (Augustin et al., 2007). e geoquı́micas do subgrupo Caxias do Sul,
O derrame portador (Colada Cata‑ enquanto outras nã o se enquadram em
lá n) é afanı́tico, com cor cinza escuro a aver‑ qualquer um dos outros subtipos propostos
melhado. E constituı́do de microfenocristais (Juchem et al., 2015).
de plagioclá sio e de piroxê nio (por vezes, Nesses depó sitos, as mineralizaçõ es
formando glomeropó r iros), dispersos em estã o associadas a rochas vı́treas, com dife‑
uma matriz, composta també m por plagio‑ rentes graus de alteraçã o. Na regiã o de Pro‑
clá sio e por piroxê nio, alé m de minerais opa‑ gresso‑Nova Bré scia (NB), foram estudados
cos ‒ magnetita titanı́fera e ilmenita. Todos cinco garimpos e identi icados cinco nı́veis
esses minerais estã o envoltos por uma mas‑ mineralizados, enquanto que na regiã o de
sa de restos de vidro vulcâ nico alterados pa‑ Caxias do Sul, ocorrem mais dois nı́veis mi‑
ra argilominerais. Observam‑se també m, neralizados (Fig. 5A). A rocha mineralizada
fraturas, vesı́culas e cavidades polié dricas tem uma espessura em torno de 2,0 m a 5,0
preenchidas por argilominerais, alé m de m e é constituı́da por uma rocha preta, de
quartzo ino e de calcedô nia. Os microfeno‑ aspecto vı́treo a resinoso (pitchstone), nã o
cristais de plagioclá sio sã o labradorita (An alterada ou com diferentes graus de altera‑
50‑60), enquanto o plagioclá sio da matriz é çã o. Intercaladas com esses nı́veis vı́treos
de composiçã o mais só dica (An 40‑50). Já o ocorrem rochas afanı́ticas a afı́ricas, de cor
piroxê nio (augita), tanto na matriz como os cinza a cinza acastanhado, com diferentes
fenocristais, pode apresentar bordos trans‑ graus de alteraçã o e que podem conter vesı́‑
formados em pigeonita (Fig. 6B). A rocha mi‑ culas, preenchidas por calcedô nia e por
neralizada da Colada Catalá n está quartzo. Como os nı́veis vı́treos mineraliza‑
intensamente alterada na zona mineralizada, dos podem estar bem preservados, por ve‑
destruindo principalmente a pigeonita, que é zes a explotaçã o é feita em cavas horizontais
alterada para esmectita, ocupando até 60% subterrâ neas, com 30 a 50 m de extensã o
(Figs. 5C e 5D), ocorrendo, també m, minera‑ dispostos por vezes em agregados radiados
çã o a cé u aberto, onde as rochas estã o em es‑ a esferulı́ticos, como nú cleos de desvitri ica‑
tado mais avançado de alteraçã o (Fig. 5B). çã o e como alteraçã o para minerais argilo‑
As rochas portadoras de ametista dos sos (Fig. 6C). A principal diferença
depó sitos estudados sã o semelhantes entre observada entre as rochas de aspecto vı́treo
si, contendo sempre vidro vulcâ nico em dife‑ em amostra de mã o e as rochas afanı́ticas/
rentes proporçõ es, com microfenocristais de afı́ricas é que as primeiras, ao microscó pio,
plagioclá sio (labradorita/andesina) e de pi‑ apresentam uma massa vı́trea, em geral,
roxê nio (augita/pigeonita) e opacos (magne‑ igual ou superior a 60% do volume da rocha,
tita titanı́fera) e micró litos de mesma enquanto nas rochas que nã o apresentam tal
composiçã o, inseridos em matriz vı́trea. Po‑ aspecto em amostra de mã o, a matriz vı́trea
dem ocorrer texturas glomerpor irı́tica e cu‑ ocupa cerca de 40% do volume da rocha (Ju‑
mulopor irı́tica, envolvendo, principalmente, chem, 2014). A proporçã o de vidro é um dos
microfenocristais de plagioclá sio e de piroxê ‑ pontos relevantes para o desenvolvimento
nio e, por vezes, opacos. Na matriz, sã o iden‑ de condiçõ es de mineralizaçã o por luidos
ti icados inı́cios de cristalizaçã o de minerais, hidrotermais no modelo epigené tico (Duarte
na forma de cristá litos ibrosos a aciculares, et al., 2010).
Figura 5 – Regiã o de Progresso‑Nova Bré scia e Caxias do Sul: A) Per is litoló gicos esquemá ticos indicando o
empilhamento e a distribuiçã o dos derrames mineralizados e nã o mineralizados, identi icados nas rochas
á cidas; B) Frente de lavra a cé u aberto de onde sã o retirados geodos de ametista em dois nı́veis vı́treos de um
vitró iro á cido, seguidos por um nı́vel de topo menos alterado (riodacito semi‑vı́treo); C) Entrada de uma galeria
de extraçã o de geodos de ametista, aberta na rocha vı́trea; D) Detalhe do interior dessa galeria, onde se observa
nas paredes a rocha vı́trea de cor preta e geodos centimé tricos mineralizados.
Figura 6 – Imagens representativas das caracterı́sticas microscó picas das rochas portadoras de geodos com
ametista: A) Distrito Mineiro de Ametista do Sul (RS) e da regiã o de Entre Rios (SC) – microfenocristais de
plagioclá sio (pl ‑ Na 40‑60) e de piroxê nio (px ‑ augita) e opacos (op ‑ ilmenita e magnetita titanı́fera), envoltos
por uma matriz de mesma composiçã o e, por vezes, de vidro alterado; B) Regiã o de Quaraı́/Livramento –
microfenocristais de plagioclá sio (pl ‑ An 50‑60) e de piroxê nio (px ‑ augita/pigeonita), envoltos por micró litos
de plagioclá sio (pl ‑ An 40‑50) e de piroxê nio (px ‑ augita/pigeonita) e em uma matriz de vidro muito alterado
para argilo‑minerais; C) Regiã o de Progresso‑Nova Bré scia e Caxias do Sul ‒ microfenocristais e micró litos de
plagioclá sio (pl ‑ labradorita/andesina) e de piroxê nio (px ‑ augita/pigeonita) e opacos (op ‑ magnetita
titanı́fera), inseridos em uma matriz vı́trea, com cristalitos aciculares a ibrosos (V1), com nú cleos de
desvitri icaçã o e, por vezes, com cristalitos radiados (V2) e com alteraçõ es para minerais argilosos.
Figura 7 ‒ Marcadores de processos epigené ticos: A) Fratura sub‑horizontal preenchida pela mesma sequê ncia
de mineralizaçã o que está presente nos geodos; (B) Fratura sub‑horizontal, preenchida por calcedô nia,
observada na base das galerias de extraçã o de geodos no nı́vel mineralizado; C) Sequê ncia de geodos
conectados por fraturas indicando conexã o tridimensional do sistema de cavidades; (E) Detalhe da fratura de
conexã o, com um dos limites bem de inido, preenchida pelas mesmas fases minerais que preenchem os geodos;
(D) Geodo com brecha na base e com canal de escape de luido, associado à porçã o de topo da cavidade; (F)
Geodo com dois canais de preenchimento associados à base; (G) Detalhe das fraturas associadas à s bordas, e da
brecha, associada ao canal de preenchimento, formada por clastos da rocha hospedeira, envoltos pelos minerais
de sı́lica.
Para a abertura das cavidades, tam‑ brechas da base dos geodos, os clastos ci‑
bé m há a contribuiçã o de processos de dis‑ mentados pela matriz de zeó litas mostram
soluçã o de alguns minerais má icos (Duarte processo avançado de dissoluçã o, com cavi‑
et al., 2009). A pigeonita é totalmente altera‑ dades neo‑formadas sendo preenchidas pe‑
da para esmectita (Duarte et al., 2010), ten‑ las fases silicosas (calcedô nia).
do, como relictos, cristais de plagioclá sios, Recentemente, processos diagené ti‑
imersos em mesó stase neo‑formada. Nas cos foram atribuı́dos à s mineralizaçõ es de
Figura 8 – Brechas hidrá ulicas associadas a geodos: (A) Base de geodo formada por grandes blocos brechados,
envoltos pela mineralizaçã o (Artigas, UY); (B) Clastos da brecha progressivamente alterados que tendem a
apresentar bordas arredondadas (Artigas, UY); C) Brecha observada na parede da galeria de exploraçã o
(Ametista do Sul, RS); D) Clasto envoltos pela mineralizaçã o na base de geodos, prontos para serem
comercializados (Ametista do Sul, RS); E) Clastos de diferentes dimensõ es e de diferentes contornos envoltos
pela mineralizaçã o (Progresso, RS); (F) Brecha associada à fratura e à base de geodo, observada em bloco
retirado da lavra (Progresso, RS).
á gata e de ametista na regiã o da fronteira no, 1974; Techera, 2009) e, també m, para os
sudoeste (Bergmann et al., 2020). Associado depó sitos de á gata do Salto do Jacuı́ (Hee‑
a estes processos de diagê nese para a mine‑ mann & Strieder, 1999; Michelin, 2014). Bossi
ralizaçã o, tem‑se a contribuiçã o de areias e & Caggiano (1974) descrevem que a entrada
de sedimentos inconsolidados e incorpora‑ de areia ocorre com a incorporaçã o dos grã os
dos pela lava para a fonte de sı́lica, para a de areia do sistema desé rtico ativo, durante a
formaçã o da á gata e de ametista, que é aven‑ erupçã o das lavas. Essa entrada de areia pode
tada para a porçã o uruguaia (Bossi & Caggia‑ ocorrer pela porçã o de topo, com a areia pre‑
enchendo as zonas de auto‑brecha, ou pela cos, foi possı́vel sugerir que um mesmo pul‑
porçã o de base, com a areia sendo incorpora‑ so pode mineralizar derrames sobrepostos.
da pelo luxo de lava. Para a transformaçã o Estes pulsos podem ser individualizados pe‑
da areia em calcedô nia, em quartzo incolor e la repetiçã o completa ou incompleta da
em ametista, a á gua presente, dissolvida no sequê ncia de minerais calcedô nia‑quartzo
magma basá ltico, solubiliza a sı́lica; se a incolor‑ametista (Fig. 8B e 8D) (Duarte et
pressã o for su iciente, haverá a formaçã o de al., 2011).
soluçõ es ricas em sı́lica, que tendem a ascen‑ As aná lises de isó topos δ18O, combi‑
der e a formar as cavidades, que serã o preen‑ nadas aos dados de δD, sugerem fonte me‑
chidas, tã o logo a temperatura diminua. Os teó rica e soluçõ es salinas das porçõ es mais
autores se reportam a Holland (1967 apud profundas do Sistema Aquı́fero Guarani para
Bossi & Caggiano, 1974), para a irmar que, o hidrotermalismo (Gilg et al., 2014). A per‑
em condiçõ es de altas temperatura e pressã o, colaçã o de luido em grande escala e, até ,
a á gua liberada pelo magma seria capaz de por unidades sedimentares abaixo do Botu‑
dissolver grandes quantidades de sı́lica. Os catu també m podem ser aventadas, sugeri‑
guias prospectivos, sugeridos por Bossi & da pelas assinaturas de isó topos de enxofre
Caggiano (1974), sã o derrames que conte‑ de rochas mineralizadas e alteradas, hidro‑
nham uma signi icativa presença de brechas termalmente (Duarte et al., 2010; Juchem &
no topo, com veios ou com ilõ es de areia. Hartmann, 2011). O intervalo de valores de
isó topos δ34S, obtidos no nı́vel mineralizado
4 PREENCHIMENTO DOS GEODOS – MI‑ (‑15‰ a ‑0,3‰) do distrito mineiro de Los
NERALOGIA E CONDIÇÕES DE CRISTALI‑ Catalanes, e a depleçã o destes em enxofre
ZAÇÃO vulcâ nico, sugerem contaminaçã o
relacionada à s rochas sedimentares, duran‑
O preenchimento dos geodos é atri‑
te a alteraçã o causada pelos luidos hidro‑
buı́do a processos de baixas temperaturas
termais, que mineralizaram o basalto.
(Juchem, 1999) e tem, por base, estudos de
inclusõ es luidas e dados de isó topos de oxi‑
gê nio. Os luidos sã o aquosos e de baixa sali‑
5 CONTEXTO ESTRUTURAL E GEO‑
TECTÔNICO DOS DERRAMES MINERALI‑
nidade, com inclusõ es luidas monofá sicas
ZADOS
(Juchem, 1999; Duarte et al., 2010; Gilg et al.,
2003, 2014). Gilg e colaboradores (2014), in‑ O desenvolvimento de estruturas
dicam quatro está gios de mineralizaçã o para aptas a conter os luidos hidrotermais que
o DMAS, marcados por diferenças de salini‑ venham a exercer sobrepressã o, é um dos
dade do luido, obtidas em inclusõ es luidas. pontos considerados, para que ocorra o de‑
A salinidade do luido indica soluçõ es hidro‑ senvolvimento das condiçõ es de mineraliza‑
termais, que evoluem de condiçõ es redutoras çã o. O processo de mineralizaçã o no Grupo
para oxidantes, com salinidades de 5,3, de Serra Geral é considerado, aqui, epigené tico
3,4 e de 0,3 wt% NaCl, respectivamente, para (Duarte et al., 2009). O aporte de luido hi‑
os está gios II, III e IV. O está gio I, constituı́do drotermal foi universal no grupo vulcâ nico,
por celadonita, por calcedô nia e por pirita, pois foram mineralizados os derrames que
nã o possui inclusõ es luidas. Em depó sitos retiveram o luido hidrotermal nas porçõ es
de Artigas (Uruguai), també m foram identi i‑ maciças pelo tempo necessá rio, resultando
cados vá rios está gios de preenchimento ou na alteraçã o dos minerais primá rios para
pulsos de mineralizaçã o. Por dados isotó pi‑ secundá rios (em 500 anos, sugere‑se). A ca‑
(Hartmann et al., 2012a). Foi mineralizado o material gemoló gico, desde o perı́odo neolı́‑
derrame que tinha a estrutura necessá ria tico, enquanto a variedade verde acinzenta‑
para a formaçã o dos geodos, em qualquer nı́‑ da entrou no mercado somente no inı́cio
vel estratigrá ico. dos anos 2000 (McClure et al., 2010). Para
essa variedade, a cor é associada ao defeito
6 APROVEITAMENTO GEMOLÓGICO estrutural Non‑Bridging‑Oxygen Hole Center
(NBOHC), um centro de cor desenvolvido
A ametista é o principal produto co‑ pela exposiçã o à radiaçã o, que possui janela
mercializado no mercado gemoló gico, para de transmissã o na faixa de 490 a 540 nm,
ins ornamentais ou de joalheria. Existe uma que corresponde à faixa verde no espectro
classi icaçã o de cores pela saturaçã o, que vai eletromagné tico (Henn & Gü ttler, 2012;
de fraca a extra. Sob tratamento té rmico, a Enokihara, 2013). As doses recebidas para
ametista desenvolve o amarelo acastanhado desenvolvimento da cor em quartzo incolor,
(citrino), com temperatura em torno de 500‑ variam de 200 a 900 kGy, para cristais pro‑
600 oC (Fischer, 1999) e, recentemente, venientes da regiã o do Alto Uruguai (Mene‑
Cheng & Guo (2020) indicaram a temperatu‑ zes, 2019), e sã o de 900 kGy para os cristais
ra de 560 oC para a formaçã o do citrino. Sã o da regiã o de Progresso (Tononi et al., 2020).
selecionadas para tratamento té rmico, ame‑ A dose a ser recebida, e que desenvolverá
tista de cor fraca, associadas a cristais bem cor, pode ser calculada pelo fator Ametista
desenvolvidos e a outros fatores esté ticos, (Lameiras et al., 2012). Cabe salientar que a
como transparê ncia (Fig. 9A). ametista e o quartzo verde perdem a cor, se
O quartzo incolor, també m conheci‑ expostos à radiaçã o ultravioleta (Juchem,
do como cristal‑de‑rocha, possui baixo valor 1999; Enokihara, 2013).
agregado no comé rcio, em comparaçã o com
as outras variedades. Té cnicas de tratamen‑ 7 CONSIDERAÇÕES FINAIS
to, a im de induzir ou de melhorar a cor, sã o
comuns e sã o uma alternativa recorrente, A ametista é um dos mais impor‑
pois resultam em um aumento no valor tantes bens minerais do RS. Entender os
agregado do produto. O tratamento por radi‑ processos gené ticos auxilia na prospecçã o
açã o ionizante é uma dessas té cnicas. No de novos alvos economicamente viá veis. A
Brasil, a radiaçã o gama, com fonte Cobalto‑ hipó tese epigené tica agrega estruturas de
60, é muito utilizada para esta inalidade. As escalas local e regional (eventos H1‑H2‑H3),
cores resultantes apó s o tratamento, estã o que indicam possı́veis novos alvos. Cabe sa‑
relacionadas à origem gené tica do depó sito, lientar que a nã o restriçã o de mineraliza‑
a impurezas e à quantidade de dose aplicada çõ es a tipos quı́micos e litoló gicos é
(Rossman, 1994). importante, para indicar fatores exó genos
O quartzo incolor do Rio Grande do ao magmatismo relacionados à mineraliza‑
Sul, ao ser exposto à radiaçã o ionizante, po‑ çã o. O RS é o maior produtor de ametista e o
de desenvolver as cores verde acinzentada e aproveitamento gemoló gico destes minerais
violeta (Enokihara, 2013; Menezes, 2019; deve ser tratado como questã o de desenvol‑
Tononi et al., 2020) (Fig. 9B‑9C). O Fe4+ é o vimento econô mico para as regiõ es produ‑
agente responsá vel pela cor violeta da ame‑ toras, aumentando a diversidade de
tista, ao substituir ı́ons de Si4+ na rede crista‑ materiais gemoló gicos disponı́veis, bem co‑
lina do quartzo (Rossman, 1994). Esta mo a qualidade das gemas.
variedade do quartzo é muito utilizada como
Figura 9 ‒ Aproveitamento gemoló gico: A) Ametista e citrino, obtido por tratamento té rmico, lapidados em
facetas para uso em joalheria; B) Coloraçã o obtida por exposiçã o à radiaçã o gama Co60, que desenvolveu
zonaçã o de cor, indicando zonaçã o quı́mica no cristal; C) Quartzo verde obtido apó s à exposiçã o à radiaçã o
gama Co60. Em (B) e em (C) os cristais eram originalmente incolores.
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*autor correspondente:vboa.geo@gmail.com
1 INTRODUÇÃO
A Bacia de Pelotas se situa entre o Alto de Florianó polis, limite com a Bacia de Santos, e
o Alto de Polô nio, no Uruguai. Esta pode ser dividida em duas sub‑bacias: Norte e Sul (Fig. 1). O
marco divisor entre os dois segmentos é representado pelo Lineamento estrutural de Porto Ale‑
gre e pelo seu prolongamento oceâ nico, a Zona de Fratura de Porto Alegre (Martins Neto et al.,
2006).
No embasamento da sub‑bacia Sul predominam litologias pertencentes ao Cinturã o
Dom Feliciano, faixa mó vel gerada durante o Ciclo Brasiliano, identi icada como fonte de clá sti‑
cos para o preenchimento da Bacia de Pelotas (Villwock & Tomazelli, 1995). Por meio de dados
do poço 1‑TO‑1, perfurado sobre a Sinclinal de Torres, pela Petrobras, constatou‑se a presença
da sequê ncia sedimentar Permo‑Triá ssica (grupos Guatá e Passa Dois) e da sequê ncia vulcano‑
sedimentar Juro‑Cretá cea (formaçõ es Serra Geral e Botucatu), con irmando a atuaçã o da Bacia
do Paraná , como embasamento dominante na sub‑bacia Norte e, també m, como á rea fonte de
sedimentaçã o clá stica.
As principais feiçõ es geoló gicas na sub‑bacia Norte sã o a Plataforma de Florianó polis
(PF) e a Sinclinal de Torres (ST). A primeira é uma feiçã o elevada e alongada de direçã o N‑S, es‑
tabelecida sobre a á rea de ocorrê ncia das vulcâ nicas Aptianas (Fig. 2), e que se comportou como
alto estrutural até o inal do Cretá ceo, enquanto a segunda consiste de um graben alinhado a
NW‑SE, que se prolonga para o continente e que preserva no seu interior, rochas mesozoicas da
Bacia do Paraná , principalmente, dos derrames da Formaçã o Serra Geral.
Contribuições à Geologia do Rio Grande do Sul e de Santa Catarina
Figura 1 ‒ Localizaçã o e limites da Bacia de Pelotas, a frente dos estados do Rio Grande do Sul e de Santa
Catarina, sobre o mapa estrutural do embasamento. A bacia é dividida pelo Lineamento e pela Zona de Fratura
de Porto Alegre, em duas sub‑bacias: Norte e Sul. A concentraçã o de grabens antité ticos a sul, o espessamento
da faixa de Seaward Dipping Re lectors (SDR) a norte, e o deslocamento para leste do limite Crosta Continental‑
Oceâ nica (COB) atestam a distinta evoluçã o do rifte propagante, ao qual a margem meridional brasileira foi
submetida (modi icado de Petrobras/UFOP, 2006).
Figura 2 ‒ Posiçã o das principais feiçõ es geoló gicas situadas nas duas sub‑bacias sobre o mapa estrutural das
vulcâ nicas aptianas, as quais se concentram na sub‑bacia Norte e que representam o prová vel eixo de centro de
espalhamento oceâ nico abortado, que posteriormente, controlou a instalaçã o da Plataforma de Florianó polis
(PF). Ainda a norte, observa‑se a Sinclinal de Torres, um graben NW‑SE continental, que se projeta por baixo da
Bacia de Pelotas. Abaixo do Lineamento de Porto Alegre, na sub‑bacia Sul, depara‑se com o Graben de
Mostardas, també m de orientaçã o NW‑SE e que foi atuante até o Paleoceno. No extremo sul, encontra‑se o Cone
do Rio Grande, feiçã o deposicional que registra as dimensõ es de um amplo sistema deltaico, construı́do a partir
do Mioceno (modi icado de Petrobras/UFOP, 2006).
Entre eles, ressaltam‑se: a) a quase ausê ncia Tal como o Lineamento de Capricó r‑
dos meio‑grabens antité ticos da fase rifte na nio, que divide a Bacia de Santos em sul e
sub‑bacia Norte, que estã o ostensivamente norte (Bueno et al., 2004a), interpreta‑se
presentes na sub‑bacia Sul (Fig. 1); b) predo‑ que o Lineamento de Porto Alegre, herança
minantemente formados durante a fase rifte, do embasamento, tenha tido o mesmo com‑
os Seaward Dipping Re lectors (SDR) sofrem portamento, sendo reativado como uma zo‑
brusca variaçã o na largura da á rea de ocor‑ na de acomodaçã o de direçã o NW, durante a
rê ncia, ao cruzar o limite entre as sub‑bacias fase rifte eocretá cea, passando a atuar como
(Fig. 1); c) a expressiva subsidê ncia termal, uma zona de fratura oceâ nica na fase drifte.
propiciando o amplo desenvolvimento da ge‑ A velocidade no processo de abertura que se
ometria sag na sub‑bacia Norte, que é pouco desenvolvia de sul para norte, sofreu um re‑
desenvolvida na sub‑bacia Sul (Figs. 3‑4); e tardo, ao se encontrar com o Lineamento de
d) o comportamento da subsidê ncia se in‑ Porto Alegre, registrado no amplo desenvol‑
verte drasticamente entre ambas as sub‑ba‑ vimento do vulcanismo durante a fase rifte,
cias, durante a fase drifte (Figs. 3‑4). que produziu a colossal seçã o de SDR na
Figura 3 ‒ Interpretaçã o da seçã o sı́smica em profundidade (S). Observam‑se os grabens antité ticos e o tı́pico
padrã o dos SDR associados à seçã o rifte, superimpostos por espessa seçã o da margem passiva‑drifte e por
inexpressiva seçã o sag. Localizaçã o nas iguras 1 e 2 (modi icado de Stica et al., 2013).
Figura 4 ‒ Interpretaçã o da seçã o sı́smica em profundidade (N). Observa‑se que a á rea de ocorrê ncia lateral da
atividade rifte, tipicamente preenchida por SDR, praticamente triplica, em relaçã o à da sub‑bacia Sul,
deslocando o COB para leste. Alto estrutural ı́gneo a menos de 13 km de profundidade, representa o centro de
espalhamento oceâ nico abortado (CEOA) na sub‑bacia Norte. Ainda, em oposiçã o ao veri icado na sub‑bacia
Sul, ampla e espessa seçã o sag se desenvolve, coberta por uma seçã o drifte delgada. Localizaçã o nas iguras 1 e
2 (modi icado de Stica et al., 2013).
sub‑bacia Norte e que provocou o desloca‑ forma episó dica, ao longo de uma extensa
mento do limite crosta continental‑crosta faixa, com mú ltiplas fases de rifteamento e
oceâ nica (COB) para leste, embora o eixo de de oceanizaçã o, processo conhecido como
um centro de espalhamento oceâ nico abor‑ rifte propagante. Isto é , ao longo da separa‑
tado possa ser identi icado na sub‑bacia çã o, enquanto um determinado segmento se
Norte, o qual se alinha com o COB observado encontra na fase de espalhamento oceâ nico,
na sub‑bacia Sul (Fig. 2 e 4), evidê ncia de outros ainda se encontram na fase rifte, em
que algum processo interrompeu a propaga‑ graus diferenciados de extensã o de crosta,
çã o linear S‑N, observada no breakup ao lon‑ trazendo implı́citos os conceitos de evoluçã o
go da Margem Sul‑Americana. progressiva e diá crona.
Em geral, aceita‑se que o desenvolvi‑ Com base nas variaçõ es das larguras
mento de separaçõ es continentais ocorra de de ocorrê ncia da provı́ncia de Seaward Dip‑
ping Re lectors (SDR) Sã o Jorge‑Pelotas e nas termo pó s‑rifte. Por ú ltimo, foi introduzida
diferentes idades, indicadas pelos lineamen‑ uma coluna, posicionando temporalmente os
tos magné ticos a ela associados, Bueno elementos do sistema petrolı́fero, atualmen‑
(2001, 2004) propô s uma evoluçã o polifá sica te, estabelecido para a bacia (Fig. 5).
para o espalhamento oceâ nico colocado à Apesar das diferenças observadas
frente da margem brasileira, sustentando nas duas sub‑bacias, que compõ em a Bacia
que, na regiã o da atual Bacia de Pelotas, teria de Pelotas, manteve‑se as denominaçõ es lito‑
ocorrido um primeiro está gio de breakup, estratigrá icas contidas em Dias et al. (1994),
junto à Sinclinal de Torres, em que se encon‑ e a estrutura de uma ú nica carta para o arca‑
tram os a loramentos basá lticos da Provı́ncia bouço estratigrá ico, para as feiçõ es geoló gi‑
Vulcâ nica Paraná , contudo, aqui, assume‑se o cas, para os eventos tectono‑magmá ticos e
Lineamento de Porto Alegre como o marco para as sequê ncias deposicionais que carac‑
do desenvolvimento da propagaçã o do brea‑ terizam a bacia, já apresentadas em Bueno et
kup. Assim, enquanto a sub‑bacia Norte ain‑ al. (2007).
da sofria o processo de rifteamento, a Cabe o registro de uma curiosidade
sub‑bacia Sul já experimentava o está gio de sobre um ciclo nã o programado, mas realiza‑
subsidê ncia lexural, produzido pelo resfria‑ do. Como visto acima, a primeira integraçã o
mento e pela contraçã o termal da crosta de dados de sub‑superfı́cie sobre a Bacia de
oceâ nica (Martins‑Neto et al., 2006). Pelotas ocorreu em 1994. Treze anos depois,
em 2007, foi realizada uma atualizaçã o e,
3 ESTRATIGRAFIA agora, em 2020, será disponibilizada uma
nova versã o, uma fotogra ia do conhecimen‑
A carta estratigrá ica da Bacia de Pe‑ to progressivo, passados mais treze anos.
lotas, aqui apresentada, difere da versã o de Apesar da assunçã o, aqui exposta,
Bueno et al. (2007) em alguns pontos. Pri‑ quanto a considerar os derrames da Forma‑
meiro, foi ajustado o intervalo de duraçã o da çã o Serra Geral como uma fase dissociada do
Fm. Serra Geral, segundo os dados isotó picos está gio rifte, uma interpretaçã o do desenvol‑
apresentados em Janasi et al. (2011), produ‑ vimento da Sinclinal de Torres provoca dú vi‑
zidos por aná lise U‑Pb em cristais de bade‑ das a esse respeito, pois observaçõ es de
leı́ta/zircã o, que resultaram num intervalo campo, a partir de seçõ es estratigrá icas,
de 3 Ma para a extrusã o de toda a suı́te vul‑ conduzem a uma possı́vel contemporaneida‑
câ nica. Segundo, introduziu‑se o Mb. Nova de de boa parte do magmatismo à evoluçã o
Prata na estratigra ia da Fm. Serra Geral, o do rifte Eocretá ceo (Petrobras/Profex,
que conduziu a outras duas mudanças: 1o) a 2011). Isto se traduz como um desa io a ser
desvinculaçã o dos derrames da Fm. Serra elucidado e a retornar na pró xima atualiza‑
Geral da fase rifte da Bacia de Pelotas, dei‑ çã o sobre a evoluçã o geoló gica da Bacia de
xando sem cores a sua representaçã o na car‑ Pelotas, talvez, daqui a outros 13 anos (Fig.
ta estratigrá ica (Fig. 6), pró pria de litologias 6).
consideradas embasamento de bacia; e 2o) o Assim, apesar do predomı́nio do Cin‑
abandono do termo pré ‑rifte, como de inido turã o Dom Feliciano no embasamento da
por Magnavita (1992), para estas litologias, sub‑bacia Sul, o poço 1‑RSS‑3 registrou a
que as pressupunham integrantes do proces‑ ocorrê ncia da sequê ncia mesozoica vulcâ ni‑
so de rifteamento. Adicionalmente, foi intro‑ ca da Bacia do Paraná , abaixo de meio‑gra‑
duzido o termo sag, relacionado ao intervalo ben desenvolvido durante a fase rifte da
de subsidê ncia té rmica, em substituiçã o ao bacia de Pelotas (Fig. 7).
Bacia de Pelotas em retrospectiva 393
Contribuições à Geologia do Rio Grande do Sul e de Santa Catarina
Figura 5 ‒ Carta estratigrá ica da Bacia de Pelotas ajustada as mais recentes e precisas aná lises
geocronoló gicas relativas à seçã o pré ‑drifte. Na seçã o drifte é realçado o padrã o transgressivo até o inal do
Oligoceno e, a partir do Mioceno, dá ‑se o predomı́nio de um padrã o francamente regressivo. Sã o indicadas as
idades dos principais elementos do sistema petrolı́fero interpretado para a bacia.
Figura 6 ‒ Modelo evolutivo da Sinclinal de Torres. A partir dos primeiros derrames sobre os depó sitos eó licos
da Formaçã o Botucatu, observa‑se a geraçã o de um graben, o qual passa a canalizar a atividade vulcâ nica,
demonstrando sua contemporaneidade à atividade de falhas normais (Petrobras/Profex, 2011).
Aná lise petrográ ica de amostra do discordâ ncia inicial do rifte na Bacia de Pelo‑
intervalo entre a Fm. Imbituba e os basaltos tas, bem como demonstra o diacronismo en‑
subjacentes con irmou a presença de um ri‑ tre os basaltos da Bacia do Paraná e os da
olito, com xenó lito de basalto (Fig. 7), identi‑ Bacia de Pelotas, també m con irmado pelos
icado como o Membro Nova Prata, no topo dados geocronoló gicos (Fig. 5).
da Fm. Serra Geral (Petrobras/UFOP, 2006). Essa relaçã o foi referendada pela
Adicionalmente, o tı́pico padrã o sı́smico di‑ aná lise de sı́smica profunda, realizada por
vergente, indicativo de deposiçã o sin‑tectô ‑ Stica et al. (2013), que interpretou a evoluçã o
nica na fase rifte, é observado no intervalo da Large Igneous Province (LIP) Paraná ‑Eten‑
correspondente à Fm. Imbituba, a qual se as‑ deka em dois está gios tectono‑vulcâ nicos:
senta discordantemente sobre um padrã o 1o) derrames tabulares, de grande extensã o,
sı́smico de re letores subparalelos, caracte‑ da Fm. Serra Geral; e 2o) focalizaçã o do vul‑
rı́stico do empilhamento vertical dos derra‑ canismo no rifte Pelotas, com deposiçã o de
mes basá lticos da Fm. Serra Geral (Fig. 7). SDR até a ruptura inal, representados pelas
Esta associaçã o permite a caracterizaçã o da fms. Imbituba e Curumim.
Bacia de Pelotas em retrospectiva 395
Contribuições à Geologia do Rio Grande do Sul e de Santa Catarina
Cunhas de SDR, de diferentes idades, as mecâ nica, do rifte, e té rmica, do sag, che‑
podem ser vistas em seçõ es sı́smicas ao lon‑ ga‑se ao está gio de margem passiva, onde
go do contato crosta continental‑crosta oceâ ‑ atuarã o, conjuntamente, a contraçã o termal
nica na Bacia de Pelotas. Uma integraçã o de da litosfera e a sobrecarga de sedimentos e
dados geoló gico‑geofı́sicos permite interpre‑ vulcâ nicas, gerando o espaço de acomoda‑
tar as cunhas mais velhas na sub‑bacia Sul, já çã o, que será preenchido, sob o controle do
na idade da Formaçã o Imbituba inseridas no binô mio aporte sedimentar‑variaçã o do nı́‑
rifte, passando as mais jovens, da Formaçã o vel do mar. Neste tema, nã o houve altera‑
Curumim, restritas à sub‑bacia Norte, sendo çõ es de interpretaçã o na carta estratigrá ica
a representaçã o da continuidade do vulca‑ da Bacia de Pelotas, na qual, desde o Cretá ‑
nismo na fase sag. Uma visã o regional permi‑ ceo (horizonte vermelho), até o Oligoceno
te traçar uma analogia entre a migraçã o (horizonte verde), ocorre o predomı́nio de
lateral da atividade vulcâ nica da LIP Paraná ‑ um ciclo transgressivo, para, a partir do Mi‑
Etendeka e o modelo de Geoffroy (2005) oceno, o forte cará ter progradante registrar
(Fig. 8). o inı́cio de um ciclo regressivo, no qual está
Passados os está gios das subsidê nci‑ inserido o Cone de Rio Grande (Fig. 9).
Figura 8 ‒ Analogia da sucessã o de eventos tectono‑magmá ticos registrados na evoluçã o da Bacia de Pelotas até
o inal da fase sag com o modelo de Geoffroy (2005). Basaltos da Fm. Serra Geral e Mb. Nova Prata,
representando derrames numa bacia continental pré ‑breakup; os SDR internos sendo a representaçã o da Fm.
Imbituba preenchendo meio‑grabens; e a Fm. Curumim, sendo o registro dos SDR externos.
Figura 9 ‒ Seçã o sı́smica em profundidade exibindo entre os horizontes vermelho (base do Cretá ceo) e verde
(topo do Oligoceno), o predomı́nio do empilhamento transgressivo sotoposto ao padrã o regressivo, registrado a
partir do Mioceno.
A perfuraçã o ocorreu sobre o Cone colapso das paredes do poço, fazendo com
de Rio Grande e tinha, como objetivo princi‑ que a profundidade inal, prevista para 3.100
pal, a busca de arenitos deltaicos/turbidı́ti‑ m, acabasse se realizando em 2.379 m, impe‑
cos miocê nicos numa estrutura em rollover, dindo testar o modelo geoló gico idealizado.
situada em um cinturã o gravitacional (Fig. Embora reservató rios miocê nicos tenham si‑
10). Estas estruturas se originam na foz de do previstos, estes nã o foram constatados no
rios de grande porte, cujos deltas sã o cons‑ poço, devido a uma armadilha na interpreta‑
truı́dos rapidamente, com um excepcional çã o de atributos sı́smicos, isto é , a aná lise de
volume de sedimentos, o que provoca o sur‑ per is do poço mostrou que os supostos re‑
gimento de uma superfı́cie de descolamento servató rios correspondiam a folhelhos hi‑
e o movimento do pacote sedimentar sobre dratados, com pressã o de poros acima dos
ela em direçã o a á guas profundas, a seme‑ folhelhos sobrepostos, o que gerou sismofá ‑
lhança do observado na foz do Rio Amazo‑ cies de alta re letividade, sendo interpreta‑
nas. dos, em sı́smica, como corpos arenosos.
Esta estruturaçã o faz surgir toda Poré m, feiçõ es erosivas, com forte evidê ncia
classe de trapas: estratigrá icas, estruturais e de preenchimento arenoso (contornitos) po‑
mistas. Em uma trapa estrutural, pretendeu‑ dem ser vistas na bacia (Fig. 11), con irman‑
se testar o poço 1‑RSS‑4, contudo esforços do a presença de rochas reservató rio, de
tangenciais dentro do cinturã o provocaram o idade Eoceno/Oligoceno, para o acú mulo de
Figura 10 ‒ Seçã o geoló gica exibindo na elipse vermelha, uma feiçã o deformacional denominada cinturã o
gravitacional, cuja origem deposicional é tı́pica de regiõ es com possante acú mulo sedimentar, caso do Cone de
Rio Grande na Bacia de Pelotas. Possı́vel identi icar uma zona distensiva proximal (D) e uma zona compressiva
distal (C), separadas por uma zona de translaçã o (T), sem ou com pouca deformaçã o, sob uma superfı́cie de
descolamento no Mioceno Inferior. Mecanismo gerador de trapas para hidrocarbonetos.
Figura 11 ‒ Seçã o sı́smica em tempo, proporcionando a interpretaçã o de canal preenchido por depó sitos
contornı́ticos (detalhe), indicativo da presença de reservató rios arenosos na bacia, de idade oligocê nica.
dos Hidratos (Hydrate Stability Zone ‒ HSZ) taçã o de seus recursos, de forma economica‑
(Fig. 12). O BSR se caracteriza por ser um re‑ mente viá vel.
letor paralelo ao fundo marinho, com um
coe iciente de re lexã o negativo, causado pe‑ 5 CONCLUSÕES
lo contraste de impedâ ncia acú stica entre a
HSZ (de alta velocidade sı́smica) e a camada Procurou‑se, aqui, fazer convergi‑
de gá s livre, situada abaixo desta (de baixa rem os conhecimentos acumulados, até en‑
velocidade sı́smica), sendo seu mapeamento tã o, sobre a Bacia de Pelotas, sejam
determinante para delimitar as ocorrê ncias acadê micos, sejam oriundos da indú stria pe‑
de hidratos no CRG (Barros et al., 2009). trolı́fera, para uma resenha evolutiva contex‑
Descrita pela primeira vez por Fon‑ tualizada na abertura do Oceano Atlâ ntico
tana & Mussumeci (1994), a ocorrê ncia de Sul. No â mbito explorató rio, a bacia pode ser
hidratos na Bacia de Pelotas se distribui so‑ considerada como nã o avaliada, sob o ponto
bre uma á rea aproximada de 45.000 km2, de vista de seu potencial petrolı́fero, tanto
tem caracterı́sticas e reservas similares a dos em á guas rasas quanto em á guas profundas,
maiores depó sitos do mundo, mas aguarda entretanto os elementos do sistema petrolı́‑
avanços tecnoló gicos, que permitam a explo‑ fero atualmente aceitos para a bacia foram
Figura 12 ‒ Mapa da ocorrê ncia de hidratos entre as isó batas de 1.000 m e de 3.000 m no Cone de Rio Grande
(I); seçã o sı́smica em tempo, que permite interpretar o Bottom Simulating Re lector (BSR) e a Hydrate Stability
Zone (HSZ), em direçã o a á guas profundas (Sad et al., 1998) (II).
introduzidos na carta estratigrá ica. Já as co‑ deiros, R. A. 2009. Aná lise de atributos sı́smi‑
lossais reservas de hidratos de gá s identi i‑ cos para caracterizaçã o de hidratos de gá s no
cadas, aguardam, no mundo todo, por uma Cone do Rio Grande. In: SIMPOSIO DE GEO‑
LOGIA DE SUDESTE, XI., 2009, Sã o Pedro.
tecnologia segura e e iciente para a sua pro‑
Anais… Sã o Pedro, SBG, v. 1, p. 111.
duçã o, assim, trata‑se de um campo aberto
para a pesquisa de ponta. Bueno, G. V. 2001. Discordância pré‑Aratu:
O conhecimento geoló gico tem avan‑ marco tectono‑isotópico no rifte afro‑brasilei‑
çado em vá rias frentes. A litoestratigra ia ro. Porto Alegre, 149p. Tese de Doutorado,
Programa de Pó s‑graduaçã o em Geociê ncias,
publicada em 1984 foi sucedida pela estrati‑
Instituto de Geociê ncias, Universidade Fede‑
gra ia de sequê ncias, em 2007, a qual foi ba‑ ral do Rio Grande do Sul.
seada na interpretaçã o dos dados sı́smicos
disponı́veis para a bacia, e, hoje, esta está Bueno, G. V. 2004. Diacronismo de eventos no
sendo atualizada, em funçã o de novos dados rifte Sul‑Atlâ ntico. Boletim de Geociências da
petroló gicos e geocronoló gicos, os quais nos Petrobras, 12(2): 203‑229.
proporcionam maior precisã o no posiciona‑
Bueno, G. V., Machado Jr., D. L., Oliveira, J. A. B.
mento estratigrá ico de eventos geoló gicos, & Marques, E. J. J. 2004a. A in luê ncia do Li‑
como o perı́odo da atividade vulcâ nica da neamento Capricó rnio na evoluçã o tectono‑
Provı́ncia Magmá tica Paraná ‑Etendeka e da sedimentar da Bacia de Santos. In: CONGRES‑
Formaçã o Imbituba, na fase rifte. SO BRASILEIRO DE GEOLOGIA, 52., 2004,
Araxá . Anais. . . Araxá , SBG, Simpó sio 28 – Pe‑
A aplicaçã o de novas tecnologias, co‑
tró leo: geologia e exploraçã o, T 773.
mo a da sı́smica ultraprofunda, proporciona
uma visualizaçã o da geologia de subsuperfı́‑ Bueno, G. V., Zacharias, A. A., Oreiro, S. G., Cu‑
cie em nı́vel de crosta‑manto, que nos permi‑ pertino, J. A., Falkenhein, F. U. H. & Martins‑
te avançar no modelo de desenvolvimento de Neto, M. A. 2007. Bacia de Pelotas. Boletim de
ruptura e oceanizaçã o do Gondwana Leste Geociências da Petrobras, 15(2): 551‑559.
aqui colocado, assim como evoluir no enten‑
Dias, J. L., Sad, A. R. E., Fontana, R. L. & Feijó ,
dimento dos SDR, durante a transiçã o entre F. J. 1994. Bacia de Pelotas. Boletim de Geoci‑
as subsidê ncias mecâ nica e termal. ências da Petrobras, 8(1): 235‑245.
Permanecem questõ es, como a do
entendimento da evoluçã o da Sinclinal de Fontana, R. L. & Mussumeci, A. 1994. Hydra‑
tes offshore Brazil. Annals of the New York
Torres e a da presença de geradores e de re‑
Acad. of Sciences, 715: 106‑113.
servató rios, as quais nos remete à evidente
necessidade de projetos regionais multidis‑ Geoffroy, L. 2005. Volcanic Passive Margins.
ciplinares, que tenham a premissa de inte‑ Comptes Rendus Geoscience, 337: 1395‑1408.
graçã o e de interpretaçã o de dados, voltados
Janasi, V. A., Freitas, V. A. & Heaman, L. H.
a consolidar e a alavancar o conhecimento,
2011. The onset of lood basalt volcanism,
direcionado a uma melhor alocaçã o de re‑ Northern Paraná Basin, Brazil: A precise U–
cursos, visando ao desenvolvimento econô ‑ Pb baddeleyite/zircon age for a Chapecó ‑ty‑
mico latente da margem meridional do pe dacite. Earth and Planetary Science Letters,
Brasil. 302: 147‑153.
1
Serviço Geoló gico do Brasil (CPRM)
2
School of Geosciences, University of Aberdeen
3
Instituto de Geociê ncias, Universidade Federal do Rio Grande do Sul
1 INTRODUÇÃO
A abertura do Oceano Atlâ ntico Sul se iniciou na parte austral do megacontinente
Gondwana Oeste e se propagou para NNE durante o Mesozoico, seguindo zonas de fraqueza li‑
tosfé rica que haviam sido formadas durante o Ciclo Brasiliano (Neoproterozoico) (Chang et al.,
1992; Stica et al., 2014; Buiter & Torsvik, 2014; Will & Frimmel, 2018). A ruptura do megaconti‑
nente levou à formaçã o da Amé rica do Sul e da Africa, assim como de vá rias bacias ao longo de
suas margens passivas. Dentre elas está a Bacia de Pelotas, a mais meridional das bacias brasi‑
leiras e que també m se prolonga pelo territó rio uruguaio (Fig. 1). Estudos pioneiros na Bacia de
Pelotas datam do inı́cio dos anos 1960, com signi icativos avanços nos anos 1990 nos campos da
sismoestratigra ia e da geotectô nica, de forma que um histó rico de trabalhos sobre a bacia pode
ser consultado em Fontana (1996) e em ANP/UFRGS (2008). Contudo, por se tratar de uma ba‑
cia marginal, essencialmente submersa pelas á guas do Oceano Atlâ ntico Sul e que nã o possui
reservas comerciais conhecidas de hidrocarbonetos, o entendimento sobre a subsuperfı́cie da
Bacia de Pelotas ainda é bastante limitado. Neste capı́tulo, buscamos fornecer um breve panora‑
ma dos conhecimentos geoló gicos acumulados, durante dé cadas, sobre a Bacia de Pelotas, assim
como apresentaremos uma aná lise semiqualitativa das unidades sı́smicas da bacia e de sua his‑
tó ria deposicional. Ao inal, é inequı́voco que a Bacia de Pelotas ainda apresenta diversas opor‑
tunidades de pesquisa, cujo fomento pode resultar tanto numa melhor compreensã o da
tectô nica global quanto na viabilizaçã o da exploraçã o de recursos energé ticos nela contidos.
Contribuições à Geologia do Rio Grande do Sul e de Santa Catarina
Florianó polis (prolongamento da Zona de Fra‑ quanto por correntes marı́timas. Ao menos
tura de Rio Grande), entre outras, associadas à trê s correntes oceâ nicas profundas erodem,
pluma Tristã o da Cunha e à rotaçã o da Amé ri‑ transportam e distribuem sedimentos pela
ca do Sul durante o rifte (Salomon et al., 2017). bacia (Schattner et al., 2019). Na porçã o su‑
A Bacia de Pelotas ainda pode ser dividida em baé rea, quatro sistemas laguna‑barreira se
duas sub‑bacias: norte, entre o Alto de Floria‑ encontram expostos e foram desenvolvidos
nó polis e o Terraço de Rio Grande; e sul, do nos ú ltimos 0,5 Ma, provavelmente em res‑
Terraço, até o Alto de Polô nio (Bueno et al., posta a ciclos glacioeustá ticos de alta
2007). Ela també m se caracteriza como um frequê ncia (Rosa et al., 2017). Reservas eco‑
ambiente deposicional de mar aberto e de nomicamente viá veis de hidrocarbonetos ain‑
pouco relevo costeiro, com baixa topogra ia e da nã o foram con irmadas na Bacia de
com litoral bastante retilı́neo. Por conseguinte, Pelotas, mas há um crescente interesse na ex‑
é constante o retrabalhamento dos sedimen‑ ploraçã o destes e de hidratos de gá s na regiã o
tos ali depositados, tanto pela açã o de ondas (Beglinger et al., 2012; Miller et al., 2015).
Figura 1 ‒ Mapa de localizaçã o da Bacia de Pelotas no extremo sul do Brasil. A Bacia de Pelotas compreende o
ambiente oceâ nico e a margem continental, em que estã o expostos os sistemas de laguna/barreira. O limite
norte da bacia se encontra na regiã o de Florianó polis, enquanto o limite sul se estende até o Uruguai (nã o
visı́vel na imagem). As linhas sı́smicas e a á rea mapeada (polı́gono amarelo) nã o abrangem a bacia em sua
totalidade.
Sismoestratigra ia e evolução da Bacia de Pelotas 405
Contribuições à Geologia do Rio Grande do Sul e de Santa Catarina
Figura 2 ‒ Carta cronoestratigrá ica da Bacia de Pelotas, modi icada a partir de Bueno et al. (2007) e Beglinger
et al. (2012). Legendas: formaçõ es BOT ‑ Botucatu; SG ‑ Serra Geral; CAS ‑ Cassino; CRM ‑ Curumim; ARI ‑ Ariri;
PBL ‑ Porto Belo; TRA ‑ Tramandaı́; ATL ‑ Atlâ ntida; CID ‑ Cidreira; e IMB ‑ Imbé ; Sup. Seq. ‑ Supersequê ncias de
Bueno et al. (2007); Con. Dep. ‑ Contexto deposicional; T. ‑ Transicional; e Uni. Sis. ‑ unidades sı́smicas.
privadas, tê m permitido avanços recentes no çã o Cassino. Apesar da complexa transiçã o
entendimento sobre o preenchimento e a entre as sucessõ es Pré e Sin‑rifte, a ú ltima
evoluçã o da bacia (e.g. Conti et al., 2017; geralmente apresenta re letores com carac‑
Morales et al., 2017; McDermott et al., 2019; terı́sticas bastante diagnó sticas, com alta
Schattner et al., 2019). A partir de um con‑ amplitude, empilhamento subparalelo, boa
junto de dados sı́smicos de re lexã o e infor‑ continuidade lateral, e com macroformas em
maçõ es de alguns poços, fornecidos pela cunhas, limitadas por falhas antité ticas ao
Agê ncia Nacional de Petró leo, Gá s Natural e mergulho da bacia. Tais falhas antité ticas sã o
Biocombustı́veis (ANP), aqui é apresentado identi icadas em diversas linhas dip e corres‑
um mapeamento sismoestratigrá ico da Ba‑ pondem à fase de fragmentaçã o crustal du‑
cia de Pelotas. Tal produto prové m da aná lise rante o rifteamento (Fontana, 1990). O
de 17 linhas sı́smicas (11 dip e 6 strike, com aumento da espessura das cunhas contra es‑
um total de mais de 5.000 km de extensã o) e sas estruturas sugere deposiçã o vulcano‑se‑
do mapeamento sistemá tico de re letores dimentar concomitante ao tectonismo e ao
sı́smicos a partir de suas terminaçõ es e do desenvolvimento de meio‑grabens. A suces‑
mé todo loop‑tie (e.g. Payton, 1977; Catunea‑ sã o Sin‑rifte é limitada, no topo, pelo trunca‑
nu, 2006), realizados com o software Pe‑ mento dos re letores em uma superfı́cie
trel® 2017, da Schlumberger. As unidades erosiva. Por im, a sucessã o Pó s‑rifte repre‑
sı́smicas aqui discriminadas sã o baseadas senta a maior parte do preenchimento da
nos trabalhos de ANP/UFRGS (2008) e de Bacia de Pelotas. Essa sucessã o se empilha
Contreras et al. (2010). Ambos os estudos acima da superfı́cie erosiva e conté m diver‑
concordam amplamente sobre quais re leto‑ sas superfı́cies‑chave, de forma que a suces‑
res delimitam as unidades sı́smicas da bacia, sã o Pó s‑rifte foi subdividida em 11 unidades
todavia apresentam diferenças quanto à sı́smicas (Figs. 2‑3).
quantidade de unidades sı́smicas e a seus in‑ Cada unidade sı́smica é limitada, no
tervalos de tempo. As maiores discrepâ ncias topo, por uma superfı́cie produto de varia‑
correspondem ao intervalo entre o Cretá ceo çõ es no nı́vel de base, um limite de sequê n‑
Superior e o Eoceno, aqui reunido numa uni‑ cia, associado a tectonismo na bacia e/ou a
dade sı́smica, perı́odo no qual o registro se‑ variaçõ es glacioeustá ticas globais. De manei‑
dimentar apresenta hiatos e os re letores ra geral e, principalmente, nas porçõ es mais
sı́smicos descontinuidades laterais, o que di‑ proximais da bacia, essas superfı́cies trun‑
iculta seu mapeamento. cam os re letores da unidade abaixo, devido
Trê s sucessõ es sı́smicas principais a processos erosivos, enquanto a unidade
foram discriminadas para a Bacia de Pelotas: acima, desenvolvida posteriormente, apre‑
Pré , Sin e Pó s‑rifte (Fig. 3). A sucessã o Pré ‑ senta re letores com padrã o de onlap na su‑
rifte inclui re letores de geometria caó tica, perfı́cie nas porçõ es proximais e de downlap
que representam o embasamento da bacia. A nas regiõ es mais distais. As unidades sı́smi‑
superfı́cie‑topo dessa sucessã o é ambı́gua, cas aqui utilizadas sã o:
devido à continuidade da natureza de parte 1. SU1: representa a transiçã o entre
dos depó sitos Pré e Sin‑rifte na bacia, ambos os está gios Sin e Pó s‑rifte. Durante esse pe‑
marcados por depó sitos vulcâ nicos das for‑ rı́odo o vulcanismo diminuiu e o aporte sedi‑
maçõ es Serra Geral (Bacia do Paraná ) e Im‑ mentar aumentou, de forma que a SU1
bituba (Bacia de Pelotas). A sucessã o incorpora as rochas vulcâ nicas da Formaçã o
Sin‑rifte engloba os SDRs da Formaçã o Imbi‑ Curumim, possı́veis depó sitos siliciclá sticos
tuba e os depó sitos siliciclá sticos da Forma‑ da Formaçã o Cassino, e os limitados evapori‑
408 Edição da Sociedade Brasileira de Geologia – Núcleo RS/SC
Machado et al.
Figura 3 ‒ Linha sı́smica dip da parte central da Bacia de Pelotas (linha branca no mapa superior direito). No
topo, as trê s sucessõ es sı́smicas principais sã o discriminadas. Abaixo, linhas coloridas representam a
superfı́cie‑topo de cada unidade sı́smica (SU#). També m é possı́vel observar os re letores sı́smicos no padrã o
seaward‑dipping re lectors (SDR), caracterı́sticos do vulcanismo sin‑rifte na bacia.
tos da Formaçã o Ariri. Os re letores dessa ambiente mais profundo e com maior aporte
unidade apresentam boa continuidade late‑ clá stico;
ral, geralmente com alta amplitude na base 3. SU3: esta e as unidades sı́smicas
da unidade, e gradando a re letores com me‑ seguintes correspondem à s formaçõ es Imbé
nor amplitude acima; e Cidreira, ambas caracterizadas por depó si‑
2. SU2: compreende os depó sitos tos siliciclá sticos de grã os inos a mé dios, e
carboná ticos e siliciclá sticos das formaçõ es que preenchem a maior parte da bacia. Os
Tramandaı́, Porto Belo e Atlâ ntida. Estas re‑ horizontes sı́smicos que limitam esta e as
presentam um ambiente de á guas rasas, fa‑ unidades seguintes correspondem a superfı́‑
vorá vel à precipitaçã o carboná tica, que foi cies regressivas, associadas a ciclos de subi‑
gradualmente afogado durante uma trans‑ da e de descida do nı́vel de base. Os
gressã o marinha. Os re letores desta unida‑ re letores da SU3 apresentam mé dias a bai‑
de exibem uma variaçã o vertical e, xas amplitude e frequê ncia, paralelismo ou
geralmente, os mais basais tê m alta amplitu‑ pequenas ondulaçõ es, boa continuidade la‑
de, baixa frequê ncia e boa continuidade late‑ teral, e um padrã o de onlap na parte proxi‑
ral, e gradam, mais para o topo da unidade, mal da bacia;
para re letores de menor amplitude, mas de 4. SU4: a base desta unidade é mar‑
continuidade lateral similar. Essa variaçã o é cada por um re letor bem de inido, de alta
decorrente, provavelmente, da mudança de amplitude, um horizonte contı́nuo por quase
uma plataforma carboná tica rasa para um toda a á rea mapeada. Na porçã o proximal da
bacia, os re letores acima dessa superfı́cie 10. SU10: unidade pouco espessa,
apresentam um padrã o de onlap nesse hori‑ apresenta re letores subparalelos com boa
zonte, enquanto que, na porçã o distal, a SU4 continuidade lateral. Na regiã o proximal e
apresenta menor espessura e re letores pa‑ junto ao talude as terminaçõ es dos re letores
ralelos, com baixa amplitude. Esta unidade tendem a ser em downlap, enquanto que, nas
tende a ser mais espessa no talude; porçõ es distais, os re letores exibem baixa
5. SU5: na parte proximal, os re leto‑ amplitude e boa continuidade lateral;
res desta unidade apresentam padrã o de on‑ 11. SU11: unidade sı́smica de topo
lap na superfı́cie abaixo, enquanto que da Bacia de Pelotas, caracterizada por re le‑
donwlaps foram identi icados junto ao talude. tores com alta frequê ncia, com baixa ampli‑
Os re letores da SU5 apresentam alta ampli‑ tude e boa continuidade lateral, frequente‑
tude na regiã o proximal da bacia, os quais mente afetados por falhas. Terminaçõ es em
gradam para amplitudes mais baixas na re‑ downlap sã o comuns na regiã o proximal e no
giã o distal, profunda; talude, enquanto re letores paralelos predo‑
6. SU6: apresenta re letores de baixa minam na regiã o distal. A SU11 també m é
a mé dia amplitude, ondulados, e, na regiã o afetada pela duplicaçã o do re letor de fundo
distal, mais retos e contı́nuos lateralmente. oceâ nico (sea‑bottom simulator re letctor),
Na regiã o proximal os re letores apresentam indicativo da presença de hidratos de gá s na
terminaçõ es com padrã o onlap; parte rasa da bacia (e.g. Miller et al., 2015).
7. SU7: unidade sı́smica menos es‑ Dois altos batimé tricos se destacam
pessa da bacia, possivelmente parcialmente na á rea mapeada da Bacia de Pelotas: o Ter‑
removida em um evento erosivo regional. Os raço de Rio Grande, ao norte, e o Cone de Rio
re letores da SU7 apresentam mé dia a alta de Grande, ao sul (Fig. 1 e Fig. 4). O Terraço
amplitude, sendo principalmente ondulados, de Rio Grande já representava um alto do
com boa continuidade lateral, e exibem pa‑ embasamento nos está gios iniciais de evolu‑
drã o de onlap na regiã o proximal; çã o da bacia (ANP/UFRGS, 2008). O poço
8. SU8: unidade de pouca espessura, BPS6, perfurado no Terraço de Rio Grande,
caracterizada por re letores de mé dia ampli‑ alcançou rochas vulcâ nicas da Formaçã o Im‑
tude, paralelos na regiã o proximal, mais on‑ bituba (Sin‑rifte), a uma profundidade de
dulados junto ao talude, e, novamente, 5.368 metros, sem de inir o limite entre essa
paralelos na regiã o distal da bacia, em que a formaçã o e o embasamento abaixo, inferido
amplitude dos re letores també m diminui. A també m como sendo composto de rochas
SU8 apresenta grande espessura na regiã o do vulcâ nicas da Formaçã o Serra Geral (Bacia
Cone de Rio Grande; do Paraná ). Outrossim, o limite entre as su‑
9. SU9: caracterizada por re letores cessõ es Pré e Sin‑rifte é de difı́cil diferencia‑
com padrã o de onlap na porçã o mais proxi‑ çã o nas imagens sı́smicas da á rea. Em linha
mal da bacia e de downlap na regiã o pró xima sı́smica strike (Fig. 4), pode‑se observar que
ao talude. No topo da unidade, os re letores, os re letores sob o Terraço de Rio Grande
por vezes, aparentam terminaçõ es of lap. Na apresentam um comportamento dominante‑
regiã o proximal, os re letores possuem alta mente caó tico, com alguns pacotes de re le‑
frequê ncia, amplitude mé dia a alta e sua con‑ tores subparalelos nas bordas norte e sul do
tinuidade lateral é afetada por falhas; na par‑ alto do embasamento, por vezes com mergu‑
te distal, os re letores apresentam baixa lho aparente para longe deste alto e limita‑
amplitude e continuidade lateral, por vezes dos por falhas. Esses pacotes podem
até padrã o caó tico; corresponder a intrusõ es do tipo sill no em‑
basamento ou a SDRs, formados durante a Cone de Rio Grande (Schattner et al., 2019),
abertura do Oceano Atlâ ntico. A sucessã o de forma que a rá pida acumulaçã o sedimen‑
Pó s‑rifte, depositada acima, tende a apresen‑ tar causaria instabilidade dos pacotes e co‑
tar pouca espessura no Terraço de Rio Gran‑ lapsos gravitacionais (Beglinger et al., 2012),
de, se comparada com outras regiõ es da resultando, assim, nos padrõ es caó ticos e na
bacia, e há indı́cios de erosã o de parte das baixa continuidade lateral dos re letores sı́s‑
unidades sı́smicas na porçã o sul deste terra‑ micos.
ço. De maneira oposta, no extremo sul da O mapeamento sistemá tico dessas
á rea mapeada, o Cone de Rio Grande repre‑ unidades nas linhas sı́smicas 2D, expandido
senta um alto batimé trico formado pela acu‑ em toda á rea atravé s do mé todo loop‑tie, e in‑
mulaçã o de sedimentos da sucessã o terpolado no espaço entre as linhas com au‑
Pó s‑rifte. De maneira geral, as unidades sı́s‑ xı́lio computacional, permite a criaçã o de
micas tendem a ser mais espessas no Cone, mapas de topo para cada unidade sı́smica.
com re letores de continuidade mé dia a boa Como as linhas sı́smicas possuem seu eixo
na parte mais basal (SU1 a SU4), gradando vertical em unidade de tempo (ms), esses
para o topo para padrõ es caó ticos e de baixa mapas sã o gerados em medida de tempo até
continuidade lateral. Em especial as unidades a superfı́cie em questã o. Contudo, a partir de
sı́smicas SU7 a SU11, acumuladas desde o i‑ modelos de velocidade das ondas sı́smicas
nal do Oligoceno, apresentam considerá vel em subsuperfı́cie, é possı́vel converter tais
espessura e re letores pouco contı́nuos. Esti‑ mapas de tempo para distâ ncia (profundida‑
ma‑se que desde o Mioceno mé dio mais de 1 de). Aqui utilizamos a relaçã o tempo‑profun‑
km vertical de sedimentos se acumularam no didade obtida a partir da aná lise de logs
Figura 4 ‒ Painel com linhas sı́smicas representativas da Bacia de Pelotas (linhas brancas no mapa inferior
direito). No topo, linha sı́smica strike que abrange o Cone de Rio Grande e o Terraço de Rio Grande, em que se
observa a variabilidade da espessura das sucessõ es sı́smicas pré , sin e pó s‑rifte. Na esquerda, detalhes de
ambos os altos batimé tricos, nos quais se observa o espesso pacote sedimentar correspondente ao Cone de Rio
Grande (A), e o Terraço de Rio Grande (B), onde as unidades sı́smicas sedimentares sã o delgadas e o
embasamento representa um alto topográ ico. Na direita, linha dip que cruza o Cone de Rio Grande, em que se
observa duas quebras na declividade.
Figura 5 ‒ Conjunto de mapas que mostram a profundidade de topo de superfı́cie de cada unidade sı́smica
mapeada, com linhas de contorno a cada 500 metros. Apó s o abrangente vulcanismo associado ao rifteamento,
as unidades sı́smicas SU1 a SU11 gradualmente cobrem a á rea mapeada e ilustram o avanço do talude em
direçã o a á guas profundas. Destaca‑se a proeminê ncia topográ ica do Terraço de Torres nos está gios iniciais de
desenvolvimento da bacia e o avanço do Cone de Rio Grande nos está gios inais, especialmente a partir da SU7.
sô nicos dos poços offshore, para, entã o, gerar quando o resfriamento e a subsidê ncia da li‑
mapas de profundidade para cada superfı́cie tosfera oceâ nica causaram uma elevaçã o do
(Fig. 5). Apesar de nã o ser ideal, a conversã o nı́vel de base, ampliando o espaço de acomo‑
de dados sô nicos permite uma boa aproxima‑ daçã o na bacia (Contreras et al., 2010). Asla‑
çã o nas estimativas de profundidade e de es‑ nian et al. (2009) sugerem, para as bacias do
pessura de cada unidade sı́smica, e os sudeste brasileiro, que o manto se movia rá ‑
resultados aqui apresentados sã o compatı́‑ pida e horizontalmente durante a ruptura
veis com os de outros estudos na bacia (e.g. continental, o que favoreceria um colapso
Bueno et al., 2007; ANP/UFRGS, 2008; Con‑ quase vertical de parte das bacias nos está gi‑
treras et al., 2010). E recomendado que, para os iniciais pó s‑rifte. Apó s o volumoso mag‑
cá lculos de profundidade e de espessura mais matismo da fase rifte, ocorreu a deposiçã o de
re inados, outros mé todos de conversã o tem‑ carbonatos de plataforma rasa, seguida do
po‑profundidade sejam aplicados, utilizando, gradual aprofundamento da bacia. Com o
por exemplo, dados de check‑shot de poço, e progressivo aumento na entrada de sedimen‑
que os mapas aqui apresentados sejam em‑ tos terrı́genos continentais e com a concomi‑
pregues com diligê ncia e como referê ncia pa‑ tante elevaçã o do nı́vel de base, ocorreram a
ra estudos mais detalhados na bacia. agradaçã o e a retrogradaçã o dos depó sitos
sedimentares na bacia (ANP/UFRGS, 2008;
5 EVOLUÇÃO DEPOSICIONAL Schattner et al., 2019). A taxa de subsidê ncia
diminuiu durante o inal do Cretá ceo (Con‑
A partir dos mapas de topo, pode‑se treras et al., 2010), mas foi acompanhada por
estimar a espessura de cada unidade sı́smica uma elevaçã o global no nı́vel do mar (Haq et
(espessura entre duas superfı́cies‑topo) e sua al., 1987), com a transgressã o da linha de
variaçã o na á rea mapeada. Dessa forma, os costa, o que manteve a criaçã o de espaço de
mapas de espessura (mapas de isó pacas) acomodaçã o e o padrã o agradacional/retro‑
permitem inferir as variaçõ es espaciais e gradacional dos pacotes sedimentares até o
temporais dos depocentros de uma bacia, Paleoceno (Barboza et al., 2008). A partir do
alé m de indicar locais de nã o‑deposiçã o e/ou Eoceno, a taxa de subsidê ncia voltou a au‑
de erosã o durante um evento de queda do nı́‑ mentar, juntamente com uma gradual queda
vel de base. Ainda que os mapas de topo das do nı́vel do mar, o que causou a regressã o da
unidades sı́smicas da Bacia de Pelotas apre‑ linha de costa e a transiçã o dos pacotes sedi‑
sentem superfı́cies bastante uniformes (Fig. mentares de padrõ es agradacionais para pro‑
5), os mapas de isó pacas de cada unidade evi‑ gradacionais (ANP/UFRGS, 2008; Barboza et
denciam a variabilidade espaço‑temporal da al., 2008; Contreras et al., 2010; Schattner et
espessura sedimentar e dos depocentros na al., 2019). Essa histó ria deposicional da Bacia
á rea mapeada (Fig. 6). A maior espessura vul‑ de Pelotas foi afetada por variaçõ es de alta
cano‑sedimentar acumulada na bacia corres‑ frequê ncia no nı́vel de base, responsá veis pe‑
ponde à regiã o do Cone de Rio Grande, em la formaçã o dos limites de sequê ncia que ba‑
que mais de 7.500 metros da coluna estrati‑ lizam as unidades sı́smicas.
grá ica estã o preservados. Os pacotes sedimentares preserva‑
A transiçã o entre as fases rifte e drifte dos na Bacia de Pelotas, aqui mapeados como
na Bacia de Pelotas ocorreu no Aptiano, unidades sı́smicas, podem ter seus volumes
Sismoestratigra ia e evolução da Bacia de Pelotas 413
Contribuições à Geologia do Rio Grande do Sul e de Santa Catarina
estimados a partir dos mapas de isó pacas. Bacia de Pelotas em direçã o ao sul. A taxa de
Essa estimativa permite inferir volumes e ta‑ sedimentaçã o apresenta diminuiçã o entre
xas de aporte sedimentar na bacia durante o SU7 e SU10 (Oligoceno a Mioceno), com de‑
seu desenvolvimento. Todavia, para cá lculos pocentros principais na regiã o do Cone de
precisos do volume sedimentar de cada uni‑ Rio Grande. O mapeamento dessas unidades
dade, é necessá rio considerar o volume ocu‑ sugere a migraçã o lateral de macroformas
pado pela porosidade, o tipo de sedimento (como deltas) na á rea do Cone, algo a ser ca‑
acumulado, e suas variaçõ es com a profundi‑ racterizado em estudos de detalhe. Destaca‑
dade. Dessa forma, para estimar valores mı́‑ se a unidade SU9, depositada no Mioceno
nimos e má ximos de volume de cada unidade mé dio, que representa um pico de aporte se‑
sı́smica, foram utilizadas as informaçõ es lito‑ dimentar, ligado ao avanço do Cone bacia
ló gicas do poço BPS6 (Fig. 1) e as curvas de adentro. Por im, a unidade SU11 també m
porosidade contra profundidade para rochas apresenta alta taxa de sedimentaçã o, com
carboná ticas e para folhelhos de Allen & Al‑ acú mulo de sedimentos na regiã o do talude
len (2013). Esses parâ metros combinados e em partes mais profundas da bacia. Há in‑
permitem cá lculos semi‑qualitativos dos vo‑ dı́cios de um suave soerguimento epirogê ni‑
lumes e das taxas de sedimentaçã o na bacia co da margem continental nos ú ltimos
(Tab. 1), que podem fomentar estudos futu‑ milhõ es de anos (Carreñ o et al., 1999; Ma‑
ros sobre a evoluçã o deposicional. Conside‑ chado et al., 2019, 2021), o que poderia ter
rando a ampla á rea da bacia e a limitaçã o dos contribuı́do para um maior aporte sedimen‑
dados aqui utilizados, sugere‑se o uso de da‑ tar na bacia. Todavia, a resoluçã o temporal
dos de poço adicionais para a obtençã o de re‑ dos dados de soerguimento da margem e de
sultados mais robustos. De qualquer forma, deposiçã o sedimentar na bacia nã o permite
os presentes resultados fornecem um pano‑ uma correlaçã o precisa.
rama sobre o aporte e a taxa de acumulaçã o
sedimentar mı́nima (m3/Ma) na Bacia de Pe‑ 6 CONSIDERAÇÕES FINAIS
lotas, em especial durante o Cenozoico, era
geoló gica mais bem detalhada na bacia. Apó s Em sı́ntese, a Bacia de Pelotas é uma
a deposiçã o da unidade transicional SU1, in‑ bacia de margem passiva, desenvolvida a
terpretada como de natureza essencialmente partir da abertura do Oceano Atlâ ntico des‑
ı́gnea, ocorre a deposiçã o, em taxas menores, de o Cretá ceo. Sua coluna estratigrá ica é do‑
da unidade SU2, caracterizada por depó sitos minada por rochas de granulometria ina,
carboná ticos e siliciclá sticos formados em como folhelhos e pelitos, mas seu está gio
um ambiente de á guas rasas (Ceolin et al., inicial compreende rochas vulcâ nicas e car‑
2011). A abrangente e complexa SU3 apre‑ boná ticas. Devido à ausê ncia de extensos
senta taxas de sedimentaçã o relativamente depó sitos evaporı́ticos, a bacia nã o apresen‑
baixas, todavia essa unidade incorpora even‑ ta estruturas geradas por halocinese e seus
tos erosivos pervasivos que removeram parte re letores sı́smicos tendem a apresentar boa
dos sedimentos depositados, de forma que se continuidade lateral por toda a bacia. O es‑
faz necessá ria uma investigaçã o em detalhe pesso pacote sedimentar, caracterizado por
dos depó sitos formados entre o Cretá ceo Su‑ rochas inas e por ocasionais camadas de
perior e o Paleogeno. As unidades SU4 a SU6 arenitos, pode favorecer à formaçã o de tra‑
(Eoceno a Oligoceno) sã o caracterizadas por pas estratigrá icas para hidrocarbonetos.
altas taxas de sedimentaçã o e por uma pro‑ Todavia, uma caracterizaçã o mais re inada
gressiva migraçã o do depocentro principal da da sequê ncia deposicional da Bacia de Pelo‑
Figura 6 ‒ Conjunto de mapas de isó pacas (mapas de espessura) da Bacia de Pelotas, com linhas de contorno a
cada 500 metros no mapa de espessura total e a cada 100 metros nos demais. O mapa de espessura total indica
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1
Instituto de Geociê ncias, Universidade Federal do Rio Grande do Sul
2
Programa de Pó s‑graduaçã o em Geociê ncias, Universidade Federal do Rio Grande do Sul
1 INTRODUÇÃO
Microfó sseis tê m sido amplamente utilizados como ferramentas estratigrá icas nas baci‑
as sedimentares brasileiras. Com relaçã o à queles de parede orgâ nica (palinomorfos), as contri‑
buiçõ es de Regali et al. (1974a, 1974b), baseadas essencialmente na sucessã o de esporos e de
grã os de pó len para todas as bacias da margem costeira, excetuando a Bacia de Pelotas (BP),
constituem um marco pioneiro para o arcabouço bioestratigrá ico dos depó sitos mesozoicos e
cenozoicos do paı́s. Somente nas ú ltimas duas dé cadas, os dados sobre os palinomorfos da seçã o
pré ‑quaterná ria desta bacia foram progressivamente revelados, a partir da descriçã o e das aná li‑
ses bioestratigrá ica e paleoambiental das seçõ es atravessadas por poços profundos, perfurados
pela Petrobras. Por outro lado, a seçã o quaterná ria é conhecida, em termos palinoló gicos, por
meio de perfuraçõ es rasas na á rea emersa da bacia, com trabalhos, versando sobre as dinâ micas
da sedimentaçã o costeira e da evoluçã o da vegetaçã o nesta porçã o do continente, com maior
concentraçã o de estudos no Rio Grande do Sul (RS). Anjos‑Zerfass et al. (2008) realizaram a
mais recente sı́ntese sobre a importâ ncia bioestratigrá ica de determinados microfó sseis ocor‑
rentes na BP. De forma complementar, este trabalho objetiva apresentar uma sı́ntese das contri‑
buiçõ es palinoló gicas disponı́veis para a bacia, enfatizando: (i) a variedade dos palinomorfos
registrados e os signi icados (ii) biocronoestratigrá ico e (iii) paleoambiental das associaçõ es.
Contribuições à Geologia do Rio Grande do Sul e de Santa Catarina
Figura 1 ‒ Localizaçã o da á rea de abrangê ncia da Bacia de Pelotas e dos sı́tios amostrados, com informaçõ es
palinoló gicas. Pontos representados por cı́rculos: ocorrê ncias quaterná rias; por triâ ngulos: ocorrê ncias pré ‑
quaterná rias (detalhamento na Tabela 1).
Silva et al. (2011, 2015) e por Fischer et al. tos do Cretá ceo. Para o Paleoceno e para o
(2013). A partir da aná lise de 535 nı́veis dos Eoceno, sã o constatadas baixa frequê ncia e
poços BP‑01 e BP‑02, Premaor (2016) iden‑ riqueza, com registros dos gê neros angio‑
ti icou 91 tá xons de esporos e de grã os de pé rmicos Ulmoideipites, Tricolpites, Retitri‑
pó len, incluindo cinco, relativos a brió itas, colporites e Scabraperiporites, alé m de
27, a pteridó itas, 21, a gimnospermas e 38, Podocarpidites (Coniferophyta). A seçã o oli‑
a angiospermas. gocena é caracterizada por expressiva con‑
Durante o Cretá ceo, a associaçã o de tribuiçã o de elementos continentais e por
mió sporos é diversi icada, com destaque aos alta riqueza de grã os de pó len, destacando‑
gê neros Inaperturopollenites, Circulina, Clas‑ se os gê neros Ephedripites, Retitricolporites,
sopollis e Callialasporites, representantes da Podocarpidites e Tricolpites, enquanto grã os
lora gimnospé rmica, alé m de Exesipolleni‑ de pó len tricolporados e porados (Perisyn‑
tes, de Equisetosporites, de Gnetaceapolleni‑ colporites pokorny) e espé cimes dos gê neros
tes, de Steevesispollenites, de Anacolosidites e Scabraperiporites e Malvacipollis passam a
de Tricesticillus. Entre os esporos, destacam‑ apresentar maiores riqueza e frequê ncia. A
se os dos gê neros Cicatricosisporites, Interu‑ recuperaçã o na riqueza e na frequê ncia, ob‑
lobites, Triporoletes e Foveosporites. O regis‑ servada nos registros de mió sporos, durante
tro de esporomorfos na seçã o paleogê nica o Oligoceno, se manté m, a partir do Neó ge‑
da bacia apresenta um decré scimo de repre‑ no. Para o Mioceno, os gê neros Podocarpidi‑
sentatividade, quando comparada aos estra‑ tes, Retitricolporites, Araucariacites,
Tricolpites, Ephedripites, Psilaperiporites, compara ao registro botâ nico dos tá xons
Echiperiporites e Echitricolporites sã o ex‑ modernos, conquanto há diversos processos
pressivos e, entre os esporos, destacam‑se tafonô micos, que resultam em uma enorme
os dos gê neros Verrucatosporites, Lycopo‑ perda de informaçã o ecoló gica.
diumsporites, Laevigatosporites e Polypodia‑
ceoisporites. A maioria dos tá xons do 3. 2 Fungos
neogê nicos se manté m nos depó sitos do Pli‑
oceno. Nas associaçõ es palinoló gicas pré ‑
A lora continental em seçõ es qua‑ quaterná rias, fungos dispersos estã o fre‑
terná rias é testemunhada, por meio de am‑ quentemente representados em alguns in‑
pla riqueza palinoló gica, em sua maioria, tervalos do Cretá ceo (Premaor et al., 2010),
relacionada à s angiospermas. As associaçõ es do Paleó geno (Fischer et al., 2013) e do
de grã os de pó len e de esporos nas amostras Neó geno (Silva et al., 2015). Entretanto, es‑
sedimentares, concomitantemente à presen‑ tes elementos ainda sã o pouco detalhados,
ça de outros elementos, revelam distintas i‑ do ponto de vista taxonô mico, e pratica‑
to isionomias, como, por exemplo, mente subutilizados, como marcadores bio‑
comunidades higró ilas e haló itas, campos e estratigrá icos. O trabalho mais relevante,
matas. As seguintes famı́lias sã o representa‑ envolvendo as ocorrê ncias destes organis‑
das: Amaranthaceae, Anacardiaceae, Apiace‑ mos na BP, foi realizado por Premaor et al.
ae, Aquifoliaceae, Apocynaceae, Arecaceae, (2018a), a partir de sedimentos marinhos
Asteraceae (subfamı́lias Asteroideae e Ci‑ miocê nicos dos poços BP‑01 e CBM001‑ST‑
chorioideae), Boraginaceae, Bignoniaceae, RS. Entre os 89 morfotipos de fungos docu‑
Bromeliaceae, Cannabaceae, Caryophyllace‑ mentados, destaca‑se a presença de diver‑
ae, Combretaceae, Convolvulaceae, Cucurbi‑ sos exemplares dos grupos Amerosporae,
taceae, Cunoniaceae, Cyperaceae, Didymosporae, Phragmosporae e Microthy‑
Droseraceae, Ericaceae, Eriocaulaceae, riales, alguns dos quais sã o utilizados como
Euphorbiaceae, Fabaceae, Gunneraceae, Iri‑ importantes fó sseis‑guia do Mioceno. A
daceae, Lamiaceae, Lentibulariaceae, Liliace‑ ocorrê ncia destes tá xons, em conjunto com
ae, Loranthaceae, Lythraceae, Malpighiaceae, esporos pteridó itos e com grã os de pó len,
Malvaceae, Melastomataceae, Meliaceae, tem auxiliado nas inferê ncias paleoambien‑
Moraceae, Myrtaceae, Onagraceae, Passi lo‑ tais, reforçando a hipó tese de condiçõ es de
raceae, Poaceae, Polygalaceae, Polygonaceae, umidade em climas nã o tropicais, durante o
Portulacaceae, Plantaginaceae, Primulaceae, Mioceno.
Proteaceae, Rhamnaceae, Rubiaceae, Sapin‑
daceae, Scrophulariaceae, Smilacaceae, 3. 3 Dino lagelados
Typhaceae, Thymelaeaceae, Urticaceae, Va‑
lerianaceae, Verbenaceae e Winteraceae (an‑ Cistos de dino lagelados tê m sido
giospermas); Ephedraceae e Podocarpaceae abundantemente documentados em seçõ es
(gimnospermas); Lycopodiaceae e Selaginel‑ pré ‑quaterná rias, principalmente, nos poços
lacea (licó itas): Osmundaceae, Blechnaceae, offshore. Na seçã o quaterná ria, ocorrem
Pteridaceae, Salviniaceae, Polypodiaceae, mais pontualmente em determinados inter‑
Cyatheaceae e Dryopteridaceae (moniló i‑ valos. Os registros mais antigos destes mi‑
tas); e Notothyladaceae e Sphagnaceae crofó sseis foram noticiados por Arai et al.
(brió itas). E importante ressaltar que a ri‑ (2006), os quais identi icaram assembleias
queza palinoló gica, aqui mencionada, nã o se palinoló gicas aptianas em um intervalo do
Tabela 1 ‒ Relaçã o dos sı́tios palinoló gicos na Bacia de Pelotas, localizados na Figura 1. Abreviaçõ es sobre a
geocronologia: A) Bioestratigra ia com foraminı́feros; B) Bioestratigra ia com palinomorfos; e C) Idades
radiomé tricas.
poço 2‑BPS‑6A. Posteriormente, novos acha‑ (2013) divulgaram associaçõ es paleocê nicas
dos foram realizados por Premaor et al. e eocê nicas dos mesmos poços. Estudos de
(2010) na seçã o cretá cea, datada entre o Al‑ natureza paleoambiental com esses palino‑
biano e o Campaniano, advindas dos poços morfos foram apresentados por Menezes
BP‑01 e BP‑02, enquanto Fischer et al. (2014) e por Menezes et al. (2016), para in‑
çõ es registradas sã o numerosas e diversi ica‑ nú mero de espé cies, em relaçã o aos do Eo‑
das, com o registro de representantes da pa‑ ceno. Um incremento signi icativo de espé ci‑
lino lora terrestre e de tá xons de natureza es de cistos de dino lagelados ocorre no
marinha. Cistos e dino lagelados, esporos Mioceno, enquanto esporomorfos sã o me‑
(brió itas e pteridó itas) e grã os de pó len se nos abundantes. Para o Pliocone, esporos e
destacam em frequê ncia e em nú mero de es‑ grã os de pó len apresentam caracterı́sticas
pé cies. Os dados apresentados na Figura 3 similares à quelas registradas para os do Mi‑
tê m base na riqueza de espé cies destes tá ‑ oceno, em nú mero de espé cies; já cistos de
xons nos poços supramencionados, nã o re‑ dino lagelados demonstram decré scimo sig‑
letindo, necessariamente, a participaçã o ni icativo.
relativa dos grupos. Para o Quaterná rio, os dados palino‑
De forma geral, as associaçõ es do ló gicos dos poços perfurados na porçã o
Cretá ceo Inferior apresentam baixa riqueza emersa da BP sã o mais robustos do que
especı́ ica, ao contrá rio dos conjuntos pali‑ aqueles, advindos dos poços offshore. Os tra‑
noló gicos veri icados no Cretá ceo Superior, balhos relacionados objetivaram o estudo
em cujos depó sitos é constatado aumento das oscilaçõ es do nı́vel relativo do mar, bem
signi icativo do nú mero de tá xons. No Cretá ‑ como variaçõ es climá ticas e dinâ micas de
ceo Superior, cistos de dino lagelados pas‑ distribuiçã o da vegetaçã o, a maioria dos
sam a ter maior representatividade de quais, com controle geocronoló gico de data‑
formas peridinioides e gonyaulacoides, seçã o çõ es radiocarbô nicas (Tabela 1). Na Figura
també m marcada por expressiva contribui‑ 4, é apresentada uma sı́ntese sobre os resul‑
çã o de elementos continentais. Nas associa‑ tados obtidos, enfatizando a in luê ncia mari‑
çõ es paleocê nicas, cistos de dino lagelados nha nos diversos sı́tios palinoló gicos,
de natureza mais cosmopolita foram veri i‑ denotada pelo reconhecimento de tá xons de
cados, tais como Palaeoperidinium pyropho‑ cistos de dino lagelados, de palinoforaminı́‑
rum, Cerodinium striatum, Trithyrodinium feros e de acritarcos. Para retratar os even‑
evittii, Eisenackia reticulata e Disphaerogena tos paleoambientais entre o Pleistoceno
carposphaeropsis. Esporos e grã os de pó len Superior e o Recente da bacia, quatro fases
mostram um decré scimo signi icativo da ri‑ sã o discriminadas aqui, com ê nfase no signi‑
queza de espé cies, representados, mais rara‑ icado das mudanças nos ecossistemas vege‑
mente, por Ulmoideipites krempii. tais. A distribuiçã o dos sı́tios em que
ocorrem é representada na Figura 5, na qual
Expressivo nú mero de elementos
os ambientes foram agrupados, a partir das
marinhos foi documentado nos intervalos
interpretaçõ es paleoambientais, advindas
eocê nicos, com tá xons de cará ter endê mico
dos trabalhos consultados, com registro de
de altas latitudes do Hemisfé rio Sul, tais co‑
tá xons da lora terrestre de distintos subam‑
mo Enneadocysta dictyostila, De landrea an‑
bientes (campo, banhado, turfeira, pâ ntano,
tarctica e Octodinium askiniae; esporomorfos
mata de restinga, mata paludosa, laguna, la‑
sã o menos numerosos, representados, mais
goa, lago e estuá rio) e de tá xons marcadores
localmente, por Clovifera triplex e por Ulmoi‑
de in luê ncia marinha (cistos de dino lagela‑
deipites krempii. Nos intervalos correspon‑
dos, acritarcos e palinoforaminı́feros).
dentes ao Oligoceno, ocorre um decré scimo
signi icativo de riqueza especı́ ica dos cistos Na Fase I (41.000‑11.000 anos AP),
de dino lagelados; esporos e grã os de pó len ocorre o domı́nio de formaçõ es campestres
apresentam tendê ncia de estabilidade em e raros tá xons, correspondentes à vegetaçã o
arbó reo‑arbustiva pioneira. Palinomorfos
Figura 2 ‒ Correlaçã o estratigrá ica dos poços, com informaçõ es palinoestratigrá icas disponı́veis para a seçã o
do Albiano ao Plioceno da Bacia de Pelotas (Silva et al., 2011, 2015; Premaor, 2016; Premaor et al., 2020).
Figura 3 ‒ Grá ico de riqueza dos tá xons de esporos, dos grã os de pó len e dos cistos de dino lagelados,
distribuı́dos nos poços BP‑01 e BP‑02, na porçã o offshore da Bacia de Pelotas (iné dito de Premaor, 2016).
marinhos (cistos de dino lagelados, palinofo‑ (sı́tios 5, 12, 13, 19 e 27). Na maioria dos sı́‑
raminı́feros e acritarcos) foram registrados tios (4, 6, 7, 9, 10, 11, 14, 15, 18, 23, 24, 26,
na base do testemunho do sı́tio 36 (ca. 28, 32, 33, 34, 35 e 37), a ingressã o marinha
41.000 anos AP). Na Fase II (11.000‑7.000 foi documentada, por meio do registro de
anos AP), a ito isionomia continua marcada cistos de dino lagelados, de acritarcos e de
pela vegetaçã o campestre, poré m a lora ar‑ palinoforaminı́feros. Na Fase IV (4.000 anos
bó reo‑arbustiva pioneira recrudesce, em res‑ AP‑Recente), concomitantemente ao evento
posta ao clima mais quente do Holoceno. regressivo marinho, registra‑se expansã o da
Neste contexto, a Mata Atlâ ntica migrou gra‑ Mata Atlâ ntica (de oeste para leste), con igu‑
dualmente da regiã o Sudeste para a regiã o rando as distintas ito isionomias arbó reo‑
Sul. Nessa fase, já é possı́vel identi icar os arbustivas nos campos litorâ neos, tais como
efeitos da ingressã o marinha sobre a planı́cie as matas de restinga psamó ilas e paludosas
costeira (sı́tios 9, 16, 35 e 37) (Fig. 4‑5). Na (e.g. Lorscheitter, 2003).
Fase III (7.000‑4.000 anos AP), a vegetaçã o Embora a transgressã o tenha sido
arbó reo‑arbustiva nos campos litorâ neos generalizada, alguns sı́tios palinoló gicos (5,
continua a se desenvolver, sobretudo, em 12, 13, 19, 27) nã o documentam a in luê ncia
á reas mais interiorizadas da planı́cie costeira marinha, o que pode ser resultante do grau
Figura 4 ‒ Fases ambientais reconhecidas nas perfuraçõ es, com informaçõ es palinoló gicas realizadas na
Planı́cie Costeira do Rio Grande do Sul (PCRS) e na Planı́cie Costeira de Santa Catarina (PCSC), em um transecto
sudoeste‑nordeste. As seçõ es hachuradas em azul indicam o registro da in luê ncia marinha nos sı́tios
(detalhamento dos sı́tios na Tabela 1).
Figura 5 ‒ Sı́tios palinoló gicos perfurados, ao longo da Planı́cie Costeira do Rio Grande do Sul e de Santa
Catarina, com ou sem registro de tá xons de in luê ncia marinha, organizados cronologicamente, conforme fases
apresentadas no texto: A) Fase I: 41.000‑11.000 anos AP; B) Fase II: 11.000‑7.000 anos AP; C) Fase III: 7.000‑
4.000 anos AP; D) Fase IV: 4.000 anos AP‑atual (a á rea em cinza escuro representa a porçã o emersa atual da
Bacia de Pelotas).
çã o onshore, com maior nú mero de sı́tios, se‑ ditos apontam para a subdivisã o dos depó si‑
ja na porçã o offshore, a partir de pouco poços tos cretá ceos a pliocê nicos em, pelo menos,
disponı́veis. Contudo, a seçã o atravessada 16 palinozonas, com atribuiçõ es de idades e
nos poços offshore corresponde ao trecho es‑ de correlaçã o entre os poços offshore e
tratigrá ico de maiores amplitude volumé tri‑ onshore, alguns dos quais com integraçã o bi‑
ca e abrangê ncia temporal (Cretá ceo Inferior cronoestratigrá ica de nanofó sseis e de fora‑
ao Recente). Estudos bioestratigrá icos iné ‑ minı́feros calcá rios. Idades do Cretá ceo
Inferior ao Plioceno tê m sido veri icadas nos the Early Cretaceous history of the South
poços profundos offshore e onshore; estes ú l‑ Atlantic. In: SIMPOSIO DO CRETACEO DO
timos, documentando depó sitos de idade BRASIL e SIMPOSIO DO TERCIARIO DO BRA‑
SIL, 7., 2006, Rio Claro. Boletim de Resumos.
miocê nica ao Recente. Em termos taxonô mi‑
Rio Claro, p. 12.
cos, destaca‑se o aprofundamento na identi‑
icaçã o de cistos de dino lagelados das Bauermann, S. G. 2003. Análises palinológicas
associaçõ es do Cretá ceo ao Recente, com re‑ e mudanças paleovegetacionais nas turfeiras
sultados descritivos publicados, colaborando de Barrocadas e Águas Claras, Planície Costei‑
no preenchimento desta lacuna de conheci‑ ra do Rio Grande do Sul, Brasil. Porto Alegre,
139p. Tese de Doutorado, Programa de Pó s‑
mento para a margem costeira brasileira.
graduaçã o em Geociê ncias, Instituto de Geo‑
Té cnicas de recuperaçã o e de aná lise tê m si‑ ciê ncias, Universidade Federal do Rio Grande
do particularmente empregadas para os ma‑ do Sul.
teriais quaterná rios, resultando na
recuperaçã o de um nú mero expressivo de Bueno, G. V., Zacharias, A. A., Oreiro, S. G., Cu‑
determinados palinomorfos, tais como de pertino, J. A., Falkenhein, F. U. H. & Martins
Neto, M. A. 2007. Bacia de Pelotas. Boletim de
cistos de dino lagelados desconhecidos,
Geociências da Petrobras, 15(2): 551‑559.
alé m do aprimoramento taxonô mico dos tin‑
tinomorfos, grupo, até entã o, com pouco Burjack, M. I. A. & Marques‑Toigo, M. M.
aprofundamento sistemá tico. 1980. Caracterizaçã o palinoló gica da turfeira
da regiã o de Aguas Claras, municı́pio de Via‑
AGRADECIMENTOS mã o – RS, Brasil. Boletim IG‑USP, 11: 181‑
189.
Os autores agradecem à FAPERGS,
pelo subsı́dio a alguns dos trabalhos de con‑ Cancelli, R. R. 2012. Evoluçã o paleoambiental
da Planı́cie Costeira sul‑catarinense (Lagoa
clusã o de curso e de pó s‑graduaçã o dos co‑
do Sombrio) durante o Holoceno, com base
autores (Processo 1012119). PAS e LAK sã o em dados palinoló gicos. Porto Alegre, 159p.
bolsistas do CNPq (processos 313340/2018‑ Tese de Doutorado, Programa de Pó s‑gradu‑
8 e 141324/2017‑1, respectivamente). açã o em Geociê ncias, Instituto de Geociê nci‑
as, Universidade Federal do Rio Grande do
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Premaor, E., Saxena, R. K., Souza, P. A. & Kal‑ oestratigrá ico e paleoecoló gico. Geologia
Souza et al.
1
Universidade Federal do Paraná
2
Universidade Estadual de Ponta Grossa
3
Instituto de Geociê ncias, Universidade Federal do Rio Grande do Sul
4
Programa de Pó s‑graduaçã o em Geologia, Universidade Federal do Rio Grande do Sul
1 INTRODUÇÃO
Rubi, sa ira e corı́ndon industrial, provenientes da regiã o nordeste de Santa Catarina, fo‑
ram descobertos em meados da dé cada de 1980 e vê m sendo estudados desde entã o, em ter‑
mos mineraló gicos, geoló gicos, gemoló gicos e econô micos (Scangarelli, 1985; Ripoll et al., 1987;
Brum et al., 1990; Chodur, 1997; Chodur & Liccardo, 2000; Liccardo, 2003; Liccardo & Chodur,
2006). As ocorrê ncias sã o caracteristicamente esparsas, do tipo depó sitos colú vio‑aluvionares,
associados ao contexto do Complexo Granulı́tico de Santa Catarina. Esses depó sitos estã o distri‑
buı́dos por cerca de 800 km2 pelos territó rios que se estendem entre os municı́pios de Joinville,
Itajaı́, Luı́s Alves e Massaranduba, com jazidas conhecidas em Barra Velha e em Sã o Joã o do Ita‑
periú (Fig. 1).
Mineralogicamente e em termos gemoló gicos, foram identi icados cristais de rubi e sa i‑
ra, alguns com efeitos ó pticos especiais, mas que raramente apresentam transparê ncia, em vir‑
tude do excesso de inclusõ es, o que parece ter limitado o mercado para essas gemas. No
entanto, a presença desses minerais na regiã o revela, para alé m de seu potencial econô mico,
uma geodiversidade importante e uma informaçã o geoló gica peculiar, já que o corı́ndon, por sua
gê nese e por sua resistê ncia ao intemperismo, é um remanescente dos processos ocorridos e
testemunha boa parte da histó ria geoló gica regional antiga.
Contribuições à Geologia do Rio Grande do Sul e de Santa Catarina
Figura 1 – Mapa geoló gico da regiã o NE de Santa Catarina, indicando a localizaçã o das ocorrê ncias de corı́ndon
em terrenos do Complexo Granulı́tico de Santa Catarina.
(canais e planı́cies aluvionares). Depó sitos uma á rea cratô nica arqueana e o detalha‑
luviais e aluviais atuais inconsolidados, com‑ ram como sendo compostos por gnaisses
postos por sedimentos de granulometrias va‑ granulı́ticos leucocrá tı́cos, por milonitos
riadas, desde argilas até grâ nulos, por seixos granulı́ticos, por blastomilonitos de deriva‑
e por calhaus, sã o encontrados nos vales e çã o granulı́tica, por ultrama itos, por gnais‑
nas planı́cies de inundaçã o de vá rios rios da ses calcossilicatados, por gnaisses
regiã o. Rampas coluviais sã o constituı́das por kinzigı́ticos, por anortositos, por quartzitos,
sedimentos detrı́ticos grosseiros e mal‑sele‑ por formaçõ es ferrı́feras e por gnaisses ca‑
cionados, formadas ao longo das baixas ver‑ taclá sticos. Sã o rochas metamó r icas de fá ‑
tentes e ocorrem regionalmente de maneira cies granulito e an ibolito que ocorrem no
muito expressiva. Nesses compartimentos, os nordeste catarinense, em uma á rea de apro‑
depó sitos de corı́ndon se acumulam onde o ximadamente 8.500 km2, estendendo‑se até
gradiente diminui no limite do relevo aciden‑ a divisa com o Paraná .
tado (Chodur, 2007). Silva (1984, 1987) distinguiu nesses
Os depó sitos sedimentares portado‑ granulitos, trê s fases deformacionais supe‑
res de corı́ndon, estã o localizados nos alu‑ rimpostas a estas rochas. A primeira mostra
viõ es quaterná rios do rio Itapocu e em vá rios um padrã o de dobramento aberto D1, com
de seus a luentes, ou em colú vios. Esses de‑ foliaçã o S1 de baixo e de mé dio â ngulo; a
pó sitos sã o rampas coluviais, aluviõ es, colu‑ segunda, ligada a fenô menos de cisalha‑
viõ es e terraços aluviais, originados das mento dú ctil, com transposiçõ es, resultando
rochas do Complexo Granulı́tico. Encontram‑ em uma foliaçã o de alto â ngulo; e a terceira,
se em zonas aplainadas, propı́cias aos pro‑ originou uma foliaçã o milonı́tica, transpon‑
cessos deposicionais, e sã o depó sitos des‑ do as duas anteriores. A fá cies an ibolito, a
contı́nuos, com ampla distribuiçã o que o Complexo Granulı́tico foi submetido, é
geográ ica, variando conforme a topogra ia representada pela hornblendizaçã o parcial
do substrato em que estã o localizados. a total dos piroxê nios. A hornblenda encon‑
O corı́ndon se concentra principal‑ trada na litologia regional, é provavelmente
mente nos depó sitos rudá ceos existentes no retrometamó r ica, sugerindo um metamor‑
sopé das elevaçõ es, sendo detectados tam‑ ismo regional da fá cies an ibolito, posterior
bé m nas planı́cies aluvionares da regiã o, po‑ à fá cies granulito. Ainda, pode‑se detectar a
ré m de forma mais dispersa, nas fá cies presença de clorita e de epidoto nessas ro‑
constituı́das por nı́veis de cascalhos. Em al‑ chas, de inindo um metamor ismo de baixo
guns locais, esse mineral també m pode ser grau, principalmente em zonas de falhas
encontrado na superfı́cie dos solos de cober‑ (Hartmann et al., 1979).
tura existentes nas porçõ es mais elevadas, A mineralogia dos gnaisses se com‑
principalmente em canais de escoamento na‑ põ e principalmente de quartzo e de feldspa‑
tural de á guas pluviais. tos, predominando amplamente o
plagioclá sio (oligoclá sio) sobre o ortoclá sio,
3. 1 Granulitos podendo ocorrer ainda o microclı́nio. A mi‑
neralogia dos má icos é constituı́da por hi‑
Silva & Dias (1981a, 1981b, 1981c) e perstê nio (paragê nese da fá cies granulito),
Silva (1984, 1987), com base em cartogra ia e por diopsı́dio, por hornblenda verde‑casta‑
em estudos de petrogra ia e de petrogê nese nha e por biotita titanı́fera, e os acessó rios
da regiã o, apresentaram o Complexo Granulı́‑ mais comuns sã o o zircã o, a magnetita, o ru‑
tico de Santa Catarina como pertencente a tilo e, mais raramente, a pirrotita (Chodur,
442 Edição da Sociedade Brasileira de Geologia – Núcleo RS/SC
Chodur et al.
cardo, 2003). Os depó sitos dessa regiã o sã o nulito mais ricas em alumı́nio poderiam ter
associados ao Complexo Granulı́tico de San‑ cristalizado o corı́ndon, com a saı́da do
ta Catarina, mas sã o caracteristicamente se‑ quartzo (enriquecimento residual), e, ao
cundá rios (coluvionares e, eventualmente, mesmo tempo, esse processo tornaria essas
aluvionares), de distribuiçã o geográ ica am‑ rochas muito suscetı́veis ao intemperismo,
pla, com localizaçã o restrita e com alta con‑ conforme citado por Jordt‑Evangelista & Lic‑
centraçã o de corı́ndon em cascalheiras de cardo (2002) e Liccardo (2003) em estudos
quartzo leitoso. Na á rea em questã o, rochas‑ comparativos de corı́ndon, em gnaisses de
fonte do corı́ndon nã o foram encontradas Catingal (BA). O mecanismo de dessilici ica‑
em dé cadas de estudos, provavelmente por çã o é , portanto, fundamental para uma gê ne‑
terem sido completamente alteradas pela se localizada do corı́ndon nas antigas rochas
açã o intempé rica. Como os terrenos nos granulı́ticas e explica a ausê ncia desse mine‑
quais se localizam os depó sitos sã o meta‑ ral nas rochas atualmente presentes na re‑
mó r icos, de fá cies an ibolito superior ou giã o, pois o enriquecimento em alumı́nio
granulito, considera‑se como premissa, que teria sido restrito à s zonas de metassomatis‑
o mineral tenha sido formado nesse ambi‑ mo. Para Chodur (1997), a granulitizaçã o que
ente metamó r ico. A correlaçã o entre a gê ‑ afetou as rochas regionalmente, poderia ter
nese do corı́ndon nessa regiã o e os afetado també m os sedimentos pré ‑existen‑
processos tectô nicos, geoquı́micos, intem‑ tes, ricos em alumı́nio, gerando dessa forma,
pé ricos e deposicionais, apresenta especial corı́ndon a partir de minerais aluminosos.
importâ ncia no estudo geoló gico e econô mi‑ Um metassomatismo entre o granuli‑
co das jazidas e é fundamental como contro‑ to e as rochas ultramá icas nã o estaria des‑
le prospectivo regional. cartado, pois regionalmente esses litotipos
Os depó sitos apresentam como foram descritos e isso explicaria a origem do
principais caracterı́sticas: intemperismo in‑ elemento cromo, causador da cor vermelha
tenso da rocha‑mã e, com liberaçã o de cris‑ nos cristais de rubi e de sa ira rosa encontra‑
tais; evidê ncias de proximidade entre fonte dos nos depó sitos. A associaçã o do corı́ndon
e á rea de deposiçã o; e concentraçã o em cas‑ com blocos angulosos de quartzo leitoso e de
calheiras, compostas exclusivamente por quartzo cataclasado nos depó sitos coluvio‑
blocos de quartzo leitoso, com alta angulosi‑ nares e a proximidade destes a zonas de fra‑
dade, dentro de leques aluviais holocê nicos. turamentos e de falhas, sã o també m
Alé m disso, esses depó sitos coluvionares indicativos da gê nese sugerida. A presença
normalmente estã o pró ximos de zonas de de argila caulinı́tica nos depó sitos, é possi‑
fraturamento e de falhas de rochas granulı́‑ velmente, fruto de alteraçã o de auré olas de
ticas, com presença de argila caulinı́tica as‑ feldspato, que originalmente teriam envolvi‑
sociada. do os cristais de corı́ndon, como ocorre em
Uma possı́vel interpretaçã o dos pro‑ outros lugares do mundo (Liccardo, 2003;
cessos que atuaram na gê nese do corı́ndon Liccardo & Jordt‑Evangelista, 2006). Ausê n‑
indica que nã o existe mais uma rocha‑fonte. cia de sinais de transporte e a associaçã o
Os eventos tectô nicos, ocorridos durante o com grandes blocos de quartzo leitoso e de
Ciclo Brasiliano, causaram um fraturamento quartzo com feiçõ es cataclá sticas, bem como
generalizado nas rochas, que muitas vezes a proximidade dos depó sitos a zonas de fra‑
foi preenchido por quartzo, formando veios turamento, apontam uma estreita relaçã o en‑
e causando a dessilici icaçã o das encaixan‑ tre os processos gené tico‑tectô nicos e os
tes nas zonas de contato. As porçõ es de gra‑ mecanismos deposicionais.
Figura 4 – Cristais de corı́ndon com há bitos caracterı́sticos encontrados em depó sitos de Barra Velha (0,5 a 2,0
cm) e um fragmento irregular (3 cm), onde se observa a geminaçã o polissinté tica caracterı́stica desse mineral
(fotos: A. Liccardo).
Figura 5 – Geminaçã o e partiçã o nos cristais de corı́ndon. A) Representaçã o do plano de partiçã o em uma face
do cristal; B) Representaçã o da interseçã o dos planos de partiçã o; C) Representaçã o da projeçã o dos planos de
partiçã o nas faces do cristal, gerando partiçã o romboé drica; D) Representaçã o da partiçã o romboé drica, vista
perpendicularmente ao eixo cristalográ ico “c” do cristal; E) Imagem em lupa binocular, indicando a partiçã o
romboé drica observada na face basal de um cristal de corı́ndon; e F) Imagem em lupa binocular, indicando a
partiçã o romboé drica observada na face lateral do prisma hexagonal de um cristal de corı́ndon (fotos e iguras:
G. Villani).
cã o, rutilo e o pró prio corı́ndon constituem o frequê ncia, sã o cristais negativos, o zonea‑
conjunto das inclusõ es só lidas caracterı́sticas mento de cor, um padrã o de estrutura em
nessas gemas. Pirita, pirrotita, ó xidos de Fe e rede em que as faixas correspondem à zona
de Mn e argilominerais sã o frequentes, mas, de alteraçã o do corı́ndon em diá sporo, cana‑
possivelmente de origem secundá ria; alé m lı́culos orientados segundo as direçõ es cris‑
disso, ocorrem feiçõ es aciculares que foram talográ icas e que podem resultar num
identi icadas como cavidades vazias (Fig. 7) efeito seda ou asterismo em algumas amos‑
(Chodur, 1997). tras, alé m da geminaçã o polissinté tica, mui‑
O estudo ó ptico dos cristais revelou a to evidente na maior parte dos cristais
presença de inclusõ es luidas primá rias, se‑ (Chodur, 1997).
cundá rias e pseudosecundá rias, com dimen‑ No rubi e na sa ira dessa regiã o, é
sõ es variá veis (> 5‑30 μm ou, mesmo, comum o aparecimento de asterismo apó s a
maiores), constituı́das essencialmente por lapidaçã o na forma de cabochã o, originando
CO2, podendo conter fases só lidas. Muitas in‑ estrelas de seis pontas com â ngulos de 60
clusõ es exibem seccionamentos paralelos à s entre os raios. Apesar de frequente, o efeito
direçõ es cristalográ icas, parecendo subdivi‑ é de baixa intensidade, ou seja, as estrelas
didas em duas ou em mais partes (Fig. 8). sã o tê nues, destacando‑se apenas sob a açã o
Outras feiçõ es internas observadas com certa de luz intensa (Chodur, 1997). Outro efeito
Figura 8 – Inclusõ es luidas em rubi e em sa ira de Barra Velha (20 a 30 µm). Muitas inclusõ es exibem
seccionamentos paralelos à s direçõ es cristalográ icas (fotos: N. Chodur).
7 CONSIDERAÇÕES FINAIS
O Brasil é considerado a maior Pro‑
vı́ncia Gemoló gica do planeta, nã o só devido
à variedade e à quantidade de materiais ge‑
moló gicos produzidos, mas també m pela sua
B
extensã o geográ ica, pois todos os estados
brasileiros produzem algum tipo de gema.
Estima‑se que cerca de 70% do volume de
gemas de cor que circulam no mercado in‑
ternacional, seja proveniente do Brasil. No
entanto, o paı́s nã o é um grande fornecedor
de rubi e de sa ira, registrando‑se um produ‑
çã o restrita e esporá dica em certos estados,
como Minas Gerais e Bahia. Os depó sitos de
rubi e de sa ira da regiã o de Barra Velha (SC)
foram descobertos na segunda metade dos
Figura 9 – Rubi e sa ira lapidados, provenientes de
Barra Velha. A) Sa ira rosa lapidada em cabochã o (2 anos 1980. Apesar dos trabalhos de pesquisa
cm), apresentando zonaçã o de crescimento e efeito lá desenvolvidos, os depó sitos ainda nã o fo‑
seda; B) Cristais de rubi translú cidos, lapidados em
cabochã o, provenientes de Sã o Joã o do Itaperiú ram convenientemente explorados e, até o
(fotos: A. Liccardo). momento, poucos sã o os registros de extra‑
planos romboé dricos e basais dos cristais. çã o comercial desses materiais. As caracte‑
rı́sticas dos depó sitos e do miné rio
O comportamento luorescente des‑
apresentadas neste capı́tulo podem contri‑
ses cristais de rubi e de sa ira foi estudado
buir para a prospecçã o desse bem mineral,
por Chodur (1997), utilizando lâ mpadas de
com a indicaçã o de possı́veis novos alvos de
luz ultravioleta de ondas longas
exploraçã o. O aproveitamento desse recurso,
(UVL=366nm) e curtas (UVC=253,7nm). Sob
alé m de trazer desenvolvimento econô mico
ondas longas, algumas amostras se mostra‑
para as regiõ es produtoras, aumentaria a di‑
ram inertes, enquanto outras apresentaram
versidade de materiais gemoló gicos produzi‑
uma forte luorescê ncia na cor vermelha.
dos no Brasil.
Nesse caso, os cristais de coloraçã o verme‑
lha mais acentuada se apresentaram muito
luorescentes, havendo uma queda gradual REFERÊNCIAS
deste comportamento em exemplares de co‑
loraçõ es ró seas mais claras. Os cristais de Basei, M. S. A. 1985. O cinturão Dom Feliciano
em Santa Catarina. Sã o Paulo, 190p. Tese de
corı́ndon com coloraçõ es cinza, preta e bran‑
Doutorado, Instituto de Geociê ncias, Univer‑
ca nã o apresentaram reaçõ es a este tipo de
sidade de Sã o Paulo.
Chodur et al.
1
Instituto de Geociê ncias, Universidade Federal do Rio Grande do Sul
2
Campus Litoral Norte, Universidade Federal do Rio Grande do Sul
1 INTRODUÇÃO
Ao longo das ú ltimas seis dé cadas, o conhecimento acerca da evoluçã o costeira da por‑
çã o emersa da Bacia de Pelotas, a qual, morfologicamente, corresponde, principalmente, à Planı́‑
cie Costeira do Rio Grande do Sul (PCRS), foi inicialmente apresentado à comunidade cientı́ ica,
no â mbito da litoestratigra ia (dé cadas de 1960 e 1970), passando pela concepçã o cronoestrati‑
grá ica (dé cadas de 1980 e 1990), e, mais recentemente (dé cadas de 2000 e 2010), tem sido
apresentado, segundo os conceitos da Estratigra ia de Sequê ncias. Essa evoluçã o do conheci‑
mento foi natural, decorrente, principalmente, da atuaçã o de uma comunidade cientı́ ica especi‑
alizada, cujo trabalho foi facilitado pela cé lere evoluçã o das ferramentas de investigaçã o, ou seja,
das ferramentas geotecnoló gicas. Essas ferramentas, englobadas nas geotecnologias, atravé s de
imagens de saté lites, dos modelos digitais de elevaçã o, da Geocronologia, da Geofı́sica de alta re‑
soluçã o e do Geoprocessamento, permitiram a obtençã o de dados com maior resoluçã o, cuja in‑
tegraçã o viabilizou a concepçã o de modelos tridimensionais, que permitiram observar com
maior detalhe e clareza o arranjo geomé trico dos sistemas deposicionais costeiros.
A PCRS foi classi icada, por Carraro et al. (1974), como uma das quatro provı́ncias geo‑
morfoló gicas do estado, constituı́da de uma ampla á rea de terras baixas, possuidora de algumas
peculiaridades, que a distingue no cená rio das regiõ es costeiras brasileiras. Essa unidade geo‑
morfoló gica, formada, principalmente, durante o Perı́odo Quaterná rio, destaca‑se pelo excelente
grau de preservaçã o dos registros morfoló gico e estratigrá ico, o que lhe confere a condiçã o de
um ó timo laborató rio natural no estudo da evoluçã o de regiõ es costeiras, submetidas à s suces‑
Contribuições à Geologia do Rio Grande do Sul e de Santa Catarina
sivas transgressõ es e à s regressõ es mari‑ campo, para estudos sedimentoló gicos, es‑
nhas, que ocorreram neste perı́odo geoló gi‑ tratigrá icos e evolutivos, o que resultou em
co. Tais eventos foram acompanhados de um signi icativo avanço do conhecimento
fatores ambientais locais (autogê nicos), co‑ sobre a Geologia da regiã o.
mo o estoque sedimentar e os processos eó ‑ Esse capı́tulo procura sintetizar o
licos e hidrodinâ micos (ondas e correntes), estado da arte (produzido, a partir de 1969)
que geraram importantes e evidentes regis‑ sobre a Geologia da porçã o emersa da Bacia
tros erosivos e deposicionais. de Pelotas, entre o Cabo de Santa Marta
As primeiras observaçõ es sobre a (Brasil) e La Coronilla (Uruguai), abordando
paisagem costeira, na primeira metade do a natureza e a distribuiçã o dos seus siste‑
Sé culo XX, de cunho essencialmente descriti‑ mas deposicionais e analisando sua histó ria
vo, sã o atribuı́das aos pesquisadores Lind‑ evolutiva. Essa revisã o está embasada em
man, Backeuser, Lamego e Rambo (Villwock muitos dos trabalhos supracitados e em no‑
& Tomazelli, 1995). Entre os vá rios aspectos vos estudos, realizados a partir deste sé cu‑
observados, chamou a atençã o destes pes‑ lo. As abordagens aqui apresentadas
quisadores o importante papel exercido pelo re letem as contribuiçõ es trazidas pelos
vento no modelado da paisagem, as dimen‑ pesquisadores, ligados ao Centro de Estu‑
sõ es dos campos de dunas eó licas e o grande dos de Geologia Costeira e Oceâ nica (CECO),
nú mero de corpos lagunares existente na re‑ do Instituto de Geociê ncias da UFRGS.
giã o.
Pesquisas mais aprofundadas, de cu‑ 2 CARACTERÍSTICAS GERAIS DA PLANÍ‑
nho geoló gico, tiveram inı́cio, a partir da se‑ CIE COSTEIRA DA BACIA DE PELOTAS
gunda metade do Sé culo XX. Conforme Closs
(1970), campanhas de sondagens estratigrá ‑ 2. 1 Contexto geológico e geomorfoló‑
icas, realizadas pela Petrobras, entre os gico
anos de 1958 e de 1963, permitiram uma
A Bacia de Pelotas está localizada
primeira abordagem da estratigra ia de sub‑
entre o Cabo de Santa Marta (Santa Catari‑
superfı́cie. A contribuiçã o de Delaney (1965)
na) e La Coronilla (Uruguai). Sua planı́cie
apresenta o primeiro mapa geoló gico, acom‑
costeira possui o registro mais completo de
panhado da primeira coluna estratigrá ica
eventos quaterná rios, ao longo da costa bra‑
das formaçõ es a lorantes na PCRS. Essa pu‑
sileira (Fig. 1), distribuı́dos ao longo dos
blicaçã o pode ser considerada um marco pa‑
seus 770 km de extensã o e dos seus 10 a 15
ra o conhecimento geoló gico da regiã o.
km de largura (trecho Tramandaı́‑Torres),
A partir de 1969, esses estudos geo‑ alcançado um valor má ximo de 100 km,
ló gicos pioneiros da PCRS receberam um pró ximo à Porto Alegre.
forte impulso, quando, sob a iniciativa do
A Bacia de Pelotas é uma bacia mar‑
Prof. Luiz Roberto Silva Martins, foi fundado
ginal aberta (sem limites fı́sicos, ao leste),
o Centro de Estudos de Geologia Costeira e
possuindo uma á rea de, aproximadamente,
Oceâ nica (CECO). Nesta mesma é poca, a con‑
210.000 km2. Faz fronteira com a Bacia de
comitante criaçã o do Programa de Pó s‑gra‑
Santos, ao norte, atravé s do Alto Florianó ‑
duaçã o em Geociê ncias, da UFRGS, com as
polis (Gamboa & Rabinowitz, 1981), e com a
á reas de concentraçã o Geologia Marinha, Es‑
Bacia de Punta Del Este, ao sul, atravé s do
tratigra ia e Paleontologia, contribuiu, para
Alto de Polô nio, no Uruguai (Urien & Mar‑
que a PCRS passasse a ser um laborató rio de
tins, 1978). Seus limites, no sentido oeste,
Figura 1 – Mapa geoló gico/geomorfoló gico simpli icado da Bacia de Pelotas. As barreiras costeiras se
estendem, longitudinalmente, entre Cabo de Santa Marta (SC) (Brasil) e La Coronilla (Uruguai) (modi icado de
Dillenburg & Barboza, 2014; Rosa et al., 2017; Bitencourt et al., 2020).
aos ambientes de encosta das terras altas, mento dos sistemas deposicionais do tipo la‑
adjacentes à planı́cie costeira. O sistema de guna‑barreira. Quatro desses sistemas depo‑
leques aluviais, provavelmente, começou a se sicionais foram preservados no registro
formar ainda no Terciá rio, e evoluiu, ao longo estratigrá ico e podem ser identi icados na
do Quaterná rio, controlado, em grande parte, paisagem da atual PCRS, sendo trê s de idade
pelas oscilaçõ es climá ticas e eustá ticas, que pleistocê nica e um de idade holocê nica
ocorreram nesse intervalo de tempo. Duran‑ (Villwock et al., 1986).
te os perı́odos climá ticos mais ú midos, as
formas originais dos leques aluviais foram 3. 3. 1 Sistemas laguna‑barreira pleisto‑
suavizadas e alteradas, resultando, no inal, cênicos
na formaçã o de uma rampa de depó sitos alu‑
viais, que mergulha suavemente, no sentido Villwock et al. (1986) denominaram,
da bacia (Tomazelli et al., 2007). os sistemas deposicionais pleistocê nicos
mais antigos para os mais jovens, como: sis‑
3. 3 Sistemas do tipo laguna‑barreira temas I, II e III. A Barreira I se encontra pre‑
servada na parte NW da PCRS, na qual da
Durante o Quaterná rio, as lutuaçõ es planı́cie costeira, na qual ocupa, atualmente,
glá cio‑eustá ticas do nı́vel do mar produziram uma faixa de terreno, com cerca de 150 km
grandes deslocamentos laterais da linha de de comprimento e 5 a 15 km de largura. Nes‑
costa. Esses deslocamentos ocorreram, ao ta regiã o, a barreira cresceu, principalmente,
longo das feiçõ es morfoló gicas, que conhece‑ a partir do acú mulo de areias eó licas, que se
mos, hoje, como plataforma continental e ancoraram sobre altos do embasamento (To‑
planı́cie costeira. Os diversos ciclos trans‑ mazelli et al., 2007). Recentes aquisiçõ es de
gressivos‑regressivos, a baixa declividade dados de subsuperfı́cie com Georadar (GPR),
destas feiçõ es morfoló gicas, a energia ambi‑ apoiados por um sistema de posicionamento
ental, dominada pela açã o das ondas, e a alta GNSS pó s‑processado, permitiram identi i‑
disponibilidade de sedimentos arenosos fo‑ car re lexõ es do substrato de depó sitos prai‑
ram fatores, que estimularam o desenvolvi‑ ais, de pó s‑praia e de estirâ ncio, que indicam
Figura 2 – Per il esquemá tico transversal dos sistemas deposicionais da Planı́cie Costeira do Rio Grande do Sul,
pró ximos à latitude de Porto Alegre (ver Fig.1). O per il da seçã o transversal A‑A' mostra a justaposiçã o lateral
dos sistemas laguna‑barreira, com as altitudes estimadas de cada elevaçã o, correspondente ao nı́vel do mar, e a
correlaçã o com os ú ltimos principais picos da curva isotó pica de oxigê nio, de acordo com Imbrie et al. (1984)
(modi icado de Tomazelli & Villwock, 2000; Rosa et al., 2017; Bitencourt et al., 2020).
Sistemas deposicionais e evolução geológica da planície costeira entre La Coronilla e Cabo de Santa Marta (Bacia de Pelotas) 459
Contribuições à Geologia do Rio Grande do Sul e de Santa Catarina
um nı́vel relativo do mar situado a, aproxi‑ Dillenburg, 2007; Martins et al., 2018). A
madamete, 15 m acima do nı́vel atual, na presença destes ichnofó sseis caracteriza um
é poca da formaçã o dessa barreira (Eduardo paleo‑nı́vel marinho, atingido durante o ú lti‑
Barboza, informaçã o verbal). Rosa et al. mo interglacial, situado 8 m acima do nı́vel
(2017), a partir de correlaçõ es com dados atual (Rosa et al., 2017).
sı́smicos e cronoló gicos da porçã o submersa
Os depó sitos sedimentares, corres‑
da Bacia, propõ em uma idade de formaçã o,
pondentes à s fá cies lagunares, associadas
relacionada ao está gio isotó pico de oxigê nio
aos sistemas pleistocê nicos I, II e III, sã o re‑
9 (Imbrie et al., 1984).
presentadas por areias sı́ltico‑argilosas, mal
A Barreira II está associada a um se‑ selecionadas, maciças ou com laminaçã o
gundo ciclo transgressivo‑regressivo pleisto‑ plano‑paralela. Nesses depó sitos, é comum a
cê nico, e estudos mais recentes indicaram ocorrê ncia de concreçõ es pedogené ticas, de
que se desenvolveu, em resposta à transgres‑ composiçõ es carboná tica ou ferruginosa.
sã o, relacionada ao está gio isotó pico de oxi‑ Conforme Tomazelli et al. (2007), é observa‑
gê nio 7, ao invé s do está gio de oxigê nio 9, do que, em alguns locais, as concreçõ es pe‑
conforme proposto, anteriormente, por dogené ticas apresentam altas
Villwock & Tomazelli (1995). Essas novas in‑ concentraçõ es, formando camadas enrique‑
formaçõ es tê m, como base, idades obtidas cidas em carbonatos de, até , 1 m de espessu‑
por termoluminescê ncia em depó sitos de ra, o que re lete, provavelmente, a
quartzos e por ressonâ ncia do spin de elé ‑ ocorrê ncia de condiçõ es paleoclimá ticas se‑
tron em dentes fossilizados de animais da miá ridas. Fó sseis de uma fauna extinta de
megafauna pleistocê nica (Lopes et al., 2010). mamı́feros pleistocê nicos (Megafauna Pam‑
Assim, segundo esses autores, o Sistema II peana) tê m sido encontrados, associados
foi depositado, em torno de 230 ka AP, e foi aos depó sitos lagunares pleistocê nicos, es‑
formado em um nı́vel relativo do mar na or‑ pecialmente, na regiã o sul da planı́cie costei‑
dem de 9,5 m acima do nı́vel atual (Rosa et ra, pró xima à fronteira com o Uruguai (Paula
al., 2017). Couto, 1953; Lopes et al., 2010).
Conforme Tomazelli & Dillenburg
(2007), a Barreira III, associada ao ú ltimo in‑
3. 3. 2 Sistema laguna‑barreira holocê‑
terglacial, de 125 ka AP (subestá gio isotó pico
nico
de oxigê nio 5e), é a que apresenta melhor
preservaçã o entre os sistemas pleistocê ni‑ O mais jovem sistema deposicional
cos. Os depó sitos a ela correlacioná veis se do tipo laguna‑barreira, observado ao longo
estendem, de maneira quase contı́nua, ao da Bacia, desenvolveu‑se durante o Holoce‑
longo de toda a planı́cie costeira da Bacia de no. A partir dos está gios inais da ú ltima
Pelotas. Assim, o desenvolvimento da Barrei‑ transgressã o pó s‑glacial, com a desacelera‑
ra III possibilitou a formaçã o dos grandes çã o da subida do nı́vel do mar, a evoluçã o
corpos lagunares, que ainda se destacam na costeira, ao longo da Bacia, passou a ser in‑
paisagem da regiã o costeira (Lagoa dos Pa‑ luenciada fortemente pela topogra ia ante‑
tos (RS), Complexo Lagunar Santo Antô nio cedente, tanto na con iguraçã o da
dos Anjos, Imaruı́ e Mirim (SC)). Em alguns morfologia da costa como, també m, na de‑
locais da Barreira III, encontra‑se uma alta terminaçã o do tipo de barreira formada
concentraçã o de tubos fó sseis de Ophio‑ (Dillenburg et al., 2000). Assim, a barreira
morpha, formados, provavelmente, por crus‑ holocê nica foi desenvolvida por dois proces‑
tá ceos do gê nero Callichirus (Tomazelli & sos bá sicos: deposiçã o, ao longo das grandes
reentrâ ncias da costa, levando à formaçã o de a lorante na parte interna da planı́cie costei‑
sistemas progradantes; e erosã o, ao longo ra, assentou‑se sobre camadas marinhas mi‑
das protuberâ ncias costeiras, levando ao de‑ ocê nicas e teve o apogeu de seu
senvolvimento de sistemas retrogradantes desenvolvimento, durante o evento regressi‑
(Dillenburg et al., 2000; Barboza et al., 2011; vo. Nessa primeira fase, a paleogeogra ia era
Dillenburg & Barboza, 2014; Rosa et al., de uma grande planı́cie, construı́da por le‑
2017). ques deltaicos coalescentes, alimentados por
Os indicadores do paleo nı́vel relati‑ luxos torrenciais, provenientes das terras
vo do mar e do sistema laguna‑barreira holo‑ altas, submetidas a um clima semiá rido (To‑
cê nico na Bacia estã o relacionados à s feiçõ es mazelli et al., 2007).
geomorfoló gicas, como terraços lagunares Estima‑se que o primeiro ciclo
(Barboza & Tomazelli, 2003), à posiçã o das transgressivo‑regressivo, de que se tem re‑
feiçõ es de praias e das zona de surf, observa‑ gistro, retrabalhou a porçã o distal dos leques
das em a loramentos, em furos de sondagem deltaicos e deu origem a um sistema laguna‑
e em per is de GPR (Barboza et al., 2011; Dil‑ barreira, que icou bem preservado na parte
lenburg et al., 2017), e correlacionados à NW da PCRS. Esta antiga linha de costa
curva do nı́vel relativo do mar de Imbituba pleistocê nica é correlacioná vel ao está gio
(SC), obtidos a partir de dataçõ es de C14 em isotó pico de oxigê nio 9, há , aproximadamen‑
vermitı́deos (Angulo et al., 2006). Esses indi‑ te, 325 ka AP (Rosa et al., 2017).
cadores propõ em um nı́vel relativo do mar O segundo ciclo, responsá vel pelo
má ximo na ordem de 2‑3 m acima do atual, inı́cio da construçã o da barreira arenosa,
há 5,6 ka AP. que isolou a Lagoa dos Patos e a Lagoa Mi‑
rim, foi denominado “Barreira Mú ltipla Com‑
4 EVOLUÇÃO GEOLÓGICA DA PLANÍCIE plexa” por Villwock (1984). O má ximo da
COSTEIRA DA BACIA DE PELOTAS transgressã o esculpiu uma escarpa erosiva
na superfı́cie dos leques aluviais e construiu
O modelo evolutivo aqui apresenta‑ alguns pontais arenosos, marcando uma se‑
do é , na sua sı́ntese, o proposto por Villwock gunda linha de costa pleistocê nica, correlaci‑
et al. (1986), o qual é re inado com os dados oná vel ao está gio isotó pico de oxigê nio 7, há ,
disponibilizados pelas geotecnologias, até o aproximadamente, 230 ka AP (Lopes et al.,
momento. De acordo com este modelo, um 2010; Rosa et al., 2017). Na margem oceâ ni‑
pacote de sedimentos clá sticos terrı́genos se ca, ao sul da Bacia, uma barreira arenosa iso‑
acumulou, a partir do inal do Terciá rio, em lou a Lagoa Mirim e, ao norte, um pontal
um sistema de leques aluviais coalescentes, arenoso recurvado, ancorado na base das
desenvolvido ao longo da margem oeste da encostas do planalto da Serra Geral (Bacia
borda da Bacia, na base das terras altas. Es‑ do Paraná ), com segmentaçõ es, ao sul de
tes depó sitos foram retrabalhados, em suas Palmares do Sul, começou a isolar a á rea,
porçõ es distais, por, no mı́nimo, quatro ciclos que viria a ser ocupada pela Lagoa dos Patos
transgressivos‑regressivos, correlacioná veis (Tomazelli et al., 2007).
aos quatro ú ltimos eventos glaciais, que ca‑ O terceiro ciclo adicionou mais um
racterizaram o inal do Cenozoico (Tomazelli sistema do tipo laguna‑barreira, completan‑
et al., 2007). do o fechamento da Lagoa dos Patos (RS) e o
A primeira fase se estendeu do Plio‑ Complexo Lagunar Santo Antô nio dos Anjos,
ceno ao Pleistoceno Inferior, quando a por‑ Imaruı́ e Mirim (SC). Pertence a este evento,
çã o superior do sistema de leques aluviais, també m, a depressã o lagunar, que, hoje, é
Sistemas deposicionais e evolução geológica da planície costeira entre La Coronilla e Cabo de Santa Marta (Bacia de Pelotas) 461
Contribuições à Geologia do Rio Grande do Sul e de Santa Catarina
mos 6‑5 ka: regressivas (ou progradacio‑ horizontais paralelas, relacionadas aos de‑
nais), transgressivas (ou retrogradacionais) pó sitos eó licos de campos de dunas trans‑
e estacioná rias (ou agradacionais). gressivos, (Dillenburg & Barboza, 2014; Rosa
A interpretaçã o de seçõ es de GPR so‑ et al., 2017).
bre estes trê s tipos bá sicos permitiu identi i‑ A de iniçã o do empilhamento estra‑
car trê s padrõ es principais de empilhamento tigrá ico, com base na con iguraçã o das re‑
estratigrá ico: retrogradacional, progradaci‑ lexõ es em subsuperfı́cie, e a sucessã o de
onal e agradacional. O padrã o de empilha‑ radarfá cies permitiu identi icar as principais
mento retrogradacional (Fig. 3A) é superfı́cies internas e delimitadoras dos sis‑
caracterizado por re lexõ es, mergulhando temas laguna‑barreira. Cada sistema laguna‑
em direçã o ao continente (Barboza et al., barreira pleistocê nico (II, III e IV) é separado
2011; Lima et al., 2013; Dillenburg & Barbo‑ por inconformidades, representando uma
za, 2014; Rosa et al., 2016, 2017; Oliveira et sequê ncia deposicional, caracterizada por
al., 2019; Bitencourt et al., 2020). As radarfá ‑ uma sucessã o de estratos, com relaçã o de
cies estã o relacionadas a depó sitos de fun‑ conformidade. O padrã o arquitetô nico ob‑
dos lagunares cobertos por depó sitos de servado nos sistemas II, III e IV é , basica‑
margens lagunares e aos depó sitos eó licos mente, o mesmo. Dessa forma, o estudo de
de campos de dunas transgressivos, sendo detalhe realizado na Barreira IV (marcada
que estes ú ltimos caracterizam a morfologia por registros mais bem preservados e menos
da barreira retrogradacional. Em algumas afetados pela diagê nese), com base em um
seçõ es de GPR, é possı́vel reconhecer a trans‑ elevado nú mero de testemunhos de sonda‑
gressã o má xima da linha de costa (Barboza gem, de idades geocronoló gicas e de levanta‑
et al., 2011), em que as re lexõ es, mergulhan‑ mentos geofı́sicos (GPR), com registros de
do para o continente, atingem sua posiçã o extraordiná ria qualidade, tem sido a chave,
mais interiorizada (Rosa et al., 2017). para a interpretaçã o dos sistemas II e III.
Em alguns setores da planı́cie costei‑ A determinaçã o do empilhamento
ra, o padrã o de empilhamento progradacio‑ estratigrá ico dos quatros sistemas laguna‑
nal (Fig. 3B) é observado e caracterizado por barreira permitiu de inir pacotes deposicio‑
conjuntos contı́nuos de depó sitos de praia e nais, relacionados aos tratos de sistemas
marinhos, com mergulho em direçã o ao oce‑ transgressivo e nı́vel alto/está gio de queda
ano. Nas seçõ es de GPR, o empilhamento (Rosa et al., 2017). O trato de sistemas de nı́‑
progradacional é composto por radarfá cies, vel baixo foi recentemente reconhecido em
relacionadas a depó sitos eó licos, praiais e de um vale inciso, relacionado ao sistema holo‑
antepraia (shoreface), formando um conjun‑ cê nico (Barboza et al., 2021a). O empilha‑
to de re lexõ es, mergulhando em direçã o à mento estratigrá ico degradacional (també m
Bacia (Barboza et al., 2011; Biancini da Silva conhecido como está gio de queda ou regres‑
et al., 2014; Dillenburg & Barboza, 2014; Leal sã o forçada) nã o foi separado do trato de
et al., 2016; Rosa et al., 2017; Leandro et al., sistemas de nı́vel alto, devido à baixa resolu‑
2019). A morfologia da barreira é represen‑ çã o dos dados. Dillenburg et al. (2017), estu‑
tada, principalmente, por cordõ es de dunas dando a Barreira IV na porçã o sul da planı́cie
frontais e por lençó is de areias transgressi‑ costeira (regiã o do balneá rio Cassino), apre‑
vos (Dillenburg et al., 2000; Hesp et al., 2007; sentam uma separaçã o dos tratos de siste‑
Martinho et al., 2008). mas de nı́vel alto e está gio de queda.
O terceiro padrã o de empilhamento A aná lise integrada dos quatro siste‑
é de inido como agradacional, com re lexõ es mas laguna‑barreira (Fig. 2) indica que, no
Sistemas deposicionais e evolução geológica da planície costeira entre La Coronilla e Cabo de Santa Marta (Bacia de Pelotas) 463
Contribuições à Geologia do Rio Grande do Sul e de Santa Catarina
Figura 3 – Seçõ es coletadas com um sistema de GPR, utilizando uma antena aé rea, com frequê ncia central de
80 MHz, demonstrando os padrõ es de empilhamentos estratigrá icos observados na barreira holocê nica: A)
Padrã o de empilhamento retrogradacional, interpretado na regiã o do Jardim do Eden (RS), em que se observam
re lexõ es, com mergulho, em direçã o ao continente; B) Padrã o de empilhamento progradacional, interpretado
na regiã o da Praia Paraı́so (RS), em que se observam re lexõ es, com mergulho, em direçã o ao oceano.
sequente queda glacio‑eustá tica do nı́vel do Barboza, E. G. & Tomazelli, L. J. 2003. Erosio‑
mar. Os quatro sistemas laguna‑barreira, nal features of the eastern margin of the Pa‑
identi icados na morfologia da planı́cie cos‑ tos Lagoon, southern Brazil: signi icance for
teira, sã o interpretados como tendo se for‑ Holocene history. J. Coas. Res., SI 35: 260‑
264.
mado nos ú ltimos 325 ka, assumindo‑se uma
correlaçã o com os perı́odos de mar alto, re‑ Barboza, E. G., Rosa, M. L. C. C., Hesp, P. A.,
presentados pelos picos das curvas do regis‑ Dillenburg, S. R., Tomazelli, L. J. & Ayup‑Zou‑
tro isotó pico de oxigê nio e por dataçõ es ain, R. N. 2011. Evolution of the Holocene co‑
radiomé tricas. astal barrier of Pelotas Basin (southern
Brazil) – a new approach with GPR data.
A aplicaçã o dos conceitos da Estrati‑
Journal of Coastal Research, SI 64: 646‑650.
gra ia de Sequê ncias permite estabelecer um
arcabouço cronoestratigrá ico, que, aliado ao Barboza, E. G., Dillenburg, S. R., Lopes, R. P.,
empilhamento estratigrá ico observado, con‑ Rosa, M. L. C. C., Caron, F., Abreu, V. S., Man‑
tribui para a prediçã o evolutiva da Bacia de zolli, R. P., Nunes, J. C. R., Weschenfelder, J. &
Pelotas. Tomazelli, L. J. 2021a. Geomorphological and
Stratigraphic Evolution of a Fluvial Incision
A á rea de estudo representa um ex‑ in the Coastal Plain and Inner Continental
celente exemplo de como sistemas do tipo Shelf in Southern Brazil. Marine Geology.
laguna‑barreira podem se desenvolver e pre‑ (submetido)
servar seus depó sitos sedimentares em cos‑
tas dominadas pela açã o de ondas, durante Barboza, E. G., Dillenburg, S. R., Caron, F., Ri‑
ter, M. N., Rosa, M. L. C. C. 2021b. Holocene
ciclos transgressivos‑regressivos de 4ª or‑
sea‑level oscillations in southern Brazil ba‑
dem. sed on high‑resolution radar stratigraphy.
Geosciences. (submetido)
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1
Universidade Federal do Rio Grande do Sul
2
Serviço Geoló gico do Brasil (CPRM)
1 INTRODUÇÃO
O Sistema Aquı́fero Serra Geral (SASG), de natureza issural e livre, representa uma das
principais unidades hidroestratigrá icas e a mais explotada do sul do Brasil, principalmente em
razã o do vasto territó rio que abrange, da boa qualidade da á gua que possui, da boa vazã o (mé ‑
dia de 14 m3/h) e dos custos relativamente baixos de instalaçã o de poços tubulares. O Sistema
de Informaçõ es de Aguas Subterrâ neas (SIAGAS) registra cerca de 13.000 poços tubulares em
funcionamento no SASG, o que permite estimar uma retirada anual da ordem de 1,02 bilhã o de
metros cú bicos.
Provı́ncias basá lticas, como a da Bacia do Paraná , formam bons sistemas aquı́feros, por‑
que contê m á gua de excelente qualidade, geralmente caracterizada por baixa salinidade, possu‑
em grandes extensõ es lateral e vertical e apresentam alta densidade de falhas e de fraturas, que
lhe conferem boa condutividade hidrá ulica e a capacidade de acumular enormes volumes de
luı́dos. A intensidade e a anisotropia estrutural do SASG representam os registros atectô nicos
do ambiente deposicional vulcâ nico (derrames e luxos piroclá sticos), assim como estruturas
tectô nicas, relacionadas aos eventos deformacionais superimpostos, ocorridos ao longo da evo‑
luçã o tectô nica da Bacia do Paraná .
A recarga do SASG ocorre, principalmente, pela in iltraçã o de á gua da chuva, mas tam‑
bé m recebe a contribuiçã o importante dos aquı́feros sedimentares sotopostos da Bacia do Para‑
ná , que tê m luxo ascendente, atravé s de falhas e de fraturas, devido ao elevado con inamento.
Essa recarga ascendente resulta na salinizaçã o das á guas do SASG, com intensidades variadas,
chegando a comprometer a potabilidade em um nú mero pouco expressivo de poços para os pa‑
Contribuições à Geologia do Rio Grande do Sul e de Santa Catarina
râ metros Só dio, Sulfato, Flú or e Ferro, alé m 917.000 km2 do setor meridional da Amé ri‑
de Arsê nio e de Selê nio. ca do Sul (Frank et al., 2009), enquanto a
sequê ncia em Etendeka (Namı́bia) repre‑
2 CONTEXTOS GEOLÓGICO E ESTRUTU‑ senta um pequeno fragmento da Provı́ncia.
RAL No RS, o pacote vulcâ nico cobre
mais de 50% da superfı́cie do estado, alcan‑
A ruptura continental do Gondwana, çando espessura má xima da ordem de 1.000
causada pela açã o de plumas manté licas, du‑ metros na escarpa da regiã o nordeste, dos
rante o Cretá ceo Inferior, determinou a aber‑ quais 600 metros correspondem aos derra‑
tura do Oceano Atlâ ntico do sul para o norte e mes bá sicos a intermediá rios. A espessura
o extravasamento de um espesso pacote vul‑ total decresce para oeste, onde possui 50 a
câ nico basá ltico sobre a superfı́cie sedimen‑ 100 metros na fronteira com a Argentina e
tar, constituı́da pelas formaçõ es Botucatu, com o Uruguai (Fig. 1). O pacote vulcâ nico
Guará , Sanga do Cabral e Piramboia, que á cido possui espessura total de, até , 400
ocorrem nos estados de RS e de SC. O pacote metros no per il da estrada que liga Lageado
vulcâ nico em pauta constitui o chamado Gru‑ a Soledade (RS) e na escarpa leste do esta‑
po Serra Geral, unidade litoestratigrá ica do.
constituı́da por intrusõ es hipoabissais (solei‑ Em SC, a espessura do Grupo Serra
ras e diques) e por derrames de basaltos e de Geral atinge, até , 1.200 metros na escarpa, à
andesitos (escassos), de natureza toleı́tica e leste, correspondente à regiã o de Urubici,
de cará ter issural, intercalados no topo ou onde o pacote á cido registra cerca de 450
sobrepostos por um pacote de natureza á cida, metros no Morro da Igreja, com 1.712 me‑
de composiçã o riolı́tica. Em seu conjunto, o tros de altitude. Tal como no Rio Grande do
pacote vulcâ nico representa a Provı́ncia Vul‑ Sul, as cotas de topo do pacote vulcâ nico
câ nica Paraná ‑Etendeka, que cobre cerca de tendem a diminuir, em direçã o a oeste.
Figura 1 ‒ Mapa geoló gico simpli icado do RS e de SC, mostrando os principais compartimentos geoló gicos,
hidrogeoló gicos e estruturais do Grupo Serra Geral, que constitui o SASG nos dois estados.
Sob o ponto de vista geoquı́mico, o rochas basá lticas possuem uma sensibilidade
vulcanismo bá sico a intermediá rio é com‑ maior à alteraçã o intempé rica, razã o pela
partimentado em dois tipos principais. A qual a espessura dos solos é maior, podendo
partir do Lineamento do Rio Piquiri (SC‑PR), constituir unidades pedoló gicas com mais de
para o norte, predominam amplamente ba‑ 10 m de espessura, como no oeste do RS e de
saltos tipo alto‑TiO2, enquanto na regiã o situ‑ SC. Já nas rochas á cidas, a espessura de solos
ada ao sul do Rio Pelotas o tipo baixo‑TiO2 é é relativamente pequena, como na regiã o da
dominante, correspondendo ao pacote vul‑ escarpa nordeste dos estados em estudo, on‑
câ nico encontrado no estado gaú cho. Ao nor‑ de pode nã o ultrapassar um metro, deixando
te do Rio Pelotas, até o Lineamento do Rio as litologias a lorantes.
Piquiri (SC), situa‑se uma zona de transiçã o e O contexto tectô nico na regiã o é de
os dois tipos litogeoquı́micos aparecem e se extrema relevâ ncia para o entendimento da
interdigitam, mostrando origem, a partir de circulaçã o e da composiçã o da á gua subter‑
sistemas alimentadores independentes. râ nea no Sistema Aquı́fero Serra Geral, tendo
O pacote á cido do Grupo Serra Geral sido objeto de inú meros estudos regionais
també m é representado nos estados do RS e (Machado, 2005; Nanni et al., 2009; Freitas et
de SC por dois tipos, petrogra icamente dis‑ al., 2016, entre outros), utilizando té cnicas
tintos. O tipo Chapecó se caracteriza pelo ca‑ de sensoriamento remoto, associadas ou nã o
rá ter notadamente por irı́tico e ocorre no à aná lise estatı́stica, e de geofı́sica. Os linea‑
noroeste do RS e no sul de SC, enquanto o ti‑ mentos tectô nicos observados representam,
po Palmas, de cará ter afı́rico, domina ampla‑ em muitos casos, a reativaçã o de falhamen‑
mente no RS, constituindo uma unidade tos, a partir do Escudo Cristalino, que consti‑
tabular, que pode se estender, de forma con‑ tui o embasamento da Bacia do Paraná , que
tı́nua, por dezenas de quilô metros. Esta é possuem, segundo Zalá n et al. (1991), trê s
uma das evidê ncias que levaram Roisenberg grupos de orientaçõ es principais, NW‑SE, NE‑
& Viero (2002) a indicar se tratar, na maior SW e E‑W, das quais as duas primeiras sã o as
parte, de rheoignimbritos. Na regiã o nordes‑ mais importantes. CPRM (2002), em estudo
te do RS, Lima et al. (2012) registram, em vá ‑ estrutural da regiã o oeste de SC, destaca, co‑
rios locais, a existê ncia de condutos mo principais, as direçõ es N30‑50E e N40‑
alimentadores e de derrames riolı́ticos asso‑ 60W, registrando falhas com direçã o N70E,
ciados. que possuem, até , 135 km de extensã o. Den‑
tro desta perspectiva, Machado et al. (2012)
E importante destacar, pelas implica‑
descrevem que, na borda leste da escarpa
çõ es no condicionamento hidrogeoló gico,
vulcâ nica de SC, lineamentos, com direçõ es
que a espessura individual dos derrames bá ‑
N‑S e E‑W, sã o coincidentes com as direçõ es
sicos varia, em geral, entre 15 a 20 metros e
encontradas na regiã o do Domo de Lages,
que é frequente o registro de lentes arenosas
marcando a in luê ncia das intrusõ es alcalinas
entre as unidades vulcâ nicas, constituindo,
na geraçã o de falhas, na regiã o.
com a zona de contato entre derrames, os se‑
tores preferenciais para a surgê ncia de á gua
subterrâ nea. 3 CONTEXTO HIDROGEOLÓGICO
Os solos sã o igualmente diferentes 3. 1 Circulação de água no sistema aquí‑
nas unidades bá sicas e á cidas, o que consti‑ fero
tui parâ metro importante, que in luencia as
caracterı́sticas das á guas subterrâ neas. As A movimentaçã o da á gua no SASG
O Sistema Aquífero Serra Geral no Rio Grande do Sul e em Santa Catarina 471
Contribuições à Geologia do Rio Grande do Sul e de Santa Catarina
ocorre de diferentes formas, tendo inı́cio no clima. Tem um papel importante na forma‑
manto de alteraçã o, existente sobre as ro‑ çã o de nascentes e de fontes e na contribui‑
chas, e continuando no conjunto de estrutu‑ çã o do luxo de base dos rios.
ras, que formam o aquı́fero fraturado (Fig. A circulaçã o e o armazenamento de
2). á gua nas rochas vulcâ nicas sã o condiciona‑
O luxo da á gua pelo manto de altera‑ dos pelas estruturas tectô nicas, pelos tipos e
çã o e a possibilidade de formaçã o de um estruturas dos derrames de rochas vulcâ ni‑
aquı́fero granular livre já foi estudada por di‑ cas e pelas condiçõ es geomorfoló gicas. Em
ferentes autores (Reginato, 2003; Reginato et geral, as fraturas tectô nicas conectam as es‑
al., 2012; Bortolin, 2018). Esse aquı́fero pos‑ truturas internas dos derrames, dando ori‑
sui dimensõ es reduzidas e pequenas espes‑ gem a diferentes tipos de aquı́feros
suras saturadas, sendo condicionado pelos fraturados. As principais estruturas, associ‑
tipos de solos (menor quantidade de argila e adas aos derrames, que tê m in luê ncia nos
maiores espessuras), pela litologia (tipo e processos de circulaçã o e de armazenamen‑
grau de fraturamento), pela topogra ia e pelo to de á gua, sã o as zonas: vesiculares a amig‑
Figura 2 ‒ Mecanismos de circulaçã o da á gua subterrâ nea nas rochas vulcâ nicas do SASG: A) circulaçã o no
contato de derrames (formaçã o de fonte); B) circulaçã o por estruturas sub‑horizontais.
daloides, de brechas e autobrechas, de dis‑ a divergente e com solos com maiores espes‑
junçõ es horizontais e verticais e de contato suras sã o as que apresentam maior potencial
entre derrames. Deve‑se destacar, també m, para a recarga. Já as á reas mais ı́ngremes e
que a circulaçã o de á gua vai ocorrer, de for‑ dissecadas sã o as que possuem menor po‑
ma diferenciada, nos derrames bá sicos e á ci‑ tencial e sã o favorá veis à descarga.
dos, sendo mais facilitada nos primeiros De acordo com Bortolin (2018), o
(Hausman, 1995; Freitas et al., 2002; Regina‑ processo de recarga ocorre em duas etapas,
to, 2003; Lisboa et al., 2004; Freitas et al., sendo, a primeira, no manto de alteraçã o e, a
2012; Machado, 2013; Reginato et al., 2015; segunda, pelo sistema de fraturas e de estru‑
Freitas, 2016). turas, existente nas rochas vulcâ nicas. Inici‑
A profundidade de circulaçã o da almente, a á gua in iltra no solo, podendo
á gua subterrâ nea é variá vel e pode ser avali‑ recarregar o aquı́fero granular livre (quando
ada, por meio da aná lise de entradas de esse existir) e, depois, dependendo do grau
á gua, identi icadas em poços tubulares. Em de fraturamento das rochas, haverá a recarga
vá rios estudos realizados (Reginato, 2003; do aquı́fero fraturado. Assim, nem toda a
Freitas et al., 2012; Machado, 2013; Frenzel á gua que in iltra no solo recarrega o aquı́fero
& Reginato, 2018), o intervalo de profundi‑ fraturado. Alé m disso, o autor identi icou
dade entre 0 m e 100 m está associado à que a resposta da recarga à precipitaçã o é
maior ocorrê ncia de entradas de á gua (80% rá pida, para o aquı́fero granular (taxas de
a 90%), sendo que 63% a 70% das entradas elevaçã o de nı́veis de á gua de, até , 1,5 m/
estã o localizadas entre 20 m e 100 m. Deve‑ dia), e mais lenta, para o aquı́fero fraturado
se salientar que, em diferentes regiõ es, sã o (taxas entre 0,02 m/dia e 0,3 m/dia). Com
encontrados poços, que apresentam entra‑ base no uso de diferentes mé todos, també m
das de á gua em profundidades superiores a foram identi icados valores mé dios de recar‑
150 metros. No entanto, Hausman (1995) ga entre 20% e 26%, sendo que, nas bacias
considera que, em profundidades superiores que possuem relevo mais dissecado, ocorrem
a 300 metros, há uma di iculdade na circula‑ as menores taxas de recarga.
çã o de á gua. Vá rios estudos demonstram que há
recarga ascendente de aquı́feros sotopostos,
3. 2 Recarga sendo que a mesma é responsá vel por mistu‑
ras de á guas entre os aquı́feros e por altera‑
A recarga do Sistema Aquı́fero Serra çõ es das composiçõ es fı́sico‑quı́micas das
Geral ocorre por precipitaçã o pluviomé trica, á guas do SASG. Entre vá rios estudos, devem
sendo condicionada por diversos fatores. Pa‑ ser destacados os trabalhos de Lisboa
ra Lisboa (1996), Freitas et al. (2002), Lisboa (1996), de Freitas (2016), de Teixeira & Vie‑
et al. (2004) e Machado (2013), as condiçõ es ro (2016), de Nanni (2018), de Tomasi &
geomorfoló gicas e estruturais tê m grande Roisenberg (2019), de Matos (2020) e de
importâ ncia nos processos de recarga e de Teixeira (2020). Para esses autores, a recarga
descarga. Segundo Descovi Filho (2015), a ascendente ocorre, em funçã o da existê ncia
recarga vai ocorrer em á reas com maior co‑ de grandes sistemas de falhas, que cortam o
bertura vegetal, com manto de alteraçã o bem pacote de rochas vulcâ nicas e sedimentares
desenvolvido e com topogra ia pouco aciden‑ e que propiciam a interligaçã o entre os dife‑
tada. Para Bortolin (2018), as á reas localiza‑ rentes sistemas aquı́feros. Alé m disso, a re‑
das em altos topográ icos, com menores carga só vai ocorrer, se també m houver
declividades, com curvatura do topo convexa condiçõ es hidrá ulicas propı́cias.
O Sistema Aquífero Serra Geral no Rio Grande do Sul e em Santa Catarina 473
Contribuições à Geologia do Rio Grande do Sul e de Santa Catarina
A recarga descendente do SASG para de á gua estã o situados acima das entradas
os aquı́feros sotopostos pode ocorrer, tendo de á gua. Deve‑se salientar que há ocorrê ncia
sido avaliada em alguns trabalhos, como nos de poços jorrantes no SASG (Freitas et al.,
de Descovi Filho (2015), de Matos (2020) e 2002).
de Teixeira (2020). A mesma pode ocorrer Os dados de transmissividade (T)
em algumas regiõ es, quando houver a exis‑ indicam a ocorrê ncia de valores entre 0,005
tê ncia de estruturas (falhas e fraturas), que m2/h e 3,61 m2/h, sendo que a maior parte
conectam os sistemas aquı́feros, alé m de é inferior a 1 m2/h, com mé dias entre 0,39
condiçõ es potenciomé tricas favorá veis. m2/h e 0,49 m2/h. Essas variaçõ es estã o de
acordo com o tipo de aquı́fero, que possui
3. 3 Avaliação hidrogeológica e hidrodi‑ baixa capacidade de transmissã o de á gua e
nâmica elevada anisotropia. Os dados de capacidade
ou vazã o especı́ ica sã o mais abundantes e
Para o SASG, os principais parâ me‑ variam entre 0,004 m3/h/m e 37,5 m3/h/m,
tros hidrogeoló gicos e hidrodinâ micos, que sendo que a maior parte se encontra abaixo
podem ser avaliados, sã o o nı́vel está tico de 1 m3/h/m, com mé dias entre 0,36 m3/h/
(NE), a transmissividade (T), a capacidade m e 1,81 m3/h/m. Os dados també m estã o
ou vazã o especı́ ica (q) e a vazã o de explota‑ condizentes com o tipo de aquı́fero e indi‑
çã o (Q). Por ser um sistema aquı́fero hetero‑ cam que há regiõ es que possuem maior pro‑
gê neo, que apresenta elevada anisotropia, dutividade do que outras.
cada regiã o ou á rea de estudo poderá apre‑
As vazõ es de estabilizaçã o, obtidas
sentar diferentes valores para cada um dos
de ensaios de bombeamento, indicam varia‑
parâ metros. Parâ metros como condutividade
çõ es entre 0,6 m3/h e 86 m3/h, sendo que a
hidrá ulica (K) e coe iciente de armazena‑
maior parte dos valores sã o inferiores a 20
mento (S) sã o difı́ceis de serem determina‑
m3/h (entre 80% e 91%, dependendo da re‑
dos, pois há di iculdade em se de inir a
giã o estudada), com mé dias entre 6,8 m3/h
espessura saturada do aquı́fero fraturado,
e 17 m3/h. Esses resultados indicam que,
bem como em promover testes de bombea‑
dependendo da regiã o, bem como de onde o
mento com poços de observaçã o.
poço foi locado, há possibilidade de se obter
Na Tabela 1, sã o apresentados al‑ diferentes vazõ es de explotaçã o. Alguns es‑
guns resultados de parâ metros hidrogeoló gi‑ tudos foram realizados, com o objetivo de se
cos e hidrodinâ micos, obtidos em trabalhos avaliar diferenças hidrogeoló gicas entre os
regionais e locais sobre o SASG. derrames bá sicos e á cidos. Alguns dos re‑
Com base nos dados de profundida‑ sultados sã o apresentados na Tabela 2 e in‑
de, pode‑se avaliar que a mesma é variá vel dicam que os aquı́feros associados à s rochas
(entre 14 m e 512 m), com valores mé dios bá sicas tendem a apresentar maiores capa‑
entre 110 m e 132m. Os valores mé dios es‑ cidade de produçã o e vazã o.
tã o dentro do esperado, visto que, em pro‑
fundidades superiores a 100 m, o nú mero de 4 ASPECTOS HIDROGEOQUÍMICOS
entradas de á gua é bastante reduzido (10% a
20%). Os dados de nı́vel está tico sã o variá ‑ A relevâ ncia do Sistema Aquı́fero
veis (entre 0 m e 176 m), mas a maioria dos Serra Geral para os estados do Rio Grande
nı́veis está situada entre 0 m e 20 m (73% a do Sul e de Santa Catarina reside, tanto na
83%), com predomı́nio entre 0 m e 10m ampla distribuiçã o espacial e na disponibili‑
(59% a 69%), sendo que, em geral, os nı́veis dade hı́drica quanto na qualidade e na pota‑
Tabela 2 ‒ Dados hidrogeoló gicos e hidrodinâ micos para os aquı́feros fraturados, associados a unidades
vulcâ nicas bá sicas e á cidas.
bilidade das á guas. Estudos hidroquı́micos, tos, 2020). A salinidade das á guas é baixa,
realizados em toda a á rea de abrangê ncia do em especial, nos tipos bicarbonatada cá lcica
sistema aquı́fero, revelam que suas á guas e magnesiana, com valores mé dios de só li‑
tê m composiçã o bicarbonatada dominante, dos totais dissolvidos (STD) da ordem de
com amplo predomı́nio do tipo bicarbonata‑ 200 mg/L (SASG I) e de 250 mg/L (SASG II)
da cá lcica e, com menor incidê ncia, bicarbo‑ no Rio Grande do Sul (CPRM, 2005). Em
natada magnesiana. Os estudos registram, Santa Catarina, a assinatura hidroquı́mica
ainda, a ocorrê ncia menos frequente de nã o é diferente, em termos gerais, registran‑
á guas bicarbonatadas só dicas, sulfatadas só ‑ do concentraçõ es de STD, geralmente, infe‑
dicas e sulfatadas ou cloretadas só dicas (Lis‑ riores a 250 mg/L na porçã o leste do
boa, 1996; Machado, 2005; Nanni et al., sistema aquı́fero, pró xima à escarpa da Ser‑
2009; Freitas et al., 2012; Reginato et al., ra Geral, e menores do que 500 mg/L nas
2013; Freitas et al., 2016; Freitas, 2016; Ma‑ regiõ es central e oeste, onde a recarga as‑
O Sistema Aquífero Serra Geral no Rio Grande do Sul e em Santa Catarina 475
Contribuições à Geologia do Rio Grande do Sul e de Santa Catarina
cendente é mais intensa (CPRM, 2002; CPRM, cá lcio e a alcalinidade total. A aná lise dos
2013). dados hidroquı́micos, publicados por CPRM
Embora predominem amplamente as (2005), revela um comportamento similar
á guas com baixo conteú do iô nico, a composi‑ em Santa Catarina, indicando a atuaçã o dos
çã o hidroquı́mica do SASG registra, em quan‑ mesmos mecanismos de recarga e dos mes‑
tidade pouco expressiva de amostras, mos processos de interaçã o á gua/rocha nos
elevadas concentraçõ es de todos os principais dois estados e, provavelmente, em toda a
ı́ons dissolvidos ( lú or, só dio, cloreto, sulfato, extensã o do sistema aquı́fero. A recarga as‑
ferro e STD), chegando a comprometer a pota‑ cendente é vinculada a grandes falhas e a
bilidade em pequeno nú mero de poços (Tab. fraturas e ocorre em toda a extensã o do
3). Aguas nã o potá veis, em razã o do arsê nio, SASG no RS e em SC, o que promove o au‑
do selê nio e do vaná dio, també m sã o inventa‑ mento da concentraçã o de vá rios ı́ons na
riadas em alguns poços do SASG, no noroeste á gua, em particular, a condutividade elé tri‑
do RS (Silveira, 2019). Para o uso na indú stria, ca, alterando as correlaçõ es interelementa‑
as á guas desse sistema aquı́fero nã o apresen‑ res, em resposta à grande variabilidade
tam restriçõ es, exceto em casos localizados, composicional e à hidrodinâ mica das unida‑
com excesso de carbonato, que podem invia‑ des hidroestratigrá icas subjacentes, alé m
bilizar a utilizaçã o em caldeiras. Na agricultu‑ da maior intensidade e da diversidade dos
ra, por outro lado, as á guas se prestam para a processos de interaçã o á gua/rocha. O só dio,
irrigaçã o das mais variadas culturas. o sulfato, o luoreto, o cloreto e o STD, alé m
da condutividade elé trica, sã o os parâ me‑
Elevada condutividade elé trica, com
tros quı́micos maiores, que tê m, nas altas
valores que chegam a 4.200 S/cm, estã o pre‑
concentraçõ es, indicadores tı́picos de recar‑
sentes em á guas termais, captadas em fontes
ga ascendente, em razã o da ausê ncia dos
e em poços tubulares jorrantes, na regiã o do
mesmos nos minerais solú veis e disponı́veis
Alto Uruguai, no RS, e em SC (Freitas et al.,
a reaçõ es com a á gua do SASG. Elevados te‑
2016). Nestas á guas, os autores registram,
ores de cá lcio, de magné sio e de alcalinida‑
ainda, concentraçõ es altas de luoreto, com
de total (HCO3‑+CO32‑) també m derivam da
mé dia da ordem de 1,52 mg/L.
contaminaçã o com á guas de prolongada re‑
A ampla variabilidade composicional
sidê ncia nos aquı́feros sedimentares soto‑
das á guas do SASG deriva da grande comple‑
postos, portadores de calcita e/ou de
xidade dos mecanismos de recarga, que con‑
dolomita. As á guas de circulaçã o restrita no
sistem na in iltraçã o direta da precipitaçã o
SASG, mesmo que tipicamente bicarbonata‑
pluviomé trica e na ascensã o de á guas, prove‑
das cá lcicas, apresentam conteú dos relati‑
nientes das inú meras unidades hidroestrati‑
vamente baixos de cá lcio e de bicarbonato
grá icas sedimentares subjacentes da Bacia do
(Teixeira, 2020) e ainda menores dos de‑
Paraná (Kern et al., 2008; Reginato et al.,
mais ı́ons.
2013; Freitas et al., 2016; Freitas, 2016; Ma‑
Nas rochas vulcâ nicas bá sicas e á ci‑
tos, 2020).
das do SASG, a hidró lise e a dissoluçã o dos
Estudos de Teixeira (2020) mostram
minerais formadores do aquı́fero é limitada
que, no Rio Grande do Sul, as á guas subterrâ ‑
ou, mesmo, inoperante, até , devido à fraca
neas de recarga direta e de circulaçã o restrita
interaçã o á gua/rocha e à baixa solubilidade
ao SASG, sem contribuiçã o dos aquı́feros sedi‑
de silicatos, quando comparadas com as dos
mentares, sã o essencialmente bicarbonatadas
sais (Chou & Wollast, 1985; Delany et al.,
cá lcicas e exibem uma boa correlaçã o entre o
1986). A natureza fraturada do aquı́fero
Tabela 3 ‒ Dados quı́micos dos principais ı́ons das á guas subterrâ neas do SASG (legenda: nq ‑ nã o quanti icado;
sn ‑ sem normatizaçã o).
restringe fortemente a interaçã o á gua/rocha, cá lcica, está intimamente associada à hidró li‑
por conta da pequena á rea de contato das fa‑ se de calcita, largamente distribuı́da em
ses só lidas com a lı́quida. A superfı́cie especı́‑ amı́gdalas e em fraturas, mantendo a boa
ica do aquı́fero é fator determinante da correlaçã o positiva entre cá lcio e alcalinidade
ciné tica de reaçã o (dn/dt), conforme a Equa‑ total (Eq. 2). Contribuem, de forma subordi‑
çã o 1. nada, ainda, a dissoluçã o de CO2 atmosfé rico
e alguma lixiviaçã o de metais, especialmente,
Mg, Fe e Na, adsorvidos em argilominerais,
em que k é a constante de dissolu‑ presentes em solos atuais jovens, em paleos‑
çã o (mol. m‑2. s‑1), s é a superfı́cie especı́ ica solos pouco lixiviados e em rochas alteradas,
do só lido (m2. m‑3), aH é a atividade de hidro‑ localizadas no topo de derrames bá sicos e de
gê nio, n é um fator de ajuste e Q/Keq repre‑ unidades piroclá sticas á cidas.
senta o ı́ndice de saturaçã o do mineral. A A maior parte da carga iô nica das
superfı́cie especı́ ica de um aquı́fero fratura‑ á guas de recarga ascendente do SASG tam‑
do, considerando fraturas espaçadas em um bé m é devida à hidró lise de carbonatos (cal‑
metro, é da ordem de 4.000 a 2.000 vezes cita e, em algumas á reas, dolomita), ao que se
menor do que a de um arenito ino e do que soma a dissoluçã o de sulfatos e de haletos e a
a de um arenito mé dio, respectivamente. troca catiô nica do cá lcio e do magné sio pelo
Quanto maior é o espaçamento das fraturas, só dio. A hidró lise de carbonatos (Equaçõ es 2
menor é a superfı́cie especı́ ica do aquı́fero. e 3) é intensa, elevando as concentraçõ es de
Por conta da interaçã o tê nue da á gua cá lcio, de magné sio e de alcalinidade total a
com as rochas vulcâ nicas nos setores do patamares da ordem de 180 mg/L, de 90 mg/
SASG em que a recarga pluviomé trica é ú nica L e de 640 mg/L, respectivamente. A calcita é
ou amplamente dominante, a assinatura hi‑ registrada como cimento, como concreçõ es
drogeoquı́mica, tipicamente bicarbonatada ou como nó dulos em vá rias unidades hidro‑
O Sistema Aquífero Serra Geral no Rio Grande do Sul e em Santa Catarina 477
Contribuições à Geologia do Rio Grande do Sul e de Santa Catarina
estratigrá icas da Bacia do Paraná , dentre as magné sio é subtraı́da da soluçã o, pela troca
quais merecem destaque o Grupo Itararé e as catiô nica com o só dio, dentro das unidades
formaçõ es Rio Bonito, Irati, Estrada Nova, Pi‑ sedimentares portadoras de argilo‑minerais
ramboia e Botucatu. Alé m da calcita, de solu‑ (Eq. 5), sendo esta a principal fonte deste
bilidade mé dia a alta, a anidrita, muito metal nas á guas subterrâ neas do SASG. O
solú vel e presente nos sedimentitos do Gru‑ só dio pode ter origem, ainda, na dissoluçã o
po Itararé e das formaçõ es Rio Bonito, Irati e da halita, descrita, principalmente, na For‑
Piramboia, contribui para o cá lcio dissolvido, maçã o Irati, e, neste caso, as á guas regis‑
con igurando, ainda, a fonte das elevadas tram, també m, enriquecimento em cloreto,
concentraçõ es de sulfato, que chegam perto o que é observado em nú mero reduzido de
de 1.000 mg/L (Eq. 4). Parte do cá lcio e do poços.
mente todas se acomodam no trend com a 5. 1 Os usos atuais da água nos abaste‑
adiçã o de cloreto ao sulfato e à alcalinidade cimentos público e privado
(Fig. 3D). Neste diagrama, a dispersã o é pe‑
A crescente demanda por recursos
quena e o coe iciente de regressã o sobe para
hı́dricos, decorrente do crescimento econô ‑
0,82.
mico e das frequentes estiagens, veri icadas
A presença de luoreto em concentra‑
nos ú ltimos anos, tem incrementado a explo‑
çõ es signi icativas nas á guas do SASG tam‑
taçã o das á guas subterrâ neas. Estas sã o uma
bé m re lete recarga ascendente (Nanni et al.,
alternativa bastante atraente para abasteci‑
2009) e sua prová vel origem reside na disso‑
mento, em virtude da sua abundâ ncia, da sua
luçã o de luorita, que, segundo Kern et al.
qualidade e do seu relativo baixo custo de
(2008), ocorre, principalmente, nos folhelhos
captaçã o, principalmente, considerando‑se a
betuminosos das formaçõ es Irati e Ponta
degradaçã o da qualidade das á guas super i‑
Grossa, como mineral diagené tico, associado
ciais, associada ao elevado custo do trata‑
a outros sais, como barita, anidrita, calcita,
mento dessas á guas, para os diversos usos.
dolomita, pirita e outros. Tal paragê nese neo‑
Assim, as á guas subterrâ neas vê m se tornan‑
formada, em especial, a dos sulfetos, que
do estraté gicas nos desenvolvimentos econô ‑
també m aparecem nos folhelhos carbonosos
mico e social do paı́s.
da Formaçã o Rio Bonito, é a prová vel fonte do
Neste contexto, enquadra‑se o Siste‑
arsê nio e do selê nio encontrados em poços
ma Aquı́fero Serra Geral, que, dos sistemas
do noroeste do estado gaú cho.
aquı́feros existentes no sul do Brasil, é o que
O comportamento relativo dos prin‑
possui maior abrangê ncia e maior utilizaçã o,
cipais ı́ons das á guas subterrâ neas, revelado
fato que decorre de sua boa explotabilidade
na geometria dos diagramas de dispersã o bi‑
e da excelente qualidade fı́sico‑quı́mica de
ná rios, é indicativo da inexpressiva in luê ncia
suas á guas. Explotado, atravé s de poços tu‑
da composiçã o quı́mica e da mineraló gica
bulares e de captaçõ es de fontes, tem suas
dos vulcanitos na assinatura hidroquı́mica do
á guas utilizadas para consumo humano, in‑
SASG. A independê ncia da quı́mica da á gua
dustrial, pastoril e, també m, para balneabili‑
subterrâ nea, em relaçã o à mineralogia e à ge‑
dade. Uma breve consulta ao Sistema de
oquı́mica do aquı́fero, també m é reconhecida
Informaçõ es de Aguas Subterrâ neas (SIA‑
no Sistema Aquı́fero Cristalino III, formado
GAS), do Serviço Geoló gico do Brasil, revela a
por granitos e por gnaisses, na regiã o metro‑
magnitude e a importâ ncia deste sistema
politana de Porto Alegre (Viero et al., 2009).
aquı́fero no Rio Grande do Sul e em Santa Ca‑
Como esperado, a partir dos princı́pios ter‑
tarina. O SIAGAS exibe um panorama parcial
modinâ micos, sã o os minerais de maior solu‑
do nú mero de poços perfurados neste siste‑
bilidade e os mais expostos a reaçõ es com a
ma aquı́fero, registrando, atualmente, cerca
á gua que conferem as propriedades quı́micas
de 17.000 poços tubulares, dos quais 77% se
das á guas subterrâ neas do sistema Aquı́fero
encontra em funcionamento, para os abaste‑
Serra Geral, tanto para aquelas mais jovens,
cimentos pú blico e industrial e para a desse‑
de recarga pluviomé trica descendente, quan‑
dentaçã o de animais. Considerando a vazã o
to para aquelas mais antigas, de recarga as‑
mé dia dos poços em utilizaçã o, que é de 13,7
cendente.
m3/h, e um perı́odo de bombeamento de 12
horas diá rias, estima‑se, nesses poços, uma
5 POTENCIAL HÍDRICO E RELEVÂNCIA retirada anual de á gua aproximada de 1,02 x
SOCIOECONÔMICA 109 m3.
O Sistema Aquífero Serra Geral no Rio Grande do Sul e em Santa Catarina 479
Contribuições à Geologia do Rio Grande do Sul e de Santa Catarina
Figura 3 ‒ Diagramas de dispersã o, mostrando correlaçõ es entre os principais ı́ons do SASG e a in luê ncia da
recarga ascendente: A) trend, decorrente da hidró lise da calcita, marcado pela elipse vermelha; B) trend,
decorrente da hidró lise da calcita, mais troca de cá tions, marcado pela elipse vermelha; C) trend, decorrente da
hidró lise da calcita e da anidrita, mais troca de cá tions, marcado pela elipse vermelha; d) trend, decorrente da
hidró lise da calcita, da anidrita e da halita, mais troca de cá tions.
Segundo dados da ANA (2010), no fató rias, como observado nos capı́tulos ante‑
Rio Grande do Sul, 59% das sedes munici‑ riores.
pais sã o abastecidas exclusivamente por Outro importante fator é de que suas
á guas subterrâ neas e, em 13% destas, o á guas, na grande maioria das vezes, caracte‑
abastecimento é realizado de forma mista rizam‑se por apresentar baixas concentra‑
(por mananciais super iciais e subterrâ ne‑ çõ es de sais dissolvidos, possibilitam o uso
os). A Companhia Riograndense de Sanea‑ nas mais variadas atividades econô micas, es‑
mento (CORSAN) opera, no SASG, 456 poços pecialmente, na indú stria. Outro nobre uso
tubulares, em 103 municı́pios, totalizando das á guas do SASG consiste no abastecimen‑
uma explotaçã o mensal de 14,24 x 106 m3. to de comunidades rurais, para as quais, ge‑
Em Santa Catarina, os municı́pios localizados ralmente, o poder pú blico municipal
na porçã o oeste tê m, como principal fonte de constró i os poços e os cede a associaçõ es ou
abastecimento de á gua, os mananciais sub‑ a condomı́nios de á gua administrados pelos
terrâ neos, sendo que 23% dos municı́pios pró prios moradores. També m há muitos po‑
sã o abastecidos exclusivamente por manan‑ ços particulares em granjas integradas com
ciais subterrâ neos e 20%, de forma mista os grandes frigorı́ icos de aves e de suı́nos,
(ANA, 2010). A Companhia Catarinense de nos quais predominam o abastecimento ani‑
Aguas e Saneamento (CASAN) e os serviços mal e o uso geral das á guas do SASG.
municipais de á gua e de esgoto abastecem
87 municı́pios com á gua subterrâ nea extraı́‑
5. 3 Vulnerabilidade natural e risco de
da do SASG.
contaminação do aquífero
distâ ncia até o nı́vel da á gua é um importante associaçã o entre alta vulnerabilidade natural
fator no controle da vulnerabilidade do aquı́‑ e uma fonte potencial de contaminaçã o. Nas
fero. á reas urbanas, as atividades industriais, os
O regolito, formado por solo ou por postos de combustı́veis, os lixõ es, os vaza‑
saprolito, desempenha crucial papel na pro‑ mentos nas redes de esgoto, entre outros,
teçã o do aquı́fero fraturado subjacente, so‑ con iguram essas fontes potenciais de conta‑
bretudo, se possuir composiçã o predo‑ minaçã o. Em muitos municı́pios mé dios a
minantemente argilosa. Em terrenos em que grandes, situados sobre as rochas interme‑
a rocha fraturada estiver exposta, a vulnera‑ diá rias a á cidas, os e luentes sã o descartados
bilidade do aquı́fero é maior, caso muito fre‑ em fossas sé pticas, que, muitas vezes, estã o
quente nas regiõ es em que predomina a instaladas em solos muito rasos ou em rocha
ocorrê ncia de rochas á cidas. Por outro lado, alterada, elevando muito o risco de contami‑
se o regolito for espesso e argiloso, a vulne‑ naçã o do SASG. Na á rea rural, os riscos estã o
rabilidade é bem menor, por vezes, insigni i‑ relacionados à s culturas que utilizam fertili‑
cante, especialmente, quando nã o há nı́vel zantes e agrotó xicos, bem como à criaçã o in‑
freá tico presente no horizonte. tensiva de animais. Rios in luentes poluı́dos
Como visto nos itens anteriores, as podem contaminar o aquı́fero Serra Geral,
zonas aquı́feras desenvolvidas nas rochas sobretudo, nas á reas muito fraturadas.
vulcâ nicas do Grupo Serra Geral estã o inti‑
mamente ligadas à presença de fraturamen‑ 6 CONSIDERAÇÕES FINAIS
tos de natureza tectô nica ou por
resfriamento da lava ou, mesmo, por alı́vio de O SASG representa a unidade hidro‑
pressã o. E natural a irmar que, quanto mais estratigrá ica com a maior abrangê ncia e de
fraturada uma rocha, melhor aquı́fero ela se‑ maior utilizaçã o em Santa Catarina e no Rio
rá e, també m, mais vulnerá vel à contamina‑ Grande do Sul, ocupando cerca de 50% da
çã o a mesma icará . á rea territorial de cada estado. E formado
A topogra ia do terreno, entre outros pelas rochas vulcâ nicas bá sicas e á cidas do
fatores, controla o escoamento super icial Grupo Serra Geral, as quais se estendem por,
das á guas originá rias da chuva. Um terreno aproximadamente, 290.000 km2 nos dois es‑
com alta declividade propicia um forte escoa‑ tados, com espessuras de, até , 1.000 m no RS
mento das á guas. Por outro lado, em um ter‑ e de, até , 1.200 m em SC. No estado gaú cho,
reno plano ou com baixa declividade, as 103 municı́pios sã o abastecidos por poços
á guas tendem a icar estagnadas por mais do SASG, enquanto, no estado catarinense,
tempo na superfı́cie e a in iltrarem no aquı́fe‑ sã o 93. A alta densidade de fraturas e de fa‑
ro, deixando a á rea mais vulnerá vel à conta‑ lhas tectô nicas, associadas a abundantes
minaçã o. juntas de contraçã o, conferem boa porosida‑
Em suma, uma determinada á rea do de e boa permeabilidade ao sistema aquı́fe‑
Sistema Aquı́fero Serra Geral pode apresen‑ ro, permitindo o acú mulo de grande volume
tar alta vulnerabilidade, se a rocha estiver de á gua e a captaçã o de elevadas vazõ es em
muito fraturada e a lorante em um terreno muitos poços tubulares.
plano ou pouco declivoso, enquanto a vulne‑ Os poços explotados, em nú mero
rabilidade será baixa em uma á rea declivosa, pró ximo de 13.000, de acordo com registros
com cobertura regolı́tica e com rochas pouco do SIAGAS, possuem vazã o mé dia da ordem
fraturadas. O risco de contaminaçã o do Siste‑ de 14 m3/h e á gua de excelente qualidade,
ma Aquı́fero Serra Geral ocorre, quando há a sem restriçã o de uso para qualquer im em
mais de 95% deles. Poços que nã o atendem dade Federal do Rio Grande do Sul.
aos padrõ es de potabilidade tê m á gua com ex‑
Chou, L. & Wollast, R. 1985. Steady‑state ki‑
cesso de Flú or, de Sulfato, de Só dio, de Cloro e
netics and dissolution mechanisms of albite.
de Ferro, alé m de Arsê nio e de Selê nio, em ra‑
Am. J. Sci., 85: 963‑993.
rı́ssimos casos.
As á guas de recarga direta por preci‑ CPRM. Companhia de Pesquisa de Recursos
pitaçã o pluviomé trica e de circulaçã o restrita Minerais. 2002. Diagnóstico dos recursos hí‑
dricos subterrâneos do oeste do estado de
ao SASG tê m assinatura hidroquı́mica marca‑
Santa Catarina. Porto Alegre, CPRM, 110p.
da pela predominâ ncia do tipo bicarbonatada
cá lcica, pelas baixas concentraçõ es de só lidos CPRM. Companhia de Pesquisa de Recursos
totais dissolvidos e pela ausê ncia de impediti‑ Minerais. 2005. Mapa Hidrogeológico do Rio
vos de uso para todos os ins. As á guas que Grande do Sul. Porto Alegre. 2v., escala
tê m contribuiçã o da recarga ascendente, por 1:750.000.
outro lado, sã o mais salinizadas, com concen‑
CPRM. Companhia de Pesquisa de Recursos
traçõ es mais elevadas de Só dio, de Sulfato, de Minerais. 2002. Mapa hidrogeológico do esta‑
Cá lcio, de Flú or e, em alguns casos, de Cloro, e do de Santa Catarina. Porto Alegre: Porto
vá rios poços apresentam restriçã o de potabili‑ Alegre, 2v., escala 1:500.000.
dade. A hidró lise de calcita, tanto no SASG
quanto nos aquı́feros sedimentares sotopos‑ Cunha, G. G., Roisenberg, A., Pulgati, F. H. &
Freitas, M. A. 2016. Hidrogeoquı́mica do Sis‑
tos, a dissoluçã o de anidrita, de luorita e de
tema Aquı́fero Serra Geral na regiã o do Alto
halita e a troca de cá tions, restrita aos aquı́fe‑ Rio Uruguai, Noroeste do Rio Grande do Sul e
ros sedimentares, constituem os processos de sua relaçã o espacial com a tectô nica rú ptil.
interaçã o á gua/rocha responsá veis pelo con‑ Pesquisas em Geociências (UFRGS), 43: 55‑67.
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O Sistema Aquífero Serra Geral no Rio Grande do Sul e em Santa Catarina 485
Patrimônio geológico e
geoconservação nos estados de
Santa Catarina e Rio Grande do Sul
André Weissheimer de Borba1*, Joã o Henrique Quoos2,
Cristina Covello2, Maria Elisabeth da Rocha3, Flá vio Augusto Pretto4,
Leonardo Kerber4, Jaciele Carine Sell5
1
Programa de Pó s‑graduaçã o em Geogra ia, Universidade Federal de Santa Maria,
2
Campus Garopaba, Curso Superior em Gestã o Ambiental, Instituto Federal de Santa Catarina,
3
Geoparque Caminhos dos Câ nions do Sul Aspirante UNESCO, Prefeitura Municipal de Torres/RS
4
Centro de Apoio à Pesquisa Paleontoló gica em Sã o Joã o do Polê sine, Universidade Federal de Santa Maria
5
Projeto Institucional Geoparques, Universidade Federal de Santa Maria
pelos materiais geoló gicos já extraı́dos (ex si‑ dade local, pode resultar em uma certi ica‑
tu, como fó sseis, por exemplo) que melhor çã o outorgada pelo Programa de Geopar‑
representam a geodiversidade de uma uni‑ ques Mundiais da UNESCO. E nesse contexto
dade territorial, em seus valores nã o consun‑ que serã o discutidas a geodiversidade e o
tivos (cientı́ ico, educativo, esté tico, cultural, patrimô nio geoló gico dos estados de Santa
funcional, ecoló gico). O patrimô nio geoló gico Catarina e do Rio Grande do Sul, bem como
deve ser inventariado, preferencialmente, de as iniciativas de levantamento, de conserva‑
acordo com as seguintes etapas (adaptadas çã o e de promoçã o desses atributos natu‑
de Lima et al., 2010): (a) revisã o da literatu‑ rais na regiã o, ao longo das ú ltimas
ra; (b) consulta a especialistas; (c) estabele‑ dé cadas.
cimento de crité rios uniformes de seleçã o de
geossı́tios; (d) adoçã o de um conjunto de ar‑ 2 GEODIVERSIDADE DOS ESTADOS DE
cabouços geoló gico‑geomorfoló gicos, em es‑ SANTA CATARINA E DO RIO GRANDE
cala adequada; e (e) identi icaçã o e DO SUL
caracterizaçã o dos geossı́tios.
A partir de um inventá rio do pa‑ O mais importante esforço de levan‑
trimô nio geoló gico, pode ser realizada uma tamento e de cartogra ia da geodiversidade
avaliaçã o quali‑quantitativa dos potenciais sul‑brasileira, no sé culo XXI, processou‑se
turı́stico e educativo e da necessidade de no â mbito da Companhia de Pesquisa de
proteçã o dos locais e dos materiais que o Recursos Minerais (CPRM), o Serviço Geoló ‑
compõ em, mediante uma sé rie de diferentes gico do Brasil, com a publicaçã o dos mapas
metodologias (e.g. Lima et al., 2010; Fassou‑ estaduais de geodiversidade do Rio Grande
las et al., 2012; Brilha, 2016). De acordo com do Sul (CPRM, 2009) e de Santa Catarina
os resultados dessa avaliaçã o, podem ser (CPRM, 2010). Em consonâ ncia com as dire‑
adotadas estraté gias diversas, constituindo trizes e com a iloso ia da empresa executo‑
os pilares de qualquer estraté gia de geocon‑ ra, esses mapas tiveram o intuito de
servaçã o: (a) medidas de proteçã o ou de representar cartogra icamente e de disponi‑
conservaçã o dos elementos da geodiversida‑ bilizar “(. . . ) informaçõ es sobre o meio fı́si‑
de, tanto do ponto de vista prá tico quanto da co para subsidiar macro‑diretrizes de
legislaçã o aplicá vel; (b) iniciativas de educa‑ planejamento, gestã o ambiental e ordena‑
çã o geopatrimonial, ou de geoeducaçã o, tan‑ mento territorial” (CPRM, 2010). Assim, tais
to no ambiente escolar, no â mbito da publicaçõ es traziam, alé m de mapas de do‑
educaçã o formal, quanto na educaçã o infor‑ mı́nios e de unidades geoló gico‑ambientais,
mal, atravé s de eventos de aprendizado lú di‑ subprodutos especı́ icos, focalizando: as in‑
co; e (c) estı́mulo ao geoturismo, um turismo fraestruturas de transportes, de geraçã o e
de interpretaçã o e de conhecimento, consci‑ de transmissã o de energia; as á reas de inte‑
ente e sustentá vel, pró ximo do turismo de resse mineral e de preservaçã o ambiental;
base comunitá ria, em que os principais atra‑ as potencialidades hidrogeoló gicas; os prin‑
tivos sejam elementos da geodiversidade e cipais atrativos geoturı́sticos; e a suscetibili‑
do patrimô nio geoló gico (ver discussã o em dade geoló gica de riscos socioambientais.
Borba & Sell, 2018). Por im, em territó rios De maneira geral, o a loramento dos
que possuam geossı́tios de comprovada rele‑ diferentes domı́nios e das unidades geoló gi‑
vâ ncia cientı́ ica internacional, a adoçã o co‑ambientais em Santa Catarina e no Rio
bem‑sucedida dessas estraté gias, por organi‑ Grande do Sul está condicionado pelos so‑
zaçõ es formais, com amplo apoio da comuni‑ erguimentos e pelos dobramentos do inal
Patrimônio geológico e geoconservação nos estados de Santa Catarina e Rio Grande do Sul 489
Contribuições à Geologia do Rio Grande do Sul e de Santa Catarina
Figura 1 – Mapa, ilustrando os aspectos de geodiversidade e de patrimô nio geoló gico do RS e de SC, a partir
dos mapas de geodiversidade da CPRM, com os compartimentos gerais citados no texto, com suas distintas
complexidades geoló gicas. Sobre o mapa, estã o espacializados os 17 sı́tios gaú chos ou catarinenses inscritos
na lista SIGEP, indicados por nú meros ará bicos, conforme seu có digo na SIGEP: (3) Dunas do Albardã o; (8)
A loramento Quité ria; (9) Sı́tios Paleobotâ nicos do Arenito Mata; (22) Tetrá podes triá ssicos do RS; (24)
Coluna White; (45) Predebom; (48) Paleotoca de Cristal; (50) Itaimbezinho e Fortaleza; (64) Minas do
Camaquã ; (75) Complexo Lagunar Sul‑Catarinense; (76) Guaritas do Camaquã ; (82) A loramento Bainha; (84)
Passo das Tropas; (101) Morro do Papalé o; (114) Domo de Vargeã o; (119) Barrancas fossilı́feras do arroio
Chuı́; (126) A loramento Canoinhas. Alé m deles, estã o plotados, no mapa, os outros locais ou contextos citados
no texto, marcados por letras: (a) falé sias da praia de Torres; (b) areais do Cerro da Esquina; (c) Cerro do
Jarau; (d) Salto do Yucumã ; (e) Itapema; (f) Garopaba; (g) monó lito Bico do Papagaio; (h) Morro dos Conventos;
(i1) ocorrê ncias de ametista de Planalto e de Ametista do Sul (RS); (i2) ocorrê ncias de ametista de Entre Rios
(SC); (j) á rea de a loramento natural de á guas minerais; (l) rochas alcalinas de Lages, ‘Pedras Brancas’, futuro
projeto de geoparque; (m) Parque Estadual da Serra do Tabuleiro. Por im, encontram‑se localizados no mapa
os contornos dos territó rios Caminhos dos Câ nions do Sul (CS), Quarta Colô nia (QC) e Caçapava (CP),
candidatos à certi icaçã o de Geoparques Mundiais UNESCO.
temnospô ndilos (Sangaia, Tomeia), entre ou‑ em Quaraı́), há signi icativa quantidade e di‑
tros, coletados nas fá cies luviais da Forma‑ versidade de fó sseis, recuperados de ambi‑
çã o Sanga do Cabral; (b) no Ladiniano/ entes luviais, que, coletivamente,
Carniano, as camadas e os fó sseis re letem representam a megafauna do Pleistoceno. A
ambientes, em geral, mais secos e faunas do‑ fauna registrada nessas camadas é caracteri‑
minadas por siná psidos, como dicinodontes zada pela presença de mamı́feros de grande
(Dinodontosaurus, Stahleckeria) e cinodontes porte, como preguiças‑gigantes (Megathe‑
(e.g. Massetognathus, Aleodon, Santacruzo‑ rium, Eremotherium, Glossotherium e Lesto‑
don, Menadon, Chiniquodon), mas com um don, (Fig. 2B)), gliptodontes (Glyptodon,
importante registro de arcossauromorfos, Doedicurus e Panochthus), pampaté rios
incluindo rincossauros (Brasinorhynchus) e (Pampatherium e Holmesina), cavalos (Equus
imponentes pseudossú quios carnı́voros e Hippidion), cervı́deos (Antifer), mastodon‑
(Prestosuchus, Decuriasuchus, Dagasuchus), tes (Notiomastodon), toxodontes e ma‑
entre outros; (b) já no Carniano/Noriano, crauquê nias (Toxodon e Macrauchenia),
condiçõ es climá ticas de maior umidade favo‑ entre outros. Devido a sua localizaçã o geo‑
receram ao predomı́nio dos diá psidos, com grá ica, a regiã o apresenta fó sseis pleistocê ‑
abundantes rincossauros (Hyperodapedon nicos com uma mescla de a inidades
(Fig. 2A), Teyumbaita), proterocâ mpsios biogeográ icas, com registros de tá xons cujos
(Proterochampsa), aetossauros (Aetosauroi‑ fó sseis ocorrem, predominantemente, em
des), alé m dos primeiros dinossauros regis‑ porçõ es mais austrais da Amé rica do Sul (e.g.
trados globalmente (e.g. Staurikosaurus, Doedicurus, Macrauchenia), bem como regis‑
Gnathovorax, Buriolestes, Bagualosaurus). Os tros de formas de a inidade intertropical (e.g.
cinodontes, contudo, se mantê m presentes Eremotherium). Ao inal do Pleistoceno e no
nas assembleias fossilı́feras, incluindo for‑ inı́cio do Holoceno, todas essas formas foram
mas de mé dio porte, como Exaeretodon, Si‑ extintas, restando somente os mamı́feros da
riusgnathus e Trucidocynodon. Estes sã o fauna atual. Embora as causas desse evento
substituı́dos, no inal do registro Triá ssico do de extinçã o de proporçõ es continentais ain‑
RS, por microvertebrados, como os cinodon‑ da sejam discutidas, infere‑se que ele nã o te‑
tes Riograndia, Irajatherium e Brasilodon nha ocorrido exatamente ao mesmo tempo,
(Fig. 2A) (cruciais ao entendimento da ori‑ e, sim, em um intervalo de tempo de alguns
gem dos mamı́feros), que viveram à sombra milhares de anos.
dos primeiros grandes dinossauros, como
Guaibasaurus, Unaysaurus e Macrocollum
3 PATRIMÔNIO GEOLÓGICO DE SANTA
(Fig. 2A).
CATARINA E DO RIO GRANDE DO SUL
Nos depó sitos da Planı́cie Costeira,
especialmente, nos da porçã o meridional, Os estados de Santa Catarina e do
junto ao arroio Chuı́, na fronteira com o Uru‑ Rio Grande do Sul nunca foram objeto, até o
guai, bem como em depó sitos quaterná rios momento, de campanhas sistemá ticas ou
no centro‑sul (Caçapava do Sul) e na frontei‑ metodologicamente consistentes de inventá ‑
ra oeste do RS (sobretudo, em Uruguaiana e rio de seu patrimô nio geoló gico, em escala
Patrimônio geológico e geoconservação nos estados de Santa Catarina e Rio Grande do Sul 491
Contribuições à Geologia do Rio Grande do Sul e de Santa Catarina
estadual, conforme as diretrizes sugeridas ontoló gicos, mas do perı́odo Triá ssico da
por Lima et al. (2010), por sua vez, inspira‑ Era Mesozoica, estã o os sı́tios Passo das
das nas experiê ncias de Portugal e da Espa‑ Tropas, em Santa Maria (RS) (SIGEP 084 (Da
nha. O presente trabalho també m nã o Rosa et al., 2013)), de conteú do paleo lorı́s‑
constitui uma tentativa de inventá rio, e, sim, tico, e Predebon, em Sã o Joã o do Polê sine
uma breve revisã o e atualizaçã o dos traba‑ (RS) (SIGEP 045 (Silva et al., 2013)), alé m de
lhos desenvolvidos. A iniciativa que mais se dois capı́tulos que descrevem, na verdade,
aproximou desse tipo de inventá rio foi a Co‑ em vez de sı́tios especı́ icos, contextos mais
missão Brasileira de Sítios Geológicos e Paleo‑ amplos: o contexto dos Sı́tios Paleobotâ ni‑
biológicos do Brasil, a chamada SIGEP, um cos do Arenito Mata (SIGEP 009 (Guerra‑
esforço de diversas entidades (ABEQUA, Sommer & Scherer, 2002)), que descreve
CPRM, DNPM, IBGE, ICMBio, IPHAN, Petro‑ uma das mais importantes lorestas petri i‑
bras, SBE, SBG, SBP e UGB) para compor um cadas do continente, distribuı́da pelos mu‑
panorama do patrimô nio geoló gico brasilei‑ nicı́pios de Sã o Pedro do Sul e de Mata (RS)
ro. Mesmo que seu â mbito tenha sido nacio‑ (Fig. 2C e 2D); e o contexto dos Tetrá podes
nal, essa lista pode dar uma ideia inicial triá ssicos do Rio Grande do Sul (SIGEP 022
desse patrimô nio regional, ainda que seu ca‑ (Barberena et al., 2002)), que agrupa o con‑
rá ter ad hoc, baseado na adesã o voluntá ria teú do fossilı́fero de vertebrados, já detalha‑
de pesquisadores, descrevendo sı́tios rele‑ do acima, de uma faixa de a loramentos de
vantes desde os seus pontos de vista, tenha quase 200 quilô metros de extensã o, orien‑
deixado as listas notadamente incompletas e tada leste‑oeste no centro do RS, que se dis‑
tenha re letido um pouco das desigualdades tribui entre Candelá ria e Sã o Vicente do Sul,
do paı́s. passando pela porçã o sul do territó rio da
Juntos, RS e SC possuem 17 sı́tios ou Quarta Colô nia, candidato a Geoparque
contextos geopatrimoniais inscritos na SI‑ Mundial UNESCO. Esse ú ltimo contexto, em
GEP (Fig. 1) e dez deles estã o diretamente que há frequente descoberta de novos fó s‑
relacionados à paleontologia. Isso, talvez, re‑ seis, foi recentemente atualizado pelo traba‑
lita a mais direta atribuiçã o de um cará ter lho de Schultz et al. (2020).
patrimonial aos fó sseis (inclusive, como pa‑ Associado, també m, à evoluçã o da
trimô nio cultural) do que a outros elemen‑ Bacia do Paraná , mas desde um ponto de
tos da geodiversidade, como minerais, vista estratigrá ico e da histó ria das geoci‑
rochas ou formas de relevo. Os sı́tios A lora‑ ê ncias no sul do Brasil, está o sı́tio Coluna
mento Quité ria, em Encruzilhada do Sul (RS) White, Serra do Rio do Rastro (SIGEP 024
(SIGEP 008 (Jasper et al., 2009)), Morro do (Orlandi Filho et al., 2009)), que recebeu
Papalé o, em Mariana Pimentel (RS) (SIGEP uma das primeiras iniciativas, no sentido da
101 (Ianuzzi et al., 2009)), A loramento Bai‑ divulgaçã o geocientı́ ica, com paradas e com
nha, em Criciú ma (SC) (SIGEP 082 (Ianuzzi, placas informativas no trajeto asfaltado, po‑
2002)) e A loramento de Canoinhas, em Ca‑ ré m sinuoso, entre Orleans e Bom Jardim da
noinhas (SC) (SIGEP 126 (Fanton et al., Serra (SC) (Fig. 2E). Esse é um verdadeiro
2009)) representam sı́tios paleobotâ nicos “itinerá rio geoló gico”, com cerca de 1000
com registros do Permiano, no inı́cio da de‑ metros de desnı́vel topográ ico e uma via‑
posiçã o da Bacia do Paraná na regiã o, ainda gem por mais de 160 milhõ es de anos de
na Era Paleozoica, ao inal da glaciaçã o que evoluçã o sedimentar, iniciando com o limite
dominou o Gondwana no Carbonı́fero. Itararé /Rio Bonito (Permiano inferior) e i‑
També m vinculados a aspectos pale‑ nalizando com os basaltos Serra Geral (Cre‑
tá ceo inferior). Sobre esses basaltos, formou‑ ao ar livre para as geociê ncias no sul do Bra‑
se, pelo singular e instantâ neo evento de sil.
queda de um meteoro, o geossı́tio Astroble‑ Os conteú dos fossilı́feros associados
ma Domo de Vargeã o, uma cratera de 12,4 ao Pleistoceno, descritos antes, estã o repre‑
quilô metros de diâ metro, que ocupa porçõ es sentados pelos sı́tios Barrancas fossilı́feras do
dos municı́pios de Vargeã o, Faxinal dos Gue‑ arroio Chuı́, em Chuı́ (RS) (SIGEP 119 (Lopes
des e Passos Maia, no oeste catarinense (SI‑ et al., 2009)), de onde foram resgatados fó s‑
GEP 114 (Cró sta et al., 2009)). seis de mamı́feros herbı́voros diversos, in‑
Grandes desnı́veis topográ icos tam‑ cluindo preguiças‑gigantes, e Paleotoca do
bé m constituem a marca dos sı́tios Itaimbe‑ Municı́pio de Cristal, em Cristal (RS) (SIGEP
zinho e Fortaleza, na divisa entre Cambará 048 (Buchmann et al., 2013)), cujas feiçõ es
do Sul (RS) e Praia Grande (SC) (SIGEP 050 indicam escavaçõ es feitas por um tatu‑gigante
(Wildner et al., 2009)), constituı́dos por dois (Xenarthra, Dasypodidae). A Planı́cie Costeira,
longos (quase 6 mil metros de extensã o) e como palco de processos sedimentares ativos,
profundos (mais de 720 metros de desnı́vel) está representada em outros dois sı́tios: as
câ nions, encaixados em estruturas tectô nicas Dunas do Albardã o, em Santa Vitó ria do Pal‑
SSE‑NNW (Itaimbezinho) e ENE‑WSW (For‑ mar (RS) (SIGEP 003 (Lopes et al., 2009)),
taleza), expondo paredõ es verticais (Fig. 2F e que registram os processos eó licos (dunas
2G), com a sequê ncia de derrames basá lticos frontais, dunas mó veis) dominantes na atual
da Formaçã o Serra Geral. Esses câ nions, jun‑ barreira arenosa; e o Complexo Lagunar Cen‑
tamente com as falé sias da praia gaú cha de tro‑Sul Catarinense, entre Jaguaruna e Garo‑
Torres (Fig. 2H), sã o os elementos mais im‑ paba (SC) (SIGEP 075 (Gianinni, 2002)),
portantes do territó rio dos Caminhos dos importante nã o só do ponto de vista geomor‑
Câ nions do Sul, també m candidato a Geopar‑ foló gico/sedimentar, mas també m arqueoló ‑
que Mundial UNESCO. gico, pela presença de sambaquis.
També m localizados em um territó ‑ Alé m da lista SIGEP, é importante
rio que pleiteia a certi icaçã o de Geoparque mencionar alguns esforços de inventá rio de
Mundial UNESCO, neste caso, o municı́pio de geossı́tios para á reas ou para territó rios espe‑
Caçapava do Sul (RS), estã o os sı́tios: Minas cı́ icos, realizados ao longo dos ú ltimos anos.
do Camaquã (SIGEP 064 (Paim, 2002)), re‑ O municı́pio de Caçapava do Sul, ou á reas
gistrando as ocorrê ncias de minerais metá li‑ mais extensas, englobando aquele municı́pio,
cos em rochas sedimentares antigas (Fig. foram objeto dos levantamentos de Degrandi
3A), bem como o patrimô nio mineiro (Fig. (2011), de Borba et al. (2013) e de Peixoto
3B) das diferentes fases dos mais de 100 (2017), cada um com foco e com abrangê ncia
anos de extraçã o de cobre e de metais asso‑ diferentes. O territó rio do Conselho Regional
ciados, nas imediaçõ es do Rio Camaquã ; e de Desenvolvimento da Regiã o da Campanha
Guaritas do Camaquã (SIGEP 076 (Paim et Gaú cha (COREDE Campanha), que integra,
al., 2013)), singular relevo ruiniforme (Fig. alé m de Caçapava do Sul, os municı́pios de
3C) desenvolvido sobre arenitos e conglome‑ Aceguá , Bagé , Candiota, Dom Pedrito, Hulha
rados de origens aluvial e eó lica do Cambria‑ Negra e Lavras do Sul, teve geossı́tios e con‑
no, que tem continuidade a leste, em Santana textos geopatrimoniais de potencial turı́stico
da Boa Vista. Caçapava do Sul, o icialmente descritos por Borba et al. (2019a e 2019b).
reconhecida como “capital gaú cha da geodi‑ Houve, ainda, levantamentos de aspectos cul‑
versidade”, pela Lei Estadual nº turais (Borba et al., 2014), ecoló gicos (Silva,
14.708/2015, é uma importante sala de aula 2016; Borba et al., 2016) e esté ticos (Borba,
Patrimônio geológico e geoconservação nos estados de Santa Catarina e Rio Grande do Sul 493
Contribuições à Geologia do Rio Grande do Sul e de Santa Catarina
Figura 2 – Aspectos da geodiversidade e do patrimô nio geoló gico de SC e do RS: (A) crâ nios fó sseis dos
tetrá podes triá ssicos Hyperodapedon (à esquerda, barra de escala de 10cm), Macrocollum (à direita, na parte
superior, barra de escala de 5 cm) e do pequeno cinodonte Brasilodon (barra de escala de 1 cm); (B) fó sseis do
pé de uma preguiça‑gigante do gê nero Lestodon (a escala em preto‑e‑branco, interna ao cartã o, é de 5 cm),
coletados em Caçapava do Sul (RS); (C) lenhos fó sseis triá ssicos in situ, a lorantes no Sı́tio da Piscina, em Sã o
Pedro do Sul (RS); (D) grandes fragmentos de lenhos fó sseis ex situ, dispostos em praça pú blica, na cidade de
Mata (RS); (E) a rodovia sinuosa, que cruza a Coluna White, na Serra do Rio do Rastro, vista a partir de um
mirante, em Bom Jardim da Serra (SC); (F) trilha do Rio do Boi, em Praia Grande (SC), curso d’á gua encaixado
nos paredõ es do câ nion Itaimbezinho; (G) vista do câ nion Fortaleza, em Cambará do Sul (RS), com ocorrê ncia
do fenô meno da ‘viraçã o’; (H) falé sias basá lticas da praia de Torres (RS). Fotogra ias de Flá vio Pretto (A), de
André Borba (B, C, D, E, F e H) e de Maria Elizabeth da Rocha (G).
2017), bem como da histó ria e da marca pai‑ nos trabalhos de Fontana (2012) e de Fonta‑
sagı́stica da mineraçã o (Von Ahn & Simon, na et al. (2015). Em anterior trabalho de re‑
2019), em locais especı́ icos de Caçapava do visã o e de perspectivas, Borba (2014) havia
Sul. mencionado, ainda, geossı́tios situados no
Ainda no Rio Grande do Sul, houve norte do RS, em diferentes porçõ es da bacia
os levantamentos realizados no territó rio da hidrográ ica do alto rio Uruguai, alguns en‑
Quarta Colô nia, composto por nove municı́‑ volvendo contextos com continuidade fı́sica
pios da regiã o central do RS (Agudo, Dona em SC, como: (a) as á reas de ocorrê ncia de
Francisca, Faxinal do Soturno, Ivorá , Nova espetaculares geodos de ametista, em Planal‑
Palma, Pinhal Grande, Restinga Sê ca, Sã o to e Ametista do Sul (RS) e em Entre Rios
Joã o do Polê sine e Silveira Martins), sempre (SC); (b) as faixas de a loramentos naturais
com foco na eventual candidatura ao selo de de á guas termais, com complexos balneá rios
Geoparque Mundial UNESCO. A partir do le‑ de diferentes nı́veis de infraestrutura, inte‑
vantamento inicial de Godoy et al. (2012a), grando os municı́pios catarinenses de Caibi,
por iniciativa do Consó rcio de Desenvolvi‑ Palmitos e Sã o Carlos, alé m de Iraı́, no RS, e,
mento Sustentá vel (CONDESUS) da Quarta mais a leste, entre Marcelino Ramos (RS) e
Colô nia, adiçõ es, supressõ es e reavaliaçõ es Piratuba (SC); e (c) o Salto do Yucumã (Fig.
de geossı́tios (e.g. Ziemann & Figueiró , 3E), em Derrubadas (RS), como uma singular
2017) foram se incorporando ao panorama queda d’á gua longitudinal (ao longo da dire‑
geopatrimonial daquele territó rio. Da mes‑ çã o do rio), inserida no Parque Estadual do
ma forma, no territó rio Caminhos dos Câ ni‑ Turvo.
ons do Sul, a partir do trabalho inicial de Em Santa Catarina, alé m das já cita‑
Godoy et al. (2012b), houve readequaçõ es, das á reas de divisa com o Rio Grande do Sul,
inclusive territoriais, que obrigaram à pro‑ destacam‑se, como levantamentos de pa‑
posiçã o de modi icaçõ es na lista de geossı́ti‑ trimô nio geoló gico em locais ou em territó ri‑
os. Alé m dos câ nions já inscritos na lista os especı́ icos (Fig. 1), trabalhos de
SIGEP, os morros e as falé sias da praia de identi icaçã o de geossı́tios em dois municı́pi‑
Torres tiveram um destaque internacional, os da regiã o litorâ nea: (1) Itapema, onde
ao serem descritos no artigo de Zerfass et al. houve levantamento da geodiversidade e
(2020). proposiçã o de prá ticas de educaçã o ambien‑
Outros elementos da geodiversidade tal e de geoturismo (Covello, 2011); e (2) a
gaú cha tê m sido focalizados desde o ponto capital Florianó polis (Figs. 3F e 3G), onde fo‑
de vista geopatrimonial (Fig. 1). E o caso dos ram propostas estraté gias de geoconserva‑
areais da Fronteira Oeste gaú cha, com suas çã o e planos de gestã o da geodiversidade
implicaçõ es paleoclimá ticas e ambientais, (Covello et al., 2017, 2018). També m no lito‑
estudados, especi icamente, no Cerro da Es‑ ral, há pesquisas direcionadas: ao municı́pio
quina, em Sã o Francisco de Assis (Gass et al., de Garopaba, uma á rea de substancial geodi‑
2019). També m merece destaque a cratera versidade (Quoos & Figueiró , 2018); a locali‑
de impacto (astroblema) do Cerro do Jarau, dades especı́ icas na ilha de Santa Catarina
em Quaraı́ (Sá nchez & Garcia, 2013), geossı́‑ (Fig. 3G), como Lagoinha do Leste (Santos &
tio de singular relevâ ncia cultural para o po‑ Valdatti, 2017); e a unidades de conservaçã o,
vo gaú cho, por ter sido local de inspiraçã o como o Parque Estadual da Serra do Tabulei‑
para a lenda da Salamanca do Jarau (Fig. ro (Pimenta, 2016). No caso de geossı́tios es‑
3D). Os aspectos geopatrimoniais da capital pecı́ icos, o recente trabalho de Miranda &
gaú cha, Porto Alegre, tê m sido focalizados Horn Filho (2020) traz o cará ter patrimonial
Patrimônio geológico e geoconservação nos estados de Santa Catarina e Rio Grande do Sul 495
Contribuições à Geologia do Rio Grande do Sul e de Santa Catarina
do Monó lito Bico do Papagaio, em Itajaı́, en‑ esportes de aventura. Outro elemento im‑
quanto Cristiano (2018) avalia a interface portante é a ocorrê ncia de diversas paleoto‑
entre a geoconservaçã o e a gestã o costeira cas, estruturas biogê nicas na forma de
no municı́pio de Araranguá , onde se localiza tú neis e salõ es escavados por mamı́feros da
um importante geossı́tio, o Morro dos Con‑ megafauna do Plioceno e do Pleistoceno nos
ventos. No interior de Santa Catarina, desta‑ arenitos eó licos da Formaçã o Botucatu, que
ca‑se o recente trabalho de Rapanos (2020), a loram na base das encostas, abaixo das ro‑
em uma á rea de rochas alcalinas na zona ru‑ chas vulcâ nicas. També m se destaca o a lo‑
ral de Lages, Painel e Bocaina do Sul, como ramento de peperitos, no contato entre o
uma iniciativa preliminar, com vistas à cons‑ arenito e o basalto, sobretudo, em Torres,
truçã o de um futuro projeto de geoparque (o nas falé sias e nos blocos, que se desprende‑
territó rio Pedras Brancas, segundo aquele ram das mesmas. Esses elementos, e mais
autor). um importante sistema de lagoas e de cam‑
pos de dunas, estã o inseridos no bioma Ma‑
4 FUTUROS GEOPARQUES MUNDIAIS ta Atlâ ntica e na correspondente Reserva da
DA UNESCO EM SANTA CATARINA E Biosfera, certi icada pela UNESCO. Sobre es‑
NO RIO GRANDE DO SUL se contexto fı́sico e bió tico se encontram os
aspectos culturais do territó rio, que remon‑
Em 2020, trê s territó rios (Fig. 1) in‑ tam aos povos indı́genas e à s imigraçõ es
seridos nos estados de SC e RS trabalham no portuguesa, alemã e italiana, alé m dos re‑
sentido de buscar a certi icaçã o do Programa manescentes quilombolas, que in luencia‑
de Geoparques Mundiais da UNESCO. O mais ram na gastronomia, na religiosidade, na
adiantado desses territó rios é denominado arquitetura e nos costumes caracterı́sticos
Caminhos dos Câ nions do Sul (Fig. 1), e reú ‑ da regiã o.
ne sete municı́pios, sendo trê s do Rio Grande A equipe té cnica do Consó rcio Pú ‑
do Sul (Cambará do Sul, Mampituba e Tor‑ blico Intermunicipal vem buscando parceri‑
res) e quatro de Santa Catarina (Praia Gran‑ as com instituiçõ es pú blicas e privadas, para
de, Jacinto Machado, Morro Grande e Timbé a disseminaçã o do conhecimento das geoci‑
do Sul), em um Consó rcio Intermunicipal ê ncias e da sua relaçã o com os patrimô nios
constituı́do especialmente para a inalidade natural e cultural do territó rio, visando ao
de implantaçã o dessa estraté gia. O Geopar‑ desenvolvimento e à valorizaçã o de produ‑
que Aspirante Caminhos dos Câ nions do Sul tos vinculados à identidade sociocultural
teve seu dossiê de candidatura enviado à regional. Das parcerias já estabelecidas, re‑
UNESCO, em novembro de 2019, mas, devido sultaram vá rias açõ es: georroteiros, implan‑
à pandemia de Covid‑19, ainda nã o havia re‑ taçã o de centros de interpretaçã o, placas e
cebido a missã o de avaliaçã o da UNESCO. painé is interpretativos, eventos, cursos de
Reunindo os câ nions Itaimbezinho e Fortale‑ capacitaçã o de guias/condutores e profes‑
za, nos Parques Nacionais dos Aparados da sores, entre outros. Como o territó rio carece
Serra e da Serra Geral, e as falé sias da praia de instituiçõ es de pesquisas nas geociê nci‑
gaú cha de Torres, o territó rio registra, ao as, estã o sendo feitas parcerias com vá rias
mesmo tempo, o episó dio vulcâ nico gigan‑ universidades, o que está resultando em te‑
tesco da Formaçã o Serra Geral, e os vales ses e em cursos de capacitaçã o, em diferen‑
profundamente escavados ao longo de suas tes á reas. A estraté gia geoparque també m
fraturas, dando origem a câ nions de grande atraiu o interesse dos governos estaduais
beleza cê nica e de potencial para lazer e para do RS e de SC e do governo federal, que es‑
tã o investindo na infraestrutura da regiã o, na costumes e idiomas sã o atrativos que com‑
melhoria das estradas e da sinalizaçã o. Entre plementam a singularidade da Quarta Colô ‑
os principais desa ios, estã o: a acessibilidade nia.
reduzida aos atrativos turı́sticos, a manuten‑ Como açã o estraté gica de proteçã o e
çã o permanente dos geossı́tios e a gestã o de de salvaguarda do patrimô nio fó ssil, por ini‑
á reas de riscos de desastres naturais, dadas ciativa do CONDESUS/QC, foi criado o Centro
as caracterı́sticas morfoló gicas do territó rio. de Apoio à Pesquisa Paleontoló gica da Quar‑
Para enfrentar esses desa ios, a estraté gia ta Colô nia (CAPPA), hoje administrado pela
conta com o engajamento das comunidades e UFSM. Alé m de possuir um corpo de pro issi‑
das entidades parceiras, tendo em vista a vo‑ onais da paleontologia e gestores, o CAPPA
caçã o turı́stica do territó rio Caminhos dos conta com um conjunto de laborató rios equi‑
Câ nions do Sul. pados para receber cientistas de diferentes
O territó rio da Quarta Colô nia, na re‑ instituiçõ es, e oferece apoio té cnico, logı́stico
giã o central do Rio Grande do Sul (Fig. 1), e acadê mico para a pesquisa paleontoló gica
reú ne os nove municı́pios do CONDESUS/QC, na á rea da Quarta Colô nia. Desde a sua fun‑
conforme mencionado anteriormente, e tem daçã o, manté m tombados todos os fó sseis
como principais instituiçõ es envolvidas em coletados na regiã o, mediante acordos com
sua constituiçã o e em sua gestã o, o pró prio instituiçõ es de pesquisa que atuam no seu
CONDESUS e a Universidade Federal de Santa territó rio de abrangê ncia. Alé m de ser refe‑
Maria (UFSM), alé m das nove prefeituras. rê ncia em pesquisa de paleodiversidade, pa‑
Apó s diversas audiê ncias pú blicas, realizadas leoecologia e paleontologia virtual, o CAPPA
em 2019, foi constituı́do um comitê gestor, atua junto à UFSM na graduaçã o e na pó s‑
com ampla participaçã o da comunidade e do graduaçã o, e estende suas atividades a ou‑
poder pú blico dos nove municı́pios. O Geo‑ tras instituiçõ es e à rede bá sica de ensino,
parque Aspirante Quarta Colô nia enviou, em atravé s de o icinas, de cursos de curta dura‑
junho de 2020, a carta de intençõ es (letter of çã o, da instrumentalizaçã o de docentes, da
intent) ao escritó rio da UNESCO, em Paris, manutençã o de uma mostra paleontoló gica e
com a chancela do Ministé rio das Relaçõ es da incorporaçã o da paleontologia aos currı́‑
Exteriores do Brasil (Itamaraty) e, atualmen‑ culos escolares do territó rio. Ainda no cam‑
te (dezembro de 2020), prepara o dossiê de po da educaçã o, o Geoparque Aspirante
candidatura. O territó rio tem, como principal Quarta Colô nia promoveu: (a) de forma vir‑
elemento geopatrimonial, o contexto interna‑ tual, ao longo do ano de 2020, uma Jornada
cionalmente reconhecido (detalhado acima) de Educaçã o Patrimonial, para 300 docentes
dos fó sseis de tetrá podes do Triá ssico (250 da educaçã o bá sica; e (b) trê s ediçõ es anuais
Ma a 200 Ma), com destaque para os dinos‑ (2017, 2018 e 2019) do Paleodia da Quarta
sauros mais antigos do mundo, com 233 mi‑ Colô nia, com atividades de lazer, de cultura e
lhõ es de anos, bem como uma importante de conhecimento sobre todos os aspectos do
fauna de cinodontes, vinculados à origem dos territó rio, cuja ú ltima ediçã o acumulou cerca
mamı́feros, datados em 225 milhõ es de anos. de 1000 visitantes.
Estes fó sseis a loram junto a um contexto de Por sua vez, o municı́pio de Caçapava
transiçã o entre a Depressã o Central e o Pla‑ do Sul, no centro‑sul do RS (Fig. 1), constitui
nalto Meridional Brasileiro, bem como entre o territó rio proposto para o Geoparque Aspi‑
os biomas Pampa e Mata Atlâ ntica. A herança rante Caçapava, uma estraté gia capitaneada
cultural de imigrantes italianos e alemã es, pela Universidade Federal de Santa Maria
sua gastronomia, religiosidade, arquitetura, (UFSM) e pela Universidade Federal do Pam‑
Patrimônio geológico e geoconservação nos estados de Santa Catarina e Rio Grande do Sul 497
Contribuições à Geologia do Rio Grande do Sul e de Santa Catarina
Figura 3 – Mais aspectos da geodiversidade e do patrimô nio geoló gico de SC e do RS: (A) manchas do mineral
malaquita (carbonato de cobre) sobre conglomerados da Bacia do Camaquã , em Caçapava do Sul (RS); (B)
instalaçõ es do Cine Rodeio, na vila Minas do Camaquã , em Caçapava do Sul (RS), marco da mineraçã o de cobre
na regiã o; (C) geossı́tio Guaritas do Camaquã , em Caçapava do Sul, relevo ruiniforme sobre arenitos e
conglomerados do inı́cio do Paleozoico; (D) Cerro do Jarau, em Quaraı́ (RS), expressã o paisagı́stica de uma
cratera de impacto (astroblema), em meio ao pampa; (E) Salto do Yucumã , extensa queda d’á gua longitudinal,
ao longo do rio Uruguai, em Derrubadas (RS); (F) campo de dunas da praia da Joaquina, em Florianó polis (SC),
com morro granı́tico, ao fundo; (G) praia de Lagoinha do Leste e, em primeiro plano, blocos residuais de rochas
piroclá sticas no Morro da Coroa, em Florianó polis (SC). Fotogra ias de André Borba (A, B, C, D e E) e de Cristina
Covello (F e G).
pa (Unipampa), com apoio da Prefeitura Mu‑ pampa, oferecem exposiçõ es, jogos, brinca‑
nicipal e de uma entidade criada em 2018, a deiras, contaçõ es de histó rias, prá ticas de es‑
Associaçã o para o Desenvolvimento do Geo‑ calada, planetá rio itinerante, caminhadas
turismo de Caçapava do Sul (AGEOTUR). Esse interpretativas pelo centro histó rico e excur‑
conjunto de instituiçõ es, com o apoio da Casa sõ es aos principais geossı́tios, alé m de feiras
Civil do Governo do Estado do RS e com a de artesanato e de produtos locais. Por im,
chancela do Itamaraty, també m enviou carta em 2019, houve a inauguraçã o de um novo
de intençõ es à UNESCO, em junho de 2020, espaço educativo no acesso ao campus da
prepara dossiê de candidatura e tenta mon‑ Unipampa: o Jardim da Geodiversidade Pro‑
tar sua estrutura de gestã o. O territó rio tem, fessor Maurı́cio Ribeiro, com grandes blocos
como destaque geopatrimonial, o contexto de rocha e com uma reconstituiçã o paleoar‑
da Bacia do Camaquã , o mais completo, es‑ tı́stica de uma preguiça‑gigante (Megathe‑
pesso e abrangente registro da “fase de tran‑ rium), com todos os elementos interpre‑
siçã o” da Plataforma Sul‑americana, exposto tados, atravé s de painé is explicativos sobre a
em geossı́tios de grande beleza cê nica, como origem e sobre a localizaçã o no territó rio.
a Serra de Santa Bá rbara, a Serra do Segredo, Nos campos do geoturismo e do desenvolvi‑
as Minas do Camaquã e as Guaritas. Ecossis‑ mento local sustentá vel, é importante desta‑
temas ú nicos e ameaçados, adaptados ao car o estabelecimento de novas empresas
substrato rochoso, com destaque para os en‑ dedicadas à conduçã o (geo)turı́stica, de no‑
demismos de cactá ceas, pontuam a isiono‑ vas opçõ es de hospedagem integradas à pai‑
mia de campos nativos, cuja ocupaçã o sagem das Guaritas e, també m, vinculadas à
tradicional, por pecuaristas familiares, ga‑ olivicultura, alé m da criaçã o de novos produ‑
rante a sustentabilidade ambiental e paisa‑ tos com identidade local e com inspiraçã o
gı́stica do meio rural. Na cidade, um centro patrimonial, desde cervejas artesanais a pro‑
histó rico de construçõ es antigas e tombadas dutos em lã . O artesanato de Caçapava do Sul
(embora, em mau estado de conservaçã o) teve, també m, um salto de qualidade, sobre‑
tem, como principal atrativo, a ú nica fortale‑ tudo, a partir de capacitaçõ es fornecidas pe‑
za preservada do RS, com muralhas construı́‑ lo Geoparque Aspirante Caçapava, e, hoje,
das com blocos do granito autó ctone: o Forte sã o encontrados muitos suvenires com refe‑
Dom Pedro II, do sé culo XIX. rê ncias aos geossı́tios, aos cactos e à pregui‑
O Geoparque Aspirante Caçapava ça‑gigante, entre outros. Nos quesitos
tem realizado uma sé rie de açõ es na á rea da conservaçã o da natureza e uso sustentá vel
educaçã o ambiental e (geo)patrimonial. Em da geodiversidade, Caçapava do Sul, que
2015 e em 2016, houve o icinas para a quali‑ nunca teve unidades de conservaçã o (UC)
icaçã o de docentes da educaçã o bá sica em em seu territó rio, conta, hoje, com o Parque
aspectos da geodiversidade local e de geoci‑ Natural Municipal da Cascata do Salso, em
ê ncias em geral e, em 2019, ocorreu o lança‑ vias de regularizaçã o, junto aos ó rgã os ambi‑
mento de um guia didá tico gratuito sobre os entais do RS, e com um trabalho muito con‑
geomonumentos do municı́pio, editado pela sistente junto ao Parque Municipal da Pedra
Pró ‑Reitoria de Extensã o da UFSM. Desde do Segredo, á rea de lazer concedida à inicia‑
novembro de 2015, realizam‑se, anualmente, tiva privada local.
os eventos Geodia, promovendo a integraçã o
entre a comunidade e o conhecimento geoci‑ 5 CONSIDERAÇÕES FINAIS
entı́ ico. Tais eventos, realizados na praça
central da cidade e nas dependê ncias da Uni‑ Em sı́ntese, o territó rio compreendi‑
Patrimônio geológico e geoconservação nos estados de Santa Catarina e Rio Grande do Sul 499
Contribuições à Geologia do Rio Grande do Sul e de Santa Catarina
do pelos estados de Santa Catarina e do Rio Queiroz, E. T., Winge, M. & Berbert‑Born, M.
Grande do Sul possui aspectos de geodiversi‑ (Eds. ) Sítios geológicos e paleontológicos do
dade e de patrimô nio geoló gico de substan‑ Brasil – SIGEP, vol. I, p. 11‑22.
cial importâ ncia cientı́ ica/educativa, bem
Borba, A. W. 2014. Perspectivas para a pes‑
como, para diversos conteú dos, de beleza cê ‑
quisa e a atuaçã o em geoconservaçã o na
nica associada e de forte atratividade turı́sti‑ Universidade Federal de Santa Maria
ca. Conta, també m, com relevantes iniciativas (UFSM) com foco nas á reas menos desenvol‑
de geoconservaçã o, de educaçã o geopatri‑ vidas do Brasil meridional. Ciência e Natura,
monial e de estı́mulo ao geoturismo, muito 36 (Ed. Especial 35 anos): 166‑172.
bem representadas nos atuais trê s territó ri‑
Borba, A. W. 2017. Geomonumentos de Ca‑
os candidatos ao selo de Geoparque Mundial
çapava do Sul (centro‑sul do RS, Brasil) e
da UNESCO. O futuro da geoconservaçã o no seu destaque na paisagem: a quanti icaçã o
extremo sul do Brasil implica, necessaria‑ do valor esté tico do geopatrimô nio e suas
mente: (a) realizaçã o de inventá rio sistemá ‑ aplicaçõ es. Geogra ia Ensino e Pesquisa,
tico e de avaliaçã o de seu patrimô nio 21(1): 216‑225.
geoló gico, inclusive, em termos de estado de
Borba, A. W. & Sell, J. C. 2018. Uma re lexã o
conservaçã o; (b) inclusã o do patrimô nio ge‑
crı́tica sobre os conceitos e prá ticas da geo‑
oló gico nas polı́ticas pú blicas de conservaçã o conservaçã o. Geographia Meridionalis, 4(1):
da natureza e nos processos de EIA‑RIMA e 2‑28.
de licenciamento ambiental, nos â mbitos es‑
tadual e municipal; (c) inserçã o de aspectos Borba, A. W., Souza, L. F., Mizusaki, A. M. P.,
geopatrimoniais nas polı́ticas de educaçã o e Almeida, D. P. M. & Stumpf, P. P. 2013. Inven‑
tá rio e avaliaçã o quantitativa de geossı́tios:
de turismo das diversas instâ ncias de gover‑
exemplo de aplicaçã o ao patrimô nio geoló ‑
nança local e regional; (d) construçã o de no‑ gico do municı́pio de Caçapava do Sul (RS,
vos projetos de geoparques, onde haja Brasil). Pesquisas em Geociências, 40(3):
conteú dos de comprovada relevâ ncia inter‑ 275‑294.
nacional, sempre considerando limites admi‑
nistrativos e a dimensã o do territó rio. Por Borba, A. W., Sell, J. C. & Figueiró , A. S. 2014.
Dimensã o cultural da geodiversidade e do
im, salienta‑se que a geodiversidade, o pa‑
geopatrimô nio de Caçapava do Sul, Rio
trimô nio geoló gico e a geoconservaçã o cons‑ Grande do Sul, Brasil. In: I Encontro Luso‑
tituem novos e importantes campos de Brasileiro de Patrimô nio Geomorfoló gico e
atuaçã o para pro issionais de geociê ncias Geoconservaçã o, Coimbra (Portugal).
graduados nas instituiçõ es de ensino superi‑ Anais. . . Coimbra. 1 CD‑ROM.
or do RS e de SC, abrindo possibilidades de
Borba, A. W., Silva, E. L., Souza, L. P. M., Sou‑
trabalho, em busca de uma geologia mais co‑
za, L. F. & Marques, R. V. 2016. Relaçã o entre
nectada à s pessoas, à sociedade, à educaçã o a geodiversidade intrı́nseca e a estruturaçã o
e ao desenvolvimento sustentá vel local e re‑ de habitat na escala do geossı́tio: exemplos
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