Você está na página 1de 10

ESCRITURAÇÃO ZOOTÉCNICA

A escrituração zootécnica consiste no conjunto de práticas relacionadas ao


registro de todos os eventos que acontecem em uma fazenda. É o mecanismo de
descrição de toda a estrutura da propriedade: identificação dos animais, dados de
sanidade do rebanho, manejo alimentar e reprodutivo, pastagens, práticas de manejo
geral, insumos, produtos e comercialização, anotações contábeis, controle do
desempenho dos animais etc. (SANTOS, 2017). Tudo isso, em conjunto, auxilia o
proprietário a identificar possíveis falhas que possam estar ocorrendo na criação,
permitindo a correção preventiva dos possíveis problemas.
Por meio da escrituração zootécnica é possível obter informações básicas,
como: a evolução de rebanho, número de animais nascidos, fêmeas paridas, e com
esses dados é possível determinar os índices zootécnicos da criação (MARQUES
JÚNIOR et al., 2010). O gerenciamento e processamento desses dados pode ser
realizado de diversas formas, sendo as tabelas em cadernos, planilhas eletrônicas ou
programas de computador os mais comuns nas propriedades (QUIRINO et al., 2004).
Vale ressaltar, ainda, que independentemente do método de controle, as anotações
realizadas diariamente em campo, feitas por peões, vaqueiros, ordenhadores,
produtores ou técnicos, são a base para o controle do rebanho e para a tomada de
decisões na propriedade.
No entanto, mesmo diante de todas essas vantagens, a escrituração zootécnica
não é uma prática comum nos estabelecimentos rurais. Segundo Corrêa et al. (2002),
no Brasil, a maioria das fazendas tradicionais é conduzida de forma empírica e
desorganizada, com raros estabelecimentos adotando registros zootécnicos,
sanitários e contábeis. Para Lima et al. (2018), em alguns casos, essa deficiência se
deve à falta de anotações rotineiras dos dados relacionados com os animais da
criação. Em outros casos, o problema está no processamento e análise dos dados
anotados, visto que algumas propriedades possuem muitos dados (ex.: data de
nascimento, peso ao nascer, mortes etc.), porém não conseguem transformá-los em
informação útil ou em índices zootécnicos.
Para Santos (2017), em seu estudo realizado no semiárido Baiano e
Pernambucano, a baixa adoção da escrituração está diretamente ligada a baixa
conscientização dos produtores acerca dos benefícios de tal prática. Outro fator é a
falta de assistência técnica de qualidade, uma vez que as informações não chegam
ao pequeno agricultor que mora afastado dos centros urbanos. Ainda conforme
Santos (2017), “a marcação e/ou identificação dos caprinos e ovinos torna-se difícil
de ser mantida porque os animais perdem frequentemente os brincos ou colares,
quando são soltos na vegetação da Caatinga. O ideal é a identificação por tatuagens
nas orelhas, mas nem todo criador tem acesso a essa tecnologia.”
De acordo com Koritaki (2020), para o melhoramento animal é imprescindível
os registros que envolvem a identificação individual dos animais atrelado aos registros
de ocorrências: reprodutivas (identificação de parto, identificação da cria e
identificação de cobrições/inseminações artificiais), produtivas (peso, ganho médio
diário de peso, produção de leite e duração da lactação), genealogia (parentesco entre
os animais) e sanitárias (incidência de enfermidades, administração de vacinações e
administração de medicamentos).
Ainda segundo Koritaki (2020), a base da escrituração zootécnica é a
identificação individual dos animais no rebanho, sendo a utilização de números – seja
eles em sequência ou em arranjos mais elaborados – o mais recomendado. Assim,
todo animal deve ter um número único para o resto da vida. Dentre os principais
métodos de identificação, estão:
Nomes: é mais utilizado em rebanhos menores, muitas vezes associado ao método
de identificação por brincos. É um sistema eficiente quando é possível o
reconhecimento de todos os animais, porém na medida em que há aumento do plantel
torna-se mais difícil a assimilação.
Brincos: está entre os sistemas mais adotados, uma vez que pode ser utilizado em
rebanhos maiores, pois os códigos utilizados (numérica e alfanumérica) são infinitos.
Existem várias opções de brincos (cores diferentes, código de barras, formatos,
numeração pronta ou em branco etc.). A aplicação dos brincos deve ser feita tomando
os devidos cuidados, além de exigir acompanhamento médico, uma vez que a sua
colocação causa um ferimento na orelha do animal e até a cicatrização, existem riscos
de infecção e, consequentemente, a perda do brinco.
Colares: é um método parecido com o de brincos (por códigos), no entanto, é de fácil
aplicação, não causa ferimento ao animal e pode ser reaproveitado em caso de
identificação de animais que ficaram por pouco tempo na propriedade. Existem
diversos materiais que podem ser utilizados (náilon, arames, sisal e outros), havendo
vantagens e desvantagens para cada tipo (facilidade na amarração e maior
resistência).
Tatuagens: a tatuagem é um método de identificação permanente e de fácil
realização. A sua desvantagem é a dificuldade para visualização do código, sendo
necessária a contenção dos animais para que a leitura seja feita com a precisão e a
segurança necessárias para um bom trabalho. Em geral, a tatuagem é feita na parte
interna da orelha do animal, na base da cauda ou na prega da pele da virilha.
Geralmente esse método está atrelado a outro de fácil visualização.
Piques nas orelhas: é um método pouco utilizado em relação aos demais. Consiste
em realizar entalhes nas orelhas, no entanto, devido aos vários ferimentos causados,
a impossibilidade de correção e a perda de agilidade de identificação, esse sistema
está em desuso.
Marcação a ferro: é um método que exige imobilização do animal para a aplicação.
A marcação pode ser realizada à frio (de fácil visualização em animais com pelagem
escura) e à quente (que provoca dor, uma vez que a pele é queimada). Os dois tipos
permitem inúmeras possibilidades de identificação.
Tinta: é um método muito utilizado em animais lanados, uma vez que a tinta dura em
média 12 a 14 meses. Embora haja necessidade de manutenção, é um método que
não causa estresse ou ferimento ao animal e é de fácil aplicação e visualização.
Chip: é o método mais tecnológico que está em uso. Embora mais oneroso, oferece
agilidade no cadastramento e leitura dos dados dos animais. Geralmente é utilizado
em brincos ou colares, o que facilita a recuperação dos chips quando não possuírem
mais utilidade.
De acordo com Lopes et al. (2012), em sua pesquisa, dos métodos liberados
no Brasil, os mais utilizados pelos produtores entrevistados são: o brinco e botão
(90%); brinco e marca a ferro quente (6%); brinco e tatuagem (3%); brinco e dispositivo
eletrônico – implante na orelha (1%). Além disso, 78% dos pecuaristas consideraram
esses dispositivos de identificação eficientes e o uso de dois identificadores fornece
maior segurança caso haja perda de um deles. No entanto, na região da Caatinga,
por exemplo, a marcação com brincos e colares torna-se difícil de ser mantida, isso
porque os animais os perdem frequentemente quando são soltos na vegetação
(SANTOS, 2017).
Segundo Corrêa et al. (2002), “a grande maioria dos produtores rurais,
principalmente os de menor porte, ainda se mostram afastados ao uso do computador.
Além disso, parte daqueles que fazem uso deste recurso consideram os programas
disponíveis complexos e/ou caros”. Nesse contexto, em função da necessidade de
disseminar boas práticas de manejo e de contribuir para um melhor gerenciamento
das fazendas, a Embrapa Gado de Corte disponibilizou ao público os modelos de
fichas mais comumente utilizadas no controle dos rebanhos. Dentre os modelos estão:
Ficha de conferência do rebanho (anexos 1): tem como principal finalidade o
controle geral do rebanho, registrando as entradas e saídas, nascimentos, mortes etc.,
permitindo saber a quantidade de animais em cada período. Essa informação é de
suma importância não só para o controle patrimonial da fazenda, pois auxilia, por
exemplo, na definição das quantidades de insumos a adquirir (vacinas e outros
produtos veterinários, sal mineral etc.), controle da questão alimentar (se a fazenda
tem suporte para o tempo esperado, se será necessário buscar alternativas para a
suplementação etc.).
Ficha de práticas sanitárias e de manejo (anexo 2): tem como principal finalidade
controlar todas as práticas sanitárias e de manejo dos quais os animais foram
submetidos, facilitando o cumprimento dos calendários de controle sanitário e de
manejo da propriedade. Registros como esse são de suma importância para o controle
da saúde pública, auxiliando na compra e transporte de animais, epidemiologia das
doenças na região e avaliação de eficácia das vacinas utilizadas (SANTOS, 2017).
Ficha de controle de reprodução das matrizes (anexo 3): tem como principal
finalidade o controle da vida reprodutiva das vacas, em que se deve anotar dados
como a data do parto e o sexo do filhote. Essa informação é de suma importância no
processo de seleção das matrizes. A ficha precisa estar sempre atualizada, cuja
recomendação é que seja semanalmente durante os meses de nascimento.
Ficha de pesagem (anexo 4): tem como principal finalidade controlar o
desenvolvimento dos animais nas diversas idades e finalidades. Com essa informação
é possível acompanhar o desempenho ponderal dos animais, facilitando a seleção e
identificando as fases em que os animais necessitam de tratamentos diferenciados.
Conforme Lima et al. (2018), “O controle deve ser feito da forma mais fácil
possível e de acordo com a disponibilidade do produtor”. A utilização do controle
zootécnico nas propriedades, seja ela de pequeno, médio ou grande porte, é
extremamente necessário e positivo, uma vez que o produtor consegue ter o controle
local, minimizando possíveis erros nas ações do trabalhador.
Cavalcante et al. (2021), em um levantamento sobre o registro zootécnico e a
rastreabilidade bovina na pecuária com bovinos no Piauí, concluiu que a pecuária se
apresenta como atividade praticada com estrutura familiar, ou seja, em pequena
escala de área e de animais, sem a adoção da escrituração zootécnica, e sem grandes
perspectivas de renovação de recursos humanos na atividade, o que implica em um
baixo potencial para inserção da atividade em ambiente com tecnologia de
informatização ou em sistema de rastreamento zootécnico.
Santos (2017) conclui que, diante da baixa utilização da escrituração
zootécnica pelos produtores, é necessário que se faça um trabalho intensivo da
assistência técnica com os produtores para obtenção dos benefícios trazidos pela
prática.
ANEXOS

ANEXO 1 (ficha de conferência do rebanho)


ANEXO 2 (ficha de práticas sanitárias e de manejo)
ANEXO 3 (ficha de controle de reprodução das matrizes)
ANEXO 4 (ficha de pesagem)
REFERÊNCIAS

CAVALCANTE, D. H. et al. Levantamento sobre o registro zootécnico e a


rastreabilidade bovina na pecuária com bovinos no Piauí. X Simpósio Brasileiro de
Melhoramento Animal Uberaba, MG – 18 a 23 de agosto de 2013.

CORRÊA, Eduardo Simões et al. Fichas para controle zootécnico de bovinos de


corte. Campo Grande, MS: Embrapa Gado de Corte, 2002., 2002.

DE LIMA, Lisiane Dorneles et al. Escrituração zootécnica e econômica em


propriedades do município de Tauá, CE. Embrapa Caprinos e Ovinos-Comunicado
Técnico (INFOTECA-E), 2018.

KORITIAKI, Natália Albieri. Escrituração Zootécnica. Disponível em:


<https://nadispersa.medium.com/escritura%C3%A7%C3%A3o-zoot%C3%A9cnica-
58da6e8251e9>. Acesso em: 12 out. 2021.

LOPES, M. A. et al. Dificuldades encontradas pelos pecuaristas na implantação da


rastreabilidade bovina. Arquivo Brasileiro de Medicina Veterinária e Zootecnia, v.
64, p. 1621-1628, 2012.

MARQUES JÚNIOR, L. et al. SERVIÇO BRASILEIRO DE APOIA ÀS MICRO E


PEQUENAS EMPRESAS - ASSOCIAÇÃO NOROESTE PAULISTA DE
OVINOCULTORES. Manual de Boas Práticas para ovinos de corte. São Paulo,
2010.

QUIRINO, C. R. et al. Implementação da Escrituração Zootécnica e Registros de


Produção e Reprodução em Propriedades de Criação de Ovinos na Região Norte
Fluminense. In: Anais... 2º Congresso Brasileiro de Extensão Universitária, 2004.

SANTOS, R. P. et al. A escrituração zootécnica como ferramenta de trabalho em


pequenas propriedades rurais de caprinos leiteiros no semiárido pernambucano e
baiano. In: XII Congresso Nordestino de Produção Animal. 2017.

Você também pode gostar