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Inventário e Partilha

Extrajudicial no
Novo CPC
Prof.a Larisse Campelo Messias

Indaial – 2021
1a Edição
Copyright © UNIASSELVI 2021

Elaboração:
Prof. Larisse Campelo Messias
a

Revisão, Diagramação e Produção:


Centro Universitário Leonardo da Vinci – UNIASSELVI

Ficha catalográfica elaborada na fonte pela Biblioteca Dante Alighieri


UNIASSELVI – Indaial.

M585i

Messias, Larisse Campelo

Inventário e partilha extrajudicial no novo CPC. / Larisse Campelo


Messias. – Indaial: UNIASSELVI, 2021.

220 p.; il.

ISBN 978-65-5663-624-5
ISBN Digital 978-65-5663-623-8

1. Inventário e partilha extrajudicial. – Brasil. II. Centro Universitário


Leonardo da Vinci

CDD 340

Impresso por:
Apresentação
Caro acadêmico, seja bem-vindo à nova disciplina do curso, na qual
estudaremos o Inventário Extrajudicial à luz do atual Código de Processo Civil.

Na Unidade 1, abordaremos os conceitos fundamentais existentes


no Direito das Sucessões necessários para a compreensão adequada do
processo de inventário e partilha de bens do falecido. Daremos ênfase ao
conceito de sucessão hereditária, às características da sucessão legítima e
sucessão testamentária, bem como ao conceito de inventário e partilha e
suas modalidades.

Em seguida, na Unidade 2, estudaremos brevemente a evolução


histórica do direito sucessório, faremos um comparativo entre o inventário
judicial e extrajudicial e uma análise dos avanços da desburocratização do
judiciário brasileiro, resultando nas inovações trazidas pela Lei n° 11.441/2007.
Nessa unidade, você ainda poderá verificar dados recentes fornecidos pela
Associação de Notários e Registradores do Brasil (ANOREG/BR) sobre o
número de inventários e partilhas extrajudiciais realizadas nos últimos anos
no Brasil. Por último, também analisaremos a (im)possibilidade de realização
de inventário extrajudicial mesmo quando da existência de testamento tendo
em vista esta relacionada com a ideia de desburocratização do procedimento
de inventário.

Por fim, na Unidade 3, o foco será as peculiaridades e regras


procedimentais, bem como todo o aparato estrutural que permeia a realização
do inventário e partilha extrajudicial. Será possível conhecer a figura do
Tabelionato de Notas e sua importância no procedimento extrajudicial e
inventário e partilha. Você saberá as formalidades obrigatórias que a escritura
pública de inventário e partilha deve observar. Também analisaremos a
possibilidade de se realizar a sobrepartilha extrajudicialmente. Por fim, você
conhecerá o instituto da carta de sentença e seu papel no procedimento de
inventário e partilha extrajudicial.

Bons estudos!

Prof.a Larisse Campelo Messias


NOTA

Você já me conhece das outras disciplinas? Não? É calouro? Enfim, tanto para
você que está chegando agora à UNIASSELVI quanto para você que já é veterano, há
novidades em nosso material.

Na Educação a Distância, o livro impresso, entregue a todos os acadêmicos desde 2005, é


o material base da disciplina. A partir de 2017, nossos livros estão de visual novo, com um
formato mais prático, que cabe na bolsa e facilita a leitura.

O conteúdo continua na íntegra, mas a estrutura interna foi aperfeiçoada com nova
diagramação no texto, aproveitando ao máximo o espaço da página, o que também
contribui para diminuir a extração de árvores para produção de folhas de papel, por exemplo.

Assim, a UNIASSELVI, preocupando-se com o impacto de nossas ações sobre o ambiente,


apresenta também este livro no formato digital. Assim, você, acadêmico, tem a possibilidade
de estudá-lo com versatilidade nas telas do celular, tablet ou computador.
 
Eu mesmo, UNI, ganhei um novo layout, você me verá frequentemente e surgirei para
apresentar dicas de vídeos e outras fontes de conhecimento que complementam o assunto
em questão.

Todos esses ajustes foram pensados a partir de relatos que recebemos nas pesquisas
institucionais sobre os materiais impressos, para que você, nossa maior prioridade, possa
continuar seus estudos com um material de qualidade.

Aproveito o momento para convidá-lo para um bate-papo sobre o Exame Nacional de


Desempenho de Estudantes – ENADE.
 
Bons estudos!
LEMBRETE

Olá, acadêmico! Iniciamos agora mais uma disciplina e com ela


um novo conhecimento.

Com o objetivo de enriquecer seu conhecimento, construímos, além do livro


que está em suas mãos, uma rica trilha de aprendizagem, por meio dela você terá
contato com o vídeo da disciplina, o objeto de aprendizagem, materiais complementares,
entre outros, todos pensados e construídos na intenção de auxiliar seu crescimento.

Acesse o QR Code, que levará ao AVA, e veja as novidades que preparamos para seu estudo.

Conte conosco, estaremos juntos nesta caminhada!


Sumário
UNIDADE 1 — DIREITO DAS SUCESSÕES.................................................................................... 1

TÓPICO 1 — CONCEITOS FUNDAMENTAIS DO DIREITO DAS SUCESSÕES................... 3


1 INTRODUÇÃO..................................................................................................................................... 3
2 A HERANÇA E SUA ADMINISTRAÇÃO...................................................................................... 3
2.1 DA VOCAÇÃO HEREDITÁRIA E OS LEGITIMADOS A SUCEDER.................................... 8
2.2 DA ACEITAÇÃO E RENÚNCIA DA HERANÇA.................................................................... 10
2.3 DA HERANÇA JACENTE E DA HERANÇA VACANTE...................................................... 15
3 DA PETIÇÃO DE HERANÇA.......................................................................................................... 16
4 DOS EXCLUÍDOS DA SUCESSÃO................................................................................................ 17
4.1 DA INDIGNIDADE SUCESSÓRIA............................................................................................. 18
4.2 DA DESERDAÇÃO....................................................................................................................... 19
RESUMO DO TÓPICO 1..................................................................................................................... 22
AUTOATIVIDADE............................................................................................................................... 23

TÓPICO 2 — DA SUCESSÃO LEGÍTIMA E DA SUCESSÃO TESTAMENTÁRIA............... 25


1 INTRODUÇÃO................................................................................................................................... 25
2 DA SUCESSÃO LEGÍTIMA............................................................................................................. 25
2.1 A INCONSTITUCIONALIDADE DO ARTIGO N° 1.790 DO CÓDIGO CIVIL................... 26
2.2 DA SUCESSÃO DOS ASCENDENTES E A CONCORRÊNCIA DO CÔNJUGE
OU COMPANHEIRO.................................................................................................................... 28
2.3 DA SUCESSÃO DO CÔNJUGE COM COMPANHEIRO COM OS DESCENDENTES........ 31
2.4 DA SUCESSÃO DO CÔNJUGE OU COMPANHEIRO, ISOLADAMENTE........................ 37
2.5 DA SUCESSÃO DOS COLATERAIS........................................................................................... 37
2.6 DO DIREITO DE REPRESENTAÇÃO........................................................................................ 39
3 DA SUCESSÃO TESTAMENTÁRIA.............................................................................................. 40
3.1 CONCEITO DE TESTAMENTO E SUAS CARACTERÍSTICAS............................................. 42
3.2 DAS MODALIDADES ORDINÁRIAS DE TESTAMENTO.................................................... 45
3.3 DAS MODALIDADES ESPECIAIS DE TESTAMENTO.......................................................... 48
3.4 DO CODICILO............................................................................................................................... 50
3.5 DAS DISPOSIÇÕES TESTAMENTÁRIAS................................................................................. 51
3.6 DOS LEGADOS.............................................................................................................................. 52
RESUMO DO TÓPICO 2..................................................................................................................... 54
AUTOATIVIDADE............................................................................................................................... 55

TÓPICO 3 — DO INVENTÁRIO E DA PARTILHA...................................................................... 57


1 INTRODUÇÃO................................................................................................................................... 57
2 DO INVENTÁRIO.............................................................................................................................. 57
2.1 DO INVENTÁRIO JUDICIAL..................................................................................................... 59
2.2 DO INVENTÁRIO EXTRAJUDICIAL........................................................................................ 62
2.3 DA PENA DOS SONEGADOS.................................................................................................... 65
2.4 DO PAGAMENTO DAS DÍVIDAS............................................................................................. 66
2.5 DA COLAÇÃO............................................................................................................................... 68
3 DA PARTILHA.................................................................................................................................... 71
3.1 DA PARTILHA AMIGÁVEL OU EXTRAJUDICIAL............................................................... 72
3.2 DA PARTILHA JUDICIAL........................................................................................................... 73
3.3 DA PARTILHA EM VIDA............................................................................................................ 73
3.4 DA GARANTIA DOS QUINHÕES HEREDITÁRIOS.............................................................. 74
3.5 DA ANULAÇÃO, DA RESCISÃO E NULIDADE DA PARTILHA....................................... 74
LEITURA COMPLEMENTAR............................................................................................................. 77
RESUMO DO TÓPICO 3..................................................................................................................... 81
AUTOATIVIDADE............................................................................................................................... 82
REFERÊNCIAS....................................................................................................................................... 83

UNIDADE 2 — DO INVENTÁRIO EXTRAJUDICIAL E O FENÔMENO DA


DESJUDICIALIZAÇÃO DO DIREITO SUCESSÓRIO.................................... 85

TÓPICO 1 — DIGRESSÕES HISTÓRICAS SOBRE O INVENTÁRIO E A PARTILHA........ 87


1 INTRODUÇÃO................................................................................................................................... 87
2 BREVE APANHADO HISTÓRICO................................................................................................ 87
3 A LEI N° 11.441/2007 E FENÔMENO DA DESJUDICIALIZAÇÃO DO DIREITO
SUCESSÓRIO COMO FORMA DE ACESSO À JUSTIÇA........................................................ 93
3.1 DADOS DA ASSOCIAÇÃO DOS NOTÁRIOS E REGISTRADORES DO BRASIL............. 98
RESUMO DO TÓPICO 1................................................................................................................... 104
AUTOATIVIDADE............................................................................................................................. 105

TÓPICO 2 — DUALIDADE DE PROCEDIMENTOS: INVENTÁRIO JUDICIAL E


EXTRAJUDICIAL....................................................................................................... 107
1 INTRODUÇÃO................................................................................................................................. 107
2 AS PRINCIPAIS DIFERENÇAS ENTRE O INVENTÁRIO JUDICIAL E O
EXTRAJUDICIAL............................................................................................................................. 108
3 DO CARÁTER EXCEPCIONAL DO INVENTÁRIO EXTRAJUDICIAL.............................. 121
RESUMO DO TÓPICO 2................................................................................................................... 124
AUTOATIVIDADE............................................................................................................................. 125

TÓPICO 3 — QUESTÕES CONTROVERTIDAS SOBRE INVENTÁRIO E PARTILHA....... 127


1 INTRODUÇÃO................................................................................................................................. 127
2 DOS BENS E DIREITOS QUE DISPENSAM INVENTÁRIO E PARTILHA....................... 127
3 DA POSSIBILIDADE DE INVENTÁRIO EXTRAJUDICIAL QUANDO HOUVER
TESTAMENTO.................................................................................................................................. 132
LEITURA COMPLEMENTAR........................................................................................................... 140
RESUMO DO TÓPICO 3................................................................................................................... 144
AUTOATIVIDADE............................................................................................................................. 145
REFERÊNCIAS..................................................................................................................................... 147

UNIDADE 3 — TÍTULO DA UNIDADE 3..................................................................................... 151

TÓPICO 1 — DAS FORMALIDADES PROCEDIMENTAIS DO INVENTÁRIO E


PARTILHA EXTRAJUDICIAL................................................................................. 153
1 INTRODUÇÃO................................................................................................................................. 153
2 ASPECTOS GERAIS........................................................................................................................ 153
3 COMPETÊNCIA FUNCIONAL DO TABELIÃO....................................................................... 157
4 DA RESPONSABILIDADE PELOS ATOS DO TABELIÃO.................................................... 166
LEITURA COMPLEMENTAR........................................................................................................... 170
RESUMO DO TÓPICO 1................................................................................................................... 175
AUTOATIVIDADE............................................................................................................................. 176
TÓPICO 2 — FORMALIDADES DA ESCRITURA DE INVENTÁRIO E PARTILHA......... 179
1 INTRODUÇÃO................................................................................................................................. 179
2 PARTES NO INVENTÁRIO E ASSISTÊNCIA JURÍDICA ..................................................... 180
2.1 CREDORES DO ESPÓLIO.......................................................................................................... 181
2.2 CESSÃO DE DIREITOS HEREDITÁRIOS............................................................................... 182
2.3 RENÚNCIA DA HERANÇA..................................................................................................... 184
2.4 PROCURADORES DAS PARTES.............................................................................................. 184
3 NOMEAÇÃO DE INVENTARIANTE.......................................................................................... 187
4 BENS – DESCRIÇÃO, VALORES E DOCUMENTOS.............................................................. 188
4.1 BENS SITUADOS NO ESTRANGEIRO................................................................................... 190
4.2 IMPOSTO DE TRANSMISSÃO................................................................................................. 190
4.3 CERTIDÃO NEGATIVA DE DÉBITOS FISCAIS ................................................................... 193
4.4 MODELO DE ESCRITURA PÚBLICA DE INVENTÁRIO EXTRAJUDICAL ................... 194
RESUMO DO TÓPICO 2................................................................................................................... 196
AUTOATIVIDADE............................................................................................................................. 197

TÓPICO 3 — SOBREPARTILHA EXTRAJUDICIAL E CARTA DE SENTENÇA OU


FORMAL DE PARTILHA EXTRAJUDICIAL....................................................... 199
1 INTRODUÇÃO................................................................................................................................. 199
2 SOBREPARTILHA EXTRAJUDICIAL......................................................................................... 199
3 DA RETIFICAÇÃO DA ESCRITURA DE PARTILHA............................................................. 201
4 EMOLUMENTOS DA ESCRITURA – LEI DE CUSTAS.......................................................... 203
4.1 GRATUIDADE............................................................................................................................. 208
5 DA ANULAÇÃO DA PARTILHA REALIZADA EM SEDE DE INVENTÁRIO
EXTRAJUDICIAL............................................................................................................................. 210
6 CARTAS DE SENTENÇA OU FORMAL DE PARTILHA EXTRAJUDICIAL...................... 213
RESUMO DO TÓPICO 3................................................................................................................... 217
AUTOATIVIDADE............................................................................................................................. 218
REFERÊNCIAS..................................................................................................................................... 219
UNIDADE 1 —

DIREITO DAS SUCESSÕES

OBJETIVOS DE APRENDIZAGEM
A partir do estudo desta unidade, você deverá ser capaz de:

• compreender os conceitos fundamentais do direito das sucessões;

• conhecer a vocação hereditária e conceitos de heranças;

• entender as principais características da sucessão legítima e sucessão


testamentária;

• conhecer os aspectos gerais sobre o inventário e partilha de bens.

PLANO DE ESTUDOS
Esta unidade está dividida em três tópicos. No decorrer da unidade,
você encontrará autoatividades com o objetivo de reforçar o conteúdo
apresentado.

TÓPICO 1 – CONCEITOS FUNDAMENTAIS DO DIREITO DAS


SUCESSÕES

TÓPICO 2 – DA SUCESSÃO LEGÍTIMA E DA SUCESSÃO


TESTAMENTÁRIA

TÓPICO 3 – DO INVENTÁRIO E DA PARTILHA

CHAMADA

Preparado para ampliar seus conhecimentos? Respire e vamos


em frente! Procure um ambiente que facilite a concentração, assim absorverá
melhor as informações.

1
2
TÓPICO 1 —
UNIDADE 1

CONCEITOS FUNDAMENTAIS DO DIREITO


DAS SUCESSÕES

1 INTRODUÇÃO
Caro acadêmico, seja bem-vindo à Unidade 1! Nesta unidade
concentraremos nossos esforços em entender conceitos fundamentais do Direito
das Sucessões antes de nos voltarmos especificamente ao inventário e à partilha
extrajudicial nas unidades subsequentes.

Ressalta-se ser imprescindível dominar os conceitos fundamentais do


Direito das Sucessões, pois, conforme veremos, as principais formas de sua
concretização se dão justamente por meio do inventário e da partilha.

O direito das sucessões disciplina a transmissão patrimonial do “de cujus”,


também chamado de “autor da herança” a seus sucessores. A Constituição Federal
em seu artigo 5° XXX prevê o direito de herança como direito fundamental.

Ademais, como a morte é a última etapa da vida, o Código Civil traz o


direito das sucessões em seu último livro, dividindo-se em quatro títulos: Da
Sucessão em Geral, Da Sucessão Legitima, Da Sucessão Testamentária e Do Inventário
e da Partilha.

Neste momento, passemos então a estudar cada eixo temático do


Direito das Sucessões com o fim de proporcionar a compreensão de conceitos
fundamentais necessários para melhor compreensão do nosso objeto de estudo.

2 A HERANÇA E SUA ADMINISTRAÇÃO


A palavra sucessão, em sentido amplo, significa o ato pelo qual uma
pessoa assume o lugar de outra, assume a titularidade de determinados bens e
direitos. Em uma relação de compra e venda, o comprador seria o sucessor do
bem, ocorrendo a sucessão “inter vivos”, no direito sucessório o sentido passa
a ser estrito, designando a transmissão de bens e direitos em decorrência do
falecimento de alguém, também denominada de transmissão “causa mortis”.

3
UNIDADE 1 — DIREITO DAS SUCESSÕES

A herança, por sua vez, é um bem jurídico universal, imóvel e indivisível,


mesmo que composta somente de bens móveis e divisíveis, como o dinheiro. Com
a morte é formada automaticamente a herança do falecido, independentemente
da vontade dos herdeiros, a qual somente será extinta com a partilha. A herança
deverá ser representada judicial e extrajudicialmente como veremos a seguir.

Com a abertura da sucessão, de forma automática pela morte, conforme


regido pelo princípio da saisine, haverá a transmissão automática do patrimônio
do falecido para seus herdeiros, teremos também a fixação da norma jurídica
sucessória que disciplinará a sucessão, esta norma será vigente na data da
abertura da sucessão e não da abertura do inventário, como estabelece o artigo n°
1.787 do Código Civil: “Art. 1.787. Regula a sucessão e a legitimação para suceder
a lei vigente ao tempo da abertura daquela”.

E
IMPORTANT

Você sabe o que é o princípio da saisine? Trata-se de princípio de origem


francesa, consagrado expressamente no artigo n° 1.784 do nosso Código Civil, o qual
estabelece que a posse dos bens do "de cujus" se transmite aos herdeiros, imediatamente,
na data de sua morte.

Perceba que, com a morte do autor da herança, nasce o direito de suceder.


Neste momento ocorre a transferência do patrimônio do de cujus para seus
herdeiros, apresentando as pessoas capacitadas pela lei para suceder. E a lei
vigente no tempo da abertura da sucessão irá regulá-la.

Nesse contexto, acadêmico, é importante que você saiba diferenciar a


data de abertura da sucessão da data da abertura do inventário. Usamos como
exemplo o falecimento de uma pessoa no ano de 1999, no entanto o processo de
inventário iniciou-se em 2010, assim a sucessão será regida pelo Código Civil de
1916, uma característica da ultratividade da lei civil.

Citamos outro exemplo prático, uma ação apreciada pelo Supremo


Tribunal Federal sobre pessoa adotada na vigência do Código Civil de 1916, em
que a mãe adotiva faleceu antes da entrada em vigor da Constituição Federal
de 1988. Seus bens foram transferidos, conforme o código civil de 1916, aos
herdeiros e sucessores, destinando-se apenas aos filhos biológicos da falecida. A
Ação Rescisória (AR) 1811 pretendia desconstituir a decisão que negou o direito
à herança ao filho adotivo (disponível em: <http://portal.stf.jus.br/processos/
detalhe.asp?incidente=2180921>).

4
TÓPICO 1 — CONCEITOS FUNDAMENTAIS DO DIREITO DAS SUCESSÕES

Todavia, a ação não prosperou, sendo julgada improcedente por entender


que a antiga redação do artigo n° 51 da Lei n° 6.515/1977 (Lei do Divórcio), destinou-
se apenas aos filhos biológicos e o artigo n° 377 do Código Civil de 1916 não foi
revogado pela referida lei, este artigo dizia que “quando o adotante tiver filhos
legítimos, legitimados, ou reconhecidos, a relação de adoção não envolve a de
sua sucessão hereditária”. Portanto, não poderia ser aplicado retroativamente o
estabelecido no artigo n° 227, § 6° da Constituição Federal, que prevê equiparação
entre filhos havidos ou não dentro do casamento e filhos adotivos. No caso em
tela, a filha não teve direito à sucessão hereditária.

Já a abertura do inventário ocorrerá no momento em que os herdeiros


desejarem. Entretanto, o Código de Processo Civil, em seu artigo n° 611 estabelece
um prazo temporal para este procedimento vejamos:

Art. 611. O processo de inventário e de partilha deve ser instaurado


dentro de 2 (dois) meses, a contar da abertura da sucessão, ultimando-
se nos 12 (doze) meses subsequentes, podendo o juiz prorrogar esses
prazos, de ofício ou a requerimento da parte.

O espólio é o ente despersonalizado que representará a herança, em juízo e
fora dele; sendo representado pelo inventariante, como prevê o artigo n° 12 do
Código de Processo Civil, “Serão representados em juízo, ativa e passivamente:
(...) V - o espólio, pelo inventariante”.

Como decorrência dessa norma, há um equívoco ao acreditar que o espólio


somente existiria com o ajuizamento do inventário, entretanto, assim como a
herança, o espólio surge automaticamente.

Até a abertura do processo de inventário e partilha, a herança será


administrada, até que o inventariante preste compromisso, por aquele que estiver
na posse dos bens do falecido. O administrador provisório deverá zelar pelo
espólio, informar e trazer aos autos todos os frutos percebidos desde a abertura
da sucessão, terá também o direito de ser reembolsado pelas despesas úteis e
necessárias que realizou durante a sua administração (artigos 613 e 614, do CPC).

Essa é a posição trazida pelo Supremo Tribunal de Justiça, assim, antes


da nomeação do inventariante, quem o representa é o administrador provisório,
sendo aquele que estiver na posse dos bens da herança, normalmente o cônjuge ou
o companheiro (REsp 777.566/RS). Se mais de um estiver na posse dos bens, todos
eles serão administradores provisórios. A nomeação do inventariante judicial ou
dativo ocorre em razão da ausência ou da inidoneidade das pessoas descritas no
art. 990 do Código de Processo Civil, vejamos:

Art. 990. O juiz nomeará inventariante:


I- o cônjuge ou companheiro sobrevivente, desde que estivesse
convivendo com o outro ao tempo da morte deste;
II- o herdeiro que se achar na posse e administração do espólio, se
não houver cônjuge ou companheiro sobrevivente ou estes não
puderem ser nomeados;

5
UNIDADE 1 — DIREITO DAS SUCESSÕES

III- qualquer herdeiro, nenhum estando na posse e administração


do espólio;
IV- o testamenteiro, se Ihe foi confiada a administração do espólio ou
toda a herança estiver distribuída em legados;
V- o inventariante judicial, se houver;
VI- pessoa estranha idônea, onde não houver inventariante judicial.
Parágrafo único. O inventariante, intimado da nomeação,
prestará, dentro de 5 (cinco) dias, o compromisso de bem e
fielmente desempenhar o cargo.

Se o inventariante for judicial ou dativo, o Código de Processo Civil exige


a citação de todos os herdeiros para que possam defender os seus interesses no
processo, posto que o inventariante judicial e o dativo não possuem interesse no
espólio já que para eles, quanto mais célere for o processo judicial, melhor.

Nem toda a relação jurídica admitirá sucessão em decorrência da morte.


O objeto do direito das sucessões diz respeito exclusivamente às relações
patrimoniais do autor da herança, as relações existenciais extinguem-se com a
morte do titular.

Citaremos a seguir algumas relações jurídicas patrimoniais em que,


excepcionalmente, não incide o direito das sucessões:

• Usufruto, o uso e a habitação: são direitos reais da coisa alheia, portanto, têm
natureza patrimonial, são três relações jurídicas vitalícias que se extinguem
com a morte do titular.
• Enfiteuse (art. 692, III, do Código Civil Brasileiro de 1916): se o enfiteuta
falecer sem deixar sucessores, extingue-se a relação jurídica impedindo que o
Estado adquira a enfiteuse.
• Direito autoral (Lei n° 9610/98, art. 41): o direito autoral é um direito híbrido,
possuindo parte personalíssima, como invento e criação; e parte patrimonial,
como exploração e exercício. Os herdeiros do falecido terão direito à parte
patrimonial, mas a parte personalíssima não se transmitirá, portanto, a música
que o falecido compôs será sempre dele. O dispositivo estabelece que falecendo
o autor, o seu direito autoral se transmite aos herdeiros pelo prazo de setenta
anos, contados de 1° de janeiro do ano seguinte ao da morte do autor e não
do dia da morte. Findo esse prazo, a obra cairá em domínio público, podendo
qualquer pessoa explorá-la. No caso de coautoria, o prazo de setenta anos
somente começará a fluir de 1° de janeiro do ano subsequente ao da morte do
último autor.
• Alvará judicial (Lei n° 6858/80, Decreto n° 85.845/81 e art. 1.037, Código de
Processo Civil): o alvará é procedimento de jurisdição voluntária, reconhecido
como procedimento não litigioso, pelo qual se regulamenta a transmissão de
pequenos valores pecuniários. Para que o juiz conceda o alvará, a legislação
exige dois requisitos:
◦ inexistência de outros bens a partilhar (não podem existir outros bens para
partilha, e existindo qualquer outro bem a partilhar, é descabido o alvará e
necessário o inventário);

6
TÓPICO 1 — CONCEITOS FUNDAMENTAIS DO DIREITO DAS SUCESSÕES

◦ que o valor pecuniário transmitido não exceda 500 OTN’s (obrigação


do tesouro nacional), como exemplo teremos o saldo de salário, rescisão
trabalhista, FGTS, restituição do imposto de renda, PIS/PASEP. O alvará
judicial é isento de tributação, por isso a natural preferência por ele.

É importante ainda saber o local competente para abertura do inventário e


partilha da herança. O artigo n° 1.785 do Código Civil informa que a sucessão
se abre no último domicílio do falecido, mesmo entendimento do Código
de Processo Civil em seu artigo n° 48, definindo como foro competente para
inventário e partilha o do domicílio do autor da herança. Dada importância de
tais dispositivos legais para a nossa temática, passamos a transcrevê-los:

Art. 1.785. A sucessão abre-se no lugar do último domicílio do falecido.

Art. 48. O foro de domicílio do autor da herança, no Brasil, é


o competente para o inventário, a partilha, a arrecadação, o
cumprimento de disposições de última vontade, a impugnação ou
anulação de partilha extrajudicial e para todas as ações em que o
espólio for réu, ainda que o óbito tenha ocorrido no estrangeiro.
Parágrafo único. Se o autor da herança não possuía domicílio certo,
é competente:
I- o foro de situação dos bens imóveis;
II- havendo bens imóveis em foros diferentes, qualquer destes;
III- não havendo bens imóveis, o foro do local de qualquer dos bens do
espólio.

A herança é composta por todos os bens pertencentes ao falecido, ou seja,


não haverá distinção em relação aos bens existentes no Brasil ou no estrangeiro.

E
IMPORTANT

: O artigo n° 10 da Lei de Introdução às normas de Direito Brasileiro (LINDB) é


claro ao dispor:

Art.  10.    A sucessão por morte ou por ausência obedece à


lei do país em que domiciliado o defunto ou o desaparecido,
qualquer que seja a natureza e a situação dos bens.
§ 1° A sucessão de bens de estrangeiros, situados no País, será
regulada pela lei brasileira em benefício do cônjuge ou dos
filhos brasileiros, ou de quem os representes, sempre que não
lhes seja mais favorável a lei pessoal do de cujus (Redação
dada pela Lei n° 9.047, de 1995).
§ 2o  A lei do domicílio do herdeiro ou legatário regula a
capacidade para suceder.

7
UNIDADE 1 — DIREITO DAS SUCESSÕES

NOTA

O parágrafo primeiro do artigo n° 10 da LINDB nada mais é que reprodução do


preceito constitucional contido no artigo n° 5°, XXXI, da Constituição de 1988.

A seguir estudaremos a vocação hereditária e os legitimados a suceder.

2.1 DA VOCAÇÃO HEREDITÁRIA E OS LEGITIMADOS A


SUCEDER
A vocação hereditária trata dos legitimados para requerer e receber a
herança do falecido. O artigo n° 1.798 do Código Civil informa que as pessoas
legitimadas a suceder serão as já nascidas ou já concebidas, no momento em que
ocorrer a abertura da sucessão.

A sucessão pode ser legítima, decorrendo da lei ou testamentária, por


disposição de última vontade por testamento ou codicilo. Falecendo a pessoa sem
deixar testamento, transmite-se a herança aos seus herdeiros legítimos. Conforme
o art. 1.846, do Código Civil: “Art. 1.846. Pertence aos herdeiros necessários, de
pleno direito, a metade dos bens da herança, constituindo a legítima”.

Conforme disposição legal, é assegurado aos herdeiros necessários, o


chamado “direito à legítima”, que corresponde à metade dos bens da herança.
Será chamada de quota disponível a outra metade, que poderá ser legada da forma
que o testador desejar, respeitando sempre os preceitos legais que tocam as
disposições testamentárias. Vejamos o artigo n° 1.829 do Código Civil que trata
da sucessão da legitima e da ordem da vocação hereditária.

Art. 1.829. A sucessão legítima defere-se na ordem seguinte:


I- aos descendentes, em concorrência com o cônjuge sobrevivente,
salvo se casado este com o falecido no regime da comunhão
universal, ou no da separação obrigatória de bens (art. 1.640,
parágrafo único); ou se, no regime da comunhão parcial, o autor
da herança não houver deixado bens particulares;
II- aos ascendentes, em concorrência com o cônjuge;
III- ao cônjuge sobrevivente;
IV- aos colaterais.

Quando não existir herdeiros necessários, o testador terá plena liberdade


para transmitir todo o seu patrimônio a quem desejar. A legítima é calculada
sobre o valor dos bens existentes na abertura da sucessão, abatidas as dívidas e
as despesas do funeral, adicionando-se, em seguida, o valor dos bens sujeitos à
colação (art. 1.847, do Código Civil).

8
TÓPICO 1 — CONCEITOS FUNDAMENTAIS DO DIREITO DAS SUCESSÕES

Há os impossibilitados de serem nomeados herdeiros e legatários


especificados no artigo n° 1.801 do Código Civil, vejamos:

Art.1801. Não podem ser nomeados herdeiros nem legatários:


I- a pessoa que, a rogo, escreveu o testamento, nem o seu cônjuge ou
companheiro, ou os seus descendentes e irmãos;
II- as testemunhas do testamento;
III- o concubino do testador casado, salvo se este, sem culpa sua,
estiver separado de fato do cônjuge há mais de cinco anos;
IV- o tabelião, civil ou militar, ou o comandante ou escrivão, perante
quem se fizer, assim como o que fizer ou aprovar o testamento.

Como questiona Carlos Roberto Gonçalves (2010, p. 29), ao estabelecer o


prazo de 5 (cinco) anos no artigo acima inciso III, entra em conflito com o previsto
no artigo n° 1.723 do Código Civil, que não estipula prazo para a caracterização
de uma união estável, bem como entra em conflito com o artigo n° 1.830, também
deste código, ao não reconhecer o direito sucessório ao cônjuge sobrevivente, se ao
tempo da morte do outro, não estavam separados judicialmente, nem separados
de fato há mais de dois anos, salvo prova, neste caso, de que essa convivência se
tornara impossível sem culpa do sobrevivente.

Para Gonçalves, “a exigência de que inexista culpa na separação de fato
não parece oportuna, pois irá propiciar extensas discussões a esse respeito”
(GONÇALVES, 2010, p. 29), questão que em breve será melhor analisada.

ATENCAO

Acadêmico, a capacidade sucessória é diferente da capacidade civil. A primeira


configura o direito de alguém receber a herança deixada pelo de cujus, já a segunda é a
qualidade que o indivíduo possui para exercer os atos da vida civil. Portanto o incapacitado
mental possui capacidade plena para ser herdeiro em um inventário.

A seguir, trataremos do ato de aceitação e de renúncia da herança.

9
UNIDADE 1 — DIREITO DAS SUCESSÕES

2.2 DA ACEITAÇÃO E RENÚNCIA DA HERANÇA


A abertura da sucessão ocorre no exato momento da morte do autor da
herança, nascendo deste ato o direito hereditário, sem distinção de herdeiro. O
patrimônio se transmitirá aos herdeiros e sucessores, independentemente de
aceitação, “é imediata, instantânea, caso contrário ficariam os bens do de cujus
abandonados até que seus herdeiros fossem admitidos em seus direitos” (FARIA,
2017, p. 63).

A aceitação da herança é o ato pelo qual o herdeiro concorda com o


recebimento da transmissão da herança do de cujus, pela abertura da sucessão.
Como nos explica Carlos Roberto Gonçalves, a aceitação da herança:

É negócio jurídico unilateral porque se aperfeiçoa com uma única


manifestação de vontade e de natureza não receptícia, porque não
depende de ser comunicado a outrem para que produza seus efeitos.
É também indivisível e incondicional, porque “não se pode aceitar ou
renunciar a herança em parte, sob condição, ou a termo” (art. 1.808)”
(GONÇALVES, 2010, p. 31-32).

O artigo n° 1.808 do Código Civil esclarece que não se pode aceitar ou


renunciar a herança em partes, sob condição ou a termo, todavia, o herdeiro a
quem se testarem legados, poderá aceitá-los, renunciando à herança, ou ao aceitá-
la, repudiar os legados. Já o herdeiro chamado na mesma sucessão, a mais de um
quinhão hereditário, sob títulos sucessórios diversos, poderá livremente escolher
os que aceita e quais renuncia.

A aceitação poderá ser expressa/direta, por meio de declaração escrita,


ou tácita, quando resultante de atos próprios da qualidade de herdeiro (artigo
n° 1.805 CC). O quinhão que caberia a determinado herdeiro, ao renunciar, será
acrescido a cota parte dos demais herdeiros da mesma classe, conforme disposição
contida no artigo n° 1.810 do Código Civil.

A aceitação poderá ser presumida/indireta, como pela conduta descrita


no artigo n° 1.807 do referido código, vejamos:

Art. 1.807. O interessado em que o herdeiro declare se aceita, ou não,


a herança, poderá vinte dias após aberta a sucessão, requerer ao juiz
prazo razoável, não maior de trinta dias, para nele se pronunciar o
herdeiro, sob pena de se haver a herança por aceita.

Porém, a simples abertura de inventário, os atos oficiosos, como funeral


do falecido, e atos de conservação e guarda provisória dos bens da herança, não
exprimem aceitação de herança. Igualmente, não importará em aceitação, a cessão
gratuita, pura e simples da herança aos demais coerdeiros (art. 1.805 § 1° e 2° CC).

10
TÓPICO 1 — CONCEITOS FUNDAMENTAIS DO DIREITO DAS SUCESSÕES

NOTA

No Código Civil consta “co-herdeiros”, conforme você pode observar no


sítio eletrônico do Planalto, acadêmico: <http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/leis/2002/
L10406compilada.htm>. Todavia, já incluímos no seu livro didático a escrita da palavra
coerdeiros inserida pelas regras conforme a reforma ortográfica, verifique esta e outras
em: <https://www.jurisway.org.br/v2/dhall.asp?id_dh=2660>.

Já a renúncia da herança do de cujus deverá ser expressa, constando em


instrumento público (comparecendo a um Ofício de Notas) ou termo judicial
(petição nos autos de inventário e partilha). Esse ato é solene, unilateral e
irrevogável. “A renúncia não se presume. Tem caráter retroativo. Aquele que
renuncia é como se nunca tivesse sido herdeiro” (FARIA, 2017, p. 65).

Não devemos confundir a renúncia com a desistência da Herança:

Quem renuncia não aceita a herança e é considerado como se não fosse


herdeiro. Quem desiste aceita a herança e, depois transfere seu quinhão
por liberalidade a um terceiro. Na renúncia é a lei quem destina a parte
do renunciante como prescrevem os artigos 1.810 e 1.811, enquanto na
desistência o destino é dado pelo desistente (FARIA, 2017, p. 67).

E, ao falar no artigo n° 1.811, ninguém poderá suceder representando o


herdeiro que renunciou a herança, entretanto, se ele for o único existente da sua
classe ou se todos os outros herdeiros da mesma classe renunciarem a herança,
poderá, então, os herdeiros subsequentes, no caso os filhos daqueles, sucederem
por direito próprio e por cabeça. Assim:

Art. 1.810. Na sucessão legítima, a parte do renunciante acresce a dos


outros herdeiros da mesma classe e, sendo ele o único desta, devolve-
se aos da subsequente.

Art. 1.811. Ninguém pode suceder, representando herdeiro


renunciante. Se, porém, ele for o único legítimo da sua classe ou se
todos os outros da mesma classe renunciarem a herança, poderão os
filhos vir à sucessão, por direito próprio e por cabeça.

Vejamos o exemplo a seguir:

Autor da Herança
__________I__________
João José Jorge (filhos – 1° grau) renunciantes
I ____I____ I
Augusto Iris Maria Denise (netos – 2° grau)

11
UNIDADE 1 — DIREITO DAS SUCESSÕES

Assim, quando todos os filhos do autor da herança renunciarem, os netos


do falecido então passarão a sucedê-lo por direito próprio por se encontrarem
todos no mesmo grau e entre eles não existe herdeiro de grau mais próximo,
posto que os filhos do autor da herança já renunciaram. Igualmente, a renúncia
é gratuita e só poderá beneficiar outro herdeiro, nunca um estranho (FARIA,
2017, p. 68-69).

E
IMPORTANT

Não se aceita herança ou renuncia herança de pessoa viva!

Para que um herdeiro possa renunciar, ele deverá cumprir alguns


requisitos, como ter capacidade jurídica, pois o incapaz deverá ser representado
ou assistido por representante legal assim como necessitará de autorização
judicial. O requerente deverá demonstrar a necessidade ou evidente interesse
para tal ato (artigo n° 1.691 do Código Civil).

Quando a renúncia for realizada por procuração através de mandatário,


este instrumento deverá discriminar os poderes especiais para o ato de renunciar,
conforme disposto no artigo n° 661, § 1° do Código Civil.

A renúncia antecipada à herança, por parte do cônjuge por pacto


antenupcial é nula, pois o direito sucessório do cônjuge não a permite conforme
previsão legal do artigo n° 426 do Código Civil. Somente será possível renunciar
a herança após a abertura da sucessão.

Aberta a sucessão, quando casado, o cônjuge também deverá participar


anuindo expressamente que concorda com a renúncia do herdeiro a herança,
entretanto, não será exigida a anuência quando o regime de casamento foi o de
separação total, também chamada de convencional e absoluta, de bens (artigo n°
1.647 do Código Civil).

Esse é um tema polêmico, gerando muitos conflitos nos tribunais,


inclusive, a exigência de outorga uxória não é pacífica, posto que o artigo n° 1.647
emprega o verbo “alienar”, “e o renunciante não transmite a propriedade, sendo
apenas considerado como se nunca tivesse existido e herdado” (GONÇALVES,
2010, p. 33-34).

Importante destacar que a renúncia da herança não poderá prejudicar os


credores, já que tal ato configura fraude. Os credores ao tomarem conhecimento
do desejo ou renúncia da herança pelo herdeiro, irão se habilitar nos autos de
inventário e poderão aceitá-la em nome do renunciante, por meio de autorização

12
TÓPICO 1 — CONCEITOS FUNDAMENTAIS DO DIREITO DAS SUCESSÕES

judicial; todavia, esta possibilidade não se aplicará aos legados. Quando


habilitados, os credores deverão receber os valores devidos e o saldo restante,
caso exista, deverá ser entregue aos demais herdeiros, mas jamais ao herdeiro que
renunciou a herança, como determina o artigo n° 1.813, do Código Civil.

Versaremos agora sobre a cessão de direitos hereditários, que está previsto


nos artigos n° 1.793 a 1.795 do Código Civil. Destacaremos o artigo n° 1.793
a seguir: “Art. 1.793. O direito à sucessão aberta, bem como o quinhão de que
dispunha o coerdeiro, pode ser objeto de cessão por escritura pública”.

Acadêmico, como citamos anteriormente, a herança é um valor


patrimonial, trata-se de um bem imóvel, indivisível e universal. Assim toda
herança é patrimônio e, portanto, admite circulação.

A cessão de direitos hereditários é o negócio jurídico pelo qual se pode


fazer circular a herança, ela só poderá acontecer após a abertura da sucessão, ou
seja, após a morte do autor da herança. Primeiramente, a herança deverá ser aceita
para depois ser cedida. A cessão de direitos hereditários poderá ser gratuita ou
onerosa, no todo ou em parte.

Como exemplo teremos o caso do herdeiro que deseja vender ou transferir


sua quota hereditária para terceiros ou outro herdeiro, antes da partilha, posto
que, após a partilha, não há herança.

A cessão recai sobre o quinhão hereditário de cada herdeiro porque a


herança é um bem universal e indivisível; assim, o cedente só pode ceder sua quota,
não podendo dispor de um bem determinado do espólio, uma vez que o bem não
é de sua exclusiva propriedade, pertencendo também aos demais herdeiros. Será
admitida a disposição de bens específicos quando todos os herdeiros interessados
consentirem com a sua cessão.

Os demais herdeiros terão direito de preferência sobre o quinhão a ser


cedido como determinado pelo artigo n° 1.794 do Código Civil.

Portanto, o coerdeiro não poderá ceder onerosamente sua cota à pessoa


estranha se outro coerdeiro a quiser pelo mesmo valor. Será aplicado por analogia
nestas situações o art. 27 da Lei n° 8.245/1991 que trata de locações, de modo que o
direito de preferência é exercido por meio de notificação judicial ou extrajudicial
ou de outro meio de ciência inequívoca.

Se mais de um coerdeiro quiser exercer o direito de preferência, a cota


do cedente será distribuída entre eles, proporcionalmente. Caso um herdeiro
não respeite o direito de preferência, cedendo onerosamente sua parte a terceiro,
essa cessão é tida como ineficaz. O coerdeiro interessado pode depositar o valor
correspondente e propor ação de adjudicação compulsória, no prazo decadencial
de 180 dias, contado da transmissão realizada sem observância do direito de
preferência. Depois de depositar o valor, o coerdeiro interessado tomará para si
a cota do cedente.

13
UNIDADE 1 — DIREITO DAS SUCESSÕES

Exercido o direito de preferência, o cedente pode desistir da cessão,


ressalvado o direito de ressarcimento de um eventual prejuízo. O direito de
preferência não se aplica à cessão gratuita, por constituir uma liberalidade.

Por essa razão, a cessão é um negócio jurídico aleatório (álea é sorte,


incerteza), não incidindo, por conseguinte, os vícios redibitórios (defeito oculto
em determinado objeto) e a evicção.

NOTA

Evicção é a perda de uma coisa por decisão judicial ou administrativa, que


determina essa propriedade ou posse a outrem. Com exemplo o entendimento fica melhor:
imagine que Paulo vendeu uma coisa para João. Assim, João, agora é o proprietário, certo?
Todavia, há uma terceira pessoa, alheia a esse negócio – Júlio – que entra com ação judicial
reivindicando o bem, que, na verdade pertencia a ele e não poderia ter sido vendido. João
é vencedor nessa demanda e o adquirente João sofre uma evicção.

O cessionário não poderá reclamar a diferença de valores quando da


venda de sua quota-parte, for posteriormente verificado em processo de
inventário que o herdeiro havia deixado dívidas que diminuíram os quinhões
de cada herdeiro, entretanto, sobrevindo direitos patrimoniais desconhecidos
do cedente quando da cessão, a ele pertencerão, e não ao cessionário.

Após a cessão de direitos, o cessionário passará a ocupar a posição jurídica


do cedente, consequentemente terá legitimidade para requerer a abertura do
inventário, conforme disposto no artigo n° 988 do Código de Processo Civil:
“Tem, contudo, legitimidade concorrente: [...] V - o cessionário do herdeiro ou
do legatário; [...]”.

A cessão de direitos deverá ser realizada por escritura pública, lavrada em


Oficio de Notas, ou termo judicial, posto que a herança possui natureza imóvel.

O cedente deverá ser capaz, sendo incapaz, será necessária autorização


judicial, após ouvido o Ministério Público. Igualmente, caso o cedente seja casado,
a cessão exigirá a outorga conjugal, não sendo necessária caso o casamento esteja
no regime de separação absoluta de bens.

Frisamos mais uma vez que a cessão de direitos hereditários somente


poderá ser celebrada no lapso temporal compreendido entre a abertura da
sucessão e a partilha. Antes da abertura da sucessão, o negócio será nulo, nos
termos do art. 426 do Código Civil, que proíbe a celebração de contrato que tenha
por objeto herança de pessoa viva. Após a efetuação da partilha não haverá mais
herança e sim o direito de compra e venda ou doação.

14
TÓPICO 1 — CONCEITOS FUNDAMENTAIS DO DIREITO DAS SUCESSÕES

Agora passaremos a estudar a herança jacente e a herança vacante.

2.3 DA HERANÇA JACENTE E DA HERANÇA VACANTE


Quando aberta a sucessão sem que o falecido tenha deixado testamento
e sem que haja um herdeiro notoriamente conhecido, irá se denominar a herança
de jacente. A herança jacente é aquela descrita no artigo n° 1.819 do Código
Civil, assim:

Art. 1.819. Falecendo alguém sem deixar testamento nem herdeiro


legítimo notoriamente conhecido, os bens da herança, depois de
arrecadados, ficarão sob a guarda e administração de um curador, até
sua entrega ao sucessor devidamente habilitado ou à declaração de
sua vacância.

Igualmente deverão ser obedecidas as exigências previstas nos artigos,


n° 738 e seguintes do Código de Processo Civil, que tratam da herança jacente. A
herança ficará sob a guarda, conservação e administração de um curador, até a
entrega ao sucessor legalmente habilitado, ou até a declaração de vacância.

A herança jacente é um conjunto de bens que forma um ente


despersonalizado, sob a guarda e administração de um curador, até que se
habilitem herdeiros ou se declare por sentença a vacância. Embora desprovida
de personalidade jurídica, a herança jacente tem capacidade processual e
legitimidade ativa e passiva para comparecer em juízo, por meio de curador
nomeado que a representará (art. 12, IV, Código de Processo Civil).

A doutrina exemplifica outros casos de jacência não expressamente


previstas no Código Civil, como quando o herdeiro ainda não tem condições
de se tornar titular do patrimônio. Exemplos são os casos em que se espera o
nascimento de um herdeiro ou a constituição de pessoa jurídica aos quais se
atribuíram os bens ou o implemento de uma condição suspensiva estabelecida
no testamento.

O procedimento se dará da seguinte maneira: os bens da herança jacente,


denominados bens vagos, serão arrecadados e ficarão sob a guarda e conservação
de um curador, até que haja a entrega destes a algum sucessor legitimamente
habilitado ou até que ocorra a declaração de vacância.

Realizada a arrecadação dos bens do falecido e ultimado o inventário,


serão expedidos editais a serem estampados 3 (três) vezes, com intervalo de 30
(trinta) dias para cada um, tanto no órgão oficial quanto na imprensa da comarca
na qual os bens estão situados, a fim de que venham a se habilitar os sucessores
no prazo de 6 (seis) meses (art.1152, CPC).

15
UNIDADE 1 — DIREITO DAS SUCESSÕES

Transcorrido 1 (um) ano da primeira publicação do edital sem haver


herdeiro habilitado ou habilitação pendente, a herança será declarada vacante,
como determinado pelo artigo n° 1.820, do Código Civil.

A declaração de vacância põe fim ao estado de jacência, portanto, enquanto


a herança não for declarada vacante, ela será considerada jacente.

A declaração de vacância estabelece a certeza jurídica de que o


patrimônio hereditário não tem titular até o momento da delação ao ente público
e, concomitantemente, devolve-o ao poder público. Contudo, a declaração de
vacância não prejudicará os herdeiros, que poderão ainda se habilitar, observado
o prazo decadencial de 5 (cinco) anos (contados da abertura da sucessão e não da
declaração de vacância), salvo os colaterais. Com efeito, declarada a herança
vaga, os colaterais são excluídos da sucessão, vejamos o artigo n° 1.822 do
Código Civil:

Art. 1.822. A declaração de vacância da herança não prejudicará


os herdeiros que legalmente se habilitarem; mas, decorridos
cinco anos da abertura da sucessão, os bens arrecadados
passarão ao domínio do Município ou do Distrito Federal, se
localizados nas respectivas circunscrições, incorporando-se
ao domínio da União quando situados em território federal.
Parágrafo único. Não se habilitando até a declaração de vacância, os
colaterais ficarão excluídos da sucessão.

Transcorridos os aludidos 5 (cinco) anos, não havendo herdeiro habilitado,


nem habilitação pendente, os bens arrecadados passarão para o domínio do
Município ou do Distrito Federal, se localizados nas respectivas circunscrições
ou se incorporará ao domínio da União quando situados em território federal.

Lembrando que conforme disposto no artigo n° 1.823 do Código Civil,


quando todos os chamados a suceder renunciarem à herança, esta será desde
logo declarada vacante.

O próximo subtópico será dedicado ao estudo da petição de herança.

3 DA PETIÇÃO DE HERANÇA
A petição da herança é o ato do herdeiro pleitear o seu reconhecimento
em direito sucessório, a fim de obter a restituição de sua herança ou parte que lhe
cabe, preceito legal contido nos artigos n° 1.824 a 1.828 do Código Civil.

A ação de petição de herança será proposta pelo interessado para ver


reconhecida sua qualidade sucessória e, ao mesmo tempo, reclamar a transmissão
que se deu para outros herdeiros, deixando-o de fora. A petição de herança será
necessária sempre que o herdeiro não tiver condições de se habilitar diretamente
no inventário.
16
TÓPICO 1 — CONCEITOS FUNDAMENTAIS DO DIREITO DAS SUCESSÕES

Ajuizada a ação de petição de herança enquanto corre o processo de


inventário, pode ser pedida a antecipação de tutela, para que sejam reservados
bens correspondentes ao quinhão do petitor, desde que comprovados os
pressupostos da medida de urgência.

Majoritariamente, entende-se que a ação de petição de herança se


submete ao prazo geral de prescrição previsto no Código Civil. Tal entendimento
encontra-se na Súmula 149 do STF, que assim prevê: “É imprescritível a ação de
investigação de paternidade, mas não o é a de petição de herança”. Dessa forma,
sob a vigência do Código Civil de 1916, aplicava-se o prazo geral de 20 anos, mas
com o novo Código Civil de 2002, o prazo passou a ser de 10 anos, conforme
artigo n° 205, contados da abertura da sucessão.

Registre-se, porém, a posição de doutrinadores como Flávio Tartuce, para


quem a ação de petição de herança seria imprescritível, sob o argumento, em
síntese, de que o direito à herança é direito fundamental constitucionalmente
protegido, relacionando-se à própria existência digna da pessoa humana, a
sustentar um patrimônio mínimo, não se sujeitando à prescrição ou decadência.
Nas palavras de Flávio Tartuce (2020, p. 199) “[…] Os valores existenciais
relacionados com a petição de herança prevalecem sobre questões patrimoniais
que fundamentam a prescritibilidade da referida pretensão.”

Quanto à legitimidade, qualquer interessado pode propor a ação de


petição de herança para ver reconhecida a qualidade de herdeiro de alguém.

No subtópico seguinte trataremos dos excluídos da herança.

4 DOS EXCLUÍDOS DA SUCESSÃO


Serão excluídos da sucessão aqueles que praticarem ato ofensivo contra o
falecido, autor da herança. A exclusão dependerá da propositura de ação judicial
por parte de interessado na sucessão, contra a pessoa considerada indigna.

Esta ação tem natureza declaratória e só serão excluídos da sucessão


após sentença judicial que retroagirá à data do óbito do autor da herança. O
direito de demandar a exclusão extingue-se em 4 (quatro) anos a contar da
abertura da sucessão.

Se no decorrer da ação o indigno vier a falecer, esta será extinta, transmitindo


seus bens aos seus herdeiros, pois a pena não deverá “ir além da pessoa do
criminoso” (GONÇALVES, 2010, p. 41), no entanto, há posicionamento distinto.

Os excluídos serão tidos como mortos na abertura da sucessão, portanto,


seus descendentes o sucederão. Os excluídos não terão direito ao usufruto nem
a administração dos bens que caberão aos seus herdeiros e nem a uma sucessão
eventual desses bens (art. 1.816, Código Civil).

17
UNIDADE 1 — DIREITO DAS SUCESSÕES

Devemos tratar agora, de forma breve, a figura do “herdeiro aparente”,


esta denominação será dada ao indivíduo que sofrerá o processo de exclusão e no
transcorrer do procedimento atuará como se estivesse na condição de herdeiro.

Portanto, as alienações onerosas de bens da herança, praticados antes da


sentença declaratória de exclusão, serão válidas quando praticadas a terceiros
de boa-fé, igualmente os atos administrativos praticados legalmente pelo
herdeiro excluído, encarnado na figura de herdeiro aparente. Todavia existirá
a possibilidade de os herdeiros prejudicados demandarem judicialmente contra o
excluído por perdas e danos (art. 1.817 do Código Civil).

4.1 DA INDIGNIDADE SUCESSÓRIA


O artigo n° 1.814 do Código Civil é taxativo na definição de quais pessoas
serão excluídas da sucessão. Transcreveremos a seguir o artigo:

Art. 1.814. São excluídos da sucessão os herdeiros ou legatários:
I- que houverem sido autores, coautores ou partícipes de homicídio
doloso, ou tentativa deste, contra a pessoa de cuja sucessão se
tratar, seu cônjuge, companheiro, ascendente ou descendente;
II- que houverem acusado caluniosamente em juízo o autor da
herança ou incorrerem em crime contra a sua honra, ou de seu
cônjuge ou companheiro;
III- que, por violência ou meios fraudulentos, inibirem ou obstarem
o autor da herança de dispor livremente de seus bens por ato de
última vontade.

Importante destacar que a exclusão do herdeiro ou legatário indigno,


nos casos previstos anteriormente só ocorrerá após declaração por sentença. A
indignidade é uma sanção civil retirando do herdeiro o direito sucessório.

Carlos Roberto Gonçalves ainda explica que não há necessidade de


existir uma condenação criminal, mas quando há absolvição expressa por
reconhecimento de inexistência de fato ou autoria de crime, a pena de indignidade
não será aplicada ao herdeiro ou legatário na esfera cível (artigo n° 935 do Código
Civil), em respeito ao princípio da independência das instâncias. Igualmente, com
o reconhecimento da prática de legítima defesa e do estado de necessidade por
parte daqueles, conforme previsto no artigo n° 65 do Código de Processo Penal
(GONÇALVES, 2010, p. 39).

Por outro lado, no caso de crime contra a honra, uma vez que a lei fala em
crime, exige-se sentença criminal condenatória transitada em julgado para que se
reconheça a indignidade, tendo em vista que só o juiz criminal pode reconhecer
a prática de crime.

18
TÓPICO 1 — CONCEITOS FUNDAMENTAIS DO DIREITO DAS SUCESSÕES

Qualquer interessado poderá promover ação de indignidade, que somente


será discutida após a abertura da sucessão. Poderá ser proposta por outros
herdeiros, pelo credor, o herdeiro do herdeiro, que irá suceder por representação,
a Fazenda Pública, que receberá por último e poderá ter o interesse de que todos
sejam considerados indignos.

Através da Lei n° 13.532/2017, foi dada uma nova redação ao artigo n°


1.815 do Código Civil, acrescentando um novo parágrafo 2°, o qual introduziu
a possibilidade do Ministério Público ser parte legítima para propor ação de
exclusão de herdeiro ou legatário indigno, a fim de impedir que este receba os
bens da herança do de cujus.

A reabilitação ou perdão do excluído por indignidade só pode ser realizada


de forma expressa pelo ofendido através de testamento ou de qualquer outro
ato conforme determinado pelo artigo n° 1.818 do Código Civil. O perdão tácito
será admitido somente por testamento conforme disposto no parágrafo único do
mencionado artigo. Vejamos o artigo a seguir:

Art. 1.818. Aquele que incorreu em atos que determinem a


exclusão da herança, será admitido a suceder, se o ofendido o tiver
expressamente reabilitado em testamento, ou em outro ato autêntico.
Parágrafo único. Não havendo reabilitação expressa, o indigno,
contemplado em testamento do ofendido, quando o testador, ao
testar, já conhecia a causa da indignidade, pode suceder no limite da
disposição testamentária.

Importante mencionar que só será aceito testamento que contenha o


perdão expresso, se realizado na forma de testamento público em tabelião de
notas, com toda as formalidades legais, conferindo autenticidade ao ato, caso
contrário, se realizado na forma de testamento cerrado ou particular, será
considerado nulo.

A seguir trataremos sobre as causas de deserdação.

4.2 DA DESERDAÇÃO
A deserdação está prevista no artigo n° 1.961 e seguintes do Código Civil.
“Art. 1.961. Os herdeiros necessários podem ser privados de sua legitima, ou
deserdados, em todos os casos em que podem ser excluídos da sucessão”.

A indignidade pode atingir todos os sucessores, herdeiros legítimos,


testamentários ou legatários, entretanto, a deserdação será o único meio de privar
os herdeiros necessários, como descendentes, ascendentes e cônjuge, do direito à
legítima assegurada por lei (GONÇALVES, 2010, p. 41).

19
UNIDADE 1 — DIREITO DAS SUCESSÕES

Lembrando que ao cônjuge deserdado perderá somente o direito à herança


e não o direito à meação, por ser um direito adquirido em razão do regime de bens
do casamento e, claro, deverá ser observado qual o regime adotado pelo casal.

As causas de deserdação podem ser as mencionadas no artigo n° 1.814 e


as acrescidas pelo rol explicativo do artigo n° 1.962 e n° 1.963, do Código Civil,
vejamos:

Art. 1.962. Além das causas mencionadas no art. 1.814, autorizam a


deserdação dos descendentes por seus ascendentes:
I- ofensa física;
II- injúria grave;
III- relações ilícitas com a madrasta ou com o padrasto;
IV- desamparo do ascendente em alienação mental ou grave enfermidade.

Art. 1.963. Além das causas enumeradas no art. 1.814, autorizam a


deserdação dos ascendentes pelos descendentes;
I- ofensa física;
II- injúria grave;
III- relações ilícitas com a mulher ou companheira do filho ou a do
neto, ou com o marido ou companheiro da filha ou da neta;
IV- desamparo do filho ou neto com deficiência mental ou grave
enfermidade.

A deserdação não deve ser confundida com a exclusão por indignidade,


porém os dois institutos possuem o mesmo objetivo de excluir da sucessão
hereditária aqueles que praticaram atos condenáveis contra o falecido.

A exclusão decorre de lei, conforme os casos dispostos no artigo n° 1.814


do Código Civil, com declaração expressa por decisão judicial.

A deserdação ocorre por vontade do autor da herança que através da


realização de testamento deverá declarar expressamente a causa da deserdação a
ser ordenada, como disposto no artigo n° 1.964 do Código Civil.

A deserdação deverá obrigatoriamente ser homologada judicialmente, a
fim de que o juiz verifique a validade dos motivos da deserdação, incumbindo
ao herdeiro instituído ou àquele a quem aproveite a deserdação o ônus da prova
da causa alegada pelo testador (art. 1.965), garantida ao processo a ampla defesa.

A ação para fazer prova da causa de deserdação prescreverá em 4 (quatro)


anos a contar da data da abertura do testamento, conforme disposto no artigo n°
1.965, parágrafo único do Código Civil. Importante destacar que o testamenteiro
terá legitimidade para propor esta ação, a fim de concretizar a vontade do testador.

O deserdado só poderá ser reabilitado de forma expressa pelo ofendido


através de um novo testamento, pois a deserdação por ser feita somente através
deste instrumento, só poderá ser revogada por outro seguindo as regras
testamentárias.

20
TÓPICO 1 — CONCEITOS FUNDAMENTAIS DO DIREITO DAS SUCESSÕES

Encerramos, acadêmico, este tópico com esses relevantes temas do


Direito das Sucessões. Agora, seguiremos nossos estudos no Tópico 2, com mais
novidades e aguçadas questões deste importante e interessante ramo do Direito.
Vamos esmiuçar mais a sucessão legítima e a sucessão testamentária! Vamos lá?

21
RESUMO DO TÓPICO 1
Neste tópico, você aprendeu que:

• Os O princípio da saisine é o que importa na transferência automática, a partir


do óbito do autor da herança, do patrimônio do falecido para os seus herdeiros.

• Há uma importante diferença entre abertura da sucessão e abertura do


inventário, sendo que a primeira acontece no momento da morte do autor
da herança e a segunda a partir da vontade dos herdeiros em dar início ao
processo de inventário.

• A vocação hereditária é a que os herdeiros que fazem parte do grupo familiar


do falecido serão chamados a sucedê-lo.

• A aceitação da renúncia poderá ser explícita ou tácita, confirmada por


determinados atos praticados pelos herdeiros no decorrer do processo de
inventário, mas que a renúncia da herança deverá ser explícita.

• A herança jacente é um conjunto de bens que forma um ente despersonalizado,


sob a guarda e administração de um curador, até que se habilitem herdeiros ou
se declare por sentença a vacância.

• Serão excluídos da sucessão, aqueles que praticarem ato ofensivo contra o


falecido (autor da herança). A exclusão dependerá da propositura de ação
judicial por parte de interessado na sucessão, contra a pessoa considerada
indigna.

22
AUTOATIVIDADE

1 Defina a aceitação direta e indireta da herança.

2 Quais os efeitos da aceitação da herança? Trata-se de um ato revogável e


retratável? O herdeiro pode aceitar a herança apenas parcialmente?

3 O que se entende por herança jacente e o que se entende por herança


vacante?

4 Julgue as assertivas a seguir como verdadeiras (V) ou falsas (F).

a) ( ) Não se pode aceitar ou renunciar a herança em parte ou sob condição


ou a termo.
b) ( ) Havendo herdeiros necessários, a sucessão testamentária e a sucessão
legítima podem coexistir. 
c) ( ) A renúncia da herança deve constar expressamente de instrumento
público ou termo judicial.
d) ( ) As pessoas casadas entre si podem fazer um testamento simultâneo,
em um só ato, instituindo benefícios mútuos.
e) ( ) A aceitação da herança pode ser tácita e há de resultar, tão somente, de
atos próprios da qualidade de herdeiro.
f) ( ) A renúncia da herança depende de ato solene, manifestada por meio de
escritura pública, ou por termo nos autos do inventário. 
g) ( ) Havendo renúncia, os herdeiros do renunciante não podem exercer o
direito de representação.
h) ( ) Os descendentes do herdeiro excluído, seja por indignidade, seja por
deserdação sucedem, como se ele morto fosse antes da abertura da
sucessão.
i) ( ) Qualquer sucessor pode ser excluído da sucessão por indignidade, mas
somente o herdeiro necessário pode ser deserdado.
j) ( ) Nos termos do Código Civil brasileiro, o direito à sucessão aberta
classifica-se como bem imóvel.

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24
TÓPICO 2 —
UNIDADE 1

DA SUCESSÃO LEGÍTIMA E DA SUCESSÃO TESTAMENTÁRIA

1 INTRODUÇÃO
Caro acadêmico, seja bem-vindo ao Tópico 2! A partir de agora,
estudaremos a sucessão legítima e a sucessão testamentária e suas peculiaridades.

Vamos abordar inicialmente a sucessão legítima, passaremos a tratar


do Código Civil, da previsão do seu artigo n° 1.829, que explica ser o herdeiro
legítimo aquele indicado pela lei em ordem preferencial para receber o patrimônio
do falecido.

Por outro lado, veremos também, que a sucessão testamentária, prevista


no artigo n° 1.799, é aquela em o testamentário ou instituído será beneficiado
através de um testamento pelo ato de última vontade de seu testador, com uma
parte ideal do seu patrimônio, após o seu falecimento.

Bons estudos!

2 DA SUCESSÃO LEGÍTIMA
A sucessão legitima respeitará uma ordem legal que acontece da seguinte
maneira:

Art. 1.829. A sucessão legítima defere-se na ordem seguinte:


I- aos descendentes, em concorrência com o cônjuge sobrevivente,
salvo se casado este com o falecido no regime da comunhão
universal, ou no da separação obrigatória de bens (art. 1.640,
parágrafo único); ou se, no regime da comunhão parcial, o autor
da herança não houver deixado bens particulares;
II- aos ascendentes, em concorrência com o cônjuge;
III- ao cônjuge sobrevivente;
IV- aos colaterais.

Primeiro serão chamados os descendentes do autor da herança,


concorrendo com o cônjuge vivo, desde que observado o regime de bens adotado
no casamento.

25
UNIDADE 1 — DIREITO DAS SUCESSÕES

O herdeiro será chamado à sucessão por direito próprio ou por cabeça,


quando entre ele e o autor da herança não existir outro herdeiro de grau mais
próximo. Quando todos os herdeiros no mesmo grau, a cada um corresponderá
uma quota igual na herança.

Quando os herdeiros são chamados a suceder por direito próprio,
divide-se a herança em tantas partes/cabeças quantos eles forem. A sucessão dos
descendentes observa duas diretrizes:

• Isonomia: não pode haver discriminação de qualquer natureza entre os


descendentes.
• Preferência: a presença do descendente mais próximo afasta o mais remoto,
como exemplo temos o caso de o falecido deixar filhos e netos, somente os
filhos serão chamados a suceder.

Em regra, os descendentes herdam por direito próprio, há, porém, três


casos em que a sucessão não é por direito próprio, mas por representação,
também denominada “por estirpe”, não se aplicando a regra da preferência,
de modo que os descendentes de um grau mais remoto podem herdar com os
descendentes de um grau mais próximo, os casos aplicáveis são: indignidade,
deserdação e pré-morte.

Quanto ao cônjuge, no direito sucessório, além de meeiro, torna-se


também herdeiro. Será meeiro a depender do regime de bens do casamento; e
herdeiro, por força de lei, independentemente da vontade. O cônjuge sobrevivo
é considerado herdeiro necessário ao lado dos descendentes e ascendentes, não
podendo ser afastado por testamento, por isso é permanente porque herdará
com o ascendente e o descendente, ou sozinho, se não houver ascendente ou
descendente, em resumo: o cônjuge sempre herdará conforme disposições legais.

2.1 A INCONSTITUCIONALIDADE DO ARTIGO N° 1.790


DO CÓDIGO CIVIL
Os preceitos legais que tratam da união estável estão nos artigos nos 1.723
a 1.727 do Código Civil, cuja definição é trazida pelo artigo n° 1.723: “Art. 1.723.
É reconhecida como entidade familiar a união estável entre o homem e a mulher,
configurada na convivência pública, contínua e duradoura e estabelecida com o
objetivo de constituição de família”.

A Lei n°. 8.971/94 regulava o direito dos companheiros a alimentos e à


sucessão, tratou da sucessão do companheiro em seu no artigo 2°, garantindo-
lhe o usufruto vidual e a possibilidade de, na falta de descendentes e
ascendentes, receber a totalidade da herança. Dessa forma, o companheiro
recebeu tratamento parcialmente semelhante àquele conferido ao cônjuge.
Outro avanço aconteceu com a Lei n° 9.278/96, que introduziu a garantia do
direito real de habitação ao companheiro.

26
TÓPICO 2 — DA SUCESSÃO LEGÍTIMA E DA SUCESSÃO TESTAMENTÁRIA

O Código Civil de 2002, porém, estabeleceu a concorrência sucessória do


companheiro de forma totalmente diversa, dispondo que o companheiro herdaria
sobre os bens adquiridos onerosamente na vigência da união estável, nos termos
do artigo n° 1.790, da seguinte forma:

Art. 1.790. A companheira ou o companheiro participará da sucessão


do outro, quanto aos bens adquiridos onerosamente na vigência da
união estável, nas condições seguintes:
I- se concorrer com filhos comuns, terá direito a uma quota
equivalente a que por lei for atribuída ao filho;
II- se concorrer com descendentes só do autor da herança, tocar-lhe-á
a metade do que couber a cada um daqueles;
III- se concorrer com outros parentes sucessíveis, terá direito a um
terço da herança;
IV- não havendo parentes sucessíveis, terá direito à totalidade da
herança.

Devido às divergências legais, o tratamento diferenciado gerou discussões


infinitas no ordenamento jurídico nacional. Exemplificados pelas diferenças
entre o regime anterior e o regime do atual Código Civil, acentuadas pelas
diferenças entre a sucessão do cônjuge e a sucessão do companheiro, sobretudo
a possibilidade de o companheiro concorrer com quaisquer outros parentes além
de descendentes e ascendentes. Mas o que mais indignava era a concorrência
do companheiro com os colaterais até o quarto grau, por receber apenas 1/3 da
herança, posto que se fosse casado, teria direito a metade da herança.

Grande parte da doutrina sustentou a inconstitucionalidade do art. n°


1.790, do Código Civil, invocando o princípio da proibição do retrocesso ou da
proibição da evolução reacionária, ficando evidente o retrocesso em relação às
conquistas do companheiro, em face da legislação anterior, além da igualdade
entre cônjuges e companheiros, que encontra amparo no art. n° 226 parágrafo 3°,
da Constituição Federal.

Concorrendo com descendentes comuns, o companheiro teria direito à


herança sobre os bens adquiridos onerosamente na constância da união estável,
no mesmo percentual reconhecido ao descendente, assim como no casamento.

Não obstante, concorrendo com descendentes apenas do de cujus, o


companheiro teria direito apenas à metade da cota de cada um dos descendentes.
Na hipótese de concorrência híbrida, quando havia alguns filhos da união do
companheiro com alguns exclusivos do falecido, não havia resposta legal no
Código Civil, prevalecia a regra da proporcionalidade.

Ressalte-se que o companheiro concorria com os descendentes somente


nos bens adquiridos onerosamente na vigência da união estável. Os demais se
transmitiriam apenas aos descendentes, não era assegurado ao companheiro o direito
de receber no mínimo um quarto da herança quando concorria com descendentes.

27
UNIDADE 1 — DIREITO DAS SUCESSÕES

Após muita polêmica e discussões, a matéria chegou ao Supremo Tribunal


Federal com o julgamento do Recurso Extraordinário 878.694-MG do ano de
2015, tendo como relator o Ministro Luís Roberto Barroso, que, por maioria
dos votos, declarou a inconstitucionalidade do artigo n° 1.790 do Código Civil,
especialmente o inciso III, que estabelecia a concorrência do companheiro com os
demais parentes, diferentemente da forma sucessória assegurada pelo artigo n°
1.829 do Código Civil ao cônjuge supérstite.

O julgamento fixou a seguinte decisão: “É inconstitucional a distinção de


regimes sucessórios entre cônjuges e companheiros, previsto no art. n° 1.790 do
CC/2002, devendo ser aplicado, tanto nas hipóteses de casamento quanto nas de
união estável, o regime do art. n° 1.829 do CC/2002”, valendo para outros casos de
inventários pendentes por sua repercussão geral. A doutrina majoritária aplaudiu
a referida decisão.

Em síntese, o companheiro sobrevivente terá o mesmo direito sucessório


que o cônjuge sobrevivente conforme estabelecido no artigo n° 1.829 do Código
Civil. O companheiro concorrerá com os descendentes do falecido conforme o
regime de bens adotado na união estável, igualmente será aplicada os mesmos
preceitos legais ao companheiro, atribuídos ao cônjuge do autor da herança.

Lembrando que o direito sucessório se rege pela lei vigente no tempo


da abertura da sucessão, conforme disposto no artigo n° 1.787 do Código Civil,
portanto, tal decisão não poderá ser aplicada às partilhas efetuadas anteriormente à
vigência da nova regra legal.

2.2 DA SUCESSÃO DOS ASCENDENTES E A


CONCORRÊNCIA DO CÔNJUGE OU COMPANHEIRO
Quando não houver descendentes do autor da herança, serão chamados
a suceder os seus ascendentes, em concorrência com o cônjuge/companheiro
sobrevivente como determina o artigo n° 1.836 do Código Civil, assim:

Art. 1.836. Na falta de descendentes, são chamados à sucessão os


ascendentes, em concorrência com o cônjuge sobrevivente.
§ 1° Na classe dos ascendentes, o grau mais próximo exclui o mais
remoto, sem distinção de linhas.
§ 2° Havendo igualdade em grau e diversidade em linha, os
ascendentes da linha paterna herdam a metade, cabendo a outra aos
da linha materna.

28
TÓPICO 2 — DA SUCESSÃO LEGÍTIMA E DA SUCESSÃO TESTAMENTÁRIA

A sucessão dos ascendentes observa três diretrizes:

• Isonomia: não pode haver discriminação de qualquer natureza entre os


ascendentes.
• Preferência: a presença do ascendente mais próximo afasta o ascendente
mais remoto, como exemplo temos o autor da herança com pai vivo, não será
chamado seu avô; e se o avô for chamado, não se chamará o bisavô.
• Divisão sucessória por linhas: a sucessão se dá entre a linha materna e a linha
paterna, dividindo-se a herança por igual para cada linha. Na ausência da linha
paterna ou materna, o que lhe seria de direito acresce à outra.

Não há direito de sucessão por representação ou estirpe no caso do


ascendente. A ausência de descendente de uma classe não gera representação,
por exemplo, aberta a sucessão, se o autor da herança não deixou descendentes
(filhos), seu pai e a sua mãe receberão a herança. Se o pai do falecido for pré-
morto, os pais do pai (avôs do de cujus) não receberão, somente a mãe do falecido
receberá a herança.

Qualquer que seja o regime de casamento, o cônjuge concorre com o


ascendente, sem limitação. O cônjuge, nesse caso, terá meação, que dependerá do
regime de bens e a herança, que incidirá sobre todo o patrimônio, aqui se incluirá
os bens comuns e particulares.

Daremos o seguinte exemplo, André, antes de casar, possuía um terreno,


após casar-se comprou um apartamento, mas veio a falecer deixando viúva e os
pais. A viúva terá direito à metade do apartamento, a título de meação, o restante
dos bens deixados será somado (o terreno mais a metade do apartamento) e
dividido entre a viúva e os pais, assim a viúva terá duas incidências patrimoniais
sobre o apartamento.

Além disso, o cônjuge herdará na seguinte proporção: metade do


patrimônio remanescente do de cujus, salvo se estiver concorrendo com pai e mãe
do de cujus, caso em que herdará um terço como estabelece o artigo n° 1.837 do
Código Civil: “Concorrendo com ascendente em primeiro grau, ao cônjuge tocará
um terço da herança; caber-lhe-á a metade desta se houver um só ascendente, ou
se maior for aquele grau”.

Agora, acadêmico, entraremos na polêmica concorrência do cônjuge


separado de fato.

O cônjuge concorrerá na herança com ascendentes e descendentes, mas


dependerá do preenchimento de alguns requisitos que são estabelecidos pelo
artigo n° 1.830, do Código Civil, assim:

Art. 1.830. Somente é reconhecido direito sucessório ao cônjuge


sobrevivente se, ao tempo da morte do outro, não estavam separados
judicialmente, nem separados de fato há mais de dois anos, salvo prova,
neste caso, de que essa convivência se tornara impossível sem culpa do
sobrevivente.

29
UNIDADE 1 — DIREITO DAS SUCESSÕES

De acordo com a literalidade desse dispositivo, o cônjuge pode herdar,


mesmo que separado de fato, salvo se já transcorridos dois anos e, mesmo nesse
caso, também pode herdar se não foi o culpado pela separação, isto é, se provar
que o casamento se desfez por culpa do outro.

A culpa tratada no artigo n° 1.830 acima citado é a chamada “culpa


mortuária” ou “culpa funerária” e caberá ao cônjuge sobrevivente provar que o
casamento não se desfez por sua culpa para concorrer à herança.

Esse dispositivo é amplamente criticado pela doutrina brasileira.


Em primeiro lugar, pode-se sustentar que basta a separação de fato,
independentemente do prazo, para que o cônjuge seja excluído da concorrência,
uma vez que a exigência do prazo era coerente com a previsão do divórcio apenas
após a separação de fato por 2 anos e a Emenda Constitucional 66 afastou esse
requisito temporal.

Como você sabe, caro estudante, o casamento implica afetividade e


comunhão plena de vida, o que não ocorre quando os cônjuges estão separados
de fato. A pessoa casada e separada de fato pode, inclusive, constituir uma união
estável com outra pessoa, não se aplicando o impedimento matrimonial, relativo
ao casamento anterior, para a união estável.

A doutrina destaca, assim, o aparente conflito normativo com o artigo n°


1.723, §1° do Código Civil: “A união estável não se constituirá se ocorrerem os
impedimentos do art. n° 1.521; não se aplicando a incidência do inciso VI no caso
de a pessoa casada se achar separada de fato ou judicialmente”, que estabelece a
possibilidade de caracterização da união estável, independentemente de prazo,
pela separação de fato.

Se há união estável, não há mais que se falar em direito sucessório do outro,


tendo em vista que a simples separação de fato cessa os efeitos do casamento.

As maiores críticas dizem respeito à possibilidade de discussão de culpa


como requisito para se determinar a exclusão ou não do cônjuge sobrevivente da
ordem de vocação hereditária.

Rolf Madaleno, por exemplo, em texto carregado de ironia, apresenta que


o art. n° 1.830 institui a “culpa mortuária” ou "culpa funerária", ressaltando a
dificuldade de produção da prova após o falecimento de um dos cônjuges, que
poderá gerar longas e desgastantes discussões processuais (MADALENO, 2005,
p. 144-151).

30
TÓPICO 2 — DA SUCESSÃO LEGÍTIMA E DA SUCESSÃO TESTAMENTÁRIA

O Supremo Tribunal de Justiça, considerou que não há que se falar em


impertinência da discussão da culpa no vigente direito sucessório, devendo ser
mantida a aplicação do art. n° 1.830 do Código Civil para os casos que regula.
Pacificou que o ônus da prova é do cônjuge sobrevivente. Este deverá provar
que não teve culpa pela separação, que a convivência se tornou impossível sem
culpa sua. Se o cônjuge sobrevivente não conseguir provar isso, ele não terá
direito à herança.

Isso se justifica porque, conforme se verifica da ordem de vocação


hereditária prevista no art. n° 1.829 do Código Civil, a concorrência do cônjuge
separado de fato é exceção. Assim, em regra, o cônjuge separado há mais de 2
anos não é herdeiro, salvo se ele provar que não teve culpa pela separação.

2.3 DA SUCESSÃO DO CÔNJUGE COM COMPANHEIRO


COM OS DESCENDENTES
Nos termos do art. n° 1.829 do Código Civil, a sucessão legítima defere-se

aos descendentes, em concorrência com o cônjuge sobrevivente, salvo


se casado este com o falecido no regime da comunhão universal, ou
no da separação obrigatória de bens (art. n° 1.640, parágrafo único);
ou se, no regime da comunhão parcial, o autor da herança não houver
deixado bens particulares.

Assim, a forma como o cônjuge herda em concorrência com os descendentes


depende do regime de bens do casamento. O cônjuge não terá direito à herança:

• Na comunhão universal.
• Na comunhão parcial, quando não houver bens particulares.
• Na separação obrigatória de bens.

Também incidirá o direito sucessório do cônjuge com descendentes


quando houver bens particulares, tendo em vista o dispositivo n° 1.829 do
Código Civil. Será afastado da concorrência o cônjuge quando casado com o de
cujus nos regimes da comunhão universal, da comunhão parcial, quando não
houver bens particulares, e da separação obrigatória, que acarreta na exclusão
do direito hereditário.

• Apenas quanto aos bens particulares, sendo os demais, quanto aos quais o
cônjuge sobrevivente tem meação, partilhados apenas entre os descendentes.
• Quanto a toda a herança, incluindo bens comuns e particulares.
• Apenas quanto aos bens comuns, sendo os bens particulares partilhados
apenas entre os descendentes. Citamos aqui o precedente do Supremo Tribunal
de Justiça, Resp n° 992749:

31
UNIDADE 1 — DIREITO DAS SUCESSÕES

Precedentes do STJ – REsp 992749. Até o advento da Lei n° 6.515/77 (Lei


do Divórcio), vigeu no Direito brasileiro, como regime legal de bens, o
da comunhão universal, no qual o cônjuge sobrevivente não concorre
à herança, por já lhe ser conferida a meação sobre a totalidade do
patrimônio do casal; a partir da vigência da Lei do Divórcio, contudo,
o regime legal de bens no casamento passou a ser o da comunhão
parcial, o que foi referendado pelo art. 1.640 do CC/02. - Preserva-se
o regime da comunhão parcial de bens, de acordo com o postulado
da autodeterminação, ao contemplar o cônjuge sobrevivente com
o direito à meação, além da concorrência hereditária sobre os bens
comuns, mesmo que haja bens particulares, os quais, em qualquer
hipótese, são partilhados unicamente entre os descendentes) (REsp
992749, de 05/02/2010).

Partindo-se dessa premissa, há três correntes a respeito dos bens quanto


aos quais o cônjuge tem direito sucessório.

A primeira corrente apresentada é a prevalente, considerando a literalidade


e a finalidade da norma do art. n° 1829, I, CC.

Nesse sentido, é o teor do Enunciado 270 da III Jornada de Direito Civil:

O art. 1.829, inc. I, só assegura ao cônjuge sobrevivente o direito de


concorrência com os descendentes do autor da herança quando
casados no regime da separação convencional de bens ou, se casados
nos regimes da comunhão parcial ou participação final nos aquestos, o
falecido possuísse bens particulares, hipóteses em que a concorrência
se restringe a tais bens, devendo os bens comuns (meação) serem
partilhados exclusivamente entre os descendentes.

Com efeito, ao estabelecer a diferenciação a partir do regime de bens, o


legislador teve em vista que, nos regimes da comunhão universal e da comunhão
parcial sem bens particulares, o cônjuge sobrevivente já é suficientemente
protegido pelo direito de família, pois tem direito à meação sobre todo o
patrimônio comum e a herança será constituída pela meação do de cujus.

No regime da separação convencional e da participação final nos aquestos,


assim como no da comunhão parcial com bens particulares, isso não ocorre. A
lógica é que, nos casos e na medida em que o cônjuge não tem direito à meação,
concorre na herança.

Dessa forma, pode-se concluir que, quando concorre com os descendentes,


o direito sucessório do cônjuge se restringe aos bens particulares do autor da
herança. Se a herança se dá sobre os bens particulares, enquanto a meação se dá
sobre os bens comuns, é possível dizer que onde se herda (particulares), não se
meia (comuns); e, onde se meia, não se herda.

Daremos o seguinte exemplo, um homem morre deixando filhos e esposa,


possuía um bem comum e um particular. A viúva terá meação sobre o bem comum
e herdará, junto com os filhos, o bem particular. Portanto, quando há meação, não
há concorrência, pois, o cônjuge já está amparado.

32
TÓPICO 2 — DA SUCESSÃO LEGÍTIMA E DA SUCESSÃO TESTAMENTÁRIA

Trataremos agora de mais uma grande polêmica do direito sucessório


brasileiro: o regime de separação convencional de bens e o entendimento da
jurisprudência a respeito do cônjuge sobrevivente.

De acordo com a interpretação literal do art. n° 1.829, Código Civil, no


caso de regime de separação total de bens, o cônjuge tem direito à herança.

Na separação convencional, os cônjuges querem que o patrimônio seja


próprio, não se misturando com o do novo cônjuge, tem-se o exemplo do pai que
se separa e quer se casar novamente, mas deseja preservar o direito dos filhos.
Mas nessa hipótese todos os bens do falecido serão particulares e, portando,
o cônjuge sobrevivente terá direito à herança sobre eles. Nota-se que a lei não
prestigiou a autonomia privada no âmbito da sucessão.

O Supremo Tribunal de Justiça, em algumas decisões (REsp 992749 e


689703), considerou que, ao falar em regime da separação legal, o art. n° 1.829
do Código Civil envolveria não apenas a separação obrigatória, mas, também, a
separação convencional.

Segundo essas decisões, deve ser respeitada a vontade dos cônjuges


que estabelecem o regime da separação convencional em pacto antenupcial. A
concorrência do cônjuge com os descendentes, nesse caso, representaria uma
burla a essa vontade. Nesse sentido:

Direito civil. Família e Sucessões. Recurso especial. Inventário e partilha.


Cônjuge sobrevivente casado pelo regime de separação convencional
de bens, celebrado por meio de pacto antenupcial por escritura
pública. Interpretação do art. 1.829, I, do CC/02. Direito de concorrência
hereditária com descendentes do falecido. Não ocorrência. (…)
• O regime de separação obrigatória de bens, previsto no art. 1.829,
inc. I, do CC/02, é gênero que congrega duas espécies: (i) separação
legal; (ii) separação convencional. Uma decorre da lei e a outra
da vontade das partes, e ambas obrigam os cônjuges, uma vez
estipulado o regime de separação de bens, à sua observância.
• Não remanesce, para o cônjuge casado mediante separação de bens,
direito à meação, tampouco à concorrência sucessória, respeitando-
se o regime de bens estipulado, que obriga as partes na vida e na
morte. Nos dois casos, portanto, o cônjuge sobrevivente não é
herdeiro necessário.
• Entendimento em sentido diverso, suscitaria clara antinomia entre
os arts. 1.829, inc. I, e 1.687, do CC/02, o que geraria uma quebra da
unidade sistemática da lei codificada, e provocaria a morte do regime
de separação de bens. Por isso, deve prevalecer a interpretação que
conjuga e torna complementares os citados dispositivos. (…)
• A ampla liberdade advinda da possibilidade de pactuação quanto
ao regime matrimonial de bens, prevista pelo Direito Patrimonial de
Família, não pode ser toldada pela imposição fleumática do Direito
das Sucessões, porque o fenômeno sucessório “traduz a continuação
da personalidade do morto pela projeção jurídica dos arranjos
patrimoniais feitos em vida”.
• Trata-se, pois, de um ato de liberdade conjuntamente exercido, ao
qual o fenômeno sucessório não pode estabelecer limitações.

33
UNIDADE 1 — DIREITO DAS SUCESSÕES

• Se o casal firmou pacto no sentido de não ter patrimônio comum e,


se não requereu a alteração do regime estipulado, não houve doação
de um cônjuge ao outro durante o casamento, tampouco foi deixado
testamento ou legado para o cônjuge sobrevivente, quando seria
livre e lícita qualquer dessas providências, não deve o intérprete da
lei alçar o cônjuge sobrevivente à condição de herdeiro necessário,
concorrendo com os descendentes, sob pena de clara violação ao
regime de bens pactuado.
• Haveria, induvidosamente, em tais situações, a alteração do regime
matrimonial de bens post mortem, ou seja, com o fim do casamento
pela morte de um dos cônjuges, seria alterado o regime de separação
convencional de bens pactuado em vida, permitindo ao cônjuge
sobrevivente o recebimento de bens de exclusiva propriedade do
autor da herança, patrimônio ao qual recusou, quando do pacto
antenupcial, por vontade própria.
• Por fim, cumpre invocar a boa fé objetiva, como exigência de
lealdade e honestidade na conduta das partes, no sentido de que o
cônjuge sobrevivente, após manifestar de forma livre e lícita a sua
vontade, não pode dela se esquivar e, por conseguinte, arvorar-se
em direito do qual solenemente declinou, ao estipular, no processo
de habilitação para o casamento, conjuntamente com o autor da
herança, o regime de separação convencional de bens, em pacto
antenupcial por escritura pública.
• O princípio da exclusividade, que rege a vida do casal e veda a
interferência de terceiros ou do próprio Estado nas opções feitas
licitamente quanto aos aspectos patrimoniais e extrapatrimoniais da
vida familiar, robustece a única interpretação viável do art. 1.829,
inc. I, do CC/02, em consonância com o art. 1.687 do mesmo código,
que assegura os efeitos práticos do regime de bens licitamente
escolhido, bem como preserva a autonomia privada guindada pela
eticidade. Recurso especial provido. Pedido cautelar incidental
julgado prejudicado (REsp 992749, de 05/02/2010).

Em julgados mais recentes, o STJ reviu esse posicionamento, entendendo


que só não há concorrência do cônjuge no regime da separação obrigatória ou legal,
assegurando ao cônjuge sobrevivente o direito a concorrer com os descendentes
do falecido no caso de regime de separação convencional, conforme se depreende
das ementas a seguir colacionadas:

O cônjuge, qualquer que seja o regime de bens adotado pelo casal,


é herdeiro necessário (art. 1.845 do CC). No regime de separação
convencional de bens, o cônjuge sobrevivente concorre com os
descendentes do falecido. A lei afasta a concorrência apenas quanto
ao regime da separação legal de bens previsto no art. 1.641 do CC”.
(STJ. 2ª Seção. REsp 1.382.170-SP, Rel. Min. Moura Ribeiro, Rel. para
acórdão Min. João Otávio de Noronha, julgado em 22/4/2015).

PROCESSUAL CIVIL. AGRAVO REGIMENTAL NOS EMBARGOS


DE DIVERGÊNCIA EM RECURSO ESPECIAL. CIVIL. DIREITO DAS
SUCESSÕES. CÔNJUGE. HERDEIRO NECESSÁRIO. ART. 1.845 DO
CC/2002. REGIME DE SEPARAÇÃO CONVENCIONAL DE BENS.
CONCORRÊNCIA COM DESCENDENTE. POSSIBILIDADE. ART.
1.829, I, DO CC. SÚMULA N. 168/STJ. 1. A atual jurisprudência desta
Corte está sedimentada no sentido de que o cônjuge sobrevivente
casado sob o regime de separação convencional de bens ostenta a
condição de herdeiro necessário e concorre com os descendentes do

34
TÓPICO 2 — DA SUCESSÃO LEGÍTIMA E DA SUCESSÃO TESTAMENTÁRIA

falecido, a teor do que dispõe o art. 1.829, I, do CC/2002, e de que a


exceção recai somente na hipótese de separação legal de bens fundada
no art. 1.641 do CC/2002. 2. Tal circunstância atrai, no caso concreto,
a incidência do Enunciado n. 168 da Súmula do STJ. 3. Agravo
regimental desprovido”. (STJ. 2ª Seção. AgRg nos EREsp 1472945 / RJ,
Rel. Min. Antônio Carlos Ferreira, julgado em 24/06/2015).

AGRAVO REGIMENTAL NO RECURSO ESPECIAL. DIREITO


DAS SUCESSÕES. CÔNJUGE. REGIME DE SEPARAÇÃO
CONVENCIONAL DE BENS. HERDEIRO NECESSÁRIO.
CONCORRÊNCIA COM DESCENDENTES. POSSIBILIDADE. ART.
1.829, I, DO CÓDIGO CIVIL. PRECEDENTES. SÚMULA N. 83 DO
STJ. AGRAVO REGIMENTAL A QUE SE NEGA PROVIMENTO. 1.
Admite-se ao cônjuge casado sob o regime de separação convencional de
bens, a condição de herdeiro necessário, possibilitando a concorrência
com os descendentes do falecido. Precedentes. Incidência da Súmula
n. 83 do STJ. 2. Agravo regimental a que se nega provimento”. (STJ. 3ª
Turma, AgRg no REsp 1334340 / MG, Rel. Min. Marco Aurelio Bellizze,
julgado em 17/09/2015).

ATENCAO

A súmula 377 do Supremo Tribunal Federal: “No regime da separação legal de


bens comunicam-se os adquiridos na constância do casamento”. Entretanto deverá ser o
esforço comum dos cônjuges.

Trataremos agora do percentual sucessório do cônjuge concorrendo


com o descendente. Este percentual será o mesmo atribuído ao descendente,
assegurado o mínimo de ¼ (um quarto) como dita o artigo n° 1.832 do Código
Civil. Essa garantia de ¼ (um quarto), todavia, somente existe se o cônjuge for o
pai ou a mãe dos descendentes com quem estiver concorrendo. Se não for, ela não
existe, vejamos o artigo:

Art. 1.832. Em concorrência com os descendentes (art. 1.829, inciso I)


caberá ao cônjuge quinhão igual ao dos que sucederem por cabeça,
não podendo a sua quota ser inferior à quarta parte da herança, se for
ascendente dos herdeiros com que concorrer.

Vamos ao seguinte exemplo, Paulo morreu, deixando sete filhos e a viúva.


Se os sete filhos são também da viúva, ela leva ¼ da herança. Porém, se os sete
filhos não são filhos dela, ela fica com 1/8 do total. Mas o que ocorre, todavia, se
houver filho comum e não comum? Infelizmente, o Código não responde.

35
UNIDADE 1 — DIREITO DAS SUCESSÕES

A doutrina se divide em três correntes:

• Alguns autores dizem que basta ter um filho comum para ter a garantia de ¼.
• Outros exigem que todos sejam comuns para ter a garantia de ¼, sendo esta a
posição predominante.
• E ainda uma terceira corrente entende que se deve considerar sua fração com
relação apenas com os filhos comuns.

De qualquer maneira, o dispositivo viola a igualdade entre os filhos, pois


trata de modo desigual os filhos comuns e não comuns.

Passaremos agora para mais uma polêmica: o direito real de habitação:


o direito real de habitação é o direito reconhecido ao cônjuge sobrevivente de
continuar morando no imóvel que servia de residência para o casal, desde que
este fosse o único imóvel residencial. Conforme o art. n° 1.831:

Ao cônjuge sobrevivente, qualquer que seja o regime de bens, será


assegurado, sem prejuízo da participação que lhe caiba na herança, o
direito real de habitação relativamente ao imóvel destinado à residência
da família, desde que seja o único daquela natureza a inventariar.

O direito real de habitação do cônjuge é vitalício e incondicionado. Assim,


persiste até a sua morte, independentemente da constituição de nova família.

O companheiro também terá direito real de habitação como o cônjuge


viúvo, o artigo n° 1.831 do Código Civil, ao tratar do direito real de habitação,
menciona apenas o cônjuge sobrevivente, silenciando a respeito da extensão
desse direito ao companheiro sobrevivente. Não obstante, com a revogação do
artigo n° 1.790 e a equiparação do companheiro ao cônjuge, é o entendimento de
que o companheiro sobrevivente também tem direito real de habitação

Desse modo, o direto real de habitação, previsto no art. n° 1.831 do Código


Civil deve ser aplicado analogicamente ao companheiro sobrevivente. Adotado esse
entendimento, o direito real de habitação do companheiro é vitalício e condicionado,
assim como o do cônjuge.

36
TÓPICO 2 — DA SUCESSÃO LEGÍTIMA E DA SUCESSÃO TESTAMENTÁRIA

2.4 DA SUCESSÃO DO CÔNJUGE OU COMPANHEIRO,


ISOLADAMENTE
Na falta de descendentes e ascendentes o cônjuge/companheiro
sobrevivente receberá por inteiro a herança do falecido, como reza o artigo n°
1.838 do Código Civil, aplicando-se ao companheiro as regras sucessórias do
artigo n° 1.829, equiparando o companheiro ao cônjuge sobrevivente.

2.5 DA SUCESSÃO DOS COLATERAIS


Quando não houver descendentes, ascendentes, cônjuge ou companheiro
vivo, os parentes colaterais até o 4° grau receberão a herança do falecido, como
prevê o artigo n° 1.839 do Código Civil.

A sucessão de herdeiros colaterais é tratada nos seguintes artigos do


referido instituto:

Art. 1.592. São parentes em linha colateral ou transversal, até o quarto


grau, as pessoas provenientes de um só tronco, sem descenderem uma
da outra.
Art. 1.594. Contam-se, na linha reta, os graus de parentesco pelo
número de gerações, e, na colateral, também pelo número delas,
subindo de um dos parentes até ao ascendente comum, e descendo até
encontrar o outro parente.
Art. 1.839. Se não houver cônjuge sobrevivente, nas condições
estabelecidas no art. 1.830, serão chamados a suceder os colaterais até
o quarto grau.

Da classe dos colaterais só serão chamados os herdeiros até o 4° grau,


a contagem dos graus é prevista no referido artigo n° 1.594 do Código Civil,
representam essa classe os primos, tios-avôs e os sobrinhos-netos, caso não seja
encontrado herdeiro colateral até o 4° grau, a herança será destinada ao Município,
ou Distrito Federal, ou a União, conforme já tratado neste material.

Aplica-se a regra na qual os herdeiros colaterais de grau mais próximo


excluem os herdeiros de grau mais distante, com exceção do direito de representação
atribuído aos filhos de irmãos quando concorrendo entre si, como dito no artigo
n° 1.840 do Código Civil.

Entretanto, na falta de irmãos, herdarão os filhos destes e não os havendo,


herdarão os tios, redação do artigo n° 1.843, que privilegia os sobrinhos aos tios.
Os herdeiros colaterais herdarão por direito próprio quando todos se encontrarem
no mesmo grau e não existir entre eles e o autor da herança um herdeiro de grau
mais próximo.

37
UNIDADE 1 — DIREITO DAS SUCESSÕES

Haverá direito de representação quando os herdeiros não se encontrarem


no mesmo grau e ela se dará em favor do filho do irmão, quando estiver
concorrendo com o irmão do falecido. Como exemplo temos o caso a seguir
trazido por Mario Roberto Carvalho de Faria (2017, p. 140):

João faleceu em 1998 deixando dois irmãos vivos, Aimar e Joaquim, e


dois sobrinhos, Henrique e Marisa, filhos de seu irmão Antônio, que falecera,
anteriormente, em 1996.

Faleceu em 1998 Faleceu em 1996


João Aimar Joaquim Antônio (irmão – 2° grau)
/ \
Henrique Marisa
(sobrinhos – 3° grau)
Filhos de irmãos

Nesse exemplo teremos dois irmãos do autor da herança concorrendo
com dois sobrinhos, filhos de irmão pré-morto. Deverá ser aplicada a regra do
artigo n° 1.840, portanto, Henrique e Marisa, filhos de Antônio, irmão pré-morto
do falecido, herdarão por representação o quota-parte da herança que lhe caberia.

Assim, “se concorrem sobrinhos-netos com sobrinhos do falecido, somente


estes herdarão em detrimento daqueles. Ou ainda, se concorrem sobrinhos-netos
com irmãos do falecido, também, não haverá direito de representação em favor
dos sobrinhos-netos. Os irmãos os excluem da sucessão” (FARIA, 2017, p. 140).

Aos irmãos bilaterais, também denominados de germanos, e os irmãos


unilaterais serão destinados os artigos nos 1.841 e 1.842 do Código Civil
respectivamente.

Os irmãos bilaterais são aqueles que possuem o mesmo pai e a mesma


mãe, já os irmãos unilaterais são irmãos por apenas um lado, mesmo pai, ou
mesma mãe. Os filhos unilaterais de mesma mãe são chamados de unilaterais
uterinos e os unilaterais de mesmo pai de unilaterais sanguíneos.

O artigo n° 1.841 diz que aos irmãos germanos, bilaterais, caberá o dobro
da herança concedida aos irmãos unilaterais quando não houver concorrência
entre eles. O artigo n° 1.842 explica que quando NÃO houver concorrência entre
os irmãos bilaterais e os irmãos unilaterais, os irmãos unilaterais herdarão em
partes iguais.

Também prevê os parágrafos do artigo n° 1.843 do Código Civil a divisão


da herança quando apenas os filhos de irmãos concorrem à herança.

38
TÓPICO 2 — DA SUCESSÃO LEGÍTIMA E DA SUCESSÃO TESTAMENTÁRIA

Art. 1.843 (…)


§ 1° Se concorrerem à herança somente filhos de irmãos falecidos,
herdarão por cabeça.
§ 2° Se concorrem filhos de irmãos bilaterais com filhos de irmãos
unilaterais, cada um destes herdará a metade do que herdar cada um
daqueles.
§ 3° Se todos forem filhos de irmãos bilaterais, ou todos de irmãos
unilaterais, herdarão por igual.

Já no que toca aos tios e sobrinhos do autor da herança, o preceito


legal competente é o artigo n° 1.843 do Código Civil, vejamos: “Art. 1.843.
Na falta de irmãos, herdarão os filhos destes e, não os havendo, os tios”.

Os tios e sobrinhos do falecido se encontram em 3° grau na linha sucessória,


por estarem no mesmo grau, sucederão por direito próprio/por cabeça, devendo
a herança ser partilhada em quantos forem os herdeiros.

Não existindo irmãos do autor da herança, os filhos daqueles, no caso os


sobrinhos, herdarão, não existindo sobrinhos do autor da herança, mas existindo
tios vivos do falecido, estes terão o direito de suceder.

A ordem sucessória dos parentes colaterais se dará da seguinte forma: 1°


herdam os irmãos do falecido, observando o direito de representação dos filhos
destes; 2° os sobrinhos do autor da herança; e caso não hajam, passará o direito
para os tios do falecido, e por último os parentes em 4° grau da linha sucessória,
quando todos estiverem neste grau, a herança deverá ser partilhada entre todos.

2.6 DO DIREITO DE REPRESENTAÇÃO


O direito de representação está previsto no artigo n° 1.851 do Código Civil:
“Art. 1.851. Dá-se o direito de representação, quando a lei chama certos parentes do
falecido a suceder em todos os direitos, em que ele sucederia se vivo fosse”.

Importante destacar o artigo n° 1.852 do Código Civil, pois ele informa


sobre o direito de representação dar-se somente na linha reta descendente e
nunca na ascendente.

Portanto, na linha descendente, o direito de representação é infinito,


enquanto existir um herdeiro pré-morto, seus descendentes serão chamados a
representá-lo na sucessão do autor da herança, concorrendo com herdeiros de
graus diferentes.

Quando o herdeiro vir a falecer antes da morte e abertura da sucessão do


autor da herança, serão chamados os seus descendentes mais próximos.

39
UNIDADE 1 — DIREITO DAS SUCESSÕES

Para que ocorra o direito de representação é preciso:

• A pré-morte do presumível herdeiro autor da herança.


• Que os herdeiros não se encontrem no mesmo grau.
• Que a sucessão seja legítima.

Vejamos o esquema a seguir para facilitar o aprendizado.

Autor da Herança – óbito – 1998



João (filho) <-----------------------> Pedro (filho pré-morto em 2000) representado
(½) (½)

(Representantes) (netos) Marcos <------------> Antônio


(¼) (¼)

Assim, Pedro que morreu após a morte do autor da herança, tendo


filhos – netos do inventariado – estes irão sucedê-lo por representação,
herdando o que Pedro receberia se vivo estivesse. João receberá metade da
herança, e ao ocupar o lugar de Pedro, Marcos e Antônio receberão o quinhão
que lhe caberia, ou seja, a outra metade, porém partilhado na fração de ¼ para
cada uma (FARIA, 2017, p. 140).

O artigo n° 1.855 do Código Civil traz a seguinte redação: “Art. 1.855. O


quinhão do representado partir-se-á por igual entre os representantes”.

Isto significa dizer que os representantes, tantos quanto existirem, são


tidos como um só herdeiro e recebem apenas a parte que caberia ao representado.

A seguir, estudaremos especificamente a sucessão testamentária.

3 DA SUCESSÃO TESTAMENTÁRIA
A sucessão legitima ocorre quando o falecido, autor da herança, deixa
seus bens para serem partilhados entre os membros de sua família, esta partilha
respeitará as leis que regulam as sucessões. A sucessão testamentária é tratada nos
artigos nos 1.857 a 1.990, do Código Civil. O tema também está presente na ordem
da vocação hereditária contida nos artigos nos 1.798 a 1.803 desse mesmo código.

As pessoas legitimadas a suceder são as nascidas ou já concebidas no


momento da abertura da sucessão, definição dada pelo artigo n° 1.798 do Código
Civil, assim, o legislador instituiu os direitos dos nascituros ao permitir que o
testador realize disposições e favor dos nascituros.

40
TÓPICO 2 — DA SUCESSÃO LEGÍTIMA E DA SUCESSÃO TESTAMENTÁRIA

Nascendo com vida, receberão a herança, caso isso não ocorra e não
haja disposição diversa, os bens inventariados retornarão ao monte para serem
novamente partilhados entre os herdeiros legítimos.

O artigo n° 1.799 traz aqueles que podem ser chamados a suceder, vejamos:

Art. 1.799. Na sucessão testamentária podem, ainda, ser chamados a


suceder:
I- os filhos, ainda não concebidos, de pessoas indicadas pelo testador,
desde que vivas estas ao abrir-se a sucessão.
II- as pessoas jurídicas.
III- as pessoas jurídicas, cuja organização for determinada pelo
testador sob a forma de fundação.


Através de disposição testamentária, poderá se beneficiar pessoas
físicas ou jurídicas de direito público ou privado. Entretanto, somente pessoas
poderão ser contempladas pela sucessão, podendo, no entanto, por disposição
testamentária, ser estipulado de forma indireta ao herdeiro, o encargo de cuidar
de determinado animal, mas estão excluídos objetos inanimados e entidades
místicas, como santos (FARIA, 2017 p. 25).

A pessoa beneficiada em testamento com coisa certa e determinada não


é denominada de herdeiro instituído ou testamentário, mas sim chamada de
legatário.

O testador definirá em vida a forma como deseja partilhar seus bens após
a sua morte, liberalidade realizada através de testamento. O testador ao realizar
sua vontade de dispor da forma que lhe convém, poderá fazê-la, mas desde
que respeitando a legitima. Diz o artigo n° 1.975: “Art. 1.975. Não se rompe o
testamento, se o testador dispuser da sua metade, não contemplando os herdeiros
necessários de cuja existência saiba, ou quando os exclua dessa parte”.

Poderá haver redução das cláusulas testamentárias quando o testador


dispor em seu testamento, parte do seu patrimônio superior àquela de que pode
dispor, não respeitando a legítima, o juiz pode, de ofício ou a requerimento,
determinar a redução das cláusulas testamentárias. Devem ser observados os
seguintes critérios para proceder a redução de tais cláusulas:

• Se houver só herança ou só legado, o juiz reduz proporcionalmente.


• Se houver herança e legado: o juiz reduzirá primeiro da herança e, só depois,
se necessário, do legado.

O testamento só produz efeito após a morte do testador, portanto em


vida não se pode discutir a validade do testamento, igualmente não terá eficácia
enquanto o testador estiver vivo.

41
UNIDADE 1 — DIREITO DAS SUCESSÕES

ATENCAO

No caso de algum herdeiro necessário ser excluído da sucessão ou o testador


não tenha respeitado a partilha da legítima na confecção de seu testamento, a ação de
anulação de testamento deverá ser proposta após o falecimento do testador, caso contrário
não haverá ao autor da ação legítimo interesse para agir.

3.1 CONCEITO DE TESTAMENTO E SUAS


CARACTERÍSTICAS
O Código Civil não apresenta definição de testamento, todavia o artigo
n° 1.857 expressa: “Art. 1.857. Toda pessoa capaz pode dispor, por testamento, da
totalidade dos seus bens, ou de parte deles, para depois de sua morte”.

Por meio de um documento chamado “testamento”, o testador, aquele


que realiza o testamento, expõe a forma como deseja que seu patrimônio seja
partilhado após seu falecimento, ele deverá respeitar o direito dos seus herdeiros
necessários e legais.

Portanto, o testamento é o ato pelo qual o testador manifesta sua própria


vontade sobre a disposição de seus bens após a sua morte, devendo respeitar a
parte legitima destinada aos herdeiros necessários, que importa em metade da
totalidade de seus bens.

O ordenamento jurídico brasileiro não permite pactos sucessórios, ou seja,


um contrato sobre a herança de pessoa viva, também chamado de testamento
conjuntivo, como explica o artigo n° 1.863: “É proibido que o testamento conjuntivo
seja simultâneo; recíproco ou correspectivo.”

O testamento conjuntivo, também conhecido como “de mão comum”,


é o realizado por duas pessoas dispondo suas vontades testamentárias, em um
instrumento só. Ao dispor em favor de terceiros em um só ato, ele será considerado
simultâneo, será recíproco quando os testadores se beneficiarem mutuamente,
será “correspectivo” quando os testadores equivalerem suas disposições com
outras correspondentes. Esta modalidade é proibida pelo artigo n° 426 do Código
Civil, pois configuraria um “contrato sobre herança de pessoa viva”.

Será lícita a realização em atos distintos, independentes, no mesmo dia, de
testamentos de duas pessoas que queiram se beneficiar com termos semelhantes
em favor do outro, no mesmo livro, perante o Tabelião de Notas.

42
TÓPICO 2 — DA SUCESSÃO LEGÍTIMA E DA SUCESSÃO TESTAMENTÁRIA

Outra possibilidade advém da partilha, em vida, de bens, respeitando a


vontade do doador, pela doação ao ascendente ou descendente, desde que não
prejudique a legítima dos herdeiros necessários, como explica o artigo n° 2.018,
do Código Civil.

O ato de testar não pode ser realizado por representação, portanto as
pessoas capazes de testar serão os maiores de 16 anos de idade, não podem testar
os incapazes e muito menos aqueles que no ato de fazê-lo, não tenham pleno
discernimento.

Destacamos mais uma vez que os incapazes não podem testar, entretanto,
a incapacidade superveniente do testador não invalida o testamento realizado,
porém, o contrário não ocorrerá, caso o testamento tenha sido realizado por
incapaz, este não será válido mesmo que venha a ter capacidade superveniente.

O ato de testar é singular, não podendo ser realizado um testamento


com dois testadores, deverá ser realizado um para cada indivíduo, como já
mencionado acima.

O testamento é um ato formal e possui requisitos fundamentais. Ele é


estabelecido pelo legislador para ser válido, caso contrário será considerado nulo.

Rege-se o testamento pela data de sua realização, mas as disposições


testamentárias obedecem a lei que vigora na data do falecimento do testador.

O testamento pode ser revogado a qualquer tempo por outro testamento


e por qualquer forma, testamento particular revogando testamento público e
vice-versa, a revogação pode ser parcial, de algumas cláusulas ou total, como
explica o artigo n° 1.970 do Código Civil.

Há três tipos de revogação:

• De forma expressa, nessa o testador diz claramente sua intenção de revogar


totalmente o testamento realizado anteriormente, seria a forma mais usual.
• De forma tácita, quando o novo testamento traz disposições diferentes àquelas
existentes no testamente anterior.
• De forma legal, este tipo é realizado pelo legislador ao descrever que
determinada disposição é ilegal ou determinada formalidade obrigatória não
foi praticada, temos como exemplo o artigo n° 1.972 do Código Civil, vejamos:
“Art. 1.972. O testamento cerrado que o testador abrir ou dilacerar, ou for
aberto ou dilacerado com seu consentimento, haver-se-á como revogado”.

Teremos também o “rompimento do testamento”, previsto no artigo nos


1.973 a 1975, do Código Civil. O testamento rompido, significa que não será
mais válido. Portanto, o testamento não será mais eficaz quando sobreviver
descendente sucessível ao testador, que não tinha ou desconhecia a existência de
outros herdeiros necessários.

43
UNIDADE 1 — DIREITO DAS SUCESSÕES

Abordaremos agora sobre a figura do testamenteiro, presente nos artigos


nos 1.976 a 1.990 do Código Civil. O testamenteiro é uma pessoa de confiança
nomeada pelo testador para fazer cumprir as disposições testamentárias após o
seu falecimento.

Poderá(ão) ser nomeada(s) uma ou mais pessoas para o cargo de


testamenteiro, que deverá defender a validade do testamento, como explica o
artigo n° 1.980 do Código: “Art. 1.980. O testamenteiro é obrigado a cumprir as
disposições testamentárias, no prazo marcado pelo testador, e a dar contas do
que recebeu e despendeu, subsistindo sua responsabilidade enquanto durar a
execução do testamento”.

Caso o testador não tenha nomeado um testamenteiro, a execução


testamentária competirá ao cônjuge e, na sua falta, será incumbida a um herdeiro
nomeado pelo juiz.

Importante explicar a diferença entre testamenteiro e inventariante, pois


são cargos distintos. Ao nomear o inventariante deverá ser seguida a ordem
preferencial prevista no artigo n° 617 do Código Processo Civil, vejamos:

Art. 617. O juiz nomeará inventariante na seguinte ordem:


I- o cônjuge ou companheiro sobrevivente, desde que estivesse
convivendo com o outro ao tempo da morte deste;
II- o herdeiro que se achar na posse e na administração do espólio,
se não houver cônjuge ou companheiro sobrevivente ou se estes
não puderem ser nomeados;
III- qualquer herdeiro, quando nenhum deles estiver na posse e na
administração do espólio;
IV- o herdeiro menor, por seu representante legal;
V- o testamenteiro, se lhe tiver sido confiada a administração do
espólio ou se toda a herança estiver distribuída em legados;
VI- o cessionário do herdeiro ou do legatário;
VII- o inventariante judicial, se houver;
VIII- pessoa estranha idônea, quando não houver inventariante judicial.

Mas nada impede que o testador nomeie a mesma pessoa para exercer a
função de testamenteira e inventariante, entretanto, o inventariante deverá estar
elencado na ordem estabelecida no artigo acima.

Não havendo cônjuge e ocorrendo conflito entre os herdeiros, o juiz


poderá nomear um testamenteiro judicial, caso exista este cargo na comarca onde
ocorrer o processo de inventário, não existindo poderá então ser nomeado um
testamenteiro dativo. O testamenteiro poderá peticionar renunciando ao cargo,
caso não queira exercê-lo.

O testamenteiro terá direito a um prêmio (corresponderá entre 1% a 5%


do valor líquido da herança) pelos serviços prestados durante a execução do
testamento, ele deverá ser fixado pelo testador ao confeccionar o testamento, caso
não tenha sido definido caberá ao juiz arbitrá-lo no processo de inventário a pedido
do testamenteiro.

44
TÓPICO 2 — DA SUCESSÃO LEGÍTIMA E DA SUCESSÃO TESTAMENTÁRIA

Entretanto, o testamenteiro herdeiro ou legatário, terá que optar entre


a herança, o legado ou a vintena (prêmio), conforme artigo n° 1.988 do Código
Civil. Caso o testamenteiro seja o cônjuge meeiro, participando da herança, terá
também o direito a vintena.

Caso o testamenteiro não desempenhe adequadamente sua função,


cumprindo o testamento, prejudicando os herdeiros ou legatários, ou for
removido de seu cargo, reverterá à herança o prêmio a que tinha direito.

Os artigos nos 735 a 737 do Código de Processo Civil tratam do processo de


abertura, registro e cumprimento do testamento.

NOTA

A aplicação do Princípio Locus Regit Actum (ato regido pela lei do local onde
foi celebrado) estava presente no artigo 11 da lei anterior de Introdução às Normas do
Direito Brasileiro, não sendo repetida pela lei atual. Este princípio, ainda em uso, é aplicado
para os atos celebrados no exterior, devendo ser observadas as formalidades externas de
validade local. Assim o testamento realizado em outro país, regido pelas leis locais, também
terá validade para os bens existentes em solo brasileiro quando a forma for admitida pela
legislação pátria e não ferir a soberania, os bons costumes ou a ordem interna nacional
(FARIA, 2017, p. 172).

No subtópico a seguir iniciaremos o estudo das modalidades de


testamento.

3.2 DAS MODALIDADES ORDINÁRIAS DE TESTAMENTO


Dispõe o artigo n° 1.862 do Código Civil sobre testamentos ordinários:
Art.1.862. São testamentos ordinários:
I- o público;
II- o cerrado;
III- o particular.

Seguindo a ordem legal, trataremos primeiro do testamento público, a


forma mais comum e mais segura para o testador.

• Testamento público

Por ser público, qualquer pessoa terá acesso ao seu conteúdo, o testamento
público não necessitará de sua confirmação em juízo. Ele está previsto no artigo
n° 1.864 do Código Civil, vejamos os seus requisitos formais:

45
UNIDADE 1 — DIREITO DAS SUCESSÕES

Art.1.864. São requisitos essenciais do testamento público:


I- ser escrito por tabelião ou por seu substituto legal em seu livro
de notas, de acordo com as declarações do testador, podendo este
servir-se de minuta, notas ou apontamentos;
II- lavrado o instrumento, ser lido em voz alta pelo tabelião ao
testador e a duas testemunhas, a um só tempo; ou pelo testador, se
o quiser, na presença destas e do oficial;
III- ser o instrumento, em seguida à leitura, assinado pelo testador,
pelas testemunhas e pelo tabelião.
Parágrafo único. O testamento público pode ser escrito manualmente
ou mecanicamente, bem como ser feito pela inserção da declaração de
vontade em partes impressas de livro de notas, desde que rubricadas
todas as páginas pelo testador, se mais de uma.

A pessoa muda (que não fala) não poderá fazer testamento público, tendo
em vista que ele é realizado de viva voz, entretanto, o indivíduo inteiramente
surdo, quando souber ler, lerá seu testamento, caso não saiba ler, designará
alguém para tal fim e deverá ser acompanhado de duas testemunhas (art. n° 1.866
do Código Civil).

Quando se tratar de pessoa analfabeta (art. n° 1.865), ou cega (art.
n° 1.867) a forma obrigatória de validade será a do testamento público,
igualmente será necessária a presença de duas testemunhas e uma delas
assinará o testamento a rogo.

Após realização do testamento público, o Oficial de Notas deverá


comunicar a realização dele ao Ofício de Registro de Distribuição, determinado
pelo Código de Organização e Divisão Judiciária Estadual. O oficial irá entregar
ao testador uma certidão do ato, caso essa se perca, poderá solicitar uma nova.

• Testamento cerrado

O testamento cerrado é também conhecido como testamento secreto ou


místico, está previsto no artigo n° 1.868 do Código Civil, vejamos as formalidades
necessárias para sua confecção:

Art. 1.868. O testamento escrito pelo testador, ou por outra pessoa, a


seu rogo, e por aquele assinado, será válido se aprovado pelo tabelião
ou seu substituto legal, observadas as seguintes formalidades:
I- que o testador o entregue ao tabelião em presença de duas
testemunhas;
II- que o testador declare que aquele é o seu testamento e quer que
seja aprovado;
III- que o tabelião lavre, desde logo, o auto de aprovação, na
presença de duas testemunhas, e o leia, em seguida, ao testador e
testemunhas;
IV- que o auto de aprovação seja assinado pelo tabelião, pelas
testemunhas e pelo testador. Parágrafo único. O testamento
cerrado pode ser escrito mecanicamente, desde que seu subscritor
numere e autentique, com a sua assinatura, todas as páginas.

46
TÓPICO 2 — DA SUCESSÃO LEGÍTIMA E DA SUCESSÃO TESTAMENTÁRIA

Não é uma modalidade muito utilizada, mas a sua principal vantagem


é ter sigilo absoluto sobre seu conteúdo, posto que nem mesmo o tabelião e as
testemunhas terão conhecimento sobre seus termos.

O testamento cerrado poderá ser escrito em qualquer língua nacional ou


estrangeira, pelo próprio testador ou por terceiro a seu rogo, porém, não poderá
dispor de seus bens em testamento cerrado, aquele que não saiba ler (art. nos 1.871
e 1.872 do Código Civil).

O surdo-mudo poderá fazer o testamento cerrado, deste que o redija de


próprio punho e o assine, em seguida deverá entregar ao oficial público, perante
duas testemunhas e deverá escrever na parte externa do documento que aquele é
seu testamento e pede aprovação.

Quando o testador vier a falecer, aquele que tenha conhecimento da


existência do testamento, deverá apresentá-lo em juízo, requerendo a sua
abertura. Será determinada audiência para tal ato, intimando-se o apresentante e
demais interessados, se não encontrar vício externo que o torne nulo ou suspeito
de falsidade, o juiz determinará seu cumprimento.

• Testamento particular ou hológrafo

O Testamento Particular está previsto nos artigos nos 1.876 a 1.880 do


Código Civil, esta forma de testar deve ser escrita pelo próprio testador, de
próprio punho ou processo mecânico. Para ter validade, se escrito de próprio
punho, deverá ser lido perante três testemunhas que irão subscrevê-lo e assinado
pelo testador. A forma mecânica não poderá conter rasuras nem espaços em
branco e também terá as formalidades exigidas ao escrito de próprio punho.

Após o falecimento do testador, o testamento particular deverá ser


confirmado em juízo. O testamento será confirmado se as testemunhas afirmarem
sobre o fato da disposição ou sobre a leitura perante elas do testamento e
reconhecerem suas próprias assinaturas. O testamento também poderá ser
confirmado se houver, ao menos, uma das testemunhas presentes no ato, quando
por ausência ou morte das demais.

Para ter maior segurança, o testamento deverá conter o máximo de


informações acerca dos dados pessoais das testemunhas, facilitando sua
confirmação posteriormente, já que o testamento particular não terá eficácia com
a morte do testador, mas sim pela sua confirmação através das testemunhas.

47
UNIDADE 1 — DIREITO DAS SUCESSÕES

3.3 DAS MODALIDADES ESPECIAIS DE TESTAMENTO


As modalidades de testamentos especiais são: testamento marítimo,
testamento aeronáutico e o testamento militar e estão reguladas pelos artigos nos
1.888 até 1.896 do Código Civil.

Estas formas de testamento devem ser utilizadas apenas quando não seja
possível efetuar as modalidades convencionais, ou seja, deverão ser utilizados
apenas em casos emergências, como viagens em geral, missões de guerra ou
qualquer outra atividade que seja exercida nestes meios e o testador esteja sob
risco de morte.

Os testamentos especiais poderão ser realizados no formato do testamento


público ou do testamento cerrado.

Os testamentos marítimo e aeronáutico poderão ser elaborados perante o


comandante na presença de duas testemunhas, ele será registrado no diário de
bordo. O testamento realizado desta forma ficará na posse do comandante que o
entregará à autoridade administrativa do primeiro porto ou aeroporto nacional
que aterrissarem ou atracarem.

Ambos os testamentos possuem validade, o documento caducará caso o


testador não vier a falecer durante a viagem ou após os noventa dias seguintes ao
término da viagem com desembarque em terra firme, em que poderá proceder as
formas ordinárias de testamento.

Igualmente não será válido o testamento especial marítimo, quando


a tempo a embarcação estava em porto e o testador poderia testar pela forma
ordinária.

Tratando do testamento militar, ele poderá ser elaborado pelas pessoas


a serviço das Forças Armadas em campanha, dentro ou fora do país. Poderá ser
realizado quando ausente tabelião ou seu substituto legal, perante duas pessoas,
que serão testemunhas ou quando o testador não souber assinar, perante três
testemunhas e uma delas assinará por este.

Esse testamento poderá assumir três formas: a do testamento público, do


testamento cerrado e a do nuncupativo.

O testamento na forma nuncupativo será feito de viva voz perante


duas testemunhas, quando empenhadas em combate ou feridas. Essa forma é
polêmica por gerar a possibilidade de adulteração da real vontade do testador
(GONÇALVES, 2010, p. 89).

48
TÓPICO 2 — DA SUCESSÃO LEGÍTIMA E DA SUCESSÃO TESTAMENTÁRIA

Essa modalidade de testamento especial também possui validade. Ele


caduca em noventa dias a contar da data em que o testador esteja em local em
que possa realizar o testamento na forma ordinária. Terá exceção e será válido, se o
testamento apresentar as formalidades presentes no parágrafo único do artigo n°
1.894 do Código Civil, vejamos:
Art. 1.894. Se o testador souber escrever, poderá fazer o testamento
de seu punho, contanto que o date e assine por extenso, e o
apresente aberto ou cerrado, na presença de duas testemunhas ao
auditor, ou ao oficial de patente, que lhe faça as vezes neste mister.
Parágrafo único. O auditor, ou o oficial a quem o testamento se apresente
notará, em qualquer parte dele, lugar, dia, mês e ano, em que lhe for
apresentado, nota esta que será assinada por ele e pelas testemunhas.

O testamento não terá mais validade se o testador não vier a falecer na


guerra ou convalescer do ferimento sofrido.

Todas estas modalidades de testamento estão previstas no código civil
como já dito, porém, há uma nova forma de testamento, ou com uma melhor
definição, uma nova forma de declaração de vontade por meio de instrumento
público, que não está prevista em lei, mas que será aceita se respeitar determinada
forma, o chamado testamento vital.

O testamento vital será um documento que conterá as disposições de
vontade do paciente sobre a forma que deseja receber tratamento em vida, por
seus familiares, médicos, enfermeiros, e demais profissionais da saúde que o
assistam, quando acometido por doença terminal.

O documento deverá ser escrito e formalizado através de escritura pública,
também aceitando a forma particular, de preferência com duas testemunhas,
poderá ser refeito quantas vezes o testador desejar a fim de expor sua vontade.

O Conselho Federal de Medicina, pela Resolução n° 1995/2012,


regulamentou o testamento vital pelo tema “Diretivas antecipadas de vontade”
de pacientes.

Faria (2017, p. 184) sustenta que o declarante dever estar assessorado:

[...] o declarante deverá ser assessorado por um médico, devendo


o documento conter os aspectos relativos ao tratamento que deseja
ter, a utilização ou não de meios mecânicos ou máquinas, a recusa
de tratamentos fúteis que somente visem o prolongamento de sua
vida e a utilização de cuidados paliativos destinados a diminuir o
seu sofrimento.

Acadêmico, terminamos os estudos sobre as modalidades de testamento.


Todavia, resta estudarmos uma modalidade de disposição de vontade também
relevante: o codicilo.

49
UNIDADE 1 — DIREITO DAS SUCESSÕES

3.4 DO CODICILO
O codicilo está presente no artigo n° 1.881 do Código Civil, assim:

Art. 1.881. Toda pessoa capaz de testar poderá, mediante escrito


particular seu, datado e assinado, fazer disposições especiais sobre o
seu enterro, sobre esmolas de pouca monta a certas e determinadas
pessoas, ou, indeterminadamente, aos pobres de certo lugar, assim
como legar móveis, roupas ou joias, de pouco valor, de seu uso pessoal.

Observe que o codicilo não é um testamento, mas tem como função dispor
sobre bens de pequeno valor, é o instrumento em que o testador define os detalhes
de seu funeral, sobre pequenos valores destinados aos pobres.

Assim, o codicilo, como espécie de ato de disposição de vontade, volta-se


a tratar de objetos de pequena monta, considerado assim pela doutrina como bens e
disposições que correspondam ao máximo 10% do patrimônio do testador. Nesse
sentido, o professor Flávio Tartuce (2020, p.1849) define codicilo como “’pequeno
escrito, ato de última vontade simplificado, para o qual a lei não exige maiores
formalidades em razão de ser o seu objeto considerado de menor importância
para o falecido e para os herdeiros”.

No codicilo também poderá ser nomeado e estabelecer a substituição de


testamenteiros (art. n° 1.883, CC/02).

ATENCAO

O art. 1.885 do CC/02 determina que caso o codicilo esteja fechado, ele será
aberto do mesmo modo que o testamento fechado, ou seja, perante o juiz (art. n° 1.875).

Ademais, acadêmico, saiba que o codicilo poderá ser revogado por outro,
poderá também ser revogado caso sobrevenha testamento posterior que não o
confirme nem o modifique, conforme disposição expressa do artigo n° 1.884 do
Código Civil.

50
TÓPICO 2 — DA SUCESSÃO LEGÍTIMA E DA SUCESSÃO TESTAMENTÁRIA

E
IMPORTANT

Perceba que o codicilo valerá independentemente do morto ter deixado


herança ou não, o que pode ocorrer é do testamente feito posteriormente não confirmar
o codicilo, ai, sim, este perderá a validade.

Finalizado o estudo sobre os codicilos, passemos a estudar as disposições


testamentárias.

3.5 DAS DISPOSIÇÕES TESTAMENTÁRIAS


O testador ao realizar seu testamento poderá definir as disposições sobre
seus bens, “instituindo herdeiros ou legatários, seja de forma pura e simples
ou mediante determinadas circunstâncias de condições, encargo ou causa”
(AMORIM; OLIVEIRA, 2020, p. 243).

As disposições testamentárias estão previstas nos artigos nos 1.897 a 1.911
do Código Civil.

Para além das disposições patrimoniais, o testador também poderá incluir


disposições de caráter não patrimonial, conforme disposto no artigo n° 1.857, §
2° do Código Civil. Assim, conforme vimos na unidade anterior, é possível que o
testador proceda ao reconhecimento de filho havido fora do casamento por meio
de testamento (inciso III, art. n° 1.609).

Teremos também as chamadas cláusulas restritivas testamentárias, que
impõem uma restrição a quem recebe o bem, perdurando por uma geração, salvo
se o testador estabelecer por prazo menor. São as cláusulas de impenhorabilidade,
incomunicabilidade e inalienabilidade.

Por oportuno, saiba que a cláusula de inalienabilidade faz presumir a


existência das outras duas, mas o contrário não é verdadeiro (art. n° 1.911).

Por fim, é importante saber que, de acordo com o art. n° 1848 do Código
Civil, excepcionalmente, o testador pode impor uma cláusula restritiva à legítima,
desde que indique justa causa e que esta seja provada.

Seguiremos nossos estudos tratando agora da temática dos legados.

51
UNIDADE 1 — DIREITO DAS SUCESSÕES

3.6 DOS LEGADOS


Conforme estudamos até aqui, o testador ao efetuar o seu testamento, por
força da autonomia de vontade, definirá quais os bens que caberão a determinado
herdeiro ou terceiro que queira beneficiar, observando as regras gerais já
estudadas. O legado é o ato de delimitar bens específicos da herança, podendo
ser realizado em favor de uma ou várias pessoas.

É pertinente destacar o esclarecimento da professora Giselda Maria


Fernandes Novaes Hironaka (2007, p. 322-323) sobre a temática:

Entende-se o legado – segundo o direito brasileiro – como a atribuição


de certo ou certos bens a outrem por meio de testamento e a título
singular. Envolve, assim, uma sucessão causa mortis que produzirá
efeitos apenas com o falecimento do testador. Consiste, sem dúvida,
numa liberalidade deste para com o legatário, o que não exige dizer
que se deva sempre traduzir em benefício para este último, já que pode
ocorrer a vir ser o legado pelos encargos que o acompanham ou mesmo
vir a se converter num ônus pesado demais para quem o recebe.

Neste momento, vamos estudar as regras gerais sobre os legados.

Será ineficaz o legado de coisa certa que não pertença mais ao testador no
momento da abertura da sucessão (artigo n° 1.912 CC).

O testador poderá estabelecer o legado, condicionando a entrega de


determinada coisa de propriedade do herdeiro ou legatário, caso não haja
cumprimento do estabelecido, será entendido como uma renúncia à herança ou
ao legado (artigo n° 1.913 CC).

Acadêmico, por oportuno, saiba que a hipótese na qual o testador ordena


que o herdeiro ou legatário entregue coisa de sua propriedade a outrem é
denominada pela doutrina como sublegado (TARTUCE, 2020, p. 1.788).

Usaremos a lista de Sebastião Amorim e Euclides de Oliveira (2020, p. 258-
259) para destacar brevemente as espécies de legado previstas no Código Civil:

• Legado de coisa comum, que valerá somente na parte que pertencer


ao testador (art. n° 1.914 do CC).
• Legado de coisa fungível, que valerá ainda que a coisa não exista
entre os bens deixados pelo testador (art. n° 1.915 do CC).
• Legado de coisa singularizada, que só valerá se existir entre os bens
do testador (art. n° 1.916 do CC).
• Legado de crédito ou de quitação de dívida (art. n° 1.918 do CC).
• Legado de alimentos, destinado ao sustento, cura, vestuário e casa
do legatário, enquanto viver, além da educação, se for menor (art.
n° 1.920 do CC).
• Legado de usufruto, que pode ser temporário ou vitalício (assim se
entendendo se não houver fixação de tempo (art. n° 1.921 do CC).
• Legado em dinheiro (art. n° 1.9215 do CC),
• Legado de renda vitalícia ou pensão periódica (art. n° 1.926 do CC).
• Legado alternativo, com opção deixada ao legatário (art. n° 1.931 do
CC) ou com a presunção de opção pelo herdeiro (art. n° 1.932 do CC).

52
TÓPICO 2 — DA SUCESSÃO LEGÍTIMA E DA SUCESSÃO TESTAMENTÁRIA

Por fim, conforme artigo n° 1.939 do Código Civil, os legados caducarão


quando ocorrer a modificação substancial da coisa legada, pela alienação da
coisa legada, se a coisa perecer ou por evicção, ainda, se o legatário indigno, for
excluído da sucessão, e, caso o legatário venha a falecer antes do testador.

Dessa forma, concluímos mais um tópico sobre o Direito das Sucessões.


Agora, seguimos rumo as nossas últimas notas sobre a matéria, com a temática
sobre o INVENTÁRIO E A PARTILHA!

53
RESUMO DO TÓPICO 2
Neste tópico, você aprendeu que:

• A sucessão legitima que ocorre quando o falecido, autor da herança, deixa seus
bens para serem partilhados entre os membros de sua família, respeitando as
leis que regulam a sucessões e sucessão testamentária, é tratada nos artigos nos
1.857 a 1.990, do Código Civil.

• Na sucessão legitima serão chamados primeiramente os descendes do


falecido, quando não houver descendentes, serão chamados a suceder os seus
ascendentes, em concorrência com o cônjuge/companheiro sobrevivente e, na
falta de todos estes, serão chamados os herdeiros colaterais.

• A polêmica a inconstitucionalidade do artigo n° 1.790 do Código Civil, por


discriminar o companheiro na ordem da vocação hereditária, equipara
atualmente os direitos da companheira aos do cônjuge sobrevivente.

• O testamento, ato pelo qual o testador manifesta sua própria vontade sobre
a disposição de seus bens após a sua morte, deve respeitar a parte legitima
destinada aos herdeiros necessários, que importa em metade da totalidade de
seus bens.

• As formas legais de testamento, os ordinários, são compostas pelo testamento


público, cerrado e particular, e as formas extraordinárias compostas pelo
testamento marítimo e aeronáutico e militar, e a possibilidade de realizar
o testamento vital, não reconhecido pelo Código Civil, mas que poderá ser
realizado desde que cumpridas certas formalidades.

54
AUTOATIVIDADE

1 Quais as formas ordinárias de testamento?

2 O que é o codicilo?

3 Sobre o testamento marítimo, é CORRETO afirmar que:

a) ( ) Não necessita ser registrado no diário de bordo.


b) ( ) Será feito na presença de duas testemunhas, por forma que corresponda
ao testamento público ou cerrado.
c) ( ) Ficará sob a guarda de uma das testemunhas, que o entregará às
autoridades administrativas do primeiro porto nacional.
d) ( ) Será válido se, ao tempo em que se fez, o navio estava em porto onde o
testador pudesse desembarcar e testar de forma ordinária.

4 Toda pessoa capaz pode elaborar testamento, como disposição de última


vontade. Sobre este assunto, leia as sentenças a seguir:

I- Aquele que possui herdeiros necessários pode dispor apenas de metade


de seu patrimônio.
II- Se o testamento ultrapassar a parte disponível, será rompido na sua
totalidade.
III- É sempre necessário que no testamento seja individualizado quem são os
herdeiros e quais bens específicos receberão.
IV- Caso um herdeiro nomeado por testamento seja pré-morto, os seus
descendentes poderão representar a sua parte na sucessão.

Assinale a alternativa CORRETA:


a) ( ) São verdadeiras apenas as assertivas I e IV.
b) ( ) São verdadeiras apenas as assertivas I, III e IV.
c) ( ) Apenas a assertiva I é verdadeira.
d) ( ) São verdadeiras apenas as assertivas I, II e IV.

55
56
TÓPICO 3 —
UNIDADE 1

DO INVENTÁRIO E DA PARTILHA

1 INTRODUÇÃO
Enfim chegamos ao último tópico da Unidade 1! Nele estudaremos a
forma prática do Direito das Sucessões, trataremos do processo de inventário e da
conclusão deste procedimento com a efetiva partilha dos bens do falecido entre
seus herdeiros e legatários.

O inventário e a partilha são tratados pelo Código Civil nos dispositivos nos
1.991 a 1.996. Após o falecimento do autor da herança, com a abertura automática
da sucessão e a transmissão automática dos bens aos herdeiros legítimos e
testamentários, deverá dar-se início ao inventário.

O inventário é o processo instaurado com o objetivo de se apurar quais


foram os bens deixados pelo falecido, para posteriormente realizar a partilha
entre os herdeiros. Consiste, portanto, na descrição pormenorizada dos bens
da herança, tendente a possibilitar o recolhimento de tributos, o pagamento de
credores e, por fim, a partilha entre os herdeiros do de cujus.

Traçado tal contexto, passemos ao estudo pormenorizado dos


importantes institutos do inventário e da partilha para finalizarmos nossa
análise sobre direito sucessório.

Então, mãos à obra!

2 DO INVENTÁRIO
A palavra inventário vem da expressão latina invenire, que significa
“encontrar”, “localizar”. É importante localizar os bens do autor da herança, pois
ela é transmitida automaticamente pelo princípio da saisine, previsto no art. n°
1.784 do Código Civil.

Em decorrência da transmissão automática, a saisine é cega: ela


transmite todo o patrimônio para todos os herdeiros, indiscriminadamente,
independentemente de suas quotas e estas têm de ser individualizadas.

57
UNIDADE 1 — DIREITO DAS SUCESSÕES

Como exemplo, temos os bens imóveis do falecido que passarão


automaticamente para os herdeiros e testamentários, entretanto, somente após
o inventário e partilha, com o formal de partilha é que poderão serem feitos os
registros dos atuais proprietários no registro de imóveis, conforme disposição
legal da Lei de Registros Públicos.

Todas as relações patrimoniais do falecido (créditos, débitos, direitos


reais etc.) são transmitidas automaticamente e formarão uma massa patrimonial,
denominada de herança, que terá como características ser universal, imóvel e
indivisível.

A herança é representada pelo espólio, em juízo e fora dele, o qual


precisará ser partilhado, justamente por ter como característica a universalidade.

O procedimento de inventário e partilha é aquele necessário e adequado


para a divisão do espólio (da representação da herança) entre os herdeiros e os
legatários e para o pagamento das dívidas do falecido. Os herdeiros, os legatários
e os credores do falecido serão, portanto, diretamente interessados no inventário.

Assim, o inventário é o procedimento de jurisdição contenciosa ou


administrativo pelo qual são pagos os legados e as dívidas do falecido e,
posteriormente, partilhada a herança.

O inventário é dividido em duas fases:

• Fase da inventariança: fase em que se faz o levantamento (apuração) do patrimônio


transmitido, a indicação dos sucessores e o pagamento das dívidas e tributos.
• Fase da partilha: fase em que ocorre a divisão do patrimônio transmitido entre
os interessados (herdeiros e legatários).

Existe uma clara prejudicialidade entre as fases do inventário, posto que


só poderá falar em partilha após o levantamento do patrimônio e efetuado o
pagamento das dívidas e de tributos.

Assim, o inventário é um procedimento bifásico e escalonado. Isso


porque ele necessariamente passa por duas fases distintas, a de enumeração e
divisão dos bens.

Quando houver apenas um herdeiro, este será chamado de herdeiro


universal. O herdeiro universal receberá a totalidade da herança mediante auto
de adjudicação e não de partilha, sendo o ato lavrado em inventário.

58
TÓPICO 3 — DO INVENTÁRIO E DA PARTILHA

2.1 DO INVENTÁRIO JUDICIAL


O Código de Processo Civil regula e divide os ritos de inventário judicial,
bem como introduz a possibilidade de realização do inventário extrajudicial que
será abordado no tópico seguinte. Trataremos agora do rito ordinário e sumário
de arrolamento de bens, inventário e partilha de bens do falecido.

Primeiro trataremos do rito ordinário, que é regulado pelos artigos 611 e
seguintes do Código de Processo Civil.

Este rito deverá ser adotado quando houver herdeiros menores de idade
ou incapazes, ou quando os herdeiros não entrarem em um acordo quanto à
partilha de bens do falecido.

O rito ordinário também poderá ser o escolhido caso os herdeiros estejam
em acordo quanto a partilha, sejam maiores e capazes. Caso seja este cenário o
existente, será menos oneroso e mais célere optarem pelo inventário extrajudicial.

O rito ordinário será mais longo e mais oneroso, um perito judicial avaliará
os bens, os cálculos serão realizados pelo contador judicial, a partilha poderá
ser realizada pelo Partidor Judicial ou, quando em acordo, pelos interessados,
herdeiros ou legatários, quando maiores de idade e capazes. Serão admitidos
também, durante o processo, o requerimento da venda de bens do espólio e o
levantamento dos valores obtidos. Igualmente, o Ministério Público deverá tomar
ciência de todos os atos praticados (FARIA, 2017, p. 234).

• Organograma do rito ordinário


◦ Petição de abertura e pedido de nomeação de inventariante.
◦ Despacho nomeando inventariante.
◦ Termo de inventariante.
◦ Primeiras declarações ou declaração de bens e herdeiros.
◦ Audiência dos interessados e fiscais sobre as primeiras declarações.
◦ Avaliações dos bens.
◦ Vistas aos fiscais.
◦ Declarações finais.
◦ Termos de ratificação das declarações finais.
◦ Cálculo do imposto causa mortis.
◦ Audiência dos interessados e fiscais sobre o cálculo.
◦ Homologação do cálculo do imposto causa mortis.
◦ Pagamento do imposto de transmissão causa mortis.
◦ Partilha ou adjudicação.
◦ Juntada das certidões fiscais
◦ Audiência dos interessados e fiscais sobre a partilha.
◦ Homologação da partilha ou adjudicação.
◦ Ciência da partilha aos fiscais.
◦ Expedição do formal de partilha, carta de adjudicação e alvarás
(FARIA, 2017, p. 234).

59
UNIDADE 1 — DIREITO DAS SUCESSÕES

Caso o de cujus tenha deixado testamento, ele deverá primeiramente


ser registrado por sentença com a juntada da certidão autêntica fornecida pelo
Cartório da Vara. A abertura do inventário caberá àquele que estiver na posse
e na administração dos bens (art. n° 625 do CPC), dentro do prazo de 2 (dois)
meses, a contar da data de abertura da sucessão, todavia, o juiz poderá prorrogar
estes prazos de ofício, ou a requerimento da parte (art. n° 611 do CPC).

Também terá legitimidade para requerer a abertura do inventário e partilha
as seguintes pessoas previstas no artigo n° 616 do Código de Processo Civil.

Art. 616. Têm, contudo, legitimidade concorrente:


I- o cônjuge ou companheiro supérstite;
II- o herdeiro;
III- o legatário;
IV- o testamenteiro;
V- o cessionário do herdeiro ou do legatário;
VI- o credor do herdeiro, do legatário ou do autor da herança;
VII- o Ministério Público, havendo herdeiros incapazes;
VIII- a Fazenda Pública, quando tiver interesse;
IX- o administrador judicial da falência do herdeiro, do legatário, do
autor da herança ou do cônjuge ou companheiro supérstite.

Portanto, qualquer dessas pessoas descritas no artigo n° 616, após


transcorrido o prazo do artigo n° 611, poderão requerer a abertura do inventário,
sem a necessidade de respeitar a ordem estabelecida em lei.

Abordaremos agora o rito de arrolamento sumário. Esse rito foi
instituído pela Lei n° 7.019 de 1982, que deu nova redação ao então Código
de Processo Civil vigente na época, tendo como objetivo simplificar e dar
celeridade ao processamento do inventário. Esse rito é regulado pelos artigos
nos 659 e seguintes do atual Código de Processo Civil, que também regulará o
rito de arrolamento comum.

O rito de arrolamento sumário terá como exigência que as partes sejam
capazes e estejam em acordo quanto à partilha dos bens da herança e que o
falecido não tenha deixado testamento.

Vejamos a redação do artigo n° 659 do Código de Processo Civil: “Art.


659. A partilha amigável, celebrada entre partes capazes, nos termos da lei, será
homologada de plano pelo juiz, com observância dos arts. 660 a 663”.  

Não importará o valor total dos bens da herança para escolher o rito de
arrolamento sumário, neste rito não serão realizadas avaliações, mas sim que
todos os herdeiros e interessados sejam maiores e capazes e que não haja conflito
entre eles. O critério, aqui, é subjetivo, diversamente do critério adotado para o
arrolamento comum.

60
TÓPICO 3 — DO INVENTÁRIO E DA PARTILHA

Como não há conflito, não há necessidade de se julgar a partilha, que é


apenas homologada pelo juiz, exigindo-se, porém, a comprovação do recolhimento
fiscal. Os interessados, com a petição inicial, apresentam a proposta de partilha e
comprovam o recolhimento do imposto, cabendo ao juiz homologar a proposta
apresentada. Cumpre salientar que tal disposição foi mantida no artigo n° 659,
Código de Processo Civil.

Por todos os interessados serem maiores e capazes; e em acordo com a
partilha, não existindo conflito de interesses, não haverá intervenção do Ministério
Público, em virtude da ausência de interesse público.

Por ser meramente homologatória a sentença, não se admitirá contra ela
o ajuizamento de ação rescisória. Com a dispensa da intervenção do Ministério
Público, no rito de arrolamento sumário, será dispensada a citação da Fazenda
Pública, porém deverá ser cientificada da sentença homologatória. A dispensa
ocorre por ser a petição inicial instruída com prova de recolhimento do imposto
de transmissão causa mortis.

Como mencionado anteriormente, se todos os requisitos para o


arrolamento sumário forem cumpridos, por não precisarem ingressar em juízo,
poderão os herdeiros optar por realizarem o inventário em Cartório de Notas,
sendo uma opção mais econômica e rápida.

Já o arrolamento comum que está previsto no artigo n° 664 do Código de
Processo Civil é destinado ao inventário que contenha bens cujo valor seja igual e
não ultrapasse 1.000 salários-mínimos.

Deverá o inventariante nomeado apresentar, através de suas declarações,
os valores atribuídos aos bens do espólio e o plano de partilha. Caso alguma
das partes ou o Ministério Público não concorde com os valores apresentados,
será nomeado pelo juiz um avaliador para apresentar laudo de avaliação dos
bens no prazo de 10 (dez) dias. Após avaliação, será designada audiência e o Juiz
deliberará sobre a partilha dos bens.

No arrolamento comum será possível ainda, mesmo que haja herdeiro
incapaz e desde que concordem com todas as partes e o Ministério Público, a
conversão do rito em arrolamento sumário, mais célere, inovação trazida pelo
novo Código de Processo Civil em seu artigo n° 665.

61
UNIDADE 1 — DIREITO DAS SUCESSÕES

ATENCAO

O provimento n° 56, de 14 de julho de 2016, do Conselho Nacional de Justiça,


estabeleceu em seu artigo 2° ser “obrigatório para o processamento dos inventários e
partilhas judiciais, bem como para lavrar escrituras públicas de inventário extrajudicial, a
juntada de certidão acerca da inexistência de testamento deixado pelo autor da herança,
expedida pela CENSEC – Central Notarial de Serviços Compartilhados.

A seguir, prosseguiremos na análise da forma extrajudicial de inventário.

2.2 DO INVENTÁRIO EXTRAJUDICIAL


A Lei n° 11.441 de 4 de janeiro de 2007 introduziu a possibilidade de
realização de inventário extrajudicial, também chamado de administrativo e
notarial, por meio de escritura pública. A lei alterou a redação dos antigos artigos
nos 982 e 983 do antigo Código de Processo Civil de 1973, passando a estarem nos
artigos 610 e 611 do Novo Código de Processo Civil de 2015. Vejamos o artigo n°
610 do novo CPC/2015:

Art. 610. Havendo testamento ou interessado incapaz, proceder-se-á


ao inventário judicial.
§ 1° Se todos forem capazes e concordes, o inventário e a partilha
poderão ser feitos por escritura pública, a qual constituirá documento
hábil para qualquer ato de registro, bem como para levantamento de
importância depositada em instituições financeiras.
§ 2° O tabelião somente lavrará a escritura pública se todas as partes
interessadas estiverem assistidas por advogado ou por defensor
público, cuja qualificação e assinatura constarão do ato notarial.

Poderá ser realizado o inventário extrajudicial quando todas as partes


forem maiores de idade, capazes e estejam em acordo quanto à partilha dos bens
da herança e o falecido não tenha deixado testamento. O testamento extrajudicial é
facultativo e as partes poderão eleger a via judicial, caso queiram, por aparentar
maior segurança.

O inventário extrajudicial tem como objetivo facilitar a transmissão de


bens ao dar celeridade por possuir uma forma mais simples, sem a necessidade de
buscar o judiciário. Será realizado no Ofício de Notas, por ato do Tabelião, que irá
“chancelar a partilha amigavelmente acordada entre o meeiro (a) e os herdeiros e o
recolhimento dos impostos devidos (AMORIM; OLIVEIRA, 2020, p. 440).

62
TÓPICO 3 — DO INVENTÁRIO E DA PARTILHA

As principais características e requisitos do inventário extrajudicial são:

• Herdeiros maiores e capazes.


• Herdeiros acordados quanto à partilha dos bens da herança do falecido.
• Inexistência de testamento deixado pelo falecido.
• Serem assistidos por um advogado, este profissional poderá representar todas
as partes.
• Adjudicação do bem quando só existir um herdeiro e este seja maior de idade e
capaz, podendo ser feito diretamente através de escritura pública de inventário.
• Escritura de inventário judicial poderá ser utilizada como título hábil para
transferência de bens.

O inventário extrajudicial poderá ser lavrado em qualquer tabelião de


notas, onde residam os herdeiros, ou estejam localizados os bens do falecido,
conforme artigo 8° da Lei n° 8.935/1994 que trata dos Serviços Notariais e de
Registros.

E
IMPORTANT

O artigo 8° da Lei n° 8.935/94, que dispões sobre Serviços Notariais de Registro,


estipula ser livre a escolha de qual tabelionato de notas, qualquer que seja o domicílio
das partes ou local dos bens a serem inventariados. Porém, o legislador estabeleceu no
caput do artigo 48 do CPC, em havendo ação de impugnação ou anulação da partilha
extrajudicial, o foro competente será o do domicílio do inventariado.

Para a confecção do inventário extrajudicial será aplicada as mesmas


regras que regem o inventário judicial, como a aplicação da lei vigente na data
do óbito do falecido, deverá ser apresentado ao Tabelião todos os documentos
que comprovem a legitimidade dos herdeiros para suceder, bem como as que
comprovem a propriedade dos bens a inventariar.

Será aplicada lei estrangeira na escritura de inventário quando o autor da


herança era domiciliado no exterior, conforme artigo n° 10 da Lei de Introdução
às Normas do Direito Brasileiro. O inventário será lavrado no Brasil, caso os bens
do falecido se localizem em solo pátrio, mas deverão ser observadas as leis que
regem a sucessão e partilha do país em que o falecido era domiciliado e, se fosse
casado, deverão ser observadas as leis que tocam os direitos do cônjuge vivo.

63
UNIDADE 1 — DIREITO DAS SUCESSÕES

Deverá ser anexada ao processo de inventário realizado pelo Tabelião


de Notas a lei estrangeira que fundamenta o direito sucessório do país em que
residia o autor da herança, podendo ser obtida junto ao consulado, traduzida
para língua portuguesa, seguindo as formalidades previstas no artigo n° 192
do Código de Processo Civil e registrada no Registro de Títulos e documentos
(FARIA, 2017, p. 460).

O prazo para lavratura da escritura será o do artigo n° 611 do Código de


Processo Civil, ou seja, 2 (dois) meses para proceder a abertura do inventário e
12 (doze) meses para seu encerramento. O inventário extrajudicial só será lavrado
após o pagamento das taxas e impostos atrelados a sua realização, o principal será
o Imposto de transmissão causa mortis e doação, de competência estadual.

Os herdeiros deverão nomear um inventariante como representante legal


do espólio para representá-lo assim como é realizado no inventário judicial.

Caso o falecido não tenha deixado bens de qualquer espécie, poderá ser
realizado através de escritura pública, o chamado inventário negativo. Esse
instrumento poderá ser usado quando o cônjuge viúvo deseja casar-se novamente
pelo regime de comunhão de bens, devendo cumpri a exigência legal de informar
o óbito e a ausência de bens do de cujus. Poderá também ser realizado para cumprir
obrigação deixada pelo falecido, como outorga em escritura pública. E para
resguardar o patrimônio dos herdeiros, para que não respondam pelas dívidas
deixadas pelo falecido que não deixou bens a inventariar (FARIA, 2017, p. 461).

Poderá haver cumulação de inventários e partilhas também no inventário


extrajudicial, aplicando-se o artigo n° 672 do Código de Processo Civil:

Art. 672. É lícita a cumulação de inventários para a partilha de heranças


de pessoas diversas quando houver:
I- identidade de pessoas entre as quais devam ser repartidos os bens;
II- heranças deixadas pelos dois cônjuges ou companheiros;
III- dependência de uma das partilhas em relação à outra.

O Tabelião realizará os inventários respeitando a ordem cronológica dos


óbitos e assim a ordem das sucessões. Entretanto, caso haja comoriência, sendo
os mesmos herdeiros dos comorientes, as duas sucessões serão objetos da mesma
escritura pública (FARIA, 2017, p. 462).

O inventário iniciado pelo rito de arrolamento e ordinário poderão ser


realizados posteriormente por escritura pública, desde que não tenha ocorrido
o recolhimento do respectivo imposto e comunicando esta vontade ao juiz
requerendo a baixa dos autos de inventário judicial.

A aceitação da herança em escritura pública ocorre com a assinatura do


herdeiro, não podendo ser parcial, somente integral, já a renúncia da herança
deverá ser expressa no documento.

64
TÓPICO 3 — DO INVENTÁRIO E DA PARTILHA

A renúncia à herança só poderá beneficiar outro herdeiro, nunca um


estranho. Segundo Faria, poderá ocorrer a renúncia translativa em favor de
terceiro, também chamada de renúncia imprópria, o que corresponde a uma
verdadeira cessão de direitos hereditários e deverá assim ser tratada no inventário.
Desta forma o herdeiro aceitará a herança, recolherá o imposto de transmissão
causa mortis e, logo em seguida, o herdeiro renunciante transmitirá em favor de
terceiro beneficiário o seu quinhão. Este fato gerará o imposto inter vivos (FARIA,
2017, p. 463).

Poderá também ser realizado no inventário extrajudicial a cessão de


direitos hereditários, aos coerdeiros, demais herdeiros e terceiros, conforme
disposições previstas no artigo n° 1.793 e seguintes do Código Civil.

A união estável também poderá ser reconhecida no instrumento público de


inventário e no processo de inventário judicial, desde que os demais herdeiros
não se oponham.

No inventário por escritura pública também poderá ser feita a sobrepartilha


de bens que não compuseram o inventário judicial, ou extrajudicial, ou que não
era de conhecimento dos herdeiros na época da abertura da sucessão.

Finalizado o estudo das regras gerais do inventário, passaremos a nos


dedicar à análise dos bens sonegados e as penas imposta aos herdeiros que
sonegam bens.

2.3 DA PENA DOS SONEGADOS


Sonegados são os bens da herança ocultados por um herdeiro dos demais,
não os declarando no inventário e partilha. Tem esse herdeiro a intenção de obter
benefício próprio ao esconder este bem, que esteja em seu poder ou de terceiro, a
fim de não o partilhar com os demais.

O tema é previsto no artigo n° 621 do Código de Processo Civil e nos artigos


n 1.992 a 1.996 do Código Civil, a pena está prevista no seguinte artigo do CC:
os

Art. 1.992. O herdeiro que sonegar bens da herança, não os


descrevendo no inventário quando estejam em seu poder, ou, com o
seu conhecimento, no de outrem, ou que os omitir na colação, a que os
deva levar, ou que deixar de restituí-los, perderá o direito que sobre
eles lhe cabia.

Já no Código de Processo Civil em seu artigo n° 621 está escrito: “Art. 621.
Só se pode arguir sonegação ao inventariante depois de encerrada a descrição dos
bens, com a declaração, por ele feita, de não existirem outros por inventariar”.

65
UNIDADE 1 — DIREITO DAS SUCESSÕES

Serão considerados sonegados os bens:

• Não descritos no inventário, quando estejam em poder do herdeiro ou, com


ciência sua no de outrem.
• Omitidos pelo herdeiro que os tenha recebido em doação, quando sujeitos à
colação.
• Não restituídos pelo herdeiro, quando os tenha em seu poder (OLIVEIRA;
AMORIM, 2020, p. 335-336).

O herdeiro que sonegar bens perderá o direito sobre o bem sonegado e


se o bem não estiver sob sua posse, deverá restituir o valor equivalente ao bem e
arcar com as perdas e danos. Já o inventariante será removido da inventariança,
caso não seja meeiro nem herdeiro, se o for, também perderá o direito ao bem
sonegado. O testamenteiro por sua vez, ao sonegar bens da herança, perderá a
inventariança e o direito a vintena.

Como dita o artigo n° 1.992, essa pena só se aplica aos herdeiros, também
não será aplicada ao inventariante dativo ou judicial. Quem praticar a sonegação
de bens da herança estará sujeito à pena civil e à pena criminal pelo delito de
apropriação indébita (FARIA, 2017).

A ação de sonegados prescreverá em 10 anos e deverá ser ajuizada no


foro do inventário. São legitimados a sua propositura, os herdeiros legítimos,
testamentários e credores, também poderá cobrar os direitos fiscais sonegados a
Fazenda Pública.

No próximo subtópico, examinaremos os pagamentos das dívidas do de


cujus. Será que os herdeiros são obrigados a pagar as dívidas deixadas pelo de
cujus? Veremos a seguir!

2.4 DO PAGAMENTO DAS DÍVIDAS


As dívidas do de cujus serão pagas pela herança, após a realização da
partilha, os herdeiros responderão cada qual pela sua quota parte correspondente
na herança.

Os encargos da herança correspondem às despesas funerárias, à vintena


do testamenteiro, às dívidas do falecido e ao cumprimento dos legados. Somente
após o pagamento das dívidas do falecido, os bens e valores serão partilhados
entre os herdeiros.

66
TÓPICO 3 — DO INVENTÁRIO E DA PARTILHA

E
IMPORTANT

Os herdeiros não responderão pelos valores das dívidas que ultrapassem


o valor da herança, todavia, deverão fazer prova do excesso, salvo se estiver em curso
inventário que comprove tais alegações, conforme dita o artigo n° 1.792 do Código Civil.

Ademais, os legados podem ser atingidos e absorvidos com o pagamento


das dívidas quando não houver saldo suficiente. A todos os interessados na herança
compete o pagamento da dívida do espólio, entretanto não há solidariedade entre
eles, caso um efetue o pagamento, este poderá ingressar com ação regressiva
contra todos os outros, como previsto no artigo n° 1.999 do Código Civil.

Os credores do falecido poderão exigir por meio de habilitação no processo


de inventário o pagamento das dívidas do espólio.

NOTA

Espólio pode ser entendido como o conjunto de bens ou o patrimônio de


alguém que veio a falecer, é um ente despersonalizado, que representa a herança, em juízo
e fora dele, mas este ente será representado pela pessoa que administra a herança, ou seja,
o inventariante (artigo 12 do Código de Processo Civil).

Os credores poderão optar pela ação ordinária de cobrança ou ação de


execução contra devedor solvente. Os herdeiros também poderão separar os bens
para pagamento de dívidas e também autorizar a penhora no processo em que o
espólio for executado (art. n° 646 Código de Processo Civil).

Prosseguindo, trataremos do importante momento no inventário: da


colação.

67
UNIDADE 1 — DIREITO DAS SUCESSÕES

2.5 DA COLAÇÃO
Dentro desta temática traremos a lume dois subtópico, que são a Colação,
propriamente dita; e também a redução das doações inoficiosas, separadas
didaticamente para sua melhor compreensão.

• Colação

A Colação é o ato pelo qual os herdeiros descendentes que concorrem à


sucessão do ascendente comum declaram, no inventário, as doações que receberam
dele em vida, para que sejam conferidas e igualadas as respectivas legítimas, tem
origem na teoria da vontade presumida, na qual o falecido não desejaria que
um de seus descendentes fosse mais privilegiado que outro, devendo então ser
mantida a igualdade entre todos.

Esse tema é abordado nos artigos nos 2.002 e 2.003, do Código Civil.

Art. 2.002. Os descendentes que concorrerem à sucessão do ascendente


comum são obrigados, para igualar as legítimas, a conferir o valor
das doações que dele em vida receberam, sob pena de sonegação.
Parágrafo único. Para cálculo da legítima, o valor dos bens conferidos
será computado na parte indisponível, sem aumentar a disponível.

Art. 2.003. A colação tem por fim igualar, na proporção estabelecida


neste Código, as legítimas dos descendentes e do cônjuge
sobrevivente, obrigando também os donatários que, ao tempo
do falecimento do doador, já não possuírem os bens doados.
Parágrafo único. Se, computados os valores das doações feitas em
adiantamento de legítima, não houver no acervo bens suficientes para
igualar as legítimas dos descendentes e do cônjuge, os bens assim
doados serão conferidos em espécie, ou, quando deles já não disponha
o donatário, pelo seu valor ao tempo da liberalidade.

O dever de trazer à colação é imposto aos herdeiros porque a doação de


ascendentes a descendentes é considerada como adiantamento do que lhes cabe
por herança, como definido pelo artigo n° 544, do Código Civil.

Esse instituto tem como objetivo proteger os herdeiros necessários contra


doações realizadas pelo autor da herança, ainda em vida, que invadam a legítima,
sem respeitar a igualdade que deve existir entre os herdeiros necessários que
concorrem entre si.

O herdeiro tem o direito de exigir dos demais a colação dos bens que estes
receberam por doação a título de adiantamento da legítima, ainda que sequer
tenha sido concebido ao tempo da liberalidade. Para efeito de cumprimento do
dever de colação, é irrelevante se o herdeiro nasceu antes ou após a doação.

A doação feita de ascendente para descendente impõe ao donatário a


obrigação de, quando o doador morrer, trazer o patrimônio recebido à colação, a
fim de igualar as legítimas, caso existam outros herdeiros necessários.

68
TÓPICO 3 — DO INVENTÁRIO E DA PARTILHA

Acerca desta temática, há um conflito entre o artigo n° 639 do Novo Código


de Processo Civil, antigo artigo n° 1.014 do Código de 1973 e o art. n° 2.004, do
Código Civil. Transcreveremos os dois a seguir,

Art. 639 (CPC/2015). No prazo estabelecido no art. 627, o herdeiro obrigado


à colação conferirá por termo nos autos ou por petição à qual o termo se
reportará os bens que recebeu ou, se já não os possuir, trar-lhes-á o valor.
Parágrafo único. Os bens a serem conferidos na partilha, assim como as
acessões e as benfeitorias que o donatário fez, calcular-se-ão pelo valor que
tiverem ao tempo da abertura da sucessão.

Art. 2.004 (Código Civil). O valor de colação dos bens doados será
aquele, certo ou estimativo, que lhes atribuir o ato de liberalidade.
§ 1° Se do ato de doação não constar valor certo, nem houver estimação
feita naquela época, os bens serão conferidos na partilha pelo que
então se calcular valessem ao tempo da liberalidade. [...].

O Código de Processo Civil estabelece que o cálculo da legítima deve ser


feito na data da abertura da sucessão, já o Código Civil, determina que o cálculo
deve ser realizado na data da liberalidade.

Assim, com base na regra de proibição de enriquecimento sem causa,


prevista no artigo n° 884 do Código Civil, o Enunciado 119 da I Jornada de Direito
Civil do Conselho da Justiça Federal resolveu a presente questão da seguinte
forma: se o bem antecipado ainda existir, será colacionado o valor da data da
abertura da sucessão (regra do Código de Processo Civil), caso não mais exista,
será colacionado na data da liberalidade, atualizado monetariamente, aplicando-
se a regra do Código Civil, a seguir a íntegra do enunciado:

Enunciado 119 - Art. 2.004: Para evitar o enriquecimento sem causa,


a colação será efetuada com base no valor da época da doação, nos
termos do caput do art. 2.004, exclusivamente na hipótese em que
o bem doado não mais pertença ao patrimônio do donatário. Se, ao
contrário, o bem ainda integrar seu patrimônio, a colação se fará com
base no valor do bem na época da abertura da sucessão, nos termos
do art. 1.014 do CPC, de modo a preservar a quantia que efetivamente
integrará a legítima quando esta se constituiu, ou seja, na data do óbito
(resultado da interpretação sistemática do art. 2.004 e seus parágrafos,
juntamente com os arts. 1.832 e 884 do Código Civil).

São dispensados da colação, conforme o Código Civil, as doações que o


doador determinar que saiam da parte disponível, contanto que não excedam,
computado o seu valor ao tempo da doação. Será também dispensada a colação
quando outorgada pelo doador em testamento ou no próprio título de liberalidade
(art. 2.006 e 2.007 CC).

Não virão à colação os gastos ordinários do ascendente com o descendente,
enquanto este for menor de idade, destinados a sua educação, estudos, sustento,
vestuário, tratamento das enfermidades, enxoval e despesas com casamento, ou
as feitas no interesse de sua defesa em processo-crime (art. n° 2.010 CC).

69
UNIDADE 1 — DIREITO DAS SUCESSÕES

Quando encabeçamos a parte Das Colações, mencionamos que traríamos


algumas linhas sobre a redução das doações inoficiosas, veja-as a seguir.

• Redução das doações inoficiosas

Entrando brevemente na temática da redução das doações inoficiosas,


presente no artigo n° 2.007 do Código Civil, vejamos:

Art. 2.007. São sujeitas à redução as doações em que se apurar excesso


quanto ao que o doador poderia dispor, no momento da liberalidade.
§ 1° O excesso será apurado com base no valor que os bens doados
tinham, no momento da liberalidade.
§ 2° A redução da liberalidade far-se-á pela restituição ao monte do
excesso assim apurado; a restituição será em espécie, ou, se não mais
existir o bem em poder do donatário, em dinheiro, segundo o seu
valor ao tempo da abertura da sucessão, observadas, no que forem
aplicáveis, as regras deste Código sobre a redução das disposições
testamentárias.
§ 3° Sujeita-se a redução, nos termos do parágrafo antecedente, a parte
da doação feita a herdeiros necessários que exceder a legítima e mais
a quota disponível.
§ 4° Sendo várias as doações a herdeiros necessários, feitas em
diferentes datas, serão elas reduzidas a partir da última, até a
eliminação do excesso.

E
IMPORTANT

É preciso termos uma atenção maior a este instituto para não confundir a
colação dos bens doados com a redução da doação inoficiosa.

Uma doação que exceda à parte que poderia ser disposta, afetando a metade
indisponível do patrimônio líquido do doador, chamada aqui de inoficiosa, ficará
sujeita a redução prevista no artigo n° 2.007, transcrito anteriormente.

Tal definição está relacionada ao art. n° 549 do Código Civil, “que considera
nula a doação inoficiosa na parte que exceder o que o doador, no momento da
liberalidade, poderia dispor em testamento”, caracterizando a nulidade absoluta
parcial, por atingir somente aquilo que exceder a proteção da legítima (TARTUCE,
2019, p. 869).

Ainda sobre este tema, o STJ, no julgamento do Resp 1.361.983/SC, tratou


da legitimidade para pleitear a declaração de nulidade de doação inoficiosa.
Nesse caso, surge a indagação: se o herdeiro (um dos interessados na nulidade)
cedeu seus direitos hereditários, o fato de ter cedido retira dele a sua legitimidade
para propor a ação declaratória de nulidade de doação inoficiosa?

70
TÓPICO 3 — DO INVENTÁRIO E DA PARTILHA

O STJ entendeu que o herdeiro que cede seus direitos hereditários


possui legitimidade para pleitear a declaração de nulidade de doação inoficiosa
realizada pelo autor da herança em benefício de terceiros. Isso porque a cessão de
direitos hereditários é meramente patrimonial, é a transmissão do recebimento
do patrimônio transmitido. O cedente não perde a qualidade hereditária, ou seja,
a qualidade de herdeiro.

Posto que, sobrevindo patrimônio hereditário desconhecido pelo cedente


quando do ato de cessão, o direito remanesce com ele, pois o que se transfere ao
cessionário é a legitimidade para requerer a partilha patrimonial.

E
IMPORTANT

Relembrando que não se cede e não se negocia a qualidade hereditária, que


é direito fundamental.

A ação declaratória de nulidade de doação inoficiosa é imprescritível,


assim como as outras ações declaratórias e poderá ser ajuizada enquanto o doador
estiver vivo ou mesmo depois de sua morte.

A seguir, vamos iniciar o estudo da partilha de bens.

3 DA PARTILHA
Chegamos ao tópico final desta unidade. Agora, iniciaremos os estudos
da partilha dos bens que integram o patrimônio do falecido entre seus herdeiros
e, por final, abordaremos brevemente os mecanismos jurídicos existentes que
visam evitar que a partilha seja feita de forma desproporcional e incorreta,
beneficiando determinados herdeiros. Vamos lá?

A partilha do patrimônio do autor da herança é tratada pelos artigos nos


647 a 658 do Código de Processo Civil. A partilha ocorrerá após o fim do processo
de inventário, tendo como finalidade a partilha dos bens que compõe a herança
entre todos os herdeiros necessários.

Acadêmico, lembre-se de que na primeira fase da inventariança, para


que se determine o patrimônio transmitido, será necessário separar a meação
do cônjuge ou companheiro. Portanto, a herança será o saldo remanescente
da separação da meação e será este saldo que se transmitirá aos herdeiros e
cessionários. Importante lembrar que no caso de existir apenas um herdeiro, a

71
UNIDADE 1 — DIREITO DAS SUCESSÕES

partilha será feita através da adjudicação dos bens, ou seja, será formalizado que
apenas aquele herdeiro é o detentor dos bens do falecido, assim, será expedindo
o documento competente, denominado de formal de partilha, também chamado
de adjudicação.

Vejamos agora os artigos nos 647 e 648 do CPC:

Art. 647. Cumprido o disposto no art. 642, § 3°, o juiz facultará


às partes que, no prazo comum de 15 (quinze) dias, formulem o
pedido de quinhão e, em seguida, proferirá a decisão de deliberação
da partilha, resolvendo os pedidos das partes e designando os
bens que devam constituir quinhão de cada herdeiro e legatário.
Parágrafo único. O juiz poderá, em decisão fundamentada, deferir
antecipadamente a qualquer dos herdeiros o exercício dos direitos
de usar e de fruir de determinado bem, com a condição de que, ao
término do inventário, tal bem integre a cota desse herdeiro, cabendo
a este, desde o deferimento, todos os ônus e bônus decorrentes do
exercício daqueles direitos.

Art. 648. Na partilha, serão observadas as seguintes regras:


I- a máxima igualdade possível quanto ao valor, à natureza e à
qualidade dos bens.
II- a prevenção de litígios futuros.
III- a máxima comodidade dos coerdeiros, do cônjuge ou do
companheiro, se for o caso.

A decisão em processo judicial de inventário tem natureza declaratória,


pois o patrimônio do falecido já foi automaticamente transmitido para seus
herdeiros, conforme o princípio da saisine (art. n° 1.784 do CC). Portanto, não
é a sentença de inventário que atribui posse e propriedade, mas a saisine, o
inventário somente determinará os quinhões, ou seja, a parte da herança que
caberá a cada herdeiro.

3.1 DA PARTILHA AMIGÁVEL OU EXTRAJUDICIAL


Estudaremos agora a partilha amigável que ocorre quando todos os
interessados, maiores e capazes, entram em acordo quanto à divisão dos bens,
não havendo desentendimento quanto à parte que integra a herança e que caberá
a cada herdeiro.

A partilha poderá ser feita por ato inter vivos ou post mortem, apresentaremos
primeiramente a partilha post mortem. A partilha post mortem é aquela realizada
durante o processo de inventário, através de termo nos autos do processo ou
através de escritura pública feita em cartório de notas ou escritura particular,
homologada pelo juiz conforme artigo n° 2.015 do Código Civil.

72
TÓPICO 3 — DO INVENTÁRIO E DA PARTILHA

A partilha amigável será feita por meio de escritura pública e anexada aos
autos de inventário, mas ela não será homologada pelo juiz. Este determinará
que as partes tomem conhecimento e efetivem o seu cumprimento para, após
sua ordem, expedir o documento chamado de título de formal de partilha
(FARIA, 2017).

Passaremos, a seguir, a estudar a partilha judicial.

3.2 DA PARTILHA JUDICIAL


A partilha judicial será obrigatória sempre que um herdeiro for incapaz
ou quando as partes interessadas não entrarem em acordo sobre a divisão dos
bens do autor da herança, como determina o artigo n° 2.016 do Código Civil.

Quando houver herdeiro incapaz, o Ministério Público deverá participar
atuando em defesa dos interesses daqueles.

3.3 DA PARTILHA EM VIDA


Como já apresentado, as partilhas amigáveis podem decorrer de atos inter-
vivos ou post mortem, a partilha em vida acontece por escolha do ascendente sobre a
disposição de seus bens após seu falecimento, podendo acontecer por meio de
escritura pública ou testamento, devendo sempre respeitar a parte legítima dos
herdeiros necessários. Vejamos o artigo n° 2.018 do Código Civil: “Art. 2.018. É
válida a partilha feita por ascendente, por ato entre vivos ou de última vontade,
contanto que não prejudique a legítima dos herdeiros necessários”.

Acadêmico, lembre-se, mais uma vez, de que não poderá a partilha em


vida ser efetuada por herdeiros através de contrato que tenha como objeto herança
de pessoa viva, como disciplina o artigo n° 426 do Código Civil.

A partilha amigável feita pelo testador, conforme dispõe o artigo n° 2.014


do Código Civil, possibilita ao testador decidir e indicar quais bens irão compor
a quota-parte de cada herdeiro, salvo se o valor dos bens não corresponder às
quotas estabelecidas.

O procedimento de verificação de validade da partilha amigável, feita em


testamento, deverá ocorrer pela via judicial a rigor, após o falecimento do testador,
a fim de ser homologada pelo juiz e produzir seu efeito entre os herdeiros.

A seguir, estudaremos os quinhões hereditários, a parte ideal que cada


herdeiro terá direito dentro da herança deixada pelo falecido.

73
UNIDADE 1 — DIREITO DAS SUCESSÕES

3.4 DA GARANTIA DOS QUINHÕES HEREDITÁRIOS


A garantia dos quinhões hereditários está prevista nos artigos nos 2.023 a
2.026 do Código Civil. Após julgada a partilha, o direito de cada um dos herdeiros
ficará circunscrito aos bens do seu quinhão, garantindo aos herdeiros o direito
sobre os bens que lhe couberam na partilha.

Se ocorrer evicção, a perda de um ou dos bens correspondentes a parte


ideal, os herdeiros são reciprocamente obrigados a indenizar-se. Porém, esta
obrigação cessará se as partes convencionarem o contrário, ou quando a evicção
ocorrer por culpa do evicto ou por fato posterior à partilha dos bens.

Também caberá indenização ao evicto pelos coerdeiros na proporção


de suas quotas-partes, entretanto, caso um deles se encontrar insolvente, os
demais responderão na mesma proporção pela parte deste, menos a quota que
corresponderia ao herdeiro a ser indenizado.

Chegamos ao tópico final desta unidade, agora, abordaremos os meios


legais de anulação, rescisão ou nulidade de uma partilha realizada entre os
herdeiros de forma irregular ou ilegal.

3.5 DA ANULAÇÃO, DA RESCISÃO E NULIDADE DA PARTILHA


A partilha poderá ser modificada por emendas, retificações e correções de
erros materiais ou ser invalidada via ação de anulação, ação de nulidade ou ação
rescisória.

Quando houver erro de fato e inexatidões materiais, como descrição dos
bens e qualificação das partes, a partilha poderá ser emendada nos autos de
inventário desde que todas as partes concordem. Como apresentado no artigo n°
656 do Código de Processo Civil, poderá o juiz de ofício ou a requerimento das
partes, a qualquer tempo, corrigir as inexatidões materiais.

A anulação da partilha amigável lavrada em instrumento público poderá
ser efetuada quando for praticada sob as seguintes hipóteses: coação, por dolo,
apresentar erro essencial ou intervenção de pessoa incapaz, como dita o artigo n°
657 do Código Processual, vejamos:

Art. 657. A partilha amigável, lavrada em instrumento público, reduzida


a termo nos autos do inventário ou constante de escrito particular
homologado pelo juiz, pode ser anulada por dolo, coação, erro essencial
ou intervenção de incapaz, observado o disposto no § 4° do art. 966.
Parágrafo único. O direito à anulação de partilha amigável extingue-se
em 1 (um) ano, contado esse prazo:
I- no caso de coação, do dia em que ela cessou;
II- no caso de erro ou dolo, do dia em que se realizou o ato;
III- quanto ao incapaz, do dia em que cessar a incapacidade.

74
TÓPICO 3 — DO INVENTÁRIO E DA PARTILHA

O artigo acima afasta a ação rescisória dos atos homologatórios de


disposição de direitos, sendo estes sujeitos à anulação nos termos da lei.

Vejamos este seguinte caso em que o autor da herança promoveu em vida
a partilha da integralidade de seus bens em favor de todos seus descendentes e
herdeiros necessários, por meio de escrituras públicas de doação nas quais ficou
consignado o consentimento de todos eles e, ainda, a dispensa de colação futura.

Caso seja constatado eventual prejuízo à legítima em decorrência da
referida partilha, ou alguma ilegalidade, a correção poderá ser pleiteada por
ação anulatória, seguindo o rito ordinário processando-se no mesmo juízo do
inventário de origem e não pela ação de inventário.

No caso acima houve a chamada "doação-partilha", ou seja, a doação,
para os herdeiros dos bens ainda em vida. Nesta situação, entende-se que não
há doação propriamente dita, mas sim um inventário antecipado, em vida. Logo,
não é cabível a colação. Afinal, se não há bens a serem partilhados, não há a
necessidade de processo do inventário (É o entendimento do STJ: 3ª Turma. REsp
1.523.552-PR, Rel. Min. Marco Aurélio Bellizze, julgado em 3/11/2015).

A partilha também poderá ser anulada quando apresentar vícios e defeitos
que invalidem os negócios jurídicos em geral, como reza o artigo n° 2.027 do
Código Civil, no prazo decadencial de 1 (um) ano.

Passaremos a falar sobre a rescisão de partilha, a sentença que julgar a


partilha será rescindível conforme dita o artigo n° 658 do Código de Processo
Civil. Vejamos o artigo:

Art. 658. É rescindível a partilha julgada por sentença:


I- nos casos mencionados no art. 657;
II- se feita com preterição de formalidades legais;
III- se preteriu herdeiro ou incluiu quem não o seja.

A ação rescisória de partilha abrangerá “sentença proferida por força de


prevaricação, concussão ou corrupção do juiz, impedimento ou incompetência,
dolo, coação, simulação ou colusão entre as partes, ofensa a coisa julgada,
violação manifesta da lei, prova falsa, prova nova e fundamento em erro de fato e
verificável do exame dos autos” (AMORIM; OLIVEIRA, 2020, p. 410).

Sendo o pedido julgado procedente, o tribunal proferirá novo julgamento,


se for este o caso (art. n° 974 do CPC). O prazo para a ação rescisória é de 2 (dois)
anos contados do trânsito em julgado da ação (art. n° 975 do CPC).

Não se esqueça, acadêmico, que todos os interessados na herança terão


legitimidade para propor a ação anulatória e ação rescisória de partilha. Também
será possível a nulidade da sentença de partilha quando existentes situações que
invalidem o negócio jurídico conforme dispositivo 166 do Código Civil:

75
UNIDADE 1 — DIREITO DAS SUCESSÕES

Art. 166. É nulo o negócio jurídico quando:


I- celebrado por pessoa absolutamente incapaz;
II- for ilícito, impossível ou indeterminável o seu objeto;
III- o motivo determinante, comum a ambas as partes, for ilícito;
IV- não revestir a forma prescrita em lei;
V- for preterida alguma solenidade que a lei considere essencial para
a sua validade;
VI- tiver por objetivo fraudar lei imperativa;
VII- a lei taxativamente o declarar nulo, ou proibir-lhe a prática, sem
cominar sanção.

Por fim, acadêmico, saiba que prevalece na doutrina e na jurisprudência
que é 10 (dez) anos o prazo para ingressar com a ação de nulidade de partilha (art.
n° 205, do CC/02). Todavia, há doutrina, tal qual a do professor Flávio Tartuce
(2020) que advoga no sentido de não haver prazo para se requerer nulidade de
natureza absoluta por força do artigo n° 169 do Código Civil.

Aqui concluímos os aspectos introdutórios e gerais a respeito da partilha


e do inventário. Na Unidade 2 nos dedicaremos especificamente a estudar o
inventário extrajudicial à luz do Novo Código do Processo Civil e o fenômeno da
desjudicialização do Direito Sucessório. Até lá!

76
TÓPICO 3 — DO INVENTÁRIO E DA PARTILHA

LEITURA COMPLEMENTAR

O INÍCIO DO PRAZO PARA A AÇÃO DE PETIÇÃO DE HERANÇA.


POLÊMICA

Flávio Tartuce

Como inovação festejada, o Código Civil de 2002 passou a tratar da ação


de petição de herança (petitio hereditatis) entre os seus arts. nos 1.824 a 1.828,
que é a demanda que visa a incluir um herdeiro na herança, mesmo após a sua
divisão. Na dicção do primeiro comando citado, o herdeiro pode, nesta ação,
demandar o reconhecimento de seu direito sucessório, para obter a restituição
da herança, ou de parte dela, contra quem, na qualidade de herdeiro, ou mesmo
sem título, a possua.

Em complemento, nos termos do dispositivo seguinte, a ação de petição


de herança, ainda que exercida por um só dos herdeiros, poderá compreender
todos os bens hereditários, tendo caráter universal (art. n° 1.825 do CC/2002).
A figura é admitida há tempos pela jurisprudência brasileira, tendo o Supremo
Tribunal Federal editado, no ano de 1963, a Súmula 149, que envolve o tema
central deste artigo.

Conforme explicam Jones Figueirêdo Alves e Mário Luiz Delgado, trata-


se de uma ação real, eis que, por força do art. 80, inc. II, do CC/2002, o direito à
sucessão aberta constitui um imóvel por determinação legal (Código Civil Anotado.
São Paulo: Método, 2005, p. 936). Na mesma linha, como se retira de importante
julgado do Tribunal de Justiça do Rio Grande do Sul, “a ação de petição de
herança é uma ação de natureza real, para a qual só tem legitimidade ativa aquele
que já é herdeiro desde antes do ajuizamento, e através da qual ele pode buscar
ver reconhecido seu direito hereditário sobre bem específico que entende deveria
integrar o espólio, mas que está em poder de outrem” (TJRS, Apelação Cível n.
36960-28.2012.8.21.7000, 8.ª Câmara Cível, Santa Rosa, Rel. Des. Rui Portanova, j.
18.10.2012, DJERS 25.10.2012).

Por ser uma ação real e também universal, a petição de herança não se
confunde com a ação reivindicatória, que visa a um bem específico. Aplicando
tal forma de pensar, consta de aresto do Superior Tribunal de Justiça que “ocorre
turbação à posse de bem imóvel quando coerdeiros reconhecidos em ação de
petição de herança molestam a posse anterior de outros herdeiros que exerciam
tal direito com base em formal de partilha. Isso porque a ação de petição de
herança tem natureza universal, pela qual o autor pretende o reconhecimento
de seu direito sucessório, o recebimento da fração correspondente da herança
e não a restituição de bens específicos. Isso é o que a diferencia de uma ação
reivindicatória, de natureza singular, que tem por objeto bens particularmente
considerados. Desse modo, é equivocado concluir que, por força da ação de
petição de herança, foram transmitidos o domínio e a posse dos bens herdados,

77
UNIDADE 1 — DIREITO DAS SUCESSÕES

quando, em verdade, transferiu-se o direito à propriedade e a posse comum


da universalidade e não dos bens singularmente considerados. Por força da
procedência da ação de petição de herança, os herdeiros que exerciam a posse
anterior ficam obrigados a devolver, no plano jurídico e não fático, os bens do
acervo hereditário, que voltam a ser de todos em comunhão até que nova partilha
se realize” (STJ, REsp 1244118/SC, Terceira Turma, Rel. Min. Nancy Andrighi, j.
22.10.2013, DJe 28.10.2013).

A respeito do prazo para a propositura dessa demanda, a citada e antiga


Súmula 149 do Supremo Tribunal Federal estabelece que “é imprescritível a
ação de investigação de paternidade, mas não o é a de petição de herança”. O
fundamento da prescrição é relacionado ao fato de a herança envolver direitos
subjetivos de cunho patrimonial, que são submetidos a prazos prescricionais.
Além disso, tem esteio na sempre alegada segurança jurídica, comumente
associada à prescrição.

O entendimento sumulado é ainda considerado majoritário, para todos


os fins, teóricos e práticos, inclusive na doutrina brasileira. Nesse contexto, na
vigência do CC/1916, a ação de petição de herança estaria sujeita ao prazo geral
de prescrição, que era de vinte anos, conforme o seu art. n° 177. Na vigência do
Código Civil de 2002, deve ser aplicado o prazo geral de dez anos, previsto no
seu art. n° 205. Exatamente nessa linha, do Superior Tribunal de Justiça, extrai-se
o seguinte: "Controvérsia doutrinária acerca da prescritibilidade da pretensão de
petição de herança que restou superada na jurisprudência com a edição pelo STF
da Súmula n. 149. [...]. Ausência de previsão, tanto no Código Civil de 2002, como
no Código Civil de 1916, de prazo prescricional específico para o ajuizamento da
ação de petição de herança, sujeitando-se, portanto, ao prazo geral de prescrição
previsto em cada codificação civil: vinte anos e dez anos, respectivamente,
conforme previsto no art. n° 177 do CC/16 e no art. n° 205 do CC/2002" (STJ, REsp
1.368.677/MG, Rel. Ministro Paulo de Tarso Sanseverino, Terceira Turma, julgado
em 05.12.2017, DJe 15.02.2018). Voltarei a esse acórdão mais à frente.

Em ambas as hipóteses, entende-se desde os tempos remotos que o prazo


tem início da abertura da sucessão, como regra, que se dá pela morte daquele de
quem se busca a herança (STF, RE 741.00/SE, Tribunal Pleno, Rel. Min. Eloy da
Rocha, j. 03.10.1973, DJU 02.01.1974). Todavia, a questão não é pacífica, pois alguns
acórdãos superiores mais recentes trazem o julgamento de que o prazo deve ter
início do reconhecimento do vínculo parental em demanda própria, ou seja, do
trânsito em julgado da sentença na ação de investigação de paternidade, tema
principal deste texto. Como é notório, na grande maioria dos casos concretos, a
petição de herança está cumulada com esse pedido relativo à filiação.

Nessa linha, em 2016, surgiu importante julgamento do Superior Tribunal


de Justiça que representa uma quebra dessa primeira corrente, tida como clássica,
concluindo que o prazo de prescrição da ação de petição de herança deve correr
do trânsito em julgado da sentença da ação de reconhecimento de paternidade.
Vejamos a sua publicação, constante do Informativo n. 583 do Tribunal da
Cidadania:

78
TÓPICO 3 — DO INVENTÁRIO E DA PARTILHA

“Na hipótese em que ação de investigação de paternidade post mortem


tenha sido ajuizada após o trânsito em julgado da decisão de partilha de bens
deixados pelo de cujus, o termo inicial do prazo prescricional para o ajuizamento
de ação de petição de herança é a data do trânsito em julgado da decisão que
reconheceu a paternidade e não o trânsito em julgado da sentença que julgou a
ação de inventário. A petição de herança, objeto dos arts. nos 1.824 a 1.828 do CC,
é ação a ser proposta por herdeiro para o reconhecimento de direito sucessório ou
a restituição da universalidade de bens ou de quota ideal da herança da qual não
participou. Trata-se de ação fundamental para que um herdeiro preterido possa
reivindicar a totalidade ou parte do acervo hereditário, sendo movida em desfavor
do detentor da herança, de modo que seja promovida nova partilha dos bens. A
teor do que dispõe o art. n° 189 do CC, a fluência do prazo prescricional, mais
propriamente no tocante ao direito de ação, somente surge quando há violação
do direito subjetivo alegado. Assim, conforme entendimento doutrinário, não há
falar em petição de herança enquanto não se der a confirmação da paternidade.
Dessa forma, conclui-se que o termo inicial para o ajuizamento da ação de petição
de herança é a data do trânsito em julgado da ação de investigação de paternidade,
quando, em síntese, confirma-se a condição de herdeiro” (STJ, REsp 1.475.759/DF,
Terceira Turma, Rel. Min. João Otávio de Noronha, j. 17.05.2016, DJe 20.05.2016).

Em 2018, essa mesma posição foi confirmada pela mesma Terceira Turma
do Tribunal, no aresto há pouco mencionado e que cita a teoria da actio nata
subjetiva, segundo a qual o prazo prescricional deve ter início do conhecimento
da lesão ao direito subjetivo. Como consta do trecho final da sua ementa, "nas
hipóteses de reconhecimento ‘post mortem’ da paternidade, o prazo para o
herdeiro preterido buscar a nulidade da partilha e reivindicar a sua parte na
herança só se inicia a partir do trânsito em julgado da ação de investigação de
paternidade, quando resta confirmada a sua condição de herdeiro. Precedentes
específicos desta Terceira do STJ. Superação do entendimento do Supremo
Tribunal Federal, firmado quando ainda detinha competência para o julgamento
de matérias infraconstitucionais, no sentido de que o prazo prescricional da
ação de petição de herança corria da abertura da sucessão do pretendido
pai, seguindo a exegese do art. n° 1.572 do Código Civil de 1916. Aplicação
da teoria da ‘actio nata’" (STJ, REsp 1.368.677/MG, Terceira Turma, Rel. Min.
Paulo de Tarso Sanseverino, j. 05.12.2017, DJe 15.02.2018). Essa forma de julgar
consubstancia uma visão que pode ser chamada de contemporânea.

No final de 2019, todavia, instaurou-se divergência na atual composição


do Superior Tribunal de Justiça, pois surgiu outro acórdão, da sua Quarta Turma,
voltando a aplicar a visão clássica, de que o prazo prescricional deve ter início
da abertura da sucessão. O julgamento se deu nos autos do Agravo no Recurso
Especial n. 479.648/MS, em dezembro de 2019. Conforme notícias retiradas do
site do Tribunal, uma vez que a decisão ainda não foi publicada quando da
elaboração deste texto, o relator, Ministro Raul Araújo, seguiu os fundamentos
apresentados pela Ministra Isabel Gallotti, na linha de que o entendimento de
que o trânsito em julgado da sentença de reconhecimento de paternidade marca

79
UNIDADE 1 — DIREITO DAS SUCESSÕES

o início do prazo prescricional para a petição de herança conduz, na prática, à


imprescritibilidade desta ação, causando grave insegurança às relações sociais.
De fato, trata-se de profundo debate que envolve a segurança e a certeza − de um
lado −, e a efetividade da herança como direito fundamental, previsto no art. 5°,
inc. XXX, da Constituição da República.

Entre uma e outra corrente, fico com a segunda, tida como contemporânea,
justamente pelo argumento da necessidade de se efetivar o direito à herança. A
propósito, apesar de não ter sido essa a opção expressa do nosso legislador − ao
contrário do que ocorreu com o Código Civil Italiano, nos termos do seu art.
n° 533, e com o Código Civil Peruano, art. n° 664 −, entendo que não há prazo
para se demandar a petição de herança, especialmente no caso de estar cumulada
com a investigação de paternidade. Na doutrina, a propósito, essa é a posição de
Giselda Maria Fernandes Novaes Hironaka, para quem “a petição de herança não
prescreve. A ação é imprescritível, podendo, por isso, ser intentada a qualquer
tempo. Isso assim se passa porque a qualidade de herdeiro não se perde (semel
heres semper heres), assim como o não exercício do direito de propriedade não lhe
causa a extinção. A herança é transferida ao sucessor no momento mesmo da morte
de seu autor, e, como se viu, isso assim se dá pela transmissão da propriedade do
todo hereditário. Toda essa construção, coordenada, implica o reconhecimento
da imprescritibilidade da ação, que pode ser intentada a todo tempo, como já
se afirmou” (Comentários ao Código Civil. Volume 20. São Paulo: Saraiva, 2007, p.
202). A propósito, na mesma esteira, pondera Luiz Paulo Vieira de Carvalho que,
“em nosso sentir, as ações de petição de herança são imprescritíveis, podendo o réu
alegar em sede de defesa apenas a exceção de usucapião (Súmula 237 do STF),
que atualmente tem como prazo máximo 15 anos (na usucapião extraordinária
sem posse social, art. 1.238, caput, do CC)” (Direito das Sucessões. São Paulo: Atlas,
2014, p. 282-283).

De toda sorte, apesar dessa imprescritibilidade, sigo a possibilidade,


em outros sistemas jurídicos, de se alegar a usucapião a respeito de bens
singularizados. Isso faz com que a situação de cada bem seja analisada
especificamente, atribuindo a determinado herdeiro, se for o caso, a propriedade
da coisa caso estejam preenchidos os requisitos da usucapião, em qualquer uma
das suas modalidades.

Como palavras finais, não se pode negar que o tema é de difícil análise
e que gera intensos debates, sendo fortes os argumentos das duas correntes.
Portanto, o Superior Tribunal de Justiça encontra-se defronte a mais um desafio,
que é pacificar a questão no âmbito da sua Segunda Seção. Aguardemos qual será
a posição seguida pela Corte.

FONTE: <http://www.flaviotartuce.adv.br/artigos>. Acesso em: 20 dez. 2020.

80
RESUMO DO TÓPICO 3
Neste tópico, você aprendeu que:

• O inventário e a partilha judicial serão obrigatórios sempre que um herdeiro


for incapaz ou quando as partes interessadas não entrarem em acordo sobre a
divisão dos bens do autor da herança.

• O inventário extrajudicial tem como objetivo facilitar a transmissão de bens ao


dar celeridade por possuir uma forma mais simples.

• A partilha poderá ser modificada por emendas, retificações e correções de


erros materiais ou ser invalidada via ação de anulação, ação de nulidade ou
ação rescisória.

CHAMADA

Ficou alguma dúvida? Construímos uma trilha de aprendizagem


pensando em facilitar sua compreensão. Acesse o QR Code, que levará ao
AVA, e veja as novidades que preparamos para seu estudo.

81
AUTOATIVIDADE

1 Quais as finalidades do processo de inventário? Explique os principais


aspectos da fase de inventariança e de partilha.

2 Qual o prazo para abertura do inventário? Quais as consequências da não


observância desse prazo?

3 Qual a natureza da decisão do inventário? Qual o termo inicial da aquisição


da posse e propriedade dos bens herdados?

4 Julgue como verdadeiro ou falso os itens a seguir:

a) ( ) De acordo com o Código Civil, o testamento particular não pode


ser escrito em língua estrangeira, mesmo que as testemunhas a
compreendam.
b) ( ) Só podem testar os maiores de dezoito anos de idade.
c) ( ) Ao cego são permitidos os testamentos público e o cerrado.
d) ( ) É nula a disposição testamentária que favoreça as testemunhas do
testamento.
e) ( ) Os relativamente incapazes, em razão da idade, não possuem
capacidade para testar.
f) ( ) Não se pode aceitar ou renunciar a herança em parte, sob condição ou
a termo.
g) ( ) Exprimem aceitação de herança os atos oficiosos, como o funeral do finado.
h) ( ) A renúncia da herança deve constar expressamente de instrumento
público ou particular.

82
REFERÊNCIAS
AMORIM, Sebastião; OLIVEIRA, Euclides de. Inventário e partilha: teoria e
prática. 26. ed. São Paulo: Saraiva Educação. 2020.

BRASIL. Código Civil. Lei no 10.406, de 10 de janeiro de 2002. Diário Oficial [da]
República Federativa do Brasil. Brasília, DF, 2002.

BRASIL. Lei n° 4.657, de 4 de setembro de 1942. Lei de introdução às normas


do direito brasileiro. 1942. Disponível em: http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/
decreto-lei/del4657compilado.htm. Acesso em: 20 mar. 2021.

FARIA, Mario Roberto Carvalho. Direito das sucessões. 8. ed. Rio de Janeiro:
Gen-Forense, 2017.

GONÇALVES, CarlosRoberto. Teria geral das obrigações. Direito civil


brasileiro. 7. ed. v. 7. São Paulo: Saraiva, 2010.

HIRONAKA, Giselda Maria Fernandes Novaes. Sobre a ordem de vocação


hereditária: condições para a concorrência do cônjuge e do convivente no
chamamento dos herdeiros antecedentes. IBDFAM. Disponível em: https://ib
dfam.org.br/artigos/287/Sobre+a+Ordem+de+vocação+hereditária%3A+
condições+para+a+concorrência+do+cônjuge+e+do+convivente+no+chamamento
+dos+herdeiros+antecedentes%2A. Acesso em: 21 jan. 2021.

MADALENO, Rolf. A concorrência sucessória e o trânsito processual: a culpa


mortuária. In: Revista brasileira de direito de família, v. 7, n. 29, p. 144-151,
abr./maio 2005.

TARTUCE, Flávio. Manual de Direito Civil. v. único. 10. ed. São Paulo: Gen, 2020.

83
84
UNIDADE 2 —

DO INVENTÁRIO EXTRAJUDICIAL E O
FENÔMENO DA DESJUDICIALIZAÇÃO
DO DIREITO SUCESSÓRIO

OBJETIVOS DE APRENDIZAGEM
A partir do estudo desta unidade, você deverá ser capaz de:

• Fornecer apanhado histórico do inventário no ordenamento jurídico


brasileiro.
• Analisar a Lei n° 11.441/2007 à luz dos fenômenos da desjudicialização do
direito sucessório.
• Verificar os dados fornecidos pela Associação de Notários e Registradores
do Brasil sobre o número de realização de inventários e partilhas
extrajudiciais nos últimos anos no Brasil.
• Expor as principais diferenças e similaridades entre os procedimentos
judiciais e extrajudiciais de inventário e partilha.
• Discorrer sobre as vantagens trazidas pelo instrumento público de
inventário e partilha.
• Ilustrar quais bens e direitos que compõe a herança dispensam a realização
do procedimento de inventário.
• Analisar a (im)possibilidade de realização de inventário extrajudicial
mesmo quando da existência de testamento.

PLANO DE ESTUDOS
Esta unidade está dividida em três tópicos. No decorrer da unidade,
você encontrará autoatividades com o objetivo de reforçar o conteúdo
apresentado.

TÓPICO 1 – DIGRESSÕES HISTÓRICAS SOBRE O INVENTÁRIO E


A PARTILHA

TÓPICO 2 – DUALIDADE DE PROCEDIMENTOS: INVENTÁRIO


JUDICIAL E EXTRAJUDICIAL

TÓPICO 3 – QUESTÕES CONTROVERTIDAS SOBRE INVENTÁRIO


E PARTILHA

85
CHAMADA

Preparado para ampliar seus conhecimentos? Respire e vamos em frente!


Procure um ambiente que facilite a concentração, assim absorverá melhor as informações.

86
TÓPICO 1 —
UNIDADE 2

DIGRESSÕES HISTÓRICAS SOBRE O INVENTÁRIO


E A PARTILHA

1 INTRODUÇÃO
Olá, acadêmico! Seja bem-vindo à Unidade 2. Neste primeiro tópico,
estudaremos o inventário extrajudicial a partir da perspectiva da desjudicialização
do direito sucessório.

De início, faremos um breve apanhado histórico do inventário no


ordenamento jurídico brasileiro para chegarmos até o momento da promulgação
da Lei n° 11.441/2007, a qual possibilitou a realização do inventário extrajudicial.

Ademais, será demonstrada a íntima relação entre a Lei n° 11.441/07


com a desjudicialização do direito sucessório como forma de concretização
do princípio do acesso à justiça. Complementando nossa abordagem, serão
colacionados os últimos dados da Associação do Notários e Registrados do
Brasil sobre nossa temática.

Mãos à obra!

2 BREVE APANHADO HISTÓRICO


Caro acadêmico, quando ingressamos no curso de direito e iniciamos
nossos estudos em história do direito e sua evolução através das civilizações,
deparamo-nos com uma obra essencial para esta disciplina, o livro intitulado
A Cidade Antiga, cujo autor é o historiador Fustel de Coulanges. Em seu VII
Capítulo, o autor aborda brevemente a natureza e a origem do direito de
sucessão entre os antigos.

Adentraremos brevemente neste tema para ilustrar como o direito


sucessório está presente desde os primórdios das civilizações e está em
constante evolução, mantendo ainda presente nos dias atuais algumas de suas
características iniciais. Transcreveremos, a seguir, um trecho dessa obra para
melhor explanação.

O direito de propriedade, estabelecido para o cumprimento de um


culto hereditário, não poderia extinguir-se ao cabo da curta vida do
indivíduo. O homem morre, o culto permanece; o fogo nunca deve
se apagar nem o túmulo ficar abandonado. Persistindo a religião

87
UNIDADE 2 — DO INVENTÁRIO EXTRAJUDICIAL E O FENÔMENO DA DESJUDICIALIZAÇÃO DO DIREITO SUCESSÓRIO

doméstica, com ela permanece também o direito de propriedade.


Duas coisas estavam intimamente ligadas, tanto nas crenças como nas
leis dos antigos: o culto e a propriedade da família. Por isso – regra
sem exceção, tanto no direito grego como no romano - não se podia
adquirir a propriedade separadamente do culto, nem o culto sem a
propriedade […] Desde o princípio se originaram todas as regras do
direito sucessório entre os antigos. A primeira é que sendo a religião
doméstica, como já foi visto, hereditária, de varão para varão, a
propriedade também o era. Assim, sendo o filho o natural e necessário
continuador do culto, herda também os bens. Nisso está o surgimento
do princípio da hereditariedade; não era pois o resultado de simples
convenção entre os homens, apenas; deriva de suas crenças e religião,
do que há de mais poderoso sobre as almas […] O homem é que passa.
É o homem que, à medida que a família acrescenta suas gerações,
chega à hora marcada de dar continuidade ao culto e de tomar a seu
cuidado a propriedade (COULANGES, 2006, p. 78-79).

Assim, a evolução histórica do direito das sucessões atravessou os povos


gregos e romanos, adentrando a idade média, influenciando povos germânicos e
também os povos latinizados, consequentemente o direito português foi um deles.

Como explicou Guilherme Braga da Cruz (1954, p. 34), notório jurista


lusitano, “a formação do moderno direito privado português e brasileiro é o
produto dum longo processo evolutivo, cujo pronto de partida se pode fixar,
com bastante rigor, nos meados do séc. XVIII”, nesta época o sistema jurídico
vigente era regido pelas Ordenações Filipinas. O direito de sucessão, abrangendo a
sucessão legítima e testamentária, estava disciplinado pelas ordenações em seus
Títulos LXX ao CVII, totalizando em vinte e seis títulos.

Não olvidemos o fato de as Ordenações Filipinas vigorarem e nosso


ordenamento jurídico até a implementação do Código Civil brasileiro em 1916, isso
significa, que até o início do século XX reinou, no Brasil, um sistema medieval de
leis que ditavam a vida civil de seus cidadãos.

Não poderemos delongar neste momento histórico luso-brasileiro, mas


citaremos os ensinamentos do doutrinador português, Carlos Alberto da Mota
Pinto (2012, p. 171) que sintetiza a evolução e o objetivo do direito sucessório:

Duas linhas de evolução se registraram, pois, desde a Antiguidade,


passando pela Idade Média, no tocante aos critérios de designação ou
de chamamento dos sucessores à herança.
Uma linha corresponde à evolução conhecida dos direitos
germânicos, parte da “propriedade familiar” e da sucessão
reservada aos membros da família para um reconhecimento
posterior da liberdade de dispor de uma quota da herança.
Outra linha, correspondendo à evolução conhecida do direito romano
e dos povos latinizados, parte da total liberdade de testar para o
estabelecimento ulterior de restrições em ordem a dar cumprimento ao
dever de auxílio e assistência aos familiares, assim surgindo a legítima.
Para a evolução do direito romano, a legítima é a excepção, é uma
restrição à liberdade de testar; para a evolução do direito germânico,
a quota disponível é que é a excepção, é uma limitação da reserva
hereditária destinada à família.

88
TÓPICO 1 — DIGRESSÕES HISTÓRICAS SOBRE O INVENTÁRIO E A PARTILHA

Refletir diretamente em nosso ordenamento jurídico, como uma herança


adquirida pelos colonizados, um patrimônio herdado pelos filhos do falecido pai.
A respeito da evolução do direito sucessório, o mesmo doutrinador nos explica:

Hoje, o nosso ordenamento jurídico, como a quase totalidade dos


sistemas, conhece, lado a lado, uma sucessão testamentária e uma
sucessão legitimária, como resultado destas evoluções convergentes.
E as justificações apresentadas para a sucessão legitimária são as que
ressaltam da descrição das duas linhas evolutivas:
a) a conservação na família de um patrimônio para que todos, em
maior ou menor medida, concorram, e que assegura a permanência
e coesão do agregado familiar;
b) cumprimento do dever moral de assistência recíproca entre
familiares, mesmo para além da morte (PINTO, 2012, p. 170-171).

Então, acadêmico, o que vemos é uma evolução permanente do direito


sucessório, com a necessidade de aprimoramento dos instrumentos práticos
para que todos os herdeiros, legatários e interessados na partilha do espólio do
falecido, tenham seu direito resguardado.

NOTA

Espólio é o patrimônio deixado por uma pessoa falecida, universalidade de


bens deixados aos sucessores; massa de bens por inventariar.

O instrumento que falamos aqui é o processo de inventário, inicialmente


apenas exercido pela via judicial, sob a tutela do magistrado. Atualmente, graças à
evolução de nosso ordenamento jurídico, criou-se a possibilidade deste processo
ser realizado administrativamente, por meio de um Tabelionato de Notas e este
será o objeto de nosso estudo neste material. Agora, aprofundaremos nesse
assunto. O inventário extrajudicial, realizado por meio de escritura pública junto
ao Tabelionato de Notas, foi introduzido pela Lei n° 11.441 de 24.01.2007, tendo
como objetivo central atribuir agilidade ao processo de transferência da herança e
facilitar a venda de bens imóveis, simplificando o procedimento.

ATENCAO

Antes da Lei n° 11.441/2007, o inventário era processado obrigatoriamente


em juízo.

89
UNIDADE 2 — DO INVENTÁRIO EXTRAJUDICIAL E O FENÔMENO DA DESJUDICIALIZAÇÃO DO DIREITO SUCESSÓRIO

Neste contexto, é consenso que a Lei n° 11.441/07 possibilita verdadeira


desburocratização no procedimento de inventário e partilha, sendo muito
festejada pela doutrina. Nas palavras de Zeno Veloso (2016, p. 68):

A Lei n° 11.441, de 4 de janeiro de 2007, alterou completamente – e para


melhor, muito melhor – o panorama do Direito brasileiro com relação
aos temas que veio regular – a separação, o divórcio, o inventário e a
partilha – que, desde então, puderam ser feitos por via administrativa,
através de escritura pública, observados os requisitos mencionados
na aludida lei, representando negócios jurídicos com eficácia plena,
por si mesmos, abrindo-se, pois, a faculdade de serem resolvidas
essas questões fora do Poder Judiciário. Tratou-se, sem dúvida, de um
grande avanço, de um progresso memorável em nosso ordenamento.

Quanto ao inventário extrajudicial em específico, Sílvio de Salvo Venosa


(2008, p. 36) afirma:

Entre nós, o inventário sempre fora um procedimento contencioso,


embora nada obstasse que o legislador optasse por solução diversa,
permitindo o inventário extrajudicial, mormente se todos os
interessados forem maiores e capazes. Finalmente, a Lei n°  11.441,
de 4 de janeiro de 2007, atendeu nossos ingentes reclamos [...]. É
importante que se libere o Judiciário da atual pletora de feitos de
cunho administrativo e o inventário, bem como a partilha, quando
todos os interessados são capazes, podem muito bem ser excluídos,
sem que se exclua o advogado de sua atuação.

NOTA

O inventário extrajudicial também é chamado de inventário notarial ou


administrativo.

Tendo em vista se tratar de uma lei pequena e ser o foco central neste
momento, veja a seguir, na íntegra, a Lei n° 11.441/2007.

O PRESIDENTE DA REPÚBLICA Faço saber que o Congresso


Nacional decreta e eu sanciono a seguinte Lei:

Art. 1o Os arts. 982 e 983 da Lei n° 5.869, de 11 de janeiro de 1973 –


Código de Processo Civil, passam a vigorar com a seguinte redação:

“Art. 982. Havendo testamento ou interessado incapaz, proceder-


se-á ao inventário judicial; se todos forem capazes e concordes,
poderá fazer-se o inventário e a partilha por escritura pública, a qual
constituirá título hábil para o registro imobiliário.

90
TÓPICO 1 — DIGRESSÕES HISTÓRICAS SOBRE O INVENTÁRIO E A PARTILHA

Parágrafo único.  O tabelião somente lavrará a escritura pública se todas


as partes interessadas estiverem assistidas por advogado comum ou
advogados de cada uma delas, cuja qualificação e assinatura constarão
do ato notarial.” (NR)

“Art. 983.  O processo de inventário e partilha deve ser aberto dentro


de 60 (sessenta) dias a contar da abertura da sucessão, ultimando-
se nos 12 (doze) meses subsequentes, podendo o juiz prorrogar tais
prazos, de ofício ou a requerimento de parte.

Parágrafo único.  (Revogado).” (NR)

Art. 2o O art. 1.031 da Lei no 5.869, de 1973 – Código de Processo Civil,


passa a vigorar com a seguinte redação:

“Art. 1.031.  A partilha amigável, celebrada entre partes capazes,


nos termos do art. 2.015 da Lei no 10.406, de 10 de janeiro de 2002 –
Código Civil, será homologada de plano pelo juiz, mediante a prova
da quitação dos tributos relativos aos bens do espólio e às suas rendas,
com observância dos arts. 1.032 a 1.035 desta Lei.

.........................................................................” (NR)

Art. 3o  A Lei no  5.869, de 1973 – Código de Processo Civil, passa a
vigorar acrescida do seguinte art. 1.124-A:

“Art. 1.124-A.   A separação consensual e o divórcio consensual,


não havendo filhos menores ou incapazes do casal e observados
os requisitos legais quanto aos prazos, poderão ser realizados
por escritura pública, da qual constarão as disposições relativas à
descrição e à partilha dos bens comuns e à pensão alimentícia e, ainda,
ao acordo quanto à retomada pelo cônjuge de seu nome de solteiro ou
à manutenção do nome adotado quando se deu o casamento.

§ 1o A escritura não depende de homologação judicial e constitui título


hábil para o registro civil e o registro de imóveis.

§ 2o O tabelião somente lavrará a escritura se os contratantes estiverem


assistidos por advogado comum ou advogados de cada um deles, cuja
qualificação e assinatura constarão do ato notarial.

§ 3o A escritura e demais atos notariais serão gratuitos àqueles que se


declararem pobres sob as penas da lei.”

Art. 4o Esta Lei entra em vigor na data de sua publicação.

Art. 5o Revoga-se o parágrafo único do art. 983 da Lei no 5.869, de 11 de


janeiro de 1973 – Código de Processo Civil.

91
UNIDADE 2 — DO INVENTÁRIO EXTRAJUDICIAL E O FENÔMENO DA DESJUDICIALIZAÇÃO DO DIREITO SUCESSÓRIO

NOTA

Ainda que a pessoa tenha falecido antes da Lei n° 11.441/07, é possível fazer o
inventário por escritura pública, desde que preenchidos os requisitos legais.

O Código de Processo Civil vigente, no seu artigo 610, manteve o avanço


trazido pela Lei n° 11.441/07, prevendo a possibilidade da realização do inventário
em cartório:

Art. 610. Havendo testamento ou interessado incapaz, proceder-se-á


ao inventário judicial.

§ 1° Se todos forem capazes e concordes, o inventário e a partilha


poderão ser feitos por escritura pública, a qual constituirá documento
hábil para qualquer ato de registro, bem como para levantamento de
importância depositada em instituições financeiras.

§ 2o O tabelião somente lavrará a escritura pública se todas as partes


interessadas estiverem assistidas por advogado ou por defensor
público, cuja qualificação e assinatura constarão do ato notarial.

Vale reforçar as características principais do procedimento de inventário


extrajudicial:

• Procedimento realizado perante o tabelião de notas.


• Sem intervenção do Ministério Público.
• Sem a necessidade de homologação pelo Poder Judiciário.
• Lavrado por meio de escritura pública.
• Por sua vez, destacam-se os requisitos legais:
• Todos os herdeiros devem maiores e capazes.
• Inexistência de conflito.
• Ausência de testamento.

NOTA

No último tópico desta unidade, trataremos da (im)possibilidade da realização


do inventário extrajudicial mesmo quando da existência de um testamento.

92
TÓPICO 1 — DIGRESSÕES HISTÓRICAS SOBRE O INVENTÁRIO E A PARTILHA

Dessa forma, a contrario sensu, havendo a presença de interesse de incapaz


ou a existência de testamento, o Código de Processo Civil, exige que o inventário
seja realizado judicialmente.

Os documentos a serem apresentados obrigatoriamente pelas partes para a


confecção do inventário extrajudicial deverão atender às exigências do artigo n°
620 do Código de Processo Civil, elencaremos a seguir este rol.

• Certidão de óbito do autor da herança.


• RG e CPF do autor da herança e das partes.
• Certidões comprobatórias do vínculo de parentesco dos herdeiros.
• Certidão de casamento dos cônjuges sobreviventes e dos herdeiros
casados e pacto antenupcial, se houver.
• Certidão de propriedade de bens imóveis e direitos a eles relativos.
• Documentos necessários à comprovação da titularidade dos bens
móveis e direitos, se houver.
• Certidão negativa de tributos.
• Certificado de Cadastro de Imóvel Rural – CCIR, se houver imóvel
rural a ser partilhado.
• Certidão Negativa Conjunta da Receita Federal e PGFN.
• Certidão Comprobatória da inexistência de testamento (Registro
Central de Testamentos) (AMORIM; OLIVEIRA, 2020, p. 453-454).

ATENCAO

Note que, mesmo presente os requisitos legais, o inventário extrajudicial não


é obrigatório.

É possível a realização do procedimento de inventário em juízo, por meio


de jurisdição especial contenciosa, mesmo quando for viável a realização pela via
administrativa do cartório.

3 A LEI N° 11.441/2007 E FENÔMENO DA


DESJUDICIALIZAÇÃO DO DIREITO SUCESSÓRIO COMO
FORMA DE ACESSO À JUSTIÇA
É notória a crise que assola o Judiciário brasileiro no que se refere à
excessiva judicialização dos conflitos e à litigiosidade que domina as relações
sociais contemporâneas.

93
UNIDADE 2 — DO INVENTÁRIO EXTRAJUDICIAL E O FENÔMENO DA DESJUDICIALIZAÇÃO DO DIREITO SUCESSÓRIO

Nesse contexto de crise, destaca-se a morosidade na prestação jurisdicional


como uma das suas principais repercussões, o que pode ser explicada pela própria
estrutura do processo judicial brasileiro (GHILARDI; OLIVEIRA, 2020, p.1018):

A estrutura do processo judicial brasileiro foi criada num contexto


de formalismo, sob o prisma de uma ideia já ultrapassada de
segurança jurídica, que faz com que as demandas tenham muitas
vezes um tempo de tramitação excessivo – levando-as a não oferecer
uma prestação tempestiva e adequada à velocidade do mundo
contemporâneo. Outrossim, é imperioso ressaltar que a jurisdição só
cumpre inteiramente o seu papel social quando é capaz de apresentar
resposta rápida e efetiva às demandas dos cidadãos.

Para Carlos Henrique Borlido Haddad (2014, p. 4-5), existem causas


concretas para o enorme aumento de demandas que adentram o judiciário a cada
ano:

O contínuo aumento da demanda judicial pode ser explicado por


vários fatores. O crescimento da população tem sido incessante
nos últimos anos e, com isso, também cresce o número de pessoas
dispostas a litigar. Em segundo lugar, a partir da Constituição Federal
de 1988, novos direitos foram articulados e o respeito a eles em boa
parte dos casos somente é possível por meio do Judiciário. O terceiro
elemento foi o substancial aumento do número de advogados, em
razão do correlato incremento do número de faculdades de Direito
espalhadas pelos quatro cantos do país.

É facilmente perceptível que a morosidade na prestação judicial traz


custos de variadas ordens, sendo pertinente refletir a respeito (RODRIGUES;
LAMY, 2019, p. 136):

A morosidade na prestação judicial mostra-se, hoje, extremamente


custosa para as partes, nos mais variados sentidos. Pode-se falar que o
processo tem um custo social¸ porquanto a sociedade como um todo é
atingida pela demora e inefetividade do Judiciário; um custo político, no
passo que a demora ou ausência de prestação jurisdicional deslegitima
o próprio poder estatal; um custo econômico-social, pois o entrave da
máquina judiciária gera ainda mais despesas à Administração; e um
custo emocional¸ na medida em que a indeterminação na espera por
uma decisão gera insegurança e estende no tempo os conflitos (grifos
do autor).

Dessa feita, diante da realidade do Poder Judiciário brasileiro, a não


judicialização, mais do que uma tendência é uma necessidade, para contribuir
com a concretização do direito fundamental à justiça em seu sentido lato.

Na maioria das vezes, o direito fundamental de acesso à justiça é concebido


apenas na acepção estampada no artigo 5°, inciso XXXV, da Lei Maior: “a lei não
excluirá da apreciação do Poder Judiciário lesão ou ameaça a direito”.

Contudo, o princípio do acesso à justiça não pode ser reduzido ao sinônimo


de acesso aos órgãos jurisdicionais, como se o acesso à justiça se realizasse apenas

94
TÓPICO 1 — DIGRESSÕES HISTÓRICAS SOBRE O INVENTÁRIO E A PARTILHA

através do processo estatal. Este direito fundamental, para além do seu aspecto
procedimental, deve ser entendido como uma ordem de valores e direitos
fundamentais para todas as pessoas.

A temática é objeto de análise dos estudiosos Mauro Cappelletii e Bryant


Garth (1988, p. 08), os quais esclarecem na célebre obra denominada “Acesso à
Justiça” que:

De fato, o direito ao acesso efetivo tem sido progressivamente


reconhecido como sendo de importância capital entre os novos
direitos individuais e sociais, uma vez que a titularidade de direitos
é destituída de sentido, na ausência de mecanismos para sua efetiva
reivindicação. O acesso à justiça pode, portanto, ser encarado como
o requisito fundamental – mais básico dos direitos humanos – de um
sistema jurídico moderno e igualitário que pretenda garantir, e não
apenas proclamar os direitos de todos.

Os autores ainda complementam aduzindo que:

A expressão “acesso à Justiça” [...] serve para determinar duas


finalidades básicas do sistema jurídico – o sistema pelo qual as pessoas
podem reivindicar seus direitos e/ou resolver seus litígios sob os
auspícios do Estado. Primeiro, o sistema deve ser igualmente acessível
a todos; segundo, ele deve produzir resultados que sejam individual e
socialmente justos (CAPELLETTI; GARTH, 1988, p.11-12).

NOTA

Acadêmico, saiba da grande importância dos autores Mauro Cappelletti e


Bryant Garth no estudo da temática do acesso à justiça. Eles desenvolveram na década de
1970 o “Projeto Florença de Acesso à Justiça”, sendo considerado um marco para o direito
processual, ao realizar, em conjunto com estudiosos de diversos países, uma abordagem
nova sobre o acesso à Justiça na sociedade contemporânea.

Passando a falar de desjudicilização propriamente, é necessário entender


seu conceito, que perpassa, necessariamente, a ideia já desenvolvida sobre a
concretização do acesso à justiça.

O conceito de desjudicialização, por seu turno, é concebido no quadro


do direito estadual e do sistema judicial como resposta à incapacidade
de resposta dos tribunais à procura (aumento de pendências), ao
excesso de formalismo, ao custo, à “irrazoável” duração dos processos
e ao difícil acesso à justiça. Os processos de desjudicialização têm
consistido essencialmente, por um lado, na simplificação processual,
recurso dos tribunais dentro do processo judicial a meios informais

95
UNIDADE 2 — DO INVENTÁRIO EXTRAJUDICIAL E O FENÔMENO DA DESJUDICIALIZAÇÃO DO DIREITO SUCESSÓRIO

e a “não-juristas” para a resolução de alguns litígios. Por outro lado,


desenvolve-se através da transferência da competência da resolução
de um litígio do tribunal para instâncias não judiciais ou para o âmbito
de ação das “velhas” ou “novas” profissões jurídicas, ou mesmo das
novas profissões de gestão e de resolução de conflitos (PEDROSO;
TRINCÃO; DIAS, 2001, p.18).

Nesta ordem de ideias, desjudicializar pode ser entendido também como


o ato de incentivar as pessoas em buscar a solução de conflitos por meio de
métodos alternativos na seara extrajudicial, desestimulando o ingresso de novos
processos judiciais.

Por meios extrajudiciais, teremos as atividades realizadas em cartórios,


local físico, em que são prestados os serviços notariais e de registro, chamados
comumente de serventia extrajudicial, ou Tabelionato de Notas, Tabelionato de
Protesto de Títulos, Registro de Imóveis, Registro de Títulos e Documentos e
Civil das Pessoas Jurídicas e Registro Civil das Pessoas Naturais e de Interdições
e Tutelas.

Os cartórios são responsáveis por garantir a publicidade, autenticidade,


segurança e eficácia dos atos jurídicos dos cidadãos. Os cartórios são encarregados
da formalização e conservação de diversos atos importantes para a vida em
sociedade, como registros de nascimento, casamento e óbito; a lavratura de
escrituras, procurações, divórcios, testamentos e inventários; as autenticações
de cópias e reconhecimento de firmas; os registros de imóveis; as notificações e
registro de documentos e de pessoas jurídicas; protestos de títulos e documentos
de dívida etc.

Os profissionais responsáveis, conhecidos como titulares de cartórios, são


chamados de notários e registradores, possuem graduação em direito e só podem
ingressar nesta atividade através da realização de concurso público organizado
pelo Poder Judiciário, que também exercerá a fiscalização desses serviços.

E
IMPORTANT

Percebam que o advento da Lei n° 11.441/2007 pode ser entendido como a


preocupação do legislador ordinário com a concretização do princípio da celeridade, o
qual foi consagrado na Constituição Federal de 1988 por meio da Emenda Constitucional
n° 45/2004.

96
TÓPICO 1 — DIGRESSÕES HISTÓRICAS SOBRE O INVENTÁRIO E A PARTILHA

Acadêmico, fique atento: não se pode entender a desjudicialização como


sinônimo de completa exclusão do Poder Judiciário, até mesmo em razão do
princípio constitucional da inafastabilidade da jurisdição.

O objetivo dos movimentos de desjudicialização é oferecer à população


formas alternativas para resoluções de problemas, prestigiando a celeridade na
resolução e a efetividade da ‘decisão’ extrajudicial.

Nesse sentido, segundo Oliveira (2014, p.164), “A desjudicialização pode


compreender a coexistência de meios ou não, mas o que caracteriza mesmo
enquanto instituto é a lógica da reformulação da função judiciária, minimizando
seu papel em vista do pluralismo de instâncias”.

No período de 2018 a 2020, o Brasil ficou marcado por grandes avanços


no Direito Sucessório, resultando em um plano da desjudicialização, facilitando e
encontrando meios para proporcionar a solução de inventários e a homologação
de testamentos mais ágeis, com a ampliação do protagonismo desempenhado
pela atuação dos Cartórios de Notas.

Com a introdução da Lei n° 11.441/07, alterando à redação do artigo 982


do Código de Processo Civil de 1973, possibilitando a lavratura de Escrituras
Públicas de Inventário e Partilha em cartório extrajudicial, entretanto, não será
possível em uma destas quatro situações: quando não existir herdeiro menor de
idade, não existir herdeiro maior incapaz e as partes litigarem entre si partes ou
ainda caso o falecido tenha deixado Testamento.

Nesse sentido, quando se fala na possibilidade de se realizar o inventário


perante o tabelionato de notas, temos a jurisdição estatal deixando de ser a
protagonista.

E
IMPORTANT

O requisito essencial de todos os procedimentos realizados nos cartórios


extrajudiciais é o consenso entre as partes envolvidas, caso contrário, a única solução será
via judicial.

Dessa feita, acadêmico, tem-se que a possibilidade de se realizar inventário


no cartório reflete no deslocamento de uma atividade que era de exclusiva
competência do Poder Judiciário em prestígio à concretização do acesso à justiça.

97
UNIDADE 2 — DO INVENTÁRIO EXTRAJUDICIAL E O FENÔMENO DA DESJUDICIALIZAÇÃO DO DIREITO SUCESSÓRIO

No subtópico seguinte, abordaremos dados da lavra da Associação dos


Notários e Registradores do Brasil com intuito de verificarmos as mudanças
perpetradas pela Lei n° 11.441/07 na dinâmica dos cartórios brasileiros.

3.1 DADOS DA ASSOCIAÇÃO DOS NOTÁRIOS E


REGISTRADORES DO BRASIL
Com o objetivo de demonstrar que desjudicialização do direito sucessório
é realidade em nosso país, neste subtópico, traremos dados numéricos sobre a
opção pela via extrajudicial para a realização de inventário e partilha.

Em relação às partilhas extrajudiciais, a Associação dos Notários e


Registradores do Brasil informa que no período de 2007 a 2017 houve grande
aumento em atos desta natureza realizado por escritura pública, veja o gráfico
a seguir.

GRÁFICO 1 – PARTILHA NO BRASIL

FONTE: Anoreg (2020, p. 52)

98
TÓPICO 1 — DIGRESSÕES HISTÓRICAS SOBRE O INVENTÁRIO E A PARTILHA

Veja também, no gráfico a seguir, os dados em relação à sobrepartilha.

GRÁFICO 2 – SOBREPARTILHA NO BRASIL

FONTE: Anoreg (2020, p. 54)

99
UNIDADE 2 — DO INVENTÁRIO EXTRAJUDICIAL E O FENÔMENO DA DESJUDICIALIZAÇÃO DO DIREITO SUCESSÓRIO

Quanto aos inventários extrajudiciais, no mesmo período, a tendência é


de expressivo aumento no número desta natureza realizado em nosso país.

GRÁFICO 3 – INVENTÁRIO NO BRASIL

FONTE: Anoreg (2020, p. 56)

100
TÓPICO 1 — DIGRESSÕES HISTÓRICAS SOBRE O INVENTÁRIO E A PARTILHA

A Associação de Notários e Registradores do Brasil (2020, p.68) também


realizou o levantamento dos números de testamentos públicos no mesmo período.

GRÁFICO 4 – TESTAMENTO PÚBLICO

FONTE: Anoreg (2020, p. 68)

UNI

O que é a ANOREG?

Fundada no dia 4 do mês de maio de 1984, com sede na cidade de Brasília-DF, então
ainda sob a denominação de Associação dos Titulares das Serventias Extrajudiciais do Brasil
(ATEB), com intuito não econômico, passou a denominar-se Associação dos Notários e
Registradores do Brasil (ANOREG-BR) em 22 de novembro do ano de 1994, após a
promulgação da Lei n° 8935 de 18 de novembro de 1994, que regulamentou o artigo 236 da
Constituição Federal. É regida pelo Código Civil brasileiro, pelas demais disposições legais
aplicáveis e pelo Estatuto.

Quanto ao aspecto financeiro, a Anoreg (2020, p. 45) também chegou à


conclusão que, no período de 2007 a 2018, em decorrência da aplicação da Lei n°
11.441/2007, foram economizados quase 5 bilhões de reais dos cofres públicos.
Veja o gráfico detalhado do período a seguir.

101
UNIDADE 2 — DO INVENTÁRIO EXTRAJUDICIAL E O FENÔMENO DA DESJUDICIALIZAÇÃO DO DIREITO SUCESSÓRIO

GRÁFICO 5 – ECONOMIA AOS COFRES PÚBLICOS

FONTE: Anoreg (2020, p. 45)

Segundo dados da Anoreg (2020), desde de 2007, quando foi instituída a


Lei n° 11.441/07, que autorizou a lavratura de inventários, partilhas, separações
e divórcios consensuais em Tabelionato, mediante escritura pública, os
Cartórios de Notas de todo o Brasil já realizaram mais de 2,7 milhões de atos
dessa natureza, gerando uma economia histórica ao Estado.

Segundo o último estudo “Justiça em Números” (CONSELHO


NACIONAL DE JUSTIÇA, 2020), realizado anualmente pelo Conselho Nacional
de Justiça, cada processo que entra no Judiciário custa em média R$ 2.369,73 (dois
mil trezentos e sessenta e nove reais e setenta e três centavos) para o contribuinte.
Isso significa dizer que, multiplicado por 2,7 milhões, o erário brasileiro, conjunto
dos recursos financeiros públicos, composto por valores em moeda e bens do
Estado, economizou cerca de 6,3 bilhões de reais com a delegação deste serviço
aos Cartórios de Notas.

NOTA

Acadêmico, o Conselho Nacional de Justiça publica todos os anos relatórios


acerca da atividade jurisdicional brasileira, através do ‘Justiça em Números’ através do qual
você pode ter acesso aos números corretos de processos ajuizados e processos sentenciados.
Acesse a edição de 2020 em: <https://www.cnj.jus.br/wp-content/uploads/2020/08/WEB-
V3-Justi%C3%A7a-em-N%C3%BAmeros-2020-atualizado-em-25-08-2020.pdf>.

102
TÓPICO 1 — DIGRESSÕES HISTÓRICAS SOBRE O INVENTÁRIO E A PARTILHA

A Anoreg (2020) estima que a população deixou de levar um ano para se


divorciar na Justiça, para fazer o ato no mesmo dia em cartório. E, que população
deixou de levar 15 anos para fazer o Inventário na Justiça, para fazer o ato em 15
dias em um cartório.

103
RESUMO DO TÓPICO 1
Neste tópico, você aprendeu que:

• A Lei n° 11.441 de 24.01.2007 introduziu possibilidade de realização de


inventário extrajudicial no ordenamento jurídico brasileiro.

• Antes da Lei n° 11.441/2007, o inventário era processado obrigatoriamente em


juízo.

• O inventário extrajudicial tem como finalidade central racionalizar, desafogar


o Poder Judiciário, permitindo o inventário e partilha mediante Escritura
Pública.

• O Código de Processo Civil, no seu artigo n° 610, abarca a possibilidade da


realização do inventário extrajudicial.

• O inventário extrajudicial pode ser entendido como expressão do fenômeno


da desjudicialização do direito sucessório e, por conseguinte, como forma de
acesso à justiça.

104
AUTOATIVIDADE

1 Qual o objetivo principal dos movimentos de desjudicialização?

2 Explique brevemente o objetivo introduzido pela Lei n° 11.441 de 24.01.2007


no que toca o procedimento de inventário extrajudicial.

3 Julgue os itens a seguir como verdadeiros (V) ou falsos (F).

a) ( ) O inventário extrajudicial foi previsto pela primeira vez no


ordenamento jurídico brasileiro com o advento do Código de Processo
Civil de 2015.
b) ( ) A doutrina majoritária realiza dura crítica à possibilidade de realização
do inventário perante o tabelionato de notas alegando usurpação de
função que deveria ser obrigatoriamente jurisdicional.
c) ( ) Presente os requisitos legais, o inventário extrajudicial é obrigatório.
d) ( ) Havendo interesse de incapaz ou testamento, o Código de Processo
Civil exige que o inventário seja realizado judicialmente.
e) ( ) É possível a realização do procedimento de inventário em juízo mesmo
quando estiverem os requisitos necessários à realização do inventário
extrajudicial.
f) ( ) O advento da Lei n° 11.441/2007 pode ser entendido como a
preocupação do legislador ordinário com a concretização do princípio
do acesso à justiça.
g) ( ) A Lei n° 11.441/2007 é o paradigma legal do fenômeno da
desjudicialização do direito sucessório brasileiro
h) ( ) A Associação dos Notários e Registradores do Brasil informa que
no período de 2007 a 2017 constatou grande aumento do número de
inventários e partilhas extrajuduciais realizados por escritura pública
no país.

4 O livro V do Código Civil de 2002 trata da normatização jurídica da


transmissão do patrimônio em decorrência da morte, fato que se justifica
em aspectos religiosos, políticos, familiares e psicológicos. No atinente ao
Direito das Sucessões, disciplina o Código Civil que:

a) ( ) o companheiro não pode ser escolhido e nomeado inventariante em


processo de inventário, por expressa vedação legal.
b) ( ) a administração da herança será exercida pelo inventariante desde a
morte do de cujus até a homologação da partilha.
c) ( ) a partilha será sempre judicial, se os herdeiros divergirem, assim como
se algum deles for incapaz.
d) ( ) a pretensão de anular a partilha prescreve em 3 (três) anos.

105
5 Após a vigência da Lei n° 11.441/07, pode-se afirmar acerca do inventário e
partilha extrajudicial:

a) ( ) Havendo consenso, inexistindo testamento ou herdeiros incapazes,


a via extrajudicial é obrigatória, não sendo o inventário judicial uma
opção válida.
b) ( ) O prazo para a abertura do inventário extrajudicial é o de sessenta dias
e para o judicial é o de trinta dias a contar da abertura da sucessão.
c) ( ) É facultado apenas quando há consenso, não existe testamento, nem
herdeiro incapaz.
d) ( ) O inventário extrajudicial não é facultado para sucessões abertas antes
da vigência da Lei n° 11441/07.

106
TÓPICO 2 —
UNIDADE 2

DUALIDADE DE PROCEDIMENTOS: INVENTÁRIO


JUDICIAL E EXTRAJUDICIAL

1 INTRODUÇÃO
Neste tópico, abordaremos inicialmente as principais diferenças entre o
inventário judicial e o inventário extrajudicial, realizado por meio de escritura
pública, trazidas pela Lei n° 11.441, de 4 de janeiro de 2007, que deu nova redação
aos artigos 982 e 983 do antigo Código de Processo Civil de 1973. A correspondência
atual está contida nos artigos nos 610 e 611 do Código de Processo Civil vigente,
de 2015.

Com as inovações trazidas pela Lei n° 11.441, de janeiro de 2007, que


visou desafogar o judiciário brasileiro possibilitando a realização de inventários,
partilhas separações e divórcios consensuais pela via administrativa em cartórios
de notas, obtivemos também uma celeridade nestes procedimentos, bem como
uma economia para as partes.

Após a implementação da Lei n° 11.441 de 2007, o Conselho Nacional de


Justiça, CNJ, criou a resolução de número 35, de 24 de abril de 2007, com o objetivo
de regulamentar os procedimentos e condições para a realização de inventário
por meio de escritura pública, sofrendo posteriormente alterações formais em seu
texto pela resolução n° 326 de 26 de junho de 2020.

É notório o fato de que o processo de inventário judicial é longo e


exaustivo, ainda mais quando há divergência entre as partes, principalmente
porque envolve questões afetivas, patrimoniais e, às vezes, intrigas familiares
entre os seus membros. Entretanto, quando há concordância com a partilha
dos bens que integram a herança e, se todas as partes forem maiores de idade e
capazes, o melhor procedimento para a realização de inventário será através da
via administrativa.

Passaremos neste tópico a abordar as diferenças existentes dentro deste


procedimento administrativo e o que permite ele ser mais célere e eficaz quando
comparado ao inventário judicial. Em seguida, analisarem detalhadamente as
peculiaridades do inventário extrajudicial na teoria e os desafios enfrentados
na prática.

107
UNIDADE 2 — DO INVENTÁRIO EXTRAJUDICIAL E O FENÔMENO DA DESJUDICIALIZAÇÃO DO DIREITO SUCESSÓRIO

2 AS PRINCIPAIS DIFERENÇAS ENTRE O INVENTÁRIO


JUDICIAL E O EXTRAJUDICIAL
Daremos início aos estudos das diferenças existentes entre o inventário
judicial e o extrajudicial, também chamado de administrativo. O inventário
extrajudicial proporciona celeridade e praticidade nos trâmites necessários para
a realização da partilha dos bens do de cujus, finalizando com a confecção da
escritura pública.

NOTA

De Cujus, a expressão latina, derivada de "de cujus sucessione agitur", de cuja


sucessão se trata, utilizada na área jurídica para designar o falecido, usada comumente
como sinônimo de 'pessoa falecida', numa figura eufemística substitutiva de 'defunto' ou
'morto'. A palavra denomina o falecido que deixou bens. Também se diz autor da herança.

Com as alterações trazidas pela Lei n° 11.441/2007, a realização de


inventário e partilha de herança poderá ser feita em Cartório de Notas, através de
escritura pública, com força executiva para cumprimento das suas disposições,
independentemente de homologação judicial, constituindo um documento hábil
para qualquer ato de registro dos bens que integravam o patrimônio do falecido.
Assim resume o artigo 3° da Resolução n° 35 do CNJ:

[…] são títulos hábeis para o registro civil e o registro imobiliário,


para a transferência de bens e direitos, bem como para promoção de
todos os atos necessários à materialização das transferências de bens
e levantamento de valores (DETRAN, Junta Comercial, Registro Civil
de Pessoas Jurídicas, instituições financeiras, companhias telefônicas,
etc.).

Para sua realização, as partes obrigatoriamente precisam estar em acordo
com a partilha dos bens que integram a herança do falecido, caso haja alguma
divergência entre os herdeiros, o inventário deverá ser realizado pela via judicial, a
fim de que o deslinde das questões levantadas seja acompanhado e solucionado
pelo magistrado, respeitando as leis que regem o direito sucessório.

Além da concordância das partes, o inventário extrajudicial só poderá ser


realizado se os herdeiros e envolvidos forem maiores e capazes, devendo ampliar
esta interpretação para o caso da existência de nascituros. Apesar de não estar
expressamente previsto na lei, deverá ser aplicado o artigo n° 733 do Código de
Processo Civil, que trata do divórcio administrativo (AMORIM; OLIVEIRA, 2020,
p. 441). Vejamos a seguir a redação deste dispositivo legal:

108
TÓPICO 2 — DUALIDADE DE PROCEDIMENTOS: INVENTÁRIO JUDICIAL E EXTRAJUDICIAL

Art. 733. O divórcio consensual, a separação consensual e a extinção


consensual de união estável, não havendo nascituro ou filhos incapazes
e observados os requisitos legais, poderão ser realizados por escritura
pública, da qual constarão as disposições de que trata o art. 731.

NOTA

Nascituro é aquele que vai nascer, terá direito a sucessão desde que comprovada
a sua concepção antes do óbito do autor da herança e se vier a nascer com vida.

O Colégio Permanente de Corregedores Gerais dos Tribunais de Justiça


do Brasil (CCOGE), durante os trabalhos do 63° ENCOGE (Encontro do Colégio
Permanente de Corregedores Gerais dos Tribunais de Justiça do Brasil), no
intuito de evidenciar o Poder Judiciário como meio de proporcionar a cidadania
e inclusão social, decidiu no sentido de:

ORIENTAR às Corregedorias – Gerais de Justiça que recomendem


a todos os tabeliães de notas, quando procurados para lavratura de
escritura de divórcio ou separação, que alertem aos interessados da
impossibilidade de uso da via administrativa prevista no art. 1.124-
A do Código de Processo Civil se estiver grávida a cônjuge virago,
bem como para que se abstenham de lavrar referidas escrituras se for
declarado ou restar evidenciado o estado gravídico, indicando a via
judicial, sem, contudo, ser permitido investigar ou diligenciar para o
esclarecimento de tal estado.

Portanto, pode-se sugerir que conste na escritura de inventário “que a


cônjuge viúva não se encontra em estado gravídico ou ao menos que não tenha
conhecimento dessa condição” (AMORIM; OLIVEIRA, 2020, p. 441), conforme
estabelecido na Resolução do Conselho Nacional de Justiça n° 35, em seus artigos
nos 34 e 37, que transcreveremos a seguir.

Art. 34. As partes devem declarar ao tabelião, no ato da lavratura


da escritura, que não têm filhos comuns ou, havendo, que são
absolutamente capazes, indicando seus nomes e as datas de nascimento.
Parágrafo único. As partes devem, ainda, declarar ao tabelião, na
mesma ocasião, que o cônjuge virago não se encontra em estado
gravídico, ou ao menos, que não tenha conhecimento sobre esta
condição (Incluído pela Resolução n° 220, de 26.04.2016).

Art. 37. Havendo bens a serem partilhados na escritura, distinguir-


se-á o que é do patrimônio individual de cada cônjuge, se houver, do
que é do patrimônio comum do casal, conforme o regime de bens,
constando isso do corpo da escritura.

109
UNIDADE 2 — DO INVENTÁRIO EXTRAJUDICIAL E O FENÔMENO DA DESJUDICIALIZAÇÃO DO DIREITO SUCESSÓRIO

Ainda nesta temática, a Corregedoria Nacional de Justiça, através da


Recomendação n° 22 de 06 de junho de 2016, informou que os Tabelionatos de
Notas de todo o país poderão realizar procedimentos de inventário, partilha de
bens, separação, divórcio e extinção de união estável, quando consensuais, sempre
que os filhos ou herdeiros da relação forem emancipados. Transcreveremos a
seguir um trecho dessa resolução.

Art. 1° Recomendar aos Tabelionatos de Notas dos Estados e do


Distrito Federal que promovam a realização de inventário, partilha,
separação consensual, divórcio consensual e extinção consensual de
união estável, não havendo nascituro ou filhos incapazes.
Parágrafo único. A existência de filhos ou herdeiros emancipados
não obsta a realização, por escritura pública, de inventário, partilha,
separação consensual, divórcio consensual e extinção consensual de
união estável.
Art. 2° A utilização desta via extrajudicial, deverá observar, no que
couber, as regras dispostas pela Resolução CNJ 35/2007.
Art. 3° Esta Recomendação não revoga, no que forem compatíveis, as
normas editadas pelas Corregedorias Gerais da Justiça e pelos Juízes
Corregedores, ou Juízes competentes na forma da organização local
relativas à matéria.
Art. 4° As Corregedorias Gerais da Justiça deverão dar ciência desta
Recomendação aos Juízes Corregedores ou Juízes que na forma da
organização local forem competentes para a fiscalização dos serviços
extrajudiciais de notas, e aos responsáveis pelas unidades do serviço
extrajudicial de notas.
Art. 5° Esta Recomendação entra em vigor na data de sua publicação.

Para Flávio Tartuce (2020, p. 831-832), houve uma confusão feita pela
norma administrativa com as situações jurídicas existentes, assim para este jurista:

Com o devido respeito, resta claro que a norma administrativa


confundiu as situações jurídicas, pois somente há menção ao nascituro
no citado art. n° 733 do CPC/2015, para a dissolução do casamento e da
união estável, e não para o inventário. De toda sorte, a recomendação
tem sido seguida na prática. Feito tal esclarecimento, não se olvide que
os principais objetivos da Lei n° 11.441/2007 – reafirmados pelo Novo
CPC – foram as reduções de burocracias e de formalidades para os
atos de transmissão hereditária, bem como a celeridade, na linha da
tendência atual de desjudicialização das contendas e dos pleitos. Assim
como ocorreu com o divórcio extrajudicial, a lei de 2007 foi concisa
e trouxe muito pouco a respeito do assunto, cabendo à doutrina e à
jurisprudência sanar as dúvidas decorrentes desses institutos.

Acreditamos que esta temática deverá se prolongar por muitos anos a


fim de encontrar meios que conciliem a desburocratização e, acima de tudo,
resguardar os direitos do nascituro.

Passaremos agora a abordar as taxas e emolumentos relacionadas ao


inventário extrajudicial.

110
TÓPICO 2 — DUALIDADE DE PROCEDIMENTOS: INVENTÁRIO JUDICIAL E EXTRAJUDICIAL

ATENCAO

Quando existir herdeiro ou interessado incapaz, a via obrigatória a ser escolhida


será a do procedimento judicial.

O artigo 982, § 2° do Código de Processo Civil, atualmente revogado,


abordava a isenção de custas dos atos notariais para pessoas carentes, como
a escritura pública e demais custas de inventário e da partilha, prevendo
sua gratuidade, entretanto não teve sua correspondência expressa no atual
código processual.

O atual código processual, quanto à questão de isenção de custas dos atos
notariais para pessoas carentes, restringe ao previsto no artigo 98, § 1°, inciso IX,
devendo ser aplicado aos atos pertinentes a escritura pública e demais custas de
inventário e da partilha. Vejamos:

Art. 98. A pessoa natural ou jurídica, brasileira ou estrangeira, com


insuficiência de recursos para pagar as custas, as despesas processuais
e os honorários advocatícios tem direito à gratuidade da justiça, na
forma da lei.

§ 1° A gratuidade da justiça compreende:


IX- os emolumentos devidos a notários ou registradores em
decorrência da prática de registro, averbação ou qualquer outro ato
notarial necessário à efetivação de decisão judicial ou à continuidade
de processo judicial no qual o benefício tenha sido concedido.
§ 8° Na hipótese do § 1o, inciso IX, havendo dúvida fundada quanto ao
preenchimento atual dos pressupostos para a concessão de gratuidade,
o notário ou registrador, após praticar o ato, pode requerer, ao juízo
competente para decidir questões notariais ou registrais, a revogação
total ou parcial do benefício ou a sua substituição pelo parcelamento
de que trata o § 6o deste artigo, caso em que o beneficiário será citado
para, em 15 (quinze) dias, manifestar-se sobre esse requerimento.

Além da gratuidade nas taxas e emolumentos notariais, que serão
concedidas em juízo quando o procedimento de inventário e partilha seja realizado
pela via judicial, poderão as partes solicitarem assistência judiciária gratuita
através da Defensoria Pública, por não possuírem condições econômicas para
contratar um advogado particular, tendo em vista ser obrigatório a assistência
deste profissional para a execução de inventário administrativo. Assim prevê o
artigo 610 § 2 do atual Código de Processo Civil.

111
UNIDADE 2 — DO INVENTÁRIO EXTRAJUDICIAL E O FENÔMENO DA DESJUDICIALIZAÇÃO DO DIREITO SUCESSÓRIO

Art. 610. Havendo testamento ou interessado incapaz, proceder-se-á


ao inventário judicial.

§ 2° O tabelião somente lavrará a escritura pública se todas as partes


interessadas estiverem assistidas por advogado ou por defensor
público, cuja qualificação e assinatura constarão do ato notarial.

Também está previsto na nova redação do artigo 8° e no artigo 9° da


Resolução n° 35 do Conselho Nacional de Justiça:

Art. 8° É necessária a presença do advogado, dispensada a procuração,


ou do defensor público, na lavratura das escrituras aqui referidas,
nelas constando seu nome e registro na OAB.(Redação dada pela
Resolução n° 326, de 26.6.2020).
Art. 9° É vedada ao tabelião a indicação de advogado às partes, que /
deverão comparecer para o ato notarial acompanhadas de profissional
de sua confiança. Se as partes não dispuserem de condições
econômicas para contratar advogado, o tabelião deverá recomendar-
lhes a Defensoria Pública, onde houver, ou, na sua falta, a Seccional da
Ordem dos Advogados do Brasil.

Tema polêmico e ainda sem uma perspectiva de pacificação será a questão


da gratuidade dos serviços cartorários quando não oriundos de decisão judicial
aos inventários administrativos.

Neste sentido é valioso os comentários tecidos pelo Oficial de Registro de
Imóveis, Jeferson Luciano Casanova (2017), vejamos:

Não se trata de conceder isenção de taxas nos Cartórios Extrajudiciais


sem lei expressa, uma vez que a prestação dos serviços com natureza
forense é isenta do pagamento de taxas pela pessoa natural ou jurídica,
com insuficiência de recursos, por força do art. 98, §1°, I e IX, do novo
CPC, seja prestada pelo Judiciário ou pelos Cartórios de Notas ou de
Registro de Imóveis. Eis que o alvo da gratuidade é o serviço com
natureza forense e não a entidade que efetivamente o fornece ao utente.

Com efeito, o serviço público de natureza forense, ao migrar, em


parte, para os Cartórios Extrajudiciais, continua circundado pelas
mesmas prerrogativas de acesso, tais como a representação por
advogado e concessão da gratuidade para os hipossuficientes. A
título de argumentação, seria de duvidosa constitucionalidade a lei
que viesse tolher dos hipossuficientes a gratuidade dos serviços com
natureza forense, quando prestados pelos Cartórios Extrajudiciais.

Vale dizer, a migração da prestação do serviço público de natureza


forense para os Cartórios Extrajudiciais não desnatura a respectiva
natureza jurídica, nem o espectro de direitos e deveres que o ladeiam.
Desse modo, de rigor à concessão da gratuidade para o hipossuficiente,
ainda quando não decorra de decisão judicial, no caso de optar pelo
acesso aos serviços forenses por intermédio dos Cartórios de Notas e
de Registro de Imóveis.

112
TÓPICO 2 — DUALIDADE DE PROCEDIMENTOS: INVENTÁRIO JUDICIAL E EXTRAJUDICIAL

Tartuce também reafirma a sua posição de manutenção da gratuidade


prevista para inventário extrajudicial, na linha da norma do Conselho Nacional de
Justiça, mesmo não havendo menção expressa no atual Código de Processo Civil
(TARTUCE, 2020, p. 834).

Devemos lembrar que a gratuidade está apenas aos atos notariais e não
atinge a isenção de pagamento de impostos existentes neste procedimento, como
o imposto de transmissão causa mortis, de competência estadual e o imposto de
transmissão de bens imóveis, de competência municipal (AMORIM; OLIVEIRA,
2020, p. 459).

Para solicitar a gratuidade das despesas cartorárias, a parte deverá realizar


uma declaração de hipossuficiência, apresentando algum comprovante que
demonstre sua condição econômica.

Como documentos hábeis para essa finalidade, teremos os comprovantes


de pagamentos de salário, também chamados de holerites, a declaração de
isenção de declaração de imposto de renda, retirada no site da receita federal e
que ilustraremos na figura a seguir.

FIGURA 1 – DECLARAÇÃO ANUAL DE ISENTO

FONTE: <https://receita.economia.gov.br/orientacao/tributaria/declaracoes-e-demonstrativos/
dai-declaracao-anual-de-isento>. Acesso em: 25 abr. 2021.

Na figura a seguir, veremos um modelo de declaração de hipossuficiência,


também denominada como declaração de pobreza.

113
UNIDADE 2 — DO INVENTÁRIO EXTRAJUDICIAL E O FENÔMENO DA DESJUDICIALIZAÇÃO DO DIREITO SUCESSÓRIO

FIGURA 2 – DECLARAÇÃO DE HIPOSSUFICIÊNCIA

FONTE: <https://static.significados.com.br/foto/exemplo-declaracao-de-pobreza-significados.jpg>.
Acesso em: 22 abr. 2021.

O tabelionato avaliará os documentos apresentados pelas partes devendo


compará-los com as declarações dos valores dos bens inventariados. É assim que
estabelece o artigo 7°, da Resolução 35 do Conselho Nacional de Justiça em sua
nova redação dada pela Resolução n° 326, de 2020:

Art. 7° Para a obtenção da gratuidade pontuada nesta norma, basta a


simples declaração dos interessados de que não possuem condições
de arcar com os emolumentos, ainda que as partes estejam assistidas
por advogado constituído (Redação dada pela Resolução n° 326, de
26.6.2020).

Após essa análise, cabendo recusa no pedido de gratuidade, caso não


atenda aos requisitos mínimos para sua concessão e a parte não concorde com
a negativa da gratuidade, poderá levar para reavaliação e posterior decisão do
correspondente órgão judicial corregedor.

Portando, não concordando com a decisão, poderá a parte procurar o


Juiz Corregedor Permanente, que responde pelo respectivo cartório, ou então,
ingressar com uma reclamação junto a Corregedoria Geral da Justiça. Os meios
para contato deverão ser fornecidos pelos cartórios e estarem visíveis para seus
clientes em seus espaços públicos.

A Corregedoria Nacional de Justiça é responsável pela orientação,
coordenação e execução de políticas públicas voltadas à atividade correcional e
ao bom desempenho da atividade judiciária dos tribunais e juízos e dos serviços
extrajudiciais de todo o Brasil. As suas funções estão estabelecidas na Constituição
Federal, no § 5° do art. 103-B e regulamentadas no artigo 31 do Regimento Interno
do Conselho Nacional de Justiça.

114
TÓPICO 2 — DUALIDADE DE PROCEDIMENTOS: INVENTÁRIO JUDICIAL E EXTRAJUDICIAL

Na figura a seguir, temos um gráfico explicativo que facilita a compreensão


de suas contribuições.

FIGURA 3 – ATRIBUIÇÕES CONSTITUCIONAIS E REGIMENTAIS

FONTE: Conselho Nacional de Justiça (2020, s.p.)

No que toca as taxas e emolumentos da escritura pública realizada em


cartório de notas: é de responsabilidade dos Estados legislar sobre as taxas e
emolumentos a serem aplicados aos cartórios de cada unidade federativa. Assim:

Seu valor deve corresponder ao efetivo custo e à adequada e suficiente


remuneração dos serviços prestados pelo cartório, conforme a
legislação local, evitando que haja excessiva oneração das partes
interessadas, em confronto com o que teriam de suportar no caso de
preferência por inventário judicial. Na falta de regulamentação específica,
cabe aos tabeliães fazer uso das normas relativas às escrituras em geral,
utilizando os emolumentos referentes a escrituras sem valor declarado,
ou segundo o valor da transmissão de bens imóveis, conforme o caso.
(AMORIM; OLIVEIRA, 2020, p. 458-459).

Na figura a seguir, exemplificaremos a título de curiosidade, a tabela
de custas e emolumentos adotada pelos cartórios e tabelionatos estaduais.
Colacionamos a imagem da tabela de custas do Tabelionato de Notas do Estado
de São Paulo.

115
UNIDADE 2 — DO INVENTÁRIO EXTRAJUDICIAL E O FENÔMENO DA DESJUDICIALIZAÇÃO DO DIREITO SUCESSÓRIO

FIGURA 4 – TABELA DE CUSTAS E EMOLUMENTOS

FONTE: <https://www.cnbsp.org.br/__Documentos/Upload_Conteudo/arquivos/Tabela_
Custas/tabela_2021__versao_visualizacao_iss_capital_pdf.pdf>. Acesso em: 25 abr. 2021.

Para visualizar os detalhes e as demais tabelas de custas, acesse o sítio


eletrônico do Colégio Notarial do Brasil correspondente a cada Estado brasileiro,
mas aqui informaremos o endereço da Seção do Estado de São Paulo: <https://www.
cnbsp.org.br/?url_amigavel=1&url_source=modulos&id_modulo=802&lj=1677>.

NOTA

O que significa Ata Notarial?

É o documento confeccionado pelo Tabelião que prova a existência de um


fato ou situação, cujo contexto seja importante documentar, como exemplos temos:
conteúdo de páginas da internet; comprovação da presença de pessoas em determinados
locais; certidões extraídas pela internet; atestar o estado de imóveis no início ou fim
de locação; fazer prova da entrega de documentos ou coisas; certificar a existência de
pessoa (denominada de ata de fé de vida); atestar apelido ou profissão de pessoa, certificar
declarações prestadas, entre outros.

116
TÓPICO 2 — DUALIDADE DE PROCEDIMENTOS: INVENTÁRIO JUDICIAL E EXTRAJUDICIAL

Em ambos os procedimentos, inventário administrativo e judicial, será


exigida a descrição dos bens, imóveis, móveis, semoventes, cotas societárias que
integram o patrimônio do falecido a serem inventariados, os valores atualizados
segundo avaliação do mercado, inclusive para recolha correta dos impostos
exigidos no processo de inventário.

Nos processos de inventário e partilha, judicial e extrajudicial, será


necessária a apresentação de certidões negativas de débitos fiscais junto à Fazenda
Pública, municipal, estadual e federal, em relação aos bens que incorporam a
herança do falecido.

No caso de inventário judicial, a sentença de partilha de bens só ocorrerá


após a quitação de todos os débitos existentes no processo de inventário, conforme
disposto no artigo n° 654 do Código de Processo Civil, vejamos:

Art. 654. Pago o imposto de transmissão a título de morte e


juntada aos autos certidão ou informação negativa de dívida
para com a Fazenda Pública, o juiz julgará por sentença a partilha.
Parágrafo único. A existência de dívida para com a Fazenda Pública
não impedirá o julgamento da partilha, desde que o seu pagamento
esteja devidamente garantido.

Deverão ser apresentadas as certidões negativas de débitos fiscais,
como certidão negativa de débitos do espólio, como o IPTU (imposto sobre a
propriedade predial e territorial urbana) para imóveis urbanos, ITR (imposto
sobre propriedade territorial rural), para imóveis rurais e a certidão negativa de
débitos para empresas, não será possível confeccionar a escritura de inventário
e partilha, “sob pena de responsabilidade subsidiária do tabelião pelos débitos
pendentes” (AMORIM; OLIVEIRA, 2020, p. 456).

Já que citamos os principais impostos exigidos e recolhidos em um
processo de inventário e partilha, em ambos os procedimentos, tanto judicial ou
extrajudicial, o recolhimento deles é obrigatório. O imposto de transmissão causa
mortis (ITCMD) é recolhido e a estipulação de sua alíquota é de competência de
cada estado brasileiro.

Veja a seguir um quadro didático com todas as alíquotas do imposto


ITCMD aplicadas pelos Estados brasileiros, conforme suas legislações.

117
UNIDADE 2 — DO INVENTÁRIO EXTRAJUDICIAL E O FENÔMENO DA DESJUDICIALIZAÇÃO DO DIREITO SUCESSÓRIO

QUADRO 1 – ALÍQUOTAS DO IMPOSTO ITCMD

FONTE: <https://pt.wikipedia.org/wiki/Imposto_de_transmissão_causa_mortis_e_doação>.
Acesso em: 25 abr. 2021.

Veja a seguir a sintetização dos casos de isenção de imposto ITCMD


aplicados pela legislação estadual do Estado de Santa Catarina.

• O beneficiário de seguros de vida, pecúlio por morte e vencimentos,


salários, remunerações, honorários profissionais e demais
vantagens pecuniárias decorrentes de relação de trabalho, inclusive
benefícios da previdência, oficial ou privada, não recebidos pelo de
cujus.
• O herdeiro, o legatário ou o donatário que houver sido aquinhoado
com um único bem imóvel, relativamente à transmissão causa
mortis ou à doação deste bem (desde que cumulativamente o
imóvel se destine à moradia própria do beneficiário; o beneficiário
não possua qualquer outro bem imóvel; e o valor total do imóvel
não seja superior a R$ 20.000,00).
• O herdeiro, o legatário ou o donatário, quando o valor dos bens ou
direitos recebidos não exceder ao equivalente a R$ 2.000,00.
• Donatário ou o cessionário, qualquer que seja o valor dos bens

118
TÓPICO 2 — DUALIDADE DE PROCEDIMENTOS: INVENTÁRIO JUDICIAL E EXTRAJUDICIAL

ou direitos, em se tratando de sociedade civil sem fins lucrativos,


devidamente reconhecida como de utilidade pública estadual.
• O donatário ou o cessionário de bens móveis ou imóveis destinados
à execução de programa oficial de moradias para famílias com
renda mensal de até cinco salários mínimos ou ao assentamento de
agricultores sem-terra, abrangendo a doação do bem:
a) à entidade executora do programa; ou
b) aos beneficiários, pela entidade executora, se for o caso
(SECRETARIA DE ESTADO DA FAZENDA DO ESTADO DE
SANTA CATARINA, 2017).

Quanto ao prazo de abertura, não haverá diferenciação entre os


procedimentos judiciais e extrajudiciais. Com o artigo 611 do Código de Processo
Civil, temos o prazo fixado em dois meses, a contar do falecimento do autor da
herança, ou seja, quando inicia-se oficialmente a abertura da herança e poderá
ter a duração de 12 meses subsequentes. Claro que o juiz, através da análise dos
autos ou a pedido das partes, poderá prorrogar este prazo.

Quando algum dos herdeiros desejar renunciar à herança, ou cessão de


direitos, os cônjuges dos herdeiros deverão comparecer ao cartório para assinar
o ato de lavratura da escritura pública de inventário e partilha. Entretanto, não
será exigido este comparecimento caso o herdeiro esteja casado sob o regime da
separação total de bens, também denominada de separação convencional.

O inventário extrajudicial possibilita a cessão de direitos hereditários,


para tanto, bastará o comparecimento em cartório do herdeiro cessionário com
seu advogado. Devendo ser obrigatória a presença dos demais herdeiros e do
cônjuge viúvo.

Concluída a escritura de inventário e partilha com a cessão de direitos


hereditários, os herdeiros e interessados deverão realizar o seu registro junto aos
órgãos competentes para fins de validar perante terceiros o do direito adquirido,
dando publicidade do ato e sua disponibilidade.

Também poderá ser realizado pela via administrativa o inventário


negativo. Esse instrumento tem como objetivo comprovar que o falecido e o
cônjuge sobrevivente não tinham bens a partilhar, visando a afastar a imposição
do regime da separação obrigatória de bens, caso este não seja o regime escolhido
pelos noivos, diante da existência de causa suspensiva do casamento.

Também se utiliza inventário negativo para resguardar o patrimônio dos
herdeiros, afastando a responsabilidade pelas dívidas deixadas pelo falecido,
posto que este não deixou bens a inventariar.

Será possível a sobrepartilha por escritura pública, mesmo ante a


existência da realização anterior de inventário e partilha pela via judicial, mesmo
que o herdeiro, hoje maior e capaz, fosse menor ou incapaz ao tempo do óbito ou
do processo judicial, como previsto pelo artigo 25 da Resolução 35 do Conselho
Nacional de Justiça.

119
UNIDADE 2 — DO INVENTÁRIO EXTRAJUDICIAL E O FENÔMENO DA DESJUDICIALIZAÇÃO DO DIREITO SUCESSÓRIO

Caso o autor da herança tenha deixado apenas um herdeiro, sendo ele


maior e capaz, terá direito à integralidade da herança e, por óbvio, não haverá
partilha, assim, será lavrada a escritura de inventário e adjudicação dos bens.
Poderá também ser realizado o inventário extrajudicial caso o de cujus tenha
deixado dívidas.

NOTA

CAUSA MORTIS: em razão da morte. Também se grafa mortis causa. Usa-se


para qualificar o imposto sobre transmissão de bens no direito sucessório.

Em ambos os inventários, judiciais e extrajudiciais, haverá a necessidade


das partes, designarem um representante, que poderá ser um herdeiro ou um
representante legal, para representar o autor da herança através de seu espólio,
em juízo ou fora dele, denominado inventariante. Como exemplo, citamos a
assinatura de uma escritura ou documento, realizar a administração dos bens
que incorporam a herança, ser parte como autor ou réu em ação em que o de cujus
seria parte e, finalmente, viabilizar a realização do processo de inventário.

O inventariante no processo judicial de inventário deverá, sempre que
houver discordância entre as partes, prestar contas pela administração dos bens
que integram o espólio. Caso os demais herdeiros ou integrantes do processo
e interessados não concordem com as contas apresentadas, poderão requerer a
remoção do inventariante de seu cargo.

Outrossim “as contas serão prestadas em ação própria, por dependência
aos autos de inventário” (FARIA, 2017, p. 405). A ação de prestar contas está
prevista nos artigos 550 a 553, do Código de Processo Civil, aproveitaremos para
transcrevê-los a seguir a fim de ilustrar o procedimento.

Art. 550. Aquele que afirmar ser titular do direito de exigir contas
requererá a citação do réu para que as preste ou ofereça contestação
no prazo de 15 (quinze) dias.
§ 1° Na petição inicial, o autor especificará, detalhadamente, as
razões pelas quais exige as contas, instruindo-a com documentos
comprobatórios dessa necessidade, se existirem.
§ 2° Prestadas as contas, o autor terá 15 (quinze) dias para se manifestar,
prosseguindo-se o processo na forma do Capítulo X do Título I deste Livro.
§ 3° A impugnação das contas apresentadas pelo réu deverá ser
fundamentada e específica, com referência expressa ao lançamento
questionado.
§ 4° Se o réu não contestar o pedido, observar-se-á o disposto no art. 355.
§ 5° A decisão que julgar procedente o pedido condenará o réu a
prestar as contas no prazo de 15 (quinze) dias, sob pena de não lhe ser
lícito impugnar as que o autor apresentar.

120
TÓPICO 2 — DUALIDADE DE PROCEDIMENTOS: INVENTÁRIO JUDICIAL E EXTRAJUDICIAL

§ 6° Se o réu apresentar as contas no prazo previsto no § 5°, seguir-


se-á o procedimento do § 2°, caso contrário, o autor apresentá-las-á no
prazo de 15 (quinze) dias, podendo o juiz determinar a realização de
exame pericial, se necessário.
Art. 551. As contas do réu serão apresentadas na forma adequada,
especificando-se as receitas, a aplicação das despesas e os investimentos,
se houver.
§ 1° Havendo impugnação específica e fundamentada pelo autor, o juiz
estabelecerá prazo razoável para que o réu apresente os documentos
justificativos dos lançamentos individualmente impugnados.
§ 2° As contas do autor, para os fins do  art. 550, § 5°, serão
apresentadas na forma adequada, já instruídas com os documentos
justificativos, especificando-se as receitas, a aplicação das despesas e
os investimentos, se houver, bem como o respectivo saldo.
Art. 552. A sentença apurará o saldo e constituirá título executivo judicial.
Art. 553. As contas do inventariante, do tutor, do curador, do
depositário e de qualquer outro administrador serão prestadas
em apenso aos autos do processo em que tiver sido nomeado.
Parágrafo único. Se qualquer dos referidos no  caput  for condenado
a pagar o saldo e não o fizer no prazo legal, o juiz poderá destituí-lo,
sequestrar os bens sob sua guarda, glosar o prêmio ou a gratificação
a que teria direito e determinar as medidas executivas necessárias à
recomposição do prejuízo.

Acadêmico, lembramos mais uma vez que esse procedimento não deverá
ocorrer no inventário extrajudicial, pois sua realização está condicionada ao
acordo entre os herdeiros e partes envolvidas no processo de inventário e partilha
dos bens do de cujus.

Caso houvesse divergência e desconfiança entre os envolvidos, o único


caminho plausível para dirimir os conflitos existentes seria ingressar com um
processo judicial de inventário e partilha.

Podemos concluir que há mais semelhanças que diferenças entre os


procedimentos judiciais e extrajudiciais de inventário e partilha de bens que
compõe a herança. Nos dois procedimentos poderão ser realizadas a aceitação e a
renúncia da herança; cessão de direitos hereditários a terceiros; o reconhecimento
de união estável, quando não houver oposição das partes; a sobrepartilha; e o
inventário negativo, quando o falecido não deixa bens para partilhar. Falaremos
detalhadamente sobre cada um deles na nossa última unidade.

3 DO CARÁTER EXCEPCIONAL DO INVENTÁRIO


EXTRAJUDICIAL
Como esclarecemos ao longo deste estudo, o inventário extrajudicial é
um procedimento opcional, podendo as partes escolherem a via judicial caso
desejarem e entenderem ser a mais adequada para sanar os problemas que
poderão surgir ao longo deste percurso.

121
UNIDADE 2 — DO INVENTÁRIO EXTRAJUDICIAL E O FENÔMENO DA DESJUDICIALIZAÇÃO DO DIREITO SUCESSÓRIO

Como estabelece o artigo 2° da Resolução de n° 35 do Conselho Nacional


de Justiça: “é facultada aos interessados a opção pela via judicial ou extrajudicial;
podendo ser solicitada, a qualquer momento, a suspensão, pelo prazo de 30 dias,
ou a desistência da via judicial, para promoção da via extrajudicial”, assim, caso
as partes estejam promovendo o processo de inventário por via judicial, desde
que todos os envolvidos estejam em acordo, poderá o procedimento ser finalizado
por via extrajudicial por meio de escritura pública.

Entretanto, caso um dos herdeiros ou parte do inventário judicial for menor


de idade, ou incapaz, ou mesmo existir a necessidade de autorização judicial
para levantamento de alguma quantia em dinheiro para dar prosseguimento ao
inventário, a mudança para o inventário extrajudicial não será possível. É o que
nos ensina o artigo n° 610 do Código de Processo Civil, veja:

Art. 610. Havendo testamento ou interessado incapaz, proceder-se-á


ao inventário judicial.
§ 1° Se todos forem capazes e concordes, o inventário e a partilha
poderão ser feitos por escritura pública, a qual constituirá documento
hábil para qualquer ato de registro, bem como para levantamento de
importância depositada em instituições financeiras.

Quanto à existência de testamento deixado pelo falecido, trataremos com


calma nos próximos tópicos por ser um tema atual e extremamente importante.
Outra facilidade trazida pelo inventário extrajudicial está na possibilidade da
conclusão de vários inventários pendentes em uma mesma escritura pública. A
cumulação de inventários também é denominada de inventários conjuntos, por
serem processados ao mesmo tempo.

É muito comum em nossa sociedade postergarmos a realização de
inventário de partilha de heranças após o falecimento do membro da família, são
inúmeros os motivos que levam a esta prática, assim poderá em uma escritura
pública constar as várias sucessões ocorridas ao longo dos anos.

Essa possibilidade está prevista no artigo n° 672 do Código de Processo


Civil, sendo aplicado em ambos procedimentos, judicial e administrativo, mas
deverão ser respeitadas as exigências de identidade de herdeiros e dependência
de uma partilha em relação à outra. Assim:

Art. 672. É lícita a cumulação de inventários para a partilha de heranças


de pessoas diversas quando houver:
I- identidade de pessoas entre as quais devam ser repartidos os bens;
II- heranças deixadas pelos dois cônjuges ou companheiros;
III- dependência de uma das partilhas em relação à outra.
Parágrafo único. No caso previsto no inciso III, se a dependência
for parcial, por haver outros bens, o juiz pode ordenar a tramitação
separada, se melhor convier ao interesse das partes ou à celeridade
processual.

122
TÓPICO 2 — DUALIDADE DE PROCEDIMENTOS: INVENTÁRIO JUDICIAL E EXTRAJUDICIAL

Entretanto, devemos ficar atentos aqui para a necessidade de pagar


os impostos relativos a cada abertura sucessória, ou seja, caso cinco membros
falecidos de uma família cujo processo de inventário e partilha esteja pendente,
será necessário pagar os impostos relacionados a cada falecido bem como as taxas
e emolumentos cartorárias para cada um dos inventários realizados.

O procedimento ocorrerá da seguinte forma: “o Tabelião deverá


relacionar os herdeiros e os bens existentes na primeira sucessão elaborando
a partilha como se o segundo inventariado fosse vivo” (FARIA, 2017, p. 462) e
assim, sucessivamente com os demais herdeiros e falecidos. A acumulação de
sucessões praticamente narrará a história sucessória desta família, como uma
árvore genealógica.

123
RESUMO DO TÓPICO 2
Neste tópico, você aprendeu que:

• No procedimento judicial e extrajudicial de inventário e partilha poderão ser


realizadas a aceitação e a renúncia da herança; cessão de direitos hereditários a
terceiros; o reconhecimento de união estável, quando não houver oposição das
partes; a sobrepartilha; e o inventário negativo.

• O inventário e a partilha judicial e extrajudicial deverão atender aos requisitos


fiscais para ser concluído.

• Existe a possibilidade de utilizar a Ação de Prestação de Contas como meio de


corrigir desvios praticados pelo inventariante, entretanto, isso só poderá ser
usado nos inventários judiciais.

• O inventário extrajudicial além de ser célere e prático, possibilita a realização


de inúmeras sucessões, facilitando a finalização de inventários pendentes de
membros de uma mesma família.

124
AUTOATIVIDADE

1 Sobre inventário e partilha extrajudicial (Lei n° 11.441/07), pode-se afirmar:

I- Faculta-se a via extrajudicial quando todos os herdeiros forem


capazes, concordes e inexistir testamento do autor da herança.
II- O inventário extrajudicial dispensa a intervenção de advogado
na escritura pública.
III- A via extrajudicial é vedada às sucessões abertas antes
da vigência da Lei n° 11.441/07 ou quando já em curso o
inventário judicial.
IV- A escritura pública de inventário e partilha extrajudicial
deverá ser levada ao Judiciário para a devida homologação.

a) ( ) Estão corretas apenas as assertivas I, II e IV.


b) ( ) Somente a assertiva I está correta.
c) ( ) Estão corretas apenas as assertivas II e III.
d) ( ) Estão corretas apenas as assertivas I e III.

2 Há diferenciação no prazo de abertura e conclusão de inventário judicial


e extrajudicial?

3 Qual é o papel do inventariante em um processo de inventário e partilha?

4 Assinale a seguir a alternativa INCORRETA:

a) ( ) Será sempre judicial a partilha, se os herdeiros divergirem, assim como


se algum deles for incapaz.
b) ( ) No partilhar os bens, não será observada a maior igualdade possível
quanto ao seu valor, natureza e qualidade.
c) ( ) É válida a partilha feita por ascendente, por ato entre vivos ou de última
vontade, contanto que não prejudique a legítima dos herdeiros necessários.
d) ( ) Se os herdeiros forem capazes, poderão fazer partilha amigável, por
escritura pública, termo nos autos do inventário, ou escrito particular,
homologado pelo juiz.

5 Assinale a alternativa que apresenta afirmação correta a respeito da


disciplina da realização de inventário, partilha e divórcio consensual,
instituída pela Lei n° 11.441/2007.

a) ( ) Havendo testamento ou interessado incapaz, poderá fazer-se o


inventário e a partilha por escritura pública, a qual constituirá título
hábil para o registro imobiliário.
b) ( ) A escritura do divórcio consensual não depende de homologação judicial
e constitui título hábil para o registro civil e o registro de imóveis.

125
c) ( ) O tabelião somente lavrará a escritura pública se todas as partes
interessadas estiverem de comum acordo, sendo facultativa a assistência
por advogado.
d) ( ) O divórcio consensual pode ser realizado por escritura pública, na
qual constarão as disposições relativas à descrição e à partilha dos bens
comuns e à pensão alimentícia dos filhos menores.

126
TÓPICO 3 —
UNIDADE 2

QUESTÕES CONTROVERTIDAS SOBRE


INVENTÁRIO E PARTILHA

1 INTRODUÇÃO
Caro acadêmico, após termos aprendido questões relacionadas aos
aspectos gerais do inventário extrajudicial, neste terceiro tópico, trataremos de
algumas questões controvertidas sobre o inventário e a partilha com o fim de
complementarmos nossos estudos.

De início, abordaremos os bens e direitos que dispensam a realização


de inventário e partilha, seja judicial ou administrativo. Também trataremos da
(im)possibilidade de se realizar inventário extrajudicial mesmo quando houver
testamento, dando destaque para a recente decisão dada pela 4ª Turma do STJ
no bojo do REsp 1.808.767-RJ, a qual autorizou a possibilidade de realização de
inventário extrajudicial, ainda que exista testamento, se os interessados forem
capazes e concordes e estiverem assistidos por advogado.

Bons estudos!

2 DOS BENS E DIREITOS QUE DISPENSAM INVENTÁRIO


E PARTILHA
Analisaremos aqui os bens e direitos que incorporam o patrimônio do
falecido, mas que não necessitarão da realização do procedimento de inventário
para serem partilhados. Vamos lá!

Abordaremos, inicialmente, a dispensa de realização de inventário
para certos bens e direitos. Observamos que não haverá diferenciação entre os
procedimentos judiciais e extrajudiciais, como prevê o artigo n° 666 do Código
de Processo Civil, que dita: “independerá de inventário ou de arrolamento o
pagamento dos valores previstos na Lei n° 6.858, de 24 de novembro de 1980”. E
o que está escrito nessa lei? Veja no trecho a seguir:

Art. 1° - Os valores devidos pelos empregadores aos empregados


e os montantes das contas individuais do Fundo de Garantia do
Tempo de Serviço e do Fundo de Participação PIS-PASEP, não
recebidos em vida pelos respectivos titulares, serão pagos, em quotas

127
UNIDADE 2 — DO INVENTÁRIO EXTRAJUDICIAL E O FENÔMENO DA DESJUDICIALIZAÇÃO DO DIREITO SUCESSÓRIO

iguais, aos dependentes habilitados perante a Previdência Social ou


na forma da legislação específica dos servidores civis e militares,
e, na sua falta, aos sucessores previstos na lei civil, indicados em
alvará judicial, independentemente de inventário ou arrolamento.

Art. 2° - O disposto nesta Lei se aplica às restituições relativas ao


Imposto de Renda e outros tributos, recolhidos por pessoa física, e,
não existindo outros bens sujeitos a inventário, aos saldos bancários
e de contas de cadernetas de poupança e fundos de investimento de
valor até 500 (quinhentas) Obrigações do Tesouro Nacional.

As 500 (quinhentas) obrigações do Tesouro Nacional foram extintas e
substituídas pelo BNT (Bônus do Tesouro Nacional), devendo acompanhar as
variações dos índices de correção na data da abertura da sucessão, conferindo o
valor máximo permitido para proceder esta forma de levantamento de valores.
Vejamos a seguinte explicação:

O teto se aplica cumulativamente, considerando-se o valor total


dos depósitos, na data do óbito do titular das contas. Configurada
essa situação e não existindo outros bens sujeitos a inventário,
caberá aos dependentes o direito de saque, mediate requerimento
ao banco depositário, com certidão comprobatória da dependência.
Faz-se necessária a alteração desse critério de valor dos depósitos
bancários para levantamento por dependentes do falecido, para que
se adote determinado número de salários mínimos, à semelhança do
disposto no art. 664 do Código de Processo Civil para o arrolamento
simples, que é limitado ao valor de 1.000 salários mínimos […]
Se o valor exceder ao teto disposto na lei para o levantamento de saldos
bancários, ou havendo outros bens sujeitos a inventário, o direito
competirá aos sucessores do falecido, mediante alvará judicial. Mas,
ainda nesses casos, fica ressalvada a percepção, pelos dependentes,
do valor até aquele limite, quando houver saldo superior, ou bens
de outra natureza, que competiriam aos sucessores (AMORIM;
OLIVEIRA, 2020, p. 476).

A referida lei dispõe sobre o pagamento aos sucessores do falecido,


de valores existentes em contas de Fundo de Garantia do Tempo de Serviço e
do Fundo de Participação PIS-PASEP, valores de salários, saldos bancários e
aplicações em cadernetas de poupança, não recebidos pelo autor da herança
quando vivo.

Assim, reforçamos aqui que estes valores serão destinados aos


dependentes do falecido habilitados junto ao serviço de Previdência Social, estes
deverão se dirigir à instituição financeira que possui estes valores para poder
levantá-los, apresentar um documento comprovando esta relação. Não havendo
dependentes, caberá aos sucessores legais do falecido.

Por sucessores legais temos o cônjuge sobrevivente e os herdeiros
necessários previstos no Código Civil. É neste sentido o seguinte julgado do
Superior Tribunal de Justiça (STJ):

128
TÓPICO 3 — QUESTÕES CONTROVERTIDAS SOBRE INVENTÁRIO E PARTILHA

PROCESSO CIVIL E ADMINISTRATIVO. AGRAVO INTERNO


NO AGRAVO EM RECURSO ESPECIAL. SERVIDOR PÚBLICO.
FALECIMENTO DO TITULAR DO DIREITO NO CURSO DA
AÇÃO. HABILITAÇÃO PROCESSUAL DO BENEFICIÁRIO DE
PENSÃO POR MORTE. DESNECESSIDADE DE INVENTÁRIO OU
ARROLAMENTO DE BENS. AGRAVO INTERNO DA UNIÃO A
QUE SE NEGA PROVIMENTO.
1. Na hipótese dos autos, deu-se provimento ao Recurso Especial
do Particular ao entendimento de que, ocorrendo o falecimento dos
autos no curso do processo, seus dependentes previdenciários podem
habilitar-se para receber os valores devidos, possuindo preferência os
dependentes habilitados à pensão por morte em relação aos demais
sucessores do de cujus.
2. É firme a jurisprudência desta Corte Superior de que os dependentes
previdenciários têm legitimidade processual para pleitear valores não
recebidos em vida pelo de cujus, independentemente de inventário
ou arrolamento de bens. Precedentes: REsp. 1.650.339/RJ. Rel. Min.
REGINA HELENA COSTA, DJe 12.11.2018; AgRg no REsp. 726.484/
RJ, Rel. Min. ROGERIO SCHIETTI CRUZ, DJe 27.2.2014; AgRg no
REsp. 1.260.414/CE, Rel. Min. LAURITA VAZ, DJe 26.3.2013. 3. Agravo
Interno da UNIÃO a que se nega provimento.
(STJ – AgInt no AREsp: 820207 SP 2015/028449-7, Relator: Ministro
NAPOLEÃO NUNES MAIA FILHO, Data de Julgamento: 14/10/2019,
T1 – PRIMEIRA TURMA, Data de Publicação: DJe 21/10/2019)

Esses valores poderão ser levantados por meio de alvará judicial, que
corresponde a uma autorização judicial para se fazer ou praticar algum ato.
Em inventário poderá ser requerido alvará em seus próprios autos, em apenso
ou em procedimento autônomo. Tem como finalidade facilitar o levantamento
de pequenas quantias deixadas pelo autor da herança, como exemplo temos os
valores deixados em contas bancárias, saldos de créditos trabalhistas, previdência
privada, entre outros.

Não haverá necessidade de inventário judicial ou extrajudicial, nos casos


de existência de valores de seguro de vida e de previdência privada, cujo montante
será destinado aos beneficiários contidos na apólice de seguro, seguindo também
o mesmo preceito legal anteriormente mencionado, ou seja, na ausência de
beneficiários estipulados pelo falecido, os herdeiros legais receberão os valores
existentes (AMORIM; OLIVEIRA, 2020, p. 449).

Importante mencionar a atenção máxima aos valores em conta corrente


conjunta com cônjuge supérstite, também chamado de cônjuges sobrevivente,
neste caso, deverá haver a meação correta, levantando apenas aquela que caberia
ao falecido e a destinando aos seus dependentes. Quando o valor exceder o
limite mencionado na lei, como explicado anteriormente, deverá então ser
realizada a partilha por inventário (AMORIM; OLIVEIRA, 2020, p 449), judicial
ou extrajudicial.

129
UNIDADE 2 — DO INVENTÁRIO EXTRAJUDICIAL E O FENÔMENO DA DESJUDICIALIZAÇÃO DO DIREITO SUCESSÓRIO

NOTA

Cônjuge Supérstite: cônjuge sobrevivente (viúvo, viúva), com direito a


meação se o casamento era no regime da comunhão de bens; concorre na herança com
descendentes, conforme o regime de bens; também concorre com os ascendentes; é o
terceiro na ordem de vocação hereditária.

Outros casos em que não haverá necessidade de inventário e partilha são


os direitos reais sob coisa alheia com natureza patrimonial, portando usufruto, o
uso e a habitação, relações jurídicas vitalícias que se extinguem com a morte de
seu titular. Mencionaremos a seguir os ensinamentos do jurista Sílvio de Salvo
Venosa (2008, p. 22):

Várias são as classificações doutrinárias dos direitos reais que facilitam


seu estudo.
A primeira e mais importante distingue os direitos reais sobre a
própria coisa e sobre coisa alheia. Essa divisão obedece à possibilidade
de desdobramento da titularidade do direito real, tornando limitado
o direito de propriedade. Propriedade, condomínio, propriedade
horizontal são direitos reais sobre coisa própria. São direitos sobre
coisa alheia, usufruto, uso, habitação, enfiteuse, servidões, hipoteca,
penhor, anticrese. Nesses últimos, perante o titular ativo e ostensivo
do direito se coloca o proprietário da coisa. Os direitos reais sobre
coisa alheia, por sua vez, dividem-se em direitos de gozo e de garantia.
São de gozo ou fruição os que conferem ao titular faculdades de uso,
atividade e participação efetiva sobre a coisa. Nessa categoria, estão o
usufruto, o uso, a habitação e as servidões positivas.

A enfiteuse, relação muito comum às propriedades existentes em solo


brasileiro da antiga coroa portuguesa e bens da igreja católica, não mais prevista
no atual Código Civil cuja correspondência pode estar no direito de superfície,
constitui uma exceção a realização de inventário e partilha. Explicaremos
brevemente o que significa esse instituto utilizando novamente os ensinamentos
de Venosa (2008, p. 406):

A enfiteuse aproxima-se paralelamente do usufruto, mas dele


distingue-se pela extensão e caráter do direito usufrutuário. Ambos
os direitos de gozo e fruição sobre coisa alheia, o usufrutuário tem
apenas o direito de usar e gozar da coisa, recebendo os frutos. O
direito do enfiteuta é mais amplo, podendo usufruir dos produtos
da coisa, que não se reproduzem, exaurindo-a. O usufrutuário não
pode alterar o bem, ao contrário do enfiteuta. O direito de enfiteuse
transmite-se aos herdeiros, enquanto a morte do usufrutuário ou o
decurso de prazo estabelecido o extingue. O usufruto é temporário;
a enfiteuse é perpétua. O usufrutuário não pode alienar seu direito,
o que é garantido ao enfiteuta. Ademais, a enfiteuse dirige-se

130
TÓPICO 3 — QUESTÕES CONTROVERTIDAS SOBRE INVENTÁRIO E PARTILHA

apenas a terras incultas e terrenos destinados a edificação, restrições


não sofridas pelo usufruto. O instituto da enfiteuse representou
no passado um dos primeiros meios para atribuir fundos a quem
desejasse trabalhar a terra.

Assim, como prevista no art. 692, III, do Código Civil Brasileiro de
1916, “falecendo o enfiteuta, sem herdeiros, salvo o direito dos credores”, e não
existindo estes, a relação jurídica será extinta, impedindo que o Estado adquira
a enfiteuse.

NOTA

Apesar do instituto de enfiteuse não estar mais previsto no atual Código Civil e
a constituição de novas enfiteuses ser proibida pela referida legislação, ainda há enfiteuses
privadas e públicas espalhadas por todo território brasileiro, grande parte está concentrada
no Estado do Rio de Janeiro, nos terrenos da Marinha Brasileira; nas antigas propriedades
da antiga Família Real e das famílias colonizadoras fixadas durante a criação das capitanias
hereditárias; também há enfiteuses nos terrenos da Igreja Católica por todo Brasil.

O direito autoral também não será abrangido pelo direito sucessório, por
ser um direito híbrido, possuindo parte personalíssima, como invento e criação e
parte patrimonial, como exploração e exercício.

Os herdeiros do falecido terão direito à parte patrimonial, mas a parte
personalíssima não se transmitirá. Como exemplo, citamos a música que o
compositor falecido compôs, ela será sempre dele. Assim, o direito autoral se
transmite aos herdeiros pelo prazo de setenta anos, contados de 1° de janeiro do
ano seguinte ao da morte do autor e não do dia da morte.

Ao finalizar esse prazo, a obra cairá em domínio público, podendo
qualquer pessoa explorá-la. No caso de coautoria, o prazo de setenta anos somente
começará a fluir de 1° de janeiro do ano subsequente ao da morte do último autor.

Passaremos a tratar dos casos em que o falecido deixou testamento e as
partes desejam realizar o inventário extrajudicial, por estarem em acordo com
as disposições testamentárias e desejarem dar celeridade ao procedimento legal.
Vamos estudar uma nova possibilidade em nosso ordenamento jurídico!

131
UNIDADE 2 — DO INVENTÁRIO EXTRAJUDICIAL E O FENÔMENO DA DESJUDICIALIZAÇÃO DO DIREITO SUCESSÓRIO

3 DA POSSIBILIDADE DE INVENTÁRIO EXTRAJUDICIAL


QUANDO HOUVER TESTAMENTO
Por diversas vezes ressaltamos os requisitos legais necessários para que
se possa proceder ao inventário extrajudicial. Entre os requisitos, está a ausência
de testamento. Dito de outro modo, o Código de Processo Civil impõe que o
inventário seja realizado por via judicial quando há um testamento (caput do
artigo 610).

Ocorre que, desde a edição da Lei n° 11.401/2007, a qual introduziu a


modalidade extrajudicial de inventário no ordenamento jurídico brasileiro, a
doutrina vem defendendo a possibilidade de que este seja realizado mesmo com
a existência de testamento.

O professor Anderson Schreiber (2020, p. 1432), representando o


descontentamento da doutrina majoritária, afirma que a exigência relativa à
ausência de testamento:

Não tem razão de ser. Pelo contrário, cria no Brasil um cenário insólito
em que o testador que realiza testamento, pretendendo justamente
evitar conflitos futuros entre seus herdeiros, acaba por lhes impor a
via judicial, mesmo que não haja herdeiro incapaz e todos estejam de
acordo quanto à divisão dos bens. Trata-se de verdadeiro contrassenso.

Como consequência do fato de que grande parte da doutrina defende


a possibilidade de se realizar o inventário perante o tabelião de notas, mesmo
quando da existência de testamento, no de 2014 o próprio Colégio Notarial do
Brasil aprovou em seu XIX Congresso Brasileiro o seguinte enunciado: “é possível
o inventário extrajudicial ainda que haja testamento, desde que previamente
registrado em Juízo ou homologado posteriormente perante o Juízo competente”.

No ano seguinte, na VII Jornada de Direito Civil, promovida pelo Conselho


Nacional de Justiça, foi aprovado o enunciado n° 600 com a seguinte redação:
“Após registrado judicialmente o testamento e sendo todos os interessados
capazes e concordes com os seus termos, não havendo conflito de interesses, é
possível que se faça o inventário extrajudicial”.

Não obstante, em 2015, durante do X Congresso Brasileiro de Direito


das Famílias e das Sucessões realizado pelo IBDFAM, foi aprovado o seguinte
enunciado “mesmo quando houver testamento, sendo todos os interessados
capazes e concordes com os seus termos, não havendo conflito de interesses, é
possível que se faça o inventário extrajudicial”.

132
TÓPICO 3 — QUESTÕES CONTROVERTIDAS SOBRE INVENTÁRIO E PARTILHA

NOTA

No ano de 2016, adotando entendimento exarado por meio do enunciado


n° 600 da VII Jornada de Direito Civil, o Provimento n° 37/2006 da Corregedoria-Geral do
Tribunal de Justiça de São Paulo passou a autorizar a realização do inventário extrajudicial
mesmo quando existir testamento. No ano seguinte, o Tribunal do Rio de Janeiro, através
do Provimento n° 21/2007, também adotou o mesmo posicionamento.

No ano de 2017, foi editado o enunciado n° 77, da I Jornada sobre Prevenção


e Solução Extrajudicial de Litígios, com a seguinte redação:

Havendo registro ou expressa autorização do juízo sucessório


competente, nos autos do procedimento de abertura e cumprimento
de testamento, sendo todos os interessados capazes e concordes,
o inventário e partilha poderão ser feitos por escritura pública,
mediante acordo dos interessados, como forma de pôr fim ao
procedimento judicial.

No mesmo ano, veio à tona o enunciado n° 51, da I Jornada de Direito


Processual Civil do CJF:

Havendo registro judicial ou autorização expressa do juízo


sucessório competente, nos autos do procedimento de abertura,
registro e cumprimento de testamento, sendo todos os interessados
capazes e concordes, poderão ser feitos o inventário e a partilha por
escritura pública.

Em sede jurisprudencial, temos que destacar a recente decisão favorável
à realização de inventário extrajudicial mesmo com a existência de testamento
e desde que observados os demais requisitos como maioridade das partes e
acordado entre elas esta vontade, da lavra do Superior Tribunal de Justiça. Tal
decisão foi exarada, por unanimidade, pela 4ª Turma do STJ no bojo do REsp
1.808.767-RJ:

RECURSO ESPECIAL. CIVIL E PROCESSO CIVIL. SUCESSÕES.


EXISTÊNCIA DE TESTAMENTO. INVENTÁRIO EXTRAJUDICIAL.
POSSIBILIDADE, DESDE QUE OS INTERESSADOS SEJAM MAIORES,
CAPAZES E CONCORDES, DEVIDAMENTE ACOMPANHADOS DE
SEUS ADVOGADOS. ENTENDIMENTO DOS ENUNCIADOS 600
DA VII JORNADA DE DIREITO CIVIL DO CJF; 77 DA I JORNADA
SOBRE PREVENÇÃO E SOLUÇÃO EXTRAJUDICIAL DE LITÍGIOS;
51 DA I JORNADA DE DIREITO PROCESSUAL CIVIL DO CJF;
E 16 DO IBDFAM. 1. Segundo o art. 610 do CPC/2015 (art. 982 do
CPC/73), em havendo testamento ou interessado incapaz, proceder-
se-á ao inventário judicial. Em exceção ao caput, o § 1° estabelece, sem
restrição, que, se todos os interessados forem capazes e concordes,
o inventário e a partilha poderão ser feitos por escritura pública, a
qual constituirá documento hábil para qualquer ato de registro, bem

133
UNIDADE 2 — DO INVENTÁRIO EXTRAJUDICIAL E O FENÔMENO DA DESJUDICIALIZAÇÃO DO DIREITO SUCESSÓRIO

como para levantamento de importância depositada em instituições


financeiras. 2. O Código Civil, por sua vez, autoriza expressamente,
independentemente da existência de testamento, que, "se os herdeiros
forem capazes, poderão fazer partilha amigável, por escritura pública,
termo nos autos do inventário, ou escrito particular, homologado pelo
juiz" (art. 2.015). Por outro lado, determina que "será sempre judicial
a partilha, se os herdeiros divergirem, assim como se algum deles for
incapaz" (art. 2.016) – bastará, nesses casos, a homologação judicial
posterior do acordado, nos termos do art. 659 do CPC. 3. Assim, de
uma leitura sistemática do caput e do § 1° do art. 610 do CPC/2015,
c/c os arts. 2.015 e 2.016 do CC/2002, mostra-se possível o inventário
extrajudicial, ainda que exista testamento, se os interessados forem
capazes e concordes e estiverem assistidos por advogado, desde que
o testamento tenha sido previamente registrado judicialmente ou
haja a expressa autorização do juízo competente. 4. A mens legis que
autorizou o inventário extrajudicial foi justamente a de desafogar o
Judiciário, afastando a via judicial de processos nos quais não se
necessita da chancela judicial, assegurando solução mais célere e
efetiva em relação ao interesse das partes. Deveras, o processo deve
ser um meio, e não um entrave, para a realização do direito. Se a via
judicial é prescindível, não há razoabilidade em proibir, na ausência
de conflito de interesses, que herdeiros, maiores e capazes, socorram-
se da via administrativa para dar efetividade a um testamento já tido
como válido pela Justiça. 5. Na hipótese, quanto à parte disponível da
herança, verifica-se que todos os herdeiros são maiores, com interesses
harmoniosos e concordes, devidamente representados por advogado.
Ademais, não há maiores complexidades decorrentes do testamento.
Tanto a Fazenda estadual como o Ministério Público atuante junto ao
Tribunal local concordaram com a medida. Somado a isso, o testamento
público, outorgado em 2/3/2010 e lavrado no 18° Ofício de Notas da
Comarca da Capital, foi devidamente aberto, processado e concluído
perante a 2ª Vara de Órfãos e Sucessões. 6. Recurso especial provido.

No caso em questão, após o Tribunal de Justiça do Estado do Rio de Janeiro


manter a sentença que julgou improcedente o pedido para que um inventário fosse
realizado administrativamente, pois o artigo n° 610 do Código de Processo Civil
determina que o procedimento ocorra na via judicial quando houver testamento, a
4ª Turma do Supremo Tribunal de Justiça reformou a decisão.

Conforme é possível extrair da própria ementa, o Ministro Luís Felipe


Salomão, relator do recurso especial em questão, aplicou uma nova forma de
interpretar o art. n° 610 do CPC para chegar à conclusão de ser plenamente
possível que, mesmo havendo testamento, realize-se o processo de inventário e
partilha de herança por meio do tabelionato de notas.

Segundo o Ministro, a partir de uma leitura sistemática do caput e


do § 1° do art. n° 610 do Código de Processo Civil vigente combinado com os
artigos nos 2.015 e 2.016 do Código Civil de 2002, mostra-se possível o inventário
extrajudicial, ainda que exista testamento, se os interessados forem capazes e
concordes e estiverem assistidos por advogado, desde que o testamento tenha
sido previamente registrado judicialmente ou haja a expressa autorização do
juízo competente.

134
TÓPICO 3 — QUESTÕES CONTROVERTIDAS SOBRE INVENTÁRIO E PARTILHA

Defendeu que a mens legis, termo em latim que significa “espírito da lei”, ou
seja, o verdadeiro significado atribuído a lei, autorizou o inventário extrajudicial
a justamente desafogar o Judiciário, afastando a via judicial de processos nos
quais não se necessita da chancela judicial, assegurando solução mais célere e
efetiva em relação ao interesse das partes.

Ademais, o Ministro se valeu do argumento de que o processo deve ser


um meio e não um entrave, para a realização do direito. Se a via judicial não é
obrigatória, não há razoabilidade em proibir, na ausência de conflito de interesses,
que herdeiros, maiores e capazes, socorram-se da via administrativa para dar
efetividade a um testamento já tido como válido pela Justiça. Defendeu em seu
voto a operacionalização da transmissão hereditária.

Vale a transcrição de pequeno trecho do voto do Ministro Relator:

Data venia, não parece razoável obstar a realização do inventário


e da partilha por escritura pública quando há registro judicial do
testamento (já que haverá definição precisa dos seus termos) ou
autorização do juízo sucessório (ao constatar que inexistem discussões
incidentais que não possam ser dirimidas na via administrativa), sob
pena de violação a princípios caros de justiça, como a efetividade da
tutela jurisdicional e a razoável duração do processo (grifos nossos)
(STJ, 2019, p. 9).

ATENCAO

Acadêmico, a referida decisão do STJ não exime os herdeiros instaurem o


processo judicial para abertura, registro e cumprimento de testamento.

É importante lembrar que é obrigatório que todo testamento, para o


cumprimento, seja antes registrado em juízo. Para tanto, é necessário se valer
de processo judicial específico denominado “ação judicial de cumprimento de
testamento”, regulado pelos artigos nos 735 a 737 do Código de Processo Civil vigente.

Nesse ato de abertura e registro de testamento, que é judicial, possíveis


vícios formais serão apreciados e o testamento somente será executado
se atender aos requisitos formais. Assim, de um modo ou de outro, o
inventário extrajudicial somente poderá ser iniciado após o registro
do testamento e da ordem de cumprimento em processo judicial
específico (FIGUEREIDO, 2015, p. 97-98).

135
UNIDADE 2 — DO INVENTÁRIO EXTRAJUDICIAL E O FENÔMENO DA DESJUDICIALIZAÇÃO DO DIREITO SUCESSÓRIO

Transcreveremos os artigos nos 735 e 737 do Código de Processo Civil para


ilustrar o comentário anterior:

Art. 735. Recebendo testamento cerrado, o juiz, se não achar vício


externo que o torne suspeito de nulidade ou falsidade, o abrirá e
mandará que o escrivão o leia em presença do apresentante.

§ 1° Do termo de abertura constarão o nome do apresentante e como


ele obteve o testamento, a data e o lugar do falecimento do testador,
com as respectivas provas, e qualquer circunstância digna de nota.

§ 2° Depois de ouvido o Ministério Público, não havendo dúvidas


a serem esclarecidas, o juiz mandará registrar, arquivar e cumprir o
testamento.

§ 3° Feito o registro, será intimado o testamenteiro para assinar o


termo da testamentária.

§ 4° Se não houver testamenteiro nomeado ou se ele estiver ausente


ou não aceitar o encargo, o juiz nomeará testamenteiro dativo,
observando-se a preferência legal.

§ 5° O testamenteiro deverá cumprir as disposições testamentárias e


prestar contas em juízo do que recebeu e despendeu, observando-se
o disposto em lei.

Art. 737. A publicação do testamento particular poderá ser requerida,


depois da morte do testador, pelo herdeiro, pelo legatário ou pelo
testamenteiro, bem como pelo terceiro detentor do testamento, se
impossibilitado de entregá-lo a algum dos outros legitimados para
requerê-la.

§ 1° Serão intimados os herdeiros que não tiverem requerido a


publicação do testamento.

§ 2° Verificando a presença dos requisitos da lei, ouvido o Ministério


Público, o juiz confirmará o testamento.

§ 3° Aplica-se o disposto neste artigo ao codicilo e aos testamentos


marítimo, aeronáutico, militar e nuncupativo.

§ 4° Observar-se-á, no cumprimento do testamento, o disposto nos


parágrafos do art. 735.

Portanto, mesmo que o falecido deixe testamento, será possível realizar


o inventário extrajudicial desde que estejam cumpridos os demais requisitos e
que antes do inventário, os herdeiros instaurem o processo judicial para abertura,
registro e cumprimento de testamento.

Acadêmico, note que a decisão da 4ª Turma veio ao encontro dos reclamos


da doutrina amplamente majoritária e, também, das práticas já adotadas em
âmbito de vários Tribunais locais, tais com o Tribunal de Justiça do Estado
de São Paulo e do Tribunal de Justiça do Estado do Rio de Janeiro, conforme
destacamos anteriormente.

136
TÓPICO 3 — QUESTÕES CONTROVERTIDAS SOBRE INVENTÁRIO E PARTILHA

NOTA

O Conselho Nacional de Justiça ainda não regulamentou a possibilidade de se


realizar o inventário extrajudicial mesmo havendo testamento.

Porém, tal decisão, por si só, não têm caráter vinculante. De qualquer
forma, é inegável que se trata do reconhecimento, por parte da jurisprudência
daquilo que já era de muito tempo exigido: “a desburocratização/desjudicialização
do procedimento inventário” (TARTUCE, 2020, p. 03), o que, em última análise,
dá azo à concretização do princípio do acesso à justiça.

Acadêmico, saiba também que está em tramitação no Senado Federal,


o Projeto de Lei n° 217/2018 que visa alterar o artigo n° 610 do Código de
Processo Civil para possibilitar que, mesmo havendo interessado incapaz, o
inventário e a partilha poderão ser feitos por escritura pública, caso em que o
Ministério Público deverá fiscalizar em conformidade com a ordem jurídica.
O procedimento deverá ser submetido à apreciação do juiz, caso o tabelião,
o Ministério Público ou terceiro se manifestem contrariamente aos termos
propostos. Veja a proposta de redação:

Art.610 Havendo testamento, proceder-se-á ao inventário judicial.

§ 1.° Se todos forem concordes, o inventário e a partilha poderão ser


feitos por escritura pública, a qual constituirá documento hábil para
qualquer ato de registro, bem como para levantamento de importância
depositada em instituições financeiras.

§ 2.° O tabelião somente lavrará a escritura pública se todas as partes


interessadas estiverem assistidas por advogado ou por defensor
público, cuja qualificação e assinatura constarão do ato notarial.

§ 3.° Havendo interessado incapaz, o Ministério Público deverá se


manifestar no procedimento, para fiscalizar a conformidade com a
ordem jurídica do inventário e da partilha feitos por escritura pública.

§ 4.° Na hipótese do § 3.°, caso o tabelião se recuse a lavrar a escritura


nos termos propostos pelas partes, ou caso o Ministério Público
ou terceiro a impugnem, o procedimento deverá ser submetido à
apreciação do juiz.

Em defesa de tal proposta legislativa, o professor Flávio Tartuce concluí


em seu artigo, Inventário Extrajudicial com Testamento (2019, s.p.) o seguinte:

Pelas projeções, nota-se que o Ministério Público passa a atuar nos


inventários extrajudiciais, diretamente no Tabelionato de Notas,
o que já ocorre em outros Países, como em Portugal. Aguarda-se,
assim, que uma das proposições citadas seja aprovada com brevidade

137
UNIDADE 2 — DO INVENTÁRIO EXTRAJUDICIAL E O FENÔMENO DA DESJUDICIALIZAÇÃO DO DIREITO SUCESSÓRIO

pelo Congresso Nacional, retirando-se definitivamente entraves


burocráticos do inventário extrajudicial, que não fazem mais o menor
sentido, e efetivando-se a saudável e esperada desjudicialização.

Paralelamente, tramita na Câmara dos Deputados o Projeto de Lei n°


9.496/2018, de autoria da Comissão Mista Temporária de Desburocratização, criada
pelo Ato Conjunto dos Presidentes do Senado e da Câmara (ATN) n° 3, de 2016.

Esee projeto também tem por objetivo facilitar e ampliar a utilização da via
extrajudicial para a realização de inventários e partilhas, propondo a revogação do
art. n° 2.016 do Código Civil; dando nova redação ao art. n° 610 e a criação do art.
n° 737-A, ambos do Código de Processo Civil, a seguir transcreveremos a proposta:

Art. 1° A Lei n° 13.105, de 16 de março de 2015 – Código de Processo


Civil, passa a vigorar com as seguintes disposições:

Art. 610. Inexistindo acordo entre os herdeiros e os legatários,


proceder-se-á ao inventário judicial.

§ 1° Se todos os herdeiros e os legatários forem concordes ou se houver


um herdeiro, o inventário e a partilha ou, se for o caso, a adjudicação
poderão ser feitos por escritura pública, a qual constituirá documento
hábil para qualquer ato de registro, bem como para levantamento de
importância depositada em instituições financeiras.

[...]

§ 3° Se houver herdeiro incapaz ou se houver testamento, a eficácia


da escritura pública dependerá de homologação do Ministério
Público, a quem o tabelião de notas submeterá a escritura.

§ 4° Se o Ministério Público desaprovar a escritura, o tabelião de notas,


por requerimento do interessado, submeterá a escritura para o juiz,
que poderá suprir a homologação do Ministério Público por meio de
sentença, em sede do presente procedimento de jurisdição voluntária.”

Art. 737-A. Se todos os herdeiros e os legatários, capazes ou não,


forem concordes, a abertura do testamento cerrado ou a apresentação
dos testamentos público ou particular, bem como o registro e o
cumprimento destes testamentos, além da nomeação do testamenteiro
e da sua prestação de contas, podem ser feitos por escritura pública,
cuja eficácia dependerá de homologação do Ministério Público.

§ 1° A abertura do testamento cerrado deverá ocorrer perante o tabelião


de notas, que lavrará uma escritura pública específica atestando os
fatos e indicando se há ou não vício externo que torne o testamento
eivado de nulidade ou suspeito de falsidade.

§ 2° Na hipótese do § 1° deste artigo, a escritura pública de abertura do


testamento cerrado deverá ser submetida à homologação do Ministério
Público pelo tabelião de notas logo após a sua lavratura.

§ 3° Se o tabelião de notas identificar vício externo que torne o


testamento cerrado eivado de nulidade ou de suspeito de falsidade, ele
deverá submeter a escritura para homologação do Ministério Público.

138
TÓPICO 3 — QUESTÕES CONTROVERTIDAS SOBRE INVENTÁRIO E PARTILHA

§ 4° Se o Ministério Público dissentir do tabelião de notas, este, a


requerimento dos interessados, submeterá a escritura para o juiz,
que decidirá por meio de sentença em sede de procedimento de
jurisdição voluntária.

§ 5° Em qualquer caso deste artigo, se o Ministério Público desaprovar


a escritura, o tabelião de notas, por requerimento do interessado,
submeterá a escritura para o juiz, que poderá suprir a homologação
do Ministério Público por meio de sentença em sede do presente
procedimento de jurisdição voluntária.

§ 6° É dispensada a publicação do testamento particular na hipótese


deste artigo.

Art. 2° Revoga-se o art. 2.016 da Lei n° 10.406, de 10 de janeiro de 2002


– Código Civil.

Em ambos os projetos o objetivo pretendido é o mesmo, dar celeridade


e desburocratizar o processamento de inventários e partilha por meio da via
extrajudicial. Portanto, havendo consenso entre os herdeiros, a via judicial poderá
ser preterida, sem que a opção pelo inventário extrajudicial implique risco aos
incapazes que fizerem jus à herança, haja vista que a respectiva escritura pública
somente surtirá efeitos após ser homologada pelo Ministério Público.

Do mesmo modo, quando existir Testamento Cerrado ou a apresentação


dos Testamentos Público ou Particular, no momento de sua abertura, os herdeiros,
capazes ou não, poderão optar pelo caminho extrajudicial, sendo que o Ministério
Público também deverá ser acionado pelo Tabelião, a fim de resguardar as
disposições de última vontade do de cujus.

Entretanto, para que reste justificada a opção pela via extrajudicial, é


salutar garantir a celeridade na tramitação da escritura pública entre o Tabelião
e o Ministério Público e, ainda, assegurar a modicidade dos custos relativos aos
emolumentos cartorários, posto ser ainda um tema polêmico e não pacificado
em nosso ordenamento jurídico, igualmente a relação entre o custo e o benefício
devem ser levados em consideração.

Assim, concluímos que a passos lentos, mas caminhando, a


desburocratização toma forma em nosso ordenamento jurídico, principalmente,
no que toca os principais atos da vida do cidadão, como nascimento, casamento e
morte. Como a evolução do procedimento de inventário extrajudicial, o processo
deverá ser simplificado e não traumático, pois já basta o luto das partes.

Por aqui terminamos os estudos da Unidade 2! Na próxima unidade,


centraremos esforços nas minúcias procedimentais do inventário extrajudicial.
Até mais!

139
UNIDADE 2 — DO INVENTÁRIO EXTRAJUDICIAL E O FENÔMENO DA DESJUDICIALIZAÇÃO DO DIREITO SUCESSÓRIO

LEITURA COMPLEMENTAR

O INVENTÁRIO EXTRAJUDICIAL ANTE A EXISTÊNCIA DE


TESTAMENTO

Vitor Kümpel e Giselle de Menezes Viana

Em que pese a incidência do princípio da  saisine,  determinando a


transmissão automática da herança no momento de abertura da sucessão (art. n°
1784 do Código Civil), é necessário um procedimento posterior de apuração de
ativos e passivos, para permitir o pagamento de eventuais dívidas e a partilha
aos herdeiros.

De fato, com a abertura da sucessão, os bens são transferidos aos


sucessores, mas como um todo unitário e indivisível (art. n° 1.790, parágrafo
único, do Código Civil). Daí a necessidade do inventário e da partilha,
permitindo a divisão por quinhões a cada herdeiro e a consolidação da
transmissão patrimonial1.

No que diz respeito ao aspecto procedimental, antes da Lei n° 11.441/2007,


os inventários processavam-se exclusivamente no âmbito judicial. Porém, com a
entrada em vigor da referida Lei – que, dentre outras providências, modificou o
art. n° 982 do antigo Código de Processo Civil de 1973 – conferiu-se um inédito
protagonismo aos notários na operacionalização da transmissão  causa mortis,
tanto na etapa do inventário quanto da partilha.

Assim, admitiu-se o processamento dos inventários e partilhas também


pela via extrajudicial, possibilidade preservada pelo atual Código de Processo
Civil (art. n° 610, §§ 1° e 2°)2. Desde 2007, portanto, o procedimento de apuração
do patrimônio líquido deixado pelo falecido, culminando na partilha aos
herdeiros, pode ser realizado não apenas em juízo, mas também por escritura
pública, perante o tabelião de notas de livre escolha dos interessados.

Vale dizer, desde que atendidos os pressupostos e requisitos legalmente


fixados, os interessados poderão escolher entre a via judicial e a extrajudicial para
a operacionalização do inventário e da partilha3.

A escritura, assim concebida, constitui título hábil para o registro


imobiliário e demais órgãos e repartições públicas e privadas para a
transferência de bens e direitos, bem como para promoção de todos os atos
necessários à materialização das transferências de bens e levantamento de
valores, independentemente de homologação judicial4.

140
TÓPICO 3 — QUESTÕES CONTROVERTIDAS SOBRE INVENTÁRIO E PARTILHA

Essa inovação se alinhou a uma tendência crescente nas últimas décadas


em prestigiar a atividade dos notários e registradores, ampliando seu âmbito de
atuação. Isso não apenas pela destacada celeridade e segurança jurídica que as
serventias extrajudiciais garantem, mas também pelo consequente desafogamento
do Poder Judiciário, que pode então se concentrar na resolução de questões
efetivamente litigiosas.

É neste ponto, aliás, que reside a nota característica dos procedimentos


atribuídos às serventias extrajudiciais: a ausência de litigiosidade. Por isso, a lei
exige como pressuposto para a viabilidade do processamento extrajudicial do
inventário que as partes sejam plenamente capazes e concordes, exigindo também
a inexistência de testamento válido e eficaz deixado pelo falecido.

A inexistência de testamento como pressuposto para a via extrajudicial

Como acima mencionado, a opção pela via extrajudicial não se


compatibiliza com a existência de litigiosidade, daí se exigir a concordância entre
os interessados. Estes, até para que possam expressar sua concordância, devem
ser plenamente capazes. O art. n° 610 do CPC é claro nesse sentido, afirmando,
em seu § 1°, que o inventário e a partilha poderão ser feitos por escritura pública
"se todos forem capazes e concordes". Essa exigência complementa o disposto
no  caput,  segundo o qual impõe-se a via judicial se houver testamento ou
interessado incapaz.

Do referido  caput, depreende-se o outro pressuposto do inventário


extrajudicial, qual seja, a inexistência de testamento válido e eficaz do falecido.
Visando operacionalizar essa exigência, o provimento 56/2016 do Conselho
Nacional de Justiça tornou obrigatória, para a lavratura de escrituras públicas de
inventário extrajudicial, a juntada de certidão acerca da inexistência de testamento
deixado pelo autor da herança. Tal certidão é expedida, a pedido de interessado
e mediante apresentação da certidão de óbito, pela CENSEC – Central Notarial
de Serviços Compartilhados, que engloba, dentre seus módulos de informação,
o Registro Central de Testamentos On-line (RCTO), responsável por recepcionar
informações sobre a lavratura de testamentos públicos e instrumentos de
aprovação de testamentos cerrados em todo o Brasil5.

Flexibilização da exigência: precedentes

A regra do caput do art. n° 610 do Código de Processo Civil, no que diz


respeito à imposição da via judicial ante a existência de testamento, não foi
considerada absoluta pela doutrina nem pela jurisprudência. Cite-se, por exemplo,
o Enunciado n° 600 da VII Jornada de Direito Civil do CJF, segundo o qual "após
registrado judicialmente o testamento  e sendo todos os interessados capazes e
concordes com os seus termos, não havendo conflito de interesses, é possível
que se faça o inventário extrajudicial". Também nessa linha se posicionaram as
Corregedorias das Justiças dos diversos estados, editando normas que igualmente
excepcionam a referida exigência.

141
UNIDADE 2 — DO INVENTÁRIO EXTRAJUDICIAL E O FENÔMENO DA DESJUDICIALIZAÇÃO DO DIREITO SUCESSÓRIO

É o caso das normas extrajudiciais paulistas, que, com a edição do


Provimento 37/20166, passaram a permitir o processamento do inventário, pela
via administrativa, quando houver expressa autorização do juízo sucessório
competente, nos autos do procedimento de abertura e cumprimento do testamento,
com todos os interessados capazes e concordes7. Regra idêntica foi incorporada à
Consolidação Normativa do Rio de Janeiro8, a partir do Provimento 24/2017.

As normas paulistas também admitiram o inventário extrajudicial nas


hipóteses de testamento revogado ou caduco ou, ainda, quando houver decisão
judicial, com trânsito em julgado, declarando a invalidade do testamento,
observadas a capacidade e a concordância dos herdeiros9.

Porém, nesse caso, cabe ao notário, de forma prévia, solicitar a certidão


do testamento, a fim de constatar a existência de disposição, reconhecendo filho
ou qualquer outra declaração de caráter irrevogável, caso em que a lavratura
de escritura pública de inventário e partilha ficará vedada, processando-se o
inventário exclusivamente pela via judicial10.

De forma semelhante determinou o Código de Normas da Corregedoria


Geral da Justiça do Estado de Santa Catarina, tanto ao permitir o inventário por
escritura pública na hipótese de testamento revogado, caduco ou invalidado
por decisão judicial transitada em julgado11, quanto ao admiti-lo se já ocorrida
a abertura do testamento em juízo e o cumprimento de todas as disposições
testamentárias12.

Posicionamento do STJ

A questão da compatibilidade entre o processamento extrajudicial do


inventário e a preexistência de testamento foi recentemente abordada pela 4ª
Turma do STJ, por ocasião do julgamento do REsp 1.808.767/RJ, ocorrido em
15/10/2019 e relatado pelo ministro Luis Felipe Salomão.

A Corte concluiu, de forma unânime, pela possibilidade de inventário


extrajudicial mesmo havendo testamento do falecido, desde que este tenha sido
previamente registrado judicialmente ou se tenha a expressa autorização do juízo
competente. Isso se, atendendo à exigência da lei, os interessados forem capazes
e concordes e estiverem devidamente assistidos por advogados.

No caso analisado, a autora da herança falecera em 2015, deixando


testamento público que atribuía a parte disponível da herança ao viúvo. O
referido testamento foi aberto, processado e concluído perante a 2ª Vara de Órfãos
e Sucessões do Rio de Janeiro, com a plena concordância dos herdeiros – todos
maiores e capazes – bem como da Procuradoria do Estado.

Muito embora o inventário tenha sido iniciado na via judicial, os


interessados solicitaram a extinção do feito e a autorização para o proceder
pela via administrativa. Tal pedido foi indeferido em primeiro grau – decisão

142
TÓPICO 3 — QUESTÕES CONTROVERTIDAS SOBRE INVENTÁRIO E PARTILHA

confirmada posteriormente pelo Tribunal de Justiça do Rio de Janeiro – com


fundamento no art. n° 610, caput, do CPC/2015. Argumentou-se que, de acordo
com o dispositivo, a existência de testamento impõe o processamento judicial do
inventário e da partilha, obstaculizando, consequentemente, a via extrajudicial.

Em recurso ao STJ, os recorrentes invocaram o disposto no § 1° do mesmo


art. n° 610, alegando que o preceito, ao permitir o inventário extrajudicial na
hipótese de herdeiros capazes e concordes, excepcionaria o caput, de modo que a
existência de testamento não seria, por si só, um empecilho à via administrativa.

No julgamento do Recurso Especial, tal argumento foi confirmado pelo


relator, que deu uma interpretação sistemática ao § 1°, considerando-o uma
exceção ao  caput.  Ou seja, muito embora a regra do  caput  estabeleça que tanto
a existência de testamento como de interessado incapaz impõem a via judicial,
o § 1°, ao exigir tão somente a capacidade e concordância dos envolvidos para
autorizar o processamento extrajudicial do inventário, estaria restringindo a
hipótese de incidência do caput. Vale dizer, a existência de testamento em princípio
impede a via extrajudicial, salvo na situação de interessados plenamente capazes
e concordes.

Reforçando essa possibilidade, argumentou o relator que o inventário


extrajudicial é fomentado pela legislação hodierna, pois representa uma redução
na carga burocrática – e consequentemente de tempo e custos – de modo a
facilitar a operacionalização da transmissão hereditária. Essa finalidade social é
endossada, segundo o ministro, pelos arts. nos 5° da LINDB e 3°, 4° e 8° do CPC.

Afirmou, ainda, que sendo todos os herdeiros e interessados maiores,


capazes e plenamente concordes quanto à destinação e à partilha de bens, inexiste
conflito de interesses, e por isso não seria razoável impor a judicialização do
inventário para efetivar um testamento inclusive já tido como válido pela Justiça.

FONTE: <https://migalhas.uol.com.br/coluna/registralhas/315898/o-inventario-extrajudicial-
ante-a-existencia-de-testamento>. Acesso em: 27 jan. 2020.

143
RESUMO DO TÓPICO 3
Neste tópico, você aprendeu que:

• Os bens e direitos deixados pelo falecido não precisam passar pelo processo de
inventariança e partilha.

• Desde o advento da Lei n° 11.401/2007, a qual introduziu a modalidade


extrajudicial de inventário no ordenamento jurídico brasileiro, a doutrina
amplamente majoritária defendia a possibilidade de que este seja realizado
mesmo com a existência de testamento.

• No ano de 2019, a 4ª Turma do STJ, por unanimidade no bojo do REsp


1.808.767-RJ, prolatou decisão favorável à realização de testamento mesmo
com existência de testamento (e desde que observados os demais requisitos).

CHAMADA

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pensando em facilitar sua compreensão. Acesse o QR Code, que levará ao
AVA, e veja as novidades que preparamos para seu estudo.

144
AUTOATIVIDADE

1 Quais são os bens e direitos que dispensam inventário e partilha?

2 Como deverá ser o procedimento adotado caso o falecido tenha deixado


testamento e todos os herdeiros e legatários estejam em acordo quando a
partilha dos bens?

3 Consoante os ditames do Novo Código de Processo Civil, assinale a


alternativa CORRETA sobre o procedimento extrajudicial de inventário:

a) ( ) Não havendo testamento ou interessado incapaz, proceder-se-á ao


inventário judicial.
b) ( ) O credor de dívida líquida e certa, ainda que vencida, pode requerer
habilitação no inventário.
c) ( ) O tabelião somente lavrará a escritura pública se todas as partes forem
capazes e concordes, dispensando-se a assistência por advogado.
d) ( ) O processo de inventário e de partilha deve ser instaurado dentro de
3 (três) meses, a contar da abertura da sucessão, ultimando-se nos 12
(doze) meses subsequentes.
e) ( ) O inventário e a partilha podem ser feitos por escritura pública, a
qual constituirá documento hábil para levantamento de importância
depositada em instituições financeiras.

4 Desde a assinatura do compromisso até a homologação da partilha, a


administração da herança será exercida pelo inventariante. De acordo com
o Código Civil, o herdeiro que sonegar bens da herança, não os descrevendo
no inventário quando estejam em seu poder, ou, com o seu conhecimento,
no de outrem, ou que os omitir na colação, a que os deva levar, ou que
deixar de restituí-los, perderá o direito que sobre eles lhe cabia. Sobre os
sonegados na herança, assinale a alternativa INCORRETA de acordo com o
Código Civil:

a) ( ) Se o sonegador for o próprio inventariante, remover-se-á, em se


provando a sonegação, ou negando ele a existência dos bens, quando
indicados.
b) ( ) A pena de sonegados só se pode requerer e impor em ação movida
pelos herdeiros ou pelos credores da herança.
c) ( ) A sentença que se proferir na ação de sonegados, movida por qualquer
dos herdeiros ou credores, não aproveita aos demais interessados.
d) ( ) Só se pode arguir de sonegação o inventariante depois de encerrada
a descrição dos bens, com a declaração, por ele feita, de não existirem
outros por inventariar e partir, assim como arguir o herdeiro, depois de
declarar-se no inventário que não os possui.
e) ( ) Se não se restituírem os bens sonegados, por já não os ter o sonegador
em seu poder, pagará ele a importância dos valores que ocultou, mais
as perdas e danos.

145
5 Com relação ao direito sucessório e suas implicações, julgue os itens a seguir.

I- Herança corresponde ao conjunto de bens deixado pelo falecido e engloba


tanto os bens positivos quanto os bens negativos.
II- Os direitos patrimoniais do autor perduram por setenta anos, contados a
partir da data do seu falecimento.
III- Na hipótese de doação de imóvel de ascendente a descendente, quando
do falecimento daquele, o bem deverá, em regra, ser trazido à colação, sob
pena de ser considerado bem sonegado.

Assinale a seguir a opção CORRETA:


a) ( ) Apenas os itens I e II estão certos.
b) ( ) Apenas os itens I e III estão certos.
c) ( ) Apenas os itens II e III estão certos.
d) ( ) Todos os itens estão certos.

146
REFERÊNCIAS
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prática. 26. ed. São Paulo: Saraiva Educação. 2020.

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TARTUCE, Flávio. Inventário extrajudicial com testamento.


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irib.org.br/publicacoes/bir/355/bir355/pdf.pdf. Acesso em: 19 fev. 2021.

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necessária releitura do acesso à justiça. Revista NEJ – Eletrônica. S.l., v. 17, n.
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article/view/3970. Acesso em: 16 jan. 2021.

149
150
UNIDADE 3 —

DAS FORMALIDADES
PROCEDIMENTAIS DO INVENTÁRIO E
PARTILHA EXTRAJUDICIAL

OBJETIVOS DE APRENDIZAGEM
A partir do estudo desta unidade, você deverá ser capaz de:

• reconhecer o papel primordial do tabelionato de notas no procedimento


de inventário e partilha extrajudicial;
• identificar as formalidades obrigatórias que a escritura de inventário e
partilha extrajudicial deve observar;
• compreender a possiblidade de realização da sobrepartilha perante o
cartório;
• conhecer o instituto da carta de sentença e entender seu papel no
procedimento de inventário e partilha extrajudicial.

PLANO DE ESTUDOS
Esta unidade está dividida em três tópicos. No decorrer da unidade,
você encontrará autoatividades com o objetivo de reforçar o conteúdo
apresentado.

TÓPICO 1 – DO TABELIÃO DE NOTAS

TÓPICO 2 – FORMALIDADES DA ESCRITURA DE INVENTÁRIO E


PARTILHA

TÓPICO 3 – SOBREPARTILHA EXTRAJUDICIAL E CARTA DE


SENTENÇA OU FORMAL DE PARTILHA EXTRAJUDICIAL

CHAMADA

Preparado para ampliar seus conhecimentos? Respire e vamos


em frente! Procure um ambiente que facilite a concentração, assim absorverá
melhor as informações.

151
152
TÓPICO 1 —
UNIDADE 3

DO TABELIÃO DE NOTAS

1 INTRODUÇÃO
Caro acadêmico, o tabelião de notas terá um papel primordial dentro do
procedimento de inventário extrajudicial. Será ele o responsável por conduzir esse
procedimento do início ao fim. Neste tópico, abordaremos, de forma breve, qual o
papel deste profissional, as principais legislações que tratam da instituição de sua
função, atos competentes, direitos e deveres atinentes ao exercício de sua função.

Conforme foi estudado na Unidade 2, a partir das alterações trazidas pela


Resolução 35/2007, do Conselho Nacional de Justiça, dando a possibilidade de
realizar o inventário extrajudicial, a vontade das partes passou a ser manifestada
perante o tabelião de notas e não somente perante um juiz de direito.

Portanto, quando iniciada a abertura da sucessão, caso as partes estejam em


acordo quanto à partilha da herança e desejem realizá-la pela via administrativa,
cumprindo os requisitos necessários, caberá livremente escolherem em qual
Tabelionato de Notas realizarão a escritura pública de inventário extrajudicial.

A partilha realizada em um tabelionado não terá a necessidade de ser


homologada judicialmente, como é previsto no artigo 1° da Resolução n° 35/2007
do CNJ, não se aplicando as regras de competência presentes no Código Civil.
Passaremos a estudar um pouco o Tabelionato de Notas neste Tópico 1.

2 ASPECTOS GERAIS
É interessante saber que a atividade notarial está presente desde os
primórdios da humanidade. Veja nas palavras dos professores Paulo Roberto
Gaiguer Ferrieira e Felipe Leonardo Rodrigues (2018, p. 12):

É provável que a atividade notarial seja uma instituição que antecede a


própria formação do Direito e do Estado. A necessidade de documentar
e registrar certos fatos da vida, das relações e dos negócios deve
ter propiciado o surgimento de pessoas que detinham a confiança
dos seus pares para redigir os negócios. Surgia assim o notário. Há
registros deste profissional desde as civilizações suméria (de 3.500 a
3.000 a.C.) e egípcia (de 3.200 a 325 a.C.).

153
UNIDADE 3 — DAS FORMALIDADES PROCEDIMENTAIS DO INVENTÁRIO E PARTILHA EXTRAJUDICIAL

Existem contratos imobiliários de terras da Suméria cuja formalização


foi feita em uma espécie de pele animal. Posteriormente, quando a
região foi conquistada pelos gregos, foi necessária a legalização destes
contratos por um profissional com atividade semelhante à notarial. Os
egípcios do Império Antigo e do Império Médio (entre 3.100 e 1.770
a.C.) possuíam uma forma documental conhecida como “documento
caseiro”, que servia para regular os convênios privados. Após a sua
lavratura, o escriba mencionava o nome de três testemunhas. O
documento era então conduzido a um sacerdote – funcionário da
hierarquia egípcia – que colava um selo de encerramento, de modo
que nada mais se poderia alterar no documento caseiro. Enquanto
os hebreus possuíam os escribas do rei, da lei, do Estado e do povo,
na Grécia havia a figura do mnemon, que se caracterizava por ser um
técnico da memorização, encarregado de formalizar e registrar os
tratados, os atos públicos e os contratos privados. Até este estágio da
história, esse profissional que redigia e conservava os contratos não
tinha ainda as feições do notário como o conhecemos hoje.

Os mesmos autores ainda observam que foi a partir do Império Romano


que a atividade notarial e os notários começam a se ter as feições jurídicas
semelhantes a que se tem atualmente, mas, sem dúvida, é seguro entender
os antecedentes históricos antes de Cristo como o seu genuíno nascedouro
(FERREIRA; RODRIGUES, 2018).

No contexto brasileiro, a doutrina identifica que o notariado se


desenvolveu, em um primeiro momento, divorciado do postulado de isonomia
e impessoalidade na Administração Pública, posto que antes do século XX a
atividade notarial era exercida à conveniência dos governantes que comumente
davam os “cartórios” aos seus amigos.

Em nosso país, o notariado nasceu e cresceu à margem do poder judicial.


Antigamente, “cartórios” eram dados aos amigos dos governantes e,
depois, negociados por seus “proprietários” ou legados aos filhos.
Com isso, a profissão atrofiou-se, situação que somente se alterou no
século XX, com o aperfeiçoamento dos concursos públicos judiciais
e, finalmente, específicos para as delegações notariais (FERREIRA;
RODRIGUES, 2018, p. 26).

A Constituição Federal de 1988, modificando tal panorama, prevê os


serviços notariais e de registros no seu artigo 236, o qual estabelecendo que serão
exercidos em caráter privado por meio de delegação pelo poder público. Vejamos
o dispositivo constitucional:

Art. 236. Os serviços notariais e de registro são exercidos em caráter


privado, por delegação do poder público.
§1° Lei regulará as atividades, disciplinará a responsabilidade civil e
criminal dos notários, dos oficiais de registro e de seus prepostos, e
definirá a fiscalização de seus atos pelo Poder Judiciário.
§ 2° Lei federal estabelecerá normas gerais para fixação de emolumentos
relativos aos atos praticados pelos serviços notariais e de registro.
§3° O ingresso na atividade notarial e de registro depende de concurso
público de provas e títulos, não se permitindo que qualquer serventia
fique vaga, sem abertura de concurso de provimento ou de remoção,
por mais de seis meses.

154
TÓPICO 1 — DO TABELIÃO DE NOTAS

Dessa forma, conclui-se que os serviços notariais e de registro são


atividades extrajudiciais de caráter estatal (atividades próprias do Estado), mas
que são exercidas em caráter privado (ou seja, por particulares, pessoas físicas)
em virtude de delegação feita pelo Poder Público após prévia aprovação em
concurso público de provas e títulos.

NOTA

Antes da promulgação da Constituição de 1988, o termo genérico “cartório”


era usado no texto constitucional para designar ofícios judiciais e extrajudiciais.

Com o advento da Constituição de 1988, através da literalidade do


destacado artigo n° 236, o termo “cartório” foi substituído por “Serviço Notarial
e de Registro”. Isso porque, a partir de 1988 os cargos de titulares de cartórios
extrajudiciais foram substituídos pelas funções delegadas de Tabeliãs ou Oficiais
de Serviços Notariais ou de Registros.

NOTA

Ainda hoje é costumeira a utilização do termo “cartório”, inclusive a Lei n°


9.835/94, uma das leis que regulam o artigo n° 236 da CF/88, autodenomina-se “Lei dos
cartórios” no seu preâmbulo.

A partir do artigo n° 236 da Constituição Federal, a doutrina sistematiza


as balizas constitucionais que devem ser observadas pela atividade notarial no
Brasil. Veja:

• Exercício em caráter privado, por delegação do Poder Público.


• Lei federal que regula as atividades e disciplina a responsabilidade
civil e criminal dos notários e de seus prepostos.
• Fiscalização pelo Poder Judiciário.
• Lei federal que fixa normas gerais de emolumentos pelos atos
praticados.
• Necessidade de concurso público de provas e títulos para ingresso
na função (FERREIRA; RODRIUES, 2018, p. 26).

155
UNIDADE 3 — DAS FORMALIDADES PROCEDIMENTAIS DO INVENTÁRIO E PARTILHA EXTRAJUDICIAL

A respeito da fiscalização da atividade notarial pelo Poder Judiciário,


destaca-se, desde já, que esta será efetivada por meio das Corregedorias da cada
Tribunal de Justiça Local, mas, sobretudo, por meio do Conselho Nacional de
Justiça:

Art. 103-B. O Conselho Nacional de Justiça compõe-se de 15 (quinze)


membros com mandato de 2 (dois) anos, admitida 1 (uma) recondução,
sendo: (Redação dada pela Emenda Constitucional n° 61, de 2009)

§ 4° Compete ao Conselho o controle da atuação administrativa


e financeira do Poder Judiciário e do cumprimento dos deveres
funcionais dos juízes, cabendo-lhe, além de outras atribuições que lhe
forem conferidas pelo Estatuto da Magistratura: 

III- receber e conhecer das reclamações contra membros ou órgãos


do Poder Judiciário, inclusive contra seus serviços auxiliares,
serventias e órgãos prestadores de serviços notariais e de registro
que atuem por delegação do poder público ou oficializados, sem
prejuízo da competência disciplinar e correicional dos tribunais,
podendo avocar processos disciplinares em curso, determinar
a remoção ou a disponibilidade e aplicar outras sanções
administrativas, assegurada ampla defesa;  (Redação dada pela
Emenda Constitucional n° 103, de 2019) (grifos nossos)

O legislador infraconstitucional tratou da matéria afeta especificamente


aos serviços notariais por meio das seguintes leis, as quais são consideradas como
fontes do direito notarial ao lado da Constituição:

• Lei n° 7.433/85 e seu regulamento, o Decreto n° 93.240/86: tratam dos requisitos


das escrituras públicas. A lei e o regulamento aduzem que se aplicam a toda e
qualquer escritura pública.
• Lei n° 8.935/94: regulamenta o art. n° 236 da Constituição Federal, dispondo
sobre serviços notariais e de registro, dispondo sobre a competência notarial e
sobre os direitos e deveres dos notários.
• Lei n° 10.169/200: regulamenta o § 2° do art. n° 236 da Constituição Federal,
estabelecendo normas erais para fixação de emolumentos relativos aos atos
praticados pelos serviços notariais e de registro.
• Lei n° 11.441/2007: está tacitamente revogada pelo novo Código de Processo
Civil (Lei n° 13.105/2015). Disciplinava a separação, o divórcio, o inventário e a
partilha por escritura pública. Era uma lei sucinta que foi regulamentada pelo
Conselho Nacional de Justiça, pela Resolução n° 35/2007 e por provimentos
de diversas corregedorias das justiças estaduais (em São Paulo, o Prov.CGJ n°
33/2007, derrogado pelo Prov. n° 40/2012).
• Lei n° 13.105/2015: o novo Código de Processo Civil, em vigor desde 18-3-2016,
contém regras de direito probatório de relevância para a atividade notarial.
Ademais, pela primeira vez, tipifica a ata notarial, em nosso direito.

No subtópico a seguir, passaremos a conhecer a competência funcional do


tabelião de notas à luz da Lei n° 8.935/94.

156
TÓPICO 1 — DO TABELIÃO DE NOTAS

3 COMPETÊNCIA FUNCIONAL DO TABELIÃO


Antes de adentrar no assunto da competência funcional, é de suma
importância traçar as semelhanças e as diferenças entre a figura do Tabelião de
Notas/Notário e o Registrador/Oficial de Registro, visto que, na prática, estes
professionais são comumente confundidos.

Conforme já vimos, de acordo com o artigo n° 236 da Constituição Federal,


tanto os serviços notariais, quanto os serviços de registros são considerados
atividades extrajudiciais de caráter estatal, mas que são exercidas em caráter
privado, ou seja, são exercidas por particulares (pessoas físicas).

Por força do mandamento constitucional insculpido também no artigo n°


236 da Constituição, foi editada a Lei n° 8.935 o próprio artigo em si, dispondo
sobre os serviços notariais e de registro. Portanto, este subtópico será basicamente
centrado nesta lei posto que ela alberga os contornos leais da competência
funcional do tabelião de notas e do registrador.

O Tabelião de Notas e o Registrador, de acordo com a dicção do art. 3°


da Lei n° 8.935/94, são “profissionais do direito, dotados de fé pública, a quem
é delegado o exercício da atividade notarial e de registro”. Estes profissionais,
vulgarmente são chamados de “donos” do “cartório” extrajudicial.

E
IMPORTANT

Acadêmico, os notários e os registradores não são servidores públicos,


embora a Constituição (art. n° 236) exija que eles realizem concurso público para
exercerem suas atividades.

O Supremo Tribunal Federal, em sede de controle de constitucionalidade


(ADI 2602/06), já se manifestou no sentido de os notários e registradores não
serem servidores públicos, confira:

EMENTA: AÇÃO DIRETA DE INCONSTITUCIONALIDADE.


PROVIMENTO N. 055/2001 DO CORREGEDOR-GERAL DE
JUSTIÇA DO ESTADO DE MINAS GERAIS. NOTÁRIOS E
REGISTRADORES. REGIME JURÍDICO DOS SERVIDORES
PÚBLICOS. INAPLICABILIDADE. EMENDA CONSTITUCIONAL
N. 20/98. EXERCÍCIO DE ATIVIDADE EM CARÁTER PRIVADO
POR DELEGAÇÃO DO PODER PÚBLICO. INAPLICABILIDADE
DA APOSENTADORIA COMPULSÓRIA AOS SETENTA ANOS.
INCONSTITUCIONALIDADE. 1. O artigo 40, § 1°, inciso II, da

157
UNIDADE 3 — DAS FORMALIDADES PROCEDIMENTAIS DO INVENTÁRIO E PARTILHA EXTRAJUDICIAL

Constituição do Brasil, na redação que lhe foi conferida pela EC 20/98, está
restrito aos cargos efetivos da União, dos Estados-membros, do Distrito
Federal e dos Municípios — incluídas as autarquias e fundações. 2. Os
serviços de registros públicos, cartorários e notariais são exercidos
em caráter privado por delegação do Poder Público — serviço público
não-privativo. 3. Os notários e os registradores exercem atividade
estatal, entretanto não são titulares de cargo público efetivo,
tampouco ocupam cargo público. Não são servidores públicos, não lhes
alcançando a compulsoriedade imposta pelo mencionado artigo 40 da CB/88
— aposentadoria compulsória aos setenta anos de idade. 4. Ação direta de
inconstitucionalidade julgada procedente. (grifo nosso)

Destaca-se que na decisão em comento, o STF fixou o entendimento no


sentido de que os notários e registradores não estão suscetíveis à aposentadoria
compulsória prevista no artigo 40, §1°, II, CF/88, justamente por não serem
titulares de caro público efetivo.

E
IMPORTANT

De acordo com expressa vedação do artigo 25 da Lei n° 8.935/94: “O exercício


da atividade notarial e de registro é incompatível com o da advocacia, o da intermediação
de seus serviços ou o de qualquer cargo, emprego ou função públicos, ainda que em
comissão”.

Contudo, conforme já sinalizamos, as funções do Tabelião e do Registrador


são distintas. Enquanto o primeiro exerce serviços notariais tais como fazer
procurações e lavrar escrituras públicas, o segundo realiza serviços de registrais
como feitura de registros de nascimento, óbito, venda de imóvel (atos previstos
pela de Lei de Registro Públicos – Lei n° 6.015/73). Veja em forma de quadro a
seguir as diferenças entre os profissionais.

158
TÓPICO 1 — DO TABELIÃO DE NOTAS

QUADRO 1 – DIFERENÇAS ENTRE TABELIÃO E REGISTRADOR

Tabelião de Notas ou Notário Registrador ou Oficial de Registro


Exercem serviços registrais (serviços de
Exercem serviços notariais.
registro).
Serviços notariais: redigir, formalizar e
Serviços de registro: atividade por meio da
autenticar, com fé pública, instrumentos que
qual são praticados os atos previstos na Lei n°
consubstanciam atos jurídicos extrajudiciais de
6.015/73.
interesse dos solicitantes.
Exemplos: fazer procuração, autenticar Exemplos: registros de nascimento, casamento,
assinaturas, lavrar escrituras públicas etc. óbito, venda de imóveis, inscrição de penhora etc.
Exemplos de serventias titularizadas por Exemplos de serventias ocupadas por
notários: registradores:
• tabelionato de notas; • registro de pessoas naturais;
• tabelionato de protesto. • registro de imóveis.

FONTE: A autora

NOTA

A Lei n° 8.935/94, ao regulamentar os serviços notariais e registros, é


popularmente conhecida como “Lei dos Cartórios”.

A partir de agora, passaremos a explorar especificamente a competência


notarial. Compete aos tabeliães de notas, em geral, segundo o art. 6° da Lei n°
8.935/94 o seguinte:

• Formalizar juridicamente a vontade das partes.


• Intervir nos atos e negócios jurídicos a que as partes devam ou queiram dar forma
legal ou autenticidade, autorizando a redação ou redigindo os instrumentos
adequados, conservando os originais e expedindo cópias fidedignas de seu
conteúdo.
• Autenticar fatos.

O art. 7° da Lei n° 8.935/94 relaciona as atribuições que somente podem


ser exercidas por tabeliães, aqueles serviços cuja competência é exclusiva da
atividade. São eles:

• Lavrar escrituras e procurações públicas.


• Lavrar testamentos públicos e aprovar os cerrados.
• Lavrar atas notariais.
• Reconhecer firmas.
• Autenticar cópias.

159
UNIDADE 3 — DAS FORMALIDADES PROCEDIMENTAIS DO INVENTÁRIO E PARTILHA EXTRAJUDICIAL

No exercício profissional, os tabeliães de notas podem realizar toda e


qualquer gestão ou diligência, necessárias ou convenientes ao preparo dos atos
notariais. O profissional tem uma representação legal para atuar no interesse do
usuário, requerendo o que for necessário, sem, porém, poder cobrar emolumentos
por este trabalho (FERREIRA, RODRIGUES, 2018, p. 21).

E
IMPORTANT

O parágrafo único do artigo 7° da Lei n° 8.935/94 assim dispõe: “É facultado


aos tabeliães de notas realizar todas as gestões e diligências necessárias ou convenientes
ao preparo dos atos notariais, requerendo o que couber, sem ônus maiores que os
emolumentos devidos pelo ato”.

Nesta perspectiva de análise, a doutrina costuma apontar dois pontos


característicos importantes da atividade notarial (LOUREIRO, 2020, p. 99), são eles:

• A liberdade de escolha do tabelião de notas, qualquer que seja o domicílio das


partes ou o lugar de situação dos bens objeto do ato ou negócio (art. 8°).
• O limite territorial da competência, vedando ao tabelião a prática de atos fora
do Município para o qual recebeu a delegação (art. 9°).

E
IMPORTANT

Acadêmico, em razão da liberdade de escolha do tabelião de notas, o inventário


extrajudicial poderá ser realizado em qualquer Tabelionato de Notas, independentemente
do domicílio das partes, do local de situação dos bens ou do local do óbito do falecido.

Portanto, as regras de competência elencadas no Código de Processo Civil


não se aplicam ao procedimento de inventário extrajudicial.

É imprescindível realizar uma ressalva em relação à liberdade de escola


do tabelião de notas. É preciso esclarecer que tal ato deve ser prestado de forma
presencial, deslocando o usuário até a serventia extrajudicial ou por meio de
diligência do tabelião dentro do município onde recebeu a delegação,  não
podendo o tabelião de notas deslocar para outro município ou estado para a
prática do ato (LOUREIRO, 2020, p. 102).

160
TÓPICO 1 — DO TABELIÃO DE NOTAS

DICAS

O Conselho Nacional de Justiça editou o Provimento n° 100/2020 instituindo


o E-Notariado, por meio do qual poderão ser praticados os atos do tabelionato de notas por
meio eletrônico, atendidos os requisitos de segurança do Instituto de Chaves Públicas
Brasileiras (ICP-Brasil).

O Provimento n° 100/2020 trouxe de maneira clara, com o escopo de se


evitar a concorrência predatória, em seu artigo 19, que os atos eletrônicos serão
lavrados  com exclusividade pelo  tabelião de notas da circunscrição do imóvel
ou do domicílio do adquirente, de forma remota, por meio do e-Notariado, com
a realização de videoconferência e assinaturas digitais das partes. Portanto, note
que a instituição do E-Notariado em nada fere a vedação insculpida no art. 9° Lei
n° 8.935/1994 (de que o tabelião de notas deve praticar os atos dentro do município
para onde recebeu a delegação).

Vale destacar, por oportuno, os deveres dos notários elencados no artigo


30 da Lei n° 8.935/94:

Art. 30. São deveres dos notários e dos oficiais de registro:


I- manter em ordem os livros, papéis e documentos de sua
serventia, guardando-os em locais seguros;
II- atender as partes com eficiência, urbanidade e presteza;
III- atender prioritariamente às requisições de papéis, documentos,
informações ou providências que lhes forem solicitadas pelas
autoridades judiciárias ou administrativas para a defesa das
pessoas jurídicas de direito público em juízo;
IV- manter em arquivo as leis, regulamentos, resoluções,
provimentos, regimentos, ordens de serviço e quaisquer outros
atos que digam respeito à sua atividade;
V- proceder de forma a dignificar a função exercida, tanto nas
atividades profissionais como na vida privada;
VI- guardar sigilo sobre a documentação e os assuntos de natureza
reservada de que tenham conhecimento em razão do exercício
de sua profissão;
VII- afixar em local visível, de fácil leitura e acesso ao público, as
tabelas de emolumentos em vigor;
VIII- observar os emolumentos fixados para a prática dos atos do
seu ofício;
IX- dar recibo dos emolumentos percebidos;
X- observar os prazos legais fixados para a prática dos atos do seu ofício;
XI- fiscalizar o recolhimento dos impostos incidentes sobre os atos
que devem praticar;
XII- facilitar, por todos os meios, o acesso à documentação existente
às pessoas legalmente habilitadas;
XIII- encaminhar ao juízo competente as dúvidas levantadas pelos
interessados, obedecida a sistemática processual fixada pela
legislação respectiva;
XIV- observar as normas técnicas estabelecidas pelo juízo competente.

161
UNIDADE 3 — DAS FORMALIDADES PROCEDIMENTAIS DO INVENTÁRIO E PARTILHA EXTRAJUDICIAL

A Lei n° 8.935/94 é sucinta quanto aos direitos de notários, mas garante o


principal: independência, autonomia no exercício de suas atribuições. Eles têm
também o direito à percepção dos emolumentos integrais pelos atos praticados
na serventia e só perderão a delegação nas hipóteses previstas em lei. Veja os
dispositivos legais pertinentes:

Art. 28. Os notários e oficiais de registro gozam de independência no


exercício de suas atribuições, têm direito à percepção dos emolumentos
integrais pelos atos praticados na serventia e só perderão a delegação
nas hipóteses previstas em lei.
 Art. 29. São direitos do notário e do registrador:
I- exercer opção, nos casos de desmembramento ou desdobramento
de sua serventia;
 II- organizar associações ou sindicatos de classe e deles participar.

Especificamente sobre o aspecto da autonomia notarial, vale o seguinte


esclarecimento:

A autonomia notarial é plena quanto ao gerenciamento administrativo


e financeiro de seu tabelionato, sendo de sua responsabilidade exclusiva
as despesas de custeio, investimento e pessoal. Compete exclusivamente
ao tabelião estabelecer normas, condições e obrigações relativas à
atribuição de funções e de remuneração de seus prepostos de modo a
obter a melhor qualidade na prestação dos serviços (art. 21).
É importante salientar, porém, que os tribunais de justiça estaduais
fazem desta norma “letra morta”. Não a cumprem, ou a cumprem
parcialmente, imiscuindo-se e pretendendo fiscalizar a administração
do serviço notarial. Portanto, cuidado! (FERREIRA; RODRIGUES,
2018, p. 28).

NOTA

O artigo 28 da Lei n° 8.935/94 aduz expressamente que “Os notários e oficiais


de registro gozam de independência no exercício de suas atribuições, têm direito à
percepção dos emolumentos integrais pelos atos praticados na serventia e só perderão a
delegação nas hipóteses previstas em lei”.

Outro ponto de extrema importância, diretamente relacionado com o tema


da competência funcional e dos deveres/direitos do tabelião, é o da fé pública.

O artigo 3° da Lei n° 8.935/94 estabelece que: “Notário, ou tabelião, e oficial


de registro, ou registrador, são profissionais do direito, dotados de fé pública, a
quem é delegado o exercício da atividade notarial e de registro” (grifo nossos).

162
TÓPICO 1 — DO TABELIÃO DE NOTAS

A fé pública é entendida pela doutrina especializada como princípio


do direito notarial, denominada por alguns como princípio da notoriedade,
funcionando como autenticação da verdade dada aos atos do tabelião.

O fundamento da existência da fé pública encontra-se na vida social,


que requer estabilidade em suas relações, para que venham alcançar a
evidência e permanência legais.
O âmbito do desenvolvimento da fé pública é tão amplo como os das
relações jurídicas que se referem a toda atividade humana, razão pela
qual há distintas formas: a geral, a especial, a judicial, a administrativa
e a extrajudicial, tendo esta última como depositário dominante, o
notário, embora existam outras pessoas que desempenhem a fé pública
em atividade notarial, como os cônsules, os militares, entre outros.
Essa diversidade não é obstáculo para se afirmar que todos os tipos
respondem a um conceito e finalidade idênticos, sendo manifestações
que procuram dotar as relações jurídicas de certeza e estabilidade, de
autenticidade e indiscutibilidade.
No entanto, a fé pública não abriga apenas o significado de
representação exata e correta da realidade, de certeza ideológica, mas
também de um sentido altamente jurídico, ou seja, fornece evidência e
força probante atribuída pelo ordenamento, quanto à intervenção do
oficial público em determinados atos ou documentos.
O valor jurídico e a certeza implicam que a fé pública pressupõe a
correspondência da realidade, cuja firmeza é tutelada pelo Direito
(REZENDE, 1998, p. 34).

O atributo da fé pública encontra guarida no artigo n° 405 Código de


Processo Civil. Veja: “Art. 405. O documento público faz prova não só da sua
formação, mas também dos fatos que o escrivão, o chefe de secretaria, o tabelião
ou o servidor declarar que ocorreram em sua presença”.

Já o Código Civil, em seu artigo n° 215, traz as formalidades necessárias


para a produção dos documentos dotados de fé pública:

Art. 215. A escritura pública, lavrada em notas de tabelião, é documento


dotado de fé pública, fazendo prova plena.
§ 1o Salvo quando exigidos por lei outros requisitos, a escritura pública
deve conter:
I- data e local de sua realização;
II- reconhecimento da identidade e capacidade das partes e de
quantos hajam comparecido ao ato, por si, como representantes,
intervenientes ou testemunhas;
III- nome, nacionalidade, estado civil, profissão, domicílio e
residência das partes e demais comparecentes, com a indicação,
quando necessário, do regime de bens do casamento, nome do
outro cônjuge e filiação;
IV- manifestação clara da vontade das partes e dos intervenientes;
V- referência ao cumprimento das exigências legais e fiscais inerentes
à legitimidade do ato;
VI- declaração de ter sido lida na presença das partes e demais
comparecentes, ou de que todos a leram;
VII- assinatura das partes e dos demais comparecentes, bem como a
do tabelião ou seu substituto legal, encerrando o ato.
§ 2o Se algum comparecente não puder ou não souber escrever, outra
pessoa capaz assinará por ele, a seu rogo.

163
UNIDADE 3 — DAS FORMALIDADES PROCEDIMENTAIS DO INVENTÁRIO E PARTILHA EXTRAJUDICIAL

§ 3o A escritura será redigida na língua nacional.


§ 4o Se qualquer dos comparecentes não souber a língua nacional
e o tabelião não entender o idioma em que se expressa, deverá
comparecer tradutor público para servir de intérprete, ou, não o
havendo na localidade, outra pessoa capaz que, a juízo do tabelião,
tenha idoneidade e conhecimento bastantes.
§ 5o Se algum dos comparecentes não for conhecido do tabelião, nem
puder identificar-se por documento, deverão participar do ato pelo
menos duas testemunhas que o conheçam e atestem sua identidade.

Desta forma, é possível concluir que o tabelião possui fé pública e, com


ela, desempenha a função de autenticar os fatos e interesse das partes perante o
Estado e a sociedade. Em outras palavras, cumpre ao notário velar pela segurança,
autenticidade, validade e eficácia dos fatos, atos e negócios jurídicos (REZENDE,
1998, p. 35).

NOTA

O professor Luiz Guilherme Loureiro (2020, p. 30) observa que “tal como ocorre
com os demais países filiados à família jurídica do direito continental (civil law), o Brasil
adota o modelo do notariado do tipo latino: o notário, além de profissional especializado
do direito, é um agente ao qual o Estado delega a fé pública.

Acadêmico, perceba que os atos praticados pelo notário no âmbito do


procedimento extrajudicial também gozarão do atributo da fé pública. Desta
forma, quando o notário partilha os bens e direitos do inventário, impõe em seus
atos a presunção de veracidade, convertendo em documentos que serão provas
das relações jurídicas ali estabelecidas (FERREIRA; RODRIGUES, 2018, p. 21).

NOTA

Aduz a doutrina que o tabelião tem função legitimadora ao documentar os


atos particulares realizados perante seu ofício e também a função autenticadora, presumindo
veracidade às práticas realizadas perante o tabelião (FERREIRA; RODRIGUES, 2018, p. 22).

164
TÓPICO 1 — DO TABELIÃO DE NOTAS

Relembre também que a realização do inventário e da partilha pela via


extrajudicial trata-se de uma opção do interessado (não sendo procedimento
obrigatório).

Com a escolha da via administrativa para a realização de inventário e


partilha, caberá inicialmente ao Tabelião analisar a viabilidade do procedimento
extrajudicial. Este profissional verificará se os requisitos legais para a realização
de partilha extrajudicial foram cumpridos e dará andamento aos trâmites legais
para sua conclusão.

Nesse contexto, é importante ainda abordar a função assessora e função


de fiscalização do tabelião.

Observa a doutrina que o tabelião funciona como assessor, devendo


instruir e orientar os interessados sobre as possibilidades legais de determinado
procedimento, bem como seus requisitos e as consequências concretas de seus
atos. Em suma, o tabelião deve sinalizar os meios jurídicos mais adequados para
os fins lícitos que os interessados se propõem a atingir.

Nesta assessoria, o tabelião deve adequar a vontade dos interessados


ao ordenamento jurídico e redigir um documento público que cumpra
os requisitos exigidos pela legislação vigente, a fim de lograr os
efeitos desejados. O assessoramento é decorrência do princípio da
legalidade a que está adstrito o fazer notarial. O controle da legalidade
no assessoramento, ressalte-se, tem duplo significado: primeiro,
a consecução do interesse público de conservar os direitos na
normalidade jurídica e a estabilidade jurídica dos direitos adquiridos;
segundo, garantir que as partes cumpram todos os requisitos legais
e tributários no ato que realizam, para que obtenham seus efeitos
jurídicos plenos (FERREIRA; RODRIGUES, 2018, p. 22).

O tabelião também deverá agir como fiscal, sendo responsável por


qualquer desvio e atos que vão contra as previsões legais. Portanto, o tabelião
não será um mero executor da partilha em inventário, caso as partes apresentem
uma minuta já elaborada com indícios de fraude ou com declarações de vontade
equivocadas por algum dos herdeiros, poderá o tabelião negar-se a lavrar a
escritura de inventário ou partilha (AMORIM; OLIVEIRA, 2020, p. 447).

Observamos aqui que o papel do Tabelião é fundamental para fazer


cumprir os ditames legais que recaem sobre o direito sucessório, além de fiscalizar
o cumprimento da lei, desempenhará o papel de assessor das partes ao orientá-
las sobre o procedimento realizado em escritura pública.

A seguir, trataremos da responsabilidade do Tabelião de Notas e da


responsabilidade civil do Estado pelos delegatórios de serviço público.

165
UNIDADE 3 — DAS FORMALIDADES PROCEDIMENTAIS DO INVENTÁRIO E PARTILHA EXTRAJUDICIAL

4 DA RESPONSABILIDADE PELOS ATOS DO TABELIÃO


Um aspecto muito importante a ser abordado é o da responsabilidade do
Tabelião de Notas por seus atos no exercício ou em razão de sua função e o da
responsabilidade civil do Estado pelos atos desses profissionais. O §1° do artigo
n° 236 aduz que: “Lei regulará as atividades, disciplinará a responsabilidade civil
e criminal dos notários, dos oficiais de registro e de seus prepostos, e definirá
a fiscalização de seus atos pelo Poder Judiciário”. Em atenção ao comando
constitucional, foi editada a Lei n° 8.935/94.

A Lei n° 8.935/94 reservou seu capítulo III para o tratamento da


responsabilidade civil e criminal dos Notários e Oficiais de Registro. Veja as
disposições legais:

Art. 22. Os notários e oficiais de registro são civilmente responsáveis


por todos os prejuízos que causarem a terceiros, por culpa ou dolo,
pessoalmente, pelos substitutos que designarem ou escreventes que
autorizarem, assegurado o direito de regresso (Redação dada pela Lei
n° 13.286, de 2016).
Parágrafo único.  Prescreve em três anos a pretensão de reparação
civil, contado o prazo da data de lavratura do ato registral ou
notarial (Redação dada pela Lei n° 13.286, de 2016).
Art. 23. A responsabilidade civil independe da criminal.
Art. 24. A responsabilidade criminal será individualizada, aplicando-
se, no que couber, a legislação relativa aos crimes contra a administração
pública.
Parágrafo único. A individualização prevista no caput não exime os
notários e os oficiais de registro de sua responsabilidade civil.

À luz da disposição legal destacada, o particular lesado em decorrência


de um ato notarial ou de registro, seja a título de culpa ou dolo, pode ajuizar ação
de reparação civil diretamente contra o Notário ou o Oficial de Registro no prazo
prescricional de três anos.

Sobre a responsabilização civil dos Notários e Registradores, ainda


paira alguma discussão se ela pode ser realizada por meio de ação ajuizada
diretamente contra os profissionais citados ou se o particular eventualmente
prejudicado teria que primeiro acionar o Estado, incidindo neste último caso a
tese da dupla garantia.

NOTA

Segundo a tese da dupla garantia, não pode um servidor público ser


diretamente acionado pelo particular por ato relacionado ao exercício de suas funções,
cabendo, se estiver presente dolo ou culpa, ao próprio Estado acionar-lhe por meio de
ação regressiva.

166
TÓPICO 1 — DO TABELIÃO DE NOTAS

Em termos simples, por meio da adoção da tese da dupla garantia, o


particular não poderá ajuizar demanda diretamente contra o agente público,
devendo acionar o Estado.

No de 2019, o Supremo Tribunal Federal, adotando expressamente a tese


da dupla garantia, em sede repercussão geral fixou a seguinte tese (tema 940):

A teor do disposto no artigo 37, parágrafo 6°, da Constituição Federal,


a ação por danos causados por agente público deve ser ajuizada contra
o Estado ou a pessoa jurídica de direito privado, prestadora de serviço
público, sendo parte ilegítima o autor do ato, assegurado o direito de
regresso contra o responsável nos casos de dolo ou culpa.

Entretanto, acadêmico, muito cuidado. Note que a tese destacada se refere


especificamente a danos causados por agentes públicos. Todavia, conforme já
aprendemos, os notários e os registradores não são servidores públicos e, sim,
particulares que atuam por delegação do Poder Público.

Neste contexto, a doutrina majoritária entende que o comando do artigo


22 da Lei n° 8.935/94 permanece válido posto que, ao não se aplicar a tese da
dupla garantia aos notários e registradores, o terceiro prejudicado poderá acionar
diretamente estes profissionais. Em outras palavras, não se pode obrigar que o
terceiro demande contra o Estado, ele poderá demandar diretamente em face do
notário ou de registrador responsável pelo ato que o prejudicou (LOUREIRO,
2020, p. 132).

E
IMPORTANT

Note que o artigo 22 da Lei n° 8.935/94 exige a comprovação de dolo ou culpa


para que os notários e oficiais de registro sejam civilmente responsabilizados, tratando,
portanto, de responsabilidade de natureza subjetiva.

O parágrafo único do dispositivo legal em análise estabelece prazo


prescricional de 3 (três) anos da ação reparação civil, o qual deve ser contabilizado
a partir da data de lavratura do ato registral ou notarial.

Acadêmico, saiba ainda que o tabelião de notas e o registrador podem ser


responsabilizados à luz da Lei de Improbidade Administrativa (Lei n° 8.429/92):

167
UNIDADE 3 — DAS FORMALIDADES PROCEDIMENTAIS DO INVENTÁRIO E PARTILHA EXTRAJUDICIAL

Consoante a jurisprudência do STJ e a doutrina pátria,  notários


e registradores estão abrangidos no amplo conceito de "agentes
públicos", na categoria dos "particulares em colaboração com a
Administração". A partir do art. 236 da CF e de sua regulamentação pela
Lei n° 8.935/1994, a jurisprudência pátria tem consignado a legalidade
da ampla fiscalização e controle das atividades cartoriais pelo Poder
Judiciário (RMS 23.945/PB, Rel. Ministro Herman Benjamin, Segunda
Turma, julgado em 20/8/2009, DJe 27/8/2009), bem como a natureza
pública dessas atividades, apesar de exercidas em caráter privado, por
delegação do Poder Público (ADI 1.378-MC, Rel. Ministro Celso de
Mello, Tribunal Pleno, julgada em 30/11/1995; ADI 3.151, Rel. Ministro
Ayres Britto, Tribunal Pleno, julgada em 8/6/2005). Os aspectos acima
elencados revelam-se suficientes a justificar a inclusão dos notários
e registradores, como "agentes públicos" que são, no campo de
incidência da Lei n° 8.429/1992.” (STJ, REsp 1186787/MG, Rel. Ministro
Sérgio Kukina, 1ª Turma, DJe 05/05/2014) (grifos nossos).

Noutro giro, ainda precisamos citar a responsabilização do Estado. Será


possível responsabilizar o Estado civilmente pelos danos que o tabelião e o oficial
de registro, no exercício de sua função, causem a terceiros?

Respondendo a tal questionamento, também no de 2019, o Supremo


Tribunal Federal, em sede repercussão geral fixou a seguinte tese (tema 777):
“O Estado possui responsabilidade civil direta e primária pelos danos que
tabeliães e oficiais de registro, no exercício de serviço público por delegação,
causem a terceiros”.

E
IMPORTANT

A responsabilidade do Estado tem como fundamento o artigo 37, § 6°, da


Constituição, tendo natureza objetiva na medida em que não exige a comprovação de
dolo ou culpa.

É relevante saber ainda que o Estado terá ação regressiva contra o notário
ou registrador que ocasionou o dano ao terceiro, porém, apenas se comprovar
dolo ou culpa destes profissionais. Isso porque frisa-se, à luz da Lei n° 8.935/94,
que a responsabilidade dos notários e registradores é de natureza subjetiva,
dependendo da comprovação de dolo ou culpa.

Por fim, sintetizando a questão da responsabilidade do notário e do


Estado, segue o seguinte quadro:

168
TÓPICO 1 — DO TABELIÃO DE NOTAS

QUADRO 2 – RESPONSABILIDADE DO NOTÁRIO E DO ESTADO

Ação de indenização proposta por pessoa


Ação de indenização proposta por pessoa
que sofreu dano em razão de ato de notário
que sofreu dano em razão de ato de notário
ou registrador contra o TABELIÃO OU
ou registrador contra o ESTADO.
REGISTRADOR.
Responsabilidade objetiva (art. 37, § 6°, da Responsabilidade subjetiva (art. 22 da Lei n°
CF/88). 8.935/94).
Prazo prescricional: 5 anos (Decreto Prazo prescricional: 3 anos (parágrafo único, art.
20.910/32). 22, da Lei n° 8.935/94).
Receberá por precatório ou requisição de Receberá por meio de processo de execução
pequeno valor (art.100 da CF/88). comum, à luz do Código de Processo Civil.

FONTE: A autora

Com intuito de proporcionar um maior aprofundamento na temática,


segue leitura complementar voltada especificamente a discussão sobre a natureza
da atividade notarial.

169
UNIDADE 3 — DAS FORMALIDADES PROCEDIMENTAIS DO INVENTÁRIO E PARTILHA EXTRAJUDICIAL

LEITURA COMPLEMENTAR

NATUREZA DA ATIVIDADE NOTARIAL: BREVE REFLEXOES EM FACE


DA JURISPRUDENCIA DO SUPERIOR TRIBUNAL DE JUSTIÇA

Luiz Guilherme Loureiro

Em reiteradas decisões que vêm negando a aplicação do regime de


recolhimento do ISS sobre serviços notariais e de registro, previsto no art. 9, § 1°, do
Decreto-Lei n° 406/68, o Superior Tribunal de Justiça utiliza como fundamentos
a inexistência de prestação de serviço sob forma de trabalho pessoal do contribuinte
(notário ou registrador) e a manifesta finalidade lucrativa (grifos nossos) [1].

Tal entendimento revela completo desconhecimento das características do


notariado latino, sistema acolhido pelo art. n° 236 da Constituição e pela Lei n°
8.935/94, que regulamenta o exercício profissional dos notários e registradores.
Com efeito, são dois principais tipos de notariado no mundo moderno – o latino
e o anglo-saxão – que, por sua vez, derivam das famílias ou sistemas de direito
imperantes: o civil law ou direito continental e a common law ou direito costumeiro.

O notariado latino é uma instituição que nasceu da cultura e da tradição


jurídica romano-germânica, que se caracteriza – a partir do século XIX – pelo
primado da lei como fonte do direito.  Este sistema de segurança jurídica se baseia
em mecanismos como a autenticidade ou fé pública que decorrem da forma
jurídica denominada “documento público”. Certas situações e relações jurídicas,
por sua relevância, devem ser acreditadas ou tidas por verdadeiras não só para o
Estado, como para os demais membros da sociedade. Para tanto, o Estado delega
a determinados agentes públicos o poder de dar fé pública aos negócios jurídicos
nos quais intervêm.

Um desses agentes públicos é o notário que por meio de uma espécie de


documento público – o documento notarial – formaliza juridicamente a vontade
das partes. Ao contrário do que ocorre com o documento particular, que apenas
prova a declaração da vontade em relação às partes, o documento público (aí
incluído o notarial) tem como reputados verdadeiros sua autoria e a integridade
de seu conteúdo, bem como sua validade e eficácia. Tal presunção de veracidade
não pode ser negada pelo Estado ou por qualquer membro da coletividade
(art. 19, II, CF), salvo por meio de impugnação judicial. No sistema do direito
romano-germânico, portanto, o notário é o profissional, com formação jurídica,
encarregado da redação e autorização do documento público.

Não obstante as particularidades locais, o notário latino pode ser definido


como “o profissional de direito encarregado de uma função pública consistente
em receber, interpretar e dar forma legal à vontade das partes, redigindo os
instrumentos adequados a este fim e conferindo-lhes autenticidade” [2].

170
TÓPICO 1 — DO TABELIÃO DE NOTAS

Por sua vez, historicamente a common law tem sua origem ligada ao poder
real, centrando-se, pois, no direito público e, ao contrário dos direitos romanos-
germânicos, suas regras não têm por finalidade precípua disciplinar as relações
jurídicas particulares com o objetivo de prevenir conflitos, mas sim de dirimir
controvérsias: o direito civil construído sobre conceitos abstratos da ciência jurídica
tem uma relevância menor do que as regras concretas aplicadas para a solução das
diferenças [3]. O notário anglo-saxão não é um profissional especializado do direito
e não tem por função a segurança das relações jurídicas e a prevenção de litígios:
o “notary public” americano, por exemplo, é um mero legitimador de firmas, sem
formação jurídica especializada e que não tem por função o controle da legalidade
dos atos e negócios jurídicos celebrados pelos particulares.

O modelo do notariado latino está presente na maioria dos países da


América, Europa, África e Ásia e alcança 70% da população mundial, segundo
dados da União Internacional do Notariado (UINL). Obviamente, cada país
adota um estatuto próprio do notário: este pode ser considerado um funcionário
público (ex.: leis francesa e espanhola) ou um profissional do direito dotado de fé
pública (Brasil, Québec, Suíça etc.). Seja como for, a função principal do notário
do tipo latino é o assessoramento imparcial e o controle estrito da legalidade. Este
modelo tem como pilar a escritura pública, o documento faz prova não só da sua
formação, mas também dos fatos que o tabelião declarar que ocorreram em sua
presença (art. 362, CPC).

Com efeito, a doutrina identifica as seguintes características essenciais


como definidoras da função notarial do sistema latino:

A- Intervenção notarial. O notário intervém para dar forma jurídica à vontade


das partes, seja redigindo ou autorizando a redação do documento público
e se torna, portanto, responsável pelo mesmo, respondendo civilmente e
penalmente por erro ou dolo nos atos de ofício.
B- Assessoramento ou conselho. Como profissional especializado do direito,
o notário tem o dever de aconselhar e assessorar os interessados, seja qual
for o ramo do direito e independentemente de vir a ser ou não lavrada a
escritura pública.
C- Controle da legalidade. A função notarial tem por base o princípio da legalidade,
no seu duplo aspecto de cumprimento das solenidades para que o documento
por ser reputado um instrumento público, e de determinação dos meios
jurídicos mais adequados para a consecução dos fins desejados pelas partes.
D- Imparcialidade. O notário é um profissional imparcial e independente, que
tem o dever de defender igualmente os interesses de ambas as partes, sem
privilegiar qualquer delas, independentemente de pressões ou influências de
qualquer natureza.
E- Imediação. A imediação significa a presença efetiva e pessoal do notário na
outorga de atos e contratos.
F- Conservação dos documentos. A função do notário não se resume e não se
esgota com a lavratura ou expedição da escritura pública ou outra espécie de
documento notarial. Uma de suas funções cardeais é a conservação perpétua

171
UNIDADE 3 — DAS FORMALIDADES PROCEDIMENTAIS DO INVENTÁRIO E PARTILHA EXTRAJUDICIAL

dos documentos notariais e dos documentos particulares ou públicos


relacionados às escrituras públicas, que se dá através de um mecanismo de
protocolo ou incorporação ao arquivo notarial.
G- Autenticidade. Em relação ao documento notarial, além das características
supracitadas, deve ser acrescentada a autenticidade que, conforme foi dito, é
a garantia da autoria e da integridade de seu conteúdo em razão da fé pública
de que vem revestido.

A característica da imediação ou da pessoalidade da atividade exercida


pelo notário, vale dizer, é consagrada no ordenamento jurídico brasileiro. O exame
do art. n° 236 da Constituição indica que o notário exerce uma função pública
delegada pelo Estado, revestida de fé pública, mas como um jurista de direito
privado. Complementando a norma constitucional, o art. 3° da Lei n° 8.935/94
dispõe expressamente que o notário é um profissional do Direito, dotado de fé
pública, a quem é delegado o exercício da atividade notarial, qual seja: formalizar
juridicamente a vontade das partes, intervir nos atos e negócios jurídicos a que elas
devam ou queiram dar forma legal ou autenticidade e autenticar fatos (art. 6°).

Vale dizer, em nosso direito o notário exerce uma função pública, delegada
pelo Estado, após aprovação em concurso público de provas e títulos. Ora a
delegação é um instituto através do qual um agente público confia o exercício
de sua competência a outro agente [4]. Como não se pode conceber a figura de
autodelegação, é necessária a existência de dois agentes públicos (o delegante e o
delegado), que haja um conjunto de atribuições relacionados à autoridade delegante
e que o agente delegado tenha competência para receber a delegação [5].

A competência, por sua vez, é um conjunto de atribuições que, por lei,


são delegadas a agentes públicos para o exercício de sua função. Trata-se de
um complexo de poderes funcionais conferidos por lei à cada órgão ou agente
público, para que possa realizar os interesses a ela cometidos. A competência
não adere à pessoa, visto que se refere ao conteúdo da função pública e constitui
também uma obrigação funcional, já que o agente não pode deixar de cumprir a
atribuição que a lei lhe impõe.

Ora, como a competência somente pode ser atribuída por lei e somente
pode ser delegada de um agente público para outro, também por lei, a conclusão
lógica é que o notário exerce pessoalmente os atos de seu mister, ao contrário
do entendimento jurisprudencial acima citado. Como vimos, o art. n° 236 da CF
dispõe que a função notarial é delegada pelo Estado à pessoa privada nos termos
da lei federal. O art. 6 da Lei n° 8.935/94 confere a competência para a prática dos
atos lá relacionados ao notário e não aos seus funcionários ou prepostos. Estes
podem ser contratados ou não pelo notário e não são considerados funcionários
públicos (art. n° 20 da Lei n° 8.935/94). Portanto, o notário não pode delegar a
competência recebida do Estado, ou parte dela, ao seu funcionário.

172
TÓPICO 1 — DO TABELIÃO DE NOTAS

Portanto, o princípio da imediação, ou seja, a presença efetiva e pessoal do


notário na outorga de atos e contratos, como a todo o modelo do notariado latino,
é também consagrado no nosso ordenamento jurídico. Tanto é que o notário não
pode se afastar da sede de seus serviços (inteligência a contrário senso do art. 25,
§ 2°, Lei n° 8.935/94) e não pode exercer qualquer outra função ou profissão (art.
25, caput), face à necessidade de sua presença para fins de assessoramento das
partes e formalização dos atos e negócios jurídicos.

Na verdade, o Superior Tribunal de Justiça confunde a simples


materialização do ato ou documento notarial com sua autoria. A autoria é um
elemento essencial do documento, porque é o autor quem condiciona e lhe dá
vida.  Autor não é aquele que materialmente faz ou escreve o documento, mas
sim aquele que dirige sua redação, ou seja, aquele que expressa o pensamento
nele contido.

Conforme ensina PELOSI, o documento “é o resultado de uma atividade


humana de tipo ideológico, é uma criação intelectual” [6]. Também nesse sentido
a opinião de CARNELUTTI, para quem a formação do documento transcende o
ato material para se fixar no ato jurídico: o autor do documento não é aquele que
o forma do ponto de vista material, mas aquele a quem a ordem jurídica atribui
sua formação [7].

O notário é o autor do documento notarial, já que é o responsável por


sua escrituração (art. 22, LNR), nele faz constar suas declarações e pensamento
ideológico, além de apor sua firma, encerrando o ato notarial. Nesse sentido,
dispõe o art. n° 215 do Código Civil que ao notário incumbe lavrar a escritura
pública, bem como autorizar o ato, finalizando-o com a sua firma e assinatura.

Em outras palavras, a confecção material do documento notarial pode ser


feita pelo escrevente, mas a autoria é sempre do notário, a quem cabe orientar seu
preposto e responder pessoalmente pelos vícios do ato. A proibição de o notário
realizar pessoalmente os atos de seu interesse confirma a regra da imediação (art.
27 da Lei n° 8.935/94).

Destarte, não se pode assimilar o notário ao empresário, como pretende


o E. Superior Tribunal de Justiça. Ao contrário do primeiro, o notário não pode
exercer a atividade em sociedade, pois realiza um serviço intelectual em nome e
sob responsabilidade pessoal. A intermediação de seus serviços e a abertura de
filial são expressamente vedadas pelo estatuto notarial. A serventia ou serviço
notarial não se confunde com a empresa ou estabelecimento, pois os livros e
arquivos notariais constituem bens públicos, assim como os equipamentos que
o contêm.

Também a alegada finalidade de lucro é incompatível com a atividade do


notário. Em primeiro lugar, conforme foi visto, este profissional do direito exerce
uma função  pública e esta, por definição, não constitui atividade lucrativa. Os
atos notariais são remunerados por emolumentos e parte deles é destinada aos

173
UNIDADE 3 — DAS FORMALIDADES PROCEDIMENTAIS DO INVENTÁRIO E PARTILHA EXTRAJUDICIAL

cofres públicos. Os emolumentos têm natureza de taxa, isso é, o seu valor deve
corresponder ao efetivo custo e à adequada e suficiente remuneração dos serviços
prestados (art. 1°, pár. único, Lei n° 10.169/2000).

Ademais, não há que se falar em objetivo de lucro se a lei proíbe a livre


fixação de preços; a expansão da atividade, seja mediante abertura de filial, seja
pelo oferecimento de outros serviços não autorizados; e tampouco captar clientela.

Concluindo, as alegações de que a atividade notarial não é pessoal e é


movida pelo intuito de lucro contrariam não apenas o texto expresso da lei, como
também os princípios e institutos de direito público acima referidos. Os conceitos
legais não podem ser ignorados pelo magistrado, uma vez que constituem lei
em sentido estrito, como é o caso dos emolumentos, definidos como direito de
percepção devido pela prática de ato notarial (art. 28, Lei n° 8.935/94), cuja fixação
pelo Estado deve levar em conta a “natureza pública e o caráter social dos serviços
notariais e de registro” (art. 2°, Lei n° 10.169/2000).

–––––––––––––––––––––––––––––––––––––––––––––––––––––––––––––––––––––––––––––––––

[1] V. dentre outros: AgRg no AREsp 580.889/MG, Rel. Ministro Mauro Campbell
Marques, Segunda Turma, DJe 05/11/2014 e AgRg no AREsp 296.022/RS, Rel.
Ministro Benedito Gonçalves, Primeira Turma, DJe 30/09/2014.
[2]Conceito apresentado no primeiro Congresso Internacional do Notariado
Latino, conforme destaca Fernando Gomá Lanzón, “El desarrollo de la función
notarial e nel âmbito del comercio eletrónico: explicaciones, reflexiones y
comentários”, em Notariado y contratación electrónica, Colegios Notariales de
España, Consejo General del Notariado, Madrid, 2000, p. 221.
[3] Cf. René David, Os Grandes Sistemas do Direito Contemporâneo, São Paulo,
Martins Fontes, 1998, pp. 16/17.
[4] Cf. Duez e Debeyre, Traité de Droit Administratif, p. 120/121.
[5] Massami Uyeda, Da competência em matéria administrativa, p. 141.
[6] Ob. cit., p. 60.
[7] Francesco Carnelutti,  A prova civil, Campinas, Bookseller.

FONTE: <http://genjuridico.com.br/2015/01/21/natureza-da-atividade-notarial-breve-reflexoes-
em-face-da-jurisprudencia-do-superior-tribunal-de-justica/>. Acesso em: 1 abr. 2021.

174
RESUMO DO TÓPICO 1
Neste tópico, você aprendeu que:

• Os serviços notariais e de registro são atividades extrajudiciais de caráter


estatal (atividades próprias do Estado), mas que são exercidas em caráter
privado (ou seja, por particulares pessoas físicas) em virtude de delegação
feita pelo Poder Público após prévia aprovação em concurso público de
provas e títulos.

• O tabelião de notas possui fé pública e desempenha a função de autenticar os


fatos de interesse das partes perante o Estado e a sociedade.

• O papel do Tabelião é fundamental para fazer cumprir os ditames legais


que recaem sobre o direito sucessório, além de fiscalizar o cumprimento
da lei, desempenhará o papel de assessor das partes ao orientá-las sobre o
procedimento realizado em escritura pública.

• O STF (ADI 2602/06-MG) fixou o entendimento no sentido de que os notários e


registradores não estão suscetíveis à aposentadoria compulsória prevista no artigo
40, §1°, II, CF/88, justamente por não serem titulares de caro público efetivo.

• O STF, em sede repercussão geral (RE 842846/RJ), fixou o entendimento de


que o Estado possui responsabilidade civil direta e primária pelos danos que
tabeliães e oficiais de registro, no exercício de serviço público por delegação,
causem a terceiros.

175
AUTOATIVIDADE

1 Discorra brevemente sobre a fé pública e a responsabilidade atribuída ao


tabelião.

2 Em relação ao Tabelionato de Notas, à luz da Lei n° 8.935/94, assinale a


alternativa correta:

I- Exercem atividades estatais cujo exercício privado se submete à exclusiva


fiscalização do Poder Executivo.
II- Os notários e oficiais de registro gozam de independência no exercício
de suas atribuições, têm direito à percepção dos emolumentos integrais
pelos atos praticados na serventia e só perderão a delegação nas hipóteses
previstas em lei.
III- Manter em ordem os livros, papéis e documentos de sua serventia,
guardando-os em locais seguros e atender às partes com eficiência,
urbanidade e presteza, são alguns dos deveres dos notários e dos oficiais
de registro.
IV- O exercício da atividade notarial e de registro é incompatível com o da
advocacia, o da intermediação de seus serviços ou o de qualquer cargo,
emprego ou função públicos, ainda que em comissão.

a) ( ) Estão corretas todas as assertivas.


b) ( ) Somente a assertiva II está correta.
c) ( ) Estão corretas apenas as assertivas II, III e IV.
d) ( ) Estão corretas apenas as assertivas III e IV.

3 A respeito da responsabilidade civil do Tabelião de Notas, bem como da


responsabilidade civil do Estado pelos danos que eles causarem a terceiros
no exercício de sua função, assinale a alternativa correta:

a) ( ) Prescreve em 4 (quatro) anos a pretensão de reparação civil, contado o


prazo da data de lavratura do ato notarial.
b) ( ) A Lei n° 8.935/94 disciplina a responsabilidade objetiva do tabelião
de notas ao estabelecer que será responsabilizado pelos prejuízos
ocasionados a terceiros independentemente da comprovação de dolo
ou culpa.
c) ( ) Não é possível a responsabilização criminal do tabelião de notas.
d) ( ) O Supremo Tribunal Federal o fixou o entendimento, em sede
repercussão de geral, no sentido de que o Estado possui responsabilidade
civil direta e primária pelos danos que tabeliães e oficiais de registro,
no exercício de serviço público por delegação, causem a terceiros.

176
4 Conforme a Lei n° 8.935/1994, é ato de competência exclusiva do tabelião de
notas:

a) ( ) Autenticar livros empresariais.


b) ( ) Lavrar atas notariais.
c) ( ) Formalizar juridicamente a vontade das partes.
d) ( ) Registrar nascimentos.

5 São considerados agentes públicos todas as pessoas físicas incumbidas,


sob remuneração ou não, definitiva ou transitoriamente, do exercício de
função ou atividade pública. Assim, é correto afirmar que os notários e
registradores são:

a) ( ) Servidores públicos e estão sujeitos à aposentadoria compulsória.


b) ( ) Agentes públicos vitalícios, ocupantes de cargo efetivo e não se
aposentam compulsoriamente.
c) ( ) Delegatários de serviços públicos aprovados em concurso público.
d) ( ) Os notários e registradores são delegatários de serviços públicos,
investidos em cargos efetivos após aprovação em concurso.

177
178
TÓPICO 2 —
UNIDADE 3

FORMALIDADES DA ESCRITURA DE INVENTÁRIO E PARTILHA

1 INTRODUÇÃO
Acadêmico, para a confecção da escritura pública de inventário e partilha
extrajudicial, algumas formalidades serão necessárias e deverão ser cumpridas à
risca. Passaremos a explicá-las um pouco neste tópico que se inicia.

Como já apresentado, as partes deverão ser maiores e capazes, deverão


ser reunidas certidões negativas de débitos fiscais de competência, municipal,
estadual e federal, partes envolvidas neste processo, o papel do advogado e dos
procuradores, temas que trataremos com mais profundidade ao longo deste
terceiro tópico.

Explicaremos com mais detalhes nesta introdução a exigência da consulta


obrigatória de existência de testamento deixado pelo de cujus. Assim, a consulta
é feita no Registro Central de Testamentos on-line, chamado de RCT-O, através
do sistema de Colégio Notarial do Brasil, CENSEC, pelo site www.censec.org.br.

Essa formalidade é necessária para dar início ao processo de inventário


administrativo, caso haja a existência de testamento deixado pelo falecido, o
procedimento inicial a ser adotado será outro, como já explicado na Unidade 2. O
site da CENSEC possui um banco de dados com informações sobre testamentos,
procurações e escrituras públicas lavradas em todo os cartórios presentes em
todo território brasileiro.

A certidão de inexistência de testamento deixado pelo autor da herança


é exigida tanto em inventários judiciais quanto extrajudiciais e expedida pelo
CENSEC. A consulta dessa certidão é obrigatória e imprescindível para a
viabilidade do inventário extrajudicial, formalidade exigida pelo art. 2° do
Provimento 56 do CNJ. Igualmente, será necessário anexar a certidão de óbito
e cópia do documento pessoal do falecido ao processo de partilha extrajudicial.

Exposto isso, caro acadêmico, passaremos a estudar as principais


características e peculiaridades que compõe o procedimento extrajudicial de
inventário e partilha, vamos lá!

179
UNIDADE 3 — DAS FORMALIDADES PROCEDIMENTAIS DO INVENTÁRIO E PARTILHA EXTRAJUDICIAL

2 PARTES NO INVENTÁRIO E ASSISTÊNCIA JURÍDICA


As partes que compõe a escritura de inventário e partilha são: a(o) viúva(o)
(cônjuge sobrevivente), os herdeiros, os cônjuges dos herdeiros, com exceção
daqueles casados sob o regime de separação absoluta de bens, como determina o
artigo n° 17 da resolução n° 35 do CNJ, vejamos:

Art. 17. Os cônjuges dos herdeiros deverão comparecer ao ato de


lavratura da escritura pública de inventário e partilha quando houver
renúncia ou algum tipo de partilha que importe em transmissão,
exceto se o casamento se der sob o regime da separação absoluta.

NOTA

O regime de casamento da separação absoluta é regulamentado a partir do


artigo n° 1.687 do Código Civil, tendo por regra geral que impõe a incomunicabilidade entre
os bens dos conguês, sejam eles adquiridos antes ou depois do casamento.

Também farão parte do inventário, o companheiro(a), entretanto, se os


demais herdeiros não estiverem em acordo não aceitando a relação estabelecida
ao não reconhecer a união estável entre o falecido e a companheira supérstite, a
via necessária será a judicial, também será esta a via obrigatória quando o falecido
não deixar outro herdeiro sucessório, mas apenas a companheira(o). Assim é o
artigo n° 18 da Resolução n° 35:

Art. 18. O(A) companheiro(a) que tenha direito à sucessão é parte,


observada a necessidade de ação judicial se o autor da herança não
deixar outro sucessor ou não houver consenso de todos os herdeiros,
inclusive quanto ao reconhecimento da união estável.

Como já informado, caso algumas das partes seja menor de idade ou


incapaz, o procedimento judicial será obrigatoriamente o adotado para realização
de inventário e partilha.

A atuação do advogado é imprescindível para a realização do inventário


extrajudicial, a sua falta implicará na nulidade do ato praticado. A presença deste
profissional está prevista na redação dada pela Resolução n° 326 de 2020 do CNJ
ao artigo 8° e no artigo 9° da Resolução n° 35:

Art. 8° É necessária a presença do advogado, dispensada a procuração,


ou do defensor público, na lavratura das escrituras aqui referidas,
nelas constando seu nome e registro na OAB (Redação dada pela
Resolução n° 326, de 26.6.2020).

180
TÓPICO 2 — FORMALIDADES DA ESCRITURA DE INVENTÁRIO E PARTILHA

Art. 9° É vedada ao tabelião a indicação de advogado às partes, que


deverão comparecer para o ato notarial acompanhadas de profissional
de sua confiança. Se as partes não dispuserem de condições
econômicas para contratar advogado, o tabelião deverá recomendar-
lhes a Defensoria Pública, onde houver, ou, na sua falta, a Seccional da
Ordem dos Advogados do Brasil.

O advogado poderá ser comum entre as partes, caso desejarem ou poderá
atuar exclusivamente em favor de apenas uma pessoa, devendo o tabelião
mencionar na escritura a quem este assiste. Será dispensada apresentação de
procuração por parte do advogado quando a parte que assiste estiver presente no
ato da assinatura da escritura pública.

Outra informação de importante é a proibição de indicação de advogado
por parte dos tabelionatos, igualmente não poderá haver um profissional presente
de prontidão “na porta do cartório” para suprir a falta de advogado quando não
constituído pelas partes.

2.1 CREDORES DO ESPÓLIO


O procedimento de inventário e partilha é necessário para a divisão do
espólio (da representação da herança) entre os herdeiros e os legatários e para o
pagamento das dívidas do falecido. Os herdeiros, os legatários e os credores do
falecido serão, portanto, diretamente interessados no inventário.

A existência de credores por ter o falecido tenha deixado dívidas a serem


saldadas, não impedirá a lavratura de escritura pública de inventário e partilha
em Tabelionado de Notas, como estabelece o artigo 27 da Resolução n.35: “Art.
27. A existência de credores do espólio não impedirá a realização do inventário e
partilha ou adjudicação, por escritura pública”.

As dívidas do de cujus serão pagas pela herança, após a realização da sua


partilha, os herdeiros responderão cada qual pela sua quota parte na herança.
Os herdeiros não responderão pelos valores das dívidas que ultrapassem o
valor da herança, todavia, deverão fazer prova do excesso, salvo se estiver em
curso inventário que comprove tais alegações, conforme dita o artigo n° 1.792
do Código Civil.

NOTA

Primeiro abate-se as dívidas com o montante total da herança e, depois,


divide-se o restante entre os herdeiros. Portanto, as dívidas são pagas antes da realização
da partilha.

181
UNIDADE 3 — DAS FORMALIDADES PROCEDIMENTAIS DO INVENTÁRIO E PARTILHA EXTRAJUDICIAL

Independentemente da partilha ser realizada extrajudicialmente, serão


aplicados os dispositivos legais utilizados no âmbito do inventário judicial,
fazendo uso dos artigos 610, §1°, e 663 do Código de Processo Civil. É neste
sentido o seguinte julgado:

REGISTRO DE IMÓVEIS – SOBREPARTILHA REALIZADA POR


ESCRITURA PÚBLICA. RECONHECIMENTO DE DÍVIDAS
INCONTROVERSAS PELA MEEIRA E HERDEIROS. NECESSIDADE
DE RESERVA DE BENS E INDICAÇÃO DO VALOR DAS DÍVIDAS.
INCIDÊNCIA DO ARTIGO 663 DO CÓDIGO DE PROCESSO CIVIL
NO ÂMBITO DA PARTILHA JUDICIAL E EXTRAJUDICIAL POR
SE TRATAR DE NORMA COGENTE – RECURSO NÃO PROVIDO.
(TJ-SP – AC: 10051615820168260019 SP 1005161-58.2016.8.26.0019,
Relator: Pinheiro Franco (Corregedor Geral), Data de Julgamento:
14/03/2019, Conselho Superior de Magistratura, Data de Publicação:
20/03/2019)

Vejamos o que está escrito no artigo n° 663 do Código de Processo Civil:

Art. 663. A existência de credores do espólio não impedirá a


homologação da partilha ou da adjudicação, se forem reservados bens
suficientes para o pagamento da dívida.

Parágrafo único. A reserva de bens será realizada pelo valor estimado


pelas partes, salvo se o credor, regularmente notificado, impugnar a
estimativa, caso em que se promoverá a avaliação dos bens a serem
reservados.


Portanto, os credores do falecido poderão exigir através de habilitação no
processo de inventário o pagamento das dívidas do espólio. Os credores poderão
optar pela ação ordinária de cobrança ou ação de execução contra devedor
solvente. Os herdeiros também poderão separar os bens para pagamento de
dívidas e também autorizar a penhora no processo em que o espólio for executado
(art. 646 Código de Processo Civil).

2.2 CESSÃO DE DIREITOS HEREDITÁRIOS


Trataremos agora da cessão de direitos hereditários, que está prevista nos
artigos nos 1.793 a 1.795 do Código Civil. Destacaremos o artigo n° 1.793 a seguir:
“Art. 1.793. O direito à sucessão aberta, bem como o quinhão de que dispunha o
coerdeiro, podem ser objeto de cessão por escritura pública”.

A herança é um valor patrimonial, trata-se de um bem imóvel, indivisível


e universal. Assim toda herança é patrimônio e, portanto, admite circulação.
A cessão de direitos hereditários é o negócio jurídico pelo qual se pode fazer
circular a herança, ela só poderá acontecer após a abertura da sucessão, ou seja,
após a morte do autor da herança. Primeiramente, a herança deverá ser aceita
para depois ser cedida. A cessão de direitos hereditários poderá ser gratuita ou
onerosa, no todo ou em parte.

182
TÓPICO 2 — FORMALIDADES DA ESCRITURA DE INVENTÁRIO E PARTILHA

Como exemplo, temos o caso do herdeiro que deseja vender ou transferir


sua quota hereditária para terceiros ou outro herdeiro, antes da partilha, posto
que após a partilha não há herança.

A cessão recai sobre o quinhão hereditário de cada herdeiro porque a


herança é um bem universal e indivisível; assim, o cedente só pode ceder sua quota,
não podendo dispor de um bem determinado do espólio, uma vez que o bem não é
de sua exclusiva propriedade, pertencendo também aos demais herdeiros.

Será admitida a disposição de bens específicos quando todos os herdeiros


interessados consentirem com a sua cessão. Compete ao tabelião analisar
os documentos apresentados pelas partes, conferindo sua autenticidade, se
realmente houve cessão de herança por parte do herdeiro.

Mas devemos ter cautela quanto à cessão, eis que, se for um bem certo
e singular, ela só poderá ser realizada mediante autorização judicial para ser
válida. Acompanhem esta explicação:

Veja-se: não é invalidade, mas apenas ineficácia perante os demais


herdeiros, já que somente será possível saber se o cedente poderia ter
transferido aquele bem depois de feita a partilha e ver para quem ficou.
Essa restrição serve de proteção aos demais herdeiros, mas é evidente
que desaparece no caso de herdeiro único ou de concordância de
todos os herdeiros na atribuição por cessão de um determinado bem
da herança (AMORIM; OLIVEIRA, 2020, p. 451).

Igualmente, os demais herdeiros terão direito de preferência sobre o


quinhão a ser cedido como determinado pelo artigo n° 1.794 do Código Civil.

Portanto, o coerdeiro não poderá ceder onerosamente sua cota à pessoa


estranha, se outro coerdeiro a quiser pelo mesmo valor. Será aplicado por
analogia, nestas situações, o art. 27 da Lei n° 8.245/1991 que trata de locações, de
modo que o direito de preferência é exercido por meio de notificação judicial ou
extrajudicial ou de outro meio de ciência inequívoca.

Se mais de um coerdeiro quiser exercer o direito de preferência, a cota


do cedente será distribuída entre eles, proporcionalmente. Caso um herdeiro
não respeite o direito de preferência, cedendo onerosamente sua parte a terceiro,
essa cessão é tida como ineficaz. O coerdeiro interessado pode depositar o valor
correspondente e propor ação de adjudicação compulsória, no prazo decadencial
de 180 dias, contados da transmissão realizada sem observância do direito de
preferência. Depois de depositar o valor, o coerdeiro interessado tomará para si
a cota do cedente.

Exercido o direito de preferência, o cedente pode desistir da cessão,


ressalvado o direito de ressarcimento de um eventual prejuízo. O direito de
preferência não se aplica à cessão gratuita, por constituir uma liberalidade.

183
UNIDADE 3 — DAS FORMALIDADES PROCEDIMENTAIS DO INVENTÁRIO E PARTILHA EXTRAJUDICIAL

Por essa razão, a cessão é um negócio jurídico aleatório (álea é sorte,


incerteza), não incidindo, por conseguinte, os vícios redibitórios (defeito oculto
em determinado objeto) e a evicção.

2.3 RENÚNCIA DA HERANÇA


Poderá também ser realizado no inventário extrajudicial a renúncia e a
cessão de direitos hereditários cumulados na mesma escritura, aos coerdeiros,
demais herdeiros e terceiros, conforme disposições previstas no artigo n° 1.793 e
seguintes do Código Civil. Vejamos: “Art. 1.793. O direito à sucessão aberta, bem
como o quinhão de que disponha o co-herdeiro, podem ser objeto de cessão por
escritura pública”.

A renúncia da herança poderá ocorrer na própria escritura pública de


inventário e partilha, ou em escritura pública realizada somente para informar este
ato, ao renunciar à herança, os direitos que competiam ao renunciante retornarão
para ser partilhados entre os demais herdeiros como já explicado brevemente na
primeira unidade.

Caso haja credores do renunciante, estes poderão se habilitar ao inventário


em seu lugar a fim de receberem os valores das pendências existentes.

A renúncia à herança só poderá beneficiar outro herdeiro, nunca um


estranho. Segundo Faria (2017), o que realmente poderá ocorrer será a renúncia
translativa em favor de terceiro, também chamada de renúncia imprópria, o que
corresponde a uma verdadeira cessão de direitos hereditários e deverá assim ser
tratada no inventário.

Desta forma, o herdeiro aceitará a herança, recolherá o imposto de


transmissão causa mortis e, logo em seguida, o herdeiro renunciante transmitirá
em favor de terceiro beneficiário o seu quinhão, este fato gerará o imposto inter
vivos (FARIA, 2017).

2.4 PROCURADORES DAS PARTES


Caso alguma das partes não possa estar presente na data de assinatura
da escritura pública, poderá nomear um procurador para representá-lo nesse
ato. O procurador poderá ser representado por terceiro ou por advogado. Essa
representação deverá cumprir os requisitos legais para ter eficácia perante o
tabelião, assim a parte deverá providenciar uma procuração feita por instrumento
público, lavrada em cartório, como disposto no artigo n° 657 do Código Civil:
“Art. 657. A outorga do mandato está sujeita à forma exigida por lei para o ato
a ser praticado. Não se admite mandato verbal quando o ato deva ser celebrado
por escrito”.

184
TÓPICO 2 — FORMALIDADES DA ESCRITURA DE INVENTÁRIO E PARTILHA

A acumulação da função de procurador e advogado das partes era um


tema polêmico por não ser permitida. Felizmente, com o pedido de providência n°
0000227-63.2013.2.00.0000 requerido pela Associação dos Advogados de São Paulo
ao Conselho Nacional de Justiça, essa regra foi alterada, culminando na Resolução
n° 179/2013, dando nova redação ao artigo 12 da Resolução n° 35/2007 do Conselho
Nacional de Justiça. Colacionamos o relatório do pedido de providência:

[…] 4. Cuida-se de requerimento que visa à modificação do art. 12 da


Resolução n° 35, a qual disciplina a aplicação da Lei n° 11.441/07 pelos
serviços notariais e de registro. (…)
6. Sabe-se que a Lei n° 11.441/07 buscou atender a uma série de
reivindicações de maior celeridade e efetividade na prática de
determinados atos e negócios jurídicos relacionados à separação e
ao divórcio como modos de dissolução da sociedade conjugal, bem
como referentes ao inventário e partilha como etapas necessárias à
formalização da transferência dos bens integrantes do patrimônio
deixado pelo falecido em favor de seus herdeiros legítimos. E, o
Conselho Nacional de Justiça, na busca da implementação das regras
contidas na Lei n° 11.441/07, editou a Resolução n° 35, posteriormente
complementada pela Resolução n° 120.
7. Exatamente em razão da facilitação dos atos concretizadores da
separação, divórcio, inventário e partilha pela via extrajudicial, houve
a determinação legal da presença de advogado como profissional
habilitado para atuar no assessoramento das pessoas interessadas e
envolvidas. E, tal obrigatoriedade foi expressamente reconhecida
no art. 8°, da Resolução n° 35. Sucede que, na eventualidade de um
dos interessados no inventário e partilha não poder estar presente no
momento da celebração da escritura pública, o art. n° 12, da referida
Resolução, estabeleceu que será possível a outorga de poderes
especiais através de instrumento público para o advogado atuar,
sendo expressamente vedada a acumulação de funções de mandatário e
de assessor das partes (parte final do referido art. n° 12).
8. A Requerente – AASP – observa que, na prática, a restrição contida
na parte final do art. n° 12, supra referido, impede que nos casos em
que um dos herdeiros ou o cônjuge (ou companheiro) sobrevivente
não possa estar presente no ato de realização da escritura pública
de inventário e partilha haja a presença de apenas um advogado,
pois a Resolução obriga que um profissional atue na condição
de representante convencional e outro atue com atividade de
assessoramento para o ato. Para tanto, apresenta quatro argumentos
que reforçam a desnecessidade da referida restrição: a) ofensa ao
princípio da legalidade na atuação do Conselho Nacional de Justiça
ao estabelecer, via resolução, restrição sem amparo legal; b) violação
a regras do Estatuto da OAB que asseguram o livre exercício das
atividades postulatórias e de consultoria e aconselhamento pelos
advogados (art. 1°, I e II, da Lei n° 8.906/94; c) a regra restritiva é
desarrazoada e desproporcional, já que nunca houve questionamento
acerca da possibilidade de o advogado atuar, simultaneamente, como
representante judicial de seus clientes e assinar partilhas amigáveis
em inventários judiciais; d) a prevalecer a restrição da Resolução, não
poderia o advogado transigir, confessar, renunciar ao direito sobre o
qual se funda a ação ou praticar outros atos de disposição de direitos.
9. Não há dúvidas quanto às diferenças que existem entre a atuação
do tabelião de notas e a atividade jurisdicional (ainda que no exercício
da jurisdição voluntária) no que pertine à realização de inventário e
partilha, mesmo que sob a modalidade consensual (ou amigável). A

185
UNIDADE 3 — DAS FORMALIDADES PROCEDIMENTAIS DO INVENTÁRIO E PARTILHA EXTRAJUDICIAL

própria natureza jurídica do ato processual representado por uma


sentença homologatória de acordo de partilha amigável, por óbvio,
permite a atribuição de maior segurança jurídica à divisão dos bens
realizada via consenso entre os interessados no inventário e na partilha
quando comparada com a partilha realizada por escritura pública.
10. Em trabalho escrito acerca da indagação sobre a possibilidade de haver
separação ou divórcio consensuais mediante procuração – sob a égide
da Lei n° 11.441/07, Cássio S. Namur responde negativamente em razão
da falta de previsão legal expressa a respeito e devido à impossibilidade
de se integrar a lacuna da norma via processo analógico. […]
13. Não se revela razoável que haja tratamento díspare na parte
referente à atuação do profissional da advocacia relacionada à questão
da formalização do acordo de partilha entre os interessados. Assim, se
na esfera judicial é perfeitamente possível que as pessoas interessadas
sejam representadas pelo mesmo advogado para fins de obtenção da
tutela jurisdicional no exercício da jurisdição voluntária relacionada à
homologação da partilha amigável (ou consensual), também deve o ser na
parte referente à escritura pública, independentemente da circunstância
de um (ou alguns) dos interessados não poder comparecer ao ato de
lavratura da escritura pública de inventário e partilha consensuais.
14. A presença de mais de um advogado na realização da escritura
pública, tal como prevista na parte final do art. 12, da Resolução n°
35, do Conselho Nacional de Justiça, não se revela medida que esteja
em sintonia com o espírito e a mens legis da Lei n° 11.441/07, na
perspectiva da desjudicialização dos atos e negócios disponíveis em
relação à separação, ao divórcio, ao inventário e à partilha amigáveis.
A possibilidade de eventual desvio ou descumprimento dos poderes
outorgados no mandato em favor do profissional da advocacia,
durante a lavratura do inventário e partilha consensuais, por óbvio,
permitirá o emprego de medidas judiciais objetivando a invalidação
do ato de inventário e partilha consensuais, sem prejuízo de outras
medidas possíveis contra o profissional que descumpriu suas
obrigações contratuais.
15. Não se pode olvidar que, sob a égide da Lei n° 11.441/07, o princípio
da autonomia privada tem campo propício para concretização mais
ampla em razão dos interesses disponíveis que são considerados para
fins de realização do inventário e partilha extrajudiciais.
16. Diante do quadro acima retratado, a hipótese é de acolhimento do
pedido de providências formulado pela Associação dos Advogados
de São Paulo e, para tanto, deve ser retirada a restrição contida na
parte final do art. 12, da Resolução n° 35.
17. Ante o exposto, julgo procedente o pedido de providências para o
fim de alterar parcialmente a regra do art. 12, da Resolução n° 35, de
24.04.2007 (com as alterações já feitas pela Resolução n. 120/10) (Trecho
do voto do relator). (CNJ - PP - Pedido de Providências - Conselheiro -
0000227-63.2013.2.00.0000 - Rel. GUILHERME CALMON NOGUEIRA
DA GAMA - 175ª Sessão Ordinária - julgado em 23/09/2013.

O procurador visa facilitar a realização da escritura pública quando uma


das partes se encontra impossibilitada de estar presente fisicamente ou enfermo.
Devemos lembrar que o procurador ao aceitar este cargo, deverá prestar contas
dos atos relacionados à partilha quando receber bens móveis ou quantias em
espécie, à parte representada (AMORIM; OLIVEIRA, 2020, p. 456).

186
TÓPICO 2 — FORMALIDADES DA ESCRITURA DE INVENTÁRIO E PARTILHA

Por fim, pontua-se que, no caso de o procurador não prestar contas, é


possível o ajuizamento de ação de exigir contas, qual possui regulamentação
específica a partir do artigo 550 do CPC.

3 NOMEAÇÃO DE INVENTARIANTE
Em ambos os inventários, judiciais e extrajudiciais, haverá a necessidade
de nomeação de um inventariante, ele poderá ser um herdeiro ou um
representante legal, para representar o autor da herança através de seu espólio,
em juízo ou fora dele.

Não será necessário seguir a ordem estabelecida pelo artigo n° 617 do


Código de Processo Civil, todavia, todas as partes devem concordar com a escolha
do representante. Assim está o artigo 11 da Resolução n° 35 do CNJ:

Art. 11. É obrigatória a nomeação de interessado, na escritura pública


de inventário e partilha, para representar o espólio, com poderes de
inventariante, no cumprimento de obrigações ativas ou passivas
pendentes, sem necessidade de seguir a ordem prevista  no art. n° 617
do Código de Processo Civil (Redação dada pela Resolução n° 326, de
26.6.2020).

A nomeação deverá constar na escritura pública. Ensinam Amorim e
Oliveira (2020, p. 453) que:

Essa providência pode constar de escritura prévia, destinada à


nomeação de pessoa que, no encargo da administração provisória ou
da inventariança, tenha acesso às fontes de informação, como bancos,
repartições públicas e outros órgãos ou pessoas que detenham bens,
documentos ou dados relacionados ao autor da herança e que devam
ser trazidos ao inventário.

Como exemplo, citamos a assinatura de uma escritura ou documento,


realizar a administração dos bens que incorporam a herança, recolher tributos,
em suma, viabilizar a realização do processo de inventário.

Haverá também a figura do administrador provisório, este é geralmente
representado pelo cônjuge ou companheiro sobrevivo ou pelo herdeiro que se
encontra na posse do imóvel ou administrando os demais bens que compõe a
herança do falecido. O administrador provisório está previsto nos artigos n° 1.797
do Código Civil e n° 613 do Código de Processo civil.

Art. 1.797. Até o compromisso do inventariante, a administração da


herança caberá, sucessivamente:
I- ao cônjuge ou companheiro, se com o outro convivia ao tempo da
abertura da sucessão;
II- ao herdeiro que estiver na posse e administração dos bens, e, se
houver mais de um nessas condições, ao mais velho; [...];
IV- a pessoa de confiança do juiz, na falta ou escusa das indicadas
nos incisos antecedentes, ou quando tiverem de ser afastadas por
motivo grave levado ao conhecimento do juiz.

187
UNIDADE 3 — DAS FORMALIDADES PROCEDIMENTAIS DO INVENTÁRIO E PARTILHA EXTRAJUDICIAL

Art. 613. Até que o inventariante preste o compromisso, continuará o


espólio na posse do administrador provisório.

Caberá ao Tabelião autorizar apenas o que lhe compete enquanto notário,
entretanto, caso o administrador provisório deseje realizar determinado ato que
não compete àquele profissional, deverá pleitear autorização judicial para exercê-
la (AMORIM; OLIVEIRA, 2020).

4 BENS – DESCRIÇÃO, VALORES E DOCUMENTOS


Para a confecção da escritura pública de inventário extrajudicial, deverão
ser reunidos e apresentados ao tabelião os seguintes documentos exigidos pelo
artigo 22 da Resolução n° 35 do CNJ:

Art. 22. Na lavratura da escritura deverão ser apresentados os


seguintes documentos:
a- certidão de óbito do autor da herança;
b- documento de identidade oficial e CPF das partes e do autor da
herança;
c- certidão comprobatória do vínculo de parentesco dos herdeiros;
d- certidão de casamento do cônjuge sobreviventee dos herdeiros
casados e pacto antenupcial, se houver;
e- certidão de propriedade de bens imóveis e direitos a eles relativos;
f- documentos necessários à comprovação da titularidade dos bens
móveis e direitos, se houver;
g- certidão negativa de tributos; e
h- Certificado de Cadastro de Imóvel Rural – CCIR, se houver imóvel
rural a ser partilhado. Será exigida a descrição dos bens, imóveis,
móveis, semoventes, cotas societárias, que integram o patrimônio
do falecido a serem inventariados, os valores atualizados segundo
avaliação do mercado, inclusive para recolha correta dos impostos
exigidos no processo de inventário.

Deverá constar na escritura o valor correspondente a cada bem que compõe


o espólio, igualmente as cotas societárias, ações e títulos, juntamente com seus
documentos comprobatórios, como contrato social, certificados, levantamento
contábil, cotação em bolsa de valores ou outros meios usuais. As dívidas ativas
do espólio também deverão ser detalhadas, constando sua origem e credores
(AMORIM; OLIVEIRA, 2020).

Os imóveis rurais deverão conter o registro imobiliário, com apresentação


de escritura de Certificado de Cadastro do INCRA (Instituto Nacional de
Colonização e Reforma Agrária) e o valor de referência do Imposto Territorial
Rural (ITR) e o comprovante de quitação do imposto territorial rural dos últimos
5 anos, conforme disposto no artigo 22, parágrafos 2° e 3° da Lei n° 497/66, que
fixa normas do direito agrário transcritas a seguir:

188
TÓPICO 2 — FORMALIDADES DA ESCRITURA DE INVENTÁRIO E PARTILHA

Art. 22 – A partir de 1° de janeiro de 1967, somente mediante


apresentação do Certificado de Cadastro, expedido pelo IBRA e previsto
na Lei n° 4.504, de 30 de novembro de 1964, poderá o proprietário
de qualquer imóvel rural pleitear as facilidades proporcionadas pelos
órgãos federais de administração centralizada ou descentralizada, ou
por empresas de economia mista de que a União possua a maioria das
ações, e, bem assim, obter inscrição, aprovação e registro de projetos
de colonização particular, no IBRA ou no INDA, ou aprovação de
projetos de loteamento (Vide Decreto n° 59.428, de 27,10.1966).

[...]
§ 2° Em caso de sucessão causa mortis nenhuma partilha, amigável
ou judicial, poderá ser homologada pela autoridade competente, sem
a apresentação do Certificado de Cadastro, a partir da data referida
neste artigo.
§ 3o A apresentação do Certificado de Cadastro de Imóvel Rural –
CCIR, exigida no caput deste artigo e nos §§ 1o e 2o, far-se-á, sempre,
acompanhada da prova de quitação do Imposto sobre a Propriedade
Territorial Rural – ITR, correspondente aos últimos cinco exercícios,
ressalvados os casos de inexigibilidade e dispensa previstos no art. 20
da Lei n° 9.393, de 19 de dezembro de 1996 (Redação dada pela Lei n°
10.267, de 28.8.2001).

Já no caso dos imóveis urbanos, será anexado o IPTU (Imposto sobre


Propriedade Predial e Territorial Urbana), de competência municipal, com seu
valor de referência e as certidões negativas correspondentes ao imóvel.

NOTA

As certidões negativas de imóveis em relação aos tributos municipais são


emitidas perante a Prefeitura do Município onde o imóvel está localizado. Alguns Municípios
já disponibilizam tal serviço por meio da página da prefeitura na internet.

Na confecção da escritura de inventário e partilha deverá constar


discriminadamente os bens sobre os quais o cônjuge sobrevivente tenha direito a
meação da herança, em razão do regime de bens adotado no casamento e os que
serão partilhados entre os demais herdeiros (FARIA, 2017).

189
UNIDADE 3 — DAS FORMALIDADES PROCEDIMENTAIS DO INVENTÁRIO E PARTILHA EXTRAJUDICIAL

4.1 BENS SITUADOS NO ESTRANGEIRO


Destacamos que os bens do falecido localizados no estrangeiro não
poderão integrar o procedimento de inventário e partilha realizado no Brasil,
somente os que se encontram em solo nacional, mesmo que o óbito tenha ocorrido
no estrangeiro. É assim o definido pelos artigos nos 23 e 48 do CPC:

Art. 23. Compete à autoridade judiciária brasileira, com exclusão de


qualquer outra:
I- conhecer de ações relativas a imóveis situados no Brasil;
II- em matéria de sucessão hereditária, proceder à confirmação de
testamento particular e ao inventário e à partilha de bens situados
no Brasil, ainda que o autor da herança seja de nacionalidade
estrangeira ou tenha domicílio fora do território nacional;

Art. 48. O foro de domicílio do autor da herança, no Brasil, é o


competente para o inventário, a partilha, a arrecadação, o cumprimento
de disposições de última vontade, a impugnação ou anulação de
partilha extrajudicial e para todas as ações em que o espólio for réu,
ainda que o óbito tenha ocorrido no estrangeiro.
Parágrafo único. Se o autor da herança não possuía domicílio certo, é
competente:
I- o foro de situação dos bens imóveis;
II- havendo bens imóveis em foros diferentes, qualquer destes;
III- não havendo bens imóveis, o foro do local de qualquer dos bens do
espólio.

Assim, os imóveis que estejam localizados em outro país deverão


seguir as regras legais do local em que estão situados. Essa regra é aplicada ao
inventário judicial e extrajudicial (AMORIM; OLIVEIRA, 2020).

4.2 IMPOSTO DE TRANSMISSÃO


O imposto de transmissão causa mortis, ITCMD, deverá ser
obrigatoriamente recolhido para conclusão do processo de inventário e partilha. A
estipulação de sua alíquota compete a cada estado brasileiro.

O valor da base de cálculo deste imposto será o valor venal dos bens e
direitos que integram o patrimônio do falecido a ser inventariado, mas somente
recairá sobre a herança destinada aos herdeiros e legatários. Assim ensinam
Amorim e Oliveira (2020, p. 386):

Assim, havendo cônjuge meeiro sobrevivo (com direito à comunhão


de bens), será apartado o valor da meação, a qual não decorre de
transmissão de bens e sim do regime de comunhão no casamento. A
outra metade deixada pelo inventariado é que fica sujeita ao tributo,
por ser transmitida aos herdeiros.

Segundo os mesmos autores, não caberá pagamento de ITCMD no caso
de renúncia à herança, vejamos:

190
TÓPICO 2 — FORMALIDADES DA ESCRITURA DE INVENTÁRIO E PARTILHA

Em caso de renúncia pura e simples da herança, também chamada de


renúncia própria ou abdicativa, não é devido o imposto de transmissão
causa mortis relativamente ao renunciante, pela simples razão de
que não se operou qualquer transmissão de bens a ele. A tributação
incidirá, naturalmente, sobre a transmissão que vier a se dar em favor
de outrem, ou seja, o herdeiro que vier a receber o quinhão renunciado.
Também não é devido, nesta hipótese de renúncia, o imposto de
transmissão inter vivos, pois o herdeiro renunciante simplesmente
abdica do seu direito, sem transmiti-lo voluntariamente a quem quer
que seja (AMORIM; OLIVEIRA, 2020, p. 388).

O recolhimento desse imposto é feito antes da finalização da escritura
pública de inventário pelo endereço eletrônico da Fazenda Estadual, após o
preenchimento do formulário, anexando os documentos obrigatórios, será gerada
uma guia para o recolhimento do imposto.

É importante destacar a necessidade do valor atribuído ao imóvel estar
em acordo com o índice de valores atualizado de mercado, pois, caso haja
divergência, a Fazenda Pública devolverá a guia com sua avaliação, corrigindo o
valor do imposto para ser devidamente recolhido pelos contribuintes.

Nos contratos de promessa de compra e venda de imóvel, devemos nos
atentar para a Súmula 590 do Supremo Tribunal Federal, portanto, o cálculo
do imposto de transmissão causa mortis deve ser feito sobre o saldo credor da
promessa de compra e venda de imóvel, no momento da abertura da sucessão do
promitente vendedor.

O tabelionato tem responsabilidade subsidiária pela conferência
do recolhimento do valor correto do tributo ITCMD, devendo manter as
documentações arquivadas para responder qualquer questionamento futuro por
parte da Fazenda Pública. Igualmente deverão ser anexados as demais guias e
comprovantes de recolhimentos de tributos e outros atos competentes da escritura
de inventário e partilha (AMORIM; OLIVEIRA, 2020).

Devemos lembrar que o imposto sobre doações por ato inter vivos, também
incidirá no direito sucessório. Vejamos:

A doação de bens imóveis ou móveis, típico ato inter vivos, pode


ocorrer também em transmissão sucessória, no âmbito do processo
de inventário, por meio da cessão gratuita de direitos hereditários ou
de meação, fazendo incidir o correspondente imposto de transmissão.
O mesmo se diga da chamada “partilha diferenciada”, em que
determinado herdeiro é beneficiado com cota superior à que lhe seria
devida por herança, sem reposição pecuniária aos demais herdeiros
(AMORIM; OLIVEIRA, 2020, p. 366).

Já em outro caso, quando ocorrer cessão de bem imóvel ou de direitos
sobre ele a título oneroso, com exceção daqueles dados em garantia, o imposto a
ser pago não será o de transmissão causa mortis, ITCMD, mas sim o ITBI, Imposto
de Transmissão de Bens Imóveis, de competência municipal, instituído no artigo
156 da Constituição Federal, em suma:

191
UNIDADE 3 — DAS FORMALIDADES PROCEDIMENTAIS DO INVENTÁRIO E PARTILHA EXTRAJUDICIAL

Compreende-se na incidência do imposto inter vivos o valor dos


imóveis que, na partilha, forem atribuídos ao cônjuge supérstite,
a qualquer herdeiro, legatário ou cessionário, acima da respectiva
meação ou quinhão. Havendo torna, ou reposição em dinheiro,
pela atribuição de determinado bem acima do quinhão devido ao
herdeiro, caracteriza-se a transmissão onerosa, e sobre esse valor
incidirá o ITBI, de competência do Município. Caso contrário, ou
seja, se não houver reposição da diferença, a hipótese será de doação,
com sujeição ao ITCMD, de competência do Estado (AMORIM;
OLIVEIRA, 2020, p. 365).

Devemos nos atentar também ao fato de caso existir vários imóveis
em distintos Estados, compondo o acervo patrimonial do autor da herança, o
imposto causa mortis deverá ser recolhido na unidade federativa em que estes
bens se localizem, por ser o ITCMD um imposto de competência Estadual, ele
valerá para o ITBI. Caro acadêmico, devemos ficar atentos a esses impostos, pois
cada ato terá sua correspondência tributária.

Por oportuno, no que se refere ao ITCMD, vale ainda destacar recente


decisão do STF em sede de repercussão geral sobre a competência legislativa
para a instituição de cobrança de ITCMD nas hipóteses de doações e heranças
instituídas no exterior.

No caso levado à Corte Suprema, o Estado de São Paulo questionava


acórdão do Tribunal de Justiça local que negou ao governo estadual o poder
de cobrar o ITCMD sobre doação testamentária instituída por cidadão italiano,
domiciliado em seu país, em favor de brasileira, consistente em móvel localizado
em uma cidade italiana.

O Tribunal de Justiça de São Paulo considerou inconstitucional o


dispositivo da Lei estadual n° 10.705/2000 regulamentando a cobrança, sob o
fundamento de que, inexistindo a lei complementar a que se refere ao artigo n°
155, parágrafo 1°, inciso III, da Constituição Federal, a legislação paulista não
poderia exigir o ITCMD na hipótese.

Destaca-se a previsão do artigo n° 155, parágrafo 1°, inciso III, da


Constituição Federal para a melhor compreensão da temática discutida:

Art. 155. Compete aos Estados e ao Distrito Federal instituir impostos


sobre:  
I- transmissão causa mortis e doação, de quaisquer bens ou direitos;         
§ 1° O imposto previsto no inciso I:   
[...]
III- terá competência para sua instituição regulada por lei
complementar:
a- se o doador tiver domicilio ou residência no exterior;
b- se o de cujus possuía bens, era residente ou domiciliado ou teve
o seu inventário processado no exterior.

192
TÓPICO 2 — FORMALIDADES DA ESCRITURA DE INVENTÁRIO E PARTILHA

O STF, corroborando o entendimento do Tribunal de Justiça de São Paulo


e julgando improcedente o Recurso Extraordinário do Estado de São Paulo (RE
851.108), fixou a seguinte tese de repercussão geral (tema 825): “É vedado aos
estados e ao Distrito Federal instituir o ITCMD nas hipóteses referidas no artigo
155, § 1°, III, da Constituição Federal sem a intervenção da lei complementar
exigida pelo referido dispositivo constitucional”.

De acordo com a decisão, mesmo diante da omissão do legislador


infraconstitucional acerca da matéria, os estados-membros não podem editar leis
instituindo a cobrança com base na competência legislativa concorrente, devendo
aguardar a edição de uma lei complementar para tanto.

Concluindo a análise, cabe ainda pontuar que foi estabelecida a modulação


dos efeitos para que a decisão passe a produzir efeitos a contar da publicação
do acórdão, ressalvando as ações judiciais pendentes de conclusão até o mesmo
momento, nas quais se discuta:  a qual estado o contribuinte deve efetuar o
pagamento do ITCMD, considerando a ocorrência de bitributação; e a validade
da cobrança desse imposto, não tendo sido pago anteriormente.

No próximo subtópico, prosseguiremos nosso estudo sobre as


formalidades da escritura de inventário e partilha, analisando a exigência da
certidão negativa de débitos fiscais.

4.3 CERTIDÃO NEGATIVA DE DÉBITOS FISCAIS


Para a finalização do inventário extrajudicial, as partes obrigatoriamente
deverão apresentar as certidões negativas de débitos fiscais junto à fazenda
pública, municipal, estadual e federal, em relação aos bens que incorporam a
herança do falecido.

As principais certidões negativas de débitos fiscais são: certidão negativa
de débitos do espólio, como o IPTU (imposto sobre a propriedade predial e
territorial urbana) para imóveis urbanos, ITR (imposto sobre propriedade
territorial rural), para imóveis rurais e a certidão negativa de débitos para
empresas, sem elas não será possível confeccionar a escritura de inventário e
partilha, “sob pena de responsabilidade subsidiária do tabelião pelos débitos
pendentes” (AMORIM; OLIVEIRA, 2020, p. 456). Resumidamente serão as
seguintes certidões (ANOREG, 2020):

Em imóveis rurais:

• Certidão de ônus expedida pelo Cartório de Registro de Imóveis (atualizada


até 30 dias).
• Cópia autenticada da declaração de ITR dos últimos cinco anos ou Certidão
Negativa de Débitos de Imóvel Rural emitida pela Secretaria da Receita Federal
– Ministério da Fazenda.
• Certificado de Cadastro de Imóvel Rural (CCIR) expedido pelo INCRA.
193
UNIDADE 3 — DAS FORMALIDADES PROCEDIMENTAIS DO INVENTÁRIO E PARTILHA EXTRAJUDICIAL

Em bens imóveis urbanos:

• Carnê de IPTU (ano do falecimento e atual).


• Certidão de ônus expedida pelo Cartório de Registro de Imóveis (atualizada
até 30 dias).
• Certidão negativa de tributos municipais incidentes sobre imóveis, declaração
de quitação de débitos condominiais.

Em bens móveis:

• Documento de veículos.
• Extratos bancários.
• Certidão da junta comercial ou do cartório de registro civil de pessoas jurídicas.
• Notas fiscais de bens e joias etc.

Consequentemente, caso exista débitos tributários de competência


municipais, estaduais e federais, impedirão a finalização da confecção da escritura
pública. Portanto, somente após a quitação desses impostos e apresentação das
certidões negativas, o tabelião poderá dar prosseguimento ao inventário.

4.4 MODELO DE ESCRITURA PÚBLICA DE INVENTÁRIO


EXTRAJUDICAL
Como forma de facilitar o aprendizado, disponibilizaremos a seguir um
modelo de escritura pública de inventário e partilha retirado do livro do professor
Mario Roberto Carvalho Faria.

MODELO DE ESCRITURA DE INVENTÁRIO

ESCRITURA PÚBLICA DE INVENTÁRIO E PARTILHA, na forma


abaixo:

Saibam quantos esta virem, que aos XX (XXXXXXX) dias do mês de


XXXXXXX do ano 2015 (dois mil e quinze), nesta Cidade de Rio de Janeiro, Estado
do Rio de Janeiro, República Federativa do Brasil, perante mim ____________,
Tabelião, compareceram, Josefa Bobi, brasileira, viúva, do lar, inscrita no CPF
..................., residente e domiciliada nesta cidade à Rua Visconde de Caravelas,
517, apto. 801 e Maria Bobi Faria, brasileira, casada com José Faria, do lar,
portadora da carteira de identidade n° ............, expedida pelo IFP, inscrita no
CPF sob o n° ..........................., respectivamente, na qualidade de viúva meeira
e única herdeira dos bens deixados pelo finado Januário Bobi, falecido nesta
cidade, no dia 27 de maio de 2005. Todos os presentes são maiores e capazes,
reconhecidos e identificados como os próprios por mim, pelos documentos
ora exibidos, estando assistidos pelo Dr.___________, brasileiro, casado,

194
TÓPICO 2 — FORMALIDADES DA ESCRITURA DE INVENTÁRIO E PARTILHA

advogado, inscrito na OAB/RJ sob n° 215.218, com escritório na Av. Praia do


Sul, n. 312, e que ficam arquivados neste Serviço Notarial, do que dou fé; bem
como da presente será enviada nota ao competente distribuidor, dentro do
prazo da Lei. E pelos outorgantes me foi dito que desejavam, de conformidade
com o disposto no artigo 610, do Código de Processo Civil, fazer o inventário e
partilha do bem abaixo descrito deixado pelo finado Januário Bobi, pelos que
fazem as seguintes declarações: 1 – Autor da herança: Januário Bobi, brasileiro,
inscrito no CPF sob o n° ................., portador da carteira de identidade expedida
pelo sob o n°.................., falecido nesta cidade do Rio de Janeiro, no dia 27
de maio de 2005, onde era residente e domiciliado, no estado civil de casado
pelo regime da comunhão universal de bens, sem deixar testamento, deixando
viúva meeira, herdeiros e bens. 2 – Viúva meeira – Josefa Bobi, brasileira,
viúva, do lar, inscrita no CPF ......................, residente e domiciliada nesta
cidade no endereço acima mencionado, que foi casada com o autor da herança
pelo regime de comunhão universal de bens. Filha única – Maria Bobi de Faria
brasileira, casada pelo regime da comunhão universal de bens com José Faria,
acima qualificada. Da inexistência de testamento ou herdeiros menores: Declara
a viúva meeira que o autor da herança não deixou testamento ou herdeiros
menores e incapazes. Bem imóvel – o imóvel objeto da presente escritura é: 1/5
(um quinto) da casa assobradada construída no lote de terreno n° 65 (sessenta e
cinco) da Rua Doutor Agueiro, na cidade de Corumbá, Estado do Mato Grosso
do Sul, cujas metragens, confrontações e forma de aquisição são as constantes
da matrícula n° 12.331 constante na certidão do Cartório do 1° Ofício da
comarca de Corumbá, MS, ora apresentada, que fica integrando a presente, ao
qual se atribui o valor de R$ 1.000,00. Partilha amigável – Monte inventariado
– R$ 1.000,00 – Meação da viúva – R$ 500,00 – Meação do inventariado que
constitui a herança da herdeira – R$ 500,00 – Pagamento que se faz à herdeira
Maria Bobi de Faria, brasileira, casada pelo regime da comunhão universal
de bens com José Faria, de sua legítima no valor de R$ 500,00 – HAVERÁ: a)
1/10 (um décimo) da casa assobradada construída no lote de terreno n° 65
(sessenta e cinco) da rua Doutor Agueiro, na cidade de Corumbá, Estado do
Mato Grosso do Sul no valor de R$ 500,00. Total: R$ 500,00. Pagamento que se
faz à viúva meeira Josefa Bobi, brasileira, viúva, do lar, de sua meação no valor
de R$ 500,00. HAVERÁ: a) 1/10 (um décimo) da casa assobradada construída
no lote de terreno n° 65 (sessenta e cinco) da rua Doutor Agueiro, na cidade
de Corumbá, Estado do Mato Grosso do Sul no valor de R$ 500,00. Total: R$
500,00. E por esta forma, têm por concluída a presente escritura de inventário
e partilha amigável. Declaração da inexistência de outros bens: Declaram os
outorgantes não existir outros bens de seu conhecimento, a inventariar. As
certidões negativas do falecido foram apresentadas. E, de como assim o disse,
me pediu e lhe lavrei a presente que feita e achada conforme, outorgam,
aceitam e assinam.

FONTE: FARIA, Mario Roberto Carvalho. Direito das sucessões. 8. ed. Rio de Janeiro: Gen-
Forense, 2017.

Dessa forma, finalizamos o Tópico 2. Até o próximo tópico!

195
RESUMO DO TÓPICO 2
Neste tópico, você aprendeu que:

• As partes que compõe a escritura de inventário e partilha são: a(o) viúva(o)


supérstite, os herdeiros, os cônjuges dos herdeiros, com exceção daqueles
casados sob o regime de separação absoluta de bens.

• O procedimento de inventário e partilha é necessário para a divisão do espólio


(da representação da herança) entre os herdeiros e os legatários e para o
pagamento das dívidas do falecido. Portanto, além dos herdeiros e legatários, os
credores do falecido também serão diretamente interessados no inventário.

• A atuação do advogado é imprescindível para a realização do inventário


extrajudicial, a sua falta implicará na nulidade do ato praticado.

• Para a finalização do inventário extrajudicial, as partes obrigatoriamente


deverão apresentar as certidões negativas de débitos fiscais junto à fazenda
pública, municipal, estadual e federal, em relação aos bens que incorporam a
herança do falecido.

196
AUTOATIVIDADE

1 Assinale a seguir a alternativa que completa a seguinte sentença: feita a


partilha, os herdeiros respondem pela dívida do falecido:

a) ( ) Em partes iguais, ainda que tenha sido desproporcional a divisão da


herança.
b) ( ) Solidariamente, porém somente até os limites da herança.
c) ( ) Solidariamente, porém somente se houver prova documental da
obrigação.
d) ( ) Proporcionalmente à parte que lhe couber na herança.
e) ( ) Solidariamente, ainda que superem o valor da herança.

2 O imposto de transmissão causa mortis, ITCMD, tem sua alíquota fixada pelos
estados e deverá ser obrigatoriamente recolhido na conclusão do processo
de inventário e partilha. Sobre os inventários e partilhas extrajudiciais, é
correto afirmar que:

a) ( ) A existência de credor de espólio impedirá a realização do inventário e


partilha ou adjudicação por escritura pública.
b) ( ) É obrigatória a nomeação de interessado na escritura pública de inventário
e partilha, para representar o espólio, com poderes de inventariante, no
cumprimento de obrigações ativas ou passivas pendentes.
c) ( ) É inadmissível a sobrepartilha por escritura pública referente inventário
e partilha judicial já findos.
d) ( ) É inadmissível reconhecer a meação do(a) companheiro(a) sobrevivente,
ainda que exista unanimidade entre os herdeiros reconhecendo a união
estável.

3 Sobre os requisitos pertinentes ao procedimento de inventário e partilha


extrajudicial, é correto afirmar:

a) ( ) Visando a simplificação do procedimento, é dispensável a atuação do


advogado.
b) ( ) Os credores do falecido não podem ser considerados como terceiro
juridicamente interessado no inventário.
c) ( ) Não é possível renunciar a herança no procedimento extrajudicial de
inventário e partilha, sendo necessário o ajuizamento de uma ação
judicial para tanto.
d) ( ) É vedada ao tabelião a indicação de advogado às partes.

197
198
TÓPICO 3 —
UNIDADE 3

SOBREPARTILHA EXTRAJUDICIAL E CARTA DE SENTENÇA


OU FORMAL DE PARTILHA EXTRAJUDICIAL

1 INTRODUÇÃO
Neste último tópico centraremos esforços especificamente no instituto
da partilha extrajudicial e suas formalidades elencadas, principalmente, na
Resolução n° 35 do CNJ.

Iniciaremos nossa análise versando sobre a possibilidade de se realizar


sobrepartilha extrajudicial. Depois abordaremos a viabilidade de se realizar a
retificação da escritura de partilha, situação que não pode ser confundida com
o instituto da sobrepartilha extrajudicial. Trataremos também das hipóteses de
anulação da partilha realizada em sede de inventário extrajudicial.

Por fim, estudaremos as cartas de sentenças extrajudiciais que se inserem


no movimento de desjudicialização, posto que, refere-se à permissão para que as
partes interessadas em expedição de cartas de sentença judiciais requeiram ao
tabelião que as lavre.

Então, mãos à obra!

2 SOBREPARTILHA EXTRAJUDICIAL
A sobrepartilha é a realização de uma nova partilha pelos interessados
na hipótese de descobrirem a existência de um bem pertencente ao falecido que,
indevidamente, ficou de fora da partilha realizada perante o Poder Judiciário ou
no Tabelionato de Notas.

Nas palavras de Elucidam Euclides de Oliveira e Sebastião Amorim


(2020, p. 392) “a sobrepartilha nada mais é que um complemento da partilha
anteriormente feita, em virtude de, nessa primeira partilha, terem sido omitidos
bens que deveriam ser atribuídos aos sucessores”.

Acadêmico, note que a necessidade de se realizar a sobrepartilha pode ter


inúmeras causas. Os professores Cristiano Chaves de Farias e Nelson Rosenvald
(2018, p. 2141) dão destaque para as seguintes:

199
UNIDADE 3 — DAS FORMALIDADES PROCEDIMENTAIS DO INVENTÁRIO E PARTILHA EXTRAJUDICIAL

Superveniência de um crédito decorrente de sentença transitada em


julgado em ação promovida por falecido, ainda vivo, por seu espólio;
por existência de resíduos de bens que haviam sido preparados para
o pagamento de dívida do extinto, mesmo depois de quitada a dívida;
pela apresentação de bem que estava na posse de herdeiro e que
deixou de constar, indevidamente, do inventário, tendo sido negado
pelo beneficiário, como no exemplo da doação de ascendente para
descendente, dentre outros.

O Código Civil de 2002 cuida da matéria em seus artigos nos 2.021 e 2.002:

Art. 2.021. Quando parte da herança consistir em bens remotos do


lugar do inventário, litigiosos, ou de liquidação morosa ou difícil,
poderá proceder-se, no prazo legal, à partilha dos outros, reservando-
se aqueles para uma ou mais sobrepartilhas, sob a guarda e a
administração do mesmo ou diverso inventariante, e consentimento
da maioria dos herdeiros.

Art. 2.022. Ficam sujeitos a sobrepartilha os bens sonegados e quaisquer


outros bens da herança de que se tiver ciência após a partilha.

Já o Código de Processo Civil dispõe sobre a sobrepartilha nos seus artigos


nos 669 e 670:

Art. 669. São sujeitos à sobrepartilha os bens:


I- sonegados;
II- da herança descobertos após a partilha;
III- litigiosos, assim como os de liquidação difícil ou morosa;
IV- situados em lugar remoto da sede do juízo onde se processa o
inventário.
Parágrafo único. Os bens mencionados nos incisos III e IV serão
reservados à sobrepartilha sob a guarda e a administração do mesmo
ou de diverso inventariante, a consentimento da maioria dos herdeiros.
Art. 670. Na sobrepartilha dos bens, observar-se-á o processo de
inventário e de partilha.
Parágrafo único. A sobrepartilha correrá nos autos do inventário do
autor da herança.

No que tange especificamente à sobrepartilha extrajudicial, temos os


seguintes requisitos para que seja possível sua realização:

• Herdeiros maiores e capazes.


• Consenso entre os herdeiros quanto à partilha dos bens.
• Inexistência de testamento (desde que não esteja caduco ou revogado), exceto
se houver prévia decisão judicial autorizando o inventário em cartório.
• Assistência por um advogado.

Logo, se após o encerramento do inventário os herdeiros descobrirem que


algum bem não foi inventariado, é possível realizar a sobrepartilha por meio de
escritura pública, observados os supracitados requisitos.

200
TÓPICO 3 — SOBREPARTILHA EXTRAJUDICIAL E CARTA DE SENTENÇA OU FORMAL DE PARTILHA EXTRAJUDICIAL

Acadêmico, note que assim como para o inventário e partilha extrajudicial,


a sobrepartilha exige a existência de consenso entre os herdeiros, ou seja, a
inexistência de conflito.

E
IMPORTANT

A sobrepartilha pode ser realizada extrajudicialmente ainda que a partilha


anterior tenha sido feita judicialmente e ainda que os herdeiros, hoje maiores, fossem
menores ou incapazes ao tempo da partilha anterior.

É neste sentido a redação do artigo 25 da Resolução n° 35 do CNJ: “É


admissível a sobrepartilha por escritura pública, ainda que referente inventário
e partilha judiciais já findos, mesmo que o herdeiro, hoje maior e capaz, fosse
menor ou incapaz ao tempo do óbito ou do processo judicial”.

NOTA

Acadêmico, saiba que não houve previsão expressa da sobrepartilha


extrajudicial na Lei n° 11.441/2007, porém é entendimento tranquilo na doutrina ser possível
se extrair sua possibilidade por meio de interpretação teleológica da referida lei, posto que
tem como objetivo a desjudicialização do direito sucessório como um todo. Ademais, para
além de sua previsão na Resolução n° 35 do CNJ, saiba que já se trata de prática concreta
dos nossos cartórios por todo país.

No tópico seguinte, abordaremos a possibilidade de se retificar a escritura


de partilha.

3 DA RETIFICAÇÃO DA ESCRITURA DE PARTILHA


A partilha que se dá na forma da Lei n° 11.441/2007 materializa-se por
meio de uma Escritura Pública.

É possível e necessário que, constatados erros na partilha, seja realizada


a retificação por meio de escritura pública, desde que observada as mesmas
formalidades do ato original.

201
UNIDADE 3 — DAS FORMALIDADES PROCEDIMENTAIS DO INVENTÁRIO E PARTILHA EXTRAJUDICIAL

Ponto crucial a ser destacado: em regra, a escritura pública de inventário


e partilha pode ser retificada apenas com o consentimento de todos os herdeiros
e interessados. Esclarece, Narciso Orlandi Filho (1999, p. 90):

Não há possibilidade de retificação de escritura sem que dela


participem as mesmas pessoas que estiveram presentes no ato da
celebração do negócio instrumentalizado. É que a escritura nada mais é
que o documento, o instrumento escrito de um negócio jurídico; prova
pré-constituída da manifestação de vontade de pessoas, explicitada
de acordo com a lei. Não se retifica manifestação de vontade alheia.
Em outras palavras, uma escritura só pode ser retificada por outra
escritura, com o comparecimento das mesmas partes que, na primeira,
manifestaram sua vontade e participaram do negócio jurídico
instrumentalizado.

Já os erros materiais podem ser corrigidos de ofício, ou seja,


independentemente do requerimento das partes. Por óbvio, as partes e seus
respectivos procuradores também têm legitimidade para requererem a correção
de erros materiais.

NOTA

O erro material pode ser entendido como aquele possível de ser percebido “em
um primeiro olhar”, não sendo fruto de qualquer tipo de tentativa de natureza fraudulenta,
mas, sim, de simples equivoco. Como exemplo, podemos citar o caso de constar na
escritura pública a grafia errada do nome de uma das partes. Já o erro formal, como a
própria denominação indica, trata-se de erro relativo a não observância às formalidades
legais previstas ao procedimento. Este último apenas poderá ser retificado caso haja
concordância de todos os interessados.

O artigo 13 da Resolução n° 35 do CNJ assim dispõe:

A escritura pública pode ser retificada desde que haja o consentimento


de todos os interessados. Os erros materiais poderão ser corrigidos,
de ofício ou mediante requerimento de qualquer das partes, ou de seu
procurador, por averbação à margem do ato notarial ou, não havendo
espaço, por escrituração própria lançada no livro das escrituras
públicas e anotação remissiva.

202
TÓPICO 3 — SOBREPARTILHA EXTRAJUDICIAL E CARTA DE SENTENÇA OU FORMAL DE PARTILHA EXTRAJUDICIAL

E
IMPORTANT

Não existe prazo para retificar uma escritura pública.

A título de comparação, destaca-se que no caso de partilha judicial, o CPC


dispõe de maneira distinta:

Art. 656. A partilha, mesmo depois de transitada em julgado a sentença


pode ser emendada nos mesmos autos do inventário, convindo todas
as partes, quando tenha havido erro de fato na descrição dos bens,
podendo o juiz, de ofício ou a requerimento da parte, a qualquer
tempo, corrigir-lhe as inexatidões materiais.

No próximo subtópico trataremos dos emolumentos da escritura pública


e da possibilidade da concessão do benefício à gratuidade da justiça no âmbito
extrajudicial.

4 EMOLUMENTOS DA ESCRITURA – LEI DE CUSTAS


Antes de adentrarmos propriamente no tema dos emolumentos da
escritura pública, vale relembrar que os serviços notariais, conforme mandamento
constitucional a seguir destacado, são exercidos em caráter privado em decorrência
de delegação do Poder Público. Além disso, a fiscalização da atividade é de
competência do Poder Judiciário.

A remuneração dos notários e registradores é realizada por meio de


pagamento de emolumentos relativo aos atos notariais praticados. Portanto, o
pagamento dos emolumentos serve como contraprestação aos serviços notariais.

O artigo 236, § 2° da Constituição faz previsão dos emolumentos, aduzindo


que Lei Federal deverá estabelecer normas para sua fixação:

Art. 236. Os serviços notariais e de registro são exercidos em caráter


privado, por delegação do Poder Público.         
§ 1° Lei regulará as atividades, disciplinará a responsabilidade civil
e criminal dos notários, dos oficiais de registro e de seus prepostos, e
definirá a fiscalização de seus atos pelo Poder Judiciário.
§ 2°  Lei federal estabelecerá normas gerais para fixação de
emolumentos relativos aos atos praticados pelos serviços notariais
e de registro.
§ 3° O ingresso na atividade notarial e de registro depende de concurso
público de provas e títulos, não se permitindo que qualquer serventia
fique vaga, sem abertura de concurso de provimento ou de remoção,
por mais de seis meses.

203
UNIDADE 3 — DAS FORMALIDADES PROCEDIMENTAIS DO INVENTÁRIO E PARTILHA EXTRAJUDICIAL

NOTA

Para dar cumprimento ao referido mandamento constitucional e à disposição,


foi editada a Lei federal n° 10.169/00, que será explorada mais adiante.

A Lei n° 9835/98 é mais específica ao deixar claro o caráter de contraprestação


que os emolumentos possuem em relação aos serviços prestados pelos notários e
registradores:

Art. 28. Os notários e oficiais de registro gozam de independência no


exercício de suas atribuições, têm direito à percepção dos emolumentos
integrais pelos atos praticados na serventia e só perderão a delegação
nas hipóteses previstas em lei.

E
IMPORTANT

Mas qual seria a natureza jurídica dos emolumentos?

A jurisprudência do Supremo Tribunal Federal já pacificou o entendimento


de que os emolumentos possuem natureza tributária, sendo considerado como
espécie de taxa.

A jurisprudência do STF firmou orientação no sentido de que as custas


judiciais e os emolumentos concernentes aos serviços notariais e
registrais possuem natureza TRIBUTÁRIA, qualificando-se como
TAXAS remuneratórias de serviços públicos, sujeitando-se, em
consequência, quer no que concerne à sua instituição e majoração,
quer no que se refere à sua exigibilidade, ao regime jurídico-
constitucional pertinente a essa especial modalidade de tributo
vinculado, notadamente aos princípios fundamentais que proclamam,
entre outras, as garantias essenciais (a) da reserva de competência
impositiva, (b) da legalidade, (c) da isonomia e (d) da anterioridade.
[ADI 1.378 MC, rel. min. Celso de Mello, j. 30-11-1995, P, DJ de 30-5-
1997.] = ADI 3.260, rel. min. Eros Grau, j. 29-3-2007, P, DJ de 29-6-2007
(grifos nossos).

O art. 3° do Código Tributário Nacional (CTN) estabelece que “Tributo


é toda prestação pecuniária compulsória, em moeda ou cujo valor nela se possa
exprimir, que não constitua sanção de ato ilícito, instituída em lei e cobrada
mediante atividade administrativa plenamente vinculada". 

204
TÓPICO 3 — SOBREPARTILHA EXTRAJUDICIAL E CARTA DE SENTENÇA OU FORMAL DE PARTILHA EXTRAJUDICIAL

Através da tal definição legal, a doutrina majoritária, da mesma forma


que a jurisprudência do Supremo, entende que os emolumentos e a custas
judiciais se enquadram perfeitamente no conceito de tributo, pois são prestações
em dinheiro pagas de forma compulsória, pois, se o usuário precisa do serviço,
ele tem que pagar, fixadas unilateralmente pelo poder público, quando ocorre
situação prevista em lei. Além de que a atividade notarial e registral é própria do
Estado, mas por disposição constitucional é delegada (LOUREIRO, 2020, p. 105).

NOTA

A Taxa é espécie tributária prevista no art. n° 145, II, CF/88, podendo ser
instituída pela União, Estados, Distrito Federal e Municípios “em razão do exercício do
poder de polícia ou pela utilização, efetiva ou potencial, de serviços públicos específicos e
divisíveis, prestados ao contribuinte ou postos a sua disposição”. Previsão semelhante é feita
pelo art. n° 77 do CTN.

Passemos agora à análise da Lei n° 10.169/00, que estabelece normas gerais


para fixação dos emolumentos.

O artigo 1° da Lei n° 10.169/00 informa que cabe aos Estados e ao Distrito


Federal fixar o valor dos emolumentos relativos aos atos praticados pelos
respectivos serviços notariais e de registro.

O parágrafo único do mesmo artigo 1° da lei em análise dispõe: “O valor


fixado para os emolumentos deverá corresponder ao efetivo custo e à adequada e
suficiente remuneração dos serviços prestados”. Deve-se evitar que haja oneração
demasiada das partes interessadas para que o procedimento extrajudicial seja
economicamente mais vantajoso que se recorrer ao Poder Judiciário.

Como norma de caráter geral, a Lei n° 10.169/00 traz balizas para que as
leis estaduais e distrital fixem os valores dos emolumentos.

Art. 2o Para a fixação do valor dos emolumentos, a Lei dos Estados


e do Distrito Federal levará em conta a natureza pública e o caráter
social dos serviços notariais e de registro, atendidas ainda as seguintes
regras:
I- os valores dos emolumentos constarão de tabelas e serão expressos
em moeda corrente do País;
II- os atos comuns aos vários tipos de serviços notariais e de registro
serão remunerados por emolumentos específicos, fixados para
cada espécie de ato;
III- os atos específicos de cada serviço serão classificados em:
a- atos relativos a situações jurídicas, sem conteúdo
financeiro, cujos emolumentos atenderão às peculiaridades
socioeconômicas de cada região;

205
UNIDADE 3 — DAS FORMALIDADES PROCEDIMENTAIS DO INVENTÁRIO E PARTILHA EXTRAJUDICIAL

b- atos relativos a situações jurídicas, com conteúdo financeiro,


cujos emolumentos serão fixados mediante a observância de
faixas que estabeleçam valores mínimos e máximos, nas quais
enquadrar-se-á o valor constante do documento apresentado
aos serviços notariais e de registro.
§ 1° Nos casos em que, por força de lei, devam ser utilizados valores
decorrentes de avaliação judicial ou fiscal, esses serão os valores
considerados para os fins do disposto na alínea “b” do inciso III do
caput deste artigo.
§ 2° Os emolumentos devidos pela constituição de direitos reais de
garantia mobiliária ou imobiliária destinados ao crédito rural não
poderão exceder o menor dos seguintes valores:
I- 0,3% (zero vírgula três por cento) do valor do crédito concedido,
incluída a taxa de fiscalização judicial, limitada a 5% (cinco por
cento) do valor pago pelo usuário, vedados quaisquer outros
acréscimos a título de taxas, custas e contribuições para o Estado
ou Distrito Federal, carteira de previdência ou para associação de
classe, criados ou que venham a ser criados sob qualquer título ou
denominação; e
II- o valor respectivo previsto na tabela estadual definida em lei,
observado que:
a- nos registros, quando 2 (dois) ou mais imóveis forem dados em
garantia, situados ou não na mesma circunscrição imobiliária,
tenham ou não igual valor, a base de cálculo dos atos será
o resultado da divisão do valor do mútuo pelo número de
imóveis, limitada ao potencial econômico de cada bem;
b- a averbação de aditivo de garantia real com liberação de
crédito suplementar será cobrada conforme o disposto neste
artigo e terá como base de cálculo o valor do referido crédito;
c- a averbação de aditivo que contenha outras alterações que
não importem mudança no valor do crédito concedido é
considerada ato sem conteúdo econômico;
d- os valores de cancelamento dos atos de que trata o caput deste
parágrafo obedecerão ao previsto nas tabelas estaduais, até o
limite máximo de 0,1% (zero vírgula um por cento) do valor do
crédito concedido;
e- a prenotação, as indicações e os arquivamentos estão incluídos
nos emolumentos devidos pelos registros de garantias reais
previstas nesta Lei;
f- os emolumentos devidos pelo registro auxiliar de cédula ou
nota de crédito e de produto rural, não garantida por hipoteca
ou alienação fiduciária de bens imóveis, obedecerão ao previsto
nas tabelas estaduais e não poderão exceder 0,3% (zero vírgula
três por cento) do valor do crédito concedido, incluída a taxa
de fiscalização judicial, limitada a 5% (cinco por cento) do
valor pago pelo usuário, observadas as vedações estipuladas
no inciso I deste parágrafo.

Ademais, a lei em análise, no seu artigo 3o estabelece, dentre outras


vedações, ser vedado cobrar das partes interessadas quaisquer outras quantias
não expressamente previstas nas tabelas de emolumentos.

A Lei n° 10.169/00, no seu artigo 4o, também estabelece que as tabelas de


emolumentos devem ser publicadas nos órgãos oficiais das respectivas unidades
da Federação, cabendo às autoridades competentes determinar a fiscalização
do seu cumprimento e sua afixação obrigatória em local visível em cada serviço
notarial e de registro.

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TÓPICO 3 — SOBREPARTILHA EXTRAJUDICIAL E CARTA DE SENTENÇA OU FORMAL DE PARTILHA EXTRAJUDICIAL

O art. 6o da referida lei, aduz que os notários e os registradores


darão recibo dos emolumentos percebidos. Note que se trata de dever desses
profissionais, expressamente disposto no artigo 30, IX da Lei n° 8.935/94.

Conforme destacado, as regras específicas sobre os valores a serem


cobrados pelas serventias extrajudiciais são de competência legislativa dos
Estados. Logo, a tabela de emolumentos é fixada por meio de lei elaborada pelo
Poder Legislativo estadual, porém, sua fiscalização fica a cargo do Tribunal de
Justiça local.

Quando houver necessidade de se proceder com reajuste dos valores


fixados na tabela de emolumento, o Tribunal deverá criar um projeto de lei e
encaminhá-lo ao Poder Legislativo estadual a fim que se aprove (ou não) a nova
tabela com as alterações propostas.

Noutro giro, no caso de se proceder apenas com a atualização monetária


dos valores fixados na tabela de emolumentos, não será necessária a edição de
lei, devendo ser realizada através de atos normativos do Poder Judiciário. Tal
atualização geralmente é feita por meio de Portaria ou Provimento do Tribunal
de Justiça local.

DICAS

Acadêmico, no site da Associação dos Notários e Registradores do Brasil, é


possível ter acesso a todas as tabelas de emolumentos dos Estados e do Distrito Federal.
Acesse-o por meio do link: <https://www.anoreg.org.br/site/tabela-de-emolumentos/>.

A seguir trataremos sobre a possiblidade de concessão de gratuidade em


relação ao pagamento dos emolumentos.

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UNIDADE 3 — DAS FORMALIDADES PROCEDIMENTAIS DO INVENTÁRIO E PARTILHA EXTRAJUDICIAL

4.1 GRATUIDADE
No que toca aos emolumentos da escritura pública realizado em
cartório de notas de inventário e partilha, já temos condições de concluir: é de
responsabilidade dos Estados legislar a fixação do valor a ser aplicado.

Neste momento, nos cabe perquirir se é possível a concessão do benefício


da gratuidade de justiça em relação aos emolumentos e taxas cobradas pelas
serventias extrajudiciais.

O Código de Processo Civil de 1973, após a alteração da Lei n° 11.441/2007,


previa expressamente a gratuidade da escritura de separação, divórcio e inventário
extrajudicial. Estabelecia o art. n° 1.124-A do revogado CPC/73: “A escritura e
demais atos notariais serão gratuitos àqueles que se declararem pobres sob as
penas da lei”.

O atual código processual, quanto à questão de isenção de emolumentos


dos atos notariais para pessoas carentes, apenas faz previsão referente à concessão
de isenção dentro de um processo judicial. Vejamos:

Art. 98. A pessoa natural ou jurídica, brasileira ou estrangeira, com


insuficiência de recursos para pagar as custas, as despesas processuais
e os honorários advocatícios tem direito à gratuidade da justiça, na
forma da lei.
§ 1° A gratuidade da justiça compreende:
IX- os emolumentos devidos a notários ou registradores em decorrência
da prática de registro, averbação ou qualquer outro ato notarial
necessário à efetivação de decisão judicial ou à continuidade de
processo judicial no qual o benefício tenha sido concedido.
§ 8° Na hipótese do § 1o, inciso IX, havendo dúvida fundada quanto ao
preenchimento atual dos pressupostos para a concessão de gratuidade,
o notário ou registrador, após praticar o ato, pode requerer, ao juízo
competente para decidir questões notariais ou registrais, a revogação
total ou parcial do benefício ou a sua substituição pelo parcelamento
de que trata o § 6o deste artigo, caso em que o beneficiário será citado
para, em 15 (quinze) dias, manifestar-se sobre esse requerimento.

Nota-se, portanto, que diferentemente do antigo CPC, o CPC atual não


trouxe qualquer disposição pertinente à gratuidade de atos notariais quando
não forem em decorrência de um processo judicial, mas, sim, de procedimento
extrajudicial, tal qual o inventário e partilha extrajudicial. Os professores Nelson
Nery Júnior e Rosa Maria de Andrade Nery (2015, p. 1.433), ao comentarem a
ausência dessa previsão específica, defendem que:

Não há razão para que a gratuidade, apesar de não contemplada na


versão final do CPC, deixe de ser reconhecida aos que comprovarem
insuficiência de recursos para custear os atos notariais necessários à
realização dos inventários e partilhas extrajudiciais, com base no art. 5°,
inciso LXXIV, da Constituição da República, já que é garantida assistência
jurídica integral e gratuita aos economicamente hipossuficientes.

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TÓPICO 3 — SOBREPARTILHA EXTRAJUDICIAL E CARTA DE SENTENÇA OU FORMAL DE PARTILHA EXTRAJUDICIAL

Para solicitar a gratuidade das despesas cartorárias, a parte deverá


realizar uma declaração de hipossuficiência, apresentando algum comprovante
que demonstre sua condição econômica. O tabelionato avaliará os documentos
apresentados pelas partes devendo compará-los com as declarações dos valores
dos bens inventariados. É assim que estabelece o artigo 7° da Resolução 35 do
Conselho Nacional de Justiça em sua nova redação dada pela resolução n° 326
de 2020:

Art. 7° Para a obtenção da gratuidade pontuada nesta norma,


basta a simples declaração dos interessados de que não possuem
condições de arcar com os emolumentos, ainda que as partes
estejam assistidas por advogado constituído (Redação dada pela
Resolução n° 326, de 26.6.2020).

Em sentido contrário ao até aqui exposto, a doutrina especializada em


direito notarial, em sua maioria, vem sustentando a impossibilidade de concessão
de isenção de emolumentos na lavratura de escritura pública de separação,
divórcio e inventário para pessoas que não possuem condições de arcar com
seus custos. Dito de outro modo, vem se sustentando não ser possível conceder
gratuidade em tais procedimentos extrajudiciais mesmo que o interessado
demonstre insuficiência de recursos (CAMARGO; PEREIRA, 2020).

A fundamentação de tal tese gira em torno da já comentada natureza


tributária dos emolumentos. Isso porque, de acordo com artigo n° 176 do Código
Tributal Nacional, a isenção tributária apenas pode ocorrer através de lei que
elenque expressamente os requisitos necessários para tanto.

Nesse contexto, não havendo mais disposição no CPC e lei sobre a


possiblidade de isenção de emolumentos aos hipossuficientes, prevalece que
não se pode falar em concessão de gratuidade em sede dos procedimentos
extrajudiciais.

Vale transcrever as reflexões de Laune Braz Adrekowisk Volpe Camargo


e Fábio Zonta Pereira (2020):

Com a devida vênia, conceder gratuidades nas escrituras de separação,


divórcio ou inventário e partilha extrajudicial sem a devida previsão
legal, ou o Estado obrigar um profissional a trabalhar sem receber o
que lhe é devido sem a correspondente compensação, nas palavras de
Olavo de Oliveira Neto, Elias Marques de Medeiros Neto e Patrícia
Elias Cozzolino de Oliveira (2015, p. 354), “implica concretizar a
antiga figura de linguagem ‘fazer caridade com o chapéu alheio’, na
medida em que não é o Estado que está abrindo mão de sua receita,
mas impondo que um profissional deixe de receber o que é devido”.
É dever do Estado assumir o seu papel de ressarcir integralmente
aqueles que trabalharam para ele; ou seja, os notários e registradores,
pois é dever do Estado prestar assistência jurídica integral àqueles que
comprovarem insuficiência de recursos (art. 5°, LXXIV, da CF).

209
UNIDADE 3 — DAS FORMALIDADES PROCEDIMENTAIS DO INVENTÁRIO E PARTILHA EXTRAJUDICIAL

A par dessa discussão doutrinária, nota-se que na prática é tendência


que as serventias extrajudiciais neguem a concessão de gratuidade nas escrituras
públicas de separação, divórcio ou inventário e partilha extrajudicial justamente
sob o fundamento de ausência de previsão legal.

No próximo subtópico, versaremos sobre a ação judicial de anulação de


partilha que foi realizada extrajudicialmente.

5 DA ANULAÇÃO DA PARTILHA REALIZADA EM SEDE DE


INVENTÁRIO EXTRAJUDICIAL
Em decorrência do princípio da inafastabilidade da jurisdição, é possível
manejar ação judicial com o fim de anular a partilha extrajudicial.

NOTA

O princípio da inafastabilidade da jurisdição, considerado como um direito


fundamental do cidadão, materializa-se no artigo 5°, XXXV, Constituição: a lei
não excluirá da apreciação do Poder Judiciário lesão ou ameaça a direito.

A ação judicial de anulação de partilha extrajudicial possui o prazo


decadencial de 01 (um) ano e pode ter os seguintes fundamentos:

• Coação.
• Dolo.
• Erro essencial.
• Intervenção de incapaz.

Veja a redação do artigo n° 657 do CPC/15:

Art. 657. A partilha amigável, lavrada em instrumento público,


reduzida a termo nos autos do inventário ou constante de escrito
particular homologado pelo juiz, pode ser anulada por dolo, coação,
erro essencial ou intervenção de incapaz, observado o disposto no § 4°
do art. 966.
Parágrafo único. O direito à anulação de partilha amigável extingue-se
em 1 (um) ano, contado esse prazo:
I- no caso de coação, do dia em que ela cessou;
II- no caso de erro ou dolo, do dia em que se realizou o ato;
III- quanto ao incapaz, do dia em que cessar a incapacidade.

Nesse contexto, interessante notar que o artigo 1.068 do CPC realizou


modificação no artigo n° 2.027 do Código Civil, veja a seguir um quadro
comparativa.
210
TÓPICO 3 — SOBREPARTILHA EXTRAJUDICIAL E CARTA DE SENTENÇA OU FORMAL DE PARTILHA EXTRAJUDICIAL

QUADRO 3 – COMPARAÇÃO DAS REDAÇÕES DO ARTIGO N° 2.027

Código Civil de 2002 Código Civil de 2002


Redação dada pelo CPC/2015 Redação anterior
“Art. 2.027. A partilha é anulável pelos “Art. 2.027. A partilha, uma vez feita e julgada,
vícios e defeitos que invalidam, em geral, os só é anulável pelos vícios e defeitos que
negócios jurídicos”. invalidam, em geral, os negócios jurídicos”.
“Parágrafo único. Extingue-se em um ano o “Parágrafo único. Extingue-se em um ano o
direito de anular a partilha”. direito de anular a partilha.”

FONTE: Tartuce (2020, p. 2815)

Notem que o CPC/15 não trouxe a possibilidade de anular a partilha


extrajudicial nos casos de estado de perigo, lesão e fraude de credores, os quais
também constituem vícios dos negócios jurídicos, respectivamente previstos nos
artigos nos 156, 157 e 158 do CC/02.

Sobre o assunto, o professor Flávio Tartuce (2020, p. 281) aponta que há


polêmica em razão do CC/02 fazer menção que a partilha poderá ser anulada
“pelos vícios e defeitos que invalidam, em geral, os negócios jurídicos”. Isso
porque, o CPC/15, por sua vez, apenas prevê que a partilha poderá ser anulada,
especificamente, nos casos de coação, dolo, erro essencial ou intervenção de incapaz.

Cabe destacar que o CPC/73 não previa as modalidades de vícios dos


negócios jurídicos da lesão e do estado de perigo em razão de que elas apenas
foram previstas no ordenamento jurídico brasileiro por meio do CC/02. Logo,
a maioria defendia que a ausência das referidas casas de anulação dos negócios
jurídicos era possível (TARTUCE, 2020).

O professor Flávio Tartuce (2020, p. 2817), alertando para o fato que ainda
não tem posicionamento no âmbito jurisprudencial, posiciona-se sobre a polêmica
doutrinária em questão:

A minha posição é mantida mesmo com a emergência do Código de


Processo Civil de 2015, que teve a chance de resolver o dilema, mas,
infelizmente, não o fez. Muito ao contrário, pode-se dizer que até
aprofundou o debate, pois surgirá o argumento de que o Código de
Processo é posterior ao Código Civil e mais especial que o último por
estar relacionado com a partilha amigável, sem a menção a respeito
dos dois vícios do consentimento que não estavam na codificação de
1916. A respeito de se anular a partilha por estado de perigo ou lesão,
as situações até podem ser raras, mas não são impossíveis. Quanto à
possibilidade de lesão na partilha, adverte Sílvio de Salvo Venosa que
“não resta a menor dúvida de que a partilha pode ser anulada por
lesão, vício que foi reintroduzido no ordenamento”. Nesses casos, o
aplicador do direito deve procurar socorro em uma regra analógica, ou
seja, incidente em hipótese próxima. Nessa seara, utilizando-se o art.
657 do CPC/2015 (art. 1.029 do CPC/1973), o prazo a ser considerado
é de natureza decadencial e é de um ano, contado da data em que se
realizou o ato (partilha). Essa é a opinião do presente autor. De todo
modo, vejamos como a doutrina e a jurisprudência se posicionarão a
respeito desse assunto no futuro.

211
UNIDADE 3 — DAS FORMALIDADES PROCEDIMENTAIS DO INVENTÁRIO E PARTILHA EXTRAJUDICIAL

Quanto à fraude contra credores, também uma das causas de anulação


dos negócios jurídicos, a doutrina entente que apenas poderá ensejar a anulação
da partilha que não seja amigável em razão da regra contida no artigo n° 2.027
do CC/02.

Vale pontuar que os regramentos do CPC/15 e do CC/02 são silentes


quanto à nulidade absoluta da partilha (judicial ou extrajudicial). A doutrina
majoritária aduz que devem ser aplicadas as regras de nulidade do negócio
jurídico previstas nos artigos nos 166 e 167 do CC/02, relembre tais normas:

Art. 166. É nulo o negócio jurídico quando:


I- celebrado por pessoa absolutamente incapaz;
II- for ilícito, impossível ou indeterminável o seu objeto;
III- o motivo determinante, comum a ambas as partes, for ilícito;
IV- não revestir a forma prescrita em lei;
V- for preterida alguma solenidade que a lei considere essencial
para a sua validade;
VI- tiver por objetivo fraudar lei imperativa;
VII- a lei taxativamente o declarar nulo, ou proibir-lhe a prática, sem
cominar sanção.

Art. 167. É nulo o negócio jurídico simulado, mas subsistirá o que se


dissimulou, se válido for na substância e na forma.
§ 1 o Haverá simulação nos negócios jurídicos quando:
I- aparentarem conferir ou transmitir direitos a pessoas diversas
daquelas às quais realmente se conferem, ou transmitem;
II- contiverem declaração, confissão, condição ou cláusula não
verdadeira;
III- os instrumentos particulares forem antedatados, ou pós-datados.
§ 2  o  Ressalvam-se os direitos de terceiros de boa-fé em face dos
contraentes do negócio jurídico simulado.

Relembre também que as causas de nulidade absoluta não convalescem


com o tempo (art. 169 do CC/02). Por esse regramento, o professor Flávio Tartuce
(2020) defende que na hipótese de incidir uma causa de nulidade absoluta na
partilha (judicial ou extrajudicial), a ação de nulidade não estaria adstrita a
qualquer prazo.

Todavia, o posicionamento do respeitado professor não prevalece. No


ano de 2020, a Segunda Seção do STJ entendeu que, sob a égide do Código Civil
de 1916 o prazo prescricional para ação de nulidade de partilha amigável em que
incluiu no inventário pessoa incapaz de suceder é de 20 (vinte) anos. Veja:

A inclusão no inventário de pessoa que não é herdeira torna a partilha


nula de pleno direito, porquanto contrária à ordem hereditária
prevista na norma jurídica, cujo respeito as partes não podem transigir
ou renunciar. A preterição de herdeiro ou a inclusão de terceiro
estranho à sucessão merecem tratamento equânime, porquanto
situações antagonicamente idênticas, submetendo-se à mesma regra
prescricional prevista no art. 177 do Código Civil de 1916, qual seja,
o prazo vintenário, vigente à época da abertura da sucessão para
hipóteses de nulidade absoluta, que não convalescem (STJ, EAREsp
226.991 /SP, Rel. Min. Ricardo Villas Bôas Cueva, 2.ª Seção, j. 10.06.2020,
DJe 01.07.2020).

212
TÓPICO 3 — SOBREPARTILHA EXTRAJUDICIAL E CARTA DE SENTENÇA OU FORMAL DE PARTILHA EXTRAJUDICIAL

Note que o caso concreto trata de nulidade da partilha amigável que


ocorreu sob a vigência do antigo Código Civil, o qual estabelecia em seu artigo n°
177 que “as ações pessoais prescrevem, ordinariamente, em vinte anos, as reais
em dez, entre presentes, entre ausentes, em quinze, contados da data em que
poderiam ter sido propostas”.

Atualmente, o CC/02 prevê no art. n° 205 que “a prescrição ocorre em dez


anos, quando a lei não lhe haja fixado prazo menor”.

De qualquer forma, o importante é compreender que o STJ entende que


em que pese a inclusão no inventário de pessoa que não é herdeira ser causa de
nulidade absoluta, estará sujeita a prazo prescricional.

Por fim, cumpre pontuar que a doutrina majoritária, em consonância


com o entendimento do STJ, defende a aplicação da regra geral dos prazos de
prescrição de 10 (dez) anos para hipóteses de nulidade absoluta da partilha
judicial ou extrajudicial (VELOSO, 2012).

6 CARTAS DE SENTENÇA OU FORMAL DE PARTILHA


EXTRAJUDICIAL
Após a realização do processo judicial de inventário e partilha, com o
trânsito em julgado, poderá ser extraído o chamado “formal de partilha”, ou no
caso de somente um herdeiro existente, a carta de adjudicação, conforme previsão
do artigo n° 655, do Código de Processo Civil.

NOTA

Utiliza-se da expressão “trânsito em julgado” para se referir a uma decisão


judicial contra qual não caiba mais recurso.

Acadêmico, saiba que o formal de partilha é um documento de mais


alta importância, pois em posse dele, que apenas é entregue após o trânsito em
julgado do processo judicial, a parte deve se dirigir a serventia extrajudicial
competente para proceder ao seu registro, a fim de resguardar seus direitos
sobre os bens partilhados.

213
UNIDADE 3 — DAS FORMALIDADES PROCEDIMENTAIS DO INVENTÁRIO E PARTILHA EXTRAJUDICIAL

Como exemplo da importância do formal de partilha, pense na


necessidade de se transferir para o beneficiário um imóvel deixado como herança
no inventário. Não é possível realizar a transferência do registro apenas com
fundamento na sentença judicial. Isso porque, o Cartório de Registro de Imóveis
exige a apresentação de outros documentos, tal qual a comprovação da quitação
de impostos.

O formal de partilha realizado no bojo de um processo judicial é


previsto no artigo n° 655 do CPC, note como ele é formado por um conjunto de
documentos e não somente a sentença judicial:

Art. 655. Transitada em julgado a sentença mencionada no  art. 654,


receberá o herdeiro os bens que lhe tocarem e um formal de partilha,
do qual constarão as seguintes peças:
I- termo de inventariante e título de herdeiros;
II- avaliação dos bens que constituíram o quinhão do herdeiro;
III- pagamento do quinhão hereditário;
IV- quitação dos impostos;
V- sentença.
Parágrafo único. O formal de partilha poderá ser substituído por
certidão de pagamento do quinhão hereditário quando esse não
exceder a 5 (cinco) vezes o salário-mínimo, caso em que se transcreverá
nela a sentença de partilha transitada em julgado.

NOTA

O formal de partilha, de acordo com o CPC, é aceito para fins de registro


junto aos cartórios extrajudiciais, uma vez que possuem regulamentação pela Lei Federal
n° 6.015/73 (Lei de Registros Públicos), mormente no artigo n° 222, inciso IV.

Ocorre que o Provimento n° 31/2013 da Corregedoria Geral de Justiça


de São Paulo inaugurou no país, especificamente no estado de São Paulo, a
possibilidade do tabelião de notas confeccionar a “carta de sentença”, também
chamada por alguns de “formal de partilha extrajudicial”, que faz as vezes do
formal de partilha realizado pelo Poder Judiciário.

O CPC não previu a possibilidade de a realização do formal de partilha ser


realizada perante o cartório, entretanto, é amplamente aceito tal possibilidade em
razão de representar a concretização da almejada desjudicialização e do princípio
constitucional da celeridade. Porquanto, acadêmico, atente-se ao fato que a carta
de sentença encontrará respaldo em normativas do Poder Judiciário, tal qual o
citado Provimento n° 31/2013 da Corregedoria Geral de Justiça de São Paulo.

214
TÓPICO 3 — SOBREPARTILHA EXTRAJUDICIAL E CARTA DE SENTENÇA OU FORMAL DE PARTILHA EXTRAJUDICIAL

E
IMPORTANT

É preciso conferir se existe a regulamentação por parte do Poder Judiciário local


(Tribunal de Justiça) da possibilidade de realização de carta de sentença extrajudicialmente
em cada estado da federação.

O referido provimento aduz que o Tabelião de Notas, a pedido da parte


interessada, poderá “formar cartas de sentença das decisões judiciais, dentre
as quais, os formais de partilha, as cartas de adjudicação e de arrematação, os
mandados de registro, de averbação e de retificação, nos moldes do correspondente
serviço judicial”.

NOTA

À luz do Provimento n° 31/2013 da Corregedoria Geral de Justiça de São Paulo,


a carta de sentença abrange uma gama de modalidades, dentre elas o Formal de Partilha,
em caso de inventário ou divórcio; a Carta de Adjudicação, em casos de inventário com
um único herdeiro; a Carta de Arrematação, em casos de aquisições em leilão decorrente
de execução judicial; e os Mandados de Registro, Averbação e Retificação nos registros de
nascimento, casamento e óbito.

Em termos simples, o Colégio Notarial do Brasil – Seção São Paulo,


esclarece que a carta de sentença/formal de partilha extrajudicial “equivale
ao “Formal de Partilha” e/ou “Carta de Adjudicação” expedida pelo Poder
Judiciário. São elaboradas pelo tabelião de notas com as cópias de um processo
judicial, unidas com fé pública, compondo o título hábil para transferência de
bens imóveis e móveis”.

E
IMPORTANT

Uma das principais vantagens da Carta de Sentença extrajudicial é a sua


agilidade que, segundo o Provimento n° 31/2013 da Corregedoria Geral de Justiça de São
Paulo, deve ser concluída pelo tabelião em no máximo cinco dias.

215
UNIDADE 3 — DAS FORMALIDADES PROCEDIMENTAIS DO INVENTÁRIO E PARTILHA EXTRAJUDICIAL

Notem que, portanto, o tabelionato de notas teve sua competência


ampliada para extrair a carta de sentença do processo de inventário judicial, essa
carta corresponde aos documentos citados anteriormente. O objetivo é facilitar a
conclusão do procedimento de inventário ou arrolamento de bens pelas partes
interessadas, além de que a carta de sentença notarial pelos seus efeitos, poderá
ser usada diante dos cartórios de registro de imóveis e demais órgãos que exijam
o regulamento dos atos após a conclusão do inventário extrajudicial.

Tendo como base o paradigmático Provimento n° 31/2013 da Corregedoria


Geral de Justiça de São Paulo, Sebastião Amorim e Euclides de Oliveira (2020, p.
459-460) fazem comentários sobre as minúcias do procedimento:

Por competência ampliada do tabelionato de notas, pode ser extraída


carta de sentença de processo de inventário judicial, depois de seu
trânsito em julgado, em lugar do formal de partilha (ou carta de
adjudicação, em caso de herdeiro único) previsto no artigo n° 655 do
Código de Processo Civil. Efetuando-se mediante requerimento ao
tabelionato, que terá acesso ao inventário para expedição de cópias
autenticadas dos autos, devendo os elementos essenciais do processo,
como a petição inicial, a certidão de óbito do autor da herança,
procurações e documentos das partes, termo de eventual renúncia,
escritura de cessão de direitos hereditários, se houver, nomeação do
inventariante, primeiras e últimas declarações, certidão negativa dos
bens e rendas do espólio, custas e recolhimentos fiscais, manifestação
da Fazenda estadual, partilha, sentença de julgamento ou de
homologação da partilha ou da adjudicação, certidão de trânsito em
julgado e outros elementos essenciais de acordo com a peculiaridade
do processo.
Esse serviço notarial facilita a obtenção do documento final do
inventário ou do arrolamento pelas partes interessadas e alivia os
encargos da serventia judicial.
Sua expedição deve atender às exigências das corregedorias estaduais
de Justiça.

E
IMPORTANT

Acadêmico, perceba que a realização da carta de sentença perante o


tabelionato de notas trata-se de procedimento facultativo, a critério dos interessados.

Por último, destaca-se que a carta de sentença notarial produz os mesmos


efeitos jurídicos que o formal de partilha judicial, servindo como instrumento
apto a ser levado ao registro imobiliário e aos órgãos competentes com o objetivo
de seu regular cumprimento.

Finalizamos nosso estudo sobre inventário e partilha extrajudicial à luz


do Código de Processo Civil! Até um próximo desafio!

216
RESUMO DO TÓPICO 3
Neste tópico, você aprendeu que:

• A sobrepartilha pode ser realizada extrajudicialmente ainda que a partilha


anterior tenha sido feita judicialmente e ainda que os herdeiros, hoje maiores,
fossem menores ou incapazes ao tempo da partilha anterior.

• O artigo n° 236, § 2° da Constituição estabelece Lei federal deve estabelecer as


normas gerais para fixação de emolumentos relativos aos atos praticados pelos
serviços notariais.

• A doutrina majoritária, em consonância com o entendimento do STJ, defende


a aplicação da regra geral dos prazos de prescrição de 10 (dez) anos para
hipóteses de nulidade absoluta da partilha judicial ou extrajudicial.

• O Provimento n° 31/2013 da Corregedoria Geral de Justiça de São Paulo


inaugurou no país, especificamente no estado de São Paulo, a possibilidade
do tabelião de notas confeccionar a “carta de sentença”, também chamada por
alguns de “formal de partilha extrajudicial” tendo em vista que faz as vezes do
formal de partilha realizado pelo Poder Judiciário.

• O CPC/15 não previu a possibilidade de a realização do formal de partilha ser


realizada perante o cartório, entretanto é amplamente aceito tal possibilidade
tendo em vista representar a concretização da almejada desjudicialização e do
princípio constitucional da celeridade.

CHAMADA

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217
AUTOATIVIDADE

1 Discorra sobre a possibilidade de concessão do benefício da gratuidade de


justiça em relação aos emolumentos em razão dos serviços prestados pelos
notários e registradores.

2 O formal de partilha, extraído de inventário causa mortis, é documento


que pode ser registrado na matrícula do imóvel inventariado e partilhado.
Nesse caso, é correto afirmar que o registro:

a) ( ) Transfere a propriedade do bem ao herdeiro do de cujus, apenas no


caso de herança legítima.
b) ( ) Transfere a propriedade do bem ao herdeiro do de cujus, apenas no
caso de herança testamentária.
c) ( ) Transfere a propriedade do bem ao herdeiro do de cujus, em qualquer
hipótese.
d) ( ) Transfere a posse do bem ao herdeiro do de cujus.
e) ( ) Não é modo de aquisição da propriedade, por parte do herdeiro do de
cujus.

3 Segundo o entendimento consolidado no âmbito do Supremo Tribunal


Federal, as custas judiciais e os emolumentos concernentes aos serviços
notariais e registrais possuem natureza:

a) ( ) Não tributária, sendo classificadas como preço público.


b) ( ) Pública, sendo classificadas como tarifas remuneratórias de serviços
públicos.
c) ( ) Tributária, qualificando-se como taxas remuneratórias de serviços
públicos.
d) ( ) Tributária, qualificando-se como preço público.

4 À luz da Lei n° 8.935/94, da Lei Federal n° 10.169/2000, bem como do


entendimento jurisprudencial sobre os emolumentos relativos aos atos
praticados pelos serviços notariais e de registro, marque a assertiva correta:

a) ( ) Os notários e registradores passarão recibo dos emolumentos


percebidos, sem prejuízo da indicação definitiva e obrigatória dos
respectivos valores à margem do documento entregue ao interessado,
em conformidade com a tabela vigente ao tempo da prática do ato.
b) ( ) O valor dos emolumentos pode sofrer reajustes periódicos, para a
recomposição de sua expressão econômica, sendo que a nova tabela
deverá obedecer a uma antecedência mínima de 30 (trinta) dias, a partir
de sua publicação, para adquirir validade.
c) ( ) Os emolumentos concernentes aos serviços notariais e registrais, por
não possuírem natureza tributária, não se submetem ao princípio da
anterioridade.
d) ( ) As atividades notariais e de registro se inscrevem no âmbito das
remuneráveis por tarifa ou preço público.
218
REFERÊNCIAS
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prática. 26. ed. São Paulo: Saraiva Educação. 2020.

ANOREG. Cartório em números. 2020. Disponível em: https://www.anoreg.org.


br/site/wp-content/uploads/2020/11/Cart%C3%B3rios-em-N%C3%BAmeros-2-
edi%C3%A7%C3%A3o-2020.pdf. Acesso: 10 jan. 2021.

BRASIL. Lei n° 13.105, de 16 de março de 2015. Código de Processo Civil.


Disponível em: http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/_ato2015-2018/2015/lei/
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BRASIL. Código Civil. Lei no 10.406, de 10 de janeiro de 2002. Diário Oficial [da]
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CAMARGO, Laune Braz Andrekowisk Volpe; PEREIRA, Fábio Zonta. Da


extensão da gratuidade de justiça sob a compreensão dos emolumentos
notariais e de registro no novo CPC. 2020. Disponível em: http://genjuridico.
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FARIAS, Cristiano Chaves; ROSENVALD, Nelson; BRAGA NETTO, Felipe.


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LOUREIRO, Luiz Guilherme. Manual de Direito Notarial da atividade e dos


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VELOSO, Zeno. Separação, extinção de união estável, divórcio,


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VELOSO, Zeno. Código Civil comentado. Coord. Ricardo Fiúza e Regina


Beatriz Tavares da Silva. 8. ed. São Paulo: Saraiva, 2012.

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