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As Entesposas
Sobre seu Destino na 2ª e 3ª Eras do Sol

Existe uma pergunta (na verdade mais de uma, mas essa é das
grandes) que vem perturbando todos os fãs da literatura Tolkineana há
vários anos: Tolkien escreveu ou citou alguma explicação definitiva a
respeito do que poderia ter acontecido às entesposas durantes a 2ª e
3ª Eras do Sol ?

Infelizmente nunca foi dada uma resposta definitiva a esta questão.


Muitas conjecturas e teorias foram criadas, nenhuma delas abordando
o problema de forma definitiva ou sem falhas de raciocínio dando
margem a ainda mais especulação. Porém Tolkien escreveu sobre o
assunto em duas de suas cartas, e enquanto ele acautelava-se em
dizer qualquer coisa de revelador sobre o assunto e preferia usar
excreções como "eu acho" e "eu não sei", o tom de seus comentários
era notoriamente pessimista. Além disso ele não parece ter mudado
de idéia posteriormente, tornando o destino das Entesposas algo
negro e sujeito revelações desagradáveis. O que se segue foi escrito em 1954 (antes da
publicação do Senhor dos Anéis):

"O que quer que tenha acontecido às entesposas não está


definido neste livro [O Senhor dos Anéis]. (...)Eu creio que na
verdade as entesposas desapareceram para sempre, tendo sido
destruídas junto com seus jardins durante a Guerra da Última
Aliança (3429 a 3441 S.E.) quando Sauron usou de métodos que
calcinaram o solo e que destruíram suas terras, no intuito de
impedir o avanço dos Aliados descendo o Anduin. Elas
sobreviveram apenas na "agricultura" transmitida aos homens (e
hobbits). Algumas, é claro, devem ter fugido para o leste, ou até
mesmo escravizadas; pois mesmo nessas histórias os tiranos
deveriam possuir um esquema econômico e agrícola para seus
soldados e ferreiros. Assim sendo, se alguma sobreviveu, deveria
de fato ter sido grandemente afastada dos ents, e sua
reaproximação seria muito difícil - a não ser que a experiência de
uma agricultura militarizada e industrializada fizeram com que elas
se tornassem um pouco mais anárquicas. Tomara. Eu não sei."
(Letters, p. 149, n.º 144)

Percebam que, acima, a referência a "métodos que calcinaram o solo" de Sauron, faz com que a
destruição das terras das entesposas passe a ser uma coisa muito mais deliberada e grave do que
parecia ser na história principal, na qual Barbárvore simplesmente mencionou que "a guerra
passara por ali" (As Duas Torres, livro III, cap. IV, p. 105). O trecho a seguir foi escrito em 1972, o
ano anterior à morte de Tolkien:

"Das Entesposas: Não sei. (...)Mas creio que em As Duas Torres,


106-107, fica claro que não haveria para os ents nenhuma reunião
na 'história' - mas os ents e suas esposas, sendo criaturas
racionais, encontrariam alguma espécie de 'paraíso terrestre' até o
fim deste mundo: além do qual nem a sabedoria dos elfos nem dos
ents poderiam contemplar. Embora, talvez, eles tenham
compartilhado da esperança de Aragorn, de que eles não estavam
para sempre presos aos círculos do mundo, sendo que além
daqueles haveria mais do que lembrança." (Letters, p. 419, n.º
338)

O Destino das Entesposas 1


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A referência a As Duas Torres, pp. 106-107, diz respeito à canção do Ent e Entesposa, que foi
recitada a Merry e Pippin por Barbárvore; a fala de Aragorn que Tolkien comenta é a do Retorno do
Rei, p. 518, Apêndice A. Não obstante os comentários acima não soarem esperançosos, ainda
resta o mistério não solucionado do diálogo entre Sam Gamgi e Ted Ruivão no Dragão Verde de
Beirágua. Este diálogo se passa durante o segundo capítulo de A Sociedade do Anel (p. 65) e foi
apontado por muitos como uma possível prova da sobrevivência das entesposas.

- Tudo bem - disse Sam, rindo com os outros. - Mas e esses homens-árvores, esses que podemos
chamar de gigantes? Dizem que um homem maior que uma árvore foi visto indo para os Pântanos
do Norte há pouco tempo.

- Quem disse isso ?

- Meu primo Hal é um. Ele trabalha para o Sr. Boffin em Sobremonte e sobe até a Quarta Norte
para caçar. Ele viu um.

- Disse que viu, talvez. Esse seu primo vive dizendo que viu coisas, e pode ser que ele veja coisas
que não estão lá.

- Mas esse era grande como um olmo, e estava andando.Avançava sete jardas a cada passo,
como se fosse uma polegada.

- Então aposto que não era uma polegada. O que ele viu era um olmo, é bem possível.
- Mas esse estava andando, eu te digo; e não existe olmo nos Pântanos do Norte.

- Então Hal não pode ter visto um - disse Ted." (A Sociedade do Anel, livro I, cap. II, p. 65

Esta conversa é situada cedo na história, quando seu aspecto ainda era o ambiente de uma
"história infantil" hobbit (teria o aspecto sido mudado?). Quando é lido o excerto acima num
primeiro momento, a reação natural é aceitar que trata-se de um "mais do mesmo" (isto é, outra
miscelânea de "contos de fadas"). Todavia, uma vez que alguém tenha aprendido mais a respeito
dos ents, torna-se quase impossível uma releitura do trecho sem pensar nas entesposas. A
impressão torna-se ainda mais acentuada pelas próprias palavras de Barbárvore a Merry e Pippin:

"Fez com que eles descrevessem o Condado e sua região inúmeras vezes. Disse uma coisa
estranha nesse ponto. - Vocês nunca viram algum, hm, algum ent por lá, viram? - perguntou ele. -
Bem, não ents, entesposas, eu deveria dizer na verdade.

- Entesposas? - disse Pippin. São parecidas com vocês?

- Sim, hm, bem, não: na verdade não sei com certeza agora - disse Barbárvore com ar pensativo.
Mas elas gostariam de sua terra, ou pelo menos achei que sim." (As Duas Torres,

livro III, cap. IV, p. 98).

Juntas, essas duas conversações dão a noção bastante plausível de que, o que Halfast teria na
verdade visto, tratava-se de uma entesposa. Contudo, tão logo é determinado que Tolkien nunca
conectou a coisa toda com as entesposas, explicitamente, é fato que ele jamais mencionou isso de
alguma forma. Então, nos é deixado o papel de especular. (O fato de que uma criatura descrita
como sendo "alta como um olmo" não ser um ent, não prova nada de um modo ou de outro. Isso
poderia indicar que a história é tão somente uma invenção irreal de um hobbit, mas é
proporcionalmente possível de que um ent com mais de quatro metros de altura poderia parecer
gigantesco para um hobbit pego de surpresa, e que a história poderia ter sido exagerada ao ser
contada.) Tampouco a análise textual ajuda em qualquer coisa. O próprio Tolkien, numa discussão
sobre seus métodos de invenção, mencionou que Barbárvore não havia nem sequer sido
imaginado até o momento em que entra na história:

O Destino das Entesposas 2


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"Já faz tempo que parei de inventar (...): Eu fico esperando até ter
a noção do que realmente aconteceu; ou até a coisa toda
'escrever-se'. Então, embora eu soubesse por anos que Frodo
ingressaria em uma 'aventura na floresta' em algum lugar ao longo
do Grande Rio, eu sequer teria me lembrado de inventar ents.
Enfim eu cheguei ao ponto em que escrevi o capítulo 'Barbárvore'
sem qualquer lembrança de ter tido algum pensamento anterior
sobre ents: exatamente como agora. Então eu percebi, é claro,
que a coisa não aconteceu a Frodo, desse modo. (Letters, p. 231,
n.º 180)

Os rascunhos em The History of Middle-earth confirmam que o diálogo entre Sam e Ted fora
composto muito antes da própria entrada dos ents na história (Return of the Shadow, 253-254;
Treason of Isengard, 411-414). Então, Tolkien não poderia tê-los em mente quando escreveu o
diálogo, além do que deve ter sido, originalmente, um elemento vago, fantástico e aleatório. Por
outro lado, quando ele diz algo a respeito de Tom Bombadil, que também tomou parte na história
bem cedo: "Eu não o deixaria entrar se ele não tivesse alguma função, qualquer que fosse."
(Letters, p. 178) A implicação é clara: tudo o que foi preservado nos primeiros capítulos da história,
foi preservado por alguma razão. Quando ele fez isso com o diálogo entre Sam e Ted, ele deve ter-
se dado conta de quão sugestiva a coisa toda era. Mas como isso se encaixa com as
especulações obscuras expressadas em suas cartas, não é claro (a menos que depois ele tenha
mudado de idéia).

Esse pode ser um caso de que as emoções de Tolkien entraram em conflito com seu raciocínio. T.
A. Shippey percebeu que "ele [Tolkien] estava 'misericordioso' em relação a assuntos menores"
(Road to Middle-earth, p. 173). (Assim, Bill, o pônei, escapou, Scadufax recebeu a permissão de ir
pro Oeste com Gandalf, e nas narrativas escritas posteriormente, nos Contos Inacabados, Isildur é
mostrado usando o Anel com muito mais relutância do que o Conselho de Elrond sugeria [Contos
Inacabados, pp. 287-300] e um caminho é planejado de tal forma que Galadriel poderia ser
absolvida de toda culpa nos crimes de Fëanor [Contos Inacabados, 250-253]). Pode ser que, como
um amante de árvores que era, Tolkien desejou preservar pelo menos a esperança de que os ents
e as entesposas poderiam então encontrar-se e dar continuidade à raça. Mas as conclusões
indesejadas do que, em outro lugar, ele chamara "a lógica da história" provou ser inescapável

O Destino das Entesposas 3

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