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Hermenêutica e Xadrez

A hermenêutica, teoria da interpretação ou investigação da intepretação, tem na figura de


Hermes sua representação. Hermes, um dos deuses olímpicos ,com suas sandálias aladas era o
mensageiro dos Deuses Gregos com a função de levar ao homem comum a mensagem destes. Era o
que chamaríamos hoje de tradutor, pois os Deuses falam em outra língua.

Índice de Conteúdos
1- Santo Agostinho e a Hermenêutica da Sincronicidade
2- Freud, a linguagem complicada
3- Cristo e as palavras
4- A Linguagem expressando a Realidade
5- Xadrez: linguagem universal
6- Diagrama

Santo Agostinho e a Hermenêutica da Sincronicidade


Santo Agostinho (354–430 d.C.) é o exemplo da hermenêutica da Sincronicidade (Yung E
Wolfgang Pauli, 1935) no sentido de transformadora. Em agosto de 386 em Milão com 32 anos
chorava nos jardins de sua residência a procura de uma resposta para o sentido da vida. Foi neste
momento que escutou a voz de uma criança cantando: “Toma e lê, toma e lê” em refrão. Levantou-
se bruscamente, olhou em torno para descobrir de onde vinha o canto, mas não viu mais que um
livro sobre uma pequena mesa. Abriu e leu a página caída por acaso sob seus olhos: “Não caminheis
em voracidades e embriaguez, não nos prazeres impuros do leito e em leviandades, não em
contendas e disputas, mas revesti-vos de Nosso Senhor Jesus Cristo, e não cuideis da carne com
demasiados desejos”. Não quis ler mais. Uma espécie de luz inundou-lhe o coração, dissipando todas
as trevas da incerteza, e ele correu à procura da mãe para lhe contar o sucedido. Ela exultou e
bendisse ao Senhor, pois o filho estava convertido pelas palavras de Paulo de Tarso, e as portas da
bem-aventurança eterna abriam-se finalmente para recebê-lo.¹
Santo Agostinho em seu livro “A Doutrina Cristã” utilizou a hermenêutica bíblica com o
objetivo de interpretá-la na difícil tarefa de separar os textos literais dos alegóricos.
Freud, a linguagem complicada
Freud nos seus últimos texto dizia que a linguagem é uma complicação, e ela funciona como
alucinação, é uma recolocação da percepção que não tem mais nada com a realidade do mundo. A
linguagem cria uma realidade nova, pois ela é a matéria da linguagem acústica, que é uma realidade.
Esta distância entre a realidade e a linguagem, faz com que os conceitos possuam um caráter
metafórico e partir disto identifica uma diferença absoluta entre o mundo e o pensamento e assim o
conceito aparece como uma falsa expressão do mundo.
Cristo e as palavras
Conhecer o mundo é interpretá-lo, ou seja, fornecer valor a ele, através de perspectivas
múltiplas. Referenciando as palavras de Cristo: "quem não for adúltero atire a primeira pedra". Ele
se refere em relação aos olhos, pois certamente não mandaria ninguém jogar pedras. Adulterar a
realidade é projetar na realidade seus pensamentos, seus conceitos, suas memórias; não adulterar é
você ter os olhos abertos.
Tomemos agora o exemplo do “Martelo”. O martelo é martelo se ele puder martelar e o único
ser capaz de fazer isso é o homem que cria seus valores, por isso o conhecimento não é
transcendente. É o ser humano que interpreta e dá um sentido às coisas, e este é um sentido
humano. Assim, a verdade busca se firmar através da linguagem que lhe fornece suas primeiras leis,
mas estas são válidas na perspectiva do ser humano.
Como podemos entender existe uma grande distância entre a realidade e a linguagem, logo
não existe qualquer correspondência entre o conceito e o mundo.

A Linguagem expressando a Realidade


Existem exceções que tornam a hermenêutica mais abrangente e também metafisica, e
neste caso a linguagem expressa exclusivamente a realidade. O primeiro é o sistema de comunicação
da etnia Pirahã, povo indígena do Brasil, possui um sistema de linguagem diferente das outras tribos.
A outra é a materialização da linguagem do pensamento na realidade e ocorre no jogo milenar do
Xadrez. Segundo Reuben Fine que foi um dos melhores enxadristas do mundo na década de 1930 e 1940,
Grande Mestre Internacional, assim como psicólogo, em seu livro “A psicologia do jogador de Xadrez(1956)
“, descreve que o xadrez está relacionado aos conflitos em torno da linguagem do aprendizado
respondendo o por que existem jogadores gênios aos 12 anos. Exemplo de menino prodígio é Samuel
Reshevsky, que atingiu a força de mestre aos cinco anos.

Xadrez: linguagem universal


Martin Heidegger (1889-1976) filósofo, escritor, professor universitário e reitor alemão, no livro
Ser e Tempo (1927), apresenta que qualquer compreensão de entes pressupõe uma compreensão
do ser. “Essa afirmação aparentemente obscura é clarificada pelo paralelo de Haugeland (1988) com
o xadrez. Não podemos ter um encontro com uma torre sem alguma forma de compreensão do jogo
de xadrez. Nos termos de Heidegger, a “descoberta” dos entes do xadrez (peças, posições,
movimentos ou situações) pressupõe uma “abertura” prévia do xadrez como o contexto para que
eles façam sentido. O “ser” das torres ou dos garfos do cavalo é o seu lugar no interior do jogo,
atribuindo sua inteligibilidade enquanto os entes que são. O próprio jogo somente faz sentido,
contudo, como uma maneira possível de nos comportarmos.”2

Diagrama
O diagrama a seguir manifesta a linguagem do pensamento em realidade e se refere a
última partida da série da Netflix Gambito da Rainha, partida entre Elizabeth Harmon x Vasily Borgov.
As peças estão colocadas de maneira a expressar uma posição que tem que ser entendida como um
todo, não podendo ser fracionado como a realidade. Para resolve-la é preciso que linguagem do
nosso pensamento seja convertida em realidade, neste caso no xeque-mate. As Brancas arrematam
a partida da maneira surpreendente, Dama toma Cavalo e é neste momento em que a linguagem
resultado do pensamento se torna realidade.
Se Heidegger estivesse assistindo essa partida ele certamente diria neste momento: O ser que
pode ser compreendido é a linguagem, a linguagem precisa ser universal.
O xadrez é jogado da mesma forma em todo o mundo e o número de livros editados só perde
para a Bíblia, o que o torna um meio de comunicação verdadeiramente universal.

1 PESSANHA, José Américo Motta. Os Pensadores – Agostinho. São Paulo: Editora Nova Cultural, 1999, p. 5.
2 Joseph Rouse, A filosofia da ciência de Heidegger
O presente artigo foi escrito por Emilio R.S. Mansur, Engenheiro Civil-Eletricista, pós-graduado
em ENGENHARIA DE BARRAGENS (PUC- MINAS), EDUCAÇÃO HIBRIDA (UNIAMÉRICA), RECURSOS HUMANOS
E MARKETING (URCAMP), ESTRUTURAS DE CONCRETO( INBEC), PROFESSOR UNIVERSITÁRIO .

18/02/2022

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