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Nesta resenha teórica buscamos contextualizar a etnografia e o método etnográfico com base
em três principais tópicos: definições (1), paradigmas (2) e perspectivas (3). Para isso,
estabelecemos um diálogo entre o primeiro capítulo do livro Ethnography: Principles and
Practices intitulado de “What is ethnography?”[i], o capítulo cinco do livro Estratégias de
Pesquisa em Organização, intitulado de “A Etnografia e os Estudos Organizacionais”[ii], o
artigo “O Método Etnográfico em Estudos sobre a Cultura Organizacional: Implicações
Positivas e Negativas”[iii] e a dissertação de mestrado “Chegadas e Partidas – Um Estudo
Etnográfico sobre as Relações Sociais em Casas-Lares”[iv].
Partindo de nosso primeiro tópico de contextualização (1) podemos afirmar que a definição
de etnografia e método etnográfico é questão de complexas discussões no campo das ciências
sociais desde o seu surgimento. Nascida da antropologia, com contribuições de Malinowski,
entre 1914 e 1918, a etnografia se modificou desde então. Contudo, como conceito, se sustenta
em uma “tecelagem etnográfica” dotada de uma complexidade epistemológica[v].
Para Godoy (1995 apud ANDION; SERVA, 2006, p. 153) a etnografia se baseia na descrição,
sendo ela uma característica bastante ampla para a sustentação de um conceito. No entanto,
“há discordâncias se a característica distintiva da pesquisa etnográfica é a elicitação do
conhecimento cultura, a investigação detalhada de padrões de interação social ou a análise
holística das sociedades”[vi].
Apesar das divergências quanto a sua característica principal, a pesquisa etnográfica é dotada
de alguns atributos específicos, presentes na maior parte de suas definições, entre eles
podemos destacar: a proximidade com o campo e com o objeto em uma espécie de imersão
no contexto cultural do pesquisado e a descrição do caso buscando transmitir ao leitor a
sensação de “estar lá”[vii].
Segundo Cavedon (1999, p. 4) a etnografia “[…] não é o ‘trabalho de campo’, mas sim o ‘que
se escreve sobre o trabalho de campo’”, sendo que é a observação participante, de acordo com
o autor, uma das técnicas que legitima o método por conta da coleta de dados, permitindo,
assim, que se tenha condições para a elaboração do texto.
Nessa discussão, os autores comentam sobre a influência que os dogmas herdados das
conhecidas ciências duras que têm em sua concepção a lógica do experimento, e por isso
carregam uma série de pressupostos como: a mensuração, a neutralidade, a verificação e a
característica dedutiva da ciência. Esses dogmas positivistas compõem o pano de fundo do
paradigma dominante, discutido por Boaventura de Souza Santos (1988[xi]). Em uma critica
antipositivista, Andion e Serva (2006) explicam que essa concepção tradicional de ciência
nega todas as formas de conhecimento por não se basearem nos princípios epistemológicos
positivistas. Corrobora com este argumento a discussão de Hammersley e Atkinson (1983)
onde afirmam que etnografia tem sido, às vezes, declarada como inadequada para a ciência
social, sob o argumento de que os dados e descobertas que ela produz são impressões
subjetivas, meramente idiossincráticas, que não podem fornecer uma base sólida para
análises científicas rigorosas.
Andion e Serva (2006) apontam que é essencial considerar o surgimento de novas leituras
epistemológicas e metodológicas onde o objeto é analisado em seu contexto em rejeitar as
suas redes de comunicação. Deste modo, a etnografia por sua complexa relação com o campo
propõe um embate paradigmático uma vez que aproxima categorias tratadas de forma
excludente (como quantitativo/qualitativo, estático/dinâmico e individual/social) podem ser
repensadas sob a perspectiva de complementaridade. De acordo com os autores, a nova
epistemologia não se trata de conciliar o inconciliável, mas de buscar uma visão distinta da
tradicional que era pautada por critérios como método, comprovação, rigor, explicação e
divisão em disciplinas.
Neste embate paradigmático, Hammersley e Atkinson (1983) afirmam que a distinção entre
ciência e senso comum, entre as atividades do pesquisador e as dos pesquisados, está
no cerne do positivismo e do naturalismo. Apontando que isso que leva à sua obsessão
conjunta em eliminar os efeitos do pesquisador sobre os dados. Por um lado, a solução é
a padronização dos procedimentos de pesquisa (positivismo); para o outro, é a experiência
direta do mundo social, em sua forma extrema (naturalismo), a exigência de que
os etnógrafos se entreguem às culturas que desejam estudar.
Ao incluir nosso próprio papel dentro do foco da pesquisa e explorar sistematicamente nossa
participação no mundo em estudo como pesquisadores, podemos desenvolver e testar a
teoria sem confiar em apelos fúteis ao empirismo, seja de variedades positivistas ou
naturalistas[xii]. Deste ponto de vista, e especialmente em relação à etnografia, nem o
positivismo nem o naturalismo são completamente satisfatórios. Na opinião dos autores eles
compartilham um equívoco fundamental: ambos mantêm uma distinção nítida entre a
ciência social e se objeto.
Mariana Mickosz Ravedutti Paul é Mestranda em Administração pela Universidade Tecnológica Federal do Paraná
(UTFPR).
Marina Emanuelli Belo é Mestra em Administração pela Universidade Tecnológica Federal do Paraná (UTFPR).
Stephanie Daher é Mestranda em Administração pela Universidade Tecnológica Federal do Paraná (UTFPR).
3 de julho de 2020
Pensadores, Teorias e Contribuições nos Estudos Organizacionais
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