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Vídeo sob Demanda no Lar:


Ficção ou Realidade? 

N os últimos anos, tem-se observado uma grande popularização do termo


multimídia. O conceito é propalado a quatro ventos mas seu significado, apesar de
simples, em geral não é claro. Multimídia, de modo geral, é uma referência a uma
sub-área das ciências tecnológicas que estuda os problemas inerentes ao
armazenamento, recuperação e transmissão de texto, sons, imagens e vídeo
digitalizados. A mídia é dita múltipla porque texto, sons e imagens são codificados
e armazenados de formas distintas. Observe que a noção dominante hoje é que
objetos multimídia são objetos digitais (embora, no caso da TV comum e do
cinema, este não seja o caso).

A grande maioria dos programas atualmente disponíveis no mercado de computadores


pessoais inclui facilidades multimídia provendo, pelo menos, texto e imagens. Ademais,
muitos deles proveem ainda sons. Entretanto, poucos destes programas proveem facilidades
de vídeo animado (tal como a TV e o cinema) e, quando o fazem, o produto final é sempre
de qualidade baixa. A razão central é que lidar com vídeo digital não é tarefa trivial.

A TV convencional utiliza tecnologia analógica, ao invés de digital, para o


armazenamento, a transmissão e a exibição de vídeo animado. Entretanto, vídeo digital
provê qualidade melhor na transmissão e exibição de filmes. Para obter tal exibição
superior, o usuário terá que se livrar de sua TV analógica e adquirir um novo aparelho de
TV digital. Isto não vai acontecer da noite para o dia, mas acontecerá. Se você tem dúvidas,
lembre-se do caso do CD digital a laser que aniquilou com a indústria de discos fabricados
com vinyl. Dado que a revolução de TV analógica para digital é irreversível, há que se
perguntar o que ocorrerá com o mercado de vídeo sob demanda.

V ídeo sob demanda é uma referência a toda forma de distribuição de filmes na qual o
usuário final determina, sob demanda, o que ele quer ver. Para exemplificar, a TV comum
não se constitui em vídeo sob demanda pois o usuário é obrigado a ver uma programação
que está pré-estabelecida. O máximo que o usuário pode fazer é selecionar canais. Se o
programa que ele gostaria de ver não está no ar, o usuário nao tem como requisitá-lo (isto é,
solicitá-lo sob demanda). A locadora de vídeo, por outro lado, permite ao usuário selecionar
o filme de sua preferência dentre uma coleção de filmes disponíveis. Entretanto, ir à lojinha
de vídeo implica que horas podem se passar desde o momento em que o usuário decide ver
um filme e o momento em que ele/ela finalmente se senta à frente da TV para assistí-lo.
Devido à esta grande latência, o serviço das locadoras de vídeo não é normalmente
considerado como um serviço de vídeo sob demanda.

E m sua forma mais essencial, o serviço de vídeo sob demanda implica que o usuário
pode se sentar à frente de seu aparelho de TV em casa e, naquele momento, pesquisar uma
lista de filmes disponíveis, selecionar o filme de sua escolha, e começar a assistí-lo
imediatamente. Um serviço que provê tal conforto e flexibilidade tem apelo comercial claro
e deverá se popularizar no futuro. Entretanto, apesar de tecnologicamente executável, o
serviço de vídeo sob demanda ainda não é uma realidade. O único serviço que provê
funcionalidade que lembra a do serviço de vídeo sob demanda é a propalada TV digital.
Infelizmente, o serviço é fundamentalmente um serviço convencional de TV analógica
onde somente a transmissão é digital. A transmissão é por difusão (como o sistema
convencional) o que implica que o número de filmes disponíveis é limitado, pré-
selecionado e com hora marcada para se iniciar.

O serviço de vídeo sob demanda não é ainda uma realidade comercial por razões
diversas tais como: a complexidade do serviço, a ausência de canais de comunicação
apropriados até o lar, a complexidade de se produzir servidores de vídeo, o alto custo
inerente e a alta competividade do serviço convencional de locação de fitas. Transmitir
vídeo digitalizado comprimido requer canais de 2 mega bits por segundo conectando o
servidor de vídeo ao lar. Atualmente, é simplesmente muito caro prover lares com canais de
tal velocidade. Uma solução para este problema pode vir com a adaptação da malha de TV
a cabo que já se encontra instalada.
O problema de se fazer o vídeo chegar até a casa do consumidor a custo aceitável é
enorme, mas não é o único. Há que se cuidar também da construção de servidores de vídeo
que possam atender a dezenas (ou centenas) de requisições simultâneas por filmes distintos.
O problema não é trivial e tem sido objeto de intensa investigação por parte da comunidade
cientifíca internacional. Por fim, mesmo com servidores de vídeo disponíveis, é necessário
lidar com a competição proporcionada pelas locadoras de vídeo cujo serviço é de boa
qualidade e de custo muito baixo.

D e nossa discussão acima, fica claro que construir servidores de vídeo é tarefa
complexa. Apesar disto, como muitos destes servidores serão necess'rios para cobrir
grandes áreas metropolitanas, é altamente desejável que tais servidores tenham custo baixo.
Em nosso entendimento, isto implica que tais servidores devem ser implementados em
equipamento de baixo custo como, por exemplo, os populares PCs. Neste sentido, o
Departamento de Ciência da Computação da UFMG (DCC/UFMG) tem suportado um
projeto de desenho e construção de um servidor de vídeo sob demanda utilizando uma rede
de PCs. Este esforço é parte do projeto ALMADEM, Aplicações e Análise de Algoritmos
de Redes Multimídia de Alto Desempenho, financiado pelo programa PROTEM-III do
MCT. O projeto agrega pesquisadores de 7 instituições distintas, está programado para
durar 2 anos e tem financiamento total de R$ 715.000,00

O servidor de vídeo do projeto ALMADEM deverá suportar entre 60 e 100 requisições


de vídeo simultâneas por computador servidor. Numa rede com 4 servidores, entre 240 e
400 requisições de vídeo poderão ser suportadas o que deve ser bastante para atender
vizinhanças como, por exemplo, um pequeno bairro. O equipamento em que tais servidores
executam são PCs convencionais dotados de discos de alta velocidade. Cada um destes PCs
tem atualmente um custo médio da ordem de R$8.000,00. O primeiro protótipo de nosso
servidor de vídeo sob demanda encontra-se em fase final de conclusão e foi demonstrado
em Maio de 1998 no Rio.

C om servidores de vídeo sob demanda executando em equipamento de baixo custo, o


problema central passará a ser o de fazer os filmes chegarem até o lar. Como já enfatizado,
parece-nos que a melhor abordagem para lidar com este problema é adaptar a malha de TV
a cabo que já se encontra instalada. A solução não é trivial pois implica em alterar a
mecânica de distribuição que deixa de ser por difusão. Ademais, é necessário transmitir
sinais de controle do lar para as centrais servidoras o que não é possível atualmente.
A pesar de todos estes desafios tecnológicos, a aplicação de vídeo sob demanda vem
para ficar. Serviços de vídeo sob demanda não vão se tornar realidade amanhã mas, se a
história recente de introdução de inovações tecnológicas no mercado de diversões servir de
espelho, vídeo sob demanda é uma tecnologia destinada ao triunfo comercial.

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