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UNIFANOR – CENTRO UNIVERSITÁRIO UNIFANOR WYDEN

CURSO DE ENGENHARIA CIVIL

MANOELLA LIRA VIANA

ADEQUAÇÃO DE FINALIDADE DA BARRAGEM DO RIO MARANGUAPINHO COMO


ESTRATÉGIA DE CONVIVÊNCIA COM A SECA

FORTALEZA
2018
MANOELLA LIRA VIANA

ADEQUAÇÃO DE FINALIDADE DA BARRAGEM DO RIO MARANGUAPINHO COMO


ESTRATÉGIA DE CONVIÊNCIA COM A SECA

Trabalho de conclusão de curso apresentado


ao curso de Engenharia Civil, do Centro
Universitário Unifanor Wyden, como requisito
para a obtenção do grau de Bacharel em
Engenharia Civil.

Orientadora: Profª. Ms. Marcella Facó


Soares.

FORTALEZA
2018
MANOELLA LIRA VIANA

ADEQUAÇÃO DE FINALIDADE DA BARRAGEM DO RIO MARANGUAPINHO COMO


ESTRATÉGIA DE CONVIVÊNCIA COM A SECA

Trabalho de conclusão de curso apresentado ao


curso de Engenharia Civil, do Centro
Universitário Unifanor Wyden, como requisito
para a obtenção do grau de Bacharel em
Engenharia Civil.

Orientadora: Profª. Ms. Marcella Facó Soares.

Aprovado em:18 / 12 / 18

BANCA EXAMINADORA

Profª. Ms. Marcella Facó Soares (Orientadora)


UniFanor – Faculdade Nordeste

Profª. Ms. Ylana Claúdia Medeiros Paula (Examinadora)


UniFanor – Faculdade Nordeste

Profª. Dra. Uilma Cardoso de Queiroz Ferreira (Examinadora)


UniFanor – Faculdade Nordeste
Dedico

A minha irmã Gabriela e ao meu pai, Manoel, pelo carinho e os momentos de alegria;
vocês que compartilharam dos meus sonhos, me incentivando e que sempre estiveram do
meu lado, dedico com muito carinho.

A minha mãe, Meire, pelo exemplo de honestidade, valores e compreensão, por ter
acreditado em mim e me apoiado em todas as fases da minha vida; pelo companheirismo,
cuidado, amor e paciência a mim dedicados em todos os momentos de dificuldades, em
especial nos momentos de alegria e de boas gargalhadas; a você que acreditou
incondicionalmente nos meus sonhos, dedico todas as minhas melhores conquistas com
muito amor e gratidão.
AGRADECIMENTOS

Agradeço primeiramente ao universo, aos deuses, a quem ou ao que estiver regendo


sobre nós – meros mortais – pela oportunidade de estar nesse mundo, poder enxergar
a imensidão de tudo que existe e desfrutar de todas as coisas boas que essa vida pode
oferecer.

Aos meus familiares que se fazem muito presentes em todas as etapas da minha vida e
que por mim tem muito apreço e carinho. Em especial a tia Fatinha, por sempre ter
acreditado no meu potencial. Agradeço pelos conselhos, amor e boas gargalhadas.

Aos meus amigos Yan Soares, Kamila Veras, Jessica Galeno, Kaliane Rodrigues,
Tamires Silva, Heloise Damasceno, Ricardo Santos, Karol Vasconcelos e Luana
Losada, que tive a oportunidade de encontrar durante essa trajetória que percorro pela
vida e permaneceram sempre ao meu lado – mesmo que não fisicamente – me
apoiando, acreditando em mim e acolhendo minhas dores nos momentos mais difíceis.

A todos os meus professores, principalmente aos do IFPI e Unifanor, por terem me


guiado nesse caminho mágico e fascinante do conhecimento; em especial à minha
orientadora, Professora Marcella Facó Soares, a quem devo todo meu respeito,
admiração e credibilidade pelo incentivo, orientação, confiança, paciência e dedicação
durante parte da minha vida acadêmica e principalmente me ajudando a superar as
dificuldades e anseios durante a pesquisa.

À Companhia de Gestão de Recursos Hídricos (COGERH), em especial a equipe da


Gerência de Segurança de Barragens e Infraestrutura Hídrica (GESIN) por terem me
acolhido e me ensinado com tanto carinho e dedicação; pela colaboração, apoio e pelos
dados cedidos que contribuíram para o desenvolvimento dessa pesquisa.

A todos que, de alguma forma, contribuíram para a realização deste trabalho.

Meus prezados agradecimentos.


RESUMO

As condicionantes climáticas desfavoráveis e o cenário hidrológico contribuíram para o


colapso do abastecimento de água, que tem provocado uma das piores secas dos
últimos 50 anos no semiárido nordestino brasileiro. Com base nas problemáticas
apresentadas nesse contexto, o Governo do Estado do Ceará posicionou-se mudando
perspectivas e adotando novas estratégias - estas não mais de combate à seca, mas de
convivência. Desta forma, essa pesquisa propõe-se a debruçar-se sobre essa temática,
focando seu olhar especificamente na análise da estratégia de adequação feita na
barragem Maranguapinho como medida para mitigar os efeitos da seca. O projeto da
barragem foi uma das ações estabelecidas como prioritárias na resolução do impacto
das cheias nas populações ribeirinhas e advém da elaboração do Plano de
Saneamento Ambiental da Região Metropolitana de Fortaleza (PSARMF). Com advento
da situação hídrica no Estado do Ceará provocada pela estiagem, a barragem passou a
atender uma nova demanda: o abastecimento humano. No presente trabalho, foram
levantados dados que fornecem informações que legitimam a tomada dessa decisão,
além de verificar oportunidade de melhoria e potencialidades de reprodução em outras
situações similares. Observou-se dois pontos importantes: a necessidade de avaliar a
eficiência do tratamento de água para atender essa nova demanda; e o comportamento
da estrutura da barragem após a adequação. Verificou-se que a ETA que realiza esse
processo de tratamento é do tipo compacta (tratamento simples), levando em
consideração que o Rio Maranguapinho se encontra em um nível máximo de
eutrofização, assim, seria recomendado que, caso houvesse a mudança de tecnologia
para ampliação da ETA, esse sistema teria maior eficiência com mananciais
eutrofizados. Além dessa problemática, constatou-se que o volume da água a jusante
da barragem aumentou no período de intensificação pluviométrica, ocasionando em
perdas por inundação. Como foi projetada pra evitar esse tipo de evento, fazem-se
necessários novos estudos sobre sua utilização.

Palavras-chave: Seca. Barragem. Situação Hídrica.


ABSTRACT

The unfavorable climatic conditions and the hydrological scenario contributed to the
collapse of the water supply, which has caused one of the worst droughts of the last 50
years in the Brazilian northeastern semi-arid region. Based on the problems presented
in this context, the Government of the State of Ceará has positioned itself by changing
perspectives and adopting new strategies. The new strategies are no longer for fighting
the drought, but coexisting with it. In this way, this research proposes to focus on this
theme, focusing specifically on analyzing the strategy of adequacy made in the
Maranguapinho dam as a measure to mitigate the effects of drought. The dam is located
between the municipalities of Maranguape and Maracanaú. Its project was one of the
priority actions in the resolution of the impact of floods on the riverside populations and
comes from the elaboration of the Environmental Sanitation Plan of the Fortaleza
Metropolitan Region (PSARMF), an initiative of the Federal Government executed by the
National Health Foundation (FUNASA). With the advent of the water situation in the
State of Ceará caused by the drought, the dam started to meet a new demand: human
supply. In the present work, data were collected that provide information that legitimizes
decision making, as well as verify the opportunity for improvement and reproductive
potential in other similar situations. Two important points were noticed: the need to
evaluate the efficiency of water treatment to meet this new demand and the behavior of
the dam structure after adequacy. It was verified that the ETA that performs this process
of treatment is of the compact type (simple treatment), taking into account that the
Maranguapinho River is in a maximum level of eutrophication, it would be recommended
that, if there was a change of technology to increase the ETA, this system would be
more efficient with eutrophic springs. In addition, from this problem, it was verified that
the water volume downstream of the dam increased during the period of rainfall
intensification, causing flood losses. As it was designed to avoid this type of event, new
studies on its use are necessary.

Keywords: Dry. Dam. Hydrological situation.


LISTA DE ABREVIATURAS E SIGLAS

CAGECE: Companhia de Água e Esgoto do Ceará


COGERH: Companhia de Gestão de Recursos Hídricos do Ceará
ANA: Agência Nacional das Águas
DNOCS: Departamento Nacional de Obras contra a Seca
PSARMF: Plano de Saneamento Ambiental da Região Metropolitana de Fortaleza
FUNCEME: Fundação Cearense de Meteorologia e Recursos Hídricos
FUNASA: Fundação Nacional de Saúde
RMF: Região Metropolitana de Fortaleza
IEPRO: Instituto de Estudos, Pesquisas e Projetos da UECE
CCR: Concreto Compactado a Rolo
CBDB: Comitê Brasileiro de Barragens
SAAE: Seviço Autômo de Água e Esgoto
LISTA DE FIGURAS

Figura 1. Número de chuvas abaixo da média de 1958 a 2016 ..................................... 18


Figura 2. Registro da distribuição da precipitação média anual ..................................... 20
Figura 3. Registro da distribuição da evaporação média anual ...................................... 22
Figura 4. Barragens de terra e de enrocamento............................................................. 23
Figura 5. Barragens de concreto .................................................................................... 23
Figura 6. Regularização do regime hidrológico .............................................................. 24
Figura 7. Amortecimento de uma onda de enchente...................................................... 24
Figura 8. Barragem Pedro do Cavalo, Bahia. ................................................................. 26
Figura 9. Barragem Guarapiranga, São Paulo ............................................................... 27
Figura 10. Organograma ETA, estudada ....................................................................... 31
Figura 11. Localização da Barragem Maranguapinho .................................................... 32
Figura 12. Estado trófico do Rio Maranguapinho ........................................................... 41
Figura 13. Nível do reservatório da Barragem Maranguapinho ...................................... 47
LISTA DE QUADROS

Tabela 1. Parâmetros de qualidade da água ......................................................................... 30


Tabela 2. Ficha técnica da barragem ...................................................................................... 34
Tabela 3. Caraterização da Barragem Maranguapinho ....................................................... 35
Tabela 4. Qualidade da água bruta - Rio Maranguapinho ................................................... 43
SUMÁRIO

1 INTRODUÇÃO.................................................................................................. 13

2 OBJETIVOS ..................................................................................................... 15

2.1 OBJETIVO GERAL ......................................................................................... 15

2.2 OBJETIVOS ESPECÍFICOS ........................................................................... 15

3 ESTRUTURA DO TRABALHO ........................................................................ 16

4 REFERENCIAL TEÓRICO ............................................................................... 17

4.1 A SECA NO ESTADO DO CEARÁ E AS ESTRATÉGIAS DE CONVIVÊNCIA17

4.2 CONDIÇÕES CLIMÁTICAS REGIONAIS (PSARMF, 2008)........................... 19

4.3 CONDIÇÕES CLIMÁTICAS LOCAIS (PSARMF, 2008) ................................. 19

4.4 BARRAGENS ................................................................................................. 22

4.4.1 Barragens de contenção ........................................................................... 24

4.4.2 Barragens para abastecimento ................................................................. 25

4.4.3 Barragens de múltiplos usos .................................................................... 25

4.5 ABASTECIMENTO DE ÁGUA ........................................................................ 28

4.5.1 Parâmetros e indicadores de qualidade hídrica ...................................... 29

4.5.2 Sistemas de Tratamento de Água ............................................................. 31

5 MATERIAIS E MÉTODOS ................................................................................ 32

5.1 LOCALIZAÇÃO DA ÁREA DE ESTUDO ........................................................ 32

5.2 RECONHECIMENTO DA ÁREA DE ESTUDO ............................................... 33

5.3 FICHA TÉCNICA DA BARRAGEM MARANGUAPINHO ................................ 34

5.4 O RIO MARANGUAPINHO E A BARRAGEM DE CONTENÇÃO DE CHEIAS –


CONTEXTO GERAL ......................................................................................... 36
5.5 A BARRAGEM DO RIO MARANGUAPINHO NO ÂMBITO DO PLANO DE
SEGURANÇA HÍDRICA DA REGIÃO METROPOLITANA DE FORTALEZA
(PSHRMF, 2016) .............................................................................................. 38

6 DISCUSSÃO DOS RESULTADOS .................................................................. 40

6.1 QUALIDADE HÍDRICA DO RIO MARANGUAPINHO ..................................... 40

6.2 BARRAGEM MARANGUAPINHO COM FINALIDADES MÚLTIPLAS ............ 46

7 CONCLUSÃO ................................................................................................... 49

REFERÊNCIAS .................................................................................................... 50
13

1 INTRODUÇÃO

O semiárido nordestino, composto por seis unidades federativas da região


Nordeste, constitui-se por parte dos Estados do Ceará, Rio Grande do Norte,
Pernambuco, Alagoas, Sergipe e Bahia. (IBGE, 2018)

O Estado do Ceará, especificamente, tem em torno de 147 mil km² de extensão.


Khan (2005), aponta que 92,0% dessa totalidade compõe o semiárido, excluindo
somente as zonas litorâneas e as serras úmidas, que abrangem cerca de 8,0% da área
total. Ainda segundo o mesmo autor, a precipitação pluvial anual é de 775 mm, já a
média do sertão semiárido de 400 mm por ano, o que inevitavelmente torna o Estado
suscetível às frequentes calamidades climáticas.

As condicionantes climáticas desfavoráveis e o cenário hidrológico, contribuíram


para o colapso do abastecimento de água, que tem provocado uma das piores secas
dos últimos anos no semiárido nordestino, segundo dados da ANA, 2018. Com base
nas problemáticas apresentadas nesse contexto, o governo do Estado do Ceará,
posicionou-se mudando perspectivas e adotando novas estratégias. Estas não mais de
combate à seca, mas de convivência com ela mesma.

Diante do exposto, em 2012, foi criado o Comitê de Convivência com a Seca,


que tem representantes de órgãos governamentais e da sociedade civil, e têm como
objetivo realizar reuniões de acompanhamento das ações, além de estudos de
mananciais e análises de alternativas viáveis para o abastecimento de sistemas em
situação de emergência.

Já no início de 2015, o Plano Estadual de Convivência com a Seca foi concebido,


delimitando medidas emergenciais, estruturantes e complementares para cinco eixos de
atuação: segurança hídrica, segurança alimentar, benefícios sociais, sustentabilidade
econômica, conhecimento e inovação. A partir do comitê estadual, foi criado, também
em 2015, o Grupo de Contingência, que se reúne semanalmente com o intuito de
discutir operações de abastecimento e captação de recursos, oferecendo
14

encaminhamento a medidas para amenizar os transtornos da escassez de água no


Ceará.

Em 2016, foi elaborado o Plano de Segurança Hídrica da Região Metropolitana


de Fortaleza. A iniciativa proposta pelo Governo do Estado do Ceará, juntamente com a
participação de instituições de interesse em comum, em particular da Cagece,
prefeituras e entidades gestoras de recursos hídricos, tem caráter emergencial, atuando
como alternativa ao racionamento e fornecendo o abastecimento de água tratada para
aproximadamente, 3,2 milhões de pessoas.

Foram elaboradas dentro desse plano, dez estratégias de segurança hídrica, das
quais destaca-se, o aproveitamento da água do reservatório da Barragem
Maranguapinho. Esta barragem foi concebida com o propósito de barrar o volume de
água excedido em períodos de precipitação intensa. O projeto da barragem foi uma das
ações estabelecidas como prioritárias na resolução do impacto das cheias nas
populações ribeirinhas, sua obra foi concluída no ano de 2012 e advém da elaboração
do Plano de Saneamento Ambiental da Região Metropolitana de Fortaleza (PSARMF),
elaborado pelo o Instituto de Estudos e Projetos – IEPRO, em convênio com a
Fundação Nacional da Saúde (FUNASA). No entanto, em razão da escassez provocada
pela estiagem a barragem passou a atender uma nova demanda: o abastecimento
humano.

Desta forma, essa pesquisa propõe-se a debruçar-se nessa temática, focando


seu olhar especificamente para analisar a estratégia de adequação feita na barragem
como medida de convivência com a seca. A relevância desse estudo se dá pela falta de
literatura disponível que analise e aborde criticamente a obra, a mudança de estratégia
e a gestão desse processo de readequação da barragem. Com o intuito de fornecer
uma leitura esclarecedora, as informações aqui reunidas, poderão ser utilizadas como
base para novos estudos e possibilidades dentro desse campo.
15

2 OBJETIVOS

2.1 OBJETIVO GERAL

Analisar a estratégia de adequação feita na Barragem Maranguapinho como


medida para mitigar os efeitos da seca.

2.2 OBJETIVOS ESPECÍFICOS

a. Identificar as estratégias adotadas pelo setor público para decisão da medida de


adequação da barragem e aproveitamento hídrico do seu reservatório;

b. Verificar oportunidades de melhoria e potencialidades de reprodução em outras


situações similares;

c. Explicar as etapas do processo de execução do plano.


16

3 ESTRUTURA DO TRABALHO

Este trabalho é composto por 8 capítulos. O primeiro capítulo se refere a


Introdução, onde nela contém uma explanação sobre o que se trata o assunto
abordado no trabalho, além de contemplar justificativa, a relevância da pesquisa, o
porquê da importância do assunto escolhido a ser estudado e breve menção aos
objetivos. No Capítulo 2, Objetivos, são descritos o objetivo geral e objetivos
específicos que nortearam a realização da pesquisa. No capítulo 4, encontra-se o
Referencial Teórico, onde nele contém o histórico da seca e as medidas de
convivência, seguido da explicação de barragens (conceito, uso e aplicação) e
legislação. Em seguida, no capítulo 5 encontra-se o Materiais e Métodos, são
apresentados os métodos utilizados para realizar a revisão bibliográfica e consolidar as
informações obtidas a fim de compor a base metodológica, e também o estudo de caso
utilizado para a aplicação dos métodos propostos, que engloba uma breve
caracterização da construção, finalidade e aproveitamento da barragem do rio
Maranguapinho. No Capítulo 6, Discussão dos Resultados foram discutidos os
resultados apresentados no estudo de caso. Finalmente, no Capítulo 7, Conclusões,
são apresentadas as conclusões deste trabalho e algumas recomendações para
estudos futuros.
17

4 REFERENCIAL TEÓRICO

4.1 A SECA NO ESTADO DO CEARÁ E AS ESTRATÉGIAS DE CONVIVÊNCIA

A região do semiárido está essencialmente relacionada a fenômenos de


estiagem. Existem registros dessas ocorrências desde meados do século XIX e XX. De
acordo com Costa (2004), o período compreendido entre anos 1845 e 1877, foi uma
época em que o Ceará desfrutou de boas chuvas e colheitas. Esse período foi
apontado, por muitos historiadores, como o de maior desenvolvimento econômico no
estado.
Ainda segundo Costa (2004), a história começou a mudar seu roteiro quando, em
1877, as mudanças climáticas foram tão severas que eclodiu em uma das maiores e
mais danosas secas enfrentadas pelo Ceará, sendo prolongada até o ano de 1979 e
causando a migração e morte de milhares de pessoas.

A partir do quadro catastrófico vivido pelo sertão nordestino, começava a


se delinear que a grande solução para o enfrentamento das secas do
Nordeste seria a construção de obras de barramentos de rios, visando
estocar água nos anos de pluviometria regular, para garantir o
abastecimento nos seus anos de penúria. (Lima, 2015, p. 16)

Molle e Cadier (1992) apontam que as secas de 1825, 1827 e 1830 foram os
propulsores para o início da construção de açudes no Nordeste; diante desse contexto,
Lima (2015) aponta que no ano de 1884 foi iniciada a construção da barragem do
Cedro em Quixadá, proposta por D. Pedro II, e teve sua conclusão em 1906, 22 anos
após seu início. Atualmente o Estado conta com 155 barragens monitoradas pela
Companhia de Gestão de Recursos Hídricos (COGERH) em conjunto com o
Departamento Nacional de Obras contra a Seca (DNOCS), dentre elas a maior
barragem pública para múltiplos usos do Brasil, o Castanhão, que representa um
importante mecanismo de controle das secas.
O Monitor de Secas (ANA, 2014), um mecanismo de integração da informação
de nível federal, estadual e municipal nas áreas de meteorologia, recursos hídricos e
agricultura, mostra que a seca mais recente, que teve início no ano de 2012 e se
18

prolonga até os dias atuais, já é considerada como a seca mais grave em décadas, ou
até mesmo dos últimos 50 a 100 anos.
O calendário de chuvas no Estado do Ceará elaborado pela Fundação Cearense
de Meteorologia e Recursos Hídricos (FUNCEME, 2018), indica que desde o ano de
2010 houve uma intensificação do cenário de baixa precipitação, verificando-se no ano
de 2011 a confirmação desse fenômeno. Além disso, nos anos que se sucederam e até
a atualidade a situação permaneceu constante, sendo declarada uma crise hídrica. Pela
gestão estadual, no ranking das 10 piores quadras chuvosas, divulgada pelo mesmo
órgão, os anos de 2012, 2013 e 2016, encontram-se respectivamente em quinto, nono
e oitavo lugar, como pode ser observado na Figura 1.

Figura 1. Número de chuvas abaixo da média de 1958 a 2016

Fonte: FUNCEME, 2015.

A quantidade considerável de reservatórios acabou não sendo suficiente para


combater a seca, a situação climática na região se agravou nos últimos anos. A
precipitação não tem sido bastante para atender a demanda dos reservatórios, fazendo
assim, todas a teorias de combate à seca pensadas em décadas passadas se tornarem
obsoletas, dando espaço para uma nova definição, não mais de combate e sim de
convivência.
19

4.2 CONDIÇÕES CLIMÁTICAS REGIONAIS (PSARMF, 2008)

Devido às condições irregulares com períodos prolongados de seca, o processo


de desertificação já se encontra instalado no interior do Ceará. As características
agressivas do clima semiárido associado a técnicas inapropriada de manejo do solo,
geram o abandono de áreas. As atividades socioeconômicas são profundamente
modificadas, através da queda da produção, êxodo rural, crescimento da miséria etc.
A circulação atmosférica no estado do Ceará é regida, basicamente, por três
sistemas geradores de precipitação: as frentes frias, com sua formação original no Polo
Sul, a Zona de Convergência Intertropical, que oscila dentro da faixa de trópicos e um
Centro de Vorticidade Ciclônica, com tempo de atuação variável dentro do período de
chuvas.
Além desses, outros sistemas de menor escala atuam na região, como as linhas
de instabilidade formadas ao longo da costa e as brisas marítima e terrestre que
incidem com frequência na zona litorânea.
A Zona de Convergência Intertropical é o principal sistema responsável pelo
estabelecimento da quadra chuvosa. Atinge sua posição máxima, no hemisfério sul, em
torno do equinócio outonal (23 de março), retornando ao hemisfério norte em maio,
quando o período chuvoso entra em declínio.

4.3 CONDIÇÕES CLIMÁTICAS LOCAIS (PSARMF, 2008)

O clima é razoavelmente homogêneo na Região Metropolitana de Fortaleza, as


variações estão diretamente ligadas ao regime pluviométrico. Com base nos índices de
precipitação média anual, mostrado na Figura 2, pode-se esboçar o seguinte
zoneamento pluviométrico:
20

Figura 2. Registro da distribuição da precipitação média anual

Fonte: FUNCEME/DATEN, 1993.

Os meses mais secos correspondem ao período de setembro a novembro. A


disponibilidade de água no solo é essencial para a demanda das plantas e,
consequentemente, para a utilização agrícola do solo. O balanço hídrico consiste do
confronto entre as necessidades das plantas e a quantidade de chuvas que ocorre
numa determinada região. Em outras palavras, representa a contabilidade da entrada e
saída de água no solo. O balanço hídrico consiste dos seguintes fatores:

a. Precipitação (P): quantidade de água adicionada ao solo por processos naturis


(chuvas) ou artificiais (irrigação);

b. Evapotranspiração potencial (EP): quantidade anual de água, teoricamente


necessária para a manutenção da planta verde;

c. Evapotranspiração real (ER): quantidade de água que retorna à atmosfera por


transpiração vegetal;

d. Excesso hídrico: quantidade de água precipitada, não absorvida pelo solo e não
evapotranspirada, incorporando-se à rede de drenagem superficial e/ou
subterrânea;
21

e. Deficiência hídrica: quantidade de água que falta ao pleno desenvolvimento e


crescimento da planta.

Na zona litorânea a evapotranspiração real (ER) ocorre com valores médios


anuais inferiores a 1.000 mm, tendo os maiores índices mensais no período de
fevereiro a junho, quando assume valores similares aos de EP, congruentes ao período
de armazenamento de água no solo. Os maiores índices de excesso hídrico ocorrem
nas serras citadas e no litoral, enquanto os menores estão localizados a sotavento dos
maciços orográficos. Obviamente, o período de maior excedente hídrico é concomitante
à estação chuvosa, enquanto que a deficiência hídrica se acentua nos meses de
estiagem, ou seja, no segundo semestre, com ênfase nos meses de setembro a
novembro.
Além disso, as condições climáticas da região favorecem o fenômeno da
evaporação, o qual provoca perdas hídricas consideráveis, mormente aos volumes
acumulados em superfícies livres. Como este processo está diretamente relacionado ao
regime pluviométrico, o trimestre úmido (março-maio) é o de menor índice,
correspondendo, em média, a 15% da evaporação anual. Por outro lado, o período de
setembro a novembro concentra quase um terço do total. Na zona litorânea, a taxa
média de evaporação fica em torno de 2.300 mm, enquanto nas áreas mais interiores
alcança valores de 2.800 mm.
Quando ocorrem anos muito secos, os índices de evaporação são ainda mais
elevados, podendo superar 3.300 mm. Nesses casos, acontece uma acentuada
redução na diferença entre as taxas do primeiro e do segundo semestres. A Figura 3
mostra os gráficos contendo os valores médios mensais desse fenômeno.
22

Figura 3. Registro da distribuição da evaporação média anual

Fonte: FUNCEME/DATEN, 1993.

4.4 BARRAGENS

Nos estudos de hidráulica, as barragens são caracterizadas como estruturas


construídas transversalmente à direção do escoamento de um curso d’água, formando
um reservatório artificial, com finalidade de acumular água ou elevar seu nível. Esse
acúmulo recebe a denominação de açude quando as águas pluviais são utilizadas para
seu enchimento (MATOS, SILVA, & PRUSKI, 2012). Dessa forma, para definir os
elementos de uma barragem é necessário o uso de uma abordagem sistêmica que
contemple seus tipos, uso e funcionalidade, permitindo uma análise mais profunda.
As barragens podem ser de terra (Figura 4), pedra ou enrocamento, alvenaria,
concreto (Figura 5) ou mista. Os estudos geológicos e geotécnicos definem a escolha
do tipo de material a ser empregado, a localização adequada para construção, a
disponibilidade de recursos para a obra, entre outros.
23

Figura 4. Barragens de terra e de enrocamento

Fonte: Costa, 2012.

Figura 5. Barragens de concreto

Fonte: Costa, 2012.

Entre as finalidades das barragens estão a produção de energia


elétrica, o controle de enchentes e a regularização de vazões, a
navegação, o abastecimento doméstico, a irrigação, a
dessentação de animais, a piscicultura, o embelezamento e a
recreação. (MATOS; SILVA; PRUSKI, 2012, p.9)

MATOS; SILVA; PRUSKI (2012) apontam que é importante avaliar, sempre que
possível, a viabilidade de uso múltiplo do reservatório. Na hipótese do reservatório ser
empregado para fins de abastecimento humano, se faz necessário analisar os
parâmetros de qualidade da água para garantir características adequadas de
potabilidade.
24

4.4.1 Barragens de contenção (COSTA, 2012)

Esse tipo de barragem tem como finalidade conter água de forma temporária,
regularizar o regime hidrológico (Figura 6) do rio ou acumular sedimentos, resíduos
industriais ou rejeito de mineração.

Figura 6. Regularização do regime hidrológico

Fonte: Costa, 2012.

No que diz respeito à retenção de água, essas barragens têm como objetivo
amortecer a onda de enchente, evitando assim, inundações a jusante. A onda é
temporariamente armazenada e liberada de forma que a vazão efluente não cause
danos à jusante. Além de contenção da onda de enchente, se faz necessário considerar
áreas em que não seja muito prejudicial a inundação temporária a montante.

Figura 7. Amortecimento de uma onda de enchente

Fonte: Costa, 2012.


25

4.4.2 Barragens para abastecimento (COSTA, 2012)

Reservatórios são necessários para o abastecimento de indústrias e cidades.


Cidades populosas ou que não são contempladas com condições climáticas favoráveis,
dependem de reservatórios para que o abastecimento de água seja garantido ao longo
do tempo.
Toda barragem que visa qualquer tipo de abastecimento, seja para uso
doméstico ou para atividades económicas (agricultura, indústria, etc.), tem como
característica e objeto o aumento de volume. Por essa razão, esse tipo de barragem
exige condições morfológicas que proporcionem um grande volume de
armazenamento. Outro fator importante é garantir as seguintes condições:

a. Abastecimento doméstico: avaliar todos os parâmetros químicos e biológicos


para garantir a potabilidade, assegurar o baixo teor de salinização na água e
proibir o uso recreativo do lago;

b. Abastecimento industrial: obter o controle de águas duras (carbonatadas) e


restringir a salinização;

c. Abastecimento para irrigação: reduzir a salinização em função das


características do solo a irrigar.

4.4.3 Barragens de múltiplos usos

Obras hidráulicas exigem, em geral, grandes investimentos. É importante


enfatizar que essas obras devem ser projetadas procurando-se obter delas maiores
vantagens econômicas e ambientais. Em razão disso, os reservatórios devem ser
implantados, sempre que possível, com finalidades múltiplas.
A Política Nacional de Recursos Hídricos, lei nº 9.433, de 8 de Janeiro de 1997,
tem como um dos seus fundamentos, garantir o aproveitamento múltiplo e integrado
dos recursos hídricos, em especial da hidroenergia e navegação, de forma sustentável,
26

conforme estabelecido nos planos das respectivas bacias hidrográficas. Para


Fernandes e Bursztyn (2008), a adoção dos usos múltiplos da água como princípio
dessa lei, pode ser considerada uma medida de grande avanço que concede a
igualdade de acesso ao recurso para todas as categorias de usuários.
De acordo o Comitê Brasileiro de Barragens (CBDB, 2015), a maioria dos
projetos de concepção de barragens é planejada para que a estrutura disponha de uma
única utilização, desta forma, caso ocorra surgimento de necessidades adicionais, se
faz necessário inclusão de adaptações, muitas vezes conflituosas. Os
empreendimentos brasileiros, em geral, não foram projetados para função múltipla,
como, por exemplo, Pedra do Cavalo (Figura 8), no rio Paraguaçu, na Bahia, onde além
do controle de cheias, abastece a população de Salvador, tem área agrícola irrigada e
geração de energia, além de lazer.

Figura 8. Barragem Pedro do Cavalo, Bahia.

Fonte: Repositório da EMAE


Disponível em: < http://www.bahianoiteedia.com.br/pesca-e-esportes-nauticos-em-pedra-
cavalo/>. Acesso em: 10 nov. 2018

O CBDB (2015) mostra ainda, uma situação contraria na barragem Guarapiranga


em São Paulo, como mostra a Figura 9. Essa barragem foi concebida e construída com
a finalidade de geração de energia, porém, em advento de tramitação de gestão
operacional, passou a prover água para o consumo doméstico da região metropolitana
da capital paulista, com regra operativa diferente da finalidade original. Em janeiro de
1976, em razão do período chuvoso intenso, a vazão do efluente encontrou o
27

reservatório cheio e quase ocorreu o galgamento da barragem, construída como aterro


hidráulico. Posteriormente a este episódio foram tomadas medidas reparadoras tanto
físicas, como operacionais.

Figura 9. Barragem Guarapiranga, São Paulo

Fonte: Repositório da EMAE


Disponível em: <http://www.emae.com.br/conteudo.asp?id=Barragens>. Acesso em: 10 nov.2018

Como já foi abordado anteriormente, além do projeto de concepção da barragem,


se faz necessário levar em consideração a adaptação dessa estrutura para mais de um
objetivo. Contudo, esse aproveitamento com múltiplas finalidades deve ser precedido
de uma análise hidrológica que verifique o balanço entre os volumes afluente e efluente
utilizado em cada uma das finalidades. Uma barragem projetada para hidrelétrica ou
para abastecimento, em que a demanda é grande em relação ao volume afluente, pode
apresentar reduções do reservatório que inviabilize qualquer aproveitamento turístico
do seu lago. Da mesma forma, uma barragem de abastecimento doméstico não permite
aproveitamento para lazer; e a manutenção de um volume vazio para amortização de
enchentes inviabiliza o aproveitamento para fins de abastecimento ou de produção de
energia elétrica, explica Costa (2012).
28

4.5 ABASTECIMENTO DE ÁGUA

De acordo com o Manual do Saneamento Básico (2012) elaborado pelo Instituto


Trata Brasil, um sistema de abastecimento de água constitui-se de um conjunto de
obras, equipamentos e serviços que tem como finalidade realizar a captação da água
dos mananciais, apropriar sua qualidade ao padrão potável e transportar esse recurso
para garantir o consumo doméstico, industrial, agrícola, entre outros. A demanda deve
ser fornecida em quantidade compatível com suas necessidades. Esse sistema tem
alguns objetivos específicos definidos em dois aspectos:

Aspectos sanitário e social:

a. Controlar e prevenir doenças;


b. Implantar hábitos higiênicos na população como;
c. Facilitar a limpeza pública;
d. Facilitar as práticas desportivas;
e. Propiciar conforto, bem-estar e segurança.

Aspectos econômicos:

a. Aumentar a vida média pela redução da mortalidade;


b. Aumentar a vida produtiva do indivíduo, por meio do aumento da vida média ou
pela redução do tempo perdido com doença;
c. Facilitar a instalação de indústrias, inclusive a de turismo, e consequentemente
ao maior progresso das comunidades;
d. Facilitar o combate a incêndios;
e. Mais fácil proteger o manancial;
f. Mais fácil supervisionar o sistema do que fazer supervisão de grande número de
mananciais e sistemas;
g. Mais fácil controlar a qualidade da água consumida;
h. Redução de recursos humanos e financeiros.
29

De acordo com Tsutya (2006), a concepção deverá estender-se aos diversos


componentes do sistema de abastecimento, e tem como premissa, fornecer ao usuário
uma água de boa qualidade, quantidade adequada e pressão suficiente. Esse sistema é
definido pelos seguintes itens:

a. Manancial é o corpo de água superficial ou subterrâneo, de onde é retirada a


água para abastecimento de água;
b. Captação define-se pelo conjunto de estruturas e dispositivos responsáveis por
garantir a retirada de água destinada ao sistema de abastecimento;
c. Estação elevatória é o conjunto de obras e equipamentos destinados a recalcar a
água para a unidade seguinte;
d. Adução é toda a estrutura que tem finalidade de canalizar a água entre as
unidades que precedem a rede de distribuição;
e. Tratamento se designa pelo conjunto de unidades que garantem o tratamento e
adequação do recurso hídrico aos padrões de potabilidade;
f. Reservatório se caracteriza como elemento do sistema destinado a regularizar as
variações entre vazões de adução e distribuição, e ainda condicionar as
pressões nas redes de distribuição;
g. Rede de distribuição é a parte do sistema formada por tubulações e acessórios
que garantem a população o acesso a água potável, de forma continua, em
quantidade e pressão recomendada;

h. Ramal domiciliar é o conjunto de tubulações que destina a água da rede de


distribuição até residência.

4.5.1 Parâmetros e indicadores de qualidade hídrica

VON SPERLING (1996) aponta que a qualidade da água pode ser retratada por
diversos parâmetros, os quais representam as suas características físicas, químicas e
biológicas (tabela 1). Esses parâmetros consistem em identificar impurezas quando
alcançam valores superiores aos determinados para uso.
30

Quadro 1. Parâmetros de qualidade da água

Parâmetro
Cor, turbidez, sabor e odor,
Físico
temperatura.

pH, alcalinidade, acidez,


dureza, ferro e maganês,
cloretos, nitrogênio, fósforo,
Químico
OD, matéria orgânica,
micropoluentes inorgânicos e
orgânicos, DBO, DQO.
Biológico Microrganismos, coliformes.

Fonte: Autor, 2018.

A portaria nº 2.914, de 12 de Dezembro de 2011, do Ministério da saúde dispõe


sobre os procedimentos de controle e de vigilância da qualidade da água para consumo
humano e seu padrão de potabilidade. Os parâmetros que estabelecem os padrões
mínimos a serem atendidos, estão distribuídos nos anexos de I a VIII. Segundo o Art.
5°, para os fins desta portaria e que são pertinentes a esse trabalho, são adotadas as
seguintes definições:

I - água para consumo humano: água potável destinada à ingestão, preparação


e produção de alimentos e à higiene pessoal, independentemente da sua
origem;

II - água potável: água que atenda ao padrão de potabilidade estabelecido


nesta Portaria e que não ofereça riscos à saúde;

III - padrão de potabilidade: conjunto de valores permitidos como parâmetro da


qualidade da água para consumo humano, conforme definido nesta Portaria;

IV - padrão organoléptico: conjunto de parâmetros caracterizados por provocar


estímulos sensoriais que afetam a aceitação para consumo humano, mas que
não necessariamente implicam risco à saúde;

V - água tratada: água submetida a processos físicos, químicos ou combinação


destes, visando atender ao padrão de potabilidade.
31

4.5.2 Sistemas de Tratamento de Água

Conforme os dados do SAAE (2006), os sistemas de tratamento de água para


abastecimento público podem ser do tipo convencional (completo) - que incluem todas
as etapas tradicionais do processo como coagulação, floculação, decantação, filtração,
desinfecção, tanque de contato, correção de pH e fluoretação - e não convencional
(direta), composto de adutora, floculadores, flotador, filtros e reservatórios. Outro
exemplo de método não convencional inclui a filtração direta ascendente (FDA),
filtração direta descendente (FDD), a dupla filtração (DF) e filtração lenta (FL), como
ilustrado na figura 10. (SAMPAIO, 2014)

Figura 10. Organograma ETA, estudada

Fonte: Sampaio, 2014.

A filtração direta é a que apresenta menor custo de implantação, dentre as tecnologias


usuais de tratamento para abastecimento público, contudo, a necessidade de se levar em
consideração que é eficiente apenas para o tratamento de águas brutas com até um limite da
quantidade de matéria em suspensão e substâncias dissolvida. Se as características físico-
químicas e bacteriológicas da água bruta não permitirem assegurar sua potabilidade por
filtração direta, faz-se necessário o emprego do tratamento em ciclo completo, e às vezes,
tratamentos complementares, aponta Sampaio (2014). Dessa forma, a escolha da tecnologia de
tratamento depende basicamente da qualidade da água bruta e da qualidade desejada para o
efluente final. Além da tecnologia apropriada, se faz necessário garantir um rigoroso controle
durante o projeto, construção e operação.
32

5 MATERIAIS E MÉTODOS

No presente trabalho, o tipo de pesquisa realizada foi uma pesquisa descritiva,


no qual foram feitas coletas dos dados do estudo de caso, determinando-se os
resultados obtidos. As fontes de pesquisa utilizadas foram fontes secundárias,
organizadas em coletas de dados (análise de relatórios cedidos pelos órgãos
responsáveis pela tramitação) e referências bibliográficas de autores de diversos livros,
como também autores de monografias e artigos. As conclusões obtidas deste trabalho
foram apresentadas em resultados qualitativos (expressos por análise de dados que
não podem ser mensurados numericamente para obter o resultado).

5.1 LOCALIZAÇÃO DA ÁREA DE ESTUDO

A Barragem Maranguapinho está localizada na RMF, dentro do município de


Maracanaú, em terras antes pertencente à Fazenda Tok-Milk, distante 3,7 km para a
rótula de acesso à região central de Maranguape, cerca de 5,7 km da interseção da CE-
065 com o 4º Anel Viário. O eixo cruza o rio Maranguapinho nas coordenadas N
9.571.305 e E 538.940. Na Figura 11, pode-se observar o detalhe da localização da
referida barragem em relação à região metropolitana adjacente.

Figura 11. Localização da Barragem Maranguapinho

Fonte: COGERH, 2013.


33

5.2 RECONHECIMENTO DA ÁREA DE ESTUDO

A primeira etapa do trabalho constou de uma revisão bibliográfica, relacionando


às questões pertinentes ao tema da pesquisa e à barragem Maranguapinho,
relacionando trabalhos anteriores e realizando levantamentos das atividades de uso e
funcionalidade, hidrologia e qualidade da água.
Esse material foi adquirido a partir de um levantamento bibliográfico por meio de
artigos, revistas acadêmicas e técnicas, bem como da consulta em bibliotecas em
instituições, como: Universidade Federal do Ceará (UFC), Companhia de Gestão dos
Recursos Hídricos (COGERH), Fundação Cearense de Meteorologia e Recursos
Hídricos (FUNCEME) e Secretaria de Recursos Hídricos (SRH).
34

5.3 FICHA TÉCNICA DA BARRAGEM MARANGUAPINHO

Quadro 2. Ficha técnica da barragem

Características Técnicas da Barragem


Denominação Barragem Maranguapinho
Estado Ceará
Município Fortaleza
Coordenadas UTM SAD 69 E 538.940 e N 9.571.305

Sistema Bacia Metropolitana

Rio barrado Maranguapinho


Proprietário Funasa

Autor do projeto
EngeSoft Engenharia e Consultoria S/S
Data do projeto out/07

Data de revisão do projeto jun/10

Bacia Hidrográfica

Área 111,45 km²

Comprimento do talvegue principal 17,69

Tempo de concentração 2,72 h

Características do Reservatório

Área da bacia hidráulica (cota 51,50m) 306,84 hm

Volume acumulado (cota 51,50) 9,35 hm³

Volume morto do reservatório 1,14 hm³

Vazão afluente máx. de projeto (TR = 1000


anos) 1.104,70 m³/s

Vazão máx. de afluente (TR = 1000 anos) 601,66 m³/s

Nível d'água máx. normal 51,50 m

Nível d'água máx. (TR = 1000 anos) 53,20 m

Fonte: COGERH (2013) adaptado pelo Autor, 2018.


35

Quadro 3. Caraterização da Barragem Maranguapinho

Barragem Principal (Tipo Mista de terra e CCR)

Maçico de Terra

Altura máx. do maciço 9,00 m

Largura do coroamento 6,00 m

Ext. pelo coroamento margem esquerda 672,40 m

Ext. pelo coroamento margem esquerda 1.525,54 m

Cota do coroamento 55,00 m

Largura máx. da base 46 m

Taludes de montante 1.0 (v); 2.0(H)

Taludes de jusante 1.0 (v); 2.0(H)

Cortina de injeção 9,00 m

Barragem em CCR - Insubmersível


Tipo Gravidade

Altura máxima 10,30 m

Largura do coroamento 6,00 m

Ext. pelo coroamento margem esquerda 260,00 m

Ext. pelo coroamento margem esquerda 320,00 m

Cota do coroamento 55,00 m

Largura máx. da base 12,00 m

Taludes de montante Vertical

Taludes de jusante 1.0 (v); 0,80 (H)

Cortina de injeção 9,00 m

Fonte: COGERH (2013), adaptado pelo Autor, 2018,


36

5.4 O RIO MARANGUAPINHO E A BARRAGEM DE CONTENÇÃO DE CHEIAS –


CONTEXTO GERAL

O Rio Maranguapinho possui uma área de contribuição de 223,80 km². Este rio
conflui com o Rio Ceará pouco antes do encontro com o mar, portanto, compartilham da
mesma foz. Apresenta suas nascentes na região serrana, o que faz com que suas
declividades sejam acentuadas, provocando altas velocidades do rio e seus afluentes,
nos altos cursos. Estas características do rio têm maior intensidade na estação
chuvosa, período em que ocorrem deslizamentos da serra, os quais provocam
assoreamento do seu leito natural e, consequentemente, transbordamentos e
alagamentos de grandes proporções, conforme mostra os dados do relatório técnico nº
0107‐2: Avaliação da Qualidade do Sedimento do rio Maranguapinho, elaborado pelo
Instituto Agrópolos (2008).

O relatório de mapeamento de recursos hídricos feito pela Defesa Civil de


Fortaleza (2016), identificou 48 áreas consideradas de alto risco e outras 37 de médio
risco nos 110 canais e lagoas catalogados. Em época de intensificação pluviométrica,
as populações ribeirinhas vivem o tormento das enchentes e o aumento da incidência
de doenças como infecções respiratórias, hepatite e dengue.
Diante dessa problemática, no ano de 2008, foi elaborado pelo Instituto de
Estudos e Projetos – IEPRO, em convênio com a Fundação Nacional da Saúde
(FUNASA), o Plano de Saneamento Ambiental da Região Metropolitana de Fortaleza
(PSARMF). O plano constitui-se de uma combinação de intervenções que inclui:

a. A construção de barragens de controle de cheias nos dois principais eixos de


macrodrenagem da RMF, rios Cocó e Maranguapinho;

b. Melhorias nas condições de escoamento fluvial dos dois rios supracitados por
meio de trabalhos de dragagem;
37

c. Remanejamento das populações ribeirinhas residentes nas áreas de riscos às


margens dos rios com ocupação das margens com equipamentos comunitários.

Para o vale do Maranguapinho foram concebidas as seguintes ações:

d. A construção da barragem que barra o rio Maranguapinho

e. A dragagem do rio, a jusante da barragem para acomodar na calha do rio as


cheias de frequência decenal;

f. O remanejamento da população em torno do rio, em áreas alagadas por cheias.

Os tópicos apresentados a cima são os principais objetivos elaborados pelo


plano de requalificação do rio. Especificamente para esse trabalho, será analisado
apenas o projeto da barragem, que teve coordenação da Secretaria das Cidades, e foi
uma das ações estabelecidas como prioritárias na resolução do impacto das cheias nas
populações ribeirinhas. Os estudos hidrológicos e hidrodinâmicos realizados na Fase I
– Diagnóstico do PSMARF, mostraram que não haveria alternativas de se promover o
saneamento ambiental integrado do Rio Maranguapinho se não fossem construídas
obras de controle de cheia em seu curso.
Para cumprir com sua finalidade principal, a barragem foi planejada para ser
gerida de forma a manter a cota de espera de cheias na cota 47,20 m, correspondendo
a um volume de acumulação de 1,138 hm³, que representa 12% da capacidade do
reservatório. O volume de espera para controle de cheia é de 8,287 hm³ (8.287.167 m³).

As obras da barragem do açude Maranguapinho foram concluídas em 2013 e,


em 2015, a Cogerh passou a monitorar este açude, tendo em vista o seu
aproveitamento no incremento da oferta hídrica da RMF.
38

5.5 A BARRAGEM DO RIO MARANGUAPINHO NO ÂMBITO DO PLANO DE


SEGURANÇA HÍDRICA DA REGIÃO METROPOLITANA DE FORTALEZA
(PSHRMF, 2016)

A maior parte da água distribuída na RMF se dá por meio de um macrossistema


que abastece, aproximadamente, 3,2 milhões de pessoas em Fortaleza e sedes de
Caucaia, Eusébio, Maracanaú e a localidade de Pedras, no município de Itaitinga. O
abastecimento de água potável em áreas tão adensadas e heterogêneas é um desafio
em tempos de escassez hídrica. Para atendimento das demandas da RMF, o
Castanhão contribui, em média, com 74% da oferta, frente a 26% do que é ofertado a
partir dos açudes das Bacias Metropolitanas.

Em 2015, como consequência da seca, estabeleceram-se para o açude


Castanhão, restrições aos usos múltiplos. Estas restrições implicam em proibição de
irrigação por inundação, redução de disponibilidade para culturas temporárias e
permanentes e na redução do trecho perenizado pelo reservatório. A Cogerh atua na
redução gradual de vazões para a RMF.

De acordo com monitoramento da SRH e Cogerh, as chuvas ocorridas em 2016


conseguiram aumentar o volume de alguns reservatórios pequenos. No entanto, na
maioria dos açudes e barragens que abastecem a população, o volume de água está
abaixo de 30%. Em 2012, por exemplo, o volume desses reservatórios era de 63,8%.
Em 2015, caiu para 18,8%. Em junho de 2016, chegou a 13,78%. Atualmente, dos 155
reservatórios monitorados pela Cogerh, 101 estão com menos de 30% da capacidade.

Diante dessa crise no abastecimento, a gestão do Estado, acionou o


bombeamento do Sistema Adutor da Barragem do Maranguapinho. A ação é parte do
Plano de Segurança Hídrica da Região Metropolitana de Fortaleza, apresentado como
uma das medidas para reduzir em 20% o consumo de água do sistema integrado de
abastecimento até a próxima quadra chuvosa.

Além de 3,8 km de adutora de 400 mm, foi construída uma Estação de


Bombeamento no local (na parede do reservatório, entre os municípios de Maranguape
39

e Maracanaú). No total, foram investidos R$ 3,8 milhões pela Companhia de Gestão de


Recursos Hídricos do Ceará (Cogerh). As águas têm como destino a estação de
bombeamento já existente em Maranguape, seguindo para a Estação de Tratamento de
Água (ETA) da cidade, onde eram tratadas e distribuídas para atender 87 mil pessoas.
A intervenção adiciona 200 litros por segundo ao sistema, destinadas à cidade de
Maranguape e aos distritos de Sapupara e Amanari, beneficiando agora, quase 104 mil
pessoas.
40

6 DISCUSSÃO DOS RESULTADOS

6.1 QUALIDADE HÍDRICA DO RIO MARANGUAPINHO

O uso de uma bacia hidrográfica de forma indevida pode influenciar diretamente


nos processos de degradação da mesma. A poluição hídrica, a descaracterização da
vegetação local, do solo e da morfologia do canal fluvial são alguns exemplos. Os
danos provocados à qualidade da água pela falta de tratamento dos efluentes lançados
diretamente nas águas do rio Maranguapinho, tem criado riscos à população ribeirinha.
Essa população específica, por estabelecer contato com essas águas, seja ele direto ou
indireto, acaba comprometendo sua saúde, aponta Maia (2011).

A eutrofização das águas é caracterizada pelo crescimento excessivo de plantas


aquáticas, algas e macrófitas devido ao aumento da disponibilidade de fatores
limitantes necessários à fotossíntese tais como luz e nutrientes (CHISLOCK et al.,
2013). Isso, consequentemente, ocasiona um desequilíbrio no ecossistema e a
degradação da qualidade d’água dos corpos hídricos de forma progressiva.

Em função dessas concentrações de nutrientes e/ou das manifestações


ecológicas verificadas em lagos e reservatórios, esses ambientes podem ser
classificados de forma genérica, como ultra-oligotrófico, oligotróficos, mesotrófico,
eutrófico ou hipereutrófico.

O estado trófico avaliado no Rio Maranguapinho está representado na Figura 12,


mostra a variação desse estado ao longo dos anos. De 2015 a 2018 o rio manteve o
nível máximo desse estado, denominado hipereutrófico, com exceção apenas de junho
e setembro de 2017, e junho de 2018 em que o rio apresentou um nível menor, mas
ainda assim significativo, denominado estado eutrófico.
41

Figura 12. Estado trófico do Rio Maranguapinho

Fonte: COGERH, 2018.

Segundo a portaria 2.912/11 do Ministério da Saúde, que dispõe sobre os


procedimentos de controle e de vigilância da qualidade da água para consumo humano
e seu padrão de potabilidade, a água destinada ao consumo humano deve atender aos
padrões de potabilidade hídrica, estabelecidos na referida portaria, os quais devem ser
baseados nos padrões de substâncias químicas que representam risco a saúde da
população. Estabelece também, parâmetros de qualidade hídrica para água no
reservatório e na saída da estação de tratamento. Existe um Valor Máximo Permitido
(VMP) para concentração dessas substâncias na água. Os parâmetros avaliados na
entrada e saída da ETA Maranguape e que são pertinentes a esse trabalho, são:

a. Cor aparente: A cor é geralmente um indicador da presença de metais (Fe, Mn),


húmus (matéria orgânica oriunda da degradação de matéria de origem vegetal),
plâncton (conjunto de plantas e animais microscópicos em suspensão nas
águas) dentre outras substâncias dissolvidas na água.
b. Turbidez: A turbidez é uma medida do espalhamento de luz produzido pela
presença de partículas coloidais ou em suspensão e é expressa como unidade
nefelométrica de turbidez. A turbidez é um parâmetro indicador da possível
presença de argila, silt, substâncias orgânicas (Ex: húmus) ou inorgânicas (Ex:
óxidos) finamente divididas, plâncton e algas.
42

c. pH: O pH é a sigla usada para potencial (ou potência) hidrogeniônico, refere-se à


concentração de [H+] (ou de H3O+) em uma solução. Assim, o pH indica se uma
solução é ácida, neutra ou básica.
d. Nitrito: O nitrito é um parâmetro simples, mas de fundamental importância na
verificação da qualidade da água para consumo, pois sua presença é um
indicativo de contaminação recente, procedente de material orgânico vegetal ou
animal.
e. Nitrato: Nitrato (NO3) é a composição de Nitrogênio e Oxigênio. O Nitrogênio é
essencial para a vida, porém alta concentração de Nitrato na água potável pode
ser perigosa para a saúde.
f. Cloreto: O cloro, na forma de íon, Cloreto (Cl-), é um dos principais ânions
inorgânicos em águas naturais e residuais. O cloro é um produto químico
altamente tóxico e venenoso ao ser humano, utilizado para a eliminação de
bactérias, vírus e germes. Níveis acima do permitido podem colocar em risco a
saúde de quem faz uso dessa água.
g. Ferro: O Ferro é uma substância química indesejável na água por gerar
coloração e sabor desagradável.
h. Sulfato: Os sulfatos são os ions mais abundantes em águas naturais, podendo
ser de origem geológica, resultado de contaminação por águas residuais,
fertilizantes (p. e. sulfato de amónio), intrusão salina, chuva ácida resultante da
presença de óxidos de enxofre (dos combustíveis fósseis), tratamento de água
(p. e. coagulação com sulfato de alumínio).
i. E. Coli: Substância biológica originária de contaminação fecal, bactérias
coliformes, um marcador conveniente para uma classe de agentes patogénicos
prejudiciais.
j. Cianobactérias: As cianobactérias são microrganismos presentes em ambientes
aquáticos com capacidade de produzir toxinas (cianotoxinas), em alguns casos,
altamente prejudiciais à saúde humana e animal, que podem causar graves
intoxicações pela ingestão e contato com corpos de água contaminadas.
43

A Tabela 4 compara os dados de qualidade da água bruta (que saem do


reservatório) com o Valor Máximo Permitido (VMP) estabelecido pela portaria 2.914/1,
que é o valor acima do qual representa possibilidade de causar prejuízos a saúde, e
mostram que existe alta concentração de E. Coli e Cianobactérias, além de exibir um
valor muito alto de cor aparente e turbidez. A ETA Maranguape começou a receber as
águas do reservatório da Barragem Maranguapinho a partir do ano de 2016, os dados
analisados são de 2016, 2017 e 2018.

Quadro 4. Qualidade da água bruta - Rio Maranguapinho

Valor Máximo
Permitido (VMP)
Parâmetro Unidade 2016 2017 2018
(Portaria
2.914/11)
Cor Aparente mgPt-Co/L 15 40 30 35
Turbidez NTU 5 52,4 29,7 20,3
pH P 6,0 a 9,5 - 8,27 7,86
Nitrito mg/L 1 0,01 0,01 0,01
Nitrato mg/L 10 0,1 0,1 0,1
Cloreto mg/L 250 118,24 141,39 96,67
Ferro mg/L 0,3 0,24 0,38 0,47
Sulfato mg/L 250 11,27 31,71 25,42
Escherichia Coli NMP/100ml Ausente 126 13 20,1
Até 20.000
células/ml antes
Cianobactérias Células/ml 1.283.865 96.565 197.714
de fazer análise de
cianotoxinas

Atende o VMP
Não atende o VMP

Fonte: Cogerh (2018); Ministério da Saúde (2011), adaptado pelo Autor, 2018.
44

Em função da construção da barragem, avaliou-se a necessidade de realizar a


dragagem do trecho onde a obra foi executada, pois grande parte desse corpo hídrico
estava assoreado. Em 2008, o Instituto Agropolos realizou um relatório técnico sobre as
características dos sedimentos ao longo do Rio Maranguapinho. Foram avaliados 43
pontos de amostragem com o objetivo de analisar a qualidade ambiental dos
sedimentos do rio em atendimento a resolução CONAMA 344 de 2004 e identificar o
melhor local de disposição final do material a ser dragado.

Dentre os resultados obtidos nesse relatório, os que foram identificados e que


são pertinentes a esse trabalho foram que, apenas 7 Estações apresentaram‐se acima
do limite recomendado pela resolução CONAMA 344/04. Contudo, apesar das outras
Estações de Amostragem terem apresentado parâmetros químicos abaixo do Nível 1 ou
abaixo do valor alerta da Resolução, a maioria desses pontos apresentou toxicidade em
nível agudo e/ou em nível crônico. Vale salientar ainda que na Estação 6 foi registrado
o maior valor de Nitrogênio Total desse monitoramento, a concentração encontrada
ultrapassou cerca de 65 vezes o valor alerta recomendado pela Resolução, resultado
esse típico de ambiente com intenso aporte de esgoto doméstico/sanitário.

Apesar dos parâmetros contemplados serem de resoluções diferentes, tanto o


relatório elaborado pelo Intituto Agropolos em 2008, como os relatórios de qualidade de
água bruta elaborado pela Cogerh (2016, 2017, 2018), mostram altas concentrações de
substâncias prejudiciais à saúde, em consequência do aporte de esgoto doméstico in
natura em vários pontos do rio e, consequentemente, no reservatório da barragem.

Quanto maior o número de resíduos em um manancial, sejam eles agentes


químicos ou biológicos, mais difícil e caro será seu tratamento, portanto, existe uma
certa necessidade de investimentos na região, nesse setor, para mitigar esses
problemas e, consequentemente, economizar recurso financeiro. É importante observar
que um recurso hídrico com as características do Rio Maranguapinho deve obedecer
um nível de tratamento mais avançado, para que sejam obedecidos os padrões de
potabilidade exigidos pela Portaria 2.914/11 do Ministério da Saúde.
45

A ETA responsável por realizar o tratamento da água do reservatório da


Barragem Maranguapinho é do tipo não convencional, composto de adutora, filtração
direta ascendente (FDA), filtração direta descendente (FDD), a dupla filtração (DF) e
filtração lenta (FL). O sistema é composto por cinco filtros rápidos ascendentes, com
diâmetro de 4,00 m com uma capacidade de tratamento de 157 L/s cada (taxa de
filtração = 180m³/m² x dia). A água bruta passa pelas seguintes etapas de tratamento:
Pré-oxidação com hipoclorito de cálcio, coagulação com cloreto de polialumínio e
polímero catiônico, filtração e desinfecção com ácido hipocloroso produzido a partir de
cloreto de sódio na usina geradora instalada na ETA.

Cada filtro da ETA é lavado diariamente por 15 minutos através de conjunto


motor-bomba 40 CV. Os filtros são lavados duas vezes ao dia durante 10 minutos cada.
Antes a captação era feita nos mananciais do açude Gavião e Acarape do Meio, as
descargas das águas residuárias oriundas das lavagens eram lançadas em um terreno
próximo à ETA que desaguava no riacho Gavião e posteriormente no Rio
Maranguapinho. Porém, em advento do Plano de Segurança Hídrica, a ETA passou a
receber água apenas do manancial do açude Maranguapinho. A estação possui 4
operadores e funciona 24 horas por dia em regime de plantão de 12 por 36 horas.

Segundo Teixeira (2004), alguns fatores influenciam no desempenho da filtração


direta, como por exemplo, a hidrodinâmica do fluido no meio filtrante e/ou etapa de
coagulação. Além disso, essa tecnologia apresenta limitações quanto à qualidade
microbiológica e físico-química da água bruta, especificamente quando esta apresenta
valores expressivos de turbidez, cor verdadeira ou concentração de algas e
microrganismos.

Processos físico-químicos convencionais combinados com a agregação de um


processo oxidativo avançado (POA), aplicados no tratamento da água de um manancial
eutrofizado é uma solução tecnológica eficiente e segura na potabilização da água
contaminadas com cianotoxinas. De acordo com Albuquerque (2017), os processos
oxidativos são economicamente viáveis e constituem práticas alternativas sustentáveis
e seguras para o tratamento de água contaminadas com esse tipo de composto.
46

6.2 BARRAGEM MARANGUAPINHO COM FINALIDADES MÚLTIPLAS

Como já foi abordado no referencial teórico, as barragens são divididas em


vários tipos, de acordo com sua estrutura e/ou finalidade. Muitas vezes se faz
necessário levar em consideração a adaptação dessa estrutura para mais de um
objetivo. Contudo, esse aproveitamento com múltiplas finalidades deve ser precedido
de uma análise hidrológica detalhada que verifique o balanço entre os volumes afluente
e efluente utilizado em cada uma das finalidades.

Nas barragens de contenção de cheias, é necessário que o reservatório


permaneça sempre no volume mínimo ou seco, esperando a próxima onda de cheia.
Em geral, nas barragens do Ceará, aproveita-se a água do reservatório para
abastecimento, ou seja, se o volume for pequeno, haverá água no reservatório o ano
todo. Essa condição é uma característica regional, que busca amenizar os efeitos
provocados pelos longos períodos de estiagem.

A Barragem do Rio Maranguapinho foi construída com o objetivo principal de


controlar e amortecer ondas de cheias, visando controlar a vazão a sua jusante e
diminuir a faixa de inundações. Porém, devido a necessidade de acumular água e
também para cumprir com a finalidade a qual foi projetada, a barragem foi planejada
para ser gerida de forma a manter a cota de espera de cheias na cota 47,20 m,
correspondendo a um volume de acumulação de 1,138 hm³, que representa 12% da
capacidade do reservatório. O volume de espera para controle de cheia é de 8,287 hm³.

A figura 13 mostra o nível do reservatório ao longo do tempo, do início de


operação até os dias atuais. É possível analisar que o volume do reservatório atinge
seu nível máximo nos meses mais úmidos, que correspondem ao período de janeiro a
julho (quadra chuvosa). Nos meses que se sucedem o volume diminui gradativamente,
porém não chega a ficar a abaixo de 50% da capacidade.
47

Figura 13. Nível do reservatório da Barragem Maranguapinho

Fonte: COGERH / FUNCEME, 2018.

No dia 16 de abril de 2018, durante o período chuvoso, foi registrado pelo G1


Ceará um incidente no curso do Rio Maranguapinho, que teve como agente causador o
aumento do nível do rio a jusante da barragem. Uma ponte provisória usada por
moradores do Bairro Jaçanã, em Maracanaú, desabou e deixou a população ilhada. A
estrada provisória foi construída pelo Governo do Ceará para que os moradores
pudessem cruzar o Rio Maranguapinho até que a ponte em construção fique pronta.
(Jornal G1 Ceará, 2018)

Essa informação vai de encontro com a problemática já apresentada


anteriormente sobre o efeito desse aumento de volume nas áreas de riscos a
inundação. Segundo dados da Defesa Civil de Fortaleza, em 2008 foram contabilizadas
cerca de 105 áreas de risco na capital cearense, parte dessas áreas estão localizadas
na faixa de inundação das bacias dos rios Maranguapinho e Cocó; um novo relatório de
mapeamento de recursos hídricos feito pelo mesmo órgão em 2015, identificou 48
áreas consideradas de alto risco e outras 37 de médio risco nos 110 canais e lagoas
catalogados. Nota-se que, de 2008 a 2015, a quantidade de áreas de riscos diminuiu
nas faixas próximo as bacias. Parte disso se deve a execução do Plano de Saneamento
Ambiental da Região Metropolitana de Fortaleza (PSARMF).
48

Entretanto, o registro acima alerta que o evento acontece mesmo que a


barragem esteja em estado operante. Esse fato ocorre, pois, em consequência da
necessidade de armazenar água para os períodos de estiagem na região do semiárido,
a recomendação de esvaziar o reservatório no fim da quadra chuvosa, para barragem
de contenção de cheias, não está sendo obedecida em sua totalidade.

Conforme expõe o Guia Básico de Segurança de Barragens (2001), elaborado


pelo Comitê Brasileiro de Barragens (CBDB), as barragens devem ser projetadas e
avaliadas para a passagem de uma Cheia Afluente de Projeto (CAP) sem perda de
capacidade do reservatório. É importante, também, que seja elaborado um estudo para
a Cheia Máxima Provável (CMP) e deve-se considerar a combinação mais severa
“fisicamente possível” dos seguintes fenômenos sobre a bacia hidrológica a montante
da estrutura sendo estudada, como por exemplo: tempestades; condições iniciais da
bacia (exemplo: umidade do solo, níveis do lago e do rio) e previsão de distúrbios
atmosféricos etc. o que provavelmente não foi previsto em projeto.
49

7 CONCLUSÃO

De acordo com os resultados obtidos nos levantamentos sobre a ETA


responsável por tratar as águas do reservatório da Barragem Maranguapinho e sobre o
comportamento da estrutura da barragem em advento da adequação de finalidade,
existem as seguintes situações:

Considerando as informações expostas na apresentação dos resultados, seria


recomendado que, caso houvesse a mudança de tecnologia da ETA para um sistema
composto por todas as fases do tratamento, que incluem coagulação, floculação,
decantação, filtração, desinfecção, tanque de contato, correção de pH e fluoretação,
incluindo ainda o processo oxidativo avançado, o procedimento seriamais eficiente e
seguro para o tratamento de mananciais com as características do reservatório do Rio
Maranguapinho. Além de ser economicamente viável e constituir-se como uma
alternativa sustentável.
Diante da realidade atual da barragem, existe o questionamento da
funcionalidade atual da barragem está obedecendo os critérios de operação exigidos
pelos órgãos fiscalizadores. Dessa forma, os órgãos responsáveis pela elaboração,
execução e operação da barragem deveriam ter previsto um cenário de crise hídrica
desde o princípio, portanto, é de extrema importância que sejam feitos novos estudos
mais elaborados que avaliem o impacto socioambiental dessa adequação de mudança
de funcionalidade da estrutura da barragem.
50

REFERÊNCIAS

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tratamento de água de abastecimento em sistema convencional seguido por
processo oxidativo avançado (poa). Campina Grande, 2017.

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51

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