Você está na página 1de 13

TEXTO DE APOIO

3.1.3. A CONFERÊNCIA DE BERLIM DE 1884/85


A ideia da realização de uma Conferência Internacional para resolver a questão
do Congo, lançada por Portugal, seria materializada pela Alemanha e pela
França que, em conjunto, planificaram o programa da Conferência de Berlim.

A Conferência realizou-se em Berlim, capital da Alemanha, de 15 de Novembro


de 1884 a 26 de Fevereiro de 1885 e entre as suas decisões destacam-se: a
liberdade de comércio na Bacia Convencional do Congo, a liberdade de
Navegação nos rios Níger e Congo, a obrigatoriedade da ocupação efectiva das
novas possessões europeias nas costas de África e a criação do Estado Livre
do Congo, presidido por Leopoldo II da Bélgica.

A preparação da Conferência de Berlim

Bismarck «apercebera-se que certos trunfos, para manter a sua arbitragem


sobre a Europa, encontravam-se nos territórios de além-mar que as potências
disputavam cada vez mais» (Brunschwig, 1963: 174) e aproveitando todas as
ocasiões para uma aproximação com a França – sempre motivado pelo desejo
de tentar afastá-la da vingança pela perda de Alsácia e Lorena – propõe-lhe, em
Agosto de 1884, após o fracasso das negociações franco-inglesas relativas ao
Egipto, estabelecer por associação das duas nações um contrapeso à
supremacia colonial da Inglaterra.

A aproximação franco-alemã
tornou-se um facto quando
Jules Ferry, Primeiro-ministro
francês, aceitou a proposta de
Bismarck para combinarem o
programa de uma
Conferência Internacional
sobre Assuntos Africanos e,
especialmente, sobre a
Bismarck questão do Congo. Jules Ferry
Origem: Wikipédia, a Origem: Wikipédia, a
Enciclopédia Livre Enciclopédia Livre
ooo
Ao preparar a Conferência, a Alemanha tinha a intenção de obstar, quanto
possível, ao contínuo engrandecimento da Inglaterra, sua principal rival e estava
interessada em obter a garantia de liberdade comercial na África Central. A
França não tencionava dar esta garantia nas suas possessões localizadas na
referida zona mas pretendia que ela triunfasse nos territórios da Associação
Internacional do Congo.

O governo francês aderindo à ideia da reunião de uma Conferência, fixava como


condição fundamental que esta se ocupasse somente dos negócios da
navegação e livre comércio no Zaire, conservando-se alheia a todas as outras
questões pendentes acerca dos territórios marginais (Cordeiro, 1934: 606).

Finalmente, em Setembro de 1884, Bismarck e Jules Ferry tomaram a decisão


oficial de reunir a projectada Conferência, em cujo programa constavam os
seguintes pontos:

I. Liberdade de comércio na bacia e embocaduras do Congo.


II. Aplicação ao Congo e ao Níger dos princípios adoptados pelo
Congresso de Viena com vista a consagrar a liberdade de navegação
em vários rios internacionais, princípios mais tarde aplicados ao
Danúbio.
III. Definição das formalidades a observar para que as novas ocupações
nas costas de África sejam consideradas efectivas.

Observe o mapa de África antes da Conferência de Berlim:

Elaborado por Mariete Costa, ISCED/HUÍLA, 2012. Página 2


A Conferência de Berlim teve o seu
início a 15 de Novembro de 1884,
sábado, pelas 14H00, sob a
presidência de Bismarck, estando
presentes os plenipotenciários de
catorze países: Alemanha, França,
Grã-Bretanha, Espanha, Portugal,
Bélgica, Império Austro-húngaro,
Dinamarca, Estados Unidos da
América, Itália, Reino da Suécia e
A Conferência de Berlim de 1884/85 Noruega, Reino dos Países Baixos,
Origem: Wikipédia, a Enciclopédia Livre
Rússia e Turquia.

A Associação Internacional do Congo (A.I.C.) não podia estar representada


oficialmente na Conferência porque juridicamente não passava de uma
sociedade particular, mas contava com dois fortes apoios: a Alemanha e os
E.U.A. que a tinham reconhecido antes da Conferência. Os interesses da A.I.C.
foram também cuidados, embora não abertamente, por um dos plenipotenciários
belgas, o barão de Lambermont, considerado como sendo mais representante
de Leopoldo II do que da própria Bélgica.

No discurso de abertura da Conferência de Berlim, o chanceler alemão apontou


os “objectivos altruístas” da sua reunião:

Organizando esta Conferência o governo imperial foi guiado pela convicção


de que todos os governos partilham o desejo de associar os indígenas da
África à civilização, abrindo o interior deste continente ao comércio,
fornecendo aos seus habitantes os meios de se instruírem, encorajando as
missões e empresas de natureza a propagar os conhecimentos úteis e
preparando a supressão da escravatura e sobretudo o tráfico de negros
(Lavradio, 1936: 46).

Liberdade de comércio na bacia e embocaduras do Congo

Ao expor o programa da Conferência, Bismarck deixou claro que «a ideia


fundamental |…| é facilitar a todas nações comerciais o acesso ao interior da
África» (Santa-Rita, 1956: 46) e, manifestando que seria desejável que todas as
mercadorias destinadas ao interior fossem admitidas livremente pelo litoral
africano, exprimiu o desejo de que se estabelecessem negociações entre os

Elaborado por Mariete Costa, ISCED/HUÍLA, 2012. Página 3


Estados interessados em regular este ponto de direito internacional para dar
satisfação às necessidades de comércio (Santa-Rita, 1956: 46).

De acordo com o programa da Conferência, a primeira questão discutida e


resolvida dizia respeito à aplicação do princípio de liberdade de comércio na
bacia e embocaduras do Congo. Desta questão derivou a necessidade de se
delimitar a chamada bacia convencional do Congo, pelo que a Conferência
nomeou uma comissão encarregada de o fazer.

Após longa discussão acabou por se delimitar a bacia convencional do Congo


pelos cumes das bacias do Niari, Ogoué, Chari e Nilo, a norte; pela linha da
cumeada oriental dos afluentes do lago Tanganiyka, a leste; pelos cumes das
bacias do Zambeze e Loge, a sul; pelo oceano Atlântico, desde o paralelo 2º 30’
de latitude sul até à embocadura do Loge, a oeste. Englobava, portanto, todos
os territórios banhados pelo Congo e seus afluentes, incluindo o lago Tanganiyka
e seus afluentes orientais.

Elaborado por Mariete Costa, ISCED/HUÍLA, 2012. Página 4


A delimitação da bacia convencional do Congo com vista à aplicação do princípio
de liberdade comercial era o modo de conseguir «que as potências envolvidas,
sem bases para reivindicações territoriais na região, não abdicassem de todos
os seus interesses» (Almeida, 1979: 235).

Convencionaram-se, então, na Conferência as bases gerais para os regimes


fiscais que se teriam de organizar na bacia convencional do Congo:

I – O livre acesso de todas as bandeiras, sem distinção de nacionalidade,


incluindo o exercício de cabotagem e de batelagem marítima e fluvial em
igualdade de condições com a bandeira nacional respectiva;

II – A taxação igual e restritiva à justa compensação das despesas úteis ao


comércio das mercadorias importadas de qualquer procedência ou sob qualquer
bandeira, com interdição absoluta de tratamento diferencial;

III – A isenção de direitos de entrada e de trânsito por um período de 20 anos,


pelo menos.

IV – A interdição de qualquer monopólio ou privilégio em matéria de comércio.

Aditaram-se ainda aos princípios expostos outros referentes à protecção dos


indígenas, dos missionários e dos viajantes; à liberdade de consciência e
tolerância religiosa:

Todas as potências que exerçam direitos de soberania ou influência nos ditos


territórios comprometem-se a zelar pela conservação das populações indígenas
e pelo melhoramento das suas condições de existência e a concorrer para a
supressão da escravatura e sobretudo do tráfico dos negros; elas protegerão e
favorecerão, sem distinção de nacionalidade nem de culto, todas as instituições
e empresas religiosas, científicas ou caritativas criadas e organizadas para
esses fins ou tendentes a instruir os indígenas e fazer-lhes compreender e
apreciar as vantagens da civilização |…|. A liberdade de consciência e a
tolerância religiosa são expressamente garantidas tanto aos indígenas como aos
nacionais e estrangeiros (Artigo 6 do Acto Geral de Berlim)

Uma série de princípios vagos, tendentes a ocultar os verdadeiros objectivos das


potências sob a máscara da filantropia.

Liberdade de navegação nos rios Congo e Níger

A Conferência debruçou-se depois sobre o segundo ponto do seu programa, a


aplicação ao Congo e ao Níger dos princípios adoptados pelo Congresso de
Viena com vista a consagrar a liberdade de navegação em vários rios
internacionais.

Elaborado por Mariete Costa, ISCED/HUÍLA, 2012. Página 5


Os plenipotenciários alemães apresentaram um projecto único para os dois rios
mas o embaixador britânico, Sir Edward Malet, insistiu na diferença essencial
entre o Congo e o Níger, salientando que enquanto o curso do primeiro se
desenvolvia em território ainda não ocupado (alto Congo) ou pertencendo a
vários países (baixo Congo), a Inglaterra era a única potência presente no baixo
Níger não admitindo, por isso, o controle de uma comissão internacional e que
faria, ela própria, respeitar as decisões da Conferência.

Assim, foi necessário, adoptar dois actos de navegação, um para o Congo,


composto de onze artigos e outro para o Níger com oito artigos. Desses artigos
destaca-se o estabelecimento da liberdade de navegação nesses rios e seus
afluentes, para os navios de todas as nações em perfeita igualdade, não sendo
submetidos a direitos de trânsito nem a portagens baseadas no simples facto da
navegação, podendo apenas ser cobradas taxas ou direitos que tenham o
carácter de retribuição por serviços prestados à própria navegação, mas sem
tratamento diferencial.

Sir Edward Malet focou o desejo da Grã-Bretanha de ver a extensão ao rio


Zambeze dos regulamentos do acto de navegação do Níger, mas os
plenipotenciários portugueses evitaram a internacionalização daquele rio
alegando que ele percorria territórios exclusivamente portugueses.

Definição das formalidades a observar para que as novas


ocupações nas costas de África sejam consideradas efectivas.

Finalmente a Conferência dedicou-se à definição das formalidades a observar


para que novas ocupações nas costas de África fossem consideradas efectivas.

A Conferência estabeleceu, para as novas ocupações nas costas do continente


africano, dois princípios, nomeadamente a notificação e a ocupação efectiva.

O primeiro estipulava a obrigação, para as potências que no futuro adquirissem


possessões ou assumissem protectorados nas costas do continente africano, de
acompanhar a respectiva acta de uma notificação às outras potências
signatárias do Acto Geral de Berlim, a fim de as pôr em condições de fazer valer
as suas reclamações.

O segundo princípio (ocupação efectiva) foi aprovado depois de o embaixador


britânico ter conseguido excluir os protectorados da obrigação de ocupação

Elaborado por Mariete Costa, ISCED/HUÍLA, 2012. Página 6


efectiva, bastando que se fizesse a respectiva notificação às potências
signatárias do Acto Geral de Berlim.

A Conferência concordou que as potências signatárias do Acto Geral de Berlim


reconheciam a obrigação de assegurar nos seus territórios que viessem a ocupar
nas costas do continente africano, a existência duma autoridade suficiente para
fazer respeitar os direitos e, se for caso disso, a liberdade de comércio e de
trânsito nas condições em que ela for estipulada.

Mas não se definiu exactamente em que consistia uma “autoridade suficiente”…

Veja-se a respeito deste assunto o que nos diz o Acto Geral de Berlim:

CAPÍTULO VI
Declaração relativa às condições essenciais a preencher para que novas
ocupações nas costas do continente africano sejam consideradas como
efectivas
Artigo 34
A Potência que, de futuro, tome possessão dum território nas costas do
continente africano situado fora das suas possessões actuais, ou que, não as
tendo até então, venha a adquiri-las, e do mesmo modo uma Potência que
assuma um protectorado, acompanhará a acta respectiva duma notificação
dirigida às outras Potências signatárias do presente Acto, a fim de as pôr em
condições de fazer valer, se for caso disso, as suas reclamações.
Artigo 35
As Potências signatárias do presente Acto reconhecem a obrigação de
assegurar, nos territórios por elas ocupados nas costas do continente africano,
a existência duma autoridade suficiente para fazer respeitar os direitos e, se for
caso disso, a liberdade de comércio e de trânsito nas condições em que ela for
estipulada.

A leitura atenta deste Capítulo V do Acto Geral de Berlim é, por si só, suficiente
para elucidar que a Conferência de Berlim não fez a partilha integral do
continente africano, como se afirma na maior parte das obras de História de
África.
Qual seria a necessidade do artigo 34 se já tivessem sido distribuídos, na
Conferência, os territórios africanos pelas potências coloniais? Não bastaria
então apenas o artigo 35?
A criação do Estado Livre do Congo

Enquanto na sala de sessões da Conferência eram discutidos os três pontos do


seu programa, «nos bastidores um outro assunto se debatia entre os
colaboradores do rei Leopoldo e os representantes das potências e que, afinal,
tinha sido o objectivo oculto da sua convocação: o reconhecimento da A.I.C.

Elaborado por Mariete Costa, ISCED/HUÍLA, 2012. Página 7


como Estado soberano e a delimitação das suas fronteiras» (Teixeira, 1934:
125).

Vimos que o maior objectivo da convocação da Conferência de Berlim era


preservar, na região do Congo, a liberdade comercial que a ratificação do
Tratado Makoko pela França e, posteriormente, o Tratado Luso-britânico de
26/02/1884 tinham posto em perigo. Daí que as potências europeias preferissem
que a maior parte da zona submetida à liberdade comercial ficasse com a A.I.C.
uma vez que Leopoldo II dava todas as garantias para o livre comércio
internacional na região.

Assim a A.I.C. foi sucessivamente reconhecida pela Inglaterra (16/12/1884),


Itália (19/12/1884), Império Austro-Húngaro (24/12/1884), Países Baixos
(27/12/1884), Espanha (07/01/1885), Rússia (05/02/1885), Suécia e Noruega
(12/02/1885) e Dinamarca (23 /02/1885). A Alemanha tinha reconhecido a A.I.C.
antes da Conferência, a 08/11/1884.

Nas convenções celebradas entre estas potências e a A.I.C. não se colocava o


problema dos seus limites territoriais, sendo simplesmente reconhecida a
personalidade política da A.I.C. Apenas Portugal e França exigiam que qualquer
convenção com a A.I.C. fosse precedida de delimitação de fronteiras, questão
difícil de solucionar devido às exageradas ambições da Associação. Esta
pretendia a posse de toda a margem direita do rio Congo ou Zaire e, na margem
esquerda, queria ficar com Nóqui, que era o término do caminho de São Salvador
e obter ainda a possibilidade de construir um caminho-de-ferro para o Stanley
Pool (mais tarde Malebo Pool) inacessível por via fluvial devido às cataratas do
rio. Estas pretensões encontraram a oposição da França e de Portugal e só
depois de morosas e difíceis negociações foi possível chegar a acordos.

A 5 de Fevereiro de 1885 a França assinava uma convenção com a A.I.C. e, em


troca do reconhecimento do Estado Livre do Congo, ficava com o Kouilou-Niari,
um território vasto e rico onde as estações da A.I.C. se intercalavam com
estações francesas e parecia estar parcialmente segura da posse da bacia do
Ubangui.

A 6 de Fevereiro de 1885, a França e depois a Inglaterra e a Alemanha


começaram a pressionar o Governo português para aceitar a proposta da A.I.C.,

Elaborado por Mariete Costa, ISCED/HUÍLA, 2012. Página 8


desistindo de toda a sua pretensão sobre territórios situados ao norte do rio
Congo, com excepção de Malembo e Cabinda, assegurando, desta forma, ao
futuro Estado Livre do Congo, amplo e livre acesso ao mar. Só assim seria
reconhecida a soberania portuguesa sobre os territórios a norte do Ambriz.
Portugal ainda tentou exceptuar o porto de Banana na margem direita do rio
Congo mas as três potências declaram que não convinha aos seus Governos
que o mesmo país possuísse as duas margens do rio, preferindo atribuir uma
das margens à A.I.C. o “mais fraco de todos os Estados”. Devido à pressão
exercida por essas potências, Portugal foi obrigado a assinar a 14 de Fevereiro
de 1885 a convenção com a A.I.C. e, de acordo com esse tratado de partilha da
região do Congo, Cabinda ficou separada do resto do território de Angola por um
corredor que permitia à A. I. C. (futuro Estado Livre do Congo) o acesso à costa
atlântica.

A concessão do Congo à A.I.C. garantia o regime de internacionalização que as


potências reunidas em Berlim desejavam estabelecer na vasta região do Congo
que ficava aberta ao comércio europeu e excluída da soberania de qualquer
Estado europeu, porquanto Leopoldo II agia em nome pessoal e não em nome
do Governo belga que não desejava adquirir colónias.

Deste modo, embora fora do âmbito da Conferência de Berlim, o Estado Livre do


Congo foi oficialmente criado durante a sua realização, em trabalhos que tiveram
lugar fora as sessões da Conferência mas em simultâneo com elas. Por isso, os
trabalhos da Conferência de Berlim foram-se arrastando até que as potências
tivessem reconhecido o Estado Livre do Congo, o que aconteceu oficialmente na
sessão de 23/02/1885.

A 26 de Fevereiro de 1885, ao encerrar a Conferência de Berlim, Bismarck


pronunciou as seguintes palavras:

O novo Estado do Congo é chamado a tornar-se um dos principais guardiões da


obra que nós temos em vista e faço votos para que o seu desenvolvimento
prospere e para o cumprimento das nobres aspirações do seu ilustre fundador
(Banning, 1888:125).
Finalmente procedeu-se à assinatura do Acto Geral de Berlim pelas potências
participantes.

O mapa a seguir mostra a África, depois da Conferência de Berlim.

Elaborado por Mariete Costa, ISCED/HUÍLA, 2012. Página 9


A sorte reservada ao Acto Geral de Berlim

As decisões da Conferência de Berlim foram reunidas num “Acto Geral”, devendo


ser cumpridas por todas as potências signatárias mas, como se costuma dizer,
“um acordo é feito para ser violado” e “a sorte reservada ao Acto Geral de Berlim
não fará mentir o provérbio. Nunca um tratado internacional foi pisado pelos pés
com maior sangue-frio”.

A Conferência de Berlim tinha estabelecido a liberdade de navegação sobre o


rio Níger, mas os agentes da Royal Níger Company, a pretexto de despesas de
fiscalização e polícia do rio, tornaram de tal forma pesados os encargos sobre
os comerciantes estrangeiros que conseguiram afugentá-los e realizar elevados
lucros.

O livre acesso à bacia do Congo, tão reclamado e exaltado durante a


Conferência de Berlim, não chegou a durar os vinte anos que esta lhe tinha
fixado. A Conferência de Bruxelas, reunida em 1890, por Leopoldo II, sob um
pretexto filantrópico, visava, na realidade, modificar o regime aduaneiro do
Estado Livre do Congo, onde o rei dos belgas se tinha apercebido que não era
possível manter a liberdade de comércio prevista em 1885. Depois de laboriosas
negociações concordou-se em introduzir na bacia convencional do Congo os
direitos de 10% sobre as importações. Assim, foi violado o princípio de liberdade

Elaborado por Mariete Costa, ISCED/HUÍLA, 2012. Página 10


comercial estabelecido pela Conferência de Berlim e que tinha servido ao rei
Leopoldo II para obter o reconhecimento internacional do Estado “Livre” do
Congo, combatendo as pretensões portuguesas na região.

Além disto, pouco depois da realização da Conferência de Bruxelas, Leopoldo II


empenhou-se em constituir no Estado Livre do Congo um domínio privado
reservando para si a posse das “terras vagas”, onde foi proibida a colheita e
exploração de cauchu e outros produtos vegetais sem autorização do Estado e,
mais tarde, foram determinados quais os distritos em que o comércio era livre e
que representavam apenas 1/5 do território. Vendendo directamente a maior
parte dos produtos ricos do país e principalmente o marfim e o cauchu, o Estado
realizou fáceis e elevados lucros (Santa-Rita, 1916).

As disposições da Conferência de Berlim referentes às novas ocupações nas


costas do continente africano foram contornadas pelos processos que as
potências encontraram para se esquivarem ao seu cumprimento. Assim, para
evitarem as obrigações do princípio de ocupação efectiva, as potências
(Inglaterra, França e Alemanha) recorreram à criação de “zonas de influência”,
princípio que não havia sido mantido em Berlim e que estava em contradição
com o princípio de ocupação efectiva, porquanto numa “zona de influência” não
é exercida nenhuma “autoridade suficiente”. Trata-se apenas de uma reserva
destinada a uma futura exploração e ocupação. A obrigatoriedade da ocupação
efectiva apenas seria exigida pelas potências a Portugal.

Deste modo pode afirmar-se que a maior obra da Conferência de Berlim de


1884/85 foi a criação do Estado Livre do Congo, que ao longo da sua História foi
apenas mudando de nome (Congo Belga, República do Zaire, República
Democrática do Congo).

Conclusão

A Conferência de Berlim de 1884/85 não fez a partilha integral do continente


africano mas foi o ponto de partida para essa partilha porque, por um lado,
aprovou (na sessão de 23 de Fevereiro de 1885) a partilha de grande parte da
África Central, feita entre a França, A.I.C., a 5 de Fevereiro de 1885, e entre
Portugal e a A.I.C., a 14 de Fevereiro de 1885, consagrando, assim, a existência
do Estado Livre do Congo.

Elaborado por Mariete Costa, ISCED/HUÍLA, 2012. Página 11


Por outro lado, estabeleceu princípios que deviam presidir à partilha das costas
do continente africano, nomeadamente a notificação e a ocupação efectiva,
deixando vislumbrar o destino que o Imperialismo europeu reservava à África.

PRINCIPAIS DECISÕES DA
CONFERÊNCIA DE BERLIM DE 1884 /1885

Os princípios da
Delimitação da Notificação
Bacia convencional e da Ocupação
Liberdade de
do Congo onde Efectiva
Navegação nos
deveria vigorar a deveriam ser
Rios Congo e Níger.
liberdade comercial, respeitados pelos
durante 20 anos. Países que
ratificassem o Acto
Geral de Berlim

CONFERÊNCIA DE BERLIM DE 1884/1885

CONSEQUÊNCIAS

Criação do Estado Partilha de parte Ocupação Efectiva


Livre do Congo da África Central de
Presidido por entre a França, Novas Possessões
Leopoldo II a A.I.C. e Portugal. nas costas de
da Bélgica África

PONTO DE PARTIDA PARA A PARTILHA DA ÁFRICA


ENTRE VÁRIOS PAÍSES EUROPEUS

BIBLIOGRAFIA

ALMEIDA, Pedro Ramos (1979). História do Colonialismo Português em


Elaborado por Mariete Costa, ISCED/HUÍLA, 2012. Página 12
África. Cronologia do século XIX e do século XX. Lisboa: Editorial
Estampa.
BANNING, Émile (1888). Le Partage Politique de l’Afrique d’après les
Transactions Internacionales les plus Recentes (1885 - 1888).
Th Falk Editeur, Bruxelles: Librairie Européenne.
BRUNSCHWIG, Henri (1972). A Partilha da África. Lisboa: Publicações Dom
Quixote.
CORDEIRO, Luciano (1934). Questões Coloniais I. Coimbra: Imprensa da
Universidade.
CORNEVIN, Robert (1966). Histoire de l’Áfrique. Vol.2. Paris: Payot.
CORNEVIN, R. et CORNEVIN, Marianne (1970). Histoire de l’Afrique des
Origines à la Deuxième Guerre Mondiale. Paris: Payot.
COSTA, Mariete da C. P. (1989). A Conferência de Berlim de 1884 /1885.
Realidades e Consequências Históricas Verdadeiras. Lubango:
ISCED (Tese de Licenciatura).
HERNANDEZ, Leila Leite (2005). A África na Sala de Aula: Visita à História
Contemporânea. São Paulo: Selo Negro.
KAKÉ, Ibrahima Baba et M’BOKOLO, Elikia L’Afrique Coloniale. Histoire
Général de l’Afrique. Vol. 8. Paris: ABC.
KI-ZERBO, Joseph (1972). História da África Negra. Vol. 2, Tradução
de Américo de Carvalho. Editor Francisco Lyon de Castro, Viseu:
Publicações Europa – América.
LAVRADIO, Marquês de (1936).Portugal em África depois de 1851. Subsídios
para a História. Lisboa: Agência Geral das Colónias
M’BOKOLO, Elikia (2007). África Negra. História e Civilizações – do século
XIX aos nossos dias. Vol. 2, 2.ª ed.,Tradução de Manuel Resende
Lisboa: Edições Colibri.
MONNIER, J. (1968). História Universal – Idade Contemporânea (1870 –
1914). Lisboa: Verbo Juvenil.
OLIVER, Roland e FAGE, J. D. (1972). Breve História de África. Lisboa: Sá da
Costa Editora.
SANTA-RITA, J. G. (1959). África nas Relações Internacionais depois de 1870.
Lisboa: Junta de Investigações do Ultramar.
SANTA-RITA, J. G. (1916). Estudo Sobre a Conferência de Berlim de 1885.
Lisboa: Imprensa Libâneo da Silva.
SANTOS, Eduardo dos (1966). A Questão da Lunda (1885 – 1894).Lisboa:
Agência Geral do Ultramar.
TEIXIERA, A. A.(1934). Angola Intangível. s.l. Edições da primeira exposição
colonial portuguesa.

História Geral de África, VII: África sob dominação colonial, 1880 – 1935.
Editado por Albert Adu Boahen, 2.ª ed. rev. , Brasília: UNESCO, 2010.

Grande Enciclopédia Portuguesa e Brasileira. Lisboa / Rio de Janeiro: Editorial


Enciclopédia.

Elaborado por Mariete Costa, ISCED/HUÍLA, 2012. Página 13

Você também pode gostar