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CARDIOPATIAS CONGÊNITAS

CARDIOLOGIA PEDIÁTRICA

Cardiopatia congênita é qualquer anormalidade


na estrutura ou função do coração e dos
grandes vasos da base que surge nas primeiras
oito semanas de gestação quando se forma o
coração do bebê. Enquanto na maior parte dos
adultos as cardiopatias têm origem isquêmica,
em crianças as desordens cardíacas são em sua
maioria de origem congênita. A cardiopatia
congênita pode se dizer como uma doença da
neonatologia pois dentre aqueles que são
internados no primeiro ano de vida (maioria
dentro dos números de casos), grande parte
dos casos ocorrem no primeiro mês de vida (50
a 60%) e, dentro do primeiro mês, ocorrem na
primeira semana (40 a 50%). Porém, vale
ressaltar que o reconhecimento da doença
pode ser feito em qualquer fase da vida, tanto
no período fetal como no paciente adulto, como
acontece com os diagnósticos de comunicação interatrial em alguns casos. As principais cardiopatias
congênitas estão descritas na tabela ao lado.

Isto posto, devemos, então, relembrar a formação embriológica do coração fisiologicamente normal, já
que essas condições recaem principalmente para anomalias anatômicas:

Embriogênese do coração: Na terceira semana do desenvolvimento humano se inicia a formação do


sistema cardiovascular. O desenvolvimento precoce desse sistema está relacionado com o rápido
desenvolvimento do embrião e a necessidade da chegada de oxigênio e nutrientes para o embrião. A
partir de células mesenquimais da área cardiogênica se desenvolve o coração e os vasos. O primórdio do
coração são os cordões angioblásticos laterais que canalizados formam os tubos endocárdicos cardíacos.
Conforme acontece o dobramento no plano horizontal, os tubos cardíacos endocárdicos (também
chamados de braços do primeiro campo cardíaco) se aproximam e se fundem dando origem à um único
tubo cardíaco endocárdico (chamado de tubo cardíaco primário). O coração tubular começa a bater por
volta do vigésimo primeiro dia. Ao longo do desenvolvimento, esse tubo cardíaco endocárdico passa
por uma série de dobramentos e transformações até obter sua forma final. O sistema cardiovascular é o
primeiro sistema de órgãos a alcançar um estado funcional.

É válido citar que o tubo cardíaco possui constrições e dilatações que são os primórdios das câmaras que
se reconhecem no coração adulto. De cranial para caudal, são elas: tronco arterioso, bulbo cardíaco,
ventrículo primitivo, átrio primitivo e o seio venoso. Porém, o crescimento rápido do bulbo cardíaco não
é acompanhado pela cavidade pericárdica, o que provoca o dobramento do tubo cardíaco entre o átrio
e o ventrículo primitivo em uma curva em S. A câmara ventricular única se dobra para baixo e para a
direita, e o átrio e o seio venoso se dobram para cima, posteriormente para a esquerda, formando assim
as posições definitivas das futuras câmaras do coração. As quatro câmaras do coração (dois átrios e
dois ventrículos) são formadas pela septação interna. O início da septação se dá com a formação dos
coxins endocárdicos nas paredes ventrais e dorsais do canal atrioventricular. Eles se fusionam e divide o
canal AV em canais AV direito e esquerdo.
Separando o átrio do ventrículo,
primordialmente.

No final da 4ª semana ocorre a septação do


átrio primitivo, dividindo-o em átrio direito e
átrio esquerdo. Essa septação se inicia com a
formação do septum primum, uma fina
membrana em forma de meia-lua começa a
surgir a partir do teto do átrio em direção aos
coxins endocárdicos em fusão. Esse processo
dá origem ao forâmen primum. Antes da
obliteração total do forâmen primum,
perfurações no septum primum aparecem,
resultantes de apoptoses, representando o
forâmen secundum. Inicia-se a formação do septum secundum e a degeneração cranial do septum
primum. Como a formação do septum secundum é incompleta ocorre a formação do forame oval.
Assim, o septum secundum divide incompletamente o átrio e a parte distal do septum primum funciona
como uma válvula (válvula do forame oval). Logo após o nascimento, quando a pressão do átrio
esquerdo excede a pressão do átrio direito, os dois septos são empurrados juntos e se fundem,
formando a fossa oval, que é um vestígio(remanescente) do forame oval (fusão anatômica depois de 1
ano)

Enquanto o septo interatrial está se formando, há formação também do septo interventricular


muscular, que junto com o septo membranoso irão dividir o ventriculo primitivo em duas câmaras. O
septo interventricular muscular é formado a partir de uma crista muscular mediana no assoalho do
ventrículo próximo ao seu ápice que cresce em direção ao coxin. Na sua formação há um espaço entre a
margem livre do septo interventricular e os coxins endocárdicos denominado de forame
interventricular, que se fecha ao final da sétima semana de gestação. A porção membranosa resulta da
fusão de tecidos de três fontes (crista bulbar direita, crista bulbar esquerda e o coxim endocárdico),
sendo que esse tecido se une ao septo aorticopulmonar e à porção muscular espessa do septo
interventricular

Durante a 5ª semana de desenvolvimento a proliferação de células mesenquimais nas paredes do bulbo


cardíaco resulta na formação das cristas bulbares. No tronco arterial, de forma semelhante, ocorre a
formação das cristas do tronco. Esses dois conjuntos de cristas sofrem espiralização de 180° resultando
na formação do septo aorticopulmonar. Esse septo divide o bulbo cardíaco e o tronco arterial em dois
canais: a aorta e o tronco pulmonar. O bulbo cardíaco é incorporado às paredes dos ventrículos
definitivos. No ventrículo direito é representado pelo cone arterial (infundíbulo) e no ventrículo
esquerdo ele forma as paredes do vestíbulo aórtico, porção do ventrículo logo abaixo da válvula aórtica

Fisiopatologia: A maior parte dos defeitos congênitos é bem tolerada durante a vida neonatal devido à
natureza em paralelo da circulação fetal. É após o nascimento, quando se fecham funcionalmente o
canal arterial e o forame oval, que as alterações hemodinâmicas significativas decorrentes de
anormalidades anatômicas aparecem. De um modo geral, as cardiopatias congênitas são classificadas
em função de apresentarem ou não cianose. Devemos ter em mente que os shunts direita-esquerda em
geral se manifestam como cianose; e os shunts esquerda-direita, como insuficiência cardíaca.
 Cardiopatias acianóticas: a oxigenação pulmonar do sangue proveniente de VD está preservada e, por
isso, não há cianose. Sua fisiopatologia pode ser compreendida através de dois mecanismos, com
manifestações clínicas próprias:

 Lesões que cursam com sobrecarga de volume: O denominador comum destas lesões é a comunicação
entre o sangue de VD e de VE, levando a uma sobrecarga de volume intracavitária. O shunt esquerda-
direita será mais intenso quanto mais extenso for o tamanho do gap entre as câmaras cardíacas e
quanto menor for a resistência do leito pulmonar. Logo após o nascimento, a resistência vascular
pulmonar ainda se mantém elevada, limitando parcialmente a mistura de sangue entre as cavidades.
Entretanto, semanas após o nascimento, com a progressiva dilatação dos vasos intrapulmonares, a
resistência local cai, aumentando o fluxo pelo defeito septal. Com isso, o volume de sangue que chega
ao pulmão aumenta e mais fluido extravasa do leito capilar, preenchendo os alvéolos e interstício num
processo de edema pulmonar. A complacência do parênquima diminui, sendo necessário o aumento
do trabalho respiratório. Surgem a taquipneia e a dispneia com aumento do esforço respiratório
traduzido clinicamente por batimento de aletas nasais, retrações intercostais, subcostais e de fúrcula.
O aumento da pré-carga também determina um aumento do trabalho cardíaco, com elevação do tono
simpático e taquicardia. Este aumento do gasto metabólico e do consumo de oxigênio provocado pelo
aumento das catecolaminas circulantes produz insuficiente ganho de peso, estatura, aumento da
sudorese e irritabilidade. No início, existe uma remodelação cardíaca com tendência à dilatação das
câmaras cardíacas. Com o passar dos anos, a contínua sobrecarga de pressão e fluxo sobre o leito
pulmonar induz paulatinamente ao desenvolvimento de uma hipertensão pulmonar secundária, um
processo fisiopatológico conhecido como síndrome de Eisenmenger. Nesse grupo de patologias estão
inclusos: Defeito de Septo Atrioventricular (DSAV), Comunicação Interatrial (CIA), Interventricular (CIV)
e Canal Arterial Patente (PCA).

 Lesões que cursam com sobrecarga de pressão: No segundo grupo (sobrecarga de pressão)
encontramos as lesões que obstruem o fluxo de saída ventricular direito ou esquerdo: estenose de
valva pulmonar, estenose de valva aórtica e coarctação de aorta. Neste modelo fisiopatológico,
quando a obstrução é leve a moderada, o débito de VD e VE é mantido à custa de hipertrofia muscular
em estágios iniciais e dilatação de câmaras subsequente com pouca ou nenhuma manifestação nas
fases iniciais da vida. Por outro lado, se a obstrução ao fluxo é grave, já no período neonatal imediato
serão observados os primeiros sintomas/sinais. Na estenose pulmonar grave, instala-se um quadro de
falência de VD bastante precoce, com hepatomegalia, edema periférico e cianose (por desvio do
sangue de AD para AE através do forame oval patente). Na estenose aórtica grave, ocorre uma falência
de VE, com edema pulmonar (por congestão retrógrada), sintomas de baixo débito cardíaco com
hipoperfusão de órgãos nobres como cérebro e rins e falência de VD (hepatomegalia e edema
periférico). Na coarctação grave de aorta, o fluxo sistêmico é mantido através da patência do ducto
arterioso, que permite o desvio de fluxo sanguíneo da artéria pulmonar para a aorta distal, by-
passando a estenose. Quando, o ducto tende ao fechamento, sinais e sintomas graves começam a
aparecer

 Cardiopatias Cianóticas: o principal achado semiológico é a cianose, provocada pela dessaturação do


sangue arterial. Também podemos compreendê-la sob a ótica de dois modelos patológicos:

 Lesões que cursam com hiperfluxo pulmonar: A principal cardiopatia congênita com hiperfluxo
pulmonar é a transposição de grandes vasos, caracterizada pela saída da aorta a partir de VD e a saída
do tronco da pulmonar de VE. A sobrevivência desta grave cardiopatia é dependente da presença de
outras comunicações que permitam a mistura do sangue direito (sistêmico) e esquerdo (pulmonar),
como a persistência do forame oval aberto e o canal arterial patente. A consequência desta mistura de
sangue é a cianose
 Lesões que cursam com hipofluxo pulmonar: As lesões cianóticas com hipofluxo pulmonar são aquelas
que levam a uma obstrução ao trato de saída de VD: tetralogia de Fallot (estenose infundibular, CIV,
dextroposição da aorta e hipertrofia de VD), atresia tricúspide e estenose pulmonar. Com isso, o fluxo
pulmonar fica restrito, e menor volume de sangue poderá ser oxigenado, resultando em cianose. É a
presença de alguma comunicação esquerda-direita que minimiza a cianose, como CIA, CIV ou
persistência de canal arterial

1) Comunicação Interatrial (CIA)

O septo interatrial é constituído por duas membranas que, por mecanismo valvular, permitem a
passagem do sangue. O septo primum é fibroso e delgado, localizado inferiormente e pelo lado do átrio
esquerdo, enquanto o septo secundum é mais rijo e musculoso, situado superiormente e mais próximo
ao átrio direito. Logo após o nascimento, a resistência pulmonar cai, a pressão no átrio direito diminui e
cessa o shunt direita-esquerda pelo forame oval. Assim, ocorre o fechamento “funcional” da
comunicação interatrial. O fechamento anatômico acontecerá até o primeiro ano de vida. Os defeitos no
desenvolvimento destas estruturas serão chamados Comunicação Interatrial. A associação com outras
malformações cardíacas é relativamente comum. Existe um predomínio no sexo feminino de 2:1 . Essa
comunicação pode ser classificada em quatro tipos anatômicos:

 CIA ostium secundum (OS): é o defeito mais comum e ocorre na região da fossa oval, sendo, por isso,
também conhecida como CIA tipo fossa oval;
 CIA ostium primum (OP): existe uma passagem abaixo da borda livre do septum primum, que será
interrompida se este septo atingir
os coxins endocárdicos e com eles
fundir-se. Esta passagem persiste
caso isto não suceda. Ao
desenvolver-se o septum
secundum, este também não se
funde com os coxins, pois sabemos
que ele só cresce onde existe
implantação do septum primum. A
passagem entre as câmaras
persistirá próxima do assoalho dos
átrios. Esse defeito decorre frequentemente da anormalidade dos coxins atrioventriculares, que não
oferecem condições para o ancoramento dos septos atriais. Por esse motivo, essa comunicação é
associada a outras anomalias decorrentes de defeitos dos coxins, como a fissura do folheto septal da
valva mitral
 CIA seio venoso (SV): está localizada junto à desembocadura da veia cava superior e, em geral, está
associada à drenagem anômala parcial de veias pulmonares direitas;
 CIA seio coronário (SC): é um defeito raro, decorrente da presença de orifício no teto do seio coronário,
permitindo passagem do átrio esquerdo para o átrio direito através do óstio do seio coronário.

a) Fisiopatologia: A magnitude do shunt esquerdo-direito através do defeito do septo atrial depende do


tamanho desse defeito, da complacência relativa dos ventrículos e da resistência relativa nas
circulações pulmonar e sistêmica. Durante a vida fetal, a CIA permite um shunt direito esquerdo. Logo
após nascimento, o fluxo sanguíneo esquerda-direita é ainda limitado pela alta resistência vascular
pulmonar, baixa resistência vascular sistêmica e pela reduzida complacência do ventrículo direito do
recém-nascido. Pode-se dizer que o VD no RN e no lactente jovem oferece maior resistência ao seu
enchimento diastólico, uma vez que suas paredes são mais musculares e menos complacentes. Com o
tempo a resistência vascular pulmonar diminui e a complacência ventricular direita aumenta e, então, a
CIA permite o shunt da esquerda para direita (sem turbilhonamento, ou seja, sem sopro identificável-
Fluxo Laminar).

Por causa da passagem do sangue da esquerda para a direita pela CIA, há hiperfluxo pulmonar e retorno
de sangue aumentado para o átrio esquerdo. O shunt ocorre predominantemente no final da sístole
ventricular e início da diástole (principalmente) com as valvas atrioventriculares abertas, com algum
aumento durante a contração atrial. Com o volume aumentado nas cavidades direitas, há dilatação do
átrio e do ventrículo direito e da artéria pulmonar, e um prolongamento no tempo de esvaziamento do
ventrículo direito, denotado clinicamente pelo desdobramento fixo da 2a bulha, que é o atraso no
fechamento da valva pulmonar e também sopro no foco pulmonar (estenose relativa da valva
pulmonar-se for pelo menos moderada) e tricúspide. Se não houver correção da CIA, o paciente pode
desenvolver, em idade adulta, insuficiência cardíaca, arritmia e hipertensão pulmonar.

b) Quadro Clínico: Os pacientes com defeito do septo interatrial geralmente são assintomáticos no início
da vida, embora existam relatos ocasionais de insuficiência cardíaca congestiva (<5%) e pneumonia
recorrente nos primeiros anos de vida. As crianças com defeito no septo atrial podem sentir fadiga
facilmente e dispnéia ao exercício. Tendem a ser fisicamente hipodesenvolvidas e propensas à infecção
respiratória. Ao contrário das manifestações que ocorrem nos adultos, as arritmias atriais, a hipertensão
arterial pulmonar, o desenvolvimento de obstrução vascular pulmonar e insuficiência cardíaca são
extremamente incomuns na faixa pediátrica. Neste grupo, o diagnóstico freqüentemente é suspeitado
após detecção de um sopro cardíaco ao exame de rotina, exigindo uma avaliação cardíaca mais completa.
Alguns sinais do exame físico que sugerem investigação são:

 Abaulamento e pulsações precordiais: em conseqüência da dilatação das câmaras direitas e também


pulsações palpáveis da artéria pulmonar no segundo espaço intercostal esquerdo
 Sopro sistólico em focos pulmonar e tricúspide
 Sopro diastólico em foco tricúspide se a CIA for de grande magnitude
 B2 hiperfonética e desdobrada

c) Diagnóstico:

 Sinais Radiológicos:

 Variam com a magnitude do shunt


 Aumento do átrio e ventrículo direito
 Aumento da trama vascular, tronco pulmonar abaulado e convexo a esquerda com marcada
dilatação do ramo direito

 Ecocardiograma:

 Tamanho e posição da CIA


 Aumento do AD e VD
 Quantificação entre o fluxo pulmonar (QP) e o fluxo sistêmico (QS) avaliando a repercussão
hemodinâmica da CIA

 Eletrocardiograma:

 Ritmo sinusal com onda P morfologicamente normal (maioria do paciente)


 QRS aumentado configurando bloqueio incompleto do ramo direito (demora do VD em despolarizar
em relação ao VE)
 Padrão RSR em V1 (CIA pequena), com crescimento do R conforme aumento do shunt com aspecto
de letra M

d) Conduta: O tratamento paliativo é reservado para as situações onde há presença de grande hiperfluxo
pulmonar, com importante repercussão clínica e indicação cirúrgica iminente, porém, com condições
clínicas extremamente desfavoráveis, como, por exemplo, na vigência de um quadro infeccioso agudo ou
desnutrição protéico-calórica de grau avançado. Nessas situações, dá-se preferência pela realização de
bandagem do tronco pulmonar, com redução do fluxo pulmonar num primeiro estágio e, após atingir a
melhora, procede-se à correção definitiva do defeito.

A cirurgia deve ser realizada de preferência entre dois e quatro anos de idade em pacientes com DSA não
complicados, em que existe evidência de shunt esquerdo-direito, isto é, com razão de fluxo pulmonar-
sistêmico excedendo aproximadamente 1,5:1,0. Os pacientes com DSA podem apresentar fechamento
espontâneo (Somente a CIA OS se fecha espontaneamente dependendo do tamanho) e podem ser
seguidos mais conservadoramente até uma idade posterior antes que se indique uma cirurgia. A cirurgia
não deve ser realizada em pacientes com defeitos pequenos e shunts triviais da esquerda para direita
(razão de fluxo pulmonar-sistêmico menor ou igual a 1,5:1,0) ou naqueles com doença vascular pulmonar
grave (razão de resistência pulmonar-sistêmica maior ou igual a 0,7:1,0), sem shunt da esquerda para
direita significativo. A cirurgia também está contra-indicada para pacientes que apresentam estenose
mitral grave ou hipoplasia do ventrículo esquerdo

Obs: até 2mm- CIA mínima/2-4mm discreta/5-7mm moderada/ acima de 7 importante

2) Comunicação Interventricular (CIV): A Comunicação Interventricular (CIV) é a cardiopatia congênita


mais frequente, sendo responsável por 25-30% dos casos. As CIV de grande tamanho geralmente se
encontram associadas a outros defeitos cardíacos. Entretanto, o mais comum é que estes defeitos
congênitos sejam de tamanho médio ou pequeno e que evoluam com redução do seu diâmetro e
fechamento espontâneo nos primeiros dois anos de vida. Pode ocorrer em qualquer parte do mesmo,
podendo ser único ou múltiplo, com tamanho e
forma variável, sendo responsável, então, por
uma passagem de sangue entre os dois
ventrículos.

Observação: O fechamento espontâneo depende


do tamanho e da localização da CIV

 Pequena: 70-80% dos casos ocorre o


fechamento
 Moderada: 30-40% dos casos
 Grande: 1-6% dos casos

CIV subarteriais não se fecham


espontaneamente

a) Classificação: Para a classificação da CIV,


consideram-se os seguintes aspectos anatômicos: visão do defeito pela face direita do septo; estruturas
que compõem a margem do defeito; e localização do defeito segundo a porção do ventrículo direito. O
septo interventricular é dividido numa pequena porção membranosa e uma maior porção muscular,
sendo que o muscular possui 3 componentes: entrada, trabecular (ou muscular) e de saída. Assim, acaba
por ser dividida em quatro tipos de acordo com sua posição anatômica:
 CIV Perimembranosa (membranosa): É o defeito mais comum (70% dos casos) e envolve o septo
membranoso e o septo muscular. Essa denominação deve-se ao fato de que os defeitos são, em geral,
maiores do que a porção membranosa do septo ventricular. As margens do defeito são constituídas
por estruturas fibrosas das valvas aórtica e tricúspide e bordas musculares do septo muscular
adjacente. Uma característica anatômica fundamental é que o feixe de Hiss se relaciona com a sua
borda póstero inferior. Esse defeito pode ser subdividido em CIV Perimembranosa de via de entrada,
saída e zona trabecular, dependendo da direção de sua extensão. Quando se estende pra mais de uma
região denomina-se CIV Perimembranosa confluente.
 CIV Justatricuspídea: Localizado abaixo da valva tricúspide não se relacionando com o septo
membranoso. Nesse caso, o feixe de Hiss passa na borda anterior do defeito. Suas margens são
constituídas pelo anel da valva tricúspide e pelas bordas musculares do septo muscular da via de
entrada do ventrículo direito
 CIV Duplamente Relacionada (infundibular, subpulmonar ou subarterial): localizam-se no septo de saída
sendo as suas margens constituídas pelo anel pulmonar e aórtico, podendo haver prolapso de uma das
válvulas da valva aórtica e regurgitação da mesma associada.
 CIV Muscular: é o defeito cuja margem é totalmente composta por tecido muscular, portanto, sem
relação com as valvas cardíacas e o feixe de His. São subdivididas em apical (a mais comum),
mesosseptal (central), anterior (superior) e posterior, essas CIV são muitas vezes múltiplas (SIV tipo
“queijo suíço”) ou associada a outros defeitos.

b) Fisiopatologia: Na vida fetal, as pressões nos ventrículos são iguais, por isso a passagem de sangue
pela CIV é irrelevante, mas, após o nascimento, com o fechamento dos shunts fisiológicos (placenta,
forame oval e canal arterial), ocorre queda da pressão pulmonar e aumento da pressão sistêmica com a
passagem de sangue da esquerda para a direita. Ou seja, a quantidade de sangue que passa através da
CIV aumenta gradualmente, à medida que diminui a resistência vascular pulmonar, mas fica claro que
esse shunt pode ser limitado pelo tamanho do defeito. Resumindo, a resistência vascular pulmonar e o
tamanho do defeito ditam a repercussão hemodinâmica da CIV. Na CIV restritiva (< 0,5 cm²), a pressão
em VE é maior que em VD, e o tamanho do defeito limita a magnitude do shunt esquerda-direita. Na CIV
não restritiva (> 1 cm²), o defeito é grande de modo a equalizar as pressões entre os ventrículos direito e
esquerdo. Dessa forma, é a resistência vascular pulmonar o determinante do sentido do fluxo.

O fluxo aumentado na circulação pulmonar chega ao átrio esquerdo e ao ventrículo esquerdo,


dilatando-os e elevando a pressão diastólica e, por conseguinte, aumentando a pressão capilar
pulmonar retrogradamente. O aumento da pressão venocapilar é responsável pelos sintomas de
taquipneia, dispneia aos esforços e interrupções às mamadas. A persistência crônica do fluxo pulmonar
aumentado e da hipertensão venocapilar provoca uma reação das arteríolas pulmonares, com
espessamento e fibrose da média e aumento da pressão da artéria pulmonar e do ventrículo direito. Se
não houver uma correção da cardiopatia ocorre progressão da lesão arteriolar, com proliferação da
íntima e obstrução total do lúmen, causando uma hiper resistência pulmonar com consequente
aumento da hipertensão pulmonar, o que provoca um shunt invertido pela CIV, da direita para esquerda
e aparecimento de cianose. Esse estágio é denominado como síndrome de Eisenmenger e impede
definitivamente a correção do defeito. Além disso, é válido dizer que na CIV, ao contrário da CIA, o
pulmão recebe um sangue com pressão de ventrículo esquerdo, então a piora do quadro e o
desenvolvimento de HP é mais rápido do que na CIA

c) Manifestações Clínicas: O quadro clínico depende da magnitude do shunt, iniciando-se ao final do 1º


mês de vida, e com instalação completa ao final do 3º mês. No período neonatal imediato, o sopro
pode não ser audível devido à pressão pulmonar ainda elevada, o que diminui a intensidade do shunt.
Os sinais e sintomas variam em relação ao tamanho da CIV, cuja repercussão hemodinâmica é avaliada
através da relação entre o fluxo pulmonar (Qp) e sistêmico (Qs):
 CIV Pequena (relação QP: QS entre 1-1,5:1): A pressão em VD geralmente é normal. O paciente é
assintomático, com bom desenvolvimento ponderoestatural. Ao exame físico podemos identificar uma
2ª bulha na área pulmonar discretamente aumentada ou normal e um sopro sistólico na borda esternal
esquerda baixa

Obs: Sopro de CIV é audível em mesocardio, isso é, foco aórtico acessório (localiza-se no 3 o  espaço
intercostal esquerdo, junto ao esterno), tricúspide (localiza-se na base do apêndice xifóide, ligeiramente
para a esquerda) e mitral (localiza-se no 4 o ou 5o espaço intercostal esquerdo da linha hemiclavicular e
corresponde ao ictus cordis ou ponta do coração)

 CIV Moderada (relação Qp:Qs entre 1,5-2:1): Há hiperfluxo pulmonar, aumento da sobrecarga de ambas
as câmaras ventriculares. Há sintomas de ICC, infecções respiratórias de repetição e deficit
ponderoestatural. Se ausculta segunda bulha hiperfonética na área pulmonar e o sopro sistólico de
regurgitação.

 CIV Grande (relação Qp:Qs > 2:1): O diâmetro da comunicação interventricular é igual ou maior que o
diâmetro da aorta. Há grande aumento das cavidades esquerdas e grave congestão pulmonar, e todo o
quadro de manifestações clínicas aparece de forma mais exuberante. No exame físico se observa
aumento do diâmetro ântero-posterior do tórax. A segunda bulha em foco pulmonar é intensa e o sopro
sistólico de regurgitação está presente. Existe um sopro diastólico discreto em ponta, por causa do
grande fluxo pela valva mitral. O quadro clínico e típico de IC

 CIV com Hiper resistência vascular pulmonar (síndrome de Eisenmenger): Em um período de


desenvolvimento da hipertensão pulmonar, há equalização das pressões entre as duas cavidades
ventriculares, com desaparecimento do shunt da esquerda para a direita. O QP/QS pode se igualar a 1, a
semelhança da fisiologia normal. Com isso, há melhora dos sintomas por um curto período, inclusive
com aumento no desenvolvimento ponderoestatural. A progressão a HP leva a inversão do shunt,
aparecimento de cianose e sintomas como dispneia, cansaço, tontura e síncope. Ao exame físico a
cianose central é generalizada, segunda bulha no foco pulmonar é intensa, palpável e não se ausculta o
sopro da CIV. Essas alterações geralmente ocorrem de 5 a 10 anos de idade, mas podem ser mais
precoces, principalmente em crianças sindrômicas

d) Exame Físico:

 Ictus de VE deslocado lateral e inferiormente


 Frêmito paraesternal, na borda esternal esquerda.
 Sopro sistólico na borda esternal esquerda inferior holossistólico rude e alto quando a CIV é pequena
e menos rude quando a CIV é grande. Se o defeito é muito grande, não restritivo e a resistência
pulmonar está elevada, o sopro proto ou protomesossistólico poderá ser de pouca ou mediana
intensidade, pela equalização das pressões (shunt bidirecional).
 Componente pulmonar variável na segunda bulha cardíaca – normal, se CIV pequena, e
hiperfonético na CIV grande
 Desdobramento da segunda bulha, podendo ser único e estalante quando existir resistência
pulmonar muito elevada, podendo ser ouvido como um estalido protossistólico proeminente.

e) Diagnóstico:

 Sinais Radiológicos: O Raio-X na CIV pequena é normal, na CIV moderada observa-se aumento da
circulação pulmonar com cardiomegalia à custa das cavidades esquerdas, e na CIV grande há importante
aumento da circulação pulmonar, com sinais de hiperfluxo e congestão venosa e uma cardiomegalia
significativa, com consequente do aumento das cavidades esquerdas, da artéria pulmonar e do ventrículo
direito. Na hiper resistência vascular pulmonar, os vasos dos hilos pulmonares ficam proeminentes, com
ausência de vasos na periferia, e a área cardíaca pode estar normal ou discretamente aumentada com
grande aumento da artéria pulmonar

 Ecocardiograma: Quase sempre demonstra a anatomia precisa do defeito. Também deve ser possível
avaliar os componentes hemodinâmicos através do ecocardiograma com Doppler. Nos pequenos defeitos,
muitas vezes, o diagnóstico só é dado através do emprego do Doppler colorido.

 Eletrocardiograma: É normal quando a CIV é pequena e sem sobrecarga ventricular. Nos defeitos grandes
não complicados, poderá ser observado padrão de sobrecarga biventricular ou predomínio de ventrículo
esquerdo com crescimento atrial associado; onda T invertida em V1 sugere ausência de hipertensão
pulmonar, enquanto onda T ascendente indica sua presença.

 Indicação de Cateterismo:
 Casos de dúvidas persistentes quanto à magnitude do shunt.
 Suspeita de associação com outros defeitos.
 Estudo da pressão pulmonar. Devemos lembrar que, nas CIV grandes, a hipertensão pulmonar pode ser
determinada pelo aumento significativo do fluxo, e não por uma elevação da resistência da
vasculatura local

f) Tratamento: As CIV pequenas fecham espontaneamente em 30-50% dos casos nos primeiros dois anos
de vida. Se o defeito septal for do tipo muscular, a taxa de fechamento é de 80% versus 35%, que é a taxa
de fechamento do septo membranoso. De qualquer forma, as CIV pequenas e sem repercussão
hemodinâmica não têm indicação de fechamento cirúrgico.

O tratamento da CIV moderada a grande divide-se em manejo clínico e cirúrgico. O manejo clínico
compreende o uso de diuréticos, digitálicos, inibidores da Enzima Conversora de Angiotensina (IECA) e
restrição hídrica, com objetivo de controlar os sintomas e garantir um crescimento adequado. É indicado
para pacientes com sinais de IC, e aqueles com sinais leves podem ser tratados com o uso apenas de
digital. Em casos mais graves, podemos fazer um vasodilatador também, como um IECA.

O tratamento cirúrgico por meio de uma correção total é indicado em qualquer idade para aqueles que
mantem sinais de IC mesmo com tratamento clínico. O tratamento eletivo deve ser feito quando o Qp/Qs
(relação fluxo pulmonar/fluxo sistêmico por meio do ecocardiograma) for maior que 1,5, a partir do 10o
mês de vida e até 2 anos. Também é uma indicação importante quando a CIV se encontra na via de saída,
com potencial de desenvolvimento de insuficiência aórtica. A operação realizada durante o primeiro ano
de vida previne, na maior parte dos casos, a doença vascular pulmonar. Além desses, a bandagem da
artéria pulmonar (tratamento cirúrgico paliativo) está indicada nos casos em que há múltiplas CIV ou não
existem condições clínicas de correção total, com desnutrição importante e/ou sinais de hipertensão
artéria pulmonar importante com muito baixo peso.

3) Persistência do Canal Arterial: O canal arterial está patente na vida fetal, como um curto e largo vaso
conectando a artéria pulmonar à aorta descendente, logo abaixo do istmo aórtico. É uma estrutura
fundamental na circulação fetal. Com a retirada da placenta se tem a mudança da circulação fetal para a
neonatal, ocorrendo também a queda da concentração de prostaglandinas determinando a constrição da
camada muscular média das artérias, elevando a pressão arterial sistêmica. Dessa forma, a comunicação
entre a aorta e a artéria pulmonar tende ao fechamento, que é potencializado pela rápida contração do
canal em resposta à elevação da concentração de oxigênio. O fechamento do canal arterial ao nascimento
ocorre em duas etapas: o fechamento funcional, que ocorre nos primeiros quatro dias de vida (geralmente
em 12 horas) e decorre do papel constritor do oxigênio que, com a oxidação do citocromo A 3, promove a
produção de ATP e a contração do canal arterial; e o fechamento anatômico (dentro de 14 a 21 dias) segue
o fechamento funcional do canal arterial e se deve à isquemia hipóxica profunda na parede muscular do
canal, com degeneração da parede, necrose e migração das células musculares, com formação de cistos e
proliferação da camada íntima, havendo oclusão gradual do lúmen vascular. Com isso, o canal se
transforma em ligamento arterioso.

A resposta à pressão arterial de oxigênio ocorre proporcionalmente ao aumento da idade gestaciona l,


razão pela qual os prematuros são mais propensos a manter a patência do canal arterial. Sabe-se que, com
28 semanas de gestação, não se observa o efeito constritor do O 2, nem mesmo com concentrações
próximas a 100%. Já nos nascidos a termo, mesmo em ar ambiente, a constrição do canal é evidenciada
com o fechamento completo até o quarto dia de vida. Além disso, nos prematuros, o fechamento pode ser
retardado, sobretudo na presença de asfixia perinatal, síndrome do desconforto respiratório, ventilação
mecânica e hipervolemia. Nos bebês a termo a PCA é decorrente de um defeito da camada endotelial e
da camada muscular média, e por isso, seu fechamento espontâneo ou farmacológico é improvável. Nos
prematuros, esta perviedade não se deve a defeitos estruturais, mas em função de fatores como
imaturidade e hipóxia, que agem diminuindo a eficácia da contração ductal, como já citado . Mesmo no
bebê prematuro, quando diâmetro do canal é grande, as chances de fechamento espontâneo são
diminutas. Canais menores que 1,7mm provavelmente fecharão espontaneamente, enquanto aqueles
maiores que 2,2mm não terão fechamento espontâneo. É ainda válido citar que a PCA é mais comum em
mulheres e tem associação com a síndrome da rubéola congênita

a) Fisiopatologia: O shunt de uma PCA em RN pré-termo dá-se essencialmente no sentido esquerdo-


direito, da aorta para as artérias pulmonares. Como resultado, há um excesso de fluxo através da
circulação pulmonar (com aumento da pressão hidrostática e filtração de fluido pulmonar) e hipoperfusão
sistémica (fluxo pós-canal reduzido, apesar do aumento do débito cardíaco). As consequências fisiológicas
deste “roubo” dependem do tamanho do shunt e da resposta do coração, pulmões e outros órgãos ao
mesmo. Em PCAs de pequeno tamanho, as pressões em AD, VD e artéria pulmonar são normais. Por outro
lado, em ductos grandes, até 70% do DC do VE pode atingir a circulação pulmonar. Os pacientes com PCA
que não são operados correm um grande risco de desenvolver doença vascular pulmonar

Na fase inicial (fase compensada), o neonato consegue manter o fluxo sistêmico à custa da elevação do
débito cardíaco, decorrente do aumento da contratilidade miocárdica e da freqüência cardíaca. No
entanto, dado o limitado desempenho miocárdico, instala-se a fase descompensada, caracterizada por
insuficiência cardíaca e diminuição do débito cardíaco. É durante a fase de descompensação que se
instalam as complicações respiratórias decorrentes do edema pulmonar propiciado pelo shunt E-D,
agravado por maior permeabilidade dos capilares pulmonares, menor desenvolvimento dos linfáticos
pulmonares e maior imaturidade da membrana alveolar, característicos do prematuro. Como
conseqüência, há congestão pulmonar, piora da complacência e da resistência pulmonar, gerando
mudanças na mecânica pulmonar e alteração na relação ventilação-perfusão, com hipóxia, hipercapnia e
acidose mista. Assim como na CIV, a persistência crônica dessa doença é capaz de levar à síndrome de
Eisenmenger. Ainda é válido pontuar que o aumento de voluma nas cavidades esquerdas provoca aumento
das pressões diastólicas e, consequentemente, da pressão capilar, desencadeando todo processo
fisiopatológico descrito na CIV

b) Quadro Clínico: Na PCA ampla encontraremos:

 Pulso de amplitude aumentada


 Pulso Palmar: é de grande valor diagnóstico na diferenciação entre a CIV e PCA no período neonatal
 Pressão arterial divergente à custa de diastólica, que será baixa.
 Precórdio hiperdinâmico
 Sopro sistólico principalmente em região infraclavicular esquerda com irradiação para o dorso.
 Classicamente o sopro é descrito como contínuo ou maquinária.
 Com a resistência pulmonar maior que a sistêmica ocorrerá uma reversão do fluxo pelo ducto, com
aparecimento de cianose nos membros inferiores, pela mistura de sangue insaturado na aorta
descendente.
 A PCA pode estar associada ao quadro da síndrome da angústia respiratória e piorar o padrão
respiratório, aumentando a taquicardia, a taquipneia e desenvolvendo edema pulmonar e nesses
quadros o sopro pode estar ausente.

c) Diagnóstico:

 Sinais Radiológicos: Pequenos shunts não se manifestam radiologicamente, nos shunts maiores ocorrerá
aumento das câmaras esquerdas, da trama vascular pulmonar e da aorta ascendente.
 Ecocardiograma: É extremamente útil no diagnóstico e avaliação da PCA. Uma relação átrio
esquerdo/raiz da aorta superior a 1,5:1 é reflexo de um aumento atrial esquerdo secundário a um
shunt esquerda- -direita importante.
 Eletrocardiograma: Quando existir um shunt importante, mostrará sobrecarga biventricular ou com
predomínio de VE.

d) Tratamento: Todas as PCA evidentes ao exame físico devem ser fechadas, mesmo as pequenas, em
razão do risco de endocardite infecciosa. Em prematuros, a 1a opção para os casos que necessitam de
fechamento é o tratamento medicamentoso, com a indometacina (inibidor de prostaglandina) e o
ibuprofeno, que ambos se têm mostrado úteis. A cirurgia está indicada quando houver falência no
fechamento medicamentoso ou em condições em que o prematuro não possa receber a droga e em
crianças não prematuras (eletiva entre 1 a 2 anos), o fechamento está indicado em qualquer idade para
IC congestiva. Além disso, é importante realizar uma restrição hídrica (60 a 80% do volume adequada
para o peso e idade), a correção de eventuais anemias (HB>12 mg/dl) e avaliar a necessidade de
diurético.

4) Transposição das Grandes Artérias (TGA): A TGA é uma das principais cardiopatias cianóticas no
período neonatal. Esta condição tem como característica uma topografia anormal da aorta, anterior e à
direita em relação ao tronco da pulmonar. A aorta sai do ventrículo direito; e o tronco da pulmonar, do
ventrículo esquerdo. Existem duas circulações em paralelo. O retorno venoso sistêmico segue do AD para o
VD e então para a aorta. Independente deste trajeto, o sangue venoso pulmonar que retorna ao AE vai ao
VE, sendo ejetado nas artérias pulmonares. Se não houver “mistura” entre as duas circulações, este
distúrbio torna-se incompatível com a vida. A presença do forame oval patente e da persistência do canal
arterial logo após o nascimento permite a mistura parcial do sangue oxigenado, garantindo a sobrevida
inicial destes bebês. Cerca de 50% das crianças apresentam CIV associado, defeito que também possibilita
esta comunicação entre o sangue sistêmico e pulmonar e atenua a hipóxia. Com o fechamento fisiológico
do canal arterial e do forame oval na TGA simples, inicia-se um processo de hipóxia progressiva, em função
da mistura insuficiente, que pode levar a óbito do paciente. Na TGA com CIV ou com outros defeitos (CIA,
PCA) isso não ocorre, por causa da manutenção constante da mistura de sangue. Na TGA simples, o fluxo
pulmonar é normal ou discretamente aumentado e a clínica predominante é a cianose, sendo que quando
presente a CIV, o fluxo pulmonar está aumentado e a clínica é de insuficiência cardíaca com cianose leve.

A TGA é mais comum em RN filhos de mães diabéticas, no sexo masculino (3:1) e em crianças com a
deleção do cromossoma 22q:11 (CATCH 22).

a) Manifestações Clínicas: A idade de aparecimento dos sintomas depende, em grande parte, da


integridade do septo interventricular. Se o septo estiver íntegro, a cianose surgirá nas primeiras horas de
vida, momento concomitante ao fechamento do canal arterial e redução da taxa de sangue misturado. A
primeira manifestação clínica costuma ser a cianose. Em decorrência da hipóxia e acidose metabólica
resultantes, desenvolve-se uma disfunção miocárdica com ICC: taquipneia, ocorrendo piora em 12 a 24h;
cansaço às mamadas, gemência e palidez cutâneo-mucosa. A hipoxemia é grave e se constitui em uma
emergência médica. Se não tratada, evolui com acidose e choque circulatório. Não se ausculta sopro e a
segunda bulha é única e alta, em virtude da posição anterior da aorta. Se houver CIV associada, a cianose é
mais leve ao nascimento, e após a primeira semana de vida com a queda da resistência vascular pulmonar,
desenvolve-se ICC. Há sinais de aumento da área cardíaca com impulsões sistólicas na borda esternal
esquerda, a segunda bulha é alta e não se ausculta sopro

b) Exame Físico: Sempre há algum grau de cianose. O restante do exame cardiocirculatório dependerá das
anomalias associadas. Em geral a segunda bulha (B2) é alta e única, devido à posição anterior da aorta. Não
costuma haver sopro. O teste da hiperóxia pode ser usado, e não mostra melhora da cianose mesmo após
a administração de oxigênio a 100%

c) Diagnóstico:

 Radiologia: Classicamente, a descrição é de um mediastino superior estreito, e a aparência da sombra


cardíaca é descrita como um “ovo deitado”. A trama vascular pulmonar costuma estar normal ou
aumentada, se houver CIV associada.

 Eletrocardiograma: Raramente auxilia no diagnóstico. Na presença de defeitos do septo ventricular


associado, demonstra ondas P proeminentes, HVD isolada ou hipertrofia biventricular. Por outro lado, na
ausência de defeitos do septo ventricular, o ECG demonstra o padrão normal do neonato, que é de
dominância ventricular direita.

 Ecocardiograma: Essencial para definir conexões anormais e alterações associadas. O estudo com Doppler
permite a quantificação do percentual de sangue misturado através das comunicações entre a circulação
sistêmica e pulmonar.

d) Tratamento: No recém-nascido cianótico, devemos aumentar a mistura de sangue saturado e


dessaturado. Isso se faz com infusão de prostaglandina E1 (0,05-0,20 mg/kg/min), com intuito de manter
o canal arterial pérvio. Obviamente a manutenção do RN aquecido (hipotermia provoca acidose
metabólica) e o controle da glicemia (evitando hipoglicemia) são elementos fundamentais no manejo pré-
operatório destes pacientes. Os recém-nascidos que permanecem cianóticos, a despeito da infusão de
prostaglandina, devem ser submetidos à atriosseptostomia de Rashkind por balão, que consiste na
confecção de uma comunicação entre o AD e o AE para permitir maior mistura de sangue venoso e
arterial.

O procedimento cirúrgico definitivo para a transposição de grandes vasos com septo ventricular íntegro é
a inversão arterial de Jatene. Ele deve ser realizado nas primeiras duas semanas de vida, para preservar a
massa muscular de VE. Com a queda da resistência vascular pulmonar nas primeiras semanas de vida, o
VE – que está conectado ao tronco da pulmonar – passa a ejetar sangue contra um território de baixa
resistência. Se este processo se perpetua, há uma redução significativa da massa muscular de VE, e os
resultados hemodinâmicos de uma inversão cirúrgica tardia com reconstrução da aorta à esquerda será
ruim, pois a resistência periférica é alta

5) Tetralogia de Fallot (T4F): É a cardiopatia congênita cianótica mais comum na infância e resulta do e
resulta do desvio anterior do septo atrioventricular durante a embriogênese. Esta anomalia é
caracterizada por quatro achados cardinais:

 Estenose pulmonar, comumente do tipo infundíbulo-ânulo-valvar (obstrução ao trato de saída do VD)


 CIV Perimembranoso
 Dextroposição da aorta
 Hipertrofia Ventricular direita

O defeito primário da T4F é o desvio anterior do septo infundibular (septo muscular que separa a via de
saída aórtica e pulmonar). A obstrução ao fluxo sanguíneo arterial pulmonar é, usualmente, no nível do
infundíbulo ventricular (área subpulmonar) e válvula pulmonar. A artéria pulmonar principal é
frequentemente pequena e encontra-se associada a graus variados de estenose de seus ramos. A
obstrução completa do trato de saída de VD é classificada como uma forma extrema de tetralogia de Fallot

a) Fisiopatologia: A quantidade de sangue desviado do ventrículo direito para a circulação sistêmica é, em


primeiro lugar, decorrente do grau de estenose infundibular e valvar. Quanto mais estenose, mais cianose
e mais alto o sopro. Se a estenose for discreta, haverá um predomínio do shunt esquerda-direita (através
do defeito do septo interventricular) e a cianose poderá não ocorrer (Fallot rosa ou acianótico). Nos casos
de RN e que há uma obstrução grave na via de saída do ventrículo direito, a circulação pulmonar pode ser
dependente da persistência do canal arterial e nas crianças mais velhas esse fluxo pode ser
complementado por colaterais aortopulmonares provenientes da aorta ascendente e descendente.

A cianose não é necessariamente uma manifestação precoce da T4F, pois a persistência do canal arterial,
por exemplo, permite um fluxo pulmonar adequado. Posteriormente, com o seu fechamento associado ao
aumento da atividade física e hipertrofia progressiva do infundíbulo, ocorrerá cianose

b) Manifestações Clínicas: As manifestações clínicas da T4F dependem da anatomia da doença. Na T4F com
estenose pulmonar grave, a cianose é intensa desde o nascimento, e o fluxo pulmonar é dependente de
canal arterial. Na T4F com estenose pulmonar leve, o paciente pode ser acianótico (“Fallot rosa”) com
sopro cardíaco alto, e sinais/ sintomas de ICC pela CIV. À medida que a hipertrofia do infundíbulo
ventricular direito aumenta e a criança cresce, a cianose aparece ao longo do primeiro ano de vida. Esta é
mais bem notada nas membranas mucosas da boca e lábios e nas unhas. Em crianças mais velhas, as
queixas são de cansaço e surgimento de cianose após atividade física, que costuma regredir com o repouso
e a posição de cócoras. Em crianças não operadas notamos, mais tardiamente, baqueteamento digital.

c) Crises Hipercianóticas: As crises hipercianóticas paroxísticas ou crises de hipóxia constituem-se em um


sério problema e ocorrem nos primeiros dois anos de vida (especialmente entre 6 e 12 meses); têm como
característica hiperpneia, agitação, agravamento ainda maior da cianose e síncope. As crises graves podem
também se seguir de hemiparesia e convulsões. Os ataques ocorrem pela manhã ou após choro, são
imprevisíveis e espontâneos. Durante a crise, o sopro sistólico da estenose infundibular diminui de
intensidade e duração, podendo mesmo desaparecer, pois um mecanismo da crise cianótica é justamente
o espasmo da musculatura infundibular com fechamento completo da passagem de sangue pela artéria
pulmonar e redução do shunt E > D pela CIV. Os fatores que pioram a crise estão relacionados ao aumento
da resistência ao fluxo de saída de VD (choro, agitação, digitálicos...), ou à diminuição da resistência
vascular sistêmica (calor, hipotensão, medicamentos ou exercícios).

d) Exame Físico:

 Exibem cianose generalizada


 Dedos em baqueta de tambor.
 Hipodesenvolvimento ponderoestatural.
 É comum adotarem a posição de cócoras, pois esta posição aumenta a resistência sistêmica, reduzindo o
shunt pela CIV e “forçando” a um aumento do fluxo pulmonar
 Não se observa hiperatividade de precórdio e pode não haver frêmito
 A primeira bulha tem intensidade normal ou pouco aumentada e a segunda bulha é única sendo que o
sopro varia de acordo com o grau da estenose pulmonar. Nas crises, o sopro tende a diminuir ou até
mesmo desaparecer, refletindo a diminuição da passagem de sangue pela valva pulmonar
 Na ausculta a segunda bulha é praticamente única, correspondendo ao fechamento da válvula aórtica.

e) Diagnóstico:

 Radiologia:

 Área cardíaca normal ou aumentada


 Botão aórtico saliente
 Ponta cardíaca acima do diafragma (sinal do tamanco holandês)
 Vasos pulmonares pouco desenvolvidos e hilos pouco expressivos

 Eletrocardiograma:

 Hipertrofia ventricular direita; onda T positiva em V1 com onda R proeminente nas derivações
precordiais direitas

 Ecocardiograma:

 Importante para ressaltar aspectos anatômicos do defeito infundibular e valvar.


 Tamanho do CIV.
 Dextroposição da aorta.
 Diâmetro do tronco e ramos pulmonares.

 Cateterismo:

 Complementa o diagnóstico, define aspectos da hemodinâmica e oximetria.

f) Complicações:

Trombose cerebral: pode ocorrer em crianças policitêmicas e desidratadas. Ocorre mais comumente nas
veias cerebrais e nos seios durais e, ocasionalmente, nas artérias cerebrais. Acomete principalmente
crianças menores de dois anos.

Abscesso cerebral: menos comum do que a trombose, acomete crianças maiores de dois anos. O início é
insidioso com febre baixa e alteração do comportamento. Entretanto, o quadro inicial pode ser abrupto
com cefaleias, convulsões, náuseas e vômitos. O diagnóstico requer tomografia computadorizada e
ressonância magnética. A antibioticoterapia e a drenagem cirúrgica são necessárias

Endocardite bacteriana: pode ocorrer no infundíbulo ventricular direito, valvas tricúspide, pulmonar ou
aórtica. Em pacientes que já foram operados, a endocardite pode acometer uma válvula pulmonar com
estenose residual ou uma CIV residual.

Insuficiência cardíaca: como dito acima, ela pode estar presente inicialmente devido à CIV. Com a
hipertrofia do infundíbulo e obstrução ao trato de saída de VD, ela regride para dar lugar à cianose

g) Tratamento: Deve-se, como medidas de manutenção, evitar a anemia e a policitemia. Enquanto


aguardam a cirurgia, os pacientes podem se beneficiar do propranolol (0,5 a 1,5 mg/kg/dia),
betabloqueador que promove relaxamento da musculatura infundibular e diminui as crises de cianose.
 Crises Hipercianóticas:

 Manter a criança em posição genupeitoral, visando aumentar a resistência periférica (diminuir


shunt direita-esquerda).
 Administrar oxigênio.
 Uso de morfina (0,2 mg/kg SC, IM ou EV): visa inibir o centro respiratório e melhorar a
taquidispneia.
 Propranolol (0,5-1,5 mg/kg/dia): relaxamento da musculatura infundibular.
 Cetamina (1-3 mg/kg EV): sedação e aumento da resistência vascular periférica
 Bicarbonato de sódio (1 mg/kg EV) é empregado na correção da acidose metabólica. Esta se
encontra presente sempre que a PO2 cai abaixo de 40 mmHg.
 Vasoconstrictores (aminas): epinefrina 0,01 mg/kg EV para aumentar a resistência vascular
periférica.
 Quando não houver melhora clínica com as medidas acima citadas, está indicada a correção
cirúrgica paliativa através do procedimento Blalock-Taussig, que consiste na colocação de um
shunt entre a artéria subclávia e a artéria pulmonar como tentativa de ultrapassar a obstrução no
trato de saída de VD.

 Tratamento Cirúrgico: Recém-nascidos com obstrução importante do trato de saída de VD devem


ser mantidos até a cirurgia com infusão contínua de prostaglandina E1 (0,05-0,20 µ/kg/min). Não
existe consenso sobre o melhor procedimento cirúrgico para o tratamento destes recém-nascidos,
se o procedimento paliativo ou a cirurgia definitiva com correção total. Em crianças abaixo de seis
meses de idade ou naquelas em más condições clínicas ou com a anatomia da lesão desfavorável,
em geral se opta pela correção paliativa com o shunt de Blalock-Taussig modificado. Este consiste
de um conduto que liga a artéria subclávia ao ramo homolateral da artéria pulmonar. As
complicações desta cirurgia incluem quilotórax, síndrome de Horner e paralisia diafragmática.

Em crianças que possuam anatomia favorável, com cianose menos grave, crescimento
relativamente bom e na ausência de crises cianóticas, está indicada a correção cirúrgica total
entre 6 meses a 1-2 anos de de vida. Esta consiste de alívio da obstrução do trato de saída de VD,
removendo as faixas de músculo aí localizadas e fechamento da CIV com um patch. Em casos de
valva pulmonar estenótica, o cirurgião realiza uma valvotomia.

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