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Técnicas utilizadas em mediação:

entrevista, comunicação e negociação

APRESENTAÇÃO

Seja bem-vindo!

A mediação é considerada uma importante técnica de resolução dos conflitos, tendo sido inspira
da na possibilidade de autocomposição e empoderamento pelas partes do litígio. Em conformida
de com a política nacional de resolução de conflitos, introduzida pela Resolução 125/2010 do C
NJ, há a propagação de um novo paradigma de negociação entre os conflitantes.

Nesta Unidade de Aprendizagem, você vai compreender a importância das habilidades técnicas
para a mediação, bem como as técnicas negociais. Por fim, você verá casos práticos de utilizaçã
o da mediação.

Bons estudos.

Ao final desta Unidade de Aprendizagem, você deve apresentar os seguintes aprendizados:

• Explicar a importância do emprego das técnicas de mediação.


• Definir o que é escuta ativa, rapport, parafraseamento, caucus e brainstorming.
• Identificar casos práticos utilizando as técnicas de mediação.

DESAFIO

Marcos reside em um apartamento com sua esposa e, há seis meses, o casal teve uma filha, cha
mada Carmela. Superada a fase em que o bebê chorava à noite, a família pode descansar, sempre
cuidando para não acordar a criança. Entretanto, nos últimos dias, houve uma mudança na rotina
do casal.
Assim, ajuizada a ação judicial de Marcos contra Vitor, o juiz determina a mediação entre os viz
inhos.

Como mediador, quais técnicas negociais você utilizaria e como?

INFOGRÁFICO

As técnicas negociais utilizadas na mediação são habilidades que podem ser aprendidas e pratica
das para se obter sucesso no processo de negociação, especialmente no restabelecimento da com
unicação na mediação. Técnicas como escuta ativa, rapport, parafraseamento, caucus e brainsto
rming são muito úteis.

No Infográfico a seguir, você vai conferir algumas informações sobre a escuta ativa.
CONTEÚDO DO LIVRO

A mediação foi introduzida no ordenamento jurídico pátrio como um importante instrumento de


pacificação social e meio alternativo ao Poder Judiciário para a resolução de conflitos pela autoc
omposição. Nesse sentido, a mediação emprega técnicas negociais em seu desenvolvimento.

No capítulo Técnicas utilizadas na mediação: entrevista, comunicação e negociação, da obra Sol


ução de conflitos jurídicos, você verá a importância das técnicas de negociação no procedimento
de mediação, não bastando apenas a habilidade interpessoal dos envolvidos. Você vai conhecer,
ainda, técnicas negociais usadas na mediação, como escuta ativa, rapport, parafraseamento, cau
cus e brainstorming, as quais são fundamentais no processo negocial. Por fim, você verá alguns
casos práticos.

Boa leitura.
SOLUÇÃO DE
CONFLITOS
JURÍDICOS

Eduardo Zaffari
Revisão técnica:

Gustavo da Silva Santanna


Bacharel em Direito
Especialista em Direito Ambiental Nacional e Internacional
e em Direito Público
Mestre em Direito
Professor em cursos de graduação e pós-graduação em Direito

Z17s Zaffari, Eduardo Kucker.


Solução de conflitos jurídicos / Eduardo Kucker Zaffari,
Martha Luciana Scholze ; [revisão técnica: Gustavo da Silva
Santanna]. – Porto Alegre: SAGAH, 2018.
166 p. : il. ; 22,5 cm.

ISBN 978-85-9502-522-6

1. Direito. I. Scholze, Martha Luciana. II.Título.


CDU 34

Catalogação na publicação: Karin Lorien Menoncin — CRB 10/2147


Técnicas negociais
utilizadas em mediação
Objetivos de aprendizagem
Ao final deste texto, você deve apresentar os seguintes aprendizados:

 Explicar a importância do emprego das técnicas de mediação.


 Definir o que é escuta ativa, rapport, parafraseamento, caucus e
brainstorming.
 Identificar casos práticos utilizando as técnicas de mediação.

Introdução
A mediação foi introduzida no ordenamento jurídico brasileiro como um
importante instrumento de pacificação social e um meio alternativo ao
Poder Judiciário para resolução de conflitos pela autocomposição. Nesse
sentido, a mediação se constitui em técnica negocial e, ao mesmo tempo,
emprega técnicas negociais em seu desenvolvimento.
O mediador judicial ou extrajudicial pode desenvolver habilidades espe-
cíficas para auxiliar no reestabelecimento da comunicação e na realização
da autocomposição. Técnicas como a escuta ativa, o rapport, o parafrase-
amento, o caucus e o brainstorming são fundamentais para a mediação.
O princípio da confidencialidade impede que as mediações tenham seu
conteúdo divulgado. Entretanto, ocasionalmente, são divulgados casos
práticos em que a mediação resolveu conflitos de forma célere, restaurando
o diálogo entre os conflitantes. Tais casos são exemplos que comprovam
a eficácia da mediação, sua rapidez e adequação à solução de conflitos.
Neste capítulo, você vai estudar a mediação e a importância do em-
prego das técnicas negociais para a resolução de conflitos. Você tam-
bém vai explorar as técnicas de escuta ativa, rapport, parafraseamento,
caucus e brainstorming. Por fim, você vai verificar exemplos de casos que
empregaram a mediação com sucesso em detrimento das soluções do
Poder Judiciário.
2 Técnicas negociais utilizadas em mediação

Importância do emprego das técnicas


de mediação
A mediação é reconhecida como um dos mais relevantes meios alternativos
de resolução de conflitos (MARCs), também conhecidos como ADRs, da
expressão norte-americana alternative dispute resolutions. Ela tem servido
como importante instrumento da Política Judiciária Nacional de tratamento
adequado dos conflitos de interesses no âmbito do Poder Judiciário brasileiro.
Introduzida pela Resolução nº. 125, de 29 de novembro de 2010, do Conse-
lho Nacional de Justiça (CONSELHO NACIONAL DE JUSTIÇA, 2010), a
mediação ganhou regulamentação especial na Lei nº. 13.140, de 26 de junho
de 2015 (BRASIL, 2015a), o marco legal da mediação, e na Lei nº. 13.105, de
16 de março de 2015, o Código de Processo Civil (CPC) (BRASIL, 2015b).
A insatisfação dos jurisdicionados com o Judiciário, decorrente de sua
crise devido à lentidão, aos altos custos, à massificação e à falta de recursos
materiais e humanos, levou ao incremento dos meios alternativos. A solução
judicial nem sempre é cumprida a partir dos meios judiciais tradicionais, o que
demonstra que, sem a participação daquele que deve cumprir a obrigação na
construção da solução, menores são as probabilidades de eficiência. Ou seja,
por meio da desjudicialização, como já se vem admitindo para situações que
antes ficavam sob o “monopólio” do Poder Judiciário — como o inventário e
o divórcio extrajudiciais —, os conflitos podem ser solvidos de forma célere,
pela via negocial. Os conflitos resolvidos pela via consensual tendem a ter
maior efetividade, devido ao cumprimento espontâneo das partes que se com-
prometem voluntariamente, reestabelecendo-se a comunicação e as relações
dos conflitantes a um custo muitas vezes menor.
Até mesmo o surgimento das formas alternativas de solução de conflitos
se deu fora dos tribunais, como explica Tartuce (2018, p. 160). Diante da in-
satisfação dos jurisdicionados, as lides comerciais passaram a ser negociadas
diretamente entre os envolvidos, propagando-se para outras áreas de impasse,
como nos conflitos sindicais (convenções coletivas, acordos sindicais). A partir
dos anos 1970, os norte-americanos institucionalizaram diferentes formas para
a resolução dos conflitos e, em Conferência realizada em 1976, o professor
emérito da Escola de Harvard Frank Sanders sugeriu que os tribunais america-
nos tivessem “várias portas”, o que levou essa forma alternativa de resolução
de conflitos a ser designada também de justiça multiportas.
Técnicas negociais utilizadas em mediação 3

O CPC de 2015 (BRASIL 2015b, documento on-line) estabelece, entre as suas normas
fundamentais, que o Estado promoverá a solução consensual dos conflitos:

Art. 3º Não se excluirá da apreciação jurisdicional ameaça ou lesão


a direito.
§ 1o É permitida a arbitragem, na forma da lei.
§ 2o O Estado promoverá, sempre que possível, a solução consensual
dos conflitos.
§ 3o A conciliação, a mediação e outros métodos de solução consensual
de conflitos deverão ser estimulados por juízes, advogados, defenso-
res públicos e membros do Ministério Público, inclusive no curso do
processo judicial.

No entanto, mesmo sendo a solução dos conflitos pela via privada muito
mais antiga e tendo estado muito mais tempo nas mãos privadas, a solução
pela via negocial é considerada alternativa à jurisdicional, considerando-se
a justiça estatal como padrão. Mesmo quando a solução se dá em meio a
procedimento judicial, considera-se que a solução por qualquer dos meios
preconizados na Política Judiciária Nacional de tratamento adequado dos
conflitos de interesses será alternativa.
Um dos pontos fundamentais na mediação, reconhecido em todos os ins-
trumentos que tratam sobre esse importante meio de solução de conflitos, é
a autonomia de vontade daqueles que participam. A autodeterminação traz
à mediação uma maior probabilidade de eficiência e um protagonismo aos
conflitantes, responsabilizando-os pelo conflito, pela solução e pelo outro. Há
uma valorização do princípio da dignidade da pessoa humana, na medida
em que são as próprias partes interessadas que têm o poder de decidir sobre
o seu destino, sem a interferência estatal.

O marco legal da mediação, Lei nº. 13.140/2015 (BRASIL, 2015a), prescreve como princípio
informador a autonomia de vontade das partes, nos termos de seu art. 2º: “A mediação
será orientada pelos seguintes princípios: [...] V — autonomia da vontade das partes;”.
4 Técnicas negociais utilizadas em mediação

O mediador, terceiro imparcial que serve de canal para que as partes pos-
sam retomar o diálogo, tem a responsabilidade de empregar todas as técnicas
possíveis para que as partes possam construir uma solução para o litígio que
mais lhes convenha. Nas palavras de Tartuce (2018, p. 257):

As atividades de falar, escutar, questionar e responder devem ser apropriada-


mente praticadas pelo terceiro imparcial para promover o diálogo, identificar
os interesses envolvidos na relação interpessoal e colaborar para a retomada
de conversações produtivas.

O § 3º do art. 166 do CPC prescreve expressamente a aplicação de técnicas


negociais para a criação de um ambiente favorável à autocomposição. O uso
de técnicas negociais no procedimento de mediação, além de recomendável,
não compromete a imparcialidade do mediador, o qual as usa para o reesta-
belecimento do diálogo. É importante salientar que, na mediação, as técnicas
negociais não são utilizadas exclusivamente pelo mediador, mas igualmente
pelas partes envolvidas, as quais, mesmo sem treinamento adequado, poderão
fazer uso delas a partir da orientação do mediador.
A mediação, propriamente dita, é uma técnica de autocomposição do
conflito, mas, conforme preceitua Bacellar (2017, p. 122), “a mediação, como
um método consensual, não é intuitiva e só funciona se trabalhada com téc-
nica. Inclusive, antes ainda de ter início o processo formal, deve haver um
planejamento do ambiente”. Assim, antes de iniciado o processo de mediação,
o mediador deverá orientar os conflitantes sobre a possibilidade de sessões
conjuntas e individuais, sobre o procedimento a ser adotado e, mais impor-
tante, sobre os princípios informadores. Não será necessário informar o uso
das técnicas negociais, tampouco quais eventualmente serão usadas, pois isso
dependerá da necessidade. Além disso, tal informação poderia transparecer aos
mediandos uma ausência de informalidade, contrariando uma das principais
diretrizes da mediação, a informalidade.
Diferentes tipos de mediação são utilizados, dependendo da prática do
mediador, do conflito e da finalidade pretendida, não sendo as mesmas exclu-
dentes. Bacellar (2017, p. 108) classifica quatro diferentes tipos de mediação,
sendo a primeira a mais utilizada:

Mediação da Escola de Harvard. Essa modalidade de mediação é con-


siderada a mediação clássica e desenvolve-se em fases bem-defi nidas e
estruturadas, com base em princípios que buscam desvelar interesses aco-
Técnicas negociais utilizadas em mediação 5

bertados por posições. Usa as técnicas negociais desenvolvidas pela Escola


de Harvard, buscando a solução por meio de ganhos mútuos.

Mediação circular-narrativa. Conhecido também como modelo Sara Cobb.


Deve-se buscar uma visão sistêmica, com foco não apenas nas pessoas en-
volvidas, mas também em suas historicidades e relações sociais pertinentes,
pois o conflito não se dá de forma isolada relacionando-se com outros fatores
nem sempre identificáveis de imediato.

Mediação transformativa. Conhecido como modelo de Bush e Folger, essa


forma de mediação busca transformar a atitude adversarial dos envolvidos em
uma postura colaborativa, confiando na capacidade das partes de identificar os
interesses envolvidos e de decidir pelo reestabelecimento do vínculo para, a partir
daí, encontrar uma solução que atenda aos interesses de todos os envolvidos.

Mediação avaliadora. Essa modalidade se diferencia das demais porque


o mediador, depois de cumpridas todas as etapas da mediação e recolhidas
todas as propostas de solução criadas pelos envolvidos, emite sua opinião de
solução de conflito, como forma de viabilizar o acordo.
Além de consistirem em diferentes técnicas de mediação, a escuta ativa,
o rapport, o parafraseamento, o caucus e o brainstorming serão excelentes
ferramentas negociais, as quais poderão ser aprendidas pelo mediador e, depois
de conquistadas como habilidades, trarão excelentes resultados à mediação.
Estudaremos essas técnicas a seguir.

O que é escuta ativa, rapport, parafraseamento,


caucus e brainstorming
As técnicas negociais que podem ser utilizadas na mediação são habilidades
que podem ser aprendidas e praticadas para se obter sucesso no processo de
negociação, especialmente para o reestabelecimento da comunicação. Técnicas
como a escuta ativa, o rapport, o parafraseamento, o caucus e o brainstorming
são muito úteis.
A escuta ativa é a técnica pela qual o ouvinte busca compreender e se
comunicar com base no sentido e no motivo de mensagens verbais e não verbais
para a compreensão de informações ocultas na comunicação. Essa técnica
parte da ideia de que todos têm a necessidade de ser ouvidos e considerados
pelos demais. A boa comunicação é representada pela necessidade que o outro
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tem de se expressar. Deve-se escutar a linguagem dos envolvidos como um


todo, para que possam ser identificados os interesses em questão, como afirma
Spengler (2017, p. 61), que explica que:

[...] através dessa técnica, o mediador garante a quem fala que ela está sendo
escutada, demonstra aceitação das emoções, permite que as explore, escla-
recendo o que realmente sente e por que, além de fisiologicamente estimular
a liberação da tensão, deixando-a expressar-se emocionalmente. Escutar
ativamente é, antes de tudo, ouvir sem julgar.

Para que se pratique uma escuta ativa, faz-se necessário que aquele que
a pratica, seja o mediador, seja qualquer dos conflitantes, siga as seguintes
orientações:

 limite a própria fala, escute mais do que fale;


 esteja interessado e demonstre esse interesse;
 sintonize-se no outro, concentre-se na pessoa quando ela estiver falando;
 faça perguntas para esclarecer-se;
 contenha a ansiedade e não tire conclusões precipitadas;
 escute ideias, não apenas palavras;
 desligue-se de suas preocupações;
 reaja às ideias, e não às pessoas;
 separe a pessoa do problema e da solução;
 observe a linguagem não verbal; e
 peça retorno ( feedback), faça perguntas enquanto fala.

Bacellar afirma que estudos realizados na Faculdade de Direito de Harvard


comprovaram que a constante reclamação em negociações de que o outro
não ouve decorre do fato de que também o reclamante não escuta a pessoa
de quem reclama, conforme explica Bacellar (2017, p. 125). As pessoas não
ouvem as outras, não por teimosia, mas tão somente porque não se sentem
escutadas. Por essa razão, a escuta ativa consiste, muitas vezes, em ficar em
silêncio, para que se permita a expressão do outro e a atenção ao que este fala.
Rapport, por sua vez, é uma técnica advinda da psicologia, que consiste em
criar uma empatia e ligação com a outra pessoa. O mediador, já no início do
procedimento, deve criar um rapport para que seja aceito e consiga conduzir a
mediação, gozando da confiança dos conflitantes. Cada pessoa terá uma forma de
construir um rapport com o outro, mas importa estabelecer um elo de confiança
pautado no interesse no outro e no conflito mediado, conforme afirma Spengler
Técnicas negociais utilizadas em mediação 7

(2017, p. 47). Embora difícil de se definir, posto que representa a construção de


um elo subjetivo entre pessoas, Bacellar (2017, p. 180) afirma que:

[...] rapport é um relacionamento que se constrói para o bem ou para o mal,


de forma positiva ou negativa, respeitosa ou desrespeitosa. Pode representar
uma total empatia ou a sua ausência, dependendo como é construído. Trans-
parece ser (nossa posição) o grau de qualidade obtido no relacionamento
entre as pessoas.

Algumas regras auxiliam na construção do rapport, como:

 o mediador deve se apresentar, dizer quem é e sua qualificação; deve


perguntar como as pessoas preferem ser chamadas e dispensar títulos
formais, para auxiliar na criação de um bom relacionamento;
 anunciar, e se comprometer, logo no início do procedimento, com a
confidencialidade sobre tudo o que for tratado, para que os conflitantes
possam estabelecer com o mediador um vínculo de confiança;
 não consignar propostas rejeitadas, pois nada auxiliarão e apenas re-
lembrarão recusas, passos perdidos, que apenas servirão para quebrar
o vínculo de confiança.

O modelo aristotélico de comunicação prescrito em Retórica aponta para três elementos


da comunicação (ARISTÓTELES, 2005):
 a pessoa que fala (emissor);
 o discurso que é falado (mensagem); e
 a pessoa que ouve (receptor).
Todos os modelos desenvolvidos posteriormente apenas o tornaram mais complexo,
usando sempre o modelo do filósofo como fundamento.

O parafraseamento é uma técnica em que uma pessoa reformula o texto de


outra utilizando as próprias palavras, mas mantendo a ideia do outro. Realizado
em sua forma autêntica, para que não seja interpretado pelo parafraseado como
um deboche ou uma sátira, a paráfrase se constitui em uma importante ferra-
menta, que permitirá demonstrar que o receptor da mensagem compreendeu a
ideia e que o emissor da ideia está sendo ouvido e compreendido. Isso também
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dará um feedback ao emissor, para que ele possa repensar a mensagem, depois
de ouvida a ideia de outra forma.
Observe que, para que os interlocutores conflitantes não rompam a comu-
nicação pela impressão de que um está “roubando a ideia do outro”, e para que
o receptor da mensagem não se obrigue imediatamente com a ideia proposta,
até ter certeza de que se trata de uma ideia comum, recomenda-se o uso de
algumas frases no início de uma paráfrase, como “deixe-me ver se entendi o
que você disse”, “se entendi direito, você disse...” ou “ajude-me a entender,
você quer dizer que...”.
Já o caucus consiste em uma expressão que usualmente se aceita como
advinda das reuniões (Conselhos) realizadas pelas tribos norte-americanas.
Trata-se da mediação de “sessões privadas/individuais, que consiste em ouvir
separadamente uma das partes e depois ouvir a outra, garantindo-se sempre a
confidencialidade e a igualdade entre elas”, conforme esclarece Bacellar (2017,
p. 127). O art. 19 da Lei da Mediação prescreve ao mediador a possibilidade de
reunião com os conflitantes tanto de forma conjunta como de forma individual,
momento em que as partes poderão falar com maior desenvoltura. Consta no
referido art. que, "No desempenho de sua função, o mediador poderá reunir-se
com as partes, em conjunto ou separadamente, bem como solicitar das partes
as informações que entender necessárias para facilitar o entendimento entre
aquelas”. Tanto o mediador quanto as partes poderão sugerir os encontros
individuais, os quais estarão sempre resguardados pela confidencialidade.
O que for falado na sessão individual não poderá ser revelado pelo mediador
na sessão conjunta, salvo expressa autorização da parte.

Segundo a Lei da Mediação, Lei nº. 13.140/2015 (BRASIL, 2015a, documento on-line), nos
termos dos §§ 3º e 4º do art. 30, não estão resguardadas pela confidencialidade
as seguintes hipóteses:

§ 3º Não está abrigada pela regra de confidencialidade a informação


relativa à ocorrência de crime de ação pública.
§ 4º A regra da confidencialidade não afasta o dever de as pessoas dis-
criminadas no caput prestarem informações à administração tributária
após o termo final da mediação, aplicando-se aos seus servidores a
obrigação de manterem sigilo das informações compartilhadas nos
termos do art. 198 da Lei nº. 5.172, de 25 de outubro de 1966 — Código
Tributário Nacional.
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Outra importante técnica negocial utilizada na resolução de conflitos é o


chamado brainstorming, termo que pode ser traduzido para o português como
geração de opções. Essa tempestade de ideias sugere a criação conjunta da
maior quantidade de alternativas possíveis para o conflito, estimulando-se a
criatividade e valorizando todas as alternativas sugeridas como opções que,
ao final, poderão contribuir para a solução final eventualmente adotada. Os
conflitantes vão sugerindo novas ideias (relacionadas ao conflito), umas sobre
as outras, independentemente de serem a solução final, como em um jogo de
criatividade. Essa técnica permite que as partes possam ter ideias a partir das
propostas dos demais.

Casos práticos utilizando a mediação


Um exemplo de aplicação prática da mediação foi a assinatura, pela então
vice-governadora do Estado do Ceará, Izolda Cela, em 13 de junho de 2018,
do Termo de Cooperação para a implantação de Núcleos de Mediação Escolar
em 19 municípios daquele estado. O termo de cooperação, assinado entre o
Poder Público, o Ministério Público Estadual, a organização internacional
WeWorld e os dezenove municípios tem como objetivo levar o processo de
mediação para as escolas, para o tratamento de conflitos entre os alunos.
A iniciativa, que já contava com outros vinte e um municípios participantes,
leva ao ambiente escolar a preocupação com o tratamento de todas as formas
de violência e incentiva o aprendizado e a prática de uma cultura de não
violência, com a manutenção dos laços afetivos. Segundo a vice-governadora
(TEIXEIRA, 2018, documento-online):

Queremos comprometer a todos na melhoria do projeto educacional das crian-


ças. Reconhecemos o efeito das práticas de mediação, mediação de conflitos,
das práticas ligadas a uma metodologia da construção de uma cultura de paz,
e uma educação que contribua para o respeito ao outro. Precisamos reduzir,
cada vez mais, os indicadores perversos relacionados à violência e outros
tipos de agravos. E, com o que for debatido aqui, temos a certeza que vão
contribuir no âmbito da escola e isso é necessário para uma escola melhor.

A prática da mediação escolar, que usualmente conta com a participação


de professores, educadores, advogados e promotores, permite que os conflitos
surgidos nas escolas e as práticas de bullying sejam tratados, diminuindo-se
os índices de violência e evasão escolar.
10 Técnicas negociais utilizadas em mediação

A Lei nº. 9.870, de 23 de novembro de 1999 (BRASIL, 1999, documento on-line), que
trata sobre as anuidades escolares, art. 4º, prevê a possibilidade de mediação entre
estabelecimentos de ensino e associações de pais e alunos:

Art. 4º A Secretaria de Direito Econômico do Ministério da Justiça,


quando necessário, poderá requerer, nos termos da Lei nº 8.078, de 11
de setembro de 1990, e no âmbito de suas atribuições, comprovação
documental referente a qualquer cláusula contratual, exceto dos estabe-
lecimentos de ensino que tenham firmado acordo com alunos, pais de
alunos ou associações de pais e alunos, devidamente legalizadas, bem
como quando o valor arbitrado for decorrente da decisão do mediador.

Outro exemplo de aplicação da mediação foi uma disputa envolvendo duas


empresas de transporte em razão do descumprimento de um acordo comercial,
que foi notícia no jornal Estadão, em maio de 2018, por ter sido solucionada por
meio de um processo de mediação. O acordo que pôs fim ao litígio encerrou um
conflito sobre um valor de R$ 23 milhões e foi intermediado por uma câmara
privada do Estado de São Paulo (AMORIN, 2018). A solução desse conflito
empresarial, inclusive, surpreendeu pela rapidez com que a disputa foi resol-
vida: em apenas dois dias, mesmo estando uma das empresas em recuperação
judicial. Outra grande vantagem obtida pelas partes foi a confidencialidade
prescrita pela mediação ao processo compositivo. As empresas conseguiram
compor o conflito em curto espaço de tempo e sem expor dados importantes
a concorrentes, enquanto as demandas que tramitam no Poder Judiciário não
estão, em regra, resguardadas pelo sigilo.
Tartuce (2018, p. 364) traz como exemplo de aplicação bem-sucedida dos
processos de mediação um país. Segundo a autora:

A França, país de larga tradição no uso da mediação, contou com a adoção


da técnica não apenas de forma institucionalizada de distribuição estatal de
justiça, mas no âmbito das próprias empresas. Estas passaram a contratar
mediadores para tratar de problemas que as envolvessem (especialmente no
tocante a questões ambientais e relações de consumo).

O município de Santos, interior de São Paulo, é outro exemplo de emprego


da mediação em larga escala, já que inaugurou, em junho de 2018, um espaço
exclusivo para mediação dentro do prédio da Prefeitura Municipal, destinado à
Técnicas negociais utilizadas em mediação 11

mediação de casos de perturbação ao sossego, brigas entre vizinhos e queixas


de barulhos, dentre outros conflitos mais voltados ao dia a dia dos munícipes.
Segundo notícia veiculada no A Tribuna On-line, em 21 de junho de 2018,
no ano de 2017 foram realizadas 367 mediações no projeto, das quais 300
terminaram em acordo. No ano de 2018, até a veiculação da notícia, das 189
mediações, 170 terminaram em acordo (SANTOS..., 2018). Os membros do
projeto, vinculados à Ouvidoria, Transparência e Controle, foram treinados
pela Ordem dos Advogados do Brasil, da Subseção de Santos, no ano de 2017.

1. A mediação é uma importante b) inadmissível, pois tornaria


técnica de autocomposição a mediação mecânica.
do litígio. Ela foi introduzida c) eticamente não desejável.
no Brasil por qual razão? d) uma prática que nada
a) Porque o Poder Judiciário não auxilia os conflitantes.
tem jurisdição para decidir e) recomendável, embora
sobre certas questões. não obrigatório.
b) Porque a mediação não 3. A escuta ativa é uma técnica
auxilia no reestabelecimento negocial. Pode-se dizer
da comunicação. dessa técnica que:
c) Porque, por meio da mediação, a) ela é desnecessária, pois é evidente
os conflitantes podem que as pessoas ouvem as outras.
reestabelecer a comunicação e b) apenas deve ser utilizada
se responsabilizar pela solução com conflitantes surdos.
do conflito, desafogando o c) é uma técnica muito útil, que
Poder Judiciário brasileiro. pode ser incorporada no dia
d) Porque foi introduzido em a dia de todas as pessoas.
outros países, e o legislador d) é utilizada apenas por
achou interessante copiar ideias teóricos da comunicação.
vindas de outros lugares. e) não deve ser usada, restringindo-se
e) Porque a mediação não aos casos em que não haja conflito.
se aplica aos casos que 4. Dentre as técnicas negociais
poderiam ser decididos usualmente utilizadas na mediação,
pelo Poder Judiciário. o parafraseamento consiste em:
2. O sucesso da mediação exige a) repetir o que o outro diz, sem
pessoas capacitadas. O emprego distorcer qualquer palavra.
de técnicas é considerado: b) demonstrar ao emissor
a) uma obrigatoriedade, da mensagem que o
pois é previsto em lei.
12 Técnicas negociais utilizadas em mediação

receptor compreendeu a a) que os conflitantes decidam


mensagem transmitida. procurar o Poder Judiciário.
c) uma técnica que jamais deve b) atrapalhar a negociação,
ser utilizada, pois parece em razão da confusão
uma sátira com o outro. que será gerada.
d) uma técnica que apenas c) que o mediador interrompa
atrapalha a comunicação. o processo de mediação.
e) uma técnica ultrapassada, d) que os conflitantes
que deve deixar de ser fiquem apenas com as
usada na mediação. suas próprias idei as.
5. A "tempestade de ideias", conhecida e) a criação de alternativas
como brainstorming, é uma ao impasse.
técnica negocial que permite:

AMORIN, J. R. N. Avanços na mediação empresarial. Estadão, São Paulo, 5 mai. 2018.


Disponível em: <https://politica.estadao.com.br/blogs/fausto-macedo/avancos-da-
-mediacao-empresarial/>. Acesso em: 20 jul. 2018.
ARISTÓTELES. Retórica. Lisboa: Impressão Nacional Casa da Moeda, 2005.
BACELLAR, R. P. Mediação e arbitragem. São Paulo: Saraiva, 2017.
BRASIL. Lei Federal n°. 9.870, de 23 de novembro de 1999. Dispõe sobre o valor total
das anuidades escolares e dá outras providências. Diário Oficial da União, Brasília, DF,
24 nov. 1999. Disponível em: < http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/leis/L9870.htm>.
Acesso em: 20 jul. 2018.
BRASIL. Lei Federal nº. 13.105, de 16 de março de 2015. Código de Processo Civil. Diário
Oficial da União, Brasília, DF, 17 mar. 2015b. Disponível em: <http://www.planalto.gov.
br/ccivil_03/_ato2015-2018/2015/lei/l13105.htm>. Acesso em: 20 jul. 2018.
BRASIL. Lei nº. 13.140, de 26 de junho de 2015. Dispõe sobre a mediação entre particu-
lares como meio de solução de controvérsias e sobre a autocomposição de conflitos
no âmbito da administração pública. Diário Oficial da União, Brasília, DF, 27 jun. 2015a.
Disponível em: <http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/_ato2015-2018/2015/lei/l13140.
htm>. Acesso em: 20 jul. 2018.
CONSELHO NACIONAL DE JUSTIÇA (Brasil). Resolução n°. 125, de 29 de novembro
de 2010. Diário da Justiça [do] Conselho Nacional de Justiça, Brasília, DF, n. 219, 1º dez.
2010, p. 1-14. Disponível em: <https://juslaboris.tst.jus.br/handle/20.500.12178/15958>.
Acesso em: 20 jul. 2018.
Técnicas negociais utilizadas em mediação 13

SANTOS inaugura sala para mediação de conflitos. A Tribuna On-line, 21 jun. 2018.
Disponível em: <http://www.atribuna.com.br/noticias/noticias-detalhe/cidades/santos-
-inaugura-sala-para-mediacao-de-conflitos/?cHash=609c74ac553ea120720be3d446a
f0e41>. Acesso em: 20 jul. 2018.
SPENGLER, F. M. Mediação de conflitos: da teoria à prática. Porto Alegre: Livraria do
Advogado, 2017.
TARTUCE, F. Mediação nos conflitos civis. Rio de Janeiro: Forense, 2018.
TEIXEIRA, M. T. Ceará pacífico: Vice-governadoria e 19 municípios assinam acordo de
cooperação para criação de núcleos de meditação escolar. Portal de Integração de
Independência e Região, Ceará, 14 jun. 2018. Disponível em: <http://www.ceara.gov.
br/2018/06/13/vice-governadoria-e-19-municipios-assinam-acordo-de-cooperacao-
-para-criacao-de-nucleos-de-mediacao-escolar/>. Acesso em: 20 jul. 2018.
Encerra aqui o trecho do livro disponibilizado para
esta Unidade de Aprendizagem. Na Biblioteca Virtual
da Instituição, você encontra a obra na íntegra.
DICA DO PROFESSOR

A utilização de técnicas negociais é essencial no procedimento da mediação. Em determinadas s


ituações, o conflitante ou seus procuradores têm o indevido sentimento de que essas técnicas co
mprometem a imparcialidade do mediador.

Acompanhe, nesta Dica do Professor, como o emprego das técnicas não compromete a imparcia
lidade do mediador, com base na Lei de Mediação, n.º. 13.140, de 26 de junho 2015.

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EXERCÍCIOS

1) A mediação é uma importante técnica de autocomposição do litígio. Por qual razão el


a foi introduzida no País?

Porque o Poder Judiciário não tem jurisdição para decidir sobre certas questões.
A)
Porque não auxilia no reestabelecimento da comunicação.
B)
Porque os conflitantes podem restabelecer a comunicação e se responsabilizar pela solução
C)
do conflito.

Porque foi introduzida em países, e o legislador achou interessante reproduzir no Brasil.


D)
Porque não se aplica aos casos que poderiam ser decididos pelo Poder Judiciário.
E)

2) O sucesso da mediação exige pessoas capacitadas. O emprego de técnicas é considera


do:
uma obrigatoriedade, pois é previsto em lei.
A)
inadmissível, pois tornaria a mediação mecânica.
B)
eticamente não desejável.
C)
uma prática que não auxilia os conflitantes.
D)
recomendável, embora não obrigatório.
E)

3) A escuta ativa é uma técnica negocial. Pode-se dizer que esta técnica:

não é nesnecessária, pois é evidente que as pessoas ouvem umas às outras.


A)
deve ser utilizada apenas com conflitantes surdos.
B)
é uma técnica muito útil, podendo esta ser incorporada no dia a dia de todas as pessoas.
C)
é utilizada apenas por teóricos da comunicação.
D)
não deve ser utilizada, restringindo-se aos casos em que não há conflito.
E)

4) Dentre as técnicas negociais usualmente utilizadas na mediação, o parafraseamento c


onsiste em:

repetir o que o outro diz, sem distorcer qualquer palavra.


A)
demonstrar ao emissor que o receptor compreendeu a mensagem transmitida.
B)
uma técnica que jamais deve ser utilizada, pois se assemelha a uma sátira.
C)
uma técnica que atrapalha a comunicação.
D)
uma técnica ultrapassada, que não deve mais ser utilizada na mediação.
E)

5) A "tempestade de ideias", conhecida como brainstorming, é uma técnica negocial que


permite:

aos conflitantes decidirem se procuram ou não o Poder Judiciário.


A)
atrapalhar a negociação em razão da confusão que será gerada.
B)
ao mediador interromper o processo de mediação.
C)
aos conflitantes permanecerem apenas com as próprias ideias.
D)
a criação de alternativas para o impasse.
E)

NA PRÁTICA

O sucesso da mediação tem feito com que esse meio de resolução de conflitos seja utilizado em
diferentes espaços, como escolas, empresas e comunidade. A versatilidade da mediação, bem co
mo sua capacidade de solucionar conflitos que o Judiciário não alcança, tem permitido, inclusiv
e, a solução de embates dentro de presídios.

Uma experiência inovadora em Rondônia busca resolver divergências dentro de presídios de seg
urança máxima através do processo de mediação e do emprego de técnicas de negociação.

Saiba, Na Prática, um pouco mais sobre o projeto Vida Nova, que foi notícia no Conjur, em 14 d
e abril de 2017.
SAIBA +

Para ampliar o seu conhecimento a respeito desse assunto, veja abaixo as sugestões do professo
r:

No país da encrenca, startup fatura resolvendo conflitos entre empresas e clientes

A mediação tem ganhado reconhecimento por sua importância. Uma experiência inovadora, pro
posta pela advogada Melissa Gava, traz a possibilidade de mediação de conflitos on-line.

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Guia Prático de Mediação Judicial e Conciliação

O Tribunal de Justiça do Estado de São Paulo criou um guia para orientar todos aqueles que têm
o desejo de trabalhar como mediador em câmaras privadas.

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