Você está na página 1de 59

RENAN LENON MARCONDES MARCELINO

A COMPATIBILIDADE FUNCIONAL DA ATUAÇÃO DO MINISTÉRIO PÚBLICO


FACE A PROPOSITURA DE AÇÕES QUE VISEM A EXCLUSÃO DE HERDEIRO
POR INDIGNIDADE
LEI 13.532 DE DEZEMBRO DE 2017

Telêmaco Borba - PR
2019
RENAN LENON MARCONDES MARCELINO

A COMPATIBILIDADE FUNCIONAL DA ATUAÇÃO DO MINISTÉRIO PÚBLICO


FACE A PROPOSITURA DE AÇÕES QUE VISEM A EXCLUSÃO DE HERDEIRO
POR INDIGNIDADE
LEI 13.532 DE DEZEMBRO DE 2017

Monografia apresentada ao Curso de


Direito, da Faculdade de Telêmaco Borba,
como requisito parcial à obtenção do grau
de Bacharel em Direito.

Orientadora: Prof.ª Hanna Caroline Krüger

Telêmaco Borba - PR
2019
Marcelino, Renan Lenon Marcondes
S578g A Compatibilidade Funcional da Atuação do Ministério Público
Face à Propositura de Ações que Visem a Exclusão de Herdeiro por
Indignidade: Lei 13.532 de dezembro de 2017 / Renan Lenon
Marcondes Marcelino. – Telêmaco Borba, PR. 2019.
126f.

Orientadora: Hanna Caroline Krüger


Monografia (TCC), Graduação em Direito – Faculdade de
Telêmaco Borba.
Bibliografia: f.

1. Ministério Público. 2. Exclusão de Herdeiros. 3. Indignidade.


I - Faculdade de Telêmaco Borba.

CDD 658
RENAN LENON MARCONDES MARCELINO

A COMPATIBILIDADE FUNCIONAL DA ATUAÇÃO DO MINISTÉRIO PÚBLICO


FACE A PROPOSITURA DE AÇÕES QUE VISEM A EXCLUSÃO DE HERDEIRO
POR INDIGNIDADE
LEI 13.532 DE DEZEMBRO DE 2017

Monografia apresentada ao Curso de


Direito, da Faculdade de Telêmaco Borba,
como requisito parcial à obtenção do grau
de Bacharel em Direito.

COMISSÃO EXAMINADORA

______________________________________
Professora: Hanna Caroline Krüger.
Faculdade de Telêmaco Borba

______________________________________
Professor Jorcy Erivelto Pires.
Faculdade de Telêmaco Borba

______________________________________
Professor: Thiago Ferreira Pavezzi.
Faculdade de Telêmaco Borba

Telêmaco Borba, ____ de___________ de 20__.


A todos aqueles que não medem esforços
para alcançar seus objetivos.
AGRADECIMENTOS

Agradeço primeiramente a Deus, pelo dom da vida.


Agradeço ao professores, pelo conhecimento transmitido, os quais, sem isso, não
seria possível a elaboração deste trabalho.
Agradeço a minha esposa, pela compreensão da minha ausência e motivação
enquanto dedicava tempo ao estudo.
Agradeço aos meus pais, pelo apoio e suporte, os quais proporcionaram condições
favoráveis para minha total dedicação aos estudos.
Agradeço a professora orientadora, a qual destinou seu tempo e conhecimento para
que este trabalho pudesse ser elaborado com excelência.
Agradeço aos amigos e colegas que contribuíram em todos os momentos deste tempo
acadêmico.
“Se você deseja ser na vida qualquer coisa
menos do que aquilo que você é capaz, você
corre o risco de ser infeliz todos os dias da
sua vida”.
Abraham H. Maslow
MARCELINO, Renan Lenon Marcondes. A compatibilidade funcional da atuação
do Ministério Público face à propositura de ações que visem a exclusão de
herdeiro por indignidade: Lei 13.532, de dezembro de 2017. Monografia (Trabalho
de Conclusão de Curso) – Faculdade de Telêmaco Borba.

RESUMO

Entre os princípios basilares do Direito estão a moral e a justiça, os quais norteiam


todo o ordenamento jurídico brasileiro. Neste diapasão, o legislador pátrio consagrou
esses princípios no instituto da indignidade sucessória, expresso no diploma legal
vigente, Lei 10.406 de 2002, que prevê a exclusão do herdeiro ou legatário do direito
de suceder, caso venha a praticar determinados atos ofensivos contra a pessoa, a
honra ou os interesses do autor da herança ou de algum de seus familiares. Em 2017
entrou em vigor a Lei 13.532 que proporciona legitimidade ao Ministério Público a
propor ações que visem a exclusão de herdeiro por indignidade, nos crimes expressos
no rol do art. 1.814 do referido diploma legal. Anteriormente a norma, a doutrina
argumentava, entre comentários prós e contra sob a inserção do Parquet no âmago
do direito privado, por meio do ingresso da ação de indignidade, criando uma
discussão acirrada sobre os limites da atuação do Ministério Público. Face a isso,
procurar-se-á analisar a compatibilidade funcional da atuação do MP face a lei vigente,
buscando embasamento técnico para ambas linhas de argumentação, desde os
primórdios da criação do Instituto até os dias atuais.

Palavras-chave: princípios basilares, indignidade sucessória, Ministério Público.


MARCELINO, Renan Lenon Marcondes. A compatibilidade funcional da atuação
do Ministério Público face à propositura de ações que visem a exclusão de
herdeiro por indignidade: Lei 13.532, de dezembro de 2017. Monografia (Trabalho
de Conclusão de Curso) – Faculdade de Telêmaco Borba.

ABSTRACT

Among the fundamental principles of law are morality and justice, which guide the
entire Brazilian legal system. In this tuning fork, the national legislator enshrined these
principles in the institute of inheritance unworthiness, expressed in the current law,
Law 10.406 of 2002, which provides for the exclusion of the heir or legatee from the
right to succeed if he / she engages in certain offensive acts against the person, the
honor or interests of the inheritor or any of his family members. In 2017, Law 13,532
came into force, which gives the Public Prosecution Service its legitimacy to propose
actions aimed at the exclusion of heirs for indignity, in the crimes expressed in art.
1,814 of the referred legal diploma. Formerly the norm, the doctrine argued, between
pro and con comments about the insertion of Parquet at the heart of private law, by
entering the action of indignity, creating a heated discussion about the limits of the
prosecution. In view of this, we will seek to analyze the functional compatibility of the
performance of the MP against the current law, seeking technical basis for both lines
of argument, from the early days of the Institute's creation to the present day.

Key words: basilar principles, inheritance indignity, Public Prosecution Service.


SUMÁRIO

INTRODUÇÃO ......................................................................................................... 11

CAPITULO 1 – A EVOLUÇÃO DA INSTITUIÇÃO DO MINISTÉRIO PÚBLICO NA


HISTÓRIA .................................................................................................. 13

1.1 As primeiras codificações do Direito ........................................................... 13

1.2 A transição do Pré-direito ao direito ............................................................ 15

1.3 As primeiras menções históricas à instituição do Ministério Público .......... 17

1.4 O Ministério Público e as Constituições do Brasil ....................................... 19

CAPITULO 2 – DIREITO CIVIL – OS EXCLUÍDOS DA SUCESSÃO .................... 22

2.1 Introdução ao Direito de Sucessão ............................................................. 22

2.2 Noção de herança ...................................................................................... 24

2.3 Distinção entre herança e legado ............................................................... 25

2.4 Dos Excluídos da Sucessão ....................................................................... 27

2.4.1 Distinção entre deserdação e indignidade .................................................. 27

2.4.2 Características da indignidade ................................................................... 29

2.5 Dos delitos passíveis de declaração de indignidade .................................. 32

2.5.1 Herdeiro atuando como autor, coautor ou partícipe ................................... 32

2.5.2 Do delito contra a honra ............................................................................. 33

2.5.3 Casos de violência ou fraude ..................................................................... 34

2.6 Efeitos da indignidade ................................................................................ 34

2.7 Reabilitação do indigno .............................................................................. 37

CAPITULO 3 – ATUAÇÃO DO MINISTÉRIO PÚBLICO ......................................... 39

3.1 O conceito da Instituição do Ministério Público na CF/88 ........................... 39


3.2 Funções Jurisdicionais ............................................................................... 40

3.3 Defesa da ordem jurídica ............................................................................ 41

3.4 Defesa do regime democrático ................................................................... 41

3.5 Defesa do interesse público, sociais e dos interesses individuais


indisponíveis ............................................................................................... 42

3.6 Legitimidade para propositura de ação de indignidade pós-vigência da lei


13.532/17..................................................................................................... 44

3.7 Origem da Lei 13.532 de dezembro de 2017 .............................................. 45

3.8 Discussão doutrinária: A atuação do MP na seara privada ......................... 46

METODOLOGIA ..................................................................................................... 50

CONSIDERAÇÕES FINAIS .................................................................................... 51

REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS ....................................................................... 53

ANEXOS ............................................................................................................... 57
11

INTRODUÇÃO

O presente trabalho tem como finalidade analisar a compatibilidade da Lei de


n° 13.532/17, que outorga legitimidade ao Ministério Público para ingressar com
ações visando a exclusão de herdeiro por indignidade.
Em tempos hodiernos, em que se deveria haver grande racionalidade e
civilidade na sociedade, que tornar-se-ia inconcebível pensar que um ser humano,
por vezes com grau de parentesco consanguíneo, fosse capaz de cometer um crime
contra a vida de outro indivíduo com o fim de receber um quinhão hereditário
patrimonial.
Todavia, o legislador, percebendo o quão bárbara a comunidade humana
ainda é, este trabalhou para que o ato atentatório contra o de cujus – autor da
herança, não beneficiasse seu algoz.
Com base nos princípios norteadores do Direito, a moral e a justiça, o
legislador pátrio consagrou, no instituto da indignidade sucessória, uma norma que
possibilita expressamente que o herdeiro ou legatário possa ser afastado de seu
direito de suceder, caso venha a praticar atos ofensivos contra a pessoa, a honra ou
os interesses do autor da herança ou cometa ilícitos contra membros de sua família.
Dessa forma, em primeiro momento, buscar-se-á analisar a essência da
criação do Instituto do Ministério Público, observando as primeiras atuações de seus
membros na antiguidade, e uma análise sucinta dos primeiros códigos escritos da
história.
No segundo capítulo procurar-se-á situar o leitor ao tema proposto,
apresentando fundamentações técnicas com vistas à legislação brasileira sobre o
instituto da indignidade, buscando fornecer informações concisas, para o leitor possa
ter condições para analisar a conjectura da norma em estudo.
Neste contexto, buscar-se-á analisar a compatibilidade da norma vigente,
verificando possíveis conflitos nos conceitos por ela elencados; diferenciar herdeiro
de legatário; os crimes pelos quais o herdeiro poderá ser afastado da linha
sucessória, entre outros.
Anteriormente a entrada em vigência da lei 13.532 de 2017, era dúbia a
questão da legitimidade do Ministério Público face a propositura de ações que
visassem a declaração de indignidade do herdeiro, pois, afastando-se do interesse
12

público, o Parquet ingressaria diretamente na seara do direito particular.


Frente a isso, muitos doutrinadores teciam observações acerca desta
legitimidade expressa em lei, posto que a atuação do Ministério Público insurge em
matéria patrimonial em que não há interesse de incapaz nem cuida de mínimo
existencial.
Ademais, de acordo com a doutrina, a atuação do MP deveria ser pautada à
questões voltadas ao interesse público, ou seja, da coletividade.
A partir desse breve contexto, surge a seguinte problemática: Há
compatibilidade funcional da atuação do Ministério Público face à propositura de
ações que visem a exclusão de herdeiro por indignidade?
Dessa forma, no terceiro capítulo buscar-se-á analisar os argumentos prós e
contras da doutrina sobre a compatibilidade funcional da norma vigente – Lei 13.532
de 2017 e analisar a atuação do Ministério Público em face à propositura de ações
que busquem a declaração de indignidade de herdeiros.
13

CAPITULO 1

1. A EVOLUÇÃO DA INSTITUIÇÃO DO MINISTÉRIO PÚBLICO NA HISTÓRIA

1.1. As primeiras codificações do Direito


Antes de iniciar a discussão central do tema proposto, é imprescindível
analisar a conjuntura histórico social da evolução não somente do Instituto do
Ministério Público, mas do Direito como um todo. Para criar um posicionamento claro
e objetivo sobre a problemática proposta e evitar embasamentos rasos para as
referidas discussões, necessário se faz realizar uma abordagem sobre
contextualização histórica e extrair a máxima dos conceitos adiante abordados.
O eminente jurista brasileiro, Miguel Reale, enfatiza que
[...] não se pode, com efeito, estudar um assunto sem se ter dele uma noção
preliminar, assim como o cientista, para realizar uma pesquisa, avança uma
hipótese, conjectura uma solução provável, sujeitando-a a posterior
verificação”1.

Tal como os demais elementos da vida social, o fenômeno jurídico se


desenvolve ao longo do tempo devido a uma crescente complexidade das relações
sociais.
O estudo histórico do Direito é abrangente e, nas palavras de Castro:
O valor do estudo da história do Direito não está em ensinar-nos não somente
o que o direito tem ‘feito’, mas o que o Direito é. Tendo isso em mente,
podemos avançar neste estudo, buscando compreender não somente as
regras de povos que viveram no passado, mas sua ligação com a sociedade
que a produziu para assim, e somente assim, entender o “nosso Direito 2.

Aprofundando os estudos pode-se compreender que há, no decorrer da


história, uma grande contribuição oriunda do pensamento grego e das instituições
jurídicas gregas para a formação do atual direito ocidental.
Segundo Cerqueira:
O direito ocidental é filho das experiências republicanas das cidades-Estado
mediterrâneas antigas. Surge na pólis grega e desenvolve-se diferentemente
na civitas romanas, conforme as peculiaridades políticas das culturas
helênicas e romana. Radicalmente, devemos dizer que o direito é filho da
pólis, na qual se viveu uma experiência intelectual, política e jurídica que
alterou completamente, na história, os modelos de relação entre o poder

_____________
1 REALE, Miguel. Lições preliminares de direito. Miguel Reale. – 27. ed. – São Paulo: Saraiva, 2002.
p. 1
2 CASTRO, Flávia Lajes de. História do Direito Geral e Brasil. Rio de Janeiro: Lumen Juris, 2007.p. 5.
14

constituído no Estado e a população por este governada3.

Sabe-se também, que o direito ocidental recebeu deveras contribuições de


outras linhas de pensamento, como a tradição do direito consuetudinário anglo-
saxão4, o deuteronômio hebraico, os códigos romanos, além das leis paleo-
babilônicas5.
Por volta de 1792-1750 a.C, na Mesopotâmia, surgiam as primeiras
codificações da humanidade, entre elas o código de Hamurabi, conhecido rei da
Babilônia, e a Lei de Eshnunna6.
Ao analisar o que os historiadores definem como o preâmbulo do Código de
Hamurabi, encontra-se a menção:
[...]me chamaram, a mim Hamurabi, o excelso príncipe, o adorador dos
deuses, para implantar justiça na terra, para destruir os maus e o mal, para
prevenir a opressão do fraco pelo forte, para iluminar o mundo e propiciar o
bem-estar do povo7.

O supramencionado preâmbulo do Código de Hamurabi é uma das primeiras


menções à aplicação da justiça para determinar aquilo que é bom e justo visando o
bem-estar social de determinado povo, ou seja, a real aplicação dos princípios da
justiça social.
Em que pese houvesse uma clara distinção entre a aplicabilidade das regras
para as determinadas classes existentes na época, ou seja, favorecendo uma em
detrimento de outra, a essência dos Códigos norteava, na visão dos reis da época, o

_____________
3 CERQUEIRA, Fábio Vergara. As origens do direito ocidental na pólis grega. Revista Justiça e
História. TJRS. Disponível em:
https://www.tjrs.jus.br/export/poder_judiciario/historia/memorial_do_poder_judiciario/memorial_judiciar
io_gaucho/revista_justica_e_historia/issn_1676-5834/v2n3/doc/04-Fabio.PDF>. Último acesso em set
de 2019.
4 Século V – ano 1066, período de criação e desenvolvimento do Common Law.
5 Paleo-babilônicas – período que os historiadores remetem à elaboração do Código do Hamurabi.
6 Aprox. 1930 a.C - Tábuas escritas em língua arcádica; trata-se, contudo, não de cópias oficiais dessa

coleção jurídica, mas sim de tábuas usadas para treinamento dos escribas.
7 Preâmbulo do Código de Hamurabi: “Quando o alto Anu, Rei de Anunaki e Bel, Senhor da Terra e dos

céus, determinador dos destinos do mundo, entregou o governo de toda a humanidade a Marduc;
quando foi pronunciado o alto nome da Babilônia; quando ele a fez famosa no mundo e nela
estabeleceu um duradouro reino cujos alicerces tinham a firmeza do céu e da terra, -por esse tempo
Anu e Bel me chamaram, a mim Hamurabi, o excelso príncipe, o adorador dos deuses, para implantar
justiça na terra, para destruir os maus e o mal, para prevenir a opressão do fraco pelo forte, para
iluminar o mundo e propiciar o bem estar do povo. Hamurabi, governador escolhido por Bel, sou eu; eu
o que trouxe a abundância à terra; o que fez obra completa para Nippur e Dirilu; o que deu vida à cidade
de Uruk; supriu água com abundância aos seus habitantes; o que tornou bela a nossa cidade de
Brasíppa; o que encelerou grãos para a poderosa Urash; o que ajudou o povo em tempo de
necessidade; o que estabeleceu a segurança na Babilônia; o governador do povo, o servo cujos feitos
são agradáveis a Anuit”.
15

senso daquilo que era justo. Sobre o tema, enfatiza Cerqueira:


Seu conteúdo normativo, apesar de traduzir o esforço de legitimação da
autoridade real numa tarefa de regulamentação das relações sociais,
buscando promover o que na cultura de então, era considerado “justo”,
revela-nos um conjunto de leis e de instituições jurídicas marcadamente
distintas daquelas que se desenvolverão na pólis grega, passados onze a
doze séculos8.

Ainda nas palavras de Fábio Vergara Cerqueira:


A base de sustentação do que hoje entendemos como democracia ateniense
estava no modelo jurídico que lá se desenvolvera. Precisamos entender,
então, a relação entre os regimes políticos e as instituições jurídicas, entre o
pensamento político e o pensamento jurídico, haja vista serem instâncias
inseparáveis no Mediterrâneo Antigo9.

Após um longo período, diante da crise da realeza homérica o direito


transcendeu de um direito privado, em que o monarca detinha todos os poderes
políticos, para ser exercido como ordem de direito público, mesmo que ainda sob
hegemonia da aristocracia. Neste tempo o direito foi dividido em três funções: militar,
administrativo e direito religioso.
A partir deste marco, rompe-se o ciclo do poder exercido apenas por uma
pessoa – controle do rei - sendo agora um poder exercido como uma “função”. Para o
exercício dessas determinadas funções, escolhia-se os indivíduos que as exerceriam
por determinado período por meio de eleições.
Após o alargamento dos processos das prerrogativas políticas, surge então o
conceito de que o “poder” do Estado deveria estar sujeito ao interesse público e, esse
público deveria exercê-lo por si mesmo e não apenas delega-lo a uma autoridade real
com poderes ilimitados. Esse processo ficou denominado “isonomia”, que se resume
no conceito da garantia de igualdade entre os cidadãos na aplicabilidade da lei.

1.2. A transição do Pré-direito ao Direito


Nos primórdios da sociedade homérica (séc. XII – VIII) o direito estava nas
mãos da realeza e era aplicado de forma autoritária, com total prerrogativa real. Na
cidade aristocrática (séc. VIII a VI), após a queda da realeza, o poder passou a ser
exercido pela elite aristocrática. Esses eram os possuidores do poder da “justiça
social” e faziam uso para benefícios próprios.

_____________
8 CERQUEIRA, Fábio Vergara. op. cit. p.4
9 CERQUEIRA, Fábio Vergara. op. cit. mesma página.
16

[...] Eram os ‘reis comedores de presentes’, que espoliavam os camponeses,


os quais, despojados de suas terras pelos abusivos impostos cobrados de
arrendatários, tornavam-se endividados e, por conseguinte, caíam na
escravidão por dívidas. A crise social do séc. VI, a chamada stásis, provocou
um clamor geral por justiça. Esse anseio se fez sentir tanto do ponto de vista
intelectual como político10.

Observa-se no transcorrer da história que é na Grécia antiga que acontece o


processo de transição daquilo que Louis Gernet11 chamou de “Pré-Direito ao Direito”.
Nas palavras de Cerqueira:
Pré-direito era o direito arcaico, exercido de forma autoritária pela realeza e
pala aristocracia. [...] No Pré-direito, as acusações são sumárias, não há
procedimentos regulares de defesa. Os interesses particulares, sobretudo
das famílias mais influentes, exercem um controle muito grande sobre o
exercício da justiça, em prejuízo dos indivíduos de extração social inferior. A
justiça era exercida por delegação divina, como justificativa para os atos
autocráticos. As leis estavam baseadas na tradição, eram passadas
oralmente, e somente um restrito grupo tinha a prerrogativa de interpretá-la12.

Aos poucos, o Pré-direito foi cedendo espaço ao Direito.


Ainda neste mesmo século, começaram a surgir as primeiras regras escritas,
notadamente na ilha de Creta. Neste povoado, a lei começou a ser registrada e
passara ao domínio comum, escrita sobre uma pedra e exposta em local público para
que todos pudessem ver, ainda que nem todos soubessem ler.
Ao longo do século VI, foram desenvolvidos procedimentos de
democratização, humanização e racionalização do direito. A “justiça de sangue”
afasta-se para o fortalecimento da justiça da pólis.
Nesse ponto, importante frisar, nas palavras de Fábio Vergara Cerqueira:
[...] as instituições judiciárias atenienses guardam grandes diferenças em
relação à civilização romana, da qual o direito moderno é, em grande parte,
herdeiro direito. No entanto é da Grécia que provém o sentido intelectual da
universalidade da justiça; foi entre os gregos que se desenvolveu a noção de
que o direito é coisa pública, confeccionada e controlada pelo conjunto da
comunidade13.

A partir desse marco foram sendo definidos procedimentos para os processos


de acusação; e é a partir desse período que surge o consagrado direito de defesa.

_____________
10 CERQUEIRA, Fábio Vergara. op. cit.
11
Louis Gernet foi o decano da faculdade de letras em Argel, helenista, especialista em direito grego,
mas igualmente sociólogo.
12 CERQUEIRA, Fábio Vergara. op. cit., p.5.
13 CERQUEIRA, Fábio Vergara. op. cit., p.5.
17

1.4. A primeiras menções históricas à instituição do Ministério Público


Em meados do século V, Sólon, de Atenas, poeta lírico e grande legislador da
época, elaborou leis, que, embora não tenha gerado grandes efeitos práticos para o
período, proporcionou o ponto de partida para a difusão do regime de governo
conhecido hoje por democracia.
Nesse contexto, uma dessas leis permitia que os cidadãos mais abastados
fossem indicados ao Areópago – instância aristocrática ainda atuante nas primeiras
décadas do século V - e participassem do governo da cidade, que antes pertencia
exclusivamente a nobreza.
Nas palavras de Castro:
A nova legislação não provocou mudanças imediatas, pois na época, os mais
ricos eram os mesmos nobres detentores do poder. No entanto, ela abriu
caminho para que, a partir de então, cidadãos comuns, sem sangue real, que
se destacavam em suas atividades comerciais e enriqueciam, ocupassem os
mais altos cargos políticos14.

Nesse período, a administração cotidiana da justiça recai sobre os


tesmótetas15, que eram magistrados sorteados pela Assembleia dos cidadãos, à razão
de um por tribo, notadamente conhecidos como “homens do povo”. Eles permaneciam
no cargo por um ano e deviam prestar contas a Boulé pela sua atuação, o qual era
um conselho com aproximadamente 400 membros responsáveis pela organização e
sessões das Assembleias.
Cada vez mais o povo passou a comandar os destinos de Atenas. Todas as
decisões – desde as mais simples às mais complexas e importantes – eram
tomadas na Assembleias dos cidadãos, que se reunia uma vez por mês16.

Com a implementação desse sistema desenvolve-se a profissão do lológrafo


ou atidógrafo, hodiernamente conhecido como advogado. Sobre esses, o professor
Fábio Vergara Cerqueira leciona:
Tanto para a acusação como para a defesa, costumava-se contratar um
orador, cujos discursos tornavam esses julgamentos primorosos do ponto de
vista da retórica, fazendo uso de sofisticadas técnicas do pensamento
racional para encaminhar os procedimentos de defesa e acusação. O sentido
de isonomia os regulamentava: uma ampulheta controlava o tempo, para que
os advogados de acusação e defesa dispusessem do mesmo tempo para
exposição de seus argumentos e para arrolar suas testemunhas. 17

_____________
14 CASTRO, Roberto Carlos Gomes. A Grécia antiga: uma visão panorâmica. IJI - Universidade do
Porto. 2014. p. 5.
15 Responsáveis por levar a notícia crime à Assembleia do povo.
16 CASTRO, Roberto C. G. op. cit., pág. 18. p. 7.
17 CERQUEIRA, Fábio Vergara. op. cit., p.18.
18

Ademais, no tocante aos conhecidos Promotores de Justiça da época, pode-


se citar os “éforos”18 e os já mencionados “tesmótetas” que exerciam funções
semelhantes aos membros do Ministério Público atual.
Existia também a figura do defensor civitatis, que era eleito pelos notáveis da
vila e tinha como principal função promover a ordem pública, além de
defender as classes inferiores contra os abusos e os desmandos dos
funcionários imperiais e dos agentes municipais19.

Outrossim, ainda nas palavras de Andreatta:


Ainda dentro da busca da origem do Ministério Público, alguns estudiosos
veem no Magiaí, funcionário real no Egito a origem da instituição. Cabia ao
mesmo representar o rei do país, protegendo os cidadãos de bem e punindo
os rebeldes, de forma a acolher a vontade do homem justo, além de amparar
as viúvas a os órfãos, participando do processo fazendo-se ouvir as palavras
da acusação, podendo ainda participar das investigações a fim de se
descobrir a verdade20.

Entretanto, alguns doutrinadores mencionam a dificuldade em se afirmar que


a origem da instituição do Ministério Público advém destes tempos longínquos.
Nesse pensar, Hélio Tornaghi ensina:
O Ministério Público, tal como numerosos outros órgãos do Estado, não
apareceu de jato, em determinado lugar, nem foi produto de um ato
legislativo; foi se formando paulatinamente, foi ajuntando em torno de si
várias funções antes espalhadas em diferentes mãos, foi se aperfeiçoando,
até que uma lei o encontrou cristalizado e o consagrou21.

Em que pese haja menções aos promotores de justiça desde a antiguidade,


Mauro Fonseca Andrade esclarece:
[...] enfim, é muito difícil encontrar um antepassado do Ministério Público junto
à Idade Antiga, visto que a simples associação a uma ou duas de suas
funções atuais não se presta a servir como fundamento válido para a
construção de algum vínculo entre o Parquet e qualquer outro funcionário
público da antiguidade22.

Todavia, a maioria dos autores prefere localizar a figura dos promotores de


justiça na figura dos advogados e procuradores do rei, na França, no século XVI.

_____________
18 Quando o ofendido não exercia seu direito de acusação, os éforos eram encarregados de incriminar
os acusados, evitando que estes ficassem impunes.
19 ANDREATTA, Lucas Henrique Padovan. A investigação criminal realizada pelo Ministério Público e

a teoria constitucional dos poderes implícitos. São Paulo - 2011. p. 13


20 ANDREATTA, Lucas Henrique Padovan. op. cit., mesma página.
21 TORNAGHI, Hélio. Instituições de Direito Processual Penal, vol. III, Rio de Janeiro, Saraiva, 1977, p

137.
22 ANDRADE, Mauro Fonseca. Ministério Público e sua Investigação Criminal, 2ª edição, Curitiba,

Juruá, 2008. p.30.


19

1.5. O Ministério Público e as Constituições do Brasil


Como já anteriormente citado, diversos historiadores e estudiosos do direito
divergem quanto a exata criação do Ministério Público.
Entretanto, no Brasil, de acordo com Gomes,
[...] a origem do Ministério Público está diretamente ligada ao Direito lusitano,
principalmente à época em que o Brasil foi Colônia de Portugal, vigorando,
portanto, a lei da Metrópole. Desse modo, registra-se que as Ordenações
Manuelinas (1521) foram as pioneiras em prever obrigações pertinentes ao
Promotor de Justiça, ao passo que a Lei de 9 de janeiro de 1609 foi o primeiro
texto efetivamente brasileiro a fazer menção ao Ministério Público 23.

A referida Lei, datada de 9 janeiro de 1609, “regulamentava estruturação do


Tribunal de Relação do Brasil”24. Ademais, esta foi a pela primeira vez que uma lei
brasileira se referiu à Instituição do Ministério Público.
Neste contexto, faz-se necessário mencionar que o Brasil se tornou
independente em 7 de setembro de 1822, entretanto, as movimentações
emancipatórias ocorreram em período anterior. Esse processo teve início em 24 de
janeiro de 1808, “quando a Corte Portuguesa atraca nos portos brasileiros motivada
pelo avanço das tropas de Napoleão em direção a Lisboa”25.
Destarte, na data de 25 de março de 1824, D Pedro I outorga a primeira
Constituição do Império do Brasil. No teor desta Constituição não há previsão legal à
criação do Ministério Público, apenas menciona que o membro Procurador da Coroa,
teria, em alguns casos, a função de realizar a acusação.
Apenas em 1832, com o Código de Processo Penal do Império iniciou-se a
sistematização das ações do Ministério Público.
Ademais, no ano de 1890, com o decreto n°848, é que o Ministério Público
passou a ter seus contornos como Instituição. Este, ao criar e regulamentar a Justiça
Federal, dispôs, em um capítulo, sobre a estrutura e atribuições do Ministério Público
no âmbito federal26.
_____________
23 GOMES, Rodrigo Jimenez. A investigação criminal e a atuação do Ministério Público. PUC – São
Paulo. 2009. p. 39.
24 ANDREATTA, Lucas Henrique Padovan. op. cit., p. 15.
25 MAGALHÃES, Anala Lelis. A importância do estudo da história para a compreensão das evoluções
do direito. In: Âmbito Jurídico, Rio Grande, XV, n. 101, jun. 2012. Disponível em: http://www.ambito-
juridico.com.br/site/?n_link=revista_artigos_leitura&artigo_id=11786>. Acesso em set 2019.
26 CAPITULO VI - DO MINISTERIO PUBLICO

Art. 21. O membro do Supremo Tribunal Federal, que for nomeado procurador geral da Republica,
deixará, de tomar parte nos julgamentos e decisões, e, uma vez nomeado, conservar-se-ha
vitaliciamente nesse cargo.
Art. 22. Compete ao procurador geral da Republica:
20

Outrossim, foi devido ao processo de codificação do Direito nacional que


alavancou o crescimento da Instituição do Ministério Público27.
Na vigência da Constituição brasileira de 1934, o Parquet foi disciplinado de
forma mais detalhada, tendo um capítulo exclusivo chamado “Dos órgãos de
cooperação”. Além, disso, no âmbito desta Constituição existia a previsão legal para
a organização do Ministério Público da União.
Entretanto, a Constituição brasileira de 1937, notadamente conhecida como
“Polaca”, segundo Gomes:
[...] representou um enorme retrocesso para a instituição. As normas que
versavam sobre o Ministério Público passaram a ser esparsas, retornando o
caráter de livre nomeação e destituição do Procurador Geral da República28.

No ano de 1946, após a deposição do Presidente da época, Getúlio Vargas,


o cenário político nacional se rearticulou diante da promulgação de uma nova
Constituição. No tocante ao Ministério Público, houve a inserção da Instituição em
título próprio, além de assegurar aos seus membros estabilidade e inamovibilidade
relativa29.

_____________
a) exercer a acção publica e promovel-a até final em todas as causas da competencia do Supremo
Tribunal;
b) funccionar como representante da União, e em geral officiar e dizer de direito em todos os feitos
submettidos á jurisdicção do Supremo Tribunal;
c) velar pela execução das leis, decretos e regulamentos, que devem ser applicados pelos juizes
federaes;
d) defender a jurisdicção do Supremo Tribunal e a dos mais juizes federaes;
e) fornecer instrucções e conselhos aos procuradores seccionaes e resolver consultas destes, sobre
materia concernente ao exercicio da justiça federal.
Art. 23. Em cada secção de justiça federal haverá um procurador da Republica, nomeado pelo
Presidente da Republica, por quatro annos, durante os quaes não poderá ser removido, salvo si o
requerer.
Art. 24. Compete ao procurador da Republica na secção:
a) promover e exercitar a acção publica, funccionar e dizer de direito em todos os processos criminaes
e causas que recaiam sob a jurisdicção da justiça federal;
b) solicitar instrucções e conselhos do procurador geral da Republica, nos casos duvidosos;
c) cumprir as ordens do Governo da Republica relativas ao exercicio das suas funcções, denunciar os
delictos ou infracções da lei federal, em geral promover o bem dos direitos e interesses da união;
d) promover a accusação e officiar nos processos criminaes sujeitos á jurisdicção federal até ao seu
julgamento final, quer perante os juizes singulares, quer perante o Jury.
Art. 25. Os procuradores seccionaes serão julgados nos crimes de responsabilidade pelos juizes das
respectivas secções, com recurso para o Supremo Tribunal, no caso de condemnação.
Art. 26. Nas faltas ou impedimentos temporarios dos procuradores seccionaes, o procurador geral da
Republica nomeará quem os substitua
27 Código Civil de 1917; Código de Processo Civil de 1939 e de 1973; Código Penal de 1940 e o

Código de Processo Penal de 1941.


28 GOMES, Rodrigo Jimenez.op. cit., pág. 39.
29 Inamovibilidade é a garantia de juízes e membros do Ministério Público (MP) de que não serão
arbitrariamente removidos de sua lotação pelos tribunais ou pelos órgãos de gestão do Ministério
Público.
21

Durante a vigência do Regime Militar, foi outorgada, em 15 de março de 1967,


uma nova Constituição. Esta incluíra normas relativas ao Ministério Público em um
capítulo destinado ao Poder Judiciário. “As prerrogativas de estabilidade e
inamovibilidade foram mantidas, com nomeação do Procurador Geral da República
pelo Presidente da República, após aprovação pelo Senado Federal”30.
Ademais, segundo o mesmo autor:
Em 1969, adveio a Emenda Constitucional alterando as disposições da Carta
de 1967, inserindo-se as disposições referentes ao Parquet dentro do capítulo
reservado ao Poder Executivo. Com as alterações, o chefe do Ministério
Público da União passou a ser nomeado e exonerado livremente pelo
Presidente da República”31.

Neste diapasão, como se percebeu a instituição passou por deveras


evoluções ao longo da História. Da qualidade de funcionário real no Egito à Instituição
com previsão expressa na Carta de Lei maior do Estado; de mero lológrafo do rei à
incumbência do dever de proteger a ordem jurídica e os interesses da sociedade
moderna.

_____________
30 GOMES, Rodrigo Jimenez. op. cit., p.40.
31 GOMES, Rodrigo Jimenez. op. cit., mesma pag.
22

CAPITULO 2

2. DIREITO CIVIL - OS EXCLUÍDOS DA SUCESSÃO

2.1. Introdução ao Direito de Sucessão


Antes de adentrar ao tema sobre os excluídos da sucessão, é plausível
conceituar este ramo do Direito para um ampla visão do tema a ser abordado.
A palavra sucessão, em seu sentido amplo, significa substituir outrem em uma
relação jurídica e tornar-se titular daquele determinado direito.
Sobre o tema, o doutrinador Silvo Venosa ensina:
Quando o conteúdo e o objeto da relação jurídica permanecem os mesmo,
mas mudam os titulares da relação jurídica, operando-se uma substituição,
diz-se que houve uma transmissão no direito ou uma sucessão. Assim, o
comprador sucede ao vendedor na titularidade de uma coisa, como também
o donatário sucede o doador, e assim por diante” 32.

Neste sentido, Carlos Roberto Gonçalves leciona:


A ideia de sucessão, que se revela na permanência de uma relação de direito
que perdura e subsiste a despeito da mudança dos respectivos titulares, não
ocorre somente no direito das obrigações, encontrando-se frequente no
direito das coisas, em que a tradição a opera, e no direito de família, quando
os pais decaem do poder familiar e são substituídos pelo tutor”33.

No âmago do direito, doutrinadores defendem que há duas formas de


sucessão: inter vivos e causa mortis. A primeira refere-se a atos realizados entre
pessoas vivas, como por exemplo, um contrato de compra e venda, em que há
consentimento de ambos – ato bilateral - para a realização do ato.
Em contrapartida, a sucessão causa mortis ocorre pelo fenômeno “morte”, e
tem como causa da sucessão a morte de outrem, operando, dessa forma, a
transferência das obrigações do de cujus para seus herdeiros e/ou legatários.
O doutrinador Sílvio Venosa salienta:

Quando se fala, na ciência jurídica, em direito das sucessões, está-se


tratando de um campo específico do direito civil: a transmissão de bens,
direitos e obrigações em razão da morte. É o direito hereditário, que se
distingue do sentido lato da palavra sucessão, que se aplica também entre
vivos”34.

_____________
32 VENOSA, Sílvio de Salvo. Direito civil : direito das sucessões / Silvio de Salvo Venosa. 9. ed. – São
Paulo : Atlas, 2009.
33 GONÇALVES, Carlos Roberto. Direito Civil brasileiro, volume VII : Direito das Sucessões / Carlos

Roberto Gonçalves. – 3. ed. rev. São Paulo : Saraiva, 2009. p. 1.


34 VENOSA, Sílvio de Salvo. op. cit., p. 1.
23

Neste sentido, Carlos Roberto Gonçalves enfatiza que “no direito das
sucessões, o vocábulo é empregado em sentido estrito, para designar tão-somente a
decorrente da morte de alguém”35.
Necessário mencionar que o Direito de sucessão causa mortis refere-se
apenas à pessoas naturais, não abarcando pessoas jurídicas, vez em que, não tem
expressão de última vontade do falecido e os preceitos estatutários regulam o destino
do patrimônio social da empresa.
No tocante as espécies de sucessão, estas podem ser classificadas em
sucessão testamentária e sucessão legítima ou ab intestato.
Na primeira, diz ser oriunda de testamento válido ou de disposição de última
vontade do de cujus. Sobre o tema, o Código Civil expressa em seu artigo 1.857 que
“toda pessoa capaz pode dispor, por testamento, da totalidade de seus bens, ou de
parte deles, para depois da sua morte”36.
Não obstante, a sucessão legítima ou ab intestato é produto da lei, ou seja, a
sucessão legítima prevalece quando não houver testamentos válidos, ou se houver,
ocorrer a caducidade. Desse modo, o patrimônio do falecido passará aos herdeiros
legítimos estabelecidos em lei37, obedecendo a ordem de vocação hereditária.
Importante salientar que, em decorrência dos julgados no Supremo Tribunal
Federal, Recurso Extraordinário nº 646.72138 e Recurso Extraordinário nº 878.69439,
entendeu-se que:
“[...] no sistema constitucional vigente, é inconstitucional a distinção de
regimes sucessórios entre cônjuges e companheiros, devendo ser aplicado,
em ambos os casos, o regime estabelecido no art. 1.829 do CC/2002”. RE
646721. Min. Relator Roberto Barroso.

_____________
35 GONÇALVES, Carlos Roberto. op. cit., p. 1.
36 Lei 10.406/02 - Art. 1.857. Toda pessoa capaz pode dispor, por testamento, da totalidade dos seus
bens, ou de parte deles, para depois de sua morte.
§ 1° - A legítima dos herdeiros necessários não poderá ser incluída no testamento.
§ 2° - São válidas as disposições testamentárias de caráter não patrimonial, ainda que o testador
somente a elas se tenha limitado.
37 Lei 10.406/02 - Art. 1.829. A sucessão legítima defere-se na ordem seguinte:

I - aos descendentes, em concorrência com o cônjuge sobrevivente, salvo se casado este com o
falecido no regime da comunhão universal, ou no da separação obrigatória de bens (art. 1.640,
parágrafo único); ou se, no regime da comunhão parcial, o autor da herança não houver deixado bens
particulares;
II - aos ascendentes, em concorrência com o cônjuge;
III - ao cônjuge sobrevivente;
IV - aos colaterais.
38 BRASIL. Supremo Tribunal Federal. Recurso Extraordinário 646721. Relator Ministro Roberto

Barroso, Brasília, 30 de novembro de 2018.


39 BRASIL. Supremo Tribunal Federal. Recurso Extraordinário 878694. Relator Ministro Roberto

Barroso, Brasília, 10 de maio de 2017.


24

Dessa forma, o Supremo Tribunal Federal reconheceu o vínculo entre


companheiros que, mesmo sob regime de União Estável, devem ser comparados à
herdeiros legítimos, vinculados à herança, como se cônjuge fossem.
Outrossim, o Código Civil de 2002 concedeu tratamento isonômico entre os
herdeiros outrora denominados “legítimos” e “ilegítimos”, suprimindo qualquer
diferenciação entre eles e, reconhecendo, dessa forma, o direito sucessório de filhos
adotivos e naturais.

2.2. Noção de Herança


Em que pese ocorra com frequência o emprego do termo sucessão como
sinônimo de herança, necessário se faz distingui-los.
Sucessão refere-se ao ato de suceder e, como supramencionado, poderá
ocorrer sucessão inter vivos ou causa mortis.
Entretanto, no tocante a herança, o Código Civil disciplina que “não pode ser
objeto de contrato a herança de pessoa viva”40.
Nestes termos, não há que se falar em “validade” nos contrato celebrados
tendo objeto pertencente a pessoa viva, malgrado possa ocorrer a abertura da
sucessão de pessoa ausente, presumindo-lhe a morte, conforme disposto no art. 26
e seguintes do Código Civil41.
Ocorrendo o fato morte, transmite-se a herança aos herdeiros.
De acordo com Venosa, “herança é o conjunto de direitos e obrigações que
se transmitem, em razão da morte, a uma pessoa, ou a um conjunto de pessoas, que
sobreviveram ao falecido”42.
Neste caso, é assertiva a afirmação de que a herança é um termo exclusivo
do direito de sucessão.
No Código Civil, em seu artigo 1.791, encontra-se expresso que “a herança
defere-se como um todo unitário, ainda que vários sejam os herdeiros”43.

_____________
40 Lei 10.406/02 – Art. – 426: Não pode ser objeto de contrato a herança de pessoa viva.
41 Lei 10.406/02 – Art. 26: Decorrido um ano da arrecadação dos bens do ausente, ou, se ele deixou
representante ou procurador, em se passando três anos, poderão os interessados requerer que se
declare a ausência e se abra provisoriamente a sucessão.
42 VENOSA, Sílvio de Salvo. op. cit., p.6.
43 Lei 10.406/02 - Art. 1.791. A herança defere-se como um todo unitário, ainda que vários sejam os

herdeiros.
Parágrafo único. Até a partilha, o direito dos co-herdeiros, quanto à propriedade e posse da herança,
será indivisível, e regular-se-á pelas normas relativas ao condomínio.
25

Nas palavras de Carlos Roberto Gonçalves


A herança é, na verdade, um somatório, em que se incluem os bens e as
obrigações, as pretensões e ações de que era titular o falecido, e as que
contra ele foram propostas, desde que transmissíveis44.

Outrossim, a herança abarca-se no conceito de patrimônio, em que Sílvio


Venosa conceitua como sendo “o conjunto de direitos reais e obrigacionais, ativos e
passivos, pertencentes a uma pessoa. Portanto, a herança é o patrimônio da pessoa
falecida, ou seja, do autor da herança”45.
Importante mencionar que com o fato morte, desaparece o titular do
patrimônio. A partir desse momento, o patrimônio do de cujus é pertencente ao espólio
e, como descrito no artigo 91 do Código Civil, é entendido como “a universalidade dos
bens e direitos’46 pertencentes ao falecido.

2.3. Distinção entre herança e legado


Como já citado, a herança engloba todo o patrimônio do de cujus – bens,
direitos e obrigações – e o legado, por sua vez, refere-se a um bem certo e
determinado. A primeira, decorre da determinação da lei, enquanto a segunda, do ato
de última vontade do de cujus, expressa em testamento ou codicilo47. Pode-se dizer
que a sucessão legítima é a regra, a testamentária a exceção.
Nas lições de Carlos Roberto Gonçalves, entende-se, portanto, que “legatário
não é o mesmo que herdeiro. Este sucede a título universal, pois a herança é uma
universalidade; aquele, porém, sucede ao falecido a título singular, tomando o seu
lugar em coisa certa e individuada”48.
A eminente doutrinadora Maria Helena Diniz destaca que “predomina, na
tradição do nosso direito das sucessões, a sucessão legítima, em razão da marcante
influência do elemento familiar na formação desse ramo do direito entre nós” 49.
Outrossim, o ordenamento jurídico brasileiro permite, ainda, a possibilidade

_____________
44 GONÇALVES, Carlos Roberto. op. cit., p. 14.
45 VENOSA, Sílvio de Salvo. op. cit., p.7.
46 Lei 10.406/02 – Art. 91 – Constitui universalidade de direito o complexo de relações jurídicas de

uma pessoa, dotadas de valor econômico.


47 Codicilo é também chamado de testamento miniatura. Isso porque por meio dele, é possível deixar
disposições de ultima vontade, porém, de forma limitada. Versa apenas sobre disposições sobre
enterro, esmolas de pouca monta e fazer legados de bens móveis, roupas e joias de pequeno valor.
48 GONÇALVES, Carlos Roberto. op. cit., p. 27.
49 DINIZ, Maria Helena. Curso de direito civil brasileiro, volume 6 : direito das sucessões / Maria

Helena Diniz – 23. ed. reformulada – São Paulo : Saraiva, 2009. p. 28.
26

de existência simultânea dessas duas espécies de sucessão, pois, de acordo com o


Código Civil, art. 1.788, 2ª parte, se o testamento não abranger a totalidade dos bens
do falecido, a parte do seu patrimônio não mencionada no ato de última vontade é
deferida aos herdeiros legítimos, na ordem da vocação hereditária.
Dessa forma, uma pessoa pode vir a ser, ao mesmo tempo, herdeira e
legatária, como por exemplo, a filha que recebe de sua mãe um carro por meio do
testamento, e ainda assim, desfruta de seu quinhão hereditário determinado pela
legítima50.
Em que pese o autor da herança seja livre para dispor de seus bens, o
legislador pátrio buscou proteger os herdeiros denominados necessários51, no rol do
artigo 1.845 do Código Civil, dispondo, no artigo subsequente que “pertence aos
herdeiros necessários, de pleno direito, a metade dos bens da herança, constituindo
a legítima”52.
Neste sentido, destaca Carlos Roberto Gonçalves:
A sucessão testamentária dá-se por disposição de ultima vontade. Havendo
herdeiros necessários (ascendente, descendentes, ou cônjuge), divide-se a
herança em duas partes iguais e o testador só poderá dispor livremente da
metade, denominada porção disponível, para outorgá-la ao cônjuge
sobrevivente, a qualquer de seus herdeiros ou mesmo a estranhos, pois a
outra constitui a legítima, àqueles assegurada no art. 1.846 do Código Civil53.

Outrossim, importante salientar que o herdeiro responde pelas dívidas e


encargos da herança na proporção de sua quota hereditária, conforme disciplina o
artigo 1.997 do Código Civil54, ao passo que o legatário está isento dessa
responsabilidade.

_____________
50 Lei 10.406/02 – Art. 1849: O herdeiro necessário, a quem o testador deixar a sua parte disponível,
ou algum legado, não perderá o direito à legítima.
51 Lei 10.406/02 – Art. 1845: São herdeiros necessários os descendentes, os ascendentes e o

cônjuge.
52 Lei 10.406/02 - Art. 1.846: Pertence aos herdeiros necessários, de pleno direito, a metade dos bens

da herança, constituindo a legítima.


53 GONÇALVES, Carlos Roberto. op. cit., p. 25.
54 Lei 10.406/02 - Art. 1.997. A herança responde pelo pagamento das dívidas do falecido; mas, feita

a partilha, só respondem os herdeiros, cada qual em proporção da parte que na herança lhe coube.
§ 1o Quando, antes da partilha, for requerido no inventário o pagamento de dívidas constantes de
documentos, revestidos de formalidades legais, constituindo prova bastante da obrigação, e houver
impugnação, que não se funde na alegação de pagamento, acompanhada de prova valiosa, o juiz
mandará reservar, em poder do inventariante, bens suficientes para solução do débito, sobre os quais
venha a recair oportunamente a execução.
§ 2o No caso previsto no parágrafo antecedente, o credor será obrigado a iniciar a ação de cobrança
no prazo de trinta dias, sob pena de se tornar de nenhum efeito a providência indicada.
27

2.4 Dos Excluídos da Sucessão

2.4.1 Distinção entre deserdação e indignidade


Ao abordar casos de exclusão de herdeiros ou legatários da respectiva
herança ou legado, necessário, preliminarmente, abordar sobre à distinção entre os
institutos da deserdação e da indignidade.
Ao tratar de ambos os institutos, observa-se o cuidado do legislador em zelar
pela ordem ética no âmago do Direito das Sucessões. Este zelo, consiste em sintetizar
a afeição real ou presumida do falecido com os herdeiros ou legatários.
O doutrinador Sílvio Venosa salienta que, no entanto,
[...] o sucessor, chamado pela ordem de vocação hereditária, pode praticar
atos indignos dessa condição de afeto e solidariedade humana. É moral e
lógico que quem pratica atos de desdouro contra quem lhe vai transmitir uma
herança torna-se indigno de recebe-la55.

Sobre esse mesmo viés, discorre Carlos Roberto Gonçalves:


A quebra dessa afetividade, mediante a prática de atos inequívocos de
desapreço e menosprezo para com o autor da herança, e mesmo de atos
reprováveis ou delituosos contra a sua pessoa, torna o herdeiro ou legatário
indignos de recolher os bens hereditários56.

A doutrinadora Maria Helena Diniz ainda ressalta, sobre os preceitos éticos


da indignidade. Nas palavras da autora:
[...] repugna a ordem jurídica como à moral que alguém venha auferir
vantagem do patrimônio da pessoa que ofendeu. Deveras, a sucessão
hereditária baseia-se na afeição real ou presumida do falecido para com o
herdeiro ou legatário; se este último, por atos inequívocos, demonstrar
ingratidão, desapreço ou ausência de sentimento afetivo para com o de cujus,
nada mais justo do que privá-lo do que lhe caberia em razão do óbito do autor
da herança57.

O ordenamento jurídico vigente, ao permitir o afastamento desses da


respectiva herança ou legado, faz um juízo de reprovação, em função da lesividade
da conduta praticada.
Embora haja similitudes entre os institutos da deserdação e da indignidade,
qual seja, excluir da sucessão aquele que pratica atos condenáveis contra o falecido,
pode-se afirmar que ambos diferem em sua estrutura.
Sobre o tema, Carlos Roberto Gonçalves salienta,
Ambos os institutos tem o mesmo fundamento, qual seja, a “vontade” do de
cujus, com a diferença que, para a indignidade, o fundamento é vontade
_____________
55 VENOSA, Sílvio de Salvo. op. cit., p.53.
56 GONÇALVES, Carlos Roberto. op. cit., p. 93.
57 DINIZ, Maria Helena. op. cit., p. 50.
28

presumida, enquanto a deserdação só pode fundar-se na vontade expressa


do testador58.

Como supramencionado, herdeiros ou legatários podem ser privados de


recolher os bens hereditários, caso venham a cometer determinados atos ofensivos
contra de cujus, e/ou atos reprováveis contra a família deste.
No capítulo V, do Código Civil de 2002, sob a epígrafe “Dos Excluídos da
Sucessão”, estão expressos os crimes aos quais, se cometidos, poderão privar do
direito sucessório herdeiros ou legatários59.
Nos casos envolvendo a deserdação é o próprio autor da herança quem pune
o responsável, por meio de testamento, cabendo ao herdeiros remanescentes provar
os motivos que deram causa à deserdação60. Diz-se, sobre o instituto da deserdação
que prevalece a vontade expressa do testador.
Desse modo, leciona de Sílvio Venosa, salientando que,
[...] só existe deserdação no testamento, e seu fim específico é afastar os
herdeiros necessários da herança, suprimindo-lhes qualquer participação,
tirando-lhes a legítima, ou seja, a metade da herança que, afora tal situação,
não pode ser afastada pelo testamento”61.

Todavia, no instituto da indignidade, o herdeiro ou legatário só poderá ser


excluído da sucessão por sentença judicial, como expressa o art. 1.815, do Código
Civil.62 Desse modo, presume-se que o autor da herança agiria de tal forma,
impedindo que o indigno usufrua da herança ou legado, o qual seria produto de seu
ato.
Entretanto, não é qualquer delito que poderá acarretar a exclusão da herança

_____________
58 GONÇALVES, Carlos Roberto. op. cit., p. 102.
59 Lei 10.406/02 - Art. 1.814: São excluídos da sucessão os herdeiros ou legatários:
I - que houverem sido autores, co-autores ou partícipes de homicídio doloso, ou tentativa deste,
contra a pessoa de cuja sucessão se tratar, seu cônjuge, companheiro, ascendente ou descendente;
II - que houverem acusado caluniosamente em juízo o autor da herança ou incorrerem em crime
contra a sua honra, ou de seu cônjuge ou companheiro;
III - que, por violência ou meios fraudulentos, inibirem ou obstarem o autor da herança de dispor
livremente de seus bens por ato de última vontade.
60 Lei 10.406/02 - Art. 1.965: Ao herdeiro instituído, ou àquele a quem aproveite a deserdação,

incumbe provar a veracidade da causa alegada pelo testador.


Parágrafo único. O direito de provar a causa da deserdação extingue-se no prazo de quatro anos, a
contar da data da abertura do testamento.
61 VENOSA, Sílvio de Salvo. op. cit., p.53.
62 Lei 10.406/02 - Art. 1.815: A exclusão do herdeiro ou legatário, em qualquer desses casos de

indignidade, será declarada por sentença”.


§ 1o O direito de demandar a exclusão do herdeiro ou legatário extingue-se em quatro anos,
contados da abertura da sucessão.
§ 2o Na hipótese do inciso I do art. 1.814, o Ministério Público tem legitimidade para demandar a
exclusão do herdeiro ou legatário.
29

por indignidade, mas apenas os descritos no rol do artigo 1.814, do referido diploma
legal.
De acordo com a doutrina de Carlos Roberto Gonçalves,
O Código Civil de 2002 continua a tratar a deserdação como um instituto de
sucessão testamentária, e, dessa forma, é possível afirmar que a indignidade
é um instituto de sucessão legítima, malgrado possa alcançar também o
legatário, enquanto a deserdação só pode ocorrer na sucessão
testamentária, pois depende de testamento, com expressa declaração de
causa63.

O Código Civil, aduz ainda, em seu art. 1.961, que os herdeiros necessários
podem ser privados de sua legítima, ou deserdados, em todos os casos em que
podem ser excluídos da sucessão.
Ademais, os artigos subsequentes mencionam outras hipóteses em que o
testador poderá afastar da linha sucessória os herdeiros legítimos, tais como ofensa
física, injúria grave, entre outros64.
Outrossim, o art. 1.964, do Código Civil, determina que a deserdação só
poderá ocorrer com expressa declaração de causa. Ao inserir o referido artigo no
diploma legal vigente, o legislador busca evitar formas de abusos do que podem
ocorre por parte do testador.

2.4.2 Características da indignidade


Em análise etimológica da palavra “indignidade”65, descobre-se que o
vocábulo é oriundo do latim indignus, que significa “desprezível; vil; torpe; aquele que
não é digno”; ao contrário do vocábulo “digno”66, do latim dignus, que possui os
sinônimos de “merecedor, que tem dignidade, hábil, capaz”.
Como outrora mencionado, a indignidade é o instituto pelo qual exclui-se o
herdeiro ou legatário, que cometer falta grave contra o autor da herança e/ou contra
membros da sua família, de receber o acervo hereditário.

_____________
63 GONÇALVES, Carlos Roberto. op. cit., p. 103.
64 Lei 10.406/02 - Art. 1.962: Além das causas mencionadas no art. 1.814, autorizam a deserdação
dos descendentes por seus ascendentes:
I - ofensa física;
II - injúria grave;
III - relações ilícitas com a madrasta ou com o padrasto;
IV - desamparo do ascendente em alienação mental ou grave enfermidade.
65 INDIGNO. In: DICIONÁRIO WEB. Disponível em: <http://www.dicionarioweb.com.br/digno/>. Último

acesso em set de 2019.


66 DIGNO. In: DICIONÁRIO WEB. Disponível em: <http://www.dicionarioweb.com.br/digno/>. Último

acesso em set de 2019.


30

Em tempos remotos, a indignidade estava intimamente ligada ao conceito de


deserdação.
Sobre o tema, nas palavras de Sílvio Venosa,
[...] No direto romano, o autor da herança podia afastar de sua sucessão o
herdeiro mediante uma deserdação, que era, a princípio, completamente
livre. Posteriormente, já com Justiniano é que as hipóteses são limitadas.
Sobre esse conceito de deserdação se enxerta posteriormente a
indignidade67.

Hodiernamente, as causas que autorizam a exclusão de herdeiros ou


legatários estão expressos sob o rol do art. 1.814, do Código Civil, resumidos em
crimes contra a vida, a honra e a liberdade do de cujus ou integrantes da sua família.
A doutrinadora Maria Helena Diniz destaca, que por se tratar de uma pena
civil, “a exclusão por indignidade só pode ocorrer nos casos expressamente
mencionados em lei, não comportando interpretação extensiva ou aplicação analógica
ante o princípio nulla poena sine lege”68.
No tocante a propositura de ações que visem a declaração de herdeiro
indigno, sabe-se é necessário sua propositura por herdeiros interessados.
Neste viés, ressalta Daniella de Almeida e Silva:
Atualmente, para que ocorra a exclusão do herdeiro indigno é necessário que
terceiros interessados na sucessão proponham ação específica de exclusão,
a chamada Ação de Indignidade, a qual irá declarar a exclusão por sentença
nos termos do artigo 1.815 do Código Civil. Ressalte-se, ainda, que os
interessados em propor a ação podem ser o herdeiro ou legatário favorecido
com a exclusão do indigno e o credor prejudicado com a inércia dos demais
interessados69.

Ademais, conforme leciona Maria Helena Diniz,


A exclusão do herdeiro ou legatário por indignidade não é arbitrária nem se
dá ipso iure. É imprescindível o pronunciamento da indignidade por sentença
proferida, por ser matéria de alta indagação, em ação ordinária (CC, art.
1.815), movida, em regra, contra o herdeiro, que praticou ato insidioso
passível de excluí-lo da herança, por quem tenha legítimo interesse (CPC,
art. 3° e 6°) na sucessão, isto é, co-herdeiro, legatário, donatário, fisco, ou
melhor, o Município, o Distrito Federal ou a União (na falta de sucessores
legítimos e testamentários) e qualquer credor, prejudicado com a inércia
desses interessados [...]70.

_____________
67 VENOSA, Sílvio de Salvo. op. cit., p.53.
68 DINIZ, Maria Helena. op. cit., p. 53.
Nulla poena sine lege: Não haverá pena sem prévia cominação legal.
69 SILVA. Daniella de Almeida e, Os herdeiros que perdem seus direitos. Migalhas. 2019. Disponível

em: <https://www.migalhas.com.br/dePeso/16,MI116049,41046-
Os+herdeiros+que+perdem+seus+direitos>. Último acesso em set de 2019.
70 DINIZ, Maria Helena. op. cit., p. 54.
31

Conforme aludido, o Estado é legitimado a propor ação que vise à exclusão


do indigno, caso não haja sucessor mais próximo a fazê-lo.
Sobre o tema, Sílvio Venosa sublinha que “seria absurdamente imoral que se
permitisse que um filho patricída71 ou matricída72 herdasse dos falecidos pai ou mãe,
só porque não havia parente próximo algum intitulado para afastá-lo da sucessão”73.
Outrossim, com a entrada em vigor da Lei 13.532/17, o Ministério Público
passa a ter legitimidade para solicitar à exclusão do herdeiro por indignidade, sempre
que presente os crimes previstos no rol do artigo 1.815, do Código Civil.
Entretanto, em tempos pretéritos, doutrinadores divergiam quanto a
legitimidade do Ministério Público em propor Ações de Declaração de Indignidade,
como se observa na obra de Carlos Roberto Gonçalves, que menciona,
[...] se o herdeiro legítimo ou testamentário assassinou o hereditando, mas as
pessoas a quem sua exclusão beneficiaria preferissem manter-se silentes o
assassino não perderia a condição de herdeiro e receberia os bens da
herança, não podendo a sociedade, através do Ministério Público, impedir tal
solução74.

Contrapondo a ideia não permissiva de legitimidade do Parquet na propositura


de ações, Maria Helena Diniz aponta que
[...] o Ministério Público poderia também propô-la, por ser o guardião da
ordem jurídica (CF, art. 127) e pelo fato de haver interesse social e público
de evitar que herdeiro ou legatário desnaturado receba vantagem,
beneficiando-se da fortuna deixada pela sua vítima75.

Importante mencionar que, de acordo com o enunciado de número 116 do


STJ, o Ministério Público, por força do art. 1.815 do novo Código Civil, desde que
presente o interesse público, tem legitimidade para promover ação visando a
declaração de indignidade de herdeiro ou legatário.
Destarte, visando dirimir tais discussões, será apresentado em capítulo
próprio, as questões envolvendo a vigência da norma que legitimou o Ministério
Público a propor ações que visem a declaração de indignidade do herdeiro ou
legatário.
Por fim, o referido código, em seu artigo 1.815, parágrafo 1°, estabelece o
prazo decadencial de 4 (quarto) anos para que os interessados exerçam seu direito

_____________
71 Aquele que comete patricídio: crime cometido pelo indivíduo que mata o próprio pai.
72 Aquele que comete matricídio: crime cometido pelo indivíduo que mata a própria mãe.
73 VENOSA, Sílvio de Salvo. op. cit., p.54.
74 GONÇALVES, Carlos Roberto. op. cit., p. 106.
75 DINIZ, Maria Helena. op. cit., p. 54.
32

de demandar a exclusão de herdeiro ou legatário, a contar da abertura da sucessão.

2.5 Dos delitos passíveis de declaração de indignidade

2.5.1 Herdeiro atuando como autor, coautor ou partícipe


Como outrora mencionado, é passível de exclusão de herdeiro ou legatário da
ordem vocacional ou de testamento, respectivamente, caso esse venha a agir de
acordo com o rol taxativo do artigo 1.814 do Código Civil, resumidos em crimes contra
a vida, a honra e a liberdade do de cujus ou integrantes da sua família.
O inciso I, do aludido artigo, considera indignos aqueles que houverem sido
autores, coautores ou partícipes de homicídio doloso, ou tentativa deste, contra a
pessoa de cuja sucessão se tratar, cônjuge, companheiro, ascendente ou
descendente.
Sobre o tema, discorre Carlos Roberto Gonçalves:
O Código de 2002, aperfeiçoando a redação do dispositivo, não mais se
refere a “cúmplices”, como fazia o inciso I do art. 1.595 do Código Civil de
1916, mas em “coautores ou partícipes”, nem em ‘homicídio voluntário’, mas
em ‘homicídio doloso’. Não se exige que o herdeiro seja ator do homicídio ou
tentativa deste. A sua participação no crime como coautor ou partícipe, por
qualquer forma, é suficiente para comprometê-lo76.

Trata-se do crime de maior gravidade contra o autor da herança ou de


membros família deste.
Ademais, Maria Helena Diniz enfatiza que há casos em que não poderá ser
solicitado em juízo a exclusão de herdeiro, devido à falta de algum elemento essencial
na configuração do crime.
Não se estende, no caso, ao homicídio culposo por imprudência, imperícia ou
negligência, como ainda não tem cabimento no erro in personai; na aberractio
ictus (CP, art. 20, §3°); nos casos de: legítima defesa, estado de necessidade,
exercício regular de um direito, loucura ou embriaguez (CP, arts. 23, I a III,
26 e 28, III). Em todas essas circunstâncias o ato lesivo não é voluntário, para
efeito de afastar o agente da sucessão, visto que o dolo é elementar na
determinação da causa da exclusão; daí não se pode cogitar de qualquer
situação em que a perda da vida resultou de uma ausência de animus
necandi77.

Outrossim, sendo o autor do crime pessoa inimputável, faltando dessa forma


uma das elementares do crime, não há que se falar em possibilidade de declaração
de indignidade.

_____________
76 GONÇALVES, Carlos Roberto. op. cit., p. 95.
77 DINIZ, Maria Helena. op. cit., p. 50.
33

Infere-se que a norma sucessória não prevê a condenação criminal, bastando


o conhecimento no juízo cível e a sentença do magistrado declarando a indignidade
para que seja afastada a possibilidade de recebimento da herança.
Evidentemente que, caso o magistrado não possua convicção sobre autoria,
coautoria ou participação no crime, poderá aguardar as conclusões do juízo criminal
para prolatar sua decisão, como prevê o art. 315, do Código de Processo Civil 78.
Entretanto, se o juízo criminal decidir pela inexistência do fato delituoso ou a
declaração de não participação do acusado no delito, não há que se falar em
condenação e, por isso, fará coisa julgada no juízo civil.

2.5.2 Do delito contra a honra


Sabe-se que a vida é o bem mais precioso de uma pessoa. Contudo, a
imagem e a honra também integram o patrimônio moral de todo indivíduo. Diante
disso, o legislador, pensando na proteção aos direitos de personalidade, faz proteção
ao autor da herança, afastando o agressor do direito de sucessão.
O art. 1.814, II, do Código Civil apresenta a seguinte redação:
II – que houverem acusado caluniosamente em juízo o autor da herança ou
incorrerem em crime contra a sua honra, ou de seu cônjuge ou companheiro.

O referido inciso refere-se aos art. 339 (denunciação caluniosa), 138 (calúnia),
139 (difamação) e 140 (injúria), todos presentes no Código Penal Brasileiro.
O doutrinador Sílvio Venosa assim ensina:
[...] a denunciação caluniosa constitui-se no fato de alguém dar causa à
instauração de investigação policial ou processo judicial contra outrem,
imputando-lhe crime de que sabe ser inocente. Os reflexos devem atingir o
juízo criminal, ainda que a imputação tenha sido veiculada no juízo cível.
Aqui, pela dicção legal, não há necessidade de condenação criminal79.

Destarte, referindo a lei aos herdeiros ou legatários que houverem acusado


caluniosamente em juízo ou incorrerem em crime, torna-se claro à necessidade de
condenação criminal para a decisão de afastar o herdeiro da sua referida herança.

_____________
78 Código de Processo Civil - Art. 315. Se o conhecimento do mérito depender de verificação da
existência de fato delituoso, o juiz pode determinar a suspensão do processo até que se pronuncie a
justiça criminal.
§ 1o Se a ação penal não for proposta no prazo de 3 (três) meses, contado da intimação do ato de
suspensão, cessará o efeito desse, incumbindo ao juiz cível examinar incidentemente a questão prévia.
§ 2o Proposta a ação penal, o processo ficará suspenso pelo prazo máximo de 1 (um) ano, ao final do
qual aplicar-se-á o disposto na parte final do § 1o.
79 VENOSA, Sílvio de Salvo. op. cit., p.61.
34

2.5.3 Casos de violência ou fraude


Encerra as causas de exclusão a prática de violência ou fraude contra o autor
da herança, apta a inibir ou obstar a livre manifestação de vontade do falecido.
Procurando punir os que assim agirem, o legislador pátrio consagrou no rol do
art. 1.814, especificadamente, no inciso III, do referido artigo que serão excluídos da
sucessão os herdeiros ou legatário que:
III – por violência ou meios fraudulentos, inibirem ou obstarem o autor da
herança de dispor livremente de seus bens por ato de última vontade.

Em situações em que o autor preparou-se ao futuro, programando a quem


deixaria sua herança, via testamento, faz-se notório que a autonomia da vontade
esteja presente na norma sucessória. Caso esta seja corrompida, não deverá o
indivíduo, causador de afronta a livre vontade do testador, receber o quinhão
desejado.
Sobre o tema, assim leciona Maria Helena Diniz:
O Código Civil, ao prescrever essa causa de indignidade, teve por escopo
defender a liberdade de disposição do de cujus, punindo o herdeiro que,
fraudulenta, dolosa ou coativamente, praticar atos, omissões, corrupção,
alterações, falsificação, inutilização, ocultação, atentando contra essa
liberdade ou obstando a execução do ato de última vontade 80.

A questão da fraude aponta para um engodo elaborado pelo agente a fim de


encantar o autor da herança, podando-lhe o entendimento e viciando sua livre
vontade. Faz-se necessário destacar que a fraude deve ser conexa com o dolo, desta
forma, o ofensor deverá agir com fraude na intenção de provocar o resultado
esperado, ou seja, ser um dos sucessores do autor da herança a partir de sua ação
de má-fé.

2.6 Efeitos da indignidade


Transitado em julgado a ação que determine a exclusão de herdeiro por
indignidade, sobre o excluído decairá determinados efeitos, como expressa o artigo
1.816, do Código Civil. São eles, a) a pessoalidade dos efeitos da decisão; b) os
efeitos ex tunc à data da abertura da sucessão; c) o declarado indigno não terá direito
ao usufruto e administração dos bens que passem aos filhos menores.
O referido artigo 1.816, dispõe que “os descendentes do herdeiro excluído

_____________
80 DINIZ, Maria Helena. op. cit., p. 50.
35

sucedem, como se ele morto fosse antes da abertura da sucessão”81, ou seja, os


descendentes do herdeiro declarado indigno mantêm-se na posição de receber seu
quinhão hereditário. Isto ocorre devido a sanção referir-se a pessoa certa e
determinada. Desta forma, a punição é pessoal, personalíssima, e não para a
descendência.
Nas palavras de Carlos Roberto Gonçalves,
A exclusão, tendo por natureza punitiva, não pode assim prejudicar os
descendentes daquele que foi excluído pela sentença de indignidade, e o
sucedem, por representação, como se o indigno morto fosse82.

Neste sentido, leciona Maria Helena Diniz:


[...] equipara-se, portanto, ao herdeiro pré-morto, hipótese em que se abre a
exceção do princípio de direito sucessório de que não se pode representar
pessoa viva (viventis nulla est representatio). Com isso, acata-se o princípio
constitucional da responsabilidade pessoal (CF, art. 5°, XLV) e a velha
parêmia: nullum patris declitum innocenti filio poena est (nenhum crime do pai
pode prejudicar o filho inocente)83.

Os bens que o indigno receberia como herança retornam para os herdeiros


que herdariam caso este fosse falecido no momento da abertura da sucessão.
Todavia, destaca Maria Helena Diniz que “a substituição do excluído da
sucessão ocorre tão-somente na linha reta descendente; assim sendo, não poderá
ser sucedido pelos ascendentes ou colaterais”84.
No tocante aos efeitos da sentença declaratória de indignidade, sabe-se que
esta possui efeitos ex tunc, ou seja, seus efeitos retroagem até a data da abertura da
sucessão, pois, considera-se o indigno como pré-morto ao hereditando, e os herdeiros
o sucedem como se ele morto fosse.
Sobre o tema, Carlos Roberto Gonçalves ressalta que,
[...] embora se reconheça a aquisição da herança pelo indigno, no momento
da abertura da sucessão, o legislador, por ficção legal, determina a retroação
dos efeitos da sentença, para considerar o indigno como pré-morto ao
hereditando. Como consequência, o excluído da sucessão é obrigado a
restituir os frutos e rendimentos que dos bens da herança houver percebido,
mas tem direito a ser indenizado das benfeitorias com a conservação deles
(CC, art. 1.817, parágrafo único) para que não ocorra o enriquecimento sem
causa dos seus sucessores85.
_____________
81 Lei10.406/02 – Art. 1.816: São pessoais os efeitos da exclusão; os descendentes do herdeiro
excluído sucedem, como se ele morto fosse antes da abertura da sucessão.
Parágrafo único. O excluído da sucessão não terá direito ao usufruto ou à administração dos bens
que a seus sucessores couberem na herança, nem à sucessão eventual desses bens.
82 GONÇALVES, Carlos Roberto. op. cit., p. 110.
83 DINIZ, Maria Helena. op. cit., p. 56.
84 DINIZ, Maria Helena. op. cit., mesma pag.
85 GONÇALVES, Carlos Roberto. op. cit., p. 111.
36

Da mesma maneira, importante destacar que não se confundem o reembolso


das despesas necessárias para com a conservação dos bens hereditários, com o
próprio direito hereditário do excluído, visto que o Código Civil, em seu art. 884,
expressa que a ninguém é lícito locupletar-se à custa de outrem86.
Não obstante o herdeiro indigno deva restituir os frutos percebidos desde o
momento da abertura da sucessão, o efeito retroativo, todavia, não poderá causar
prejuízos a terceiros de boa-fé, entretanto, “aos herdeiros subsiste, quando
prejudicados, o direito de demandar-lhe perdas e danos”87.
Em que pese o art. 1.689, incisos I e II, determinem que “pai e mãe, no
exercício do poder familiar, são usufrutuários e administradores dos bens dos filhos”88,
o legislador procurou evitar que, mesmo sendo declarado indigno, o excluído pudesse
se aproveitar dos bens hereditários dele afastados.
Neste diapasão, o art. 1.816, parágrafo único, do Código Civil, revela a
atenção do legislador na punição ao excluído, “não restando a ele o usufruto ou a
alienação dos bens que a seus sucessores couberem na herança, nem à sucessão
eventual desses bens”89.
Sobre o tema, destaca Carlos Roberto Gonçalves,
Não fosse a regra em apreço o indigno poderia tirar proveito, indiretamente,
das rendas produzidas pela herança da qual foi afastado por ingratidão. O
propósito do legislador é impedir que tal aconteça. Da mesma intenção se
acha este imbuído quando estabelece, no mesmo artigo, que o indigno não
poderá suceder nos bens de que foi excluído90.

_____________
86 Lei 10.406/02 - Art. 884: Aquele que, sem justa causa, se enriquecer à custa de outrem, será
obrigado a restituir o indevidamente auferido, feita a atualização dos valores monetários.
Parágrafo único. Se o enriquecimento tiver por objeto coisa determinada, quem a recebeu é obrigado
a restituí-la, e, se a coisa não mais subsistir, a restituição se fará pelo valor do bem na época em que
foi exigido.
87 Lei 10.406/02 – Art. 1.817: Art. 1.817. São válidas as alienações onerosas de bens hereditários a

terceiros de boa-fé, e os atos de administração legalmente praticados pelo herdeiro, antes da


sentença de exclusão; mas aos herdeiros subsiste, quando prejudicados, o direito de demandar-lhe
perdas e danos.
Parágrafo único. O excluído da sucessão é obrigado a restituir os frutos e rendimentos que dos bens
da herança houver percebido, mas tem direito a ser indenizado das despesas com a conservação
deles.
88 Lei 10.406/02 – Art.1.689: O pai e a mãe, enquanto no exercício do poder familiar:

I - são usufrutuários dos bens dos filhos;


II - têm a administração dos bens dos filhos menores sob sua autoridade.
89 Lei 10.406/02 - Art. 1.816: São pessoais os efeitos da exclusão; os descendentes do herdeiro

excluído sucedem, como se ele morto fosse antes da abertura da sucessão.


Parágrafo único. O excluído da sucessão não terá direito ao usufruto ou à administração dos bens
que a seus sucessores couberem na herança, nem à sucessão eventual desses bens.
90 GONÇALVES, Carlos Roberto. op. cit., p. 111.
37

Importante enfatizar que os bens pelos quais haverá restrição aos curadores,
referem-se, única e exclusivamente, aos bens da herança ao qual o herdeiro foi
excluído.
Conclui-se que, uma vez excluído, o herdeiro declarado indigno por sentença
judicial estará sempre nessa situação.

2.7 Reabilitação do indigno


O ordenamento jurídico brasileiro, prevê, no rol do artigo 1.818, do Código
Civil, as possibilidades da reabilitação do excluído por indignidade e a consequente
admissão do declarado indigno ao direito de suceder91.
Nas palavras de Sílvio Venosa,
[...] o ofendido por uma das causas de indignidade, é o primeiro e o melhor
juiz para saber se a pena deve ser aplicada. Daí por que pode ele perdoar o
ofensor. Esse perdão é ato formal e privativo da vítima. Só o próprio ofendido
pode fazê-lo. Ninguém o fará por ele: é ato personalíssimo por excelência,
além de ato autêntico, citado pela lei (art. 1.818)92.

Ademais, enfatiza Railma Marrone Pereira Silva,


Tal hipótese está condicionada à expressa declaração do ofendido, mediante
testamento ou outro ato autêntico, como a escritura pública, de que, não
obstante a ofensa sofrida, o ofensor deve ser chamado a gozar os benefícios
da sucessão. E uma vez concedido o perdão, este será irretratável, não mais
se reconhecendo aos coerdeiros legitimação para intentar a ação de
exclusão93.

Como acima mencionado, qualquer escrito público do ofendido, contra qual


não haja suspeitas de sua autenticidade, tornará o documento valido para que
herdeiro autor de atos considerados indignos seja restabelecido na sua capacidade
de herdar.
Hodiernamente, a doutrina entende que, “mesmo o testamento sendo
anulado, por qualquer vício de forma, que não vício de vontade, não há porque negar
_____________
91 Lei 10.406/02 - Art. 1.818: Aquele que incorreu em atos que determinem a exclusão da herança
será admitido a suceder, se o ofendido o tiver expressamente reabilitado em testamento, ou em outro
ato autêntico.
Parágrafo único. Não havendo reabilitação expressa, o indigno, contemplado em testamento do
ofendido, quando o testador, ao testar, já conhecia a causa da indignidade, pode suceder no limite da
disposição testamentária.
92 VENOSA, Sílvio de Salvo. op. cit., p.57.
93 SILVA, Railma Marrone Pereira, A legitimação do Ministério Público para a propositura da ação civil

de indignidade. Âmbito Jurídico, 2013. Disponível em: <https://ambitojuridico.com.br/cadernos/direito-


civil/a-legitimacao-do-ministerio-publico-para-a-propositura-da-acao-civil-de-indignidade/>. Último
acesso em set de 2019.
38

eficácia a vontade que perdoou o indigno”94.


Assim também entende o doutrinador Carlos Roberto Gonçalves,
mencionando que, “desse modo, mesmo revogado o testamento que contém o
perdão, permanece válida a cláusula que reabilita o indigno”95.
Entretanto, para que haja validade do testamento ou outro determinado
instrumento público, deverá ser autenticada pelo escrivão. Ademais,
Não têm valor, para esse fim, escritura particular; declarações verbais ou do
próprio punho, embora corroboradas por testemunhas; cartas ou quaisquer
outros atos que revelem reconciliação ou propósito de clemência96.

Em que pese, o aludido parágrafo único do referido artigo preveja que não
havendo reabilitação expressa, o indigno, contemplado em testamento do ofendido,
quando o testador, ao testar, já conhecia a causa da indignidade, pode suceder no
limite da disposição testamentária.
Ao conceder o perdão ao indigno, o autor da herança evita que outros
interessados na herança excluam o referido herdeiro da sucessão, após a abertura
desta. Entende-se, dessa forma, que ninguém melhor que o próprio autor da herança
para mensurar a intensidade da ofensa praticada.

_____________
94 VENOSA, Sílvio de Salvo. op. cit., p.58.
95 GONÇALVES, Carlos Roberto. op. cit., p. 108.
96 GONÇALVES, Carlos Roberto. op. cit., p. 108.
39

CAPITULO 3

3 DA ATUAÇÃO DO MINISTÉRIO PÚBLICO

3.1 O conceito da Instituição do Ministério Público na CF/88


A Constituição Federal de 1988 elevou o status do Ministério Público à nível
de instituição independe, concedendo ao Parquet um capítulo próprio no corpo do seu
texto de Lei Maior.
No capítulo denominado “Das funções essenciais à justiça”, está descrito à
organização, as atribuições e as garantias do Parquet.
Evidente a intenção do Constituinte Originário em desvincular a referida
instituição dos demais Poderes da União – Legislativo, Executivo e Judiciário.
Neste contexto, Gomes ensina que “o Ministério Público constitui um órgão do
Estado, que exerce função tipicamente administrativa e possui algumas garantias
efetivas de Poder, no entanto, não integra nenhum dos três Poderes”97.
O conceito de Ministério Público está expresso na Constituição da República,
em seu artigo 127, e estabelece que se trata de uma Instituição permanente, essencial
à função jurisdicional do Estado, além de imprescindível à defesa da ordem jurídica,
à manutenção do regime democrático e dos interesses sociais e individuais
indisponíveis98.
Nas palavras de Andreatta compreendemos que:
[...] o Ministério Público é órgão permanente, com independência funcional e
administrativa, essencial ao Estado Democrático, uma vez que defende os
interesses da coletividade, passando a ser órgão de proteção das liberdades
públicas constitucionais, da defesa de direitos indisponíveis, da garantia do
contraditório99.

Além disso, no tocante a indivisibilidade da instituição, o Procurador do

_____________
97 GOMES, Rodrigo Jimenez. A investigação criminal e a atuação do Ministério Público. PUC– São
Paulo. 2009. p.72
98 Art. 127 - O Ministério Público é instituição permanente, essencial à função jurisdicional do Estado,

incumbindo-lhe a defesa da ordem jurídica, do regime democrático e dos interesses sociais e individuais
indisponíveis.
§ 1º São princípios institucionais do Ministério Público a unidade, a indivisibilidade e a independência
funcional.
§ 2º Ao Ministério Público é assegurada autonomia funcional e administrativa, podendo, observado o
disposto no art. 169, propor ao Poder Legislativo a criação e extinção de seus cargos e serviços
auxiliares, provendo-os por concurso público de provas ou de provas e títulos, a política
remuneratória e os planos de carreira; a lei disporá sobre sua organização e funcionamento”.
(Redação dada pela Emenda Constitucional n. 19, de 1998).
99 ANDREATTA, Lucas Henrique Padovan. op. cit. p. 17.
40

Trabalho, Fábio Goulart Villela salienta:


Ao se reportar à expressão “instituição permanente”, o legislador constituinte
deixa claro que o Ministério Público consiste em instituição por meio da qual
o Estado manifesta a sua soberania, sendo indispensável à construção do
projeto democrático, o que afastaria a possibilidade de sua supressão por
parte do legislador constituinte derivado100.

Ademais, de acordo com o supramencionado dispositivo constitucional, ao


Ministério Público é assegurada autonomia funcional e administrativa, podendo,
observado o disposto no art. 169 da CF/88, propor ao Poder Legislativo a criação e
extinção de seus cargos e serviços auxiliares.

3.2 Funções Jurisdicionais


Como outrora mencionado, a Constituição da República do Brasil, em seu
Título IV, artigo 127, explicita que o Instituto do Ministério Público desempenha à
função essencial à justiça.
Além disso, expressa que o Ministério Público é incumbido da defesa da
ordem jurídica, do regime democrático e dos interesses sociais e individuais
indisponíveis.
Caberá ao Ministério Público atuar como fiscal da lei, sempre que em
determinado processo haja a questão de interesse público.
Todavia, importante frisar que o Parquet, quando não atuar como parte do
processo, atuará apenas, como fiscal da Lei, o chamado custus legis do Estado.
Em que pese a Constituição da República mencione a essencialidade da
atuação do Ministério Público aos processos judiciais, não significa dizer que seus
membros deverão atuar em todos os processos. Todavia, sua essencialidade decorre
da busca da efetivação da “justiça”.
Neste sentido, embora esteja inserido no âmbito do sistema de justiça, cabe
enfatizar que o Ministério Público é uma instituição independente, dessa forma, como
aludido, não está subordinada a nenhum dos Poderes da República.
Tal independência proporciona total autonomia para o cumprimento de suas
funções constitucionais.
Dessa forma, compreende-se que o Parquet não intervém em todos os

_____________
100 VILLELA, Fábio Goulart. As formas de atuação do Ministério Público do Trabalho no regime
democrático. Revista Consultor Jurídico, novembro de 2015. Disponível em: <
https://www.conjur.com.br/2015-nov-21/fabio-villela-formas-atuacao-ministerio-publico-
trabalho#_ftn2>. Último acesso em set de 2019.
41

processos judiciais que tramitam no âmago do Poder Judiciário, mas, tão somente
àqueles aos quais possui legitimidade.

3.3 Defesa da ordem jurídica


No tocante a defesa da ordem jurídica, atribuído ao Parquet pela Constituição
Federal, deve-se analisar o sentido amplo da expressão, visto que seus membros
deverão atuar não somente na observância da lei da expressa, mas também em
outras funções, desde que compatíveis com a sua finalidade, ora atuando como órgão
agente, ora na condição de órgão interveniente.
Destarte, o Procurador do Trabalho, Fábio Villela, enfatiza que a característica
da essencialidade deverá ser analisada com duplo enfoque: o restritivo e ampliativo:
[...] Sob o aspecto restritivo, a atuação do Ministério Público não se faz
presente em todos os feitos que estejam em trâmite no Judiciário, mas tão
somente naqueles em que haja o interesse público primário subjacente à lide.
[...] Por “interesse público primário” entende-se aquele de cunho
eminentemente social, seja pela natureza da lide e/ou pela qualidade da
parte, concernente a valores relevantes à sociedade como um todo, e não o
pontual e momentâneo do administrador público, denominado de “interesse
público secundário”. Sob o prisma ampliativo, a atuação do Parquet não se
restringe à intervenção em processos judiciais, destacando-se duas outras
importantes formas de exercício de suas funções institucionais: a promoção
de interesses e as atividades de órgão agente, além dos procedimentos de
mediação e de arbitragem.

Neste contexto, observa-se que, evidentemente, a função exercida pelo


Parquet é de extrema importância para a busca da aplicabilidade da justiça em todo o
ordenamento jurídico brasileiro, ora atuando na promoção de interesses, ora atuando
como órgão agente.

3.4 Defesa do regime democrático


Outra atribuição conferida ao órgão do Ministério Público pela Carta Magna é
a defesa do regime democrático.
Sobre o tema, discorre Fábio Goulart Villela:
O Ministério Público é o guardião do Estado Democrático de Direito, o que
justifica a instituição de garantias e prerrogativas para atuação independente
de seus membros. E esta atuação não se limita à defesa de direitos políticos.
Uma sociedade democrática exige o respeito da ordem jurídica pelo Estado
e pelos particulares, além da tutela dos direitos fundamentais 101.

Como é sabido a Constituição da República, promulgada em 1988, rompeu

_____________
101 Villela, Fábio Goulart. op. citado.
42

com a ditadura antecedente, criando uma marco histórico na sociedade brasileira: a


saída do poder das mãos dos militares, para o Governo nas mãos do povo, a chamada
“res pública”, ou coisa do povo.
Assim, naturalmente destinou-se ao Ministério Público aquilo que de maior
valor tem em um Regime Democrático: a defesa da própria ordem democrática.
O Procurador de Justiça do Estado de São Paulo, Hugo Mazzili, leciona:
[...] A rigor, portanto, o Ministério Público pode existir seja num regime
autoritário, seja num regime democrático; poderá ser forte tanto num, quanto
noutro caso; porém, só será verdadeiramente independente num regime
essencialmente democrático, porque não convém a governo totalitário algum
que haja uma instituição, ainda que do próprio Estado, que possa tomar, com
liberdade, a decisão de acusar até mesmo os próprios governantes ou de não
processar os inimigos deste último”102.

Algumas das hipóteses de atuação do MP no tocante a defesa da ordem


democrática estão expressamente dispostas no art. 129 da CF/88, tal como segue:
Art. 129. São funções institucionais do Ministério Público:
II - zelar pelo efetivo respeito dos Poderes Públicos e dos serviços de
relevância pública aos direitos assegurados nesta Constituição, promovendo
as medidas necessárias a sua garantia;
III - promover o inquérito civil e a ação civil pública, para a proteção do
patrimônio público e social, do meio ambiente e de outros interesses difusos
e coletivos;
IV - promover a ação de inconstitucionalidade ou representação para fins de
intervenção da União e dos Estados, nos casos previstos nesta
Constituição103.

Outrossim, em ordem prática, poderá o Ministério Público se manifestar em


defesa do regime democrático através das ADI – Ações Diretas de
Inconstitucionalidade, como outrora mencionado.

3.5 Defesa do interesse público, sociais e dos interesses individuais


indisponíveis
Dentre as atribuições expressamente previstas na Constituição Federal ao
Ministério Público, temos a defesa dos interesses sociais e individuais indisponíveis.
Trata-se da tutela do interesse público primário, concretizada na proteção dos direitos
metaindividuais expressos no artigo 81, parágrafo único, da Lei 8.078/90104.

_____________
102 MAZZILLI, Hugo Nigro. O Ministério Público e a defesa do regime democrático. Revista Justitia,
São Paulo, vol. 180, p.139 e s., jul-dez, 1997. Disponível em: <
http://www.mazzilli.com.br/pages/artigos/mpedemocracia.pdf>. Último acesso em set 2019.
103 BRASIL. Constituição (1988). Constituição da República Federativa do Brasil. Brasília, DF:

Senado Federal: Centro Gráfico, 1988.


104 Art. 81 - A defesa dos interesses e direitos dos consumidores e das vítimas poderá ser exercida em
43

No tocante a atuação do Ministério Público no âmbito do CDC, Neto salienta


que o Parquet “tem sido o agente mais importante para a tutela de direitos
transindividuais, pois, em alguns Estados, há promotorias especializadas, tornando-o
não só competente, mas também atuante”105.
Sobre a amplitude da atuação do Parquet, ISMAIL enfatiza
[...] o Ministério Público vem ocupando lugar de cada vez mais destaque, não
apenas na organização do Estado mas na própria sociedade. Isso porque a
tutela dos direitos difusos e coletivos contribui para a legitimidade do MP
perante a população na medida em que o aproxima dos demais atores sociais
e da comunidade diretamente interessada, que projeta na instituição seus
anseios pela busca de soluções para os conflitos coletivos e sociais 106.

Neste diapasão, depreende-se da ideia constitucional de que cabe ao


Ministério Público zelar pelos interesses da sociedade, respeitando a ordem pública e
o Estado Democrático de Direito.
Em sintonia com o texto de Railma Pereira Silva
[...] o conceito clássico de interesse público resume-se no necessário
atendimento aos interesses da sociedade como um todo, perseguindo-se o
bem-estar e a satisfação de seus indivíduos, cabendo ao Ministério Público,
na sua condição de órgão do Estado, a tutela de tal interesse107.

Ainda de acordo com o autor, pode-se extrair o entendimento de que


[...] o interesse público não goza de aplicação imediata e irrestrita no nosso
ordenamento jurídico, principalmente quando em conflito com algum
interesse privado decorrente de um direito ou garantia fundamental 108.

Outrossim, alguns doutrinadores extraem desse argumento a base para

_____________
juízo individualmente, ou a título coletivo.
Parágrafo único. A defesa coletiva será exercida quando se tratar de:
I - Interesses ou direitos difusos, assim entendidos, para efeitos deste código, os transindividuais, de
natureza indivisível, de que sejam titulares pessoas indeterminadas e ligadas por circunstâncias de
fato;
II - Interesses ou direitos coletivos, assim entendidos, para efeitos deste código, os transindividuais, de
natureza indivisível de que seja titular grupo, categoria ou classe de pessoas ligadas entre si ou com a
parte contrária por uma relação jurídica base;
III - interesses ou direitos individuais homogêneos, assim entendidos os decorrentes de origem comum.
105 NETO, Pedro Jorge. O Ministério Público e as principais ações em defesa dos direitos difusos e

coletivos: uma análise evolutiva. ESMP – CE. Disponível em: <


http://www.mp.ce.gov.br/esmp/publicacoes/ed1/artigos/ministerio_publico_principais_acoes_defesa_d
ireito_difuso_e_coletivo.pdf>. Último acesso em set de 2019.
106 ISMAIL, Mona Lisa Duarte Abdo Aziz. O papel do Ministério Público no controle de políticas públicas.

Boletim Científico ESMPU, Brasília, jan./dez. 2014


107 SILVA. Railma Marrone Pereira, A legitimação do Ministério Público para a propositura da ação civil

de indignidade. 2013. Âmbito Jurídico. <


http://www.ambitojuridico.com.br/site/?n_link=revista_artigos_leitura&artigo_id=13894>. Último acesso
em out de 2019.
108 SILVA. Railma Marrone Pereira. op., citado.
44

afirmarem que, por esse motivo, não é coerente que o Ministério Público ingresse com
ações que visem a exclusão de herdeiro indigno, pois alegam não ser de bom tom a
interferência do Parquet na vida íntima e privada do núcleo familiar.
Ademais, ressaltam que, devido ao fato do direito de herança ser garantido
constitucionalmente, com previsão legal expressa no rol do artigo 5º, incisos XXX, da
Carta Magna, permanece evidente o interesse privado em detrimento do público.

3.6 Legitimidade para propositura da ação de indignidade pós-vigência da Lei


13.535/17
O Código Civil de 2002 expressa que a indignidade deve ser solicitada em
juízo, e por isso, haverá sentença que a declare, como prevê o artigo 1.815 do CC, in
verbis “a exclusão do herdeiro ou legatário, em qualquer desses casos de indignidade,
será declarada por sentença”109.
Outrossim, o referido artigo orienta sobre a prescrição do prazo salientando
que o interessado possui o prazo de quatro anos para fazê-lo. Ademais, expressa que
o prazo para o interessado ingressar com a ação solicitando a exclusão de herdeiro
se inicia a partir da abertura da sucessão.
O douto professor Orlando Gomes, salienta que “se não ocorrer o pedido,
decai o direito de fazê-lo; e somente os interessados na sucessão possuem o direito
de postular a indignidade de um dos herdeiros"110.
Entretanto, o legislador pátrio consagrou poderes ao Ministério Público para
que o Parquet tenha legitimidade para demandar a exclusão do herdeiro ou legatário,
respeitadas as hipóteses do artigo 1.814 do Código Civil de 2002.
Esta medida está prevista no corpo da Lei de n° 13.535, de 07 de dezembro
de 2017, e que altera a redação do artigo 1.815 do Código supracitado, acrescentando
o parágrafo segundo ao referido artigo111.
A partir deste novo texto, o Ministério Público está autorizado a pedir a
exclusão de direito à herança do herdeiro que violar as hipóteses previstas no art.
1.814 do Código Civil.
Anteriormente a vigência da Lei de n° 13.532/17, segundo IBDFAM:
[...] até então, era levado em consideração o artigo previsto no Código Civil
_____________
109 BRASIL. Lei n. 10.406, de 10 de jan. de 2002. Código Civil Brasileiro, Brasília, DF, jan 2002.
110 GOMES, Orlando. Sucessões. 12ª ed. Rio de Janeiro. Forense, 2004. p.36.
111 Lei 10.406/02 - Art. 1.815: [...] §2° Na hipótese do inciso I do art. 1.814, o Ministério Público tem

legitimidade para demandar a exclusão do herdeiro ou legatário.


45

de 1916, que mencionava expressamente que a exclusão poderia ser pedida


apenas por pessoas com “interesse legítimo” na sucessão, incluindo, dessa
forma, outros herdeiros e credores que se sintam prejudicados, por exemplo.
Entretanto, com a nova mudança é importante no sentido de que vai permitir
que a própria legislação afirme que o Ministério Público tem legitimação
concorrente para entrar com ação de indignidade e deserdação” 112.

O Código Civil de 2002, foi omisso nessa questão onde deveria ter incluído o
Ministério Público, para também atuar nos casos de exclusão de herdeiro da sucessão
por indignidade.

3.7 Origem da Lei 13.532 de dezembro de 2017


Um acontecimento que chocou o Brasil no ano de 2002 e conhecido como
“Caso Richthofen”, foi o assassinato do casal Marísia e Manfred Von Richthofen
cometido pelos Irmãos Daniel e Cristian Cravinhos a pedido da filha do casal, Suzane
Richthofen.
Os três arquitetaram e executaram o plano com o intuito de, ao final, dividir
entre eles a herança que Suzane herdaria. Entretanto, o enredo não findou como o
programado e os três acabaram sendo condenados a mais de 38 anos de reclusão.
Suzane e Daniel foram sentenciados a cumprir 39 anos e 6 meses e Cristian
Cravinhos a 38 anos e 6 meses de prisão.
O filho do casal, Andreas Von Richthofen, único herdeiro remanescente,
ingressou com a “Ação de exclusão de herança por indignidade”, solicitando a
exclusão do direito à herança de Suzane. O pedido foi acolhido pela 1° Vara da Família
e Sucessões - SP, no ano de 2011, e divulgado no Diário de Justiça do Estado de São
Paulo.
Ademais, foi ratificado pelo TJSP, no ano de 2015, oficializando o julgado,
aludindo o motivo da sentença ter “transitado em julgado” – processo de n° 0069536-
30.2002.8.26.0002-SP.
Neste interim, observa-se que, como já anteriormente citado, para o ingresso
neste modelo de Ação Civil deve o interessado, por vias próprias, solicitar ao juízo
competente mediante fundadas razões, que exclua o herdeiro indigno, por meio de
sentença judicial, de fruir do patrimônio de seus herdeiros.

_____________
112 IBDFAM, Instituto Brasileiro de Direito de Família. Ministério Público agora tem legitimidade para
pedir exclusão de herdeiro indigno. 2017.
<http://www.ibdfam.org.br/noticias/6531/Minist%C3%A9rio+P%C3%BAblico+agora+tem+legitimidade
+para+pedir+exclus%C3%A3o+de+herdeiro+indigno> último acesso em março de 2017.
46

No que tange a atuação do Ministério Público, fica evidente o zelo pelo


princípios norteadores do Direito aplicados a este caso, pois, muito embora, Suzane
Richthofen tenha perdido o direito à herança de seus pais, haja vista seu irmão,
herdeiro remanescente, ter proposto a pertinente ação de exclusão, o jovem, quando
menor de idade, chegou a fazer um pedido de desistência do pleito, o qual foi negado,
em virtude da intervenção do Parquet, que se manifestou contra o pedido de Andreas,
sob a argumentação de que cabia ao tutor do menor zelar pelos interesses deste, os
quais eram indisponíveis.
Sobre o tema prevê o ordenamento jurídico brasileiro que os direitos e
interesses dos menores de idade devem ser zelados, até que eles atinjam a idade e
condições para que possam agir em seu próprio nome113.
Na justificativa para a criação do Projeto de Lei o deputado Antônio Bulhões
esclarece que poderia existir a “duvidosa possibilidade” de ingresso de ações por
parte do MP, nos casos de atuação de herdeiros ou legatários atuando como autores,
coautores ou partícipes de homicídio doloso contra a pessoa de cuja sucessão se
tratar.
Entende-se, na visão do autor do projeto, que sem a atuação do Ministério
Público, há a possibilidade de se arquitetar um crime em conjunto com os herdeiros
ou legatários, imputando a responsabilidade a apenas um dos herdeiros, excluindo
este da sucessão por indignidade e posteriormente repartindo com o excluído a
herança, pois, trata-se de fraude, onde sem a atuação do Ministério Público, isso
eventualmente não seria notado.

3.8 Discussão doutrinária: A atuação do MP na seara privada


Anteriormente a entrada em vigência da Lei 13.532/17, diversos doutrinadores
teciam observações sob o fato do Instituto do Ministério Público ingressar com ações
que envolvam unicamente a autonomia privada.
Muitos buscam na hermenêutica jurídica embasamento técnico para
fundamentar seus argumentos, ora defendendo a atuação no Parquet na seara
privada, ora questionando se tal atuação teria respaldo legal.

_____________
113DIREITO DIÁRIO. Tutela e Guarda: sobre as formas de proteção do menor de idade no
ordenamento brasileiro. Maio, 2016. Disponível em: < https://direitodiario.com.br/tutela-e-guarda-
sobre-as-formas-de-protecao-do-menor-de-idade-no-ordenamento-brasileiro/>. Último acesso em
out 2019.
47

A doutrinadora Maria Helena Diniz, enfatiza em seu texto, escrito


anteriormente a entrada em vigor da norma em apreço, que o representante do
Ministério Público teria legitimação para ajuizar ações que visassem a exclusão de
herdeiro indigno, e complementa, salientando, em tom particular,
[...] há quem ache, como nós, que, como o novo Código Civil foi omisso a
respeito, o Ministério Público poderia também propô-la, por ser o guardião da
ordem jurídica (CF; art. 127) e pelo fato de haver interesse social e público
de evitar que herdeiro ou legatário desnaturado receba vantagem,
beneficiando-se da fortuna deixada pela sua vítima114.

Entretanto, para Carlos Roberto Gonçalves apud Silvio Rodrigues ambos


entendem que
[...] a matéria concernente ao legítimo interesse para o ajuizamento da ação
de exclusão do indigno é de interesse privado, e não público, de sorte que só
aqueles que se beneficiaram com a sucessão poderiam propor a exclusão do
indigno. Se o herdeiro legítimo ou testamentário assassinou o hereditando,
mas as pessoas a quem a sua exclusão beneficiaria preferissem manter-se
silentes, o assassino não perderia a condição de herdeiro e receberia os bens
da herança, não podendo a sociedade, através do Ministério Público, impedir
tal solução115.

O doutrinador ainda enfatiza que “não se justifica, como pretendem alguns,


atribuir legitimidade ao Ministério Público, nos casos de interessados menores ou de
inexistência de herdeiros”116, visto que os que não possuem capacidade civil serão
representados por seu representante legal.
Ademais, nos casos de inexistência de herdeiros, a legitimidade é transferida
para o Município, o Distrito Federal ou a União, conforme expressa o art. 1.844 do
Código Civil.
Na mesma linha de pensamento de Maria Helena Diniz, concordando com a
intervenção do Parquet, Silvio Venosa ressalta que
O Estado está colocado na posição de herdeiro, ou, ainda que assim não se
considere, pode ser interessado na herança quando não houver outros
herdeiros, de modo que o Poder Público está legitimado a mover a ação
contra o indigno, se não houver sucessor mais próximo legitimado a fazê-lo.
Seria absurdamente imoral que se permitisse que um filho patricída ou
matricida herdasse dos falecidos pai ou mãe, só porque não havia parente
próximo algum intitulado para afastá-lo da sucessão117.

Ademais, Venosa descreve o possível caso em que herdeiro que atente contra
a vida do autor da herança, sem que haja outros herdeiros interessados para promover

_____________
114 DINIZ, Maria Helena. op. cit., p. 54.
115 GONÇALVES, Carlos Roberto. op. cit., p. 106.
116 GONÇALVES, Carlos Roberto. op. cit., mesma página.
117 VENOSA, Sílvio de Salvo. op. cit., p. 54.
48

a ação, como sendo um atentado “contra a Moral e a Lógica do Direito”118.


Outrossim, ainda segundo Venosa, o doutrinador descreve que
[...] há que se entender que o Estado possui legitimidade, como derradeiro
herdeiro que é, ainda que tecnicamente não o seja, para promover a ação de
indignidade. O Estado possui interesse na sucessão. Os últimos casos
relatados pela imprensa exigem que essa matéria seja profundamente
repensada em prol da credibilidade do ordenamento119.

Seguindo essa mesma linha de pensar, Railma Marrone Pereira expressa


Neste diapasão e, entendendo-se que a locução “defesa da ordem jurídica”
consiste na tutela da própria Constituição e das leis, não se pode negar que
a prática de atos impuros contra quem lhe transmitirá um patrimônio não seja
uma afronta às normas jurídicas contidas na nossa Magna Carta. Ao começar
com o disposto no art. 3º, I, segundo o qual é objetivo fundamental da
República Federativa do Brasil a construção de uma sociedade livre, justa e
solidária. Daí, permitir que um indigno se aproveite, por ausência de quem
possa promover a sua exclusão judicial da herança ou legado deixado pelo
ofendido, vai completamente de encontro à justiça, valor supremo de uma
sociedade. Em segundo lugar, um ato de indignidade contra aqueles que
deveria amar, cuidar e proteger, acarreta uma violação na relação familiar,
ferindo valores morais e destruindo os laços afetivos que faziam do ofensor
digno da sucessão. Desse modo, vê-se claramente um atentado contra um
dos princípios gerais implícitos na Constituição: o da afetividade120.

Em contrapartida, tecendo comentários contrários aos argumentos


supracitados, José Fernando Simão enfatiza que,
[...] percebe-se que o MP não pode nem poderia propor a ação em questão,
pois estará defendendo direito patrimonial e disponível de terceiro. Frise-se:
patrimonial e disponível de um particular. Poucas notas indicarão que a
legitimidade do MP é fruto exclusivamente do politicamente correto, de uma
resposta ao caso Richthofen e da vontade sanguinária e punitiva que reina
nos corações de parte dos brasileiros neste quarto do século XXI. a) O direito
à herança é puramente patrimonial. Não há qualquer razão para o MP se
intrometer em matéria patrimonial em que não há interesse de incapaz nem
cuida de mínimo existencial. b) O direito à herança é disponível. Ninguém é
obrigado a ser herdeiro. Não só é possível a renúncia abdicativa como
também a equivocadamente chamada renúncia translativa ou in favorem121.

Outrossim, Simão ressalta seu argumento salientando que


Ainda, se o MP propuser a ação, como aparentemente indica a lei, e o
beneficiado pela indignidade se opuser expressamente, teremos uma
situação esdrúxula: o MP poderia prosseguir com a demanda? A resposta por
óbvio é negativa. Seu resultado seria inútil e não desejado. Alguns afirmam
_____________
118 VENOSA, Sílvio de Salvo. op. cit., p. 55.
119 VENOSA, Sílvio de Salvo. op. cit., mesma página.
120 SILVA, Railma Marrone Pereira, A legitimação do Ministério Público para a propositura da ação

civil de indignidade. Âmbito Jurídico, 2013. Disponível em:


<https://ambitojuridico.com.br/cadernos/direito-civil/a-legitimacao-do-ministerio-publico-para-a-
propositura-da-acao-civil-de-indignidade/>. Último acesso em out de 2019.
121 SIMÃO, José Fernando. Legitimidade do MP para propor ação de exclusão do sucessor por

indignidade. Consultor Jurídico. Jan, 2018. Disponível em: < https://www.conjur.com.br/2018-jan-


28/processo-familiar-legitimidade-mp-acao-exclusao-sucessor-indignidade>. Último acesso em out de
2019.
49

que se trata de uma questão de ética. O Direito Civil não pode e não resolverá
os dilemas éticos da humanidade. É forma de regular as relações particulares
e resolver as questões concretas122.

Neste diapasão, extrai-se o fato de que, anteriormente a vigência da Lei


13.532 de 2017, não havia consenso doutrinário acerca da matéria em tela.

Muitos utilizam o argumento ético e moral intrínsecos aos ordenamento


jurídico para sustentar seus argumentos. Outros afirmam que o Direito Civil não foi
elaborado para suprir dilemas éticos da humanidade.

Neste contexto o já citado enunciado da 116 Jornada de Direito Civil foi


elaborado para suprimir as lacunas deixadas pelo Código Civil de 2002, no tocante a
referida matéria.

_____________
122 SIMÃO, José Fernando. op. cit.
50

4 METODOLOGIA

Utilizar-se-á como metodologia de pesquisa o modelo de natureza


exploratório de cunho qualitativo, constituída através do método dedutivo, haja vista
que, buscar-se-á verificar a compatibilidade funcional da atuação do Ministério
Público face à propositura de ações que visem a exclusão de herdeiro por
indignidade, afastando, em primeiro momento, o MP da esfera pública, adentrando-o
na esfera privada.
No que tange as técnicas de pesquisa, utilizar-se-á a pesquisa bibliográfica,
especificadamente doutrinárias, artigos científicos, revistas jurídicas e sítios de
internet.
Ademais, por meio de um procedimento dialético, buscar-se-á apresentar a
eficácia da norma aplicada aos casos em que há atuação do Ministério Público na
propositura de ações que visem à exclusão de herdeiro nos casos por indignidade.
51

5 CONSIDERAÇÕES FINAIS

Para o desenvolvimento deste trabalho optou-se pelo tema “compatibilidade


funcional da atuação do Ministério Público face à propositura de ações que visem a
exclusão de herdeiro por indignidade”, em observância a Lei vigente de n° 13.532 de
2017.
Inúmeros são os acontecimentos envolvendo casos de exclusão de herança
por indignidade. Em todos eles, para que deixe o herdeiro de gozar de sua herança
legítima, caberia a outros herdeiros interessados, desde que legitimados, ingressar
com a propositura da ação em juízo competente.
Nos casos em que não houvessem herdeiro legitimado a suceder, poderia, o
algoz, ferir o princípio nemo auditur propriam turpitudinem, ou seja, esse beneficiar-
se-ia de sua própria torpeza.
Sendo o Direito criado pelo homem como um meio para a realização de valores
como a moralidade e a justiça, princípios basilares de uma sociedade, caso o
ordenamento permanecesse omisso, ou seja, sem a criação de uma Lei que
propiciasse legitimidade ao Ministério Público à adentrar na seara do direto particular,
tais princípios ficariam desprotegidos, permitindo ao infrator de tais atos usufruir de
um malefício causado per si.
Neste diapasão, o legislador pátrio consagrou tais princípios no instituto da
indignidade sucessória, expresso no diploma legal vigente sob a Lei 10.406/02 que
prevê a exclusão do herdeiro ou legatário do direito de suceder, caso venha a praticar
atos ofensivos contra a pessoa, a honra ou os interesses do autor da herança ou de
membros de sua família.
Como supramencionado, motivado pelo “Caso Richthofen”, o legislador
outorgou poderes para que o Parquet tenha legitimidade para demandar ações deste
gênero, sustentando, como fundamento, que o Código Civil em vigência foi omisso
em não incluir o Ministério Público no rol dos legitimados para ingressar com a referida
ação.
Sendo o Ministério Público um ente do Estado e protetor de princípios morais,
faz jus proteger o patrimônio daquele que agride não só os princípios morais e éticos
do particular, mas, de toda sociedade.
Dessa forma, considera-se que a elaboração da referida norma foi uma decisão
mui acertada, pois, esta carrega consigo não apenas uma ordem expressa, mas,
52

intrinsecamente, sucumbe a intenção de possíveis criminosos, que visavam a lacuna


da Lei para cometer tais ilícitos e beneficiar-se de suas próprias torpezas.
53

REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS

ANDRADE, Mauro Fonseca. Ministério Público e sua Investigação Criminal, 2°


edição, Curitiba, Juruá, 2008.

ANDREATTA, Lucas Henrique Padovan. A investigação criminal realizada pelo


Ministério Público e a teoria constitucional dos poderes implícitos. São Paulo -
2011.

BOUZON, Emanuel. Origem e Natureza das Coleções do Direito Cuneiforme.


TJRS. Disponível em:
<https://www.tjrs.jus.br/export/poder_judiciario/historia/memorial_do_poder_judiciario
/memorial_judiciario_gaucho/revista_justica_e_historia/issn_1676-5834/v2n3/doc/01-
Bouzon.pdf>. Último acesso em set de 2019.

BRASIL. Constituição promulgada, 5 de out. de 1988. Constituição da República


Federativa do Brasil, Brasília, DF, out 1988;

BRASIL. Decreto-Lei n. 2.848 de 7 de dez. de 1940. Código Penal Brasileiro, Rio


de Janeiro, RJ dez 1940;

BRASIL. Lei n. 10.406, de 10 de jan. de 2002. Código Civil Brasileiro, Brasília, DF,
jan. 2002;

BRASIL. Lei n. 13.105, de 16 de mar. de 2015. Código de Processo Civil, Brasília,


DF, mar 2015;

BRASIL. Supremo Tribunal Federal. Recurso Extraordinário 646721. Relator


Ministro Roberto Barroso, Brasília, 30 de novembro de 2018.

BRASIL. Supremo Tribunal Federal. Recurso Extraordinário 878694. Relator


Ministro Roberto Barroso, Brasília, 10 de maio de 2017.

BRASIL. Tribunal de Justiça do Estado de São Paulo. Inventário e Partilha nº


0069536-30.2002.8.26.0002-SP (002.02.069536-7). Requerente: Andreas Albert Von
Richthofen. Requerido: Manfred Albert Von Richthofen. Interessados: Suzane Von
Richthofen. Fiscal: Fazenda Pública do Estado de São Paulo. Juiz: José Ernesto de
Souza Bittencourt Rodrigues. 1° Vara da Família e Sucessões – Foro Regional II –
Santo Amaro. São Paulo, 02 de dezembro de 2002;
54

CASTRO, Flávia Lajes de. História do Direito Geral e Brasil. Rio de Janeiro:
Lúmen Juris, 2007.

CASTRO, Roberto C. G. A Grécia antiga: uma visão panorâmica. IJI –


Universidade do Porto. 2014. Disponível em < http://www.hottopos.com/isle17/61-
72Roberto.pdf>. Último acesso em set de 2019.

CERQUEIRA, Fábio Vergara. As origens do direito ocidental na pólis grega.


Revista Justiça e História. TJRS. Disponível em:
https://www.tjrs.jus.br/export/poder_judiciario/historia/memorial_do_poder_judiciario/
memorial_judiciario_gaucho/revista_justica_e_historia/issn_1676-5834/v2n3/doc/04-
Fabio.PDF>. Último acesso em set de 2019.

DIGNO. In: DICIONÁRIO WEB. Disponível em:


<http://www.dicionarioweb.com.br/digno/>. Último acesso em set de 2019.

DINIZ, Maria Helena. Curso de direito civil brasileiro, volume 6 : direito das
sucessões / Maria Helena Diniz – 23. ed. reformulada – São Paulo : Saraiva, 2009.

DIREITO DIÁRIO. Tutela e Guarda: sobre as formas de proteção do menor de


idade no ordenamento brasileiro. Maio, 2016. Disponível em: <
https://direitodiario.com.br/tutela-e-guarda-sobre-as-formas-de-protecao-do-menor-
de-idade-no-ordenamento-brasileiro/>. Último acesso em out 2019.

GAGLIANO, Pablo Stolze. Manual de direito civil; volume único. – Ed. 1. São
Paulo. Saraiva, 2017;

GOMES, Orlando. Sucessões. 12ª ed. Rio de Janeiro. Forense, 2004;

GOMES, Rodrigo Jimenez. A investigação criminal e a atuação do Ministério


Público. PUC – São Paulo. 2009.

GONÇALVES, Carlos Roberto. Direito Civil brasileiro, volume VII : Direito das
Sucessões / Carlos Roberto Gonçalves. – 3. ed. rev. São Paulo : Saraiva, 2009.

IBDFAM, Instituto Brasileiro de Direito de Família. Ministério Público agora tem


legitimidade para pedir exclusão de herdeiro indigno. 2017.
<http://www.ibdfam.org.br/noticias/6531/Minist%C3%A9rio+P%C3%BAblico+agora+t
em+legitimidade+para+pedir+exclus%C3%A3o+de+herdeiro+indigno> último acesso
em março de 2017;
55

INDIGNO. In: DICIONÁRIO WEB. Disponível em:


<http://www.dicionarioweb.com.br/digno/>. Último acesso em set de 2019.

ISMAIL, Mona Lisa Duarte Abdo Aziz. O papel do Ministério Público no controle
de políticas públicas. Boletim Científico ESMPU, Brasília, jan./dez. 2014

MAGALHÃES, Anala Lelis. A importância do estudo da história para a


compreensão das evoluções do direito. In: Âmbito Jurídico, Rio Grande, XV, n.
101, jun. 2012. Disponível em: http://www.ambito-
juridico.com.br/site/?n_link=revista_artigos_leitura&artigo_id=11786>. Acesso em set
2019.

MAZZILLI, Hugo Nigro. O Ministério Público e a defesa do regime democrático.


Revista Justitia, São Paulo, vol. 180, p.139 e s., jul-dez, 1997. Disponível em: <
http://www.mazzilli.com.br/pages/artigos/mpedemocracia.pdf>. Último acesso em set
2019.

NETO, Pedro Jorge. O Ministério Público e as principais ações em defesa dos


direitos difusos e coletivos: uma análise evolutiva. ESMP – CE. Disponível em: <
http://www.mp.ce.gov.br/esmp/publicacoes/ed1/artigos/ministerio_publico_principais
_acoes_defesa_direito_difuso_e_coletivo.pdf>. Último acesso em set de 2019.

REALE, Miguel. Lições preliminares de direito. Miguel Reale. – 27. ed. – São
Paulo : Saraiva, 2002.

SILVA. Daniella de Almeida e, Os herdeiros que perdem seus direitos. Migalhas.


2019. Disponível em: <https://www.migalhas.com.br/dePeso/16,MI116049,41046-
Os+herdeiros+que+perdem+seus+direitos>. Último acesso em set de 2019.

SILVA, Railma Marrone Pereira, A legitimação do Ministério Público para a


propositura da ação civil de indignidade. Âmbito Jurídico, 2013. Disponível em:
<https://ambitojuridico.com.br/cadernos/direito-civil/a-legitimacao-do-ministerio-
publico-para-a-propositura-da-acao-civil-de-indignidade/>. Último acesso em set de
2019.

SILVA. Railma Marrone Pereira, A legitimação do ministério público para a


propositura da ação civil de indignidade. 2013. Âmbito Jurídico. <
http://www.ambitojuridico.com.br/site/?n_link=revista_artigos_leitura&artigo_id=1389
4>. Último acesso em set de 2019.

SIMÃO, José Fernando. Legitimidade do MP para propor ação de exclusão do


56

sucessor por indignidade. Consultor Jurídico. Jan, 2018. Disponível em: <
https://www.conjur.com.br/2018-jan-28/processo-familiar-legitimidade-mp-acao-
exclusao-sucessor-indignidade>. Último acesso em out de 2019.

TORNAGHI, Hélio. Instituições de Direito Processual Penal, vol. III, Rio de


Janeiro, Saraiva, 1977.

VENOSA, Sílvio de Salvo. Direito civil : direito das sucessões / Silvio de Salvo
Venosa. 9. ed. – São Paulo : Atlas, 2009.

VILLELA, Fábio Goulart. As formas de atuação do Ministério Público do


Trabalho no regime democrático. Revista Consultor Jurídico, novembro de 2015.
Disponível em: <https://www.conjur.com.br/2015-nov-21/fabio-villela-formas-atuacao-
ministerio-publico-trabalho#_ftn2>. Último acesso em set de 2019.
57

ANEXOS

Posições Jurisprudenciais sobre à Atuação do Ministério Público

Superior Tribunal de Justiça

“Remetido ao DJE
Relação: 0119/2015 Teor do ato: Vistos. 1-Uma vez transitada em julgado a sentença
deste Juízo que determinou a exclusão, por indignidade, da herdeira Suzane Louise
von Richthofen, relativamente ao bens deixados por seus pais, ora inventariados,
defiro o pedido de adjudicação formulado pelo único herdeiro remanescente, Andreas
Albert von Richtofen. Expeça-se o necessário, à inexistência de custas a serem
recolhidas, sempre ressalvado erros, omissões ou prejuízo a terceiros; 2-Na esteira
da R. Decisão da Egrégia Corregedoria Geral da Justiça, proferida aos 21.10.2013,
nos autos do Processo - DICOGE 1.2 - nº 2013/39867, que atendeu a proposta
formulada pela Presidência do Colégio Notarial do Brasil, para rápida efetivação da
decisão ora proferida, o formal de partilha será expedido, preferencialmente, por
Tabelião de Notas, no prazo de cinco dias, através de peças que serão extraídas
mediante entrega dos autos judiciais originais pelo interessado, ou do processo
judicial eletrônico, conforme o caso, tudo conforme detalhadamente regulamentado
no correlato Provimento - CG nº 31/2013, publicado às fls. 10/13, no DJE do dia
23/10/2013. Arquive-se. P.R.I. FAZENDA PÚBLICA. Advogados(s): MARIA
APARECIDA C F L EVANGELISTA (OAB 20249/SP), DENIVALDO BARNI JUNIOR
(OAB 235518/SP), WANDA APARECIDA GARCIA LA SELVA (OAB 70573/SP),
DENIVALDO BARNI (OAB 51448/SP)”.

Supremo Tribunal Federal

EMENTA: DIREITO CONSTITUCIONAL E CIVIL. RECURSO EXTRAORDINÁRIO.


REPERCUSSÃO GERAL. INCONSTITUCIONALIDADE DA DISTINÇÃO DE REGIME
SUCESSÓRIO ENTRE CÔNJUGES E COMPANHEIROS. 1. A Constituição brasileira
contempla diferentes formas de família legítima, além da que resulta do casamento.
Nesse rol incluem-se as famílias formadas mediante união estável. 2. Não é legítimo
desequiparar, para fins sucessórios, os cônjuges e os companheiros, isto é, a família
formada pelo casamento e a formada por união estável. Tal hierarquização entre
entidades familiares é incompatível com a Constituição de 1988. 3. Assim sendo, o
art. 1790 do Código Civil, ao revogar as Leis n.º 8.971/94 e 9.278/96 e discriminar a
companheira (ou o companheiro), dando-lhe direitos sucessórios bem inferiores aos
conferidos à esposa (ou ao marido), entra em contraste com os princípios da
igualdade, da dignidade humana, da proporcionalidade como vedação à proteção
deficiente, e da vedação do retrocesso. 4. Com a finalidade de preservar a segurança
jurídica, o entendimento ora firmado é aplicável apenas aos inventários judiciais em
que não tenha havido trânsito em julgado da sentença de partilha, e às partilhas
extrajudiciais em que ainda não haja escritura pública. 5. Provimento do recurso
extraordinário. Afirmação, em repercussão geral, da seguinte tese: “No sistema
constitucional vigente, é inconstitucional a distinção de regimes sucessórios entre
58

cônjuges e companheiros, devendo ser aplicado, em ambos os casos, o regime


estabelecido no art. 1.829 do CC/2002”.

EMENTA: DIREITO CONSTITUCIONAL E CIVIL. RECURSO EXTRAORDINÁRIO.


REPERCUSSÃO GERAL. APLICAÇÃO DO ARTIGO 1.790 DO CÓDIGO CIVIL À
SUCESSÃO EM UNIÃO ESTÁVEL HOMOAFETIVA. INCONSTITUCIONALIDADE
DA DISTINÇÃO DE REGIME SUCESSÓRIO ENTRE CÔNJUGES E
COMPANHEIROS. 1. A Constituição brasileira contempla diferentes formas de família
legítima, além da que resulta do casamento. Nesse rol incluem-se as famílias
formadas mediante união estável, hetero ou homoafetivas. O STF já reconheceu a
“inexistência de hierarquia ou diferença de qualidade jurídica entre as duas formas de
constituição de um novo e autonomizado núcleo doméstico”, aplicando-se a união
estável entre pessoas do mesmo sexo as mesmas regras e mesas consequências da
união estável heteroafetiva (ADI 4277 e ADPF 132, Rel. Min. Ayres Britto, j.
05.05.2011) 2. Não é legítimo desequiparar, para fins sucessórios, os cônjuges e os
companheiros, isto é, a família formada pelo casamento e a formada por união estável.
Tal hierarquização entre entidades familiares é incompatível com a Constituição de
1988. Assim sendo, o art. 1790 do Código Civil, ao revogar as Leis nº 8.971/1994 e nº
9.278/1996 e discriminar a companheira (ou o companheiro), dando-lhe direitos
sucessórios bem inferiores aos conferidos à esposa (ou ao marido), entra em
contraste com os princípios da igualdade, da dignidade humana, da proporcionalidade
como vedação à proteção deficiente e da vedação do retrocesso. 3. Com a finalidade
de preservar a segurança jurídica, o entendimento ora firmado é aplicável apenas aos
inventários judiciais em que não tenha havido trânsito em julgado da sentença de
partilha e às partilhas extrajudiciais em que ainda não haja escritura pública. 4.
Provimento do recurso extraordinário. Afirmação, em repercussão geral, da seguinte
tese: “No sistema constitucional vigente, é inconstitucional a distinção de regimes
sucessórios entre cônjuges e companheiros, devendo ser aplicado, em ambos os
casos, o regime estabelecido no art. 1.829 do CC/2002”.

Você também pode gostar