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[…] Assim, a despeito da presença de uma mulher, não é a ela que se disputa nesse triângulo amoroso, mas ao
rapaz, objeto do desejo tanto dela quanto do negro. Nesse sentido, pode-se dizer que, contraditoriamente,
Bom-crioulo e d. Carolina estão num mesmo plano, de um mesmo lado, em oposição àquele ocupado por
Aleixo. […] Aleixo é desejado, não apenas por seus atrativos físicos, mas pelo que simboliza no inconsciente
dos outros dois. (THOMÉ, 2009, p. 88-89)
No hospital, internado, Amaro começa, aos poucos, a achar que seu amante o está
traindo com outro homem, e essa obsessão, aos poucos, transforma-se em “delírio de raiva”,
pelo fato de Aleixo não responder a seus bilhetes, o que lhe causa “febre de vingança”. A
espera frustrada por Aleixo alimenta a “ideia fixa e obstinada e mortificante” de traição. A
inquietação provocada pela ideia de traição faz nascer o desejo de vingança. No auge do
ciúme e do desespero, Amaro desejava gozar em Aleixo o “[...] prazer brutal, doloroso, fora
de todas as leis, de todas as normas” (CAMINHA, 2002, p. 139). Motivado por toda a
composição psiquiátrica exposta pelo narrador, Bom-crioulo foge do hospital ao saber que
Aleixo estava com alguém. Mais uma vez temos uma comprovação do caráter indomável de
Amaro, que primeiro fugiu do seu antigo dono, já que ele é um escravo fugido; depois fugiu
do navio no qual trabalhava para buscar seu amado Aleixo; e retorna a fugir, dessa vez do
hospital, mas para ir atrás de seu objeto de desejo, o jovem Aleixo. A obra recebe um caráter
fatalista, a medida que, no final dela, vemos Amaro ser consumido pela dor, pela raiva e pelo
ciúme, em saber que Aleixo estava amigado com Dona Carolina, e é consumido por essa
paixão e por essa cólera que ele decide matar Aleixo. Após concretizado o crime, percebemos
mais uma vez, o papel inferior de Amaro no seguinte trecho: “ninguém se importava com o
“outro”, com o negro, que lá ia, rua abaixo, triste e desolado, entre baionetas, à luz quente
da manhã: porém, todos queriam “ver o cadáver”, analisar o ferimento, meter o nariz na
chaga...” (CAMINHA, 2002, p.108). Percebemos aqui que, a morte de um branco atrai
multidão; um branco morto vale mais que um negro vivo, pois ao negro Amaro não restava
sequer um olhar de condenação ou de comiseração.
A modificação do comportamento de Amaro, que age por instinto, é o que leva ao
final trágico do relacionamento entre este e Aleixo. Para dimensionar a trajetória de Amaro,
vemos que ela é descrita como uma tentativa de autoafirmação, uma vez que se trata de um
ex-escravo que engaja na marinha. O negro é retratado socialmente à lume de ideias
deterministas, mas por outro lado, é retratado com requintes de superioridade pelo retrato
forte e extremamente masculino. Contudo, alterado seu comportamento em decorrência de
relacionar-se amorosamente com Aleixo. Nesse sentido, Caminha retrata a relação entre os
dois marinheiros de forma ambígua, haja a vista a passionalidade levar à destruição dos
personagens.
Bibliografia: