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“João Romão, depois de serrazinar na venda com os caixeiros e com a Bertoleza, tornou ao
pátio da estalagem queixando-se de que tudo ali ia muito mal. Censurou os trabalhadores da
pedreira, nomeando o próprio Jerônimo, cuja força física, aliás, o intimidara sempre. ‘Era um
relaxamento aquela porcaria de serviço! Havia três semanas que estava com uma broca à toa,
sem atar, nem desatar; afinal aí chegara o domingo e não se havia ainda lascado fogo! Uma
verdadeira calaçaria! O tal seu Jerônimo, dantes tão apurado, era agora o primeiro a dar o mau
exemplo! perdia noites no samba! não largava os rastros da Rita Baiana e parecia embeiçado
por ela! Não tinha jeito!’ Piedade, ouvindo o vendeiro dizer mal do seu homem, saltou em
defesa deste com duas pedras na mão, e uma contenda travou-se, assanhando todos os
ânimos. Felizmente, a chuva, caindo em cheio, veio dispersar o ajuntamento que se tornava
sério.”
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NATURALISMO
Bertoleza é que continuava na cepa torta, sempre a mesma crioula suja, sempre atrapalhada
de serviço, sem domingo nem dia santo: essa, em nada, em nada absolutamente, participava
das novas regalias do amigo: pelo contrário, à medida que ele galgava posição social, a
desgraçada fazia-se mais e mais escrava e rasteira.
5. (Ufsm 2015) Bom-Crioulo não pensou em dormir, cheio, como estava, de ódio e desespero.
[...]
Amigado, o Aleixo! [...] Amigar-se, viver com uma mulher, sentir o contato de outro corpo que
não o seu, deixar-se beijar, morder, nas ânsias do gozo, por outra pessoa que não o Bom-
Crioulo!...
Agora é que tinha um desejo enorme, uma sofreguidão louca de vê-lo rendido, a seus pés [...]
As palavras de Herculano (aquela história do grumete com uma rapariga) tinham-lhe
despertado o sangue, fora como uma espécie de urtiga brava arranhando-lhe a pele,
excitando-o, enfurecendo-o de desejo. [...] Não, não era somente o gozo comum, a sensação
ordinária, o que ele queria depois das palavras de Herculano: era o prazer brutal, doloroso, fora
de todas as leis, de todas as normas...
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E Jerônimo via e escutava, sentindo ir-se-lhe toda a alma pelos olhos enamorados.
Naquela mulata estava o grande mistério, a síntese das impressões que ele recebeu
chegando aqui: ela era a luz ardente do meio-dia; ela era o calor vermelho das sestas da
fazenda; era o aroma quente dos trevos e das baunilhas, que o atordoara nas matas
brasileiras; era a palmeira virginal e esquiva que se não torce a nenhuma outra planta; era o
veneno e era o açúcar gostoso; era o sapoti mais doce que o mel e era a castanha do caju, que
abre feridas com o seu azeite de fogo; ela era a cobra verde e traiçoeira, a lagarta viscosa, a
muriçoca doida, que esvoaçava havia muito tempo em torno do corpo dele, assanhando-lhe os
desejos, acordando-lhe as fibras embambecidas pela saudade da terra, picando-lhe as artérias,
para lhe cuspir dentro do sangue uma centelha daquele amor setentrional, uma nota daquela
música feita de gemidos de prazer, uma larva daquela nuvem de cantáridas que zumbiam em
torno da Rita Baiana e espalhavam-se pelo ar numa fosforescência afrodisíaca.
8. (Fuvest 2015) O efeito expressivo do texto – bem como seu pertencimento ao Naturalismo
em literatura – baseia-se amplamente no procedimento de explorar de modo intensivo aspectos
biológicos da natureza. Entre esses procedimentos empregados no texto, só NÃO se encontra
a
a) representação do homem como ser vivo em interação constante com o ambiente.
b) exploração exaustiva dos receptores sensoriais humanos (audição, visão, olfação,
gustação), bem como dos receptores mecânicos.
c) figuração variada tanto de plantas quanto de animais, inclusive observados em sua
interação.
d) ênfase em processos naturais ligados à reprodução humana e à metamorfose em animais.
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Ana Rosa cresceu; aprendera de cor a gramática do Sotero dos Reis; lera alguma
coisa; sabia rudimentos de francês e tocava modinhas sentimentais ao violão e ao piano. Não
era estúpida; tinha a intuição perfeita da virtude, um modo bonito, e por vezes lamentara não
ser mais instruída. Conhecia muitos trabalhos de agulha; bordava como poucas, e dispunha de
uma gargantazinha de contralto que fazia gosto de ouvir.
Uma só palavra boiava à superfície dos seus pensamentos: “Mulato”. E crescia,
crescia, transformando-se em tenebrosa nuvem, que escondia todo o seu passado. Ideia
parasita, que estrangulava todas as outras ideias.
– Mulato!
Esta só palavra explicava-lhe agora todos os mesquinhos escrúpulos, que a sociedade
do Maranhão usara para com ele. Explicava tudo: a frieza de certas famílias a quem visitara; as
reticências dos que lhe falavam de seus antepassados; a reserva e a cautela dos que, em sua
presença, discutiam questões de raça e de sangue.
11. (Upf 2015) Considere as asserções a seguir, em relação aos romances Dom Casmurro, de
Machado de Assis, e São Bernardo, de Graciliano Ramos.
É igualmente verdadeiro, em relação aos dois romances referidos, apenas o que se afirma
em:
a) I e II.
b) I e III.
c) I, II e III.
d) II e IV.
e) III e IV.
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Gabarito:
Resposta da questão 1:
[D]
O 1º trecho refere-se a Vidas Secas (4), romance de Graciliano Ramos em que Sinhá Vitória
sonha com uma cama.
O 2º trecho refere-se a O Tempo e o Vento (1), trilogia de Érico Veríssimo na qual se
acompanha a saga das famílias Terra e Cambará.
O 3º trecho refere-se a Iracema (5), romance de José de Alencar, cuja protagonista, homônima
à obra, é caracterizada de modo superior à Natureza, sendo mais rápida que a ema selvagem.
O 4º trecho refere-se a Euclides da Cunha (3), escritor correspondente de guerra durante o
embate em Canudos, na obra Os Sertões. Com base no pensamento cientificista que vigorava
na época, o autor procura analisar o ambiente e o sertanejo como determinantes para o
desenrolar da Guerra de Canudos.
O 5º trecho faz menção a Bentinho, esposo desconfiado de Capitu, mulher inteligente e de
personalidade marcante.
Resposta da questão 2:
[B]
João Romão é o dono do cortiço, no qual convive com Bertoleza; nesse local, o português
Jerônimo mantém Rita Baiana como amante, apesar de seu casamento com Piedade. Trata-se
de um trecho do romance O Cortiço, obra escrita por Aluísio Azevedo e publicada em 1890.
Resposta da questão 3:
[E]
Amaro, protagonista de Bom Crioulo, de Adolfo Caminha, é um escravo fugido que deseja ser
dono de seu próprio destino. Seus dramas são explicados pelo determinismo, à maneira
naturalista, e sofre zoomorfização.
Resposta da questão 4:
[A]
Resposta da questão 5:
[B]
A leitura do trecho indica a temática da sexualidade (“Amigado, o Aleixo! [...] Amigar-se, viver
com uma mulher, sentir o contato de outro corpo que não o seu, deixar-se beijar, morder, nas
ânsias do gozo, por outra pessoa que não o Bom-Crioulo!”) e a prevalência do instinto sobre a
razão (“As palavras de Herculano (aquela história do grumete com uma rapariga) tinham-lhe
despertado o sangue, fora como uma espécie de urtiga brava arranhando-lhe a pele,
excitando-o, enfurecendo-o de desejo.”), assim como se espera de uma obra naturalista.
Resposta da questão 6:
[C]
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passando a aproveitar a vida de modo indolente e toma Rita Bahiana como sua amante. Esta,
por sua vez, corresponde ao “açúcar gostoso”, atraindo e seduzindo o português.
Resposta da questão 7:
[A]
Jerônimo é um português que, na companhia de sua esposa e filha, vem ao Brasil para
trabalhar; tal expectativa não se consolida, principalmente a partir do momento em que ele
passa a se relacionar intensamente com o meio onde ele se insere e as pessoas que ali vivem.
Logo, as impressões descritas no trecho a respeito da natureza brasileira demonstram que há
uma verdadeira discrepância entre sua experiência em Portugal e no Brasil; um trecho que
ilustra essa mudança é a sensação que as matas brasileiras lhe deixaram: o aroma da baunilha
lá presente o atordoara.
Resposta da questão 8:
[E]
No excerto citado, há o homem representado como ser vivo interagindo constantemente com o
ambiente, como se verifica em “era o aroma quente dos trevos e das baunilhas, que o
atordoara nas matas brasileiras”; receptores mecânicos e sensoriais humanos são explorados,
como “ela era o calor vermelho das sestas da fazenda”; plantas e animais figuram e interagem,
como em “era o sapoti mais doce que o mel e era a castanha do caju, que abre feridas com o
seu azeite de fogo; ela era a cobra verde e traiçoeira, a lagarta viscosa, a muriçoca doida (...)”;
finalmente, há ênfase em processos naturais ligados à reprodução humana e à metamorfose
animal, como em “ela era (...) a muriçoca doida, que esvoaçava havia muito tempo em torno do
corpo dele, assanhando-lhe os desejos”. Desse modo, não há referência aos processos de
seleção natural como principal força direcionadora do processo evolutivo no trecho
apresentado; o Darwinismo Social é uma característica presente em outros trechos do
romance, configurando-se como exemplos as personagens João Romão e Miranda.
Resposta da questão 9:
[B]
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Em São Bernardo, temos também um narrador protagonista, Paulo Honório, que escreve com
o objetivo de reconstituir seu passado, com a clara intenção de compreender a razão do
suicídio de sua esposa, Madalena. Paulo Honório revela-se, psicologicamente, um homem
bruto e de um ciúme paranoico em relação à esposa, que, no entanto, é inocente.
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