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Fluidos II - Cálculo de tubulação para água fria - Parte ½

Escoamento real

Na página anterior foi comentada a equação de Bernoulli, que vale para o escoamento de
um fluido incompressível sem atrito com as paredes da tubulação.

Os líquidos reais têm alguma compressibilidade, mas ela é tão pequena que eles podem ser
considerados incompressíveis e os erros são desprezíveis.

As tubulações reais, no entanto, oferecem resistência ao escoamento e isso não pode ser
desprezado na maioria dos casos, sob pena de erros consideráveis.

Na Figura 01 é considerada uma situação ideal. Portanto, h0 + p0 / (µ g) + c02 / (2 g) = h1


+ p1 / (µ g) + c12 / (2 g).

Para uma tubulação real, pode ser considerada essa igualdade com um dos membros
acrescido de uma altura correspondente à perda de pressão devido ao atrito com a
tubulação. Essa é a chamada perda de carga.

Na Figura 2, Ha é a perda de carga. Assim,

h0 + p0 / (µ g) + c02 / (2 g) = h1 + p1 / (µ g) + c12 / (2 g) + Ha.

Ou seja, para fins de cálculo, uma tubulação real é considerada uma ideal acrescida da
parcela da perda de carga.

As fórmulas que permitem o cálculo da perda de carga dão em geral valores por unidade de
comprimento de tubulação (perda de carga unitária), simbolizada por J. Se, por exemplo, J
é dado em metro por metro (m/m) e o comprimento L da tubulação também é em metros,
temos

Ha = J L.
O método mais preciso de cálculo da perda de carga unitária é dado pela equação de Darcy-
Weisbach, J = f v2 / (2 g D), onde

J: perda de carga unitária (m/m).


f: coeficiente de atrito para o escoamento (adimensional).
v: velocidade do escoamento (m/s).
g: aceleração da gravidade (m/s²).
D: diâmetro interno da tubulação (m).

A velocidade do escoamento pode ser obtida da equação da continuidade

Q = S v, onde Q é a vazão em m3/s e S é a área da seção transversal interna do tubo em m2.

Já a determinação do coeficiente de atrito f é mais complexa. Ele depende de dois fatores:

1) do número de Reynolds Re do escoamento, que é dado por Re = v D / vcin. Onde:

v é a velocidade do escoamento (m/s)


D é o diâmetro interno da tubulação (m)
vcin é a viscosidade cinemática do fluido (m2/s)

Se Re < 2000 o escoamento é dito laminar. Se Re > 4000 o escoamento é dito turbulento.
Entre os dois valores existe uma zona de transição, para a qual não há fórmula precisa. Na
maioria dos casos práticos, os escoamentos são turbulentos.

2) do diâmetro e rugosidade das paredes da tubulação.

Com esses dados, o valor de f pode ser determinado por gráficos ou métodos iterativos. Por
enquanto, isso não é dado nesta página. A alternativa mais simples é o uso de alguma
fórmula empírica como a de Hazen-Williams. Alguns especialistas contemporâneos
sugerem o abandono da mesma, alegando que os métodos computacionais estão
disseminados e, portanto, não mais se justifica o uso. Mas é simples e por isso colocada
nesta primeira versão de página, lembrando que é uma fórmula aproximada e válida
somente para instalações comuns de água.

Material da tubulação Vazão Diam mm Diam pol

m3/h
Perda de carga unitária (J) m/m

Valores adotados para o coeficiente C: aço galvanizado 125, aço soldado 130,
cimento-amianto 130, ferro fundido revestido 125, polietileno 120, PVC ou cobre
140.
Perdas localizadas e comprimento equivalente

Acessórios como conexões e registros provocam perdas de carga localizadas. No cálculo, a


perda localizada é representada pelo comprimento equivalente, isto é, o comprimento de
tubulação da mesma bitola que produz a mesma perda de carga.

No exemplo da Figura 01, o comprimento para efeito de cálculo da tubulação entre A e B é


dado por

Ltotal = L1 + L2 + Lequiv_registro + Lequiv_curva.

E a perda de carga total é dada conforme igualdade já vista Ha = J Ltotal.

Os comprimentos equivalentes são encontrados em tabelas conforme próximo tópico.


Comprimentos equivalente
Para conexões e registros (em metros de tubulação). Os dados em cor azul se referem a tubulações
de aço galvanizado e os em cor vermelha, a tubulações de PVC ou cobre. Números na primeira e
última linhas são diâmetros internos em milímetros.

Galvanizado
15 20 25 32 40 50 60 75 100 125 150
PVC/cobre

0,4 0,6 0,7 0,9 1,1 1,4 1,7 2,1 2,8 3,7 4,3
Joelho 90º
1,1 1,2 1,5 2,0 3,2 3,4 3,7 3,9 4,3 4,9 5,4

0,2 0,3 0,4 0,5 0,6 0,8 0,9 1,2 1,5 1,9 2,3
Joelho 45º
0,4 0,5 0,7 1,0 1,3 1,5 1,7 1,8 1,9 2,4 2,6

0,2 0,3 0,3 0,4 0,5 0,6 0,8 1,0 1,3 1,6 1,9
Curva 90º
0,4 0,5 0,6 0,7 1,2 1,3 1,4 1,5 1,6 1,9 2,1

0,2 0,2 0,2 0,3 0,3 0,4 0,5 0,6 0,7 0,9 1,1
Curva 45º
0,2 0,3 0,4 0,5 0,6 0,7 0,8 0,9 1,0 1,1 1,2

0,3 0,4 0,5 0,7 0,9 1,1 1,3 1,6 2,1 2,7 3,4
Tê fluxo direto
0,7 0,8 0,9 1,5 2,2 2,3 2,4 2,5 2,6 3,3 3,8

1,0 1,4 1,7 2,3 2,8 3,5 4,3 5,2 6,7 8,4 10,0
Tê fluxo lateral
2,3 2,4 3,1 4,6 7,3 7,6 7,8 8,0 8,3 10,0 11,1

1,0 1,4 1,7 2,3 2,8 3,5 4,3 5,2 6,7 8,4 10,0
Tê fluxo bilateral
2,3 2,4 3,1 4,6 7,3 7,6 7,8 8,0 8,3 10,0 11,1

Saída de 0,4 0,5 0,7 0,9 1,0 1,5 1,9 2,2 3,2 4,0 5,0
tubulação 0,8 0,9 1,3 1,4 3,2 3,3 3,5 3,7 3,9 4,9 5,5

Entrada de tan- 0,2 0,2 0,3 0,4 0,5 0,7 0,9 1,1 1,6 2,0 2,5
que s/ borda 0,3 0,4 0,5 0,6 1,0 1,5 1,6 2,0 2,2 2,5 2,8

Entrada de tan- 0,4 0,5 0,7 0,9 1,0 1,5 1,9 2,2 3,2 4,0 5,0
que c/ borda 0,9 1,0 1,2 1,8 2,3 2,8 3,3 3,7 4,0 5,0 5,6

Registro gaveta 0,1 0,1 0,2 0,2 0,3 0,4 0,4 0,5 0,7 0,9 1,1
aberto 0,1 0,2 0,3 0,4 0,7 0,8 0,9 0,9 1,0 1,1 1,2

Registro globo 4,9 6,7 8,2 11,3 13,4 17,4 21,0 26,0 34,0 43,0 51,0
aberto 11,1 11,4 15,0 22,0 35,8 37,9 38,0 40,0 42,3 50,9 56,7

Registro 2,6 3,6 4,6 5,6 6,7 8,5 10,0 13,0 17,0 21,0 26,0
angular 5,9 6,1 8,4 10,5 17,0 18,5 19,0 20,0 22,1 26,2 28,9

Válvula de pé 3,6 5,6 7,3 10,0 11,6 14,0 17,0 20,0 23,0 30,0 39,0
e crivo 8,1 9,5 13,3 15,5 18,3 23,7 25,0 26,8 28,6 37,4 43,4

Válvula de re- 1,1 1,6 2,1 2,7 3,2 4,2 5,2 6,3 8,4 10,4 12,5
tenção leve 2,5 2,7 3,8 4,9 6,8 7,1 8,2 9,3 10,4 12,5 13,9

Válvula de re- 1,6 2,4 3,2 4,0 4,8 6,4 8,1 9,7 12,9 16,1 19,3
tenção pesada 3,6 4,1 5,8 7,4 9,1 10,8 12,5 14,2 16,0 19,2 21,4

Galvanizado
15 20 25 32 40 50 60 75 100 125 150
PVC/cobre
Fluidos IIA - Cálculo de tubulação para água fria - Parte 2/2

Critérios de dimensionamento ↑Topo • Fim↓

Para o dimensionamento de uma tubulação, em primeiro lugar, alguns parâmetros devem


ser conhecidos. Seja, conforme exemplo da Figura 01, uma tubulação de diâmetro uniforme
D que conduz uma vazão de água Q do ponto A até o ponto B (a parte tracejada indica que
pode haver pontos de perdas localizadas, como conexões e registros).

Notar, conforme o primeiro tópico, que a equação de Bernoulli tem 6 variáveis (a perda Ha
pode ser calculada a partir das outras) e, portanto, é preciso ter 5 conhecidas para a
determinação da sexta.

Se, no exemplo da Figura 01, B é a entrada de água de um equipamento, Q e pB são


conhecidos, pois são definidos pelo projeto do mesmo. Desde que o diâmetro é constante, a
velocidade é a mesma (Q=S v) em todos os pontos e as parcelas c/2g se anulam. As alturas
físicas hA e hB são conhecidas, pois são dados do projeto da rede.

Portanto, é possível determinar a pressão necessária em A, que será a diferença das alturas
físicas acrescida da perda de carga na tubulação.

Suponha agora que o ponto A é a saída de uma bomba. Pelas fórmulas e também pela
dedução óbvia, quanto menor D maior a perda de carga e, portanto, mais potente deve ser a
bomba, com maior custo de aquisição e maior consumo de energia. Mas, em compensação,
o custo da tubulação é menor. E vice-versa. Então, o dimensionamento da bitola D parece
ser o melhor compromisso entre esses custos.

Mas existe um critério técnico que deve ser observado: a velocidade do fluxo. Velocidades
muito baixas exigem tubos de grande diâmetro que são antieconômicos. Velocidades muito
altas produzem ruídos e desgastes prematuros. No caso de bombas centrífugas, as
velocidades recomendadas são:

• Linha de sucção 1 a 1,6 m/s


• Linha de recalque 2 a 3 m/s.

O exemplo do próximo tópico usa esse critério para a primeira estimativa.


Exemplo: bomba centrífuga

A Figura 5 dá exemplo de uma rede para bombear água de um reservatório inferior para um
superior. Bastante usado em edifícios, indústrias e outros. É suposta uma vazão Q = 15
m3/h (ou 0,00417 m3/s). Deseja-se saber uma bitola satisfatória para uma tubulação de
PVC e a capacidade da bomba.

Conforme equação da continuidade, Q = S v = π D2 v / 4. Ou v = 4 Q / (π D2). Com a


bitola padronizada D = 60 mm (0,06 m) temos v ≈ 4 0,00417 / (3,14 0,06 0,06) ≈ 1,48 m/s.
É um valor dentro da faixa recomendada para sucção e, portanto, será adotado em
princípio.

Para a linha de recalque, a velocidade pode ser maior. Assim, tentamos um valor
padronizado logo abaixo (D = 50 mm = 0,05 m): v ≈ 4 0,00417 / (3,14 0,05 0,05) ≈ 2,12
m/s. O valor está dentro da faixa recomendada e a bitola será em princípio adotada.

Considerando água a 20ºC, a viscosidade cinemática é aproximadamente 0,000001 m2/s. E


o número de Reynolds para a sucção será Re_suc = 1,48 0,06 / 0,000001 = 88800. E para o
recalque Re_rec = 2,12 0,05 / 0,000001 = 106000. Ambos estão na faixa de escoamento
turbulento e a fórmula de Hazen-Williams pode ser usada.

Desde que a bomba produz um aumento de pressão do fluxo, a análise fica mais fácil se as
linhas de sucção (01) e de recalque (23) são separadas.

Linha de sucção:

Consideramos que o nível da água está apenas um pouco acima da válvula de pé (é a pior
situação). Nesta condição, podemos desprezar a coluna de líquido e considerar a pressão
em 0 como sendo a pressão atmosférica (a equação de Bernoulli usa pressões absolutas).
Assim, p0 = patm. O nível zero de referência arbitrado passa por esse ponto e, portanto, h0
= 0. A água no reservatório está em repouso e a sucção da bomba a acelera para entrar na
tubulação com a velocidade de sucção anteriormente calculada. Assim, é lícito supor uma
situação limite e c0 = 0.

No ponto 1 temos h1 = 2,5 m e c1 = 1,48 m/s (a velocidade anteriormente calculada para a


sucção).

E, aplicando a equação de Bernoulli para tubos reais conforme tópico inicial, temos

0 + patm / (µ g) + 02 / (2 g) = 2,5 + p1 / (µ g) + 1,482 / (2 g) + Ha_sucção.

Para o cálculo da perda de carga, considera-se o comprimento do trecho acrescido dos


equivalentes para perdas localizadas conforme já dito:
Lsucção = 2,5 + 2,0 + 25,0 + 1,4 = 30,9 m (as duas últimas parcelas são os comprimentos
equivalentes para válvula de pé e curva com bitola 60 mm conforme tabela anterior).

E a perda de carga unitária é calculada pelo formulário do tópico Fórmula de Hazen-


Williams, J ≈ 0,04 m/m.

Portanto, Hasucção = J Lsucção = 0,04 30,9 = 1,24 m. E, substituindo e calculando valores


na igualdade anterior,

patm / (µ g) = 2,5 + p1 / (µ g) + 0,11 + 1,24. Ou p1/(µg) = patm/(µg) - 3,85.

Linha de recalque:

Para o ponto 2, h2 = 2,5 m, c2 = 2,12 m/s (a velocidade anteriormente calculada).

Para o ponto 3, h3 = 50,0+2,5 = 52,5 m, c3 = c2 = 2,12 m/s (pois o diâmetro do tubo é


uniforme). O fluxo sai livre nesse ponto e, portanto, sua pressão pode ser considerada a
pressão atmosférica. Para a altura de 3, a variação é desprezível e pode ser a mesma do
ponto 0. Assim, p3 = patm.

Fazendo a igualdade de Bernoulli,

2,5 + p2 / (µ g) + 2,122 / (2 g) = 52,5 + patm / (µ g) + 2,122 / (2 g) + Ha_rec.

O cálculo da perda de carga é feito de forma similar ao da sucção:


Lrec = 50,0 + 2,0 + 0,8 + 10,8 + 3,3 = 66,9.

As três últimas parcelas são as perdas para registro gaveta, válvula de retenção pesada e
saída de tubulação, conforme tabela da página anterior.

E, calculando a perda conforme Fórmula de Hazen-Williams para PVC, vazão 15 m3/h e


diâmetro 50 mm,

J ≈ 0,098 m/m. Assim, Ha_rec = J Lrec = 0,098 66,9 = 6,55 m.

Na equação de Bernoulli, as parcelas de velocidade se anulam por serem iguais. Assim,

2,5 + p2 / (µ g) = 52,5 + patm / (µ g) + 6,55. Ou p2/(µ g) = 56,55 + patm/(µ g).

Para que a água possa fluir nessas condições, a bomba deve produzir um aumento de
pressão igual à diferença entre as pressões dos pontos 2 e 1. Fazendo a diferença com o
valor calculado para o ponto 1, temos

p2/(µ g) - p1/(µ g) = 56,55 + patm/(µ g) - [ patm/(µ g) - 3,85 ]. Ou (p2 - p1)/(µg) = 60,35


m.

Desde que a massa específica da água e a aceleração da gravidade são conhecidos, pode-se
calcular essa diferença. Entretanto, no caso de bombas, é praxe a indicação em altura e o
valor encontrado (60,35 m) é dito altura manométrica da bomba. Agora, é só procurar em
catálogos de fabricantes uma bomba com altura manométrica e vazão iguais ou próximas
dos valores aqui definidos ou calculados (60,35 m e 15 m3/h).

Pode-se tentar o cálculo com outros diâmetros de tubulações para um estudo econômico,
conforme mencionado no tópico anterior.

Voltando à parte da sucção, comenta-se agora um importante aspecto da operação de


bombas. Foi calculado que a pressão na entrada da sucção é p1/(µg) = patm/(µg) - 3,85.

Notar que é uma pressão menor que a da atmosfera e seu valor é tanto menor quanto maior
for a altura de sucção e/ou perdas na mesma. Se a pressão atingir a faixa da pressão de
vapor da água, esta se vaporiza e partículas se condensam de forma brusca em zonas de
maior pressão. Isso se chama cavitação e é um fenômeno altamente indesejável porque
provoca ruídos, queda de rendimento e desgaste prematuro de partes internas.

Para prevenir a cavitação, os fabricantes de bombas indicam um valor mínimo de NPSH


(do inglês, net positive suction head). É um dado normalmente obtido em gráfico, pois
depende da vazão e altura manométrica de trabalho da bomba.

Para calcular o NPSH da instalação, subtrai-se a pressão de vapor da água da pressão de


entrada. Considerando água a 20ºC, a pressão de vapor é cerca de 0,24 m. Portanto,

NPSH = p1/(µg) - 0,24 = 101325 / (1000 9,81) - 3,85 - 0,24 = 6,24 m.


Esse valor deve ser maior do que o NPSH indicado pelo fabricante.

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