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As noções de trauma e regressão

nos escritos de Sándor Ferenczi


e suas possíveis articulações com as propostas
teóricas da Escola Psicossomática de Paris

Marcos Mariani Casadore


Rodrigo Sanches Peres

Revista Brasileira de Psicanálise Marcos Mariani Casadore  é da


volume 50, n.2, p. 122-135 · 2016 Universidade de Uberlândia (UFU).

Rodrigo Sanches Peres  é da


Universidade de Uberlândia (UFU).

Resumo
Neste estudo, temos como objetivo discutir as noções
de trauma e regressão nos escritos de Sándor Ferenczi e
suas possíveis articulações com as propostas da Escola
Psicossomática de Paris, em particular aquelas estabelecidas
por Pierre Marty. Ao tratar da imbricação entre corpo e psique
para compreender a traumatogênese, a angústia e a formação
de sintomas desprovidos de conteúdo representacional,
associados a movimentos regressivos, Ferenczi esboça uma
teorização que virá a convergir com desenvolvimentos
posteriores no campo da psicossomática psicanalítica. Em
nosso entendimento, há um diálogo fecundo a ser construído
entre as últimas teses de Ferenczi e as formulações teóricas e
clínicas de Marty, malgrado o fato de este não ser apontado
como um leitor daquele. Consideramos possível reconhecer
certas raízes ferenczianas, sobretudo acerca das noções
de trauma e regressão, nas proposições teóricas de Marty,
nomeadamente aquelas relativas às noções de pensamento
operatório, desorganização progressiva e regressão somática.
Palavras-chave
psicossomática psicanalítica; trauma; regressão; Sándor
Ferenczi; Pierre Marty.

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Os derradeiros estudos aludir a situações em que este, em primeiro


de Sándor Ferenczi: lugar, se deixaria levar por uma situação de
modificações teóricas e técnicas conforto no setting e se absteria de inco-
modar-se com isso e, em segundo lugar,
estabeleceria como prioridade questões

O médico e psicanalista húngaro


Sándor Ferenczi (1873-1933), ao desafiar
referentes ao seu trabalho e identidade
profissional em detrimento da análise de
seu paciente. É nesse sentido que o autor
os limites da clínica psicanalítica de sua chegaria a sugerir, inclusive, uma metapsi-
época, empreendeu importantes transfor- cologia do analista (Ferenczi, 1928/2012d)
mações na técnica. Com isso, veio a con- como uma espécie de complemento às for-
templar em sua prática certas demandas mulações metapsicológicas voltadas à com-
que, até então, eram pouco consideradas preensão do funcionamento do paciente.
pelos demais analistas, mas que ocupam Tais apontamentos evidenciam o quanto
lugar central nos chamados casos difíceis, Ferenczi buscou repensar a clínica. Para
pelos quais, inclusive, ganhou reconheci- tanto, colocou em evidência preocupações
mento como exímio clínico. O autor pôde, concernentes à pessoa do analista e às impli-
dessa forma, experienciar mudanças que cações determinadas pela inserção deste em
concerniam a determinados aspectos da uma relação essencialmente intersubjetiva,
relação terapêutica e da dinâmica trans- bem como se ocupou das consequências,
ferencial que não haviam sido suficiente- positivas e negativas, das diferentes possibili-
mente explorados por seus pares. dades de manejo desta relação. Como resul-
A partir de suas incursões clínicas, Ferenczi tado direto desse movimento, empreendeu
foi impelido a reconsiderar o posiciona- adaptações no dispositivo analítico para que
mento do analista como um todo. O autor pudesse trabalhar com os casos que se man-
não apenas apresentaria contraindicações à tinham inertes às tentativas de aplicação da
sua recém-proposta técnica ativa (Ferenczi, técnica psicanalítica conforme preconizada
1926/2012c) como destacaria a necessidade até então e que, justamente por isso, eram
de, por vezes, demonstrar empatia e favore- considerados contraindicados à psicanálise
cer o acolhimento do sofrimento do paciente, pelos demais analistas.
conforme a demanda, a fim de possibilitar a Ferenczi ainda buscou investigar outros
consolidação da confiança dele na pessoa e meandros das experiências subjetivas asso-
no trabalho do analista (Ferenczi, 1930/2012f). ciadas a problemas mais arcaicos. Os com-
Nessa perspectiva, a técnica, flexibilizada de portamentos regredidos apresentados por
acordo com cada caso, obedeceria ao “tato” alguns pacientes fizeram com que o psi-
do analista e sua capacidade de “sentir com” canalista húngaro passasse a atentar para
o paciente (Ferenczi, 1928/2012d). possíveis experiências traumáticas, viven-
Ferenczi também criticou o que designou ciadas na tenra infância, que se mostravam
como hipocrisia e narcisismo do analista, ao ainda fortemente inscritas na subjetividade

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deles, embora essas “inscrições” não pare- Concluímos, assim, que se origina do
cessem ter se efetivado a partir da lingua- campo da prática o interesse de Ferenczi
gem. O autor se reporta a determinado pela traumatogênese, pelo modo como o
ponto do desenvolvimento humano no trauma pode se inscrever na história do
qual não haveria uma capacidade simbó- sujeito e, ainda, por sua relação com certos
lica bem estruturada e, portanto, o físico movimentos regressivos experimentados na
e o psíquico se encontrariam ainda difu- clínica. O autor buscava também trabalhar
sos e pouco definidos. O registro mnêmico teoricamente com tais questões, tendo
de qualquer experiência traumática tam- como objetivo compreendê-las mais por-
bém obedeceria a essa (con)fusão entre menorizadamente para ampliar o alcance
corpo e mente, pois, “não estando o órgão da psicanálise na clínica dos casos difíceis.
do pensamento completamente formado, Vale destacar que, em seus estudos sobre
só eram registradas as lembranças físicas” o trauma e a regressão, Ferenczi consta-
(Ferenczi, 1930/2012f, p. 74). tava com frequência a relação destes com
A flexibilização do setting terapêutico a períodos muito precoces do desenvolvi-
partir do “tato” do analista, a análise “sen- mento humano e, logo, com relações obje-
sível” e as técnicas de relaxamento propos- tais arcaicas. Por essa razão, esboçava uma
tas por Ferenczi despertavam, em certos proximidade entre os traumatismos infan-
pacientes, movimentos regressivos. Ocorre tis e o desencadeamento de “sintomas”
que estes, muitas vezes, se encontravam corporais, ou mesmo doenças orgânicas
distantes da possibilidade de elaboração qualificadas como distúrbios psicossomá-
simbólica inerente às tradicionais interpre- ticos, que se mostravam essencialmente
tações do material oriundo das associações irrepresentáveis.
livres. A palavra, assim, mostrava-se insufi- Ferenczi, infelizmente, morreu antes
ciente, e a “irrepresentabilidade” tomava de transformar em textos mais aprofun-
forma como “ação”. Ferenczi percebeu dados parte de suas anotações (Ferenczi,
então que somente poderia responder a 1934/2012e) ou alguns pensamentos expres-
isso também com “ação”. Tanto sua crítica sos em um diário pessoal escrito durante
a uma abordagem clínica simplesmente seu último ano de vida (Ferenczi, 1990).
tecnicista e insensível quanto sua proposta Todavia, podemos inferir, a partir destas
de uma prática essencial, que envolveria, publicações póstumas, uma série de for-
por parte do analista, a compreensão empá- mulações que em muito colaboram com os
tica do paciente, teriam, grosso modo, um estudos psicanalíticos dos fatores psíquicos
mesmo objetivo: impedir a repetição de das doenças orgânicas, e não simplesmente
uma situação traumática infantil atualizada em um sentido contextual e histórico. Em
no registro transferencial da análise. Afinal, última instância, entendemos que pode ser
esta repetição impossibilitaria a construção
de uma relação de confiança sobre a qual
se fundamentaria a análise.

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identificada uma certa continuidade entre Ferenczi o acesso a conteúdos de outra


tais formulações e algumas teses estabeleci- ordem, de caráter essencialmente corporal,
das anos depois no campo da psicossomá- que seriam pouco ou nada passíveis de tra-
tica psicanalítica. dução em termos psíquicos. É justamente
Diante do exposto, no presente estudo este aspecto do trauma que se articula de
temos como objetivo principal discutir as forma direta à dinâmica psíquica de muitos
noções de trauma e regressão nos escritos pacientes acometidos por doenças orgâni-
de Ferenczi. Adicionalmente, procurare- cas e que, por essa razão, interessa à nossa
mos apontar suas possíveis articulações leitura presente, na perspectiva de uma
com as propostas teóricas e clínicas da articulação entre as formulações do autor
Escola Psicossomática de Paris, conside- e os desenvolvimentos teóricos posteriores
rada uma das principais correntes psica- no campo da psicossomática psicanalítica.
nalíticas na atualidade, a qual teve como No último dos textos publicado por
maior expoente o médico e psicanalista Ferenczi (1933/2012b), o escopo é justa-
francês Pierre Marty (1918-1993). Para mente a exploração do processo traumá-
tanto, delinearemos a seguir um pano- tico infantil a partir de um fator exógeno.
rama das formulações ferenczianas sobre Trata-se do momento final de sua teoria
trauma e regressão. Mais adiante, abor- do trauma, elaborada com mais afinco
daremos algumas implicações clínicas de nos anos precedentes. O autor fala de
tais formulações. Por fim, com o intuito de uma experiência traumática ocasionada
colocar em relevo a possibilidade de apro- por uma confusão de línguas entre o que
ximações entre Ferenczi e Marty, apresen- seria próprio de uma linguagem adulta –
taremos uma síntese dos fundamentos da a qual foi qualificada como linguagem da
Escola Psicossomática de Paris conforme paixão e estaria envolta de genitalidade –
definidos, especificamente, a partir de três e a linguagem ainda imatura da criança,
de suas noções mais relevantes, a saber: denominada linguagem da ternura. Res-
pensamento operatório, desorganização salte-se que ambas seriam sexualizadas,
progressiva e regressão somática. mas o psicanalista húngaro sustenta que a
expressão libidinal infantil remete à relação
Trauma e regressão em Ferenczi: elementos terna mãe-criança, e todo elemento que
para uma compreensão psicanalítica extrapola essa condição e arrebata passio-
dos distúrbios psicossomáticos nalmente tal relação, em um momento em
que ainda não há possibilidade de com-
Os casos difíceis abordados a partir dos preensão maior por parte da criança, seria
experimentos técnicos implementados consequente de um tratamento desprovido
na clínica psicanalítica possibilitaram a de “tato” por parte do ambiente (Ferenczi,
1931/2012a).
É válido salientar que o trauma se des-
taca como tópico central nos estudos finais

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de Ferenczi. À época, o autor foi bastante compreensão de tal fenômeno. É nesse


criticado por seus pares – Freud incluso – sentido que inaugura as bases do que Més-
por retomar um assunto que há muito já záros (2011) chama de teoria moderna do
havia sido tratado, sobretudo em um movi- trauma, cujos aspectos centrais, a propó-
mento que culminou no abandono da teo- sito, fornecem elementos valiosos para a
ria freudiana da sedução e no advento da compreensão de algumas condições psi-
teoria da fantasia, a qual demarcou o lugar copatológicas atualmente recorrentes na
central da realidade psíquica na patogênese clínica psicanalítica. Ferenczi explora a
neurótica. Porém, ao contrário do que traumatogênese por reconhecer potencia-
apontavam com destrato alguns de seus crí- lidades, tanto terapêuticas quanto teóricas,
ticos, o intuito de Ferenczi não era subver- inerentes a esta incursão, e o faz chamando
ter a lógica da fantasia ou mesmo revogar atenção especial para as experiências em
a ideia da existência de uma sexualidade que reconhece a implementação de uma
infantil, mas apontar para algo de ordem espécie de “lembrança corporal” disparada
externa que também poderia compor uma pela incapacidade de o sujeito registrá-las
experiência traumática. de qualquer outra forma.
Desse modo, o psicanalista húngaro É nesse sentido que o autor enquadra
considera também os efeitos de eventos a angústia como consequência imediata
reais provenientes da realidade externa, e de todo traumatismo, atrelando-a à invia-
não somente o papel da fantasia, na com- bilidade de o sujeito se adaptar a determi-
posição de uma complexa experiência trau- nada situação desprazerosa. Em uma de
mática. Logo, expande a dinâmica desse suas anotações publicadas postumamente,
tipo de situação para o plano das relações Ferenczi fala da exigência de um “escoa-
intersubjetivas, embora ainda mantenha douro” de angústia, a partir da situação de
o protagonismo dos mecanismos intrapsí- desprazer, e associa-o à autodestrutividade.
quicos. A demarcação das relações obje- Mais especificamente, alude a uma auto-
tais arcaicas como ponto de partida para destrutividade da consciência, que obede-
a compreensão do funcionamento psí- ceria mais prontamente que a unidade
quico, inclusive, está presente nas primei- corporal, ao afirmar: “Eu não sofro mais,
ras obras do autor (Ferenczi, 1909/2012g). no máximo uma parte do meu corpo”
Ademais, se revelou crucial na evolução de (Ferenczi, 1934/2012e, p. 294). Sabemos, no
suas propostas teóricas, perpassando suas entanto, que muitos distúrbios psicossomá-
experimentações técnicas e influenciando ticos não obedeceriam a essa “cisão” entre
diretamente os caminhos que percorreu consciência e corpo, emergindo sempre
até culminar nos estudos sobre o trauma no contexto de uma relação bastante com-
(Casadore, 2012, 2014). plexa entre as referidas instâncias, a qual,
Ferenczi, portanto, expande as fronteiras
dos estudos psicanalíticos sobre o trauma e
amplia suas perspectivas para uma melhor

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até mesmo em função disso, se revelaria de deixando seus traços de lembrança somente
difícil “tradução”, situando-se às margens em uma linguagem que poderia ser classifi-
da clínica psicanalítica clássica conforme cada como corporal. Logo, enquanto substi-
concebida para a abordagem das neuroses. tuta de uma memória representacional, tal
Em outra nota, Ferenczi complemen- linguagem implicaria “marcas somáticas”
taria este posicionamento ao sustentar que consequentes. Assumindo esta assertiva,
os bebês apenas possuiriam emoções e sen- Knobloch (1996) diz que, na perspectiva
sações corporais, subjetivas, relacionadas ferencziana, o trauma apenas se expres-
à expressão, e mesmo as crianças, nos pri- saria como silêncio, “ação” ou clivagem.
meiros anos de vida, teriam poucas lem- Segundo a autora, tratar-se-iam de “apa-
branças conscientes do desenvolvimento rições” do trauma, na medida em que ele
de sua própria compreensão de mundo. somente poderia “apresentar-se”, e não ser
Logo, haveria uma supremacia das sensa- representado.
ções, com tonalidades de prazer e despra- Em suma, de acordo com as formulações
zer, e reações corporais subjacentes, sendo de Ferenczi acerca da traumatogênese, os
que as lembranças permaneceriam imobi- traços referentes ao trauma situar-se-iam
lizadas no corpo, e somente nele poderiam em um sistema-limite (corpo/psique) e,
ser despertadas. O autor complementa: justamente por essa razão, seriam regis-
trados de maneira “sensível” e não simbó-
Não se justifica exigir da análise a reme- lica. Ampliando essa linha de raciocínio, o
moração consciente de algo que nunca foi autor ainda afirmaria que certos conteúdos
consciente. Só é possível reviver alguma não podem e não devem ser interpretados,
coisa, com uma objetivação a posteriori, ou sequer remodelados pela interpreta-
pela primeira vez, na análise. Reviver o ção, sendo que a vivência direta de uma
trauma e interpretá-lo (compreendê-lo)  – experiência do passado, por meio da téc-
em vez de “recalcamento” puramente sub- nica de relaxamento, poderia legitimá-la
jetivo – é, portanto, a dupla tarefa da análise. como verdadeira, além de possibilitar, por
(Ferenczi, 1934/2012e, p. 305) fim, um trabalho clínico relacionado a ela
(Ferenczi, 1934/2012e).
Ferenczi se refere àquilo que viria a Ainda que não seja oportuno, diante do
denominar posteriormente, em uma de escopo do presente estudo, um aprofunda-
suas últimas anotações, como mnemos mento a respeito da noção de neurose de
orgânico-psíquicos (Ferenczi, 1934/2012e, órgão proposta por Ferenczi, consideramos
p. 308). Basicamente, estes seriam even- relevante salientar que, ao vislumbrar a pos-
tos “psíquicos” do passado que se revela- sibilidade de “sintomas” corporais não sim-
riam incompreensíveis para o consciente, bólicos emergirem como consequência de
um trauma, o autor acaba revendo, ainda
que indiretamente, uma tentativa anterior
de compreensão dos fatores psíquicos das

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doenças orgânicas esboçada em um dos de modo diferenciado: o “tato” e a empa-


poucos textos que consagrou especifica- tia, por parte do analista, permitiam-lhe
mente ao assunto. Ocorre que a neurose perceber que os procedimentos clínicos
de órgão seria, em essência, um distúr- deveriam se adequar ao funcionamento psí-
bio psicossomático precedido de alguma quico do paciente e à dinâmica referente a
desordem na sexualidade adulta (Ferenczi, seu sofrimento.
1926/2012c). Logo, na descrição desta con- Ferenczi procurou desenvolver mudan-
dição estaria implícita uma ideia da sim- ças concernentes à relação terapêutica que
bologia do órgão afetado, com a qual, pudessem responder de maneira positiva
podemos antecipar, o posicionamento de à evolução do trabalho clínico com estes
Marty não consentiria. Portanto, não deixa pacientes, que estariam à margem de uma
de ser curioso o fato de Ferenczi ter contri- aplicação “clássica” dos preceitos psicana-
buído para avanços posteriores no campo líticos. Seus “experimentos” com a técnica
da psicossomática psicanalítica, sobre- psicanalítica – que, por vezes, foram criti-
tudo a partir de estudos sobre o trauma e a cados por seus pares – tinham como intuito
regressão, e não sobre os distúrbios psicos- conseguir alcançar novos horizontes den-
somáticos propriamente ditos. tre as possibilidades de trabalho da psica-
nálise (Casadore, 2012). Todavia, é preciso
salientar que, nos últimos anos de vida de
Algumas considerações sobre o recorte Ferenczi, seu furor sanandi incontido tam-
clínico proposto por Ferenczi bém o levou a muitas frustrações devido
à proposição de práticas que se revelaram
A exemplo do que ocorreu no início das pouco plausíveis, como a chamada análise
incursões clínicas de Breuer e Freud, mútua. Ainda assim, o psicanalista húngaro
em um período ainda pré-psicanalítico, foi responsável por inovações técnicas que
quando as histéricas exigiam que fossem viriam a ser reconhecidas como importan-
ouvidas e apresentavam o caminho do tes para a clínica psicanalítica, principal-
trabalho terapêutico pautado na fala e mente nas décadas vindouras.
em todo seu potencial representativo, na Com relação à clínica do trauma, Més-
clínica do trauma havia também a emer- záros destaca que o principal ponto de
gência de algo a ser “compreendido” nos apoio das propostas clínicas ferenczianas
movimentos regressivos, nos atos e peque- passa pelo reconhecimento das relações
nos gestos dos pacientes. Ferenczi obser- objetais precoces, bem como da relevância
vou tal fato e atentou às novas exigências da “atualização” delas na relação terapêu-
que emergiam na relação terapêutica em tica. É nesse sentido que o autor afirma:
razão da ocorrência de material que esca-
pava à interpretação e de sintomas empo-
brecidos em termos de simbologia. Logo,
compreendeu que devia responder a eles

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A psicanálise torna-se um sistema de pro- autor estabelece as bases sobre as quais se


cessos multidirecionais de elementos inter- apoiarão desenvolvimentos posteriores no
pessoais e intersubjetivos. Desenvolver a campo da psicossomática psicanalítica.
confiança entre analista e analisando torna-se Assumindo tal premissa, entendemos que
o meio indispensável para abordar experiên- a teorização ferencziana serviu como uma
cias traumáticas. A comunicação autêntica espécie de ponto de partida para a consti-
por parte do terapeuta torna-se requisito fun- tuição da Escola Psicossomática de Paris,
damental, pois afirmações falsas resultam sobre a qual nos deteremos a seguir.
em dissociação e repetem a dinâmica pato-
lógica de relações anteriores. (2011, p. 14)
Articulações possíveis entre Ferenczi e
Ainda sobre o papel da confiança na Marty à luz das noções de pensamento
relação terapêutica, Ferenczi enfatizou operatório, desorganização progressiva
que esta seria essencial para qualquer tra- e regressão somática
balho clínico que envolvesse movimentos
regressivos associados a situações traumáti- É importante frisar, de início, que para
cas. O autor deixou claro tal ponto de vista Marty (1996/1998) há um pressuposto
ao asseverar que “essa confiança é aquele fundamental a ser levado em considera-
algo que estabelece o contraste entre um ção para a compreensão dos fatores psíqui-
presente e um passado insuportável e trau- cos associados não apenas aos distúrbios
matogênico”. Ademais, reforçando este psicossomáticos, ou somatizações, como
posicionamento, afirmou que a confiança prefere o autor, mas também à saúde em
do paciente – sobretudo daquele que viven- seu sentido mais amplo: a constituição
ciou um trauma – no analista seria “indis- do sujeito se apoia em uma unidade fun-
pensável para que o passado seja reavivado, cional entre corpo e mente. Dessa forma,
não enquanto reprodução alucinatória, como salienta Aisenstein (1994), todas as
mas como lembrança objetiva” (Ferenczi, suas vivências, quer sejam físicas, quer psí-
1933/2012b, pp. 114-115). quicas, seriam compreendidas como resul-
Podemos inferir, portanto, que Ferenczi tantes de interações contínuas e dinâmicas
ensaia outro tipo de compreensão acerca que obedeceriam a movimentos de orga-
dos distúrbios psicossomáticos e, con- nização ou desorganização. Mais adiante,
sequentemente, um modo diferente de discutiremos com maiores detalhes tais
abordá-los. E é justamente por fazê-lo movimentos e as possíveis articulações
vislumbrando a possibilidade de a for- entre as concepções subjacentes a eles e os
mação de “sintomas” corporais não ser postulados ferenczianos acerca do trauma
intermediada pela simbolização que o e da regressão.
Antes disso, consideramos relevante
salientar que, conforme o modelo teórico da
Escola Psicossomática de Paris, em função

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de uma marcante limitação representacio- Vale ressaltar que, ampliando suas for-
nal, as tensões tendem a ser descarregadas mulações iniciais, Marty (1980) passou a
diretamente no corpo, o que, em última utilizar o termo vida operatória para aludir
instância, favoreceria a eclosão de soma- a uma dinâmica mental propensa à croni-
tizações. É justamente por essa razão que cidade, em que os mecanismos presentes
haveria uma inclinação a doenças orgâni- nas neuroses e nas psicoses seriam pouco
cas em sujeitos que apresentam uma capa- apreciáveis devido à predominância do
cidade de simbolização restrita. Ocorre que pensamento operatório. Ademais, acres-
estes, de acordo com Marty (1990/1993), não centou que a vida operatória se encontra-
disporiam dos recursos necessários para se ria intimamente relacionada a desarmonias
valer do aparelho mental e tampouco do afetivas experimentadas na primeira infân-
aparelho sensório-motor para elaborar psi- cia em virtude do desempenho inapro-
quicamente ou escoar por meio de com- priado  – excessivo ou insuficiente  – da
portamentos as tensões que experimentam. função materna. Tal proposição, crucial
Logo, restaria apenas o acionamento da via para a Escola Psicossomática de Paris,
somática como possibilidade de descarga, a nos remete à associação estabelecida na
qual se afiguraria, para o psicanalista fran- perspectiva ferencziana entre o trauma, a
cês, como o último dos três domínios mobi- regressão e os períodos precoces do desen-
lizáveis por qualquer indivíduo em prol da volvimento humano.
supressão do desequilíbrio provocado pelo Todavia, com base em conhecimentos
excesso ou acúmulo de tensões. oriundos da biologia, Marty (1976) origi-
Quando a capacidade de simbolização é nalmente sustentou que movimentos cons-
restrita a esse ponto, tipicamente prevalece- tantes de organização evolutiva seriam
ria uma forma de pensamento consciente, fundamentados em grupos funcionais ou
superficial, desprovida de valor libidinal, elementos funcionais (p. 118), sendo que
excessivamente orientada para a realidade estes se constituiriam de funções – somáti-
externa e estreitamente vinculada à mate- cas e mentais, nesta sequência – adquiridas
rialidade dos fatos, que foi denominada e estabelecidas em momentos anteriores
por Marty e M’Uzan (1963[1962]/1994) do desenvolvimento individual. Tal dinâ-
pensamento operatório. Os autores ainda mica, em contraste com o que se poderia
asseveraram que, nessas circunstâncias, a cogitar a princípio, não seria linear e exigi-
impossibilidade de referência a um “objeto ria, para a constituição de uma nova orga-
interno realmente vivo” (p. 168) ensejaria nização funcional, rearranjos das referidas
um amplo apagamento da expressividade funções. E estas, devido a traumas, atuais
de ordem mental, comumente acompa- ou passados, possivelmente não se mostra-
nhado por uma variedade de somatizações riam disponíveis para tanto, o que ensejaria
não simbólicas, análogas, portanto, àquelas
que, para Ferenczi, resultariam de expe-
riências traumáticas.

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desorganizações em razão das quais adviria deu o nome de desorganização progressiva,


um tipo específico de movimento regres- definindo-o, essencialmente, como “a des-
sivo. Porém, um outro tipo de movimento truição da organização libidinal de um
regressivo seria observado, diante de desor- indivíduo” (p. 246). O autor esclareceu que
ganizações, nos casos em que, a exemplo o adjetivo progressivo se justificaria porque
do que ocorre na vida operatória, as fun- o referido movimento não seria interrom-
ções prévias são insuficientes. pido por um sistema regressivo válido, ou
Marty, portanto, fala de dois tipos distin- seja, capaz de se deter em fixações anterio-
tos de movimentos regressivos que seriam res, em contraste com o que ocorreria na
desencadeados por processos de desorga- regressão somática. Como consequência, a
nização, a depender, essencialmente, da desorganização progressiva provocaria um
capacidade de simbolização do sujeito. Um apagamento global da dinâmica mental
pré-consciente enriquecido, quantitativa e que abriria caminho para doenças orgâni-
qualitativamente, por representações, além cas capazes de representar ameaça à vida.
de conduzir a uma estrutura egoica mais Com base nesta diferenciação, Marty
consistente, proporcionaria o aporte de posicionou a desorganização progressiva
pontos de fixação aos movimentos regres- e a regressão somática em polos opostos
sivos disparados por traumas. O termo nos processos de somatização. Outrossim,
regressão somática foi criado pelo psicana- esclarecendo o que determinaria a imple-
lista francês para aludir a este fenômeno, mentação desta ou daquela, o autor sus-
que seria essencialmente reorganizativo, tentou que,
mas comumente provocaria, em um pri-
meiro momento, além de uma leve desor- quanto mais o pré-consciente de um sujeito
ganização mental, “sintomas” corporais se mostrar rico de representações perma-
menores e muitas vezes passíveis de rever- nentemente ligadas entre si, mais a pato-
são espontânea, na medida em que um de logia eventual correrá o risco de se situar
seus desdobramentos seria a substituição na vertente mental. Quanto menos o pré-
momentânea da elaboração psíquica pela -consciente se mostrar rico de representa-
reação física (Marty, 1990/1993). ções, de ligações entre as que existem e de
Por outro lado, sujeitos que possuem permanência das representações e de suas
uma capacidade de simbolização restrita ligações, mais a patologia eventual correrá
a ponto de depreender a existência de uma o risco de se situar na vertente somática.
carência funcional do psiquismo tende- (1990/1993, p. 28).
riam a experimentar um tipo de desorgani-
zação que fomentaria “sintomas” corporais É nesse sentido que Aisenstein (1994)
mais graves. A este fenômeno Marty (1968) distingue duas valências nos movimen-
tos regressivos conforme compreendidos
pela Escola Psicossomática de Paris. Em
uma primeira, haveria uma disposição

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volume 50, n.2 · 2016

estrutural do aparelho psíquico que viabi- ao paciente se referenciado simplesmente


lizaria regressões limitadas no tempo por pelo modelo clássico de tratamento das
pontos de fixação e dotadas de potencial neuroses e pelo emprego prioritário da
reorganizador em termos mentais ou capa- interpretação que dele decorre.
zes, inclusive, de enriquecer o repertório Eis aqui, portanto, um importante ponto
evolutivo do indivíduo. Em uma segunda de convergência, em termos técnicos,
valência, diante da inexistência de pontos entre as propostas de Ferenczi acerca dos
de fixação que possam atuar como ante- casos difíceis, que exprimiriam um forte
paros das regressões, a desorganização se movimento regressivo durante o processo
manifestaria clinicamente obedecendo analítico, e as formulações de Marty con-
à ordem da pulsão de morte e encerra- cernentes aos pacientes que apresentam
ria uma carga de energia contraevolutiva, somatizações: o posicionamento do ana-
ensejando, assim, processos de somatiza- lista e a dinâmica instaurada na relação e
ção que atingiriam funções cada vez mais no setting obedecerão a outra lógica em
fundamentais. ambos os casos. Conforme já menciona-
Concluímos, diante do exposto, que mos, Ferenczi teve “tato” suficiente para
as formulações de Marty evidenciam as perceber que precisava investir no que seria
especificidades tanto de pacientes que uma relação intersubjetiva de fato, a fim de
apresentam somatizações associadas à possibilitar ao paciente algumas “constru-
vida operatória ou a desorganizações pro- ções” mais fundamentais, que em muito
gressivas quanto dos desafios que se apre- diriam respeito às relações objetais mais
sentam ao tratamento deles. Afinal, sob a arcaicas e aos modelos abstraídos destas.
égide do pensamento operatório se tornaria O estabelecimento de um laço mais posi-
perigosamente usual um expediente de que tivo com o paciente, baseado em uma pos-
qualquer sujeito poderia lançar mão pon- tura confiável e compreensível, favorecia
tualmente e sem maiores prejuízos à sua tal evolução.
saúde física diante do excesso ou acúmulo Na Escola Psicossomática de Paris
de tensões: o emprego da via somática em encontramos um posicionamento equiva-
detrimento do recurso ao aparelho mental lente, pois Marty também atentou à fragi-
ou ao aparelho sensório-motor. Ademais, a lidade subjetiva inerente às somatizações
desorganização progressiva abriria caminho associadas à vida operatória ou a desorga-
para a eclosão de doenças orgânicas gra- nizações progressivas e observou que estas
ves mediante a destruição da organização se encontrariam intimamente relaciona-
libidinal do sujeito, diferentemente do que das a uma fase pré-verbal e pré-simbó-
ocorreria a partir da regressão somática. O lica do desenvolvimento humano, sendo
psicanalista francês asseverou que os cená- que, por essa razão, fugiriam ao escopo
rios implementados por tais fenômenos vão
exigir outro tipo de abordagem por parte
do analista, que pouco poderá oferecer

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As noções de trauma e regressão nos escritos de Sándor Ferenczi e suas possíveis articulações 133
com as propostas teóricas da Escola Psicossomática de Paris
Marcos Mariani Casadore e Rodrigo Sanches Peres

da interpretação. Este tipo de interven- somáticas de Marty, malgrado o fato de este


ção, portanto, deveria ser usada de modo não ser apontado como um leitor daquele.
extremamente criterioso. Seria imprescin- Em síntese, é a partir do reconhecimento
dível, em contrapartida, investir em uma da relevância da regressão na clínica e de
relação mais honesta e aberta, na qual o sua associação com as experiências trau-
analista disponibilizaria seus próprios sis- máticas – do qual decorre uma abordagem
temas elementares de representações e que valoriza a postura ativa e empática do
defesas, de modo a dar contorno ao desem- analista – que podemos situar os dois auto-
penho progressivo de funções fragilizadas res dentre aqueles que vislumbraram novos
do paciente, e abandonaria gradualmente horizontes para a psicanálise e que extrapo-
esse papel quando dos primeiros sinais de laram as fronteiras da clínica mais tradicio-
independência. nal, de modo a contemplar casos até então
Justamente em função disso Marty afir- pouco estudados. Contudo, obviamente não
mou que, “aplicada a qualquer outra coisa é possível reduzir um ao outro.
que não seja a análise da neurose clássica, a Afinal, tratamos de dois autores que tra-
neutralidade iguala-se à indiferença” (1976, balharam em épocas e locais diferentes.
p. 131). Caberia então ao analista assumir Ferenczi, psicanalista húngaro pertencente
uma postura ativa para cuidadosamente à primeira geração e colega de Freud,
estimular a retomada do funcionamento pôde, ao fim da vida, focar sua prática clí-
mental apresentado pelo paciente antes nica e seus estudos nos casos difíceis, que
de seu adoecimento, para apenas posterior- se mostravam refratários a uma terapêu-
mente passar a envidar esforços no intento tica pautada essencialmente na regra fun-
de enriquecer seu aparelho psíquico até o damental psicanalítica da livre associação.
nível mais desenvolvido possível. Nessa Anos depois, Marty, trabalhando em hospi-
perspectiva, como observou Santos Filho tais franceses, se depara com uma proble-
(1994), o que se busca, em última instância, mática mais específica e passa a se ocupar
é a construção de uma possibilidade elabo- do mapeamento dos fatores psíquicos das
rativa a partir de um vínculo duradouro, somatizações. Apesar destas distinções, e
confiável e contínuo. mesmo considerando o fato de Marty não
apontar Ferenczi como um dos autores que
influenciaram suas teorizações, é possível
Considerações finais compreendermos que ambos chegaram
a posicionamentos congruentes entre si.
Diante do exposto, é possível pensar na Assim, julgamos viável reconhecer certas
existência de articulações entre os escritos raízes ferenczianas, sobretudo acerca das
finais de Ferenczi e as formulações psicos- noções de trauma e regressão, nas proposi-
ções teóricas do psicanalista francês.
Aprofundando este argumento, nos pa-
rece possível sustentar que, mesmo que

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volume 50, n.2 · 2016

de modo pouco contundente, os estu- aprofundadas por ele e somente vieram a


dos de Ferenczi propagaram-se também público postumamente. A identificação
no campo da psicossomática psicanalí- de uma confluência entre o posiciona-
tica. Afinal, as formulações de Marty  – mento destes dois autores pode auxiliar
que ainda hoje se consolidam como uma tanto clínicos quanto pesquisadores na
das vertentes teóricas mais importantes compreensão de desenvolvimentos teóri-
para o estudo psicanalítico das somatiza- cos pós-freudianos que têm se revelado de-
ções – viriam a corroborar algumas propo- terminantes para a ampliação do alcance
sições de Ferenczi que não puderam ser da psicanálise.

Las nociones de trauma y de regresión en los escritos The concepts of trauma and regression in Sándor
de Sándor Ferenczi y sus posibles vínculos con las Ferenczi’s work, and their possible articulations
propuestas teóricas de la Escuela Psicosomática with the theoretical proposals of the Paris
de París Psychosomatic School

Este estudio analizará las nociones de trauma y de This paper aims to discuss both concepts of trauma
regresión en los escritos de Sándor Ferenczi y sus and regression in Sándor Ferenczi’s work, and its
posibles vínculos con las propuestas de la Escuela possible connections with the proposals of the Paris
Psicosomática de París, en particular las establecidas Psychosomatic School, particularly those established
por Pierre Marty. Al tratar de la unidad establecida by Pierre Marty. By bringing up the imbrication
entre cuerpo y psique para entender la génesis del between soma and psyche in order to understand
trauma, la angustia y la formación de síntomas que the genesis of trauma, angst, and the development of
carecen de contenido representacional, asociados symptoms (symptoms without any representational
con movimientos regresivos, Ferenczi esboza una content and associated to regressive movements),
teoría que convergerá con los desarrollos posteriores Ferenczi outlines a theory which is going to converge
en el campo de la psicosomática psicoanalítica. towards later progress in the field of psychoanalytic
Hay un diálogo rentable hecho entre las últimas psychosomatics. Although Marty has never been
teorías de Ferenczi y las formulaciones teóricas known to read Ferenczi’s work, we believe that
y clínicas de Marty, a pesar de que este último there is a fruitful dialogue to be built between
no sea reconocido como un lector de Ferenczi. Ferenczi’s latest theories and Marty’s theoretical
En última instancia, consideramos posible notar and clinical formulations. Therefore, we think it
ciertas raíces ferenczianas, especialmente en may be found certain Ferenczian roots, especially
relación a las nociones de trauma y de regresión, concerning both concepts of trauma and regression,
en las proposiciones teóricas hechas por Marty, en in Marty’s theoretical proposals, specifically those
particular en las nociones de pensamiento operatorio, related to his ideas of operative thinking, progressive
desorganización progresiva y regresión somática. disorganization, and somatic regression.
Palabras clave: psicosomática psicoanalítica; trauma; Keywords: psychoanalytic psychosomatics; trauma;
regresión; Sándor Ferenczi; Pierre Marty. regression; Sándor Ferenczi; Pierre Marty.

Referências
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As noções de trauma e regressão nos escritos de Sándor Ferenczi e suas possíveis articulações 135
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Marcos Mariani Casadore e Rodrigo Sanches Peres

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[Recebido em 16.09.2015, aceito em 19.02.2016]

Marcos Mariani Casadore Rodrigo Sanches Peres


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