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OS CINCO ESTÁGIOS DO DECLÍNIO

José Pio Martins

Compro muitos livros e, às vezes, sem muito critério. O resultado é que, no


meio das pilhas de livros desconhecidos, acabo descobrindo verdadeiras pérolas.
Aprendi que as melhores obras não são as mais vendidas. Pode até haver
coincidência entre qualidade e quantidades vendidas; mas apenas coincidência.
Embora eu não tenha preconceito em relação a estilos, nos últimos tempos ando
reticente com esses gurus de administração, sobretudo os americanos, que têm
escrito muita coisa de segunda categoria.

Um livro que me surpreendeu positivamente foi “Como as Gigantes Caem”, de


Jim Collins. Somente as primeiras vinte páginas já justificam a obra. Ao estudar por
que grandes organizações, aparentemente sólidas, acabam ou decaem, Jim Collins
elaborou uma lista com cinco estágios do declínio, que pode ser aplicada à nossa
vida profissional e ao mundo dos negócios. Lembrando que “a ruína iminente se
insinua em silêncio”, certo executivo afirmou que “quando você está com tudo, é a
nação mais poderosa do mundo, a empresa de maior sucesso do seu setor, o
melhor jogador do seu jogo, seu próprio poder e sucesso podem ocultar o fato de
que você já está no caminho do declínio”. Então, como é possível saber?

Estágio 1: O excesso de confiança proveniente do sucesso. Pessoas e


empresas de sucesso podem ser vítimas do que eu chamo a “transposição da linha
divisória” entre autoconfiança e arrogância. Eu quero que o meu médico seja
autoconfiante, mas não quero que ele seja arrogante, a ponto de se achar infalível. A
linha que separa uma coisa da outra é tênue, e o sucesso pode levar o indivíduo a
ver a si mesmo blindado contra o fracasso. A partir daí, erros começam a ser
cometidos.

Estágio 2: A busca indisciplinada por mais. A arrogância do estágio 1 leva


o profissional ou a empresa a buscar sempre mais (mais crescimento, mais poder,
mais aplausos), de forma não planejada e indisciplinada. É quando a pressa confusa
substitui o planejamento zeloso. Um alpinista que subiu várias vezes a mesma
montanha pode subestimar as dificuldades, confiar demais no seu talento e ser
menos diligente. E aí ele cai. Planejamento, disciplina, capacidade de ouvir são as
primeiras virtudes que os arrogantes perdem, e passam a crer no “eu sou um
sucesso, logo, posso tudo”.

Estágio 3: A negação dos riscos e dos perigos. Neste estágio, as pessoas


e as empresas arrogantes não conseguem perceber os sinais de que algo está
errado ou, então, começam a negar os problemas, os riscos e os perigos. Uma
jornalista escreveu na revista Exame que “quanto mais longo for o histórico de
sucesso, mais próximo está o dia em que erros serão cometidos”. Há tantos
empresários, executivos e políticos, arrogantes e soberbos, que acabaram falidos,
humilhados e desprezados pela sociedade e por antigos bajuladores. Mesmo assim,
eles não culpam a si mesmos; preferem culpar o governo, o mercado, os outros.
Aqui mesmo no Paraná há vários exemplares dessa espécie.
Estágio 4: A luta desesperada pela salvação. A passagem da pessoa ou da
empresa pelos estágios anteriores leva ao estágio 4, e aí começa a luta
desesperada e desorganizada para salvar a carreira ou o negócio. A essa altura, as
pessoas já não fazem as coisas certas e tentam saídas ridículas e impróprias. Como
disse Vilfredo Pareto, economista do século 19, “é inútil confiar a quem destruiu uma
máquina a tarefa de reconstruí-la”. Os arrogantes até tentam algum lance de
sensatez, mas, em geral, o fazem tarde demais, quando o fracasso está iminente.

Estágio 5: A entrega à irrelevância ou à morte. Há empresas que


sobrevivem, mas passam a ter uma existência irrelevante, longe do brilho anterior.
Outras agonizam por anos até o fim total. Outras mais quebram rapidamente e
algumas ainda conseguem ser vendidas e incorporadas por concorrentes mais
competentes. Milhares de empresas familiares viveram essa experiência, e fortunas
foram dizimadas no desaparecimento de grupos empresariais aparentemente
sólidos e inquebráveis.

Como o espaço deste artigo não me permite mais do que algumas pinceladas
sobre o assunto, o livro de Jim Collins justifica as duas horas de leitura que nele
gastei (lendo devagar). Recomendo.

José Pio Martins, economista, é reitor da Universidade Positivo.

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