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O BEM DE
UM LOBO
Obra infantil de
Fernando Teixeira
alerta e sensibiliza
para a importância
21 AGOSTO 2021 REVISTA DO NASCER DO SOL do lobo ibérico
Joana
de Verona
‘No Brasil, acham que sou
muito séria e cautelosa no
trato, em Portugal acham
MIGUEL SILVA
SUMÁRIO
21
AGOSTO
2021
8. Nas redes Férias: o Algarve continua a ser destino de eleição das celebridades
nacionais 12. Sociedade George Clooney vai investir em moradia de luxo em Melides
14. Perfil Bernard Arnault, o francês que discute o pódio dos homens mais ricos do
mundo com Elon Musk e Jeff Bezos 16. Entrevista Atriz Joana de Verona 24. Livro Obra
infantil O Bem de um Lobo alerta e sensibiliza para a importância do lobo ibérico
28. Personagem Henrique VIII, uma vida cheia... de mulheres 36. Destino Impro-
vável Curaçao também fala português 40. Receitas Chef Daniel Sousa 42. Agen-
da The Walking Dead: a 11.ª e última temporada da série de zombies mais conhe-
cida no mundo 46. Cronica Enid Blyton, a escritora e a pessoa, por Alice Vieira
EDITORIAL
Q
uando as portas da escola voltarem Mas naturalmente que não comia todos
a abrir já não deverão ter bolos ou os dias. Um todas as semanas, talvez.
pastéis com massa folhada e/ou Certamente que se fosse agora não iria
com creme e/ou cobertura, como sair da sala de aula com a mesma pressa,
palmiers, jesuítas, mil-folhas, bolas de dada a confirmação da expulsão coletiva:
Berlim, donuts, folhados doces, croissants também croquetes, rissóis, empadas e ou-
ou bolos tipo queque». Estes são apenas tros que tais deixaram de ter permissão
alguns dos produtos de uma lista de mais para entrar.
Laura de meia centena que vão perder o seu lu- Cortar a «venda de produtos prejudiciais
Ramires gar nas prateleiras apelativas dos bares. à saúde» tem como principal objetivo fa-
Setembro espera assim um regresso às zer com que os jovens cresçam com uma
aulas com outro sabor. alimentação mais saudável e com rotinas
Quando li a notícia lembrei-me de ime- alimentares mais equilibradas. Mas era
diato do pão com chouriço que comia nos preciso passar do 8 para o 80? E ficar tudo
tempos de escola – podiam até estar pães pouco mais do que a pão e água?
ou croissants quentinhos, acabadinhos de Mais do que isso, é esperado que nas ida-
sair do forno no preciso momento em que des em questão os pais saibam o que os fi-
chegava a minha vez de fazer o pedido, que lhos comem na escola. E os hábitos alimen-
a voz não deixava sequer disfarçar os se- tares costumam ser, de resto, um espelho
gundos de hesitação para os adversários. dos alimentos que se comem em casa.
E talvez só me tenha apercebido neste mo- Resta saber se o bolo de arroz e o refri-
mento que era das primeiras coisas que fa- gerante passam a ir na mochila... Afinal,
zia na escola quando voltava de férias: ir ao um vez de vez em quando nunca fez mal
bar e comer o famoso pão com chouriço. a ninguém.
JOSÉ ANTÓNIO
SARAIVA
Q D
uando os bárbaros chegaram ao do o conceito de herança. E a herança su- urante vários séculos, atravessando a
Sul da Europa e à Península Ibé- punha a monogamia, sem a qual se tor- Idade Média, a Idade Moderna e en-
rica, no início do século IV, encon- nava difícil identificar os herdeiros. Com trando na Idade Contemporânea, a or-
traram povos num estádio supe- uma família estável – um pai, uma mãe ganização social que vinha dos romanos,
rior de civilização. e filhos – os beneficiários da herança não consolidada pela Igreja Católica, mante-
Os romanos tinham implantado na sua ofereciam dúvidas. ve-se relativamente estável no Sul da
zona de influência estruturas políticas, ad- Sobre as famílias assim organizadas Europa.
ministrativas, sociais e económicas que construíram-se os municípios e sobre os Com a chegada da revolução industrial,
geravam modos de vida que os bárbaros municípios construiu-se o Estado. Que, porém, este mundo vai entrar em crise.
desconheciam. com a sua burocracia, garantia o funciona- Quase tudo muda. A posse da terra torna-
Caído o império romano, a Igreja Cató- mento daquilo que era colectivo, perten- -se secundária em relação à produção in-
lica ‘substituiu-o’ no papel de consolidar ça de todos. Assim se construíram socie- dustrial. As cidades crescem enormemen-
e fazer funcionar essas estruturas, de- dades organizadas. te. As mulheres entram no mercado de tra-
fendendo ao mesmo tempo o cumpri- balho. A vida em família altera-se.
mento de regras essenciais à vida em so-
ciedade. Não matar, não roubar, não co-
biçar a mulher do próximo nem o seu
O s bárbaros, quando chegaram ao Sul
da Europa, estavam noutro patamar ci-
vilizacional. Vinham em hordas por aí
O homem perde protagonismo, as mu-
lheres ganham independência, os filhos
deixam parcialmente de ser criados em
servo nem o seu boi, não usar o homem abaixo, homens mulheres e crianças, e casa e vão para creches ou para colégios
como mulher, etc., eram princípios sem desconheciam as leis que regulavam a vida internos, a estabilidade familiar é abalada,
os quais a vida em comunidade se tor- dos povos do Sul. os divórcios aumentam.
naria um inferno. Matavam, roubavam, violavam as mu- O positivismo avança, com o conse-
lheres, não cultivavam a monogamia, vi- quente recuo da influência da Igreja
NA ONDA
Bolos e pães
Pilas e Poças
com chouriço ao poder
Rapaziada mais nova e não
só, toca a comer essas igua- É sabido que as redes sociais
rias enquanto é possível. Os estão a nivelar muita coisa
novos ditadores agora que- por baixo, e a pré-campanha
rem até decidir o que os me- eleitoral das autárquicas está
ninos podem ou não comer a ser bem o espelho disso.
na escola. Já no exterior, por Quando gozávamos com os
enquanto, os que têm dinhei- brasileiros por terem um Ti-
ro podem encher-se à vonta- ririca, estávamos longe de
de de tais ‘petiscos’. Quem imaginar que teríamos Poças,
não tem dinheiro, que fique Pilas lubrificadoras e afins.
Conduzir em Lisboa
É, talvez, a pior altura para an- Um certificado digital
dispensável à semana
dar de carro na capital. Há os
nabos que só conduzem no ve-
rão, há os emigrantes e os es-
trangeiros que não conhecem os A história do certificado que só é indispensável ao fim
caminhos e ficam parados entre de semana tem irritado muito boa gente, mas ainda não
duas estradas e torna-se muito chegámos ao ponto de Obélix que trata da saúde a todos
complicado conseguir ‘fintar’ aqueles que lhe querem obrigar a mostrar o certificado
esses obstáculos. Depois há ain- digital para poder comer tranquilamente os seus javalis.
da que acrescentar aqueles que Afinal, em Portugal somos todos mansos e aceitamos
vão a 50 em estradas que se que um documento só seja indispensável a partir das 19
pode andar a 90. Uma desgraça horas de sexta-feira e durante sábado e domingo. Isto
que se segue ao período dos faz algum sentido? Faz, para desgraçar ainda mais os
confinamentos onde se podia restaurantes que não têm esplanada e que perdem dias
andar à vontade. Volta confina- fundamentais para faturarem alguma coisa. Mas com
mento que estás perdoado. este Governo, tudo é possível....
Trapezista
mas nem
tanto
Que Suzana Garcia, a candi-
data do PSD à Câmara da
Amadora, é uma mulher de
peso, ninguém tem dúvidas.
Alterações
Que o seu aparecimento na
vida política também provo-
climatéricas
cou um pequeno terramoto,
também ninguém tem dúvi-
na música
das. Não é pois de estranhar
que a nova social-democrata
veja o seu nome e a sua figura
usados para a denegrir. O O tempo está mesmo a trocar-
Surfar, que é muito ingénuo e -nos as voltas e nem a música
acredita em tudo, quase viu escapa às alterações climatéri-
nesta mulher do varão Suza- cas. Segundo este cartoon que
na Garcia. Mas, afinal, tudo chegou ao Surfar, as 4 Estações
não passa de uma montagem, de Vivaldi devem ser rebatiza-
embora a candidata à autar- das, pois agora é tudo a mesma
quia amadorense seja bem fruta. Ou chuva torrencial ou
capaz de nos surpreender sol abrasador. O que na música
com os seus movimentos. cria alguma confusão...
Tempo de
não contar
o tempo:
Férias!
Férias de verão continuam a ser
sinónimo de rumar ao Sul, mas as ilhas
da Madeira e dos Açores também
foram opção de várias celebridades
nacionais. Já fora de portas, as Maldivas
foi o destino mais procurado
para uns dias de descanso
Família
Patrocínio
A tradição
mantém-se
A família da apresentadora de
televisão Carolina Patrocínio
reuniu-se mais uma vez no
Algarve, como tem sido habi-
tual ao longo dos últimos
verões, em que são encontra-
dos na Praia dos Salgados. As
Bibá Pitta
férias, porém, já terminaram Neta a caminho
para a apresentadora do pro- Na Praia do Ancão na compa-
grama What’s Up? TV, da SIC nhia dos filhos e netos, Bibá
Mulher, que deixou uma Pitta mostrou-se feliz e ansiosa
mensagem nas redes a despe- pela chegada da neta. Maria
dir-se do barlavento algarvio. Pitta Paixão aguarda a chegada
«Hora de dizer adeus. Algarve, de uma menina, que vem jun-
21». Além de ter estado reuni- tar-se a Duarte, de cinco anos, e
da com a mãe e as restantes António, de um. «Gostava que
cinco irmãs, contou, como viesses com a coragem da tua
sempre, com a companhia do mãe, batalhadora como o teu
companheiro Gonçalo Uva e pai, e muito alegre como a tua
dos quatro filhos de ambos. avó … tenho dito», escreveu.
Eduardo Madeira
Quando o apelido ganha outro sentido
O humorista recarregou baterias numas férias na ilha da Madei-
ra e aproveitou a estadia para se encontrar com uma das figuras
mais queridas da ilha: não, não foi com Cristiano Ronaldo, mas
sim com a mãe do craque português, Dolores Aveiro. «Belo en-
contro, bela Poncha», escreveu na legenda da imagem. Eduardo
Madeira foi até ao Funchal na companhia da namorada, Joana
Machado Madeira, e da filha mais velha de ambos, Leonor. O
casal partilhou também vários momentos com o humorista An-
tónio Raminhos, a mulher Catarina e as suas três filhas.
Fátima Lopes
A beleza do Douro
A apresentadora está a desfrutar ao máximo as suas férias no
Douro e partilhou vários momentos com os quase 750 mil se-
guidores que reúne na rede social Instagram. A jogar ténis ou a
praticar desportos aquáticos, Fátima Lopes tem aproveitado os
dias de descanso também para superar alguns medos: «No
Douro estou a perder alguns medos, como andar numa bóia de
tração. Para muitos é normal, para mim foi uma grande aven-
tura», admitiu. Antes de ficar rendida à beleza do Douro, Fáti-
ma Lopes esteve, na última semana de julho, na ilha do Pico,
nos Açores, com duas amigas, para subir a montanha do Pico.
Fernanda
Serrano
Feliz nas Maldivas
Fernanda Serrano rumou
até às Maldivas na compa-
nhia do namorado, o perso-
nal trainer Ricardo Pereira.
A atriz partilhou vários mo-
mentos de descontração e
paixão nas suas redes du-
Maria Botelho
rante os dias de descanso.
«Às vezes a vida pode ser
Moniz
maravilhosa! Temos de sor-
Açores e amor
rir e agradecer…», escreveu A apresentadora já regressou
no Instagram, rede social às manhãs da TVI, mas não
onde regista mais de 300 sem antes ter partilhado al-
mil seguidores. Este verão o gumas imagens das suas fé-
casal já fizera um cruzeiro, rias nos Açores, ao lado do
tendo passado por lugares namorado Pedro Bianchi
igualmente paradisíacos, Prata. «Janela mágica com
como a Costa Amalfitana. um adeus especial», pode
ler-se na legenda.
Sónia
Araújo
Rumo ao Sul
Depois de uma pas-
sagem por Vila-
moura, a apresenta-
dora da RTP conti-
nuou em solo
algarvio, tendo
aproveitado mais
uns dias de descan-
so nos Salgados, em
Albufeira. Aos 50
anos, Sónia Araújo
mostrou-se em ex-
celente forma física
e recolheu centenas
de elogios na caixa
de comentários na
Ricardo e Francisca Pereira
sua página de Insta- Férias em família
gram (onde reúne O ator Ricardo Pereira, a mulher Francisca, e os três filhos –
mais de 200 mil se- Vicente, Francisca e Julieta –, gozaram uns dias de férias no
guidores). O segre- Algarve, na Praia Verde. No último fim de semana, a família
do parece passar por aproveitou mais uns dias de descanso em Évora – ainda antes,
comer bem e treinar em maio, o casal havia elegido as Maldivas para desfrutar
ainda melhor. de umas férias românticas.
VASCO
RIBEIRO
A
s redes sociais – Facebook, Instagram e LinkedIn –, – Lembre-se que hoje está na posição da voz do con-
tornaram-se grandes plataformas de comunicação sumidor nas redes sociais, mas amanhã poderá estar do
digital e têm servido também para os consumido- outro lado;
res exporem as suas reclamações, fazendo publi- – Não publique nas redes sociais fotografias de uma re-
cações nas quais identificam as próprias marcas/empre- clamação que tenha feito no livro de reclamações;
sas. Além disso, também as plataformas digitais permi- – Uma reclamação online estrategicamente bem-su-
tem realizar reclamações eletrónicas sob diversas formas. cedida pelo consumidor reclamante terá provavelmen-
O que acontece na maioria dos casos é que essa recla- te outra recetividade, gerando outro benefício na sua
mação, por ter um alcance digital público que pode tomar resolução;
proporções planetárias, tem uma gestão e despacho mais – Não destratar a pessoa que está a responder à sua re-
célere e eficaz em comparação à reclamação tradicional. clamação com desagrado;
Consequentemente pode terminar numa oferta de solu- – Dependendo do tipo de compra, tenha atenção ao pra-
ção útil que agrade ao consumidor reclamante. zo para poder reclamar;
Se optar por fazer uma reclamação por esta via, não dei- – Quanto mais tempo demorar a reclamar menor será a
xe de ter em atenção alguns aspetos: expectativa face à eficácia da resolução do problema;
– Em primeiro lugar, deve estar consciente dos direitos do – Não expor publicamente a resposta dada à sua re-
consumidor, em particular as principais regras da reclama- clamação;
ção, e só depois deve avançar para o livro de reclamações – As reclamações realizadas nas redes sociais ou nas
eletrónico; plataformas digitais de reservas não são equiparadas às
– O livro de reclamações eletrónico permite que registe a reclamações efetuados no livro de reclamações, sendo
sua reclamação a qualquer momento, mesmo após sair da apenas consideradas reclamações informais;
loja física, mas terá é de ser fiel ao que aconteceu in loco; – Quando reclamar numa plataforma digital de re-
– Evite fazer reclamações em grupos de Facebook, Ins- servas, antes de expor a sua reclamação veja primei-
tagram, LinkedIn e WhatsApp ro se alguém já reclamou pelo mesmo motivo e repa-
– Substitua a publicação pública (visível para todos os re na forma como o fez e se obteve feedback da mesma
utilizadores) na rede social identificando a marca/empre- forma;
sa por uma sms no messenger/chat da marca/empresa; – Nas redes sociais ou nas plataformas digitais de re-
– Numa reclamação exposta nas redes sociais não men- serva, caso tenha o comprovativo de garantia na sua
cione marcas concorrentes que se distingam pela qualida- posse, tire uma fotografia e junte-a ao texto da sua re-
de superior; clamação.
DR
Madonna num dos passeios de cavalo no areal da Comporta
George Clooney
Ator vai ter morada
na zona da Comporta
A estrela de Hollywood vai construir uma moradia de luxo no Costa Terra Golf &
Ocean Club, em Melides.A zona da Comporta tem sido um refúgio muito
procurado pelas celebridades internacionais durante os últimos anos. Comparada
aos Hamptons de Nova Iorque, o projeto deverá estar concluído em 2022
P
ortugal tornou-se nos últimos Pereira, dona da Semapa – que havia com- Com as obras relacionadas com as in-
anos um destino de eleição prado os terrenos há 11 anos, em 2008, com fraestruturas (estradas e esgotos) finaliza-
para várias celebridades in- o objetivo de construir um projeto turístico das, acredita-se que já começou a conta-
ternacionais. George Clooney que seria gerido pelo empresário suíço An- gem decrescente para dar início à constru-
prepara-se agora para se tor- dreas Reinhart. Segundo o mesmo jornal ção das moradias. A expectativa é que o
nar o mais recente nome a digital, a propriedade tem uma área de 200 resort fique concluído até ao final de 2022.
juntar-se à já considerável lis- hectares onde serão construídas quase 150 O Costa Terra Golf & Ocean Club deixa
ta. A estrela de Hollywood vai construir uma moradias. Faz ainda parte dos planos edifi- desta forma cair definitivamente a sua ver-
moradia de luxo em Melides, no complexo car um centro de saúde e bem-estar e um tente turística – uma visão que tinha sido
Costa Terra Ocean Club, avançou durante a campo de golfe (já em construção). já idealizada pelos proprietários anterio-
última semana o jornal Eco. A propriedade Apesar de haver a possibilidade de com- res –, e aposta assim nas residências par-
Costa Terra pertence à empresa Discovery pra de lotes já idealizados pela Discovery ticulares, que, de acordo com o Eco, vai
Land, gerida por Mike Meldman, sócio do Land, o ator norte-americano optou por atrair «clientela premium».
ator norte-americano desde 2013, ano em fazer a casa a gosto. O ator de 60 anos ti-
que fundaram uma empresa de tequila, a nha viagem prevista a Portugal neste mês Comporta, o refúgio dos famosos
Casamigos. Meldman adquiriu o projeto tu- de agosto, mas terá adiado a visita a Me- Num artigo publicado em 2020 no El País, a
rístico de luxo em 2019 à família Queiroz lides para o próximo mês de setembro. Comporta era descrita como o «centro de
BERNARD ARNAULT:
O TERCEIRO
TODO PODEROSO
O dono da marca francesa Louis Vuitton (LVMH)
conseguiu, mais uma vez, chegar ao primeiro
lugar da lista das pessoas mais rica do mundo,
destronando assim Jeff Bezos. Contudo, como
já aconteceu no passado, tudo indicava que
JOEL SAGET/AFP
Q
uando Bernard Arnault tre, as receitas foram ainda maiores, supe- Neste momento, o empresário da indústria
acordou na manhã de 5 de rando 14% dos níveis pré-pandemia: mais tecnológica tem uma fortuna avaliada em 193
agosto, de acordo com o Ín- 17,4 mil milhões de dólares (14,82 mil mi- mil milhões de dólares (164,42 mil milhões
dice de multimilionários da lhões de euros), acrescentando ao valor de de euros). Em segundo lugar, surge Jeff Be-
Forbes, o seu património lí- mercado total que, quando Bernard se tor- zos, com uma fortuna avaliada em 191 mil mi-
quido estava avaliado em nou no mais rico do mundo, era de 416 mil lhões de dólares (162,71 mil milhões de eu-
196 mil milhões de dólares milhões de dólares (354,38 mil milhões em ros) e Bernard Arnault, com 176 mil milhões
(165,91 mil milhões de euros). O empre- euros), segundo o The Independent. de dólares (149,94 mil milhões de euros).
sário francês, de 72 anos, superou assim Em contrapartida, os lucros da Amazon Já não é a primeira vez que Elon Musk
Jeff Bezos que detinha 186 mil milhões de caíram 7% na semana anterior, facilitan- atinge esta marca. A 20 de julho, tornou-
dólares (157,45 mil milhões de euros), tor- do a subida de Arnault, enquanto Bezos -se o homem mais rico na Terra, ainda que
nando-se o homem mais rico do mundo. perdeu 14 mil milhões (11,93 mil milhões por motivos bem diferentes: quando Be-
Tendo em conta os dados do Market Watch, de euros) da sua fortuna num dia só. zos subiu ao espaço com o foguetão do
as ações do grupo de luxo LVMH aumen- Blue Origin, deixou de estar nesta posi-
taram 2.2% para quase os 165,2 dólares Uma reviravolta já esperada ção, não por perder a riqueza, mas por ter
(139,84 euros) por ação. Desde o início do Mas tudo apontava que esta seria «uma saído do planeta. Assim, durante apenas
ano que a LVMH tem lucrado com o valor conquista efémera», e sete dias depois, 11 minutos, o CEO da SpaceX foi, realmen-
das ações a aumentarem 30% e o número no dia 12 de agosto, Elon Musk, CEO da te, o homem mais rico no planeta Terra.
de vendas e lucro das mesmas a atingirem Tesla Motors e da SpaceX, «subiu ao pó-
recordes positivos no primeiro semestre dio», ultrapassando Arnault e tornou-se Bernard Arnault e a sua fortuna
de 2021. No que toca ao segundo trimes- ele o homem mais rico do mundo. Bernard Jean Étienne Arnault nasceu em
5 de março de 1949, em Roubaix, França. ris, era dono da empresa de engenharia sas deu origem a LVMH Moët Hennessy
Desde cedo que teve contacto com o civil Ferret-Savinel. Foi precisamente na Louis Vuitton, em 1987. No ano seguinte,
mundo da luxúria: a sua mãe, Mari empresa da família que Arnault come- Arnault forneceu 1,28 mil milhões de eu-
Josèphe Savinel, tinha um «fascínio por çou «a dar os primeiros passos» no ros, formando uma holding com a Guin-
Dior» e o seu pai, o fabricante Jean Léon mundos dos negócios. Depois de se for- ness, que detinha 24% das ações da
Arnault, formado pela École Centrale Pa- mar na École Polytechnique, a principal LVMH e, após os crescentes investimen-
escola de engenharia da França, em 1971, tos, tornou-se o maior acionista da mar-
o jovem francês começou a trabalhar para ca – tornando-se também no responsá-
a empresa do seu pai da qual acabou por vel por transformar o grupo no maior
ser presidente de 1978 a 1984, mudando conglomerado de luxo do mundo. Nos
ARNAULT o foco da empresa para o mercado imo- anos posteriores, a LVMH foi compran-
COMEÇOU NA biliário.
Depois disso, «os dedos tiveram sem-
do mais e mais marcas de luxo, como a
gigante Sephora. Além dessa marca, Ber-
EMPRESA DA pre apontados para o céu»: em 1984,
Bernard Arnault comprou a primeira em-
nard Arnault é acionista do Carrefour e
da Princess Yachts.
FAMÍLIA, MAS presa de artigos de luxo: a Financière Para além do universo empresarial, Ar-
Joana
de Verona
‘A ideia que as pessoas têm
do cinema português é que tem
uma identidade muito própria
e com muita qualidade’
TEXTO Joana Faustino FOTOGRAFIA Miguel Silva
C
resceste numa família de ar- o contacto na infância com algumas influên-
tistas. Achas que estavas des- cias e referências: estar rodeada de telas, ver
tinada a seguir o caminho da a minha mãe a pintar, os irmãos a tocar...
representação? A minha fa- Isso pode ter criado ali uma conjuntura mais
mília não é ligada às artes em propícia a que eu despertasse para essas
termos profissionais. Eles têm áreas. Mas quando eu comecei a fazer tea-
outras profissões, mas man- tro e dança, aos oito anos, foi por minha von-
tém efetivamente a ligação à arte. Seja no tade, não tinha ninguém em casa a fazer isso.
caso da música para os meus irmãos, ou a
relação da minha mãe com a pintura, mas Sentes que existe uma missão intrínseca à
são coisas às quais as pessoas da minha fa- profissão do ator? Depende do que se con-
mília estão ligadas em termos de hobbie. Acho sidera uma missão. Eu acho que existe uma
que isso pode ter facilitado de alguma forma coisa intrínseca à profissão de ator e intér- >>
‘Tens de gostar
de pessoas,
tens de gostar
e de ter
curiosidade
pela mente
humana, tens
de explorar os
teus próprios
limites’
portanto, é uma não questão. Tenho 31 anos o espetáculo Meridional vai ter atores e bai- realizar esse trabalho? Eu descobri aquele
e fiz os Morangos com Açúcar com 16. Como larinos e vai ser muito ligado ao movimen- senhor, o Ali, e durante um mês entrei no
já fazia teatro e cinema na mesma altura, to. Não é que o bailarino só dance e o ator universo dele, e ele, muito gentilmente,
nunca foi um problema que se impôs. só fale, isso não é uma questão. Às vezes, deixou-me, sem grandes entraves, filmá-
até mesmo em cinema, os atores falam -lo. Aquilo que mais me interessava era a
Portanto já tinhas formação quando en- pouco e têm um trabalho com o corpo fan- obsessão que ele tinha por um manequim.
traste no projeto... Sim, quando eu entrei tástico. O que me interessa é essa pluralida- A ideia desta filme surgiu da dificuldade
estava no terceiro ano do curso do Chapitô de e multidisciplinaridade. que eu tive de pôr em prática uma outra
e a fazer um curso de criação de performan- ideia. A minha ideia inicial tinha que ver
ce com a Joana Craveiro. Fazia curtas-me- Aos 22 anos foste para Paris estudar reali- diretamente com a morte recente da mi-
tragens e a minha primeira longa-metra- zação de documentário. O que te levou a nha avó, eu queria fazer um documentário
gem foi logo a seguir aos Morangos. tomar essa decisão? Eu queria estudar rea- sobre as pessoas que maquilham os mortos.
lização porque mais ou menos aos 18 anos Em França era, no entanto, muito difícil.
Quando é que tiveste a certeza de que era percebi que queria também ser realizado- Tive várias entrevistas com organismos que
isto que querias fazer para o resto da vida? ra. Fui estudar documentário por gosto e, fazem isso, mas era mesmo complicado
Aos oito anos. talvez, por fazer muita ficção como intér- abordar o tema. De repente, deparei-me
prete quisesse estar mais na parte do do- com aquele senhor, numa loja que parecia
Já falaste muito, tanto nesta entrevista cumentário. Se me perguntares se hoje em um aquário, uma coisa muito exótica. Ele
como em outras, sobre a importância de dia eu só quero realizar documentários a tinha uma obsessão brutal por uma mane-
explorar o corpo. Porquê? Porque desde resposta é não, também quero realizar fic- quim, parecia que lhe queria dar vida, que
pequena que me interesso tanto pela dan- ções. Mas a verdade é que, quando penso a queria animar. E, portanto, embora não
ça como pelo teatro e o corpo é um lugar em projetos, normalmente penso em do- de maneira direta, está lá um homem que
que me interessa trabalhar. Acredito que há cumentários. O curso era de documentá- ‘maquilha’ e que tenta dar vida a um obje-
uma liberdade enorme quando se cria al- rio, mas o que aprendi foi sobre realização to inanimado, havia ali um paralelo. Por
guma coisa através do movimento, seja pela no geral. Aprendes tudo relacionado com a fim, a vida dele, em si, também era bastan-
abstração ou pela multiplicidade de senti- edição, tanto de som como de câmara. te interessante e decidi retratá-lo. Embora
enorme aceitação, não só em Portugal como Artistas) teve um papel muito importante tenhas em casa. Quando eu vou passear,
nos outros países. Eu acredito que também no que toca a socorrer alguns artistas e ga- vou mais facilmente para um jardim do que
é bom para Portugal ter produções com al- rantir os mínimos. A redistribuição e os para o meio de um centro comercial, tem
cances internacionais. apoios por parte da Ministra da Cultura não mais que ver com isso. Claro que Nova Ior-
foram bem feitos, houve muita gente que que é uma cidade fantástica, claro que São
Como é que a produção nacional e os ato- ficou sem apoios. Não houve um pensamen- Paulo é uma cidade com uma atividade cul-
res portugueses são vistos no estrangeiro? to alargado, democrático e efetivo. As me- tural brutal, mas quando eu tenho tempo
A ideia que as pessoas têm do cinema por- dida foram feitas tardiamente e distribuídas para viajar vou sempre para sítios com na-
tuguês é que é extremamente autoral, com de uma forma insuficiente. tureza – quer seja para os Açores, que já fui
uma identidade muito própria e com mui- seis vezes ou sete –; para locais no Brasil fora
ta qualidade. Relativamente aos atores, aqui- Sobre o Mappa Mundi... É um espetáculo das grandes cidades, para Cabo Verde, para
lo que se perceciona é que é um país peque- um pouco diferente daquilo a que as pes- a Ásia... Ou até mesmo para Portugal, para
no, mas cheio de talento. soas estão habituadas. É uma instalação, o Alentejo ou para o Norte, desde que sejam
um género muito específico. Tem estado a recantos próximos da água e da floresta. São
Também já participaste em novelas bra- ter adesão? Sim, o Mappa Mundi é uma ins- duas coisas muito importantes para mim,
sileiras. Que diferenças vês entre as pro- talação para uma galeria de arte e há pes- água até mais em termos de rio e de casca-
duções que fazes cá e as que fazes lá? A soas em Portugal que estão habituadas a ver tas. Em vez de ir para uma esplanada no
dimensão, lá é muito maior. Desde o nú- aquele tipo de espetáculo e de performan- meio do Chiado, vou para uma esplanada
mero de pessoas que a Globo emprega, aos ce. Se calhar não é o público na sua gene- num jardim, por exemplo. Acho que tem
orçamentos, ao material técnico, ao espa- ralidade, mas é uma performance de insta- que ver com, com o tempo que tens, esco-
ço que existe para se montarem as cida- lação numa galeria. Correu muito bem, foi lheres ir para onde te sentes melhor. Quan-
des cenográficas, é tudo muito maior. co-produzido pelo FITEI (Festival Interna- do as coisas fazem parte de ti não pensas
Consegue-se reproduzir uma favela, ou cional de Teatro de Expressão Ibérica), que muito nelas, é onde de te sentes bem e onde
uma cidade de interior ou qualquer outra acontece no Porto e tem muitos anos. Cá em precisas de estar.
infraestrutura. Em termos de cinema, é Lisboa, estreamos no Temps D’Image, um
diferente também porque as equipas são festival que eu gosto e que programa mui- Portanto, nessa dicotomia campo/cidade,
muito maiores, há muito mais gente. O tas peças com várias linguagens. Esteve escolherias o campo? Já pensei em morar
E SE OS LOBOS NÃO
FOSSEM ODIADOS?
O lobo ibérico é uma espécie em perigo na Península
Ibérica. Por ter nascido no Fundão e sempre ter lidado
com a presença desta espécie, Fernando Teixeira,
de 25 anos, escreveu uma fábula acerca da mesma
através da qual trabalha ‘na consciência de futuro’,
mas também tenta ‘formar os adultos do presente’
TEXTO Maria Moreira Rato
DR
S
ei que te peço muitas coi- Quem o explica é Fernando Teixeira, rapaz que recorda que, anteriormente,
sas e que não as podes fa- jovem fundanense, de 25 anos, autor da era «um projeto de ambientalista».
zer todas, mas será que me obra lançada em maio e licenciado em «Sempre quis saber mais sobre o assun-
consegues arranjar um Direito pela Faculdade de Direito da Uni- to, mas não tinha disponibilidade, mas
amigo de verdade?», pede versidade do Porto, mestre em Gestão fui-me apercebendo de que muitas crian-
o pequeno Joaquim sempre pela Universidade da Beira Interior e que ças a sul do rio Douro não fazem ideia de
que reza ao final da noite. sempre nutriu uma paixão pelo mundo que o lobo habitava aquelas terras há cem
Depois, sonha com meninos da sua ida- da comunicação e, por esse motivo, pas- anos. Quem se lembra são os avós deles e,
de com os quais brinca. No entanto, cer- sou por órgãos de informação como a Rá- por vezes, nem esses eram nascidos», diz,
to dia, conhece uma cria de lobo ibérico, dio Cova da Beira, o Diário de Aveiro e a Comu- referindo-se ao facto de que esta subes-
travando uma forte e inesperada ligação nidade Cultura e Arte. «Trabalho como as- pécie, com a designação científica de Ca-
com o animal, apesar de viver «numa sessor de comunicação na Rewilding nis lupus signatus e descrita em 1907 pelo
aldeia onde se alimentava o ódio pelo Portugal, uma associação de conservação zoólogo espanhol Angel Cabrera, é, mui-
lobo, este era perseguido e caçado». É de natureza e temos uma vertente dedi- tas das vezes, esquecida ou totalmente
este o resumo d’O Bem de Um Lobo, fá- cada a garantir que o lobo ibérico tem desconhecida pelos próprios portugueses.
bula que tem o objetivo «de apelar, aos condições para subsistir em território Exatamente por ter noção deste pano-
mais jovens e não só, à necessidade de nacional. Por ação direta do homem, o rama, a equipa do projeto LIFE WolFlux,
conservação do lobo ibérico na Penín- lobo desapareceu diretamente de todo o coordenado pela Rewilding Portugal, de-
sula Ibérica, uma espécie atualmente território de Portugal e numa área espe- cidiu levar a cabo um estudo para perce-
considerada em perigo em Portugal». cífica a Norte do rio Douro», explica o ber quais são as reações das populações
necessidade de trabalhar no terreno, em identifico-o a partir das memórias da nem fizemos resumos. Começámos por
conjunto com as autoridades locais, para minha infância. Por exemplo, a cruz que explicar a razão pela qual preparámos
detetar a origem dessa inflexibilidade. se encontra por cima da cama da perso- esta obra e procurámos que fizessem
«O que é vivido por um vizinho espa- nagem principal é aquela que via em perguntas», até porque «o lobo que cos-
lha-se rapidamente nas comunidades, casa das minhas bisavós», avança, tumamos ver é o americano, muito gran-
principalmente entre os seus pares, e tem adiantando que, à medida que foi reali- de, e não o ibérico. Fazemos um jogo de
uma grande influência nas opiniões dos zando as sessões de apresentação do li- fotos para que identifiquem esta subes-
outros», assinalou Sara Aliácar, técnica de vro juntamente com a ilustradora Caro- pécie e a conheçam», acrescenta, escla-
conservação da Rewilding Portugal e uma lina Baptista, jovem de 22 anos natural recendo que, na segunda parte, Carolina
das entrevistadoras do estudo. «Também da aldeia de Sentieiras, em Abrantes, e mostra as ilustrações que fez e os dois
constatámos que o medo do lobo estava estudante de Arte e Design no Instituto adiantam «o porquê de as roupas serem
associado à intolerância […]. O medo do Politécnico de Coimbra, foi compreen- de determinada forma, de existir o pe-
lobo pode ter muitas origens, mas desco- dendo que as crianças «não conheciam lourinho, de haver o tanque para lavar a
brimos que os entrevistados que tiveram a natureza que as envolve. Conhecem roupa».
uma experiência positiva ao ver um lobo mais aquilo que está longe do que a flo- «Quisemos que o livro se tornasse in-
na natureza perceberam que este não tem ra e a fauna portuguesas». teressante e didático simultaneamente.
nada a ver com o animal feroz sobre o qual Na ótica de Fernando, tal deve-se ao Já que o Joaquim representa todas as
ouviram falar», sublinhou a dirigente no facto de «o currículo de ciências estar crianças que estão a ler o livro, o lobo re-
comunicado anteriormente referido. A seu muito voltado para uma ideia global, mas presenta todos os lobos ibéricos e, por
lado, o recurso a cães de gado como defe- precisamos de uma ideia de proximida- isso, não lhe atribuí um nome para que
sa face a ataques de lobos, uma das apos- de. Na Serra da Estrela, temos o Centro exista uma universalização e não uma
tas do LIFE WolFlux, foi encarado com de Ecologia, Recuperação e Vigilância de personificação ainda maior do animal»,
bons olhos pela maioria, mas os mesmos Animais Selvagens. São encontrados de- declara, constatando que a União de
têm de ser de raças portuguesas adequa- bilitados e ajudados a voltar à vida sel- Freguesias de Covilhã e Canhoso, o Mu-
das, como os Serra da Estrela ou Castro vagem. Excetuando as escolas de Gou- nicípio da Covilhã, assim como o do
Laboreiro. veia, nenhuma faz uma visita de estudo Fundão e o de Abrantes aderiram de
«Embora um grande número de atores ao mesmo, mas vão ao Jardim Zoológico imediato à ideia de apoiar Fernando e
locais demonstre tolerância em relação ao de Lisboa», critica o também doutoran- Carolina. «O sim foi automático», tal
lobo, menos de metade mencionou algu- do em Agronegócios e Sustentabilidade como o dos media partners Jornal Fórum
ma vantagem na presença deste predador na Universidade de Évora Covilhã e Comunidade Cultura e Arte,
no território. A atração de turistas foi men- «Por estes motivos, o livro serve para algo que o escritor e a ilustradora pre-
cionada apenas por alguns atores-chave», colocar os miúdos mais próximos da na- zam porque, desta forma, conseguiram
evidenciou a Rewilding Portugal, acres- tureza em Portugal. Já fizemos sete apre- chegar aos pais e não às crianças como
centando que, apesar de este turismo ser sentações do livro e não lemos excertos habitualmente.
raro em Portugal, na vizinha Espanha tra- De acordo com dados disponibilizados
ta-se de «um setor lucrativo e bem esta- no site da Associação de Conservação do
belecido, que leva muitas pessoas a re- Habitat do Lobo Ibérico, este é um ma-
giões como a Serra da Culebra, na espe- mífero da família dos canídeos. Sendo
rança de ver este animal elusivo». Em um carnívoro de grande porte, somente
território nacional, a Dear Wolf, empresa ultrapassado na Europa pelo urso pardo,
composta por biólogos especializados em é o canídeo selvagem de maiores dimen-
vida selvagem, foca-se no ecoturismo, na sões da atualidade. «O lobo ibérico ca-
consultoria e investigação, na educação e racteriza-se por ser mais pequeno que o
formação, proporcionando passeios guia- lobo presente no resto da Europa e pela
dos pelos profissionais suprarreferidos ‘NÃO ESTOU A pelagem mais amarelo-acastanhada. A
«que garantem que as melhores práticas
são seguidas e que os animais não são per- DIZER QUE O LOBO mudança para pelagem de verão ocorre
no início da primavera, com a redução
turbados».
É SÓ BOM. É UMA da densidade e tamanho do pelo e em
outubro dá-se início à mudança para a
‘O título O Bem de Um Lobo ESPÉCIE CARNÍVO- pelagem de inverno. A pelagem de in-
opõe-se ao ódio que se sente
por este animal’
RA. É LEGÍTIMO verno fica mais densa e comprida, con-
ferindo ao lobo uma maior resistência às
ta negra no dorso, outra nos membros também «formar os adultos do presente «Mas o próximo desafio será desmis-
dianteiros e, em adulto, pesa entre os para uma consciência ambiental». tificar o papel dos abutres. São aves ne-
25kg e os 40kg, tendo uma aparência im- «Para o ano, vamos fazer apresenta- crófagas, mas têm uma importância ex-
ponente. ções por escolas de todo o país. O nosso trema», descortina, reconhecendo que
Contudo, tal não significa que a única objetivo é ir a pelo menos a uma escola existem as espécies Grifo (Gyps fulvus)
característica que lhe possa ser associada de cada distrito. É o primeiro livro sobre – pode chegar aos dois metros e meio,
seja a perigosidade. «O título O Bem de o lobo ibérico que ganhou esta proje- apresenta penas castanhas escuras no
Um Lobo opõe-se ao ódio que se sente por ção», confessa Fernando, admitindo que centro e pretas nas extremidades e o seu
este animal e acaba por ser realista: não está a pensar escrever sobre outras es- estado de conservação no país é quase
estou a dizer que o lobo é só bom. É uma pécies, nomeadamente, acerca do saca- ameaçado –, o abutre-preto (Aegypius
espécie carnívora. É legítimo que exista -rabos, um mamífero de distribuição in- monachus) – é o maior abutre da Euro-
algum ódio das comunidades locais por- vulgar na Europa, estando mais presen- pa e tem uma plumagem castanha escu-
que o animal não tem carne para comer te no Sudoeste da Península Ibérica, ra, estando criticamente em perigo – e
no seu habitat e aproxima-se dos seres hu- ocupando terrenos rochosos com vege- abutre-do-Egipto (Neophron percnop-
manos. Porém, não nos esqueçamos de tação e campos de cultivo, possuindo terus) – é o menor dos três, tem uma
que tem um papel importantíssimo nos uma ementa carnívora – alimenta-se es- plumagem branca e preta e está em pe-
ecossistemas em Portugal”, salienta Fer- sencialmente de coelhos juvenis, ratos, rigo – que devem ser estudadas e apre-
nando, realçando que, deste modo, tor- aves, cobras e ovos –, mas cujo estado sentadas aos mais novos por meio da li-
na-se importante, mais do que nunca, de conservação é pouco preocupante, ao teratura, aliando o rigor científico ao
“trabalhar na consciência de futuro», mas contrário do do lobo ibérico. imaginário infantil.
Henrique
VIII
Ele teve mulheres
de todas as cores...
Havia quem dissesse, na pilhéria, que Henrique era
um ótimo marido até decidir cortar a cabeça à
esposa. Teve seis oficiais e umas poucas de amantes
oficiosas, sendo que as mulheres já eram, quase
todas, suas amantes antes de as núpcias se
concretizarem
TEXTO Afonso de Melo
A
gora, 474 anos após a sua mor- 22 de Abril de 1509 até à sua morte (28 de Janei- mentos. O primeiro com Catarina de Aragão,
te, seria fácil dizer que Martinho ro de 1547). Aquele que foi, para muitos, o mais filha do rei Fernando e da rainha Isabel, de Es-
da Vila compôs a sua feminina importante monarca de Inglaterra, o homem panha, viúva do seu irmão mais velho, Artur,
canção em sua honra: «Já tive que libertou o país do jugo papal e criou a sua que morreu antes de chegar ao trono. Diz-se
mulheres de todas as cores/De própria igreja, a Igreja Anglicana, assumindo- que Catarina foi a mulher que Henrique ver-
várias idades de muitos amo- -se como seu chefe supremo, dissolvendo con- dadeiramente amou, embora não seja fácil de
res/Com umas até certo tempo ventos e mosteiros, primeiro rei a lançar as ba- acreditar tal as tranquibérnias com que embru-
fiquei/Pra outras apenas um pouco me dei/Já ses da marinha que viria a tomar conta dos ma- lhou a sua separação, na altura embeiçado pela
tive mulheres do tipo atrevida/Do tipo acanha- res do mundo, escritor, poeta, compositor, jovem Maria Bolena, irmã da sua segunda mu-
da, do tipo vivida/Casada carente, solteira fe- podia entrar com à vontade na lista dos gran- lher, Ana Bolena. Confuso? Olhe que não. As
liz/Já tive donzela e até meretriz/Mulheres ca- des mulherengos, não fosse o adjetivo, no seu coisas ainda nem começaram sequer a desen-
beças e desequilibradas/Mulheres confusas, de caso, um eufemismo, já que a palavra vem a rolar-se, tenha paciência.
guerra e de paz..» A letra encaixa na perfeição propósito. Henrique vivia obcecado com o legado da fa-
na vida de Henrique VIII, rei de Inglaterra de Para os registos da História somou seis casa- mília Tudor que substituiria a de York no trono >>
AO «HERDAR»,
AINDA MUITO
JOVEM, A VIÚVA
DO IRMÃO,
após a Guerra das Rosas que depôs o seu tio- CATARINA um rapaz cujo pai era Henrique. A hierarquia
-avô Ricardo III. Catarina viveu com Henrique
durante 23 anos mas não foi capaz de lhe dar o DE ARAGÃO, estava assegurada. Jane é que não aguentou a
violência do parto e morreu pouco depois. Hen-
filho que este tanto ansiava. Pariu, por entre um HENRIQUE rique estava demasiado feliz com o jovem
razoável número de abortos espontâneos, uma
menina que ganhou o nome de Maria. Ora, Ca- PERCEBEU COMO Eduardo (que viria a reinar muito brevemente
como Eduardo VI) para se deixar abater pela
tarina tinha uma aia chamada Elizabeth Blount, AS MULHERES morte da mulher. Mas ofereceu-lhe o reconhe-
mais conhecida por Bessie, que passou com
frequência pelo leito real de Henrique e con- ERAM UTILIZADAS cimento eterno ao ordenar que viesse a ser en-
terrada a seu lado quando chegasse a hora.
seguiu dar-lhe o tão desejado rapaz, Henrique
Fitzroy, o único filho ilegítimo que se conhece Escolha à distância
da tão ativamente sexual figura. Mas Bessie não Solto durante dois anos, Henrique foi empur-
ia além de um entretém perante a nova meni- e que rainha! Nada que deixasse Henrique sa- rado para novo casamento, desta vez mais um
na bonita da corte, Ana Bolena que, juntamen- tisfeito. Dera-se a tantos sarilhos para ter um casamento eminentemente político já que ser-
te com a irmã, Maria, tinha passado uns anos filho homem e saía-lhe mais uma petiza. Mais viria para o aliar ao Duque de Cleves, um dos
ao serviço da rainha de França. Em 1520, já Ma- três ou quatro gravidezes perdidas provoca- Estados do Sacro Império Romano. Puseram-
ria, apesar de casada, caíra sob os encantos de ram o desinteresse crescente de Henrique por -lhe na frente o retrato das duas filhas soltei-
Henrique. Mas Ana, feita de outra cepa, tinha a Ana. Esta já devia saber, por essa altura, de cor ras do duque, Ana e Amélia, e depois de os ob-
ambição de ser rainha e não suportava a ideia e salteado, como funcionava a cabeça do so- servar atentamente, o rei optou por Ana, que
de se ficar pelo papel de amante. berano, mas não foi suficientemente inteli- lhe parecia mais bonita. Terrível engano! Quan-
Era necessário, para isso, afastar Catarina do gente para seguir o percurso elegante da sua do desembarcou em Londres, no dia 1 de Ja-
trono. Tarefa nada fácil. Bem pôde Henrique predecessora Catarina. neiro de 1540, Ana de Cleves apresentou-se ao
suplicar ao Papa Clemente VII que lhe dissol- Quando Henrique começou a mostrar-se pu- vivo em toda a sua feiúra. Para a História fica-
vesse os votos contraídos pela Igreja, que de blicamente acompanhado pela nova conquis- ria como The Ugly Queen. Henrique, sentindo-
Roma só ouviu a palavra NÃO. No ano de 1527, ta, Jane Seymour, Ana deixou-se dominar pelo -se enganado, explodiu de fúria. Quis recusar
o Vaticano foi invadido por Carlos V, Impera- monstro dos olhos verdes do ciúme, como lhe o enlace, mas as negociações estavam dema-
dor do Sacro Império Romano, e Clemente teve chamou Shakespeare, o autor que não tarda- siado adiantadas. Cinco dias depois, havia uma
de refugiar no Castelo de Sant’Ângelo. De mal ria a ser utilizado como arma política para a nova rainha em Inglaterra e, seis meses mais
a pior, tendo em conta que Carlos era o sobri- união dos povos britânicos, o primeiro verda- tarde, já não havia outra vez: Ana aceitou uma
nho preferido de Catarina. Dois protestantes deiro historiador de Inglaterra, embora historia- muito razoável fortuna em troca do divórcio e
com grande peso nas opiniões de Henrique, dor mais romântico do que fiel. Henrique VIII de continuar a viver na corte inglesa com o es-
Thomas Cranmer e Thomas Cromwell, acon- já estava mais do que preparado para resolver tatuto de King’s Sister.
selharam o rei a romper o casamento com base o problema da sua segunda esposa. Acusou-a
no facto de Catarina já ter consumado um ca- de adultério e de traição e fez-lhe rolar a cabe- Umas atrás das outras
samento anterior, com Artur, embora esta ga- ça no cadafalso sem que ela tivesse sequer tido Ainda nesse ano de 1540, Henrique voltou a ca-
rantisse a pés juntos que era absolutamente vir- tempo para se defender das blasfémias rapida- sar-se, desta vez com a lindíssima (para os seus
gem quando aterrara na cama do novo rei. Es- mente espalhadas pelos labirintos da corte. O parâmetros) Catarina Howard. Uma garota de
tando-se nas tintas para o Papa, Henrique alegre viúvo casou menos de uma semana após apenas 19 anos, aia da sua ex-mulher Ana, que
nomeou Cranmer Arcebispo de Canterbúria a morte da consorte. não tardou muito a traí-lo, como seria de es-
que, nessa função, formou um tribunal religio- Jane Seymour tinha serpenteado, no verda- perar. Com a idade e o advento da hidropisia,
so que permitiu, por unanimidade, o divórcio deiro sentido do termo, por entre as damas de Henrique deixara de ser um homem atraente e
requerido. Em 1533, Ana Bolena era coroada companhia tanto de Catarina como de Ana. Sa- transformara-se numa figura monstruosa, gor-
rainha de Inglaterra. Tudo rolava sobre as re- bia tudo sobre as más-línguas e como colocá- díssimo e incapaz de se deslocar pelos próprios
gras da vontade do caprichoso Henrique. -las ao seu serviço. Além disso, a sua mãe era pés. «A rosa sem espinhos», como chamava à
prima direita da mãe de Maria e Ana Bolena, e sua segunda Catarina, tornou-se um espinho
Mais uma rapariga! as meninas tinham sido educadas juntas na in- cravado na sua garganta escondida pela pela-
Oficializada a independência inglesa do pa- fância, o que dá bem ideia do calibre da sua ca- gem do duplo queixo. Com o tempo veio a des-
pado, Ana trouxe ao mundo uma legítima nalhice. Além disso, e o que verdadeiramente cobrir que Catarina não se limitava a traí-lo: era
criança, Isabel, que viria um dia a ser rainha, interessava, conseguiu, finalmente, ser mãe de uma rapariga promíscua que conhecia o leito >>
2. 3.
1.
1. Imagem irónica para um rei que viveu por entre ironias – Henrique VIII de mão estendida para uma garrafa 2. O monarca que desafiou o papado e
separou a Igreja inglesa do Vaticano 3. O pequeno Eduardo – ninguém diria que foi educado para ter uma vida dedicada ao sacerdócio
2. 3.
JOSÉ CABRITA
SARAIVA
N Grosso
a semana passada escrevi aqui so- Mas recentemente descobri que talvez modo, Pessoa estaria a dizer qual-
bre Dark Star Safari – Overland não seja bem assim. Talvez Pessoa nos qui- quer coisa como isto: que Torga tinha
from Cairo to Cape Town, de Paul sesse antes dizer que para ser um bom sensibilidade de poeta mas não sabia de-
Theroux. Uma das coisas de que poeta não basta sentir, ou transmitir sen- pois separar a sensibilidade da inteligên-
não gostei no livro foi a insatisfação quase timentos: há que transmutar esses senti- cia, distanciar-se dos sentimentos para os
permanente do autor, sempre a pensar no mentos em matéria literária para que pro- transformar, através da razão, em maté-
próximo destino, numa espécie de fuga para duzam o efeito pretendido no leitor. ria poética.
a frente sistemática. Darei um de muitos Essa mesma ideia aparece num texto re- Esta reflexão, de resto, mereceria ao au-
exemplos possíveis: «Não tinha pressa – produzido no livro Cartas para Miguel Tor- tor da Mensagem uma segunda carta, em
não me esperavam em lado nenhum – e, ga (org. Carlos Mendes de Sousa, ed. D. que desenvolveu essa teoria – mas que
no entanto, sempre que chegava a uma ci- Quixote). Trata-se de uma carta em que o nunca chegou a enviar.
dade africana queria partir de imediato». famoso poeta agradecia um livro que lhe No comentário a Rampa, livro de poe-
Esta ânsia de partir fez-me lembrar uma fora enviado pelo debutante. mas de Torga, Pessoa tratou da separação
conhecida música de António Variações («só «Muito agradeço o exemplar do seu livro ‘Ram- entre a sensibilidade e a inteligência. Na
estou bem aonde eu não estou») e um não me- pa’. Recebi-o já há alguns dias. Só hoje posso es- ‘Autopsicografia’, dizia que «o poeta é um
nos conhecido poema de Fernando Pessoa: crever para lho agradecer. Li-o, porém, logo que fingidor» e falava do «comboio de corda»
«Não pertencer nem a mim! o recebi. Li-o e gostei dele». que «gira a entreter a razão».
Ir em frente, ir a seguir, Palavras simpáticas que deveriam ter Talvez não se trate de um acaso. O livro de
A ausência de ter um fim enchido o jovem Torga de orgulho. Mas Torga foi publicado em Coimbra em abril de
E da ânsia de o conseguir». logo em seguida Pessoa dizia algo que dei- 1930 e a carta de Pessoa é de 6 de junho de
xou o destinatário irritadíssimo: desse ano. Já a ‘Autopsicografia’ está data-
‘Viajar! Perder Países!’ era um dos dois «A sua sensibilidade é de tipo igual à do José da de 1 de abril, dia das mentiras, de 1931, e
poemas de Pessoa que a minha professo- Régio – é confundida em si mesma, com a inte- foi publicada pela primeira vez em novem-
ra de Português do 12.º ano considerava ligência. O que em si é ainda por aperfeiçoar é o bro de 1932, na revista Presença. Terá Pessoa,
que todos devíamos saber de cor. O outro modo de fazer uso dessa sensibilidade. Há que depois de espicaçado pelo livro de Torga, fi-
era ‘Autopsicografia’. separar mais os dois elementos que naturalmen- cado cerca de um ano a ‘ruminar’ sobre o
te a compõem; ou que confundi-los ainda mais. assunto, até destilar a sua visão num poema?
Afeganistão
Um avião militar ameri-
cano transportou mais do
triplo de passageiros per-
mitidos, levando 640 afe-
gãos para o Qatar. Milha-
res de afegãos continuam
a tentar fugir após os tali-
bãs terem conquistado o
país. O aeroporto de Ca-
bul foi o principal palco
do terror e desespero.
Madonna: 63 anos
da Rainha da Pop
Madonna Louise Veronica
Ciccone celebrou 63 anos
no dia 16 de agosto. Com
mais de 30 anos de car-
reira, a Rainha da Pop é
desde a década de 1980
considerada uma das
cantoras mais conhecidas
do mundo. É também
compositora, atriz, baila-
rina, produtora musical
e empresária.
O CORAÇÃO
MULTICULTURAL
DE CURAÇAO
Uma colónia holandesa das Caraíbas tornou-se
um grande polo esclavagista. Acolheu judeus
sefarditas que se haviam refugiado da Inquisição
em Amesterdão e Recife e assimilou influências
das povoações portuguesas e espanholas com que
comerciava. No âmago desta fusão cultural secular
esteve sempre a sua velha capital: Willemstad
P
rovou-se quase imediata a teração evoluiu para tagarelice. Sem que numa das ruas de Punda mas, com o mapa
sensação de intimidade com o esperássemos, quanto mais os ouvíamos estudado, sabíamos que era curta a dis-
a nova escala do périplo cari- mais nos parecia identificarmos sons e pa- tância entre ambas. Metemo-nos a cami-
benho que havíamos inaugu- lavras. Evitamos precipitar-nos. No en- nho. Pouco depois, confrontamo-nos com
rado quase quatro meses an- tanto, entre tantas outras expressões e ter- o canal de Sint Annabaai que nos separa-
tes. Tínhamos aterrado, fazia mos do crioulo local, continuaram a re- va de Punda.
uma meia hora, provindos de petir ‘tá bom’ e ‘tio’, estes, bem mais que A sudeste, como em redor, o céu man-
Port of Spain, Trinidad. Na deslocação en- alguns outros. tinha-se limpo e azulão, condizente com
tre o aeroporto e o centro de Willemstad, Quando chegamos ao destino final de a atmosfera seca e ventosa que se fazia
metemo-nos numa carrinha estilo Hiace, Otrobanda, estávamos convictos a dobrar sentir. Percorriam-no, apenas, caravanas
daquelas bem populares e económicas, que da influência do português no papiamen- velozes de pequenas nuvens brancas.
acolhe passageiros pelo caminho. to, o dialeto oficial de Curaçao e de Aruba, Este firmamento em fundo reforçava a
Sentados em lugares dianteiros, escuta- também falado em Bonaire, a ilha B do fa- elegância arquitetónica e, àquela distân-
mos os diálogos entre as passageiras de to- moso trio ABC do Caribe Holandês. cia, sobretudo cromática, da Handelska-
dos os dias e o condutor, que as conhecia Saímos na derradeira paragem de Otro- de, a marginal encerrada por uma linha
de ginjeira. De conversa de ocasião, a in- Banda. Tínhamos marcado alojamento de prédios históricos exuberantes.
Metemo-nos pela ponte móvel Rainha escritório’ por completar e os dias em Cu- Ciosos de que Espanha – ou outro qual-
Emma que, nos dias seguintes, havería- raçao ainda em aberto, já não saímos. quer rival colonial – poderia almejar a
mos de cruzar vezes sem conta. Sentimos, O dia seguinte amanhece igual. Apro- ilha, os novos donos apressaram-se a er-
pela primeira vez, o seu estranho menear. veitamo-lo ao máximo, com deambula- guer muralhas. Três décadas mais tarde,
A ponte deixa-nos de frente para o que nos ções longas e aturadas por praticamente até à abolição holandesa do esclavagis-
pareceu o mais intrincado dos edifícios do todas as ruas e ruelas; para começar, as da mo, Willemstad manteve-se o principal
conjunto. Punda em redor. polo de comércio de escravos da Holan-
O Penha faz de sede de um dos comer- Ditaram o tempo e a história que Wil- da, capturados ou adquiridos no litoral
ciantes de produtos de beleza pioneiros lemstad se desdobrasse em áreas bem de- oeste de África, vendidos para os restan-
das Caraíbas, de portas abertas desde 1708. marcadas. Essa sua diversidade só lhe tes territórios coloniais das Caraíbas e das
Surge à entrada da espécie de centro co- granjeia interesse. Américas.
mercial histórico instalado ao longo da Punda foi a primeira zona a surgir, a Este comércio fez aumentar a popula-
Breedestraat, a via pela qual prossegui- partir de 1634, o ano em que os holande- ção de Punda a grande ritmo. O potencial
mos a caminhada. ses conquistaram Curaçao aos espanhóis. da colónia atraiu novos comerciantes. No
Damos entrada nos aposentos já sobre O seu nome derivou do holandês de punt, final do século XV, o rei D. Manuel decre-
as quatro da tarde. Com trabalho de ‘tipo a Ponta. tou a expulsão de todos os judeus que não >>
1.
se convertessem ao catolicismo. Em 1497, Os judeus instalaram-se e aos seus pro- bano de Willemstad, repleto de prédios de
cerca de vinte mil judeus concentraram- líficos negócios em Punda. quatro e cinco andares de corres garridas,
-se no porto de Lisboa, decididos a partir. Com eles, o número de lares e edifícios culminados por águas furtadas com facha-
Muitos, rumaram ao norte da Europa, so- comerciais aumentou sobremaneira. De da recortada, numa óbvia transposição da
bretudo Alemanha e Países Baixos. Dos tal forma, que as autoridades se viram obri- arquitetura de Amesterdão e de outras par-
Países Baixos, uma parte atravessou o gadas a aprovar a expansão da colónia para tes da metrópole holandesa. E, a despon-
Atlântico e instalou-se na Nova Holanda, fora das muralhas, a uma distância de cer- tar do conjunto, a sinagoga de Curaçao, er-
o território do norte do Brasil ocupado e ca de 500 metros que permitisse aos ca- guida pelos judeus sefarditas chegados da
explorado pela Companhia Holandesa das nhões do Forte Amesterdão alvejar navios Holanda e do Brasil, hoje, a sinagoga mais
Índias Ocidentais. ao largo, sem edifícios pelo meio. antiga das Américas, com piso de areia,
No contexto complexo de disputa do Essa nova povoação, Pietermaai, esten- como se tornou hábito nas Caraíbas.
norte do Brasil entre Portugal, a Holanda deu-se para sudeste de Punda e do braço Lá nos sentamos e acompanhamos a
e Espanha, Portugal prevaleceu. Na se- de mar de Waaigat que a delimita a norte. dissertação de um rabi norte-americano
quência, o Tribunal do Santo Ofício Por- Dia após dia, deambulamos por ambos. que a desbobinava tim-tim por tim-tim
tuguês dedicou-se a identificar e a casti- Confirmamos em Punda o perfil mais ur- a cada novo grupo de visitantes.
gar os judeus que tinham fugido da sua Em Pietermaai, predominam as viven-
ação na Europa. das, envelhecidas, senhoras de uma des-
Milhares de sefarditas recém-chegados lumbrante decadência colonial. Algumas,
à Nova Holanda voltaram a fugir. Muitos, foram transformadas em bares e restau-
rumaram a Nova Amesterdão (mais tar- rantes que combinam mobília velha, mas
de, Nova Iorque). Outros, dispersaram-se
por colónias caribenhas e das Índias Oci-
O PAPIAMENTO elegante com murais, pinturas e outras
decorações criativas.
dentais. A começar por Curaçao. ADVÉM DA Willemstad é, toda ela, uma deslum-
A componente portuguesa e crioula-
-portuguesa do dialeto papiamento ad- LINGUAGEM brante galeria de arte de rua, repleta de
murais tridimensionais, que aproveitam
vém da linguagem introduzida pelos ju-
deus sefarditas, mas também dos diale-
INTRODUZIDA as formas de contadores de água e outros
recursos criativos inspiradores. Devido aos
tos falados pelos escravos chegados de PELOS JUDEUS preços hiper inflacionados, a sua margi-
territórios portugueses, da atual Guiné-
-Bissau de Cabo Verde e até de São Tomé SEFARDITAS nal está reservada aos passageiros dos cru-
zeiros. Mais para dentro, os inevitáveis
e Príncipe. MAS NÃO SÓ franchises multinacionais também marcam
3.
presença. Malgrado as sucessivas marés Por essa altura, devido a uma qualquer seu antropológico Kurá Hulanda, que exi-
de turistas desembarcados, Willemstad necessidade da navegação, as autoridades be e explica a história do tráfico esclava-
preserva alguns recantos antigos e genuí- portuárias mantinham a ponte móvel re- gista do Atlântico. Guia-nos Yflen Floren-
nos. A tasquinha que anuncia petiscos de colhida. A substituí-la, colocaram ao dis- tina, ela própria, descendente dos escra-
‘kuminda krioyo’ que identificamos sem por um pequeno ferry com convés eleva- vos radicados em Curaçao.
grande esforço: os ‘pastechi’, ‘serbes i re- do. Agradados com a variante, cumprimos Subimos a níveis mais elevados de Otra-
fresco’, ‘pan ku krokèt’, ‘ku frikandel’ ou a viagem no seu cimo. Uma e outra vez. banda, entre vivendas arejadas, aqui e ali,
‘ku hotdog’. Noutros estabelecimentos, a Para cá e para lá, até nos fartarmos. à conversa com os seus moradores, às
excêntrica sopa tradicional de iguana tam- Por fim, desembarcarmos à descober- tantas, com tentativas esforçadas de em-
bém servida na Plasa Bieu!, a extensão ta de Otrobanda, o bairro oposto de Pun- pregarmos uma ou outra expressão do pa-
gastronómica do Old Market. da, seu rival quase espelhado se bem que piamento.
Há uns poucos anos, este mercado con- sem o mesmo deslumbre arquitetónico Até que escurece. Descemos de volta
tava com uma ala flutuante de frutas e ve- do lado de lá da Sint Anna Bay, tratado para a Sint Anna Bay. Da sua beira, admi-
getais sobre as águas de Waigaat que de- por ‘lado hispânico’, por conta do perfil ramos a iluminação artificial da frente de
pendia da chegada de produtos e de ven- dos seus habitantes. Lá visitamos o mu- Handelskade destacar-se do crepúsculo.
dedores da vizinha Venezuela. Deixou de Voltamos a passar para lá, pela ponte que
funcionar quando o presidente Nicolás está de novo operacional.
Maduro ordenou o fecho das fronteiras Regressamos às margens de Waigaat.
com as ilhas ABC. Condenados pela mi- Aventuramo-nos por Scharloo, o quarto
séria que se alastra na sua nação, os vene- bairro de Willemstad, na génese, uma
zuelanos continuam a chegar, muitos de-
les (quase todos) por meios ilegais. Ins-
WILLEMSTAD plantação abandonada onde, mais tarde,
os mercadores judeus abastados ergue-
talam-se e enriquecem o caldeirão étnico É UMA ram as suas villas. Evoluiu, assim, para se
e cultural secular de Curaçao.
Ao entardecer, sentados numa das es- DESLUMBRANTE tornar o setor ‘grãfino’ da cidade, até que,
por volta de 1960, entrou noutro dos de-
planadas da Handelskade, ouvimos al-
guns deles tagarelar no castelhano suave
GALERIA DE ARTE liciosos declínios da ilha.
Lá nos sentamos numa esplanada po-
do sul do Caribe. E, pouco depois, pren- DE RUA, REPLETA pular. Saboreamos cervejas Brion gela-
darem os clientes com uma cantoria ge-
nerosa de rumba, reggaeton e outros su- DE MURAIS das. Tínhamos o tempo por nossa conta.
Willemstad e Curaçao mereciam muito
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