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POR UMA AUTOETNOGRAFIA/AUTOCRÍTICA REFLEXIVA

Nara Hiroko Takaki*

RESUMO: Neste capítulo discorro brevemente sobre as causas históricas que levaram à ampliação
epistemológica e, consequentemente, à necessidade de se desenvolver metodologias condizentes com as
mudanças e destaco características da autoetnografia (ALLEN-COLLINSON, 2016; JONES, ADAMS,
ELLIS, 2016; BOCHNER, 2016; ELLIS, 2016; DENZIN, 2016)/ autocrítica (TAKAKI, 2011) e sua
escrita. Em seguida, correlaciono a autoetnografia/autocrítica com uma perspectiva de educação
linguística reflexiva com uma pesquisa ilustrativa de autocrítica num encontro ontológico-
epistemológico-metodológico. A metodologia orienta-se pela revisão bibliográfica atualizada.
Argumento que a ampliação culturalmente sensível e ética das pesquisas da área depende, dentre outros
fatores, de uma metodologia informada por perspectivas pós-coloniais (CLIFFORD, 1997), pós-
nacionalistas (HELLER, 2011) letramentos críticos (COPE, KALANTZIS, 2012; MUSPRATT, LUKE,
FREEBODY, 1997, NEW LONDON GROUP, 1997; JANKS, 2010, MONTE MÓR, 2007a, 2007b;
SOUZA, 2011) voltada para a reconstrução da cidadania contemporânea.

ABSTRACT: In this chapter, I briefly write about the historical causes that fostered the expansion of
epistemologies, and, therefore, the need to develop more congruent methodologies with the changes and I
highlight some characteristics of autoethnography (ALLEN-COLLINSON, 2016; JONES, ADAMS,
ELLIS, 2016; BOCHNER, 2016; ELLIS, 2016; DENZIN, 2016)/ selfcritique (TAKAKI, 2011) together
with its writing. Next, I relate autoethnography/self-critique with a critical linguistic educational
perspective with an illustrative research of self-critique in an ontological-epistemological-methodological
encounter. The methodology is guided by an updated bibliographical revision. I argue that the expansion
of culturally sensitive and ethical researches in the field depend, among other factors, on a methodology
informed by post-colonial (CLIFFORD, 1997), post-nationalist perspectives (HELLER, 2011) and critical
literacies (COPE, KALANTZIS, 2012; MUSPRATT, LUKE, FREEBODY, 1997, NEW LONDON GROUP,
1997; JANKS, 2010; MONTE MÓR, 2007a, 2007b; SOUZA, 2011) towards the reconstruction of
contemporary citizenship.

PALAVRAS-CHAVE: Autoetnografia. Autocrítica. Letramentos Críticos e Reflexivos

KEYWORDS: Autoethnography. Selfcritique. Critical Reflexive Literacies

INTRODUÇÃO

O cientificismo apregoa métodos que compactuam com critérios baseados em validade,


confiabilidade, dados estatísticos normalmente representados por gráficos, tabelas e
comparações resultando num empirismo meramente quantitativo de informações. Esse
fazer científico é regido por uma lógica que separa o conhecimento e o objeto de
pesquisa do sujeito investigador. Por meio desse paradigma, a vida social pode ser
simplificada se o rigor estabelece a priori que aquilo que não pode ser mensurado e

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visto por telescópio ou microscópio não conta como conhecimento. O conhecimento é
pré-estabelecido, racional, fixo, cumulativo e passível de ser transmitido de geração
para geração. Tanto o pesquisador quanto o sujeito pesquisado são seres dotados de
identidades estáticas, normatizadas e predeterminadas.

As consequências dessa lógica cientificista têm um alto custo: um mundo de


reproduções culturais e sociais sendo politicamente manipulado por grupos que decidem
o que conta como ciência, conhecimento, identidade, língua, cultura, pesquisa,
democracia e convivência O bom das epifanias e perturbações é que elas possibilitam
abrir caminhos para rupturas do ciclo interpretativo (RICOEUR, 1978). Nessa direção, a
partir do reconhecimento de que as pesquisas fundamentadas nos princípios do
iluminismo e da linearidade do pensamento (MORIN, 2005), como anteriormente
mencionados, não mais davam conta de explicar as complexidades (MORIN, 2005).
Houve uma reorientação na história. Atenção foi dada ao caráter político e ético às
mudanças que traziam insumos e outros critérios. Ciências como a física, biologia,
matemática abriram o horizonte de realidades mais vastas para lidar com a
“hipercomplexidade para aceitar a ambiguidade e uma ambiguidade na relação
sujeito/objeto, ordem/desordem, auto-hetero-organização (MORIN, 2005, p. 36). É
preciso reconhecer fenômenos, como a liberdade ou criatividade, inexplicáveis fora do
quadro complexo que é o único a permitir sua presença”.

Em ecossistemas abertos, “traços do sujeito como complexidade e incerteza são


características do objeto máquina, implicando uma “auto-eco-organização [...] em que
sujeito e objeto nesse processo são constitutivos um do outro” (MORIN, 2005, p. 43).
Ou seja, tanto sujeito como objeto permanecem abertos para além da compreensão
racional caracterizando a incompletude das relações. Nesse prisma, sujeito e objeto da
ciência rompem com a ontologia e epistemologia de outrora, insurgindo
consubstancialmente graças ao “princípio autocrítico e autorreflexivo” (MORIN, 2005,
p. 44), segundo o qual, as verdades ganham status de verdades biodegradáveis.
Podemos inferir que isso significou um exercício dialógico (conflituoso) abrindo mão
de “verdades” historicamente construídas liberando o potencial criativo ao lado de uma
genealogia rompendo com essencialismos dados com universais nas questões de
identidade, evento e conhecimento (FOUCAULT, 1979). É o autor quem explica que “a
genealogia seria, portanto, com relação ao projeto de uma inscrição dos saberes na
hierarquia de poderes próprios à ciência, um empreendimento para libertar da sujeição
os saberes históricos, isto é, torná-los capazes de oposição e de luta contra a coerção de
um discurso teórico, unitário, formal e científico”. (FOUCAULT, 1979, p. 172).

A resistência ao discurso único e científico levou a uma ressignificação da natureza,


cultura e uma reprogramação nos estudos que consideram a ecologia, identidade, as
relações sociais, os discursos e agências humanas mediados por heterogeneidades e

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contingências contextuais que nem sempre são possíveis de serem traduzidos por lentes
culturais parciais e linguagem convencional. Se houve uma ruptura nos âmbitos
ontológicos e epistemológicos da ciência ocidental, não seria diferente para as
metodologias. Na seara das metodologias, a etnografia nasceu, pois, de crises na
antropologia com enfoques interdisciplinares sobre cultura elaborados por Clifford e
Marcus (1986). Estes adotaram a escrita como modalidade que traduziria o processo de
apreensão das realidades pelo radar do pesquisador. Tais autores entendem que a partir
do momento em que o pesquisador se insere no processo de pesquisa, passa a ter
condições de apreender as visões dos participantes de pesquisa, os quais podem fazer
parte de várias comunidades, donde a complexidade de suas identidades e atuações não
lineares.

Corroborando essa posição, Heller (2018, p. 74) acentua que a etnografia desenvolve
habilidades para o etnógrafo explicar substancialmente como as pessoas combinam as
múltiplas formas de recursos que estão disponíveis e que são por elas criadas e com as
quais elas participam da organização social da vida com suas histórias e geografias. O
etnógrafo parte da seguinte visão de conhecimentoi: o conhecimento não é deriva
diretamente da evidência ou experiência, mas é mediado pela escolha que fazemos para
formulá-lo e representá-lo em contextos específicos de comunicação. (HELLER, p. 74).
O pesquisador ocupa-se de relações dialógicas entre o que é, vê, ouve e faz relacionando
tudo isso com as singularidades e regularidades que precisam ser explicadas no seu
exercício científico, conforme Denzin (2016, p. 124) insinua que “o fazer científico
permite que o pesquisador capte a vida de cada pessoa em sua particularidade imediata e
relacioná-la ao seu momento histórico […] A interpretação leva adiante uma série de
atos apreendidos pelo pesquisador, [...] interrogando as condições históricas, culturais e
biográficas que levaram a pessoa a vivenciar os eventos em estudo ii.

Merecedor de destaque nessa citação é a possibilidade que o pesquisador tem de


reinventar outras maneiras de “performar” sua experiência de vida e reconstruir sua
biografia. A biografia é revivida e transpassada por histórias, relações, imagens,
memórias, narrativas, análises que mesclam significados e reposicionamentos
identitários, políticos, científicos e populares que fazem do pesquisador um agente
cultural. Ao reatualizar seu repertório, entra em contato com sentidos e efeitos
provocados em níveis superficiais e níveis profundos (“surface level and deep level”) de
epifanias (“epiphanies”) nas palavras de Denzin (2016, p. 130). Epifanias são
experiências liminares ritualmente estruturadas e conectadas a momentos de
rompimento, ajuste, crise, cisma, atravessando um espaço pelo outroiii (DENZIN, 2016,
p. 132).

Denzin, Lincoln (1994, p. 10) discorrem sobre a “crise da representação” nas pesquisas
tradicionais (inclusive a etnografia) e apontam para um dado importante que
denominaram “reflexividade,” isto é um engajamento político que suscita uma ação para

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compreender as diferenças sócio-históricas que reconectam níveis individuais,
comunitários e globais e, a partir desse entendimento, buscar estratégias de mudanças
com a outridade, mas sem eliminar tais diferenças. A reflexividade constitui-se num
componente importante nas pesquisas que requerem um trabalho em equipe na visão de
Cresse, Takhi, Blackledge (2017). Um prefixo viria a fazer a diferença nessas epifanias,
ou seja, auto em autoetnografia/autocríticaiv para redundar na ideia de que não há
controle total sobre o andamento de uma pesquisa, já que adota um conceito de
conhecimento como sendo incompleto e dinamicamente coconstruído em parcerias. É
objetivo deste capítulo focalizar a autoetnografia/autocrítica num primeiro momento e
sua escrita e, depois, correlacioná-la a uma perspectiva de educação linguística crítica e
reflexiva com vistas a contribuir com a ampliação culturalmente sensível das pesquisas
da área, uma característica demandada na cidadania contemporânea.

1. DA AUTOETNOGRAFIA

A autoetnografia surgiu de duas fontes, segundo Tetnowski e Damico (2014): Heider


usou esse termo em 1975 observando e participando da vida diária de alunos na
Indonésia e produziu narrativas etnográficas a partir de suas perspectivas. Em 1979,
Hayano descreveu estudos que os antropologistas haviam feito de suas próprias
comunidades e que espelhavam os princípios da autoetnografia acentuando a presença
de um membro envolvido na experiência vivida no contexto de pesquisa, expressando
sentimentos, procedendo às meta-análises de si e do outro e detalhando suas
interpretações de eventos diários e internos à comunidade na qual pertencia. Tetnowski
and Damico (2014, p. 5) argumentam que “O ponto crucial é que a autoetnografia
acessa visões pessoais e autênticas do participante que não seria possível por meio de
outras metodologias. O método autoetnográfico propicia reflexão dos pesquisadores
sobre si e sobre suas próprias visões v”.

Interpreto, assim, que o diferencial da autoetnografia está na inserção corporificada,


espiritual, afetiva, intelectual e ética do pesquisador caracterizando a participação
intersubjetiva de si e do(s) outro(s)e dos objetos (inseparáveis do sujeito, conforme
Morin, 2005) como fundamental para a captação de significados que outrora ficariam
submersos. Com o passar do tempo, o autoetnógrafo vai entendendo o comportamento e
as práticas sociais no funcionamento de uma determinada comunidade, as relações de
poder que dali insurgem e como os conflitos são negociados de modo que seu olhar
pode levá-lo a questionar seu próprio contexto sociohistórico frente às diferenças que
são identificadas no processo de pesquisa. Ao engajar-se como observador ativo, pois
aciona seus recursos interpretativos em tal processo, uma preocupação desponta, isto é,
refletir a respeito dos paradoxos que muitas vezes não encontram teorias que deem
conta de explicá-los satisfatoriamente. O pesquisador se permite autocriticar (TAKAKI,
2011) com um exercício que refrata, ou seja, que se volta para si na relação com o outro

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(ambos coletivamente concebidos). Nesse sentido, é possível atribuir o status de autor-
“performador” de sua coexistência na comunidade pesquisada. Sua pesquisa é uma
vivência parcial e significativa para sua própria formação.

A vantagem é que o pesquisador se debruça sobre si e sobre seu olhar com mais
liberdade de expressar normas, reações e interpretações do evento que estuda enquanto
negocia com intersubjetividades segundo Hayano (1979) e Heider (1975). Mais do que
se preocupar com a autoetnografia como uma metodologia, o pesquisador aprende com
suas aproximações e inserções ao dia a dia dos participantes, dialoga com os insumos de
suas próprias apreensões, interpretações, experiências vividas e narrativas pessoais. No
entanto, Bochner (2016, p. 53) acentua que a autoetnografia não se preocupa com o
controle do olhar sobre os eventos tampouco sobre os outros buscando encontrar
objetividades nas subjetividades. O pesquisador é quem constrói os significados a partir
de sua apreensão sobre o que está acontecendo na comunidade focalizada: “Nós
atribuímos significado a nossas ações e experiências”vi (BOCHNER, 2016, p. 53) sendo
“um modo de vida que reconhece a contingência, a finitude, corporificadas no ser
histórico, encontros com a outridade dos sujeitos participantes e dos objetos, uma
apreciação de comprometimentos éticos e morais, e uma vontade de desejo de manter a
conversa”.vii

Nesse prisma, o conhecimento desconhecido torna o próprio pesquisador um constante


pesquisador de si em meio a relação com os outros. Entretanto, nem o si do pesquisador,
nem o(s) outro(s) são completamente acessíveis por meio da autoetnografia, isto é, uma
autoinvestigação engajada com o outro (ambos membros de coletividades, as quais
interagem entre si e se retroalimentam). Isso se deve ao fato de que a autoetnografia
parte do conceito de linguagem que é igualmente mutável e incapaz de relatar histórias
transparentemente modificando, assim, a realidade ao mesmo tempo em que se recria
(BAKHTIN, 1999).

A autoetnografia tem como propósito ampliar dinamicamente as pesquisas de natureza


qualitativa e interpretativa associando dois eventos, quais sejam: a experiência
individual e da cultura (local-global) em que a pesquisa ocorre de forma a considerar:
conhecimento como sendo parcial, uma política de identidade (pela diferença) que
influencia a intersubjetividade, autocrítica (TAKAKI, 2011)/reflexividade (WINDLE,
2017; MORGAN, RAMANATHAN, 2005) e valorização do trabalho incorporado
(performance, sentimento, escrita). “Novamente, a autoetnografia não se propõe a
produzir uma pesquisa melhor, ou mais confiável, generalizável, e/ou validar mais a
pesquisa que os métodos, mas sim prover outra abordagem para estudar a experiência
culturalviii (JONES, ADAMS, ELLIS, 2016, p. 33). Dessa forma, é possível conceber
uma etnografia relacional que conta com a partilha de narrativas e aprendizagens. Mais
do que mera opção metodológica, a autoetnografia delineia um compromisso que busca

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desfossilizar ideias historicamente cristalizadas e se nutre de outras relações do eu-
outro, do sujeito-objeto (BOCHNER, 2016; ALLEN-COLLINSON, 2016).

2. ESCRITA NA AUTOETNOGRAFIA

It has long been asserted that scientific anthropology


is also an “art,” that ethnographers
have literary qualities.
(CLIFFORD, MARCUS, 1986, p. 7, grifo do autor)

Narrar a fim de dizer algo mais ou algo diferente por meio de estilo, evocação, silêncio,
alegorias e metáforas de modo “artesanal” é o que a epígrafe salienta. Isso porque o que
se ouve, vê, cheira, sente, saboreia não pode ser plenamente traduzido em palavras. Os
modos de apresentar o trabalho etnográfico não obedecem necessariamente ao rigor da
escrita formal conforme a academia direciona. Arte, dança, filme, projeção multimídia,
imagens, gêneros literários como prosa, poesia, performance etc. atendem a um público
mais abrangente. A autoetnografia toma esses modos emprestados. Como já dito
anteriormente, a linguagem (convencional ou não) não pode captar fielmente os
sentidos, o que não significa que seja um vale tudo abrindo mão das exigências do rigor
científico que a pesquisa requer. Aspectos literários e retóricos na escrita
autoetnográfica não são facilmente compartimentalizados. “As verdades etnográficas
são, portanto, parcialmente comprometidas e incompletas.”ix (CLIFFORD, MARCUS,
1986, p. 7) como uma ponta de iceberg que se interrelaciona com outros em rede
dinâmica.

Para melhor explicar a dificuldade inerente da carência de recursos tradutórios dos


significados das relações, Clifford e Marcus (1986) trazem um trecho do livro de
Marjorie Shostak, Nisa: The life and words of !Kung woman, que é o relato de Nisa que
está dando à luz a uma criança em algum lugar do deserto de Kalahari enquanto narra a
sua experiência. O leitor é levado a imaginar mais do que está sendo descrito: a norma
cultural, o heroísmo da mãe, o sentimentos e dúvidas de pós-parto e os próximos passos,
enfim, a alegoria evoca na mente leitora questões que remontam a humanidade, o
significado de ser mulher (agora mãe), ser mãe de filha naquela cultura. A alegoria é
uma história de outra história. A narrativa emerge na ocasião da fala simultaneamente
de si e para o outro (p. 106): vida vivida e contada. A consciência de que sujeito-sujeito
(e não sujeito e objeto) se engendra num movimento duplo de imaginação, dúvida,
desejo e ação (rememorar, confessar, levantar-se, cobrir a filha recém-nascida e
caminhar, um rito de passagem) que responde pela qualidade discursiva na etnografia
dando centralidade à intersubjetividade e autoria do pesquisador.

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Percebe-se, assim, que a escrita traduz a experiência na forma de texto com múltiplas
vozes e posições que evocam circunstâncias históricas, culturais e políticas em que
ambos, informante e pesquisador são leitores e reescritores da invenção cultural
(CLIFFORD, MARCUS, 1986, p.115-116). Levantamento bibliográfico e leitura da
literatura, anotações de campo, escrita de histórias como forma de teorizar, ou seja,
“teorizar o trabalho diário da cultura x” (JONES, ADAMS, ELLIS, 2016, p. 19) são
previstos. O pesquisador se teoriza e a teoria se modifica a partir de seu olhar
interpretativo. Criticidade e atuação emergente são complementares quando se
desenvolve uma relação de embodiment/encorporamento na performance (isto é,
vivendo a autoetnografia com energia vibrante e experiência suscitada) da escrita e da
leitura (ou de forma multimodal de registro das apreensões) que são críticas,
autocríticas/reflexivas e de riscos. Os riscos são pessoais, resistentes, coletivos, éticos e
necessários para mudanças relevantes no mundo (JONES, 2016, p. 19). O pesquisador
pode correr o risco de distorcer visões e práticas de comunidades na tentativa de ativar e
ouvir suas vozes, declaram Ellis, Adams, Bochner (2016, p. 289).

Ainda, o que está em jogo é uma reconsideração de como pensar, fazer pesquisa,
relacionar com o diferente que auxilia o pesquisador a apreender os sentidos dessa
convivência. No entanto, nem toda escrita pessoal é autoetnográfica. Esta última
caracteriza-se por: a) apresentar observações e posição crítica sobre práticas culturais
com um propósito social; b) contribuir para pesquisas já existentes; c) engajar-se com
vulnerabilidades com um propósito social e d) criar uma relação recíproca com o
público com vistas às explicações de tais práticas culturais envolvendo as perspectivas
de todos os participantes da pesquisa (JONES, ADAMS, ELLIS, 2016, p. 22). Não falar
por todos é o alerta que tais autores acionam, pois o pertencimento é dinâmico; estamos
associados e dissociados às comunidades. Analogamente, estas estão em relação viva
com outras.

Nesse raciocínio, a perspectiva é híbrida, produtiva e encampa o estudo aqui em


questão. “A etnografia é uma atividade textual híbrida: ela atravessa gêneros e
disciplinasxi” (CLIFFORD, MARCUS, 1986, p. 26) que produz histórias que se abrem
para outras histórias. No que tange à questão de culturas, Clifford, Marcus explicam “as
culturas não são objetos científicos (assumindo que tais coisas existem, até nas ciências
naturais). As culturas, e nossas visões “dela” são historicamente produzidas, e são
ativamente contestadas...temporais e emergentes” (CLIFFORD, MARCUS, 1986, p. 18-
10, grifo do autor).

Os benefícios são: a reconstituição identitária dos participantes da pesquisa junto a


possibilidade de expandir a consciência crítica e autocrítica/reflexiva, pois “pessoas
locais estudando suas próprias culturas oferecem novos ângulos de visão e de
profundidade de compreensão” xii(CLIFFORD, MARCUS, 1986, p. 9) Marcus indaga:

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“Por que você está exatamente neste loca e não em outro?” (MARCUS, 1986, p. 172)
ao acentuar que uma sensibilidade com níveis culturais macro e micro para entender
como as pessoas respondem ao dia a dia (incluindo as dificuldades do fazer
interpretativo religado ao mundo social por meio de metacomentário) pode ser um
caminho para ouvir atentamente aos significativos, uma condição essencial à pesquisa
(MARCUS, 1986, p. 193)

Corroborando os autores supracitados, Allen-Collinson (2016, p. 286) assinala que:


“uma consequência importante para os autoetnógrafos é que nenhuma história pessoal
de um sujeito é completamente sua; as vozes e os eus dos outros interconectam conosco
e com nossas históriasxiii.” Se, de acordo com Poulos (2016, p. 476) a autoetnografia
tem sido acusada de egocêntrica com o risco do pesquisador (normalmente de lócus
eurocêntrico) se colocar num lugar distante e supostamente neutro, outra postura
emerge: “Mas a autoetnografia não é exatamente a minha história. Quando ocorre, é a
história de todos nós”xiv (POULOS, 2016, p. 476).

Essa experiência vigorosa de escrita suscita inovações compartilhadas para os outros e o


espírito de busca, de pesquisa com produtividade ao fazer insurgir outras
problematizações e questionamentos, um exercício de cidadania que respira por outros
poros tanto para o pesquisador quanto para os participantes em seu entorno. A
produtividade vigorosa é compreendida por Poulos (2016, p. 476) como “esperança”
(“hope”). Tal produtividade pode ampliar e silencia vozes, já que é impossível para o
pesquisador transitar por todos os espaços ao mesmo tempo. Contudo, desnaturalizar o
“privilégio” do Norte global e o “desprivilegiado” Sul global passa a ser uma opção
relevante na perspectiva pós-colonial. Vale a pena lembrar de um ponto fulcral aqui:
“Um trabalho autoetonográfico que adota uma posição pós-colonialista crítica pode
propiciar voz potente voltada para o desafio e rompimento de discursos e práticas
imperialistas, por mais bem intencionados que possam ser”xv (ALLEN-COLLINSON,
p. 290). Nessa lógica, questões éticas na relação das vozes e engajamento com uma
determinada cultura podem transformar discursos rígidos com vistas à agência coletiva
e participativa com distribuição de forças.

Toyosaki and Pensoneau-Conway (2016, p. 559) vão além e propõem exercitar


autoetnografia para além da epistemologia (modos de conhecimento) e praxiologia
(ação crítica no mundo) seguindo uma orientação que poderá prover o mundo com
respostas que transforme a individualidade em processos de reconstrução social e justa.
Para este fim social, três pilares fundamentam a autoetnografia: “tornando-se (o eu),
relacionando (com outros relacionais), e formando comunidades (juntos). Tudo isso
promove autoetnografia colaborativa como uma práxis de justiça social xvi” de acordo
com Toyosaki and Pensoneau-Conway (2016, p. 562). Assim sendo, intersubjetividade,

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relacionamento e comunidade formam uma importante tríade que se abre para outras
interpretações em rede.

O teor dialógico transforma a individualidade do eu e de você em nós. Esse encontro


prevê respeito às diferenças culturais, linguísticas, geográficas, políticas etc. discórdia
de posicionamentos e transformação dos privilégios dados como “padrões” como sendo
recursos necessários à epistemologia e ontologia, reafirmam Toyosaki and Pensoneau-
Conway (2016, p. 567). Reconhecer a consciência relacional e desenvolvê-la e não
eliminá-la em meio à incompletude das interpretações das cenas dos processos diários.
A autoetnografia relacional é um modo de responder às injustiças sociais por meio das
narrativas que são produzidas coautoralmente, acrescentam Toyosaki and Pensoneau-
Conway (2016, p. 569), os quais enfatizam que “As narrativas viajam de modo
rizomático de forma a trazer à tona questões de justiça social xvii” (TOYOSAKI,
PENSONEAU-CONWAY 2016, p. 571). Esse trabalho desenha a parcialidade das
narrativas que se entrelaçam e se intertextualizam com outras, ou seja, “as histórias
dependem umas das outrasxviii” (TOYOSAKI, PENSONEAU-CONWAY, 2016, p.
571).

Por o eu (self) em diálogo, por assim dizer, com contextos sociopolíticos mais amplos
para ouvir as vozes de grupos menos favorecidos como salienta Allen-Collinson (2016,
p. 290) em: “dar voz a grupos que frequentemente não são ouvidos.xix” Talvez, nem seja
ao caso de dar vozes, já que tais grupos possuem vozes que apenas precisam ser
ativadas. A autoetnografia cria espaço para as vozes dissonantes questionarem se o
conhecimento supostamente universal, neutro e racional é parcial e singular, servindo
meramente para reforçar discursos dominantesxx” (ALLEN-COLLINSON, 2016, p.
290), o que nos leva a ratificar que a pesquisa, com qualquer processo científico, é um
ato político.

Além disso, a autoetnografia pode ter natureza colaborativa incluindo discussões e


processos imbricados por redes de histórias coletivas que considerem processos de
“rememorar a centralidade da experiência humana vivida e compartilhada e os limites
da intersubjetividade”xxi (ALLEN-COLLINSON, 2016, p. 292- 293). Isso pode implicar
a “suspensão das pré-suposições e dos pressupostos do pesquisador a respeito do
fenômeno... atribuindo ao familiar um sentimento emergente de estranheza xxii”
(ALLEN-COLLINSON, 2016, p. 295), auto analítico, auto questionador com vistas à
abertura de outros horizontes.

Entendemos que a relevância da autoetnografia é vivenciar experiências construídas na


base de autoconhecimento, expondo publicamente as intersubjetividades (“dando a cara
a tapa”) mas com consciência autocrítica do mundo social circundante. Ou seja,

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politizar a experiência autoetnográfica por meio de autocrítica/reflexividade engajada
com as visões dos participantes da pesquisa e descrições mais ou menos densas
(GEERTZ, 1973) com elaborações a partir do reconhecimento de que as diferenças,
tensões e contingências entram no jogo da construção de sentidos. Em contextos
multilínguesxxiii Martin-Jones, Andrews, Martin (2017, p. 189-202) relatam experiências
etnográficas em que os pesquisadores trabalham em grupo. Cada vez mais, reflexões
críticas sobre os significados da natureza dos recursos linguísticos, semióticos e textuais
são ampliados e o engajamento dos membros com as diferenças de toda ordem que
navegam pelas práticas de pesquisa dessa ótica permitem riquezas. Dentre elas, um
entendimento de como as percepções e interpretações dos eventos e das práticas
discursivas dos participantes e de toada a equipe são influenciadas por próprias
histórias, valores e pressupostos. O resultado é o reconhecimento de o desenho de
projeto de pesquisa de cunho reflexivo precisa criar espaço e condições que permitam a
emergência de “etnografia polifônica” (CLIFFORD, 1990), ou seja, com a consideração
das vozes, princípios e agência dos participantes por meio da recepção e produção de
tais vivências de forma crítica (e acrescentaria autocrítica reflexiva) de textos e relatos
que exprimam cultural e sensivelmente os processos complexos da pesquisa. A
autoetnografia rompe com o silenciamento de questões da vida pessoal e o
reposicionamento de vozes, os quais dificilmente seriam trazidos à tona por meio de
metodologias não autocríticas/não reflexivas. Aqui, os leitores são convidados a
repensar seus modos de vida para além do senso comum.

3. AUTOETNOGRAFIA/AUTOCRÍTICA REFLEXIVA PARA FORMAÇÃO DO


PROFESSOR-PESQUISADOR DE/COM LÍNGUAS/LINGUAGENS

Vimos até aqui que a autoetnografia não se propõe a resolver problemas assim como sua
“mãe”, a etnografia, também não se propõe a fazer isso. No entanto,

[...] nós conceituamos e atribuímos sentido ao mundo que nos cerca por meio
da linguagem, e nós negociamos nossas relações com os outros por meio da
linguagem. Quem somos, e quem podemos ser são questões de linguagem. E
quem podemos ser tem a ver com nosso acesso às coisas que interessam:
poder político, recursos econômicos como trabalho, educação, status social
ou recursos culturais como histórias, músicas e arte. (HELLER,
PIETIKÄINEN, PUJOLAR, 2018, p. 1).

Mas a fim de compreender as diferenças e problematizá-las tentando transformar as


questões locais-globais, inerentemente perturbadoras porque dialógicas, o pesquisador
também se pesquisa e prescinde da convivência com as diferenças ontológicas que nem
mesmo conhece sobre si e seu espaço social. Seu caráter é político, pois “nos permite
tornar visível as contradições e condições que não somente explicam porque as pessoas
fazem o que fazem [...] mas tampem prever as zonas de fragilidade e tensão, as áreas

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que requerem administração xxiv” (HELLER, 2011, p. 93). Nesse projeto social, que
poderia ser uma prática diária, a busca pode ser surpreendente e o retorno não é
replicável. A única certeza é a incerteza quando se vai a campo pesquisar porque as
lacunas não estarão lá para serem preenchidas e sim apreendidas. Essa viagem alarga o
espectro de interpretações, discussões e reflexões acerca de questões que interessam e
que tornam a comunidade culturalmente sensível ao rememorarem o passado ativando
outros significados, ao reinventarem o presente com maior probabilidade de se
organizarem para um futuro de maneira criativa, ética, coletiva e participativa.

Outra importante interface que se destaca é a proposta pós-colonial de conceber o


mundo e nele agir. Na esteira do pós-colonialismo, Clifford (1997) e pós-nacionalismo
Heller (2011) argumentam a favor de pesquisas de natureza (auto)etnográfica que
reforcem a agência crítica dos pesquisadores. Perguntas-chave mostram-se importantes
nesse processo. O mundo das linguagens admite a diversidade como parte natural da
realidade e pessoas como coconstrutoras do mundo sociedade:
Quais recursos estão sendo acionados num determinado espaço discursivo? Quem tem
acesso a eles? O que fazem com eles? Como e em que circunstâncias e com que efeitos?
(HELLER, 2011, p. 193). Quais componentes de identidade são “profundos” e quais são
“superficiais”? O que é “central” e o que é “periférico”? Quais elementos são bons para
viajar e quais são bons para habitar/alojar? O que será articulado na comunidade? O que
funciona em coalisão? Como esses elementos interagem historicamente, em tensão e
diálogo? (CLIFFORD, 1997, p 46). Essas perguntas reorientam os participantes para
outras lógicas além das que trazem.

Santos (2007), por exemplo, critica o que denomina pensamento abissal, o qual
estabelece uma fronteira entre o sul e o norte, um precipício que separa o eu e o outro
conferindo a este último o poder de lançar luzes às trevas do sul, epistemologicamente
falando, e não do ponto de vista geográfico. Em defesa de uma ecologia de saber, o
autor chama a atenção para o valor que o conhecimento desconhecido ou pouco
legitimado (quilombolas, indígenas, camponeses etc.) tem e que precisa se acomodado
nas decisões políticas e democráticas. É nesse ponto que a autoetnografia focaliza um
trabalho social com oportunidades para contestar e transformar relações, vozes e ações
autoritárias por meio de escrita autocrítica/autoreflexiva promovendo problematizações,
reconceitualizações e insights em direção à justiça social. Justiça esta como um
processo que também se permita autocrítica reflexiva para se reinventar de tempo em
tempo. Do ponto de vista educacional, a proposta da pesquisa é política, conforme
explicam Clifford, Marcus (1986, p. 9), “o trabalho etnográfico tem sido imbricado num
mundo de permanentes desigualdades de poder, e continua sendo ativo. Ele encena
relações de poder. Mas sua função em meio a essas relações é complexa,
frequentemente ambivalente, potencialmente contra-hegemônico”.xxv

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Os leitores renegociam o que está sendo entendido como cultura e realidade sem que a
voz do pesquisador seja uma autoridade e a do informante/participante de pesquisa
apenas uma voz parafraseada. Isso porque em meio ao dialogismo e polifonia
(BAKHTIN, 1999) há níveis de hierarquias discursivas. O conceito de língua/linguagem
que a autoetnografia adota deriva de uma filosofia de linguagem (BAKHTIN, 1999), ou
seja, um sistema aberto e dinâmico que modifica as realidades a partir da agência de seu
usuário/pesquisador imerso num contexto sociocultural e histórico que revitaliza os
sentidos cada vez que interpretar um determinado texto/discurso. A agência de tal
usuário, neste caso, o pesquisador corresponde a sua capacidade de ativamente negociar
sentidos com o autor, o texto e seu entorno social engendrando, assim, a incessante
reinvenção das formas de se usar a língua/linguagem. É nesse momento que:

[...] a comunicação e interação sã garantidas pela ação das duas forças sociais
simultâneas – centrípeta e centrífuga, uma normatizadora e outra des-
normatizadora; enquanto a força centrípeta garante o mínimo de elementos
em comum, e portanto, a compreensibilidade, a força centrífuga impõe a
diferença e a variabilidade, introduzindo o novo e a transformação.”
(MENEZES DE SOUZA, 2010, p. 298)

As formas emergentes de se usar a língua/linguagem carregam características híbridas a


elas inerentes que concebem, por exemplo, os gêneros textuais/discursivos como sendo
altamente híbridos na origem. Embora as diferentes áreas do conhecimento estejam
separadas por disciplinas para fins de organização institucional, isso não quer dizer que
o conhecimento seja compartimentalizado. Ao contrário, as ciências, culturas, relações
de poder, identidades e narrativas de vida seguem o comportamento da
língua/linguagem e se retroalimentam e não podem ser reduzidas a um único processo
linguístico, cultural, social, político e econômico. Para os tempos que enfatizam a
diversidade como norma social, a autoetnografia busca atender a essa premissa e aos
conceitos de língua/linguagem, conhecimento, poder e identidade. Nesses conceitos o
que ganha destaque é a heterogeneidade, pois o que que é híbrido para uns, pode não ser
para outros. Conceitos de textos, oralidades, discursos, convenções, códigos, variações,
estratégias e contextos dependem da emergência de sentidos que os interlocutores de
uma determinada situação social constroem em meio às tensões dialógicas e éticas
(TAKAKI, 2011, 2012, 2013a, 2013b), as quais lutam por espaços ontológicos,
epistemológicos e metodológicos plena e constantemente situados (TAKAKI, 2016,
2018).

Aliado a esse pensamento, Monte Mór (2007a, 2007b) promove uma reflexão que
denomina terceira fase dos letramentos (MONTE MÓR, 2007a, 2007b) e desperta a
necessidade de se buscar alternativas para transformar noções de alfabetização, leitura e
interpretação na formação dos estudantes e professores. Distanciando-se da educação
reprodutivista de hierarquias, salienta que o conhecimento coconstruído com a
agência/autoria dos estudantes, professores e autoridades dialogando com a

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contemporaneidade diária do espaço digital local-global mostra-se relevante. Essa
perspectiva despertou em mim, autora deste capítulo, o interesse para exercitar a
autoetnografia (embora não tenha usado tal termo, preferi autocrítica para incluir meu
self em letramentos críticos e na ocasião adotava um avatar em seu endereço de e-mail:
bobnation@terra.com.br) numa pesquisa de mestrado publicada (TAKAKI, 2011). Sai
de uma experiência para adotar e ensaiar uma nova identidade, “experience of adopting
and rehearsing a new identity (HELLER, 2018, p. 131), ou melhor, identidades que se
mesclavam: a de professora, pesquisadora e escritora do meu próprio fazer pedagógico
Inspirei-me nas aulas das disciplinas “Etnografia da prática escolar” e “Narrativa e
Identidade”, ministradas por Souza, no período de 2001- 2008, as quais foram pautadas
pelo pensamento pós-colonial e pós-estrutural.

Essas disciplinas enfatizaram conceitos e princípios ontológicos e epistemológicos


críticos que contribuíram para informar a autoetnografia que aqui se desenhou. Ou seja,
compreender a si com o outro e tendo o outro como parte de si requer constantes
negociações com as diferenças, convergências e divergências em movimento tendo em
mente o foco da pesquisa e as teorias que a revestem. A autocrítica (doravante
autocrítica/etnografia) pressupõe coragem e modéstia para o desenvolvimento de
processos que revisem conceitos. Conceitos estes muitas vezes grassados pela
escolaridade convencional. Um dos caminhos possíveis para reflexividade crítica de si e
do outro com maiores probabilidades de se moverem juntos, num engajamento que
reavalie questões ontológicas, epistemológicas e metodológicas xxvi fazendo da
autocrítica/autoetnografia um modo de vida para além de mera alternativa de pesquisa.

Nesse sentido, concepções sobre a expansão da capacidade crítico-interpretativa,


processo tão caro aos novos letramentos (LANKSHEAR, KNOBEL, 2005),
multiletramentos (NEW LONDON GROUP, 1997; COPE, KALANTZIS, 2012) e
letramentos críticos (MUSPRATT, LUKE, FREEBODY, 1997; JANKS, 2010;
SOUZA, 2011; MONTE MÓR, 2007a, 2007b; MORGAN, RAMANATHAN, 2005,
TAKAKI, MACIEL, 2017, dentre outros) são companheiros imprescindíveis à
autoetnografia/autocrítica. Para este fim, transitar por outras disciplinas e dialogar com
autores que pesquisaram concepções que auxiliam no desenvolvimento do espírito
crítico mostrou-se relevante. Foi isso que procurei realizar nessa pesquisa de mestrado,
com atitude transdisciplinar aliando conceitos como: ruptura de Ricoeur (1978),
linguagem de Bakhtin (1999) e desconstrução de Derrida (2001), sem os quais
autocrítica/autoetnografia ficariam devendo em termos de teor crítico na polivalência
requisitada pela atualidade da formação de professores e pesquisadores de/com
línguas/linguagens.

Os participantes da referida pesquisa eram professores de inglês da educação básica que


faziam um curso de inglês com duração de três anos num instituto de ensino de inglês

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da iniciativa privada. Esses três anos tinha como objetivo o desenvolvimento de
habilidades comunicativas conforme princípios epistemológicos e critérios de
proficiência linguística britânicos. Após esse período, tais professores participariam de
um projeto “Reflexão sobre a Ação; o professor de inglês aprendendo e ensinando”
como um curso de Pós-graduação lato sensu, com duração de um ano e meio numa
universidade particular conveniada ao referido instituto de inglês. O curso de inglês para
tais participantes na escola de idiomas refletia o mesmo curso oferecido para os alunos
regulares. Realizei uma pesquisa de natureza etnográfica, por aproximadamente um ano,
tendo no radar a autocrítica junto com teorias de linguagem, interpretação, letramentos
críticos, conforme já mencionadas.

Para povoar o pensamento de outras perguntas, cenas, introspecções, reflexões, práticas


de relações, rodas de conversa e de discussão com os meus alunos (TAKAKI, 2011),
amparei-me em propostas que extrapolam a dicotomia entre ensinar e aprender e preferi
ontologias, epistemologias e metodologias que reconhecem que a formação cidadã para
um mundo com diferentes nuanças sobre o local-global e digital tem por norma a
diferença viva e produtiva. Nesse processo de interação entre escola, universidade e
sociedade, indago se o cuidado do outro e de si (coletivos) não implica um exercício
contínuo da capacidade crítica, autocrítica/ reflexiva e criativa na reconstrução e
renegociação de sentidos por meio de materiais, estratégias, relações e transformações
para além das aulas buscando respostas por meio de ontologias-epistemologias-
metodologias vanguardistas e problematizadoras, mas não tentando alcançar uma
verdade como universal e ahistórica.

Reconhecer que “em terra de cego quem tem olho é mero espectador” que aprende com
os participantes, muda os termos da pesquisa. Interrogar sobre o porquê das pessoas em
contextos específicos se interessarem por ler o que vivenciei, aprendi e escrevi e de que
modo contei a minha história foi parte constitutiva da pesquisa autocrítica. Nesse
sentido, engajei-me no processo de investigação e no da escrita de uma narrativa
autocrítica com as vozes ativadas dos participantes e isso me fez distanciar de um
simples relato etnográfico. Sem perder o rigor científico, o mergulho nas profundezas
das águas e a volta à superfície para enxergar outras perspectivas coexistentes no
processo de apreensão de significados incertos, ambíguos e emergentes, os quais são
inerentes à pesquisa, deu a tom transdisciplinar como meio de me aproximar do público
também externo à academia.

A escrita desse projeto, das perguntas de pesquisa, as anotações, das análises em


retrospecto e da narrativa geral da experiência foi apenas parte de uma conversa com os
interlocutores (eu mesma com os outros) e convidou leitores a reviver eventos,
passagens e insights e validá-los, algo que não seria possível de ser acessado por meio
de metodologias mais rigorosas, lineares e pré-estabelecidas. A autocrítica é um

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processo complexo que envolve investimento pessoal dialógico, intervenção que
assume várias identidades (professora, pesquisador, orientanda de mestrado, leitora de
si, da outridade e do mundo), argumentos que são passíveis de mudança e apoiados em
dados empíricos, reajustes para atender às normas institucionais, benefícios à sociedade
e acessibilidade para as múltiplas formas de comunicação quanto à disseminação da
pesquisa. Por entre engajamentos e distanciamentos críticos e autocríticos, ouso dizer
que os processos de construção de conhecimento e os critérios de validade e
confiabilidade da pesquisa autocritica/autoetnográfica são continuamente
problematizados e também ficam por conta do leitor (igualmente constituído por
intersubjetividades móveis) que é coautor e revitaliza as formas sociais híbridase
transculturais, as quais sempre estiveram na origem das performatividades.

4. PARA CONTINUAR...

Advogar a favor de uma educação ampliada por meio da autocrítica/autoetnografia não


é simplesmente agregar itens, como se fosse uma matemática com a adição de
ingredientes criativos, críticos e éticos. Este capítulo prestou-se a tratar de uma
possibilidade de reaprendizagem com a abertura do pensamento (MORIN, 2005) e,
portanto, com probabilidade de mudanças. A mudança interior que se reconecta ao
mundo exterior com o outro e volta-se para si (ambos coletivos porque pertencem a
várias comunidades tensionadas por diferentes interesses) como modo de vida funciona
como o coração da autocrítica/autoetnografia. É permitir-se cair na armadilha daquilo
que critica e reconhecer que essa viagem é uma passagem importante para se distanciar
da zona de conforto e enxergar o que estava embaçado. Ao se dar conta da chamada do
eu sobre o outro (TAKAKI, 2011), mas não a garantia de sucesso, afinal, o que seria
bem-sucedido para um, não seria necessariamente para outro, tornamos o familiar
estranho, desconstruímos e reconstruímos os conflitos por outras lógicas e exercitamos
criticamente as línguas/linguagens. A autocrítica/autoetnografia possibilita intensificar
os diálogos/as tensões (no sentido produtivo) e ampliar o encontro com o diferente e
entender que a contingência remonta outros significados outrora irrelevantes ou
omitidos. É dessa forma que, talvez, as epifanias possam se abrir para uma relação
produtiva que não se fecha e nem tem tempo para terminar.

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i
Original: knowledge does not derive directly from evidence or experience, but is mediated by how we
choose to formulate it and represent it in specific contexts of communication.
ii
Original: It allows the researcher to take up each person´s life in its immediate particularity and to
ground the life in its historical moment […] Interpretation works forward to the conclusion of a set of acts
taken up by the subject, while working backing in time, interrogating the historical, cultural and
biographical conditions that moved the person to experience the events being studied.
iii
Original: Epiphanies are ritually structured liminal experiences connected to moments of breach, crisis,
redress, schism, crossing over one space to another.
iv
Neste trabalho, opto por usar a forma autoetnografia/autocrítica/reflexividade quando me refiro à
semelhante base epistemológica embora de diferentes autores. Quando usada isoladamente, a palavra
autoetnografia marca afiliações com seus autores criadores.
v
Original: The key point is that autoethnographic research allows for the personal and authentic views of
the participant that could not occur through other methodologies. The autoethnographic method allows
for reflection of the researchers upon themselves and upon their own views.
vi
Original: We atribute significance and meaning to our actions and experiences.
vii
Original: A way of life that acknowledges contingency, finitude, embeddedness in storied being,
encounters with Otherness, an appraisal of ethical and moral commitments, and a desire to keep
conversation going.
viii
Original: Again, autoethnography does not claim to produce better, or more reliable, generalizable,
and/or valid research than other methods, but instead provides another approach for studying culture
experience.
ix
Original: Ethnographic truths are thus inherently partial-committed and incomplete.
x
Original: Theorizing the daily working of culture.
xi
Original: Insiders studying their own cultures offer new angles of vision and depths of understanding.
xii
Original: Why precisely are you in this locale rather than another?
xiii
Original: An important consequence for autoethnographers is that no individual person´s story or self
is therefore completely or entirely her or his own; the voices and selves of others intertwine with
ourselves and our stories.
xiv
But autoethnography is not really my story. When it works, it is the story of us all.
xv
Original: Autoethonographic work that adopts a critical postcolonialist stance can provide a potent
voice aimed at challenging and disrupting imperialist discourses and practices, however “well-
intentioned” these might be.
xvi
Original: Becoming (the self), relating (with relational others), and making communities (together) all
of which collaboratively promote autoethnogtraphy as a praxis of social justice.
xvii
Original: Narratives travel in rhizomatic fashion so as to bring to light issues of social justice.

DOI: 10.29327/214648.8.31-17

INTERLETRAS, ISSN Nº 1807-1597. QUALIS. V. 8, Edição número 31, abril/setembro 2020 - p


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xviii
Original: stories hinge upon one another.
xix
Original: to give voice to groups often unheard.”
xx
Original: dissenting voices to question whether supposedly universal, neutral and rational knowledge is
in fact highly partial and particularist, merely serving to reinforce dominant discourses”
xxi
Original: re-memory the centrality of shared human lived experience and the limits of intersubjectivity.
xxii
Original: suspension of the researcher´s pre-suppositions and assumption about a
phenomenon...rendering the familiar strange feeling that emerge
xxiii
Quando se considera as pluralidades e complexidades, “o monolinguismo nunca existiu de fato”
(CANAGARAJAH, ministrando minicurso na Universidade de São Paulo em 2015).
xxiv
Original: allows us to uncover the contradictions and conditions that not only explain why people do
what they do […] but also foresees the zones of fragility and tension, the areas that require management.
xxv
Original: Ethnographic work has indeed been enmeshed in a world of enduring and changing power
inequalities, and it continues to be implicated. It enacts power relations. But its functions within these
relations is complex, often ambivalent, potentially counter-hegemonic.”
xxvi
Para mais detalhes do imbricamento entre ontologia-epistemologia-metodologia consultar Takaki
(2016, 2017, 2018).

*Doutora em Letras, Universidade Federal de Mato Grosso do Sul (UFMS), Faculdade


de Artes, Letras e Comunicação (FAALC). E-mail: narahi08@gmail.com.

DOI: 10.29327/214648.8.31-17

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