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ILHAS KASIKILI/SEDUDU

(Botsuana/Namíbia)

Julgamento de 13 de dezembro de 1999


Resumo do processo e das conclusões das partes (parágrafo 1º ao 10)
A Corte começou recordando que, por uma carta conjunta datada de 17 de maio de 1996, Botswana
e a Namíbia transmitiram ao Secretário o texto original de um compromisso entre os dois Estados, assinado
em Gaborone no dia 15 de fevereiro de 1996 e que entrou em vigor em 15 de maio de 1996, cujo artigo I lê-se
como se segue:
"A Corte é chamada a determinar, com base no Tratado Anglo-Alemão de 1° de julho de 1890 [um
acordo concluído entre a Grã-Bretanha e a Alemanha que trata sobre as esferas de influência desses dois
países na África] e nas regras e princípios do direito internacional, a fronteira entre a Namíbia e Botswana em
torno da ilha de Kasikili/Sedudu bem como o status jurídico dessa ilha."
A Corte relembrou, em seguida, as etapas sucessivas do processo e enunciou as conclusões das
partes:

As conclusões finais de Botswana, apresentadas na audiência de 5 de março de 1999, foram as


seguintes:
"Queira a Corte:
1) declarar e julgar:
a) que o canal norte e oeste do rio Chobe nas proximidades da ilha de Kasikili/Sedudu
constitui o "canal principal" do Chobe conforme as disposições do parágrafo 2º do artigo III do
Acordo Anglo-Alemão de 1890; e que:
b) dessa forma, a soberania sobre a ilha de Kasikili/Sedudu pertence exclusivamente à
República de Botswana; e ainda
2) determinar a fronteira em torno da ilha de Kasikili/Sedudu com base no talvegue no canal
norte e oeste do Chobe."
As conclusões finais da Namíbia, lidas na audiência de 2 de março de 1999, foram as seguintes:
"Queira a Corte, rejeitando todas as pretensões e conclusões contrárias, declarar e julgar:
1. que o canal situado ao sul da ilha de Kasikili/Sedudu é o canal principal do Chobe;
2. que o canal situado ao norte da ilha de Kasikili/Sedudu não é o canal principal do Chobe;
3. que a Namíbia e seus predecessores ocuparam e utilizaram a ilha de Kasikili e exerceram
sobre ela sua jurisdição soberana com o conhecimento e aquiescência de Botswana e de seus
predecessores, desde pelo menos 1890;
4. que a fronteira entre a Namíbia e Botswana em torno da ilha de Kasikili/Sedudu segue o
centro (ou seja, o talvegue) do canal sul do Chobe;
5. que, sobre o status jurídico da ilha de Kasikili/Sedudu, essa faz parte do território
submetido à soberania da Namíbia."
O contexto do caso (parágrafo 11 ao 16)

A Corte forneceu, então, uma descrição da geografia da zona em questão, ilustrada por três mapas-
croqui.

A Corte relembrou, em seguida, o histórico da controvérsia que opõe as partes, que encontra sua
origem na corrida promovida entre as potências coloniais européias no século XIX para a divisão da África.
Na primavera de 1890, a Alemanha e a Grã-Bretanha iniciaram negociações com vistas a chegar a um acordo
no que concerne a seu comércio e a suas zonas de influência na África. O Tratado de 1° de julho de 1890 que
delas resultou delimitava, inter alia, as esferas de influência da Alemanha e da Grã-Bretanha no sudoeste da
África; essa delimitação é o coração do presente caso.

No curso do século seguinte, o status dos territórios em causa sofreu diversas mutações. Em 30 de
setembro de 1966, a República Independente de Botswana surgiu sobre o território do antigo protetorado
britânico de Bechuanaland, enquanto a Namíbia (na qual a faixa de Caprivi está situada) acedeu à
independência em 21 de março de 1990.

Pouco após a independência da Namíbia, divergências apareceram entre os dois Estados quanto ao
posicionamento da fronteira em torno da ilha de Kasikili/Sedudu. Em maio de 1992, concordou-se em
submeter a determinação da fronteira em torno da ilha a uma Comissão Mista de Peritos Técnicos. Em
fevereiro de 1995, o relatório da Comissão Mista no qual essa anunciava que não havia chegado a uma
conclusão aceita por ambas as partes sobre a questão que lhe foi posta, foi examinado e decidiu-se que a
controvérsia seria submetida à Corte Internacional de Justiça, para uma solução definitiva e obrigatória.

As regras de interpretação aplicáveis ao Tratado de 1890 (parágrafo 18 ao 20)

A Corte começou por observar que o direito aplicável ao presente caso encontra, primeiramente, sua
fonte no Tratado de 1890 pelo qual Botswana e a Namíbia reconheceram estarem vinculadas. Sobre a
interpretação desse Tratado, a Corte notou que nem Botswana nem a Namíbia são partes à Convenção de
Viena de 23 de maio de 1969 sobre o Direito dos Tratados, mas que ambas consideram que o artigo 31 da
Convenção de Viena é aplicável como expressão do direito internacional costumeiro.

Segundo o artigo 31 da Convenção de Viena sobre o Direito dos Tratados:


"1. Um tratado deve ser interpretado de boa-fé, segundo o sentido comum dos termos do
tratado em seu contexto e à luz de seu objeto e finalidade.
2. Para os fins de interpretação de um tratado, o contexto compreende, além do texto, seu
preâmbulo e anexos:
a) qualquer acordo relativo ao tratado e feito entre todas as partes por ocasião da conclusão
do tratado;
b) qualquer instrumento estabelecido por uma ou várias partes por ocasião da conclusão do
tratado e aceito pelas outras partes como instrumento relativo ao tratado."
A Corte indicou, em seguida, que iria proceder à interpretação do Tratado de 1890, aplicando as
regras de interpretação expressas na Convenção de Viena de 1969. Ela relembrou que
"Um tratado deve ser interpretado de boa-fé, segundo o sentido comum dos termos do
tratado em seu contexto e à luz de seu objeto e finalidade. A interpretação deve estar fundada antes
de tudo sobre o texto do próprio tratado. Podem ser chamados, a título complementar, meios de
interpretação tais como os trabalhos preparatórios e as circunstâncias nas quais o tratado foi
concluído." (Disputa territorial (Grande Jamahiriya Árabe Popular Socialista da Líbia/Tchad),
Decisão, C.I.J. Recueil 1994, p. 21-22, parágrafo 41).

O texto do Tratado de 1890 (parágrafo 21 ao 46)

A Corte examinou em primeiro lugar o texto do Tratado de 1890, cujo artigo III lê-se como segue:
"No Sudoeste Africano, a esfera de influência reservada à Alemanha é delimitada da
seguinte forma:
1. Ao sul, por uma linha que parte da foz do Orange e segue, subindo o curso do rio, a
margem norte do mesmo até sua interseção com o 20º grau de longitude leste.
2. A leste, por uma linha que parte do ponto de interseção supramencionado e segue o 20°
grau de longitude leste até sua interseção com o paralelo 22° de latitude sul, segue esse paralelo em
direção leste até sua interseção com 21° grau de longitude leste; depois segue esse meridiano em
direção norte até sua interseção com o 18° paralelo de latitude sul; segue esse paralelo em direção
leste até o Chobe, e segue o centro do canal principal desse rio até sua confluência com o Zambèze,
onde ela termina.
É entendido que, em virtude desse acordo, a Alemanha tem livre acesso ao Zambèze a partir
do seu protetorado por uma faixa de território que em nenhum ponto deve ter uma largura inferior a
20 milhas inglesas.
A esfera de influência reservada à Grã-Bretanha se limitou a oeste e ao noroeste pela linha
supramencionada. Ela compreende o lago Ngami.
O curso da fronteira descrito acima é traçado de uma forma geral a partir de um mapa
estabelecido oficialmente pelo governo britânico em 1889."

No que concerne à região tratada pelo presente caso, essa disposição situa o limite entre as esferas de
influência das partes contratantes no "canal principal" do Chobe; todavia, nem esta nem qualquer outra
disposição do tratado fornece critérios que permitiriam identificar esse "canal principal". Convém igualmente
notar que a versão inglesa fala do "centro" do canal principal (centre of the main channel) e que a versão
alemã utiliza o termo "talvegue" do referido canal (Thalweg des Hauptlaufes). Observando que Botswana e a
Namíbia não expressaram, elas mesmas, posições realmente diferentes sobre o sentido desses termos, a Corte
indicou que considerará então que as palavras "centro do canal principal" incluídas no parágrafo 2º do artigo
III do Tratado de 1890 têm o mesmo sentido que as palavras "Thalweg des Hauptlaufes". Na opinião da
Corte, a verdadeira controvérsia entre as partes concerne ao posicionamento do canal principal onde se situa a
fronteira. Para Botswana, esse deve ser determinado "com base no talvegue do canal norte e oeste do Chobe",
enquanto para a Namíbia ele "segue o centro (isto é, o talvegue) do canal sul do Chobe". A Corte observou
que se deve presumir que as partes contratantes, introduzindo a expressão "canal principal" no projeto do
tratado, quiseram atribuir um sentido preciso. Também a Corte indicou que deve, primeiramente, determinar
qual é o canal principal. Ela procurará para tanto o sentido comum da expressão "canal principal", referindo-
se aos critérios mais correntemente utilizados em direito internacional e na prática dos Estados, que as partes
invocaram.

Critérios para identificar "o canal principal" (parágrafo 29 ao 42)

A Corte notou que as partes à controvérsia concordaram sobre um grande número de critérios que
permitem identificar o "canal principal", mas se opõem sobre a pertinência e sobre a aplicabilidade de vários
desses critérios.

Segundo Botswana, os critérios pertinentes são os seguintes: maior profundidade e largura, a


configuração do perfil do leito, a navegabilidade e maior volume de escoamento das águas. Botswana
ressaltou, por outro lado, a importância, com relação à identificação do canal principal, da "capacidade do
canal", da "velocidade da corrente" e do "volume escoado". A Namíbia admitiu que
"os critérios possíveis para assegurar a identificação do canal principal de um rio que
comporta mais de um canal são: o canal mais largo, o canal mais profundo ou o canal que desloca a
maior proporção de escoamento anual desse rio. Em numerosos casos, o canal principal apresenta
essas três características reunidas".
Ela acrescentou, contudo, evocando as bruscas variações do nível das águas do Chobe, que
"nem a largura nem a profundidade constituem critérios apropriados para determinar qual
canal é o canal principal".
Entre os critérios possíveis, a Namíbia conferiu um peso decisivo à vazão: segundo ela, o canal
principal é aquele "que desloca a maior proporção de escoamento anual do rio". A Namíbia igualmente fez
valer que uma outra tarefa essencial consistia em determinar o canal mais utilizado para o tráfego fluvial.

A Corte ressaltou que as partes se expressaram sobre ambos aspectos dos critérios, distinguindo-os
ou realçando sua complementaridade e suas relações com outros critérios. Antes de se expressar sobre o papel
e a importância respectivos dos diferentes critérios assim considerados, a Corte constatou ainda que a situação
hidrológica atual do Chobe em torno da ilha de Kasikili/Sedudu pode ser presumida como idêntica àquela que
existia quando da conclusão do Tratado de 1890.

A profundidade (parágrafo 32)

Não obstante todas as dificuldades que se apresentaram à realização de sondagens de profundidade e


à interpretação de seus resultados, a Corte chegou à conclusão de que o canal norte é mais profundo que o
canal sul em termos de profundidade média, e é igual em termos de profundidade mínima.

Largura (parágrafo 33)

No que concerne à largura, a Corte concluiu, com base em um relatório que remonta a 1912, assim
como em fotografias aéreas tiradas entre 1925 e 1985 e em imagens de satélites realizadas em junho de 1975,
que o canal norte é mais largo que o canal sul.

Vazão (parágrafo 34 ao 37)

No que concerne à vazão, i.e., ao volume de água deslocada, a Corte não pôde conciliar os dados
apresentados pelas partes, que têm uma concepção totalmente diferente do que são os canais em questão. A
Corte entendeu que, para determinar o canal principal, ela deveria levar em conta a linha da vazante, e não as
linhas das cheias. Advém do dossiê que, em tempos de cheia, a ilha fica submergida pelas inundações e toda a
região toma a aparência de um lago imenso. Não mais sendo distinguíveis os canais, não é possível
determinar qual desses canais é o canal principal. A Corte não está, dessa forma, convencida pela
argumentação da Namíbia concernente à existência de um grande canal "principal"; o canal sul visível seria
apenas o talvegue.

Visibilidade (parágrafo 38)

A Corte não pôde, portanto, concluir que do ponto de vista da visibilidade - ou fisionomia geral - o
canal sul se apodera do canal norte, como a Namíbia sustentou.

Configuração do perfil do leito do canal (parágrafo 39)

Tendo examinado os argumentos desenvolvidos pelas partes, assim como os mapas e fotografias que
elas produziram, a Corte não pôde disso concluir que, pela configuração do perfil de seu leito, o canal sul
constituiria o prolongamento principal e natural do curso do Chobe antes da bifurcação.

Navegabilidade (parágrafo 40)

A Corte ressaltou que a navegabilidade dos cursos d'água apresenta uma grande variação segundo as
condições naturais que prevalecem. Essas condições podem impedir a utilização do curso d’água em questão
por navios de grande porte carregados, mas permitem a circulação de barcos leves de fundo reto. No caso em
tela, os dados fornecidos pelas partes tendem a provar que a navegabilidade dos dois canais em torno da ilha
de Kasikili/Sedudu é limitada por sua falta de profundidade. Essa situação incita a Corte a considerar que,
desse ponto de vista, o "canal principal" nessa região do Chobe é aquele dentre os dois que oferece as
condições mais favoráveis à navegação. Na opinião da Corte, é o canal norte que responde a esse critério.

Pelos motivos que precedem, a Corte concluiu que o canal norte do Chobe em torno da ilha de
Kasikili/Sedudu deve ser considerado como seu canal principal, seguindo o sentido comum dos termos que
figuram na disposição pertinente do Tratado de 1890. Ela observou que essa conclusão é confirmada pelos
três exames efetuados no local em 1912, em 1948 e 1985, que conduziram à conclusão de que o canal
principal do Chobe seria o canal norte.

O objeto e a finalidade do Tratado de 1890 (parágrafo 43 ao 46)

A Corte buscou, então, como e em que medida o objeto e a finalidade do tratado podem clarear o
sentido a atribuir a seus termos, não se tratando, no caso em tela, de um tratado que delimita fronteiras
propriamente dito, mas de um tratado que delimita esferas de influência, não obstante as partes o aceitam
como sendo o tratado determinador da fronteira entre seus territórios. A Corte salientou que as potências
contratantes, ao escolherem os termos "centro do canal principal", tinham a intenção de estabelecer uma
fronteira separando suas esferas de influência, mesmo no caso de um curso d’água que tem vários canais.

A Corte observou que a navegação parece ter sido um elemento que orientou a escolha das potências
contratantes no momento em que procederam à delimitação de suas esferas de influência, mas não considerou
que essa tenha sido a única finalidade das disposições do parágrafo 2º do artigo III do Tratado. Ao se referir
ao canal principal do Chobe, as partes pretendiam assegurar para si a livre navegação sobre esse rio e
proceder a uma delimitação mais precisa possível de suas esferas de influência respectivas.

A prática ulteriormente seguida (parágrafo 47 ao 80)

No processo, Botswana e Namíbia por várias vezes se referiram à conduta ulterior das partes ao
Tratado de 1890 - bem como àquela de seus sucessores - como elemento de interpretação deste. Se as partes
ao presente caso concordaram que os acordos interpretativos e a prática ulterior constituem elementos de
interpretação de um tratado, em virtude do direito internacional, contrariamente elas se opuseram sobre as
conseqüências que decorrem dos fatos deste caso quanto à interpretação do Tratado de 1890.

O parágrafo 3° do artigo 31 da Convenção de Viena de 1969 sobre o Direito dos Tratados, que, como
já foi indicado, reflete o direito costumeiro, é assim escrito:
"3. Será levado em consideração, juntamente com o contexto:
a) qualquer acordo posterior entre as partes relativo à interpretação do tratado ou à aplicação
de suas disposições;
b) qualquer prática seguida posteriormente na aplicação do tratado pela qual se estabeleça o
acordo das partes relativo à sua interpretação"
Para basear a interpretação que dá o parágrafo 2º do artigo III do Tratado de 1890, Botswana invocou
principalmente três séries de documentos: um relatório de reconhecimento do Chobe, feito em agosto de 1912
por um oficial de polícia do protetorado de Bechuanaland, o capitão Eason; um compromisso ocorrido em
agosto de 1951 entre um magistrado da parte oriental da faixa de Caprivi, o major Trollope, e um comissário
de distrito do protetorado de Bechuanaland, Sr. Dickinson, bem como as trocas de correspondência que
precederam e seguiram esse compromisso; e um acordo concluído em dezembro de 1984 entre as autoridades
de Botswana e as da África do Sul, para encarregar uma comissão mista de efetuar um levantamento comum
sobre o Chobe, assim como o relatório dessa comissão.

O relatório Eason (1912) (parágrafo 53 ao 55)

A Corte partilhou da opinião, enunciada pela Namíbia e aceita por Botswana na versão final de sua
argumentação, de que o relatório Eason e as circunstâncias que o circundam não poderiam ser consideradas
como constitutivas de uma "prática ulteriormente seguida na aplicação do Tratado" de 1890, no sentido da
alínea b) do parágrafo 3º do artigo 31 da Convenção de Viena.

A correspondência Trollope-Redman (1947-1951) (parágrafo 56 ao 63)

Em 1947, um empresário de transporte de Bechuanaland, Sr. Ker, propôs-se a transportar madeira


pelo Chobe, utilizando o canal norte. Ele obteve a autorização necessária do administrador competente na
faixa de Caprivi, o Major Trollope, mas requereu igualmente às autoridades de Bechuanaland. Em seqüência
a um relatório conjunto intitulado "Fronteira entre o Protetorado de Bechuanaland e a Parte Oriental da Faixa
de Caprivi: ilha de Kasikili" elaborado pelo Major Trollope e o Sr. Redman (Comissário de Distrito em
Kasane, Bechuanaland), em 1948, e transmitido às suas autoridades respectivas, ocasionou diversas trocas de
correspondência entre esses.

Em 1951, uma troca de correspondência entre o Sr. Dickinson, que nesse ínterim havia sucedido ao
Sr. Redman como Comissário de Distrito em Kasane (Bechuanaland), e o Major Trollope concluíram o
gentlemen's agreement seguinte:
"a) nós concordamos em diferir sobre o problema jurídico relativo à ilha de Kasikili e a
questão conexa da via d’água setentrional;
b) os acordos administrativos que tomamos abaixo são absolutamente sem prejuízo ao
direito dos responsáveis do protetorado e daqueles da faixa de Caprivi de prosseguir ao exame da
questão jurídica visada na alínea a), se julgarem desejável fazê-lo em um momento qualquer e esses
acordos não poderão ser invocados para sustentar que um ou outro desses territórios admitiu algo ou
renunciou a qualquer pretensão que seja; e
c) levando-se em conta o que precede, a situação volta a ser aquela que existia de facto antes
que toda a questão tomasse um aspecto litigioso em 1947 - isto é, que a ilha de Kasikili continuará a
ser utilizada pelos membros das tribos de Caprivi e que a via d’água setentrional continuará a servir
de 'via de circulação aberta a todos'."
Cada parte havia, todavia, formulado um aviso relativo à sua posição em qualquer polêmica
concernente a essa ilha no futuro.

A Corte observou que cada uma das partes no presente processo invocou, em apoio a suas teses, o
relatório conjunto dos Srs. Trollope e Redman e a correspondência que a ele se relaciona. Em seqüência ao
exame do conjunto de correspondências, a Corte concluiu que os eventos suprareportados, que se
desenvolveram entre 1947 e 1951, revelam a ausência de acordo entre a África do Sul e Bechuanaland quanto
ao posicionamento da fronteira em torno da ilha de Kasikili/Sedudu e ao status da ilha. Esses eventos não
poderiam, desde então, ser constitutivos de uma "prática ulteriormente seguida na aplicação do tratado [de
1890] pela qual se estabeleceu o acordo das partes com relação à interpretação do tratado" (Convenção de
Viena de 1969 sobre o Direito dos Tratados, artigo 31, parágrafo 3, al. b)). A fortiori não podem ter
ocasionado um "acordo ... entre as partes sobre a interpretação do tratado ou a aplicação de suas disposições"
(ibid.,artigo 31, parágrafo 3, al. a)).

A perícia conjunta de 1985 (parágrafo 64 ao 68)

Em outubro de 1984, um incidente, no curso do qual houve troca de tiros, enfrentaram-se membros
das forças armadas de Botswana e soldados sul-africanos que se deslocavam a bordo de uma pequena
embarcação sobre o canal sul do Chobe. Quando de uma reunião ocorrida em Pretória, em 19 de dezembro de
1984, entre representantes de diversos ministérios da África do Sul e de Botswana, deu-se que o incidente
ocorreu após divergências de interpretação sobre o posicionamento exato da fronteira em torno da ilha de
Kasikili/Sedudu. Durante essa reunião, referência foi feita aos termos do Tratado de 1890 e foi convencionado
"que havia urgência em realizar uma perícia conjunta a fim de determinar se o canal principal do Chobe
estava situado ao norte ou ao sul da ilha". A perícia conjunta foi realizada no início do mês de julho de 1985.
As conclusões do relatório da perícia foram as seguintes:

"O canal principal do Chobe contorna agora a ilha Sidudu/Kasikili pelo oeste e pelo norte
(ver mapa C em anexo).
As provas de que se dispõe parecem indicar que tal é o caso, ao menos, desde 1912.
Não é possível verificar se uma inundação particularmente violenta mudou o curso do rio
entre 1890 e 1912. O Capitão Eason, da polícia do protetorado de Bechuanaland, declarou, na pág. 4
do capítulo I do relatório mencionado anteriormente, que inundações ocorreram em 1899 e em junho
e julho de 1909.
A supor que o canal principal do rio jamais se encontrou ao sul da ilha, é provável que a
erosão do vale Sidudu, que pode ser visto figurado no mapa C em anexo, provocou o assoreamento
parcial do canal sul.
Fotografias aéreas mostrando os canais do rio na vizinhança da ilha se encontram nos
arquivos dos serviços cartográficos dos dois países. Elas foram tiradas em 1925, 1943, 1972, 1977,
1981 e 1982. As fotografias não demonstram nenhuma mudança importante do posicionamento dos
canais."
Tendo examinado a correspondência trocada entre as autoridades da África do Sul e de Botswana, a
Corte estimou que só podia concluir que, em 1984 e 1985, a África do Sul e Botswana haviam acordado sobre
mais que o envio da comissão mista de peritos. A Corte não pôde, em particular, concluir que os dois Estados
teriam acordado, de uma maneira ou de outra, em reconhecer-se juridicamente vinculados pelos resultados da
perícia conjunta efetuada em julho de 1985. Nem as atas da reunião ocorrida em Pretória, em 19 de dezembro
de 1984, nem os termos do mandato confiado aos peritos permitiriam estabelecer tal acordo. Ademais, a
correspondência que as autoridades sul-africanas e botswanesas trocaram em seqüência parecem desmentir a
existência de qualquer acordo nesse sentido: em uma nota de 4 de novembro de 1985, Botswana chamou a
África do Sul a aceitar as conclusões dos peritos; a África do Sul não só não deu essa aceitação, mas, por
várias vezes, insistiu sobre a necessidade de Botswana negociar e entrar em acordo sobre a questão da
fronteira com as autoridades competentes do Sudoeste Africano/Namíbia, ou seja, da futura Namíbia
independente.

Presença dos Masubia na ilha (parágrafo 71 ao 75)

No caso em tela, a Namíbia também invocou, em apoio a suas teses, a conduta ulterior das partes ao
Tratado de 1890. Em seu memorial, ela sustentou que essa conduta
"é pertinente na presente controvérsia por três razões distintas. Em primeiro lugar, ela
corrobora a interpretação do tratado... Em segundo lugar, ela constitui um segundo fundamento
totalmente distinto da reivindicação da Namíbia em virtude das doutrinas concernentes à aquisição
de territórios por prescrição, aquiescência e reconhecimento. E, em último lugar, a conduta das
partes mostra que a Namíbia estava na posse da ilha na época em que se pôs fim ao regime colonial,
fato que é pertinente para a aplicação do princípio do uti possidetis".
Segundo a Namíbia, a conduta ulterior sobre a qual ela se funda consiste
"no controle e na utilização da ilha de Kasikili pelos Masubia da faixa de Caprivi, o
exercício da jurisdição sobre a ilha pelas autoridades responsáveis namibianas e o silêncio guardado
por Botswana e seus predecessores durante quase um século com pleno conhecimento dos fatos..."
A Corte indicou que, nesse estágio da decisão, ela não deveria examinar o argumento namibiano
relativo à prescrição. Ela se contentaria em pesquisar se a presença sem objeções e prolongada de membros da
tribo dos Masubia na ilha de Kasikili/Sedudu é constitutiva de uma "prática ulteriormente seguida na
aplicação do Tratado [de 1890] pela qual se estabeleceu o acordo das partes com relação à interpretação do
tratado" (Convenção de Viena de 1969 sobre o Direito dos Tratados, artigo 31, parágrafo 3 b)). Para que tal
prática pudesse ser demonstrada, seria necessário, ao menos, que dois elementos fossem satisfeitos: primeiro,
que a ocupação da ilha pelos Masubia estivesse ligada à convicção das autoridades de Caprivi de que a
fronteira fixada pelo Tratado de 1890 seguia o canal sul do Chobe; e segundo, que esse fato tivesse sido
plenamente conhecido e aceito pelas autoridades de Bechuanaland como confirmando a fronteira fixada pelo
Tratado.

Nada demonstrou, na opinião da Corte, que a presença intermitente de habitantes da faixa de Caprivi
na ilha tinha ligação com as pretensões territoriais das autoridades de Caprivi. Parece à Corte, por
conseguinte, que da parte de Bechuanaland, e subsequentemente de Botswana, a presença intermitente dos
Masubia na ilha a ninguém incomodava e era tolerada, posto que ela não parecia ligada a uma interpretação
dos termos do Tratado de 1890. A Corte concluiu, dessa forma, que a utilização pacífica e aberta, durante
anos, da ilha de Kasikili/Sedudu pelos membros da tribo dos Masubia de Caprivi oriental não é constitutiva de
uma "prática ulteriormente seguida na aplicação do Tratado" [de 1890], no sentido da alínea b) do parágrafo
3º do artigo 31 da Convenção de Viena sobre o Direito dos Tratados.

A Corte concluiu de tudo o que precede que a conduta ulterior das partes ao Tratado de 1890 não
levou a nenhum "acordo ... entre as partes sobre a interpretação do tratado ou da aplicação de suas
disposições", no sentido da alínea a) do parágrafo 3º do artigo 31 da Convenção de Viena de 1969 sobre o
Direito dos Tratados, e que ela não tem mais ocasionado qualquer "prática ... seguida na aplicação do tratado
pela qual se estabelece o acordo das partes com relação à interpretação do tratado", no sentido da alínea b)
dessa mesma disposição.

Os mapas como prova (parágrafo 81 ao 87)

Cada uma das duas partes produziu como elementos de prova em apoio a suas teses um grande
número de mapas, que remontam a 1880. A Namíbia salientou que a maior parte dos mapas produzidos no
processo, mesmo aqueles provenientes de fontes coloniais britânicas e que não têm por objeto figurar as
fronteiras de Bechuanaland, tendem a indicar que a fronteira em torno da ilha de Kasikili/Sedudu se encontra
no canal sul do Chobe. A Namíbia aqui viu "uma forma especial de 'prática ulteriormente seguida' e ...
também um aspecto tanto do exercício da competência quanto da aquiescência a esta que leva à aquisição de
um título por prescrição". Por sua vez, Botswana deu uma importância menor aos mapas e considerou
principalmente que a maior parte dos mapas antigos são muito pouco detalhados, ou em uma escala muito
pequena, para serem úteis no caso em tela. Botswana fez valer, entretanto, que os mapas e os croquis
disponíveis mostravam que, desde a época em que exploradores europeus procederam a um levantamento
pouco detalhado do Chobe, a partir dos anos 1860 e seguintes, um canal norte em torno da ilha era conhecido
e regularmente representado. Botswana, entretanto, não tentou demostrar que a fronteira se encontraria, desse
fato, no canal norte. Sua posição geral é, sobretudo, que o material cartográfico coloca a fronteira no canal sul
de forma bem menos sistemática do que a Namíbia pretendia.

A Corte começou por relembrar os termos nos quais a Câmara encarregada de conhecer do caso da
Disputa Fronteiriça (Burkina Faso/República do Máli) se expressou sobre o valor probante dos mapas:
"os mapas são apenas simples indicações, mais ou menos exatas segundo o caso; eles jamais
constituem - por si mesmos e apenas pelo fato de sua existência - um título territorial, ou seja, um documento
ao qual o direito internacional confere um valor jurídico intrínseco para fins do estabelecimento dos direitos
territoriais. Decerto, em alguns casos, os mapas podem adquirir tal valor jurídico, mas esse valor não decorre
então de suas próprias qualidades intrínsecas: resulta do fato de que esses mapas foram integrados entre os
elementos que constituem a expressão da vontade do Estado ou dos Estados concernentes. Esse é o caso, por
exemplo, quando mapas são anexados a um texto oficial do qual são parte integrante. Fora dessa hipótese
claramente definida, os mapas só são elementos de prova extrínsecos, mais ou menos confiáveis, mais ou
menos suspeitos, os quais se podem evocar, entre outros elementos de prova de natureza circunstancial, para
estabelecer ou reconstituir a materialidade dos fatos". (C.I.J. Recueil 1986, p. 582, parágrafo 54).
Após ter examinado o dossiê cartográfico que lhe foi submetido, a Corte não se considerou apta a
tirar conclusões desse, tendo em vista a ausência de qualquer mapa que traduzisse oficialmente a vontade das
partes ao Tratado de 1890, assim como de qualquer acordo expresso ou tácito entre estas ou seus sucessores
sobre a validade da fronteira representada sobre um mapa, e levando em conta o caráter incerto e contraditório
do material cartográfico que lhe foi submetido. Esse dossiê não pôde então "endossa[r] uma conclusão à qual
o juiz chegou por outros meios, independentes dos mapas" (Disputa fronteiriça (Burkina Faso/República do
Máli), C.I.J. Recueil 1986, p. 583, parágrafo 56), nem modificar os resultados da interpretação textual do
Tratado de 1890 à qual a Corte procedeu acima.

"O centro do canal principal" ou Talvegue (parágrafos 88 e 89)

A interpretação das disposições pertinentes do Tratado de 1890 à qual a Corte procedeu acima a leva
a concluir que a fronteira entre Botswana e Namíbia em torno da ilha de Kasikili/Sedudu, definida por esse
Tratado, passa no canal norte do Chobe.

Segundo o texto inglês do Tratado, o traçado dessa fronteira segue o "centro" do canal principal,
enquanto o texto alemão menciona o "talvegue". A Corte já indicou que as partes ao Tratado de 1890
pretendiam que esses dois termos fossem sinônimos e que Botswana e Namíbia não podiam, elas mesmas,
expressar posições realmente diferentes a esse respeito.

Advém, por outro lado, dos trabalhos preparatórios do Tratado, que as partes contratantes esperavam,
ambas, que a navegação sobre o Chobe fosse possível, e que tinham a intenção de explorar essa possibilidade.
Mesmo que as partes tenham, em 1890, utilizado de forma intercambiável os termos "talvegue" e "centro do
canal", o termo "talvegue" expressa, de forma mais precisa que o faz a expressão "centro do canal", a intenção
comum de usufruir das possibilidades de navegação. Conseqüentemente, é esse primeiro termo que a Corte
considerou determinante no parágrafo 2º do artigo III.

Botswana e Namíbia, tendo concordado, nas respostas que trouxeram a uma questão colocada por
um membro da Corte, que o talvegue era constituído pela linha das sondagens mais profundas, a Corte
concluiu que a fronteira segue essa linha no canal norte em torno da ilha de Kasikili/Sedudu.

A prescrição aquisitiva (parágrafo 90 ao 99)

A Namíbia fundou sua reivindicação sobre a ilha de Kasikili/Sedudu, não somente sobre o Tratado
de 1890, mas ainda, a título subsidiário, sobre a doutrina da prescrição. A Namíbia sustentou, com efeito, que
"em virtude da ocupação e da utilização contínuas e exclusivas da ilha de Kasikili, bem
como do exercício de uma jurisdição soberana sobre essa ilha desde o início do século, com total
conhecimento, aceitação e aquiescência das autoridades responsáveis de Bechuanaland e de Botswana, a
Namíbia adquiriu um título por prescrição sobre a ilha".
Botswana considerou que a Corte não pode levar em consideração os argumentos da Namíbia
relativos à prescrição e à aquiescência, pois estes não se inscrevem no sistema da questão que lhe foi
submetida, nos termos do compromisso.

A Corte notou que, nos termos do artigo I do compromisso, ela é demandada a determinar a fronteira
entre Namíbia e Botswana em torno da ilha de Kasikili/Sedudu e o status jurídico dessa ilha "com base no
Tratado Anglo-Alemão de 1° de julho de 1890 e das regras e princípios do direito internacional". Na opinião
da Corte, referindo-se às "regras e princípios do direito internacional", o compromisso autoriza não somente a
Corte a interpretar o Tratado de 1890 à luz deste, mas igualmente a fazer uma aplicação independente das
referidas regras e princípios. A Corte estimou, por conseguinte, que o compromisso não a impediria de
conhecer dos argumentos relativos à prescrição apresentados pela Namíbia.

Após ter resumido os argumentos que cada uma das partes fez valer, a Corte observou que as partes
convieram entre si que a prescrição aquisitiva é reconhecida em direito internacional e também que convieram
sobre as condições nas quais um título territorial pode ser adquirido por prescrição, mas que se opõem sobre o
ponto de saber se essas condições estão reunidas aqui. Seu desacordo tratou, essencialmente, das
conseqüências jurídicas que podem ser tiradas da presença, na ilha de Kasikili/Sedudu, dos Masubia de
Caprivi oriental: enquanto a Namíbia se fundou essencialmente nessa presença, considerada à luz da noção de
"administração indireta", para pretender que seus predecessores exerceram sobre a ilha uma autoridade estatal
constitutiva de um título, Botswana viu nisso uma simples atividade "privada" desprovida de qualquer
pertinência com relação ao direito internacional.

A Corte prosseguiu, observando que para os fins do presente caso não devia ater-se ao status da
prescrição aquisitiva em direito internacional ou às condições de aquisição de um título territorial por
prescrição. A Corte considerou, pelos motivos expostos acima, que as condições enunciadas pela própria
Namíbia não foram preenchidas e que a argumentação namibiana relativa à prescrição aquisitiva não pode,
pois, ser adotada.

Resulta desse exame que, mesmo se conexões de submissão possam ter existido entre os Masubia e
as autoridades de Caprivi, não foi estabelecido que os membros dessa tribo ocupavam a ilha à titre de
soverain, isto é, lá exerciam atributos de poder público em nome dessas autoridades. Ao contrário, vê-se no
dossiê do caso que os Masubia utilizavam a ilha de forma intermitente, de acordo com as estações e segundo
suas necessidades, para fins exclusivamente agrícolas; essa utilização, anterior ao estabelecimento de
qualquer administração colonial na faixa de Caprivi, parece ter prosseguido sem estar ligada às pretensões
territoriais da autoridade que administrava Caprivi. Certamente, quando, em 1947-1948, a questão da fronteira
na região se colocou pela primeira vez entre as autoridades locais do protetorado de Bechuanaland e as da
África do Sul, considerava-se que o "canal principal" do Chobe em torno da ilha era o canal norte, mas as
autoridades sul-africanas se basearam na presença dos Masubia na ilha para pretender que eles possuíam um
título fundado na prescrição. A partir de então, as autoridades de Bechuanaland consideraram que a fronteira
se situava no canal norte e que a ilha fazia parte do protetorado; após alguma hesitação, eles recusaram a
satisfazer as pretensões sul-africanas sobre a ilha, reconhecendo a necessidade de proteger os interesses das
tribos de Caprivi. A Corte inferiu, de um lado, que, para Bechuanaland, as atividades dos Masubia na ilha
eram uma questão independente daquela do título sobre a mesma, e, de outro, que, quando a África do Sul
oficialmente reivindicou esse, Bechuanaland não aceitou essa reivindicação, o que excluía uma aquiescência
de sua parte.

Na opinião da Corte, a Namíbia não provou, com o grau de precisão e de certeza necessário, que atos
de autoridade estatal suscetíveis de fundar de outra forma a aquisição de um título por prescrição, segundo as
condições que ela enunciou, teriam sido preenchidos pelos seus predecessores, ou por ela própria, na ilha de
Kasikili/Sedudu.

O status jurídico da ilha e os dois canais que a circundam (parágrafo 100 ao 103)

No término de sua interpretação do parágrafo 2º do artigo III do Tratado de 1890, a Corte chegou à
conclusão de que a fronteira entre Botswana e Namíbia em torno da ilha de Kasikili/Sedudu segue a linha das
sondagens mais profundas no canal norte do Chobe. Não tendo a Corte aceitado a argumentação namibiana
relativa à prescrição, segue-se que a ilha de Kasikili/Sedudu faz parte do território de Botswana.

A Corte notou, que o comunicado de Kasane, de 24 de maio de 1992, considerou o fato de que os
Presidentes da Namíbia e de Botswana acordaram e decidiram que:
"c) a interação social existente entre a população namibiana e aquela de Botswana deveria
prosseguir;
d) as atividades econômicas, como a pesca, deveriam continuar, estando entendido que
nenhuma rede de pesca deveria ser estendida atravessando o rio;
e) a navegação deveria continuar sem entraves, incluindo a livre movimentação de turistas".
À luz das disposições pré-citadas do comunicado de Kasane, e em particular de sua alínea e), bem
como da interpretação que foi dada a essa alínea perante a Corte no caso em tela, a Corte, que, em virtude do
compromisso, está habilitada a determinar o status jurídico da ilha de Kasikili/Sedudu, concluiu que as partes
mutuamente garantiram a liberdade de navegação, sobre os canais em torno da ilha de Kasikili/Sedudu, para
os barcos de seus nacionais de bandeira nacional. Disso resulta que, no canal sul em torno da ilha de
Kasikili/Sedudu, os nacionais da Namíbia e os barcos de sua bandeira estão no direito de se beneficiar e se
beneficiarão do tratamento acordado por Botswana a seus próprios nacionais e aos barcos com bandeira de
sua própria nacionalidade. Os nacionais dos dois Estados e os barcos de bandeira de Botswana ou da Namíbia
serão submetidos às mesmas condições no que concerne à navegação e à proteção do meio ambiente. No
canal norte, cada parte acordará, igualmente, em relação aos nacionais e aos barcos de bandeira da outra parte,
em pé de igualdade, o regime de tratamento nacional.

O texto completo do dispositivo (parágrafo 104) é o seguinte:


"Por esses motivos,
A Corte,
1) Por onze votos a quatro,
Entende que a fronteira entre a República de Botswana e a República da Namíbia segue a
linha das sondagens mais profundas no canal norte do rio Chobe emtorno da ilha de Kasikili/Sedudu;
A FAVOR: Presidente Schwebel; juízes Oda, Bedjaoui, Guillaume, Ranjeva, Herczegh, Shi,
Koroma, Vereshchetin, Higgins, Kooijmans;
CONTRA: Vice-PresidenteWeeramantry; juízes Fleischhauer, Parra-Aranguren, Rezek;
2) Por onze votos a quatro,
Entende que a ilha de Kasikili/Sedudu faz parte do território da República de Botswana;
A FAVOR: Presidente Schwebel; juízes Oda, Bedjaoui, Guillaume, Ranjeva, Herczegh, Shi,
Koroma, Vereshchetin, Higgins, Kooijmans;
CONTRA: Vice-PresidenteWeeramantry; juízes Fleischhauer, Parra-Aranguren, Rezek;
3) Por unanimidade,
Entende que, nos dois canais em torno da ilha de Kasikili/Sedudu, os nacionais e os barcos
de bandeira da República de Botswana e da República da Namíbia devem beneficiar-se, em pé de
igualdade, do regime de tratamento nacional."
Os juízes Ranjeva, Koroma e Higgins, juntaram declarações à decisão; os juízes Oda e
Kooijmans juntaram à decisão a exposição de suas opiniões individuais; o Vice-Presidente
Weeramantry e os juízes Fleischhauer, Parra-Aranguren e Rezek juntaram à decisão a exposição de
suas opiniões dissidentes.

ANEXO

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