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INDICAÇÃO GEOGRÁFICA: O CASO DO QUEIJO ALAGOA EM ALAGOA, MINAS


GERAIS

Conference Paper · September 2015

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Aldara César
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INDICAÇÃO GEOGRÁFICA: O CASO DO QUEIJO ALAGOA – EM
ALAGOA, MINAS GERAIS

Lucas Gonçalves Pinto


Graduado em Engenheiro de Produção -Universidade Federal Fluminense (UFF) - lucasgpinto@hotmail.com

Angelita Pereira Batista


Docente e Pesquisadora do Departamento de Engenharia de Agronegócios da Universidade Federal Fluminense
(VEA/UFF) - angelita_batista@yahoo.com.br

Aldara da Silva César


Docente e Pesquisadora do VEA/UFF - aldaracesar@id.uff.br

Grupo 10. Desenvolvimento Rural, Territorial e Regional.

Resumo
A Indicação Geográfica (IG) permite a valorização de ativos intangíveis associados a uma
identidade territorial e origem geográfica, podendo potencializar uma região e trazer inúmeros
benefícios às partes envolvidas. Dessa forma, espera-se que a certificação agregue valor à
produção local principalmente porque permite explorar o terroir em cada município, tornando
o produto exclusivo. Nesse sentido, o presente trabalho apresenta um estudo de caso único, o
qual teve como objeto o Queijo Alagoa produzido no Sul de Minas Gerais – especificamente
no município de Alagoa. O produto é a principal fonte de renda para muitas famílias e é o
motor da atividade econômica do município. Em campo, foi verificado que será necessário o
dispêndio de recursos que podem inviabilizar a adequação de pequenos produtores às
exigências da certificação. A população do município parece entender que a IG
potencializaria a economia local, contudo é importante que se avalie até que ponto os
benefícios gerados por essa certificação para a sociedade alagoense serão maiores do que os
prejuízos causados devido à segregação dos produtores não certificados.
Palavras-chave: Identificação Geográfica, produção familiar, Queijo Alagoa, Alagoa.

GEOGRAPHICAL INDICATION: THE CASE OF ALAGOA CHEESE - IN


ALAGOA, MINAS GERAIS
Abstract
The Geographical Indication (GI) allows asset intangible valuations associated to the
territorial identity and geographical origin. It can exacerbate a region and it could provide
many benefits to the stakeholders involved. Thus, it is expected that the certification add value
to local production, mainly because it allows explore the terroir in each city, which can make
the product unique. In this sense, this work presents a single case study - the "Queijo Alagoa"
produced in the Southern´s Minas Gerais -, specifically in the city of Alagoa. This product is
the main source of income for many families. In the field, it was found that the small
producers would require resources that could make the certification unviable for some of

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them. The population of Alagoa seems to understand the GI would increase the local
economy, but it is important to evaluate the extension of the benefits to guarantee that those
will be higher than the loses caused due to the segregation of producer no certified.
Key words: Geographical Indication, family production, Queijo Alagoa, Alagoa.

1. INTRODUÇÃO

Para Porter (1986), a empresa que se diferencia para obter lealdade tende a estar mais
bem posicionada em relação a seus concorrentes. Segundo Hitt et al. (2005), uma vantagem
competitiva se torna ainda maior quando a estratégia de uma empresa está associada a ativos
intangíveis, por esses serem difíceis de serem entendidos, copiados e comprados - o que por
sua vez, os torna mais valiosos e permite que as empresas sustentem sua vantagem por maior
período em relação às que se sustentam em estratégias associadas a ativos tangíveis.
Nesse contexto, a Identidade Geográfica (IG) merece destaque visto que preserva as
particularidades do produto/serviço, regulada através das normas especificadas para o
processo de produção e controle durante o desenvolvimento do projeto de certificação. Bérard
e Marchenay (2008) apud Cerdan et al. (2009) afirmam a necessidade de se colocar em
evidência o modo como uma IG deseja alcançar a valorização das tradições, costumes,
conhecimentos, práticas e outros ativos intangíveis associados a uma identidade territorial e
origem geográfica. Este pensamento se completa no entendimento de Allaire e Sylvander
(1997) e Cerdane Vitrolles (2008), os quais concluíram que ao qualificar ativos intangíveis
que são de difícil transposição para outros territórios, as IGs podem mesmo ser
conceitualmente percebidas como um catalisador de processos de desenvolvimento
territorial/endógeno. Percebe-se dessa forma, que as IGs podem potencializar uma região e
trazer inúmeros benefícios às partes envolvidas se o processo de fortalecimento das
características do produto/serviço e o desenvolvimento do processo de certificação forem
definidos claramente e executados de forma eficiente.
O estímulo aos investimentos na área especificada por determinada IG, o
desenvolvimento sócio-econômico com consequente geração de empregos e o
desenvolvimento do turismo são benefícios que também podem ser alcançados a partir do
estabelecimento de uma certificação. A melhoria do padrão tecnológico, a fidelização do
consumidor a partir do momento em que consegue identificar qualidade e características
regionais no produto, a maior competitividade dos produtores no mercado, a garantia da
qualidade, reputação, identidade e aperfeiçoamentos no processo de comercialização do
produto e/ou serviço são vantagens comerciais que trazem melhorias para todo o sistema.
Especialmente nos países em desenvolvimento, espera-se que as IG’s possam
acrescentar valor à produção local proporcionando mais renda do que os produtos sem IG,
tendo em vista que esses produtos certificados trariam não somente uma ideia de qualidade,
como também de exclusividade (CACIE et al., 2011).
A legislação brasileira prevê para produtos e serviços agropecuários duas espécies de
proteção a partir do Art. 176 da Lei 9.279 do Código de Propriedade Industrial: Indicação de
Procedência (IP) e Denominação de Origem (DO).

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A partir da percepção do governo brasileiro da necessidade de garantir certa proteção a
produtores através do INPI (Instituto Nacional de Propriedade Intelectual)1, do desejo de
desenvolver sistemas produtivos específicos de algumas regiões, além do entendimento pelos
comerciantes e consumidores que alguns produtos apresentavam características particulares,
como qualidade e reconhecimento, começou a ser inserido, no Brasil, o conceito de
Indicações Geográficas (IG’s). Em um país onde um mix de povos e culturas se estabeleceu
desde o tempo da colonização, é comum que vários produtos sejam reconhecidos de acordo
com a região em que são produzidos, ou seja, a cultura, clima, relevo, solo, dentre outros
aspectos que influenciam os sistemas produtivos e potencializam as características dos
resultados de algumas produções específicas. Desta forma, o produto começa a adquirir uma
identidade que o distingue de outros produtos existentes no mercado.
A IG trata-se, portanto, de “um selo distintivo composto por um nome geográfico e
protegido por lei” (INDICAÇÃO GEOGRÁFICA 2010). Refere-se à identificação e
certificação de um produto e/ou serviço que está diretamente ligado à sua origem local, seja
uma cidade, região ou país, quando sua reputação, valor intrínseco, identidade própria,
características e/ou qualidade possam ser relacionadas a esta origem particular. Trata-se de
um direito privativo (e exclusivo) de uso coletivo, ou seja, é restrito aos produtores e/ou
prestadores de serviço estabelecidos no local e que estão de acordo com as regras
estabelecidas.
Para que se estabeleça a certificação, é necessário que haja alguns fatores naturais e
humanos que apresentem papel preponderante na delimitação de uma IG. A composição do
solo, a temperatura da região, a umidade do ar e a altitude são exemplos de fatores naturais
que auxiliam nesse processo. Ao mesmo tempo, o saber fazer relacionado a métodos de
cultivo, fabricação, e o conhecimento de todas as etapas do processo de produção proveniente
de uma cultura forte e tradicional, são aspectos humanos que também devem ser levados em
consideração nessa etapa. A título de ilustração, Sebrae (2011), apresenta um guia detalhado
de como identificar o potencial de reconhecimento de uma região ou produto a obter a
certificação.
No entanto, não basta a existência de um produto com características potenciais para a
obtenção da IG. O reconhecimento desse tipo de certificação exige a união dos produtores,
que de modo voluntário, operam em defesa de seus produtos. Dessa forma, é possível
concretizar um fortalecimento comunitário com o propósito de realizar a inclusão social de
produtores através de práticas educativas, melhoria das práticas já existentes e facilitação do
acesso a recursos, conseguindo agregar valor à cadeia e aperfeiçoar os processos produtivos.
Ou seja, o processo de busca pela certificação deve ser conduzido de forma que os benefícios
gerados pela IG superem os custos decorrentes das exigências impostas aos produtores pela
necessidade de adequação à padronização produtiva.

1
O INPI, criado em 1970, é a entidade máxima no Brasil no que se diz respeito à execução das normas que
regulam a propriedade industrial, sendo responsável pelo registro e concessão de marcas, patentes, desenho
industrial, transferência de tecnologia, indicação geográfica, programa de computador e Topografia de Circuito
Integrado. Esta entidade objetiva estimular a inovação e o desenvolvimento tecnológico, econômico e social
brasileiro. Dessa forma, em 1996, a partir da Lei da Propriedade Industrial nº 9.279, foi introduzido o conceito
de Indicação Geográfica e a Resolução INPI nº 75/2000 especificou as condições para seu registro.

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A partir dos conceitos introduzidos até então, torna-se evidente, a partir de todas estas
informações, a bagagem cultural que existe por trás da produção leiteira e fabricação do
queijo parmesão na região. Além disso, o produto é a principal fonte de renda para as muitas
famílias que se aplicam à sua produção e é o motor da atividade econômica do município, o
que justifica e demonstra a importância da proposta deste trabalho se propôs ao realizar um
estudo de caso único, o qual teve como objeto o Queijo Alagoa fabricado na região Sul de
Minas, mais especificamente, nas cidades de Alagoa e Itamonte. O trabalho caracteriza o
processo de busca por certificação como IG da produção do Queijo Alagoa no município de
Alagoa identificando características que indiquem a potencialidade do queijo como produto a
ser certificado. O trabalho também caracteriza a fase atual desse processo e aponta algumas
dificuldades da adaptação pelos produtores para obtenção da certificação.

2. PROCEDIMENTOS METODOLÓGICOS

Esta pesquisa caracteriza-se por aplicada, pois, o intuito é realizar um estudo do


conceito e possível aplicação do registro por IG da produção do Queijo Alagoa na cidade
mineira de Alagoa buscando soluções para a valorização e o fortalecimento do produto local e
da comunidade como um todo.
O trabalho apresenta também uma abordagem qualitativa, já que “o estudo qualitativo
engloba a ideia do subjetivo, passível de expor sensações e opiniões” (BICUDO, 2004,
p.106). A pesquisa qualitativa “é válida, sobretudo, na elaboração das deduções específicas
sobre um acontecimento ou uma variável de inferência precisa, e não em inferências gerais”
(BARDIN, 2009, p. 141). Dessa forma, os resultados e abordagem serão retratados por meio
de aspectos tidos como relevante na sociedade no que se diz respeito à consequência deste
tipo de certificação.
Quanto aos objetivos do trabalho é de caráter descritivo, visando descrever as
características de determinada população ou fenômeno ou o estabelecimento de relações entre
variáveis de que uma pesquisa descritiva (GIL, 1991). A classificação se dá em função da
abordagem de como se estrutura e funciona um sistema produtivo para que seja viável a
concessão do registro e também devido à análise de suas características, assim como do
impacto de tal certificação no processo de fabricação do produto em questão e na sociedade
como um todo.
O estudo também se apresenta na forma de um estudo de caso, já que a produção do
Queijo Alagoa foi estudada através de uma abordagem metodológica de investigação,
especialmente visando a busca da compreensão, exploração e descrição das características
relacionadas ao processo produtivo em questão.
A coleta de dados ocorreu através de observação, entrevistas e questionários que
captaram opiniões relevantes para sustentar a discussão desse trabalho. Bogdan e Bilken
(1994, p.150) explicam que as notas são “o relato escrito daquilo que o investigador ouve, vê,
experiência e pensa no decurso da recolha e refletindo sobre os dados de um estudo
qualitativo”. Portanto, o diário de bordo além de ser uma fonte importante de dados é capaz
de dar suporte ao pesquisador no desenvolvimento do estudo, já que a observação direta
proporciona um maior entendimento da realidade do objeto escolhido para o estudo de caso

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por meio de visita ao local escolhido, ou seja, através de uma experiência em tempo real na
zona em estudo.
Vale ressaltar que, para desenvolvimento do trabalho, o contato com as partes
envolvidas no processo produtivo do Queijo Alagoa (produtores de queijo e de leite), com
funcionários da Prefeitura Municipal de Alagoa, além de técnicos e responsáveis do Instituto
Mineiro de Agropecuária (IMA) e da Empresa de Assistência Técnica e Extensão Rural
(EMATER) de Minas Gerais foi de relevante importância para que a realidade que permeia
esse sistema produtivo fosse caracterizada e entendida, uma vez que estes órgãos realizam
controles relacionados à produção leiteira na região. O contato com as partes citadas
anteriormente envolveu entrevistas, questionários e observações que são as fontes de dados
que fomentaram as informações do presente estudo.

3. REFERENCIAL TEÓRICO

O registro de IG é capaz de potencializar a imagem no produto frente ao mercado


consumidor, uma vez que,
“os consumidores estão cada vez mais interessados nos atributos
específicos dos produtos agrícolas e nos modos sustentáveis de
produção. Igualmente, tais produtos contribuem potencialmente à
biodiversidade e conservação do patrimônio cultural mundial, ao
desenvolvimento sociocultural e à redução da pobreza nas zonas
rurais.” (VANDERCANDELAERE et al., 2010, p.xix).

O processo de estabelecimento e implantação de uma IG exige a coordenação entre os


atores locais que se beneficiam com tal registro. De acordo com Vandecandelaere et al.
(2010), é possível que os atores locais transformem os recursos latentes locais em recursos
ativos, preservando-os e melhorando-os - ações que resultariam em um reconhecimento social
e a uma ampliação da remuneração nos mercados.
O autor apresenta o ciclo virtuoso (Figura 1) da implementação de uma IG,
apresentando as etapas de Identificação, Qualificação, Remuneração e Reprodução, além dos
aspectos envolvidos no processo de conquista do registro e controle e melhoria dos sistemas
produtivos.
De acordo com o autor, é possível que os atores locais transformem os recursos
latentes locais em recursos ativos, preservando-os e melhorando-os, ações que resultariam em
um reconhecimento social e a uma ampliação da remuneração nos mercados. Portanto, a
mobilização de atores locais é de extrema importância para que o procedimento de registro
tome forma e os objetivos de todos os interessados sejam atendidos ou ao menos discutidos e
adaptados.
A etapa de identificação de um produto como IG marca o início do processo de
registro já que é necessário o fortalecimento de promoção do produto em questão. É
importante que sejam estabelecidas as relações entre o produto, o ambiente e as comunidades
envolvidas, e a partir disso deve-se realizar um programa que possa definir quais serão os
passos que levarão os envolvidos a conseguirem tal certificação, sem se esquecer do debate
sobre a possibilidade de elaboração de perspectivas sustentáveis de produção.

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Figura 1 - Círculo virtuoso da qualidade ligada à origem.
Fonte: Vandercandelaere et al. (2010)

Para que sejam estabelecidas as relações e posterior potencialização produtiva e


comercial, pode ser necessário que estudos e análises sejam realizados de modo que
comprovem os aspectos que influenciam no sistema produtivo e tornam o produto único,
como análise de solo, umidade, história do produto, dentre outros.
A fase de qualificação é a etapa do ciclo na qual os produtores, processadores e demais
atores da cadeia de valor que determinam as regras relativas ao produto IG, já que são estes os
maiores conhecedores das características específicas do produto e seu processo produtivo, ou
seja, são os proprietários do know-how de certo tipo de produção, além de conhecerem
também a região, cultura e tradições da sociedade local.
É nesta fase que o valor agregado do produto vinculado à origem passa a ser
conhecido por todos os segmentos da sociedade, desde aos atores da cadeia produtiva até
cidadão, consumidores e instituição, devido ao fato de se realizar estudos detalhados que
caracterizam o produto IG e suas propriedades, seu processo de produção, a região que abriga
tal sistema produtivo.
A terceira fase do círculo virtuoso consiste na abordagem do produto levando-se em
consideração os aspectos econômicos relacionados ao mesmo. Dessa forma, é perceptível que,
“a fase de remuneração corresponde aos mecanismos mediante os quais a sociedade
pagará aos produtores pelos serviços que implicam no produto vinculado à origem. Por
exemplo, estes serviços são os atributos específicos relacionados com a qualidade
intrínseca, a preservação e a promoção dos recursos naturais e culturais, etc.” (ibid. p. 5).”

Como se espera uma potencialização da sociedade envolvida, as estratégias e acordos


comerciais estabelecidos devem levar em conta fatores territoriais que façam com que a
economia local se beneficie do comércio e produção da IG.
Participar de uma organização, como se pode perceber a partir das informações
explicitadas, exige que os produtores decidam se devem e se tem condições e pretensão de
alterar suas unidades e modos de produção com a finalidade de se adaptar às exigências pré-
estabelecidas na descrição das normas das IGs. Além disso, é importante que os produtores

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tenham consciência de que esse tipo de organização exige que tenham que abrir mão de
estratégias próprias e passem a praticar estratégias coletivas. Para tal decisão é importante que
analisem os prós e contras de se aceitar a inserção nesse tipo de arranjo organizacional e se os
resultados a serem obtidos realmente estão à altura de suas necessidades e objetivos pessoais.
No Quadro 1, são listadas possíveis desvantagens e vantagens de se praticar a estratégia
coletiva de uma Indicação Geográfica.

Quadro 1 – Vantagens e desvantagens da estratégia coletiva da IG.


Desvantagens Vantagens
• Combate à fraude e usurpação pela observância das
• Levar em conta o plano de comercialização coletiva
especificações da IG
(estratégia e operacionalidade) no plano de
•Capacidade de atingir novos segmentos de mercado e
comercialização da empresa
novos mercados
• Certo grau de interdependência com outras empresas
• Maior visibilidade do produto IG no mercado e
que utilizam a IG
melhora do volume de vendas
• Taxa de associação da organização IG
• Serviços oferecidos pela organização coletiva a um
• Eventuais custos para adaptar-se aos requisitos das
custo menor graças às economias de escala
especificações de condições da IG
• Aumento da reputação do produto e de seu valor
• Custos de certificação, remunerados ou não, em
• Aumento da reputação da empresa em seu conjunto
função do sistema de garantia adotado.
(repercussão nas vendas de outros produtos da empresa)
Fonte: Vandercandelaere et al. (2010)

A reprodução dos recursos locais consiste em garantir que o sistema produtivo e o


produto a ser registrado sejam sustentáveis ao longo do ciclo virtuoso, ou seja, esta etapa
busca uma certeza de que os recursos envolvidos na produção se mantenham presentes, se
renovem e que adquiram propriedades ainda melhores no desenrolar das atividades produtivas
em pauta. É importante que se certifique que as atividades relacionadas ao produto não
agridam as características locais, o meio ambiente, as tradições, sociedade, cultura e tradições.
A participação de autoridades governamentais também é essencial de modo que haja
uma segurança para as iniciativas locais de que há representatividade do interesse da
população, o que torna o processo mais forte e incentiva a luta em prol do registro da IG.

4. ESTUDO DE CASO E DISCUSSÕES

4.1. A cidade de Alagoa e o início da tradição do Queijo Alagoa

O foco é o município de Alagoa, cidade situada nas Terras Altas da Serra da


Mantiqueira, na região Sul de Minas Gerais (Figuras 1).
A cidade de Alagoa teve o início da produção de queijo há mais de 100 anos quando o
italiano Paschoal Poppa e sua esposa Luiza Altomare Poppa chegaram às terras alagoenses.
Segundo o cidadão alagoense entrevistado nessa pesquisa - - ali se instalaram e perceberam
que os pastos verdejantes, situados em altitudes acima de 1100 metros que se igualam aos pré
Alpes suíços, eram o cenário essencial para criação de gado leiteiro, a fonte da matéria-prima
para a fabricação do queijo parmesão. Ao se estabelecer na cidade, o casal, junto ao Sr.
Gumercindo Ferreira Pinto, conseguiu fundir a experiência italiana com as características do
povo e a natureza da pacata cidade, que é a mais alta entre as cidades das Terras Altas da

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Mantiqueira. Movimentaram e incentivaram a produção do queijo artesanal (feito até hoje
com leite cru, não pasteurizado) em todo seu território a partir de uma sociedade e criação de
laticínios. Desde então, os costumes do povo local fizeram com que o know-how apresentasse
caráter hereditário, transmitindo essa tradição de geração em geração.

Figura 1 – Municípios pertencentes ao Circuito das Terras Altas da Mantiqueira


Fonte: CIM (2015)

Anualmente, a prefeitura municipal realiza o Festival do Queijo (Figura 2), buscando


agregar valor ao Queijo Alagoa. O evento é marcado por palestras, divulgação e festa para os
moradores da região. Além disso, a Lei Municipal 828/2010 instituiu o 4º sábado do mês de
Maio como o “Dia do Queijo e do Queijeiro de Alagoa”.

Figura 2 - Cartazes de divulgação do evento Festival do Queijo da cidade de Alagoa.


Fonte: CIM (2015)

Em sintonia com todas estas características, o município ainda está inserido em sua
totalidade em Unidades de Conservação, dentre elas a Área de Preservação Ambiental Federal
Serra da Mantiqueira - APA Serra da Mantiqueira, no Parque Estadual Serra do Papagaio e
também nos arredores do Parque Nacional do Itatiaia, além de estar associada ao Corredor
Ecológico Mosaico da Mantiqueira. Historicamente, a cidade pertence ao Caminho Velho da
Estrada Real e o queijo da cidade é considerado patrimônio cultural registrado no Instituto
Estadual do Patrimônio Histórico e Artístico de Minas Gerais – IEPHA, além de também

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receber o título, como todo queijo artesanal mineiro, de patrimônio imaterial brasileiro pelo
Instituto do Patrimônio Histórico e Artístico Nacional (Iphan).
É possível dizer que o Queijo Alagoa, junto a outros queijos produzidos na cidade
mineira, representa a base da economia local já que o município apresenta caráter rural,
estando situado a mais de 35 km da cidade vizinha Itamonte e a aproximadamente 30km da
outra cidade mais próxima, Aiuruoca, sendo o acesso à Alagoa somente por estradas sem
pavimentação, com trechos que, no verão, se tornam de difícil movimentação. O município
possui um número de habitantes muito pequeno e boa parte da população reside em áreas
rurais. A população estimada pelo IBGE (2013), para 2013, foi de 2.768 habitantes, que
ocupam uma área territorial de 161,356 Km², com cerca de 16,79 hab/Km².
Ainda, de acordo com a mesma fonte, a cidade do queijo apresenta uma
representatividade do setor agropecuário e de serviços superior a do setor industrial, no que se
refere ao valor adicionado ao Produto Interno Bruto (PIB) municipal. Diferente do estado de
Minas Gerais e do Brasil, o setor agropecuário é responsável por uma parcela do PIB quase
cinco vezes maior que a do setor industrial (Gráfico 1).

Gráfico 1 – Representatividade dos valores adicionados setoriais do PIB em Alagoa, Minas Gerais e Brasil.
Fonte: IBGE - Cidades (2014).

É possível visualizar, também, a partir do Gráfico 1, o que já foi mencionado


anteriormente sobre o comércio local, mostrando a importância do setor de serviços para a
comunidade alagoense.
Além disso, os dados referentes à produção agrícola local indicam a existência de uma
agricultura pouco diversificada, já que produtos como milho e feijão, típicos da agricultura
familiar, representam a totalidade da produção agrícola no município (IBGE – Cidades,
2014). Parte da produção é utilizada na própria propriedade, como alimento para os rebanhos.
A partir de dados da pecuária (Tabela 1), é visível também o quanto é significativa para o
município a produção leiteira e a criação de bovinos. Percebe-se que a cidade apresenta mais

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que o dobro de animais bovinos do que de habitantes, e é esse contingente de animais que
abastece as unidades produtivas do queijo parmesão na cidade.
Tabela 1 - Pecuária no município de Alagoa
Pecuária 2012 Alagoa
Bovinos - efetivo dos rebanhos 6.671 cabeças
Equinos - efetivo dos rebanhos 340 cabeças
Asininos - efetivo dos rebanhos 24 cabeças
Muares - efetivo dos rebanhos 140 cabeças
Suíno - efetivo dos rebanhos 435 cabeças
Caprinos - efetivo dos rebanhos 38 cabeças
Ovinos - efetivo dos rebanhos 40 cabeças
Galos, frangas, frangos e pintos - efetivo dos rebanhos 2.485 cabeças
Galinhas - efetivo dos rebanhos 1.342 cabeças
Vacas ordenhadas - quantidade 3.028 cabeças
Leite de vaca - produção - quantidade 5.044 Mil litros
Leite de vaca - valor da produção 6.052 Mil Reais
Ovos de galinha - produção - quantidade 18 Mil Dúzias
Ovos de galinha - valor da produção 35 Mil Reais
Mel de abelha - produção - quantidade 1.660 kg
Mel de Abelha - valor da produção 16 Mil Reais
Fonte: Adaptado de IBGE-Cidades (2014).

2.1 Características e importância do produto e atores envolvidos na busca pela IG

Para técnicos da EMBRAPA e EMATER, o Queijo Alagoa não deve ser chamado
apenas de parmesão. Como pode ser encontrado em sites (2012) relacionados ao queijo local,
“apesar de ser conhecido como Queijo Parmesão de Alagoa ou Parmesão da Mantiqueira, a
Corte Européia não autoriza esta nomenclatura. (...) Como todo bom mineiro gosta de
economizar nas palavras, fica mais conveniente chamá-lo de Queijo Alagoa”.
O nome geográfico do produto tem sentido para os consumidores, já que ao encontrar
ou solicitar o Queijo Alagoa, sabe-se que o mesmo é proveniente de uma cidade e até mesmo
uma região conhecida pelo saber em fazer esse tipo de produto. O Sul de Minas, em especial,
as cidades que compõem a chamada “Terras Altas da Mantiqueira”, apresenta características
de localidades propícias para a prática deste tipo de produção, uma vez que a cultura, o clima
tropical de altitude, a água pura em abundância e demais recursos existentes contribuem para
a diferenciação do produto.
Dessa forma, é possível fazer com que o nome do queijo também consiga levar ao
mercado consumidor a cultura local e que o fator histórico existente no produto seja
disseminado.
O Queijo Alagoa impulsiona o desejo de aquisição dos consumidores devido ao fato
de ter um sabor marcante, um aroma diferente dos queijos mais conhecidos pela população,
uma textura macia quando se refere ao estilo parmesão e as características de queijo estilo
artesanal, o que para um alimento agrega valor.
Características relacionadas ao aroma e aparência do produto fazem o queijo
apresentar caráter artesanal e tipicamente brasileiro. Os aromas de ervas frescas e de lácteos e
o sabor levemente picante e forte gosto, intenso e persistente na boca, fazem, de acordo com o

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depoimento de consumidores, o sabor do queijo fica entre o provolone maturado e o Calcar
(parmesão capa preta) do Uruguai. A textura macia faz o produto não apresentar aspecto de
queijo “borrachento” e artificial como a maioria dos industrializados.
Alguns consumidores ressaltam as características diferenciadas do produto,
principalmente o menos curado, e alegam que isto não quer dizer que o curado não tenha a
mesma qualidade. Depoimentos como este mostram a aceitação do produto no mercado e o
potencial existente para que a conquista de novos pontos de consumo seja efetivada através de
um planejamento da comunidade como um todo, resultando em um fortalecimento do
processo produtivo e da marca. O fortalecimento de tal processo envolve atores locais e
externos, pessoas que atuam em todas as etapas da cadeia produtiva.
Alagoa conta com um número elevado de famílias que vivem da produção de Queijo
Alagoa e também do Queijo Minas Frescal. No sistema produtivo do Queijo Alagoa,
destacam-se os inúmeros produtores de leite, produtores estes que produzem o queijo com o
leite do próprio rebanho e há aqueles que apenas fornecem o leite para laticínios da cidade.
Esses atores locais aprenderam sobre a fabricação do queijo com seus familiares e hoje a
prática é passada de pai para filho de modo que o costume não se perca e a economia local
continue sustentada pela comercialização do queijo. Como se pode perceber, o produto é a
fonte do sustento dessas famílias, tornando-se importante para todo o município.
O comércio local de Alagoa, apesar de pequeno, foi a base que sustentou o sistema
produtivo, no início da prática queijeira. Por ser uma cidade onde o queijo movimenta a
economia, é costume dos moradores locais utilizá-lo de forma abundante na culinária local,
garantindo dessa forma a comercialização, principalmente a de pequenos produtores.
Quanto aos atores envolvidos, como interessada no processo de certificação do
parmesão, a Prefeitura Municipal de Alagoa é quem está na busca de parcerias que esclareçam
as dúvidas das pessoas envolvidas no sistema produtivo local e passem as informações
necessárias ao elo de suprimentos da cadeia, de modo que o entendimento seja disseminado e
o processo de certificação passe a tomar forma. Para a Prefeitura de Alagoa, tal processo
conseguiria aquecer a economia local a partir do momento em que os fornecedores do leite e
os produtores do queijo pensassem de forma concatenada e buscassem a valorização do
produto e novos mercados, gerando faturamento acima do atual, a partir da conquista de
mercados ainda não explorados. Além disso, o potencial turístico da cidade passaria a ser
mais explorado e a população se veria inserida em uma economia local mais sólida e com
mais recursos. Percebe-se que a tentativa de classificar o Queijo Alagoa como uma IG é, para
a Prefeitura Municipal, uma ótima oportunidade de fortalecimento do comércio local e
geração de novas oportunidades de emprego, o que gera consequências positivas para o
município.
O IMA e a EMATER são instituições que se destacam por estarem empenhadas em
mapear a produção leiteira e de queijo na cidade e também em passar informações referentes
ao processo de certificação por IG aos interessados locais. São estas instituições que, a
princípio, oferecem suporte ao processo idealizado pela Prefeitura Municipal em busca da
certificação do Queijo Alagoa como uma Indicação Geográfica de Origem.
Além dos já citados, os vendedores são responsáveis por atingir novos mercados,
sendo atores indispensáveis para o sucesso e sustento do sistema produtivo do Queijo de
Alagoa. Destacam-se os vendedores da própria cidade, produtores ou não do queijo e que

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também tentam ampliar seus ganhos comercializando o produto principalmente nos estados
do Rio de Janeiro e São Paulo, os vendedores externos que vão até a cidade em busca do
queijo, vendedores estes que saem de suas cidades com vendas já efetuadas. E aqueles que
ainda cultivam a cultura do século passado do transporte do Queijo Alagoa através da Serra da
Mantiqueira, no lombo de burros e mulas (Figura 3), os chamados tropeiros do Sul de Minas,
provenientes de Alagoa e Itamonte. Estes últimos são bastante conhecidos e já tem freguesia
garantida na região turística de Maromba, Maringá e Mauá, abastecendo as pousadas e hotéis
da localidade.

Figura 3 - Tropeiros das Terras Altas da Mantiqueira


Fonte: YOUTUBE (2010)

Observa-se, portanto, que o Queijo Alagoa já consegue ultrapassar as barreiras das


Terras Altas da Mantiqueira e do Sul de Minas Gerais, sendo comercializado em diversos
estados brasileiros, inclusive nas regiões Norte e Nordeste do país. A prática do e-commerce
disseminou o produto no território nacional. De forma similar, consumidores de estados mais
próximos de Minas Gerais têm acesso ao queijo através dos vendedores que vivem do
transporte e comercialização do produto. O queijo tornou-se um chamativo uma vez que
apresenta características não encontradas em queijos similares de outras regiões do país.

2.3 Estágio atual do processo de certificação

Sabe-se, a princípio, através de entrevista a um funcionário da Prefeitura Municipal,


que o conhecimento local a respeito de IG ainda é incipiente. Segundo relato do mesmo, esse
tipo de certificação ainda está em fase de expansão no país e somente agora existe certa
divulgação pelos órgãos competentes, resultando na disseminação do conceito e interesse de
produtores de diversos tipos de produto no território nacional.
Tal percepção talvez se respalde no fato de somente 14 Indicações Geográficas
brasileiras estarem registradas atualmente no INPI, sendo recente a obtenção dessas, quando
comparadas às existentes na Europa. Ou seja, isso ocorre mesmo sabendo-se que o Brasil
apresenta potencial para obter números mais expressivos nesse tipo de registro, uma vez que
as diversidades culturais, ambientais e populacionais tornam o país uma mistura capaz de
resultar em produtos que acabam adquirindo características da região e dos atores envolvidos
no processo de fabricação desses.
O conceito IG apresenta maiores níveis de conhecimento em países mais
desenvolvidos. É possível encontrar em países da Europa, em territórios bem menores que o
brasileiro, com uma miscigenação menor, números mais expressivos dessa certificação.

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Planeja-se, agora, na comunidade de Alagoa, com a chegada de um representante da
EMATER de Minas Gerais, ampliar tal conceito, a partir da convocação de reuniões com os
atores envolvidos nas indústrias do leite e do queijo. Uma tentativa semelhante a essa ocorreu
há alguns meses, mas não se obteve sucesso, uma vez que órgãos como IMA e EMATER
ainda não tinham estrutura para dar suporte aos interessados. Foram realizadas reuniões, mas
os produtores locais apareceram em pequena quantidade, não alcançando o tal registro
entendimento por parte significativa da comunidade.
Apesar de todo queijo proveniente de Alagoa apresentar características artesanais, é
possível destacar a existência, no município, de dois padrões de produção: um realizado em
laticínios, unidades produtivas com maior quantidade de recursos, onde se podem encontrar
maquinários que auxiliam no controle da qualidade e possibilitam uma maior produção
(Figura 4), e o outro padrão, totalmente artesanal, realizado, na maioria das vezes, em
pequenas propriedades rurais, sítios e fazendas familiares que conservam a cultura local, onde
o beneficiamento do leite ocorre próximo aos currais, junto à ordenhas das vacas (Figura 5).

Figura 4 - Produção de Queijo Alagoa em laticínio


Fonte: Dados da pesquisa de campo

Figura 5 – Produção artesanal do queijo Parmesão


Fonte: Dados da pesquisa de campo.

Como já mencionado, os dois tipos de produção resultam no mesmo tipo de queijo, o


que diferencia é o poder aquisitivo dos produtores que se reflete na estrutura de suas unidades
produtivas. Alguns com laticínios equipados, com maior controle de higiene e gestão de
recursos e outros, com unidades precárias e sem máquinas que ampliem a capacidade
produtiva (Figura 6). Ressalta-se, no entanto, a existência de objetivos diferenciados. Alguns
produtores visam alcançar mercados externos ao municipal e outros se limitam a abastecer o
comércio local ou apenas familiar.

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Observou-se, a campo, que será necessário o dispêndio de valores altos para que os
produtores com menor nível de recursos se adaptem aos níveis de exigências dos padrões de
produtos certificados, nesse caso, das IGs. Este fato faz com que muitos produtores com essa
característica não estejam motivados e envolvidos com a valorização do produto, via IG, já
que o retorno dos investimentos necessários para implementação das unidades produtivas se
dará em longo prazo, o que não é atrativo já que esses possuem uma carteira de clientes que
os beneficiam de modo satisfatório.

Figura 6 – Estrutura de propriedade rural produtora de queijo artesanal.


Fonte: Dados da pesquisa de campo

Quanto à comercialização, observa-se que o Queijo Alagoa, em geral, ainda não


apresenta especificação de signos para o produto. Tal especificação passa a existir a partir do
momento em que os produtores se unem em prol do objetivo da certificação IG, visando a
processo de agregação de valor, padronização da qualidade e fortalecimento da
comercialização do produto. Consequentemente, torna-se necessária a criação de uma marca
que represente a IG, signo este explorado por um marketing que visa buscar oportunidades em
regiões ainda não alcançadas e fidelização de clientes já existentes.
Os signos mais conhecidos no município e região referentes ao Queijo Parmesão
Alagoa são a logomarca do Festival do Queijo, que acontece todo o ano no município e que
atrai turistas de diversas localidades, a logomarca do “Queijo Parmesão Alagoa” e do “Queijo
D’Alagoa”, empresa cujos proprietários foram os pioneiros na cidade na comercialização via
internet (Figura 7).

Figura 7 - Logomarca do Queijo Alagoa e Logomarca do Queijo D’Alag


Fonte: http://www.queijodalagoa.com.br/ e http://www.mercadorural.net.br/anuncio/34/queijo-parmesao-de-
alagoamg-peca-grande/

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Outro aspecto a explorar seria o desenvolvimento de embalagens que tornassem o
produto mais atrativo, despertando a curiosidade e o desejo de consumo pelos clientes. A
Queijo D’Alagoa já trabalha nessa linha (Figura 8), obtendo resultados positivos em termos
de aceitação pelo consumidor.

Figura 8 - Queijo fabricado na cidade Alagoa com embalagem especial.


Fonte: http://www.queijodalagoa.com.br/

2.3 Fatores que dificultam o processo de certificação

A cidade de Alagoa possui apenas uma associação, a ASPPRAC (Associação dos


Produtores de queijo tipo parmesão das comunidades do Rio Acima e Condado) (Figura 9).
Essa conta com dez associados que fazem o queijo de forma conjunta. São produtores de leite
que convergem suas produções para a associação e todo o montante de leite é convertido em
queijo parmesão comercializado principalmente no Sul de Minas e no Vale do Paraíba carioca
e paulista.

Figura 9 – Associação local de produtores do queijo Parmesão Alagoa.


Fonte: Dados da pesquisa de campo

Observa-se, portanto, que a cidade de Alagoa ainda não possui um grupo ou


cooperativa que trabalhe com o objetivo de fiscalizar e buscar a garantia de um queijo de
qualidade produzido com padrões de higiene.
Pode-se perceber, de forma clara, que as unidades produtivas com características mais
artesanais, no sentido de menor uso de maquinários, apresentam menor controle de higiene e

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limpeza do que os laticínios e unidades produtivas mais industrializadas. Essas unidades
artesanais remetem, em geral, aos sistemas produtivos mais antigos, praticados no início do
aprendizado da prática produtiva do queijo no município.
Esses produtores, como mencionado anteriormente, teriam que buscar incentivos
financeiros que os capacitassem e dessem um suporte para que pudessem adaptar suas
unidades aos padrões de higiene, limpeza e qualidade definidos no processo de certificação,
sendo este um aspecto que dificultaria, a princípio, a aceitação de todos os produtores locais à
aplicação da IG ao Queijo Alagoa. Tal processo de adaptação é um dos fatores críticos na
busca pela certificação, já que a exclusão de produtores menos favorecidos e com unidades
produtivas mais discrepantes do padrão que seria traçado e exigido por órgãos de fiscalização
faria com que os produtores se dividissem, o que poderia caracterizar a marcha pela
certificação do produto local como um processo de segregação.
O aspecto da heterogeneidade dos sistemas produtivos do Queijo Alagoa é uma
questão que deverá ser considerada, caso o processo de certificação vier a ser concretizado.
Como quase todos os tipos de produções que envolvem um grupo de produtores, pode-se
dizer que ocorre certa heterogeneidade não só no processo, mas no produto final. Essa
característica do sistema produtivo pode ser explicada pelo fato de os produtores agregarem
em suas unidades produtivas especificidades que tornam suas produções particulares e com
aspectos que condicionam o produto final ao perfil das pessoas envolvidas na produção
(qualificação da mão-de-obra) e aos recursos disponíveis. Vale ressaltar que tais diferenças
não ocorrem de forma intensa, mas são provenientes de uma pequena parcela de produtores de
queijos na cidade.
De acordo com o funcionário da Prefeitura Municipal entrevistado, “dentro de Alagoa
há diferença na qualidade, quem dirá fora do município. O queijo feito fora de Alagoa não
fica tão bom quanto o queijo feito em Alagoa. O terroir é específico em cada município, com
pequena variação dentro do município”.
O mesmo funcionário explica que na cidade de Carvalhos, também situada no Sul de
Minas Gerais e com características semelhantes à de Alagoa, ocorre a fabricação do queijo
parmesão, porém o processo produtivo é um pouco diferente. Na cidade de Carvalhos, os
produtores costumam não atingir a temperatura que os queijeiros de Alagoa atingem,
resultando em um queijo mais pesado, o que, segundo o relato do funcionário, faz o queijo
ficar menos saboroso e com qualidade inferior. Nesse caso, o queijo é comercializado com um
valor menor e acaba, na maioria das vezes, sendo utilizado pela indústria como queijo ralado.
Apesar de todos os benefícios mencionados, é evidente a dificuldade de união entre os
produtores e outros envolvidos na cadeia devido à necessidade de adaptação por parte dos
produtores menores e/ou localizados em bairros afastados do centro da pequena cidade.
Bairros estes também com acesso bastante restrito e sem estrutura para a implantação de
laticínios ou unidades produtivas com um nível de complexidade, em termos tecnológicos,
superior à existente.
É importante lembrar que uma certificação por IG exige certo nível de organização dos
atores envolvidos no processo produtivo e uma política de qualidade que atinja a totalidade
das unidades produtivas certificadas, garantindo que o produto final apresente as mesmas
características, ou seja, que a heterogeneidade do produto final seja anulada. Para que isso
seja possível, em Alagoa, seria necessário que os órgãos interessados em tal certificação

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intensifiquem as atividades de informação e esclarecimento à população de forma que as
pessoas relacionadas ao queijo parmesão passem a pensar e agir de forma organizada e com o
mesmo objetivo.

2.4 Possíveis efeitos e impactos da obtenção da IG

A partir da análise do cenário evidenciado, em Alagoa, observa-se que um pensamento


em sinergia da população local a favor da certificação por Indicação Geográfica poderia
potencializar a economia de Alagoa, gerando benefícios para a comunidade como um todo.
Pessoas envolvidas, como produtores, fornecedores de leite, funcionários de unidades
produtivas, dentre outros, estão diretamente ligadas ao processo produtivo do queijo e veriam
de forma mais rápida tal retorno, mas os envolvidos indiretamente no processo produtivo se
beneficiariam a partir do fortalecimento da economia local e do surgimento de novas
oportunidades de emprego e melhorias no município.
A importância da consolidação da IG reside, portanto, no fato de Alagoa não
apresentar focos de industrialização além dos laticínios, e nem modernização, o que é um dos
fatores responsáveis pela preservação da cultura e do ambiente tradicional do município.
A Prefeitura municipal é a instituição que mais gera empregos na cidade e junto à
produção de queijos, faz com que a economia local apresente um giro de capital, gerando
renda aos comércios e demais cidadãos locais. Como já dito, a importância do queijo na
economia local é muito expressiva e atualmente a cidade é lembrada pela qualidade e história
existente por trás desse produto.
Nesse sentido, o processo de certificação agregaria à cidade de Alagoa, já que esse
tipo de diferenciação do produto, através de uma proteção por lei, exige que o produto tenha
qualidade padronizada, impede que o mesmo seja copiado e comercializado por produtores
que não contenham licença para tal e fortalece a marca. Esse conjunto de fatores resulta no
alcance de novos mercados consumidores, além da elevação da qualidade, fidelização de
clientes já existentes e identificação mais intensa do produto com a marca, a partir de um
marketing que agregue valor a toda a cadeia.
Todos estes benefícios potencializariam a economia local e fortaleceriam os elos da
cadeia, uma vez que, ao aumentar a demanda pelo produto, os elevaria a arrecadação dos
atores envolvidos direta e indiretamente, gerando oportunidades para a melhoriada qualidade
de vida na cidade, mesmo que de forma não equitativa.
Além dos benefícios apontados, existiria a possibilidade de fortalecimento da
produção de queijo a partir do uso de tecnologias mais adequadas, do ponto de vista sanitário
e ambiental, resultando em processos mais limpos, com menos desperdícios, sem
comprometer o caráter de produto artesanal e diferenciado, e ao mesmo tempo, agregando
valor ao produto, dada a qualidade superior.
Utilizar tal nomenclatura também pode resultar em outro ponto positivo, a
potencialização do turismo local. A localidade passa a ter maior reconhecimento e a despertar
curiosidade nos consumidores que podem se interessar pela região, que já apresenta
características turísticas. A cidade apresenta diversas montanhas, comunidades rurais, rios
com corredeiras para a prática de esportes radicais, festas típicas, festivais do queijo e

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chamativos religiosos, principalmente para peregrinos católicos após a beatificação da
chamada Nhá Chica que reflete a cultura mineira (Figura 9).

Figura 10- Festa e referência à Nhá Chica em reportagem.


Fonte: minasgeraistour.blogspot.com (2013).

4. Considerações Finais

Com a disseminação do conceito e certificação por IG no Brasil, comunidades que


apresentam traços fortes de cultura, que possuem o know-how sobre determinado produto ou
serviço, ou que tem em seu território fatores que propiciam certo tipo de produção específica,
tem a oportunidade de buscar a proteção sobre o produto local e aumentar o poder de
comércio do mesmo através da organização do sistema produtivo e sociedade.
Portanto, mudar a forma como um sistema produtivo funciona pode também implicar
em mudanças em toda uma rede que envolve fornecedores de matéria-prima, produtores,
funcionários fabris, vendedores e consumidores, ou seja, a sociedade passa por alterações e a
economia local também pode ser transformada. Quando se tratando de IGs, esse contexto se
torna ainda mais complexo, uma vez que a intensa dependência da sociedade por esses
produtos faz com que uma tomada de decisão equivocada prejudique toda uma sociedade. A
cidade de Alagoa ilustra de forma clara a abordagem, uma vez que a sociedade local apresenta
forte dependência do processo produtivo do Queijo Alagoa.
O conhecimento da sociedade alagoense que há décadas vive em uma economia
sustentada pelo Queijo Alagoa e as características presentes na região geográfica onde a
cidade se localiza, faz com que o queijo apresente características dificilmente encontradas em
outra região do país, o que pode ser percebido pelo reconhecimento que a cidade adquiriu
devido ao produto. Neste aspecto, a certificação por IG poderia ser uma forma de garantir a
continuidade do sucesso do produto local e a conquista de novos mercados consumidores e
proteção no mercado.
Entretanto, introduzir o conceito em uma sociedade conservadora, onde recursos são
escassos e os atores envolvidos não apresentam homogeneidade em suas unidades produtivas
pode ser um trabalho árduo e que não beneficie a todos da mesma forma. Fazer a sociedade
pensar de forma semelhante e ter os mesmo desejos e objetivos, criar regras, e exigir que os
envolvidos se adaptem para que continuem ativos no sistema produtivo local pode acabar
criando certa exclusão social. Atores envolvidos que não tem capital e incentivos para se
adaptarem às regras estabelecidas no processo de certificação teriam seus negócios

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impactados negativamente. Além do mais, para que a sociedade local consiga introduzir no
município o conceito de IG e as autoridades locais continuem alimentando o desejo da
concretização da certificação, é necessário que um trabalho de conscientização a respeito de
IGs seja feito e que os atores envolvidos se organizem e busquem uma forma do benefício
alcançar, sem exceção, todos os envolvidos na cadeia produtiva.
É importante que se avalie até que ponto os benefícios gerados por uma certificação
desse tipo para a sociedade alagoense serão maiores do que os prejuízos causados devido à
segregação dos produtores que teriam maior dificuldade de adaptação às exigências que a
certificação traria consigo.
Além disso, tem-se observado no Brasil que o número de comunidades que buscam a
certificação ainda é muito pequeno frente à diversidade que o Brasil apresenta e ao potencial
desse mix de raças, culturas e territórios. Talvez esse cenário exista devido ao fato da cultura
brasileira ainda não ter uma identidade marcante com os requisitos necessários para que a
certificação por IG se dê de forma mais natural e menos impactante.
Durante a busca de conhecimento e desenvolvimento deste estudo de caso, a captação
de informações foi a maior dificuldade encontrada. É notória a falta de conhecimento da
sociedade local a respeito do conceito de IG e, quando se tem este conhecimento ou se está
envolvido no projeto e planejamento da busca pela IG no local, é perceptível a ideia de que
passar informações a respeito do andamento do processo ou anseios das partes envolvidas
pode ser prejudicial neste início da busca pela IG do Queijo Alagoa.
Tentar quantificar o impacto de tal certificação do produto local e exclusão de
produtores que não conseguiriam se adaptar às exigências de qualidade e padronização do
sistema produtivo seria uma forma de garantir uma maior precisão e certeza nas tomadas de
decisões a respeito da implantação da IG no município. Isto seria também uma sugestão para
futuros estudos sobre o a produção queijeira no Sul de Minas e até mesmo em específico da
cidade de Alagoa.

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