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Eutanásia em cães com leishmaniose não diminui a doença entre humanos, dizem

especialistas.

A morte de cães que hospedam o parasita causador da leishmaniose, prática comum no


Brasil, não se refletiu na diminuição da incidência da doença entre os seres humanos. A
conclusão é dos participantes de audiência pública da Comissão de Meio Ambiente e
Desenvolvimento Sustentável da Câmara que reivindicaram avanços no tratamento dos
animais para evitar a eutanásia. A leishmaniose é uma doença causada por um parasita que é
transmitido por um inseto conhecido como mosquito palha.

É infecciosa, mas não é contagiosa. Se for tratada a tempo, tem cura. No Brasil, a
incidência em crianças é alta e cerca de 240 pessoas morrem anualmente em decorrência da
doença, em geral vindas das camadas mais pobres da população. Há dois tipos da doença: o
tegumentar, que atinge a pele e as mucosas; e o visceral, mais grave, que compromete órgãos
como o baço e o fígado. O Brasil faz parte de um grupo de seis países que concentram 90% dos
casos de leishmaniose visceral. Além do ser humano, são vítimas da doença mamíferos
silvestres e domésticos. O cão é o principal hospedeiro do parasita nas zonas urbanas,
podendo transmitir a leishmaniose para a população por meio do mosquito.

Segundo o deputado Fred Costa (Patriota-MG), que solicitou a realização do debate, o


problema é que, apesar de uma nota técnica do governo autorizar desde 2016 o uso de um
medicamento para o tratamento dos cães, a prática da eutanásia pelos municípios ainda é
generalizada. Na medida que nós optamos pela política pública do sacrifício, esses animais não
estão tendo a oportunidade sequer de ter o tratamento, desde a opção mais barata até a
opção mais complexa", lamentou.

Durante muitos anos, a incidência da leishmaniose se concentrou na região Nordeste, mas


segundo o professor Gilberto Fontes, da Universidade Federal de São João Del Rey, em Minas
Gerais, a doença já alcançou outras partes do País. Ele mostrou resultados de uma pesquisa
feita em Iguatama, município de 8 mil habitantes no centro-oeste mineiro. Em 2013, 8,3% dos
cães da cidade tinham leishmaniose e sofreram eutanásia. Em 2017, o índice diminuiu para
7,4%, uma diferença estatisticamente irrelevante. "A eutanásia como único programa de
controle não foi satisfatório e nós temos outros trabalhos na literatura que mostram que
apenas a eutanásia dos cães como programa de controle não vai levar à diminuição de
transmissão nas regiões", ressaltou. Representante do departamento de Imunização e
Doenças Transmissíveis do Ministério da Saúde, Francisco de Lima Júnior comparou a
dificuldade de eliminar a leishmaniose à erradicação da dengue, transmitida pelo Aedes
aegypti. Ele salienta que o Ministério da Saúde está apostando na distribuição de uma coleira
com inseticida, método de prevenção da leishmaniose defendido pelos especialistas e já
comprou 1 milhão de unidades. Francisco negou que a prática da eutanásia seja uma
prioridade. "A eutanásia é uma opção para aqueles animais com a carga parasitária altíssima e
que não podem receber tratamento, colocando em risco não só a saúde humana, mas todos os
outros animais que estão ali presentes.

Por isso, a eutanásia ainda é uma medida necessária, mas a gente vai ver que ela vai se
tornar cada vez menos frequente, pelas estratégias que a gente está adotando", esclareceu.
Alguns debatedores apontaram que a Constituição garante a dignidade animal. Monique
Gonçalves, do Ministério Público de Minas Gerais, ressaltou que a eutanásia deve ser a última
opção, só quando outras providências tomadas pelo Poder Público não se mostrarem eficazes.

A promotora de Justiça aponta discriminação no tratamento, já que o único remédio aprovado


tem custo alto. "Os animais que vivem nas ruas ou com tutores que não têm capacidade
financeira já vivem em situação baixa de bem-estar.

E aí, eles vão ser duplamente penalizados, sendo mortos por essa circunstância?", lamentou.

Os participantes da audiência pública se propuseram a elaborar um documento para ser


entregue ao Ministério da Saúde com as reivindicações para avançar no tratamento da
leishmaniose em cães.

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