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1 H erbert M arcuse, Das Veralten der Psychoanalyse. In: id ., Kultur und Gesellschaft 2 , Frankfurt
a. M . 1965, pp. 85 e ss. Essa análise já se apoia nos trabalhos em M ax H orkheim er (org.),
Autorität und Familie, Paris 1936. N o m esm o sentido, A lexander M itscherlidv A u f dem W eg
zur vaterlosen Gesellschaft, M unique 1973, espedalm ente pp. 307 e ss,
2 M arcuse, loc. d t., p. 96. - Em todo caso, esse excesso de confiança depositado n o Judiciário
tam bém pode ser quantificado em sondagens (nesse caso, relativas à jurisdição constitudo-
nal). Dentre as instituições políticas e sodais da Alem anha, a confiança depositada pela po-
. pulação no Tribunal Constitudonal alem ão atinge a exorbitantem ente taxa de 62% . Para fins
de com paração: as universidades têm apenas 2% e m esm o a televisão recebe apenas 34% da.
confiança da população. Cf. a reprodução da tabela do Instituto de C iêh áas Sodàis A plicadas
em Klaus von Beyme, Institutionentheorie in der neueren Politíkxoissensdutft. Im G erhard Göhler
(org.), Grundfragen der Theorie politischer Institutionen, Opladen 1987, pp. 4 8 -6 0 ,5 5 ,
15
Coleção Conexões Jtuidicas OP
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O Judiciário com o Superego da Sociedade
7 Esses conceitos encontram-se no título e na dedicatória de A lan B arth, Prophets with Honor.
Great Dissents and Great Dissenters in the Supreme Court, N ova York 1974. A dedicatória refere-
-se a Hugo L. Black e a Felix Frankfurter.
8 Erich Kaufmann, Die Gleichheit vor dem Gesetz im Sinne des A rt. 109 der Reichsverfassung. In:
W D StR L 3 (1927), pp. 2 -2 4 ,8 - aqui, baseando-se nas form ulações de Friederich N eum ann.
9 Quanto a esse topos, espedalm ente quanto a teoria do D ireito livre, vide infra.
10 Kaufmann, be. cit., pp. 13 e ss., 11.
17
/■iT
£
i 11Kaufmann, loc. cit., pp. 12,22.
i. \ 12Ronald Dworkin, Laws Empire, Cam bridge 1986, pp. 3 e ss.; id ., Taking R ight Seriously,
] 4;,■1 « Cambridge/Mass. 1978, pp. 7 ,8 1 e ss.
* •! T 3‘ Dworkin, Taking Right Seriously, loc. cit., pp. 128 e ss.
í :í 14 A esse respeito e sobre a m oralização da jurisdição em geral, vid e Ingeborg Maus, The
i i;’.i Differentiation between Law and Morality as a Limitation of Law. In: A . A am io et al. (ed.), law and
i Legitimacy, 1989.
■Vt' i
O Judiciário com o Superego da Sociedade
I
O sólido conceito da regressão com o qual se m arca, aqui, o processo
estatal-judidal do século X X na relação com os ideais de autonom ia das
concepções constitudonais do século XVHI necessita, antes de tudo, de
um esdaredm ento a p artir da confrontação histórica. O construtor cons-
titudonal da Revolução Francesa, Em m anuel Sieyès, na fase prim itiva de
sua teoria, enundou exigên d as liberais burguesas ao colocar o "dom ínio
da lei" no lugar da divindade paterna absolutista a ser destituída. Sieyès,
no ano de 1788, argum entou de form a bem expressa que o povo, após
"longa escravidão m ental", p areria não saber que os direitos de liberdade,
direito inviolável não àquilo que a lei p e rm ite , p o is a lei não tem que
permitir nada, mas a tu d o que ela n ã o p ro íb e . (...) T u d o que a lei não
proft&pncontra-se no âm bito d a lib e rd a d e d o d d a d ã o (.«).“
15 Emmanuel Sieyès, Ábhandlung ilber ãie Prw ilegien, ed itad o p o r R olf H . Foerster, Frankfurt *•
M. 1968, pp. 23-53.
16 .Sieyès, loc. cil., p. 40,
17 Isso também constitui o núcleo, p .ex., da p olêm ica d e L o ck e com a o b ra Patrutrchia, d eFil^ '
*%n
O Ju d iciário com o Superego da Sociedade
"viver n a sociedade" sem con h ecer exatam ente as obrigações que nela
assum im os".“
D esse m odo, na R evolu ção Francesa, introduziu-se, de fato, o (im pra
ticável) référé législatif: em caso de obscuridade da lei, os juízes deviam
buscar a interpretação au tên tica d o Legislativo. Por m ais ilusória que a
ideia d a rigorosa vin culação à lei ainda parecesse na p rática ju rídica até
o início deste século, n esse m odelo enundava-se um a ideia enfática de
liberdade, novam ente form ulad a p ór M ontesquieu:
E ssa ideia de liberdade n ão pode ser nem reduzida exd usivam en-
te a interesses econôm icos, nem entendida com o m eram ente "n eg ativ a".
Franz N eum ann já m ostrou que a exigênda protoburguesa de rigorosa
vinculação à lei dos aparelhos estatais provém , n a verdade, da necessi
dade de um a sodedade liberal de concorrênda por previsibilidade das
intervenções estatais que, além da segurança da propriedade, tam bém
garanta a calculabilidade de investim entos econôm icos e de relações de
m ercado, m as que ela con tém u m forte elemento excedente de p roteção da
liberdade não específica de Uma dasse.30 Essa ideia de liberdade só não é
negativa porque, independentem ente de sua variante defídtária rio cons-
titudonalism o alem ão, d a n ão exd u i m eram ente esferas de liberdade de
intervenções estatais, m as tam bém contém a determ inação m aterial dos
d d ad ãos sobre essas intervenções. A ideia de identificar o dom ínio d a lei
com a soberania do poyo (ainda m uito lim itada p or restrições do D ireito
Eleitoral) transform ou o dom ínio em autolegislação.
A rigorosa vinculação dos aparelhos estatais (executivos e) ju d id -
ários à lei,' que é realçad a pela prim azia do Poder Legislativo n a teoria
d ássica da divisão dos p od eres,21 tinha o sentido exdusivo de subm eter
esses aparelhos à vontade d o povo legislador. Assim , desenvolveu-se um
conceito de autonom ia social que encontra seu equivalente individual na
18 Monstesquieu, Vom Geist der Gesetze, org. por Em st Forsthoffc Tübingen 1951, livro XI, cap. 6.
19 Montesquieu, loc. dt., livro VT, cap. 3.
20 Franz Neumann, Der Funktionswandel des Gesetzes im Recht der bürgerlichen Gesellschaft, ln: id.,
P anokratischsMind-autorítãreF Staat, Frankfurt a. M ., 1967, pp. 3 1 -8 1 ,4 8 ,5 0 , entre outras.
21 Nesse sentido, p. ex., John Locke, Two Treatises c f Civil Government, org. por Carpenter,
Londres e Nova York 1966, § 134, ou Immanuel Kant; Die Metaphysik der Sitten, org. por
W eischedd, obras com pletas, vol. 8, p. 431. - Além disso, Franz Neumann, loc. e it, p. 46.
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Coleção Conexões Jurídicas
concepção m oral do Huminismo. A qui, tam bém / sua versão específica das
funções de superego vira do avesso as conclusões do processo "natural"
de socialização. Este último é descrito p or Freu d da. seguinte maneira:
22 Sigmund Freud, Die Zerlegung der psychischen Persönlichkeit, ln : edição acadêmica, vol. 1, org.
por A lexander M itscherlich et alii, Frankfurt a. M . 1969, p p . 4 9 6 -5 1 6 ,5 0 5 .
23 A esse respeito, com referências correspondentes: Ingeborg M aus, Zur Theorie kt
lnstitutianalisierung.]?ei Kant. In: G erhard G öhler et alii (o rg ,), Politische Institutionen imgesell-
schaftlichen Umbruch. Ideengeschichtliche Beiträge zu r Theorie politischer Institutionen, Opladen
1989, pp. 358-386,364 e ss.
24 Quanto á função da "razão exam inadora da lei" em K ant e H egel, vidè Jürgen Habermas»
Moralität und Sittlichkeit. Treffen Hegels Einwände gegen Kant auch auf die Diskursethik zu? fc
W blfgàng Kuhlm ann (org.), Moralität und Sittlichkeit, Frankfurt a. M . 1986, pp. 16-37.
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O Ju d iciário com o Superego da Sociedade
outrora, d eviam g aran tir o con trole de su a conform idade com a vonta
de popular. Toda in vocação de u m p rin cip io "su p e rio r" que preceda o
D ireito escrito - se a ju stiça estatal dela se serve - acarreta a derrubada das
disposições legais in divid u ais e a d ecisão d o caso em tela de acordo com
aspectos n ão exp ectáveis.
A ssim , enriquecido p o r asp ectos m orais, o âm bito das "proibições"
legais p od e ser am pliado ao b el-p razer p ara o âm bito das esferas extra-
jurídicas de liberdade. Som ente m ais tard e, p or ocasião de um processo
judicial, é que o cid ad ão tom a conhecim ento do que lhe era "p roibid o"
e aprende, p ara o futuro, a d ed u zir (de form a extrem am ente incerta) das
decisões judiciais o que é "p erm itid o ". Os âm bitos prévios de liberdade
do indivíduo transform am -se, assim , em um produto da atividade decisó
ria judicial, fabricado caso a caso.
E ssa inversão dos polos das expectativas jurídicas é intensificada n ão
apenas p o r usurpações dos tribunais, m as tam bém pela própria estrutura
da lei. N o D ireito m oderno, é típica a m ultiplicação de conceitos de teo r
m oral, com o "d e m á fé", "inconsciente" ou "con d enável",25 que se tom am
pontos de acesso de representações m orais do juiz nem sem pre racionais,
mas extrem am ente tradicionalistas (ou, no caso da jurisprudência sobre as
m anifestações de bloqueio:26politicam ente arbitrárias).
A expectativa externa que se apresenta ao Judiciário, de que ele fun
cione com o instância m oral, se expressa não apenas nas demandas de cláu
sulas jurídicas, m as tam bém na confiança reinante d a população na justiça.
Mesmo um a pessoa que, por exem plo, seguindo um entendimento antiau-
toritárip de educação, evita ao m áxim o um a solução paternalista precipita
da de conflitos no quarto das crianças, favorece com grande naturalidade
essa m esm a estrutura autoritária de decisão quando se trata da solução de
conflitos sodais. Aqui, o Judidário aparece com o um a instituição que, da
perspectiva do terceiro im pardal superior, propordona um a decisão objeti
va, neutra e, por conseguinte, "justa" às partes litigantes envolvidas em si
tuações e interesses concretos. O puerilismo da crença na justiça se expressa
da form a mais d ara nos casos em que se espera do Tribunal Constítudonal
alemão um a correção do próprio com portam ento "cívico". Frequentemente^
23
Coleção Conexões jurídicas
27 Niklas Luhmann, Die Einheit des Reditssystems. In: Rechtstheorie 14 (1983), pp. 129-154,144*
- Luhmann fala de "sistem a jurídico" no sentido m ais am plo; o contexto esdaréce, todavA
que, aqui, trata-se espedalm ente da justiça.
O Judiciário como Superego da Sodedade
Dessa form a, a p róp ria Lei Fundam ental pode se tom ar objeto do
exame de sua própria cónstitucionalidade ou, ao menos, objeto de um a
interpretação "constitucional":
28 BVerfGE 1 ,14,3 2 e LS 27 (destaque da autora). Com essa opinião, o Tribunal Constitucional ale
mão adere a decisões do Tribunal Constitucional da Baviera, das quais retoma a última passagem.
25
Coleção Conexões Jurídicas
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O Judiciário como Superego da Sociedade
n
No século XX, a evid ên da democrática de que os aparelhos estatais,
como o parlamento, não ppdem ser controlados por um aparelho estatal'
27
Coleção Conexões Jurídicas
ainda mais superior, mas apenas "de baixo", pela base social, recaiu em
um processo de recalque coletivo. .
Para tanto existem razões que residem também em necessidades eco-'
nômicas vigentes, em deslocamentos do poder político e em condições
funcionais do próprio Judiciário, que se associam a mecanismos sociais li
bidinosos. A ascensão do Judiciário à posição de últim a instância dácons-
ciência social é acompanhada em todos os ram os jurisdidonais por um
método de aplicação'do direito que não apenas corrige as representáções
de Montesquieu quanto a seus elementos ilusórios, m as também as trai
forma em seu exato inverso. As leis, a despeito de suas respectivas de
sidades regulatórias, são reconheddas apenas com o predições altamei
improváveis e como premissas da atividade dedsória judidal.
Nas teorias metodológicas jurídicas atualm ente dominantes, os pi
cedimentos teleoíógico, analógico, tipológico ou tópico, as orientaçí
pelo objetivo, pélas consequêndas e pelos valores e, por fim, a respectj .
"escolha metodológica" do juiz, entre as concepções concorrentes, fazeir^
praticamente desaparecer a program ação legal da justiça.37 J.
EsSa evolução (cujas determinantes sodais reais ainda estão por ^er
tratadas) é sustentada pôr uma apredação do Judidário por parte da pg-
pulação que parece provir de tempos m uito rèm òtos de um
tipatriarcal da justiça. A confiança ainda existente na funçã i
Judidário de garantir a liberdade, que tinha um últim o ponto, de-eoiítato
real na primeira metade do século XDC, tom ou-se nula em termos objeti
vos com o disdplinamento brutal e bem -sucedido (!) da justiça feito por
Bismarck e foi negada de forma totalm ente fundam ental pelo tenor extre
mamente autônomo do Judidário do sistem a nazista. M as era justamente
na fase inidal gloriosa do judidário alem ão que ainda vigorava intacto o
prindpio de sua aplicação formalista do Direito.
Max Weber esboçou com grande d areza essa relação inidal entre in-
dependênda material do Judidário, garantia da liberdade por parte da
jurisdição e aplicação formalista do direito:
37 Dentre as num erosas abordagens da m etodologia jurídica, vide apenas Karl Larenz,
- Methodenlehre der Rechtsioissenduift, Berlim, H eidelberg e N ova York 1969, ou Josef Esser,
Vorverständnis -und Methodenwahl in der Rechtsfindung, Frankfurt a.‘ M . 1970. Quanto à cri
tica dos défices das atuais teorias m etodológicas sób o aspecto do Estado de Direito, vide
Friederich Müller, Juristische Methodik, Berlim 1976.
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O Judiciário como Superego da Sociedade
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Coleção C onexões Jurídicas
43 A esse respeito, Karl F. Kübler, D er deutsche Richter und das dem obatische Gesetz, Im AcP 162
(1963), pp. 104-128; Bernd Rüthers, D ie unbegrenzte A u slegun g, F ran k fu rt a, M . 1973.
44 A esse respeito, Ingeborg M aus, Bürgerliche Rechtstheorie und Faschism us, Z u r sozialen Funktion
und aktuellen Wirkung der Theorie Carl Schmitts, M unique 1980, p p . 2 7 e ss.
45 Em st Fraenkel, Z ur Soziologie der Klassenjustiz. In: id ., Z u r Soziologie der Klassenjustiz uni
Aufsätze zur VerfassungskriBe 1931-32, D arm stad t 1968, p. 8.
46 Cf. a esse respeito Kübler, loc. d t.
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O Judiciário com o Superego da Sociedade
dos Juízes alem ães, q uan do o prim eiro, em 1906, por exem plo, serve-se
da mais alta cu ltu ra p olítica dos juízes contra "os agentes partidários que
atuam com o legislad o res"0 ou a últim a, quando, em 1912, entre outros,
declara: "q u and o a m açan eta d o Legislativo é mais facilmente alcançada
pelo m aior agitador, com o ainda h á de ser a lei considerada com o algo
que se deve ter em alta con ta ou m esm o respeitada como algo sagrad o".4*
Por conseguinte, am bos os grupos reivindicam um a ampla liberdade do
juiz em relação à lei assim constituída: os teóricos do direito livre, ao ca
racterizarem de form a bastan te aberta a possibilidade de relacionar a de
cisão judicial com um a n orm a jurídica positiva mais como uma exceção
improvável;49os protagonistas da A ssociação dos Juízes alemães, ao redefi
nir o conceito da vinculação legal, atribuindo à própria lei a desejada flexi
bilização do D ireito.50N o âm bito dessas reflexões, a Associação dos Juízes
vai cedendo cad a vez m ais em sua reticência em entender-se com o um a
organização profissional de interesses, e os partidários do movim ento do
direito livre aspiram a um "rei-juiz" que não apenas atue legibus solutus,
como tam bém seja singularizado por "u m salário totalmente diferente".51
Essas argum entações contêm um a dimensão metafórica em que a
"tópica" psíquica dos m ecanism os de integração política é redeterm inada.
Embora os próprios interesses m ateriais dos profissionais da justiça sejam
discutidos de form a direta, apenas o parlamento aparece como represen
tante dás m oções pulsionais contra cujo transbordamento o Judiciário'é
empregado com o censor. !
Os lam entados d efid ts de com petência técnica do Parlamento, a es
trutura com prom issórià de suas leis, ria qual se reproduz o antagonismo
dos interesses sodais> a consequente particularização das m atérias jurídi
cas individuais um as em relação às outras, que ameaça, cada vez mais, a
conectividade interna e a unidade do sistem a jurídico: tudo isso desafia a
um autoentendim ento do Ju d idário segundo o qual ele deve produzir a
síntese sodal, para além da "querela partidária", e a unidade do direito,
independentemente das leis conectadas a interesses. Dessa forma, o juiz
toma-se juiz d a própria lei, que, em seu aspecto real, é "desm ascarada
47 Hermann Kantorowicz, Der Kampf um die Rechtswissenchaft (1906), In: Rechtswissenschaft und
Soziologie. Ausgewählte Schriften zur Wissenschaftslehre, Karlsruhe 1962, p. 38.
48 Hesse sentido, no jom al da Associação dos Juízes Alemães, o Deutsche Richterzeitung (DriZ),
1912, col. 1; dtado em K üblet loc, d l., p. 111.
49 Emst Fuchs, Was will die Freirech tsschule? (1929). In: id., Gerechtigkeitswissçnschaft- Ausgewählte
Schriften zur Freirechtsschule, Karlsruhe 1965, pp. 21 e ss. (27).
50 DRiZ 1909, col. 91; 1913, col. 569 e ss., 693 e ss.
51 Fuchs, loc cif., p. 35.
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"O juiz alem ão sem pre foi n ad o n alista e con sd en te de sua respon
sabilidade (...) ele julgou apenas segu nd o a lei e (!) a consdênda (!).
(...) Possa a grande obra da con stru ção do E stad o dar logo ao povo
alem ão o sentim ento de p erten ça in co n d id o n al!"55
56 Richterbrieß. Dokumente zur Beeinflussung der deutschen Rechtsprechung 1942-1944, org. por
Heinz Boberach, Boppard am Rhein 1975, p . 5.
57 For razões que ainda serão tratad as, esse fenômeno ainda é am plam ente desconhecido na
atualidade. A esse respeito, com rem issões: Ingeborg M alis, "Gesetzesbindung" der Justiz und
die Struktur nationalsozialistischer Rechtsnormen. In: Ralf D reier e W olfgang Sellert (org.), Recht
und Justiz im "Dritten Reich", Frankfurt a. M . 1989,
58 A respeito de que esse tam bém não era o caso, vide M aus, "Gesetzesbindung". .
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Coleção Conexões Jurídicas
m '
época discutidas a título de exem plo, porque o quantum das penas estipu
ladas era dem asiado alto.
Após 1945,64 a vigorosa continuidade pessoal do Judiciário alem ão
explica a forte influência das n oções antigas nas deliberações sobre a
Lei Fundam ental. Os anseios do Judiciário encontraram acesso n a L ei
Fundam ental, diretam ente, p o r m eio da grande participação de juris
tas nas deliberações da A ssem bleia de H errenchlem see e do Conselho
Parlam entar, e, indirètam ente, p o r m eio de um lobby regular das org a
nizações de interesses jurídicos, dentre outros, da renascida A ssociação
dos Juízes alem ães.45A com petência do Judiciário para exam inar a con stí-
tudonalidade das leis, introduzida na C onstituição pela prim eira v ez n a
história da Constituição álem ã, e a centralização dessa com petência n o
Tribunal Constitucional alem ão fazem parte das m atérias tratad as "co m
unanim idade" na Assem bleia de H errenchiem see.
.Até mesmo nas form ulações individuais da Lei Fundam ental, a
Assembleia de Herrenchiemsee tinha a preocupação de que "justam ente a
personalidade do juiz devia ser espedalm ente evidenciada (em relação à ins
tituição do Judiciário)",“ e, sobretudo, despertou-se o interesse do. Conselho
Parlamentar para a ideia da independênda pessoal do juiz por meio de pe
tições, dedarações e audições de juízes. Suas módicas tentativas inidais de
garantir não apenas a "proteção do povo através da independênda da jurisdi
ção", m as também uma "proteção do povo em relação ao abuso da indepen-
dênda dos tribunais"47submetiam-se às exigências do lobby dos j u í z e s . *
Essas exigêndas foram fundam entadas com a surpreendente refe-
rênda ao Estado de não D ireito d o N azism o, con tra o qual havia que se
restaurar u m Estado de D ireito, que seria idêntico com à garantia de u m
judidário livre de todo controle e vinculaçao - sob essas d rcu n stân d as, a
mera continuidade do entendim ento m etodológico jurídico após 1945 era
inevitável.“ Hoje, ele pode ser resum ido na seguinte frase con du den te:
64 A esse respeito, recentem ente, Ingo M üller, Furchtbare Juristen<Die unbm&tigte Vergangenheit
Unserer Justiz, Munique 1987.
65 Quanto ao que se segue, vide W erner Sörgel, Konsensus und Interessen. Eine Studie zur
Entstehung des Grundgesetzes fü r die Bundesrepublik Deutschland, Stuttgart 1969, pp. 134 e ss.
66 Citado em Sörgel, loc. d t., p . 150.
67 Quanto a essas formulações, vide S ö rg e l,/o c.rit., p. 150. ... . . ..
68 A esse respeito, IngeborgM aus, Juristische Methodik und JustizJunktion im Nationalsozialismus.
In: ARSP, suplemento 18 (1983), pp. 176*196, com referências.
69 Klaus Adom eit, artigo Juristisdie Methode. In: A xel Görlitz (org.), Handlexikon zur
Rechtswissendiafl, Munique 1972, p . 217-222-220; vide também nota 34.
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C oleção Conexões Jurídicas
Esse processo tam bém foi su stentad o p ela continuidade pessoal nas
Faculdades de Direito. A queles que ali lecionam , assim com o os profissio-
nais d o Judiciário, continuaram tendo o p o d er de su p erar o próprio pas
sado, e, dessa form a, con seguiram , depois d e 1945, im p u tar a submissão
da justiça sob o regim e n azista à m esm a d ou trin a jurídico-positivista de
ap licação do D ireito que eles h aviam com b atido en tre 1933 e 1945 como
sendo um substitutç do E stad o.7®A ssim , foi ain d a m ais fácil justificar a
extrap olação efetiva da d ou trin a an tifon ü alista com o u m a "retomada ca
racterística do Estado de D ireito ".
Esse processo de recalque b em -su cedid o n ão p od e ser esclarecido de
form a definitiva por m eio de situ ações p essoais, nem tam pouco está limi
tad o à ciência do direito e à ju stiça n a assu nção da defesa de interesses cor
porativos; ele faz parte da atitu d e de tod a a socied ad e alem ã. Na medida
em que os conhecim entos sobre o ju diciário n azista continuam sendo, em
geral, vagos, os argum entos ap resentad os p elo Ju d iciário e pela dênda do
d ireito após a guerra são aceitos p o r u m p úb lico am plo; eles fazem parte
dos princípios centrais d a rèligion d v ile do atu al ente estatal.
E m razão de um a certa h erm ética d as m atérias jurídico-científicas,
p raticam ente não é possível ob ter u m p oten cial crítico d e outras disci
plinas científicas. O psicanalista, sobretudo, faz q uestão de não susdtar
nenhum interesse pelo D ireito: pois ele é gu arn ecid o, justam ente em sua
estru tu ra form al, com um a sim bólica p síq uica que rem ete às abstrações da
socialização "an al-cap italista". T odavia, o fato de as abstrações do direito
form al funcionarem , em seu m o d u s op eran d i real, de m odo a manter o
ap arelh o estatal a distância e a im p ed ir in terven ções "con cretas" e, por
conseguinte, arbitrárias, em âm bitos sociais d a v id a,71 perm anece mais fe
chad o a um a p erspectiva fixad a em d im ensões sim bólicas.
Tipicam ente, essa visão d as coisas é com b in ad a com a noção de que
u m a estru tu ra jurídica form al d om in a ain d a hoje, enquanto, no século XX,
ela, d e fato, sucum be aos p ro cesso s exp o sto s de extrem a erosão. A par
tir d essa perspectiva, fica m a sca ra d o o fato d e que, sob as drcunstândas
atu ais, a exigência da v in cu lação ju ríd ico -fo rm al d os aparelhos estatais
assu m e u m caráter quase an arq u ista. M u itas d iscu ssões dentífico-sodais
e in terd isd p lin ares sobre "a lte rn a tiv a s a o d ire ito "71 tam b ém supõem que,
36
0 Judidário com o Superego dã Sodedade
37
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também como prindpios im anentes às relações sod ais fáticas” e até com
a im portânda de m eros m ecanism os fundonais: assim / em Emst Fuchs,
o corretivo superior das leis do D ireito já constitui o "efeito natural das
leis econôm icas" ou, com o ele form ula de m odo lapidar: "A jurisdição &
vre consum a-se de m odo tão legal quanto a livre form ação do mercado".*
Aqui, já se encontram legalidades m ateriais que, segundo Marcuse, ocu
param o lugar de com petêndas m orais de orientação pessoal como dire
trizes diretas da sodedade industrial arionim izada.
Esses imperativos fundonais penetram n a jurisprudênda do Tribunal
Constitudonal alemão justam ente p or estarem diretam ente ligados a con
ceitos jurídicos moralmente enriqueddos. A conversão da Constituição em
um "ordenam ento de valores" confere a cad a um a das disposições consti*
tudonais (além da "abertura" das form ulações") u m a im predsão que per
m ite com plem entar os princípios constitudonais positivados ao bel-pra
zer com outros aspectos. Assim , nas ponderações de valores do Tribunal
C onstitudonal, surgem , de form a bastante n atural, critérios de efidàida
que nãó encontram o mínimo ponto de referên d a no texto constitudonal:
a constitudonalidade das leis e dos atos constitudonalm ente relevantes,
por exem plo, é exam inada segundo o critério da "cap add ade fúndonal
das em presas e da econom ia com o u m to d o ",76 da "cap ad d ad e fúndonal
das Forças Arm adas Federais", do "p oten rial fúndonal da defesa territo
rial m ilitar"77 ou do "poteridal funcional da ju risd ição penal",7»enquánto,
p or outro lado, disposições individuais jurídico-constitudonais pòdem
p erd er im portânda. A s garantias de liberdade escritas da Constituição
são subm etidas, desse m odo, à reserva das legalidades próprias não escri
tas dos aparelhos econôm icos e políticos. C om esses e outros critérios de
exam e, m as também ao insistir continuam ente nos fundamentos de suas
d ed sões, em que as lim itações dos direitos fundam entais pela pondera
ção de valores são válidas unicam ente considerando-se as circunstândas
esp ed ais do caso concreto em tela,79 ou seja, tam bém podem , sob outras
d rcu n stân d as, ser determ inadas de ou tro m o d o , o Tribunal adapta &es
tru tu ra jurídica, em geral, ao m odo de fu n d on am en to adequado a cada
situ ação dos aparelhos adm inistrativos.
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O Judiciário com o Superego da Sociedade
39
*
f
Coleção Conexões Ju ríd icas
S3 R ex., Kantorowicz, loc. cif., pp. 17 e ss. A esse resp eito, M aus, Rechtstíieom m i
Theorie, pp. 300 e ss.
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