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BIO

LOGIA
Genética Molecular
Profa. Rita de Cássia de Moura
Profa. Marília de França Rocha
P r o f a . M a r i a Te r e s a M a r q u i m N o g u e i r a C o r n é l i o

2a edição | Nead - UPE 2013


Dados Internacionais de Catalogação-na-Publicação (CIP)
Núcleo de Educação à Distância - Universidade de Pernambuco - Recife

Moura, Rita de Cássia


M929b Biologia: genética molecular/Rita de Cássia de Moura; Marília de França
Rocha; Maria Tereza Marquim Nogueira Cornélio. – Recife: UPE/NEAD, 2011.

64 p.

1. Genética Molecular 2. Biologia 3. Educação à Distância I. Universidade de


Pernambuco, Núcleo de Educação à Distância II. Título


CDD – 17ed. – 575.1
Claudia Henriques – CRB4/1600
BFOP-090/2011
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Genética Molecular

Profa. Rita de Cássia de Moura Carga Horária I 60H


Colaboradoras: Profa. Marília de França Rocha
Profa. Maria Teresa Marquim Nogueira Cornélio

APRESENTAÇÃO
Caros alunos, vocês iniciam uma nova jor-
nada que os levará a conhecimentos tão
intrigantes quanto interessantes. Além da
habitual dedicação que todos deverão ter
à disciplina, destaco a importância de de-
senvolver a habilidade de abstração que
permitirá uma aprendizagem mais rápida e
prazerosa.

Os primeiros geneticistas estavam interes-


sados em compreender o mecanismo da
hereditariedade, particularmente o modo
de transmissão dos genes por meio da re-
produção. A partir da década de 1930, os
genes passaram a ser reconhecidos como
entidades físicas, o que os tornou candida-
tos a objeto de estudo através de métodos
bioquímicos e biofísicos. Estudos focados
nesta nova abordagem permitiram que a
natureza química dos genes fosse desven-
dada bem como foram um marco para a
Genética, pois, a partir do momento em
que os biólogos deixaram de perceber os
genes apenas como unidades de herança
e passaram a considerá-los unidades de in-
formação biológica, nascia um novo ramo
da Genética, a Genética Molecular.

O termo Genética Molecular é comumen-


te usado para se referir à área da Genéti-
ca, que estuda todos os aspectos do gene.
Desde a década 1950, os biólogos mole-
culares têm buscado compreender e descre- envolvidos na regulação da expressão gêni-
ver os processos relacionados ao modo de ca. Adicionalmente permitirá aos estudantes
transmissão da informação biológica, ao seu uma visão geral sobre o impacto significativo
acondicionamento e à maneira pela qual esta que a genética tem obtido sobre a sociedade,
informação torna-se disponível para a célula. em particular sua aplicação na medicina e na
Vários estudos colaboraram para a descober- agricultura modernas.
ta da estrutura dos genes; para a descrição
da molécula de DNA; para a compreensão da Os conteúdos que serão estudados na discipli-
organização e função dos genes; descrição na Genética Molecular estão distribuídos em
de novos tipos de moléculas de RNA; carac- quatro capítulos. Capítulo 1- A estrutura e a
terização dos processos da expressão gênica replicação do DNA; Capítulo 2- Expressão gê-
e dos diferentes modos de controle da ex- nica, Mutação e reparo do DNA; Capítulo 3-
pressão tanto em organismos procariontes Genética de vírus e bactérias, Técnicas de ge-
quanto em eucariontes; descrição e aplicação nética molecular e suas principais aplicações;
de ferramentas moleculares, dentre outros Capítulo 4- Regulação da expressão gênica em
conhecimentos. procariontes e eucariontes.

Nós teremos, durante esta disciplina, a opor- O estudo de qualquer área da Genética requer
tunidade de estudar as descobertas e os pro- o exercício do desprendimento, esforço e de-
cessos moleculares acima citados e compre- dicação contínuos, o que resulta não apenas
ender os conceitos fundamentais em genética na compreensão dos mecanismos (para alguns
molecular, com ênfase na descrição dos prin- mistérios) como também na capacidade de
cipais processos moleculares, organização e participar efetivamente de discussões refe-
função dos genes, organização molecular em rentes a aspectos éticos que têm sido comuns
vírus e bactérias, os métodos moleculares e nos dias atuais. A Genética Molecular propi-
suas aplicações. Contudo, é importante que ciará o embasamento necessário para compre-
todos compreendam que a energia direciona- ensão da dimensão alcançada pela Engenharia
da a este propósito não se trata simplesmente Genética, sua importância, e por que não seus
do cumprimento de mais uma tarefa propos- prós e contras.
ta pelo docente em resposta à estrutura cur-
ricular do curso de Ciências Biológicas. Pode- Neste capítulo, manteremos o padrão apre-
mos garantir que é bem mais que curiosidade sentado nos capítulos das disciplinas Genéti-
científica ou obrigação, pois a dimensão al- ca Geral e Citogenética, isto é, cada capítulo
cançada pela Genética Molecular, através de apresentará atividades de revisão e de pesqui-
sua aplicação na agricultura, medicina e meio sa, com o objetivo de aprofundar conteúdos e
ambiente, tem provocado uma grande reper- verificar seus conhecimentos. Você continua-
cussão social, portanto é natural o espaço rá sendo desafiado pela Fix, a esfinge que foi
que as novas descobertas têm conseguido na apresentada durante a disciplina de Genética
mídia e notória, a importância do estudo des- Geral. Contudo, é importante lembrar que o
ta disciplina, em particular pelos profissionais maior desafio está sempre dentro do próprio
da área de saúde (Medicina, Biologia, Nutri- homem, consiste no que ele verdadeiramen-
ção, Farmácia, etc.). te deseja e no quanto é capaz de transformar
sonho em realidade. Por isso, esperamos que
A disciplina Genética Molecular apresenta essa disciplina não seja apenas mais uma opor-
conceitos fundamentais para compreensão tunidade de crescimento intelectual, e sim que
do modo de organização da estrutura mo- contribua, através da beleza, complexidade e
lecular do material genético; do mecanismo precisão dos processos moleculares para o sur-
através do qual o material genético é repli- gimento de um novo modo de ver a vida, com
cado; do processo de expressão da informa- mais profundidade e consciência.
ção genética; de como o material genético
muda com o tempo; da descrição de siste- Desejamos-lhes sucesso nessa nova etapa de
mas biológicos modelos (vírus e bactérias); aprendizagem.
da manipulação genética e dos mecanismos
Oi, sou Fix, leoa
alada com ca-
beça humana
e só posso ser
vencida pelo
intelecto. Meu
primeiro desafio
foi quando via-
java pela Grécia,
anos atrás.

Decifra-me ou te devoro! “Qual o ser que anda


de manhã com quatro patas, ao meio dia com
duas e, à tarde, com três e que, contrariamen-
te à lei geral, é mais fraco quando têm maior
número de membros?” Essa é fácil, porém de-
safio mesmo é o que tenho para vocês.

O caminho do conhecimento é árduo, mas ex-


tremamente gratificante para aquele que nele se
aventurar. Convido a quem tiver coragem a en-
trar na maravilhosa viagem do conhecimento.
9

capítulo 1
Ácido Desoxirribonucléico
(DNA) A Estrutura e
a Replicação do DNA

Profa. Rita de Cássia de Moura Carga Horária I 15H


Colaboradoras: Profa. Marília de França Rocha
Profa. Maria Teresa Marquim Nogueira Cornélio

INTRODUÇÃO
Iniciaremos nosso estudo, relatando as des-
cobertas que levaram à determinação do
DNA como material genético e à descrição
da estrutura da molécula de DNA. Destaca-
remos suas funções biológicas, particular-
mente a capacidade que a molécula tem de
sofrer replicação, a qual ocorre devido a sua
composição e organização, que permitem
a ação de um complexo enzimático capaz
de sintetizar a cópia precisa da molécula de
DNA, garantindo a transmissão da informa-
ção genética de célula a célula, portanto, de
geração a geração.

Neste capítulo, estudaremos o ácido de-


soxirribonucléico - DNA, sua estrutura e o
processo de replicação, responsável pela
produção de cópias do DNA. O período
correspondente às décadas de 1920 até os
primeiros anos de 1950 foi fundamental
para descrição e compreensão de processos
moleculares. Dentre tantas descobertas, po-
demos destacar a descrição da dupla héli-
ce de DNA por Watson e Crick, em 1953 e
salientar que estes pesquisadores contaram
com conhecimentos prévios, os quais foram
relevantes e estão destacados a seguir: 1- a
descrição dos genes como sendo fatores he-
reditários por Mendel, embora ainda não se
soubesse sua natureza física; 2- o reconhe-
cimento da mutação como um fator capaz
10
capítulo 1

de alterar o funcionamento do gene; 3- a teo- • Comparar a replicação em procariontes e


ria, um gene, uma proteína; 4- o conhecimen- eucariontes.
to de que os cromossomos estão constituídos
de DNA e proteínas; 5- uma série de outras
descobertas reveladas por experimentos reali-
zados a partir dos anos 1920, os quais serão
1. DE QUE SÃO FEITOS
descritos no item 2. OS GENES?
SAIBA MAIS 1.1 EXPERIMENTOS QUE
COMPROVAM QUE O DNA
Ácido desoxirribonucléico: ver DNA. É O MATERIAL GENÉTICO
DNA: ácido desoxirribonucléico molécula de desoxir-
ribonucleotídeos, enrolada em dupla hélice, respon- Para responder a pergunta “De que são feitos
sável pela informação genética. os genes?”, os pesquisadores precisaram des-
crever a natureza química do material genéti-
Genes: segmento de DNA, que produz um RNA ou co. Um caminho promissor foi o de investigar
cadeia polipeptídica e inclui regiões que antecedem
e seguem a região codificadora, representada pelos as substâncias bioquímicas presentes nos cro-
éxons.. mossomos, pois já se sabia que os cromosso-
mos continham genes. Em meados de 1920,
Mutação: geralmente associada à alteração em um vários experimentos foram realizados, até que
único gene (mutação de ponto ou gênica), embora
possa designar, em um sentido mais amplo, alteração
fossem conhecidos os componentes biológi-
nos cromossomos, no genoma ou no organismo; al- cos do cromossomo: ácidos nucléicos (DNA
teração nas células somáticas ou germinativas. e RNA) e proteína. A partir dessa descoberta,
outras perguntas precisavam ser respondidas,
A replicação do DNA continua sendo um tema dentre elas, qual desses componentes biológi-
interessante, apesar de já terem passado mais cos teria maior variabilidade, sendo, portanto,
de 50 anos da descoberta da dupla hélice. capaz de variar de uma forma simples a uma
Atualmente há um grande interesse no estudo forma complexa, o que implicaria capacidade
da maquinaria protéica, o replissomo, respon- de variação de estruturas químicas. A falta de
sável pela ação coordenada de um complexo conhecimento sobre a estrutura da molécula
de proteínas, que se associam e atuam de for- de DNA fez com que os biólogos concluíssem
ma coordenada, para que a replicação do DNA equivocadamente que o material genético era
seja rápida e precisa. a proteína.

OBJETIVO GERAL No final da década de 1930, tornou-se cres-


cente a necessidade de se ter uma prova expe-
Compreender os conceitos fundamentais em rimental do material genético, pois, nessa épo-
genética molecular, com ênfase na descrição ca, já havia evidências de que o DNA do mesmo
dos principais processos moleculares, na orga- modo que a proteína poderia formar longos
nização e função dos genes, na organização polímeros e apresentar diferentes formas. Dois
molecular em vírus e bactérias, nos métodos experimentos foram cruciais para a identifi-
moleculares e suas aplicações. cação do material genético: a descoberta da
transformação bacteriana e a caracterização
OBJETIVOS ESPECÍFICOS química do material genético em bacteriófagos.

• Reconhecer os principais experimentos SAIBA MAIS


que identificaram o DNA como material
genético Bacteriófagos: vírus cujo hospedeiro é uma bactéria.

• Descrever a estrutura do DNA 1.1.1 PRINCÍPIO TRANSFORMANTE

• Compreender o mecanismo de replicação Frederick Griffith, em 1928, descobriu um tipo


do DNA de recombinação em Streptococcus pneumo-
11

capítulo 1
niae (pneumococos), responsável pela transfor- vivo: o camundongo morreu, e as bactérias
mação bacteriana. Como os demais organis- IIIS foram recapturadas.
mos, esta bactéria exibe variabilidade genética
que pode ser observada através de fenótipos O resultado obtido na etapa número 4 foi
diferentes (tipo = I e II; aspecto = rugoso (R) e inesperado, pois, ao invés de o camundongo
liso (L); tamanho = grande e pequeno; cápsula permanecer saudável, morreu, indicando que
= ausente e presente; virulência = avirulenta algum componente do tipo IIIS morto (princí-
e virulenta). Os caracteres informativos obser- pio transformante) tinha transformado o tipo
vados por Griffith foram: a presença ou ausên- IIR em tipo IIIS.
cia de uma cápsula de polissacarídeo, a qual
pode ser de vários tipos antigênicos (tipo I, II,
III, etc), e o tipo de cápsula.

O cultivo de pneumococos em meio de ágar e


sangue, em placas de Petri permitiu que fos-
sem observadas colônias virulentas, grandes e
lisas denominadas de tipo S bem como colô-
nias avirulentas, pequenas, rugosas, denomi-
nadas de tipo R (Figura 1).

Figura 1- Aspecto das colônias de duas linhagens de Strep-


tococcus penumoniae. Fonte: Snustad D.P. e Simmons M.J.
(2001) Fundamentos de Genética. Editora Guanabara Koogan.

Figura 2- Experimento de Griffith: transformação em Streptococcus


penumoniae. Fonte: Snustad D.P. e Simmons M.J. (2001) Funda-
A grande descoberta de Griffith se deu a partir mentos de Genética. Editora Guanabara Koogan.
do experimento em que amostras de diferen-
tes combinações de caracteres de pneumo-
cocos (tipo IIIS, tipo IIR, virulenta, avirulenta, 1.1.2 PROVA QUE O DNA MEDEIA A
viva, morta) foram injetadas em camundon- TRANSFORMAÇÃO
gos, ocasionando ou não a morte dos animais
e posteriormente recapturadas das bactérias a A prova de que o DNA medeia a transformação
partir destes. A Figura 2 ilustra as etapas que foi obtida por Oswald Avery e colaboradores
compõem este experimento. Podemos resumi- em 1944. Estes pesquisadores selecionaram
-las da seguinte forma: uma amostra de células S mortas por aque-
cimento, contendo o princípio transformante,
1. amostra tipo IIIS viva injetada em camun- a qual teve os seus componentes individuais
dongo vivo: o camundongo morreu, e as submetidos à degradação através de enzimas
bactérias IIIS foram recapturadas; específicas, capazes de degradar DNA, RNA
2. amostra tipo IIIS morta por aquecimento ou proteínas. A amostra inicial de células IIIS
injetada em camundongo vivo: o camun- foi subdivida em três amostras, as quais foram
dongo permaneceu vivo; degradadas separadamente, por desoxirribu-
3. amostra tipo IIR viva injetada em camundon- cuclease (DNAse), que degrada DNA; ribunu-
go vivo: o camundongo permaneceu vivo; clease (RNAse), que degrada RNA; e protease,
4. amostra tipo IIIS morta por aquecimento que degrada proteína. Dos três tratamentos
mais tipo IIR viva injetada em camundongo apenas, aquele que utilizou DNAse apresen-
12
capítulo 1

tou efeito sobre a atividade transformante, mostrando, portanto, que a informação genética
em pneumococos está presente no DNA. (Figura 3)

Figura 3- O DNA como princípio transformante. Fonte: Snustad D.P. e Simmons M.J. (2001) Fundamentos de Genética.
Editora Guanabara Koogan.

1.1.3 OS GENES DE BACTERIÓFAGOS SÃO FEITOS DE DNA

Em 1952 Hershey e Chase mostraram que o material genético do bacteriófago ou fago T2 estava
presente no DNA e não, na proteína. Estes pesquisadores levaram em consideração o fato de esse
vírus ser composto por 50% de DNA e 50% de proteína bem como a informação de que o DNA
contém fósforo, mas não, enxofre, e que a proteína contém enxofre e nenhum fósforo. Daí por
diante, eles precisaram apenas marcar o DNA do fago com isótipo radioativo do fósforo 32P, ao
invés do fósforo normal 31P. Do mesmo modo, marcaram a cápsula de proteína com o enxofre
35S, ao invés do enxofre normal 32S. Os fagos marcados com 35S foram misturados a uma cultura
de E. coli por alguns minutos, as células infectadas foram submetidas a um liquidificador, e depois
transferidas para tubos de ensaio onde se pôde observar que a maior parte da radioatividade
poderia ser retirada das células, sem afetar a prole. Quando foram usados fagos marcados com
32
P, verificou-se que a radioatividade estava, predominantemente, dentro da célula. A cultura foi
centrifugada; as bactérias, contendo o DNA do fago, foram coletadas na parte inferior do tubo,
enquanto as partículas vazias dos fagos ficaram em suspensão.(Figura 4)
13

capítulo 1
Figura 4 – Experimento de Hershey e Chase. Fonte: Snustad D.P. e Simmons M.J. (2001) Fundamentos de Genética.
Editora Guanabara Koogan.

Os experimentos apresentados até o momento


não deixaram dúvidas quanto à natureza do
material genético em procariontes. Contudo,
os pesquisadores continuaram insatisfeitos,
pois não sabiam se seria possível extrapolar
essas evidências para organismos superio-
res. Essas dúvidas foram elucidadas a partir
da descrição da dupla hélice de DNA, a qual
apresentou uma estrutura compatível com as
necessidades do material genético.

2. A ESTRUTURA DO DNA
2.1 NATUREZA QUÍMICA
O DNA ou ácido desoxirribonucléico é um polí-
mero ou molécula de cadeia longa, que possui
várias unidades individuais denominadas de
monômeros, unidas em série. Os monômeros,
também chamados de nucleotídeos, são con-
siderados as unidades básicas da molécula de
DNA, além de serem observados, compondo
os ácidos nucléicos; também desempenham
diferentes papéis na célula. O nucleotídeo está
composto por três componentes: 1- um açú- Figura 5- Componentes estruturais dos ácidos nucléicos.
car; 2- uma base nitrogenada e 3- um ácido
fosfórico. (Figura 5a)
14
capítulo 1

SAIBA MAIS exemplo, adenina e guanina) ou pirimídica, com um


anel e (como exemplo, citosina, timina, uracila).
Nucleotídeo: molécula constituída de um grupamen-
to fosfato, uma pentose (desoxirribose, no DNA ou Nucleosídeo: molécula constituída de uma pentose
ribose, no RNA) e uma base nitrogenada (púrica, com (desoxirribose, no DNA ou ribose, no RNA) e uma
dois anéis ou pirimídica, com um anel), responsável base nitrogenada (púrica, com dois anéis ou pirimí-
pela formação dos ácidos nucléicos. Compare com o dica, com um anel). Compare com o nucleotídeos.
nucleosídeo.
Para que haja a formação de polinucleotídeos,
1. O açúcar do nucleotídeo é uma pentose é necessário que os nucleotídeos se unam atra-
denominada 2’- desoxirribose, cuja forma vés de grupamentos fosfato. A ligação de mo-
é de cadeia linear ou estrutura de Fischer nômeros de nucleotídeos se dá a partir da união
(Figura 5b). A denominação 2’- desoxirri- do grupamento -fosfato acoplado ao carbono
bose indica que a estrutura da ribose foi 5’ de um dos nucleotídeos ao carbono 3’ do
modificada a partir da substituição do gru- próximo nucleotídeo na cadeia. A ligação que
pamento hidroxila (-OH) unido ao átomo ocorre entre os nucleotídeos se chama ligação
do carbono 2’ por um hidrogênio (-H). Os fosfodiéster, a qual também é conhecida como
carbonos são sempre numerados da mes- 3’-5’ fosfodiéster, e indica quais os átomos de
ma forma 1’, 2’, 3’, 4’, 5’ e 6’, os quais são carbono no açúcar que participam da ligação.
chamados de um linha, dois linha e assim É importante destacar que o polinucleotídeo
por diante. A numeração dos carbonos é possui duas terminações diferentes. Em uma
importante, pois ela indica à qual posição das extremidades, observamos um nucleotídeo
do carbono outros componentes do nucle- cujo grupamento trifosfato ligado ao carbono
otídeo estão ligados. 5’ não participa da ligação fosfodiéster. Esta
terminação é chamada 5’-P terminal. Na outra
2. As bases nitrogenadas são estruturas sim- extremidade, o grupamento 3’-hidroxila não
ples, ligadas ao carbono 1’ do açúcar e que reage e é denominada 3’-OH terminal. Na Fi-
se apresentam em forma de anel simples gura 6, podemos observar a estrutura de um
ou duplo. As bases adenina e guanina são pequeno polinucleotídeo, permitindo a me-
denominadas purinas e são de anel duplo, lhor compre-
enquanto as bases timina e citosina são de ensão de sua
anel simples e são chamadas de pirimidi- organização
nas. (Figura 5c) química, a
qual permite
3. O ácido fosfórico, ao ser adicionado a uma a ocorrên-
molécula que contém apenas um açúcar cia de duas
ligado a uma base, a qual é denominada terminações
nucleosídeo, provoca a conversão dessa distintas que
molécula em um nucleotídeo, através da fazem com
ligação do ácido fosfórico ao carbono 5’ que os poli-
do açúcar. (Figura 5d) nucleotídeos
possuam um
Os nucleotídeos que se polimerizam na forma- sentido que
ção do DNA são de quatro tipos diferentes: 2’ pode ser 5’-
desoxiadenosina 5’ trifosfato (dATP); 2’desoxi- 3’ ou 3’-5’.
guanosina 5’ trifosfato (dGTP); 2’desoxicitidina
5’ trifosfato (dCTP); 2’desoxitimidina 5’ trifos-
fato (TTP), os quais podem também ser cha-
mados de A, G, C e T, respectivamente.

SAIBA MAIS
Bases nitrogenadas: compostos nitrogenados que
Figura 6 - Formação de cadeia polinucle-
são incorporados aos nucleosídeos ou nucleotídeos. otídica. Fonte: genomasur.com/lecturas/
São classificadas em púrica, com dois anéis (como Guia02-2.htm
15

capítulo 1
Um outro tipo de ácido nucléico encontrado
em células vivas é o RNA ou ácido ribonucléico,
que, do mesmo modo que o DNA, também
é um polinucleotídeo e possui um importante
papel na Genética Molecular. Apesar das gran-
des semelhanças entre DNA e RNA, podemos
destacar importantes diferenças: 1- o açúcar
no RNA é a ribose; 2- o RNA contém uracil ao
invés de timina; 3- o RNA, em geral, se apre-
senta como polinucleotídeo único; 4- os nu-
cleotídeos que se polimerizam para formar o
RNA são: adenosina 5’ trifosfato, guanosina
5’ trifosfato, citidina 5’ trifosfato e uridina 5’
trifosfato.

SAIBA MAIS
Ácido ribonucléico: ver RNA. Figura 7 – James Watson (esquerda) e Francis Crick (direita).
Fonte: www.hps.cam.ac.uk/medicine/studying.html
RNA: ácido ribonucléico - molécula sintetizada na
maioria dos organismos, a partir de um molde de
DNA.

Considerando as informações disponíveis


2.2 DUPLA HÉLICE E FORMAS sobre a estrutura e a função da molécula
ALTERNATIVAS de DNA até o momento, Watson e Crick
analisaram várias possibilidades e verifica-
A dupla hélice de DNA foi descrita em 1953, ram que, apenas, o modelo da dupla hélice
por James Watson e Francis Crick (Figura 7), correspondia às sete características consi-
tendo sido uma das mais importantes des- deradas por eles, como sendo prováveis e
cobertas da Biologia, em particular, da Ge- relevantes para descrever um modelo de
nética Molecular. Para compreender melhor molécula estável: 1- a dupla hélice contém
como estes pesquisadores chegaram ao mo- dois polinucleotídeos, o que foi observado
delo da estrutura da molécula de DNA, é im- a partir da análise da densidade do DNA;
portante conhecer os experimentos realiza- 2- as bases nitrogenadas estão arranjadas
dos por Erwin Chargaff e Rosalind Franklin. no interior da hélice, e o arcabouço de açú-
O trabalho realizado por Chargaff e colabo- car fosfato, na parte externa da molécula;
radores usou técnicas sensíveis de cromato- 3- Pontes de hidrogênio unem as bases ni-
grafia para quantificar as quatro bases ni- trogenadas dos dois polinucleotídeos (duas
trogenadas presentes no DNA de amostras pontes entre A e T, e três pontes entre G e
de diferentes organismos. Os dados obtidos C). Esta característica é considerada muito
permitiram observar que o número de ade- importante, pois mostra a complementari-
ninas é igual ao de timinas e que o núme- dade de bases; 4- a dupla hélice executa um
ro de citosinas é igual ao de guaninas, ou giro a cada 10 pares de bases; 5- os dois po-
seja, A=T e C=G. Já o experimento realizado linucleotídeos da dupla hélice têm sentidos
por Rosalind, em 1952, permitiu, através da opostos (5’-3’e 3’-5’), e essa característica é
análise de difração de raios X, técnica pre- fundamental para replicação, transcrição e
viamente desenvolvida por Maurice Wilkins, recombinação; 6- a dupla hélice apresenta
mostrar que o DNA é uma hélice com duas dois sulcos diferentes; 7- a dupla hélice é
periodicidades regulares de 3,4 Å e 34 Å ao dextrógira. (Figura 8)
longo do eixo da molécula.
16
capítulo 1

Figura 8- Propriedades da molécula de DNA: complementaridade e polaridade inversa. Fonte: Snustad D.P. e
Simmons M.J. (2001) Fundamentos de Genética. Editora Guanabara Koogan.

A dupla hélice descrita por Watson e Crick é


denominada de forma B com 10pb por giro Estudos realizados através de análises mate-
da hélice e diâmetro de 19 Å, porém existem máticas da cinética de renaturação dos DNAs
outras formas, como, por exemplo, a forma eucarióticos tem permitido observar diferentes
A, que é uma dupla hélice mais compacta e tipos de DNA. Três classes principais foram des-
possui 11pb por giro da hélice e diâmetro de critas para eucariontes: 1- DNA de sequência
23 Å, e a forma Z, que apresenta a particula- única, uma a dez cópias por genoma; 2- DNA
ridade de girar para esquerda (levógira), dife- de sequência moderadamente repetitiva, 10 a
rindo, portanto, do observado nas formas B e 105 cópias por genoma; 3- DNA de sequência
A (dextrógiras), as quais giram para a direita. altamente repetitiva, mais de 105 cópias por
Existem ainda estruturas helicoidais adicionais, genoma. A quantidade de qualquer um dos
as formas C, D e E, as quais são produzidas sob três tipos de sequências no genoma varia de
condições de laboratório. espécie para espécie. Entretanto, sabe-se que
as sequências únicas constituem cerca de 40 a
Desafio da FIX: constru- 70% do genoma da maior parte dos animais
am o modelo tridimen- e plantas. Já as sequências moderadamente
sional do DNA através repetitivas são consideradas bastante hetero-
da técnica do origa- gêneas, e as sequências altamente repetitivas
mi. Para isso, acessem: são compostas por DNA satélite e não, satélite.
www.sbg.org.br/Ge-
neticaEscola2/web/vol- SAIBA MAIS
2Num1.htm - Estrutura
do DNA em origami, Genoma: conjunto completo de DNA de uma célula
ou organismo.
possibilidades didáticas.
DNA satélite: porção do DNA altamente repetitivo,
2.3 TIPOS DE SEQUÊNCIAS que apresenta densidade de sedimentação específi-
DE DNA ca. Não confundir com o satélite dos cromossomos
acrocêntricos.

Os genomas de procariontes estão constituí- Replicação: duplicação do material genético a partir


dos predominantemente de sequências únicas de moléculas originais de DNA.
de pares de bases, o que indica que a maioria
dos genes está presente no genoma, apenas,
uma vez.
17

capítulo 1
3. DE QUE MODO O DNA Um dos experimentos mais interessantes den-
tro da Biologia foi o de Meselson-Stahl (1958),
E OS CROMOSSOMOS no qual foram usados isótipos de nitrogênio,
SÃO REPLICADOS? tanto na forma normal 14N quanto o 15N,
considerado nitrogênio pesado, que permitiu
3.1 REPLICAÇÃO distinguir, dentre as três propostas de repli-
SEMICONSERVATIVA cação, qual delas é realmente funcional. O
experimento consistiu no cultivo de células de
Durante a multiplicação celular, é preciso que a E. coli por várias gerações, em um meio com
molécula de DNA seja duplicada ou replicada, o nitrogênio pesado 15N, o qual foi substituído
para que as células filhas recebam a informa- pelo 14N. Após o crescimento celular em um
ção genética presente na célula mãe. Descre- meio com 14N, o DNA foi extraído e analisado
veremos, a partir de agora, como uma dupla em gradientes de transferência de densidade
hélice de DNA pode originar duas moléculas de cloreto de césio (CsCl). Os resultados mos-
filhas; o mecanismo de replicação; as enzi- traram-se coerentes com a replicação semicon-
mas envolvidas no processo de replicação e as servativa e poderão ser observados com mais
principais diferenças, quando comparamos a detalhes na Figura 10.
replicação em eucariontes e procariontes. A
característica de complementaridade das ba-
ses nitrogenadas na estrutura da molécula de
DNA possibilita que ela apresente um poten-
cial natural para replicação, pois cada um dos
seus filamentos pode ser usado como molde
para síntese de um filamento complementar.
Contudo, a maneira como se dá o processo de
replicação não é tão óbvio assim, o que levou à
proposição de várias estratégias. Dentre elas,
as mais aceitas foram: 1- replicação semicon-
servativa, na qual cada molécula-filha possui
um filamento parental e outro recém sinteti-
zado; 2- replicação conservativa, na qual uma Figura 10 – Experimento de Meselson e Stahl demonstrando a replica-
das moléculas-filhas possui dois filamentos de ção semiconservativa. Fonte: Snustad D.P. e Simmons M.J. (2001) Fun-
damentos de Genética. Editora Guanabara Koogan.
origem parental, e a outra possui dois filamen-
tos recém-sintetizados; 3- replicação dispersiva
consiste na produção de moléculas-filhas com 3.1.1 FORQUILHAS E ORIGENS DE
filamentos parcialmente de origem parental e REPLICAÇÃO
recém-sintetizado. (Figura 9)
O estudo da replicação em procariontes teve
início com o trabalho de Jonh Cairns em 1963,
no qual foram cultivadas células de E. coli em
meio, contendo [3H] timidina em tempos va-
riados: as células foram lisadas com cuidado,
e os cromossomos, removidos em membra-
nas de filtragem, sendo afixados em lâminas e
guardadas no escuro para posterior análise. As
auto-radiografias mostraram que os cromos-
somos de E. coli são circulares durante a re-
plicação e que os dois filamentos da molécula
parental se deselicoidizam e sofrem replicação
semiconservativa simultaneamente. Cairns su-
Figura 9- Modelos de replicação do DNA: semiconservativo, conser- geriu que a replicação ocorre a partir de um
vativo e dispersivo. Fonte: Snustad D.P. e Simmons M.J. (2001) Funda-
mentos de Genética. Editora Guanabara Koogan.
ponto de origem e que prossegue unidirecio-
nalmente, em torno do círculo. Experimentos
18
capítulo 1

subseqüentes constataram que a replicação em E. coli, como em outros organismos que possuem
cromossomos lineares, é bidirecional e que cada estrutura em forma de Y consiste em uma forqui-
lha de replicação, e as duas forquilhas de replicação são movidas em sentidos opostos, até percor-
rer todo o cromossomo circular (Figura 11). Entretanto, a replicação bidirecional não é universal,
como observado no colifago P2, que apresenta replicação unidirecional.

Figura 11- Replicação bidirecional em procariontes. Fonte: Snustad D.P. e Simmons M.J. (2001) Fundamentos de
Genética. Editora Guanabara Koogan.

A origem de replicação, também chamada 3. DNA topoisomerase, enzimas que catali-


replicon, é única em cromossomos de proca- sam quebras transitórias e adicionam ou
riontes, enquanto que, em eucariontes, são removem superélices na molécula de DNA.
múltiplas; em ambos os casos, ocorrem em
sítios ou sequências específicas denominadas 4. DNA primase, sintetiza um primer de RNA,
de sequências de replicação autônoma (ARS). o qual fornece a extremidade 3’OH, neces-
É esperado que ocorram múltiplas origens de sária para a ação da DNA polimerase;

replicação em eucariontes, visto que é neces-
5. DNA polimerase, enzima capaz de sinte-
sário que a replicação da molécula de DNA,
tizar um novo polinucleotídeo a partir da
presente em cada cromossomo, seja replicada
adição de desoxiribonucleotídeos no sen-
ordenadamente. tido 5’-3’ (atividade polimerásica), corres-
pondentes aos pares de bases complemen-
3.2 APARATO ENZIMÁTICO tares, presentes no filamento molde. Para
manter-se ativa, a polimerase requer o 5’
Para que uma molécula de DNA seja replica- trifosfato de cada um dos quatro desoxir-
da, é necessário que ocorra a desilecoidização ribonuclesídeos, íons de Mg+ e DNA pré-
dos dois filamentos parentais, despareamento -existente. Existem, em procariontes, três
de bases na origem de replicação bem como a tipos de DNA polimerase: a DNA polime-
progressão desse despareamento ao longo da rase I, que apresenta as funções de repa-
molécula em ambas as direções, formando as ro, replicação e excisão do primer; a DNA
forquilhas de replicação. Além desses,passos polimerase II, cuja função é de reparo e a
iniciais, é necessário que haja a síntese de poli- DNA polimerase III, denominada também
nucleotídeos na medida em que os filamentos de replicase, por ser a principal enzima de
da molécula se separam. Para que tudo isso replicação em E. coli. Todas as polimera-
ocorra, é necessária a ação de várias enzimas, ses precisam de uma ponta 3’OH e de um
as quais constituem um aparato complexo en- molde de DNA apropriado. A atividade
exonucleásica no sentido 3’-5’ das DNAs
zimático, no qual cada uma delas terá sua im-
polimerases revisa os filamentos recém-
portância e efetiva participação. Dentre elas,
sintetizados. (Figura 12)
destacamos:
SAIBA MAIS
1. DNA helicase, responsável pelo mecanismo
de desilecoidização da molécula de DNA Primer: pequena sequência de RNA sintetizada pela
através do uso de energia derivada do ATP; primase e adicionada a um molde de DNA para início
da síntese de DNA.

2. SSB são proteínas de ligação ao DNA unifila- Exonucleásica: ver exonuclease.


mentar, impedindo que o filamento sofra re- Exonuclease: enzima que cliva o DNA e/ou RNA a par-
naturação ou forme estruturas em grampo; tir de uma extremidade; atua no reparo do DNA.
19

capítulo 1
Figura 12- Atividades da DNA polimerase I de E. coli. Fonte: Snustad D.P. e Simmons M.J. (2001) Fundamentos de Genética. Editora
Guanabara Koogan.

6. DNA ligase, enzima que catalisa o fecha- são complementares e que apresentam pola-
mento covalente de cortes nas moléculas ridade oposta, a polimerização deve ocorrer
de DNA, através da energia de nicotidami- na extremidade 5’ de um filamento (amplia-
na adenina dinucleotídeo (NAD) ou adeno- ção 3’-5’) e na extremidade 3’ do outro fila-
sina trifosfato (ATP); mento (ampliação 5’-3’). Sabendo ainda que
todas as DNAs polimerases precisam de uma
Além das enzimas relacionadas acima, outros extremidade 3’OH livre, para realizar a síntese
tipos de enzimas participam da replicação do polinucleotídeo (sentido 5’-3’), é possível
como, por exemplo, as proteínas DNA A, DNA perceber que estamos diante de um paradoxo,
B, DNA C, DNA T, DNA J, DNA K, Pri A, Pri B, o qual só foi resolvido a partir da descoberta
Pri C e HU, todas participantes do processo de de que a síntese de um filamento de DNA é
iniciação da replicação e da formação das for- contínua (sentido 5’-3’), enquanto a do outro
quilhas bidirecionais. é descontínua (sentido 3’–5’), ou seja, apesar
dos filamentos de DNA estarem sendo ampli-
3.3 COMPLEXO MECANISMO ficados em sentido físicos opostos, eles estão
DE REPLICAÇÃO sendo ampliados no sentido químico 5’- 3’. A
síntese do filamento descontínuo se dá através
Estudos de auto-radiografia e microscopia da síntese de fragmentos curtos (sentido 5’-
eletrônica revelaram que a síntese dos dois 3’), os quais foram denominados fragmentos
filamentos-filhos se dá na mesma direção, em de Okasaki em homenagem ao pesquisador,
ambas as forquilhas de replicação. Conside- que os descobriu na década de 1960. Como
rando que os filamentos da molécula de DNA a síntese do filamento descontínuo gera vários
20
capítulo 1

fragmentos de DNA, estes são considerados Os filamentos da molécula parental continuam


como um produto intermediário no processo se separando. Para tal, é necessário que a mo-
de replicação e são posteriormente ligados co- lécula sofra um mecanismo de deselicoidiza-
valentemente, a partir da ação da DNA ligase. ção, o qual será catalizado pelas enzimas
Essa enzima não tem ação sobre o preenchi- DNA helicases, as quais, através de energia
mento de lacunas ou gaps oriundos do proces- derivada de ATP, são capazes de desenrolar a
so de replicação. Estes espaços são fechados molécula de DNA. Além das diferentes helica-
pela ação de uma DNA polimerase. (Figura 13) ses, cuja ação também promove a quebra das
pontes de hidrogênio e, portanto, separação
SAIBA MAIS das bases, é necessário que as proteínas SSB se
liguem cooperativamente ao DNA unifilamen-
Polimerização: união química de duas ou mais molé-
culas do mesmo tipo, para formar um novo compos- tar, evitando, dessa forma, a renaturação do
to, tendo os mesmos elementos em iguais propor- filamento de DNA ou a formação de estruturas
ções. Possui peso molecular mais alto e propriedades secundárias. É importante também destacar
físicas diferentes. que a deselicoidização da molécula promove
a formação de um eixo de rotação, que im-
pede que o DNA permaneça superelicoidizado
positivamente, diante da forquilha de replica-
ção. As enzimas DNA topoisomerases são as
responsáveis pelo eixo de rotação necessário
à replicação de moléculas circulares e compre-
endem dois tipos: As topoisomerases são de
dois tipos: topoisomerase I e topoisomerase
Figura13- Síntese semidescontínua. Observe
os fragmentos de Okasaki.
II. Ambas produzem quebras transitórias nas
moléculas, as quais são mantidas por ligações
covalentes, contudo diferem quanto à capaci-
Considerando as informações que temos até o
momento, podemos, então, descrever sucinta- dade de gerar quebras unifilamentares e bifila-
mente todas as etapas do processo de replica- mentares, respectivamente.
ção. (Figura 14) Inicialmente, devemos recor-
dar que estamos Assim que o aparato
estudando a re- de replicação é for-
plicação semicon- mado, a replicação é
servativa, adotan- iniciada pela ação da
do como exemplo DNA primase, enzi-
a replicação em ma responsável pela
E. coli, a qual se síntese de um primer
inicia a partir do de RNA, o qual apre-
reconhecimen- senta à DNA polime-
to da origem de rase uma extremidade
replicação deno- 3’OH livre. Os dois fi-
minado OriC. O lamentos necessitam
reconhecimen- do primer, embora
to da sequência o filamento descon-
presente em OriC tínuo precise de vá-
por um conjun- rios primers, um para
to de proteínas cada fragmento de
pré-iniciais é res- Okasaki. A replicação
ponsável pela no filamento descon-
separação dos tínuo é iniciada por
filamentos espe- um complexo pro-
cificamente no téico, formado pela
Figura 14- Replicação em E. coli: síntese contínua (filamento 3’-5’) e
ponto de origem. descontínua (filamento 5’-3’). Fonte: Snustad D.P. e Simmons M.J. DNA primase e DNA
(2001) Fundamentos de Genética. Editora Guanabara Koogan.
21

capítulo 1
helicase, denominado primossomo. O primos- na várias unidades teloméricas repetidas, que
somo é ativado pela energia do ATP e move-se servirão de molde para que a DNA polimerase
pelo filamento. A DNA polimerase III sinteti- complete a síntese do filamento complementar.
za os filamentos-filhos. No caso do filamento
descontínuo, após a síntese dos fragmentos de Para melhor compreensão da replicação aces-
Okasaki, os primers são retirados, e a DNA po- sem o aplicativo GBOL material genético http://
limerase I preenche os gaps através da síntese www.ufv.br/dgb/gbol/htm/gbol23.htm. Nele
de DNA. Logo em seguida, os fragmentos são vocês poderão, de forma dinâmica, percorrer
unidos pela DNA ligase. A DNA polimerase II todos os passos de mecanismo de replicação.
atua na correção de possíveis erros durante a
síntese dos filamentos-filhos. Imediatamente Desafio da FIX: Vocês
após a replicação de um segmento de DNA, podem tentar reavaliar
este é superelicoidizado negativamente pela os principais conceitos
topoisomerase girase, sendo posteriormente da Genética mendelia-
dobrado e condensado no genoma. Todas as na e da Genética mole-
enzimas citadas acima atuam de forma coor- cular através da elabo-
denada, em cada forquilha de replicação. O ração de um mapa de
aparato completo, que se move na forquilha conceito. Para tal, aces-
de replicação, é chamado de replissomo. sem www.sbg.org.br/
GeneticaEscola2/web/
SAIBA MAIS vol1Num2htm - Men-
del enrolado na dupla
Renaturação: conversão do DNA do estado de fita hélice.
única para o de fita dupla, após desnaturação.

Primossomo: um complexo de replicação, que con-


tém atividades de DNA primase e DNA helicase. REVISANDO
CONHECIMENTOS
3.4 REPLICAÇÃO EM
EUCARIONTES 1. Os avanços e a importância da genética
molecular são evidentes em diversas áre-
A maior parte dos experimentos de replica- as, tais como na medicina e na agricultura.
ção foi realizada em procariontes, contudo as Para melhor compreendê-los, é fundamen-
informações disponíveis são suficientes para tal ter conhecimentos sobre a estrutura bá-
considerarmos que a maioria dos aspectos sica da molécula do DNA. Para tanto, es-
do processo de eplicação é similar em proca- quematize a unidade básica da molécula,
riontes e eucariontes. Algumas diferenças me- mostrando (identificando) o grupamento
recem ser destacadas. São elas: 1- os primers fosfato, o açúcar e a base nitrogenada.
de RNA e os fragmentos de Okasaki são mais
curtos em eucariontes; 2- a síntese de DNA em
eucariontes ocorre numa etapa específica do
2. Com base no segmento de DNA represen-
tado abaixo, responda as alternativas.
ciclo celular; 3- os eucariontes possuem múl-
tiplas origens de replicação; 4- os eucarion- 5...GGGATCCTGCCCAAAATC...3
tes possuem cinco tipos de DNA polimerase
α (alfa),β (beta),γ (gama),δ (delta),ε (epsilon), a) Quantos desoxirribonucleotídeos consti-
sendo a γ especifica para as mitocôndrias; 5- tuem esta molécula?
para cada forquilha de replicação, os eucarion- b) Quantas ligações duplas e triplas de
tes usam duas DNAs polimerases diferentes (α pontes de hidrogênio estão
para a descontínua e δ para a contínua); 6- a presentes no segmento complementar?
molécula de DNA linear em eucariontes difi- c) Represente a cadeia complementar deste
culta a replicação das extremidades da molé- segmento.
cula no filamento descontínuo. Esse problema
é contornado pela enzima telomerase, a qual
possui um molde de RNA, cuja ação adicio- 3.
Você aprendeu que a replica-
22
capítulo 1

ção do DNA envolve um complexo de enzimas com papéis específicos que visa à ma-
nutenção da integridade genética nas moléculas-filhas. A seguir, citamos algu-
mas dessas enzimas, e você deverá relacioná-las com as funções correspondentes.

1- DNA polimerase III


2- Helicase
3- Proteínas SSB
4- DNA ligase
5- Primase

( ) Religa o arcabouço de DNA, catalisando as ligações fosfodiéster.


( ) Sintetiza o iniciador do processo da replicação.
( ) Adiciona nucleotídeos às novas cadeias.
( ) Responsável pelas quebras das pontes de hidrogênio.
( ) Ligam-se ao DNA unifilamentar, impedindo a reconstituição da dupla hélice.

4. Sabemos que as descobertas científicas resultam de pesquisas realizadas com muito rigor
e dedicação, muitas das quais levam anos para serem concluídas. É importante e necessário
conhecermos os trabalhos de tantos cientistas que fizeram e fazem com que a ciência se
desenvolva e traga benefícios para o nosso planeta. A seguir, relacionamos algumas etapas
de experimentos ou deduções que favoreceram o crescimento na área da biologia molecular.

1. As cepas de Bactérias tipo IIR foram transformadas em tipo IS. ( ) Watson e Crick
O princípio transformante é o material genético.
2. A digestão do DNA com desoxirribonuclease destruiu total- ( ) Maurice Wilkins e
mente a capacidade transformadora. O princípio transforman- Rosalind Franklin
te é o DNA.
3. Amostras de DNA e proteínas foram marcadas respectivamente, ( ) Frederick Griffith
com os radioisótopos 32P e 35S. Mais de 80% do 32P estavam
presentes no pellet da bactéria. O material genético é o DNA.
4. Deduziram que o DNA existe na forma de dupla hélice. ( ) Avery, MacLeod e
McCarty
5. A análise por difração de raios X indica que o DNA é uma mo- ( ) Alfred Hershey e
lécula helicoidal. Marta Chase

Identifique os principais autores envolvi- Guanabara Koogan S/A, 2006.


dos.
REFERÊNCIA SITES

LEITURA FUNDAMENTAL http://www.sbg.org.br/GeneticaEscola2/web/


vol2Num1.htm
SNUSTAD, D. P. e SIMMONS M. J. Fundamen-
tos de Genética: Guanabara Koogan S/A, 2000. http://www.ufv.br/dgb/gbol/htm/gbol23.htm

LEITURA COMPLEMENTAR http://www.sbg.org.br/GeneticaEscola2/web/


vol1Num2htm-
GRIFFITHS, A. J. F.; WESSLER, S. R.; LEWONTIN,
R. C.;GELBART, W. M.; SUZUKI, D. T.e MILLER,
J. H. Introdução à Genética: Rio de Janeiro:
23

capítulo 2
Expressão Gênica,
Mutação e Reparo
do DNA
Profa. Rita de Cássia de Moura Carga Horária I 15H
Colaboradoras: Profa. Marília de França Rocha
Profa. Maria Teresa Marquim Nogueira Cornélio

INTRODUÇÃO
Iniciaremos nosso estudo conceituando
genes, descrevendo seus modos de orga-
nização e de expressão, ou seja, como os
genes expressam sua informação biológica
e a disponibilizam à célula. Veremos, ain-
da, as possíveis alterações que ocorrem na
sequência de nucleotídeos da molécula de
DNA e as diferentes formas de correção ou
reparo.

Neste capítulo, estudaremos os genes, não


mais considerando a sua composição, mas,
a sua estrutura e a sua forma de transmis-
são da informação biológica. No que diz
respeito à transmissão das informações,
estudaremos os processos que compõem a
expressão gênica, a transcrição e a tradução
bem como os diferentes tipos de moléculas
de RNA e o código genético.

Adicionalmente, abordaremos, ainda, de


forma sucinta, os principais agentes res-
ponsáveis pela mutação das sequências de
nucleotídeos da molécula de DNA, as prin-
cipais consequências das mutações e os di-
ferentes modos de reparo do DNA.

OBJETIVOS ESPECÍFICOS
• Comparar o processo de transcrição em
procariontes e eucariontes;
24
capítulo 2

• Descrever o processo de tradução; A maior parte dos genes está distribuída alea-
toriamente e de forma intercalar ao longo da
• Distinguir os diferentes tipos de mutação; extensão de uma molécula de DNA. Contu-
do, em alguns casos, os genes encontram-se
• Identificar os mecanismos de reparo da agrupados separadamente, organizados em
molécula de DNA. grupos de genes que possuem unidades de
informações biológicas correlacionadas. São
exemplos de grupos de genes, os operons e
1. TRANSMISSÃO DA as famílias multigênicas. Operons consistem
em um grupamento de genes, que codificam
INFORMAÇÃO uma série de enzimas participantes de uma via
BIOLÓGICA bioquímica. Este tipo de grupamento é carac-
terístico de bactérias. Por outro lado, em dife-
1.1 GENES E INFORMAÇÃO rentes organismos, podemos observar famílias
BIOLÓGICA multigênicas, nas quais os genes também se
encontram correlacionados, e que, apesar de
Um gene consiste em um segmento de uma serem distintos, possuem sequências idênticas.
molécula de DNA, com comprimento variável, Existem dois tipos de famílias multigênicas:
que transporta a informação biológica. A in-
formação está contida no gene, sob a forma 1. Família multigênica simples, na qual todos
de instruções, as quais orientarão a síntese de os genes são idênticos. A maioria dos or-
uma molécula de RNA, que poderá ou não ganismos superiores possui esse tipo de fa-
subseqüentemente orientar a síntese de uma mília, como, por exemplo, as cópias múlti-
molécula de proteína. plas do gene RNAr 5S (Figura 2a).

A informação biológica de um gene é lida em, 2. Família multigênica complexa são grupos
apenas, um dos dois polinucleotídeos da du- de genes similares, embora não idênticos,
pla hélice, o como, por exemplo,
qual é chama- os genes dos polipep-
do filamento tídios da globina em
molde (direção vertebrados. A família
3’5’), que serve multigênica da globi-
de modelo para na possui ainda pseu-
a síntese de dogenes (ψ), que são
uma molécula genes muito parecidos
complementar com os outros genes
de RNA duran- da família, embora te-
te a transcrição nham perdido sua fun-
(Figura 1). ção (Figura 2b).

SAIBA MAIS
Família multigênica: conjun-
to de genes que descendem
de um gene ancestral co-
mum, que sofreu duplicação
e divergência; grupo de ge-
nes que codificam produtos
homólogos com funções se-
melhantes.

Pseudogenes: gene inativo


dentro de uma família mul-
Figura 1- Filamento molde (direção 3’5’) servindo de modelo para a tigênica.
síntese de uma molécula complementar de RNA durante a transcrição.
Fonte: Snustad D.P. e Simmons M.J. (2001) Fundamentos de Genética.
Editora Guanabara Koogan.
25

capítulo 2
Baltimore descobriram que, em alguns vírus, a
informação biológica pode ser transferida do
RNA para o DNA (Figura 3).

SAIBA MAIS
Éxons: segmento de um gene mantido após o pro-
cessamento e traduzido nos ribossomos.

Íntrons: segmento de DNA, que se intercala aos


éxons, sendo retirado durante o processamento do
RNA e, portanto, não traduzido.

Figura 2- Famílias multigênicas. (a) simples – genes RNAr 5S de Droso-


phila; (b) complexa – grupos de genes da globina humana.

Pesquisa da Fix: Você


deve estar se pergun-
tando por que um
dado organismo preci-
sa de repetições de ge-
nes? Para compreender
melhor este evento,
pesquise, em livros e
em sites especializa-
dos, exemplos de gru-
pamentos de genes, Figura 3- Fluxo da informação genética: replicação, transcrição e tra-
com ênfase no papel que desempenham e no dução ocorrem em todos os organismos; transcrição reversa ocor-
re em células infectadas com vírus com RNA. Fonte: Snustad D.P. e
seu grau de conservação. Simmons M.J. (2001) Fundamentos de Genética. Editora Guanabara
Koogan.

Alguns genes são ditos descontínuos, pois se


apresentam divididos em unidades distintas,
separadas por segmentos de DNA. As unida- 2. EXPRESSÃO GÊNICA
des que contêm a informação biológica são
chamadas éxons, e as sequências intermedi- 2.1 TRANSCRIÇÃO
árias, íntrons. Os genes descontínuos podem
ser observados em vírus, eubactérias, arqueo- A transcrição é o primeiro estágio da expressão
bactérias e organismos superiores. gênica, processo através do qual o filamento
molde de DNA orienta a síntese de um fila-
1.1.1 O DOGMA CENTRAL mento complementar de RNA, denominado
transcrito. Como a maioria dos experimentos
Francis Crick, 1958, descreveu o processo hoje pioneiros na Genética Molecular, as primeiras
conhecido como expressão gênica como sen- descrições do processo de transcrição ocorre-
do a transferência da informação biológica ram em organismos procariontes. Este fato se
contida no DNA de um gene para o RNA, e, deve à simplicidade desses
posteriormente, para proteína. Crick conside- organismos em compara-
rou ainda que o fluxo de informação é unidire- ção aos eucariontes.
cional, ou seja, que a proteína não pode orien-
tar a síntese de RNA e que o RNA não pode Lista da Fix: Para relembrar
orientar a síntese de DNA. Esta parte do Dog- e compreender melhor,
ma foi questionada a partir de 1970, quando faça uma lista comparativa
independentemente, Howard Temin e David entre procariontes e euca-
26
capítulo 2

riontes, considerando as características básicas 2.1.1 RNA POLIMERASE


e a organização e a estrutura gênica.
A enzima RNA polimerase responsável pela
A sequência de DNA molde na transcrição será transcrição de todos os genes de E.coli foi des-
a de DNA não molde do gene (sentido 5’3’), coberta em 1958. A RNA polimerase é uma
ou seja, a sequência capaz de orientar um grande proteína formada por subunidades po-
transcrito de RNA similar ao filamento de DNA lipeptídicas diferentes (α2ββ’σ), denominada
não molde (Figura 4). holoenzima (peso molecular de 480.000 dal-
tons), a qual pode se organizar de outra for-
SAIBA MAIS ma (α2ββ’), na qual o cerne da enzima (peso
molecular de 395.000 daltons) está separado
Transcrição: processo através do qual as moléculas de da subunidade σ (sigma). Diferentemente, os
RNA são sintetizadas pela RNA polimerase a partir de
um molde de DNA. organismos eucariontes apresentam RNA po-
limerase mais complexas (oito a doze subuni-
Expressão gênica: manifestação fenotípica dos genes. dades com peso molecular superior a 500.000
daltons), classificadas em três ti-
pos diferentes: RNA polimerase I,
II e III, que transcrevem genes de
RNA ribossomal; RNA mensagei-
ro e pequeno nuclear; RNA trans-
portador, pequeno nuclear e ri-
bossomal 5S, respectivamente.

2.1.2 ETAPAS DA TRANSCRIÇÃO

A transcrição é dividida em três


etapas: início, alongamento
e término. Na primeira etapa,
ocorre o reconhecimento do sítio
de início da transcrição pela RNA
polimerase. Este sítio é sinalizado
por uma região chamada promo-
tor ou sequência promotora, que
está localizada anteriormente ao
Figura 4- A transcrição usa apenas um filamento molde de DNA. Fonte: Snustad D.P. e gene. Estas sequências são iguais
Simmons M.J. (2001) Fundamentos de Genética. Editora Guanabara Koogan.
ou muito similares em diferentes
organismos, de modo que estas
possam ser reconhecidas pela
Para que uma molécula de RNA seja sintetiza- RNA polimerase, o que faz com que sejam co-
da, é necessário que ocorra a polimerização nhecidas também como sequências concenso.
de subunidades de ribonucleotídeos, a qual Em E. coli, a sequência promotora foi descri-
pode ser resumida como: n(NTP) →RNA com ta como sendo composta por duas unidades
n nucleotídeos de comprimento + n - 1(PPi); diferentes, uma denominada boxe -35 (5’-TT-
nesta reação, o grupo 3’-OH de um ribonucle- GACA-3’) e a outra, boxe -10 (5’-TATAAT-3’),
otídeo reage com o grupo 5’-P do segundo, ambas recebendo a denominação de boxes
formando uma ligação fosfodiéster. Isto impli- -35 e -10 devido a sua localização na molécula
ca a subseqüente perda de uma molécula de de DNA, em relação ao início da transcrição
pirofosfato (PPi) para cada ligação formada. O (Figura 5).
RNA transcrito é, portanto, sintetizado no sen-
tido 5’→3. A enzima que catalisa esta reação SAIBA MAIS
chama-se RNA polimerase.
Promotor: sequência de DNA localizada na extremi-
dade 5’ de um gene e reconhecida pela RNA polime-
rase, para dar início à transcrição.
27

capítulo 2
seu estado. Uma outra característica do alon-
gamento refere-se à velocidade da transcrição,
a qual é variável. Verificamos, ainda, que o
transcrito produzido é maior que o gene, pois
uma sequência inicial ou transcrito líder que
antecede o gene também sofre transcrição
bem como uma região posterior ao gene e an-
terior ao término da transcrição.

Figura 5 –Transcrição: início. Fonte: Snustad D.P. e Simmons M.J. (2001)


Fundamentos de Genética. Editora Guanabara Koogan.

Ainda na etapa de início, podemos observar


que a subunidade σ da holoenzima RNA poli-
merase (α2ββ'σ) em E. coli é responsável pela
localização do sítio promotor. Inicialmente é
formado pela RNA polimerase e o DNA, um
complexo chamado promotor fechado (a en-
zima cobre cerca de 60pb desde o boxe -35
ao -10), logo depois no boxe -10, ocorre a
quebra do pareamento de bases e a deseli-
coidização da molécula de DNA, formando o
complexo promotor aberto. Após a formação
desse complexo, a subunidade --é liberada e a
holoenzima é convertida ao cerne da enzima.
Verificamos, ainda, o pareamento dos dois
primeiros ribonucleotídeos com o filamen-
to molde na posição +1 e +2 e a síntese da
primeira ligação fosfodiéster da molécula de
RNA (Figura 6). Figura 7- Transcrição: alongamento. Fonte: Snustad D.P. e Simmons
M.J. (2001) Fundamentos de Genética. Editora Guanabara Koogan.

O término da transcrição consiste na disso-


ciação da RNA polimerase e liberação do RNA
transcrito. Pode ocorrer de duas formas: 1-
Através de palíndromos complementares, que
são sequências capazes de se parearem den-
tro do filamento de DNA ou de RNA transcri-
Figura 6 – Complexo promotor fechado. http://paginas.terra.com.br/ to, formando haste-alça ou grampo, seguido
educacao/biolmol/Genetica-Medicina/index.htm
de uma sequência de cinco a dez adeninas no
DNA, a qual se pareia com uma sequência de
Uracilas do RNA e posterior rompimento do
Na etapa de alongamento (Figura 7), a RNA pareamento com subseqüente liberação do
polimerase desenrola a molécula de DNA, na RNA; 2- Proteína dependente de rô é um outro
medida em que avança, adicionando ribonu- tipo de finalizador da transcrição, que atua na
cleotídeos à extremidade 3’ da molécula de ausência de sequências de As. A proteína cha-
RNA. Apenas uma parte da molécula é aberta mada rô (peso molecular de 276.000 daltons)
durante a transcrição, pois, após a polimeri- liga-se à molécula de RNA e a libera após o
zação, o transcrito se dissocia do filamento pareamento intrafilamentar, responsável pela
molde, permitindo que a dupla hélice volte ao formação de haste-alça ou grampo (Figura 8).
28
capítulo 2

SAIBA MAIS
Palíndromos: sequência de DNA cuja sequência complementar é a mesma, lida de forma equivalente em ambas as
direções.

Figura 8- Transcrição: término; liberação do RNA através de haste-alça ou grampo. Fonte: Snustad D.P. e
Simmons M.J. (2001) Fundamentos de Genética. Editora Guanabara Koogan.

2.1.3 TRANSCRIÇÃO EM EUCARIONTES devem se dissociar do complexo no final do


gene, levando à sua desintegração.
A transcrição em eucariontes, apesar de ser si-
milar ao observado em procariontes, apresen- Aprofunde seu conhecimento, consultando o
ta-se mais complexa, em especial, na etapa de capítulo 12 do livro: Snustad D.P. e Simmons
início. As três RNAs polimerases (I, II e III) reco- M.J. (2001) Fundamentos de Genética. Edito-
nhecem promotores diferentes, de modo que ra Guanabara Koogan. Acessem o site: http://
a transcrição é específica para grupos de ge- www.ufv.br/dgb/gbol
nes. A formação do complexo de pré-iniciação
se dá pela polimerase e por vários fatores de 2.2 TIPOS DE RNA
transcrição, como, por exemplo, TFIID, TFIIA,
os quais estão envolvidos no reconhecimento a) O RNA mensageiro (RNAm) é produzido a
dos promotores pela RNA polimerase. A etapa partir da informação biológica de uma sequ-
de ligação da RNA polimerase ao complexo en- ência gênica. Ele é intermediário entre o gene
volve outros fatores de transcrição. e o produto da tradução e, em geral, não tem
vida longa na célula, sendo, portanto, produ-
SAIBA MAIS zido sempre que necessário. Este tipo de RNA
sofre modificações e processamento antes
Fatores de transcrição: proteína que se liga ao DNA do processo de tradução em eucariontes, en-
para ativar e regular a transcrição gênica. quanto em procariontes, ele é cópia direta do
gene. As principais modificações consistem em
Dentre eles, podemos destacar o TFIIH, que alterações químicas nas duas extremidades da
é uma helicase com atividade de dissociação molécula de RNAm, remoção de íntrons, e, em
do DNA, permitindo o início da transcrição. A alguns casos, alterações na sequência de nu-
etapa de término ainda precisa ser melhor es- cleotídeos do RNAm.
tudada, sabendo-se que fatores de transcrição
29

capítulo 2
Inicialmente, vamos discutir as modificações químicas nas extremidades do RNAm, as extremida-
des 5’ são revestidas por uma estrutura complexa m7GpppNpN, onde m7G é o nucleotídeo, que
transporta a base modificada 7-metilguanina, e que é adicionado à molécula de RNAm após a
transcrição. Na extremidade 3’ da maioria dos RNAsm de eucariontes, é adicionada cerca de 250
nucleotídeos A, formando uma cauda denominada cauda poli (A): ...pNpNpA(pA)npA. Este tipo
de modificação é chamado poliadenilação e é produzido pela enzima poli (A) polimerase (Figura
9). Um outro tipo de modificação consiste na remoção de íntrons e reunião de éxons, antes que
ocorra a tradução. Este processo, denominado de recomposição (splicing), é considerado com-
plexo e ocorre em genes descontínuos (Figura 10).

SAIBA MAIS
Poliadenilação: adição de sequência de resíduos de adenina à extremidade 3’ de um pré RNAm (RNA heterogêneo),
em eucariotos.

Figura 10- Mecanismo de recomposição (splicing). Fonte: Snustad


D.P. e Simmons M.J. (2001) Fundamentos de Genética. Editora Gua-
nabara Koogan.

Figura 9- Inserção do 7-metil guanosina e da cauda poli A. Fonte: Snustad


D.P. e Simmons M.J. (2001) Fundamentos de Genética. Editora Guanabara
Koogan.

Pesquisa da Fix: você ção de duas proteínas com funções bioquími-


pode desvendar os cas diferentes, oriundas da informação bioló-
mistérios desse proces- gica de um mesmo gene.
so, pesquisando sobre
sinais envolvidos na re- b) O RNA ribossomal (RNAr) é um dos com-
moção de íntrons, vias ponentes dos ribossomos, que são estruturas
de remoção e diferen- complexas com grande atuação no processo
tes tipos de íntrons. Ver de tradução. Nos ribossomos, encontramos
bibliografia indicada. uma cópia de cada um dos tipos de RNAr exis-
tentes, três RNAsr em ribossomos de proca-
Por último, conversaremos um pouco sobre a riontes e quatro em eucariontes. O transcrito
edição de RNA, ou seja, a modificação de um primário do RNAr é chamado pré-RNAr e con-
RNAm através da inserção de novos nucleo- tém os tipos de RNAr (16S, 23S e 5S em pro-
tídeos ou pela deleção de nucleotídeos. Este cariontes, e 18S, 5,8S e 28S em eucariontes),
tipo de modificação é responsável pela obten- separados por espaçadores. Os genes de 5S
30
capítulo 2

em eucariontes encontram-se separados dos c) O RNA transportador (RNAt) é relativamente


demais genes de RNAr. Tanto para procarion- pequeno, possuindo cerca de 74 a 96 nucleo-
tes como em eucariontes, existem repetições tídeos para diferentes moléculas de distintos
de unidades de transcrição do RNAr e ocorrem organismos. Todas as moléculas de RNAt for-
cerca de sete cópias em procariontes e de 50 a mam uma configuração que se assemelha a
5.000 cópias, em eucariontes (Figura 11). um trevo, o qual está constituído dos seguin-
tes componentes: braço aceptor, braço D ou
SAIBA MAIS DHU, braço anticódon, braço extra ou variável
e braço TψC (Figura 12). Veremos, com mais
Inserção: adição de qualquer segmento de DNA;
também pode se referir à alteração cromossômica detalhes no item tradução, o papel desempe-
estrutural. nhado pelos braços do RNAt. Em procarion-
Deleção: perda de qualquer segmento de DNA; também
tes e eucariontes, os RNAt são transcritos em
pode se referir à alteração cromossômica estrutural. precursores de RNAt, que são processados e,
posteriormente, liberados como RNAt madu-
Ribossomos: organelas celulares constituídas de RNAr
e proteínas; organelas responsáveis pela tradução. ros. Do mesmo modo que o RNAr, o RNAt
também possui múltiplas cópias em respos-

Figura 12- Configuração em trevo do RNAt. Fonte: Snustad D.P. e Simmons


M.J. (2001) Fundamentos de Genética. Editora Guanabara Koogan.

ta à demanda celular.
Pesquisa da Fix: Existem
outros tipos de RNA,
como, por exemplo, o
pequeno nuclear e o
RNA de interferência.
Este último descoberto
no início dos anos 2000.
Aproveite este momen-
to, em que sua curiosi-
Figura 11- RNAs ribossomais (RNAr) e proteínas na formação dade está aguçada e pesquise sobre o papel
dos ribossomos. Fonte: Snustad D.P. e Simmons M.J. (2001)
Fundamentos de Genética. Editora Guanabara Koogan.
dos RNAs pequeno nuclear e de interferência
31

capítulo 2
na célula. tofano, possuem mais de um códon;
2.3 CÓDIGO GENÉTICO 2. é considerado não-ambíguo, ou seja, uma
trinca só pode codificar um aminoácido;
A descrição completa do código genético só 3. sem superposição, isto é, uma dada base
foi determinada no ano de 1966, quando se pertence a uma só trinca;
elucidou a colinearidade entre o gene e apro- 4. é contínuo, não existindo espaçamento
teína e a correspondência entre cada códon do entre os códons;
código a uma trinca de nucleotídeos. A partir 5. o código é quase universal, pois códigos
daí, foi possível conhecer as características do fora do padrão foram observados em ge-
código, dentre elas: nes mitocondriais de Drosophila, fungos e
leveduras;
1. o código é redundante, no qual todos os 6. o código contém códons de pontuação
aminoácidos, exceto a metionina e o trip- dos tipos códons de iniciação (AUG - me-
tionina) e finalização (UAA, UGA e UAG)

Tabela 1 - Código Genético. Fonte: Snustad D.P. e Simmons M.J. (2001) Fundamentos de Genética. Editora Guanabara Koogan.

(Tabela 1). molécula de RNAt é específica a um dos 20


2.4 TRADUÇÃO aminoácidos envolvidos na síntese protéica. O
RNAt sofre aminoacilação, ou seja, cada RNAt
A tradução é o segundo processo da expressão forma uma ligação com um aminoácido espe-
gênica, diferente da transcrição, ocorrendo no cífico. O aminoácido se liga à extremidade do
citoplasma, em eucariontes e de forma conco- braço aceptor do trevo do RNAt através da liga-
mitante com a transcrição em procariontes. É ção do grupamento carboxila do aminoácido e
considerado um processo complexo, que en- do grupamento 3’-OH do nucleotídeo termi-
volve muitos elementos. Para que a tradução nal do RNAt. Esta associação é controlada pela
ocorra adequadamente, é fundamental que o aminoacil-RNAt sintetase. Após a ligação do
código genético seja respeitado. O RNAt é im- aminoácido correto ao braço aceptor do RNAt,
prescindível durante esse processo, pois cada a molécula necessita completar a ligação entre
32
capítulo 2

o RNAm e o polipeptídeo por meio do reconhecimento do códon correto e da ligação a ele. A alça
anticódon do RNAt liga-se a ele através do pareamento de bases, pois é complementar ao códon.

Da mesma forma que a transcrição, a tradução também apresenta três etapas: início, alongamen-
to e término. Como exemplo do processo de tradução, veremos as etapas em E. coli. No início,
a subunidade menor do ribossomo (30S) se ligará a uma molécula de RNAm em um ponto es-
pecífico (5’-AGGAGGU-3’), antecedente ao códon de início do gene. Esta sequência é chamada
sequência de Shine-Dalgarno. Logo após a localização do sítio de início, a subunidade migra até
encontrar o códon AUG, que corresponde ao códon de início da tradução. Quando um RNAt
associado à metionina é formilado (fmet) e forma pares de bases com o códon de iniciação locali-
zado na subunidade 30S, declaramos que foi formado o complexo de iniciação. Participam, ainda,
da formação desse complexo alguns fatores de iniciação (IF1, IF2, IF3) (Figura 13).

Figura 13 – Início da Tradução- fatores de iniciação (IF1, IF2, IF3). Fonte: Snustad D.P. e Simmons M.J.
(2001) Fundamentos de Genética. Editora Guanabara Koogan.

Durante a etapa de alongamento da cadeia pelo RNAtfmet aminoacetilado. O segundo sítio


polipeptídica, a subunidade maior do ribosso- chamado sítio aminoacil ou A posiciona-se so-
mo se liga ao complexo através da hidrólise da bre o segundo códon do gene. O alongamento
molécula de GTP associada ao complexo de ini- se inicia, quando o RNAt correto se encaixa no
ciação, gerando dois sítios distintos. O primei- sítio A e forma pares de bases com o segundo
ro sítio denominado Peptidil ou P’ é ocupado códon. Alguns fatores de alongamento são ne-
33

capítulo 2
cessários (EF-Tu, EF-Ts) para a entrada do aminoacil RNAt no sítio A. Após a ocupação dos dois sítios,
ocorrerá uma ligação peptídica entre o grupamento carboxila do fmet e o grupamento amino do se-
gundo aminoácido. A enzima que catalisa esta reação é a peptidil transferase. O ribossomo desliza
ao longo do RNAm, de modo que o RNAt a-a se encaixe no sítio P e o RNAtfmet se dissocie do sítio
A, liberando-o, para que outro RNAt aminoacetilado possa penetrar no sítio A. Esse processo é
chamado de translocação, repetindo-se várias vezes, durante o ciclo de alongamento (Figura 14).

Figura 14- Alongamento da tradução. Fonte: Snustad D.P. e Simmons M.J. (2001) Fundamentos de Genética. Editora Guanabara Koogan.
34
capítulo 2

Figura 14- Alongamento da tradução. Fonte: Snustad D.P. e Simmons M.J. (2001) Fundamentos de Genética. Editora Guanabara
Koogan.

Na etapa de término da tradução, um dos três nesse processo. Após a ação desses fatores
códons finalizadores (UAA, UAG ou UGA) se e liberação do polipeptídio, o complexo de
apresenta ao sítio A. Um dos dois fatores de tradução é desfeito, as subunidades do ribos-
liberação (RF1 ou RF2) entra no sítio A e cliva o somo se separam, e os fatores são liberados
polipeptídio a partir do RNAt final. Um terceiro (Figura 15).
fator (RF3) desempenha um papel secundário
35

capítulo 2
Figura 15- Término da tradução. Fonte: Snustad D.P. e Simmons M.J. (2001) Fundamentos de Genética. Editora
Guanabara Koogan.

2.4.1 TRADUÇÃO EM EUCARIONTES iniciação em eucariontes requer a hidrólise de


uma molécula de ATP; 5- o término da tradu-
A tradução em procariontes e eucariontes é ção requer a hidrólise de uma molécula de GTP.
bastante similar, contudo difere em alguns as-
pectos. São eles: 1- A subunidade pequena do Desafio da Fix: através
ribossomo reconhece uma estrutura capsular, da modelagem, vocês
a qual se liga à extremidade 5’ do RNAm, de- podem realizar os pro-
pois se move ao longo do RNAm, até alcançar cessos de transcrição e
um códon iniciador; 2- O RNAt iniciador trans- tradução, os quais ne-
porta uma metionina não formilada; 3- o início cessitam de abstração.
da tradução requer mais fatores de iniciação Para isso, acessem www.
do que o necessário para procariontes; 4- a sbg.org.br/GeneticaEs-
36
capítulo 2

cola2/web/vol2Num1.htm - O ensino da trans- 3.1.1 TIPOS DE MUTAÇÃO


crição e tradução para portadores de necessi-
dades educativas especiais - visuais e pessoas Para classificar as mutações, em geral, são
de visão normal. Uma outra forma dinâmica considerados os seguintes aspectos: o tipo de
de trabalhar com esses processos é acessar o alteração sofrida pela sequência de DNA; os
Programa GBOL (http://www.ufv.br/dgb/gbol - possíveis efeitos provocados pela mutação e as
Genética Molecular- Dogma central), no qual possíveis alterações fenotípicas resultantes da
é permitido ao usuário acompanhar os pro- mutação.
cessos de forma automática ou passo a passo
(botão manual), além de alterar a velocidade 3.1.1 TIPOS DE MUTAÇÃO
da apresentação das etapas da transcrição ou
da tradução. Para classificar as mutações, em geral, são
considerados os seguintes aspectos: o tipo de
alteração sofrida pela sequência de DNA; os
3. MUTAÇÃO E REPARO possíveis efeitos provocados pela mutação e as
possíveis alterações fenotípicas resultantes da
DA MOLÉCULA DE DNA mutação.

3.1 MUTAÇÃO 1. Mutações na sequência de DNA

Mutação é uma alteração do material gené- A mutação pode ser denominada de mutação
tico de células (ou vírus), podendo ocorrer de ponto (Figura 16a), quando ocorre a subs-
no genoma, nos cromossomos ou no gene. tituição de um nucleotídeo por outro. Pode ser
Geralmente, quando nos referimos à muta-
classificada de transição, por exemplo, quando
ção, estamos tratando de uma alteração em
ocorre a substituição de uma purina por ou-
um único gene, conhecida como mutação de
tra purina (A « G) ou de uma pirimidina por
ponto ou gênica.
outra pirimidina (T « C). Pode ainda ser uma
Uma mutação é uma pequena alteração na transversão, se a alteração for de uma purina
molécula de DNA, a qual pode ocorrer duran- para uma pirimidina ou vice-versa (A ou G «
te o processo de replicação, podendo ou não T ou C). São verificadas, ainda, mutações do
ser corrigida. Quando o erro não é corrigido, tipo inserção ou deleção, nas quais ocorre a
ocorre o mau pareamento entre os filamentos adição ou remoção de um par ou vários pares
da molécula filha, promovendo a formação de bases. Existe ainda a inversão, que consis-
de moléculas-netas diferentes, uma apresen- te na retirada de uma sequência da molécula
tando a sequência correta de nucleotídeos, de DNA e sua reintegração na mesma posição,
enquanto a outra apresenta uma mutação. porém invertida.
As mutações podem ser neutras ou graves,
por isso, para minimizar os problemas que SAIBA MAIS
podem advir das mutações, os organismos
possuem mecanismos de reparo do DNA, os Mutação de ponto: alteração em um loco gênico es-
pecífico, podendo ser ocasionada por substituição,
quais corrigem o mau pareamento e as pos- inserção ou deleção de uma única base (ou poucas).
síveis alterações.
Mutação silenciosa: aminoácidos equivalentes fun-
As mutações podem ocorrer dentro de um cionalmente podem substituir-se reciprocamente, e,
gene ou em regiões intergênicas. Se a muta- assim, o produto mutante funciona como o original.
ção ocorrer em um gene, ela pode alterar o Transição: substituição de base púrica por púrica ou
produto gênico e provocar uma alteração de pirimídica por pirimídica.
fenótipo. Contudo, se a mutação ocorrer em
uma região intergênica, ela provavelmente Transversão: substituição de base púrica por pirimídi-
ca ou vice-versa.
não terá efeito sobre a célula e será denomina-
da de silenciosa.
37

capítulo 2
Figura 16- Tipos de mutação. Fonte: Snustad D.P. e Simmons M.J. (2001) Fundamentos de Genética. Editora Gua-
nabara Koogan.

2. Mutações em um gene SAIBA MAIS


Deleção: perda de qualquer segmento de DNA; tam-
Pode ser qualquer um dos tipos de mutações
bém pode se referir à alteração cromossômica estru-
na sequência de DNA, considerando que es- tural.
tas ocorram em uma região codificante de um
gene. Inversão: quebra e rotação de 180º de qualquer seg-
mento de DNA; também pode se referir à alteração
cromossômica estrutural.
A mutação pode ser dita silenciosa, quando a
alteração de um nucleotídeo modificar, em ge- Mutação de sentido trocado: a substituição de uma
ral, a terceira base de um códon, provocando base troca o aminoácido original por outro.
alteração do códon, mas não, do aminoáci-
Mutação sem sentido: mutação que gera um códon
do. Isso ocorre devido à redundância do có-
finalizador.
digo genético. Contudo, se a mutação ocorrer
no primeiro ou no segundo nucleotídeo do Mutação por mudança na matriz de leitura: mutação
códon, a mutação é denominada de sentido por deleção ou adição de número de bases não múl-
trocado, a qual alterará a base e, por conse- tiplo de três, alterando a leitura.
guinte, o aminoácido. A mutação sem sentido
também é uma mutação de ponto, que muda 3. Mutação em um organismo
um códon especificador para um códon fina-
lizador. Por último, falaremos da mutação ca- Consiste na ocorrência de uma mutação capaz
paz de provocar mudança na matriz de leitura; de formar um fenótipo mutante. Este mutan-
essa mutação pode ser dos tipos inserção ou te poderá perder parcialmente a atividade de
deleção, pois a adição ou remoção de pares de uma dada proteína, que passa a ter sua ati-
bases que não seja múltiplo de três provocará vidade reduzida, aumentada ou nula. Isso
alteração na tradução (figura 16b). ocorre em procariontes e eucariontes. Vários
38
capítulo 2

exemplos de mutantes foram observados em ou seja, faz com que as bases se juntem, origi-
E. coli, dentre eles, os mutantes dos tipos au- nando deleções durante a replicação do DNA.
xotróficos, condicional-letais, sensíveis à tem-
peratura, resistentes a antibióticos e mutantes Você sabia que o câncer é uma doença genéti-
regulatórios. ca, embora nem sempre seja hereditário ?

Pesquisa da Fix: pesquise Pesquisa da Fix: pesqui-


sobre esses tipos de mu- se os principais agentes
tantes e procure observar mutagênicos responsá-
as consequências prove- veis por mutações em
nientes da mutação para protooncogenes, suas
o mutante, a ciência e a consequências e as eta-
sociedade. pas de desenvolvimento
do câncer (mutação ®
A mutação poderá, também, gerar um produ- metástase).
to gênico incapaz de desempenhar sua função
na célula. Neste caso, a célula poderá morrer, Desafio da Fix: o Programa GBOL (http://www.
e esta mutação será considerada letal. Vários ufv.br/dgb/gbol - Mutações) disponibiliza vá-
exemplos foram destacados na disciplina Ge- rias formas de trabalhar com o tema muta-
nética Geral, dentre esses um letal dominante ções. Vocês poderão observar as várias formas
em humanos, a Acondroplasia. mutantes em Drosophila, a diversidade genéti-
ca em plantas, como o milho, maracujá e fei-
SAIBA MAIS jão, além de ter acesso ao código genético por
diferentes formas. Acessem e divirtam-se.
Letal: gene ou genótipo que, ao se expressar, ocasio-
na morte ao seu portador.
3.2 REPARO
3.1.2 AGENTES MUTAGÊNICOS
O reparo do DNA é um processo complexo, no
Vimos que as mutações podem ocorrer devido qual existe um número variável de proteínas,
a erros no processo de replicação. Além desses como, por exemplo, em E. coli foram obser-
erros, a mutação pode também ser provenien- vadas 24 proteínas diferentes. Existem vários
te da ação de mutágenos, que se encontram tipos de mecanismos de reparo, dentre eles
freqüentemente no meio e provocam altera- destacaremos quatro, que são: 1- reparo di-
ções na molécula de DNA. Vejamos alguns ti- reto, que consiste na reversão de uma altera-
pos principais, como: 1-análogos de bases, os ção estrutural; 2- reparo por excisão de bases,
quais podem substituir uma base durante a re- que ocorre através da ação de enzimas (uracila
plicação, como por exemplo, a 5-bromouraci- DNA glicosilase, endonucleases, fosfodiestera-
la, que é derivada da timina por uma substitui- ses, polimerases); 3- reparo de excisão de nu-
ção do grupamento metila (-CH3) por bromina cleotídeos, realizado por várias enzimas, que
(-Br); 2- agentes intercalantes são compostos fazem quebras unifilamentares em ambos os
que se intercalam na dupla hélice, provocan- lados de um nucleotídeo danificado; 4- repa-
do perturbação na replicação, provavelmente ro de mau pareamento, que corrige erros in-
devido à inserção de pares de bases. Este tipo troduzidos durante a replicação no filamento
de mutágeno é comumente usado em labo- filho.
ratórios de pesquisa; em geral, são corantes,
como, por exemplo, a acridina e o brometo de Pesquisa da Fix: você
etídeo; 3- o calor é um dos mutágenos am- sabia que existem vá-
bientais mais importante, é capaz de clivar as rias síndromes humanas
ligações entre as bases púricas e seus açúca- oriundas de defeitos no
res, e em menor escala, também, afetam as sistema de reparo de
ligações das bases pirimídicas; 4- a radiação DNA? Alguns exemplos
ultravioleta, que causa dimerização das bases, são o Xeroderma pig-
mentoso, a Síndrome de
39

capítulo 2
Bloom, a Pancitopenia de Fanconi e a Atalaxia-
-telangiectasia. Para ter acesso a informações
3. Utilize a tabela do código genético para
citar duas seqüências diferentes do RNAm
sobre essas doenças, utilize o site de busca: que podem codificar a seguinte seqüência
http://www.google. de aminoácidos: Arginina – Glicina – Histi-
dina – Aspartato – Alanina.

REVISANDO 4. As mutações são classificadas em vários ti-


CONHECIMENTOS pos, alguns dos quais estão citados abaixo.
Faça a correta associação entre esses tipos
1. Com qual sequência de 5’ a 3’, a sequência com as características e os exemplos. (Pes-
quise a tabela do código genético)
5’ – ACTGCCATGCTA – 3’ em um filamento
molde de DNA codifica uma molécula de
RNA ? Tipo Características Exemplo
a) 5’...TGACGGTACGAT...3’ 1. Sentido A. Substituição I. G para A
b) 5’...UAGCAUGGCAGU..3’ contrário de uma purina
c) 5’...TAGCATGGCAGT...3’ por uma piri-
d) 5’...UGACGGUACGAU..3’ midina ou vice
e) 5’...ATCGTACCGAGA...3’ versa.
2. Transição B. Substituição II. T para G
2. Teste seus conhecimentos sobre as bases de uma purina
da expressão gênica, analisando as afir- por outra puri-
mativas abaixo e assinalando-as como ver- na ou de uma
dadeiras ( V ) ou falsas ( F ). Em seguida, pirimidina por
justifique as respostas consideradas falsas. outra pirimidi-
na.
Em procariontes e eucariotes, as mo- 3. Silenciosa C. Resulta na III. ATG GGA
( ) léculas de RNAm são sintetizadas no substituição deGCT CTA TTA
sentido 5’→3’, com a adição de ribonu- um aminoácido ACC TAA
cleotídeos ao grupo 3-hidroxila na ponta por outro tipo.para ATG
da cadeia da molécula. GGA GCT
Cada códon, presente no RNAm, é CTA TGA
( ) específico para um aminoácido, assim ACC TAA
como cada aminoácido é codificado por, 4. Transversão D. Muda um IV. ATG GGA
apenas, um tipo de códon. códon especifi- GCT CTA TTA
( ) Para início da transcrição, a RNA polime- cador de uma ACC TAA
rase liga-se a um sítio específico de DNA aminoácido para ATG
denominado de promotor. para um códon AGA GCT
( ) O código genético é composto por có- finalizador, CTA TTA
dons, cada um deles sendo constituído oca-si onan- ACC TAA
de três nucleotídeos. do o término
Nas células eucarióticas, os segmentos prematuro da
( ) íntrons e éxons são traduzidos de for- tradução.
mas diferentes ; os primeiros codificam 5. Sem E. Altera o có- V. ATG GGA
proteínas estruturais, e os segundos, sentido don, mas não GCT CTA TTA
proteínas repressoras ou reguladoras. altera o ami- ACC TAA
( ) Os códons que representam finalização noácido a ser para ATG
de cadeia são encontrados no RNAt. codificado. GGA GCT
CTA TTG
( ) A enzima aminoacil-RNAt sintetase ACC TAA
catalisa as ligações entre aminoácidos e
moléculas de RNAt.
40
capítulo 2

Assinale a alternativa que faz a correta as-


sociação

a) 1DII; 2AI; 3BIV; 4CV; 5EIII.


b) 1BIV; 2EII; 3AV; 4CIII; 5DI.
c) 1CIV; 2BI; 3EV; 4AII; 5DIII.
d) 1EII; 2CIV; 3DV; 4AIII; 5BI.
e) 1BI; 2AIII; 3EIV; 4CII; 5DV.

5. Você aprendeu que há diferentes tipos de


sistemas de reparo do DNA. Pesquise so-
bre o reparo de mau pareamento e respon-
da: 1) Por que é importante as enzimas de
reparo reconhecerem qual a fita parental e
a recém sintetizada? 2) Como é realizado
o reconhecimento?

REFERÊNCIAS
LEITURA FUNDAMENTAL

SNUSTAD, D. P. e SIMMONS M. J. Fundamen-


tos de Genética: Guanabara Koogan S/A, 2000.

LEITURA COMPLEMENTAR

GRIFFITHS, A. J. F.; WESSLER, S. R.; LEWONTIN,


R. C.;GELBART, W. M.; SUZUKI, D. T.e MILLER,
J. H. Introdução à Genética: Rio de Janeiro:
Guanabara Koogan S/A, 2006.

SITES

http://www.ufv.br/dgb/gbol

www.sbg.org.br/GeneticaEscola2/web/vol-
2Num1.htm

http://www.google
41

capítulo 3
Genética de Vírus e
Bactérias, Técnicas de
Genética Molecular e
suas Principais Aplicações

Profa. Rita de Cássia de Moura Carga Horária I 15H


Colaboradoras: Profa. Marília de França Rocha
Profa. Maria Teresa Marquim Nogueira Cornélio

INTRODUÇÃO
Estudaremos os vírus, que constituem a
mais simples forma de vida, e as bactérias
sob os seguintes aspectos: ciclo de vida,
organização genômica e recombinação. Es-
tes conhecimentos permitirão uma melhor
compreensão da variabilidade genética bem
como contribuirão para o melhor entendi-
mento das metodologias adotadas na bio-
logia molecular.

OBJETIVOS ESPECÍFICOS
• Comparar os ciclos de vida dos bacterió-
fagos;

• Distinguir os diferentes tipos de recombi-


nação em bactérias;

• Conhecer as principais técnicas de gené-


tica molecular.
42
capítulo 3

1. VÍRUS
Os vírus são biologicamente tão simples que
alguns pesquisadores consideram que eles não
são organismos, embora hoje concordem que
são parasitos ultracelulares permanentes; que
a maioria depende da maquinaria enzimática
da célula hospedeira para replicar e transcrever
seus genes e que necessitam dos ribossomos e
do aparato de tradução do hospedeiro. Quan-
to a sua origem, considera-se que o fato de
eles dependerem da célula hospedeira, seja ela
bacteriana ou eucariótica, indica que os vírus
evoluíram depois do aparecimento da célula,
provavelmente a partir de segmentos de DNA
ou RNA, os quais teriam adquirido a capacida-
de de se replicar independente do genoma da
célula hospedeira.

Existem diferentes tipos de vírus; os mais estu-


dados são aqueles capazes de infectar bacté-
rias, denominados de bacteriófagos ou fagos,
os quais veremos com mais detalhes abaixo.

SAIBA MAIS
Bacteriófagos (fagos) – vírus que infecta bactérias.

1.1 BACTERIÓFAGOS Figura 1 - Estrutura do capsídeo. a-eletromicrografia, b- diagrama.


Fonte: Snustad D.P. e Simmons M.J. (2001) Fundamentos de Genética.
Editora Guanabara Koogan.

Os bacteriófagos estão constituídos de ácido


nucléico e proteínas. A proteína é responsável
pela formação de um revestimento chamado
capsídeo, o qual contém em seu interior o ge- ra (chamada OmpC) na superfície da bactéria.
noma do fago. O capsídeo pode apresentar Depois da ligação, o fago introduz o seu DNA
três tipos de estrutura básica: Icosaédrica, em na bactéria, através de sua cauda.
forma geométrica; filamentar ou helicoidal,
em forma de bastão; cabeça e cauda, uma Logo após a introdução do DNA do fago, a
combinação de uma estrutura icosaédrica a síntese de DNA, RNA e proteínas da bactéria
uma cauda filamentar (Figura 1). é desligada, por um complexo entre a RNA
polimerase modificada da célula hospedeira e
1.1.1 CICLOS DE VIDA DE BACTERIÓFAGOS as proteínas iniciais do fago, as quais são pro-
duzidas dentro de minutos, após a infecção.
Para exemplificar os ciclos de vida dos bac- A RNA polimerase modificada reconhece os
teriófagos, usaremos exemplos de fagos que promotores dos genes do fago e catalisa sua
infectam a E. coli: o T4 para o ciclo lítico ou transcrição. Um aspecto importante do ciclo
virulento e o λ (lambda) para o ciclo lisogênico de T4 consiste na adição de grupos hidroxi-
ou temperado. metila às citosinas do fago, protegendo-as
da degradação por nucleases produzidas pelo
1.1.1.1 CICLO LÍTICO fago, as quais degradam o DNA da bactéria
hospedeira. Proteínas posteriores também são
O primeiro passo para que o T4 infecte a E. coli produzidas e são responsáveis pela formação
é a ligação do fago a uma proteína recepto- de estruturas da cabeça e cauda do fago. Este
43

capítulo 3
ciclo dura 22 minutos e é encerrado quando o fago codifica uma enzima chamada lisozima, a
qual junto com outras proteínas rompe a bactéria hospedeira e libera cerca de 100 a 300 fagos
da prole (Figura 2).

Figura 2 - Ciclo lítico. Fonte: Snustad D.P. e Simmons M.J. (2001) Fundamentos de Genética. Editora Guanabara Koogan.

1.1.1.2 CICLO LISOGÊNICO

O fago λ , como a maioria de outros fagos temperados, pode seguir o ciclo lítico, embora freqüen-
temente utilize o ciclo lisogênico, cuja diferença básica consiste na integração do genoma do fago
ao DNA hospedeiro. Logo após a entrada do DNA do fago na bactéria, ocorre a integração, e o
bacteriófago passa a ser chamado de profago. A integração ocorre devido ao processo de recom-
binação, que é possível graças a uma pequena região (cerca de 15pb) idêntica entre a molécula
de DNA do fago e o genoma de E. coli.

O profago integrado pode permanecer na molécula hospedeira, por muitas gerações da célula.
Ele pode ser induzido por estímulos químicos ou físicos a assumir o ciclo lítico. Para que isso ocor-
ra, é necessária uma segunda recombinação, que excisa o genoma do fago do DNA hospedeiro.
O DNA do fago se replica, as proteínas de revestimento são sintetizadas, a célula se rompe, e os
novos fagos λ são liberados (Figura 3).
44
capítulo 3

Figura 3- Ciclo lisogênico. Fonte: Pierce, B.A. (2004) Genética um enfoque conceitual. Editora Guanabara Koogan.

1.1.2 ORGANIZAÇÃO GÊNICA para traçar uma comparação entre bacterió-


fagos e vírus eucariótico. Além de termos, é
Quando dizemos que os bacteriófagos estão claro, a oportunidade de conhecer um pouco
constituídos de ácidos nucléicos, nos referimos sobre sua estrutura, ciclo de vida, genoma e
ao fato de alguns fagos terem como material curso da infecção. Pesquise esse tema no ca-
genético o DNA e outros, o RNA. O genoma pítulo 16, do livro: Snustad D.P. e Simmons
dos fagos, seja de DNA ou RNA, pode ser bi- M.J. (2001) Fundamentos de Genética. Editora
filamentar ou unifilamentar. Pode ainda estar Guanabara Koogan e em outras bibliografias
constituído de, apenas, uma molécula ou de especializadas.
um número de moléculas diferentes. Nesse
caso, dizemos que o genoma é segmentado. Desafio da Fix: acesse o
texto Gripe aviária: Se-
Os genomas de bacteriófagos são relativamen- guindo as pegadas de
te pequenos, como, por exemplo, o genoma um novo vírus, Eliana M.
do M13, que possui 6.407 nucleotídeos e um B. Dessen, no site abai-
pouco mais de dez genes conhecidos; o ΦX174 xo. http://www.sbg.org.
com 5.386 nucleotídeos armazena informação br/GeneticaEscola2/web/
biológica extra, pois possui genes superpostos, Vol1Num1.htm
os quais compartilham sequências de nucleo-
tídeos que codificam 11 proteínas diferentes
com mais de 2.300 aminoácidos. Por outro 2. BACTÉRIAS
lado, alguns bacteriófagos possuem genomas
maiores, como o T4, com 166kb e cerca de 2.1 RECOMBINAÇÃO EM
150 genes, e o fago λ com 49,5kb e mais de BACTÉRIAS: UMA VISÃO
44 genes. GERAL
Pesquisa da FIX: considerando que a estrutura As bactérias se reproduzem assexuadamente,
básica do vírus HIV é comum a de outros vírus contudo, elas também possuem o modo de re-
eucarióticos, podemos usá-lo como modelo produção sexuada, o qual permite a recombi-
45

capítulo 3
nação entre o cromossomo de uma linhagem Quadro 1: Critérios para o reconhecimento
doadora com o cromossomo de uma linhagem dos três processos parassexuais.
receptora, de forma unidirecional. Como não Processo de Critério: Critério: sensibi-
há processo meiótico em procariontes, devido recombinação Contato celular lidade à DNase
à ausência de citoesqueleto, a recombinação Transformação Não Sim
não é necessariamente recíproca. Uma bacté- Conjugação Sim Não
ria contém um cromossomo, em geral circular, Transdução Não Não
o qual possui milhares de genes. Pode ter, ain-
da, elementos extracromossômicos denomina-
dos plasmídeos. Contudo, se a DNase estiver presente no meio
de cultura do tubo em U, e ainda assim ocorrer
SAIBA MAIS recombinação, é porque o processo envolvido
é do tipo transdução.
Plasmídeo – DNA circular extracromossômico encon-
trado em bactérias, possui capacidade de auto-repli-
2.1.2 TRANSFORMAÇÃO
cação e serve como vetor de clonagem.

A transformação é um processo que só ocor-


Os três principais tipos de transferência gené-
re em bactérias ditas competentes, pois estas
tica em bactérias são: transformação, proces-
possuem a maquinaria enzimática e as proteí-
so pelo qual uma molécula de DNA doadora
nas necessárias para captar moléculas de DNA
é captada no meio e incorporada ao genoma
livres no meio e transportá-las para o citoplas-
de uma célula receptora; conjugação, proces-
ma. Apenas as células que portam um fator
so no qual as bactérias fazem contato efetivo,
competente, uma pequena proteína que induz
e há transferência de DNA de uma célula do-
a síntese de oito a dez proteínas envolvidas na
adora para uma célula receptora; transdução,
transformação. Como exemplo, usaremos o
transferência de DNA de uma célula para ou-
Streptococcus pneumoniae, onde uma célula
tra, através de vírus. Todos os três processos
competente liga-se a um grande filamento bi-
são ditos parassexuais, visto que a recombina-
filamentar de DNA em sítios receptores espe-
ção não ocorre através da meiose.
cíficos na superfície da bactéria. Após o reco-
nhecimento e ligação ao sítio, a molécula de
2.1.1 TESTE PARA TRANSFORMAÇÃO,
DNA move-se através da membrana celular, e
CONJUGAÇÃO E TRANSDUÇÃO
um dos dois filamentos de DNA é hidrolisado
por uma exonclease, recebendo, desse modo,
Os tipos parassexuais de transferência gênica
energia para o transporte do DNA através da
em bactérias podem ser separados através de
membrana. O filamento de DNA não degrada-
critérios simples, são eles: sensibilidade à de-
do é transportado através da membrana. Esse
soxirribonuclease (DNase) e dependência de
DNA está revestido com proteínas de ligação
contato célula-célula (ver Quadro 1). Estes cri-
ao DNA, e proteínas de recombinação procu-
térios são facilmente testados, pois basta que
ram regiões homológas na célula receptora
se adicione ao meio, contendo linhagens de
(Figura 4). Este tipo de recombinação é unidi-
bactérias envolvidas na recombinação. Caso
recional e não recíproco.
não ocorra a recombinação, o processo envol-
vido deve ser do tipo transformação, no qual
Pesquisa da FIX: o
o DNA fica livre no meio e facilmente pode
processo de transfor-
ser degradado pela DNase. Na conjugação e
mação pode diferir de
transdução, o DNA não fica livre no meio. O
bactéria para bactéria,
processo de conjugação deverá ser verificado
por isso sugiro que vo-
através do experimento do tubo em U, no qual
cês pesquisem em sites
bactérias de duas linhagens diferentes são co-
e na bibliografia reco-
locadas nos braços opostos de um tubo de
mendada o processo
cultura em forma de U. Como nesse proces-
de transformação em
so ocorre contato célula-célula, o filtro evita a
Haemophilis influenzae, para que possam co-
passagem da molécula de DNA de um braço
nhecer outro modo de transformação.
para o outro, evitando a recombinação.
46
capítulo 3

filamento de DNA é transferido para célula


receptora, onde sofre replicação e passa a ser
bifilamentar. A frequência de recombinação,
em geral, é baixa, podendo, contudo, ocor-
rer, caso o fator F se integre ao cromossomo
(Figura 5).

Figura 4- Transformação em Streptococcus pneumoniae. Fonte: Snus-


tad D.P. e Simmons M.J. (2001) Fundamentos de Genética. Editora Gua-
nabara Koogan.

2.1.3 CONJUGAÇÃO

A conjugação é o processo no qual ocorre


transferência de material genético de uma li- Figura 5 - Conjugação F+ x F- Fonte: Snustad D.P. e Simmons
nhagem de bactérias para outra, unidirecio- M.J. (2001) Fundamentos de Genética. Editora Guanabara
Koogan.
nalmente, criando genótipos de recombina-
ção. Durante a conjugação, o DNA bacteriano
pode ou não ser transferido para uma célula
A frequência de recombinação pode ser alta,
receptora. Em um cruzamento entre uma célu- caso o fator F esteja integrado ao genoma da
la doadora F+ x F-, os genes da célula doadora célula doadora. Esta célula é denominada de
raramente são transferidos para uma célula re- Hfr (alta frequência de recombinação). A cé-
ceptora, o que ocorre é a transferência de um lula Hfr inicia a transferência a partir do ponto
plasmídeo chamado fator F de fertilidade, que de origem da replicação do fator F integrado.
torna a célula receptora F+. Os genes do fator A replicação círculo rolante transfere o DNA da
F facilitam o contato celular e a transferência célula doadora para a célula receptora, onde
do fator F, enquanto que alguns genes do fa- ele passa a ser bifilamentar. A célula receptora
tor F- direcionam a síntese de filamentos (pili) permanece F-, pois apenas uma parte do fator
sexuais. O fator F se insere no cromossomo F foi transferido e integrado à célula, entre-
bacteriano, devido à presença de sequências tanto ela poderia passar a ser F+, caso todo
de inserção denominadas (IS). A replicação do o cromossomo bacteriano fosse transferido
fator F é do tipo círculo rolante, e apenas um (Figura 6).
47

capítulo 3
Pesquisa da FIX: além
dos fatores F+ e F-, exis-
te o fator F’, pesquise
um pouco sobre esse
fator e compare-o com
os fatores F+ e F-.

2.1.4 TRANSDUÇÃO

Na transdução, os genes bacterianos são em-


balados no capsídeo do fago, devido a erros,
durante o ciclo de vida do vírus. Após a lise da
célula hospedeira, os vírus serão liberados e in-
fectarão outra célula, na qual ocorrerá a trans-
ferência de material genético. Podem ocorrer
dois tipos de transdução:

1. generalizada, na qual o fago pode transfe-


rir qualquer segmento do genoma da célu-
la doadora para receptora;

2. especializada, na qual ocorre transferência


de segmentos restritos do genoma de uma
célula para outra (Figura 7).

Figura.6 - Conjugação F+ x Hfr. Fonte: Snustad D.P. e Simmons M.J.


(2001) Fundamentos de Genética. Editora Guanabara Koogan.

Figura 7- Transdução especializada e generalizada. Fonte: Snustad D.P. e Simmons M.J. (2001) Fundamentos de
Genética. Editora Guanabara Koogan.
48
capítulo 3

2.2 ORGANIZAÇÃO GÊNICA Em E. coli, o tamanho do genoma corresponde


a 4.639,221pb, com cerca de 4.280 sequên-
Como se organizam os genes em bactérias? cias hipoteticamente codificantes de proteínas
Essa pergunta é muito ampla, por isso ao ou genes, desses genes apenas 1/3 são bem
invés de tentar, de forma resumida, respon- conhecidos. O tamanho das sequências inter-
dê-la, achamos adequado mais uma vez gênicas é de 118pb. Os genes que especificam
usarmos a E. coli como exemplo, visto que proteínas, RNAs estáveis e DNA repetitivo cor-
é um dos organismos modelo da Genética respondem a cerca de 87,5%, 0,6% e 0,7% do
bem como a bactéria melhor estudada até genoma, respectivamente. Os 10,7% restantes
o momento. do genoma devem envolver sequências regu-
ladoras dentre outras sequências ainda desco-
nhecidas (Figura 8).

Figura 8- Genoma de Escherichia coli. Fonte: Snustad D.P. e Simmons M.J. (2001) Fundamentos de Genética. Editora Guanabara Koogan.

3. TÉCNICAS DE gênicas, a recombinação de moléculas de DNA


in vitro bem como o seqüenciamento de áci-
GENÉTICA MOLECULAR dos nucléicos, o uso de microscopia eletrônica
E SUAS PRINCIPAIS e de outras técnicas analíticas. Muito do que
APLICAÇÕES se sabe hoje sobre os genes, deve-se a análises
moleculares através da aplicação de tecnolo-
gias do DNA recombinante e subseqüente clo-
3.1 CONSIDERAÇÕES GERAIS nagem gênica. Discutiremos, de forma sucin-
ta, algumas das principais ferramentas usadas
A década de 70 do século XX foi crucial para em análises moleculares, como, por exemplo,
os geneticistas moleculares, pois foi a partir as enzimas de restrição, a reação em cadeia da
do desenvolvimento de novas tecnologias que polimerase e suas principais aplicações.
se tornou possível o isolamento de sequências
49

capítulo 3
3.2 TÉCNICAS USADAS 3.2.2 MOLÉCULAS DE DNA RECOMBINANTES
PARA CLONAGEM O fato da enzima de restrição cortar um par
específico de nucleotídeos, independente do
3.2.1 ENZIMAS DE RESTRIÇÃO (RES) organismo (fago, humano, camundongo,
mosca, etc), permite que sejam produzidos
Para que se possa clonar e sequênciar qualquer fragmentos com as mesmas extremidades,
gene de interesse, é fundamental o uso de en- ou seja, complementares, seja qual for à
zimas de restrição, as quais são produzidas por origem do DNA. Esses fragmentos oriundos
microorganismos e possuem a capacidade de de distintos organismos podem ser fusio-
reconhecer sequências diferentes de nucleotí- nados, gerando uma molécula de DNA re-
deos no DNA. As REs cortam a molécula de combinante (Figura 9). Após a produção do
DNA apenas em sequências específicas ditas DNA recombinante, é necessário agora que ele
sítios de restrição (ver Quadro 2). A nomen- seja amplificado, isto é, que sejam produzidas
clatura usada para determinar o tipo de REs, muitas cópias ou clones desta molécula. Para
baseia-se na espécie de microorganismo que a que isto ocorra, é preciso que a molécula de
produziu, como, por exemplo, a endonuclease DNA recombinante seja inserida em um vetor
de restrição EcoRI. A primeira letra se refere a de clonagem, o qual é auto-replicante, como,
inicial do gênero (Escherichia), e as demais, ao por exemplo, plasmídeos. Como já sabemos,
início do nome da espécie (coli), seguido da os plasmídeos são moléculas de DNA extracro-
linhagem bacteriana (R) e da referência ao fato mossômico presentes em microorganismos.
de ter sido a primeira enzima de restrição iden- O seu tamanho varia de 1kb (= 1.000pb) a
mais de 200kb. Além dos plasmídeos, outros
tificada nesta linhagem (I).
vetores são usados de acordo com suas ca-
SAIBA MAIS racterísticas e capacidade de inserto, sendo os
principais tipos: bacteriófagos, cosmídeos e
DNA recombinante – DNA sintetizado artificialmente, cromossomos artificiais.
onde uma sequência específica de DNA de um orga-
nismo é inserido no genoma de outro.

Clonagem gênica – método que envolve a multiplica-


ção de sequências de DNA incorporadas a um vetor
de clonagem, em geral um plasmídeo, um cosmídeo
ou um fago, capaz de se replicar ao ser introduzido
em um hospedeiro adequado.

Enzimas de Restrição (REs) – enzima, oriunda de bac-


térias, capaz de reconhecer uma sequência específica
de ácido nucléico e cortar dentro do sítio de restrição.

Reação em Cadeia da Polimerase (PCR) – ver PCR

PCR ou Reação em Cadeia da Polimerase – Técnica


utilizada na rápida amplificação enzimática in vitro
de sequências específicas de DNA.

Quadro 2 – Sequências de reconhecimento


e sítios de restrição de algumas enzimas de
restrição.
Enzima Fonte Sequência de
reconhecimento
e Sítio de restrição
EcoRI Escherichia coli GˇAATTC
CTTAAˆG
HindIII Haemophilus AˇAGCTT
influenzae lR TTCGAˆA

AluI Arthobacter AGˇCT


luteus TCˆGA Figura 9 - Formação de molécula de DNA recombinante. Fonte: Snus-
tad D.P. e Simmons M.J. (2001) Fundamentos de Genética. Editora Gua-
nabara Koogan.
50
capítulo 3

SAIBA MAIS sejam favoráveis ao gene marcador selecioná-


vel presente no vetor (Figura 11).
Inserto – sequência de DNA a ser inserida em um ve-
tor de clonagem.
A triagem de uma biblioteca de DNA é feita
Cosmídeos – vetor de clonagem construído pela in- principalmente pela seleção genética, podendo
serção da sequência cos do fago lambda em um plas- também ser feita através do uso de sequências
mídeos, permitindo a clonagem de insertos de 30 a de DNA ou RNA como sondas de hibridização
46 kb de tamanho. ou através de anticorpos que reconhecem pro-
Cromossomos artificiais – vetor capaz de propagar
dutos gênicos.
insertos maiores do que os encontrados em fagos e
cosmídeos. Podem ser de origem bacteriana (BAC),
de levedura (YAC), ou até mesmo humana (HAC). SAIBA MAIS
Um vetor de clonagem possui três componen- Sítio de Policlonagem – sequência de DNA reconheci-
tes básicos: 1- origem de replicação; 2- gene da por diferentes enzimas de restrição.
marcador dominante selecionável; 3- ao me- Sondas de Hibridização – pequena molécula (cerca
nos um sítio de restrição (Figura 10). Os veto- de mil pb) de ácido nucléico marcado (radioativa-
res atualmente mais usados possuem um sítio mente ou enzimaticamente) usada na detecção de
de policlonagem. sequências complementares de DNA ou RNA.

Figura 10- Vetor de clonagem e seus componentes básicos. Fonte:


Snustad D.P. e Simmons M.J. (2001) Fundamentos de Genética. Edi-
tora Guanabara Koogan.

3.2.3 CONSTRUÇÃO E TRIAGEM DE


BIBLIOTECAS DE DNA

O primeiro passo para clonagem consiste na


construção de uma biblioteca de DNA genô-
mico, que corresponde a um conjunto de dife-
rentes fragmentos de DNA do genoma inteiro. Figura 11- Construção de bibliotecas de DNA. Fonte: Snustad D.P. e
O processo é iniciado com o isolamento do Simmons M.J. (2001) Fundamentos de Genética. Editora Guanabara
Koogan.
DNA total de um organismo, o qual é digerido
por enzimas de restrição, gerando vários seg-
mentos de DNA, os quais são inseridos em um VOCÊ SABIA
vetor de clonagem apropriado. Após a ligação
dos fragmentos do DNA genômico ao DNA ve- Você sabia que além das bibliotecas genômicas, exis-
tor, as moléculas recombinantes são inseridas tem as bibliotecas cromossômicas e de cDNA (DNA
complementar)? Ambas são mais específicas que a
em células hospedeiras, em geral E. coli, para
biblioteca genômica e são úteis para o mapeamento
posterior replicação in vivo. As bactérias trans- cromossômico e estudos de expressão gênica, respec-
formadas, ou seja, que contêm o DNA vetor, tivamente.
deverão crescer em um meio, cujas condições
51

capítulo 3
Desafio da FIX: visite o carga por unidade de massa essencialmente
site da Sociedade Brasilei- constante, elas se separam em géis de agarose
ra de Genética e consulte ou acrilamida com base em seu tamanho ou
a prática de DNA recom- conformação. São feitas cavidades em uma
binante (Enzima de res- extremidade do gel, onde são depositadas as
trição), Octavio Henrique amostras de DNA, e é passada uma corrente
de O. Pavan. http://www. elétrica no gel. Os fragmentos de DNA migram
sbg.org.br/GeneticaEsco- para extremidade positiva do gel. Isso ocorre,
la2/web/Vol1Num2.htm porque o grupo fosfato de cada nucleotídeo
da molécula de DNA tem carga negativa. Após
3.3 ANÁLISE MOLECULAR DE a eletroforese, os fragmentos são separados
ÁCIDOS NUCLÉICOS E pelo tamanho e são observados como bandas
GENES a partir de sua revelação por corantes espe-
cíficos, como o brometo de etídio. Alternati-
3.3.1 ELETROFORESE vamente também se pode usar um marcador
radioativo ou químico (Figura 12). A eletrofo-
A eletroforese é usada para separação de ma- rese em gel é usual em experimentos de DNA
cromoléculas com tamanhos e cargas dife- recombinante.
rentes. Como as moléculas de DNA possuem

Figura 12 - Eletroforese. Fonte: Snustad D.P. e Simmons M.J. (2001) Fundamentos de Genética. Editora Guanabara Koogan.
52
capítulo 3

3.3.2 ANÁLISE DE DNA POR HIBRIDIZAÇÃO E náilon (Figura 13). O DNA é desnaturado an-
TRANSFERÊNCIA DE SOUTHERN tes da transferência, colocando-se o gel numa
solução alcalina. Após a transferência, o DNA
Esta técnica permite localizar genes e sequên- é imobilizado na membrana por secagem ou
cias de DNA em fragmentos de restrição sepa- radiação UV e identificado por uma sonda ra-
rados por eletroforese em gel, em particular, dioativa de DNA, a qual será hibridizada à se-
pela transferência das moléculas de DNA do quência de interesse, cuja sequência de nucle-
gel para uma membrana de nitrocelulose ou otídeos é complementar à sequência da sonda.

Figura 13 - Transferência de Southern. Fonte: Snustad D.P. e Simmons M.J. (2001) Fundamentos de Genética. Editora Guanabara
Koogan.

3.3.3 ANÁLISE DE RNA POR HIBRIDIZAÇÃO E 3.3.4 REAÇÃO EM CADEIA DA


TRANSFERÊNCIA DE NORTHERN POLIMERASE (PCR)

O procedimento da análise de RNA é similar ao A reação em cadeia da polimerase (PCR) permite


descrito na transferência de Southern. Contu- a amplificação de uma sequência selecionada
do, as moléculas de RNA são muitos sensíveis de DNA milhares de vezes. Este procedimento
à degradação por RNase e, em geral, contém só pode ser usado, quando se conhecem as
uma estrutura secundária. Por isso, se deve ter sequências de nucleotídeos das extremidades
cuidado quanto a contaminação de materiais da sequência de interesse. É necessário o uso
e manutenção das moléculas de RNA desnatu- de oligonucleotídeos sintéticos complementa-
radas durante a eletroforese, para garantir que res a estas sequências conhecidas, servindo de
elas se separem pelo tamanho. A hibridização início para amplificação destas.
e transferência de Northern podem ser usadas
para o estudo temporal da expressão de genes. A PCR compreende três etapas, são elas: Eta-
pa 1, o DNA genômico a ser amplificado é
Pesquisa da FIX: pes- desnaturado por aquecimento a 95-97°C,
quise, na literatura por 15 a 30 segundos; etapa 2, o DNA des-
recomendada e em naturado é helicoidizado a um excesso de
sites, a análise de pro- primers de oligonucleotídeos sintéticos, in-
teínas por hibridiza- cubando-os juntos a 50-60°C por 30 segun-
ção e transferência de dos; etapa 3, a DNA polimerase (atualmente
Western e compare substituída por uma DNA termoestável, a Taq
este procedimento com polimerase) é usada para replicar o segmen-
Southern e Northern. to de DNA, o primer fornece a extremidade
53

capítulo 3
3’-OH livre para a ampliação, e o DNA genômico desnaturado fornece o molde. A polimeri-
zação é feita a 70-72°C por 1,5 minuto (Figura 14). O procedimento é repetido muitas vezes,
até que se obtenha o nível de amplificação desejada.

SAIBA MAIS
Oligonucleotídeos – molécula curta de DNA (cerca de 8 a 50 pb), usualmente utilizada como sonda.

Primers – pequeno oligonucleotídeo de uma sequência definida que se liga a um molde de DNA, para dar início à
replicação (sintetizado pela primase) ou à reação em cadeia da polimerase (sintetizado artificialmente).

Figura 14 - Reação em Cadeia da Polimerase (PCR). Fonte: Snustad D.P. e Sim-


mons M.J. (2001) Fundamentos de Genética. Editora Guanabara Koogan.

A PCR tem sido usada no diagnóstico de do- SAIBA MAIS


enças hereditárias humanas, diagnóstico pré-
-natal, casos forenses, clonagem e sequen- Sequenciamento – determinação da sequência de ba-
ciamento. A principal vantagem do uso dessa ses de um fragmento de DNA ou RNA bem como da
metodologia se deve ao uso de DNA isolado de sequência de aminoácidos de uma proteína.
amostras muito pequenas.

Desafio da FIX: procure REVISANDO


saber mais sobre apli-
cações das técnicas de
CONHECIMENTOS
Genética Molecular. Para
tal, acesse: http: /www. 1. Vimos que as bactérias, embora não reali-
biotecnologia.com.br. zem reprodução sexuada, realizam outros
Neste site, você terá aces- processos que permitem a recombinação
so a entrevistas e artigos gênica, denominados de parasexuais. Três
científicos sobre temas tipos básicos de recombinação são obser-
relacionados à Biologia Molecular e Biotecno- vados, cada um apresentando particulari-
logia, como, por exemplo, clonagem, marca- dades. Faça a correta associação entre as
dores moleculares, terapia gênica do câncer, características apresentadas e o tipo espe-
dentre outros. cífico de recombinação.
54
capítulo 3

( a ) Conjugação ( ) Molécula de DNA lde uma dependendo do organismo e do tamanho


célula doadora é captada do genoma. Um dos vetores valiosos para
do ambiente externo e in-
corporada no genoma de mapear e seqüenciar genomas eucarióti-
uma célula receptora. cos corresponde a
( b ) Transdução ( ) O DNA é transferido de a) Plasmídeos
uma célula para outra, b) Cosmídeos
através de um vírus bacte-
riano. c) YACs
d) Bacteriófagos
( ) As bactérias que têm a ca-
pacidade de receber DNA e) Sondas híbridas
são denominadas de com-
petentes.
( c ) Transformação ( ) Formação do pili sexual. 5. Sobre as atuações das enzimas de restri-
ção, analise as afirmativas abaixo.
( ) É necessária a presença de
um bacteriófago. I. Quebram as pontes de hidrogênio e se
intercalam entre as duas fitas de DNA,
favorecendo a clonagem de um seg-
2. A Reação em cadeia de polimerase (PCR) mento molecular específico.
tem sido um recurso valioso para ampli- II. Reconhecem e clivam as duas fitas de
ficação (um milhão ou mais de vezes) de DNA em sítios específicos.
sequências específicas de DNA em poucas III. Protegem os organismos que as produ-
horas. Dentre os processos apresentados zem contra a ação de DNA exógenos.
abaixo, assinale com um X aqueles que IV. Ligam-se a sítios específicos do DNA e,
ocorrem durante a aplicação dessa técnica. associadas a proteínas histônicas, favo-
( ) Replicação da região de interesse com a atuação recem a amplificação gênica.
de uma DNA polimerase especial tolerante ao Estão corretas:
calor, por exemplo, a taq polimerase. a) I e II.
( ) Formação de um híbrido molecular que identifi- b) I e III.
ca regiões mutadas no genoma. c) II e III.
( ) Ativação de genes promotores, ocasionando in- d) III e IV.
tensa replicação gênica.
e) II e IV.
( ) Desnaturação de todo o DNA envolvido no pro-
cesso.
( ) Duplicação de ácidos nucléicos através da DNA
e RNA polimerase, após estas moléculas serem
separadas por eletroforese em gel de agarose.
REFERÊNCIAS
( ) Helicoidização do DNA desnaturado a primers. LEITURA FUNDAMENTAL

Dentre os eventos assinalados por você, rela- SNUSTAD, D. P. e SIMMONS M. J. Fundamen-


cione-os por ordem de acontecimentos e expli- tos de Genética: Guanabara Koogan S/A, 2000.
que sucintamente, como são realizados.
LEITURA COMPLEMENTAR
3. Uma biblioteca de cDNA não apresenta ín-
trons, porque GRIFFITHS, A. J. F.; WESSLER, S. R.; LEWONTIN,
a) é construída a partir de DNA genômico. R. C.;GELBART, W. M.; SUZUKI, D. T.e MILLER,
b) os íntrons são retirados in vitro depois J. H. Introdução à Genética: Rio de Janeiro:
da construção do cDNA. Guanabara Koogan S/A, 2006.
c) é construída com genes isolados do
cromossomo bacteriano. SITES
d) é construída a partir de RNAm.
e) é construída a partir do filamento mol- http://www.sbg.org.br/GeneticaEscola2/web/
de de DNA. Vol1Num1.htm

4. No processo de clonagem gênica, diferen- http://www.sbg.org.br/GeneticaEscola2/web/


Vol1Num2.htm
tes tipos de vetores podem ser utilizados,
55

capítulo 4
Regulação da
Expressão Gênica
em Procariontes
e Eucariontes

Profa. Rita de Cássia de Moura Carga Horária I 15H


Colaboradoras: Profa. Marília de França Rocha
Profa. Maria Teresa Marquim Nogueira Cornélio

INTRODUÇÃO
A totalidade de genes de uma célula repre-
senta uma grande quantidade de informação
biológica, a qual não é requisitada, integral-
mente e a todo tempo, pela célula. Entretan-
to, alguns genes permanecem sempre ativos,
como, por exemplo, genes de RNA e de pro-
teínas ribossomais, RNA polimerase e histo-
nas, dentre outros. Os genes que codificam
produtos desse tipo e que são continuamen-
te expressos são denominados genes consti-
tutivos (mantenedores). Entretanto, o mais
freqüentemente observado é a atividade de
genes, de acordo com a necessidade da cé-
lula, fazendo com que algumas informações
biológicas sejam necessárias, o que determina
a expressão de alguns genes. De um modo
geral, podemos dizer que os organismos são
capazes de regular a expressão de seus ge-
nes. A regulação gênica pode ocorrer em cin-
co níveis principais. São eles: transcricional,
processamento do RNA, estabilidade do RNA,
traducional e pós-traducional. Abordaremos,
prioritariamente, neste capítulo, tanto para
procariontes como eucariontes, o nível mais
comum de regulação gênica, o transcricional.
56
capítulo 4

SAIBA MAIS 1.1 CONTROLE POSITIVO


E NEGATIVO DA
Genes constitutivos (mantenedor) – gene cuja
expressão é essencial à manutenção da função da EXPRESSÃO GÊNICA
maioria ou de todos os tipos de células.
A regulação gênica pode ser ligada ou desli-
OBJETIVOS ESPECÍFICOS gada por indução ou repressão dos genes,
respectivamente. Para que isso ocorra, existem
• Distinguir os tipos de controle positivo e dois mecanismos de controle, tanto positivos
negativo da expressão gênica; como negativos. Em ambos os casos, existe
a participação de genes reguladores, os quais
• Diferenciar os operons indutíveis dos ope- codificam produtos que regulam a expressão
rons repressíveis; de outros genes.

• Conhecer os principais mecanismos de No mecanismo de controle positivo, o produ-


ação do nível de regulação transcricional to do gene regulador liga a expressão de um
em eucariontes; ou mais genes estruturais. Já o mecanismo de
controle negativo precisa do produto do gene
• Diferenciar os mecanismos reguladores em regulador para desligar a expressão dos genes
procariontes e eucariontes. estruturais. A figura 1 ilustra os mecanismos
de controle positivo e negativo nos sistemas
indutíveis e repressíveis.
1. REGULAÇÃO GÊNICA
EM PROCARIONTES SAIBA MAIS
Genes reguladores – genes cuja função primária é
As mudanças ambientais afetam diretamente a controlar a síntese dos produtos de outros genes.
expressão de genes em bactérias. Consideran-
do a E. coli como exemplo, observamos que o Genes estruturais – genes que codificam a estrutura
fato de essa bactéria possuir vários genes que primária (sequência de amininoácidos) de um poli-
peptídeo.
codificam diferentes enzimas, capazes de me-
tabolizar qualquer um dos diferentes açúca-
res, não implica necessariamente na expressão O produto do gene regulador pode ser deno-
contínua de todos os seus genes que utilizam minado de ativador, quando este é capaz de
açúcar. Isso é compreensível, visto que impli- ativar a expressão gênica no sistema de con-
caria um gasto energético desnecessário, pois trole positivo, podendo, também, ser chama-
não faz sentido que a bactéria requisite uma do de repressor, caso reprima a expressão gê-
enzima, se no meio não houver oferta imedia- nica no sistema de controle negativo. Para que
ta de um determinado açúcar. Podemos, en- a proteína reguladora seja capaz de se ligar ao
tão, dizer que as bactérias só expressam genes sítio de ligação da proteína reguladora (RBS),
codificantes de enzimas necessárias, enquanto o qual fica adjacente ao promotor do(s)
os demais genes são mantidos inativados. gene(s) estrutural(ais), é necessária a presença
ou ausência de moléculas efetoras na célula.
As enzimas envolvidas em vias catabólicas, Essas moléculas são denominadas indutores
como lactose e galactose, são ditas indutíveis, ou co-repressores, quando estão envolvidas na
pois ligam a expressão de genes em respos- indução ou repressão, respectivamente.
ta à presença de uma substância no meio. Os
genes regulados deste modo são denomina- Desafio da FIX: analise
dos indutíveis, e suas enzimas são chamadas a figura 1 e descreva,
enzimas indutíveis, diferente das enzimas que sucintamente, os meca-
compõem as vias anabólicas, que, em geral, nismos de controle indu-
são repressíveis. Tanto a indução como a re- tível negativo e positivo,
pressão ocorrem no nível da transcrição, que é repressível negativo e po-
considerado o nível de regulação gênica mais sitivo.
comum para procariontes e vírus.
57

capítulo 4
Figura 1 - Mecanismos de controle positivo e negativo nos sistemas indutíveis e repressíveis. Fonte: Snustad D.P. e Simmons M.J. (2001) Funda-
mentos de Genética. Editora Guanabara Koogan.

1.2 OPERONS parte dele (Figura 2). São eles: um conjunto


de genes estruturais; um promotor (sítio de li-
Operons são unidades coordenadamente regu- gação da RNA polimerase) e um operador (sí-
ladas de expressão gênica. O modelo de ope- tio de ligação de uma proteína regulatória). A
ron (controle negativo) foi descrito para E. coli regulação acontece através de dois elementos
por Jacob e Monod, em 1961, através do qual reguladores, o produto do gene regulador e o
esses pesquisadores explicaram a regulação operador. Quando o repressor está ligado ao
dos genes que codificam as enzimas necessá- operador, não ocorre a transcrição. A ligação
rias para o uso de lactose nessa bactéria. Para do repressor ao operador, desligando os genes
compreender como o operon é regulado, é im- estruturais, como dito anteriormente, depende
portante conhecer os componentes que fazem da presença ou ausência da molécula efetora.
58
capítulo 4

Os operons indutíveis e repressíveis podem ser


distinguidos pela ligação apenas do repressor
ou de um complexo repressor-efetor ao opera-
dor. Quando se trata de um operon indutível,
o repressor livre se liga ao operador, desligan-
do a transcrição. Já no caso do operon repres-
sível, o repressor livre não consegue se ligar ao
operador; é preciso a formação do complexo
repressor-efetor (co-repressor), que é capaz de
se ligar ao operador, impedindo a transcrição
(Figura 3).

Figura 2- Componentes do operon. Fonte: Snustad D.P. e Sim-


mons M.J. (2001) Fundamentos de Genética. Editora Guanabara
Koogan.

A B
Figura 3 - Operons indutíveis (a) e repressíveis (b). Fonte: Snustad D.P. e Simmons M.J. (2001) Fundamentos de Genética. Editora Guanabara
Koogan.

1.2.1 OPERON DA LACTOSE O operon lac contém um promotor (P), um


operador (O) e três genes estruturais: o gene
O operon da lactose (lac) é, dentre os conheci- lacZ, que codifica a β-galactosidade; o lacY,
dos e estudados em E. coli, o melhor caracteri- que codifica a β-galactosídeo permease e o
zado, e foi, a partir de estudos sobre ele, que Ja- lacA, que codifica a β-galactosídeo transaceti-
cob e Monod propuseram o modelo do operon. lase (Figura 4). Com relação à função das enzi-
59

capítulo 4
mas codificadas pelo operon lac, sabemos que a β-galactosídeo permease bombeia a lactose para
o interior da célula e que a β-galactosidade quebra a lactose em glicose e galactose. O papel da
transacetilase não é bem conhecido.

Figura 4- O operon lac. paginas.terra.com.br/.../aula4_controle.htm

O promotor do operon lac con-


tém dois componentes separa-
dos. São eles: 1- o sítio de ligação
da RNA polimerase; 2- o sítio de
ligação de uma proteína chama-
da proteína ativadora do catabo-
lismo (CAP), cuja função consiste
em impedir que o operon lac seja
induzido na presença de glicose.

1.2.1.1 INDUÇÃO

O operon lac é do tipo indutível


de controle negativo. O gene re-
gulador (I) desse operon codifica
um repressor, cuja forma ativa
corresponde a um tetrâmero
contendo quatro cópias do pro-
duto do gene I. Na ausência do
indutor, o repressor se liga ao
operador, impedindo que a RNA
polimerase catalise a transcrição
dos três genes estruturais. Con-
tudo, na presença do indutor
(alolactose), é formado o com-
plexo repressor-indutor, levan-
do à liberação do repressor do
operador e subseqüente trans-
crição dos genes (Figura 3). A
alolactose é derivada da lactose
Figura 3 - Operons indutíveis. Fonte: Snustad D.P. e Simmons M.J. (2001) Fundamentos de
em uma reação catalisada pela Genética. Editora Guanabara Koogan.
β-galactosidade. Para que a alo-
lactose esteja presente no meio,
é necessário que algumas enzimas dos genes
estruturais sejam produzidas no estado não in-
duzido, fornecendo, dessa maneira, um nível
mínimo de atividade enzimática.
60
capítulo 4

1.2.1.2 REPRESSÃO CATABÓLICA exemplos que ilustram a regulação em nível trans-


cricional e de processamento do RNA bem como da
A repressão catabólica (ou efeito da glicose) organização e ativação/inativação cromossômica.
assegura que a glicose seja catabolizada quan-
do presente, em detrimento a outras fontes de 2.1 TRANSCRICIONAL
energia. Por isso, quando a glicose está pre-
sente no meio, ela impede a indução do ope- A regulação gênica em nível transcricional é
ron lac. Isto ocorre porque a glicose impede mediada por interações DNA-protéina. Estas
a ação de adenilciclase, a enzima que catalisa proteínas são chamadas de fatores de trans-
a formação de uma molécula efetora chama- crição, e muitas delas possuem dois domínios
da adenosina-3’, 5’-monofosfato (cAMP) a quimicamente importantes, um de ligação ao
partir de ATP. Quando há baixa concentração DNA e o outro, de ativação transcricional. Um
de cAMP, a proteína CAP não pode se ligar ao fator de transcrição pode se ligar a um acentu-
promotor do operon lac, portanto não ocorre ador (enhancer) ou fazer contato com proteí-
a ligação da RNA polimerase de forma eficien- nas em dois ou mais acentuadores, ou ainda,
te ao promotor, e a taxa de transcrição não interagir diretamente com proteínas associa-
excede a 2%. Por outro lado, se a proteína CAP das ao promotor. Estes contatos e interações
e a molécula efetora cAMP estiverem presentes podem induzir a mudanças conformacionais
em concentrações suficientes, elas formarão nas proteínas, através da ação do domínio de
um complexo, o qual se liga ao promotor, in- ativação transcricional. Estas mudanças permi-
duzindo à transcrição do operon lac, exercen- tem que a RNA polimerase inicie a transcrição.
do, neste caso, um controle positivo. Existem vários motivos estruturais resultantes
de associações entre aminoácidos, em suas
Pesquisa da FIX: um ou- cadeias polipeptídicas. Dentre eles, os mais
tro operon de E. coli bas- conhecidos são: zinc finger; hélice-giro-hélice;
tante estudado é o trip- zíper de leucina e hélice-alça-hélice.
tofano (trp). Pesquise, na
literatura recomendada, SAIBA MAIS
a composição e a estru-
Fatores de transcrição – proteínas responsáveis pela
tura desse operon bem
expressão de um gene.
como os níveis de regula-
ção de sua expressão. Acentuador – sequência reguladora de DNA que
interage com fatores de transcrição específicos, au-
Desafio da FIX: para ter acesso à animação dos mentando a frequência da transcrição de sequências
adjacentes.
operons lac e trp, acessem o site www.whfree-
man.com/pierce. Cliquem na capa do livro: Ge- Os acentuadores são sequências repetidas que
netics: A conceptual approuch by Benjamin A. apresentam atividade parcial de regulação, em
Pierce. Genetics 1e. Selecionem Genetics in mo- geral são grandes e funcionam de modo histo-
tion, Chapter 16 - Control of gene expression. específico. Eles apresentam três propriedades
básicas:

2. REGULAÇÃO GÊNICA 1. atuam a distâncias grandes;


EM EUCARIONTES 2. funcionam independente de sua orienta-
ção (normal ou invertida);
Os mecanismos de regulação gênica em eucarion-
3. seus efeitos independem de sua posição
tes são mais complexos que os observados em pro-
(anterior ou posterior ao gene).
cariontes, e isso se deve, principalmente, por se tra-
tar de organismos multicelulares, os quais possuem
Estas propriedades permitem distinguir os
diferentes tipos de células. Os diferentes genes
acentuadores dos promotores.
presentes nessas células sofrem regulação espacial
e temporal de sua expressão por meio de diver-
A indução da atividade transcricional também
sos mecanismos moleculares. Estudaremos alguns
se dá pela ação de fatores ambientais e bioló-
gicos. Como exemplo, temos as proteína de
61

capítulo 4
choque térmico observadas na Drosophila me- RNAm, que codifica uma proteína reguladora,
lanogaster e, em muitos outros organismos, a proteína SXL. A presença dessa proteína em
as quais têm sua expressão regulada através embriões regula a expressão de um conjunto
do estresse provocado pelo calor, que induz de genes, fazendo com que esses embriões
a transcrição de genes, que codificam estas se desenvolvam como fêmeas. Contudo, nos
proteínas. Em D. melanogaster, por exemplo, machos (XY), ocorre a recomposição alternati-
a proteína de choque térmico HSP70 (peso va do transcrito Sxl, com inclusão de um éxon
molecular de 70 quilodáltons) é codificada com códon finalizador, levando à produção de
quando a temperatura excede 33°C. A trans- um polipeptídio sem função reguladora, de
crição induzida pelo calor é mediada por um modo que, em embriões XY, na ausência da
polipeptídio denominado fator de transcrição proteína SXL, um conjunto diferente de genes
Heat-Shock (ou de choque térmico). Quando é expresso, fazendo com que os embriões se
a mosca é estressada pelo calor, esses fatores desenvolvam como machos (Figura 6).
de transcrição são quimicamente alterados por
fosforilação e associam-se a elementos de res- SAIBA MAIS
posta heat-shock, promovendo o estímulo da
transcrição dos genes hsp70 (Figura 5). Recomposição alternativa – formas alternativas de re-
moção de íntrons e reunião de éxons na geração de
RNAm maduro, a partir do transcrito primário, pos-
sibilitando a formação de diferentes polipeptídeos
oriundos de um mesmo gene.

Figura 5- Transcrição de genes de choque térmico HSP70. Fonte:


Snustad D.P. e Simmons M.J. (2001) Fundamentos de Genética.
Editora Guanabara Koogan.

Como já foi discutido no capítulo 2, todos já


sabem que a maioria dos genes eucarióticos
possuem íntrons, e que esses íntrons são ex-
cisados por um processo chamado recompo-
sição. Além deste tipo de recomposição, pode
ocorrer, também, a recomposição alternativa.
A recomposição alternativa dos transcritos é
Figura 6- Recomposição alternativa do gene Sxl em Drosophila. Fonte:
um modo de regulação gênica, que pode ser Snustad D.P. e Simmons M.J. (2001) Fundamentos de Genética. Editora
utilizada para possibilitar que um único gene Guanabara Koogan.
codifique diferentes polipeptídeos. Um exem-
plo bastante interessante de recomposição al-
Pesquisa da FIX: pes-
ternativa pode ser observado durante a expres-
quise, na literatura re-
são de genes envolvidos na determinação do
comendada e em sites,
sexo em Drosophila. O gene regulador do pro-
exemplos de regulação
cesso de determinação sexual em Drosophila
gênica através da meti-
está localizado no cromossomo X e foi deno-
lação e imprinting do
minado sexo-letal (Sxl). Nas fêmeas (XX), esse
DNA.
gene sofre recomposição para produzir um
62
capítulo 4

2.2 ORGANIZAÇÃO de proteínas MSL. Estes genes são conhecidos


CROMOSSÔMICA X também como loci letais de machos, pois se
REGULAÇÃO DA EXPRESSÃO eles sofrerem mutações, o cromossomo X não
será hiperativado, e os machos morrerão. Cada
Quando falamos de expressão gênica e orga- uma das quatro proteínas MSL se liga especi-
nização cromossômica, estamos nos referindo ficamente ao X nos machos e se associam a
à possibilidade de alteração da transcrição de dois RNAs diferentes, roX1 e roX2, produzidos
genes, a partir de sua transferência para outros pelo cromossomo X. Ainda não se conhece
sítios dentro do cromossomo. Dentre vários detalhadamente como este complexo MSL e
exemplos, vamos detalhar o que pode ocorrer RNAs roX hiperativam genes ligados ao X em
em genes de Drosophila, quando estes, devido machos. Contudo, especula-se que o comple-
a rearranjos cromossômicos dos tipos inversão xo facilite a acetilação do X e posterior altera-
e translocação, são transferidos de uma região ção na estrutura da cromatina, intensificando
eucromática para uma região heterocromáti- a atividade transcricional do único X do macho
ca, levando ao funcionamento anormal ou, até (Figura 7a).
mesmo, ao silenciamento desses genes. O mau
funcionamento dos genes pode levar à mistura
de caracteres normais e mutantes no mesmo
indíviduo, o que é chamado de variegação de
efeito de posição.

Muitos exemplos de variegação de efeito de


posição foram descritos em Drosophila, dentre
eles o alelo salpicado white é um bom exemplo.
Neste caso, o alelo selvagem do gene white
mudou de posição devido a uma inversão, que
o transferiu de uma região eucromática para
uma região heterocromática no cromossomo X.

Esta mudança de posição do gene white al-


terou a expressão do gene, levando a um fe-
nótipo de olho salpicado. Este exemplo ilustra
bem a ação da heterocromatina na repressão
da expressão gênica, que pode ocorrer devido
ao alto grau de condensação dessa cromatina
bem como pela inacessibilidade dessa região à
maquinaria transcricional.
Figura 7- Mecanismos de compensação de dose gênica. Fonte:
Snustad D.P. e Simmons M.J. (2001) Fundamentos de Genética.
2.3 ATIVAÇÃO E INATIVAÇÃO Editora Guanabara Koogan.

CROMOSSÔMICA
Quanto à inativação aleatória de um dos cro-
Organismos, cujos mecanismos de determina- mossomos X de fêmeas de mamíferos, esta
ção sexual são do tipo XX/XY ou XX/XO, preci- tem início em um sítio chamado centro de
sam usar estratégias para equalizar a atividade inativação do X (XIC) e, a partir deste ponto,
dos genes ligados ao cromossomo X nos dois se propaga em sentidos opostos para as ex-
sexos. Para exemplificar diferentes tipos de ati- tremidades do cromossomo. Entretanto, nem
vação e inativação do cromossomo X, vamos todos os genes do cromossomo X inativado
estudar a hiperativação do X em Drosophila e são silenciados, como, por exemplo, o gene
a inativação do X em fêmeas de mamíferos. XIST, que se encontra dentro do XIC. O gene
XIST codifica um RNA funcional, que reveste
A compensação de dose gênica em Drosophila gradativamente o cromossomo X, reprimindo
requer a ação de quatro genes diferentes, os a maioria dos genes do X inativo (Figura 7b).
quais são chamados de msl, e seus produtos, É importante destacar que no mecanismo de
63

capítulo 4
compensação de dose em mamíferos, o X que tes, exemplificado através do operon lac-
permanece ativo é paradoxalmente o que re- tose de E.coli.
prime o seu gene XIST.
I - Quando a proteína repressora liga-se
ao gene operador, a RNA polimerase liga-
REVISANDO -se ao gene promotor dando início ao pro-
cesso de transcrição e, conseqüentemente,
CONHECIMENTOS dando início à formação das três enzimas
necessárias ao metabolismo da lactose.
1. No modelo do operon, a principal função II - A RNA polimerase, após se ligar ao gene
do gene promotor é:
promotor, realiza o processo da transcrição
a) produzir uma proteína repressora dos três genes estruturais, envolvendo as
b) ser o sítio de ligação para a molécula regiões denominadas de íntrons e éxons.
indutora. III - O gene promotor corresponde a uma
c) ser o sítio de ligação para a RNA poli- sequência de nucleotídeos na qual a RNA
merase. polimerase reconhece e se encaixa para
d) produzir uma proteína acentuadora. dar início a transcrição.

2. Você tem conhecimento de que, nas mu- IV - O operon Lac contém um promotor (P),
lheres, um dos cromossomos X sofre pro- um operador (O) e três genes estruturais: o
cesso de inativação, tornando-se quase gene lacZ que codifica a β-galactosidase; o
todo heterocromático. Sobre esse proces- lacY que codifica a β-galactosídeo perme-
so, analise as afirmativas abaixo e identifi- ase e o lacA que codifica a β-galactosídeo
que as corretas. transacetilase.

Estão corretas as afirmativas:


I. A inativação de um dos cromossomos X
a) I e IV.
tem início em um sítio específico deno-
b) II e III.
minado centro de inativação do X (XIC).
c) I e II.

d) II e IV.
II. Um cromossomo X com o alelo XIST
e) I e III.
inativo permanece eucromático, en-
quanto um cromossomo X com alelo
XIST ativo é heterocromatinizado. 4. O processo de regulação gênica em pro-
cariontes envolve diferentes mecanismos
III. O gene XIST codifica um RNA não tra- moleculares cujo princípio básico consiste
duzido, o qual permanecerá no núcleo na ativação ou repressão de genes especí-
e será fundamental na inativação do X. ficos. Ambos os processos se enquadram
em duas categorias de controle da regu-
IV. No caso das células masculinas, as lação: positiva e negativa, cada uma apre-
quais contêm XY, o gene XIST encon- sentando particularidades. A seguir, asso-
tra-se ativo. cie as características apresentadas ao tipo
de controle de regulação.
São corretas apenas as afirmativas:
a) I, II e III.
(1) Controle ( ) O produto do gene regulador
positivo corresponde a um ativador.
b) I, II e IV.
( ) O produto do gene regulador
c) II, III e IV. (2) Controle corresponde a um repressor.
d) I e IV. negativo
O produto do gene regulador la-
e) II e IV. ( ) ga-se ao sítio de ligação da pro-
teína reguladora, impedindo a
transcrição de genes específicos.
3. As afirmativas abaixo referem-se ao pro- ( ) O modelo de operon Lac é u
cesso de regulação gênica em procarion- exempolo.
64
capítulo 4

5. Você estudou que tanto em procariontes


quanto em eucariontes, fatores ambientais
podem induzir a expressão de genes. Em
Drosophila melanogaster., por exemplo, a
temperatura acima de 33ºc leva à ativação
de genes codificadores de proteínas espe-
cíficas (proteínas de choque térmico), as
quais ajudam no controle da temperatura
celular interna. Pesquise sobre esse exem-
plo e responda:

a) Qual o peso molecular e a denomina-


ção da referida proteína?

b) Qual o gene que a codifica?

c) De que modo esse gene é ativado?

REFERÊNCIAS
LEITURA FUNDAMENTAL

SNUSTAD, D. P. e SIMMONS M. J. Fundamen-


tos de Genética: Guanabara Koogan S/A, 2000.

LEITURA COMPLEMENTAR

GRIFFITHS, A. J. F.; WESSLER, S. R.; LEWONTIN,


R. C.;GELBART, W. M.; SUZUKI, D. T.e MILLER,
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SITES

www.whfreeman.com/pierce

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