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Uma Carta Aberta
No ano passado, eu, como muitos de vocês, me preocupei com a ação judicial
entre a Igreja Local, liderada por Witness Lee, e a Spiritual Counterfeits Project
(SCP), Neil T. Duddy e o editor de seu livro, The God-Men. Inicialmente, preocupou-
me o fato de que um grupo cristão, isto é, a Igreja Local, levasse outros cristãos à
justiça (ou a um tribunal), até que descobri que os líderes da igreja já haviam
exaurido todos os meios menos rigorosos para que o livro fosse recolhido e seus erros
reconhecidos.
Recentemente foi-me pedido pela Igreja Local para começar uma investigação
sobre sua vida e crença, mais rigorosa do que me fora possível nos anos anteriores,
enquanto trabalhava na minha Enciclopédia of Amerícan Religions. Comecei essa
investigação em 1984, e algumas das averiguações estão inclusas no artigo anexo que
apresento para sua consideração.
Parte do meu estudo da Igreja Local implicou na leitura da maioria dos
escritos publicados de Witness Lee e das colocações prolongadas de Neil T. Duddy e
Brooks Alexander (da SCP). A experiência provou ser das mais dolorosas de minha
vida cristã. A medida que comecei a conferir as citações de Witness Lee usadas no
livro de Duddy, descobri que The God-Men tomara invariavelmente sentenças dos
escritos de Lee e, colocando-as fora do contexto, fez com que dissessem exatamente
o oposto do pretendido por ele. Isto foi feito desconsiderando os ensinamentos e
afirmações claras a respeito das grandes verdades da fé cristã encontradas por todos
os escritos de Lee. Notei também, a tentativa ridícula de equiparar a prática da
Igreja Local de orar-ler com o uso de mantras nas religiões orientais. Elas não trazem
quaisquer semelhanças. Quando li os depoimentos, especialmente o de Duddy, fiquei
chocado ao descobrir o número de substanciais acusações difamatórias feitas contra
Lee em The God-Men, que foram integralmente baseadas em narrações não
confirmadas de não mais que um único ex-membro hostil. Frequentemente, tomando
a palavra de um ex-membro, Duddy não buscou nenhuma verificação independente
dos supostos incidentes, antes de fazer sérias acusações de má administração
financeira, distúrbios psicológicos entre os membros da Igreja Local e seus atos
ilegais tentando molestar ex-membros.
Tendo sido defensor da SCP, especialmente da sua tentativa de proporcionar à
comunidade material de qualidade a respeito de religiões alternativas, fiquei
verdadeiramente abalado à medida que minha pesquisa prosseguia. Preocupou-me
que tal paródia sobre a vida de um grupo de cristãos tivesse sido escrita, que fosse
patrocinada por tal organização como a SCP e então publicada por uma editora de
tanta reputação como a Inter-Varsity Press. Fiquei ainda mais abalado, entretanto,
pelas implicações óbvias de ética envolvidas na produção de tal livro. Os enganos e
afirmações errôneas no livro são tão freqüentes e persistentes que forçam a crer que
The God-Men é, simplesmente, o produto de uma pobre erudição.
Foi minha infeliz tarefa ter de apresentar estas descobertas à Corte em
Oakland, Califórnia, em 28 de maio, durante o julgamento contra Duddy e o editor
alemão.
Do volume de material apresentado naquele julgamento, apenas uma pequena
porção, embora representativa, pode ser mencionada no documento anexo.
Entretanto, à luz daquele material, só posso concluir que nós, na comunidade cristã
evangélica, cometemos um grande erro para com a Igreja Local e devemos dedicar-
nos, imediatamente, a tentar desfazer os danos tanto quanto pudermos. Devemos
começar com nosso repúdio público a The God-Men e a retirada de circulação de
todos os artigos e panfletos que foram escritos baseados nele. Podemos também
começar a considerar novamente os ensinamentos da Igreja Local. Eu, pessoalmente,
fui incapaz de encontrar um único ponto sobre o qual ela se desvie de qualquer
doutrina essencial da fé cristã, embora tenha diferenças em assuntos que todos nós
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consideramos secundários, isto é, preocupações doutrinárias sobre as quais os
cristãos podem discordar sem expulsar uns aos outros da comunidade cristã, em
particular, eclesiologia e devoção.
Espero que vocês tenham pela questão da Igreja Local sua séria consideração.
Em um futuro próximo, espero que seja publicada uma transcrição completa do
julgamento, para que vocês tenham acesso a todo o material sobre o qual eu e os
outros chegamos à nossa conclusão a respeito da natureza totalmente incorreta e
difamatória de The God-Men.
Seus em Cristo.
J. GORDON MELTON
P.S. Pode ser que a contínua controvérsia entre a SCP e a Igreja Local tenha
despertado dúvida em sua mente sobre a adequação dos outros trabalhos de Spíritual
Counterfeits Project. Espero atenuar algumas das preocupações, à medida que ainda
creio que The God-Men seja uma obra atípica da SCP. Recentemente, fui co-autor de
um livro Juntamente com um dos membros da diretoria da SCP, Ronald Enroth. No
apêndice, escrito durante as minhas descobertas sobre The God-Men, ainda pude
recomendar toda a sua obra à Igreja. Espero continuar capaz de recomendá-la no
futuro.
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A Igreja Local:
Uma Reflexão Sobre Seus
Ensinamentos
Durante os últimos anos, a Igreja Local e o seu mais proeminente mestre
tornaram-se o foco de uma intensa controvérsia gerada por vários livros criticando as
crenças e práticas da Igreja. As acusações mais sérias contra Lee e a Igreja foram
veiculadas em The God-Men (1981) por Neil T. Duddy e a SCP (Spiritual Counterfeits
Project)1, que objetou a posição da Igreja Local como um grupo cristão ortodoxo e
fundamentalista, e que crê na Bíblia. Essas acusações são tão sérias e tão amplas em
sua extensão, tocando quase todos os aspectos da vida da Igreja Local, que se
tornaram o motivo de uma grande ação judicial e uma preocupação da grande
comunidade cristã.
Meu interesse particular na Igreja Local começou no início dos anos 70, depois
de adquirir vários livros de Watchman Nee, os quais, apesar de discordar de uma
série de articularidades, achei a leitura adequada. Em meados dos nos 70, descobri a
Igreja em Chicago e assisti a diversas reuniões, onde obtive alguns dos livros de
Witness Lee. Estas visitas, que ocorreram num período de vários anos, proveram a
base para o verbete a respeito da Igreja Local na Enciclopédia of American Religions
(1979)2. Desde aquela época, periodicamente, tenho visitado a livraria da Igreja em
Chicago, que contém uma ampla seleção de literatura cristã, especialmente alguns
livros de editores evangélicos ingleses difíceis de encontrar. Em anos mais recentes,
intensifiquei meu estudo da Igreja Local, em parte por causa da controvérsia
envolvendo os ataques a ela e, em parte, por causa de viagens constantes que me
têm permitido visitar as reuniões da Igreja Local em outras cidades e observar e
participar da sua adoração. Embora sendo um intruso (sou ministro de Igreja
Metodista Unida), os membros e presbíteros na Igreja Local sempre me deram boas-
vindas às suas reuniões e livremente responderam a todas as minhas perguntas.
Ao mesmo tempo, na minha qualidade de Diretor do Instituto para o Estudo da
Religião Americana, estive também escrevendo sobre as religiões alternativas na
América e familiarizei-me com as publicações do Spirit Counterfeits Project (SCP),
um dentre mais de cem ministérios cristãos para pessoas em religiões não cristã
heréticas. Fiquei impressionado com sua literatura que como um todo, de melhor
qualidade do que a maioria vários ministérios estavam produzindo a respeito das
novas religiões.
Mas, minhas experiências com a Igreja Local deixaram-me um pouco surpreso,
quando comecei a vê-la associada outras religiões alternativas controversas e
classificadas como "grupos tipo seita", particularmente na literatura da SCP 3. Fui
levado a crer que a Igreja Local era bastante ortodoxa tendo a maioria da sua
doutrina derivado diretamente Irmãos de Plymouth, de cuja ortodoxia ninguém
duvidava. Parecia diferir apenas em sua defesa do princípio de "uma igreja para uma
comunidade local", algumas práticas pietistas, algo diferente (todavia aceitáveis)
como orar-ler a Escritura e o uso de alguns jargões arcaicos, que foi previamente
utilizados na teologia dos patriarcas da igreja Grega, no seu falar sobre Deus (i.e.
amalgamar).
A medida em que a controvérsia se avolumava, comecei a ler, com alguma
profundidade, a literatura anti-igreja Local, que me levou aos muitos livros de
Witness Lee e vários itens publicados pela Igreja Local em resposta aos ataques.
Como resultado daquele estudo, fiquei convencido que a minha avaliação original da
Igreja Local era verdadeira e que os críticos, particularmente Neil Duddy, tinham
feito juízo errôneo e dado à comunidade cristã uma impressão tremendamente falsa
da Igreja Local. Fiquei convencido de que, embora haja provavelmente alguns pontos
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que possam exigir algum esclarecimento, e outros, alguma critica como um todo, as
crenças e práticas da Igreja Local estão bem dentro dos limites da ortodoxia cristã. A
crítica de Duddy à Igreja Local é tão extensa que seria necessário um livro duas vezes
maior do que o seu, para avaliar suas muitas acusações. Por isso, escolhi focalizar um
grupo importante de críticas relativas à visão da Igreja Local sobre a autoridade da
Bíblia. A compreensão que Witness Lee tem da Bíblia é um ponto importante ao se
avaliar a alegação da Igreja Local em ser um grupo cristão evangélico. Igualmente
importante, o ataque de Duddy sobre a legitimidade dessa compreensão é ilustrativo
do seu método de abordagem a todos os escritos de Lee, e, creio eu, põe em questão
a adequabilidade de ambos: o método e o conteúdo do seu trabalho.
Considerações Preliminares
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A intenção homilética é também muito evidente em todos os escritos de Lee.
Fiel ao seu propósito central de ensinar o evangelho, ao que é basicamente uma
audiência leiga, Lee concentra-se em aspectos mais práticos dos ensinamentos
cristãos. Seus livros, a maioria dos quais são comentários sobre a Escritura, deveriam
ser classificados como “exposição" e não como "exegese". Embora a obra exegética
esteja atrás da expositóría, ela não é facilmente visível. Ele também dá pouco
espaço para pontos teológicos formais. Por exemplo: ele raramente discute as
doutrinas mais abstraias a respeito de Deus, antes, escolhe enfatizar o trabalho de
Deus na comunidade humana. Isto não quer dizer que ele não faz as mais abstratas
afirmações acerca de Deus, mas mostra que ele tem prioridade e preocupações
imediatas diferentes daquelas de um professor teológico. Sua posição é resumida e
seu estilo claramente ilustrado numa passagem do seu Estudo-Vida de Gêneses:
"Gênesis 1:26 revela que foi realizada uma conferência pela Deidade e entre
a Deidade. Dizemos "entre" porque Deus é triúno. Usando termos humanos, podemos
dizer que há três Pessoas na Deidade, um Deus com três Pessoas. Não posso explicar
isso. Posso apenas dizer que Deus é triúno, que temos um Deus com três Pessoas. Foi
realizada uma conferência por estas três Pessoas da Deidade, e uma decisão foi
tomada..." assim, ele prossegue com sua exposição da criação.7
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Nelson Darby e os Irmãos de Plymonth. Cada um dos movimentos anteriormente
citados restaurou algo que fora perdido durante os anos de dominação Católica
Romana da Igreja e, todavia, cada um ficou parcialmente defeituoso. Na história,
cada um representou o mover de Deus num determinado momento, embora cada um
tivesse perdido a substância espiritual de sua primeira geração e/ou tenha se
desviado daquilo que Nee e Lee viram como um testemunho claro da verdade. Um
tema principal na restauração foi o movimento para fora do governo episcopal
católico e da liderança de bispos e padres, em direção à forma bíblica de governo de
igreja local nas mãos dos presbíteros.
Darby e os Irmãos Unidos representam um passo maior na restauração.
Rejeitando o denominacionalismo e o clericalismo, Darby optou por uma comunhão
de assembléias locais, cada uma encabeçada por presbíteros não ordenados, que
ensinavam e dirigiam a ceia do Senhor. Na comunhão como um todo, Darby estava
entre os primeiros de um grupo de obreiros que viajavam de igreja em igreja, agindo
como um supervisor e evangelista para a igreja como um todo. Assim como seus
contemporâneos, que fundaram a Igreja dos Discípulos de Cristo nos Estados Unidos,
Darby viu Deus rejeitando as divisões escandalosas do cristianismo e conclamou os
cristãos para saírem do denominacionalismo (e denominações) para a única
comunhão dos Irmãos (ou Discípulos, conforme o caso). Darby não viu a si próprio
como alguém que formava uma nova seita, ao contrário, ele estava reformulando a
única Igreja de Cristo verdadeira em sua base bíblica e chamando os cristãos para
dentro de sua expressão organizada.
Nee foi criado em uma família cristã e, na sua infância, experimentou tanto a
igreja Congregacional quanto a Metodista. Logo cedo em sua vida ele experimentou
uma variedade de tradições evangélicas britânicas independentes e, por fim,
associou-se a um ramo exclusivo dos Irmãos de Plymouth. Seu rompimento com esses
irmãos veio após ter "partido o pão" com um outro grupo liderado por T. Austin-
Sparks. Lee foi também um membro dos Irmãos de Plymouth antes de se unir a Nee,
no movimento da Igreja Local. Eles compartilhavam com os Irmãos algumas idéias,
muitas vezes severas, sobre denominações, denominacionalismo e outras igrejas.
Não se pode entender separadamente a Igreja Local de suas raízes e
participação contínua no movimento iniciado por Darby e seus colegas. A Igreja
tomou dos Irmãos Unidos a maioria de suas crenças (por exemplo:
dispensacionalismo), organizações e práticas. Os mais populares autores extra-Igreja
Local lidos pêlos membros do movimento são os Irmãos Unidos e os escritores
evangélicos fortemente influenciados por esses irmãos, os quais influenciaram
profundamente a Nee e Lee.
A história da restauração, como entendida e experimentada por Lee e a Igreja
Local, tem um efeito duplo. Ela posiciona a Igreja Local no centro do fluir da história
cristã e se vê relacionada com e sendo uma parte dessa história. Os membros
reconhecem a contribuição dos grandes autores e líderes cristãos do passado e do
presente e sua unidade com os cristãos em todas as Igrejas do cristianismo. Sobre
esta base os membros da Igreja Local podem ter e têm comunhão com os crentes nas
denominações.
Também é verdade, entretanto, que a Igreja Local afirma que o mover
principal de Deus hoje está em e ocorre através do movimento da Igreja Local.
Enquanto toma muito dos estágios anteriores da restauração, ela acrescentou a
verdade adicional: a unidade da igreja baseada no princípio de uma igreja em cada
cidade. Esta noção simples diferencia mais claramente a Igreja Local dos Irmãos
Unidos, com quem ela compartilha uma forma similar de governo da igreja.
Num modo prático, esta única doutrina tem limitado, pelo menos até certo
nível, suas relações com igrejas denominacíonais. Deus está, crêem eles, levando a
Igreja Universal a uma expressão visível da Sua unidade baseada na localidade. Desde
que divisões denominacionais estão erradas, a Igreja Local não coopera com
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estruturas denominacionais. Todavia, uma vez que a unidade da Igreja inclui todos os
cristãos, e que a Igreja Local reconhece irmão e irmã cristãos apesar da sua
participação numa igreja denominacional, os membros da Igreja Local não vêem
nenhuma barreira à sua comunhão com cristãos individuais de todas as
denominações. Assim, a Igreja Local dá as boas-vindas a não membros em sua mesa
de comunhão e, embora, não seja adotada cooperação de grupo, os membros da
Igreja Local mantém fortes laços pessoais com cristãos de fora.
Uma certa compreensão das raízes históricas da Igreja Local provê um ponto
de partida para uma ponderação da compreensão que Witness Lee tem da Bíblia e da
autoridade bíblica. Os Irmãos Unidos e os grupos evangélicos correlatos eram, antes
de tudo, estudiosos da Bíblia. Tanto Nee quanto Lee seguiram este padrão, embora
Nee fosse mais propenso a escritos sistemáticos. Lee surgiu primordialmente como
um expositor bíblico e tipicamente tem concentrado seu ensinamento numa
apresentação da Escritura capítulo por capítulo. Entretanto, é uma alegação de
Duddy que, na verdade, Lee sustém uma visão muito questionável da Escritura.
Segundo The God-Men, Lee degrada a Escritura e sua autoridade a um ponto
inaceitável aos cristãos evangélicos. Em outras acusações, ele acusa Lee de:
(1) negar a *revelação preposicional;
(2) desdenhar qualquer necessidade de guardar a lei moral (especificamente
os Dez Mandamentos) e, com efeito, desviar as pessoas da ética bíblica;
(3) depreciar o pensamento, o estudo e o papel da mente na leitura da Bíblia;
(4) no lugar de autoridade bíblica, Lee coloca-se como um oráculo da nova
revelação. Cada uma dessas acusações serão consideradas abaixo.
* Revelação Proposicional
Romanos 7:6 diz: "Agora, porém, libertados da lei, estamos mortos para aquilo
a que estávamos sujeitos, de modo que servimos em novidade de espírito e não na
caducidade da letra" (V.R.A). Ora, sabemos o que significa a palavra "letra" aqui: é a
Bíblia escrita. Hoje, devemos servir o Senhor vivo com novidade no espírito, não
segundo a caducidade da Bíblia escrita. Posso dizer isto ousadamente, porque sou um
pequeno seguidor desse mais ousado, o apóstolo Paulo. Agora servimos não segundo a
caducidade do código escrito, a Bíblia escrita, mas segundo a novidade do espírito.
Por quê? Porque no espírito está Cristo, enquanto que no código escrito está a
religião. Isto é Cristo versus a religião.
Que é ser religioso? Ser religioso é simplesmente ser correio, bíblico e
fundamentalista, sem, todavia, a presença de Cristo. Se carecemos da Sua presença,
não importa o quão bíblicos sejamos, somos simplesmente religiosos. Paulo, nestes
dois versículos de Romanos, lançou um sólido fundamento para Cristo versus religião
Hoje, nosso culto, nosso trabalho e até mesmo a nossa vida devem ser totalmente no
espírito, não meramente segundo as letras da Bíblia escrita. Sei que, quando digo
isso, corro, um sério risco. Serei acusado da heresia por desviar as pessoas para longe
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da Bíblia. Mas eu simplesmente cito estas duas passagens da Escritura: Romanos 2:29
e 7:6. Todos devem admitir que a palavra "letra", nestas passagens, refere-se às
Escrituras escritas. Não pode haver discussão. Cristo é versus religião: Cristo é versus
o código escrito. Podemos ter a citação correta do código escrito e, todavia, termos
falta de Cristo, assim como os fariseus e os escribas nos tempos antigos. Devemos
estar alerta para não prestarmos muita atenção ao código escrito. Se o fizermos, será
totalmente possível e extremamente provável que perderemos Cristo. O único
caminho da segurança é contemplar "com o rosto desvendado a glória do Senhor" (2
Co 3:18)9.
Enquanto as duas frases, tomadas separadamente, parecem degradar a
Escritura, estas não se encontram sós. No texto de Lee elas se tornam uma parte não
de uma depreciação da Escritura, mas de um ataque à idolatria, a idolatria que
coloca o código escrito entre nós e Deus, de perdermos Deus por seguirmos uma
religião fabricada pelo homem — seja ela á lei do Velho Testamento ou uma tradição
cristã mais moderna. Ao extrair as duas frases do meio do parágrafo de Lee, Duddy
distorce completamente o que Lee quer dizer, e sua hipérbole é feita para significar
o oposto do pretendido por Lee.
Mas, que ensina Lee sobre a Bíblia como uma revelação de Deus? Ele afirma
aderir à declaração das crenças da Igreja Local: "Cremos que a Bíblia Sagrada é a
revelação divina completa, verbalmente inspirada pelo Espírito Santo". Mas, será que
ele segue esse posicionamento em suas palestras? Duddy diz que não: "Para Witness
Lee, estamos liberados das obrigações de acatar a Bíblia escrita por causa de sua
vaga inferioridade"11
Após um ligeiro exame dos escritos de Lee, é-se imediatamente levado a
espantar-se com a afirmação de Duddy. A maioria das volumosas obras de Lee são
palestras expositoras sobre os livros da Bíblia. Ele dispendeu toda sua vida fazendo
conferências e ensinando sobre a Escritura. Será essa a atividade de uma pessoa para
quem a Bíblia assumiu uma posição secundária, para quem a palavra escrita possui
meramente uma vaga inferioridade? Se assim fosse, Lee seria verdadeiramente
singular. Ele seria a única pessoa que conheço a seguir tal rota. Porém, num exame
mais acurado, que ele ensinou sobre a Bíblia? Seus ensinamentos conformam-se à
declaração de fé da Igreja Local ou à avaliação de Duddy? Por exemplo, na sua
exposição de Gênesis, ele ensinou:
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Suas palavras são mais consistentes em sua abertura de estudo:
Louvado seja o Senhor pela Bíblia! Louvado seja o Senhor pela vida, a vida
divina, a vida eterna que está contida neste Livro! E louvado seja o Senhor por nos
ter proporcionado esta oportunidade de termos um estudo-vida da Sua Palavra divina
com uma congregação tão grande!...
Que é a Bíblia? Sabemos que a palavra "Bíblia" significa "O Livro". Mas, que é
este Livro? A própria Bíblia diz: "toda escritura" ou "toda escritura é soprada por
Deus" (2 Tm 3:16 - gr.). A Bíblia é o sopro de Deus. Não é meramente a palavra ou o
pensamento de Deus, mas o
* N.T. — Jornais diários de Los Angeles e Santa Ana, cidades do estado da Califórnia - USA.
próprio sopro de Deus. Tudo o que expiramos é o nosso sopro e este sopro procede do
nosso ser. Assim, a Bíblia, como o sopro de Deus, é algo expirado do ser de Deus. A
Bíblia contém o próprio elemento de Deus. Tudo o que Deus é está contido neste
livro divino. Deus é luz, vida, amor, poder, sabedoria e muitos outros itens. Todos
estes itens do que Deus é foram soprados para dentro da Bíblia. Sempre que nos
achegamos a este Livro com o coração e o espírito abertos, podemos tocar,
imediatamente, algo divino: não simples pensamentos, conceitos, conhecimento,
palavras ou frases, mas algo mais profundo do que todas estas coisas. Nós tocamos o
próprio Deus.14
Para que não pensemos que estas preleções sobre Gênesis, que ocorreram em
vários anos da vida de Lee, em princípios dos anos 70, são únicas, compare-as com
esta citação. Em meio a uma dissertação das práticas de adoração da Igreja Local,
Lee diz:
Alguns podem acusar-nos de sermos liberais demais (por não ter nenhuma
opinião em muitos assuntos do que pode acontecer durante a adoração); eles podem
chamar-nos de "cristãos liberais". Mas, cuidado, este termo: "cristão liberal" refere-se
aos modernistas que não crêem que a Bíblia é a revelação divina, nem que Jesus
Cristo é o Filho de Deus, que consumou a redenção, ressuscitou e ascendeu aos céus.
Esses são os liberais; nós não. Nós morreríamos pela Bíblia. Cremos que a Bíblia é a
Palavra divina de Deus e cremos que o nosso Senhor Jesus Cristo é o próprio Deus
encarnado para ser um homem, que morreu na cruz pêlos nossos pecados e foi
ressuscitado fisicamente, espiritualmente e literalmente. 17
A Bíblia e a Moral
12
porque os cristãos também são divinos, eles não deveriam estar sujeitos às leis
morais externas"20. Para ilustrar esta posição, Duddy refere-se ao capítulo quatro do
livro de Lee: Christ and the Church Revealed and Typified in the Psalms 21. Lee lança a
hipótese de que uma progressão espiritual é mostrada em Salmos e inclui um
diagrama para ilustrar sua posição. Na página 42 de The God-Men, Duddy reproduz o
que ele diz ser o diagrama na pagina 40 do livro de Lee, mas, ao examinar-se o
diagrama no livro de Duddy, ele está significativamente modificado em relação
àquele publicado por Lee. Primeiramente, parte do diagrama de Lee foi removido e,
o mais importante, foram acrescentadas palavras para induzir que Lee dividiu os
Salmos em aqueles que foram humanamente inspirados e os que foram divinamente
inspirados. Entretanto, em nenhum lugar neste livro ou em seus outros escritos, Lee
traça tal distinção. Lee traça uma distinção entre vários Salmos, a mesma distinção
que os cristãos amplamente delineiam entre o Velho e o Novo Testamento — aqueles
que tomam a lei como seu centro e base e os que conduzem em direção a Cristo, isto
é, o Ungido de Deus, como sua base. Todos são inspirados por Deus, mas Cristo é
maior do que a lei. Lee está simplesmente reiterando o que o dispensacionalismo
tem ensinado desde Darby, que a dispensação da lei foi seguida pela dispensação da
graça e que esta última foi melhor para nós.
Mas quando Lee está discutindo moral, não a tipologia de Cristo no Velho
Testamento, que ele diz sobre a responsabilidade do cristão diante da lei moral? Essa
questão, como se pode esperar, surge continuamente em seus comentários sobre o
Evangelho de Mateus. Por exemplo, em sua exposição de Mateus 5:17, ele diz:
Antes de Cristo vir, existia a lei com o fortalecimento através dos profetas.
Por que, então, ainda havia a necessidade da lei do reino dos céus? A razão é que as
exigências da velha lei não eram suficientemente elevadas. Os requisitos da velha lei
não eram completos. Tome como exemplo o assassinato. A velha lei ordenava-nos a
não matar (Ex 20:13), mas, não dizia nem uma palavra sobre a ira. Se você matasse
alguém, você seria condenado pela lei de Moisés. Mas não importava o quanto
estivesse irado com alguém, desde que não o matasse, você não seria condenado
pela lei de Moisés... De acordo com a lei do reino dos céus, somos proibidos de nos
irarmos contra os nossos irmãos. Nos versículos 21 e 22, o Senhor disse: "Ouvistes que
foi dito aos antigos: Não matarás; e: Quem matar estará sujeito a julgamento. Eu,
porém, vos digo que todo aquele que se irar contra seu irmão estará sujeito a
julgamento...". Por isso, a lei do reino dos céus é mais elevada do que a lei da velha
dispensaçâo.22
13
restante dos Dez Mandamentos. Assim, a lei é um conjunto de regras fixas que todos
devem guardar. Ela não muda com cada indivíduo. Não importa se a pessoa é um
homem ou uma mulher, velho ou Jovem, rico ou pobre, ele é forçado a guardar as
regras.24
É lamentável que, com muitos irmãos e irmãs, exista uma séria carência de
treinamento da mente na esfera espiritual. Alguns irmãos, ao predizerem as
flutuações no mercado de ações e calcular lucros e perdas, têm mentes hábeis.
Também algumas irmãs, ao tagarelarem com seus vizinhos, expõem uma mente
muito ativa. Mas quando elas sentam-se na reunião e ouvem uma mensagem, são
incapazes de entendê-la.27
14
Então, para aqueles que não entenderam, ele novamente abrange a matéria:
Estas citações, que foram tiradas do livro de Lee: How to Meet, estão entre as
mais irresponsáveis citações errôneas sobre Lee em The God-Men. Colocadas no
contexto de argumentação de Duddy sobre a autoridade de Lee na Igreja Local, elas
parecem mostrar Lee jactando-se do seu papel como um oráculo e, até mesmo,
reivindicando suporte bíblico para tanto. Entretanto, quando lidas nos capítulos dos
quais foram tiradas, elas significam algo muito diferente. Tomaremos as duas
citações na ordem inversa, pois esta é a ordem de sua aparição no escrito de Lee.
15
outros líderes fundadores dominaram novas denominações em suas primeiras
décadas. Entretanto, ele não reivindica nada mais para si próprio além do papel de
um mestre bíblico. (Lee, é claro, tem uma posição formal como o chefe do Living
Stream Ministry, uma organização de ensino independente relacionada com Igreja
Local, mas seu papel administrativo é outro tópico relacionado à organização total da
Igreja e encontra-se além da esfera deste artigo).
Conclusão
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NOTAS
1. Neil T. Duddy e o SCP, The God-Men (Downers Grove, IL: Inler Varsity Press, 1981).
(Doravante, "Duddy")
3. Outros ataques à Igreja Local incluem Robert e Gretchen Passantino, Witness Lee
and the Local Church (San Juan Capistrano, CA.: Instituto de Pesquisa Cristã, n.d.);
Walter Martin: The New Cults (Santa Ana, CA.: Vision House, 1980); e Jack Sparks:
The MindBenders (Nashville: Thomas Nelson, 1977).
4. Uma carta aos "Amigos do SCP", datada de 10.04.85, dizia: "No resultado [no
processo] está a liberdade dos cristãos de dizerem que os ensinamentos de outra
pessoa são heréticos sem a réplica... resultado que nos sentimos muito certos e
confiantes em defender". Pelo contrário, heresia não está absolutamente envolvida
no processo. O resultado é difamação.
5. WÍtness Lee: Gospel Outíines (Anaheim, CA.: Livin Stream Ministry, 1980).
9. Witness Lee: Chnst Versus Religio/t (Taipé: The Gospe Book Room, 1971) 152-3.
11. Duddy,pg.42.
18. Duddy,pg.71.
19. Duddy.pg.46.
20. Duddy.pg.72.
21. Witness Lee: Christ and fhe Chwch Revealed and Typi/iei m fhe Psalms (Anaheim,
CA.: Living Stream Ministry, 1972), pg. 4.
17
22. Witness Lee: Estudo-Vida de Mateus (Anaheim, CA Living Stream Ministry, 1977)
n6 17,211 (Doravante, "Mateus").
23. Witness Lee: The Knowledge ofLife (Anaheim, CA.: ThiStream, 1973) pg. 97.
24. Witness Lee: The Ecwomy of God (Anaheim, CA.: Thi Stream Publishers, 1968),
pg. 139.
26. Witness Lee: The Experience ofUfe (Anaheim, CA.: Th Stream, 1973), pg. 170.
27. IbÍd.pg.183.
30. Duddy.pg.39.
33. Ibid.pg.97.
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