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É difícil fazer um filme sobre um tema e em 90% do tempo o filme estar

"disfarçado", não sendo em quase nada sobre aquilo que parece. Million


Dollar Baby supostamente é um filme de boxe, tanto que
aproximadamente três quartos dele se passam dentro de um ginásio ou em
ringues espalhados pelo mundo. No entanto, o contexto em que o filme se
encaixa é bem diferente do que aparenta.

A trama mostra Maggie (Hilary Swank), uma americana que trabalha como
empregada de mesa e tem um sonho: ser lutadora de boxe. Tentando
alcançá-lo, ela passa a treinar em um ginásio à procura de um treinador.
Depois de muita insistência por parte de Maggie e uma ajudinha de Scrap
(Morgan Freeman), o dono do ginásio, Frankie Dunn (Clint Eastwood), que
inicialmente a rejeitou, acaba sucumbindo à insistência e aceita treiná-la.

Passamos então a acompanhar a evolução da menina, que, a princípio, mal


consegue se entender com um saco de areia. É mostrada uma dedicação
absurda por parte dela, com a realização de vários treinos noturnos,
alternando com o trabalho de empregada de mesa. Posteriormente ela
passa a derrotar as adversárias com extrema facilidade, chegando ao ponto
de ser concorrente ao título mundial de boxe. E, após essa luta, o filme dá
uma virada absurda, algo que me surpreendeu bastante.

Essa virada, aliada a alguns diálogos - principalmente do Scrap - é que me


fizeram perceber que muito pouco do filme é realmente focado no
boxe. Million Dollar Baby tenta, de maneiras variadas, mostrar as
dificuldades que a vida nos impõe. Danger (Jay Baruchel), por exemplo, é
um aspirante a lutador que demonstra ter algum tipo de deficiência. Em um
momento do filme, ele é espancado pelos próprios companheiros do ginásio,
e, pela minha leitura, aquilo é um modo do diretor (o próprio Eastwood, no
caso) demonstrar que, mesmo quando queremos muito alguma coisa, às
vezes não servimos para aquilo. Ainda que posteriormente o mesmo
personagem tenha um momento de esperança, o sentimento que a sua
trajetória me causou foi o descrito. Frankie, por sua vez, mostra-se como
um homem amargurado. Sabemos que ele teve algum tipo de atrito com
sua filha no passado, e que isto ainda o atormenta. Por isso, ele trata seus
boxeadores com extrema cautela, temendo colocá-los em lutas difíceis, por
medo de cometer algum erro novamente.

A própria trajetória da Maggie é bem tortuosa. Ela vem de uma família


pobre e que - considerando que há uma cena em que ela leva para casa um
bife deixado por um cliente - provavelmente passa fome. Mas mesmo
assim, ela não desiste do sonho. Mesmo sendo rejeitada, ela insiste, e
prova que é possível alcançar aquilo que sonhamos. E mesmo quando
conseguimos, sempre achamos pessoas e situações que tentam tirar o
prazer da nossa conquista. No caso dela, a própria família se mostra como
um obstáculo à sua felicidade, pois mesmo que ela tente agradá-los (sem
ter obrigação nenhuma de fazê-lo), ainda é maltratada.
Quando Maggie alcança o auge de sua carreira um incidente numa luta,
provocado por uma lutadora desleal, a deixa tetraplégica, retirando de
Maggie todas as probabilidades de continuar com o seu sonho.
No momento em que mais precisa de apoio, sua família só se interessa pelo
dinheiro que pretende herdar, e lhe vira as costas. Ela agora só conta com a
ajuda de Frankie que se mostra uma pessoa muito dedicada. A situação de
Maggie só piora e sua perna tem que ser amputada. Sem possibilidades de
melhora, ela pede para Frankie que acabe com o seu sofrimento, e desligue
seus aparelhos.

Frankie se recusa a conceder esse pedido, e Maggie num ato de desespero


para ser atendida, acaba se machucando, para tentar sensibilizar Frankie.
Ele termina cedendo ao seu apelo e lhe dá o medicamento que provoca seu
falecimento.

Longe de travar uma batalha entre os que são a favor ou contra a eutanásia,
Million Dollar Baby está um patamar acima disso. O diretor não tem o
intuito de dar um ponto final sobre o tema, quer apenas contar uma história
de vida, e a decisão individual de uma pessoa de pôr fim ou não nela,
ultrapassando as barreiras da lei.

Até onde vai o poder de uma pessoa de dispor de sua própria vida? Pode o
Estado, a Igreja, ou a Família reclamar o direito de decidir, contra a
vontade do indivíduo de continuar vivo ou não? A eutanásia é um crime ou
um ato de solidariedade? Essas são questões polemicas e que ainda
remanescem dúvidas. Para tanto faz – se necessário algumas lições sobre o
que é de fato a eutanásia.

Úlceras de pressão

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