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30/06/2021 Obras - Obras analisadas - O bom crioulo | PAS Digital

Obras

O bom crioulo

http://objdigital.bn.br/Acervo_Digital/Livros_eletronicos/Bom_crioulo.pdf

O bom crioulo, Adolfo Caminha, 1895.

Sobre o romance

Enredo
O romance “O bom crioulo” conta a história de Amaro, um escravo fugido que se alista na
Marinha e se torna um soldado exemplar. O homem ganhou o apelido de Bom-Crioulo por conta
de sua gentileza com o próximo, no entanto, com o passar dos anos, ele começa a perder sua
disposição para o trabalho e sua bondade. Amaro começa a se envolver com bebidas e
desenvolve uma atração por um colega de trabalho, Aleixo, um jovem marinheiro.

Amaro, que nunca havia sentido atração física por mulheres, é tomado por um desejo sexual
desconhecido até então, e por isso passa a defender Aleixo em diversas situações no navio onde
trabalhavam. Amaro se arriscava por Aleixo e o defendia em todas as circunstâncias.

Por conta do trabalho, Amaro e Aleixo vão para o Rio de Janeiro e se instalam em uma pensão na
Rua da Misericórdia, onde a proprietária e ex prostituta, D. Carolina, oferece um quarto
discreto para os dois. Eles começam um relacionamento secreto, que dura um ano.

Amaro é designado para trabalhar em outra embarcação, o que acaba causando muitos
desencontros entre ele e Aleixo, e consequentemente o distanciamento do casal. Na ausência
de Amaro, Aleixo passa a ser seduzido por D. Carolina.

Durante um trabalho de condução de mantimentos, o Bom-Crioulo vê uma oportunidade de


atracar no Rio de Janeiro na intenção de poder ver Aleixo na pensão, no entanto seu amante não
apareceu durante toda a noite, despertando descon anças e ciúmes. Embriagado, Amaro se vê
no cais perturbado de ciúmes. A polícia é acionada e o Bom Crioulo é levado até o comandante
do navio para o qual trabalha. Amaro recebe um castigo tão severo de seu superior que precisa
ser levado ao hospital.

Herculano, antigo companheiro de embarcação de Amaro, o visita no hospital e acaba revelando


o envolvimento de Aleixo com a proprietária da pensão. Amaro ca intensamente abalado com a
notícia e decide fugir do hospital para tirar satisfações com Aleixo. Então ele vai até a padaria
próxima da pensão para con rmar com o funcionário do estabelecimento o caso de Aleixo e D.
Carolina.

Logo em seguida, Amaro vê Aleixo saindo pela porta da pensão, e por meio de uma abordagem
nada delicada, ele inicia uma discussão com o ex amante, culminando em um episódio trágico. A
briga causa grande alvoroço na rua e, quando D. Carolina se dá conta, Aleixo está estirado no
chão com seu pescoço cortado. Amaro se afasta desolado da cena do crime.

Análise

Nessa obra de Adolfo Caminha, são nítidas diversas características do movimento ao qual o
romance pertence, o Naturalismo. O enredo amoroso abordado por Caminha revela a
veracidade dos desejos humanos e a recusa ao sentimentalismo, pois mesmo que Amaro tenha
desenvolvido um amor voraz por Aleixo, o mesmo não ocorre de maneira idealizada, e sim em
sua forma mais crua e real. Tratar de temas vistos como tabu, como a sexualidade, também é
algo marcante na obra. O livro é uma paródia do amor romântico, tendo um casal homossexual,
a bissexualidade de Aleixo e o desfecho marcado por uma tragédia.

O romance é narrado em 3° pessoa, utilizando uma linguagem clara e objetiva, típica do


Naturalismo. Ocorrem interferências por parte do narrador em alguns momentos, que introduz
certos comentários pessoais a respeito do enredo que se apresenta. Podemos ver tal ocorrência
no seguinte comentário do narrador, que expressa seu ponto de vista, destacado em negrito: “A
velha e gloriosa corveta - que pena! - já nem sequer lembrava o mesmo navio de outr’ora”. Essa
tendência do narrador revela uma subjetividade, vista em obras do romantismo, movimento de
que o Naturalismo é contrário.

Sugestões românticas ocorrem na narrativa, funcionando como uma crítica, e podem ser vistas
em outras situações do romance de Adolfo Caminha, como por exemplo quando ocorre a dor da
separação e do ciúme, a descoberta do amor e a presença do herói forte e protetor, capaz de
qualquer sacrifício pelo seu amor.

Amaro, ao se descobrir homossexual, começa a desenvolver um ciúmes doentio, semelhante ao


das novelas sentimentais. Já Aleixo possui semelhanças com as heroínas românticas

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convencionais que se demonstravam indefesas e frágeis. Diante desses fatos, vemos que Adolfo
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Caminha realizou, propositalmente, uma versão grotesca do romantismo, com a apelação sexual
e descrições de ambientes sujos, fatos improváveis em um enredo do romantismo. As
personagens desse romance naturalista são marginalizadas e se entregam explicitamente aos
seus desejos carnais e instintivos.

O narrador trata as questões de homossexualidade como sendo uma manifestação natural dos
instintos. No naturalismo não há um caráter moral que se preocupe com preceitos sociais ou
julgamento das ações das personagens, no entanto é possível observar um viés moralista
condenatório no romance de Adolfo Caminha, que é evidenciado devido à marginalização das
personagens, acentuada pelos espaços de livre manifestação sexual, caracterizados pelas
sombras e pelo distanciamento da sociedade, como ocorre nos porões do navio ou no humilde
quartinho da pensão de D. Carolina.

O comportamento do bom crioulo é tomado pela força do sexo, que o transforma e o transfere
da zona da submissão, de quando ele ainda era um soldado exemplar, para a instabilidade
comportamental manifestada devido ao a oramento dos desejos depois de conhecer Aleixo, o
qual também manifesta a força sexual em suas ações, como por exemplo, quando se deixa levar
pela sedução de D. Carolina.

Outro ponto marcante nas personagens desse romance é quanto à descrição das mesmas.
Amaro é explicitamente descrito como um homem negro e forte, já Aleixo é branco, loiro e
possui olhos azuis. Propositalmente, essas características são marcadas no intuito de relacioná-
las com a vida das personagens. Amaro é quem defende o seu amado, e Aleixo, muito indefeso, é
o protegido.

Do ponto de vista teórico, o romance naturalista de Adolfo Caminha é de caráter cienti cista,
característico do pensamento positivista, que investiga as situações por meio da ciência para
entender os comportamentos. O mesmo ocorre quando observamos a essência das
personagens de maneira mais profunda e analisamos os aspectos racionais que as circundam e
as fazem ser como são. Outro pensamento encontrado no romance é o do determinismo, que
diz respeito ao meio que certo indivíduo vive e como o mesmo in uencia nas atitudes desse ser.

Características de Romance

Pertencente ao gênero narrativo, a forma literária de um romance apresenta uma narrativa em


prosa e uma história completa, geralmente com personagens variados e tramas longas. Possui
enredo, temporalidade, ambientação, narrador e personagens de nidos de maneira clara. Os
temas abordados em romances costumam representar sentimentos ou acontecimentos que
possivelmente aconteceriam na vida real.

Sobre Adolfo Caminha

Adolfo Caminha nasceu em 1867 na cidade de Aracati (CE), onde viveu até os 10 anos, quando
cou órfão e precisou se mudar para Fortaleza com seus irmãos. Desde cedo já manifestava
sentimentos republicanos e abolicionistas em meio ao cenário conservador e monarquista que
presenciava na Escola Naval do Rio de Janeiro, onde se formou como guarda-marinha.

Em 1886 começou a demonstrar gosto pela literatura por meio da publicação de seus poemas
chamados “voos incertos”. Então, foi vivendo por meio dos trabalhos como escritor e por meio
da marinha ao mesmo tempo.

Em 1888, quando ocorre a abolição, Caminha pede demissão do seu cargo de 2° tenente na
marinha e volta para o Ceará para comemorar o m da escravidão.

Adolfo foi um grande representante naturalista, e sua tendência de escrita girava em torno de
tramas densas e trágicas, sofrendo muitas críticas ao longo de sua carreira por conta da
irreverência de algumas de suas obras, que ousaram abordar temas polêmicos para o contexto
em que vivia. Adolfo faleceu aos 30 anos, debilitado pela tuberculose e sofrendo com
di culdades econômicas.

Movimento artístico

Naturalismo
O Naturalismo se desenvolveu no Brasil nas duas últimas décadas do século XIX e início do
século XX. Como principais representantes do movimento, temos as guras de Aluísio de
Azevedo, Raul Pompéia e Adolfo Caminha. A tendência teve sua origem na França e foi vista
como um modelo extremista das características do Realismo, sendo muitas vezes considerada
uma vertente realista. Sofreu in uência de correntes teóricas como o determinismo, teoria da
evolução das espécies e o postulado das leis da hereditariedade. O Positivismo, corrente
cienti cista, e as teorias socialistas de Karl Marx também in uenciaram o movimento.

Por meio do interesse em escrever um retrato extremamente verídico da realidade, o

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Naturalismo se contrapõe ao Romantismo, desenvolvendo um estilo objetivo e investigativo
quanto à natureza humana, desvendando seusObras
mais intensos e secretos desejos e expondo
todos os podres da sociedade de forma crua e sem ltros.
As feridas sociais são reveladas por meio de situações que testam os limites da personagem
naturalista, que uma hora ou outra, irá revelar sua verdadeira essência.

Contexto histórico

Estamos falando de uma época em que o capitalismo brasileiro formava a tendência da


consolidação da exploração dos vários tipos de trabalho, de maneira direta ou indireta. A
escravidão foi abolida em 1888 e não houve políticas de indenização ou suporte para os ex-
escravos, que estavam à mercê da marginalização.

Os romances “O cortiço” e “Bom Crioulo” exempli cam que as atividades marginais tanto
podem salvar, em alguma medida, alguns empobrecidos da derrota total, da pobreza extrema e
de parte das arbitrariedades que estão sempre à espreita, quanto podem fortalecer a riqueza
dos homens do poder, intensi cando a desigualdade e a violência social.

A obra de Adolfo Caminha se insere em um contexto de virada de século, em que ocorriam


diversas transformações econômicas, políticas e sociais na Europa por conta da Revolução
Industrial e Revolução Francesa, ocorridas no século XVIII. Os primeiros centros urbanos
começam a surgir e uma nova ordem econômica do capitalismo nanceiro começa a dividir a
sociedade entre burguesia e proletariado.

As novas condições de trabalho impulsionaram o surgimento das teorias socialistas de Karl


Marx, que in uenciaram diretamente o Naturalismo e a obra de Adolfo Caminha. Além disso,
houve também in uência do cenário histórico do Positivismo, que surge do entusiasmo das
novas descobertas e invenções humanas daquele período e a rma que, para chegar à verdade,
era necessário utilizar a ciência como único método de comprovação.

Naquele momento também houve destaque para a teoria da evolução das espécies, de Charles
Darwin, e para as leis da hereditariedade, postuladas por Mendel, que também in uenciaram o
Naturalismo. As leis da hereditariedade entendem o homem como produto da natureza, o que é
marcante em “O bom crioulo”. Pertencente ao mesmo contexto histórico, temos também o
surgimento da corrente determinista, que entende o contexto e o meio em que vive o homem
como determinantes em suas ações, além de sua raça e o momento vivenciado pelo ser. Essa
teoria deu espaço para correntes teóricas acerca do racismo cientí co, que surgirão
posteriormente.

Por dentro da Matriz

O romance O Bom-Crioulo (Adolfo Caminha, 1895), vinculado aos ideais naturalistas,


apresenta-se em linguagem clara, direta e objetiva.

Cabe questionar mais profundamente a relação do indivíduo e sua cultura no processo de


mudança social, assim como as possibilidades das identidades construídas gerarem mudança
social. Os contos Pai contra a mãe, A cartomante, A igreja do Diabo e O enfermeiro (Machado
de Assis), assim como o romance O Bom-Crioulo (Adolfo Caminha), ilustram a partir da
literatura algumas dessas questões.

É possível analisar criticamente como o gênero de cada indivíduo condiciona seus pensamentos
e estabelece limitações para suas atitudes. Nesse viés, há abordagem semelhante na obra O
Bom-Crioulo (Adolfo Caminha, publicada em 1895), visto que o romance engendra questões
de gênero, corpo e sexualdiade, não só como identidades representadas, mas também
discursivamente construídas.

Nesse mesmo período, conhecido como a Era das Revoluções, constroem-se novos paradigmas
e pensamentos cientí cos que repercutem nas produções artísticas desse período, como se
percebe em O Bom-Crioulo (Adolfo Caminha), representante do Naturalismo, diretamente
in uenciado pelo Positivismo de Augusto Comte e Determinismo de Hippolyte Taine.

Outras obras também criticaram as contradições do emergente Capitalismo Industrial ou até


mesmo apontaram caminhos para perspectivas sociais alternativas, como pode ser observado
no conto realista A Igreja do Diabo (Machado de Assis, 1884), na obra naturalista O Bom-
Crioulo (Adolfo Caminha, 1895), assim como na peça realista Um Inimigo do Povo (Henrik
Ibsen, 1882).

Itens que já caíram no PAS

Ainda não encontramos nenhum item no PAS acerca dessa obra.

Referências

https://loope.bsb.br/projetopas/obras/obra/119 3/4
30/06/2021 Obras - Obras analisadas - O bom crioulo | PAS Digital
https://www.maisbolsas.com.br/enem/lingua-portuguesa/caracteristicas-e-tipos-do-romance
Obras
http://educacao.globo.com/literatura/assunto/resumos-de-livros/bom-crioulo.html
https://brasilescola.uol.com.br/literatura/o-naturalismo.htm
https://www.infoescola.com/livros/o-bom-crioulo/ https://www.infoescola.com/livros/o-bom-
crioulo/ https://www.youtube.com/watch?v=BUyaM4QPyZ0 https://www.youtube.com/watch?
v=K6_QWp86haM

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