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Dor e apagamento

O caso de Britney Spears revela como as mulheres têm dores invisibilizadas na


sociedade
Durante vinte minutos em uma audiência no tribunal superior de Los Angeles, a cantora
Britney Spears pede o fim da tutela do pai. O depoimento que parecia mais um pedido
de socorro impressiona pelo fato de que em pleno 2021 enquanto as mulheres teriam em
tese liberdade de fazer suas próprias escolhas, vemos Britney pedir para sair do controle
de um homem que além de lucrar à custa do seu trabalho interfere nas suas escolhas
pessoais. O caso da cantora revela como o patriarcado legitima o controle das mulheres
mesmo quando elas têm independência e carreira.

No livro “O segundo sexo”, Simone de Beauvoir argumenta que a condição feminina é


dada por um projeto patriarcal em que homens são sujeitos com história, enquanto
mulheres são objetos dessa história; por isso elas infelizmente se encontram em uma
posição de inferioridade.

O apagamento da existência feminina se deve ao desejo de controle sobre mulheres,


fruto da mentalidade machista presente nas relações familiares e sociais. Afinal meninas
crescem escutando de pais ou figuras masculinas que mulheres não nasceram para
comandar, ou ainda que mulheres sérias não fazem sexo no primeiro encontro. Porque o
delírio coletivo masculino considera agradável a convivência com mulheres que não
estejam em posição de poder ou que tenham sua sexualidade voltada para o prazer
masculino?

Não é à toa que somos condicionados a pensar que meninas são fáceis de criar porque
são quietas, quando na verdade a sociedade criou um modelo disciplinador para
mulheres e aquelas que não se encaixam nele sofrem escrutínio alheio. Quando olhamos
para a talentosíssima Marta vemos uma mulher que por seis vezes foi eleita melhor
jogadora pela Fifa e com uma atuação em campo superior à de jogadores como Neymar,
Gabriel Jesus, homens que além de performances duvidosas por vezes apresentam
comportamentos de instabilidade dentro e fora de campo. Mas infelizmente, apesar de
tudo isso Marta é chamada de “Maria Machão”, “Sapatão”. Seu trabalho parece não ter
reconhecimento; talvez seja esse preço que uma mulher paga ao invadir um território
tido como masculino.
A dominação masculina sob a justificativa da proteção é o equívoco do caso de Britney.
É fato que ela passou por momentos de instabilidade emocional, mas para Jamie Spears
o seu cuidado não é trazer conforto emocional para uma mulher que foi sexualizada
quando adolescente ou que foi colocada como vilã ao fim de seu relacionamento com
Justin Timberlake. Para James a sua proteção é interferir nas escolhas pessoais da filha,
não lhe permitindo cuidar dos filhos, fazer novas amizades. Interessante que ele
considera Britney apta para trabalhar e fazer dela a sua máquina de dinheiro que lhe dá
lucros de cinco mil dólares por mês.

Quando uma sociedade é orientada por pensamentos machistas, infelizmente é de se


esperar que a justiça que se tem a oferecer seja aquela que coloca mulheres como rés,
seres que não tem direitos. Basta lembrar do caso de Mariana Ferrer, em que o
advogado de acusação lhe considerou culpada do estupro que ela sofreu.

Ao final de “O segundo sexo”, Simone de Beauvoir alerta que a união das mulheres
permitirá que elas vençam o apagamento e se tornem sujeitos com existência própria.
Contudo, mais do que união necessitamos de representatividade feminina em posição de
poder,caso contrário Britney e tantas outras mulheres continuarão a ter seus sofrimentos
silenciados.

Patrícia, seu texto tem muito potencial, tanto que fiz pouquíssimos comentários!

Dois pontos me chamaram atenção positivamente:

1- O vigor opinativo. Fica muito claro o que você pensa sobre o assunto (como deve
acontecer em textos assim). Nas próximas atividades, mantenha esse estilo direto e
incisivo.

2- Também gostei do fato de você ‘ultrapassar’ o assunto do editorial. O caso Britney


aparece, naturalmente, mas ao lado de várias outras relações. Dessa forma, a leitura
ganha densidade e complexidade.

Faço ressalvas apenas à construção frasal. Algumas frases estão muito longas, ocupando
todo um parágrafo, e sem vírgulas separando os adjuntos. Tenha cuidado porque isso
pode atrapalhar o entendimento do conteúdo. Sugiro o seguinte exercício: reescrever o
texto com frases menores. Depois, comparar as duas versões.

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