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CURSOS TÉCNICOS INTEGRADOS

(P5)

Nome: _______________________________ Curso: _______________________

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f orem os meios empregados: eletrônicos, mecânicos, fotográficos, gravação ou quaisquer meios.

Hugo L P Magalhães

E-mail: hugo.magalhaes@ifce.edu.br

2022

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Prof. Hugo Magalhães Gramática e Literatura Brasileira
DISCIPLINA: LÍNGUA PORTUGUESA V
Código:
Carga Horária Total: 40h CH Teórica: 40h CH Prática: -
CH - Prática como Componente Curricular do ensino: -
Número de Créditos: 2
Pré-requisito: -
Correquisito: -
Semestre: 5
Nível:
EMENTA

Conceito de frase, oração e período. Estudo da estrutura do período composto: orações


coordenadas e subordinadas. Textos dos períodos pré-modernista, vanguardista e da 1ª
e 2ª fases modernistas, com foco nos gêneros reportagem, entrevista e manifesto que
possam ser encontrados nesses momentos literários ou que, sendo atuais, guardem com
eles correspondência temática.

OBJETIVOS
Objetivos Gerais

▪ Reconhecer e produzir períodos compostos bem estruturados, do ponto de vista


sintático, e adequados ao contexto, do ponto de vista semântico;
▪ Apropriar-se do conceito e da estrutura dos gêneros reportagem, entrevista e manifesto,
distinguindo as especificidades desses gêneros em épocas distintas;
▪ Conhecer textos produzidos sob a estética modernista e seus antecessores.

Objetivos Específicos

▪ Utilizar, a partir da escolha consciente e intencional, conjunções e pronomes relativos


que estabeleçam a melhor relação em face do propósito comunicativo;
▪ Proceder à escolha consciente e intencional de períodos simples ou compostos na
construção do texto;
▪ Ler e discutir obras literárias do Pré-Modernismo, das vanguardas europeias e da 1ª e
2ª fases do Modernismo, compreendendo seu contexto de atuação e suas formas
majoritárias de expressão;
▪ Analisar e produzir reportagens, a partir de temas estudados no semestre.
PROGRAMA
• Gêneros reportagem, entrevista e manifesto.
• Pré-Modernismo, vanguardas e 1ª e 2ª fases modernistas.
• Período simples e composto: orações coordenadas e subordinadas.
• Produção de texto: reportagem.
• Leitura obrigatória: Bruzundanga e Vidas Secas.

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Prof. Hugo Magalhães Gramática e Literatura Brasileira
METODOLOGIA DE ENSINO

Aulas expositivas dialogadas; discussões; apresentações orais; estudos dirigidos ,


resumos de textos e livros; produções textuais; atividades práticas; pesquisas em livros
e na internet; projeção de filmes e encenação com base nos autores e escolas estudadas
em literatura.
RECURSOS
Material didático-pedagógico:
• Livro didático (coleção escolhida pelo corpo docente de Língua Portuguesa);
• Apostila elaborada pelo professor-regente;
• Fotocópias;
• Jornais virtuais ou impressos atuais.

• Recursos audiovisuais:
• Lousa digital;
• Datashow.

AVALIAÇÃO
O processo de avaliação está diretamente ligado aos objetivos específicos de cada
atividade desenvolvida pelo trabalho em sala e pelo trabalho que o aluno desenvolve em
casa. Será, portanto, um instrumento de interação entre o professor e o aluno no
processo de ensino-aprendizagem, por meio de constante observação, durante a qual o
professor poderá direcionar estratégias de ensino, buscando a efetiva apreensão do
conteúdo por parte do aluno.

A diversidade de atividades propostas pelo professor facilitará a verificação efetiva do


processo ensinar-aprender.

Os alunos poderão ser avaliados através de:

▪ Provas e listas de exercícios;


▪ Apresentações orais;
▪ Participação em sala;
▪ Seminários;
▪ Produção textual.
BIBLIOGRAFIA BÁSICA
ANTUNES, I. Muito além da gramática: por um ensino de línguas sem pedras no
caminho. São Paulo: Parábola, 2007.
BAGNO, M. Preconceito linguístico: o que é, como se faz. São Paulo: Edições Loyola,
2007.
BAKHTIN, M. Os gêneros do discurso. In: Estética de criação verbal. São Paulo: Martins
Fontes, 1992.
BECHARA, E. Gramática Escolar da Língua Portuguesa. Rio de Janeiro: Nova
Fronteira, 2010.
BRASIL, Secretaria de Educação Básica: Parâmetros Curriculares Nacionais para o
Ensino Médio. Brasília: MEC/SEF, 2007.
FARACO, C. E.; MOURA, F. M de; MARUXO, J. H. J. Língua portuguesa: linguagem e
interação - 2 ed. - São Paulo: Ática, 2013.
FIORIN, J.L; SAVIOLI, F. P. Para entender o texto: Leitura e Redação. 18 ed. São Paulo:
Ática, 2007.
NICOLA, José de. Literatura brasileira: das origens aos nossos dias. São Paulo:
Scipione, 1998.

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LÍNGUA PORTUGUESA – V (40H/A)

CONTEÚDO PROGRAMÁTICO

1 NOÇÕES DE SINTAXE.................................................................................................... 05

2 COORDENAÇÃO E SUBORDINAÇÃO........................................................................... 09

3 COORDENAÇÃO DE ORAÇÕES.................................................................................... 12

4 PARALELISMO: SINTÁTICO E SEMÂNTICO................................................................. 17

5 ORAÇÕES SUBORDINADAS: SUBSTANTIVAS E ADJETIVAS................................... 20

6 ORAÇÕES SUBORDINADAS ADVERBIAIS................................................................... 26

7 PRÉ-MODERNISMO......................................................................................................... 33

8 VANGUARDAS EUROPEIAS........................................................................................... 51

9 MODERNISMO: 1ª FASE.................................................................................................. 59

10 MODERNISMO: 2ª FASE.................................................................................................. 79

11 REPORTAGEM.................................................................................................................. 107

12 ENTREVISTA..................................................................................................................... 114

13 MANIFESTO.................................................................................................................... .. 114

14 REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS................................................................................. 122

15 GABARITO......................................................................................................................... 122

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Disciplina: Português V – AULA 1
Conteúdo: NOÇÕES DE SINTAXE: PERÍODO COMPOSTO
NOÇÕES DE SINTAXE
A sintaxe se ocupa de estudar as palavras agrupadas em segmentos que cumprem funções específicas no
discurso e as relações entre os segmentos;

É o estudo das relações que as palavras estabelecem entre si nas orações e das relações que se
estabelecem entre as orações nos períodos;

A sintaxe estuda a relação de combinação existente entre as palavras e orações;

“A palavra estudada não em suas partes, ou em seus elementos mórficos, mas em grupo, em sociedade;
(...) mas se todo sintático é grupal, nem todo grupal é sintático, porque os elementos devem combinar -se
funcionalmente, relacionando-se uns com os outros” (MACAMBIRA, 1993, p. 18)

O garoto comeu a carne de frango

A construção é grupal e sintática, pois as palavras constituem um todo interdependente e significativo. Já


em

Garoto o comeu carne a frango de.

a construção é grupal, mas não é sintática, já que os elementos constituintes não são interdependentes, isto
é, não são significativamente, funcionalmente associados.

Por outro lado, quem diz sintático está dizendo funcional, pois a sintaxe estuda a função das palavras
organizadas em grupos.

Cada palavra desempenha uma função na frase.


Vejamos o caso do substantivo rato.

1. O rato fugiu.
2. O gato comeu o rato.
3. Não gosto de rato.
4. Aquilo é um rato.
5. Tenho medo de rato.
6. Deste animal não gosto: o rato.
7. O queijo foi roído pelo rato.

Perceba que esse substantivo é o mesmo em todas as frases, no entanto, evidentemente, não assume a
mesma função. Isto é, a posição dele é crucial para se saber a exata função sintática que está
desempenhando na oração. Temos, respectivamente, assim: sujeito, objeto direto, objeto indireto,
predicativo do sujeito, complemento nominal, aposto e agente da passiva .

GRAMÁTICA INTERNA(LIZADA)

A gramática interna permite reconhecermos as estruturas convenientes da língua de que fazemos uso. É ela
que dá a cada um de nós a capacidade de rejeitarmos uma dada estrutura (ex.: “*Vejo menina uma linda!”)
e aceitarmos uma outra (ex.: “Me dá um cigarro aí!”), uma vez que o único critério considerado é o de “estar
de acordo com as regras da língua, ser uma das suas unidades ou estruturas”.

Qualquer usuário do português rejeitaria a estrutura “Vejo menina uma linda!”, pelo simples fato de o artigo
“uma” estar após o nome substantivo “menina”, visto que em português o artigo deve preceder o nome
substantivo. Esse mesmo usuário até poderia questionar o uso proclítico (antes do verbo, iniciando uma

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frase) do pronome oblíquo em “Me dá um cigarro aí!”, mas não a rejeitaria. Certamente o que o faria
questionar aquele uso é o conhecimento de um padrão da língua, preconceituosamente denominado “culto”,
o qual considera “errado” iniciar uma frase com um pronome oblíquo “átono”.

1. FRASE

Frase é qualquer enunciado linguístico dotado de sentido completo.

Fogo!

Quem é?

Volta aqui!

Que Deus te abençoe!

Quanto à estrutura, as frases classificam-se em nominais e verbais.

Temos uma frase nominal, quando não há verbo, como: Socorro! Que calor! Quanta sujeira! etc.

Temos uma frase verbal, pois se encerra num verbo, assim como: A Terra gira, Açúcar engorda etc.
Coincidem com período simples (oração absoluta).

2. ORAÇÃO

Oração é a frase que se biparte normalmente em sujeito e predicado, embora falte sujeito em alguns casos.

Choveu hoje de manhã.


A Terra gira em torno do Sol
A chuva está caindo lentamente.

É a estrutura cujo termo central, que é o verbo, conecta os demais termos a ele relacionados. Em geral,
denomina-se qualquer construção que contém verbo ou locução verbal.

3. PERÍODO

Construção sintática em que há um verbo ou mais verbos.

Aquele aluno tirou uma boa nota.

Como essa frase tem verbo, dizemos que se trata de uma oração. Por outro lado, só há um verbo, então se
trata de um período simples ou oração absoluta. Mas em

No aniversário, beberam refrigerante e comeram bolo.

temos uma frase com dois verbos, logo duas orações, portanto um período composto.

4. OBJETO DA SINTAXE

Como vimos, a sintaxe é o estudo da palavra em combinação com outras palavras, de modo que todas estão
funcionalmente associadas. Daí temos a subdivisão:

a) sintaxe de concordância: estudo da harmonização de flexão de número e gênero entre as palavras;


b) sintaxe de regência: estudo da relação de subordinação entre termos regentes e regidos;
c) sintaxe de oração e período: estudo dos termos que constituem a oração e classificação de orações.

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EXERCÍCIOS
1. Analise o texto abaixo e assinale a única alternativa CORRETA:

a) A partir do texto escrito, compreende-se que as embalagens sempre são as mesmas.


b) O anúncio pretende promover um serviço para os consumidores.
c) O texto escrito é composto por um período formado por duas orações.
d) Há dois verbos compondo orações.
e) O anúncio é construído a partir de frases nominais, fazendo uma comparação entre o passado e o
presente.

2. Sobre o trecho a seguir, é CORRETO firmar que

"O tempo voa. Cabe a você ser o piloto!"

a) Trata-se de um período, mas não é uma frase.


b) A 1ª é uma oração absoluta e a 2ª um período composto.
c) Trata-se apenas de um período.
d) As palavras “voa”, “cabe”, “você” e “ser” são verbos, portanto indicam orações.
e) O ponto final une a 1ª oração ao período.

3. Pode-se afirmar que a sintaxe

a) estuda o sistema sonoro de um idioma.


b) estudo da estrutura e formação das palavras.
c) estuda as relações que palavras estabelecem entre si nas orações.
d) estuda o significado e a interpretação do significado de uma palavra, de um signo, de uma frase.
e) estuda os processos de uso da linguagem que permitem a quem fala ou escreve sug erir conteúdos
emotivos.

4. A sintaxe estuda a relação de associação entre os termos da oração, combinando -se funcionalmente.
Marque a alternativa em que essa combinação está devidamente estabelecida.

a) Oferecemos um exemplar de Os Lusíadas ao professor encadernado em couro.


b) Durante o namoro, Carlos pediu que Maria se casasse com ele várias vezes.
c) Quase sempre passo uma semana com meus tios de férias.
d) Estive em São Paulo logo que me casei duas vezes.
e) Vi, da janela do meu quarto, o sol surgir no horizonte.

5. Leia os enunciados abaixo e marque o que é um período composto.

a) Que medo!
b) Ele chutou a porta.
c) O povo odeia os governantes populistas.
d) Coitadinho do garoto que perdeu o cachorro.
e) Transmitirei o recado a sua namorada porque gosto de você.

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6. Aponte a única alternativa abaixo que se trata de uma oração absoluta.

a) Chutou a bola e marcou o gol!


b) As risadas não eram normais!
c) Que alívio, meu Deus!
d) Que voz estranha!
e) Luizinho, não!

7. "Praias, baías e enseadas. Conquistas, batalhas e abandono. Fantasias, lendas e personagens. Fauna e
flora. Não faltam elementos para narrar essa história tão rica e cheia de surpresas como o próprio
protagonista: o arquipélago de Fernando de Noronha." Com base nesse trec ho, é correto afirmar que há

a) uma oração
b) duas orações
c) três orações
d) quatro orações
e) somente frases nominais.

8. "As alterações no regimento foram feitas sem conhecimento dos funcionários, por isso eles solicitaram
uma reunião para reformularem o documento." A respeito do trecho, pode-se dizer que há

a) frases nominais
b) períodos simples
c) orações absolutas
d) período composto
e) período simples e composto

9. Marque a única alternativa em que NÃO há oração.

a) Pedro chegou estressado em casa.


b) Nossa! Pare com tantos comentários indesejáveis.
c) Razão e emoção... as duas vértices da vida.
d) Caso você venha amanhã, traga-me aquele seu vestido vermelho.
e) Não concordo com suas atitudes, pois elas vão de encontro aos meus pr incípios.

10. Observe a imagem abaixo. Apenas duas afirmativas estão corretas. Assinale-as.

a) "A maior linha do Brasil” é uma frase.

b) “Mais de 100 produtos a preço único” é uma oração absoluta.

c) No canto inferior, à direita, consta: "Porque sua saúde é única".


Trata-se de uma oração.

d) “Mais qualidade e energia para a sua vida.” Pode ser classificado


como período composto.

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Disciplina: Português V – AULA 2
Conteúdo: COORDENAÇÃO E SUBORDINAÇÃO
Frase é todo enunciado suficiente por si mesmo para estabelecer comunicação.
Oração, às vezes, é sinônimo de frase ou de período (simples) quando encerra um pensamento completo e
vem limitada por ponto final, ponto de interrogação, de exclamação e, em certos casos, por reticências. O
período que contém mais de uma oração é composto.
Um vulto cresce na escuridão. Clarissa se encolhe. É Vasco. (Veríssimo, 1953:118)
Nesse trecho há três orações correspondentes a três períodos simples ou a três frases. Cada uma delas
encerra um enunciado expresso num arcabouço linguístico em que entram um sujeito (vulto, claro na
primeira, mas oculto na última, e Clarissa) e um predicado (cresce, se encolhe, é Vasco).
Mas nem sempre oração (diz-se também proposição) é frase. Em “convém que te apresses” há duas orações
mas uma só frase, pois somente o conjunto das duas é que traduz um pensamento completo; isoladas,
constituem simples fragmentos de frase, pois uma é parte da outra: “que te apresses” é o sujeito de “convém”.

Quanto à sua estrutura sintática, isto é, quanto à característica da integridade gramatical explícita (existência
de um sujeito e um predicado), a frase pode ser simples (uma só oração independente) ou complexa (várias
unidades oracionais). Pela nomenclatura gramatical (brasileira ou não) vigente e tradicional, também a frase
simples se diz período simples, e a complexa, período composto.

Coordenação e subordinação: encadeamento/hierarquização


Num período composto, normalmente estruturado — isto é, não constituído por frases de situação ou de
contexto —, as orações se interligam mediante dois processos sintáticos universais: a coordenação e a
subordinação. A justaposição, apesar de legitimamente abranger uma e outra, é ensinada no Brasil como
variante da primeira, e a correlação, como variante da segunda.
Na coordenação, que é um paralelismo de funções ou valores sintáticos idênticos, as orações se dizem da
mesma natureza (ou categoria) e função, devem ter a mesma estrutura sintático-gramatical (estrutura
interna) e se interligam por meio de conectivos chamados conjunções coordenativas. É, em essência, um
processo de encadeamento de ideias. Por exemplo:
(1) Na feira, compraram frutas e legumes: aqui temos um conector – e – ligando dois termos: substantivos.

(2) É um aluno bom, mas mal-educado: aqui temos um conector – mas – ligando dois termos: adjetivos.

(3) Estuda ou trabalha: aqui temos um conector – ou – ligando dois verbos: duas orações.

As orações coordenadas, chamadas de independentes, dividem-se em assindéticas (justapostas) e


sindéticas (conectivas). As assindéticas caracterizam-se por não terem em sua estrutura nenhuma
conjunção, nenhuma oração “principal”.
Ex1: Pedro chegou em casa, deitou no sofá, dormiu.

Há nesse período três orações coordenadas assindéticas, independentes entre si.

Já as sindéticas caracterizam-se por terem em sua estrutura uma conjunção coordenada.

Ex2: Pedro chegou em casa e deitou no sofá.

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EXERCÍCIOS
1. Acerca do fenômeno da coordenação, circule a afirmativa correta.

I – há paralelismo de funções ou valores sintáticos idênticos.


II – relação de dependência entre termos ou orações.

2. No fenômeno da coordenação, pressupõe-se encadeamento de termos, estruturas gramaticais ou


orações. Assinale a opção em que há dois termos coordenados.

a) mudanças / irreversíveis
b) clima / ONU
c) irreversíveis / sem precedentes
d) homem / ONU
e) mudanças no clima / sem precedentes

3. Considerando o trecho abaixo, circule a afirmativa verdadeira.

I – Há duas orações coordenadas assindéticas

II – Há duas orações coordenadas sindéticas

4. No trecho abaixo, duas estruturas gramaticais estão em nível de coordenação, sobretudo, com a presença
da conjunção "e". Quais são esses termos?

a) Fifa / Copa
b) confirma / acerto
c) com Globo / por Copa
d) disputa judicial / pagamentos por Copa
e) fim de disputa judicial / acerto de pagamentos

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5. Considere os trechos abaixo e, em seguida, marque a afirmativa correta.

a) há orações coordenadas sindéticas.


b) há orações coordenadas assindéticas.
c) há coordenação de termos e de orações.
d) Somente em 4, há coordenação de orações.
e) Somente em 5, há coordenação de termos.

6. Após a leitura do período interrogativo abaixo, é correto afirmar que há

a) duas orações coordenadas assindéticas.


b) oração coordenada sindética adversativa.
c) oração coordenada assindética explicativa.
d) oração coordenada assindética adversativa.
e) duas orações coordenadas por justaposição.

7. Com base na notícia, é correto afirmar que a conjunção "e" coordena

a) duas orações coordenadas.


b) dois termos: São Paulo / Brasileiro.
c) duas orações coordenadas assindéticas.
d) dois termos: tabu / tempos melhores.
e) três termos: São Paulo / Sport / Brasileiro

8. Após a análise do trecho a seguir, pode-se afirmar que (circule a opção verdadeira)

I – existem orações coordenadas assindéticas.

II – existem orações coordenadas sindéticas.

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Disciplina: Português V – AULA 3
Conteúdo: COORDENAÇÃO DE ORAÇÕES
GRUPOS DAS CONJUNÇÕES COORDENADAS
1) Conjunções ADITIVAS

Estabelecem-se quando mais um item é introduzido num conjunto ou, do ponto de vista argumentativo,
quando mais um argumento é acrescentado a favor de uma determinada conclusão. Opera por expressões
como: e, não só...como também, não só...mas também, tanto...quanto, nem...nem.

Ex1: Pedro estuda de manhã e trabalha à noite.


Ex2: Naquela lanchonete, a vigilância sanitária encontrou ratos e baratas.
Ex3: É importante tanto se alimentar bem quanto praticar exercícios.

2) Conjunções ALTERNATIVAS
Podem ocorrer de duas maneiras: em primeiro lugar, sendo sinalizada pelo ou exclusivo, implica que os
elementos em alternância se excluem mutuamente, ou seja, não admitem que ambas as alternativas sejam
verdadeiras, como se pode ver nos exemplos abaixo:
Ex1: Circule a opção verdadeira ou sublinhe o item correto.
Ex2: Pague o aluguel ou será posto para fora.
Em segundo lugar, a alternância pode ser inclusiva, ou seja, por ela os
elementos envolvidos não se excluem; pelo contrário, se somam.
Ex3: Livro ou apostila podem ser úteis para o aprendizado.

3) Conjunções ADVERSATIVAS

A relação adversidade implica um conteúdo que se opõe a algo explicitado ou implicitado em um enunciado
anterior. Indica oposição, contraste. Opera por meio de expressões como: mas, contudo, porém, entretanto,
todavia, no entanto.
Ex1: O atleta se esforçou ao máximo, mas perdeu a competição.
Ex2: A economia precisa de mais incentivos fiscais. O governo, no entanto, não sinaliza favoravelmente.
Ex3: O candidato não se preparou suficientemente, porém fez uma boa prova.

As adversativas (mas, porém, contudo, todavia, no entanto, entretanto) marcam oposição (às vezes com um
matiz semântico de restrição ou de ressalva). Por serem etimologicamente advérbios — traço já muito
esmaecido em mas, mas ainda vivo nas restantes —, as adversativas, como também as explicativas e as
conclusivas, são menos gramaticalizadas, quer dizer, menos despojadas de teor semântico, do que e, nem
e ou. Sua função de conjunção é, aliás, fato relativamente recente na língua portuguesa, fato de ocorrência
posterior ao século XVIII. Ainda hoje, os dicionários registram entretanto, no entanto e todavia como
advérbios, embora lhes anotem igualmente a função de conjunções.

Por isso, por serem essencial e etimologicamente advérbios, é que no entanto, entretanto, contudo e todavia
vêm frequentemente precedidos pela conjunção e: “Vive hoje na maior miséria e, no entanto, já possuiu uma
das maiores fortunas deste país.”
Ao contrário de mas, que se usa unicamente em começo de oração, as demais conjunções adversativas
podem figurar ou no rosto da oração ou depois de um dos termos dela (ROCHA LIMA, 1999):

(1) Gosto de teatro, porém prefiro cinema.


(2) Gosto de teatro; porém, prefiro cinema.
Note o uso da pontuação; note a posição da conjunção
(3) Gosto de teatro; prefiro, porém, cinema.
(4) Gosto de teatro; prefiro cinema, porém.

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Prof. Hugo Magalhães Gramática e Literatura Brasileira
4) Conjunções EXPLICATIVAS

As explicativas relacionam orações de tal sorte que a segunda encerra o motivo ou explicação (razão,
justificativa) do que se declara na primeira. Essa relação se manifesta linguisticamente pelas expressões:
pois, porque, que.

Ex1: Não se atrase, que a aula já vai começar.


Ex2: Vamos rápido, porque vai chover.
Ex3: No Sul faz frio, pois as temperaturas são baixas.

5) Conjunções CONCLUSIVAS

Acontece sempre que, em um segmento, se expressa uma conclusão que se obteve a partir de fatos ou
conceitos expressos no segmento anterior. Essa relação é sinalizada pelos conectores: logo, portanto, por
conseguinte, assim, então, por isso, sendo assim, assim sendo, por essa razão.
Ex1: Toda pessoa merece dignidade; por isso, respeite o próximo.
Ex2: Lucas resolveu todas as questões da prova e, portanto, tirou nota máxima.

Um texto bem produzido precisa apresentar coesão sequencial, isto é, devemos usar conectivos que ajudam
a delinear as ideias contidas nos enunciados. Muitas vezes, não convém que passemos de uma frase a
outra, ou de um parágrafo a outro, de modo estanque, sem uma palavra/expressão de ligação; faz -se
necessária a presença de um elemento sequenciador no discurso. Veja a diferença:

O funcionário saiu de casa cedo. Chegou atrasado ao trabalho.


O funcionário saiu de casa cedo, mas chegou atrasado ao trabalho.

Os elementos de ligação entre os enunciados são chamados de conectores ou conectivos sequenciais


(alguns estudiosos chamam de “operadores discursivos”). Aqui, no caso, são as conjunções.

Assim, as conjunções realizam a chamada coesão sequencial ou por conexão, que desempenha a função
de promover a sequencialização de diferentes porções do texto. De certa forma, todo recurso coesivo
promove a sequencialização do texto. Neste caso, envolve um tipo específico de ligação: aquela efetuada
em pontos bem determinados do texto (entre orações e períodos) e sob determinações sintáticas mais
rígidas.

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Prof. Hugo Magalhães Gramática e Literatura Brasileira
EXERCÍCIOS
1. Com base na primeira parte do título da notícia, a conjunção expressa

a) causa
b) explicação
c) adversidade
d) consequência
e) alternância

2. "Podem acusar-me: estou com a consciência tranquila." Os dois pontos (:) do período ao lado poderiam
ser substituídos por vírgula, explicitando-se o nexo entre as duas orações pela conjunção:

a) e
b) logo
c) como
d) pois
e) embora

3. Considerando as expressões conectivas destacadas no fragmento “...desejo neste momento NÃO SÓ que
ganhe a Copa do Mundo para que milhões possam viver um sopro de felicidade, MAS TAMBÉM que essa
vitória seja a antecipação de outra felicidade maior...”, é correto afirmar que

a) apresentam valor semântico de adição.


b) expressam valor semântico de explicação.
c) apresentam valor semântico de conclusão.
d) exprimem valor semântico de adição e adversidade.
e) são duas locuções com diferentes valores semânticos.

4. Quanto às possibilidades de conexão entre estas duas orações "Pedro saiu; João chegou" e o emprego
de pontuação, assinale a alternativa correta.

a) Pedro saiu, porém, João chegou.


b) Pedro saiu; porém João chegou.
c) Pedro saiu; João chegou, porém.
d) Pedro saiu; João porém, chegou.
e) Pedro saiu, João chegou porém.

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Prof. Hugo Magalhães Gramática e Literatura Brasileira
5. Há situações em que a conjunção "e", naturalmente, de valor "aditivo", pode não indicar esse sentido.
Identifique qual o sentido dessa conjunção no contexto abaixo.

a) conclusivo
b) adversativo
c) explicativo
d) consecutivo
e) alternativo

6. O termo entre vírgulas, no texto abaixo, não teria o sentido original preservado se fosse substituído por

a) portanto
b) contudo
c) todavia
d) porém
e) entretanto

7. As frases seguintes devem ser transformadas em um só período. Utilize -se dos mecanismos de coesão
adequados para fazê-los. Lembre-se do uso da vírgula e das alterações necessárias.
a) Os alunos dispunham de pouco tempo. Não foi possível concluir a pr ova de Matemática.
_____________________________________________________________________________________
_____________________________________________________________________________________
b) Moramos no mesmo andar. Vemo-nos com frequência. Mal nos falamos.
_____________________________________________________________________________________
_____________________________________________________________________________________
c) O show estava excelente. Meu amigo saiu antes de terminar. Tinha um aniversário para ir.
_____________________________________________________________________________________
_____________________________________________________________________________________

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8. Agrupe as frases abaixo num só período, usando conectivos sequenciais adequados:
O céu está carregado.
Não vamos levar guarda-chuvas.
O serviço de meteorologia avisou que o tempo vai melhorar.
_____________________________________________________________________________________
_____________________________________________________________________________________

9. “Não está claro o motivo pelo qual o diabetes é mais perigoso ao coração das mulheres do que dos
homens, mas existem algumas hipóteses." O termo destacado pode ser substituído, sem que haja prejuízo
semântico ou sintático, por
a) logo

b) porque

c) portanto

d) entretanto

e) porquanto

10. Escreva três possibilidades de unir as duas orações, de forma coerente:

Pedro saiu; João chegou.

1 - _________________________________________________________
2 - _________________________________________________________
3 - _________________________________________________________

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Prof. Hugo Magalhães Gramática e Literatura Brasileira
Disciplina: Português V – AULA 4
Conteúdo: PARALELISMO1: SINTÁTICO E SEMÂNTICO

PARALELISMO SINTÁTICO

Se coordenação é, como vimos, um processo de encadeamento de valores sintáticos idênticos, é justo


presumir que quaisquer elementos da frase — sejam orações sejam termos dela —, coordenados entre si,
devam — em princípio pelo menos — apresentar estrutura gramatical idêntica, pois não se podem coordenar
frases que não comportem constituintes do mesmo tipo. Em outras palavras: a ideias similares deve
corresponder forma verbal similar. Isso é o que se costuma chamar paralelismo ou simetria de construção.
Entretanto, o paralelismo não constitui uma norma rígida; nem sempre é, pode ou deve ser levado à risca,
pois a índole e as tradições da língua impõem ou justificam outros padrões. Trata-se, portanto, de uma
diretriz, mas diretriz extremamente eficaz, que muitas vezes saneia a frase, evitando construções incorretas,
algumas, inadequadas, outras.
Errado: Pelo aviso circular recomendou-se aos Ministérios economizar energia e que elaborassem planos
de redução de despesas.

Nesta frase temos, nas duas orações subordinadas que completam o sentido da principal, duas estruturas
diferentes para ideias equivalentes: a primeira oração ( economizar energia) é reduzida de infinitivo,
enquanto a segunda (que elaborassem planos de redução de despesas) é uma oração desenvolvida
introduzida pela conjunção integrante que. Há mais de uma possibilidade de escrevê-la com clareza e
correção; uma seria a de apresentar as duas orações subordinadas co mo desenvolvidas, introduzidas pela
conjunção integrante que:

Certo: Pelo aviso circular, recomendou-se aos Ministérios que economizassem energia e (que)
elaborassem planos para redução de despesas.

Outra possibilidade: as duas orações são apresentadas como reduzidas de infinitivo:

Certo: Pelo aviso circular, recomendou-se aos Ministérios economizar energia e elaborar planos para
redução de despesas.
Nas duas correções respeita-se a estrutura paralela na coordenação de orações subordinadas.

Mais um exemplo de frase inaceitável na língua escrita culta:

Errado: No discurso de posse, mostrou determinação, não ser inseguro, inteligência e ter ambição.

O problema aqui decorre de coordenar palavras (substantivos) com orações (reduzidas de infinitivo). Para
tornar a frase clara e correta, pode-se optar ou por transformá-la em frase simples, substituindo as orações
reduzidas por substantivos:

Certo: No discurso de posse, mostrou determinação, segurança, inteligência e ambição.

Ou empregar a forma oracional reduzida uniformemente:

Certo: No discurso de posse, mostrou ser determinado e seguro, ter inteligência e ambição.

1 1
Conteúdo adaptado do livro Comunicação em Prosa Moderna: Aprendendo a Escrever, Aprendendo a Pensar, de Othon Garcia Marques,
página 24). Referência bibliográfica: GARCIA, Othon M. Comunicação em Prosa Moderna: Aprendendo a Escrever, Aprendendo a Pens ar. – 27 ed.
– Rio de Janeiro: Editora FGV, 2010.

17
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Em alguns casos, como no seguinte trecho de Carlos de Laet, a ausência de paralelismo não invalida a
construção da frase: “Estamos ameaçados de um livro terrível e que pode lançar o desespero nas fileiras
literárias”. Os dois adjuntos de “livro” — o adjetivo “terrível” e a oração adjetiva “que pode lançar...” —
coordenados pela conjunção “e” não têm estrutura gramatical idêntica. Isso não impede que a construção
seja vernácula, inatacável, embora talvez fosse preferível tornar os dois adjuntos paralelos:

Também seria cabível omitir a conjunção “e”, mantendo-se a oração adjetiva ou substituindo-a por um
adjetivo equivalente: “...um livro terrível, que pode lançar...” ou “...um livro terrível, capaz de lançar...”
Qualquer dessas formas é sintaticamente inatacável; todavia, a que observa o paralelismo parece, do ponto
de vista estilístico, mais aceitável. O mesmo julgamento se pode fazer, quando se coordenam duas orações
subordinadas:
Não saí de casa por estar chovendo e porque era ponto facultativo.

Aqui também se aconselha o paralelismo de construção, se bem que a sua falta não torne a frase incorreta.
Do ponto de vista estilístico, seria preferível que as duas orações causais (“por estar chovendo” e “porque
era ponto facultativo”) tivessem estrutura similar: “por estar chovendo e por ser ponto facultativo” ou “porque
estava chovendo e (porque) era ponto facultativo”.
Caso se adotasse o processo correlativo aditivo (“não só... mas também”), o paralelismo seria ainda mais
recomendável:
Não saí de casa não só porque estava chovendo mas também porque era ponto facultativo.
ou
Não saí de casa não só por estar chovendo mas também por ser ponto facultativo.

No primeiro caso, as duas orações causais são desenvolvidas; no segundo, ambas são reduzidas.
Observou-se assim o princípio do paralelismo gramatical estrito.
PARALELIMO SEMÂNTICO

Atentemos, ainda, para o problema inverso, o falso paralelismo, que ocorre ao se dar forma paralela
(equivalente) a ideias de hierarquia diferente ou, ainda, ao se apresentar, de forma paralela, estruturas
sintáticas distintas:

Errado: O Presidente visitou Paris, Bonn, Roma e o Papa.

Nesta frase, colocou-se em um mesmo nível cidades (Paris, Bonn, Roma) e uma pessoa (o Papa). Uma
possibilidade de correção é transformá-la em duas frases simples, com o cuidado de não repetir o verbo
da primeira (visitar):

Certo: O Presidente visitou Paris, Bonn e Roma. Nesta última capital, encontrou-se com o Papa.

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EXERCÍCIOS

1. Vamos agora tornar as orações adequadas quanto ao paralelismo sintático.

2. Identifique o trecho em que há falta de paralelismo sintático e reescreva-o corretamente.

3. A única alternativa incorreta quanto à reescrita da oração: “É muito comum vermos, nas esquinas
brasileiras, crianças pedindo esmolas ou que limpam vidros de carros.”
a) “É muito comum vermos, nas esquinas brasileiras, crianças pedindo esmolas ou limpando vidros de
carros.”
b) “É muito comum vermos, nas esquinas brasileiras, crianças pedirem esmolas ou limpando vidros de
carros.”
c) “É muito comum vermos, nas esquinas brasileiras, crianças que pedem esmolas ou que limpam vidros de
carros.”
d) “É muito comum vermos, nas esquinas brasileiras, crianças a pedir esmolas ou a limpar vidros de carros.”

4. Em um dos itens abaixo, há falta de paralelismo na construção da frase. Assinale -o:


a) Bebida alcoólica caseira causa intoxicação e mata 51 pessoa na Líbia.
b) Três policiais são acusados de desviar drogas e ligação cor traficantes internacionais.
c) Plano de saúde muda de nome e escapa de punição da Agência Nacional de Saúde.
d) Problema técnico na PF afetou não só emissão de passaporte como também retirada.
5. "Funcionários cogitam uma nova greve e isolar o governador." A reescrita que mantém o paralelismo
sintático encontra-se na alternativa
a) "Funcionários cogitam que se faça uma nova greve e isolar o governador."
b) "Funcionários cogitam fazer uma nova greve e que isolem o governador."
c) "Funcionários cogitam uma nova greve e o isolamento do governador."
d) "Funcionários cogitam fazer uma nova greve e o governador isolado".

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Disciplina: Português V – AULA 5
Conteúdo: ORAÇÕES SUBORDINADAS
O período composto pode ser constituído por coordenação – com a presença de orações coordenadas –
ou por subordinação – com a apresentação de orações subordinadas.
As orações subordinadas – também chamadas de dependentes - têm funções sintáticas de sua principal e
equivalem a um substantivo, adjetivo ou advérbio2:
a) Vi que ele tinha chegado = Vi a sua chegada (objeto direto).
b) O homem que estuda aprende = O homem estudioso aprende (adjunto adnominal)
c) Saímos porque estava chovendo = Saímos por causa da chuva (adjunto adverbial de causa).
Assim, as orações subordinadas serão classificadas em
1) SUBSTANTIVAS 2) ADJETIVAS 3) ADVERBIAIS

ORAÇÕES SUBORDINADAS SUBSTANTIVAS

➢ Têm como principal característica serem substituídas pelo pronome “ISTO”:

(1) Governador disse que todos serão vacinados.

A oração destacada pode, simplesmente, ser trocada por “ISTO”:

(1a) Governados disse isto.

Portanto, classifica-se como oração subordinada substantiva.

➢ Geralmente, são iniciadas pela palavra “que” – conjunção integrante:

(2) O diretor afirmou que não haverá aula na próxima semana.

Toda a oração destacada pode ser trocada por “ISTO”; a palavra que introduz a oração substantiva; é,
portanto, uma conjunção integrante.

➢ Exercem uma função sintática da principal, podendo funcionar como sujeito, complemento verbal
(objeto direto, objeto indireto), complemento nominal, predicativo do sujeito ou aposto.

(3) O importante é que todos usem máscara.

A oração destaca é subordinada substantiva com a função sintática de predicativo do sujeito.

(3a) O importante é que todos usem máscara


Oração Subordinada Substantiva Predicativa / que = conjunção integrante

BECHARA, Evanildo. Lições de português pela análise sintática. – 17.ed. – Rio de Janeiro: Lucerna, 2005.
2

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❖ Em todo período em que há oração subordinada, sempre haverá uma oração chamada principal.
Não que necessariamente constitua o núcleo da comunicação, mas porque desencadeia as demais
orações no período.

(1) Governador disse que todos serão vacinados

Oração principal: Governador disse


Oração subordinada substantiva: que todos serão vacinados.

ORAÇÕES SUBORDINADAS ADJETIVAS

Considere as orações abaixo:

(1) O cliente comprou o capacete.


(2) O cliente escolheu o capacete preto.
(3) O cliente escolheu o capacete de fibra .
(4) O cliente escolheu o capacete que estava em promoção.

As orações adjetivas funcionam como adjunto adnominal de um termo chamado antecedente (substantivo
ou pronome) posto na oração a que se prende (BECHARA, 2005, p. 128).

(1) O gerente demitiu todos os funcionários.


(2) O gerente demitiu todos os funcionários que constrangiam os clientes.

➢ Geralmente, são iniciadas pela palavra que, neste caso, será classificada como pronome relativo,
podendo ser substituído por o qual, a qual, os quais, as quais, de acordo com a palavra antecedente.

Encontraram um cachorro na rua. O cachorro parecia estar doente.

Encontraram um cachorro na rua QUE parecia estar doente.

Considere os demais exemplos:

(1a) Compraram o livro que o professor indicou = o qual o professor indicou → oração adjetiva
(1b) Compraram os livros que o professor indicou = os quais o professor indicou → oração adjetiva
(1c) Compraram a apostila que o professor indicou = a qual o professor indicou → oração adjetiva

Vamos identificar o pronome relativo que introduz a oração subordinada adjetiva no título da notícia abaixo:

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CLASSIFICAÇÃO DAS ORAÇÕES SUBORDINADAS ADJETIVAS

1. Oração Adjetiva RESTRITIVA → sem vírgula (s), antes do que, pronome relativo
2. Oração Adjetiva EXPLICATIVA → com vírgula (s), antes do que, pronome relativo

➢ Sempre que houver pronome relativo (que, quem, cujo, onde), sempre haverá oração subordinada
adjetiva.

Podemos ter em um período composto por subordinação tanto oração substantiva


quanto oração adjetiva. Veja:

A atleta que ganhou medalha de ouro disse que treinou bastante durante a pandemia.

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EXERCÍCIOS
1. Assinale a opção em que há uma oração subordinada adjetiva.

a) Ele era uma pessoa com poucos amigos.


b) Havia uma casa de serra grande e espaçosa.
c) Compraram o livro que estava esgotado pela editora.
d) A água da chuva banhava suave as flores campestres do sítio.
e) O quadro da parede parecia transbordar de cores e boa vibrações.

2. Identifique a alternativa em que há oração subordinada adjetiva.

a) O cliente escolheu o capacete preto.


b) O cliente escolheu o capacete da vitrine.
c) O cliente escolheu o capacete com visor.
d) O cliente escolheu o capacete sem marca.
e) O cliente escolheu o capacete que queria.

3. A palavra "que" no título em destaque da notícia abaixo é um pronome relativo, por isso equivale a

a) o qual
b) a qual
c) os quais
d) as quais
e) palavra "isto"

4. Dentre as opções abaixo, apenas uma apresenta oração subordinada substantiva. Identifique -a.

a) Disseram uma verdade que chocou a todos.


b) A verdade é que todos podem estar vacinados.
c) A verdade dos fatos que alguns ignoram resistirá.
d) As anotações apontam a verdade que esperavam.
e) A verdade que muitos buscavam ainda não encontraram.

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5. É correto afirmar que no título da notícia em destaque abaixo há (circule a opção)

I – uma oração substantiva


II – uma oração adjetiva restritiva
III – uma oração adjetiva explicativa

6. Em “Há um projeto de lei em tramitação no Senado QUE pede alterações no envio de informações sobre
os medicamentos e propõe um prazo maior para adequação", o termo em destaque refere -se a

a) um projeto de lei
b) informações
c) Senado
d) prazo
e) lei

7. “(...) Recentemente, num desses programas QUE fazem parte da grade de televisão, ouvi pessoas
afirmarem QUE o verdadeiro tratamento psiquiátrico foi inventado pela médica Nise da Silveira, QUE curava
os doentes com atividades artísticas. Trata-se de um equívoco”. A palavra “que” destacada é,
respectivamente,

a) conjunção integrante – pronome relativo - conjunção integrante


b) pronome relativo – conjunção integrante - pronome relativo
c) pronome relativo – pronome relativo - conjunção integrante
d) conjunção integrante – conjunção integrante - pronome relativo
e) pronome relativo - conjunção integrante - conjunção integrante

8. Em relação aos termos destacados em “Mas uma pesquisa publicada no Journal of Consumer Research
sugere QUE todas essas pessoas QUE acham QUE se sentiriam constrangidas jantando ou indo ao cinema
sozinhas podem estar erradas.”, assinale a alternativa correta.

a) Todos os termos destacados exercem a mesma função sintática, ou seja, são pronomes relativos e podem
ser substituídos por “o qual”, com suas respectivas adaptações quanto à concordância.

b) O primeiro e o terceiro termos destacados funcionam como conjunção integrante, enquanto o segundo é
um pronome relativo e pode ser substituído por “as quais”.

c) O primeiro termo destacado funciona como conjunção integrante, enquanto os outros dois são pronomes
relativos e podem ser substituídos por “o qual”, com suas respectivas adaptações quanto à concordância.

d) Todos os termos destacados exercem a mesma função sintática, ou seja, são conjunções integrantes e
têm como objetivo relacionar orações principais às subordinadas.

e) O primeiro termo destacado funciona como conjunção integrante, o segundo como pronome relativo e o
terceiro é uma conjunção coordenativa explicativa.

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9. O elemento destacado introduz uma oração subordinada adjetiva, EXCETO :
a) “Das 97.549 armas de fogo QUE foram registradas em nome de empresas de segurança...”
b) “‘As empresas QUE atuam com segurança externa costumam ser as mais visadas.”
c) “‘Podemos dizer ainda QUE, para cada funcionário de empresa regularizada...’”
d) “‘...existem problemas no setor QUE devem ser investigados pela PF.’’
e) “Os vigilantes acompanhavam um caminhão QUE transportava um insumo industrial...”

10. Com base no título da notícia abaixo,

pode-se afirmar que se trata de um período composto por:

a) coordenação e subordinação
b) coordenação
c) subordinação
d) justaposição
e) correlação

11. (FAMENA – Marília) – Assinale a alternativa que contém uma coordenativa conclusiva:

a) Sérgio foi bom filho; logo será um bom pai.


b) Os meninos ora brigavam, ora brincavam.
c) Jaime trabalha depressa, contudo produz pouco.
d) Os cães mordem, não por maldade, mas por precisarem viver.
e) Adão comeu a maçã, e nossos dentes até hoje doem.

12. (UNlMFP-SP) – “Mauro não estudou nada e foi aprovado”. Apesar do e, normalmente aditivo, a oração
tem valor:

a) adversativo
b) conclusivo
c) explicativo
d) alternativo
e) causal

13. “Um ciclone tropical é um termo genérico usado por meteorologistas. Significa que é um sistema rotativo
e organizado de nuvens e tempestades que se originaram em águas tropicais ou subtropicais”. Nesse trecho,
a palavra “que” destacada é, respectivamente,

a) pronome relativo – pronome relativo


b) pronome relativo – conjunção integrante
c) conjunção integrante – pronome relativo
d) conjunção integrante – conjunção integrante

14. Marque o item em que a palavra “que” destacada é um pronome relativo.


a) (...) segundo Ribeiro, estima-se que o Produto Interno Bruto argentino recue 2,5% neste ano.
b) "O problema é que a inflação come grande parte do poder de compra (ganho na conversão cambial).
c) A Associação de Comércio Exterior do Brasil (AEB) afirma que a má situação no país vizinho vai estagnar
d) (...) mas analistas dizem que hoje o Brasil, embora em situação delicada, está mais protegido de um
contágio.
e) Começando a faltar dólar (moeda que as pessoas buscam em momentos de crise), o valor do peso
explode", diz Ribeiro.

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Disciplina: Português V – AULA 6
Conteúdo: ORAÇÕES SUBORDINADAS ADVERBIAIS
As orações subordinadas adverbiais recebem essa denominação porque expressam uma circunstância da
oração a que se subordinam; essa circunstância é a função de um advérbio. As orações adverbiais são
introduzidas pelas conjunções subordinadas:

1) Conjunções CONCESSIVAS

Estes tipos de conjunção exprimem, em relação a outro enunciado, a ideia de oposição, contraste, quebra
de expectativa. São estas: embora, ainda que, mesmo que, por mais que, mesmo assim, ainda assim,
apesar de (que).
Ex1: Embora estivesse machucado, o jogador marcou dois gols.
Ex2: Irei à aula hoje, mesmo que não haja transporte.

Nesse sentido, este tipo de conjunção confunde-se com a “adversativa”. É que ambas expressam relações
de oposição. A diferença está na direção argumentativa que cada uma expressa: com as adversativas, a
expectativa levantada no primeiro enunciado não é mantida.
1. Pedro é um bom funcionário, mas costuma chegar atrasado = conjunção adversativa
2. Lucas é um bom funcionário, embora costume chegar atrasado = conjunção concessiva

Quem você contrataria para sua empresa? Pedro ou Lucas? Por quê?
Ora, no primeiro exemplo, o que se mantém não é o argumento a favor de Pedro; pelo contrário, passa a
valer o argumento contra ele. Agora, quando se diz: Pedro é um bom funcionário, embora costume chegar
atrasado, prevalece o argumento a favor de Pedro. Ou seja, é fato que a ideia de oposição está explicitada
tanto nas adversativas quanto nas concessivas. A diferença está na direção argumentativa que uma e outra
expressam.

2) Conjunções CONDICIONAIS

São estabelecidas quando um segmento expressa a condição para o conteúdo de um outro. Essa relação é
sinalizada linguisticamente pelos conectores: se, caso, desde que, contanto que, a menos que, a não ser
que, desde que.

Ex1: Se dirigir, não beba.


Ex2: Todos farão uma boa prova, a menos que/desde que/ a não ser que estudem.
Ex3: Iremos à praia, contanto que não chova.

3) Conjunções CONFORMATIVAS

Ocorrem quando um segmento expressa algo que foi realizado de acordo com o que foi pontuado em um
outro. Os conectores que sinalizam essa relação são: conforme, consoante, segundo, como.

Ex1: Fizeram o exercício como o professor ensinara.


Ex2: Segundo dizem os especialistas, não faz mal comer ovo todo dia.

4) Conjunções COMPARATIVAS

Manifestam-se para estabelecer comparação. Dá-se mediante os conectores: como, mais/menos...(do) que.

Ex1: Aquela garotinha se vestiu como uma princesa.


Ex2: Ana é mais esperta (do) que sua prima.

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5) Conjunções CONSECUTIVAS

Indicam a ideia de efeito, resultado, consequência exposta em um dos segmentos do período. Ocorre com
os conectores: tão...que, tanto(a)...que, de modo que, de forma que, de maneira que . Com os
intensificadores “tão” e “tanto(a)”, estes se prendem no segmento primeiro, e a conjunção que, no segmento
seguinte, introduz a ideia de consequência.

Ex1: Leu tanto o conteúdo que sentiu dor de cabeça.


Ex2: Esse cachorro é tão esperto que surpreende os donos.
Ex3: Fez uma boa prova, de modo que sua nota foi a mais alta da turma.

6. Conjunções TEMPORAIS

Expressam o tempo, a partir do qual são localizados as ações ou os eventos em foco. Essa relação pode
envolver: tempo anterior, tempo posterior, tempo simultâneo, tempo habitual, tempo proporcional. Os
segmentos que sinalizam essa relação são iniciados pelos conectores: quando, enquanto, desde que,
assim que, logo que, antes que, depois que, mal (= assim que), todas as vezes que, sempre que.

Ex1: Quando começar a chover, feche as janelas.


Ex2: Desde que viajou, não mandou mais notícias.

7) Conjunções CAUSAIS

Indicam a causa, a razão, motivo de algo.

porque, porquanto, pois, visto que, uma vez que (verbo no indicativo), posto que, já que, como (= “já que)

Ex1: Como (= já que) chovia, resolveu ficar em casa.

Ex2: Desligaram as luzes, porque queriam economizar energia.

8) Conjunções PROPORCIONAIS

Quando uma oração exprime um fato que aumenta ou diminui na mesma proporção do que se declara em
outra oração. A relação de proporcionalidade manifesta-se com estes conectores: à medida que, à
proporção que, ao passo que, quanto mais/menos...mais/menos.

Ex1: À medida que se aproxima o dia da prova, o nervosismo aumenta.


Ex2: Adquiria mais vocabulário, à proporção que lia os grandes mestres.

9) Conjunções FINAIS

Manifestam-se quando um dos segmentos explicita o propósito, ou o objetivo pretendido e expresso pelo
outro. Essa relação é sinalizada pelos conectores: para que, a fim de que, para + verbo no infinitivo, a
fim de + verbo no infinitivo.

Ex1: Estamos em sala para que possamos estudar.


Ex2: Pedro acordou cedo a fim de estudar para a prova.

A palavra QUE como conector: pronome (relativo) ou conjunção integrante

A palavra “que” pode ser considerada um pronome quando:

1. Refere-se a um termo anterior, substituindo-o e, ao mesmo tempo, ligando orações;


2. Nesse caso, equivale às expressões: o qual, a qual, os quais, as quais.

Ex1: Encontraram um cachorro na rua. O cachorro parecia estar doente.

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Aqui temos duas orações, além da repetição do termo “cachorro”. Podemos substituir esse termo e ao
mesmo tempo ligar as orações, por meio da palavra “que”. Veja:

Ex2: Encontraram um cachorro na rua QUE (= o qual) parecia estar doente.

➢ QUE – Pronome Relativo

Para identificar a palavra que como pronome relativo, basta trocá-la no contexto pelas expressões
equivalentes.

Ex3: A apostila que o professor me indicou é muito boa = A apostila a qual o professor me indicou é muito
boa.

Ex4: Achei os livros que você me pediu emprestados = Achei os livros os quais você me pediu emprestados.

➢ QUE – Conjunção Integrante

Será conjunção integrante a palavra que quando ela integrar outro termo, introduzir um complemento de
termo anterior ou integrar outra oração.

Ex1: O professor disse que a prova está fácil → aqui o que introduz um complemento da forma verbal “disse”.
Ex2: É importante que o estudo torne-se um hábito → aqui o que integra outra oração “é importante”.

Para identificar o que como conjunção integrante, basta substituí-lo ou toda a oração pelo pronome “isto”.
Nos exemplos anteriores, podemos naturalmente fazer isso. Veja:

Ex1: “O professor disse ISTO”.


Ex2: “É importante ISTO”

Assim, toda a oração e o próprio que foi substituído pelo “isto”. Temos, portanto, uma conjunção integrante.

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QUADRO RESUMITIVO DAS CONJUNÇÕES E ORAÇÕES COORDENADAS E SUBORDINADAS

CLASSIFICAÇÃO DAS
VALOR SEMÂNTICO CONJUNÇÕES EXEMPLOS
CONJUNÇÕES

e, nem...nem,
tanto...como, não Ligaram para a pizzaria
Adição
ADITIVAS só...mas também E fizeram um pedido.
(como também)
mas, contudo, porém,
Adversidade, O vaso caiu no chão,
entretanto, todavia,
ADVERSATIVAS contraste MAS não quebrou.
no entanto, e (= mas)
ou, ora, ou...ou, ORA Pedro estuda,
Alternância
ALTERNATIVAS ora...ora ORA joga video game.
pois, porque,
Explicação, porquanto, visto que, Jonas não fez a prova,
EXPLICATIVO- justificativa, uma vez que, posto PORQUE estava
CAUSAIS causa, motivo, razão que, dado que, como, doente.
já que
portanto, logo, então,
por conseguinte,
assim (= então), por Acenderam as luzes do
Conclusão, efeito isso, pois quarto, PORTANTO há
CONCLUSIVAS (= entre vírgulas alguém em casa.
equivalendo a
“portanto”)
se, caso, desde que, SE persistirem os
Condição contanto que, uma sintomas, o médico
CONDICIONAIS
vez que deverá ser consultado.
embora, ainda que, Ana não conseguia
Concessão, quebra de por mais que, dormir, EMBORA
CONCESSIVAS
expectativa conquanto, não estivesse muito
obstante cansada.
COMO Einsteins disse,
conforme, segundo,
CONFORMATIVAS Conformidade, acordo a ignorância humana
consoante, como
não tem limites.
como, como se, (do)
Tales luta COMO um
COMPARATIVAS Comparação que, que nem
guerreiro.
(informal)
(tão)...que,
(tanto)...que,
Consequência, Estudou tanto para a
CONSECUTIVAS de
resultado prova QUE tirou dez.
modo/forma/maneira
que
quando, assim que,
logo que, antes que, QUANDO você chegar,
TEMPORAIS Tempo
depois que, me avise.
enquanto, até que
À MEDIDA QUE se
Proporção, fato à medida que, à aproxima o dia da
PROPORCIONAIS
simultâneo proporção que prova, fico mais
nervoso.
Estude PARA QUE
FINAIS Finalidade, propósito a fim de que, para que
tenha um bom futuro.

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EXERCÍCIOS
1. Identifique o valor semântico da oração introduzida pela conjunção destacada, mantendo o sentido original
do período. Siga o exemplo:

Embora chovesse, as pessoas não se importavam: concessão

a) Mal entrou na sala, sentou na cadeira e dormiu ______________________________________________

b) O motorista bateu com o carro, porque dormira ao volante ____________________________________

c) A mulher ficou tão nervosa que perdeu a voz _______________________________________________

d) Se persistirem os sintomas, o médico deverá ser consultado ____________________________________

e) Respondeu às questões, porém errou a maioria _____________________________________________

f) Quando acordar, dê um bom dia àqueles que estão à sua volta __________________ _______________

g) O nervosismo aumenta, à medida que anoitece _____________________________________________

h) Não foi aprovado, apesar de que tivesse estudado bastante ___________________________________

i) Como fazia frio, resolveu vestir uma camisa mais grossa ________________ ______________________

j) Resolveu as questões como o professor ensinou ____________________________________________

k) Acorde cedo para que possa aproveitar melhor o dia ________________________________________

l) O candidato não enviou o currículo, portanto está fora da seleção ______________________________

m) Ainda que se apressasse, não chegaria a tempo ao trabalho ________________ __________________

2. “COMO o vírus é detectado logo depois de a pessoa ser contaminada, é possível começar o tratamento
mais cedo.” A relação lógico-semântica apresentada pela conjunção destacada é a de

a) comparação.
b) conformidade.
c) causa.
d) consecução.
e) proporção.

3. O primeiro enunciado introduz, no contexto, a ideia de *

a) tempo
b) causa
c) consequência
d) condição
e) proporção

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4. (INSTITUTO AOCP/2016 – SERCOMTEL) Em “É inevitável que a gente cometa equívocos QUANDO a
vida vira um tango”, a conjunção destacada introduz a oração

a) subordinada adverbial causal.


b) subordinada adverbial consecutiva.
c) subordinada adverbial temporal.
d) subordinada adverbial condicional.
e) subordinada adverbial concessiva.

5. No período “o extraordinário sucesso da depressão e dos antidepressivos não existiria, se nossa cultura
não atribuísse um valor especial à felicidade”, a segunda oração estabelece com a anterior uma relação de

a) concessão.
b) finalidade.
c) conclusão.
d) condição.
e) causa.

6. Assinale a alternativa que contém oração subordinada adverbial consecutiva.

a) Mal entrou na sala, sentou na cadeira e dormiu.


b) O motorista bateu com o carro, porque dormira ao volante.
c) A mulher ficou tão nervosa que perdeu a voz.
d) Se persistirem os sintomas, o médico deverá ser consultado.
e) Quando acordar, dê um bom dia àqueles que estão à sua volta.

7. Dentre as alternativas abaixo, apenas uma apresenta oração subordinada concessiva. Identifique -a.

a) Como fazia frio, resolveu vestir uma camisa mais grossa.


b) Resolveu as questões como o professor ensinou.
c) Acorde cedo para que possa aproveitar melhor o dia.
d) O candidato não enviou o currículo, portanto está fora da seleção.
e) Ainda que se apressasse, não chegaria a tempo ao trabalho.

8. Considerando o texto em destaque da notícia abaixo, é correto afirmar que há oração subordinada
adverbial

a) condicional
b) concessiva
c) temporal
d) consecutiva
e) conformativa

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9. A segunda oração do período abaixo classifica-se como

a) oração subordinada adverbial concessiva


b) oração subordinada adverbial condicional
c) oração subordinada adverbial proporcional
d) oração subordinada adverbial conformativa
e) oração subordinada adverbial comparativa

10. A respeito das orações que constituem o período abaixo, pode-se afirmar que há

a) oração coordenada assindética e oração subordinada adverbial proporcional


b) oração principal e oração subordinada adverbial temporal
c) oração coordenada assindética e oração subordinada adverbial condicional
d) oração principal e oração subordinada adverbial proporcional
e) oração coordenada assindética e oração subordinada adverbial consecutiva

11. O objetivo da oração concessiva é fazer uma ressalva, que, no entanto, não irá anular o argumento da
oração principal. Isso se revela em

a) Lucas era um bom funcionário, mas sempre chegava atrasado ao trabalho.


b) Os irmãos ganharam presentes, embora não merecessem.
c) Lionel Messi joga como um verdadeiro craque do futebol.
d) O suco de laranja é mais gostoso, quando está gelado.
e) O atleta treinou tanto o arremesso que ficou cansado.

32
Prof. Hugo Magalhães Gramática e Literatura Brasileira
Disciplina: Português V – AULA 7
Conteúdo: PRÉ-MODERNISMO3 (1902 – 1922)
No início do século XX, a literatura brasileira atravessava um período de
transição. De um lado, ainda era forte a influência das tendências
artísticas da segunda metade do século XIX· de outro, já começava a
ser preparada a grande renovação modernista, cujo marco no Brasil é
a Semana de Arte Moderna (1922). Esse período de transição, que não
chega a constituir um movimento literário, é chamado Pré-Modernismo.

As estéticas literárias não são estanques entre si e, muitas vezes, se


tocam, se influenciam e se fundem. No início do século XX, por exemplo,
vários de nossos escritores do Realismo, Naturalismo, Parnasianismo e
Simbolismo ainda estavam vivos, escrevendo e publicando. Ao mesmo
tempo, começava a surgir em nosso país um grupo de novos escritores
que, embora ainda presos aos movimentos literários do século anterior, apresentavam algumas inovações
quanto aos temas e à linguagem. Concomitantemente, já começavam a chegar ao nosso país as primeiras
influências dos movimentos artísticos europeus, as chamadas vanguardas europeias, que iriam
impulsionar o Modernismo brasileiro.

A esse período, marcado pelo sincretismo de tendências artísticas, costuma-se chamar Pré-Modernismo.
Sem constituir um movimento literário propriamente dito, o Pré -Modernismo consiste na fase de transição
pela qual passou a produção literária brasileira entre o final do século XIX e o movimento modernista.

Embora os autores pré-modernistas ainda estivessem presos aos modelos do romance realista-naturalista
e da poesia simbolista, duas novidades essenciais podem ser observadas em suas obras:
• o interesse pela realidade brasileira: os modelos literários realistas-naturalistas eram essencialmente
universalizantes. Tanto a prosa de Machado de Assis e Aluísio Azevedo quanto a poesia dos parnasianos e
simbolistas não revelavam interesse em tratar da realidade brasileira. A preocupação central desses autores
era abordar o homem universal, sua condição e seus anseios. Aos escritores pré-modernistas, ao contrário,
interessavam assuntos do dia a dia dos brasileiros, originando-se, assim, obras de nítido caráter social.
Graça Aranha, por exemplo, retrata em seu romance Canaã a imigração alemã no Espírito Santo; Euclides
da Cunha, em Os sertões, aborda o tema da guerra e do messianismo em Canudos, no sertão da Bahia;
Lima Barreto detém-se na análise das populações suburbanas do Rio de Janeiro; Monteiro Lobato descreve
a miséria do caboclo na região decadente do Vale do Paraíba, no Estado de São Paulo. A exceção está na
poesia de Augusto dos Anjos, que foge a esse interesse social.

• a busca de uma linguagem mais simples e coloquial: embora não se verifique na obra de todos os
pré-modernistas, essa preocupação é explícita na prosa de Lima Barreto e representa um importante passo
para a renovação modernista de 1922. Lima Barreto procurou "escrever brasileiro", com simplicidade. Para
isso, teve de ignorar muitas vezes as normas gramaticais e de estilo, o que provocou a ira dos meios
acadêmicos conservadores e parnasianos.

Adaptado de CEREJA, William R. e MAGALHÃES, Thereza C. Literatura brasileira. 2ª ed. – São Paulo: Saraiva, 2013.
3

33
Prof. Hugo Magalhães Gramática e Literatura Brasileira
Canaã (1902) – Graça Aranha
4Foi saudável e forte a influência de Graça Aranha nos moços que já se
preparavam, quando ele retornou da Europa ao findar 1921, para organizar o
movimento que, nascido do futurismo, tomaria entre nós a designação de
modernismo. Contesta-se tivesse sido ele o chefe do movimento. Mas o que
ninguém nega é efeito que a sua presença teve no êxito da campanha contra a
estagnação, o marasmo e a rotina.
Canaã inicia o período provisoriamente chamado de Pré-Modernismo.
Representa a visão de um problema ainda não estudado, qual seja o da
contribuição do imigrante para a vida brasileira.
Graça Aranha, que se terá valido da permanência como juiz, ele próprio, no
Espírito Santo, para recolher material para o romance, coloca em ação dois
imigrantes que são também dois símbolos: Milkau, visionário e idealista, vendo
no Brasil a Canaã, e Lentz, o germânico orgulhoso da própria raça. Serve -se
dos dois para, através do longo diálogo, debater problemas múltiplos e tais como a defesa da hegemonia da
raça branca, por Lentz, contra o ponto de vista de Milkau; a defesa da guerra por Lentz (“o mundo deve ser
a morada deliciosa do guerreiro”), para quem “a vida é luta, é o crime”, enquanto Milkau dirá que “o princípio
do amor me sustenta e protege. Eu sou daqueles que foram por ele consolado...”.
Cabe dizer que tal diálogo, ou debate (como outros menores, mas semelhantes entremeados na narrativa),
se permite ao romancista acentuar a natureza moral dos dois personagens, mostra principalmente como lhe
interessavam mais as ideias que a ação.
E Milkau ia lentamente adormecendo, feliz e sossegado naquela benfazeja noite tropical, no meio de homens
primitivos, no seio de uma nova terra suave e forte; e o que era cisma da vigília se ia pouco a pouco
transformando no puro sonho em que ele entrevia num horizonte iluminado, surgindo docemente, uma nova
raça, que seria a incógnita feliz do amor de todas as outras, que repovoaria o mundo e sobre a qual se
fundaria a cidade aberta e universal, onde a luz se não apague, a escravidão se não conheça, onde a vida
fácil, risonha, perfumada, seja um perpétuo deslumbramento de liberdade e de amor. (p. 84)
E Lentz via por toda parte o homem branco apossando -se resolutamente da terra e expulsando
definitivamente o homem moreno que ali se gerara. E Lentz sorria com orgulh o na perspectiva da vitória e
do domínio de sua raça. Um desdém pelo mulato, em que ele exprimia o seu desprezo pela languidez, pela
fatuidade e fragilidade deste, turvou-lhe a visão radiosa que a natureza do país lhe imprimira no espírito.
Tudo nele era agora um sonho de grandeza e triunfo... Aquelas terras seriam o lar dos batalhadores eternos,
aquelas florestas seriam consagradas aos cultos temerosos das virgens ferozes e louras... Era tudo um
recapitular da antiga Germânia. (p. 85)
(...) A felicidade de Milkau era perfeita. Tinha limitado o inquieto deseja, apagado do espírito as manhas da
ambição, do domínio e do orgulho, e deixado que a simplicidade do coração o retomasse e inspirasse.
Trabalhava mansamente no quinhão de terra que ocupava. A sua peque na habitação, erguida no silêncio
da mata, era humilde como as outras dos colonos. (...) Sem demora, Milkau espraiava -se em relações com
o grupo colonial do Rio Doce. Achava um encanto em conviver com gente primitiva (...) estava destinado a
ser pouco a pouco a figura central daquela região (...) (p.100)
(...) Ao contrário do seu companheiro, Lentz vivia triste, num íntimo e reservado desespero. A vida que
tomara era para ele uma grande humilhação, torturando-o essa pungente agonia de praticar a existência
condenada pela ideia. (...) O caráter fraco traía a audácia do sonhador, e a bondade do sentimento
entorpecia-lhe as maldades grandiosas do seu idealismo. E assim inativo, paralisado, caminhando na doce
sombra de Milkau, ele, o criador da força, o apóstolo da energia, completava-se na contradição como um
verdadeiro homem. (p. 101.)

4
Prefácio adaptado de Alphonsus de Guimarães Filho. In: Canaã. Rio de Janeiro: Editora N. Fronteira, 1982.

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Prof. Hugo Magalhães Gramática e Literatura Brasileira
Monteiro Lobato: o retrato crítico do país
Monteiro Lobato (1882-1948), paulista de Taubaté, foi um dos escritores
brasileiros de maior prestígio, em consequência de sua atuação como
intelectual polêmico e autor de histórias infantis. Apesar do grande destaque
advindo de sua literatura feita para crianças, sobretudo com a publicação da
sequência de livros do Sítio do Pica-pau Amarelo, com personagens como
Narizinho, Pedrinho, a boneca Emília, Dona Benta, Tia Nastácia, o Visconde
de Sabugosa e o porco Rabicó ficaram conhecidas por inúmeras gerações
de crianças de vários países, o autor também ficou marcado na história da
literatura brasileira pela publicação de obras com forte teor regional, como o
livro de contos Cidades mortas, publicado em 1919.

Sua ação foi além do círculo literário, tendo se estendido também para o âmbito da luta política e social.
Moralista e doutrinador, aspirava ao progresso material e mental do povo brasileiro. Com a personagem
Jeca Tatu - um típico caipira acomodado e miserável do interior paulista -, por exemplo, Lobato criticava a
face de um Brasil agrário, atrasado e ignorante, cheio de vícios e vermes. Seu ideal de país era um Brasil
moderno, estimulado pela ciência e pelo progresso.

Sempre muito polêmico, chamou atenção do mundo das letras e das artes pelo seu posicionamento
conservador, em artigo de opinião intitulado “Paranoia ou mistificação”, publicado, em 1917, no jornal O
Estado de S. Paulo. Nesse artigo ele apresenta uma crítica em relação à exposição da artista modernista
Anita Malfatti, uma das principais figuras da Semana de Arte Moderna de 1922. Segundo Lobato, a criação
dessa importante pintora modernista seria fruto de uma “deformação mental”.

Monteiro Lobato situa-se entre os autores regionalistas do Pré-Modernismo e destaca-se no gênero conto.
O universo retratado por ele geralmente são os vilarejos decadentes do Vale do Paraíba (região paulista
entre São Paulo e Rio de Janeiro) na época da crise do plantio do café, na obra Cidades mortas.

Nesse cenário interiorano, o autor reflete sobre a decadência da


vida no campo, sendo o ápice dessa reflexão o conto “Urupês”,
protagonizado pelo famoso personagem Jeca Tatu, o qual foi
visto por muitos críticos como um símbolo caricato criado pelo
autor para ridicularizar o homem do campo. No entanto, Monteiro
Lobato criticava não o personagem em si, mas o contexto que o
colocava em tamanha miséria.

Portanto, Monteiro Lobato é estudado aqui como um pré-


modernista, por duas características fundamentais em sua obra
de ficção: o regionalismo e a denúncia da realidade brasileira.

Como regionalista, o autor nos dá a dimensão exata do Vale do Paraíba paulista do início do século XX, sua
decadência após a passagem da economia cafeeira, seus costumes e sua gente, tão bem retratados nos
contos de Cidades mortas .. E nesse aspecto - a gente do Vale do Paraíba - está o traço mais importante da
ficção lobatiana: a descrição e a análise do tipo humano característico da região, o caboclo Jeca Tatu, a
princípio chamado de vagabundo e indolente. Só mais tarde toma o autor consciência da realidade daquela
população subnutrida, marginalizada socialmente, sem acesso à cultura, acometida de toda sorte de
doenças endêmicas . O preconceito racial e a situação dos negros após a abolição foi outro tema abordado
pelo autor de Negrinha . As personagens são gordas senhoras que, num falso gesto de bondade, "adotavam"
menininhas negras para escravizá-las em trabalhos caseiros.

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Prof. Hugo Magalhães Gramática e Literatura Brasileira
Urupês5
Esboroou6-se o balsâmico7 indianismo de Alencar ao advento8 dos Rondons9 que, ao invés de imaginarem
índios num gabinete, com reminiscências de Chateaubriand 10 na cabeça e Iracema aberta sobre os joelhos, metem-se
a palmilhar11 sertões de Winchester em punho.
Morreu Peri12, incomparável idealização dum homem natural como o so nhava Rousseau13, protótipo de
tantas perfeições humanas que no romance, ombro a ombro com altos tipos civilizados, a todos sobreleva em beleza
de alma e corpo.
Contrapôs-lhe a cruel etnologia dos sertanistas modernos um selvagem real, f eio e brutesco, anguloso e
desinteressante, tão incapaz, muscularmente, de arrancar uma palmeira, como incapaz, moralmente, de amar Ceci 14.
Por f elicidade nossa – e de Dom Antônio de Mariz15 –, não os viu Alencar; sonhou-os qual Rousseau. Do
contrário lá teríamos o f ilho de Araré16 a moquear17 a linda menina num bom braseiro de pau-brasil, em vez de
acompanhá-la em adoração pelas selvas, como Ariel benfazejo do Paquequer 18.
A sedução do imaginoso romancista criou forte corrente. Todo o clã plumitivo 19 deu de forjar seu indiozinho
ref egado de Peri e Atala20. Em sonetos, contos e novelas, hoje esquecidos, consumiram-se tabas inteiras de aimorés
sanhudos21, com virtudes romanas por dentro e penas de tucano por fora.
Vindo o público a bocejar de f arto, já céptico ante o crescente desmantelo do ideal, cessou no mercado
literário a procura de bugres 22 homéricos, inúbias 23, tacapes, borés 24, piagas25 e virgens bronzeadas. Armas e heróis
desandaram cabisbaixos, rumo ao porão onde se guardam os móveis fora de uso, saudoso museu de extintas pilhas
elétricas que a seu tempo galvanizaram nervos. E lá acamam poeira cochichando reminiscências com a barba de Dom
João de Castro, com os franquisques26 de Herculano, com os frades27 de Garrett e que tais...
Não morreu, todavia. Evoluiu.
O indianismo está de novo a deitar copa, de nome mudado. Crismou28-se de “caboclismo”. O cocar de penas
de arara passou a chapéu de palha rebatido à testa; a ocara 29 virou rancho de sapé; o tacape af ilou, criou gatilho, deitou
ouvido e é hoje espingarda trouxada; o boré descaiu lamentavelmente para pio de inambu30; a tanga ascendeu a camisa
aberta ao peito.
Mas o substrato psíquico não mudou: orgulho indomável, independência, f idalguia, coragem, virilidade
heroica, todo o recheio em suma, sem faltar uma azeitona, dos Peris e Ubirajaras.
Este setembrino rebrotar duma arte morta inda se não desbagoou de todos os frutos. Terá o seu “I Juca-
Pirama”31, o seu “Canto do Piaga” e talvez dê ópera lírica.
Mas, completado o ciclo, em f lor da ilusão indianista virão destroçar o inverno os prosaicos de ídolos – gente
má e sem poesia. Irão os malvados esgaravatar o ícone com as curetas 32 da ciência. E que f eias se hão de entrever
as caipirinhas cor de jambo de Fagundes Varela! E que chambões 33 e sornas34 os Peris de calça, camisa e faca à cinta!

5
Publicado em O Estado de S. Paulo, em 23 de dezembro de 1914.
6
Reduzir-se a fragmentos; pulverizar.
7
Que reanima, conforta.
8
Aparecimento, chegada.
9
Marechal Cândido Rondon (1865-1958), explorador brasileiro de sangue indígena, ao lado do ex-presidente americano Theodore Roosevelt (1858-
1919), então aos 55 anos, se embrenhou pela Floresta Amazônica no norte de Mato Grosso, em 1914, com o intuito de ca talogar espécies e mapear
um rio inexplorado, batizado sugestivamente de Rio da Dúvida.
10
Chateaubriand, escritor, ensaísta, diplomata e político francês, exerceu uma profunda influência na literatura romântica de r aiz europeia, incluindo
a lusófona.
11
Andar por, percorrer a pé.
12
Índio herói do romance O Guarani (1857), de José de Alencar.
13
Filósofo franco-suíço Jean-Jacques Rousseau criador do mito do "bom selvagem", que consiste na tese de que o ser humano era puro e inocente
em seu estado natural, sendo a sociedade responsável por incutir nele valores e hábitos que o conduziriam ao conflito e aos problemas sociais.
14
Redução de Cecília, personagem do romance indianista O Guarani, a quem Peri adora e com quem faz par romântico.
15
Fidalgo português, pai de Ceci, no romance O Guarani.
16
Segundo o mitologia, refere-se a uma divindade indígena.
17
Assar.
18
É o rio em cujas margens fica localizada a casa de D. Antônio de Mariz e sua família no romance O Guarani (1857), de José de Alencar.
19
De sentido pejorativo, escritor ou jornalista sem méritos.
20
A bela personagem indígena da obra homônima de Chateaubriand que faz par romântico com índio Chactas.
21
Que provoca medo; temível, terrível.
22
Grupo indígena que habitava o Sul do Brasil.
23
Buzina ou trombeta de guerra dos índios.
24
Trombeta feita de bambu usada pelos indígenas brasileiros.
25
Variação de pajé, principal índio de uma tribo, que conduz os rituais.
26
Machado de guerra que foi utilizado durante os anos iniciais da Idade Média pelos germânicos francos.
27
Indivíduo que pertence a uma ordem religiosa; monge.
28
Apelidar-se, cunhar-se.
29
Praça no interior de aldeia indígena.
30
Ave brasileira, espécie de perdiz.
31
Poema épico do poeta indianista Gonçalves Dias.
32
Instrumento cirúrgico.
33
Que ou aquele que possui apresentação desagradável; deselegante.
34
Lentidão, demora para fazer algo; lerdeza, pachorra.

36
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Isso, para o futuro. Hoje ainda há perigo em bulir no vespeiro: o caboclo é o “Ai Jesus!” 35 nacional.
É de ver o orgulhoso entono com que respeitáveis figurões batem no peito exclamando com altivez:
– “Sou raça de caboclo!”
Anos atrás o orgulho estava numa ascendência de tanga, inçada de penas de tucano, com dramas íntimos
e f lechaços de curare36.
Dia virá em que os veremos, murchos de prosápia37, confessar o verdadeiro avô: – “Um dos quatrocentos
de Gedeão trazidos por Tomé de Sousa38 num barco daqueles tempos, nosso mui nobre e fecundo Mayflower 39”.
Porque a verdade nua manda dizer que entre as raças de variado matiz, f ormadoras da nacionalidade e
metidas entre o estrangeiro recente e o aborígine de tabuinha 40 no beiço, uma existe a vegetar de cócoras, incapaz de
evolução, impenetrável ao progresso. Feia e sorna, nada a põe de pé.
Quando Pedro I lança aos ecos o seu grito histórico e o país desperta estrouvinhado 41 à crise duma mudança
de dono, o caboclo ergue-se, espia e acocora-se de novo.
Pelo 13 de Maio 42, mal esvoaça o florido decreto da Princesa e o negro exausto larga num uf ! o cabo da
enxada, o caboclo olha, coça a cabeça, imagina e deixa que do velho mundo venha quem nele pegue de novo.
Em 15 de Novembro43 troca-se um trono vitalício pela cadeira quadrienal. O país bestifica-se ante o
inopinado da mudança44. O caboclo não dá pela coisa.
Vem Floriano; estouram as granadas de Custódio; Gumercindo bate às portas de Roma; Incitatus derranca
o país. 45 O caboclo continua de cócoras, a modorrar...
Nada o esperta. Nenhuma ferrotoada o põe de pé. Social, como individualmente, em todos os atos da vida,
Jeca, antes de agir, acocora-se. Jeca Tatu é um piraquara46 do Paraíba, maravilhoso epítome47 de carne onde se
resumem todas as características da espécie.
Ei-lo que vem falar ao patrão. Entrou, saudou. Seu primeiro movimento após prender entre os lábios a palha
de milho, sacar o rolete de fumo e disparar a cusparada de esguicho, é sentar-se jeitosamente sobre os calcanhares.
Só então destrava a língua e a inteligência.
– “Não vê que...”
De pé ou sentado as ideias se lhe entramam, a língua emperra e não há de dizer coisa com coisa. De noite,
na choça de palha, acocora-se em frente ao fogo para “aquentá-lo”, imitado da mulher e da prole.
Para comer, negociar uma barganha, ingerir um café, tostar um cabo de foice, fazê-lo noutra posição será
desastre infalível. Há de ser de cócoras.
Nos mercados, para onde leva a quitanda domingueira, é de cócoras, como um faquir do Bramaputra48, que
vigia os cachinhos de brejaúva49 ou o feixe de três palmitos.
Pobre Jeca Tatu! Como és bonito no romance e feio na realidade!
Jeca mercador, Jeca lavrador, Jeca filósofo...
Quando comparece às f eiras, todo mundo logo adivinha o que ele traz: sempre coisas que a natureza
derrama pelo mato e ao homem só custa o gesto de espichar a mão e colher – cocos de tucum ou jiçara, guabirobas,
bacuparis, maracujás, jataís, pinhões, orquídeas; ou artefatos de taquara-poca – peneiras, cestinhas, samburás, tipitis,
pios de caçador; ou utensílios de madeira mole – gamelas, pilõezinhos, colheres de pau.
Nada mais.
Seu grande cuidado é espremer todas as consequências da lei do menor esforço – e nisto vai longe.
Começa na morada. Sua casa de sapé e lama faz sorrir aos bichos que moram em toca e gargalhar ao joão-
de-barro. Pura biboca50 de bosquímano51. Mobília, nenhuma. A cama é uma espipada esteira de peri 52 posta sobre o
chão batido.
Às vezes se dá ao luxo de um banquinho de três pernas – para os hóspedes. Três pernas permitem
equilíbrio; inútil, portanto, meter a quarta, o que ainda o obrigaria a nivelar o chão. Para que assentos, se a natureza
os dotou de sólidos, rachados calcanhares sobre os quais se sentam?
Nenhum talher. Não é a munheca um talher completo – colher, garfo e faca a um tempo?
No mais, umas cuias, gamelinhas53, um pote esbeiçado, a pichorra54 e a panela de feijão.

35
Referência ao poema de Álvares de Azevedo, autor ultrarromântico.
36
Substância tóxica extraída de plantas, utilizada pelos índios sul-americanos como veneno das flechas.
37
Orgulho, jactância, vaidade, fanfarrice.
38
Tomé de Sousa veio ao Brasil com um carregamento de quatrocentos degredados e uns tantos jesuítas.
39
Famoso navio que, em 1620, transportou os chamados Peregrinos, do porto de Southampton, Inglaterra, para o Novo Mundo.
40
Ripa de madeira.
41
Emaranhado, revolto.
42
Por muitos anos, o dia 13 de maio foi uma data comemorativa, no Brasil, devido à abolição da escravatura, ocorrida em 1888.
43
Data da Proclamação da República.
Aristides Lobo: “O país assistiu bestificado à Proclamação da República”.
44
45
O presidente Hermes da Fonseca.
46
Pessoa que vive no campo ou na roça; caipira, capiau.
47
Que serve de modelo ideal de.
48
Rio da Ásia.
49
Palmeira silvestre. Seus frutos são usados pelas crianças para se fazer piões.
50
Barranco.
51
Povos antigos da região da África: homens do mato.
52
Vegetação.
53
Vasilhas em forma de madeira ou barro.
54
Pequeno jarro com bico.

37
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Nada de armários ou baús. A roupa, guarda-a no corpo. Só tem dois parelhas55; um que traz no uso e outro
na lavagem.
Os mantimentos apaiola56 nos cantos da casa. Inventou um cipó preso à cumeeira 57, de gancho na ponta e
um disco de lata no alto: ali pendura o toucinho, a salvo dos gatos e ratos.
Da parede pende a espingarda pica-pau, o polvarinho58 de chifre, o São Benedito defumado, o rabo de tatu
e as palmas bentas de queimar durante as f ortes trovoadas. Servem de gaveta os buracos da parede. Seus remotos
avós não gozaram maiores comodidades.
Seus netos não meterão quarta perna ao banco. Para quê? Vive-se bem sem isso.
Se pelotas 59 de barro caem, abrindo seteiras 60 na parede, Jeca não se move a repô-las. Ficam pelo resto
da vida os buracos abertos, a entremostrarem nesgas de céu.
Quando a palha do teto, apodrecida, greta em fendas por onde pinga a chuva, Jeca, em vez de remendar a
tortura, limita-se, cada vez que chove, a aparar numa gamelinha a água gotejante...
Remendo... Para quê?, se uma casa dura dez anos e f altam “apenas” nove para ele abandonar aquela?
Esta f ilosofia economiza reparos.
Na mansão de Jeca a parede dos f undos bojou para fora um ventre empanzinado, ameaçando ruir; os
barrotes 61, cortados pela umidade, oscilam na podriqueira do baldrame 62. A fim de neutralizar o desaprumo e prevenir
suas consequências, ele grudou na parede uma Nossa Senhora enquadrada em moldurinha amarela – santo de
mascate63.
– “Por que não remenda essa parede, homem de Deus?”
– “Ela não tem coragem de cair. Não vê a escora?”
Não obstante, “por via das dúvidas”, quando ronca a trovoada Jeca abandona a toca e vai agachar-se no
oco dum velho embiruçu do quintal – para se saborear de longe com a eficácia da escora santa.
Um pedaço de pau dispensaria o milagre; mas entre pendurar o santo e tomar da f oice, subir ao morro,
cortar a madeira, atorá-la, baldeá-la e especar a parede, o sacerdote da Grande Lei do Menor Esforço não vacila. É
coerente.
Um terreirinho descalvado rodeia a casa. O mato o beira. Nem árvores frutíferas, nem horta, nem f lores –
nada revelador de permanência.
Há mil razões para isso; porque não é sua a terra; porque se o “tocarem” não f icará nada que a outrem
aproveite; porque para frutas há o mato; porque a “criação” come; porque...
– “Mas, criatura, com um vedozinho64 por ali... A madeira está à mão, o cipó é tanto... ” Jeca, interpelado,
olha para o morro coberto de moirões, olha para o terreiro nu, coça a cabeça e cuspilha.
– “Não paga a pena.”
Todo o inconsciente filosofar do caboclo grulha65 nessa palavra atravessada de fatalismo e modorra. Nada
paga a pena. Nem culturas, nem comodidades. De qualquer jeito se vive.
Da terra só quer a mandioca, o milho e a cana. A primeira, por ser um pão já amassado pela natureza. Basta
arrancar uma raiz e deitá-la nas brasas. Não impõe colheita, nem exige celeiro. O plantio se faz com um palmo de rama
f incada em qualquer chão. Não pede cuidados. Não a ataca a formiga. A mandioca é sem-vergonha.
Bem ponderado, a causa principal da lombeira do caboclo reside nas benemerências sem conta da
mandioca. Talvez que sem ela se pusesse de pé e andasse. Mas enquanto dispuser de um pão cujo preparo s e resume
no plantar, colher e lançar sobre brasas, Jeca não mudará de vida. O vigor das raças humanas está na razão direta da
hostilidade ambiente. Se a poder de estacas e diques o holandês extraiu de um brejo salgado a Holanda, essa joia do
esf orço, é que ali nada o favorecia. Se a Inglaterra brotou das ilhas nevoentas da Caledônia, é que lá não medrava 66 a
mandioca. Medrasse, e talvez os víssemos hoje, os ingleses, tolhiços 67, de pé no chão, amarelentos, mariscando de
peneira no Tâmisa. Há bens que vêm para males. A mandioca ilustra este avesso de provérbio.
Outro precioso auxiliar da calaçaria68 é a cana. Dá rapadura, e para Jeca, simplificador da vida, dá garapa.
Como não possui moenda, torce a pulso sobre a cuia de caf é um rolete, depois de bem macetados os nós; açucara
assim a beberagem, fugindo aos trâmites condutores do caldo de cana à rapadura.

55
Par de cavalos.
56
Armazenar.
57
Telha que cobre o vão de encontro das extremidades de um telhado.
58
Objeto usado para guardar pólvora.
59
Bolas, caroços.
60
Aberturas nas paredes para a entrada de luz.
61
Pequena trave de madeira, de metal, que serve de sustentação de soalhos, telhados.
62
Alicerce, viga de sustentação.
63
Vendedor que oferece mercadorias em domicílio.
64
Árvore de grande porte.
65
Falar muito, tagarelar.
66
Fazer crescer.
67
Atrofiado, defeituoso.
68
Preguiça, ociosidade.

38
Prof. Hugo Magalhães Gramática e Literatura Brasileira
(...) O f ato mais importante de sua vida é sem dúvida votar no governo. Tira nesse dia da arca69 a roupa
preta do casamento, sarjão70 f uradinho de traça e todo vincado de dobras; entala os pés num alentado 71 sapatão de
bezerro; ata ao pescoço um colarinho de bico e, sem gravata, ringindo e mancando, vai pegar o diplom a de eleitor (...).
Vota. Não sabe em quem, mas vota. Esfrega a pena no livro eleitoral, arabescando 72 o aranhol73 de
gataf unhos74 e que chama “sua graça”.
O mobiliário cerebral de Jeca, à parte o suculento recheio de superstições, vale o do casebre. O banquinho
de três pés, as cuias, o gancho de toucinho, as gamelas, tudo se reedita dentro de seus miolos sob a f orma de ideias:
são as noções práticas da vida, que recebeu do pai e sem mudança transmitirá aos filhos.
O sentimento de pátria lhe é desconhecido. Não tem sequer a noção do país em que vive. Sabe que o
mundo é grande, que há sempre terras para diante, que muito longe está a Corte com os graúdos e mais distante ainda
a Bahia, donde vêm baianos pernósticos75 e cocos76.
Perguntem ao Jeca quem é o presidente da República.
– “O homem que manda em nós tudo?”
– “Sim.”
– “Pois de certo que há de ser o imperador.” Em matéria de civismo não sobe de ponto.
– “Guerra? Te esconjuro! Meu pai viveu af undado no mato pra mais de cinco anos por causa da guerra
grande77. Eu, para escapar do ‘reculutamento’, sou inté capaz de cortar um dedo, como o meu tio Lourenço...” Guerra,
def esa nacional, ação administrativa, tudo quanto cheira a governo resume-se para o caboclo numa palavra apavorante
– “reculutamento”.
(...) A sua medicina corre parelhas com o civismo e a mobília – em qualidade. Quantitativamente, assombra.
Da noite cerebral pirilampejam-lhe apózemas78, cerotos, arrobes79 e eletuários 80 escapos81 à sagacidade cômica de
Mark Twain. Compendia-os um Chernoviz82 não escrito, monumento de galhofa onde não há rir, lúgubre como é o
epílogo. A rede na qual dois homens levam à cova as vítimas de semelhante farmacopeia é o espetáculo mais triste da
roça.
Quem aplica as mezinhas 83 é o “curador”, um Eusébio Macário de pé no chão e cérebro trancado como
moita de taquaruçu. O veículo usual das drogas é sempre a pinga – meio honesto de render homenagem à deusa
Cachaça, divindade que entre eles ainda não encontrou heréticos.
Doenças hajam que remédios não faltam.
Para bronquite, é um porrete cuspir o doente na boca de um peixe vivo e soltá-lo: o mal se vai com o peixe
água abaixo...
Para “quebranto de ossos”, já não é tão simples a medicação. Tomam-se três contas de rosário, três galhos
de alecrim, três limas de bico, três iscas de palma benta, três raminhos de arruda, três ovos de pata preta (com casca;
sem casca desanda) e um saquinho de picumã; mete-se tudo numa gamela d’água e banha-se naquilo o doente,
f azendo-o tragar três goles da zurrapa84. É infalível!
O específico da brotoeja consiste em cozimento de beiço de pote para lavagens. Ainda há aqui um pormenor
de monta; é preciso que antes do banho a mãe do doente molhe na água a ponta de sua trança. As brotoejas saram
como por encanto.
Para dor de peito que “responde na cacunda”, cataplasma de “jasmim de cachorro” é um porrete.
Além desta alopatia85, para a qual contribui tudo quanto de mais repugnante e inócuo que existe na natureza,
há a medicação simpática, baseada na influição misteriosa de objetos, palavras e atos sobre o corpo humano.
O ritual bizantino dentro de cujas maranhas os filhos de Jeca vêm ao mundo, e do qual não há f ugir sob
pena de gravíssimas consequências futuras, daria um in-fólio86 de alto f ôlego ao Sílvio Romero bastante operoso que
se propusesse a compendiá-lo. Num parto difícil nada tão ef icaz como engolir três caroços de f eijão mouro, de passo
que a parturiente veste pelo avesso a camisa do marido e põe na cabeça, também pelo avesso, o seu chapéu. Falhando
esta simpatia, há um derradeiro recurso: colar no ventre encruado a imagem de São Benedito.
Nesses momentos angustiosos outra mulher não penetre no recinto sem primeiro defumar-se ao fogo, nem
traga na mão caça ou peixe: a criança morreria pagã. A omissão de qualquer destes preceitos fará chover mil desgraças
na cabeça do chorincas87 recém-nascido.

69
Caixa grande.
70
Tecido grosseiro de lã.
71
Resistente, forte.
72
Rabiscar.
73
Relativo a teias de aranha.
74
Letra malfeita, garatuja.
75
Presumido, pretensioso.
76
Que tem muito dinheiro.
77
Guerra do Paraguai
78
Cozimento de substâncias vegetais, a que se juntam outras substâncias que o clarificam e adoçam.
79
Nome comum a certos xaropes medicinais, preparados à base de extratos vegetais.
80
Medicamento de uso interno constituído de pós finos, xarope, mel ou resinas líquidas; empr. esp. como calmante e purgativo.
81
Que escapou; livre.
82
Os manuais de medicina popular do dr. Chernoviz foram essenciais na difusão de saberes e práticas aprovados pelas instituições médicas oficiais.
83
Referente a qualquer remédio.
84
Referente a bebida de mau sabor.
85
A alopatia é o mais conhecido sistema de medicação usado pela medicina tradicional.
86
Folha de impressão dobrada uma vez, resultando em duas folhas que formam quatro páginas.
87
Var. chorão.

39
Prof. Hugo Magalhães Gramática e Literatura Brasileira
A posse de certos objetos confere dotes sobrenaturais. A invulnerabilidade às facadas ou cargas de chumbo
é obtida graças à f lor da samambaia.
Esta planta, conta Jeca, só f loresce uma vez por ano, e só produz em cada samambaial uma f lor. Isto à
meia-noite, no dia de São Bartolomeu. É preciso ser muito esperto para colhê-la, porque também o diabo anda à cata.
Quem consegue pegar uma, ouve logo um estouro e tonteia ao cheiro de enxofre – mas livra-se de faca e chumbo pelo
resto da vida. Todos os volumes do Larousse não bastariam para catalogar-lhe as crendices, e como não há linhas
divisórias entre estas e a religião, confundem-se ambas em maranhada teia, não havendo distinguir onde para uma e
começa outra.
A ideia de Deus e dos santos torna-se jecocêntrica. São os santos os graúdos lá de cima, os coronéis
celestes, debruçados no azul para espreitar-lhes a vidinha e intervir nela ajudando -os ou castigando-os, como os
metediços deuses de Homero. Uma torcedura de pé, um estrepe, o feijão entornado, o pote que rachou, o bicho que
arruinou – tudo diabruras da corte celeste, para castigo de más intenções ou atos.
Daí o f atalismo. Se tudo movem cordéis lá de cima, para que lutar, reagir? Deus quis. A maior catástrofe é
recebida com esta exclamação, muito parenta do “Allah Kébir” do beduíno 88.
E na arte?
Nada.
A arte rústica do campônio europeu é opulenta a ponto de constituir preciosa fonte de sugestões para os
artistas de escol89. Em nenhum país o povo vive sem a ela recorrer para um ingênuo embelezamento da vida. Já não
se f ala no camponês italiano ou teutônico, filho de alfobres 90 mimosos, propícios a todas as florações estéticas. Mas o
russo, o hirsuto91 mujique92 a meio atolado em barbárie crassa. Os vestuários nacionais da Ucrânia nos quais a cor viva
e o sarapantado da ornamentação indicam a ingenuidade do primitivo; os isbas 93 da Lituânia, sua cerâmica, os
bordados, os móveis, os utensílios de cozinha, tudo revela no mais rude dos campônios o sentimento da arte.
No samoiedo, no pele-vermelha, no abexim, no papua, um arabesco ingênuo costuma ornar-lhes as armas
– como lhes ornam a vida canções repassadas de ritmos sugestivos.
Que nada é isso, sabido como já o homem pré-histórico, companheiro do urso das cavernas, entalhava
perf is de mamutes em chifres de rena.
Egresso à regra, não denuncia o nosso caboclo o mais remoto traço de um sentimento nascido com o
troglodita.
Esmerilhemos o seu casebre: que é que ali denota a existência do mais vago senso estético? Uma
chumbada no cabo do relho e uns zigue-zagues a canivete ou fogo pelo roliço do porretinho de guatambu. É tudo.
Às vezes surge numa f amília um gênio musical cuja f ama esv oaça pelas redondezas. Ei-lo na viola:
concentra-se, tosse, cuspilha o pigarro, fere as cordas e “tempera”. E fica nisso, no tempero.
Dirão: e a modinha?
A modinha, como as demais manifestações de arte popular existentes no país, é obra do mulato, em cujas
veias o sangue recente do europeu, rico de atavismos94 estéticos, borbulha de envolta com o sangue selvagem, alegre
e são do negro.
O caboclo é soturno95.
Não canta senão rezas lúgubres.
Não dança senão o cateretê96 aladainhado.
Não esculpe o cabo da faca, como o cabila97.
Não compõe sua canção, como o felá98 do Egito.
No meio da natureza brasílica, tão rica de f ormas e cores, onde os ipês f loridos derramam f eitiços no
ambiente e a inf olhescência dos cedros, às primeiras chuvas de setembro, abre a dança dos tangarás; onde há abelhas
de sol, esmeraldas vivas, cigarras, sabiás, luz, cor, perfume, vida dionisíaca em escacho 99 permanente, o caboclo é o
sombrio urupê de pau podre, a modorrar silencioso no recesso das grotas.
Só ele não f ala, não canta, não ri, não ama.
Só ele, no meio de tanta vida, não vive...

88
Grupo árabe nômade habitante dos desertos.
89
O que é considerado melhor, de maior qualidade, numa sociedade ou num grupo; elite.
90
Lugar que produz grande quantidade de qualquer coisa.
91
Rude, grosso.
92
Homem rude, do povo.
93
Habitações tradicional de camponeses.
94
Características.
95
Melancólico, tristonho, taciturno.
96
Dança rural.
97
Os cabilas ou cabildas são um povo que habita tradicionalmente a região montanhosa da Cabília, no nordeste da Argélia.
98
Felá é um fazendeiro e laborador agrícola do Oriente Médio e Norte da África. A palavra deriva do termo árabe para "lavrador" ou "agricultor".
99
No sentido de farra.

40
Prof. Hugo Magalhães Gramática e Literatura Brasileira
Lima Barreto (1881 – 1922)
Nascido no Rio de Janeiro, Lima Barreto, escritor de origem humilde e
descendente de negros escravizados, é considerado um dos principais
autores pré-modernistas brasileiros. Autor de uma vasta obra, constituída
por contos, crônicas e romances, não teve seu nome aprovado para
ingresso na Academia Brasileira de Letras. Sua principal obra, o romance
Triste fim de Policarpo Quaresma, publicado em 1915, assim como as
outras obras do autor, expressa as características fundamentais do pré-
modernismo, como o uso de uma linguagem mais popular e a
representação de enredos centrados no cotidiano de homens
Lima Barreto em foto tirada em 1919, quando
comuns. internado no Hospício Nacional, no Rio de
Janeiro.

Mulato, pobre, orgulhoso de suas origens, ferino e severo em suas críticas, alcoólatra e subversivo, Lima
Barreto foi incompreendido pela crítica de seu tempo e alcançou em vida apenas uma relativa popularidade.
Além do preconceito de que sempre foi vítima, por ser mulato e alcoólatra, sua distância em relação ao grupo
paulista que daria início à revolução modernista na literatura e nas artes também pode explicar seu
ofuscamento como escritor. (CEREJA, 2013, p. 365)

Lima Barreto foi um dos poucos em nossa literatura que combateram o preconceito racial e a discriminação
social do negro e do mulato. Essa abordagem está presente, por exemplo, nos romances Clara dos Anjos,
Vida e morte de M.J. Gonzaga de Sá e no quase autobiográfico Recordações do escrivão Isaías Caminha.
Escreveu ainda um curioso romance, Cemitério dos vivos, que ficou inacabado, resultado de suas
observações e reflexões nas duas vezes em que, por alcoolismo, esteve internado num hospício. (Idem, p. 365)

A paixão de Lima Barreto por sua cidade, o Rio de Janeiro, com seus subúrbios, sua gente pobre e seus
dramas humildes, também está presente nas obras do escritor, assim como a crít ica a figuras da classe
média que lutam desesperadamente para ascender socialmente ou a políticos da época, sarcasticamente
retratados, pela mania de ostentação, pelo vazio intelectual e pela ganância.

Triste Fim de Policarpo Quaresma (1911) – Lima Barreto


fim de Policarpo Quaresma foi publicado inicialmente em folhetins do
100 Triste

Jornal do Comércio do Rio de Janeiro, entre 11 de agosto e 19 de outubro de


1911. Só cinco anos depois saiu em volume.
Graças ao Policarpo, conhecemos uma das representações ficcionais mais
abrangentes do quadro social nos primeiros anos da República. Note -se que o
romance se ocupa de aspectos relativos a fatos sócio-históricos ocorridos quase
vinte anos antes da sua elaboração, tempo da presidência de Floriano Peixoto
(1891-1894).
Lima Barreto cria sua consistente personagem, o Major Policarpo Quaresma,
caracterizando-o como patriota de ação, tomado de “um sentimento sério, grave
e absorvente” pelo seu país. Identificado com o narrador, Lima assumirá a
representação de alguns aspectos expressivos do contexto histórico -social do
final do século, no interior dos quais o ingênuo e impetuoso reformismo de
Quaresma vai ser humanamente experimentado, isto é, vivenciando em tropeços
e superações ocorrentes em qualquer processo humano de ação/conhecimento.

100
Texto adaptado de DIAS, Carmen Lydia de Souza. Quaresma/Ressureição. In: Triste Fim de Policarpo Quaresma. São Paulo: Editora
Ática, 2001.

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Prof. Hugo Magalhães Gramática e Literatura Brasileira
(...) Desde moço, aí pelos vinte anos, o amor da Pátria tomou-o todo inteiro (...) o que o patriotismo o fez pensar, foi
num conhecimento inteiro do Brasil, levando-o a meditações sobre os seus recursos, para depois então apontar os
remédios, as medidas progressivas, com pleno conhecimento de causa. Não se sabia bem onde nascera, mas não fora
decerto em São Paulo, nem no Rio Grande do Sul, nem no Pará. Errava quem quisesse encontrar nele qualquer
regionalismo; Quaresma era antes de tudo brasileiro. (...)
Centrado na temático do nacionalismo como valor a ser revisto, o autor mobilizará um referencial adequado
à reconstituição histórico-ficcional forjando um espaço favorável de confronto entre o pat riotismo
ufano/abstrato do Major Policarpo e a realidade concreta do quotidiano nacional. A representação deste real
cheio de vícios gritantes da distribuição do Poder e da Riqueza recairá sobre a infraestrutura burocrática,
civil e militar, correlacionada ao caráter agroexportador e dependente do país, já no início do século XIX.
Distribui-se em três etapas de ação a trajetória do pátrio ufanismo de Quaresma. É um tipo de nacionalismo
que, de saída, já pode constar como dado sociocultural próprio de uma certa mentalidade otimista dos
primeiros anos da República, a conquista redentora, carregada de promessas que cedo começam a se
mostrar inviáveis decepcionando gradualmente alguns setores das classes médias e continuando a
marginalizar a crescente massa do povo inculto, urbano e rural.
Entretanto, é a convicção, até o absurdo, da condição privilegiada do Brasil entre as nações que impele
Quaresma a três “grandes cometimentos” para reformar a inigualável “pátria do Cruzeiro”:

1) o cultural (lembremos os engraçados lances do projeto de adoção do tupi-guarani como língua oficial e
a iniciativa esdrúxula de cumprimentar as pessoas chorando como faziam os tupinambás) :
Essa ideia levou-o a estudar os costumes tupinambás; e, como uma idéia traz outra, logo ampliou o seu propósito e eis
a razão por que estava organizando um código de relações, de cumprimentos, de cerimônias domésticas e festas,
calcado nos preceitos tupis. Desde dez dias que se entregava a essa árdua tarefa, quando (era domingo) l he bateram
à porta, em meio de seu trabalho. Abriu, mas não apertou a mão. Desandou a chorar, a berrar, a arrancar os cabelos,
como se tivesse perdido a mulher ou um filho. A irmã correu lá de dentro, o Anastácio também, e o compadre e a filha,
pois eram eles, ficaram, estupe- fatos no limiar da porta.
—Mas que é isso, compadre?
—Que é isso, Policarpo?
—Mas, meu padrinho...
Ele ainda chorou um pouco. Enxugou as lágrimas e, depois, explicou com a maior
naturalidade:
—Eis aí! Vocês não têm a mínima noção das coisas da nossa terra, Queriam que eu apertasse a mão... Isto não é
nosso! Nosso cumprimento é chorar quando encontramos os amigos, era assim que faziam os tupinambás.
O seu compadre Vicente, a filha e Dona Adelaide entreolharam-se, sem saber o que dizer. O
homem estaria doido? Que extravagância! (p. 14)

2) o agrícola (a luta com a terra e a politicagem no “Sossego”)

Quaresma e seus empregados trabalhavam agora longe, faziam um roçado, e fora para auxiliar esse serviço que
contratou o Felizardo. Era este um camarada magro, alto, de longos braços, longas pernas, como um símio. Tinha a
face cor de cobre, a barba rala e, sob uma aparência de fraqueza muscular, não havia ninguém mais valente que ele a
roçar. Com isto era um tagarela incansável. De manhã, quando chegava, aí pelas seis horas, já sabia todas as
intriguinhas do município. (p. 57)

3) e o político (a adesão incondicional – e fatal – ao “governo forte” de Floriano). Lima Barreto transcende
a visão limitada de seu protagonista – ainda mais asfixiante no final patético em que Policarpo, esperando o
seu triste fim, lamenta o tempo mal empregado a inconstância do objeto de seus esforços, ou seja, a pátria,
noção que agora lhe parece abstrata e que “precisa ser revista”.

Desde dezoito anos que o tal patriotismo lhe absorvia e por ele fizera a tolice de estudar inutilidades. Que lhe
importavam os rios? Eram grandes? Pois que fossem... Em que lhe contribuiria para a felicidade saber o nome dos
heróis do Brasil? Em nada... O importante é que ele tivesse sido feliz. Foi? Não. Lembrou-se das suas cousas de tupi,
do folk-lore, das suas tentativas agrícolas... Restava disso tudo em sua alma uma satisfação? Nenhuma! Nenhuma! O
tupi encontrou a incredulidade geral, o riso, a mofa, o escárnio; e levou-o à loucura. Uma decepção. E a agricultura?
Nada. As terras não eram ferazes e ela não era fácil como diziam os livros. Outra decepção. E, quando o seu patriotismo
se fizera combatente, o que achara? Decepções. Onde estava a doçura de nossa gente? Pois ele não a viu combater
como feras? Pois não a via matar prisioneiros, inúmeros? Outra decepção. A sua vida era uma decepção, uma série,
melhor, um encadeamento de decepções. A pátria que quisera ter era um mito; era um fantasma criado por ele no
silêncio do seu gabinete. Nem a física, nem a moral, nem a intelectual, nem a política que julgava existir, havia. (p. 175)

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Prof. Hugo Magalhães Gramática e Literatura Brasileira
Eu (1912) – Augusto dos Anjos
101 Augusto de Carvalho Rodrigues dos Anjos nasceu no Engenho Pau
D’Arco, vila do Espírito Santo, Paraíba a 20 de abril de 1884. Após os
estudos primários e secundários, conduzidos pelo pai, forma-se em
Direito por Recife (1907). Muda-se para o Rio de Janeiro (1910), onde
vive do magistério. Publica, em 1912, à custa do irmão, seu único livro,
Eu, recebido ruidosamente pela crítica.
A poesia de Eu resulta de antagonismos irreconciliáveis: dicotomia
irredutível entre Espírito/Ideia e Matéria – tudo o mais deriva desse
núcleo irradiador de tormento, bem como a poesia mais tensa e vigorosa
do período. Dessa antitética aproximação nasce a poesia da
decomposição, marca registrada e Eu. Movido pela atração do bizarro,
não surpreende que se voltasse para o grotesco. O mínimo que se pode
dizer é que a mente do poeta se afigura um palco de horrores,
avassalada por contínuos pesadelos.

Psicologia de um vencido Versos Íntimos


Eu, f ilho do carbono e do amoníaco, Vês?! Ninguém assistiu ao formidável
Monstro de escuridão e rutilância, Enterro de tua última quimera.
Sof ro, desde a epigênese da infância, Somente a Ingratidão — esta pantera —
A inf luência má dos signos do zodíaco. Foi tua companheira inseparável!
Prof undissimamente hipocondríaco, Acostuma-te à lama que te espera!
Este ambiente me causa repugnância... O Homem, que, nesta terra miserável,
Sobe-me à boca uma ânsia análoga à ânsia Mora, entre f eras, sente inevitável
Que se escapa da boca de um cardíaco. Necessidade de também ser fera.
Já o verme — este operário das ruínas — Toma um f ósforo, acende teu cigarro!
Que o sangue podre das carnificinas O beijo, amigo, é a véspera do escarro,
Come, e à vida em geral declara guerra, A mão que afaga é a mesma que apedreja.
Anda a espreitar meus olhos para roê-los, Se a alguém causa inda pena a tua chaga,
E há de deixar-me apenas os cabelos, Apedreja essa mão vil que te afaga,
Na f rialdade inorgânica da terra! Escarra nessa boca que te beija!

Poesia crepuscular, apocalíptica, de fim de mundo, de agonia, poesia “de um vencido”, a bracejar num mar
de dúvidas e antagonismos inconciliáveis. É ainda poesia de um erudito: o conhecimento, nomeadamente
o científico, é convocado para dentro do poema, assim refletindo estados de alma, como sustentáculo e
matéria da forma. Erudição transfundida na sensibilidade, tornada cerne do organismo poético.
Morcego Budismo moderno
Meia-noite. Ao meu quarto me recolho. Tome, Doutor, esta tesoura, e... corte
Meu Deus! E este morcego! E, agora, vede: Minha singularíssima pessoa.
Na bruta ardência orgânica da sede, Que importa a mim que a bicharia roa
Morde-me a goela ígneo e escaldante molho. Todo o meu coração, depois da morte?!
“Vou mandar levantar outra parede...” Ah! Um urubu pousou na minha sorte!
— Digo. Ergo-me a tremer. Fecho o ferrolho Também, das diatomáceas da lagoa
E olho o teto. E vejo-o ainda, igual a um olho, A criptógama cápsula se esbroa
Circularmente sobre a minha rede! Ao contato de bronca destra forte!
Pego de um pau. Esforços faço. Chego Dissolva-se, portanto, minha vida
A tocá-lo. Minh’alma se concentra. Igualmente a uma célula caída
Que ventre produziu tão feio parto?! Na aberração de um óvulo infecundo;
A Consciência Humana é este morcego! Mas o agregado abstrato das saudades
Por mais que a gente faça, à noite, ele entra Fique batendo nas perpétuas grades
Imperceptivelmente em nosso quarto! Do último verso que eu fizer no mundo

101
Texto adaptado de Moisés, Massaud. In: História da literatura brasileira. São Paulo: Cultrix, 2016.

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Prof. Hugo Magalhães Gramática e Literatura Brasileira
Euclides da Cunha: em busca da verdade histórica
Euclides da Cunha (1866-1909) nasceu no Rio de Janeiro, estudou na Escola
Militar e fez curso de Engenharia. De formação positivista e republicano
convicto, sempre mostrou grande interesse por ciências naturais e filosofia.
Viveu durante algum tempo em São Paulo e, em 1897, foi enviado pelo jornal
O Estado de S. Paulo ao sertão da Bahia, para cobrir, como correspondente,
a guerra de Canudos. Na condição de ex-militar, Euclides pôde informar com
precisão os movimentos de guerra das três últimas semanas de conflito.
Mobilizando e dividindo a opinião pública, suas mensagens, transmitidas pelo
telégrafo, permitira que o sul do país acompanhasse passo a passo a
campanha. Cinco anos depois, o autor lançou Os sertões, obra que narra e
analisa os acontecimentos de Canudos à luz das teorias científicas da época.
Euclides deixou também vários outros escritos - tratados, cartas, artigos -, todos relacionados ao país, às
suas características regionais, geográficas e culturais.

Canudos: miséria e violência


A guerra de Canudos, que ocorreu entre 1896 e 1897 e
provocou a morte de 15 mil pessoas, entre sertanejos e
militares, foi um dos mais violentos conflitos da história
brasileira.

O Nordeste brasileiro vivia nas últimas décadas do século


XIX uma de suas piores crises econômicas e sociais.
Entre 1877 e 1880, só em Fortaleza morreram 64 mil
pessoas vitimadas pela seca. Quando foi proclamada a
República, em 1889, uma nova seca ameaçava a
população, cuja média de vida não ultrapassava os 27
anos.

Canudos, no sertão da Bahia, era uma fazenda


abandonada, quando ali se instalou o religioso Antônio
Maciel, conhecido como Conselheiro. Em pouco tempo,
em torno do líder religioso formou-se uma cidade de Casa e morador da região do conflito, em foto histórica de Flávio
pessoas miseráveis e abandonadas à própria sorte. A de Barros, de 1896. Pobre e abandonada pelos governos estadual
cidade, que passou a chamar-se Belo Monte, chegou a e federal, a população foi facilmente influenciada pelo discurso
social e religioso de Antônio Conselheiro.
contar com cerca de 15 mil a 25 mil habitantes, população
superada na época apenas pela de Salvador.

Isolados, alheios a pagamentos de impostos e à oficialização da cidade junto ao Estado, seus moradores
logo passaram a ter problemas com a Igreja e com as leis locais, o que originou o conflito.

Além disso, os sermões de Conselheiro não tratavam apenas da salvação das almas, mas também de
problemas concretos, como a miséria e a opressão política. Talvez sem ter completa clareza do que falava,
Conselheiro fazia críticas à República nascente, acusando-a de responsável pelas precárias condições de
vida do povo nordestino.

Embora Canudos tivesse uma organização social e econômica que se assemelhava ao comunismo primitivo
dos cristãos, com todos trabalhando e dividindo igualmente os frutos do trabalho , o movimento passou a ser
visto em todo o país como monarquista e considerado uma ameaça à soberania nacional. Suas verdadeiras
causas, na época, não foram objeto de nenhuma discussão mais aprofundada.

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Prof. Hugo Magalhães Gramática e Literatura Brasileira
Os Sertões: o Brasil esquecido
Durante o conflito, os militares mantiveram os jornais sob censura. O país recebia apenas a versão oficial
da guerra: a luta da República contra focos monarquistas no sertão baiano. Terminada a guerra, as
verdadeiras ações dos vencedores - degola de prisioneiros, tortura, prostituição, estupros e comércio de
crianças - continuaram sendo encobertas.

A obra Os Sertões, de Euclides da Cunha, publicada cinco anos depois do término do conflito, consiste em
uma tentativa de rever a versão oficial da guerra de Canudos.

Com sua obra, Euclides não pretendia apenas contar o que presenciara no sertão. Munido das teorias
científicas vigentes - determinismo, positivismo e conhecimentos de sociologia e geografia natural e humana
-, pretendia também compreender e explicar o fenômeno cientificamente.
Os Sertões, portanto, constitui uma experiência única em
nossa literatura: é uma obra com estilo literário, de fundo
histórico (apesar do fato recente) e de rigor científico.

Adotando o modelo determinista, segundo o qual o meio


determina o homem, a obra organiza-se em três partes:
"A terra", que descreve as condições geográficas do
sertão; "O homem", que descreve os costumes do
sertanejo; e "A luta", que descreve os ataques a Canudos
e sua extinção.

Colocando-se nitidamente a favor do sertanejo, Euclides


da Cunha situa o fenômeno de Canudos como um
problema social decorrente do isolamento político e
econômico do sertão brasileiro em relação ao Brasil
cosmopolita, do Sul e do litoral. Assim, ele desmontou a
versão oficial do Exército, segundo a qual o movimento
tinha a finalidade de destruir a República.

A seguir, você vai ler quatro textos. Os três primeiros são


de Os sertões: o texto 1, retirado da primeira parte da
obra, é uma descrição da caatinga; o texto 2, da segunda
parte, descreve o sertanejo; e o 3, da terceira parte, trata
da guerra e de seu significado.
Igreja de Santo Antônio, palco das batalhas de Canudos .
TEXTO 1

Então, a travessia das veredas sertanejas é mais exaustiva que a de urna estepe nua. Nesta, ao menos, o viajante tem
o desafogo de um horizonte largo e a perspectiva das planuras francas. Ao passo que a caatinga o afoga; abrevia-lhe
o olhar; agride-o e estonteia-o; enlaça-o na trama espinescente e não o atrai; repulsa-o com as folhas urticantes, com
o espinho, com os gravetos estalados em lanças, e desdobra-se-lhe na f rente éguas e léguas, imutável no aspecto
desolado: árvore sem folhas, de galhos estorcidos e secos, revoltos, entrecruzados, apontando rijamente no espaço ou
estirando-se flexuosos pelo solo, lembrando um bracejar imenso, de tortura, da flora agonizante...
(Euclides da Cunha. Os sertões. São Paulo: Círculo do Livro. 1975. p. 38.)

TEXTO 2

O sertanejo é, antes de tudo, um forte. Não tem o raquitismo exaustivo dos mestiços neurastênicos do litoral.
A sua aparência, entretanto, ao primeiro lance de vista, revela o contrário. Falta-lhe a plástica impecável, o
desempenho, a estrutura corretíssima das organizações atléticas. É desgracioso, desengonçado, torto. Hércules-
Quasímodo, reflete no aspecto a fealdade típica dos fracos. O andar sem firmeza, sem aprumo, quase gigante e sinuoso
aparenta a translação de membros desarticulados.

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EXERCÍCIOS
1. Apenas duas opções podem ser apontadas como características do Pré-Modernismo:

a) Riqueza em detalhes e pelo exagero.


b) Linguagem coloquial.
c) Exaltação da natureza.
d) Marginalidade dos personagens.
e) Nacionalismo e Indianismo.

2. Indique a alternativa que contenha apenas autores pré-modernistas:

a) Euclides da Cunha, Graça Aranha, Monteiro Lobato.


b) Arianos Suassuna, Graciliano Ramos, Monteiro Lobato.
c) Lima Barreto, José de Anchieta, Euclides da Cunha.
d) José de Anchieta, Santa Rita Durão, Tomás Antônio Gonzaga.
e) Manuel Bandeira, Graciliano Ramos, Clarice Lispector.

3. Quais desses acontecimentos marcam o contexto histórico do Pré-Modernismo?

a) Chegada da família real portuguesa.


b) Transferência da capital do Brasil para Salvador.
c) Inconfidência mineira.
d) Revolta da Chibata.
e) Era Vargas.

4. Apenas uma das afirmações abaixo não se referem a Canaã, obra mais conhecida de Graça Aranha.
Indique qual.

a) Seus personagens principais são Milkau e Lentz.


b) Aborda a imigração alemã no Espírito Santo.
c) Narra os acontecimentos da Guerra de Canudos.
d) Tem como pano de fundo discussões ideológicas.
e) Explora o tema do racismo.

5. ________, autor de apenas um livro, Eu, morreu com apenas 30 anos, e foi um incompreendido. Numa
edição póstuma do seu livro, foram divulgados poemas inéditos.

O nome do autor que completa a informação acima é:

a) Augusto dos Anjos


b) Sousândrade
c) Clarice Lispector
d) Aluísio de Azevedo
e) Jorge Amado

6. Indique a alternativa correta.

a) Para muitos estudiosos, o Pré-Modernismo não é uma escola literária.


b) O Pré-Modernismo teve início da Semana de Arte Moderna, em 1922.
c) Manuel Bandeira e Graciliano Ramos são autores Pré-Modernistas.
d) Os Sertões e Grande Sertão: Veredas são da autoria de Euclides da Cunha.
e) Dentre as principais características do Pré-Modernismo, podemos citar a liberdade de expressão, a
imprecisão e a espontaneidade.

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7. (PUC-RS) Na figura de ________, Monteiro Lobato criou o símbolo do brasileiro abandonado ao seu
atraso e miséria pelos poderes públicos.

a) O Cabeleira
b) Jeca Tatu
c) João Miramar
d) Blau Nunes
e) Augusto Matraga

8. (UFR) "Crítico feroz do Modernismo, grande incentivador da disseminação da cultura, defensor dos
valores e riquezas nacionais; conhecido, particularmente, pela sua grande obra infantil, em que se destacam
os personagens do Sítio do Picapau Amarelo."

O nome do autor a que se refere a afirmativa acima é:

a) Lima Barreto
b) José Lins do Rego
c) Monteiro Lobato
d) Mário de Andrade
e) Cassiano Ricardo

Desde dezoito anos que o tal patriotismo lhe absorvia e por ele f izera a tolice de estudar inutilidades. Que lhe
importavam os rios? Eram grandes? Pois se fossem... Em que lhe contribuiria para a f elicidade saber o nome dos heróis
do Brasil? Em nada... O importante é que ele tivesse sido f eliz. Foi? Não. Lembrou-se das suas causas de tupi, do
f olclore, das suas tentativas agrícolas... Restava disto tudo em sua alma uma sofisticação? Nenhuma! Nenhuma!"

(Lima Barreto)

9. As obras do autor desse trecho integram o período literário chamado Pré-Modernismo. Tal designação
para este período se justifica, porque ele:

a) desenvolve temas do nacionalismo e se liga às vanguardas europeias.


b) engloba toda a produção literária que se fez antes do Modernismo.
c) antecipa temática e formalmente as manifestações modernistas.
d) se preocupa com o estudo das raças e das culturas formadoras do nordestino brasileiro.
e) prepara pela irreverência de sua linguagem as conquistas estilísticas do Modernismo.

10. (FCC-BA) Fazendo um paralelo entre Os Sertões, de Euclides da Cunha, e Grande Sertão: Veredas, de
Guimarães Rosa, pode-se afirmar:

a) Em ambas as obras predomina o espírito científico, sendo analisados aspectos da realidade brasileira.
b) Ambas têm por cenário o sertão do Brasil setentrional, sendo numerosas as referências à flora e à fauna.
c) Ambas as obras, criações de autores dotados de gênio, muito enriqueceram a nossa literatura regional de
ficção.
d) Ambas têm como principal objetivo denunciar o nosso subdesenvolvimento, revelando a miséria física e
moral do homem do sertão.
e) Tendo cada uma suas peculiaridades estilísticas, são ambas produto de intensa elaboração de linguagem.

11. (UEL) Assinale a alternativa incorreta sobre o Pré-Modernismo:

a) Não se caracterizou como uma escola literária com princípios estéticos bem delimitados, mas como um
período de prefiguração das inovações temáticas e linguísticas do Modernismo.
b) Algumas correntes de vanguarda do início do século XX, como o Futurismo e o Cubismo, exerceram
grande influência sobre nossos escritores pré-modernistas, sobretudo na poesia.
c) Tanto Lima Barreto quanto Monteiro Lobato são nomes significativos da literatura pré -modernista
produzida nos primeiros anos do século XX, pois problematizam a realidade cultural e social do Brasil.

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d) Euclides da Cunha, com a obra "Os Sertões", ultrapassa o relato meramente documental da batalha de
Canudos para fixar-se em problemas humanos e revelar a face trágica da nação brasileira.
e) Nos romances de Lima Barreto observa-se, além da crítica social, a crítica ao academicismo e à linguagem
empolada e vazia dos parnasianos, traço que revela a postura moderna do escritor.

12. (UFRGS) Lima Barreto é um autor que se caracteriza por criar tipos:

a) rústicos, ligados ao campo.


b) aristocratas, ligados ao campo.
c) aristocratas, ligados à cidade.
d) burgueses, ligados à cidade.
e) populares, ligados ao subúrbio.

13. (Enem)
O f alecimento de uma criança é um dia de f esta. Ressoam as violas na cabana dos pobres pais, jubilosos entre as
lágrimas; referve o samba turbulento; vibram nos ares, f ortes, as coplas dos desafios, enquanto, a uma banda, entre
duas velas de carnaúba, coroado de f lores, o anjinho exposto espelha, no último sorriso paralisad o, a f elicidade
suprema da volta para os céus, para a felicidade eterna — que é a preocupação dominadora daquelas almas ingênuas
e primitivas.
CUNHA, Euclides da. Os sertões: campanha de Canudos. Edição comemorativa do 90.º ano do lançamento. Rio de Janeiro: Ediouro, 1992, p. 78.

Nessa descrição de costume regional, é empregada

a) variante linguística que retrata a fala típica do povo sertanejo.


b) a linguagem científica, por meio da qual o autor denuncia a realidade brasileira.
c) a modalidade coloquial da linguagem, ressaltando–se expressões que traduzem o falar de tipos humanos
marginalizados.
d) linguagem literária, na modalidade padrão da língua, por meio da qual é mostrado o Brasil não –oficial dos
caboclos e do sertão.
e) variedade linguística típica da fala doméstica, por meio de palavras e expressões que recriam, com
realismo, a atmosfera familiar.

14. (UNITAU)

"Só ele não fala, não canta, não ri, não ama. Só ele, no meio de tanta vida, não vive."

Os comentários acima são endereçados por Monteiro Lobato:

a) ao nordestino.
b) ao menor.
c) ao sertão.
d) ao caboclo.
e) ao paulistano.

15. (Vunesp) Volume contendo doze histórias tiradas do sertão paulista, foi citado por Rui Barbosa, em
discurso no Senado, apontando o personagem Jeca Tatu como o protótipo do camponês brasileiro. Aponte
o autor e sua obra:

a) Monteiro Lobato - Urupês


b) Lima Barreto - Cemitério dos vivos
c) Monteiro Lobato - Cidades mortas
d) Coelho Neto - Fogo-fátuo
e) Euclides da Cunha - Contrastes e confrontos

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16. (Cesmac) Engenheiro e ensaísta social, Euclides da Cunha (1866-1909) é autor de uma das obras
clássicas

a) Os Sertões encerra uma prosa coloquial, clara e denotativa.


b) Os Sertões aborda a Guerra de Canudos, na Bahia.
c) Os Sertões trata da Guerra do Contestado, em Alagoas.
d) Os Sertões narra a vida do Conselheiro e de Lampião.
e) Os Sertões é um livro que faz a defesa veemente da Monarquia.

17. (Enem)
Negrinha
Negrinha era uma pobre órfã de sete anos. Preta? Não; fusca, mulatinha escura, de cabelos ruços e olhos assustados.
Nascera na senzala, de mãe escrava, e seus primeiros anos vivera-os pelos cantos escuros da cozinha, sobre velha
esteira e trapos imundos. Sempre escondida, que a patroa não gostava de crianças. Excelente senhora, a patroa.
Gorda, rica, dona do mundo, amimada dos padres, com lugar certo na igreja e camarote de luxo reservado no céu.
Entaladas as banhas no trono (uma cadeira de balanço na sala de jantar), ali bordava, recebia as amigas e o vigário,
dando audiências, discutindo o tempo. Uma virtuosa senhora em suma “dama de grandes virtudes apostólicas, esteio
da religião e da moral”, dizia o reverendo.
Ótima, a dona Inácia.
Mas não admitia choro de criança. Ai! Punha-lhe os nervos em carne viva.
[...]
A excelente dona Inácia era mestra na arte de judiar de crianças. Vinha da escravidão, fora senhora de escravos e
daquelas ferozes, amigas de ouvir cantar o bolo e estalar o bacalhau. Nunca se afizera ao regime novo essa indecência
de negro igual.
LOBATO, M. Negrinha. In: MORICONE, I. Os cem melhores contos brasileiros do século. Rio de Janeiro: Objetiva, 2000 (fragmento).

A narrativa focaliza um momento histórico-social de valores contraditórios. Essa contradição infere-se, no


contexto, pela

a) falta de aproximação entre a menina e a senhora, preocupada com as amigas.


b) receptividade da senhora para com os padres, mas deselegante para com as beatas.
c) ironia do padre a respeito da senhora, que era perversa com as crianças.
d) resistência da senhora em aceitar a liberdade dos negros, evidenciada no final do texto.
e) rejeição aos criados por parte da senhora, que preferia tratá-los com castigos.

18. (Enem)
Desde dezoito anos que o tal patriotismo lhe absorvia e por ele f izera a tolice de estudar inutilidade s. Oue lhe
importavam os rios? Eram grandes? Pois que f ossem... Em que lhe contribuía para a f elicidade saber o nome dos
heróis do Brasil? Em nada... O importante e que ele tivesse sido f eliz. Foi? Não. Lembrou-se das coisas do tupi, do
f olk-lore, das suas tentativas agrícolas... Restava disso tudo em sua alma uma satisfação? Nenhuma! Nenhuma!
O tupi encontrou a incredulidade geral, o riso, a mofa, o escárnio; e levou-o à loucura. Uma decepção. E a agricultura?
Nada. As terras não eram ferazes e ela não era f ácil como diziam os livros. Outra decepção. E, quando o seu patriotismo
se f izera combatente, o que achara? Decepções. Onde estava a doçura de nossa gente? Pois ele a viu combater como
f eras? Pois não a via matar prisioneiros, inúmeros? Outra decepção. A sua vida era uma decepção, uma série, melhor,
um encadeamento de decepções.
A pátria que quisera ter era um mito; um fantasma criado por ele no silêncio de seu gabinete.
BARRETO, L. Triste fim de Policarpo Quaresma. Disponível em: www.dominiopubIico.gov.br. Acesso em: 8 nov. 2011.

O romance Triste fim de Policarpo Quaresma, de Lima Barreto, foi publicado em 1911. No fragmento
destacado, a reação do personagem aos desdobramentos de suas iniciativas patrióticas evidencia que

a) A dedicação de Policarpo Quaresma ao conhecimento da natureza brasileira levou -o a estudar


inutilidades, mas possibilitou-lhe uma visão mais ampla do país.
b) A curiosidade em relação aos heróis da pátria levou-o ao ideal de prosperidade e democracia que o
personagem encontra no contexto republicano.
c) A construção de uma pátria a partir de elementos míticos, como a cordialidade do povo, a riqueza do solo
e a pureza linguística, conduz à frustração ideológica.
d) A propensão do brasileiro ao riso, ao escárnio, justifica a reação de decepção e desistência de Policarpo
Quaresma, que prefere resguardar-se em seu gabinete.
e) A certeza da fertilidade da terra e da produção agrícola incondicional faz parte de um projeto ideológico
salvacionista, tal como foi difundido na época do autor.

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19. (FEI) Uma das obras citadas abaixo foi escrita por Lima Barreto. Assinale-a:

a) Canaã
b) Os sertões
c) Triste fim de Policarpo Quaresma
d) Eu
e) Urupês

20. (Enem PPL 2019)


A nossa emotividade literária só se interessa pelos populares do sertão, unicamente porque são pitorescos e talvez
não se possa verificar a verdade de suas criações. No mais é uma continuação do exame de português, uma retórica
mais dif ícil, a se desenvolver por este tema sempre o mesmo: Dona Dulce, moça de Botafogo em Petrópolis, que se
casa com o Dr. Frederico. O comendador seu pai não quer porque o tal Dr. Frederico, apesar de doutor, não tem
emprego. Dulce vai à superiora do colégio de irmãs. Esta escreve à mulher do ministro, antiga aluna do colégio, que
arranja um emprego para o rapaz. Está acabada a história. É preciso não esquecer que Frederico é moço pobre, isto
é, o pai tem dinheiro, fazenda ou engenho, mas não pode dar uma mesada grande.
Está aí o grande drama de amor em nossas letras, e o tema de seu ciclo literário.

BARRETO, L. Vida e morte de MJ Gonzaga de Sá. Disponível em: www.brasiliana.usp.br. Acesso em: 10 ago. 2017.

Situado num momento de transição, Lima Barreto produziu uma literatura renovadora em diversos aspectos.
No fragmento, esse viés se fundamenta na

a) releitura da importância do regionalismo.


b) ironia ao folhetim da tradição romântica.
c) desconstrução da formalidade parnasiana.
d) quebra da padronização do gênero narrativo.
e) rejeição à classificação dos estilos de época.

21. Identifique o poeta de preocupação filosófica e científica, em cuja obra aparecem expressões do tipo:

"herança miserável de micróbios", "cuspo afrodisíaco", "fotosferas mórbidas", "anatômica desordem",


"intracefálica tortura", "microorganismos fúnebres" .

Resposta: ________________________________________________________________________

22. (VUNESP-SP)

"Policarpo Quaresma, cidadão brasileiro , funcionário público, certo de que a língua portuguesa é
emprestada ao Brasil ; certo também de que, por esse fato , o falar e o escrever em geral, sobretudo no
campo das letras, se vêem na humilhante contingência de sofrer continuamente censuras ásperas dos
proprietários da língua; sabendo , além, que, dentro do nosso país, os autores e os escritores, com
especialidade os gramáticos, não se entendem no tocante à correção gramatical, vendo -se, diariamente,
surgir azedas polêmicas entre os mais profundos estudiosos do nosso idioma - usando do direito que lhe
confere a Constituição, vem pedir que o Congresso Nacional decrete o tupi-guarani, como língua oficial e
nacional do povo brasileiro."

Indique o que pretende o requerente com sua solicitação; indique também o título da obra, o nome do autor
e o movimento literário, aos quais o texto transcrito pertence.

Resposta: ___________________________________________________________________________

____________________________________________________________________________________

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Disciplina: Português V – AULA 8
Conteúdo: VANGUARDAS EUROPEIAS E MODERNISMO102
No início do século XX, uma verdadeira revolução começou a ocorrer nas artes em geral. Na literatura não
foi diferente: envolvidos por um espírito demolidor, os escritores voltaram-se contra o academicismo e
romperam com os padrões estéticos vigentes. Avessos às regras. os modernistas propuseram as "palavras
em liberdade".

Do vermelho ao verde todo amarelo morre


Quando cantam as araras nas florestas natais
[ ... ]
Aves chinesas de uma asa só voando em dupla
É preciso um poema sobre isso
Enviaremos mensagem telefônica
Traumatismo gigante
Faz escorrer os olhos
Garota bonita entre jovens turinenses
O moço pobre se assoava na gravata branca
Você vai erguer a cortina
E agora veja a janela se abre (...)
Guillaume Apollinaire, um dos principais poetas do Cubismo francês e amigo de Picasso

o capoeira
- Quê apanhá sordado?
-O quê?
- Quê apanhá?
Pernas e cabeças na calçada
(Oswald de Andrade. Poesias reunidas. 5. ed. Rio
de Janeiro: Civilização Brasileira, 1978. p. 94.)

À primeira vista, a linguagem modernista causa grande estranhamento, mesmo para o leitor atual. Uma das
razões desse estranhamento resulta do uso da técnica da simultaneidade de imagens, isto é, a junção de
elementos aparentemente sem relação uns com os outros. Essa técnica dá a impressão de fragmentação
da realidade, como se uma câmera estivesse captando flashes.

Os poetas modernistas eram contrários a regras. Para criar, propunham as "palavras em liberdade", o que
significava não se prender a regras preconcebidas. No lugar da métrica, propunham o uso do verso livre
(sem um número predeterminado de sílabas poéticas); em vez de formas fixas, inventavam novas formas a
cada novo poema.

102
Adaptado de CEREJA, William R. e MAGALHÃES, Thereza C. Literatura brasileira. 2ª ed. – São Paulo: Saraiva, 2013.

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Contexto histórico

SÉCULO XX

O século XX daria coordenadas absolutamente inéditas ao mundo. Provocaria transformações radicais e


profundas. Sob o seu signo, registra- se o apogeu da época industrial e técnica, a formação da alta burguesia
e do proletariado, o estabelecimento organizado do capitalismo. Cresce o comércio, fomenta-se o transporte,
multiplica-se a produção, que, processada em larga escala, abarrota os entrepostos, gerando as rivalidades
do comércio internacional.

A BELLE ÉPOQUE

O período da literatura europeia que se estende de 1886, por aí, a 1914, corresponde, de um modo geral,
ao que informalmente se denomina "belle époque". Uma de suas características, sob o ponto de vista da
história literária, é a pluralidade de tendências filosóficas, científicas, sociais e literárias, advindas do
realismo-naturalismo. Muitas das quais não sobreviveriam à grande guerra, transformando -se ou
desaparecendo no conflito e arrastando o final do século XIX que em vão tentava ultrapassar os seus
próprios limites cronológicos.

É a época das boêmias literárias, como as de Montmartre e Munique. Dessa literatura de cafés e boulevards,
de transição pré-vanguardista, é que vão se originar os inúmeros - ismos que marcarão o desenvolvimento
de todas as artes neste século [XX]. Esses movimentos foram, por um lado, decorrentes do culto à
modernidade, resultado das transformações científicas por que passava a humanidade; e, por outro,
consequência do esgotamento de técnicas e teorias estéticas que já não correspondiam à realidade do novo
mundo que começava a desvendar-se.

CONTEXTO BRASILEIRO E O MODERNISMO

Uma simples inspeção dos números mostra que o Modernismo se vincula estreitamente a certas
transformações das sociedades, determinadas em geral por fenômenos exteriores, que vêm repercutir aqui.
1922 é um ano simbólico do Brasil moderno, coincidindo com o Centenário da Independência. A Guerra
Mundial de 1914-1918 influiu no crescimento da nossa indústria e no conjunto da economia, assim como

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nos costumes e nas relações políticas. Não apenas surge uma mentalidade renovadora na educação e nas
artes, como se principia a questionar seriamente a legitimidade do sistema político, dominado pela oligarquia
rural.

Em 1922, irrompe a transformação literária [com a Semana de Arte Moderna]. ocorre o primeiro dos levantes
político-militares que acabariam por triunfar com a Revolução de Outubro de 1930, funda-se o Partido
Comunista Brasileiro, etapa significativa da política de massas, que se esboçava e que avultaria cada vez
mais.

(Antonio Candido e José Aderaldo Castello. Presença da literatura brasileira: Modernismo. 8. ed. São Paulo/Rio de Janeiro: Di fel, 1979. p. 7-8.)

VANGUARDAS EUROPEIAS103

Na Europa não houve uma arte moderna uniforme. Houve, sim, um conjunto de tendências artísticas - muitas
vezes provenientes de países diferentes – com propostas específicas, embora as aproximassem certos
traços, como o sentimento de liberdade criadora, o desejo de romper com o passado, a expressão da
subjetividade e certo irracionalismo.

Paris era o principal centro cultural europeu da época e o lugar de onde as novas ideias artísticas se
irradiavam para o resto do mundo ocidental. Essas tendências, que surgiram na Europa antes, durante e
depois da Primeira Guerra Mundial, foram consideradas correntes de vanguarda.

FUTURISMO

Após a publicação, em 1909, do Manifesto Futurista, que define o perfil ideológico do movimento, Marinetti
lançou, em 1912, o Manifesto Técnico da Literatura Futurista, cujas propostas representam uma verdadeira
revolução literária. Entre elas, destacam-se:
• destruição da sintaxe e disposição das "palavras em liberdade";
• emprego de verbos no infinitivo, com vistas à substantivação da linguagem;
• abolição dos adjetivos e dos advérbios;
• uso de substantivo duplo, em lugar de substantivo acompanhado de adjetivo (praça-funil, mulher-golfo, por
exemplo);
• abolição da pontuação, que seria substituída por sinais da matemática ( +, -, :, =, >, <) e pelos sinais
musicais;
• destruição do eu psicologizante.

Evidentemente, nem todas essas propostas se firmaram na literatura. Contudo, o verso livre ficou como
uma das mais importantes contribuições do Futurismo e do Cubismo às correntes contemporâneas.

Embora a área de maior penetração do Futurismo tenha sido a literatura, o movimento também encontrou
ecos na pintura e na escultura, particularmente nas obras de Calos Carrà, Umberto Boccioni, Gino Severini,
Luigi Russolo e Giacomo Balia. Nas telas futuristas são comuns elementos que sugerem a velocidade e a
mecanização da vida moderna.

As propostas técnicas do Futurismo italiano tiveram adeptos em todo o mundo, entre os quais o escritor
norte-americano Walt Whitman, o poeta português Fernando Pessoa e os poetas brasileiros Mário de
Andrade e Oswald de Andrade. Veja, por exemplo, como nos seguintes versos do poema "Ode triunfal", de

Adaptado de CEREJA, William R. e MAGALHÃES, Thereza C. Literatura brasileira. 2ª ed. – São Paulo: Saraiva, 2013.
103

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Fernando Pessoa, manifestam-se certos traços da poesia futurista, como o tom exaltado e exclamativo, a
negação do passado e a exaltação das máquinas.

CUBISMO

Iniciado na França, em 1907, o movimento cubista teve como principais representantes o pintor espanhol
Pablo Picasso e o poeta francês Apollinaire.

Na pintura, os artistas desse movimento cultivavam a representação de objetivos pelo uso de figuras
geométricas e de ângulos retos. Também difundiram a técnica de colagem, que consiste em criar imagens
por meio de outras, recortadas de jornais, revistas, anúncios.

Na literatura, os poetas compunham seus poemas por meio da exploração do espaço gráfico do livro,
dispondo versos e estrofes de modo a construir imagens. Em relação ao plano do conteúdo, os poemas
cubistas expressavam mistura de assuntos, sobreposição de tempos e espaços, o que resultava na
fragmentação do pensamento refletido nos textos poéticos.

Figura 1Figura 1Pablo Picasso, principal artista do cubismo, é autor de “Guernica”, obra que remete à Guerra Civil
Espanhola. [1]

DADAÍSMO

O movimento dadaísta, surgido durante a Primeira Guerra Mundial, teve como líder o artista Tristan Tzara e
como centro de difusão a cidade de Zurique, na Suíça, em razão desse país europeu ter -se mantido neutro
durante a guerra. As obras de arte desse movimento caracterizavam-se pela irreverência, pela ausência de
lógica, pela agressividade. Assim, muitas vezes, reunidos no Cabaret Voltaire, espaço cultural de Zurique,
esses artistas faziam declamações e performances permeadas por gritos, palavrões, comicidades. O
propósito dessa estética era expressar a decadência da humanidade diante dos horrores da guerra e a
impotência da arte tradicional.

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Nas artes plásticas, destaca-se o artista Marcel Duchamp. Na literatura, destaca-se o poeta Ludwing Kassak,
responsável pela construção de poemas fonéticos, nos quais predominam a reprodução gráfica de sons
variados. Outro poeta representativo foi André Breton, que posteriormente tornou -se fundador do
surrealismo.

“Fonte” (1917), obra de Marcel Duchamp.


SURREALISMO

Iniciado na França, a partir da publicação do Manifesto do surrealismo, lançado em 1924, d e autoria de


André Breton, o movimento surrealista visava unir arte e psicanálise, principalmente tendo o sonho como
fonte imaginária para a criação artística. Nesse sentido, é importante lembrarmo -nos de que estudos de
Sigmund Freud, pai da psicanálise, eram difundidos nessa época.

Valorizava também o automatismo artístico, que consistia em reproduzir-se na tela tudo o que vinha à
mente do artista, sem que houvesse um filtro, o que interessava era a expressão do subconsciente sem
qualquer controle racional. Dessa forma, tornaram-se comuns o ilogismo, o devaneio, a hipnose etc.
Na literatura, destacaram-se o fundador do movimento, André Breton, Louis Aragon e Antonin Artaud. Nas
artes plásticas, destacaram-se o artista espanhol Salvador Dalí, Joan Miró e Max Ernst. O surrealismo
também se manifestou no cinema, sendo o principal cineasta dessa vertente o espanhol Luis Buñuel.

A persistência da memória (1931), do pintor espanhol A tentação de Santo Antônio (1946)


Salvador Dali

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EXPRESSIONISMO: liberdade na expressão no mundo interior

Chamados expressionistas na Alemanha e fauvistas na França, os


artistas do expressionismo valorizavam a expressão da subjetividade
do artista, ou seja, de seu mundo interior, de modo que a obra de arte
teria que ser o reflexo direto da interioridade de quem a compõe.
Opunha-se, assim, ao impressionismo, movimento que valorizava o
contrário do que propunha o expressionismo, já que os artistas
impressionistas acreditavam que a criação artística adivinha de um
processo em que o exterior afetava o interior do artista.

No plano literário, o expressionismo priorizava o uso de uma


linguagem fragmentada, a ausência de sujeito no período sintático, o
uso do verso livre, a crítica aos valores burgueses, como consumismo
e indiferença social.
A dança da vida (1899-1900), de Edvard Munch,
um dos mais importantes
O Impressionismo consiste em uma corrente da pintura que valoriza a
impressão, ou seja, é uma arte sensorial e subjetiva quanto ao modo de captação da realidade. Na relação
entre o artista impressionista e a realidade, o movimento de criação vai do mundo exterior para o mundo
interior. Já no Expressionismo ocorre o oposto: o movimento de criação parte da subjetividade do artista, do
seu mundo interior, em direção ao mundo exterior. Assim, para o artista expressionista, a obra de arte é
reflexo direto de seu mundo interior e toda a atenção é dada à expressão, isto é, ao modo como f orma e
conteúdo livremente se unem para dar vazão às sensações do artista no momento da criação.
Entre os principais fundamentos do Expressionismo destacam-se:
• A arte não é imitação, mas criação subjetiva, livre. A arte é expressão dos sentimentos.

• A realidade que circunda o artista é horrível e, por isso, ele a deforma ou a elimina, criando a arte abstrata.
• A razão é objeto de descrédito.
• A arte é criada sem obstáculos convencionais, o que representa um repúdio à repressão social.
• A intimidade e a vivência da dor derivam do sentido trágico da vida e causam uma deformação significativa.
• A arte se desvincula do conceito de belo e feio e torna- se uma forma de contestação.
Na literatura, o Expressionismo geralmente apresenta estas características:
• linguagem fragmentada, elíptica, constituída por frases nominais (basicamente aglomerados de
substantivos e adjetivos), às vezes até sem sujeito;
• despreocupação quanto à organização do texto em estrofes, ao emprego de rimas ou à musicalidade;
A VANGUARDA BRASILEIRA

O Modernismo brasileiro iniciou-se oficialmente em 1922, com a realização da Semana de Arte Moderna.
Entre os fatos que precederam a Semana de Arte Moderna destacam-se a criação da revista de artes O
Pirralho, dirigida por Oswald de Andrade e Emílio de Menezes, em 1911; a exposição de obras do pint or
russo Lasar Segall, em 1913; a participação do poeta brasileiro Ronald de Carvalho, em 1915, na fundação
da revista Orpheu, que deu início ao Modernismo em Portugal; a publicação, em 1917, de várias obras de
poesia, entre elas Há uma gota de sangue em cada poema, de Mário de Andrade (que usou o nome Mário
Sobral), e A cinza das horas, de Manuel Bandeira. Contudo, o fato mais marcante desse período foi uma
exposição da pintora paulista Anita Malfatti, realizada em 1917, que provocou por parte do escritor e crítico
do jornal O Estado de S. Paulo Monteiro Lobato uma violenta crítica, intitulada "Paranoia ou mistificação?".
Veja um fragmento desse artigo:

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Há duas espécies de artistas. Uma composta dos que veem normalmente as coisas e em consequência disso fazem
arte pura, guardando os eternos ritmos da vida, e adotados para a concretização das emoções estéticas, os processos
clássicos dos grandes mestres. [...] A outra espécie é formada pelos que veem anormalmente a natureza, e interpretam-
na à luz de teorias efêmeras, sob a sugestão estrábica de escolas rebeldes, surgidas cá e lá como furúnculos da cultura
excessiva. São produtos do cansaço e do sadismo de todos os períodos de decadência: são frutos de fins de estação,
bichados ao nascedouro. [. . .] Estas considerações são provocadas pela exposição da Sra. Malfatti, onde se notam
acentuadíssimas tendências para uma atitude estética forçada no sentido das extravagâncias de Picasso e companhia.
[. . .]
EXERCÍCIOS
1. Sobre as vanguardas europeias, é correto afirmar, exceto:
a) Entre suas principais manifestações estão o Cubismo, o Futurismo, o Expressionismo, o Dadaísmo e o
Surrealismo, todos surgidos na Europa no início do século XX.
b) As tendências literárias que compuseram as vanguardas europeias estavam unidas por um único projetor
artístico, cuja proposta era a de retomar os ideais clássicos nas artes e na literatura.
c) As vanguardas europeias influenciaram as artes no mundo ocidental de maneira contundente. No Brasil,
as inovações nas artes e na literatura ficaram conhecidas como Modernismo.
d) A palavra “vanguarda” tem origem no francês avant-garde, que significa “o que marcha na frente”, ou seja,
as correntes de vanguarda antecipavam o futuro com suas práticas artísticas inovadoras e nada
convencionais.
e) Não havia um projeto artístico em comum que agregasse os artistas de vanguarda em torno de uma única
proposta, contudo, estavam unidos por uma mesma causa: a de inovar as artes e romper com os padrões
clássicos vigentes.
2. Sobre o Futurismo, estão corretas as seguintes alternativas:
I. No Brasil, todas as tendências de vanguarda foram chamadas de Modernismo, que equivale ao Futurismo,
para os italianos, e ao Expressionismo, para os alemães.
II. Na literatura brasileira, seus principais representantes foram Manuel Bandeira e Augusto Frederico
Schmidt, que se apropriaram de ideais futuristas para a realização de uma escrita automática e telegráfica.
III. O Futurismo difundiu-se por meio de manifestos e conferências, encontrando na literatura seu meio ideal
de realização artística.
IV. Entre suas principais características estão a decomposição das figuras em formas geométricas, a não
retratação da realidade de forma real (realidade fragmentada), a não utilização da perspectiva e
tridimensionalidade e o uso do humor.
a) Todas estão corretas.
b) Apenas I está correta.
c) I e III estão corretas.
d) II e IV estão corretas.
e) II e IV estão corretas.

3. (UCP – PR)
Movimento literário brasileiro que recebeu influências de vanguardas europeias, tais como o Futurismo e o
Surrealismo:

a) Modernismo
b) Parnasianismo
c) Romantismo
d) Realismo
e) Simbolismo

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4. (Enem) “Todas as manhãs quando acordo, experimento um prazer supremo: o de ser Salvador Dalí.”
NÉRET, G. Salvador Dalí. Taschen, 1996.

Assim escreveu o pintor dos “relógios moles” e das “girafas em chamas” em 1931. Esse artista excêntrico
deu apoio ao general Franco durante a Guerra Civil Espanhola e, por esse motivo, foi afastado do movimento
surrealista por seu líder, André Breton. Dessa forma, Dalí criou seu próprio estilo, baseado na interpretação
dos sonhos e nos estudos de Sigmund Freud, denominado “método de interpretação paranoico”. Esse
método era constituído por textos visuais que demonstram imagens
a) do fantástico, impregnado de civismo pelo governo espanhol, em que a busca pela emo ção e pela
dramaticidade desenvolveu um estilo incomparável.
b) do onírico, que misturava sonho com realidade e inconsciente como um universo único ou pessoal.
c) da linha inflexível da razão, dando vazão a uma forma de produção despojada no traço, na temática e nas
formas vinculadas ao real.
d) do reflexo, que, apesar do termo "paranoico", possui sobriedade e elegância advindas de uma técnica de
cores discretas e desenhos precisos.

e) da expressão e intensidade entre o consciente e a liberdade, declarando o amor pela forma de conduzir
o enredo histórico dos personagens retratados.
5. (Ano: 2017 Banca: INEP Órgão: ENEM)
E venham, então, os alegres incendiários de dedos carbonizados! Vamos! Ateiem fogo às estantes das bibliotecas!
Desviem o curso dos canais, para inundar os museus! Empunhem as picaretas, os machados, os martelos e deitem
abaixo sem piedade as cidades veneradas!
MARINETTI, F. T. Manifesto futurista. Disponível em: www.sibila.com.br. Acesso em: 2 ago. 2012 (adaptado).

Que princípio marcante do Futurismo e comum a várias correntes artísticas e c ulturais das primeiras três
décadas do século XX está destacado no texto?
a) A tradição é uma força incontornável.
b) A arte é expressão da memória coletiva.
c) A modernidade é a superação decisiva da história.
d) A realidade cultural é determinada economicamente.
e) A memória é um elemento crucial da identidade cultural.

6. (ENEM – 2019)
1. Nós queremos cantar o amor ao perigo, o hábito da energia e da temeridade.
2. A coragem, a audácia, a rebelião serão elementos essenciais de nossa poesia.
3. A literatura exaltou até hoje a imobilidade pensativa, o êxtase, o sono. Nós queremos exaltar o movimento agressivo,
a insônia f ebril, o passo de corrida, o salto mortal, o bofetão e o soco.
4. Nós af irmamos que a magnif icência do mundo enriqueceu-se de uma beleza nova: a beleza da velocidade. Um
automóvel de corrida com seu cofre enfeitado com tubos grossos, semelhantes a serpentes de hálito explosivo… um
automóvel rugidor, que parece correr sobre a metralha, é mais bonito que a Vitória de Samotrácia.
5. Nós queremos entoar hinos ao homem que segura o volante, cuja haste ideal atravessa a Terra, lançada também
numa corrida sobre o circuito da sua órbita.
6. É preciso que o poeta prodigalize com ardor, f austo e munif iciência, para aumentar o entusiástico f ervo r dos
elementos primordiais.
MARINETTI, F. T. Manifesto futurista. In: TELES, G. M. Vanguardas europeias e Modernismo brasileiro. Petrópolis: Vozes, 1985.

O documento de Marinetti, de 1909, propõe os referenciais estéticos do Futurismo, que valorizam a


a) composição estática.
b) inovação tecnológica.
c) suspensão do tempo.
d) retomada do helenismo.
e) manutenção das tradições.

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Disciplina: Português V – AULA 9
Conteúdo: MODERNISMO: 1ª FASE (1922-1930)104

O movimento modernista no Brasil contou com duas fases: a primeira foi de 1922 a 1930, e a segunda, de
1930 a 1945. A primeira fase caracterizou-se pelas tentativas de solidificação do movimento renovador e
pela divulgação de obras e ideias modernistas.
Apesar da diversidade de correntes e ideias, pode-se dizer que, de modo geral, os escritores de maior
destaque dessa fase defendiam a reconstrução da cultura brasileira sobre bases nacionais, a promoção de
uma revisão crítica de nosso passado histórico e de nossas tradições culturais, a eliminação definitiva do
nosso complexo de colonizados, apegados a valores estrangeiros. Eram, portanto, defensores de uma visão
nacionalista, porém crítica, da realidade brasileira.
Mário de Andrade, na conferência que fez em 1942 sobre a Semana de Arte Moderna, assi m se referiu a
esse período: "E vivemos uns oito anos, até perto de 1930, na maior orgia intelectual que a história artística
do país registra".

SEMANA DE ARTE MODERNA - 1922

A Semana de Arte Moderna foi um evento artístico e cultural que


ocorreu no Teatro Municipal de São Paulo, entre os dias 13 a 17 de
fevereiro de 1922. A proposta era apresentar uma nova estética
artística para todos os campos das artes.
O evento contou com apresentações de dança, música, recital de
poesias, exposição de obras de arte, como pinturas e esculturas, e
palestras.
Os artistas envolvidos na organização da Semana de 22 propunham novas visões de estética artística,
baseadas nas vanguardas artísticas europeias.
O evento, que chocou grande parte da plateia presente, buscou implementar novos processos na confecção
das artes e dar-lhe uma feição mais brasileira. Um dos principais objetivos era o rompimento com a estética
da arte acadêmica, especialmente do parnasianismo.
A informalidade e o improviso, a liberdade de produção, tudo isso se tornou regra da arte moderna, de modo
a romper o formalismo das artes até então vigentes.
Os principais objetivos da Semana de Arte Moderna foram:
• criar uma arte que fosse autenticamente brasileira;

• criticar a arte acadêmica;

• romper com o formalismo da estética artística;

• inaugurar o movimento modernista brasileiro inspirado nas vanguardas europeias;

• popularizar a arte.

Adaptado de CEREJA, William R. e MAGALHÃES, Thereza C. Literatura brasileira. 2ª ed. – São Paulo: Saraiva, 2013.
104

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A REALIZAÇÃO DO EVENTO105 – SEMANA DE ARTE MODERNA 1922
"Queremos luz, ar, ventiladores, aeroplanos, reivindicações
obreiras, idealismos, motores, chaminé de fábricas, sangue, velocidade, sonho,
na nossa Arte!" Menotti dei Picchia, trecho da conferência pronunciada no segundo
espetáculo da Semana, em 15 de fevereiro de 1922.

As primeiras informações sobre a realização de uma semana de arte foram


veiculadas pela imprensa paulista em 29 de janeiro de 1922; nessa data, o jornal
Correio Paulistano noticia a organização da Semana e relaciona todos os
prováveis participantes do evento.
Já o historiador do Modernismo, Mário da Silva Brito, reproduz parcialmente uma nota que constou da edição
de 29 de janeiro de O Estado de S. Paulo, praticamente com o mesmo conteúdo da anterior: "Por iniciativa do
festejado escritor, Sr. Graça Aranha, da Academia Brasileira de Letras, haverá em São Paulo uma 'Semana de Arte
Moderna', em que tomarão parte os artistas que, em nosso meio representam as mais modernas correntes·artísticas."
Durante os primeiros dias de fevereiro, várias notícias criavam um clima de expectativa em torno do
acontecimento; tal fato explica a enorme afluência de público ao primeiro espetáculo, na noite de 13 de
fevereiro. Pelo saguão do Teatro Municipal de São Paulo, várias pinturas e esculturas provocavam reações
de espanto e repúdio; os trabalhos mais visados eram os de Victor Brecheret e Anita Malfatti.
O espetáculo de 13 de fevereiro foi aberto com a conferência de Graça Aranha, "A emoção estética na arte
moderna", acompanhada da música de Ernani Braga e das poesias de Ronald de Carvalho e Guilherme de
Almeida. A conferência de Graça Aranha não chegou a causar espanto, ao contrário da música de Ernani
Braga, que fazia uma sátira a Chopin - o que levaria a pianista Guiomar Novaes a protestar publicamente
contra os organizadores da Semana. A noitada prosseguiu com a conferência "A pintura e a escultura
moderna no Brasil", de Ronald de Carvalho, três solos de piano de Ernani Braga e três danças africanas de
Villa-Lobos.
O segundo espetáculo, a 15 de fevereiro , anunciava como grande atração a pianista Guiomar Novaes, que,
apesar do protesto, compareceu e se apresentou. Entretanto, a "atração" foi uma conferência de Menotti dei
Picchia sobre arte e estética, ilustrada com a leitura de textos de Oswald de Andrade, Mário de Andrade e
Plínio Salgado, entre outros ; a cada leitura, o público se manifestava através de miados e latidos. Ronald
de Carvalho lê "Os sapos", de Manuel Bandeira, numa crítica aberta ao modelo parnasiano; o público faz
coro , ironizando o refrão "foi! não foi! foi! ... ". Durante o intervalo, Mário de Andrade lê , nas escadarias do
teatro, trechos de A escrava que não é Isaura .
Os sapos (Manuel Bandeira)
Enfunando os papos,
Saem da penumbra,
Aos pulos, os sapos.
A luz os deslumbra.
Em ronco que aterra,
Berra o sapo-boi:
- "Meu pai foi à guerra!"
- "Não foi!" - "Foi!" - "Não foi!".
O sapo-tanoeiro,
Parnasiano aguado,
Diz: - "Meu cancioneiro
É bem martelado.
Vede como primo
Em comer os hiatos! (...)
A 17 de fevereiro, realizou-se o “terceiro e último grande festival" da Semana de Arte Moderna, com a
apresentação de músicas de Villa-Lobos. O público já não lotava o teatro e comportava-se mais
respeitosamente. Exceto quando o maestro Villa-Lobos entra em cena de casaca e ... chinelos; o público
interpreta a atitude como futurista, e vaia. Mais tarde, o maestro explicaria que não se tratava de futurismo
e sim de um calo arruinado...

105
NICOLA, José de. Literatura brasileira: das origens aos nossos dias. São Paulo: Scipione, 1998.

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Afinal, o que queriam os modernistas?

➢ Propunham abrasileirar o país;


➢ Antipassadistas, rumavam a um forte nacionalismo;
➢ De esteticismo anárquico, refutavam o purismo gramatical;
➢ Buscavam a ruptura com o academicismo e o tradicionalismo artístico;
➢ Aspiravam à fusão de influências externas aos elementos artísticos brasileiros;
➢ Objetivavam a utilização da linguagem coloquial e vulgar para aproximar-se da linguagem do povo.

o capoeira
- Quê apanhá sordado?
-O quê?
- Quê apanhá?
Pernas e cabeças na calçada
(Oswald de Andrade. Poesias reunidas. 5. ed. Rio de Janeiro: Civilização Brasileira, 1978. p. 94.)

“Reagiam, portanto, contra o europeísmo parnasiano, ao mesmo tempo em que rendiam reverência a um
passado ainda mais remoto, além de reaquecer um estereótipo romântico, sob o pretexto de brasilidade e
nacionalismo.” (MOISÉS, 2019, p. 28)

Características
O período de 1922 a 1930 é o mais radical do movimento modernista, justamente em consequência da
necessidade de definições e do rompimento de todas as estruturas do passado. Daí o caráter anárquico
desta primeira fase modernista e seu forte sentido destruidor, assim definido por Mário de Andrade:

" ... se alastrou pelo Brasil o espírito destruidor do movimento modernista. Isto é, o seu sentido
verdadeiramente específico. Porque, embora lançando inúmeros processos e idei as novas, o movimento
modernista foi essencialmente destruidor. ( ... ) Mas esta destruição não apenas continha todos os germes
da atualidade, como era uma convulsão profundíssima da realidade brasileira. O que caracteriza esta
realidade que o movimento modernista impôs é, a meu ver, a fusão de três princípios fundamentais: o direito
permanente à pesquisa estética; a atualização da inteligência artística brasileira e a estabilização de uma
consciência criadora nacional."

Ao mesmo tempo que se procura o moderno, o original e o polêmico, o nacionalismo se manifesta em suas
múltiplas facetas: uma volta às origens, a pesquisa das fontes quinhentistas, a procura de uma "língua
brasileira" (a língua falada pelo povo nas ruas), as paródias, numa tentativa de repen sar a história e a
literatura brasileiras, e a valorização do índio verdadeiramente brasileiro. É o tempo dos manifestos
nacionalistas do Pau-Brasil e da Antropofagia, dentro da linha comandada por Oswald de Andrade, e dos
manifestos do Verde-Amarelismo e do grupo da Anta, que já trazem as sementes do nacionalismo
comandado por Plínio Salgado.
Entre os principais nomes dessa primeira fase do Modernismo e que continuariam a produzir nas décadas
seguintes destacam-se Mário de Andrade, Oswald de Andrade, Manuel Bandeira, Antônio de Alcântara
Machado, além de Menotti deI Picchia, Cassiano Ricardo, Guilherme de Almeida e Plínio Salgado.

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A orgia intelectual

O período a que Mário de Andrade chama de "orgia intelectual" é rico em


publicações de obras literárias, revistas e manifestos. Entre as revistas
fundadas para difundir as propostas modernistas, destacam-se: Klaxon
(1922), criada em São Paulo logo após a Semana de Arte Moderna;
Estética (1924), no Rio de Janeiro; A revista (1925), em Belo Horizonte;
Terra Roxa e Outras Terras (1927), em São Paulo; a Revista de
Antropofagia (1928), porta-voz do movimento Antropofagia, fundado por
Oswald de Andrade.
Simultaneamente à publicação de obras e à fundação de revistas, foram lançados vários manifestos e
movimentos, que aglutinavam e dividiam os escritores da época. Entre eles, destacam-se quatro: Pau-Brasil,
Verde-Amarelismo, Antropofagia e a Escola da Anta.

Pau-Brasil: a poesia de exportação

Em 1924, Oswald de Andrade lançou o Manifesto da Poesia Pau-Brasil, dando início ao movimento Pau-
Brasil, que, inspirado em nosso primeiro produto de exportação, o pau -brasil, defendia a criação de uma
poesia brasileira de exportação. Demonstrando irreverência e revolta contra a cultura acadêmica e a
dominação cultural europeia em nosso país, o movimento propunha uma poesia primitivista, construída com
base na revisão crítica de nosso passado histórico e cultural e na aceitação e valorização dos contrastes da
realidade e da cultura brasileiras.
Do ponto de vista técnico, o manifesto de Oswald propunha: a criação de uma língua brasileira ("A língua
sem arcaísmo, sem erudição"; "A contribuição milionária de todos os erros"); a síntese; o equilíbrio; a
surpresa.

Verde-Amarelismo e Anta: a reação

Como reação ao tipo de nacionalismo defendido por Oswald de Andrade no Manifesto da Poesia Pau-Brasil
e ao espírito anarquista de seu autor, surgiu em São Paulo o movimento Verde -Amarelismo, constituído por
Menotti del Picchia, Plínio Salgado, Guilherme de Almeida e Cassiano Ricardo. Defendendo um
nacionalismo ufanista, com evidente inclinação para o nazifascismo (conforme ficaria comprovado mais tarde
com a adesão de Plínio Salgado ao integralismo), o grupo aleg ava que o movimento Pau-Brasil era
"afrancesado". Em 1927, tomando a anta e o índio tupi como símbolos da nacionalidade primitiva, o grupo
verde-amarelo transformou-se na Escola da Anta.

A Antropofagia: a deglutição cultural

Revidando com sarcasmo o primitivismo xenófobo da Anta, Oswald de Andrade, Tarsila do Amaral e Raul
Bopp lançaram, em 1928, o mais radical de todos os movimentos do período: a Antropofagia. O movimento
foi inspirado no quadro Abaporu ("antropófago", em tupi), que Tarsila oferecera a Os wald como presente de
aniversário.
Partidários de um primitivismo crítico, os antropófagos propunham a devoração da cultura estrangeira. As
ideias do grupo tinham como porta-voz a Revista de Antropofagia, da qual também participavam Antônio de
Alcântara Machado, Geraldo Costa e outros.
Contrariamente à xenofobia da Escola da Anta, os antropófagos não negavam a cultura estrangeira, mas
também não a copiavam nem imitavam. Assim como os índios primitivos devoravam seu inimigo, acreditando
que desse modo assimilariam suas qualidades, os artistas antropófagos propunham a "devoração simbólica"

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da cultura estrangeira, aproveitando suas inovações artísticas, porém sem a perda da nossa própria
identidade cultural. Trata-se, portanto, de um aprofundamento da ideia da "digestão cultural" já proposta no
Manifesto da Poesia Pau-Brasil.

Observe, nestes fragmentos do Manifesto Antropófago, de autoria de Oswald de Andrade, o posicionamento


ideológico do escritor em relação ao sistema social e à dominação cultural estrangeira:

Da primeira geração do Modernismo brasileiro, participaram vários escritores, entre os quais se destacaram
Oswald de Andrade, Mário de Andrade, Manuel Bandeira, Alcântara Machado, Menotti delPicchia, Guilherme
de Almeida, Ronald de Carvalho e Raul Bopp.

MARIO DE ANDRADE: VANGUARDA E TRADIÇAO

Mário de Andrade (1893-1945) nasceu em São Paulo, cidade que amou


intensamente e que retratou em várias de suas obras. Estudou música
no Conservatório Musical de São Paulo e cedo iniciou sua carreira como
crítico de arte, em jornais e revistas. Com apenas 20 anos e com o
pseudônimo de Mário Sobral, publicou seu primeiro livro, Há uma gota
de sangue em cada poema, no qual fazia críticas à carnificina produzida
pela Primeira Guerra Mundial e defendia a paz. As inovações formais da
obra desagradaram aos críticos de orientação parnasiana.
O autor teve um papel decisivo na implantação do Modernismo no Brasil.
Homem de vasta cultura, pesquisador paciente, Mário soube dar a Retrato de Mário de Andrade (1935), de Portinari.
substância teórica de que necessitava o movimento em algumas ocasiões decisivas. Em 1922, meses após
a Semana, publicou o seu Prefácio interessantíssimo; e em 1925, quando se articulavam revistas e
movimentos por todo o país, lançou o ensaio A escrava que não é Isaura, no qual retomava e aprofundava
suas considerações iniciais sobre arte moderna.
PREFÁCIO INTERESSANTÍSSIMO
Leitor:
Está fundado o Desvairismo.
Este prefácio, apesar de interessante, inútil. Alguns dados. Nem todos. Sem conclusões. Para quem me aceita são
inúteis ambos. Os curiosos terão prazer em descobrir minhas conclusões, confrontando obra e dados. Para quem me
rejeita trabalho perdido explicar o que, antes de ler, já não aceitou.

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Autor de uma frase como "o passado é lição para se meditar e não para se reproduzir", o que mais
impressiona em Mário de Andrade é a capacidade de conciliar, em plena euforia da "destruição" dos
primeiros embates modernistas, as lições do passado e as conquistas do presente. Já em 1921, Mário
aceitava várias das propostas formais do futurismo italiano, mas rejeitava-lhe a postura radicalmente
destruidora. E foi com essa serenidade e equilíbrio que ele conduziu toda a sua obra.
Essa postura de rever o passado, em vez de negá-lo radicalmente, levaria Mário a escrever ensaios de
crítica literária de inestimável valor, que chegaram a alterar a visão da crítica vigente sobre certos autores
do passado. A par da literatura, Mário também revelou interesse pela música, pelo folclore, pela antropologia,
pela etnografia, pela psicologia e por outras áreas do conhecimento humano que podiam enriquecer suas
atividades essenciais de escritor e músico (pianista, professor de música e compositor) .
Sem nunca ter saído do país, Mário empreendeu várias viagens pelo Brasil, inicialmente como mero "turista
aprendiz" e depois como pesquisador. Passou pelas cidades históricas mineiras, pelo Norte e pelo Nordeste
do país, onde recolheu materiais e informação de interesse cultural, como poemas e canções populares,
modinhas, ritmos, festas religiosas e de folia, lendas e músicas indígenas, objetos de arte.
Mário foi diretor do Departamento de Cultura da Prefeitura de São Paulo, funcionário do Serviço do
Patrimônio Histórico, do Ministério da Educação e professor universitário, sempre prestando serviços de
grande valor na área da cultura e da educação.
Muito mais do que como meio de satisfação pessoal, Mário encarava sua intensa atividade cultural como
missão, isto é, queria ser útil no processo de reconstrução de um Brasil que se transformava social, política,
econômica e culturalmente.

A poesia: um canto de amor a São Paulo e ao país


Após haver publicado Há uma gota de sangue em cada poema, Mário publicou em 1922 Pauliceia
desvairada, sua primeira obra de fato modernista. Vista hoje como uma obra que não alcança um estágio
mais elevado de poesia, Pauliceia na época agradou ao grupo modernista, pois cumpriu o papel de destruir
os padrões literários vigentes e propor uma nova linguagem poética, baseada no verso livre, nas rupturas
sintáticas, nos flashes cinematográficos, nos neologismos, na elisão e na fragmentação. O poema a
seguir ilustra bem o emprego desses procedimentos formais, ao mesmo tempo que lança a cidade de São
Paulo, cidade natal do poeta, como uma de suas mais importantes fontes temáticas.
O cortejo
Monotonias das minhas retinas…
Serpentinas de entes frementes a se desenrolar…
Todos os sempres das minhas visões! “Bom giorno, caro.”
Horríveis as cidades!
Vaidades e mais vaidades…
Nada de asas! Nada de poesia! Nada de alegria!
Oh! Os tumultuários das ausências!
Paulicéia – a grande boca de mil dentes;
e os jorros dentre a língua trissulca
de pus e de mais pus de distinção…
Giram homens fracos, baixos, magros…
Serpentinas de entes frementes a se desenrolar…
Estes homens de São Paulo,
Todos iguais e desiguais,
Quando vivem dentro dos meus olhos tão ricos,
Parecem-me uns macacos, uns macacos.

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INSPIRAÇÃO
São Paulo! comoção de minha vida.
Os meus amores são flores feitas de original! .
Arlequinal! . Trajes de losangos.. Cinza e ouro ...
Luz e bruma. Forno e inverno morno ..
Elegâncias sutis sem escândalos. sem ciúmes ...
Perfumes de Paris. Arys!
Bofetadas lírica no Trianon. Algodoal!...
São Paulo! comoção de minha vida.
Galicismo a berrar nos desertos da América

ODE AO BURGUÊS
Eu insulto o burguês! O burguês-níquel,
o burguês-burguês!
A digestão bem-feita de São Paulo!
O homem-curva! o homem-nádegas!
O homem que sendo francês, brasileiro, italiano,
é sempre um cauteloso pouco-a-pouco!
Eu insulto as aristocracias cautelosas!
Os barões lampiões! os condes Joões! os duques zurros!
que vivem dentro de muros sem pulos;
e gemem sangues de alguns mil-réis fracos
para dizerem que as filhas da senhora falam o francês e tocam os “Printemps” com as unhas!

O TROVADOR
Sentimentos em mim do asperamente
dos homens das primeiras eras ...
As primaveras de sarcasmo
intermitentemente no meu coração arlequinal.
Intermitentemente.
Outras vezes é um doente. um frio
na minha alma doente como um longo som redondo.
Cantabona! Cantabona!
Dlorom ..
Sou um tupi tangendo um alaúde!

Em 1926, Mário publicou Losango Cáqui, uma obra de poemas escritos em 1922 e que segue a orientação
dos poemas "desvairistas".
Clã do Jabuti (1927) e Remate de Males (1930), obras escritas em 1923 e 1930 e nas quais Mário empregou
o resultado das pesquisas folclóricas realizadas nas viagens que empreendeu pelo Brasil entre 1924 e 1927,
representam o início de um período de grande fecundidade, do qual surgiria Macunaíma. Buscando o
conhecimento e o registro do Brasil e de suas manifestações culturais, Mário introduziu nessas obras as
lendas, os costumes e o modo de falar regionais, os ritmos e as danças populares: samba, toada, modinha.
A partir de 1930, a poesia de Mário de Andrade sofreu uma mudança de orientação, possivelmente por
influência da Revolução de 1930. Esse fato não é isolado: definitivamente implantado o Modernismo, toda a
literatura se voltava para a reflexão, a análise e a denúncia dos problemas nacionais.
A poesia de Mário tomou então duas direções: de um lado, a poesia intimista e introspectiva, serena ou
conflitante, de que é exemplo a obra Poesia (1942); de outro, a poesia política, de combate às injustiças
sociais, em linguagem agressiva e explosiva, de que são exemplos as obras O carro da miséria e Lira
paulistana (1946). O poema que segue ilustra esse misto de lirismo e solidariedade social.

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A prosa: experimentalismo e crítica social

A atividade literária em prosa de Mário de Andrade foi ampla. O escritor cultivou o conto, com Primeiro Andar
(1926) e Contos Novos (1946); a crônica, com Os filhos da Candinha (1945); o romance, com Amar, verbo
intransitivo (1927); a rapsódia, com Macunaíma (1928).
Em quase todas essas obras se destaca a preocupação com a descoberta e a exploração de novas técnicas
narrativas e, ao mesmo tempo, com a sondagem do universo social e psicológico do ser humano das grandes
cidades. Contos como "Primeiro de maio", "Peru de natal", "Vestida de preto" e outros conc iliam com
perfeição a análise das relações familiares e sociais e a introspecção psicológica, fundada nas teorias de
Freud.
O romance Amar, verbo intransitivo causou impacto quando publicado. Desafiando preconceitos, tematiza a
descoberta do amor entre Carlos e Fraulein, uma governanta oficialmente contratada pelo empresário Souza
Costa para ensinar alemão e piano a seus filhos, mas, na verdade, encarregada de iniciar Carlos, o filho
adolescente, na vida sexual.

Macunaíma: em busca do nacional

Na prosa, Macunaíma é a obra-prima do autor e, provavelmente, a mais


importante realização da primeira fase do Modernismo. A obra
representa não apenas o resultado das pesquisas e das qualidades do
autor como poeta, prosador, músico e folclorista, mas também a plena
realização do projeto nacionalista dos escritores de sua geração.
O ponto de partida para a criação de Macunaíma foi a leitura que Mário
fez da obra Vom Roraima zum Orinoco, do etnógrafo alemão Koch-
Grünberg, que colheu na Amazônia (Brasil e Venezuela). Entre 1911 e
1913, um ciclo de lendas dos índios taulipangues e arecunás. Mário fez
algumas modificações na lenda original, acrescentou outras, de origens
diversas, incluiu anedotas da história brasileira e aspectos da vida
urbana e rural do país e introduziu personagens reais e fictícias, além de
feitiçaria, erotismo e o absurdo surrealista.
Quanto à língua, também se verifica na obra uma verdadeira miscelânea, formada por vocábulos indígenas,
africanos, frases feitas, expressões e provérbios populares, gírias, tudo isso formando, em um estilo narrativo
dinâmico e irônico, um delicioso painel antropofágico da cultura brasileira.
Vamos agora ler alguns trechos da obra:
“No fundo do mato-virgem nasceu Macunaíma, herói da nossa gente. Era preto retinto e filho do medo da
noite. Houve um momento em que o silêncio foi tão grande escutando o murmurejo do Uraricoera, que a
índia tapanhumas pariu uma criança feia. Essa criança é que chamaram de Macunaíma.
Já na meninice fez coisas de sarapantar. De primeiro passou mais de seis anos não falando. Si o incitavam
a falar exclamava:
– Ai! que preguiça!...e não dizia mais nada.

Ficava no canto da maloca, trepado no jirau de paxiúba, espiando o trabalho dos outros e principalmente
os dois manos que tinha, Maanape já velhinho e Jiguê na força de homem. O divertimento dele era decepar
cabeça de saúva.

Vivia deitado mas si punha os olhos em dinheiro, Macunaíma dandava pra ganhar vintém. E também
espertava quando a família ia tomar banho no rio, todos juntos e nus. Passava o tempo do banho dando
mergulho, e as mulheres soltavam gritos gozados por causa dos guaimuns diz-que habitando a água-doce

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por lá. No mucambo si alguma cunhatã se aproximava dele pra fazer festinha, Macunaíma punha a mão nas
graças dela, cunhatã se afastava. Nos machos guspia na cara. Porém respeitava os velhos, e frequentava
com aplicação a murua a poracê o torê o bacorocô a cucuicogue, todas essas danças religiosas da tribo.

Quando era pra dormir trepava no macuru pequeninho sempre se esquecendo de mijar. Como a rede da
mãe estava por debaixo do berço, o herói mijava quente na velha, espantando os mosquitos bem . Então
adormecia sonhando palavras-feias, imoralidades estrambólicas e dava patadas no ar. (p. 1)

Mário de Andrade relata que, ao criar a obra, não pretendia inventar nem símbolos nem uma personagem
que representasse todos os brasileiros. No entanto, à medida que dava vida ao herói da lenda colhida por
Grünberg - curiosamente, herói por suas "desqualidades" de preguiçoso, mentiroso, covarde, etc. -, foi
percebendo inúmeras semelhanças entre ele e os brasileiros ou os latino-americanos em geral, que são,
segundo o autor, povos "sem nenhum caráter". Explica ele:
Com a palavra caráter não determino apenas a realidade moral não, em vez entendo a entidade psíquica
permanente, se manifestando por tudo, nos costumes na ação exterior no sentimento na língua na História
na andadura, tanto no bem como no mal. O brasileiro não tem caráter porque não possui nem civilização
própria nem consciência tradicional.
Macunaíma centra-se (...) num verdadeiro anti-herói, já que “sem nenhum caráter”, como a exprimir a colcha
de retalhos do nosso país (MOISÉS, 2019, p. 65)
Perseguindo a tradição das canções de gesta, das epopeias, das novelas picarescas e dos contos populares
- enfim, perseguindo a tradição oral da literatura -, Macunaíma foi com propriedade chamada por Mário de
rapsódia, nome que, na música, designa um tipo de composição que utiliza uma variedade de motivos
populares. Contudo, a designação romance não lhe é de todo inadequada, já que a obra apresenta
semelhanças com os romances medievais.
Vamos continuar acompanhando mais trechos da obra:

Macunaíma tremeu assustado espantou os mosquitos e caiu no pajuari por demais pra ver si espantava o
medo também. Bebeu e dormiu noite inteira. Então chegou a Cobra Preta e tanto que chupou o único peito
vivo de Ci que não deixou nem o apojo. E como Jiguê não conseguira moçar nenhuma das icamiabas o
curumim sem ama chupou o peito da mãe no outro dia, chupou mais, deu um suspiro envenenado e morreu.

Botaram o anjinho numa igaçaba esculpida com forma de jaboti e prós boitatás não comerem os olhos do
morto o enterraram mesmo no centro da taba com muitos cantos muita dança e muito pajuari. (p. 16)

(...)
No outro dia os manos foram pescar e caçar, a velha foi no roçado e Macunaíma ficou só com a companheira
de Jiguê. Então ele virou na formiga quenquém e mordeu Iriqui pra fazer festa nela. Mas a moça atirou a
quenquém longe. Então Macunaíma virou num pé de urucum. A linda Iriqui riu, colheu as sementes se
faceirou toda pintando a cara e os distintivos. Ficou lindíssima. Então Macunaíma, de gostoso, virou gente
outra feita e morou com a companheira de Jiguê. (p. 31)

(...)
Agora dou minha garrucha pra você e quando alguém bulir comigo você atira. Então virou Jiguê na máquina
telefone, ligou pro gigante e xingou a mãe dele. (p.57)

(...)
E todo aquele mundão de gente procurando. Era já perto da noite quando pararam desacorçoados. Então
Macunaíma se desculpou:
– Tetápe dzónanei pemo...
Não deixaram nem que ele acabasse, todos perguntando o que significava aquela frase. Macunaíma
respondeu:
– Sei não. Aprendi essas palavras quando era pequeno lá em casa. (p. 107)

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OSWALD DE ANDRADE: O ANTROPÓFAGO DO MODERNISMO

A obra de Oswald de Andrade (1890-1954) representa um dos cortes


mais profundos do Modernismo brasileiro em relação à cultura do
passado. Paulista, de família rica, Oswald cursou Direito e ingressou na
carreira jornalística. Em 1911 fundou a revista semanal O Pirralho, que,
com Alcântara Machado e Juó Bananére, dirigiu até 1917, ano em que
a publicação teve fim. Nesse mesmo ano, em sua coluna no Jornal do
Commercio, defendeu Anita Malfatti das críticas de Monteiro Lobato.
Viajava frequentemente à Europa, onde fez várias amizades nos meios
artísticos, o que lhe permitiu estar a par das novidades introduzidas
pelas correntes de vanguarda e, no Brasil, assumir um papel de
liderança. Em 1926, casou-se com Tarsila do Amaral. Retrato de Oswald de Andrade (1923), de
Tarsila do Amaral
Em 1929, sofreu um grande abalo financeiro com a crise do café. Em
1930, casou-se com a escritora comunista Patrícia Galvão (a Pagu). Junto com ela militou nos meios
operários e, em 1931, ingressou no Partido Comunista, no qual permaneceu até 1945.
Desse período são suas obras mais marcadas ideologicamente, como o Manifesto Antropófago, o romance
Serafim Ponte Grande e a peça teatral O rei da vela.
Tal qual a obra que escreveu, Oswald sempre foi debochado, irônico e crítico, pronto para satirizar os meios
acadêmicos ou a própria burguesia, classe de que se originara.

VÍCIO NA FALA CIDADE PRONOMINAIS


Para dizerem milho dizem mio Foguetes pipocam o céu quando em Dê-me um cigarro
Para melhor dizem mió quando Diz a gramática
Para pior pió Há uma moça magra que entrou no Do professor e do aluno
Para telha dizem teia cinema E do mulato sabido
Para telhado dizem teiado Vestida pela última fita Mas o bom negro e o bom
E vão fazendo telhados Conversas no jardim onde crescem branco
bancos Da Nação Brasileira
AMOR Sapos Dizem todos os dias
Humor Olha Deixa disso camarada
A iluminação é de hulha branca Me dá um cigarro.
3 DE MAIO Mamães estão chamando
Aprendi com meu filho de dez anos A orquestra rabecoa na mata
Que a poesia é a descoberta
Das coisas que eu nunca vi.

Seu conceito de nacionalismo era diferente daquele pregado pelos românticos e mesmo por certos grupos
modernistas, como o Verde-Amarelismo e o Anta. Sem ser ingênuo e ufanista, Oswald defendia a
valorização de nossas origens, de nosso passado histórico e cultural, mas de forma crítica, isto é,
recuperando, parodiando, ironizando e atualizando nossa história de colonização. Sua visão de Brasil, ao
mesmo tempo que procura captar a natureza e as cores próprias do país, flagra igualmente as contradições
moderno-primitivas de nossa realidade.
O romance foi o gênero em prosa que mais despertou o interesse de Oswald de Andrade. O autor estreou
na prosa em 1922, com o romance Os condenados, primeiro volume da intitulada Trilogia do exílio, que
incorpora também os volumes Estrela do absinto (publicado em 1927, mas escrito antes de 1922) e Escada
vermelha (1934).

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O romance-experiência: “o estilo telegráfico, a metáfora lancinante”
As principais produções em prosa do escritor são os romances Memórias sentimentais de João Miramar
(publicado em 1924, mas escrito a partir de 1916, segundo o autor) e Serafim Ponte Grande (1933). Essas
obras representam o amadurecimento e a radicalização do emprego de certas técnicas, tais como mescla
de prosa e poesia, estrutura fragmentária, estilo elíptico e telegráfico, sátira-paródica, linguagem jornalística,
aproveitamento de lugares-comuns da linguagem cotidiana, como discursos, bilhetes, cartas, etc.
Memórias sentimentais de João Miramar é um romance fragmentário, formado por 163 capítulos-
relâmpago, sem preocupação com sequência lógica. Baseada em muitas das experiências do autor, a obra
narra a história de um paulista de família burguesa que trilha os caminhos comuns à classe, na época:
estudos, viagem à Europa, casamento, aventuras amorosas, crise financeira, falência, etc.
1. O pensieroso
Jardim desencanto
O dever e procissões com pálios
E cônegos
Lá fora
E um circo vago e sem mistério
Urbanos apitando nas noites cheias
Mamãe chamava‑me e conduzia‑me para dentro do oratório
de mãos grudadas.
— O Anjo do Senhor anunciou à Maria que estava para ser a
mãe de Deus.
Vacilava o morrão do azeite bojudo em cim a do copo. Um
manequim esquecido vermelhava.
— Senhor convosco, bendita sois entre as mulheres, as
mulheres não têm pernas, são como o manequim de mamãe até
embaixo. Para que pernas nas mulheres, amém.
2. Éden
A cidade de São Paulo na América do Sul não era um livro que
tinha cara de bichos esquisitos e animais de história.
Apenas nas noites dos verões dos serões de grilos armavam
campo aviatório com os berros do invencível São Bento as baratas
torvas da sala de jantar.
3. Gare do infinito As Memórias sentimentais de João
Miramar é uma tentativa seríssima de
Papai estava doente na cama e vinha um carro e um homem e o estilo e narrativa, ao mesmo tempo que
carro ficava esperando no jardim.
um primeiro esboço de sátira social.
Levaram‑me para uma casa velha que fazia doces e nos muda-
(Antonio Candido)
mos para a sala do quintal onde tinha uma figueira na janela.
No desabar do jantar noturno a voz toda preta de mamãe ia me As Memórias sentimentais de João
buscar para a reza do Anjo que carregou meu pai. Miramar foram, realmente, o verdadeiro
4. Gatunos de crianças “marco-zero” da prosa brasileira
contemporânea, no que ela tem de
O circo era um balão aceso com música e pastéis na entrada.
inventivo e criativo .
E funâmbulos cavalos palhaços desfiaram desarticulações
risadas para meu trono de pau com gente em redor. O estilo telegráfico do monólogo interior:
Gostei muito da terra da Goiabada e tive inveja da vontade de simultaneidade de estados de espírito
ter sido roubado pelos ciganos. polarizados por vias analógicas de
18. Informações recordações, de pensamentos remotos,
Gustavo Dalbert numa noite de cabelo e cigarro disse‑me que a arte de impressões de outros lugares e de
era tudo mas a vida nada. Ele era músico e ia morar em Paris comi ‑ outros tempos.
go, o amigo e jovem poeta João Miramar. Havia um outro artista na
A técnica cinematográfica, caracterizada
vizinhança, o Bandeirinha barítono e outros poetas na cidade.
pela “descontinuidade cênica”, pela
56. Órfão “tentativa de simultaneidade”, é uma
O céu jogava tinas de água sobre o noturno que me devolvia a São constante na obra de Oswald. Envolve
Paulo. necessariamente a de montagem de
O comboio brecou lento para as ruas molhadas, furou a gare fragmentos . (Haroldo de Campos,
suntuosa e me jogou nos óculos menineiros de um grupo negro. Miramar na mira)
Sentaram-me num automóvel de pêsames.
Longo soluço empurrou o corredor conhecido contra o peito
magro de tia Gabriela no ritmo de luto que vestia a casa.

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MANUEL BANDEIRA: o resgate do lírico
Por meio de Manuel Bandeira e Alcântara Machado, o Modernismo pôde, em sua
primeira fase, alargar horizontes e diversificar experiências. Com Bandeira, pelo
resgate do lirismo poético, quase abandonado pelos demais modernistas na fase
de luta antipassadista; com Alcântara Machado, pela conciliação de inovações
técnicas e linguagem jornalística com a fala coloquial dos ítalo-paulistas.
Manuel Bandeira (1886-1968) compõe, juntamente com Oswald e Mário de
Andrade, a tríade maior da primeira fase do Modernismo, responsável pela
divulgação e pela solidificação do movimento em nosso país.
O poeta nasceu em Recife, fez os estudos secundários no Rio de Janeiro e iniciou
o curso de Arquitetura em São Paulo, mas foi obrigado a abandoná-lo em virtude de uma crise de
tuberculose, que nele se manifestara em 1904. Tratou-se em várias cidades do país e, inclusive, na Suíça,
entre 1913 e 1914, onde conheceu o jovem e mais tarde famoso escritor dadaísta e surrealista francês Paul
Éluard, internado na mesma clínica.
Éluard colocou Bandeira a par das inovações artísticas que vinham ocorrendo na Europa, entre as quais o
emprego do verso livre na poesia. Esse aspecto técnico já fazia parte das preocupações de Bandeira, que
hoje é considerado o mestre do verso livre no Brasil.
Os temas mais comuns de sua obra, marcada pela experiência da doença e do isolamento advindo dela,
são, entre outros, a paixão pela vida, a morte, o amor e o erotismo, a solidão, a angústia existencial, o
cotidiano e a infância.
GESSO
Esta minha estatuazinha de gesso, quando nova
– O gesso muito branco, as linhas muito puras –
Mal sugeria imagem da vida
(Embora a figura chorasse).
Há muitos anos tenho-a comigo.
O tempo envelheceu-a, carcomeu-a, manchou-a de
[pátina amarelo-suja.
Os meus olhos, de tanto a olharem,
Impregnaram-na de minha humanidade irônica de tísico.
Um dia mão estúpida
Inadvertidamente a derrubou e partiu.
Então ajoalhei com raiva, recolhi aqueles tristes fragmentos,
[recompus a figurinha que chorava.
E o tempo sobre as feridas escureceu ainda mais o sujo
[mordente da pátina…
Hoje este gessozinho comercial
É tocante e vive, e me fez agora refletir
Que só é verdadeiramente vivo o que já sofreu.

Bandeira e o Modernismo
Em 1922, Bandeira morava no Rio de Janeiro e estava, portanto , distanciado do grupo paulista que
centralizava os ataques à cultura oficial e propunha mudanças. Embora tivesse conhecido Mário de Andrade
- de quem seria grande amigo - em 1921, no Rio, Bandeira buscou sempre uma atuação mais isolada. À
Semana de Arte Moderna, por exemplo, preferiu não ir pessoalmente e enviou o famoso poema "Os sapos",
que, lido por Ronald de Carvalho, tumultuou o Teatro Municipal.
Além disso, quando se realizou a Semana de Arte Moderna, Bandeira já publicara dois livros, A cinza das
horas (1917) e Carnaval (1919), em que se verificam influências pós-simbolistas.

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Sua adesão às técnicas modernistas deu-se gradativamente, à medida que via na renovação a única
alternativa à sua poesia, que não se ajustava mais às antigas fórmulas de expressão. Mais do que modismo
ou oportunismo, o Modernismo impunha-se como condição à continuidade de sua poesia. Assim, o poeta,
que em 1918 escrevera "Os sapos", publicaria em 1924 O ritmo dissoluto, obra de transição, e em 1930
Libertinagem, obra de plena maturidade modernista, das "palavras em liberdade". É de Libertinagem, por
exemplo, o poema "Poética" e “Pneumotórax”.
POÉTICA
Estou farto do lirismo comedido
Do lirismo bem comportado
Do lirismo funcionário público com livro de ponto expediente protocolo e manifestações de apreço ao sr.
diretor.
Estou farto do lirismo que pára e vai averiguar no dicionário o cunho vernáculo de um vocábulo.
Abaixo os puristas.
Todas as palavras sobretudo os barbarismos universais
Todas as construções sobretudo as sintaxes de exceção
Todos os ritmos sobretudo os inumeráveis (...)

PNEUMOTÓRAX
Febre, hemoptise, dispneia e suores noturnos.
A vida inteira que podia ter sido e que não foi.
Tosse, tosse, tosse.
Mandou chamar o médico:
— Diga trinta e três.
— Trinta e três… trinta e três… trinta e três…
— Respire.
……………………………………………………………………….
— O senhor tem uma escavação no pulmão esquerdo e o pulmão direito infiltrado.
— Então, doutor, não é possível tentar o pneumotórax?
— Não.
A única coisa a fazer é tocar um tango argentino

Ainda que não tenha tido em relação à cultura do passado a postura radical da maioria dos jovens rebeldes,
Bandeira veio a ser um dos três mais importantes escritores da primeira fase do movimento modernista,
além de um dos pontos mais altos da poesia lírica nacional. Chamado de "o São João Batista" do
Modernismo, em razão da idade que tinha em 1922 (36 anos), Bandeira nunca abandonou a admiração que
tinha por certos escritores do passado, como Camões, Gonçalves Dias e Musset.
Após Libertinagem, ainda foram publicadas, em poesia, Estrela da manhã (1936), Lira dos cinquent'anos
(1948), Belo belo (1948), Opus 10 (1952) e Mafuá do malungo (1954), todas incluídas em Estrela da vida
inteira, de 1965.

Manuel Bandeira: o humilde e o sublime


Entre as inúmeras contribuições deixadas pela poesia de Manuel Bandeira, duas se destacam: o seu papel
decisivo na solidificação da poesia de orientação modernista, com todas as suas implicações (verso livre,
língua coloquial, irreverência, liberdade criadora, etc.), e o alargamento da lírica nacional pela sua
capacidade de extrair poesia das coisas aparentemente banais do cotidiano.
POEMA TIRADO DE UMA NOTÍCIA DE JORNAL
João Gostoso era carregador de feira livre e morava no morro da Babilônia num barracão sem número
Uma noite ele chegou no bar Vinte de Novembro
Bebeu
Cantou
Dançou
Depois se atirou na lagoa Rodrigo de Freitas e morreu afogado.

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Partindo de temas até então considerados "baixos" para a criação da "grande poesia", tais como a própria
doença, o quarto, as ações habituais do cotidiano, o jornal, a cultura popular, etc., Bandeira criou uma poesia
rica em construção e significação, apesar de sua aparência quase prosaica. Veja, por exemplo, nos versos,
como ele concilia a crítica social e a reflexão filosófica acerca da condição humana com oposições formais
e coloquialidade linguística. É com simplicidade e despojamento que são trabalhados pelo poeta temas como
a reflexão existencial, a solidão, o amor, a vida e a natureza.
Retomando certos motivos já explorados por poetas românticos - a saudade, a infância, a solidão - e
procurando estreitar os laços entre poesia e cultura popular, Manuel Bandeira mantém, de fato, alguns
pontos de contato com o Romantismo, mas é um poeta essencialmente modernista. Jamais cai, por exemplo,
num sentimentalismo piegas ao lembrar-se da infância. A infância que evoca é uma experiência vivida e
concreta, não idealizada, que, contrastada com o presente, acentua-lhe a condição trágica.
A solidão, que levava os poetas ultrarromânticos a buscar na morte a saída para os problemas da existência,
em Manuel Bandeira toma outra direção - a da paixão pela vida:
O que eu adoro em tua natureza,
Não é o profundo instinto maternal
Em teu flanco aberto como uma ferida.
Nem a tua pureza. Nem a tua impureza.
O que eu adoro em ti - lastima-me e
[consola-me!
O que eu adoro em ti, é a vida.
(Madrigal melancólico". Estrela da vida inteira, cit., p. 90.)

Pasárgada e a infância: válvulas de escape da realidade


Diante da realidade por vezes opressora, dois temas se destacam como válvulas de escape para Bandeira,
seja como paraíso sonhado, seja como paraíso perdido: Pasárgada, o "país de delícias" do poema "Vou-me
embora pra Pasárgada", e a infância. É o espaço imaginado pela fantasia, compensação das frustrações
cotidianas da "vida besta", como dizia o poeta. Em Pasárgada, tudo é possível e permitido, sobretudo os
prazeres que foram proibidos ao poeta quando criança em virtude da doença, como nadar, brincar, andar de
bicicleta, etc. Também são possíveis todos os prazeres negados pela solidão:
VOU-ME EMBORA PRA PASÁRGADA

Vou-me embora pra Pasárgada


Lá sou amigo do rei
Lá tenho a mulher que eu quero
Na cama que escolherei
Vou-me embora pra Pasárgada
Aqui eu não sou feliz
Lá a existência é uma aventura
-------------------------------------
E quando eu estiver mais triste
Mas triste de não ter jeito
Quando de noite me der
Vontade de me matar
— Lá sou amigo do rei —
Terei a mulher que eu quero
Na cama que escolherei
Vou-me embora pra Pasárgada.

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EXERCÍCIOS
1. O contexto histórico do Modernismo no Brasil é marcado pelo (a)
a) influência da Belle Époque francesa
b) ato da Proclamação da República no Brasil
c) inauguração do museu de arte moderna de São Paulo-MASP
d) tendência da Art Nouveau que se espalhou pela Europa
e) divulgação da Semana de Arte Moderna

2. Assinale a alternativa em que se encontram preocupações estéticas da Primeira Geração Modernista:


a) Principal corrente de vanguarda da Literatura Brasileira, rompeu com a estrutura discursiva do verso
tradicional, valendo-se de materiais gráficos e visuais que transformaram a estrutura do poema.
b) Busca pelo sentido da existência humana, confronto entre o homem e a realidade, reflexão filosófico-
existencialista, espiritualismo, preocupação social e política, metalinguagem e sensualismo.
c) Os escritores de maior destaque da primeira fase do Modernismo defendiam a reconstrução da cu ltura
brasileira sobre bases nacionais, revisão crítica de nosso passado histórico e de nossas tradições culturais,
eliminação do complexo de colonizados e uso de uma linguagem própria da cultura brasileira.
d) Amadurecimento da prosa, sobretudo do romance, enfoque mais direto dos fatos, influência da estética
Realista-Naturalista do século XIX e caráter documental, como no livro Vidas secas, de Graciliano Ramos.
3. O movimento modernista no Brasil (1922-1930), apesar do desejo de ruptura com o passado, foi marcado
por um forte sentimento de nacionalismo, de busca de identidade nacional. Tal característica foi também
uma reivindicação, a princípio, dos *

a) românticos
b) realistas
c) parnasianos
d) arcadistas
e) simbolistas

4. (ENEM) – “Poética”, de Manuel Bandeira, é quase um manifesto do movimento modernista brasileiro de


1922. No poema, o autor elabora críticas e propostas que representam o pensamento estético predominante
na época.

Poética
Estou farto do lirismo comedido
Do lirismo bem comportado
Do lirismo funcionário público com livro de ponto expediente
protocolo e manifestações de apreço ao Sr. diretor.
Estou farto do lirismo que pára e vai averiguar no dicionário
o cunho vernáculo de um vocábulo.
Abaixo os puristas
[…]
Quero antes o lirismo dos loucos
O lirismo dos bêbedos
O lirismo difícil e pungente dos bêbedos
O lirismo dos clowns de Shakespeare
– Não quero mais saber do lirismo que não é libertação.
(BANDEIRA, Manuel. Poesia completa e prosa. Rio de janeiro: José Aguilar, 1974)

Com base na leitura do poema, podemos afirmar corretamente que o poeta:

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a) Critica o lirismo louco do movimento modernista.
b) Critica todo e qualquer lirismo na literatura.
c) Propõe o retorno ao lirismo do movimento clássico.
d) Propõe o retorno do movimento romântico.
e) Propõe a criação de um novo lirismo.

5. (ENEM) – O uso do pronome átono no início das frases é destacado por um poeta e por um gramático
nos textos abaixo.
Pronominais
Dê-me um cigarro
Diz a gramática
Do professor e do aluno
E do mulato sabido
Mas o bom negro e o bom branco
Da Nação Brasileira
Dizem todos os dias
Deixa disso camarada
Me dá um cigarro.
(ANDRADE, Oswald de. Seleção de textos. São Paulo: Nova Cultural, 1988.)

“Iniciar a frase com pronome átono só é lícito na conversação familiar, despreocupada, ou na língua escrita
quando se deseja reproduzir a fala dos personagens (…)”.
(CEGALLA. Domingos Paschoal. Novíssima gramática da língua portuguesa. São Paulo: Nacional, 1980.)

Comparando a explicação dada pelos autores sobre essa regra, pode-se afirmar que ambos:

a) Condenam essa regra gramatical.


b) Acreditam que apenas os esclarecidos sabem essa regra.
c) Criticam a presença de regras na gramática.
d) Afirmam que não há regras para uso de pronomes.
e) Relativizam essa regra gramatical.

6. (Enem – 2012)
O trovador
Sentimentos em mim do asperamente
dos homens das primeiras eras...
As primaveras do sarcasmo
intermitentemente no meu coração arlequinal...
Intermitentemente...
Outras vezes é um doente, um frio
na minha alma doente como um longo som redondo...
Cantabona! Cantabona!
Dlorom...
Sou um tupi tangendo um alaúde!
ANDRADE, M. In: MANFIO, D. Z. (Org.) Poesias completas de Mário de Andrade. Belo Horizonte: Itatiaia, 2005.

Cara ao Modernismo, a questão da identidade nacional é recorrente na prosa e na poesia de Mário de


Andrade. Em O trovador, esse aspecto é
a) abordado subliminarmente, por meio de expressões como “coração arlequinal” que, evocando o carnaval,
remete à brasilidade.
b) verificado já no título, que remete aos repentistas nordestinos, estudados por Mário de Andrade em suas
viagens e pesquisas folclóricas.
c) lamentado pelo eu lírico, tanto no uso de expressões como “Sentimentos em mim do asperamente” (v. 1),
“frio” (v. 6), “alma doente” (v. 7), como pelo som triste do alaúde “Dlorom” (v. 9).
d) problematizado na oposição tupi (selvagem) x alaúde (civilizado), apontando a síntese nacional que seria
proposta no Manifesto Antropófago, de Oswald de Andrade.
e) exaltado pelo eu lírico, que evoca os “sentimentos dos homens das primeiras eras” para mostrar o orgulho
brasileiro por suas raízes indígenas.

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Dê-me um cigarro
Diz a gramática
Do professor e do aluno
E do mulato sabido
Mas o bom negro e o bom branco
Da Nação Brasileira
Dizem todos os dias
Deixa disso camarada
Me dá um cigarro.
(Pronominais, Oswald de Andrade)

7. Oswald de Andrade foi um dos principais autores da primeira fase do modernismo no Brasil. Na poesia
acima, o escritor propõe:

a) a busca de uma identidade universal.


b) a valorização da linguagem coloquial brasileira.
c) uma crítica aos maus hábitos, como o tabagismo.
d) enfatizar a relação entre professor e aluno.
e) repensar o uso do português do Brasil.

8. A primeira geração modernista ficou conhecida como “fase heroica” por tentar criar uma identidade mais
brasileira se fastando dos moldes europeus. Assim, houve diversos grupos, revistas e manifestos que foram
criados nesse momento, exceto:

a) Movimento Verde-Amarelo
b) Revista Klaxon
c) Movimento Pau-Brasil
d) Movimento Antropofágico
e) Poesia de 30

9. Leia as afirmações a seguir:

I. A primeira fase do modernismo no Brasil ficou conhecida como fase heroica ou de destruição.
II. Os artistas da primeira geração modernista buscaram no folclore as raízes da cultura local.
III. Algumas características da primeira fase modernista são: a liberdade da arte, a valorização da língua
coloquial brasileira e o uso do sarcasmo e da ironia.

A alternativa correta é:

a) somente a I
b) I e II
c) I e III
d) II e III
e) I, II e III

10. O capoeira
— Qué apanhá sordado?
— O quê?
— Qué apanhá?
Pernas e cabeça na calçada.
(Oswald de Andrade. Poesias reunidas. 5.ed. Rio de Janeiro: Civilização Brasileira, 1978. p. 94)

Sobre a linguagem modernista é incorreto afirmar:

a) busca de uma linguagem mais coloquial.


b) valorização de temas ligados ao cotidiano.
c) uso dos versos livres, sem métrica definida.

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d) arte pela arte ou arte sobre a arte.
e) irreverência e subjetivismo dos textos.

11. Considere o trecho abaixo.


“No fundo do mato-virgem nasceu Macunaíma, herói de nossa gente. Era preto retinto e filho do medo da
noite. Houve um momento em que o silêncio foi tão grande escutando o murmurejo do Uraricoera, que a
índia, tapanhumas pariu uma criança feia. Essa criança é que chamaram de M acunaíma.”
Macunaíma é um dos mais emblemáticos romances da primeira fase do modernismo no Brasil. Escrito por
Mario de Andrade e publicado em 1928, essa obra é considerada uma rapsódia, pois:

a) trata-se de um poema épico cantado baseado na obra de Homero, poeta grego da antiguidade.
b) trata-se de um conjunto de poemas clássicos baseados em temas da mitologia grega.
c) trata-se de uma obra literária que absorve todas as tradições orais e folclóricas de um povo.
d) trata-se de uma obra literária que reúne as tradições dos colonizadores portugueses.
e) trata-se de um conjunto de poemas selecionados do escritor modernista Mario de Andrade.

12. Após a Semana de Arte Moderna, realizada em fevereiro de 1922 na cidade de São Paulo, o movimento
modernista brasileiro começa a despontar no cenário cultural e artístico do país. Sobre a primeira geração
modernista, é correto afirmar:
a) A produção literária da primeira geração modernista era intimista, regionalista e urbana.
b) Os escritores desse momento buscavam uma poesia mais equilibrada e preocupada com a palavra e a
forma.
c) A primeira geração modernista constituiu um dos melhores momentos da ficção brasileira.
d) A intenção dessa fase esteve relacionada com a denúncia social e o engajamento político.
e) Essa fase esteve marcada por duas tendências: a destruição e a construção.
13. (UNIRIO 1995) Em relação ao Modernismo, podemos afirmar que em sua primeira fase há:

a) maior aproximação entre a língua falada e a escrita, valorizando-se literariamente o nível coloquial.
b) pouca atenção ao valor estético da linguagem, privilegiando o desenvolvimento da pesquisa formal.
c) grande liberdade de criação, mas expressão pobre.
d) reconquista do verso livre.
e) ausência de inspiração nacionalista.

14. (PUC-PR 2007) Assinale a alternativa correta para as características do Modernismo de 1922, também
chamado de "fase heroica".
a) espírito polêmico e destruidor, valorização poética do cotidiano, nacionalismo, busca da originalidade a
qualquer preço.
b) Temática ampla com preocupação filosófica, predomínio do romance regionalista, valorização do
cotidiano, nacionalismo.
c) Espírito polêmico, busca da originalidade, predomínio do romance psicológico, valorização da cidade e
das máquinas.
d) Visão futurista, espírito polêmico e destruidor, predomínio da prosa poética, valorização da cidade e das
máquinas.
e) Valorização poética do cotidiano, linguagem repleta de neologismos, nacionalismo e busca da poesia na
natureza.

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15. (MACKENZIE 2014) Poema Tirado de uma Notícia de Jornal

João Gostoso era carregador de feira livre e morava no morro da


Babilônia num barracão sem número
Uma noite ele chegou no bar Vinte de Novembro
Bebeu
Cantou
Dançou
Depois se atirou na lagoa Rodrigo de Freitas e morreu afogado.
Manuel Bandeira

Sobre a primeira fase do Movimento Modernista, ao qual a crítica vincula Manuel Bandeira, todas as
alternativas estão corretas, EXCETO:

a) buscava inspiração nas ideologias concretistas para simplificação poética.


b) objetivava o rompimento com as estruturas artísticas do passado.
c) apresentava, em um primeiro momento, um caráter anárquico e destruidor.
d) valorizava a língua “brasileira”.
e) a postura nacionalista, do final dos anos 1920, apresentava uma vertente crítica e uma ve rtente ufanista.

16. (PUC-CAMPINAS 2016) Considere o texto abaixo.


Contraditoriamente, foi o patrocínio da fração mais europeizada da aristocracia rural de São Paulo, aberta
às influências internacionais, que permitiu o florescimento das inovações estétic as. O café pesou mais do
que as indústrias. Os velhos troncos paulistas, ameaçados em face da burguesia e da imigração, se juntaram
aos artistas numa grande “orgia intelectual”, conforme a definição de Mário de Andrade. Segundo ele, “foi
da proteção desses salões literários [promovidos pela aristocracia rural] que se alastrou pelo Brasil o espírito
destruidor do movimento modernista.”
(MARQUES, Ivan. Cenas de um modernismo de província. São Paulo: Editora 34, 2011, p. 11)

O Modernismo de 22 caracterizou-se, de fato, por algumas contradições, entre as quais a que o texto aponta:

a) Os mentores modernistas promoveram ideais estéticos para agradar burgueses e aristocratas.


b) Uma economia voltada para a industrialização propiciou o desenvolvimento da produção rural.
c) Membros da aristocracia paulista renunciaram a seu gosto estético em nome da arte popular.
d) Membros da recém-formada burguesia impuseram seu gosto estético aos aristocratas.
e) Um setor da economia rural estimulou um movimento cultural de raiz urbana e moderna.

17. (PUCCAMP-SP) São características da primeira fase do Modernismo:


a) retomada da ficção regionalista, cultivo de uma poesia neobarroca e visão de mundo em perspectiva
elitista.
b) libertação dos modelos acadêmicos, experimentalismo em novas formas de expressão e rompimento com
o nacionalismo tradicional.
c) cultivo de uma ficção de caráter intimista, revisão das regras de metrificação e retomada do nacionalismo
romântico.
d) predominância dos temas políticos, crítica ao uso indiscriminado das máquinas e visão de mundo em
perspectiva universalista.
e) pesquisa de lendas e narrativas folclóricas, valorização do índio enquanto mito romântico e cultivo de
fórmulas estéticas consagradas.

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18. Considere o poema abaixo:
GESSO
Esta minha estatuazinha de gesso, quando nova
– O gesso muito branco, as linhas muito puras –
Mal sugeria imagem da vida
(Embora a figura chorasse).
Há muitos anos tenho-a comigo.
O tempo envelheceu-a, carcomeu-a, manchou-a de
[pátina amarelo-suja.
Os meus olhos, de tanto a olharem,
Impregnaram-na de minha humanidade irônica de tísico.
Um dia mão estúpida
Inadvertidamente a derrubou e partiu.
Então ajoalhei com raiva, recolhi aqueles tristes fragmentos,
[recompus a figurinha que chorava.
E o tempo sobre as feridas escureceu ainda mais o sujo
[mordente da pátina…
Hoje este gessozinho comercial
É tocante e vive, e me fez agora refletir
Que só é verdadeiramente vivo o que já sofreu.

A ação do tempo sobre a estátua de gesso é vista pelo poeta como:

a) O que acabou por torná-la mais vivaz e expressiva, pelo menos até que um acidente a fizesse perder
essa vivacidade.
b) Responsável por danos que levaram uma obra de arte a perder sua pureza e vivacidade originais.
c) Um elemento que, juntamente com os danos causados por um acidente, dá vida e singularidade ao que
era inexpressivo e vulgar.
d) O causador irremediável do envelhecimento das coisas e da consequent e desvalorização dos objetos
pessoais mais valiosos.
e) Capaz de transformar um simples objeto comercial em uma obra de arte que parece ter sido criada por
um escultor genial.

“Um dia mão estúpida


Inadvertidamente a derrubou e partiu.
Então ajoelhei com raiva, recolhi aqueles tristes fragmentos,
[ recompus a figurinha que chorava.
E o tempo sobre as feridas escureceu ainda mais o sujo
[ mordente de pátina…”

19. Sobre os versos acima transcritos é INCORRETO afirmar:

a) Mão estúpida pode ser alusão do poeta a si próprio e carregaria assim algum matiz da raiva que o teria
acometido quando derrubou a estátua.
b) Inadvertidamente tem o sentido de “De modo descuidado”, indicado o caráter acidental do episódio.
c) Em recompus a figurinha que chorava, o poeta se vale de uma ambiguidade para sugerir o sofrimento da
estátua com a queda.
d) Com a alusão às feridas causadas à estátua, o poeta se refere aos sinais visíveis da junção dos pedaços
dela depois de reconstituída.
e) Com a expressão o sujo mordente da pátina, o poeta alude a transformação da estátua de sofredora em
causadora de sofrimento.

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Disciplina: Português V – AULA 10
Conteúdo: MODERNISMO: 2ª FASE (1930-1945)106
O ROMANCE DE 30

Na década de 1930, enquanto o rádio - o mais moderno meio de comunicação de massa da época -
encurtava as distâncias, aproximando o país de ponta a ponta, nossa prosa de ficção, com renovada força
criadora, nos punha em contato com um Brasil pouco conhecido.
Por meio da obra de autores como Rachel de Queiroz, José Lins do Rego, Graciliano Ramos, Jorge Amado,
Érico Veríssimo, Dionélio Machado, desponta um Brasil multifacetado, apresentado em sua diversidade
regional e cultural, mas com problemas semelhantes em quase todas as regiões: a miséria, a ignorância, a
opressão nas relações de trabalho, as forças da natureza sobre o homem desprotegido.
Herdeiros diretos dos modernistas de 1922, os modernistas da segunda geração (1930 -1945) também se
voltam para a realidade brasileira, mas agora com uma intenção clara de denúncia social e engajamento
político. Unindo ideologia e análise sociológica e psicológica a novas técnicas narrativas, o romance de 30
constitui um dos melhores momentos da ficção brasileira.
Devemos lembrar que o Modernismo da 1ª Fase ou 1ª Geração (1922) é marcado pelo esteticismo
anárquico, cujas obras são essencialmente poéticas. Agora, temos o apo geu da prosa de ficção da literatura
brasileira, sobretudo, com a (re)tomada da realidade nacional.

CARACTERÍSTICAS

➢ Literatura engajada, de denúncia social;


➢ Ensaios sócio-históricos: compreensão da realidade social
do país;
➢ Prosa de ficção: registros de aspectos sociais, geográficas
e históricas;
➢ Nasce o romance social dos anos 1930;
➢ Brasil, país de contradições sociorregionais: denúncia da
miséria, ignorância, opressão nas relações de trabalho;
➢ Romance de 30: análise sociológica e psicológica;
➢ Romance de tese; romance-denúncia;
➢ Personagens: representantes de uma classe ou um grupo
social

Esta geração destaca-se pelos “ciclos”


nas obras dos seus autores:
a) Ciclo da seca: José Américo de
Almeida; Graciliano Ramos; Rache de
Queiroz;
b) Ciclo do açúcar: José Lins do Rego;
c) Ciclo do cacau: Jorge Amado;
d) Ciclo do “gaúcho”: Érico Veríssimo

Adaptado de CEREJA, William R. e MAGALHÃES, Thereza C. Literatura brasileira. 2ª ed. – São Paulo: Saraiva, 2013.
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A GERAÇÃO DE 30
Quando a literatura se volta para um retrato mais objetivo da realidade, quase sempre o romance é o gênero
que ela privilegia. Nas décadas de 1930 e 1940, período em que o país e o mundo viveram profundas crises,
não foi diferente. O romance brasileiro de então, encontrando no regionalismo uma de suas principais
vertentes, ganhou matizes ideológicos e se transformou em um importante instrumento de análise e denúncia
da realidade brasileira.
No final da década de 1920, já eram vitoriosas as conquistas formais da primeira geração modernista,
inclusive aquelas feitas no campo da prosa de ficção em obras como Macunaíma e Memórias sentimentais
de João Miramar. Técnicas inovadoras, como a linguagem cinematográfica, a sobreposição de planos
narrativos, a mistura de gêneros, a paródia e a síntese, romperam com a forma tradicional de contar histórias.
Os romancistas da segunda geração modernista, em sua maioria distantes geograficamente do núcleo
paulista - que se caracterizava pelo experimentalismo estético -, aderiram à concepção moderna e
modernista de literatura, porém sem o espírito iconoclasta da geração de 1922. Interessavam-lhes
principalmente certos aspectos explorados pelo Modernismo, como os temas nacionais e cotidianos e a
busca de uma linguagem brasileira.

O ROMANCE DE 30: A ESTÉTICA DO COMPROMISSO

Desde a década de 1920, a literatura brasileira vinha ganhando matizes cada vez mais ideológicos. Foram
ideológicos, por exemplo, os debates nascidos em torno da questão da nacionalidade, liderados, de um lado,
por Oswald de Andrade e, de outro, por Plínio Salgado.
Na década de 1930, o quadro político-econômico brasileiro e internacional – composto por reflexos da crise
de 1929 na Bolsa de Nova Iorque, pela crise cafeeira, Revolução de 30, Intentona Comunista (de 1935),
Estado Novo (1937-1945), ascensão do nazismo e do fascismo e combate ao socialismo, Segunda Guerra
Mundial (1939-1945) - exigia dos artistas e intelectuais uma tomada de posição ideológica. Dessa exigência
resultou uma arte engajada, de clara militância política, como se observa em muitos romances de Jorge
Amado, ou de engajamento espiritual, como se verifica nas obras de Jorge de Lima e Murilo Mendes.

CAMINHOS DA FICÇÃO DE 30
O romance de 30 trilhou diferentes caminhos, dos quais o regionalismo, especialmente o nordestino, é o
mais importante. A tradição da ficção regionalista nordestina já contava com nomes como Franklin Távora,
Rodolpho Teófilo e Domingos Olímpio. Mas, com a publicação de A bagaceira (1928), de José Américo de
Almeida, e, em seguida, O Quinze (1930), de Rachel de Queiroz, o romance nordestino entrou numa fase
nova, de denúncia das agruras da seca e da migração, dos problemas do trabalhador rural, da miséria, da
ignorância.
Observe como José Américo de Almeida, em A bagaceira, retrata o drama coletivo da degradação humana
na descrição que faz da chegada dos retirantes ao engenho Marzagão.
Era o êxodo da seca de 1898. Uma ressurreição de cemitérios antigos - esqueletos redivivos, com o
aspecto terroso e o fedor das covas podres.
Os fantasmas estropiados como que iam dançando, de tão trôpegos e trêmulos, num passo arrastado
de quem leva as pernas, em vez de ser levado por elas.
Andavam devagar, olhando para trás, como quem quer voltar. Não tinham pressa em chegar, porque
não sabiam aonde iam. Expulsos do seu paraíso por espadas de fogo, iam ao acaso, em descaminhos, no
arrastão dos maus fados.
Fugiam do sol e o sol guiava-os nesse forçado nomadismo. Adelgaçados na magreira cômica,
cresciam, como se o vento os levantasse. E os braços afinados desciam -lhes aos joelhos, de mãos
abanando.
Vinham escoteiros. Menos os hidrópicos - doentes da alimentação tóxica - com os fardos das barrigas
alarmantes. Não tinham sexo, nem idade, nem condição nenhuma. Eram os retirantes, nada mais.

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Nos anos seguintes, esse veio literário foi explorado por muitos outros autores, como Amando Fontes, Jorge
Amado, José Lins do Rego e Graciliano Ramos, cujas obras trazem temas novos, como o cangaço, o
fanatismo religioso, o coronelismo, a luta pela terra, a crise dos engenhos. O regionalismo também se
manifestou no Sul do país, na ficção histórica e épica de O tempo e o vento, de Érico Veríssimo, ou no
romance de fazenda de Ivan Pedro de Martins, com Fronteira agreste. Nessas obras, é ressaltado o homem
hostilizado pelo ambiente, pela terra, pela cidade, pelos poderosos, o homem sendo devorado pelos
problemas que o meio lhe impõe.

RACHEL DE QUEIROZ: A SAGA DA SECA


Rachel de Queiroz (1910-2003) nasceu em Fortaleza, Ceará. A
instabilidade decorrente da seca de 1915 fez com que ela e a família
migrassem para o Rio de Janeiro, em 1917. Logo em seguida retornaram
para o Nordeste, passando por Belém, no Pará, antes de se estabelecerem
novamente em Fortaleza.
Em 1927, além de atuar como professora primária, começou a colaborar
no jornal O Ceará, com poemas e crônicas. Tornou-se conhecida,
entretanto, com a publicação de O Quinze, em 1930, quando tinha apenas
20 anos. Nos anos seguintes militou no Partido Comunista Brasileiro e em
1937 foi presa por defender ideias esquerdistas. Publicou nesse período
os romances João Miguel, Caminho de pedras e As três Marias. Dedicou-se depois ao teatro e à crônica-
jornalística. Foi a primeira mulher a ingressar na Academia Brasileira de Letras.
Os quatro romances iniciais de Rachel revelam intensa preocupação social. Os dois primeiros – O quinze e
João Miguel - aprofundam o tema da seca, já introduzido por José Américo em A bagaceira, e ampliam a
abordagem ao tratar também do coronelismo e dos impulsos passionais do sertanejo. Além disso, as obras
de Rachel de Queiroz introduzem um elemento novo, o enfoque psicoló gico, que dá às personagens uma
dimensão mais humana e completa.
Caminho de pedras (1937), cuja redação coincide com o período de militância política da autora, é uma obra
de nítida inspiração ideológica. Conciliando a história de um relacionamento amoroso com abordagem
psicológica e ideias socialistas, a obra não tem o mesmo vigor de O Quinze. Seu narrador parece ver os
fatos de fora, sem vivê-los, e os conflitos se resolvem no plano sentimental.
Em As três Marias (1939), verifica-se o aprofundamento da abordagem psicológica, já notada nas obras
anteriores. Embora tenha o Nordeste como cenário - tal como Caminho de pedras -, as narrativas que
constituem a obra não se propõem a analisar sua estrutura social, econômica e política.
Nas décadas subsequentes, publicou ainda Dora, Doralina (1975) e muitos livros de crônica, gênero a que
se dedicou nos últimos anos de vida, em que escreveu para jornais do Rio de Janeiro, onde vivia, e de São
Paulo. Também cultivou o teatro e a literatura infantil, em que se destaca a obra Andira.
Depois de quase vinte anos sem se dedicar ao gênero romance, Rachel surpreendeu o público com uma
nova produção, Memorial de Maria Moura (1992), que foi adaptada pela Rede Globo para um seriado na
tevê e consagrou a autora junto ao grande público.
Para escrever O Quinze, Rachel de Queiroz aproveitou as lembranças da grande seca que se abateu sobre
o Nordeste em 1915 - a autora tinha, na época, 5 anos. O eixo narrativo central da obra é a migração de
Chico Bento e sua família. Em paralelo, desenvolve-se o tema do amor entre Vicente, um jovem proprietário
rural, e Conceição, moça culta da cidade. No eixo central, a narrativa é social: apresenta os efeitos da seca
sobre o sertanejo. No segundo eixo, é individual: Conceição procura sua identidade e autonomia numa
sociedade patriarcal, recusando o amor de Vicente. Diante da situação de miséria provocada pela seca,
Conceição auxilia os retirantes, adota uma das crianças de Chico Bento e consegue as passagen s que
tornam possível a migração do retirante e sua família para o Sudeste.

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MODERNISMO 2ª GERAÇÃO: AUTORES DE DESTAQUE
A principal expressão do romance de 30 encontra-se no regionalismo nordestino representado por escritores
como Graciliano Ramos, José Lins do Rego e Jorge Amado, além de Rachel de Queiroz. Abordando temas
como a seca, o coronelismo, o cangaço, a disputa por terras e o fanatismo religioso, entre outros, essa
produção representa um momento de maturidade de nossa ficção.

GRACILIANO RAMOS: A PROSA NUA

Graciliano Ramos (1892-1953) é o principal romancista da geração de


1930. Nasceu em Quebrângulo, Alagoas, e viveu em várias cidades
nordestinas, como Buíque, Viçosa, Maceió e Palmeira dos Índios, da qual
foi prefeito em 1927. Além de ter se dedicado à literatura, o escritor
também exerceu atividades ligadas ao jornalismo, à vida pública e à
política.
Em 1936, durante o governo Vargas, foi preso sob a acusação de
subversão e, depois de passar por várias prisões, foi levado para a Ilha
Grande, no Estado do Rio de Janeiro, onde permaneceu dez meses
encarcerado. Dessa experiência, nasceria Memórias do cárcere, obra
que ultrapassa os limites do pessoal para se tornar um importante
depoimento da realidade brasileira da época e uma denúncia do atraso
cultural e do autoritarismo da era Vargas.
Libertado, Graciliano Ramos mudou-se para o Rio de Janeiro. Em 1945, ingressou no Partido Comunista
Brasileiro; em 1951, então reconhecido como o principal romancista brasileiro depois de Machado de Assis,
foi eleito presidente da Associação Brasileira de Escritores. Da viagem que fez para a Rússia, no ano
seguinte, nasceria a obra Viagem.
Como romancista, Graciliano Ramos alcançou raro equilíbrio ao reunir análise sociológica e psicológica.
Como poucos, retratou o universo do sertanejo nordestino, tanto na figura do fazendeiro autoritário quanto
na do caboclo comum, o homem de inteligência limitada, vítima das condições do meio natural e social, sem
iniciativa, sem consciência de classe, passivo diante dos poderosos.
Contudo, em Graciliano o regional não caminha na direção do específico, do particular ou do pitoresco; ao
contrário, as especificidades do regional são um meio para alcançar o universal. Suas personagens, em vez
de traduzir experiências isoladas, revelam uma condição coletiva: a do homem explorado socialmente ou
brutalizado pelo meio.
Sua primeira obra, Caetés (1933), ao fazer uma narrativa da vida provinciana e Palmeira dos Índios, constitui
um exercício de técnica literária com características naturalistas, como severamente o próprio autor
reconhecia.
No livro seguinte, São Bernardo (1934), verdadeira obra-prima da literatura brasileira, Graciliano apresenta
uma notável evolução em técnica e estilo e um significativo aprofundamento na análise psicológica das
personagens, cujo resultado é a criação de Paulo Honório, uma das mais marcantes personagens brasileiras.
A São Bernardo seguiram-se Angústia (1936), em que o romancista acentua a preocupação psicológica,
servindo-se de aprimorados recursos expressivos, e Vidas secas (1938), seu único romance em 3ª pessoa,
uma grande obra pelo poder de fixar figuras subumanas vivendo o fatalismo das secas da região Nordeste.
Graciliano Ramos não foi apenas romancista; escreveu, ainda, contos ( Histórias incompletas, Insônia,
Alexandre e outros heróis), crônicas (Linhas tortas, Viventes das Alagoas) e impressões de viagens
(Viagem).

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O autor de Vidas Secas sobressai entre os demais de sua época, não só pelas qualidades universalistas
que apresenta, mas sobretudo pela linguagem enxuta, rigorosa e conscientemente trabalhada, no que se
mostra o legítimo continuador de Machado de Assis na trajetória do romance brasileiro.
Trecho 1
NA PLANÍCIE avermelhada os juazeiros alargavam duas manchas verdes. Os infelizes tinham caminhado o dia inteiro,
estavam cansados e famintos. Ordinariamente andavam pouco, mas como haviam repousado bastante na areia do rio
seco, a viagem progredira bem três léguas. Fazia horas que procuravam uma sombra. A folhagem dos juazeir os
apareceu longe, através dos galhos pelados da catinga rala.
Arrastaram-se para lá, devagar, Sinha Vitória com o filho mais novo escanchado no quarto e o baú de folha na cabeça,
Fabiano sombrio, cambaio, o aió a tiracolo, a cuia pendurada numa correia presa ao cinturão, a espingarda de
pederneira no ombro. O menino mais velho e a cachorra Baleia iam atrás. (p. 01)

Trecho 2
(...) Nunca vira uma escola. Por isso não conseguia defender-se, botar as coisas nos seus lugares. (...) Se lhe tivessem
dado ensino, encontraria meio de entendê-la. Impossível, só sabia lidar com bichos. (...) Ele, Fabiano, era aquilo
mesmo, um bruto.
As pernas dos meninos eram finas como bilros, Sinha Vitória tropicava debaixo do baú de trens. Na beira do rio haviam
comido o papagaio, que não sabia falar. Necessidade.
Fabiano também não sabia falar. As vezes largava nomes arrevesados, por
embromação. Via perfeitamente que tudo era besteira. Não podia arrumar o que tinha no interior. Se pudesse... Ah! Se
pudesse, atacaria os soldados amarelos que espancam as criaturas inofensivas. (p.18)

Trecho 3
Sinha Vitória dormia mal na cama de varas. Os meninos eram uns brutos, como o pai. Quando crescessem, guardariam
as reses de um patrão invisível, seriam pisados, maltratados, machucados por um soldado amarelo. - Arreda! (p. 19)
Sinha Vitória, com o filho mais novo escanchado no quarto, equilibrava o baú de folha na cabeça; (...) Baleia
mostrava as costelas através do pêlo escasso. (p.28)

JOSE LINS DO REGO: MEMÓRIA E FICÇÃO NO ENGENHO


A decadência da estrutura social e econômica dos latifúndios e engenhos da zona açucareira da Paraíba e
de Pernambuco, bem como o início da modernização, com a chegada das usinas, encontra sua maior
expressão literária na prosa de José Lins do Rego.
José Lins do Rego (1901-1957) nasceu no município de Pilar, Paraíba. Fez Direito em Recife, onde teve
contato com o grupo modernista que ali surgia, formado por Gilberto Freire e José Américo de Almeida, entre
outros. Atuou como promotor em Maceió, onde escreveu seus primeiros livros e conviveu com Graciliano
Ramos, Jorge de Lima e Rachel de Queiroz. Atuou na imprensa, na vida diplomática e foi eleito para a
Academia Brasileira de Letras pouco antes de morrer.
Muito da obra do escritor concilia ficção com as recordações dos tempos de menino e adolescente, quando
vivia na fazenda do avô paterno, juntamente com tios e primos. Numa linguagem fluida, solta, popular, o
escritor capta a vida nordestina por dentro e registra-a num momento em que se operavam no Nordeste
transformações de ordem social e econômica profundas, fruto da decadência do engenho, logo substituído
pela usina moderna.
Oriundo de uma família rica, neto do então importante coronel José Paulino (transformado em personagem
de algumas de suas obras), José Lins não tem a envergadura ideológica nem a capacidade de análise e de
crítica social de Graciliano Ramos; contudo, como poucos, capta e transpõe para a literatura o imaginário do
povo nordestino, antes dele expresso apenas nas narrativas orais, nos romances cantados e na literatura de
cordel.

Segundo o próprio autor, sua obra pode ser dividida em ciclos. São eles:
• ciclo da cana-de-açúcar: Menino de engenho, Doidinho, Banguê, Fogo morto e Usina;
• ciclo do cangaço, misticismo e seca: Pedra Bonita e Cangaceiros;
• obras independentes: romances vinculados aos dois ciclos: Moleque Ricardo, Pureza, Riacho doce;
romances desvinculados dos ciclos: Água-mãe e Eurídice.

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Fogo Morto e o ciclo da cana-de-açúcar
Em sua primeira obra, Menino de engenho, José Lins do Rego pretendia escrever a biografia de seu avô
José Paulino, uma das mais representativas figuras da tradição fundamentada no sistema patriarcalista,
escravocrata e latifundiário. A obra deveria, também, conter cenas autobiográficas da infância do escritor.
Entretanto, o José Lins biógrafo foi superado pela imaginação criadora do José Lins romancista. Desse
modo, Menino de engenho inicia em torno da figura do garoto Carlos de Melo uma trilogia em que se incluem
também Doidinho e Banguê. As tensões socioeconômicas do engenho de açúcar apontadas pelo narrador-
personagem dessas obras têm continuidade nos outros romances que integram o ciclo da cana-de-açúcar,
principalmente em Fogo Morto, romance-síntese do ciclo, que marca a parte mais significativa das produções
do autor.
Fogo Morto é a mais madura das obras de José Lins do Rego. Nela o autor consegue captar, na paisagem
e no elemento humano, não só as imagens oriundas de suas lembranças pessoais, mas principalmente a
bruta realidade de uma estrutura social em decomposição.
Fogo Morto se divide em três partes. Na primeira, "O mestre José Amaro", José Lins enfatiza o destino e o
drama humano de uma personagem que se orgulha de ser seleiro, de ter uma profissão independente,
passada de pai para f ilho. A segunda, "O engenho de seu Lula", é a história da ascensão, do apogeu e da
decadência do engenho Santa Fé, arruinado no final por seu proprietário, o Coronel Lula de Holanda,
autoritário, prepotente e incapaz. Na terceira, "O Capitão Vitorino", o autor dá ênfase à figura dessa
personagem, alvo das chacotas da molecada e até dos adultos, uma espécie de D. Quixote nacional que
anda de engenho em engenho em defesa dos injustiçados, grandes ou pequenos.
As relações que se estabelecem entre as personagens funcionam como fios que costuram as três partes da
narrativa, ao mesmo tempo que ajudam a construir um grande painel da zona açucareira, retratada num
momento de profunda transformação social e econômica, que põe fim às centenárias estruturas fundiárias e
se abre para a modernização.
A visão nostálgica do autor, marca principal dos outros romances que integram o ciclo da cana-de-açúcar,
cede lugar em Fogo Morto a um profundo sentimento de tristeza e de inconformismo social.
LEITURA
O texto a seguir, extraído do romance Fogo Morto, encontra-se no capítulo que narra as agruras do Coronel
Lula de Holanda, senhor do então decadente engenho Santa Fé. O trecho mostra a perda de autoridade de
Lula de Holanda na tentativa de expulsar de suas terras um dos moradores, o mestre Amaro.
Parara na porta da casa-grande do Santa Fé um cargueiro com uma carta para o senhor de engenho. Seu Lula chamou
D. Amélia.

- Vem cá, Amélia, lê isto, hein, vê que desaforo.


Era um bilhete do Capitão Antônio Silvino em termos de ordem. Mandava dizer que o mestre José Amaro tinha que
ficar no sítio, até quando ele bem quisesse. A casa inteira se alarmou com a notícia. O negro Floripes atribuía tudo ao
mestre. Bem que ele dizia todos os dias que aquele homem tramava uma desgraça para o povo do Santa Fé. O velho
Lula entrou para o santuário e rezou muito. Nunca se vira tanta ruindade. D. Amélia, que esperava por um estouro do
marido, espantou-se da calma que ele apresentara.

Não falou com mais ninguém durante o resto do dia. Na manhã seguinte tomou o carro e saiu para o Santa Rosa. Lá
conversou com o velho José Paulino que se alarmou com a notícia. Era o diabo. Mas quem podia com o cangaceiro
que mandava por todo o interior do Estado, como um governo? Era um absurdo, mas era a verdade. Nada podia fazer
contra a força. O Coronel Lula de Holanda voltou do engenho vizinho mais calmo ainda! Em casa, não dava uma
palavra.
D. Amélia e a filha Neném pensaram em abandonar a casa-grande, em fugir para a capital. Antônio Silvino com raiva
de uma criatura fazia o diabo. Não viram o que sucedera ao prefeito, ao Comendador Quinca Napoleão? O que podiam
fazer eles, que eram tão fracos, tão sem ajuda de ninguém? Seu Lula não sairia de seu engenho. Que viessem, podiam

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tocar fogo em tudo que era seu, mas dali não sairia. Aquele mestre José Amaro que se aprontasse para deixar a
propriedade.
E chamou Floripes:

- ó Floripes!
O negro se chegou para receber as ordens do senhor.

- Vá ao sítio do mestre José Amaro e lhe diga, hein, que só tem três dias para mudar-se.
O negro, de cabeça baixa, saiu para a casa do engenho. Não iria fazer uma coisa desta. Ele sabia que o mestre, se o
pegasse de jeito, faria uma desgraça. Com pouco mais, chegava ao Santa Fé o Capitão Vitorino. A burra velha estava
amarrada na casa da farinha. Viera conversar com o primo sobre política. Seu Lula, muito calado, ouvia-o, até que,
como se estivesse tratando com um inimigo, se abriu com a visita. Não era homem de pabulagem, de mentira. Não se
metia em política, não contasse com o nome dele para coisa alguma. Vitorino levantou a voz para dizer-lhe que não
era um camumbembe e nem estava ali para pedir favor de espécie alguma. Não era cabra de bagaceira. Estava muito
enganado. Apareceu D. Amélia para acalmá-los.

- É o que lhe digo, Seu Coronel Lula de Holanda. O seu primo Vitorino Carneiro da Cunha não está aqui de mão estirada
pedindo esmola. Sou homem de um partido.

- Capitão Vitorino - disse-lhe D. Amélia - o Lula não quis ofender.

Seu Lula se levantara, e de pé, na porta da casa, parecia que olhava para a estrada à espera de alguém, tão embebido
estava.

- É, Dona Amélia, estes parentes ricos só pensam que os parentes pobres estão de esmola. Estou aqui para uma causa
política. Não sou uma coisa qualquer. (Fogo morto. Rio deJaneiro:José Olympio Editora, 1989. p. 198-203.)

JORGE AMADO: LIRISMO E MILITÂNCIA NA BAHIA


Jorge Amado (1912-2001) nasceu em Pirangi, no Estado da Bahia. Trabalhou na imprensa e estudou Direito.
Em 1931, mudou-se para o Rio de Janeiro e se tornou conhecido com a publicação do romance O país do
carnaval. Alcançou notoriedade, entretanto, com dois romances publicados logo em seguida: Cacau e Suor.
Politicamente comprometido com ideias socialistas, participou da Aliança Nacional Libertadora, movimento
de frente popular, e foi preso em 1936. Libertado em 1937, morou em Buenos Aires, onde publicou a biografia
de Luís Carlos Prestes. De volta ao Brasil, em 1945, foi eleito deputado federal, mas teve cassado seu
mandato político. Deixou novamente o país e residiu na França, na União Soviética e em países das
chamadas democracias populares até 1952, quando retornou ao Brasil. Nessa ocasião já se tornara
mundialmente conhecido. Em 1959, ingressou na Academia Brasileira de Letras. Seus livros estão hoje
traduzidos para mais de trinta línguas.
A maior parte das obras do escritor, principalmente as primeiras que publicou, apresenta preocupação
político-social, denunciando, num tom direto, lírico e participante, a miséria e a opressão do trabalhador rural
e das classes populares.
Conforme o autor foi amadurecendo, sua força poética voltou-se para os pobres, para a infância abandonada
e delinquente, para a miséria do negro, para o cais e os pescadores de sua terra natal, para a seca, o
cangaço, a exploração do trabalhador urbano e rural e para a denúncia do coronelismo latifundiário.
Autor de obras de cunho regionalista e de denúncia social no início de sua carreira de escritor, Jorge Amado
passou por diferentes fases até chegar à última delas, voltada para a crônica de costumes.
Alfredo Bosi, crítico literário, distingue na obra do escritor cinco fases:
a) um primeiro momento de águas-fortes da vida baiana, rural e citadina (Cacau, Suor), que lhe deram a
fórmula do "romance proletário";
b) depoimentos líricos, isto é, sentimentais, espraiados em torno de rixas e amores marinheiros (Jubiabá,
Mar Morto, Capitães da Areia);
c) um grupo de escritos de pregação partidária (O Cavaleiro da Esperança, O Mundo da Paz);

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d) alguns grandes afrescos da região do cacau, certamente suas invenções mais felizes, que animam de
tom épico as lutas entre coronéis e exportadores (Terras do Sem-Fim, São Jorge dos Ilhéus);
e) mais recentemente, crônicas amaneiradas de costumes provincianos ( Gabriela, Cravo e Canela, Dona
Flor e Seus Dois Maridos). Nessa linha, formam uma obra à parte, menos pelo espírito que pela inflexão
acadêmica do estilo, as novelas reunidas em Os Velhos Marinheiros.

Na última fase abandonam-se os esquemas de literatura ideológica que nortearam os romances de 30 e de


40; e tudo se dissolve no pitoresco, no "saboroso", no "gorduroso", no apimentado do regional.
(História concisa da literatura brasileira. São Paulo: Cultrix, 1978. p. 457.)

Parte da crítica literária vê pouco valor na obra de Jorge Amado, principalmente nos romances da última
fase. Certos críticos rejeitam o caráter militante de algumas de suas obras, acusando -as de panfletárias;
outros rejeitam sua linguagem despretensiosa e popular, acusando -o de escrever mal; outros rejeitam o
apimentado de suas histórias mais populares, recheadas de erotismo; outros o consideram repetitivo em
relação a personagens e enredos. Independentemente da opinião da crítica, porém, Jorge Amado tornou-se
um dos mais prestigiados escritores brasileiros no Brasil e no exterior. Suas obras foram traduzidas em 55
países e, no Brasil, venderam 20 milhões de exemplares.
Em março de 2012, entre os eventos comemorativos do centenário do escritor, houve o relançamento de
suas obras, o lançamento do filme Capitães da Areia e a montagem de uma exposição sobre ele no Museu
da Língua Portuguesa, em São Paulo.

Capitães da Areia
Capitães da Areia, obra publicada em 1937, explora questões sociais que têm como pano de fundo a cidade
de Salvador, mas são, com poucas alterações, as mesmas de muitas outras cidades brasileiras. Suas
personagens são dezenas de crianças de rua, de idade entre 8 e 16 anos, que, atiradas à própria sorte,
cometem delitos para sobreviver. Detidas, são humilhadas e castigadas.
Lideradas por Pedro Bala, moram num velho trapiche, um armazém abandonado e cercado pela areia no
cais de Salvador, a "cidade da Bahia". A relação que mantêm entre si é regida por códigos de lealdade e de
solidariedade, e contam com a ajuda de apenas duas pessoas: um padre e uma mãe de santo.

O SUL NO ROMANCE: ÉRICO VERÍSSIMO E DIONÉLIO MACHADO


No Sul do país, pelas mãos dos gaúchos Érico Veríssimo e Dionélio Machado, entre outros, o romance de
30 percorre caminhos diferentes daqueles trilhados pelos escritores nordestinos. O primeiro e mpenhasse na
reconstituição da história deformação de seu Estado; o segundo avança em outra direção: a do romance
urbano e psicológico.
O Rio Grande do Sul também assistiu, na década de 1930, ao florescimento de uma ficção de grande valor,
voltada ao retrato realista tanto do campo quanto da cidade.
Por um lado, Ivan Pedro de Martins, em Fronteira agreste, retrata a vida numa fazenda do interior gaúcho.
Por outro, Cyro Martins, em Estrada nova, e Dionélio Machado, em Os ratos, trabalham a
crescente politização e consciência crítica da classe média gaúcha. Já Aureliano de Figueiredo Pinto, em
Memórias do Coronel Falcão, e Érico Veríssimo, em O tempo e o vento, retratam a formação e a crise da
oligarquia rural do Rio Grande do Sul.

Desses autores, a crítica nacional tem destacado principalmente a obra de Érico Veríssimo e Dionélio
Machado.

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ÉRICO VERÍSSIMO: RESGATE HISTORICO E CRITICA
Érico Veríssimo nasceu no município gaúcho de Cruz Alta. Embora sem ter
cursado universidade, iniciou-se no jornalismo em 1930 e tornou-se professor
de literatura nos Estados Unidos. Também dirigiu um dos departamentos
culturais da Organização dos Estados Americanos – experiência que registrou
nos livros Gota preto em campo de neve e A volta do gato preto.
Sua estreia na literatura ocorreu com Fantoches, uma coletânea de contos. O
marco inicial de sua popularidade, entretanto, foi a publicação do romance
Clarissa, no ano seguinte.
A obra do autor costuma ser dividida em três fases. A primeira inicia-se com a
publicação de Clarissa (1933), que acaba sendo o primeiro de uma série de romances - Caminhos cruzados,
Música ao longe, Um lugar ao sol, Saga - que têm como traço de união a presença constante de certas
personagens, principalmente os pares Vasco e Clarissa e Fernanda e Noel, e completa-se com Olhai os
lírios do campo e O resto é silêncio. Essa primeira fase do romancista caracteriza-se pelo registro do
cotidiano da vida urbana de Porto Alegre e pela apresentação de certos problemas morais, sociais e
humanos decorrentes da vigência de valores degradados. Verdadeiros best-sellers, suas obras foram
vertidas para diversas línguas.
A segunda fase do escritor corresponde a O tempo e o vento, obra cíclica que trata da formação do Rio
Grande do Sul. Nessa obra de envergadura épica, Érico Veríssimo demonstra pleno amadurecimento de
processos técnicos e expressivos e se firma como um legítimo retratista do povo gaúcho, embora, do ponto
de vista do crítico José Hildebrando Dacanal, a obra expresse a ideologia das elit es dirigentes que
historicamente se instalaram no poder.
Pode-se reconhecer na obra do romancista ainda uma terceira fase, representada por O prisioneiro, O
senhor embaixador e Incidente em Antares, caracterizada por uma postura mais universalista, mais crítica e
de engajamento social.
Érico Veríssimo dedicou-se também à ficção didática (Viagem à aurora do mundo, Aventuras no mundo da
higiene), à literatura infantil (Os três porquinhos pobres) e a obras de caráter memorialista (Solo de clarineta).
Da mesma forma que Jorge Amado, Érico Veríssimo tornou-se um escritor consagrado em seu tempo, sendo
aceito por públicos de diferentes estratos culturais. Parte da crítica, entretanto, considera sua obra superficial
em relação à análise social e tímida quanto às inovações de linguagem. De qualquer modo, ainda se espera
um estudo mais aprofundado do conjunto da obra por parte de pesquisadores e críticos.

O tempo e o vento
Comparando o romance nordestino de 1930 ao romance gaúcho da mesma época, o crítico José
Hildebrando Dacanal afirma:
Se São Bernardo, por sua densidade e perfeição formal, pode ser considerado a súmula em que se concentram todas
as características do que foi definido como romance de 30, O tempo e o vento, de Érico Veríssimo, também ocupa um
lugar semelhante. Poder-se-ia considerar esta obra de Érico Veríssimo como a mais característica do romance de 30
em termos estritos de amplitude temática. (O romance de 30. 3. ed. Porto Alegre: Novo século, 2001. p. 91.)

O tempo e o vento, obra-prima de Érico Veríssimo, é constituída de três partes: "O continente", "O retrato" e
"O arquipélago". Nela é narrada a saga da formação socioeconômica e política do Rio Grande do Sul, desde
as suas origens, no século XVIII, até o ano de 1946.
O palco em que se dá o desenrolar dos fatos e das situações é a região de Santa Fé, onde o poder econômico
e político local é disputado por duas famílias: os Amaral e os Terra Cambará.

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A SEGUNDA FASE DO MODERNISMO: A POESIA DE 30
Nas décadas de 1930 e 1940, a poesia brasileira vivia um de seus melhores momentos. Tratava-se de um
período de maturidade e alargamento das conquistas dos modernistas da primeira geração. A maturidade
advinha do fato de que já não havia necessidade de escandalizar os meios culturais acadêmicos. Sem
radicalismos e excessos, os poetas sentiam-se à vontade tanto para criar um poema com versos livres
quanto para fazer um soneto, sem que isso significasse voltar ao Parnasianismo.
O alargamento se dava principalmente nos temas. Nas obras de Drummond, Cecília Meireles, Vinícius de
Morais, Jorge de Lima, Murilo Mendes, Mário Quintana e Manuel de Barros encontramos o que de melhor a
poesia brasileira já produziu em termos de abordagem social, religiosa, filosófica, sensual e histórica.

A POESIA DE 30: CARLOS DRUMMOND DE ANDRADE


(...) Uma flor nasceu na rua!
Passem de longe, bondes, ônibus, rio de aço do tráfego.
Uma flor ainda desbotada
ilude a polícia, rompe o asfalto.
Façam completo silêncio, paralisem os negócios,
garanto que uma flor nasceu.
Sua cor não se percebe.
Suas pétalas não se abrem.
Seu nome não está nos livros.
É feia. Mas é realmente uma flor.
Sento-me no chão da capital do país às cinco horas da tarde
e lentamente passo a mão nessa forma insegura.
Do lado das montanhas, nuvens maciças avolumam-se.
Pequenos pontos brancos movem-se no mar, galinhas em pânico.
É feia. Mas é uma flor. Furou o asfalto, o tédio, o nojo e o ódio.
(Carlos Drummond de Andrade. A rosa do povo. 36. ed. Rio de Janeiro: Record, 2006. p. 28)

A poesia da segunda geração modernista foi, essencialmente, uma poesia de questionamento: da existência
humana, do sentimento de "estar-no-mundo ", das inquietações social, religiosa, filosófica, amorosa. Carlos
Drummond de Andrade é o poeta que melhor representa o espírito dessa geração, e sua produção poética
constitui um dos pontos mais altos da nossa literatura.
A poesia e o romance de 30 tomaram rumos diferentes, embora tenham conservado algumas características
em comum. Os poetas da década de 1930, interessados fundamentalmente no sentido da existência
humana, no confronto do homem com a realidade, enfim, no "estar -no-mundo", seguiram caminhos
diferentes. Assim, buscaram uma abordagem mais universal, que vai da reflexão filosófico-existencialista ao
espiritualismo, da preocupação social e política ao regionalismo, da metalinguagem ao sensualismo.
O poema que segue pertence ao livro Alguma poesia, publicado em 1930.

Quadrilha
João amava Teresa que amava Raimundo
que amava Maria que amava Joaquim
[que amava Lili
que não amava ninguém.
João foi para os Estados Unidos,
[Teresa para o convento,
Raimundo morreu de desastre,
[Maria ficou para tia,
Joaquim suicidou-se e Lili casou com
[J. Pinto Fernandes
que não tinha entrado na história. (Rio de Janeiro: Record. © Grana Drummond - www.carlosdrummond.com.br.)

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A POESIA DE 30

Em 1930, a vitória da primeira geração modernista na luta travada contra a cultura acadêmica já estava
consolidada. Muitas de suas propostas, como o verso livre, a afirmação de uma língua brasileira, a
priorização da paisagem nacional e a abordagem de temas ligados ao cotidiano, estavam definitivamente
consolidadas em nossa literatura.
A segunda geração modernista, livre do compromisso de combater o passado, manteve muitas das
conquistas da geração anterior, mas também se sentia inteiramente à vontade para voltar a cultivar certos
recursos poéticos que o radicalismo da primeira geração tornara objeto de desprezo, tais como os versos
regulares (metrificados), a estrofação criteriosa e as formas fixas, como o soneto, a balada, o rondó, o
madrigal.
Não se trata de uma geração antimodernista no interior do próprio Modernismo. Pelo contrário, esses poetas
levaram adiante o projeto de liberdade de expressão dos seus antecessores, a ponto até de se permitirem
empregar as formas utilizadas pelos clássicos. Por isso não é de causar espanto que grandes autores do
verso livre desse período, como Manuel Bandeira (da primeira geração), Murilo Mendes, Jorge de Lima,
Carlos Drummond de Andrade, Vinícius de Morais e Mário Quintana, tenham sido também excelentes
sonetistas.

CARLOS DRUMMOND DE ANDRADE: UM BRUXO COM AMOR

Carlos Drummond de Andrade (1902-1987) é considerado por alguns críticos o principal poeta brasileiro do
século XX, um desses escritores que aparecem de tempos em tempos e conseguem apreender e refletir
poeticamente as inquietudes de uma época, tal qual um Camões ou um Fernando Pessoa.
Mineiro de ltabira, Drummond proveio de família ligada às tradições da região, ou seja, de fazendeiros e
mineradores. Formou-se em Farmácia, mas nunca exerceu a profissão. Dedicou-se ao jornalismo e
ingressou no funcionalismo público, que lhe garantiu a sobrevivência. Em 1925, foi um dos fundadores de A
Revista, publicação modernista de Belo Horizonte. Em 1928, em perfeita sintonia com a irreverência do
grupo modernista de São Paulo, Drummond publicou na Revista de Antropofagia, provocando escândalo,
este conhecido poema:

No meio do caminho
No meio do caminho tinha uma pedra
Tinha uma pedra no meio do caminho
Tinha uma pedra
No meio do caminho tinha uma pedra
Nunca me esquecerei desse acontecimento
Na vida de minhas retinas tão fatigadas
Nunca me esquecerei que no meio do caminho
Tinha uma pedra
Tinha uma pedra no meio do caminho
No meio do caminho tinha uma pedra

(Reunião. 10. ed. Rio de Janeiro: J. Olympio, 1980. p. 12.)

Na década de 1940, Drummond foi simpatizante da causa socialista e chegou a participar de um dos
números de um jornal comunista. Logo depois, porém, rompeu definitivamente com o jornal e com o Partido
Comunista. Da década de 1950 em diante, o ceticismo político passou a marcar sua vida.

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A OBRA

Drummond foi poeta e prosador (cronista) admirável. A dimensão e a riqueza de seus escritos produzidos
de 1930 a 1986 ainda requerem investigação mais profunda e abrangente.
Como contista e cronista, escreveu, entre outras obras, Fala, amendoeira, A bolsa e a vida, Quadrante 1 e
2, Cadeira de balanço. Apesar da qualidade desse material, daremos ênfase ao estudo de sua poesia,
gênero em que o escritor mais se destacou.
Dada a farta produção poética de Drummond, a organização de suas obras em partes ou em fases permite
acompanhar com maior clareza a evolução de seus temas, de sua visão de mundo e de seus traços
estilísticos.
Se considerarmos os 56 anos de carreira poética do autor, pelo menos quatro fases podem ser identificadas
em sua produção: a fase gauche (década de 1930); a fase social (1940-1945); a fase do "não" (décadas
de 1950 e 1960); a fase da memória (décadas de 1970 e 1980).

A fase gauche: consciência e isolamento

As obras que representam essa fase são Alguma poesia (1930), a primeira publicação do poeta, e Brejo das
almas (1934). Nelas ainda podem ser encontrados certos recursos que se associam à primeira geração
modernista, tais como a ironia, o humor, o poema-piada, a síntese, a linguagem coloquial.
Veja este poema-pílula, que lembra os de Oswald de Andrade:

Cota zero
Stop.
A vida parou
ou foi o automóvel?
(Alguma poesia. Rio de Janeiro: Record. © Grafia Drummond - www.carlosdrummond.com.br.)

Mas o que essencialmente caracteriza essa fase é o gauchismo presente na maioria dos poemas. A palavra
gauche, do francês, significa "lado esquerdo". Aplicada ao ser humano, significa aquele que se sente às
avessas, torto, que não consegue estabelecer uma comunicação com a realidade. São comuns a essa fase
da poesia drummondiana traços como o pessimismo, o individualismo, o isolamento, a reflexão existencial,
além de certas atitudes permanentes, que se estendem por toda a obra, como a ironia e o uso da
metalinguagem.
Para o gauche não há saídas: nem o amor, nem a morte, nem mesmo o isolamento. Desesperado, ele busca
comunicar-se com o mundo por meio do canto, mesmo que seja um canto torto e gauche:
A poesia é incomunicável.
Fique torto no seu canto.
Não ame.
(Idem.)

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Embora o gauche afirme que a "poesia é incomunicável", é ela que estabelece a mediação entre o eu e o
mundo, e talvez a saída, a única esperança, para ele, seja cantar o próprio canto ou cantar o silêncio, isto é,
cantar o canto que não existe:

O texto que segue é o poema de abertura de Alguma poesia, a primeira obra publicada por Drummond. Sua
importância reside no fato de apresentar pela primeira vez o tema do gauchismo e por conter uma síntese
de vários aspectos que caracterizariam a obra do autor no futuro.

Poema de Sete Faces


Quando nasci, um anjo torto
desses que vivem na sombra
disse: Vai, Carlos! ser gauche na vida.

As casas espiam os homens


que correm atrás de mulheres.
A tarde talvez fosse azul,
não houvesse tantos desejos.

O bonde passa cheio de pernas:


pernas brancas pretas amarelas.
Para que tanta perna, meu Deus, pergunta meu coração.
Porém meus olhos
não perguntam nada.

O homem atrás do bigode


é sério, simples e forte.
Quase não conversa.
Tem poucos, raros amigos
o homem atrás dos óculos e do bigode,

Meu Deus, por que me abandonaste


se sabias que eu não era Deus
se sabias que eu era fraco.

Mundo mundo vasto mundo,


se eu me chamasse Raimundo
seria uma rima, não seria uma solução.
Mundo mundo vasto mundo,
mais vasto é meu coração.

Eu não devia te dizer


mas essa lua
mas esse conhaque
botam a gente comovido como o diabo.

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A fase social: todo o sentimento do mundo

Sentimento do mundo (1940), o terceiro livro de Drummond, marca uma sensível mudança na orientação da
poesia do autor, comentada por ele próprio:
Meu primeiro livro, Alguma poesia (1930), traduz uma grande inexperiência do sofrimento e uma deleitação
ingênua com o próprio indivíduo. Já em Brejo das almas (1934), alguma coisa se compôs, se organizou; o
individualismo será mais exacerbado, mas há também uma consciência crescente de sua precariedade e
uma desaprovação tácita da conduta (ou falta de conduta) espiritual do autor. Penso ter resolvido as
contradições elementares de minha poesia num terceiro volume, Sentimento do mundo (1940).
Quando Drummond afirma em Sentimento do mundo que pensa ter resolvido as contradições elementares
de sua poesia, refere-se às contradições entre o eu e o mundo - o veio principal da sua obra poética.
Nessa fase, o eu lírico dos poemas manifesta interesse pelos problemas da vida social, da qual estivera
isolado até então. De certa forma, o gauchismo da primeira fase é deixado de lado.
Essa mudança de postura diante da realidade observada nos poemas drummondianos relaciona-se, sem
dúvida, ao contexto histórico. No período de gestação das três obras que compõem a segunda fase (1935 a
1945) do autor - além de Sentimento do mundo, também José (1942) e Rosa do povo (1945) -, o mundo
presenciou a ascensão do nazifascismo, a guerra na Espanha e a Segunda Guerra Mundial; no Brasil,
tiveram lugar ainda a Intentona Comunista (1935) e a ditadura de Vargas (1937-1945). Em todo o mundo se
verificava o crescimento de uma literatura social, engajada numa causa política.
Além disso, pode-se supor que o gauche da primeira fase percebe que seu gauchismo não lhe é exclusivo -
é universal. Todos os homens são gauches, pois essa é a consequência de se estar num mundo
problemático. Portanto, em vez de o eu se excluir do mundo, tenta transformá-lo e garantir nele o seu espaço.
Essa consciência da debilidade do mundo e da necessidade de transformá-lo levou o poeta a simpatizar
com o Partido Comunista e com a causa socialista. A adesão do poeta aos problemas do seu tempo e o
sentimento de solidariedade diante das frustrações e das esperanças humanas resultaram na criação da
melhor poesia social brasileira de nosso século, da qual é exemplo o poema "José", escrito durante a
Segunda Guerra Mundial.

José
E agora, José?
A festa acabou,
a luz apagou,
o povo sumiu,
a noite esfriou,
e agora, José?
e agora, você?
você que é sem nome,
que zomba dos outros,
você que faz versos,
que ama, protesta?
e agora, José?

Está sem mulher,


está sem discurso,
está sem carinho,
já não pode beber,
já não pode fumar,
cuspir já não pode,

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a noite esfriou,
o dia não veio,
o bonde não veio,
o riso não veio,
não veio a utopia
e tudo acabou
e tudo fugiu
e tudo mofou,
e agora, José?

E agora, José?
Sua doce palavra,
seu instante de febre,
sua gula e jejum,
sua biblioteca,
sua lavra de ouro,
seu terno de vidro,
sua incoerência,
seu ódio — e agora?

Com a chave na mão


quer abrir a porta,
não existe porta;
quer morrer no mar,
mas o mar secou;
quer ir para Minas,
Minas não há mais.
José, e agora?

Se você gritasse,
se você gemesse,
se você tocasse
a valsa vienense,
se você dormisse,
se você cansasse,
se você morresse...
Mas você não morre,
você é duro, José!

Sozinho no escuro
qual bicho-do-mato,
sem teogonia,
sem parede nua
para se encostar,
sem cavalo preto
que fuja a galope,
você marcha, José!
José, para onde?
(Reunião, cit .p. 70.)

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CECÍLIA MEIRELES E VINÍCIUS DE MORAIS

Cecília Meireles e Vinícius de Morais completam o grupo dos


principais poetas da segunda geração do Modernismo brasileiro.
Espiritualistas ambos. Cecília desenvolve uma poesia intimista e
reflexiva. de profunda sensibilidade feminina. Vinícius. partindo de
uma poesia religiosa e idealizante. chega a ser um dos poetas
mais sensuais de nossa literatura.
Embora não tenham pertencido diretamente ao grupo católico
carioca formado por Jorge de Lima, Murilo Mendes, Ismael Nery,
Tristão de Ataíde e outros, Cecília Meireles e Vinícius de Morais
também são considerados poetas espiritualistas e reforçam essa
tendência da segunda geração modernista.

Contudo, a obra de ambos trilha caminhos próprios: a de Cecília, o da reflexão filosófica e existencial; a de
Vinícius, um caminho em direção à percepção material da vida, do amor e da mulher.

CECÍLIA MEIRELES: O EFEMERO E O ETERNO

Cecília Meireles (1901-1964), a primeira grande escritora da literatura brasileira e a principal voz feminina
de nossa poesia moderna, nasceu no Rio de Janeiro, onde fez seus primeiros estudos e se formou
professora. Sempre preocupada com a educação de crianças, dedicou-se ao magistério, ao mesmo tempo
que desenvolvia uma intensa atividade literária e jornalística, colaborando em quase todos os jornais e
revistas cariocas da época.
Em 1919, lançou seu primeiro livro de poemas, Espectros, bem recebido pela crítica. A partir da década de
1930, já conhecida e respeitada, passou a lecionar literatura luso-brasileira na Universidade do Distrito
Federal e a dar cursos e fazer conferências em vários países, como Portugal e Estados Unidos. Sempre
cultivou um interesse enorme pelo Oriente e, em 1953, esteve em Goa, na Índia.
A produção literária de Cecília Meireles é ampla. Embora mais conhecida como poetisa, deixou contribuições
no domínio do conto, da crônica, da literatura infantil e do folclore. É dela um dos livros de literatura infantil
mais lidos e apreciados, Ou isto ou aquilo, que reúne poemas suaves e musicais sobre os sonhos e as
fantasias do imaginário infantil: os jogos, os brinquedos, os animais, as flores, a chuva.

A poesia: o neossimbolismo

A rigor, Cecília Meireles nunca esteve filiada a nenhum movimento literário. Sua poesia, de modo geral, filia-
se às tradições da lírica luso-brasileira. Apesar disso, as publicações iniciais da escritora - Espectros (1919),
Nunca mais ... e poema dos poemas (1923) e Baladas para El-Rei (1925) - evidenciam certa inclinação pelo
Simbolismo. Essa tendência é confirmada por sua participação na revista carioca Festa, publicação literária
de orientação espiritualista que defendia o universalismo e a preservação de certos valores tradicionais da
poesia.
Além disso, a frequente presença de elementos como o vento, a água, o mar, o ar, o tempo, o espaço. a
solidão e a música dá à poesia de Cecília Meireles um caráter fluido e etéreo, que confirma a inclinação
neossimbolista da autora.
O espiritualismo e o orientalismo. tão prezados pelos simbolistas. também se fazem presentes na obra da
poetisa. que sempre se interessou pela cultura oriental e foi admiradora e tradutora do poeta hindu Tagore,
do chinês Li Po e do japonês Bashô.

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Do ponto de vista formal, a escritora foi das mais habilidosas em nossa poesia moderna, sendo cuidadosa
sua seleção vocabular e forte a inclinação para a musicalidade (outro traço associado ao Simbolismo). para
o verso curto e para os paralelismos, a exemplo da poesia medieval portuguesa.

Raramente a poesia de Cecília Meireles foge à orientação intimista. Um desses momentos é representado
por Romanceiro da Inconfidência (1953), que, pelo viés da História, abre importante espaço em sua obra
para a reflexão sobre questões de natureza política e social, tais como a liberdade, a justiça, a miséria, a
ganância, a traição, o idealismo.
Fruto de um longo trabalho que envolveu dez anos de pesquisas, Romanceiro da Inconfidência é "uma
narrativa rimada", segundo a autora, que reconstrói, fundindo história e lenda, os acontecimentos de Vila
Rica à época da Inconfidência Mineira (1789).

A efemeridade do tempo
Cecília Meireles cultivou uma poesia reflexiva, de fundo filosófico, que aborda, entre outros, temas como a
transitoriedade da vida, o tempo, o amor, o infinito, a natureza, a criação artística. Mas não se deve entender
sua atitude reflexiva como postura intelectual, racional. Cecília foi antes de tudo uma escritora intuitiva, que
sempre procurou questionar e compreender o mundo a partir das próprias experiências: a morte dos pais
quando menina, a morte da avó que a educara, o suicídio do primeiro marido, o silêncio, a solidão. Ela
mesma revelou os objetivos que buscava alcançar por meio da poesia:
"Acordar a criatura humana dessa espécie de sonambulismo em que tantos se deixam arrastar. Mostrar -lhes
a vida em profundidade. Sem pretensão filosófica ou de salvação - mas por uma contemplação poética
afetuosa e participante"*.
Desses temas, os que mais se destacam são a fugacidade do tempo e a efemeridade das coisas. Tal
preocupação filosófica, rico filão explorado por toda a tradição clássica, sobretudo pelo Barroco, tem bases
na experiência pessoal da autora, conforme ela própria declarou:
Nasci aqui mesmo no Rio de Janeiro, três meses depois da morte de meu pai, e perdi minha mãe antes dos
três anos. Essas e outras mortes ocorridas na infância acarretaram muitos contratempos materiais, mas, ao
mesmo tempo, me deram, desde pequenina, uma tal intimidade com a Morte que docemente aprendi essas
relações entre o Efêmero e o Eterno [. . .] Em toda a vida, nunca me esforcei por ganhar nem me espantei
por perder. A noção ou sentimento da transitoriedade de tudo é o fundamento mesmo da minha
personalidade. (ln: Cecília Meireles, cit., p. 3 .)
RETRATO
Eu não tinha este rosto de hoje,
Assim calmo, assim triste, assim magro,
Nem estes olhos tão vazios,
Nem o lábio amargo.
Eu não tinha estas mãos sem força,
Tão paradas e frias e mortas;
Eu não tinha este coração
Que nem se mostra.
Eu não dei por esta mudança,
Tão simples, tão certa, tão fácil:
— Em que espelho ficou perdida
a minha face?

Ao reunir seus escritos para a publicação de Obras poéticas (1958), Cecília Meireles não incluiu seus três
livros iniciais, por entender que sua verdadeira maturidade poética se iniciara com Viagem (1939). A escritora
publicou, entre outras, estas obras de poesia: Vaga música (1942), Mar absoluto e outros poemas (1945),
Doze noturnos de Holanda e O aeronauta (1952), Romanceiro da Inconfidência (1953), Solombra (1963) e
Cânticos (1981).

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VINICIUS DE MORAIS: UM CANTO DE POETA E DE CANTOR

Você conhece estes versos?

E estes?

Os versos dessas canções são de Vinícius de Morais (1913-1980), autor que, além de ter sido um dos mais
famosos compositores da música popular brasileira e um dos fundadores, na década de 1950, do movimento
musical Bossa Nova, foi também poeta significativo da segunda fase do Modernismo.
Vinícius nasceu no Rio de Janeiro, em uma família de intelectuais. Já em 19 28, começou a fazer suas
primeiras composições musicais. Formou-se em Letras em 1929 e em Direito em 1933, ano em que publicou
seu primeiro livro de poemas, O caminho para a distância. Tornou-se representante do Ministério de
Educação junto à Censura Cinematográfica. Na década de 1940 ingressou na carreira diplomática e também
no jornalismo, como cronista e crítico de cinema. Como diplomata, viveu durante muitos anos em Los
Angeles, Paris e Montevidéu, com alguns intervalos no Brasil. Nesse período, conheceu intelectuais e
artistas de todo o mundo.
Na década de 1950, interessou-se por música de câmara e popular e começou a compor. Em 1956, publicou
a peça teatral Orfeu da Conceição, levada ao palco do Teatro Municipal do Rio de Janeiro com grande
sucesso. A peça continha músicas do próprio Vinícius e de Tom Jobim. Algum tempo depois, João Gilberto
juntou-se à dupla, e dessa reunião de compositores surgiu o movimento da Bossa Nova. Ainda em 1956,
Vinícius publicou o poema "O operário em construção". A partir daí, passou a dedicar-se cada vez mais à
atividade de cantor e compositor, compondo e fazendo shows com vários parceiros, como Dorival Caymmi,
Tom Jobim, Edu Lobo, Baden Powell, Toquinho, Chico Buarque.

A poesia: da transcendência espiritual ao amor sensual

Como poeta, Vinícius integra o grupo de poetas religiosos que se formou no Rio de Janeiro entre as décadas
de 1930 e 40.
Em sua Antologia poética, publicada em 1955, Vinícius de Morais assinalava que sua obra consistia em duas
fases: "A primeira, transcendental, frequentemente mística, resultante de sua fase cristã, termina com o

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poema 'Ariana, a mulher', editado em 1936". Na segunda "estão nitidamente marcados os movimentos de
aproximação do mundo material, com a difícil, mas consistente repulsa ao idealismo dos primeiros anos".
A exemplo de outros poetas de sua geração, a primeira fase da poesia de Vinícius é marcada pela
preocupação religiosa, pela angústia existencial diante da condição humana e pelo desejo de superar, por
meio da transcendência mística, as sensações de pecado, culpa e desconsolo que a vida terrena oferece.
Os poemas dessa fase geralmente são longos, com versos igualmente longos, em linguagem abstrata,
alegórica e declamatória. Observe:
No sangue e na lama
O corpo sem vida tombou.
Mas nos olhos do homem caído
Havia ainda a luz do sacrifício que redime
E no grande Espírito que adejava o mar e o monte
Mil vozes clamavam que a vitória do homem forte tombado na luta
Era o novo Evangelho para o homem da paz que lavra no campo.
(Poesia completa e prosa. Rio de Janeiro: Aguilar, 1974. p. 68.)

A poesia sensual e social

Cinco elegias (1943) é a obra que marca, na poesia de Vinícius, a passagem para uma fase de proximidade
maior com o mundo material. O poeta torna-se interessado nos temas cotidianos, nas coisas simples da
vida, e explora com sensualismo os temas do amor e da mulher. A linguagem também tende à simplicidade:
o verso livre passa a ser mais empregado, a comunicação fica mais direta e dinâmica.
Pode-se dizer que, pela primeira vez, Vinícius aderiu às propostas dos modernistas de 22, embora certa
dicção clássica e o gosto pelo soneto sempre tenham feito parte de sua poesia. Contudo, em suas mãos o
soneto ganhou uma roupagem diferente, mais moderna e real, fazendo uso de vocábulos do cotidiano, pouco
comuns nesse tipo de composição. Observe, por exemplo, o soneto a seguir, em que o erotismo é recriado
a partir de uma forma clássica e de uma linguagem crua e direta:

Soneto de devoção
Essa mulher que se arremessa, fria
E lúbrica em meus braços, e nos seios
Me arrebata e me beija e balbucia
Versos, votos de amor e nomes feios.
Essa mulher, flor de melancolia
Que se ri dos meus pálidos receios
A única entre todas a quem dei
Os carinhos que nunca a outra daria.
Essa mulher que a cada amor proclama
A miséria e a grandeza de quem ama
E guarda a marca dos meus dentes nela.
Essa mulher é um mundo! - uma cadela
Talvez ... - mas na moldura de uma cama
Nunca mulher nenhuma foi tão bela!
(Livro de sonetos. São Paulo: Cia. das Letras. Editora Schwarcz Ltda., 1991. p. 15. Autorizado pela VM Empreendimentos Artíst icos e Culturais Ltda.
© VM e © Cia. das Letras, Editora Schwarcz.)

Além de ter explorado a poesia sensual, Vinícius também se interessou pela poesia social. O poema "O
operário em construção" (1956) é o melhor exemplo desse envolvimento: por meio de uma linguagem
simples e direta, quase didática, o poeta manifesta solidariedade às classes oprimidas e almeja atingir a
consciência daqueles que o leem ou ouvem. Observe o fragmento a seguir.

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Era ele que erguia casas
Onde antes só havia chão.
Como um pássaro sem asas
Ele subia com as casas
Que lhe brotavam da mão.
Mas tudo desconheci
De sua grande missão:
Não sabia, por exemplo
Que a casa de um homem é um templo
Um templo sem religião
Como tampouco sabia
Que a casa que ele fazia
Sendo a sua liberdade
Era a sua escravidão
Mas ele desconhecia
Esse f ato extraordinário:
Que operário faz a coisa
E a coisa faz o operário.
De f orma que, certo dia
À mesa, ao cortar o pão
O operário foi tomado
De uma súbita emoção
Ao constatar assombrado
Que tudo naquela mesa
- Garraf a, prato, facão -
Era ele quem os fazia
Ele, um humilde operário
Um operário em construção.
Olhou em torno: gamela
Banco, enxerga, caldeirão
Vidro, parede, janela
Casa, cidade, nação!
Tudo, tudo o que existia
Era ele quem o f azia
Ele, um humilde operário
Um operário que sabia
Exercer a profissão.
Ah, homens de pensamento
Não sabereis nunca o quanto
Aquele humilde operário
Soube naquele momento!
(Poesia completa e prosa, cit., p. 293-4.)

Do último Vinícius, poeta sensual e social, para o Vinícius cantor e compositor foi u m passo. A partir da
década de 1960 o poeta entregou-se de corpo e alma à música. Se a poesia perdeu para a música popular
um grande talento, não se sabe. O certo é que Vinícius foi o poeta mais conhecido e amado do público
brasileiro, aquele que levou às rodas de bar, aos teatros e ao rádio composições de requinte literário.
Vinícius, além da poesia, também escreveu prosa, em especial crônicas. Dessa produção destacam-se as
obras Para viver um grande amor (1962), que também contém alguns poemas, e Para uma menina com
uma flor (1966).

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Soneto de separação
De repente do riso fez-se o pranto
Silencioso e branco como a bruma
E das bocas unidas fez-se a espuma
E das mãos espalmadas fez-se o espanto.
De repente da calma fez-se o vento
Que dos olhos desfez a última chama
E da paixão fez-se o pressentimento
E do momento imóvel fez-se o drama.
De repente, não mais que de repente
Fez-se de triste o que se fez amante
E de sozinho o que se fez contente.
Fez-se do amigo próximo o distante
Fez-se da vida uma aventura errante
De repente, não mais que de repente.

Soneto da fidelidade
De tudo, ao meu amor serei atento
Antes, e com tal zelo, e sempre, e tanto
Que mesmo em face do maior encanto
Dele se encante mais meu pensamento.
Quero vivê-lo em cada vão momento
E em louvor hei de espalhar meu canto
E rir meu riso e derramar meu pranto
Ao seu pesar ou seu contentamento.
E assim, quando mais tarde me procure
Quem sabe a morte, angústia de quem vive
Quem sabe a solidão, fim de quem ama
Eu possa me dizer do amor (que tive):
Que não seja imortal, posto que é chama
Mas que seja infinito enquanto dure.

Ausência
Eu deixarei que morra em mim o desejo de amar os teus olhos que são doces
Porque nada te poderei dar senão a mágoa de me veres eternamente exau sto.
No entanto a tua presença é qualquer coisa como a luz e a vida
E eu sinto que em meu gesto existe o teu gesto e em minha voz a tua voz.
Não te quero ter porque em meu ser tudo estaria terminado
Quero só que surjas em mim como a fé nos desesperados
Para que eu possa levar uma gota de orvalho nesta terra amaldiçoada
Que ficou sobre a minha carne como uma nódoa do passado.
Eu deixarei… tu irás e encostarás a tua face em outra face
Teus dedos enlaçarão outros dedos e tu desabrocharás para a madrugada
Mas tu não saberás que quem te colheu fui eu, porque eu fui o grande íntimo da noite
Porque eu encostei minha face na face da noite e ouvi a tua fala amorosa
Porque meus dedos enlaçaram os dedos da névoa suspensos no espaço
E eu trouxe até mim a misteriosa essência do teu abandono desordenado.
Eu ficarei só como os veleiros nos portos silenciosos
Mas eu te possuirei mais que ninguém porque poderei partir
E todas as lamentações do mar, do vento, do céu, das aves, das estrelas
Serão a tua voz presente, a tua voz ausente, a tua voz serenizada.

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MÁRIO QUINTANA

Mário Quintana (1906-1994) nasceu em Alegrete, no Rio Grande


do Sul, foi jornalista e tradutor e, em 1940, lançou seu primeiro
livro, A rua dos cata-ventos.
Com raízes no neossimbolismo, o lirismo de Quintana concilia o
humor com temas do cotidiano: a infância, a vida, a morte, o amor.
É autor de várias obras, entre elas algumas de literatura infantil.
Destacam-se: Aprendiz de feiticeiro (1950), Pé de pilão (1975),
Quintanares (1976), Lili inventa o mundo (1983), Nariz de vidro
(1984).

MANOEL DE BARROS

Manoel de Barros (1917) nasceu em Cuiabá e publicou sua primeira


obra, Pecado, em 1937. Fazendeiro, homem culto, o poeta vive isolado
no Pantanal, mas perfeitamente informado da grande poesia feita no
Brasil e no exterior. Embora ligado cronologicamente à geração de 30,
o autor trilha um percurso pessoal.

Como toda grande poesia, a de Barros trata do destino do homem, do


medo da morte, da sombra da infância se projetando no adulto, da
busca da felicidade e consequente contencioso de frustrações e da face
oculta de um Deus (creia-se ou não nele) que nos perseguem vida afora. (Rodrigo Brasil e Reinaldo Azevedo.
Bravo!,junho 1998.)
Normalmente apontado como "poeta ecológico", Manoel de Barros reage:
Minha obra tem um lastro de terra, mas não gosto de ser chamado de poeta ecológico – não dou muita
importância a isso. Poeta é o sujeito que mexe com palavras [ ... ] Se as palavras que me chegam mais
comumente são do brejo, é devido ao meu lastro existencial, que reflete um pouco a terra. (Idem.)
Autor de mais de quinze livros, entre outros publicou Pássaros (1960), Livro de pré-coisas (1985), Livro sobre
nada (1996), Cantigas por um passarinho à toa (2003).

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EXERCÍCIOS
1. Sobre a segunda geração do modernismo brasileiro é correto afirmar:

a) a cultura indígena e africana foram os principais temas explorados pelos escritores desse período.
b) chamada de fase de construção, a produção literária desse momento esteve voltada para a denúncia da
realidade brasileira.
c) o índio foi eleito como o herói nacional, reforçando ainda mais a identidade brasileira.
d) desprovida de engajamento político, nesse momento a preocupação era acerca do aprimoramento da
linguagem.
e) com forte teor indianista, a poesia dessa fase esteve voltada para temas cotidianos.

2. Sobre as características da prosa da segunda fase do modernismo no Brasil é incorreto afirmar:

a) a produção literária dessa fase buscou apresentar um retrato mais objetivo da realidade.
b) o regionalismo nordestino representou uma das principais expressões do romance de 30.
c) a denúncia social e o engajamento político são duas fortes características da produção desse período.
d) o uso da linguagem coloquial e dos regionalismos marcaram os romances publicados nessa fase.
e) a literatura destrutiva dessa fase foi essencial para criar uma abordagem menos politizada.

3. A prosa de 30 foi um dos momentos de grande destaque da segunda geração modernista. Nesse
momento, a literatura teve um papel importante na divulgação de temas relacionados com a realidade
brasileira. Muitos escritores de destacaram nessa fase, exceto:

a) Rachel de Queiroz
b) Graciliano Ramos
c) José Lins do Rego
d) Clarice Lispector
e) Jorge Amado

4. A poesia de 30 reuniu obras que foram produzidas no Brasil durante a segunda geração modernista (1930-
1945). Essa fase representou um dos melhores momentos da poesia brasileira. Sobre as características
desses textos, é correto afirmar:

a) presença de versos livres


b) preferência pela linguagem formal
c) excesso de pontuação
d) centrados na lógica
e) ausência de humor

5. Temas relacionados com o universo nordestino foi explorado por diversos autores na segunda fase do
modernismo no Brasil. Das alternativas abaixo, o romance que não apresenta essa temática é:

a) Vidas secas, de Graciliano Ramos


b) A bagaceira, de José Américo de Almeida.
c) O quinze, de Rachel de Queiroz
d) Menino do engenho, de José Lins do Rego
e) O país do carnaval, de Jorge Amado

No meio do caminho tinha uma pedra


Tinha uma pedra no meio do caminho
Tinha uma pedra
No meio do caminho tinha uma pedra

Nunca me esquecerei desse acontecimento


Na vida de minhas retinas tão fatigadas
Nunca me esquecerei que no meio do caminho

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Tinha uma pedra
Tinha uma pedra no meio do caminho
No meio do caminho tinha uma pedra
(No meio do Caminho, Carlos Drummond de Andrade)

6. Publicado na revista Antropofagia em 1928 e posteriormente em sua obra Alguma poesia (1930), o poema
de Carlos Drummond de Andrade causou um escândalo na época sendo duramente criticado. Sobre isso é
correto afirmar:

a) o poema representou um ataque aos políticos da época.


b) o poema critica duramente a desatenção dos seres humanos.
c) o poema utiliza do ceticismo para abordar um tema corriqueiro.
d) o poema apresenta críticas relacionadas com o choque social presente no país.
e) o poema utiliza a ironia e o sarcasmo para se referir a condição humana.

Não rimarei a palavra sono


com a incorrespondente palavra outono.
Rimarei com a palavra carne
ou qualquer outra, que todas me convém.
As palavras não nascem amarradas,
elas saltam, se beijam, se dissolvem,
no céu livre por vezes um desenho,
são puras, largas, autênticas, indevassáveis.
[...]
(Consideração do poema, Carlos Drummond de Andrade)

7. A função da linguagem explorada pelo autor no trecho acima é chamada de:

a) Conativa
b) Metalinguística
c) Referencial
d) Emotiva
e) Fática

8. (Ibmec-SP)

1ª parte do poema “Eu, etiqueta” - Carlos Drummond de Andrade

Em minha calça está grudado um nome


que não é meu de batismo ou de cartório,
Um nome…estranho.
Meu blusão traz lembrete de bebida
que jamais pus na boca, nesta vida.
Em minha camiseta, a marca de cigarro
que não fumo, até hoje não fumei.
Minhas meias falam de produto
Que nunca experimentei
Mas são comunicados a meus pés.
Meu tênis é proclama colorido
de alguma coisa não provada
por este provador de longa idade.
Meu lenço, meu relógio, meu chaveiro,
minha gravata e cinto e escova e pente,
meu copo, minha xícara,
minha toalha de banho e sabonete,
meu isso meu aquilo,
desde a cabeça ao bico dos sapatos,
são mensagens,

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letras falantes,
gritos visuais,
ordens de uso, abuso, reincidência,
costume, hábito, permanência,
indispensabilidade,
e fazem de mim homem-anúncio itinerante,
escravo da matéria anunciada.

Carlos Drummond de Andrade é considerado o poeta mais importante do nosso Modernismo e pertenceu à
segunda geração desse período literário. Assinale as principais características dessa fase, visivelmente
detectadas no poema:

a) Literatura marcada pela obscuridade. A realidade é revelada de uma forma imprecisa e vaga.
b) Literatura politizada, marcada pelo questionamento da realidade e comprometida com as transformações
sociais enfrentadas pelo país.
c) Subjetividade, o culto ao “EU”, ao individualismo e à liberdade de expressão.
d) Culto excessivo da forma, expresso por meio de malabarismos sintáticos e abusos de figuras literárias, o
que resulta em um rebuscamento exagerado da linguagem.
e) Predomínio da razão sobre os sentimentos e uso de uma linguagem mais sóbria, sem excessos e figuras
de linguagem.

9. Sobre a Segunda Geração do Modernismo, é correto afirmar:

1. Foi caracterizada, no campo da poesia, pelo amadurecimento e pela ampliação das conquistas dos
primeiros modernistas;
2. Valorização de uma linguagem rebuscada e metalinguística;
3. Os poetas do período tinham liberdade para escolher formas como o soneto ou o madrigal, sem que isso
significasse uma volta a estéticas do passado, como o Parnasianismo;
4. Valorização do conteúdo sonoro e visual, disposição assimétrica dos versos no papel, possibilidade de
diversas leituras através de diferentes ângulos;
5. No plano temático, a abordagem do cotidiano continuou sendo explorada, mas os poetas voltaram-se
também para problemas sociais e históricos, além de manifestarem inquietações existenciais e religiosas
que ampliaram as proposições da fase anterior.

a) Apenas 2 e 4 são corretas.


b) 1, 3 e 5 são corretas.
c) 3, 5 e 4 são corretas.
d) 2, 3 e 5 são corretas.
e) apenas 4 está correta.

10. Excelente sonetista, é um dos poucos representantes da poesia sensual, erótica, com fortes imagens:
"Nunca mulher nenhuma foi tão bela (...) / Essa mulher é um mundo! — uma cadela, / Talvez... — mas na
moldura de uma cama (...)". O trecho pode ser associado a:

a) Oswald de Andrade.
b) Carlos Drummond de Andrade
c) Murilo Mendes
d) Vinicius de Moraes
e) Mário de Andrade.

SENTIMENTAL

Ponho-me a escrever teu nome


com letras de macarrão.
No prato, a sopa esfria, cheia de escamas
E debruçados na mesa todos contemplam
esse romântico trabalho.

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Desgraçadamente falta uma letra,
uma letra somente
para acabar teu nome!
- Está sonhando? Olhe que a sopa esfria!
Eu estava sonhando...
E há em todas as consciências um cartaz amarelo:
Neste país é proibido sonhar.
Carlos Drummond de Andrade

11. Esse poema é caracteristicamente modernista, porque nele:

a) A uniformidade dos versos reforça a simplicidade dos sentimentos experimentados pelo poeta.
b) Tematiza-se o ato de sonhar, valorizando-se o modo de composição da linguagem surrealista.
c) Satiriza-se o estilo da poesia romântica, defendendo os padrões da poesia clássica.
d) A linguagem coloquial dos versos livres apresenta com humor o lirismo encarnado na cena cotidiana.
e) O dia a dia surge como novo palco das sensações poéticas, sem imprimir a alteração profunda na
linguagem lírica.

12. Sobre o Modernismo brasileiro, em que se insere a obra de Carlos Drummond de Andrade, pode -se
afirmar corretamente que:

1. Conta com diferentes tendências individuais e pelo menos duas fases distintas;
2. Discute as diferenças culturais e estéticas e valoriza as peculiaridades locais;
3. Respeitas as regras da poética tradicional e evita formar ideias originais.

a) 1 e 2 estão corretas.
b) 1 e 3 estão corretas.
c) 2 e 3 estão corretas.
d) 1, 2 e 3 estão corretas.
e) Somente 2 é correta.

13. Leia o poema abaixo:

Retrato

Eu não tinha este rosto de hoje,


assim calmo, assim triste, assim magro,
nem estes olhos tão vazios,
nem o lábio tão amargo.

Eu não tinha estas mãos sem força,


tão paradas e frias e mortas,
eu não tinha este coração
que nem se mostra.

Eu não dei por esta mudança,


tão simples, tão certa e fácil:
- Em que espelho ficou perdida
a minha face?"
(Cecília Meireles)

Assinale a alternativa INCORRETA de acordo com o poema:

a) A expressão "mãos sem força", que aparece no primeiro verso da segunda estrofe, indica um lado
fragilizado e impotente do "eu" poético diante de sua postura existencial.

b) As palavras mais sugerem do que escrevem, resultando, daí, a força das impressões sensoriais. Imagens
visuais e auditivas, em outros poemas, sucedem-se a todo momento.

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c) O tema revela uma busca da percepção de si mesmo. Antes de um simples retrato, o que se mostra é um
autorretrato, por meio do qual o “eu” poético olha-se no presente, comparando-se com aquilo que foi no
passado.

d) Não há no poema o registro de estados de ânimo vagos e quase incorpóreos, nem a noção de perda
amorosa, abandono e solidão.

14. São características da poesia na segunda geração modernista, EXCETO:

a) O traço formalizante é o que caracteriza essa geração de poetas. Enq uanto alguns buscaram um estilo
culto e elevado, outros buscaram uma linguagem essencial, sintética e racional.

b) As principais características da poesia na segunda geração modernista foram o experimentalismo, a


poesia social e o neobarroquismo, com forte influência no cultismo e no gongorismo.

c) Seus principais representantes foram João Cabral de Melo Neto, Cecília Meireles, Carlos Drummond de
Andrade, Vinícius de Moraes e Mario Quintana.

d) A segunda fase do Modernismo foi caracterizada, no campo da poesia, pelo amadurecimento e pela
ampliação das conquistas dos primeiros modernistas. Assim, nos anos de 1930 a 1945, a poesia modernista
consolidou-se e alargou seus horizontes temáticos.

15. (UNIFOR-CE)

Não serei o poeta de um mundo caduco.


Também não cantarei o mundo futuro.
Estou preso à vida e olho meus companheiros.
Estão taciturnos mas nutrem grandes esperanças.
Entre eles, considero a enorme realidade.

Os versos acima, do poema "Mãos dadas", de Carlos Drummond de Andrade, prendem-se a uma fase de
sua poesia na qual o poeta mineiro,

a) promovendo um balanço crítico de sua poesia, aventura-se em novas formas poéticas, de caráter
experimental.
b) influenciado diretamente por Oswald de Andrade, passa a compor epigramas irônicos.
c) relativizando a ironia que caracterizava momentos anteriores, escreve poemas de cunho político -social.
d) desiludido com os rumos do mundo contemporâneo, recolhe -se à intimidade e passa a refletir sobre o
absurdo da existência.
e) já na casa dos setenta anos, entrega-se a um memorialismo em tom de crônica, revivendo suas
experiências juvenis.

"Não faça versos sobre acontecimentos,


Não há criação nem morte perante a poesia.
Diante dela, a vida é um sol estático,
Não aquece nem ilumina."

16. Uma das constantes da obra de Carlos Drummond de Andrade, como se verifica nos versos acima, é:

a) a louvação do homem social.


b) negativismo destrutivo.
c) a violação e desintegração da palavra.
d) pessimismo lírico.
e) questionamento da própria poesia.

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17. (EsPCEx) Leia as afirmações abaixo sobre Carlos Drummond de Andrade:

I- Preferiu não participar da Semana de Arte Moderna, mas enviou seu famoso poema “Os Sapos”, que, lido
por Ronald de Carvalho, tumultuou o Teatro Municipal.
II – Sua fase “gauche” caracterizou-se pelo pessimismo, pelo individualismo, pelo isolamento e pela reflexão
existencial. A obra mais importante foi o “Poema de Sete Faces”.
III- Na fase social, o eu lírico manifesta interesse pelo seu tempo e pelos problemas cotidianos, buscando a
solidariedade diante das frustrações e das esperanças humanas.
IV- A última fase foi marcada pela poesia intimista, de orientação simbolista, prezando o espiritualismo e
orientalismo e a musicalidade, traços que podem ser notados no poema “O motivo da Rosa”.

Estão corretas as afirmações:

a) I, II e III
b) II, III e IV
c) II e III
d) II e IV
e) III e IV.

18. (ENEM – 2007) A partir da obra Vidas Secas e das informações sobre o romance regionalista nordestino,
relativas às concepções artísticas do romance social de 1930, avalie as seguintes afirmativas.

I - O pobre, antes tratado de forma exótica e folclórica pelo regionalismo pitoresco, transforma-se em
protagonista privilegiado do romance social de 30.
II - A incorporação do pobre e de outros marginalizados indica a tendê ncia da ficção brasileira da década de
30 de tentar superar a grande distância entre o intelectual e as camadas populares.
III - Graciliano Ramos e os demais autores da década de 30 conseguiram, com suas obras, modificar a
posição social do sertanejo na realidade nacional

É correto apenas o que se afirma em

a) I
b) II
c) III
d) I e II
e) II e III

19. (Univ. Católica de Pelotas)

"Lutar com palavras


é a luta mais vã.
Entretanto lutamos
Mal rompe a manhã.
São muitas, eu pouco
Algumas, tão fortes
como um javali."
(O Lutador)

Uma das constantes na obra poética de Carlos Drummond de Andrade, como se verifica nos versos acima,
é

a) a louvação do poema social.


b) o negativismo destrutivo.
c) o questionamento da própria poesia.
d) o espiritualismo e o intimismo.
e) a denúncia social.

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Disciplina: Português V – AULA 11
Conteúdo: REPORTAGEM107
Reportagem é o nome dado ao gênero textual jornalístico que realiza a interação verbal entre os indivíduos,
seja por meio da fala ou escrita.

O ser humano comunica-se e expressa as suas ideias e emoções através da linguagem. Os gêneros textuais
são as representações dessa linguagem, que podem ser alteradas de acordo com o contexto em que são
empregadas.

A reportagem é transmitida por meio dos veículos jornalísticos, como jornais impressos, revistas, sites, TVs
e rádios. A sua principal função é informar.

PRINCIPAIS ELEMENTOS DA REPORTAGEM

A reportagem caracteriza-se por texto mais longo, com detalhes e informações que geralmente não são
encontradas em outros tipos de escrita. Para a produção, é necessário que o repórter faça um levantamento
de dados, realize entrevista com pessoas relevantes para o caso e atenda todos os lados envolvidos, ou
escute especialistas sobre o assunto relatado. Ela não mostra somente o fato, mas os encaminhamentos
para o seu acontecimento.

A reportagem por ser encontrada em diversos veículos de comunicação. (Foto: Pixabay)

O objetivo principal do texto deve ser o de informar. A reportagem cumpre uma função social, e não é feita
somente de temas atuais. Qualquer fenômeno pode virar pauta para esse gênero textual.

A linguagem utilizada é simples e objetiva, como nos demais textos jornalísticos. É importante que se
estabeleça uma relação com o leitor/ interlocutor. Pode-se também, na reportagem, fazer a observação do
fato ocorrido através da interpretação.

FORMATO DO TEXTO

Como se trata de um gênero textual jornalístico, a reportagem não precisa obedecer a uma estrutura
determinada. O texto é mais livre, sendo necessário apenas se atentar para alguns elementos essenciais,
que são:

Título: onde se coloca o tema da reportagem de forma clara e que atraia o interesse do leitor.

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Reportagem. Educa mais Brasil. Conteúdo disponível em https://www.educamaisbrasil.com.br/enem/lingua-portuguesa/reportagem. Acesso em
04 de ago. de 2021.

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Subtítulo: é um título secundário, que pode apresentar outras informações relevantes do texto. Não é
obrigatória a sua presença.

Lide (ou lead): é basicamente um resumo do texto, colocado no seu primeiro parágrafo, situando o leitor
sobre o que ele vai ler a seguir. As informações são colocadas de acordo com a relevância, ou seja, o mais
importante é dito antes.

Corpo do texto: são as demais informações sobre o fato. Comparando com um texto dissertativo, seria o
seu desenvolvimento.

REPORTAGEM X NOTÍCIA

Reportagem e notícia são a mesma coisa? Essa pergunta é bem comum, já que os dois tipos de gêneros
textuais apresentam bastante semelhanças. Para entender como funciona cada uma delas, portanto, é
necessário prestar atenção justamente nas suas diferenças.

A notícia precisa ser dada logo após o fato acontecer. Por conta disso, as vezes as informações não são
suficientes. É necessário um tempo maior para apurar o que aconteceu, e oferecer ao leitor uma maior
riqueza de detalhes. Esse é o papel da reportagem.

A notícia é mais curta, já reportagem é mais longa, e explica o desdobramento do caso, o que foi necessário
para que ele acontecesse. Outra característica importante que faz a diferenciação entre ambas é que a
reportagem escuta diversas fontes, especialistas e os vários lados da mesma história.

Perceba nos exemplos como a diferença entre os dois gêneros existe:

Exemplo de reportagem

Jovens e conectados: novos investidores da Bolsa


buscam informação na web
Estudo da B3 mostra que entre os 2 milhões de novos investidores da bolsa, cerca de 60% acompanham influencers
digitais
Por Luisa Purchio Atualizado em 15 dez 2020, 00h26 - Publicado em 14 dez 2020, 17h09
Leia mais em: https://veja.abril.com.br/economia/jovens-e-conectados-novos-investidores-da-bolsa-buscam-informacao-na-web/

Um estudo divulgado na tarde desta segunda-feira 14 pela B3, com os 2 milhões de novos investidores na Bolsa de
Valores entre abril de 2019 e abril de 2020, mostrou que o investidor brasileiro está mais maduro em relação ao mercado
de renda variável. Sinal que os esforços das corretoras e influenciadores digitais em atrair novos investidores à bolsa
estão dando bons frutos. Apesar de serem novatos, os novos investidores possuem uma melhor visão de longo prazo,
mesmo em momentos de alta volatilidade nas ações, o que mostra uma melhor compreensão sobre esse tipo de ativo
e um bom entendimento financeiro.
“O pensamento de médio e longo prazo já faz parte da mentalidade de boa parte dessa nova safra que começa a
investir. A decisão de resgatar os investimentos fica muito mais atrelada à liquidez do que à volatilidade”, afi rma Felipe
Paiva, diretor de Relacionamento com Clientes Pessoa Física da B3. “É uma mudança de mentalidade que está se
consolidando entre os jovens brasileiros e, por isso, uma mudança geracional na forma de investir no país”, diz ele. A
média de idade desses novos investidores é de 32 anos.
De acordo com o levantamento da B3, a maioria desses novos investidores (73%) obtém informações sobre o mercado
na internet, sendo que 60% acompanham influenciadores digitais. Das pessoas que acompanham influenciadores, 73%
declaram que tomam decisões de investimento por conta própria, a partir de análise e dados de diversas fontes. “A
transformação digital trazida pelo avanço da tecnologia e o maior acesso à informação foram cruciais para que o
mercado de investimentos se desenvolvesse muito nos últimos anos no Brasil. E, nesse cenário, é essencial que as
pessoas estejam cada vez mais atentas não só à qualidade dos dados como, também, à credibilidade, reputação e
histórico de suas fontes”, diz Paiva.
Além disso, os novos investidores têm diversificado mais. Quase a metade deles (46%) fez isso este ano. Em 2016,
78% do investidor do varejo detinha somente ações e, em 2020, são 54%. Não colocar todos os ovos na mesma cesta
é considerado uma decisão acertada no mercado brasileiro por parte dos especialistas financeiros. “Aqueles que
criaram regras muito bem definidas de diversificação das carteiras estão firmes e fortes enquanto aqueles que
concentraram demais ficaram pelo caminho”, diz Renato Breia, sócio fundador da Nord Research, a respeito do que

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observou das gestoras nos últimos 15 anos. “Precisamos lembrar que no Brasil as coisas funcionam bem diferente dos
EUA. Com uma simples canetada, nossos governantes já foram capazes de rasgar contratos e dizimar alguns setores
da economia”, diz ele.
Apesar do crescimento e da consolidação da renda variável no Brasil, vale lembrar que ele está muito aquém ao
americano e com enorme potencial de crescimento. Nos Estados Unidos, por exemplo, mais da metade da população
investe em bolsas, e no Brasil esse índice é inferior a 5%.

ICONOGRAFIA
Trata-se de uma forma de linguagem visual que usa imagens para representar algum tema. As
REPORTAGENS exploram imagens, gráficos, infográficos, tabelas, fotos etc., para complementar e dar
maior credibilidade às informações que serão transmitidas.

Exemplo de notícia

BB Seguridade vai pagar R$ 1 bilhão em dividendos


A companhia pagará R$ 0,52087499717 por ação, com base na posição acionária em 11 de agosto.
Publicado 23 horas atrás em 3 de agosto de 2021por InvestNews

A holding de seguros BB Seguridade (BBSE3) anunciou nesta segunda-feira (02) seu cronograma para pagamento de
dividendos referentes ao 1º semestre de 2021, adicionados os dividendos prescritos referentes ao segundo semestre
de 2017.
Segundo comunicado, a companhia vai pagar R$ 0,52087499717 por ação, totalizando R$ 1,04 bilhão em dividendos
a serem pagos no dia 23 de agosto, com base na posição acionária do dia 11.
A companhia divulgou seu resultado referente ao segundo trimestre de 2021, apresentando lucro líquido de R$753,7
milhões, uma redução de 21,2% em relação ao reportado no segundo trimestre de 2020.

➢ A Notícia tem como temas os fatos de relevância imediata; já na Reportagem, os temas são diversos,
como políticos, sociais, econômicos, culturais etc. Outra diferença é de natureza conteudista, enquanto na
notícia privilegiam-se os fatos, atuais e cotidianos; na reportagem preza-se pela interpretação dos fatos e
dados narrados. Tomada como método de registro, a notícia se esgota no anúncio; a reportagem, porém, só
se esgota no desdobramento, na pormenorização, no amplo relato dos fatos.

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EXERCÍCIOS
1. (UFPR – 2010) Considere as seguintes características:

1. Texto expressionista de subjetividade exacerbada.


2. Predominância da forma narrativa e humanização do relato.
3. Texto de natureza impressionista e objetividade dos fatos narrados.
4. Predominância da forma descritiva e desumanização do relato.
5. Texto literário e alta subjetividade.

São estabelecidas para o gênero reportagem as características:

a) 1 e 3 apenas.
b) 2 e 3 apenas.
c) 2, 3 e 4 apenas.
d) 3, 4 e 5 apenas.
e) 1 e 2 apenas.

2. São características do gênero reportagem:

a) Comunicação utilizada entre pessoas que mantêm algum tipo de relação íntima, cuja linguagem é
predominantemente coloquial.

b) Seu principal objetivo é transmitir a opinião de pessoas de destaque sobre algum as sunto de interesse.

c) Texto jornalístico divulgado nos meios de comunicação de massa, informa fatos de interesse público, cuja
linguagem deve ser objetiva e clara.

d) A linguagem é sua principal característica, pois há uma preocupação com a seleção e a combinação
vocabular. Sua linguagem é predominantemente subjetiva.

Os altos salários renderam a Brasília a fama de ilha da fantasia. No chamado entorno da cidade, um milhão
de pessoas vivem sem saneamento, utilizam transporte público de baixa qualidade e sofrem com a violência.
Adaptado de O Globo, 21/04/2010

3. A reportagem publicada no jornal “O Globo”, do dia 21 de abril de 2010, tem como assunto principal
informar sobre os problemas que atingem os moradores do entorno de Brasília. Sobre ela, é possível afirmar
que:

I. Apresenta linguagem clara e objetiva, recurso predominante na linguagem jornalística.

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II. Apesar de contrariar o princípio da imparcialidade, é possível observar que há uma opinião pessoal do
enunciador na reportagem.

III. A imagem da campanha institucional do Governo do Distrito Federal, aliada aos seus recursos
linguísticos, estabelece um paradoxo com a informação veiculada na reportagem.

IV. O fragmento da reportagem corrobora com as informações veiculadas na campanha institucional do


Governo do Distrito Federal.

Estão corretas:

a) I e IV.
b) I, II e III.
c) Apenas IV.
d) I e II.

4. (Enem 2018 – PPL)


Deserto de sal
O silêncio ajuda a compor a trilha que se ouve na caminhada pelo Salar de Atacama.
Com 100 quilômetros de extensão, o Salar de Atacama é o terceiro maior deserto de sal do mundo. De acordo com
estudo publicado pela Universidade do Chile, o Salar de Atacama é uma depressão de 3 500 quilômetros quadrados
entre a Cordilheira dos Andes e a Cordilheira de Domeiko. Sua origem está no movimento das placas tectônicas. Mais
tarde, a água evaporou-se e, desta forma, surgiram os desertos de sal do Atacama. Além da crosta de sal que recobre
a superf ície, há lagoas formadas pelo degelo de neve acumulada nas montanhas.
FORNER, V. Terra da Gente, n. 96, abr. 2012.

Os gêneros textuais são textos materializados que circulam socialmente. O texto Deserto de sal foi veiculado
em uma revista de circulação mensal. Pelas estratégias linguísticas exploradas, conclui-se que o fragmento
apresentado pertence ao gênero

a) relato, pela apresentação de acontecimentos ocorridos durante uma viagem ao Salar de Atacama.
b) verbete, pela apresentação de uma definição e de exemplos sobre o termo Salar de Atacama.
c) artigo de opinião, pela apresentação de uma tese e de argumentos sobre o Salar de Atacama.
d) reportagem, pela apresentação de informações e de dados sobre o Salar de Atacama.
e) resenha, pela apresentação, descrição e avaliação do Salar de Atacama.

5. (Ano: 2010 Banca: INEP Órgão: ENEM Prova: INEP - 2010 - ENEM - Exame Nacional do Ensino Médio)

A notícia, do ponto de vista de seus elementos constitutivos,

a) apresenta argumentos contrários à pesca ilegal.


b) tem um título que resume o conteúdo do texto.
c) informa sobre uma ação, a finalidade que a motivou e o resultado dessa ação.
d) dirige-se aos órgãos governamentais dos estados envolvidos na referida operação do Ibama.
e) introduz um fato com a finalidade de incentivar movimentos sociais em defesa do meio ambiente.

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6. (Ano: 2011 Banca: INEP Órgão: ENEM Prova: INEP - 2011 - ENEM - Exame Nacional do Ensino Médio)

Essa notícia, publicada em uma revista de grande circulação, apresenta resultados de uma pesquisa
científica realizada por uma universidade brasileira. Nessa situação específica de comunicação, a função
referencial da linguagem predomina, porque o autor do texto prioriza

a) as suas opiniões, baseadas em fatos.


b) os aspectos objetivos e precisos.
c) os elementos de persuasão do leitor.
d) os elementos estéticos na construção do texto.
e) os aspectos subjetivos da mencionada pesquisa.

7. (Ano: 2021 Banca: INEP Órgão: ENEM Prova: INEP - 2021 - ENEM - Exame Nacional do Ensino Médio)

Ação coloca baleia encalhada às margens do Rio Sena

As pessoas em Paris acordaram com uma notícia inusitada: uma baleia encalhada f oi encontrada nas margens do
Sena, perto de Notre Dame. Para deixar tudo ainda mais surreal, cientistas f orenses f oram vistos est udando o
f enômeno. O público ficou impressionado com as cenas e bombou as redes sociais de comentários e fotos. Horas mais
tarde, a verdade por trás do espetáculo bizarro f oi revelada. Embora parecesse muito com um animal real, tudo não
passava de uma instalação artística criada pelo coletivo belga Capitão Boomer. A escultura gigante media 17 metros e
simulava o cheiro de uma baleia morta, com todos os seus detalhes, incluindo o sangue. O projeto foi desenvolvido
para aumentar a conscientização sobre o impacto provocado pelos seres humanos no meio ambiente, em todas as
espécies, incluindo as baleias.

Disponível em: http://exame.abril.com.br. Acesso em: 16 ago. 2017 (adaptado).

Essa notícia tem sua relevância informativa estabelecida ao apresentar um fato inesperado relativo ao(à)

a) excesso de comentários nas redes sociais sobre valores ecológicos e meio ambiente.
b) presença de um animal marinho encalhado e em decomposição no centro de Paris.
c) uso de uma instalação artística realista como instrumento de denúncia social.
d) falta de ações de preservação do meio ambiente no continente europeu.
e) opção por uma análise sensacionalista de um evento inusitado.

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8. (Ano: 2013 Banca: INEP Órgão: ENEM Prova: INEP - 2013 - ENEM - Exame Nacional do Ensino Médio)

Empresa vai fornecer 230 turbinas para o segundo complexo de energia à base de ventos, no sudeste da Bahia. O
Complexo Eólico Alto Sertão, em 2014, terá capacidade para gerar 375 MW (megawatts), total suficiente para abastecer
uma cidade de 3 milhões de habitantes.
MATOS, C. GE busca bons ventos e fecha contrato de R$ 820 mina Bahia. Folha de S. Paulo, 2 dez 2012.

A opção tecnológica retratada na notícia proporciona a seguinte consequência para o sistema energético
brasileiro:

a) Redução da utilização elétrica.


b) Ampliação do uso bioenergético
c) Expansão das fontes renováveis.
d) Contenção da demanda urbano-industrial.
e) Intensificação da dependência geotérmica.

9. (Ano: 2019 Banca: INEP Órgão: ENEM Prova: INEP - 2019 - ENEM - Exame Nacional do Ensino Médio)

Com o enredo que homenageou o centenário do Rei do Baião, Luiz Gonzaga, a Unidos da Tijuca foi
coroada no Carnaval 2012.

A penúltima escola a entrar na Sapucaí, na segunda noite de desfiles, mergulhou no universo do cantor e compositor
brasileiro e trouxe a cultura nordestina com criatividade para a Avenida, com o enredo O dia em que toda a realeza
desembarcou na Avenida para coroar o Rei Luiz do Sertão.
Disponível em: www.cultura.rj.gov.br. Acesso em: 15 maio 2012 (adaptado).

A notícia relata um evento cultural que marca a

a) primazia do samba sobre a música nordestina.


b) inter-relação entre dois gêneros musicais brasileiros.
c) valorização das origens oligárquicas da cultura nordestina.
d) proposta de resgate de antigos gêneros musicais brasileiros.
e) criatividade em compor um samba-enredo em homenagem a uma pessoa.

10. (Ano: 2021 Banca: INEP Órgão: ENEM Prova: INEP - 2021 - ENEM - Exame Nacional do Ensino Médio)

Caminhando contra o vento, Sem lenço e sem documento No sol de quase dezembro Eu vou
O sol se reparte em crimes Espaçonaves, guerrilhas Em cardinales bonitas Eu vou
Em caras de presidentes Em grandes beijos de amor Em dentes, pernas, bandeiras Bombas e Brigitte Bardot O sol nas
bancas de revista Me enche de alegria e preguiça Quem lê tanta noticia Eu vou
VELOSO, C. Alegria, alegria In Caetano Veloso. São Paulo. Philips. 1967 (fragmento).

É comum coexistirem sequências tipológicas em um mesmo gênero textual. Nesse fragmento, os tipos
textuais que se destacam na organização temática são

a) descritivo e argumentativo, pois o enunciador detalha cada lugar por onde passa, argumentando contra a
violência urbana.
b) dissertativo e argumentativo, pois o enunciador apresenta seu ponto de vista sobre as noticias relativas á
cidade.
c) expositivo e injuntivo, pois o enunciador fala de seus estados físicos e psicológicos e interage com a
mulher amada.
d) narrativo e descritivo, pois o enunciador conta sobre suas andanças pelas ruas da cidade ao mesmo
tempo que a descreve.
e) narrativo e injuntivo, pois o enunciador ensina o interlocutor como andar pelas ruas da cidade contando
sobre sua própria experiência.

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Disciplina: Português V – AULA 12
Conteúdo: ENTREVISTA108

Somos melhores com a desordem


Em "Antifrágil", o filósofo libanês Nassim Taleb defende que não devemos evitar o caos para
podermos crescer
NATHALIA BIANCO
10/07/2014 - 17h22 - Atualizado 11/07/2014 12h12

O filósofo e pesquisador libanês Nassim Taleb falou a


ÉPOCA sobre seu mais recente livro traduzido para o
português, Antifrágil, da Editora Best Business. Na
entrevista a seguir, Taleb explica como sistemas
complexos dos mais variados, do corpo humano até o
financeiro, precisam de pontos frágeis e de oportunidade
para se adaptarem a esses pontos, sem intervenções, para
que se aperfeiçoem. Taleb diz que a ideia equivocada que
fazemos da desordem elimina ótimas oportunidades de
crescimento.

ÉPOCA – O que é ser antifrágil? Nassim Taleb: "Antifrágil é tudo o que se beneficia da
desordem" (Foto: Divulgação)

Nassim Taleb – Antifrágil é tudo o que se beneficia da desordem. Podemos separar objetos em três
categorias: existem as coisas que quebram e que sofrem. Coisas que aguentam esse sofrimento, não
quebram e crescem. Ser antifrágil é uma terceira categoria. Foi o nome que dei, por falta de outro, às coisas
que se beneficiam da desordem.

ÉPOCA – O senhor pode dar alguns exemplos?


Taleb – Há muitas coisas que vieram do estresse. Temos o conhecido estresse pós -traumático, mas
ninguém fala sobre o crescimento pós-traumático. No 4º capítulo do meu livro, cito que tudo o que é orgânico
gosta de desordem. O corpo humano, se não tiver desordem, desaparece. É por isso que as pessoas vão à
academia, para causar um estresse ao corpo que o beneficie. Pense numa floresta. Muitas pessoas não
sabem disso, mas as florestas se beneficiam das pequenas queimadas. É dessa forma que elas se tornam
uma sociedade antifrágil, porque com essas pequenas queimadas, evitam que materiais inflamáveis se
acumulem a ponto de causarem um grande incêndio que ficará fora de controle. Deixar que pequenos
incêndios ocorram limpa a floresta de materiais inflamáveis evitando um grande incêndio. Essa poderia ser
uma alegoria para muitos outros sistemas.

ÉPOCA – Como podemos diferenciar a Teoria da Evolução da tese do Antifrágil? Nos dois casos,
sobrevive quem está mais bem preparado, é mais inteligente e forte.

Taleb – As duas coisas são completamente diferentes. A teoria da evolução é, como o próprio nome sugere,
apenas uma teoria. Antifragilidade é um problema matemático e significa se fortalecer da desordem. Se você
tiver um maior número de ganhos do que de perdas, você se torna antifrágil. E muitos sistemas requerem
desordem, porque sem ela eles enfraquecem. Temos muitos problemas com pessoas que não conseguem
entender que precisamos do antifrágil, que precisamos de desordem. Sem a desordem, alguns sistemas
acabam por se ferir. As companhias precisam de desordem. Muitas vezes, a intervenção dos governos pode
enfraquecê-las porque eles acabam removendo a habilidade de ganhar da desordem, então, precisamos

108
Entrevista. Educa mais Brasil. Conteúdo disponível em https://www.ed ucamaisbrasil.com.br/enem/lingua-portuguesa/entrevista. Acesso em 04
de ago. de 2021.

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Prof. Hugo Magalhães Gramática e Literatura Brasileira
trabalhar com essa prioridade. Você se lembra da queda do
avião francês que deixou o Rio com destino a Paris? Você
não acha que esse meio de transporte está muito mais
seguro depois desse acidente? É muito seguro viajar de
avião, porque todas as vezes que ocorrem erros como esse,
a indústria se beneficia deles. Eles sabem que precisam
transformar os erros em algo melhor que possa salvar outras
vidas. Para cada vida perdida, milhares são salvas.

ÉPOCA – É um ciclo vicioso? Precisamos de sistemas


frágeis para que possamos aprender com eles?
Taleb – Para um sistema se tornar antifrágil, os
componentes em si precisam ser frágeis. Do contrário, o
sistema explodirá de vez em quando. Pense nos
restaurantes. Eles são frágeis, pois competem entre si. O
seu coletivo, no entanto, torna-se antifrágil por essa mesma
razão. Se não fosse dessa maneira, eles ficariam
estagnados e comeríamos nada mais do que comida de
refeitório, não haveria competição ou erros. Então, nós Livro Antifrágil, de Nassim Taleb (Foto: reprodução)
precisamos de fragilidade.
Disponível em https://epoca.oglobo.globo.com/vida/noticia/2014/07/somos-melhores-com-bdesordemb.html. Acesso em 04 de ago. de 2021.

Entrevista é um diálogo entre duas ou mais pessoas: entrevistador (es) e entrevistado (s). O principal
objetivo é extrair declarações e informações sobre determinado assunto.

As entrevistas são muito utilizadas pelos jornais, sites, revistas, rádios e tvs com o intuito de passar um
conhecimento para a população. Além de jornalística, existe também a entrevista de emprego, soc ial,
psicológica, entre outras.

De maneira geral, essa linha de gêneros textuais, principalmente o jornalístico, tem grande importância para
a sociedade por possibilitar à população o conhecimento sobre fatos e assuntos por meio de profissionais
que apuram os detalhes e os apresentam de forma completa e precisa.

CARACTERÍSTICAS

As principais características da entrevista são a oralidade e o


discurso direto (reprodução integral da fala de um personagem). A
primeira pelo fato de tratar-se de um diálogo e a segunda pois, na
maioria das vezes, o diálogo é transcrito exatamente como foi
conversado.

Nas entrevistas publicadas em meios impressos, por exemplo, é


possível perceber a utilização de muitos sinais de pontuação, como
travessão, aspas, reticências, interrogação, parênteses, em alguns
casos até detalhando aspectos do entrevistado, como emoções,
lágrimas e risos.
A entrevista é um diálogo entre uma ou mais
pessoas onde o entrevistador faz as perguntas e
o entrevistado pergunta. (Foto: Pixabay)

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ESTRUTURA DA ENTREVISTA
Geralmente, a entrevista costuma compor-se de:

* Manchete ou título – como o objetivo é despertar o interesse no público expectador, essa costuma vir
acompanhada de uma frase de efeito, proferida de modo marcante por parte do entrevistador.

* Apresentação - nesse momento faz-se referência ao entrevistado, divulgando sua autoridade em relação
ao posicionamento social ou relevância no assunto em questão, como, por exemplo, experiência profissional
e conhecimentos relativos à situação em voga, como também os pontos principais relativos à entrevista.

* Perguntas e respostas – trata-se do discurso propriamente dito, em que perguntas e respostas são
proferidas consoante ao assunto abordado. Em meio a essa interação há um controle por parte do
entrevistador para demarcar o momento da atuação dos participantes.

Além disso, incluem-se


- Roteiro: como o próprio nome diz, é o material que vai guiar o entrevistador no momento da entrevista.
Para elaborá-lo é imprescindível pesquisar sobre o tema e sobre a fonte. A partir daí podem ser listadas
algumas perguntas que nortearão o trabalho, apesar de que podem surgir outras questões inter essantes
além do que estará no papel.

- Revisão: por fim, é fundamental que todo o texto seja revisado para identificar possíveis erros de escrita.

Um exemplo de como funciona essa estrutura na prática é a dinâmica em um veículo de comunicação. Após
a definição da pauta – que é o tema da reportagem ou matéria – o repórter faz as pesquisas necessárias
para realizar a entrevista.

É comum que seja utilizada uma câmera ou gravador para que seja possível transcrever de maneira literal
tudo que foi dito. Após a transcrição e revisão, a entrevista é publicada. Podem ser utilizados mecanismos
que atraia o leitor, como o “olho”, que são destaques em frases ditas pelo entrevistado.

SETE PRINCIPAIS TIPOS DE ENTREVISTA JORNALÍSTICA


- Individual: é realizada apenas com o entrevistador e o entrevistado, previamente agendada.

- Rotina: acontece a partir dos acontecimentos factuais e de interesse público, com personagens que
estiveram presentes nessas ocorrências (que podem ser acidentes, mortes, assaltos, enchentes, entre
outros).

- Em grupo: mais conhecida como coletiva de imprensa, é realizada com jornalistas de diversos veículos e
cada um faz suas respectivas perguntas ao(s) entrevistado(s).

- Exclusiva: é uma entrevista concedida a apenas um jornalista, com uma informação ainda desconhecida
por todos.

- Pesquisa: realizada por especialistas que devem dar uma informação técnica, porém de fácil compreensão
sobre determinado assunto.

- Personalidade: descreve a vida de uma pessoa famosa como seus hábitos, história de vida e curiosidades.

- Opinativa: é realizada com pessoas que possuem experiências e conhecimentos sobre determinados
assuntos, como atletas, estudiosos ou profissionais consagrados.

- Caracterizada: são os trechos curtos de uma entrevista, inseridos em um texto entre aspas e transcritos
exatamente como foram ditos pelo entrevistado.

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EXERCÍCIOS
1. São características a serem apontadas no gênero textual entrevista:

a) A linguagem dialógica e oral.


b) Marca do discurso indireto e da objetividade.
c) Preferência pela linguagem informal.
d) Lapsos de incoerência no discurso.
e) Transcrição fidedigna da fala com ocultação das marcas da oralidade.

2. Ao trabalhar o gênero textual entrevista, deve-se levar em consideração:

a) A escolha do tema, sendo desnecessário o comparecimento do entrevistado.


b) A elaboração do roteiro que deverá ter um caráter objetivo e que evite o aparecimento de perguntas novas,
mesmo que as respostas do entrevistado levem a isso.
c) A escolha de um título para a entrevista de modo a nortear o leitor delimitando o tema proposto .
d) A revisão da entrevista, na qual o autor deverá editar possíveis marcas de oralidade e excessiva
coloquialidade do entrevistado.
e) A escolha do veículo de divulgação da entrevista deve ser sempre anterior a ela para que o autor elabore
um roteiro específico.

3. (ENEM – 2014) Entrevista — Tony Bellotto

A língua é rock

Guitarrista do Titãs e escritor completa dez anos à frente de programa televisivo em que discute a língua
portuguesa por meio da música

O que o atraiu na proposta de Afinando a Língua?

No começo, em 1999, a ideia era fazer um programa que falasse de língua portuguesa usando a música
como atrativo, principalmente, para os jovens. Com o passar do tempo, ele foi se transformando num
programa sobre a linguagem usada em letras de música, no jornalismo, na literatura de ficção e na poesia.
Como não sou um cara de TV, trago a experiência de escritor e músico, e sempre participo de forma mais
ativa do que como um mero apresentador. Estou nas reuniões de pauta e faço sugestões nos rotei ros. Mas
o conteúdo é feito pelo pessoal do Futura.

Quais as vantagens e desvantagens do ensino da língua por meio das letras de música?

Não sou pedagogo ou educador, então só vejo vantagens, porque as letras de música usam uma linguagem
que é a do dia a dia, principalmente, dos jovens. A música é algo que lhes dá prazer e, didaticamente, pode
fazer as vezes de algo que o aluno tem a noção de ser entediante — estudo da língua, sentar e abrir um
livro. Ao ouvir uma música, os exemplos surgem. É a grande vantagem e sempre foi a ideia do programa.
Disponível em: http://revistalingua.uol.com.br. Acesso em: 8 ago. 2012 (fragmento).

Os gêneros textuais são definidos por meio de sua estrutura, função e contexto de uso. Tomando por base
a estrutura dessa entrevista, observa-se que

a) a organização em turnos de fala reproduz o diálogo que ocorre entre os interlocutores.


b) o tema e o suporte onde foi publicada justificam a ausência de traços da linguagem informal.
c) a ausência de referências sobre o entrevistado é uma estratégia para induzir à leitura do texto na íntegra.
d) o uso do destaque gráfico é um recurso de edição para ressaltar a importância do tema para o
entrevistador.
e) o entrevistado é um especialista em abordagens educacionais alternativas par a o ensino da língua
portuguesa.

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4. (Ano: 2018 - Banca: FUNDEP)
O gênero textual entrevista possui como principal função a informação. No entanto, nesse caso específico,
ele possui características bem próximas de um outro gênero textual em função de uma de suas
características principais.

De acordo com as características desse texto e dos gêneros textuais, assinale a alternativa que indica esse
outro gênero com o qual essa entrevista se assemelha.

a) Biografia.
b) Notícia.
c) Artigo de opinião.
d) Debate.

5. (Enem 2015)
Mudança linguística
Ataliba de Castilho, professor de língua portuguesa da USP, explica que o internetês é parte da metamorfose
natural da língua.

- Com a internet, a linguagem segue o caminho dos fenômenos da mudança, como o que ocorreu
com “você”, que se tornou o pronome átono “cê”. Agora o interneteiro pode ajudar a reduzir os excessos da
ortografia, e bem sabemos que são muitos. Por que o acento gráfico é tão importante assim para a escrita?
Já tivemos no Brasil momentos até mais exacerbados por acentos e dispensamos muitos deles. Como toda
palavra é contextualizada pelo falante, podemos dispensar ainda muitos outros. O interneteiro mostra um
caminho, pois faz um casamento curioso entre oralidade e escrituralidade. O internetês pode, no futuro, até
tornar a comunicação mais eficiente. Ou evoluir para um jargão complexo que, em vez de aproximar as
pessoas em menor tempo, estimule o isolamento dos iniciados e a exclusão dos leigos.
Para Castilho, n entanto, não será uma reforma ortográfica que fará a mudança de que precisamos
na língua. Será a internet. O jeito eh tc e esperar pra ver?
Disponível em: http://revistalingua.com.br. Acesso em: 3 jun. 2015 (adaptado)

Na entrevista, o fragmento “O jeito eh tc e esperar pra ver?” tem por objetivo


a) ilustrar a linguagem de usuários da internet que poderá promover alterações de grafia.
b) mostrar os perigos da linguagem da internet como potencializadora de dificuldades de escrita.
c) evidenciar uma forma de exclusão social para as pessoas com baixa proficiência escrita.
d) explicar que se trata de um erro linguístico por destoar do padrão formal apresentado ao longo do texto.
e) exemplificar dificuldades de escrita dos interneteiros que desconhecem as estruturas da norma padrão.

6. (Enem 2016)
TEXTO I
Entrevistadora — eu vou conversar aqui com a professora A. D.... o português então não é uma língua difícil?
Prof essora — olha se você parte do princípio… que a língua portuguesa não é só regras gramaticais… não se você se
apaixona pela língua que você… já domina que você já f ala ao chegar na escola se o teu professor cativa você a ler
obras da literatura… obras da/ dos meios de comunicação… se você tem acesso a revistas… é... a livros didáticos…
a... livros de literatura o mais f ormal o e/ o dif ícil é porque a escola transforma como eu já disse as aulas de língua
portuguesa em análises gramaticais.
TEXTO II
Entrevistadora — Vou conversar com a professora A. D. O português é uma língua difícil?
Prof essora — Não, se você parte do princípio que a língua portuguesa não é só regras gramaticais. Ao chegar à escola,
o aluno já domina e f ala a língua. Se o professor motivá-lo a ler obras literárias, e se tem acesso a revistas, a livros
didáticos, você se apaixona pela língua. O que torna difícil é que a escola transforma as aulas de língua portuguesa
em análises gramaticais. MARCUSCHI, L. A. Da fala para a escrita: atividades de retextualização. São Paulo: Cortez, 2001 (adaptado).

O Texto I é a transcrição de uma entrevista concedida por uma professora de português a um programa de
rádio. O Texto II é a adaptação dessa entrevista para a modalidade escrita. Em comum, esses textos
a) apresentam ocorrências de hesitações e reformulações.
b) são modelos de emprego de regras gramaticais.
c) são exemplos de uso não planejado da língua.
d) apresentam marcas da linguagem literária.
e) são amostras do português culto urbano.

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Disciplina: Português V – AULA 13
Conteúdo: MANIFESTO
Manifesto de Davos 2020: O Objetivo Universal dos Negócios
na Quarta Revolução Industrial
A - O objetivo das empresas é colaborar com todos os seus stakeholders na criação de valor partilhado e sustentado.
Ao criá-lo, as empresas não cumprem apenas com seus acionistas, mas com todos os seus públicos de interesse:
colaboradores, clientes, fornecedores, comunidades locais e sociedade em geral. A melhor maneira de compreender e
harmonizar os interesses divergentes de todas as partes interessadas é adquirir um compromisso comum com políticas
e decisões que aumentem a prosperidade de longo prazo das empresas.

I - Uma empresa atende seus clientes quando lhes oferece uma proposta de valor que atenda perfeitamente às suas
necessidades. Aceita e apoia uma competição justa e condições equitativas. Mostra tolerância zero para corrupção.
Garante a conf iabilidade e confiabilidade do ecossistema digital em que opera. Compartilha totalmente a f uncionalidade
de seus produtos e serviços com seus clientes, bem como as implicações adversas ou externalidades negativas.

II - Uma empresa trata seus f uncionários com dignidade e respeito. Respeita a diversidade e ambiciona a melhoria
contínua das condições de trabalho e o bem-estar dos colaboradores. Em um mundo em constante mudança, uma
empresa defende a continuidade no emprego por meio da melhoria contínua de competências e da aquisição de novas.

III - Uma empresa considera seus f ornecedores como verdadeiros parceiros na criação de valor. Oferece as mesmas
oportunidades para novos participantes no mercado. Integra o respeito pelos direitos humanos em todos os elos da
cadeia de abastecimento.

IV - Uma empresa cumpre com a sociedade em geral por meio de suas atividades, apoia as comunidades onde atua e
paga uma porcentagem justa dos impostos. Garante uma utilização segura, ética e ef iciente dos dados. Atua como
f iador do universo ambiental e material para as gerações f uturas. Protege nossa biosfera com responsabilidade e é
campeão de uma economia circular, compartilhada e regenerativa. Ultrapassa incessantemente os limites do
conhecimento, inovação e tecnologia para melhorar o bem-estar das pessoas.

Trecho do Manifesto de Davos 2020. Disponível em https://es.weforum.org/agenda/2019/12/manifiesto-de-davos-2020-el-proposito-universal-de-las-


empresas-en-la-cuarta-revolucion-industrial/. Acesso em 04 de ago. de 2021.

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O manifesto é um gênero textual cuja tipologia é dissertativa, de cunho político, cultural ou social, que visa
a expressar o ponto de vista de um ou mais autores para um grande público, com intuito de sensibilizá-lo ou
convencê-lo.

Sua estrutura divide-se em título, corpo do texto e assinatura. Sua linguagem deve estar adequada ao seu
público, garantindo a acessibilidade e compreensão do conteúdo. Um dos mais conhecidos textos desse
gênero é o “Manifesto antropófago”, de 1928, que defende uma cultura nacional com direito à mestiçagem.

CARACTERÍSTICAS E ESTRUTURA DO MANIFESTO 109

O manifesto situa-se entre os chamados gêneros argumentativos, cujo propósito do emissor é persuadir,
convencer o interlocutor por meio de argumentos considerados plausíveis. Didaticamente, devemos
concebê-lo como sendo a forma pela qual um grupo, de forma coletiva, expressa seus pensamentos sobre
um determinado assunto de ordem social, política, cultural, etc. O intuito do manifesto é sensibilizar ou
persuadir a opinião pública por meio da defesa argumentativa no texto. O propósito é atrair leitores para
comungar das ideias e/ou críticas expostas.

A estrutura do manifesto se divide em:

109
Manifesto. Mundo Educação UOL. Disponível em https://mundoeducacao.uol.com.br/redacao/manifesto.htm. Acesso em 04 de ago. de 2021.

119
Prof. Hugo Magalhães Gramática e Literatura Brasileira
➢ Título

O título atrai o leitor para realizar a leitura completa do texto, bem como pode fornecer dicas e pistas do
assunto ou da opinião apresentada no manifesto.

➢ Corpo do texto

O corpo do texto é onde estão inseridas todas as ideias e críticas. O corpo textual do manifesto deve
apresentar uma boa organização e argumentação, pois é essencial que o público compreenda a linguagem
sem dificuldades, ao mesmo tempo em que reconhece as estratégias argumentativas utilizadas pelo(s)
autor(es). É importante seguir a ordem do tipo dissertativo (introdução – desenvolvimento – conclusão).

A introdução deve apresentar as informações iniciais, que contextualizam o leitor a respeito do tema bem
como indicam o ponto de vista argumentativo do autor. O desenvolvimento deve aprofundar as críticas e
exposições, apresentando dados comprovadores, pesquisas, comparações e outras estratégias válidas ao
contexto. A conclusão deve promover um desfecho do que foi discutido, apresentar uma síntese das ideias
e, em certos casos, sugerir ou cobrar medidas de intervenção nos problemas expostos.

➢ Local, data e assinatura

Após o corpo do texto, o manifesto costuma apresentar a marcação de data e local onde o documento foi
escrito, bem como a assinatura do autor, da instituição ou dos manifestantes que comungam do seu
conteúdo.

(MAIS) EXEMPLO DE MANIFESTO

Dentre os mais conhecidos manifestos que servem de exemplo ao estudo do gênero, destaca-se o
“Manifesto antropofágico”, escrito por Oswald de Andrade, em 1928. Esse documento apresenta as
ideias não só do autor como também de outros artistas da época, que comungavam das opiniões defendidas
e propunham uma transformação cultural no Brasil.

O “Manifesto antropofágico” é um texto de reconhecimento e prestígio social, tanto por seus aspectos
históricos e sociais como por seus aspectos artísticos e culturais. A argumentação do autor direciona-se na
defesa da antropofagia como um elemento característico da cultura brasileira. Em outras palavras, o texto
defende a mistura e a “digestão” das diferentes identidades que constituem o povo brasileiro, produzindo-se
um resultado novo e mestiço.

“Só a Antropofagia nos une. Socialmente. Economicamente. Filosoficamente.


Única lei do mundo. Expressão mascarada de todos os individualismos, de todos os coletivismos. De todas as religiões.
De todos os tratados de paz.
Tupi or not tupi, that is the question.
Contra todas as catequeses. E contra a mãe dos Gracos.
Só me interessa o que não é meu. Lei do homem. Lei do antropófago.
Estamos fatigados de todos os maridos católicos suspeitosos postos em drama. Freud acabou com o enigma mulher e
com outros sustos da psicologia impressa.
O que atropelava a verdade era a roupa, o impermeável entre o mundo interior e o mundo exterior. A reação contra o
homem vestido. O cinema americano informará.
Filhos do sol, mãe dos viventes. Encontrados e amados ferozmente, com toda a hipocrisia da saudade, pelos imigrados,
pelos traficados e pelos touristes. No país da cobra grande.
Foi porque nunca tivemos gramáticas, nem coleções de velhos vegetais. E nunca soubemos o que era urbano,
suburbano, fronteiriço e continental. Preguiçosos no mapa-múndi do Brasil. Uma consciência participante, uma rítmica
religiosa.
Contra todos os importadores de consciência enlatada. A existência palpável da vida. E a mentalidade pré-lógica para
o Sr. Lévy-Bruhl estudar.
Queremos a Revolução Caraiba. Maior que a Revolução Franc esa. A unif icação de todas as revoltas ef icazes na
direção do homem. Sem nós a Europa não teria sequer a sua pobre declaração dos direitos do homem. A idade de
ouro anunciada pela América. A idade de ouro. E todas as girls.
Filiação. O contato com o Brasil Caraíba. Où Villeganhon print terre.
Montaigne. O homem natural. Rousseau. Da Revolução Francesa ao Romantismo, à Revolução Bolchevista, à
Revolução Surrealista e ao bárbaro tecnicizado de Keyserling. Caminhamos.”

120
Prof. Hugo Magalhães Gramática e Literatura Brasileira
Como é possível observar, já nesse pequeno trecho, o autor constrói uma expressão em defesa de uma
cultura nacionalista, cultura essa que deveria abraçar a sua mestiçagem por meio da antropofagia cultural.
Isso significa se “alimentar” de tudo que chega, mas produzir seu próprio resultado, valori zar suas próprias
criações.
Essas características podem ser observadas em trechos como “Queremos a Revolução Caraiba. Maior que
a Revolução Francesa.”, em que o autor valoriza os processos nacionais em detrimento dos processos
europeus.
Outras expressões como “contra todos os importadores de consciência enlatada. A existência palpável da
vida.” reforçam o posicionamento crítico ao conceituar as culturas como “enlatadas”, comparando -as aos
alimentos que vêm desse processo e, consequentemente, são mais artificiais e menos saudáveis.
Desse modo, percebe-se que, apesar da sua flexibilidade estrutural, o manifesto apresenta o tipo
dissertativo-argumentativo como a tipologia predominante, de modo que influencia a organização das ideias
e críticas em defesa de um ponto de vista.

A paz e ano 2000


O Manifesto 2000 pela paz.

Reconhecendo a minha cota de responsabilidade com o futuro da humanidade, especialmente com as crianças de hoje
e as das gerações f uturas, eu me comprometo em minha vida diária, na minha f amília, no meu trabalho, na minha
comunidade, no meu país e na minha região – a:
Respeitar a vida e a dignidade de cada pessoa, sem discriminação ou preconceito;
Praticar a não violência ativa, rejeitando a violência sob todas as suas formas: física, sexual, psicológica, econômica e
social, em particular contra os grupos mais desprovidos e vulneráveis como as crianças e os adolescentes;
Compartilhar o meu tempo e meus recursos materiais em um espírito de generosidade visando o fim da exclusão, da
injustiça e da opressão política e econômica; Defender a liberdade de expressão e a diversidade cultural, dando sempre
pref erência ao diálogo e a escuta do que ao fanatismo, a difamação e a rejeição do outro;
Promover um comportamento de consumo que seja responsável e práticas de desenvolvimento que respeitem todas
as f ormas de vida e preservem o equilíbrio da natureza no planeta;
Contribuir para o desenvolvimento da minha comunidade, com a ampla participação da mulher e o respeito pelos
princípios democráticos, de modo a construir novas formas de solidariedade.
(www.unesco.org.br/noticias/noticias2000/nu200/nu200e/mostra¬_documento)

EXERCÍCIOS
1. (ENEM – 2019)
1. Nós queremos cantar o amor ao perigo, o hábito da energia e da temeridade.
2. A coragem, a audácia, a rebelião serão elementos essenciais de nossa poesia.
3. A literatura exaltou até hoje a imobilidade pensativa, o êxtase, o sono. Nós queremos exaltar o movimento
agressivo, a insônia febril, o passo de corrida, o salto mortal, o bofetão e o soco.
4. Nós afirmamos que a magnificência do mundo enriqueceu-se de uma beleza nova: a beleza da velocidade.
Um automóvel de corrida com seu cofre enfeitado com tubos grossos, semelhantes a serpentes de hálito
explosivo... um automóvel rugidor, que parece correr sobre a metralha, é mais bonito que a Vitória de
Samotrácia.
5. Nós queremos entoar hinos ao homem que segura o volante, cuja haste ideal atravessa a Terra, lançada
também numa corrida sobre o circuito da sua órbita.
6. É preciso que o poeta prodigalize com ardor, fausto e munificência, para aumentar o entusiástico fervor
dos elementos primordiais.
MARINETTI, F. T. Manifesto futurista. In: TELES, G. M. Vanguardas europeias e Modernismo brasileiro. Petrópolis: Vozes, 1985.

O documento de Marinetti, de 1909, propõe os referenciais estéticos do Futurismo, que valorizam a

a) composição estática.
b) inovação tecnológica.
c) suspensão do tempo.
d) retomada do helenismo.
e) manutenção das tradições.

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Prof. Hugo Magalhães Gramática e Literatura Brasileira
Referências bibliográficas
BECHARA, Evanildo. Lições de português pela análise sintática. 10ª ed. Rio de Janeiro: Lucerna, 2005.

CEREJA, William R. e MAGALHÃES, Thereza C. Literatura brasileira. 2ª ed. – São Paulo: Saraiva, 2013.

GARCIA, Othon M. Comunicação em Prosa Moderna: Aprendendo a Escrever, Aprendendo a Pensar.


– 27 ed. – Rio de Janeiro: Editora FGV, 2010.

Entrevista. Educa mais Brasil. Conteúdo disponível em https://www.educamaisbrasil.com.br/enem/lingua-


portuguesa/entrevista. Acesso em 04 de ago. de 2021.

Manifesto. Mundo Educação UOL. Disponível em


https://mundoeducacao.uol.com.br/redacao/manifesto.htm. Acesso em 04 de ago. de 2021.

Reportagem. Educa mais Brasil. Conteúdo disponível em https://www.educamaisbrasil.com.br/enem/lingua-


portuguesa/reportagem. Acesso em 04 de ago. de 2021.

GABARITO

Aula 1 – Noções de Sintaxe

1. E
2. B
3. C
4. E
5. E
6. B
7. B
8. D
9. C
10. A/C

Aula 2 – Coordenação e Subordinação

1. I
2. C
3. I
4. E
5. C
6. B
7. A
8. I

Aula 3 – Coordenação de orações

1. C
2. B
3. A
4. C
5. B
6. A
7.
a) Os alunos dispunham de pouco tempo, POR ISSO não foi possível concluir a prova de Matemática.
b) Moramos no mesmo andar E vemo-nos com frequência, PORÉM mal nos falamos.
c) O show estava excelente, MAS meu amigo saiu antes de terminar, PORQUE tinha um aniversário para ir.

122
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8. O céu está carregado, mas não vamos levar guarda-chuvas, porque o serviço de meteorologia avisou que
o tempo vai melhorar.

9. D

10.
1) Pedro saiu e João chegou;
2) Pedro saiu, mas João chegou;
3) Pedro saiu quando João chegou

Aula 4 – Paralelismo: sintático e semântico

1. VAI DAR CERTO!


2. VAI DAR CERTO!
3. B
4. B
5. C

Aula 5 – Orações Subordinadas

1. C
2. E
3. C
4. B
5. II
6. A
7. B
8. B
9. C
10. B
11. A
12. A
13. C
14. E

Aula 6 – Orações Subordinadas Adverbiais

1. SUGESTÕES DE RESPOSTA:
a) assim que
b) pois
c) de forma que
d) caso persistam...
e) mas
f) assim que
g) à proporção que
h) embora
i) já que
j) conforme
k) a fim de que
l) por isso
m) por mais que

2. C
3. D
4. C
5. D

123
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6. C
7. E
8. A
9. A
10. B
11. B

Aula 7 – Pré-Modernismo

1. B/D
2. A
3. D
4. C
5. A
6. A
7. B
8. C
9. C
10. E
11. B
12. E
13. D
14. D
15. A
16. B
17. D
18. C
19. C
20. B

Aula 8 – Vanguardas europeias

1. B
2. C
3. A
4. B
5. C
6. B

Aula 9 – Modernismo: 1ª Fase

1. E
2. C
3. A
4. E
5. E
6. D
7. B
8. E
9. E
10. D
11. C
12. E
13. A
14. A
15. A

124
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16. E
17. B
18. C
19. E

Aula 10 – Modernismo: 2ª Fase

1. B
2. E
3. D
4. A
5. E
6. E
7. B
8. B
9. B
10. D
11. D
12. A
13. D
14. B
15. C
16. E
17. C
18. D
19. C

Aula 11 – Reportagem

1. B
2. C
3. B
4. D
5. C
6. B
7. C
8. C
9. B
10. D

Aula 12 – Entrevista

1. A/C
2. C
3. A
4. C
5. A
6. E

Aula 13 – Manifesto

1. B

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