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A arte da regência – Por Wilson Dias

A arte da regência é uma ciência como qualquer outra, utilizada como um meio de fazer arte,
no entanto a esta arte são impostas implicações técnicas que devem ser desvendadas e
dominadas por todos os candidatos a regentes, não importa que tipo de grupo se predispõe a
dirigir. Não ha diferença no dirigir um coro, orquestra ou banda. A técnica do dirigir é igual
para todos os tipos de grupo, o que muda são os conhecimentos específicos de cada uma. O
que é a regência?

Dirigir é muito mais que abanar os braços. É acima de tudo saber se relacionar com as pessoas.
É lembrar que do outro lado de uma estante de musica encontra-se um ser humano, que tem
alegrias, tristezas, preocupações e problemas como todos, inclusive o maestro, e que ele seve
ser tratado com respeito.

O ato de dirigir engloba conhecimentos importantes, como o conhecimento do


relacionamento humano, o domínio dos conhecimentos gerais, o domínio dos conhecimentos
musicais em geral, o domínio dos conhecimentos específicos da regência e por último o
domínio da técnica do gesto. Nenhum destes conhecimentos isolados desempenha sua função
dentro do "ser um regente" , mas só a soma do conjunto destes conhecimentos vai contribuir
para que o regente se torne um bom regente.

quando falamos em regência, só "lembramos" do gestual, na verdade ele tem sua importância
mas não é o mais importante ...

Gestual

- Conhecimentos Específicos da regência

- Conhecimentos Musicais

- Conhecimentos Gerais

- Conhecimento do Relacionamento Humano

Colocando em termos de % ficaria algo assim:

60% Humano

20% Geral

15% Musical

3% Específico

2% Gestual

Isto quer dizer que o gesto encontra-se no alto da pirâmide da arte da regência, mas que para
que ele aconteça é necessário que na base da pirâmide haja os demais conhecimentos.

Os valores apresentados nas porcentagens são fictícios, mas servem como sugestão para a
reflexão que se pretende. A formação da regência é composta por uma pirâmide, formada da
seguinte forma: o maior valor de porcentagem corresponde a base da pirâmide e o menor
valor da porcentagem corresponde ao vértice superior da pirâmide.

O ato de dirigir está mais intimamente ligado a como se relaciona o maestro com seus
comandos que com o gestual propriamente dito. O gesto tem sua importância na
comunicação. Observe esta palavra: Table. O que significa? Como se pronuncia? O significado
é um só: table = mesa, mas a pronúncia vai depender do idioma: francês ou inglês. O que
desejo mostrar é que cada um tem seus meios de expressão, mas o significado é o mesmo. Há
diversas maneiras de dizer a mesma coisa, dependendo apenas como você a diz. No entanto a
linguagem que você usa deve ser compreensível a todos.

O gesto tem um padrão universal, que pode variar dependendo do contexto da obra. O gesto
não é um símbolo independente, ele está associado ao domínio e conhecimento da partitura,
adquirido pelo estudo diário e pela dedicação ao que faz. Dirigir, não é apenas conduzir os
elementos melódicos. Alguns maestros se tornam maestros dos primeiros violinos, dos
sopranos ou das palhetas solistas. Dirigir é muito mais que dirigir uma linha melódica, com
toda a certeza ela é importante, mas nem sempre a regência deverá se ater a linha melódica,
visto que algumas linhas melódicas dependem de alguns elementos rítmicos ou harmônicos, e
é aí que o maestro deverá verificar a importância destes elementos: a melodia, ritmo ou
harmonia.

Só para clarear um pouco mais, muitas vezes a linha melódica depende do bom desempenho
de uma passagem rítmica ou de uma passagem harmônica. O maestro se preocupa tanto com
o desempenho melódico e esquece de observar o que lhe dá sustentação.

O olhar, as mãos, os braços, dedos, enfim o corpo todo deve participar na função da regência e
estes não devem ser desperdiçados.

A comunicação do maestro é feita por meios não verbais, e por este motivo os sinais devem
ser claros, objetivos e preciso. Todo processo de reger exige do maestro muito estudo e
dedicação. O gesto deve ter objetivos claro e possuir uma estratégia bem definida. Tudo o que
se faz a mais é desperdício e desvia a atenção podendo induzir ao erro. Todo processo gestual,
não acontece por acaso. Alguns regentes se preocupam com a marcação dos compassos, mas
o ato de reger envolve muito mais que marcar compassos. Os músicos não desejam que um
maestro marque compassos e som que dirija a obra.

O que desejo mostrar aqui é justamente o que está por trás de uma partitura simples ou
complexa. O gesto é portador de uma ideia, de uma frase, de um efeito, de uma dinâmica, de
uma passagem ou de um encadeamento harmônico. É pra isso que serve o gestual.

Vou trabalhar numa abordagem sucinta de alguns tópicos, aspectos importantes da regência
válidos para todo e qualquer tipo de grupo que necessite de um regente:

a - O poder que temos em nossas mãos ao nos colocarmos frente a um grupo, pode de alguma
forma contribuir ou prejudicar a eficiência do trabalho. Como desfrutar dos benefícios da
autoridade, sem agredir nossos músicos, e sem prejudicar o resultado de nosso trabalho?
b - A memória e a importância que ela desempenha na direção musical?

c - A percepção do maestro frente aos fatos que se sucedem a cada instante dentro do grupo
que dirigimos.

d - O domínio da partitura, a importância de saber a partitura de memória e dominar todo o


conteúdo.

e - A batuta, como e porque usar.

f - As técnicas do gestual.

A - Poder

A autoridade do maestro frente ao grupo de trabalho pode ser resumida em dois aspectos:

Autoridade Pessoal

Autoridade Técnica

Na regência, a autoridade é o substractum de sua arte, e é como se fosse parte integrante da


natureza das coisas, sendo lastreada pelo conhecimento, experiência e competência do
maestro.

Na atividade humana raras as vezes o poder de um único indivíduo se mostra tão evidente nas
exigências de obediência e lealdade. O gestual do maestro é dominador e sua imagem exprime
suas intenções e expressões que devem ser seguidas. Exercer a atividade da regência
pressupõe ter virtudes de liderança, poder de comunicação, precisão técnica e senso de
autoridade.

Hoje o maestro sugere, não impõe sua vontade - Bernard Haitink.

O regente moderno não tem mais a ascedência autoritária como Karajan (Maestro Austríaco),
que era chamado de Pontifex Maximus, que usava de mão de ferro para dirigir seus músicos.

O maestro Carlo Maria Giulini, falando sobre a autoridade do maestro: Não nos sentimos
absolutos sobre o podium. Devemos pedir constantemente aos músicos que executem e aos
cantores que cantem.
O maestro Pierre Monteaux fala sobre o assunto da seguinte forma: O maestro nunca deve
faltar com o respeito aos seus músicos, que tem o direito a ter os direitos? O autoritarismo
absoluto não existe mais, mantendo-se o respeito, o diálogo, sem abdicar de nosso senso de
perfeição e musicalidade.

B - Memória

A memória é a possibilidade do indivíduo de disponibilizar conhecimentos adquiridos sem o


auxílio de referências escritas.

Nesse sentido a memorização, segundo a psicologia, passa por três etapas principais:

a. a aquisição do conhecimento

b. tratamento da informação

c. a lembrança, quando a informação é transferida para o momento do uso.

O maestro Von Bülow sempre dirigia de memória e exigia que seus músicos o fizessem. Ele
sempre afirmava que:

“mais vale a pena ter a partitura na cabeça, que ter a cabeça na partitura”.

O século XX tornou-se célebre que os grandes maestros dirijam seus concertos de memória,
com a ascensão do maestro virtuose.

Muitos regentes gostam de dirigir seus concertos totalmente de memória e outros, como
Mendelssohn-Bartholdy (Maestro Alemão), usava a partitura apenas como apoio, não
necessitando utilizar o texto para toda a direção. No entanto, alguns regentes podem possuir
lapsos, déficits ou perturbações de memória que o impedem de dirigir sem a partitura.

Muitos consideram que dirigir de memória é um ato de exibicionismo e outros consideram que
é um ato que demonstra o talento do maestro, no entanto não há uma unanimidade sobre o
assunto. Cabe ao maestro considerar os riscos e os caprichos de dirigir com ou sem a partitura
durante uma apresentação pública. De qualquer forma conhecer a obra de memória, com ou
sem a partitura na sua frente no ato do espetáculo, é extremamente importante para o bom
desempenho do maestro. Quando o uso da partitura for necessário, deve ser utilizada
somente como apoio para eventuais consultas durante a execução.

C - Percepção

A percepção do músico de um conjunto instrumental ou vocal, que está sempre em estado


receptivo é bem complexa, determinada pela associação do senso de acuidade visual,
estabelecida por sinais gerados pela fisionomia, gestual e atitudes do maestro, somados à
percepção auditiva do coletivo, sem deixar de lado as informações da partitura, que este
transformará em linguagem musical, na elaboração do senso musical coletivo.
O gesto deve conter todas as informações necessárias para a interpretação, entre muitas estão
as seguintes:

Esse processo de percepção começa a partir do momento que se determina a afinação do


conjunto, quando o maestro ergue os braços, chamando a atenção para o início do processo
sonoro musical, seguido pelo principal sinal que se chama levare, do “i” ou seja, a preparação
para a emissão do primeiro som do coletivo. A partir deste processo, o músico instrumentista
ou cantor inicia a sua postura de receptáculo das informações. Todos os sentidos estão
voltados para o maestro, e respondem as suas indicações, entrando num grau máximo de
concentração.

A. Fazer todo o efetivo musical tocar ou cantar junto.

B. Indicar o tempo.

C. Indicar as principais entradas.

D. Indicar os andamentos.

E. Indicar as dinâmicas.

F. Controle dos planos sonoros entre os naipes.

G. Indicar acelerandos e ritardandos.

H. Qualidade sonora do instrumento ou cantor.

I. Indicações e saída de fermatas.

J. Dirigir os fraseados.

K. Linhas melódicas.

L. Manter a fidelidade na interpretação.

M. Indicar articulações diversas, entre muitas outras indicações.

Benjamin Zander: maestro e professor de regência inglês. Autor do livro: A Arte da


Possibilidade - Editora Campus - ISBN 85-352-0753-8 - Edição Original - ISBN 0-87584-770-6

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