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NATAL
Maio 2012
O aprimoramento moral genético
Alias, é exatamente nesse ponto referente à moralidade, que quero dar ênfase
aqui, a questão do aperfeiçoamento moral. Destaco então o artigo1 do Dr. Halley S.
Faust, que vai além do que está acontecendo atualmente, mas sugere a hipótese de que
se poderíamos ou não usar o aprimoramento genético para a moral. Em uma hipótese
teórica o Dr. Faust coloca a questão se futuros pais poderiam por um processo de
diagnostico de pré-implantação selecionar embriões para a fertilização in vitro (IVF), de
um haplótipo (teórico) Moral Kinder (MK+) que tem a predisposição de um nível de
moralidade maior que a média dos outros indivíduos (MK-). Então ele nos faz uma
pergunta: seria lícito ou seria obrigatório selecionar para um MK+ haplótipo? Ou seja,
é moral selecionar para a moralidade? Tentarei fazer um breve resumo das questões
levantadas por Faust nesse artigo, como também mostrarei minha opinião sobre o
mesmo.
Faust coloca em seu texto que procuramos educar nossos filhos com sabedoria
moral, agindo virtuosamente para ser um ser humano melhor, integro e decente. Por
meio da educação escolar, religião ou mesmo os ensinamentos dos próprios pais e
familiares, ditamos o caráter moral de nossas crianças e jovens para que se tornem
adultos capazes de exercer as regras de conduta moral, e quando não agem assim os
repreendemos e até mesmo castigamos. Todas as sociedades tentam coagir os sistemas
antimorais, para terem menos problemas relacionados a furtos, crimes, desobediência a
leis, etc. O que nosso escritor propõe de antemão é se poderíamos fazer isso de uma
maneira um pouco mais simples por meio do haplótipo MK+, em outras palavras, não
seria mais fácil já que todos querem uma sociedade mais justa e moral escolher nossos
filhos por uma pré-implantação do MK+? Ou melhor, talvez ela não seja apenas
desejável, mas talvez obrigatória.
É bem verdade, de maneira geral, que quando alguém age moralmente cria em
nós empatia, queremos elogiar, temos mais respeito por essas pessoas. Se um MK+ está
propenso a tomar decisões morais mais corretas, é logico então que ele receberia maior
respeito e elogios das pessoas, e poderia criar no MK- uma espécie de vergonha ou
descriminação. Porém, poderíamos também pensar ao contrário, caso um indivíduo
MK- chegasse a agir mais moralmente, ele teria muito mais motivos de ser elogiado.
Temos que analisar também que uma criança MK+ não teria nenhuma facilidade para
agir moralmente, ele teria os mesmos problemas sócias e enfrentaria os mesmos desejos
que o MK-, apenas que ele supera esses impulsos antimorais com mais frequência, não
necessariamente com maior facilidade. Também não iríamos interferir no plano de
Deus já que o haplótipo MK+ já existe, mas que se encontra em grau reduzido na
população. Não estaríamos trapaceando contra o plano do criador, mas tornando o
mundo melhor entre uma combinação dos antigos métodos de estudos para a educação
moral e um novo método que poderia agir com maior rapidez.
O Dr. Faust ainda enfatiza que poderíamos também pensar que se uma criança
age moralmente demais, poderiam seus colegas criar um rótulo, uma espécie de bulling,
como por exemplo, “o queridinho da mamãe” por agir sempre corretamente, e a criança
se sentir desconfortável, mas é bem verdade que todos nós por algum momento na vida
já passamos por isso nos tempos colegiais, e isso seria algo não tão forte que nos
obrigaria a não escolher o haplótipo Mk+.
Mas uma questão pode ser levantada sobre a competitividade. Por exemplo, se
todos tivessem um QI elevado, se buscaria ainda um nível de QI maior, ou se todos
tivessem altura ideal para jogar basquete, ainda assim precisaria buscar uma altura bem
maior do que a já estabelecida. Mas de acordo com Faust isso não seria problema, pois
não buscamos competitividade na moralidade, pelo contrário, gostaríamos de pessoas
que acertassem sempre nas questões morais. Mesmo assim, poderíamos pensar que uma
sociedade de MK+ poderia ser explorada ou até mesmo guerreada por uma sociedade
MK-, já que evitariam as guerras e conflitos. Como agir diante dessa situação?
Teríamos que buscar as maneiras cabíveis de defesa como já praticamente existem hoje
contra o terrorismo. Ser um MK+ não significa ser um idiota que não pode usar de
táticas de guerra caso seja necessário. Além do mais, é possivelmente razoável
pensarmos que em uma sociedade de MK+ que se defendem de seus agressores e
combate de forma justa vai acabar elevando o nível de moralidade das outras
sociedades.
Mas será que tal tratamento estaria disponível a todas as classes sociais? Será
que todos poderiam ter acesso a seleção do haplótipo MK+? Hoje em dia qualquer tipo
fertilização in vitro é bastante cara para a maioria da população. Nesse caso isso seria
um privilegio de poucos. Nesse ponto o Dr. Faust entre em uma questão hilária, pois os
poucos que podem pagar (os ricos) enfrentariam a sua própria falta de estímulo para
isso, pois com o aumento de MK+s aumentaria também a justiça, a honra e
possivelmente diminuiriam as desvantagens sociais, então, que lucro teriam os ricos
sobre isso? Os ricos querem se tornar mais ricos não menos ricos. Nosso autor,
entretanto diz que a população de MK+s não se daria do dia para noite, mas seria algo
gradativo, regulado. Os filhos MK+ se tornariam adultos, e esses por sua vez poderiam
influenciar as novas gerações a respeito de fraldes e de uma melhor distribuição da
renda para todos, fazendo com que o preço também da fertilização fosse favorável aos
menos ricos.
Faust ainda coloca duas questões a serem abordadas. A primeira questão é se
em vez de um único haplótipo para as virtudes morais, existissem diferentes haplótipos
para as diferentes virtudes morais, como a justiça, amizade, carinho, verdade, etc. Ora,
isso criaria um problema para a escolha dos haplótipos corretos, pois, quais virtude
iríamos querer para nossos filhos? Que eles tivessem carinho, mas não fossem justos,
que tivesse justiça, mas não fossem atenciosos? Qual seria a combinação perfeita? Faust
aborda duas visões diferentes para esse caso, uma do professor Michael Parker e a outra
do professor Julian Savulescau ambos da universidade de Oxford na Inglaterra.
Parker da uma visão mais moderada, para ele a escolha de tais características
embrionárias seria algo muito complexo, não teríamos capacidade de escolhermos todas
as características para uma boa vida2 da futura criança, muito mais sobre os aspectos
políticos, econômicos, e sócias que estariam por vim e que dependendo de nossas
escolhas poderia afetar de maneira decisiva toda a sua vida. Já o Dr. Savulescau é mais
otimista, e diz que os pais já fazem escolhas para os filhos de outra maneira, mas
sempre buscando o melhor para eles independendo da complexibilidade da situações.
Saber se futuramente alguém terá ou não uma vida ruim é um dado probabilístico um
tanto improvável, como também algo muito pessoal. Uma pessoa muito talentosa e
cheia de virtudes pode ter uma vida ruim3, exclama Savulescau. Também argumenta
que não se pode saber ao certo o que seria uma vida boa ou a melhor para cada pessoa,
por exemplo, se Paulo descobre que tem câncer e morre uma morte lenta e dolorosa e
João de ataque cardíaco, qual vida entre a deles foi melhor? É muito difícil saber qual
teve a melhor vida, mesmo que soubéssemos todos os detalhes da vida de ambos. Outro
argumento seria dizer que “A” é melhor que “B”, mas ambos são melhores que “C”,
logo é preferível escolher entre as virtudes “A” e “B” do que a “C”, ou mesmo a não
preferir valor moral nenhum, ou seja, em outras palavras seria justo que pais tivessem a
liberdade de escolha para o que seria melhor para suas crianças.
2
Parker, Michael. 2007. The best possible child. Journal of Medical Ethics.
3
Savulescu, Julian. 2007. In defence of procreative beneficence. Journal of Medical Ethics.
bem na melhoria de toda a sociedade que ganharia com menos guerras e índices geral de
violência e moralidade.
Sendo assim, Halley Faust chega à conclusão que mesmo que a moralidade não
fosse em suma apenas uma questão genética, mas que também é influenciada por fatores
sócios- culturais, educacionais, etc. haveria um ganho incomensurável em toda a
sociedade na seleção de embriões MK+. Eliminando as consequências de saúde, livre
arbítrio, entre outros, por que não optar pelo aprimoramento genético como algo
necessário a sociedade? Ou melhor, se isso realmente trará uma recompensa enorme na
questão moral por que não ser obrigatório? Já que em todos os sistemas morais, sejam
eles filosóficos, religiosos, secular, buscam um melhor comportamento virtuoso.
As questões levantadas por nosso autor merecem sem dúvida alguma nossa
atenção, até porque, essas questões relacionadas à engenharia genética para o
aperfeiçoamento humano está apenas no início, como também as discursões sobre elas.
No entanto, gostaria de frisar alguns pontos que não posso concordar efetivamente com
ele. Uma que já citei é o ponto de que poderíamos realmente ser muito pretenciosos e
egoístas a levantar uma questão e ter uma teoria tão certa para o bem de toda a
humanidade. Como por uma maneira probabilística poderemos saber ao certo o futuro
da sociedade? E como poderíamos ter a arrogância em dizer que ela é obrigatória? Acho
que qualquer que seja a obrigatoriedade de um modelo de pensamento, já está no
encalço antiético. O futuro é como uma caixa de mágicos em que ficamos esperando
que saia sempre um coelho da cartola, mas que pode sair uma arma letal. Ao longo dos
anos a humanidade criou centenas de milhares de coisas para seu aperfeiçoamento, mas
que na verdade serviram também para a destruição da mesma. Talvez olhando
generosamente, podemos imaginar uma possível melhora no pensamento analisado por
Faust em relação ao aprimoramento genético de haplótipos MK+, mas seria apenas
olhar pelo buraco da fechadura sem ver toda a cena ao redor.
Não quero com isso ser negativista, mas se existe um número X de MK+ na
sociedade e que se encontra apenas em 10% da população, mudar tal estrutura parece
algo arriscado e que devemos no mínimo estudar todas as possibilidades para o erro ou
o acerto dos nossos atos. Não que a ordem natural esteja certa, mas saber se a ordem
desejada possa estar correta. O futuro é algo sempre incerto, mesmo aqueles que têm a
maior probabilidade de acertos. Pensar em um tratamento para a moralidade é sempre
bom, mas saber se esse é o correto é melhor ainda.
Referencias biográficas:
SAVULESCU, J; KAHANE, Guy. The moral obligation to create children with the
best of the best life. Bioethics ISSN 0269-9702 (print); 1467-8519 (online)
doi:10.1111/j.1467-8519.2008.00687.x Volume 23 Number 5 2009 pp 274–290. Acesso
em 10/05/12. Disponível em: http://faculty.smu.edu/jkazez/PAP/savulescu-kahane.pdf