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UNIVERSIDADE FEDERAL DO RIO GRANDE DO NORTE

CENTRO DE CIÊNCIAS HUMANAS, LETRAS E ARTES


DEPARTAMENTO DE FILOSOFIA
DISCIPLINA: ÉTICA III
PROFESSOR: CINARA NAHRA
ALUNO: TARCÍSIO ALVES DOS SANTOS

O APRIMORAMENTO MORAL GENÉTICO

NATAL
Maio 2012
O aprimoramento moral genético

Grandes debates éticos da atualidade giram em torno do “aprimoramento


genético” (genetic enhancement) e em suas vantagens e possíveis consequências para a
sociedade. O aprimoramento genético é em grande parte um desejo não só da ciência,
mas também de boa parte da população que poderia ser beneficiada pelo aprimoramento
genético na luta contra doenças agudas, como o câncer ou AIDS e outros benefícios.

Claro que poderia hipoteticamente ocorrer situações controversas de acordo


com a sua finalidade, podendo ser utilizada tanto para fins lícitos como ilícitos, nos
casos, por exemplo, de doping genético, o qual o atleta sofreria uma pequena
modificação em sua estrutura genética proporcionando um maior desenvolvimento e
privilégios que outros atletas. Digamos que isso hoje já é usado nas alterações genéticas
não definitivas por meio de drogas, as quais muitas vezes podem acarretar mudanças
psicofísicas no atleta. Nesse caso, não seriam todos os atletas que teriam esse privilégio
(embora seja uma discursão em saber se isso é um privilégio), pois nem todos poderiam
pagar por isso, como do mesmo modo, as questões das doenças. Mesmo que todos
tivessem acesso outros problemas éticos surgiriam, como a questão, se poderíamos
modificar ou não a natureza humana, quais os ricos que isso poderia acarretar na
humanidade, entre outros conceitos filosóficos bastante antigos, a saber, entre o que é
natural e o que é artificial, se o natural é melhor que o artificial, etc. Essas questões
éticas causariam grandes debates em uma briga conceitual entre bioconservadores e os
transhumanistas.

Hoje o aprimoramento genético não se restringe somente aos humanos ou


animais, mas as frutas, legumes, hortaliças, etc. Os transgênicos andam lado a lado com
o aprimoramento, mas em um processo acelerado e que ignoram as condições
ambientais, como também a adaptação que tanto as plantas, como os seres que as
consomem podem sofrer. É basicamente uma questão de capitalismo selvagem, que da
pouca ou nenhuma importância às consequências que podem acarretar tais modificações
nos genes das plantas e sua interferência no meio ambiente em meio a sua adaptação;
como também a humanidade, que poderia sofrer grandes mudanças no seu organismo
causando mal a saúde.
Para mim esse é um processo sem volta, a ciência com sua biotecnologia cada
vez mais procuram maneiras de uma manipulação e aperfeiçoamento genéticos. A
criação não só de plantas, mas de um homem melhorado, aperfeiçoado, parece ser mais
que uma ficção científica, senão algo real, concreto demais para fecharmos os olhos.
Desde o projeto genoma a ciência tem avançados muito em pesquisas acerca do
aperfeiçoamento humano, não só a nível físico, mas também psíquico e moral.

Alias, é exatamente nesse ponto referente à moralidade, que quero dar ênfase
aqui, a questão do aperfeiçoamento moral. Destaco então o artigo1 do Dr. Halley S.
Faust, que vai além do que está acontecendo atualmente, mas sugere a hipótese de que
se poderíamos ou não usar o aprimoramento genético para a moral. Em uma hipótese
teórica o Dr. Faust coloca a questão se futuros pais poderiam por um processo de
diagnostico de pré-implantação selecionar embriões para a fertilização in vitro (IVF), de
um haplótipo (teórico) Moral Kinder (MK+) que tem a predisposição de um nível de
moralidade maior que a média dos outros indivíduos (MK-). Então ele nos faz uma
pergunta: seria lícito ou seria obrigatório selecionar para um MK+ haplótipo? Ou seja,
é moral selecionar para a moralidade? Tentarei fazer um breve resumo das questões
levantadas por Faust nesse artigo, como também mostrarei minha opinião sobre o
mesmo.

Faust coloca em seu texto que procuramos educar nossos filhos com sabedoria
moral, agindo virtuosamente para ser um ser humano melhor, integro e decente. Por
meio da educação escolar, religião ou mesmo os ensinamentos dos próprios pais e
familiares, ditamos o caráter moral de nossas crianças e jovens para que se tornem
adultos capazes de exercer as regras de conduta moral, e quando não agem assim os
repreendemos e até mesmo castigamos. Todas as sociedades tentam coagir os sistemas
antimorais, para terem menos problemas relacionados a furtos, crimes, desobediência a
leis, etc. O que nosso escritor propõe de antemão é se poderíamos fazer isso de uma
maneira um pouco mais simples por meio do haplótipo MK+, em outras palavras, não
seria mais fácil já que todos querem uma sociedade mais justa e moral escolher nossos
filhos por uma pré-implantação do MK+? Ou melhor, talvez ela não seja apenas
desejável, mas talvez obrigatória.

Podemos pensar que a condição moral está associada a fatores genéticos,


culturais e sociais na condição para a moralidade. Sendo assim, se isso for verdade, os
1
Should we select for genetic moral enhancement? A thought experiment using the MoralKinder (MK+) haplotype. Published
online: 9 January 2009. Springer Science+Business Media B.V. 2009.
genes podem influenciar, mas não determinam a personalidade das pessoas, pois, a
hereditariedade, a genética e o modelo de cada sociedade e lugar, formam o caráter
moral. Supondo hipoteticamente que realmente possa existir genes que façam as
crianças agirem com uma maior probabilidade moral, mas não determina o seu agir, ou
seja, eles teriam o livre arbítrio para agirem, e que ainda os haplótipos testados
cientificamente comprovem que não há risco nenhum, nem para a saúde ou fisicamente
na escolha para a implantação do haplótipo MK+, seria o caso pensarmos se essa
implantação não poderia ser obrigatória, pois de certo modo resolveria e muito os
nossos problemas morais? Bem, depois analisaremos se tal procedimento poderia ser
apenas desejável ou obrigatório como pensa nosso autor.

Uma criança MK+ poderia inclusive influenciar o comportamento de outras


crianças MK- para agirem de forma mais justa e honesta. Temos ainda que esclarecer
que a seleção para um haplótipo MK+ não é de fato algo criado, mas algo que já existe.
Seria o caso de apenas selecionar o embrião MK+ em detrimento de outro embrião para
a fertilização in vintro. Ora, se é verdade que queremos uma sociedade mais justa e
honesta, e não uma sociedade propensa às desordens vindas da imoralidade, então, é
verdade também que se pudéssemos escolher nossos filhos escolheríamos os haplótipos
MK+. De acordo com Faust, a seleção do MK+ não destruiria ou anularia os outros
meios para a educação moral, os meios tradicionais como a família, a escola ou a
religião, continuariam existindo, apenas haveria o acréscimo dos velhos métodos com o
novo para um melhor aperfeiçoamento da moralidade. Os meios antigos seriam
necessários, uma vez que não é somente o fator genético responsável pela moralidade,
mas também os fatores sócio/educacionais.

Então, nosso autor propõe algumas objeções e preocupações relevantes no que


se refere à escolha ou não de um indivíduo MK+. Podemos dizer que existem alguns
aspectos a ser analisados, como, por exemplo, a identidade, o livre arbítrio, o mérito
relacionado com o esforço e as desvantagens sociais.

Observemos então o primeiro ponto: a identidade. Nosso autor primeiro


distingue a identidade em duas: a numérica e narrativa. Resumindo em miúdos, a
Identidade numérica diz respeito a quem você é hoje e futuramente em essência, e você
se reconhece mesmo sabendo que mudou ao longo da vida. A narrativa vem sob forma
psicológica, a qual narram às diversas formas de nossas identidades. A identidade
numérica não será afetada pela FIV, já que a seleção não cria o haplótipo MK+, não
altera o processo já existente na natureza, ela apenas seleciona. Outro ponto é dizer que
um embrião não tem identidade narrativa, não sabe os contextos para se agir ou não
moral, é algo que ele vai aprender ao longo da vida, logo, não podemos alterar o que
ainda não existe. Pode-se, contudo, aprimorar a identidade narrativa, construir uma vida
mais moral. Por exemplo, se uma determinada família tem um pai chefe de um crime
organizado e que a mãe o apoia, tendo eles uma narrativa de que o crime é a ordem
certa a seguir e isso faz parte da família a anos, poderiam eles querer que seu filho
seguisse o mesmo caminho? É bem provável. É verdade que uma família assim seria
raridade, mas que pode existir, e nesse caso possivelmente eles escolheriam um
individuo MK-, pois o MK+ além de estar mais propenso a agir moralmente, poderia ter
um aprimoramento moral e quem sabe até mesmo modificar o rumo de toda a família, o
que era possível que acontecesse.

Um segundo ponto a ser analisado é a questão do livre arbítrio. Alguns


poderiam dizer que estaríamos predeterminando as ações morais de nossos filhos, e
produzindo um determinismo, o que seria inaceitável para alguns. Mas ao escolhermos
um haplótipo MK+ não estamos tirando suas capacidades de escolhas, entre o certo e o
errado, entre roubar e não roubar, cometer um crime ou não. Apenas tal criança terá
maior propensão para agir moralmente, não que ela fosse determinada a agir assim.
Embora o indivíduo MK+ tenha maior propensão a agir moral do que um MK-, não
sabemos como isso funciona no âmbito cognitivo das ações morais e do seu agir ao
analisar todos os fatores de sua decisão. Desse modo, alguns podem dizer que de
alguma maneira alteramos o percurso natural, nem que seja um pouquinho, entre o livre
arbítrio e determinismo. Pode até ser verdade, pois não há como explicar como isso
acontece ao certo, mas podemos reafirmar que o MK+ indivíduo não garante ao certo se
ele agira moralmente ou não, apenas que ele tem maior propensão a agir assim, e nesse
caso é mais fácil pensar que tal indivíduo está agindo livremente. Poderíamos pensar,
mesmo que se tivéssemos alterado algo (entre livre arbítrio e determinismo), que alguns
pais ficariam mais tranquilos e felizes por não se sentirem impotentes sobre o futuro
moral de seus filhos ao poder selecionar para a moralidade. Será? Pode ser um tanto
egoístico pensar assim, que os pais podem escolher o futuro de seus filhos, mas não
vamos entrar aqui nesse ponto ainda.

Um terceiro ponto a ser abordado é a questão do mérito relacionado ao esforço.


Esse argumento é algo que os naturalistas e bioconservadores gostam muito. Na verdade
o que esse argumento tenta dizer é que o caráter moral deve ser construído com esforço,
assim as pessoas se tornaram virtuosos, boas e dignas. Temos que lutar contra nossos
desejos impuros para realizar ações nobres, não algo de graça dado para nós. Tal
discursão filosófica já vem sendo debatida desde a antiga Grécia por Sócrates, Platão e
Aristóteles, a qual para se conseguir a virtude temos que nos esforçarmos muito. O caso
de intervenção para o aprimoramento e melhoramento moral por meios tecnológicos e
biomédicos, parecem tirar o valor da moralidade de um ser. Alguns chegariam até
mesmo falar se poderíamos brincar de Deus, interferindo na genética, mudando o que é
ser humano, pela nossa arrogância e pretensão. Onde ficaria então o respeito a moral?

É bem verdade, de maneira geral, que quando alguém age moralmente cria em
nós empatia, queremos elogiar, temos mais respeito por essas pessoas. Se um MK+ está
propenso a tomar decisões morais mais corretas, é logico então que ele receberia maior
respeito e elogios das pessoas, e poderia criar no MK- uma espécie de vergonha ou
descriminação. Porém, poderíamos também pensar ao contrário, caso um indivíduo
MK- chegasse a agir mais moralmente, ele teria muito mais motivos de ser elogiado.
Temos que analisar também que uma criança MK+ não teria nenhuma facilidade para
agir moralmente, ele teria os mesmos problemas sócias e enfrentaria os mesmos desejos
que o MK-, apenas que ele supera esses impulsos antimorais com mais frequência, não
necessariamente com maior facilidade. Também não iríamos interferir no plano de
Deus já que o haplótipo MK+ já existe, mas que se encontra em grau reduzido na
população. Não estaríamos trapaceando contra o plano do criador, mas tornando o
mundo melhor entre uma combinação dos antigos métodos de estudos para a educação
moral e um novo método que poderia agir com maior rapidez.

Em relação às desvantagens sociais podemos levantar a seguinte questão: será


que indivíduos moralmente corretos não estariam em desvantagem social com aqueles
que não são? Isso poderia ser possível, já que os indivíduos MK- procurariam levar
vantagem em cima dos indivíduos MK+, poderiam querer manipular, explorar, usar a
injustiça, tentariam até mesmo manipular a maneira de agir de um individuo
moralmente correto. Lembro-me do filme “Invenção da mentira”, o qual uma única
pessoa levava vantagem ao mentir em cima de toda uma população por serem tão
honestas e não entenderem a mentira, claro que isso é apenas uma ficção. A verdade é
que existe na sociedade uma propensão nas pessoas de negócio em tirar vantagens,
agindo imoralmente, mas nada nos diz que não poderíamos sermos competitivos nos
negócios usando táticas legais e sendo seres morais. Mesmo que isso ocorra na
sociedade, não é algo que nos agradamos ou aceitamos, pelo contrário, procuramos
mecanismos para coagir ou extinguir tais práticas, usamos métodos reguladores, leis,
multas, para acabar com as práticas ilegais.

Mesmo assim, poderíamos pensar que o MK+ estaria em desvantagem para o


MK-, mas isso não seria tão certo, pois os indivíduos MK+ procurariam identificar as
práticas ilícitas e imorais dos indivíduos MK-. Inclusive, poderia acontecer dos
indivíduos MK- serem influenciados a agirem moralmente ao conviverem diariamente
com os indivíduos MK+, criando assim uma tendência inversa ao seu estado original.

O Dr. Faust ainda enfatiza que poderíamos também pensar que se uma criança
age moralmente demais, poderiam seus colegas criar um rótulo, uma espécie de bulling,
como por exemplo, “o queridinho da mamãe” por agir sempre corretamente, e a criança
se sentir desconfortável, mas é bem verdade que todos nós por algum momento na vida
já passamos por isso nos tempos colegiais, e isso seria algo não tão forte que nos
obrigaria a não escolher o haplótipo Mk+.

Certamente se a população de MK+ aumentasse, teríamos uma sociedade mais


moral, mesmo que existissem diferenças e variações nos indivíduos MK+. Por exemplo,
a descoberta de um amigo com câncer poderia fazer com que a bondade de Patrícia
fosse superior a de Paulo, mas mesmo assim os dois teriam bondade, ao passo que o
individuo MK- não seria tão certo de isso ocorrer. Provavelmente a média moral
população seria melhor.

De acordo com nosso autor, em uma abordagem utilitarista, todas as esferas da


sociedade sairiam ganhando ao escolheres selecionar os haplótipos MK+. Acaso
aumentássemos a população de MK+ crianças, isso iria repercutir nos futuros MK+
adultos ao ponto de influenciar os demais MK-. De modo geral, tanto os diplomatas,
como políticos, os cônjuges, e toda a sociedade sairiam ganhando. Nesse caso, os
utilitaristas não só achariam aceitável selecionar o MK+ como também achariam
obrigatório. Falaremos disso depois.

Mas uma questão pode ser levantada sobre a competitividade. Por exemplo, se
todos tivessem um QI elevado, se buscaria ainda um nível de QI maior, ou se todos
tivessem altura ideal para jogar basquete, ainda assim precisaria buscar uma altura bem
maior do que a já estabelecida. Mas de acordo com Faust isso não seria problema, pois
não buscamos competitividade na moralidade, pelo contrário, gostaríamos de pessoas
que acertassem sempre nas questões morais. Mesmo assim, poderíamos pensar que uma
sociedade de MK+ poderia ser explorada ou até mesmo guerreada por uma sociedade
MK-, já que evitariam as guerras e conflitos. Como agir diante dessa situação?
Teríamos que buscar as maneiras cabíveis de defesa como já praticamente existem hoje
contra o terrorismo. Ser um MK+ não significa ser um idiota que não pode usar de
táticas de guerra caso seja necessário. Além do mais, é possivelmente razoável
pensarmos que em uma sociedade de MK+ que se defendem de seus agressores e
combate de forma justa vai acabar elevando o nível de moralidade das outras
sociedades.

Aqui gostaria de expor algo que já mencionei acima, sobre o egoísmo e a


intolerância que talvez fosse selecionar para a moralidade. Podemos realmente achar
intolerante que pais possam escolher o futuro de seus filhos por sua própria conta, já
que os mesmos não tem o direito de escolha? Será que os pais podem querer dominar a
moralidade pela ação genética? Talvez essa questão não se dê pela arrogância, talvez
pela motivação em deixar a sociedade mais justa. Ainda podemos dizer que, as formas
que a humanidade encontrou para fazer aprimoramento podem trazer alguns efeitos
negativos ou não, mas que a melhora vem ao longo do tempo, como nos casos das
doenças que às vezes tem efeitos colaterais, mas com um longo processo isso é
resolvido. Poderíamos pesar o haplótipo MK+ como um tratamento para a imoralidade.
Ainda falarei sobre isso no final desse artigo.

Mas será que tal tratamento estaria disponível a todas as classes sociais? Será
que todos poderiam ter acesso a seleção do haplótipo MK+? Hoje em dia qualquer tipo
fertilização in vitro é bastante cara para a maioria da população. Nesse caso isso seria
um privilegio de poucos. Nesse ponto o Dr. Faust entre em uma questão hilária, pois os
poucos que podem pagar (os ricos) enfrentariam a sua própria falta de estímulo para
isso, pois com o aumento de MK+s aumentaria também a justiça, a honra e
possivelmente diminuiriam as desvantagens sociais, então, que lucro teriam os ricos
sobre isso? Os ricos querem se tornar mais ricos não menos ricos. Nosso autor,
entretanto diz que a população de MK+s não se daria do dia para noite, mas seria algo
gradativo, regulado. Os filhos MK+ se tornariam adultos, e esses por sua vez poderiam
influenciar as novas gerações a respeito de fraldes e de uma melhor distribuição da
renda para todos, fazendo com que o preço também da fertilização fosse favorável aos
menos ricos.
Faust ainda coloca duas questões a serem abordadas. A primeira questão é se
em vez de um único haplótipo para as virtudes morais, existissem diferentes haplótipos
para as diferentes virtudes morais, como a justiça, amizade, carinho, verdade, etc. Ora,
isso criaria um problema para a escolha dos haplótipos corretos, pois, quais virtude
iríamos querer para nossos filhos? Que eles tivessem carinho, mas não fossem justos,
que tivesse justiça, mas não fossem atenciosos? Qual seria a combinação perfeita? Faust
aborda duas visões diferentes para esse caso, uma do professor Michael Parker e a outra
do professor Julian Savulescau ambos da universidade de Oxford na Inglaterra.

Parker da uma visão mais moderada, para ele a escolha de tais características
embrionárias seria algo muito complexo, não teríamos capacidade de escolhermos todas
as características para uma boa vida2 da futura criança, muito mais sobre os aspectos
políticos, econômicos, e sócias que estariam por vim e que dependendo de nossas
escolhas poderia afetar de maneira decisiva toda a sua vida. Já o Dr. Savulescau é mais
otimista, e diz que os pais já fazem escolhas para os filhos de outra maneira, mas
sempre buscando o melhor para eles independendo da complexibilidade da situações.
Saber se futuramente alguém terá ou não uma vida ruim é um dado probabilístico um
tanto improvável, como também algo muito pessoal. Uma pessoa muito talentosa e
cheia de virtudes pode ter uma vida ruim3, exclama Savulescau. Também argumenta
que não se pode saber ao certo o que seria uma vida boa ou a melhor para cada pessoa,
por exemplo, se Paulo descobre que tem câncer e morre uma morte lenta e dolorosa e
João de ataque cardíaco, qual vida entre a deles foi melhor? É muito difícil saber qual
teve a melhor vida, mesmo que soubéssemos todos os detalhes da vida de ambos. Outro
argumento seria dizer que “A” é melhor que “B”, mas ambos são melhores que “C”,
logo é preferível escolher entre as virtudes “A” e “B” do que a “C”, ou mesmo a não
preferir valor moral nenhum, ou seja, em outras palavras seria justo que pais tivessem a
liberdade de escolha para o que seria melhor para suas crianças.

A outra questão abordada é sobre a saúde. Embora no pensamento original


levantado por Faust não haja complicações para a saúde, ele mesmo hipotetiza que
possa haver efeitos negativos. O exemplo citado por nosso autor é que poderia haver
uma diminuição dos anos de vida devido à escolha do haplótipo MK+ em relação ao
DNA dos mesmos. OU seja, o MK+ individuo viveria 5 anos a menos que o MK-.
Mesmo que isso fosse em tese uma escolha difícil a ser tomada, precisaríamos pensar

2
Parker, Michael. 2007. The best possible child. Journal of Medical Ethics.
3
Savulescu, Julian. 2007. In defence of procreative beneficence. Journal of Medical Ethics.
bem na melhoria de toda a sociedade que ganharia com menos guerras e índices geral de
violência e moralidade.

Sendo assim, Halley Faust chega à conclusão que mesmo que a moralidade não
fosse em suma apenas uma questão genética, mas que também é influenciada por fatores
sócios- culturais, educacionais, etc. haveria um ganho incomensurável em toda a
sociedade na seleção de embriões MK+. Eliminando as consequências de saúde, livre
arbítrio, entre outros, por que não optar pelo aprimoramento genético como algo
necessário a sociedade? Ou melhor, se isso realmente trará uma recompensa enorme na
questão moral por que não ser obrigatório? Já que em todos os sistemas morais, sejam
eles filosóficos, religiosos, secular, buscam um melhor comportamento virtuoso.

As questões levantadas por nosso autor merecem sem dúvida alguma nossa
atenção, até porque, essas questões relacionadas à engenharia genética para o
aperfeiçoamento humano está apenas no início, como também as discursões sobre elas.
No entanto, gostaria de frisar alguns pontos que não posso concordar efetivamente com
ele. Uma que já citei é o ponto de que poderíamos realmente ser muito pretenciosos e
egoístas a levantar uma questão e ter uma teoria tão certa para o bem de toda a
humanidade. Como por uma maneira probabilística poderemos saber ao certo o futuro
da sociedade? E como poderíamos ter a arrogância em dizer que ela é obrigatória? Acho
que qualquer que seja a obrigatoriedade de um modelo de pensamento, já está no
encalço antiético. O futuro é como uma caixa de mágicos em que ficamos esperando
que saia sempre um coelho da cartola, mas que pode sair uma arma letal. Ao longo dos
anos a humanidade criou centenas de milhares de coisas para seu aperfeiçoamento, mas
que na verdade serviram também para a destruição da mesma. Talvez olhando
generosamente, podemos imaginar uma possível melhora no pensamento analisado por
Faust em relação ao aprimoramento genético de haplótipos MK+, mas seria apenas
olhar pelo buraco da fechadura sem ver toda a cena ao redor.

Finalizando, não sabemos ao certo o que modificaria ou poderia acontecer em


uma sociedade voltada totalmente para a moralidade, supondo que todos fossem morais,
e vivendo um “céu” na terra, há possibilidade, inclusive, de sermos causadores de uma
estrutura de imoralidade pior caso viesse a dar errado, pois não creio como nosso autor
que não exista uma competitividade moral, e se existe, poderíamos sermos os criadores
de uma espécie de queda de Lúcifer caído do céu, os quais seus seguidores seriam
pessoas capazes cada vez mais de identificar a moralidade e assim criar subterfúgios
para ela.

Não quero com isso ser negativista, mas se existe um número X de MK+ na
sociedade e que se encontra apenas em 10% da população, mudar tal estrutura parece
algo arriscado e que devemos no mínimo estudar todas as possibilidades para o erro ou
o acerto dos nossos atos. Não que a ordem natural esteja certa, mas saber se a ordem
desejada possa estar correta. O futuro é algo sempre incerto, mesmo aqueles que têm a
maior probabilidade de acertos. Pensar em um tratamento para a moralidade é sempre
bom, mas saber se esse é o correto é melhor ainda.

Referencias biográficas:

FAUST, Halley S. Should we select for genetic moral enhancement? A thought


experiment using the MoralKinder (MK+) haplotype. Published online: 9 January
2009. Springer Science+Business Media B.V. 2009

Projeto genoma. Acesso em 09/05/12. Disponível em:


http://pt.wikipedia.org/wiki/Projeto_Genoma_Humano

Preimplantation genetic diagnosis. Acesso em 11/05/12. Disponível em:


http://en.wikipedia.org/wiki/Preimplantation_genetic_diagnosis.

MASSUCHETTO, Vinicius. Transgênicos causam mal à saúde? Acesso em 9/05/12.


Disponível em: http://vinicius.soylocoporti.org.br/transgenicos-causam-mal-a-saude/

SAVULESCU, J. In Defence of Procreative Beneficence. Journal of Medical Ethics,


v. 33, 2007, p. 284-288. Acesso em 09/05/12. Disponível em:
http://www.ncbi.nlm.nih.gov/pmc/articles/PMC2598126/

SAVULESCU, J; KAHANE, Guy. The moral obligation to create children with the
best of the best life. Bioethics ISSN 0269-9702 (print); 1467-8519 (online)
doi:10.1111/j.1467-8519.2008.00687.x Volume 23 Number 5 2009 pp 274–290. Acesso
em 10/05/12. Disponível em: http://faculty.smu.edu/jkazez/PAP/savulescu-kahane.pdf

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